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Odontopediatria

Maria Luíza Vaz

Conteúdo
Psicologia e Manejo do Comportamento Infantil .................................................................... 4
Comportamentos que podem ocorrer durante o atendimento Odontológico ..................... 5
Técnicas para a adaptação do comportamento infantil ao atendimento Odontológico .... 7
Odontogênese .......................................................................................................................... 8
Amelogênese ........................................................................................................................ 9
Dentinogênese ................................................................................................................... 11
Polpa Dentária ................................................................................................................... 11
Desenvolvimento da raiz .................................................................................................... 12
Anomalias de desenvolvimento dentário e sua importância clínica .................................. 12
Erupção Dentária ................................................................................................................... 13
Fases da Erupção................................................................................................................ 13
Teorias sobre os mecanismos de erupção .......................................................................... 14
Cronologia e sequência de erupção ................................................................................... 15
Variações da Cronologia ................................................................................................ 15
Sintomatologia relacionada ao processo de erupção dos dentes decíduos....................... 17
Rizólise ................................................................................................................................... 17
Mecanismos de reabsorção ............................................................................................... 17
Aspectos clínico e radiográfico da reabsorção radicular ................................................... 18
Dentições Decídua, Mista e Permanente............................................................................... 19
Fase pós-natal da biogênese: recém-nascido à dentadura decídua completa .................. 19
Análise facial .................................................................................................................. 20
Análises intrabucal e funcional ...................................................................................... 20
Dentadura Mista ................................................................................................................ 22
Dentadura Permanente...................................................................................................... 23
Exame Clínico, Diagnóstico e Plano de Tratamento .............................................................. 24
Ficha Clínica........................................................................................................................ 24
Exame Clínico ..................................................................................................................... 25
Anestesia Local em Odontopediatria ..................................................................................... 28
Anestésicos Locais .............................................................................................................. 28
Técnicas de Anestesia Local em Odontopediatria.............................................................. 31
Anestesia tópica ............................................................................................................. 31
Anestesia Infiltrativa ...................................................................................................... 31
Anestesia Interseptal ou Interpapilar ............................................................................. 31
Anestesia regional pterigomandibular ........................................................................... 32
Acidentes e complicações locais......................................................................................... 32
Sedação e Anestesia Geral ..................................................................................................... 33

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Sedação inalatória com a mistura oxigênio/óxido nitroso ................................................ 33
Anestesia Geral .................................................................................................................. 34
Anestésicos Gerais.......................................................................................................... 35
Radiologia em Odontopediatria ............................................................................................. 37
Pesquisa radiográfica em crianças de 0 a 3 anos (1ª infância).......................................... 39
Pesquisa radiográfica em crianças de 3 a 6 anos (idade pré-escolar) ............................... 39
Pesquisa radiográfica em crianças de 6 a 12 anos (idade escolar) .................................... 40
Métodos de localização mais utilizados ............................................................................. 40
Pesquisa Radiográfica Extrabucal ...................................................................................... 41
Exame Radiográfico em Pacientes Especiais...................................................................... 41
Cárie Dentária ........................................................................................................................ 42
Cárie precoce na infância ou cárie de acometimento precoce .......................................... 45
Tratamento Endodôntico em Dentes Decíduos ..................................................................... 47
Medicamentos Intracanais................................................................................................. 48
Técnicas .............................................................................................................................. 49
Capeamento Pulpar Direto............................................................................................. 49
Capeamento Pulpar Indireto .......................................................................................... 49
Pulpotomia ..................................................................................................................... 49
Pulpectomia ................................................................................................................... 50
Cirurgia em Odontopediatria ................................................................................................. 51
Remoção de Dentes Decíduos ............................................................................................ 52
Dentes Não Irrompidos ...................................................................................................... 53
Cistos de Erupção ............................................................................................................... 54
Ulectomia e Ulotomia ........................................................................................................ 55
Frenectomia ....................................................................................................................... 55
Processos Inflamatórios Sépticos ....................................................................................... 56
Hábitos Deletérios.................................................................................................................. 58
Terapêutica Medicamentosa ................................................................................................. 61
Controle de Infecções ......................................................................................................... 61
Penicilinas....................................................................................................................... 62
Macrolídeos.................................................................................................................... 62
Clindamicina ................................................................................................................... 63
Profilaxia Antibiótica ...................................................................................................... 63
Controle da Dor .................................................................................................................. 64
Pacientes com Necessidades Especiais .................................................................................. 67
Deficiência Física ................................................................................................................ 67
Paralisia Cerebral ........................................................................................................... 67
Anomalias Congênitas........................................................................................................ 68
Síndrome de Down ......................................................................................................... 68
Distúrbios Comportamentais ............................................................................................. 68

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Autismo .......................................................................................................................... 68
Doenças Sistêmicas Crônicas ............................................................................................. 69
Diabetes Mellitus............................................................................................................ 69
Cardiopatias ................................................................................................................... 70

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Psicologia e Manejo do Comportamento Infantil
O estudo da psicologia aplicada à Odontopediatria auxilia na abordagem da criança de modo adequado
a cada faixa etária. O desenvolvimento da criança acontece de modo contínuo, integral e multidimensional,
uma vez que acontece nas dimensões físico-motora, cognitiva, emocional e social.
Cientistas do desenvolvimento organizam as informações e ideias em estruturas maiores, chamadas de
teorias. Existem três grandes teorias: a psicanalítica, a cognitivo-desenvolvimental e a da aprendizagem.

1. Teoria psicanalítica: explica o comportamento humano com base nos processos subjacentes da
psique (mente). Sigmund Freud é o criador dessa teoria, que diz que o comportamento é governado
por processos conscientes e inconscientes e que a personalidade se desenvolve ao longo do tempo.
Ele propôs a existência de três partes: o id (centro da libido), o ego (mais consciente, executivo da
personalidade), e o superego (centro da consciência e da moralidade → incorpora as normas)
O bebê é todo id, pois ele é todo instinto, desejo. O ego começa a se desenvolver dos 2 aos 4 anos
de idade, e o superego começa a se desenvolver à medida que a criança incorpora valores e costu-
mes.
De acordo com a teoria psicanalítica de Freud, as fases do desenvolvimento são baseadas no conte-
údo maturacional de cada parte do corpo em que a energia é mais focalizada, com a existência de
um impulso sexual instintivo e inconsciente (libido) como força motriz. As fases são cinco: oral (0 a 1
ano), anal (1 a 3 anos), fálica (3 a 5 anos), latência (6 a 12 anos) e genital (12 a 18 anos).
Ainda na teoria psicanalítica, existem os Estágios Psicossociais de Erikson, onde ele propõe que os
estágios são influenciados pelas demandas culturais comuns para crianças de cada idade, indepen-
dente da maturação.

2. Teorias cognitivo-desenvolvimentais: nessa teoria, o que interessa é o desenvolvimento cognitivo, e


não a personalidade.
Temos a Teoria Cognitiva de Piaget, onde ele propõe que as estruturas que caracterizam cada está-
gio não são inteiramente predeterminadas pela hereditariedade; a experiência física e o ambiente
social contribuem para a emergência desses estágios. Desse modo, todas as crianças percorrem os
mesmos estágios em uma sequência física, mas a idade cronológica em que os estágios são concluí-
dos pode variar. A criança busca compreender seu ambiente, explorando, manipulando e exami-
nando os objetos e pessoas de seu mundo. A sequência de desenvolvimento é dividida em quatro
períodos: sensório-motor (0 a 2 anos), pré-operacional (2 a 6/7 anos), operações concretas (6/7 a
11/12 anos), operações formais (11/12 anos).

3. Teorias da aprendizagem: enfatizam mais o ambiente, que molda a criança. Por essa teoria, o
comportamento humano é extremamente flexível. Dentro dela, temos o condicionamento clássico e
o operante.
O Condicionamento Clássico é uma forma de aprendizagem que envolve a aquisição de novos sinais
para respostas existentes. Os estímulos podem tornar-se condicionados e desencadear a resposta
do bebê. Desempenha importante papel no desenvolvimento das respostas emocionais.
(Ex: sensações desagradáveis podem tornar-se estímulos condicionados para uma sensação de in-
quietude ou ansiedade).
O Condicionamento Operante envolve a associação de uma nova resposta a um antigo estímulo, pe-
la aplicação de estímulos de reforço adequados. Qualquer comportamento que seja reforçado terá
uma probabilidade maior de ocorrer outra vez.

→ Primeira Infância: de 0 a 3 anos de idade


1º ao 3º mês: a criança não distingue a mãe de si mesma, e quando se afasta dela tem sensações de
abandono.
2º ao 9º mês: progressão das reações afetivas e reação quando frustrada ou incompreendida, assim
como à vozes altas ou não amigáveis. Responde ao seu nome, e aos estímulos ambientais, alterando
o comportamento de forma significativa entre o riso e o choro (por volta dos 6 meses). Começa a
morder.

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9º ao 18º mês: luta continuamente contra a vontade de seus educadores, em favor da sua vontade.
É possível estimular a fala e a linguagem da criança, que reage aos sons que ela produz, falando com
ela enquanto cuida dela, mantendo uma linguagem simples e concreta, recitando versinhos e can-
tando, ensinando o nome das coisas e das pessoas. Esse processo além de estimular, auxilia na
compreensão do novo ambiente (consultório).
18º ao 36º mês: a criança tem inúmeros sentimentos; o medo de pessoas estranhas, barulhos altos
e movimentos bruscos persiste. A separação dos pais em alguns momentos (mais críticos) pode cau-
sar ansiedade, mas sem sensação de abandono; é capaz de permanecer em uma atividade por 8 mi-
nutos, memoriza pequenos versos e músicas. Ela está num estágio semi-independente, pois já tem
um autocontrole e o raciocínio é mais amplo. A comunicação desenvolve-se, melhorando a intera-
ção. Quando se interessam por histórias ou brinquedos, ficam bastante atentas. A presença dos pais
deve ser mantida para que conheçam o profissional, valorizem e confiem em seu trabalho. Os pro-
cedimentos devem ser breves e explicados de forma clara e concisa. Nessa faixa etária as crianças
são motivadas pelo elogio e, principalmente, pela premiação.
Ainda dentro desse período, na fase do 18º ao 24º mês, ela já faz gestos para mostrar ou expressar
algo, realiza até duas ordens, responde sim e não, e começa a elaborar frases simples. O profissional
deve falar olhando nos olhos dela, de forma simples e clara, e tornar a experiência de falar e escutar
agradável e divertida.
Quando atinge 2 anos de idade, há uma grande transição para a responsabilidade pessoal e o auto-
controle. Reage as exigências que lhe são feitas com resistência, aprende a controlar seus sentimen-
tos e é capaz de influenciar nas atitudes dos pais. A expressão facial e o tom da voz são mais impor-
tantes que as palavras. Durante o atendimento odontológico os comentários devem ser breves e
simples (a atenção nessa faixa etária é muito limitada), e os procedimentos devem ser rápidos, pois
a criança não entende a necessidade de sentar e abrir a boca. Elas não gostam de ser imobilizadas
para trocar de roupa, cortar unha, tomar remédio... e esse tipo de reação também pode acontecer
no consultório. Portanto, o material deverá estar disponível e organizado na mesa clínica.
Esse período, entre 0 e 3 anos de idade, é um período de modificações rápidas, e comportamento
imprevisível.

→ Segunda Infância: dos 3 anos de idade à pré-adolescência


As operações concretas são poder às crianças de aprender rapidamente as principais matérias esco-
lares. Inúmeras aptidões são atingidas e ocorre a formação dos hábitos. A criança é egocêntrica e
age por impulso. Inicia-se o desenvolvimento do superego, intimamente ligado ao desenvolvimento
da consciência. Teme punição e perda de amor. Divide-se em três períodos: inicial (até 6 ou 7 anos),
intermediário (6 ou 7 anos até os 9 ou 10 anos) e o posterior (10 anos).

→ Terceira Infância: entre 10 e 12 anos de Idade


Fase em que há um importante desenvolvimento cognitivo, e a criança aprende a usar o intelecto
sobre a emoção. É a consolidação da independência. Não se deve tratá-las de maneira infantil, e sim
explicar os procedimentos, reforçando e dialogando sobre condutas inadequadas. No geral, coope-
ram bastante.

→ Adolescência e vida adulta


Também é uma fase com grandes peculiaridades, de interesse para a odontopediatria, pois muitos
pacientes continuam sendo atendidos por essa especialidade, devido ao vínculo positivo criado en-
tre o profissional e a criança.

Comportamentos que podem ocorrer durante o atendimento Odontológico

Geralmente, quando a criança é conduzida de forma correta no atendimento odontológico, apresenta


um comportamento satisfatório e favorável. Por outro lado, em algumas ocasiões, por inúmeros motivos,
as crianças podem apresentar comportamentos que merecem uma atenção especial por parte do
profissional. Exemplos:

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1. Medo: estado emocional que ocorre diante do perigo, quando se tem consciência do mesmo, e que
provoca apenas a sensação psicológica. Tem objeto causador definido (pode ser enfrentado, ataca-
do, tolerado). O medo pode ser biológico, quando está relacionado à defesa e proteção; psicológico,
quando a defesa intelectual é menor; e condicionado, quando o conteúdo intelectual pode desapa-
recer, passando à ansiedade e criando a verdadeira fobia.
Na Odontologia o medo pode ser dividido em objetivo e subjetivo.
O medo objetivo é aquele associado a uma experiência odontológica desagradável anterior gerada
pela própria criança, associada com a interferência da ansiedade familiar. Ele pode ser dividido em
direto (quando a experiência desagradável foi sofrida pela criança durante o tratamento) e indireto
(quando a experiência desagradável foi sofrida em local parecido, como médico ou farmácia).
O medo subjetivo ocorre a partir de informações dadas por adultos ou crianças maiores. Quando a
criança percebe pela fala ou expressões faciais, que outras pessoas tiveram experiências desagradá-
veis.
O medo da criança está relacionado a falta de confiança no profissional; medo de perder o controle,
e para isso o profissional pode permitir que ela tome alguma decisão, realizar a técnica do falar-
mostrar-fazer ou combinar que, caso ela sinta necessidade, poderá levantar a mão esquerda e o tra-
tamento será imediatamente interrompido; medo do desconhecido, e para isso o profissional deve
explicar os procedimentos antes de fazer; medo de invasão.
Para que a criança seja dessensibilizada, é necessário que a causa do medo seja identificada. geral-
mente o medo decorrente de suas próprias limitações desaparece com a maturidade.

2. Ansiedade: estado psíquico em que predominam sentimentos de caráter ameaçador, desencadeado


por estímulos internos e/ou externos, reais ou imaginários, que estejam na iminência de acontecer.
Diferente do medo, não tem objeto causador definido, e o indivíduo se sente desamparado, com
perda de direção, e reações inadequadas sem intenção. Quanto mais experiência o paciente tiver
com consultas odontológicas, menor é a ansiedade, e por isso o ideal é que as consultas sejam inici-
adas mais cedo, aumentando a probabilidade de experiências de sucesso. Ela pode ter origem no
temor de ser abandonada; culpa ou negação de autonomia e posição (quando é impedida de reali-
zar tarefas para as quais já está pronta); atritos entre os pais; nascimento de um irmão; morte de
parentes; tratamentos odontológicos prévios; ambientes pequenos e pouco espaço pra brincar.

3. Agressividade: nesses casos a criança pode querer chamar atenção ou ter atenção; expressar sua
dificuldade de adaptação ou de compreensão do mundo em que vive e das pessoas que a cercam;
ser compreendida; expressar sentimentos de raiva legítimos por diversas causas; expressar senti-
mentos de insegurança, inferioridade, baixa autoestima, ansiedade por não entender o funciona-
mento de algum esquema social que ela viva, rejeição etc.; avisar que não é capaz de expressar seus
sentimentos profundos e verdadeiros; demonstrar identificação com os pais (quando é acostumada
com comportamentos agressivos em casa); expressar ciúmes; autofirmar-se em situações que en-
volvam disputa de poder; mostrar que é melhor.
O profissional deve manter o autocontrole, não gritar ou usar de violência com a criança. Deve falar
com firmeza, e evitar punir a criança, e sim, elogiar comportamentos positivos. Deve-se ter coerên-
cia em seu comportamento, e quando a criança se acalmar, explicá-la porque ela está ali. Se a crian-
ça perder completamente o controle, o profissional deve contê-la, sem usar violência ou agressivi-
dade.

4. Birra: provocada pela frustração na obtenção de algo, onde ocorre a explosão (dar vazão aos
sentimentos agressivos da criança) devido aos empecilhos que o adulto opõe à realização dos seus
desejos. Não cedendo e mostrando que a ama, estará ajudando a aprender a enfrentar e superar
obstáculos. Difere da histeria, pois a birra acaba rapidamente com o tratamento lúdico. Um dos tra-
tamentos é diminuir o número de frustrações e conhecer para evitá-las no futuro.

5. Choro: o recém-nascido chora de 2 a 11% do tempo. Essa porcentagem aumenta nas três primeiras
semanas, e depois diminui, por volta dos três meses. A função básica é chamar atenção, assinalar
uma necessidade, atrair alguém até eles.

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O choro de raiva é mais alto e intenso; o de dor tem início mais abrupto; fome ou sofrimento, ge-
ralmente começam com choramingos ou gemidos.

Técnicas para a adaptação do comportamento infantil ao atendimento


Odontológico

São técnicas que auxiliam o profissional na abordagem da criança, mas requerem, além do conhecimen-
to, algumas habilidades em comunicação, empatia e treinamento. É necessário aprofundar o conhecimento
sobre a criança e suas emoções, ética e tecnicamente, para o exercício da Odontopediatria. Existem
técnicas não farmacológicas e farmacológicas.
Entre as técnicas não-farmacológicas nós temos:

1. Comunicação não-verbal: reforça e guia o comportamento por meio do contato, da postura e da


expressão facial. Seu objetivo é melhorar a efetividade de outras técnicas baseadas na comunicação,
além de obter e manter a atenção do paciente e seu acompanhante. Utiliza uma variedade de mu-
danças no corpo, como o timbre das pregas vocais, tipo de respiração, gestos manuais, contato dos
olhos. Nas primeiras fazes da infância, a criança não diferencia palavras e sons, e por isso ela cons-
trói sua primeira compreensão pelo tom de voz e gestos. A comunicação não-verbal é estabelecida
por sorriso e simpatia, amabilidade e entendimento pelo olhar, toque sutil, que associados à descri-
ção do procedimento, podem afetar positivamente a experiência odontológica da criança. Carinho e
abraços (contato da pele) são fundamentais para que a criança se sinta aceita e amada. O profissio-
nal precisa estar atento aos sinais não-verbais apresentados pela criança, com base em expressões
faciais, gestos, tom da voz e tipo de choro.

2. Toque: quando a criança é delicadamente tocada, aconchegada, ela aprender a tocar, acariciar,
aconchegar, confortar. Pode ser um caminho efetivo para o controle do medo odontológico. Apoiar
as mãos na cabeça da criança e tocar seu rosto durante a contenção deve ser feito com carinho e
segurança pela auxiliar, para que o paciente se sinta confortável.

3. Falar-mostrar-fazer: é a técnica mais utilizada, e consiste em explicar o procedimento (falar),


mostrar como os objetos funcionam e que reações provocam, em todos os aspectos, visual, auditivo
e olfativo (mostrar) e finalmente realizá-los (fazer). Uma estratégia eficaz é o uso do vocabulário a-
dequado, eufemismos e associações divertidas, rimas e jogos de palavras. O profissional não deve
usar de mentiras ou chantagem, para que não se perca laços de confiança estabelecidos. Falar a
verdade significa filtrar o que é indispensável ser dito a cada idade, sem explicação excessiva do
procedimento ou objeto. Os instrumentos devem ser mostrados de forma gradativa, do menos an-
siogênico pro mais ansiogênico. Geralmente essa técnica é realizada na primeira consulta, e sempre
que vai se fazer procedimentos novos, ou para pacientes que viveram experiências prévias negati-
vas. Pode-se usar espelhos para que a criança acompanhe o procedimento, e desenvolva confiança.

4. Reforço positivo: consiste em recompensar o paciente por comportamentos desejáveis, reforçando


a recorrência desse comportamento. Pode ser classificado em social (expressão facial alegre, de-
monstrações de afeto, elogios) ou não-social (prêmios, brinquedos). A reação da criança pode vari-
ar, em felicidade, ou irritação e recusa em recebê-lo. Nesse último caso, o profissional não deve in-
sistir, mas, dizer que vai guardar para quando ela voltar, e quiser recebê-lo.

Outras técnicas: controle de voz, dessensibilização, modelagem, distração, imobilização física (passi-
va/ativa)

Técnicas farmacológicas: analgesia/sedação consciente e anestesia geral.

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Odontogênese
Após a fecundação, o zigoto inicia uma série de clivagens, se deslocando em direção ao útero. Atinge a
fase de mórula, e depois, com a formação de uma cavidade central cheia de líquido (blastocele), passa a se
chamar de blastocisto. Na segunda semana IU, evolui para disco embrionário bilaminar, composto por
endoderma e ectoderma, evoluindo depois para disco embrionário trilaminar, com a formação do
mesoderma. No final da segunda semana IU, determinam-se as duas extremidades do sistema digestivo
(boca e ânus), oriundas de um espessamento do endoderma, que se adere firmemente ao ectoderma.
Durante o segundo mês de vida IU, há grandes mudanças das estruturas e anexos próximos que condu-
zem a formação da face embrionária. Essa fase é dividida em duas etapas:

1ª fase: entre a 5ª e a 6ª semana IU. Ocorre a união dos processos formadores da face e a comunica-
ção da cavidade oral primitiva e o intestino cefálico, por meio do rompimento da membrana bucofarín-
gea.
2ª fase: entre a 7ª e a 8ª semana IU. Ocorre o término dos preparos para a divisão das cavidades
bucal e nasal, e a formação do palato definitivo.

Após essas etapas, o desenvolvimento embrionário ocorre de forma acelerada, resultando na odonto-
gênese.
A cavidade bucal primitiva é revestida por um epitélio delgado que recobre um tecido que está sendo
invadido por células ectodérmicas das cristas neurais. Esse tecido nas regiões do futuro crânio e face fazem
o papel do mesênquima, e por isso, é denominado de ectomesênquima. O ectoderma bucal dará origem ao
epitélio bucal.
Nesse epitélio bucal existem células basais, onde determinadas áreas dessas células começam a se
proliferar de forma mais rápida que as células adjacentes, invadindo o ectomesênquima adjacente e
formando uma estrutura em formato de ferradura, chamada de banda epitelial primária. Esta estrutura
logo sofre uma bifurcação, com a formação de dois cordões proliferativos (no mesmo formato →
ferradura), paralelos entre si. A banda epitelial mais externa sofre degeneração das células centrais,
formando uma fenda que dará origem ao fundo de saco do sulco vestibular (lâmina vestibular), e a banda
epitelial mais interna dará origem aos dentes (lâmina dentária).
Essa formação ocorre mais ou menos na 6ª semana IU. A lâmina dentária é constituída por células
epiteliais, e sofre proliferação (aumento da quantidade de células) dentro do ectomesênquima. Cada
lâmina dentária corresponde a um arco, iniciando na margem lateral e proliferando em direção mediana,
para se unir, e formar uma lâmina contínua.
Aproximadamente na 8ª semana IU, cada lâmina apresenta 10 centros de proliferação das células
epiteliais, formando uma estrutura chamada de broto ou botão. Esse estrutura junto com o ectomesên-
quima (tecido conjuntivo) que o envolve, são os germes dentários, precursores dos dentes decíduos.
Portanto, um germe dentário é formado por uma estrutura ectodérmica (lâmina dentária) que dará origem
ao esmalte, e uma porção mesodérmica, que originará a polpa, dentina, cemento e estruturas de suporte
do dente.
Após o início da formação dos dentes decíduos, em diferentes períodos, a lâmina dentária também
inicia a formação dos sucessores permanentes (incisivos, caninos e pré-molares), pela lingual dos decíduos
correspondentes, por volta do 5º mês de vida intrauterina (incisivos) até o 11º mês (segundos pré-
molares). Os molares também se desenvolvem a partir da lâmina dentária, proliferando pela distal dos
germes dos segundos molares decíduos. (1ºM – 4 a 5 meses IU; 2ºM – após 1º ano de vida; 3ºM – entre 4 e
5 anos de idade).
O início da formação do germe NÃO corresponde ao início da mineralização do dente!
Odontogênese
Cada germe que se originou da lâmina dentária passa por uma série de modificações morfológicas
divididas em 5 fases: fase de botão, capuz, campânula, coroa ou campânula avançada e fase de raiz.

Inicialmente, tem-se uma condensação epitelial em forma de esfera, que recebe o nome de broto ou
botão. Depois, esse germe evolui e assume a forma de capuz.

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A fase de capuz é marcada por proliferação do epitélio, resultando no crescimento desigual na parte
mais externa do botão e da resistência física resultante da condensação ectomesenquimal subjacente à
parte epitelial. Já se nota alguma diferenciação em sua estrutura. Ela é composta por epitélio interno,
epitélio externo, retículo estrelado, papila dentária e folículo dentário.
 Epitélio externo do órgão do esmalte: células cuboidais que contornam a convexidade do capuz.
 Epitélio interno do órgão do esmalte: células altas contornando a concavidade do capuz.
 Reticulo estrelado: porção localizada entre os dois epitélios, onde há aumento do volume de
fluido intercelular, separando as células, mas mantendo contato por desmossomas dos prolon-
gamentos.
 Papila dentária: o epitélio interno influencia na condensação do ectomesênquima, com a apro-
ximação das células (não é tanto pela proliferação), formando a papila dentária, órgão formador
da dentina e do primórdio da polpa dentária. Ocorre concomitantemente com o desenvolvi-
mento do órgão do esmalte.
 Folículo dentário: simultaneamente ao desenvolvimento do órgão do esmalte e da papila, ocor-
re a condensação marginal do ectomesênquima que os envolve, formando uma camada mais
densa e mais fibrosa, que separa o germe dentário do restante do ectomesênquima, o folículo
ou saco dentário primitivo.
O germe continua evoluindo, e atinge a fase de campânula, marcada pela histodiferenciação dos tecidos
provocada por crescimento das partes externas do capuz, que se aprofundam no ectomesênquima
subjacente, e também pela depressão ocupada pela papila dentária.
Na fase de coroa ou campânula avançada ocorre depósito de esmalte e dentina da coroa do futuro
dente, ou seja, amelogênese e dentinogênese. Quando esses eventos atingem a região cervical, inicia-se a
fase de raiz, onde os epitélios interno e externo proliferam em sentido apical para induzir a formação da
raiz (até o fechamento do ápice), além da formação do periodonto de inserção.
Durante esses processos, o germe dentário rompe a ligação com a lâmina dentária, e o folículo dentário
passa a envolver todo o germe, criando a cripta óssea.
Amelogênese
Durante o desenvolvimento do órgão do esmalte, até a fase de campânula, o epitélio interno é compos-
to por células denominadas de pré-ameloblastos, que passam a serem chamadas de ameloblastos quando
depositam a primeira camada de esmalte. Essas células estão separadas da papila dentária por uma
camada basal, que representa a união amelodetinária futura.
O retículo estrelado aumenta e, no líquido intercelular, essas células em forma de estrela se anastomo-
sam-se livremente. Nessa fase, aparece uma quarta camada de células no órgão do esmalte, entre o
epitélio interno e o retículo estrelado, com duas ou três camadas de células baixas, chamada de extrato
intermediário. No local onde os epitélios (interno e externo) se encontram forma-se um ângulo agudo,
chamado de alça cervical, importante estrutura para a formação radicular. Nos estágios finais da fase de
campânula, o órgão do esmalte já assume a forma característica do dente que vai assumir, e o contorno da
membrana basal determina o padrão da superfície incisiva ou oclusal do dente.
O órgão do esmalte já está em condições de começar a produzir esmalte. Os pré-ameloblastos se
desenvolvem mais nos pontos correspondentes as cúspides ou bordas incisivas, e se diferenciam menos na
região cervical. Esses pré-ameloblastos induzem as células ectomesenquimais da região periférica a
cessarem sua divisão, e começarem a se diferenciar em odontoblastos, secretando a primeira camada de
matriz de dentina. A presença da dentina e a interação entre odontoblastos e pré-ameloblastos, estas se
diferenciam em ameloblastos e iniciam a secreção de matriz orgânica de esmalte. Esse fenômeno é
denominado de indução recíproca, caracterizando a fase de coroa ou campânula avançada.
O processo de amelogênese divide-se em cinco fases: morfogenética, diferenciação, secretora, matura-
ção e proteção.
1. Fase Morfogenética: essa fase ocorre no início do estágio de campânula, antes dos ameloblastos
estarem completamente diferenciados e produzirem esmalte, há a interação deles com células ec-
tomesenquimais adjacentes, determinando a forma da junção amelodentinária e da coroa. As célu-
las do epitélio interno param a divisão nas regiões das futuras cúspides e borda incisiva, causando
uma dobra no epitélio, que determinará a anatomia da coroa dos dentes.
2. Fase de diferenciação: etapa marcada pela mudança na aparência das células do epitélio interno,
que passam de cuboidais e com o núcleo grande e centralizado à células cilíndricas (alongadas) e o

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núcleo migra para a porção próxima ao extrato intermediário, caracterizando o processo de inversão
de polaridade, e as organelas vão para a porção próxima à futura dentina. O epitélio interno intera-
ge com células do tecido conjuntivo adjacente, as quais se diferenciam em odontoblastos. As células
do epitélio interno, chamadas de pré-ameloblastos, prosseguem sua diferenciação até a formação
da primeira camada de matriz dentinária, quando passam a ser chamadas de ameloblastos e estão
prontas para a próxima fase.
3. Fase secretora: fase onde se inicia a amelogênese propriamente dita, pois os ameloblastos agora
são células sintetizadoras e secretoras de proteínas, passando a secretar a matriz do esmalte, for-
mada basicamente por proteínas não-colágenas divididas em amelogeninas e não amelogeninas.
Nessa fase ocorrerá uma parte inicial da mineralização.
4. Fase de maturação: a maturação (mineralização completa) ocorre após estar formada a maior parte
da espessura da matriz do esmalte na superfície incisiva ou oclusal. Nessa fase, onde há a minerali-
zação pré-eruptiva, ainda está ocorrendo a formação da matriz do esmalte nas porções cervicais da
coroa. Os ameloblastos são levemente reduzidos em comprimento e estão intimamente ligados à
matriz do esmalte. As células do extrato intermediário perdem a sua forma cuboidal e disposição
regular, adquirindo um aspecto fusiforme.
5. Fase de proteção: quando o esmalte está completamente desenvolvido, os ameloblastos já não
estão dispostos em uma camada bem definida e não podem ser distinguidos das células do extrato
intermediário e epitélio externo do esmalte. Então, essas camadas de células formam um revesti-
mento epitelial estratificado do esmalte, chamado epitélio reduzido do esmalte, cuja função é pro-
teger o esmalte maduro, separando-o do tecido conjuntivo até que o dente irrompa, além de ser
importante para a formação do epitélio juncional da gengiva. Se o tecido conjuntivo entrar em con-
tato com o esmalte, podem se desenvolver anomalias, como a reabsorção do esmalte, ou o revesti-
mento por uma camada de cemento. Isso explica, também, porque o processo de irrupção do dente
não acompanha sangramento.

Mineralização e maturação da matriz do esmalte


A mineralização da matriz do esmalte ocorre em duas etapas com um intervalo muito pequeno entre
elas. Na primeira etapa há mineralização parcial imediata nos segmentos da matriz e na substância
interprismática, conforme vão sendo depositadas. Nessa fase tem de 25% a 30% do conteúdo mineral total,
que geralmente está sob a forma de apatita cristalina.
A segunda etapa, ou maturação, é caracterizada pela mineralização gradual até a completa, se iniciando
no alto da coroa e progredindo cervicalmente. Entretanto, em cada nível, a maturação começa na
extremidade dentinária dos primas. Ou seja, cada prisma amadurece da profundidade para a superfície, e a
sequência da sua maturação é desde as cúspides ou borda incisiva até a linha cervical.

Epitélio externo

Órgão de esmalte na Extrato intermediário


Parte epitelial
fase de campânula
Epitélio interno Esmalte
Germe
Dentário Odontoblastos Dentina
Papila dentária
Polpa dentária
Parte conjuntiva

Cementoblastos Cemento
Folículo dentário
Fibroblastos Periodonto

Osteoblastos Lâmina
dura do
álveolo

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Dentinogênese
Ocorre em duas fases. Primeiro, após a diferenciação dos odontoblastos, ocorre a elaboração de uma
matriz orgânica não-mineralizada, constituída basicamente por dois componentes: o fibrilar (fibrilas
colágenas) e a substância fundamental interfibrilar. Com o depósito dessa matriz, os odontoblastos
caminham em direção ao centro do germe dentário (centrípeta). Na segunda etapa, mais ou menos nesse
momento, ocorre o início da mineralização dentro das vesículas da matriz, que se rompem, fundem-se e
formam focos de mineralização. Essa primeira camada de dentina é chamada de dentina do manto. Com a
continuação desse processo, estabelece-se uma banda contínua de dentina logo abaixo do esmalte.
Enquanto os odontoblastos se descolam centripetamente, continuam secretando matriz, que posteri-
ormente se mineraliza, formando a dentina circumpulpar. Durante a dentinogênese sempre haverá uma
nova camada de matriz não-mineralizada, chamada pré-dentina. As dentinas do manto e circumpulpar são
formadas por fibrilas colágenas de mesma origem (odontoblástica), porém, apresentam tamanhos
diferentes.
A formação e a mineralização da dentina começam na ponta da cúspide ou bordas incisivas, e avança
para o centro por uma aposição rítmica de camadas cônicas, uma dentro da outra. Com a conclusão da
dentina radicular, a formação da dentina primária chega ao seu final.
Após a mineralização inicial da dentina (por meio das vesículas da matriz), há a continuação desse
processo, avançando em direção à polpa, quando a dentina está formada. Existem três padrões diferentes:
linear, globular e uma mistura dos dois.
Polpa Dentária
A polpa do dente é inicialmente chamada de papila dentária. Recebe o nome de polpa quando a dentina
ao redor dela se forma. A papila dentária controla a formação inicial do dente.
A região central da polpa contém muitos troncos nervosos e vasos sanguíneos. Perifericamente, a polpa
é circunscrita pela região odontogênica especializada (composta por odontoblastos), a zona pobre em
células, e a zona rica em células.
Elementos estruturais:
a. Substância intercelular: densa, com aparência variável (finamente granular até fibrilar), com acúmu-
los e espaços em determinadas áreas.
b. Fibroblastos e fibras: os fibroblastos são as células predominantes na polpa, com função de produzir
fibras colágenas.
c. Odontoblastos: o segundo tipo de célula mais presente na polpa, se situam na zona odontogênica
da polpa (localização constante), adjacentes à pré-dentina, com os corpos celulares na polpa (colu-
nares, com núcleos grandes e ovais) e os prolongamentos celulares nos túbulos dentinários.
d. Células de defesa: histiócitos ou macrófagos, linfócitos, eosinófilos, mastócitos e plasmócitos.
e. Vasos sanguíneos: a polpa é extensivamente vascularizada. Os vasos da polpa e do periodonto
nascem da mesma artéria e drenam pelas mesmas veias, se comunicando por conexões apicais e
acessórias. Isso tem uma importância clínica considerável quando ocorrem problemas patológicos
no periodonto ou na polpa. Porém, os vasos que penetram na polpa têm paredes consideravelmen-
te mais finas que aqueles que circundam o dente. Pequenas artérias e arteríolas penetram no canal
apical e seguem um caminho até a polpa, dividindo-se em numerosos ramos na polpa radicular. O
fluxo sanguíneo pulpar é mais rápido que na maior parte das regiões do corpo.
f. Vasos linfáticos: originam-se na porção coronária e caminham em direção apical. Apresenta saída
em comum com os vasos do periodonto, passando pelos nódulos submentais (vasos que drenam
anteriores), submandibulares e cervicais profundos (drenam posteriores).
g. Nervos: seguem a distribuição dos vasos sanguíneos. A maioria dos nervos é mielínicos, mediadores
da sensação de dor, causada por estímulos externos. Feixes nervosos espessos entram pelo forame
apical e seguem até a área coronária, onde se ramificam e irradiam seus feixes à zona odontogênica.
Funções da polpa dentária:
a. Indutiva: o primeiro papel do primórdio da polpa (papila dentária), induzindo a diferenciação do
epitélio bucal a formar a lâmina dentária e a formação do órgão do esmalte, e também determinar a
identidade do dente formado.
b. Formativa: produz a dentina que os envolve.
c. Nutritiva: nutre a dentina (fluido tissular) através dos odontoblastos e seus prolongamentos.

