Professional Documents
Culture Documents
Resumo Abstract
Reações adversas a drogas são eventos comuns na pratica Adverse drug reactions are common conditions in clinical
clínica. As reações de hipersensibilidade representam aproxi- practice. Hypersensitivity reactions represents 25 to 30% of
madamente de 25 a 30% das reações a medicamentos. A pele total drug reactions. The skin is the most frequently affected
é o órgão mais frequetemente acometido sendo comuns erup- organ and are common morbiliform and urticarial eruptions.
ção morbiliformes e urticária. Dermatites graves como TEN, Severe dermatitis as NET, SJS and DRESS also are associated
SJT e DRESS também são associadas a medicamentos, porém to drug reactions but have lesser incidence. The risk which
tem menor incidência. O risco dessas reações e a crescente these reactions presents and current availability of new medi-
disponibilidade de novas drogas mantém o tema atual e deter- cations maintain the subject importance and determine needs
minam a necessidade de atualização constante. Na parte I des- of permanent update. In Part I of the Guide of Drug Hypersen-
te Guia sobre Hipersensibilidade a Medicamentos os autores sitivity the authors explain the major mechanisms and classify-
abordam os principais mecanismos e classificação das reações cation of drug reactions, diagnosis evaluation and therapeutic
a drogas, avaliação diagnóstica e manejo terapêutico. management.
Rev. bras. alerg. imunopatol. 2009; 32(2):42-47 alergia a Rev. bras. alerg. imunopatol. 2009; 32(2):42-47 drug aller-
drogas, hipersensibilidade a drogas, erupção por droga, diag- gy, drug hypersensitivity, drug eruption, diagnosis, drug tole-
nóstico, tolerância a drogas rance
1. Mestre em Imunologia USP, Prof. Adjunto da Faculdade de Me- As reações a medicamentos em sua maioria, não se en-
dicina de Santo Amaro (UNISA), Colaborador do Serviço de quadram nesta categoria, uma vez que não são provocadas
Alergia e Imunologia Clínica do HC-FMUSP por mecanismo imunológico. Desse modo, pela proposta da
2. Mestre em Alergia pela UNIFESP, Encarregada pelo ambulató- WAO, essas reações devem ser consideradas como reações
rio do Serviço de Alergia do HSPE-SP
de hipersensibilidade não alérgica3, 4.
3. Especialista em Alergia e Imunologia Clínica, Membro do Servi-
ço de Alergia e Imunologia da Santa Casa de Porto Alegre (RS) As reações de hipersensibilidade a drogas afetam mais
4. Doutora em Medicina pela USP que 7% da população em geral, se constituindo em grave
5. Mestre em Imunologia USP, Prof.Adjunto Instituto de Patologia problema de saúde pública. As reações de hipersensibilida-
Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás de alérgica e não alérgica representam 15% das RAM5. Em
6. Prof. Titular da Discplina de Imunologia e Imunopatologia da nosso meio, os medicamentos mais frequentemente envol-
UFCMPA, Membro do Serviço de Alergia e Imunologia da Santa vidos nas reações de hipersensibilidade são os antibióticos
Casa de Porto Alegre (RS)
e os antiinflamatórios não-esteroidais (AINEs)6.
Artigo submetido em 16.05.2008, aceito em 21.10.2008.
II – Mecanismos
Hipersensibilidade a medicamentos Historicamente, as reações imunológicas a drogas foram
descritas no contexto da classificação de Gell e Coombs.
I– Definições, classificação e epidemiologia Este modelo continua sendo clinicamente útil, embora a
As reações adversas a medicamentos (RAM) são causa maior parte das RAM não envolva mecanismos imunológi-
importante de morbidade e mortalidade tendo impacto sig- cos específicos.
nificativo na prática médica diária. A presença de anticorpos IgE específicos a um fármaco
As RAM podem ser classificadas como previsíveis (co- no contexto de uma história clínica compatível, possui um
muns e relacionadas às ações farmacológicas da droga) e importante valor preditivo. Esta abordagem, porém tem
imprevisíveis (incomuns e não relacionadas à atividade far- valor limitado quando aplicado à maioria das drogas. Re-
macológica da droga). As reações previsíveis incluem os ações a medicamentos podem se apresentar como urticá-
efeitos colaterais e secundários, toxicidade e interações ria, angioedema, broncoespasmo, etc., porém sem ter a
medicamentosas. As reações imprevisíveis estão associa- participação de IgE.
