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APRESENTAÇÃO

Prezado (a) acadêmico(a)!

É com grande entusiasmo que apresentamos a você, a disciplina Estudos da

Tradução e Interpretação em Língua de Sinais.

Este livro foi desenvolvido com muito estudo e dedicação para apresentar as
orientações teóricas e recursos que servirão como base para conduzi-lo(a) ao

conhecimento acerca das questões e debates que envolvem a Tradução e


Interpretação em Língua de Sinais.

A Tradução e interpretação em Língua de Sinais, está envolvida diretamente no que

diz respeito a vida social da comunidade surda sua escolarização e letramento, este

material aborda diferentes concepções teóricas com intuito de problematizar o tema


e possibilitar uma visão ampla dos diversos aspectos relacionados ao processo de

tradução e interpretação das línguas em geral, dando ênfase para a Língua de

Sinais do nosso Pais, que a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS ou LSB – (Língua

de Sinais Brasileira).

Os Estudos relacionados com a Tradução e Interpretação em Língua de Sinais tem


tido muito destaque pela modalidade visual/espacial das Línguas de Sinais, que foi

desenvolvida pelas comunidades surdas, por meio de aspectos culturais e de

identidade.

Assim como toda língua, as Línguas de Sinais são dinâmicas e está sempre em

processo de desenvolvimento e ampliação. Dessa forma se faz necessária conhecer

e se aprofundar no campo dos Estudos de Tradução e Interpretação dessa língua a

fim discutirmos o conceito e tipos de tradução que integra a Cultura da comunidade

surda.

Na Unidade 1 do livro, vamos buscar compreender o que é tradução, veremos quais

são os tipos de tradução conforme a tipologia definida por Roman Jakobson e


confrontaremos os conceitos de tradução e interpretação segundo autores como

Schleiermacher, Mounin, Maria Cristina Pires Pereira, entre outros.


Na Unidade 2 vamos entender os Problemas teóricos e práticos da Tradução e
Interpretação em diversos ambientes. Tipos discursivos e gêneros textuais

envolvidos na tradução e interpretação em Língua de Sinais. O processo cognitivo:

memória, inferências, soluções de problemas. Aplicação aos estudos da tradução e

interpretação. Problematizar e orientar a atividade tradutória e interpretatória, para


uma tradução e interpretação fidedigna e ética.

Na Unidade 3 apresentaremos Políticas e propostas vigentes na área de tradução e

Interpretação, criadas pelo Ministério da Educação, e pelas associações de

Tradutores Intérpretes no âmbito nacional. As tecnologias como apoio para

formação do Tradutor intérprete de Língua de Sinais. O trabalho do profissional

Tradutor Intérprete com o aluno surdo e o professor regente. Finalizaremos este livro
com um minidicionário, com alguns sinais em LIBRAS, para que você, acadêmico

(a), aprenda e treine no dia a dia, oportunizando um aprendizado básico para

desenvolver habilidades na Tradução e Interpretação em Língua Brasileira de Sinais

– LIBRAS.

Bons estudos!

Prof.ª Adriana Prado Santana Santos

Prof. Luiz Henrique Milani Queriquelli


UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS DA TRADUÇÃO: CONCEITOS E

TEORIAS

TÓPICO 1: TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO........................................................... 5

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 5
2 QUESTÕES GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO .................................................... 5

3 DIVERSIDADE LINGUÍSTICA ............................................................................ 9

LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................... 11

4 NEGOCIAÇÃO ENTRE TEXTOS E ENTRE CULTURAS ................................. 14

RESUMO DO TÓPICO 1 ..................................................................................... 19

AUTOATIVIDADE ................................................................................................ 21
TÓPICO 2: TIPOS DE TRADUÇÃO ........................................................................ 24

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................. 24

2 TRADUÇÃO INTRALINGUAL ........................................................................... 24

2.1 O PAPEL DA TRADUÇÃO INTRALINGUAL PARA A HISTÓRIA DA LÍNGUA

......................................................................................................................... 28
3 TRADUÇÃO INTERLINGUAL ........................................................................... 32

3.1 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL RELIGIOSA E O FOCO NO TEXTO DE


PARTIDA ......................................................................................................... 34

3.2 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL LITERÁRIA E O FOCO NO TEXTO DE

CHEGADA ....................................................................................................... 38

LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................... 40

4 TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA ...................................................................... 43

LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................... 48

RESUMO DO TÓPICO 2 ..................................................................................... 51

AUTOATIVIDADE ................................................................................................ 52
TÓPICO 3: FUNÇÕES DO TRADUTOR E DO INTÉRPRETE ................................ 55

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................. 55
2 INTERPRETAÇÃO SIMULTÂNEA E INTERPRETAÇÃO CONSECUTIVA ....... 55

3 ESPECIFICIDADES DE CADA PAPEL ............................................................ 58

LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................... 61
RESUMO DO TÓPICO 3 ..................................................................................... 64
AUTOATIVIDADE ................................................................................................ 66

REFERÊNCIAS DA UNIDADE 1 ............................................................................. 69


TÓPICO 1: TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO

1 INTRODUÇÃO

Olá, estudante! Você já parou para pensar que grande parte da vida moderna seria

impensável sem a tradução? Como você pode imaginar, esta é uma das atividades
mais antigas da humanidade e, num mundo cada vez mais diverso como o nosso,

ela continua sendo mais necessária do que nunca.

Em um sentido amplo, isto é, entendendo tradução como interpretação, podemos

afirmar que não há atividade linguística sem tradução. Como veremos adiante,

pode-se admitir que o aprendizado de qualquer língua passa necessariamente pela

tradução.

Além disso, pensando no propósito específico deste material, cabe acrescentar que

a atividade tradutória, na cultura dos surdos, ocupa um lugar igualmente central,

pois ela se faz presente tanto na comunicação destes com os ouvintes como entre

os próprios surdos.

Ao que parece, são muitas as implicações da tradução na nossa vida, certo? Você
verá, porém, que elas vão muito mais além do que podemos imaginar. Na próxima

seção, vamos abordar a definição de tradução, percorrendo uma relativa variedade


conceitual. Na seção seguinte, vamos discutir a diversidade linguística como

fenômeno que confere razão de ser a essa atividade. E na última seção, enfim,

pretendemos defender a definição de tradução como uma negociação entre textos e

entre culturas. Acompanhe!

2 QUESTÕES GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO

O conceito de tradução vem sendo objeto de debate há muito tempo.
 Em termos

diacrônicos, sabemos que a palavra portuguesa deriva do vocábulo latino traducere,


que significava levar/conduzir (ducere) além (tra).
Hoje, no entanto, esse sentido empregado pelos latinos, de levar um significado
para além de uma língua em direção a outra, já evoluiu para uma diversidade de

outros sentidos. Não é incomum vermos, por exemplo, alguém falando em traduzir

com o sentido de “revelar, explicar, manifestar, explanar”, “representar, simbolizar”,

entre outros usos.

Como Guerini e Costa (2006, p. 4) argumentam – e como você já deve ter inferido –

o sentido de “passar de uma língua a outra” é uma metáfora do ato físico de

transferir. Daí concluímos que os demais sentidos atribuídos a traduzir e a tradução

são gerados a partir de extensão metafórica, isto é, em todos eles, pressupõe-se o

ato de transferir, de passar algo de um lado a outro.

Nos termos dos autores, “traduzir designa, de modo


restrito, uma operação de transferência linguística e, de

modo amplo, qualquer operação de transferência entre


códigos ou, inclusive, dentro de códigos.” (GUERINI;

COSTA, 2006, p. 4).

Há pouco falamos que a prática tradutória se faz presente tanto na comunicação dos

surdos com os ouvintes, como entre os próprios surdos. E isso vale para o interior

de qualquer língua. Paz (1990, p. 9), a propósito, radicaliza a importância da


tradução intralingual para a constituição da linguagem ao considerar esse processo

essencial para os estágios iniciais de aquisição:

Aprender a falar é aprender a traduzir: quando uma criança


pergunta a sua mãe o significado desta ou daquela palavra, o que
realmente pede é que traduza para a sua linguagem a palavra
desconhecida. A tradução dentro de uma língua não é, nesse
sentido, essencialmente diferente da tradução entre duas línguas, e
a história de todos os povos repete a experiência infantil.

Nesse sentido, então, podemos assumir que não existe linguagem sem tradução.

Logo, reputamos como algo normal a antiguidade desse fenômeno, embora

devamos ressalvar que, ao longo dos tempos, seu status mudou por diversas vezes:

ora a translação de textos era considerada uma atividade nobre, equivalente a um


processo criativo, ora era considerada uma atividade vil, decorrente dos vícios
humanos.

A primeira e mais positiva dessas visões – a de tradução como criação – pode ser

bem observada entre os antigos romanos. A gênese da literatura e da ciência latina

está na tradução e imitação de modelos gregos, sendo que o conceito clássico de


imitação significava essencialmente recriação e superação do modelo. Uma prova

de como a tradução estava no centro da inventividade latina é a quantidade de

termos que os romanos tinham para essa atividade. Para diferentes nuances desse

fenômeno, dava-se diferentes nomes: verter, converter, transverter, imitar, explicar,

interpretar, exprimir, render, transferir, transladar, de onde vêm translação e

translator. Eis o que explica Furlan (2001, p. 13):

Na tradução artística, uma invenção latina, se produziu uma


romanização não só da expressão mas também do conteúdo, com
ênfase no texto de chegada, e a este novo valor se denominou com
os verbos uertere e o composto conuertere, transuertere e imitari.
Explicare também compartilha estas noções, mas em São
Jerônimo assume o significado de acentuação sobre a
funcionalidade semântica mais que sobre o ornato retórico. Outras
acepções latinas oferecem os verbos interpretari, que parece
colocar a atenção sobre o conteúdo, a dependência e o esforço
de fidelidade da cópia; exprimere, que parece enfatizar a marca
formal do calco; e reddere, que indicaria a correspondência formal
não literal entre original e tradução. No latim tardio e na Idade
Média vai predominar o termo transferre, e, ainda mais, de seu
derivado participial, o verbo translatare, que oferece o substantivo
translatio e o agente translator.

A segunda e mais negativa dessas visões se produziu – paralelamente ao

paganismo – no pensamento judaico-cristão, que até a Idade Média promoveu a

visão da tradução como deturpação da palavra.

Uma das causas dessa visão pejorativa deriva do mito

bíblico da Torre de Babel, segundo o qual, Deus, para


obstruir o trabalho dos homens, que tentaram construir

uma torre tão alta quanto os céus, originou a diversidade

de línguas entre si, levando-os ao desentendimento e ao


fracasso no projeto. Consequentemente, a tradução, que

derivaria da necessidade surgida com essa punição


divina, era comumente mal vista no antigo mundo

judaico-cristão.

Bassnett (2003, p. 1) corrobora esse entendimento ao observar que, até o medievo,

a tradução era “considerada uma atividade marginal, que só começou a ser vista

como um ato fundamental do intercâmbio humano no século XX”.

Essa função de mediação cultural, franqueada por Bassnett (2003), é, a propósito,

um aspecto fundamental da atividade em discussão aqui. Analogamente, Rónai

(1976) comenta que, em geral, as definições dadas à tradução disfarçam sua

natureza transcultural. Em seus termos:

Ao definirem “tradução”, os dicionários escamoteiam


prudentemente esse aspecto e limitam-se a dizer que “traduzir é
passar para outra língua”. A comparação mais óbvia é fornecida
pela etimologia: em latim, traducere é levar alguém pela mão para
o outro lado, para outro lugar. O sujeito deste verbo é o tradutor, o
objeto direto, o autor do original a quem o tradutor introduz num
ambiente novo [...]. Mas a imagem pode ser entendida também de
outra maneira, considerando-se que é ao leitor que o tradutor pega
pela mão para levá-lo para outro meio linguístico que não o seu
(RÓNAI, 1976, p. 3-4).

Do ponto de vista cultural, haveria, então, duas perspectivas distintas do ato

tradutório: a do tradutor conduzindo o autor à outra língua, e a do translator que


leva, não o autor, mas o leitor para o outro “lado”, isto é, para a cultura alheia.

Assim, na primeira perspectiva, aquela que Rónai (1976, p. 4) chama de “tradução

naturalizadora”, o tradutor “conduz uma obra estrangeira para outro ambiente

linguístico, adaptando-a ao máximo aos costumes do novo meio, retira-lhe as


características exóticas, faz esquecer que reflete uma realidade longínqua,

essencialmente diversa”; na segunda perspectiva, que o autor chama de “tradução

identificadora”, o intérprete “conduz o leitor para o país da obra que lê e mantém


cuidadosamente o que essa tem de estranho, de genuíno, e acentua a cada instante

a sua origem alienígena”.

Perceba que as definições que vimos esboçando até aqui dão destaque ao papel do

tradutor e do leitor como sujeitos ativos nesse processo. Pereira (2008), no entanto,
observa que não são raras algumas tentativas de definir a tradução que deixam de
lado elementos essenciais dela. Segundo a autora, tais tentativas acabam reduzindo

o conceito de tradução à mera substituição de material textual numa língua-fonte por

material textual equivalente noutra língua-meta, ou à simples transferência do

conteúdo de um texto para os meios próprios de outra língua. Embora não sejam
inteiramente erradas, essas definições deixam lacunas importantes, pois

descrevem um processo somente entre línguas, esquecendo-se de dois

elementos essenciais: os sujeitos envolvidos e a situação (o contexto). Assim,

nessas abordagens redutivistas, o tradutor é encarado como um mero reprodutor de

textos, uma espécie de adaptador de voltagem entre línguas, sem nunca alçar a

posição de autor.

Em dissonância a esse tipo de visão, declaramos que neste material procuraremos

sempre abordar a tradução numa perspectiva que inclui não só os códigos

linguísticos, mas também os sujeitos envolvidos nesse processo e o contexto em

que atuam.

3 DIVERSIDADE LINGUÍSTICA

Para Guerini e Costa (2006, p. 6), o mito da Torre de Babel, que mencionamos há
pouco, pode ser interpretado como uma expressão da interminável tarefa do

tradutor, o que por sua vez decorre de um fenômeno primordial: a grande


diversidade de línguas existes.

