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ISSN 1982 - 0283

A arte de ilustrar livros


para crianças e jovens

Ano XIX – Nº 7 – Junho/2009

Secretaria Ministério da
de Educação a Distância Educação
Sumário

A arte de ilustrar livros para crianças e jovens

Aos professores e professoras ................................................................................... 3


Rosa Helena Mendonça

Apresentação da série A arte de ilustrar livros para crianças e jovens ..................... 5


Rui de Oliveira

Texto 1 – A ilustração como arte narrativa .................................................................. 12


Rui de Oliveira

Texto 2 – A ilustração no Brasil ................................................................................ 29


Graça Lima

Texto 3 – Fundamentos e técnicas da arte de ilustrar ............................................ 45


Guto Lins
A arte de ilustrar livros para crianças e jovens

Aos professores e professoras,

Numa das séries que produzimos sobre lite- Uma possível resposta está no site do artista:
ratura infantil e juvenil no Programa Salto
para o Futuro, da TV Escola, recebemos a “Gosto de ilustrar livros com conteúdos e
instigante questão, entre tantas outras ar- propostas literárias bem diferentes uma da
quivadas em nosso banco de dados: outra. Acredito que este seja o aspecto mais
fascinante do ato de ilustrar, e sem dúvida o
Na criação de um livro de imagens, o ilustra- maior desafio para o ilustrador. Em meu tra-
dor/autor pensa em um texto verbal/escrito ou balho, sempre almejo que a interpretação
as imagens surgem por elas mesmas? Janaína que tenho do texto não seja a única. Procuro,
Fusinato, Ibirama - SC. sempre que possível, criar portas – verdadei-
ras passagens secretas para que as pessoas
3
Para responder a esta e a muitas outras tenham as suas próprias e particulares visões.
questões, convidamos o escritor, ilustrador, Preocupa-me, portanto, não condicionar em
pesquisador, professor Rui de Oliveira, pre- demasia o leitor. Penso que o ato de criação
miado autor de livros para crianças e jovens, de imagens se origina não diretamente na pa-
cuja produção literária volta-se também para lavra, mas no entre-palavras. Daí vem minha
os estudos teóricos sobre a arte de ilustrar. preocupação em criar para cada texto uma
A ideia de uma série de programas e desta imagem adequada, que muitas vezes está de
publicação eletrônica sobre A arte de ilustrar acordo, ou não, com meus gostos pessoais,
livros para crianças e jovens surgiu, pois, do ou com a minha visão de arte. Por isto, não
interesse demonstrado por professores e tenho nenhuma intenção em ser reconhe-
professoras em debater a relação imagem e cido de um livro para outro. Eu substituiria
palavra e, em especial, a leitura, esta práti- em meu trabalho a palavra estilo por método
ca cultural complexa e polissêmica. E contar de abordagem. O texto é a origem de tudo. É
com a consultoria de Rui de Oliveira nesse impossível ilustrar sem gostar de literatura. É
passeio pelo universo das imagens que são impossível ilustrar sem gostar de ler.”
constitutivas de identidades e subjetivida-
des desde a infância, mostrou-se instigante Mas fomos buscar muitas outras opiniões,
e desafiador. ouvimos ilustradores sobre os processos
criativos, buscamos traçar um panorama cativa na constituição de leitores críticos e
da ilustração no Brasil, falamos do papel do criativos.
professor como um mediador de leituras das
imagens produzidas para e pelas crianças e, Esta publicação, assim como os programas
ainda, sobre como as ilustrações nos livros televisivos, trazem um repertório visual que
de literatura são relevantes na construção junto com os textos e os depoimentos cer-
de representações sociais. Destacamos, en- tamente possibilitarão compreender as nar-
tão, a importância das escolhas e do aces- rativas produzidas por imagens e palavras
so de crianças e jovens a uma diversidade como expressões a um tempo independen-
de imagens que expressem o imaginário e a tes e complementares, no contexto da arte
cultura dos vários grupos que compõem a literária.
nação brasileira, sem deixar de considerar
o panorama mundial desta arte tão signifi- Rosa Helena Mendonça1

1 Supervisora Pedagógica do programa Salto para o Futuro.


Apresentação

A arte de ilustrar livros para crianças e jovens1

Rui de Oliveira2

A série A arte de ilustrar livros para crianças ção convencional. Certamente teríamos no
e jovens tem como objetivo principal oferecer futuro melhores leitores e apreciadores das
subsídios para que os professores atuem como artes plásticas, do cinema e da TV, além de
mediadores no processo de leitura de imagens, cidadãos mais críticos e participativos dian-
a partir dos livros de literatura para crianças e te de todo o universo icônico que nos cerca.
jovens. A premissa é que toda ilustração, além A posterior alfabetização convencional seria
de suas inter-relações com o texto escrito, muito mais agradável às crianças.
possui qualidades estruturais e artísticas que
precisam ser analisadas, considerando que as Os critérios de avaliação e de escolha de li-
5
imagens dos livros são elementos importantes vros ilustrados são geralmente baseados no
na criação da memória visual, em especial, na âmbito da “preferência pessoal”, alicerçados
infância e na adolescência. em gostos e aversões não justificados. Assim
como existe uma sintaxe das palavras, existe
também uma relativa sintaxe das imagens.
A leitura da imagem
Logicamente que para “ler” uma imagem
Infelizmente, priorizamos para as crianças, é impossível adotar um método rígido, um
de forma até perversa, o aprendizado da sistema, por exemplo, que avalie unicamen-
leitura das palavras como atestado de alfa- te as questões estruturais — ritmo, linha,
betização. Seria mais conveniente se, nas cor, textura, etc.
escolas de educação básica, a iniciação à
leitura das imagens precedesse a alfabetiza- Os textos apresentados nesta série não têm

1 Todos estes textos são resumos, trechos e excertos dos livros: Pelos Jardins Boboli. Reflexões sobre a arte de
ilustrar livros para crianças e jovens. Rui de Oliveira: Editora Nova Fronteira, 2008. 2ª edição. O que é qualidade em
Ilustração no livro infantil e Juvenil – com a palavra o ilustrador. Organizado por Ieda de Oliveira. São Paulo: Editora
DCL, 2008. Neste livro escrevi o artigo Breve Histórico da Ilustração no livro Infantil e Juvenil. ruideoliveira@uol.
com.br www.ruideoliveira.com.br
2 Ilustrador e escritor. Doutor em Comunicação e Estética do Audiovisual pela Escola de Comunicação e
Artes da USP. Professor na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Consultor da série.
nenhuma pretensão de ser didáticos. São re- possui uma iniciação metodológica e que,
flexões, até porque, como foi dito, não há acima de tudo, é aptidão adquirida; uma ca-
uma gramática das imagens, muito menos pacidade adestrada e cultivada.
um manual, um receituário de qualidade.
Muitos outros fatores, além dos estruturais Toda ilustração, além de suas inter-relações
já citados, concorrem para sua correta frui- com o texto, possui qualidades configuracio-
ção. nais e estruturais perfeitamente explicáveis
e analisáveis. A frequente alusão à pintura e
Nesse sentido atua a estética, uma reflexão às suas sutis diferenças e semelhanças com
filosófica que de modo algum está preocu- a ilustração será sempre necessária.
pada com definições rígidas da obra de arte.
Na verdade, todas as linhas de estudo do fe- Sem colocar a ilustração em posição inferior,
nômeno artístico — por meio da sociologia é preciso admitir que existem percepções di-
da arte, da psicologia, da história da arte e ferenciadas da ilustração perante a pintura,
até mesmo da biografia do artista — são co- quer seja no ato de sua criação, sempre re-
nhecimentos sempre parciais. A leitura de lacionada com um texto literário, quer seja
uma obra de arte se dá por camadas, níveis, na sua circunstancialidade de existir dentro
de um livro ao passar das páginas, sem men- 6
filtros esclarecedores; são aproximações que
nos revelam uma das muitas faces da arte. cionar o seu destino de imagem reproduzi-
da, quase sempre em contradição e infiel ao
Os mergulhos psicanalíticos, a decifração que o ilustrador criou. Tudo isso, e muitos
da imagem pelos labirintos semiológicos, os outros fatores, nos conduzem a uma expec-
reducionismos da obra de arte às questões tativa menor, a uma fruição mais simples e,
históricas e sociais, os idealismos de que as consequentemente, a uma análise sem as
imagens se originam de imagens e seguem complexidades de quando estamos diante
indiferentes aos clamores humanos indivi- da obra de um grande mestre da pintura.
duais e coletivos, enfim, todas essas leituras
— e existem outras — o nome já as define Portanto, sem humilde reverência, é mais le-
bem, são leituras da obra de arte. Neces- gítimo, para entendermos a arte da ilustra-
sárias. Importantes. No entanto, são apro- ção, admitir suas diferenças com a pintura.
ximações, camadas reveladoras da criação Existem os salões e as salas, o ouro e a prata,
artística. as monumentais óperas e os musicais norte-
americanos, todos legítimos em sua própria
Essas abordagens diferenciadas não inva- linguagem. Diferentes, mas iguais em suas
lidam o fato de que a leitura da imagem potencialidades artísticas.
Após essa necessária comparação, a análise xível para a leitura das imagens narrativas
da arte de ilustrar em nossos estudos será dos livros não apenas relacionando-as com
direcionada para as questões estruturais da o texto. Ele próprio terá um novo significa-
imagem, até pelo fato de ser mais conve- do de interesse junto às crianças a partir do
niente para uma linguagem que, em princí- momento em que os aspectos formais da
pio, está associada a um texto. Isso não nega ilustração forem mais compreendidos.
sua existência independente.
Considerando que as imagens de um livro
A finalidade, ao adotar este gênero de lei- criam a memória visual das crianças, a lei-
tura, é também desmitificar a auréola de tura harmoniosa e participativa da palavra e
intocabilidade que afeta a ilustração e, so- da ilustração amplia o significado e o alcan-
bretudo, a pintura. Com isso, colocaremos ce lúdico e simbólico de um livro.
ante a ilustração uma luz mais lúcida sobre
o chamado gosto pessoal. Qualquer fenôme- Ao estudarmos a imagem impressa, não im-
no artístico, seja ilustração, seja pintura, é portando em qual suporte — vídeo, papel,
um fenômeno de comunicação. A arte não é película, etc. —, vamos compreender que o
uma esfinge, um mito indecifrável de acesso significado de uma ilustração se origina no
antes e no depois. 7
restrito a uma elite de exegetas.

