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LITERATURA E CINEMA

(Literature and Cinema)


Geraldina Porto Witter

UNICASTELO / APP

STAM, R. A Literatura através do Cinema: realismo, magia e a arte da adaptação.


Tradução de M. A. Kremer e C. R. G. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008, 511p.

Há uma forte relação entre literatura e cinema e isto tem impacto tanto no leitor de
texto literário quanto no assíduo frequentador de cinema. Ao assistir a um filme baseado em
uma obra literária a pessoa que leu antes o livro pode ficar decepcionada ou achar que,
embora algo tenha ficado fora ou mal apresentado, valeu a passagem para outra linguagem.
Assistir ao filme sem ter lido o livro pode levar outros a buscarem um prazer maior lendo o
texto.
A transposição de texto para o cinema é complexa e o livro aqui resenhado evidencia
as dificuldades e a variação de opções e resultados. Robert Stam é um brasilianista
consagrado pelo seu enfoque cultural com ênfase na análise crítica do processo e do produto
das adaptações cinematográficas com rigor metodológico. Ele leciona na Universidade de
Nova York. O livro foi editado no mesmo ano nos USA e no Brasil e enfoca vários textos
passados para outra linguagem, inclui também obras brasileiras. As obras estão organizadas
cronologicamente, compreendendo sete transposições algumas com vários destaques.
A introdução é um texto didático em que contextualiza a obra em sua produção
pessoal e explica a inclusão de produção brasileira. Discute conceitualmente aspectos
relevantes que são retomados ao longo dos capítulos destacando-se os relativos à fidelidade,
gênero (intertextualidade), realismo, magia, o eurocentrismo, as questões multiculturais.
Fecha a introdução enfocando alguns aspectos metodológicos relativos ao trabalho.
A primeira passagem do texto literário para o cinema tem por foco Dom Quixote,
começando por uma perspectiva histórica de c
omo romances deste tipo (autoconscientes) foram vistos ao longo do tempo para depois passar
para tela em muitas continuações e adaptações, com mutações diversas. As adaptações são
arroladas e, dada a amplitude, escolheu como primeira opção, o Dom Quixote de Kosintsev
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(1957), face ao produto e as raízes do diretor fincadas no movimento avantgard soviético dos
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anos 20, mas que sob o stalinismo fez que concessões diversas tivessem que ser incorporadas

Brazilian Cultural Studies, Vol. 1 (1), p. 121-123, 2010.


pelo autor, por exemplo, enfatizando a “crueldade” das classes altas e emergentes contra os
menos favorecidos. Como contra-ponto analisa a versão inacabada de Dom Quixote (1955) de
Welles faz um paralelo de criação entre os autores do texto e do filme. As análises são
profundas, bem sustentadas em dados e bibliografia pertinente.
Dada extensão plausível da resenha não é viável fazer uma síntese de todos os
percursos percorridos pelo autor em cada filme. O apresentado pode oferecer uma perspectiva
da composição dos demais. Apenas são arroladas aqui as obras estudadas.
Entre as demais obras estudadas estão: Robinson Crusoé, Tom Jones, Inocente
Sedutor, Memórias Póstumas de Brás Cubas, Madame Bovary, Notas do Subterrâneo, Lolita,
A Hora da Estrela, Hiroshima, meu amor, O desprezo, Macunaíma.
Considerando que a preocupação central da revista é a cultura brasileira, que ela não
está isenta das influências mundiais e que a obra de Stam incluiu obras geradas no Brasil
decidiu-se incluir uma nota sobre uma das análises da produção brasileira.
Macunaíma foi incluída no capítulo7 sobre o realismo mágico e o real maravilhoso
americano (p. 400). A obra brasileira recai na primeira categoria, sendo vista como exemplo
de Modernismo e da “antropologia” dos brasileiros nos anos vinte do século passado. Lembra
a dificuldade de fazer a transposição de obras deste tipo, sendo inviável recorrer à adaptação
per se. Relembra e contrasta com produções européias e estabelece paralelo com Terra em
Transe, de Glauber Rocha e outros para ilustrar estas dificuldades e criatividade que requerem
dos diretores. Retoma o percurso do realismo mágico da literatura para o cinema, indicando as
obras mais marcantes desde 1925 até o presente, incluindo a antropofagia carnavalesca.
Foi dentro deste contexto que Mario de Andrade escreveu Macunaíma (1928) que
Stam considera como “mãe” do realismo mágico (embora nem sempre reconhecido como tal,
p. 415). Apresenta a obra como um exemplo do pós-modernismo arcaico, usando mitos
amazônicos dentro de uma estética proto-pós-modernista de colagem (p. 415). Faz uma
análise indicando as semelhanças com as propostas de análise de Bakhtin aplicadas. Após um
estudo do livro passa para a análise do filme de mesmo nome, de 1968, de Joaquim Pedro de
Andrade. Tem o cuidado de contextualizá-lo no tempo, destaca aspectos como os
antropofágicos, guerrilha urbana, canibalismo, sexualidade exacerbada, entre outros,
comparando texto e filme. Dá especial atenção a representação de Grande Otelo como o
Macunaíma Negro e sua transformação. Usa o filme para caracterizar o realismo mágico
brasileiro.
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O texto em si é muito enriquecedor, mas algumas fotos bem escolhidas foram


acréscimos de interesse. No final, o leitor encontra notas organizadas por Introdução e
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Brazilian Cultural Studies, Vol. 1 (1), p. 121-123, 2010.


Capítulos, incluindo adendos informativos e referencias bibliográficas. Além disso, conta com
um índice de conteúdo que facilita a reconsulta a tópicos especiais.
Ao estudar a relação literatura-cinema o autor trata de tema de grande relevância
cultural e sendo um brasilianista, ao incluir no seu trabalho análises de produtos nacionais
tornou o livro particularmente interessante para os brasileiros quer sejam cidadãos de outros
áreas, quer se ocupem com a cultura brasileira, em particular com a literatura ou o cinema.

Recebido em 26/02/2010

Aprovado em 05/04/2010

Sobre a Autora: Doutora em Ciências, Livre-docente em Psicologia Escolar. Coordenadora Geral da Pós-
Graduação Stricto Sensu da Universidade Camilo Castelo Branco – UNICASTELO (SP).
E- mail: gwitter@uol.com.br

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