Você já parou para pensar em por que há tantas línguas no mundo? Steiner (2005)

entende que essa diversidade é uma consequência da própria individualidade dos

seres humanos, ou seja, cada um de nós é naturalmente diferente; logo, é natural

que nos expressemos de modos singulares. Embora negociemos nossas diferenças

com vistas à comunicação (e isso é a língua), os limites dessas diferenças se


tornam cada vez mais salientes à medida que os limites sociais também se alargam.

Nos termos de Steiner (2005, p. 72):


[...] o fato de que milhares e milhares de línguas diferentes e
mutuamente incompreensíveis foram e são faladas em nosso
pequeno planeta é uma expressão clara do enigma profundo da
individualidade humana, da evidência biogenética e bissocial de
que não existem dois seres humanos inteiramente iguais.

Quando Steiner afirma que milhares de línguas diferentes foram e são faladas por

razões biogenéticas e biossociais, ele chama a nossa atenção para o fato de que,

desde que o ser humano desenvolveu a faculdade da linguagem, as línguas

variaram e mudaram por inúmeros fatores, como sexo dos falantes, idade, classe
social, região geográfica, registro (culto ou informal) etc. Com tantos fatores

condicionando o comportamento das línguas e sua mudança, é natural que, quanto

mais a população humana se multiplica e suas diferenças biológicas e culturais se

agravam no tempo e no espaço, tanto mais as línguas se diferenciem e se

multipliquem.

É importante ressaltar que a variedade linguística existe

dentro de uma mesma língua, e essa variação, à medida


que se intensifica, pode levar ao surgimento de novas

línguas, o que o torna a operação tradutória sempre


necessária e atual.

A língua portuguesa, por exemplo, por muitos considerada uma só, tem variedades

díspares a ponto de seus falantes não as reconhecerem mais como variedades de


um mesmo sistema. Estamos falando do português europeu e do português

brasileiro, variedades diatópicas que já guardam profundas diferenças, não só no


léxico (vocabulário), mas também na fonologia (regras para a articulação dos sons),

na prosódia (entonação, acentuação e atração de clíticos) e na morfossintaxe


(regras de concordância, sistema pronominal etc.). Não é à toa que muitas edições

de obras estrangeiras têm uma tradução no Brasil e outra, sensivelmente diferente,

em Portugal.
Para saber um pouco mais sobre as causas da diversidade linguística, leia a seguir
o texto de Fábio de Oliveira, um breve artigo que aborda a questão de uma forma

leve e informativa.

LEITURA COMPLEMENTAR

Por que todo mundo não fala a mesma língua?

Fábio de Oliveira

Fonte: Superinteressante, São Paulo, n. 376, jun. 2017, p. 31-33.

As línguas foram surgindo nas várias regiões do mundo de forma independente.

Algumas têm a mesma origem, como o hindu, o sueco, o inglês e o português. Eles
vieram de uma grande língua comum, chamada protoindo-europeu, que há milhares

de anos era falada na Ásia. Esse idioma deu origem a quase todas as línguas

ocidentais e algumas orientais. “Supõe-se que o indo-europeu tenha sido uma língua

só, que foi se diferenciando com o tempo”, explica o professor de linguística Paulo

Chagas de Souza, da Universidade de São Paulo.

É que as línguas são vivas – elas se transformam com o uso. Mesmo as que vieram

de uma raiz comum foram sendo modificadas pouco a pouco pela prática de cada

grupo falante, que seleciona os termos adequados ao seu ambiente e à sua cultura.

Os esquimós, por exemplo, criaram palavras capazes de descrever 40 tons de

branco. Esses termos não fazem o menor sentido para um povo que mora no

deserto, concorda?

O Império Romano teve uma forte função na difusão e na construção de muitas das

línguas que são faladas hoje. Naquela época, na região de Roma, falava-se o latim,

uma língua derivada do protoindo-europeu que floresceu na região do Lácio. À

medida que o império avançava, conquistando novos territórios, esse idioma foi
sendo imposto aos povos dominados, mas não sem sofrer influência das línguas

locais, com mudanças de pronúncia e enxertos de palavras. Com o enfraquecimento


do domínio dos césares, essas diferenças foram se intensificando e construindo

dialetos, que se transformaram em idiomas próprios. Foi assim que surgiu o

português, o italiano e o francês, por exemplo.

Hoje são faladas 7.099 línguas ao redor do mundo, segundo o compêndio


Ethnologue, um livro que cataloga os idiomas do nosso planeta desde 1950. Mas a

gente não ouve a maioria delas: mais de 90% dessas línguas estão na boca de

apenas 6% dos habitantes da Terra. O restante da população mundial usa menos de

400 idiomas.

O português brasileiro

O português demorou mais de 200 anos para se consolidar no Brasil. No final do

século 17, o tupinambá, um dos dialetos do tupi, era o que mais se escutava por
aqui. Para não perder o predomínio político na colônia, Portugal proibiu que

crianças, filhos de portugueses e indígenas aprendessem outra língua que não o


português. Mas a língua que falamos hoje não é idêntica à que se fala em Portugal.

O “português brasileiro” também é resultado de um amplo e complexo processo de


transformação sofrido ao longo dos anos, com importantes contribuições dos

escravos africanos e de imigrantes que vieram de vários cantos do mundo. Mas,

ainda hoje, 237 línguas são faladas no País. Desse total, 216 estão vivas. Delas,

201 são indígenas e 153 correm risco de ser extintas.

4 coisas que você não sabia sobre idiomas

1) O Ethnologue lista 237 línguas no Brasil. Desse total, 216 estão vivas e 21,

extintas. Das vivas, 201 são indígenas e 15, não indígenas. Além disso, 56 estão em

perigo e 97, morrendo.

2) Na Espanha, são 15 no total, entre elas o basco e o catalão. Na ditadura de

Franco, essas línguas foram proibidas, mas o decreto caiu no fim dos anos 1970.

3) Na Índia, um país com mais de 1 bilhão de habitantes, o número de línguas


catalogadas chega a 462. Desse montante, 448 estão vivas e 14, extintas.
4) Nos Estados Unidos, o número de línguas catalogadas chega a 231. Dessas, 220

estão vivas e 11, extintas. Das vivas, 196 são indígenas e 24, não indígenas.

Mãe de (quase) todas

Muitas das línguas que você sabe que existem vieram de uma raiz comum.

Fonte: Dossiê 376/Superinteressante.

O protoindo-europeu

Boa parte da população mundial, incluindo países das Américas, da Europa e até a

Índia, fala línguas que se agrupam no que os linguistas chamam de filo protoindo-

europeu. Sua origem é incerta: há os que defendem que ele tenha surgido na

Anatólia, atual Turquia, há 9 mil anos, e outros, ao norte do Mar Negro, há 5 mil

anos.

Rumo ao Norte

Um dos ramos diretos do indo-europeu é o germânico. Ele engloba as línguas de


povos do norte da Europa, muitos dos quais ficavam fora dos limites do Império
Romano (os bárbaros, que, na primeira acepção da palavra, queria dizer

estrangeiro). Dessa lista fazem parte o inglês, o alemão, o holandês, o sueco e o

dinamarquês.

“Quo vadis?”

A frase acima significa “para onde vais” em latim, língua que nasceu no Lácio, região

próxima a Roma. Com a expansão do Império Romano, ela migrou para regiões

onde hoje estão países como Espanha, França e Portugal. Com o declínio dos

romanos, cada um desses locais começou a falar o latim do seu jeito. Daí surgiram o

português e seus coirmãos.

4 NEGOCIAÇÃO ENTRE TEXTOS E ENTRE CULTURAS

Há pouco dissemos que a atividade linguística consiste em negociar nossas

diferenças com vistas à comunicação, sendo que os limites dessas diferenças se

tornam cada vez mais salientes à medida que os limites sociais também se alargam,

e isso traz ensejo para o tradutor. A tradução, portanto, pode ser entendida como

uma negociação entre textos e entre culturas.

Em meio a outros que defenderam essa visão, encontra-se o famoso escritor


Umberto Eco, que a expôs numa obra intitulada “Dizer quase a mesma coisa:

experiências de tradução”. Eco enxerga a tradução como negociação, em vários


níveis e entre vários atores: o autor, seu texto original, as culturas de saída e

chegada, os leitores prováveis, as editoras e, naturalmente, o tradutor – o maior dos

negociadores. Segundo Eco (2007), para o tradutor profissional, há muito a

negociar. Ele negocia, por exemplo:

 uma estratégia de tradução (influenciada, possivelmente, pelo autor, pela

editora, pelos leitores potenciais ou almejados);

 a noção de fidelidade que se pretende, ou que se julga mais adequada à

situação;
 o tamanho do texto e outras idiossincrasias editoriais (não raramente, frase

a frase, palavra a palavra).

Como sintetiza Ferreira (2011), “Escuta daqui, afere de lá — e bate-se o martelo.

Manda-se o texto à editora. Que o publica: negócio fechado.”

Eco (2007) defende que a noção de negociação, em certa medida, depõe a obsoleta

noção de fidelidade. Ele, que antes de tradutor é autor de obras originais, não só

aceita a negociação de sentidos nas traduções dos seus textos autorais, como

também estimula sua alteração, desde que se tencione recriar a mesma sensação

estética, a mesma emoção, quem sabe a mesma surpresa que ele pretendeu em
princípio. Eco, portanto, afirma ser tolerável – e geralmente inevitável – a

deformação da superfície do texto em proveito de seu significado profundo, de seu

núcleo expressivo.

Até aqui falamos de tradução entre línguas e de tradução entre variedades de uma
mesma língua, que podem ser sutis ou abissais. No entanto, também podemos

traduzir de um meio para outro, de um gênero para outro, ou – mais


especificamente, como defende Plaza (1987) – de um sistema semiótico para outro,

e nesses casos a negociação é mais controversa. Chamamos de tradução

intersemiótica quando, por exemplo, uma obra literária é adaptada para o cinema,

ou para quadrinhos, ou ainda quando um poema é transformado em canção. Você


deve imaginar que, nesses casos, as negociações não devem ser muito fáceis,

certo? Voltaremos a este ponto no segundo tópico desta unidade, quando

estivermos tratando dos tipos de tradução. Por ora, em termos de dificuldade

negocial, gostaríamos de abordar uma operação que talvez esteja no meio de dois
polos, entre a tradução entre línguas fônicas e a tradução intersemiótica: a tradução

entre línguas fônicas e línguas gestuais.

Desde que a linguística moderna varreu uma série de preconceitos históricos, frutos

do fonocentrismo, que pairavam sobre as línguas gestuais, equiparando o status

destas ao de todos os demais sistemas de signos linguísticos humanos (cf.


QUERIQUELLI, 2018), a tradução envolvendo línguas gestuais e línguas fônicas
tornou-se um terreno extremamente fértil.

Um exemplo dessa fertilidade é o trabalho de Klamt
 (2014), que encarou a tarefa

de traduzir para o português o poema “Voo sobre o Rio”, composto por Fernanda

Machado em Libras – Língua Brasileira de Sinais. A performance completa do


poema pode ser vista em: https://youtu.be/dDw2WSqIS8k. Nele, a poetiza descreve

suas percepções ao sobrevoar a cidade do Rio de Janeiro. Nos primeiros versos, a

autora coloca o leitor na perspectiva de alguém que se aproxima da Terra e,

portanto, a vê primeiro bem pequena, ao longe; depois mais próxima, até que ela

preenche todo o campo de visão. A imagem a seguir reproduz essa parte do poema:

Figura 1 – Início do poema “Voo sobre o Rio”

Fonte: Klamt (2014, p. 115).

A tradutora assim explica suas estratégias tradutórias (ou negociais) para esse

trecho:
Estes sinais mostram as três dimensões referidas anteriormente.
Na ponta do dedo da poetisa, o planeta terra é minúsculo e
distante; quando polegar e demais dedos se juntam em letra “o”
(“grávidos no espaço”), já está mais próximo; por fim, quando o
efeito de aproximação da câmera chega ao seu máximo nível, o
planeta terra é grande e próximo e a configuração das mãos lembra
o embalar de um ser frágil. Assim, no início do poema, estes três
sinais foram traduzidos como: O astro distante: terra. / (gotícula de
terra viaja na ponta do dedo) / O planeta de percorrer com as
mãos: terra. / (o tamanho da terra quando polegar e dedos se
encontram grávidos no espaço) / O chão coberto de terra
 (mãos
de embalar um ser frágil). (KLAMT, 2014, p. 115).

Perceba que a tradutora toma o cuidado de não impor soluções familiares ao falante

nativo de português. Talvez lhe seria mais cômodo recriar um poema mostrando

essa descida ao planeta Terra, com elocuções típicas do português brasileiro, mas a

tradutora cede nessa negociação e traz a língua alheia para dentro da sua: “o astro

distante: terra / gotícula de terra viaja na ponta do dedo”; “o tamanho da terra


quando polegar e dedos se encontram grávidos no espaço”. Repare que é uma

negociação não apenas entre soluções textuais bilaterais, mas entre convenções e
perspectivas culturais.

Mais adiante, no poema, há um trecho em que se representa um diálogo entre um

casal de pássaros utilizando um recurso típico da Libras: as chamadas boias, isto é,

a suspensão de um enunciado com uma das mãos para a intercalação de um

segundo enunciado com a outra mão. Tal trecho é reproduzido nesta imagem:

Figura 2 – Diálogo entre pássaros no poema “Voo sobre o Rio”

Fonte: Klamt (2014, p. 116).

A tradutora, por sua vez, comenta as opções feitas em relação a essa parte do

poema:

Nos trechos II e III, ocorre um diálogo entre os dois pássaros: a


mão direita sempre representa o pássaro-fêmea e a mão esquerda
o pássaro-macho. Uma mão é suspensa, sem movimento,
representando um dos pássaros que é o receptor da mensagem,
enquanto a outra representa o pássaro produtor da mensagem, que
realiza uma ação ou fala por meio do movimento e dos sinais não-
manuais. É interessante, ainda, notar neste trecho que todos os
sinais foram produzidos com a mesma configuração de mão que
assume a forma, ao mesmo tempo, da cabeça e da asa das aves.
Traz-se aqui, então, um trecho do texto de chegada, em Português,
para mostrar como esta dualidade entre o feminino e o masculino
foi representada graficamente: [...] O de corpaço busca. / A de
corpóreo sorri, se enfeita. / Ela espia, gira o corpo de vergonha. /
Ele não compreende. / Põe-se esbelto, ele dirige a vista e investe. /
Ela não nota, não se vira. / Ele fala no dorso; ela não vira as
costas. (KLAMT, 2014, p. 116).