No caso da ilustração, ela pode assumir um Explicando melhor, a arte de ilustrar se lo-
caráter de transcendência do texto, o que caliza mais na sombra do que nos aspectos
não significa transgressão. O critério único simbólicos da palavra. O olhar pergunta
de avaliação baseado na adequação à pala- mais para o que está na escuridão do que
vra não explica toda a extensão da lingua- para o que está nos significados dos objetos
gem visual, como, por exemplo, as qualida- representados à luz. A ilustração não se ori-
des formais e a fisicalidade da ilustração de gina diretamente do texto, mas de sua aura.
um Jiri Trnka. As belas aquarelas desse mes-
tre da ilustração tcheca já são em si mesmas A leitura narrativa é sempre uma com-
um prazer e uma experiência de leitura per- preensão dos significados antecedentes e
ceptiva para todas as crianças. consequentes da imagem. Com relação ao
texto, a imagem é um prisma, jamais um
Portanto, um dos objetivos fundamentais espelho. São muitos os olhares que pode-
destas reflexões sobre a arte de ilustrar é mos ter diante de uma ilustração. Nenhu-
mostrar que, apesar das limitações descri- ma ilustração possui uma leitura absoluta
tas, é possível a criação de um processo fle- do texto, muito menos o leitor da imagem.
A leitura será sempre parcial, segmentada te nos detemos e apreciamos a leitura, e não
e particularizada. Vemos aquilo que espe- no texto original.
ramos ver.
Só haverá interesse na ilustração se ela nos
Vemos a nossa ilusão e a nossa pessoal re- possibilitar a criação de um novo texto visu-
alidade a partir de uma ilustração de um al. Uma das finalidades da ilustração nos li-
texto. A mágica da ilustração é um truque vros não é apenas apresentar uma versão do
que nós mesmos fazemos e revelamos. Eis texto, mas sim favorecer a criação de outra
o sentido do que foi exposto como antes literatura, uma espécie de livro e imagem
e depois. O momento presente da imagem pessoais dentro do livro que estamos lendo.
é apenas um ardil para resgatarmos nossa
experiência vivida e projetarmos e criarmos A arte de ilustrar está assentada no equilí-
sua memória futura. É a pessoalidade da brio e na harmonia entre a imaginação ver-
criação do ilustrador que permite o trans- bal e a imaginação visual. Em realidade, o
porte ao vivido e ao que se vai viver. Nesse que esperamos de um ilustrador é que ele
particular, quais são os limites da subjetivi- seja um livre intérprete do texto, e não um
dade, da pessoalidade do ilustrador diante médium.
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de um texto?
Um dos objetivos básicos do ilustrador é
É difícil saber onde está o ponto exato, a tornar incomum o comum, transformar o
justa interpretação. A sensatez nos diz que real em fantástico, sugerir e representar
deverá sempre existir um equilíbrio entre o que o leitor supõe ver. O espaço imagi-
as intenções literárias do escritor e a visão nário entre o visto e o não-visto é a área
pessoal do ilustrador dessas intenções. A preferencial de atuação do ilustrador ante
originalidade da leitura visual do texto não a sua inexorável referência a um texto li-
é uma negação do mesmo. Na arte de ilus- terário.
trar, as leituras paralelas de um texto são
imagens radiantes e profundamente preg- Como dizia Anatole France, o homem inven-
nantes. tou a ninfa, mas antes havia a água. É fácil
e cômodo desenhar aquilo que nunca se viu.
O virtuosismo da imagem e a interpretação Infelizmente grande parte das ilustrações
do ilustrador não podem ser mais importan- para livros infantis trabalha sobretudo com
tes que a obra. Apesar de vivermos em uma o universo do grotesco. Toda esta introdu-
época em que as releituras são sinônimos de ção tem o objetivo de nos situar diante das
originalidade e pessoalidade, frequentemen- convenções que caracterizam grande parte
das ilustrações, principalmente para os pe- nável quando essa opção soberana oculta
quenos leitores. em realidade seu pouco adestramento à
arte de desenhar. Um artifício ante a falta
de ofício.
Ilustrar não é fazer
“bonequinhos”
Como reflexo do final do texto acima, advém
Estes “bonequinhos” que podemos classifi- a pergunta: o que é desenhar bem para o
car como doces de coco podem ser ilustra- ilustrador? Desenhar e estruturar satisfato-
ções apetitosas e açucaradas bastante acei- riamente a figura humana não preenchem
tas como infantis, fato que não esconde sua totalmente os requisitos de uma boa ilustra-
outra face, nauseante e repetitiva. Longe ção. O desenho é como se fosse uma cali-
dessas imagens, poderíamos definir a ilus- grafia, e todos temos a nossa. A ilustração é
tração como uma representação da ausên- uma forma de literatura e o desenho é o seu
cia do objeto, sem saudades ou nostalgias, alfabeto, as formas, as suas sentenças.
muito menos atrelada à sua reprodução fiel.
Creio ser impossível classificar o que seja
Faz parte do universo das ilustrações para desenhar bem sem considerar o passado e
9
livros infantis e juvenis sua íntima relação a cultura de um artista. É lamentável ver,
com a ilusão do objeto ou do corpo huma- às vezes, talentosos desenhistas brasileiros,
no. Isso não significa uma trapaça. Apesar de principalmente quadrinistas, professando o
massificado em livros, catálogos e premia- catecismo nipônico e colonizador do Mangá
ções, esse gênero de ilustração tão comum e do Animê, ou desenhando sob a tutela e
é uma representação duvidosa dos objetos e garrote da anatomia monstruosa do univer-
dos seres. As ilustrações aqui denominadas so Marvel.
doces de coco apresentam, com suas ima-
gens geralmente em traços ingênuos e cores Concluímos, então, que o domínio da repre-
chapadas, um naifismo aculturado e con- sentação figurativa é necessário. O aprendi-
trabandeado dos cartuns, RPGs, gibis e TV. zado também. Mas esta qualidade, mesmo
São ilustrações que parecem padrões têxteis que virtuosa enquanto ilustração, não é um
para quartos e enxovais de crianças, ou mes- fim em si mesma, ou pré-requisito, muito
mo papel de embrulho para presentes. menos salvo-conduto para uma boa imagem
narrativa.
O legítimo direito que tem o ilustrador de
desenvolver seu trabalho em qualquer esti- O universo figurativo, muito além de sua
lo que bem lhe aprouver se torna questio- mimese, deve estar perfeitamente integrado
nos objetivos da ação, na proposta e atmosfe- Shepard, com ligeiros, soltos e expressivos bi-
ra literárias e com o fundo onde transcorre a cos de pena, são muito mais fantasiosas, e até
ação. É necessário que haja um isomorfismo mesmo comunicativas, do que as modernas
absoluto entre forma e fundo. Uma ilustra- versões deste personagem feitas através de
ção hiper-realista deixa poucos espaços para um realismo frio e infográfico. As imagens de
o complemento da imaginação do pequeno Shepard não eram abstratas, ou comumente
leitor. Esta participação imaginária significa chamadas de estilizadas, porém suas figuras
que vemos na verdade a nossa expectativa do permitiam o ato de abstrair. Este domínio en-
ver, não necessariamente o que está de forma tre a concreção e a leve soltura da indefinição
tão realista explicitado em demasia. de seus desenhos comprova que abstração e
abstrair são conceitos divergentes.
Esta participação imaginária, acima proposta,
simboliza o direito que o pequeno leitor tem Retornando ao início destas reflexões sobre
de exercer a sua legítima alternativa pessoal o significado da representação figurativa,
do olhar. O que está nas sombras, ou apenas surge incontinente, e de novo, a pergunta:
sugerido, é muito mais legível do que as for- o que é desenhar bem? Acredito ser este um
mas sob a luz da precisão cirúrgica. Nada é dos grandes problemas na formação de jo-
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mais tedioso aos domínios do que supomos vens ilustradores, acrescidos pelo abandono
ver que um livro para crianças narrado atra- sistemático das escolas de arte do aprendi-
vés de fotos. O real imaginário prescinde do zado tradicional da forma, quer humana ou
realismo, mas se origina no verdadeiro. dos objetos e plantas. Em outras palavras,
foi dada uma nefasta prioridade ao conhe-
As maravilhosas aventuras do ursinho Winnie- cer, em lugar do ver. Uma sacralização do
the-Pooh, desenhadas em 1926 por Ernest H. auto-expressar. Uma tirania do conceitual.

Textos da série A arte de ilustrar livros para


crianças e jovens3

Texto 1: A ilustração como arte narrativa

O texto do primeiro programa apresenta para crianças e jovens, contextualizando-a


questões relativas à arte de ilustrar livros no bojo da revolução industrial do século XIX

3 Estes textos são complementares à série A arte de ilustrar livros para crianças e jovens, com veiculação de 15
a 19 de junho de 2009, no programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC).
até os anos 30 do século XX, com a chama- ção, as inovações trazidas pelas tecnologias.
da idade de ouro da ilustração. Também são A proposta do texto é apresentar a ilustração
abordadas as relações entre pintura e ilustra- como um gênero das artes visuais narrativas.