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d. Protetora: os nervos sensoriais respondem com dor a todos os estímulos.
e. Defensiva ou reparadora: é um órgão com extraordinária capacidade reparadora. Responde a
irritação mecânica, térmica, química ou bacteriana, por meio da produção de dentina reparadora e
causando esclerose dos túbulos dentinários, como tentativas de proteger a polpa da fonte de irrita-
ção. A polpa contém macrófagos, linfócitos e outros leucócitos, que ajudam no processo de reparo.
Embora sua parede rígida seja considerada uma proteção, ela também compromete a sua existência
sob essas condições (inflamação).
Desenvolvimento da raiz
O desenvolvimento das raízes começa depois que a formação de esmalte e dentina atinge a junção
amelodentinária. Os epitélios interno e externo do órgão do esmalte unem-se e mergulham em direção ao
ectomesênquima que os envolve. Eles não conseguem se aprofundar verticalmente, devido ao folículo
dentário e a cripta óssea, formando o diafragma epitelial. Nessa região, vai haver a proliferação das células
epiteliais, criando a bainha epitelial de Hertwig (ambas as estruturas constituídas pelas mesmas células). A
continuação da sua proliferação coincide com a erupção do dente. A presença dessa porção epitelial é
importante para a diferenciação das células ectomesenquimais da papila dentária, que se diferenciam em
odontoblastos e formarão a dentina radicular.
A bainha epitelial de Hertwig não consegue acompanhar o crescimento da raiz, e fragmenta-se onde a
dentina já começou a se formar, permanecendo apenas a porção apical da bainha em contato com a raiz,
formando os restos epiteliais de Malassez, que são agrupamentos de células inativos, com capacidade de
ativação em casos patológicos, formando cistos.
A dentina radicular que já começou a ser formada entra em contato com as células ectomesenquimais
adjacentes ao folículo dentário as diferencia em cementoblastos, que são responsáveis pela formação da
matriz orgânica do cemento, composta, inicialmente, por fibras colágenas e substância intercelular amorfa.
Após esse depósito, a matriz é mineralizada, e ao final é muito semelhante ao osso, com 60% de mineral.
Inicialmente, o cemento é depositado lentamente enquanto o dente está irrompendo. Quando o dente
entra em oclusão, é formado mais cemento e de forma mais rápida. As células retiram-se para o ligamento,
e, portanto, esse cemento é acelular.
Ao mesmo tempo, as células centrais tornam-se fibroblastos para forma o ligamento periodontal. As
fibras são formadas antes do término da irrupção do dente, e conforme isso ocorre, vão sendo remodela-
das até depois de o dente entrar em função.
A medida que o ligamento periodontal se forma, as células do lado externo do folículo diferenciam-se
em osteoblastos e formam o osso alveolar sobre a cripta óssea, em torno das fibras do ligamento. Esse
depósito ósseo reduz gradualmente o espaço interligamentar, e as fibras do LP ficam inseridas no cemento
e osso alveolar quando estes se mineralizam, e são denominadas fibras de Sharpey.
Anomalias de desenvolvimento dentário e sua importância clínica
Fases da Odontogênese Ocorrências
Lâmina Dentária Menor número de dentes
Botão Número excessivo de dentes
Capuz Geminação, fusão e concrescência
(iniciação e proliferação) Odontoma
Campânula Amelogênese imperfeita tipo hipoplásica
(histodiferenciação) Dentinogênese imperfeita
Campânula avançada ou Aposição Hipoplasia do Esmalte
coroa Dentinodisplasia
Pérolas de esmalte
Hipercementose
Calcificação Amelogênese imperfeita
Dentina interglobular
Esclerose dentinária ou
Dentina esclerótica

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Erupção Dentária
A erupção dentária é o fenômeno que tem início nos primórdios da odontogênese e acompanha por
toda vida o órgão dentário. É classicamente dividido em três fases: pré-eruptiva, eruptiva e pós-eruptiva.
Porém, de acordo com Marks Jr & Schroeder, esse processo pode ser dividido em cinco fases: movimenta-
ção pré-eruptiva, erupção intraóssea, penetração na mucosa, erupção pré-oclusal e erupção pós-oclusal.
Fases da Erupção
Fase pré-eruptiva
Fase de movimentação pré-eruptiva: tem seu inicio com a diferenciação dos germes e termina com a
formação completa da coroa (fase intraóssea). Quando os germes dos dentes decíduos se formam, ficam
contidos nos maxilares, e nessa época, os maxilares crescem em todas as suas direções, provocando um
aumento em altura, comprimento e largura. Para manter uma relação constante com os maxilares, os
germes movem-se para oclusal e para vestibular, para compensar o aumento em altura e largura,
respectivamente. Esses movimentos são chamados de movimentos de corpo. Outro movimento importante
nessa fase é o movimento excêntrico, onde uma parte do germe dentário em desenvolvimento permanece
estacionada, enquanto o restante continua a crescer, levando a uma mudança em seu centro. Durante esse
movimento, ocorre a reabsorção óssea que altera a forma da cripta para acomodar o germe. Há reabsorção
osteoclástica do osso sobre a superfície da parede da cripta, na frente do dente em movimento, enquanto
ocorre depósito de osso sobre a parede da cripta, atrás dele.
O tamanho das coroas dos dentes é estabelecido ainda com ele dentro dos maxilares, e como estes
ainda têm dimensões reduzidas, no início desse período existe apinhamento dos dentes dentro da
estrutura óssea, aglomerando-se principalmente na região de caninos e incisivos, assim como os primeiros
molares permanentes também estão apinhados e inclinados nos maxilares (na tuberosidade maxilar e no
ângulo da mandíbula). Esse aglomerado é aliviado pelo crescimento do comprimento dos maxilares,
proporcionando espaço para os segundos molares irem para trás, e os dentes anteriores para frente. Ao
mesmo tempo, os germes também se movem para fora conforme os maxilares aumentam em largura, e
para cima (para baixo na maxila) conforme as bases ósseas aumentam em altura.
Os dentes permanentes também sofrem movimentos complexos antes de alcançarem a posição na qual
irromperão. Os incisivos e caninos desenvolvem-se em posição lingual aos germes dentários decíduos, no
nível de suas superfícies oclusais e na mesma cripta óssea. Enquanto seus antecessores irrompem, eles se
movem para uma posição mais apical e ocupam suas próprias criptas ósseas.
Os molares permanentes superiores desenvolvem-se na tuberosidade da maxila, com suas superfícies
oclusais voltadas para distal. Os molares permanentes inferiores desenvolvem-se com suas superfícies
oclusais voltadas para mesial. Ambos só giram quando os maxilares crescem e fornecem o espaço
necessário. Esses movimentos são realizados para posicionar o dente em sua cripta dentro dos maxilares
em preparo para a erupção dentária.
Fase eruptiva
Fase composta pelas fases de erupção intraóssea, penetração na mucosa e erupção pré-oclusal. Inicia-se
quando a coroa está formada, e termina quando o dente chega ao plano oclusal – intra e extraósseas.
Fase de erupção intraóssea: corresponde ao deslocamento do germe dentário a partir da sua posição
inicial na cripta óssea até sua penetração na mucosa oral. A formação e reabsorção seletivas das paredes
da cripta são os principais eventos dessa fase, devido ao deslocamento intraósseo. No início dessa fase, o
folículo que rodeia o dente torna-se muito denso, formando o folículo dentário propriamente dito, que
adere ao epitélio externo do órgão do esmalte, formando uma camada que separa a cripta óssea do tecido
ectomesenquimal. O folículo propriamente dito continua se modificando, com aumento do conteúdo de
colágeno e proteoglicanos, aumento de fluido tissular, e aparecimento de monócitos (células mononuclea-
res) e osteoclastos. As fibras colágenas, além de aumentarem em número, se espessam. Durante essa fase,
ocorrem alterações significativas de desenvolvimento, como a formação das raízes, ligamento periodontal e
epitélio juncional. A raiz em formação cresce primeiro em direção ao assoalho da cripta óssea, e ocorre
reabsorção de osso nesse local, para fornecer espaço para a ponta da raiz. Esse espaço é criado no início do
movimento eruptivo do dente, e a reabsorção não ocorre mais no assoalho da cripta. À medida que as
raízes se formam há deposito de osso sobre a parede da cripta, depósito de cemento sobre a superfície da
raiz recém-formada e a organização de um ligamento periodontal, a partir do folículo dentário. Os tecidos

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que cobrem o dente em erupção sofrem alterações, com perda do tecido conjuntivo, e proliferação
epitelial (epitélio reduzido do esmalte e epitélio bucal), formando um obstáculo de células ao avanço do
dente em erupção. A velocidade de erupção nessa fase varia entre 1 e 10 m/dia, dependendo do dente.
Fase de penetração na mucosa: se inicia quando as cúspides em desenvolvimento alcançam a altura da
crista alveolar, aumentando a velocidade de erupção, fazendo com que o dente chegue rapidamente até o
epitélio da mucosa. Ocorre uma discreta proliferação das células do epitélio reduzido, as quais liberam
algumas proteínas, entre elas, quantidade variável de IgE, que pode desencadear uma reação de
hipersensibilidade, que pode provocar febre na criança. Depois disso, as células centrais da massa
resultante da proliferação dos epitélios se degeneram, formando um canal revestido por epitélio logo
acima da coroa do dente, que é desligado do suporte nutricional, fazendo com que a erupção ocorra sem
hemorragia. Uma vez que parte do dente tenha emergido na cavidade bucal, o epitélio reduzido do esmalte
passa a ser conhecido como aderência epitelial ou epitélio de união, o qual liga os tecidos gengivais à coroa
do dente. Com a erupção contínua, a gengiva e o sulco gengival migram no sentido da raiz, deixando o
dente descoberto de epitélio, até alcançarem a união cemento-esmalte, mesmo após ter entrado em
oclusão com o antagonista, de modo que parte do epitélio de união fica sobre esmalte, e parte sobre
dentina.
Fase de erupção pré-oclusal: após penetrar na cavidade bucal, o dente continua seu movimento em
direção oclusal, até atingir o plano funcional. Nessa fase, fatores intrabucais como as forças musculares
(lábios, língua e bochechas, principalmente), hábitos e o crescimento craniofacial interferem na direção do
movimento eruptivo do dente. A velocidade de erupção alcança uma média de 75 m/dia. Enquanto o
decíduo irrompe, o germe do sucessor permanente situa-se apicalmente envolvido por osso, com exceção
de um pequeno canal (canal gubernacular) contendo restos de lâmina dentária e tecido conjuntivo,
formando o cordão gubernacular. Conforme o sucessor irrompe, o canal gubernacular é rapidamente
alargado pela atividade osteoclástica local, para acomodar a coroa do dente que está irrompendo. O
ligamento periodontal desenvolve-se somente após o início da formação da raiz, e logo que estabilizado
deve ser remodelado, a fim de permitir o movimento dentário eruptivo. A remodelação é realizada pelos
fibroblastos, que degrada e sintetiza fibras colágenas simultaneamente, quando necessário. Nessa fase, o
principal movimento é o excêntrico, pelo próprio desenvolvimento do germe dentário; ocorrem ainda
movimentos de acomodação com inclinações para V, L, M e D, bem como movimentos de rotação.
Fase pós-eruptiva
Inicia-se quando o dente entra em oclusão, e termina com a perda do dente ou sua remoção (fase
extraóssea).
Fase de erupção pós-oclusal: quando o dente alcança sua posição funcional no plano oclusal, a veloci-
dade de erupção decresce significativamente, permanecendo quase imperceptível ao longo da vida do
indivíduo. Nessa fase há a formação completa da raiz. A perda ou ausência do dente antagonista propicia a
continuação do movimento eruptivo. Nesse deslocamento, há depósito contínuo de cemento na região
apical e o movimento do dente e do seu periodonto, em conjunto. Os movimentos dentários pós-eruptivos
são aqueles que mantêm a posição do dente irrompido, enquanto a maxila continua a crescer; e compen-
sam os desgastes oclusal e proximal. O primeiro ocorre em direção axial, e é o principal movimento para
manter espaço com o aumento em altura dos maxilares. Ele inclui tanto o dente como seu alvéolo, e é
realizado pelo depósito ativo de osso na crista alveolar e na base do alvéolo. O segundo movimento ocorre
por desgaste na oclusal ou interproximal, causando inclinação para mesial ou proximal. O ligamento do
dente tem alta capacidade de remodelagem, a qual não é diferente da remodelagem da erupção.
Teorias sobre os mecanismos de erupção
Muitas são as teorias que tentam explicar o mecanismo de erupção dentária. Sabe-se que os movimen-
tos de erupção são resultantes do crescimento diferencial dos dentes e dos ossos maxilares. Entre as
teorias, as mais conhecidas são:
 Crescimento radicular;
 Ligamento em rede;
 Crescimento dos tecidos periapicais;
 Pressão hidrostática;
 Crescimento do tecido pulpar
 Ligamento periodontal;

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 Teoria de Thomas;
 Remodelagem do osso da cripta;
 Papel do folículo dentário e do estrelado.
Cronologia e sequência de erupção
A cronologia corresponde à data que o dente irrompe na cavidade bucal, enquanto que a sequência é a
ordem na qual os dentes vão irromper na boca. A cronologia obedece a um padrão genético, sofrendo
influencia de acordo com o gênero, fatores sistêmicos e fatores locais. Do nascimento aos 6 a 7 meses de
vida, a cavidade bucal é edentada, com crescimento em todas as direções para receber os dentes decíduos.
Aproximadamente a partir dos 6 meses de idade, inicia-se a erupção dos dentes, que ocorre na seguinte
ordem para ambos os arcos: incisivos centrais, incisivos laterais, primeiros molares, caninos e segundos
molares, os inferiores sempre surgindo antes dos superiores.

Sequência da dentição decídua:


incisivo central inferior, incisivo
central superior, incisivo lateral
superior, incisivo lateral inferior,
primeiro molar superior, primeiro
molar inferior, canino superior,
canino inferior, segundo molar
inferior, segundo molar superior.

A cronologia e a sequência de erupção dos dentes permanentes sofrem mais influencia do que a dos
decíduos, podendo ser de ordem geral ou local. A avaliação do desenvolvimento dentário individual é de
grande importância para o clínico, e por isso, Nolla estabeleceu o que se conhece por estágios de
desenvolvimento de Nolla para dentes permanentes, por meio de exame radiográfico.
A radiografia é comparada com os desenhos, e a cada dente é dado um valor de desenvolvimento do
qual se aproxima. Se o desenvolvimento estiver entre dois estágios, poderá ser usado o valor médio ou o
valor maior. A sequência de erupção dos dentes permanentes é muito variada, e muitos fatores podem
influenciar; assim, a cada pesquisa pode-se ter determinada ordem de erupção considerada normal.
Variações da Cronologia
Muitos são os fatores que podem afetar a cronologia e sequência da erupção. Esses fatores podem ser
relativos ao indivíduo e ao ambiente, e os relacionados a problemas sistêmicos.
Sabe-se que para os dentes decíduos o fator genético é o de maior peso na determinação da erupção,
sendo os outros bem menos influentes. Quanto à variação relativa ao sexo, na dentição decídua não há
diferença, enquanto que na dentição permanente a erupção é mais precoce nas meninas, devido ao
desenvolvimento biológico mais rápido na pré-puberdade e na puberdade.
Outro fator importante que provoca alterações na cronologia é o ambiente. Crianças que moram em
grandes centros têm erupção mais precoce que as de zona rural. Acredita-se que o fator de maior variação
é relativo à raça e ao país. Lugares com temperatura média anual baixa causam retardo na erupção em
relação à países tropicais, e num mesmo país, as cidades litorâneas parecem ter erupção mais precoce.

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Cronologia segundo Logan e Kronfeld
Dente Saída para a Raiz completada
cavidade bucal
Incisivo central 7-8 anos 10 anos
Incisivo lateral 8-9 anos 11 anos
Canino 11-12 anos 13-15 anos
Primeiro pré-molar 10-11 anos 12-13 anos
Superior
Segundo pré-molar 10-12 anos 12-14 anos
Primeiro molar 6-7 anos 9-10 anos
Segundo molar 12-13 anos 14-16 anos
Dentição per- Terceiro molar 17-21 anos 18-25 anos
manente Incisivo central 6-7 anos 9 anos
Incisivo lateral 7-8 anos 10 anos
Canino 9-10 anos 12-14 anos
Primeiro pré-molar 10-12 anos 12-13 anos
Inferior
Segundo pré-molar 11-12 anos 13-14 anos
Primeiro molar 6-7 anos 9-10 anos
Segundo molar 11-13 anos 14-15 anos
Terceiro molar 17-21 anos 18-25 anos

A erupção dos dentes de um indivíduo que possa ser considerada fora dos padrões normais é aquela
que se afasta muito das datas consideradas normais. Esses casos geralmente estão relacionados a
problemas endócrinos, como o hipotireoidismo e o hipopituitarismo, que retardam a erupção. Por outro
lado, a atividade excessiva dessas glândulas geralmente provoca erupção precoce dos dentes. Retardo na
puberdade em geral provoca atraso na erupção. Outro fator importante é a desnutrição, que geralmente
afeta a dentição decídua por carência das vitaminas A, C e D. A erupção prematura dos dentes decíduos é
verificada nos dentes natais (ao nascimento) e neonatais (primeiros 30 dias).
Pacientes portadores de síndrome de Down apresentam alterações da sequência, bem como atraso da
erupção. Na disostose cleidocraniana, os dentes decíduos irrompem normalmente; entretanto, sua queda é
excessivamente retardada, e a erupção dos permanentes sofre grande atraso, e a maioria chega a não
irromper.
Na dentição decídua, um dos poucos fatores locais que provoca discreto retardo da erupção é o hema-
toma de erupção, que em geral ocorre nos molares superiores. É um hematoma traumático, que às vezes
se fibrosa e dificulta a erupção do dente. Na maioria dos casos a solução é natural. Também pode ocorrer
com primeiros molares permanentes, mas é menos frequente. A fibrose gengival é quando o tecido
conjuntivo denso atrasa a erupção dentária.
A anquilose é uma alteração da erupção onde a continuidade do ligamento periodontal está comprome-
tida. O dente fica abaixo da linha de oclusão, e estático, enquanto os dentes adjacentes continuam o
processo de erupção. É mais frequente em segundos molares decíduos, e raramente acomete todos os
molares. Não atinge dentes anteriores, exceto em casos de trauma. Acredita-se que é padrão hereditário. A
anquilose extensa de um dente decíduo pode alterar sua esfoliação e a erupção do sucessor permanente.
Ocorre provavelmente por distúrbio local no metabolismo, quando o processo de neoformação óssea junto
à parte da raiz reabsorvida é mais rápido do que a reorganização das fibras periodontais, permitindo a
união entre o osso de suporte e o dente. Se a decisão for manter esses dentes por um determinado tempo
no arco, eles devem ser avaliados periodicamente.
O processo de reabsorção radicular não é contínuo. Ocorre em períodos de repouso, seguido de perío-
dos de reparo. Neste último, frequentemente desenvolve-se uma sólida união entre o dente e o osso.
Outro fator a ser considerado é os dentes decíduos, que não irrompem por perda de força eruptiva, ou
pela presença de uma barreira mecânica em seu caminho (impactados). A falta de espaço devido ao
apinhamento no arco dentário ou por perda precoce dos dentes decíduos com fechamento parcial do
espaço é um fator de impactação parcial ou total, podendo provocar inclusive rotação do germe dentário.

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Sintomatologia relacionada ao processo de erupção dos dentes decíduos
Algumas alterações podem surgir nessa fase, podendo ou não estar relacionadas ao irrompimento dos
dentes. Os sintomas mais comuns são: aumento da salivação, irritabilidade, diarreia leve, febre, sono
agitado, falta de apetite, erupção cutânea, corisa e outros.
A febre, como já foi dito anteriormente, ocorre pela liberação de proteínas, entre elas, quantidades
variáveis de IgE, quando o dente penetra na mucosa bucal, podendo causar uma reação de hipersensibili-
dade. O aumento da salivação pode estar relacionado à dor e ao desconforto, mas também pode ser
explicado pela mudança na qualidade da saliva pelo amadurecimento das glândulas salivares, tornando-se
mais viscosa e de difícil deglutição. A diarreia leve pode estar relacionada ao período em que as crianças
levam com maior frequência objetos à boca, aumentando a ingestão de microrganismos patogênicos.
Observa-se que dias antes do irrompimento dos dentes ocorre, em geral, edema local e eritema gengi-
val. Para aliviar o desconforto, recomendam-se mordedores limpos e resfriados, alimentos duros, e uso de
dedeiras ou acessórios para estimular a área, provocando isquemia na gengiva e acelerando o processo. Em
alguns casos pode ser recomendado o uso de anestésico local e até analgésicos para aliviar a sintomatolo-
gia.
Como alguns sintomas podem estar relacionados a alterações sistêmicas, é importante o contato com o
pediatra. Geralmente os sintomas são temporários, desaparecendo em poucas semanas, e se persistirem,
os pais devem procurar o pediatra da criança.

Rizólise
É um processo normal (fisiológico) que ocorre nos dentes decíduos, que precede a troca dos dentes,
caracterizado pela destruição gradativa dos tecidos dentários duros e moles, com início aproximadamente
3 a 4 anos antes de o dente esfoliar.
Nesse processo, as raízes vão adquirindo novas configurações, como alterações na posição do forame
apical e na área de bi ou trifurcação dos molares decíduos. O profissional precisa saber disso, para diferir o
que fisiológico do que é patológico.
Mecanismos de reabsorção
Existem diversas teorias que tentam explicar esse processo, mas, alguns autores afirmam que ele ocorre
por atividade dos odontoclastos, que, junto às superfícies em reabsorção, emitem projeções formando uma
borda estriada. Por meio dessas projeções, as células excretam enzimas lisossômicas, como a fosfatase
ácida, que desagregarão a matéria orgânica do tecido mineralizado. O pH ácido, na área de reabsorção,
favorece a decomposição da hidroxiapatita, explicando a desmineralização final dos cristais, que ocorre
após a lise da matéria orgânica.
A reabsorção de cemento, dentina e osso produz trocas tissulares, e o tecido periodontal desorganiza-se
por completo, perdendo toda a sua característica. Os feixes fibrosos principais soltam-se do osso alveolar, e
o cemento é reabsorvido. Os vasos sanguíneos são comprimidos, acelerando a reabsorção. A polpa
dentária é a última a ser atingida, e, provavelmente, sua remoção ocorre por apoptose das células, assim
como o ligamento periodontal (morte programada).
A erupção do dente permanente sucessor é considerada o principal fator desencadeante da reabsorção
do dente decíduo. Entretanto, deve-se considerar outros fatores, como o crescimento da face e os ossos
maxilares e o aumento de forças mastigatórias (podem afetar o periodonto de inserção do dente decíduo),
pois quando há ausência do germe permanente, a reabsorção ainda ocorre. A reabsorção das raízes dos
dentes decíduos é um requisito prévio para a erupção normal dos dentes permanentes.
Nas primeiras etapas do desenvolvimento, os dentes decíduos e os permanentes têm cripta óssea
comum. Depois, o decíduo apresenta uma cripta separada, por osso, do germe do permanente. Esse osso é
reabsorvido durante as etapas iniciais de erupção do permanente, e em seguida, inicia-se a reabsorção dos
tecidos duros do dente (cemento e dentina). Essa reabsorção pode começar pela superfície da raiz, antes
do fechamento da porção apical.
A reabsorção não é um processo contínuo, mas sim interrompido por períodos de repouso. Este caráter
intermitente é o que possibilita a permanência do dente decíduo até o momento de sua esfoliação.
Observam-se as lacunas de Howship, concavidades com tamanho, forma e profundidades variadas,
contendo odontoclastos multinucleados. Em seguida a esse período de repouso, ocorre uma neoformação
para permitir que as estruturas adjacentes às raízes se reorganizem. O tecido de regeneração que se forma

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é semelhante ao cemento, em estrutura e mineralização, e as células são similares aos cementoblastos. Há
a reorganização das fibras do periodonto, e após um período de atividades menor, reinicia-se a reabsorção
ativa.
Nos dentes unirradiculares, os germes dos dentes permanentes encontram-se por lingual e apical do
antecessor decíduo, e são esfoliados com a câmara pulpar praticamente intacta; nos multirradiculares,
encontram-se próximos da posição inter-radicular, e são esfoliados com reabsorção da dentina inter-
radicular, da câmara pulpar e da dentina coronária.
O septo ósseo intermediário entre a raiz do decíduo e o germe do permanente é reabsorvido. Quando a
reabsorção chega à dentina, as células deixam de ser cementoclastos e recebem o nome de dentinoclastos.
Durante a fase final da esfoliação do dente decíduo, há migração do epitélio da junção dentogengival e
do epitélio gengival para a superfície interna da coroa em progresso de reabsorção, promovendo
sangramento mínimo após a queda do dente decíduo e uma rápida cicatrização.
Aspectos clínico e radiográfico da reabsorção radicular
O processo de reabsorção radicular pode apresentar variações, como a reabsorção precoce com perda
prematura dos dentes decíduos, ou a reabsorção retardada com a presença de dentes decíduos além da
época normal. Há uma correlação direta entre reabsorção radicular dos decíduos e a rizogênese do
sucessor permanente, e normalmente esse processo inicia-se mais cedo nas meninas, do que nos meninos.

Dente Rizólise – decíduo Nolla – permanente


Entre 1/3 e 2/3 Entre 7 e 8
Canino decíduo
Menor que 1/3 Entre 5 e 6
Molares decíduos Entre 1/3 e 2/3 ≥6

A reabsorção radicular fisiológica, em geral, progride de forma razoavelmente uniforme e simétrica, à


medida que o germe permanente cresce em sentido oclusal e entra em relação direta com as raízes do
dente decíduo. Pode acontecer uma reabsorção radicular desigual em alguns casos, como o mau
posicionamento do germe do dente permanente. Isso ocorre particularmente em segundos molares
decíduos, devido à discrepância de tamanho entre ele e o pré-molar sucessor e a posição de desenvolvi-
mento do dente permanente com relação à raiz decídua.
Tem-se notado com frequência, também, que dentes decíduos que sofreram traumatismo, sofrem
reabsorções mais aceleradas, assim como dentes tratados endodonticamente, diminuindo a vida do dente
no arco. Molares com lesões de cárie profundas apresentam reabsorção mais rápida nas raízes do mesmo
lado. Traumatismo, infecções ou distúrbios metabólicos são agentes etiológicos da reabsorção radicular,
que também pode ter causa idiopática. Em alguns casos esporádicos, o trauma estaciona a reabsorção.
Dentes que sofreram mortificação pulpar e não foram tratados, na maioria dos casos, também esfoliam
ligeiramente antes da época normal, assim como em casos de abscesso. O processo de cura do dente com
rizólise é quase sempre precário, e por isso, é melhor optar por pulpectomia ao invés de pulpotomia
(potencial de regeneração comprometido).
Por outro lado, casos como a ausência do sucessor permanente causa o retardo na rizólise, podendo
inclusive não acontecer a esfoliação do decíduo. Pode ocorrer, também, de o sucessor permanente
unirradicular estar muito por lingual, não provocando a esfoliação adequada, e o sucessor irrompe por
lingual do decíduo.
Os dentes unirradiculares apresentam as reabsorções iniciadas por lingual, prosseguindo para vestibu-
lar; nos dentes multirradiculares a reabsorção ocorre na superfície inter-radicular.
Outro aspecto clínico importante é que em determinadas épocas os dentes decíduos apresentam
alguma mobilidade, e em outras, tornam-se mais firmes. Isso ocorre devido ao processo ser intermitente,
permitindo que a função do dente decíduo seja mantida até que o sucessor permanente possa tomar o seu
lugar.
Pode-se relacionar fatores locais ou gerais como fenômenos que alteram a velocidade de reabsorção
radicular, acelerando ou retardando-a. Como problemas gerais que aceleram nós temos o querubismo,
síndrome de Down, hipofosfatasia, pseudo-hipofosfatasia, tumores benignos ou malignos dos ossos
maxilares. Como retardadores temos o hipotireoidismo, hipotituitarismo e disostose cleidocraniana. Com
relação aos problemas locais, os principais são anodontia e desvio de trajetória do permanente. Casos de
fluorose discreta, mesmo imperceptível, pode causar retardo na reabsorção, por maior mineralização.

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Dentições Decídua, Mista e Permanente
Fase pós-natal da biogênese: recém-nascido à dentadura decídua com-
pleta
Comparativamente à face, algumas estruturas têm seu desenvolvimento mais precoce. O crânio e o seu
volume, o volume encefálico e a base anterior do crânio tem maturação mais cedo. Já a face, só terá seu
crescimento completo por volta dos 10 aos 14 anos de idade. Ela cresce em três dimensões: vertical,
transversal (largura) e sagital (profundidade). A face média corresponde à região das estruturas da cavidade
nasal, órbitas, seios maxilares, processos alveolares e dente.
A maxila é um osso pequeno, que até os 3 anos de idade já completou 1/3 do seu crescimento. Entre a
infância e a adolescência seu tamanho praticamente duplica. O crescimento vertical ocorre por deposição
óssea e deslocamento; no sentido transversal, ocorre crescimento significante no primeiro ano de vida,
contínuo até após a puberdade com o fechamento da sutura palatina mediana; no sentido anteroposterior,
a maxila cresce principalmente por deposição óssea na região da tuberosidade, levando a um deslocamen-
to dos ossos para anterior.
A mandíbula apresenta forma obtusa e natureza rudimentar dos côndilos, que favorece a sucção. Com a
erupção dos dentes, o ramo torna-se mais reto e o ângulo goníaco, mais agudo. A mudança na sua forma é
resultado do crescimento para baixo e para frente. O crescimento vertical ocorre principalmente por
deposição óssea nos processos alveolares e na região inferior do ramo mandibular; o crescimento dos
côndilos ocorre em resposta a outras forças atuantes na região (ex. muscular); transversalmente – largura –
a sua forma final é alcançada graças à divergência das cabeças da mandíbula, conforme estas crescem para
posterior. Também ocorre deposição na região externa do corpo e ramos mandibulares. O crescimento na
região anterior limita-se ao primeiro ano de vida, com deposição na região de sínfise, e posteriormente por
deposição de osso alveolar; no sentido anteroposterior o crescimento é por deslocamento, reflexo do
crescimento ósseo na região posterior. Ocorre reabsorção na borda anterior e deposição na borda
posterior, para acomodar os dentes em formação.
A cavidade bucal dos recém-nascidos apresenta características próprias desta faixa etária. Os rebordos
ósseos são denominados rodetes gengivais, e são recobertos pelo tecido gengival. Esse rebordo gengival
dos rodetes é mais saliente na região anterior, e mais achatado na região posterior. ocorre ausência de
osso alveolar recobrindo o rebordo (ainda não há dentes irrompidos), e apinhamento intraósseo dos
dentes decíduos anteriores superiores e inferiores, pois o desenvolvimento pré-natal destes dentes
precede ao desenvolvimento das estruturas ósseas que os contêm.
A maxila apresenta rodete gengival com forma arredondada e pouca profundidade no palato, e é rica
em acidentes anatômicos. Já a mandíbula apresenta rodete gengival em forma de “U” e sulcos laterais na
região distal dos caninos. Nas duas podemos visualizar um cordão fibroso e flácido à palpação denominado
“cordão fibroso e Robin e Magitot”.
No sentido anteroposterior a mandíbula encontra-se re-
truída em relação à maxila em 96,7% dos casos (± 5mm). No
sentido vertical pode existir ou não espaço entre o rodete
superior e o inferior, e se presente, não implica na presença
de mordida aberta na dentição decídua.
Na ATM a eminência articular apresenta pouca elevação,
o côndilo é “tosco” e achatado, com altura próxima ao plano
palatino, e fosse glenoide quase plana.
É língua frequentemente é observada interposta entre os
rodetes gengivais em posição de repouso; o freio labial apre-
senta inserção próxima à crista do rebordo alveolar, e no lá-
bio superior encontramos o “calo” de amamentação (sucking
pad), considerado um apoio.
A erupção dentária é um processo presente no desenvolvimento das dentições, que compreende a
movimentação em direção a posição final de oclusão, e as compensações decorrentes dos desgastes
oclusais. Portanto, se inicia na odontogênese, passa pela irrupção, atinge a posição funcional e termina com
a possível perda do dente. Desta forma, a irrupção dentária é apenas uma fase do processo eruptivo, onde
os dentes surgem na cavidade bucal.

