You are on page 1of 54

Orientações para a organização do

Ciclo Inicial de Alfabetização

PREPARANDO A
ESCOLA E A SALA DE AULA
Caderno 3
Belo Horizonte
2004
GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Aécio Neves da Cunha
SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO Vanessa Guimarães Pinto
SECRETÁRIO-ADJUNTO DE EDUCAÇÃO João Antônio Filocre Saraiva
SUBSECRETÁRIA DE
DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO Maria Eliana Novaes
SUBSECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO
DO SISTEMA DA EDUCAÇÃO Gilberto José Rezende dos Santos

EQUIPE TÉCNICA

SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO Raquel Elizabete de Souza Santos


DIRETORIA DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO
INFANTIL E FUNDAMENTAL Bernardette Castro Salles
SUPERINTENDÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO DE
RECURSOS HUMANOS PARA A EDUCAÇÃO Syene Maria Coelho de Toledo
DIRETORIA DE CAPACITAÇÃO DE
RECURSOS HUMANOS Maria Célia Basques Moura
SUPERINTENDÊNCIA DE
ORGANIZAÇÃO EDUCACIONAL Maria Regina da Silva Moreira

U58c Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Educação.


Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita.

Preparando a escola e a sala de aula/Centro de Alfabetização,


Leitura e Escrita. Belo Horizonte: Secretaria de Estado da Educação de
Minas Gerais, 2003.

54 p. (Coleção: Orientações para a Organização do Ciclo Inicial


de Alfabetização; 3)

1. Alfabetização Minas Gerais. I. Título. II. Secretaria de Estado


da Educação de Minas Gerais. III. Ceale/FaE/UFMG. IV. Ensino
Fundamental de Nove Anos. V. Título da Coleção.

CDD 372.4

Catalogação da Fonte: Biblioteca da FaE/UFMG

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS


CENTRO DE ALFABETIZAÇÃO, LEITURA E ESCRITA/CEALE

FICHA TÉCNICA
Elaboração
Antônio Augusto Gomes Batista - Diretor
Aparecida Paiva
Ceris Ribas
Isabel Cristina Alves da Silva Frade
Maria da Graça Ferreira da Costa Val
Maria das Graças de Castro Bregunci
Maria Lúcia Castanheira
Sara Mourão Monteiro

Consultores
Carla Viana Coscarelli
Marco Antônio de Oliveira

Revisão
Luiz Carlos de Assis Rocha

Diagramação e Editoração Eletrônica


Vívien Gonzaga e Silva
A coleção Orientações para a Organização do Ciclo
Inicial de Alfabetização faz parte da estratégia de preparação
dos professores para atuarem no ensino fundamental que, a
partir de 2004, passou a ter a duração de nove anos.

A implantação do ensino fundamental de 9 anos,


organizado em ciclos nos anos iniciais com ênfase na
alfabetização e no letramento, na rede estadual e na maioria dos
municípios do Estado de Minas, constitui-se em poderosa
ferramenta para elevação da qualidade da educação pública, pois
significa a universalização da pré-escola no âmbito do ensino
fundamental. Com mais tempo para ensinar e mais tempo para
aprender, a escola terá condições de planejar seu trabalho e
propiciar experiências pedagógicas e culturais a todas as
crianças de modo a garantir a aprendizagem significativa.

Agradeço à equipe do Ceale (Centro de Alfabetização,


Leitura e Escrita) da Faculdade de Educação da UFMG que
elaborou esta coleção. Sou grata também às professoras
alfabetizadoras* da Rede Pública Escolar que participaram de
grupos de discussão, partilhando suas experiências profissionais
com a equipe do Ceale.

Vanessa Guimarães Pinto


Secretária de Educação

* Ana Célia Costa Conrado, Ana Maria Prado Barbosa,


Bernadete do Carmo Gomes Ferreira, Dirlene Aparecida Chagas Guimarães,
Maria Lúcia Nogueira Ribeiro, Maria Terezinha Pessoa Vieira de Aquino,
Maura Lúcia de Almeida, Nancy Fernandes Rodrigues de Souza,
Rita de Cássia Pinheiro Quaresma, Rosa Maria Lacerda,
Rosângela Presoti Versieux, Rosângela Rodrigues de Araújo Prado,
Soraya do Valle.
Este caderno integra a Coleção Orientações para o Ciclo Inicial de Alfabetização,
elaborada para auxiliar as escolas das redes públicas do Estado de Minas Gerais na
organização do Ciclo Inicial de Alfabetização.

A Coleção é composta dos seguintes cadernos:

! Caderno 1: Ciclo Inicial de Alfabetização

! Caderno 2: Alfabetizando

! Caderno 3: Preparando a escola e a sala de aula

! Caderno 4: Acompanhando e avaliando

Para que a Coleção possa, de fato, auxiliar na organização do Ciclo Inicial de


Alfabetização, a sua colaboração é muito importante. Escreva, dando suas sugestões e
fazendo suas críticas.

Entre em contato conosco:

Universidade Federal de Minas Gerais


SEE/SD/SED/DEIF
Faculdade de Educação/CEALE
Av. Amazonas, 5855 - Gameleira
Projeto Ciclo Inicial de Alfabetização
Belo Horizonte/MG
Av. Antônio Carlos, 6627 – Campus Pampulha
CEP: 30.510-000
Belo Horizonte / MG
Fax: 31 3379-8658
CEP: 31.270-901
sed.deif@educacao.mg.gov.br
Fax: 31 3499 53 35
cicloinicial@fae.ufmg.br
SUMÁRIO

Apresentação .........................................................................................7

1. O perfil de professores e outros profissionais do


Ciclo Inicial de Alfabetização: critérios para sua seleção
e sua formação continuada .................................................................7

2. O planejamento do trabalho em sala de aula e a


organização de atividades em torno da alfabetização.......................15

3. O lugar da discussão metodológica no conjunto


de decisões relacionadas à alfabetização .........................................35

4. A escolha e a utilização de livros didáticos no


Ciclo Inicial de Alfabetização ............................................................44

5. A integração das famílias ao trabalho desenvolvido


pelas escolas na alfabetização .........................................................50

Palavras finais .......................................................................................54


Preparando a escola e a sala de aula.............

APRESENTAÇÃO
Este Caderno focalizará algumas dimensões diretamente relacionadas à preparação
da escola e da sala de aula para o trabalho no Ciclo Inicial de Alfabetização. A abordagem
proposta ampliará o foco explorado no Caderno 2, voltando-se, agora, para o estabelecimento
de um conjunto de procedimentos que poderão contribuir para a
organização das práticas pedagógicas em torno da alfabetização e O Caderno 2 focaliza as
progressivas capacidades a
do letramento dos alunos desse Ciclo: serem atingidas pelas
crianças ao longo do Ciclo
1. Os critérios mais relevantes para a seleção e a
Inicial de Alfabetização.
preparação dos educadores – professores e
especialistas – que atuarão no Ciclo Inicial de Alfabetização;

2. Os procedimentos relacionados ao planejamento de atividades pedagógicas para o


trabalho a ser desenvolvido em sala de aula;

3. As decisões relativas aos métodos de alfabetização que serão privilegiados no


Ciclo;

4. Os critérios de escolha de livros e materiais didáticos que serão utilizados pelos


professores-alfabetizadores;

5. As condições mais relevantes para a integração das famílias ao trabalho de


alfabetização desenvolvido pelas escolas.

Tais núcleos funcionarão como eixos organizadores do complexo trabalho de


preparação da sala de aula e da escola para a tarefa de consolidação da alfabetização ao longo
do Ciclo. Esse trabalho somente será bem sucedido se houver convergência de reflexões,
decisões e ações em torno desse conjunto de procedimentos, a partir da mobilização coletiva
da escola. Com o objetivo de favorecer esse processo, cada um dos eixos propostos será
desenvolvido nas seções seguintes.

1. O perfil de professores e outros profissionais do


Ciclo Inicial de Alfabetização: critérios para sua seleção
e sua formação continuada
No conjunto dos eixos organizadores propostos neste Caderno, destaca-se, em
primeiro plano, a importância do perfil do profissional que estará envolvido com o trabalho de
alfabetização ao longo do ciclo inicial. Por essa razão, esta seção enfatizará os critérios que as
escolas devem considerar na escolha ou indicação dos professores alfabetizadores, bem como
dos demais profissionais de apoio que atuarão na coordenação do projeto de alfabetização da
escola, tais como o supervisor e o orientador educacional.

7............
..............Preparando a escola e a sala de aula
O professor alfabetizador é o profissional que atua no contexto de um
projeto pedagógico, um programa curricular, uma área de
conhecimento e um ciclo específico do nível fundamental de ensino. Os
indicadores de êxito de seu trabalho pressupõem: (i) a consolidação do
ensino e da aprendizagem da língua escrita; (ii) a efetivação de uma
prática diversificada, flexível e sensível às características culturais,
sociais e de aprendizagem dos alunos dos três anos do Ciclo Inicial de
Alfabetização.

Diante das especificidades do trabalho de alfabetização, a escola precisa se organizar


para escolher os professores alfabetizadores e os responsáveis pela coordenação pedagógica
do Ciclo Inicial de Alfabetização. Esses profissionais possuem saberes e atitudes que lhes são
particulares, além de elevadas demandas de competências que, em conjunto, definem um perfil
bastante exigente:

I. O professor alfabetizador tem uma identidade própria e precisa


ser reconhecido pela importância de seu trabalho
O professor alfabetizador trabalha em um momento específico, especial e definidor da
trajetória de seus alunos. Embora a alfabetização e o letramento devam ser preocupação de
todos os profissionais da educação, por suas implicações em todos os segmentos de ensino,
tais processos exigem o reconhecimento de uma identidade
O trabalho do professor
profissional, associada à valorização de um conjunto de saberes:
alfabetizador inclui saberes
a) os saberes sistematizados na área de conhecimento, que das disciplinas ou áreas de
conhecimento, saberes
dependem de formação profissional em disciplinas e dimensões
pedagógicos e saberes
pedagógicas pertinentes ao ensino-aprendizagem da língua escrita, práticos.
bem como de formação contínua engajada em programas e projetos
curriculares; b) os saberes práticos ou saberes da experiência, que envolvem conhecimentos e
habilidades adquiridos pelo professor ao longo do exercício de sua atividade. Essa segunda
dimensão representa um grande diferencial no perfil de professores alfabetizadores de
sucesso, que acumulam um “saber fazer” digno de atenção no processo reflexivo e nas
escolhas da escola em função do Ciclo Inicial de Alfabetização.

II. O conteúdo de alfabetização é tão elaborado e


complexo quanto os demais conteúdos trabalhados
em outros ciclos e níveis de ensino
O professor alfabetizador precisa conhecer: a) quais são os pressupostos e as
implicações político-pedagógicas dos processos de alfabetização e letramento; b) quem são os

............8
Preparando a escola e a sala de aula.............

alunos, quais são suas capacidades e como eles valorizam e compreendem a escrita e a
própria escolarização (aspectos sócio-culturais, cognitivos, atitudinais); c) quais são os
conteúdos e conhecimentos lingüísticos que devem ser enfatizados no ciclo; d) quais são as
possibilidades metodológicas mais pertinentes aos objetivos do ensino (a didática da
alfabetização); e) quais são os instrumentos de avaliação mais adequados ao processo
(diagnósticos e intervenções).
Nos Cadernos desta
Esse complexo conjunto de procedimentos evidencia que Coleção você pode
não será o professor inexperiente o mais indicado para a tarefa de encontrar os fundamentos
desses procedimentos:
alfabetizar. Caso as condições da escola assim o exijam, será Caderno 1 (a,b), Caderno 2
necessário criar uma rede de parceria e sustentação pedagógica em (b,c) Caderno 3 (d),
Caderno 4 (e).
torno da atuação do professor iniciante.

III. O profissional que atua no Ciclo Inicial de Alfabetização


deve possuir competência e sensibilidade para o trabalho
com alunos na faixa etária de seis a oito anos
O professor alfabetizador, na escola regular, deve se identificar com alunos da faixa
etária própria ao ciclo, entendendo o momento que vivem no processo de escolarização e as
experiências extra-escolares que trazem. Essa faixa etária define um momento psicológico e
cultural da infância, que marcará os temas preferidos por essas crianças, as brincadeiras
vivenciadas, a atividade física em expansão, as modalidades de linguagem utilizadas, as
possibilidades de relacionamentos sócio-afetivos e de compreensão de regras. Considerando-
se a inclusão da criança de seis anos no Ciclo Inicial de Alfabetização, a sensibilidade exigida se
amplia, tendo em vista as implicações pedagógicas dessa reorganização: não se trata, por
exemplo, de antecipar todas as demandas anteriormente dirigidas a uma criança de sete anos e
projetá-las no perfil da criança de seis anos que é introduzida no Ensino Fundamental.
A inserção do aluno na
Acrescente-se que, para os alunos de classes populares,
cultura escolar é discutida
esse nível representa o início efetivo de sua inserção em uma cultura no Caderno 1 e as
escolar: eles precisam entender as rotinas, as normas, os rituais dimensões procedimental e
organizacional desse
escolares. Precisam também saber lidar com os instrumentos aspecto são analisadas nos
utilizados na escola (livros, cadernos, lápis e outros) e com a Cadernos 2 e 3.

organização de tempos e espaços dessa instituição.

IV. O professor alfabetizador evidencia abertura para o trabalho em


contextos de diversidade e de diferenças
Ensinar os alunos das escolas públicas a ler e a escrever é trabalhar com um leque de
sensibilidades, culturas e relações com a escrita. Isso significa que um desafio a ser enfrentado

9...........
..............Preparando a escola e a sala de aula
pelo professor é o de promover o convívio e o trabalho com a diversidade e com a diferença.
Essa pluralidade se desdobrará em dimensões sócio-culturais e econômicas, étnico-raciais ou
ainda de gênero, quando se pensa em possíveis diferenças de oportunidades de interação e de
desempenho entre meninos e meninas.
Alguns estudos (SIROTA,
As diferenças também dizem respeito aos ritmos de 1996; GIUSTA e
BREGUNCI, 1998) têm
aprendizagem (entre aqueles que são mais informados e estão mais
apontado maior incidência
avançados e aqueles que estão menos avançados no conhecimento de dificuldades na
escolarizado). As diferenças podem, ainda, ser mais desafiadoras se escolarização inicial em
meninos, menos
o professor estiver envolvido com a inclusão de crianças com valorizados nas interações
necessidades especiais – o que exigirá que demande recursos e em sala de aula e menos
adaptados aos rituais da
preparação adicional para as ações nas quais se sente despreparado escola do que as meninas.
ou inseguro. Assim, para trabalhar nesse contexto de diferenças é
importante que o alfabetizador saiba criar um ambiente de parceria,
de troca e de intervenção na sala de aula, de modo a favorecer que
A discussão sobre
cada aluno avance em relação ao ponto em que se encontra. Precisa reagrupamentos de
compreender, enfim, que, por mais que se tente o reagrupamento de alunos é desenvolvida
no Caderno 4.
alunos das turmas de alfabetização durante o ano letivo ou ao longo
do ciclo, buscando sua homogeneidade, sempre haverá diferenças
Propostas de
entre eles. Para enfrentá-las, o professor necessita propor procedimentos
diversificados são
procedimentos diversificados, adaptados às necessidades e ao nível
sugeridas nos
de cada aluno. Cadernos 2 e 3.

