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S U M Á R I O D A S E G U N D A PA R T E
2 ORIGENS E EVOLUÇÕES DAS CIÊNCIAS E DA PESQUISA................................6
2.1 Origem da Filosofia................................................................................................11
2.2 Origens das Ciências Atreladas à Origem e Evolução da Sociedade...................20
2.3 Revoluções Científicas..........................................................................................40
2.4 Filósofos e “Cientistas” - Pesquisadores da Antiguidade......................................43
2.4.1 Thales / Tales (θαλες, Thalễs): 624 – 546 a.C.?.................................................46
2.4.2 Anaximandro: 610 / 609 – 545 / 546 a.C............................................................49
2.4.3 Anaxímenes: 585 - 528 a.C................................................................................51
2.4.4 Pitágoras (do grego Πυθαγόρας): 571/70 a 497/96 a.C.....................................52
2.4.5 Heráclito (540 /550 - 470 / 480? a.C...................................................................55
2.4.6 Parmênides: 515 ou 530 – 440 ou 460 a. C.?....................................................57
2.4.7 Zenón: 495 - 430 a.C..........................................................................................58
2.4.8 Sócrates: 469 / 470 - 399 a.C.............................................................................58
2.4.9 Demócrito / Democritus: 460 a 370 a.C..............................................................63
2.4.10 Hipócrates: em grego antigo, Ἱπποκράτης; 460 – 377 / 379, a.C....................64
2.4.11 Platão (Aristócles) (427 / 428 – 347 /348 a.C...................................................68
2.4.12 Aristóteles: em grego Αριστοτέλης (384 - 322 a.C.).........................................72
2.4.13 Epicuro (341 a 270 a.C.....................................................................................81
2.4.14 Euclides (330 a 260 / 270 a.C.)........................................................................82
2.4.15 Erasístrato / Erasistratus de Chios / de Iulis: 330 / 304? – 250 a.C.................84
2.4.17 Arquimedes (em grego Ἀρχιμήδης): 287 a 212 a.C.........................................85
2.4.18 Erastóstenes / Ερατοσθένης: 276 – 285 ? a 194 a.C.......................................86
2.4.19 Sêneca (Lucius Annaeus): 4 a.C a 65 d.C.......................................................87
2.4.20 Galeno (Claudius): 130 – 200...........................................................................88
2.5 Filósofos e “Cientistas” da Idade Média................................................................91
2.5.1 Robert Grosseteste: 1168 a 1253.......................................................................95
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
A
origem e a evolução da pesquisa e de seus métodos estão associadas, mais do que associadas,
unificadas e concentradas nas mesmas fontes de dados - informações e com os mesmos
pensadores responsáveis pela origem, evolução e desenvolvimento das ciências.
As ciências, por sua vez, têm suas origens e evoluções, com estreitos e diretos relacionamentos,
muitas vezes, confundimentos em grande parte da história, em especial da história anterior à revolução
científica, com as origens e evoluções da sociedade e da filosofia (do grego Φιλοσοφία: philos - que
ama + sophia – sabedoria, que ama a sabedoria) ou, modernamente, da investigação crítica e
racional de princípios fundamentais.
Foram estreitos relacionamento e confundimentos verificados até a revolução científica, no
século XVII, quando as ciências iniciaram sua “independência”, em certo sentido, da filosofia. Dessa
forma aceita e entendida, para compreender a origem e evolução da pesquisa e seus métodos é preciso
ter o entendimento de fatos importantes nas histórias das ciências e na evolução da filosofia e da
sociedade.
Que fatos podem ser destacados nessas histórias? As revoluções científicas são partes desses
fatos (sintetizadas neste livro); a separação e independência das ciências da filosofia; e as
interdependências das ciências com a filosofia.
A separação ou independência das ciências da filosofia, no início, teve formas próprias de
abordagens da realidade por um lado (o das ciências) e outro (a filosofia), com o surgimento das
chamadas ciências particulares, tais como: a física, a astronomia, a química, a biologia, a sociologia e a
economia, com delimitações em seus campos.
No caso das ciências, em particular das ciências modernas, essa independência da filosofia teve
início com método experimental. Entretanto, essa separação não foi (não tem sido e, possivelmente, não
será) definitiva nem igualmente aplicada para todos os casos ou em todas as áreas do conhecimento.
O tratamento empírico adscrito ao domínio das ciências não atinge o conhecimento filosófico
que, segundo Kant, é racional a partir de conceitos. Entretanto, se as ciências compreendem, também,
conhecimentos racionais elaborados a partir de conceitos, então essa separação não foi (não tem sido e,
possivelmente, não será) definitiva ou total nem igualmente aplicada em qualquer situação e/ou em
todas as áreas do conhecimento. São os casos, por exemplos, de ciências que conservam estreitas
relações e interdependências com a filosofia, tais como: as disciplinas da filosofia lógica, ética, teoria
do conhecimento e a epistemologia, entre outras, com importantes funções no conhecimento, seja ele
científico ou não.
Em outro sentido, conforme Habermas (1990) e dentro do fundamentalismo da teoria do
conhecimento, citando a Kant (Crítica da razão pura), a filosofia indica às ciências o seu lugar e
define limites do que pode ser objeto de experimentação: o caso da biotecnologia em seres humanos,
em que a pesquisa é “limitada” (vale dizer, disciplinada) por normas e critérios da ética da investigação
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científica em humanos. Para Habermas, mais do que indicar o lugar e definir limites, a filosofia é o
guardião da racionalidade e interprete das ciências.
Independente da discussão acerca da independência entre as ciências e a filosofia há casos
frequentes em que as ciências conservam estreitas relações e interdependências com a filosofia, tais
como:
a) No direito; este caso é considerado, entre outros, por Habermas, na filosofia da práxis: entender
o homem é, em parte, entender o direito diante do qual se torna possível a convivência humana;
nessa convivência há questões morais e éticas do campo da filosofia.
b) Na sociologia em que, segundo Weber, a compreensão de fenômenos históricos e sociais, a
reflexão sobre o método das ciências e os problemas metodológicos como produtos de
inumeráveis variáveis culturais não podem estar desvinculados da autonomia lógica e teórica,
porém, não submetida a entidades metafísicas do espírito do povo.
c) Na economia que, de acordo com Adam Smith, a explicação básica para a lógica dos fenômenos
coletivos; a ordem social como emergência que harmoniza o caos potencial de interesses
individuais e o traduz em bem-estar social.
Outras áreas das ciências e pesquisa modernas como a biotecnologia e a conservação de recursos
naturais encontram suportes explícitos na filosofia em assuntos como os de ética (p, ex., bioética) e
responsabilidade, apenas para citar dois casos.
Para se entender a origem e evolução da pesquisa e seus métodos, dadas as identificações e
associações entre ciência, pesquisa e filosofia é preciso ter o entendimento da origem e evolução das
ciências, da sociedade e da filosofia. Tal inter-relacionamento ou engrenagem (Figura 1) se da, a partir
da sociedade e, em particular, da origem e evolução da filosofia.
O filósofo era o sábio que refletia sobre todos os saberes de sua época. Esses saberes, ainda em
tempos modernos, são considerados desejos ou necessidades de conhecer e se apresentam como um dos
elementos essenciais do ser humano. Entretanto, esse desejo, no início, era tido como um dom
preternatural, um presente de Deus, segundo a perspectiva judaico-cristã (GALLIAN, 2005).
O inter-relacionamento ou engrenagem compreende, além da sociedade como fonte da filosofia,
a sociedade e a filosofia como fontes e referências das ciências, conforme se ilustra na Figura 1.
Da sociedade quando passou a considerar, de forma gradativa, as ciências e seus resultados como
fatores de desenvolvimento e de mudanças sociais e culturais, econômicas e em sistemas produtivos e
organizacionais, entre outros, ajustando e/ou substituindo procedimentos, técnicas e modos de fazer,
inclusive (em muitos casos), auxiliando atividades bélicas, contrariando, por vezes, os atores das
ciências e pesquisas.
A sociedade ao ser impulsionada, nos últimos séculos, por revoluções tecnológicas como as
protagonizadas pela eletricidade com múltiplos benefícios sociais; pelo motor de combustão (explosão)
interna, ao transformar energia de reação química em energia mecânica; pela síntese de produtos
químicos a partir de outros produtos básicos; pela tecnologia da informação e comunicação que vem
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Fundamentos da pesquisa
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aproximando e integrando setores e atores; pela biotecnologia com seus múltiplos benefícios em quase
todos os setores (...), colocou a ciência em lugar de destaque que é preciso (re)avaliar para não perder
ou desviar seu potencial e efetico papel de transformação e bem-estar social.
SOCIEDADE: Busca
Explicações: fenômenos, fatos (...)
Previsões de eventos para (...)
Soluções: saúde, alimentação (...)
CIÊNCIA
Conjunto organizado de conhecimentos,
relativo a determinada área do saber, com
determinadas características (...), obtido
com um método especial (...).
Seu caminho: a P E S Q U I S A
(aceitar ou rejeitar) teorias, descobrir, inventar e adaptar soluções; tarefas como as de difundi-las na
forma de tecnologias e serviços para inovações e de informações científicas para novos conhecimentos.
São os resultados das ciência e pesquisa como forças (a serem disciplinadas) do desenvolvimento.
Por sua vez, essa conquista e reconhecimento das ciências na sociedade, representam desafios de
comunidades, entre outras as de cientistas e pesquisadores para assegurar a sustentação social da
investigação. Qual é o suporte social para as ciências? A sociedade, o meio ambiente, entre outros
alvos, querer o que as ciências podem gerar – disponibilizar porque esses alvos foram consultados e
tidos em consideração e porque as ciências e pesquisa geram/adaptam e disponibilizam o que esses
alvos possam adotar com sustentabilidade em várias dimensões em evidências pela consulta e interação
com a sociedade, com o meio ambiente.
Destaca Lauda et. al. (1994; adequado ao texto) que uma cultura que se orgulha de sua
capacidade de auto-exame crítico deve ter em alta conta, na sua agenda intelectual, o estudo sistemático
dos processos de mudança e invenção de teoria na ciência com aplicação, racionalidade e utilidade -
benefícios.
O destaque das ciências e pesquisa na sociedade pode ter sua base em propósitos práticos como
os de financiar, orientar - controlar a direção e o “progresso” das ciências e de aprovar, com a adoção e
difusão, seus resultados pelos efeitos positivos social e ambientalmente sustentáveis. Podem ser
propósitos intelectuais, como os de determinar a natureza e o escopo do conhecimento humano. Em
ambos os casos, segundo Lauda et. al. (op. cit.) “há excelentes razões para [a sociedade moderna] tentar
examinar a dinâmica das ciências”. Isto, a despeito de não se ter um quadro geral confirmado de como
as ciências funcionam, nem de como uma teoria científica mereça seu assentimento, com divergência
não apenas na sociedade, mas dentro da comunidade científica. Em muitos casos, essa diversidade tem
um efeito positivo.
A evolução, em ritmos cada vez mais acelerados, das ciências, sob influência da sociedade (às
vezes, sob pressão e/ou “determinação” de um poder político, religioso, econômico etc.) ocorreu, no
início, segundo Lewis (1982; complementado), a reboque de técnicas existentes, de acordo com
evidências históricas da Antiguidade. São exemplos os Egípcios com suas grandes construções e
projetos e os gregos, com invenções e aplicações em diversos campos. Mas tarde, outras pressões, entre
outras, as da indústria, determinarão parte do direcionamento das ciências e pesquisas para atendê-las
em suas necessidades de crescimento. Nesses casos, foram resultados nem sempre com benefícios
sociais e ambientais.
As relações das ciências e pesquisas com a sociedade são, em geral, complexas, tanto em suas
vias de execução (p.ex., as de financiamentos) como nos casos das ciências e pesquisas para a
sociedade através da tecnologia (p.ex., as de fisuão e adoção de resultados). São complexas, também, as
relações da sociedade com as ciências e pesquisas: possíveis origens sociais de ideias científicas e
temas de pesquisas e dos impactos de fatos sociais como os culturais e históricos em comunidades
científicas, em centros de pesquisas.
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Fundamentos da pesquisa
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história da filosofia, foram motivados por preocupações ligadas às ciências, tendo sua mais importante
exemplificação no realismo científico: a existência de recursos cognitivos para legitimar uma teoria
científica que transcende o nível de percepção do cientista e pesquisador. Enfatizou o caráter
irredutivelmente conjetural de todo conhecimento científico não como episteme (certeza), mas como
doxa (opinião, com base). Leis, teorias e conhecimentos científicos são sempre hipóteses que se tornam
científicas ao serem falseáveis. Dessa forma, o progresso da ciência seria constantes conjeturas e
refutações de substituições de hipóteses falseadas por melhores hipóteses não-falseadas, porém sempre
colocadas no campo de serem falseáveis, de serem testadas e com possibilidade de rejeição.
Trata-se de um comportamento normal do cientista e pesquisador, do “bom” profissional das
ciências, ao questionar, com sentido e lógica, com fundamentos e objetividade, a “veracidade” e a
aceitação de resultados alcançados, nos limites do rigor científico, e das possibilidades de tradução
desses conhecimentos acumulados no início de um novo milênio para uma sociedade da informação,
conhecimento e comunicação com carências e inseguranças que questionam tais limites.
O pesquisador, ao ser questionado pelo cliente acerca da validade – aplicabilidade do resultado
gerado com rigor científico, deverá ampliar (adequar, ajustar etc.) esse rigor para, no contexto da teoria
sinergética, buscar novas explicações, novas soluções que atendem novas realidades, obsdervando os
mesmos fatos e objetos, mas com novas perspectivas e novos fundamentos e métodos.
Nesse processo, segundo Capra, o “velho” que se rejeita é descartado e o novo que
provisoriamente possa ser aceito é introduzido: ambos os movimentos estão de acordo com as
exigências do tempo, em que os problemas são facetas de uma mesma crise; crise que exige um novo
paradigma e uma nova visão da realidade com novos pensamentos.
As informações anteriores apresentam um conceito básico, o da ciência, que, segundo
Aristóteles em suas obras Matafísica e Analíticos (Organon), define-se como o necessário, universal
e certo; um conhecimento que deve satisfazer alguns critérios. 1
Na próxima seção se apresentam aspectos gerais da origem da filosofia com tendência para
vinculá-la à história das ciências compreendendo, também, fatores sociais, em estreitas
interdependências e engrenagens (Figura 1), em que a direção desses componentes determina ou
influência a direção das ciências e, como efeito direto, da pesquisa.
Fundamentos da pesquisa
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Eram conceitos e conhecimentos de Empédocles que teriam suas origens em Egito e na sabedoria
judaica.
“Outros historiadores” indicam, também, datas (anteriores), locais e autores diferentes, bem
como ideias sem equivalentes evidências às encontradas na cosmologia da Grécia antiga. Seriam
sabedorias como a chinesa, hindu e arábica, entre outras, com traços filosóficos diferenciáveis e com
aparentes menores influencias sobre a cultura ocidental européia e sobre fundamentos lógicos da
racionalidade, da ética e das ciências na cultura ocidental.
Tais questionamentos, possíveis omissões e diferenças da Grécia antiga com outras civilizações,
são propositadamente omitidas, sem um motivo forte de exclusão (apenas por simplificação), nesta
obra.
Considera-se que parte do rumo da civilização ocidental, da lógica e raciocínio das ciências e
seus métodos modernos tiveram suas fontes, originais ou não, no pensamento da Grécia antiga que
testemunhou o surgimento de uma nova perspectiva cognitiva, como resultado de reflexões, em
propostas orientadas para buscar o conhecimento pelo próprio conhecimento, por curiosidade e/ou por
amor à sabedoria.
Essas primeiras ideias, nos séculos VII e VI a.C., tomaram a forma de um novo modo de pensar
e de refletir sobre os saberes disponíveis, desmistificando-os: seria o nascimento da filosofia com
interpretações desacralizadas de mitos da época.
Na antiguidade o homem começou a refletir sobre o funcionamento da vida e do universo e a se
organizar e buscar soluções sobre as questões da existência humana. Tais preocupações, indagações e
interesses presentes no nascimento da filosofia, confundiam-se com as ciências, tendo seus “melhores
traços e evidências” em cidades gregas da Ásia Menos, segundo Chauí (2000).
Para muitos historiadores a filosofia, entendida como a aspiração à superação, o amor à
sabedoria e o respeito pelo saber, pelo conhecimento que é racional, lógico e sistemático da realidade
natural e humana, suas causas e transformações e do próprio pensamento, nasceu em pequenas
comunidades. Eram as polis (ou cidades – estados, localizadas entre a Jônia, Ásia Menor da
Grécia antiga e o sul da Itália.
Naquelas cidades, - as polis, como resultado de sucessivas invasões e suas influencias sobre
essas comunidades na região, teve início a filosofia por interpretações dessacrilizadas de mitos
cosmogônicos de religiões da época. Tais mitos foram segundo Platão e Aristóteles, a matéria-prima
de reflexões de filósofos como os miletianos Tales, Anaximandro e Anaxágoras.
As primeiras ideias que surgiram nos séculos VII e VI a.C. com essas interpretações, tomaram
forma de um novo modo de pensar e de refletir sobre os saberes disponíveis, mediante a
desmistificação: início da filosofia. Isso não significa nem deve ser interpretado como o fato de que
outros povos, tão antigos, ou mais antigos quanto os gregos, não tivessem suas próprias filosofias e não
houvessem desenvolvido seus pensamentos, reflexões e formas de pensar, por vezes, peculiares e de
conhecer a natureza e seus fenômenos, com características diferenciáveis das registradas naquelas
cidades – estados. Entretanto, essas outras formas de pensar e reflexionar, diferentes ou não das
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Fundamentos da pesquisa
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registradas - vivenciadas na Grécia antiga, não são consideradas na resenha histórico – evolutiva da
filosofia e das ciências que se apresenta neste livro.
É importante destacar, no início do texto, que apesar da ruptura das duas formas de abordagens
da realidade, a filosófica e a científica, a filosofia continua com a visão de conjunto, do total, com o
relacionamento do parcial, objeto de especialização das ciências; e como uma reflexão crítica a respeito
dos fundamentos do conhecimento científico e do agir e se posicionar do cientista e pesquisador.
Esse agir e posicionamento devem ter fundamentos na ética: no pensamento filosófico do
comportamento moral, do problema moral e do juízo moral: com moral, baseado em normas, princípios
e valores que são aceitos de forma livre e consciente para regular o comportamento individual e social
(HUISMAN e VERGEZ, 1976). Fundamentos na responsabilidade: com o cliente, com a sociedade,
com o meio ambiente, com a organização, com o governo etc. Fundamentos em valores sociais e
morais, culturais e históricos, entre outros relacionados ou que venham a se relacionar com a
investigação com suporte na filosofia.
A parte que segue aborda, de forma sintética, aspectos iniciais do processo histórico das ciências
e sua estreita relação com a filosofia.
Nas fases da Grécia clássica, nos séculos V e IV a.C., a filosofia experimentou seu máximo
desenvolvimento, com alguns destaques.
Na época helênica, com a desenvolução da democracia e da vida intelectual e artística, a
filosofia teve grandes períodos como o socrático com a investigação de questões humanas éticas,
políticas e técnicas, e o sistêmico, com a reunião e sistematização do saber cosmológico e
antropológico (CHAUÌ, 2000; complementado).
O surgimento da filosofia na Grécia antiga, a do período clássico, com o início do
desenvolvimento cultural e científico nas polis, foi favorecido por diversas situações, circunstâncias ou
fatos históricos, destacando-se, sem detalhes, os seguintes:
a) As viagens marítimas que procuravam dos deuses e seres fabulosos explicações dos fatos, dos
fenômenos e das coisas que ocorriam.
A frustração de navegantes ao não encontrarem tais explicações e a própria desmistificação
desses seres passaram a exigir “outras” explicações que o mito, os deuses e os seres fabulosos
não podiam oferecer com base na realidade, com poder de convicção e sentido global, harmônico
e de inter-relação entre todas as coisas apreensíveis pelo pensamento.
É oportuno observar, de acordo com Gutiérrez (2002), que desde a origem do pensamento, a
ideia do global, da harmonia e da inter-relação das coisas, dos elementos de um todo tem estado
sempre presente na mente de filósofos sendo essas ideias, para os orientais, tão antigas quanto
eles mesmos.
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Para os ocidentais, essas ideias foram orientadas pelo corte aristotélico preferencialmente
analítico, com profundidade das partes e dificuldades para encaixá-las, bem como para entender
como interagem e essas partes formam uma unidade, um sistema. Tais dificuldades, as do
entendimento sistêmico, ainda perduram e se manifestam pela visão reducionista, como reflexo
de orientações e ações de ensino e pesquisa, em que o foco é o objeto e o enfoque é o disciplinar
(merológico).
b) A invenção do calendário, uma forma de medir o “tempo” segundo estações do ano, dos dias, de
um período como o lunar, das horas etc., foi outro fator importante no surgimento da filosofia.
Dessa invenção, destaca-se: o ano tropical devido à revolução da Terra em torno do Sol com
relação ao equinócio vernal (a referência é de 365, 2422 dias solares ou 365 dias, 5 horas, 48
minutos e 46 segundos). Outro destaque é o calendário egípcio, com início da enchente anual do
rio Nilo e duração de 360 dias e, depois, um dia a mais a cada 4 anos (Ptolomeu, em 238 a.C.).
Com essa invenção se revelou uma nova capacidade de abstração como algo natural e não como
um poder divino incompreensível. Posteriormente, a abstração foi do fator tempo civil, medido
de 12 horas e do tempo universal ou tempo civil de Greenwich.
c) A invenção da moeda, no século VIII a.C. Foi a cunhagem de moeda, que possibilitou uma forma
de troca alternativa à realizada através de coisas concretas trocadas por semelhantes. Essa
possibilidade colocou o meio de troca abstrata feita com base no cálculo de valores semelhantes
de coisas diferentes: foi a revelação de uma nova capacidade de abstração e generalização
facilitadas pela moeda.
A invenção da moeda se deu pelas moedas em ouro e prata, condicionador de seu valor como,
p.ex., o “tosão de ouro” de carneiro do rei de Aliates, da Lídia. Foi a primeira moeda com
monograma de representação de um Estado, para facilitar os negócios de venda e compra,
pagamentos e cobranças de impostos, entre outros, tendo como referências conceitos abstratos e
generalizáveis de um valor semelhante-equivalente aplicado para coisas diferentes como as
envolvidas nas transações, no comércio.
d) O surgimento da vida urbana e com ela o desenvolvimento e predomínio de atividades como as
do comércio com uma nova classe, os comerciantes.
Essa classe precisava do poder e prestígio para enfrentar às classes dominantes. Outra classe foi a
do artesanato com as técnicas de fabricação, diminuindo o prestígio de famílias da aristocracia
proprietária de terras, por quem e para quem os mitos foram criados.
Tais surgimentos tiveram impactos, pelo patrocínio e estímulo às artes, entre outros, para criar
um ambiente favorável ao desenvolvimento da filosofia.
e) A invenção do alfabeto que, a semelhança do surgimento do calendário e da moeda, revelou a
capacidade de abstração e de generalização ao evidenciar o sentido de ideias, substituindo a
representação de figuras, imagens e ideogramas pela escrita com base no alfabeto de sons.
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A primeira referência escrita do alfabeto foi a Fenícia e sua migração para a Grécia apareceu no
5º. livro de Histórias escrito por Herodotus / Heródoto. 2
A invenção fenícia dos 22 signos do alfabeto fonético de Biblos, em 2.000 a.C., mudou a história
da civilização e determinou, gradativamente, o desaparecimento de escritas conhecidas na época,
tais como a cuneiforme da Mesopotâmia e a hieroglífica do Egito.
O alfabeto de Biblos, com menor número de letras ou signos que o alfabeto moderno, permitiu
maior precisão e mais clareza nas ideias a difundir, ampliando o poder de comunicação ao
permitir descrever sentimentos, analisar pensamentos (...), supondo-se que não apenas se
representavam imagens das coisas, mas, as ideias acerca delas: o que se pensa se transcreve pelo
símbolo fonético. Essa possibilidade, para outras escritas, não poderia ser feita com certas
fidelidade e perspectivas de permanecer no futuro.
O alfabeto é a obra-prima do poder de abstração do espírito humano que facilitou comunicar a
reflexão e incentivou a filosofia, as ciências, a organização e os sistemas sociais.
Com a invenção do alfabeto foi possível ter informações apresentadas em tábuas escritas, entre
os séculos XIV e início do XII a.C. Partes dessas tabuas foram encontradas pelos fenícios na
cidade de Ougarit (Ugarito )اوگاریت, dispostas em camadas que correspondem ao início da
Idade do Bronze, com vestígios de instalações utilizadas na produção de azeite (HISTÒRIA,
2005), além de cartas, contratos, textos literários mitológicos e religiosos como é o caso de a
Bíblia Cananéia, com histórias como as de Daniel, Jô, Noé, entre outras. (O ALFABETO, 2005).
f) A invenção da política com a introdução de ideias como a lei expressão da vontade de uma
coletividade humana que decide por si mesma, o que é melhor para ela e que tipo de relação
interna prefere.
A legislação que regulou a polis serviu de referência e modelo para a filosofia propor aspectos
legislados, regulados e ordenados do mundo com o racional.
Com a invenção da política se teve o surgimento de um espaço público e nele, o aparecimento do
discurso. Do discurso entendido como afirmações articuladas de uma forma coerente e lógica da
palavra, como sendo o direito do cidadão para emitir suas opiniões, discuti-las com outros,
persuadi-los e tomar decisões.
O espaço criado pela política e seus desdobramentos foram contrários às informações -
orientações do mito, do sobrenatural e oculto, contribuindo para a valorização do decidir fazer ou
não alguma “coisa”, valorizar o ser humano, seu pensamento e para criar condições do
surgimento do discurso filosófico, do pensamento filosófico.
Com a política, ao estimular o pensamento e o discurso, procurou-se, ao contrário do pensamento
do mítico e sobrenatural, a ideia de um pensamento ensinado, transmitido e discutido. A ideia de
um pensamento que todos pudessem compreender e discutir, que todos pudessem comunicar e
transmitir. Tais ideias, conceitos e práticas foram fundamentais para a filosofia e seu
desenvolvimento.
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circunstâncias, às ciências e à pesquisa, além de incitar à reflexão acerca de relações entre filosofia e
ciências, sociedade e ciências, filosofia – sociedade e ciências.
São tendências consistentes com os três meios (instrumentos) disponíveis pelo homem para
buscar e/ou aumentar o “domínio” (vale dizer, o conhecimento para a conservação e manejo racionais e
sustentáveis) sobre a natureza: a percepção (em um extremo), a intuição (no meio) e a lógica (no outro
extremo), com variantes (evoluções, ajustes – adaptações, mudanças etc.) que se acussam na evolução
das ciências enos métodos científicos.
Para se ter uma referência, inicial e simplles, à necessária reflexão entre filosofia e ciências se
apresentam, a seguir, elementos do histórico das ciências. Não se trata de uma introdução da história
das ciências, mas de dados esparsos compilados de vários autores citados, sem se ter uma referência de
história das ciências.
Isto porque, à despeito de se terem obras conhecidas de filósofos da Antiguidade e dos períodos
medieval e moderno, com descrições genealógicas de informações e procedimentos científicos, a
história das ciências se organizou como disciplina apenas no final do século XIX e início do século XX,
quando foi institucionalizada em comunidades como as de cientistas – pesquisadores, historiadores e
filósofos, amadurecendo os esforços empreendidos por academias (p.ex., a Royal Society of London e a
Academia Francesa; GUSDORF, 1988), preocupadas de cuidarem tanto de suas memórias quanto do
papel que elas deveriam desempenhar.
Os dados históricos de sábios da Antiguidade foram transmitidos por compiladores que, de forma
sistêmica, dedicaram-se a recolher, classificar, ordenar (...) ideias de filósofos: os doxógrafos. Os
resultados correspondem a escritos didáticos com informações e procedimentos “científicos” em cursos
naquelas épocas, tais como as primeiras compilações de matemática (aritmética e geometria),
astronomia, medicina, agricultura (...) feitas no período helenístico e, depois, por bizantinos, judeus,
árabes (...); compiladores da Idade Média Ocidental etc.
São escritos que possibilitaram conservar e transmitir parte dos resultados das ciências e seus
métodos da Antiguidade até os tempos contemporâneos, muitos deles não escritos pelos próprios
sábios, mas por seus discípulos.
Fundamentos da pesquisa
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de se acertar com o meio ambiente sem, contudo, ficar alheio às adaptações e, por força natural, aos
ajustes e à evolução “imposta” por mudanças desse meio.
Sob tais circunstâncias e contornos, o homem primitivo abandonou, de maneira gradativa, sua
vida nômade há mais de dez mil anos e começou a se organizar em comunidades. Com elas, surgiram
as primeiras civilizações na Mesopotâmia (sumérios e babilônicos), no Egito, na China e na Índia, entre
outros povos e civilizações. Foram longos processos de aprendizagens e de transições de um estado
para outro, em que se desenvolveram e aperfeiçoaram atividades como as agrícolas, pecuárias e de
organização social, entre outras, afeiçoadas ao lugar de residência, às condições e circunstâncias do
meio.
Em tais processos de aprendizagem o homem começou a construir e utilizar utensílios e
instrumentos para dominar forças da natureza e obter benefícios dos recursos desse meio,
diferenciando-se dos outros animais por uma característica singular: a preocupação e interesse pelo
conhecimento.
Foram preocupações e interesses comuns para todos os povos da antiguidade, ainda que com
destaques e orientações de saberes e de formas de pensar, decidir (...) diferentes entre ums e outros
povos como, p.ex., entre os egípcios, a trigonometria; entre os romanos, a hidráulica; entre os indianos
e muçulmanos, a matemática e a astronomia; e entre os gregos a geometria, a mecânica, a astronomia, a
acústica e a lógica e raciocínio (...) como bases na formação do conhecimento.
Não é contraditório, como se mostra aparetemente, considerar os conceitos de prehistória e
ciência, dado que prehistória não implica barbarismo nem ciência suficiência nem humanismo, mas um
estado que identifica a evolução de um povo com importantes ensinamentos.
Esse é os propósitos da síntese histórica na formação do profissional da pesquisa para que possa
entender como os gregos, p.ex., desenvolvveram a intuição, um tipo de reflexão a considerar que,
segundo Matallo (2000), possibilitou gerar teorias sobre a natureza e desvincular o saber racional do
saber mítico.
No início da história da civilização, da origem das ciências, cada estágio do cultivo de plantas, da
domesticação de animais, da organização social (legal e institucional), econômica e política
representou, segundo Bronowski (1992; complementado), inovações técnicas e invenções com
fundamentos em “princípios científicos”, em métodos e rudimentos tecnológicos que permitiram
aproximações contínuas da realidade.
A busca e aproximação é um processo permanente, mediante modelos mentais, para
compreender melhor a realidade. Por causa da melhoria da compreensão e do pensar apareceram as
primeiras técnicas (tecnologias) na produção de tijolos, na arte da vidraria e metalurgia e em atividades
produtivas, de organização e de comércio. O crescimento do comércio estimulou, por sua vez, a
pilhagem, as técnicas de guerra, a navegação com a construção de barcos a vela.
Para prever períodos de cheias dos rios e de plantio e colheita surgiram a astronomia, a
matemática e o calendário. Uma lição é: as “necessidades” têm estimulado sobremaneira à criatividade
em todos os tempos.
25
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
se atingir essa fase de um processo de evolução das ciências e sua filosofia foram diversas as
concepções e motivações da busca de “saberes” e de explicações anteriores dos fatos da realidade,
exemplificando-se uma motivação não-utilitarista ou de aplicação material.
Foram os gregos da antiguidade “possivelmente” os primeiros a buscar o saber não
necessariamente com um fim prático, mas, como um desejo e vontade de conhecer o por quê? e o para
que? de tudo o que se pudesse pensar, definindo as bases essenciais da mentalidade e do conhecimento
científico como algo abstrato, generalizável e baseado em princípios. Algo que pudesse ser testado,
não-esotérico, organizado e coerente, sujeito à correção, à experimentação e até “matematicamente”
sedimentado, porém, não como um reultado acabado e indiscutível de “algo”, mas um produto de
processos que têm sido determinados, influenciados e/ou alterados ao longo da história.
Eram elementos da ciência da natureza com fundamentos diferentes do mito e da religião que
começaram com os primeiros filósofos – cientistas com base em observações. É claro que esses
primeiros passos em direção à ciência não poderiam revelar todas as características do conhecimento
científico. Desse começo do conhecimento científico se exemplifica a ideia de Tales de Mileto que,
apesar de acreditar em deuses, sua resposta quanto à origem ou princípio das coisas não podia ser
mítica; deveria ser algo que por todos pudesse ser diretamente observado na natureza: a água. A
explicação de tudo surgir da água, ainda que não científica à luz da ciência moderna, não estava
baseada em entidades míticas.
Outros filósofos – cientistas como Anaximandro, Heráclito, Pitágoras e Parmênides deram
suas contribuições para as ciências. Demócrito defendeu que tudo quanto existia era composto de
pequeníssimas partículas indivisíveis, unidas entre si de diferentes formas, e que na realidade nada mais
havia do que átomos e o vazio onde eles se deslocavam. Foi o primeiro filósofo naturalista em não
acreditar em deuses e propor que a natureza tinha as suas próprias leis: couve às ciências descobrí-las,
um processo ainda em curso.
Apesar das limitações de recursos materiais e tecnológicos para desenvolverem as ciências,
foram pensadores como Aristóteles, Arquimedes e Erastóstenes grandes “cientistas” que trouxeram
contribuições às ciências, iniciadas como uma atividade organizada na cidade de Alexandria, cidade
fundada por Alexandre o Grande, em 331 a.C., situada ao norte de Egito e oeste do delta do rio Nilo,
às margens do Mar Mediterrâneo.
Essa cidade se constituiu no centro cultural (pesquisa, ciência...), comercial, financeiro e
industrial do mundo helênico e foi sede da mais importante biblioteca da antiguidade fundada por
Ptolomeu e organizada por Demétrio de Falero. Naquela biblioteca, reuniam-se filósofos,
matemáticos e pensadores em diversas áreas para a construção de novos conhecimentos e das ciências.
As mesmas “forças”, motivações (...) que deram origem às ciências e determinaram a sua
natureza, deram origem e fundamentou, também, a pesquisa como o caminho da ciência, como um
processo histórico e evolutivo para se ter o conhecimento adquirido prático com base em descobertas,
invenções, explicações e predições úteis de fatos, fenômenos e coisas. Alguns autores admitem a
obtenção de certos conhecimentos como sendo revelados.
28
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Alguns autores admitem a obtenção de certos conhecimentos como sendo revelados; é o caso dos
conhecimentos religiosos para explicar a natureza de o próprio ser e do crescimento - evolução
espiritual; em outros casos, a revelação para se ter explicações psicofísicas de telecinesia em
fenômenos como os de levitação e de potencialidades fluídicas humanas com “pressupostas”
capacidades como as de cura.
Em relatos antigos como os da Bíblia, em livros mesopotâmicos, em poemas épicos, em escritos
etnográficos (...), estabeleceram-se, em alguns deles, distinções entre conhecimentos revelados e
conhecimentos transmitidos por tradições históricas e justificados apenas por observações empíricas e
pelo “bom-senso” (PORTER, 1999), além de análises e classificações. É o caso de, p.ex., remédios e
poções extraídas de certas plantas para o tratamento de doenças comuns, descobertas por lógicas
deduções ou por “acaso”. Essas duas formas de conhecimentos, os revelados e os transmitidos, além de
terem fontes de dados e procedimentos diferenciados, não eram equilibrados e um deles tinha
privilégios que favoreciam à revelação (JAEGER, 1995).
Desde os tempos primitivos, com os filósofos gregos, quando a ciência, como resultado da
investigação, teve um novo status, os conhecimentos adquiridos serviram não apenas como
29
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
interpretação da dinâmica social [econômica, ambiental...] capaz, segundo Martinez (1994), de integrar
rupturas, saltos qualitativos e inter-relações, além da simples visão técnica.
No contexto da realidade brasileira o profundo sentido estratégico da ciência e tecnologia tem
seu principal desafio para: adequar-se à realidade de profundas e extensas dimensões territoriais, como
é o caso do Brasil; atender a diversidade de ambientes e recursos naturais (p.ex., da biodiversidade);
consultar condições sociais, culturais e econômicas variáveis; e definir a participação da ciência e
pesquisa na política e na economia mundiais.
À internalização de princípios como os do “bem-agir” de uma “nova ética” integrada ao devir
humano, centrada no conhecimento, na lógica da racionalidade e na sustentabilidade, acrescentam-se
novos problemas como os de conhecer a natureza (o suficiente) para valorizá-la e valorizar seus
recursos, ambientes, estruturas, funções, potencialidades (...) para conservá-los com o adequado
manejo integrado. Esse mesmo conhecimento leva à classificação do meio ambiente e à proteção e
preservação de fontes e ciclos, à parcimônia no “uso racional” de “excedentes” (...) na ausência de
meios tecnológicos “seguros” para “garantir” o uso sustentável, vale dizer, a conservação da natureza e
seus recursos.
Esta deveria ser uma inquietação importante e destacada a considerar na formação do
profissional pesquisador, bem como uma preocupação constante da organização e dos envolvidos na
pesquisa (p.ex., clientes, pesquisador, financiador, indústria, mercados, sociedade etc.) em conservação
para o desenvolvimento sustentado.
Tal preocupação tem fundamentos na história e na evolução do pensamento científico e se torna
cada vez mais importante com o crescimento de externalidades negativas tecnológicas e pecuniárias.
Por outro lado, essa história e evolução em seus fundamentos são oportunidades para refletir acerca do
conhecimento que se tem, que poderia / deveria se ter e de que como melhorá-lo ou adequá-lo às
circunstâncias e às exigências de cada caso, período, local, comunidade, oportunidade (...).
Mazursky (2005; complementado), ao tratar aspectos históricos da ciência e suas relações com a
filosofia e a sociedade em um contexto geral, considerou que “todas as formas de saber humano
estiveram reunidas em duas modalidades de discursos: a do mito e a do senso comum”.
O discurso do senso comum primitivo era o uso prático e imediato da linguagem, enquanto que o
discurso do mito, especializado e com conteúdo estruturado que, posteriormente se diferenciaria para
dar origens à religião, à arte, à ciência e à filosofia, era para explicar o mundo e dar sentido à vida. O
autor (MAZURSKY op. cit.) destacou a Grécia Antiga como a raiz da cultura européia e da cultura que
se generalizou no Ocidente.
Nas polis o discurso da filosofia ganhou autonomia e preferência em relação ao mito e ao senso
comum, com postulados que perduraram por séculos como os de “ordem, harmonia e equilíbrios das
forças que regem o mundo”, derrubando crenças do senso comum como a do mundo regido por forças
arbitrárias e caprichosas.
Do mito restaram as narrativas de grandes poetas épicos como fontes de inspiração das artes
clássica e, posteriormente, renascentista. Mais tarde o mito fui substituído pelo logos que na filosofia
31
Grega era a razão colocada como o princípio constituinte e controlador do universo e sendo expresso
pela fala, como uma abstração da intuição racional do filósofo o que resultava socialmente acessível.
Dessa forma, os filósofos realizaram os primeiros trabalhos científicos com base em observações
empíricas explicitamente racionais, objetivas e universais (MAZURSKY, op. cit.; complementado).
Tais atributos são elementos, alguns persistentes, em atividades da ciência e pesquisa e que é preciso
destacar com os devidos ajustes, mudanças e complementações ou revisões.
Os interesses dos filósofos nos mais variados campos científicos, dividiam-se em dois: no estudo
da natureza e no estudo de assuntos de ética e política (humano), sendo que o ideal de harmonia, de
equilíbrio e de equidade, tanto em assuntos humanas como em explicação da natureza, presidia a visão
do mundo, com uma tendência para todo encontrar seu lugar mais justo e mais adequado
(MAZURSKY, op. cit.; complementado).
Entender a origem e evolução da pesquisa passa e, por vezes, confunde-se com a origem e
evolução da filosofia no tratamento da ciência, da filosofia da ciência, ao se ocupar de ideias e não de
conceitos restritos, com elementos básicos da própria história do desenvolvimento científico. Essa
filosofia, segundo Quintanilla (1987), ocupa-se da análise e fundamentação das ciências consideradas
como formas de conhecimento.
A importância (mais do que isso, a relação – complementação) da história da ciência e da
filosofia da ciência pode ser sintetizada pro uma frase de Lakatos, inspirada em Kant, “a filosofia da
ciência sem a história da ciência é cega; a história da ciência sem a filosofia é vazia”.
A lição dessa relação- complementação pode ser colocada em perspectivas, tanto internalista
(análise filosófica como as de pressupostos e fundamentos das ciências) de análises e compreensão das
ciências, desde dentro, a partir de problemas e constituição – desenvolvimento específico, como
externalista (análise sociológica) ao buscar caracterizá-la com base no exame de suas relações com o
meio externo. Uma referência para este tema se encontra em The origins of modern science
(BUTTERFIELD, 1985).
Uma síntese de aspectos históricos, da evolução do pensamento científico e, em especial, de
pontos destacados da filosofia da ciência e suas contribuições (poucos exemplos) às ciências é um
ponto de partida para a reflexão e compreensãom da importância da história e filosofia das ciências
para a pesquisa. Esclarece-se que que em descobertas, invenções (...) interferem, com frequência,
fatores não-científicos (p.ex., te elógicos, religiosos), não-racionais (...) considerados apenas na
historiografia moderna das ciências.
A atitude da maioris dos escritores da primeira metade do século XX desprezava elementos não-
científicos no surgimento e evolução de teorias científicas, dificultando o pleno entendimento do
processo de criação das ciências (THORNDIKE, 1923-1958). Expressava que “nenhum escritor
medieval, seja de ciência ou de magia, pode ser entendido por si próprio, mas precisa ser avaliado com
respeito ao seu ambiente e antecedente” se o que se quer é uma visão abrangente da evolução das ideias
científicas.
32
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Para isso é precissodescrever como essas ideias surgiram e progrediram em diferentes cultutras e
sociedades. Thorndike (op. cit.) exemplifica dois casos famosos limitados em seus entendimentos por
omissões nas narrativas: a influência da alquimia sobre Newton, na concepção da ideia de gravitação, e
sobre Kekulé, ao imaginar a estrutura da molécula de benzeno.
A importância da “história” da ciência e da filosofia das ciências para a educação científica de
qualidade e com resultados esperados com efetividade tem sido destacada na literatura, entre outros,
por Mattews (1998). Esse autor afirma que a aprendizagem da prática científica precisa ser
complementada pelas aprendizagens sobre as ciências (natureza das ciências) e sobre a história e
filosofia das ciências, importantes tanto para pesquisadores como para professores.
Os professores precisam pelo menos de três competências: o conhecimento e a apreciação da
ciência que ensinam; a compreensão da história e da filosofia das ciências; e alguma teoria que
proporcione uma base racional no processo de ensino.
O contexto da pesquisa científica não se limita a um ambiente “neutro” de um laboratório, de um
campo experimental, de um ambiente fechado de investigação (...), mas compreende inúmeros fatores e
circunstâncias abertas e com interações com o meio interno, tais como: a diversidade de pessoas e de
conflitos e interesses compreendidos pela investigação; a questão legal e ética cada vez mais complexa
em suas relações com as invações; as relações ambíguas, difusas (...) entre as ciências e os interesses da
comunidade científica, dos financiadores das ciências e da tecnologia com o meio ambiente. Tudos
esses processos compreendem aspectos históricos e sociais.
À filosofia das ciências caberia mostrar não que a ciência existe, mas, que ela existe com as
características do conhecimento científico, entre outras as de lógica e racionalidade: certa legitimação e
diferenciação do conhecimento científico dos demais conhecimentos.
Esse é um dos propósitos da primeira parte do livro que trata da origem e evolução das ciências e
da pesquisa para entender o desenvolvimento científico, ao se admitir que a garantia desse
conhecimento esteve associada à forma de uso – aplicação e à resposta da ciência, pela sua utilidade,
em cada período.
A ciência, um sistema complexo, organizado, sistematizado (...) de conhecimentos e de
compreensões de fatos e fenômenos naturais, tem sido definida de várias formas e para diferentes
propósitos, com variações, ênfases ou destaques ao longo da história das ciências. As que seguem são
exemplos dessas definições.
33
A ciência é formada por instituições ou sistemas sociais em que atuam determinados atores, os
cientistas e pesquisadores, sob enfoques disciplinares, com frequência, integrados, para desenvolver
estudos sistemáticos e racionais baseados em métodos adequados à natureza com objetivos
determinados: conhecer e compreender as coisas. Por esse método auxiliador à criatividade do cientista
e pesquisador, buscam-se ou se descobrem leis explicativas gerais que estabelecem conexões entre
fatos e fenômenos pelas quias se antecipam ações, reações, comportamentos, respostas (...), em
esquemas “modelados”, tais como:
a) se for feito isto (...) como, p.ex., a estruturação rígida de uma organização, a centralização na
tomada de decisões sem intencionalidade e controle para produzir efeitos diferentes mediante
diversas manipulações ou a aplicação de uma determinada dose em um experimento científico,
portanto, com a “manipulação” deliberada e controlada de produtos e ambientes experimentais (...)
b) então acontecerá (provavelmente) aquilo, p.ex., a insatisfação dos membros dessa estruturação
rígida; as dificuldades de compartilhar a tomada de decisões na gestão (...); ou determinadas
respostas, conforme evidências em pesquisas semelhantes e tidas como referências à aplicação de
uma dose (...).
Em outro contexto, o conceito ciência é o de um conjunto estruturado de aquisições (de
conhecimentos atentos e aprofundados de alguma coisa) sistemáticas e de formas de conhecimentos
científicos (episteme) que refletem relações entre a realidade e o ente pensante, com
determinados propósitos ou objetivos; um modo, com métodos especiais, de conhecer a realidade e a
“verdade”, ambas baseadas em fatos (observação, experimentação, verificação, inferência lógica etc.),
em evidências.
Tais métodos e seus resultados são: claros pelas suas evidências; precisos, porém, não
definitivos; verificáveis com técnicas confiáveis; sistemáticos, ao compreender partes de um sistema;
gerais, ao não se limitar a um caso; explicativos; preditivos; abertos (...) possibilitam tecer um
conhecimento científico que é objetivo, racional e refutável, entre outras características diferenciadoras
desse conhecimento dos demais conhecimentos.
Os objetivos das ciências poderão ser melhorias da qualidade de vida (um fim utilitário) e/ou
melhorias de “estados” como o intelectual (, eidos; ideia), moral (pístis; crença, fé),
imaginativo (, eikones) e dialético (, dianóia), entre outros. Para atingir esses
objetivos, a ciência precisa de um método, de uma lógica de raciocínio e de uma referência para se
avaliar e decidir sobre questões de aplicação ou utilidade, éticas, morais (...) compreendidas em, p.ex.,
investigações biotecnológicas que afetam (possam afetar), de maneira negativa, o homem e seu meio.
No sentido da ciência como conhecimento (episte), encontra-se uma estreita e direta relação de
interesses com a filosofia: a filosofia da ciência.
A filosofia, por sua vez, está intimamente relacionada à epistemologia e à ontologia para buscar
explicações sobre a natureza de afirmações e conceitos científicos universais que compreendem
aspectos específicos.
34
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
O pensar melhor para viver melhor, finalidade da filosofia (o pensar para buscar o sentido em sua
dupla acepção: significado e direção), é uma das finalidades da pesquisa tecnológica para o
desenvolvimento ao levar a teoria à prática, ao refletir nos fundamentos da teoria para aplicá-la na
realidade e ao proceder, conforme o método científico, para gerar / adaptar – disponibilizar / difundir os
meios (informações) de novos conhecimentos, de inovações (tecnologias), de mudanças de atitudes
(...). São resultados desejáveis compreendidos no desenvolvimento, seja para explicar como é (ciência
positiva) ou para definir como deve ser (ciência normativa).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
montes (...)? Por que voam os pássaros? Por que razão se tem fome, sede e adoecem. / morrem as
pessoas? Qual é causa da sucessão dia e noite? Das estações do ano? O que são as estrelas? entre
muitas, outras perguntas.
As respostas às perguntas poderiam ser científicas (p.ex., em épocas mais recentes), baseadas em
processos de um método especial aplicado às observações especiais, ou não (épocas mais remotas). Em
ausência de respostas com base em processos racionais, sistêmicos, testáveis (...) e com poder de
convicção outras respostas, possíveis em cada época conforme o nível de entendimento, de evolução
dos povos, como as de ordens religiosas e míticas, não explicativas com base no raciocínio e em mitos,
na religião.
São “explicações” que, apesar de não serem satisfatórias em outras épocas ou para outros povos
e culturas, não podem ser interpretadas como sendo respostas de menor importância. Eram as
“melhores” explicações da época e para aqueles povos, para aquelas culturas. Foram os conhecimentos
históricos e biologicamente primitivos de um saber motivado por algo externo (a necessidade de
controle, de sobrevivência...) à atividade cognitiva, isto é, onde se realiza a representação do objeto
pelo sujeito.
Na pré-história o homem teve experiências segundo as suas peculiares concepções dos fatos, dos
fenômenos, das relações e comportamentos da natureza. Aqueles fatos e comportamentos além da
capacidade de assimilação do homem primitivo eram relegados ao campo do mistério, da religião, da
vontade / capricho dos deuses. Dessa forma, a ignorância do homem tinha suporte em entes
sobrenaturais encarregados de ajudar ou de castigar, segundo as condições de ocorrência do fato.
Apesar desse conformismo, o homem continuou discernindo e obtendo suas experiências,
observando com curiosidade e analisando racionalmente, em um processo de aprendizagem e melhoria
permanentes até, em determinado momento da evolução, relacionar, consciente ou inconscientemente,
fatos pela causalidade, pela evidência na observação de uns serem causas e outros efeitos. Naquele
momento da história da ciência surgiu o primeiro método “científico”, a intuição de causalidade
alcançada de maneira empírica.
Mas, antes desse surgimento, o processo de explicação de fatos por entes superiores, pela
curiosidade humana de cada época e por causas míticas, foi prolongado, com “verdades populares” que
atribuíam importância às coisas. Essas “verdades”, com frequência, passaram a se constituírem códigos
de conduta moral, de comportamento e de manifestações socioculturais.
O mito não deve ser entendido como uma manifestação falsa, ilusória e de um ídolo, como às
vezes se admite, quando tenta “explicar” a realidade, ainda não justificada pela razão e pelo estudo
objetivo do fato analisado com critérios científicos.
O entendimento como uma manifestação dessa forma é uma concepção reduzida do mito,
inclusive com certo preconceito quando se desqualifica o desejo de dominação, implícito no mito, para
afugentar o medo e a insegurança, sem obedecer à lógica ou quando essa expressão é atribuída aos
povos primitivos e às pessoas menos instruídas de uma sociedade.
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O mito pode ser visto como uma narrativa ou representação de um fato heróico com um fundo
de verdade, porém, com aportes do imaginário coletivo; pode ser compreendido como um relato
simbólico que passa de geração para geração dentro de um grupo, que narra e “explica” a origem de
certos fenômenos, acidentes, instituições, costumes sociais ou, ainda, uma exposição alegórica de uma
ideia, doutrina ou teoria filosófica.
Essa narrativa, relato ou exposição alegórica compreende valores sociais e morais, por vezes
questionáveis, porém decisivos para entender o comportamento de grupos sociais, com seus mitos, em
determinadas épocas, inclusive de povos e culturas modernas.
O mito não é uma mentira, pois é verdadeiro para quem o vive e passa a se constituir a primeira
atribuição do sentido da realidade, sobre o qual age a afetividade e a imaginação. Tampouco é uma
ilusão uma vez que o mito tem sua racionalidade, ainda que não seja lógica, quando trabalha com a
fantasia, com o imaginário coletivo. Não se trata de um ídolo, mesmo existindo uma relação entre o
mito e o ídolo. O mito é de um conteúdo maior; é o caso da figura do Super-homem que representa um
ídolo, porém sua história é mítica quando traduz momentos de fracasso no ser humano e, por outro
lado, tem sucesso; constitui-se a imagem da incapacidade do pleno sucesso, sem frustração
(MEUNIER, 1976; complementado).
O mito, em todos os tempos e culturas dos povos, tem sido e continua sendo um componente
indissociável da vida humana. Isso porque o homem, tanto dos tempos moderno como dos antigos, não
é só razão, mas, também, afetividade e emoção; são sentimentos que, com variáveis dosagens, são
colocados na compreensão da realidade.
Quando a razão e a lógica não são suficientes para se ter a compreensão necessária ou
satisfatória de um fato ou fenômeno, apela-se ao sobrenatural, ao mítico para descrevê-la, com certa
“coerência” em manifestações de passagens sociais e culturais como as do nascimento, casamento,
morte e infância - adolescência.
O mito não tem a função de explicar, com coerência, consistência ou evidência, o fato da
realidade, mas, a de “acomodar situações” e até tranquilizar aflições que decorrem da ignorância ou da
falta de uma referência adequada em relação ao fato.
Em outro sentido e para determinados campos do saber, o mito pode ser uma fonte de
informações valiosas para a ciência, pela riqueza de informações das mesmas e pela possibilidade de
compreender raízes de desejos, manifestações e interpretações, implícitas no mito. É o caso, p.ex., do
complexo de Édipo, um dos principais descobrimentos da psicanálise feito por Freud com base no
mito grego de Édipo. Esse complexo se verifica quando a criança atinge o período sexual fálico, na
segunda infância, dá-se conta da diferença de sexos e tende a fixar a sua atenção libidinosa em pessoas
do sexo oposto, no ambiente familiar (WIKIPÉDIA, 2005b).
A própria ciência pode, indevidamente, invadir e até se constituir ou identificar com um mito
quando por determinadas circunstâncias (omitidas), o cientista acredita que a ciência possa ser
desenvolvida à margem da sociedade e de seus interesses; que a solução cientifica - tecnológica seja
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
suficiente para resolver todos os problemas do desenvolvimento, do bem-estar social; e que a ciência
mantenha total objetividade e neutralidade, entre outras crenças e mitos.
Acreditar na total objetividade e neutralidade da ciência “mito” não se relaciona com uma das
proposições centrais da ciência “normal”: a objetividade e neutralidade da observação: a observação
pode e deve ser feita sem qualquer antecipação especulativa e sem diretriz teórica preconcebida que
possa induzir o cientista; a mente do pesquisador deve estar “limpa” de ideias e influências; não deve
ter nada em vista, a não ser a observação pura e evidente.
Deve-se adiantar, sem entrar em detalhes, que o mito, enquanto processo vivo de compreensão
da realidade surge como uma verdade de ordem sobrenatural. Portanto, não se trata de uma verdade
científica, de uma verdade filosófica (...), com fundamentos em explicações racionais, com coerências
lógicas e com “garantias” de testes – prova de argumentações, entre outras exigências a que se submete
o fato, a observação, a hipótese, a teoria (...) da ciência.
A verdade do mito é intuitiva ou percebida de maneira espontânea (KURY, 1990), sem exigência
da comprovação em evidências ou observações, nem de causa para um efeito, mas, apenas pela
simultaneidade de fatos como no caso de, p.ex., a estrela Sírus se levantar, em certo dia, um pouco
antes do nascente; a esse fato, segue-se a semeadura do trigo nas margens do rio Nilo; ao terminá-la, as
águas crescerão e o trigo germinará.
Na intuição e por definição, tem-se o ato de pressentir ou de ver um fato de maneira diferente
daquela normalmente visto pela maioria das pessoas.
O mito é a adesão de um fato, objeto (...) às crenças como nos casos de, p.ex., as origens de
técnicas, em que o mito de Prometeu roubou o fogo dos deuses para dá-lo aos homens, seus
protegidos, os mortais; de instrumentos como, p.ex., a enxada, o anzol, a lança e espada; e da proteção
e origem do ser humano como, p.ex., o mito de Pandora “aquele que possui todos os dons”:
características boas e más nas almas dos animais, colocadas no peito do homem com vida, sentido
espiritual e sabedoria, para socorrê-lo; era o animal nobre e espiritual criado por “aquele que prevê”, o
Prometeu, de argila, águas (...), à imagem dos deuses; tais imagens arquetípicas e míticas estão
ligadas, segundo alguns pesquisadores (entre outros, ALVES, 2005), à psicologia analítica,
constituindo-se, como no caso do mito de Édipo, fonte de informações.
O mito é uma pré-reflexão de emoções e afetividades com tal força que é capaz de se estender na
realidade vivida, àquela que é objeto de estudo, no conhecimento, e não apenas no campo religioso,
porém, sem a evidência racional e reflexiva característica da verdade científica, do conhecimento
científico.
O desenvolvimento da cultura humana, os valores dessa cultura e os saberes tradicionais,
aspectos em foco da ciência e objetos de pesquisa, misturam-se, em muitos casos, com o mito. Dessa
forma, ao resgatar essas culturas e ao evidenciar e potencializar os valores de saberes tradicionais, a
pesquisa poderá levar aspectos míticos, alguns substituídos por informações e conhecimentos técnicos,
com novos valores ou com valores agregados aos saberes tradicionais; essa é parte da essência do
conceito de pesquisa e desenvolvimento.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
como o processo de superação, de transição de um paradigma para outro. Isso não aconteceu, em
muitos casos, em narrativas históricas das ciências.
Com o surgimento da ciência moderna se tevê a preocupação de cuidar da história das ciências.
Com essa preocupação surgiram filósofos das ciências como F. Bacon. A importância da história para
esse pensador pode se compreendida pelas frases: “a verdade é filha do tempo” e a “(...) a necessidade
de uma história exata do saber, contendo as antiguidades e as origens das ciências (...), as invenções, as
tradições, os diversos tipos de preparação e organização; os momentos de expansão, as oposições, as
decadências, depressões e esquecimentos; com as suas causas e possibilidades (...) que dizem respeito
ao saber (...)”. Destacou o valor da história no desenvolvimento do conhecimento e elaborou um
esboço dessa história como uma pedagogia da ciência, uma tomada de consciência da experiência
adquirida pelas gerações anteriores.
Mas não foi apenas a história da ciência que teve seu reconhecimento recente. O próprio conceito
- sentido moderno da ciência teve sua origem, segundo Herrnshaw, citado por Gauer (1996), apenas no
início do século XIX. Porém, o conceito é muito mais antigo, tanto quanto sua história e as histórias da
sociedade e da filosofia.
As civilizações orientais chinesas, hindus (...) e as do Meio Ocidente tinham empreendimentos
da ciência e fundamentos científicos. Contudo, repetindo, foram os gregos os que assentaram as bases
da mentalidade científica e definiram conceitos como os de abstrato, generalizável (...) com base em
princípios de evidências, de testes (...). Tais bases e conceitos, apesar de limitados, foram essenciais
para provocarem mudanças e revoluções na evolução das ciências. Dessas revoluções se trata, de forma
simples e informática, na próxima seção.
científico, de ideias baseadas em conceitos de valor, tais como perfeição, harmonia, significado e
objetivo, substituindo-as por um universo indefinido e até mesmo infinito, mantido coeso pela
identidade de seus componentes e leis fundamentais. Todos os componenete, nesse universo, são
colocados no mesmo nível de ser.
Outro conceito de revolução científica a ser destacado é o de Kuhn (1978) que o formulou com
base, entre outras ideias, na rejeição de transformação linear, em favor da ideia de revolução, com
sentido parecido ao de revolução política: quando se atinge o momento de uma revolução política, os
recursos disponíveis para resolver os problemas dentro do sistema político se esgotam e, pela
necessidade de transformar esse sistema, é preciso recorrer a meios externos à política como os de
persuasão e o da força – violência.
De forma parecida, quando se esgotam os recursos internos da ciência normal, é necessário
transformar o próprio paradigma que orienta as pesquisas, recorrendo a argumentos externos à ciência.
No período de “competição” entre paradigmas, estabelecem-se discussões de “surdos” a ponto de não
ser possível demonstrar que um paradigma é melhor que outro. É uma situação de não entendimento
não pode perpetuar-se. O autor define condições e estabelece conceitos para a se efetivar a transição, a
revolução científica, sintetizados na seção Thomas Samuel Kuhn.
Conforme diversos autores, a ideia da revolução científica como um fenômeno apenas europeu,
livre de influências externas, não é sustentável. Basta considerar os elementos levados à Europa
durante os períodos de navegações e ocupações de terras na América, na África e na Ásia, carregados
de conhecimentos provenientes de povos e culturas diversas, de lugares e tipos de naturezas diferentes.
Foram elementos que mudaram (ou que contribuíramn para a mudança) a mentalidade européia
herdada da Idade Média e sua visão de mundo.
Perante essa nova realidade era difícil resistir às contestações e reavaliações. Se a realidade do
mundo era tão diferente, como confiar em doutrinas enunciadas por quem ignorava tanta diversidade?
A resenha “histórica” que se apresenta não considera, apesar de relevantes, as influencias externas nas
revoluções científicas. Apenas se destaca o fato de serem revoluções ocorridas periodicamente, ao
longo da histeria das ciências, indicando-se como exemplos dessas revoluções:
a) Na antiguidade, o tratamento matemático na descrição dos movimentos dos planetas, iniciado e
sedimentado, para a época, pelos babilônicos e, depois (um novo paradigma), aperfeiçoado pelos
gregos. O sistema de classificação de seres vivos, introduzido por Aristóteles e, posteriormente,
aperfeiçoado por outros (outros paradigmas).
b) No período contemporâneo, a informática, na “sociedade conhecimento” e a nanotecnologia não
limitada apenas a conhecer a matéria em suas formas e funções elementares de átomos e
moléculas; de interações e organização (...), mas, a tomar decisões em qualquer escala e ter
acesso nas menores grandezas de milionésimos de milímetros para entender leis da natureza.
A mais importante revolução científica teve início com as descobertas de Galileu e Kepler, entre
outros pensadores do século XVII, quando a ciência, até então atrelada à filosofia, iniciou a sua
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
c) A reforma religiosa com reformistas que pregavam, entre outras ideias, uma forma de existência
de Deus através de descobertas científicas e, por isso, tais práticas cientificas foram incentivadas.
d) O hermetismo; ao pregar ideias quase mágicas, mas que exaltava a matematização do universo
encorajou o desenvolvimento e uso da matemática para relacionar grandezas e demonstrar
verdades essenciais. O desenvolvimento e difusão da matemática criaram um “ambiente propício
para o desenvolvimento de um método científico mais rigoroso, crítico e que modificou a forma de
fazer ciência” (WIKIPÉDIA, 2006).
Segundo Koyré (1961), a revolução científica representou o abandono, pelo pensamento
científico, de ideias baseadas no conceito de valor, como perfeição, harmonia, significado e objetivo,
substituindo-os por um universo indefinido (e até infinito) mantido pela identidade de seus
componentes e por suas leis.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Conforme se desenvolvia a linguagem surgiram experiências e opiniões que pareciam dar força e
poder. Nesse contexto surgiu o duplo caráter no espírito humano: o de esconder e quardar e o de dizer,
contrastar e impressionar. A cada faze do desenvolvimento da linguagem correspondeu a possibilidade
de criar e intensificar tradições de tabus, restrições e ceremônias.
Com o surgimento de vida pastoril, dar-se-ia um considerával aumento dessas práticas. O homem
neolítico era nômade, mas diferente do homem primitivo que vivia da sismples busca, durante o dia, de
alimentos.
Com a atividade pastoril, foi obrigado a ter um senso de direção e de posição; vigiava o seu
rebanho e o sol durante o dia e as estrelas à noite, o ajudavam a dirigir as suas migrações; depois,
percebeu que as estrelas eram guias mais fixas do que o sol. A agricultura lhe permitiu buscar e
aprofundaro senso de estação; com ela começou a acertar o mês lunar como o ano solar.
Por outro lado, o homem neolítico começou a contar suas posses acumuladas; a usar varas
marcadas com sinais para indicar os númeroos e relacionar sobre a triangularidade de três, quadratura
de quatro etc., observando que algumas quantidades como doze, eram fáceis de dividir, enquanto outras
como treze, impossíveis. Provavelmente começou a contar o tempo pelo relógio de luas cheias e novas.
A contagem mais primitiva registrada na história é a das luas e gerações (WELLS, op. cit.).
A capacidade de dizer e contar coisas aumentou com o vocabulário e assim a simples fantasias,
as habilidades fetichistas e os tabus do homem paleotítico começaram a ser manipulados e
transformados: começou a contar histórias e surgiu a mentalidade tribal e com ela a tradição.
O homem peleolítico, muito mais livre, artista e selvagem do que o homem neolítico que
chegava à prescrição e à educação desde a infância para fazer ou não fazer coisas: ter mais palavras e a
atender mais as palavras: aumentar a capacidade mental; as palavras do homem paleolítico eram,
sobretudo, nomes, enquanto que no homem neolítico, estimulava-se a faculdade de pensar sobre certo
número de coisas, tecendo, com a linguagem, redes com combinações mais largas e eficientes.Foram
grandes e significativas as transformações do homem com a agricultura, através de milênios
entrecortados de flutuações e interrupções (WELLS, op. cit.).
É possível que a primeira civilização tenha surgido na Mesopotâmia, onde, em torno de 3.500
a.C., os sumérios (sumerianos) desenvolveram as primeiras bases para seus empreendimentos culturais,
orientados de acordo com a visão de mundo da época; orientados para a sobrevivência em formas como
a de linguagem e caça; de fundação, conquista nômade e refinamentos, característicos da região do
Tigre e Eufrates de assombrosa fertilidade. Foram os sumerianos o primeiro povo a construir cidades e
fundar uma civilização, com uma escrita, gravada em grés ou barro, pela qual se lhes decifrou a língua.