Texto 2: A ilustração no Brasil

Este texto apresenta um breve histórico da de arte visual que, por sua criatividade, pro-
arte de ilustrar livros para crianças e jovens jeção, estilo ou forma, amplia, diversifica e
no Brasil desde os anos 30 até os dias de pode até, por vezes, ir além da própria leitu-
hoje. Analisa a ilustração como uma forma ra do texto narrado.

Texto 3: Fundamentos e técnicas da arte de ilustrar

O texto trata dos fundamentos e técnicas da da mediação na leitura de textos e imagens.


arte de ilustrar livros para crianças e jovens.
Aborda, em especial, o diá­logo entre palavra Os textos 1, 2 e 3 também são referenciais
e imagem, escritor e ilustrador na edição de para o quarto programa, com entrevistas
um livro. Considera que o livro é, simultanea- que refletem sobre esta temática (Outros
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mente, veículo de comunicação, peça literária, olhares sobre a arte de ilustrar) e para as
instrumento pedagógico, fonte de saber e de discussões do quinto e último programa da
lazer. Neste contexto, destaca-se a importância série (A arte de ilustrar em debate).
Texto 1

A ilustração como arte narrativa


Rui de Oliveira1

A sequência de estudos adotada para estas crianças, como hoje em dia entendemos, quer
reflexões teve como prioridade realizar uma do ponto vista gráfico e conceitual, se popula-
análise, uma abordagem das principais in- rizou no período vitoriano, apesar das naturais
fluências que constituíram a linguagem da limitações de um gênero literário que gradual-
arte de ilustrar livros para crianças e jovens. mente se estabelecia e se propagava.
O período selecionado foi do século XIX até
a década de 30 — trajeto em que a ilustração O segundo aspecto que nos conduz a es-
de livros se individualiza como arte, como tudar a ilustração de livros para crianças e
linguagem de massa e como realidade in- jovens, a partir do século XIX, é que, neste
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dustrial e profissional. período, ela começa a estabelecer códigos —
e até mesmo convenções em sua linguagem
visual — que permanecem até hoje.
A revolução industrial,
a era vitoriana e a
Quanto ao conteúdo dos livros para crianças,
ilustração de livros para
ele reflete o conservadorismo que caracterizou
crianças no século XIX
o longo período vitoriano, com a sua inevitável
A publicação de livros ilustrados, especialmen- influência nos costumes e, por conseguinte,
te para o público infanto-juvenil, antecede, na ilustração. Por outro lado, a Inglaterra pas-
em muito, o período da Rainha Vitória (1819- sava por grandes transformações econômicas
1901), da Inglaterra e de seu filho e sucessor, e sociais logicamente advindas do desenvolvi-
Rei Edward VII (1841-1910). No entanto, três mento do comércio e do transporte de mer-
foram os motivos para adotar este período cadorias, condições que, naquele momento
como ponto de partida de nossos estudos: pri- histórico, eram próprias do país. Este fato per-
meiramente, o aspecto industrial — o livro para mitia uma comercialização e difusão maior do

1 Ilustrador e escritor. Doutor em Comunicação e Estética do Audiovisual pela Escola de Comunicação e


Artes da USP. Professor na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Consultor da série.
livro, agregado a uma demanda crescente de do saber e do surgimento de novas lingua-
ilustradores e gravadores. Sem esquecer a con- gens, como é o caso da ilustração de livros,
solidação planetária do império britânico até do cartaz, e do próprio cinema através da
final do século XIX. reprodução fotográfica, sem esquecer que
grande parte do conhecimento que temos
Outro aspecto que convém ressaltar no sur- da história da arte em nossos dias advém de
gimento do livro para crianças, além das reproduções de pinturas e esculturas em li-
questões industriais, refere-se aos processos vros e revistas especializadas.
educacionais da época. Apesar do conserva-
dorismo acima aludido, a criança passa a ser É impossível dissociar o surgimento e a con-
aceita e compreendida como um ser único, solidação profissional de ilustradores espe-
possuidor de particularidades e necessida- cializados em histórias para crianças sem
des inerentes à sua fase de vida, superando- considerar as possibilidades técnicas que
se desta forma a visão tradicional da criança permitiram a reprodução em larga escala,
unicamente como um adulto pequeno. com satisfatória fidelidade ao original do
artista. Principalmente com a impressão a
Mesmo considerando o convencionalismo cor, recurso importante de comunicação e
na imagem e na literatura destinadas ao 13
empatia junto ao público infantil.
público infantil, reiterando o que foi dito, o
livro e a ilustração para crianças, como hoje
os entendemos, se originam neste período. A estandardização da
imagem nos primeiros livros
A linguagem da ilustração e destinados às crianças
as tecnologias de impressão
Inicialmente, a reprodução das ilustrações
Outra questão que nos leva a tomar como em livros era feita através de xilogravuras a
referência a era vitoriana é o grande desen- partir do original em papel fornecido pelo
volvimento ocorrido, naquela época, nos artista. As artes eram transferidas para a
processos de captura e reprodução da ima- madeira, ou então desenhadas sobre a mes-
gem. Naquele século, reproduziram-se mais ma para depois serem trabalhadas pelo gra-
imagens do que em todos os séculos prece- vador. Neste último caso, havia ainda o in-
dentes. conveniente da perda, no ato de gravar, do
original do artista. Porém, o maior proble-
Portanto, a capacidade de reprodução da ma era a excessiva padronização tão visível
imagem foi essencial para a consolidação nas ilustrações de livros daquela época, sem
contar que esta “tradução” visual do dese- Ganso, de Perrault, datadas de 1695, ou dos
nho original do ilustrador freqüentemente irmãos Valentin & Orson, em uma edição
era realizada por mais de um gravador. francesa de 1489, é nestas imagens — que po-
deríamos chamar de alfarrábios da história
É bom esclarecer que a ênfase que está sendo da ilustração — que encontraremos uma série
dada ao período vitoriano — como início da de convenções visuais que se perpetuou no
atividade profissional de ilustradores de livros imaginário das pessoas, principalmente nas
para crianças — não ignora que, em outros soluções gráficas utilizadas pelos ilustrado-
países, na mesma época já se ilustravam clás- res de livros para crianças que se seguiram.
sicos para este público. No caso da França,
por exemplo, os contos de Charles Perrault, Apesar de não ser apenas esta a sua fonte,
Sophie, Condessa de Ségur, Jeanne-Marie Le- podemos dizer que as imagens se originam
prince de Beaumont foram freqüentemente de outras imagens. A história da ilustração
ilustrados, da mesma forma, na Alemanha, de livros para crianças e jovens não foge
os contos de Jacob e Wilhelm Grimm. deste processo quase inexorável.

Seguindo esta trilha da origem das imagens


14
As origens, a publicação dos nos contos de fadas, é importante citar,

primeiros contos de fadas e a mesmo de forma breve, os dois volumes de

história da ilustração Le Piacevoli Notti escritos por Francesco


Straparola, publicados em 1550 e 1553.
Considerando os contos de fadas como um
gênero literário, podemos também compreen- Até mesmo Perrault, em seu famoso Pele de
der a ilustração destes contos como um gêne- Asno, tomou como fonte o conto Teobaldo de
ro de ilustração. Apesar de seu estudo ir além Straparola.
dos limites deste trabalho, mesmo assim um
retorno às origens e às primeiras publicações Mais tarde, ainda sob inspiração deste es-
dos contos de fadas é de grande utilidade para critor, outro italiano nascido em Nápoles,
entendermos não somente a história da ilus- Giambattista Basile, publica postumamente,
tração, mas principalmente analisar o nasci- em 1634 e 1636, O conto dos Contos, também
mento de um gênero de imagem que, em nos- conhecido como Pentamerone.
sos dias, alcança dimensão universal, quando
associado à indústria do audiovisual. Enfim, o estudo das imagens a partir das di-
versas adaptações e recriações de alguns li-
Diante das gravuras para os Contos da Mãe vros fundamentais, como estes citados, nos
ajuda a compreender melhor não apenas o Profundamente místico e identificado espiri-
conto de fadas como literatura, mas sobre- tualmente com temas bíblicos, em 1789 ele
tudo, por suas diversas leituras visuais ao escreveu e desenhou um livro chamado Can-
longo dos anos, nos possibilita um conheci- ções da Inocência — poemas em que a palavra
mento melhor da história da ilustração. e a imagem se entrelaçam, se amalgamam
em uma expressão única. É uma obra refe-
rencial no estudo da ilustração para crianças.
Os princípios da ilustração
nos livros lítero-visuais do Todos nós conhecemos a atração que o jogo
século XIX rimado e ritmado das palavras exerce sobre
as crianças, como, por exemplo, as parlen-
Na gênese da arte de ilustrar para crianças,
das e os trava-línguas. Na história da ilus-
e principalmente no estudo da relação entre
tração de livros, um dos pioneiros no uso da
a palavra e a imagem, é fundamental ana-
junção sonora entre imagem e palavra foi
lisar a obra de dois artistas que, com seus
Edward Lear (1812-1888). A obra deste ilustra-
desenhos e textos, criaram um gênero de
dor inglês nos passa a sensação espontânea
livro que poderíamos chamar de expressão
de que o desenho e a poesia fazem parte de
lítero-visual. Seus nomes: William Blake
15
um mesmo corpo, uma criação simultânea
(1757-1827) e Edward Lear (1812-1888).
originária de um único gesto criador. Seus
personagens e textos non-sense certamente
Esta interação é perfeitamente exemplifica-
influenciaram Lewis Carrol (1856-1898) ao
da na antiga tradição dos caligramas, que
escrever Alice no País das Maravilhas e Alice
eram figuras cujo corpo é preenchido com
através do espelho.
letras, assim formando a imagem de um ho-
mem, de um animal ou planta. Estes jogos
O conhecimento de sua obra é uma parada
de letras possuem uma longa tradição nos
obrigatória, uma estação rica de humor e
chamados alfabetos figurativos, ou seja, le-
sutilezas nesta curta viagem que fazemos
tras constituídas de formas diversas, muito
pela ilustração destinada às crianças.
utilizadas em capitulares para textos.

