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PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo


SESSÃO ORDINÁRIA
14-12-2016

PROCESSO Nº 3-39.2015.6.08.0020 - CLASSE 31


NOTAS TAQUIGRÁFICAS – Fls. 1/13

RELATÓRIO

O Sr. DESEMBARGADOR SAMUEL MEIRA BRASIL JÚNIOR


(RELATOR):-
Trata-se de Recurso Criminal interposto por ANDERSON SEGATTO GHIDETTI
em face da r. sentença de fls. 335/348, proferida pelo MM. Juiz da 20ª Zona Eleitoral, que julgou
procedente a pretensão punitiva estatal, condenando-o pela prática da conduta tipificada no art.
299 do Código Eleitoral, na forma do art. 71 do Código Penal.
Irresignado, o Recorrente interpôs o recurso de fls. 353/379, por meio do qual
alega a inexistência do delito previsto no art. 299, do Código Eleitoral.
Em contrarrazões oferecidas às fls. 382/393, o Recorrido pugna pela manutenção
da sentença vergastada.
A Procuradoria Regional Eleitoral exarou parecer às fls. 398/412, manifestando-se
pelo conhecimento do recurso criminal eleitoral, e, no mérito, pelo seu improvimento, ao
argumento de que o conjunto probatório restou suficiente à comprovação do elemento subjetivo
do tipo penal eleitoral da corrupção.
É, em abreviada síntese, o Relatório.
À douta Revisão.
*

SUSTENTAÇÃO ORAL

O Sr. ADVOGADO DO RECORRENTE Dr. LUCIANO CEOTTO:-


Senhor Presidente; Digníssimo Relator; Senhor Diretor Geral do Tribunal; colegas
advogados, senhoras e senhores: Nesta oportunidade, dirijo especial cumprimento ao
representante do Ministério Público Eleitoral nesta Corte, Dr Carlos Vinícius Soares Cabeleira,
parabenizando na pessoa de S.Exa. todos os membros do zeloso e diligente Ministério Público
Nessa oportunidade, por ocasião da data festiva do órgão acusador e fiscalizador
da lei, trago aqui uma lembrança feita por um dileto colega, também membro do instituto do
Ministério Público, Dr. Leonardo Costa Barreto: “Há dois tipos de pessoas que não gostam do
Ministério Público: os ignorantes, porque não o conhecem; os criminosos, porque o
conhecem bem demais.” É assim que reputamos e que queremos continue o zeloso Ministério
Público.
Pois bem, subo à tribuna, substabelecido pelos colegas Dr. Luiz Alberto Lima
Martins e Dr. Marcos Modonezi Vicente, que patrocinaram até o momento a causa de Anderson
Segatto Ghidetti, que aqui recorre contra a sentença que julgou procedente a ação penal,
condenando-o como incurso nas penas do artigo 299, do Código Eleitoral, na forma do artigo 71
do CP, nsurgindo-se contra a fixação de pena de três anos e nove meses de reclusão, substituída
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por pena restritiva de direito, substituída por prestação de serviços à comunidade. No processo,
merecem destaque os seguintes pontos.
Está-se julgando nos autos o fato de ter o recorrente custeado o pagamento de dez
litros de combustível para cinco cidadãos: Manoel Gomes Bandeira, José Nilson de Jesus Barros,
Josemar Miranda de Jesus, Marilha Vescovi Gadioli e Dioneu Elias Monteiro no período que
antecedeu as vésperas das eleições do longínquo ano de 2008.
Todos os cinco cidadãos foram considerados pelo Parquet como sendo supostos
corruptores eleitorais passivos, porque firmaram contrato com o recorrente de cessão de uso dos
respectivos veículos, automóveis e motocicletas, todos eles discriminados nos autos às fls 79 a
88, e que essa cessão tinha como objeto a adesivagem para a propaganda e participação em
eventos da campanha eleitoral daquele ano de 2008.
Destaco também que todos os abastecimentos em discussão nos autos, cinco no
total, foram declarados pela parte recorrente na respectiva prestação de contas apresentada à
Justiça Eleitoral, prestação de contas essa aprovada na forma da lei.
Todos os cinco cidadãos considerados pelo Ministério Público como supostos
corruptores eleitorais passivos em seu depoimento, perante o honrado Juízo da 20ª Zona Eleitoral
de Aracruz/ES, expressamente disseram não terem recebido nenhum tipo de proposta, vantagem,
ou promessa em troca de voto, e que exerceram livremente suas respectivas intenções de voto.
A jurisprudência é cristalina, inclusive, já sedimentada neste Tribunal Regional
Eleitoral no sentido de que abastecimento de veiculo, ainda que tivesse sido em troca
exclusivamente de adesivagem de carros e motos, não se amolda à tipicidade prescrita no artigo
299 do Código Eleitoral.
Dos autos não se extrai sequer indícios, até porque não houve tal prática, de que
tivesse o recorrente Anderson Ghidetti feito abordagem direta aos cinco eleitores discriminados
na inicial com o objetivo de obter votos.
O Ministério Público Eleitoral não impugnou durante a tramitação de primeira
instância os contratos de cessão de uso de veículos, firmados entre o recorrente e os cinco
supostos corruptores eleitorais passivos, bem como não impugnou a prestação de contas aprovada
pela Justiça Eleitoral A condenação do recorrente contraria, por via reflexa, a prestação de contas
eleitoral aprovada pelo TSE, já que os abastecimentos em discussão estão inclusos naquele
julgamento.
Por fim, a pratica de abastecimento de veículos não configura o crime de
corrupção eleitoral tipificado no artigo 299 do Código Eleitoral, pois, na hipótese, não se está a
comprar votos do eleitor, e sim o exercício de propaganda, objetivando uma maior visibilidade à
campanha eleitoral. Esses são os principais pontos delineados nos autos.
Chamo a atenção também para o fato de que a investigação policial que precedeu a
denuncia criminal decorreu de denúncia anônima, onde diversos candidatos daquele Município de
Aracruz foram acusados de compra de votos em troca de cupons de abastecimento de
combustível. No entanto, embora diversos candidatos daquele pleito tenham sido delatados no
documento anônimo, apenas o recorrente teve contra si instaurada a ação penal.
Data máxima vênia, com todo o respeito que tenho pelo Juiz prolator da sentença,
S.Exa. se equivocou ao associar todos os cupons de abastecimento ao recorrente Anderson
Segatto Ghidetti, enquanto que, liquidando-se a documentação constante dos autos, vê-se que os
abastecimentos restringiram-se a apenas cinco cidadãos. Todos os abastecimentos foram reunidos
na nota fiscal nº 12372, no valor de hum mil e cinqüenta e quatro reais, datados de 4 de outubro
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de 2008, da qual se extrai terem ocorrido 38 abastecimentos, cinco reais ou dez litros, de 23
veículos, no período de 25 de setembro a 4 de outubro de 2008.
São esses especificamente os abastecimentos atribuídos ao recorrente. Todos os
supostos beneficiários ou destinatários do combustível foram ouvidos em juízo, afirmaram que
puseram os seus veículos à disposição da campanha do recorrente, e que na tratativa para este ato
de campanha eleitoral nunca, em momento nenhum, houve o comprometimento de voto.
Então, Exas., me parece que a questão aqui reside na qualificação jurídica dada ao
fato. S.Exa. o Juiz prolator da sentença entendeu que o abastecimento de veículo configura o tipo
penal do artigo 299, enquanto nós, respeitosamente, e aí escorados e amparados na jurisprudência
das cortes eleitorais, inclusive deste Tribunal, que já se manifestou pela inexistência de compra
de voto em abastecimento de veículo para carreata, não caracteriza a tratativa, a negociação
ilícita da compra de voto.
São esses os pontos mais importantes, gizando que na sentença, onde se alude a
suposta contradição entre os depoimentos prestados na esfera policial e na esfera judicial, na
verdade tais contradições não existem porque o enfoque feito na esfera policial foi da verificação
do fato, e o enfoque na esfera judicial foi já com a qualificação do fato, cinco anos após sua
ocorrência, já com prestação de contas apresentada e aprovada pela Justiça Eleitoral.
Com base em todos esses fatos, e certamente nos judiciosos suplementos jurídicos
que serão adensados pelo Relator da matéria, é que se pede o provimento do recurso ora em
análise para a absolvição total, plena e completa do recorrente Anderson Segatto Ghidetti.
Muito obrigado.

VOTO

O Sr. DESEMBARGADOR SAMUEL MEIRA BRASIL JÚNIOR


(RELATOR):-
Trata-se de Recurso Criminal interposto por ANDERSON SEGATTO
GHIDETTI, em face da r. sentença de fls. 335/348 que julgou procedente a prática do crime de
corrupção eleitoral, em decorrência do fornecimento de combustível, com o objetivo de angariar
votos nas Eleições de 2008.
Cabe registrar, inicialmente, que o presente recurso preenche os requisitos
intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, por isso, deve ser conhecido.
Irresignado, o Recorrente interpôs o recurso em apreço, aduzindo, em síntese: (i) a
inexistência do delito previsto no art. 299, do Código Eleitoral, haja vista que os depoimentos
colhidos em nenhum momento demonstraram a prática do ilícito penal; (ii) que os supostos
corruptores eleitorais passivos firmaram contrato de cessão de uso dos veículos com o
Recorrente, tendo como finalidade a adesivagem de propaganda eleitoral e a participação em
eventos nas Eleições 2008, motivo pelo qual não se justificaria a condenação.
Em contrarrazões oferecidas às fls. 382/393, o Recorrido pugna pela manutenção
da sentença vergastada.
A Procuradoria Regional Eleitoral exarou parecer às fls. 398/412, manifestando-se
pelo conhecimento do recurso criminal eleitoral, e, no mérito, pelo seu improvimento, ao
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argumento de que o conjunto probatório restou suficiente à comprovação do elemento subjetivo
do tipo penal eleitoral da corrupção.
O artigo 299 do Código Eleitoral tipifica o crime de corrupção eleitoral, que assim
dispõe:

“Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva,
ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção,
ainda que a oferta não seja aceita.
Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.”

Da análise do dispositivo em referência, tem-se que “o objeto jurídico é a


liberdade do eleitor de escolher livremente, de acordo com sua consciência e seus próprios
critérios e interesses, o destinatário de seu voto. Tanto a dação, a oferta ou a promessa, quanto a
solicitação e o recebimento de vantagem podem gerar obrigação moral que o force a apoiar
determinada candidatura em razão da vantagem auferida ou apenas acenada” (GOMES, 2015, p.
53).
Dada a sua natureza formal, para que ocorra sua consumação, basta a oferta
(independente de aceitação), a promessa (independente de cumprimento), ou a solicitação (ainda
que não seja atendido), de modo que a entrega concreta, efetiva e real da coisa, bem ou produto,
ou mesmo a transferência de sua propriedade, posse ou detenção, configura mero esgotamento da
ação delituosa.
Além disso, para a configuração do crime de corrupção eleitoral, exige-se a
comprovação de dolo específico, ou seja, exige-se que reste comprovada a intenção do agente em
obter ou dar voto ou, ainda, em conseguir ou prometer abstenção, como propósito único da ação.
In casu, o Recorrente, candidato a vereador no pleito de 2008, pelo município de
Aracruz/ES, teria supostamente oferecido e entregue dádivas, consistente em autorizações de
abastecimento de combustível, condicionado à fixação de adesivos nos veículos de propriedade
dos eleitores, contendo propaganda eleitoral do mesmo.
Das provas documentais, verifico que o Recorrente promoveu o fornecimento de
vales combustíveis para terceiros, que não detinham vinculação com a sua campanha eleitoral,
restando comprovada a doação de combustível, exclusivamente para a obtenção de votos.
No período compreendido entre 25/09/08 a 04/10/08, 24 (vinte e quatro) veículos
foram abastecidos no Posto Trevão, mediante a apresentação de 26 (vinte e seis) autorizações de
abastecimento, fornecidos pelo Recorrente, conforme atestado pela Nota Fiscal nº 12372 (fl. 120)
e Demonstrativo de Vendas por Cliente de fls. 120/122, vinculados ao Inquérito Policial nº
740/2008. Tais documentos comprovam, com efetividade, a materialidade delitiva e autoria do
Recorrente.
Por sua vez, as provas testemunhais demonstram o dolo específico do Recorrente,
consistente na finalidade de obter votos, ainda que não haja o pedido expresso.
Nesse sentido, o depoimento de FRANCISVALDO ABILIO DE SOUZA, Chefe
de fiscalização dos frentistas do Posto Trevão:

Depoimento em Juízo (fl. 288)


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“[...] que exibidos os documentos de fls. 33/68, reconhece como sendo semelhantes àqueles que
eram recebidos; que eram feitos abastecimentos de “carros de políticos”; que era feita a
identificação por meio de um adesivo do candidato; que seria o carro comum, mas com o adesivo
de um candidato; [...] que este abastecimento de “carros de políticos” ocorriam até as eleições.”

Depoimento no Inquérito Policial (fls. 199/200)

“[...] que por orientação do proprietário do posto de gasolina em tela, JAIME LOPES BITTI, para
que houvesse o abastecimento mediante apresentação das autorizações do posto TREVÃO
supramencionadas, bastaria que o condutor, primeiro, apresentasse tal autorização preenchida
com data, placa do veículo e do condutor e em segundo, que tivesse adesivo do candidato colado
no veículo [...].”

Depoimento de JOSÉ LIMA DOS SANTOS, frentista do Posto Trevão:

Depoimento em Juízo (fl. 286)

“[...] que trabalha no Posto Trevão desde 1999 até hoje; que em se tratando de empresas, é
comum que os abastecimentos ocorram por meio de documentos (vales), o mesmo não ocorrendo
com relação a pessoas físicas; [...] que na época da política, a maioria dos candidatos mandavam
abastecer no posto Trevão [...]; que na época da política era comum pessoas aparecerem para
abastecer veículos [...].”

Depoimento no Inquérito Policial (fl. 160)

“[...] que esclarece que o procedimento de abastecimento com autorização em tela, no que tange
ao cidadão comum, ou seja, que não tinha vínculo com nenhuma empresa conveniado com o
posto em foco, só se deu no período pré-eleitoral [...].”

