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1.

A FLEXÃO DE CASO
VAMOS INICIAR NOSSO ESTUDO RECORDANDO UM CONCEITO
FUNDAMENTAL: A FLEXÃO

Flexão nada mais é que a propriedade que certas palavras possuem de


sofrer alterações na sua parte final. Existem palavras que possuem essa
propriedade e são chamadas de palavras variáveis, enquanto outras não a
possuem, e por isso são chamadas de palavras invariáveis.

Nas palavras variáveis distinguimos dois elementos. À parte final, flexível,


da palavra, denominamos desinência; à parte que sobra, tirada a
desinência, e que é fixa, denominamos tema ou radical. Assim, por
exemplo, na palavra menino podemos distinguir o radical menin e a
desinência o:

menin – o

Mudando-lhe a desinência podemos obter, por exemplo, as seguintes


flexões:

menina
meninos
meninas
menininho
meninão

A flexão de uma palavra implica sempre alteração na idéia que ela


exprime; tal alteração dá-se, em português, quanto ao gênero, número ou
grau nos substantivos, adjetivos e pronomes, ou quanto ao tempo e pessoa
nos verbos.

As flexões existentes na língua portuguesa

Como acabamos de ver, substantivos, adjetivos e pronomes são palavras


flexíveis e podem flexionar-se de três maneiras:
a) quanto ao gênero;
b) quanto ao número;
c) quanto ao grau.

Na língua latina encontramos um gênero a mais, que não existe em


português: o gênero neutro. Para o início do nosso estudo tenhamos em
mente os seguintes três gêneros em latim: masculino, feminino e neutro.

A flexão de número em latim funciona como em português: singular e


plural. Ao longo do nosso estudo, porém, veremos que o latim conserva
alguns resquícios de um antigo número dual.

Quanto ao grau também tudo se dá em latim como em português: para os


substantivos temos os graus normal, aumentativo e diminutivo, e para os
adjetivos, além desses três, temos o comparativo e o superlativo.

Até agora a única novidade em relação à nossa língua é que em latim


existe o gênero neutro. A próxima novidade, importantíssima, e que nos
ocupará bastante tempo de estudo, é que em latim temos mais um tipo de
flexão: a flexão de caso.

Uma flexão a mais em latim: a flexão de CASO

A flexão de caso consiste na alteração da desinência da palavra de acordo


com a função sintática, ou seja, de acordo com a função que ela exerce na
oração. Quer dizer que um substantivo, adjetivo ou pronome apresenta
desinências diferentes de acordo com o papel que estiver desempenhando
na oração, a saber, sujeito, predicativo, objeto direto, objeto indireto,
adjunto adverbial, etc.

Tomemos, por exemplo, uma frase bem simples:

Pedro ama Maria.


A análise sintática nos dirá que Pedro é o sujeito da oração, e ama Maria, o
predicado. Nesse predicado identificamos o verbo ama (amar) como um
verbo que pede obrigatoriamente um complemento, pois quem ama, ama
alguém ou alguma coisa; temos então em Maria o complemento do verbo,
que nesse caso chama-se objeto direto. O nome Pedro - PETRUSreceberá a
desinência própria do sujeito ao passo que Maria - MARIA receberá a
desinência do objeto direto - MARIAM:

Petrus amat Mariam


Note que, uma vez que a função sintática é identificada pela desinência,
há uma flexibilidade maior na ordem das palavras; isso quer dizer que
nossa frase poderia ser dita da seguinte forma sem alteração do sentido:

Petrus Mariam amat.


Imagine a situação contrária: Maria ama Pedro. A análise sintática nos
mostrará que Maria é o sujeito agora, e Pedro, o objeto direto. Pois bem,
Maria receberá a desinência do sujeito - MARIA, e PETRUS, a do objeto
direto - PETRUM; teremos então:

Maria amat Petrum


ou

Maria Petrum amat.


O caso do sujeito chama-se em latim o caso Nominativo, e o do objeto
direto, acusativo. Há em latim seis casos, e o início de nosso estudo será
exatamente o estudo dos diversos casos e suas desinências.

Vamos imaginar agora outra frase:

Maria deu o livro a Pedro.