das à suscetibilidade individual como na intolerância, idios- Os principais modelos de estudo do mecanismo das rea-
sincrasia e hipersensibilidade1-3. As reações de hipersensi- ções de hipersensibilidade por fármacos envolve os antibió-
bilidade, segundo a World Allergy Organization (WAO), po- ticos β-lactâmicos. Nesta revisão muitas vezes utilizaremos
dem ser alérgicas ou não-alérgicas, conforme apresentem o exemplo destas drogas para analisar os principais meca-
ou não mecanismo imunológico como desencadeante. nismos das reações a medicamentos.
42
Hipersensibilidade a Medicamentos Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 32, Nº 2, 2009 43
Tipo I: Hipersensibilidade Imediata gado, pleura, pulmões, articulações e outros órgãos e teci-
Reações do tipo I resultam da síntese de IgE específica, dos caracterizando quadros de intensa gravidade (tabela
por exemplo contra antígenos β-lactâmicos (determinantes 2).
principais, secundários ou cadeias laterais). A interação
destes antígenos com a IgE específica ligada aos mastóci- Tabela 1 - Manifestações cutâneas comuns nas reações de hiper-
tos ou basófilos via FcεRI (receptor de alta afinidade para sensibilidade aos fármacos de acordo com o fármaco envolvido1
IgE) leva à liberação de mediadores pré-formados (hista-
mina, triptase, etc) e neo-formados (prostaglandinas, leu- Lesões Fármacos Relacionados
cotrienos, PAF, etc). Estas reações geralmente ocorrem
imediatamente, em 20 a 30 minutos após a administração AAS, AINEs, β-lactâmicos, Anti-
da droga e podem manifestar-se por urticária, edema larín- convulsivantes, Barbitúricos,
ERUPÇÕES
geo, broncoespasmo, hipotensão e colapso cardiovascular7. MÁCULO-PAPULARES
Isoniazida, Fenotiazinas,
Quinolonas, Sulfonamidas,
Tipo II: Anticorpos Citotóxicos Tiazídicos
As reações citotóxicas ocorrem quando determinados
antígenos, por exemplo antígenos β-lactâmicos ligam-se à AAS, AINEs, Barbitúricos,
ERUPÇÕES Furosemida, Griseofulvina,
superfície das células sanguíneas ou do interstício renal, al- VÉSICO-BOLHOSAS Penicilina, Sulfonamidas,
terando-a e sendo identificados por anticorpos específicos Tiazídicos
IgG ou IgM. Esses anticorpos específicos ao interagirem
com estes antígenos, determinam a ativação do sistema
Amiodarona, Clorpromazina,
complemento e, consequentemente, lise celular. Este fenô- Furosemida, Quinolonas,
meno ocorre mais frequentemente em pacientes com uso FOTOSSENSIBILIDADE
Sulfonamidas, Tetraciclina,
prolongado de penicilinas e antibióticos relacionados7. As Tiazídicos, Piroxican
manifestações clínicas incluem anemia hemolítica, trombo-
citopenia, granulocitopenia ou nefrite induzida por droga. Acetaminofen, Anti-
convulsivantes, Barbitúricos,
Tipo III: Reações por Imunocomplexos ERITEMA Anti-concepcionais orais,
Anticorpos β-lactâmico-específicos das classes IgG e IgM FIXO Dipirona, Metronidazol,
Fenoftaleína, Penicilina, Gingko
podem formar complexos circulantes com os antígenos β-
biloba
-lactâmicos. Estes imunocomplexos, uma vez depositados
no interior dos vasos, podem levar a fixação de comple- Alopurinol, Cimetidina, Sais de
mento e se depositar em diversos tecidos, causando rea- VASCULITE ouro, Fenitoína, Quinolonas,
ções similares a doença do soro e, possivelmente, seja um Propiltiuracil, Tiazídicos, AINEs
dos mecanismos envolvidos na febre induzida por drogas7.