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Como já foi descrito em outro resumo, o processo eruptivo é composto por três fases: pré-eruptiva
(intraóssea), eruptiva (intra e extraóssea) e pós-eruptiva (extraóssea).
A cronologia de irrupção corresponde à idade em que o dente surge na cavidade, enquanto que a
sequência é a ordem com que eles irrompem. A cronologia é relativamente variável, e qualquer antecipa-
ção ou atraso de 6 meses ainda está na normalidade. Por outro lado, a sequência é geralmente preservada,
na seguinte ordem: ICI, ICS, ILS, ILI, 1ºMI, 1ºMS, CI, CS, 2ºMI, 2ºMS. A irrupção inicia por volta dos 6 meses,
e aos dois anos e meio, a dentição decídua em geral está completa, com os segundos molares.
Para a avaliação da dentadura decídua, precisa-se fazer o exame clínica incluindo análise facial, intraoral
e funcional.
Análise facial
A análise morfológica da face é fundamental no diagnóstico, plano de tratamento ortodôntico e prog-
nóstico das más oclusões a longo prazo. Este é o principal recurso diagnóstico para determinar o Padrão
Facial, remetendo a protocolos de tratamentos e prognósticos específicos em diferentes faixas etárias. A
classificação do Padrão é realizada pela avaliação da face nas visões frontal e lateral, e os indivíduos podem
ser classificados em Padrão I (normalidade), II ou III, Face longa ou Face curta. No padrão I, quando há má
oclusão, é apenas dentária, e não associada a discrepância esquelética. Os padrões II e III são caracterizados
pelo degrau sagital positivo e negativo, respectivamente, entre a maxila e a mandíbula. Nos pacientes com
erros esqueléticos, as más oclusões são geralmente consequências dessas discrepâncias. Nos Padrões Face
longa e Face curta, a discrepância é vertical. Padrões II e III apresentam discrepância sagital entre a maxila e
a mandíbula, principalmente na avaliação lateral. Pacientes com Padrão I na visão frontal, e II ou III no
perfil, apresentam melhor prognóstico que aqueles Padrões II ou III nas duas visões, onde há um
desequilíbrio mais grave.
O diagnóstico ideal da má oclusão de Classe III deve ser precoce, se possível ainda na dentadura decí-
dua. Entretanto, os padrões de desenvolvimento facial dos portadores de Classe III são imprevisíveis, em
idades muito precoces. A condição se agrava ao longo do crescimento, principalmente na adolescência, de
modo que, na criança, esta má oclusão não se apresenta totalmente definida, dificultando o diagnóstico.
Por isso, é necessária uma observação minuciosa de várias características faciais, oclusais e cefalométricas
que revelam forte tendência à Classe III, como a ausência de proeminência zigomática ou malar, linha
aumentada em relação à profundidade da face média e o ângulo mais agudo entre o mento e o pescoço.
Padrão I Classe I (62,99%) Classe II (35,82%) Classe III (1,18%)
Padrão II Classe I (18,64%) Classe II (81,35%)
Padrão III Classe I (48,4%) Classe II (1,35%) Classe III (50%)

Todas essas relações apresentadas na tabela apresentam tratamento e prognósticos diferentes. A Classe
é a relação sagital entre as arcadas dentárias, enquanto que o Padrão é a relação sagital do esqueleto
facial, e a Classe tende a refletir o Padrão.
O paciente poderá apresentar perfil reto, convexo ou côncavo, respectivamente nos padrões faciais I, II
e III. A configuração facial não muda radicalmente ao longo do crescimento, pois esta configuração é
morfogenética. Por isso a definição precoce do Padrão Facial é importante, pois determina como a face
crescerá e qual o prognóstico de tratamento.
O exame facial é realizado por análise clínica e fotográfica, podendo ser complementado por telerradio-
grafia, analisando simetrias, proporções e harmonia, além do tônus muscular. O paciente deve estar em pé
em posição relaxada, e a cabeça posicionada de modo que o plano de Frankfurt fique paralelo ao solo, com
os lábios em repouso.
Análises intrabucal e funcional
O exame da cavidade bucal deve compreender a avaliação transversal (largura), sagital (anteroposterior)
e vertical das arcadas dentárias.
A análise transversal permite a avaliação das características da dentição utilizando como referência o
plano sagital mediano. Permite avaliação intra e interarcadas.
1. Relação Intra-arcadas: na maxila, a linha mediana é vista por uma linha imaginária traçada pela
porção posterior da rafe palatina até a região da papila interincisiva. Na mandíbula, essa linha é vista
entre o ponto de inserção do freio lingual seguindo posteriormente pelo ponto de projeção do plano
da rafe palatina. Quando há apinhamento na região anterior da dentadura decídua é um fator indi-

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cativo de futura falta de espaço nas dentaduras mista e permanente, com chances próximas de
100% de aparecer nessas dentições. Ele não será tratado na dentadura decídua, mas deverá ser rea-
valiado na mista, para possível tratamento. Por outro lado, os diastemas são espaços iguais ou mai-
ores que 0,5mm, podendo ser fisiológicos na dentição decídua, tanto na região anterior como na
posterior. Os diastemas primatas na maxila são espaços presentes entre os incisivos laterais e os
caninos, enquanto que os diastemas primatas na mandíbula estão presentes entre os caninos e os
primeiros molares. Os diastemas de região posterior também podem estar presentes após a erup-
ção dos segundos molares, mas tendem a se fechar ainda nessa fase.
2. Relação Interarcadas: nessa relação, a linha mediana dentária é a relação existente entre o encontro
das duas linhas medianas, podendo apresentar-se como coincidente ou desviada para o lado direito
ou esquerdo. Podemos avaliar também os tipos de Arcos de Baume. Nos Arcos de Baume tipo I te-
mos presença de diastemas na região anterior em ambas as arcadas; no tipo II, ausência de diaste-
mas na região anterior em ambas as arcadas; no tipo Misto, temos tipo I superior e tipo II inferior
(mais frequente), ou o contrário. Fazemos também a avaliação transversal da oclusão, podendo
classificar a relação interarcadas em normo-oclusão ou mordida cruzada anterior ou posterior, en-
volvendo um ou vários dentes, uni ou bilateralmente.
2.1 Análise sagital: pode-se avaliar a relação entre caninos decíduos, usado para diagnóstico sagital
interarcadas. Pode ser classificado em classe I, II ou III. Na Classe I, a cúspide do canino decíduo
superior se assenta na ameia entre o canino inferior e o primeiro molar inferior decíduos; na
Classe II, o canino superior se desloca dessa ameia para mesial; na Classe III, o canino superior
se desloca dessa ameia para distal. Ainda nessa análise, temos a relação molar ou plano termi-
nal, estabelecida entre as faces distais dos segundos molares decíduos superiores e inferiores
(linha pós-láctea), podendo ser classificado como plano terminal reto (76% dos casos), degrau
mesial para a mandíbula ou degrau distal para a mandíbula.

Na análise anteroposterior avalia-se a sobressaliência (overjet), uma medida linear realizada paralela-
mente ao plano oclusal para avaliar a distância (em mm) entre a face vestibular do incisivo central inferior e
a borda incisal do incisivo central superior. Pode ser positiva – quando o superior está situado por
vestibular do inferior –, nula (topo-a-topo) – quando as faces vestibulares dos dois se encontram em um
mesmo plano – ou negativa – quando o superior está situado por lingual do inferior. A sobressaliência
normal para a dentadura decídua é de 0 a 3 mm, e é mais acentuada em crianças mais novas, diminuindo
com o avançar da idade.
Na análise vertical temos a avaliação das características da oclusão, tendo como referência o plano
oclusal, permitindo a avaliação de sobremordida (overbite), paralelismo entre o longo eixo dos dentes
decíduos e da Curva de Spee. A sobremordida é a distância entre as bordas incisais dos incisivos centrais
inferiores e superiores, e assim como o overjet, diminui com o avanço da idade. É negativa em casos de
mordida aberta anterior. O paralelismo entre os seus longos eixos é mais uma característica dessa dentição,
e a Curva de Spee acredita-se estar ausente na dentadura decídua.

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Características de normalidade
da dentição decídua: arcada den-
tária inferior contida na superior;
relação sagital entre os caninos
Classe I; trespasses horizontal e
vertical positivos; diastemas ou
não; linha mediana superior e
inferior coincidente e linha medi-
ana dentária sem desvio.

Dentadura Mista
Inicia-se com a erupção dos primeiros molares permanentes, e no geral está presente dos 6 aos 12 anos.
Normalmente, os dentes permanentes irrompem quando estão no estágio 8 de Nolla (2/3 da raiz formada),
e após irromper, a raiz completa sua formação depois de 2 a 3 anos.

Cronologia Favorável (dentes permanentes) Sequência Favorável (dentes permanentes)


Dente Maxila Mandíbula Ordem Maxila Mandíbula
Incisivo central 7-8 6-7 1º 1ºM 1ºM
Incisivo lateral 8-9 7-8 2º IC IC
Canino 11-13 10-11 3º IL IL
Primeiro PM 9-11 10-11 4º 1ºPM C
Segundo PM 11-13 11-13 5º 2ºPM 1ºPM
Primeiro M 6-7 6 6º C 2ºPM
Segundo M 12-13 11-12 7º 2ºM 2ºM

O momento da irrupção pode variar em um ano ao redor da média, e ainda ser considerado dentro da
normalidade. Ex: ICI → entre os 5 e os 7 anos de idade.
A fase de dentadura mista pode ser classificada em três períodos: primeiro período transitório, período
intertransitório e segundo período transitório.
1. Primeiro período transitório: período que dura cerca de 2 anos (entre os 6 e os 8 anos), iniciando
com a irrupção dos primeiros molares permanentes e terminando com a irrupção dos incisivos late-
rais superiores. A irrupção dos incisivos permanentes, em particular os superiores, demarca o início
da “fase do patinho feio”, caracterizada pela presença de espaços entre estes dentes, persistindo
por 3 ou 4 anos, até a irrupção dos caninos permanentes, com pico aos 10 anos de idade, aproxima-
damente.
2. Período intertransitório: período de repouso na substituição dos dentes decíduos pelos permanen-
tes, durando aproximadamente 2 a 3 anos. Ocorre reabsorção radicular extensa dos caninos e mola-
res decíduos e desenvolvimento radicular dos sucessores permanentes.
3. Segundo período transitório: inicia-se por volta dos 10 anos de idade com a irrupção dos caninos
inferiores, e terminando com a irrupção dos segundos molares permanentes, que próximo aos 12
anos estão próximos de irromper, em ambas as arcadas. Na maioria das vezes, os dentes sucessores
completam sua erupção antes de os segundos molares permanentes irromperem. A transição da
dentadura decídua para a permanente causa impacto no comprimento, na circunferência da arcada,
nas larguras intermolares e intercaninos. Com o avanço da idade (>45 anos) há uma ligeira redução
no comprimento da arcada,devido à verticalização dos incisivos.
Características da dentadura mista
Geralmente inicia-se com a irrupção dos primeiros molares permanentes inferiores, seguidos dos
superiores, por volta dos 6 anos de idade. Estes dentes iniciam seu desenvolvimento ainda na VIU, e sua
mineralização no final da gestação/nascimento. No terceiro ano de vida, a coroa está totalmente
calcificada. Ao nascimento, os 1ºsMI localizam-se praticamente na junção entre corpo e ramo ascendente
da mandíbula, e com o processo de aposição e reabsorção, passam a ocupar lugar dentro do ramo
horizontal. Os 1ºsMS têm inicialmente a face oclusal inclinada para distal, com seu desenvolvimento na
região da tuberosidade. Desenvolvem um movimento em direção ao rebordo alveolar, com longo eixo em
direção à face distal, com modificação gradual em direção aos 2ºsMS decíduos.

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A relação anteroposterior entre os dois primeiros molares permanentes antagonistas, após a sua
irrupção, depende de suas posições previamente ocupadas nas arcadas, da relação sagital entre a
mandíbula e a maxila e das proporções coronárias mesiodistais dos molares decíduos superiores e
inferiores.
Edward Angle classificou a má oclusão interarcadas em classes I, II e III, onde a referência escolhida para
determinar a relação interarcadas são os 1ºsM permanentes.
As variações nos planos terminais dos 2ºsM decíduos influenciam na oclusão inicial dos 1ºsM perma-
nentes, pois a sua irrupção é orientada pelas superfícies distais dos 2ºsM decíduos. Casos que apresentam
degrau distal na dentadura decídua desenvolvem relação molar Classe II na dentadura permanente.
O desenvolvimento favorável da oclusão depende principalmente de três fatores: sequência favorável
de irrupção, relação entre tamanho dentário versus espaço disponível e a obtenção de relação molar
normal com proveito máximo do espaço livre de Nance. Este espaço livre de Nance compreende a diferença
em milímetros entre a soma do comprimento mesiodistal dos caninos e molares decíduos e a soma do
comprimento mesiodistal dos caninos e pré-molares, sendo mais significativa na arcada inferior, e de
importante papel no ajuste do posicionamento dos dentes permanentes.
Dentadura Permanente
É estabelecida quando já ocorreu a troca de todos os dentes decíduos pelos permanentes. No período
inicial observa-se a irrupção dos segundos molares, por volta dos 12 anos, e, depois, a irrupção dos
terceiros molares, por volta dos 18 anos.
Do ponto de vista funcional, os primeiros movimentos mandibulares ocorrem na fase fetal e nos primei-
ros meses de vida, com os movimentos anteroposteriores e de abertura e fechamento mandibular, sem
que haja ciclo mastigatório e movimentos de lateralidade. Esse movimento inicial é importante para o
crescimento ósseo da mandíbula em relação à maxila e para compensar a discrepância sagital observada ao
nascimento.
Quando a alimentação do bebê passa para semissólida e, depois, para sólida, temos a irrupção dos
primeiros dentes decíduos. Estebelece-se a oclusão em relação cêntrica e o primeiro levante da dimensão
vertical. Desta forma, tem-se o primeiro tripé oclusal para a estabilidade funcional (ATMs na região
posterior e incisivos na região anterior). Do ponto de vista oclusal esta é uma posição instável, pois só há
toque dentário na região anterior e a mandíbula que estava em uma posição estável (relação cêntrica)
movimenta-se para posterior.
Em um terceiro momento temos a irrupção dos 1ºsM decíduos, e o estabelecimento de uma oclusão
funcional mutuamente protegida, onde os dentes posteriores protegem os anteriores (não permitindo
toques dentários) e ATMs (não permitindo deslocamento para posterior) nos movimentos cêntricos
(fechamento) da mandíbula; e os dentes anteriores protegem os posteriores e as ATMs durante os
movimentos excêntricos (abertura) da mandíbula.
Com a irrupção dos caninos e 2ºsM decíduos, todos os dentes entram em funcionamento. Na fase inicial
ocorre desoclusão canina durante os movimentos de lateralidade, e com o passar dos anos, as pontas dos
caninos desgastam (facetas de maturação) e a desoclusão canina transforma-se em desoclusão em grupo
balanceada bilateral. Por volta dos 6-7 anos de idade, com a irrupção dos 1ºsM permanentes, é importante
que os caninos decíduos tenham estas facetas e a desoclusão em grupo (característica da dentadura mista),
pois os movimentos de lateralidade serão importantes para modelar a curva de Wilson em formação. Nesta
fase temos também aumento da dimensão vertical pela irrupção destes dentes e mudanças nas trajetórias
das linhas de força.
Com a irrupção dos incisivos permanentes, ainda existe desoclusão em grupo, e por isso há desgaste das
pontas destes dentes (flor de Liz). A modelagem das arcadas dentárias se dá pela oclusão balanceada
bilateral da dentadura mista.
Apenas com a irrupção dos caninos permanentes que a desoclusão em grupo transforma-se em deso-
clusão canina, em função da inclinação e convergência destes dentes, estabelecendo a oclusão balanceada
bilateral com guia de canino e incisivo, que é a desejada do ponto de vista da oclusão saudável.

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Exame Clínico, Diagnóstico e Plano de Tratamento
Atualmente, a Odontologia se baseia na prevenção, visando o mínimo de intervenção do profissional, e
estimulando a participação do paciente no processo saúde-doença. Assim, o exame do paciente tem como
objetivo a coleta de dados, que constitui a base do diagnóstico. Para garantir o melhor atendimento, deve-
se partir de anamnese correta, exame clínico completo, diagnóstico e plano de tratamento adequados. É
importante recolher o maior número de dados possível, de forma ordenada e registrados em fichas
apropriadas, com a finalidade de avaliar a saúde geral do paciente, condições da cavidade bucal e dos
dentes, detectando sinais precoces de lesões que servirão de base para a elaboração do plano de
tratamento. Deve-se, ainda, informar aos pais da criança todos os problemas que ela apresenta no
momento, mesmo que não vá tratar de imediato.
Vale salientar a importância do bom relacionamento do profissional com a criança e seus pais, pois ele é
o iniciador da vida odontológica do paciente. Todo o futuro da criança em relação ao tratamento, positivo
ou negativo, depende da forma com a qual o profissional conduza a primeira consulta, que deve ser a
experiência mais agradável possível, mesmo em casos de emergência. A história clínica completa, o exame
minucioso, o diagnóstico completo e o plano de tratamento adequado, exigem o melhor da capacidade e
habilidade profissional. Aos pais também se deve dar a atenção necessária, pois, muitas vezes, estão
ansiosos, por estar confiando os cuidados odontológicos de seu filho.
Existem três principais tipos de exames: de emergência, panorâmico e o completo. O exame de emer-
gência é necessário diante de processos agudos e de emergência (dor, abscessos agudos, traumatismos),
deve ser rápido, porém, preciso, e seu sucesso depende muito do conhecimento e da habilidade
profissional no diagnóstico de doenças agudas; o panorâmico consiste na rápida avaliação das condições
gerais da criança, com a finalidade de detectar doenças visíveis na busca superficial e indicar o exame
completo. É o tipo de exame feito em triagens; o exame completo é feito com a sistemática total, para
obter o maior número de informações possíveis do paciente, com o objetivo de conseguir o melhor
diagnóstico.
O exame completo consiste em: anamnese ou história clínica, exame clínico, exames complementares
(radiográfico e laboratorial, quando necessário), diagnóstico, prognóstico e plano de tratamento. Em
Odontopediatria deve-se envolver não só a criança, mas, também, sua família e o meio ambiente em que
ela vive, para que se obtenha sucesso no tratamento.
Ficha Clínica
Fornece informações que possam ser úteis ao estabelecimento do exame completo, devendo conter
toda informação possível do paciente, de forma sistemática, seguindo uma sequência lógica com o objetivo
de fornecer elementos de forma clara e sem perda de tempo. Por meio desses dados teremos a elaboração
do diagnóstico, o prognóstico e orientação durante a terapêutica e a avaliação dos resultados, constituindo,
também, um importante instrumento legal. Para ser completa, deve conter identificação, anamnese,
informações clínicas, odontograma, plano de tratamento, síntese diagnóstica e relatório final. A ficha deve
ser simples e o questionário extenso, contendo todas as perguntas de todas as áreas, e quando algo de
interesse for observado, será anotado. Cada profissional utiliza a ficha que julga conveniente, com o que
acha que pode ser importante e relevante na sua maneira de conduzir o exame, o diagnóstico e a
elaboração do plano de tratamento.
A identificação do paciente tem os dados coletados previamente a quaisquer outros. Sempre que
possível é interessante a presença da mãe e/ou do pai, para que estes informem o profissional pessoalmen-
te.
A anamnese ou história clínica é a coleta de dados que compõe os panoramas físicos e psíquico,
passado e presente do paciente. É uma entrevista com os pais ou responsável, em forma de conversa,
capaz de dar informações claras e precisas sobre a criança. A história clínica é o primeiro passo na evolução
do diagnóstico, e representa o início da interação perfeita dentista-criança-pais, onde procura-se
conquistar a confiança do responsável. Deve-se prevenir a omissão de informações pertinentes.
A história dental refere-se ao motivo da consulta. É importante saber o objetivo dos pais, e o que eles
esperam do tratamento. Perguntar se a criança já foi ao dentista, se sim, há quanto tempo, e qual foi o seu
comportamento diante do tratamento dentário. Essas informações proporcionam um esboço do estado
emocional da criança, e da expectativa dos pais. Essas informações devem ser avaliadas com muito
cuidado, para poder justificar a linha de trabalho, e entender as informações fornecidas pelos pais.

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Ficha de Identificação (modelo)
Nome:
Data nasc.: Sexo: Cor: Natural de:
Endereço: Telefone:
Bairro: CEP: Cidade: Estado:
Grau de escolaridade: Escola: Horário:
Nome da mãe: Profissão: Nasc.:
Nome do pai: Profissão: Nasc.:
Endereço comercial: Telefone:
RG do responsável: CPF:
Médico ou pediatra da família: Telefone:
Indicado por:

No comportamento psicológico deve-se registrar não só o comportamento da criança, como também a


atitude dos pais ou responsáveis frente ao tratamento dentário. Se for a primeira vez da criança num
consultório, é importante saber seu comportamento em consultas médicas. Também procura-se saber se a
criança é tímida, dócil ou agressiva, e como é sua relação com outras crianças. No que se refere aos pais,
analisar como eles educam a criança, e se têm medo do dentista, pois acabam transmitindo insegurança ao
paciente.
Na história médica temos um apanhado geral da saúde do paciente (passada/atual), que, algumas
vezes, é de grande relevância em termos de diagnóstico e plano de tratamento. A história médica passada
consiste em obter informações sobre possíveis doenças sistêmicas com alguma gravidade, avaliando,
também, condições de saúde geral da família (antecedentes hereditários), doenças infecciosas e tratamen-
tos medicamentosos e cirúrgicos que a criança recebeu. Também é importante para se relacionar
problemas locais momentâneos com sistêmicos passados, e problemas familiares de saúde relativos ao
comportamento da criança, assim como maiores precauções em casos especiais. Deve-se considerar as
fases pré-natal, natal e pós-natal da criança. Histórias médicas das fases pré-natal e natal proporcionam
indicações sobre várias alterações na formação dos dentes, por efeitos de medicamentos ou distúrbios
endócrinos. Sempre que surgir a suspeita de doenças herdadas, os parentes devem ser pesquisados, pois
pode haver alterações na evolução do diagnóstico, prognóstico e terapêutica. Deve-se valorizar o índice de
cárie familiar e os problemas ortodônticos de parentes diretos, orientando medidas preventivas. Na
história médica atual o dentista deve pesquisar problemas médicos atuais e se a criança faz uso de algum
medicamento, e caso sim, é indispensável que o dentista mantenha contato com o pediatra, para saber
detalhes a respeito da enfermidade presente e que orientarão sobre a conduta clínica a ser tomada. É
importante conhecer a condição da carteira de vacinação, o estado geral de saúde, se há algum tratamento
médico em andamento, problemas respiratórios ou outros que possam interferir no tratamento dentário.
Na pesquisa de hábitos, deve procurar saber sobre hábitos higiênicos (sobre a escovação), nocivos e
alimentares, como uso de mamadeiras noturnas, guloseimas etc.
Exame Clínico
É a etapa que sucede a identificação e a anamnese, com o objetivo de observar sinais presentes que,
junto aos sintomas, definirão o quadro clínico e a elaboração do provável diagnóstico. é feito com o uso dos
sentidos naturais humanos na análise dos sinais, definidos como: inspeção, palpação, percussão e
auscultação.
A inspeção é a avaliação visual sistemática do paciente, feita no primeiro contato, ao verificá-la na sala
de recepção, onde já pode observar qualquer sinal físico de alteração ou desvio do padrão normal, como no
jeito de andar, falar, olhar, agir e conversar. Dessa forma, observam-se os traços anatômicos, fisiológicos e
psíquicos da criança.
Na palpação se utiliza a sensação tátil no exame das estruturas normais, e na detecção e apuração das
estruturas anormais. Pode-se localizar gânglios (linfonodos) que indiquem lesões de origem dentária, ex.
A percussão é de uso bastante restrito na odontopediatria, pois pode desencadear sensação dolorosa, o
que é totalmente indesejável na relação profissional-paciente. Consiste da associação do contato físico ao
sentido auditivo, fundamentais na apreciação de sons produzidos em segmentos do corpo humano.

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A auscultação é uma manobra própria de condições específicas, como interpretações de alteração na
ATM ou crepitações na análise de fraturas.
O exame odontopediátrico deve ser o mais abrangente possível, e por isso, a atenção do profissional
deve estar voltada ao paciente infantil, no sentido global, avaliando-se as condições gerais da criança, até a
particularização da saúde dentária. Para isso, o exame clínico deve ser feita de forma sistemática e
uniforme, minimizando as possíveis negligências.
O exame clínico geral coleta informações sobre possíveis alterações sistêmicas, possibilitando oportuni-
dade de prevenção médico-odontológica. Consta da observação discreta à distância da criança, de maneira
conjuntural, avaliando postura, compleição física, movimentos involuntários e modo de caminhar. A
observação do biótipo da criança deve ser dirigida em tópicos: estatura/peso, movimentos, fala, mãos e
pele.
A estatura e o peso mantém relação direta com idade, dieta, características hereditárias, condições de
desenvolvimento e secreções endócrinas. Já movimentos anormais podem indicar fatores de eventuais
doenças sistêmicas ou bucais. A fala pode traduzir doenças infecciosas, alterações de inserções musculares,
deglutição atípica, anomalias de desenvolvimento (lábio leporino, ex.), e problemas relacionados à oclusão
e maus relacionamentos entre as bases ósseas e arcadas dentárias. As mãos orientam o profissional sobre o
estado emocional da criança, bem como caracteriza doenças sistêmicas por presença de ulcerações,
eventuais hábitos, como sucção digital, e pode mostrar alterações na tonalidade das unhas, compatível
com cardiopatia congênita. Na pele se avalia textura, tonalidade, pigmentação e cicatrizes. Ela mantém
uma relação de semelhança com a mucosa oral, e frequentemente doenças sistêmicas apresentam
manifestações clínicas em ambas.
O exame extrabucal é inicialmente dirigido à região de cabeça e pescoço, avaliando possíveis desvios da
normalidade e auxiliando o diagnóstico precoce de doenças sistêmicas ou bucais, o que torna o prognóstico
bastante favorável. A observação clínica deve estar voltada especialmente para a cabeça, os olhos, ouvidos,
nariz, pescoço e ATM.
Variações no tamanho, forma e assimetrias da cabeça, e paralisias de nervos cranianos podem revelar
doenças sistêmicas ou distúrbios relacionados às alterações bucais. Qualquer comprometimento de visão
deve ser anotado. Da mesma forma, distúrbios auditivos e relatos de tontura, que podem ter relação com
doenças sistêmicas ou bucais. A condição anatômica do nariz, possíveis obstruções e relatos de rinites e
sinusites alérgicas também devem ser anotados, e alterações na respiração bucal estabelecem princípios
para tratamento periodontal e ortodôntico. No pescoço é avaliado o sistema linfático, que fica comprome-
tido tanto em doenças sistêmicas como nas bucais, com sensibilidade anormal ou aumento ganglionar. Na
ATM, a palpação e auscultação são de grande importância. A palpação avalia a função, na região do
côndilo, bilateralmente, em posição de repouso, com os dentes em oclusão cerrada e abertura da boca em
várias posições. Os movimentos condilares devem deslizar suavemente, e a auscultação dos ruídos deve ser
devidamente registrada.
O exame clínico intrabucal sucede o extrabucal, e visa a interpretação dos possíveis desvios de normali-
dade instalados na cavidade bucal. Deve-se ter uma boa fonte de iluminação, e os materiais necessários são
espelho bucal infantil, sonda exploradora, pinça clínica, espátula de madeira, gaze, algodão, fio dental,
evidenciadores de placa e pasta profilática. Deve ser conduzida de forma padronizada, verificando,
também, tecidos moles, oclusão em desenvolvimento e anomalias dentárias eventualmente observadas.
A sequência do exame geralmente é: lábios, palato, orofaringe, soalho bucal, língua e periodonto.
O exame clínico dentário consiste da inspeção do órgão dentário de forma sistemática, disciplinada e
ordenada, avaliando cor, forma, tamanho e número, e identificando cada dente. Avalia-se, também, a
presença de erosão, abrasão e fraturas, a condição das restaurações presentes, mobilidade dentária,
relação de contato dos dentes e a evidência de lesões cariosas. Deve ser realizado após profilaxia, e
recomenda-se a avaliação por quadrantes, acompanhando a sistematização do diagrama dentário,
inspecionando cada dente de forma isolada. No mapeamento da cárie, o dente deve ser seco e bem
iluminado, utilizando-se espelho e sonda (atualmente se preconiza o uso da sonda da OMS). O uso irrestrito
da sonda exploradora de ponta afiada nas superfícies dentárias com mancha branca não deve ser realizado.
O exame da oclusão está relacionado com o processo dinâmico de desenvolvimento dentário e o padrão
de crescimento ósseo referente à faixa etária da criança, permitindo que o profissional intercepte e corrija
qualquer indício de anormalidade. De um modo geral, observa-se o perfil e a simetria facial, a linha média
dentária, a relação esquelética maxila/mandíbula, a posição dos lábios no perfil da porção inferior da face,
e a sequência de erupção.

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Na dentição decídua é importante observar os tipos de arcada, presença de espaços primatas, a relação
terminal do segundo molar decíduo, chave de caninos, sobressaliência e sobremordida e a presença de
mordida cruzada. Na dentição mista, verificam-se as relações molar e canina, a relação incisiva e a mordida
cruzada.
Algumas vezes, a identificação de desequilíbrios ortodônticos discrepantes indica a necessidade de
complementação ao exame clínico, com o auxílio de modelos de estudo e técnicas radiográficas específicas.
O odontopediatra deve trabalhar em conjunto com profissionais de áreas relacionadas à Ortodontia e
Ortopedia, que possam solucionar problemas de malocusão e problemas de crescimento e desenvolvimen-
to.

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Anestesia Local em Odontopediatria
A anestesia local tem sido um ótimo método auxiliar no tratamento dentário em crianças, por elimina-
ção de dor nos procedimentos, minimizando grande parte das dificuldades clínicas. É importante que, para
isso, seja praticada de forma indolor e bem aceita pelo paciente, através do preparo psicológico da criança,
conhecimentos específicos da anatomia, fisiologia e farmacologia, escolha do material adequado,
delicadeza e destreza do profissional e uma boa técnica.
Este tipo de anestesia apresenta diversas vantagens, como permitir que o paciente permaneça desperto
e cooperando; interferir pouco na fisiologia normal, podendo ser usada em pacientes relativamente
debilitados; baixa incidência de morbidade e baixa porcentagem de insucessos; técnicas não difíceis de
serem realizadas; sem despesa adicional para o paciente; e permitir que o paciente se alimente antes. Além
disso, não há contra indicações para pacientes com pouca idade, se o seu estado geral de saúde permitir.
Entretanto, apresenta algumas contraindicações, como pacientes alérgicos aos diferentes anestésicos
locais, deficientes mentais que não têm condições de cooperar, cirurgia oral maior que os limites da
anestesia local e presença de anomalias que dificultem ou impeçam a anestesia local.
Está indicada em todo e qualquer procedimento que possa provocar dor, levando em consideração que
o limiar de dor da criança e do adolescente é muito menor que no adulto, e que o “suportar a dor” trás
consequências indesejáveis, pois a criança irá associar ansiedade e medo ao tratamento.
Portanto, a anestesia é muito importante, e quando bem-sucedida, permite que o tratamento seja
concluído mais rápido, com melhor qualidade e cooperação e tranquilidade da criança.
Anestésicos Locais
São fármacos utilizados para bloquear temporariamente a condução nervosa, levando à perda ou
diminuição da dor. Ao escolher usar este recurso, o CD passa a ser responsável por todas as implicações
que venham a surgir durante ou após o procedimento, e por isso, o profissional deve conhecer a
farmacologia dos anestésicos locais.
Para que tenham ação terapêutica satisfatória, os AL precisam apresentar alguns requisitos, como:
especificidade de ação, reversibilidade, solubilidade em água e lipídios, potência e baixa toxicidade, efeito
rápido e duração suficiente, não deve produzir reações alérgicas ou idiossincrásicas, estabilidade, estéril ou
de fácil esterilização e custo relativamente baixo.
A estrutura química dos AL é constituída de uma porção hidrofílica (amina secundária ou terciária) e
uma porção lipofílica (núcleo aromático) que devem estar em equilíbrio relativo para que seja capaz de se
difundir nos tecidos e penetrar na fibra ou tronco nervoso. Essas duas porções devem estar unidas por uma
cadeia intermediária, que pode ser do tipo éster ou amida, que é rompida para que o metabolismo do
anestésico se inicie. O anestésico ideal deve ter grande potência e baixa toxicidade.
Os anestésicos locais podem ser classificados em dois grupos: tipo éster e tipo amida. Essa diferença é
importante do ponto de vista da biotransformação e das reações alérgicas. Os anestésicos do tipo éster
formam soluções menos estáveis, e tem como representantes mais conhecidos os compostos derivados do
ácido paraminobenzóico (PABA), ou seja, a procaína e a tetracaína.
Já os anestésicos do tipo amida apresentam maior estabilidade à esterilização e menor frequência de
reações alérgicas, sendo representados por lidocaína, prilocaína e mepivacaína. Ambos apresentam mesma
capacidade de penetração e efetividade clínica, porém, a lidocaína tem efeito muito curto quando não está
associada à vasoconstritores. A prilocaína é reabsorvida mais lentamente, dependendo menos da
associação com vasoconstritor, e é rapidamente degradada pelo fígado, com reações de intoxicação de
curta duração. A mepivacaína também apresenta reabsorção lenta, mas sua metabolização não é tão
rápida quanto a prilocaína.
Os AL agem por bloqueio temporário da condução nervosa, estabilizando a membrana da fibra e
impedindo sua despolarização e consequente propagação do impulso. Eles são bases alcalinas que,
combinadas com ácidos, formam sais, que são usados por serem estáveis e hidrossolúveis (penetra nos
tecidos). São formados pela associação de uma base fraca com um ácido forte, que se dissociam quando o
pH do meio está acima de 7, liberando a base alcalina, que apresenta maior lipossolubilidade, penetrando
no nervo. Os AL podem ser encontrados nos tecidos na forma ionizada, e na forma não-ionizada. O efeito
anestésico é produzido pela forma ionizada, e a quantidade presente dessa forma dependerá da constante
de ionização (pKa) do anestésico e do pH tecidual no local da injeção. Na inflamação, o pH do meio
apresenta um caráter ácido, dificultando a dissociação do sal anestésico e evitando a liberação da base
alcalina, e sua penetração na fibra.

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Para obtenção de uma anestesia adequada deve-se considerar o tipo do nervo e o seu diâmetro e
tamanho. Nervos amielínicos são bloqueados com menores concentrações e em menos tempo do que os
mielínicos. Do mesmo modo, as pequenas fibras sensitivas em relação às fibras motoras grandes.
Inicialmente há perda de sensibilidade dolorosa, e depois ao frio, calor, tato e pressão, podendo variar a
ordem.
Alguns fatores podem interferir na instalação e manutenção dos efeitos desejados do anestésico, como
o pH tecidual muito ácido ou muito alcalino; a diluição excessiva por sangue ou fluidos teciduais, que deve
ser evitada com a deposição da solução o mais próximo possível do nervo desejado; ou a absorção rápida
pela circulação.
As crianças apresentam proporções anatômicas e características fisiológicas próprias para suas idades,
afetando a sua resposta para uma dose específica de anestésico local. As dimensões anatômicas são
reduzidas e mais próximas, havendo necessidade de reduzir o nível de anestésico, sem alterar a concentra-
ção básica para o bloqueio efetivo da condução nervosa. Deve-se procurar utilizar o menor volume de
concentração necessário, que vai variar em função do tipo de intervenção, do nível e sensibilidade do
paciente e da presença e intensidade do processo inflamatório.
A solução anestésica deve ser injetada lentamente, pois a velocidade é um fator na rapidez da absorção
do medicamento e nas reações tóxicas subsequentes. A vascularização da área também deve ser avaliada,
pois áreas muito vascularizadas têm absorção mais rápida e aumento da possibilidade de efeito tóxico.
Os testes-padrão em Odontopediatria não contêm recomendações específicas para a dose máxima
permitida dos anestésicos locais em crianças. Mas, existem algumas regras que calculam as doses
pediátricas como uma fração da dose do adulto, servindo apenas como guia para determinar aproximada-
mente a dose da criança. Ex: fórmula de Young (crianças entre 1 e 12 anos):

Fórmula de Clark:

A dose empregada deve ser baseada na experiência clínica e no conhecimento da anatomia aplicada,
fisiologia, farmacologia e anestesiologia.
A toxicidade compreende as manifestações decorrentes de dose ou administração excessiva de uma
droga. Depende da concentração atingida na corrente sanguínea e do grau da dose de dependência,
podendo afetar SNC, respiratório e circulatório. O efeito tóxico dos anestésicos pode ser causando tanto
pelo sal anestésico, como pelo vasoconstritor. Os níveis tóxicos variam de um indivíduo para o outro, e num
mesmo indivíduo em consultas diferentes. Dependem de alguns fatores como a condição física do paciente
no momento da injeção, condição emocional do paciente, rapidez da injeção, via de administração
(intravascular acidental) e quantidade da droga utilizada. Crianças, idosos e pacientes debilitados
apresentam reações tóxicas com níveis mais baixos de droga.
Essas reações indesejáveis podem ser prevenidas por meio de alguns cuidados, como: avaliar adequa-
damente as condições do paciente; selecionar o anestésico mais indicado; manter a dose total do
anestésico local bem abaixo da dose máxima permitida; reduzir a dose total máxima de anestésico para 1/3
quando se tratar de criança debilitada ou pré-medicada; empregar vasoconstritor quando não houver
contraindicação, a fim de diminuir a absorção da droga; evitar a injeção intravascular acidental; injetar
lentamente a solução anestésica, para evitar níveis sanguíneos excessivos.
Os anestésicos locais mais usados produzem, de início, o estímulo do SNC, e em seguida, advém propor-
cionalmente a depressão do SNC. Os sistemas tóxicos devem ser rapidamente reconhecidos e, para isso, o
profissional precisará estar atento ao paciente durante e após a aplicação da solução anestésica. Havendo
qualquer reação indesejável, deve-se suspender a injeção e retirar a agulha. A grande parte das manifesta-
ções tóxicas é imediata, leve e transitória, não exigindo tratamento específico. Quando o grau de estímulo
for elevado, deve ser administrada lentamente uma injeção endovenosa de barbitúrico, e em casos de
convulsão, cloreto de succilcolina (relaxante da musculatura esquelética, que controlará a convulsão, mas
também paralisará os músculos da respiração). Não sendo atendido na fase inicial do estímulo, o paciente
passa à fase de depressão, que exigirá medidas de ressucitação, onde a primeira é a oxigenação,
simultaneamente a verificação da condição cardíaca. Geralmente a oxigenação é suficiente até ocorrer a
biotransformação da droga.