Desse modo, temos em Klamt (2014) um bom exemplo de tradução como


negociação, ao mesmo tempo, entre textos e entre culturas. Não é uma negociação

convencional que se faz entre textos de línguas fônicas modernas; não é uma

negociação radical que se faz entre sistemas semióticos diferentes; mas é uma
negociação delicada, entre línguas de natureza sensivelmente diferentes, que exige

– com a licença da analogia – uma destreza diplomática do tradutor para não ferir as

propriedades poéticas do texto-fonte, que é gestual, e para recriá-lo na língua alvo,

também respeitando suas propriedades linguísticas e suas particularidades culturais.


RESUMO DO TÓPICO 1

Na primeira seção deste tópico, abordamos diferentes nuances do conceito de

tradução. Começamos por uma definição mais geral, a de levar um significado para

além de uma língua em direção a outra, e em seguida vimos como esse conceito se

desdobrou em outros, como “revelar, explicar, manifestar, explanar”, “representar,


simbolizar” etc. Vimos também que a tradução pode se fazer entre duas línguas ou

no interior de uma mesma língua, e neste sentido concluímos que, em última

instância, não há atividade linguística sem tradução. Ainda no primeiro tópico,

discutimos as diferentes conotações que a atividade tradutória já ganhou na história:

extremamente positiva na antiguidade clássica, por exemplo, símbolo de invenção,

criação e engenhosidade; e extremamente pejorativa na tradição judaico-cristã,


símbolo de discórdia, obscuridade e degeneração da verdade.

Na segunda seção, discutimos que a tarefa do tradutor decorre de um fenômeno

primordial: a grande diversidade de línguas existes. Essa diversidade, por sua vez,

advém de razões biogenéticas e biossociais (sexo dos falantes, idade, classe social,

região geográfica, registro culto ou informal etc.), e, com tantos fatores


condicionando o comportamento das línguas e sua mudança, é natural que, quanto

mais a população humana aumenta e suas diferenças se agravam, tanto mais as


línguas se diferenciem e se multipliquem. Assim, a diversidade das línguas é, por

excelência, a razão de ser da tradução.

Na última seção, por fim, debatemos a tradução vista como um ato de negociação

entre textos e entre culturas. Tal negociação acontece em vários níveis e entre

vários atores: o autor, seu texto original, as culturas de saída e chegada, os leitores

prováveis, as editoras e, naturalmente, o tradutor – o maior dos negociadores.

Analisamos os argumentos de Eco (2007), segundo o qual a noção de negociação

depõe a obsoleta noção de fidelidade. Mencionamos o caso da tradução


intersemiótica, em que a negociação se torna crítica e discutimos um caso

intermediário: a tradução entre uma língua fônica e uma língua gestual. Para isso,
comentamos a experiência de tradução, para o português, de uma poema composto

em Libras, sugerindo que a tradutora procedeu a uma negociação delicada,


respeitando as propriedades poéticas do texto-fonte, que é gestual, e também
buscando trazer as idiossincrasias da cultura que o produziu, permeando o texto

português de uma estranheza positiva, fruto de um sincretismo cultural bem

sucedido.
AUTOATIVIDADE

1. Relacione os itens abaixo às afirmações a seguir:

I. Visão da tradução na antiguidade clássica

II. Visão da tradução na antiga tradição judaico-cristã

III. Tradução como atividade linguística básica


IV. Causa primordial da necessidade da tradução

V. Tradução como negociação entre textos

VI. Tradução como negociação entre culturas

(VI ) Um texto não reflete apenas as propriedades estritamente linguísticas de

uma língua (léxico e gramática, por exemplo), mas também espelha convenções

muito particulares à cultura do seu autor, motivo pelo qual a tradução envolve
equalizar as diferenças entre o mundo do autor e o mundo do leitor.

(V ) Em termos estritamente linguísticos (léxico, morfologia, sintaxe etc.) as

línguas são invariavelmente distintas; portanto, na versão de um texto de uma língua

a outra, o tradutor tem perdas e ganhos em termos de escolhas vocabulares,

construções sintáticas, equivalências morfológicas etc.

(IV ) As pessoas são naturalmente diversas entre si, e essa diversidade se

estende à linguagem, fazendo com que, quanto mais as diferenças se agravam,

mais as diferenças linguísticas se acentuam.

(III ) Estamos operando traduções a todo momento, quando explicamos algo a

alguém, quando mudamos de contexto, quando mudamos de veículo de

comunicação ou gênero discursivo, quando estamos adquirindo linguagem, quando

lidamos com línguas estrangeiras.

(II ) A tradução era vista como uma deturpação do sentido original das palavras

e como causa primordial da discórdia entre os homens.


(I ) A tradução era vista como um processo criativo, assumindo sentidos como
os de: criar, verter, converter, transverter, imitar, explicar, interpretar, exprimir,

render, transferir, transladar, entre outros.

2. Diante do que foi apresentado neste primeiro tópico, como você explicaria a
seguinte afirmação: “quanto mais as diferenças entre seres humanos se

aprofundam, mais a tradução se faz necessária”?

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___________________________________________________________________

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2. (Adapt. de concurso para tradutor/intérprete de Libras da UFSJ/2016) Existem

tentativas de simplificar o conceito do que é uma tradução, como sendo a

substituição de material textual numa língua-fonte (LF) por material textual


equivalente noutra língua-meta (LM) ou a transferência do conteúdo de um texto

para os meios próprios de outra língua. Apesar de sucintas, ainda existem pontos
não explicitados nessas definições, pois descrevem um processo somente entre

línguas, em que os sujeitos envolvidos e a situação – contexto – nem são

mencionados. Com base nesse enunciado, marque a opção INCORRETA:

a) (X ) O tradutor ora é encarado como um mero reprodutor de textos, uma

espécie de adaptador de voltagem entre línguas, ora alça a posição de autor.

b) ( ) A tradução é o termo geral que define a ação de transformar um texto a

partir da língua-fonte, por meio de vocalização, escrita ou sinalização, em outra

língua-meta.
c) ( ) É aceitável que a tradução procure uma correspondência de aspectos
linguísticos, porém seus objetivos de interação podem ser perdidos numa busca

obsessiva de equivalência entre as línguas.

d) ( ) A tradução é uma atividade que abrange a interpretação do significado de

um texto em uma língua – o texto-fonte – e a produção de um novo texto em outra


língua, sendo que esse texto resultante também é chamado de tradução.
TÓPICO 2: TIPOS DE TRADUÇÃO

1 INTRODUÇÃO

Olá, estudante! No primeiro tópico, você deve recordar que, de forma ainda um

pouco tímida, já abordamos alguns tipos de tradução. Falamos em traduções que se

fazem dentro da própria língua (intralingual), traduções que se fazem entre línguas
diferentes (interlingual) e também comentamos – quando falávamos sobre a

negociação entre textos – traduções entre veículos ou gêneros diferentes, ou mais

especificamente entre sistemas semióticos diferentes (intersemiótica).

Pois bem. Essa divisão corresponde à clássica tipologia proposta por Roman

Jakobson (1969) em seu ensaio “Aspectos linguísticos da tradução”. No presente

tópico, portanto, vamos aprofundar essa tipologia de Jakobson. Acompanhe.

2 TRADUÇÃO INTRALINGUAL

Jakobson abre seu ensaio relativizando um preceito da filosofia da linguagem

proposto por Bertrand Russel, o qual – levado às suas últimas consequências –

impossibilitaria a tradução. Russell sugere que ninguém poderá compreender a


palavra queijo, por exemplo, se não tiver um conhecimento não-linguístico do queijo.

Jakobson, entretanto, contra-argumenta que, se seguirmos esse preceito

russelliano, seremos então obrigados a dizer que ninguém poderá compreender a

palavra queijo se não conhecer o significado atribuído a esta palavra no código

lexical do português. Na verdade, porém, qualquer representante de uma cultura

culinária que desconheça o queijo compreenderá tranquilamente a palavra

portuguesa queijo se souber que, nesta língua, ela significa “alimento obtido pela

coagulação do leite” e se tiver, ao menos, um conhecimento linguístico de leite

coalhado.

Jakobson faz essa digressão para defender que o significado de um signo linguístico
não é mais que sua tradução por um outro signo correspondente, especialmente um

signo “no qual ele se ache desenvolvido de modo mais completo”, como afirmou
Peirce (1946, p. 91 apud JAKOBSON, 1969, p. 63). Feita essa defesa, o autor
distingue as três maneiras de interpretar um signo verbal que já conhecemos: ele

pode ser traduzido em outros signos da mesma língua, em outra língua, ou em outro

sistema de símbolos não-verbais.

O linguista russo assim define em seus termos os três tipos em questão:

1) A tradução intralingual ou reformulação (rewording) consiste na

interpretação dos signos verbais por meio de outros signos da mesma língua.

2) A tradução interlingual ou tradução propriamente dita consiste na

interpretação dos signos verbais por meio de alguma outra língua.

3) A tradução intersemiótica ou transmutação consiste na interpretação dos

signos verbais por meio de sistemas de signos não-verbais.

A tradução intralingual envolve os fenômenos da sinonímia e da paráfrase. Segundo

Jakobson (1969, p. 65), “a tradução intralingual de uma palavra utiliza outra palavra,

mais ou menos sinônima, ou recorre a um circunlóquio. Entretanto, via de regra,

quem diz sinonímia não diz equivalência completa.” Essa impossibilidade da

sinonímia perfeita apresentada pelo autor é, a propósito, uma marca da abordagem


que ele representa: o funcionalismo. Na perspectiva funcionalista, cada palavra

guarda, em alguma medida, um significado único. Assim, uma palavra como calor,
embora possa ser tomada como sinônimo relativo de quentura, tem nuances

semânticas particulares.

Contudo, é inegável – e Jakobson admite isso – que estamos a todo momento

fazendo operações de sinonímia e paráfrase quando usamos a língua, ora com

finalidades pontuais e espontâneas, ora de modo metódico. Pense, por exemplo,

quando você fala sobre algo complicado para alguém, e essa pessoa não o entende.

O que você faz? Provavelmente vai explicar de outra forma para ela, com outras

palavras, certo? Muito bem. Isso é um procedimento de tradução intralingual.


Lembra que, no Tópico 1, comentamos que um dos termos usados pelos antigos

latinos para tradução era o verbo explicar? Ora, esse sentido corresponde
justamente à tradução intralingual coloquial que estamos abordando aqui.
Frequentemente, fazemos esse tipo de operação para nós mesmos, quando
queremos clarear o nosso pensamento. A esse respeito, Paulo Rónai (1976, p. 1)

faz o seguinte comentário:

[...] ao vazarmos em palavras um conteúdo que em nosso


pensamento existia apenas em estado de nebulosa, fenômeno
constante em todos os momentos conscientes da vida, estamos
também traduzindo, mas praticamos a tradução intralingual,
operação esta que tem as próprias dificuldades e cujo resultado
muitas vezes nos deixa insatisfeitos.

Muitas vezes, quando lemos textos antigos escritos na nossa própria língua, temos

de fazer um certo esforço para entender algumas palavras, algumas construções,

algumas elocuções específicas, não temos? Bem, esse tipo de esforço também

pode ser visto como uma tradução intralingual. Steiner (2005, p. 54) a chama de
tradução diacrônica no interior da própria língua, que, para ele, é um fenômeno “tão

constante, nós a realizamos tão inconscientemente, que raramente paramos para

observar seja sua complexidade formal, seja o papel decisivo que ela exerce na

própria existência da civilização”.

E o que acontece naturalmente na leitura ou no pensamento pode, muitas vezes, se

tornar um projeto editorial. É o que ocorre, por exemplo, quando algumas editoras
resolvem retextualizar alguns clássicos literários para leitores modernos, ou

popularizar alguns ícones da ciência e da filosofia. Temos muitas edições que

apresentam “Hamlet, de Shakespeare, para crianças”, “A eletrodinâmica dos corpos


em movimento, de Einstein, para os leigos”, “O discurso do método, de Descartes,

para não-iniciados”. Nesses casos, esse tipo de tradução intralingual recebe o nome
de “adaptação”.

O maior épico da literatura portuguesa, por exemplo, “Os Lusíadas”, de Camões, já

foi adaptado muitas vezes. No Brasil, uma das mais conhecidas é a adaptação na

forma de um romance em prosa feita por Rubem Braga. Compare, a seguir, os

textos de Camões e Braga, correspondentes à parte da narrativa em que Baco, por

inveja, tenta impedir o sucesso dos navegantes portugueses:

Versos das estrofes 30 e 32 do Canto I dos Lusíadas:


O padre Baco ali não consentia
No que Júpiter disse, conhecendo
Que esquecerão seus feitos no Oriente,
Se lá passar a Lusitana gente.
[...]
Teme agora que seja sepultado
Seu tão célebre nome em negro vaso
D'água do esquecimento, se lá chegam
Os fortes Portugueses, que navegam.

Tradução intralingual de Rubem Braga (1997, p. 13):

Ele [Baco] não se conformava:  Por que eu, filho de Júpiter,


tenho de deixar que outros usurpem minha fama? Que um povinho
arrogante tome o lugar conquistado por mim, por Alexandre da
Macedônia e pelos romanos? Não, não permitirei que isso
aconteça. Essa frota jamais chegará ao Oriente.

No primeiro tópico, mencionamos que as línguas são diversas por conta de vários

fatores. Um deles, ao menos, as diferenças decorrentes das idades dos falantes, já


apareceu neste segundo tópico indiretamente, quando falamos em tradução

intralingual diacrônica. Os outros fatores de variação, contudo, também induzem


operações de tradução interna a uma língua: classes sociais, comunidades de fala,

região, sexo, entre outros. A esse respeito, Steiner (2005, p. 70-1) faz a seguinte

reflexão:

Não há duas épocas históricas, duas classes sociais, duas


localidades que usem as palavras e a sintaxe para expressar as
mesmas coisas [...]. Nem dois seres humanos. Cada uma das
pessoas se serve, deliberadamente ou por costume espontâneo, de
duas fontes de suprimento linguístico: a língua corrente que
corresponde a seu grau de letramento e um tesouro privado. [...] A
língua de uma comunidade, por mais uniformes que sejam seus
contornos sociais, é um agregado inesgotavelmente múltiplo de
átomos de fala, de significados pessoais em último caso
irredutíveis.