A expressão lítero-visual possui diversas fei- A influência da


ções, diferentes modos de ser realizada. No
fisiognomonia na ilustração
caso da ilustração de livros para crianças,
de livros para crianças
ela assume um outro papel na obra do poeta
romântico e ilustrador inglês William Blake. Prosseguindo em nossa trilha para mapear
as origens da ilustração de livros para crian- Dois outros livros do artista são fundamen-
ças e jovens, temos agora que cruzar o Ca- tais para compreensão deste gênero de ilus-
nal da Mancha e aportar na França. E, logo tração destinada ao leitor infanto-juvenil.
a seguir, viajar até Paris, onde atuou, na pri- São as obras As Metamorfoses do Dia, escritas
meira metade do século XIX, um dos mais e ilustradas em litografias pintadas à mão,
extraordinários e visionários ilustradores, e As flores animadas. Nelas, ele expressa as
caricaturistas e chargistas franceses: Jean diversas faces e características do compor-
Ignace-Isidore Grandville (1803-1847). tamento humano através do que podería-
mos chamar de personagens-plantas. Além
Antes de analisarmos de forma sucinta a sua de inspirar a obra de subsequentes ilustra-
obra, que por sinal se projeta no século XX dores, encontraremos a sua influência até
através do surrealismo, é necessário nos de- nos desenhos animados de Walt Disney. Seu
ter em um dos mais significativos elementos livro O Outro Mundo, publicado em 1844, é
da linguagem da ilustração, que é a fisiogno- uma antevisão do surrealismo.
monia animal. Apesar de sua importância, é
muito pouca analisada quando se pensa so-
bre a história e sobre a arte de ilustrar.
O real e o humano na
história da ilustração 16

Os estudos fisiognomônicos possuem uma Retornando à ilustração inglesa, podemos


antiga tradição no Ocidente, e suas origens citar outro grande artista que compõe este
remontam à Grécia. A identificação gráfica quadro de formadores de uma imagem nar-
do homem com o animal, a fim de revelar as rativa associada a um texto literário. Como
particularidades ocultas da personalidade, tantos outros da época, também se dedica-
uma espécie de bestiário humanizado, foi va à charge política, à caricatura, enfim à
largamente utilizada na Idade Média, mas crítica social — referimo-nos a George Crui-
alcança o seu apogeu na metade final do sé- kshank (1792-1878). O conhecimento de sua
culo XVIII e princípio do século XIX. obra é também obrigatório no estudo da
arte de ilustrar. Através de imagens cômicas,
A obra original de Grandville está repleta grotescas, fantasiosas, mas profundamente
deste hibridismo quando ilustra, por exem- expressivas e humanas, desfilam em seus
plo, As fábulas de La Fontaine (1621-1695), desenhos personagens das ruas e dos su-
onde através de animais humanizados ex- búrbios pobres de Londres. Suas ilustrações
pressa sua crítica social e os defeitos e vicis- para Oliver Twist, de Charles Dickens (1812-
situdes da alma humana. 1870) interpretam com fidelidade a vida dos
marginalizados, a cotidiana brutalidade a terpretado pela nossa sensibilidade — muito
que as pessoas estavam submetidas, princi- longe das intenções do autor. Em qualquer
palmente as crianças. ilustração, o que está oculto é o que mais
queremos ver e vivenciar. As imagens são in-
vocações que procuram mais as nossas ima-
A imagem e magia nos contos
ginações noturnas do que as diurnas.
de fadas

O que mais nos encanta e seduz ao olhar-


Os pintores de Contos de Fadas
mos uma ilustração não é ver o que estamos
do período vitoriano e sua
vendo. Na verdade, o que nos atrai não é
influência na ilustração de
necessariamente aquilo que o ilustrador fez.
livros infantis e juvenis
Por mais estranho que possa parecer esta re-
flexão, o que desperta o interesse do olhar é Finalmente aportamos nas terras do Nunca Ja-
aquilo que supomos que estamos vendo. Em mais, um território mitológico onde habitam
outras palavras: as sombras são muito mais as imagens dos chamados pintores de Contos
reveladoras que as luzes. O que está indefi- de Fadas — um movimento artístico essencial-
nido na penumbra, o que não foi ilustrado, mente inglês, pouco estudado nos livros de
17
mas sugerido, esta imagem que se origina história da arte, e que teve seu nascimento e
em nossa mente, em nosso passado, em apogeu entre os anos de 1790 e 1870. Um mo-
nossa expectativa e ansiedade de ver, sem vimento que veio exercer a mais profunda e
dúvida, esta é a imagem que possui maior duradoura influência na arte de ilustrar para
poder de pregnância no imaginário do pe- crianças. Qual era o seu repertório? Um mun-
queno e mesmo do leitor adulto. do ideal. Mítico. Uma terra povoada de fadas,
príncipes, princesas e duendes, além de te-
A ilustração é uma ambígua sugestão. Um mas oriundos do folclore, tendo nas peças de
mosaico onde faltam algumas peças, e são William Shakespeare a sua mais vívida referên-
justamente estas ausências que preenche- cia.
mos com as nossas imagens. Poderíamos
até afirmar que as imagens se originam bem Estas pinturas — ao imergirem em um uni-
antes das imagens. Onde? Talvez em um pas- verso de sonhos, fantasias e encantamentos
sado recente ou num passado imemorial. — parecem visualizar, dar corpo às palavras
Quem sabe no finnis terra de cada um. e às narrativas das velhas contadoras de his-
tórias ao pé da lareira, cercadas de crianças
As imagens funcionam como movediças par- e sombras fantasmagóricas nas paredes.
tituras de música, algo para ser tocado e in- Sem dúvida, estes artistas deram forma à
imaginação da figura emblemática da Mãe verso infantil.
Ganso, figura real e ao mesmo tempo fanta-
siosa de senhora narradora de histórias. Em
Os pintores
nossa memória, Dona Benta é a Mãe Ganso
brasileira, cercada de netos, nas noites silen- O primeiro deles: Richard Dadd (1817-1896),
ciosas do Sítio do Pica-pau Amarelo. sem dúvida alguma um dos mais extraordi-
nários pintores de sua época — entretanto,
A importância e o legado destes pintores na a expectativa em torno dele de um futuro
história da ilustração virão mais tarde a ser brilhante é tragicamente interrompida em
concretizados plenamente no chamado Pe- agosto de 1843. Dadd, numa crise de insani-
ríodo de Ouro da ilustração de livros para dade e julgando ver em seu pai a figura do
crianças. Fase que abrange o princípio do demônio, o assassina brutalmente. Após o
século XX até o final da década de 30. crime, foge para a França onde é preso em
1844 e recolhido ao Hospital Bethlen. Isola-
Neste sentido, é inegável que estas fancy pic-
do do meio artístico e da própria sociedade,
tures — como ficou conhecido este gênero
ele recria em suas telas um mundo extrema-
de pintura no período vitoriano — expressem
mente pessoal, repleto de seres fantásticos
também, ao seu turno, um escape, a procu- 18
e microscópicos, uma verdadeira represen-
ra de um passado mítico nas narrativas fol-
tação em detalhes mínimos de uma viagem
clóricas e dos contos de fadas. Uma espécie
visual ao inconsciente.
de contraponto ante os grandes questiona-
mentos sociais e religiosos da época. Continuando com estas breves referências,
encontramos a obra originalíssima de John
Independente das causas, o que interessa
Anster Fitzgerald (1819-1906). Sua pintura
para o estudo da história da ilustração é que
expressa um mundo, um universo à parte,
os pintores de Contos de Fadas trouxeram em
habitado por seres-plantas e animais fabu-
suas imagens uma série, um elenco de litur-
losos. Tal foi a intimidade do artista com
gias visuais para crianças que até hoje per-
este chamado mundo paralelo, que muitos
manece. Isto é inegável.
críticos na época suspeitavam que o pintor
convivesse com esses seres em seu cotidia-
São muitos os pintores que visualizaram o
no.
até então inexprimível universo das fadas e
duendes. Destacamos, abaixo, apenas 3 ar-
Fitzgerald elabora um universo ameno, líri-
tistas em cuja obra convergem todos estes
co, fantasioso, um mundo do faz de conta,
rituais e cerimoniais típicos do clássico uni-
e que constitui um dos fundamentos na his-
tória da ilustração — a imagem fantástica porque a ilustração é uma linguagem pró-
oriunda do real. pria, com sua sintaxe e técnicas específi-
cas. Nem todo grande pintor é um grande
Impregnada na essência da arte de ilustrar ilustrador, e vice-versa. O pintor enquanto
livros para crianças e jovens, a imagem fan- ilustrador é um capítulo à parte na história
tástica, para ser convincente e crível, neces- da ilustração.
sita ser originária do real, não necessaria-
mente do realismo. O real é o caminho mais
legítimo para o imaginário. A história da ilustração e
os pintores acadêmicos da
Completando esta caminhada, chegamos a segunda metade do século
um dos mais importantes artistas do perío- XIX e os Pré-Rafaelitas
do vitoriano: Sir Joseph Paton.
É sempre bom lembrar que a história da
Lewis Carroll tinha grande admiração por pintura não coincide com a história da ilus-
este pintor. Ele chegou a contar 165 duendes tração. Assim como o cinema, que em seus
em seu famoso quadro “A disputa entre Titâ- primórdios se utilizou do teatro filmado,
nia e Oberon”, de 1849. também a ilustração de livros para crianças
19
— como qualquer linguagem que se inicia
Um universo de seres fabulosos povoa suas — sofreu influência direta de algumas esco-
pinturas, cada pequeno trecho de seus qua- las e estilos de pintura do século XIX. Esta
dros é um cortejo, um desfilar de persona- influência não está circunscrita apenas aos
gens e histórias paralelas. Ele era também pintores de Contos de Fadas. Ela se estende
ilustrador. aos pintores acadêmicos franceses, que, de
forma pejorativa, eram chamados de “pom-
Cabe aqui um parêntese sobre a complica- piers”, e com este nome passaram para a
da, por vezes traumática, relação entre pin- história da arte.
tar e ilustrar.
Na verdade, eram grandes artistas, e hoje
É um fato curioso que Patton, apesar de suas obras ganham espaço no interesse de
sua importância para a história da ilus- estudiosos e por marchand de arte também.
tração enquanto pintor, na verdade como Artistas como Alexandre Cabanel (1823-
ilustrador, certamente por limitações téc- 1889), William-Adolphe Bouguereau (1825-
nicas de reprodução, não tem a relevância 1905), Jean-Léon Gerôme (1824-1904), Paul
das imagens de suas pinturas. Ou mesmo Delaroche (1797-1856), Théodore Chasseriau
(1819- 1856) e Marc-Gabriel-Charles Gleyre deste artista.
(1808-1874), e tantos outros que poderiam
ser citados. É interessante ressaltar que os pintores de Con-
tos de Fadas estavam muito identificados com
a narração oral, enquanto os Pré-Rafaelitas se
aproximavam mais da narração escrita.
Seguindo este mapeamento de influências,
não podemos deixar de mencionar — pelo
Alguns pintores deste período se destacam.
seu grande poder narrativo e descritivo, que
Sem dúvida, em primeiro lugar é Dante Ga-
são dois elementos básicos para se contar
briel Rossetti (1828-1882) que também desen-
histórias visuais — a decisiva influência dos
volveu um intenso trabalho como ilustrador
pintores ingleses Pré-Rafaelitas na arte de
de livros, poeta e tradutor de Dante para o
ilustrar. Não somente pelo motivo de que
inglês. William Holman Hunt (1827-1910) foi
grande parte destes pintores também eram
um dos formuladores do movimento, tendo
ilustradores, mas principalmente pelo en-
ilustrado diversos livros, como, por exem-
volvimento literário que este movimento
plo, as poesias de Alfred Tennyson (1809-
possuiu.
1892). Outro aspecto que aproxima muito os
Pré-Rafaelitas da ilustração é a larga utiliza- 20
Não existe ilustração se esta não estimula
ção da fotografia como modelo e referência
a verbalização. Principalmente a destinada
para as suas pinturas. Tal foi a importância
aos pequenos leitores, alfabetizados ou não.
da foto — na época, um processo fotoquími-
co de reprodução da imagem — que surgiu
Na Alemanha, um outro movimento de pin-
uma escola, uma tendência de foto chama-
tura chamado de Nazareno tinha grande
da de Pré-Rafaelita.
identificação espiritual com os Pré-Rafaeli-
tas, apesar de algumas diferenças tanto na
Ao encerrar este breve capítulo sobre este
forma quanto na temática de suas pinturas.
também período na história da arte, é im-
Na verdade, era uma variante do Roman-
portante citar alguns proeminentes pinto-
tismo panteísta que é tipicamente alemão.
res da época, como Sir John Everett Millais
Um dos maiores ilustradores alemães de li-
(1829-1896), que também realizou pinturas
vros para crianças da época, Adrian Ludwig
do gênero contos de fadas, e que veio a ser
Richter (1803-1884), foi profundamente in-
mestre e conselheiro da futura ilustrado-
fluenciado pelos pintores Nazarenos. Qual-
ra Beatrix Potter (1866-1943), notabilizada,
quer estudo sobre a história da ilustração
mais tarde, pelo seu maravilhoso Pedro, o
de livros passa necessariamente pela obra
Coelho. Ela frequentava o atelier do artista
levada por seu pai que era grande amigo do sagrado, tudo que permanece sagrado deve
pintor. ser coberto com o mistério”. A imagem fi-
gurativa, diferente da imagem poética, seria
Outro Pré-Rafaelita de significativa impor- um desnudamento de sua poesia.
tância foi Sir Edward Burne-Jones (1833-
1898), cuja obra teve uma grande influência O interessante para o estudo da ilustração
nos pintores simbolistas. é justamente analisar as obras dos pintores
simbolistas, que, ao trabalharem com temas
tão etéreos e desprovidos de forma física,
O movimento simbolista e
puderam, através de suas imagens tangíveis
a história da ilustração de e profundamente simbólicas, interpretar o
livros repertório da poesia simbolista.