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A associação de vasoconstritores aos anestésicos retarda a absorção do anestésico local, trazendo
vantagens como a redução da toxicidade do anestésico, aumento da duração, possibilita o emprego de
menores volumes de anestésico e aumenta a eficácia das soluções anestésicas.
Os vasoconstritores usados em odontologia podem ser obtidos sinteticamente, sendo a epinefrina e
norepinefrina sintetizadas pelo próprio organismo. São usados em pequenas quantidades, interferindo
apenas nas arteríolas na proximidade da injeção. Entretanto, ele geralmente é o responsável pelos efeitos
colaterais indesejáveis, tanto pela sua origem (catecolaminas), pela sua alta concentração, como por
injeções intravasculares acidentais. A dose do vasoconstritor deve ser calculada cuidadosamente, a fim de
evitar efeitos sistêmicos. Deve-se considerar também a condição emocional do paciente no momento da
intervenção, que interfere na produção de catecolaminas endógenas. A sua escolha deve ser baseada em
três aspectos: toxicidade aguda do vasoconstritor, margem entre dose terapêutica e a dose letal e os
efeitos colaterais. Atualmente os mais usados são a adrenalina, noradrenalina, octapressina e fenilefrina.
A adrenalina é um vasoconstritor potente, com concentração ideal em torno de 1.200.000 mI. Sua
toxicidade sistêmica é baixa, com poucas reações, desde que sejam respeitadas a dose e a forma de
administração. É contraindicada para cardiopatas e hipertireoideos.
A noradrenalina apresenta menos atividade vasoconstritora e menos duração de efeito quando compa-
rada a adrenalina. É contraindicada para hipertireoideos, e não deve ser usadas em volumes muito grandes,
pois pode causar escaras nos tecidos.
A octapressina é um polipeptídeo sintetizado a partir da vasopressina (hormônio antidiurético), que vem
substituindo os vasoconstritores adrenérgicos, desde que esteja associado a um anestésico de base forte.
Eliminou-se grande parte dos efeitos colaterais hipertensivos e hiperglicêmicos indesejáveis das catecola-
minas, sendo indicado principalmente para crianças, idosos, hipertensos e diabéticos.
A fenilefrina tem atividade vasoconstritora periférica inferior à da adrenalina, e não tem demonstrado
alterações cardíacas indesejáveis.
A margem de segurança dos anestésicos locais é muito baixa em crianças pequenas, e por isso, é mais
prudente o uso de vasoconstritor, reduzindo a quantidade da droga. A primeira opção é lidocaína 2% com
epinefrina 1:100.000; depois mepivacaína 2% com epinefrina 1:100.000; e caso não possa usar mepivacaí-
na, usar prilocaína 3% com felipressina, devendo ser evitada em anêmicos, pelo risco de metamoglobine-
mia.
O tratamento dentário sem dor provoca reação favorável, estabelecendo um fator de otimismo. Para
isso, deve-se prepara a criança psicologicamente, ou a anestesia poderá ser um momento desagradável e
difícil. Esse preparo se inicia na anamnese, perguntando se a criança já foi anestesiada, e para cada
resposta haverá uma conduta diferente. Recomenda-se iniciar o tratamento com intervenções que não
necessitem de anestesia, a fim de conquistar a confiança da criança e de seus responsáveis, que será
conseguida quando a criança perceber que o CD não mente, explicando todo o tratamento de forma que
ela compreenda, e tirando todas as dúvidas com respostas convincentes. É preciso prestar atenção nos
sinais de medo e tensão, onde a criança tentará postergar o tratamento. Nesses casos, convém parar os
trabalhos, procurar saber o que está acontecendo e tranquilizar novamente o paciente.
As explicações sobre o procedimento não são iguais, e vão variar de acordo com a idade da criança. Para
crianças muito novas, usamos uma explicação mais curta e com palavras mais simples, pois seu tempo de
concentração e vocabulário são limitados. A explicação não deve conter palavras ou expressões que
assustem, enganem ou despertem alguma preocupação na criança. Deve-se falar, por exemplo, “se você
sentir alguma coisa, levante a mão que eu paro”, pois não induz tensão ou dor. Para crianças maiores e
adolescentes, deve ser dada uma explicação mais realista da necessidade e vantagem de se usar a
anestesia, ou ainda fazer uma pergunta como sugestão, com o objetivo de que ela mesmo opte pela
anestesia, levando sua opinião em consideração, e induzindo a cooperação.
É importante que se estabeleça um código de confiança entre o profissional e a criança, permitindo que
ela manifeste desconforto, por qualquer motivo. Caso contrário, ela utilizará o choro como manifestação
de desconforto, e este deve ser evitado ao máximo, permitindo um ambiente tranquilo e sem tensão para a
criança. Levando em consideração que a criança vai ao dentista de tempos em tempos, a explicação da
anestesia e do tratamento deve ser sempre repetida. Um erro cometido por CDs, é o silêncio na hora da
anestesia. Recomenda-se continuar falando, para distrair e relaxar a criança. Os sintomas da anestesia
também precisam ser explicados, como formigamento, crescimento, adormecimento ou endurecimento da
região anestesiada, lembrando que é passageiro. Lembrar que o CD não deve exibir a agulha nem antes,
nem depois do procedimento, pois elas são geradoras de ansiedade/dor.

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Nos casos de crianças que já passaram por experiências anteriores negativas, deve ser coletado o maior
número de informações possíveis relativas ao tratamento anterior, para planejar o tipo de abordagem. Essa
criança tende a ser mais desconfiada e a testar muito mais o profissional. O primeiro contato deve ser o
mais agradável possível, e é necessário usar mais tempo para que ela seja preparada de forma gradual e
mais lenta. O CD deve estabelecer um canal de comunicação direto com a criança, para que ela diga o que
não gostou no atendimento passado, e o que ela gostaria que acontecesse nesse. Respeitando-se a ética,
pode comparar a sua conduta e o seu consultório com o outro que ela conheceu. Para a anestesia local,
deve-se utilizar a maneira mais apropriada para aplicar a técnica, considerando a criança e respeitando
seus medos e fantasias, a fim de, aos poucos, eliminá-los.
Técnicas de Anestesia Local em Odontopediatria
A anestesia local em odontopediatria é semelhante à do adulto, sofrendo algumas modificações em
razão de algumas peculiaridades das crianças. O osso mais poroso e menos calcificado facilita a difusão do
anestésico, resultando em boa anestesia em menos tempo. A ação efetiva depende muito da técnica
precisa, que visa depositar a solução o mais próximo possível da inervação desejada. Esta deverá ser
escolhida em função da intervenção clínica a ser realizada.
A posição correta do paciente e do operador facilitará o emprego da técnica anestésica. Para a maxila, o
encosto da cadeira formará um ângulo de aproximadamente 150 com o assento, cando a maxila quase
perpendicular ao solo. Para a mandíbula, o ângulo encosto-assento deverá estar por volta de 110 , e a
mandíbula paralela ao solo. O paciente deverá estar sempre à frente e à direita do profissional, e a altura
da cadeira será ajustada de tal forma que a região anestesiada encontre-se no mesmo plano do cotovelo do
operador, que deve estar com as mãos apoiadas, para permitir movimentos mais precisos e seguros.
Anestesia tópica
É considerada o primeiro passo de uma boa técnica anestésica, contribuindo para minimizar a dor da
puntura da agulha. Estão indicadas antes de qualquer tipo de anestesia local em mucosa, onde a ação
anestésica ocorre por simples processo de absorção. Apresenta ação farmacológica e psicológica, agindo
como um recurso a mais para o sucesso da anestesia. Deve-se dar preferência aos anestésicos tópicos em
forma de gel ou pomada, evitando o spray.o seu uso sobre lesões ulceradas ou erosões não é recomenda-
do, pelo maior poder de absorção da área, além de que esses fármacos são mais tóxicos que os injetáveis.
Também são indicados para a remoção de dentes decíduos com raízes totalmente reabsorvidas. A técnica
consiste em secar a mucosa (a saliva dilui e age como isolante), depositar o anestésico na mucosa durante
um tempo mínimo de 3 minutos.
Anestesia Infiltrativa
Também chamada de terminal ou periférica, consiste no depósito da solução anestésica em local
definido, objetivando alcançar um ramo nervoso. Está indicada tanto para dentes decíduos como
permanentes, para todos os dentes superiores, e os dentes anteriores inferiores. Em alguns casos pode ser
indicada para molares decíduos, desde que os primeiros molares permanentes não tenham erupcionado,
pois isso indica maior calcificação óssea da mandíbula.
O lábio do paciente deve ser esticado, de modo que a mucosa fique bem distendida. Insere-se a agulha
na região do fundo do vestíbulo e traciona-se o lábio contra o bisel da agulha, aprofundando-a delicada-
mente. Durante o trajeto o anestésico vai sendo injetado lentamente, até que a ponta da agulha chegue na
região apical do dente que se quer anestesiar, onde a maior porção do conteúdo do tubete vai ser
depositado. Toma-se cuidado para não atingir o periósteo, pois é extremamente sensível. O anestésico
deve ser injetado lentamente e com pouca pressão, para dar tempo aos tecidos se expandirem e para que
o vasoconstritor atue, evitando absorção rápida e efeitos tóxicos.
Anestesia Interseptal ou Interpapilar
Consiste numa variação da técnica infiltrativa, com o objetivo de anestesiar as mucosas lingual e palatal
sem provocar dor decorrente de mais uma puntura da agulha. É indicada em geral para crianças, sempre
que houver necessidade de anestesiar por lingual ou palatal.
Inicialmente, realiza-se a anestesia infiltrativa vestibular, e introduz a agulha na região da papila gengival
vestibular já anestesiada, paralela ao plano oclusal, penetrando lentamente de vestibular para lingual, da
região anestesiada, para não anestesiada. Deve-se desviar a agulha da crista óssea alveolar, deixando-a

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caminhar em tecido mole. Quando as papilas interdental e lingual estiverem anestesiadas, faz-se a
anestesia dessa região, introduzindo a agulha num local agora já anestesiado.
Anestesia regional pterigomandibular
Faz o controle da sensibilidade de molares inferiores, inervados pelo n. dentário inferior, devido a
espessura e condensação da cortical óssea alveolar dessa região. Está indicada para intervenções em todos
os dentes inferiores decíduos e permanentes, intervenções no tecido ósseo e ao mucoso da mandíbula, e
no lábio inferior. É um procedimento eficaz e duradouro, desde que haja conhecimento da posição e a
relação das várias formações anatômicas.
As estruturas anatômicas que devem ser observadas são:
 Prega molar ou ligamento pterigomandibular: é uma faixa muscular claramente perceptível,
que une o último molar superior ao último molar inferior. Atrás dessa prega fica o músculo pte-
rigoideo medial, que deve ser evitado, insinuando a agulha para fora da prega molar, em dire-
ção ao osso.
 Linha oblíqua externa ou borda anterior do ramo ascendente: situada pra fora da prega molar.
Ao se colocar o dedo na face interna do ramo, lateral ao último molar, sentimos uma depressão,
a fossa retromolar, limitada externamente pela linha oblíqua externa, e internamente pela linha
oblíqua interna, que raramente está presente nas crianças.
 Superfície oclusal dos molares inferiores: é referência para se localizar a altura do ponto de
punção, feita com o auxílio do dedo indicado, palpando a linha oblíqua externa. O local de pene-
tração é 1 cm acima da linha oclusal.
A técnica é idêntica para crianças e adultos, sofrendo algumas variações anatômicas que levarão a
pequenas adaptações. O ramo ascendente da mandíbula da criança é mais curto em relação ao ramo
horizontal que no adulto; o diâmetro anteroposterior do ramo é menor; quanto mais jovem a criança, mais
aberto é o ângulo goníaco; a linha oblíqua interna raramente está presente; a espinha de spix ou língula é
mais baixa quanto mais jovem for a criança, e com a idade, ela recua e sobe. Portanto, a anestesia
pterigomandibular na criança deverá ser realizada numa posição ligeiramente mais baixa e mais posteriori-
zada do que no adulto.
A anestesia pterigomandibular pode ser executada por meio de dois métodos: o indireto (técnica das
três posições da agulha), e o direto. A técnica direta em geral não anestesia o nervo bucal, enquanto que na
indireta geralmente é anestesiado por infiltração terminal na prega mucosa do dente respectivo. O método
indireto permite melhor orientação através das estruturas anatômicas, além de evitar a penetração em
tecido muscular.
Acidentes e complicações locais
Em Odontopediatria, felizmente são raros os acidentes e as complicações decorrentes da anestesia,
quando esta for bem conduzida. Para isso, o profissional deve ter conhecimento dos sinais e sintomas que
possam vir a ocorrer com seu emprego, bem como controlar e restabelecer a normalidade em cada
situação. A anamnese é fundamental, pois através de avaliação cuidadosa, esses efeitos podem ser
evitados. A posição do paciente no momento da anestesia é um fator que pode influenciar na manifestação
do acidente. Ele deve estar em posição confortável, semirreclinado, evitando a posição ereta.
Alguns exemplos são: úlcera traumática, injeção no músculo, infecção, traumatismo, injeção intravascu-
lar, equimose, trismo, escaras, paralisia temporária, fratura da agulha, reações alérgicas e isquemia da pele
e face.

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Sedação e Anestesia Geral
Sedação inalatória com a mistura oxigênio/óxido nitroso
O tratamento dentário pode gerar dor e ansiedade. O uso de anestésicos locais, boas técnicas de
condicionamento, equipamentos modernos e habilidade técnica possibilitam pouco ou quase nenhum
desconforto ou medo para o paciente. Os métodos de controle da dor e ansiedade podem ser não-
farmacológicos ou farmacológicos. Para a maioria dos pacientes, o condicionamento psicológico associado
à anestesia local são suficientes para fazer o tratamento. Para pacientes extremamente ansiosos, com
deficiências mentais e/ou físicas ou com comprometimentos sistêmicos, os recursos de sedação e anestesia
geral estão indicados.
De acordo com as novas normas da Academia Americana de Odontopediatria, há três graus de sedação:
a sedação mínima, que é um estado induzido por drogas, onde o paciente responde normalmente a
comandos verbais, suas funções cognitivas e de coordenação parecem prejudicadas, e as funções
respiratória e cardiovascular não são afetadas; a sedação moderada, um estado de depressão da
consciência onde o paciente responde prontamente a comandos verbais, e as funções respiratória e
cardiovascular são preservadas; e a sedação profunda, um estado controlado de depressão de consciência,
que pode estar acompanhado de perda parcial dos reflexos protetores, incluindo a incapacidade de
responder prontamente a estímulos físicos e comando verbal. A função respiratória pode estar comprome-
tida, e a cardiovascular geralmente é preservada.
A técnica de sedação por Óxido Nitroso foi descoberta por Horace Wells, e atualmente é uma técnica
muito mais segura, pois este é associado ao oxigênio, com a finalidade principal de sedação (efeito
relaxante), e não com o objetivo anestésico, que é obtido com o uso associado do anestésico local. Sabe-se
que uma concentração de 30% de óxido nitroso para 70% de oxigênio são suficientes para se obter o efeito
desejado, tornando-se um coadjuvante do condicionamento psicológico, pois o paciente encontra-se
consciente e com sugestibilidade e cooperação aumentada, além de minimizar o desconforto físico e a dor,
aumentar a tolerância para procedimentos mais longos e reduzir o reflexo de vômito.

Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4


Analgesia Excitação Anestesia Cirúrgica (geral) Parada respiratória
Plano 1 Plano 2 Plano 3 1 2 3 4
Analgesia Relativa Analgesia
total
De acordo com este quadro, a sedação por óxido nitroso é representada pelo estágio 1, planos 1 e 2,
quanto que, na anestesia geral, o médico anestesista visa atingir o estágio 3 o mais rápido possível. A
anestesia geral inviabiliza o emprego de técnicas de condicionamento psicológico, pois o paciente está
inconsciente.
Por definição, o óxido nitroso é um anestésico geral. No entanto, é de baixa potência, e geralmente
necessita estar associado a outros fármacos para induzir à anestesia geral. Nas concentrações preconiza-
das, seu efeito principal é a redução da ansiedade. É administrado via inalatória.
As vantagens dessa técnica são a rápida indução (2 a 3 min), flexibilidade (profundidade da sedação
pode ser alterada mudando a concentração), rápida eliminação/reversibilidade (o gás não é metabolizado
pelo organismo), possibilidade de ser gradativamente dosado e baixo risco (reações alérgicas).
Por outro lado, apresenta algumas desvantagens, como a necessidade de cooperação e aceitação da
máscara nasal, o efeito individual variável (necessidade de concentração determinada individualmente) e o
risco ocupacional para o clínico e pessoal auxiliar pela exposição crônica, em baixas concentrações, do gás,
que pode provocar a inativação da cobalamina, com consequente interferência na formação do DNA
levando ao risco de fetotoxicidade, distúrbios neurológicos e anemia megaloblástica.
Esta técnica é indicada para pacientes odontofóbicos, imaturos e/ou hiperativos, com distúrbios físicos
e/ou mentais, com reflexo de ânsia pronunciado ou com comprometimento sistêmico que não suporte um
pico de hipertensão transcirúrgica devido a estresse e/ou vasoconstritores.
Não existem contraindicações absolutas para o uso da sedação por O2/N2O, desde que tenha uma
concentração mínima de 20% de oxigênio (geralmente usa-se 43% de óxido nitroso). Algumas contraindica-
ções relativas são: pacientes com problemas comportamentais severos incapazes de usar a máscara nasal,
pacientes ASA IV ou V, obstrução das vias aéreas superiores, crianças com distúrbios no ouvido médio,
pacientes psicóticos ou que fazem uso de medicação psicotrópica, doenças pulmonares crônicas

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obstrutivas, doenças neuromusculares, pacientes com anemia, pacientes que fazem uso da droga sulfado
de bleomicina e gravidez (evitar no primeiro trimestre).
Apresenta equipamento próprio para este tipo de sedação, composto por fluxômetro (dispensador de
gases), torpedos de oxigênio e óxido nitroso, mangueiras e máscara nasal. Este equipamento possui
dispositivos de segurança indispensáveis, como:
 Fornecimento contínuo de oxigênio de no mínimo 30-50%;
 Não fornecimento de gás de óxido nitroso caso o oxigênio não seja fornecido conjuntamente;
 Válvulas de emergência que quando acionadas fornecem o fluxo de O2 sob pressão ou entrada
direto do ar atmosférico;
 Máscara nasal visando o desempedimento bucal e com sistema de exaustão do gás da sala de
consulta;
 Válvula na máscara nasal, impedindo o retorno do gás expirado e o aumento indesejado da con-
centração de CO2;
 Oferta automática, ao se ligar o equipamento, de 3 litros de oxigênio por minuto, mesmo que os
controles do fluxômetro estejam desligados.
Os equipamentos deverão ser vistoriados pelo profissional antes de cada consulta em que ele vá ser
utilizado, fazendo observação e controle do conteúdo dos cilindros de oxigênio e óxido nitroso, controle de
vazamentos do equipamento e verificar o funcionamento dos dispositivos de segurança.
Após a colocação da máscara nasal, inicia-se a técnica, onde o gás de óxido nitroso é empregado em
pequenas concentrações, de forma lenta e gradual, para atingir e manter o estágio correto da sedação. A
técnica apresenta quatro fases: pré-oxigenação, fase de indução, fase de manutenção e pós-oxigenação.
A concentração utilizada deve ser suficiente para produzir sedação, mas não o bastante para compro-
meter os reflexos protetores do paciente. Os principais sinais que o paciente apresenta são seguir
instruções, responder a perguntas, ficar sonolento e relaxado, mas não dormir, taxa respiratória normal,
reflexo de ânsia reduzido, movimentos dos membros reduzidos, movimentos palpebrais reduzidos e
analgesia de tecidos moles. Os principais sintomas são relaxamento mental, sensação de calor, parestesia e
formigamento dos lábios, mãos e pés, perda da noção de tempo e espaço, sons parecem distantes e
sonhos.
O efeito colateral mais comum é a náusea em 1 a 3% dos casos, sendo mais comum em pacientes
pediátricos, e ocorre geralmente por concentração de N2O em níveis acima do ideal e administração
prolongada do gás. Também pode ocorrer hipóxia de difusão, quando há liberação rápida do N2O da
corrente sanguínea para o alvéolo, levando à dor de cabeça, e pode ser evitando administrando 100% de O.
Durante a aplicação da técnica deve-se avaliar as condições físicas do paciente, observando cor da pele
e mucosas, movimentos respiratórios, pressão sanguínea e pulso, além de se recomendar a monitorização
da saturação de oxigênio.
Após a consulta inicial, onde verifica-se a indicação do paciente para sedação, explica o procedimento
aos pais, faz a anamnese completa, demonstração da máscara nasal e condicionamento, inicia-se o
tratamento odontológico propriamente dito. É obrigatória a autorização por escrito do responsável legal. O
tratamento deve ser feito na fase de manutenção, onde o limiar de dor encontra-se aumentado. Não há
impedimento para o uso do isolamento absoluto, mas, como a máscara se apoia no lábio superior, pode
dificultar procedimentos na região de dentes anteriores superiores. Geralmente há associação com
anestesia local, e a sedação está indicada rotineiramente, mas não de recomenda a associação de fármacos
depressores do SNC em ambiente ambulatorial. Estão aptos a utilizar a técnica de sedação com a mistura
de O2/N2O apenas os profissionais que realizarem um curso de capacitação de 96 horas ou que comprova-
rem utilizar a técnica a mais de 5 anos. Esta é uma forma muito boa de viabilizar o tratamento odontológico
apresentando efeito positivo e duradouro, já que é associada a condicionamento psicológico.
Anestesia Geral
É o tipo de conduta que deverá ser utilizado sempre que houver o fracasso no manejo do paciente ou
quando, mesmo com o uso de recursos farmacológicos, o tratamento não for aceito pelo paciente. É
importante lembrar que os problemas odontológicos não se resumem a uma sessão, e por isso, o mais
importante é que se consiga o condicionamento psicológico do paciente para tratamentos futuros, e que
haja a promoção procedimentos preventivos. Estudos mostram que pacientes que necessitaram ser tratos
com anestesia geral/sedação são mai vulneráveis a problemas odontológicos futuros. A anestesia geral tem
um importante papel na odontologia, desde que haja real necessidade, e não por ser um meio mais “fácil”.

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O profissional deverá fazer a história clínica, exame físico e exames laboratoriais para avaliar a saúde do
paciente. Mesmo pacientes com boa saúde podem apresentar problemas que devem ser conhecidos pelo
anestesista, tais como problemas respiratórios, história anestésica, refluxo gástrico, entre outros. Quem
deve determinar se o paciente está apto ou não para ser submetido a anestesia geral é o anestesista. No
caso do tratamento odontológico, esses pacientes deverão ser classificados como ASA I (pacientes sem
alteração nenhuma) ou II (pacientes com transtornos sistêmicos leves ou moderados, causados pela
condição que será tratada cirurgicamente ou por outro fenômeno fisiopatológico).
Antes de a anestesia geral ser indicada, devemos considerar se realmente não há e não poderá ser
obtida a colaboração do paciente. Está indicada para pacientes com necessidades especiais, crianças
rebeldes (extremamente não-cooperativas), crianças de pouca idade (tratamento extenso sem a
compreensão do mesmo), pacientes alérgicos aos anestésicos locais e pacientes hemofílicos.
Alguns cuidados pré-cirúrgicos devem ser tomados em relação aos pais ou responsáveis, ao hospital, ao
anestesista e ao próprio paciente e ao auxiliar.
Em relação aos pais deve haver explicação sobre o trabalho a ser realizado, o porquê da indicação da
anestesia geral, os riscos, tempo de duração, custos e esclarecimentos sobre a dieta pré e pós-cirúrgica.
Algumas vezes, o esclarecimento sobre a necessidade de exames laboratoriais pode fazer com os pais
colaborem na tentativa de fazer o tratamento no consultório. Também deve deixar claro que algumas
vezes, mesmo com o máximo empenho profissional, nem sempre se pode obter o restabelecimento
completo da dentição como seria possível em condições habituais.
Quanto ao hospital, deve ser bem equipado do ponto de vista odontológico, ser bem conceituado no
meio médico e ter equipes de infraestrutura e ser capaz de solucionar as possíveis emergências. É
necessário conhecer o funcionamento burocrático do hospital, bem como do centro cirúrgico. O equipa-
mento disponível deve ser verificado ver se há necessidade de adaptações. A posição de trabalho do
profissional não será semelhante à usual.
O anestesista deverá estar habituado à anestesia pediátrica, e se possível, familiarizado com o trabalho
odontológico, havendo integração entre os profissionais. O CD deverá levar o seu próprio pessoal auxiliar,
por estar acostumado com instrumentais, medicamentos e materiais. O auxiliar deverá ter conhecimento
da sala cirúrgica e seu funcionamento.
Para o paciente, deverá ser feito o interrogatório familiar, contendo informações como as doenças
familiares, enfermidades associadas, alergias, medicamentos em uso e cirurgias anteriores. A avaliação do
paciente deverá ser feita pelo pediatra e encaminhada para nós. Os exames geralmente pedidos são
hemograma, coagulograma e eletrocardiograma. Exames laboratoriais mais específicos podem ser pedidos
de acordo com a necessidade do paciente. Outro exame complementar que deve ser feito é a radiografia
panorâmica, principalmente para pacientes com absoluta falta de colaboração. O paciente deve apresentar
nível de hemoglobina normal, não ter nenhum processo respiratório agudo nas últimas 48 horas, não ter
sido vacinado nos últimos 20 dias, e ficar em jejum (12h para sólidos, e no mínimo 6h para líquidos).
O paciente deverá ser visitado pelo anestesista antes de ser encaminhado ao centro cirúrgico, para troca
de informações com o responsável. Deverá ser feito exame clínico apurado, avaliando PA, pulso,
temperatura e exames laboratoriais, para traçar um perfil das condições orgânicas do paciente, e decidir se
há indicação ou não de medicação pré-anestésica (geralmente benzodiazepínicos, anticolinérgicos ou anti-
histamínicos), a fim de evitar a tensão emocional e proporcionar um campo de trabalho seco e a
diminuição da quantidade de anestésico utilizado, obtendo um despertar mais rápido. O paciente deverá
permanecer pouco tempo no hospital.
No centro cirúrgico, o equipamento deve ser testado previamente. O cirurgião-dentista deverá levar
todo material de uso no consultório, e o instrumental deve ser disposto na ordem de trabalho estabelecida
pelo profissional, mantendo a organização até o fim da cirurgia, evitando perda de tempo. O tratamento
visa a cura definitiva, iniciando pelo quadrante de maior dificuldade, e seguindo para o de menor
dificuldade, e iniciando sempre pela queixa principal, pois, caso haja algum problema, o mais importando já
foi feito.
Anestésicos Gerais
Podem ser divididos em inalatórios e endovenosos. Os inalatórios, por sua vez, podem ser divididos em
gasosos e líquido orgânicos voláteis. O mais utilizado é o óxido nitroso, porém é pouco potente e não
apresenta atividade relaxante muscular. Por ser um potente analgésico, é usado em combinação com
outros anestésicos. O anestésico volátil de referência é o halotamo.

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Os endovenosos mais comumente utilizados são os barbitúricos, com indução rápida e agradável da
anestesia, sendo bastante utilizada para induzir o paciente ao sono; os benzodiazepínicos, com proprieda-
des sedativas, ansiolíticas, anticonvulsivantes e relaxante muscular; e o propofol, bastante usado para
indução e manutenção da anestesia, cuja maior vantagem é o não comprometimento da função hepática e
renal, e proporciona ação anestésica mais rápida.
A intubação da traqueia oferece muitas vantagens, entre elas a garantia da via aérea estar sempre
desobstruída e regulação da respiração à distância pelo anestesista. O tipo de intubação mais usado e
recomendado é o nasotraqueal, por deixar a cavidade bucal livre. Em casos de adenoides hipertrofiadas,
pode ser recomendada a intubação orotraqueal. Após a intubação, coloca-se uma gaze cativa (gaze com
fio) úmida na região de glote, para maior segurança contra a aspiração de detritos. Os olhos do paciente
devem ser fechados para prevenir uma possível ulceração na córnea pela falta de lubrificação.
Durante o tratamento, é colocado um abridor de boca tipo tesoura, com o cuidado de não abrir muito a
boca do paciente, pois a musculatura está relaxada e pode haver luxação da ATM, resultando em pós-
operatório doloroso. O uso do isolamento absoluto é recomendado sempre que possível, com o grampo 14
de Ivory, que apresenta boa adaptação e dificilmente se desloca, mesmo com destruição coronária. O
isolamento da arcada superior é total, e o da arcada inferior é por hemiarcadas. Primeiro deve ser feito
tratamentos endodônticos, dentística, próteses, e por último, cirurgias necessárias e as suturas com fios
reabsorvíveis. O médico anestesista deverá ser avisado, durante o procedimento, quanto tempo ainda
falta, para que, quando tiver acabando, ele já vá revertendo a anestesia, para um despertar mais rápido.
Terminado o tratamento, retira-se a gaze cativa, e o paciente passa aos cuidados do médico anestesista.
A extubação é feita quando os reflexos e os sinais de atividade muscular estiverem presentes, e é
essencial que a traqueia e a faringe estejam limpas de secreções. Antes da retirada, administra-se oxigênio
ao paciente, para que fique com uma reserva nos pulmões.
Após a cirurgia, o paciente é transferido da mesa cirúrgica para a maca, com todo cuidado para não
tensionar ligamentos e músculos em um indivíduo totalmente relaxado. Quando inconsciente deve
permanecer em decúbito lateral, e ficará em observação durante um período, que geralmente é de 30
minutos, para depois ser levado ao quarto.
Geralmente não há complicações pós-operatórias, mas, quando presentes, podem ser sangramento
nasal, arritmias cardíacas, rouquidão, epistaxe (sangramento nasal por traumatismo da sonda endotraque-
al), apneia e hipertermia.
O despertar depende da quantidade e do tipo de anestésico, bem como do metabolismo de cada
indivíduo. O paciente só é levado ao quarto quando estiver em condições normais. Os pais devem ser
esclarecidos sobre o despertar, a alimentação e a possibilidade do paciente vomitar (por isso a necessidade
de ficar em decúbito lateral). A alimentação líquida pode ser dada logo que a criança acorde e se apresente
disposta; no entanto, a alimentação sólida só deverá recomeçar 12 horas após a anestesia geral. Deve-se
prescrever antiemético, em caso de vômito, e analgésico.
Não há motivos para permanência no hospital, por isso, a alta será dada pelo CD logo que a criança
acorde em boas condições. Caso haja alguma complicação durante a anestesia, a alta deverá ser dada após
o paciente ser visto pelo anestesista.

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Radiologia em Odontopediatria
O exame radiográfico apresenta importante papel na elaboração do diagnóstico. Porém, sua vital
importância não deve ultrapassar seu verdadeiro papel de exame auxiliar ou complementar. A exploração
clínica e os dados anamnéticos precedem decisão da solicitação ou realização dos exames por imagens. A
Odontopediatria encontra grande suporte nesses exames, desde o processo diagnóstico inicial, avaliação
de desenvolvimento dos dentes, detecções e alterações de desenvolvimento, processos patológicos,
planejamento e acompanhamento.
Os raios X são radiações eletromagnéticas, ou seja, uma onda, com velocidade de propagação (neste
caso, a velocidade da luz), comprimento de onda e frequência de oscilação. Radiação ionizante refere-se a
ondas de alta energia, como os raios X e gama, cuja interação com a matéria desencadeará uma série de
ionizações por transferir energia. Apresenta efeitos nocivos, e seus efeitos biológicos são variados, de
acordo com o tecido irradiado, como consequência das alterações físico-químicas no meio exposto.
Os raios X são altamente energéticos, com capacidade de atravessar as estruturas que compõem o
corpo humano. Os efeitos biológicos podem ser divididos em efeitos estocásticos (sem limiar de dose,
como a indução de câncer) e não-estocásticos (a expressão é proporcional à dose). A radiação atua nos
seres vivos por meio de efeitos diretos e indiretos.
Após o descobrimento dos raios X, fez-se as primeiras observações do efeito das radiações: células com
alta taxa de proliferação são mais sensíveis às radiações ionizantes; a radiossensibilidade é inversamente
proporcional ao grau de diferenciação das células; a radiossensibilidade das células é tanto maior quanto
maior o número de divisões necessárias da célula recém-formada, até que seja alcançada a sua forma-
função final como célula madura. Células nervosas ou musculares, que não se dividem e são diferenciadas,
encontram-se entre as mais resistentes do corpo humano. Entre as mais radiossensíveis estão os linfócitos,
oócitos, espermatogônias, as células totipotentes e as hematopoiéticas.
A magnitude do risco de ser ter uma neoplasia e a relação direta entre causa e efeito ainda são incertos
em exames radiográficos dentários.
Os efeitos biológicos podem ser somáticos ou genéticos. Quando somáticos, atinges células diploides,
causando alterações no próprio indivíduo, e são dependentes de frequência, dosagem, tempo de latência,
área do corpo exposta e tipo de radiação. Os efeitos genéticos atingem o DNA (células haploides),
provocando a transmissão de caracteres do indivíduo irradiado para os descendentes. Atinge principalmen-
te as crianças, pela quantidade de células indiferenciadas e alta multiplicação.
As alterações biológicas podem ser nos ácidos nucleicos, proteínas, estruturas intracelulares, núcleo,
citoplasma e cinética celular, podendo provocar aberrações cromossômicas, quando as células são
irradiadas no momento da mitose.
Para a devida radioproteção, as exposições radiológicas devem ser efetuadas em condições otimizadas
de proteção e segurança, tanto para os profissionais quanto para os pacientes. O objetivo é proteger
indivíduos, seus descendentes e a humanidade contra os efeitos danosos da radiação; evitar a ocorrência
de efeitos não estocásticos e limitar a probabilidade de ocorrência de efeitos estocásticos em níveis
aceitáveis.
As proteções são classificadas em:
 Obrigatórias: realizadas pelo fabricante do aparelho de raios X. Consiste na calibração do apare-
lho, avaliação de filtros, colimadores etc.
 Necessárias: referentes ao paciente e a equipe odontológica.
 Recomendáveis: monitorização do ambiente, como parede de chumbo ou biombos plumbíferos,
por exemplo.
A proteção ao paciente visa prevenir a perda da qualidade, a repetição de exames e o uso de baixos
tempos de exposição, com o armazenamento adequado dos filmes radiográficos e soluções de processa-
mento, uso de filmes rápidos e ultra-rápidos, processamento e arquivamento adequados, calibração
correta e manutenção dos aparelhos radiológicos, indicação correta da técnica radiográfica, esclarecimento
ao paciente, interpretação correta das imagens e radiografias digitais, além do uso obrigatório do avental e
colar plumbíferos, que protege a glândula tireoide.
Para a proteção da equipe odontológica, recomenda-se educação continuada, monitoramento por meio
de dosimetria, não manter o filme na boca do paciente ou segurar o cabeçote ou o cilindro localizador do
aparelho, distância mínima de 2 metros e 135 graus em relação à direção do feixe principal, aparelhos com
retardador e uso de barreira de proteção, assim como o uso do avental de chumbo.