Naquela região e época acreditava-se, p.ex., que a dor seria uma forma de punição; que as
doenças diagnosticadas e prognosticadas por adivinhações resultariam de interferências de deuses ou de
demônios no ser humano; e que a cura (p.ex., com resinas, temperos e extratos de plantas como a
papoula (Papaver rhoeaus), com propriedades narcóticas e da qual se extrai o ópio) poderia ser
proporcionada por orações, exorcismos (praticados por sacerdotes) e sacrifícios oferecidos aos deuses
(TEIXEIRA e OKADA, 2006; p. 17).
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
(doxa), depois se alcançaria um grau mais avançado das ciências (episteme) para só, então, atingir o
nível mais alto do saber filosófico.
Ao longo da história, com variáveis desdobramentos e influências, pode-se observar que as
ciências se constituíram numa atividade importante do desenvolvimento humano; no entanto, até o
século XVII, essa atividade teve pouca relevância para a vida. Diversos fatores entre outros, estruturas
sociais, econômicas e de poder contribuirão par a elitização do saber.
Considera-se o início da filosofia ocidental, no século VI a.C. na cidade de Mileto, Ásia Menor e
ponto de encontro entre o Oriente e Ocidente, com os primeiros filósofos milesianos Thales,
Anaximandro e Anaxímenes.
A síntese que segue destaca alguns aspectos, poucos, do nascimento da filosofia, em particular de
filósofos das ciências da Grécia Antiga (e de áreas de influências: Ásia menor e sul da Itália) dos
períodos arcaicos (séc. VIII a VI a.C.) e clássico (séc. V a IV a.C.).
Em outros povos e culturas, tais como China, Índia, Babilônia, Egito, América etc., houve,
também, consideráveis contribuições à filosofia e às ciências e tecnologias, ao método científico, sendo
propositadamente omitidas da síntese que segue, aceitando-se que que a filosofia ocidental tenha sido
einfluenciada por filósofos da Grécia Antiga; por filósofos iniciados no sécula VI a.C., em Mileto,
cidade no litoral jônico da Ásia Menor.
A síntese foi elaborada com base em pesquisa documental (CHAUI, 1998 e 2002; OS
PENSADORES: PRÉ-SOCRÁTICOS; FILOSOFIA DA CIÊNCIA, 2005; LLOYD, 1973;
COLLINSON, 2004; MARITAIN, 2001 e obras dos próprios pensadores relacionados na síntese, entre
outras fontes citadas no texto).
Tales de Mileto foi o fundador da Escola Jônica, a primeira escola filosófica grega que orientou o
pensamento para procurar o princípio básico do universo, a matéria-prima de que eram constituídas as
coisas. Essa orientação era feita com base na racionalidade, portanto, sem recorrer à explicação mítica:
elaboro um conjunto de proposições que, apesar de não apresentarem numa sequência lógica estrita ou
correta, estavam, ainda assim, relacionadas umas coim as outras de modo dedutivo, método requerido
numa pova geométrica (COLLINSON, 2004; p. 9).
Segundo Aristóteles, Thales, junto com seus discípulos Anaximandro e Anaxímenes, foi o
primeiro filósofo proponente de um sistema da natureza desenvolvido em torno do elemento
fundamental, a água: todas as coisas têm sua origem na água e a própria Terra flutuava nela (antiga
crença agípcia, parte da tradição homérica), uma pespectiva que foi discutida por Aristóteles, tersentos
anos depois, em sua Metafísica.
A segunda grande afirmação de Thales sobre a natureza do universo foi a de que todas as coisas
estão cheias de deuses, sem se ter um claro significado, porém a sua acepção mais comum é a de que
algum tipo de força vital permeia o mundo, que todas as coisas são de alguma forma animadas,
constituindo parte de um ínico conjunto, de uma vitalidade unificadora.
Thales tinha como principais características: a observação cuidadosa da natureza
(filósofo da natureza: poderia parecer mais uma teoria das ciências do que uma filosofia, mas seu
conteúdo filosófico e importância, foram elucidados por Nietsche) e o uso da razão para
explicá-la e para buscar uma substância universal, o princípio primordial (o arché,
em grego, do qual tudo deriva, identificado na água) que comporia todos os
objetos do universo; ainda que simplista ou insatisfatória, pela primeira vez,
busca-se uma solução racional desligada do mítico-fantástico.
Tales de Mileto foi, também, astrônomo, matemático, professor, comerciante e, possivelmente,
político. A ele é atribuída a criação da federação de cidades jônicas para a defesa contra o império Persa
e a obra O guia de navegação pelas estrelas. Seus principais discípulos foram Anaxímenes e
Anaximandro.
Possivelmente Tales de Mileto viajou ao Egito, conviveu com sacerdotes de Mênfis (o mais
importante centro urbano do Egito; capital dos reinos Antigo e Médio) e Eliópolis (destacado centro
religioso do culto solar do Egito) e estudou astronomia (segundo Heródoto, previu um eclipse solar, no
ano 585 a.C.), geometria (seus conhecimentos lhe permitiram conduzir navios e medir as pirâmides;
agrimensura e construções), manejo do solo e água (canais; tratou de assuntos como, p.ex., explicar as
inundações do rio Nilo, com base na tese de que os ventos sopravam contra o Egito e isso elevaria o
nível das águas) e “filosofia” (descrição e análise racional do mundo, sem explicações mitológicas)
(ENCICLOPÉDIA SIMPÓZIO, op. cit.).
Dizia Tales que o princípio de todas as coisas era algo que por todos podia ser observado na
natureza: a água: physis / natureza ou substância primeira, como princípio da unidade material; desse
princípio surgia todo, o movimento e a vida; seria a fonte originária e o processo de surgimento: o que
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
veio primeiro. Observou que esse elemento, a água, tudo fazia crescer e viver, enquanto que a sua falta
provocava a morte. Verificou que a água podia ser encontrada em diferentes estados.
Foi o introdutor na Grécia da matemática oriental por ele desenvolvida e aperfeiçoada e de mitos
cosmogônicos, em especial provenientes do Egito, aos quais deu um sentido racional. Dedicou-se à
matemática (p.ex., dele permanece o teorema de Tales: quando duas linhas retas se cortam, os ângulos
contrários pelo vértice são iguais) e estabeleceu os primeiros postulados da geometria. Estudou as retas
e os ângulos e fez demonstrações formais e rigorosas sobre a geometria do círculo e do triângulo
isósceles. A ele se atribui o cálculo da altura de uma pirâmide baseado no comprimento de sua sombra,
em determinado horário do dia e a demonstração de como medir a distância de um navio que se
encontra no mar.
Atribui-se a Tales a primeira medição exata do tempo com o relógio solar (gnômon) e a
construção de calendários astronômicos (parapegmas) com informações meteorológicas, sendo o
primeiro astrônomo a explicar o eclipse de sol. Um dos aspectos fundamentais de Tales era a
possibilidade de reformulação e correção de teses propostas, permitindo, assim, progredir e serem
repensadas e até substituídas visões do mundo, com base racional.
Em estas como em outras proposições, desafiava a aqueles que conhecessem suas ideias a
demonstrar que não tinha razão, com vontade de discuti-las racionalmente. Seu desprendimento pela
riqueza se mostra na frase: Tendo-lhe um discípulo perguntado, qual o preço do seu ensino, respondeu:
“reconhece aquele que te ensinou, e o terás pagado”.
Exaltou os valores conforme seu tempo, atribuindo-se a ele frases, tais como:
“Eu dou graças à Fortuna, por três coisas: ser membro da espécie humana e não uma besta; ser
homem e não mulher; ser grego e não bárbaro".
"Tendo-lhe perguntado um adúltero, se podia jurar não ter cometido adultério, contestou: Não é
pior o falso juramento, que o adultério?"
"Perguntou-se lhe, O que é o mais difícil? Respondeu, conhecer-se a si mesmo! E o que é mais
fácil? Dar conselhos! E o mais agradável? Ter êxito! Que coisas têm visto mais extraordinárias?
Que um tirano chegasse à velhice. Qual é o melhor meio para levar uma vida pura e virtuosa?
Evitar o que se afeia nos outros!. Qual é o homem feliz? Aquele que tem o corpo são, o espírito
culto e a fortuna suficiente. Qual é a mais doce consolação do infeliz? Ver o inimigo mais infeliz do
que ele" (ENCICLOPÉDIA SIMPÓZIO, op. cit.).
Sob a influência e no lastro de Tales de Mileto surgiram na Grécia outros pensadores e se deu
início a uma tradição que gradualmente se afastou de concepções míticas na explicação de fenômenos
naturais. Alguns desses filósofos são apresentados a seguir.
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Fundamentos da pesquisa
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Anaximandro acreditava que o princípio de tudo é algo infinito, tanto no sentido quantitativo,
quanto no sentido qualitativo, uma substância primordial, o ápeíron, algo insurgido e imortal; algo sutil
que era ao mesmo tempo o fim das coisas e a razão porque se movia conforme as leis. Esse princípio
que se suponha era sutil, insurgido (...), sem fronteira nem limite ou definição, substituiu o princípio da
água proposto por Tales. Sua preocupação estava orientada para os comos e os porquês das coisas: no
nascimento do mundo de uma semente de quente e frio se separou do Ilimitado e a partir disso uma
bola de fogo girou no ar em torno da Terra, como o casco de uma árvore. Acreditava que o tempo era o
"juiz" que permitia que ora existisse um, ora existisse outro.
As coisas se encontrariam em constante movimento e o que nascia do infinito a ele retornaria na
morte, existindo certo balanço ou estado de justiça, possivelmente por meio de interações entre
oposições cósmicas de quente e frio, de seco e úmido.
O problema ontológico do infinito iniciado com Anaximandro foi tratado ao longo da história e
da filosofia das ciências.
Perante algumas de suas afirmativas (p.ex., nada se explicaria exaustivamente no campo limitado
do finito, sem uma redução ao infinito; o problema estaria na multiplicidade; e esta, como se explicaria,
senão pela a unidade? o finito se prenderia à multiplicidade; e como se explicaria o finito e toda a sua
multiplicidade, senão pelo infinito?) e dos objetivos (saber, se o infinito é possível e como deve ser
entendido para que seja possível) de sua teoria como explicadora da formação da diversidade das
coisas, abriu-se a questão das mudanças em si mesmas, tendo no hilemorfismo de Aristóteles (isto é, os
corpos constituídos pelos quatro elementos de Empédocles, - fogo, ar, água e terra, mas
acrescentando-lhes matéria e forma, imaginando, com essa teoria, explicar as mudanças substanciais
das coisas: aplicação aos corpos da teoria do ato e potência), uma formulação particular. Kant
apresentou outra solução ao problema ontológico do infinito (ENCICLOPÉDIA SIMPÓZIO, op. cit.).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Depois da escola jônica fundada por Tales de Mileto e que deu origem à filosofia da Grécia
antiga, seguiu, pela ordem cronológica, a escola pitagórica ou escola itálica fundada por Pitágoras de
Samos.
Honra antes que nada aos Deuses imortais, na ordem que lhes foi assinalada pela lei. Respeita o
juramento. Honra também a teu pai e a tua mãe e a teus parentes próximos. Honra logo aos heróis
glorificados; venera assim mesmo aos Gênios terrestres, cumprindo tudo aquilo que é conforme às
leis. Entre os demais homens, toma por amigo aquele que se destaca na virtude. Cede sempre às
palavras de brandura e às atividades salutares.
Não chegues nunca, por uma culpa leve, a aborrecer o teu amigo, quando isto te for possível; porque
o possível reside próximo do necessário. Saiba que estas coisas são assim, e acostuma-te a dominar
estas outras, a gula primeiramente, e o sonho, a luxúria e o arrebatamento.
Jamais cometas ação alguma de que possas envergonhar-te; nem com outro, nem tu particularmente;
e, mais que nada, respeita-te a ti mesmo. Pratica logo a justiça em atos e em palavras.
Não te acostumes a proceder sem reflexão em coisa alguma, por pequena que esta seja. Mas recorda
que todos os homens estão destinados a morrer; e chega a saber por igual adquirir e perder os bens
da fortuna.
A respeito de todos os males que tem de sofrer os homens por obras dos augustos fados do Destino,
aceita-os como sorte que tens merecido; sobreleva-os com mansidão e não te molestes por isso.
Convém te pôr-lhes remédio, na medida em que esteja em tuas mãos fazê-lo; mas pensa bem nisto.
Que o Destino evita às gentes de bem a maior parte destes males.
Multidões de discursos, mesquinhos ou generosos, caem ante os homens; não os acolhas com
admiração, mas tão pouco te permitas desviar-te deles, porém se te advertes que dizem algo de falso,
sobreleva-o com paciência e mansidão.
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Quanto ao que te vou dizer, observa-o em toda a circunstancia: jamais alguém, nem com suas
palavras nem com sua suas ações, possa induzir-te a que profiras ou faças coisa alguma que para ti
não seja útil; reflete antes de agir, para que não leves a cabo coisas insensatas, já que é próprio dos
desditados proferir ou fazer coisas insensatas. Não faças nunca, portanto, coisa alguma de que possas
ter depois lugar a te afligir. Jamais empreendas coisa que não conheças; senão deverás aprender;
tudo aquilo que é preciso que saibas, com o que viverás a mais ditosa vida. Não deves descurar da
saúde de teu corpo, antes com medida conceder-lhe a bebida, o alimento, o exercício; e chamo
medida a aquilo que; jamais possa prejudicar-te.
Acostuma-te a uma existência decorosa, singela, e guarda-te de fazer tudo aquilo que possa atrair-te
invejas. Não faças gastos inúteis, como fazem os que ignoram em que consiste o formoso. Tão
pouco sejas avaro: excelente é em tudo a justa medida.
Jamais tomes a teu cargo empresa que possa prejudicar-te, e reflita antes de obrar; não permitas ao
doce sonho que se deslize sob teus olhos, antes que hajas examinado cada uma das ações de tua
jornada. Em que falte? Que fiz? Que omiti do que deveria fazer? Principia a recorrer tuas ações pela
primeira de todas, e logo se achares haver cometido culpas, admoesta-te; mas, se houveres agido
bem, regozija-te. Que omiti do que deveria fazer?
Com ordem e com tempo, encontra-se o segredo de fazer tudo e tudo fazer bem.
Ajuda a teu semelhante a levantar sua carga, mas, não a carregá-la.
O que fala, semeia, o que escuta, recolhe.
Pensem o que quiserem de ti; faz aquilo que te parece justo.
Educai as crianças e não será necessário punir os homens.
Esforça-te para pôr em prática estes preceitos, medita-os; é preciso que ponhas amor neles e eles te
porão sobre a pista da virtude divina.
Não comeces a tomar sobre ti nenhuma empresa, sem pedir aos Deuses que a terminem bem.
Quando todos estes preceitos te forem familiares, conhecerás a constituição dos Deuses imortais e
dos homens mortais; saberás até que pontos diferem entre si as coisas e até que pontos se reúnem.
Conhecerás, assim mesmo, na medida da justiça, que a Natureza é em tudo semelhante a si mesma;
de sorte que não esperarás o inesperado, e nada estará já oculto para ti. Saberás igualmente que os
homens escolhem por si mesmos e livremente os males; míseros, deles!, não sabem ver nem
entender os bens que tem junto de si.
Pitágoras, depois de viajar pela Pérsia, Gália, Creta, Egito (...), fundou e liderou em Cróton,
(Crotona), na Magna Grécia (sul da Itália), onde viveu a maior parte de sua vida, uma instituição que se
dedicou à prática religiosa e ao estudo: ciência, ética e política, composta por sábios, seus discípulos:
escola pitagórica. Essa instituição transformou a vida política da cidade de Crotona e por isso mesmo
progrediu, mas, ao se tornar excessivamente aristocrática e teocrática, provocou uma reação popular e a
dispersão de seus membros. Naquela escola se fazia a análise de um objeto qualquer como, p.ex., um
cubo, cujas partes estariam compostas de planos; estes, por linhas e as linhas por pontos, dispostos
numa relação precisa que seja a mesma para todas as formas semelhantes ao cubo.
Acreditava na reencarnação da alma (metempsicose) e aparentemente conversava com alguns
animais, afirmando reconhecer neles a alma de um amigo falecido. Considerava o saber como o
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
principal instrumento da purificação religiosa: “só amando a sabedoria podemos nos colocar em
sintonia com a harmonia do universo”.
A escola Jônica fundada por Tales de Mileto, e que deu origem à filosofia grega, foi seguida pela
escola pitagórica, fundada por Pitágoras, destacada e diferenciada da Jônica, pelo racionalismo: o
sujeito seria a fonte de representações que constituiriam o conhecimento, sem ser limitado ao
conhecimento empírico, ao conhecimento que não tratava de conceitos puramente racionais. Isto,
porque, o racionalismo pitagórico compreendia noções, tais como as de espaço, tempo, lugar, ação,
espírito, essência e existência em elementos não empíricos. A ciência dos números era a base da
filosofia pitagórica que representava não apenas a harmonia e regularidade, mas o próprio princípio das
coisas.
A escola pitagórica, sob profunda influência mítica (esotérica; Pitágoras era místico, além de
matemático), tinha o foco e interesse pelos números e pelo estudo de suas propriedades; conceitos
como a soma de pares e ímpares e de opostos de limitado e ilimitado, expressavam as relações que se
encontravam em permanentes processos de mutações, criando a teoria da harmonia das esferas.
Acreditava-se, nessa escola, que o cosmo era regido por relações matemáticas e aos números
eram atribuídos significados míticos e religiosos; portanto, que o fundamento e causa de cada coisa,
residia no número, tendo uma dimensão especial, um ente intermediário entre a aritmética e a
geometria.
O que Pitágoras ensinava aos seus pares na escola por ele fundada ninguém pode dizer com
certeza, pois se estabeleceu como norma observar profundo silêncio. Entretanto, são conhecidas
algumas ideias como, p.ex., a aceitação do conceito universal da alma ser imortal; da alma que migraria
para o corpo de outras criaturas vivas, conforme registro de Dicearco, discípulo de Aristóteles.
Se a alma é imortal e se ela migra entre pessoas e outros tipos de criaturas vivas, então algo deve
permanecer. Daí se segue que, p.ex., ao matar e comer um animal poder-se-ia estar matando a nossa
própria espécie. Por conta disso, os pitagóricos desenvolveram prescrições relativas ao abate de
animais, bem como proibições destinadas a manter a pureza da alma (COLLISON, 2004).
Pitágoras reduziu o acorde musical a uma proposição matemática e, desse modo, chegou à ideia
de que “os números são o princípio, a fonte e a raiz de todas as coisas”. Da racional concepção de que
tudo era determinado segundo relações numéricas, passava-se a visão fantástica do número como
essências das coisas. Descobriu vários resultados matemáticos importantes, alguns perduram, tais como
o teorema de Pitágoras da geometria. A tábua de multiplicação de dupla entrada. Essa tábua podia
representar as ideias contraditórias; estava composta por dez princípios que governariam as atividades
humanas; esses princípios eram: o limitado e ilimitado, o ímpar e o par, o uno e o múltiplo, à direita e a
esquerda, o macho e a fêmea, o repouso e o movimento, o reto e o curo, a luz e a escuridão, o bem o e
mal e o quadrado e o retangular, descritos por Aristóteles. A tábua podia-se adaptar a qualquer lei de
composição.
Seus estudos matemáticos de Pitágoras eram de valor o que mostra como a ciência e a religião
estavam misturadas nos primeiros tempos. Segundo relato de Aristóteles, os números definidos foram
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atribuídos às coisas, como no caso, p.ex., do casamento representado pelo número cinco, resultado da
soma de três, o primeiro número masculino, e de dois, o primeiro número feminino. Os números
representariam, também, as formas das coisas: o um seria um ponto, o dois, uma linha; o três, uma
superfície;e o quatro, um sólido.
Pitágoras também estimulou o desenvolvimento de outras ciências; é o caso, p.ex., de seu
discípulo, o “médico” Alcmleton, estimulado a e estudar os órgãos dos sentidos; este, por dissecções
anatômicas, demonstrou que era o cérebro e não o coração o centro das sensações e da razão
(TEIXEIRA E OKADA, 2006; p. 19).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Heráclito estabeleceu sua filosofia na base de que o universo é uma eterna transformação, onde
os contrários buscam o equilíbrio a ser iniciado por: só o ser é e por ser é verdadeiro; contudo, a
verdade do ser é o devir, um princípio. Todas as coisas mudam sem cessar, e o que se tem em um
determinado momento pode ser diferente do que foi há pouco e do que será depois; dessa forma, não é
possível ser estático. O ser é múltiplo e constituído de oposições internas.
O que mantém o fluxo do movimento não é o simples aparecimento de novos seres, mas, sim a
luta dos contrários, de opostos ideais (a lógica pura) e reais (filosofia da natureza 9), cuja síntese é a
harmonia com sua unidade no infinito.
A harmonia é o absoluto devir, a permanente transformação que permite que cada partícula e
cada ser sejam diferentes de outros, não de qualquer outro absoluto, mas, de seu outro; assim, cada um
é conforme o outro esteja consigo, no conceito.
A essência da harmonia, da qual faz parte não apenas a diferença, mas o surgir e o desaparecer
(...) foi a base da sentença de Heráclito: o não ser é, por isso é o não-ser, por isso é o ser: a verdade da
identidade de ambos no princípio do devir, da mutação ou vir-a-ser. Dessa forma, os opostos são
atributos do mesmo objeto como, p.ex., o mel é doce (para os sãos) e amargo (para os que sofrem de
icterícia), possibilitando ligar o ser e o não-ser ao mesmo objeto. O equilíbrio de opostos seria a razão
universal (logos), a lei fixa que regeriam os planos cósmicos e humanos com base na harmonia
universal.
Heráclito concebeu o próprio absoluto como um processo, como a própria dialética, um princípio
tanto exterior (um raciocínio de cá para lá e não a essência da “coisa”) como imanente do objeto
(contemplação do sujeito). A intuição dessa lógica dialética, dois milênios mais tarde, foi elaborada por
Hegel e Marx, no século XIX.
Do princípio lógico ou universal de Heráclito se têm frases como: o ser não é mais que o não-ser,
nem é menos, portanto, o ser e nada é o mesmo e a essência de tudo é a mudança; o verdadeiro é
apenas uma unidade dos opostos; o entendimento que se tem é abstrato, isto é, do ser que é; tudo flui,
nada persiste, nem permanece o mesmo; segundo Platão, Heráclito: comparou as coisas com a
corrente de um rio - que não se pode entrar duas vezes na mesma corrente; tudo é devir; significa que
“não há um sujeito estável e permanente, idêntico a si mesmo”. Esse devir é o princípio, na expressão:
"O ser é tão pouco como o não-ser; o devir é e também não é".
As determinações opostas estão ligadas numa unidade; nela se tem o ser e, também, o não-ser;
dela faz parte não apenas o surgir, mas, também o desaparecer.
sentidos, pois o que se observa como as árvores crescem, os rios correm etc., mudanças que são ilusões
dos sentidos; a essência é uma, imutável que nega o movimento, sendo a razão a única forma de se
chegar à verdade, ao conhecimento.
Ideias, como a identidade absoluta do Ser, foram apresentadas em seu poema Sobre a Natureza
mediante o conhecimento do que seria verdadeiro, racional e universal: a alétheia, isto é, o não-
esquecido, o não-oculto, o visível aos olhos do corpo e do espírito, o verdadeiro, a manifestação do que
é ou existe tal como é.
Esse é o pensamento da filosofia da Escola Eleática, da filosofia de Parmênides, com ideias mais
metafísicas do que científica. Nessa Escola e filosofia, o caminho que é possível seguir, pela razão,
para atingir o Ser é Uno, indivisível, imutável e intemporal.
Para atingir o Ser, segundo Parmênides, seria necessário desvencilhar-se dos sentidos, pois o
verdadeiro não pode ser percebido pelo campo sensorial do conhecimento sensível, pela via da opinião
e dos sentidos os quais trazem apenas ilusões. O verdadeiro, nesse contexto, é fruto do pensado e da
razão; é o conhecimento racional; essa é a via da verdade e por essa via se deve transitar para conhecer
a verdade. Assim, segundo Parmênides, o “Ser que é pensado e que é verdadeiro existe, pois só é
possível pensar sobre algo que tem existência e pode ser nomeado, dito e persuadido; fora desse
caminho, pela opinião, o homem se afasta do verdadeiro”.
A opinião era outro caminho; o caminho do não-ser, do nada, do inominável e impensado, do que
deve ser rejeitado. O não-ser é o que se capta do campo sensorial com apenas ilusões; é o campo da
doxa, isto é, crença; relativo ao conhecimento que se sustenta em certeza injustificada; opinião;
conceito dogmatizado que não permite dúvida da incerteza, oposto a alethéia, ao Ser, à vida da
verdade, da razão, do indivisível, imutável e intemporal. Seria nessa rota que se deveria caminhar,
concluindo: "O Ser é e o não ser não é" (contrária à máxima de Heráclito), sendo esta a máxima que
deveria nortear todas as discussões ulteriores sobre o Ser.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
estendido até o infinito ou não; caso ele possa continuar, ter-se-ia um número infinito de partes
compondo um segmento finito de tempo; caso não, ter-se-ia um segmento de tempo que não poderia
ser dividido; ambas alternativas seriam inaceitáveis: como pode um número infinito de subdivisões
estar compreendido em um segmento finito de tempo? Ou como poderia existir um segmento de tempo
indivisível?
Acreditava que o universo é uma unidade homogênea e que, portanto, não poderia existir o
espaço formado por elementos descontínuos. Demonstrava o absurdo da tese segundo a qual as
magnitudes constam de uma infinidade de pontos descontínuos; a soma dos mesmos deveria ser tão
pequena que não existiria uma magnitude; a segunda tese é a de que as magnitudes compostas de uma
infinidade de pontos contínuos, com determinadas magnitudes, de tal forma que a soma dos mesmos
poderia ser infinitamente grande.
Inventou a demonstração do absurdo, a partir de argumentações do adversário tomadas como
hipóteses e que mediante hábeis deduções conduziria o adversário a aceitar a tese da contradição. Seus
principais argumentos eram os contras da pluralidade como estrutura do real; da validade do espaço; da
realidade do movimento e da realidade do transcorrer do tempo. Os sofismas de Zenón são traços que
se conservam do pensamento infinitesimal, desenvolvido muitos séculos depois por Leibniz.
Sócrates foi quem valorizou a descoberta do homem feita pelos sofistas, orientando-o para os
valores universais, segundo o pensamento grego. Postulou a dúvida metódica como princípio do
método, sintetizado como: nada deve ser considerado certo sem antes passar pelo tribunal da razão;
seria "o meio de se passar de uma verdade de ordem espontânea para uma verdade de ordem reflexiva;
de uma verdade natural, para uma verdade científica". Como amigo da verdade e inconformado com as
inverdades de seu tempo praticou uma filosofia investigativa e reflexiva. Acreditava que a
incapacidade para encontrar respostas completas e adequadas aos problemas não era justificativa para
se conformar com a ignorância ou se limitar ao aparente.
Acreditava que o objeto da ciência não era o sensível, particular e o indivíduo que passa; devia
ser algo inteligível, o conceito que se exprime pela definição. Tal conceito seria obtido por um
processo dialético, a indução, consistente em comparar vários indivíduos da mesma espécie, eliminar-
lhes as diferenças individuais, as qualidades mutáveis e reter-lhes os elementos comuns, estáveis e
permanentes a natureza e essência da coisa. Dessa forma, a indução socrática não teria o caráter
demonstrativo que se tem no moderno processo lógico, que vai do fenômeno à lei, do particular ao
geral (...), mas seria um meio de generalização, que remonta o indivíduo à noção universal.
Enquanto os filósofos pré-Socráticos, os naturalistas, procuravam responder o que era natureza
ou o fundamento último das coisas, Sócrates, procurou a resposta em o que era a natureza ou a
realidade última do homem. Sua resposta era: a alma - psyché, porque seria a alma que distinguiria o
homem de qualquer outra coisa, dando-lhe, em virtude de sua história, uma personalidade única. Pela
psyché era possível entender a condição: racional, inteligente e ética, isto é, a consciência e a
personalidade intelectual e moral do homem. “Relacionava a busca da verdade com a busca do
conhecimento: o agir mal é não saber”.
Defendia que os detentores do conhecimento deveriam compartilhá-lo gratuitamente com as
outras pessoas, pois o saber é recebido gratuitamente e dessa forma não deveria ser trocado por
dinheiro. A busca da verdade, a busca do conhecimento era uma questão ética a ser orientada para uma
vida melhor. Seu interesse profundo e persistente estava voltado para as questões éticas e humanas às
quais dedicou seus esforços após a resposta do Oráculo de Delfos ao pronunciamento de Xenofonte,
no sentido de que nenhum homem vivo era mais sábio que Sócrates. Após disso se viu compelido,
segundo Platão em sua obra Apologia, a “persudir cada homem de que podia olhar para si mesmo e
procurar a virtude e a sabedoria antes de olhar para seus interesses pessoais, e olhar para o Estado antes
de olhar para os interesses do Estado; e esta deve ser a ordem a observar pelo homem” (COLLINSON,
op. cit.).
Enquanto os sofistas sustentavam que todo era relativo; o conhecimento era da própria
elaboração do homem; as opiniões mudam de indivíduo para indivíduo; “o homem era a medida de
todas as coisas”; Sócrates afirmava que existiam princípios absolutos, verdades eternas, leis morais
imutáveis e iguais para todos e que a vida humana merecia e devia ser vivida em obediência a tais
valores éticos. Para tal propósito, acreditava que “a filosofia não ensina a verdade, mas ajuda ao
indivíduo a descobri-la; não oferece soluções, mas apenas é um método para raciocinar a partir de si
mesmo; a verdade é uma conquista pessoal”.
62
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
A incitação à introspecção, segundo Sócrates, era uma atitude permanente e podia ser sintetizada
no lema do conhecimento e padrão de vida do sábio: conhece-te a ti mesmo, máxima de vida e
manifestação para que a pessoa tivesse consciência de sua ignorância e um estímulo / oportunidade de
se aperfeiçoar na busca da sabedoria; bem como para pensar o bem viver que era o desejo da ciência
mediante a prática da virtude: sua tese: “não é possível conhecer algo sem reconhecer a própria
ignorância sendo a presunção de saber o maior obstáculo ao descobrimento: o ignorante supõe saber
tudo, enquanto que o sábio sabe que não sabe, admite que não saiba. Outra máxima que orientou sua
vida foi: “A perfeição moral consiste em nos elevar acima das fraquezas da natureza, em resistir aos
apetites orgânicos e tornar a alma senhora do corpo (...)”; nesse contexto seria necessário sacrificar os
interesses e os prazeres ao dever moral. Aristóteles escreveu que duas coisas podem seguramente ser
atribuídas a Sócrates: o raciocínio por indução e a definição de universais. Xenofonte, em Memórias
de Sócrates, relacionou conceitos (universais), tais como: o que é pio e ímpio; honorável e vil; justo e
injusto, sabedoria e ignorância, coragem e covardia e Estado e comunidade política, entre outros
(COLLINSON, op. cit.).
Sócrates foi o fundador tanto da ciência em geral, associando o conceito conhecimento ao de
virtude (ignorância ao de vicio) como, em particular, da ciência moral, mediante os conceitos de ética
e ação racional. Apesar da ênfase na filosofia moral, as discussões socráticas foram esclarecendo tanto
questões formais do conhecimento (lógica) como da validade de seu conteúdo (gnosiológico, ramo da
filosofia que se preocupa com a validade do conhecimento de forma mais abstrata do que a
epistemologia, em função do sujeito cognoscente; COMTE-SPONVILLE, 2003, p. 267). É mais
abstrata que a epistemologia (trata menos o conhecimento e mais as ciências em particular).
Defendeu a validade do conhecimento não feita com simples afirmação dogmática, mas, com a
prática do pensamento crítico, seguida do exercício da dúvida metódica sintetizada na frase sei que
nada sei, consagrada, depois, por Descartes. Foram discussões que levaram ao conceito de ciência
como um conhecimento voltado para o mundo humano e espiritual, com fins práticos (úteis) e morais
(felicidade).
O fundamento do método socrático para a prática da ciência partia do contínuo fluxo das coisas e
da variabilidade das impressões sensitivas de indivíduos em constantes transformações: seriam os fatos
da realidade objetos da ciência. Contudo e, apesar da impossibilidade de se ter um saber absoluto e
objetivo desses fatos e do ceticismo com respeito à cosmologia e à metafísica, admitiu que a única
ciência possível e útil fosse a ciência da prática dirigida para valores universais. Isso significava que o
agir e o conhecer humano, os objetos da ciência, deveriam estar baseados em normas objetivas e
transcendentes à experiência.
Definia o objeto da ciência como algo que não era sensível, nem particular e individual, mas, o
que fosse inteligível, um conceito ou ideia geral que se exprimiria na definição e se obteria por um
processo dialético. Esse processo seria a indução; um método (processo) de generalização que levaria o
indivíduo (o singular) à noção universal, capaz de gerar um resultado único, possível e com finalidade
prática e moral (bem-estar) de valor universal. O processo da indução compreenderia e diferenciaria
relações entre os dados para descobrir elementos comuns sem, contudo, examinar normas formais que
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regem esse processo. Coube aos modernos filósofos como Locke e S. Mill o desenvolvimento
(complementação) desse conceito, da indução.
É importante destacar que a análise de casos particulares para atingir um conhecimento geral
(processo indutivo), a crítica desse conhecimento e a elaboração do conceito definição (seus elementos
e como chegar a ela) representaram grande avanço no campo da metodologia de investigação.
No método socrático a discussão se desenvolvia em duas fases ou tempos: a ironia (que em grego
tem o sentido de perguntar) e a maiêutica (em grego significa arte de dar a luz; no contexto em que
Sócrates a utilizou possivelmente fosse uma homenagem a Fenáreta, sua mãe, que era parteira; seu pai
foi o escultor Sofronisco). A ironia ou dúvida fictícia e metódica consistia em perguntar, fingindo
desconhecer o assunto (aparente humildade de ignorância) até levar o interlocutor a contradição, refutar
a tese contrária e preparar a tese verdadeira. A maiêutica era um processo em que cada qual,
devidamente orientado, devia encontrar a verdade mediante suas próprias forças. Consistia em levar o
interlocutor a descobrir paulatinamente o conhecimento sobre o objeto de discussão, na suposição de
que as ideias existem, são inatas. Seria necessário apenas fazer recordá-las, despertar os conhecimentos
virtualmente possuídos. Neste sentido, nada seria ensinado ou transmitido, mas, apenas se ajudaria à
pessoa para obter de se opiniões próprias e limpas de falsos valores, acreditando que o verdadeiro
conhecimento deve vir de dentro (gerado e parido, engenhosa obstetrícia do espírito, segundo alguns
historiadores) e ser capaz de revelar o verdadeiro discernimento, de acordo com a consciência. Dessa
forma, o professor só podia orientar e esclarecer dúvidas, conduzindo o processo de aprendizagem, um
processo interno e tanto mais eficaz quanto maior for o interesse de aprender, de modificar o
comportamento pela aprendizagem.
Sócrates, por meio de perguntas, estaria destruindo o saber constituído, para depois reconstruí-lo
na procura da definição, do conceito. Posteriormente, seu discípulo Platão, o aperfeiçoaria e
transformaria em dialética.
A indução e a dedução desenvolvidas por Sócrates (há controvérsias acerca dessa origem)
fortaleceram à lógica, não apenas para estabelecer a distinção entre esses conceitos, mas, para associá-
los no silogismo 10. (há, também, controvérsias acerca da origem desse processo). Dessa forma, o
argumento que procedia de fatos isolados e sem organização, passou a ter origem em fatos semelhantes
e organizados. Foram os primeiros sinais ou suportes de uma argumentação ordenada.
A essência da doutrina filosófica socrática buscava, com base no seu método da ironia e
maiêutica, despojarem a pessoa da suas falsas ilusões de saber. Tinha como lema, repetindo: conhece-
te a ti mesmo, uma incitação à introspecção e à conscientização acerca da ignorância, o ápice da
sabedoria, que é o desejo da ciência mediante a virtude e que se constituiu um princípio de sua vida de
sábio e virtuoso, pois o objetivo constante de Sócrates era aprender a viver virtuosamente,
argumentando que cada pessoas buscava o próprio bem, podendo-se enganar ou ingnorar no que
consistia esse bem; ao buscar somente o bem, descobriria-se que este não poderai causar mal: todo
comportamento ilegal ou imoral é um errop e o conhecimento é a virtude. Outro lema, complemento ou
alternativa do primeiro, era: só sei que nada sei, pressuposto de seu método. Acreditava que com a
sabedoria do reconhecimento da própria ignorância se tinha um ponto de partida para procurar o saber.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Isto, por sua vez, debilitaria a vaidade e permitiria, assim, que a pessoa estivesse mais livre de falsas
crenças e mais susceptível a extrair a verdade lógica que estava dentro de sua psyché.
O conceito, o juízo e o raciocínio, considerados dentro de um enfoque formal, são assuntos da
lógica que foram desenvolvidos, em parte, por Sócrates. Um conceito implica sempre abstração;
também poderá ser o resultado de um raciocínio indutivo. Abstraídos os indivíduos, resta a essência
dos mesmos; então, a essência passa a ser o conteúdo de um conceito universal obtido por indução.
Mas, o conceito não expressa apenas a essência da coisa, aquilo que a define, mas, as sua própria
definição.
O conceito é complementado com as ideais reais, universais, segundo o pensamento de Platão,
bem como inspirado nos números reais da escola de Pitágoras e nos argumentos de Heráclito sobre a
verdade para a persuasão de que todas as coisas são sensíveis e que estão em um fluxo perpétuo. Dessa
forma, se há ciência e conhecimento de qualquer coisa, devem existir outras realidades, além das
coisas sensíveis; seriam realidades estáveis, porque não há ciência daquilo que se encontra em
perpétuo movimento.
As finalidades do diálogo socrático (período antropológico, quando a filosofia tratava questões
humanas: a ética, a política etc.) eram a catarse (purificação; segundo Aristóteles, era a purgação de
paixões por meio da arte que permitia a expansão em objetos fictícios; o método catártico como sendo
terapêutica psicanalítica; consiste em livrar o sujeito de suas perturbações, quer mediante revogação à
consciência da ideia cujo recalque as produziu, quer mediante a ab-reação) e a educação para o
autoconhecimento, acreditando que ensinar o homem é cuidar de sua própria alma.
Autoconfiante no que falava e acreditava com poder para mudar a opinião dos ouvintes e a
“dele”, mediante a retórica. O ponto de partida para o diálogo era o mesmo para todos: saber que não
sabia. Acreditava que as ideias fluíam mais facilmente nos diálogos do que na escrita.
A parte culminante da filosofia socrática é a moral em que ensina a bem pensar para bem viver
como o único meio para alcançar a felicidade ou a semelhança com Deus, fim supremo do homem,
mediante a prática da virtude. Essa prática que se dá e é motivada pela sua utilidade, é adquirida com a
sabedoria.
Considerou a moral como o fim da filosofia; no entanto, para atingir esse fim, era necessário
conhecê-la. Para construir uma ética era necessária uma teoria; mas, se o fim da filosofia é prático, o
prático depende, por sua vez, do teórico; isto, porque o homem tanto opera (prático) quanto conhece
(ciência), associando à moral no lema: virtuoso é o sábio, malvado, o ignorante. Nessa frase aparecem
vários conceitos que foram tratados por Sócrates, tais como ética, bem / bem-estar, e utilitarismo,
entre outros.
Sócrates é considerado o fundador da ética, um padrão do ser humano, de bom cidadão,
moralmente rígido sem radicalismo nem ascetivismo. A ética é do direito natural, como uma
propriedade que surge da natureza e se exprime no fundamento de normas positivas, acreditando que
na análise e operações das coisas, nenhum homem pode senão querer o bem e mesmo quando quer o
mal, procura-o na suposição de buscar um bem. Neste sentido a ética é finalística (teleológica,
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conservada por mais de dois milênios, até Kant) e toda a finalidade, como norma, tem como propósito
último a felicidade. O utilitarismo decorre da ética da felicidade: as coisas são úteis na medida em que
produzem a felicidade e são medidas pelo útil; o mal ocorre na ação que prejudica a felicidade e
conduz ao interesse pessoal.
Sócrates reconheceu, acima de leis mutáveis, a existência de uma lei natural, universal e fonte
primária de todo direito positivo, do direito formado pelo conjunto da legislação vigente em
determinada sociedade, nação ou estado, que contém regras de conduta e de organização coativamente
impostas, bem como expressão da vontade divina promulgada pela voz interna da consciência de cada
um. No balanço de valores hierarquizados estabeleceu, no nível inferir, as vantagens exteriores de
saúde, beleza, riqueza (...), seguidas dos prazeres do corpo e da sensibilidade ligados aos sentidos. A
seguir colocou a liberdade de paixões e instintos, submetendo-os à razão. No topo dessa escala colocou
a sabedoria e as virtudes suficientes para tornar o homem feliz.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
mecânica da sensação e no suposto da alma ser composta por átomos como qualquer outra coisa,
acreditava que a sensação deveria consistir no impacto dos átomos externos sobre os átomos da alma.
Nesse caso, os órgãos dos sentidos seriam passagens (póroi ou poros) através dos quais os átomos
externos se introduziriam no corpo para gerar as sensações. No contexto teórico do conhecimento,
segundo Demócrito, os objetos da visão não são exatamente as coisas que se percebem, mas, apenas as
imagens (deíkela, eidôla) que os corpos emitem (emanações ou aporroai) constantemente.
Afirmava que por convenção (nómo) "há o doce e o amargo; há o quente e o frio; por
convenção”, porém, o que existe na realidade são os átomos e o vazio (etee). Pelo sentido, dizia, "não
se conhece nada de certo, mas, somente alguma coisa que muda de acordo com a disposição do corpo e
das coisas que nele penetram ou lhe opõem resistência”. Dessa forma, concluía: “na se pode conhecer
verdade da realidade (...), pois a verdade jaz num abismo”.
A concepção de Demócrito sobre o comportamento está baseada em proposições, tais como: “a
boa disposição ou bem-estar” “a felicidade não reside em rebanhos, nem em ouro”; “a alma é a moradia
do dáimon” (um aspecto da espiritualidade de Sócrates; a experiência de uma presença divina dentro de
si); “o melhor para o homem é levar a vida com o máximo de alegria e o mínimo de aborrecimentos” ;
“quem escolhe os bens da alma, escolhe os mais divinos; quem escolhe os bens do tabernáculo (isto é,
do corpo), escolhe os humanos”.
A saúde, para ele, é resultado da harmonia entre os quatro humores [sangue, muco, bile amarela
e bile negra; a dor seria sentida quando um desses humores estivesse em déficit ou em excesso
(discrasia); TEIXEIRA E OKADA, 2006; p. 19] presentes no corpo humano e os quatro elementos
fundamentais (calor, frio, umidade e secura), bem como da interação da pessoa com o meio,
destacando quatro fatores: higiene, dieta, exercícios físicos e clima, além de outras circunstâncias a
serem levadas em consideração na avaliação da saúde.
Acreditava que o adoecimento obedecia a três estágios facilmente reconhecíveis por um
observador atento: degeneração (desequilíbrio) dos humores, cocção e crise. Conforme as quantidades
relativas presentes no corpo desses humores ter-se-iam estados de equilíbrio (eucrásia) ou de doenças e
dor (discrasia).
Em sua época caracterizada pela divisão em classes sociais uma delas as dos escravos
desprovidos de direitos, fez surgir regras como a do respeito pela vida humana seja ela de homens
livres, escravos, mulheres ou crianças.
Notabilizou-se, sobretudo, por defender a causalidade natural das doenças, escrevendo em A
doença sagrada:
“nenhuma doença é mais humana ou mais divina que as outras; todas têm uma causa natural”, rejeitando,
dessa forma, as concepções sobrenaturais ao afirmar: “o homem é uma parte do Cosmo e só a natureza
pode preservar e curar os seus males”.
ParaHipócrates, saúde significava o estado perfeito de harmonia das forças, seu completo
equilíbrio. Afirmava que o corpo é um todo harmonioso e cujas partes se mantêm numa dependência
mútua e onde os atos são solidários uns com os outros, comunicando-se. Dizia: “e xiste uma força
vital curativa com a qual o médico tem de contar”. Afinal, “não é o médico quem cura doenças: ele
deve ser o seu intérprete”.
Hipócrates não dava importância à classificação das doenças, levando muito mais em conta a
pessoa e seu contexto, seu meio ambiente. Quanto à terapia, era parco no uso de medicamentos,
interferindo somente nos momentos considerados necessários, quando a natureza o indicar. Ficou
muito conhecido no seu tempo por sua honestidade científica e na relação com os pacientes e seus
familiares, insistindo na necessidade de se trabalhar com a verdade e de se fazer a leitura do
prognóstico do estado de saúde. Com tais postulados de vida e a prática dos mesmos foram
estabelecidas as bases da ética nas relações entre médicos, entre médico e discípulos e entre médicos e
pacientes.
Hipócrates de Cós é o autor do juramento do médico. 11 Criticou o simplismo (além da
superstição) de fatores apontados como as causa de mortes e doenças defendendo que as doenças
tinham causas naturais. Acreditava que o cérebro era a sede da mente e, em relação a isso, escreveu:
Deveria ser sabido que ele é a fonte do nosso prazer, alegria, riso e diversão, assim como nosso
pesar, dor, ansiedade e lágrimas, e nenhum outro que não o cérebro. É, especificamente, o órgão que
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
nos habilita a pensar, ver e ouvir, a distinguir o feio do belo, o mau do bom, o prazer do desprazer. É
o cérebro também que é a sede da loucura e do delírio, dos medos e sustos que nos tomam, muitas
vezes à noite, mas ás vezes também de dia; é onde jaz a causa da insônia e do sonambulismo, dos
pensamentos que não ocorrerão, deveres esquecidos e excentricidades.
A obra de Hipócrates foi reunida por seus discípulos no Corpus hippocraticum / Coleção
Hipocrática, considerada como a enciclopédia médica da Antiguidade, composto por 72 livros
(diversos tratados) dos quais sete tratam de ética (Juramento, Lei, Da arte, Da antiga medicina,
Da conduta honrada, Dos preceitos e Do médico). Esta obra é considerada entre as primeiras que
abordam a medicina como ciência natural e experimental, separando-a da filosofia, da especulação
abstrata para colocá-la na trilha do estudo racional: recooreu à razão para avaliar dados extraídos da
experiência e estebleceu passos a serem seguidos, tais como: descobrir os sintomas ou sinais da
doença; depois, o diagnóstico ou identificação da moléstia; em seguida, a terapia ou os meios de cuar.
Propunha exercícios respioratórios, ginástica, dietas, massagens e sangrias, entre outros, como métodos
de tratamentos.
Na Coleção Hipocrática, além de definições de quatro humores, dos quatro elementos
fundamentais e dos fatores de interações do homem com o meio, considerou o cérebro como uma
glândula capaz de secretar muco para regular o calor humano e centro do pensamento, das sensações.
Estabeleceu o conceito de doença como um processo natural, sendo algumas intratáveis. Fundamentou
a racionalização da interpretação dos sintomas, valorizando o relato do doente. A cura seria baseada em
modelos físicos como, p.ex., substâncias como o mecon, possivelmente a base de ópio, e não o meio
espiritual. Entre as obras mais importantes do Corpus hippocraticum mencionam-se:
Aforismos, composto de sete seções; centrado no homem e atento à observação da natureza; o
primeiro aforismo na maxima latina de ars longa vita brevis observa que a vida é curta para
que aprender toda sua arte; em outro aforismo, afirma que as moléstias causadas por
vrepleção se curam por bdepleção e viceversa: cura pelo opostos, servido de base para definir
outros aforismos.
A doença Sagrada; um tratado sobre a epilepsia em que revela o conhecimento dominante de
anatomia na Grecia Antiga; indicada que a causa era a falta de ar que afetava o cérebro e as
extremidades através das veias.
As Articulações; descreveu o uso do chamado banco pipocrático para o mtratam,ento de
luxações
Tratado do prognóstico; o médico apenas poderá predizer a evolução de uma doença mediante
a observação de um número suficiente de casos.
O tratado dos ares, das águas e dos lugares; apontava os fenômenos climáticos e
geográficos como propiciadores de moléstias; no invés de atribuir uma origem divina às
doenças, definiu as suas causas ambientais; sugeriu que considerações como clima, água e
situação de um lugar em que os ventos fossem favoráveis seriam elementos para avaliar o
estado de saúde geral de uma população.
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Fundamentos da pesquisa
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a) observar; grande parte da “arte médica” consiste na capacidade de observação feita sem nenhum
tipo de preconceito ou julgamento, com atenção e aberto aos relatos, explícitos e implícitos, do
paciente;
b) estudar o doente e não a doença; este princípio assentou as bases da holística; para a
compreensão da saúde / enfermidade não se divide a pessoa em sistemas ou órgãos, mas, avalia-
se em sua totalidade sintética;
c) avaliação com honestidade e devida atenção à leitura prognostica de causas do problema;
c) ajudar a natureza; a função precípua do médico é auxiliar as forças naturais do corpo para
conseguir a harmonia, a saúde.
Hipócrates foi, também, o primeiro a descrever formas alternativas de abordar a terapia, com
base em princípios, tais como:
a) Similia similibus curantur; semelhantes são curados por semelhantes, base terapêutica da
homeopatia.
b) Contraria contrariis curantur; contrários são curados por contrários, sendo este um princípio
seguido por Galeno que estabeleceu as bases da alopatia.
Exemplos de aforismos de Hipócrates são: “todo acontece conforme a natureza”; “a cura está
ligada ao tempo e às vezes, às circunstancias”; “para os males extremos, só são eficazes os remédios
intensivo”; “que seu remédio seja seu alimento, e que seu alimento seja seu remédio”; “a vida é breve,
a ocasião fugaz, a experiência é vacilante e o julgamento é difícil”; “ha verdadeiramenta duas coisas
diferentes: saber e crer que se sabe; a ciência consite em saber; em cre que se sabe reside a ignorância”.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Outros temas abordados em A República foram: A alma humana (psikê) composta de três partes
(apetite, coragem e razão). A justiça (dikê) como a distribuição equânime da igualdade, porém
reconhecendo em cada seu valor na sociedade segundo a natureza das coisas. Propriedade e família
destacando os conflitos devidos às diferenças de classes rivais indicando, para a sociedade ideal, suprir
as desigualdades entre cidadãos.
Do período da velhice de Platão são destacadas as obras (CHAUI, 2005):
Crítias: considerada uma obra inacabada; nela delineou um estado agrário como ideal.
Filebo: sobre o prazer.
Leis: sobre o ideal político.
Político: sobre a monarquia.
Sofista: contra os sofistas.
Timeu: sobre a natureza física e cosmologia.
O ponto de partida da filosofia de Platão foi o conceito, o objeto da ciência, segundo Sócrates.
Esse objeto foi desenvolvido ao relacioná-lo com a realidade, até chegar à teoria das ideias.
Platão não buscava a verdadeira essência da forma física como o fazia Demócrito e seus
seguidores, mas a essência das coisas, em algo estável, nas verdadeiras causas. A essência do
conhecimento não poderia estar na essência das coisas que são corruptíveis, que variam (...). A verdade
deve ser buscada em algo superior, além do físico (no matefísico). Essa busca racional seria
comtemplativa, buscar a verdade no interior. Dessa forma, o conhecimento seria o conhecimento do
próprio homem e com fins morais: levá-lo à bondade e à felicidade; o autoconhecimento seria árduo e
metódico (WIKIPÉDIA, 2006e).
Vários problemas atormentaram os filósofos gregos em geral e, em particular, a Platão, um deles
era o fluxo da natureza, onde se verificaram que muitas coisas estão em mudanças constantes: as
estações se sucedem, as sementes se transformam em árvores, os planetas e estrelas percorrem o céu
noturno (...). Mas, como seria possível explicar os fenômenos naturais, se eles estão em permanentes
mudanças?
Como o mundo estava em constantes mudanças, parecia que não poderia ser objeto de
conhecimento científico. Entre os conceitos universais, imutáveis, necessários e eternos de Sócrates e
o mundo que é individual, contingente e transitório de Heráclito deveria existir, além do fenomenal,
outro mundo de realidades, com os mesmos atributos dos conceitos subjetivos. Esse mundo era o das
ideias.
Segundo Platão, a ciência era objetiva e a realidade correspondia ao conhecimento científico;
mas, entre elas existiam conflitos, pois, de um lado se tinha o indivíduo transitório e contingente; do
outro, os conceitos que eram universais e perenes. Imaginava que deveria existir outro mundo, o das
ideias, as quais não poderiam representar simples formas abstratas do pensamento, mas, realidades
objetivas mediante os atributos dos conceitos; as coisas percebidas (aparências, reflexos, cópias etc.)
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não poderiam constituir a verdadeira realidade contida na ideia eterna, única e imutável. A teoria das
ideias se aproxima à teoria do conhecimento e a uma concepção do mundo.
Uma das preocupações de Platão foi distinguir a verdadeira ciência e conhecimento científico da
simples opinião ou crença. Não se tratava de representações intelectuais e formas abstratas do
pensamento, mas, de realidades objetivas de que as coisas visíveis seriam apenas cópias; assim, p.ex., a
ideia de homem era abstrata, perfeita e universal, enquanto que os indivíduos seriam transitórios e
defeituosos.
Conhecer as ideias seria o mesmo que conhecer a verdade última, já que elas seriam os modelos
ou as causas de objetos sensíveis. Como tal, só se poderia falar de ciência acerca das ideias e estas não
poderiam residir nas coisas. Procurar a razão de ser das coisas obrigava a ir para além delas, ascender à
outra realidade distinta e superior: a filosófica com um fim prático e moral realizado intelectualmente,
mediante a especulação e o conhecimento ampliado da ciência.
Nesse contexto, a ciência não pode ser de objetos que rodeiam o ser humano e são observados
com os sentidos, mas, algo constante. Esse algo é de ideias com uma teoria central das formas, o mundo
das ideias com arquétipos imutáveis por causa da perfeição e estabilidade das formas, além do mundo
físico.
O sistema metafísico de Platão centraliza-se e culmina no mundo das ideias (o ser), contraposto
ao mundo da matéria (o não-ser). Entre esses mundos e como mediadores se encontram o Demiurgo
(divindade ou força criativa que deu forma ao mundo material; no gnosticismo, uma divindade
subordinada à Divindade suprema, algumas vezes considerada como o criador do mal) que plasma o
caos da matéria no modelo das ideias e as almas, uma comunicação do movimento e a vida, da ordem e
harmonia.
Diversamente de Sócrates que limitava a pesquisa ao campo antropológico e moral, Platão
estende a indagação ao campo metafísico e cosmológico. Ambos partem do conhecimento empírico,
sensível e da opinião para chegar ao conhecimento intelectual, conceptual, universal e imutável, com
uma diferença: a gnosiologia platônica tem caráter científico e filosófico.
Platão divide o mundo em duas partes com seus correspondentes níveis de conhecimentos. O
primeiro é o mundo das ideias; um mundo constante e real, associado ao conhecimento, derivado da
razão e não de experiências; um conhecimento intelectual universal e imutável. O segundo é o mundo
físico, onde o fluxo é permanente e a realidade é relativa, associada à opinião; nele, o conhecimento é
sensível, particular, mutável e relativo, embora verdadeiro, porém sem saber o que é, portanto, incapaz
de explicar o conhecimento intelectual, de entender um dever-ser e de compreender valores como os de
beleza, verdade e bondade afetivamente presentes no espírito.
Pelo conhecimento intelectual, o terceiro nível, sabe-se como as coisas estão e são porque devem
ser assim; é o conhecimento das coisas pelas causas; é a relação entre o conceito e a realidade da
ciência objetiva. Pelo conhecimento sensível se sabe como as coisas estão sem saber por que o estão,
podendo-se cair no erro sem saber quando.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Arsitóteles foi um dos mais importantes pensadores que buscava o saber pelo saber, conforme se
verifica em suas obras, a Metafífica (na introdução). Em seguida apresenta e estabelece a distinção
entre três tipos de saberes: por experiências sensoriais diretas limitados aos objetos e eventos
individuais para reponder a que é; o técnico que compreende leis gerais e se orienta para responder o
como é; e o teórico ou conhecimento que se orientar para responder o por que e entra no campo da
ciência; afirmando, no cap. 2 de sua oba, Metafísica:
“Aquele que é mais exato e mais capaz de ensinar as causas é mais sábio, em todas as áreas do
conhecimento. E quanto às ciências, igualmente, aquilo que é desejável por si mesmo e com vistas
apenas ao conhecimento é mais próprio da sabedoria do que aquilo que é desejável com vistas aos
seus resultados” [com vistas à aplicação, à tecnologia].
O pensamento de Aristóteles culminou o processo iniciado por Tales de Mileto, entre outros
pensadores e foi orientado para rever e para corrigir falha, bem como para considerar imperfeições dos
filósofos anteriores, com novos procedimentos e proposições, determinando ou influenciando o
caminho do pensamento científico.
A lógica de Aristóteles tinha um objetivo metodológico. Tratava-se de mostrar o caminho correto
para a investigação, o conhecimento e a demonstração científica. O método científico assentava-se nas
seguintes fases:
a) a observação de fenômenos particulares; seriam as observações de como se sucederiam certos
fenômenos, da existência de propriedades (...),
b) a intuição dos princípios gerais (universais) a que os mesmos fenômenos obedeceriam; pela
indução, serão traduzidos em princípios explicativos;
c) dos princípios explicativos, a partir deles das causas dos fenômenos particulares, retornariam aos
fenômenos pela dedução.
Aristóteles considerava a investigação científica como a passagem (progressão) de observações
para princípios gerais, com retorno às observações. Nesse processo acreditava que o cientista deve
inferir (induzir) princípios explicativos a partir de fenômenos a serem explicados e, depois, deduzir
enunciados dos fenômenos com base em premissas compostas por esses princípios, conforme se indica
a seguir (LOSEE, op. cit.):
indução
a
Observações b Princípios explicativos
c
dedução
76
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Estava convencido que se esses princípios gerais fossem adequadamente formulados, e as suas
consequências corretamente deduzidas, as explicações só poderiam ser verdadeiras. Dessa forma, a
explicação científica seria uma transição do conhecimento de um fenômeno ou fato (a) até o
conhecimento de suas razões (c) compreendendo os métodos indutivos e dedutivos, depois de passarem
por princípios explicativos (b).
Quais foram as contribuições em áreas de conhecimentos como a ética, a lógica, a metafísica, a
biologia, a física e a política? No campo da lógica, foram múltiplas as contribuições de Aristóteles para
a criação e desenvolvimento, tais como: a separação da validade formal do pensamento e do discurso
da sua verdade material; a identificação dos conceitos básicos da lógica; a introdução de letras mudas
para denotar os termos; e a criação de termos fundamentais, tais como: “válido", "não válido",
"contraditório", "universal", "particular" (...) para analisar a lógica do discurso.
No sistema aristotélico, a ética é uma ciência menos exata na medida em que se ocupa de um
assunto que pode ser modificado, sem ser essencial e imutável, mas, obtido por ações repetidas,
disposições adquiridas ou hábitos que constituem as virtudes e os vícios passíveis de modificação. O
objetivo, na ética, era o de garantir ou possibilitar a conquista da felicidade.
A partir de disposições naturais e particulares, conforme fossem o caráter e a moral da pessoa, as
disposições seriam modificadas para que pudessem se ajustar à razão; essas disposições, em geral,
estariam afastadas do meio-termo. Dessa forma, algumas pessoas poderão ser muito tímidas, outras
muito audaciosas.
A virtude é o meio-termo e o vício se dá ou na falta ou no excesso de tais disposições, realizada
sempre no âmbito humano. Destaca a virtude especulativa ou intelectual, que pertence apenas a alguns
que, fora da vida moral, buscam o conhecimento pelo conhecimento: são os filósofos.
O estudo de condições em que se pode afirmar que um dado raciocínio é correto (válido), foi
desenvolvido por filósofos como Parmênides e Platão, mas foi Aristóteles quem o sistematizou e
definiu a lógica; foi o primeiro a enunciar os princípios a que deveriam obedecer ao discurso coerente;
tais princípios acabaram por serem consagrados na seguinte formulação:
a). Princípio da Identidade, sintetizado pela seguinte expressão: A é A; uma proposição tautológica
necessariamente verdadeira que pressupõe, como condição necessária, a existência de dois
elementos em sua forma reflexiva; este princípio indica o que as coisas são como p.ex., “um
pesquisador é um pesquisador”; uma vez definido o conceito de certa maneira, essa definição
deve permanecer constante ao longo do raciocínio.
b) Princípio da Não Contradição, sintetizado por: nada pode ser A e não A; A é A ou o que é. A é A
e é impossível que seja, ao mesmo tempo e na mesma relação, não-A. Este princípio indica que
nada pode ser e não ser ao mesmo tempo sob o mesmo aspecto, como, p.ex., em uma proposição
afirmar que o pesquisador é não pesquisador.
c) Princípio do Terceiro Excluído, sintetizado por: tudo é A ou não A; A é x ou é y sem uma terceira
possibilidade de ser; uma coisa ou é, ou não é, e não pode ser e não ser ao mesmo tempo e na
mesma relação; estre princípio define a decisão de um dilema: ou isto ou aquilo, mas não isto e
77
aquilo. Afirma que as coisas e ideias contraditórias são impensáveis e impossíveis. Exemplo em
um teste de múlktipla escolha se escolhe entre duas opções: os está certo ou erstá errado.
O sistema lógico aristotélico, com esses princípios, tornou-se a base de estudos de lógica, de
investigação, da ciência (...) até o século XIX, quando esses princípios forma “complementados” (um
deles é o princípio da razão suficiente) para se definir uma base de princípios racionais utilizada na
pesquisa, conforme se apresenta e ilustra neste livro, no parate referente à metodologia de pesquisa.
A lógica, segundo Aristóteles, é um tipo de ferramenta geral para estudo e aquisição de
conhecimentos de todos os tipos, com base em:
a) o pressuposto de que o pensamento é essencialmente uma combinação de elementos, em que uns
conduzem à descoberta de outros;
b) o estudo das operações mentais deve atender apenas às formas como se realizam essas
combinações, sem considerar o conteúdo material dos elementos.
c) as operações mentais válidas (corretas) são aquelas em que estes elementos são utilizados de
forma rigorosa e em uma sequência precisa.
d) as operações mentais por mais complexas que sejam, resultam sempre da combinação de
conceitos em juízos, e a combinação destes, em raciocínios, sendo desse modo, que se ascende, a
partir do conhecido, ao desconhecido.
Seus escritos sobre o assunto são conhecidos como Organum / Organon, instrumento ou
ferramenta de pensamento, depois, denominado lógica; compreendem escritos sobre a teoria pela qual
os objetos são classificados de acordo com o que se pode dizer significativamente acerca deles.
Esse instrumento compreende regras do pensamento correto de modo a garantir o rigor da
demonstração, da conclusão, com sua característica básica, o silogismo como “um discurso no qual,
dada certa premissa, extrai-se uma conclusão consequente e necessária, por médio das premissas
dadas”. O Organon está dividido nas seguintes partes:
Categorias; teoria dos tipos de objetos classificados;
Tópicos: orientações de dialética ou de discussão;
Refutações dos Sofistas. Interpretação: sobre os juízos.
Primeiros Analíticos: silogismo em geral.
Segundos Analíticos: demonstração.
Aristóteles considerava que todos os argumentos poderiam ser reduzidos à forma de um
silogismo, a um argumento pelo qual, a partir de um antecedente com premissas que se “ligam” a um
terceiro, poder-se-ia concluir um consequente em que se relacionam os termos antecedentes.
“Um discurso no qual, dada certa premissa, extrai-se uma conclusão consequente e necessária,
por médio das premissas dadas”.
78
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Essa ideia, ainda que não necessariamente verdadeira, é útil na avaliação de argumentos,
apresentada e ilustrada na parte que segue:
Dessa forma, o silogismo aristotélico consiste em três proposições, duas das quais são premissas
e a outra, a conclusão de um argumento. São exemplos de silogismos:
Na conclusão o termo menor está incluído no termo maior. O termo do médio está nas duas
premissas, mas não na conclusão.
Para que um argumento silogístico seja válido deve obedecer a um conjunto de regras intuitivas.
Essas regras exemplificadas são:
a) Possuir apenas (silogismo completo) três termos: o menor, o do médio e o maior, em que o termo
menor é ligado ao termo maior pelo termo do médio. Quatro ou mais termos poderão não
permitir obter uma conclusão silogística, conforme se ilustra com o seguinte exemplo:
Este silogismo, com aparentemente três termos, têm, de fato, quatro termos. Na premissa maior, o
termo “cão” foi tomado com sentido diferente (um animal), com extensão diferente do
considerado na premissa menor (o cão como um nome de estrela), trazendo como efeito a
incorreção da conclusão.
b) Os termos (os designativos de classes) maior e menor não devem ter maior extensão na
conclusão do que nas premissas. Dessa forma, se uma das classes for considerada, numa das
premissas, em apenas uma parte de sua extensão, enquanto que na conclusão, em toda a sua
extensão, tem-se uma falácia ao passar indevidamente de uma parte (indicada na premissa) para o
todo (indicado na conclusão).
A identificação da extensão do sujeito, em proposições aristotélicas, é relativamente fácil porque
vêm indicadas por quantificadores. Assim, nas proposições: “todo homem é mortal” e “toda
pesquisa é um processo racional” os termos sujeitos “homem” e “pesquisa”
são considerados partes de proposições universais (PU), enquanto que
“algum homem é casado” e “alguma pesquisa não é racional” os termos
“homem” e “pesquisa” tem sentido particular de proposições particulares
(PP).