Guerini e Costa (2006, p. 9), por sua vez, corroboram a posição de Steiner ao
afirmar que:

As diferentes camadas das sociedades humanas também


costumam usar um idioma diferente, embora a diferença varie
bastante de sociedade para sociedade. Exemplos não faltam: há
comunidades que usam uma língua para a religião, outra para o
governo, outra para literatura, outra para a comunicação do
cotidiano. [...] Junto com uma língua comum a uma dada
comunidade, teríamos, portanto, inevitavelmente, um grande leque
de variantes segundo, a época histórica, a localização geográfica, a
classe social, a faixa etária, até chegar ao próprio indivíduo.
Normalmente, crescemos com a ilusão de que, no ambiente lusófono por exemplo,
todos falam a mesma língua, muito embora sintamos um estranhamento quando

temos que traduzir certos enunciados do nosso idioleto para a língua de outras

pessoas com quem convivemos.

A causa desse estranhamento fica, portanto, bem

esclarecida diante das reflexões que vimos fazendo aqui:

num país em que supostamente todos falam a mesma

língua, a verdade é que há muitas línguas coexistindo.

Elas são chamadas erroneamente de sotaques, mas

deveríamos nos referir a elas como dialetos ou mesmo

línguas, motivo pelo qual faz todo o sentido falarmos em


tradução nesses casos. Pereira (2008) refere-se a esse
processo como tradução sociolinguística.

Para ilustrar como a tradução passa a ser mais e mais necessária à medida que as

variedades linguísticas de uma mesma língua se emancipam em direção a novas

línguas, traremos aqui um caso ilustrativo para a língua portuguesa: as chamadas

versões (ou cópias) do Testamento de Afonso II. Acompanhe.

2.1 O PAPEL DA TRADUÇÃO INTRALINGUAL PARA A HISTÓRIA DA LÍNGUA

Na história das línguas, podemos encontrar diferentes casos de traduções que

exerceram um papel crucial na consolidação política, identitária e cultural dessas

línguas. Podemos citar, por exemplo, a tradução do grego para o latim da Odisseia

de Homero feita por Lívio Andrônico, em 240 a.C., que inaugurou a literatura latina e

serviu de modelo de língua para muitos poetas latinos e – por que não? – falantes

de latim que vieram depois; a tradução do Antigo Testamento do hebraico para o

latim feita por São Jerônimo, em cerca de 400 d.C., que serviria de modelo para o

latim eclesiástico praticado dali em diante; e, principalmente, a tradução da Bíblia


feita por Martinho Lutero, em 1534, que notoriamente contribuiu para estabelecer o
alemão moderno. Também, há que se considerar o papel político desempenhado

pelas traduções no período de colonização, fato que produziu efeitos sobre os

modos de circulação, normatização e consolidação das línguas e das culturas nos

diferentes espaços geopolíticos colonizados.

Nota-se, de forma geral, dois movimentos aparentemente

antagônicos produzidos pelos processos tradutórios: um

centrífugo, que motiva a estratificação de uma língua,

produzindo variedades linguísticas; e outro centrípeto,

que condiciona a normatização e estabilização de uma

língua.

Exemplificando, na história da língua portuguesa, um caso de movimento


centrífugo diz respeito ao Testamento de Afonso II, de 1214, um documento de

grande valor, considerado o primeiro documento real escrito em português. Desse

documento, restaram duas das treze cópias feitas e distribuídas por diferentes

entidades. Cada uma das treze cópias originais era destinada a uma região

específica do reino. As duas cópias que restaram, em muitos momentos, parecem

estar escritas em línguas diferentes, embora se trate de uma estratificação da língua


portuguesa em variedades diferentes. Como veremos adiante, as cópias desse

testamento consistiram em translações conscientes de textos, visando a línguas-

alvo específicas.

Já o movimento centrípeto pode ser exemplificado com os casos mencionados

anteriormente, de tradução da Odisseia de Homero por Lívio Andrônico, do Antigo

Testamento por São Jerônimo e da Bíblia por Lutero.

Tanto naqueles casos em que traduções constituem marcos na promoção da

diversidade linguística, quanto nestes casos em que a tradução motiva a

normatização de línguas, temos a figura do tradutor e o papel da tradução como

implicados em processos de estabilização, variação e mudança das línguas.


O Testamento de Afonso II, datado de 27 de junho de 1214, é o primeiro documento
real conhecido escrito em língua portuguesa. Conforme Avelino de Jesus da Costa

(1979), seu autor, D. Afonso II, quando o escreveu, tinha apenas 28 anos de idade e

pouco mais de três anos de reinado. Ele era, porém, uma pessoa muito doente e

decidiu fazer esse testamento para garantir a paz e a tranquilidade da família e do


reino, no caso de morrer prematuramente. Afonso II tomou providências para

garantir a sucessão pela via masculina ou, na falta desta, pela filha mais velha. Além

disso, no caso de uma possível menoridade do herdeiro, ele confiou ao Papa a

proteção de seus irmãos e do reino. Segundo Costa (1979, p. 308):

Na disposição dos bens, além da rainha, dos filhos e filhas,


contempla o Papa, as dioceses galegas de Santiago de
Compostela e de Tui, alguns mosteiros e Ordens militares. Das
dioceses portuguesas contemplou apenas a de Idanha, bispos de
Coimbra, Évora, Lamego, Lisboa, Porto e Viseu, além de outras
pessoas, de executarem as suas disposições testamentárias.

As treze cópias do testamento destinavam-se, portanto, aos herdeiros dessas

diferentes regiões do reino. As duas cópias remanescentes eram destinadas ao

arcebispo de Braga e ao arcebispo de Toledo. Afonso II fez ainda outros dois

testamentos, ambos redigidos em latim; um datado de 1218, e o outro, de 1221.

As duas cópias escritas no vernáculo apresentam diferenças consideráveis:

a) Ambas foram escritas por mãos diferentes, como se pode observar pelo tipo

e corpo de letra que em cada uma delas aparece (não estão identificados os
copistas).

b) A cópia de Braga (doravante B) tem 27 linhas, e a de Toledo (doravante T),

37 linhas.

c) Alguns sons são representados com grafas diferentes em uma e outra.

d) Também divergem certas formas linguísticas (ordem de palavras, sinônimos

etc.).

Costa (1979, p. 311) defende que as cópias foram feitas a partir de um ditado

simultâneo: “As variantes entre os exemplares [...] levam a supor que o original do
testamento foi ditado para serem simultaneamente escritos vários exemplares por

diferentes notários.” Castro (1991) não descarta essa hipótese de Costa, mas,
considerando uma série de diferenças radicais entre os dois textos, defende que
elas derivam ou de uma tradução a partir de um original em latim ou a partir de um

original escrito no vernáculo então falado na capital do Reino (Coimbra). Algumas

dessas diferenças destacadas por Castro (1991, p. 194-196) são as seguintes:

a) Variação na ordem das palavras:


(linha 2) B meu reino e me(us) uassalos
T meus uassalos e meu reino
(linha 9) B todas mias devidas
T mias deuidas todas
(linha 21) B out(ras) cousas
T cousas outras;

b) Variação entre vocábulos e sua ausência:


(linha 6 ) B do arcebispo de Santiago
T do de Santiago
(linha 8) B se a raina morrer
T se a reina dona Vrr(aca) morrer
(linha 8) B Da out(ra) meiadade
T Da outra mia meiadade
(linha 8) B fazã desta guisa
T facan ende desta guisa
(linha 12) B no dia
T en dia
(linha 12) B ssi eu en
T se en
(linha 13) B en’os out(ro)s logares
T en outros logares
(linha 18) B q(ue) os de ... aq(ue)stes
T q(ue) os de ... a aq(ue)stes
(linha 18) B todos nõ poderem
T nõ pode(er)en
(linha 24) L mãdo aq(ue)les
B mãdo a aq(ue)les
(linha 25) B come outra
T como a outra
(linha 26) B facer guarda
T faco eu aguardar;

c) Variação entre vocábulos:


(linha 7) B como uirẽ por derecto
T como uiren por guisado
(linha 8) B aq(ue)stas
T estas
(linha 16) B e dito
T e nomeado
(linha 17) B se alguus de me(us) flios ouuerẽ
T se alguno de meus flios ouuer
(linha 20) B no meu logar
T no meu logo
(linha 26) B nouea
T nona

A despeito das preferências pessoais de um e outro copista, certas variações de

formas linguísticas atestam a existência de dialetos significativamente diferentes –


tão diferentes entre si quanto o são hoje o galego, o português, o espanhol e o
catalão. É interessante observar que Braga se encontra no extremo norte do

território português, na divisa com a Galícia, próxima a Guimarães e ao Porto, e

Toledo fica no centro do território, entre Coimbra e Lisboa. Pouco tempo antes do

momento em que se escreve o Testamento, a capital tinha sido transferida de


Guimarães para Coimbra. Isso significou a independência política de Portugal e

também a independência linguística em relação ao galego-português. Disso

podemos inferir que a cópia destinada a Braga é escrita em um dialeto mais próximo

do galego-português do que a cópia destinada a Toledo, fato que ilustra a promoção

da estratificação linguística de uma língua, com variedades e variantes linguísticas

emergindo no processo tradutório.

De um modo geral, a língua da cópia destinada a Toledo é muito mais próxima do

atual português brasileiro do que a língua da cópia destinada a Braga, seja em

aspectos fonético-fonológicos, morfológicos, sintáticos, lexicais e semânticos, seja

em aspectos discursivos. Análises aprofundadas dessas diferenças podem ser

encontradas não apenas em Avelino de Jesus da Costa (1979) e Ivo Castro (1991),
mas também em Edwin Willians ([1938] 1975), Joseph Huber ([1933] 1986), Ana

Maria Martins (1985), Anthony Naro ([1971]1973) e Joseph Maria Piel (1942).

A partir dessas análises, o que se pode afirmar é que – tenham sido essas cópias

feitas a partir de um ditado, a partir de um original latino, ou partir de um esboço

escrito num dialeto vernáculo (provavelmente de Coimbra) – estamos diante de um

caso de tradução deliberada pelo copista-tradutor. Cada um dos copistas-tradutores

evidentemente sabia que o público-alvo da sua cópia falava uma língua distinta e

respeitou as particularidades dessa língua.

3 TRADUÇÃO INTERLINGUAL

Como já definimos brevemente, a tradução interlingual envolve dois códigos: a

língua de partida e a língua de chegada, também chamadas de língua-fonte e

língua-alvo. Trata-se do conceito mais comum de tradução que o senso comum


manipula no dia a dia. Ao conceituar esse tipo de operação, Jakobson (1969, p. 64)
observa que, “no nível da tradução interlingual, não há comumente equivalência

completa entre as unidades de código”. Por isso, ao traduzir de uma língua para

outra, o foco da atividade recai sobre a mensagem e não sobre suas partes

constituintes. Nas palavras do autor:

[...] ao traduzir de uma língua para outra, substituem-se mensagens


em uma das línguas, não por unidades de códigos separadas, mas
por mensagens inteiras de outra língua. Tal tradução é uma forma
de discurso indireto: o tradutor recodifica e transmite uma
mensagem recebida de outra fonte. Assim, a tradução envolve
duas mensagens equivalentes em dois códigos diferentes
(JAKOBSON, 1969, p. 64).

Já ressaltamos aqui a importância da tradução em muitos âmbitos da experiência

humana. No entanto, não é exagero acrescentar que a difusão do conhecimento e


das instituições em geral não teria atingido níveis globais de expansão sem o

recurso à tradução. Guerini e Costa (2006, p. 11) aludem a esse fato quando

consideram que “com frequência não avaliamos bem sua importância. Na prática,

[porém], a própria existência da civilização humana em escala mundial depende

muito da tradução contínua desses diferentes tipos de texto [técnicos, literários,


esportivos, religiosos, políticos].” Trazendo a discussão para questões mais

contemporâneas, os autores ainda apresentam um dado surpreendente:

No Brasil, por exemplo, calcula-se que a tradução interlingual


representa cerca de 60 a 80% dos textos publicados e que 75% do
saber científico e tecnológico provém das traduções, alimentando
vários setores da vida nacional. Sem a tradução, muitos setores
simplesmente não funcionariam, como por exemplo, o de
softwares, medicamentos, automobilístico etc. (GUERINI; COSTA,
2006, p. 11).

No Tópico 1 desta unidade, discutimos a importância dada a essa atividade na

antiguidade clássica, especialmente entre os romanos. Não é à toa que dois dos
primeiros tradutólogos tenham vindo justamente da cidade latina: os escritores

Cícero (106 a.C - 43 a.C) e Horácio (65 a.C - 8 a.C) foram os primeiros a discutir a

distinção entre “tradução literal” e “tradução do sentido”. Considerando que, como já


discutimos, a tradução para aquela cultura era entendida como recriação, ambos

advogavam em favor da tradução do sentido, em detrimento de verter palavra por

palavra. Bassnett (2003, p. 81), a propósito, relembra que:


As posições de Cícero e Horácio sobre tradução tiveram grande
influência em gerações sucessivas de tradutores e ambos
entendem a tradução dentro do contexto alargado das duas
funções principais do poeta: o dever humano universal de adquirir e
disseminar a sabedoria, e a arte especial de fazer e dar forma ao
poema.

A esta altura, você pode estar se perguntando: por que estamos falando de
questões mais gerais e históricas da tradução – sobre as quais já falamos no

primeiro tópico – nesta seção que deveria tratar especificamente da tradução

interlingual? Bem, ocorre que a tradução interlingual é, como dissemos, sinônimo de

tradução lato sensu, e sua abordagem mudou significativamente ao longo dos


tempos. Podemos pontuar pelo menos dois grandes momentos da tradução

interlingual na história: aquele que nasce entre os romanos e é retomado mais

tarde pelo modernos, que imprimem uma abordagem científica sobre a tradução

com vistas aos os textos literários, passando a admitir uma rica diversidade na

translação entre línguas; e aquele que se instala nos tempos medievais, quando as
intermináveis disputas sobre a tradução de textos religiosos focavam a

preservação da palavra original.

Para fins didáticos, vamos subdividir esta seção entre esses dois momentos
referidos. Acompanhe.