Feita a análise sintática saberemos que Maria é o sujeito e livro é o objeto
direto. Mas essa oração apresenta um outro complemento do verbo; como
quem dá, dá alguma coisa (objeto direto) a alguém, temos aqui um outro
tipo de objeto o objeto indireto; o objeto indireto em latim é chamado de
caso dativo. Vamos agora montar a frase. A palavra livro em latim é líber,
mas na forma do objeto direto, ou seja, no acusativo, fica librum. O nome
Pedro, você já sabe, é Petrus; você já sabe também que, se Petrus for
objeto direto, ou seja, acusativo, aparecerá como Petrum; na nossa
oração, entretanto, Petrus é objeto indireto, dativo: aparecerá sob a
forma Petro. Assim, finalmente nossa frase aparecerá como

Maria Petro librum dedit.

Note também que a oração parece ter ficado com uma forma invertida em
relação à forma que apresenta em português, o que não altera em nada o
sentido, já que cada palavra aparece flexionada segundo a função sintática
que exerce. Por outro lado essa ordem é preferida em latim: verbo no final
da frase, objeto direto antes do verbo, objeto indireto antes do direto.

Resumindo: se em português as palavras variáveis são flexionadas em


gênero, número e grau, em latim flexionam-se em gênero, número, grau e
caso, ou seja, de acordo com a FUNÇÃO SINTÁTICA.

Penso que você já entendeu que precisa ter a análise sintática na ponta da
língua. Com efeito, tanto para traduzir do latim para o português, quanto
para traduzir de português para o latim é necessário proceder à análise
sintática de cada oração.

2. A ORAÇÃO: SUJEITO E PREDICADO


Como vimos na postagem anterior, A FLEXÃO DE CASO, o latim exprime a
função sintática por meio da flexão de caso. Cada caso representa um
conjunto de noções ou de relações semânticas associadas a características
morfológicas; tais características encontram-se no fim da palavra e
recebem o nome de desinências. As mudanças de forma que a palavra
sofre são exatamente o que denominamos “flexão”.

Em latim há seis casos: Nominativo, Genitivo, Acusativo, Dativo, Ablativo e


Vocativo. Mas, antes de abordar cada caso, vamos recordar o conceito de
oração.

ORAÇÃO

Palavra: vocábulo e termo


Na linguagem verbal as idéias são expressas através de palavras. Podemos
distinguir duas realidades na palavra: 1. a palavra enquanto representação
material, ou seja o som ou sua aparência gráfica, e a isso chamaremos de
vocábulo; 2. a palavra enquanto índice da idéia que encerra, ao que
chamaremos termo. Dito de outra forma, a palavra apresenta dois
aspectos: um externo, onde podemos observar, por exemplo, o número de
sílabas, a acentuação tônica, a ortografia etc. e outro interno, a saber, o
conteúdo, a idéia, o sentido que exprime.

Um pensamento ou uma idéia completa pode ser expresso em sua forma


mais simples por uma única palavra. O pensamento se formula em bloco,
por assim dizer, como no caso das interjeições e exclamações: Ai!, Orra,
meu!, Pô, cara!!!... Mais para frente voltaremos a esse assunto.

A frase ou locução
Mas é comum que usemos reuniões de palavras (termos) para expressar
pensamentos ou idéias mais complexas. Assim, se digo “o livro de Pedro”,
“os olhos de cigana de Capitu” ou “as margens plácidas do Ipiranga”, estou
reunindo palavras para expressar idéias; a essa reunião ou agrupamento de
termos denominamos locução ou frase. Mas, perceba que ao dizer “o livro
de Pedro” ou “as margens plácidas do Ipiranga” estou exprimindo idéias
sem, contudo, afirmar ou negar alguma coisa a respeito delas.

A oração
Quando uma frase encerra uma declaração, ou seja, afirma ou nega algo
de alguém ou alguma coisa, temos então uma oração. Por ex.: “O livro de
Pedro é grande”; a respeito do “livro de Pedro” declaro ser grande; há
algo a respeito de que eu faço uma declaração, o livro de Pedro e há algo
que eu declaro, que é grande. Outro exemplo: “Ouviram do Ipiranga as
margens plácidas, de um povo heróico o brado retumbante”. Afirmo, a
respeito das “margens plácidas do Ipiranga” que elas “ouviram o brado
retumbante de um povo heróico”; tenho novamente os dois elementos:
algo a respeito do qual faço uma declaração, As margens plácidas do
Ipiranga, e aquilo que eu declaro a respeito, ou seja, que ouviram de um
povo heróico o brado retumbante.