O predicado é considerado particular em proposições afirmativas como “toda pesquisa é um
processo racional” e “alguma pesquisa é racional”; é considerado universal em proposições
negativas como “nenhuma pesquisa é racional” e “alguma pesquisa não é racional”. Com base
nesses conceitos se formula a regra da extensão do predicado que permite verificar a aplicação
da segunda regra em um dado silogismo. A regra de extensão é definida como:
c) Como síntese: os termos maior e menor não devem ter maiores extensões na conclusão do que
nas premissas; o termo médio não deve aparecer na conclusão e deve ser considerado
universalmente ao menos uma vez; de duas premissas negativas ou de duas premissas
particulares nada se conclui; a conclusão segue à menor premissa; e as duas premissas forem
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
sentenças afirmativas, a conclusão não pode ser negativa. Se as premissas de um silogismo forem
verdadeiras e se a formulação ou modelo for válido, então a conclusão será verdadeira. Assim, o
silogismo válido que possui premissas verdadeiras constitui, portanto, uma prova daquilo que as
suas conclusões afirmam.
As etapas do processo indutivo aristotélico partem do pressuposto de que toda coisa particular é
composta de matéria e forma; a matéria é o que permite que um particular seja individual e único; a
forma é o que permite que um particular seja membro de uma classe de coisas similares.
Especificar a forma de um particular, segundo o processo indutivo aristotélico, é especificar as
propriedades que compartilha com outros particulares.
As generalizações das formas se obtêm da experiência sensível por meio da indução,
considerando dois tipos de proposições que partilham as características de proceder dos enunciados
particulares para os enunciados gerais. O primeiro tipo, o da indução, corresponde a enumeração
simples, base para a generalização, conforme se sintetiza a seguir (LOSEE, 1972):
Premissa Conclusão
a1 tem a propriedade P
a2 tem a propriedade P
....
an tem a propriedade P
Todos os a têm a propriedade P
O segundo tipo de indução é o da intuição direta obtida dos princípios gerais, relacionadas, em
parte, com a capacidade de perceber o que é essencial nos dados da experiência, do que é sensível,
81
como no exemplo, de observações do brilho da Lua quando ela se encontra de frente ao Sol; a
conclusão é o de que a Lua brilha porque reflete a luz solar (LOSEE, op. cit.).
As etapas do processo dedutivo aristotélico utilizado, também, na investigação científica, com as
generalizações a partir de induções utilizadas como premissas para se terem as deduções de enunciados
sobre as observações iniciais.
Aristóteles, no processo dedutivo, estabeleceu uma restrição importante acerca dos tipos de
enunciados que podem aparecer como premissas e conclusões. Essa restrição diz respeito à enunciados
que compreendam uma classe (representada pelo símbolo P) incluída em outra (símbolo Q), com os
seguintes possíveis tipos (LOSEE, op. cit.):
Todos os M são P
Todos os S são M
Todos os S são P
Aristóteles relacionou dez predicados ou categorias diferentes que constituem as dez maneiras
diferentes pelas qual o sujeito, no exemplo acima, todos os homens, pode se relacionar com o
predicado, no mesmo exemplo, são mortais, da mesma premissa; a proposição todos os homens são
mortais pertence à categoria de qualidade, enquanto que a proposição João Ninguém é homem
pertence à categoria de substância; diz que João Ninguém é. Outras categorias são as de: quantidade,
relação, lugar, tempo, posição, estado, ação e passividade. A questão que recebeu um tratamento mais
detalhado ou que foi mais discutida por Aristóteles foi: qual é o sujeito – substância?
Aristóteles, em uma de suas obras, a Metafísica, inicia o texto com a seguinte afirmação: por
natureza todo homem deseja conhecer (ou todos os homens, por natureza, desejam conhecer; observe-
se que o que conhecer: a realidade a ser explicada e como conhecer são questões que acompanham a
82
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
história da humaniodade) em seguida traça, em um texto analiticamente preciso, a distinção entre três
tipos de saberes, assim:
a) O conhecimento por experiências sensoriais e diretas, restritas aos objetos e eventos, com o
propósito de responder o que é.
b) O conhecimento técnico que compreende leis gerais e se orienta para responder o como é.
c) O conhecimento teórico, de domínio da ciência, orientado para buscar as causas e princípios dos
fenômenos e responder o porquê é.
Aponta Aristóteles em sua obra Metafísica que a pessoa que é mais exata e capaz de ensinar as
causas é mais sábia. Quanto à ciência, afirmava que aquilo que é desejável por si mesmo e com vista
ao conhecimento é mais próprio da sabedoria do que aquilo que é desejável pelos seus resultados.
O cultivo do saber pelo saber é um dos elementos mais importantes da cultura ocidental, da
metafísica aristotélica, para a ciência, para o conhecimento universal e certo dos fenômenos naturais,
dos números, das figuras geométricas etc., a ser buscado sem preocupações práticas. Esse ideal de
universalização e certeza se expressa por um método de investigação, com certo rigor. Um método
baseado na observação cuidadosa, controlada e sistemática, quanto possível, submetida ao crivo da
razão. Por esse método seria possível distinguir disciplinas científicas das disciplinas não-científicas ou
pseudocientíficas. Era uma visão diferente da apresentada por Platão, em que a ciência se fazia na
contemplação dos universais.
Deve-se acrescentar que a ideia de certeza na ciência (episteme), de infalibilidade da verdade
científica, foi modificada pela análise epistemológica empirista de Locke, cética de Hume e conjetural
de Popper (CHALMERS, 1982). Popper sugeriu entender o conhecimento científico como opinião
(doxa) em lugar de algo com certeza (episteme), indicando que as leis e teorias mesmas as mais
robustas, são, sempre hipóteses que poderão ser científicas se rejeitáveis pela experiência:
falseabilidade.
Segundo Aristóteles, a lógica é um instrumento, uma propedêutica para as ciências e para o
conhecimento, baseada no silogismo. Trata-se do raciocínio formalmente estruturado que supõe certas
premissas devidamente dispostas para que haja uma conclusão necessária; parte-se de uma premissa
universal (necessária, inerente, de ocorrência na maioria das vezes etc.) para outra particular; neste
sentido, o silogismo é contrário à indução que parte do particular para o universal.
Aristóteles denominou filosofia primeira ao que é conhecido como metafísica, a ciência que se
ocupa com as realidades, além do plano físico de fácil e imediata apreensão sensorial (conhecimento
por experiência). O conceito de metafísica aristotélica é complexo e considerado, em alguns casos,
como a indagação de causas e princípios; em outros, como a investigação do ser enquanto ser, a
substância; em alguns casos é tido com a ciência que investiga Deus e a substância supra-sensível
dessa investigação.
Nas diversas definições de metafísica, além da distinção dos tipos (ou etapas) do conhecimento,
aparecem vários conceitos como os de ato e potência, matéria e forma, substância e acidente e causas
83
em vários “níveis”, tais como: causa material: aquilo do qual é feita alguma coisa; causa formal: a
coisa mesma; causa motora: aquilo que da origem ao processo em que a coisa surge; e causa final:
aquilo para o qual a coisas é feita.
A concepção aristotélica de física parte do movimento, elucidando-o nas análises dos conceitos
de crescimento, alteração e mudança. A teoria do ato e potência, com implicações metafísicas, é o
fundamento do sistema. Ato e potência relacionam-se com o movimento enquanto que a matéria e
forma com a ausência de movimento.
A biologia aristotélica é a ciência da vida e situa-se no âmbito da física ao estar centrada na
relação entre o ato e a potência. Teve seu início na zoologia, levando-se em conta o sentido etimológico
da palavra.
É de Aristóteles a primeira divisão do reino animal e a primeira teoria criteriosa sobre a origem
da vida com a formulação da hipótese de geração espontânea, superando a explicação religiosa e
mística (mítica) até então predominantes; essa teoria dominou os meios científicos por quase dois anos,
até a experimentação de Pasteur, em 1864, que provou que a vida surge a partir de outra forma de
vida semelhante.
Segundo o princípio da geração espontânea ou abiogênese de Aristóteles, alguns seres vivos se
desenvolvem a partir da matéria inorgânica em contato com um princípio vital, ou princípio ativo; essa
teoria começou a ser testada por Redi 15.
Em 1759 Wolff 16 lançou a teoria epigênese, com base no estudo do desenvolvimento de
embriões. Mais foi o químico e biologista francês Pasteur, após uma série de experiências, que
demonstrou não existir no ar ou nos alimentos qualquer princípio ativo capaz de gerar vida
espontaneamente. Abre caminho, com essa demonstração, para a biogênese, segundo a qual a vida se
origina de outro ser vivo preexistente (HALL, 1975).
Na filosofia de Aristóteles a política é o desdobramento da ética em que tanto a ética como a
política compõe a unidade de filosofia prática. Enquanto a ética se preocupa com a felicidade
individual do homem, a política se preocupa com a felicidade coletiva da pólis e, desse modo, a
política tem como tarefa investigar e descobrir quais são as formas de governo e as instituições capazes
de assegurar a felicidade coletiva dentro de uma constituição do estado.
Em termos gerais, os princípios e fundamentos da doutrina de Aristóteles, o aristotelismo que
passaram à tradição filosófica ou que inspiraram movimentos conexos como os da escola peripatética, o
aristotelismo medieval e o aristotelismo do renascimentos, podem ser sintetizados, confome dados do
Dicionário de Filodofia de Nicola Abbagnano (1998), em:
a) A importância atribuída por Aristóteles à natureza e o valor e a dignidade das indagações;
enquanto Platão pensava que tais indagações só poderaim atingir um graus de probabilidade
inferior ao conhecimento científico, Aristóteles considerava que nada há na natureza tão
insignificante que não valha a pena ser estudado: em todos os casos, o verdadeiro objeto da
pesquisa é a substância das coisas: esse é o sentido conceitual de sunstância.
84
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
b) O preincipio do atomismo com que Epiocuro explicava a formação e a transformação das coisas
por meio da união dos átomos da alma.
c) O princípio do semiateismo, pelo qual Epicuro acrediotava na existência dos deusase, porém sem
nenhum papel na formação e governo do mundo.
85
De conformidade com o pensamento de Epicuro o homem é infeliz por temer aos deuses e pelo
medo do futuro ao “sentir” a morte como algo inevitável. Diz que a filosofia não é pura a reflexão
sobre a morte, porque ela existe [é inevitável] enquanto se vive e não existirá após a morte. Ao afirmar
que “não há nada a temer quanto à morte” queria dizer que não se deve temer o que não está presente e
como ausente não se pode sentir; sofrer ao esperá-la constitui um erro e a causa da perda de serenidade.
Com base em que todo bem e todo mal reside na sensação e de que a morte é privação dela,
chega a noção correta da morte como o nada que torna alegre o fato da vida ser concluída com a morte,
não lhe atribuindo um tempo infinito, mas, subtraindo-lhe o desejo da imortalidade.
Não há nada de terrível na vida para quem tenha compreendido que não há nada de terrível na
morte. Ao afirmar que “pode-se alcançar a felicidade” expressava a vocação do homem para ter uma
vida feliz: não sofrer no corpo, não ter a alma perturbada, eis a fórmula epicurista da felicidade, sendo
preciso transformar o tempo de vida em tempo de felicidade. Acreditava na felicidade que flui de
dentro e, portanto, é construída a partir de um processo de libertação interior que exclui o medo e a dor
da vida.
A lógica epicurista subsidia sua ética na recordação do prazer; é com a sensação do prazer que se
pode retornar ao presente pela memória, isto é, o prazer resgatado no tempo para ser vivenciado em um
momento de dor. Em sua lógica concluía “nada provém do nada nem se reduz ao nada”.
Foi herdeiro da tradição atomística de Demócrito, afirmando que os átomos, com suas
qualidades intrínsecas à forma, peso e grandeza, são os únicos elementos de que se pode ter certeza,
explicando a múltipla variedade das coisas e do seu devir, pela combinação dos mesmos; estes, com
tais novidades, possibilitam as mudanças de uma ética não determinista. Em sua teoria do
conhecimento faz da evidência um fator de verdade e a fonte de todo saber, supondo que apenas o juízo
e raciocínio são os que podem errar.
Na carta e saudação de Epicuro a Meneceu afirma que sempre é tempo de filosofar: quem é
jovem não espere para fazer filosofia; quem é velho não se canse disso; com efeito, ninguém é imaturo
nem superado em relação à saúde da alma; por isso, ambos devem fazer filosofia para que, apesar de
envelhecido, permaneça sempre jovem por causa do passado ou para se sentir jovem e velho ao mesmo
tempoDessa forma, conclui, não há porque temer o futuro.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
A Alexandria, desde o seu tempo (recém fundada a cidade) até à invasão dos Mouros, foi a sede
da ciência matemática; sua famosa biblioteca continha praticamente todo o saber (vale dizer, o registro
de todo o conhecimento) da antiguidade.
Euclides, considerado o pai da geometria (essa ciência nasceu, provavelmente no antigo Egito,
com as medições de terras, esse é o significado da palavra grega e geometrein, geo = terra e metrein =
medida, periodicamente inundadas pelo rio Nilo), foi um típico homem da ciência dedicado à
especulação pelo gosto de saber. Ocupava-se com astronomia e geometria, mas, de forma diferente dos
egípcios e babilônicos, desligado de preocupações religiosas e voltado para as questões teóricas.
De sua obra resta menos da metade, com destaque para os treze livros dos Elementos de
geometria / Stoicheia ( Nessa obra se têm
informações de geometria (9 livros de geometria plana e sólida), aritmética, álgebra e teoria dos
números e teoremas fundamentais da aritmética. O primeiro livro de Elementos (...) contém 23
definições; os quatro seguintes, proposições de geometria plana; os dois que seguem teorias das
proporções e sua aplicação às magnitudes geométricas; os livros VII a IX tratam da teoria dos números,
da divisibilidade dos fatores primos e das proporções geométricas e aritméticas; o livro X, trata dos
números irracionais; os últimos três, referem-se à geometria do espaço.
Em geral em Elementos de geometriaa não foram oferecidas explicações preliminares, nem
observações de esclarecimentos para situar seu conteúdo em algum contexto histórico ou matemático.
A obra se inicia com uma definição: “o ponto é o que não tem parte"; “uma retaé um comprimento sem
largura”; “uma superfície é o que tem apenascomprimento e largura” e prossegue numa constante
apresentação de 465 proposições até a geometria do espaço, compreendendo arranjos sistemáticos de
descobertas anteriores, baseando-se em axiomas, definições e teoremas provados um após o outro. Um
exemplo dessa contribuição são as cinco proposições geométricas que formula nos postulados: “dado
dois pontos, há uma superfície de reta que os une”; “um segmento de reta pode ser prolongado
indefinidamente para construir uma reta”; “dados um ponto qualquer e uma distância qualquer, pode-se
construir um círculo de centro nequele ponto e com raio igual à distância dada”; “todos os ângulos
retos são iguais”; e “se uma linha retacortar duas outras retas de modo que a soma dos ângulos internos
de um mesmo lado seja menor do que dois retos, então essas duas retas, quando sificientemente
prolongadas, cruzam-se do mesmo lado em que estão esses dois ângulos”: postulado de Euclides. Os
três conceitos e os cinco postulados servem de base à geometria euclidiana.
Esta obra, uma das obras mais difundidas da história como texto básico e referência de geometria
e matemática, segue o método axiomático como padrão para a argumentação científica que, apesar de
algumas deficiências lógicas (segundo critérios e padrões modernos, em especial, no livro VII),
passaram despercebidas por mais de dois milênios, apesar de seu conteúdo consistente e valioso.
É oportuno citar que se o valor de um trabalho científico for medido pelo tempo que ele se
mantém válido ou consistente, então, os Elementos de geometria de Euclides, deveria ser
considerado um dos trabalhos mais valiosos da história da ciência. Desse trabalho se destacam, sob o
enfoque metodológico, além de seu método axiológico, dois aspectos: o sintético indutivo que permite
percorrer (inferir) do conhecido até o desconhecido mediante passos lógicos; e o analítico dedutivo,
87
em que se busca o desconhecido e se trabalha na sua direção com base no conhecido, também, pela via
ou fundamentação lógica.
Muitos outros textos lhe são atribuídos a Euclides, dos quais se conhecem alguns títulos, tais como:
Divisões de superfícies.
Data: com aplicações da álgebra à geometria numa linguagem geométrica.
Tratado sobre harmonia.
A Divisão: com aproximadamente 36 proposições relativas à divisão de configurações planas.
Os Dados: um manual de tabelas, servindo como guia de resolução de problemas, com relações
entre medidas lineares e angulares num círculo dado.
Óptica: estudo da perspectiva desenvolvida com base em teoria contrária à proposta por Aristóteles,
segundo a qual é o olho que envia os raios que vão até o objeto que se vê, e não o inverso.
Os fenômenos (celestes): discorrer sobre a geometria esférica para utilização na astronomia.
Porismos: um dos mais lamentáveis desaparecimentos com possíveis aproximações à Geometria
Analítica.
Fundamentos da pesquisa
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Erastóstenes, matemático e geografia, foi o primeiro a adotar a palavra geografia científica como
sendo a descrição da Terra, em sua obra Geographika: três volumes (história / predecessores,
geografia física e geografia política da qual se têm apenas fragmentos): suas descrições geográficas
eram acompanhadas de cartas geográficas. Escreveu, também, filosofia, história, astronomia e
matemática, sendo considerado o primeiro matemático da Antiguidade.
Entre as contribuições de Erastóstenes se destacam: a esfericidade da Terra e a medição, com
relativa precisão, o cálculo da circunferência (360º.); do diâmetro da Terra (12.630 km; o diâmetro
polar correto é de 12.700 km), sob o pressuposto de que a Terra era redonda e os raios solares
paralelos, utilizando informações de Euclides; a obliquidade de um eclipse (23º. 51´ 19´´); o intervalo
entre os trópicos (...).
Há pessoas que não param de se atormentar com a lembrança de coisas passadas; outras se afligem
pelos males que virão. É tudo absurdo, pois o que já aconteceu não nos afeta mais e o futuro ainda
não nos toca...
O homem vive preocupado em viver muito e não em viver bem, quando na realidade não depende
dele o viver muito, mas sim o viver bem.
Se vives de acordo com as leis da natureza, nunca serás pobre; se vives de acordo com as opiniões
alheias, nunca serás rico.
Se o que tens te parece insuficiente, então, mesmo que possuas o mundo, ainda assim se sentirás na
miséria.
O amor não se define; sente-se.
Onde quer que haja um ser humano, há uma oportunidade para o bem.
O prêmio de uma boa ação é tê-la praticado.
A virtude é difícil de se manifestar, precisa de alguém para orientá-la e dirigi-la. Mas os vícios são
aprendidos sem mestre.
Ninguém escreve em seu caderno de notas os favores recebidos.
Deixarás de temer quando deixares de ter esperança.
Se um homem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe será favorável.
A parte mais importante do progresso é o desejo de progredir.
Se um grande homem cair, mesmo depois da queda, ele continua grande.
Nunca a fortuna põe um homem em tal altura que não precise de um amigo.
Longo é o caminho ensinado pela teoria, curto e eficaz o do exemplo.
Feliz é quem está contente com a sua sorte atual, seja ela qual for, e ama o que tem.
Grande parte do progresso está na vontade de progredir.
Poucos acertaram antes de errar.
Não é porque as coisas são difíceis que não nos arriscamos; é porque não nos arriscamos que elas se
tornam difíceis.
Só uma coisa que sabemos: é que não sabemos nada.
Do homem eminente podemos aprender, mesmo quando se mantém em silêncio.
Em sua obra as Questões naturais, Sêneca tratou de aspectos científicos ao expor a física
estóica vinculada aos problemas éticos; é uma abordagem de fenômenos naturais em que se mistura a
ética com a física.
Fundamentos da pesquisa
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suas experiências famosas em medicina foi a demonstração de que as artérias conduzem sangue e não
ar, conforme se acreditava na época. Fez a diferenciação de ossos com e sem cavidade medular.
Pesquisou a cavidade craniana e o sistema muscular. Ao investigar os nervos do crânio reconheceu os
nervos raquidianos, os cervicais, os recorrentes e uma parte do sistema simpático.
Foi o primeiro a demonstrar, baseado em experimentos, que o rim é um órgão excretor de urina.
Apesar dos erros de Galeno, descobertos, entre outros, por Harvey, foi o médico que maior e mais
duradoura influência exerceu sobre a medicina, sendo sua obra muito valorizada ao mesmo tempo
pelos hebreus, cristãos e muçulmanos durante a Idade Média, permanecendo quase que dogmática e
intocável até a Renascença.
Calcula-se que tenha escrito cerca de 400 livros sobre vários assuntos, 70 dos quais sobre
medicina. Parte de seus manuscritos se perdeu em um incêndio no Templo da Paz, em Roma, onde os
mesmos se encontravam.
Um fato da Idade Antiga, 300 a.C. que deve ser destacado pela sua importância nas ciências, na
história das ciências, ainda que sem registro contemporâneo, é o Museu de Alexandria ou Escola de
Alexandria, um centro de estudo de filosofia, artes, ciências e pesquisa, fundado por Euclides, no
século III a.C. Alexandria (cidade fundada por Alexandro o Grande) foi a primeira instituição
científica organizada e financiada pelo Estado com infra-estrutura para a prática das ciências. Aquela
instituição formal de pesquisa, tal vez a primeira da humanidade, com informações de que chegou a
reunir mais de 700 mil rolos de papiro, aproximadamente 100 a 125 mil livros compreendia
laboratórios, observatórios, jardins botânico e zoológico, salas de anatomia, departamentos para
pesquisa e ensino e residências para estudantes.
Nesse Museu foi criada a primeira biblioteca pública destruída no ano 642 (646), Ali atuaram, em
diferentes épocas, pensadores, tais como: Arquimedes, Aristarco de Samos, o primeiro a anunciar
que a Terra gira ao redor do Sol; Erastóstenes, o primeiro a mediar a circunferência da Terra;
Euclides que escreveu a geometria ainda utilizada; Hisparco de Nicéia, o primeiro a medir o ano solar
com uma precisão de 6,5 minutos; e Herácçlito de Taranto, entre muitos outros que atuaram em
campos como a matemática, astronomia, filosofia e medicina. (CHASSOT, 2005; complementado).
Não se discute, nestas Orientações para elaborar um projeto de pesquisa (...),
a validade das contribuições de ideias, conceitos, princípios e formulações de pensadores da Idade
Antiga à ciência ou a correspondência da ciência antiga com a ciência moderna, afirmando-se,
contudo, de que tais contribuições foram significativas e algumas delas perduram. O leitor interessado
no tema poderá consultar, entre outros autores, a Lindberg (1992).
Os filósofos cientistas relacionados acima dão uma ideia da origem e evolução da ciência na
Idade Antiga, restrita ao pensamento grego, com suas principais características, tais como: estar ligada
à filosofia; ser qualitativa, com argumentação baseada na análise de propriedades intrínsecas; em geral,
93
não ser experimental; sua natureza contemplativa ao buscar o saber pelo saber e não pela aplicação; e a
ciência estar baseada numa concepção estática.
Quanto aos métodos que utilizaram para satisfazer a necessidade de saber, o homem da Idade
Antiga tinha suas experiências e conhecimentos segundo as concepções particulares da natureza,
atribuindo-lhes significados míticos, religiosos (...) quando os fatos estiverem fora de uma compreensão
racional e “científica”: a ignorância. A ignorância esteve associada à existência de entes sobrenaturais
que poderiam ajudar ao homem ou castigá-lo, segundo a condição em que ocorresse o fenômeno. Dessa
forma, a necessidade de compreensão ficou relegada à vontade e capricho dos deuses.
Contudo, o homem prosseguiu aplicando o discernimento a sua experiência com base na
observação e na curiosidade, bem como no desejo de saber até a análise e raciocínio na
experimentação. Nesse processo, consciente ou não, surgiu a ideia de causalidade, o primeiro traço de
um método. Deve-se observar que esse traço, segundo Poincaré, autor das conjeturas (SMALE, 1961)
perdura: “o homem moderno tem utilizado a relação causa e efeito do mesmo modo como o homem da
antiguidade usava os deuses, isto é, para ordenar o universo. Isto não ocorria apenas porque se tratava
do sistema mais verdadeiro, mas porque era o mais conveniente”.
Os primeiros pré-socráticos da escola Jônica apresentaram outras características de um método: a
observação cuidadosa da natureza, o uso da razão para explicá-la e buscar uma causa universal que
compõe todas as coisas. Com tal atitude metódica Tales de Mileto estabeleceu sua ideia de causalidade
na da água como primeira substância.
Anaximandro substitui o princípio da água pelo apeíron para explicar a unidade do mundo,
enquanto que Pitágoras e Parmênides estabeleceram o método com base na essência dos números.
Demócrito estabeleceu a multiplicidade de unidades, o átomo como entidade física, enquanto que
Sócrates postulou a dúvida metódica como base em seu método: nada é certo sem antes ser submetido
ao tribunal da razão. Platão estabeleceu como princípio, que as percepções são aparências e o que
importa são as ideias que sustentam a verdade.
Aristóteles definiu o método do silogismo, baseado em premissas, para buscar o conhecimento,
sendo o ser o objeto da ciência, extraído da realidade sensível pela abstração. Essa busca se fazia de
maneira diferente, segundo Euclides, ao postular seu método de experimentos mentais. Diferente foi,
também, a proposta metodológica de Arquimedes com o seu método, baseado na indução, dedução e
axioma de seus antecessores, da experimentação real. Todas foram contribuições mais ou menos
valiosas no processo de formulação de um método científico para a investigação como, p.ex., as
influências de Sócrates e Aristóteles sob pensadores de Idade Média e de Heráclito precursor de
Bérgson, na Idade Moderna.
A explicação da dualidade da natureza foi, entre muitas outras, uma preocupação na filosofia
ocidental. Em tal sentido, Parmênides e Zenão, da Escola Eleática, afirmavam a imutabilidade do ser
e a realidade estática, enquanto que Heráclito de Éfeso julgava a realidade ser apenas um devenir, um
movimento, um processo de mudança. Essa contribuição na forma de contradição no campo filosófico
de pensadores gregos, sintetizada na inconsistência da simultaneidade da dupla realidade da flecha
94
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
O homem instruído desses séculos era, com frequência, um clérigo, para quem o estudo da
natureza fazia parte de sua escolaridade, mas, desenvolvida em um ambiente dominado pela fé,
pela religião, a escolástica: misto de teologia cristão e filosofia grega (platônica, pela influência de
santo Agostinho, depois aristotélica), de lógica e de argumentação de autoridade.
b) Grande dificuldade que minaram a produção intelectual: educação para poucos (filhos dos
nobres) e marcada pela influência da Igreja Católica, com orientações para táticas de guerra em
função do interesse, as Cruzadas entre católicos e muçulmanos, por cerca de dois séculos. Estas,
com traços econômicos, contribuíram para o renascimento urbano e comercial.
c) Consideráveis perdas do acesso aos tratados científicos da antiguidade clássica (período do séc.,
VIII a.C. até a queda do Império romano, no séc. V, no início do período medieval).
As características das ciências grego-latinas se mantiveram, em parte, mas, as ciências e a
filosofia foram submetidas aos dogmas religiosos e a prática da investigação deixou de ser livre.
Perderam-se o interesse e as orientações para buscarem os conhecimentos na própria natureza,
vinculando-os aos interesses religiosos e à subordinação da revelação, pois a razão humana devia se
submeter ao testemunho da fé.
O domínio da religião, da Igreja Católica, não foi apenas no científico, mas, também no social,
econômico, artístico e cultural e até em campos como o político. Com o poder adquirido, uma das
principais preocupações passou a ser a de conservá-lo. No campo das ciências, “decretava-se que as
suas verdades não estavam sujeitas à crítica e quem se atrevesse sequer a discuti-las teria de se
confrontar com os guardiões em terra da verdade divina”. A Igreja, temendo perder sua autoridade,
reprimia toda ideia que pudesse traçar novos caminhos para as ciências, impedindo seus livres
desenvolvimentos. Mesmo assim, houve cientistas que ousaram
O que se registrou na Idade Média Antiga, no campo das ciências, foi a compilação resumida e
até deturpadas, favorecida por textos truncados, de documentos traduzidos ao latim, contendo
(expressando) o sentido da vontade divina e, portanto, o sentido da natureza criada. A orientação para
buscar o conhecimento científico da filosofia natural, em geral, feita por clérigos, esteve atrelada às
Sagradas Escrituras; compreender a natureza consistia, no fundo, em interpretar a vontade de Deus.
Essa orientação foi sintetizada na frase de santo Agostinho: “aquilo que a verdade descobrir não pode
contrariar aos livros sagrados, quer do Antigo quer do Novo Testamento” da Bíblia.
Dentro da Idade Média é possível considerar vários períodos e fontes ou fatores de influencias
para as ciências, entre outros os de origem latina e grega (bizantino) com poucas contribuições e
apenas com alguns desdobramentos da sabedoria antiga.
A influência da ciência oriental (China e Índia) foi significativa, com épocas de esplendor,
embora de forma não sustentada ou contínua. Da China foram notáveis as contribuições em métodos
matemáticos e geométricos e, em especial, em inovações práticas como a fabricação do papel e da
pólvora, o uso da imprensa e o emprego da bússola na navegação. Da Índia, as contribuições foram em
formulações numéricas (indo-arábigas) e para a moderna trigonometria. Outras influências às ciências,
96
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
foram de origem muçulmana e de culturas americanas como as dos Astecas, Incas e Mayas que, p.ex.,
descobriram e empregaram o zero em seus cálculos de astronomia.
No final do séc. VIII houve uma primeira tentativa de reerguimento da cultura ocidental, da vida
política e da econômica, com destaque para uma reforma da educação proposta por Carlos Magno
(747 a 814): o projeto de desenvolvimento escolar contemplava reviver o saber clássico pelo estudo
baseado nas sete artes liberais, compreendidas em duas estruturas; o trivium: gramática, retórica e
dialética e o quadrivium: aritmética, geometria, astronomia e música, em arranjos monacais (escolas de
mosteiros), catedrais (escolas de bispados) e palatinos (cortes). Essa reforma na educação ajudou à
preparação do Renascimento.
A primeira fase da Idade Média (Idade Média Antiga) se estendeu até o século XII quando surgiu
o Renascimento (Idade Média Clássica), em que se renovou o interesse pela investigação da natureza,
sendo favorecida pela redescoberta de textos antigos por eruditos bizantinos os quais tiveram que
buscar refúgio no ocidente, em especial em Itália, alimentando o interesse de acadêmicos europeus pelo
clássico.
A Idade Média Clássica foi um período áureo, o da escolástica, 17 (do lat. scholasticus, com o
significado de professor das artes liberais, neste caso trivium e quadrivium, o doscente de filosofia ou
teologia na escola do convento, da catedral...), por vezes tomado como sinônimo da filosofia medieval.
Entre as características do método escolástico se destaca o processo de aprendizagem realizado
em três fases: a lectio, leção magistral; a disputatio, a discussão em todos os níveis da informação; e
opúsculo ou conclusões dogmáticas. O lema era: não entender para acreditar, mas, acreditar para
entender, mediante o conhecimento, o estudo. A ênfase na lógica com base no empirismo 18 para
entender a natureza como um sistema coerente de leis que poderiam ser explicadas pela razão. Isso
representou o início da ruptura da visão teocêntrica na explicação das ciências naturais e relativa perda
do rigor da filosofia nessas explicações.
Concomitantemente novos conceitos e atividades passaram a serem considerados, tais como o da
dignidade humana e o florescimento das artes. Começou a surgir, por parte de pensadores, a
necessidade de dar um fundamento teórico, ou racional, à fé cristã, no suposto de que era preciso
demonstrar as verdades da fé; demonstrar que a fé não contradiz a razão e vice-versa.
Se na Idade Média Antiga se dizia que era preciso crer para compreender, na Idade Média
Clássica (Revolução Industrial da Idade Média: 1100 a 1300) a ideia era a de compreender para crer: a
fé revela a verdade, a razão demonstra-a. Dessa forma, fé e razão conduziriam uma à outra. Foi essa a
posição de um dos mais destacados de todos os filósofos cristãos, S. Tomás de Aquino, ao dar ao
cristianismo todo um suporte filosófico com base em conceitos da filosofia aristotélica, filosofia que
passou a ser cristianizada, após ser estudada e comentada nas escolas católicas.
Tanto os conceitos metafísicos de Aristóteles, entre outros, o de que tudo quanto existe tem uma
causa primeira e um fim último, como a sua cosmologia (geocentrismo, reformulado por Ptolomeu)
foram utilizados e adaptados à doutrina cristã. Esses fundamentos sábios medievais se orientaram para
97
a busca de explicações de fatos e fenômenos do universo com importantes avanços em áreas como a
metodologia científica e a física, entre outras.
No campo intelectual é importante registrar, com destaque nestas Orientações para
elaborar um projeto de pesquisa (...), a fundação das primeiras universidades medievais,
como as de Bolonha (1088), Paris (1150), Oxford (1167) e mais de setenta instituições até o ano 1500.
Essas universidades foram pontos de partida para a universidade contemporânea.
Naquelas universidades, desenvolviam-se, também, pesquisa e o debate. Algumas inovações
contemporâneas são daquela época, tais como o relógio mecânico que transformaram a noção do tempo
na cidade, os óculos (microscópio e telescópio), em 1285, a prensa móvel, em 1448, técnicas agrícola,
melhorias em carroças e carruagens, moinhos de água e a invenção da caravela na expansão do
comércio marítimo, entre outras.
As conquistas da Idade Média Clássica foram repentinamente interrompidas, no séc. XIV / 1348,
pela peste negra ou peste bubônica 19 que, segundo historiadores, acabou com aproximadamente um
terço da população européia, seguida, por um século, de novas pragas e outros desastres, todos com
efeitos negativos sobre a ciência e cultura.
Há um aspecto que não pode ser omitido, quando se trata da ciência na Idade Média: é a
alquimia. Era uma prática muito frequente na época, exercida no anonimato (foi uma forma de
proteção de seus praticantes esotéricos), com certo mistério e fanatismo próprios ao espírito medieval
impregnado de simbolismo; com essas práticas se pretendia decifrar as maravilhas da natureza, não
apenas para penetrar nos seus segredos, mas, para manipulá-los e transformar, p.ex., metais vis em
metais preciosos.
Os historiadores registram o desconhecimento de contribuições importantes da Idade Média à
ciência sendo, de forma incorreta, rotulada Idade das Trevas ou associada a expressões como
barbarismo, escuridão, noite de mil anos etc. Contudo, conforme aponta Losee (1997), contribuições
como o método de falsificação de Grosseteste e as controvérsias sobre verdades necessárias, são,
entre muitas outras, valiosas e interessantes do pensamento medieval. Nesta síntese há que destacar
dois fatos: o nascimento e multiplicação das universidades como centros de ensino e pesquisa e as
primeiras sementes da metodologia científica contemporânea, destacada na relação de filósofos
cientistas da ciência medieval.
A parte que segue relaciona alguns pensadores destacados da escolástica, com indicações de
contribuições à ciência.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Grosseteste afirmava que a experimentação usada para verificar uma teoria e testar suas
consequências deveria ser conduzida pela matemática e levar à compreensão do mundo mediante
elementos matemáticos. Explicava a estrutura do cosmos, relacionando a luz e sua energia como a base
de toda causalidade; por essa razão, as leis da óptica serviam de fundamento a todas as interpretações
da natureza; a luz seria a primeira forma de matéria-prima criada que daria origem às três dimensões
no espaço.
Foi o primeiro escolástico a entender a visão de Aristóteles do método duplo para o pensamento
científico, sintetizado em: a generalização de observações particulares para uma lei universal e, depois,
o caminho inverso, de leis universais para a previsão de situações particulares que ele denominou
método da resolução e composição.
As principais obras de Grosseteste, nas ciências e na filosofia da ciência, foram: De sphera, em
que o autor tratou diversos temas. De accessione et recessione maris / Marés e movimento das
ondas
De lineis, angulis et figuris / Sobre linhas, ângulos e figuras, com abordagens sobre a
lógica matemática aplicada às ciências naturais. Nesta obra e Sobre refração e reflexão de raios,
afirmava que não apenas a visão e a luz, mas todo agente natural enviava suas “virtudes” aos objetos,
afetando a agindo sobre os sentidos e sobre a matéria ao longo de linhas geométricas.
Na Metodologia da pesquisa científica Grosseteste, baseado em reflexões de textos
aristotélicos, afirmava que a ciência começava com a experiência dos fenômenos e tinha como
propósito de encontrar as causas desses fenômenos. Pelo seu método, o primeiro passo era tentar
descobrir as possíveis causas, os agentes causais para os fenômenos vividos; o próximo passo seria
separar o agente causal em seus princípios componentes; depois, com base numa suposição admissível
(a hipótese), o fenômeno observado deveria ser reconstruído a partir de seus princípios; finalmente a
própria hipótese deveria ser testada e validada (ou rejeitada) pela observação. Esse procedimento,
precursor do método científico moderno, continha a base de toda a ciência experimental.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
estudos, tais como a matemática e as línguas. Propôs a reforma do calendário; fez experiências de
óptica e de propagação da força; anteviu as propriedades das lentes convexas, que poderiam se
transformar em telescópio ou microscópio; as consequências práticas do uso da pólvora; os navios de
propulsão mecânica e a possibilidade de vôo de engenhos mais pesados que o ar.
Com seus trabalhos, baseado em observações, acreditava que a ciência poderia resolver todos os
problemas do homem. Dedicou-se a estudos nos quais introduziu a observação e a experimentação
como fundamentos do conhecimento natural, avançando além de seu tutor Grosseteste.
Descreveu um estado do método científico, com detalhes para que outros [pesquisadores]
pudessem reproduzir seus experimentos e testar os resultados, como um ciclo repetido de observação
da natureza, de formulação de hipóteses, de experimentação e da necessidade de verificação
independente. Para uns foi o iniciador do método de experimentação científica desenvolvido pelo
chanceler F. Bacon (séc. XVI); para outros, o monge foi o verdadeiro mestre e o chancelar seu
discípulo.
Segundo Jolivet (1990), R. Bacon, além de procurar aplicar o método matemático à ciência da
natureza, fez diversas tentativas para torná-la experimental, em especial, no campo da óptica,
argumentando que ver com seus próprios olhos não seria incompatível com a fé, sem conseguir
demover as desconfianças medievais por qualquer tipo de experimentação.
Foi professo da Universidade de Paris. Foi frade dominicano e interessado pela alquimia; sobre
esse assunto escreveu a Aurora consurgnes. Foi o maior expoente da escolástica, a filosofia
medieval, protagonista da conciliação entre os valores da fé com os valores da razão numa abordagem
aristotélica. Afirmava: a fé supera a razão, porém, não pode haver oposição entre elas; a verdade da fé
cristã ultrapassa a capacidade da razão, porém, os princípios naturais da razão não podem estar em
oposição a essa verdade.
Os princípios lógicos têm caráter intuitivo e Deus não pode ter dotado o homem de princípios
lógicos falsos. O pensamento racional coloca o homem de acordo com a sabedoria divina. Criado por
Deus, a mente humana é capaz de conhecer a verdade.
A maior contribuição de São Tomás para a ciência foi a integração do aristotelismo à tradição
escolástica, na forma de sustentação do pensamento Cristiano e da reflexão teológica.
As principais obras de Tomás de Aquino são:
101
Suma contra os gentis em que voltou contra os não cristãos; discute assunto sobre a natureza e os
trabalhos de Deus, a sabedoria humana e a felicidade, a compatibilidade da fé com a razão.
Summa theologiae / Suma teológica composta por três partes; nela tratou, na forma de perguntas
e respostas, com a questão da razão e da revelação vistos como caminhos para o conhecimento de
Deus, oferecendo provas; analisou Sua natureza e propriedades e discutiu a relação intelecto
humano e deidade.
Cinco caminhos que conduzem a Deus. Provavelmente Tomas de Aquino seja mais conhecido
pela sua obra. Em sua obra colocava que não entendia a existência de Deus pudesse ser auto-
evidente, oferecendo provas nessa obra.
Escreveu inúmeras Questões sobre a verdade, a alma, o mal e a beatitude.
Opúsculos filosóficos; toda sua produção se caracterizou pela claridade expositiva e por sua
articulação metodológica de conceitos e argumentos; foi responsável.
Tomás de Aquino analisou a natureza do argumento com base no fundamento de um axioma
implícito: não há ordem no mundo material sem um princípio inteligente transcendente. Para que essa
proposição tenha a força pretendida deve necessariamente excluir que qualquer princípio de
organização se dê ao acaso (a matéria se auto-organizar casualmente). Fosse possível a auto-
organização, sua conclusão de que existe um ser que a ordena não teria a validade lógica necessária
porque haveria, pelo menos, a possibilidade lógica de que a organização observada se desse de forma
casual pela própria matéria.
Dessa forma, estar-se-ia dispensando a necessidade de um princípio inteligente. Mas, sem essa
demonstração de impossibilidade, já se tem um ponto como certo que constitui a segunda objeção
levantada contra a possibilidade da existência de Deus: a de que existe uma natureza autônoma.
Afirmava que o que se pode fazer com menos não se deve fazer com mais, então, por que excluir, logo
de início, a auto-organização inerente à matéria? A resposta à segunda objeção é reafirmar sua quinta
via: “na natureza, operando para um fim determinado, sob a direção de um agente superior, é
necessário que as coisas feitas por ela ainda se reduzam a Deus como à causa primeira”.
Tomás de Aquino postulou que um argumento tem sucesso em convencer alguém de sua
conclusão apenas se a pessoa, de início em dúvida, pudesse ser levada pelo argumento a acreditar em
sua conclusão. Esse acreditar deve ser o resultado daquilo que lhe for apresentado pelas premissas, as
quais devem, por sua vez, fornecer base sustentável para se acreditar na conclusão demonstrada. Dessa
forma, quem estiver em dúvida sobre a conclusão, estaria também em dúvida a respeito das premissas.
O que o argumento precisa demonstrar é que as coisas na natureza agem propositadamente em
direção a um fim e que, por si, elas são incapazes de realizá-lo. Dessa forma, para um epicurista que
considera a natureza apenas uma conformação temporária e casual dos átomos, tal argumento não faria
sentido.
Tomas de Aquino acentuou a diferença entre a filosofia, que estuda todas as coisas pelas últimas
causas à luz da razão e a teologia, ciência de Deus, que a estuda as coisas à luz da revelação.
102
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Considerou que o conhecimento tem a primazia sobre a ação, pois nada pode ser amado se ante não for
conhecido e defendia a liberdade da vontade humana (livre arbítrio) para aderir ao bem ou ao mal,
conforme a responsabilidade moral de quem decide.
nomes, sem realidades fora do espírito ou da mente; as únicas realidades seriam os indivíduos e os
objetos considerados individualmente. A tese central do nominalismo é a não-existência de conceitos
abstratos e universais, mas, apenas de termos ou nomes com o sentido de designar indivíduos revelados
pela experiência. Nesse contexto, argumentava que não se poderia chegar a uma verdade teológica
utilizando-se meios racionais.
Occam rejeitou a explicação do conhecimento pela doutrina iluminista (S. Agostino) ou pela
inspiração platônica (Tomás de Aquino) na abstração, na essência, de origem aristotélica. A
individualidade do sujeito e a particularidade do objeto não podem ser omitidas do conhecimento.
Ofereceu uma explicação baseada na intuição sensível que permitiria entrar em contato direto com a
realidade individual e concreta: é a tese do nominalismo.
A intuição não é a captação direta por parte do sujeito de uma essência, de uma ideia platônica,
mas, a relação direta do sujeito que conhece com o objeto que é conhecido, algo presente e garantido
pelo que é imediato, pela presencia da “coisa”. Assim, o conhecimento é algo que se oferece de modo
direto e imediato e não o resultado da elaboração do entendimento que culminaria no conceito, de uma
abstração; isto, porque o universal não é real e o conhecimento se dá pela presencia de uma coisa e/ou
causa imediata que é real. Sua doutrina nominalista, junto com a navalha de Occam, faz parte e reforça
o argumento de que somente coisas individuais são reais.
Dessa forma, não considerava a necessidade de justificar o uso de termos gerais ou universais
como mulher, fogo (...) como referentes às formas ou essências, as quais possuem um modo especial de
existir, distinto da existência de mulheres, de fogos (...) particulares. Sua navalha extirparia o
pressuposto da existência real das formas ou essências. Isto, porque a universalidade que a essência
necessita para se justificar não estará na universalidade que é apenas propriedade de certo nome ou
signo.
Para Occam os conceitos não podem representar essências que não tem presencias nem
existências reais; são apenas sinais de natureza linguística, formados a partir da experiência, por
generalizações. Os conceitos seriam de dois tipos: os naturais concebidos pela mente, por palavras
mentais e os convencionais ditos e escritos que não serião essências.
No prólogo de seus comentários sobre a as Sentenças de Lombardo, Occam estabeleceu dois
tipos de conhecimentos, o intuitivo: de uma consciência imediata, tanto objetos dos sentidos como de
atividade mentais em manifestações como revelação e verdades auto-evidentes, e o conhecimento
abstrato, proveniente do conhecimento intuitivo, não sendo baseado em fatos, mas sim em proposições.
Um dos fundamentos do método científico é a chamada Navalha de Occam ou Lei da
parcimônia, um dos fundamentos do reducionismo na ciência, sintetizado pela expressão: se há várias
explicações igualmente válidas para um fato, então, deve-se escolher a mais simples, isto, porque a
natureza é por si mesma econômica.
Esse princípio, - o da Navalha de Occam ou Lei da parcimônia, diz respeito, nas explicações de
fenômenos, que não se deve exagerar as complexidades das teorias: “entia non multiplicanda praeter
necessitateum”.
104
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
A essência dessa lei pode ser considerada empirista por defender a necessidade de
experimentação como fonte do conhecimento.
A Navalha de Ockham estabeleceu, entre outras proposições, as seguintes:
a) É desnecessário fazer com mais o que se pode fazer com menos. Na pesquisa com qualidade,
racionalidade e efetividade em seus resultados o princípio pode ser interpretado como planejar e
buscar apenas as informações necessárias para se atingir determinados propósitos. O excesso de
dados, explicações (...) traz ineficiência e poderá ocultar explicações valiosas.
b) O essencial não deve ser multiplicado sem necessidade. Na pesquisa pode ser visto como
complicar situações por vezes complexas, tornando-as inexplicáveis. Neste sentido, Occam
expressou ideias interessantes, tais como: “há certo receio (...) de que algumas coisas não são
feitas para serem conhecidas e algumas inquirições são muito perigosas (...); todas as pesquisas
acarretam elementos de risco (...); o melhor meio de evitar abusos e incompreensões é tornar a
sociedade cientificamente informada a fim de que compreenda as implicações de tais
investigações”.
c) Quando existem várias formas, igualmente válida, para explicar um mesmo fato, a mais certa é
a mais simples. Nesta proposição é necessário diferenciar simples de simplismo em que fatores
essenciais são eliminados. Estabelecer o simples não deve ser interpretado como a diminuição da
variedade nem a redução da entidade até torná-la inadequada, simplista. Tampouco deve ser
colocado no outro extremo, o da complexidade, em que o real é um todo indissociável contraposto
à causalidade, em atrito com o conhecimento que só poderia ser obtido pelo uso da razão pura.
Há autores que consideram o princípio da parcimônia como um princípio ontológico ao acreditar
que a natureza não faria de forma complicada o que pudesse fazer de forma simples; era, em parte, uma
tese de Grosseteste. Outros acreditam que se trata de certa tendência simplificadora quando se
prefere explicar as coisas de uma forma simples, com a evidência de que teorias simples conseguem,
muitas vezes, explicar fenômenos aparentemente complexos.
Qualquer que seja sua explicação, ela deve estar presente na atividade do pesquisador para
eliminar exageros, supérfluos e complexidades desnecessárias.
Uma das contribuições mais significativas de Buridan, com base nos movimentos dos astros, foi
a formulação e popularização da teoria do impetus, a semelhança da hipótese / teoria de Occam, que
explicava o movimento de projéteis e objetos em queda livre: “quando o arqueiro lança a sua flecha, ele
imprime-lhe certo impetus proporcional ao seu volume, à sua densidade e à velocidade...; se o impetus
não fosse diminuído e destruído por alguma força contrária, que a ele resistisse ou então por algo que
inclinasse o móvel para um movimento diferente, o impetus duraria indefinidamente”. Essa ideia foi
precursora da dinâmica de Galileu e do princípio da inércia de Newton. Para o tomismo aristotélico os
astros eram movidos por uma inteligência divina que, segundo Buridan, não havia necessidade dessa
inteligência.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Esse mesmo pensamento, em outro sentido, estimulou as artes; para os escolásticos da Idade
Média, a arte era uma virtude do intelecto prático, um hábito de ordem intelectual que imprimia ideias à
matéria; algo com “aquilo cuja visão agrada” (Tomás de Aquino), aquilo cujos requisitos seriam a
proporção ou harmonia, a integridade ou unidade e a clareza ou luminosidade.
____________0____________
Entre os muitos aspectos que a Idade Média trouxe e deixou, além de um grande e inigualável
acervo de obras de arte, um é destacado nestas Orientações para elaborar um projeto de
pesquisa (...):
(...) a lógica moderna com novos fundamentos da matemática; novas teorias de lógicas
não-clássicas, baseadas em linguagens mais ricas em formas de expressão, com novos princípios e
semânticas distintas. Da Idade e seus pensadores que herdou tais contribuições à ciência, trata-se na
próxima seção.
permitiu a leitura de autores – filósofos, como os gregos. A divulgação por esse meio de comunicação -
informativa foi feita, em parte, pelos estudiosos migrantes para o Ocidente, após a captura de
Constantinopla pelos turcos. Outro fato importante que deve ser destacado foi a descoberta da América,
com suas civilizações.
Na astronomia, o Renascimento teve sua principal contribuição com as obras de Galileu, dando
início a uma nova forma de estudar e de compreender a natureza em dois sentidos:
a) Em primeiro lugar, buscou-se a autonomia da ciência, desligando-a da teologia e da tradição
aristotélica, conforme consta na obra de Galileu Diálogo dos grandes sistemas.
b) Em segundo lugar, aplicou-se um novo método, o método experimental adequado a realidade
para chegar ao conhecimento científico, com um resultado diferente daquele encontrado na
ciência tradicional.
Com relação ao método experimental, Galileu afirmava que ao cientista só se devia exigir que
provasse o que afirma. (...), a começar pelas experiências sensatas e pelas demonstrações
indispensáveis, conforme constam em sua obra As duas novas ciências.
As contribuições filosóficas e matemáticas de Galileu deram e matemático à ciência uma nova
linguagem, a linguagem do rigor, a linguagem matemática.
A parte que segue apresenta uma síntese de algumas contribuições de grandes pensadores na
ciência, no período moderno, buscando definir uma linha de evolução do pensamento científico e do
método de investigação, com exemplos, poucos, de descobertas e invenções ocorridas naquele período
da história da ciência.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
planetas que giram em seu entorno. Inicialmente suas ideais foram apresentadas na forma de hipóteses
como explicações preliminares e orientadoras de pesquisa, dada a sua insatisfação com as explicações
aristotélico-ptolemaicas. Pensava que o centro da Terra não era o centro do universo, mas, apenas o
centro da órbita da Lua, acreditando que perturbações nos movimentos observados dos planetas eram
resultados da rotação da Terra ao redor de seu eixo e de seu movimento orbital.
O padre, astrônomo e matemático Copérnico continuou trabalhando, em sigilo, corrigindo e
expandindo seu texto Comentário (...) com resultados, anos depois, apresentados na sua obra De
revolutionibus orbitum coelestium / Sobre as revoluções das esferas celestes, onde a teoria
heliocêntrica foi colocada de forma científica e não apenas como uma hipótese; mas, também, naquela
oportunidade se negou a publicá-la, dado o risco de ser condenado pela Igreja e por reconhecer a
necessidade de revisão e de verificação de suas observações. A obra Sobre as revoluções (...) gerou
intensos debates, por décadas, e ataques como, p.ex., de teólogos protestantes ao sustentar que o
heliocentrismo contrariava a Bíblia.
Após 20 anos de escrita Sobre as revoluções (...) o frade dominicano Giordano Bruno
acrescentou a ideia do Universo infinito sendo, por isso, condenou a morte pela Inquisição.
Copérnico debilitado, semiparalítico e frustrado (era um cientista perfeicionista impedido de se
expressar e trabalhar com liberdade) confiou o manuscrito De revolutionibus (...) a seu aluno George
Rheticus; este, sob pressão “facilitou” que o manuscrito caísse em mãos do teólogo luterano Andréas
Osiander o qual introduziu mudanças no texto (p.ex., apresentando a teoria como uma hipótese) sendo,
anos depois, publicado; um exemplar da obra, sem o conhecimento das mudanças, chegou às mãos de
Copérnico em seu leito de morte.
Segundo a teoria heliostática, o Sol é o centro do sistema solar e das órbitas dos planetas que
giram em torno dele; o movimento da rotação da Terra sobre seu próprio eixo é o que dá origem a
sucessão de dias e noites. Foi o primeiro a posicionar, de maneira correta, Vênus e Mercúrio (mais
próximos do Sol e com movimentos mais rápidos), estabelecendo a ordem e distância dos planetas
conhecidos.
Na comprovação dessa teoria criou, para a física experimental, um novo método, o método
experimental, com a concepção matemática da natureza, uma ideia defendida pelos pitagóricos, mas,
com novas contribuições, hipóteses e alteração de várias teorias astronômicas dos gregos.
Brahe realizou observações regulares e mais acuradas das posições dos planetas, mostrando que
as trajetórias descritas por Ptolomeu eram apenas grosseiros roteiros dessas trajetórias. Por tudo isso,
ficou famoso por ter coletado os mais precisos dados astronômicos até aquela época. Sem acreditar no
modelo heliocêntrico proposto por Copérnico e utilizando seus dados, propus um novo modelo
geocêntrico do universo que se tornou popular.
Coube a seu discípulo e assistente Kepler, alguns anos mais tarde e utilizando as mesmas
observações, porém, com novas orientações, não apenas comprovar o modelo heliocêntrico, mas,
estabelecer princípios das três Leis de Kepler do movimento planetário. Afirmava que os fatos não são
suficientes por si mesmo; fatos e medidas precisam ser interpretados pelo pesquisador que realiza um
experimento, sem viés ou sem influência estranha à ciência e seu método, para se gerar um
conhecimento científico. 26
Brahe publicou o Mundi aetherei recentioribus phaenomenis / Sobre o novo fenômeno
no mundo etéreo, sobre observações de um cometa demonstrando que se movia entre as esferas dos
planetas, e, portanto, que o céu não era imutável e as esferas cristalinas, como concebidas na tradição
greco-cristã, não eram entes físicos. Junto com Kepler, seu ajudante, e Galileu deram mais realismo ao
método hipotético.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
posso afirmar (...) que temos necessidade de uma história exata do saber, contendo a origem das
ciências, as invenções, as tradições, os diversos tipos de preparação e organização, os períodos de
expansão, oposição e decadência (...) com as suas causas e possibilidades de todos os
acontecimentos que dizem respeito ao saber.
F. Bacon elaborou um esboço da história da ciência, das artes e das técnicas, extensiva a todas
as regiões do mundo e a todos os períodos da história. Destacou a experiência (iniciador do empirismo)
e o método dedutivo de tal forma que o transcendente e a razão acabaram relegados a planos
secundários. Apontam os historiadores que faltou a consciência crítica do empirismo, conquistada, aos
poucos, pelos seus sucessores e discípulos até Hume.
No começo da obra Instauratio magna scientiarum, F. Bacon apresentou a classificação geral
das disciplinas humanas, baseada no respectivo predomínio das três faculdades que precedem à
organização do saber: a memória, a fantasia e a razão. A classificação não era baseada no objeto do
conhecimento, e sim no sujeito que conhece, compreendendo a História tanto civil quanto natural, que
registra (memória) os dados de fato; a poesia com elaboração imaginativa desses dados; e a ciência ou
filosofia, o conhecimento racional de Deus, do homem e da natureza.
111
F. Bacon destacou em sua obra Novum organum que o que interessa a ciência não é seus
princípios comuns, e sim a ciência da natureza. Dessa forma, o Novum (...) deveria conter as regras
para a construção dessa ciência, reivindicando o método indutivo com um novo sentido. Tal método,
segundo Aristóteles e Tomás de Aquino, entre outros predecessores, foi reconhecido como único
procedimento para se ter o conhecimento humano, mas, com o interesse maior nas causas do que na
experiência, portanto, com um conteúdo mais metafísico do que científico.
Na obra o Novum organum que F. Bacon previa com 130 seções agrupadas em seis partes,
desenvolveu a primeira teoria moderna do método científico, mediante etapas essenciais. O objetivo
desse método era o de se constituir uma nova maneira de estudar os fenômenos naturais mediante a
descoberta de fatos que não depende de raciocínio silogístico aristotélico, mas, sim da observação e da
experimentação dispostas conforme regras do raciocínio indutivo. O conhecimento “verdadeiro” seria
o resultado da concordância e da variação dos fenômenos que, se devidamente observados,
apresentariam as suas causas reais.
Na primeira parte, Partitiones scientiarum, apresentaria diversos saberes científicos existentes,
relativos à natureza (astronomia, meteorologia, geografia, mineralogia, vegetais e animais), ao homem
(anatomia, fisiologia, poder e estruturas sociais) e a ação do homem sobre a natureza (medicina,
química, artes visuais, sentidos, emoções, faculdades intelectuais, arquitectura, transporte, imprensa,
agricultura, navegação e aritmética, entre outras), com indicações de deficiências e sugestões de
soluções.
A segunda parte, De interpretatione natura, seria uma nova e fecunda metodologia, a lógica
indutiva; essa metodologia permitiria ampliar o campo do que se sabe, não por generalizações
falaciosas, mas por procedimentos inventivos capazes de permitir uma exploração ativa do universo e
da diversidade dos seres que o habitam.
A terceira parte, Phaenomena Universi, seria uma colecção de fatos e acontecimentos de todos
os campos da experiência para se constituir um "Alfabeto do Universo" que deveria funcionar como
base de aplicação do novo método.
A quarta e quinta partes, Scala intelectus e Prodomi sive anticipationes philosophiae
secundae, ofereceriam exemplos bem sucedidos da aplicação, respectivamente, do novo método
inventivo e dos métodos antigos.
A sexta parte seria a Philosophia secunda sive scientia activa, incompleta e inconcluída.
No aforismo 36 do Novum organum, atribui tanto a superioridade explicativa da ciência quanto
sua eficácia praxiológica, ao fato de serem cuidadosas e rigorosas as observações dos fenômenos,
indicando que a observação desponta como a garantia de não se projetar uma racionalidade que não
pertence à ordem da inteligibilidade do objeto de investigação. Afirmava que só a razão não tem
capacidade preditiva, adquirindo-a quando se combina com a observação.
O verdadeiro método da indução científica compreenderia uma parte negativa ou crítica e uma
parte positiva ou construtiva. A parte negativa consistiria, em alertar a mente contra os erros comuns
(observação sem valor) na busca do conhecimento científico. Neste caso, a observação com valor nem
112
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
sempre seria fácil de obter; poderia ser prejudicada por falhas no nível de percepção, bem como por
preconceitos que introduzirião visões deformadas. Dessa forma, estariam sendo identificados vários
tipos de fontes tipológicas de ilusões cognitivas, tais como os ídolos:
a) da tribo (idola tribus): são os erros que ocorrem por conta das deficiências do próprio espírito
humano que se revelam pela facilidade com que se generaliza com base nos casos favoráveis e
se rejeita com base em casos desfavoráveis; são erros inerentes à natureza humana, à própria
tribo; são os erros do homem de não saber o por que das coisas;
b) da caverna (idola specus); uma alegoria à caverna de Platão; são os erros que resultam da própria
educação e de pressões como as dos costumes;
c) da vida pública (idola fori); erros vinculados à linguagem e ao mau uso que se faz;
d) da autoridade (idola theatri); são erros que decorrem da subordinação à autoridade ou de escolas
filosóficas, que substituem o mundo real por um mundo fantástico, por um jogo cênico.
A parte positiva ou construtiva do método indutivo corresponderia à verdadeira interpretação da
natureza com base em princípios imanentes.Seriam as causas e leis certas dos fenômenos (as chamadas
formas da natureza) associadas às ações e ordens da natureza. Tratava-se de fenômenos experimentais
objeto da física como, p.ex., a luz, o calor e o peso.
A pesquisa estaria baseada na passagem (explicação...) das naturezas às formas; da presença de
um atributo à ausência do mesmo em um objeto; dos fenômenos às essências (...). Compreenderia a
descrição pormenorizada de fatos observados, confrontados com três tabuas que disciplinariam o
método indutivo. São as tabulae baconiana de investigação, com suas duas formas: as experiências
vagas ou noções quando o investigador atua por acaso e as experiências escrituradas, quando o
pesquisador informado observa metodicamente e faz experimentos. Essas tábuas constituiriam o
núcleo do método sobre as quais F. Bacon estabeleceu a epistemologia da ciência (epistemologia
tradicional) ao defini-la como: “a ciência parte da observação e só, em seguida, procedendo
cautelosamente, chega às teorias”.
Nas tabuas baconianas são considerados três estados. A primeira tábua de investigação é a de
presença, afirmação ou verificação de uma ocorrência positiva; a causa (forma) dos fenômenos,
procurada com base na presença nessa tabela. F. Bacon reconheceu que não é fácil se ter tábuas
completas e isolar as naturezas simples que coloque em evidência a causa; assim, para destacar a causa
e as leis das formas da natureza seria necessário estabelecer hipóteses testadas pela experimentação
com base no maior número possível de exemplos em que aparece um dado fenômeno, enumerar os
casos que mais se assemelhem e os casos em que o fenômeno não aparece.
A segunda tábua baconiana consiste na ausência, negação ou verificação de que o fenômeno
não ocorre; era a tábua responsável pelo controle de situações nas quais as formas pesquisadas se
revelariam ausentes.
113
A terceira tábua é a das graduações ou comparações, que consistiria na anotação dos diferentes
graus de variação ocorrida no fenômeno para descobrir possíveis correlações entre as modificações; era
a tábua responsável pelo registro das variações que as referidas formas manifestam.
Com as tábuas seria possível eliminar causas que não se relacionam com o efeito ou com o
fenômeno ou objeto analisado e, pelos registros da presença e de variações seria possível chegar à
verdadeira causa do mesmo. Estas tábuas não apenas dariam suporte ao método indutivo, mas,
permitiriam fazer uma distinção entre a experiência vaga ou noções recolhidas ao acaso e a
experiência escriturada ou observação metódica e passível de verificações empíricas.
No método de F. Bacon a observação é considerada como o único meio para se combater a
especulação vazia. Trata-se do recurso necessário para garantir a autenticidade do conhecimento e a
condição praxiológica (teoria epistemológica), isto é, a condição que estuda as ações, comportamentos
e leis humanas como conclusões operacionais da ciência, supondo-se que não seria possível
transformar a racionalidade funcional de alguma coisa sem dispor de um conhecimento baseado na
observação de sua “conduta” ou natureza. Observar é, em consequência, tanto um procedimento de
garantia da autêntica epistêmica quanto uma atividade rastreadora que fundamenta ao projeto
praxiológico de controle instrumentalizador da natureza.
Dessa forma, o autêntico conhecimento só é possível quando o homem se dedica à observação
[criteriosa] dos fatos, registrando-os [com auxílio de instrumentos] de modo à de eles derivarem as leis
que os explicam: um trabalho empírico-analítico na medida em que implica o acompanhamento
cuidadoso des fatos, percebendo sua natureza para, a partir daí, inferir as possíveis constatações sob a
forma de leis; sem uma metodologia adequada pouca utilidade teria a observação e o raciocínio e em
nada contribuiriam para o progresso da ciência.
Um aspecto que deve ser destacado, entre as contribuições de F. Bacon à ciência e pela
pertinência com o texto, diz respeito à integração de esforços, quando conclui que o conhecimento
pode ser frutífero somente se a tecnologia e a filosofia estiverem unidas; em lugar do debate de
pormenores de matéria e forma, de especulação da metafísica (...), os cientistas deveriam observar a
natureza [observar e registrar o fato de valor], esboçar conclusões com base na indução e
experimentação e empregar ferramentas aplicáveis [convenientes, adequadas] para testá-las. São as
comunidades, em vez de gênios isolados, as responsáveis pelo progresso científico. Contudo, os
historiadores apontam como falha, o menosprezo pela ciência especulativa e a pouca importância da
hipótese na pesquisa. Afirmava Bacon que todo conhecimento se deriva da observação e
experimentação e que a suposição de leis uniformes de um mundo essencialmente caótico poderá
distorcer a percepção.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
método científico ressaltava o valor da experimentação como o mais importante procedimento a ser
seguido nas ciências naturais; dizia: “não basta acompanhar os fatos, é necessário modificá-los para
entender como acontecem”.
A maior contribuição à metodologia científica foi a integração das investigações teórica e
experimental em um todo único sem que, ao colocar o experimento como base do conhecimento
científico, menosprezasse o papel da teoria. Outra notável contribuição foi a introdução da matemática
na prática da investigação científica.
Galileu, em sua obra Diálogos sobre os dois máximos sistemas do Mundo: copernicano
e ptolomaico defendeu o sistema heliocêntrico que motivou um longo processo contra ele em
tribunais da Inquisição, obrigando-o a abdicar de suas ideias, conforme consta na confissão que foi
obrigado a redigir:
Eu Galileu Galilei, filho do falecido Galelei de Florenza, com 70 anos de idade, julgado
pessoalmente por esta corte, e ajoelhado diante de vós, Eminentíssimo e Reverendíssimos Cardeais,
Inquisidores-Gerais de toda a República Cristã (...), após receber a admonição da Igreja Católica,
abandono inteiramente a opinião falsa segundo a qual o Sol é o centro do universo e imóvel, e Terra
não é o centro do universo e que ela se move, a dita falsa doutrina, na qual não devo crer, defender
ou ensinar sob qualquer forma, seja verbalmente ou por escrito (...), adjuro, de todo coração e com
verdadeira fé detesto a amaldiçôo os supraditos erros e heresias, e todo e qualquer erro em geral que
seja contrário à Igreja Católica (...).