Clinicamente, manifesta-se por febre, erupções cutâneas, Sulfonamidas, Tetraciclinas,
STEVENS-JOHNSON OU
urticária, linfoadenopatia e artralgia que tipicamente sur- Barbitúricos, Fenitoína,
Necrólise Epidérmica Tóxica
Carbamazepina, Fenilbutazona
gem de uma a três semanas após a última administração
da droga. DERMATITE DE CONTATO
Neomicina, Benzocaína,
etilenodiamina
Tipo IV: Hipersensibilidade Mediada por Células Sulfas, Penicilinas, anti-
São reações mediadas por linfócitos T, os quais reco- DERMATITE ESFOLIATIVA convulsivantes, dipirona,
nhecem antígenos β-lactâmicos e/ou porções da molécula alopurino
carreadora através do receptor de células T (TCR), desen- AAS =ácido acetilsalicílico
AINEs = antiinflamatórios não-esteroidais
cadeando a liberação de citocinas, recrutamento de outros
tipos celulares e inflamação tecidual. Uma das apresenta-
ções clínicas mais clássicas é a dermatite de contato alér- A seguir, são descritas as principais reações de hiper-
gica7. sensibilidade relacionadas a drogas.
Evidências dos últimos cinco anos sugerem que nem to- ERUPÇÃO MÁCULO-PAPULAR: constitui o tipo mais fre-
das as drogas passam pelo clássico processamento e apre- quente de reação a droga. Pode surgir subitamente, uma a
sentação antigênicos para induzir uma resposta imunológi- duas semanas após a introdução do tratamento. Algumas
ca. Alguns fármacos podem se ligar de forma não covalen- vezes ocorre após a interrupção do medicamento (reação
te, diretamente ao receptor de linfócitos T e desencadear tardia), e em outros casos, a erupção desaparece mesmo
uma reação imunológica; este fenômeno foi denominado mantendo a exposição, dificultando o diagnóstico9. A erup-
de conceito “p - i” (pharmacological interaction) ou intera- ção caracteriza-se por pequenas máculo-pápulas eritema-
ção farmacológica com o receptor imune6. Este conceito tosas que acometem o tronco e membros, geralmente pou-
pode explicar a frequência de reações não mediadas por pando a face3.
IgE, que ocorrem horas após a primeira exposição à droga. Amoxicilina e ampicilina estão associadas com o desen-
Ainda não se sabe se este mecanismo também está envol- volvimento de erupção máculo-papular em cerca de 5 a
vido em reações IgE-dependentes (Tipo I)5. 10% dos pacientes. Estas reações não são IgE mediadas e,
em muitos casos, estão associadas infecções virais, parti-
III – Manifestações clínicas cularmente mononucleose infecciosa.
As reações alérgicas a medicamentos podem envolver O principal diagnóstico diferencial das erupções máculo-
qualquer órgão ou sistema. A pele é o órgão mais frequen- -papulares por drogas são os exantemas de etiologia viral,
temente acometido e sabe-se que um mesmo fármaco po- o que pode levar a uma interpretação equivocada de aler-
de estar envolvido em mais de um tipo de reação cutânea8. gia ao medicamento. Todavia, em algumas circunstâncias
As reações incluem urticária, erupção máculo-papular, se verifica maior probabilidade de surgimento dessas le-
erupção bolhosa, e dermatite esfoliativa (tabela 1). Nas re- sões. Por exemplo, pacientes com síndrome da Imunodefi-
ações anafiláticas, além das manifestações cutâneas, ocor- ciência Adquirida (AIDS) são mais propensos a reações
re comprometimento cardiorrespiratório e/ou gastrointesti- exantemáticas com sulfa e crianças com mononucleose
nal. Outras formas de reações sistêmicas podem levar ao medicadas com antibióticos ß-lactâmicos poderão evoluir
acometimento de membranas mucosas, linfonodos, rins, fí- com exantemas em mais de 90% dos casos10.
