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Autores: Maria de Fátima de Lima das Chagas; Nize Maria Campos Pellanda; Karla Rosane do
Amaral Demoly
Resumo: Este texto é o resultado de uma experiência com um grupo de professores em processo de
formação continuada no Núcleo de Tecnologia Educacional Municipal – NTM em Mossoró-RN, em
um fazer que se justificou a partir de estudos do mestrado finalizado na Universidade Federal Rural do
Semi-Árido - UFERSA e de estudos que constituem o projeto de doutorado em educação que está em
andamento na Universidade de Santa Cruz-UNISC. A experiência convida a pensar sobre como as
aprendizagem, os saberes e o modo de perceber as tecnologias podem ser afetados/transformados na
convivência em um processo de (re)invenção de si, de autoria. O objetivo deste fazer foi refletir os
processos de subjetivação, de auto-organização na perspectiva da autopoiesis de Humberto Maturana e
Francisco Varela, possibilitando acoplamentos tecnológicos de professores em uma experiência
inventiva na interface educação e tecnologia. Enquanto pesquisa intervenção, esta experiência foi
organizada com oficinas tecidas junto, e, momentos de conversações e autonarrativas que
possibilitaram a percepção de novos modos de conceber a tecnologia e suas possibilidades de
ampliação das ações humanas, na perspectiva complexidade, à luz dos estudos de Gilbert Simondon.
Autores como Gilbert Simondon (2007), Nize Pellanda (2012), Demoly (2008), Sherry Turkle (1997,
1984), Humberto Maturana e Francisco Varela (2011) compõem uma rede de sustentação que nos
ajuda a pensar a temática da experiência. Como resultado da experiência, pudemos distinguir
transformações cognitivas e afetivas constituídas em uma rede de autoria e subjetivação dos
professores que compuseram este percurso de pensar/narrar a si próprios quando acoplados à
tecnologias digitais.
1 INTRODUÇÃO
2 METODOLOGIA
Na perspectiva da complexidade, onde Morin (2010) destaca que complexo é aquilo que é
tecido junto, havendo uma união entre a unidade e a multiplicidade. Considerando também estudos de
Jack Goody e Gilbert Simondon, passamos a discutir no NTM a tecnologia de forma ampliada,
concordando com Goody (2007, p. 193), que destaca em seus estudos que desde que os seres humanos
passaram a interagir temos as tecnologias do intelecto, o balbucio de sons, a composição de línguas,
seguindo com tantos outros modos de comunicar, interagir e conhecer; e com o entendimento da
relação humano-máquina (acoplamento tecnológico) de Gilbert Simondon (2007).
Neste contexto da complexidade, de fazer junto, e, enquanto pesquisa intervenção esta
experiência foi organizada com rodas de conversas e oficinas tecidas junto com os professores da
Educação Básica que fizeram parte do campo empírico da pesquisa. Nos momentos de conversações e
autoria emergiam narrativas que possibilitaram a percepção de novos modos de conceber a tecnologia
e suas possibilidades de ampliação das ações humanas, na perspectiva complexidade. Nesta caminhada
em complexificação, cada um de nós como participantes deste grupo de professores pesquisado foi se
complexificando ao se incluir na experiência de estudo na perspectiva de inseparabilidade epistêmica-
ontológica pois consideramos que conhecer é viver (MATURANA; VARELA, 2011) e que não
podemos nos afastar do mundo para conhecê-lo, desse modo, não precisamos nos afastar das
tecnologias para conhece-las.
As oficinas propostas como dispositivos de aprendizagem que compôs a metodologia de
oficinar com professores em um percurso de produção inventiva com tecnologias digitais foi tecida
coletivamente nas rodas de conversas, em momentos de interações, de escuta e de envolvimento. Nos
encontros, nas rodas de conversas, em um percurso de autoria, os professores decidiam juntos o
caminhar do estudo em questão, discutiam, narravam experiências, angústias nas (não)interações com
tecnologias digitais no cotidiano pedagógico/pessoal, nas auto-narrativas emergiam coordenação de
ações que estabeleceram vínculos interpessoais indispensáveis nas interações subjetivas no processo de
aprendizagem, que acontecia na convivência.