V. O professor alfabetizador desenvolve expectativas de


sucesso e estimula a auto-estima dos alunos
O professor alfabetizador precisa acreditar nas capacidades de aprendizagem de
todos os seus alunos, independentemente de sua origem social, cultural, ou de outras
diferenças apontadas no tópico anterior. O aluno constrói a crença de
que vai fracassar quando se sente desestimulado e rejeitado no seu Pesquisas sobre relações
entre expectativas de
processo de aprendizagem e nas interações processadas em sala de professores e desempenho de
aula. Dependendo de como o professor se manifesta ao avaliar os alunos evidenciam que as
predições ou profecias sobre
alunos, estes podem acreditar que não são capazes. Assim, a
fracasso e sucesso se
motivação para estudar e a disponibilidade para aprender são cumprem de fato: os alunos
aprendem mais quando os
resultantes da valorização que o aluno recebe quando está
seus professores apostam e
aprendendo a ler e a escrever, das expectativas afirmativas em investem nessa possibilidade.
relação a suas possibilidades e da auto-estima positiva que poderá se (ROSENTHAL;
JACOBSON, 1981).
consolidar nesse processo.

..........10
Preparando a escola e a sala de aula.............

O profissional da alfabetização – seja ele professor ou coordenador – não compara


desempenhos com modelos idealizados, que estariam classificando os alunos com base em
parâmetros estatísticos ou externos ao processo. Ao contrário, esse profissional reconhece o
desempenho do aluno, sempre considerando sua trajetória particular, sem perder de vista as
metas ampliadas para que ele avance. Isso significa, em outros termos, não se conformar com
um trabalho aquém das possibilidades do aluno, não se restringir a um patamar mínimo de
conteúdos, não reforçar apenas os conhecimentos espontâneos aos quais o aluno pode chegar
por suas experiências cotidianas. Trata-se, enfim, de valorizar os objetivos progressivos e os
passos seguintes a serem dados pelos alunos em direção a algum avanço – o avanço em
conhecimentos e capacidades, o avanço em autonomia, o avanço em cidadania.

VI. O profissional da alfabetização desenvolve uma atitude de


pesquisa em relação à sua atividade e investe na socialização
de conhecimentos produzidos na área
O profIssional que atua na área da alfabetização deve se dispor a elaborar registros de
sua prática, refletindo sobre seus avanços e dificuldades na escolha de contextos, de
estratégias, de materiais para ensinar a ler e a escrever. Deve também se dispor a tornar
públicos tais registros, no grupo de alfabetizadores e em outras instâncias, socializando sua
prática. Essas disposições podem prepará-lo para uma permanente atitude de pesquisa em
relação à área, levando-o a conhecer e aproximar-se de grupos que discutem o tema,a
identificar novas produções em revistas, livros e outras fontes ou mesmo a produzir textos para
serem divulgados em sua escola, em sua região e em revistas dirigidas a professores. O campo
da alfabetização é muito amplo e depende das contribuições de muitas áreas, com crescente
valorização acadêmica e científica. Por isso mesmo, a produção de conhecimentos nesse

campo deve ser incentivada a partir de projetos em parceria, da A ampliação da


produção de
participação em concursos e de diversos fóruns de divulgação, com conhecimentos na área
estímulos das coordenações pedagógicas e de instâncias diversas de alfabetização
demanda o registro, a
do sistema. análise e a socialização
de experiências de
professores e
coordenadores.

VII.O profissional da alfabetização desenvolve a


perspectiva do trabalho coletivo e compartilhado O coletivo da escola é
uma instância interativo-
O trabalho docente do alfabetizador não pode ser uma prática reflexiva formadora do
professor alfabetizador
solitária. Da mesma forma, experiências de fracasso ou de sucesso no e sua dinâmica depende
da articulação
ensino não podem ser relacionadas apenas a competências da coordenação
particulares dos professores. A perspectiva do trabalho coletivo ou em pedagógica.

11..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
parceria permite que as aprendizagens do professor sejam compartilhadas, contribui para
maior consistência de seu desempenho em sala de aula, propicia reflexões sobre experiências,
conquistas e frustrações, espelhadas nas práticas e nos sentimentos de seus pares. Essa
perspectiva pode se ampliar através de sua participação em trabalhos de colegas na sala de
aula, na exposição de experiências bem sucedidas, na formação de iniciantes, na acolhida de
estagiários de alfabetização, no envolvimento com a discussão de resultados e problemas da
alfabetização e nos momentos de compartilhar esses resultados com os pais de alunos.

O papel do coordenador pedagógico, nesse contexto, é extremamente importante, por


ser esse o profissional que realmente pode funcionar como articulador do Ciclo, constituindo
grupos de estudo, consolidando processos de mudança e projetos inovadores, estimulando
propostas de formação continuada que envolvam os responsáveis pela alfabetização na
escola.

VIII. O profissional responsável pela alfabetização participa de


processos de formação continuada
Embora a prática profissional seja um elemento constitutivo
da formação dos educadores, estes necessitam ter espaços e
tempos próprios para sua formação continuada ou em serviço. A formação continuada
Através desse processo, o profissional que atua no Ciclo de abrange todas as formas
deliberadas e organizadas
Alfabetização Inicial poderá discutir suas experiências, atualizar-se de aperfeiçoamento
em relação às novas tendências e abordagens produzidas na área, profissional do docente,
tendo em vista sua
envolver-se em temas e procedimentos que possam contribuir para a qualificação e a melhoria
de sua prática no contexto
superação de problemas e lacunas em sua prática docente. Poderá,
escolar.
em conseqüência, ter crescente autonomia para se tornar
protagonista de seu processo de formação e contribuir para a
formação de seus pares. A importância da
produção e da
O conjunto de competências, saberes, valores que socialização de
informam a visão sobre o alfabetizando e sobre o ofício de alfabetizar conhecimentos ou projetos
no coletivo da escola foi
ganha mais sentido quando os professores os transformam em focalizada no tópico
saberes públicos. anterior.

Há saberes práticos e intuitivos que levam ao sucesso e


fazem parte da tradição escolar. Há também um conjunto de A transposição didática
envolve a apropriação,
pesquisas sobre temas da área produzidas pelas universidades e pelos professores, de
outras instituições. Assim, a ampla discussão de princípios teóricos concepções ou saberes
teóricos que são
sobre a alfabetização é uma das bases de sustentação de diversas reelaborados e
ações de formação dos professores. No entanto, é preciso enfrentar reconstruídos, em busca de
maior consistência com
um aspecto pouco valorizado na discussão da alfabetização, nos suas crenças e práticas
últimos anos: o da transposição didática. pedagógicas.

..........12
Preparando a escola e a sala de aula.............

Quando os professores discutem coletivamente a sua cultura pedagógica,


relacionando-a a pressupostos teóricos inovadores, estarão buscando, além de compreensão
da alfabetização em suas dimensões políticas e sócio-culturais, as formas adequadas de fazer
ou de desenvolver esse trabalho mediante ações e intervenções intencionais e sistematizadas.

Nesse contexto de possibilidades tão amplas, há ações e Algumas modalidades de


formação continuada
processos de formação continuada que ocorrem no espaço
podem ser desenvolvidas
institucional e que devem ser previstas no projeto de alfabetização de no âmbito da própria
escola.
cada unidade:
a) Reuniões periódicas para análise de problemas, divulgação de experiências,
pesquisa de resultados alcançados pelos professores, revisão do projeto
pedagógico da instituição, estudo e discussão de textos de referência, análise e
escolha de materiais didáticos, entre outras possibilidades;

b) Registro permanente (impresso ou em vídeo) de projetos de intervenção, de


produções escritas dos alunos, de resultados aferidos por avaliações internas, ao
longo do Ciclo, e de avaliações externas à escola, que sirvam de subsídios para
discussões e pesquisa sistemática sobre o processo de alfabetização da escola;

c) Organização de tempos e espaços para reuniões de formação de pequenos


grupos, com ampliação de seus resultados e proposições para o coletivo dos
alfabetizadores e para a escola como um todo;

d) Previsão de situações em que os professores e outros profissionais iniciantes ou


experientes, possam alternar, em algum momento, o papel de quem está dirigindo a
aula com o de quem observa a aula de outro, com fins de formação.

e) Criação de um clima institucional e solidário de troca de experiências entre


professores, no plano mais informal das trocas diárias, em que possam ser
discutidos, sem receio, os problemas que cada professor vive, assim como as
soluções que encontra ao longo do processo.

Uma outra dimensão da formação continuada refere-se às


Inúmeras propostas de
ações que ocorrem em um campo mais aberto, que vai além da formação continuada
própria escola: é o campo do intercâmbio com escolas vizinhas, de podem ocorrer em espaços
extra-escolares, articuladas
uma regional, do município, da superintendência, das secretarias e a programas e políticas
redes como um todo. Para o encaminhamento dessas modalidades, públicas de qualificação
docente.
é importante determinar, no projeto de formação:

a) Modalidades democráticas de participação de


professores em ações de formação fora da escola,
demandadas pelo sistema ou pelo coletivo da instituição;

b) Definição de temáticas e focos sintonizados com a


reflexão e solução de problemas específicos da prática

13..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
docente (como dificuldades na apropriação pedagógica As Orientações para o
Ciclo Inicial de
de orientações curriculares e projetos inovadores,
Alfabetização representam
dificuldades no ensino da leitura e da escrita, das um conjunto de temas e
focos que demandarão
intervenções no campo ortográfico ou de recursos
inúmeras ações de
alternativos para o trabalho junto a crianças com formação continuada dos
necessidades especiais); profissionais da
alfabetização, através de
c) Formas de avaliação coletiva das experiências e ações parcerias entre as redes de
ensino e as instituições
da instituição que serão divulgadas fora da escola;
formadoras desses
d) Retorno, para o conjunto de profissionais, de ações e profissionais.

conhecimentos vivenciados em processos de formação,


sob várias formas: exposição, em reuniões ou oficinas, de temas, conteúdos e
atividades; proposição de novos materiais pedagógicos; socialização de projetos
de trabalho individuais, grupais ou interdisciplinares; desdobramento de processos
internos multiplicadores da formação vivenciada pelo professor.

Referências
ANDRÉ, Marli (Org.). Pedagogia das diferenças na sala de aula. Campinas: Papirus, 2001.
AQUINO, Júlio G. Diferenças e preconceito na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo:
Summus, 1998.
GIUSTA, Agnela; BREGUNCI, Maria das Graças. Diferenças.de desempenho entre meninas e meninos
no processo de alfabetização. Belo Horizonte: Faculdade de Educação da UFMG; SEEMG - 15ª SRE,
1998.
LÜDKE, Menga (Org.). O professor e a pesquisa. Campinas: Papirus, 2002.
MOYSÉS, L. A auto-estima se constrói passo a passo. Campinas: Papirus, 2002.
NÓVOA, Antônio (Org.) Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
ROSENTHAL, R.; JACOBSON, L. Profecias auto-realizadoras em sala de aula: as expectativas de
professores como determinantes não intencionais da competência intelectual. In: PATTO, Maria Helena S.
(Org.). Introdução à Psicologia Escolar. São Paulo: T. A. Queiroz, 1981. (parte III, cap. 3).
PATTO, Maria Helena S. (org.). Introdução à Psicologia Escolar . São Paulo: T.A. Queiroz, 1981. (parte III,
cap. 3 - Profecias auto-realizadoras em sala de aula: as expectativas de professores como determinantes
não intencionais da competência intelectual; Rosenthal e Jacobson).
PERRENOUD, P. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2000.
PERRENOUD, P. Formando professores profissionais: quais estratégias? Quais competências? Porto
Alegre: Artmed, 2001.
SILVA, Tomaz Tadeu. Alienígenas na sala de aula. Petrópolis: Vozes, 1996.
SILVA, Tomaz Tadeu et al. Territórios contestados: o currículo e os novos mapas políticos e culturais.
Petrópolis: Vozes, 1998.
SIROTA, Régine. A escola primária no cotidiano. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
SHÖN, D. O profissional reflexivo: como pensa, como atua? Porto Alegre: Artes Médicas, 2001.
VEIGA, Ilma P.; RESENDE, Lúcia Maria G. Escola: espaço do projeto político-pedagógico. Campinas:
Papirus, 2002.

..........14
Preparando a escola e a sala de aula.............

2. O planejamento do trabalho em sala de aula e a


organização de atividades em torno da alfabetização
O planejamento do trabalho em sala de aula é uma dimensão fundamental do trabalho
pedagógico, porque permite, aos professores e à escola, controlar os resultados desse
trabalho, controlar a consecução das finalidades desse trabalho.

Mais importante: é por meio da elaboração do planejamento, de seu desenvolvimento


e de sua avaliação que a escola afirma a sua autonomia e o seu saber específico. Ao planejar, a
escola controla os fins de seu trabalho, define os meios para alcançar esses fins, estabelece
instrumentos para sua auto-avaliação, redefine, com base na avaliação, suas metas e meios.

Quando a escola e os professores abrem mão do planejamento, eles abrem mão de


sua autonomia, de seu saber, do controle de seu trabalho. Abrem mão até da possibilidade de
desenvolvimento de sua formação, pois é planejando, executando e se avaliando que a escola
e os docentes geram um contexto de ampliação de seu saber, pela criação da necessidade de
estudo, de elaboração de novas estratégias, de análise e reflexão sobre problemas
encontrados.

O planejamento é, desse modo, o principal instrumento por meio do qual a escola e os


professores asseguram o controle autônomo de seu trabalho. Não é uma mera formalidade e
não pode ser delegado a um método de ensino ou a um livro didático, por melhores que sejam.
Não pode tampouco ser delegado a outro profissional. Um arquiteto que copia plantas de
revistas deixa de ser um arquiteto; um médico que apenas segue procedimentos ditados por um
manual deixa de ser médico. Um professor que não planeja deixa de ser um professor.

Mas o planejamento é também imprescindível por uma outra razão. É que o trabalho
pedagógico deve ser sempre um trabalho sistemático para que possa ter efeitos (e efeitos
duráveis) sobre o aluno. É preciso que haja uma continuidade entre uma aula e outra;
conhecimentos complexos para o aluno devem ser abordados antes daqueles menos
complexos; o que é mais próximo da realidade da criança ajuda a dominar o que é mais distante.
Em outras palavras, uma prática de ensino assistemática é pouco favorável ao aprendizado do
aluno e é o planejamento que pode assegurar que essa prática assuma um caráter sistemático.

Por que, então, muitos professores e escolas deixam de fazer o planejamento?

É que planejar, primeiramente, é uma tarefa complexa. Possui, por exemplo,


dimensões coletivas e individuais, bem como dimensões escolares e não-escolares, que
devem ser sempre articuladas.

Quando um professor planeja, ele se baseia, muito, nas suas expectativas individuais
em relação ao ensino, bem como em suas possibilidades individuais (em seu estilo de atuação,
em seus conhecimentos, em seus gostos). Essa dimensão individual e subjetiva da prática de
ensino é extremamente importante, porque é ela que nos faz sentir prazer em sala de aula, nos

15..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
faz sentir realizados, nos faz sentir que nos exprimimos por meio de nosso trabalho. Assim,
nossa prática deve expressar nossa subjetividade, nossas crenças e nossas possibilidades.

Mas essas expectativas e possibilidades individuais precisam sempre estar integradas


e articuladas com fatores de ordem social e coletiva. Alguns desses fatores têm a ver com
necessidades escolares: o trabalho em cada turma deve alcançar resultados semelhantes; o
trabalho em cada série e ciclo deve gerar condições para o desenvolvimento do trabalho na
série ou ciclo seguinte. Outros desses fatores de ordem coletiva têm a ver com fatores não-
escolares: as expectativas dos pais, as expectativas dos alunos, da comunidade, dos diferentes
grupos sociais que buscam, legitimamente, influenciar na definição das finalidades da escola e
de seu trabalho.