44 Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 32, Nº 2, 2009 Hipersensibilidade a Medicamentos
Poliarterite Hidralazina
Síndrome de hipersensibilidade Hidantoína, fenobarbital, carbamazepina,
(SHD – DRESS) sulfametoxazol, penicilinas
Anemia hemolítica Metildopa, cefalosporinas
Trombocitopenia Tiazídicos
Manifestações hematológicas
Agranulocitose Dipirona, fenilbutazona
Eosinofilia Hidantoína
URTICÁRIA E ANGIOEDEMA: podem ocorrer de forma xia não alérgica). O quadro clínico de ambas é semelhante
isolada ou como parte de reação imediata generalizada, e aparece poucos minutos após o contato com o agente
como a anafilaxia e a doença do soro. Manifesta-se clini- causal. Urticária e angioedema podem ocorrer em 90% dos
camente por urticas grandes, geralmente permanecendo pacientes. Alguns pacientes apresentam cólicas abdomi-
por poucas horas no mesmo local. Entre as causas mais nais, náuseas e vômitos, podendo chegar à liberação de
frequentes destacam-se os antibióticos com radical ß-lac- esfíncteres e perda da consciência. Estas reações podem
tâmico, especialmente as penicilinas. Os AINE podem cau- ser provocadas por grande variedade de drogas e produtos
sar urticária por mecanismo não imuno-mediado. Acredita- biológicos.
-se que 20 a 40% dos pacientes com urticária crônica idio- No Brasil, a causa mais frequente de reações anafiláti-
pática apresentam intolerância aos AINEs e o uso destes cas são os analgésicos, AINEs e os antibióticos. Outras
fármacos provoca exacerbações da urticária/angioedema causas são: insulina, enzimas (estreptoquinase), soro he-
Por outro lado, os AINEs também podem causar reações do terólogo, protamina e heparina. Além destas, outras subs-
tipo 1, incluindo urticária, angioedema e anafilaxia por me- tâncias usadas como excipientes têm sido envolvidas em
canismo imunológico e, neste caso, as reações são droga- reações tipo I, como parabenos, metabissulfito, formaldeí-
-específica e não se verifica reatividade cruzada com ou- do e eugenol3,10,12.
tros AINEs11. DERMATITE DE CONTATO: apresentam-se como lesões
Angioedema isolado (sem urticária) pode ser induzido pápulo-vesiculares, produzidas por drogas de uso tópico ou
por anti-hipertensivos do grupo de inibidores da enzima por excipientes de formulações tópicas. Constituem o tipo
conversora de angiotensina (iECA). O mecanismo provável mais comum de reação de hipersensibilidade mediada por
envolve acúmulo de bradicinina. O quadro pode persistir células. Uma variação deste tipo de lesão são as dermati-
por meses após suspensão da droga. tes de contato fotoalérgicas que dependem da luz solar pa-
ANAFILAXIA: são reações agudas, potencialmente fa- ra ativar as lesões. As drogas mais comumente implicadas
tais, que podem envolver o trato respiratório superior e in- são: penicilina, anestésicos locais e anti-histamínicos tópi-
ferior e também o sistema cardiovascular, além das mani- cos. Potentes excipientes sensibilizantes incluem os para-
festações cutâneas. A reação anafilática pode representar benos, formaldeído, etilenodiamina, lanolina e thimerosal11.
sensibilização alérgica verdadeira (reações IgE mediadas) FOTODERMATITE: é morfologicamente semelhante à
ou ocorrer por mecanismo não dependente de IgE (anafila- dermatite de contato. Acomete áreas expostas à luz solar.
Hipersensibilidade a Medicamentos Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 32, Nº 2, 2009 45
Após a sensibilização, a indução do quadro requer mínima toms - DRESS syndrome) e Pustulose Exantemática Aguda
exposição à luz. As reações fototóxicas não alérgicas (ex: Generalizada (PEGA). Estas condições serão abordadas iso-
eritrosina) são histologicamente similares às fotoalérgicas. ladamente no número 3 desta Série.