3.1 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL RELIGIOSA E O FOCO NO TEXTO DE


PARTIDA

Como avaliam Guerini e Costa (2006, p. 12, grifo nosso):

Se a ênfase de Cícero e Horácio era no texto de chegada para o


enriquecimento da língua e da literatura latina, com a tradução da
Bíblia, por exemplo, temos uma mudança de foco e a preocupação
era com o texto de partida, pois o objetivo era o de “espalhar a
palavra de Deus” e estar o mais próximo possível da palavra
divina.

Procurando semear suas doutrinas sem perverter os sentidos originais, as religiões

sempre tiveram a tradução como atividade essencial para a sua disseminação entre
os povos. As principais religiões do mundo, entre elas o cristianismo, o islamismo, o
hinduísmo e a religião tradicional chinesa, em certa medida, podem creditar o seu
sucesso às contínuas traduções de seus textos doutrinários.

A saga da história tradutória da Bíblia, por exemplo, começa no século 3 a.C.,

quando o antigo testamento foi vertido do hebraico para o grego, num projeto

coletivo que envolveu mais de 70 tradutores de 12 tribos judaicas. Essa edição ficou
conhecida como Septuaginta (ou versão dos setenta). Mais tarde, a Septuaginta

seria transvertida para o copta (língua dos cristãos egípcios), o etíope e o gótico.
Todas essas traduções foram marcadas por uma preocupação explícita de

manter a essência do texto original judaico a despeito das demais línguas

destinadas e suas respectivas culturas (uma evidente falta de equilíbrio na

negociação). No entanto, na translação ao latim, essa postura começa a mudar.

Em latim, a Bíblia passou por pelo menos duas traduções. A primeira delas foi feita

de forma fragmentária e coletiva, e reflete variedades de latim vernacular. Trata-se


da Vetus Latina, também conhecida como a Bíblia dos Pais da Igreja, versão à qual

se associa a doutrina patrística. A segunda delas, a mais famosa de todas, é


atribuída a São Jerônimo e ficou conhecida como Vulgata, acabada por volta de

1400 d.C.

A Vulgata viria a ser, a partir de então, o texto basilar para todas as demais
traduções que se fariam posteriormente. E não foram poucas: “Se em 1450 havia já

33 diferentes traduções, e em 1800 esse número tinha saltado para 71, no final do

século XX, havia edições integrais em mais de 250 línguas e edições parciais em

cerca de 1300 outras línguas.” (GUERINI; COSTA, 2006, p. 13).

E o que essa história toda das traduções bíblicas nos informam a respeito da

tradução interlingual? Ora, a disputa sobre a melhor forma de traduzir a palavra

sagrada naturalmente avivou a controvérsia entre tradução literal e tradução livre.


Enquanto que, historicamente, defendia-se que a Bíblia

deveria ficar sempre próxima das raízes hebraicas

(porque seriam contíguas à palavra de Deus), São

Jerônimo, especialmente na tradução do Novo


Testamento, afirmou ter preferido o sentido à palavra.
Isso significou uma guinada em direção a uma maior

atenção ao texto de chegada, algo que vinha sendo

preterido na história das traduções do cristianismo.

Não é à toa que Jerônimo de Estridão (seu nome secular) é considerado o patrono

dos tradutores. Guerini e Costa (2006) também salientam que, na Umbanda, São
Jerônimo é o sincretismo de Xangô, deus associado às leis e à sabedoria, o que

sugere uma interpretação da tradução como instrumento de acesso ao saber. Os

autores ainda recordam outra curiosidade interessante a respeito do santo:

São Jerônimo foi um dos primeiros a se preocupar


com os surdos ao afirmar em um comentário na

Epístola de Paulo aos Gálatas (I, 3) que “os surdos


podem aprender o Evangelho através dos sinais”. Este é

o primeiro documento que cita os sinais como meio para


a instrução dos surdos.

Ao lado da Vulgata, a versão de Lutero (publicada em 1534) é outra tradução bíblica

que abalou os paradigmas medievais e merece uma consideração especial. Ao dizer

isso, não ignoramos que, não apenas o texto de Lutero, mas toda tradução da Bíblia

para outras línguas teve um valor político e cultural singular, especialmente no

Ocidente:

O Ocidente dedicou muita atenção às traduções, pois o seu texto


central, a Bíblia, foi escrito em uma língua que não podia ser
compreendida prontamente e, por isso, [os estados teocráticos]
foram obrigados a confiar nos tradutores para legitimar seu poder.
(LEFEVERE, 2003, p. 3).

Seriam dignas de atenção, por exemplo, a tradução para francês, publicada em

1528 por Jacques Lefevre d’Étaples (ou Faber Stapulensis); a tradução para o

espanhol, publicada na Basileia em 1569 por Casiodoro de Reina (Biblia del Oso); a

tradução para o tcheco, publicada em Kralice entre 1579-1593; a tradução para o

inglês, conhecida como Bíblia do Rei James, publicada em 1611; e a tradução para

o holandês, conhecida como The States Bible, publicada em 1637. Todas essas

traduções, guardadas as devidas proporções, causaram muito impacto cultural e

linguístico em seus países. Entretanto, a tradução de Lutero para o alemão merece


algum destaque particular, principalmente pelas declarações e explicações que ele

deixou a respeito das suas escolhas.

Numa das anotações feitas por seus alunos e colaboradores durante encontros

informais (as chamadas “Conversas à mesa”), Martinho Lutero (1532 apud FURLAN,
2004, p. 13) afirma que a “A verdadeira tradução é a adaptação do que foi dito numa

língua estrangeira à sua própria língua.” Ocorre que a “própria língua” de Lutero não
estava bem consolidada quando ele se propôs a traduzir a Bíblia. Naquela época, o

que hoje se conhece como alto-alemão era um conjunto de dialetos distintos, nem
sempre compreensíveis entre si. Ciente da importância política e religiosa de unificar

a língua, Lutero se propôs a compor um alemão standart a partir daqueles dialetos

existentes, a fim de que o povo pudesse se identificar com aquela língua e, por
tabela, com aquela Bíblia. É por isso que na sua “Carta Aberta sobre a Tradução”,

publicada em 1530, ao criticar traduções anteriores à sua, decalcadas do latim,

Lutero afirma:

Assim, quando Cristo fala: Ex abundantia cordis os loquitur. Se eu


fosse seguir esses asnos, eles me apresentariam a letra e
traduziriam assim: Aus dem Überfuss des Herzens redet der Mund
[Da abundância do coração fala a boca.] Diga-me: isso é falar
alemão? Que alemão entenderia uma coisa dessas? Que coisa é
abundância do coração? Nenhum alemão poderia dizer isso, a não
ser que quisesse dizer que alguém tem um coração demasiado
grande ou tem coração demais; embora isto também não seja
correto. Pois, abundância do coração não é alemão, assim como
não é alemão abundância da casa, abundância da estufa,
abundância do banco, porém assim fala a mãe em casa e o homem
comum: We das Herz voll ist, des gehet der Mund über [A boca fala
daquilo de que o coração está cheio]. Isto é falar um bom alemão,
pelo que eu me esforcei, e infelizmente nem sempre consegui ou o
encontrei. Pois as letras latinas dificultam muito a formulação para
se falar em bom alemão (LUTERO, [1530] 2006, p. 105).

As declarações e explicações de Lutero sobre as suas opções tradutórias são

repletas de comentários desse tipo, marcados por um humor ácido. Independente

disso, interessa ressaltar que, do projeto de tradução de Lutero, sobressai uma

evidente insinuação: de modo semelhante a Jerônimo, Lutero indica uma mudança

de foco, que se desloca do texto de partida para o texto de chegada. Essa

alternância de foco promovida pelos dois tradutores ventilou as concepções sobre

tradução no Ocidente e gerou efeitos principalmente no âmbito da tradução literária,

como veremos a seguir.

3.2 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL LITERÁRIA E O FOCO NO TEXTO DE


CHEGADA

Até o século XIX, a literatura monopolizou um espaço na sociedade que acumulava

as funções de árbitro de costumes, veículo do conhecimento e meio de

entretenimento. Por esse motivo, a tradução literária foi até então um tópico amplo
debate teórico e consequentemente um campo de muita experimentação. Todo esse

movimento de inflexão, crítica, experimentação e reflexão sobre a tradução iniciado

no embalo das revoluções modernas nos deixou um vasto legado, o qual


pretendemos explorar aqui.

Entre os tradutólogos mais relevantes desse período, podemos destacar Etienne

Dolet, John Dryden e Friedrich Schleiermacher. Todos eles teorizaram a tradução

interlingual, mostrando problemas em seus dois polos: o foco no texto de partida e


no texto de chegada. Vejamos algumas de suas proposições.

Em seu clássico ensaio “A maneira de bem traduzir de uma língua para outra”, Dolet

os seguinte princípios:

1. o tradutor deve entender perfeitamente o sentido e a


matéria do autor a ser traduzido;
2. o tradutor deve conhecer perfeitamente a língua do autor
que ele traduz; e que ele seja igualmente excelente na
língua na qual se propõe traduzir;


3. o tradutor não deve traduzir palavra por palavra;


4. o tradutor deve usar palavras de uso corrente;

5. o tradutor deve observar a harmonia do discurso.

(DOLET, 2004 [1540], p. 15-19 apud GUERINI; COSTA, 2006,


p. 14).

Bassnett (2003, p. 98) entende que, embora os princípios de Dolet acentuem a

importância da compreensão do texto de partida, sobressai a preocupação com “a

percepção do lugar que a tradução pretende ocupar no sistema da língua de

chegada.” Cabe observar que ele é, de certo modo, pioneiro por prenunciar certos

entendimentos acerca da tradução interlingual que seus sucessores viriam a reforçar

séculos mais tarde, sob influência das ideias renascentistas.

Um desses sucessores é o inglês John Dryden, que traduziu o poeta latino Ovídio e,

no ensaio de introdução à publicação da sua tradução, teorizou sobre a tradução e

diferenciou três tipos – a metáfrase (palavra por palavra), a imitação (recriação) e a

paráfrase (tradução do sentido), defendendo abertamente este último método. Para


Dryden (1680 apud GUERINI; COSTA, 2006), a tradução do sentido (paráfrase), que

enfatiza o texto de chegada, é o método mais sensato por permitir extrair do original
minúcias do estilo e da forma, e reelaborá-las na tradução.

Outro sucessor de Dolet no debate sobre a tradução é o alemão Friedrich

Schleiermacher, que, em seu clássico “Sobre os diferentes métodos de tradução”,

de 1813, propõe uma tipologia enxuta, reduzindo a questão da tradução a duas


possibilidades: ou o tradutor deixa o autor em paz e leva o leitor até ele; ou o

tradutor deixa o leitor em paz e leva o autor até ele.

Ainda que a visão de Schleiermacher possa parecer simplista à primeira vista, sua
classificação foi uma das mais prósperas nesse debate, tendo sido retomada mais

tarde, no século XX, por teóricos como Walter Benjamin e Lawrence Venuti. Este
último reformulou a divisão schleiermacheriana na – hoje famosa – dicotomia

“tradução estrangeirizadora versus tradução domesticadora” (VENUTI, 1992). Além


destes, outro tradutólogo contemporâneo que também se vale dessa dicotomia é o
brasileiro Paulo Rónai (1976), que se a ela em termos de “tradução naturalizadora” e

“tradução identificadora”.

Assim, temos a seguinte diversidade terminológica para se referir à posição de uma

tradução em relação aos textos de partida e de chegada:

Quadro 1 – Terminologias tradutórias


Teórico Foco no texto de partida Foco no texto de chegada
Schleiermacher Trad. que leva o leitor ao autor Trad. que leva o autor ao leitor
Venuti Tradução estrangeirizadora Tradução domesticadora
Rónai Tradução identificadora Tradução naturalizadora
Fonte: Elaboração do autor (2018).

Como você pode perceber, ao longo da história, a maior parte das abordagens

sobre a tradução acabaram, de uma forma ou de outra, tangenciando a questão do


foco sobre o texto-fonte ou o texto-alvo. Se o escopo deste trabalho não fosse

reduzido, poderíamos ainda aprofundar aqui outras tipologias, como a “criação


paralela” de Haroldo de Campos, ou a tradução totalizadora de August Willemsen.

Acreditamos, porém, que, para os fins a que este texto se destina, a dicotomia em

questão é uma maneira útil e simplificada de compreender os problemas que

incidem sobre a tradução interlingual.

De todo modo, a fim de que você possa aprofundar o tema e aceder a nuances mais

sutis que subjazem a essa polarização se assim desejar, oferecemos a seguinte


leitura complementar.

LEITURA COMPLEMENTAR

As teorias da tradução segundo Steiner, Borges e Leopardi

Andrea Guerini e Walter Costa

Fonte: ______. Introdução aos Estudos de Tradução. Florianópolis: CCE/UFSC,

2006. p. 16-18.
Diante desta variedade de teorizações, vamos agora ver como o professor, crítico e

teórico George Steiner agrupa as teorias da tradução. Para ele, a produção teórica

ocidental sobre o assunto pode ser dividida em quatro grandes períodos:

1) o primeiro caracteriza-se como o mais empírico e abarcaria de 46 a. C. a


1804, isto é, de Cicero a Hölderlin. Entre essas duas datas, figuram São

Jerônimo, Leonardo Bruni, Montaigne, Dryden entre outros;

2) o segundo período, de teoria e investigação hermenêutica, dá ao problema

da tradução um caráter mais filosófico, iniciando-se com os escritos de Tytler

e Schleiermacher passando por Schlegel e Humboldt. Já os textos de

Goethe, Schopenhauer, Paul Valéry, Pound, Croce, Benjamin e Ortega y

Gasset refletem as descrições da atividade do tradutor e das relações entre


as línguas. Essa época comporta uma historiografia da tradução e se

estende até Valery Larbaud (1946);


3) o terceiro momento é o da corrente moderna. No final da década de 40

aparecem artigos sobre tradução automática (que vamos ver a seguir). Os

pesquisadores russos e tchecos aplicam a teoria linguística e os métodos

estatísticos à tradução;

4) no quarto momento, por volta da década de 60, há o redescobrimento de A

tarefa do tradutor, texto de Walter Benjamin, publicado em 1923, que dará


nova vida aos estudos hermenêuticos, quase filosóficos, sobre a tradução e

a interpretação. Decai a confiança que inspirava a tradução automática.

