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♯8 primer semestre 2016 : 105-120 ISSN 2313-9242

Danielle Manoel dos Santos Pereira


IA-UNESP, Brasil

Pintura setecentista na igreja da ordem terceira de


Nossa Senhora do Carmo em Mogi das Cruzes (SP
– Brasil)

Pintura setecentista na igreja da ordem terceira de Nossa Senhora do Carmo em Mogi das Cruzes (SP – Brasil) – Danielle
Manoel dos Santos Pereira
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levantamento das autorias e confirmação das


atribuições feitas anteriormente, ou mesmo a
consulta aos documentos e fontes primárias.

Em pesquisas anteriores6 buscou-se a influência da


pintura do meio norte de Minas Gerais sobre a
Pintura setecentista na igreja da pintura de Mogi das Cruzes (SP), procedendo a
identificação e confirmação dos pintores que
ordem terceira de Nossa Senhora executaram duas de três pinturas existentes na Igreja
da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo de
do Carmo em Mogi das Cruzes Mogi das Cruzes. A terceira pintura, para a qual não
(SP – Brasil) havia nenhuma informação, somente trabalhos
esparsos que apresentavam alguns dados sobre a
obra,7 prosseguiu sem nenhum dado adicional ao
Danielle Manoel dos Santos Pereira término da pesquisa.
IA-UNESP, Brasil
Novos estudos foram empreendidos acerca da
pintura colonial/ilusionista do Estado de São Paulo,
visto haver ainda muitas lacunas sobre as obras e os
artistas, na qual a terceira pintura da Igreja da
Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo de Mogi
Breve Histórico das Cruzes foi incluída, esta situa-se no forro do
vestíbulo da sacristia da dita igreja; tal obra, forro do
A pintura colonial no Estado de são Paulo recebeu vestíbulo, possui uma tipologia muito diferente das
pouca atenção por parte de especialistas e estudiosos demais existentes no forro da nave e capela-mor da
da arte, diferentemente da situação de Minas Gerais, mesma igreja, o que suscita em pesquisadores como
com diversos estudos de Myriam Andrade Ribeiro de Salomão e Tirapeli (2005), Pereira (2012) ou no
Oliveira,1 a qual analisa as transformações na pintura restaurador Júlio Moraes (2008)8 inúmeras
com o correr dos séculos, apresentando as pinturas indagações.
em determinada composição estilística, quer seja
barroca ou rococó. Com dois volumes sobre a pintura Dentre as hipóteses formuladas acerca da pintura do
em Minas Gerais Carlos Del Negro2 apresenta um forro do vestíbulo da sacristia há a possibilidade de a
panorama geral da pintura, elaborando um volume obra não ter sido executada para a Igreja da Ordem
especifico sobre a pintura do meio norte de Minas Terceira dos Carmelitas, uma vez que há sobra de
Gerais. Ambos os trabalhos e muitos outros taboado nas extremidades do forro sem camada
subsidiam pesquisadores na continuidade de estudos pictórica. Essa “sobra” de taboas corrobora para a
sobre determinada obra, autoria das pinturas e formulação dessa hipótese, pois se a obra não tiver
alguns estudos por meio de comparação estilística. sido executada para os carmelitas é natural que a
obra tenha sido rearranjada no espaço disponível,
O cenário da pesquisa, paulista, sofre mudanças com algo que exigiu um complemento de taboas para dar
a busca pelo sentimento de nacionalidade ocorrido sustentação à obra.
após a proclamação da República em 1889,
intensificado nas primeiras décadas de 1900. A pintura, forro do vestíbulo, não possui relação com
Imbuído do espirito nacionalista Mário de Andrade a demais na mesma igreja, o que fundamenta uma
inicia junto a outros intelectuais e estudiosos uma nova hipótese, diante da diversidade na linguagem
série de viagens pelo interior do país para buscar esse formal das obras existentes na mesma igreja, seria
produto verdadeiramente nacional.3 ela obra de datação anterior ou ulterior? Embora o
estado de conservação da obra seja visualmente
É Mário de Andrade4 quem inicia também as melhor do que as demais, que parecem ligar-se às
pesquisas sobre a pintura em São Paulo, encontrando pinturas de gosto rococó, ou seja, do início do século
obras e autores, estabelecendo trajetórias e cruzando XIX, sendo que a pintura do vestíbulo possui
vidas. Contudo após suas descobertas muito pouco se linguagem barroca, ou seja anterior.9
fez nessa direção em São Paulo. Contamos com
pesquisas esparsas e isoladas, alguns artigos, Outra hipótese formula-se a partir das indagações de
capítulos de livros, algumas teses e dissertações que Salomão e Tirapeli,10 que alegam que as
tratam da pintura paulista colonial;5 entretanto são características e elementos constituintes da obra a
estudos isolados que tratam objeto específico, de aproximam muito das pinturas de sacristia coloniais,
modo geral, sem continuidade no tocante ao