ERUPÇÃO FIXA POR DROGAS: são lesões pápulo-erite-
matosas, violáceas que se tornam acastanhadas. A carac- IV – Avaliação e Diagnóstico
terística desta farmacodermia é a reativação das lesões, O ponto de partida para a investigação de uma reação
com ou sem surgimento de novas lesões, a cada nova ex- medicamentosa é estabelecido pela suspeita clínica. A rela-
posição ao medicamento ou outros com reatividade cruza- ção temporal entre consumo do medicamento e o surgi-
da. É um evento frequentemente associado aos AINE e às mento de sinais e sintomas sugestivos pode favorecer o
sulfas3, 11. diagnóstico precoce.
VASCULITES: manifestam-se por lesões purpúricas e A história e o exame do paciente constituem a base para
petequiais, podendo acometer pele e órgãos internos, co- o diagnóstico em reações a medicamentos. Na história clí-
mo consequência da inflamação e necrose de vasos sanguí- nica devem ser observados dados relacionados ao início
neos. Podem evoluir com bolhas hemorrágicas, ulcerações, dos sintomas, tipo das manifestações e cronologia dos
nódulos e necrose dos órgãos acometidos. São induzidas acontecimentos (tabela 3)3.
por diferentes categorias de medicamentos, incluindo fato-
res de crescimento, citocinas e interferons. Algumas drogas
como a procainamida e hidralazina são implicadas como Tabela 3 - Aspectos importantes na história clínica3
causa da síndrome lupus-like, induzida por drogas. Outras,
como medicações anti-tireoideanas, minociclina e penicila- Analisar a reação: As manifestações são compatíveis?
mida são associadas às vasculites com c-ANCA ou p-ANCA – Identificar todos os medicamentos em uso
positivos. A púrpura de Henoch-Schonlein com vasculite
– histórico de administração da droga suspeita
cutânea e glomerulonefrite pode ser induzida por carbidopa
ou levodopa11. – início da administração e reação, exposição prévia
Esta afecção desenvolve-se em torno de 7 a 21 dias – história de outras reações a medicamentos
após o início da medicação, mas qualquer droga utilizada – uso intermitente, datas de administração e suspensão, modifica-
nos dois meses anteriores deve ser considerada suspeita, o
que pode dificultar o diagnóstico do agente causal. ção de doses de todos os medicamentos em uso
REAÇÕES CITOTÓXICAS: se enquadram no tipo II de
Gell-Coombs e são graves e potencialmente fatais. Ane- Dados complementares:
mias imuno-hemolíticas podem ocorrer após tratamento
– doença hepática ou renal concomitante
com quinidina, metildopa e penicilina. A trombocitopenia
pode ocorrer após uso de quinidina, propiltiuracil, sais de – histórico familiar, atopia
ouro, sulfonamidas e outras drogas. A granulocitopenia é – efeito da suspensão do medicamento
incomum, mas pode ser induzida por anticorpos citotóxicos
sintetizados em resposta a grande variedade de drogas,
como pirazolonas, fenotiazinas, tiouracil, sulfonamidas e De modo geral a reação não ocorre no primeiro contato
anticonvulsivantes11. com a droga. Dependendo do mecanismo envolvido, as
DOENÇA DO SORO: as reações por imunocomplexos fo- manifestações podem surgir já nas primeiras doses do me-
ram originalmente descritas com o uso de soro heterólogo, dicamento. São comuns as reações cruzadas entre fárma-
porém podem ser causadas por drogas de baixo peso mo- cos com estruturas similares.
lecular como penicilina, sulfonamidas, tiouracil e fenitoína. Um dado de grande valor diagnóstico é a observação de
As manifestações incluem febre, erupção máculo-papular melhora da reação após a suspensão do medicamento sus-
ou urticariforme, linfoadenopatia ou artralgias, que apare- peito. Em pacientes que estão usando vários medicamen-
cem de uma a três semanas após o início do uso da droga. tos a avaliação pode ser feita com a retirada escalonada
Embora a urticária seja a manifestação cutânea mais co- dos mesmos, seguida pela avaliação clínica (desapareci-
mum na doença do soro, a presença de lesões máculo-pa- mento dos sintomas).