Outra grande influência na arte de ilustrar


é representada pelos pintores simbolistas
Os pioneiros ou a atividade
do final do século XIX. Trata-se de um ou-
contínua de ilustradores
tro gênero de influência, mais conceitual do
dedicados ao livro infantil
que formal. Para melhor entendimento des-
e juvenil no terço final do 21
ta relação entre poesia e pintura simbolista
e seus reflexos na arte de ilustrar, é preciso século XIX
primeiramente definir alguns princípios da
Após este relato da influência da imagem
poesia simbolista. Seus poetas procuravam
pictórica sobre a ilustração, bem como al-
expressar um mundo de ambiguidades, dú-
gumas contradições entre pintura e ilustra-
vidas e fugacidades. Profundamente meta-
ção, chegamos ao portal, ao frontispício de
fórica e abstrata, a poesia simbolista renun-
três ilustradores, que, herdando todas estas
ciava a qualquer procura de representação
influências acima citadas, reúnem em seus
através de formas físicas. Em outras pala-
trabalhos uma síntese particular do que seja
vras, um primado da evocação sobre os pro-
uma ilustração para crianças e jovens. São
cessos figurativos, narrativos e descritivos,
eles: Walter Crane (1845-1915), Eleanor Vere
que são elementos básicos da ilustração.
Boyle (1825-1916), e especialmente a obra de-
licada, sutil, original e fantasiosa de Richard
Muitos poetas simbolistas, como o francês
Doyle (1824-1883), um artista referencial na
Stéphane Mallarmé (1842-1898), por exem-
história da ilustração.
plo, não permitiam que seus poemas fos-
sem ilustrados. Dizia o poeta: “tudo que é
A grande contribuição de Crane ao livro
ilustrado, sem dúvida, está localizada no como linguagem, acrescida de novas in-
projeto gráfico, no design do livro. À épo- fluências como o Art Nouveau e o japane-
ca, ele já entendia o livro como uma arte sismo, que se tornaram tão presentes na
sequencial, uma linguagem temporal, um passagem do século XIX para o século XX.
passar de páginas e manchas de texto, es- Estes dois estilos atuam mais fortemente
paços em branco, um suceder de imagens, nas artes dependentes da reprodução do
traços e cores. O livro como um objeto de original, como foi o caso dos quadrinhos
arte, onde todas as partes estão interligadas e da própria ilustração. O fato interessan-
harmoniosamente. te é que toda esta fase chamada de perí-
odo de ouro da ilustração ainda sofria a
Esta concepção moderna do livro para crian- influência mais flagrante dos movimentos
ças caracteriza a obra deste ilustrador, gra- artísticos já citados, do que das escolas e
vador e designer inglês. estilos de arte surgidos até meados da dé-
cada de 20. O cubismo, o expressionismo,
O segundo artista é Eleanor Vere Boyle (1825- o dadaísmo, o surrealismo, o neoplasticis-
1916). O seu trabalho é uma poética trans- mo, o neoconcretismo russo, e tantos ou-
crição para o universo da ilustração para tros, têm presença maior no design, nos
crianças de todo o imaginário visual utiliza- 22
cartazes por exemplo, do que na ilustra-
do pelos pintores de Contos de Fadas. ção de livros para crianças.

Fechando a tríade, chegamos à obra de Ri- Apenas para referência de ilustradores de


chard Doyle (1824-1883). Este artista con- estilos diferentes, poderíamos citar inicial-
grega em sua obra todo um repertório de mente Arthur Rackham (1867-1939), Jean de
imagens repletas de situações diversas com Bosschère (1881-1953), Edmund Dulac (1882-
elfos, duendes, príncipes e princesas. 1953), Harry Clarke (1890-1931), Edmund
Sullivan (1869-1933), William Robinson
(1872-1944), Charles Robinson (1870-1937),
A ilustração de livros como
René Bull (falecido em 1942), Howard Pyle
arte e o estabelecimento de
(1853-1911), Newell Convers Wyeth (1882-
uma linguagem própria
1945), Ivan Bilibine (1876-1942). Muitos ou-

As reflexões sobre as origens da ilustração tros grandes ilustradores poderiam ser cita-

de livros para crianças e jovens chegam ao dos.

início do século passado — período que se


O que encanta gerações e gerações na ima-
prolonga até a década de 30. Neste espa-
gem destes artistas é uma espécie de iman-
ço de tempo, ela alcança a sua plenitude
tação mágica que suas ilustrações transmi- Bibliografia
tem aos olhos e à emoção do pequeno leitor.
1 - d´Olivier, Piffault. – Il était une fois...les
Acredito que uma das funções primordiais
contes de fées – Paris – Bibliothèque Natio-
da ilustração é criar a memória afetiva e fe-
nal de France – 2001.
liz da criança. A história da ilustração está
repleta destes artistas, destes magos da
2 - E. Meyer, Susan. – A treasury of great
imagem que transcenderam as palavras e o
children´s book illustrators – New York -
tempo.
Marry N. Abrams.inc.Publishers. – 1983.

