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ACUMULADORES COMPULSIVOS ou SÍNDROME DE DIOGENES1: GUARDAR


OU MORRER

Todos nós temos nossos segredos. Alguns partilháveis, outros, todavia bem
ocultos. Impossíveis, impossíveis de comunicar, de se deixar ir.

Memórias, mágoas, saudades. Raiva? Culpas? Arrependimentos? Vergonha?


Conflitos, muitos conflitos... Ansiedade quanto ao que virá e sim, principalmente medo,
muito medo.

Imagine como deve ser difícil carregar tudo isso em silêncio. Sem partilhar. Os
pensamentos e ruminações circulando dentro de você. A angústia diante da
possibilidade de que isso se torne de alguma maneira público, em parte ou na totalidade.
Imagine toda esta montoeira de emoções armazenadas internamente. Acumuladas como
lixo, jamais descartadas...

Desesperador não? Então, exercite um pouco mais sua capacidade de imaginar. E


pense em todo este sofrimento mental, à cada pensamento, à cada emoção
desestabilizadora se materializado em objetos, novos ou velhos, cuja quantidade
gradativamente vá aumentando, aumentando, aumentando.

Em uma mente assim atormentada e compulsiva, em pouco tempo estes objetos


terão invadido cada espaço livre dentro de uma casa. Quartos, sala, banheiro, área de
serviço, escada, quintal. E então todas as funções da casa são subvertidas na priorização
destes objetos. A cozinha não serve mais para cozinhar. O quarto não mais para dormir.

Todos os cômodos cheios de objetos, alguns comprados e talvez nunca usados,


somente guardados, intactos. No inicio talvez apenas um armário, cheio de roupas e
sapatos que nunca foram usados, ainda com etiquetas. Mas pouco a pouco se adicionam
a esta coleção objetos já danificados e mesmo assim guardados.

Como por exemplo, eletrodomésticos quebrados. Depois peças ou pedaços de


eletrodomésticos, ou fios, restos de obra, parafusos, ferramentas... Aos poucos serão
estocados jornais, revistas, lãs, isopor, pedaços de metal, tampas de garrafa
enferrujadas. Ou quem sabe mais, garrafas pet, caixas e embalagens, potes vazios,
barbantes etc., etc. ,etc... e tudo mais que a mente imaginar e a mão puder carregar para
dentro de casa talvez até retirados do lixo. Sim, retirados do lixo e em um estado que
outras pessoas poderiam considerar repugnante, mas que para este olhar distorcido
podem ser um verdadeiro tesouro.

Valiosos, únicos e absolutamente necessários mesmo que sejam apenas objetos


que para a maioria das pessoas há muito tempo já teriam sido levados pelo caminhão do
lixo, estão ali guardados, como itens preciosos.

Preciosos porque dentro de sua lógica acumuladora estas coisas em algum


momento poderão ser necessárias.
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Ou pelo menos é esta a argumentação do inicio. Porém após dias, meses e anos
nada será feito com estes objetos recolhidos. Continuarão ali apenas se acumulando,
ocupando espaço. Intocáveis.

Já em estágios avançados não, nem este disfarce bem articulado é usado.


Nenhuma argumentação mais será sequer levantada. São “minhas coisas”— dirá. Ou
como gemia o tenebroso personagem Gollum do Senhor dos Anéis : “ My
precious!” Uma excelente representação dos acumuladores, esquálido desesperado e
consumido no desespero de reter o que é impossível de ser retido.

Esta na verdade é a representação angústia que conseguiu romper os limites da


mente tomando forma no mundo real e gerando um sofrimento concreto tão ou mais
difícil de resolver do que aquele que atormenta a mente.

Como se pode concluir o que deve ser acumulado será variável de pessoa a
pessoa assim como a maneira de lidar com o objeto

Em alguns casos, por exemplo, acumulam bens que socialmente são muito bem
aceitos como carros, imóveis, jóias, perfumes, sapatos. Porém em excesso. Estes
embora vistos como excêntricos, passam despercebidos.