Por conseguinte, o Recorrente aduz que os supostos corruptores eleitorais passivos firmaram
contrato de cessão de uso dos veículos com o candidato, tendo como finalidade a adesivagem de
propaganda eleitoral e a participação em eventos nas Eleições 2008, motivo pelo qual não se
justificaria a condenação.

Em que pesem as contradições apontadas nos depoimentos judiciais de algumas testemunhas, as


mesmas confirmaram, em sede de interrogatório policial, que não laboraram na campanha do
denunciado e que a doação de combustível ocorria sem qualquer vínculo com a atividade eleitoral
típica, desqualificando o suposto contrato de cessão.

Senão vejamos:

Depoimento de DIONEL ELIAS MONTEIRO (fl. 345 do IP nº 740/08):

“[...] que não trabalhou na campanha do então candidato a vereador para o município de Aracruz
no ano de 2008, Anderson Ghidete; que, todavia, reconhece que de fato abasteceu o veículo supra
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citado, durante o período de campanha eleitoral no Posto de Gasolina denominado Trevão,
localizado no Município de Aracruz; que esclarece que tal abastecimento se deu após ter recebido
requisição do comitê eleitoral do candidato supra citado; que desta forma, após ter colado seu
adesivo de campanha teve garantido, no posto em questão o abastecimento gratuito de seu
veículo, após apresentação desta requisição; que na época não participou de nenhuma carreata do
candidato em tela [...].”

Depoimento de JOSEMAR MIRANDA DE JESUS (fl. 299 do IP nº 740/08):

“[...] que esclarece que em nenhum momento laborou na campanha do candidato a vereador para
o município retro citado ANDERSON SEGATTO GHIDETTI; que no entanto ficou sabendo, na
época dos fatos, que no comitê deste candidato localizado em frente ao Posto Central do mesmo
Município, o candidato em tela estava distribuindo tais autorizações de abastecimento com a
condição de que o depoente adesivasse a sua propaganda eleitoral em seu veículo; que se fizesse
isso teria o direito a abastecer 5 litros de gasolina por semana [...] que se recorda que o
movimento no comitê das pessoas que chegavam com o fim de obtenção da autorização em
questão era bastante intenso; que destaca quando esteve no comitê supra mencionado e recebeu a
autorização de abastecimento em tela foi solicitado pelas pessoas que trabalhavam no local que o
depoente votasse no candidato ANDERSON GHIDETTE [...].”

De igual modo foram os depoimentos prestados na esfera policial pelas


testemunhas Manoel Gomes Bandeira (fl. 297 do IP nº 740/08) e José Nilson de Jesus Barros (fl.
298 do IP nº 740/08).
Figura correta a sentença hostilizada quando afirma que muito embora o
Recorrente sustente que os contratos e a prestação de contas são provas da legalidade dos
pagamentos, aqueles foram simulados para dar aparência de legalidade em conduta que, na
verdade, apenas representava a concessão de vantagem e benefícios em troca do apoio nas
eleições municipais de 2008, mormente quando as testemunhas, em sede policial, foram
unânimes em afirmar que não trabalharam na campanha eleitoral.
Destaco, por derradeiro, que o dolo específico do crime em espécie ficou bem
delineado, como bem asseverou a Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer de fls. 398/412,
que passo a transcrever:

“Portanto, o conjunto probatório produzido nos autos é suficiente à comprovação do elemento


subjetivo do tipo penal-eleitoral da corrupção, já que as testemunhas ouvidas, tanto na fase
policial, quanto na esfera judicial, afirmam que o recorrente ANDERSON SEGATTO
GHIDETTI realizou a doação de combustível, durante o período eleitoral, configurando a
conduta típica na qual fora baseada a condenação.”

Diante do conjunto fático e probatório, restou plenamente aperfeiçoada a autoria e


a materialidade da conduta delitiva do Recorrente, prevista no art. 299 do Código Eleitoral, na
forma do art. 71, do Código Penal.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, NEGO PROVIMENTO
e mantenho a sentença inalterada em todos os seus termos, por seus próprios fundamentos.
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É como voto, Senhor Presidente.

VOTO DIVERGENTE

O Sr. JURISTA ADRIANO ATHAYDE COUTINHO (REVISOR):-


Senhor Presidente: Ouso discordar da conclusão do eminente Relator pelos
seguintes fundamentos.
Versam os presentes autos de recurso criminal interposto pelo ANDERSON
SEGATTO GHIDETTI em face da sentença de fls. 335/348, proferida pelo MM. Juiz da 20ª
Zona Eleitoral, que o condenou à pena privativa de liberdade pelo prazo de 03 (três) anos e 09
(nove) meses, pela prática do delito previsto no art. 299, da Lei nº. 4.747/65, na forma do art. 71,
do Código Penal.
Narra a denúncia, às fls. 02/05, que, nas eleições de 2008, o ora Recorrente, então
candidato a vereador no município de Aracruz/ES, teria doado combustíveis a eleitores do
município nos dez dias que antecederam a data das eleições, ocorrida em 05.10.2008, visando a
obtenção de votos em seu favor.
Na oportunidade, relata que a autoria e materialidade do delito estão demonstradas
nos boletos de autorização de abastecimentos apreendidos em diligência do Ministério Público
em 04.10.2008 (fls. 33 a 68 do IP nº. 740/2008), na nota fiscal nº. 12372 que está acompanhada
de demonstrativo de vendas expedido pelo posto revendedor na qual consta o nome do acusado
como responsável financeiro por 38 (trinta e oito) abastecimentos em 24 (vinte e quatro) veículos
nos dez dias que antecederam as eleições (fls. 120/122 do IP nº. 740/2008) e nos depoimentos dos
eleitores que foram beneficiados com os combustíveis. Para comprovar o alegado, arrola as
seguintes testemunhas (fls. 06/07): José Lima dos Santos, Francivaldo Abílio de Sousa, Manoel
Gomes Bandeira, José Nilson de Jesus Barros, Josemar Miranda de Jesus, Marilha Vescovi
Gadioli Castoldi e Dionel Elias Monteiro.
Em suas razões, às fls. 353/79, o Recorrente aduz que (a) todos os corruptores
eleitorais passivos, indicados pelo Parquet, firmaram contrato de cessão de veículo/moto para
adesivagem como propaganda e participação em eventos da campanha eleitoral de 2008; (b)
todos os abastecimentos foram declarados na respectiva prestação de contas apresentada à Justiça
Eleitoral; (c) todos os supostos corruptores eleitorais passivos afirmaram em juízo que não
receberam nenhum tipo de vantagem ou promessas em troca de voto; (d) não se extrai dos autos
qualquer indício de que o Recorrente tivesse feito abordagem direta aos cinco eleitores
descriminados na inicial com o objetivo de obter votos. Ao final, requer a absolvição do
Recorrente.
Às fls. 398/412, a Procuradoria Regional Eleitoral pugna pelo improvimento do
presente recurso.
É a síntese necessária.
O crime de corrupção eleitoral está previsto no artigo 299, do Código Eleitoral, in
verbis:
Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para
outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar
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voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja
aceita:
Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

A norma penal tutela o livre exercício da liberdade de voto. O delito do art. 299 do
Código Eleitoral constitui crime comum, tendo como sujeito ativo qualquer pessoa.
É indispensável para a caracterização do delito que a vantagem, a promessa, o
benefício vise à obtenção de voto. O tipo penal pune tanto a conduta de compra de voto como a
de compra de obtenção ou promessa de abstenção de voto.
Não se exige a comprovação de pedido explícito ou direto de voto1. No entanto, é
indispensável à configuração da corrupção eleitoral a existência de elementos que indiquem,
satisfatoriamente, a negociação do voto ou da abstenção através do oferecimento, promessa ou
doação de alguma vantagem ou benefício para o eleitor.2 Nesse sentido, tem se posicionado a
Corte Superior, senão vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENAL.


PREFEITO, VICE-PREFEITO E VEREADOR. CRIME DE
CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CE. DOLO ESPECÍFICO.
COMPROVAÇÃO. PROVA INDIRETA. PRAZO PRESCRICIONAL.
CONTAGEM. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 115 DO
CP. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE. CRITÉRIOS ABSTRATOS E
GENÉRICOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Para a configuração do delito de corrupção eleitoral exige-se a
finalidade de obter ou dar o voto ou conseguir ou prometer a abstenção, o
que não se confunde com o pedido expresso de voto. Precedentes.
2. A verificação do dolo específico em cada caso é feita de forma
indireta, por meio da análise das circunstâncias de fato, tais como a
conduta do agente, a forma de execução do delito e o meio empregado.
[...]
Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 7758, Acórdão de
06/03/2012, Relator(a) Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, Publicação:
DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 65, Data 09/04/2012, Página
16 )

O tipo penal exige uma finalidade específica, qual seja, o fim de obter ou dar voto
ou promessa da abstenção. De sorte que o fim especial da conduta constante no tipo penal
1
Ação penal. Corrupção eleitoral.
[...]
3. O pedido expresso de voto não é exigência para a configuração do delito previsto no art. 299 do Código Eleitoral, mas sim a
comprovação da finalidade de obter ou dar voto ou prometer abstenção.
4. A circunstância de a compra de voto ter sido confirmada por uma única testemunha não retira a credibilidade nem a validade
da prova.
Embargos de declaração recebidos como agravo regimental e não provido.
(Embargos de Declaração em Recurso Especial Eleitoral nº 58245, Acórdão de 02/03/2011, Relator(a) Min. ARNALDO
VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 89, Data 12/05/2011, Página 31 RJTSE -
Revista de jurisprudência do TSE, Volume 22, Tomo 2, Data 02/03/2011, Página 92 )
2
ZILIO, Rodrigo López. Crimes Eleitorais. Ed. JusPodivm. Ano 2014. Pg. 105.
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previsto no art. 299, do Código Eleitoral deve estar presente, sob pena de não restar configurado
o ilícito penal em comento.3
Feitas tais considerações acerca da norma estatuída no art. 299, do Código
Eleitoral, passo a apreciar o conjunto probatório colacionado aos presentes autos.
Da análise do Demonstrativo de Vendas por Cliente referente à nota fiscal nº
12372, no valor de R$ 1.054,52 (Um mil, cinquenta e quatro reais e cinquenta e dois centavos)
emitida pela VESCOVI & BITTI LTDA (POSTO TREVÃO), na qual consta o Recorrente como
responsável financeiro (fls. 120/122 do IP nº. 740/2008), verifico que, à exceção do veículo com
Placa MPI 4343, todos os demais veículos abastecidos foram declarados na prestação de contas
de campanha do Recorrente, alguns foram adesivados e utilizados em eventos da campanha
eleitoral, outros foram utilizados na divulgação de propaganda eleitoral, sendo acordado que os
abastecimentos dos veículos era encargo do Recorrente, consoante se infere dos contratos de
cessão e de prestação de serviços acostados aos autos às fls. 61/115 e 232 e 237, que foram parte
integrante da prestação de contas do Recorrente, referente às eleições de 2008.
Inclusive, verifico que José Nilson de Jesus Barros e Josemar Miranda de Jesus,
testemunhas arroladas pela acusação, cederam seus veículos para adesivagem e participação em
eventos de campanha (fls. 76 e 83/84 e 81/82 e 89). E, Marilha Vescovi Gadioli Castoldi,
testemunha, também arrolada pelo Parquet, confirmou que seu marido, Jocimar Foresti Castoldi
também cedeu seu veículo para adesivagem e participação em eventos da campanha eleitoral do
Recorrente (fl. 87/88).
Não me parece razoável concluir, como entendeu o douto magistrado, que os
contratos foram simulados e realizados em data posterior aos fatos narrados na exordial como
forma de justificar os abastecimentos visando dar aparência de legalidade à conduta de
distribuição de “vales combustível”, consoante se extrai de parte da sentença que ora destaco:

“[...] O depoente Josemar Miranda de Jesus nitidamente foi orientado em


seu depoimento a modificar o que disse na esfera policial, inclusive,
sendo “lembrado” pelo questionamento feito pela defesa sobre o
“contrato” de cessão do automóvel para campanha, contrato este que,
pelas circunstâncias, concluo ter sido simulado em data posterior para
justificar o abastecimento. [...] Muito embora a defesa sustente que os
contratos e a prestação de contas são prova da legalidade dos pagamentos,
discordo de tal afirmação, pois como afirmado, os contratos foram
simulados para dar aparência de legalidade em conduta que, na verdade,
apenas representava a concessão de vantagens e benefícios em troca de
apoio nas eleições municipais que ocorreram em 2008, [...]”
3
RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CRIME. ARTIGO 299 DO CE. CORRUPÇÃO
ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO DE COMBUSTÍVEL A ELEITORES. REALIZAÇÃO DE PASSEATA. ALEGAÇÃO.
AUSÊNCIA. DOLO ESPECÍFICO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PROVIMENTO. 1. Esta Corte tem entendido que, para a
configuração do crime descrito no art. 299 do CE, é necessário o dolo específico que exige o tipo penal, qual seja, a finalidade de
"obter ou dar voto" e "conseguir ou prometer abstenção". Precedentes. 2. No caso, a peça inaugural não descreve que a
distribuição de combustível a eleitores teria ocorrido em troca de votos. Ausente o elemento subjetivo do tipo, o trancamento da
ação penal é medida que se impõe ante a atipicidade da conduta. 3. Recurso parcialmente provido e, nesta extensão, concedida a
ordem para trancar a ação penal ante a atipicidade da conduta.