Este refletir, repensar e exposição de opiniões dos professores retratados aqui na reinvenção de
si não acontecia de forma linear e constante, mas sim em um movimento circular de construção de
aprendizagens, fazeres e refazeres no linguajar e nas interações dinâmicas entre espaço e tecnologias,
constituindo na interface educação-tecnologia, uma rede de autoria e subjetivação docente.
As oficinas vividas na experiência estão descritas na tabela abaixo:
OFICINAS DESCRIÇÃO
Modos de conceber e de operar com as Esta oficina aconteceu em dois momentos, um no início e
tecnologias outro no final da experiência, para observarmos
deslocamentos e transformações neste modo de conceber e
de operar com as tecnologias digitais.
Tecnologias digitais como ferramentas Nas redes de conversações onde os professores puderam
pedagógicas de autoria construir caminhos para interações com as tecnologias
digitais, estes organizaram uma lista de temas para as
oficinas, envolvendo, de acordo com suas narrativas:
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Hoje quando penso em tecnologias, lembro de tudo que vivi nestas oficinas e que não
é apenas um meio de comunicação prático e de muita importância para facilitar a
vida, mas que é uma parceria para nossas produções. Não é tão simples entrar em um
mundo conectado que não é da minha geração, mas concordo com Simondon, quando
diz que as tecnologias são parte da nossa vida. Elas são.
Excerto 02 Narrativa da Professora Francisca Andrea– novembro/2015
1
Nome fictício (Para resguardar a identidade dos sujeitos, cada participante inventou um nome fictício para suas
narrativas e auto-narrativas)
A professora traz em sua fala em momentos distintos, mudanças de entendimentos e, no fazer
com tecnologias digitais no ambiente de oficinas, com espaços de escuta e observação de processos de
atenção a si, buscou construir aproximações em redes de autoria e foi transformando modos de
perceber e de interagir com tecnologias no viver a educação, no emocionar para viver a escola.
Nas oficinas conversamos sobre a escola, sobre os espaços de vida, de emocionar, de aprender
em rede e percebemos que temos uma escola onde não flui a vida, onde não aprendemos a viver
porque faltam nesses espaços os elementos fundamentais para essa construção: as emoções, as
interações solidárias, autoria. Se o modelo da vida é o modelo de rede e se conhecer passa por autoria,
como nos sugere a teoria que estamos tratando, então o que precisamos é de um ambiente rico de
perturbações estéticas e amorosas, um espaço de convivência. Ou seja, um ambiente tal que possamos
sempre considerar “o outro como legítimo outro”, como costuma dizer Maturana (PELLANDA, 2003,
p.17).
Na busca de constituirmos uma rede de autoria, de interações, de afeto, percebemos no início
das oficinas, entre os professores, sensações de insegurança, medo de não saberem operar com as
tecnologias, um certo desconforto e resistência na interação com essas ferramentas na coletividade. No
transcurso da experiência, visualizamos a construção de uma maior articulação na afetiva na interação
com as tecnologias digitais e em alguns momentos, mudanças no modo de percebê-las. Em narrativas,
professores conceituavam algumas tecnologias como “parceiras pedagógicas”, diminuindo de certa
forma, o distanciamento e a ideia reducionista de uso da tecnologia.
No percurso, o viver-agir nas oficinas, produziu não apenas conhecimento, mas o ser humano
que é constituído na ação. Para Francisco Varela, a ética do humano é percebida na ação e essas ações
se desencadeiam no entrelaçamento do linguajar e do emocionar. Enquanto humanos, podemos
compreender como produzimos conhecimento, refletindo sobre as formas que buscamos para
engendrar, para aprender, considerando que o “[...] conhecer, fazer e viver não são coisas separáveis e
a realidade assim como nossa identidade transitória são companheiros de uma dança construtiva”
(VARELA, 1997, p. 60).