Já outros traduzirão seu sofrimento em objetos específicos ou em acumulações


inimagináveis e assustadoras entre as quais, animais domésticos.

Sim as pessoas podem, por vezes, recolher mais animais do que têm a
capacidade de cuidar, sem consciência de que seus animais não recebem cuidados
adequados.

Em tempos modernos encontramos até mesmo acumulações virtuais como, por


exemplo, lixo eletrônico na sua caixa de e-mail ou fotos, arquivos pdf e músicas no hd
ou smarthphone .

Todas, coisas sobre as quais a mera ideia de descarte irá provocar uma angústia
intensa. E que no principio, caso ocorra o desvendamento deste segredo tão sofrido para
as pessoas de fora, irá causar extremo desconforto e mal estar. Por isso quando seu
espaço é visitado outro mal estar vem à tona e se adiciona a este da compulsividade em
acumular. E isto se dá não exatamente pelo estado deplorável em que o ambiente fica,
mas muito mais pelo risco de ser criticado e pela tentativa de ser convencido a jogar
fora os objetos guardados ou pelo risco de que o façam sem seu consentimento.

Assim ameaças reais ou imaginárias a estes objetos protegidos como tesouros


provocam distúrbios físicos como náuseas, falta de ar e taquicardia e, em alguns casos,
dependendo do grau de comprometimento psíquico, episódios agressivos podem ser
desencadeados. Todos tentativa de defesa diante da pavorosa possibilidade de se livrar
dos objetos estocados ou de não poder mais adquirir novos.

Porque embora as acumulações a princípio possam ter um caráter secreto


fatalmente chegarão a um ponto em que se tornarão impossíveis de esconder. E diante
da solicitação ou imposição em jogar algo fora virá à tona um desespero dilacerante
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porque a sobrevivência emocional destas pessoas está profundamente conectada a cada


pequeno pedaço de lixo guardado zelosamente.

Com isso o convívio social vai sendo gradativamente minado pela necessidade de
guardar coisas. E a casa passa a ser uma fortaleza inacessível ao mundo lá fora. Assim
como já era o mundo interno deste sujeito que precisou criar novas defesas além das
relacionais que já mantinha.

Acredito que agora sim tenha conseguido criar um quadro vivo em sua
imaginação. Um quadro deste terror acumulativo que se assemelha a um
encarceramento desesperador já que um grande impasse sempre se mantém. Não é
possível viver em meio a todos estes objetos sem que seu cotidiano e suas inter-
relações, profissionais e afetivas e sua saúde sejam de alguma maneira afetadas. Porém
emocionalmente não é possível viver sem elas. E quando é necessário fazer uma escolha
todas as outras possibilidades são esquecidas pela preponderância da necessidade em
acumular.

Este é o drama do indivíduo que apresenta a Síndrome de Acumulação


Compulsiva ou Disposofobia (medo de dispor das coisas), que pode ser primária ou
mais séria. Aos casos mais graves, onde existe total afastamento social, foi criado o
apelido de Síndrome de Diógenes¹2 já que implica em algumas outras características que
rompem completamente o laço social .

Esta manifestação mais grave foi tecnicamente descrita pela primeira vez pelos
estudiosos Macmillan e Shaw¹ em 1966 e então denominada pelo conjunto de
características de Síndrome de Esqualides Senil (Senile Squalor Syndrome) ou ruptura
social no idoso (Social Breakdown of the Elderly) porque uma estranha magreza
costuma acometer a estes pacientes que passam a descuidar de si mesmos no afã de
acumular.

Porém em 1975 os pesquisadores liderados Clark et al ²3 sugerem um pouco


injustamente o termo “Síndrome de Diógenes” em referência ao filosofo grego do
século IV a.C. Diógenes de Sínope, que acreditava que para se alcançar a felicidade era
necessário o total desapego ou seja viver uma vida de autossuficiência diante dos apelos
do mundo, através da quebra das convenções sociais, desvalorizando todo e qualquer
acúmulo material numa vida restrita ao mínimo necessário à sobrevivência.