Assim, planejar é difícil porque envolve a articulação e a equilibração de diferentes


fatores: planejar é uma tarefa complexa.

Além de complexa, essa tarefa exige condições para ser


realizada. Essa é a segunda razão pela qual muitos professores e
escolas deixam de elaborar seu planejamento e avaliá-lo. É que isso
exige tempo e trabalho coletivo. Tempo é algo de que, em geral, os A SEE-MG está
estudando instrumentos
professores não dispõem. A maior parte dos docentes brasileiros
para assegurar
possui contratos de trabalho que não prevêem tempos para atividade (inicialmente, aos
professores
extra-classe e para o trabalho coletivo. A maior parte dos docentes
alfabetizadores) tempo
trabalha em dois turnos, o que faz com que sejam responsáveis por para o planejamento
um número excessivo de alunos e com que gastem a maior parte de cotidiano e para o
trabalho coletivo.
seu tempo fora da sala de aula com a correção de trabalhos.

Planejar, portanto, supõe tempo de atividades extra-classe, para o trabalho individual e


coletivo de planejamento.

Embora seja complexo e suponha condições, o planejamento é imprescindível para o


trabalho pedagógico. Até aqui, abordamos as razões pelas quais é importante e necessário
fazê-lo. Nas seções seguintes, discutiremos como fazê-lo.

Como planejar?
Um processo de planejamento deveria se estruturar em torno de cinco grandes
conjuntos de procedimentos, estabelecidos de acordo com o aquilo que se deseja definir,
organizar, planejar,
! criando condições para o planejamento;
! estabelecendo e compartilhando as finalidades ou metas a serem alcançadas;
! definindo os meios para alcançar essas metas ou finalidades;

..........16
Preparando a escola e a sala de aula.............
! escolhendo instrumentos de registro das atividades;
! avaliando o que se planejou e o que se realizou.

Nas seções que se seguem serão discutidos os três primeiros procedimentos. Os dois
últimos serão focalizados no Caderno 4 e detalhados em documentos posteriores.

2.1. Criando condições para o planejamento


É preciso planejar. Mas como conseguir planejar? O ideal é:
! criar a semana de planejamento;
! criar a semana de diagnóstico e de recepção das crianças;
! criar condições para a reelaboração do planejamento.

Criar a semana de planejamento

Como muitas escolas já fazem, define-se uma semana para a elaboração do


planejamento, antes do início do ano letivo. Durante essa semana, a escola define suas metas
para a alfabetização, os meios que utilizará para alcançar essas metas e os procedimentos de
acompanhamento e avaliação de seu trabalho. Uma dinâmica interessante para isso é
apresentada abaixo.

Primeiro dia – a comunidade escolar (incluindo a família dos alunos do Ciclo Inicial e
do Ciclo Completar de Alfabetização) faz, num seminário, uma avaliação das
conquistas e das dificuldades da escola e define as metas ou objetivos a serem
alcançados no ano letivo que se iniciará.
A proposta de metodologia
Segundo dia – os professores alfabetizadores e de avaliação aqui
apresentada se baseia na
especialistas elaboram individualmente o planejamento do proposta do projeto
Ciclo Inicial de Alfabetização, estabelecendo os objetivos ou Indicadores Qualitativos da
Educação na Escola, um
metas a serem alcançados, bem como os principais meios instrumento elaborado por
para alcançar essas metas. Para o estabelecimento das educadores e apoiado pelo
Unicef e por Ação
metas, o Caderno 2 desta Coleção, ao definir as principais
Educativa. Para ter acesso a
competências envolvidas na alfabetização e no letramento, essa proposta, consulte
acaoeducativa@org.br
fornece uma base inicial.

Terceiro dia – estabelece-se um planejamento coletivo da


escola para o Ciclo Inicial.

Quarto dia – a escola se organiza para discutir, no dia


seguinte, com as famílias dos alunos do Ciclo Inicial, as
metas a serem alcançadas, tal como definidas no
planejamento coletivo.

17..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
Quinto dia – a escola realiza a discussão, com a É muito importante
envolver os pais na
comunidade escolar, das metas a serem alcançadas e dos discussão sobre as
principais meios a serem utilizados. metas ou objetivos a
serem alcançados. A
última seção deste
Caderno focalizará as
Sexto dia – a escola refaz o planejamento com base nas
relações da escola com
discussões com a comunidade escolar. a comunidade escolar.

Criar a semana de diagnóstico e de recepção das crianças


A primeira semana de aula é extremamente importante para alunos e professores. Ela
é um momento “de passagem”, em que as crianças devem aprender como “funciona” a escola e
a sala de aula. Mas é também o momento ideal para a escola fazer, sistematicamente, uma
revisão de seu planejamento. As metas já foram estabelecidas e os meios já foram definidos,
em suas linhas mais gerais. É hora de adaptar esses meios aos alunos: o que já sabem? o que
não sabem ainda?

No Caderno 4, são apresentadas algumas formas de diagnóstico. Na primeira semana


de aula, o professor deve estar preocupado em descobrir os conhecimentos e capacidades que
as crianças já dominam e auxiliá-las a conhecer a escola, sua forma de organização, sua
estrutura espacial, seus valores e códigos (regras e rituais).

Com o diretor e os especialistas, é preciso, com base nos diferentes instrumentos de


diagnóstico empregados, redefinir e aprimorar os meios definidos no planejamento. Mas é
preciso ressaltar: as metas não são mais objeto de redefinição: elas já foram acordadas com a
comunidade escolar.

Criar condições para a reelaboração do planejamento


Com base no diagnóstico construído na semana de
Você e sua escola podem
diagnóstico, assim como a partir da avaliação contínua do trabalho conhecer outras
realizado, é preciso reelaborar o planejamento, modificando-o, possibilidades de
organização do trabalho
especificando-o, aprimorando-o. Para isso, pelo menos coletivo. Por favor, nos
quinzenalmente, será preciso que os professores do Ciclo Inicial de enviem essas
possibilidades para que
Alfabetização se reúnam. Uma possibilidade para selecionar tempo
possamos divulgá-las.
para isso tem a ver com o horário das aulas especializadas (se, na Você pode nos contactar:
elaboração do horário da escola, as aulas de Biblioteca, Artes e www.fae.ufmg.br/ceale/cicloinicial

Educação Física coincidirem, pelo menos três professores e um ou


mais especialistas poderão se reunir).

..........18
Preparando a escola e a sala de aula.............

2.2. Estabelecendo e compartilhando as finalidades


ou metas a serem alcançadas
No Caderno 2 – “Alfabetizando” – foram apresentadas diferentes capacidades
necessárias ao domínio da língua escrita. Esse caderno é a base para que se estabeleçam os
objetivos e metas do trabalho pedagógico.

Para isso, é importante que a escola:


! Avalie a distribuição dessas capacidades por ano e pelo Ciclo Inicial, determinando quais
delas irá privilegiar (o Caderno 2 já apresenta uma sugestão de distribuição em cada
quadros relativo aos conjuntos de capacidades);
! Compartilhe essas metas com as famílias de seus alunos, para sua avaliação, para acolher
sugestões e para favorecer, por meio dessa partilha, o interesse da família pelo aprendizado
do aluno, bem como para lhe dar instrumentos para acompanhá-lo;
! Compartilhe esses objetivos com os próprios alunos, para que sempre saibam o que deles é
esperado e para que possam monitorar, assim, o processo de ensino e aprendizado.

2.3. Definindo meios para alcançar as metas e os objetivos


Estabelecidos os objetivos e as metas da alfabetização, nos diferentes momentos do
Ciclo, é preciso definir: como alcançar esses objetivos?

Sugerimos que a escola e os professores planejem suas atividades tendo em vista:

I. a natureza da atividade (se se trata de uma atividade de A natureza da atividade


introdução de conteúdos ou capacidades, de trabalho sistemático é discutida também no
Caderno 2.
com esses conteúdos e habilidades, ou de garantia ou sedimentação
do aprendizado); Outros importantes
aspectos do planejamento
II. a criação de um contexto ou ambiente alfabetizador; e da organização da
alfabetização, como a
III. o estabelecimento de rotinas diárias e semanais.
escolha dos métodos e do
Cada um desses aspectos da organização da alfabetização livro didático, bem como
a articulação da escola
será discutido a seguir. com a família são
abordados ainda neste
Caderno, em seções
específicas.
I. Organizando as atividades para o processo de alfabetização
Neste tópico serão apresentadas, sob a forma de quadros de síntese, algumas
possibilidades de atividades pedagógicas para o trabalho a ser desenvolvido no Ciclo Inicial de
Alfabetização. Trata-se de proposta que não pretende ser exaustiva Seu redimensionamento
dependerá do nível de planejamento deliberado pela escola, em sintonia com os princípios
discutidos até o momento.

19..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
A intenção principal consiste em valorizar alguns tipos de
atividades que podem ser considerados indispensáveis para que a
alfabetização dos alunos se realize, de acordo com os eixos de
conteúdos e capacidades essenciais à aprendizagem inicial da Para a revisão desses eixos
e de seus desdobramentos
linguagem escrita: compreensão e valorização da cultura escrita; consulte o Caderno 2.
apropriação do sistema de escrita; leitura; produção de textos
escritos; desenvolvimento da oralidade.

Os quadros oferecem uma perspectiva geral de organização do trabalho pedagógico,


tendo em vista processos de longa duração. O princípio organizador seria a dimensão temporal
do próprio Ciclo, para que as atividades perpassem os três anos de sua duração. A sinalização
através do código utilizado pretende enfatizar três níveis de intensidade do trabalho em função
da natureza da atividade focalizada:
Os níveis propostos devem
ser relacionados às
categorias focalizadas no
Caderno 2 e às sugestões
para sua avaliação no
Caderno 4.

Proposição da atividade para introduzir conteúdo ou capacidade,


familiarizando o aluno com conceitos e procedimentos que serão
enfatizados no período (ou retomar eventualmente, quando se tratar de
conceitos ou capacidades já consolidadas em período anterior);

Proposição da atividade para trabalhar, de forma sistemática, conteúdos,


procedimentos ou capacidades em desenvolvimento pelo aluno;

Proposição da atividade para consolidar o processo de aprendizagem do


aluno e seus avanços em conhecimentos e capacidades.

Deve-se observar, portanto, que o encaminhamento das atividades propostas será


regulado pelo nível de aprendizagem dos alunos: algumas delas estarão sendo apenas
introduzidas, enquanto outras poderão ser mais sistematizadas ou, ainda, consolidadas, em
um mesmo momento do Ciclo.

..........20
Preparando a escola e a sala de aula.............

Quadro 1
Compreensão e valorização da cultura escrita
Atividades pedagógicas para o trabalho no
Ciclo Inicial de Alfabetização

Atividades Fase
Fase I Fase II
Introd.
Atividades que abordam os modos de produção e circulação da
escrita na sociedade: diferentes gêneros textuais (histórias,
notícias, cartas, propagandas, etc.), em diferentes suportes A- A+- A+
(livros, revistas, jornais, papel de carta, out-doors, etc.), em
diferentes espaços (livrarias, bancas, bibliotecas, etc.)

Atividades que abordam os usos e funções sociais da escrita


(usos públicos e particulares de diferentes gêneros, com A- A+- A+
diferentes funções)

Atividades de exploração dos materiais escolares de escrita

Atividades de observação e controle do uso dos materiais


escolares de escrita

As duas primeiras linhas do quadro tratam de atividades que visam desenvolver


conhecimentos gerais e valores atitudinais (saber para que serve a escrita na sociedade e
valorizar seus usos e funções). O sombreamento forte nas três quadrículas correspondentes aos
anos do Ciclo Inicial de Alfabetização sugere que essas atividades sejam realizadas
sistematicamente nos três anos, buscando consolidar conhecimentos e atitudes. As marcas A-,
A e A+ são usadas para significar uma gradação na autonomia das crianças. A sugestão é que,
na Fase Introdutória, o professor lhes mostre escritos variados, explorando os suportes, usos,
funções, espaços e veículos de circulação desses escritos; na Fase I, os alunos explorem por
conta própria algumas manifestações da escrita (individualmente, em duplas, em grupos), mas
ainda contando com a orientação direta do professor para a exploração de outras; na Fase II, os
alunos ampliem o leque dos gêneros e suportes que são capazes de usar com autonomia.

As duas últimas linhas do quadro dizem respeito a atividades cujo objetivo é ensinar as
crianças a manejar os materiais de leitura e escrita usados na escola (livro didático, livro de
histórias, caderno, lápis, borracha, régua, etc.). A coluna relativa à Fase Introdutória, no quadro,
está com o sombreamento mais escuro porque se considera que esse aprendizado deve ser
desenvolvido e consolidado logo no ano de entrada do aluno no Ciclo Inicial de Alfabetização. A
gradação nos tons de cinza, nesse caso, do mais escuro para o mais claro, sugere que, na Fase I
e na Fase II, o professor ainda esteja atento à adequação do uso desses materiais pelas crianças
e que, quando considerar necessário, promova atividades ou faça intervenções para correção de
algum procedimento inadequado.

21..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
Quadro 2
Apropriação do sistema de escrita
Atividades pedagógicas para o trabalho no
Ciclo Inicial de Alfabetização

Fase
Atividades Fase I Fase II
Introd.
Atividades que exploram unidades fonológicas como sílabas,
rimas, terminações de palavras, etc.

Exercícios que exploram as diferenças entre a escrita alfabética


e outras formas gráficas (desenhos, números, sinais
matemáticos, setas, asteriscos, etc.)

Atividades que exploram a orientação e o alinhamento da


escrita da língua portuguesa
Atividades que exploram a função de segmentação dos espaços
em branco e da pontuação de final de frase

Exercícios de apreensão do alfabeto (identificação das letras e


conhecimento da ordem alfabética)
Exercícios de observação e análise do valor e da posição das
letras nas palavras, com vista à compreensão da natureza
alfabética do sistema de escrita

Exercícios de identificação de diferentes tipos de letras e de


treino da letra cursiva

Exercícios de apreensão das relações entre fonemas e


grafemas, com vista ao domínio das regularidades ortográficas

Exercícios de apreensão das irregularidades ortográficas

A primeira linha do quadro se refere a atividades que orientam a atenção das crianças
para a pauta sonora da fala, propondo-lhes brincar com sílabas, rimas, partes de palavras, de
modo a desenvolver sua consciência fonológica – ou seja, sua compreensão de que a palavra
está representada por uma seqüência de sons, que se modificarão conforme sua posição no
registro escrito. Tais atividades podem, facilitar-lhes a apreensão da natureza alfabética da
escrita. Trata-se, portanto, de um aprendizado que deve ser sistematicamente trabalhado e
consolidado no ano de entrada da criança no Ciclo Inicial de Alfabetização, podendo,
eventualmente, ser retomado, se necessário, na Fase I e na Fase II. Entretanto, como se
espera que a natureza alfabética da escrita esteja apreendida na Fase I, prevê-se que esse tipo
de atividade, com o objetivo de sensibilização da consciência fonológica, se torne
progressivamente menos necessário. Esse é o significado das gradações de cinza nas colunas
referentes às três Fases do Ciclo.

..........22
Preparando a escola e a sala de aula.............