Nessa época, o estudo da teoria e da prática da tradução torna-se

interdisciplinar, com contribuições, entre outros, da psicologia, antropologia,

sociologia e etnografia. Assim, a filologia clássica, a literatura comparada, a

estatística lexical e etnográfica, a sociolinguística, a retórica formal, a poética

e o estudo da gramática confluem no propósito de esclarecer o ato de

tradução e os mecanismos da “vida entre as línguas” (2005: 259-262).

Como se pode perceber, muito se falou sobre a tradução entre línguas diferentes e,
grosso modo, a teoria sobre o assunto debate:
1) tradução literal;

2) tradução intermediária, que se dá com a ajuda de um enunciado que procura

ser fiel e, no entanto, autônoma;

3) imitação, recriação, variação ou interpretação paralela.

Steiner vai observar, por exemplo, que embora a história da tradução seja muito

rica, o número de ideias originais e significativas sobre o assunto permanece

limitado, porque as reflexões sempre tendem a falar ou da tradução literal, ou da

tradução livre (200: 263).

Mas há autores como Jorge Luís Borges, por exemplo, que vai além desse tipo de

classificação e dá uma nova dimensão à tradução, valorizando-a por contribuir para

a discussão estética. Na concepção borgiana, as traduções são vistas não apenas


como derivadas de um original necessariamente superior, mas como atualizações

do original que podem, eventualmente, ser tão ou mais significativas do que este.
Assim, um conjunto de traduções realizadas para diferentes línguas pertencentes a

sistemas literários sofisticados pode ser representar para seu leitor mais riqueza
estética do que para o leitor monolíngue do original. Borges ilustra o aparente

paradoxo de as traduções oferecerem mais prazer estético que o original, dizendo

que pelo fato de não conhecer grego, pôde ler a Odisseia em várias traduções para

diferentes línguas.

Para Borges, que era um grande conhecedor de línguas estrangeiras, a sua leitura

de um conjunto de Odisseias em inglês, francês, alemão, representando diferentes

estilos e épocas, constituiu uma experiência literária mais rica do que sua leitura de

Dom Quixote feita apenas em espanhol.
 A tradução interlingual também serve

como exercício de escrita e como meio de desenvolver e/ou aprimorar o próprio

estilo.

Aliás, muitos escritores como, por exemplo, o italiano Giacomo Leopardi (1798-

1837), defendem a prática da tradução para o escritor iniciante. É traduzindo que se

aprende a compor com estilo. Convém frisar que quando Leopardi fala que é
traduzindo que se aprende a escrever, ele se refere à tradução de excelentes
autores clássicos gregos e latinos, como Homero, Virgílio e Horácio. Mas no caso de

ser escritor e escrever bem, a probabilidade de uma boa tradução é bastante alta,

pois a tradução de qualidade é obra do escritor maduro.

Assim, em uma de suas primeiras observações sobre tradução, que se encontra


numa carta de 29 de dezembro de 1817 endereçada ao amigo e escritor Pietro

Giordani, ele diz: [...] dou-me conta de que traduzir, assim por exercício, deve

realmente preceder a atividade de compor, sendo útil e necessário para os que

querem tornar-se escritores insignes; mas para tornar-se um grande tradutor

convém antes haver composto e ter sido bom escritor: enfim, uma tradução perfeita

é obra mais da maturidade que da juventude (1996: 730).

Como se pode perceber, Leopardi coloca a prática da tradução como requisito para
se tornar um bom escritor, porque para o escritor italiano, a tradução possibilita o

mais íntimo e profundo contato com determinados textos literários, com suas formas,
mas também com o conteúdo das obras dos escritores que estão sendo traduzidos.

Com essas ideias, Leopardi lança as bases da relevância do traduzir, estabelecendo


a relação tradutor-escritor e escritor-tradutor, afirmando que somente um bom

escritor pode ser um bom tradutor. Claro que esta ideia pode ser contestada e há

muitos autores que defenderam uma ou outra posição, embora a balança pareça

pender mais para o lado de Leopardi.

4 TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA

Conforme já indicamos no início deste tópico, Jakobson (1969) entende a tradução

intersemiótica como a transmutação de uma obra de um sistema de signos a outro.

Rónai (1976, p. 2), por sua vez, oferece um conceito mais amplo, afirmando que a

tradução intersemiótica é

[...] aquela a que nos entregamos ao procurarmos interpretar o


significado de uma expressão fisionômica, um gesto, um ato
simbólico mesmo desacompanhado de palavras. É em virtude
dessa tradução que uma pessoa se ofende quando outra não lhe
aperta a mão estendida ou se sente à vontade quando lhe indicam
uma cadeira ou lhe oferecem um cafezinho.

Frequentemente, uma tradução intersemiótica ocorre entre um sistema verbal e um

não-verbal. Exemplos clássicos desse tipo de percurso são:

 a passagem da ficção literária ao cinema, ao vídeo e aos quadrinhos;

 ilustração de livros;

 passagem do texto à publicidade.

Figura 3 – A Divina Comédia de Dante em quadrinhos: exemplo de tradução


intersemiótica

Fonte: Bagnariol; Bagnariol, 2011, p. 6-7.

Todavia, a tradução intersemiótica também pode se dar entre dois sistemas não-

verbais. Como exemplo, temos translações entre:

 música e dança;

 música e pintura;

 etc.
Figura 4 – A música de Ernesto Lecuona traduzida em dança pelo Grupo Corpo, de
Belo Horizonte: exemplo de tradução intersemiótica

Fonte: Paula (2016).

Assim, de acordo com Guerini e Costa (2009, p. 23), na passagem de texto para

outro sistema, podemos observar o seguinte percurso:

Figura 5 - Caminho do texto numa tradução intersemiótica

texto de partida → intérprete → ícone de chegada

através de códigos diferentes, isto é

texto = imagem estática: desenho, foto, pintura

ou

texto = imagem animada através de vídeo, cinema

Fonte: Guerini e Costa (2009, p. 23)

A tradução intersemiótica, vale dizer, guarda semelhanças em relação aos outros

dois tipos. No entendimento de Diniz (1998), de modo similar às traduções


intralingual e interlingual, a intersemiótica também busca equivalentes, isto é,
procura em outro sistema de signos elementos formais cujas funções se

assemelhem às dos elementos originais. Segundo a autora, tal busca por


equivalentes deve dar conta de transportar também o sentido da obra original,

o que torna a tarefa bastante delicada.

Nessa tentativa de buscar equivalências formais que deem conta de transportar o

sentido, o tradutor intersemiótico acaba por operar recortes no texto original. Como

afirma Osimo (2004):

[...] o tradutor intersemiótico, queira ou não, está sendo obrigado a


dividir o texto original em partes [...]: denotação/conotação,
expressão/conteúdo, diálogos/descrições, referências
intertextuais/intratextuais etc. A seguir, deve desmontar tais partes
do original, encontrar um elemento traduzível em cada uma delas e
voltar a montá-las, recriando a coerência e a coesão, que, como já
observamos, é a essência de um texto.

Complementarmente a Osimo, Diniz (1998, p. 320) argumenta que, “mesmo que se

estabeleçam equivalentes semânticos para os elementos de dois sistemas de signos


diferentes, não se pode abranger todas as nuances de cada um dos sistemas”.

E o raciocínio da autora nos parece bastante plausível, já que, em se tratando de


tradução, seja a mais literal delas ou a mais transvertida, jamais haverá

correspondência total entre dois textos. Por esse motivo,

[...] toda tradução irá [...] oferecer sempre algo além ou aquém do
chamado original, e o sucesso não dependerá apenas da
criatividade nem da habilidade, mas das decisões tomadas pelo
tradutor, seja sacrificando algo, ou encontrando a todo custo um
equivalente. Se nos lembrarmos de que o sentido é o resultado de
uma interpretação, de uma leitura, e da função que o texto/tradução
terá para a audiência a que se destina, nunca poderemos avaliar
uma tradução com critérios de fidelidade. (DINIZ, 1998, p. 330).

Esse necessário exercício de decomposição numa tradução intersemiótica pode

ser facilmente observado se pensarmos na transposição de um texto escrito para o

cinema. Como sabemos, uma parte ínfima do texto escrito se converte em falas de
personagens no cinema. A maior parte se transforma em gestos, sons,

ambientação, trilha sonora, montagem, enquadramento, iluminação, cor, plano,


perspectiva etc. Como observa Osimo (2004), para realizar a tradução fílmica de um

texto verbal, “é imprescindível fazer uma subdivisão racional do original para decidir
quais elementos da composição fílmica são confiáveis para tradução de
determinados elementos estilísticos ou narratológicos do original”.

Figura 6 – Cena do filme Troia (2004), de Wolfgang Petersen, versão

cinematográfica da Ilíada de Homero: exemplo de tradução intersemiótica

Fonte: AMC Network Entertainment LLC (2008).

Uma abordagem que defende abertamente tal processo de decomposição do texto


em “unidades tradutórias” é a chamada teoria da funcionalidade, representada por

Christiane Nord (2012 apud PONTES; PEREIRA, 2017). Conforme essa visão, o
tradutor sabe intuitivamente que a tradução de um texto se faz por partes e, em

princípio, busca reconstruir essas partes sequencialmente no texto chegada,

tomando por base a estrutura de partida. Ao fazê-lo, porém, depara-se com itens

lexicais desconhecidos, estruturas sintáticas incompreensíveis e ambuiguidades

semânticas de difícil solução. Isso modifica o ritmo sequencial do trabalho do

tradutor, levando-o a retroceder, formular novas possibilidades, fazer novas

escolhas, suspender problemas não solucionados etc. Para sair desse labirinto, a

teoria da funcionalidade defende que o tradutor abandone as literalidades lexicais e


sintáticas, e: (1) decomponha o texto em unidades tradutórias, identificando a função
de cada uma; e (2) oriente-se por uma contextualização mais adequada na língua e
cultura de chegada.

Segundo Pontes e Pereira (2017), as unidades de tradução podem variar de acordo

com a compreensão do texto pelo tradutor, e isso é absolutamente legítimo.

Transpondo tal teoria para o contexto da tradução intersemiótica, vemos que este
tipo recorre justamente a uma seleção de unidades tradutórias a fim de reconstruí-

las ou recombiná-las no sistema de chegada, com base na função de cada uma.

Feitas essas considerações, podemos assumir que a tradução intersemiótica não é

tão diferente das demais quanto parece à primeira vista. Sua dificuldade, e

particularidade, reside no fato de que o seu praticante precisa se desprender das

palavras e fazer um exercício mais intenso de abstração em direção ao signos e


suas funcionalidades.

LEITURA COMPLEMENTAR

A tradução intersemiótica

Bruno Osimo

Fonte: http://courses.logos.it/

[...] a tradução de um sistema de signos (por exemplo, o sistema verbal) para outro

(por exemplo, um sistema não-verbal), e vice-versa, pertence sem dúvida ao campo

dos estudos da tradutologia. O fato de, neste caso, no início ou no fim do processo,

não se ter um texto verbal não lhe tira importância; pelo contrário, devido a algumas

implicações, torna-se fundamental para a descrição do processo tradutivo em geral.

Em lugar de considerar uma tradução intersemiótica como um caso fronteiriço que

Jakobson, por alguma razão, incluiu em seu clássico ensaio sobre os aspectos

lingüísticos da tradução (talvez o ensaio tradutológico mais citado de todos os


tempos), seria melhor considerá-la como uma atividade que nos permite conceber o
processo tradutivo do ponto de vista das novidades e, portanto, muito interessantes.

Para fazê-lo, seria necessário ampliar o conceito de "texto". Segre afirma:

No uso comum, texto, que deriva do latim textus, 'tecido',


desenvolve uma metáfora na qual são visíveis as palavras que
formam uma obra e os elementos que as unem, como ao se tratar
de uma trama. Esta metáfora, que antecipa as observações sobre a
coesão do texto, alude em particular a seu conteúdo, ao que está
escrito em uma obra.

Se interpretarmos isso em seu sentido mais amplo, sem ter em conta que Segre fala

de "palavras" e "escrito", podemos transferir o conceito de texto a qualquer obra de


tipo musical, pictórico, cinematográfico e outros. Ou seja, nestes outros casos a obra
é também um tecido consistente e coeso, "um sistema de estruturas coimplicadas

em diferentes níveis, de maneira que cada elemento adquire um valor em relação

aos demais".

Steiner também concorda com aqueles que incluem a tradução intersemiótica na


ciência mais ampla da tradução:

Uma "teoria" da tradução, uma "teoria" da transferência semântica,


deve significar uma de duas coisas: ou se trata de uma
manifestação aguçada intencionalmente, orientada
hermeneuticamente, da totalidade da comunicação semântica -
incluída a tradução intersemiótica ou "transmutação" de Jakobson -
, ou é um apartado de tal modelo, com referência específica aos
intercâmbios intralinguísticos, à emissão e recepção de mensagens
significativas entre linguagens diferentes [...] A designação
"totalizadora" é ainda mais instrutiva porque discute o fato de que
todos os procedimentos de articulação expressiva e recepção
interpretativa sejam translacionais, de maneira intra ou
interlinguística).

Tentaremos agora demonstrar, do ponto de vista metodológico, a utilidade de incluir

a tradução intersemiótica na busca de uma descrição do processo tradutivo.

Em primeiro lugar, é necessário destacar que existem algumas diferenças entre as

linguagens verbais, que são discretas, e as linguagens icônicas (como a pintura ou

as artes figurativas em geral), que são contínuas. O que significa isto? Que nas
linguagens discretas podemos distinguir entre um signo e outro, mas nas linguagens

contínuas o texto não é divisível em signos discretos. Se uma pintura representa


uma árvore, não é fácil dividir esse texto em signos separados.

Lotman explicou com eficácia:

A impossibilidade de realizar uma tradução exata de linguagens


discretas para não-discretas, e vice-versa, tem raiz em suas
naturezas claramente diferentes: nos sistemas linguísticos
discretos, o texto é secundário em relação ao signo, ou seja, divide-
se claramente em signos. O isolamento do signo como unidade
elementar inicial não representa dificuldade alguma. Nas
linguagens contínuas, o texto é fundamental: não se divide em
signos, mas é um signo em si mesmo, ou é isomórfico para um
signo.

Temos repetido que todo tipo de ato comunicativo, inclusive todo processo tradutivo,

nunca é completo, pois sempre existe resíduo, ou seja, uma parte da mensagem

não chega a destino.