Após alguns anos de silencio pelo receio de represálias da Igreja, publicou, mas não em seu
nome, o Saggiatore / O ExPerimenta; nessa obra apresentou uma exposição dos princípios que
devem regular o raciocínio científico e o processo experimental, defendendo o ceticismo do
pesquisador perante as afirmações. Além disso, esboçou uma teoria que alcançou notável importância
na história do pensamento humano: há uma diferença, na natureza, entre as qualidades primárias, tais
como posição, número, formato e movimento dos corpos e as qualidades secundárias, tais como cores,
cheiros e gostos que existiriam apenas na consciência do observador.
Depois, Galileu publicou, com seu estilo claro e incisivo: Dialogo sopra i due massimi
sistemi del mondo: Tolemaico.
Coperniano / Diálogos sobre os dois máximos sistemas do Mundo: coperniicano e
ptolomaico, obra que causariam sua condenação como pessoa não grata para a Igreja e daria origem
ao processo de sua condenação sob a acusação de heresia à prisão perpétua. Essa obra foi escrita sob a
forma de um diálogo entre três pessoas que confrontavam as cosmologias de Ptolomeu e Aristóteles
com a de Copérnico, destruindo metodicamente os argumentos tradicionais. Nela, desafiava o edito
contra a propagação da teoria heliocêntrica de Copérnico.
Nessa fase de sua vida se voltou para o estudo da mecânica dos movimentos dos corpos,
chegando a conclusões opostas às de Aristóteles que afirmava que todo movimento, para poder se
manter, pressupõe a ação contínua e permanente de uma força; Galileu, com uma visão diferente,
115
concluiu, após várias observações, que os corpos sempre se mantêm tanto em movimento retilíneo e
uniforme como em repouso, a menos que haja uma força ou forças para impedi-lo; nascia, assim, o
princípio da inércia, que Newton usaria depois na construção de sua teoria.
Galileu estudou a queda dos corpos, concluindo, também em oposição a Aristóteles, que os
corpos leves, longe de caírem mais lentamente do que os pesados, como se afirmava, fazem-no com a
mesma velocidade. Ao mostrar como essa queda ocorre em Diálogos sobre as duas novas
ciências, a apresentou como uma relação de proporcionalidade entre o espaço percorrido e o tempo,
reafirmando a importância do método experimental para a ciência; nesse método, formulada uma
hipótese, o cientista a evidencia pela realização de experimentos e, somente então, parte para as
elaborações teóricas. Tais ideias foram referências da mecânica moderna.
Na especulação no campo da mecânica, a simples observação não era suficiente para se obter o
princípio da inércia. Esse princípio não poderia repousar apenas na realização de um ou mais testes.
Galileu recorreu às "experiências em pensamento". Com efeito, qualquer tentativa de demonstrar
experimentalmente o princípio da inércia estará, de antemão, condenada ao fracasso, pois ele ocorre
literalmente apenas em condições ideais. No mundo real, o atrito sempre se faz sentir. A experiência
em si serve apenas para constatar a validade do princípio, pois, com uma progressiva redução do atrito,
a “bola percorre”.
A grande contribuição de Galileu à ciência (apenas uma amostra) esteve na criação da ciência do
movimento, com duas novas ciências: a estática e a dinâmica. Além do novo método de análise e de
verificação, a "cinemática" geral implicava um novo conceito de movimento tão revolucionário quanto
à nova cosmologia. O movimento era uma espécie de mudança, a mudança de lugar (física
aristotélica), devida a uma causa, sendo que no repouso não existe essa causa (estado natural de um
corpo); o movimento seria uma mudança repetida e, de acordo com o princípio de causalidade,
exigiria a ação constante de causas (influxo permanente de energia, no contexto moderno).
Sendo que o movimento exige causas e o repouso é a sua própria causa, Galileu considerou que
existe um estado de movimento equivalente ao estado de repouso. Dessa forma, o movimento deixou
de ser uma mudança e a continuação do movimento não seria mudança repetida, mas, retenção de um
estado. O que requer uma “causa” é a passagem do repouso ao movimento e do movimento ao repouso.
Nesse contexto, o movimento seria definido por velocidade e direção, sendo o movimento
retilíneo uniforme o mais simples de todos; nele, define-se cada um dos vetores por coordenadas de
espaço e de tempo, combinadas na aritmética geometrizada. Dessa forma, um dado movimento em
certo momento seria definido por determinadas quantidades representadas por essas coordenadas.
Assim, seria a mudança nesta quantidade que constituiria uma mudança no movimento. Mudança de
velocidade e de direção indica uma ação de uma força adicional à força que mantém o movimento
retilíneo. Estas, entre outras, foram inferências e conclusões de Galileu contra as aparências, contra as
percepções sensoriais, em que o corpo para se a força impulsionadora cessar.
Também como exemplos se relacionam alguns inventos, conceitos e descobertas de Galileu, tais
como: o pêndulo e outros instrumentos usados para medir o tempo com precisão; os conceitos de
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
aceleração, utilizado na física moderna e de fricção da inércia com relação aos objetos em
movimento; os componentes da força e outros precursores da formulação das leis do movimento de
Newton; as bússolas magnéticas, termômetros, telescópios e lentes especiais; descobriu que a Via
Láctea está composta por milhares de estrelas e que o Universo não é fixo nem imutável.
O método de investigação proposto por Galileu pode ser sintetizado:
a) a partir de dados da investigação e de experimentos iniciais se cria o modelo ideal que será
implantado;
b) mediante repetições de experimentos se obtém valores médios [das variáveis em estudo] tendo
em conta as correções e os fatores de perturbação;
c) os valores obtidos de experimentos repetidos são as referências para formular hipóteses
matemáticas a serem testadas; são as bases da inferência feita mediante raciocínios lógicos;
d) as consequências [das inferências] serão testadas por outros experimentos como forma de
confirmação indireta da hipótese adotada.
escritos salientam a necessidade da experiência como base para a filosofia: o sujeito com a consciência
pela via do sentir (sensciente) sente primeiro a se mesmo e depois o calor.
Entre as principais obras de Campanella se destaca A cidade do Sol; escrita no cárcere, com
certa orientação da República de Platão. Trata-se de uma proposta urbanística na ilha de Taprobana
(Sri Lanka), com sete círculos sobrepostos, cada um com uma antena para captar as influencias astrais
positivas dos sete planetas; com quatro portas voltadas para os pontos cardeais. No alto da cidade se
encontraria um templo redondo, reproduzindo a esfericidade cósmica. Essa estrutura propiciaria um
ambiente que pudesse ajudar aos homens a se tornarem melhores. Cabe destacar, nessa cidade ideal,
sem hierarquias e na qual todos trabalhariam e as várias funções seriam adequadamente repartidas, um
método de ensino para todas as crianças com especificações.
Em Apologia de Galileu Campanella defendeu o sistema de Copérnico e a separação das
passagens das Escrituras e a natureza para o conhecimento do Criador. Em sua aproximação animística,
neoplatônica e astrológica, do Criador, argumentou que a verdade sobre a natureza não está revelada
nas Escrituras e pedia liberdade de pensamento na especulação filosófica.
Outras obras de Campanella são: Do sentido das coisas e da magia e Metafísica e
monarquia de Espanha.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
adquiriram explicações que não se ajustavam no mesmo contexto à realidade. Essas descobertas
substituíram velas teorias do médico grego Galeno.
Apesar da oposição dos doutores da época, suas ideias foram aceitas e divulgadas por
Descartes, influenciando-o na composição da quinta parte de Discurso do método e em sua obra As
Paixões da alma. A teoria da circulação sanguínea de Harvey foi publicada na sua obra A propósito
dos movimentos do coração e do sangue.
Conhece-se melhor uma coisa através dos elementos de que ela se constitui. Assim como não é
possível saber, em um relógio ou outra máquina mais complexa, qual é a função de uma parte se ele
não for desmontado e separadamente examinado o desenho e o movimento, tampouco é possível
conhecer a cidade. É necessário compreender a condição da natureza humana, com o uso de quais
meios ela é capaz ou incapaz de dar corpo à cidade, de que modo hão de se ajustar entre si os homens
se querem alcançar a união.
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Fundamentos da pesquisa
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Quanto ao conhecimento, Hobbes é empirista, com conceitos, tais como: a origem de todo
conhecimento é a sensação, o princípio original do conhecimento dos próprios princípios: a
imaginação é um agrupamento inédito de fragmentos de sensação e a memória nada mais é do que o
reflexo de antigas sensações. Contudo acreditava na possibilidade de uma lógica pura e racional, em
um raciocínio demonstrativo rigoroso, ao lado de uma indução empírica de aproximação entre a
experiência passada, sem prova decisiva, para o que se passará no futuro, sem outro fundamento que
não fosse a associação de ideias, the trayan of imagination.
A filosofia de Hobbes é materialista e mecanicista. Assim como a percepção é explicada
mecanicamente a partir das excitações transmitidas pelo cérebro, a moral se reduz ao interesse e à
paixão. Na fonte de todos os valores, há o endeavour, em inglês, e conatus, em latim (encontrado
também em Spinoza), isto é, o instinto de conservação ou de afirmação e de crescimento de si próprio;
esforço próprio a todos os seres para unir-se ao que lhes agrada e fugir do que lhes desagrada. É a
partis desses fundamentos elabora sua justificação do despotismo: no absolutismo da época, apoiado na
teologia, ao justificar o poder absoluto do soberano, descobre-lhe uma origem natural. Para ele, o
direito, em todos os casos, reduz-se à força, com dois estado na história.
O estado natural, em que o poder de cada um é medido por seu poder real; cada um tem
exatamente tanto de direito quanto de força e todos só pensam na própria conservação e nos interesses;
o homem, por natureza, procura ultrapassar todos os seus semelhantes: ele não busca apenas a
satisfação de suas necessidades naturais, mas, sobretudo as alegrias da vaidade: Homo homini lupus, /
o homem é o lobo do homem; Bellum omnium contra omnes, é a guerra de todos contra todos.
O outro é estado político. O homem não possui instinto social, não é sociável por natureza, mas,
tendo que estabelecer a paz e a segurança deverá renunciar ao direito absoluto que tem sobre todas as
coisas. Isto só será possível quando cada um abdicar de seus direitos absolutos em favor de um
soberano que, ao herdar os direitos de todos, terá um poder absoluto, sem que se configure a
intervenção de uma exigência moral. Simplesmente o medo é maior do que a vaidade e os homens
concordam em transmitir todo o seu poder a um soberano, sem compromisso em relação a seus súditos.
Seu direito não tem outro limite que seu poder e sua vontade. No estado de sociedade, como no de
natureza, a força é a única medida do direito. No estado social, o monopólio da força pertence ao
soberano.
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Fundamentos da pesquisa
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Fundamentos da pesquisa
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contrário do pensamento dos gregos antigos e dos escolásticos que acreditavam que “as coisas
existem porque precisam existir ou porque assim devem ser”.
Uma das primeiras obras de Descartes foi a Regulae ad directionem ingenii / Regras para
a direção do espírito. Nela, defendeu a ideia fundamental de que a unidade do espírito humano,
qualquer que seja a diversidade dos objetos da pesquisa, deve permitir a invenção [aplicação] de um
método universal. Depois publicou três resumos de obras científicas: A dióptrica, Os meteoros e A
geometria.
Em sua obra, o Discurso sobre o método, inspirada no rigor da matemática (a certeza
cartesiana é matemática) e com longas cadeias de razões, prova a existência de Deus e o primado da
alma sobre o corpo. Nessa obra afirmou que a análise matemática dos antigos (geometria) e a álgebra
dos modernos, além de apenas compreenderem coisas abstratas e sem uso, estavam (a análise)
limitadas às considerações das figuras sem uma ação fácil sobre o entendimento; e a álgebra, por estar
sujeita às regras e números, tornava-se uma arte confusa e obscura que ofuscava o espírito, em lugar de
cultivá-lo. Por isso “me obrigo a pensar na necessidade de buscar outro método que, tendo a vantagem
dos três [além da análise e da álgebra, referia-se à lógica], superasse tais inconvenientes”.
A ideia de integrar as três abordagens surgiu na obra Regras (...) quando se referiu a uma
matemática universal. Essa ideia provocou perseguições e acusações como as de ser ateu e um cidadão
perigoso à segurança do Estado.
A ideia central do Discurso (...) é a essência do racionalismo sendo o arauto dessa concepção.
Anos depois escreveu Meditações metafísicas, sua obra-prima, onde ofereceu respostas às objeções
de seu pensamento. Mais tarde publicou uma espécie de manual cartesiano: Os Princípios de
filosofia; sua última obra foi o Tratado das paixões.
Descartes admirava os geômetras gregos e os da Escola de Alexandria flexibilizando seus
conceitos como, p.ex., o da rigidez euclidiana, e introduzindo a dimensão tempo nas considerações
espaciais dos gregos; dizia: “dai-me espaço e movimento e os darei um mundo”. Três séculos mais
tarde, Einstein inverteu a frase: “sem um mundo não há movimento nem espaço”, demonstrando que a
ciência é um perpétuo fluir; as leis científicas mudam.
Destaca-se, nesta síntese, a ideia geral da obra o Discurso sobre o método, em que Descartes
apresentou um novo método de investigação científica. O método cartesiano foi uma proposta de
organizar o pensamento para se chegar ao meio mais adequado de conhecer e controlar a natureza; essa
era uma inquietação no final do período do Renascimento.
A proposta de Descartes, diferente da de F. Bacon (método indutivo e resultado de contínuas
experimentações) era baseado no método dedutivo capaz de possibilitar a aquisição do conhecimento
mediante a elaboração lógica de hipótese e a busca de sua confirmação ou negação. Seu método
consistia em subdividir o problema nas menores peças possíveis para, a partir desse nível desagregado,
perceber as relações entre elas. Esse é o fundamento do processo analítico-reducionista.
Os cuidados básicos do método na resolução de um problema eram evitar a precipitação e os
preconceitos; apenas as ideias claras e distintas deveriam ser aceitas como verdadeiras: acolher como
125
verdadeira exclusivamente a conclusão que não deixe dúvidas; se houver dúvida, a conclusão deverá
ser rejeitada.
O método de Descartes seria universal tendo como lógica, não formas de silogismos, mas, regras
para guiar a razão necessária na investigação e descobertas de verdades, com as seguintes regras e seus
três componentes inseparáveis:
a) A primeira regra é a evidência: não admitir uma coisa como verdadeira se não for reconhecida
evidentemente como tal. Significa evitar toda "precipitação" e toda "prevenção" (preconceitos) e
só ter por verdadeiro o que for claro e distinto, isto é, aquilo da qual não se tenha a menor
indecisão; “é a evidencia que salta aos olhos, é o que não se pode duvidar, apesar de todos os
esforços nesse sentido, é o que resiste a todos os assaltos da dúvida, apesar de todos os resíduos; é
o resultado do espírito crítico”.
b) A segunda regra é a análise de dificuldades (problemas) da investigação; consiste em dividir
cada uma das dificuldades em tantas partes quantas forem possíveis; dividir todos os problemas
em tantas partes quantas sejam necessárias para resolvê-los adequadamente; não aceitar que um
todo possa ser compreensível como uma totalidade orgânica que supera a simples soma de suas
partes constituintes; negligenciava o sistema e destacava a inter-relação lógica das partes como
base para a compreensão do todo; essa ênfase analítica levou a fragmentação característica da
especialização.
c) A terceira regra é a síntese: ordenar os pensamentos, começando pelos objetos mais simples e
mais fáceis de conhecer para, aos poucos, ascender, como que por meio de degraus, aos objetos
mais complexos; é a regra de (re)agrupar as unidades estudadas em um todo, da ordem do
raciocínio a iniciar com os elementos ou partes mais simples e de fácil compreensão para, de
maneira gradativa, ascender no conhecimento do mais complexo.
d) A quarta regra é a dos desmembramentos [e integrações] tão complexos (...) a ponto de estar
certo de nada ter omitido; é a enumeração ou relação completa, concisa e geral para se ter a
“segurança” de que todas as conclusões e princípios foram utilizados para manter a ordem do
pensamento; realizar revisões periódicas de maneira cuidadosa.
e) Os componentes do método são: todo problema científico se reduz a um problema formulado em
termos matemáticos; todo problema matemático se reduz a um problema algébrico; e todo
problema algébrico se reduz à solução de uma única equação.
Parte do sucesso do método cartesiano se deveu ao fato de não afirmar a independência da razão
nem rejeitar qualquer autoridade, religiosa ou política, bem como a de ser um método racionalista: a
evidência cartesiana não é sensível (os sentidos podem enganar e as percepções podem ser confusas e
obscuras) nem empírico puro, mas, de ideias. As ideias da razão são claras e distintas, percebidas
diretamente, no início, pela intuição.
A dedução se limita a transmitir, ao longo de raciocínios em cadeias, a evidência intuitiva das
"naturezas simples". Entende por dedução a razão para encontrar verdades necessárias a partir de
outras já conhecidas com certeza; era uma operação intelectual que se realizava como operação
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Outro aspecto a destacar de Descartes é o relativo a gênese das ideias; nesse sentido considerava
três tipos: ideais inatas que existem na própria razão; as ideais adventícias, originárias dos sentidos; e
as ideais facticias, que resultam da imaginação, da capacidade de inventar.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Pascal separou a ciência do ser humano e não aceitou o “matematicismo” proposto por
Descartes, sendo contrário ao racionalismo e à especulação lógica, clara e precisa como reducionismo
da realidade humana da maioria dos filósofos sob a influencia de Descartes.
Pascal se posicionou contra os conceitos de Descartes, admitindo, em sua obra Pensamentos,
que existem razões que a própria razão desconhece; Nessa obra, em essência uma crítica a Descartes,
Pascal, revela naturalidades e verdades das vicissitudes e considerour que a ciência e a técnica sempre
ficarão aquém da realidade humana. Afirmava que a riqueza humana consiste em aprofundar em
aspectos individuais e sociais de conformidade com o real, sem esgotar o diálogo consigo e com os
outros. Ao final teve a ideia de escrever uma Apologia da religião Cristão, projeto que não teve a
oportunidade de realizar pela morte prematura, a idade de 39 anos.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
livres e senhores de si mesmos) que é autônoma. Portanto, para ele, a educação deveria ser formativa
(incluindo a educação física como o meio de domínio de se mesmo), desenvolvendo o intelecto, e não
[apenas] uma educação informativa, erudita e mnemônica.
O pensamento gnosiológico de Locke se caracterizou pela negação de ideias inatas à razão;
considerava que a mente é como uma tábua rasa, como uma página em branco, em que nada está
escrito. Uma das preocupações de Locke, em sua teoria do conhecimento, foi “combater” a existência
de ideias inatas na mente humana, preconizada por Descartes. Para ele, a mente humana era como uma
folha em branco, como uma tabua rasa, em que nada estaria escrito que receberia impressões através
dos sentidos a partir das experiências do indivíduo, sem trazer consigo, do nascimento, quaisquer
ideias como a de extensão e perfeição, entre outras, como pretendia Descartes. Caberia à experiência
gravar na mente as ideias. Portanto, todo o conhecimento procederia da experiência, pois só seria
possível conhecer aquilo que está dentro dos limites dela. Pelo seu pensamento nominalista seria
impossível a ciência verdadeira da natureza, tida como o conhecimento de leis universais e necessárias;
mesmo definida em termos de probabilidade: a ciência seria útil enquanto for prática.
Locke tentou demonstrar que os poderes do homem são muito limitados para construir sistemas
metafísicos, mas, por outro lado, criticava a noção corrente segundo a qual o homem nascia com
determinado conhecimento sob a forma de ideias inatas. Ele julgou, a semelhança de Bacon, que a
finalidade da filosofia devia ser prática, mas, contrário a Bacon que a considerava para conhecer a
natureza e dominá-la, Locke sustentava que esse fim era essencialmente moral: a filosofia devia
proporcionar uma norma racional para a vida do homem; da mesma forma que os predecessores
empiristas, ele sentiu a necessidade de investigar o conhecimento humano. Na sua gnosiologia a tarefa
seria encontrar um critério de verdade, sem partir do ser e sim do pensamento, com apenas ideias
(representações), excluindo as ideias de princípios que delas se formam.
Em sua obra Ensaio sobre o entendimento humano,manifestou:
"Somente são imagináveis as qualidades que afetam aos sentidos.(...) e si a humanidade houvesse
sido dotada de tão somente quatro sentidos, então, as qualidades que são o objeto do quinto sentido
estariam tão afastadas de nossa noticia, de nossa imaginação e de nossa concepção, como podem
estar agora as que poderiam pertencer a um sexto, sétimo ou oitavo sentidos (...) que talvez existam
em outras criaturas. (...). Todas as ideias vêm ou da experiência de sensação ou de experiência de
reflexão” (itálico ausente na fonte).
“Em primeiro lugar, nossos sentidos, que têm trato com objetos sensíveis particulares, transmitem
respectivas e distintas percepções de coisas à mente, segundo os variados modos em que esses
objetos os afetam, e é assim como chegamos a possuir essas ideias que temos do amarelo, do
branco, do calor, do frio, do macio, do duro, do amargo, do doce, e de todas aquelas que chamamos
qualidades sensíveis: isso é o mecanismo de geração das ideias de sensação (...). E como a
extensão, a forma, o número e o movimento de corpos de grandeza observável podem perceber-se a
131
distancia por meio da vista, é evidente que alguns corpos individualmente imperceptíveis devem vir
deles aos olhos, e desse modo comunicam ao cérebro algum movimento que produz essas ideias que
temos em nós acerca de tais objetos".
Locke utiliza o termo ideia com um significado amplo que incluía todos os diferentes modos da
experiência e de consciência: representação e imagem, percepção (cópias das coisas da realidade
exterior), conceito ou noção e sentimento, entre outros.
Na análise da correspondência entre a realidade exterior (observada: experiência) e as ideias
provenientes dos sentidos (internalizadas: reflexão) estabeleceu diferenças entre as qualidades
primárias, objetivas e pertencentes inteiramente ao objeto como, p.ex., extensão, forma e número e as
qualidades secundárias, subjetivas que dependem do observador ou objetivas apenas em suas causas,
como, p.ex., a cor e o sabor. Estabeleceu a classificação de ideias de qualidades primárias: as
concebidas por influencias direta do objeto e que são internamente inseparáveis dele, algo que está no
corpo, tais como solidez, forma, extensão, mobilidades; e as ideias de qualidade secundárias que
dependem das primárias; não correspondem aos atributos dos objetos mesmos, mas correspondem a
poderes que os objetos têm de produzirem indiretamente diversasa sensações, como as de cor, gosto,
cheiro.
Com relação às ideias da experiência dereflexão Locke manifestou que a mente não tem ideias
inatas, mas faculdades inatas: a mente percebe, lembra, e combina as ideias que lhe chegam do mundo
exterior, além de desejar, deliberar, e querer (...), constituindo-se em atividades mentais que são elas
próprias a fonte de nova classe de ideias.
Conforme Lockie, as ideias de reflexão podem ser agrupadas em:
a) Memória ou habilidade de chamar uma ideia ausente de volta à consciência.
b) Retenção ou habilidade de manter um pensamento na consciência.
c) Discernimento ou habilidade de reconhecer diferenças entre as coisas.
d) Comparação ou habilidade de reconhecer as semelhanças entre as coisas.
e) Composição ou habilidade de construir novas ideias tomando como material outras ideias.
f) Abstração ou habilidade de distinguir princípios de relações abstratas (p.ex. provas matemáticas)
os quais permenecem por trás de outras ideias e assim criar uma ideia geral.
Dessa forma, a experiência tem duplo sentido; em “observações” que podem provir tanto de
sensibilidade de objetos externos (sensação) quanto das operações internas da mente (reflexão), com
duas possíveis classes: ideias simples que podem ser dintinguidas em diferentes grupos como são,
p.ex., quente, frio, preto, branso etc.; e ideais complexas que resultam de procedimentos e
entendimentos como os de repetição, comparação, união (...) de ideais simples.
Locke admitia que todos têm temperamentos diferentes que devem ser desenvolvidos de
conformidade com as peculiaridades de cada um, presumindo que a educação individual não excluísse
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
a formação e educação social; mas, com elas se ampliaria e enriqueceria a própria personalidade.
Considerou muito importante a ação do educador, porém, era imprescindível a colaboração do
discípulo por se tratar da formação do intelecto (mediante a moral) e da razão (formação de seres
conscientes, livres e senhores de si mesmos) que é autônoma. Portanto, para Locke, a educação deveria
ser formativa (incluindo a educação física como o meio de domínio de se mesmo), desenvolvendo o
intelecto, e não [apenas] uma educação informativa, erudita e mnemônica.
Outro aspecto do pensamento de Locke que é preciso destacar nesta síntese é o relativo ao
associacionismo, sendo o precursos desse pensamento nas ciências.
Trata-se do princípio de que o pensamento consiste em associar ideias, derivadas da experiência
(e da reflexão), conforme as leis da frequência, da recência (do mais recente) e da vivacidade: quanto
mais frequentes, recentes e vividas sejam duas ideias relacionadas, mais provável será o fato de que a
apresentação de uma delas à mente, a outra a acompanha. (KNELLER, 1972; p. 39; complementado).
De acordo com o associacionismo, as novas ideias são formadas a partir de velhas ideias,
mediante um processo de tentativas e erros, por meio de combinação de idéais até que seja encontrado
um arranjo, uma nova ideia, que possa resolver a situação. Dessa forma, o pensamento criador de um
pesquisador na busca de uma solução, seria a ativação de conexões mentais contínuas até o surgimento
de certa combinação “aceitável”. Um aspecto positivo da explicação da criatividade seria o de que
quanto mais associaççoes tenha uma pessoa, mais ideias terá a sua disposição e mais criativo será seu
pensamento.
É oportuno indicar, conforme críticas de Kneller (op. cit.) que dificilmente o associacionismo se
adapta aos fatos da criatividade uma vez que, conforme o associacionismo, novos pensamentos (novas
ideis) foram obtidos do contexto de ideias anteriores e se combinaram para formar uma ideia original.
Tal pensamento ignora conexões estabelecidas e cria as suas próprias. Não seria fácil atribuir as ideias
criativas a conexões entre ideias derivadas de experiência pregressa, uma vez numa criança
relativamente incriativa experiências semelhantes podem deixar de produzir uma única ideia original.
Seria de esperar que a confiança nas associações passadas produzisse, em lugar de originalidade,
respostas comuns e previsíveis.
Spinoza negou o Deus revelado na Bíblia, substituindo-o por um Deus-natureza manifesto por
leis naturais. Suas ideias, naquele ambiente de diversas tendências e contradições religiosas, foram
apresentadas em Tractatus de Deo et homine et jusque felicitate / Tratado sobre Deus, o
homem e sua felicidade que originou a sua expulsão e isolamento da comunidade judaica, afetando-
o em seus negócios de comercio. Depois escreveu:
Tractatus de intellectus emendatione / Tratado sobre o melhoramento do intelecto.
Renati dês cartes principiorum philosophiae – Cogitata tetaphysica / Princípios de filosofia
– Pensamentos metafísicos; sua única obra assinada e publicada durante sua vida.
Ética dividida em quatro partes, assim: A respeito de Deus; A natureza e origem do espírito
humano. A natureza e origem das emoções; e a Escravidão humana ou a Força das
emoções.
Poder do conhecimento ou a Liberdade humana. Essas obras foram orientadas para a
contestação do dualismo cartesiano.
Tractatus theologico-politicus / Tratado teoloógico-político; nessa publicação, “sem autoria
declarada”, mostrava que não apenas a liberdade de filosofia era compatível com a piedade
religiosa e com a paz do Estado, mas que cercear essa liberdade era destruir a paz pública e
inclusive a própria piedade. Nessa obra exigia a participação do povo no Estado e a cooperação
regular do povo com a aristocracia, além de expor os dogmas de uma fé comum.
Tractatus de intellectus e mendatione / Tradado do intelecto e das meditações. Epistolae /
Cartas.
Compendium grammatitices lenguae hebrae / Compêndio de gramática da língua
hebráica.
Dentro dos diversos aspectos destacáveis do pensamento filosófico de Spinoza dois são
considerados; O primeiro é o da teoria do conhecimento. Era uma resposta ao dualismo da filosofia de
Descartes; afirmava que seria impossível explicar a relação entre Deus e o mundo ou entre o espírito e
o corpo; acreditava na existência de um sentido no qual a definição de um objeto pode ser correta ou
incorreta, confiável ou não ao deixar clara a possibilidade ou a necessidade da existência do objeto
definido. Era necessário considerar cada aspecto da realidade, do objeto e deveria existir toda
possibilidade logicamente coerente.
Estava convencido de que cada aspecto da realidade era necessário e que toda possibilidade
logicamente coerente deveria existir. Assim, seria possível demonstrar a metafísica dedutivamente,
mediante uma série de teoremas derivados, etapa por etapa, de consequências necessárias a partir de
premissas auto-evidentes e em termos auto-explicativos ou definidos com uma correção
inquestionável. Entretanto, o método poderá garantir conclusões verdadeiras somente se os axiomas
forem verdadeiros e as definições corretas.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Spinoza recomendava que fosse feita uma cuidadosa distinção entre as várias formas do
conhecimento e que apenas se confiasse na melhor delas. Fazia a seguinte classificação de
conhecimentos:
a) O primeiro era o conhecimento do “ouvir dizer”, sem a percepção criteriosa.
b) O segundo era o conhecimento de uma experiência, de um resultado empírico (depreciativo), por
impressões do que costuma dar certo, porém, sem formulação científica de testes experimentais;
esse conhecimento era inadequado.
c) O terceiro, era o conhecimento obtido pela dedução imediata ou pelo raciocínio, sendo superior
aos outros, mas sujeito a possível de refutação pela experiência direta: era o conhecimento da
razão.
d) O quarto era o conhecimento mais elevado proveniente da dedução imediata; o método utilizado
era o dedutivo proposto por racionalistas como Descartes e Leiobniz: só a razão é capaz de levar
ao conhecimento verdadeiro que decorre de princípios a priori evidentes e irrecusáveis; a
valorização da razão enquanto instrumento de conhecimento com base na percepção direta; era o
tipo de conhecimento da intuição adequado ao conhecimento de objetos individuais.
Acreditava que nenhum objeto pode ser isolado do resto da natureza; portanto, não se pode
afirmar a verdade total sobre ele, uma vez que isso envolveria a natureza inteira; era o conhecimento
“opinião ou imaginação”. Se, no entanto, como acontece na terceira forma de conhecimento, a
consciência é dirigida somente para aquelas propriedades que todos os objetos têm em comum, não
haverá a distorção que ocorre na experiência dos sentidos. Por esse caminho Spinoza dava conta da
possibilidade do conhecimento da razão a priori na geometria, na física geral e na psicologia geral.
O segundo aspecto a relacionar da filosofia de Spinoza é o da educação sendo determinística e
estóica. Considerava que as ações dos homens são determinadas pelas suas lembranças e que a
sociedade devia formar os cidadãos manipulando suas esperanças e receios, para alcançar certa dose de
ordem social e de cooperação. Afirmava, quer as ações sejam livres ou não, as motivações ainda serão
a esperança e o medo.
Aqueles que considerassem todas as coisas como determinadas não se poderiam queixar, ainda
que pudessem resistir; pois perceberiam as coisas sob certa luz de eternidade e compreenderiam que
suas desventuras não seriam resultados do acaso, mas, teria alguma justificativa na eterna sequência e
estrutura do mundo. Com esse espírito se esqueceriam dos prazeres caprichosos da paixão para a
elevada serenidade da contemplação, onde todas as coisas seriam partes da ordem e do
desenvolvimento eternos.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
foram em campos como os de colisões, pêndulos, projeteis, fricção do ar, hidrostática e propagação de
ondas. Essa obra foi reconhecida como o livro científico mais importante.
Publicou Arithmetica universalis, livro-texto sobre identidades matemáticas, análise e
geometria.
Outras obras de Newton foram: De analysis per aequations numero terminorum infinitas.
Methodus fluxionum et serierum infinitorum sobre séries e calculo.
Entre suas grandes contribuições à ciência se tem a lei da gravitação, a decomposição da luz
solar no espectro e os anéis coloridos das lâminas delgadas, com consequências que se estendem por
todo o campo científico, abrindo a porta à ciência moderna. Ao firmar o princípio da gravitação
universal, Newton eliminou a dependência da ação divina e influenciou profundamente o pensamento
filosófico do século XVIII.
Os princípios matemáticos da filosofia natural podem ser sintetizados como segue:
a) As leis do movimento (livro I: Princípios...), que deram uma explicação completa ao movimento
e à forma como as forças atuam, sintetizadas como segue:
a.1) Primeira lei: todo corpo continua em seu estado de repouso ou de movimento uniforme em
linha reta, a menos que seja forçado a mudar esse estado por forças que atuam nele. A inércia:
em ausência de forças externas, um objeto em repouso permanece em repouso e um objeto em
movimento permanece em movimento, ficando em movimento retilíneo e com velocidade
constante; é a propriedade do corpo de resistir à mudança cuja medida é o momentum definido
como proporcional à sua velocidade. (HAWKING, 2005).
a.2) Segunda lei: a alteração do movimento é sempre proporcional à força motriz aplicada e
ocorre na direção da linha reta da força aplicada. A força que relaciona a mudança de
velocidade do objeto com a força aplicada sobre ele; a força líquida aplicada a um objeto é
igual à massa do objeto multiplicado pela aceleração, na mesma direção, causada ao corpo por
essa força (HAWKING, op. cit.).
a.3) Terceira lei: para cada ação há uma reação igual e contrária (as ações mutuas de dois corpos
um no outro são sempre iguais e em direções contrárias), com diversos corolários. A ação e
reação podem explicar o movimento dos planetas em torno do Sol, assumindo a hipótese de
uma força dirigida ao Sol que produz uma aceleração capaz de forçar a velocidade do planeta a
mudar de direção continuamente, baseada no movimento da Lua em torno da Terra. Nela,
combina-se sua lei de aceleração centrípeta às leis de Kepler da aceleração em órbitas
circulares e à lei de aceleração do holandês Christiaan Huygens (HAWKING, op. cit.).
A ideia dos movimentos absoluto e relativo, sua diferenciação e síntese de suas leis, é o
movimento verdadeiro ou absoluto que não pode ser criado ou modificado, exceto pela ação de
forças, mas, o movimento relativo pode ser criado ou modificado sem essas ações de forças.
b) Regras (método de investigação) para o estuda da física.
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b.1) Primeira regra. Não admitir mais causas para os fenômenos naturais do que aquelas
verdadeiras e suficientes para explicá-los; pro isso, diz-se que a natureza não faz nada em vão,
e mais terá sido feito em vão quando menos útil for; essa proposição remete à simplicidade e à
evitar causas supérfluas.
b.2) Segunda regra. Aos mesmos fenômenos naturais, devem-se, na medida do possível, atribuir
as mesmas causas.
b.3) Terceira regra. As qualidades dos corpos que não são susceptíveis de aumento nem
diminuição e que pertencem a todos os corpos com os quais se podem realizar experiências,
devem ser consideradas qualidades universais.
b.4) Quarta regra. Na filosofia experimental as proposições obtidas por indução dos fenômenos
quando contrariadas as hipóteses, devem ser consideradas exatas (muito próximas), até que se
apresente outro fenômeno mediante o qual estas proposições possam ser confirmadas ou
rejeitadas.
A metodologia de investigação de Newton pode ser sintetizada pelos seguintes passos:
a) A observação da realidade e a experimentação cuidadosa de seu comportamento, feitas
mediante induções gerais com o propósito de estabelecer uma lei ou hipótese.
b) Uma vez enunciada essa lei ou hipótese geral se aplica para uma situação particular,
deduzindo-se matematicamente o comportamento dos objetos da realidade em cada caso.
c) Os dados são testados mediante procedimentos dedutivos, com base nos dados de observações
e experimentações e as proposições iniciais de leis ou hipóteses.
d) O procedimento se repete um considerável número de vezes particulares e se os resultados são
coerentes, se aceita a hipótese até descobrir um caso de rejeição.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Para Leibniz, além da causa eficiente (matemática e mecânica) que produz as coisas segundo o
princípio de razão com suas duas exigências (a não-contradição e a suficiência), há, também, nessa
produção, uma causa final (dinâmica e moral). O fim da produção das coisas é a vontade justa, boa e
perfeita de Deus que assim o deseja. Trata-se do finalismo que é sustentado pelo princípio do melhor.
Outros princípios do conhecimento, além dos princípios da razão e do melhor, foram os da
continuidade e do indiscernível; pelo princípio da continuidade afirmava que não existem
descontinuidades na hierarquia dos seres; pelo princípio do indiscernível, afirmava que não há no
universo dois seres idênticos e que as diferenças são intrínsecas de naturezas numéricas, espaciais ou
temporais; cada ser é em si diferente de qualquer outro; a diferença é de essência e se manifesta no
plano visível das coisas.
Dos princípios do conhecimento Leibniz passou para os fundamentos da monadologia,
entendida como a formulação teórica dinâmica que substitui a energia cinética pela conservação do
movimento como uma força viva com capacidade de agir e não como uma força física; com energia e
vigor e não como uma maquina; com a concepção do mundo oposta à geométrica e mecânica
cartesiana.
A partir da ideia de matéria como atividade chega à ideia do universo composto por unidades de
força, as mônadas, noção fundamental de sua metafísica. A mônada compreende em si toda a realidade
e nada lhe pode vir de fora. Dessa forma, tudo o que acontece no mundo está incluído na sua essência,
a mônada, e, por conseguinte, é uma noção completa. Essa unidade de força se caracteriza pela
percepção ou capacidade de representar ou espelhar as coisas do universo; pela apercepção ou
capacidade espiritual do autor se apresentar (a consciência); pela apetição ou tendência de cada
mônada fugir da dor e desejar o prazer, passando de uma percepção para outra; e pela expressão como
sendo um poder interno.
As mônadas são indivisíveis e, portanto, inextensas, porque a extensão é sempre divisível;
simples e incorruptíveis. Tudo o que acontece à mônada brota do seu próprio ser, das suas
possibilidades internas, sem intervenção exterior.
Quanto à metodologia de investigação, um aspecto que se destaca nesta síntese, seguindo
Leibniz, o problema consiste em buscar um método exato para combinar (inter-relacionar) as ideias; o
objetivo desse método seria o de estabelecer, mediante ideias elementares, um “alfabeto” lógico em
que todas as noções compostas acerca da realidade estejam reduzidas a noções simples. Para ele, a
fundamentação da ciência não estava apenas nos juízos, mas, também, nas definições de conceitos
básicos; assegurava que todas as verdades podem ser classificadas em verdades da razão e verdades
dos fatos.
O nível de fundamentação de uma hipótese está determinado pelo seu nível de probabilidade,
sendo mais provável a hipótese quanto mais simples seja; quanto maior seja o número de fenômenos
que possa explicar um fenômeno, um fato (...) com o menor número de postulados e axiomas; e quanto
melhor permite prever novos fenômenos ou explicar novos experimentos, exceto os não conhecidos.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
(...) algumas verdades são tão próximas e óbvias para a mente que se precisa apenas abrir os olhos
para vê-la (...), isto é importante para o entendimento no mundo; (...) não existe qualquer substância
sem a mente, sendo a existência percebida ou conhecida; consequentemente, enquanto não sejam
percebidas, ou elas não existem na mente (...) ou apenas existem na mente de qualquer espírito
eterno (...).
O conceito do mundo externo apenas produzido pela mente é o idealismo, entendido, além da
concepção trivial, como o fato de ter ideias em relação ao problema do ser. Afirma que o ser é idêntico
à ideia do mesmo: o ser existe somente como manifestação ou produto do pensamento. É uma das
respostas à pergunta fundamental da filosofia: o que é o ser; a outra resposta clássica a esta pergunta é
o realismo.
O idealismo surgiu como consequência da desconfiança em relação aos dados colhidos com base
em orientações dos sentidos, como possibilidade de um conhecimento válido que se contrapõe ao
materialismo para o qual toda realidade tem sempre caráter material. O idealismo tem como traço
característico e ponto de partida para a reflexão o eu, visto como a alma, o espírito ou a mente; a ideia
ou o pensamento é o elemento primordial, com duas concepções: uma ontológica (do ser) e outra do
conhecimento (gnoseológica).
Entre outros filósofos do idealismo se tem Platão: no idealismo platônico o ser em sua pureza e
perfeição não está na realidade (...). Os objetos são captados pelos sentidos e são cópias imperfeitas.
Nesse contexto se têm:
a) Locke: a possibilidade de só se conhecerem ideias, objetos subjetivos e exclusivos da mente.
b) Kant: idealismo crítico na teoria do conhecimento com base no fenomenismo; idealismo
transcendental, em que o intelecto humano não pode chegar a conhecer a coisa em si, a essência.
c) Hegel: idealismo absoluto: as formas de pensar seriam, também, as formas de ser: o que é
racional é real e o que é real é racional.
d) Schelling: panteísmo de idealismo transcendental pela identificação entre sujeito e objeto.
e) Cohen: idealismo objetivo: o pensamento é idêntico ao ser e tudo que é real é racional.
Qual foi a época e ambiente em que viveu Berkeley? Nos primeiros anos do século XVIII, as
concepções dominantes estavam baseadas na “nova ciência”, chamada “nova filosofia”; exemplos de
algumas dessas concepções são: o universo material seria átomo ou corpúsculo em sua estrutura e
mecânico em sua operacionalização; o mundo funcionaria com base em conceitos, tais como: massa,
forma, tamanho e movimento na forma de qualidades primárias da matéria. Outras qualidades, as
secundárias (segundo Locke), seriam: gosto, cores, temperatura (...), atribuídas às coisas, porém
ausentes delas; eram atributos percebidos através dos sentidos até formar, na mente, as ideias. As
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
alienante e um indivíduo oprimido, ideia defendida por Rousseau, mas, crê em um sentimento
universal e inato da justiça, que deve ser observado em leis da sociedade.
Considerava que a vida em comum exige uma convenção, um contrato social, necessário para
preservar o interesse de cada um, sendo que o instinto e a razão levariam o homem a respeitar e
promover esse contrato. O propósito da moral era ensinar os princípios da convivência. O trabalho
possibilitaria que o homem tivesse domínio de seu destino, melhorando as sua condição mediante a
ciência e a técnica e proporcionando beleza à vida através da arte.
Voltaire acreditava na ordem do mundo como tendo uma finalidade providencial; dessa forma, a
estrutura geográfica da terra e as espécies vivas eram fixas; em nome desse finalismo estático, rejeitava
as ideias evolucionistas que, na época, começam a se difundir; portanto, recusava-se a crer nos fósseis
de animais marinhos descobertos nas montanhas e em admitir que as montanhas outrora estivessem
submersas; ao aceitá-las seria negar a estabilidade e a finalidade da ordem providencial do mundo.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
alguns, aristocracia; a monarquia nas mãos de um só, segundo leis positivas e com alicerce na honra; e
o despotismo, soberania nas mãos de um só, segundo o arbítrio deste e com base no medo. Ao rejeitar
este último sistema de governo e acreditar que a democracia só seria viável em repúblicas de pequenas
dimensões territoriais se decide em favor da monarquia constitucional.
Montesquieu elaborou a teoria da separação dos poderes, em que a autoridade política seria
exercida pelos poderes executivo, legislativo e judiciário, cada um independente e fiscal um do outro.
Seria essa a melhor garantia da liberdade dos cidadãos e, ao mesmo tempo, da eficiência das
instituições políticas. A parte que segue apresenta algumas ideias:
As leis escritas ou não, que governam os povos, não são fruto do capricho ou do arbítrio de quem
legisla; ao contrário, decorrem da realidade social e da história concreta própria ao povo
considerado. Não existem leis justas ou injustas. O que existe são leis mais ou menos adequadas a
um determinado povo e a uma determinada circunstância de época ou lugar. É necessário estabelecer
a relação das leis com as sociedades, ou ainda, com o espírito dessas.
O que Montesquieu descreve como espírito geral de uma sociedade aparece como o resultado de
causas físicas [naturais], de causas morais como costumes e religião e de máximas de um governo [isto
é, da natureza; daquilo que faz um governo ser o que é e o princípio que determina o seu movimento]
ou, segundo Aron (...) a identidade nacional sintetizando esse espírito geral.
Ao buscar as relações que as leis têm com a natureza e o princípio de cada governo Montesquieu
desenvolveu uma teoria de governo com ideias do constitucionalismo. Conforme essa teoria, a
autoridade seria distribuída por meios legais, de modo a evitar o arbítrio e a violência, orientada para o
exercício da democracia e para a melhor definição da separação dos poderes em Executivo, Judiciário
e Legislativo. Essas ideias influenciaram os constitucionalistas da época, dos Estados Unidos, em
particular. As funções dos poderes seriam:
a) O Poder Executivo seria exercido por um rei, com direito de veto sobre as decisões do
parlamento.
b) O Poder Judiciário não seria único, porque os nobres não poderiam ser julgados por tribunais
populares, mas só por tribunais de nobres; dessa forma não defendia a igualdade de todos
perante a lei.
c) O Poder Legislativo seria convocado pelo executivo e deveria ser separado em duas casas: o
corpo dos comuns, composto pelos representantes do povo, e o corpo dos nobres, formado por
nobres, hereditário e com a faculdade de vetar as decisões do corpo dos comuns. Essas duas
casas teriam assembléias e deliberações separadas, assim como interesses e opiniões
independentes.
Refletindo sobre o abuso do poder real, Montesquieu conclui que “só o poder freia o poder”, daí
a necessidade de cada poder fosse autônomo e constituído por pessoas e grupos diferentes.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Publicou, entre muitas obras, Mechanica, onde tratou da análise matemática de dinâmica newtoniana
e Letters to a Princess of Germany / Cartas a uma Princesa da Alemanha (3 volumes).
Euler trabalhou nas origens do cálculo de variações; foi um pioneiro no campo da topologia,
com notáveis contribuições para a teoria do número (fundamento do cálculo com, p.ex., teorema do
número primo e a lei da reciprocidade biquadrática) como uma ciência, Na análise do infinito incluiu
novos campos como equações diferenciais, o cálculo de variações e a mecânica racional. Em Física,
articulou a dinâmica Newtoniana e colocou a fundação de mecânica analítica, especialmente na sua
Teoria dos Movimentos de Corpos Rígidos.
Pesquisou a mecânica contínua e a cinética de gases com base em modelos moleculares. Estudos
a determinação da órbita de cometas e planetas baseadas em poucas observações e as considerações
sobre suas naturezas (mecânica celeste e teoria lunar), trabalhos dos mais impressionantes e pelos quais
ganhos vários prêmios da Academia de Ciências de Paris; os métodos de cálculo da paralaxe do Sol; a
teoria da refração (...). Realizou pesquisas fundamentais em elasticidade, acústica, teoria de onda de luz
e hidromecânica de navios, entre outras.
que a análise psicológica partia do princípio de que as ideias eram cópias das impressões (sensações e
reflexões: emoções e paixões) e de dados empíricos (dados imediatos da consciência, segundo
Bergson; ou intuição originária, vivida, segundo a fenomenologia). Examinou os meios pelos qual o
homem percebe o mundo, través de dois tipos de percepções diferenciadas pelo grau de vivacidade e
pela força com que atinge a mente. Essas percepções, segundo o autor, eram as impressões, isto é,
“todas as nossas sensações, paixões e emoções assim que fazem suas primeira aparição na alma”; são
as apreensões imediatas da realidade exterior; e as ideias que “são as imagens indistintas destas
[impressões] no pensamento e na reflexão”; são as representações tal como se encontram armazenadas
na memória, mais fracas e menos vividas do que as impressões.
Enunciou no Tratado da (...), também, importantes conceitos sobre a forma de falar, quando
assim se expressou:
(...) todos os objetos da razão ou da investigação podem dividir-se em dois: relações de ideias [toda
afirmação que é intuitivamente demonstrável, como na geometria, álgebra, aritmética] e questões de
fatos [não são determinadas do mesmo modo que no caso anterior; apenas como possibilidade].
Acreditava que as impressões (mais vividas) e as ideias (retidas na memória na ordem em que
elas ocorrem, sendo reorganizadas pela imaginação) podem ser tanto simples quanto complexas, sendo
que todas as ideias simples são derivadas de impressões simples. As impressões causam ideias, porém
as ideias não causam impressões. Era a não justificativa lógica da indução, ainda que se verifique certa
justificativa pragmática; significa fazer induções porque, mesmo que não tenham justificativa lógica,
em geral dão certo.
Hume depois escreveu Ensaios morais, políticos e literários. Neles, defendeu a ideia de tudo
o que o homem sabe procede da experiência. Mostrou que um fenômeno se repetia ou seguia muitas
vezes a um outro, mas sem dizer nem indicar que sempre seria desse modo. Um saber dos sentidos
mostrando como as coisas acontecem e não a impossibilidade de acontecerem de outras maneiras,
ainda que tais coisas ocorressem em um grande número de vezes da mesma forma.
Mais tarde publicou os Diálogos sobre a religião natural, a História da Inglaterra e
Ensaios filosóficos sobre o entendimento humano (com o título definitivo Investigação sobre
o entendimento humano) em que tratou do significado das impressões dos sentidos e da lógica da
investigação e apresentou seu método de raciocínio experimental nas ciências morais, com máximas
como:
(...) todo evento possui uma causa (...);(...) nada há em qualquer objeto, considerado em si
mesmo, que não possa oferecer uma razão para obter uma conclusão além dele e mesmo após a
observação da frequente conjunção de objetos, não temos razão para extrair qualquer inferência
relativa a qualquer objeto, além daqueles com os quais temos tido experiências (...)
148
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Explicava todos os efeitos com base nas causas mais simples (...). Nessa linha de pensamento
afirmava: “não podemos seguir além das experiências e qualquer hipótese que simule a descoberta de
uma qualidade original (...) deveria ser rejeitada” (COLLINSON, 2004: p. 140).
Na obra Investigação sobre (...) tratou de conexões entre causas e efeito, sem que tais
conexões fossem necessariamente utilizadas nas relações de ideias nem na formação das mesmas
provenientes da observação. Afirmava que a necessidade pela qual se imputa um efeito sucedendo a
uma causa não fazia parte do modo como as coisas são, mas, estava na mente e era parte de operações
mentais. Todo o que se observa estaria conectado a determinado evento, porém, nada garantiria a
continuidade dessa conexão.
Como contribuição à economia (exemplos de apenas algumas delas) Hume analisou as forças da
economia, concentrando-as em dois fatores: o lucro e a acumulação. Aconselhou que se deviam adotar
medidas de redistribuição para não eliminar o estímulo individual que era imprescindível para o
funcionamento de um sistema econômico.
Criticou as teorias mercantilistas 33 e fisiocráticas 34 de seu tempo, bem como as atitudes dos
terratenentes da época por não contribuírem no aumento de riqueza nacional. Em suas obras aparecem,
também, temas e fundamentos econômicos, tais como: teorias monetária, de juro, de política fiscal e
de comércio internacional.
Diversas e importantes foram as contribuições de Hume à ciência em geral e, em particular, ao
método científico, destacando-se, nesta síntese, umas poucas delas. Além das indicadas anteriormente,
outra é relacionada com o pensamento (enfoque) sistêmico na referência da unidade, o que se infere
quando Hume assim se manifestava:
Olha o mundo ao redor, contemplai o seu todo e cada parte dele, vós descobrireis que ele nada mais é
que uma grande máquina subdividida em um número infinito de máquinas menores (....); todas elas,
mesmo suas partes mais diminutas, se ajustam umas as outras com precisão tal que arrebata todos os
homens que as contemplam. A curiosa adaptação dos meios aos fins, em toda a natureza, assemelha-se
exatamente aos produtos da invenção, da inteligência e da sabedoria humana, embora com maior
perfeição. Portanto, desde que os efeitos se pareçam entre si, somos levados a inferir, segundo as
regras da analogia, que as causas também se pareçam, e que o Criador da natureza é de algum modo
similar a mente do homem, ainda que dotado de faculdades muito maiores, proporcionais à grandeza
do trabalho que [Ele] executou.
causas estariam produzindo os mesmos efeitos. Tudo raciocínio experimental, pelo qual do presente se
conclui o futuro se baseia nesse princípio. Afirmava que “de fato, não existe, na ideia da causalidade,
senão o peso de meu hábito e da minha expectativa”; “não existe nenhuma impressão autêntica da
causalidade; o que acontece é que eu acredito na causalidade (...)”, é um conceito que se baseia em
hábitos e associações de ideias
O princípio da causalidade 35 seria reduzido à ideia de uma sucessão de fenômenos, sem prova
lógica de se ter uma relação de causa e efeito. Anotava o que se observa nos acontecimentos e
fenômenos é uma sucessão constante de fatos, de fenômenos (...) e a partir dela, tem-se a suposição de
que sempre será assim. Mas, não é possível passar, com certeza, dessa representação empírica para a
ideia de uma conexão necessária. Nesse contexto, o empirismo e o espírito humano estariam
desempenhando papéis passivos no processo do conhecimento e onde se estaria valorizando a
influência das impressões do exterior, sendo que a mente apenas registraria dados da experiência. A
razão estaria direcionada para a realidade que a rodeia e só dela seria possível ter conhecimentos: essa
foi a virada para o ceticismo na crítica da causalidade.
Os fatos de, p.ex., uma pessoa ter observado que muitas folhas caírem (...), de o Sol nascer (...),
não são suficientes para que possa concluir que todas as folhas cairão e que o Sol nascerá no dia
seguinte, pois não são fatos empíricos. Tampouco, pela experiência, é possível formular juízos
universais, mas, apenas juízos particulares. Contudo, admitia que esse era o proceder do raciocínio por
indução. Tais são as leis científicas apoiadas nesse raciocínio ou inferência. A única possibilidade de se
admitirem esses fatos seria pressupor que a natureza se comportaria de maneira regular: seria o
princípio da uniformidade da natureza, apoiado na observação repetida dos mesmos fatos e
fenômenos. Dessa forma se teria um raciocínio que seria circular, em que a indução só poderá
funcionar se antes for estabelecido o princípio da uniformidade. Este, por sua vez, seria definido por
meio do raciocínio indutivo. Portanto, a insistência nessa argumentação não seria lógica, mas, apenas
psicológica em função do resultado de um hábito, de observar muitas vezes a mesma “coisa”. Tal é a
essência da crítica da lógica indutiva, baseada na crença e não na lógica (consistente) de um raciocínio.
Na visão de Hume, a causalidade é enigmática porque, com base nesse princípio e de maneira
constante, ultrapassa-se à experiência imediata. Por exemplo, com base no princípio de que as mesmas
causas produzem os mesmos efeitos, afirmar que sempre se terá um mesmo resultado seria uma
conclusão que estaria ultrapassando o objeto. A causalidade não é objetiva, pois nem sempre as
mesmas causas produzem os mesmos efeitos; neste caso, a certeza deve ser substituída pela
probabilidade e plausibilidade de ocorrência.
Todo raciocínio experimental pelo qual do presente se conclui algo no futuro, baseia-se no
princípio da causalidade no suposto do princípio da uniformidade. Daí a conclusão de que o
conhecimento que produz verdades universais e necessárias não é logicamente possível. Essa foi sua
posição cética (absoluta) sintetizada em: “não existe, na ideia de causalidade, senão o peso do hábito e
da expectativa” sem fundamento racional. Essa ideia foi explorada por Kant, em a Crítica da razão
pura, para encontrar uma resposta ao problema do ceticismo de Hume que, ao abolir a causalidade,
estabeleceu a suspeita na ciência experimental e no conhecimento com ilusões da imaginação e do
150
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
hábito, bem como na própria unidade do eu apresentada como uma evidência, mas que não passaria de
ilusória.
Hume foi o filósofo mais importante no século XVIII, um filósofo empirista cético, com seu
pensamento sob as influencias de Berkeley, porém, sem aceitar dele apenas a crítica material, mas,
estendendo-a ao espiritual e de Locke, sem suas percepções sobre as representações. Foi contrário ao
conceito de alma de Descartes.
Segundo Hume, o eu não é simples nem fixo, mas, um feixe de sensações e de conteúdos de
consciência, uma soma de instantes que se encontra em permanente fluxo de rápidas sucessões. As
representações do eu, fruto da imaginação, seriam divididas em duas: as representações dos sentidos
(impressões ou sensações) e as representações de autopercepção.
A percepção pura, o sentir, o primeiro contato com o mundo (...) seriam apenas impressões. Mais
tarde, pela representação, o sujeito formaria a ideia. Dessa forma, a ideia seria um reflexo da
impressão, uma cópia e até uma deturpação da percepção bruta. Um exemplo de impressão seria a
noção simples de como perceber, p.ex., a tristeza, enquanto que a ideia seria p.ex., o conceito de um
anjo. Mediante as ideias se criam imagens que não existem no mundo material.
Tal é o conceito de empirismo psicológico, cuja consequência é o empirismo lógico. Neste, uma
palavra só é significativa se tiver um correspondente sentido na realidade; portanto, no uso nominal
seria necessário se ter uma base empírica. Todas as ideias válidas (o próprio conhecimento) têm
fundamentos na impressão (e nas relações entre as ideias, como as de associações, sendo que a
abstração não existiria).
As verdades dos princípios matemáticos são irrefutáveis e fazem parte de objetivos da razão, de
relações de ideias como p.ex., o fato de um triângulo ter em seus ângulos internos sempre a soma de
dois ângulos retos ou de ter sempre três ângulos (definição). A relação de ideias remete apenas à
própria razão humana que definem as relações de certo modo: um valor assertório, porque assim é,
com validade universal, mas, não seria analítico (assim tem que ser). As deduções lógicas existem por
demonstração. O infinitamente pequeno não tem sentido, pois depende do ponto de vista, e quando este
muda, o antigo desaparece.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Rousseau escreveu, também, romance, como a Júlia ou a Nova Heloísa, com grande sucesso;
tratados sobre música e uma ópera como O Adivinho da aldeia. Suas ideias causaram polêmicas com
outros pensadores e com as autoridades francesas que provocaram sua saída do país e exílio na
Inglaterra.
Em sua obra Emílio, um ensaio pedagógico sob a forma de romance, Rousseau traçou linhas
gerais a serem seguidas para fazer da criança, sob o pressuposto da bondade natural do homem, um
adulto bom como um processo natural de maturação. Colocava como objetivos da educação o
desenvolvimento das potencialidades naturais, devendo ser progressivo, de tal forma que cada estágio
do processo pedagógico fosse adaptado às necessidades individuais, dentro dos interesses próprios da
criança. A primeira etapa, nesse processo, deveria ser dedicada ao aperfeiçoamento dos órgãos dos
sentidos já que as necessidades iniciais da criança são principalmente físicas; ela é incapaz de
abstrações e deveria ser orientada no sentido do conhecimento do mundo através do contato com as
próprias coisas.
A educação deveria ser livre da tirania das opiniões humanas, possibilitando a criança, por si
mesma, e sem nenhum esforço especial, identificar-se com as necessidades de sua vida imediata e
torna-se auto-suficiente. Era necessário, porém, prepará-la para o futuro. Caberia ao educador reter
puro esse grande potencial (evitar a excitação precoce da imaginação porque poderia se tornar fonte de
infelicidade) e intacta essa energia até o momento propício. Para Rousseau, tanto os processos
educativos, quanto as relações sociais deveriam partir de um princípio básico: a liberdade como direito
e dever.
Diderot, junto com Leibniz, Kant, Montesquieu, Rousseau e Voltaire, ajudou a formar o
ambiente de mudança de mentalidade, propício para o avanço das ciências modernas em uma crescente
especialização; isso contribuiu para o desenvolvimento das indústrias e, em outro sentido, para que a
sociedade ocidental passasse a respeitar os direitos civis dos indivíduos; neste sentido, suas hipóteses,
teorias e manifestações, em meio a convulsões políticas que agitavam Europa, serviram de inspiração
para as reivindicações maiores por liberdade de ação e de pensamento.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
de um sistema de corpos rígidos em movimento estão em equilíbrio”. Outra obra importante foi
Ensaio sobre os Elementos de Filosofia. Dirigiu com Diderot, a Enciclopedia. Amigo de Euler e
Voltaire, entre outros filósofos que influenciaram na Revolução Francesa.
As suas pesquisas no campo da mecânica e da astronomia representaram fundamental
contribuição para o avanço da ciência. Na Encyclopédie foi responsável pela redação de diversos
artigos e pela elaboração do prefácio; na introdução, escreveu:
(...) só se citam fatos, só se comparam experiências, só se imaginam métodos para excitar o gênio a
abrir-se a caminhos ignorados e a avançar para novas descobertas, vendo como primeiro passo àquele
com que os grandes homens acabaram os seus caminhos. Foi também o propósito que nos
propusemos, aliando ao princípio das ciências e das artes liberais, a história da sua origem e dos seus
sucessivos progressos”. “Não se encontrará nesta obra (...) nem a genealogia das grandes casas, mas a
genealogia das ciências, mais preciosa para quem sabe pensar; (...) nem os conquistadores que
desolaram a terra, mas os gênios imortais que esclareceram; nem, por fim, uma multidão de soberanos
que a história deveria ter proscrito. O próprio nome dos príncipes e dos grandes não tem o direito de
se encontrar na Enciclopédia senão pelo bem que fizeram às ciências; porque a Enciclopédia deve
tudo aos talentos, nada aos títulos, e porque ela é a história do espírito humano, e não a vaidade dos
homens.
revoluções que ocorreram durante a vida: a americana, em que os franceses ajudaram aos americanos
na guerra de independência e a francesa, em que triunfaram as ideias dos enciclopedistas. Segundo
Keynes, A. Smith foi o economista ideal, devido à forma como combinou o raciocínio abstrato-
dedutivo com o raciocínio histórico-dedutivo revelado em sua obra para justificar a visão abstrato-
dedutiva da economia (BLAUG, 1993; p. 119).
A primeira obra de Smith foi a The theory of moral sentiments / Teoria dos sentimentos
morais, como parte de um projeto que compreenderia a filosofia moral e os princípios de economia e
de política econômica base de sua principal obra A riqueza das nações. Na The theory (...)
descreveu os princípios da natureza humana que, como Hume e outros filósofos da sua época, eram
tidos como sendo universais e imutáveis.
A partir desses princípios se teriam explicações e previsões das relações sociais e do
comportamento do homem, de “o homem interior”, no “sentido moral” para que a sua criação supere o
sei comportamento predador de sua natureza; é o homem que forma juízos morais, é interesseiro e,
simultaneamente, é egoísta e altruístas, levado, com frequência, “por uma mão invisível sem que o
saiba, sem que tenha essa intenção, a promover o interesse da sociedade". Nessa obra Smith mostrou a
sua capacidade de argumentação, fluência e persuasão.
O homem é guiado por paixões e ao mesmo tempo auto-regulado pela sua habilidade de
raciocinar e, também, pela sua simpatia; a dualidade paixão – raciocínio tanto leva o homem a lutar
contra seu semelhante quanto a mitigar as lutas e a buscar o bem comum.
A obra An inquiry into the nature and causes of the wealth of nations / Uma investigação
sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações, em dois volumes; é um tratado claro e
organizado de argumentos e ideias fisiocráticas, de conteúdo mais filosófico – social do que econômico
que, apesar de ser considerada a primeira grande obra de economia política, é pouco original; foram
ideias de precursores ingleses como William Petty e Dudley North; para outros historiadores, foi a
continuação da Teoria dos sentimentos morais. Contudo, trata-se de sua obra prima, onde Smith
considerou vários problemas, entre outros:
a) as desigualdades; podiam ser vistas como incentivos ao trabalho e ao enriquecimento, cuja
solução seria o progresso econômico; nele apresenta sua teoria da mão invisível;
b) o Estado com suas funções de manutenção da segurança, administração da justiça e instituição –
manutenção de certas instituições públicas;
c) a melhoria da educação integrando o ensino particular com o público;
d) a teoria do valor ao reconhecer que o processo de produção, em todas as sociedades, pode ser
reduzido a uma série de esforços;
e) a repartição do rendimento compreendendo salários, lucros e rendas, entre outros.
Smith abordou em sua obra a Riqueza das nações, a luta interior entre a paixão e o
expectador imparcial ao longo da evolução da sociedade. Com relação a essa evolução, foi o primeiro
filósofo a conceber uma organização dinâmica da sociedade, no sentido de evolução, para um bem-
156
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
estar coletivo sempre maior; essa ideia evoluiu, no século XIX, para o utilitarismo, isto é, para a teoria
desenvolvida na filosofia liberal inglesa, em especial, por Bentham e Stuart Mill, que consideraram a
boa ação ou a boa regra de conduta caracterizável pela utilidade e pelo prazer que podem proporcionar
a uma pessoa e, por extensão, à coletividade, na suposição de uma complementaridade entre a
satisfação pessoal e satisfação coletiva. No contexto da ciência e contrário ao ideal do conhecimento
desinteressado, o utilitarismo afirma que o valor da ciência se encontra na quantidade de aplicações
práticas que possa ter o conhecimento; é a utilidade imediata que prova a verdade de uma teoria
científica e lhe confere valor. Os conhecimentos são obtidos para resolver problemas e estes
determinam não apenas o aparecimento de uma ciência, mas, sua transformação no decorrer do tempo
(CHAUI, 2000).
Conforme Smith, o utilitarismo seria favorecido pela própria natureza humana que se inclinaria
para a troca comercial e apresentaria o desejo de melhoria susceptível de orientação pela razão.