As três linhas seguintes tratam de atividades cujo objetivo é a compreensão, pelas


crianças, das características mais gerais e fundamentais do sistema de escrita (por exemplo,
alinhamento, direção e valor de espaços em branco). Espera-se que esse aprendizado esteja
consolidado até o final da Fase Introdutória, porque ele é condição para compreensão da
natureza alfabética e ortográfica da escrita do português. Por isso é que, no quadro, estão mais
escuras as quadrículas da primeira coluna. Nas quadrículas referentes à Fase I, o tom médio de
cinza indica que ele pode ser eventualmente retomado; o cinza claro nas quadrículas relativas à
Fase II significa a expectativa de que nesse período não sejam mais necessárias atividades
gerais e sistemáticas com tal objetivo.
Nas linhas que se referem ao conhecimento do alfabeto (identificação das letras,
compreensão de seu valor e posição nas palavras, identificação dos diferentes tipos de letra), o
quadro sugere que o trabalho sistemático se concentre na Fase I, período em que se espera
que tal aprendizado seja consolidado. É isso que significa o tom mais escuro de cinza na
segunda coluna. Na Fase Introdutória, prevêem-se atividades que dão início ao processo de
compreensão da natureza alfabética do sistema (tom médio de cinza); na Fase II, espera-se
que não seja mais necessária a abordagem sistemática de questões dessa natureza (tom mais
claro de cinza). Chama-se atenção aqui quanto às atividades visando ao domínio da letra
cursiva: a sugestão é que elas comecem a ser introduzidas na Fase Introdutória, sejam
enfatizadas na Fase I e ainda permaneçam na Fase II, em razão da necessidade de oportunizar
aos alunos a conquista de uma caligrafia legível.
Supondo crianças que entrem na escola sem experiência sistemática anterior com a
língua escrita e que conquistem os conhecimentos e capacidades básicos na Fase Introdutória
do Ciclo Inicial de Alfabetização, o quadro prevê que os exercícios voltados para o domínio das
regularidades ortográficas sejam sistematicamente realizados na Fase I e que esse trabalho
permaneça ainda na Fase II (daí o cinza escuro nas quadrículas da segunda e da terceira
colunas). Já o domínio das irregularidades ortográficas, de acordo com o princípio de gradação
(discutido e recomendado no Caderno 2), deverá ser objeto de atividades sistemáticas,
destinadas à consolidação do aprendizado, apenas na Fase II. Essa sugestão é indicada no
quadro pela presença do tom mais escuro de cinza, na última linha, apenas na coluna 3.
Os professores alfabetizadores e a escola devem adaptar as indicações dos quadros
sobretudo as do Quadro 2 às condições e necessidades de seus alunos. É possível que, para
alguns alunos, as atividades aqui sugeridas para a Fase Introdutória sejam banais, repetitivas e
sem sentido, porque lidam com conhecimentos e capacidades que eles já conquistaram. Nesse
caso, o mais sensato é o professor realizar com eles o que é sugerido para a Fase I. Mas pode
acontecer também o contrário: os alunos terminarem a Fase Introdutória sem ter dominado as
capacidades previstas para esse período. Nesse caso, então, o razoável é reinvestir nessas
capacidades na Fase I, retomando atividades propostas para a Fase Introdutória. O sucesso do

O caso da aluna Débora, comentado no Caderno 1 desta Coleção, seria um bom exemplo dessa situação.
Analise novamente suas dificuldades e identifique as capacidades que não foram consolidadas por essa aluna e
nem retomadas pela proposta da escola ao longo de sua escolarização.
23..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
trabalho vai depender da atenção e da sensibilidade do professor e da equipe da escola na
adequação das propostas dos quadros deste Caderno às reais condições de seus alunos.
Quadro 3
Leitura
Atividades pedagógicas para o trabalho no Ciclo Inicial de Alfabetização

Atividades Fase
Fase I Fase II
Introd.
Atividades voltadas para o desenvolvimento de atitudes e
A- A+- A+
disposições favoráveis à leitura (por exemplo: escolha,
manuseio e leitura de livros, jornais e revistas, na biblioteca da
escola; alunos livres ou orientados pelo professor e/ou
bibliotecário, individuais ou coletivos)

Atividades voltadas para o domínio do sistema de escrita

Exercícios de decodificação de palavras e


textos escritos

Exercícios de reconhecimento global de palavras

Atividades voltadas para o desenvolvimento de capacidades


necessárias à leitura com fluência e compreensão
A- A+- A+

Atividades de exploração das finalidades e funções


da leitura, pelo reconhecimento do suporte, do gênero A- A+- A+
e da contextualização do texto

Atividades de antecipação de conteúdos de textos a


serem lidos em função do reconhecimento de seu A- A+- A+
suporte, seu gênero e sua contextualização

Atividades de levantamento e confirmação de


hipóteses relativas ao conteúdo do texto que está A- A+- A+
sendo lido

Atividades de exploração de pistas textuais,


intertextuais e contextuais que auxiliem a ler nas A- A+- A+
entrelinhas e ampliar a compreensão

Atividades voltadas para a compreensão global do


texto lido (resumo, discussão de título, etc.) A- A+- A+

Atividades voltadas para a compreensão global do


texto lido, que promovem a unificação de informações A- A+- A+
e a inter-relação entre informações explícitas e
implícitas (produção de inferências)

Atividades de avaliação afetiva do texto lido e de A- A+- A+


elaboração de extrapolações pertinentes

Leitura oral fluente e expressiva, pelo aluno

..........24
Preparando a escola e a sala de aula.............

A extensão do Quadro 3 se prende à concepção de leitura que orientou sua


elaboração: saber ler envolve valoração afetiva, decodificação e compreensão do que foi lido.
Há duas regiões do quadro em que as três quadrículas correspondentes aos anos do Ciclo
Inicial de Alfabetização estão recobertas com cinza escuro e preenchidas com os sinais A-, A e
A+. São elas: a primeira linha relativa a atividades voltadas para o desenvolvimento atitudinal,
cuja finalidade é a plena inserção da criança no universo letrado; as linhas relativas a atividades
para o desenvolvimento da capacidade de compreensão dos textos lidos. O que se quer indicar
com isso é que, dada a importância dessas conquistas para a criança, deve haver investimento
sistemático em atividades com esses objetivos nas três fases do Ciclo. As marcas A-, A e A+
são usadas para significar que a gradação, nesse caso, se prende ao grau de autonomia da
criança na relação com os objetos de leitura. Na Fase Introdutória, o professor, por exemplo,
encaminha as crianças à biblioteca, ajuda-as na escolha de livros, lê para elas; na sala de aula,
lê em voz alta para a turma, orienta a atenção das crianças para as relações entre gênero,
suporte, contexto de produção e circulação do texto, de um lado, e as finalidades da leitura, os
conteúdos do texto e suas possibilidades de significação, de outro lado. Na Fase I, esse mesmo
tipo de atividade pode ser realizado com mais autonomia pelas crianças, individualmente, ou
em grupos, mas ainda com a ajuda do professor; na Fase II é que haveria maior possibilidade de
trabalho autônomo das crianças.
As quadrículas referentes às atividades voltadas para o domínio do sistema de escrita
(decodificação e reconhecimento global) têm sombreamento mais claro na coluna da Fase
Introdutória, mais escuro na da Fase I e médio na da Fase II. Com isso pretende-se sugerir a
introdução desse trabalho no primeiro ano de escolaridade no Ensino Fundamental, a ênfase
sistemática no segundo ano e a manutenção, de acordo com as necessidades, no terceiro ano.
A última linha do quadro concerne à atividade de leitura oral, Retorne ao caso de Débora,
descrito no Caderno 1, para
fluente e expressiva, que representa o resultado de um trabalho ativo
verificar capacidades de
de compreensão do texto pela criança. A possibilidade de realização leitura que ela não
desenvolveu, levando em
desse tipo de atividade pelos alunos vai num crescendo, ao longo do
conta, sobretudo, os
Ciclo Inicial de Alfabetização. É isso que sugere a gradação dos tons critérios de compreensão e
fluência.
de cinza.
Quadro 4
Produção escrita
Atividades pedagógicas para o trabalho no Ciclo Inicial de Alfabetização

Fase
Atividades Fase I Fase II
Introd.
Atividades voltadas para a compreensão e valorização do uso
da escrita com diferentes funções, em diferentes gêneros A- A+- A+

Atividades voltadas para o domínio do sistema de escrita

Exercícios de escrita focalizando o uso das


convenções gráficas (alinhamento, direção, espaços
em branco, pontuação de final de frase)

continua
25..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
continuação

Fase
Atividades Fase I Fase II
Introd.

Exercícios de escrita voltados para o domínio do


princípio alfabético

Exercícios de escrita voltados para o domínio das


regras ortográficas

Atividades voltadas para a produção de textos escritos de


gêneros diversos, adequados aos objetivos, ao destinatário e ao A- A+- A+
contexto de circulação

Atividades de planejamento da organização temática


A- A+- A+
do texto

Atividades voltadas para a organização composicional


A- A+- A+
do texto (as partes do texto)

Atividades que focalizam a escolha da variedade


lingüística apropriada à situação de produção e de A- A+- A+
circulação (vocabulário e gramática)

Atividades voltadas para o uso expressivo (estilístico


e literário) de recursos lingüísticos adequados ao A- A+- A+
gênero e aos objetivos do texto
Atividades de revisão e reelaboração do texto escrito,
considerando sua adequação aos objetivos, ao
destinatário e ao contexto de circulação previstos

A elaboração do Quadro 4 segue, em linhas gerais, a mesma orientação do Quadro 3.


Supõe-se que as atividades de produção de textos escritos, assim como as de leitura, podem ter
início na Fase Introdutória e permanecer como trabalho sistemático também na Fase I e na
Fase II: por isso é que estão com sombreado escuro as quadrículas das três colunas na maior
parte do quadro (linhas referentes à compreensão e valorização da escrita e à produção de
textos de gêneros diversos, adequados aos objetivos, ao destinatário e ao contexto de
circulação). Supõe-se, paralelamente, que a necessária gradação seja feita em função da
autonomia do aluno, tanto nas atividades voltadas para a compreensão e valorização do uso da
escrita quanto naquelas voltadas para a produção de textos. Assim, o que se quer sugerir é que,
na Fase Introdutória, por exemplo, os alunos escrevam textos pequenos, como crachás e
etiquetas, orientados pelo professor, e que o professor realize atividades de escrita coletiva, em
que a temática, os objetivos, a organização do texto sejam definidos em discussão com a turma,
ficando o docente com a incumbência de registrar o texto por escrito no quadro de giz. Na Fase I
e na Fase II, mantendo a proposta de atividades que definam previamente destinatário,

..........26
Preparando a escola e a sala de aula.............

objetivo, gênero, suporte e contexto de circulação para orientar o


Também aqui valeria a
processo de produção de textos, sugere-se que o encaminhamento pena voltar ao caso de
Débora, para se
possibilite autonomia crescente para os alunos.
identificar os problemas
A sugestão de distribuição e de intensidade das atividades ocorridos quanto ao
encaminhamento de sua
relativas às convenções gráficas, ao domínio do princípio alfabético e produção escrita, em
das regras ortográficas segue a mesma orientação que aparece no função dos critérios
apontados no Quadro 4.
Quadro 2.

Quadro 5
Desenvolvimento da oralidade
Atividades pedagógicas para o trabalho no
Ciclo Inicial de Alfabetização

Atividades Fase
Fase I Fase II
Introd.
Atividades voltadas para o desenvolvimento de atitude de
respeito e valorização da diversidade das formas de expressão
oral de colegas, professores e funcionários da escola, bem
como de pessoas da comunidade extra-escolar

Interações cotidianas em sala de aula

Atividades que demandam escuta atenta e


compreensão

Atividades que demandam formulação de respostas


orais às questões propostas pelo professor
Atividades que demandam exposição oral de opiniões
e sugestões, bem como escuta e respeito com
relação à fala dos colegas

Atividades de usar da língua falada em diferentes situações


escolares, com o emprego da variedade lingüística adequada

Atividades de planejamento e apresentação de textos falados


em situações formais

Atividades que demandam escuta atenta e compreensão de


textos falados ou lidos, para posterior realização de tarefas

O sombreamento escuro nas cinco primeiras linhas do quadro pretende sugerir que
sejam trabalhadas com sistematicidade, nas três fases do Ciclo, tanto atividades voltadas para
a convivência democrática e respeitosa com falantes de diferentes variedades lingüísticas
quanto atividades de interação oral em sala de aula que possibilitem a participação ativa dos
alunos.
A gradação nos tons de cinza das três últimas linhas sugere gradação na dificuldade
das situações de exposição oral e de escuta.

27..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
Fechando a apresentação dos quadros de atividades, voltamos a enfatizar que se trata
de um conjunto de sugestões e nunca de imposição de uma seqüência linear e inflexível. Como
já foi dito no Caderno 2 e voltará a ser discutido no Caderno 4, a implementação dessas
sugestões na escola precisa passar pela análise e discussão dos profissionais envolvidos com
o processo de alfabetização, de modo a adequá-las às condições reais dos alunos, dos
professores e da escola. O compromisso prioritário da escola não é com o cumprimento
rigoroso desta proposta, é com a efetiva alfabetização de seus alunos.

II. Criando um ambiente alfabetizador


Sabemos que o processo de alfabetização se desenvolve mais facilmente quando as
crianças chegam à escola tendo uma maior familiaridade com a escrita, obtida em contextos
nos quais ela circula com usos e funções sociais. Tal como na vida cotidiana, a escola pode
apresentar situações, contextos e materiais capazes de estimular o interesse e a atenção dos
alunos.
Por essa razão, um elemento importante do trabalho de Ambiente alfabetizador é
alfabetização se refere à qualidade e à diversidade do material escrito um contexto de cultura
escrita propiciado pela
que é disponibilizado no contexto escolar, ou seja, na criação e na organização da sala de aula
manutenção, pelo professor, de um ambiente alfabetizador. e da escola, que oferece
oportunidades de interação
Essa forma de organização pode estar relacionada, por dos alunos com diferentes
exemplo, à exposição de rótulos de diferentes produtos na sala ou da tipos e usos de textos em
práticas sociais ou de
página principal de um jornal da semana, para consultas ou letramento.
observações casuais. A fixação desses textos em locais bem visíveis
pode possibilitar aos alunos algumas hipóteses, inferências e
deduções relevantes: o sentido da relação entre ilustração e texto; a identificação de
características dos suportes; a apreensão da estrutura de um texto escrito em relação a um
texto “falado” ou lido por alguém. Além disso, o material também pode servir como um apoio
quando se deseja escrever uma palavra ou uma letra, a partir, por exemplo, de uma atividade de
ditado que é específica para o estudo do sistema da escrita.
Uma outra implicação direta desses princípios diz respeito à organização do trabalho
escolar: nas salas de aulas e também em toda a escola, deve estar previsto um conjunto
significativo de portadores e suportes escritos. É importante se considerar não apenas os
materiais escolares, como livros didáticos e produções dos professores, mas também materiais
reais, tais como aqueles encontrados na sociedade, no nosso dia-a-dia. O importante é que os
materiais impressos escolhidos sejam adequados e relevantes para os alunos.
Alguns critérios devem ser considerados pelo professor na organização de um
ambiente alfabetizador:
a) O tipo de material escrito é apropriado para ser exposto em sala de aula? Além
dos materiais escolares, como o livro didático, dicionários, atlas, enciclopédias e
cartazes produzidos pelo professor e pelos próprios alunos, é fundamental que

..........28
Preparando a escola e a sala de aula.............

também estejam presentes os textos que circulam em nossa sociedade e, sempre


que possível, apresentados nos seus suportes originais, tais como jornais, revistas,
livros, entre outros.

b) Como organizar o material escrito em sala de aula? A decisão do professor


sobre a localização do material escrito em sala de aula deve se dar em função de
seu planejamento de ensino. O importante é que considere que a função desse
material é possibilitar o acesso fácil dos alunos, sempre que julgarem necessário. A
proximidade física dos impressos influi no interesse, na decisão e no entusiasmo
dos alunos em consultá-los. Também no contexto da escola essa organização é
fundamental, com a seleção pertinente de murais coletivos, quadros de avisos,
notícias de interesse da comunidade e organização do espaço da biblioteca.

c) Qual deve ser o tempo de exposição do material em sala de aula? A função do


material exposto na sala de aula não é a de mera decoração ou etiquetagem; deve-
se estimular sua efetiva apropriação ou consulta, de acordo com o planejamento de
ensino realizado pelo professor. Assim, as mudanças do material devem ocorrer, de
forma dinâmica, conforme a sucessão e a duração das atividades que o professor
vai desenvolvendo. Além disso, à medida que o professor avalia que seu conteúdo
já foi incorporado pelos alunos, a necessidade de substituição se coloca em pauta.