Os pacientes acumuladores, ao contrário de Diógenes, sofrem da filosofia


contrária, acreditam que é necessário guardar muito, muito além do necessário para
sobreviver.

Antes destes estudiosos o psicanalista Sigmund Freud escreveu um artigo em 1908³4 no


qual descrevia no caráter do obsessivo a presença constante de três peculiaridades no
seu comportamento e que seriam observadas como mecanismos de defesa diante dos
afetos que lhes causavam sofrimento e que sempre andam juntas sendo: Ordem,
obstinação e parcimônia, e se observarmos com cuidado podem ser encontradas nos
traços de caráter do paciente acumulador. A ordem estaria relacionada a noção de apuro
como o escrúpulo no cumprimento de pequenos deveres e a fidedignidade. O
Acumulador escrupulosamente mantem seu ritual acumulador. A parcimônia estaria
ilustrada na avareza exagerada, na economia constante no seu comportamento e por fim
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a obstinação que é a inflexibilidade que crescente no sujeito que acumula pode termina
por alheá-lo da vida e esta associada à ira e as tendências vingativas que são
encontradas no temperamento dos acumuladores conhecidos por seu gênio difícil.

Freud atribuía uma correlação entre necessidade de guardar ou poupar no caso


especifico do dinheiro, com a fixação do sujeito em uma fase do seu desenvolvimento
psicossexual, denominada fase anal, quando a criança treinada a usar o urinol começa
as primeiras negociações com a mãe em termos de poder e vontade. Ela pode escolher
dar ou reter e percebe que aquilo tem um grande valor para aqueles que cuidam dele e
que ele poderá escolher “dar” ou não.

Além disso, a associação entre dinheiro, bens, sorte e as fezes é universal em


todas as culturas e várias historias e ditos tradicionais reafirmam isto como o exemplo
clássico : “Nasceu com o c* para a lua”.

Segundo Freud na neurose a linguagem toma as palavras, e as coisas associadas,


em seu sentido figurado através de todas as percepções e escutas que vão sendo
absorvidas pelo sujeito através do seu desenvolvimento psicoafetivo, assim os conceitos
associados por efeito do trauma se mantém por toda vida inferindo na neurose uma
repetição doentia. No caso do obsessivo, a fixação na fase anal ira se desdobrar no
interesse em guardar dinheiro, a avareza e na acumulação se sintetiza em guardar , não
mais importa o que.

Se a partir destes estudos se considerava esta patologia uma variação do


transtorno obsessivos compulsivos mais conhecido popularmente como TOC ,
atualmente os estudos levaram a considerá-lo um transtorno independente do TOC,
embora relacionado a ele porque alguns estudiosos entenderam que o colecionismo
não é acompanhado de outros sintomas que aparecem nos acumuladores como a
predecessão por obsessões ou pensamentos de conteúdo catastróficos que so
poderiam ser evitados pelo ato de acumular .

Um fato notável nos pacientes acumuladores graves é que não conseguem se


dar conta de que apresentam sofrimento emocional , seus sintomas são voltados
inteiramente para si mesmos e como se sentem confortáveis e
protegidos rodeados de lixo e de objetos acumulados em grande desordem não
entendem a razão da reação das pessoas que possam conseguir ter acesso aos seus
“bens”.

Por isso não acreditam necessitar de tratamento. Somente se mobilizam para


mudar alguma coisa caso seus objetos estejam sendo ameaçados de despejo. Ai sim,
buscarão a defesa que acontece com um afastamento social cada vez mais intenso.

O que delineia o comportamento de pacientes acumuladores compulsivos portanto,


são três características fundamentais.