3 - Peppin, Brigit. – Fantasy Book illustration


Últimas palavras 1860-1920 – London - Studio Vista – 1975.

O trajeto que percorremos — desde as ima- 4 - Harding, James. – The Pré-Raphaelites –


gens do período vitoriano — teve como Academy Editions – London – 1977.
objetivo nos conduzir a um entendimento
maior da arte de ilustrar. Compreensão que 5 - Houfe, Simon. – The Dictionary of British

nos transporta para além das palavras. Es- Book – Illustrators and Caricaturists – Lon-

tudar os mistérios da imagem é como se don - Antique Collector´s Club – 1981.


23
estivéssemos sendo enlaçados e acolhidos
6 - Bland, David. – A History of Book Illus-
pelas árvores de um bosque imemorial. To-
tration – London - Faber and Faber Limited
dos nós temos alguma árvore especial no
- 1958.
passado, e a ilustração é a memória de cada
um. Após o breve relato de sua origem, po- 7 - Ovendem, Graham. – Nymphets & Fairies
demos sentir que a ilustração nos livros – The Victorian Children´s Illustrators Lon-
deve ser uma árvore confidente. A “xururu- don - Academy Editions – 1976.
ca”, como o animismo de Zezé — o menino
8 - Vogler, Richard. – Graphic Works of Geor-
que um dia descobriu a dor — chamava o
ge Cruikshank – New York - Dover Publica-
seu querido pé de laranja lima, no livro do
tions, Inc – 1979.
mesmo nome.

9 - Garner, Philippe. – The World of Edwar-


O texto acima apresenta trechos do original
diana – London - The Hamlyn Publishing
que escrevi para o livro O Que é Qualidade em
Group Limited – 1974.
Ilustração no Livro Infantil e Juvenil – Com a
palavra o Ilustrador – Organizado por Ieda de 10 - Meggs, Philip. – History of Graphic De-
Oliveira – Editora DCL – 2008. sign – New York - Nostrand Reinhold – 1983.
11 - Larkin, David. – Charles & William Heat 18 - Genty, Gilles. Etc – L´Abcdaire du Symbo-
Robinson – London – Pan Books Ltd. – 1976. lisme e de l´Art Noveau – Paris – Flammarion
– 1997.
12 - Gaunt, William – The Restless Century
– Painting in Britain 1800-1900 – London – 19 - Gibson, Michael. – Simbolismo – Lisboa

Phaidon Press – 1978. – Taschen – 2006.

20 - Osborne, Harold. – Estética e Teoria da


13 - Phillpotts, Beatrice. – The Book of Fairies
Arte – São Paulo – Cultrix – 1968.
– New York – Ballantine Books – 1978.

21 - Held, Jacqueline. – O Imaginário no Po-


14 - Gaunt, William. – Painters of Fantasy –
der – São Paulo – Summus Editorial – 1980.
London – Phaidon Press Limited – 1974.

22 - Tatar, Maria. – Contos de Fadas – Rio de


15 - Durand, Marion e Bertrand, Gerard –
Janeiro – Jorge Zahar Editor – 2004.
L´image dans le livre pour enfants – Paris –
L´École des Loisirs – 1975. 23 - Chilvers, Ivan – Dicionário Oxford de
Arte – São Paulo – Martins Fontes – 2001.
16 - Histoire Générale de l´Art – Paris – Flam- 24

marion – 1950. 24 - Pareyson, Luigi – Os Problemas da Esté-


tica – São Paulo – Martins Fontes – 1997.
17 - Harding, James. – Artistes Pompiers –
French Academic Art in the 19 th Century 25 - Balakian, Anna – O Simbolismo – São
-London - Academy Editions – 1979. Paulo – Editora Perspectiva – 2000.
Ilustração 1
Richard Dadd

Ilustração 2
Joseph Noel Patton
Ilustração 3
William Adolphe Bouguereau

Ilustração 5
Dante Gabriel Rossetti

Ilustração 4
Jean-Léon Gerome
Ilustração 6
Richard Doyle

Ilustração 7
Arthur Rackham
Ilustração 8
Edmund Dulac

Ilustração 9
Edmund Dulac
Texto 2

A ilustração no Brasil
A ilustração de livros para crianças e jovens no Brasil

Graça Lima1

A ilustração é uma arte instrutiva, pois de- A inteligência visual aumenta o efeito da in-
senvolve nosso conhecimento visual e a per- teligência humana, amplia o espírito criati-
cepção das coisas. Através da imagem, po- vo. Não se trata apenas de uma necessidade,
demos reconstruir o passado, refletir sobre mas de uma promessa de enriquecimento
o presente e imaginar o futuro, ou mesmo cultural para o futuro.
criar situações impossíveis no mundo real.
A ilustração é uma forma de arte visual que, No início do século XX, um intenso fluxo de
por sua criatividade, projeção, estilo ou for- mudanças ocorreu em todo o mundo, atin-
ma, amplia, diversifica e pode até, por ve- gindo por completo vários níveis da experi-
29
zes, ir muito além da própria leitura do texto ência social. Em nenhum período anterior
narrado. a este, na história das civilizações, a huma-
nidade fora envolvida num  processo tão di-
A obra de um ilustrador é uma arte, porque, nâmico de transformação de seus hábitos,
assim como os pintores, os escultores, os convicções e modos de percepção. É a par-
músicos ou outros artistas, ele tem a neces- tir deste momento que o impacto da revo-
sidade de fazer compreensíveis seus sonhos lução científico-tecnológica, intensificada
e, através de sua capacidade profissional, nas últimas décadas do século XIX, é sentida
interpretar o mundo em que vive com sua em sua plenitude, alterando por completo o
visão imaginativa. O livro infantil ilustrado ritmo da vida das pessoas. No Brasil, mais
pode ser encarado como uma espécie de ri- especificamente no Rio de Janeiro, o impac-
tual iniciatório, que obedecerá a uma série to das conquistas alcançadas pelo mundo
de etapas progressivas na formação de um desenvolvido impulsionou as elites locais
homem esteticamente civilizado. na implementação de um projeto moderni-