Com relação à luta, Smith apresentou quatro estágios de organização da sociedade, nos quais a
história se desdobraria, caso não houvesse guerra, escassez de recursos ou deliberada intervenção do
governo. Esses estágios são:
a) o original ou dos caçadores, com escassa propriedade e, como efeito, escassa administração
regular de justiça;
b) a agricultura nômade com organização social, instituição da propriedade privada com
manutenção e garantia pela lei;
c) a fazenda ou latifúndio feudal, com novas instituições como o salário determinado em um
mercado;
d) o estágio da independência comercial de liberdade em que atua a mão invisível capaz de levar a
ação ambiciosa e egoísta a criar o bem-estar coletivo; isto, porque havendo, liberdade, o lucro
dependerá da livre concorrência.
Vários conceitos, no desdobramento da Teoria dos sentimentos morais, poderiam ser
destacados, tais como livre concorrência, divisão do trabalho, melhoria na educação e crescimento
econômico; são conceitos básicos da teoria econômica clássica que propositadamente são omitidos
desta síntese.
Smith acreditava que a natureza é o melhor guia do homem. A Providência (Deus) dispôs as
coisas de tal forma que se os homens forem deixados livres para buscar seus próprios e legítimos
interesses, eles agirão naturalmente em favor do melhor para a sociedade e as pessoas, tendo ou não
intenção se ajudarão umas às outras; mesmo os mais gananciosos levaram resultados favoráveis para
todos: esse é o trabalho da mão invisível da Providência. Esse trabalho é tão bem feito que, concluiu
Smith, “é uma tolice os governos se intrometerem na produção e no comércio: em síntese é a tese do
laissez faire”. Tal doutrina poderia funcionar bem em uma economia em expansão, relativamente livre
e forte, como a da Inglaterra, na época de Smith; mas, não funcionaria tão bem em uma economia de
recessão, em país em desenvolvimento ou quando o nível de desemprego for alto.
157
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Quais foram os novos conceitos e teorias tratados por Kant para dar uma nova explicação ao
conhecimento? A seguir se apresentam ideias, conceitos e teorias, insuficientes para compreender o
pensamento kantiano, mas, suficientes como ilustrativas e para incitar à pesquisa na literatura
pertinente.
Os conceitos renomeados e reclassificados por Kant foram os relativos às proposições ou juízos
no campo metafísico, mediante uma visão e teoria nova do conhecimento. Essa proposição ou juízo
consiste em um sujeito lógico, do qual se diz algo, e em um predicado que é aquilo que se diz desse
sujeito, seguindo a tradição aristotélica.
Os juízos kantianos podem ser analíticos quando se toma parte do sujeito como predicado, sem
referência imediata a experiência, como é o caso de: a casa branca é casa. Tais juízos são sempre
verdadeiros (Leibniz os chamou de verdades de razão) e universais, independentes de tempo e lugar,
porque expressam algo necessário e inescapável (óbvio ou tautológico). São juízos a priori (segundo
Kant, razão pura é razão a priori, intuição pura é intuição a priori, independentes de experiência), uma
vez que os nexos entre eles são percebidos sem o auxílio da experiência. Esse tipo de juízo não permite
o avanço do conhecimento porque é baseado apenas no princípio da identidade.
Outros tipos de proposições ou juízos são os sintéticos, isto é, aqueles onde não seria possível
chegar a verdade pela análise de proposições. Estes juízos resultam da combinação (síntese) de fatos,
de dados, de experiências; são juízos a posteriori. Neles se junta o conceito expresso pelo predicado ao
conceito do sujeito como no exemplo, as ondas eletromagnéticas produzem no humano a sensação do
calor e igualmente dilatam os corpos, em que todas as proposições resultantes de experiências são
sintéticas. Na explicação kantiana da verdade científica há ideias de Hume (p.ex., negação da
causalidade) e de Leibniz (p.ex., princípios da contradição e da razão ou causa suficiente /
causalidade).
A obra Dissertação foi seguida por grandes obras com o criticismo kantiano: a Crítica da
razão pura, um estudo sobre os limites do conhecimento, em que explicou porque as metafísicas são
voltadas ao fracasso e porque a razão humana é impotente para conhecer o fundo das coisas;
apresentou a sua tese de ser possível fazer juízos sintéticos a priori (é a posição conhecida como
transcendentalismo) com a introdução de um novo conceito: a intuição sensível, mediante o qual o ato
do conhecimento (observação e experiência) se faz segundo juízos sintéticos que são, também, a priori.
Nesse conceito se incluiriam todas as formas de intuições racionais, não apenas a de causa-e-efeito,
mas, as de qualidade, quantidade, modalidade etc., possibilitando, assim, um novo conhecimento como
sendo o resultado de verdades sintéticas, por via da intuição sensível. Com essa tese corrigia a Leibniz:
o princípio de causa-e-efeito como a priori e não analítico; corrigia, também, a Hume, em que o juízo
causal era sintético, porém, não exclusivamente empírico, a posteriori. Na Crítica da razão pura
articulou uma ampla variedade de temas tão diferentes quanto filosofia da religião, moral, arte, história
e ciência, em particular, epistemologia e metafísica.
A moral kantiana foi exposta em obras como: o Fundamento da metafísica dos costumes e a
Crítica da razão prática. Na obra Crítica do juízo tratou de conceitos como os de beleza, arte e
finalidade, buscando a passagem do mundo da natureza, submetido à necessidade, para o mundo moral
160
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
onde reinaria a liberdade. Pelas suas ideias apresentadas na obra A religião nos limites da simples
razão, foi proibido de escrever e lecionar sobre temas religiosos por determinado período, dada a
forma de ensino não ortodoxo de religião baseado no racionalismo mais do que na revelação, enquanto
súdito do imperador Frederico-Guillerme II. Após o advento de Frederico, não hesitou em tratar de
novo, em sua obra o Conflito das faculdades, o tema religioso, considerando o problema das relações
entre a religião natural e a religião revelada. Outras importantes obras foram: A doutrina do direito, A
doutrina da virtude e seu Ensaio filosófico sobre a paz perpétua.
Um aspecto de interesse na história da ciência tratado por Kant é o relativo à análise reflexiva
compreendida em seu método a crítica, aproximando a ciência à metafísica. Em essência, seu método
consistia em ir à origem do conhecimento para torná-lo legítimo, sem duvidar de verdades da física
como as de Newton ou de verdades de valores de regras morais (...) necessárias. As questões eram
sobre que fundamentos se tinham essas verdades e em que condições eram racionalmente justificadas.
Nesse contexto, surgiram novos conceitos e teorias como, p.ex., a dos juízos verdadeiros, isto é, os
juízos necessários e universais, juízos a priori.
Segundo Kant, eram a priori os elementos do conhecimento, tais como: intuições, conceitos e
juízos, independentes da experiência. Assim, p.ex., a proposição todos os corpos são extensos ou um
triângulo é uma figura de três ângulos ou, ainda, a soma de seus ângulos equivale a dois ângulos retos
seriam afirmações necessárias e universalmente verdadeiras. Os juízos a priori seriam universais e
necessários, sem que a priori significassem que fossem inatos. Rejeitou a ideia de todo conhecimento
ser inato; a priori existiriam corpos ou não; por definição era um triângulo ou não.
Em sua obra a Crítica da razão pura Kant verificou que o conhecimento científico se referia
aos fatos observáveis que se apresentavam de uma forma universal e necessária. Dessa forma as
verdades científicas serão juízos sintéticos a priori; sintéticos porque não dependeriam da análise de
conceitos; a priori porque não se fundamentariam em experiências empíricas, mas, nas formas a priori
do entendimento que os tornariam necessários e universais; seriam verdades que não dependeriam da
experiência.
Acerca da verdade, afirmava se ter um conhecimento que é a posteriori, quando só seria possível
obtê-lo mediante a experiência. A primeira vista, pareceria que os juízos a priori fossem juízos
analíticos, isto é, juízos cujos predicados estariam contidos no sujeito. Em compensação, os juízos
sintéticos, aqueles cujos atributos enriqueceriam o sujeito seriam a posteriori, sem nada ter de
necessário, como no exemplo este livro é interessante. Não se trata de uma proposição necessária (o
livro poderá não ser interessante para alguém) nem universal (todos os livros não seriam interessantes).
Kant indicou enigmas porque se tinham juízos que poderiam ser, ao mesmo tempo, sintéticos e a priori,
como era o exemplo do triângulo, um juízo a priori, ao acrescentar algo ao conceito geométrico que
passaria a ser um juízo sintético quando se especifica o valor da soma; estaria se acrescentando algo ao
conceito, sem necessidade de se ter a constatação experimental ou de medir.
A maneira como se forma o conhecimento com suas características de necessário e universal
depende do sujeito que conhece. Ao explicitar o caráter necessário e universal das leis científicas, Kant
tornou-as intersubjetivas, uma vez que dependeriam da capacidade humana de conhecer e não do
161
mundo em si. Dessa forma, quando um cientista afirma que nenhum objeto pode viajar mais depressa
do que a luz, estará formulando uma proposição que é necessária e universal, que se refere não à
natureza íntima do mundo, mas, ao modo como se apresenta ao conhecimento humano; com essa
concepção, abriam-se as portas ao idealismo.
Para Kant, o entendimento não se limita a receber o que os sentidos captam do exterior. O
entendimento é ativo e contém as formas a priori que independem da experiência às quais todos os
dados empíricos se teriam que submeter. Nas formas a priori do entendimento se encontram a
necessidade e universalidade do conhecimento: essa é a explicação do problema apresentado por
Hume.
Outro exemplo da originalidade da filosofia de Kant pode ser encontrado em sua observação ao
conceito de causalidade; Hume tinha assinalado que: “cada evento tem uma causa”; isto não é
necessariamente verdadeiro: se x for a causa de y não é dedutível do conceito de x, nem esta
observação seria derivada simples e diretamente da experiência; todas as experiência poderá informar
que y segue regularmente x, mas, não que ele o faça necessariamente deste modo; significa que não
existiria qualquer justificativa para se ter uma conclusão geral pelo qual todos os eventos possuem
causa.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
a) Não permitir que as pessoas tenham necessidades (...); significa garantir um nível mínimo renda
para a subsistência e assegurar a segurança para todos.
b) Encorajar o aumento tanto da produção como da população, ainda que com aparente
inconsistência: se a riqueza for constante, então um aumento da população significaria diminuição
da riqueza para cada um; contudo, pelo princípio da utilidade marginal, maior população, porém
pobre, teria uma utilidade agregada maior que uma população menor e rica.
c) Pelo mesmo principio da utilidade marginal, um R$1 extra para uma pessoa rica terá menor
utilidade que um R$1 para uma pessoa pobre; portanto, a distribuição de renda para “uniformizar”
utilidades é desejável, sendo que a perda de utilidade que um rico experimentasse com uma
unidade a menos é mais que compensada pelo ganho de utilidade de um pobre com essa mesma
unidade; nesse sentido, poderia se ter um imposto progressivo.
Sob a influencia da Adam Smith, Bentham publicou Defence of usury / Defesa da usura, com
consideráveis considerações e ideais sobre esse assunto. Mais tarde publicou sua principal obra,
Introduction to the principles of morals / Uma investigação aos princípios da moral e da
legislação, onde lançou a base da teoria do utilitarismo quantificado com base em sete critérios:
intensidade, duração, certeza, proximidade, fecundidade, pureza e extensão. Dentro dessa teoria se
citam como exemplos ilustrativos, algumas ideias, tais como:
A natureza colocou o gênero humano sob o domínio de dois senhores soberanos: a dor e o prazer.
Somente a eles compete apontar o que devemos fazer, bem como determinar o que na realidade
faremos. Ao trono desses dois senhores está vinculada, por uma parte, a norma que distingue o
que é reto do que é errado, e, por outra, a cadeia das causas e dos efeitos.(...).
O princípio de utilidade reconhece essa sujeição e a coloca como fundamento desse sistema, cujo
objetivo consiste em construir o edifício da felicidade através da razão e da lei. Os sistemas que
tentam questionar este princípio são meras palavras e não uma atitude razoável, capricho e não
razão, obscuridade e não luz.(...).
Por princípio de utilidade, entende-se aquele princípio que aprova ou desaprova qualquer ação,
segundo a tendência que tem a aumentar ou a diminuir a felicidade da pessoa cujo interesse está
em jogo, (...), segundo a tendência de promover ou de comprometer a referida felicidade.
Digo qualquer ação, com o que tenciono dizer que isto vale não somente para qualquer ação do
indivíduo particular, mas, também de qualquer ato ou medida de governo.
A maior felicidade para o maior número [de pessoas] é o fundamento da moral e da legislação.
Uma lei pode ser boa ou má, dependendo de se ela contribui para aumentar a felicidade da
população ou não.
163
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
de uma síntese de pólos opostos, na qual as contradições fossem sintetizadas. As contradições no nível
científico seriam inevitáveis, mas, o pensamento como uma atividade da razão podia elevar-se e
resolver tais contradições.
Na dialética hegeliana o desenvolvimento se daria em três estágios definidos: a tese, com uma
posição particular, uma afirmação ou uma situação dada; a antítese, com uma posição contrária ou
oposição à tese; e a síntese, com elementos das duas posições anteriores apresentando um resultado,
uma situação nova ou uma nova tese.
Esse sistema trabalharia, sempre com a rejeição do que não era racional e com a incorporação do
que seria racional. A introdução desse sistema, a dialética, foi feita para compreender a história da
filosofia, da ciência, da arte, da política e da religião. Tratava-se de um modo esquemático de
explicação da realidade, baseado em oposições e em choques entre situações diversas ou opostas;
diferentemente do método causal em que se estabeleciam relações de causa e efeito entre os fatos, na
dialética se buscavam elementos conflitantes, entre dois ou mais fatos, para explicar uma nova situação
decorrente dos conflitos. O método dialético era uma progressão na qual cada movimento sucessivo
surgia como solução das contradições inerentes ao movimento anterior.
Outras obras escritas por Hegel foram:
Encyklopädie der philosophischen Wissenschaften im Grundrisse / Enciclopédia das
ciências filosóficas em resumo, dividida em três partes componentes do sistema da ciência;
essas partes eram: a lógica, a natureza e o espírito com o método de expressão dialética.
Wissenschaft der Logik / Ciência da Lógica, e os Naturrecht und Staatswissenschaft im
Grundrisse / Fundamentos do direito natural e da ciência política. Em geral, são textos de
estilos difíceis e de conexões entre as ideias nem sempre claras.
Filosofia da história, onde desenvolveu uma teoria baseada na visão do Estado como a
realidade do progresso da mente na direção da unidade com a razão. Esse Estado, enquanto unidade,
incorporaria a liberdade objetiva e a paixão subjetiva, constituindo-se, assim, uma organização racional
da liberdade. Nesse contexto, identificou quatro tipos de membros do Estado: o cidadão, passivo em
relação às leis e sem consciência de liberdade pessoal ou civil; a pessoa consciente e ativa; o herói,
cuja vontade de liberdade pessoal estaria em harmonia com os grandes movimentos; e a vitima cujos
desejos e interesses pessoas raramente se relacionariam.
economia política, com influencia nos adeptos das duas principais escolas do pensamento econômico,
o marxismo e o marginalismo keynesiano. Suas ideais permeiam e sustentam o debate de problemas
teóricos da economia em assuntos como teoria do valor, repartição de renda, comércio internacional e
sistema monetário, entre outros.
Algumas das obras de David Ricardo são: The high price of bullion. A proof of the
Depreciation of Bank Notes / O alto preço do ouro. Uma prova da depreciação das notas
bancárias. Essay on the influence of a low price of corn on the profits of stock / Ensaio sobre
a influência de um baixo preço do trigo sobre os lucros do capital. On the Principles of
political economy and taxation / Princípios da economia política e tributação. On Protection in
Agricultura / Proteção da agricultura.
A partir dos estudos de economia política, e da observação dos problemas decorrentes do
processo de industrialização, David Ricardo centrou a sua análise na distribuição, ao criar a teoria
valor-preço com o interesse pela relação de troca entre as mercadorias. Constatou, ainda, que esse valor
incidia diretamente sobre os salários dos trabalhadores, e sintetizou a lei férrea dos salários: a
existência de um salário mínimo para o trabalhador viver com dignidade. Segundo alguns especialistas,
essas ideias serviram como justificativa para a manutenção da exploração dos industriais sobre os
trabalhadores.
A contribuição de David Ricardo pode ser sintetizada pela suas teorias da população e da renda
numa doutrina geral do valor e da distribuição. A determinação das leis que regem a distribuição do
produto é o problema primordial da economia política, deslocando assim, o foco da economia para o
problema da distribuição. Formulou, com clareza, o princípio básico de sua teoria do valor, entendendo
que o valor dos bens depende da quantidade de trabalho necessária a sua obtenção ou pela sua
escassez. Analisou questões relacionadas com afirmações, tais como: as diferentes qualidades do
trabalho podem ser reduzidas a um só tipo homogêneo; o capital pode ser considerado como trabalho
acumulado; a diferente proporção entre capital fixo e circulante, ou a diferente amplidão do período de
produção levantam problemas.
Ao utilizar a teoria da renda (a renda econômica pura do modelo clássico da economia) David
Ricardo propôs um modelo que representava a evolução do cultivo das terras de um país; a ocupação
da terra começava com as de melhor qualidade e vai se deslocando para as de menor qualidade, de
acordo com a pressão exercida pelo aumento da população. Os salários sempre se mantêm em nível de
subsistência e os lucros são iguais aos da última parcela (marginal) utilizada para cultivar. A evolução
das rendas no tempo seria: os salários reais mantêm-se, os lucros diminuem e a renda da terra aumenta,
alcançando-se, no futuro, o estado estacionário.
Das contribuições há que se destacar a sua teoria das vantagens comparativas, parte essencial da
teoria do comércio internacional. Por ela, demonstrou que duas nações podem beneficiar-se do
comércio livre, mesmo que uma nação seja menos eficiente na produção de todos os tipos de bens do
que o seu parceiro comercial. A equivalência é outra teoria importante; é um argumento que sugere que
em certas circunstâncias, a escolha entre financiar as despesas através de impostos ou através do déficit
não terá efeito na economia. Analisou também a natureza da renda da terra.
168
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
historiadores o maior gênio da história matemática, com prodigiosa memória. Para ele a ciência era
uma simples recreação.
As primeiras obras de Gauss foram: Disquisitiones arithmeticae / Discussões aritméticas.
Theoria motus corporum coelestium em conicis de sectionibus ambientium de Solem /
Teoria do movimento dos corpos celestiais girando a volta do Sol, sendo considera como a
mais importante de suas obras, com uma exaustiva explanação da determinação das órbitas dos
planetas e cometas. Essa obra é dividida em dois volumes; no primeiro, Gauss discutiu equações
diferenciais, seções cônicas, órbitas elípticas (...) aplicadas nesses movimentos, enquanto que no
segundo volume, na parte principal, mostrou como calcular e refinar a estimação da órbita de um
planeta; nessas obras apresentou o método dos mínimos quadrados para o ajustamento de erros
de observações.
Disquisitiones generales circa seriem infinitam, um tratamento rigoroso de série e uma
introdução da função hipergeométrica.
Methodus nova integralium valores per approximationem inveniendi, Bestimmung der
Genauigkeit der Beobachtungen, uma discussão sobre estatísticas (aos 18 anos de idade
inventou o método dos mínimos quadrados utilizado para relacionar ciência e natureza na análise
de causa - e - efeito).
Theoria attractionis corporum sphaeroidicorum ellipticorum homogeneorum methodus
nova tractata.
Seu trabalho posterior foi inspirado em problemas geodésicos (forma e grandeza da Terra ou de
uma parte de sua superfície) e com orientação para a teoria potencial de Gauss que foi de grande
importância na física. Sua obra Theoria combinationis observationum erroribus minimis
obnoxiae com seu suplemento, foi dedicada a estatística matemática.
Depois, seu interesse foi voltado para a geometria não-euclidiana (geometria diferencial) com
vários documentos publicados sobre esse assunto. Sobre o magnetismo escreveu: Intensitas vis
magneticae terrestris ad mensuram absolutam revocata. Allgemeine Theorie des
Erdmagnetismus.
Allgemeine Lehrsätze in Beziehung auf die im verkehrten Verhältnisse des Quadrats der
Entfernung wirkenden Anziehungs und Abstossungskräfte, com teorias do magnetismo,
medidas absolutas de forças magnéticas e definição empírica do magnetismo terrestre.
Em sua obra A Allgemeine theorie mostrou que só pode haver dois pólos no globo, provando
um importante teorema sobre a intensidade da componente horizontal da força magnética junto com o
ângulo de inclinação; nessa prova usou a equação de Laplace.
170
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
virtude da qual nada de existente por si nem de independente (...), pode tornar-se objeto: é o princípio
da razão suficiente” (SCHOPENHAUER, 1983).
No princípio da razão suficiente Schopenhauer distinguiu quatro formas sintetizadas no Quadro
1.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Sobre a quádrupla raiz do princípio da razão suficiente que foi a sua tese e passou a ser o
trabalho mais conhecido, sendo a referência de leitura, segundo ele, para compreender o seu
pensamento. Nessa obra, argumentou que existiam quatro razões ou explicações para tudo:
a) as razões de mudanças físicas: tem como referência o princípio da causalidade para se ter o
conhecimento;
b) as razões de conexões entre conceitos, com base na razão ou lógica;
c) as razões das verdades matemáticas, tendo como base a pura intuição sensível do espaço e do
tempo; e
d) as razões de nós mesmos, enquanto sujeitos cuja vontade teria como referência as leis da
motivação, sendo esta quarta raiz, referente à vontade, de especial significado para o
desenvolvimento de sua filosofia; afirmava que alguém, sujeito de conhecimento, poderia se
reconhecer a si mesmo como um sujeito de vontade (COLLINSON, 2004; p. 173 – 174).
A metafísica do amor sexual (...), peça central do sistema chopenhaurino, com intuições geniais.
Considerava que a vontade, que é essência do mundo, tem o seu foco no impulso sexual; esse
impulso, com exceção de Platão, elevou-se a dignidade metafísica, influenciado pensadores como
Freud: o impulso sexual é a raiz inconsciente do comportamento humano; a suposição freudiana
da preponderação do irracional e inconsciente sobre o racional e consciente foi a base da
metafísica de Schopenhauer.
Outras obras foram: Sobre a visão e as cores, escrita por sugestões de Goethe.
Sobre a vontade da natureza. Os dois princípios fundamentais da ética. Parerga e
paralipomena, conjunto de ensaios que o tornaram mais conhecido.
os problemas e que a civilização progrediria com novos conhecimentos. Nesse contexto, a ciência que
substituiu o lugar ocupado pela religião, junto com a tecnologia, mudaria o mundo, possibilitando
significativas melhorias sem limites para o desenvolvimento. Ainda dentro dessa corrente, foram
produzidas as primeiras teorias modernas sobre a ética, entre outras disciplinas.
A avaliação, com otimismo, do poder e das realizações da razão criadas pelo iluminismo e a
crença na possibilidade de reorganizar a sociedades segundo princípios racionais e sem aceitar a ideia
da evolução ser determinada pelo passado, apesar de não ignorar a história, foram resultados
(expectativas) que perduraram até as duas grandes guerras mundiais, no século XX, quando veio o
ceticismo.
Ao final da Idade Moderna foram estabelecidos fundamentos da ciência com os de Hume e
Kant; começaram a desaparecer as dúvidas com a física newtoniana em relação ao mecanicismo e
determinismo da natureza; foram postulados fundamentos do método experimental e se deu início à
caracterização de novos problemas, tais como os do conhecimento, dos fatos científicos verdadeiros e
universais, da indução – dedução e da inferência lógica, entre outros.
No campo da lógica e durante a Idade Contemporânea foram desenvolvidos novos conceitos de
lógicas não clássicas (HAACK, 1974), tanto complementares como alternativas ou lógicas
heterodoxas. Com as lógicas complementares se ampliou o escopo da lógica clássica; dentro dessas
lógicas se relacionam:
a) as lógicas modais, com operadores modais de possibilidades e necessidades;
b) as lógicas deônticas com operadores deônticos como proibido, permitido, indiferente e
obrigatório;
c) as lógicas de tempo; as lógicas epistêmicas; e as lógicas imperativas, entre outras.
Com as lógicas heterodoxas se substituiu a lógica clássica em algumas áreas do saber, tais como
as lógicas não-reflexivas que se aplica na física quântica, onde não é válida a lei reflexiva da
identidade; e as lógicas para-completas, em que não é válido o princípio do terceiro excluído (lógicas
intuicionistas e lógicas polivalentes), entre outras.
Deve-se observar que o desenvolvimento das lógicas não clássicas facilitou ou abriu campos em
várias áreas de pesquisa e propiciou importantes soluções de problemas de matemática, física, ciências
da computação / teoria da informação, inteligência artificial etc. (p.ex., programação em lógica;
PRIEST, ROUTLEY e NORMAM, 1989) e ética, como é o caso da lógica par-consistente que admite
crenças inconsistentes, lógicas doxásticas e teorias das probabilidades.
A parte que segue sintetiza aspectos gerais da história e da filosofia da ciência, com novos
conceitos como o da investigação do conhecimento científico e da prática da ciência; e de como se
desenvolvem, avaliam e combinam as teorias científicas; destacam-se algumas contribuições de
cientistas da Idade Contemporânea.
174
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
a via que leva a esse objetivo é permeada de dificuldades. Essa via “o conduz para fora dos caminhos
batidos e dos usos ordinários”, apesar de ter seus fundamentos na realidade. Não acredita que o espírito
[do pesquisador] possa ter uma visão indutivistas dos processos da natureza, mas, só tem dela uma
abordagem indireta, pela colocação à prova empírica de suas teorias, sem que nada possa garantir, a
priori, a uniformidade da natureza nem a invariância de suas leis.
Afirmava Herschel que a verdade de uma teoria não se prova, apenas pode ser atestada de
maneira indireta, por ocasião de sua aplicabilidade bem-sucedida, sendo que um conjunto de
conformações empíricas particulares não se transforma em uma verdade universal validade. Nesse
processo, considerava que ainda o gênio científico só percebe enigmas onde os outros vêem evidências
e formula questões [de orientação] onde os outros só constatam fatos; os “princípios da ciência são
como tesouros escondidos sob as evidências mais ordinárias”. Apontava:
(...) é preciso [que tenha] um certo hábito de abstração, uma certa penetração de espírito (...), crê no
valor dos princípios (...) escondidos nos fatos; é preciso treinamento (...) e aptidão para desenvolvê-
los e evidenciá-los, formulá-los em termos explícitos e fazê-los servir para a explicação de outros
fatos menos familiares ou para a realização de um objetivo útil [bem como para evitar] se precipitar
sobre seu objeto, a subestimar os meios sobreestimando a finalidade; ao fixar demais o objeto (...)
perder de vista a riqueza e diversidade dos pontos de vista que se apresentam nos dois lados da
estrada. (ANDEL, FAGOT-LARGEAULT E SAINT-SERNIN, op. cit.; p. 39):
Em sua obra A preliminary discourse (...) afirmava que no espírito não estava espontaneamente
preparado para perceber a realidade como ela é e que, portanto, havia necessidade da investigação,
apresentando uma fenomenologia do conhecimento individual e coletivo. A natural philosopher,
habituado a discernir a ação [efeito] das causas gerais e a ilustração das leis gerais (...) encontrará
objetos de esclarecimento de algum princípio e lhe comunicará uma impressão de harmonia e ordem
(...); muitas questões poderão surgir e com elas, muitos temas para a pesquisa, mantendo desperta suas
faculdades.
Conceituou a pesquisa científica como sendo de natureza intersubjetiva, com uma definição de
“laço dos espíritos” da qual deriva a definição da ciência: “a ciência é o conhecimento de muitos,
assimilado e organizado com ordem e método, de modo a se tornar acessível a um só”.
Apontava que o conhecimento devia ser de muitos, conforme se indica a seguir (ANDEL,
FAGOT-LARGEAULT E SAINT-SERNIN, op. cit.; p. 41):
(...) o conhecimento, ao contrário da alimentação, não se destrói pelo uso. O uso o aumenta e
aperfeiçoa. Ele não ganha (...) mais certeza, mas, ganha mais autoridade e em duração provável,
quando um assentimento universal o confirma. Não há corpo de conhecimento que seja
suficientemente completo para não receber um crescimento ou suficientemente isento de erros para
não receber correções, quando ele passa por milhões de espíritos. Os que admiram (...) o
conhecimento (...) devem desejar que seus elementos se tornem acessíveis a todos, ainda que só
fosse pelo seguinte motivo: é assim que estes serão escrutados da maneira mais profunda, que suas
177
consequências serão tiradas da maneira mais eficaz e que eles adquirirão a dutibilidade e plasticidade
que apenas a pressão dos espíritos pode conferir.
A intuição para Herschel é a subida para os axiomas (processo subjetivo e objetivo ao desdobrar
a ação do espírito quando revela a arquitetura das coisas) da natureza a partir dos fatos (reflexo do
real) e o processo inverso de retorno para os fatos particulares a partir dos axiomas; esse processo do
método da ciência apresenta duas fases: um caminho para aqueles que fazem a ciência e um
movimento inerente à natureza; são dois aspectos que não são separáveis nem disjuntos de um
processo legítimo e onde o erro não tem lugar; quando há um erro é do pesquisador, do
encaminhamento do espírito e não da natureza; para minimizá-lo, invoca-se a experiência, como
fundamento da pesquisa, porém, antes dessa invocação é necessário abandonar os preconceitos: “a
busca de verdade consiste em discernir e trazer à luz, local e sem premeditação, um elo de longa
concatenação das verdades físicas” (ANDEL, FAGOT-LARGEAULT E SAINT-SERNIN, op. cit.; p.
52).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
comparação, da classificação e da filiação histórica como método para a obtenção de dados reais.
Em sua visão, os fenômenos sociais, assim como na física, obedeceriam a leis gerais.
Comte apresentou, no início, uma classificação das ciências, mas, depois e de maneira diferente,
as ciências seriam reduzidas à física, inclusiva a mais recente, a sociologia (física social). Dessa
forma se teriam físicas celeste, terrestre, orgânica e social nas quais se encontrariam as grandes
categorias de fenômenos: astronômicos, químicos, fisiológicos e sociais.
A filosofia positivista de Comte, uma forma de captar e justificar o sentimento da época, negava
que a explicação de fenômenos naturais e sociais tivesse um só princípio. Nessa filosofia se
eliminariam a consideração de causas dos fenômenos atribuídas a Deus ou a natureza (causas mais
profundas), voltando-se para a pesquisa de leis, vista como relações constantes entre fenômenos
observáveis.
Um pressuposto básico do positivismo é o de que há uma regularidade no funcionamento da
natureza e de que ao homem cabe descobrir, com exatidão, as leis naturais invariáveis, às quais estão
submetidos todos os fenômenos. Essas leis deveriam traduzir, com rigor, as condições em que
determinados fatos se gerariam. Isso seria possível de ocorrência mediante a observação e estudo das
relações entre os fenômenos. Nesse processo, as mesmas causas produziriam sempre os mesmos
efeitos, sem lugar na natureza para a improvisação: isso é o determinismo da ciência tradicional (a que
atende aos pressupostos da perspectiva cartesiana), uma consequência do mecanicismo moderno, com
notáveis defensores, entre outros Laplace.
A visão positivista de Comte provocou reações e movimentos antipositivistas, tais como: o
romantismo (movimentos intelectuais que, a partir do final do século XVIII, determinou o domínio do
sentimento sobre a razão e da imaginação sobre a análise crítica) e o irracionalismo (atitude ou
corrente filosófica que sustentava que o fundamento do conhecimento ou os valores da conduta
humana não são tributários da razão ou escapam, total ou parcialmente, à razão; seria a razão que
perdeu o rumo, sustentado em o ceticismo em que a verdade e o conhecimento não existem, mas
apenas se têm pontos de vistas e o relativismo, em que a verdade e o conhecimento existem, mas cada
época, cada cultura e mesmo cada indivíduo, tem a sua verdade e o seu conhecimento: tudo pode ser
verdade, dependendo do contexto). Tratava-se de algo inexplicável que definiria ou influenciaria um
novo perfil da filosofia européia no século XX.
Em quanto o positivismo exaltava a ciência, o romantismo e irracionalismo a deploravam. Pode-
se dizer que o conhecimento positivo tem como fundamento "ver para prever" e onde a previsão
científica caracteriza esse pensamento. O espírito positivista, segundo Comte, tem a ciência como
investigação do real. No social e no político, o positivismo passaria o poder espiritual para o controle
do cientista.
181
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
natureza é uniforme”; este é o princípio fundamental da indução com sua implicação ou suposto de o
futuro ser como o passado, mas com restrições compreendidas na proposição geral: a indução está
baseada no princípio da uniformidade e este último baseado na indução. Trata-se de uma proposição
que Mill desdobrou em duas:
a) todo evento tem de possuir uma causa, isto é, não há efeito sem causa; e
b) as causas semelhantes produzem (e sempre produziram) feitos semelhantes.
Seria incoerente aceitar a proposição “b” sem aceitar a proposição “a”, porém é coerente aceitar
“a” e rejeitar “b”; esta distinção é oportuna na consideração de pensamentos como os de Kant e
Hume; no pensamento de Mill a proposição “b” segue naturalmente “a” e a completa, pois as
proposições são indissociáveis na formulação do princípio.
A distinção que Mill estabeleceu entre conotação e denotação e entre o geral e o singular (...),
influenciou a semântica de Frege. Em sua obra Examination of Sir William Hamilton's philosophy
apresentou a indução como um fundamento da metodologia de descoberta de leis causais e a
epistemologia naturalizada; afirmou que a tentativa de compreender as operações mentais seria o
resultado da ação de leis conhecidas sobre os dados da experiência.
Sustentava que a indução era um processo mental com o qual se pode deduzir algo que é
conhecido e verídico em um caso particular ou em certos casos, sendo verídico em todos os casos
semelhantes. Elaborou a descrição clássica dos métodos da indução científica feita conforma a tradição
de Bacon; esses métodos são: os de semelhança ou concordância, os de diferenças, os de semelhança e
diferença e os de resíduos.
O pensamento indutivista clássico Bacon – Mill predominou no século XIX. Nele, colocava-se
em primeiro plano da metodologia da análise de teste e fundamentação da tese na forma de uma
hipótese. Essa hipótese era confrontada tanto com os fatos (dados) empíricos conhecidos (passado -
presente) como com fatos que seriam definidos posteriormente (pressuposto de evolução da hipótese
em termos de probabilidade) para explicar e prever. O método da fundamentação das generalizações
teóricas, adotadas como hipóteses com o auxílio da dedução de consequências empíricas comprovadas
é o método hipotético – dedutivo.
Na ética, S. Mill é conhecido, em especial pelas suas obras Utilitarianism / Utilitarismo e on
liberty / Ensaio sobre a Liberdade, clássicos do seu gênero pela sua combinação de hedonismo com
distinções de qualidade entre os prazeres, bem como pela mistura entre elementos de utilitarismo dos
atos e utilitarismo das regras. Da Liberdade é a defesa clássica do princípio da liberdade de
pensamento e de discussão, argumentando que o "único fim pelo qual a humanidade está autorizada,
individual ou coletivamente, a interferir na liberdade de ação de qualquer um dos seus é a sua própria
proteção".
Outras obras importantes que S. Mill escreveu foram Essays on some unsettled questions of
political economy, com clara influencia de David Ricardo e Principles of political economy /
Princípios de economia política em que começou a defender a propriedade provada (agricultores
irlandeses). Nessa obra afirmava que o ideal de desenvolvimento final vai além da democracia (...); o
183
problema social do futuro será o de como reunir a maior liberdade individual de ação com a
propriedade comum das matérias-primas e dar uma participação igualitária de todos nos benefícios do
trabalho associado. Na tentativa de conciliar as ideias socialistas com os seus fundamentos utilitaristas
usou uma relação entre a religião e a moral na qual admitiu que o aperfeiçoamento intelectual do
homem servisse de base ao desenvolvimento social; essa relação de ecletismo do qual Mill é o melhor
intérprete,deu origem a principal crítica de Marx: isso é prova inconteste de ingenuidade numa
tentativa de "conciliação dos inconciliáveis".
Fundamentos da pesquisa
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
A filosofia marxista (inclui as ideias de Engel e Lenin) acabou com a oposição do princípio da
gnoseologia à ontologia, da doutrina do conhecimento à doutrina da existência. Considerou o método
da ciência sob a perspectiva da dialética materialista como um método universal do conhecimento
porque ele é o reflexo no raciocínio teórico de leis gerais do desenvolvimento.
Suas principais obras foram: Manuscritos econômico-filosóficos; um conjunto de textos
escritos sob a influencia de economistas como Adam Smith, J. B. Say e David Ricardo. A
Sagrada Família. A ideologia alemão, escrito junto com Engels. A Miséria da filosofia é uma obra
polêmica.
O Manifesto do Partido Comunista foi escrito junto com Engels, considerado um dos tratados
políticos de maior influência. No Manifesto (...), os autores sugerem um curso de ação para uma
revolução proletária e formas como o proletariado se organizar como classe social capaz de
reverter sua precária situação; traz críticas ao modo de produção capitalista e na forma como a
sociedade se estruturou; foi uma crítica ao capitalismo e à economia política como origem do
pensamento socialista marxista.
O Capital, publicado em três partes; a primeira, trata de mercadoria e dinheiro, tais como: os dois
fatores de mercadorias: valor-de-uso e valor-de-troca; o duplo caráter do trabalho e as formas do
valor; a segunda parte, após sua morte e publicada por Engels, trata da transformação do dinheiro
em capital; e a terceira parte trata da produção de mais - valia.
Contribuição à crítica da economia política. O marxismo tem seus fundamentos nesta obra e no
O Capital; depois recebeu contribuições, em especial de Lênin, líder e teórico da Revolução
Russa, em O imperialismo, etapa superior do capitalismo.
A teoria econômica marxista explica, com a metodologia marxista, como o modo de produção
capitalista gera a acumulação contínua de capital pela forma como ocorre a produção das mercadorias.
A produção resulta da combinação de fatores de produção e do trabalho humano, sendo que a
quantidade de trabalho socialmente necessária para produzir um bem é o que determinaria seu valor. A
expansão do capital, um fator de produção, seria explicada porque o trabalho produz um valor superior
ao do salário; a diferença entre o valor produzido (de venda do produto) e o salário pago (custo de
produção) ao trabalhados é a mais-valia: é o conceito central da teoria marxista, considerado a fonte
dos lucros e da acumulação capitalista.
Nesse conceito há duas formas, a mais-valia absoluta (aumento proporcional com o aumento do
número de horas da jornada de trabalho, mantendo-se constante o salário pago) e a mais-valia relativa
(dá-se com o aumento da produtividade, com a racionalização do processo produtivo e com o
aperfeiçoamento tecnológico; acrescentando que o uso de máquinas cada vez mais produtivas elimina
periodicamente parte da força de trabalho).
A filosofia de Marx, o materialismo 43 dialético, é baseada, na parte que corresponde ao
materialismo, em Demócrito e Epicuro e, na parte da dialética, em Heráclito, para superar a dialética
do idealismo, isto é, as limitações da doutrina filosófica que nega a realidade individual das coisas
distintas do eu, admitindo a ideia de Hegel. Entretanto, ao adotar a dialética hegeliana, substitui o devir
187
das ideias, o espírito humano dessa dialética pelo progresso material e econômico. Ao final, o
materialismo dialético sustentava que o capitalismo (afirmação) provoca o proletariado (negação) e
essa contradição podia ser superada no futuro pela negação da negação, isto é, pela sociedade sem
classes.
Outro aspecto fundamental da filosofia marxista, compreendendo aspectos metodológicos, é a
interpretação do homem no contexto do materialismo histórico; é a aplicação ao estudo da evolução
histórica do homem, explicada pela análise de acontecimentos materiais - econômicos e tecnológicos.
Essa análise se inicia com o estudo das necessidades humanas na história que, na busca da satisfação,
luta contra a natureza e nela descobre como ser produtivo; com essa descoberta passa a ter consciência
de si, da realidade e a perceber que "a história é o processo de criação do homem pelo trabalho
humano".
Para Marx, a finalidade da história não é apenas interpretar os fatos, mas, transformar a
sociedade, uma vez que a história é a transformação da natureza humana. É na sociedade que se faz a
história para dar respostas aos problemas concretos; por isso, a história deve centrar-se nas análises dos
modos de produção existentes em cada etapa do desenvolvimento. Nesse processo, introduziu
conceitos básicos, entre eles, o conflito humano ou a luta de classe resultado das desigualdades
econômicas. Na análise de conflitos destaca o ponto chave de desigualdades da sociedade industrial
moderna, junto com o modo e a forma ideológica de manipular as ideias para que não seja percebido o
vínculo entre poder econômico, o poder político e sua influência na qualidade de vida de todos: a
alienação política e cultural.
Um ponto a destacar na ideologia marxista é o da dialética, influenciado por Hegel, mas, com
inversão de sua concepção; enquanto Hegel, entre outros pensadores de sua época, postulava a crença
no absoluto de um estado, das ideias, Marx colocou a produção material como a base da sociedade de
uma época histórica criadora da subjetividade. Afirmava, não é o conhecimento espiritual, as ideias,
que mudam a existência e a vida social, mas, o contrário, com a atividade prática, com a produção, o
corpo social transforma a sua subjetividade. Contudo, a relação da produção prática e material não
seria determinística nem reducionista como poderia parecer. Existe uma relação dialética entre essas
duas entidades. No materialismo dialético se associa o materialismo ao conceito de uma dialética 44
visto como a luta entre ideias opostas sobre diversas formas de forças sociais.
A dialética marxista postula que as leis do pensamento correspondem às leis da realidade
(pensamento e realidade a um só tempo, compreendendo a contradição), sendo que a matéria e seu
conteúdo histórico ditam a dialética. A contradição dialética não é apenas contradição externa, mas
unidade das contradições e de elemento de identidade, definida como: “dialética é a ciência que mostra
como as contradições podem ser idênticas, como passam uma na outra, mostrando também porque a
razão não deve tomar essas contradições como coisas mortas (...), mas, como coisas vivas, móveis,
lutando uma contra a outra (...)", sendo que as situações contraditórias são tidas na história com suas
parcelas de verdade e de erro, sem se misturar.
Os elementos do método dialético são: a tese, afirmação ou situação inicial, proposição
intelectual; a antítese, oposição à tese ou recurso para enfatizar conceitos envolvidos, às vezes
188
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
relacionado com o paradoxo; do conflito entre tese e antítese surgiria a síntese, uma nova situação com
elementos resultantes desse embate. A dinâmica: tese, antítese e síntese, expressavam a contundência
da dialética, mostrando que todo é o resultado de lutas de ideias e forças que gera, na síntese, a
realidade.
Com base na interpretação da história e da sociedade burguesa Marx definiu bases
metodológicas e epistemológicas da pesquisa: o método materialismo histórico-dialético de inegável
valor para a compreensão da realidade histórica. Seu ponto de partida era, sempre, o real, um fato
concreto, para elaborar um conhecimento que depois seria inserido na realidade para observar (testar)
as relações e conexões que haviam sido elaboradas. Dessa forma, para compreender um fato social
seria necessário entender as bases em que os sujeitos estariam inseridos e como se produziriam suas
consciências (atuações, decisões...), bem como levar em consideração fatores como a luta de classe, a
dominação e a alienação associadas ao fato correspondente.
eficiente de esterilização. A refutação da geração espontânea. Continua por se provar o contrário como
uma hipótese como: é possível que a vida surja espontaneamente de matéria sem vida.
A aceitação de uma das hipóteses experimentais de Pasteur foi a origem da teoria de que todos
os organismos surgem apenas de organismos vivos pré-existentes: a lei de biogênese. Essa lei não se
refere à origem química da vida, a biopoeise.
De certa forma, muitas outras teorias e hipóteses tiveram base nas descobertas de Pasteur, um
dos fundadores da biologia moderna. Alguns exemplos delas para exemplificar o desenvolvimento da
ciência são: a hipótese de Oparin – Haldane: em ambiente aquoso, os compostos orgânicos sofrem
reações em níveis crescentes de complexidade molecular responsáveis por agregados colóides; a
hipótese de Urey-Miller: os agregados colóides em diversas condições atmosféricas são responsáveis
pela origem de aminoácidos e outros “tijolos” básicos da vida; a hipótese de Sidney Fox: os “tijolos”
básicos da vida se juntam por simples aquecimento dando origem as protenóides como são moléculas
polipeptídicas; a subsequente hipótese: os aminoácidos e pequenos peptídeos podem formar
membranas esféricas fechadas, microesferas capazes de absorver moléculas presentes no seu ambiente
e formar estruturas maiores na forma de protuberâncias que podem se separar e crescer
individualmente; e as hipóteses de Manfred Eigen (...), de Sol Spiegelman (...), de Tomas Gol (...) e de
Caim – Smith (...), entre outras.
Outro exemplo notável de uma sequência de hipótese e teorias científicas se encontra no campo
da genética, ilustrado na ordem histórica em que eventos ocorreram (MATTE, 2005; complementado):
1859. Darwin 45 publicou o livro A Origem das Espécies, em que estabeleceu sua teoria: as
espécies se modificam pela ação seletiva do ambiente sobre as variações existentes na população.
Anos mais tarde publicou Observações acerca de uma classificação étnica dos idiotas
onde afirmava que os traços mongolóides presentes em indivíduos com Síndrome de Down eram
produto de uma degeneração que determinava o surgimento de características típicas de raças
inferiores.
1865. Mendel, 46 formulou a Lei da Transmissão dos Caracteres Hereditários, após a realização e
análise experimentos de hibridação com ervilhas-de-cheiro (Lathyrus sp), cultivadas em seu
jardim. Os resultados passaram despercebidos pela comunidade científica, por aproximadamente
30 anos, ofuscados pela atenção à teoria da seleção natural de Darwin. Somente em 1900, três
cientistas trabalhando independentemente, o holandês Hugo de Vries, o alemão Carl Correns e
o austríaco Erich von Tscheermack, reconheceram as descobertas de Mendel: a transmissão de
características hereditárias era feita por meio de fatores presentes nos gametos, os genes: leis de
Mendel, sustentadas pela matemática na lei da segregação, (lei da variação independente). Não
existe herança por combinação pois os caracteres permanecem diferenciados e intactos.
1871. Friedrich Miescher (1844 – 1895; médico suíço, um dos primeiros a trabalhar com química
dos tecidos e composição dos leucocitos). Descobriu a nucleína, presente em espermatozóide de
salmão, substância que compõe o núcleo das células, o DNA, porém ainda não visto como
portador da informação genética.
190
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
1949. L. Pauling e H. Itano identificaram uma alteração na hemoglobina, detectada por uma
diferença na sua mobilidade eletroforética, como a causa subjacente da anemia falciforme.
1951. M. Wilkins e R. Franklin determinaram a constante cristalográfica e interpretaram as
imagens de difração obtidas com cristais de DNA.
1952. M. Chase e A. Hershley demonstraram experimentalmente que o DNA transmitia as
características hereditárias.
1953. J. Watson e F. Crick definiram a estrutura de dupla hélice do DNA: o ácido
desoxirribonucléico, como sendo a base molecular da hereditariedade, indispensável para a
síntese de proteínas.
1956. Tijo e Lavan demonstraram que o número correto de cromossomos da espécie humana é 46.
1957. F. Crick formulou o "dogma central" de uma nova teoria dos processos vitais: DNA à RNA à
proteína.
1958. A. Kornberg isolou a DNA polimerase, enzima responsável pela duplicação do DNA de
Escherichia coli.
1959. J. Lejeune determinou a causa genética da Síndrome de Down, um cromossomo 21 extra.
1961. F. Jacob e J. Monod decifraram os mecanismos de regulação gênica em procariotos.
M. Lyon propôs que a compensação de dose nas fêmeas humanas era obtida pela inativação de
um dos cromossomos X, conhecido como corpúsculo de Barr.
L. Hayflick estabeleceu que células normais em cultura possuíssem uma capacidade finita de
divisões, cerca de 50: Limite de Hayflick com implicações em processos como os de
envelhecimento.
1964. M. Nirenberg, R. Holley e G. Khorana, decifraram o código genético, a linguagem que
permitiu ao DNA produzir uma proteína.
Zuckerkandl e Pauling propusseram a existência de um relógio molécula: a taxa de evolução
molecular é constante no tempo. Isto possibilitou a utilização da análise de proteínas para
determinar as épocas de divergência entre as espécies e reconstruir a filogenia dos organismos.
1967. A. Wilson e V. Sarich, mediante a comparação da estrutura de certas proteínas sanguíneas,
estimaram que humanos, chimpanzés e gorilas divergiram a partir de um ancestral comum há 5
milhões de anos.
1968. F. Anderson teorizou a possibilidade de combater as doenças hereditárias introduzindo no
organismo o gene correto ou substituindo aquele defeituoso, uma antecipação da terapia gênica,
tese / artigo que o New England Journal of Medicine se recosou a publicar.
M. Kimura lançou a teoria neutralista da evolução: a maior parte das mutações não tem efeitos
deletérios significativos e, portanto, não estão sujeitas a ação da seleção natural.
192
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
1969. Edelman determinou pela primeira vez a sequência de aminoácidos de uma proteína, a
Imunoglobulina G.
1970. G. Khorana sintetizou quimicamente e construiu o primeiro gene.
D. Baltimore descobriu a existência da transcriptase reversa, capaz de transformar RNA em
DNA.
P. Ramsey defendeu a cirurgia genética para eliminar deficiências genéticas, mas, posiciono-se
contra o uso de tecnologias reprodutivas.
1971. P. Berg, W. Gilbert e F. Sander por seus estudos sobre sequenciamento de DNA,
levantaram o primeiro alarme sobre a manipulação genética e suspenderam seus experimentos; o
resultado foi a criação de um comitê de especialistas para avaliar os valores e riscos da
manipulação genética.
1972. Surgiu o DNA recombinante: P. Berg utilizou pela primeira vez enzimas de restrição para
cortar e reunir pedaços de DNA de espécies diversas.
N. Eldredge e S. J. Gould sugeriram que a evolução ocorre aos saltos e não de maneira linear,
numa teoria conhecida como Equilíbrio Pontuado.
1973. A.M. Olovnikov, cientista russo, propus uma teoria de envelhecimento associada a perda de
telômeros, observando que as células perdem a extremidade dos cromossomos a cada ciclo de
replicação.
S. Cohen, A.Y. Chang, H. Boyer e R.B. Helling desenvolveram a técnica de manipulação
genética: a chave biológica para cortar e reunir o DNA seriam as enzimas de restrição, usadas
como bisturi. As bactérias servirem para multiplicar os pedaços ou o pedaço obtido com as
enzimas.
S. Cohen e A.Y. Chang realizaram um experimento com o qual superavam uma barreira
biológica ao introduzirem uma molécula de DNA de sapo na bactéria E. coli que começava a
produzir, não obstante a distância evolutiva, o gene estranho. A possibilidade de utilizar a técnica
para inserir genes de vírus tumorais em E. coli e verificar como exercem seus efeitos
cancerígenos suscitou o temor entre os cientistas de que a bactéria possa transformar-se em um
organismo.
1975. W. Gilbert, F. Sanger e A. Maxim desenvolveram uma técnica que permitiu determinar a
exata sequência das bases que compõe o gene e ler o código genético.
Gurdon demonstrou o desenvolvimento de uma larva a partir de um núcleo de sapo adulto.
1976. Varmus e Bishop revelam a existência de oncogenes, genes dormentes capazes de causar
câncer. Clonagem (isolamento) do primeiro gene humano, o gene da beta-globina.
1977. S. Weismann identificou a mutação genética responsável pela anemia falciforme: o
primeiro gene defeituoso a ser decodificado e clonado.
193
A E. coli foi utilizada para clonar por primeira vez um hormônio humano, a somatostatina, pela
Genentech. Sanger descreveu a sequência completa de um DNA viral.
R. Roberts e P. Sharp descobriram independentemente os íntrons, sequências intervenientes
que interrompem os genes dos organismos eucariotos.
Foi feita a localização de um gene humano por hibridização molecular.
O gene da alfa-globina é localizado utilizando sondas construídas a partir de beta-globina.
1978. Com o DNA recombinante a Genentech clonou e sintetizou, em bactérias manipuladas em
laboratórios, a insulina humana, sendo, quatro anos depois, comercializada.
Foi construída a primeira biblioteca genômica humana, com clonagem de DNA humano em
vetores.
Foram utilizados métodos moleculares (RFLP e Southern) para diagnóstico pré-natal de Anemia
Falciforme.
1979. Genentech clona o gene do hormônio de crescimento humano.
L. Shettles publicou Diploid nuclear replacement in mature human ova with cleavage, em
que relatou a transferência in vitro do núcleo de uma espermatogônia para um oócito maduro que
foi mantido até o estágio de mórula, estágio pré-implantação.
1980. M. Cline, oncologista americano, inseriu na medula óssea de dois doentes com talassemia
genes de hemoglobina manipulados para corrigir o defeito gênico, “violando” (quebra de
paradigma), com isso, várias regras de pesquisa com seu protocolo.
Prusiner sugeriu a existência de proteínas infectantes (prions), aceitas 15 anos depois como
sendo responsáveis pela Encefalopatia espongiforme Bovina (Síndrome da Vaca Louca) e pelo
Kuru e Doença de Creutzfeld-Jacob em humanos.
1981. S. Anderson publicou a sequência completa do DNA mitocondrial humano.
1982. R. Palmiter e R. Brinster, realizaram o primeiro experimento de manipulação genética a
partir de células germinais animais: o gene para hormônio de crescimento de rato (Rattus spp)
foi inserido em camundongos (Mus musculus), gerando um animal de dimensões gigantes. Essa
técnica permitiu produzir cobaias transgênicos para estudar doenças do homem.
J. Kemp e T. Hall transferiram um gene de feijão (Phaseolus vulgaris L.) em um girassol
(Helianthus sp. ) e obtiveram um híbrido que eles chamaram de "sunbean"; nesse experimento
foi utilizado, como veículo, a bactéria Agrobacterium thumefaciens.
Foi produzida a primeira droga de DNA recombinante (insulina humana) comercializada.
1983. A. Jeffreys descobriu que o material genético de um indivíduo continha sequências únicas
de nucleotídeos, os elementos que compõe o DNA. Quando a amostra de DNA foi "digerida" por
uma enzima e separada em um gel, se formou uma série de bandas segundo um padrão que
194
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
mudava de uma pessoa para outra, produzindo uma impressão genética que podia ser utilizada
para a identificação de indivíduos.
Foi feita a primeira localização de um locus autossômico relacionado com uma doença e cujo
gene e proteína são desconhecidos: Doença de Huntington no cromossomo 4.
Foi descoberto o gene do Retinoblastoma e formulado o conceito de anti-oncogene (genes
supressores de tumor).
1984. Nasceu na Inglaterra um híbrido entre cabra e ovelha, obtido a partir da justaposição de
embriões desses dois animais.
1985. McGrath e Solter desenvolveram a técnica de transferência nuclear de embriões de
mamíferos.
No braço longo do cromossoma 7 foi localizado o gene da Fibrose Cística, uma doença genética
devido a um erro protéico que apresentava um alto nível de heterozigotos na população
caucasóide.
Foi feito o primeiro diagnóstico pré-natal, por RFLP, de uma doença cujo gene e a proteína são
desconhecidos: Distrofia Muscular de Duchenne.
K. Mullis desenvolveu o método de PCR (Reação em Cadeia da Polimerase).
Pela primeira vez é aceito um teste de DNA para determinar uma identidade em uma instância
judiciária.
1986. Willadsen demonstrou o desenvolvimento de uma ovelha adulta a partir de um núcleo de
embrião de oito células.
1987. Nasceu em Harvard, nos EUA, o oncomouse, o camundongo manipulado geneticamente para
que tivesse uma maior suscetibilidade ao câncer, importante modelo animal para a pesquisa.
Cresceu nos EUA a primeira planta de tomate (Solanum lycupersicum) manipulado Greider e
Blackburn descobriram a telomerase, enzima responsável pelo alongamento dos cromossomos
do protozoário Tetrahymena após cada divisão celular. Dois anos depois a mesma enzima é
caracterizada no homem e torna-se fundamental nos estudos de câncer e de envelhecimento.
1988. É lançado nos EUA o Projeto Genoma Humano, patrocinado pelo NIH (National Institutue
of Health) e DOE (Department of Energy), com a proposta de mapear o patrimônio genético do
homem.
Paralelamente surgiu um organismo de coordenação internacional chamado HUGO (Human
Genome Organization) para sintonizar o trabalho e recolher em um banco de dados centralizado,
o Genome Database, o conhecimento adquirido.
1989. L. Tsui e F. Collins identificaram e decifraram o gene da Fibrose Cística, uma das cerca de
5000 anomalias genéticas conhecidas.
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Fundamentos da pesquisa
Volume 1
1995. Foi publicada a sequência completa do primeiro organismo de vida livre, a sequência do
Hemophilus influenzae, com 1743 genes e 1,8 milhões de pares de bases.
1996. Foram conhecidos 6300 genes humanos (5 a 10% do total estimado), a metade deles
relacionados as doenças. Foram lançados testes genéticos com potencial para detectar doenças
genéticas em 42%.
1998. O físico americano R. Seed, pioneiro na transferência de embriões, anunciava que pretendia
clonar seres humanos utilizando a técnica desenvolvida na Escócia.
J. Shay e W. Wright publicaram um trabalho em cultura de células. (...)
com relação aos elementos do meio não se encontrarem em equilíbrio, com o surgimento de forças
mecânicas sobre corpos magnetizados e sobre os corpos que transportam correntes elétricas; os testes
dessas hipóteses lhe permitiram gerar estados de tensão e explicar causas.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
que consiste em desviar o olhar de tudo o que é causa primeira, primeiro princípio, categoria, suposta
necessidade, voltando-o para os resultados, para as consequências”.
A concepção da lógica como semiótica de Pierce é mais ampla do que a tradicional concepção de
ciência dos signos, a semiótica como processo de raciocinar estabelecendo, de certa forma, posições
antipositivistas e libertárias.
O entendimento do conceito semiótico e de suas posições lógicas está baseado, em parte, na
classificação da linguagem das ciências das descobertas, das heurísticas, sintetizado no Quadro 2.
Os estudos que precedem as ciências normativas no sistema proposto por Pierce, não fazem
nada para afetar a realidade, enquanto os seguintes, os das ciências normativas, começando com
metafísica e incluindo as ciências especiais e as artes práticas, são progressivamente direcionados no
sentido de entendimento e da alteração da realidade em vários sentidos.
É na ciência normativa que se examina criticamente os fins que guiam as interações com o
mundo, inclusive a ação de conhecê-lo. Dessa forma, questões de significação precedem não apenas a
ação, mas também a maior parte das questões de fato (carregado de significado), exceto, as questões
mais gerais em relação ao fato formal que diz respeito às relações matemáticas, e aquelas que dizem
respeito à estrutura da experiência que são levantadas na fenomenologia.
Cada uma das ciências normativas (isto é, da ciência das leis da conformidade das coisas com os
fins), aborda um modo particular de interação com o mundo, conforme é sintetizado na última linha
das ciências heurísticas do quadro anterior; a estética, p.ex., considera aquelas coisas cujos fins devem
incorporar qualidades de sentimento; a ética, aquelas cujos fins situam-se na ação; e a lógica, aquelas
cujo fim é representar algo, com clara interdepência entre as três ciências noramtivas.
II Ciências de Revisão
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Trouxe importantes contribuições para a lógica simbólica, para a metodologia científica e para a
semiótica.
A descrição de Pierce para o pragmatismo é, com frequência, não bem compreendida; seu
método requer que aquilo que é considerado como suporte prático de um conceito e os seus efeitos,
possam ser expressadas em uma sentença condicional. Afirmava:
(...) voltamos ao que é tangível e concebível, como a raiz de toda a distinção real do pensamento,
não importando quão sutil ela possa ser; não existindo qualquer distinção de significado tão bom
quanto qualquer diferença possível de prática (...); (...) o pragmatismo é um método de verificação
dos significados, não de todas as ideias, mas (...) de conceitos e argumentos concernentes, dos quais
os fatos objetivos possam depender.
coisas são; toda pessoa que tiver experiências e raciocínio o bastante, será capaz de ter uma conclusão
verdadeira (NICOLA, 2005; p. 244).
Na obra The Fixation of Belief Pierce concluí que o método científico é o único capaz de
formular hipóteses e as submeter às verificações, com bases nas suas consequências. Identificou na
ciência três diferentes modos de raciocínio:
a) A indução, que considera um argumento generalizado, o que possibilita a formação de hábitos.
b) A dedução que considera um argumento necessário, um raciocínio que não pode partir de
premissas verdadeiras chegando a resultados falsos.
c) A abdução o fato de levantar hipóteses que possibilitam o surgimento de uma teoria de onde é
possível deduzir consequências observáveis. A abdução é o princípio da descoberta, da
possibilidade de decifrar o mundo; compreende a ciência enquanto um processo de desvendar
permanente, sem se chegar à verdade total das coisas; a ciência apenas anuncia alguns aspectos
dessas verdades.
A fenomenologia encontra na abdução o aspecto do indeterminado, a disposição de olhar para as
coisas da maneira como elas aparecem naquele instante único. Isto permite dizer apenas de algumas
facetas de algo, não sendo possível dizê-la como um todo.
Formulou sua própria teoria fenomenológica classificando os fenômenos em três categorias:
a) primeiridade, que considera o acaso, a experiência imediata;
b) segundidade, que considera a existência, a reação imediata; e
c) a tercieridade, que considera a lei, o pensamento mediativo.
Essas categorias da fenomenologia seria o esqueleto através do qual a realidade pode aparecer, e
ainda, compõem a lógica que sustenta sua concepção metafísica.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Não precisamos antecipar nossos futuros detalhes próprios, mas apenas estabelecer nossa conclusão
geral de que introspecção é difícil e falível; e que a dificuldade é simplesmente aquela que acontece
a qualquer tipo de observação [...]. A única salvaguarda está no consenso final de nosso adicional
conhecimento sobre a questão, com perspectivas posteriores corrigindo às anteriores, até que ao cabo
a harmonia de um sistema consistente seja alcançada (JAMES, 1983).
sistemática do método; nessa obra afirmavam que não era possível dar um passo à frente em
pesquisa, a menos que se tivesse em mente uma possível solução do problema objeto de investigação,
uma sugestão capaz de explicar a dificuldade, as causas que originam o problema. Aspectos básicos da
relação lógica – método científico são apresentados em Metodologia.
Essas “sugestões”, com base em fundamentos teóricos e observações da realidade, ganham o
status de hipóteses, no momento em que são traduzidas em proposições claras, com capacidade para
nortear a pesquisa. A hipótese, se verificada, poderá ser acerca de uma possível solução, de um objetivo
(...). Cohen e Nagel, em sua obra, defendem a ideia de que uma pesquisa é iniciada a partir da
existência de um problema; perante o problema, o pesquisador deve adotar certa posição de ceticismo
e, simultaneamente, formular hipóteses, não de qualquer forma, mas, as que se coadunem com a
realidade observada e registrada nos dados. Os dados da realidade e uma teoria de suporte aplicável ao
caso devem possibilitar testar a hipótese.
Brandes / Cohen acreditava que se uma ideia funciona, ela é uma ideia verdadeira e na medida
em que faz diferença para a vida, é detentora de significado. Verdade, para ele, não é um valor
absoluto, fixo e imutável, independente da cognição humana, mas algo que é inventado ou criado pelos
sentidos e que se encontra intimamente conectado com a vontade, porque o que é verdade se
transforma no que é bom. Sua preocupação final era com a moral.
Fundamentos da pesquisa
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como um método crítico a se constituir no nível da patologia, ao procurar fazer aquilo que se gostaria
estivesse mudo.
Nietzsche foi um dos primeiros filósofos a afirmar a multiplicidade da vida e do mundo, com
uma postura crítica da científica. Foi o primeiro crítico do positivismo em um momento em que essa
corrente dominava Europa e o Novo Mundo. Era o domínio de um positivismo lógico que no século
XX daria sustentação ao Círculo de Viena (ver nota de rodapé 6) com grande influência sobre a
comunidade científica.
Para Nietzsche, a ciência deveria tratar da vida humana, acreditando que o conhecimento só faria
sentido quando tratasse dessa vida. Daí sua proposta de uma Gaia ciência, de um saber não perdido na
irrefletida ideia do saber pelo saber dos filósofos da antiguidade.
Na perspectiva crítica do filósofo alemão, a ciência nem torna o homem mais íntimo de Deus,
nem possibilita um conhecimento útil e inocente acima de qualquer suspeita. Ao contrário, a ciência
responde a interesses e a ideia do saber afasta o homem do homem, muitas vezes estando a serviço da
extinção de vidas humanas. O saber pelo saber, que compartimenta o mundo para saber cada vez mais
sobre cada vez menos, não atende aos interesses humanos. Nessas ideias se têm críticas da
disciplinaridade da ciência, da especialização do saber, que são omitidas.
Na obra A gaia da ciência, Nietzsche entre os verbetes e provérbios apresentados em rima, são
citados uns poucos para uma reflexão (NIETZSCHE, s.d):
a) Do objetivo da ciência (seção 12 do Livro primeiro). “Com que estão! Será o objetivo da ciência
dar ao homem a maior quantidade de prazer e a menor quantidade de desprazer possível? Mas,
como chegará a isso, se o prazer e o desprazer estão tão intimamente ligados que aquele que quer
saborear um deles ao máximo é forçado a provar ao máximo os outros, se o que quer chegar a
´felicidade celeste´ também deve se preparar para a ´angustiais mortais´? Tal vez seja assim! Os
estóicos, pelos menos, eram desta opinião e mostravam seu espírito de coerência pedindo o menor
prazer possível à vida para ter o mínimo desprazer, quando proclamada a máxima “o homem mais
feliz é o mais virtuoso (...)”. Ainda é possível a escolha: ou o menor desprazer possível, digamos a
ausência de sofrimento (no fundo os socialistas e os políticos de todo partido nunca deviam,
honestamente, propor a seus partidários) ou o maior desprazer possível como juro de aumento da
quantidade de prazeres e alegrias (...). É correto que com a ciência se pode proporcionar um ou
outro objetivo, sendo tal vez mais conhecida por privar o homem de suas alegrias (...). Porém,
nada impede também que se descubra nela a grande dispensadora de dores (...)”.
b) A questão da compreensão (seção 381 do Livro quinto). “Deseja-se não apenas ser compreendido
quando se escreve como também não ser bem compreendido. Não é objeção contra um livro
quando existe alguém que o julga incompreensível: talvez fizesse parte das intenções do autor o
não ser compreendido por qualquer. Todo espírito distinto escolhe assim seus ouvintes quando
deseja se comunicar; escolhendo-os, previne-se contra os outros (...)”.
