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Temática

marioswald(s): Antropofagia – ontem. hoje. amanhã.

Resumo
A Antropofagia nasce sob o signo da metamorfose: “marioswald”, autonomeação híbrido-
composta utilizada pelos dois “pontas-de-lança” de nosso modernismo e recorrentemente
invocada nas reapropriações posteriores do canibalismo político-cultural. Por isso, ela nasce
também sob o signo da impropriedade, da impossibilidade de fixar uma identidade estável:
dentre as peculiaridades da Antropofagia do final da década de 1920, está o fato – pouco
percebido pela crítica – de que não há, a rigor, nenhuma obra antropofágica (se Macunaíma era
reivindicado pelo “movimento” como sua obra-prima, seu autor, Mário de Andrade, negava
veementemente o rótulo e foi, além disso, constantemente atacado pelos antropófagos; Cobra
Norato, de Raul Bopp, e o par de romances Miramar/Serafim, de Oswald de Andrade, foram
gestados muito antes da Antropofagia; e os quadros de Tarsila do Amaral, muito mais que
inspirarem-se no ideário do grupo, foram a sua inspiração). Ao contrário da Poesia Pau-Brasil,
fundada na idéia de invenção, i.e., de uma apropriação visando à propriedade, à criação de um
legado que possa ser transmitido e inventariado, a Antropofagia define-se como prática sem
obra, como um meio sem fim, como um objetivo sem objeto, que aparece/acontece em uma
temporalidade não-redutível à linearidade cronológica que funda o tempo da transmissão da
propriedade (ou seja, da tradição).

Coordenador
Flávia Cera (doutoranda CPGL/UFSC – Bolsista REUNI/CAPES)

Local: Sala 201 CCE/Bloco A

Data: 28 de maio

Horário: 14:20 – 18:00 (totalizando 2 sessões)

Da invenção da invenção à posse da posse: Pau-Brasil e Antropofagia


Alexandre Nodari (doutorando CPGL/UFSC)

Saneamento Básico: da lama ao caos


Flávia Cera (doutoranda CPGL/UFSC)

O modernismo nasceu na zona: em torno d'O perfeito cozinheiro das almas deste mundo'
Victor da Rosa (mestre pelo CPGL/UFSC)

Antropofagia e obnubilação. Gregório de Matos e o daimon


Diego Cervelin (mestrando CPGL/UFSC)

Antropofagia e Perspectivismo literário: o outro canibal em Rosa e Mussa


Ana Carolina Cernicchiaro (doutoranda (CPGL/UFSC)

O banquete de Mário de Andrade diante do espelho: questões do corpo híbrido


Evandro de Sousa (mestrando CPGL/UFSC)

Do outro lado do rio: Oswald de Andrade e Paulo Duarte


George França (doutorando CPGL/UFSC)
RESUMOS

Da invenção da invenção à posse da posse: Pau-Brasil e Antropofagia


Alexandre Nodari
É lugar-comum da crítica sublinhar a continuidade entre Pau-Brasil e Antropofagia, dois
movimentos capitaneados por Oswald de Andrade. Todavia, há, entre ambos, uma diferença
radical de estratégia, de política: enquanto o Pau-Brasil opta pela “invenção”, pela instituição de
uma propriedade, a Antropofagia visa o derrocamento da propriedade na forma de uma posse
pura. O objetivo deste trabalho é analisar as duas estratégias e algumas de suas recorrências e
conseqüências na história político-cultural brasileira do século XX.

Saneamento Básico: da lama ao caos


Flávia Cera
Mangue é uma área de solo rico em materiais orgânicos em decomposição; seu odor fétido e sua
aparência úmida e lameada o vinculam a proliferação de doenças; não raro o encontramos em
forma de esgoto; sobre ele, entretanto, habitam pessoas; perto do seu canal mais famoso no Rio
de Janeiro formou-se uma zona de baixo meretrício. Para controlar a proliferação do mangue:
saneamento básico, necessário na medida em que torna a vida da população mais saudável, e
perverso na medida em que, para alcançar seus objetivos, neutraliza a população. Nesse texto
pretendemos abordar a antropofagia sob a ótica do mangue, ao qual Oswald de Andrade dedicou
um longo poema-peça intitulado “Santeiro do Mangue” para, então, percebermos de que
maneira o “baixo” se articula como tarefa de emergência.

O modernismo nasceu na zona: em torno d'O perfeito cozinheiro das almas deste mundo'
Victor da Rosa
A idéia é analisar, segundo a idéia bastante escorregadia de zona, o modo como algumas noções
e procedimentos que aparecem no modernismo brasileiro, sobretudo na obra de Oswald de
Andrade, já estão vislumbradas n'O perfeito cozinheiro das almas... deste mundo - espécie de
diário escrito a várias mãos, segundo nomes e heterônimos, ainda no final da década de dez.
Gênero cindido entre arte e vida, o diário é construído praticamente inteiro a partir de uma
personagem feminina, Miss Cyclone, e sua narrativa certamente já antecipa os romances
maduros de Oswald, digamos, muitas vezes pautados pelo fragmento, a auto-biografia, a frase
feita e o humor, mas também pelo sentido da transgressão e do trágico. Nota-se, por fim, que o
espaço que sustenta a trama do diário, um estúdio alugado por Oswald na Rua Libero Badaró (é
onde grande parte do diário foi escrito, afinal) funciona como uma garçonnière - em outras
palavras, um motel informal - espaço destinado a encontros amorosos, provavelmente proibidos,
o que marca afinal um contexto forte e significativo.