(TSE - RHC: 142354 GO, Relator: Min. LAURITA HILÁRIO VAZ, Data de Julgamento: 24/10/2013, Data de Publicação: DJE -
Diário de justiça eletrônico, Tomo 232, Data 05/12/2013, Página 67/68)
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A uma, por que verifico que os termos/contratos foram assinados pelas
testemunhas e apresentados juntamente com a prestação de contas, por ocasião da entrega à
Justiça Eleitoral, em data que antecedeu às declarações prestadas na esfera policial, inclusive
verifico que para cada contrato foram emitidos os respectivos recibos eleitorais que, frise-se,
estão assinados pelos respectivos contratados, consoante podemos atestar da peça que deve
integrar a prestação de contas denominada “Demonstrativo dos Recursos Arrecadados”, às fls.
120/129 e da documentação acostada aos autos, às fls. 158/160. E, a duas, por que na esfera penal
não pode o julgador basear-se em conjecturas para exarar decisão condenatória.
Destaco que das 07 (sete) testemunhas arroladas pela acusação, 06 (seis) foram
ouvidas em juízo, a saber, José Lima dos Santos, Francivaldo Abílio de Sousa, José Nilson de
Jesus Barros, Josemar Miranda de Jesus, Marilha Vescovi Gadioli Castoldi e Dionel Elias
Monteiro. Dessas testemunhas, José Nilson de Jesus Barros e Josemar Miranda de Jesus
confirmaram terem assinado os termos de cessão (fls.282/285); Marilha Vescovi Gadioli Castoldi
confirmou que a assinatura aposta no contrato era de seu marido (Jocimar Foresti Castoldi) (fls.
289/290); Dionel Elias Monteiro afirmou que nunca esteve no comitê eleitoral do denunciado
(fls. 280/281) e José Lima dos Santos e Francivaldo Abílio de Sousa, respectivamente, frentista e
comandante dos frentistas, à época dos fatos, em nada contribuíram para atestar os fatos narradas
na exordial (fls. 286/288).

Embora algumas testemunhas tenham apresentado testemunhos contraditórios,


quando comparado aos realizados na esfera policial, fato que fez com que o juízo a quo
encaminhasse cópias para a Policia Federal para instauração de inquérito visando à apuração de
falso testemunho (fl. 279), fato é que nenhuma das testemunhas ouvidas em juízo, sob o manto do
contraditório e ampla defesa, confirmaram que as autorizações de abastecimentos foram
oferecidos em troca de voto.
No tocante as “autorizações de abastecimentos”, emitidos nas datas que
antecederam o pleito de 2008, acostada aos autos, às fls. 33/68 do IP nº. 740/2008, tenho dúvidas
em afirmar que todos os “vales” foram distribuídos pelo comitê de campanha do Recorrente.
Depreendem-se dos testemunhos de Jose Lima dos Santos e Francivaldo Abílio de Sousa,
respectivamente, frentista e comandante dos frentistas do Posto Trevão, à época dos fatos, que
outros candidatos também tinham o costume de autorizar abastecimentos, senão vejamos:

“[...] que trabalha no posto Trevão desde 1999 até hoje; [...] que na época
da política, a maioria dos candidatos mandavam abastecer no posto
Trevão; [...] que os abastecimentos ocorriam tanto durante o dia como a
noite; que ao receber a autorização, levava para o rapaz do caixa para
conferir o documento e depois fazia o abastecimento; [...] que não
consegue recordar se a documentação apreendida no posto era de um
candidato específico ou de vários; que não se lembra se, nesta
documentação, havia documentos do Anderson Guidetti.[...]
[Depoimento de Jose Lima dos Santos (fls. 286/287)]
“[...] que na época trabalhava como chefe de fiscalização da pista,
comandando os frentistas; que na época de política haviam as requisições
de abastecimentos;[...] que não tem como afirmar, com certeza, que as
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pessoas que iriam abastecer eram ou não funcionários de campanha; que
verificavam a requisição e o adesivo de campanha e não questionavam
mais nada;[...] que outros candidatos também apresentavam requisições
de abastecimentos no posto, e não apenas o ora denunciado;[...]
[Depoimento de Francivaldo Abílio de Sousa (fl. 288)]

Ademais, verifico não ser possível correlacionar tais “autorizações” e cupons


fiscais (fls. 33/68) à campanha do Recorrente, posto que, além de verificar que, juntamente, com
a documentação fora apreendido cupom fiscal no qual o responsável pelo pagamento dos
combustíveis era o candidato à época, Marcelo de Souza Coelho (fl.67), verifico que as
“autorizações” se apresentam, ora, com a placa do veículo e nome do condutor, ora, tão somente,
com a placa do veículo. E os cupons fiscais se apresentam ora sem identificação do fornecedor e
ora com a identificação do Sr. Lomanto Gabidelle Gatti (fls. 55/66 e 68), de modo que, pondero
que tais documentos não comprovam os fatos narrados na exordial, sendo, portanto, inservíveis a
fundamentar o decreto condenatório.
Podemos até concluir que a distribuição de vale combustíveis traz em seu bojo a
associação intrínseca com o pedido de voto, até mesmo por que, regra geral, a compra de votos
ocorre às ocultas. No entanto, analisando o conjunto probatório, ainda que não tivéssemos os
contratos a acobertar as autorizações de abastecimentos, nenhuma das testemunhas afirmou que o
Recorrente teria distribuído combustíveis em troca de voto.

Constato que as testemunhas, em juízo, - José Nilson de Jesus Barros, Josemar


Miranda de Jesus e Marilha Vescovi Gadioli Castoldi - afirmaram que o recebimento de vale
combustível era dado àqueles que adesivassem o veículo. No entanto, a distribuição de “vale
combustível” em troca de afixação de adesivos não caracteriza o crime em questão, porquanto
está ausente o dolo específico necessário para a caracterização da corrupção eleitoral, qual seja, a
finalidade de “obter ou dar voto”.
Inclusive, não é outro o entendimento do c. Tribunal Superior Eleitoral. Confira-
se:

ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL.


AÇÃO PENAL. IMPROCEDÊNCIA. CORRUPÇÃO ELEITORAL.
DISTRIBUIÇÃO DE VALE-COMBUSTÍVEL EM TROCA DA
AFIXAÇÃO DE ADESIVOS. DOLO ESPECÍFICO DE CAPTAR
VOTOS. AUSÊNCIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA.
PROVIMENTO.
1. Segundo a jurisprudência desta Corte, para a configuração do crime
descrito no art. 299 do CE, é necessário o dolo específico que exige o tipo
penal, isto é, a finalidade de "obter ou dar voto" e "conseguir ou prometer
abstenção" (RHC nº 142354, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 5.12.2013).
2. Na espécie, o recebimento da vantagem - materializada na distribuição
de vale combustível -, foi condicionado à fixação de adesivo de campanha
em veículo e não à obtenção do voto. Desse modo, o reconhecimento da
improcedência da ação penal é medida que se impõe.
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3. Agravo regimental provido para conhecer e prover o recurso especial
e julgar improcedente a ação penal, afastando a condenação do agravante
pela prática do crime de corrupção eleitoral.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 291, Acórdão de


03/02/2015, Relator(a) Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS
MOURA, Relator(a) designado(a) Min. LUCIANA CHRISTINA
GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico,
Tomo 42, Data 04/03/2015, Página 220 )

E da e. Corte Regional de São Paulo, veja-se:

RECURSO CRIMINAL - ARTIGO 299 DO CÓDIGO ELEITORAL -


SENTENÇA CONDENATÓRIA - PRELIMINAR DE NULIDADE
ARGUIDA POR PELO RECORRENTE GILMAR EM RAZÃO DE SER
CIVILMENTE INCAPAZ E TER SIDO OUVIDO NO INQUÉRITO
SEM O ACOMPANHAMENTO DE SUA CURADORA - NULIDADE
RELATIVA - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO -
MATÉRIA PRELIMINAR REPELIDA - MÉRITO - DISTRIBUIÇÃO
DE VALES-COMBUSTÍVEL EM TROCA DA AFIXAÇÃO DE
ADESIVOS COM PROPAGANDA ELEITORAL - AUSÊNCIA DE
PROVAS SUFICIENTES QUANTO À CONFIGURAÇÃO DOS
ILÍCITOS - RECURSOS PROVIDOS PARA ABSOLVER OS RÉUS
COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 386, VII, DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL.

(TRE-SP. RECURSO CRIMINAL nº 40270, Acórdão de 25/08/2015,


Relator (a) MÁRIO DEVIENNE FERRAZ, Publicação: DJESP - Diário
da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 03/09/2015)

A meu ver, não há nos autos qualquer prova de que o Recorrente tenha
efetivamente distribuído combustível em troca de sufrágio a configurar o dolo específico exigido
pelo tipo penal.
As provas são frágeis não se revelando robustas para assentar que o Recorrente
ofereceu a benesse em troca de sufrágio, de maneira a configurar o dolo específico estabelecido
pelo tipo penal a ensejar o decreto condenatório.
Não é demais lembrar que “[...] Nenhuma acusação penal se presume provada.
Não compete ao réu demonstrar a sua inocência. Cabe ao Ministério Público comprovar, de
forma inequívoca, a culpabilidade do acusado. Já não mais prevalece, em nosso sistema de direito
positivo, a regra, que, em dado momento histórico do processo político brasileiro (Estado Novo),
criou, para o réu, com a falta de pudor que caracteriza os regimes autoritários, a obrigação de o
acusado provar a sua própria inocência (Decreto-Lei nº 88, de 20/12/37, art. 20, n. 5). [...]” 4

4
STF. HC 73338, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 13/08/1996, DJ 19-12-1996 PP-51766
EMENT VOL-01855-02 PP-00270)
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Destarte, diante da precariedade das provas acostadas aos autos, faz-se mister
absolver o Recorrente, ante a ausência do dolo específico a configurar o crime de corrupção
eleitoral, nos termos do art. 299, do Código Eleitoral.
Por tais razões, dou provimento ao recurso, para reformar a sentença e absolver o
Recorrente, nos termos do artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.
É como voto.

PEDIDO DE VISTA

O Sr. JUIZ DE DIREITO HELIMAR PINTO:-


Senhor Presidente, respeitosamente, peço vista dos autos.

DECISÃO: Adiada a pedido de vista do Dr. Helimar Pinto.

Presidência do Desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama (Presidente).


Presentes o Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior e os Juízes Helimar Pinto, Aldary Nunes
Junior, Cristiane Conde Chmatalik, Adriano Athayde Coutinho e Wilma Chequer Bou-Habib
(Suplente).
Presente também o Dr. Carlos Vinícius Soares Cabeleira, Procurador Regional Eleitoral.

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SESSÃO ORDINÁRIA
24-01-2017

PROCESSO Nº 3-39.2015.6.08.0020 - CLASSE 31 – (Continuação do julgamento)


NOTAS TAQUIGRÁFICAS – Fls. 1/5

VOTO-VISTA

O Sr. JUIZ DE DIREITO HELIMAR PINTO:-


Senhor Presidente: Dada a complexidade do presente caso, tive por bem solicitar
vista dos autos para tecer algumas ponderações.
Conforme relatado pelo Ilustre Relator Desembargador Samuel Meira Brasil
Júnior, trata-se de Recurso Criminal interposto por Anderson Segatto Ghidetti em face da r.
sentença proferida pelo Juízo da 20ª Zona Eleitoral às fls. 335/348, através da qual julgou-se
procedente a denúncia oferecida pelo Ministério Público Eleitoral, condenando o ora recorrente à
pena de 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, pela prática do crime de corrupção eleitoral,
previsto no artigo 299 do Código Eleitoral Brasileiro.
Segundo a denúncia, o ora recorrente, nas eleições de 2008, enquanto candidato a
vereador no Município de Aracruz/ES, realizou doações de combustíveis a eleitores do referido
município nos dez dias que antecederam a data das eleições, a qual ocorreu em 05 de outubro de
2008, visando a obtenção de votos em seu favor.
Em seu recurso, às fls. 353/379, o ora recorrente aduz, em síntese, que o conjunto
probatório não se revela robusto suficiente a ensejar a condenação, eis que o ilícito não teria
restado caracterizado. Requer, ao final, a reforma da sentença, a fim de que seja absolvido pela
prática do delito previsto no art. 299, do Código Eleitoral e, alternativamente, na hipótese de
manutenção da condenação, postula pela redução da pena aplicada, ante a condição de
primariedade do réu.
O Ministério Público de primeiro grau apresentou contrarrazões às fls. 382/393,
postulando pelo conhecimento do recurso e pelo seu desprovimento, a fim de que seja mantida
incólume a r. sentença guerreada.
Em parecer de fls. 398/412, a Douta Procuradoria Regional Eleitoral opinou, de
igual forma, pela manutenção do provimento jurisdicional proferido pelo Juízo de primeiro grau.
Em julgamento realizado no dia 14 de dezembro de 2016, o eminente Relator,
Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior, votou no sentido de negar provimento ao recurso
por entender que restou caracterizada a autoria e materialidade da conduta delitiva do recorrente.
O Culto Revisor, Dr. Adriano Athayde Coutinho, por sua vez, divergiu do
eminente relator para absolver o recorrente, votando pelo provimento do recurso.
Pois bem.
Convém pontuar, inicialmente, que de uma forma geral, os crimes eleitorais
objetivam a proteção de bens e valores políticos-eleitorais preciosos à vida coletiva e,
especialmente à democracia. Tais bens são eminentemente públicos, indisponíveis e
inderrogáveis, destacando-se, dentre eles, a lisura e a legitimidade do processo eleitoral (em
sentido amplo), o livre exercício da cidadania e dos direitos políticos ativos e passivos, o
resguardo do direito fundamental ao sufrágio, a regularidade da campanha política, da
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propaganda eleitoral, da arrecadação e do dispêndio de recursos, a veracidade do voto e a
representatividade.1
No caso em apreço, o recorrente foi condenado à pena de 03 (três) anos e 09
(nove) meses de reclusão pela prática do crime de corrupção eleitoral, previsto no artigo 299 do
Código Eleitoral Brasileiro. In verbis:

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para


outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para
conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita.
Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-
multa.

Da análise do dispositivo supra, tem-se que nas três primeiras hipóteses (dar,
oferecer e prometer) o crime de corrupção ativa, ou seja, aquela praticada por candidato (ou de
alguém por ele) para com o eleitor, enquanto nas duas últimas (solicitar ou receber), verifica-se a
corrupção passiva, cometida pelo eleitor para com o candidato ou seus cabos eleitorais.
De qualquer modo, trata-se de tipo penal eleitoral misto alternativo, de forma que a
ocorrência de crime de corrupção será verificada quando da prática de qualquer um dos verbos
que compõem o dispositivo supratranscrito. Além disso, dado a sua natureza formal, para que
ocorra sua consumação, basta a oferta (independente de aceitação), a promessa (independente de
cumprimento), ou a solicitação (ainda que não seja atendido), de modo que a entrega concreta,
efetiva, e real da coisa, bem ou produto, ou mesmo a transferência de sua propriedade, posse ou
detenção, configura mero esgotamento da ação delituosa.
Além disso, para a configuração do crime de corrupção eleitoral, exige-se a
comprovação de dolo específico, ou seja, exige-se que reste comprovada a intenção do agente em
obter o voto ou, ainda, em conseguir ou prometer abstenção, como propósito único da ação.
Nesse sentido é a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

“Recurso especial eleitoral. Crime eleitoral. Corrupção eleitoral.