207
Fundamentos da pesquisa
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raciocínio matemático, uma caracterização precisa de uma demonstração matemática. Para isso,
formalizou as regras de demonstração, começando por regras simples; o resultado final foi a lógica de
predicados.
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eram diferentes às euclidianas e não podiam ser observadas diretamente. Essa ideia demorou a ser
aceita entre os matemáticos e só foi considerada por Bernhard Riemann: a existência de um espaço
que precede os postulados de Euclides. Nesse espaço foram desenvolvidas as funções automórficas
(funções fuckianas).
Além de desenvolver teorias em funções abeliannas e geometria algébrica, Poincaré contribuiu
no desenvolvimento da álgebra para resolução de problemas de análise e nos estudos de Lie sobre
grupos. Teve contribuições, também, na eletricidade, eletromagnetismo e movimento do elétron. A
associação de espaço não-euclidiano com o eletromagnetismo e mecânica celeste é, segundo alguns
historiadores, princípio básico da relatividade: considerar um espaço não-euclidiano, em que a
curvatura é importante e modifica a distância entre dois pontos; em um plano, o espaço é euclidiano, a
curvatura é nula; em uma esfera, é positiva e em um espaço hiperbólico, é negativa. Essas ideais
básicas foram apresentadas em Principles of mathematical physics / Princípios de matemática
física antes de Einstein publicar seu trabalho sobra a relatividade.
Dentre as obras de Poincaré se destacam: Analysis situs, um tratado sistemático sobre
topologia. Léçons de mécanique céleste / Lições de mecânica celeste.
Les méthodes nouvelles da mécanique céleste / Os novos métodos da mecânica
celeste, com equações que solucionaram o problema de três corpos; as equações foram usadas no
estudo de soluções periódicas, quando as massas de dois corpos são muito pequenas se comparadas
com a de um terceiro, o que acontece no caso do sistema solar.
Escreveu várias obras de divulgação científica, com destaque para a trilogia sobre a filosofia da
ciência: La science et l’hipothèse / Ciência e hipótese. Nessa obra discorreu sobre o espaço e a
geometria não-euclidiana. Acreditava que considerar uma ciência válida apenas se for passível de
experimentação. Considerou a existência do tempo como a quarta dimensão; este é um dos
fundamentos da teoria da relatividade de Einstein.
Na obra Science et méthode / Ciência e método considerou que o método científico não
pode desprezar a intuição; ela atua como ponto de partida para construir um sistema que reproduz
todas as situações; nesse contexto, a ciência é um sistema de relações.
Na obra La valeur de la science / O valor da ciência; entendia que esse valor estava nas
relações que a objetividade deve buscar; seria inútil procurá-lo nos seres considerados como isolados
uns dos outros.
A própria faculdade de invenção, segundo Poincaré, era a intuição; em geral, à intuição
compete prover os objetos, sendo diferente da evidência; tem a função de revelar a verdade
independente da razão discursiva. Considerou, além da intuição sensível ou apenas a percepção por
meio dos sentidos, a existência de uma forma de intuição que permite o domínio de objetos ideais.
Acreditava que a intuição era uma faculdade do espírito com a sua função basicamente heurística.
Afirmava que era pela intuição que se descobria e inventava; entendia a invenção como o
processo de selecionar (portanto, era necessário supor a existência de um princípio seletivo:
inconsciente ou parcialmente inconsciente), de combinação particular (supor uma função avaliadora:
211
inconsciente) dada por um insight criativo; enquanto que era pela lógica que se justificava a criação ou
invenção. A intuição era transversal nas atividades do sujeito cognoscente; dessa forma, estava presente
na percepção, no entendimento, na imaginação criadora e na razão. No entendimento intuitivo
realizava sínteses originais baseadas, com frequência, em analogias e em induções. Como subsidiária
da razão, a intuição podia sintetizar em um único momento, todos os momentos de uma cadeia
dedutiva.
Afirmava que "o homem moderno tem utilizado a relação de causa e efeito do mesmo modo
como o homem da antiguidade usava os deuses, isto é, para ordenar o universo. Isto não ocorria apenas
porque se tratava do sistema mais verdadeiro, mas porque era o mais conveniente”. Em outras questões
pensava que “o ser humano se fez mais amigo dele mesmo do que da verdade, alienando-se devido a
sua covardia e criando justificativas próprias para sua artificialidade perante o mundo que o cerca”.
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O fato social é um conceito central no método de estudo da sociologia; esse fato é definido por
Durkheim como todo o modo de agir, permanente ou não, que possa exercer alguma forma de coerção
externa ao indivíduo ou ainda que, por apresentar existência própria e independente das manifestações
individuais, possa ter um sentido geral para a sociedade. Esse modo é criado a partir da maneira como a
sociedade percebe a si mesma e à realidade ao seu redor e explicado pelos efeitos sociais que produz.
A primeira regra para a observação dos fatos sociais é considerá-los como coisas; isso implica
afastar sistematicamente de preconceitos e influencias fora do campo científico; definir previamente as
coisas por meio de caracteres exteriores comuns; considerá-las independentemente de suas
manifestações individuais, da maneira objetiva. Estes fatos poderiam ser agrupados como normais ou
patológicos.
O normal, conforme Durkheim, é aquilo ao mesmo tempo obrigatório para a pessoa e superior a
ela, o que significa que a sociedade e a consciência coletiva são entidades morais, antes mesmo de
terem existências tangíveis; tal preponderância da sociedade sobre o indivíduo deve permitir a
realização deste, sempre que a pessoa consiga se integrar a essa estrutura. Implícito na normalidade
está a solidariedade 49 variável conforme o desenvolvimento da sociedade. A solidariedade social é a
responsável pela coesão que surge entre os indivíduos e os mantém em sociedade, lutando contra as
ameaças externas; nesse contexto, há duas consciências: uma individual e a outra comum a todos, da
sociedade que age e vive em cada um.
Consistente com a solidariedade, segundo Durkhein, tem-se o fato da norma moral tornar-se
norma jurídica, para se definirem regras de cooperação e troca dos que participam do trabalho coletivo.
A partir do normal se conceitualiza e analisa o que é patológico. As sociedades modernas são doentes
porque sofrem de anomia, isto é, o estado da sociedade caracterizada pela desintegração das normas
que regem a conduta humana e asseguram a ordem social e porque estão submetidas a mudanças
abruptas sem o tempo necessário para que o conhecimento coletivo possa definir a regulamentação
adequada.
As relações sociais, no método de Durkheim, apresentadas em As Regras do método
sociológico, não são consideradas como sendo inseridas em um processo histórico, mas, como fatos
sociais de fenômenos naturais, desligados de sujeitos conscientes; seriam fatos que obedecem às leis
naturais. Assim, o fenômeno social se reduz a um fato desvinculado do sujeito. Esse conceito é oposto
à posição de Weber, outro clássico da sociologia, para o qual a objetividade do social só pode ser
apreendida por ações individuais.
Como características a destacar (princípios) ou regras do método sociológico de Durkheim se
têm as seguintes:
a) um método que é exclusivamente sociológico e objetivo, independente de qualquer filosofia,
destinado para descobrir a verdade na objetividade social, inclusive os valores compreendidos
nessa objetividade, independente de vontades e consciências;
b) um método que é dominado pela ideia de que os fatos sociais, somente explicados por outro(s)
fato(s) social(is), são coisas que pertencem ao reino da natureza, são coisas sociais que devem ser
215
Fundamentos da pesquisa
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universidade de Pequim, China; elaborou um projeto de reforma educacional para a Turquia e durante
visitas a México, Japão e URSS estudou os problemas da educação nesses países.
Dewey não aceitava a educação pela instrução conforme era a proposta por Herbart. 50 Criticou a
educação tradicional, principalmente no que se refere à ênfase dada para: a) intelectualismo ou a
redutibilidade de tudo no Universo a elementos intelectuais, até mesmo categorias de fatos
considerados pela maioria dos filósofos como irredutíveis à inteligência (p.ex., os sentimentos e a
vontade), entendidos, em última análise, como fenômenos intelectuais confusos; e b) a memorização
ou o conjunto de operações metódicas que auxiliam a fixação (conservação e fixação e retenção) de
informações na memória; de aquisição mnemônica voluntária; que auxiliam a fixação de
conhecimentos na memória.
Para Dewey, o conhecimento é uma atividade orientada que não tem um fim em si mesmo, mas,
que está dirigida para a experiência. As ideias são hipóteses de ação e são verdadeiras quando
funcionam como orientadoras dessa ação.
A educação tem como finalidade, segundo Dewey, propiciar à criança condições para que resolva
por si própria os seus problemas; isso é contrário às tradicionais ideias de formar a criança de acordo
com modelos prévios, ou mesmo orientá-la para um porvir. Tendo o conceito de experiência como fator
central de seus pressupostos, chega à conclusão de que a escola não pode ser uma preparação para a
vida, mas sim, a própria vida.
Assim, para Dewey, a vida-experiência e a aprendizagem estão unidas, de tal forma que a função
da escola se encontra em possibilitar uma reconstrução permanente feita pela criança, da experiência.
A educação progressiva está no crescimento constante da vida, na medida em que o conteúdo da
experiência vai aumentado, assim como o controle que se pode exercer sobre ela. É importante que o
educador descubra os verdadeiros interesses da criança, para apoiar-se nesses interesses, pois para ele,
o esforço e disciplina, são produtos do interesse e somente com base nesse interesse a experiência
adquiriria um verdadeiro valor educativo.
Dewey atribui grande valor às atividades manuais, pois apresentariam situações problemas
concretas para serem resolvidas, considerando ainda, que o trabalho desenvolve o espírito de
comunidade. A divisão de tarefas entre os participantes, estimularia a cooperação e a consequente
criação de um espírito social.
Dewey concebia que o espírito de iniciativa e a independência levam à autonomia e ao
autogoverno. Estas seriam virtudes de uma sociedade democrática, em oposição ao ensino tradicional
que valoriza a obediência. A educação, para ele, é uma necessidade social, os indivíduos precisam ser
educados para que possam assegurar a continuidade social, transmitindo crenças, ideias e
“conhecimentos”. Ele não defendia o ensino profissionalizante, mas considerava a escola voltada aos
reais interesses dos alunos, valorizando sua curiosidade natural.
De acordo com os ideais da democracia, Dewey, vê na escola o instrumento ideal para estender a
todos, os seus benefícios, tendo a educação uma função democratizadora ao igualar as oportunidades.
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Essa concepção é responsável pelo otimismo pedagógico da escola nova criticado pelos teóricos das
correntes crítico-reprodutivistas. 51
O processo de ensino - aprendizagem estaria baseado, segundo Dewey, na compreensão de que o
saber é constituído por conhecimentos e vivências que se inter-relacionam de forma dinâmica; os
alunos e professor com experiências próprias aproveitadas no processo; o professor com sua uma visão
sintética de conteúdos; os alunos com sua visão sincrética; isso tornaria a experiência, de experimentar
e de provar, um ponto central na formação do conhecimento, mais do que os conteúdos formais; a
aprendizagem essencialmente coletiva, assim como seria coletiva a produção do conhecimento.
Um aspecto (ponto chave) a destacar nas ideais de Dewey é necessidade de estreitar a relação
entre teoria e prática ao acreditar que as hipóteses teóricas só têm sentido no dia-a-dia. Outro ponto-
chave de sua teoria é a crença de que o conhecimento é construído de consensos que, por sua vez,
resultam de discussões coletivas. “O aprendizado se dá quando se compartilham experiências e isso só
é possível num ambiente democrático, onde não haja barreiras ao intercâmbio de ideias”.
Seu grande mérito foi ter sido um dos primeiros a chamar a atenção para a capacidade de pensar
do aluno. 52 Acreditava que para o sucesso do processo educativo bastava um grupo se comunicar e
trocar ideias, sentimentos e experiências sobre as situações práticas do dia-a-dia. Ao mesmo tempo,
reconhecia que, à medida que as sociedades foram ficando complexas, a distância entre adultos e
crianças se ampliou. Ensinou argumentando que o aprendizado se dá quando os alunos são colocados
diante de problemas reais. A educação é “uma constante reconstrução da experiência, de forma a dar-
lhe cada vez mais sentido e a habilitar as novas gerações a responder aos desafios da sociedade”.
Educar, portanto, seria mais do que reproduzir conhecimentos, seria incentivar o desejo de
desenvolvimento contínuo, preparar pessoas para transformar algo.
Outro aspecto pertinente a ser destacado é o relativo à investigação dinâmica. Afirmava que não
havia investigação que não envolvesse alguma mudança nas condições do ambiente; o conhecimento
tanto como a ação, seria interativo. Afirmava; “a interação é um traço universal da existência natural;
ao admitir que conhecer seja algo que ocorre na natureza, então se segue como um truísmo: o conhecer
é um ato observável, accessível e aberto à experiência”. O conhecimento não seria o acesso à realidade
existente, porém escondida, mas a determinação ativa do que era mal determinado. Assim, o
conhecimento seria uma atividade de assegurar e gerar certezas e não de entendê-las.
Dewey desloca a ênfase da realidade (o que) que se pode observar para o método (o como) pelo
qual se interage, muda tanto o sujeito quanto o objeto e se transformam as coisas em eventos e
relações.
Os princípios lógicos são avaliados por suas consequências e são selecionados como princípios
provados pela evolução da investigação para serem confiáveis em função da capacidade de realizarem
conexões e inferências úteis.
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Assim, Bérgson mostrou que o durée é dinamismo e algo que mostra transformação capaz de cria o
novo; esse novo proporciona a ação livre e criativa.. Dessa forma, tanto a lembrança como a
percepção não existe isoladamente. A matéria como imagem, é certa existência que aparece
através da visão, existe por si mesmo, tem atualidade e potência. Dentre dos conjuntos de imagens
há um que é mais bem conhecida, o corpo; ele ocupa um lugar especial por ser o centro da ação,
substrato da vida espiritual e por ser através dele que se percebe o mundo. Na obra A evolução
criadora propõe que a durée está nas coisas, responsável não apenas pelo ato livre criativo, mas,
pelo processo de evolução; daí porque Bérgson seja considerado o filósofo da evolução científica,
de um universo em contínua evolução, com novas formas.
Tanto em Essai sur les données immédiates de la conscience / Ensaio sobre os dados
imediatos da consciência, como na Matière et mémoire, essai sur la relation du corps à
l'esprit / Matéria e memória, ensaios sobre a relação do corpo com o espírito, Bergson
abordou o problema da inserção do espírito no mundo material.
Postulou que o passado se conserva íntegro na memória e que o cérebro apenas filtra as
lembranças que são úteis às ações do presente. Afirmava que o tempo da filosofia positivista não
tem duração e, por isso, não é possível relacionar com o tempo real, aquele que é atestado pela
consciência e que tem como característica essencial à duração. Dessa forma, o positivismo, em
relação ao tempo, seria insustentável porque os dados imediatos da consciência não se revelariam
de forma intermitente, mas, são dados contínuos e extensos. Nesse contexto, o tempo seria a
sucessão de estados de consciência, portanto, essencialmente duráveis, não sendo possível reduzi-
lo ao espaço nem considerá-lo um processo divisível, mas si em contínuo enriquecimento.
d) O impulso vital, o devir, categoria suprema das coisas; (élan; força e energia que atuam sobre a
matéria; potência inventiva e criativa; impulso de vida), é outro nome dado a durée. A evolução
criadora tem como ponto de partida a realidade com energia, fonte da qual emanam todas as
coisas. O impulso vital não é substância, mas, força que produz, por evolução, novas e melhores
formas; pela marcha evolutiva nascem linhas divergentes: a ascendente (vida que se faz) e a
descendente (matéria, realidade que se desfaz).
Em seu estado primitivo era a vida vegetativa e a vida animal, com o instinto adormecido; com a
evolução, desenvolveu-se o instinto (animais) e a inteligência (homem) que se elevou até a
consciência e a liberdade; contudo, persiste o instinto, como faculdade de apreender a essência das
coisas reais e a inteligência que conhece somente relações conceituais.
Bergson considerou que era necessário juntar o instinto e a inteligência na faculdade cognitiva e
na metafísica, manifestas na intuição, na razão, porém, sem atividade reflexiva. Em sua obra As
duas fontes da moral e da religião, considerou que a criatividade e a espiritualidade tendo
dimensões biológicas são, também, forças para poderão elevar a natureza em níveis mais
complexos de comportamento moral; quanto à moral, sua ideia é a de que ela não tem fundamento
na razão, apenas um instrumento de ordenamento, mesmo que a moral seja necessária para
constituir a ordem ética; dessa forma, a moral agiria em dois pólos: moral de pressão (limite
inferior) para garantir a coesão social, preservar a vida e os interesses das pessoas e moral no
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limite superior, aberta para a liberdade com dois momentos: ética fechada (moral da razão
imutável, com base na ideia da sanção temporal: obedece às leis) e ética aberta (moral da
liberdade, do amor..., em movimento e com tendência para o progresso)
E a evolução de seu pensamento situa-se entre a intenção de libertar-se do racionalismo e
cientificismo do fim do século XIX e um interesse pela vida e a força criadora do espírito.
A intuição da duração heterogênea e qualitativa (durée) tinha uma concepção positivista e
científica, na época de Bergson, semelhante ao conceito de espaço; via-se nela, uma realidade
homogênea, divisível em partes, distintas entre si somente por ocuparem uma posição diferente: o
passado era considerado diferente do presente e do futuro apenas por ser anterior a ambos.
Essa concepção do tempo, segundo Bergson, era insustentável, testando-a com base em dados
imediatos da consciência que revelam algo contínuo, extenso e heterogêneo: nenhum estado da
consciência se repete de forma idêntica; poderão ser fases momentâneas; se o tempo for a sucessão de
estados de consciência, então, a duração não pode ser reduzida ao espaço, mas, será um processo em
contínuo enriquecimento, não é divisível e que caracteriza não só dados da consciência, mas, toda a
realidade, a vida, sem princípio constitutivo suprema.
O método para estudar a realidade, sem submetê-la a pressão, é a intuição ou a capacidade de
perceber um objeto e seu dinamismo; de conhecer pelo menos a realidade do eu que permanece no
tempo, flui e vive. Esse método foi aplicado para resolver problemas da teoria do conhecimento que,
segundo Bérgson, recebeu três soluções clássicas: o dualismo, o kantismo e o idealismo, as três com a
falsa afirmação de que percepção e a memória são especulativas, independentes da ação.
A obra Matéria e memória (...) tem um fundamento na durée, representação da exterioridade,
algo que se modifica e que mantém contato com a interioridade (dualismo); da interioridade da
consciência (memória que é elo entre a matéria e o espírito) passa a aceitar uma exterioridade (matéria
como imagem de uma visão), tentando fazer uma relação da matéria com o espírito, com base na
ordem material, sob os conceitos de imagem e percepção; na ordem espiritual, com base na memória
como elo entre o material e o espiritual.
Em Le rire / O riso, Bergson procurou determinar os processos de fabricação do cômico,
localizando-os no encontro da inteligência de quem ri com a eventual postura de um ser vivo que se
comporta como autômato. Na obra L'Évolution créatrice / A evolução criadora, a mais importante,
estabeleceu que a duração é o tempo específico de tudo aquilo que existe, seja espírito ou matéria, sem
se submeter às injunções da finalidade nem às rotas mecânicas, por ser espontaneidade pura ou impulso
vital.
A duração, por ser incapaz de apreensão pelo raciocínio analítico, só pode ser captada pela
intuição, uma “espécie de simpatia intelectual pela qual nos transportamos ao interior de um objeto
para coincidir com aquilo que ele tem de único e, por conseguinte, de inexprimível”. A última de suas
obras foi Les deux sources de la morale et de la religion / As duas fontes da moral e da
religião, onde confrontou duas morais, definidoras de dois tipos de sociedade: a moral fechada, que
emana das imposições sociais, forçando a pessoa ao automatismo e à rotina até esmagá-la; e a moral
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aberta, representada pelos místicos que escapam às pressões externas e, por sua capacidade geradora
de vida, tornam-se participantes da obra da criação.
correspondentes objetos do mundo exterior. Acreditava que a filosofia devia ficar livre dessas
suposições e que pensar o mundo somente poderia ser feito depois de bem examinada a matéria no
campo da consciência.
Na opinião de Husserl não era proveitoso à discussão de uma teoria do conhecimento sem antes
examinar a matéria, uma vez que o que teria existência verdadeira e assegurada seriam os fatos da
consciência. Assim, qualquer problema filosófico tradicional deveria ser examinado após sua completa
descrição fenomenológica: criar uma época para a questão em exame; seria o detalhamento da
apreensão da realidade como um fenômeno da consciência, isto é, a redução transcendental para tornar
o conhecimento preciso, objetivo e analítico, como uma simples experiência da consciência. A redução
teria início no estudo das ideias (a essência das coisas: a redução eidética para os filósofos antigos)
para depois descrever o Eu. Com isso, pretendia chegar a uma metodologia para a filosofia que
garantisse a certeza e, assim, corrigir os defeitos de teorias do conhecimento.
A parte que segue apresenta alguns pontos da evolução e sequência do pensamento de Husserl
como asuntos para uma atenta e profunda reflexão.
Em uma de suas primeiras obras (tese) Uber den Begriff der Zahl: Psychologische Analysen
/ Sobre o conceito de número: análise psicológica, Husserl mostrou a transição da pesquisa
matemática para a reflexão psicológica de conceitos, sendo depois desenvolvida como base de outras
obras. O fundamento filosófico para a lógica e a matemática começa, segundo Husserl, com a análise
da experiência que precede todo pensamento formal. Seriam as ideias empiristas de John Locke,
David Hume e John S. Mill.
A terminologia da lógica e semântica derivada da tradição empirista, levou-o às concepções
apresentadas em sua obra Logische Untersuchungen / Investigações lógicas; nessa obra dirigiu a
atenção para os fundamentos da lógica mostrando o método de análise fenomenológico como uma
ciência filosófica universal. Essa nova visão representou um sério golpe ao positivismo e nominalismo
dominantes no século XIX. Simultaneamente, sem método, com destaque de conteúdos e essências do
objeto, contribuiu para o pensamento antikentiano.
Para Husserl, o objeto percebido da realidade é tema que se coloca na consciência quando esta se
volta para o fato da realidade. É esta percepção externa que se torna assunto para a reflexão e perante a
qual poderá se afirmar a existência do objeto. É o retorno às coisas mesmas, à essência (eidós) como
uma construção que resulta de um ato intencional da consciência. Do ponto de vista metodológico,
representa a redução e análise (eidética e busca do eidós, da essência), o Eu e, depois, a compreensão
das relações entre as pessoas.
O princípio básico do método é a redução fenomenológica, (a eidética), procurada com a
experiência básica da consciência. Tal redução seria, também, uma reflexão acerca das funções pelas
quais o essencial se torna consciente. Nesse caso a redução revelaria o Eu em que todas as coisas têm
sentido. Essa foi a virada da fenomenologia para um novo estilo de filosofia transcendental
apresentada na obra Ideen zu einer reinen Phänomenologie und phänomenologischen
Philosophie / Ideias: introdução geral à fenomenologia pura com a pretensão de se constituir em
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um manual para seus estudantes. Entretanto, a maior parte de seus alunos considerou essa filosofia um
retrocesso e o movimento fenomenológico se desfez. Com isso, complicou-se sua permanência na
atividade como professor em Göttingen.
Da obra Ideias: introdução (...), são destacados alguns conceitos (NICOLA, 2005; p.456 –
461):
a) não existem limites à capacidade de duvidar, ao responder do que se pode duvidar? e é possível
iltrapassar os próprios preconceitos? A tentativa de duvidar entra no campo da completa
liberdade do indivíduo: duvidar de tudo e de qualquer coisa, mesmo com certezas, com base em
evidência adequada;
b) a fenomenologia é uma proposta de uma dúvida sistemática (suspender os juízos sobre os
fenômenos, as crenças ingênuas, porém, sem excluir a existência de uma verdade) em relação a
teses específicas, sem interesse na dúvida universal (como proposta por Descartes);
c) é preciso lutar contra a predisposição que leva a considerar os resultados dos processos como
descrições objetivas do mundo e os conteúdos ordinários da mente como verdades óbvias; ao
contrário, deve-se assumir uma atitude fenomenológica, desinibida, desinteressada e crítica, em
primeiro lugar em relação aos hábitos mentais;
d) a crise da ciência não é interior às disciplinas incontestáveis em suas teorias individuais, mas diz
respeito ao significado geral, à sua capacidade de se dirigir ao ser humano e sua espiritualidade,
de responder as suas questões sempre relativas aos significados, não aos fatos; dessa forma a
redução da história a uma sucessão de eventos contatáveis pela abordagem científica (com a
exclusão de fatores de subjetividade) acaba por ocultar o seu sentido profundo e leva à perda de
significado desses eventos; uma nova ciência deveria estudar a espiritualidade segundo os seus
princípios, inclusive, a subjetividade.
O recomeço da atividade filosófica de Husserl se deu na Universidade de Freiburg com um novo
programa de trabalho apresentado na obra Die reine Phänomenologie, ihr Forschungsgebiet und
ihre Methode / Fenomenologia pura, sua área de pesquisa e seu método. Partia da tese da
fenomenologia, com seu método de redução, como sendo o caminho para a realização da autonomia
ética do homem, para a justificação da vida. Ao desenvolver essa tese continuou elucidando a relação
entre a análise psicológica e a análise fenomenológica da consciência e sua pesquisa, quanto ao
embasamento da lógica. O resultado dessas elucidações foi a obra Formale und transzendentale
Logik: Versuch einer Kritik der logischen Vernunft / Lógica formal e transcendental.
As palestras de Husserl (p.ex., em universidades como as de Londres, Amsterdã e Paris /
Sorbone, Praga) foram aproveitadas para uma nova apresentação da fenomenologia, sob o título
Méditations cartésiennes / Meditações cartesianas. Na Sociedade Cultural em Viena apresentou a
palestra (repetida em outros locais) Die Philosophie in der Krisis der europäischen Menschheit /
A filosofia na crise da humanidade européia da qual surgiu sua última obra Die Krisis der
europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie: Eine Einleitung in
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o pesquisador que gera uma tecnologia para controlar a praga (...) que afeta à produção de (...),
sob a perspectiva social dessa tecnologia;
b) a ação com relação a um valor definido em base a determinados valores como são os éticos,
estéticos e religiosos condicionadores de conduta; a pessoa age aceitando os riscos não para obter
determinado resultado exterior, mas, para permanecer fiel aos seus valores, crenças, princípios
(...); é o caso, p.ex., do comandante que afunda com o seu navio;
c) a ação afetiva determinada por um estado de consciência, um sentimento, uma reação emocional
(...) em determinadas circunstâncias e não motivada por um objetivo determinado ou um sistema
de valor, como é o caso do pai que “castiga ou corrige” o seu filho quando age mal; esta ação
produz relação entre pessoas; e
d) a ação tradicional ditada por hábitos, costumes, crenças (...) transformadas numa segunda
natureza para agir conforme a tradição, produzindo relação entre as pessoas.
Brasil e a cachorra branca de olhos negros e rabo curto; contrariamente à aparência, a primeira
frase não expressa proposição singular, mas, uma proposição geral.
Analysis of matter, em que defende que o empirismo precisa ser complementado com alguns
postulados, caso se deseje uma filosofia adequada da ciência, formulando alguns desses princípios
como os da quase permanência e da própria indução. A tese logicista de fundamentação da
matemática.
Em The principles (...), Russell admitia que frases descritivas se referissem a entidades reais; a
frase a cachorra branca de olhos negros e rabo curto, transforma-se, no caso de uma sentença geral,
em: existe um e um só objeto tal que ele é a cachorra (...). Se esse objeto existe com tais atributos,
então a descrição é definida (certa) e aponta para o mesmo. Poderão existir outras cachorras com
outros atributos e a descrição passaria a ser imprópria ou indefinida (falsa). Poderá ocorrer, também,
que a cachorra com essa descrição não exista e, neste caso, a descrição é vazia.
Essa é a essência da teoria dos tipos lógicos ilustrada com o exemplo da cachorra, com vários
níveis linguísticos, sintetizados, com dois exemplos, nas seguintes estruturas simbólicas: uma classe
“A” é de tipo mais elevado que o tipo dos elementos de ”A” (classe de uma entidade vs. tipo de
elementos da mesma entidade); para qualquer enunciado “B”, em relação a outro enunciado “C” que
for de tipo mais elevado (entidades diferentes). Tais frases não terão significados lógicos quando
houver confusão de tipos, mesmo que os enunciados sintaticamente estejam formulados de maneiras
corretas, conforme se ilustra no próximo parágrafo.
Na proposição y é mortal, em que a variável y poderia ser substituída (âmbito de significância
ou tipo de função) por uma constante (p.ex., uma pessoa), transformando-a em proposição verdadeira;
deve ser uma entidade particular com sentido, mesmo que a proposição seja falsa; exemplos: uma
entidade particular é mortal; sem sentido como no caso uma classe de homem ou a humanidade é
mortal; concluindo que a função deve ser sempre do tipo mais elevado do que o dos argumentos
(exemplo acima: “A”). Ao substituir a função por outras constantes (p.ex., uma pedra), a definição
passaria a ser falsa. Ainda, na substituição da variável y por algumas constantes a tornarão sem
significado. Esse raciocínio levou a Russel a transformar a dicotomia: verdadeiro – falso de S. Mill,
numa tricotomia: os enunciado podem ser: verdadeiros, falsos e sem significado.
Russell estudou a análise anterior para outras expressões como as dos nomes próprios ordinários
que poderiam ser abreviações de descrições definidas na mente quando usados tais nomes; assim, p.ex.,
Aristóteles seria uma abreviação de uma descrição como "o maior discípulo de Platão". Em estreita
harmonia com essas teses lógicas desenvolveu algumas teses da teoria do conhecimento, em particular,
a distinção entre conhecimento direto e conhecimento por descrição.
O conhecimento que se tem acerca de um atributo como, p.ex., a técnica utilizada é apropriada
para o cliente (...); é uma proposição particular que poderia ser transformada numa frase como: a
técnica é apropriada. Os conhecimentos que se têm dos números e de suas relações numéricas como,
p.ex., 2 é maior que 1, envolvem conceitos lógicos, e não os conhecimentos diretos dos números.
Russell formulou a relação entre essas duas formas de conhecimento na seguinte frase (Princípio de
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Russell): todo o conhecimento envolve a relação direta do sujeito cognoscente com alguma entidade,
mesmo que esse conhecimento seja somente por descrição.
Na obra The problems of philosophy, Russel analisa as coisas asseverando que se tem
conhecimento não de objetos físicos, mas, de dados sensoriais, sendo a existência do objeto físico uma
hipótese cuja aceitabilidade depende da capacidade de simplificar a explicação / significado da
observação no dado sensorial, com fundamentos cartesianos: procuram-se pontos sem dúvidas para se
ter um conhecimento sensorial; entretanto, existe um conhecimento universal quando se tem um dado
sensorial que é atribuído como posterior a outro, tem-se um conhecimento de um universal,
correspondente a relação posterior; porém, não se tem conhecimento do objeto físico que precisa ser
inferido a partir de dados sensoriais.
Um aspecto que deve ser destacado nesta síntese é o relativo à indução. Para Russell, trata-se de
um princípio (método) que é incoerente porque não se têm motivos para esperar que o futuro seja
semelhante ao passado; por outro lado, não se tem como estabelecer que o princípio da indução se
justifique a partir da experiência, além de não ter base matemática. Mas, vê-se na contingência de
aceitar uma conclusão sem pleno fundamento; isto, porque o conhecimento com base em resultado de
experimento foi obtido na crença (crença que a experiência não poderá aceitar ou rejeitar) que tem
raízes na experiência.
Algo só é impossível até que alguém duvide e prove o contrário. A maioria de nós prefere olhar para
fora e não para dentro de si mesmo.
Nenhum problema pode ser resolvido pelo mesmo estado de consciência que o criou. É preciso ir
mais longe. Eu penso várias vezes e nada descubro. Deixo de pensar, mergulho em um grande silêncio
e a verdade me é revelada.
Às vezes me pergunto porque eu fui o único a desenvolver a teoria da relatividade. A razão, acho, é
que um adulto normal nunca pára pra pensar nos problemas de espaço e tempo. Essas são coisas que
só as crianças pensam. Mas como meu desenvolvimento intelectual foi retardado, como resultado eu
comecei a me perguntar sobre espaço e tempo somente quando cresci.
Eu sou suficientemente artista para desenhar livremente na minha imaginação. Imaginação é mais
importante que conhecimento. O conhecimento é limitado. A imaginação dá a volta ao mundo."
Nenhuma experimentação, por mais intensa e precisa que seja, pode provar minhas ideias; um único
experimento, todavia, pode demonstrar que estou errado.
A ciência nos afasta de Deus, mas a ciência pura nos aproxima de um criador.
Algo que aprendi em uma longa vida: toda nossa ciência, medida contra a realidade, é primitiva e
infantil - e ainda assim, é a coisa mais preciosa que temos.
O espírito científico, fortemente armado com seu método, não existe sem a religiosidade cósmica. Ela
se distingue da crença das multidões ingênuas que consideram Deus um ser de quem esperam
bondade e do qual temem castigo; um sentimento exaltado semelhante aos laços do filho com o pai;
um ser com quem também estabelece relações pessoais, por respeitosas que sejam.
Como é possível que a matemática, sendo afinal um produto do pensamento humano, que é
independente da experiência, seja tão admiravelmente apropriada para os objetos da realidade? Será
que a razão humana é, sem recurso à experiência, meramente pelo pensamento, capaz de sondar as
propriedades das coisas reais? Em minha opinião a resposta a esta pergunta é em poucas palavras: na
medida em que as leis da matemática referem-se à realidade, elas não são exatas; e, na medida em que
elas são exatas, não se referem à realidade.
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Acredito no Deus de Spinoza, que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe, e não no
Deus que se interessa pela sorte e pelas ações dos homens”. “(...), minha religiosidade [religião
cósmica] consiste em uma humilde admiração pelo espírito infinitamente superior que se revela no
pouco que nós, com nossa fraca e transitória compreensão, podemos entender da realidade. (Religião
e ciência, parte de seu livro Como vejo o mundo).
A vida não dá nem empresta, não se comove nem se apiada. Tudo quanto ela faz é retribuir e
transferir aquilo que nós lhe oferecemos.
A vida é como jogar uma bola na parede. Se for jogada uma bola azul, ela voltará azul, se for jogada
uma bola verde, ela voltará verde, se a bola for jogada fraca, ela voltará fraca, se a bola for jogada
com força, ela voltará com força. Por isso, nunca jogue uma bola na vida de forma que você não
esteja pronto a recebê-la.
O ser humano vivencia a si mesmo, seus pensamentos, como algo separado do resto do universo -
numa espécie de ilusão de ótica de sua consciência. Essa ilusão é um tipo de prisão que nos restringe
aos nossos desejos pessoais, conceitos e ao afeto apenas pelas pessoas mais próximas. Nossa
principal tarefa é a de nos livrarmos dessa prisão, ampliando o nosso círculo de compaixão, para que
ele abranja todos os seres vivos e toda a natureza em sua beleza. Ninguém conseguirá atingir
completamente este objetivo, mas lutar pela sua realização já é por si só parte de nossa liberação e o
alicerce de nossa segurança interior.
A investigação científica se baseia na ideia de que tudo o que ocorre está determinado pelas leis da
natureza; por esta razão, um investigador científico dificilmente se verá inclinado a crer que os
acontecimentos possam ser influenciados pela oração, ou por um desejo dirigido a um ser
sobrenatural.
Antes de morrer: Quero partir quando quiser. É de mau gosto prolongar a vida artificialmente; já dei
o meu contributo, é tempo de partir. Fá-lo-ei elegantemente.
quantum de Max Planck, explicou o efeito fotoelétrico, o quanta da luz com suficiente energia,
segundo o qual para cada elétron emitido é utilizada uma quantidade de energia específica (o quanta
pode extrair elétrons nos corpos em que batem), contradizendo a teoria ondulatória da luz de equações
de Maxwell; esse efeito quântico foi a base para grande parte do desenvolvimento posterior da
mecânica quântica.
Em seu segundo artigo, Sobre uma nova determinação das dimensões moleculares
(dissertação de doutorado), Einstein tratou sobre o movimento browniano, um fenômeno descrito pelo
botânico Robert Brown após o seu estudo do movimento errático do pólen suspenso em um fluido,
apresentado como uma evidência experimental da existência dos átomos, substituindo a ideia do átomo
como apenas um conceito útil; na experimentação relacionou as grandezas estatísticas desse
movimento com o comportamento dos átomos, determinando o número deles através de um
microscópio; esse movimento seria causado pela pelas colisões entre átomos e moléculas.
No terceiro artigo estabeleceu o princípio da equivalência de energia e de massa; naquele ensaio
teórico Sobre a eletrodinâmica dos corpos em movimento sem comentários nem citação
bibliográfico, Einstein em apenas 9.000 palavras e em cinco semanas, introduziu os conceitos teóricos
da teoria da relatividade restrita (especial) ao estabelecer uma relação detalhada entre os conceitos de
tempo, distância, massa e energia, omitindo a força gravitacional. Nessa relação teve como suporte
dois axiomas: um de Galileu: as leis da natureza são as mesmas para todos os observadores que se
movem a uma velocidade constante relativamente uns aos outros; o outro axioma foi o de que a
velocidade da luz é a mesma para todos os observadores.
No quarto artigo Einstein apresentou uma dedução teórica derivada dos axiomas da relatividade;
era a relação entre massa e energia mediante uma equação: a energia é equivalente à massa
multiplicado pelo quadrado da velocidade da luz cujo significado pode não ser facilmente apreendido,
mas cujo resultado foi comprovado com a explosão da bomba atômica. Essa equação permitiu explicar
como foi a explosão de energia pura, o Big-bang (singularidade do início do universo cerca de 15
bilhões de anos atrás; HAWKING, 2002) que poderia ter dado origem à matéria, bem como constatar
que uma quantidade mínima de matéria tem o potencial de fornecer uma enorme quantidade de energia
pela divisão do átomo, pela fissão nuclear.A natureza do espaço e do tempo sempre foram enigmas
para os filósofos da ciência; com Einstein se começou a entender o espaço-tempo, diz que:
Se a teoria da relatividade especial ou restrita mudou (...) os conceitos de tempo e masanece sempre
similar e imutável´; o espaço newtoniano é euclidiano, infinito e ilimitado (...), sua estrutura é
independente da matéria que o ocupa; nele todos os corpos gravitam uns em direção aos outros sem ter
efeito na estrutura do espaço. Em contraste, a teoria da relatividade geral afirma que não apenas a
massa gravitacional de um corpo age em outro corpo, mas, também influencia a estrutura do espaço.
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Uma razão pela qual a matemática goza de estima especial, acima de todas as outras ciências, é que
as suas proposições são certas e indisputáveis, enquanto que as das outras ciências são até certo
ponto discutíveis e em perigos constantes de serem descartadas por fatos acabados de descobrir.
Apesar disto, o investigador em outras de ciências não precisaria invejar o matemático se as
proposições da matemática se referissem aos objetos da nossa mera imaginação, e não a objetos da
realidade (...). Existe outra razão para a alta reputação da matemática (...) é a matemática que fornece
às ciências exatas naturais certa medida de certeza, que não poderiam atingir sem a matemática (...).
Essa simbiose entre o abstrato e o real, com o real a precisar do abstrato para a sua melhor
compreensão e o abstrato a ir buscar a sua razão de ser e inspiração no real, deveria permear o ensino
da matemática.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
sucesso, de inúmeras atividades, tais como: homem de negócio, funcionário público, assessor, diretor
de banco, protetor das artes, professor de economia e acima de tudo, autor de uma fecunda e influente
obra em teoria econômica, com destaque para A teoria geral do emprego, do juro e da moeda. De sua
fecunda produção apenas se relacionam alguns pontos dispersos relativos aos fundamentos da
metodologia.
Keynes acreditava, com base em constatações e estudos comparativos econômicos, que a
instabilidade econômica era atribuída à incerteza, à insegurança, às dificuldades monetárias e
financeiras, ao desenvolvimento de atividades especulativas e de entesouramento (...) constituindo-se
entrave ao processo econômico equilibrado, a produção e ao emprego. Os fundamentos metodológicos
de tais constatações no funcionamento da economia capitalista eram teoricamente, conhecidos no
plano da construção teórica, porém, menos no plano epistemológica.
A visão atomística e orgânica na metodologia econômica apareceu em sua obra Treatise on
money, onde Keynes analisou as forças que levavam a expansão ou a contração da produção,
combinando a teoria quantitativa (abordagem de problemas macroeconômicos) com as teorias de valor
e de distribuição (abordagem de problemas microeconômicos) encontrando dificuldades.
Keynes indica a necessidade de uma nova abordagem em que variáveis nominais (moeda e
ativos financeiros) afetam as variáveis reais (investimento, produção e emprego) e onde surgem
aspectos macro e micro (relações como investimento – poupança) com uma nova função da moeda;
essa abordagem aparece em A teoria geral do emprego (...). Nessa obra apresenta uma teoria do
equilíbrio estacionário e uma teoria do equilíbrio móvel e onde, dada as condições em que operam as
firmas com quantidades de recursos fixos e condições constantes, as preocupações com a moeda são
dispensáveis. Porém, quando se analisa o emprego como um todo, faz-se necessário uma teoria
monetária da produção e do emprego.
A lógica de diferenciar as formas atomísticas (aditivas) e orgânicas (não-aditivas) da
organização estrutural na economia se revelam no paradoxo da poupança, na ineficácia da política de
reduzir salários pressupondo que não terão efeitos na procura e no motivo especulativo da procura de
moeda sobre a taxa de juro, entre outras variáveis.
Os conceitos de probabilidade nos problemas do método científico foram tratados por Keynes,
tendo como precursor Marshall (todos os métodos tem lugar na pesquisa em economia: “a ciência
econômica não é mais do que o funcionamento do sentido comum auxiliado pela aplicação da análise
organizada e do raciocínio: Principios de economia) e seu pai J. Neville Keynes”.
Discordava da ideia de que a investigação econômica devia começar e concluir com a
observação e que o método dedutivo deveria ser apoiado no método indutivo; tais métodos foram
evitados; em lugar deles, acreditava que “era necessário, primeiro, determinar quais são as forças em
operação e as leias de as sustentam (...), depois inferir como consequência das forças e leis e
finalmente, fazer as comparações, validações (...); a teoria, primeiro propõe e logo, com o auxílio da
estatística, confirmam” (A teoria geral do emprego (...)).
237
A habilidade analítica da Teoria geral do emprego (...), em seu aspecto metodológico, seria a
de explicar, em nível mais alto de abstração, as forças que determinam rendimento e emprego em
determinado momento do tempo com a coexistência, em cada momento, das decisões baseadas em
expectativas de curto e longo prazo.
Nessa explicação, segundo Keyne, se tinha o conceito de que a teoria econômica era
basicamente uma ciência moral e não uma ciência natural. Uma ciência moral que utiliza juizos de
valor, introspecção, expectativas, incertezas etc., e onde uma fórmula quantitativa destruiria sua
utilidade como instrumento do pensamento; a teoria econômica mais como um método, uma técnica
de pensar (...), do que uma doutrina.
Keynes partia da ideia de que o conhecimento de uma proposição oferecida pela evidência era
usada para derivar conhecimentos pelo argumento de proposições não observáveis, na base de uma
relação lógica existente entre a primeira e a segunda. Se a primeira proposição é indutiva a segunda
derivada pode ser dedutiva, com o que o conhecimento verdadeiro dependeria do valor da crença
racional atribuída e associada as primeiras premissas. A aplicação deste método da sentido e valor à
teoria econômica e permitiria descobrir o poder heurístico de seu método quando comparado com o
método dedutivo do equilíbrio. O modelo lógico-probabilistico keynesiano é baseado no método
indutivo com suporte dedutivo o que significa uma base em juízos prováveis para construir teorias.
Para associar o conhecimento (a probabilidade de se obter) com a incerteza, Keynes utilizou e
diferenciou a lógica formal (conjunto de regras para oi correto raciocínio) e a lógica humana (análise
de certos hábitos mentais pelos quais a mente utiliza a informação dada pela percepção).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Materialismo Racional; e a fase noctura ou faceta do âmbito da imaginação poética, dos sonhos (...),
em que destacam as obras: A psicanálise do fogo. A água e os sonhos. O ar e os sonhos. A
terra e os devaneios da vontade. A poética do espaço.
A obra “diurna” bachelardiana se insere no contexto da revolução científica promovida, em
parte, pela Teoria da Relatividade de Einstein. Foi orientada para definir o significado epistemológico
da ciência que rompeu com as ciências anteriores e trouxe uma nova metodologia não mais empirista,
porém com um sentido filosófico compatível com a nova ciência. É a partir desses objetivos que
Bachelard formulou suas principais proposições para a filosofia da ciência, em termos de: a
historicidade da epistemologia e a relatividade do objetivo que resume a nova ciência relativista
divorciada das concepções epistemológicas e metodológicas anteriores. Em sua obra Conhecimento
comum e conhecimento científico (BACHELARD, 19720) afirmava:
(...) tentamos chamar a atenção dos filósofos para o caráter específico do pensamento e do trabalho da
ciência moderna e onde parece cada vez mais evidente (...), que o espírito científico contemporâneo
não pode ser colocado em continuidade com o simples bom senso (...); o novo espírito científico se
encontra em ruptura, com o senso comum (...); significa uma distinção entre o universo em que se
localizam as opiniões, os preconceitos, o senso comum e o universo das ciências
comum e si com sustentação na teoria. Isso significa que o método da ciência não poderia ser direto e
imediato, mas si indireto e mediado pela razão. O vetor epistemológico segue o percurso do racional
para o real. Este racionalismo tem um sentido próprio que é a preocupação constante com a aplicação:
o racionalismo aplicado com um traço básico do novo espírito científico, um elo (dialética) entre a
experiência e a teoria (BACHELARD, 1977).
Afirmava Bachelard que a ciência é a expressão de um racionalismo que trabalha no pormenor,
ao reconhecer que seria muito mais fácil desfazer as formulações imprecisas num campo restrito do
saber, conforme consta em sua principal obra Le nouvel espirit scientifique / A formação do
espírito científico. Nessa obra descreveu em detalhes o trabalho da razão, mostrando que surge a
descontinuidade no interior de cada noção. Ao analisar a constituição das geometrias não-euclidianas e
da teoria da relatividade mostrou como surgiram essas teorias pela negação de princípios tidos como
absolutos pela ciência anterior.
O caráter de simplicidade não foi, inicialmente aceito, mas, ao introduzir em suas definições
determinações experimentais Bachelard mostrou que suas ideias não eram apenas teóricas, mas,
tinham, também, sustentação experimental. Assim, o racionalismo científico contemporâneo seria um
racionalismo aplicado, com dois sentidos: um teórico e o outro técnico, sendo essa bicerteza
fundamental para fazer da ciência um pensamento vivo e em constante renovação.
Outro ponto a destacar da metodologia científica bachelardina apresentado na sua obra A
formação do espírito científico é o relativo aos obstáculos epistemológicos; são considerações
básicas para o desenvolvimento do conhecimento no âmbito da pesquisa, com proposta de psicanálise
do conhecimento. O progresso é analisado com base em condições internas por via psicológica do
pensamento científico: imagem, forma geométrica, forma abstrata. É na superação dos obstáculos que
reside o sucesso de uma pesquisa científica, porém, é preciso que o cientista os reconheça. Entre os
empecilhos do desenvolvimento do conhecimento se destacam:
a) o obstáculo da realidade: deixar-se levar pelo visível, pelo empirismo; o pesquisador, ao olhar
seu objeto de estudo pode incorrer no perigo de se deixar levar pelo que lhe é visível, dando a
este um estatuto de verdade que ele não tem; para Bachelard, "diante do mistério do real, a alma
não pode, por decreto, tornar-se ingênua; é impossível anular, de um só golpe, todos os
conhecimentos habituais; diante do real, aquilo que cremos saber com clareza ofusca o que
deveríamos saber".
b) o obstáculo do senso comum: relaciona-se especificamente com a dificuldade com a qual se
depara o pesquisador em separar o seu conhecimento comum, suas opiniões, seus preconceitos,
as avaliações relacionadas à sua posição social e econômica, etc., do conhecimento teórico,
científico, que deve estar comprometido com a busca da verdade, baseada em leis gerais, em
conceitos e não em preconceitos.para a superação do primeiro, aponta que a realidade a ser
estudada deve passar pelo crivo de uma teoria rigorosa; a realidade não responde por si mesma,
mas, mediante questões com fundamentação teórica, pressupondo-se um equilíbrio entre a teoria
e a prática.
240
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
libertação e despojando-se de sua herdada fortuna, tornou-se professor de uma modesta escola primária
de província e, depois, foi jardineiro. Retornou à filosofia, na Universidade de Cambridge, quando
escreveu Investigações Lógicas. Por muitos historiadores é considerado o filósofo mais importante do
século XX.
A filosofia de Wittgenstein pode ser dividida em dois grandes períodos relacionados com suas
obras. São duas concepções filosóficas diferentes. O primeiro período correspondeu ao Tratado
lógico-filosófico e foi dominado pela linguagem e os seus limites. A revolução na lógica matemática
oferecia uma perspectiva de criação de uma ciência dos significados. A lógica prometia aliar a razão ao
significado de frases e textos; da filosofia às demonstrações de geometria, da história ao direito. A ideia
era reduzir essas disciplinas aos seus elementos lógicos para, em seguida, mostrar como as partes se
conectavam umas às outras, em uma linguagem ideal, a fim de compor todos os possíveis significados.
Na época de estudante de engenharia e como aluno de Bertrand Russell (influenciado pela obra
Principia matematica) foi tentado a reduzir a matemática à lógica; em sua obra Tractatus logico-
philosophicus procurou eliminar parte dos problemas da filosofia devidos às imperfeições da
linguagem, estabelecendo limites para aquilo que faz sentido dizer e aquilo que é destituído de sentido
afirmar. A realidade se revela nos fatos limitados pela linguagem e, segundo Wittgenstein, essa
linguagem apresenta diversos tópicos como são os de estrutura lógica da linguagem; o isomorfismo
entre a linguagem e a realidade, a totalidade de fatos, não de coisas; 59 a linguagem com sentido, como
sendo um conjunto de proposições; e a filosofia como uma atividade de análise da linguagem.
Wittgenstein se identificou com as suas Investigações lógicas (conjunto de conferências
ditadas em Cambridge), destacando-se, nele, também, a sua grande influencia sobre a filosofia analítica
e sobre o Círculo de Viena, ao qual não pertenceu.
Em Investigações filosóficas Wittgenstein ofereceu um novo ponto de vista ao cientista: o
significado das palavras não depende daquilo a que elas se referem, mas de como elas são usadas.
A linguagem é um tipo de jogo, um conjunto de peças (palavras) que são usadas de acordo com
um conjunto de regras (convenções linguísticas 60).
O mundo é construído a partir de proposições, ou proposições potenciais que recaem menos no
que as afirmações significam do que em como elas se desenvolvem dentro de um contexto e um
conjunto de regras. Daí segue-se que o conhecimento não consiste em descobrir (ou inventar) a
realidade que se fala, mas sim em estudar o modo como a fala funciona; neste contexto, os métodos da
lógica pura não podem dar conta dos problemas filosóficos.
Fundamentos da pesquisa
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l) Não são adequadas as primeiras ideias positivistas defendidas pelo Círculo de Viena de que toda
sentença da linguagem científica podia ser traduzida em sentença de percepção, nem a tese do
fisicalismo (toda linguagem científica dudesse ser reduzida à linguagem da física) justificada.
m) Não existem mistérios insondáveis no universo; as fronteiras do conhecimento são sempre
empíricas e ultrapassáveis.
n) A verdade não é o fruto da coerência entre diferentes proposições; a teoria da coerênciam é falsa.
A verdade é a correspondência aos fatos.
As contribuições de Carnap à filosofia das ciências incluem estudos sobre as propriedades
formais dos sistemas linguísticos, a definição de conceitos científicos e a estrutura das teorias
científicas, além de ter desenvolvido uma lógica indutiva para estimar o nível de confirmação como
uma relação entre hipóteses e enunciados que se referem à experiência (LOSSE, 1972; p. 186).
A filosofia, segundo Carnap, trata do estudo da síntese lógica de enunciados científicos, de
termos da linguagem científica, descendo aos detalhes como os de testabilidade e confirmabilidade das
proposições. Uma teoria científica é um sistema axiomático interpretado que compreende uma
linguagem formal (incluindo termos lógicos e não-lógicos) e uma série de conjuntos, tais como: os
axiomas lógico-matemáticos e as regras de inferência. Os axiomas não-lógicos expressam a parte
empírica da teoria. Os de postulados de significados definem as declarações dos significados dos
termos não-lógicos (verdades analíticas da teoria). As regras de correspondências dão interpretação
empírica à teoria.
Entre as obras de Carnap, destacam-se as seguintes: a) Der logische aufbau der welt / A
construção lógica do mundo ou A estrutura lógica do mundo. Nessa obra desenvolveu uma
versão formal e rigorosa do empirismo utilizando os termos científicos
fenomenalistas. 62 O sistema formal estaria fundado em um único predicado
primitivo agrupado em dois (diádico ou par). Tal predicado é satisfeito se dois
indivíduos "assemelham-se" um ao outro.
Inicialmente argumentou que um juízo tem significado somente se todo termo não-lógico
é explicitamente definível por meio de uma linguagem fenomênica restrita. Mais tarde compreendeu
que essa tese era insustentável pelo fato da linguagem fenomênica ser pobre para definir conceitos
físicos, entre outras razões.
Na obra Logische syntax der sprache / Sintaxe lógica da Língua apresentou uma
linguagem formal para expressar a matemática clássica e as teorias científicas, propondo, entre outros
conceitos, uma nova regra de inferência (regra ômega ou regra de Carnap). Definiu a noção de
consequência lógica nos seguintes termos: um juízo Q (proposição; ver Metodologia) é uma
consequência lógica de um conjunto P de juízos se e somente se há uma prova de Q baseada no
conjunto P (uso da regra ômega na prova).
Outro conceito a destacar nessa Sintaxe lógica (...) é o da demonstração; a definição é: “um
juízo Q é demonstrável por um conjunto P de juízos se e somente se há uma prova de Q baseada no
245
conjunto P”. Nessa mesma obra definiu vários tipos de juízos, tais como (utiliza-se a mesma
simbologia):
a) um juízo é verdadeiro-L se e somente se for uma consequência lógica do conjunto vazio de
juízos;
b) um juízo é falso-L se e somente se todos os juízos forem uma consequência lógica dele;
c) um juízo é analítico se e somente se for verdadeiro-L ou falso-L; definiu o juízo analítico como o
determinado logicamente e onde suas verdades dependem das regras lógicas de inferências, sendo
independente da experiência; isto significa que os juízos analíticos são a priori, ao contrário dos
juízos sintéticos que são a posteriori, pois não são logicamente determinados;
d) um juízo é sintético se e somente se não for analítico.
Em Logical foundations of probability / O fundamento lógico da probabilidade a
probabilidade foi definida de várias formas como, p.ex., a interpretação clássica: a razão entre
resultados favoráveis e resultados esperados; a interpretação axiomática: o que quer que satisfaça os
axiomas da teoria da probabilidade; o de frequência: a probabilidade de um evento em uma sequência
de eventos como o limite da frequência relativa daquele evento.
A probabilidade de um juízo é o grau de confirmação que a evidência empírica dá ao juízo; a
probabilidade de um juízo, com relação a um dado corpo de evidência, é uma relação lógica entre o
juízo e a evidência; dessa forma, é preciso construir uma lógica indutiva, isto é, um método
matemático para analisar a confiabilidade de uma hipótese; uma lógica que estude a relação entre os
juízos e a evidência.
A Logische Syntax der Schprache / Sintaxe lógica da linguagem foi ampliada na tradução
inglesa Testability and meaning / Testabilidade e significação. Nessa obra, Carnap apresentou
definições parecidas às anteriores. Primeiro definiu a noção de verdadeiro-L (um juízo é verdadeiro-L
se sua verdade depender das regras semântica) e depois a noção de falso-L (um juízo é falso se sua
negação for verdadeira-L). Um juízo é determinado-L se for verdadeiro-L ou falso-L. Juízos analíticos
são determinados, enquanto que juízos sintéticos não são determinados. Um juízo é analítico se e
somente for logicamente verdadeiro; será autocontraditório se e somente se for logicamente falso; caso
contrário o juízo é sintético; nesta definição, usou a noção de verdadeiro e falso no sentido semântico.
Em Testability and meaning, Carnap deu uma explicação do princípio de verificabilidade,
segundo o qual um juízo sintético é provido de significado somente se ele é verificável; nesse princípio
considerou, inicialmente, que todos os termos deviam ser redutíveis, por meio de definições ou
sentenças de redução, para a linguagem observacional. Essa redução foi criticada por Popper e,
posteriormente, reconheceu com insustentável tal tese em sua obra o Caráter metodológico dos
conceitos teóricos, onde apresentou um novo conceito.
O significado de um termo torna-se um conceito relativo: um termo tem significado com relação
a uma dada teoria e uma dada linguagem; dessa forma, o significado de um conceito depende da teoria
na qual o conceito é usado; isso é importante na teoria do empirismo. Reconheceu que alguns termos
246
Fundamentos da pesquisa
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teóricos não podem ser reduzidos à linguagem observacional: eles adquirem um significado empírico
pelas ligações com outros termos teóricos que são redutíveis. Além disso, admitiu que o princípio do
operacionalismo 63 era muito restrito.
Entre os conceitos significado e necessidade, Carnap estabeleceu em sua Lógica modal e
filosofia da linguagem interessantes relações entre propriedades modais como necessário
(simbolizado por N) e impossível (de uma proposição ou juízo, simbolizado por p) com as
propriedades lógicas dos juízos como verdadeiro-L, falso-L. analítico e sintético. Algumas dessas
propriedades são:
As propriedades modais podem ser definidas por meio de propriedades lógicas do juízo.
Em sua obra Fundamentos filosóficos da física definiu a linguagem como um conjunto de
símbolos (na linguagem científica, esses símbolos são lógicos e não-lógicos) e de regras (entre outras,
as de sintaxe) que determinam a sequência dos símbolos.
O conjunto de termos lógicos compreende, segundo Carnap, tanto os símbolos lógicos, conetivos
e quantificadores como os símbolos matemáticos (p.ex., ‘+’, ‘x’, ‘derivadas’, ‘integral’, etc.).
Os símbolos não-lógicos denotam entidades físicas (p.ex., ‘azul’, ‘frio’ ...), propriedades (p.ex.,
‘caro’, ‘campo eletromagnético’, ‘útil’...) ou relações (p.ex., ‘mais quente que’, menos aproximado do
que).
Os termos não-lógicos são divididos em observacionais e teóricos.
As fórmulas são divididas em juízos lógicos, sem termos não-lógicos; juízos observacionais, sem
termos teóricos; juízos estritamente teóricos; e regras de correspondência as quais contém tanto termos
observacionais como teóricos.
A classificação desses juízos na linguagem científica é sintetizada no Quadro 3.
Carnap definiu alguns tipos de juízos, tais como:
a) um juízo é verdadeiro se e somente se, for uma cpnsequência lógica do conjunto vazio de juízos;
b) um juízo é falso se e somente se, todos os juízos forem uma consequência lógica dele;
247
c) um juízo é analítico se e somente se for verdadeiro ou for falso; são juízos determinados
logicamente: sua verdade depende das regras lógicas de inferências e independe da experiência
d) um juízo é sintético se e somente se não for analítico.
Observacional
Juízos lógicos Sim Não
(lei empírica: lida com objetos ou
propriedades observadas ou
Juízos
medidas para explicar e prever Sim Não
observacionais.
fatos)
Teórico
Juízos puramente
(lei teórica; lida com objetos ou Não Sim
teóricos
propriedades que não podem ser
medidas, mas que se podem
inferir a partir de observações;
não são generalizações indutivas, Regras de
Sim Sim
mas hipóteses além da correspondência
experiência)
Fundamentos da pesquisa
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Fundamentos da pesquisa
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indivíduo um processo genético; daí, porque o indivíduo só poderia receber uma determinada
informação e a incorporá-la [aprendizagem] se estiver preparado para recebê-la, isto é, se puder agir
sobre o objeto do conhecimento para inseri-la em seu sistema de relações. Esse objeto de conhecimento
é o resultado da pesquisa que foi preparado com base na realidade – possibilidade do cliente, sua
cultura e visão.
Piaget (1978) pesquisou período em que se ocorre o desenvolvimento da inteligência em etapas
sucessivas, com complexidades crescentes, encadeadas umas às outras (construtivismo sequencial e
integrativo), assim:
a) o período sensório – motor (ausência da função semiótica), até os dois anos de idade,
caracterizado por percepções (símbolos) e ações (motor) de uma inteligência prática / empírica,
exploração não verbal e aprendizagem pela experiência;
b) o período simbólico (pré-operacional) até os 7 anos de idade, com a função semiótica e
surgimento da linguagem, do desenho, da imitação, da dramatização, da formação de imagens
mentais etc.;
d) o período intuitivo, os porquês, dos 4 aos 7 anos de idade, concentrado em seu próprio ponto de
vista e com a manifestação de desejos de explicação dos fenômenos, distinção entre a fantasia e o
real;
e) período operário concreto, dos 7 aos 12 anos de idade, em que se consolidam conceitos como os
de números, substância, volume, peso etc., organização social, compreensão de regras e
compromissos; e realização normal de operações lógicas próprias do raciocínio.
A parte que segue, pela pertinência com Orientações para elaborar um projeto de
pesquisa (...), sintetiza aspectos do método de descoberta, na prática do ensino (PIAGET, 1972):
a) A análise da demonstração: o método da descoberta, baseado em procedimento indutivo para,
em seguida deduzir; a segunda característica é a definição de possibilidades de erro; a terceira é a
participação do aluno com base no conceito de que o conhecimento é construído a partir da ação
do sujeito sobre o objeto (método ativo).
b) Os fundamentos do método; seus fundamentos se encontram na epistemologia genética, com
destaque de estruturas mentais; nesses fundamentos apresenta conceitos como os de operações e
geração do conhecimento.
c) Pesquisa baseada em estruturas, em aspectos importantes selecionados da realidade objeto de
estudo e explorados em termos de suas relações com outros aspectos da realidade; as estruturas
se constituem uma totalidade, com leis próprias independentes de características particulares dos
seus elementos; consistem em um sistema de operações de transformações e com um conjunto de
combinações internas que não geram produtos fora da estrutura.
251
A relação de filósofos das ciências que segue apresenta alguns pensadores nascidos no século
XX. Um século que não foi apenas de promessas do desenvolvimento da humanidade, mas, também,
um período que trouxe as maiores guerras, as mais graves ameaças à convivência com a insegurança e
estado de terror que esvaziaram as promessas de uma sociedade perfeita, do progresso tecnológico e
tecno-científico, socialmente distribuído e para o bem-estar social. Nesse século, ainda prosseguiu a
retórica de que a ciência e a tecnologia ocupariam um lugar de destaque, porém com constatações, ao
longo desse século, de exclusão social, de persistência da miséria, de concentração de riquezas, de
degradação ambiental (...).
Parte da comunidade científica, no início do século XX, notou que, diferentemente da noção de
conhecimento da realidade vigente até essa época, a possibilidade de se ter um conhecimento que fosse
absoluto, universal e perene era insustentável, pelo fato da estrutura do universo ser dinâmica e
instável. Nesse contexo Heisenberg formulou o princípio da incerteza: sempre que se decide observar
um aspecto da realidade necessariamente se negligenciam outros, o que significa, no caso específico da
física quântica, p.ex., a impossibilidade de se conhecer simultaneamente a velocidade e a posição de
uma determinada partícula subatômica. Dessa forma, percebeu-se que eventualmente não se poderaim
fazer interpretações objetivas de fenômenos da natureza, uma vez que em suas estruturas fundamentais,
as relações de de seus componentes apresentariam caracteristicamente dinâmicas e indeterminadas;
portanto, as descrições não poderiam ser precisas e objetivas, mas, apenas, probabilísticas e
indeterminadas.
Com o reconhecimento de que os processos de relações dos componentes da matéria são
indeterminados e probabilísticos, os postulados do determinismo e materialidade do mundo físico,
deram lugar à instabilidade e imprevisibilidade. Alguns efeitos desses novos conceitos foram na
objetividade da observação (postulando-se a necessidade de interação natural entre oobservador e o
objeto de estudo), na mensuração do fato (aceitando-se como convencional e consensual) e no
determinismo (sem fundamentação térico-prática: o caos) da realidade.
O filósofo – pesquisador com interesse e se preocupa em ir, segundo Husserl, “as próprias
coisas”, não pode ignorar os desafios especulativos na aplicação pragmática de uma solução de algo
material que é indeterminado e probabilístico; no estudo do caos que renovou o determinismo; com o
abalo da confiança no formalismo, segundo Gödel; na descoberta da diferenciação celular que
fragilizou o que se acreditava era a identidade – individualidade, com imposições de reflexões
ontológico-biológicas; e em observações neuropsicológicas, em relações corpo – mente, entre muitos
outros aspectos e desafios das ciências.