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A seleção da técnica radiográfica que deve ser utilizada deve obedecer critérios. Primeiro, o desenvol-
vimento da dentição. Para pacientes com arco tipo I de Baume, não há necessidade de radiografia
interproximais, diferente dos arcos tipo II e misto. Já o exame radiográfico periapical é indicado pros três
tipos de arcos, nos dentes em que houver necessidade. O segundo critério é o risco de cárie, com avaliação
de experiência de cárie anterior, avaliação da dieta (ingestão de carboidratos é diretamente proporcional
ao risco de cárie) e do padrão de higienização. Para pacientes de baixo risco, faz-se exame radiográfico de
12 a 18 meses; pacientes de risco moderado e alto, faz-se de 6 em 6 meses.
A preparação da criança é feita usando um vocabulário adequado para a idade da criança, o uso de
analogias, explicação sobre os barulhos e que a foto é só da criança.
As radiografias podem servir para três tipos de exame: exames gerais dos dentes e maxilares, exame de
determinadas áreas específicas e para situações gerais.
O exame geral da criança deve ser feito nas primeiras consultas e complementado posteriormente, para
o controle do estado dos dentes e maxilares. Os métodos radiográficos dependem da idade e do
comportamento da criança. A radiografia panorâmica permite a visualização do estado geral dos dentes e
maxilares, principalmente o crescimento e o desenvolvimento dentomaxilar, situação da dentição mista
com os diferentes estágios de esfoliação dos dentes decíduos, relação do posicionamento dos germes
dentais com os espaços disponíveis para a erupção normal e as patologias dentomaxilares. As interproxi-
mais são indicadas para o diagnóstico precoce das lesões coronais incipientes, observação da relação
coronal-polpa e avaliação das cristas ósseas alveolares. Se a criança não permitir a execução de radiografias
panorâmicas, utiliza-se as incidências oclusais ou extrabucais, principalmente as laterais de mandíbula. A
frequência depende da fase de crescimento e dos problemas encontrados na criança.
O exame de regiões específicas geralmente é feito com radiografias periapicais, e a escolha da incidência
depende do tipo de suspeita. Já os exames especiais são principalmente as radiografias cefalométricas,
carpais, radiografias com contraste e as radiografias com quilovoltagem mais baixa para visualização de
tecidos moles.
As tomadas radiográficas intra-bucais podem apresentar uma série de dificuldades, principalmente em
crianças menores, como o tamanho da boca, o posicionamento do filme e o grau de cooperação da criança.
O envolvimento participativo da criança durante todas as etapas de execução da radiografia é fundamental,
pois responsabiliza e distrai, tornando-a mais cooperativa. Se a criança tem condições de entender, deve-se
fazer uma explicação correta dos procedimentos. Caso contrário, deve explicar através de simbolismo o
equipamento e as fases do processo. Para isso, deve-se estabelecer um canal de comunicação com a
criança, desenvolvendo um diálogo e exercitando o bom relacionamento. Quanto mais rapidamente for
realizada a radiografia, maior a chance de sucesso. Jamais a situação deve ser forçada em casos de
resistência, ou ânsia de vômito, por exemplo.
Algumas recomendações são familiarizar a criança com o aparelho e instruí-la sobre o procedimento
antes da colocação do filme; se necessário, deixar a criança tocar no cone e até fazer um pequeno disparo
para mostrar que não machuca; colocar a angulação a ser utilizada e regular o tempo de exposição antes da
colocação do filme na boca; procurar não usar um filme que fique curvado por ser grande; usar bloco de
mordida ou suportes retentores de filme para a retenção, ou optar pelo método oclusal quando a criança
tiver dificuldade de reter o filme; realizar as primeiras radiografias nas regiões mais fáceis para conquistar a
confiança; prender a atenção do paciente para não mexer o dedo que segura o filme; encorajar o paciente
após cada exposição e dizer que mostrará os filmes quando estiverem prontos.
Os tipos de filmes caracterizam-se pelo tamanho e pelo grau de sensibilidade. Em Odontopediatria está
indicado o uso de filmes de maior sensibilidade, reduzindo ao máximo da dose de radiação na criança. Os
filmes usados em odontopediatria são:
 Filme periapical padrão: é o filme convencional, usado sempre que as condições da criança
permitirem, como o tamanho da boca e a sensibilidade da região. Pode ser usado em diferentes
faixas etárias, para métodos periapical, intreproximal, oclusal e nos métodos especiais.
 Filme infantil: apresenta tamanho reduzido, possibilitando maior emprego em crianças de me-
nor idade, portadoras de dentição decídua. Por ser pequeno, radiografa pequenas áreas, neces-
sitando de mais filmes. Nas crianças menores é usado em todas as áreas, e em crianças maiores
é usado quando o convencional não pode ser usado, como na região de molares inferiores.
 Filme oclusal: pode ser usado da forma convencional na radiografia oclusal em crianças maiores.
Em crianças menores pode ser dobrado ao meio, fornecendo duas imagens no mesmo filme.
Pode ser usado ainda como filme extrabucal, principalmente na região de molares.

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 Filme periapical: possui uma aleta presa ao filme, para mordida. Existem tamanhos diferentes
para dentes posteriores e anteriores.
Pesquisa radiográfica em crianças de 0 a 3 anos (1ª infância)
São indicadas para avaliação de dentes natais e neo-natais, lesão de cárie, anomalias e traumatismo
dentário. Os três tipos de técnicas usadas são o método de Harndt & Weyers, o método de Kennedy e o
método de Mannkopf.
1. Método de Harndt & Weyers: é uma técnica intrabucal, oclusal para dentes anteriores. Para a
maxila, na incidência frontal, o longo eixo do filme fica perpendicular ao plano sagital, e o cone de
raios X fica dirigido para a base do nariz, numa angulação de 35o a 45o positivos. Na incidência late-
ral o filme é deslocado para o lado a ser radiografado, com o longo eixo paralelo ao plano sagital,
introduzindo a película até tocar no ramo ascendente, e a ponta do cone toda a parte anterior do
osso zigomático, ao lado do nariz, onde o raio deve ser dirigido sobre a bissetriz do ângulo formado
pela película e pelo rebordo alveolar. Na mandíbula, o longo eixo do filme fica perpendicular ao pla-
no sagital, mordido pela criança, e o cone do aparelho aponta para a sínfise mentoniana, com o raio
central perpendicular ao filme.
2. Método de Kennedy: técnica usada para dentes posteriores. Para molares superiores, deve-se fazer
incidências oclusais, com filme periapical padrão (se possível), ou infantil. O filme fica com o longo
eixo no sentido ântero-posterior, retido por mordida ou pressão digital do acompanhante, e a cabe-
ça deve obedecer ao paralelismo com a linha de Camper, com angulação de 60o do cone, procuran-
do passar os raios centrais pelo ápice dos molares temporários. Os molares inferiores deverão ser
radiografados por incidências extrabucais, utilizando o filme oclusal. O filme é colocando do lado
que vai ser radiografado, sobre a face, na região dos molares, com o longo eixo paralelo ao assoa-
lho, e a cabeça levemente girada para o lado a ser radiografado, com angulação vertical do cone de
17o, com o raio central dirigindo-se perpendicularmente ao filme.
Pesquisa radiográfica em crianças de 3 a 6 anos (idade pré-escolar)
Apresenta três técnicas usadas: técnica de Álvares, técnica Interproximal e a técnica com três filmes.
1. Álvares: indicada para avaliar lesões periapicais, fraturas radiculares, lesão cariosa na cavidade
pulpar, fraturas ou traumatismos na região periapical e a relação do dente decíduo com o perma-
nente. Pode ser feita para dentes anteriores ou posteriores, usando o filme periapical padrão ou o
oclusal dobrado ao meio. Para radiografrar a região anterior da maxila, o paciente fica posicionado
com o plano sagital mediano perpendicular ao solo, com a linha de Camper paralela ao solo, e a an-
gulação do cone em 65o positivos, utilizando filme periapical. Para a região anterior da mandíbula, a
posição do paciente é a mesma, e o ângulo é de 35o negativos, com área de incidência do feixe cen-
tral no centro do assoalho, utilizando também filme periapical. Para a região posterior utiliza-se o
filme oclusal dobrado em ângulo reto (90o). Na maxila, a posição do paciente é a mesma, com angu-
lação de 35o positivos, e incidência na linha que desce do centro da pupila e corta a linha de Cam-
per. Na mandíbula, a posição do paciente é a mesma, com angulação do cone de 15o negativos, e
incidência do feixe central na linha um pouco acima do bordo inferior da mandíbula.
 Modificação de Guedes-Pinto: consiste na colocação de um rolete de algodão junto à face
oclusal na face ativa do filme, e a fixação com fita adesiva, permitindo que o paciente morda
a asa e o rolete de algodão, fazendo com que não haja distorção das cúspides na imagem.
2. Técnica interproximal: indicada para diagnóstico de cáries incipientes, avaliação da proximidade da
cárie com a cavidade pulpar, adaptação de bandas ortodônticas e adaptação cervical de restaura-
ções classe II. Utiliza filme periapical padrão, e pode ser feita com posicionador infantil, ou aleta pa-
ra mordida feita com fita adesiva. A posição do paciente é semelhante a técnica de Álvares, e angu-
lação do cone de 0o a 8o positivos, com incidência no plano oclusal.
 Modificação de Guedes-Pinto: consiste em dobrar o filme periapical ao meio, segundo o seu
menor eixo, e com fita adesiva confeccionar uma asa de mordida voltada para uma das me-
tades da face ativa do filme.
3. Técnica de três filmes: consiste em duas interproximais (direita e esquerda) e uma radiografia
panorâmica.

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Pesquisa radiográfica em crianças de 6 a 12 anos (idade escolar)
Feita de forma semelhante aos adultos, utilizando as técnicas periapical, interproximal e de três filmes.
1. Técnica periapical: indicada para observação da região periapical, lesões periapicais, relação dos
dentes decíduos e permanentes e fraturas. Pode ser feita pela técnica da bissetriz, onde há direcio-
namento do feixe de raios X perpendicular ao plano bissector formado pelo plano do dente e pelo
plano do filme radiográfico, ou pela técnica do paralelismo. Esta última baseia-se no princípio do
paralelismo entre o longo eixo do dente e do filme, que é sustentado por um posicionador, dispen-
sando um posicionamento orientado pela cabeça do paciente e as referências de incidência, produ-
zindo imagem com mínimas distorções. Utiliza-se filme periapical padrão ou periapical infantil.

Técnica da Bissetriz - Maxila


Região Ângulo Vertical Ângulo Horizontal Área de Incidência
Incisivos Centrais +50o a 55o 0 Ápice nasal
Canino e Incisivo Lateral +45o a 50o 60 a 75o
o
Asa do nariz
Intersecção da linha que desce do
Pré-molares +30o a 40o 70o a 80o centro da pupila com a linha de
Camper.
Intersecção da linha que desce 1
Molares +20o a 30o 80oa 90o cm atrás da comissura palpebral
externa com a linha de Camper.
Técnica da Bissetriz - Mandíbula
Região Ângulo Vertical Ângulo Horizontal Área de Incidência
Incisivos -15o a -20o 0 Sulco mentolabial
Intersecção da linha que desce da
asa do nariz com a linha que
Caninos -10o a -15o 45o a 50o
passa 2 cm acima da borda da
mandíbula
Intersecção da linha que desce do
centro da pupila com a linha que
Pré-molares -5o a -10o 70o a 80o
passa 0,5 cm acima da base da
mandíbula
Intersecção da linha que desce
1cm atrás da comissura palpebral
Molares 0 a -5o 80oa 90o
externa com a linha que passa 0,5
cm acima da borda da mandíbula.

2. Técnica Interproximal: apresenta a mesma indicação da idade pré-escolar, e é feita em crianças do


mesmo modo que é feita em adultos. Utiliza-se a aleta mantida pela mordida do paciente, ou posi-
cionador interproximal, mantendo o filme paralelo ao dente. A posição da cabeça do paciente é i-
dêntica à técnica da bissetriz, com linha de Camper paralela ao solo, com angulação vertical será de
8o a 10o, e a horizontal determinada pela incidência dos raios X paralela aos espaços interproximais.
3. Técnica de três filmes: semelhante a idade pré-escolar.
Métodos de localização mais utilizados
Os principais métodos de localização intrabucais são a técnica de Clark e a técnica de Miller-Winter. As
duas apresentam a mesma indicação, de localização de dentes não-irrompidos, extranumerários, corpos
estranhos e processos patológicos; localização reparos anatômicos, como os forames mentual e incisivo,
distinguindo-os de alterações periapicais; e dissociação de raízes e canais radiculares; pesquisa de fraturas
radiculares transversais, variando-se o ângulo vertical. A técnica de Clark é indicada para a maxila, e consiste
na variação da angulação horizontal de incidência do feixe principal de raios X, dissociando os objetos em
pesquisa. O objeto mais próximo sempre se desloca em sentido contrário ao observador. O objeto mais
distante sempre acompanha o deslocamento. Portanto, se o dente permanecer no mesmo lugar, ele está na
vestibular. A técnica de Miller-Winter é indicada para a mandíbula, e é considerada uma técnica oclusal,

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onde se usa um filme periapical padrão, que é mantido pela mordida do paciente. É feita com a inclinação da
cabeça do paciente e incidência do feixe central perpendicular ao filme. Portanto, consiste de uma
radiografia periapical e uma radiografia oclusal (com filme periapical), com incidência perpendicular dos
feixes em ambas.

Os métodos de localização extrabucais mais conhecidos são o método de Fazzi e o método de Andreasen.
São indicadas para intrusão de dentes decíduos, observar a relação com o germe sucessor, ou como
complementar da técnica intrabucal. No método de Fazzi pode-se utilizar um filme periapical padrão ou
oclusal, mantido em posição pelo paciente ou pelo responsável que o apoiará de encontro à face da criança.
Para auxiliar nesta tomada radiográfica pode ser utilizada espátula de madeira, que é quebrada em uma das
extremidades formando um ângulo de 90o. O paciente fará a apreensão da espátula mordendo-a na haste
maior, que ficará paralela ao plano oclusal. Prende-se o filme periapical com fita adesiva no lado interno da
menor porção da espátula, de maneira que a face sensível fique voltada para a extremidade maior da
espátula.

Na técnica de Andreasen usa-se uma película oclusal, com o longo eixo do filme perpendicular ao solo e
paralelo a face da criança. O feixe central dos raios X incide entre a ponta do nariz e o lábio superior.
Pesquisa Radiográfica Extrabucal
Para pesquisas radiográficas extrabucais utilizamos a radiografia lateral dos maxilares (feita com filme
oclusal), a ortopantomografia (panorâmica), as telerradiografias lateral e frontal, as radiografias carpais, e
outras técnicas, como a ressonância magnética e as tomografias.
A radiografia panorâmica é indicada para visão geral do arco superior e inferior, estudo da relação entre
dentes decíduos e permanentes, graus de rizogênese e rizólise, diagnóstico de enfermidades, planos de
tratamento, acompanhamento da evolução de anomalias e de casos cirúrgicos e traumáticos. Apresenta
algumas vantagens, como a necessidade de apenas uma tomada radiográfica, a facilidade da técnica, a
baixa dose de radiação e possibilidade de ser utilizada em pacientes pouco colaboradores e com trismo
(contratura involuntária dos músculos mastigatórios).
As telerradiografias são as radiografias utilizadas na cefalometria. A lateral é a mais utilizada, e mostra a
relação da base do crânio com os maxilares, dos maxilares entre si, e dos maxilares com os dentes, bem
como o desenvolvimento craniofacial e dos maxilares. A frontal mostra altura, largura e simetria facial.
Exame Radiográfico em Pacientes Especiais
Considera-se como paciente especial aquele que não pode ser submetido às técnicas normais de
radiografia, como os pacientes politraumatizados, pacientes que não podem abrir a boca, pacientes
portadores de deficiência física, motora ou mental. Doença sistêmica não é considerada deficiência.
As técnicas utilizadas para este tipo de paciente são: oclusal de Álvares, técnica interproximal e periapi-
cal pelo paralelismo. Anotação: para pacientes especiais utiliza-se apenas técnicas intrabucais oclusais.
Para tomadas radiográficas extrabucais recomenda-se a lateral da face e dos maxilares. A radiografia
panopanorâmica não é indicada.

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Cárie Dentária
O entendimento da cárie permite ao odontopediatra prevenir e controlar melhor a doença. É na criança
que se pode conseguir o maior benefício, pois, em geral, hábitos adquiridos na infância são incorporados e
permanecem por toda a vida. Devem ser adotadas maneiras corretas de motivação dos pacientes e
educação dos pais e responsáveis. O prognóstico dependerá das características individuais de cada
paciente.
Atualmente, a doença tornou-se endêmica em várias populações. O conceito de presença ou ausência
de doença na população depende do critério escolhido para o diagnóstico: início de desmineralização ou
cavidade. O processo carioso é resultante da dinâmica de des/remineralização decorrente do metabolismo
bacteriano e que pode, havendo predominância da desmineralização, resultar em perda mineral e
consequente possibilidade de cavitação.
É considerada uma doença infecciosa e multifatorial, dependendo a intersecção dos seus fatores
determinantes: hospedeiro, microbiota e dieta, por um determinado tempo. Esses fatores são considera-
dos os fatores primários, que são completados pelos fatores secundários ou confundidores.

Tríade de Keys

Para se falar em hospedeiro, deve ser feita uma abordagem não só dos dentes, mas de todo sistema
bucal envolvido, em especial, do papel da saliva.
Os dentes podem apresentar diferentes graus de susceptibilidade à carie, dependendo de vários fatores.
Entre dois e quatro anos após a irrupção os dentes apresentam maior risco de desenvolverem lesões de
cárie. O esmalte é mais suscetível à desmineralização e alguns dentes tornam-se mais vulneráveis nesse
período, por propiciarem maior acúmulo de filme, especialmente os molares, risco que diminui após a
oclusão com o seu antagonista, devido à capacidade de autolimpeza que adquirem. A morfologia pode ser
um fator de risco, dependendo das características anatômicas do dente e da ocorrência de defeitos no
esmalte, como fossas e fissuras. O alinhamento dos dentes também pode influenciar na suscetibilidade,
pois dentes apinhados retêm mais alimentos e dificultam a higienização. A presença de flúor influi na
resistência do esmalte.
A saliva exerce ação protetora por diversos mecanismos, como pelos elementos de sua composição,
capacidade de diluição e neutralização dos ácidos e eliminação de substâncias com potencial cariogênico
(clearance salivar). Além disso, após alguns segundos em contato com a superfície do esmalte, esta adsorve
várias glicoproteínas ácidas (membrana proteinácea e amorfa), que, depositada sobre a superfície de
hidroxiapatita, compõe a película adquirida, que após sua instalação, dá-se início a formação da placa
bacteriana. Esta película funciona também como barreira iônica, limitando a troca de íons. Essas proteínas
tornam-se insolúveis com o tempo, alterando algumas propriedades da superfície do esmalte. Age como
lubrificante, prevenindo o desgaste prematuro do esmalte durante a mastigação; reduz a velocidade da
desmineralização provocada por ácido e bebidas; age como membrana semipermeável, reduzindo a
mobilidade de íons (importante na prevenção da desmineralização superficial de lesões incipientes);
previne o crescimento contínuo do cristal de hidroxiapatita, quando isso tende a ocorrer em saliva
supersaturada; forma a superfície para colonização bacteriana.
A mastigação é um importante estímulo da salivação. Em dietas líquidas pode haver a atrofia das
glândulas, menor fluxo salivar e modificação na composição da saliva.
Após a ingestão de sacarose, inicia-se a glicólise, e ácidos são produzidos pelas bactérias da placa. Na
interface placa-esmalte ocorre aumento da concentração de íons H+, começando a queda do pH no local e a
mancha branca. A queda do pH deve ser interrompida pelos elementos tampões do fluido da placa e pela
saliva, que tem como principal agente tampão o íon bicarbonato. Sua concentração é elevada com o
aumento do fluxo salivar.
A secreção salivar obedece um ritmo fisiológico individual e praticamente para durante o sono. diaria-
mente é secretado em torno de 700 a 800 ml de saliva. A diminuição do fluxo salivar é uma importante

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causa de ataque de cárie rápido. Por isso, alterações associadas a diminuição do fluxo salivar (xerostomia),
como a síndrome de Sjögren e a radioterapia, por tempo demasiado podem trazer sérias consequências à
cavidade bucal. A capacidade tampão tende a ser menor em crianças que apresentam cárie, em compara-
ção as que não têm a doença.
Após a irrupção do dente acontece a maturação pós-eruptiva, processo de consiste na absorção de íons
como o cálcio, fósforo, magnésio, flúor e peptídios ricos em histidina, através do contato do esmalte com a
saliva. Isso permite o aumento da dureza da superfície, pois o esmalte torna-se mais mineralizado, e
consequentemente, mais resistente à cárie. Esse processo pode acontecer por toda vida, sendo mais
intenso nos dois primeiros anos após a irrupção do dente.
A saliva apresenta agentes antimicrobianos, que podem ter origem nas glândulas salivares ou serem
provenientes do sangue. A lisozima, a lactoferrina e a lactoperoxidase são exemplos de enzimas que agem
diretamente na bactéria. A lisozima desestabiliza a membrana celular bacteriana; a lactoferrina compete
com as bactérias pelo ferro; e o sistema lactoperoxidase interfere na produção de ácidos (metabolismo
bacteriano), oxidando o tiocianato salivar a hipotiocianato e ácido hipotiocianoso, e estes produtos oxidam
enzimas envolvidas na glicólise.
A imunoglobulina predominante na saliva é a IgA produzida localmente. Atua inibindo a aderência de
bactérias ao esmalte e aos tecidos moles, e inibindo as atividades enzimáticas. Os mecanismos exatos de
todos os fatores de proteção na saliva são complexos, pois ocorrem interações constantes entre eles.
Em relação à microbiota, destaca-se que a cárie é uma doença localizada, provocada por atividade
bacteriana local. O principal microrganismo encontrado em indivíduos cárie-ativos é o Streptococcus
mutans, presente em 90% dos indivíduos. Esses microrganismos são transmitidos pelo contato salivar entre
humanos, e sua implantação, propriamente dita, inicia-se quando há vantagens ecológicas para a
colonização das superfícies dentárias, formando o biofilme. Cabe lembrar que nem toda placa bacteriana
tem características cariogênicas.
A cariogenicidade das cepas de S. mutans ocorre pelo seu potencial de virulência, em especial pela
capacidade de produzir ácido e de sobreviver em meio ácido. Além desses, outros fatores de virulência são
relevantes, como a produção de polissacarídeos intracelulares (PIC) e extracelulares (PEC), além de
substâncias antimicrobianas (mutacinas). O PIC pode servir de reserva, quando há falta de carboidratos da
dieta, prolongando a exposição do dente aos ácidos. As mutacinas podem agir em outros microrganismos,
mantendo sua colonização, inibindo o crescimento de outras espécies, favorecendo a colonização primária
e garantindo vantagens na ocupação de nichos. Cepas com maior nível de produção de mutacinas são mais
facilmente transmitidas de mãe para filhos.
O único reservatório natural dos S. mutans é a cavidade bucal. A fonte de infecção primária está na mãe,
e a infecção da criança dependerá do nível da infecção da mãe ou da pessoa que tem mais contato com ela.
O veículo de transmissão é a saliva, por qualquer comportamento que a transmita da mãe para o bebê. Há
uma quantidade necessária do inoculo para que ocorra o sucesso da implantação do S. mutans, e por isso,
é fundamental a redução desses microrganismos durante a irrupção da dentição decídua e antes da
irrupção dos primeiros molares, pois o inoculo inicial pode ser o fator determinante nesse sucesso.
Caufield sugere que a aquisição inicial dos S. mutans pela criança ocorre em uma faixa de idade delimi-
tada e definida, denominada “janela de infectividade”.
Para a aquisição da bactéria, é necessária a presença de dentes, e crianças na faixa etária entre 6 e 30
meses terão 20 dentes decíduos irrompidos. A época de irrupção dos molares decíduos é crítica, pois
apresentam fossas e fissuras, retendo mecanicamente os S. mutans, assim como as superfícies proximais
côncavas, pela própria anatomia dos dentes decíduos. Esse evento ocorre entre os 12 e 24 meses.
A colonização ocorre concomitantemente com a irrupção da coroa, pois, se já existir uma microbiota na
superfície, a colonização pelo S. mutans é muito dificultada, podendo apresentar-se como um efeito
protetor contra cárie dentária. Com isso, a primeira janela de infectividade ocorre entre os 6 e os 24-30
meses de idade (irrupção dos incisivos até dos 2ºsM decíduos), e a segunda ocorre entre os 6 e os 12
anos de idade, quando irrompem os primeiros e segundo molares permanentes. Quanto mais
precoce for sua implantação na cavidade bucal, maior será o risco do desenvolvimento de lesões
de cárie. No entanto, esse processo depende de outros fatores, como a ingestão de sacarose e o
padrão de higiene bucal. Sua presença não determina o surgimento da doença. Crianças sem cárie
também podem apresentar níveis altos desse microrganismo.
Em relação ao S. sobrinus, é outro tipo de espécie que está presente numa parte menor da população
(em torno de 20%), e que apresenta um potencial cariogênico maior. Lactobacillos também estão

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envolvidos na progressão da lesão de cárie, e a contagem desse microrganismo na saliva parece refletir a
ingestão de carboidratos, fator determinante de risco de cárie.
A presença desse tipo de microrganismo pode ser benéfica para o hospedeiro, prevenindo a colonização
por outros microrganismos. É preciso conscientizar as crianças da importância da escovação do dorso da
língua, que atua como fonte de bactérias para a saliva. Medidas preventivas adotadas na mãe podem surtir
grande efeito na prevenção e incidência da cárie em seus folhos, e por isso, elas devem ser conscientizadas
que a cárie não é uma fatalidade, e que ela tem responsabilidades no cuidado da saúde bucal.
Em relação à dieta, esta pode afetar os dentes de duas maneiras: antes e após a irrupção. Antes da
irrupção, têm-se os efeitos nutricionais na formação do dente, onde os nutrientes mais importantes são o
cálcio, o fósforo, a vitamina D, o açúcar, o flúor e outros elementos traço. O flúor é o único capaz de
apresentar efeito pré-eruptivo na futura susceptibilidade à carie. A vitamina D regula a concentração de
cálcio e fosfato inorgânico, controlando a mineralização de ossos e dentes. Embora sejam nutrientes
importantes, não são o maior impacto na cárie, pois até o esmalte mais perfeitamente mineralizado, pode
ser desmineralização.
O período de socialização primária ocorre nos primeiros anos de vida, e é importante iniciar os hábitos
higiênicos e de alimentação. o principal açúcar da dieta humana é a sacarose. Existem dois tipos de
açúcares: os intrínsecos e os extrínsecos. Os intrínsecos estão disponíveis na natureza, e são naturalmente
integrados na estrutura celular, presentes no doce das frutas e vegetais, e não são responsáveis por
doenças. Os extrínsecos são provenientes da cana-de-açúcar, beterraba, entre outros, e estão associados à
doenças em humanos, incluindo a cárie. Os carboidratos mais consumidos pelo homem são amido,
sacarose, frutose e a glicose. O amido não apresenta alto potencial cariogênico, exceto o industrializado.
Os alimentos apresentam determinadas propriedades que são importantes na determinação do seu
potencial cariogênico. Propriedades mecânicas, como dureza, coesão, viscosidade e adesividade. Alimentos
mais rígidos estimulam o fluxo salivar e promovem limpeza através do atrito. Outro ponto importante e o
conteúdo de gorduras, pois, proteínas e gorduras não fornecem energia para as bactérias, por isso têm
baixo potencial cariogênico.
Em crianças de pouca idade o alimento permanece mais tempo na boca, por isso, deve se encorajar a
ingestão de alimentos que favorecem a limpeza mecânica dos dentes. O controle da dieta (diário alimentar)
deve ser orientado levando em conta o carboidrato ingerido (tipo, frequência e modo de consumo), a
presença de doenças sistêmicas, presença do fluxo salivar adequado, realização da higiene bucal,
morfologia dos dentes e configuração da arcada dentária e indicadores sociais.
O desequilíbrio dos ciclos des/remineralização, favorece a perda mineral do esmalte, dentina e cemen-
to, causando destruição localizada dos tecidos duros, e formando a lesão, que é o sinal da doença cárie. O
esmalte hígido é constituído de cristais de hidroxiapatita firmemente unidos, com finos espaços intercrista-
linos, preenchidos por água e matéria orgânica, formando dina rede de vias de difusão, chamadas de poros
do esmalte (menos de 1% do volume no esmalte hígido). Na exposição aos ácidos, os minerais são
dissolvidos havendo redução do tamanho do cristal e aumento dos poros, e por isso o esmalte desminerali-
zado é mais poroso. A perda mineral no início de formação da lesão não ocorre de forma intensa na
superfície, pois esta é protegida pela película adquirida, além de ser mais mineralizada e apresentar flúor.
Em função disso, a lesão de cárie inicial pode ser dividida em quatro zonas:
 Zona Superficial: macroscopicamente hígida, e com sinais microscópicos de dissolução direta da
superfície, e um pequeno aumento da porosidade do esmalte. Se a placa se mantém, após 14
dias há sinais macroscópicos de perda mineral do dente após secagem, caracterizando o início
da lesão de mancha branca.
 Corpo da lesão: região onde há mais perda mineral, podendo ocorrer cavitação.
 Zona escura: apresenta uma área de remineralização, pois recebe depósito de minerais perdidos
na desmineralização. É uma área mais extensa, em lesões de progressão lenta ou inativa.
 Zona translúcida: linha de frente da lesão. Mais porosa que o esmalte hígido e representa os
processos de desmineralização.
Essas características são visualizadas melhor em superfícies lisas. Com uso intenso de flúor, a lesão pode
se desenvolver internamente, e a superfície ficar intacta, formando as cáries ocultas.
A lesão incipiente de “mancha branca” é caracterizada pela mudança nas propriedades ópticas do
esmalte, não alterando a translucidez. À medida que aumenta a perda mineral, espaços maiores passam a
ser preenchidos por água ou ar, alterando a translucidez do esmalte, dando o característico aspecto de
mancha branca, com aparência opaca e rugosa. Lesões grandes podem ser visualizadas até em dentes

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úmidos. Essas lesões geralmente não podem ser visualizadas no exame radiográfico. O uso intenso e
constante do flúor diminui a velocidade de progressão da lesão, e pode paralisar ou inativá-las, principal-
mente pelo desgaste da superfície externa do esmalte. Para definir o tratamento de lesões de mancha
branca, deve-se avaliar local da lesão e aspecto clínico.
A cavidade ocorre quando a parte mais avançada de desmineralização atinge de forma significante o
tecido dentinário, resultado da progressão da lesão. A dentina apresenta resposta à cárie ainda no esmalte,
através da esclerose dos túbulos dentinários. Conforme a lesão aumenta, deposita-se dentina reacional na
superfície interna da câmara pulpar.
Quando o esmalte é rompido, pelo colapso da camada superficial, se a placa for mantida, o processo
continuará, e as bactérias estarão favorecidas em um nicho mais protegido, aumentando a destruição
tecidual. Uma vez a dentina atingida, ocorrerá invasão tubular superficial das bactérias, e a porção mais
próxima da junção esmalte/dentina será rapidamente decomposta. Essa é a zona de destruição, e abaixo
dela está a invasão bacteriana.
A lesão de cárie em dentina é morfologicamente dividida em zona de esclerose dentinária (mais próxima
da polpa, zona de reação que tenta paralisar a lesão), zona de desmineralização profunda, zona de invasão
bacteriana, zona de desmineralização superficial ou avançada e zona de destruição.
Essas áreas servem de guia na intervenção clínica. A zona mais profunda pode ser remineralizada, pois
não está infectada e o colágeno é reversivelmente quebrado. A zona mais superficial deve ser removida,
pois já existe invasão bacteriana, e colágeno irreversivelmente quebrado.
No diagnóstico da cárie deve-se considerar o risco (alto, médio ou baixo) e a atividade. Lesões de
mancha branca ativas são lisas e brilhosas; lesões em dentina (cavitadas) apresentam atividade quando a
amarelada e amolecida. Essas lesões caracterizam o indivíduo como cárie-ativo, aumento o risco de novas
lesões. Deverá ser adotado um programa individualizado para cada paciente, com controle de placa, dieta e
uso racional do flúor, e em algumas situações, selantes oclusais.
O risco indica a probabilidade de desenvolver a doença, e para saber o seu grau, deve-se avaliar os
fatores envolvidos em sua etiologia (hospedeiro, dieta e microbitoa).
Em relação ao hospedeiro, deve avaliar a idade (fase de irrupção aumenta o risco – janela de infectivi-
dade), anatomia dos dentes (fossas e fissuras, apinhamentos e hipoplasias), uso de flúor, experiência prévia
de cárie e análise da função salivar (fluxo e capacidade tampão).
O nível de S. mutans parece ser o fator de risco mais relevante, principalmente em crianças entre 0 e 3
anos de idade. Demoram a colonizar a cavidade bucal, e dependem de fatores predisponentes, como cárie
na mãe e consumo precoce de sacarose. A presença de placa visível nos incisivos superiores parece ser um
bom preditor para o desenvolvimento de lesões de cárie.
Para o diagnóstico de lesão de cárie, utilizam-se métodos visuais, táteis e radiográficos. No método tátil,
a sonda exploradora de ponta afiada foi substituída pela de ponta romba. As fossas e fissuras oferecem um
sítio bastante propício às bactérias cariogênicas, porém, não na sua área mais profunda, pela falta de
nutrientes. Pode existir lesão de cárie oculta, principalmente depois do flúor, detectada apenas pela
radiografia.
Existem outros métodos de diagnóstico, como o método de resistência elétrica, onde a condutibilidade
elétrica é aumentada em áreas desmineralizadas (aparelho ainda não disponível); o laser, onde o tecido
cariado e as bactérias fluorescem com mais intensidade que as estruturas saudáveis. Ainda é um método
bastante controverso, e deve ser utilizado como complemento; e a transiluminação (FOTI).
Para as superfícies proximais, o método mais utilizado são as radiografias interproximais, lembrando
que, quando há lesão na radiografia, já há perda mineral significante. Entretanto, a simples presença
radiográfica não determina intervenção restauradora.
Para decisão de tratamento, o diagnóstico mais difícil é quando radiograficamente a lesão está na
junção amelodentinária. Nesses casos, usa-se elásticos separadores por 24 a 48 h, para que se faça exame
visual e tátil, para ver se tem cavitação e a atividade da lesão. Para ver atividade também pode-se sondar o
sulco gengival, e se tiver sangrante, é um preditor de progressão da doença.
Cárie precoce na infância ou cárie de acometimento precoce
A forma mais comum de manifestação da doença em crianças de pouca idade é a cárie de mamadeira,
que apresenta aspecto de “cárie rampante”, ou seja, atinge um grande número de superfícies em pouco
tempo. Representa claramente um desequilíbrio na dieta, com alto consumo de sacarose, e higiene bucal
inadequada, principalmente em períodos noturnos.

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Observa-se uma relação frequente entre o tempo de aleitamento materno e a presença de cárie. A
carigoenicidade do leite materno ainda é um assunto bastante controverso. Deve ser recomendado (pelos
seus muitos benefícios) até a época correta. Após os 6-8 meses, quando inicia-se a irrupção dos dentes, o
leite deve ser removido ou menos frequente, pois já há consumo de sacarose, aumentando a cariogenici-
dade. Outro fator importante na prevenção da cárie precoce é a implantação dos hábitos de higiene bucal o
mais cedo possível.
O leite bovino tem capacidade de inibir o desenvolvimento da cárie, devido a presença de substâncias
cariostáticas, como a caseína, enzimas antibacterianas e lipídeos. Já os leites em fórmulas infantis devem
ter cuidados dobrados, pela presença de outros açúcares, principalmente a sacarose, exceto os que contém
ferro, que reduziram em 50% a cariogenicidade.
O quadro de cárie de mamadeira afeta os dentes decíduos logo após sua irrupção, acometendo de
acordo com a ordem cronológica de exposição ao meio bucal, exceto os incisivos inferiores, pois são
protegidos pela língua e pela ação da saliva (mas se o quadro avançar, também são afetados). Se o hábito
de mamar durante o sono for interrompido, os dentes que não irromperam ainda são poupados. Afeta
primeiros incisivos, depois primeiros molares decíduos, vestibulares de caninos e oclusais se segundos
molares. Nessa etapa, já se nota a perda das coroas dos quatro incisivos superiores. Deve interromper o
hábito e estimular a higiene bucal.