Concurso formal imperfeito. Caracterização. Impossibilidade de revisão de fatos e
provas. Dissídio jurisprudencial não demonstrado. 1. Não há violação ao art. 275 do
Código Eleitoral quando as teses da defesa são examinadas. 2. O recurso especial não
se presta ao reexame de matéria fático-probatória. 3. O crime de corrupção eleitoral
(Cod. Eleitoral, art. 299), na modalidade "prometer" ou "oferecer", é formal e se
consuma no momento em que é feita a promessa ou oferta, independentemente de ela
ser aceita ou não. 4. A oferta de dinheiro em troca do voto, realizada em ação única, a
mais de uma pessoa, caracteriza o tipo do art. 299 em relação a cada um dos eleitores
identificados. 5. Há concurso formal impróprio, ou imperfeito, quando o candidato,
em conduta única, promete bem ou vantagem em troca do voto de dois ou mais
eleitores determinados, agindo com desígnios autônomos (Cód. Penal, art. 70,
segunda parte). Recurso especial desprovido. (TSE - REspe: 1226697 MG, Relator:
Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Data de Julgamento: 03/09/2014, Data de

1
GOMES. Jairo José. Crimes e Processo Penal Eleitorais. São Paulo: Atlas. 2015. Pg. 3.
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Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 183, Data 30/09/2014, Página
487/488)”

Na hipótese vertente dos autos, o recorrente foi denunciado por, supostamente,


durante período de campanha eleitoral de 2008, enquanto concorria ao cargo de vereador,
oferecer e entregar autorizações para abastecimento de combustível em veículos, condicionando a
oferta à colagem de adesivos de campanha eleitoral de si mesmo nos veículos dos eleitores.
Conforme asseverado pelo eminente Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior,
em seu voto condutor, restou devidamente comprovado nos autos do processo que o recorrente
promoveu o fornecimento de vales combustíveis para terceiros que não possuíam ligação com a
sua campanha eleitoral, haja vista que no período de 25/09/2008 a 04/10/2008, 24 (vinte e quatro)
veículos foram abastecidos no Posto Trevão, mediante apresentação de 26 (vinte e seis)
autorizações de abastecimento fornecidos pelo recorrente, conforme se verifica através da Nota
Fiscal nº 12372 de fl. 120.
Ademais, os depoimentos das testemunhas, amplamente rememorados no voto
condutor, revelam o dolo específico do agente.
Nesse ínterim, após a análise conjunta das provas produzidas, o eminente Relator
concluiu pela responsabilidade criminal do recorrente, nos termos da denúncia oferecida pelo
Ministério Público Eleitoral.
No meu sentir, decidiu acertadamente o douto Desembargador Relator, haja vista
que, diante de todo o conjunto fático e probatório existente nos presentes autos, restou
plenamente aperfeiçoada a autoria e a materialidade da conduta delitiva prevista no art. 299 do
Código Eleitoral.
Isto porque, em que pese a alegação do recorrente no que tange à fragilidade da
prova testemunhal presente nos autos, e que a mesma não possui contundência suficiente para
ensejar a sua condenação, há que se rememorar que o direito processual brasileiro adota o sistema
do livre convencimento motivado ou princípio da persuasão racional, segundo o qual o juiz pode
se valer de todos os meios de prova admitidos em direito para formar sua convicção, não estando
adstrito exclusivamente a provas técnicas ou periciais.
Há que se ressaltar, ainda, que a jurisprudência desta Egrégia Corte tem entendido
pelo perfeito cabimento da prova testemunhal para comprovação de fato tipificado como crime.
Confira-se:

“RECURSO CRIMINAL - CRIME PREVISTO NO ARTIGO 299


DO CÓDIGO ELEITORAL - CORRUPÇÃO ELEITORAL - AUTORIA E
MATERIALIDADE CONFIRMADAS PELOS DEPOIMENTOS PRESTADOS -
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU - RECURSO
IMPROVIDO. 1. Diversamente do que alegam os recorrentes, verifica-se presente
nos autos substancioso conjunto probatório - especialmente depoimentos
testemunhais - que não deixa dúvidas no tocante à infringência do disposto no
art. 299, do Código Eleitoral, razão pela qual me sinto bastante confortável para
confirmar a sentença do juízo de piso, inclusive com relação à dosimetria
efetuada. 2. No tocante à tese dos recorrentes, no sentido de que estariam sendo
vítimas de perseguição política perpetrada pelo grupo político adversário do prefeito
cassado, Sr. José Chierici Filho, tenho que a mesma não procede, por absoluta
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ausência de provas. 3. No caso dos autos, entendo, em cotejo com as provas
apresentadas, presente o dolo específico, requisito necessário para a configuração do
delito, consistente na finalidade de obter para si ou para outrem o voto, consoante
farta jurisprudência do colendo Tribunal Superior Eleitoral. Por essa razão e
absolutamente convencido da correção da decisão do juiz eleitoral, conheço o
recurso, mas nego-lhe provimento (TRE-ES - RC: 12202 ES , Relator: MARCELO
ABELHA RODRIGUES, Data de Julgamento: 08/02/2012, Data de Publicação: DJE
- Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do ES, Data 01/03/2012, Página 02).”

À vista disso, o argumento levantado pelo recorrente de que meras declarações


testemunhais são provas muito frágeis para comprovação do delito não pode servir como escusa
para que o mesmo não seja penalizado pelo crime cometido, tendo em vista que os depoimentos
presentes nos autos formam um conjunto probatório consistente e coerente apto a corroborar a
constatação da ocorrência do crime tipificado no art. 299 do Código Eleitoral.
Por outro lado, em que pese o judicioso voto divergente proferido pelo Dr.
Adriano Athayde Coutinho, no meu sentir, no presente caso, restou configurado o dolo
específico, eis que a regra era clara no sentido de que só podiam ser abastecidos os veículos que
tivessem afixado o adesivo de campanha do ora recorrente. E, nesta ótica, chega-se à conclusão
de que, ainda que as pessoas não tenham efetivamente votado no ora recorrente, o fato é que a
intenção do então candidato era a de obter o voto dos aludidos eleitores, configurando, por
conseguinte, o dolo específico necessário à configuração do delito previsto no art. 299, do Código
Eleitoral.
Desse modo, nos termos do parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral,
entendo que “o conjunto probatório produzido nos autos é suficiente à comprovação do elemento
subjetivo do tipo penal-eleitoral da corrupção, já que as testemunhas ouvidas, tanto na fase
policial, quanto na esfera judicial, afirmam que o recorrente ANDERSON SEGATTO
GHIDETTI realizou a doação de combustível, durante o período eleitoral, configurando a
conduta típica na qual fora baseada a condenação.” (fl. 412).
Verifico, ainda, que, ao fixar a pena, o magistrado observou os critérios instituídos
pelo artigo 59 do Código Penal, não havendo qualquer alteração a ser feita.
Ante o exposto, rogando vênia ao voto divergente, acompanho o voto proferido
pelo eminente relator, no sentido de CONHECER do recurso e, no mérito, NEGAR-LHE
PROVIMENTO, mantendo a sentença inalterada em todos os seus termos, por seus próprios
fundamentos.
É como voto.

PEDIDO DE VISTA

O Sr. JUIZ DE DIREITO ALDARY NUNES JÚNIOR:-


Senhor Presidente: Respeitosamente, peço vista dos presentes autos.

*
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DECISÃO: Adiada em virtude de pedido de vista formulado pelo Dr. Aldary Nunes Júnior.

Presidência do Desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama (Presidente).


Presentes o Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior e os Juízes Helimar Pinto, Aldary Nunes
Júnior, Adriano Athayde Coutinho, José Eduardo Nascimento (Suplente) e Raphael Americano
Câmara (Suplente).
Presente também o Sr. Carlos Vinícius Soares Cabeleira, Procurador Regional Eleitoral.
\cds
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SESSÃO EXTRAORDINÁRIA
26-01-2017

PROCESSO Nº 3-39.2015.6.08.0020 - CLASSE 31 – (Continuação do Julgamento)


NOTAS TAQUIGRÁFICAS – Fls. 1/5

VOTO-VISTA

O Sr. JUIZ DE DIREITO ALDARY NUNES JÚNIOR (RELATOR):-


Senhor Presidente: Relembro que se trata de Recurso Criminal de nº 3-39, de
Relatoria do eminente Desembargador Samuel Meira Brasil Junior, interposto por ANDERSON
SEGATTO GHIDETTI em face da r. sentença de fls. 335/348, proferida pelo MM. Juiz da 20ª
Zona Eleitoral de Aracruz/ES, Dr. Felipe Leitão Gomes, que julgou procedente a Representação
ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, condenando o recorrente à pena privativa
de liberdade de 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão definitiva, em virtude de prática de
corrupção eleitoral, crime previsto no art. 299 da Lei de nº 4.747/65 e na forma do art. 71 do
Código Penal.
O eminente Relator conheceu do recurso e a ele negou provimento, mantendo
inalterada a r. sentença proferida pelo culto Juiz de primeiro grau.
Por sua vez, o ilustre Revisor, Dr. Adriano Athayde Coutinho, por entender
inexistir nos autos prova de que o recorrente tenha efetivamente distribuído combustível em troca
de sufrágio a configurar o dolo específico exigido pelo tipo penal, deu provimento ao recurso
para reformar a sentença e absolvê-lo, nos termos do artigo 386, inciso VII do Código de
Processo Penal.
Depois de pedido de vista, o culto Magistrado Helimar Pinto, acompanhando o
Relator, negou provimento ao recurso.
Em seguida, pedi vista dos autos para melhor apreciar a demanda.
Pois bem!
Conforme disciplina o tipo penal do art. 299 do Código Eleitoral1, o crime de
corrupção eleitoral consiste na intenção do autor de angariar votos ou promessas de abstenção de
votos para beneficiar a sua campanha eleitoral e, em troca, fornece proventos ao beneficiado.
Nas lições de Suzana de Camargo Gomes2 “o caráter negocial é indispensável para
a caracterização do delito, ou seja, a vantagem, a promessa, o benefício deve visar à obtenção do
voto”.

In casu, a meu sentir, nos depoimentos prestados em Juízo, há comprovação de


que o fornecimento de combustível estava condicionado à colocação de adesivos do recorrente
nos veículos a serem abastecidos e não à obtenção de voto em seu favor. Senão vejamos:

1
Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou
qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a
oferta não seja aceita:
Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.
2
GOMES, Suzana de Camargo, Crimes Eleitorais, 4ª ed. Revista, atualizada e ampliada. Ed. Revista dos
Tribunais, pág. 198.
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Depoimento da Testemunha JOSEMAR MIRANDA DE JESUS (fls. 282/283):

[...] que chegou a abastecer o seu veículo em


poucas vezes, acreditando que umas 03 ou 04 vezes, nos
finais de semana; que o trabalho voluntário na campanha
consistia em ficar fazendo propaganda com o carro como
adesivo; [...] que na época da campanha, o depoente procurou
o denunciado, em seu comitê para desivar o seu automóvel,
sendo que lá apenas é que ficou sabendo que quem adesivasse
o veículo ganhava combustível; [...] que nunca recebeu
qualquer proposta do denunciado no sentido de tentar
comprar-lhe o voto.

Em depoimento a Testemunha JOSÉ NILSON DE JESUS BARROS (fls.


282/283):

[...] que para ganhar a autorização de


abastecimento, o depoente tinha que adesivar o carro; [...] que
se não tivesse adesivado o seu veículo, não teria recebido as
autorizações de abastecimento; [...] que o denunciado nunca
tentou comprar o voto do depoente; que não se sentiu
pressionado a votar no denunciado; [...].

Depoimento da Testemunha FRANCIVALDO ABÍLIO DE SOUZA, Chefe da


Fiscalização de pista do Posto Trevão (fls. 288/289):

[...] que era feita a identificação por meio um


adesivo do candidato; [...] que verificavam a requisição e o
adesivo de campanha e não questionavam mais nada; na
época da campanha, o depoente procurou o denunciado, em
seu comitê para adesivar o seu automóvel, sendo que lá
apenas é que ficou sabendo que quem adesivasse o veículo
ganhava combustível; [...].

Depoimento da Testemunha MARÍLIA VESCOVI GADIOLI GASTOLDI


(fls. 282/283):

[...] que recebiam o vale combustível pelo fato


de adesivarem o automóvel; que a partir do momento em que
adesivarem o carro, recebiam semanalmente o combustível;
[...] que jamais recebeu qualquer abordagem do denunciado
no sentido de tentar comprar-lhe o voto.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
Conforme se extrai do acórdão abaixo transcrito, este E. Tribunal, ao analisar o
Recurso Criminal de nº 101-37 de Relatoria do Exmo. Sr. Juiz Federal José Eduardo do
Nascimento, manifestou-se no sentido de que o ilícito penal definido no art. 299 do Código
Eleitoral exige a comprovação do dolo específico do agente de obter votos.