Os dois principais elementos da oração: O sujeito e o predicado


Embora um pensamento possa ser expresso por uma única palavra, ou por
uma locução, o mais comum é que se expresse por meio de uma oração, a
saber, uma frase que encerra uma declaração a respeito de alguém ou de
algo, e que apresenta, na maior parte dos casos, dois elementos: 1. o ser
de que se declara algo, o SUJEITO, e aquilo que se declara a sobre o
sujeito, o PREDICADO.

Como você pode ver pelos exemplos dados, tanto o sujeito como o
predicado podem ser constituídos de uma só palavra, ou de muitas, ou até
mesmo por uma ou várias orações. Isso será objeto de importante
aprofundamento do nosso estudo quando estudarmos os processos
sintáticos denominados expansão, determinação e aposição.

Mas, mesmo que o sujeito seja formado por mais de uma palavra, existe
sempre uma única palavra que é como que o seu núcleo. Por exemplo, se
digo “A galinha do vizinho bota ovo amarelinho”, o sujeito é “a galinha do
vizinho”; mas o núcleo desse sujeito é “galinha”, a palavra essencial. Uma
certa nomenclatura gramatical dirá que “a galinha do vizinho” é o sujeito
lógico da oração, enquanto “galinha” constitui o sujeito gramatical. Outra
forma de abordar esse assunto é chamar “a galinha do vizinho” de
sintagma do sujeito, e “galinha” de núcleo do sujeito. Mas são apenas duas
maneiras de dizer a mesma coisa.

Como o sujeito é a pessoa ou coisa sobre a qual se faz uma declaração fica
claro que deve ser constituído por um substantivo, ou por qualquer
palavra, frase ou oração que tenha força de substantivo.

Da mesma forma, o predicado, mesmo que possa ser representado por mais
de uma palavra, apresenta sempre uma que é seu núcleo. E o núcleo do
predicado é sempre um verbo, palavra que serve para exprimir uma ação,
um processo ou atribuir um estado. Dessa maneira, no nosso exemplo
anterior, “a galinha do vizinho bota ovo amarelinho”, temos o predicado
“bota ovo amarelinho”, centrado sobre o núcleo “bota”; claro que caberia
a pergunta “bota o quê”, mas isso nos conduz a um tema que será
abordado mas para frente.

Assim, o núcleo central dessa oração se concentra sobre os dois termos


“galinha – bota”: afirmamos a respeito da “galinha” (sujeito) que ela
“bota”.

3. OS CASOS: O NOMINATIVO E O ACUSATIVO


Vamos agora estudar os casos latinos. Como o assunto é longo,
abordaremos inicialmente apenas a função principal de cada caso,
deixando o resto para futuros aprofundamentos.

O NOMINATIVO – SUJEITO DA ORAÇÃO

O nominativo é essencialmente o caso do sujeito.

Tomemos alguns exemplos bem simples:

1. A MENINA CANTA.
Nessa oração simples, fica bem fácil de identificar o sujeito A MENINA e o
predicado CANTA.

A palavra menina em latim é puella, e pode apresentar seguintes flexões:


puella, puellae, puellarum, puellis, puellam, puellas. No exemplo acima,
“menina” é o sujeito da oração; portanto, entre todas as formas possíveis
para essa palavra, escolheremos a do nominativo singular – puella.

Nossa frase fica então: PUELLA CANTAT.

2. Outro exemplo: O MESTRE EDUCA.


Nesta oração simples identificamos o sujeito O MESTRE e o predicado
EDUCA. A palavra mestre em latim pode ter as seguintes formas: magister,
magistri, magistrorum, magistro, magistrum, magistros, magistris. Como
sujeito, a palavra mestre deve ir para o nominativo singular: magister.

Nossa frase ficará então: MAGISTER EDUCAT.

Antes de continuar dando mais exemplos de emprego do NOMINATIVO,


proponho estudarmos o ACUSATIVO. Creio que o emprego das flexões de
caso começará a ficar mais claro se dispusermos de dois casos em uma
mesma oração.