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Tratamento Endodôntico em Dentes Decíduos
O principal objetivo do tratamento em Odontopediatria é a manutenção dos dentes decíduos nos arcos
até a época de sua esfoliação fisiológica, visando uma oclusão correta da dentição permanente, e, por isso,
a prevenção vem sendo muito valorizada.
A incidência das lesões de cárie nos dentes decíduos é muito significante, e, além disso, o número de
dentes com problemas de ordem pulpar são bem maiores do que se possa imaginar, necessitando de
tratamento endodôntico. Nesses tratamentos, deve-se ter comprovação clínica e radiográfica de
acompanhamento da remissão dos processos patológicos.
O aspecto mais importante do tratamento pulpar é estabelecer o grau de saúde da polpa, o estágio de
inflamação ou necrose, para que se estabeleça a melhor forma de tratamento. O diagnóstico correto é
fundamental, pois a técnica de trabalho é diferente para polpas vitais ou mortificadas. Para isso, o
cirurgião-dentista deve conhecer bem os sinais e sintomas, considerar o grau de reabsorção radicular, e
reconhecer que os dentes decíduos apresentam suas particularidades, devido ao fato de ser transitório e
ter um ciclo biológico próprio. Por isso, é comum que dentes decíduos sejam assintomáticos. Deve-se
valorizar os exames clínicos, anamnese e exames radiográficos. O exame clínico visual dos tecidos de
suporte deve ser feito, observando se há tumefações, fístulas ou mudanças na coloração e mobilidade do
dente (não confundir com a fase de esfoliação). O exame da cavidade de cárie é o mais importante. Não se
recomenda os testes de frio e quente em crianças. O exame radiográfico é fundamental, para mostrar se a
cárie tá perto ou já atingiu a polpa.
O comprometimento da polpa dentária de molares decíduos produz alterações clínicas, radiográficas e
histológicas na região inter-radicular do respectivo dente.
A estrutura histológica da polpa saudável, antes da esfoliação, era similar àquela encontrada no dente
permanente jovem. Nos dentes esfoliados, contudo, a polpa tinha sofrido mudanças regressivas por
resposta inflamatória crônica, onde os odontoblastos estavam esparsos ou ausentes.
Em relação à atividade metabólica de dentes decíduos e permanentes, observa-se que ela é mais
intensa em dentes na fase de rizogênese e rizólise, e isso se manifesta, na clínica, com um processo de cura
da cárie precário em dentes com rizólise, pois sua atividade metabólica é relativa a desorganização da raiz.
Na morfologia pulpar, podemos ver que a população celular é reduzida em dentes decíduos com
rizogênese incompleta ou em dentes permanentes velhos. Por isso, cáries proximais em dentina (profundi-
dade média) nos dentes decíduos, apresentam prognóstico favorável quando curetamos a cavidade cariosa
o suficiente para removermos dentina necrosada e se coloca um cimento provisório, ao invés de uma
restauração definitiva. Esse cimento permite um estado de alívio para a estrutura pulpar, e evita uma
agressão pelo preparo mecânico imediato para a restauração.
A polpa de dentes decíduos sem cárie, em diferentes graus de reabsorção radicular, apresenta um papel
passivo nesse fenômeno de reabsorção, onde há uma diminuição do tamanho das células dos vasos
sanguíneos. Entretanto, esses vasos aumentam de calibre.
Ao exame de polpas de dentes decíduos cariados, em diferentes graus de reabsorção radicular, foi visto
que na dentina aparecia uma linha cálcio-traumática, com quantidades variáveis de dentina de reparo, e a
polpa mostrava alteração da camada odontoblástica, além de um infiltrado inflamatório como resposta.
De acordo com esses estudos, concluímos que a quantidade de agentes irritantes afetando os dentes
decíduos é muito grande (especialmente molares), e o tratamento restaurador imediato não apresenta
prognóstico favorável. Recomenda-se o uso de algum material forrador em caso de capeamento pulpar
direto, principalmente os à base de hidróxido de cálcio, pois induzem a formação de dentina reparadora.
Lembrando que a dentina reparadora não é sinais de normalidade pulpar, e por isso, recomendam-se
adotar o tratamento endodôntico preconizado para polpa vital.
Dentes decíduos com mais de um terço de raiz reabsorvida respondem mal aos processos reparativos, e
por isso, são contrários à tentativa do uso de medicamentos que necessitam de respostas pulpares
reparadoras para o bom êxito do tratamento.
Em relação à anatomia, a camada de esmalte e dentina do decíduo é mais delgada e menos calcificada
que a do permanente. Proporcionalmente, o colume pulpar do decíduo é maior. A topografia da câmara
pulpar, a curvatura das raízes e a rizólise dificultam a manipulação e obturação do canal. O assoalho é
irregular, e junto à rizólise favorece a trepanação por instrumentos endodônticos.
A região anatômica de maior relevância no tratamento pulpar de dentes decíduos é a da bifurcação e
cerca de 4 mm em direção às raízes. Primeiro, porque está próxima à região espacial anatômica onde se
localiza o germe do dente permanente, implicando em observação e cuidados especiais. Outro fator

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importante é que a configuração interna dos dentes decíduos é composta por numerosos canais
secundários e acessórios, que podem ser um fator desencadeante de problemas pulpoperiodontais, pois o
número de forames é grande.
Medicamentos Intracanais
A escolha de medicamentos para o tratamento pulpar de dentes decíduos deve-se levar em conta os
pontos mencionados, pois a difusão destes podem causar danos à região, principalmente aqueles que são
muito irritantes aos tecidos, como o formocresol.
As propriedades ideais de um material de preenchimento radicular para dentes decíduos são: ser
bactericida, bacteriostático, apresentar estabilidade de desinfecção, anti-inflamatório, inertes ao tecido
periapical, reabsorvível, biocompatível, radiopaco e possibilitar condição de reparo. Os materiais mais
comumente usados são formocresol, glutaraldeido, pastas iodoformadas, pastas de hidróxido de cálcio e
pastas de óxido de zinco e eugenol.
A pasta preconizada Guedes-Pinto (PGP) é composta por iodofórmio, paramonoclorofenol canforado e
rifocort, e foi proposta como material de preenchimento de dentes decíduos com polpa necrosada. Em
dentes com fístula e/ou mobilidade patológica apresentaram neoformação em 60 dias, e a pasta
extravasada era totalmente reabsorvida em 30 dias. O iodofórmio apresenta propriedades antissépticas,
atividade antimicrobiana, é radiopaco, promove liberação de iodo, inclusive em condições desfavoráveis, e
possibilita estimulação biológica. O paramonoclorofenol canforado é antimicrobiano, com discutida ação
bacteriostática e bactericida, e alta citotoxicidade. O Rifocort é anti-inflamatório, caracterizando associação
corticosteroide-antibiótica, evitando resposta inflamatória intensa nas primeiras fases do reparo, e
promovendo precaução profilática.
Estudos mostraram que a PGP apresenta menos citotoxicidade do que outros medicamentos, como o
formocresol, glutaraldeido, callen, CTZ, entre outras, permitindo a viabilidade celular. Em relação a
implantação subcutânea, a PGP apresentou discreta resposta inflamatória inicialmente, e após 28 dias
notou ausência do material colocado e tecido com características de normalidade. Em relação à pasta de
hidróxido de cálcio, a Guedes-Pinto apresentou resposta inflamatória menos intensa. Polpas submetidas a
pulpotomia e medicadas com essa pasta apresentam melhor comportamento que com outros materiais,
como o formocresol. Os tecidos periapicais também apresentam boa resposta quando submetidos a esta
pasta. A PGP modificada com acréscimo de óxido de zinco possui ação antimicrobiana mais acentuada,
seguida da PGP. Apresentou efetividade antimicrobiana, pelos componentes PMCC e Rifocort. Estudos
também mostraram que ela modula o processo de reparo, e induz maior potencial para a quimiotaxia de
células de defesa, principalmente os macrófagos, que limpam a região, eliminando fatores que impeçam ou
retardem a cura. Também induz o processo de reparação mais rápido em pacientes HIV-positivos após
exodontia.
O formocresol é medicamento amplamente utilizado na pulpotomia de dentes decíduos, devido a
facilidade de utilizá-lo, e sua média de sucesso clínico a curto prazo ser alta. Contudo, os efeitos citotóxicos
de seus componentes, a possível difusão nos tecidos periapicais e sistêmicos, e os possíveis efeitos
mutagênicos e carcinogênicos são aparentes. É composto por 19% de formaldeído, 35% de tricresol e 15%
de glicereina em uma base aquosa, sendo a forma mais utilizada, possuindo propriedades desinfectantes e
fixadoras.
O formol misturado em água é um redutor que reage com inúmeras substâncias orgânicas, precipitando
as proteínas, apresentando ação bactericida. Fixa a polpa subjacente a ela pela interação química da droga
com as proteínas celulares. Provoca, ainda, trombose, que resulta em isquemia. Essa substância é irritante,
e portanto, prejudicial ao tecido pulpar vitalizado. A outra parte do formocresol representado pelo metil-
fenol mostra poder antisséptico 4 a 5 vezes maior que o da fenol, porém, com propriedade irritante mais
atenuada. O cresol serve como antisséptico, além de atenuar o poder irritante do formol. A glicerina tem
ampla utilização com solvente, conservante e edulcorante em várias fórmulas de medicamentos. No
formocresol, além de ser veículo, também atenua o poder irritante do formol.
Pelo fato do formocresol apresentar em alta toxicidade em sua forma clássica, podendo causar necrose
e posterior fracasso, pesquisadores preocuparam-se em desenvolver medicamentos cada vez menos
irritantes aos tecidos pulpares e periapicais. Dessa forma, fizeram-se estudos com o uso do formocresol
diluído 1/5. Porém, apesar de ser menos tóxico que o original, a sua aplicabilidade clínica não é desejável.
Assim o glutaraldeído tem sido proposto como uma alternativa, devido às suas propriedades fixadoras
superiores e propriedades antimicrobianas efetivas, aliadas à mínima difusão nos tecidos periapicais.

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O glutaraldeído é mais vantajoso que o formocresol, sendo capaz de fixar os tecidos superficialmente,
limitando a sua penetração, mantendo a vitalidade da polpa subjacente a sua ação e que há lenta ação
progressiva de fibrose no tecido pulpar coronário, não atingindo o periápice. Não vai além da região
inferior da raiz, provocando menos respostas periapicais.
O hidróxido de cálcio apresenta propriedades antibacterianas, atribuída ao seu pH fortemente alcalino,
que destrói, por contato, as bactérias que possam ter permanecido no canal. No entanto, para exercer esse
efeito, o material deve permanecer no canal entre 7 dias e mais de 6 semanas, para que haja inativação
enzimática das bactérias anaeróbias, de forma irreversível. Ele inativa a molécula do lipopolissacarídeo
(LPS), resultando na sua degradação com liberação de ácidos graxos livre de hidróxido, podendo também
alterar as propriedades biológicas do LPS, endotoxina capaz de estimular reações de defesa e inflamatórias,
bem como desencadear reabsorção óssea. Apresenta ainda capacidade de reduzir o exsudato e auxiliar na
redução do processo inflamatório, por atuar como vasoconstritor capilar. Tem capacidade de dissolver
remanescentes de tecido pulpar, e atuar como indutor do processo de mineralização, neutralizando o pH
ácidos das lesões periapicais. É usado como campeador da porção radicular após pulpotomia, porém,
apresenta sucesso apenas em dentes permanentes, com resultados não animadores em dentes decíduos.
É importante ressaltar que a escolha do material a ser utilizado no tratamento pulpar de dentes decí-
duos deve considerar o ciclo biológico deste dente, não relacionando com os resultados obtidos em dentes
permanentes.
Técnicas
Capeamento Pulpar Direto
Contraindicado na maioria dos casos em dentes decíduos, exceto em casos especiais, como molares de
crianças com menos de 4 anos de idade ou antes do início da reabsorção destes dentes, e onde a exposição
não foi contaminada por saliva, o tecido cariado tenha sido removido e o diâmetro da exposição seja
pequeno. A pulpotomia é um procedimento mais seguro. Em casos onde se indique o capeamento direto,
recomenda-se óxido de zinco e eugenol ou hidróxido de cálcio como agente capeador, além da pasta
Guedes-Pinto, que obteve bons resultados. Quando se usar a PGP ou óxido de zinco e eugenol, o selamento
cavitário deve ser feito com IRM. Quando se usa hidróxido de cálcio, se faz o selamento com cimento de
fosfato de zinco, de policarboxilato ou CIV. A restauração deve ser feita o mais rápido possível, para evitar a
perda do agente capeador.
Condutas conservadores que necessitem de respostas pulpares reparadoras para o bom prognóstico do
tratamento devem ser avaliadas, de acordo com o ciclo biológico do dente.
Capeamento Pulpar Indireto
Feito com certa frequência, em particular em dentes com cáries profundas em que a continuidade da
remoção do tecido cariado pode expor a polpa. Nesses casos, suspendemos a curetagem e colocamos um
curativo sobre a dentina remanescente, que pode ser de óxido de zinco e eugenol ou hidróxido de cálcio. A
indicação desse tratamento está diretamente ligada à resposta pulpar. Obviamente, dentes com pulpite,
mesmo sem exposição pulpar, não se enquadram nessa indicação.
Os dois tipos de capeamento requerem acompanhamento do caso. Na suspeita de fracasso, deve-se
tentar a etapa seguinte do tratamento pulpar. Se o dente apresentar vitalidade, opta-se pela pulpotomia.
Se a polpa tiver mortificada, indica-se o tratamento específico.
Pulpotomia
Técnica que consiste da remoção da polpa coronária e subsequente uso de medicamentos que procu-
ram manter a polpa radicular em condições de saúde, permitindo que o ciclo biológico de reabsorção
radicular se processe naturalmente. É indicada para dentes decíduos com vitalidade pulpar e que não
possuam mais de dois terços de reabsorção radicular, nem lesão na bi ou trifurcação das raízes dos
molares. Em crianças com baixa resistência e saúde geral precária, os resultados do tratamento endodônti-
co apresentam sucesso em porcentagens menores, em especial quando se deseja uma resposta da polpa,
como nos casos de capeamento e pulpotomia, e por isso, esses tratamentos são feitos como tentativa, e os
pais devem ser avisados.
A pulpotomia com a pasta Guedes-Pinto é feita com a mesma técnica, e após se conseguir a hemostasia
com uma pelota de algodão estéril, a polpa radicular é coberta com a pasta. Sobre a pasta coloca um fino
disco de guta-percha, sobre o qual restaura-se o dente, preferencialmente na mesma sessão.

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Dentre os vários materiais usados, o mais conhecido é o formocresol, por sua eficácia clínica, apesar dos
seus efeitos tóxicos. A técnica de trabalho consiste em anestesia local, isolamento absoluto, remoção de
tecido cariado com broca, exposição da polpa e remoção com cureta, aplicar uma pelota de algodão com
formocresol e aguardar de 3 a 5 minutos, retirar o algodão, colocar uma base de óxido de zinco e eugenol e
selar o dente. Na tentativa de diminuir os efeitos tóxicos, alguns autores recomendam o uso de formocre-
sol diluído a 1/5, usando a mesma técnica.
O glutaraldeído é considerado um desinfetante eficaz e atua contra várias espécies de microrganismos.
Na odontologia, a proposta de seu uso visa fixar o tecido pulpar. O seu efeito de fixação é superficial por
união de moléculas de proteínas em nível de aminoácidos, no grupos peptídicos, não alterando a estrutura
básica dos tecidos, porém, modificando sua atividade química e aumentando a dureza dos tecidos, o que
lhe confere propriedades desejáveis. Produz também trombose, isquemia e coagulação. Existem
controvérsias quanto à concentração (2% ou 5%) e tempo de permanência do medicamento sobre a polpa
(5 min ou menos). Outro fator de discussão é o pH da solução, que é ácida, ser um dos inconvenientes ao
seu uso. A técnica obedece os passos tradicionais até a hemostasia, e após esta, a colocação de uma pelota
de algodão com glutaraldeído por 5 minutos sobre o remanescente pulpar. Depois, remove o algodão e sela
o dente com óxido de zinco e eugenol.
Pulpectomia
Consiste na remoção total da polpa viva, e está indicada para dentes decíduos anteriores e posteriores
com pulpite aguda, ou para dentes que após a tentativa de pulpotomia continua com sangramento
abundante. Indicada também para dentes decíduos com grande destruição coronária que necessitam de
pino intracanal, ou ainda nos casos de dúvida da vitalidade da polpa. A técnica usada para dentes com
polpa viva é igual à que será descrita a seguir para dentes com polpa morta, tomando cuidados especiais,
como não ultrapassar com a lima o início de reabsorção radicular.
O tratamento endodôntico de dentes decíduos com mortificação pulpar tem sido baseado quase que
exclusivamente na ação dos medicamentos intracanais, com o objetivo de promover a desinfecção
desejada, devido a dificuldade de instrumentação desses canais em razão da própria anatomia e
reabsorção radicular destes dentes. Por isso, deve-se usar medicamentos com ação bactericida e
bacteriostática, onde os mais usados são tricresol formalina, paramonoclorofenol canforado, formocresol,
eugenol e timol, usados de forma isolada ou associada.
Esses medicamentos, entretanto, provocavam a morte das bactérias por coagulação, afetando, da
mesma forma, os remanescentes da polpa, limitando a penetração do medicamento, impedindo a
continuidade do efeito da volatização, e com isso, o material necrótico próximo do ápice radicular não
sofria efeito do fármaco. Frequentemente não havia cura e ocorria recidiva das lesões.
As substâncias químicas auxiliares do tratamento devem possuir qualidades, como facilitar o uso do
instrumento, remover restos orgânicos contaminados ou não, combater os possíveis germes existentes,
permitir o seu íntimo contato com as superfícies dentais (os detergentes, que possuem baixa tensão
superficial, facilitando o “molhamento” das superfícies), além de serem bem tolerados pelos tecidos vivos,
sem causar coagulação ou desnaturação das albuminas vivas, e possuir ação de limpeza energética.
O tratamento endodôntico de dentes decíduos com necrose consiste na remoção da maior parte desse
tecido contaminado, permitindo que o medicamento usado atue sobre a menor quantidade desse tecido,
para que se obtenha uma resposta orgânica favorável, que será avaliada por exames clínicos e radiográficos
periódicos (3 meses, pelo menos). Essa limitação ocorre devido à anatomia dos dentes decíduos, com
canais tortuosos e canais colaterais, delta apical etc., além do fenômeno de reabsorção radicular.
A técnica preconizada é indicada para dentes anteriores e posteriores com polpa mortificada, com ou
sem lesão periapical, na presença ou não de fístula. Um dos principais problemas dessa técnica é o limite
apical da instrumentação. Assim, demonstra-se a possibilidade de condutometria em dentes decíduos que,
ao se medir o instrumento intracanal, deve-se recuá-lo 1 mm, que sempre estará dentro dos limites de
segurança. É importante que a radiografia seja de boa qualidade, para a visualização de pontos de
reabsorção ectópica da raiz, para não inserir indevidamente o instrumento, provocando acidentes como
lesão no germe do permanente.

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Cirurgia em Odontopediatria
A cirurgia é uma modalidade de terapêutica praticada por atividade manual e com o auxílio de instru-
mentos apropriados que, por meio de manobras cruentas, permitem a obtenção da solução de continuida-
de dos tecidos e a atuação direta na causa determinante do seu uso. Na Odontologia existem dois tipos de
cirurgias, chamadas de oral menor ou bucodentoalveolar e bucomaxilofacial. A bucodentoalveolar pode ser
feita por todos os cirurgiões-dentistas, e a bucomaxilofacial requer mais conhecimentos, sendo restrita ao
especialista.
A cirurgia, quando decidida, deve ser comunicada aos pais da criança, explicando o porquê e as possíveis
complicações e o que será feito. Recomenda-se que a autorização dos pais seja feita por escrito.
Os princípios básicos que regem a cirurgia bucal em crianças são os mesmos que orientam a cirurgia
bucal em adultos: necessidade e oportunidade; assepsia e antissepsia; técnica cirúrgica atraumática e
realizada com instrumentais adequados.
A necessidade refere-se a determinação correta e segura de que a cirurgia representa a forma de
terapêutica mais adequada. Fundamenta-se em uma diagnóstico completo do quadro clínico, avaliando os
aspectos da sua etiologia, do grau de comprometimento anatomofuncional, das vantagens oferecidas e das
sequelas inerentes ao ato cirúrgico. Deve ser sempre considerada a última opção entre as modalidades
terapêuticas. Como exemplo das múltiplas peculiaridades inerentes a cirurgia em crianças, temos a
indicação de remoção de dentes decíduos, considerando aspectos que se relacionam com os permanentes
sucessores.
A evolução para a cura da ferida cirúrgica depende de condições favoráveis da saúde local e sistêmica do
paciente. Assim, avaliamos a oportunidade, ou seja, constatar se o ato operatório pode ser efetuado
imediatamente, ou se é preciso postergá-lo para corrigir algum aspecto da saúde local e/ou sistêmica,
como a diabetes melito, ou controle de infecção (local ou sistêmica) e inflamação (local). Por outro lado,
temos os estágios terminais de doenças degenerativas hepáticas, cardíacas, renais, além de doenças
consuntivas, como as neoplasias, representando condições que podem impedir a aplicação da terapêutica
cirúrgica (inoportunidade definitiva). O odontopediatra deve estar a par da doença infantil, da sua
interferência no ato operatório e dos recursos que pode usar para adequar o paciente à cirurgia. Na
maioria das vezes, em Odontopediatria, as inoportunidades são momentâneas e podem ser compensadas
de forma a possibilitar a exodontia.
Resumindo, o princípio da oportunidade cirúrgica visa possibilitar o ato operatório, sem agravar a
condição geral da saúde do paciente, bem como evitar que no trans e pós-operatório possam ocorrer
interferências desfavoráveis que tenham origem nas condições inadequadas da saúde sistêmica.
As medidas de assepsia e antissepsia visam a prevenção de infecções. Medidas de assepsia visam reduzir
a quantidade de microrganismos que possam vir a contaminar a ferida cirúrgica, por meio da equipe,
instrumental, campo cirúrgico e ambiente. Medidas de antissepsia representam o uso tópico de susbtân-
cias específicas que diminuem a quantidade de germes presentes na região anatômica, sede da cirurgia. Os
desinfetantes são subtstâncias capazes de prevenir a multiplicação de microrganismos capazes de produzir
sépsis (colapso dos tecidos vivos, em consequência da ação de microrganismos, geralmente acompanhada
de inflamação). A esterilidade representa a inexistência de qualquer forma viável de microrganismos.
A técnica cirúrgica atraumática consiste na aplicação da técnica operatória mais adequada à resolução
do quadro clínico do paciente, fazendo uso do instrumental correto, e respeitando a técnica. Deve-se
desenvolver habilidade psicomotora no uso do instrumental; ter conhecimento de algumas variáveis da
técnica, tornando possível selecionar aquela que seja mais vantajosa; ter amplo conhecimento da anatomia
regional; ter condições de manter e recompor as funções fisiológicas básicas, entre outras.
As medidas pré-operatórias consistem na obtenção da oportunidade cirúrgica (adequar o paciente),
determinar o padrão cirúrgico – hospitalar ou ambulatorial – e todos os demais recursos que tornem a
cirurgia viável, incluindo a medicação pré-operatória.
As medidas pós-operatórias visam obter as melhores condições para que a recuperação do paciente e a
evolução para a cura da ferida cirúrgica ocorram da melhor forma possível. Para quase todas as cirurgias
menores, essas medidas são rotineiras, visando o controle da dor, a redução da intensidade da inflamação
traumática e a contribuição para a hemostasia regional, com a obtenção de um coágulo sanguíneo
estabilizado, favorecendo o reparo tecidual.
Deve-se lembrar que a criança encontra-se em fase de crescimento e desenvolvimento, e precisa de um
cuidado especial ao intervir próximo a centros de crescimento e estruturas em desenvolvimento. O preparo
psicológico da criança e dos pais é fundamental, exigindo do profissional paciência, uso da sinceridade e se

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compreensivo e firme, ao mesmo tempo. Para o controle da dor, uma anestesia eficaz é fundamental,
principalmente na criança, para a manutenção do condicionamento psicológico. Lembrar que o tecido
ósseo é menos calcificado e mais poroso, e que o forame mandibular, na dentição decídua, está localizado
abaixo do plano oclusal.
A exodontia é procedimento mais frequente na odontologia. Seus objetivos são limitar o dano causado
pela doença ou pelo traumatismo, de forma a evitar sequelas de ordem local e sistêmica; e favorecer a
correção do déficit anatomofuncional existente, contribuindo para a reabilitação funcional em aplicação
conjunta com outros recursos de terapêutica.
Assim como em outros procedimentos, ela deve seguir princípios, como posicionamento correto do
paciente e do profissional, permitindo visualização adequada do campo operatório; obtenção de uma via
desimpedida para a exérese do dente, reduzindo a resistência à sua remoção e não traumatizando dentes
permanentes sucessores; uso de instrumental apropriado, com força controlada, e respeitando ao máximo
a integridade das estruturas adjacentes.
É conveniente planejarmos etapas sequenciais, como: a exodontia foi considerada necessária; a exodon-
tia tornou-se oportuna; a criança é calma e está pronta para colaborar; a anestesia será local com
determinado anestésico; com base em boas radiografias seleciona-se a técnica adequada; hemostasia pós-
operatória efetuada; e recomendações pós-operatórias (rotineiras ou não).
Remoção de Dentes Decíduos
Para efetuar a remoção de dentes decíduos, alguns aspectos devem ser considerados: o medo da
criança; deve-se avisar com alguns dias de antecedência que se pretende efetuar a exodontia; as remoções
de dentes com coroas totalmente destruídas são as mais trabalhosas; é imprescindível estar baseado em
radiografias adequadas, para avaliar o grau de integridade radicular do decíduo, o grau de intimidade do
decíduo com o permanente a ele justaposto, o estágio de rizólise do dente decíduo, o estágio evolutivo da
rizogênese do permanente e a existência de doença óssea regional; a eficácia da anestesia é prioritária.
A exodontia é indicada quando não existem recursos de terapêutica conservadora a serem usados;
quando favorece a resolução terapêutica de doença local e/ou sistêmica; quando possibilita a correção de
anormalidade funcional das arcadas dentárias; quando o dente decíduo apresenta comprometimento
pulpar e já tiver ocorrido o rompimento da cripta do germe do sucessor permanente; e nos casos de dentes
com alveólise, dentes com raízes fraturadas e dentes anquilosados e submersos.
Para a remoção de dentes decíduos com o uso de fórceps, recomenda-se os fórceps infantis, pois, seu
tamanho menor, facilita as manobras técnicas. Os movimentos realizados para luxar um dente variam em
função do número de raízes. Para dentes unirradiculares, emprega-se movimentos pendulares e de
rotação, e para dentes multirradiculares, emprega-se movimentos de lateralidade e/ou pendulares. A parte
ativa do fórceps deverá prender corretamente na raiz, para que a força seja transmitida ao dente de forma
correta. Nos casos onde a coroa do dente está muito fragilizada por cárie extensa, deve-se considerar a
possibilidade de fratura, e se esta ocorrer, lançar mão de elevadores dentais. O fórceps não deve ser usado
se a radiografia mostrar que pode lesar o dente permanente justaposto.
Os elevadores dentais foram projetados com diferentes pontas ativas. Os mais usados em Odontopedi-
atria são os de Seldin reto e o curvo, e os apicais. São indicados para luxar dentes, expandir a cortical
vestibular e remover raízes residuais fraturadas, ou que foram seccionadas para facilitar a cirurgia. O
domínio da técnica para seu uso é muito importante para que não haja danos aos dentes adjacentes ou aos
sucessores permanentes, e para isso, o apoio deve ser em tecido ósseo. Para quem ainda não tem
segurança, pode ser menos prejudicial não remover pequenos fragmentos dentários e esperar sua
superficialização, por resposta inflamatória ou irrompimento do permanente.
A odontossecção com instrumentos rotatórios visa reduzir a resistência à avulsão dentária. Nos molares
decíduos, ocorre pelo dente permanente se situar encarcerado entre suas raízes. Nos molares decíduos
inferiores deve ser feita de vestibular para lingual com broca troncocônica diamantada ou Zekria, sendo a
clivagem (separação das raízes) realizada com alavanca manual reta. Já nos molares decíduos superiores, a
secção deve ser em forma de “Y” devido à posição e ao número de raízes. Um dos cuidados no uso de
brocas é o condicionamento correto da criança, que não deve estar muito agitada e se movimentando.
Deve haver irrigação e aspiração adequadas.
A osteotomia não é uma manobra rotineira em Odontopediatria. É indicada para acesso a dentes não-
irrompidos, dentes com anquilose radicular e em algumas situações para o acesso a raízes residuais. Pode
ser feita com instrumentos rotatórios ou instrumentos manuais apropriados, como os osteótomos.

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Vale lembrar que os instrumentais cirúrgicos podem despertar apreensão, e, portanto, a mesa clínica
deve ficar fora do alcance visual do paciente. Em algumas situações temos que lançar mão de outra técnica
durante o ato cirúrgico, caracterizando o uso de técnicas combinadas.
A anquilose dental caracteriza-se pela fusão anatômica entre o dente e o osso alveolar, com desapare-
cimento do ligamento periodontal. É frequentemente observado em molares decíduos. Na região da
anquilose, o crescimento ósseo alveolar deixa de ocorrer e o dente anquilosado passa a localizar-se abaixo
do plano oclusal, ligeiramente fora de oclusão ou totalmente dentro do processo alveolar, mas mostrando
evidência de já ter estado na boca. Para a remoção de um dente anquilosado, tenta-se primeiramente o
uso de alavancas e fórceps. Se a luxação não for obtida, deve-se partir para a remoção do tecido ósseo que
o circunda, com o auxílio de broca esférica nº8 ou troncocônica, sob intenso resfriamento com soro
fisiológico estéril. Normalmente também se opta por odontossecção, seguida da luxação e avulsão. Nos
casos em que não se consegue diferenciar o que é raiz e o que é osso, faz-se uma dissecção em bloco,
controlada por meio de radiografias.
A curetagem deve ser feita sempre que, após a exodontia, se constatar a presença intra-alveolar de
lesão patológica, passível de ser removida por curetagem. Deve ser feita de maneira cuidadosa devido à
presença do sucessor permanente, com atenção especial para não deixar resíduos de um processo
patológico que possa vir a evoluir, ou atuar como um foco residual.
A sutura para dentes decíduos geralmente é indicada quando a passagem da agulha não venha a causar
esgarçamento do tecido gengival e não possa lesar as porções mais superficiais do germe sucessor, e
também nos casos de exodontias múltiplas. O fio de sutura mais usado é o de seda preta 3-0 ou 4-0. A seda
é um material não absorvível, de fácil visualização, bem tolerado pelos tecidos moles e pela língua, e não
desata com facilidade. Devem ser retiradas após 5 a 7 dias. Em casos de acidentes hemorrágicos transope-
ratórios deve ser sempre praticada, preferencialmente com fio reabsorvível.
O risco de acidentes transoperatórios diminui consideravelmente quando se seguem os princípios da
exodontia. Entretanto, podem ocorrer acidentes, como fraturas radiculares ou coronárias, hemorragia,
deslocamento ou avulsão de um sucessor permanente, corte ou laceração de tecidos moles etc.
Quando acidentalmente um dente permanente sofrer avulsão junto com o decíduo, ele deve ser
recolocado cuidadosamente em seu alvéolo, e os tecidos devem ser suturados, com acompanhamento
clínico e radiográfico do dente reimplantado. A prescrição de antiinflamatórios e antibióticos pode
contribuir para o sucesso, e em casos de resposta inflamatória exacerbada, deve admitir o insucesso e
remover o dente.
A maioria das remoções de dentes decíduos evolui sem complicações. Estas ocorrem geralmente
quando não se tem uma análise correta da oportunidade cirúrgica. Tampões de gaze promovem a
formação do coágulo. Analgésicos podem ser prescritos na dosagem adequada. Os pais devem ser
orientados a uma alimentação líquida e fria nas primeiras 24h, e comunicar qualquer fato que ocorra
decorrente da cirurgia.
Dentes Não Irrompidos
Os dentes não irrompidos são aqueles que, passada a época normal para sua irrupção, ainda permane-
cem dentro dos tecidos. Podem ser considerados inclusos, quando não existe bloqueio ao seu irrompimen-
to, ou impactados, quando há um obstáculo. A sua remoção será necessária quando o dente puder ser
relacionado com a presença de um cisto ou tumor odontogênico, ou com manifestações de repetidas
reações locais inflamatórias; quando interferir no tratamento ortodôntico; quando estiver relacionado
como causa de dano aos tecidos periodontais ou mesmo das estruturas mineralizadas de um dente
irrompido e posicionado na arcada; previamente ao tratamento regional por irradiação; e quando o dente
for portador de lesão de cárie ou reabsorção interna. Fora esses critérios, alguns casos necessitam de
análise isolada. Sua permanência deve ser periodicamente avaliada.
Alguns dentes permanentes não irrompidos podem ser orientados a irromper e se posicionarem
corretamente na arcada, por técnicas cirúrgicas e ortodônticas. Outra opção para isso é o reimplante
dentário. Esses dois recursos devem ser avaliados, considerando os fatores negativos e o ganho do
paciente.
Cerca de 90% dos dentes supranumerários ocorrem no maxilar superior, preferencialmente na linha
média, seguindo-se a região de pré-molares e molares, no gênero masculino e na dentição permanente.
Contudo, podem se localizar em qualquer parte do rebordo alveolar dos maxilares, sendo únicos ou aos
pares e em qualquer posição. Precisam ser retirados quando impedem o irrompimento de um dente

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permanente, quando sedia um cisto dentígero, quando participa da formação de um diastema ou quando
representa a causa do desposicionamento de um dente permanente na arcada. A decisão de não retirar
deve ser comunicada, sabendo que haverá possibilidade de modificação de conduta, com base nos achados
clínicos e radiográficos periódicos.
A escolha da época para a exodontia deve levar em consideração o estágio evolutivo da rizogênese dos
dentes permanentes, aguardando no mínimo a formação de 2/3 da raiz, ou a formação completa.
O conhecimento da posição real do dente supranumerário é imprescindível para a escolha da técnica
cirúrgica correta, preservando ao máximo a integridade das estruturas anatômicas adjacentes, e para isso,
deve-se usar métodos de localização radiográfica ou ainda uma tomografia linear ou computadorizada 3D.
A descrição da técnica cirúrgica é baseada na maioria absoluta dos casos, portanto, na região anterior
superior. Os dentes supranumerários podem estar posicionados próximos da cortical óssea alveolar do
vestíbulo, do palato ou em equidistância a ambas, sendo um fator básico para determinar o lado mais
favorável do acesso cirúrgico.
Com localização vestibular a sequencia cirúrgica é assim descrita: antissepsia intra e extrabucal; aneste-
sia tópica; anestesia infiltrativa mesial e distal, bem como na mucosa palatina; traçado incisional nas papilas
interdentais ou na mucosa gengival, na dependência da altura, em relação ao longo eixo do dente
permanente que o supranumerário se localiza; divulsão dos tecidos moles com uso de uma espátula de
Freer; osteotomia com cinzel (goiva), de preferência aplicado manualmente, em torno da porção dentária
mais proeminente no vestíbulo, visando obter uma via desimpedida para a avulsão com uso de elevadores
dentais; regularização da loja óssea; curetagem; sutura.
Com localização palatina, a anestesia é infiltrativa em toda a extensão da mucosa compreendida entre
os primeiros molares, de ambos os lados. O traçado incisional é feito nas papilas interdentais, de forma a
permitir a divulsão de toda a mucosa palatina, de molar a molar. A osteotomia com cinzel e martelo ou
mesmo com instrumento rotatório é feita, de início, na região da coroa dentária. Liberada a coroa, faz-se
sem maiores dificuldades a avulsão do dente com uso de elevadores dentais.