III. Estabelecendo rotinas semanais e diárias


O planejamento da organização do trabalho pedagógico envolve decisões sobre
aspectos simples, porém fundamentais para a construção de uma rotina de atividades que
possa efetivamente contribuir para a aprendizagem dos alunos. Esses aspectos dizem respeito
à utilização do tempo e do espaço pelos participantes da turma (alunos, professor, outros) na
realização de atividades pertinentes ao programa de ensino a ser desenvolvido, dentro ou fora
da sala de aula. Assim, o professor inicia o planejamento de seu trabalho com o grupo de alunos
se perguntando:
! Quais atividades devem ser propostas aos alunos?
! Quando devem ser realizadas?
! Quanto tempo deve ser dedicado a cada uma delas? (Quantas vezes em um
mesmo dia? Quantas vezes por semana? Quantas vezes em um mês? Com que
freqüência ao longo do ano?)
! Como essas atividades devem ser desenvolvidas? (Em pequenos grupos?
Individualmente?)

A produção de respostas a essas questões não pode perder de vista as


particularidades e características de cada turma ou grupo de alunos; sendo assim, a cada
professor caberá, inicialmente, realizar uma sondagem dos conhecimentos prévios de seus

29..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
alunos, das capacidades por eles já desenvolvidas e daquelas que O Caderno 4 apresenta
ainda estão por se desenvolver, de maneira a ter subsídios que algumas sugestões sobre o
diagnóstico das capacidades
suportem suas decisões sobre o que, quando e como desenvolver
dos alunos.
certas atividades com o seu grupo de alunos.

Se, por um lado, o professor precisa estar atento às particularidades do seu grupo ao
definir o planejamento de seus trabalhos, por outro, ele não pode perder de vista a inserção de
sua turma em um contexto de ensino mais amplo. Dessa forma, o professor é desafiado a
planejar seu trabalho com os alunos de maneira a estar em consonância com outros
professores da escola onde trabalha e de outras escolas do sistema de ensino. Enfim, a
qualidade das experiências escolares vivenciadas por seu grupo de alunos deve estar em
sintonia com o que se propõe, no plano estadual, para os alunos do Ciclo Inicial de
Alfabetização. Atentar para essa necessidade é responder ao apelo pela garantia de um ensino
que efetivamente possibilite o acesso de todos os alunos a práticas escolares que lhes
garantam a aprendizagem da leitura e da escrita e o desenvolvimento de suas capacidades
como sujeitos letrados.

É no sentido de contribuir para a reflexão sobre uma organização do trabalho em sala


de aula que atenda tanto às diferenças e semelhanças entre turmas e grupos, como também a
uma sintonia e coerência com uma proposta de ciclos, que se sugere, a seguir, uma breve
discussão acerca da necessidade e das características de uma rotina de trabalho a ser
implementada nas turmas desse período escolar.

Rotina: uma necessidade burocrática ou um


princípio organizador?
Diversas pesquisas etnográficas têm demonstrado que Pesquisas etnográficas são
desde o primeiro momento em que alunos e professores se reúnem, modalidades de estudos
descritivos e analíticos
como uma turma oficialmente constituída, inicia-se um processo de sobre práticas escolares
construção de papéis e relações, direitos e deveres, demandas e cotidianas, com ênfase em
processos interativos nos
expectativas para participação no grupo. contextos de ensino-
aprendizagem.
Por meio desse processo, participantes de uma turma ou
grupo constroem conhecimentos comuns e padrões relacionados a
modos de agir, comunicar, construir e interpretar textos. Mesmo tornando-se “invisíveis” aos
olhos dos próprios participantes do grupo, esses conhecimentos e padrões orientam a
participação dos membros nas atividades escolares e a sua avaliação do que significa ser
aluno, professor, leitor, escritor, na comunidade da qual fazem parte.

Esse conjunto de normas, expectativas, papéis, relações, direitos e deveres


estabelecidos no dia-a-dia de trabalho em sala de aula ou fora dela, quando alunos e
professores desenvolvem atividades escolares em outros espaços sociais pode se tornar

..........30
Preparando a escola e a sala de aula.............

evidente ao analisarmos como a rotina de uma turma está organizada. Algumas perguntas
auxiliam essa análise:
! quem pode dizer (ou fazer, escrever, ler) o quê?
! com quem?
! para quem?
! de que forma?
! sob que condições?
! quando?
! onde?
! com que propósito?
! e com que resultados?
Essas questões podem ser utilizadas tanto para evidenciar os elementos de uma rotina
já estabelecida, como para orientar a organização de uma rotina a ser estabelecida.
A rotina será variada, por exemplo, quando: a) permitir que Uma rotina é variada
um determinado aluno trabalhe ora com colegas que apresentam quando possibilita aos
capacidades similares à sua, ora com colegas que apresentam alunos experiências
diversificadas de trabalho e
capacidades diferentes da sua; b) possibilitar ao alunos que leiam ora
contribui para a ampliação
livros, ora quadrinhos, ora textos de colegas ou outros tipos de textos; de capacidades,
c) criar condições para que os alunos produzam textos para conhecimentos e contextos
diferentes destinatários pais, colegas, professor, jornais, revistas, de aplicação.
etc.
Além disso, a rotina será sistemática, por exemplo, quando
permitir que os alunos exercitem suas capacidades de leitura e de Uma rotina é sistemática
escrita ou apreendam a lógica das diferentes formas de produzir quando possibilita a
presença freqüente e
textos.
previsível de certas
Como procedimento sistemático, a rotina poderá assegurar atividades, contribuindo
que experiências de trabalho com a escrita não permaneçam para a consolidação de
isoladas, aleatórias, desvinculadas do processo e dos resultados capacidades e experiências
dos alunos.
pretendidos. Esse parece ser um dos paradoxos que o professor
precisa resolver ao organizar, planejar, coordenar e desenvolver, no dia-a-dia de trabalhos com
seus alunos: possibilitar-lhes oportunidades variadas de aprendizagem, ao mesmo tempo que
lhes garanta vivenciá-las com uma certa freqüência, de forma a ampliar e consolidar suas
capacidades como aprendizes da leitura e da escrita.

Examinando algumas possibilidades de organização da rotina em sala de aula


Com o objetivo de ilustrar como o paradoxo criado pela exigência simultânea de
variedade e sistematicidade pode ser equacionado, apresentaremos, a seguir, um quadro
sobre as atividades desenvolvidas em uma turma de alfabetização, durante os primeiros cinco
dias de aulas. A observação das atividades nessa turma e a construção do quadro foram
orientadas pelas questões listadas na seção anterior. Optamos, entretanto, para fins da
presente discussão, por apresentar respostas encontradas para, apenas, duas perguntas:
quais foram as atividades desenvolvidas nessa turma? Com que freqüência essas atividades
foram desenvolvidas?

31..........
..............Preparando a escola e a sala de aula

Quadro 6

Freqüência de atividades desenvolvidas em uma turma de alfabetização

Atividades 1º dia 2º dia 3º dia 4º dia 5º dia

AR DR AR DR AR DR AR DR AR DR

Ouvindo histórias lidas pelo professor x x x x x

Lendo com um colega (pares) x x

Lendo em grupo acompanhado pelo x x x x


Ênfase na leitura

professor

Leitura independente e livre (livros, x x x x x


quadrinhos, revistas, jornais)

Selecionando e fazendo empréstimo de


x
livros na biblioteca

Brincando e aprendendo (jogos


variados)

Conversando sobre histórias lidas x x x x x

Treinando a letra x x x x x
Ênfase na
escrita

Produzindo textos coletivos x x

Tomando notas em diário pessoal x x x

Usando o livro didático x x x


Leitura e escrita

Explorando músicas, parlendas, trava-


x x x
língua

Ilustrando histórias

Explorando o calendário x x x x x

Copiando ou lendo o Para Casa x x x

Discutindo ou corrigindo o Para Casa x x

Educação Física x
Artes x x
Legenda: AR = Antes do Recreio; DR = Depois do Recreio; X = Uma ocorrência de determinada atividade

..........32
Preparando a escola e a sala de aula.............

O quadro sugerido nos permitiu organizar visualmente a seqüência de atividades que


foram desenvolvidas a cada dia e, durante uma semana de aulas, em uma turma de
alfabetização. Por meio desse registro é possível ver, por exemplo, que a professora dessa
turma deu ênfase, em seu trabalho, à leitura e à escrita, o que resultou em dois grandes blocos
de atividades – o primeiro voltado para experiências com a leitura; o segundo, voltado para
experiências com a escrita.
Assim, a cada dia a professora iniciou seu trabalho permitindo aos seus alunos
experienciar práticas de leituras de diferentes maneiras: ouvindo uma história lida por ela, lendo
ou explorando um livro com um colega ou participando de uma atividade de leitura em grupo,
supervisionado por ela. A professora também reservou tempo para que seus alunos tivessem
oportunidade de ler livros, jornais ou revistas de sua escolha. As diferentes configurações de
grupo para realização de leitura permitiram à professora flexibilidade para observar e
acompanhar seus alunos em diferentes situações. A turma observada também teve
oportunidade de conversar sobre as histórias ou textos lidos diariamente.

Embora com menor intensidade do que aquelas relativas à leitura, atividades que
possibilitaram o trabalho com a escrita também foram desenvolvidas com freqüência
significativa: treino da letra (diariamente), produção coletiva de texto – sendo a professora a
escriba (duas vezes durante a semana). Anotação de palavras novas, nomes de colegas ou de
letras do alfabeto em diário pessoal também tiveram seu espaço na programação. Além disso,
foram explorados, durante a semana, jogos diversos, músicas, parlendas e trava-línguas.

O quadro destaca, ainda, atividades que propiciaram aos alunos experiência


simultânea do ato de ler e escrever: produção do calendário individual a partir de modelo grande
afixado no quadro; cópia e/ou leitura do Para Casa ou correção ou comentário sobre o Para
Casa. Também o livro didático foi utilizado três vezes durante a primeira semana de aula. Foram
registradas a realização da aula de Educação Física (uma vez por semana), de Artes (duas
vezes) e a ida à biblioteca para escolher e fazer empréstimo de livros, que foram,
posteriormente, utilizados em sala de aula e nas atividades de casa.

Ao se apresentar o quadro acima, não se teve a intenção de apresentar um modelo a


ser seguido, mas uma referência para a discussão sobre possibilidades de organização da
rotina de atividades em uma turma de alfabetização, de forma sistemática e variada.

Referências
CHARTIER, Anne-Marie et al. Ler e escrever: entrando no mundo da escrita. Porto Alegre: Artes Médicas,
1996.

CURTO; MORILLO; TEIXIDÓ. Escrever e ler: como as crianças aprendem e como o professor pode
ensiná-las. 2 vol. Porto Alegre: Artes Médicas, 2002.

33..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
EDWARDS, Verônica. Os sujeitos no universo da escola: um estudo etnográfico no ensino primário. São
Paulo: Ática, 1997.

FERREIRO, Emília; PALACIO, M. Os processos de leitura e escrita: novas perspectivas. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1987.

FONTANA, Roseli A. Cação. Mediação pedagógica na sala de aula. Campinas: Autores Associados,
1996.

NEMIROVSKY, Myriam. O ensino da linguagem escrita. Porto Alegre: Artmed, 2002.

TEBEROSKY, Ana. Psicopedagogia da linguagem escrita. São Paulo: Trajetória Cultural, 1989.

TEBEROSKY, Ana; COLOMER, Teresa. Aprender a ler e escrever: uma proposta construtivista. Porto
Alegre: Artmed, 2003.

ZABALA, A. Como trabalhar os conteúdos procedimentais em sala de aula. Porto Alegre: Artes Médicas,
2001.

..........34
Preparando a escola e a sala de aula.............

3. O lugar da discussão metodológica no conjunto de


decisões relacionadas à alfabetização
Nas últimas décadas, a discussão sobre aspectos metodológicos da alfabetização cedeu
lugar à discussão dos conceitos de alfabetização e letramento, com ênfase no processo de
construção do conhecimento pela criança. Os desdobramentos dessa mudança de pólo
exigiram a ampliação da discussão da didática da alfabetização, redimensionada em novas
bases teóricas.
As decisões metodológicas pertinentes à alfabetização incluem
Os procedimentos que
tomadas de posição que vão além da escolha de métodos, precisam ser
considerados nas decisões
envolvendo um conjunto de procedimentos: a definição de
metodológicas são
capacidades dos alunos a serem atingidas, a organização da sala de focalizados nos Cadernos
aula e de um ambiente de letramento, a escolha de materiais, de 2, 3 e 4.

atividades pedagógicas e de formas de avaliar.


Todos os encaminhamentos, nesse campo, dependem de um contexto de construção
coletiva do projeto de alfabetização para a escola e da política mais ampla de organização do
ensino em uma proposta de ciclos. Decisões metodológicas devem ser objeto de discussão
permanente de professores e têm tanta importância quanto as discussões conceituais.

A referência explícita à escolha de métodos de alfabetização não deve ser interpretada


como retrocesso no tempo ou como adesão a práticas anteriores que deslocavam para a
escolha do método todo o peso do trabalho pedagógico desenvolvido com as crianças. O que se
pretende é dar visibilidade a determinados princípios organizadores desse trabalho, capazes
de conduzir o processo de alfabetização em uma das suas facetas: a do método.

Três questões centrais orientarão a reflexão sobre o tema desta seção:


! Quais são os princípios presentes nas concepções sobre Método, do grego
méthodos: caminho (ode)
métodos de alfabetização e o que representam na prática para se chegar a um fim
pedagógica? (meta).

! Quais são os princípios metodológicos valorizados como


Essas vertentes
permanentes e que, portanto, persistem nas práticas atuais? metodológicas são também
! Quais são os critérios mais relevantes para as tomadas de discutidas no Caderno 1 e
na seção de apresentação do
decisão relativas a métodos de alfabetização? Caderno 2.

3.1. Os princípios subjacentes aos métodos de alfabetização e seu


significado na prática pedagógica
Os métodos voltados para a sistematização da prática alfabetizadora, em nossa tradição
pedagógica, têm sido organizados em torno de duas vertentes: os métodos sintéticos e os
métodos analíticos.