1 Ilustradora de livros para crianças e jovens. Mestre em Design pela PUC-Rio. Professora de Metodologia
Visual na Escola de Belas Artes da UFRJ.
zador que alteraria de maneira irreversível mia e ilustração fotográfica, inovando essa
a sociedade carioca e, por conseguinte, a área acostumada a ilustrações litografadas,
brasileira. Sua execução baseou-se na iden- tornando-se padrão de qualidade. Em 1928,
tificação de um poderoso conjunto de sím- Pimenta de Mello & Companhia apresen-
bolos, instituições e usos metropolitanos, tam, além d’O Malho, O Tico-Tico e Leitura
caracterizados por uma série de reformas para todos. As revistas satíricas eram as mais
urbanas batizadas pela grande imprensa da apreciadas na época por sua orientação
época de “Regeneração”. A modernização humorística e crítica. Todos conheciam os
do Brasil no início do século assinala a in- nomes de Angelo Agostini, J. Carlos, Edmir
trodução de novos padrões de consumo ins- Pederneiras, Alberto Thoreau e outros im-
tigados por uma crescente onda publicitá- piedosos caricaturistas. A revista Kosmos,
ria, além de uma imensa interação entre os lançada em 1904, é tida como uma das re-
periódicos e a difusão de práticas culturais. vistas ilustradas mais sofisticadas da época,
e Fon-Fon, surgindo três anos mais tarde, re-
Meios de comunicação impressos, como tratava a vida cotidiana do Rio de Janeiro, em
as revistas ilustradas em seus mais varia- artigos leves e movimentados e ilustrações
dos títulos, estabelecem novos padrões de abundantes, razões de seu sucesso entre os
30
estilo e comportamento. Baseadas no uso leitores do país. Essa fórmula faz sucesso
sistemático da ilustração e da fotografia, através do tempo e anos mais tarde, na dé-
as revistas seduziam seus consumidores cada de 40, a revista O Cruzeiro cumpre sua
através da imagem, enaltecendo as con- trajetória de fenômeno popular com uma
quistas da civilização. Os principais fatos tiragem de 700 mil exemplares. Os padrões
da vida política e social da nação passam gráficos de revistas e jornais marcaram épo-
a ser expressos nestas publicações, que se ca sendo referenciais gráficos. Beneficiadas
tornam um instrumento eficaz na propa- pelo progresso tecnológico, documentavam,
gação dos valores culturais da belle époque qualificavam e otimizavam sua mensagem
brasileira, em virtude de seu caráter de mo- por meio da imagem, ao utilizar abundante-
mento, condensado e de fácil consumo. mente ilustrações e fotografias que produzi-
riam um grande impacto visual na sociedade
Várias revistas surgem no universo carioca da época. Na ilustração, particularmente,
do início do século XX: D. Quixote, O Diabo, as imagens impressas nos periódicos criam
Tagarela, O Martelo, Avenida, O Tico-Tico, O um espaço imaginário de transparências e
Malho, Careta, Fon-Fon, A Cigarra, Kosmos, de visibilidade simbólica. Tais ilustrações
Renascença, A ilustração brasileira e Cruzeiro. foram criadas para capas, sumários, publi-
A Revista da Semana trabalhava com tricro- cidade, letras de música, poemas, contos,
expedições científicas, alegorias referentes a sos na França e Portugal por iniciativa das
datas comemorativas do ano, charges políti- editoras pioneiras Francisco Alves e Garnier.
cas, caricaturas e histórias em quadrinhos. O horizonte não se mostrava muito favorável
às empresas nacionais, que eram bem pou-
Os artistas que ilustravam nesse momento cas, por causa das dificuldades naturais de
buscavam, de modo geral, formas que pu- importação de máquinas e do seu preço.
dessem expressar de maneira consistente o
desenho, a composição e a cor, estabelecen-
Primeiro livro editado no
do sempre uma ponte entre o real e o ima-
Brasil
ginário. Inseridos em um contexto de época
muito rico do ponto de vista estético, seus A história do livro no Brasil pode ser dividida
trabalhos são um desdobramento da tradi- em “antes e depois de Monteiro Lobato”. Foi
ção pictórica, adaptados a um meio de ex- ele quem, nos anos 20, vislumbrou que um
pressão que impunha apenas limites de na- país como o Brasil precisava de um parque
tureza mecânica (o tipo de impressão). gráfico à altura de suas necessidades. A cida-
de de São Paulo vivia um momento favorável
A ilustração veiculada nas revistas é absor- e Lobato o aproveitou para montar a primei-
vida de maneira direta — sem intermedia- 31
ra empresa com equipamentos adequados à
ções de conceitos — e da mesma forma seus produção de livros. Naquele momento, sur-
elementos particulares são reproduzidos giu a idéia de que a brasilidade deveria es-
em um fluxo contínuo de associações. Seus tar ligada à modernidade. Assistiu-se, então,
desdobramentos materiais ainda podem ser a um surpreendente desenvolvimento das
atestados por frisos, motivos florais, motivos artes e da literatura, graças ao Movimento
marinhos, motivos geométricos e alegorias Modernista. Ainda ligados às vanguardas eu-
femininas que compõem a arquitetura de fa- ropéias, mas já em busca de originalidade li-
chadas edificadas entre a Zona Sul e a perife- gada às nossas raízes culturais, os modernis-
ria da cidade. Muitos dos ilustradores desse tas destruíam fórmulas e quebravam tabus
período se dividiam entre o traçado em re- sociais e artísticos. Nada parece ter causado
vistas e jornais, assim como na indústria do tanto escândalo, no campo das artes brasi-
livro. leiras do século, quanto a Semana de Arte
Moderna em 1922.
Até o início do nosso século, os poucos livros
de literatura infantil eram estrangeiros e, em Na década de 40, novos nomes aparecem:
sua maioria, ilustrados em preto e branco. Os Théo, Tomás Santa Rosa, Augusto Rodrigues,
textos escritos em português eram impres- Lan, Luiz Sá, etc. Os anos 50 representaram
o grande salto da industrialização no Brasil. No campo cultural, a censura estava nova-
Até então, os materiais produzidos careciam mente em cena. Centenas de peças teatrais,
de qualidade, devido à utilização de máqui- letras de músicas, roteiros de filmes, jornais
nas envelhecidas por 30 anos de restrição e livros foram condenados. Muitos autores e
às importações. Uma virada em nossa his- editores foram presos. Entre os mais visados,
tória econômica e cultural estava em curso estava Ênio Silveira, da Civilização Brasileira.
desde a década de 30, quando a hegemonia
cultural francesa tornou-se ultrapassada. As Essa época foi também caracterizada por um
cidades transformaram-se em metrópoles, grande incentivo à produção. O governo in-
servidas por ônibus e telefones, e os primei- vestiu em áreas geradoras de infraestrutura
ros arranha-céus despontavam com seus para a indústria, como transporte e comu-
anúncios luminosos. Por trás deles estavam nicações, além de decretar medidas que via-
as agências de publicidade americanas, tra- bilizaram subsídios, reduziram impostos e
zidas para cá pelas recém-chegadas multi- taxas de importação. Esse processo foi fun-
nacionais. Toda a admiração pelo estilo de damental para as empresas gráficas e de pa-
vida americano se acentua nesse momento, pel, solucionando os problemas básicos de
influenciando diretamente a criação gráfica. industrialização. Com isso, o setor livreiro
lucrou enormemente. 32
Juscelino Kubitschek libera a importação, re-
equipando a indústria gráfica, que irá cres-
cer surpreendentemente entre 1950 e 1960. Na década de 70, o país mergulhou na mo-
derna industrialização, graças à velocidade
O crescimento do setor ligava-se a transfor- da produção dos novos equipamentos. O pro-
mações mais amplas que marcavam a socie- jeto gráfico assume papel especial nas novas
dade dos novos tempos. A embalagem dos tendências de mercado consumidor. Para a
produtos começa a exercer não só a função indústria editorial, apesar do obscurantismo
de proteção como também a de sedução ao de um regime que discriminava o conteúdo
consumidor. As transformações político-eco- das obras, as novidades surgidas nos anos 60
nômicas da década de 60 traçaram um pa- vêm tomar grande impulso nos anos 70. A
norama de incertezas e riscos, onde algumas Melhoramentos permanece como a mais po-
editoras ofereceram resistência ao regime derosa editora de literatura infantil. Porém,
militar imposto em 1964. De imediato, tive- a Editora Ática dará um grande impulso nes-
ram início as perseguições e punições aos sa literatura, lançando em curto espaço de
grupos que, de alguma forma, eram identi- tempo uma quantidade inédita de obras com
ficados como inimigos ou dissidentes do re- propostas gráficas inovadoras, criando um
gime militar. divisor de águas na produção editorial para
crianças no Brasil. Os livros passam a ter tra- Na década de 90 assistiremos a novas mu-
tamento de produto voltado ao público in- danças no tratamento visual do livro infantil
fantil e é oferecida a possibilidade de leitura brasileiro. Uma nova geração de ilustrado-
ao iniciante através de livros com suprema- res designers toma a incumbência da ela-
cia de narrativa visual com pequenos textos boração geral do projeto gráfico do livro,
de fácil compreensão. A coleção Gato e Rato, assim como novas tecnologias de produção
com ilustrações de Eliardo França, é o me- e impressão da imagem irão sofisticar e ele-
lhor exemplo desta nova postura e um mar- var a qualidade do produto final. Neste mo-
co editorial. Ziraldo lança o livro Flicts com mento, uma reflexão acerca de nossas raízes
um projeto gráfico arrojado e inovador, em culturais vai se refletir nas paletas de cores
que o personagem central é uma cor. Gian e na organização do espaço plástico do livro.
Calvi apresenta colagens no livro O Menino Destacam-se os trabalhos de Roger Mello,
Mágico de Rachel de Queiroz. Mariana Massarani, Graça Lima, Ivan Zigg,
Guto Lins, Elizabeth Teixeira, Helena Alexan-
Na década de 80, Rui de Oliveira traz a ex- drino, Nelson Cruz, Marilda Castanha, Luis
periência de sua passagem pelo Instituto Su- Maia, Odilon Moraes, Renato Alarcão.
perior de Artes Industriais, na Hungria, para
33
o livro infantil. Juarez Machado apresenta O início do século XXI é marcado por um nú-
Ida e Volta, inaugurando a produção de li- mero cada vez maior de profissionais ilus-
vros de imagens. Eva Furnari e Angela Lago tradores. Novas tecnologias geram novas
têm grande destaque com narrativas visuais linguagens e novas possibilidades. Ainda é
bem-humoradas e de fino tratamento gráfi- pequena a oferta de cursos de formação es-
co. Jô de Oliveira traz para o livro infantil a pecífica para ilustradores, mas a criação ver-
influência da arte popular da xilogravura dos tiginosa dos cursos de design implementou
cordéis e Ricardo Azevedo, com um traçado o crescimento de mão-de-obra na área. An-
limpo e expressivo, conta histórias do nosso dré Neves, Andrés Sandoval, Cristina Biazeto,
folclore. Destacam–se também os nomes de Fernando Vilela, Salmo Dansa, Suppa, Rosi-
Regina Yolanda, Walter Ono, Ciça Fitipaldi, nha Campos, Ana Terra são nomes que vêm
Claudio Martins, Miadara, Alcy e Michelle, marcando este novo panorama gráfico e que
entre outros. ainda vai fazer surgir muitos novos talentos.
Ilustração 1
Primeiro livro editado no Brasil.

Ilustração 2
Ilustradores de Lobato.
Ilustração 3
Ilustradores de Lobato.

Ilustração 4
Ilustradores de Lobato.
Ilustração 5
Ilustradores de Lobato.

Ilustração 6
Ilustradores de Lobato.
Ilustração 7
Coleção Gato e Rato.

Ilustração 7A
Coleção Gato e Rato, com
ilustrações de Eliardo França.

Ilustração 8
Gian Calvi.
Ilustração 9
Ziraldo

Ilustração 10
Rui de Oliveira
Ilustração 11
Angela Lago

Ilustração 12
Eva Furnari.

Ilustração 13
Ciça Fitipaldi
Ilustração 14
Ricardo Azevedo.

Ilustração 15
Regina Yolanda.
Ilustração 16
Roger Mello.

Ilustração 17
Mariana Massarani.
Ilustração 18
Graça Lima

Ilustração 19
Ivan Zigg.
Ilustração 20
Marilda Castanha

Ilustração 21
Nelson Cruz.

Ilustração 22
Odilon Moraes.
Ilustração 23
Renato Alarcão.