Com localização palatina, a anestesia é infiltrativa


em toda a extensão da mucosa compreendida entre
os primeiros molares, de ambos os lados. O traçado
incisional é feito nas papilas interdentais, de forma a
permitir a divulsão de toda a mucosa palatina, de mo-
lar a molar. A osteotomia com cinzel e martelo ou
mesmo com instrumento rotatório é feita, de início,
na região da coroa dentária. Liberada a coroa, faz-se
sem maiores dificuldades a avulsão do dente com uso
de elevadores dentais.

A odontosecção é uma técnica usada quando não é possível liberar toda a coroa dentária do tecido
ósseo que a envolve. Em seguida, deve-se remover os tecidos foliculares e apicais, que em geral não estão
totalmente calcificados. Depois, regulariza a loja óssea, limando as saliências ósseas que possam ter ficado
e faz a sutura com fio de seda ou categute.
Na posição intermediária, a avulsão do supranumerário torna-se mais complexa, até mesmo para
determinar o acesso cirúrgico. Havendo erro quando a esse acesso, não deve se tentar outro, no mesmo
ato cirúrgico, pois pode comprometer a irrigação sanguínea no tecido ósseo alveolar. Nessa posição, a
odontosecção é mais frequente, e muitas vezes torna-se necessária a fixação interdentária dos dentes
irrompidos.
Respeitado os princípios básicos da cirurgia, o pós-operatório avalia o controle da dor, edema, da
imobilização tecidual, visando à hemostasia e à ingestão de alimentos líquidos e frios. O controle
radiográfico deve ser feito para avaliar osteogênese e recidiva de processos patológicos constatados no
pré-operatório.
Cistos de Erupção
Na dentição decídua, os cistos de erupção, um tipo de cisto dentígero extraósseo, ocorrem quando o
dente tem dificuldade de vencer resistências ao seu irrompimento na arcada e permanece com a face
oclusal da sua coroa recoberta por um capuz de mucosa gengival, favorecendo o desenvolvimento de um

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quadro inflamatório de natureza traumática, e o exsudato inflamatório dá origem a uma lesão bolhosa, que
pode conter apenas líquido (translúcido azulado) ou também pigmento hemoglobínico (hematoma). O
quadro clínico pode tornar-se dolorido e incômodo. A terapêutica é cirúrgica, e consiste na exérese dos
tecidos que se superpõem à face oclusal do dente não-irrompido, permitindo um caminho desimpedido
para a oclusão, colocando-o em contato com o meio intrabucal (ulectomia), técnica muito semelhante à
marsupialização dos processos císticos com localização intraóssea.
Ulectomia e Ulotomia
A técnica é chama de ulectomia quando se remove tecido, e ulotomia quando há apenas incisão.
também denomina ulectomia a remoção cirúrgica da mucosa gengival que permanece recobrindo a coroa
de dentes parcialmente irrompidos.
Na técnica cirúrgica, faz anestesia local infiltrativa ao redor dos tecidos que devem ser removidos. Se o
quadro inflamatório não for muito intenso, usa um bisturi incisando circunferencialmente a mucosa
gengival que deve ser removida e, por sua divulsão, expõe a coroa subjacente, que pode ainda está
recoberta por tecido ósseo alveolar. Nessa situação, efetua-se cuidadosamente a osteotomia, usando de
preferência um cinzel reto de Black, aplicado manualmente, seguida de raspagem óssea com um escariador
visando à regularização tecidual. Se o quadro inflamatório for muito intenso, se faz a ulectomia em dois
tempos cirúrgicos. No primeiro tempo, após anestesia local infiltrativa, faz a drenagem do conteúdo da
lesão bolhosa, e depois de 24-48 horas, o segundo tempo cirúrgico, descrito anteriormente.
Quando o aspecto for de hematoma, deve-se fazer a punção exploradora, manobra simples, que
fornece informações capazes de evitar uma incisão em lesão hemangiomatosa, evitando hemorragia
intensa.
Para a maioria das situações clínicas, a superficialização do dente não-irrompido faz com que a etapa de
manipulação tecidual termine com a constatação de que a hemostasia regional foi obtida. Em situações
onde o dente encontra-se em maior profundidade e recoberto por tecido ósseo, é conveniente o uso de
manobra de orientação ao reparo tecidual feita pela aposição de uma gaze vaselinada ou furacinada
(impede aderências) mantida por sutura no local por 48-72 horas. Esse recurso dificulta a reaproximação
dos tecidos e facilita o irrompimento dentário que, se não vier a ocorrer em prazo normal, possibilita a
formação de novo cisto.
Frenectomia
A frenectomia consiste na remoção cirúrgica dos freios dos lábios e da língua. O freio labial superior está
presente a partir do 3º mês de vida IU, e consiste de uma prega que conecta o tubérculo do lábio superior à
papila, denominado de freio tetolabial. É constituído de um tecido epitelial pavimentoso estratificado
superficial que contem internamente um tecido conjuntivo com estrutura fibroelástica, bastante
vascularizado. No adulto, é uma prega fina, triangular, com a base voltada para o fundo do sulco vestibular.
No RN, o freio do lábio superior estende-se até a papila incisiva, podendo permanecer em definitivo nessa
posição ou, devido à expansão do rebordo ósseo alveolar decorrente do irrompimento dentário, vir a
apresentar sua inserção principal no vestíbulo bucal, com algumas fibras estendendo-se e inserindo-se na
região de papila incisiva. Suas funções são amplas no RN e restritas no adulto, limitando movimentos
exagerados do lábio que permitam a excessiva exposição ambiental da mucosa gengival.
A exérese do freio labial é preconizada por razões bem diversificadas e polêmicas. As principais são:
presença de freio tetolabial persistente; quando o freio dificulta a sucção de alimentos e interfere na
fonação; visando favorecer tratamento ortodôntico e periodontal com fechamento de diastemas; e quando
há dificuldade de escovação e tensão direta do freio sobre a mucosa gengival. Por outro lado, a possibilida-
de de cicatrizes viciosas, hipertróficas em sua maioria, tem sido um fator impeditivo da frenectomia.
A figura mostra freio tetolabial
persistente com indicação cirúrgi-
ca. Sinais clínicos: baixa inserção,
presença de diastema e isquemia
da papila quando tracionado.

Os procedimentos cirúrgicos podem ser de dois tipos. O reposicionamento, que consiste em colocar o
freio labial em uma nova posição anatômica, eliminando suas interferências negativas. Nessa técnica o

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repouso tecidual pós-operatório é determinante, e por isso, é restrita a pouco casos, preferencialmente em
adultos. E a exérese, que consiste na remoção da porção anatômica do freio visível macroscopicamente e
responsável pela maioria das interferências que se pretende corrigir. É o procedimento de rotina.
A idade ideal para a remoção do freio é bastante controversa. A maioria dos autores julga ideal: imedia-
tamente após o nascimento; após a remoção dos incisivos laterais decíduos; após a erupção dos incisivos
laterais permanentes; e após a erupção dos caninos permanentes. Pelo caráter eletivo da frenectomia,
julga-se que a época correta para sua remoção seja determinada por diversos aspectos, como a oportuni-
dade cirúrgica, a possibilidade de uso de anestésico local, colaboração do paciente no trans-operatório e
condições de seguir as orientações pós-operatórias, evitando cicatriz anômala que comprometa a estética
regional e exercitação funcional normal do lábio.
A técnica cirúrgica consiste em uma fase preliminar, onda já o preparo da boca (campo operatório,
cuidados antissépticos etc.) e anestesia, e a fase cirúrgica, dividida nos seguintes tempos: incisão,
frenectomia e sutura. A anestesia é infiltrativa (bilateral), no fundo do saco gengivolabial próximo do freio,
com complementação intrapapilar e por palatino, ao redor da papila incisiva. a proteção da ferida cirúrgica
deve ser feita com cimento cirúrgico na região do rebordo alveolar, por no mínimo 72 horas. A reparação
inicial começa em 5 a 7 dias, quando se remove a sutura, e a nova inserção só será visualizada em 21 dias.
O freio lingual é constituído de epitélio pavimentoso estratificado desqueratinizado, com tecido conjun-
tivo interno rico em fibras colágenas e elásticas, bem como células adiposas, fibras musculares e vasos
sanguíneos. No RN, estende-se do ápice da língua até a base do processo alveolar da mandíbula. Em poucas
semanas, com o alongamento da língua, passa a ocupar a porção central da parte anterior da língua, sua
posição final. Alterações funcionais no músculo genioglosso e um freio lingual curto são os fatores
desencadeantes da anquiloglossia ou “língua presa”, que provoca interferência na dicção, na função de
autóclise (autolimpeza), bem como no crescimento evolutivo normal da mandíbula.
O tratamento conservador é feito por fonoterapia, com exercícios quem alongam a estrutura do freio
lingual. O tratamento cirúrgico é a frenectomia lingual. Em bebês, pode ser feita com anestésico tópico
oftálmico e uma única incisão, diante da dificuldade de apreender o mamilo no aleitamento materno.
Na técnica cirúrgica, faz-se anestesia local nos nervos linguais de ambos os lados, na região do lado
interno do ramo ascendente da mandíbula. Para fazer a imobilização da língua, utiliza-se a técnica da
transfixação com fio de seda ou se algodão, feita na estrutura muscular situada próxima à ponta da língua.
Pode-se utilizar outra técnica, usando um tentacânula de 15cm, utilizado na posição contrária à original,
posicionando corretamente a língua e posicionando o freio de tal forma que permita ao operador servir-se
de referência para a incisão. A partir daí, usa-se uma tesoura cirúrgica, seccionando o freio em sua porção
mediana, com cuidado para que não haja um corte excessivo. Agindo nos tecidos componentes do freio,
por divulsão, dá amplitude maior a ferida cirúrgica e obtém um traçado bem próximo ao linear, para
facilitar a sutura com fio 4.0 ou reabsorvível. Deve-se dispor de pinças hemostáticas tipo Kelly, para se
houver seccionamento arteriolar. O diagnóstico é multiprofissional, e havendo oportunidade cirúrgica,
opera-se de imediato. O pós-operatório é tranquilo, porém, incômodo, pela dor provocada pela movimen-
tação da língua. Após 15 dias, pode-se fazer fonoterapia.
Processos Inflamatórios Sépticos
Os processos inflamatórios sépticos de origem dentária ocorrem quando a defesa do organismo promo-
ve uma resposta inflamatória contra um agente microbiano, provocando dor, rubor, calor, edema e perda
funcional regional. Os quadros inflamatórios podem ter origem nos dentes, periodonto, trauma ou ser de
natureza cística e neoplásica. Os de origem pulpar já tem sequência evolutiva bem conhecida, e por isso,
suas etapas de evolução serão descritas preconizando a terapêutica compatível em cada uma delas.
A primeira fase é bem nítida nos dentes permanentes e algumas vezes fugaz nos decíduos. Caracteriza-
se pela concentração do exsudato, advindo da resposta inflamatória, na região periodontal, promovendo a
extrusão alveolar do dente (“dente crescido”), mobilidade e dor intensa ao toque. Pode haver envolvimen-
to da cadeia ganglionar linfática cervical, com gânglios aumentados, doloridos e com mobilidade. Na
criança, pode ocorrer febre, mal-estar geral, náuseas e cansaço. Além disso, pela grande quantidade de
osso medular ou esponjoso, a evolução é rápida e pode comprometer os tecidos que constituem centros de
crescimento e os germes do dente sucessor (hipoplasia do esmalte ou manchas marrons). O tratamento é
feito com drenagem preferencialmente por via endodôntica ou através do próprio alvéolo dental, por
avulsão do dente causador.

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Na segunda fase evolutiva ou subperióstica, ocorre a formação de abscesso, pois o exsudato inflamató-
rio torna-se extraósseo. O lado que o processo vai se instalar depende de fatores como a existência de uma
via óssea com menos resistência, comprimento radicular, posicionamento do dente causador em relação às
corticais ósseas alveolares e inserção muscular. A região torna-se abaulada, hiperêmica e intensamente
sensível à compressão, com redução/desaparecimento dos sintomas e assimetria dos tecidos moles da face
em correspondência e intensificação da periadenite cervical. A drenagem é feita por incisão dos tecidos
moles, com um dreno, envolvendo a cavidade neoformada. Recomenda-se endodontia ou avulsão.
Na terceira fase, o processo atine os tecidos moles adjacentes, difundindo-se pelos espaços anatômicos
existentes entre as fáscias musculares regionais ou em cavidades anatômicas naturais.
Flegmão ou celulite é o quadro clínico onde o exsudato inflamatório, purulento ou não, encontra-se
difuso entre os tecidos. Tende a evoluir para um abscesso, onde o exsudato desorganiza a estrutura
tecidual, possibilitando a origem de uma cavidade onde o exsudato vem a se coletar. Quando o exsudato
vem a se coletar dentro de uma cavidade anatômica natural, como os seios maxilares, tem-se a empiema.
Na terceira fase, a celulite é tratada, de início, com antibiótico, para estabilizar o quadro clínico, restrin-
gido a extensão da área comprometida. Depois, suspende o medicamento e faz aplicação de calor
(fisioterapia), possibilitando que o exsudato se concentre em uma cavidade (forma de abscesso),
permitindo a drenagem. Antes da drenagem deve administrar antibiótico, evitando a disseminação
sistêmica da infecção.
Os empiemas dos seios maxilares devem ser tratados por punção antral, por especialista em cirurgia e
que tenha, também, experiência nesse tipo de procedimento, pois pode desencadear possíveis sequelas.
Em Odontopediatria sempre se deve prescrever antibiótico antes de qualquer manipulação cruenta de
tecidos comprometidos por infecção, devido às características anatômicas da criança e por não esperar
participação no combate aos microrganismos. É importante o conhecimento sobre o tipo de droga,
posologias, vias de administração corretas e apresentação comercial da droga.
A drenagem é indicada quase que exclusivamente em abscessos, onde existe concentração localizada de
exsudato, evidenciável clinicamente pela palpação bidigital.
A angina de Ludwig, por apresentar prognóstico grave, é drenada visando facilitar o escoamento do
exsudato difuso, a instilação local de medicamentos (administração gota a gota de uma medicação direto
no corpo) e, principalmente, favorecer a regressão do processo, estimulando o aumento nas defesas
regionais decorrentes da resposta inflamatória a corpo estranho, desencadeada pelos drenos.
Bochechos quentes podem criar condições para que o exsudato inflamatório se colete em regiões
acessíveis intrabucais, esteticamente vantajoso. Na pele, o traçado incisional não deve aprofundar-se nos
tecidos, e deve ter amplitude suficiente para permitir a divulsão dos planos anatômicos subjacentes, feita
com uma pinça hemostática introduzida fechada, aberta quando dentro dos tecidos, e fechada pra sair.
Deve ser feita em região que favoreça o escoamento do exsudato por ação gravitacional e em tecido que
não apresente sinais de desorganização tecidual.
O dreno de borracha do tipo de Penrose é o mais facilmente aplicado. Quando aplicado via extrabucal é
mantido no local pelo uso de um apósito de gaze, fixado com esparadrapo. Os curativos devem ser diários,
evitando dissecção do plasma e formação de uma crosta que não permita o escoamento contínuo do
exsudato presente e ainda para possibilitar uma avaliação contínua do resultado da terapêutica usada.
A drenagem espontânea promove a formação de lesões superficiais necróticas extensas, que se reparam
de forma viciosa, deixando cicatrizes retráteis, invaginadas e antiestéticas, que demandam correção
cirúrgica.
Os flegmões podem permanecer em cronicidade, geralmente pelo uso incorreto de antibióticos. A
resposta inflamatória ocorre e se mantém devido à presença do fator desencadeante, que deve ser
eliminado para que haja involução do quadro clínico. Nesses casos, recursos de fisioterapia reagudizam os
processos para que se efetue a drenagem.

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Hábitos Deletérios
Os fatores determinantes das maloclusões podem ser hereditários, congênitos e pós-natais. Assim, por
exemplo, ausências ou malformações dentárias ocorrem em pessoas de um mesmo grupo familiar, sendo
uma causa hereditária, e, por outro lado, é um fator intrínseco, pois está diretamente ligado às arcadas.
Quanto aos fatores extrínsecos, encontramos as alterações metabólicas, enfermidades e deficiências
nutricionais, por exemplo, que podem determinar uma maloclusão. Entretanto, o CD pouco pode fazer
nesses casos. Sendo assim, nos capacitamos para atender problemas oclusais determinados por pressões
anormais (fatores extrínsecos) sobre as arcadas dentárias, como os hábitos bucais indesejáveis.
Os hábitos resultam da repetição de um ato que, em sua essência primordial, tem uma determinada
finalidade. A sucção, por exemplo, quando realizada sem fins nutritivos pela prática repetitiva, pode
condicionar a instalação de um hábito. O hábito será sempre prazeroso para o indivíduo, e não deve ser
confundido com vício, pois, este, tem fundo farmacológico. A tendência de se realizar um ato no início tem
participação consciente, mas, gradativamente, pela repetição automatiza-se, aperfeiçoa e torna-se
inconsciente, tanto os bons (escovar os dentes, por exemplo) quanto os maus hábitos.
Os bons hábitos são estímulos condutores da definição de formas e contornos morfológicos adequados.
Já os maus hábitos não satisfazem as exigências para o crescimento normal, e conduz às deformações. Não
podemos afirmar que a instalação de um hábito vai causar uma maloclusão, pois é necessário levar em
conta a predisposição individual, idade e as condições de nutrição e saúde do indivíduo. Mas, para que a
malformação se instale, são necessárias a persistência e a duração do hábito indesejável. Além disso, uma
análise das expressões faciais, da fala, deglutição e mastigação será de grande importância.
O tratamento básico deve ser embasado no complexo individual. Há um envolvimento pessoal, psicoló-
gico, emocional, familiar e sociológico. Deve-se ter paciência, humanismo, compreensão, bastante
convicção e personalidade do profissional que se propuser a remover um mau hábito. O primeiro passo é
dá consciência de como o mau hábito se instala, quais as prováveis consequências e, se já houver alguma
deformação, mostrar com o auxílio de fotografias, modelos e dispositivos do próprio paciente. Após isso,
indicamos exercícios com a chupeta ortodôntica maior, que deve ser chamada de “aparelho de sucção”
para evitar o constrangimento. Assim, o aparelho de sucção deve ser preparado para os exercícios
passando-se um anel de elástico com 10 cm de comprimento, preso no anel ou halo. A criança coloca o
aparelho de sucção na boca, de forma que o aparador de lábio fique bem ajustado e faça sucções fortes,
tracionando suavemente o elástico que foi adaptado. Deve ser feito 5 minutos pela manhã, tarde e noite.
No período noturno pode deixar o aparelho até dormir, e deverá ser retirado e guardado após a instalação
do sono mais profundo. Quando os exercícios estiverem sendo feitos regular e corretamente, inicia-se o
terceiro estágio específico para cada tipo de hábito.
O hábito de sucção sem fins nutritivos faz parte das fases iniciais
da vida, persistindo como hábito indesejável em 30% das crianças
nas etapas posteriores do crescimento. Nas proximidades da esfoli-
ação dos incisivos decíduos e erupção dos permanentes (± 5 anos),
o trabalho deve ser iniciado. Em idades mais avançadas, a remoção
deve ser iniciada imediatamente. Os exercícios com o aparelho de
sucção devem ser mantidos, até que haja transferência do hábito
para este recurso, e depois, diminuir o tempo regressivamente. po-
de ainda fazer uso de uma placa de Hawley, ou de uma placa labio-
ativa se já houver inclinação dos incisivos superiores para vestibu-
lar, e dos inferiores para lingual.
Qualquer abertura de mordida pode ser um sinal de sucção indesejável. Examinam-se as mãos, especi-
almente os dedos, procurando alterações na pele ou na forma do polegar. Analisamos a pele abaixo do
lábio inferior, que pode mostrar alguma alteração devido ao umedecimento excessivo. Procura-se marcas e
impressões na língua, pois a sucção pode ser apenas lingual. Avaliar se a sucção é de chupeta é mais difícil,
pois geralmente o paciente omite. Pode-se perguntar ao paciente qual a chupeta que ele mais gosta, sem
alteração na voz, ou perguntar aos pais, mas não na frente da criança.
No hábito da respiração bucal, o diagnóstico e desobstrução são feitos pelo otorrinolaringologista, e
após isso, começamos o atendimento. A reeducação é indispensável para que não haja recidiva das
obstruções nasais. Há relação direta da respiração bucal com fundos alérgicos, resfriados crônicos,
vegetações adenoides e tonsilas hipertrofiadas. A respiração bucal pode desuso é aquela onde não há
obstruções e a criança respira pela boca. Após os exercícios com o aparelho de sucção (ajudam na limpeza

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da região retronasal), emprega-se o guia de vedamento labial, que promove o contato do lábio superior e
inferior, desencadeando o reflexo da respiração normal. Os exercícios com o “guia de vedamento labial”
acostumam o fechamento da boca, a respiração nasal vai, gradativamente, sendo estabelecida até se
automatizar. Talvez esse hábito seja o único que possa trazer deformações em níveis acima do complexo
dentoalveolar, ou seja, na região nasomaxilar. A falta de contato labial determina a hipotonia com lábios
aparentemente grossos. A falta da respiração nasal atresia a região e consequentemente a maxila torna-se
gradativamente alta, ogival, por não acompanhar o crescimento vertical dos rebordos alveolares. À medida
que cresce, a deformação torna-se mais grave.
Para avaliação, o paciente deve estar confortavelmente sentado na cadeira odontológica, e com a
seringa, enchemos a cavidade bucal de água, e pedimos para ele reter o máximo possível. Se ele mantiver
por 5 minutos, entende-se que a respiração bucal é por desuso e não existe obstrução. Se ele não conseguir
reter, é sinal de que existe obstrução, e encaminhamos para o otorrinolaringologista.
A deglutição atípica se trata do indivíduo que realiza o ato de engolir de forma diferente. Não é a função
atípica que produz alguma deformação, mas sim, a posição de repouso da língua. Entretanto, a posição só
poderá ser corrigida normalizando a deglutição. Se a língua permanece entre os dentes, esses não poderão
atingir as posições de contato, levando à mordida aberta anterior. Se houver predisposição da face o
quadro torna-se grave e de difícil ou impossível tratamento convencional.
O atendimento do paciente portador desse mau hábito deve ser feito pelo fonoaudiólogo. Entretanto,
quando não for possível, cabe ao CD dar algum atendimento. Como todo hábito indesejável, inicia-se com o
aparelho de sucção, e depois passamos aos exercícios específicos numa série de 5, que devem ser
realizados 5 minutos pela manhã, tarde e noite. Ao final, todos os exercícios estarão sendo feitos em
sequência lógica, amadurecendo a deglutição normal, que se espera que se normalize gradativamente.
Quanto melhor a condição morfológica das arcadas dentárias entre si e com as regiões adjacentes,
melhores e mais rápidos serão os resultados, ou seja, se houver deformações nas arcadas dentárias,
dificilmente se conseguem resultados bons. Quando já há MAA, recomenda-se o emprego da placa
reeducadora durante o dia, e a placa reeducadora impedidora, à noite. Esses recursos são auxiliares, e os
exercícios devem ser feitos normalmente, conforme orientação.
O paciente, sentado corretamente na cadeira odontológica, recebe um gole de água e é convidado a
deglutir. Avaliamos, então, os sinais: não participação perceptível da musculatura da mímica; vedamento
labial pelo perfeito contato estabelecido; língua perfeitamente confinada dentro das arcadas dentárias;
língua em repouso em contato com o palato duro.
Os hábitos de morder são considerados extensões do hábito de sucção. Assim, hábitos de sucção digital
ou chupeta podem ser substituídos por onicofagia ou outros hábitos de morder (língua, lábio, gola de
camisa etc.). Todos esses hábitos, pela frequência, duração e época (idade), podem determinar maloclu-
sões. Inicia-se o tratamento com o aparelho de sucção. Solicitamos que a consistência da dieta alimentar
seja aumentada para que o ato de morder seja exercitado. Ainda, junto com os exercícios do aparelho de
sucção, associamos o mordedor de borracha. Os exercícios são realizados durante 4 minutos com o
aparelho de sucção e 1 minuto com o mordedor, e progressivamente vai invertendo, até ficar 5 minutos
completos com o mordedor. As mordidas devem ser realizadas ao longo de todas as posições das arcadas.
Quando já há alguma deformação, faz-se necessário corrigi-las com recursos ortodônticos. Se o hábito
de morder os lábios produz uma MAA, emprega-se placa impedidora, especialmente durante o sono, para
evitar que a língua ocupe esse espaço, e a placa labioativa durante o dia, pra impedir que o lábio,
compulsivamente, ocupe esse espaço.
As posturas indesejáveis deem ser impedidas nas primeiras fases da vida, ainda durante a amamenta-
ção, onde a criança deve ser amamentada ora em uma mama, ora na outra. Quando a criança é amamen-
tada na mamadeira, deverá ser segura corretamente e também mudada de posição, procurando repetir o
melhor possível como se fosse natural. Em todo instante a criança deve ter condições de sucção, deglutição
e respiração normal, pois, hábitos de postura indesejáveis podem trazer atipias nessas funções com
prováveis consequências morfológicas.
As posturas em idades mais avançadas, geralmente, são de apoios da cabeça no punho fechado. Esse
apoio é feito apenas na maxila e só de um lado da face, podendo levar à deformação do rebordo
dentoalveolar e consequente mordida cruzada. Nesses casos, a orientação baseia-se na conscientização do
problema, e correção do problema com ortodontia. O sinal que pode indicar este hábito é a mordida
cruzada unilateral.

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Os hábitos de fonação, assim como de deglutição, são atipias da função. Os pacientes devem ser
encaminhados para tratamento fonoaudiológico, entretanto, devemos dar condições de trabalho a esse
especialista, com normalizações morfológicas básicas, sem as quais julgamos impossível normalizações
fonéticas. Portanto, devemos corrigir MAA, mordida cruzada, sobremordida profunda etc.
Os problemas de fonação mais vistos são a gagueira e os sigmatismos (pronúncia incorreta de fonemas,
como s, e, x, j, ou z). A avaliação e atendimento são feitos pelo fonoaudiólogo.
De todas as deformidades humanas as de maior frequência são as dentofaciais. Pouco pode ser feito
para se evitarem as causas primárias (hereditárias, congênitas, enfermidades IU), mas muito pode ser feito
para prevenir as causas secundárias. O osso responde deformando-se ou adaptando-se à pressão de ação
contínua. Por isso, é preciso analisar um hábito pela sua frequência, duração e intensidade. A remoção do
hábito é, provavelmente, o mais difícil trabalho na ortodontia.
No hábito de sucção, até os 3 ou 4 anos, não se recomenda qualquer conduta, pois ele pode desapare-
cer. Contudo, as condutas devem ser radicais quando o mau hábito de sucção persiste até a fase de
esfoliação dos incisivos decíduos, ou até ultrapasse. Esse hábito tem implicações subconscientes e por isso,
deve ser tratado com cautela, evitando lesões e traumas psíquicos. Deve ser removido antes da instalação
dos dentes anteriores permanentes, pois se já houver algum desvio anormal, poderá ocorrer autocorreção.
Quanto à respiração bucal, certas predisposições anatômicas podem levar à este hábito, como por
exemplo, os tipos de crescimento facial com predominância vertical. Ou seja, tanto a face longa pode levar
à respiração bucal, como esta pode levar a alterações faciais. Pode estar relacionada também a síndrome
alérgica, e, em todos os casos, após liberação das vias, deve ser feita a reeducação da respiração nasal.
O hábito de dormir apenas de um dos lados, apoiando a cabeça no travesseiro, pode ser mais conse-
quente quando se coloca a mão embaixo. O peso da cabeça praticamente é recebido só pela maxila, pois a
mandíbula, sendo móvel, faz o movimento de báscula.
A onicofagia pode estar associada à instabilidade psíquica e emocional. Pode ser substituída pelo hábito
de morder os lábios ou mascar chiclete. Dificilmente trazem más posições dentárias, pois a pressão é de
pouca duração e realizada praticamente no sentido do longo eixo do dente.
O ideal é procurar evitar que os hábitos possam ser adquiridos, dando-se orientação correta desde as
primeiras fases da vida. Se o hábito já estiver instalado, deve ser combatido o quanto antes, reguardando
os aspectos emocionais. Se deformações dentoalverolares já foram determinadas, a correção prévia, ou
durante o programa de remoção do hábito, deve ser assumida.

60
Terapêutica Medicamentosa
A terapêutica medicamentosa é usada muitas vezes pelo odontopediatra, constituindo-se de um recurso
auxiliar. Com o avanço da medicina, hoje, temos medicamentos mais eficazes, entretanto, com efeitos
adversos indesejáveis. É importante sabermos que a criança não é um adulto em miniatura, e que suas
variações são em função de condições fisiológicas e estruturais. Essa imaturidade morfológica, bioquímica,
fisiológica e psicológica gera uma fisiologia toda especial, condicionando as diferenças com o adulto. A
imaturidade do SNC (desenvolvimento incompleto da barreira hematoencefálica) faz com que crianças
submetidas a doses de analgésicos de ação central apresentem, em alguns casos, convulsões, que
dificilmente ocorreriam em adultos. O equilíbrio ácido-básico pode ser mais facilmente perturbado em
crianças, pois os sistemas hepático e renal imaturos tendem a acumular medicamentos. As crianças são
especialmente vulneráveis aos efeitos tóxicos de alguns agentes, como os esteroides sexuais e outros
hormônios, que podem prejudicar o crescimento e o desenvolvimento normais.
A literatura é diversificada ao apresentar fórmulas para calcular a posologia ideal em pacientes infantis.
Na maioria delas, leva-se em consideração o peso, idade ou a superfície corpórea, tomando como
referência os esquemas posológicos dos adultos, apenas como orientação.
O cálculo da dose levando em conta a idade não considera as diferenças de tamanho e peso entre
crianças da mesma faixa etária. O peso determina mais precisamente a dose pediátrica, utilizando
principalmente a fórmula de Clark. A superfície corpórea seria o método mais adequado, porém, tem como
desvantagem a necessidade de serem conhecidos o peso e a estatura da criança, além do uso de tabelas
especiais para a determinação de tal superfície.

Na realidade, não existe nenhum método de cálculo ideal de posologia infantil para todos os medica-
mentos e situações terapêuticas. Em crianças acima de 6 anos, o peso a e a superfície corpórea são
métodos satisfatórios, mas são mais dificilmente aplicados em crianças mais novas. Para RN não existe um
esquema posológico definido, pois são baseados em ensaios clínicos.
A via de administração mais usada é a oral, pois é segura, conveniente e menos onerosa ($), utilizando
mais os medicamentos em forma líquida, que têm mais facilidade de ingestão. Outra via que pode ser
utilizada é a retal, principalmente em crianças com dificuldade de ingestão, pois alguns medicamentos
podem causar náuseas.
Algumas denominações importantes: RN é a criança até 1 mês; lactante é a criança com até 1 ano de
idade; primeira infância é do primeiro até os 2 anos e meio ou até completar a primeira dentição; a
segunda infância começa aos 3 anos e recebe as denominações de pré-escolar (até os 5 anos), escolar (6
aos 12 anos) e pré-puberal (dos 12 à adolescência).
Controle de Infecções
Em relação ao controle de infecções, sabemos que houve aumento da prevalência de microrganismos
resistentes aos antibióticos disponíveis atualmente. Hoje em dia, não existe antibiótico que não possua
resistência bacteriana. Crianças recentemente tratadas com antibióticos são mais propensas à resistência.
O melhor tratamento da infecção consiste no uso sensato do antibiótico junto com a intervenção clínica. A
decisão pelo uso do antibiótico deve ser baseada em diversos fatores. Primeiro é necessário identificar a
causa da infecção e determinar o tratamento odontológico apropriado. Em casos de abscessos, a
antibioticoterapia é coadjuvante à intervenção clínica, pois o sistema de defesa no interior do dente está
comprometido. Para um indivíduo saudável, o antibiótico não é necessário quando se remove o agente
agressor.
Entretanto, existem algumas situações especiais em que o seu uso está indicado: quando os mecanis-
mos de defesa do hospedeiro estiverem comprometidos ou então quando a infecção for severa, causando
sinais de disseminação sistêmica, e conforme o patógeno esperado para tipos específicos de infecção.
Antibióticos estão indicados em casos como: ferimentos bucais, pois estão associados ao alto risco de
contaminação bacteriana, avaliando se o trauma parece estar contaminado por bactérias extrínsecas,
indicando a antibioticoterapia para auxiliar no processo de cicatrização, com atenção para o período de
administração, para não modificar a ecologia bacteriana normal do hospedeiro; crianças com edema facial
agudo de etiologia odontológica devem receber atenção imediata, com intervenção clínica e cobertura
antibiótica, contendo a disseminação da infecção; em situações de traumatismo dental podem ser

61
utilizados como auxiliares, mas sua efetividade permanece incerta; em situações clínicas como neutropeni-
as, síndrome de Papillon-Lefèvre, deficiência na adesão leucocitária, o sistema imunológico é incapaz de
controlar o avanço de doenças periodontais, necessitando de antibioticoterapia, que pode ser prolongada
em casos de doenças periodontais crônicas. Antibióticos não são indicados em infecções odontogênicas
contidas na câmara pulpar ou no tecido imediatamente adjacente, sem sinais sistêmicos.
Os antibióticos que se destacam são as penicilinas, os macrolídeos e as lincosaminas. Sempre que
possível, deve-se coletar uma amostra do foco infeccioso e realizar o antibiograma, para escolha do
fármaco. Uma vez escolhida a via oral, deve-se utilizar uma dose de ataque, que proporciona concentração
adequada do medicamento na circulação sanguínea e, consequentemente, no local da infecção. Concentra-
ções inadequadas favorecem o desenvolvimento do microrganismos resistentes. Os principais microrga-
nismos relacionados infecções orais são anaeróbios e aeróbios Gram-positivos, encontrados nos abscessos
dentoalveolares e periodontais e na polpa necrótica.
Penicilinas
As penicilinas são os antibióticos de primeira escolha no manejo de infecções odontogênicas, pois os
microrganismos presentes são susceptíveis a elas. Os medicamentos deste grupo atuam na última fase da
síntese da parede celular das bactérias, inibindo a formação de sua parede celular, causando a sua lise e
consequentemente sua morte (bactericidas), e por isso possuem toxicidade quase nula. Entretanto, são os
antibióticos com maior probabilidade de causar reações alérgicas. A maioria das respostas alérgicas
potencialmente letais é causada pela administração parenteral. Também podem perturbar a ecologia
normal microbiana do TGI, causando náuseas, vômitos e diarreias.
As penicilinas G são encontradas em três formas: G potássica, G procaína e G benzatina. São utilizadas
exclusivamente por via parenteral, quando a via oral está comprometida ou em infecções leves, devido ao
seu pequeno espectro de ação. A potássica possui rápido início de ação e apresenta distribuição nos tecidos
moles, na saliva e nos ossos, determinando eficácia clínica em doses de 6/6 horas. Devido a sua pequena
eficácia, foi praticamente substituída pela penicilina V, que pode ser administrada por via oral. As
penicilinas G procaína e benzatina são insolúveis em água, e após a injeção IM são lentamente liberadas na
circulação sanguínea. A diferença entre elas é que a G benzatina é menos solúvel aos fluidos sanguíneos,
possuindo cobertura antibiótica por muito mais tempo.
A penicilina V é um fármaco de pequeno espectro de ação, administrado por via oral, rapidamente
absorvido pelo intestino delgado, atingindo concentrações sanguíneas máximas em 1 hora. Atualmente
tem-se resistência aumentada a este medicamento, e por isso, está indicado apenas em infecções orais
leves.
A amoxicilina é um antibiótico de largo espectro, efetivo contra Gram +, Gram – e a maioria dos anaeró-
bios bucais. Apresenta melhor absorção oral e menor ligação às proteínas plasmáticas, atingindo
concentrações efetivamente maiores e mais prolongadas do que a penicilina V. É o fármaco de primeira
escolha no tratamento de infecções intrabucais. O seu largo espectro aumenta a probabilidade de causar
superinfecção, além de causar reações alérgicas, como erupções cutâneas.
As bactérias são capazes de produzir uma enzima chamada de β-lactamase, que rompe o anel β-
lactâmico das penicilinas (e cefalosporinas), tornando estes antibióticos inativos. Em pacientes que não
mostram melhoras em 48 horas de tratamento com as penicilinas, isso pode estar acontecendo, e o uso de
medicamentos que possuam inibidores da β-lactamase, como a amoxicilina associada ao clavulanato de
potássio, pode ser indicado, tornando a amoxicilina mais efetiva.
Macrolídeos
Os macrolídeos consistem em outro grupo de antibióticos, que apresentam um anel lactônico. Seus
principais representantes são a eritromicina, claritromicina e azitromicina.
A eritromicina está indicada em infecções leves, e é uma excelente alternativa para pacientes alérgicos
às penicilinas. Atua inibindo a síntese proteica relacionada a bactérias Gram-. É comumente administrada
por via oral, na forma de comprimidos revestidos por películas insolúveis em ácido, ou na forma de sais
insolúveis em água e ésteres. Não atravessa facilmente a barreira hematoencefálica, mas atravessa a
placenta. É um antibiótico seguro e indicado para uso infantil. Distúrbios gatrointestinais são os problemas
mais comumente encontrados.
A claritromicina é um antibiótico análogo à eritromicina. Suas principais vantagens são a pequena
ocorrência de efeitos colaterais gastrointestinais e a comodidade de administração. Leves distúrbios
gastrointestinais, além de cefaleia, podem estar presentes em 13% dos casos. Pode alcançar altas

62
concentrações teciduais na saliva, gengiva normal e inflamada e no tecido ósseo alveolar. Pode existir
resistência cruzada entre a eritromicina e os novos macrolídeos. Outra desvantagem é o custo.
A azitromicina é um derivado da eritromicina, similar a claritromicina, com a vantagem de apresentar
excelente penetração tecidual, com meia-vida sérica e tecidual longa, necessitando de apenas uma dose
diária. Em 12% dos casos pode causar efeitos adversos, em geral gastrointestinais.
Clindamicina
A clindamicina apresenta mecanismo de ação semelhante aos macrolídeos, atuando, em geral, como
bacteriostático. É duas ou quatro vezes mais efetiva in vitro e é quantitativamente mais eficaz in vivo do
que a eritromicina. Administrada por via oral, bem absorvida pelo TGI, mesmo quando ingerida com
alimentos. Distribui-se pelos tecidos e fluidos orgânicos, sendo de interesse especial a sua excelente
penetração no tecido ósseo, e por isso, é indicado no tratamento de infecções ósseas. Seus efeitos
colaterais mais comuns são as diarreias e a colite pseudomembranosa.