35..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
a) Métodos sintéticos

Os métodos sintéticos partem de unidades menores do que as palavras, tais como a


letra (método de soletração), o fonema (método fônico) e as sílabas (método silábico). A
lógica que organiza cada um destes métodos sintéticos é parecida: ensina-se a ler e a
escrever a partir da apresentação de unidades menores, em uma progressão que pretende
ir do mais simples para o mais complexo, numa seqüência fixa estabelecida pelo professor
ou pelo livro didático, privilegiando o processo de decodificação.

Estes métodos, em seu conjunto, abordam uma dimensão importante e necessária para o
aprendizado da escrita: a análise das relações entre fonemas (“sons” ou unidades sonoras) e
grafemas (“letras” ou grupos de letras).

De fato, dificilmente alguém aprenderá a ler ou escrever sem As relações entre fonemas e
grafemas são analisadas do
que opere com os fonemas e o modo de representá-lo graficamente. ponto de vista conceitual e
É importante, como já se enfatizou em várias seções desta Coleção, procedimental na segunda
seção do Caderno 2.
que a criança focalize a pauta sonora da língua, observando
segmentos como sílabas, começos ou finais de palavras, rimas e
outras unidades do sistema fonológico. Somente assim estabelecerá
relações entre a escrita e a cadeia sonora das palavras, apreendendo
regras de correspondência entre grafemas e fonemas.

Em outros termos, a consciência fonológica e os processos de


codificação e decodificação são requisitos essenciais à
alfabetização. Para a criança que se inicia nesse processo, o uso da
decodificação é mais pertinente e necessário do que para um leitor As capacidades
avançado ou fluente que, gradualmente, poderá “abandonar” parte progressivas no campo da
leitura são descritas na
da decodificação na leitura. seção 3 do Caderno 2.
Reconhecida essa importante dimensão que é valorizada pelos
métodos sintéticos, algumas questões problemáticas devem ser
apontadas. A primeira delas é que, apesar de focalizarem a pauta
A discussão das relações
sonora, detendo-se nas menores unidades da língua, esses (diferenças e semelhanças)
métodos não resolvem a complicada relação entre a fala e a escrita. entre língua oral e língua
escrita é feita nas seções 4 e
Sabe-se que, em alguns casos, há uma relação direta entre essas 5 do Caderno 2.
duas modalidades da língua. Em vários outros, porém, a escrita não
representa os sons da fala. Assim, em algum momento, o aprendiz
tem que se desvincular da fala para codificar (escrever) e decodificar
(ler) palavras, frases e textos.

Um segundo problema que se pode apontar é que essas


abordagens metodológicas descontextualizam a escrita,
desconsiderando seus usos e funções sociais. Para o adulto, a

..........36
Preparando a escola e a sala de aula.............

escrita pode parecer simples, se for pensada do ponto de vista das relações fonema/grafema.
Para uma criança, aprendiz iniciante do sistema de escrita, pode ser uma grande abstração
deter-se em fonemas e cadeias sonoras apenas aparentemente fáceis, como ai, oi, au, ua. Da
mesma forma, se os livros ou professores se concentram somente em sílabas, palavras, frases
ou textos para o mero treinamento de letras, fonemas ou sílabas já estudadas ou conhecidas, os
textos perdem sua unidade de sentido e a escrita se esvazia de suas funções comunicativas.

b) Métodos analíticos O caso de Débora pode ser


relembrado nesta seção,
O conjunto de métodos analíticos conhecidos como pois continua sendo um
bom exemplo dos efeitos
palavração, sentenciação ou global de contos representa uma dessa postura metodológica
inversão na concepção de ensino da leitura e da escrita, em relação à parcial.
abordagem anterior. Os métodos analíticos são assim chamados
porque elegem, como ponto de partida, um todo, ou uma unidade de
sentido mais ampla e significativa, que pode aparecer na forma de
A abordagem ideovisual
palavra, frase ou texto. Essas unidades de sentido são
indica que uma idéia é
progressivamente decompostas em unidades menores, até o representada a partir de
uma percepção ou
trabalho em torno de sílabas, grafemas e fonemas.
visualização global, ou
A dimensão mais destacada nessa abordagem é, portanto, a seja, pela silhueta da
palavra ou da frase.
ênfase na compreensão e no sentido, valorizando-se a natureza
ideovisual do aprendizado da escrita e da leitura: é o que ocorre quando uma criança que ainda
não desenvolveu capacidades mais elaboradas de leitura, consegue identificar a silhueta do
próprio nome, de uma logomarca familiar (já associada a um refrigerante ou a um brinquedo, por
exemplo), ou de um texto inserido em um portador bem delimitado, exposto com regularidade,
como nomes de jornais ou revistas.

As vantagens desses métodos é que trabalham com uma habilidade muito importante na
leitura: o reconhecimento global e mais rápido das palavras. Leitores adultos ou fluentes que
têm um repertório ideovisual muito amplo, não necessitam decodificar tudo, quando já
conhecem as palavras que lêem. Uma das vantagens dos métodos analíticos é exatamente o
estímulo para que as crianças possam ler unidades com sentido mesmo que apenas pelo
reconhecimento global desde o início de sua escolarização.

Um problema desses métodos é que essas estratégias são muito boas para textos
conhecidos, mas podem não ser suficientes quando aparecem palavras completamente novas.
Um outro risco é que as crianças aprendam apenas “de cor”, por
Essa forma de
processos de memorização elementares e que, sem orientação para aprendizagem foi
a decodificação, não observem que as palavras são compostas de exemplificada no caso da
aluna Débora, sendo mais
unidades menores como a sílaba, a letra ou sufixos. Assim, quando um efeito de abordagens
as propostas do professor ou do livro didático se valem apenas de metodológicas consideradas
apenas parcialmente.
textos artificiais, curtos e repetitivos, tendo como objetivo apenas a

37..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
fixação e a memorização, discriminações importantes e capacidades mais elaboradas ficam
prejudicadas.

Ressalvados esses problemas, uma necessária síntese ou As escolhas metodológicas


para a alfabetização
equilíbrio de princípios deve ser registrada. Por um lado, o
precisam levar em conta
reconhecimento global leva a uma maior compreensão do sentido e a processos de decodificação
e codificação, sem abrir
uma rapidez e fluência de leitura e na produção da escrita. Por outro
mão da produção de
lado, também a decodificação leva à compreensão do princípio de sentidos pelos alunos.
organização do sistema ortográfico da escrita e confere ao aluno a possibilidade de ler e
escrever qualquer palavra nova, a partir do reconhecimento de relações convencionais e
arbitrárias entre fonemas e grafemas.

c) Escolhendo métodos: misturar, negar ou integrar princípios metodológicos?

Historicamente, os métodos mistos tentam resolver os problemas resultantes da


polarização de princípios anteriormente focalizada, buscando englobar as dimensões já
valorizadas na aprendizagem da escrita e da leitura e tentando estabelecer maior controle
sobre as habilidades pretendidas (consciência fonológica ou reconhecimento global, por
exemplo). Embora a intenção possa ser bem justificada, muitas dessas propostas, quase
sempre anunciadas como “ecléticas”, podem, contudo, gerar contradições e comprometer a
prática consistente do professor. Isso ocorre em algumas formulações de livros didáticos, por
exemplo, que anunciam pressupostos avançados de conciliação dos
A análise de critérios de
referidos princípios, mas não conseguem operacionalizar uma consistência relacionados
a escolhas de livros
proposta didática coerente com essa integração, fixando-se em
didáticos será objeto da
apenas um dos pólos, nas atividades sugeridas a alunos e próxima seção deste
professores, ou apenas misturando exercícios pertinentes às duas Caderno.

orientações metodológicas.
Uma reflexão necessária, portanto, deve se centrar na
avaliação da consistência da proposta metodológica, que não
poderia se limitar a uma soma ou justaposição de princípios, sem
clareza sobre suas implicações didáticas.

No contexto dessas contradições, acentuou-se, nos últimos Essa tendência é


problematizada no
anos, a crítica a diversos componentes dos métodos de Caderno 1. Ver também
alfabetização, por vezes radicalizada em uma ampla rejeição aos SOARES, 2002.
métodos, sob alegação de que eles:
! Estariam desconsiderando as formas de raciocínio do aprendiz,
não valorizando suas tentativas espontâneas de representar
relações entre fonemas e grafemas ou de chegar, por outras vias,
a elaborações conceituais sobre a palavra, a frase ou o texto;

..........38
Preparando a escola e a sala de aula.............
! Estariam, como conseqüência da razão anterior, prescrevendo e controlando o processo de
aprendizagem dos alunos, não permitindo a progressão e a autonomia no uso de suas
capacidades;
! Impediriam a autonomia do próprio professor, protagonista principal nas decisões sobre a
condução do processo de alfabetização;
! Estariam restringindo o estudo do sistema de escrita à fixação, ora em uma unidade da
língua, ora em uma seqüência repetitiva, ora em um padrão textual artificial;
! Apresentariam a língua escrita ao aprendiz iniciante de forma controlada, não abordando
contextos e usos sociais que escapem ao padrão ou modelo previsto.

Uma das perspectivas críticas mais contundentes pode ser situada na oposição entre os
métodos considerados tradicionais e os métodos naturais ou de imersão na língua.
Considerando a vertente “tradicional” excessivamente diretiva, os métodos naturais
defenderiam uma perspectiva mais espontânea, ou não diretiva, no ensino-aprendizagem da
escrita e da leitura, valorizando a busca de significados, em situações em que haja necessidade
de escrever ou ler, regida pelas circunstâncias do trabalho e pelos interesses dos alunos, com
pouca intervenção do professor. Apesar dessa valorização da atividade da criança, a ausência
de sistematização no ensino oferece riscos de um “espontaneísmo” excessivo, que certamente
compromete a aquisição de um sistema complexo como o da escrita.

Uma outra vertente que busca superar polarizações anteriores Veja comentários sobre
o Construtivismo no
estaria representada pelo ideário construtivista, mais fortemente Caderno 1 e na
discutido e incorporado, em nosso contexto, nas últimas duas Apresentação do
Caderno 2.
décadas. Foram anteriormente analisadas, nesta Coleção,
dimensões positivas e problemas associados à sua apropriação nas
práticas de alfabetização, que não serão aqui retomadas, para evitar
redundâncias.

Devem ser reconhecidas as contribuições do Construtivismo ao alargamento das


concepções de aprendizagem e ensino da alfabetização, ampliada pelo enfoque do letramento.
Por outro lado, as dimensões que representam impropriedades, lacunas ou distorções
precisam ser depuradas, para que não nos fixemos em novas polarizações. O que interessa
refutar, do ponto de vista da abordagem desta seção, é uma certa inferência tão equivocada
quanto dominante, na prática da alfabetização: o método estaria identificado com uma postura
tradicional de ensino, enquanto uma concepção inovadora ou de vanguarda deveria se
identificar com uma teorização ou uma base puramente conceitual para o ensino da língua
escrita. Em função da defesa do equilíbrio enfatizado ao longo desta Coleção, a reflexão deve
revalorizar, portanto, os princípios metodológicos que o professor-alfabetizador não pode
ignorar.

39..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
3.2. Princípios metodológicos permanentes e sua
presença nas práticas “atuais”
Tanto o princípio de decodificação, como o princípio da compreensão ou do
reconhecimento global são duas faces da mesma moeda. Muitos professores que optam por
um método dito “tradicional” precisam saber os aspectos deficitários da abordagem
selecionada, para buscar complementá-lo. Por outro lado, os professores que assumem
práticas consideradas “alternativas” podem negar a importância da permanência desses
princípios, por desconhecerem a sua importância. No entanto, eles estão presentes em suas
práticas atuais e nas atividades que realizam.

Se fizermos uma análise das práticas de professores inovadores de sucesso,


perceberemos uma série de procedimentos metodológicos que se repetem e que configuram
um “saber fazer” considerável. Constata-se, a partir de relatos e observações de práticas

desses professores, uma valorização das hipóteses e conhecimentos


As fontes desses relatos
prévios dos alunos. Percebe-se, ainda, uma ênfase nos contextos de
são contextualizadas no
produção da escrita e em estratégias ou procedimentos que Caderno 1 e nelas se
contribuam para a construção de sentidos do texto pelo aluno (a partir incluem as contribuições
do grupo de professoras da
de uma das palavras mais significativas para o aluno, como o próprio rede que discutiram suas
nome). Mas também se observa a progressão do trabalho em direção práticas com a equipe do
CEALE.
a unidades menores, em torno de palavras, sílabas, fonemas.
Nesse caso, identificam-se procedimentos do método global, que supõe, em primeiro
lugar, uma aproximação com a totalidade (seja representada por textos, frases ou palavras),
para depois se proceder à análise de unidades menores. É comum se identificar, hoje, o
trabalho que incentiva a memorização de parlendas, músicas, poemas e a proposição de
desafios que supõem o reconhecimento de lacunas (palavras que faltam no texto), o
reordenamento de frases do mesmo texto que são recortadas e embaralhadas. Em última
instância, são propostas análises, embora ainda limitadas, das relações entre a oralidade e a
escrita e entre fonemas e grafemas. Algumas dessas práticas, então, poderiam ser entendidas
como aplicações dos princípios analíticos, próprios do método global.

Para desconstruir essa classificação, pode-se descrever um movimento inverso, nas


práticas atuais de sucesso, que aplicam, simultaneamente, alguns princípios dos métodos
sintéticos de alfabetização, privilegiando o trabalho com unidades menores (letras, fonemas e
sílabas) na organização do trabalho. Parte-se do alfabeto como unidade significativa (porque
seu conhecimento se presta a um aprendizado da escrita), busca-se o reconhecimento de
sílabas iniciais e finais (como rimas e outros recursos que favorecem a consciência fonológica).
Não se deixa de valorizar, contudo, a contextualização da escrita, a perspectiva de uso da
língua.

..........40
Preparando a escola e a sala de aula.............

Nesses processos, aqui descritos como bem sucedidos, infere-se que as estratégias
metodológicas clássicas estão presentes, no momento certo, para os alunos certos, na ordem
estabelecida pela necessidade pedagógica e que são mais bem aproveitadas por quem já tem
conhecimento de métodos e possui a memória do sucesso desses procedimentos. Essa é uma
reconstrução necessária no coletivo da escola, para que se garanta o desejável equilíbrio
metodológico – algo que não deve ser confundido com o esvaziamento procedimental ou com a
mera recusa ao método.

3.3. Os critérios mais relevantes para as tomadas de decisão


relativas a métodos de alfabetização
Em função da discussão anterior, este tópico final retornará à ênfase inicial desta seção.
Afinal, já que a discussão sobre métodos de alfabetização ocupou lugar secundário ou irrisório
nas últimas décadas, onde e como se poderia voltar a inseri-los na agenda reflexiva da escola?

Como um primeiro nível desta síntese, considera-se que a concepção de métodos de


alfabetização pode referir-se a:
! um método específico, como o silábico, o fônico, o global, por exemplo, proposto ou
elaborado por um autor de manual de professor ou de livro didático;
! um conjunto de princípios teórico-procedimentais que organizam o trabalho pedagógico em
torno da alfabetização, nem sempre filiado a uma vertente teórica explícita ou única;
! um conjunto de saberes práticos ou de princípios organizadores do processo de
alfabetização, (re)criados pelo professor em seu trabalho pedagógico.

Assim, podemos dizer que o que acontece na sala de aula é muito mais do que
imaginamos, porque os professores não se apropriam da mesma maneira das prescrições
existentes em determinado método. Usam de competências, de conhecimento e de intuição,
advindos de suas práticas de sucesso. Poderíamos dizer que existem tantos métodos de
alfabetização quantos são os professores alfabetizadores.