Esse pesquisador deve estar preparado para tratar, no fim desse século, a explosão da outros
assuntos que o desafiam. Não poderá ignorar tendências como as de automação com o uso intensivo e
“democratizável” da informática (p.ex., da comunicação permanente e instantânea) e da robótica, do
aumento da produtividade e da qualidade (...) de processos e resultados que definem sustentabilidade.
O pesquisador moderno deve estar preparado para tratar a explosiva desarmonia - desequilíbrio
entre um desabrochar da pesquisa técnico-científica, com contribuições como as do milho, soja (...)
transgênicos e animais clonados com novas funções; benefícios e utilidades sociais, como as do
252
Fundamentos da pesquisa
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como o cérebro, ela estaria composta de matéria. Admite-se, entretanto, que a criação, o entendimento
pleno, a manipulação segura etc., da realidade requerem mais do que ciência, tecnociência, mais do
que especulações filosóficas. Tais requerimentos não são relacionados nestas Orientações para
elaborar um projeto de pesquisa (...). (...)
Fundamentos da pesquisa
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desenvolvida mais tarde por Bohr, e tornou-se a base de uma filosofia da ciência, aceita por quase
todos os cientistas, consagrada por muitas experimentações e livre de contradições (prêmio Nobel).
Após a descoberta do nêutron, Heisenberg interessou-se pela física nuclear. Foi o primeiro a
sugerir que o núcleo atômico é constituído por nêutrons e prótons, e não prótons e elétrons, como se
supunha antes. Para explicar a coesão do núcleo, utilizou um modelo decorrente do Princípio das
Incertezas; deram origem as reações nucleares em cadeia.
Seu pensamento foi oposto a duas tendências marcantes de sua época: o positivismo lógico e a
filosofia da linguagem e esteve, com o neopositivismo do princípio do emperismo, orientado para a
reflexão acerca da adequação desse princípio à prática das ciências. No lastro dessa reflexão surgem
considerações que Japiassu (1985), ao tratar o pensamento epistemológico de Popper, colocou como:
a) Impossibilidade de o postulado empirista ter uma intuição intelectual pura.
b) Entendimento do papel da experiência: cosntatações sensíveis e, pela ação da lógica,
regularidade de ligações sistêmicas do saber universal.
c) Pela epistemologia conceitualista, há um retorno à experiência sensível para a obtenção de
conteúdos de conhecimento (o dado perceptivo com um conteúdo de significado).
d) Sem intuição intelectual, não se pode fazer a economia da percepção, portanto, destaca a indução
sob duas perspectivas: elaboração de teorias (invenção) a partir de observações finitas da
realidade e o estabelecimento da verdade da teoria (valor da teoria; esta é a preocupação
epistemológica: princípio da verificação e da falsificação) apoiado apenas nas observações.
Afirmava que a ciência progride por revoluções constantes e não por acúmulos de supostas
verdades. Portanto, a história da ciência não seria, como afirmava Kuhn, a história de algumas
revoluções teóricas entre longos períodos de ciência normal, mas, uma revolução permanente
(POPPER, 1959, 1984 e 1997)..
Deu uma nova interpretação ao conceito de comprovação experimental com a sua teoria da
falibilidade (falibilismo) utilizada para separar crenças, explicações e teorias em duas categorias:
científicas e pseudocientíficas (POPPER, op. cit.).
A obra The logic of scientific dsicovery / A lógica da pesquisa científica teve
endereçamento e crítica à concepção de Carnap sintetizada em observações, tasis como: o que se
busca nas ciências é um elevado conteúdo de informações com certas características e não um alto
nível de probabilidade; o que se pretende alcançar é um alto grau de confirmação apoiada em elevado
conteúdo de informação. Afirmava:
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verdadeira; mas, é possível falseá-la, embora nunca seja possível verificá-la. Existe uma forma
inferencial dedutiva que permite o falseamento com a utilização da experiência.
Segundo a metodologia proposta por Popper, o pesquisador deve trabalhar contra sua teoria e não
a seu favor, conforme ideias prescritivas ou normativas e não descritivas, bem de acordo com os
conceitos de descobertas e justificações, científicas e pseudocientíficas ou não científicas.
Em A lógica da pesquisa científica, Popper colocou, no primeiro capítulo dessa obra, alguns
problemas fundamentais, tais como:
a) O problema da indução: como “as inferências indutivas se justificam e em que condições” se
aplicam, concluindo pela contestação, porque não se tem um princípio de indução com validade
universal.
b) A eliminação do psicologismo no processo de conceber uma nova ideia e os métodos e resultados
de seu exame no enfoque lógico, afirmando que não existe um método lógico de conceber ideias
novas e toda descoberta compreende um elemento irracional ou uma intuição criadora.
c) O problema da demarcação, afirmando que a principal razão para rejeitar a lógica indutiva está
em não se ter um critério de demarcação entre a ciência empírica, a lógica e a metafísica.
d) A experiência como método, associando-a à definição de ciência empírica, numa estrutura de
sistemas teóricos com uma lógica similar à do sistema aceito, o da ciência empírica; indica
condições a satisfazer no sistema teórico: sintético de modo que possa representara realidade não-
contraditória; a demarcação, ao representar o mundo da experiência possível; deve ser diferente,
de alguma forma, de outros sistemas semelhantes.
e) A falseabilidade como critério de demarcação: todos os enunciados da ciência empírica devem
ser susceptíveis de julgamento com respeito à sua verdade e falsidade: conclusivamente julgáveis.
f) O problema da base empírica, isto é, concernentes ao caráter empírico de enunciados singulares e
a maneira de submetê-los a prova.
g) A objetividade científica: as circunstâncias em que enunciados científicos podem ser
intersubjetivamente submetidos a teste, e a convicção subjetiva: a experiência subjetiva ou um
sentimento de convicção, não pode justificar um enunciado científico.
No segundo capítulo de A lógica (...), Popper tratou do problema (escolha) da teoria do método
científico indicando que a lógica da pesquisa (epistemologia) deve ser identificada com a teoria do
método científico; esta por sua vez, relaciona-se com os objetivos selecionados. Relaciona regras
metodológicas convencionais. O progresso da ciência seria o resultado de um processo constante de
conjeturas criativas e de refutações rigorosas, de ensaios (experimentos) e erros, de substituições de
hipóteses falseadas por novas e melhores hipóteses não falseadas, porém sempre falseáveis,
permanecendo sempre as mais aptas, sem ser teorias verdadeiras, apenas as melhores disponíveis para
um dado conjunto de condições.
259
O progresso da ciência, segundo Popper (op. cit.), pode ser resumido: a ciência começa com
problemas que poderão estar associados à explicação de comportamento de alguns aspectos; o cientista
propõe hipóteses falsificáveis para solucionar os problemas propostos; as hipóteses são criticadas e
testadas; algumas são eliminadas, outras não. As hipóteses que permanecem devem se submetidas às
críticas e provas mais rigorosas. As hipóteses que tenham superado, com sucesso, uma grande
variedade de testes, porém, ao final, forem falsificadas, surge, então, um novo problema: a invenção /
criação de novas hipóteses, seguidas de novas críticas e provas.
Trata-se de um processo e que, por isso, não seria possível afirmar que uma teoria possa ser
verdadeira, ainda que tenha superado inúmeras provas. Ao permanecer indefinidamente válida uma
teoria se teria, como efeito, o estanque da ciência.
O progresso da ciência requer que as teorias sejam cada vez mais falsificáveis e, em
consequência, tenham cada vez mais informações, excluindo, no entanto, que se façam modificações
em teorias destinadas a protegê-las da falsificação. Seriam modificações ad hoc rejeitadas pelo
falsificacionista. Podem ocorrer outros tipos de modificações não ad hoc, aceitáveis pelo
falsificacionista, conforme se ilustra com o seguinte exemplo: o medicamento A é eficiente no controle
da doença B; ao submeter a hipótese a teste foi rejeitada, aceitando-se as teorias definidas por C que se
trata de um medicamento não eficiente. Neste caso exemplificado a teoria pode ser modificada para
evitar que seja rejeitada: o medicamento A é eficiente no controle de B, exceto para as condições C.
Esta é uma modificação ad hoc. A teoria modificada não pode ser comprovada de maneira que não o
seja também a teoria original. A hipótese modificada é menos falsificável que a versão original.
A proposição a ser testada deve ter uma forma geral, com mudança livre de artifícios não aceitas
pelo falsificador. Do exemplo anterior, uma forma geral poderia ser: o medicamento A, exceto quando
se registrem as condições C, é eficiente no controle de B, não sendo uma modificação ad hoc porque
leva a nova comprovação, contrastável de forma independente.
Um aspecto que se destaca na visão popperiana da ciência é o realismo científico (um nexo forte
e direto com a filosofia ao evidenciar os recursos cognitivos para legitimar as hipótese e teorias
científicas) e a descrição com objetividade do fato. É oportuno indicar que essa visão teve contrários
até se configurar, no pensamento de Neils Bohr, 68 a posição anti-realista científica: o
instrumentalismo. Segundo essa posição, as teorias seriam meros instrumentos de predição dos fatos,
sem a pretensão de descrever a realidade não-observável subjacente aos fatos. Depois surgiram novas
ideias – argumentos contra o instrumentalismo, em especial as de Einstein apoiado na mecânica
quântica: a incompletude ao se expressar que a teoria poderá não descrever, de maneira completa,
certas propriedades de objetos físicos.
Outro aspecto a destacar nas ideias de Popper é a reflexão em relação à filosofia da ciência. É a
definição de critérios para distinguir ou demarcar teorias científicas ou o discurso da ciência de
conjeturas metafísicas ou pseudociências. Nesse aspecto, observou que o paradigma (tradicional) da
ciência indutiva a partir de observações (dados da realidade), experiências, hipóteses e formulação de
leis sobre os fatos, procedendo depois à sua generalização e verificação era inconsistente com
resultados rejeitados. Em lugar desse paradigma buscou reconstruir a lógica da ciência de forma que
260
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
somente a lógica dedutiva fosse suficiente para avaliar a proposição científica. Assim, definiu a
demarcação entre ciência e não-ciência ao estabelecer que: uma proposição só pode considerar-se
científica, se dela for possível deduzir um conjunto de enunciados de observação que possam falsificá-
la, ainda que não a falsifiquem necessariamente; é o fato de uma teoria científica poder ser
teoricamente falsificável que determina a sua cientificidade, permitindo avaliar o seu grau de
verossimilhança.
Seria científica apenas a teoria ou hipótese que pudesse ser confrontada com a realidade e
refutável; uma teoria como, p.ex., a virtude que não é susceptível de refutação, não seria, portanto,
científica. Segundo a teoria de refutabilidade empírica, a ciência não seria um processo de confirmação
de, p.ex., as leis da natureza obtidas pela intuição, mas, um processo de falseamento. Dessa forma, o
problema na ciência não se limitaria à aceitação ou a rejeição de uma teoria ou hipótese determinada
pela verificabilidade empírica mediante a aplicação de um método essencialmente indutivo e sim na
refutabilidade empírica da teoria mediante um teste. O teste é o meio para refutar a teoria. Por isso, a
racionalidade científica de uma teoria não estaria na sua geração nem na sua verificação por um teste,
mas, em sua criticidade.
Uma teoria seria científica na medida em que for possível deduzir dela proposições
observacionais singulares, cuja falsidade seria a prova da falsidade da teoria. Por outro lado, se uma
teoria não previsse meios para uma possível rejeição empírica e se não houvesse experiência capaz de
refutá-la, ela deveria ser reconhecida uma explicação pseudocientífica do real. Por tanto, a atitude
científica do pesquisador não poderia consistir em procurar casos particulares que confirmem uma
hipótese ou teoria, mas, procurar casos que, se ocorressem, falsificariam a hipótese.
A definição do método científico popperiano difere da versão do método baconiana de
empirismo por sua ênfase da eliminação em lugar da ênfase na verificação; contudo, é comum o fato de
que tanto a eliminação como a verificação tem apenas duas ferramentas: a lógica e a confrontação com
a realidade. As teorias são julgadas por pela consistência lógica e pela conformidade com os fatos, com
a realidade. As posições epistemológicas centradas no empirismo lógico são:
a) As ciências empíricas não podem admitir enunciados que não sejam apoiados em observações; ao
admiti-los, seriam enunciados desprovidos de sentido. As observações, no sentido estrito
popperiano, seriam guiadas pela teoria e a pressupõe, não admitindo qualquer afirmação que
implique o estabelecimento da teoria como verdadeira ou provavelmente verdadeira à luz de
evidências da observação. Toda teoria, uma vez proposta, terá que ser testada com base em
observações e experimentações; aquela que não superar as provas observáveis e experimentais
deve ser eliminada.
b) O método legítimo das ciências empíricas é o indutivo. O espírito humano, por esse método,
organiza as informações da observação que armazena nos seus sentidos e percepções, porém,
rejeitou a ideias de construir uma lógica indutiva: no raciocínio indutivo se passa de um caso
(juízo particular) para todos os casos (juízo universal), sem ter legitimidade e lógica; isto, porque,
as relações ou juízos de experiências são sempre particulares e contingentes, insuficientes e
logicamente inconsistentes para formular um juízo universal. Em termos lógicos, a conclusão de
261
um argumento não pode ter maior extensão ou conteúdo do que aquilo que é afirmado nas
premissas; essa é a infração que se verifica numa proposição científica universal quando baseada
em premissas singulares e finitas.
c) A instrução por repetição; estabelece que apenas as observações de repetições ou de frequências
na natureza permitem ao pesquisador inferir a existência de relações constantes no interior de
asserções gerais.
d) O princípio de verificação, implícito no positivismo; estabelece que a acumulação indefinida de
observações e experimentações permite verificar progressivamente a aceitação (ou falsidade) das
primeiras hipóteses; definiu que “uma proposição é significativa se, e apenas se, puder ser
verificada empiricamente para se decidir se ela é aceitável ou refutável”.
Na sua filosofia política, vítima do terror nazista, Popper refletiu sobre a origem e
fundamentação ideológica dos regimes totalitários com análise de filósofos como Platão, Hegel e Marx
em contextos históricos que os justificavam. A seguir se apresenta uma síntese das principais ideais da
filosofia política popperiana.
a) A história da humanidade não tem um sentido concreto que possibilite antecipar acontecimentos;
o único sentido que possui é aquele dado pelo homem em seu contexto.
b) É possível se ter o progresso da humanidade com base em critérios últimos de verdades.
c) A razão humana é essencialmente falível e o dogmatismo não tem qualquer fundamento [no
campo científico]. As únicas atitudes que se justificam para alcançar a verdade são o diálogo e o
confronto de ideias por meios não violentos. Na ciência significa aceitar o risco de formular
hipóteses que venham depois a serem refutadas pela experiência. Na política significa que cada
um deve aceitar o risco de verem as suas propostas serem recusadas por outros no confronto de
ideias.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
processos nas modernas sociedades. Sociological theory and modern society / Teoria
sociológica e moderna sociedade. Politics and social structure / Política e estrutura social.
O enfoque do estudo de Parsons consistia em ver os sistemas sociais como existindo
independentemente e onde cada um dos componentes do sistema, tal como uma peça qualquer em
relação a uma máquina, desempenharia sua função e contribuiria para a estabilidade e ordem social. A
partir dessa visão totalizadora e integradora das diferentes correntes da sociologia e das ciências sociais
passaria à seguinte fase: determinar os seus componentes básicos (interdependentes e agindo no
sentido de preservar a sobrevivência do todo, não havendo necessariamente uma hierarquia entre elas)
formados pela economia, o sistema político, a família e o sistema educativo em geral, com seus valores
e crenças bem definidos. Para os funcionalistas esses componentes atuam por interação, tendo
capacidade de adaptação para enfrentar os imprevistos e as exigências de mudanças; se por uma razão
qualquer o sistema não apresentar a elasticidade necessária, a qualidade de adaptar-se, o sistema tornar-
se-ia disfuncional.
As peças que compõem o sistema social seriam mutuamente dependentes e todas contribuiriam
para o “bom” funcionamento do sistema mantendo o equilíbrio, ainda que em movimento. Esse sistema
apresentaria diversas propriedades, tais como: adaptação (p.ex., à economia), integração institucional
(p.ex., leis, justiça), manutenção de padrões (p.ex., a família, a cultura: a sociedade e a cultura
formariam um sistema integrado de funções) e realização de objetivo (p.ex., político).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Les Mains sales / As mãos sujas. Les Séquestrés de Altona / Os sequestrados de Altona.
Nestas últimas obras, adotou certa postura independente na elaboração de
um socialismo (...)
Ensaios literários: Critique de la raison dialectique / Crítica da razão dialética; expressão
filosófica em que apresentou o marxismo como uma filosofia totalizante, em permanente
evolução interna, da qual o existencialismo constitui uma forma de expressão ideológica.
Les Mots / As palavras e L'Idiot de la famille / O idiota da família. Obra no final de
sua vida quando recosou o Prêmio Novel de literatura.
Na época contemporânea e durante o século XX várias correntes surgiram, algumas de reflexões
do marxismo e com novas propostas como as de Lefebvre, Focault, Althusser e Luckács; outras,
também com base em releituras e reflexões como as da fenomenologia, dá importância a existência
humana no existencialismo de Sartre; este, seguindo as ideias da Hurschel na análise da consciência
fenomenologia, apresentou as bases do existencialismo em seus primeiros trabalhos L'Imagination / A
imaginação e a L'Imaginaire: psychologie phénoménologique de l'imagination / A imaginação:
psicologia e fenomenologia da imaginação, onde fiz a distinção entre a consciência
perceptual e a consciência imaginativa aplicando o conceito de intencionalidade
de Husserl.
Sartre em sua obra The Philosophy of existentialism / A filosofia do existencialismo
declarou que "a subjetividade deve ser o ponto de partida" do pensamento existencialista; a base é a
fenomenologia. A negação de valores e o convite ao anarquismo implícitos no seu existencialismo
atraíram os pensadores de esquerda e afastou os conservadores de direita.
Um aspecto que sobressai da filosofia de Sartre na fase de seu pensamento maduro é a
antropologia estrutural e histórica relacionado diretamente com a ciência e com o conhecimento
científico. A antropologia revela a alienação do conhecimento quando dificulta o desenvolvimento do
autêntico materialismo histórico; por outro lado, mostra seus limites enquanto método científico
baseado no conhecimento da alienação.
A antropologia estrutural e histórica de Sartre oferece a possibilidade de compreender a relação
entre a razão positiva e a razão dialética baseada na objetivação da subjetividade e na subjetividade da
objetividade; um condicionando o outro e vice-versa. A razão positiva constitui-se como o limite
externo da interioridade da razão dialética porque obstrui a possibilidade de vencer o princípio da não-
conformidade entre o Ser e o pensamento, além de não reconhecer o caráter estrutural do materialismo
histórico pela impossibilidade dessa razão compreender todos os aspectos da alienação humana. Apesar
de representar esse limite do desenvolvimento interior da razão dialética contém equívocos; um deles é
a incompreensão sobre o ponto de partida de relações históricas entre a anterioridade do orgânico e a
exterioridade do inorgânico. Por conta dessa incompreensão, dessa falta de discernimentos da relação
unívoca da práxis com o meio circundante, o estudo do homem, com essa razão o compreenderia
apenas como um objeto do processo histórico, tornando-o abstrato.
265
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
As ideias de Quine sobre a lógica da matemática foram expostas em suas obras: A system of
logistic. Mathematical logic. Methods of logic. From a logical point of view.
Nessas obras criticou a distinção entre o processo analítico e o processo sintético, sugerindo
mudanças na linguagem do positivismo lógico e incentivou à reflexão e reapreciação para fornecer
bases empíricas às teses sobre convenção, significado e sinonímia; estes últimos tópicos foram
destacados em sua obra Word and object.
Em Philosphy of logic Quine problematizou e apresentou pontos essenciais relativos à filosofia
da lógica e a filosofia da linguagem como, p.ex., a relação entre a gramática e lógica, entre a teoria dos
conjuntos e lógica. Tratou, também, do problema da definição de verdade em proposições.
A tarefa do lógico, determinar o valor de verdade de uma proposição, é empreendida com
vínculos da realidade empírica; entretanto, o lógico apenas se refere a frases (é a diferença com o
gramático que não se preocupa com a determinação do valor de verdade das frases, mas apenas com a
sua gramaticalidade, isto é, a correta ou incorreta construção gramatical do discurso) nem sempre de
maneira objetiva.
Na “gramática lógica” Quine (1970) considerou que apenas seria necessário um léxico dividido
em categorias de gramáticas, tais como: predicados unários ou verbos intransitivos, tais como:
‘leia’;
‘o experimento durou um mês’;
‘o pesquisador dirigiu-se ao campo experimental’
Predicados binários ou verbos transitivos, tais como:
‘trabalha’;
‘é mais resistente que... ’
P Q: P é um subconjunto de Q).
O lógico de Quine é alguém interessado no mundo real, com a tarefa do lógico, que consistiria,
repetindo, em determinar o valor de verdade de determinadas frases. Essa tarefa seria empreendida
com laços com a realidade empírica. Afirmava que toda proposioção é uma frase, porém, nem toda
frase seria uma proposição; apenas as frasesa que admitam um dos valores lógicos: falso (F) ou
verdadeiro (V); assim, as frases:
Detenha-se!
Quer consultar essa obra?
Eu não estou convencido se a consulta a essa obra será benéfica.
Não serão proposições. Enquanto que as frases que seguem:
A Lua é único satélite da Terra (V).
A cidade de Belo Horizonte é a capital do Estado da Bahia. (F).
A raiz quadrada de dois números é um número irracional (V)..
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
empreender generalizações num nível objetivo, como no cado de ‘5 é 5’ e ‘Pedro é Pedro’, isto é,
‘todas as coisas são alas próprias permitindo fazer generalizações.
Um aspecto destacado da obra Philosphy of logic é o relativo à gramática lógica; elementos
dessa gramática em termos de léxico, construções e predicados, com ilustrações são apresentados nas
próximas seções, com base em informações obtidas de Davidson (1969) e Quine (1970).
Outro aspecto indicado da contribuição de Quine à ciência foi a crítitica da inferência baseda em
um único procedimento. Em que consistiu essa crítica holística? Seja a proposição maior Q dada pelo
enunciado: a Terra é redonda; a aproximação de um navio no horizonte mostra, primeiro, o mastro
(proposição secundária: P); a inferência científica simplista é: se P, então Q; se Q é falso, então se
rejeita P; se o primeiro a aparecer no horizonte é o mastro do navio, logo a Terra é redonda.
Quine têm duas objeções para essa inferência: a primeira é outorgar à determinada experiência
sensorial, no exemplo citado, a observação do mastro do navio, a condição de árbitro de um enunciado
maior; a segunda objeção é a de tomar um enunciado isolado, no exemplo, quando o navio se aproxima
do horizonte o primeiro que aparece é o mastro, como uma inequívoca consequência empírica de outro
enunciado isolado: a Terra é redonda. Quine formulou esse ponto assim; “ás vezes uma experiência
contida em uma teoria deixa de se produzir (...), é declarada falsa; mas, o insucesso falsifica apenas
uma parte da teoria que é um todo, uma conjunção de muitos enunciados; o insucesso mostra que um
ou mais dos enunciados é falso, porém não mostra qual” (QUINE, 1985).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
natureza em si, mas, a natureza exposta ao método de questionamento; daí resultava a interação entre o
pesquisador – cientista e a natureza, sendo que que a descrição resultante dependia do método de
questionar, acreditando que a ciência era um diálogo com a natureza. A observação, a descrição, o teste
/ prova e o resultado do fato, em termos matemáticos, não passavam de construções da mente; não
havia uma natureza comum a todos, mas particular com a qual cada um manteria um diálogo.
Prigogine escreveu diversas obras com destaque para: Thermodynamics of irreversible
processes / Termodinâmica e irreversibilidade de processos. Self-Organization in non-
equilibrium / Auto-organização e não-equilóbrio (co-autoria com G. Nocalas). Chaotic Dynamics
and transport in fluids and plasmas / Dinâmica caótica e trnsporte em fluídos e plasma. End
of certainty / O fim das certezas: tempo, caos e as leis da natureza. La nouvelle allianc:
métamorphose d la science / A nova aliança: a metamorfpse da ciência (pensamento
cientídico).
A parte que segue apresenta pontos de reflexão na filosofia da ciência de Prigogine, com base em
conceitos de suas obras O fim das certezas (...) e A nova aliança (...).
No sumário de O fim das certezas (...) Prigogine apresenta: uma nova racionalidade (prólogo);
o dilema de Epicuro; apenas uma ilusão? Das probabilidades à irreversibilidade; as leis do caos; para
além das leis de Newton; uma nova forma da teoria quântica; nosso diálogo com a natureza; o tempo
precede a existência; e um caminho estreito.
No prólogo de O fim das certezas (...) Prigogine coloca a questão do tempo: um paradoxo, o
dilema do determinismo de William James, a relação de causa-e-efeito de Popper, o problema da
existência e do conhecimento (...) presente na química, na geologia, na cosmologia, na biologia ou nas
ciências humanas, em fim, em toda parte, onde o passado e o futuro desempenham papéis diferentes. O
problema do tempo, da flecha do tempo numa simetria temporal. Relacionado com o tempo destaca o
nascimento de uma nova ciência, a física dos processos de não-equilíbrio com o estudo dos processos
dissipativos em um tempo unidirecional e um novo significado: a irreversibilidade, com novos
conceitos, p.ex., a auto-organização e as estruturas dissipativas de ampla utilização. Esses processos
eram compreensíveis com o auxílio das leis da dinâmica.
Entretanto a irreversibilidade “não aparece mais apenas em fenômenos tão simples, mas, está na
base de um sem-número de fenômenos novos como a formação de turbilhões, das oscilações químicas
ou da radiação laser”. Afirma que “a irreversibilidade não pode ser mais identificada com uma mera
aparência que desapareceria ao ter-se um conhecimento perfeito; ela é um componente essencial de
comportamentos coerentes (...). Sem a coerência dos processos irreversíveis de não-equlíbrio, o
aparecimento da vida na Terra seria inconcebível”.
Outro aspecto a destacar é da revisão do conceito de tempo na física é dos sistemas dinâmicos
instáveis; a ciência clássica privilegia a ordem e da estabilidade, ao passo que a observação reconhece
as flutuações e a instabilidade, condicionantes de escolhas múltiplas e limitação de horizontes de
previsão, (PRIGOGINE, 1996)
271
(...) a ciência pode ser descrita como um jogo a dois parceiros: trata-se de adivinhar o comportamento
de uma realidade distinta de nós, insubmissa tanto a nossas crenças e ambições quanto a nossas
esperanças. Não se obriga a dizer tudo o que se quer à natureza, e é porque a ciência não é um
monólogo, porque ao objeto interrogado não faltam meios para desmentir a hipótese mais plausível
(...).
Em A nova aliança (...), indica que a ciência moderna começou por negar as visões antigas e a
legitimidade das questões postas a propósito de relações homem-natureza, iniciando-se o diálogo
experimental, inclusive voltado contra a natureza, ao lhe negar a complexidade e o devir em nome de
um mundo eterno e cognoscível regido por leis simples e imutáveis (ciência newtoniana, p.ex.). Isso
mudou: a metamorfose; as ciências da natureza descrevem um “universo fragmentado, rico de
diversidades qualitativas e de surpresas (...)” e onde o diálogo racional (encontro entre a técnica e a
teoria e a aliança entre a ambição de modelar a realidade e a necessidade de compreendê-la) não é
“sobrevôo” da realidade, mas a “exploração sempre local e eletiva de uma natureza complexa e
múltipla”.
A metamorfose considera que o objetivo da ciência da natureza se transformou: os fenômenos
imutáveis não são os que interessam ao cientista, mas “as evoluções, as crises e as instabilidades”; não
é de interesse estudar apenas o que permanece, “mas também, o que se transforma (...), as perturbações
climáticas, a evolução das espécies, a gênese e as mutações das normas que interferem nos
comportamentos sociais (...); as sociedades industriais procuram compreender-se melhor, integrando os
272
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
saberes e as práticas das sociedades primitivas (...); a biologia molecular trouxe uma contribuição à
descoberta do homem em relação à natureza” (PRIGOGINE e STENGER, op. cit.).
Ao propor uma nova aliança entre natureza e cultura Prigogine aponta equívoco e impotência da
ciência clássica da mítica de um mundo simples e passivo, como consequência do próprio
desenvolvimento científico baseado em postulados newtonianos, cartesianos (...).
As tentativas de abandonar esses postulados sem renunciar à compreensão da natureza suscitam
temas e mudanças fundamentais, tais como, insistir em descrever a natureza como reversível: ela é
irreversível; a atividade inovadora e a diversidade qualitativa, sistematicamente enclausurada ao
determinismo e à aparência pela razão moderna, quando com trata-se de estruturas dissipativas, tese
que se baseia na irreversibilidade dos fenômenos e na flecha do tempo. Põe à prova o mecanicismo
teórico cartesiano que tem dominado o paradigma moderno; por esta teoria, a história não pode ser
reduzida à monotonia de um tempo único, uma vez que cada ser complexo é constituído por uma
pluralidade de tempos.
Afirma que a obsessão compulsiva da ciência em ordenar e classificar o tempo como se fosse
sempre temporalmente comparável, é uma invenção artificial para suprir as necessidades humanas de
recorrência e repetição. O tempo que se repete, as horas que se sucedem, as estações e anos
razoavelmente previsíveis, ações predeterminadas confortam a “segurança” do futuro ser tecnicamente
controlável, mesmo não sendo nunca dessa forma.
Para Prigogine, a natureza não se move no ritmo inventado pela observação científica com os
pressupostos cartesianos, newtonianos (...). Os fenômenos da natureza, suas dinâmicas, insubmissões e
flutuações são intrínsecas ao devir; são irreversíveis e sua termodinâmica tende sempre a escapar da
dominação e da clausura, apesar de apresentarem certa regularidade captada pela cognição humana.
Esse foco da ciência vem tomando cada vez mais centralidade em produções científicas, em
especial com os aportes de Einstein e da física quântica à ciência sem, contudo, ser uma discussão
recente. Mas, é uma discussão antiga apresentada em ideais como, p.ex., por Diderot que, em seu
protesto vitalista, quando sustentou que a matéria é sensível, já que até as pedras têm surdas
sensações, no sentido de que suas moléculas procurarem certas combinações e evitarem outras.
Entenda-se, nesta discussão, a disrupção pulsando na natureza, dado que a ebulição inquieta e
potencialmente transformadora lhe é constitutiva. Na termodinâmica dos processos irreversíveis, o
acaso das flutuações nutre fenômenos de auto-organização espontânea, rupturas de simetria e
evoluções no sentido de uma complexidade crescente.
É a história unindo os dois mundos que a ciência classicamente insiste em separar e que se abre
na nova aliança: é a ciência humana que estabelece a necessidade de repensar o fulcro que se tem feito
entre ciências naturais e ciências sociais. O conhecimento é natural e social e onde todos os seres
históricos convivem e conflitam na natureza, numa propulsão dialética produtora de sínteses e
contrários. Assim, o conhecimento humano acontece na natureza e os seres humanos fazem parte dela,
a escutam, observam e descrevem. O distanciamento entre homem e natureza, entre sujeito e objeto
273
(...) pela razão moderna, está cada vez mais difícil de defender, apesar de ainda sustentar um discurso
hegemônico.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Segundo Bunge, a filosofia da ciência e técnica estuda os problemas lógicos que surgem na
investigação científica, tais como: que é o tempo? Que é a vida, que é psique e quais são os problemas
nosológicos com relação ao conhecimento científico, suas características e diferenças com o
conhecimento vulgar.
Exemplos de ideias e posições de Bunge são ilustrados com uns poucos casos: o mais importante
na atualidade (últimas décadas do século XX) não é a luta de classe, mas, a luta pela sobrevivência e o
inimigo não é o capitalismo nem o comunismo e si o belicismo, o terrorismo, os contaminadores do
meio ambiente, a explotação desenfreada dos recursos naturais e o crescimento demográfico
desordenado.
A ciência e pesquisa são ferramentas na solução desses problemas; a sociotécnica ou ciência com
a missão social pode contribuir na solução desses problemas.
As principias obras de Bunge, algumas apresentadas com partes de sumários, são:
Causality: the place of the causal principle in modern science / Causalidade: o lugar do
princípio da causalidade na moderna ciência. Tratam-se de um ensaio determinístico, com ênfase
nos fatores de causalidade e de determinação como um caso extremo de uma causa. Analisa como a
causa atua em vários setores da moderna ciência e o significado das leis de causação. Do sumário dessa
obra se destacam alguns itens, tais como: os significados de causação e determinação; a formulação do
princípio de causalidade e um exame crítico; a linearidade, unidirecionalidade e externalidade da
causalidade; a função da causalidade na moderna ciência; a causalidade e a racionalidade do
conhecimento; e a causalidade e leis científicas.
The Myth of simplicity / O mito da simplificação apresentou conceitos-chave para filósofos e
cientistas como os de análise, analítico, verdade, lei, nível de simplicidade e complexidade; explorou o
aspecto mítico; a metodologia utilizada foi a elucidação metacientífica, analítica e sintética.
La investigación científica, su estrategia y su filosofía / A investigação científica; sua
estratégia e sua filosofia. Parte da ideia de: fazer ciência é um processo intelectual e criativo
assistido por meios materiais. Oferece um tratado sistemático de epistemologia que percorre as fases da
investigação científica examinando cada uma das fases: as hipóteses de trabalho, as hipóteses que são
aceitas como lei, o sistema hipotético-dedutivo da teoria, a explicação e a predição de teorias, a ação
baseada na teoria e a avaliação de ideais à luz dos fatos. Procura responder: que é ciência? Qual é o
método da ciência? Qual é o significado de lei científica? Entre outras, para [induzir] a filosofar
cientificamente e encarar a ciência filosoficamente.
Divide a ciência, conforme seus objetivos e temas de estudo, em ciências formais ou ideais e
ciências materiais.
A obra La investigación (...) está dividida em quatro partes. A primeira parte, com três
capítulos, compreende a formulação científica com conceitos como os de conhecimento, método e
tática científica; objetivos e alcance da ciência e pseudociência; divisão, ordenação e sistematização;
ambiguidade, precisão e definições. Na segunda parte se definem fases da pesquisa e apresenta
aspectos de leis e teorias estáticas e dinâmicas; dessa parte se destaca a definição do método da ciência
275
com base em fatores fundamentais como é a objetividade. Um método que é falível e sem regras
permanentes; que não produz automaticamente o saber, mas, compreende um processo de investigação
com uma variedade de habilidades [competências] e de informações agrupadas em:
a) a percepção de fatos e o descobrimento e formulação do problema;
b) a construção de um método teórico, seleção de critérios, formulação de hipóteses e tradução para
a linguagem matemática;
c) deduções de técnicas particulares (generalizações de leis);
e) prova / teste de hipótese com o desenho da prova, aplicação do teste, obtenção dos dados e
inferências conclusivas;
f) introdução das conclusões na teoria mediante comparações / validações das conclusões com as
predições, reajuste do modelo e sugestões para posteriores trabalhos de investigação, conforme
1.
1.A percepção
Ana
percepção de
de fatos ee oo
se ilustra
descobrimento Figura 2. fatos
e formulação do problema
descobrimento e formulação do problema
Na terceira para
para investigar
parte investigar
apresenta a aplicação das ideias científicas: da explicação à ação: explicação,
predição e ação. Na última parte apresenta outras fases do método de investigação, tais como a
observação, a 2.
medição,
2.A o experimento
Adocumentação
documentação e a inferência
ee definição
definição do científica.
do problema
problema
com
com base
base na
na construção
construção de
de um
um método
método
O livro de La investigación teórico(...) é um dos mais citados em Orientações para elaborar
teórico
um projeto de pesquisa (...) não apenas pela completeza de abordagens em assuntos como o
método científico e3. aseleção
filosofia
3. seleção de da ciência,
de critérios,
mas, pordesehipóteses
critérios, aa formulação
formulação de
acreditar na pertinência e atualização de seus
hipóteses ee
conceitos na pesquisa com objetividade
aa tradução
tradução para e efetividade
para aa linguagem em
linguagem matemática.seus resultados.
matemática.
4.
4. Deduzir
Deduzir ou
ou “imaginar”
“imaginar” consequências”
consequências” das
das
hipóteses:
hipóteses: prova / teste, generalização
prova / teste, generalização
Figura 2 Síntese dos elementos (habilidades e competências) do método científico, segundo Bange
5.
5.Aplicação
Aplicação do
do teste,
teste, obtenção
obtenção de
de dados:
dados:
procedimento concreto a seguir
procedimento concreto a seguir
6.
6. Inferências
Inferências conclusivas
conclusivas como
como resultados
resultados
da investigação
da investigação
7.
7. Introdução
Introdução das
das conclusões
conclusões nana teoria
teoria
mediante
mediante comparações
comparações // validações
validações
(generalizaçãoe)
(generalizaçãoe) comcom as
as predições,
predições, reajuste
reajuste ee
sugestões
sugestões para posteriores trabalhos de
para posteriores trabalhos de
investigação..
investigação
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
A parte que segue sintetiza conceitos básicos de ciência, do método da ciência, do conhecimento
científico e de sua obra Scientific method: optimizing applied researc decision.
De acordo com Ackoff o conteúdo da mente humana pode ser classificado nas seguintes
categorias:
a) Dado; símbolo, simplesmente existe e não requer que tenha significado por si mesmo além da
própria existência.
b) Informação: dados para os quais foi dada significância por meio de conexão relacional, bem
como atribuída conveniente organização e consolidação.
c) Conhecimento; a apropriada coletânea de informação tal que seja de proveito e utilização,
possibilitando abstrair regras para obter informações a partir de dados ou de outras informações
que possam representar eventos ou conjunto de eventos ou que permita construir regras para
codificar o conhecimento consolidado.
d) Entendimento; a simples memorização de uma coletânea de informações não se constitui em
conhecimento considerado utilizável para inferir novo conhecimento; para tal é necessário o
entendimento ou a habilidade cognitiva e analítica para desenvolver abstrações. O entendimento é
um processo probabilístico interpolativo pelo qual se sintetiza um novo conhecimento a partir de
um conhecimento prévio.
e) Sabedoria; é um processo extrapolativo, não determinístico e não probabilístico que invoca todos
os níveis prévios de consciência e, especificamente, de valores tais como os éticos e morais, entre
outros. Tais níveis de consciência são desenvolvidos, com base em habilidades cognitivas e,
principalmente pela vivência, pelo insight e pela experiência naquela área de conhecimento,
acenando com a possibilidade de entendimento sobre aquilo que anteriormente não se tinha
entendimento. Diferentemente dos níveis anteriores, formulam-se questões para as quais não
existe resposta, ou a resposta não é facilmente derivável via entendimento. Assim, a sabedoria é
um processo pelo qual se discerne entre o bom e o mau, o que requer uma boa mente e
principalmente espírito, por envolver a consciência. Por estas características é impossível de
automatizar.
Conforme Ackoff, no nível da informação são compreendidas as relações entre dados. No nível
do conhecimento são compreendidos os padrões e formas que derivam informações recorrentes,
permitindo, portanto, antecipar dados e informações. Já em nível da sabedoria são compreendidos os
princípios por trás do conhecimento.
A sabedoria é essencialmente sistêmica e abrangente, com evidente existência de uma forte inter-
relação entre sabedoria e entendimento, tanto que é comum a confusão entre ambos; no entanto é
consenso que a habilidade para chegar ao entendimento depende da inteligência. Pela própria
característica, a sabedoria se diferencia por trabalhar com níveis de consciência. Uma percepção que
transcende o conhecimento e o entendimento de acordo como se tem usualmente aceito na filosofia
ocidental.
279
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
d) A revolução científica com suas relações, associada, em sua origem, às profundas transformações
introduzidas por Copérnico, Galileu, Newton e Bacherad, entre outros pensadores, na
astronomia, física, educação, com rupturas revolucionárias com o passado.
O conceito de revolução foi utilizado, por primeira vez, pelo russo Koyré; Khun o incorporou em
sua obra a Estrutura das revoluções científicas. Rupert Hall o utilizou em sua obra The
cientific revolution; o conceito se incorporou ao acervo norte-americano na obra The origins of
the moder sciente 1300 - 1800 de Butterfiel.
A ciência moderna não surgiu perfeita e completa em determinado período como, p.ex., com os
pensamentos e ideias criativas de Galileo, de Descartes (...), mas, foi um processo de esforços na
evolução e história das ciências; foram esforços obstinados para tratar muitas vezes os mesmos
problemas criando, lenta e progressivamente, novos conceitos, técnicas, métodos, teorias (...).
O surgimento de uma nova teoria (...) que rompe com a tradição da prática científica e introduz
uma nova metodologia, teoria e critérios de legitimação, quer dos problemas, quer das próprias
soluções, referem-se a um universo de razões também diferentes.
O sucesso de um paradigma é uma promessa de sucesso que a ciência normal atualiza quando
amplia os conhecimentos de fatos apresentados pelo paradigma como particularmente relevantes,
mpliando, também, as articulações e inter-relações entre esses fatos, bem como as predições.
O cientista trabalha com base em modelos adquiridos durante sua formação e/ou na revisão de
literatura que são aplicados, muitas vezes, sem conhece ou precisar conhecer quais as
características que proporcionam o status do paradigma (negritado ausente da fonte) comunitário a
esses modelos. É notável destacar que o paradigma “força” o pesquisador a investigar aspectos da
realidade, dos fatos, com detalhes ou profundidade que de outras formas seriam inimagináveis e para
isso, precisa conhecer as características dos meios que utiliza.
Nesse processo Kuhn indica que "existem apenas três focos normais para a investigação cientifica
dos fatos e eles não são necessariamente permenentes nem distintos". Quando o pesquisador os
emprega na solução de um problema, tornam-se merecedores de determinações mais precisas e com
ampliação em uma variedade de situações; o paradigma, além de permitir detalhes e profundidade,
possibilita que alguns fenômenos de interesses muitos intrínsecos (em velhos paradigmas), possam ser
diretamente comparáveis (colocados em evidência) com predições da teoria do paradigma. Em outros
casos, amplia as atividades de observação, de medição, de registro (...) de fatos da ciência normal
quando, durante o trabalho empírico para articular a teoria do paradigma, permite resolver
ambiguidades residuais e solucionar problemas que em velhos paradigmas apenas eram mencionados.
O pesquisador, ao adotar um novo paradigma para antecipar, de forma diferente, o proposto pela
pesquisa, deixa de praticar a ciência, a pesquisa que este define e passa a ser orientado, com suciente
força (consistência, coerência...), para perceber, medir, registrar, tratar (...) um fato, dentro do
paradigma em vigor.
Quanto à substituição de “velhas” teorias, modelos, procedimentos (...) por novos, afirmava que
era importante fazer análises criteriosas indicando que, em alguns casos, a aplicação de “velhas”
284
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
teorias (...) falharam porque foram ampliadas, extrapoladas ou aplicadas de maneiras indevidas, para
outras realidades e condições, para outros propósitos e onde a extrapolação foi além de limites de
aplicabilidade dessas “velhas” teorias, de tradicionais técnicas (...).
O pesquisador deve sempre testar rigorosamente cada modelo, teoria, procedimentos (...) em
relação a sua validade, oportunidade, exequibilidade, conveniência (...), em todas as situações
possíveis, com testes rigorosos capazes de expor limites, falhas e condições em que se aplicam tais
procedimentos, ténicas, métodos (...); se aceitos, apenas se terá uma aceitação provisória, enquanto não
seja substituído, modificado (...) por novos paradigmas.
No futuro com novas técnicas, procedimentos, métodos (...) de observação do fato que interesa,
de medição e registro com exatidão, de análise com eficiência (...) e com estruturas conceituais
científicas mais avançadas poderão se evidenciar as deficiências de ”velhos” modelos, de tradicionais
teorias (...). Ao se verificarem ineficiências, deficiências, incompletezas e inadequações, o pesquisador
poderá, em alguns casos, consertá-los. Contudo, há casos em que não é possível fazer consertos, sendo
necessário substituí-los: são as revoluções científicas.
Quando tais revoluções ocorrem e modelos velhos precisam ser substituídos por novos, não
significa, repetindo, que os velhos estavam errados; eles poderão funcionar em seu âmbito geral de
aplicação. Um exemplo disso é a física de Newton que não foi subitamente errada e nem estavam suas
predições ditas não-confiáveis ou incorretas quando se adotou a teoria da relatividade de Einstein. A
relatividade teve maior âmbito de aplicação do que a física Newtoniana. Deve-se considerar que essa
comparação não é logicamente válida, uma vez que física newtoniana estava baseada em uma base
conceitual diferente a que é utilizada na teoria da realtividade.
Nos períodos de revoluções científicas com as percepções de anomalias que permitem
percepções de novidades e com as mudanças de paradigmas, novos fenômenos são descobertos,
conhecimentos são “substituídos” e se verificam ajustes - mudanças na prática da investigação,
inclusive na visão de mundo do pesquisador. Há novos instrumentos (metodologia) mais potentes e
eficazes para registrar a observação de maneira mais exata e precisa; é um ambiente que favorece o
avanço da ciência; mas, esse avanço vai depender mais das instituições e da comunidade científica do
que das teorias científicas.
Kuhn aponta que não só as descobertas de anomalias, mas, as teorias que procuram explicar o
mesmo fenômeno, sob diferentes óticas, geram as instabilidades da teoria; é a crise no modelo
científico. Dessa forma, o pesquisador – cientista que busca dar soluções aos problemas a partir de
conceitos, princípios matemáticos, instrumentos (regras estabelecidas), perde o apoio quando estas não
servem mais como parâmetros para se orientar e as técnicas normais da análise são ineficientes na
medida em que diferentes versões da mesma teoria coexistem: é a crise que só será resolvido quando
uma única visão, uma boa teoria, for aceita e as demais rejeitadas.
Segundo Kuhn, uma boa teoria, como a mecânica newtoniana e o neodarwinismo, p.ex., são
teorias científicas capazes de explicar um grande número de fatos, porém, não passa de conjetural,
285
podendo ser substituída por outras teorias que possam explicar melhor os fatos. Afirmou que uma boa
teoria deveria ter certas características, critérios ou “valores”, tais como:
a) a exatidão ou capacidade de previsão exata, entendida como a concordância da previsão feita
com a teoria com os resultados experimentais;
b) a consistência; a teoria deve estar livre de contradições internas e ser compatível com outras
teorias aceita no momento;
c) o alcance; a teoria deve explicitar fatos ou leis diferentes daqueles para os quais foi construída;
d) a simplicidade ou capacidade de unificar fenômenos que, aparentemente não tinham relação entre
si, constituindo-se uma fonte de novas descobertas e de orientação (a fecundidade) da pesquisa
para resultados úteis;
e) a plausibilidade, poder explanatória ou capacidade da teoria de resolver o maior número possível
de problemas, tanto teóricos como experimentais.
Nos critérios ou características de uma boa teoria Kuhn reconheceu a existência de redundância,
mas, considerou isso de menor importância, dado que os critérios teriam pesos relativos variáveis, por
vezes conflitantes e com interpretações diferentes. Ao final, seriam critérios insuficientes para forçar
uma decisão unânime por parte de determinada comunidade científica.
Uma teoria poderia ser superior em relação a determinado valor, mas inferior em relação a outro;
uma mais simples, mais precisa (...) que outra. Cada pesquisador poderia atribuir um peso diferente a
cada valor; dessa forma fatores psicológicos e sociais estariam influenciando a escolha, sem que
existisse uma ligação entre esses valores (não justificados, a não ser pelo fato de serem compartilhados
pela comunidade científica) e a verdade de uma teoria; tal indeterminação tem implicações; como
nenhuma teoria poderia ser comprovada ou refutada de maneira conclusiva, qualquer decisão de
escolha implicaria risco; daí porque não seria “prudente” abandonar prematuramente teorias; a
capacidade de uma nova teoria de resolver problemas seriam argumentos decisivos na escolha da
mesma.
A importância da teoria na investigação foi destacada por Kuhn quando afirmou que não há
experiência nem ciência, sem teoria. Questionava, porém, a concepção histórica continuista
(cumulativa) de formular e rejeitar teorias, como entendia Popper, postulando que a ciência avança por
rupturas.
Afirmava que a verdade de cada teoria se dava somente dentro da cada paradigma, uma verdade
apenas intraparadigmática. Acreditava ser impossível explicar a ciência de um determinado momento
pelo simples análise de axiomas, de teorias que o pesquisador supõe sejam corretas, porém, incapazes
de reconhecerem os objetos da natureza aos quais ela se refere; esses objetos são diferentes para a
ciência de cada época.
Kuhn defendeu que o progresso em ciência se dava, principalmente, pela maior capacidade de
resolver problemas que as novas teorias apresentam em relação às antigas, defendendo um critério
objetivo de progresso; mas, ao mesmo tempo, afirmava que durante uma mudança de paradigma
286
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Era uma nova visão da ciência com apoio metodológico. As teorias científicas têm sustentação
tanto na experiência, ainda que não pelo modo descrito pelo indutivismo e falseacionismo, como em
orientações teóricas para buscar, classificar e analisar os dados empíricos, as observações. Além disso a
base que sustenta ideias e experiências sensoriais é constituída, ao menos parcialmente, pelo intelecto.
Em contraste com a proposta indutivista e falseacionistas, as teorias científicas não consistem em
apenas aglomerados de leis gerais; devem incorporar regras de um método que discipline os efeitos
empíricos desfavoráveis e norteiem o aperfeiçoamento da investigação. É o conceito epistemológico de
programa de pesquisa constituído por um “núcleo firme” (hipóteses e teorias irrefutáveis) de uma
heurística que orientaria o cientista a modificar o “cinturão protetor” (hipóteses auxiliares e métodos de
observação) de modo a adequar o programa aos fatos. Para Lakatos:
(...) um programa de pesquisa é uma estrutura que fornece um guia para futuras investigações, tanto
de maneira positiva, como negativa. A heurística negativa [cinturão protetor do núcleo que
delimitaria , metodologicamente a incerteza; seria como uma regra de tolerância para manter os
princípios fundamentais do núcleo] de um programa envolve a estipulação de que as assunções
básicas ao programa, seu núcleo rígido, não devem ser rejeitados nem modificados. Esse núcleo é
resguardado contra falseacionismos por um conjunto de hipóteses, condições iniciais (...) [cinturão
de proteção, dentro de certos limites]. A heurística positiva [mais vaga e difícil de caracterizar; são
ideias de como mudar ou desenvolver...] é constituída de prescrições não muito precisas que
indiquem como o programa deve ser desenvolvido (CHALMERS, 1976).
O núcleo rígido de um programa, segundo Lakatos, seria aquilo que o identifica e caracteriza
como um núcleo constituído por uma ou mais hipóteses teóricas; é o caso de, p.ex., o programa da
mecânica newtoniana formado pelas três leis da dinâmica e pela lei gravitacional e o da teoria da
evolução de Darwin, formado pelo mecanismo da seleção natural. Esse núcleo é dado e não-refutável.
Possíveis discrepâncias com resultados empíricos seriam eliminadas na metodologia por mudanças de
hipóteses na heurística negativa do programa (CHALMERS, op. cit.).
Um programa de pesquisa é progressivo quando prevê fatos novos e alguma destas previsões é
corroborada, sendo regressivo quando não prevê fatos novos, ou, prevendo-os, não são corroborados. A
história da ciência é a história dos programas em concorrência; as chamadas revoluções científicas
constituem-se em um processo racional de superação de um programa por outro.
Lakatos acreditava que ciência compreende um novo critério de demarcação entre ciência e não-
ciência; considerava que tanto pelo critério indutivista que considera ciência somente as teorias
empiricamente provadas como pelo critério do falseacionismo em que nenhuma teoria seria
genuinamente científica, eram demasiadamente rigorosos.
A proposta de um novo critério de demarcação teria duas exigências: uma teoria deve, para ser
científico, estar compreendida em um programa de investigação e esse programa deve ser progressivo;
a ciência madura consiste de programas de pesquisa nos quais são antecipados não apenas fatos novos,
mas, também, novas teorias; a ciência madura tem poder heurístico, em contraste com a ciência banal
de tentativa [acerto] e erro (CHALMERS, op. cit.).
288
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Surveiller et punir/ Vigiar e punir onde apresentou um estudo sobre a disciplina na sociedade
moderna, “uma técnica de produção de corpos dóceis”; analisou os processos disciplinares
utilizados nas prisões e padrões normais de conduta estabelecidos pelas ciências sociais, com
explicitação de formas de relações de poder, de coerção e imposição; e criticou a psiquiatria e a
psicanálise tradicional.
Deixou inacabado seu maior projeto a seu Historie de la sexualité / História da sexualidade; o
primeiro dos seus volumes La Volonté de savoir / A vontade de saber.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Habermas fundamenta sua critica sobre as ciências que buscam o conhecimento além do aspecto
instrumental; contudo, avança na elucidação de aspectos filosóficos e epistemológicos do
processo da construção do conhecimento. Aponta a ausência da auto-reflexão na metodologia
positivisma na construção do conhecimento o que viria a limitar o caráter emancipador das
ciências.
Na perspectiva objetiva que apresenta em sua obra Conhecimento e interesse, indica que o
sujeito perde a sua referência cognoscente, em virtude de um conhecimento fundamentado na
matematização e exatidão.
Para o positivismo o conhecimento pressupôe duas certezas: a sensível e a metódica para se
manter estreitamente vinculado à esfera de dominação e instrumentalização. Mas, dessa forma
reduz as possibilidades do conhecimento crítico mediante a auto-reflexão.
Para se contrapor ao objetivismo das ciências, acredita que a psicanálise, ao reivindicar
metodicamente o exercício autoreflexivo, rompe com o objetivismo na medida em que resgata
para o seu interior a autoreflexão. Conclui que com o surgimento da psicanálise abre-se, através
do caminho peculiar à lógica da pesquisa, a perspectiva de um acesso metodológico a esta
dimensão disfarçada pelo positivismo.
Outras ideias básicas relacionadas com o tema central do livro são:
b) A ética universalista, deodontológica, formalista e cognitiva, com princípios sem conteúdos,
mas, através da participação em decisões públicas, em discussões, possibilita a avaliação de
conteúdos normativos como resultado natural.
c) A teoria discursiva orientada para a integração social e, como consequência, para a democracia e
cidadania; uma teoria que possibilitaria a resolução (a melhora como resultado do consentimento
de todos os concernidos) de conflitos (fim da arbitrariedade quando houver uma participação
mais ativa e igualitária de todos: o agir comunicativo) e da coerção na sociedade.
d) A comunicação e a opinião. Indica a ação da comunicação como superação da razão iluminista
transformada em instrumento de dominação burguesa.
e) O debate entre a modernidade e a pósmodernidade, com novas perspectivas para o
conhecimento, as quais implicam novas concepções de racionalidade.
f) Na questão da cientificidade de uma teoria consensuada da verdade, em que se observa a
vinculação entre a ética e o método científico porque a escolha desse método compreende
decisões de significado ético, indagada, entre outros aspectos, por:
f1) Os critérios utilizados no exercício da pesquisa para aceitá-la como cogente, isto é, como
racionalmente necessária com seus argumentos produzidos em determinada área do
conhecimento, de tal forma que o consenso em torno dessa argumentação fosse aproximado,
tanto quanto se possa conceber, do consenso verdadeiro; significa que o exame da cientificidade
passa por uma ética da investigação científica.
292
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
f.2) O compromisso do pesquisador deve ser com o interesse universal tendo como implícito certa
neutralidade da ciência.
f.3) Uma metodologia da investigação científica em que a cogência de determinados argumentos
esteja relacionada com o modo utilizado para gerar esses argumentos.
Em sua obra a Teoria da competência comunicativa, a partir de uma situação abstrata e ideal
de comunicação, sem pressões ou subordinação, Habermes encontra normas e valores que lhes
servirem de substrato à crítica contra o capitalismo tardio, negando-lhe sua racionalidade instrumental
com base na concepção da totalidade dialética. Essa totalidade visa superar a abordagem funcionalista
ou sistêmica em seu princípio: a totalidade é muito mais do que a soma das partes. Trata-se de uma
totalidade que, por ser dialética e histórica, transcende os fundamentos do sistema quando considerado
de forma isolado, ao estar inserido numa dimensão na qual o sujeito supera as circunstâncias dadas
objetivamente. Dessa forma, dizer que a totalidade é mais que a soma das partes ainda não é suficiente,
porque não resgata a dialética histórica, sua complexidade e abertura determinada pelo fazer humano.
Com esse pensamento aborda, de maneira crítica, o positivismo que tem base teórica na racionalidade
de tipo instrumental.
A Teoria da ação comunicativa tem como finalidade, proporcionar uma razão que possibilite
ao homem ser livre e emancipado e, nessa perspectiva, a teoria da ação gera o conceito de razão
comunicativa, a defesa da existência de uma esfera pública e que permite ao cidadão expressar e
discutir suas ideias e a idéia de que as ciências naturais seguem uma lógica objetiva, enquanto que as
ciências humanas seguem uma lógica interpretativa. São temas em que Habermas explicita a sua
herança da Escola de Frankfurt, 70 isto é, da abordagem crítica a respeito das teorias, das ciências e do
presente, construindo um conhecimento engajado e revolucionário, apresentado em a Teoria da
acão comunicativa.
Uma das principaisjippóteses desenvolvidas por Habermas é apresentada em Teoria da ação
comunicativa e se refere à sociedade moderna; é uma teoria fundamentada em métodos da sociologia,
da filosofia social eda filosofia da linguagem, esta como garantia da democracia ao pressupor a
compreensão de interesses mútuos. Mas, para que a linguagem assuma esse papel é necessário que a
comunicação seja clara: a distorção de palavras e de sua compreensão impede uma comunicação
eficaz, o consenso e, portanto, a prática efetiva da democracia.
O uso correto de palavras somente ocorrerá quando for abandobado o uso exclusivo da razão
instrumental (iluminismo), a razão que utiliza o sujeito cognoscente ao conhcer a natureza com o fim
de dominá-la, com o fim de exploração e poder; uma razão que se torna instrumento de uma ciência
como meio de dominação. É preciso uma razão que não seja instrumento de dominação; essa é a razão
comunicativa que, além de compreender aspectos instrumentais do conhecimento objetivo, permita
alcançar a esfera da interação entre sujeitos, marcada por simbolismo e subjetivismo, experiências
pessoais e a contextualização dialógica de agentes linguísticos.
Dessa forma, rompe-se um diálogo baseado em conhecimentos instrumentaisque resultam de
relações entre um sujeito cognocente e um objeto cognoscível, a partir do qual o consenso é desprovido
293
do caráter democrático. Com essa ruptura, trava-se um diálogo entre sujeitos capazes de compartilhar,
pela linguagem, de um universo simbólico comum e interagir, buscando construir um conhecimento
crítico pautado por argumentação submetida a critérios de validade, sem, contudo, orientações por
rígidos domínios científicos.
Nesse contexto, Habermas acredita que a comunicação é eficiente se atender critérios, tais como:
o uso de regras semânticas inteligíveis, - compreensíveis para o receptor; ser verdadeiro o conteúdo
dito [algo crítico nessa teoria]; ter necessária justificação (direitos sociais ou normas invocadas no uso
do idioma); e confiabilidade do emissor. Acredita que a racionalidade é compreendida na dimensão
processual, enquanto falantes e ouvintes buscam entender-se sobre o mundo objetivo, social e
subjetivo, com base nos quatro critérios indicados.
Para Habermes, o processo social não é apenas um sistema, uma conexão funcional passível de
ser apreendida empiricamente, conforme aceito pelo positivismo ao falsear o real e não tematizar a
relação do sujeito como todo social. Nesse contexto, deve-se observar uma limitação porque o
problema não se encontra na relação do sujeito com o objeto, mas se deriva da própria natureza do
objeto: sua ambiguidade como objeto e, ao mesmo tempo, como sujeito quando o pesquisador ao
estudar a sociedade, faz de si mesmo um objeto de estudo; porém, como observador e investigador,
separa-se de si mesmo e se transforma no sujeito da pesquisa, preservando-se certa abertura não-lógica
no interior do conceito de totalidade dialética.
Habermas, ao admitir essa abertura não-lógica, propõe outra "racionalidade", a racionalidade
crítica, superior à racionalidade instrumental. Nessa perspectiva, a ciência social não admitiria uma
falseabilidade estrita na relação entre uma parte e o todo, apesar da possível constante aproximação
entre teoria e prática por meio da verificação. Com isso, abre-se um espaço para um tipo de
conhecimento da sociedade que se legitima, não apenas pela experiência imediata, mas pelo
conhecimento compreensivo de tendências, admitindo dois pólos: a experiência estrita e a tendência,
ligados pela racionalidade crítica do pesquisador.
No diagnóstico da colonização do mundo, da crescente instrumentalização devida à
modernidade, pelo sistema que reserva o debate normativo aos técnicos e especialistas destaca o
cultivar do logos da troca de ideias, de opiniões e de informações entre os sujeitos históricos para
estabelecer o diálogo. Propõe duas abordagens teóricas possíveis à sociedade: o sistema ou a
reprodução material regida pela lógica instrumental: pela adequação de meios aos fins; e o mundo da
vida ou a reprodução simbólica: rede de significados que compõem determinada visão da realidad
conforme sejam os fatos objetivos, normas sociais ou conteúdos subjetivos.
A questão da cientificidade, em uma teoria consensual da verdade, é outro aspecto abordado por
Habermas a ser destacado nesta obra Ele indaga acerca de critérios utilizados na prática da ciência, da
pesquisa, para que os participantes da comunidade científica possam aceitá-la. Essa prática se faz com
base em argumentos racionalmente necessários (congentes) para cada um dos setores do conhecimento.
O consenso formado na comunidade científica, em consequência da argumentação de cada setor do
conhecimento, deve tender para se aproximar, tanto quanto se possa conceber, do consenso verdadeiro.
294
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
Significa que o exame da cientificidade, nessa aproximação, passa por uma ética da investigação
científica.
O artesão da ciência, o pesquisador, na ética da investigação científica, é um sujeito de
pressuposta boa fé [assim se espera] e que assume responsabilidades do que faz e dos efeitos desses
resultados na sociedade, no meio ambiente. Seu compromisso precisa ser com os interesses universais,
o que tem sido traduzido pelo ideal da ciência neutra, da neutralidade do método científico e da
observância de fatos e evidências no processo científico. Portanto, a cientificidade está relacionada,
também, com a metodologia da investigação científica em que a cogência de determinados argumentos
deve estar relacionada com o modo ou procedimento, com o método científico utilizado para gerar o
conteúdo informativo desses argumentos.
Portano, na questão da cientificidade, segundo Habermas, observa-se que a ética e o método
científico se encontram vinculados; isto, porque a escolha de processos e métodos de gerar a
informação envolve decisões de significado ético, no sentido específico: a ética da investigação
científica considerada, por muitos, como a principal ou a única garantia de uma investigação
inatacável.
Habermas, em sua obra a Teoria e práxis, destacou a doutrina positivista e a ideologia dela
resultante, o tecnicismo. Analisou em sua obra o Conhecimento e interesse, as relações entre o saber
e os interesses das classes dominantes, considerando que o interesse guia o conhecimento. Sua
principal tese política é a luta pelo restabelecimento de uma opinião pública democrática e crítica.
Um aspecto interessante na metodologia da investigação do direito, da hermenêutica jurídica, 71
relaciona-se, de forma estreita e direta, com a ação comunicativa, com a razão comunicativa de
Haberma, ao proporcionar interrelações entre fatos e formas de vida e normas estabelecidas para
manter essas formas. Acredita que a correlação entre validade e eficácia representa a condição
essencial para o direito, uma vez que além de manter a correlação citada, sustenata a imposição do
direito entendida como guardiã da integridade sócia (FERRAZ JÚNIOR, 2003; MAXIMILIANO,
1997_.
Outras obras importantes, entre o grande número de obras publicadas por Habermas, são:
Mudança estrutural na esfera pública / Strukturwandel der offentlichkeit (A transformação
estrutural da esfera pública). Trata-se de um estudo crítico histórico-sociológico da sociedade em
que demonstra mudanças no domínio público, diferente do domínio privado (por causa da separação
Sociedade-Estado), sendo necessário um novo conceito de opinião pública. Aborda o fundamento da
legitimidade da autoridade política como o consenso e a discussão racional.
Entre fatos e normas, faz uma descrição do contexto social necessário à democracia e
esclarece fundamentos da lei, de direitos fundamentais com uma crítica ao papel da lei e do Estado.
Outras obras: Discurso filosófico da modernidade. Técnica e ciência como ideologia.
Racionalidade e comunicação. Comentários à ética do discurso. Direito e moral. Consciência
moral e agir comunicativo. Pensamento pós-metafísico. Direito e democracia.
295
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
de uma estrutura legível. O que era válido para o rementente, o escritor, devia ser válido, também, para
o leitor; o escrito precisa continuar motivando a ser lido e relido mesmo na ausência do querer-dizer
daquele que o escreveu (BENNINGTON, op. cit.).
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
em especial, às ciências que aplicam o método analítico da física clássica de Newton como modelo a
ser seguido.
Fundamentos da pesquisa
Volume 1
N O TA S
1
Os critérios ou pedras de toques das ciências devem satisfazer certas condições, tais como: a) ser objeto delimitado, em
que esse recorte ou delimitação, especialização e complexificação se realizam pelos diversos métodos: “a ciência que
explica tudo não explica nada” (POPPER) e “aquilo que é simples, é por princípio, falso” (BACHELARD); b) a linguagem
exata e rigorosa; c) o saber certo é um saber público por exprimir o sentido epistemológico e não político; d) a privisão ou
antecipação de eventos; e) o controle seja dedutivo ou indutivo.