pulares na parte lateral das mãos e pés, com aspecto ser- Apesar da ocorrência de manifestações predominante-
piginoso, pode ser mais específica da doença do soro. O mente cutâneas, o exame físico deve incluir avaliação clíni-
prognóstico é excelente, entretanto os sintomas podem du- ca cuidadosa, devido à possibilidade de envolvimento de
rar várias semanas11. outros órgãos e sistemas. As lesões devem ser descritas de
DERMATITE ESFOLIATIVA: consiste na confluência de acordo com sua aparência e distribuição, incluindo a dife-
extensas áreas de descamação e xerose, acompanhadas de renciação entre lesões máculo-papulares e urticariformes,
eritrodermia cutânea. Pode haver manifestações sistêmicas aspectos que podem auxiliar na indicação do mecanismo
como tremores e febre. envolvido.
MANIFESTAÇÕES EXTRA-CUTÂNEAS: além das manifes- A avaliação laboratorial de paciente com possível reação
tações cutâneas podemos encontrar outros órgãos ou sis- medicamentosa, sobretudo naquelas de maior intensidade,
temas acometidos por reações de hipersensibilidade a me- poderá incluir hemograma, apontando a possível presença
dicamentos. Manifestações pulmonares de reações alérgi- de eosinofilia (ex.: pneumonias eosinofílicas, reações por
cas à drogas ocorrem na anafilaxia, reações lupus-like, imunocomplexos, síndrome de Churg-Strauss, febre por
pneumonite intersticial ou alveolar, fibrose e granulomato- drogas). A realização da análise de taxas de sedimentação,
se. Hepatite de causa imunológica pode ocorrer após sensi- proteína C reativa, fator anti-nuclear (FAN), dosagens de
bilização ao ácido para-aminosalicílico, sulfonamidas e fe- complemento ou a identificação de auto-anticorpos pode
notiazidas. Acometimento renal pode ocorrer na forma de indicar a presença de reações inflamatórias compatíveis
nefrite intersticial (meticilina) ou como glomerulonefrite com as vasculites por medicamentos. A avaliação das fun-
membranosa (sais de ouro, penicilamida e alopurinol). A ções hepática e renal e a análise de urina podem ser reali-
febre é outra manifestação sistêmica causada por drogas zadas, auxiliando a confirmar suspeita de possível hepatite
(alopurinol)13. ou nefrite medicamentosa. Na fase aguda de uma reação
FARMACODERMIAS GRAVES: incluem a síndrome de anafilática (urticária, angioedema, hipotensão, choque) é
Stevens-Johnson, Necrólise Epidérmica Tóxica (NET), possível coletar soro nas primeiras quatro a seis horas
DRESS (Drug Rash with Eosinophilia and Systemic Symp- após o episódio para determinar a presença de triptase14.
46 Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 32, Nº 2, 2009 Hipersensibilidade a Medicamentos
Antibióticos
β-lactâmicos Sepsis
Penicilinas, cefalosporinas, amino- Meningite
Anafilaxia alérgica penicilinas Pneumonias
(mediada por IgE) Fluoroquinolonas Pielonefrite
Flushing, urticária, prurido, angioedema, Ciprofloxacina, levofloxacina
edema de laronge, rinorréia, conjuntivite, Quimioterápicos
sibilos, falta de ar, broncoespasmo, Platinas Câncer primário e metastático
náusea, vômitos, diarréia, hipotensão Cisplatina, carboplatina, recorrente (mama, ovário, cólon)
oxaliplatina
Anticorpos monoclonais Doenças inflamatórias crônicas e câncer
Rituximabe, trastuzumabe (leucemia, mama, ovário)
De modo geral, deve ser dada preferência à medicação 10. Roujeau JC. Clinical heterogeneity of drug hypersensitivity. To-
oral em relação ao uso tópico ou parenteral, já que a chan- xicology 2005; 209:123-9
11. Bloomberg G, Castells MC, Mendeson LM, Weiss ME. Drug Al-
ce de reação é menor. Após o uso de uma droga parente-
lergy and Intolerance. An Updated Practice Parameter. Joint
ral, o paciente deve ser observado por pelo menos uma Council of Allergy, Asthma and Immunology, 2009; in press.