Nesta perspectiva, a pesquisa gerou contribuições na constituição de redes de autoria, de afeto e
acoplamentos tecnológicos na construção de outros modos de aprender, de perceber a si, o outro e a
tecnologia na produção de redes de autoria e subjetividade. Do ponto de vista da implicação com a
comunidade educativa, possibilitou discussões que levaram à potencialização da cognição-
subjetividade, no devir dos sujeitos no encontro com as tecnologias da informação e da comunicação
no Núcleo de Tecnologias Educacionais no município de Mossoró-RN.
Para finalizar, Turkle e Maturana nos ajudam a compreender os resultados, quando nos
afirmam que “A Tecnologia cataliza mudanças não somente no que nós fazemos, mas em como nós
pensamos” (TURKLE, 1984, p.13), e, “se o ser humano continuar sendo central para nós, seres
humanos, a tecnologia será um instrumento para a sua conservação, não o que guia o seu destino. Não
se trata de opor-se ao desafio tecnológico, mas de assumir a responsabilidade do uso da tecnologia no
devir na e conservação do humano. (MATURANA 2008, p. 84).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vivemos em rede, seja de forma física ou virtual estamos vivendo em uma sociedade
conectada, em busca de interações que nos fortaleça subjetivamente como ser humano. Para Arendt
(2007, p. 31), “todas as atividades humanas são condicionadas pelo fato de que os homens vivem
juntos”. O ser humano, neste percurso de buscar compreensão de si e do mundo, sempre estabeleceu
interações com outros sujeitos, com técnicas e instrumentos que favorecessem sua autonomia na
interpretação de sua própria existência. Dessa forma, essa autonomia seria vista como um processo a
partir do qual o ser humano evolui para um estado de ampliação da consciência, onde estabelece
interações coletivas sem perder de vista seus entendimentos, objetivos, projetos e anseios produzidos
por ele, em virtude da sua condição humana.
Constantemente, estabelecemos redes, onde na ação e na linguagem produzimos o mundo que
criamos com os outros, e, é neste ato de convivência, de conexão que surge a humanidade. As redes
são constituídas de muitas formas, e, mesmo aquelas articuladas na internet, como as redes sociais,
permitem uma conectividade entre pessoas que, nem sempre se conhecem de forma presencial, mas
que a partir de interesses comuns interagem e produzem ações juntas.
Os jovens deste século, os estudantes, estão cada vez mais ‘em rede’ conectados a partir da
internet, dispondo de inúmeros aparatos tecnológicos digitais para este fim, e, possibilitar uma
aproximação de professores com tecnologias digitais é aproximar os mundos, as redes dos professores-
estudantes em um movimento de autoria coletiva, afetividade e subjetivação. Turkle (2005, p. 261),
aponta que estamos vivendo em uma sociedade em rede, e, uma das chaves da comunidade em rede é a
ausência do transitório, onde se tem a possibilidade de compartilhar uma história, uma memória, com
pessoas diferentes, em lugares distintos, e a continuidade da rede traz a possibilidade de construir
normas sociais, rituais, sentidos para grupos específicos. Em uma rede, aprende-se junto a se fazer
confiança na medida em que experiências são partilhadas.
Neste entendimento, com a experiência apresentada buscamos a possibilidade de conversar
sobre tecnologias na constituição de redes de autoria, na desconstrução de barreiras e na ampliação da
potência do humano nos encontros afetivos-cognitivos-sociais com tecnologias como modos de
subjetivação nos espaços que atuam e configuram formas de aprender e de estar no mundo.
Ao finalizar este estudo e, na busca de seguir aprofundando conhecimentos sobre percursos de
professores em formação continuada com tecnologias que efetivamente operem transformações e
reflexões na educação, surge no Doutorado um maior interesse por pesquisar sobre a interface da
educação aliada à tecnologia que não se reduz à inclusão digital discutida na contemporaneidade, mas
em uma discussão ampliada, onde os sujeitos se percebem autores na interação com as tecnologias, no
fazer-viver-sentir na constituição de redes de autoria e subjetividade.
REFERÊNCIAS
ARENDT, Hannah. A condição humana. 10 ed, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.
SIMONDON, Gilbert. El modo de existencia de los objectos tecnicos. Buenos Aires, Prometeo,
2007.
TURKLE, Sherry. The second self-computers and the human spirit . New York, Simon and Shuster,
1984.