RECURSO ELEITORAL. CORRUPÇÃO


ELEITORAL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. FALTA DE
PROVA DA PRÁTICA DELITUOSA. RECURSO
IMPROVIDO.
1- Após analisar detidamente as provas dos
autos, em especial a prova testemunhal, todavia, assim com a
sentença recorrida, não verifico a existência de provas
suficientes para a caracterização do fim especial de agir
descrito no delito em questão.
2- Os depoimentos das testemunhas ouvidas
em juízo não confirmam a versão apresentada pelo Parquet
Eleitoral de ocorrência da prática delituosa.
3- Não basta que haja distribuição singela de
benesses para que haja a incidência do art. 299 do Código
Eleitoral. Deve necessariamente ficar comprovado que essa
distribuição seja relevante e tenha o propósito de "obter ou dar
voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a
oferta não seja aceita". E, no caso sob exame, não há prova
desse fim especial de agir descrito no referido dispositivo.
4- Recurso conhecido e não provido.
(TRE/ES - RECURSO CRIMINAL nº 10137,
Acórdão nº 42 de 18/05/2015, Relator JOSÉ EDUARDO DO
NASCIMENTO, Revisor SÉRGIO LUIZ TEIXEIRA GAMA,
Publicação: DJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do
ES, Data 27/05/2015, Página 4/5).

Por sua vez, o fornecimento de combustível a eleitor, por candidato, já foi


analisado, em pelo menos duas oportunidades, pelo E. Tribunal Superior Eleitoral, tendo aquela
C. Corte, firmado entendimento no sentido de que, somente restará configurado o delito previsto
no art. 299 do Código Eleitoral quando houver provas de que tal benefício estava condicionado à
obtenção de voto do eleitor. Senão vejamos:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO


DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL.
CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ABUSO DO
PODER ECONÔMICO.
[...]
2. Os fatos registrados pelo acórdão
regional, no presente caso, demonstram que a distribuição
de combustível não estava vinculada a um ato específico
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
de campanha e se deu de forma generalizada, massiva e
repetida, para que os eleitores votassem no candidato e
ostentassem o adesivo da campanha em seus veículos
particulares.
[...]
(Recurso Especial Eleitoral nº 18886, Acórdão
de 08/09/2015, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA
SILVA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo
204, Data 27/10/2015, Página 50-51). (grifei)
---------------------------------------------------------
-----------------
ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL.
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL.
IMPROCEDÊNCIA. CORRUPÇÃO ELEITORAL.
DISTRIBUIÇÃO DE VALE-COMBUSTÍVEL EM TROCA
DA AFIXAÇÃO DE ADESIVOS. DOLO ESPECÍFICO DE
CAPTAR VOTOS. AUSÊNCIA. ATIPICIDADE DA
CONDUTA. PROVIMENTO.
1. Segundo a jurisprudência desta Corte,
para a configuração do crime descrito no art. 299 do CE, é
necessário o dolo específico que exige o tipo penal, isto é, a
finalidade de "obter ou dar voto" e "conseguir ou
prometer abstenção" (RHC nº 142354, Rel. Min. Laurita
Vaz, DJe de 5.12.2013).
2. Na espécie, o recebimento da vantagem -
materializada na distribuição de vale combustível -, foi
condicionado à fixação de adesivo de campanha em
veículo e não à obtenção do voto. Desse modo, o
reconhecimento da improcedência da ação penal é medida
que se impõe.
3. Agravo regimental provido para
conhecer e prover o recurso especial e julgar
improcedente a ação penal, afastando a condenação do
agravante pela prática do crime de corrupção eleitoral.
(Agravo Regimental em Recurso Especial
Eleitoral nº 291, Acórdão de 03/02/2015, Relatora Min.
MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Relatora
designada Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES
LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico,
Tomo 42, Data 04/03/2015, Página 220).

Assim, diante da ausência de prova a configurar o delito específico exigido pelo


tipo penal, o provimento do presente recurso é medida que se impõe.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
Desse modo, pedindo vênias ao ilustre e culto Relator, acompanho o voto
proferido pelo eminente Revisor, dando provimento ao recurso, para reformar a r. sentença de
primeiro grau e absolver o Recorrente, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal3.
Esse é o meu voto, senhor Presidente.

PEDIDO DE VISTA

O Sr. JUIZ FEDERAL JOSÉ EDUARDO NASCIMENTO (SUPLENTE):-


Senhor Presidente: Respeitosamente, peço vista dos presentes autos.

DECISÃO: Adiada em virtude de pedido de vista formulado pelo dr. José Eduardo Nascimento.

Presidência do Desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama (Presidente).


Presentes os Juízes Helimar Pinto, Aldary Nunes Júnior, Adriano Athayde Coutinho, José
Eduardo Nascimento (Suplente) e Raphael Americano Câmara (Suplente).
Presente também o Dr. Carlos Vinícius Soares Cabeleira, Procurador Regional Eleitoral.
\cds

3
Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:
[...]
VII – não existir prova suficiente para a condenação. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008).
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
SESSÃO ORDINÁRIA
29-03-2017

PROCESSO Nº 3-39.2015.6.08.0020 - CLASSE 31 – (Continuação do Julgamento)


NOTAS TAQUIGRÁFICAS – Fls. 1/4

VOTO–VISTA

O Sr. JUIZ FEDERAL JOSÉ EDUARDO DO NASCIMENTO


(SUPLENTE):-
Sr. Presidente, egrégia Corte: Relembrando o objeto deste processo, em que é
recorrente Anderson Cegatto Guidetti e recorrido Ministério Público Eleitoral, trata-se de recurso
criminal interposto em face da sentença de fls. 335/348, de lavra do Juiz Eleitoral da 20ª Zona –
Aracruz, que julgou procedente a pretensão punitiva para condenar o recorrente como incurso nas
sanções do artigo 299 do Código Eleitoral, na forma do artigo 71 do Código Penal, fixando pena
definitiva em três anos nove meses de reclusão.
Narra a denúncia que, nas eleições municipais de 2008 para o cargo de Vereador
do Município de Aracruz, o acusado realizou doação de combustível a diversos eleitores do
Município nos dez dias que antecederam ao pleito visando a obtenção de votos. No período de
25/09/2008 a 04/10/2008, um total de vinte e quatro veículos foi abastecido com combustível
mediante a apresentação de boletos denominados de autorização de abastecimento. A
contrapartida devida pelos eleitores beneficiados com os abastecimentos era a afixação de
adesivos de campanha política do denunciado.
Relembro aos eminentes pares que a votação até o presente momento se encontra
empatada, tendo o eminente Relator, Desembargador Samuel Meira Brasil Junior, e o Juiz de
Direito Helimar Pinto votado pelo conhecimento e desprovimento do recurso, ao passo que, de
outro lado, o eminente Revisor, Dr. Adriano de Athayde Coutinho, e o Juiz de Direito Aldary
Nunes Junior votado pelo provimento do recurso para absolver o acusado.
Com a devida vênia da divergência inaugurada pelo eminente Revisor, eu
acompanho o entendimento explicitado no voto do Relator, Desembargador Samuel Meira Brasil
Junior, no sentido de negar provimento ao recurso pelas seguintes razões.
Para a verificação da ocorrência do delito do artigo 299 do Código Eleitoral, faz-se
necessária a existência do elemento do tipo consistência na finalidade de obter ou dar voto, ou
conseguir ou prometer abstenção. No regime democrático, o exercício do direito ao voto deve se
pautar por critérios programáticos, existindo diversos dispositivos na legislação eleitoral que têm
justamente por finalidade coibir a influência do dinheiro e do poder econômico na formação da
consciência política do eleitor, seja de forma mais indireta, como na proibição do abuso de poder
econômico, seja de forma mais direta, como na corrupção eleitoral propriamente dita, ou na
captação ilícita de sufrágio, em que o voto é objeto de mercancia entre o político e o eleitor.
Essa introdução é apenas para relembrar os colegas face ao tempo que decorreu do
meu pedido de vista. Algumas considerações eu acho importante serem feitas antes de entrar
propriamente no caso deste processo.
A primeira é que se for feita uma pesquisa nos sites de jurisprudência, tanto do
TSE quanto dos TRE pelo Brasil, é enorme a quantidade de casos de processos, seja de captação
ilícita, seja de doação de combustível, versando sobre esse tema, doação de combustível. Isso não
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
é uma mera coincidência, não é um caso isolado que existe na jurisprudência; são inúmeros
casos, em todos os TRE praticamente e no TSE. Que fenômeno é esse que vemos?
Dos dois anos que aqui estive com mandato titular, inúmeros também foram os
caso que julguei de captação ilícita, abuso de poder econômico, em que se via, principalmente nas
eleições em locais menores, o oferecimento de combustível, oferecimento de pequenas reformas,
oferecimento de pagodes com churrasco e cerveja liberados, que sejam. Inúmeros são os casos
versando sobre fenômenos deste tipo, ou seja, o político oferecendo vantagens econômicas de
modo a conquistar a simpatia do eleitorado.
Passando para o outro extremo, são fatos notórios que vale a pena registrar, a
última eleição presidencial de 2014 teve o recorde de gasto em campanha em torno de cem
milhões. Valho-me aqui apenas de notícias de jornal, mas amplamente veiculado, da delação do
Marcelo Odebrecht, ficou, ou pelo menos foi divulgado, registro colhidos nos sites comuns de
notícias, que na verdade fora o tal do caixa dois para as eleições presidenciais da chapa que
acabou vencedora, teria mais cento e tantos milhões dos quase oitenta por cento, ou seja, em
torno de cem milhões, teriam ido para a campanha eleitoral. Quer dizer, estamos falando de uma
campanha de duzentos milhões.
Isso nos faz repensar qual é o papel do dinheiro na formação da política. É óbvio
que não se faz uma sem dinheiro, mas até que ponto é tão importante que o dinheiro seja o
elemento formador da convicção do eleitorado. Se a política local gerou certos desvios que
influenciaram a nacional, ou vice versa, isso é um assunto que não cabe a nós. Seria o caso da
sociologia, da filosofia, de sentir se os políticos estudaram.
O que é certo é que em algum momento é preciso romper com esse paradigma de
que uma eleição se ganha oferecendo benesses e vantagens materiais ao eleitor ao invés de
projetos, programas e idéias.
Nas eleições locais isso fica muito evidente. São reiterados os casos de ofertas de
pequenas benesses, seja construir um muro, ajudar alguém a ir para Vitória fazer uma cirurgia,
arrumar uma vaga num hospital, até mesmo tíquetes de cerveja grátis num pagode. Então, em
algum momento é preciso romper com esse modelo, para não incentivar esse tipo de conduta,
para que o eleitor de uma pequena comunidade possa se interessar pelos projetos do candidato
para a comunidade, e não quantos litros de combustível ele pode dar.
Essas são observações genéricas que eu faço, e aí eu entro no caso especificamente
deste processo objeto do pedido de vista, que se trata de uma distribuição de combustível
mediante adesivagem de veículo. Confesso que quando eu li e comecei a ver a defesa do acusado,
ora recorrente, em princípio me surgiu uma certa dúvida que poderia ensejar o voto no sentido do
provimento do recurso. Qual é essa dúvida? É que realmente há contratos firmados pelo
candidato com os proprietários dos veículos, contratos de cessão, e inclusive há recibos eleitorais,
quer dizer, boa parte, se não me engano só um veículo ficou fora dessa situação, mas a maioria
estava registrada.
Alega o Ministério Público Eleitoral nas contrarrazões recursais suscita dúvidas
quanto à veracidade desses documentos. Realmente, são documentos cuja autenticidade, vamos
dizer assim, na verdade não é bem autenticidade, documentos em relação aos quais a
contemporaneidade não é possível se afirmar porque não há elementos nos autos que nos
permitam concluir que esses documentos foram firmados contemporaneamente às datas ou
posteriormente para legitimar uma doação (esses fatos que estão narrados nos autos) e
descaracterizar uma eventual corrupção eleitoral. Não há essas datas.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
Em princípio, realmente os documentos, ainda que não tenha essas datas, valeriam
a presunção relativa, muito relativa, de que eles são verídicos, as informações, o documento
particular, ainda que sem firma reconhecida. Se ele foi pós-datado, antedatado ou não essas
questões presumem-se que estão no documento.
É preciso comparar isso com o contexto dos autos. Esse é um daqueles casos, e
nesses casos de corrupção isso acontece muito, em que todas as testemunhas ouvidas em sede
policial, na fase pré-processual, firmam depoimentos num sentido e em juízo os depoimentos vão
em sentido bem diferente.
Isso por si só já nos chama a tenção sobre uma possível influência que há em cima
das testemunhas, pressão local, pressão dos políticos, pressão da comunidade, elas mesmas não
querendo se envolver muito nessa situação, mas acabaram envolvidas, mas alguma coisa há,
porque elas mudam radicalmente seus depoimentos da fase policial para a fase judicial. O que é
pior, não apresentam justificativa para tal, apenas dizem de forma um pouco mais genérica,
dizem que não se lembram, mas não dizem que foram coagidas, não dizem que não leram o
documento ou que foram forçadas a assinar, nada disso. Elas apenas mudam o depoimento e não
dão uma explicação razoável para isso. Aí sim seria ônus dela dar, porque o sistema judicial não
pode adotar, não pode aceitar dentro do seu seio um sistema judicial como um todo. Esse é um
fenômeno, a pessoa diz uma coisa, outra hora diz outra e não há sequer uma explicação razoável
para explicar o porquê, ela não fornece uma explicação. Aquela pessoa que muda uma versão
atrai para si o ônus de explicar o porquê da mudança. É isso que ocorre.
Eu, particularmente, entendo no sentido de acompanhar o voto que do Relator pela
seguintes razões: Para mim, não está caracterizado aqui que houve um contrato de cessão lícito de
veículo para trabalhar em campanha, porque mesmo nos depoimentos judiciais, essas pessoas
disseram que não trabalharam na campanha, mas sim que ajudaram uma vez ou outra, que
levaram um candidato num lugar, mas na verdade pegaram a gasolina para utilizar no seu dia a
dia.
Aliás, essa foi uma questão colocada nas contrarrazões que ficou sem resposta pela
defesa do recorrente. Se era um contrato regular de cessão registrado perante a Justiça Eleitoral,
por que a exigência de adesivagem? Por que ganhar o tíquete para ir ao posto abastecer o veículo
se mostrar que está adesivado o seu veículo? Isso nos leva a outra indagação, que para mim é
fundamental para diferencia uma doação eleitoral lícita do fato que foi aqui objeto dessa denúncia
que ensejou a condenação: Não se trata aqui de uma arregimentação de cabos eleitorais, porque
isso as testemunhas que também foram ouvidas em juízo deixaram escapar isso. Qualquer pessoa
que se dirigisse ao comitê e aceitasse adesivar o seu carro teria o tíquete de combustível. Isso
quer dizer que não é um grupo que se reúne, uma equipe que iria trabalhar na campanha. Esse
tipo de equipe pode ter o combustível pago pelo candidato. Mas não, era uma proposta aberta,
indiscriminada, posta à população.
Ora, quem comparecer ao comitê e aceitar adesivar o seu veículo vai ganhar um
vale, um tíquete combustível para abastecer o seu tanque no posto de gasolina. À medida em que
essa é uma proposta aberta, indiscriminadamente oferecida a qualquer eleitor, para mim está claro
que se trata de uma proposta de agraciar o eleitor, angariar sua simpatia em troca de uma benesse
material, o que, em outras palavras, é o que amolda ao tipo da corrupção eleitoral.
Registro ainda que para o tipo da corrupção eleitoral nós nunca vamos ter, e se se
exigir isso, nunca haverá uma condenação com esse objeto. Se se exigir que sejam ditas as
palavras sacramentais e formais “O senhor quer vender o seu voto? Eu estou disposto a comprá-
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
lo?”, evidente que nunca ninguém diz isso, muitas das vezes é subtendido, está nas entrelinhas,
como aliás já acontecia muito na corrupção do Código Penal comum. Muitas das vezes o
administrado chega perante o servidor, quer oferecer uma vantagem indevida e pergunta: “O
senhor está precisando de alguma coisa? Em que eu posso ajudar?” De repente um policial na
rua, alguém flagrado em alguma situação irregular, ele tem medo de fazer a proposta de forma
direta.
Essa coisa da oferta e do recebimento no crime de corrupção, tanto a corrupção
comum do Código Penal quanto a corrupção do 299 do Código Eleitoral, por vezes comporta
esses liames subjetivos, esses liames das entrelinhas no modo que são feitos tanto a proposta
quanto do recebimento.
De modo que, com essas considerações, eu acompanho o voto do Relator,
Desembargador Samuel Meira Brasil Junior, no sentido de negar provimento ao recurso.
É como voto.