Um segundo nível de síntese deveria, então, estar relacionado a alguns critérios que
poderiam orientar as escolhas relativas aos métodos de alfabetização. Tais escolhas poderiam
se fundamentar:
! Na escolha de livros e materiais didáticos, considerando-se seu caráter de organização e
sistematização do trabalho pedagógico. Embora a perspectiva desse processo de produção
esteja vinculada a uma autoria externa ao contexto concretamente visado, o livro didático
tanto poderá ser assumido como eixo condutor do trabalho, como poderá ser um material de
apoio pontual e instrumental, utilizado em momentos específicos e diversificados, seja para
introduzir conteúdos e explorar certas capacidades dos alunos, seja para sistematizar
atividades e consolidar aprendizagens.

41..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
! Em qualquer uma dessas possibilidades de uso, é possível que o professor venha a assumir
o lugar de co-autor dessa apropriação e sistematização, articulando suas escolhas com os
filtros seletivos de sua prática. Isso significa, em síntese, uma dimensão metodológica de
seu trabalho.
! Na seleção de princípios gerais organizadores do trabalho pedagógico, sustentados pela
produção teórica e pela pesquisa na área. Incluem-se, nesse caso, as sistematizações
encontradas em textos teóricos e estudos sobre alfabetização, leitura e escrita, que podem
fundamentar a organização dos caminhos que o professor irá trilhar na condução
metodológica: pontos de partida, eixos integradores, contextos de uso da escrita e modos
de ler que podem gerar novas aprendizagens, formas de trabalho com esses processos e de
monitoramento do desempenho da criança nessa aquisição.
! No mapeamento e na sistematização de experiências ou práticas de sucesso
desenvolvidas por professores, sinalizadoras de um conjunto de ações, procedimentos ou
atividades que, em diferentes contextos, têm ajudado a realizar intervenções adequadas.
Este é um repertório de ações digno de se tornar conhecido no interior das escolas e ser
socializado nas redes de trocas entre instituições, como se destacou em seções anteriores.

A escolha por um ou outro critério não supõe exclusividade. O importante é que os


professores questionem e reflitam sempre sobre suas escolhas e ações, para ampliar seu
repertório. Assim, não seria nenhum contra-senso a opção por um método, por um livro didático,
por ações ou procedimentos retirados de um repertório de experiências, desde que o professor
alfabetizador compreenda as demandas de complementação, ampliação ou mesmo correção e
eliminação de aspectos contraditórios e inoperantes, em função de seu processo concreto de
ensino.

Os profissionais do Ciclo, envolvidos na “escolha” de métodos de alfabetização, precisam


considerar as permanências sólidas construídas na história pedagógica, bem como conhecer
outros movimentos que impelem para inovações. Poderiam ser aproveitados, para estas
definições, os momentos de escolha de materiais didáticos (sobretudo de livros didáticos) e de
organização curricular para definir melhor seus princípios e caminhos. Nos momentos de
formação de professores poderiam ser evidenciados os procedimentos metodológicos que dão
certo. A instituição e o coletivo dos professores não estariam polarizados entre o tradicional e o
novo, e sim centrados em um trabalho de sucesso. Afinal, a meta da escola, sobretudo no Ciclo
Inicial, é alfabetizar as crianças.

..........42
Preparando a escola e a sala de aula.............

Referências
ARAÚJO, Maria Carmem C. da Silva. Perspectiva histórica da alfabetização. Viçosa: Imprensa
Universitária. Universidade Federal de Viçosa. Caderno 67, 1995.

BARBOSA, Juvêncio. Alfabetização e leitura. São Paulo: Cortez, 1991.

BELLENGER, Lionel. Os métodos de leitura. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

BRASLAVSKY, Berta. O método: panacéia, negação ou pedagogia? Cadernos de Pesquisa. São Paulo:
Fundação Carlos Chagas, v. 66, p. 41-48, ago. 1988.

CASASANTA, Lúcia M. Métodos de ensino da leitura. Rio de Janeiro: Editora do Brasil, 1972.

BREGUNCI, Maria das Graças C. Construtivismo: grandes e pequenas dúvidas. Intermédio.Cadernos


CEALE. Belo Horizonte: Formato, vol. I, ano I, fev. 1996.

CHARTIER, Anne-Marie; HÉBRARD, Jean. Método silábico e método global: alguns esclarecimentos
históricos. História da Educação. Pelotas: Editora da UFPel. v. 5, n. 10, p. 141-154, out. 2001.

FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 1985.

FERREIRO, Emília; TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas,
1985.

FRADE, Isabel Cristina Alves da Silva. Alfabetização hoje: onde estão os métodos? Presença
Pedagógica. v. 9, n. 50, mar./abr. 2003.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler; em três artigos que se completam. São Paulo: Cortez, 1987.

LERNER, Delia; PIZANI, Alicia. O que há de “novo” e o que há de “velho” no novo enfoque? In: LERNER,
Delia; PIZANI, Alicia. A aprendizagem da língua escrita na escola. Reflexões sobre a prática pedagógica
construtivista. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

MACIEL, Francisca. Ler, escrever e contar: a história da alfabetização em Minas Gerais. In: TAMBARA,
Elomar; PERES, Eliane. Livros escolares e ensino da leitura e da escrita no Brasil (séculos XIX-XX).
Pelotas: Seiva/FAPERGS. 2003.

RIZZO, Gilda. Estudo comparativo dos métodos de ensino da leitura e da escrita. São Paulo: América
Editora, 1986.

SOARES, Magda. Alfabetização: em busca de um método? In: SOARES, Magda. Alfabetização e


Letramento. São Paulo: Contexto, 2002.

TEBEROSKY, Ana; COLOMER, Teresa. Aprender a ler e escrever. Porto Alegre: Artmed, 2003.

43..........
Preparando a escola e a sala de aula.............

4. A escolha e a utilização de livros didáticos no


Ciclo Inicial de Alfabetização
Na seção anterior estabeleceu-se uma relação entre as decisões referentes a métodos
de alfabetização e as escolhas de materiais didáticos pelos professores, destacando-se o lugar
ocupado pelo livro didático na organização e sistematização do ensino.

A abordagem do tema desta seção reforçará essa relação, a partir de uma concepção
básica:

O livro didático é um material intencionalmente produzido para ser utilizado


em um processo de ensino e aprendizagem escolares, no contexto de um
programa curricular, uma área de conhecimento e um ciclo específico de um
nível de ensino. Para que se torne um instrumento de efetivo apoio a esse
processo, pressupõe-se que o livro didático seja diversificado, flexível,
sensível às variações das formas de organização escolar, dos projetos
pedagógicos, dos interesses sociais e regionais e das expectativas dos
profissionais que o utilizarão.

Essa premissa pedagógica não poderia ser desenvolvida sem uma referência à
questão das políticas públicas de livros didáticos. Reconhece-se seu avanço, em escala
nacional, desde 1985, através de ações do Ministério da Educação que se consolidaram no
PNLD (Programa Nacional do Livro Didático). Ampliado e sistematizado a partir de 1996, tal
programa passou a coordenar políticas de avaliação, aquisição e distribuição dos livros
didáticos destinados ao ensino público de nível fundamental, para os segmentos de 1ª a 4ª
séries e 5ª a 8ª séries, em todas as áreas de conteúdos curriculares. Do conjunto de programas
já desenvolvidos resultaram seis edições de Guias de Livros Didáticos, sendo quatro delas nas
áreas de Alfabetização e Língua Portuguesa de 1ª a 4ª séries (1996, 1997, 2000, 2003) todas
contendo resenhas dos livros didáticos já avaliados e aprovados, que recebem a menção geral
de Recomendados ou variações como Recomendados com Ressalvas e Recomendados com
Distinção. Ficam excluídas, portanto, as obras não aprovadas a partir dos critérios de avaliação
instituídos pelo referido Programa.

Diversos estudos e pesquisas voltados para os processos de escolha de livros


didáticos pelos professores têm constatado a preferência, principalmente nas áreas de
Alfabetização e Língua Portuguesa, por obras que obtiveram as menções mais baixas (as
“recomendadas com ressalvas”) e até mesmo o abandono das obras recebidas e sua
substituição por outras excluídas pelo PNLD. Outra tendência observada, quanto aos livros de
Alfabetização, é a preferência por obras que privilegiam os princípios dos métodos silábicos ou
de base fônica.

44..........
..............Preparando a escola e a sala de aula

Para justificar essas tendências acima, alguns argumentos As referidas interações


podem ser
têm sido apreendidos, nas interações com professores de séries
contextualizadas: a) no
iniciais ou do Ciclo Inicial de Alfabetização: âmbito nacional, através de
pesquisas e estudos de
! Os livros recebidos não correspondem às escolhas originalmente casos desenvolvidos pelo
feitas, por várias razões: processo acelerado de escolha; CEALE-FAE/UFMG sobre
desconhecimento do Guia, das resenhas ou das próprias obras; padrões e processos no
centralização de decisões em poucas pessoas das equipes PNLD, conforme
pedagógicas e rotatividade de professores na instituição; referências ao final desta
seção; b) no âmbito
! As obras não atendem às opções metodológicas dos estadual, através de grupos
professores, exigindo substituição, elaboração integral ou focais coordenados pelo
CEALE, para discussão
complementar de materiais mais coerentes com sua formação e
preliminar de problemas e
sua proposta didática para a alfabetização;
alternativas pertinentes ao
! Os conteúdos dos livros disponibilizados não correspondem à Ciclo Inicial de
Alfabetização, conforme
realidade cultural dos alunos, ao perfil da turma, ou aos níveis
processo descrito no
diferenciados do Ciclo. Caderno 1.

Embora a rede pública do Estado de Minas Gerais tenha se


integrado ao PNLD apenas em 2001, parece importante ressaltar que
a escolha e a utilização de livros didáticos ainda representam
problemas e conflitos no conjunto das decisões didáticas a serem tomadas pelo professor e
pelos coordenadores de ciclos de alfabetização. Tendo em vista tais problemas, pretende-se
propor aos profissionais da área a reflexão sobre algumas questões centrais, que servirão de
eixo para a sistematização dos tópicos abordados nesta seção:

I. Quais têm sido os processos adotados pela escola para a escolha dos livros
didáticos destinados ao trabalho com a alfabetização?

II. Quais são os critérios de avaliação que determinam a escolha do livro didático a ser
utilizado?

III. Quais são as alternativas propostas para resolver impasses e descompassos


observados nos processos de escolha e de uso desses livros didáticos?

Os processos de escolha do livro didático


A análise dos processos de escolha adotados pelas escolas depende, em primeiro
lugar, da consistência de registros efetuados pelos responsáveis por essas escolhas. Um
conjunto de questões poderia mobilizar permanentemente esse registro, funcionando como
indicadores dos níveis de envolvimento e de problemas internos a cada equipe:

..........45
Preparando a escola e a sala de aula.............

Processos de escolha do Livro Didático (LD) Sempre Nunca Às vezes

1. O conjunto dos docentes se organiza


coletivamente para a escolha de livros
didáticos?

2. Existe compromisso da coordenação


pedagógica e da direção com as escolhas
dos docentes?

3. Há pressões e interferências de editoras ou


de outros órgãos nos processos de
escolha?

4. A comunicação de requisitos e prazos


relacionados à escolha do LD ocorre de
forma ampla e adequada?

5. Os professores conhecem e consultam o


Guia de Livros Didáticos (PNLD/MEC)
antes das escolhas?

6. É realizada alguma forma de avaliação de


livros já adotados antes de novas
escolhas?

7. São efetuados e disponibilizados, pela


própria instituição, registros da escolha, do
recebimento e da utilização efetiva dos
livros didáticos?

Tendo esses níveis de análise como meta, os professores poderão partir dos registros
feitos para aumentar progressivamente seu grau de envolvimento e controle dos processos
institucionais de escolha de livros didáticos. Pode-se afirmar que esse âmbito de escolha estará
associado a retornos mais positivos, quando esse processo:
! Resultar de informações e reflexões coletivas dos profissionais da própria escola,
envolvendo professores, coordenação pedagógica e direção, em processos de escolhas
efetivamente institucionalizados;
! Levar em consideração o nível específico a que se destina o livro didático no caso, o Ciclo
Inicial de Alfabetização para organização dos grupos de referência, de estudo das obras
pertinentes e de demandas coerentes com o avanço do Ciclo;
! Assegurar o acesso ao Guia de Livros Didáticos (PNLD/MEC), além da análise cuidadosa
das resenhas nele contidas e da ampliação de acervos das obras didáticas propriamente
ditas, para exame do professor;
! Estabelecer controles de formas de pressões ou interferências de editoras ou outras
instâncias alheias ao processo institucional, para que as decisões de caráter pedagógico

46..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
não se submetam a interesses parciais ou estritamente comerciais. Em contrapartida, não
se pode prescindir do papel das editoras no que se refere à disponibilização de obras e às
parcerias em projetos pedagógicos, cabendo às redes de ensino uma sistematização de
tais processos;
! Envolver avaliações contínuas de obras já adotadas institucionalmente, de experiências
bem sucedidas com as mesmas ou de alternativas encontradas pelas professoras para
superação de limites e lacunas dessas obras. Uma direção interessante pode ser a prática
de oficinas específicas em torno de determinados focos ou eixos da alfabetização, sob
responsabilidade de profissionais com maior experiência ou êxito em alfabetização, tendo
como suporte: a) propostas que usem o livro utilizado como efetivo fio condutor do trabalho
docente; b) propostas que o utilizam como material de apoio, apelando para outros
materiais complementares, didáticos e paradidáticos; c) projetos de ampliação de recursos
associados a bibliotecas, salas de leitura , “Cantos de Leitura”, entre outras alternativas; d)
trocas de experiências entre instituições de uma mesma rede, como forma de incentivo a
escolhas coletivas e mais articuladas.

A análise da proposta de alfabetização do livro didático


A ênfase se dirigirá, neste segundo nível de análise, para a relevância da avaliação das
obras didáticas quanto à sua proposta de alfabetização propriamente dita, interesse maior do
Ciclo Inicial do Ensino Fundamental.

Um expressivo ponto de partida poderá ser a revisão crítica dos critérios utilizados
pelos professores para escolher, manter em uso ou substituir determinado livro didático. Como
nem sempre os professores terão à sua disposição todas as obras indicadas nas resenhas do
Guia de Livros Didáticos, deve-se valorizar, principalmente, a contínua análise das obras já
adotadas na escola, para melhor fundamentação de suas futuras escolhas.

Eis algumas questões que poderão orientar essa reflexão:

Critérios de avaliação do Livro Didático (LD) Sim Não Parcialmente

1. A obra analisada apresenta um manual


destinado ao professor com contribuições
objetivas para sua atuação?

2. O livro apresenta sintonia com o projeto


pedagógico da escola e sua proposta
metodológica para o ciclo?

3. As concepções de ensino, aprendizagem e


linguagem estão claramente consideradas
no LD?

continua

..........47
Preparando a escola e a sala de aula.............
continuação

Critérios de avaliação do Livro Didático (LD) Sim Não Parcialmente

4. A proposta da obra é adequada ao perfil de


alunos do Ciclo Inicial de Alfabetização e à
realidade específica da escola?

5. A obra contempla os núcleos mais


importantes do trabalho na área de
alfabetização, tendo em vista as
capacidades progressivas já estabelecidas
para os diversos níveis desse ciclo?

6. A proposta didática apresenta diversidade


de textos e atividades?

7. O projeto gráfico da obra é adequado aos


interesses e necessidades dos alunos?