Medicamentos Medicamentos
Grupo Posologias infantis
(genéricos) (patenteados)
40000 a 100000 UI kg/peso/dia, 6/6 horas
“V” Pen-Ve-Oral®
(suspensão)
Benzetacil®
“G” 40000 UI kg/peso/dia, frasco/ampola
Penicilinas Despacilina®
Amoxicilina Amoxil® 50 a 100 mg kg/peso/dia, 8/8 h (suspensão)
Amoxicilina + ácido
Clavulin®
clavulânico
Estearato de eritromi-
Pantomicina® 40 a 50mg/peso/dia, 6/6 horas (suspensão)
cina
Macrolídeos
Azitromicina Zitromax® 10 mg kg/peso/dia, 24/24 horas (suspensão)
Claritromicina Klaricidil® 7,5 a 15mg kg/peso/dia, 12/12 h (suspensão)
Cloridrato de clinda-
Clindamicina Dalacin C® 10 a 20mg kg/peso/dia, 6/6 h (suspensão)
micina

Profilaxia Antibiótica
O emprego profilático de antibióticos em odontopediatria é utilizado principalmente na prevenção da
endocardite bacteriana. Está indicada para pacientes com válvula cardíaca protética, com histórico de
endocardite bacteriana prévia, com doença cardíaca congênita (não reparada, defeito congênito cardíaco
completamente reparado nos primeiros 6 meses, ou reparação da doença cardíaca congênita com
aparecimento de tecido residual cicatricial) e transplantados cardíacos que desenvolveram valvulopatia
cardíaca, em todos os procedimentos odontológicos que envolverem a manipulação dos tecidos gengivais,
ósseos ou perfuração da mucosa bucal. Está contraindicada para procedimentos envolvendo injeções
anestésicas em tecidos não infectados, tomadas radiográficas, instalações de próteses removíveis e
aparelhos ortodônticos, esfoliação de dentes decíduos e sangramento proveniente de trauma nos lábios ou
mucosa bucal.
O uso da profilaxia antibiótica não é totalmente livre de riscos, devido aos potenciais microrganismos
resistentes. O antibiótico deve ser administrado em doses simples, antes do procedimento odontológico.
Alguns antibióticos são contraindicados para uso infantil, devido aos seus efeitos colaterais graves. As
tetraciclinas são proibidas para uso de gestantes e crianças, principalmente pela pigmentação endógena da
coroa dentária e redução do crescimento ósseo na criança, e hepatotoxicidade na mãe. Pode causar
também hipoplasia, e a pigmentação é definitiva; o cloranfenicol é o antibiótico de 1ª escolha para
infecções causadas por Salmonella typhi (febre tifoide). Seus efeitos adversos podem ser mais graves do
que a infecção, afetando a medula óssea. Pode desenvolver anemia, trombocitopenia e neutropenia
intensas. Sua reação mais grave é a aplasia da medula óssea, pancitopenia, quase sempre fatal. Esses
efeitos são reversíveis após a suspensão do medicamento; os aminoglicosídeos são muito usados na
medicina para tratar infecções potencialmente fatais. Pertencem a este grupo a estreptomicina, canamici-
na, gentamicina e neomicina. São antibióticos tóxicos, causando toxicidade renal, auditiva e vestibular. O
efeito mais grave é a perda da audição de forma irreversível.

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Via Medicamentos (genérico) Posologias infantis
Oral Amoxicilina 50 mg/kg de peso
Clindamicina ou 20 mg/kg
Oral (alérgicos às penicili-
Azitromicina ou Claritromicina ou 15 mg/kg
nas)
Cefalexina 50 mg/kg
Parenteral (incapazes por Ampicilina 50 mg/kg IM ou IV
VO) Cefazolina ou ceftriaxona 50 mg/kg IM ou IV
Cefazolina ou ceftriaxona ou 50 mg/kg IM ou IV
Parenteral (alérgicos)
Clindamicina 20 mg/kg IM ou IV

Controle da Dor
O controle da dor em Odontopediatria apresenta divergências entre a teoria e a prática, devido a
hipóteses incorretas sobre a dor, atitudes individuais e sociais, e a complexidade de avaliar a dor em
crianças. A dor em crianças não acontece necessariamente pela injúria tecidual. Pode-se experimentar dor
sem injúria e múltiplos tipos de dor em uma mesma injúria, pela plasticidade de seu sistema nociceptivo.
Evidências têm revelado que ainda na fase fetal, nas sua fases finais, as vias de transmissão e os centros
corticais necessários para a percepção da dor estão bem desenvolvidos, podendo levar a estresse em
neonatos. São observadas mudanças no desenvolvimento em resposta aos estímulos dolorosos no início da
infância. Em geral a sensibilidade à dor aumenta, e o controle da dor torna-se mais efeito com o passar da
idade.
A literatura odontológica tem se preocupado com a discussão sobre a presença de dor em crianças e seu
controle. Pesquisas mostraram casos de crianças que se queixaram de dor após cirurgia e dentística
restauradora. A extensão da injúria causada por procedimentos cirúrgicos é também um fator importante
na avaliação da necessidade de controle da dor pós-procedimentos. Por isso, o profissional deve considerar
o número de dentes extraídos e o seu grau de dificuldade como determinante do potencial de dor pós-
operatória e a necessidade de analgesia.
As dores de origem odontogênica são primariamente inflamatórias, com os sinais característicos da
inflamação. São dores prolongadas, devido a ação de mediadores, como as prostaglandinas, bradicinina e
histamina, que podem ser liberados por estímulos como o trauma ou bioproduto de uma infecção,
aumentando o extravasamento do plasma (edema) e excitando e sensibilizando as terminações dos nervos
periféricos, produzindo a dor. Após injúrias celulares, o ácido araquidônico é liberado das membranas,
formando as prostaglandinas, que, atualmente, é considerada a base bioquímica e fisiológica da inflama-
ção, da dor e da febre em crianças.
A dor pode ser classificada em branda ou suave, moderada e severa, ocorrendo num tempo de duração
de aproximadamente 5 horas. O edema atinge picos máximos nas primeiras 24 a 48 horas. O controle da
inflamação é um dos desafios da odontopediatria, e atualmente utiliza estratégias terapêuticas que visam
prevenir a liberação de mediadores químicos ou interferir nos receptores que determinam a dor. Todos os
analgésicos e antiinflamatórios de ação periférica são, em graus diferentes, inibidores do sistema
enzimático das cicloxigenases (COX1 e COX2), resultando na redução de prostaglandina com consequente
redução da resposta dos receptores da dor e da inflamação.
Três grupos de medicamentos são co-
mumente utilizados para o controle da dor
e da inflamação em Odontopediatria: a-
nestésicos locais, analgésicos antiinflama-
tórios não esteroidais e analgésicos de a-
ção central ou opioides. As dores de ori-
gem dentária são mais sensíveis ao trata-
mento com analgésicos/antiinflamatórios
não esteroidais. Fatores que podem influ-
enciar na eficácia do fármaco são a confi-
ança no profissional, nome, aparência e
paladar do remédio.

64
O odontopediatra deve escolher medicamentos analgésicos antiinflamatórios e suas doses apropriadas
com base em importantes dados científicos e na experiência clínica. Crianças merecem boa psicologia e
analgésicos mais eficazes e seguros, com ausência de efeitos colaterais indesejáveis. O custo é outro fator
que deve ser considerado. Somente quando se prevê uma dor severa ou quando a criança não responde
aos analgésicos tradicionais, é que medicamentos de ação central devem ser empregados. A escolha se o
controle da dor deve ser pré ou pós-operatório depende do tipo de procedimento a ser realizado.

Medicamento pré-
Procedimentos Medicamento pós-operatório
operatório
Restaurações simples ---- Paraminofenol ou acetaminofeno
Complexos (pulpotomias etc) ---- Paraminofenol ou acetaminofeno
Exodontias
---- Ibuprofeno
Decíduos sem abscesso
---- Ibuprofeno
Decíduos abscedados
Ibuprofeno Paraminofenol ou ibuprofeno
Exodontias múltiplas
Ibuprofeno Paraminofenol ou ibuprofeno
De permanentes
Ibuprofeno Paraminofenol com ou sem codeína.
Permanentes anquilosados

Cada caso deve ser considerado individualmente. Nos procedimentos restauradores simples e em
procedimentos mais prolongados, como a colocação de coroas de aço inoxidáveis e pulpotomias, o pré-
operatório só requer, no máximo, um anestésico. Nas exodontias simples, com metade da estrutura
radicular remanescente, não são usados recursos de controle da dor pós-operatória como nas múltiplas
extrações de decíduos.
As crianças sentem dor da mesma maneira que os adultos e necessitam de controle da dor pós-
operatória. Os medicamentos aliviam as dores em crianças com muito sucesso, se deve ter um plano para o
devido controle da dor em pacientes pediátricos. Determinados fatores podem afetar a necessidade de
medicamentos pós-operatórios: a extensão e invasibilidade dos procedimentos clínicos, a idade dos
pacientes, a história passada de dores das crianças juntamente com as expectativas dos pais.
O Paraminofenol é o analgésico mais comum e prescrito pelos pediatras. Em comparação com o AAS,
tem eficácia semelhante, mas, diferente destes, reações alérgicas são bastante raras, não determinam
problemas de irritação gástrica ou manifestações que envolvam inibição plaquetária e nem afeta o
metabolismo de carboidratos, podendo ser indicado para pacientes diabéticos. Outra vantagem é a
disponibilidade em forma líquida. A principal preocupação reside nos efeitos sobre o fígado após
superdosagem, podendo causar necrose hepática progressiva e letal. É utilizado como analgésico e
antipirético, com baixa ação antiinflamatória.
AINEs como o Ibuprofeno exercem suas ações analgésicas por inibição da síntese de prostaglandinas.
Possuem ação antiinflamatória e analgésica com superioridade ao paraminofenol e é mais efetivo no
controle de dores agudas após cirurgias dentárias ou traumatismos em crianças.
O cloridrato de tramadol é um agente sintético de ação central indicado para dores moderadas e
severas, efetivo e bem tolerado em crianças. Estudos em pré-operatórios de exodontias múltiplas
mostraram que apenas 19,4% dos pacientes submetidos à tramadol necessitaram de medicamento pós-
operatório.
Embora seja uma classe de analgésico considerada efetiva, tem baixa eficácia no controle da dor de
origem dental. A codeína, isoladamente, não tem se revelado efetiva nas dores pós exodontias. Quando
associadas ao acetaminofeno ou mesmo ao ibuprofeno, o alívio das dores apresenta-se melhor. A codeína
pode determinar sedação e supressão da tosse. A prescrição dessas associações deve ser feita em
receituários profissionais carbonados. A depressão respiratória é o efeito indesejável mais preocupante,
podendo restringir seu uso em Odontopediatria. As posologias infanti não devem ultrapassar a 0,5 a 1,0 mg
por kg de peso corporal, em no máximo 4 administrações diárias.

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Medicamentos (genéri- Medicamentos
Formas farmacêuticas Posologias infatis
cos) (patenteadas)
Paraminofenol ou Para-
Tylenol®
cetamol ou Acetamino- Comprimidos e gotas 10 mg por kg/peso, 6/6 horas
Dorico®
feno
Suspensão
Advil® 5 a 10 mg por kg de peso, 6/6
Suspensão
Ibuprofeno Dalsy® horas (5ml de suspensão equi-
Suspensão e go-
Spidufen® vale a 100mg)
tas/comprimidos
1 a 2 mg por kg de peso corpó-
Tramadol Tramal® Comprimidos reo, 6/6 horas
Dose máxima = 100mg
Paracetamol ou Aceta-
0,5 a 1,0 mg por kg de peso
minofeno associado a Tylex® Comprimidos
corpóreo, 6/6 horas.
Codeína

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Pacientes com Necessidades Especiais
A Odontologia para pacientes com necessidades especiais é uma especialidade reconhecida desde 2001,
sendo abrangente, pois coporta vários grupos de doenças e condições que fazem com que um paciente
tenha atendimento diferenciado, por apresentar alterações mentais, físicas, orgânicas, sociais e/ou
comportamentais. No Brasil, 14,5% da população é PNE, e o CD deve estar familiarizado com as diversas
entidades patológicas. Uma atuação multidisciplinar e interdisciplinar é fundamental nesse tipo de
atendimento, podendo trazer melhores resultados.
O paciente pode chegar sem o diagnóstico esclarecido da sua doença, ou com este já conhecido. Na
primeira possibilidade, o CD poderá encaminhar o paciente, quando necessário, a profissionais da área
médica, bem como para profissionais de áreas afins, com o objetivo de firmar o diagnóstico e o melhor
plano de tratamento. Caso o paciente já apresente o diagnóstico, o CD deverá entrar em contato com os
profissionais que o acompanham, para obter mais informações a respeito desse paciente. Em ambas as
possibilidades, muitas vezes haverá a necessidade de atuação interdisciplinar dentro da área odontológica
(ex: odontopediatra + cirurgião), onde deverá ter um profissional que esteja “no comando” da terapêutica.
Deficiência Física
Os portadores de deficiência física são aqueles indivíduos que apresentam lesões adquiridas no SNC
(como a paralisia cerebral – PC –, acidente cerebral encefálico, traumatismo cranioencefálico), no SNP,
sistema neuromuscular e sistema esquelético. A PC é a de maior incidência, e é o resultado clínico de
fatores etiológicos ambientais perinatais até 1 ano de idade. Se tais alterações ocorrerem após o primeiro
ano de vida, consideramos esses pacientes sob a denominação de LEIA (lesão encefálica infantil adquirida).
Paralisia Cerebral
A PC é uma encefalopatia crônica não progressiva, caracterizada por pacientes que apresentam um
distúrbio de movimento ou de postura qualquer, como as paresias, hipercinesias e incoordenações. Sua
etiologia é multifatorial, podendo ocorrer por fatores pré-natais, perinatais e pós-natais. De acordo com os
distúrbios motores pode ser classificada em espástica (quadriplégica, diplégica e hemiplégica), discinética,
atáxica e mista. Esses pacientes apresentam manifestações comuns, como deficiência mental, deficiências
sensoriais (visual, auditiva e fonética), convulsões e contrações das articulações. As manifestações bucais
não são exclusivas, mas são mais frequentes e mais severas que na população em geral, como a doença
periodontal e cáries (dificuldade de higienizar), traumatismos, hipoplasia de esmalte, maloclusão, bruxismo
e respiração bucal. observou-se, ainda, atraso na cronologia de erupção da dentição permanente, não
encontrado na dentição decídua. Além disso, há debilidade nutricional devido à dieta inadequada (pastosa).
Pacientes com PC tendem a ter uma redução da função salivar, com baixo pH, fluxo salivar e capacidade
tampão, além de alteração da concentração de sódio e potássio, provavelmente associado ao baixo
estímulo mastigatório, aumentando a suscetibilidade à cárie.
O controle do biofilme deve ser feito em ambiente agradável, com posicionamento adequado, obser-
vando a necessidade de adaptação de escovas, uso de escovas elétricas, orientação do uso ou não dos
dentrifícios, reavaliação do paciente e reforço aos pais. O uso de abridores de boca pode ser uma
alternativa ao cuidador para a realização de higiene bucal, com resultados satisfatórios.
Hábitos orais parafuncionais são mais prevalentes nesses pacientes, levando a necessidade de monito-
ramento e orientação aos pais no sentido de remover os hábitos, e uso de estratégias clínicas para
minimizar seus efeitos danosos. Sinais clínicos de disfunção temporomandibular também são mais
frequentes, com limitação da abertura bucal e desvio da mandíbula durante abertura e fechamento.
Outro aspecto importante é o uso de anticonvulsivantes, principalmente a difenilidantoína, podendo
causar hiperplasia gengival, levando a problemas estéticos, desconforto e interferência funcional.
Evidências mostram que higiene rigorosa pode reduzir e até prevenir o aparecimento e recorrência da
hiperplasia.
Alguns cuidados no atendimento ambulatorial são: estabelecimento de vínculo, posicionamento correto
do paciente na cadeira buscando sua estabilização e evitando problemas de reflexos corporais gerais e
bucais (provocados pela luz do refletor, ruídos da caneta de alta e baixa rotação etc.). Deve-se ressaltar que
esses pacientes cansam-se rapidamente, e por isso o atendimento deve ser breve. O procedimento
odontológico deve ser adequado ao nível intelectual, alterações sistêmicas, sensoriais e comportamentais
do paciente. Quanto maior o dano neurológico e comprometimentos secundários associados, maior a

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necessidade de se lançar mão de procedimentos mais complexos de gerenciamento comportamental no
atendimento ambulatorial.
Anomalias Congênitas
Síndrome de Down
A Síndrome de Down é caracterizada pela presença de três cromossomos 21, apresentando maior
incidência em mães com idade superior a 30 anos. Com um cromossomo 21 extra, há a produção
exagerada de proteínas, desregulando a química do organismo e provocando cerca de 80 alterações. O
diagnóstico no neonato é feito pela observação de alguns sinais cardinais, como hipotonia muscular, prega
palmar transversa única, sulco entre o hálux e o segundo artelho, pede abundante no pescoço, fenda
palpebral oblíqua e face achatada. Na presença de três ou mais sinais, deve-se fazer uma pesquisa mais
cuidadosa, com outros sinais auxiliares, como epicanto, micrognatia, nariz pequeno ou ponte nasal
achatada e orelhas displásicas.
As alterações sistêmicas de maior prevalência na síndrome de Down são a cardiopatia congênita,
deficiência visual, defeitos no tubo digestivo e deficiência imune do sistema de linfócitos T, levando a maior
suscetibilidade de infecções no trato gastrointestinal, respiratório (pneumonia e bronquite, principalmente)
e urinário. Há maior risco do desenvolvimento de leucemia e hipotireoidismo, e a partir dos 50 anos de
idade, 75% dos pacientes desenvolvem Alzheimer. Por isso, a anamnese e exame clínico nestes pacientes
devem ser criteriosas, e caso haja algum sinal suspeito, deve ser encaminhado ao médico especialista. Em
casos de cardiopatia congênita, deve-se avaliar o tipo de alteração para recomendar ou não a profilaxia
antibiótica. Em alguns casos, há instabilidade atlantoaxial, e o CD deve ter cuidado ao manipular o paciente,
a fim de não promover traumatismos da medula e/ou nervos periféricos.
Em relação ao aspecto facial, observamos atresia do terço médio da face, pseudoprognatismo, palato
duro atrésico e ogival. Pode haver pseudomacroglossia decorrente da hipotonia lingual, alta prevalência e
suscetibilidade a problemas periodontais, devido a erros nos mecanismos autoimunes, indicando controle
periódico e orientações de higiene aos pais, com terapia antimicrobiana (clorexidina) quando indicado.
A alta incidência de doença periodontal severa ocorre principalmente pela má higiene bucal, porém, há
fatores predisponentes, como relação oclusal inadequada (principalmente mordida cruzada), inserção alta
do freio labial mandibular anterior (defeitos mucogengivais precoces) e posição anteriorizada da lingual
(força anormal nos dentes anteriores inferiores). Perda precoce de incisivos inferiores é comum. A presença
de cárie é menor nesses pacientes, provavelmente pela capacidade-tampão da saliva e presença de
bruxismo. Entretanto, fatores determinantes da cárie podem se sobrepor, e provocar a doença. Os dentes
mais frequentemente acometidos foram 2MI, 2MS, 1MS e 1MI, e os níveis de estreptococos mutans são
maiores nesses pacientes que nas crianças normorreativas.
Alguns materiais têm uso interessante nesses pacientes, como o uso de gel de Carisolv™ (método
químico-mecânico para remoção de tecido cariado), devendo-se observar as condições sistêmicas dos
pacientes, pois este material promove aumento da frequência cardíaca em pacientes com síndrome de
Down.
Algumas anomalias dentárias podem ser observadas, como hipodontia ou oligodontia, dentes conoides,
microdentes, hipocalcificação do esmalte, fusão e geminação. Pode haver aumento do tamanho da coroa
de molares e inclinação da face oclusal para lingual, dificultando procedimentos restauradores. A erupção e
a esfoliação de decíduos, assim como a erupção dos permanentes, são retardadas.
O paciente deve ter acompanhamento do médico, CD, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e fonoau-
diólogo, a fim de desenvolver as capacidades da criança.
Distúrbios Comportamentais
Autismo
O distúrbio comportamental mais importante é o autismo, devido à sua severidade, impedindo ou
dificultando o atendimento odontológico em consultório. É definida como um transtorno do desenvolvi-
mento, que se manifesta de uma maneira grave, durante toda a vida, sendo incapacitante e aparecendo
nos primeiros 3 anos de vida. Sua etiologia é desconhecida, incluindo causas genéticas e predisposição
familiar frente a agressões ambientais, viroses, infecções bacterianas, agentes químicos, hipoxia ao
nascimento e uma série de injúrias as estruturas cerebrais. É 4 vezes mais comum em meninos do que em
meninas, e o diagnóstico diferencial pode ser feito com a síndrome de Asperger, síndrome de Rett,

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distúrbios dissociativos da infância e entre as psicoses da criança e a esquizofrenia infantil. Pode estar
associado à deficiência mental e convulsão.
O autismo manifesta-se precocemente, mas é difícil de perceber na criança muito pequena. A criança
apresenta comportamento inabitual, não reage aos estímulos do meio, nem estabelece contato dinâmico
com sua mãe. Não se prende nos braços nem se ajusta ao colo, além de ser indiferente à presença de
qualquer pessoa. O prognóstico é mais favorável quando há o desenvolvimento da linguagem até os 5 anos
de idade. Há dificuldade na higienização bucal, com acúmulo do biofilme, agravado por uma alimentação
desregrada e rica em carboidratos. Apesar disso e da incompetência da musculatura facial, características
bucodentais, índice de cárie e problemas periodontais não diferem de pacientes normais.
Para o tratamento odontológico deve-se estabelecer uma rotina, e o condicionamento deve ser gradual
e instituído o mais precocemente possível. Sessões curtas, de 10 a 15 minutos, “falar-mostrar-fazer”, com
controle de voz, comandos claros, reforço positivo são imprescindíveis, sempre lembrando da importância
de se estabelecer uma rotina nas consultas quanto ao dia e horário. Pacientes autistas reagem exagerada-
mente a estímulos sensoriais, exigindo do CD muito cuidado com os ruídos do equipamento e sabores
desagradáveis de medicamentos de uso rotineiro em Odontologia. O atendimento ambulatorial requer
cooperação por parte do paciente, o que depende em muito do grau de comprometimento de suas funções
cognitivas. Por isso, muitos pacientes autistas só poderão ser tratados sob sedação ou anestesia geral.
Doenças Sistêmicas Crônicas
As doenças sistêmicas crônicas englobam determinadas doenças de natureza congênita ou adquirida,
que merecem uma maior atenção do CD no atendimento odontológico, avaliando aspectos bucais,
alterações de ordem geral, comportamental, em conjunto com outros profissionais, principalmente
médicos de diferentes especialidades, elaborando um plano de tratamento adequado para cada caso. Entre
essas doenças estão a diabetes mellitus, cardiopatias, hemopatias, transtornos convulsivos-epilpsia,
nefropatias e doenças do sistema respiratório.
Diabetes Mellitus
O distúrbio endocrinometabólico mais importante para o CD é a Diabetes Mellitus, provocada pela
hipofunção do pâncreas, pois apresenta inúmeras manifestações bucais. É um distúrbio do metabolismo
dos carboidratos (açúcares), com múltiplos fatores etiológicos que, em geral, envolvem a deficiência de
insulina absoluta ou relativa, resistência a insulina (há produção, mas não há absorção pelo organismo) ou
ambas. Apresenta como característica básica a hiperglicemia (aumento da taxa de glicose no sangue).
Ocorre ainda glicosúria (presença anormal de glicose na urina), e problemas nos sistemas vascular e
nervoso, comprometendo principalmente olhos, rins e coração.
Pode ser classificada em diabetes tipo I (insulino-dependentes), tipo II (não-insulino-dependentes),
secundária ou associada a outras condições ou síndromes, gestacional e tolerância diminuída à glicose. A
diabetes tipo I acomete crianças e adolescentes, e apresenta grande importância na Odontopediatria.
Os principais sintomas são sede exagerada e boca seca, poliúria, polifagia, emagrecimento, fraqueza
geral (debilidade) e pouca resistência a infecções (deficiência de leucócitos T polimorfonucleares, com
diminuição da quimiotaxia e fagocitose, além de deficiência na atuação de macrófagos). Pode haver
repercussão em diversos sistemas ou órgãos, principalmente as manifestações vasculares com sucessivos
danos, de pequenos vasos (microangiopatia), acompanhada de uma lesão arteriosclerose (macroangiopati-
a). Há ainda comprometimento cardíaco decorrente de hipertensão arterial. Os pacientes são mais
suscetíveis à infecção com tendência à furunculose, abscessos profundos, infecções de úlceras e gangrenas.
A psoríase é uma manifestação cutânea frequentemente associada ao diabetes. Ocorrem manifestações
oculares agudas, complicações renais e transtornos neurológico e hepático. Todas essas complicações são
decorrentes de hiperglicemia, hiperlipidemia e outras complicações associadas.
A sintomatologia dos pacientes com diabetes tipo I é semelhante às outras, com pequenas diferenças,
como: tem início abrupto e antes dos 30 anos de idade, os pacientes geralmente são magros e propensos à
cetose (acidose), são dependentes de insulina e apresentam etiologia autoimune e multigênica.
As principais manifestações bucais são:
 Doença periodontal, com hipertrofia gengival, gengiva sensível , sangrante e menos queratiniza-
da, reabsorção óssea alveolar e mobilidade dental e tendência a formação de abscessos recor-
rentes, mesmo sem causas locais.
 Hipossalivação e eritema difuso na mucosa bucal;
 Hálito cetônico no paciente não-compensado;

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 Língua avermelhada e saburrosa; pacientes não compensados podem apresentar sensação de
ardor na língua e mucosa bucal, e o agravamento pode levar a úlceras e pontos de necrose;
 Aumento assintomático das parótidas;
 Maior ocorrência de cárie decorrente do aumento de hipoplasia e hipocalcificação dental;
 Padrões de erupção anormais na criança.
O risco de desenvolver periodontite está associado a diversos fatores, como idade, controle metabólico,
tempo de duração da doença, presença de placa bacteriana ou biofilme e tártaro. Inicia-se por fatores
locais e quando instalada, os fatores sistêmicos podem interferir na progressão da doença, agravando-a.
Por serem imunodepressivos, são mais propensos a terem herpes simples, varicela zoster, granuloma
piogênico, afta, estomatite, candidíase e quielite angular. Crianças diabéticas portadoras de aparelhos
ortodônticos com candidíase devem ser tratadas com água bicarbonatada, uso tópico de nicostatina ou
miconazol (4x/dia) e higienização do aparelho.
Há atraso na reparação tecidual e tendência a infecção secundária, aumentando a chance de deiscência
de suturas. No LP há atraso na reparação após o tratamento. Ocorre reabsorção óssea extensa, não
compatível com a idade em jovens, e esses pacientes podem estar descompensados mesmo tomando
remédio e seguindo a dieta, pela presença de focos infecciosos orais, e por isso, a prevenção é muito
importante na criança diabética.
O diagnóstico laboratorial é feito por pesquisa de glicosúria, determinação da glicemia em jejum, teste
de tolerância aos carboidratos, teste-padrão de tolerância à glicose por via oral, hemoglobina glicosada
(média das glicemias nos últimos 60 dias) e avaliação da glicemia capilar em consultório.
Na anamnese e exame clínico, o CD deve obter informações do estado geral do paciente, classificando-o
em baixo, intermediário ou alto risco ao tratamento odontológico.
O paciente de baixo risco é aquele com controle metabólico, ausência de cetoacidose, glicosúria mínima
até uma cruz e glicemia em jejum inferior a 138mg/dl. Nestes indivíduos recomenda-se, para o tratamento,
dieta adequada, evitar stress (sessões curtas) e administração de antibióticos, profilaticamente, para
procedimentos cirúrgicos.
O paciente de risco moderado é aquele com controle metabólico razoável, ausência de cetoacidose,
aplicações leves em outros órgãos, glicosúria até 3 cruzes e glicemia em jejum inferior a 200mg/dl.
recomenda-se dieta adequada, evitar stress, insulinoterapia antes e após a intervenção e antibioticoterapi-
a.
Pacientes de alto risco apresentam controle metabólico deficiente, presença de cetoacidose, glicosúria 4
cruzes, cetonúria e glicemia em jejum superior a 250mg/dl. Recomenda-se que o tratamento seja
postergado até a sua compensação.
No tratamento da criança diabética, são preconizadas consultas médicas prévias para controle de
glicemia e PA, realizar consultas odontológicas curtas, de preferência pela manhã, com o paciente
alimentado e medicado, manutenção da insulina no pós-operatório, dieta alimentar, antibioticoterapia e se
necessário, antiinflamatório não-esteroide. O tratamento ortodôntico deve ser feito sob rígido monitora-
mento do periodonto, preferencialmente com aparelhos removíveis para evitar o acúmulo de placa
bacteriana, e se houver agravamento do quadro, os procedimentos deverão ser suspensos até o restabele-
cimento da funcionalidade do indivíduo.
Cardiopatias
As cardiopatias podem ser classificadas em congênitas ou adquiridas. As congênitas podem ser classifi-
cadas em tipos cianótico e acianótico, e as adquiridas podem ser classificadas em hipertensão arterial,
insuficiência cardíaca congestiva, miocardiopatias (doença cardíaca reumática e endocardite infecciosa) e
coronariopatias (angina pectoris e infarto do miocárdio).
As cardiopatias congênitas são relativamente incomuns, mas, importantes, pois podem provocar
alterações anatomofuncionais, com alterações hemodinâmicas ou até situações mais complexas. Sua
etiologia é geralmente multifatorial, e há uma aparente interação entre os fatores genéticos e ambientais,
como a rubéola, diabetes ou uso de drogas como álcool e a fenitoína durante a gestação. É frequente em
crianças com síndrome de Down, e crianças com erros inatos do metabolismo e desordens do tecido
conjuntivo.
A endocardite infecciosa é uma doença que lesa a superfície do endocárdio, em geral comprometido,
através de agentes bacterianos, virais e fúngicos. Cerca de 78 a 91% dos casos de endocardite infecciosa na
faixa pediátrica ocorrem em portadores de cardiopatia congênita. A fonte da bacteremia não é identificada
na maioria dos casos, entretanto, as manipulações odontológicas, genitourinárias e da orofaringe a

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prodispõe. Alguns procedimentos odontológicos causam bacteremia transitória, que raramente persiste
por mais de 15 minutos. As bactérias circulantes podem alojar-se em válvulas cardíacas anormais ou
danificadas ou, ainda, no endocárdio ou no endotélio próximo de efeitos anatômicos, ocasionando
endocardite infecciosa.
O quadro clínico se manifesta por febre, palidez, sudorese, perda de peso, mialgias, manifestações
cutâneas (petéquias), anorexia e artralgia. Algumas condições cardíacas predispõem a endocardite,
recomendando-se, portanto, profilaxia antibiótica. São elas: válvula cardíaca protética; endocardite
bacteriana prévia; doenças coronarianas congênitas (doença coronariana congênita cianótica não tratada,
incluindo shunts e conduntos paliativos; defeito congênito completamente reparado com material
protético ou com outro artifício, tanto colocado via cirurgia ou cateter, durante 6 meses após o preocedi-
mento; doença coronariana congênita reparada com defeito residual no local ou adjacente aos locais do
adesivo ou artifício protético); e transplantes cardíacos seguidos de valvuloparias.
Alguns procedimentos odontológicos são considerados invasivos e indutores de bacteremia, recomen-
dando-se a profilaxia nos pacientes de risco. São eles: exodontias; procedimentos periodontais; reimplante
de dentes avulsionados; instrumentação endodôntica ou cirurgia periapical; colocação de bandas
ortodônticas, mas não de braquetes; injeções anestésicas locais intraligamentares; limpeza profilática de
dentes, onde se prevê sangramento.
De maneira geral, a profilaxia padrão consiste em amoxicilina. Crianças de até 30kg: 50mg/kg por via
oral, 30 a 60 minutos antes do procedimento odontológico, e a continuidade dessa terapêutica depende do
porte da intervenção, do problema bucal e cardíaco do paciente.

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