Ilustração 24
André Neves

Ilustração 25
Andrés Sandoval

Ilustração 25
Andrés Sandoval.
Texto 3

Fundamentos e técnicas da arte de ilustrar

TEXTO > < IMAGENS

Guto Lins1

Categorizar e identificar o livro infantil anterior à linguagem escrita, basta lembrar


como livro de imagens, ou livro ilustrado, se registros visuais feitos por grupos humanos
tornou comum. Afinal, livros para adultos nos primórdios, que foram encontrados em
não costumam ser ilustrados. cavernas ou outros sítios arqueológicos.
Hoje, milhares de anos depois, vivemos em
É fato que o livro infantil é permeado por uma sociedade globalizada, múltipla, onde a
imagens: ilustrações, desenhos, grafis- comunicação se estabelece em décimos de
mos, fotos e elementos visuais diversos, segundo. Codificação e decodificação ins-
com função informacional ou puramente tantânea e incessante, já que todos somos
45
estética. Da mesma forma, ainda no uni- bombardeados diariamente por ícones, lo-
verso das imagens, existe a mancha gráfi- gotipos, cartazes urbanos, anúncios, capas
ca, a ma­nei­ra como o texto se comporta de revista, imagens que passam a fazer parte
visualmen­te na página e que também obe- do inconsciente coletivo e da memória visu-
dece a ques­tões comunicacionais e estéticas. al compartilhada por muitos, ou mesmo por
O projeto gráfico tem o papel de equacionar um pequeno grupo, para o qual a imagem
estas duas linguagens, dando forma ao con- vira uma espécie de senha que gera identi-
teúdo do texto e conteúdo conceitual ao pa- dade e semelhanças aglutinantes.
drão estético adotado. Assim, imagem e tex-
to dialogam visualmente na página e com o Na literatura, evidentemente, a imagem não
leitor. A imagem passa a fazer parte integral pode exercer uma mera figuração. Ela não
da história, potencializando a comunicação está lá para o livro ficar bonitinho. A imagem
e a mensagem. (ilustração e projeto gráfico) potencializa o
objeto livro como veículo de comunicação
É bom lembrar que a linguagem visual é bem com sua ludicidade particular e única .

1 Autor de livros de literatura para crianças e jovens. Designer e professor no Departamento de Artes e Design
da PUC-Rio.
O livro é, simultaneamente, veículo de co- passou a ter papel fundamental em todo o
municação, peça literária, instrumento pe- processo, envolvendo-se com questões artís-
dagógico, fonte de saber e de lazer. O autor ticas, literárias e de marketing editorial. Afi-
da imagem, por meio de uma interpretação nal, além de serem bons e bonitos, os livros
subjetiva e objetiva ao mesmo tempo, trans- têm que ser lidos e comercializados.
forma o texto em livro, dando-lhe personali-
dade. A interpretação exclusiva do ilustrador Assim, o ilustrador amador que ilustrava os
permite ao leitor a oportunidade de conhecer livros como hobby, ou nas horas vagas, deu
novas visões da história e de inventar outras. lugar a um profissional com formação acadê-
mica, criterioso e encarregado de dar qualida-
Isto fica mais claro quando tomamos como de estética, funcional e lúdica a um produto
exemplo um personagem universalmente bastante peculiar. Cada livro pede uma solução
conhecido como a Alice, de Lewis Carrol. O específica e cada profissional terá sua interpre-
traço do ilustrador (fruto de sua leitura e in- tação individual. Não existe técnica mais ou
terpretação) insere personalidades diferen- menos nobre, mas sim a mais adequada ao
tes ao mesmo personagem. Veja as imagens projeto e ao momento histórico do ilustrador.
no final do texto.
O ilustrador tem hoje um universo de referên- 46

Este diálogo de interpretações e de lin- cias e materiais quase que inesgotável. Além
guagens só faz enriquecer a obra literária. de todas as técnicas clássicas e tradicionais
Afinal, o texto escrito conta uma história como guache, aquarela e lápis de cor, estão ao
recheada de imagens nas linhas e nas entre- alcance dos olhos e das mãos soluções fotográ-
linhas. A imagem complementa e enriquece ficas, técnicas digitais, imagens tipográficas,
esta história, a ponto de cada parte de uma etc. Cada uma com o seu posicionamento con-
imagem poder gerar diversas histórias. O ceitual e com resultados estéticos específicos.
texto e a imagem juntos dão ao leitor o po-
der de criar, na sua cabeça, a única história A imagem literal e óbvia é, evidentemente,
que realmente interessa: a história dele. limitante. Assim como a imagem fiel à reali-
dade e anatomicamente perfeita não condiz
Fica evidente que, em um mundo tão di- com a variedade da natureza que nos cerca. O
verso, a ilustração extremamente literal ou canal olho><mão é repleto de obstáculos mais
puramente ornamental e decorativa não re- do que benéficos, essenciais. Ninguém vê a
presenta mais a pluralidade e a riqueza de mesma coisa do mesmo jeito. Assim como
informações visuais a que as crianças de ninguém é igual a ninguém. Como diz a mú-
hoje têm acesso. Assim, o autor da imagem sica: de perto ninguém é normal. Ainda bem!
Da mesma forma, o que é ‘desenhar bem’ ra menos passiva, mais moderna e dinâmica.
ou ‘saber desenhar’? Em geral, estes termos
são usados para identificar aqueles que con- A seguir, algumas imagens da última edição
seguem representar fielmente aquilo que é da Bienal de Bratislava, realizada em 2007,
visto, o real. Mas e o irreal, o imensurável, o contemplando uma seleção das ilustrações
sentimento e a emoção? Como representar feitas no biênio anterior para o público in-
aquilo que não vemos com os olhos, mas fanto-juvenil pelos quatro cantos do planeta.
com o coração, e que passa a fazer parte de
nossa memória afetiva? O leitor, seja infantil ou adulto, é diverso,
multifacetado e bombardeado diariamente
E este ‘universo paralelo’ é infinitamente por imagens, sons, sabores e emoções. E a
maior que o mundo real. É nele que vive- literatura é feita para este leitor, não para
mos. É nele que transformamos sonhos em um leitor hipotético, ideal. Embora toda a
realidade e realidade em sonhos. produção literária voltada para a criança no
Brasil esteja direcionada quase que exclusi-
Mas, normalmente, o próprio ambiente es- vamente à escola, literatura também é ma-
colar acaba sendo limitador. Acaba aconte- gia e abrir mão disso é um retrocesso em
cendo uma ‘seleção natural’ e aquela crian- todo e qualquer processo ou ação que pre- 47

ça que sabe desenhar perfeitamente um tenda incentivar o hábito da leitura.


cavalo galopando na relva acaba concen-
trando toda a produção estética da turma. E Muitos acreditam que um dos caminhos se-
aqueles outros alunos, a grande maioria, por ria aproximar o livro, morfologicamente fa-
sinal, que não têm a mesma destreza ma- lando, de outro objeto, como um brinquedo.
nual, não são incentivados a buscar formas Livros com ‘cinto de utilidades’, com luzes
interpretativas e a se comunicar visualmen- piscando e efeitos especiais. Estes livros me-
te. Tornam-se leitores passivos de imagens recem, sim, lugar nas prateleiras, mas não é
alheias. necessário transformar o livro em outra coi-
sa para torná-lo atrativo. O livro já é, por si
A palavra, portanto, é diversidade. A mesma só, um objeto fantástico, cheio de possibili-
diversidade que existe no mundo que nos cer- dade formais, funcionais e de linguagem. Li-
ca e que a criança encontra em seu presente vros são portas para mundos desconhecidos
e que, certamente, se intensificará no futuro. e a imagem é, sem dúvida nenhuma, uma
Diversidade que abre o leque de opções e ins- das chaves para estas portas todas.
trumenta o leitor a ter senso crítico, ao ser
convidado a interpretar também. Uma leitu- Abre-te sésamo!
Ilustração 1
Alice, por Willy Pogany. Lewis Carrol. Alice
no País das Maravilhas. EP Dutton, 1929.

Ilustração 2
Alice, por DUSAN KALLAI. Lewis Carrol.
Alice no País das Maravilhas. Penny Royal.
1982.
Ilustração 3
Alice, por Barry Moser. Lewis Carrol. Alice
no País das Maravilhas . Mlade Leta, 1981.

Ilustração 4
ALI NAMVAR - “Farideh Khalatbaree: Dayreh”- Irã.
Ilustração 5
Monika
Hanulak.”Smonia” -
Polônia.

Ilustração 6
Ryoji Arai.”Boku no
Kiiroi Basu” - Japão.

50

Ilustração 7
ANDRÁS BARANYAI. “Szerintem mindenki maradton otthon varásnap délután” – Hungria.
Ilustração 8
ANNA KASZUBA-DEBSKA. “Lukasz Debski: Lamislowka” – Polônia.

Ilustração 9
ANNE MISFELDT & Jørgen Stamp - “Kor!” - Dinamarca.
Presidência da República

Ministério da Educação

Secretaria de Educação a Distância

Direção de Produção de Conteúdos e Formação em Educação a Distância

TV ESCOLA/ SALTO PARA O FUTURO

Coordenação-geral da TV Escola
Érico da Silveira

Coordenação Pedagógica
Maria Carolina Machado Mello de Sousa

Supervisão Pedagógica
Rosa Helena Mendonça

Acompanhamento Pedagógico
Carla Ramos 52

Coordenação de Utilização e Avaliação


Mônica Mufarrej
Fernanda Braga

Copidesque e Revisão
Magda Frediani Martins

Diagramação e Editoração
Equipe do Núcleo de Produção Gráfica de Mídia Impressa – TV Brasil
Gerência de Criação e Produção de Arte

Consultor especialmente convidado


Rui de Oliveira

E-mail: salto@mec.gov.br
Home page: www.tvbrasil.org.br/salto
Rua da Relação, 18, 4o andar – Centro.
CEP: 20231-110 – Rio de Janeiro (RJ)
Junho de 2009

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