Em primeiro lugar a impossibilidade de jogar objetos fora devido à ansiedade severa


relacionada a rejeitar o que a maioria considera serem objetos comuns;
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Em segundo lugar a aquisição excessiva, muitas vezes resultado de compras


desordenadas resultando em um caos absurdo ao ponto em que os espaços de vida e de
trabalho não podem mais ser usados. Em terceiro lugar nos casos mais graves a
autonegligência, o pouco caso com o próprio corpo em todos os sentidos. A anorexia
presente nestes pacientes seria a representação em seus corpos do mesmo principio da
fortaleza em que se tornam suas casas onde nada sai e ninguém entra.

Outras características de personalidade que acompanham a síndrome são a


resistência a falar no assunto e o posicionamento irredutível. Além disso, uma marcante
incerteza, uma constante dúvida sobre todas as decisões a serem tomadas,
principalmente aquelas que dizem respeito a descartar alguma coisa. Isso deflagra
grande desorganização e a intermitente procrastinação. Deixa-se tudo para depois
sempre, porque tomar decisões é sempre arriscado e causador de angústia, inclusive a
decisão de iniciar a organização do espaço onde se vive. A própria percepção desta
necessidade gera grande desconforto por que se torna cada vez mais impossivel. Este
desconforto vai aumentando até o momento de ruptura quando tudo é abandonado e o
caos passa a reger a vida do sujeito.

Em tempo, o ato em si de acumular não causa desconforto, a ausência de espaço


suficiente, a maneira de organizar para que caiba mais sim. Alguns pacientes,
obviamente dependendo do poder aquisitivo, podem vir a adquirir mais casas ou
espaços onde guardar seus tesouros e aumentarão mais e mais o sistema de segurança
destes espaços.

Então são os traços paranóicos que começarão a predominar. A desconfiança


que recai sobre todos como ameaça à sua compulsão faz com que se tornem
potencialmente inimigos em maior ou menor grau e contra os quais é necessário manter
um posicionamento firme. Isso propiciará crescente um isolamento como grande
agravante da situação.

Às vezes, esses pacientes só são descobertos quando os vizinhos, ou o síndico


junto com a assistência social ou um bombeiro, entram nesta casa em que cada
superfície disponível - pisos, mesas, sofás e camas - é coberta pela desordem e o
lixo, tornando o ambiente um local de coabitação impossível. Pois somente o
acumulador consegue ficar ali com relativa tranquilidade já que não reconhece nada de
desagradável em seu excesso. Alguns pontos de vista clínicos afirmam que
sempre coexistirá internamente o conflito entre o mal estar em ver aquilo tudo
acumulado e a dificuldade em conseguir descartar.

Como já foi pontuado, a percepção destes objetos como bens preciosos decorre
das muitas simbolizações em longos encadeamentos que se constituem neste lixo
acumulado, decorrentes de todas as muitas emoções estagnadas e intocáveis que ali
estão projetadas e impossíveis de serem descartadas ou trazidas à consciência.

E é por isso que toda esta tralha, todo este lixo, necessita ser mantido, de
preferência de maneira secreta. E é desta maneira que sua compulsão os encaminha ao
final a uma retirada definitiva do convívio social.

Enquanto ainda suportados dentro de um núcleo familiar os acumuladores geram


complicações para os membros mais jovens da família ou para aqueles que ainda
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trabalham ou estudam e que são obrigados a tê-lo em seu convívio familiar. Esconder
sua compulsão é sempre impossível, já que em algum momento para os membros mais
sociáveis será necessário receber pessoas em casa.

Para alguns membros da família também já emocionalmente comprometidos, no


entanto, reconhecer que ali existe mais do que uma mania esquisita e sem sentido é
muito difícil. Para outros será um comportamento que gerará conflitos diários e assim
que podem ganham mundo e o abandonam.

Temos, portanto, os membros que aquiescem, aqueles que são tragados e


convertidos pela mania de acumular e outros que fogem assim que possível. A família
vai gradativamente se fragmentando não só pela compulsão acumulativa, mas por outras
características de seu comportamento já que são pessoas que apresentam um
temperamento um pouco mais difícil do que o seria natural, obstinadas, teimosas e
agressivas apresentando já anteriormente certo isolamento social e uma tendência a
certa distorção da realidade junto com comportamentos obsessivos compulsivos assim
como possíveis problemas com alcoolismo costumam estar associadas aos pacientes que
gradativamente passam a desenvolver a síndrome em graus mais pesados.