2
Heródoto (Herádotus) de Halicarnasso (485 a 420 a.C.). Historiador grego, “Pai da história” e reconhecido,
também, na etnografia e antropologia. Foi o primeiro historiador que narrou a origem do alfabeto em Biblos. Sua obra
As histórias de Heródoto, dividido em 9 livros intitulados segundo os nomes das musas, em que os primeiros 6
relatam o crescimento do Império Persa, desde Croesus de Lydia e Cyrus até a Batalha de Maratona; os últimos 3
livros descrevem a tentativa do rei Persa de vingança. Essa obra foi reconhecida como uma nova forma de literatura não
apenas por registrar o passado, mas por considerá-lo como um problema objeto de reflexão filosófica ou um problema
de pesquisa (problema que ele considerava sinônimo de história) que podia revelar conhecimento do comportamento
humano (HERÓDOTO DE HALICARNASSO, 2005).
3
O papiro é uma planta aquática (Cyperus papyrus) que se encontra, principalmente, no delta do rio Nilo, Egito, cujo talo
pode atingir até 6,0 metros de comprimento; era considerada uma planta sagrada utilizada, em especial, na produção de
“papel”: rolos de fibras que eram submersos, durante vários dias, em água com vinagre para eliminar o açúcar, sendo
secas sob pressão: os “pergaminhos” utilizados para escrita eram rolos que mediam 0,25m de altura e 11m de
cumprimento, alcançando até 30m e onde a escrita era sem separação das palavras nem pontuação; as folhas,
denominadas de cólemas, eram coladas umas as outras, precedidas da primeira ou protocollon. A técnica foi
desenvolvida em torno de 2.200 a. C. (PAPIRO, 2005; complementado).
4
Siddhãrtha Gautama (556 – 483 a.C.). Nascido em Kapilavastu (Lumbini), Nepal. A palavra Buda significa aquele
que sabe, que despertou para a verdadeira natureza dos fenômenos; iluminismo interior, estado mental de quem atinge a
perfeita sabedoria de todas as coisas no nirvana ou eterna paz e realização total da sabedoria. Os principais pontos da
filosofia de Buda são: temporalidade; desprendimento; e insatisfação ou sofrimento. As verdades são: a existência do
sofrimento; a causa do sofrimento: apego às coisas, cobiça, raiva etc.; extinção do sofrimento: desapego: caminho que
leva a extinção do sofrimento (BUDA, 2005).
5
Confúcio (孔夫子) ou Kung-Fu-Tze; é a forma latinizada que quer dizer Grande Mestre, filósofo e teórico político
Kong (551-479, a.C.). No final de sua vida, além do ensino, dedicou-se a editar clássicos: são os livros sagrados, os seis
Jing (Shi Jing: cânticos; Li Jing: ritos; Shu Jinng: escrituras seletas; Chun Qiu: eventos de sua província, Lu; Yi Jing:
mutações; e Yue Jing: música) que possibilitaram a transmissão da tradição chinesa. Os quatro livros da Escola de
Confúcio (Lun Yu: Anacletos; Da Xue: grande estudo; Zhong Yonh: harmonia; e Livro de Méncio). No
Confucionismo não existia um Deus Criador, nem uma igreja organizada (...), orientando-se para a solução profunda de
agitações de seu tempo com a escolha do melhor caminho, o do meio, o do equilíbrio e harmonia (...). Sua filosofia pode
ser sintetizada em sete palavras: Jen: humanitarismo, cortesia, bondade, benevolência; (Anacleto); Chun-tzu: o homem
superior e viril que para ser perfeito deve ser humilde, magnânimo, sincero, amável; somente assim poderá transformar a
sociedade em um estado de paz, reconhecendo, porém, que a realidade é outra, egoísta, soberbo etc.; Cheng-mig: para
que a sociedade esteja em ordem, cada um precisa ter um papel, um título designativo: o rei com rei; o pai como pai, o
filho como filho; Te: poder e não a força física, autoridade para inspirar os outros; Li: padrão de conduta exemplar e
Wen: artes nobres como música e poesia. O ser humano, conforme o Confucionismo é composto por quatro dimensões:
o Eu, a comunidade; a natureza; e o céu e por cinco virtudes essenciais: o amor ao próximo; a justiça; o cumprimento
das regras de conduta, a autoconsciência da vontade do céu e a sabidoria e sinceridade desinteressada, sendo a
desobediência à piedade o único sacrilégio. Ensinava que o ser humano deve cultuar seus antepassados, de forma a
perpetuar o mesmo respeito e amor que tem por seus pais vivos Escreveu: os cinco clássicos (Livro dos documentos:
organização política de cinco dinastias da China. Livro das mutações: metafísica. Livro das cerimônias: visão social.
Livro das poesias: antologia e religião e Anais das primaveras e outonos: história da China) e quatro livros (Grande
aprendizado: ensinamento sobre a virtude. Doutrina do meio: ensinamento sobre moderação. Anacletos: máximas e
princípios éticos e Mêncio) (FILOSOFIA VIRTUAL, 2005). Exemplos de suas máximas são: A maior glória não é ficar
de pé, mas levantar-se cada vez que se cai. A natureza dos homens é a mesma, são os seus hábitos que os mantém
separados. Escolha um trabalho que você ame e não terás que trabalhar um único dia em sua vida. A virtude da
humanidade consiste em amar os homens; a prudência, em conhecê-los. Aquele que cometeu um erro e não o corrigiu,
está cometendo outro erro. O homem de bem exige tudo de si próprio; o homem medíocre espera tudo dos outros. O que
eu ouço, esqueço; o que eu vejo, lembro; o que eu faço, aprendo.
6
Eudemo (350 a 290 a.C.); matemático grego nascido em Rodes do qual se conhecem três obras: História da
aritmética; História da geometria (pré-euclidiana) e História da astronomia.
7
Uma das doze cidades jônicas (no sul da Jônia) na Ásia Menor, a mais próspera, ativa (e turbulente: dissid^Çencias,
conflitos e revoluções eram comuns) e comercial entre o oriente e Egito, e onde se estabeleceu um centro comercia em
Náucratis; a cidade fui destruída em 494 a.C, por sediar a frustrada revolução contra o domínio Persa, estendida entre
499 a 94 a.C., quando o rei Dario I a destruiu.
8
Aos sábios da Grécia Antiga se atribuíam frases e preceitos famosos por todos conhecidos e repetidos. Foram criadores
de mitos como Hesiodos ou Homero, profetas como Epimênides de Cnossos, intérpretes de tradições religiosas,
juristas e poéticas, entre outros. A tradição destacou sete sábios: 1) Tales de Mileto; ao ser questionado sobre oque é
mais antigo: Deus porque sempre existiu; o mais belo? O unioverso, porque é obra de Deus; o mais constante? A
esperança, porque permanece, mesmo depois de se perder tudo; o melhor?A virtude, porque sem ele nada existe; o mais
rápido? O pensamento; a mais forte? A necessidade, poirque com ele se enfrenta os perigos; o mais fácil? O conselho; o
mais difícil? Conhecer-se a se mesmo. 2) Periandro de Corinto, um dos mais antigos tiranos da cidade, com fama de
sanguinário, porém a cidade prosperou durante o seu governo. 3) Pítaco de Mitilene; famoso por sua feiúra física;
tornou-se governante de Mitilene, após depor o tirano local; afastou-se voluntariamente do poder. 4) Bias de Priene;
era dotado de grande eloquência e se distinguiu nas defesas pronunciadas diante dos juízes de sua cidade; escreveu
poemas. 5) Cleóbulo de Lindos: foi poeta e compunha em versos. 6) Sólon de Atenas; autor da lei que liberou da
servidão os cidadãos atenienses escravizados por dívidas; foi o responsável pela reconquista da ilha de Salamina
dominada pelos megarenses; foi poeta lírico; compôs, principalmente, elegias morais e filosóficas. 7) Quílon de
Esparta; foi, além de poeta, um dos mais poderosos representantes da cidade; consta que utilizava até a mitologia para
justificar a posição de Esparta na liderança política do Peloponeso (TASO, 1996).
9
Andler, Fagot-Largreault e Sain-Sernim (2005), no início de sua obra Filosofia da ciência, a gnoseologia,
consideraram que, sob diversas formas que variaram desde os pré-socráticos até a “filosofia da natureza coloca uma
mesma questão fundamental: como nasce, vive e morre o que existe? É possível penetrar nas operações da natureza? A
mente é capaz de discriminar entre construções mentais imaginativas e representações que informariam fielmente sobre
a realidade?” Apontam que nos últimos quatro séculos, com o desenvolvimento da ciência moderna, as respostas são
encontradas em três tradições de filosofia da natureza: o materialismo, o vitalismo e o racionalismo. A filosofia da
natureza tem como “tarefa elaborar uma visão sistêmica da realidade que seja compatível com os resultados da ciência”
e que sustente ideias, fazeres e seres. “Encarar as coisas assim é postular que, para discernir o lugar e a destinação de
liberdade e bem-estar é necessário cumprir uma peregrinação através das ciências da natureza” Refletir sobre como
funciona a natureza e como se geram as “coisas”, sem contentar-se em discernir de forma erudita sobre enunciados de
observações ou sobre estruturas lógicas de teorias não é suficiente. É preciso, conforme a realidade e tecnologias que ela
suscita, saber sobre quais modalidades as ações humanas se inserem nos processos naturais. Incita-se, nesta obra, a
pensar sobre tais assuntos: como é a natureza, como faz para realizar o que ela produz; como intervir nela protegendo
suas fontes (...). Para tal propósito se apresentam, na primeira parte, elementos da história, evolução e características de
métodos científicos como os de Bacon, Descartes, Popper (...); do racionalismo de Newton, da filosofia da ciência
de Herschel, do naturphilosophic de Hegel, Kant (...), do fato social de Weber, entre outros.
10
Silogismo (do grego antigo συλλογισμός, conexão de ideias, raciocínio; composto pelos termos σύν, com e λογισμός
cálculo). Um tipo de raciocínio dedutivo, formalizado por Aristóteles em que se juntam três termos, ligados dois a dois,
dispostos em três proposições: duas premissas e uma conclusão. Com esse termo Aristóteles designou a argumentação
lógica perfeita Um exemplo de silogismo se encontra na seguinte frase de Sócrates, de um diálogo com seu filho
Lâmpocles, em relação conflituosa com a mão Xantipa, de difícil temperamento: “É ingratidão [como o ato de] não
reconhecer os benefícios recebidos, sendo a injustiça tanto mais clamorosa quanto maiores tenham sido os benefícios
prestados (princípio geral). Ora, prossegue no argumento, os pais proporcionam grandes benefícios aos seus filhos
(enumera como prova da premissa). Logo, concluía, deve-se ter [o filho] gratidão para com os pais” (SILOGISMO,
2005; COMTE-SPONVILLE, 2003, p. 550).
11
A versão nova do Juramento de Hipócrates, conforme a Declaração de Genebra da Associação Médica Mundial, em
1948 e tida como declaração deontológica é: Eu, solenemente, juro consagrar minha vida a serviço da Humanidade.
Darei como reconhecimento a meus mestres, meu respeito e minha gratidão. Praticarei a minha profissão com
consciência e dignidade. A saúde dos meus pacientes será a minha primeira preocupação. Respeitarei os segredos a
mim confiados. Manterei, a todo custo, no máximo possível, a honra e a tradição da profissão médica. Meus colegas
serão meus irmãos. Não permitirei que concepções religiosas, nacionais, raciais, partidárias ou sociais intervenham
entre meu dever e meus pacientes. Manterei o mais alto respeito pela vida humana, desde sua concepção. Mesmo sob
ameaça, não usarei meu conhecimento médico em princípios contrários às leis da natureza. Faço estas promessas,
solene e livremente, pela minha própria honra.
12
Na Grécia Antiga o phármakon designava ao mesmo tempo o remédio e o veneno, sem possuir uma virtude própria; não
se constituía apenas uma substância ativa presente na droga, mas compreendia, também, a pessoa que a administrava,
destacando-se, assim, uma relação entre o terapeuta que a prescrevia e aquele que a administrava, como partes
importantes do tratamento.
13
Christian Friedrich Samuel Hahnemann (1755-1843). Nascido em Meissen, Saxônia, Alemanha. Estudou medicina
em um dos “melhores” centros da época, porém, segundo sua avaliação, apenas contemplava disciplinas teóricas, com
descuido do doente. Era a tendência de dar mais importância à teoria que à prática, o que explicaria o atraso científico.
Ao traduzir obras de medicina e química lhe permitiu estudar detalhes nesses campos, praticados na escola médica de
Viena que tornavam importante a observação e ensino clínico junto do doente. Depois se dedicou as experimentações
químicas e farmacêutico – médicas. Ao considerar, p.ex., a cura da malária pela quina (Coutarea hexandra, Schum) não
poderia ser pelo sabor amargo (...), mas por causa dos efeitos, enunciou o princípio da semelhança. Depois de diversas
experimentações estabeleceu os princípios da homeopatia compilados em suas obras Matéria médica pura, A
medicina da experiência (Organum da arte de curar). A lição mais importante é o de uma medicina mais humana e
coerente.
14
O mito mais célebre de Platão; encontra-se no livro VII da República. Nesse mito o autor descreveu prisioneiros
acorrentados numa caverna, de costas para a luz, incapazes até de virar a cabeça: só podem enxergar a parede rochosa
diante deles, na qual um fogo que eles não vêem projeta sombras fugazes e intangíveis das ideias; (..). Como nunca
viram outras coisas, consideram as sombras seres reais. Mas, seria diante do sol que desfilariam as coisas verdadeiras;
eles, por estarem às costas dessas coisas, não poderiam observá-las diretamente. Um desses prisioneiros é forçado a sair:
fica ofuscado a tal ponto que, de início, não consegue distinguir nada; tem que voltar para à caverna, onde a escuridão é
que o cega (...). Assim é a realidade em que apenas se conhecem sombras do real; as coisas observadas, mutáveis,
perecíveis (...); não são ideias, não são realidades, mas, apenas vir-a-ser, como pensava Heráclito, contudo, sem negá-
lhe a existência. São imagens enfraquecidas da realidade objeto de opinião e não o fruto da ciência. Ignora-se o mundo
verdadeiro, o mundo inteligível e o sol verdadeiro que o ilumina (a ideia do bem). Os raros que se aventuram a contemplar o
mundo inteligível passam de uma ofuscação, quando sobem em direção às ideias, para o obscurantismo, quando, ao retornar,
descem à caverna (...); por isso são julgados ridículos. O autor, com o mito, por analogia, procurava o entendimento de que o
que é essencial, verdadeiro, o bem, está em outro lugar que se oferece apenas ao pensamento. O mito é idealista por excelência,
o que condena o real, desvaloriza o corpo e a sensação e destaca o valor da transcendência, das ideias (PADOVANI e
CASTAGNOLA, 1972; COMTE-SPONVILLE, 2002; p. 98-99).
15
Francisco Redi (1624-1694). Foi o primeiro, em sua obra Experiências sobre a geração de insetos, a rejeitar a
teoria da abiogênese aristotélica, ao provar que larvas não nasciam em carne que ficasse inacessível às moscas, protegida
por telas, de forma que elas não pudessem colocar seus ovos. Considerou que a geração espontânea teria ocorrido apenas
durante os primórdios da Terra. Em sua hipótese reconheceu alguns erros na metodologia utilizada como, p.ex., o fato de
as tampas dos frascos que impediam o acesso das moscas impedia, também, a entrada e renovação do ar no interior dos
frascos; talvez impedisse que o princípio ativo propiciasse a geração espontânea dos vermes; para superar essa falha,
aperfeiçoou o experimento, substituindo a tampa por gaze, possibilitando a entrada do ar; contudo o resultado foi o
mesmo.
16
Kaspar Friedrich Wolff (1733-1794). Nascido em Berlin. Médico alemão tido como um dos fundadores da
embriologia. Em sua obra Theoria generationis apresentou os fundamentos da moderna embriologia com sua teoria da
epigênese. Contra o pré-formismo sustentava, com base em observações precisas, que a partir de um embrião se
desenvolviam os diversos órgãos de um tecido, inicialmente homogêneo e indiferenciado, admitindo-se que esse
processo se devesse a uma força inicial essencial de organização.
17
Por escolástica (do lat. scholastíìca, no sentido de declaração). Entende-se como sendo o pensamento cristão da Idade
Média, baseado na tentativa de conciliação entre um ideal de racionalidade, corporificado na tradição grega do
platonismo e aristotelismo. É a experiência de contato direto com a verdade revelada, tal como a concebe a fé cristã. O
escolasticismo ou o ensino teológico-filosófico da doutrina aristotélico-tomista, ministrado em escolas de conventos e
catedrais e em universidades européias da Idade Média e do Renascimento, caracterizado pelo abuso do silogismo, no
verbalismo das fórmulas abstratas (daí seu sentido pejorativo). Como sistema filosófico e teológico, a escolástica tentou
resolver, a partir do dogma religioso e mediante um método especulativo, problemas como a relação entre fé e razão,
desejo e pensamento; a oposição entre realismo e nominalismo; e a probabilidade da existência de Deus. A história da
escolástica apresenta-se, como a história da razão humana em determinado momento de sua evolução, exprimindo
inicialmente a alienação, na sujeição ao dogma. Em seguida, a consciência da alienação, na doutrina das duas verdades.
E finalmente, a negação da alienação, na ruptura entre razão e fé, com na afirmação de que o real, em sua totalidade,
natureza e história, é racional. A decadência da escolástica, no século XIII, exacerbou seus caracteres formais. A partir
de Ockham as verdades da fé foram consideradas inacessíveis à razão, à filosofia, que procurava compreender e
explicar essas verdades. Dessa forma, converteu-se numa discussão de textos e temas que perderam vigência histórica. A
escolástica representou o último período do pensamento cristão (início do século IX, até o fim do séc. XVI), depois de
passar por um período místico e dialético. Nesse período, destacaram-se: São Pedro Damião (Papa Gregório VII) que
escreveu Da Divina Onipotência; Santo Anselmo (1033-1109) que escreveu o Monologium; seu lema era: creio para
compreender; e Pedro Abelardo (1097-1142), que escreveu História das Calamidades, Dialética; Conhece-te a ti
mesmo, um ensaio ético de valorização da vida moral. (A ESCOLÁSTICA, 2005).
18
O empirismo (do gr. empeiria, que significa experiência). É a doutrina (escola de epistemologia, na filosofia) que
reconhece a experiência (ver Tabua rasa de John Locke) como única fonte válida de conhecimento (próximo do
materialismo e do positivismo) recebida e experimentada pelos sentidos, em oposição ao racionalismo que se baseia na
razão. Em termos gnosiológicos, o que caracteriza e define a validade de uma afirmação, segundo o empirismo, é a
experiência sensível. Em termos de pesquisa, é a dependência da evidência e onde as representações do conhecimento
provêm de experiência e de observações (sendo, por isso, o fulcro do método científico moderno), embora sejam
organizadas pela razão. Considera, também, as hipóteses estabelecidas e testadas por métodos empíricos. Seu principal
axioma é: nihil est in intellectu quod prius non fuerit in sense ou nada existe no intelecto que antes não tenha estado nos
sentidos. Empiristas como Locke, Hume, Condillac e Stuart Mill, consideraram que o conhecimento empírico, obtido
pelos sentidos, é suficiente para conhecer a verdade. Nem sempre é fácil diferenciar o empirismo do ceticismo; o
empirismo não participa da dúvida, das múltiplas ramificações desde o fenomenismo de Hume até o imaterialismo de
Berkeley, do próprio positivismo (...). Contudo, alguns filósofos da ciência procuram caracterizar o materialismo
mediante conceitos como: não há ideias inatas nem conceitos abstratos; o conhecimento se reduz às impressões sensíveis
(obtidos por meio dos órgãos dos sentidos) que são subjetivas; as relações entre as ideias se reduzem a associação, como
é o caso da causalidade; e o conhecimento é limitado aos fenômenos (EMPIRISMO, 2005; OLIVEIRA, 2005;
complementado).
19
A peste bubônica (peste negra, peste pneumônica: infecção dos pulmões, peste septicêmica: multiplicação bacteriana no
sangue) é causada pela bactéria Yersínia pestis (bacilo gran negativo sensível à luz solar) que, apesar de ser comum entre
roedores como o rato (Rattus spp. / Holochilus spp.) e o esquilo (Sciurus vulgaris), pode ser transmitida por suas pulgas
(Xenopsylla cheopis) para o homem, o que poderá acontecer em epizootia. A via de contaminação é por contato direto e
pela picada da pulga do rato contaminado, através da pele e pelo trato respiratório humano. Em geral todos os mamíferos
são susceptíveis (PESTE BUBÔNICA, 2005).
20
Abu Ali al-Hasan Ibn al Haytham / Alhazen (965 – 1039; Nascido em Basra, Iraque. Educado em Baghdad. Físico e
matemático; exerceu grande influencia em R. Bacon e Kepler; pioneiro com seus experimentos em ótica: descobriu as leis da
refração, dispersão – decomposição da luz em cores; densidade da atmosfera e a relação com a altura –pressão atmosférica-, a
refração atmosférica etc. Suas contribuições em matemática e física foram também extensas; em matemática desenvolveu a
geometria analítica ao estabelecer a relação entre álgebra e geometria. Em suas pesquisas aplicou um método científico,
conforme consta em suas obras Kitab at-Manazir / Opticae thesaurus Alhazeni. Depois de Ptolomeu foi um dos primeiros a
explicar os fenômenos dos corpos celestes. Teve a ideia, levada ao Califa Hakim, que com a construção de barragem no rio
Nilo poderia se armazenar água para irrigação e controlar enchentes em outros períodos; essa proposta foi precursora da
represa do Assuam. Grande parte de sua vida foi dedicada a realizar experimentos em pesquisas de diversos campos
(MÉTODO CIENTÍFICO, 2005; HISTORIC FIGURES, 2005; e ALHAZEN, 2005).
21
A escola nominalista surgiu como uma possível solução à questão do conceito, da ideia ou essência comum a todas as
coisas. O conceito é apenas um ato simples da mente expresso com um nome? Três soluções surgiram: o realismo:
afeição ideológica ou doutrinária á realeza, à monarquia; o conceitualismo: doutrina medieval formulada por Abelardo
(1079 – 1142), que atribui aos conceitos ou ideias gerais a concretude específica que os distingue de meras abstrações ou
sinais linguísticos, apresentando-os como formas reais e existentes, porém, apenas na mente humana; e o nominalismo:
doutrina medieval que afirmava a irrealidade e o caráter apenas abstrato dos conceitos caracterizados como nomes ou
entidades linguísticas, porém, sem existência autônoma, ou simples meios convencionais para a compreensão dos
objetos singulares.
22
Johannes Gensfleisch zur Laden zum Gutenberg (1390 – 1488). Naceu em Mogúncia, Alemanha. A ele se deu o crédito
da invenção da impressão e tipografia (as técnicas de impressão foram desenvolvidas, inicialmente, na China; o livro impresso
mais antigo foi em 868; a impressão tipo móvel foi, também, feita por um chinês, Pi Scheng, em 1041 a 1049), quando
substituiu as pranchas xilográficas por caráteres móveis de madeira, depois pelo cobre e, finalmente, pelo aço. Criou um
processo que consistia em cunhar letras em matrizes, em punções com letras gravadas em relevo, montados em uma base de
chumbo fundido, tintados e prensados. Dessa forma, Gutenberg produziu o primeiro livro impresso, a Bíblia (180 exemplares
com 1282 páginas cada um, a duas colunas). As mudanças econômicas, culturais e tecnológicas da época, a partir do século
XV, o desenvolvimento da metalurgia, o fabrico do papel e, principalmente, a explosão intelectual ocorrida com a Renascença,
possibilitaram o surgimento das primeiras imprensas. A invenção da imprensa de caracteres móveis revolucionou o século XV
e mudou a história das ideias, ao permitir sua disseminação com a reprodução de livros
23
Aristarco (320 – 250 a.C.). Nascido em Samos, Grécia. Admirado pelas suas conclusões sobre a organização do sistema solar
que, apesar de simples, são coerentes. Até aquela época, as concepções mais avançadas eram as de Pitágoras e de Heráclides:
as estrelas eram imóveis e a Terra se localizava no centro do universo, com rotação. Afirmava que todos esses corpos (a Terra,
Mercúrio e Vênus) poderiam ser facilmente descritos ao admitir que girassem em torno do Sol: Sobre os tamanhos e as
distâncias do Sol e da Lua.
24
A exploração do universo, no início do século XXI, continua, porém, usando meios científicos (p.ex., base na mecânica
quântica) e tecnológicos que Copérnico jamais imaginou como o Telescópio Internacional Ultravioleta Explorer e
supercomputadores para tratar informações que escapam de um buraco negro na geometria do espaço-tempo medida.
25
O Rei da Espanha Alfonso X, o Sábio, convocou, em 1252, 50 astrônomos para revisar as tabelas astronômicas
calculadas por Ptolomeu que incluía a posição dos planetas no sistema geocêntrico; os resultados foram publicados com
o nome Tabelas Alfonsinas.
26
O próprio método científico se encarrega de eliminar os julgamentos pessoais em um experimento e de impedir, no
longo prazo, que dogmas sejam formados. Nesse sentido se manifestou Einstein: "Minhas ideias levaram as pessoas a
reexaminar a física de Newton. Naturalmente alguém um dia irá reexaminar minhas próprias ideias. Se isto não
acontecer haverá uma falha grosseira em algum lugar."
27
O nome botânico do pau-brasil Cesalpinia echinata foi dado por Lamarck em homenagem ao botânico André
Cepalpino.
28
Evangelista Torricelli (1608-1647), em estudos e teorias do vácuo, teve a ideia de substituir a água por mercúrio (Hg);
no experimento utilizou um tubo fechado numa das extremidades cheio de mercúrio e colocado por cima de uma tina
que continha igualmente mercúrio; observou que a coluna de Hg descia no tubo e parava sempre à mesma altura (± 760
mm), deixando por cima um espaço vazio, sem Hg; atribuiu, corretamente, a causa do fenômeno à pressão atmosférica
sobre a superfície do Hg. Para que a descoberta da pressão atmosférica sobre a superfície de Hg fosse reconhecida foi
preciso esperar os resultados de Pascal e a experiência realizada por Florim-Périer no sopé da montanha de Puy-de-
Dome.
29
Conforme a teoria do associacionismo, com raízes na filosofia de John Locke, o pensador [o pesquisador], perante um
problema, apela para a combinação de ideias, até chegar a um arranjo que lhe permita resolver o problema; essa
combinação é uma nova ideia. Dessa forma, o pensamento criador seria a ativação de conexões mentais contínuas até o
surgimento de certa combinação “aceitável”; daí decorre que quanto mais associação tenha uma pessoa, mais ideias terá
a sua disposição e mais criativo será seu pensamento (KNELLER, op. cit.).
30
Spinoza não só ensinou sua filosofia, como também viveu suas próprias máximas, tais como: “dos prazeres fazer uso
só do necessário para conservar a saúde”; “adquirir dinheiro ou outros bens só na medida necessária para subsistir e
conservar a nossa saúde e para adaptar-se a uma vida social que não seja contraria aos nossos fins"; “aceitar a alegria
como um bem em si e rechaçar a tristeza porque nos deprime"; “quanto maior a alegria que nos invade, tanto maior é a
perfeição que alcançamos” aprender a sorrir diante do inevitável e "quer receba o que lhe é devido agora ou dentro de
mil anos, permanece contente". Com o determinismo se teria uma vida moral melhor: ensina-nos a não desprezar ou
ridicularizar ninguém (...); os homens "não são culpados"; e ainda que punamos os canalhas, será sem ódio; nós os
perdoamos (...). Acima de tudo, o determinismo fortalece-nos para acolher as duas faces da fortuna com igual espírito;
lembramo-nos de que todas as coisas sucedem conforme as leis eternas de Deus.
31
O iluminismo atribuía à razão a capacidade de explicar os fenômenos naturais e sociais e a própria crença religiosa. A
razão humana seria a luz capaz de esclarecer qualquer fenômeno. Esse movimento representou a hegemonia intelectual
burguesa européia, rejeitando tradições, injustiças e intolerâncias religiosas, abrindo caminho para a Revolução Francesa
e dando início ao Renascimento. Surgiu numa época de grandes transformações tecnológicas na transição do feudalismo
para o capitalismo. Para os teóricos do iluminismo o homem é naturalmente bom e todos nascem iguais, sendo
corrompido pela sociedade em consequências de injustiças, opressão e escravidão. A sociedade deveria ser norteada pelo
princípio da busca da felicidade, cabendo ao governo garantir os direitos naturais: liberdade individual, direito de posse,
tolerância e igualdade perante a lei. Os precursores do iluminismo foram: René Descartes e Isaac Newton; os
filósofos do iluminismo foram: John Locke (pai do iluminismo), Voltaire, Rousseau, Montesquieu, Diderot e D
´Alembert, entre outros.
32
A vasta obra de Euler compreende em torno de 100 volumes; a obra completa estava sendo editada pelo governo suíço,
no final da década de 90, em quatro séries: a série I, com 29 volumes, trata de assuntos relacionados com matemática
pura; a série II, com 31 volumes, compreende a mecânica e astronomia; a série III, com 12 volumes, aborda assuntos de
física e outros temas; e a série IVa, com 8 volumes, reúne a correspondência de Euler; a séria IVb, ainda não publicada,
deverá compreender seus manuscritos.(ZAMPANO, 2005).
33
O mercantilismo foi uma teoria e prática econômica que acompanhou o absolutismo na Europa nos séculos XVI a
XVIII, denunciado por A. Smith, em sua obra Wealth of nations / A riqueza das nações, que tinha como sustentação
econômica estoques o ouro e prata (o fortalecimento do Estado por meio da posse de metas preciosas), o comércio e a
indústria controlados; o país devia buscar exportar mais do que importar; as colônias deviam ser mantidas como
consumidoras de produtos da metrópole a, ao mesmo tempo, fornecedoras de matérias-primas para a metrópole. Para a
consecução dos objetivos mercantilistas, todos os outros interesses deviam ser relegados a segundo plano: a economia
local tinha que se transformar em nacional e o lucro individual desaparecer quando assim conviesse ao fortalecimento do
poder nacional Os principais promotores do mercantilismo foram Thomas Mun (Inglaterra), Jean-Baptiste Colbert
(França) e Antonio Serra (Itália).
34
A escola fisiocrática surgiu como reação ao mercantilismo, no século XVIII e é tida como a primeira escola de
economia científica; não é apenas uma escola do pensamento econômico, mas, também uma escola de ação política, cuja
ideologia inspirou enciclopedistas e aspectos da Revolução Francesa. Tem a ideia fundamental de governo da natureza e
liberdade de ação, a ciência da ordem natural e parte dos sistemas de direito natural, com a pretensão de construir não
apenas um sistema econômico, mas, uma sociologia geral. O promotor dessa revolução contra o mercantilismo foi
François Quesnay, apresentada em sua obra Tableau economique / Quadro econômico, onde mostrou as relações
entre as diferentes classes econômicas e setores da sociedade, o fluxo de pagamentos entre eles e criou o conceito de
equilíbrio econômico. Exemplos de algumas ideias: os resultados da livre concorrência são benéficos; refuta a ideia de
uma balança comercial favorável por entender que a acumulação de dinheiro eleva os preços; a tarifa alfandegária é
prejudicial, muitas vezes, ao país que a estabelece; só a agricultura é produtiva porque só ela tem a possibilidade de
gerar riquezas superiores à que consome.
35
Ferrari (1982; p. 21) sintetiza a causalidade de Hume explicitada pelas seguintes regras: a) a causa e o efeito devem ser
contíguos no tempo e no espaço; b) a causa deve ser anterior ao efeito; c) deve existir uma união constante entre causa e
efeito; d) uma mesma causa sempre produz um mesmo efeito, e um mesmo efeito nunca atenderá uma mesma causa; e)
quando diversas causas produzem um mesmo efeito pode ser pela presença de alguma qualidade comum entre elas; f) a
diferença entre dois conjuntos de causas serem devidas às diferenças particulares entre elas; g) quando um efeito
aumenta ou diminui conforme seja o aumento ou diminuição de sua causa pode ser um resultado composto da união dos
diversos e diferentes efeitos das diversas e diferentes partes da causa; h) um objeto que existe por algum tempo sem
nenhum efeito precisa ter um princípio que possa ajudar sua influência e operação. Segundo Cícero, citado por Andler,
Fagot-Largeault e Saint-Sernin (2005; p. 658), a noção de causa “serve para tornar inteligível um processo temporal (...);
a causa é o que produz efetivamente isto de que á a causa, como o ferimento é a causa da morte (...). O princípio da
causalidade especifica, o que não é evidente por si mesmo, que o campo de aplicação da relação causal é universal e que
as mesmas causas produzem os mesmos efeitos”; significa que a pesquisa pelas causas é, com frequência, objeto de
contestação, ao ser difícil estabelecer a filiação causal.
36
Johann Wolfgang Goethe (1749-1832). Nascido em Frankfurt, Alemanha. Estudou na Universidade de Leipzig,
direito, desenho, pintura. Escritor (uma das mais importantes figuras da literatura alemã e do romantismo europeu),
filósofo e cientista em campos diversos como a ótica, geologia, mineralogia, botânica e zoologia, com importantes
descobertas: na anatomia comparada, a do osso intermaxilar (humano), elaboração de uma teoria das cores alternativa a
do físico Newton (Teoria das cores); sua visão da natureza concebida como uma totalidade orgânica e viva em
conexão com o mundo espiritual; e aspectos da percepção emocional e psicológica. Em todos os domínios trabalhou
com dois conceitos básicos: arquétipos (ideias universais que conferem coerência à natureza) e metamorfose (variedade
das formas individuais). Autor de obras como Fausto, Os sofrimentos do jovem Werther.
37
O termo mecanicismo (origem em Demócrito) denomina a filosofia formulada na primeira metade do século XVII para
significar . Segundo essa concepção, a realidade teria uma estrutura comparável à de uma máquina e todos os fenômenos
naturais, incluindo os seres vivos, seriam susceptíveis de serem reduzidos a um sistema de determinismos mecânicos ou
a um conjunto de mecanismos, a tal ponto que tudo se pudesse explicar, como pretendia Descartes, por meio de
“grandezas, figuras e movimentos”. Nesse contexto, a realidade física se identificaria com um conjunto de partículas que
se agitam e se entrechocam; o objetivo da ciência seria elucidar certo fenômeno e descobrir as leis que regem sua
natureza (JAPIASS, 1991). Um dos grandes responsáveis por essa epistemológica foi Galileu com uma linguagem
matemática em um universo desprovido de atributos míticos, sem “anjos nem demônios” do esquema astrobiológico
dominante em sua época; ao contrário, o universo seria concebido como de relações inteligíveis numa linguagem
cifrada: “o mundo escrito em termos matemáticos”. O mecanicismo é, dessa forma, a doutrina que pretende explicar
tudo da natureza apenas pelo mecânico: no sentido científico, pelo estudos das forças e dos movimentos, próximo do
materialismo.
38
Carl Menger (1840 – 1921). Nascido em Nowy Sacz (Nova Sandec), Polônia, Áustria. Estudo na Universidade de
Viena. Economista e fundador da Escola Austríaca; foi um dos três lideres do “marginalismo”, junto co Jevons e
Walras. Desenvolveu a teoria subjetiva do valor, ligando-o à satisfação dos desejos humanos e o individualismo
metodológico, uma das mais importantes contribuições para a metodologia das ciências sociais, como sendo: um
postulado heurístico a priori; suspeita de agregados macroeconômicos (p.ex., PIB e índice geral de preços); rejeição de
testes quantitativos como os de previsões e econométricos; a crença de que se aprende mais do estudo do processo de
convergência dos mercados para o equilíbrio do que de análises sem fim. Afirmava que as trocas em economia ocorrem
porque os indivíduos têm avaliações subjetivas diferentes de um mesmo bem. Foi o primeiro a estabelecer a distinção
entre bens livres e bens econômicos no conceito de escassez. Uma das características de sua obra é o fato de atribuir
mais importância à descrição cuidadosa de um fenômeno do que em designá-lo em termos simples e adequados; dessa
forma e apesar de impedi-lo de se expressar com vigor, o preservou de unilateralidade e da tendência à simplificação;
um exemplo disso foi a formulação da teoria marginal: a intensidade decrescente da necessidade individual com o
aumento do atendimento dessas necessidades, no contexto da teoria pura sobre o valor-subjetivo; apesar do valor ser
mensurável, significa que tal valor se pode representar pelo valor de qualquer outro bem de valor igual, expressa por
escalas de utilidade. Este princípio é fundamental para o caso de existir mais de um bem para assegurar o atendimento
de uma necessidade: bens complementares e bens de ordens diferentes. Em sua principal obra Príncipes déeconomie
politique / Princípios de economia política, com grande influencia sobre o pensamento econômico, apresentou: a
doutrina geral sobre os bens (cap. 1); a economia e os bens econômicos (cap. 2); as doutrinas sobre o valor (cap. 3),
sobre a troca (cap. 4) e sobre o preço (cap. 5); o valor de uso e de troca (cap. 6); e as doutrinas sobre a mercadoria (cap.
7) e o dinheiro (cap. 8).
39
Marie-Ésprit Leon Walras (1834 – 1910). Economista neoclássico e engenheiro francês. Junto com Pareto,
estabeleceu um a linha divisória entre economia pura e economia normativa. Foi o primeiro em sugerir que o
comportamento maximizador tanto do consumidor como do produtor pode e, sob certas condições, resultará em um
equilíbrio entre quantidades procuradas a quantidades ofertadas para todo produto e fator de mercado da economia,
sendo, também, um dos primeiros a elaborar uma teoria geral abstrata de equilíbrio econômico, combinando teorias de
valor e matemáticas; tal teoria, sustentada numa ampla análise estática, enfatiza a interdependência de fatos econômicos
substituindo o princípio de causalidade pela função recíproca: é a base da análise macroeconômica contemporânea. Seu
interesse foi, em especial, no equilíbrio via mecanismos de preço; em mercado competitivo, esse equilíbrio seria obtido a
partir de um preço no qual a oferta e a procura se igualassem. Em sua obra Eléments d´economie politique pure /
Elementos de economia política pura apresentou a teoria da utilidade marginal (teoria de troca e teoria de produção).
Entre outras obras, escreveu, Etude d´economie sociale / Estudo de economia social e Étude d´economie
politique appliqué / Estudos de economia política aplicada.
40
Alfred Marshall (1842-1924). Economista e matemático inglês; principal representante da segunda geração da escola
marginalista (escola de Cambridge). Professor de economia política em Cambridge e fundador da escola de Cambridge.
Precursor da economia do bem-estar. Publicou Teoria pura do comércio exterior, Teoria pura dos valores internos
e Elementos da economia da indústria. Sua principal obra foi os Princípios de economia, onde deu tratamento
mais científico à economia buscando formas de expressar a atividade humana; nessa obra, analisou as relações entre a
oferta (compreende o esforço e sacrifício dos produtores, refletidos nos preços de oferta) a demanda (compreende a
utilidade marginal expressa nos preços de procura dos compradores) e o valor, caracterizando o comportamento
econômico numa perspectiva hedonista, como o equilíbrio entre a busca da satisfação e a negação do sacrifício.
Elaborou as bases para importantes e contemporâneos conceitos de economia como os de excedente do consumidos,
valor de mercado, valor normal e os conceitos generalizados de elasticidades de oferta, de procura e de substituição. Na
teoria do equilíbrio de valor por ele apresentada está implícita uma teoria de distribuição. Com a introdução do fator
tempo na análise econômica estabeleceu a diferença entre os fatores que determinam os preços e aqueles que são
determinados pelos preços.
41
François Maggendie (1783 – 1855). Nascido em Bordeaux, França. Estudou anatomia e medicina. Pesquisador em
fisiologia, farmacologia e patologia; pai da fisiologia experimental e pioneiro nas experimentações do século XVIII,
baseado no método cartesiano (não consideravam o sofrimento do animal por ser visto como uma máquina). Pesquisou o
funcionamento das veias e artérias. Pioneiro em pesquisa sobre o efeito de drogas em vários pontos do corpo que
conduziram à introdução científica na prática médica do efeito de substâncias como a estricnina , morfina, quinina e
outros alcalóides. Deixou um sucessor, Claude Bernard.
42
Pierre-Joseph Proudhon (1809 – 1865). Nascido em Besançon, França. Principal anarquista francês, com permanente
influência e ideias opostas ao liberalismo, tais como: uma ciência da sociedade; denuncias de organizações econômicas,
governamental e educacional, prevendo a construção de sociedades cooperativas e do socialismo desenvolvido, depois,
por Marx e Engels; princípios de um sistema mutualista (aplicados na atualidade) ou de uma cooperação que eliminasse
o poder coercitivo do Estado; reorganização da sociedade tendo como princípio de tudo a justiça; essa justiça terminou
sendo a base de harmonia social. Em sua obra Qu´est-ce que la propriété / Que é a propriedade considerou que a
propriedade é um roubo porque a exploração da força de trabalho de semelhante por outro se define como roubo; nessa
obra se apresentou como anarquista. Depois publicou Advertissement aux propriétaimes / Advertências aos
proprietários Syst’eme das contradictions économiques / Sistemas de contradições econômicas ou Filosofia
da miséria. Ides générale de la révolution au XIX / Ideia geral de revolução no século XIX. De la justice dans
la révolutions et dans l´eglise / A justiça na revolução e na igreja. Du príncipe fédératif / Do princípio
federativo.
43
Doutrina filosófica que considera a matéria como a única realidade e nega a existência da alma, de outra vida e de Deus.
44
O conceito de dialética é utilizado por diversas correntes filosóficas com significados diferentes. No caso de Platão,
p.ex., o sentido da dialética é filosófico (sinônimo de filosofia): um método de aproximação entre as ideias particulares e
universais; o meio para atingir o verdadeiro conhecimento partindo do mundo sensível e atingindo o mundo das ideias.
Para Sócrates, é a técnica de perguntar, responder e refutar. Para Aristóteles é a lógica do provável, do processo racional
que não pode ser demonstrado. Para Hegel, o sentido é idealista, quando aborda o movimento do espírito. Para Kant, é a
lógica da aparência, uma ilusão porque é baseada em princípios subjetivos. Para Marx, é um método de análise da
realidade, que vai do abstrato ao concreto para oferecer suporte ao processo de abstração; é o meio esquemático de
explicação da realidade baseado na contradição (ou reflexão crítica-dialética) e choque entre situações diversas ou
opostas, diferente do método causal no qual se estabelecem relações de causa-e-efeito entre os fatos.
45
Charles Robert Darwin (1809 – 1882). Nascido em Shrewsbury, Inglaterra. Estudou medicina na Universidade de
Edimburgo; cursou história natural, geologia e teologia. Cientista naturalista que convenceu a comunidade científica da
ocorrência da evolução ao propor uma teoria para explicar como ela se dá mediante a seleção natural e sexual, com base
em observações (geológicas, fosseis, organismos vivos (...) e coleção metódica de um grande número de espécimes,
muitos deles novos para a ciência) de expedição no Beagle por quase cinco anos na América. Essa teoria se desenvolveu
no que é considerada como o paradigma central para explicar diversos fenômenos na biologia e precursos da biocenose.
Entre suas obras se destacam: On the origin of species by means of natural selection / A origem das espécies.,
introduziu o conceito da evolução humana a partir de um ancestral comum, mediante as seleções naturais, tornando-se a
explicação científica dominante para a diversidade de espécies na nattureza The Descent of man, and selection in
relation to sex / A descendência do homem e seleção em relação ao sexo. The expression of the emotions in
man and animals / A expressão da emoção em homens e animais.
46
Johann (Gregor foi o nome que adotou depois de entrar no monetário) Mendel / (1822 – 1884). Nascido em
Heinzendorf, Áustria. Estudou física, matemática e ciências naturais na Universidade de Viena, disciplinas que três anos
depois passou a lecionar em Brunn. Foi professor de ciências naturais.
47
Deve-se observar que não se trata de um caso isolado. Muitos livros e artigos que tratam do método científico e da
prática da pesquisa foram escritos por não-pesquisadores. As maiores contribuições ao método científico como as de
Francis Bacon, David Hume, John Stuart Mill, Karl Popper (...) foram de pensadores que não eram cientistas.
48
O médico Luigi Galvani, ao dissecar uma rã (experimento perna de rã), percebeu que faíscas de uma máquina elétrica
próxima, causavam contrações na perna da rã quando se encostava a ela o bisturi acreditando que se tratava de
eletricidade do animal; mais tarde Alexandro Volta demonstrou que a ação química da umidade e de dois metais
diferentes geraria um fluxo de corrente elétrica: era, por um acidente, a invenção da pilha elétrica de Volta. Beveridge
(1981), em sua obra Sementes da descoberta científica, no capítulo 2 (Acaso e oportunismo), cita numerosos
exemplos de serendipitude: um resultado inesperado, uma coincidência curiosa; o dom de encontrar coisas valiosas em
lugares inesperados por sorte; a faculdade de fazer felizes e inesperadas descobertas por acidente; encontrar algo que não
se buscava.
49
Para Durkheim a solidariedade é o conjunto de laços que prendem os indivíduos ao grupo; essa força pode ser de dois
tipos: a solidariedade orgânica, aquela onde os indivíduos são solidários uns com os outros basicamente devido às
semelhanças existentes entre si que não permitem diferenciá-los a ponto de chamá-los de indivíduos e onde a educação é
difusa, não havendo a figura de mestres; as ideias comuns ultrapassam em número e em intensidade as ideias e as
tendências individuais e não existe reciprocidade nas relações. O segundo tipo é a solidariedade mecânica, aquela em
que o indivíduo está diretamente ligado à sociedade, sem que haja intermediário; apresenta-se como um conjunto mais
ou menos organizado de crenças e sentimentos comuns a todos os componentes; é o tipo coletivo.
50
Johann F. Herbart (1776 – 1841). Nascido em Oldenburgo, Alemanha. Trouxe grandes contribuições à pedagogia
como ciência (ciência da educação), ao dá-lhe rigor a seu método. Foi precursor da psicologia experimental aplicada à
pedagogia. Segundo ele, o processo educativo se baseia, em seus objetivos e meios, na ética e na psicologia,
respectivamente. Seu sistema educativo é amplo e completo, aplicável desde a primeira infância até a adolescência, com
a aspiração, sobretudo, de formar o indivíduo, com uma proposta de educação altamente moral, a qual enfatiza que o fim
supremo da instrução é a moralidade e a virtude. Trata-se, segundo Herbart, de um processo de instrução moral onde o
principal resultado esperado é moldar os desejos e a vontade das pessoas. Sua foi concebida para ser aplicada no âmbito
da educação particular e não da educação pública. A ação pedagógica se orienta para três procedimentos: o governo
(forma de controle de agitação da criança, exercida pelos pais e depois, pelo professor); a instrução (principal
procedimento da educação, pressupondo o desenvolvimento de interesses) me a disciplina (manter a firma a vontade
educada mo caminho e propósito da virtude, supondo autodeterminação). Acreditava que o principal papel da educação
em uma sociedade era a aquisição de ideias por parte dos indivíduos. Não diferenciava a educação intelectual da
educação moral, mas uma: a educação através da instrução.
51
As teorias crítico-reprodutivistas de educação, de inspiração marxista, que passam a ver a escola numa perspectiva
crítica da sociedade, como reprodutora das relações sociais capitalistas; a escola como violência simbólica e aparelho
ideológico do Estado; segunda tais teorias, o trabalho educativo no interior da escola é para reproduzir as relações
sociais de dominação como, p.ex., a divisão social do trabalho.
52
Dewey, com relação à educação, acreditava que a “reflexão e ação devem estar ligadas, sendo partes de um todo
indivisível”; “a realidade é mutável e é a inteligência que dá ao homem a capacidade de mudar seu entorno”; “apenas em
um sistema democrático o homem pode desenvolver plenamente suas potencialidades criadoras e deixar florescer a
inteligência”; “o aprendizado se dá em grupo e a escola, portanto, deve proporcionar práticas conjuntas e promover
situações de cooperação e em vez de lidar com o aluno de forma isolada (...), deve-se preocupar com o sentido das
coisas, com o significado, com os sinais”; “a indisciplina expressa uma energia em desenvolvimento e o professor deve
procurar para onde esses impulsos se dirigem e transformá-los em meios de crescimento”; “a experiência educativa é
uma experiência reflexiva, que resulta em novos conhecimentos”; isso requer que o aluno esteja numa situação de
experimentação, que desenvolva atividades de seu interesse, que exista um problema a resolver, que possua os
conhecimentos para agir diante da situação e que tenha a chance de testar suas ideias.
53
Martin Heidegger (1889 – 1976). Filósofo alemão nascido em Messkirch, discípulo de Edmund Husserl e um dos
pensadores destacados do século XX quer pela recolocação do problema do ser e pela (re)fundação da ontologia, quer
pela importância que atribui ao conhecimento da tradição filosófica e cultural; considerava o seu método
fenomenológico (inflexão para desviar do ente para o ser, do que é para o como é; uma inversão da ontologia) e
hermenêutico (interpretar o que se mostra pondo a lume isso que se manifesta aí mas que, no início e na maioria das vezes,
não se deixa ver).
54
Duhen em sua obra o Système du monde / O sistema do mundo descreveu as condenações que resultaram do
decreto de 1277 do bispo de Paris, supostamente por ordem do Papa João XXI, para investigar as concepções filosóficas
da Universidade de Paris, anematizando 219 teses filosóficas e científicas, aleatoriamente escolhidas, inclusive uma de
Tomás de Aquino.
55
Os quatro ensaios apresentados em Révue dês questions scientifiques (RQS) são: Quelques réflexions au sujet
des théories physique (RQS: 31, 1892). Physique e métaphysique (RQS: 341, 1893). L´Écoole anglaise et les
théories physique (RQS: 2ª. série, 1893) e Quelques réflexions au sujet de la physique expérimentale (RQS: 36,
1894).
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Em um sentido amplo e contemporâneo, o trabalho científico, de acordo como o que ensina a história e filosofia da ciência,
faz-se em comunidade, em parcerias e equipes que se integram para alcançar fins comuns. Tais comunidades encontram
motivações e curiosidade na história e filosofia para descobrir como a realidade é e pode ser tratada, projetada (...). Certamente
que os problemas, motivações, meios (...) de pesquisadores da natureza física poderão não ser os mesmos dos pesquisadores da
natureza psico-social. Os problemas de epistemologia relativos à lógica de descobertas – invenções, aos raciocínios indutivos –
dedutivos, à qualidade e pertinência de testes, à natureza de explicações, aos fundamentos e aplicabilidade de teorias (...), seja
individual ou em uma equipe pluridisciplinar, relacionam-se com o trabalho científico transformado, na época moderna e
contemporânea, em tecnociência. Essa transformação trouxe impactos na produção e organização social, tais como: a
organização coletiva de pesquisa e os grandes programas e trabalhos em redes; as políticas de pesquisa com aceitabilidade
social e ambiental, suscitando a necessidade de reflexão sobre limites, restrições e capacidades de suporte com relação à
dignidade humana, ao cuidado do bem-estar, a proteção do meio ambiente etc. Nesse contexto de ética e responsabilidade –
comprometimento, de prática da filosofia na filosofia da investigação, de mediação ciência – sociedade e teoria - prática (...) se
insere o trabalho tecnocientífico. Entenda-se por epistemologia (do gr. = ciência, e = estudo, discurso) o
estuda da ciência; é utilizado com dois sentidos: o estudo da origem e do valor do conhecimento em geral (sinônimo de
gnosiologia) e o estudo das ciências, seus princípios, critérios de verificação e de verdade e do valor dos sistemas científicos.
57
A generalização é uma característica determinante do método científico que apareceu no início da época moderna, em,
p.ex., no Discurso do método e nas Regras para a direção do espírito, de Descartes e que permanece. Significa, em
seu sentido mais amplo, a capacidade de aplicação da metodologia em todas as áreas de investigação científica onde não
ocorram prejuízos de conteúdos específicos e o particular possa tomar o lugar do geral. As técnicas de pesquisas
particulares, em contraposição ao método geral, a metodologia, caracterizam-se por serem aplicáveis em algumas áreas
científicas, mas, não na totalidade; funcionarem como uma sequência de passos que, sob determinadas condições,
permitem atingir um resultado; desempenhar sua função na resolução de problemas individuais; serem técnicas úteis em
determinadas fases da metodologia geral.
58
Sören Aabye Keirkegaard (1813 -1855). Nascido em Copenhague, Dinamarca. Estudou na Universidade de
Copenhague teolofia e filosofia. Seu pensamento se afirma como uma reação individualista às abstrações de Hegel,
enquanto sistema, usado como paradigma infalível com a tendência de explicar tudo. Para ele, as verdades objetivas e a
filosofia especulativa hegeliana, eram pouco significativas para a qualidade existencial; mais importante que a busca de
uma verdade era a busca por verdades com significado para a vida. Com essa afirmação ideológica, ao lado de ideias de
Nietzsche, estabeleceu a filosofia do existencialismo da qual foi o maior representante. Em suas obras, com a filosofia
existencialista, estabeleceu uma dialética entre seus personagens (pseudônimos como Johammes Climacus que tratava
do dilema entre a dúvida e a fé; Vigilius Haufniensis ocupava-se de aspectos psicológicos do pecado e da ansiedade;
Johannes de Silentio e Constantin Constantius ocupam-se da ética; Anti-Climacus era o cristão ideal etc.; ele
mesmo se chamava “aquele indivíduo”). Entre suas obras se destacam: Om Begrebet Ironi med stadigt Hensyn til
Sócrates / O Conceito de ironia, com referência continua até Sócrates. Enten-Eller. Et Livs-Fragment: Første
Deel, indeholdende A.'s Papirer / Um fragmento de vida. Enten-Eller. Et Livs-Fragment: Anden Deel,
indeholdende B.'s Papirer, Breve til B / Um fragmento de vida: Segunda Parte. Johannes Climacus, eller De
omnibus dubitandum est. En Fortælling / Johannes Climacus. Uma narrativa Atten. Opbyggelige Taler /
Dezoito Discursos edificantes. Frygt og Bæven: Dialectisk Lyrik / Temor e Tremor: um lírico dialético.
Gjentagelsen: Et Forsøg i den experimenterende Psychologi / Repetição, uma especulação em psicologia
experimental. Philosophiske Smuler eller Smule Philosophi / Fragmentos filosóficos. Begrebet angest. En
simpel psychologisk-paapegende Overveielse i Retning af det dogmatiske Problem om Arvesynden /
Conceito de Angustia: uma simples deliberação psicologicamente orientadora a respeito do problema
dogmático do pecado original. Forord. Morskabslæsning for enkelte Stænder efter Tid og Leilighed /
Prefácios: leitura leve para pessoas em vários estados de acordo com o tempo e a oportunidade. Tre Taler
ved tænkte Leiligheder / Três Discursos sobre ocasiões imaginárias. Stadier paa Livets Vei. Studier af
Forskjellige. Sammenbragte, befordrede til Trykken og udgivet af Hilarius Bogbinder / Estágios no caminho
da vida. En flygtig Bemærkning betræffende en Enkelthed i Don Juan / Uma observação superficial sobre um
detalhe em Don Giovanni.
59
Segundo Wittgenstein, os fatos são afirmações verdadeiras sobre coisas; uma mesa é uma coisa; a afirmação a mesa
grande é (pode ser) um fato. O mundo é o conjunto de fatos conhecidos, do que acontece, e não de coisas distintas do
que se pode dizer sobre elas, sendo a linguagem a que construí o senso de mundo, do meio e de experiências; o que não
se pode dizer não se pode conhecer; o que se consegue falar, deve-se calar.
60
As elaborações teóricas que propiciaram o desenvolvimento moderno da linguística, enquanto cieência, deve-se à
Ferdinan de Saussurre; este suiço, precursor do estruturalismo, entendia a linguística como um ramo da ciência mais
geral dos signos (semiologia), com autonomia e com seus objeto e métodos próprios. Enunciou, na obra Cours de
linguistitique générale, dicotomias como as de lingua (sistema de valores opostos, homogêneos e produto social na
mente do falante) e discurso (ato individual sujeito a fatores externos); sincronia (estudo descritivo da lingua) e
diacronia (estudo histórico: mudanças dos signos no processo histórico); sintagma (combinação de formas mínimas em
uma unidade linguística superior que surge a partir da linearidade de signos) e paradigma (banco de reservas da língua
permitindo a oposição de unidades: uma exclui a outra); significante (imagem acústica ou cadeia de sons, plano de
forma...) e significado (conceito ou base no plano do conteúdo) (WIKIPÉDIA, 2006c).
61
O neopositivismo ou positivismo lógico é um sistema filosófico baseado na crítica às ciências positivas e à análise
lógica; esse sistema compreendia o conhecimento científico como uma forma abstrata sem atender ao desenvolvimento e
à maneira como o cientista trabalha; tinha como centro o Círculo de Viena.
62
Em epistemologia e em filosofia da percepção, o fenomenalismo é o conceito e os objetos físicos não existirem como
coisas em si, mas somente como fenômenos de percepções ou de estímulos sensoriais situados no tempo e no espaço,
reduzindo, assim, o discurso sobre os objetos físicos da realidade para o discurso sobre os dados dos sentidos
(FENOMENALISMO, 2005).
63
O princípio do operacionalismo foi formulado pelo físico americano Percy Williams Bridgman (1882-1961), em seu livro A
Lógica da Física Moderna. Segundo Bridgman, todo conceito físico é definido pelas operações que um físico usa para
aplicá-lo. Afirmava que a curvatura do espaço-tempo, um conceito usado por Einstein em sua teoria geral da relatividade, não
tinha significado, pois não era definível por meio de operações. Depois, mudou seu parecer e admitiu que havia uma conexão
indireta com as observações, influenciado por Popper.
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Alexandre Koyré foi o primeiro a utilizar o conceito de revolução científica, em 1939. Depois, A. Rupert Hall, em sua
obra The scientific revolution 1500-1750 / A revolução na ciência: 1500-1750, erm que o autor explica os fatores
que contribuíram para as mudanças nas ciências. Herbert Butterfield, em The originais of the modern science; e
Thomas S. Khun, com informações gerais apresentadas no texto.
65
O método científico contemporâneo, como resultado de processos de ajustes, de adequações e de novos elementos de
filósofos da ciência de período anterior para se apresentar com novos conceitos (para alguns historiadores, regras), tais
como: consciência (da objetividade, do alcance de ações e resultados, das limitações etc.) e persistência / constância;
não arriscar-se em juízos a priori, mas, basear-se em evidências com objetividade e demonstrações, com testes rigorosos
e adequados à realidade; compreender a realidade em diversos aspectos o que significa a integração de disciplinas, de
esforços, de recursos (...) com base no conhecimento de pressupostos de técnicas; estar baseado em fontes de
consistentes do conhecimento sobre o tema, sobre a realidade; destacar os fatos essenciais e prioritários(...) de fatos
secundários, feito com base em referências e procedimentos adequados; combinar / integrar o estudo e capacidade
individual como a capacidade coletiva; manter-se atualizado sobre novos procedimentos, técnicas, métodos, conceitos
(...); apresentação clara, objetiva e direta de assuntos da investigação: o problema, os procedimentos e os resultados.
66
O estruturalismo pode ser definido como uma corrente do pensamento e do método de análise, do século XX,
importanda da linguística e das ciências sociais, que provilegia, nos objetos estudados a estrutura, detendo-se em
relações e funções dos elementos que constituem sistemas como línguagens, literatura, práticas culturais e folclore.
Considera o homem como efeito de estruturas, em lugar de criação ou subjetividade. Teve seu início com Ferdinand de
Saussurre (1957 – 1913). Os grandes nomes, na França, foram Lévi-Strausse, Foucault, Lacam e Althusser.
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Medawar (1974) relacionou diversos pensadores, tais como Whewell e Bernard, precursores das concepções
metodológicas e que defenderam o método hipotético – dedutivo para o raciocínio científico, inclusive com conceitos
como os de invenção (ou descoberta), justificação (ou prova) das teorias científicas e funções da indução e da dedução
no processo de investigação.
68
Niel Henrik David Bohr (1885 - 1962). Nascido em Copenhagen. Estudou na Universidade de Copenhagen. Ainda
jovem foi membro da Academia de Ciência por suas investigações teóricas (propriedades de metais, teoria de elétrons,
confrontação de teorias de radiação de Planck etc.). Pelos seus estudos de estruturas dos átomos ganhou o Prêmio Nobel
em 1922. Suas pesquisas em teorias físicas (p.ex., estrutura de núcleos dos átomos, transmutações, desintegrações, fissão
nuclear de urânio etc., foram fundamentais para o avanço da ciência). Deixou numerosas obras, entre outras: The
theory of spectra and atomic constitution; Atomic Theory and the description of nature e The unity of
knowledge.
69
Na pesquisa (ciência) contemporânea, muitos autores não aceitam essa classificação de ciência pura, aquela que não
têm preocupações e nem possibilidades de aplicação comercial, e pesquisa aplicada, diretamente voltada para a solução
de problemas práticos e com perspectiva de aplicação imediata. A chamada ciência pura acaba, em muitos casos, tendo
aplicações e a ciência aplicada termina não produzindo os resultados esperados. Há autores que substituíram essas
denominações por ciência básica e ciência aplicada, entendendo a primeira como aquela que não visa ao seu
aproveitamento em área de utilização prática, porém, poderá encontrá-la; nesse contexto, a pesquisa tecnológica (ciência
aplicada) visa o atendimento ou aplicação direta de seus resultados, contribuindo para o desenvolvimento da pesquisa
básica. Esta é uma discussão de pouco interesse, além do histórico, acreditando-se que o importante é o que a ciência é e
sua aplicação, com notáveis exemplos dessa posição: a biologia molecular que surgiu, nas décadas de 50 e 60, sem a
preocupação de aplicação, mas, com a engenharia genética (...) tornou-se tecnologia de desenvolvimento; outro exemplo
foi a pesquisa tecnológica da supercondutividade, propriedade de metais como chumbo, mercúrio e nióbio de conduzir a
eletricidade sem resistência, quando submetidos a resfriamentos (temperaturas de 2700. o.C negativos), descoberta por
Heike Kamerling-Onnes (1853 – 1926), com aplicações práticas.
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A Escola de Frankfurt (denominação dada ao Instituto de Pesquisa Social, fundado pelo economista austríaco Carl
Grumberg) e a Teoria Crítica (teoria crítica da sociedade), fazem em parte de um movimento que surgiu na Europa, em
especial na Alemanha, em 1924, encabeçado por Theodor W. Adorno (filósofo e socioólogo), Walter Benjamin (ensaísta
e crítico literário), Herber Marcuse (filósofo) e Max Horkheimer (filósofo e sociólogo) que acredidavam na teoria de
Marx, do materialismo histórico e esperavam conciliar essa teoria à realidade para se ter uma convivência harmònica. O
objetivo da Escola era tecer críticas ao pensamento sistemático, a partir de ukm manifesto, da Teoria tradicional e a
teoria crítica, abordando questões das relações da filosofia com a história (tributos a Kant, Hegel e Marx) com
referências ao êxito da revolução bolchevista em Rússia eda proclamação da Alemanha, surgidas de revoluções operárias
em 1919 e 1923, respectivamente.
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Entenda-se por hermeneítica do direito como o estudo sistematizado utilizado para realizar uma interpretação adequada
e correta sobre um fato concreto, sem confundir interpretação com hermenêutica, visto que a primeira é a aplicação da
segunda.
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Gregory Bateson (1904 – 1980). Nascido em Grantchester (Cambridge), Inglaterra. Estudou história natural e
antropologia. Biólogo e antropólogo com bases analíticas na psiquiatria, psicologia, sociologia, comunicação e ecologia,
o que lhe permitiu pesquisar em muitos campos diferentes. Influenciado por William Bateson, da evolução genética e
por G, Mendel. Em sua obra Comunication: the social matrix of psychietry / Comunicação: a matriz social da
psiquiatria, (com Jurgen Rueschi), tratou do fenômeno da realimentação, da meta (posição, comunicação, mensagem
etc.) base da teoria moderna da comunicação. Suas obras mais destacadas são: Naven (...) / Naven, uma cerimônia
latmul, sua primeira obra, considerada um elo entre a antropologia e a cibernética; analisou padrões culturais e formulou
critérios como os de relacionamentos complementares, simétricos e recíprocos, junto com a noção de esquizomogenese
e ethos.. Steps to an ecology of mind / Passos para uma ecologia da mente. Mind and nature: a necessary
unity / Espírito e natureza. e A Sacred unity: further steps to an ecology of mind / Pesquisou, entre muitos
outros problemas, o alcoolismo e a esquizofrenia, propondo a teoria do duplo vínculo; a
ambiguidade e comunicação interpessoal no contexto da estrutura familiar; o cotidiano e a
responsabilidade; soluções pelo caminho da complexidade; a profundidade, amplitude e
globalidade (BATESON, 1936). Um aspecto que se destaca das contribuições de Bateson à investigação científica
é o relativo a sua visão sistêmica (da mente), em que não apenas o todo é maior que a soma das partes, como também os
sistemas emergem uns dos outros com graus de complexidade acrescida; cada um dos sistemas mentais é um
metacontexto do nível anterior. A influência da visão sistêmica. A ecologia batesoniana não se refere tanto à preservação
de sistemas vivos existentes, mas, à compreensão da articulação sistêmica de padrões e metapadrões de auto-regulação.
Bateson acreditava que uma compreensão desses fenômenos levaria a agir de maneira adequada de modo a garantir a
auto-regulação da qual dependemos, quer do ponto de vista filogenético, quer do ponto de vista ontogenético; daí porque
sua ecologia seja uma ecologia da mente e não propriamente do ambiente; para ele não existia a divisão sujeito/ meio,
mas antes unidades compostas sujeitos-nichos, que são os níveis básicos da unidade-complexidade sistêmica; essa ideia
se antecipou a concepção explicativa da origem do universo auto-constructor e, junto com a termodinâmica de
Prigogine, foi suporte às conceituações de teorias como as do caos e da complexidade, entre outras.