P E D I D O de V I S T A

O Sr. JURISTA RODRIGO MARQUES DE ABREU JÚDICE:-


Sr. Presidente, respeitosamente, peço vista dos autos.

DECISÃO: Adiada a pedido de vista do Dr. Rodrigo Marques de Abreu Júdice.

Presidência do Desembargador Carlos Simões Fonseca (Presidente em exercício).


Presentes o Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior e os Juízes Helimar Pinto, Aldary Nunes
Júnior, Adriano Athayde Coutinho, Rodrigo Marques de Abreu Júdice e José Eduardo do
Nascimento.
Presente também o Dr. Carlos Vinícius Soares Cabeleira, Procurador Regional Eleitoral.

\dsl
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Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
SESSÃO ORDINÁRIA
10-04-2017

PROCESSO Nº 3-39.2015.6.08.0020 – CLASSE 31 (Continuação do julgamento)


NOTAS TAQUIGRÁFICAS – Fls. 1/4

VOTOVISTA

O Sr. JURISTA RODRIGO MARQUES DE ABREU JÚDICE:-


Senhor Presidente, Eminentes Pares: Consoante relatado, trata-se de recurso
criminal interposto por ANDERSON SEGATTO GHIDETTI, candidato a vereador no município
de Aracruz/ES, nas eleições de 2008, em face da r. sentença de fls. 335/348, que o condenou a 03
(três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, pela prática do crime de corrupção eleitoral, capitulado
no art. 299, da Lei nº. 4.747/65, consubstanciado na doação de combustível a eleitores em troca
de votos em seu favor.
O Eminente Relator, Desembargador Samuel Meira Brasil, conheceu do recurso e
a ele negou provimento, mantendo incólume a r. sentença de piso.
Por sua vez, o ilustre Revisor, Dr. Adriano Athayde Coutinho, deu provimento ao recurso para
reformar a integralmente a sentença e absolver o recorrente, entendendo inexistir prova nos autos
capaz de demonstrar o dolo específico exigido pelo tipo penal, qual seja, a distribuição de
combustível em troca de votos.
Depois de pedido de vista, o Ilustre Magistrado Helimar Pinto, acompanhando o
Relator, negou provimento ao recurso.
Em seguida, analisando detidamente o caso, o Douto Magistrado Aldary Nunes Junior,
acompanhando a divergência, deu provimento ao recurso e absolveu o Recorrente, nos termos do
voto do Revisor.
Segundo o julgamento, o Eminente Juiz Federal José Eduardo do Nascimento,
entendeu por bem acompanhar o Relator, negando provimento ao recurso.
Submetida a análise a este julgador, pedi vista dos autos para melhor apreciar a demanda.
Pois bem.
É cediço que o crime de corrupção eleitoral, previsto no art. 299 do Código
Eleitoral, consiste em dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem,
qualquer outra vantagem, para angariar votos ou abstenção, ainda que a oferta não seja aceita. In
verbis:

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva,
ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção,
ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

A referida norma penal tutela o livre exercício da liberdade dos direitos político,
especificamente do direito ao voto. A regra incrimina tanto a denominada corrupção eleitoral
ativa (nas modalidades dar, prometer e oferecer) como a corrupção eleitoral passiva (nas
modalidades solicitar e receber).
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
No que se refere ao elemento subjetivo do tipo, consoante leciona Rodrigo López
Zilio, “exige-se um elemento específico ou uma finalidade específica: o fim de obter ou dar o
voto e de promessa ou concretização da abstenção 1”. Trata-se, portanto de crime doloso, em
qualquer de suas modalidades, no qual o dolo genérico é insuficiente.
Assim, para que haja condenação baseada no art. 299 do Código Eleitoral, é
necessária a comprovação do dolo especifico consistente em "obter ou dar voto e para
conseguir ou prometer abstenção", sem o qual não se configura a conduta típica.
É essa a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO PENAL. CRIME


ELEITORAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL (ART. 299, CE). DEFICIÊNCIA NA
FUNDAMENTAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. INTELIGÊNCIA
DA SÚMULA Nº 284 DO STF. TIPIFICAÇÃO. CRIME DE CORRUPÇÃO ELEITORAL
(ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL). DOLO ESPECÍFICO DE OBTER VOTO. REEXAME
DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS
NOS 7 DO STJ E 279 DO STF. DECISÃO MANTIDA. DESPROVIMENTO. 1. O crime de
corrupção eleitoral ativa, cujo bem jurídico tutelado é o livre exercício do voto, se consuma
com o ato de prometer, doar ou ofertar bem, dinheiro ou qualquer vantagem, desde que
imbuído pelo dolo específico de obter voto, consoante a descrição do art. 299 do Código
Eleitoral. [...]. 3. A modificação do entendimento do TRE/SP, para decidir de acordo com a
pretensão do Recorrente, no sentido da não configuração do crime de corrupção eleitoral ativa,
demanda o necessário revolvimento do arcabouço probatório, providência vedada nas instâncias
extraordinárias, nos termos das Súmulas nos 279/STF e 7/STJ. 4. Agravo regimental desprovido.
(TSE - AI: 96665 SEVERÍNIA - SP, Relator: LUIZ FUX, Data de Julgamento: 14/05/2015, Data
de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 117, Data 23/06/2015, Página 86/87).

In casu, analisando atentamente o que consta dos autos, bem como os votos que
me antecederam, verifico que o ponto controvertido neste julgamento versa sobre a possibilidade
de se considerar a distribuição de combustível pelo então candidato ANDERSON SEGATTO
GHIDETTI, ora Recorrente, ato ilícito, consubstanciado na promoção de vantagem indevida em
troca de votos, ou ato lícito, mediante o abastecimento de veículos adesivados para realização de
propaganda eleitoral.
Com efeito, apreciando o conjunto probatório colacionado aos autos, a meu sentir,
entendo que não há a prova robusta capaz de levar à conclusão de que o Recorrente tenha
efetivamente distribuído combustível em troca de votos, nem mesmo de que de os contratos de
cessão de veículos juntados às fls. 61/115 e 232 e 237, possam ser considerados simulados,
visando dar aparência de legalidade da suposta corrupção eleitoral ventilada na denúncia.
Pelo contrário, a análise da prova testemunhal colhida em juízo leva a crer que o fornecimento de
combustível estava condicionado à colocação de adesivos de campanha do recorrente nos
veículos a serem abastecidos e não à obtenção de voto em seu favor.
Como bem ressaltado no voto do Eminente Magistrado Juiz Aldary Nunes Junior, as testemunhas
assim se manifestaram:

1
ZILIO, Rodrigo Lopez. Crimes Eleitorais. 2ªed. Jus Podium: 2016. p. 115
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“Depoimento da Testemunha JOSEMAR MIRANDA DE JESUS (fls. 282/283):

[...] que chegou a abastecer o seu veículo em poucas vezes, acreditando que umas 03 ou 04 vezes,
nos finais de semana; que o trabalho voluntário na campanha consistia em ficar fazendo
propaganda com o carro como adesivo; [...] que na época da campanha, o depoente procurou o
denunciado, em seu comitê para adesivar o seu automóvel, sendo que lá apenas é que ficou
sabendo que quem adesivasse o veículo ganhava combustível; [...] que nunca recebeu qualquer
proposta do denunciado no sentido de tentar comprar-lhe o voto.

Em depoimento a Testemunha JOSÉ NILSON DE JESUS BARROS (fls. 282/283):


[...] que para ganhar a autorização de abastecimento, o depoente tinha que adesivar o carro; [...]
que se não tivesse adesivado o seu veículo, não teria recebido as autorizações de abastecimento;
[...] que o denunciado nunca tentou comprar o voto do depoente; que não se sentiu pressionado a
votar no denunciado; [...].

Depoimento da Testemunha FRANCIVALDO ABÍLIO DE SOUZA, Chefe da Fiscalização


de pista do Posto Trevão (fls. 288/289):

[...] que era feita a identificação por meio um adesivo do candidato; [...] que verificavam a
requisição e o adesivo de campanha e não questionavam mais nada; na época da campanha, o
depoente procurou o denunciado, em seu comitê para adesivar o seu automóvel, sendo que lá
apenas é que ficou sabendo que quem adesivasse o veículo ganhava combustível; [...].

Depoimento da Testemunha MARÍLIA VESCOVI GADIOLI GASTOLDI (fls. 282/283):

[...] que recebiam o vale combustível pelo fato de adesivarem o automóvel; que a partir do
momento em que adesivarem o carro, recebiam semanalmente o combustível; [...] que jamais
recebeu qualquer abordagem do denunciado no sentido de tentar comprar-lhe o voto”.

Desta feita, resta demonstrado pelos depoimentos de JOSEMAR MIRANDA DE JESUS, JOSÉ
NILSON DE JESUS BARROS, FRANCIVALDO ABÍLIO de SOUZA e MARILHA VESCOVI
GADIOLI CASTOLDI, todos colidos em juízo e sob o crivo do contraditório, que o recebimento
dos vales combustíveis era fornecido àqueles que adesivassem seus veículos.
Com efeito, entende o Colendo Tribunal Superior Eleitoral, que a distribuição de combustível
para abastecer veículos adesivados com propaganda de eleitoral não caracteriza o crime de
corrupção eleitoral, porquanto ausente o especial fim de agir, consubstanciado na captação ilícita
de votos. In verbis:
ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL.
IMPROCEDÊNCIA. CORRUPÇÃO ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO DE VALE-
COMBUSTÍVEL EM TROCA DA AFIXAÇÃO DE ADESIVOS. DOLO ESPECÍFICO DE
CAPTAR VOTOS. AUSÊNCIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PROVIMENTO.
1. Segundo a jurisprudência desta Corte, para a configuração do crime descrito no art. 299 do
CE, é necessário o dolo específico que exige o tipo penal, isto é, a finalidade de "obter ou dar
voto" e "conseguir ou prometer abstenção" (RHC nº 142354, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de
5.12.2013).
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
2. Na espécie, o recebimento da vantagem - materializada na distribuição de vale
combustível -, foi condicionado à fixação de adesivo de campanha em veículo e não à
obtenção do voto. Desse modo, o reconhecimento da improcedência da ação penal é medida
que se impõe.
3. Agravo regimental provido para conhecer e prover o recurso especial e julgar improcedente a
ação penal, afastando a condenação do agravante pela prática do crime de corrupção eleitoral.
(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 291, Acórdão de 03/02/2015, Relator(a)
Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Relator(a) designado(a) Min.
LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico,
Tomo 42, Data 04/03/2015, Página 220).

Mais a mais, verifico que, à exceção do veículo com Placa MPI 4343, cujo recibo
de abastecimento consta o Recorrente como responsável financeiro, todos os demais automóveis
abastecidos foram declarados na prestação de contas de campanha do Recorrente em 2008,
acompanhada dos devidos contratos de cessão e de prestação de serviços acostados às fls. 61/115
e 232 e 237.
A referida prestação de contas foi devidamente aprovada pela Justiça Eleitoral em
2008, e, portanto, em data anterior ao inquérito policial que acompanha o presente processo.
Logo, não vislumbro indícios mínimos para concluir que tais contratos foram simulados visando
dar aparência de legalidade da suposta corrupção eleitoral narrada na denúncia.
Assim, em face da fragilidade do conjunto probatório produzido pela acusação, faz-se necessário
absolver o Recorrente, ante a ausência do dolo específico a configurar o crime de corrupção
eleitoral, nos termos do art. 299, do Código Eleitoral.
Por tais razões, acompanhando o Revisor, dou provimento ao recurso, para
reformar a sentença e absolver o Recorrente, nos termos do artigo 386, VII, do Código de
Processo Penal.
É como voto.
*

P E D I D O de V I S T A

O Sr. DESEMBARGADOR SÉRGIO LUIZ TEIXEIRA GAMA


(PRESIDENTE):-
Egrégia Corte: Diante do empate estabelecido, peço vista dos autos a fim de
proferir Voto de Minerva.
*
DECISÃO: Adiada a pedido de vista do Desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama.