Enquanto o acumulador (a) não é completamente abandonado, a acumulação


pode ser mantida sob certo controle. Porém quando todos se vão e os vínculos com o
mundo externo começam a se tornar mais e mais tênues a coisa foge ao controle. Na
solidão todo o sofrimento se torna ostensivamente simbolizado através do guardar e
guardar e guardar.

Assim aposentados, viúvos, abandonados preencherão o vazio de maneira cada


vez mais arriscada inclusive para sua integridade física, pois o acúmulo de objetos
empilhados, além de impedir a movimentação e tornar impossível a limpeza, pode em
casos extremos, desmoronar e causar graves acidentes ou óbito. Muitos casos de morte
por soterramento nas acumulações já foram registrados.

Sem contar que alguns acumuladores também guardam remédios fora da


validade que eventualmente ingeridos se tornam um perigo em constante iminência.

Como a alimentação e a higiene pessoal ficarão em segundo plano diante


daquilo que passa a ser a importância crucial em suas vidas, ao final podem apresentar
varias patologias médicas que jamais tratadas terão sempre uma evolução flagelante.

E embora a maioria dos casos seja de idosos que vivem sozinhos, pode ser observado
nos mais jovens e ser um sintoma decorrente de várias doenças orgânicas e mentais.
Nestes casos aparece em associação principalmente à outras condições de saúde mental
como alcoolismo crônico, como fobia social, fobias específicas, transtorno bipolar,
esquizofrenia paranoide e a depressão maior, autismo ou demência .

O acumulador associará ao seu comportamento uma série de crenças e


justificativas não facilmente perceptíveis podendo ou não ter noção do seu real estado
emocional, dependendo do grau de comprometimento psíquico que sua compulsão
abarca.
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Alguns em estágios mais brandos percebem que estão vivendo numa situação
problemática e tem desejo de fazer algo a respeito. Os casos mais perigosos são
daqueles que são incapazes de perceber que vivem em meio à sujeira e o lixo e que
estão perdendo muito mais do que ganham ao acumular. Estes abrirão mão de toda
convivência social, de todos os afetos para preservar seus objetos intactos empilhados
dentro de casa. A saúde e o bem estar dos outros possíveis moradores que necessitarem
conviver terá menor importância diante da compulsão de acumular.

Um estudo neurobiológico do Instituto de Neuropsiquiatria da


UCLA5demonstrou que a despeito das antigas associações em estudos a respeito, os
comportamentos dos acumuladores não são devidos unicamente uma variação do
transtorno obsessivo compulsivo, mas a um comprometimento de uma área do cérebro,
o lobo frontal, que diz respeito ás funções cognitivas de tomada de decisão, atenção
concentrada, motivação e resolução de problemas, que estão frequentemente
deterioradas nos compulsivos.

Sabe-se, no entanto que a esta operacionalidade do cérebro decorre de uma


disfuncionalidade cuja origem se encontra associada a um evento traumático. Corpo e
mente sempre será um par biunívoco onde o trauma interfere na homeostase e
transforma a funcionalidade corporal, dai os quadros que se denomina psicossomáticos.
Da mesma maneira a bioquímica cerebral irá se modificar diante de algo que afete
emocionalmente o sujeito.

Toda necessidade de acumular compulsivamente fala em uma atitude


compensatória, ou seja, o sujeito está depositando um pesado simbolismo emocional
naquilo que acumula de uma maneira que o aliena do mundo. Uma coisa material no
lugar de alguma coisa afetiva jamais preenchível, pois jamais saciável, incessante.