"Antropofagia e obnubilação. Gregório de Matos e o daimon"


Diego Cervelin
O ensaio tem como objetivo reler a apresentação feita por Haroldo de Campos a respeito da
antropofagia especialmente em dois trabalhos do início da década de 80: “A razão
antropofágica” e “Transluciferação Mefistofáustica”. Em ambos, Haroldo de Campos se dedica
a inventariar uma tradição de invenção nas letras nacionais caracterizada pela devoração crítica
de um patrimônio cultural, cujo avatar privilegiado seria o poeta Gregório de Matos. Por outro
lado, levando em consideração que Haroldo de Campos conhecia um dos textos de Araripe Jr. –
“Carta sobre a literatura brasílica”, de 16/17 de junho de 1869 – em que tratava da obnubilação
enquanto possibilidade de “esquecimento” e exposição à abertura do mundo, trataremos de ler a
antropofagia não como absorção e, conseqüentemente, apropriação de um conteúdo
determinável. Além disso, contando com algumas das observações de Giorgio Agamben sobre a
figura do daimon, presente no ensaio de Haroldo de Campos sobre a “Transluciferação
Mefistofáustica”, trataremos de ler a “tradição transluciferina” não como ramo alternativo de
majestade (contra)canônica, senão como elemento que cinde e nos expõe à possibilidade do
contato irresolúvel e da signatura rerum.
Antropofagia e Perspectivismo literário: o outro canibal em Rosa e Mussa
Ana Carolina Cernicchiaro
No ritual antropofágico tupinambá, a devoração é o momento de “transmutação de
perspectivas”, é o instante em que o matador canibal é objetivado, tornado estrangeiro,
inumano, e assume o ponto de vista do outro, do que será devorado, este sim, subjetivado e
humanizado. Também assim, o abandono do eu que se dá na literatura se torna abertura ao
outro. Este outro não mais é visto pelo olhar do eu, do self, mas empresta seu olhar, sua
perspectiva, àquele que escreve. Isso não significa, no entanto, que o outro seja um espelho, nos
explica Eduardo Viveiros de Castro, antes um destino. Em Meu tio o Iauaretê, João Guimarães
Rosa evidencia este processo na própria linguagem, na própria escritura: à medida que
Macuncôzo vai se tornando onça, o texto vai se tupinizando, se oncisando. Já em Meu destino é
ser onça, de Alberto Mussa, isto se dá na restauração do mito tupinambá, que dá voz ao outro
canibal. Um outro que nos fascina e aterroriza com seu olhar de onça, afinal, como dizem os
yawalaptí, “gente é macaco de onça".

O banquete de Mário de Andrade diante do espelho: questões do corpo híbrido


Evandro de Sousa
Tendo em vista a idéia da devoração e do descompasso de tempo, pretendo ler (a contrapelo) na
esfera da escrita a insígnia do Banquete, da partilha (e sua relação modernista-antropofágica
com a comunidade), mas também da intersecção do seres (os híbridos), na obra homônima de
Mário de Andrade, de 1943.

Do outro lado do rio: Oswald de Andrade e Paulo Duarte


George França
É notória e destacada pelo próprio Paulo Duarte sua forte ligação com Mário de Andrade, cuja
morte repercute não apenas nos projetos estético-políticos que aquele enceta após 1945, como
também na publicação da correspondência entre ambos (com o título de Mário de Andrade por
ele mesmo) e nas páginas e eleições da revista Anhembi, que Duarte dirigiu entre 1950 e 1962.
Mário é uma espécie de totem em Anhembi, um pai morto porém sempre presente, reivindicado
e obedecido. Não é novidade, também, apontarmos para a querela que findou a amizade entre os
dois agitadores do movimento modernista, Mário e Oswald de Andrade, e que não foi resolvida
até 1945. Diante dos dois fatos apontados, o que se pretende, no texto a ser apresentado, é
analisar como se dá a inscrição tumular de Oswald de Andrade na revista de Paulo Duarte, no
ano de 1954. Num país de papel marcado pela primazia da presença fantasmagórica de Mário,
quando se trata da morte do amigo feito desafeto, aparece não só um texto de caráter biográfico
a respeito do recém-falecido mas também o único texto de autoria sua na revista. Pretende-se,
pois, analisar os dois textos publicados como procedimentos de incorporação a uma narrativa do
modernismo de matriz modernista, assim como apontar possibilidades de leitura que mostrem as
fissuras que essa mesma cristalização deixa acontecer.

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