O CASO ACUSATIVO – O OBJETO DIRETO

O acusativo é, por excelência, o caso do complemento verbal denominado


em português OBJETO DIRETO.

Para bem entendermos o que significa um complemento verbal é


indispensável sabermos que há verbos de sentido completo e verbos de
sentido incompleto. Usando uma outra terminologia, podemos dizer que há
verbos de predicação completa e verbos de predicação incompleta.

Os verbos de predicação completa tendo sentido completo, não exigem


nenhum tipo de complemento. Exemplos: O pássaro voa, o ladrão fugiu,
Pedro morreu, A mestra educa. A ação expressa pelo verbo, ou seja, o
predicado, concentra-se toda no verbo, sem necessidade de nenhum
complemento. A oração se constitui de apenas dois termos, o sujeito e o
verbo. Esses verbos de predicação completa também são chamados de
intransitivos.

Já os verbos de predicação incompleta são verbos que, tendo sentido


incompleto exigem um complemento, um termo que lhes complete o
sentido. Imagine que eu diga, por exemplo “ele perdeu”; a oração tem
sentido incompleto pois não declarei “o que ele perdeu”; é preciso, para
que a oração tenha sentido completo, que eu declare “o que” ele perdeu:
Ele perdeu a carteira; ele perdeu os óculos; ele perdeu a compostura...

Outro exemplo: se eu disser “Maria ganhou”, imediatamente se fará a


pergunta, “que foi que Maria ganhou? Maria ganhou um prêmio, Maria
ganhou um doce, Maria ganhou o jogo. A oração passa a ter
obrigatoriamente três elementos: o sujeito, o verbo e o complemento do
verbo.
Vamos a alguns exemplos:

1.) Asservas amam as senhoras.


Nessa oração temos: o sujeito “as servas”, pois é delas
que se afirma o predicado “amam as senhoras”. Depois
temos o núcleo do predicado, o verbo “amar”; o verbo
amar, sendo de predicação incompleta (o que ou que,as
servas amam?) exige o complemento, o objeto direto “as
senhoras”.
Resumindo:
a) servas-sujeito: nominativo plural;
b) senhoras-objeto direto: acusativo plural.

Serva no nominativo singular é SERVA e no nominativo


plural, SERVAE.
Senhora no acusativo singular é DOMINAM, no acusativo
plural DOMINAS.

Nosso exemplo ficará: SERVAE DOMINAS AMANT.

E se quiséssemos essa frase toda no singular? O


nominativo singular de serva você já sabe: é SERVA. O
acusativo singular de domina é DOMINAM. O verbo na
terceira pessoa do singular é AMAT. Teremos
então: SERVA DOMINAM AMAT.

2.) A mãe prepara a ceia.

A análise nos mostra que o sujeito é a mãe, núcleo do


predicado o verbo preparar que, por ser de predicação
incompleta exige o complemento (o que a mãe prepara?)
“a ceia”, o objeto direto. Então, mãe deve ficar no
nominativo singular, ceia no acusativo singular,e o verbo
na terceira pessoa do singular – parat..

a) A palavra mãe, no nominativo singular é MATER.


b) A palavra ceia no nominativo singular é CENA, e no
acusativo singular é CENAM.
c) O verbo preparar, na terceira pessoa do singular é
PARAT.
Nosso exemplo ficará, então, em latim:MATER CENAM
PARAT.

3.) O filho ama a mãe.

Análise: o filho: sujeito, nominativo singular; a mãe:


objeto direto, acusativo singular.
a) Filho, no nominativo singular é FILIUS.
b) Mãe, mater, no acusativo singular é MATREM
c) O verbo na terceira pessoa do singular, presente do
indicativo: AMAT

O exemplo ficará: FILIUS MATREM AMAT.

NB. No exemplo anterior a palavra mãe


apareceu sob a forma MATER, pois era o
sujeito da oração - nominativo; neste,
aparece como MATREM, pois é o objeto
direto – acusativo.

E se quiséssemos passar esse exemplo para


o plural?
a) O nominativo plural de FILIUS é FILII;
b) o acusativo plural de MATER é MATRES;
c) o verbo na terceira pessoa do plural,
presente do indicativo, é AMANT.
O exemplo fica: FILII MATRES AMANT.

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