*
Presidência do Desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama.
Presentes o Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior e os Juízes Helimar Pinto, Aldary Nunes
Júnior, Cristiane Conde Chmatalik, Adriano Athayde Coutinho e Rodrigo Marques de Abreu
Júdice.
Presente também o Dr. Carlos Vinícius Soares Cabeleira, Procurador Regional Eleitoral.
\dsl
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
SESSÃO ORDINÁRIA
26-04-2017

PROCESSO Nº 3-39.2015.6.08.0020 - CLASSE 31 – (Continuação do julgamento)


NOTAS TAQUIGRÁFICAS – Fls. 1/9

VOTO de MINERVA

O Sr. DESEMBARGADOR SÉRGIO LUIZ TEIXEIRA GAMA


(PRESIDENTE):-
Egrégia Corte: Rememoro aos Eminentes Pares tratar-se de Recurso Criminal
interposto por ANDERSON SEGATTO GHIDETTI em face da r. sentença de fls. 335/348,
prolatada pelo MM. Juiz da 20º Zona Eleitoral - Aracruz/ES, que julgou procedente a denúncia
ofertada pela Douta Promotoria de Justiça daquela circunscrição, condenando-o a 03 (três) anos e
09 (nove) meses de reclusão, pela prática do crime de corrupção eleitoral, tipificado no art. 299
do Código Eleitoral, nos termos do art. 71 do Código Penal.
Consta da denúncia que o ora recorrente, no pleito de 2008, na condição de
candidato a vereador no Município de Aracruz/ES, promoveu doações de combustíveis a eleitores
nos dez dias que antecederam a data das eleições, a qual ocorreu em 05 de outubro de 2008,
visando a obtenção de votos em seu favor. Segundo narra a denúncia, o recorrente agiu de forma
dolosa, com a finalidade de angariar a simpatia do eleitorado e assim obter votos,
potencializando as chances de êxito de sua campanha por ocasião das eleições 2008.
Em seu recurso de fls. 353/379, o ora recorrente aduz, em síntese, que o
abastecimento de veículos, ainda que tivesse sido em troca exclusivamente de adesivagem de
carros e motos, não se amolda à tipicidade prescrita no artigo 299 do Código Eleitoral. Sustenta
que não houve tal prática e que o recorrente Anderson Ghidetti não fez abordagem direta aos
eleitores discriminados na inicial com o objetivo de obter votos. Requer, ao final, a reforma da
sentença, a fim de que seja absolvido pela prática do delito prescrito no art. 299, do Código
Eleitoral e, alternativamente, na hipótese de manutenção da condenação, postula pela redução da
pena aplicada, ante a condição de primariedade do réu.
A Procuradoria Regional Eleitoral lançou parecer às fls. 398/412, manifestando-se
pelo conhecimento do recurso criminal eleitoral, e, no mérito, pelo seu não provimento, ao
argumento de que o conjunto probatório restou suficiente para comprovar o elemento subjetivo
do tipo penal eleitoral da corrupção.
A votação até o presente momento se encontra empatada, tendo o eminente
Relator, Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior, o ilustríssimo Juiz de Direito Helimar Pinto
e o eminente Juiz Federal José Eduardo do Nascimento votado pelo conhecimento e
desprovimento do recurso. De outro lado, o eminente Revisor, Dr. Adriano de Athayde Coutinho,
inaugurou a divergência votando pelo provimento do recurso para absolver o acusado, no que foi
seguido pelo ilustre Juiz de Direito Aldary Nunes Júnior e o eminente Dr. Rodrigo Marques de
Abreu Júdice.
Pois bem.
O crime de corrupção eleitoral, previsto no art. 299 do Código Eleitoral, consiste
em dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, qualquer outra vantagem,
para angariar votos ou abstenção, ainda que a oferta não seja aceita.
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O objetivo dessa proteção penal é a liberdade de sufrágio, ou seja, a livre
manifestação de voto do eleitor sem sofrer influência ou mácula de agente corruptor. A regra
incrimina tanto a denominada corrupção eleitoral ativa (nas modalidades dar, prometer e
oferecer) como a corrupção eleitoral passiva (nas modalidades solicitar e receber).
Para a verificação da ocorrência do delito do artigo 299 do Código Eleitoral, faz-se
necessária a comprovação do elemento do tipo, que consiste na finalidade de obter ou dar voto,
ou conseguir ou prometer abstenção. Não se exige a comprovação do pedido explícito ou direto
de voto1. Esse crime consuma-se no momento da oferta ou pedido, independentemente da
aceitação, tampouco da obtenção efetiva do benefício do voto ou da abstenção2.
Não desconheço que existe no e. Tribunal Superior Eleitoral julgados no sentido
de que o tratamento penal dispensado à prática do delito de corrupção eleitoral exige que se
demonstre o dolo específico de obter o voto mediante oferecimento de vantagem indevida. (AgR-
AI nº 3748/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 15.12.2016).
Todavia, é igualmente assente no E. Tribunal Superior Eleitoral o entendimento de
que, para a configuração do delito de corrupção eleitoral é necessário demonstrar o dolo
específico cuja verificação deve ser feita, em cada caso, de forma indireta, por meio da
análise das circunstâncias de fato. (AgR-AI nº 7758/SE, Rel. Min. Fática Nancy Andrighi, DJe de
9.4.2012).
Nesse sentido é a jurisprudência do E. Tribunal Superior Eleitoral, a conferir:

(....) 1. Para a configuração do delito de corrupção eleitoral exige-se a


finalidade de obter ou dar o voto ou conseguir ou prometer a abstenção, o que não se
confunde com o pedido expresso de voto. Precedentes.
2. A verificação do dolo específico em cada caso é feita de forma indireta,
por meio da análise das circunstâncias de fato, tais como a conduta do agente, a forma
de execução do delito e o meio empregado.
[...]
Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 7758, Acórdão de
06/03/2012, Relator(a) Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, Publicação: DJE - Diário de
justiça eletrônico, Tomo 65, Data 09/04/2012, Página 16) (grifei)

Compulsando os autos e feita a devida análise fática das provas produzidas, assim
com da sentença recorrida, entendo que o recurso sob análise deve ser conhecido e desprovido,
pois em meu sentir, após analisar os fatos e provas colhidas na instrução processual, considerando
a conduta do agente, a forma de execução do delito e o meio empregado, entendo que o
recorrente agiu com finalidade de obter o voto angariando a simpatia dos eleitores, o que
desequilibrou a disputa eleitoral.
Relembro aos dignos pares que nos presentes autos o recorrente foi denunciado
por, supostamente, ter realizado doações de combustíveis a eleitores do referido município às

1
Embargos de Declaração em Recurso Especial Eleitoral nº 58245, Acórdão de 02/03/2011, Relator(a) Min.
ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 89, Data 12/05/2011,
Página 31 RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE, Volume 22, Tomo 2, Data 02/03/2011, Página 92.
2
TSE, AgR-AI nº 20903/MT, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, DJE de 05.03.2015.
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vésperas da data das eleições, a qual ocorreu em 05 de outubro de 2008, visando a obtenção de
votos em seu favor, enquanto candidato a vereador no Município de Aracruz/ES.
Destaca a denúncia que, “...os eleitores destinatários dos abastecimentos quando
inquiridos em sede policial afirmaram que sequer trabalharam diretamente na campanha do
denunciado, contudo, sentiam-se por vezes convencidos a direcionar-lhe o voto nas urnas.”
Saliento que, a averiguação do dolo específico no presente caso deve ser realizada
de modo indireto, em consonância com o entendimento já manifestado pelo E. Tribunal Superior
Eleitoral.
Segundo consignou o eminente Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior em
seu voto condutor, ficou comprovado nos autos deste processo que o recorrente promoveu o
fornecimento de vales combustíveis para terceiros, que não detinham vinculação com a sua
campanha eleitoral, restando comprovada a doação de combustível com a finalidade de obter
votos.
Registrou sua Excelência que “No período compreendido entre 25/09/08 a
04/10/08, 24 (vinte e quatro) veículos foram abastecidos no Posto Trevão, mediante a
apresentação de 26 (vinte e seis) autorizações de abastecimento, fornecidos pelo Recorrente,
conforme atestado pela Nota Fiscal nº 12372 (fl. 120) e Demonstrativo de Vendas por Cliente de
fls. 120/122, vinculados ao Inquérito Policial nº 740/2008. Tais documentos comprovam, com
efetividade, a materialidade delitiva e autoria do Recorrente.”
Muito embora a testemunha JOSEMAR MIRANDA DE JESUS não tenha
confirmado o conteúdo do seu depoimento na fase do Inquérito Policial, alegando que “deve ter
ficado nervoso”, destaco trecho do seu depoimento colhido na fase policial, que revela que o
recorrente, por meio dos trabalhadores de sua campanha, solicitou expressamente voto para sua
candidatura, o que evidencia o dolo específico exigido pelo art. 299, do Código Eleitoral, a
conferir:

Depoimento de JOSEMAR MIRANDA DE JESUS (fl. 299 do IP nº 740/08):


“[...] que no entanto ficou sabendo, na época dos fatos, que no comitê
deste candidato localizado em frente ao Posto Central do mesmo Município, o candidato
em tela estava distribuindo tais autorizações de abastecimento com a condição de que o
depoente adesivasse a sua propaganda eleitoral em seu veículo; que se fizesse isso teria o
direito a abastecer 5 litros de gasolina por semana [...] que se recorda que o movimento
no comitê das pessoas que chegavam com o fim de obtenção da autorização em questão
era bastante intenso; que destaca quando esteve no comitê supra mencionado e recebeu
a autorização de abastecimento em tela foi solicitado pelas pessoas que trabalhavam no
local que o depoente votasse no candidato ANDERSON GHIDETTE [...].” (grifei e
destaquei)

Não bastasse isso, saliento, ainda, não prosperar a alegação da defesa de que os
supostos beneficiários das doações de combustível firmaram contrato de cessão de uso dos
veículos com o candidato, tendo como finalidade a adesivagem de propaganda eleitoral e a
participação em eventos nas Eleições 2008, conforme demonstrarei a seguir.
Conforme bem registrou o eminente e culto Des. Samuel Meira Brasil Júnior em
seu voto condutor, não obstante as contradições indicadas nos depoimentos judiciais de algumas
testemunhas, as mesmas admitiram, em sede de interrogatório policial, que não trabalharam na
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campanha do denunciado e que a doação de combustível ocorria sem qualquer vínculo com a
atividade eleitoral típica, desqualificando os respectivos contratos juntados pela defesa (fls. 71,
76, 78, 79/80, 81/82, 83/84, 85/86, 87/88, 89 e 91). A conferir:

Depoimento de DIONEL ELIAS MONTEIRO (fl. 345 do IP nº 740/08):


“[...] que não trabalhou na campanha do então candidato a vereador para
o município de Aracruz no ano de 2008, Anderson Ghidete; que, todavia, reconhece que
de fato abasteceu o veículo supra citado, durante o período de campanha eleitoral no
Posto de Gasolina denominado Trevão, localizado no Município de Aracruz; que esclarece
que tal abastecimento se deu após ter recebido requisição do comitê eleitoral do candidato
supra citado; que desta forma, após ter colado seu adesivo de campanha teve garantido,
no posto em questão o abastecimento gratuito de seu veículo, após apresentação desta
requisição; que na época não participou de nenhuma carreata do candidato em tela
[...].” (grifei)

Depoimento de MANOEL GOMES BANDEIRA (fl. 297 do IP nº 740/08):


(...) Que, esclarece que em nenhum momento laborou na campanha do
candidato a vereador ANDERSON SEGATTO GHIDETTI; (...)” (grifei e negritei).

Depoimento de JOSÉ NILSON DE JESUS BARROS (fl. 298 do IP nº


740/08):
“(....) QUE, esclarece que em nenhum momento laborou na campanha do
candidato a vereador para o município retro citado ANDERSON SEGATTO
GHIDETTI; QUE, no entanto, ficou sabendo na época dos fatos que no comitê deste
candidato localizado em frente ao Posto central do mesmo município que o candidato em
tela estava distribuindo tais autorizações de abastecimento cuja moto que adesivasse a
sua propaganda eleitoral teria direito a abastecer 5 litros de gasolina por semana; QUE,
desta forma se dirigiu ao comitê retro citado tendo obtido tal autorização de
abastecimento após ter adesivado a propaganda em questão em sua moto; Que, se
recorda que o movimento no comitê das pessoas que chegavam com o fim de obtenção da
autorização em questão era bastante intenso; (...)

Com efeito, infere-se do depoimento de JOSÉ NILSON DE JESUS BARROS,


no IP, que este benefício era concedido de forma indiscriminada, deixando claro o modus
operandi utilizado pelo recorrente para obter o voto e a simpatia do eleitor, mesmo sem ter
qualquer vínculo com a campanha.
Destaco depoimento de MANOEL GOMES BANDEIRA, segundo o qual, além
de não ter trabalhado na campanha do recorrente, recebeu combustível para que pudesse se
deslocar ao município de Vitória para tratar de um câncer no intestino, o que demonstra a conduta
ardilosa do recorrente de angariar a simpatia do eleitor em busca de votos, a conferir:

Depoimento de MANOEL GOMES BANDEIRA (fl. 297 do IP nº 740/08):


“Que se recorda que durante a campanha eleitoral de 2008 solicitou ao
candidato a vereador do município de Aracruz ANDERSON GHIDETTE que lhe ajudasse
com o fornecimento de combustível para o veículo para o veículo retro citado de modo que
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pudesse se dirigir ao município de Vitória para tratar de doença de câncer no intestino;
Que, deste modo o candidato aceitou ajudá-lo tendo pedido que se dirigisse ao seu comitê
localizado em frente ao Posto Central em Aracruz para que recebesse autorização de
abastecimento que consta às fls. 33 dos autos;

De igual modo, destaco, ainda, trechos do seu depoimento de JOSEMAR


MIRANDA DE JESUS colhido em Juízo (fl. 282/283), que comprovam de modo cristalino que
o depoente recebeu combustível, sem trabalhar na campanha do recorrente, o que corrobora o seu
depoimento prestado no Inquérito Policial de que não possuía qualquer vínculo com a campanha
do recorrente, a conferir:

Depoimento colhido em Juízo (fl. 282/283)


“(....) que tem conhecimento de todos os fatos apurados; que o depoente
chegou a abastecer o seu veículo para ajudar na campanha do Anderson; que assim o fez
de forma voluntária; que chegou a abastecer o seu veículo em poucas vezes, acreditando
que umas 03 ou 04 vezes, nos finais de semana; que o trabalho como voluntário na
campanha consistia em ficar fazendo propaganda no carro o adesivo; que utilizava o carro
normalmente; (...). “que bastava comparecer com o carro adesivado para receber a guia
de abastecimento; que confirma como sua a assinatura de fl. 299/300.” (grifei)

Depoimento colhido no Inquérito Policial nº 740/08, fl. 299:


“[...] que esclarece que em nenhum momento laborou na campanha do
candidato a vereador para o município retro citado ANDERSON SEGATTO
GHIDETTI;

De forma curiosa, verificou-se que as testemunhas Manoel Gomes Bandeira (fl.