Além dessas questões, já é do conhecimento do professor que outros critérios devem


ser considerados, tais como: a contribuição da obra para a cidadania, com isenção de
preconceitos e doutrinações; a correção de conceitos e informações básicas; a correção e a
pertinência metodológicas; o atendimento aos principais eixos do ensino da língua e às diversas
capacidades envolvidas em sua aprendizagem. Deduz-se, a partir daí, que a cuidadosa análise
das resenhas apresentadas ao professor pode ser um apoio efetivo ao seu processo de decisão
elas estarão sinalizando, por exemplo, as obras que oferecem uma abordagem mais completa e
enriquecedora e aquelas cujas ressalvas ou lacunas exigirão trabalho atento do professor para
sua complementação e ampliação.

É preciso enfatizar, contudo, que nenhuma avaliação ou indicação prévia de livros


didáticos poderá retirar do professor a prerrogativa de tomar essa tarefa em suas mãos, para
que se aproprie de fato da escolha que fizer e confronte tal escolha com suas condições
cotidianas de trabalho, com sua consistência metodológica e com os resultados concretos
observados na aprendizagem dos alunos. Pode-se afirmar que esse processo faz parte da
formação continuada do professor, em direção a um profissional cada vez mais reflexivo e
autônomo. Tal processo poderá ser, de fato, bem sucedido, quando levar em conta a síntese
dos critérios ou indicadores que, legitimados pelo professor, podem qualificar um livro didático
para o Ciclo Inicial de Alfabetização:
! Oferecer pressupostos teórico-metodológicos coerentes e consistentes, abordando
concepções de ensino, aprendizagem, linguagem e alfabetização, que possam se articular
com o projeto pedagógico e curricular da escola e com as experiências e opções do próprio
professor;

48..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
! Contribuir para a formação e atuação do professor, através da sistematização do manual a
ele destinado, das propostas de planejamento e avaliação em sala de aula, da amplitude de
projetos e recursos adicionais sugeridos a alunos e professores;
! Apresentar uma proposta sistematizada para o ensino do sistema alfabético e das
convenções da escrita, levando em conta o conjunto de habilidades, capacidades e atitudes
necessárias à sua apropriação pelos alunos, nos diversos patamares em que estes se
encontram no ciclo;
! Propiciar uma seleção de textos de qualidade, com diversidade de tipos, gêneros, autoria,
temas, contextos e formas de registros - levando-se em conta o precário acesso dos alunos,
e mesmo de muitas escolas, a outros tipos de impressos;
! Contribuir para o desenvolvimento da linguagem oral dos alunos, indo além das situações
de interação em sala de aula e explorando diferenças entre modalidades oral e escrita da
língua, em diversos contextos de uso e de variedades regionais e sociais;
! Contribuir com atividades de leitura e produção de textos escritos, valorizando estratégias e
recursos diferenciados, bem como a diversidade de contextos sociais de sua circulação;
! Apresentar um projeto gráfico-editorial de qualidade e esteticamente atraente, que desperte
o interesse dos alunos do Ciclo Inicial de Alfabetização, já limitados no acesso a outros
recursos de qualidade similar.

Para operacionalizar a avaliação desses tópicos, professores e coordenadores do


Ciclo Inicial poderão se orientar pelos critérios já detalhados no primeiro Caderno desta
Coleção, em relação a cada eixo do processo de alfabetização: compreensão e valorização da
cultura escrita; apropriação do sistema de escrita; leitura, produção textual e desenvolvimento
da oralidade. Os produtos desse trabalho certamente estarão traduzidos em maior consistência
nas escolhas, maior controle de qualidade do material didático em circulação e maior segurança
e autonomia do próprio professor.

Referências:
BATISTA, Antônio A. G. Recomendações para uma política pública de livros didáticos. Brasília:
MEC/SEF, 2001.
BATISTA, Antônio A. G. (Org.). Escolha de livros didáticos de 1ª a 4ª séries: padrões e processos no
Programa Nacional do Livro Didático. Brasília: MEC/SEF, 2002.
BRASIL. MEC/Programa Nacional de Livros Didáticos. Guia de Livros Didáticos:1ª a 4ª séries. Brasília:
MEC/SEF/FNDE (edições: 1996, 1997, 2000, 2003).
CEALE. Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da Faculdade de Educação/UFMG. Os professores e
a escolha de livros didáticos de Alfabetização e Língua Portuguesa de 1ª a 4ª séries. Belo Horizonte:
CEALE/MEC-SEF, 2001. (relatório de pesquisa)
RIBAS, Céris S. R. Os novos livros didáticos de alfabetização e suas repercussões na prática docente.
2003. Tese. (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, UFMG, Belo Horizonte.

..........49
Preparando a escola e a sala de aula.............

5. A integração das famílias ao trabalho desenvolvido


pelas escolas na alfabetização
Há consenso, entre os educadores, sobre a importância da integração entre a escola e
a comunidade à qual pertencem seus alunos. Projetos político-pedagógicos vêm insistindo
nessas relações de “mão dupla”, democratizando canais de comunicação e abrindo o espaço
institucional à participação de pais ou responsáveis pelos alunos.

Entretanto, a análise de processos cotidianos relacionados a esta questão evidencia


dificuldades e resistências por parte de todos os protagonistas dessas relações. Muitos
professores têm manifestado grande perplexidade ao trabalhar com um grupo cada vez mais
diversificado de alunos. Segundo seus argumentos, “há alunos que não apresentam as
condições mínimas necessárias ao aprendizado deles esperado” ou “não recebem nenhum tipo
de suporte de seus familiares para as atividades escolares”.

É preciso observar que a democratização do acesso à escolarização trouxe para


dentro da instituição escolar não só uma grande pluralidade de grupos sócio-culturais, mas,
também, alunos pertencentes a famílias que vivem em situação econômica precária, como a
maior parte da população brasileira, ou que vivem em áreas de risco. Se, por um lado, nos
aproximamos do ideal de universalização do acesso à escola, por meio da ampliação do
número de vagas nessa instituição social, deparamos, nas últimas décadas, com o desafio de
atender adequadamente aos diferentes grupos sociais que passaram a fazer parte de nossas
salas de aula. Como garantir o acesso desses alunos não somente ao espaço físico da escola,
mas, também, a bens culturais como a leitura e a escrita ou a um amplo contexto de letramento?
Os estudos sobre as razões do fracasso escolar cuja
As implicações político-
incidência é maior junto às crianças das camadas populares
pedagógicas do fracasso de
apontam para duas ordens de fatores que influenciam o desempenho crianças de camadas
dos alunos: fatores intra-escolares e extra-escolares. populares são
problematizadas no
Os fatores extra-escolares referem-se às condições Caderno 1.
socioeconômicas e às características culturais apresentadas pelos
alunos. Os fatores intra-escolares referem-se às formas de Esta Coleção enfatiza os
organização do trabalho pedagógico e das atividades desenvolvidas fatores intra-escolares que
podem influenciar
pelos profissionais da escola, em sala de aula ou em outros espaços
positivamente o trabalho
institucionais. pedagógico em torno da
alfabetização, sem perder
Esses fatores podem influenciar positiva ou negativamente de vista sua articulação com
o desempenho escolar dos alunos. Obviamente, a ação isolada da os diversos fatores extra-
escolares que ampliam ou
escola não pode transformar os fatores socioeconômicos que criam limitam esse trabalho.
obstáculos à participação e integração de alunos, que vivem em
condições indesejáveis e, muitas vezes, de exclusão social. No

50..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
entanto, é necessário que busquemos formas alternativas de organização do trabalho escolar
que favoreçam o acesso desses alunos aos conhecimentos e práticas sociais que a escola visa
socializar.

Diferentes pesquisas têm demonstrado que as expectativas A influência de


dos professores e demais profissionais da escola a respeito das expectativas sobre os
desempenhos escolares dos
possibilidades de aprendizagem dos seus alunos, bem como seu alunos foi considerada na
julgamento sobre o tipo e a qualidade de participação da família no primeira seção deste
Caderno.
acompanhamento escolar de suas crianças têm influência direta nos
resultados obtidos por esses alunos.

A adoção ou não de uma atitude positiva frente às diferenças culturais ou dificuldades


advindas das relações de nossos alunos com suas famílias tem implicações sérias para a
construção de oportunidades de aprendizagem no ambiente escolar e, conseqüentemente,
para o que esses alunos terão oportunidade de aprender na escola.

Entretanto, o planejamento das atividades escolares tem como ponto de partida o


atendimento das crianças de acordo com suas características e necessidades concretas. Essa
é uma razão importante para que nos indaguemos sobre o que realmente conhecemos de
nossos alunos, e suas famílias, sobre a relação entre sua bagagem cultural e suas
possibilidades de aprendizagem dentro da escola. Dessa forma, poderemos organizar as
atividades de ensino de forma a explorar os recursos, experiências ou conhecimentos trazidos
pelo aluno e sua família como ponto a partir do qual se pode avançar, bem como atentar para
limitações que precisam ser superadas com recursos criados no interior da escola.

Durante o processo de alfabetização, a relação entre a O planejamento e a


organização de atividades
escola e a família destaca-se como uma das áreas em que a pedagógicas centradas na
organização do trabalho escolar precisa ser cuidadosamente alfabetização são objeto de
análise da segunda seção
planejada, organizada e implementada.
deste Caderno.
É preciso que nos indaguemos sobre como interagimos com as famílias de nossos
alunos, que espaço reservamos no interior da escola para informar aos pais sobre a vida escolar
de seus filhos ou sobre a expectativa da escola em relação à participação dos pais no processo
de ensino-aprendizagem da criança. Esses questionamentos
poderiam ser
Apresentam-se, a seguir, questões norteadoras para a recontextualizados no caso
instauração de uma discussão avaliativa sobre como vem se dando a de Débora, que procuramos
relembrar ao longo deste
relação entre a escola e as famílias de seus alunos. Trata-se de uma Caderno. Qual havia sido o
contribuição preliminar para a identificação de alternativas ou de lugar ocupado por seus pais
nas relações com a escola?
limitações na implementação de uma relação frutífera entre esses Como foram tratadas suas
atores do processo educacional. Três núcleos de critérios são expectativas e dúvidas
acerca do desempenho
propostos: escolar de sua filha?

..........51
Preparando a escola e a sala de aula.............

I. Quanto ao sentimento de acolhimento no interior da escola


Os alunos, pais e outras pessoas da comunidade gostam de estar na escola?

Qual a motivação mais freqüente para convocação da presença dos pais na escola?
São chamados apenas para comunicação de conflitos e dificuldades de aprendizagem dos
filhos ou também para obter retorno sobre seus progressos e avanços?

A escola apresenta abertura a demandas particulares dos pais em função do seu


interesse em conhecer o seu funcionamento, sua estrutura, seu projeto pedagógico e as
condições de aprendizagem dos seus filhos?

II. Quanto às condições para o atendimento aos pais dos alunos:


É possível encontrar na escola um espaço reservado para receber um pai, uma mãe,
ou um(a) aluno(a) para uma conversa particular?

Pais e alunos que chegam para fazer matrícula, pedir informações, saber sobre o
desenvolvimento dos seus filhos são atendidos com atenção e respeito?

Os pais e mães participam ativamente das reuniões sobre a vida escolar dos alunos?
São representados nos Conselhos de Classe ou de Ciclo?

A escola cria horários alternativos de atendimento aos pais quando esses não têm
disponibilidade de comparecer às reuniões

Nas reuniões de pais são disponibilizadas informações sobre o trabalho desenvolvido


na escola, seus objetivos, tipo de atividades e como são realizadas pelas crianças (isto é,
informações sobre o que e como os alunos estão aprendendo)?

Em suas conversas com os pais dos alunos, os professores apresentam sugestões de


como esses podem dar suporte em casa para os seus filhos, de forma coerente com suas reais
possibilidades (isto é, como os pais podem acompanhar o estudo de seus filhos, demonstrar
interesse, etc.)?

III. Quanto à abertura da escola aos pais e à comunidade


A escola se relaciona de forma democrática com os membros da comunidade,
isentando-se de discriminações em relação a diferenças econômicas, culturais, étnico-raciais
ou aos portadores de deficiências?

A escola cria estratégias alternativas de comunicação com pais ou responsáveis


analfabetos (explicitando, com clareza, critérios para planejamento de atividades e para
avaliação e progressão dos alunos)?

52..........
..............Preparando a escola e a sala de aula
Professores e alunos desenvolvem atividades pedagógicas (projetos, oficinas,
excursões, exposições) visando o conhecimento do local onde vivem, dos problemas e
recursos disponíveis nesse contexto e abrindo espaço para habilidades e talentos dos
familiares dos alunos?

A escola promove eventos de confraternização, comemoração ou celebração,


contando com a participação ativa da comunidade escolar (gincanas, festas juninas, bailes,
dias das mães, dos pais, formatura, entre outras)?

A avaliação inicial desses tópicos ou itens pode servir de orientação para a instauração
e registro de reflexões sobre as práticas de interação entre a escola e as famílias dos alunos,
subsidiando o redimensionamento do projeto político pedagógico da escola no que concerne às
suas relações com a comunidade.

Referências
AÇÃO EDUCATIVA, UNICEF, PNUD (Coord.). Projeto Indicadores Populares de Educação: reforçando a
qualidade da Escola (versão preliminar). São Paulo, 2003.

DAYRELL, Juarez (Org.). Múltiplos olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte: Editora da UFMG,
1999.

GONÇALVES, Francisca dos Santos. Repensando a relação entre educação, família e sociedade.
Coleção Veredas: Guia de Estudo. Módulo 1, v. 1. Belo Horizonte, Secretaria de Estado da Educação,
2002. p.130-164.

SANTOS, Lucíola de Castro Paixão. Diferentes formas de pensar as relações entre família, escola e
sociedade.Coleção Veredas: Guia de Estudo. Módulo 1, v. 4. Belo Horizonte, Secretaria de Estado da
Educação, 2002. p. 161-182.

VEIGA, Ilma P. Alencastro; Fonseca, Marília. As dimensões do projeto político-pedagógico: novos


desafios para a escola. Campinas: Papirus, 2001.

Palavras finais
Este Caderno se centrou na preparação da escola para o trabalho de alfabetização. Os
temas propostos traduziram, ao longo das cinco seções apresentadas, a preocupação com o
papel do professor e a responsabilidade da escola nesse processo. A ênfase no ensino e nas
dimensões organizadoras de atividades buscou complementar, de forma indissociável, outras
dimensões anteriormente analisadas na perspectiva da aprendizagem do aluno, conforme se
acentuou no Caderno 2.

Tomando-se como ponto de partida a valorização da identidade do professor


alfabetizador, procurou-se ressaltar a importância das ações intencionais e compartilhadas em

..........53
Preparando a escola e a sala de aula.............

torno do planejamento do trabalho em sala de aula voltado para a alfabetização. Procurou-se


redimensionar a discussão metodológica, nos últimos anos posta à margem das decisões
pedagógicas consideradas relevantes, bem como requalificar o lugar do livro didático na
alfabetização, a partir de processos de escolha consistentes. Finalmente, reintroduziu-se a
participação dos pais na discussão dos rumos da alfabetização de seus filhos, como condição
de visibilidade desse processo.

Uma das condições para essa visibilidade seria o maior investimento em ações
avaliativas que realimentem o planejamento do professor e o projeto pedagógico da escola, à
luz das efetivas aprendizagens dos alunos. Esse núcleo de reflexão será o tema do Caderno 4.

54..........

You might also like