RESUMO DO TÓPICO 2

Neste segundo tópico, retomamos a clássica tipologia do linguista russo Roman

Jackobson, que divide a tradução em três tipos: intralingual, interlingual e

intersemiótica. A tradução intralingual ou reformulação consiste na interpretação dos

signos verbais por meio de outros signos da mesma língua. A tradução interlingual
ou tradução propriamente dita consiste na interpretação dos signos verbais por meio

de alguma outra língua. E a tradução intersemiótica ou transmutação consiste na

interpretação dos signos verbais por meio de sistemas de signos não-verbais.

Também mencionamos uma quarta tipificação, conforme Pereira (2008), que é a

tradução sociolinguística, quando procedemos a traduções dialetais, decorrentes de

diferenças de classes sociais, comunidades de fala, região, sexo, entre outros


fatores.

Salientamos que, ao longo da história, a maior parte das abordagens sobre a

tradução acabaram, de uma forma ou de outra, tangenciando a questão do foco

sobre o texto-fonte ou o texto-alvo, e que esta dicotomia é uma maneira útil e

simplificada de compreender os problemas que incidem sobre a tradução


interlingual.

E, por fim, ao debater a tradução intersemiótica, aproximamo-la da teoria da


funcionalidade, que defende abertamente a decomposição do texto-fonte em

unidades tradutórias, recomendando que o tradutor abandone as literalidades

lexicais e sintáticas, a fim de decompor o texto em unidades funcionais e

contextualizá-lo na língua e cultura de chegada.


AUTOATIVIDADE

1. Reflita sobre a dicotomia “foco no texto de partida vs. foco no texto de chegada”

destacada na discussão sobre a tradução interlingual. Em que situações, como

futuro tradutor ou intérprete de libras, você se posicionaria em favor do foco no texto

de partida e em que situações você se posicionaria no foco no texto de chegada?


Explique, por exemplo, qual seria a sua postura diante dos seguintes contextos:

a) Alguém está falando sobre qualidades formais de um poema escrito em língua

portuguesa. Na tradução para libras, você focaria no texto de partida ou no texto de

chegada, por quê?

Resposta esperada:

Ainda que o tradutor seja sempre livre para fazer as suas escolhas, neste caso,
seria cabível o foco no texto de partida, já que o seu valor se encontra justamente na

sua forma. Assim, seria conveniente buscar, em Libras, alternativas para recriar o

valor dos aspectos formais do poema.

b) Alguém está simplesmente passando orientações, em português, sobre como se


comportar em uma situação específica (uma entrevista de emprego, por exemplo).

Na tradução para libras, você focaria no texto de partida ou no texto de chegada, por
quê?

Resposta esperada:

Ainda que o tradutor seja sempre livre para fazer as suas escolhas, neste caso,

seria cabível o foco no texto de chegada, já que o valor do texto-fonte não se

encontra na sua forma e tampouco na língua em si, mas sim na mensagem.

2. (Adapt. de concurso para tradutor/intérprete de Libras da UFSJ/2016) Relacione

os tipos de tradução elencados com as definições dadas a seguir a partir de Pereira


(2008).

a. Tradução interlingual
b. Tradução intralingual
c. Tradução sociolinguística

d. Tradução intersemiótica

( ) Ocorre quando há a reformulação entre signos verbais dentro de uma

mesma língua; por exemplo, no caso da paráfrase.

( ) Ocorre quando signos não verbais são transformados em linguagem verbal.

( ) Envolve duas línguas, quando há a reformulação de um texto em uma


língua diferente daquela em que foi inicialmente enunciada.

( ) Aquela em que a intenção do interlocutor é traduzida com base nos

padrões de formação sociocultural existente no meio da comunidade onde a

interação linguística ocorre.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) a, d, b, c.

b) ( ) b, d, c, a.

c) (X ) b, d, a, c.

d) ( ) c, d, b, a.

3. (Adapt. de concurso para tradutor/intérprete de Libras da UFSJ/2016) Sabe-se

intuitivamente que a tradução de um texto se faz por partes. Em princípio, essas

partes podem ser construídas sequencialmente no texto chegada, tomando-se por

base a estrutura do texto partida. Em situações práticas, porém, nem sempre uma

tradução transcorre tão naturalmente. Depara-se com itens lexicais desconhecidos,

estruturas sintáticas incompreensíveis e ambuiguidades semânticas de difícil

solução.

Com base nesse enunciado, analise as afirmativas abaixo:


I. Esses conhecimentos modificam o ritmo sequencial do trabalho de um
tradutor, levando-o a retroceder com o intuito de buscar explicações por

meio de passagens já traduzidas e/ou a avançar no texto. Assim, deixa

temporariamente de lado problemas não solucionados.

II. A Teoria da Funcionalidade vê a função de uma tradução como sendo


objeto primordial e, com isso, defende que o tradutor não abandone as

literalidades lexicais e sintáticas, e descarte a tradução que se oriente

pela contextualização mais adequada na língua e cultura de chegada.

III. Segundo pesquisadores da área, as Unidades de Tradução (UTs) podem

variar de acordo com a compreensão do texto pelo tradutor.

Conhecimentos linguísticos, tanto na língua de partida quanto na língua

de chegada, e o conhecimento prévio sobre o assunto tratado, são

fatores essenciais para essa prática.

Sobre as afirmativas acima, é possível afirmar que:

a) ( ) I e II estão corretas.

b) (X ) I e III estão corretas.

c) ( ) todas estão corretas.

d) ( ) nenhuma das afirmativas está correta.


TÓPICO 3: FUNÇÕES DO TRADUTOR E DO INTÉRPRETE

1 INTRODUÇÃO

Você já refletiu sobre as diferenças entre o tradutor e o intérprete? Como cada um

surgiu, em que situações atuam, que especificidades cada papel pressupõe? Neste

último tópico, vamos abordar a essa distinção, discutindo a importância desses dois
atores para a comunicação.

Como já falamos bastante sobre o tradutor até aqui, para iniciar a nossa conversa,
cremos que seja conveniente apresentar uma breve introdução à tarefa

interpretação. Acompanhe.

2 INTERPRETAÇÃO SIMULTÂNEA E INTERPRETAÇÃO CONSECUTIVA

Também chamada de “tradução oral” ou “tradução simultânea”, o que

convencionamos chamar aqui de “interpretação” é uma atividade extremamente


antiga na história e remonta a diplomatas, embaixadores e negociadores que

moderaram e viabilizaram o contato entre os povos em diversas épocas. Tais

sujeitos foram essenciais não só em trocas comerciais e culturais, mas também na


solução de problemas bélicos e políticos.

No mundo moderno, esse papel ganha novas funções, com a multiplicação de

eventos sociais em que sua presença passa a ser necessária, e adquire

especificidades, com sua contínua demarcação em relação à figura do tradutor. É o

que Guerini e Costa (2006, p. 30) comentam na seguinte observação:

Nos tempos modernos, com a chamada globalização, ocorre um


verdadeiro florescimento da interpretação com a multiplicação de
colóquios e congressos internacionais. Cabe recordar a
diferenciação paulatina entre a figura do intérprete e a do tradutor.
Até o século XI, aproximadamente, era chamado intérprete quem
fazia tradução, tanto oral quanto escrita. A partir do século XII,
começa-se a falar de intérprete como aquele que faz tradução oral,
ou seja interpretação, e de tradutor, como aquele que faz tradução
escrita.
Além dessa vinculação do intérprete à oralidade ou à gestualidade, e do

tradutor à escrita, as condições de trabalho de um e outro também são

frequentemente usadas como diferenciadores. Mounin (1965, p. 179), por exemplo,

chama a atenção para o fato de o intérprete ter de trabalhar de forma instantânea,

comparando-o a um orador ou um ator, enquanto que o tradutor tem mais tempo


para se planejar e elaborar seu trabalho:

O intérprete atua com a forma oral ou gestual e instantânea ou


consecutiva de tradução, já o tradutor, que trabalha com o texto
escrito, sempre terá mais tempo para consultar os instrumentos do
ofício, diferentemente do intérprete. O intérprete deve ser um
orador e até mesmo um ator: um virtuoso, um artista.

Segundo Magalhães Jr. (2007), há pelo menos dois tipos de interpretação: a

simultânea e a consecutiva. Na primeira, “o intérprete vai repetindo na língua de

chegada cada palavra ou ideia apresentada pelo palestrante na língua de partida”


(MAGALHÃES Jr., 2007, p. 44). Essa modalidade exige uma capacidade

extraordinária de memorização e intuição. Além disso, demanda recursos técnicos,


como uma cabine para o intérprete e fones de ouvido para os assistentes.

Já, na tradução consecutiva, “a pessoa que tem a palavra faz pausas periódicas em

sua fala, a fim de permitir que o intérprete faça o translado da língua original (língua-

fonte ou língua de partida) à língua dos ouvintes (língua-meta ou língua de


chegada)” (MAGALHÃES Jr., 2007, p. 44).

Ainda que a tarefa do intérprete-orador demande


improvisação, como pontuamos, não é raro que ele

receba o texto a ser interpretado previamente, a fim de


se familiarizar com o tema, o vocabulário e a fim de

pensar em soluções para formulações mais complexas

daquele texto. Esta seria, ao menos, a situação ideal,

conquanto nem sempre seja possível.


A imagem a seguir, por exemplo, ilustra uma interpretação durante uma assembleia,
situação em que não é possível prever os plenamente os discursos que serão

proferidos pelos interlocutores.

Figura 7 – Intérprete durante uma assembleia

Fonte: English for Business (2018).

Continuando a delimitar os campos de atuação típicos do intérprete e do tradutor,

convém lembrar o filósofo Schleiermacher (2001 [1813]), que, ainda no séc. XIX, no

ensaio “Sobre os diferentes métodos da tradução”, apontou outra distinção: segundo


ele, o intérprete seria mais propenso a atuar no campo dos negócios, e o tradutor,

no campo da ciência e da arte. Você concorda com essa afirmação? Ela lhe parece

atual?

Schleiermacher (2001 [1813]) também faz outra afirmação de certa forma

controversa. Segundo ele,

[...] a tradução de escritos narrativos e descritivos pode ter também


muito da função do intérprete, mas o tradutor se sobrepõe ao
intérprete quando chega ao seu ramo mais próprio, isto é, o poder
de combinar livremente as produções intelectuais da arte e da
ciência com o espírito da língua, a forma de ver o mundo e a matriz
do estado da alma (2001, p. 29).

Segundo Guerini e Costa (2006, p. 31), o filósofo alemão supervaloriza o tradutor

em detrimento do intérprete, porque acredita que, somente por meio da tradução de


grandes textos clássicos da literatura ocidental e oriental, e de textos filosóficos e
religiosos, será possível fortalecer (renovar, ampliar) a língua e a cultura nacional.

Portanto, por trás desse movimento, há uma preocupação política historicamente

contextualizada.

De fato, como ressalvam os autores, os tradutores têm um mérito particular, uma


vez que foram figuras centrais no desenvolvimento das civilizações, pois

[...] sempre contribuíram para a emergência, o enriquecimento e a


promoção das línguas e literaturas nacionais, para o despertar de
uma consciência coletiva de grupos étnicos e linguísticos, para
importar novas ideias e valores, além de colaborar para a
preservação do patrimônio cultural da humanidade. (GUERINI;
COSTA, 2006, p. 31).

Entretanto, hoje, essa preocupação ainda faz sentido? É cabível essa


supervalorização do tradutor em detrimento do intérprete? No contexto das línguas

de sinais, por exemplo, o que você acha?

Antes de tirar suas conclusões, vamos aprofundar um pouco mais o nosso

conhecimento sobre as especificidades de cada papel. Acompanhe.

3 ESPECIFICIDADES DE CADA PAPEL

Embora já tenhamos esboçado algumas respostas para essa questão, vale a pena

nos determos um pouco mais sobre ela: afinal, o que diferencia o intérprete e o

tradutor?

No que se refere a requisitos comuns, podemos dizer que, tanto a um quanto a

outro, é imprescindível transitar bem entre os dois códigos, isto é, é indispensável

possuir competência comunicativa nas duas línguas, embora ao intérprete

particularmente não seja necessária a chamada competência tradutória. Esta, por

sua vez, é um saber especializado, formado por um conjunto de conhecimentos e

habilidades, que singulariza o tradutor e o diferencia de outros falantes bilíngues não

tradutores.
A fim de simplificar essa diferença, podemos dizer que

tanto um quanto outro precisam estar aptos a usar as

duas línguas, mas o tradutor deve, em última instância,

ser capaz de entregar um texto que se possa chamar de


tradução.

E o que torna o intérprete singular? Um primeiro aspecto que provavelmente lhe

vem à mente é o fato de o intérprete interagir em eventos sociais e demandar

uma capacidade de improviso. Além disso, segundo Quadros (2004), o intérprete

se singulariza ao combinar três competências: a linguística, a técnica e a

metodológica. A competência linguística, reiterando, é a habilidade de lidar com as


línguas envolvidas no processo de interpretação. Mais uma vez: os intérpretes

precisam ser bilíngues e possuir um excelente conhecimento dos dois idiomas

envolvidos. A competência técnica diz respeito, por exemplo, à habilidade de

posicionar-se apropriadamente para interpretar, para usar microfone, para usar

fones quando necessário, para modular a voz ou a intensidade dos gestos. E a

competência metodológica é a habilidade de usar diferentes modos de

interpretação, escolher aquele mais apropriado diante das circunstâncias e

encontrar o item lexical e a terminologia adequada.

Segundo Osimo (2004), essa diferença vai um pouco mais além. Para o autor, o que

diferencia o tradutor é o seu pertencimento à comunidade da língua-alvo:

O tradutor é um animal social, porque traduzir é comunicar. É


também um animal cultural se, como temos visto, a tradução é feita
de uma cultura para outra. Neste sentido, quem pertence a uma
comunidade, entendida como núcleo social em sua acepção mais
ampla, e deve tratar com pessoas que não pertencem a tal
comunidade, vê-se obrigado a traduzir para poder comunicar-se a
partir de dentro com o exterior do grupo social. Em toda
comunidade a comunicação é baseada em uma altíssima
percentagem de elementos que se dão por adquiridos, em torno
dos quais esta se produz.