297) e José Nilson de Jesus Barros (fl. 298), ao prestarem depoimento em Juízo, embora não
tenham alegado qualquer tipo de ameaça, pressão ou agressão física ou psicológica ao tempo que
prestaram depoimentos à autoridade policial, apresentaram versão diametralmente diversa e
extremamente duvidosa dos fatos.
O questionamento em torno da validade dos instrumentos contratuais encontra
reforço na seguinte situação, verificada por ocasião da oitiva da testemunha Dionel Elias
Monteiro (fls. 280/281), colhida na fase judicial: o cidadão em referência afirmou em seu
depoimento que era proprietário do veículo Gol, placas MPA 7505, à época dos fatos, e que
somente ele utilizava o automóvel, que havia sido adquirido em uma agência. Entretanto, o
contrato de cessão de uso do veículo Gol placas MPA 7505, apresentado pela defesa à fl. 71, foi
firmado por Ademilson Silva Santana, sem participação do Sr. Dionel, o que demonstra a falta de
idoneidade do contrato.
Assim como entendeu e eminente Juiz Federal José Eduardo do Nascimento, que
acompanhou o relator, não está caracterizado aqui que houve um contrato de cessão lícito de
veículo para trabalhar em campanha, porque mesmo nos depoimentos judiciais, algumas dessas
pessoas disseram que não trabalharam na campanha, mas sim que ajudaram uma vez ou outra,
que levaram pessoas esporadicamente num lugar, mas, na verdade, pegaram a gasolina
frequentemente para utilizar no seu dia a dia, a conferir:
Depoimento de JOSÉ NILSON DE JESUS BARROS (fl. 284, fase Judicial):
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“Que o depoente, na época dos fatos, chegou a abastecer um veículo de sua
propriedade com autorização do denunciado; (...) Que quando algum funcionário da
campanha precisava do carro, o depoente o levava, mas isso foi muito raro; (...) que
apenas quando foi ao comitê é que ficou sabendo que era feto o abastecimento do carro;
que esta pessoa esclareceu que era feito um contrato e que os abastecimentos eram
semanais; que o depoente efetivamente celebrou um contrato; que se não tivesse adesivado
o seu veículo, não teria recebido as autorizações de abastecimento; que não consegue se
lembrar quantas vezes abasteceu o seu veículo, mas apenas se lembra que era semanal;
que o depoente trabalhava com um carro da empresa, sendo que o seu veículo que era
abastecido pela campanha ficava em casa; (...) que assinou o contrato, salvo engano, em
2008; que essa mulher lhe explicou que era necessário o contrato para adesivar o veículo
e ficar regular” (grifei e negritei).

Depoimento de MARILHA VESCOVI GADIOLI CASTOLDI (fl. 289, fase


Judicial):
“ (...) que adesivaram o veículo porque desejaram, posto que sempre o
apoiaram; que recebiam vale combustível semanalmente por tal motivo; (...); que
recebiam o vale combustível pelo fato de adesivarem o automóvel; (...) que os
abastecimentos eram utilizados para fins particulares, e eventualmente utilizados pela
campanha do denunciado; que já chegou, em poucas vezes, a entregar o carro para um
funcionário do denunciado, mas não se lembra o nome da pessoa, devido ao tempo já
decorrido, mais de 05 anos;

Ademais, curiosamente, nenhuma testemunha mencionou a existência quaisquer


contratos ou compromisso de trabalho na campanha do ora recorrente na fase do Inquérito
Policial, diferentemente do que ocorrera nos depoimentos judiciais.
Observo, ainda, que o contratos firmados em nomes dos depoentes (fls. 71, 76, 78,
79/80, 81/82, 83/84, 85/86, 87/88, 89 e 91), somente foram juntados aos autos após as oitivas
colhidas na fase policial e não possuem autenticação ou data capaz de atestar com certeza a
idoneidade desses documentos.
A contradição dos depoimentos prestados pelas testemunhas tanto é flagrante que
o MM. Juiz Eleitoral determinou a remessa das oitivas para a Polícia Federal apurar o crime de
falso testemunho, conforme se observa do Termo de Audiência de fl. 279.
Na mesma linha de raciocínio esboçada pelo eminente Juiz Federal José Eduardo
do Nascimento, entendo que, na medida em que o recorrente faz uma proposta aberta a qualquer
eleitor interessado que comparece ao comitê e aceita adesivar o seu veículo e promete dar um
vale, um tíquete combustível para abastecer o seu tanque no posto de gasolina, está configurado,
data vênia, a intenção de atrair a sua simpatia em troca de benesse material, conduta que se
amolda ao tipo da corrupção eleitoral, além de interferir na livre escolha do voto e desequilibrar a
disputa eleitoral em desfavor de outros candidatos que não usaram da mesma prática reprovável.
Alias, se os contratos firmados em nomes das pessoas supracitadas eram regulares
não faria sentido que o frentista exigisse que os veículos estivessem adesivados. Se a obrigação
contratual de abastecimento era do contratante, ora recorrente, não faria sentido distribuir tiquetes
para pessoa que não assinou contrato, como foi o caso da Dionel Elias Monteiro (fls. 280/281).
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É no mínimo estranho que diversas testemunhas tenham dito que não trabalharam
para campanha do recorrente, e, ainda assim, no contrato contar a obrigação do candidato de
comunicar aos depoentes, com antecedencia de 48 horas, sobre os eventos a serem realizados.
Registro que a intenção do recorrente de obter o voto, ainda que de forma velada,
restou demonstrada pelo modo ostensivo e reiterado como efertou o abastecimento de carros
adesivados, segundo restou demonstrado por meio do depoimento de FRANCISVALDO
ABILIO DE SOUZA, Chefe de fiscalização dos frentistas do Posto Trevão, no seu depoimento
prestado em Juízo (fl. 288):

“[...] que exibidos os documentos de fls. 33/68, reconhece como sendo


semelhantes àqueles que eram recebidos; que eram feitos abastecimentos de “carros de
políticos”; que era feita a identificação por meio de um adesivo do candidato; que seria o
carro comum, mas com o adesivo de um candidato; [...] que este abastecimento de “carros
de políticos” ocorriam até as eleições.”

Do mesmo modo, colaciono trecho de seu depoimento no Inquérito Policial (fls.


199/200)

“[...] que por orientação do proprietário do posto de gasolina em tela,


JAIME LOPES BITTI, para que houvesse o abastecimento mediante apresentação das
autorizações do posto TREVÃO supramencionadas, bastaria que o condutor, primeiro,
apresentasse tal autorização preenchida com data, placa do veículo e do condutor e em
segundo, que tivesse adesivo do candidato colado no veículo [...].”

O depoimento de JOSÉ LIMA DOS SANTOS, frentista do Posto Trevão,


também corrobora essa conduta, considerada habitual e ostensiva:

Depoimento em Juízo (fl. 286)


“[...] que trabalha no Posto Trevão desde 1999 até hoje; que em se tratando
de empresas, é comum que os abastecimentos ocorram por meio de documentos (vales), o
mesmo não ocorrendo com relação a pessoas físicas; [...] que na época da política, a
maioria dos candidatos mandavam abastecer no posto Trevão [...]; que na época da
política era comum pessoas aparecerem para abastecer veículos [...].”

Depoimento no Inquérito Policial (fl. 160)


“[...] que esclarece que o procedimento de abastecimento com autorização
em tela, no que tange ao cidadão comum, ou seja, que não tinha vínculo com nenhuma
empresa conveniado com o posto em foco, só se deu no período pré-eleitoral [...].”
Destaco que, ao contrário do que pretendeu aduzir o recorrente em seu recurso, a
definição típica do art. 299 do Código Eleitoral não determina que a oferta ou doação da
vantagem venha precedida de pedido expresso de votos, bastando a exigência de correlação entre
a vantagem e o voto, que pode perfeitamente se caracterizar sem necessidade de fala expressa e
direta. Nesse sentido, colaciono o julgado do E. Tribunal Superior Eleitoral, in verbis:
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(....) 3. O pedido expresso de voto não é exigência para a configuração do
delito previsto no art. 299 do Código Eleitoral, mas sim a comprovação da finalidade de
obter ou dar voto ou prometer abstenção.

4. A circunstância de a compra de voto ter sido confirmada por uma única


testemunha não retira a credibilidade nem a validade da prova.
Embargos de declaração recebidos como agravo regimental e não provido.
(Recurso Especial Eleitoral nº 58245, Acórdão, Relator(a) Min. Arnaldo
Versiani Leite Soares, Publicação: RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE, Volume
22, Tomo 2, Data 02/03/2011, Página 92) – grifei

No mesmo sentido, cito julgado do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de janeiro,


in verbis:
(....) III - Para a caracterização do crime de corrupção eleitoral é
desnecessário apresentar prova da existência de pedido expresso de voto, bastando a
comprovação do especial fim de agir. Precedente do TSE.
IV - In casu, o desejo de cooptar votos decorre ipso facto da própria
propaganda eleitoral em nome do recorrente, a qual era distribuída e afixada pelo seu
próprio comitê de campanha eleitoral nos bens particulares dos eleitores, os quais, em
troca, recebiam crédito para abastecimento em postos de combustíveis locais.
(TRE-RJ. RECURSO CRIMINAL nº 291, Acórdão de 06/11/2012,
Relator(a) LUIZ ROBERTO AYOUB, Revisor(a) SERGIO SCHWAITZER, Publicação:
DJERJ - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-RJ, Tomo 273, Data 08/12/2012, Página
27/31 )

Da mesma forma foi assentado pelo TRE-MG, no Recurso Criminal nº 56,


Acórdão de 10/09/2009, Relator(a) JOSÉ ANTONINO BAÍA BORGES, Publicação: DJEMG -
Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Data 25/09/2009.
Chamo a atenção para um fato peculiar nos delitos do art. 299 do Código Eleitoral.
No caso do crime de corrupção eleitoral, a prova testemunhal deve ser analisada cuidadosamente,
notadamente quando existe contradição nas oitivas na fase policial e judicial.
Isso porque o crime de corrupção eleitoral tem duas facetas, quais sejam, a
corrupção eleitoral ativa e a passiva. Sendo assim, tanto quem oferece, dá ou promete algo em
troca de voto como aquele que recebe ou solicita algo, incorre no crime previsto no art. 299 do
Código Eleitoral. Com isso, o depoimento de uma testemunha pode torná-la ré em virtude da
prática de corrupção eleitoral ativa.
Nesse raciocínio, é óbvio que as testemunhas não diriam que se dirigiram ao
comitê de campanha para pedir vale-combustível em troca do voto - sob pena de serem
enquadradas como co-partícipes do crime.
Mas, a partir do momento em que o candidato, em pleno período eleitoral,
aproveitando-se de uma necessidade do eleitor, lhe dá um vale-combustível tendo como contra-
partida apenas a adesivagem de veículo, que cabe destacar, era requisito para identificação pelo
posto de combustível, evidencia o modus operandi utilizado pelo recorrente para atrair a simpatia
do eleitorado, com a intenção de obter-lhe o voto, conclusão robustecida a partir das contradições
das testemunhas ouvidas nos autos.
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Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo
Caminhando para o final, destaco trecho da decisão proferida pelo Culto
Magistrado de piso, por bem representar o meu sentido nestes autos:

“Entendo que a prova testemunhal foi clara e segura para me convencer


que o denunciado, valendo-se de poderio econômico que detinha na época da eleição,
distribuiu, na forma de dádivas a eleitores, indiscriminadamente, vales combustíveis para
abastecimento, no intuito direto, ora velado, ora expresso (como afirmado por
testemunhas), de obtenção de voto para as eleições que ocorreram em 2008, sendo
procedente a pretensão punitiva do Estado neste ponto.”

Considerando os elementos sopesados neste voto, mostra-se acertada a sentença


recorrida quando afirma que, muito embora o Recorrente sustente que os contratos de fls. 71, 76,
78, 79/80, 81/82, 83/84, 85/86, 87/88, 89 e 91 e a prestação de contas são provas da legalidade
dos pagamentos, aqueles foram simulados para dar aparência de legalidade em conduta que, na
verdade, apenas representava a concessão de vantagem e benefícios em troca do apoio nas
eleições municipais de 2008, principalmente quando as testemunhas, em sede policial, foram
unânimes em afirmar que não trabalharam na campanha eleitoral.
Assim, diante dos elementos presentes nos autos, entendo que o recorrente agiu de
forma dolosa, com a finalidade de angariar a simpatia do eleitorado e assim obter votos para a
sua candidatura, potencializando as chances de êxito de sua campanha nas Eleições 2008,
desequilibrando a disputa no citado pleito e interferindo na liberdade de escolha do eleitor.
Ante o exposto, pedindo vênia à divergência inaugurada pelo culto e digno Dr.
Adriano Athayde Coutinho, acompanho o eminente relator Desembargador Samuel Meira Brasil,
no sentido de conhecer do recurso e, no mérito, negar provimento.
É como voto.

DECISÃO: Por maioria de votos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do


voto do eminente Relator.

Presidência do Desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama.


Presentes o Desembargador Samuel Meira Brasil Júnior e os Juízes Helimar Pinto, Aldary Nunes
Júnior, Cristiane Conde Chmatalik, Adriano Athayde Coutinho e Rodrigo Marques de Abreu
Júdice.
Presente também o Dr. Carlos Vinícius Soares Cabeleira, Procurador Regional Eleitoral.
\cds

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