hora, devido à possibilidade de ocorrência de reações ana- 12. Weiner M, Bernstein IL. Adverse reactions to drug formulation
filáticas neste intervalo de tempo. Esquemas profiláticos agents. A handbook of excipients. New York: Marcel Dekker;
com corticosteróides e anti-histamínicos são indicados ape- 1989.
nas em situações específicas, como nos pacientes que tive- 13. Ditto AM. Drug Allergy: Part A. In: Patterson´s Allergic Dise-
ram reações adversas aos contrastes radiológicos. ases. 6th ed.,; Lippincot Williams & Wilkins; Philadelphia, PA,
EUA; 2002; 295-334
Extremo cuidado deve ser adotado no emprego de dro-
14. Samel AD. Drug Eruptions. Official topic review from UpToDa-
gas de síntese recente. Reações adversas e interações me- te. http//www.utdol.com/utd/store/index.do (2007).
dicamentosas podem não ter sido detectadas nos estudos 15. Brockow K, Romano A, Blanca M, Ring J, Pichler W, Demoly P.
clínicos. General considerations for skin test procedures in the diagno-
sis of drug hypersensitivity. Allergy, 2002: 57: 45–51
Referências 16. Demoly P, Romano A. Recent advances in the diagnosis of
1. Gruchalla, R. Drug allergy. J Allergy Clin Immunol 2003; 111 drug allergy. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2007; 7(4):299-
(2); S548-559. 303.
2. Adkinson NF, Friedmann PF and Pongracic JA. Drug allergy. In: 17. Nagao-Dias AT, Barros-Nunes P, Coelho HLL, Solé D. Reações
Holgate ST, Church MK, Lichtenstein LM, ed Allergy 3rd ed Mos- alérgicas a medicamentos. J Pediatr (Rio J) 2004;80(4):259-66
by Elsevier 2006. 157-166 18. Khalili B, Bahna SL. Pathogenesis and recent therapeutic
3. Bernd LAG Alergia a medicamentos. Rev. bras. alerg. imuno- trends in Stevens-Johnson syndrome and toxic epidermal ne-
patol. 2005; 28(3): 125-132 crolysis. Ann Alergy Asthma Immunol 2006; 97:272-81.
4. Bernd LAG. Alergia medicamentosa. In: Diagnóstico e trata- 19. Volcheck GW. Clinical evaluation and management of drug
mento das doenças imunológicas. Elsevier 2005. Editores: hypersensitivity. Immunol Allergy Clin N Am 2004; 24:357-71.
Geller M; Scheinberg M; 133-142. 20. Bachot N, Roujeau JC. Physiopathology and treatment of seve-
5. Demoly, P, Pichler WJ, Pirmohamed M, Romano A. Important re drug eruptions. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2001; 1:
questions in allergy 1: drug allergy/hypersensitivity. Allergy 293-98.
2008; 63(5):616-9. 21. Castells M. Desensitization for drug allergy. Curr Opin Allergy
6. Ensina LF, Amigo M, Guzman E, Paoli R, Koch T, Camelo-Nunes Clin Immunol 2006; 6:476-81.
I. Self reported drug allergy in university students from São 22. Romano A, Gueant-Rodriguez R-M, Viola M, Gaeta F, Caruso C,
Paulo, Brazil. Allergy 2008; 63(suppl 88):335. Gueant J-L. Cross-reactivity among drugs: clinical problems.
7. Weiss MW, Adkinson Jr NF. Diagnostic testing for drug hyper- Toxicology 2005; 209:169-79.
sensitivity. Immunol Allergy Clin N Am 1998; 18(4):731-744
8. Gomes ER, Pichler WJ, Demoly P, Aberer, Frew AJ, Weck A, et
al. The drug ambassador project: The diversity of diagnostic
procedure for drug allergy around Europe. Allergy Clin Immu-
nol Int – J World Allergy Org 2004; 17:9-18.
9. Mayorga C, Pena RR, Blanca-Lopes N, López S, Martin E, Tor- Correspondência:
res MJ. Monitoring the acute phase response in non-immediate Dr. Luiz Antonio G. Bernd
allergic drug reactions. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2006; Rua Mariante, 257; conj. 105
6(4):249-57. 90430-181 – Porto Alegre – RS