Em contrapartida, para Mounin (1965, p. 129), a função do intérprete – à qual ele se

refere por “tradução diplomática” – se diferencia por critérios históricos e políticos:


[...] a tradução diplomática, pela sua utilidade prática, existe há
mais de quatro milênios. Os tratados de paz criavam a exigência de
tradutores já́ em épocas em que as religiões eram propriedade de
uma única comunidade ética, e não se exportavam. Apenas com o
desenvolvimento das religiões universais, a tradução religiosa se
torna o mais importante gênero de tradução.

Magalhães Jr. (2007, p. 19), por sua vez, aborda a especificidade do intérprete, em
contraposição ao tradutor, comparando-o a um artista:

É como mágica. Vista de perto, [a interpretação] parece loucura. O


intérprete tem que ouvir e falar ao mesmo tempo, repetindo em
outra língua palavras e ideias que não são suas, sem perder de
vista o conteúdo, a intenção, o sentido, o ritmo e o tom da
mensagem transmitida por seu intermédio.

Pereira (2008) traz essa discussão para o domínio das línguas de sinais, mostrando

que, neste caso, a interpretação tem, historicamente, muito mais relevância que a

tradução stricto sensu. Com exceção de iniciativas mais modernas, como a de Klamt
(2014), que vimos no Tópico 1, em que há um projeto de tradução a longo prazo e

bem delimitado, grande parte das translações envolvendo a libras sempre recorreu à
interpretação simultânea.

Por essas razões, a autora reserva o termo tradução especificamente para

operações que partem da língua sinalizada para uma língua escrita e estabelece

que o termo interpretação destina-se a operações que partem da língua escrita em


direção à língua sinalizada. Em seus termos:

[...] a tradução é o termo geral que se refere a transformar um texto


a partir uma língua fonte, por meio de vocalização, escrita ou
sinalização, em outra língua meta. A diferenciação é feita, em um
nível posterior de especialização, quando se considera a
modalidade da língua para qual está sendo transformado o texto.
Se a língua meta estiver na modalidade escrita trata-se de uma
tradução; se estiver na modalidade vocal (também chamada de
oral) ou sinalizada (presenciais ou de interação imediata), o termo
utilizado é interpretação. (PEREIRA, 2008, p. 136).

Essa distinção é, em partes, semelhante à da Fundação Rio-Grandense de

Atendimento ao Excepcional - FADERS, a qual em seu site indica que a tradução

envolve pelo menos uma língua escrita no processo.

Para além dessa questão, Pereira (2008) também chama a nossa atenção para um

estigma dramático que marca a vida do intérprete. Para ela, sua profissão é
atormentada por estereótipos como o velho e surrado traduttori, tradittori (tradutor,
traidor), que a coloca sob permanente desconfiança, fazendo com que a culpa de

qualquer incompreensão recaia em primeiro lugar sobre o intérprete.

Ser intérprete é ser, intrinsecamente, um profissional atormentado


por ter que estar presente e fingir-se invisível, algo ainda mais
impensável para um intérprete de uma língua que é percebida
prioritariamente pelo canal visual, como uma língua de sinais; e por
não poder ser o ‘eu’ nem o ‘tu’ plenamente, por estar sempre em
uma posição instável e escorregadia de um simbiótico locutor-
interlocutor. (PEREIRA, 2008, p. 138)

Outra particularidade inerente ao intérprete de línguas sinalizadas, trazida por

Pereira (2008), diz respeito ao seu surgimento no contexto social e à conquista da

sua importância. Segundo a autora:

A atividade de intérprete no meio surdo surge no meio familiar e,


aos poucos, foi se estendendo aos professores de crianças surdas
e ao âmbito religioso. Com o passar do tempo, o fortalecimento dos
movimentos sociais e políticos das comunidades surdas e o
reconhecimento legal das línguas de sinais fez surgir, finalmente, o
ILS profissional. A função intérprete ganha particular relevo porque
os surdos podem, através do intérprete, compreender e ser
compreendidos, e os ouvintes, são colocados no mesmo nível,
precisam também do intérprete ou de aprender uma língua que não
é a sua língua natural.

Assim, concluindo esta seção, podemos pontuar que o tradutor e o intérprete se


especificam de diferentes maneiras: mediante aspectos técnicos, mediante a relação

com o texto escrito, mediante o seu papel na sociedade, mediante as situações em

que atua e, por fim, mediante o tipo de línguas que manipula.

LEITURA COMPLEMENTAR

Entrevista com Maria Cristina Silva, professora e intérprete de Libras

Rosângela Fressato

Fonte: ______. Entrevista com Maria Cristina Silva, professora e intérprete de


Libras. Libras na Universidade: uma inclusão social. Portal Unifenas, Notícias, 29

abr. 2013. Disponível em: <www.unifenas.br/noticia.asp?note=uni_1020>. Acesso

em: 15 maio 2018.


A LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) é uma importante ferramenta de inclusão

social e por isso não poderia deixar de ser inserida no aprendizado oferecido pela

UNIFENAS. A Universidade instituiu a disciplina curricular de Libras no curso de


Pedagogia desde 2007 e, nos demais cursos, nos anos seguintes, como disciplina

optativa. A responsável por esta disciplina é a professora Maria Cristina da Silva,

que recentemente foi certificada pelo MEC como Proficiente na Tradução e

Interpretação de Libras Língua Portuguesa (PROLIBRAS) e que nesta entrevista

explica a real importância deste trabalho nas salas de aula.

Como a senhora define a importância de um profissional saber a língua de sinais?

Com o conhecimento da Libras, mais oportunidades o profissional terá, uma vez que
os atendimentos, prestação de serviços e as demais interações sociais ainda não

contemplam totalmente o atendimento à pessoa surda. Compreender a importância


e garantir o acesso e permanência de pessoas em condições diversas nas escolas

implica novos conhecimentos e posturas. O acesso e a permanência de pessoas


surdas nas escolas estão intrinsecamente ligados à língua de sinais, salvo em casos

em que a tecnologia, como por exemplo, aparelho de amplificação sonora individual

ou implante coclear são adotados, o que nem sempre é possível.

Os acadêmicos da UNIFENAS têm a consciência da necessidade desta ferramenta


para a inclusão social?

Certamente. Graças às mudanças de consciência, eles entendem que a educação é

a principal forma de promoção humana. Sendo assim, a escola (solo fértil para

transformações e desconstruções) é o lugar ideal para novos olhares de inclusão.

Nesse sentido, o professor (substrato fundamental neste processo) precisa conhecer

para atuar na construção de tantas pontes. Para compreender que práticas

inclusivas devem ser transformadoras, o curso de Pedagogia desenvolverá, na

disciplina de Educação Inclusiva, um projeto que visa orientar as indústrias e

empresas sobre a convivência no trabalho com pessoas com necessidades


especiais. E a UNIFENAS prima pela acessibilidade: vagas destinadas à pessoa
com mobilidade reduzida, banheiros adaptados, elevador, intérprete de Libras... são

as barreiras dando lugar a rampas...

Além destas suas colações, que aparato a auxilia nas aulas?

O curso de Pedagogia recebe convidados com os quais compartilha da confecção


de material adaptado para alfabetização do aluno surdo. A biblioteca da

Universidade dispõe de vasto material para consulta, como, por exemplo, dicionários

ilustrados. Outros materiais são disponibilizados no blog: wwwlibras.blogspot.com

(Libras – Sinais de Inclusão), no qual podem ser encontrados alguns trabalhos

produzidos pelos alunos.

A UNIFENAS também organiza alguns eventos que promovem a disseminação da

Língua de Sinais em Alfenas e região, como o Fórum de Libras. Comente sobre


estes trabalhos.

Todos os anos realizamos o Fórum de Libras, quando são apresentados alguns

projetos de alunos do curso de Extensão em Libras e de acadêmicos do câmpus

Alfenas. O Fórum recebe convidados que são especialistas envolvidos na área da


surdez: fonoaudiólogos, educadores, familiares de pessoas surdas e surdos, para a

troca de experiências e depoimentos. A APAE do município de Areado tem sido

nossa parceira todos os anos, presente no Fórum e compartilhando dos nossos

ideais no sentido de conhecer e divulgar a importância da Libras para inclusão de


surdos. E, no segundo semestre deste ano, haverá a quinta edição do Fórum de

Libras.

Em sua opinião, a falta de professores qualificados em sala de aula pode prejudicar

o aprendizado de um aluno surdo nas escolas?

A Libras deve estar presente não só na sala de aula em que há o aluno surdo (via

intérprete), mas também na convivência com professores e amigos, afinal é por

meio da verbalização e expressão de nossos pensamentos que interagimos e

construímos nossa identidade. E a língua é um dos instrumentos fundamentais na

percepção de nós mesmos e do outro. A presença de um aluno surdo em escolas


que não adotam o bilinguismo (Libras e língua portuguesa escrita), direito postulado

em documentos nacionais e internacionais, equivale abrir mão da acessibilidade e,

consequentemente, do direito à cidadania.

A Libras possui estrutura gramatical própria?

Sim. A libras é visual-gestual; é uma língua pronunciada pelo corpo. Os sinais são

formados por meio da combinação de formas e de movimentos das mãos e de

pontos de referência no corpo ou no espaço, ou seja, parâmetros. Segundo a

legislação vigente, Libras constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e

fatos, oriundos de comunidades de pessoas com surdez no Brasil, no qual há uma

forma de comunicação e expressão, de natureza visual-motora, com estrutura

gramatical própria.
RESUMO DO TÓPICO 3

Existem pelo menos dois tipos de interpretação: a simultânea e a consecutiva. Na

primeira, o intérprete repete na língua de chegada cada palavra ou ideia

apresentada pelo palestrante na língua de partida. Essa modalidade exige uma

capacidade extraordinária de memorização e intuição. Além disso, demanda


recursos técnicos, como uma cabine para o intérprete e fones de ouvido para os

assistentes.

Na tradução consecutiva, a pessoa que tem a palavra faz pausas periódicas em sua

fala, a fim de permitir que o intérprete faça o translado da língua original (língua-

fonte ou língua de partida) à língua dos ouvintes (língua-meta ou língua de chegada.

É comum que o intérprete disponha do texto a ser interpretado previamente, a fim de


se familiarizar com o tema, com o vocabulário e pensar em soluções para

formulações mais complexas daquele texto. Embora seja a situação ideal, nem

sempre é possível. Há ocasiões, como assembleias e eventos esportivos, que

impossibilitam essa preparação prévia.

O tradutor e o intérprete se especificam de diferentes maneiras: por meio de


aspectos técnicos, relação com o texto escrito, papel na sociedade, situações em

que atua e tipo de línguas que manipula.


AUTOATIVIDADE

1. Por que, no contexto das línguas de sinais, a interpretação tem, historicamente,

mais relevância que a tradução stricto sensu? Que especificidades envolvendo esse

tipo de língua confere à interpretação um status diferenciado?

Resposta esperada:

Historicamente, as línguas fônicas com modalidade escrita se apoiaram em

traduções de textos escritos para o seu desenvolvimento. No caso das línguas


sinalizadas, porém, a interpretação sempre teve mais relevo do que a tradução, por

razões sociohistóricas. Como explica Pereira (2008) a atividade de intérprete no

meio surdo surge no meio familiar e, aos poucos, foi se estendendo aos professores

de crianças surdas e ao âmbito religioso. Com o passar do tempo, o fortalecimento


dos movimentos sociais e políticos das comunidades surdas e o reconhecimento

legal das línguas de sinais fez surgir, finalmente, o ILS profissional. A função

intérprete ganha particular relevo porque os surdos podem, através do intérprete,

compreender e ser compreendidos, e os ouvintes, são colocados no mesmo nível,

precisam também do intérprete ou de aprender uma língua que não é a sua língua
natural.

2. (Adapt. de concurso para tradutor/intérprete de Libras da UFSC/2018) Diante de


diversas situações e contextos, o intérprete de Libras poderá optar pela

interpretação consecutiva ou simultânea. Qual alternativa se refere

APENAS às características de uma interpretação consecutiva?

a) (X ) Exige do intérprete mais tempo para processar a mensagem-fonte

para em seguida interpretar, podendo lançar mão de notas para possíveis

retomadas.

b) ( ) É realizada com a mensagem-fonte em andamento, devendo ser

interpretada até que esta sofra uma pausa.

c) ( ) É uma modalidade de interpretação nova para as línguas orais, sendo

recorrente nas línguas de sinais.


d) ( ) Essa modalidade de interpretação possibilita às pessoas de diferentes
línguas participarem em tempo real de reuniões, palestras e cursos sem barreiras.

e) ( ) Foi usada pela primeira vez, após a Segunda Guerra Mundial, nos

julgamentos de nazistas. A modalidade de interpretação usada até então era

apenas simultânea; no entanto, pela presença de quatro idiomas nesses


julgamentos, passou a ser uma modalidade viável.

3. (Adapt. de concurso para tradutor/intérprete de Libras da UFSJ/2016) Embora

qualquer falante bilíngue possua competência comunicativa nas línguas que domina,

nem todo bilíngue possui competência tradutória. A competência tradutória é um

conhecimento especializado, integrado por um conjunto de _________________ e

_________________, que singulariza o tradutor e o diferencia de outros falantes


bilíngues não tradutores

Os termos que completam a frase acima CORRETAMENTE são:

a) ( ) conhecimentos linguísticos – culturais

b) ( ) atos tradutórios - de interpretação

c) (X ) conhecimentos – habilidades

d) ( ) habilidades linguísticas – culturais

4. (Adapt. de concurso para tradutor/intérprete de Libras da UFSJ/2016) Conforme

Quadros (2004), os itens abaixo se referem aos modelos de tradução e de

interpretação:

I) Competência linguística é a habilidade de manipular com as línguas

envolvidas no processo de interpretação. Os intérpretes precisam ter um

excelente conhecimento de ambas as línguas envolvidas.


II) Competência técnica é a habilidade de posicionar-se apropriadamente
para interpretar, para usar microfone e para interpretar usando fones,

quando necessário.

III) Competência metodológica é a habilidade de usar diferentes modos de

interpretação, escolher o modo apropriado diante das circunstâncias e


encontrar o item lexical e a terminologia adequada.

Sobre esses itens, pode-se afirmar que

a) ( ) I e II estão corretos.

b) ( ) I e III estão corretos.

c) (X ) todos estão corretos.

d) ( ) nenhum dos itens está correto.


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