São marcantes as grandes perdas nos históricos destes sujeitos notadamente


aquelas que dizem respeito às feridas narcísicas, que são aquelas decorrentes do
confronto inevitável que todos nós teremos em algum momento de nossas
existências com as limitações naturais da condição humana. O que para estas pessoas
será insuperável. A estrutura de suas personalidades são de pessoas que só conseguem
reconhecer a si mesmas a partir de coisas externas a si, apresentando uma maneira de se
relacionar com pessoas e objetos através de uma profunda fusão emocional e que diante
das perdas afetivas passam a postura de ruptura radical com o convívio social seguida
do investimento ilusionado nestas acumulações.

Assim trata-se de pacientes que já apresentavam uma forte tendência a valorizar


patologicamente as questões materiais, sendo o sintoma de acumulação de objetos
agravado após uma situação de perda traumática: morte de algum ente querido,
demissão, aposentadoria, e outras situações que geram esta necessidade de
preenchimento de lacunas;

Num extremo da doença, o sujeito expressa seu violento conflito intra-psíquico


por uma recusa total a jogar comida podre, seu excremento, sua sujeira corporal. Por
isso nestas evoluções mais graves será necessária a intervenção judicial para que se
chegue a uma intervenção médica obrigando que se tomem providências quanto a
higiene que, afetando o bem estar e a saúde física dos moradores e do próprio
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paciente, pode desencadear doenças infectocontagiosas em decorrência da


autonegligência em que vive.

O importante seria poder identificar o comportamento comprometido e se


proceder a alguma intervenção antes que se chegasse a casos extremos, mas o
temperamento do paciente gera o abandono dos familiares e amigos e a franca evolução
do estado na ausência de tratamento.

Quando se consegue o encaminhamento teremos um tratamento que demandará


muita diligência mobilizando várias estratégias associadas. A Psicoterapia deve ser
combinada com tratamento psicofarmacológico que ajudará a retirar o paciente da
situação degradante com maior rapidez.

As internações hospitalares, muitas vezes necessárias pelas possíveis


contaminações pela sujeira, apresentam um histórico de evolução a óbito em pacientes
mais idosos. Sem suas extensões, e defesas optam por não mais existir.

Cinthya Bretas
É psicologa , picoterapeuta de base psicanalítica e se especializou em terapias de casais .
http://psicoterapiacinthyabretas.blogspot.com

1
Em 1975 esta Síndrome foi descrita e nomeada, uma certa injustiça ao filósofo grego Diógenes de
Sínope, também chamado Diógenes "o Cínico" (kynikos, kynon = cachorro). Diógenes acreditava que a
virtude não deveria ser uma teoria, mas uma ação prática, resultado da própria vivência, assim optou por
viver na miséria, habitando um grande barril como lar e carregando à luz do dia uma lanterna acesa em
busca de um homem honesto; acreditava que faria bem ao ser humano aprender com o cão: "Afinal o cão
é capaz de realizar suas funções corporais naturais em público sem constrangimento, um cachorro comerá
qualquer coisa, e não fará estardalhaço sobre que lugar dormir. Cachorros vivem o presente sem
ansiedade, e não possuem as pretensões da filosofia abstrata. Somando-se ainda a estas virtudes,
cachorros aprendem instintivamente quem é amigo e quem é inimigo. Diferente dos humanos que
enganam e são enganados uns pelos outros, cães reagem com honestidade frente à verdade.".

2
MacMillan D, Shaw P. Senile breakdown in standards of personal and environmental
cleanliness. Br Med J. 1966;2: 1032-1037
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3
Clark ANG, Mankikar GD, Gray I. Diogenes syndrome. A clinical study of gross neglect in old
age. Lancet. 1975;1: 366-368.

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FREUD, S. Caráter e erotismo anal (1908). In: ______. “Gradiva” de Jensen e outros trabalhos (1906-
1908). Direção-geral da tradução de Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1996. p. 159-164. (Edição
standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 9).

5
O Instituto de Neuropsiquiatria da UCLA é um ensino interdisciplinar e pesquisa
dedicado à compreensão do complexo instituto comportamento humano, inclusive
genéticos bases comportamentais e socioculturais, biológicos do comportamento
normal, e as causas e consequências dos distúrbios neuropsiquiátricos

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