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embora esta esteja ocupando o forro do vestíbulo, Assim como o restante do território brasileiro, Mogi
seria então obra de outro cômodo? das Cruzes também era habitada pelos indígenas,
que foram, aos poucos, sendo expulsos de suas
Por fim, coloca-se a questão da autoria da obra, pois aldeias e dizimados. Dentre as bandeiras que aí
visualmente não a relacionamos às obras dos chegaram, está a de Domingos Luís Grou, que esteve
pintores Manoel do Sacramento ou Antonio dos em Mogi nos anos de 1590 a 1593, com o objetivo de
Santos11 (Pereira, 2012), sendo assim, quem teria expulsar e apresar os índios que aí vivam. Inúmeras
realizado tal obra e quando? expedições com esse mesmo fim seriam realizadas
até meados de 1607.
Com o intento de responder as proposições
explanadas, acima, definimos como metodologia a Em 1608 segundo Grinberg (1961) foi concedida a
busca documental como método principal – Gaspar Vaz uma sesmaria no povoamento de Mogi.
recorrendo à arquivos históricos públicos e privados, Em 8 de abril de 1611 é realizada uma petição dos
tais como Arquivo da Província Carmelitana de Santo moradores para elevar o povoado de Mogi a vila. E,
Elias em Belo Horizonte, MG e o Arquivo Municipal em 1º de setembro de 1611, obteve-se a permissão
de Mogi das Cruzes “Historiador Isaac Grinberg” - e para a elevação.
a pintura como documento em si– procedemos à
análise cientifica da obra com luzes especiais para A 1º de setembro, com todas as formalidades
averiguar a existência de desenhos subjacentes, legais, inclusive levantamento de
pigmentos empregados na fatura da obra, possíveis pelourinho, é instalada a Vila de Sant’Ana de
Mogy-Mirim, depois Mogi das Cruzes. O ato
restauros e intervenções posteriores à fatura original é presidido pelo Capitão Gaspar Conqueiro,
da pintura, recortes nas pranchas e tudo o mais que o por determinação do Governador Dom Luís
desenho pudesse fornecer, especialmente quanto a de Souza. São igualmente escolhidos e
datação. empossados os primeiros juízes ordinários,
Braz de Piña e Antônio Paz; os primeiros
Mas, antes de passarmos propriamente à análise dos vereadores, Francisco Vaz Coelho e Gaspar
dados coligidos em documentos ou das análises Colaço, e o primeiro procurador do
científicas das imagens da obra, faz-se importante Conselho, Antônio Fernandes.
compreender o cenário/contexto histórico no qual a Dois dias depois é lavrada a ata de elevação
da povoação de Mogy-Mirim a Vila de
pintura está inserida. Sant’Ana de Mogy-Mirim. O documento é
redigido por João de Almeida, escrivão do
Mogi das Cruzes (SP/Brasil) e os Carmelitas Público e Judicial da referida Vila.15

A cidade de Mogi das Cruzes pertencente ao estado Assim foi assinalada a história oficial da Vila de
de São Paulo fica cerca de 60 quilômetros de Santa Ana de Mogi, recebendo inúmeras
distância da capital paulista. A cidade com denominações até constar somente como Mogi das
aproximadamente 415 mil habitantes12 conserva Cruzes. O nome da cidade foi modificado ao longo de
algumas joias de seu passado colonial nas quais é sua trajetória e essas transformações foram
possível perceber o arrebatamento artístico que acompanhadas e estudadas pelo historiador local
tomou conta das igrejas a partir do século XVIII. Isaac Grinberg em História de Mogi das Cruzes.16
Para compreender sua arte é preciso conhecer Dessas modificações pode-se citar a que ocorreu no
minimamente a história da cidade que abriga essas ano de 1625, com a mudança de Vila de Sant’Ana de
preciosas joias. Mogy-Mirim para Vila de Santa Ana das Cruzes e por
fim Mogi das Cruzes.
O ano de 1560 é aceito por inúmeros pesquisadores
como data provável em que Braz Cubas teria pisado Mogi das Cruzes desenvolveu-se como as demais
pela primeira vez o solo mogiano e aí estabelecido vilas da Capitania de São Vicente e de outras regiões
pouso e em 1561, teria fundado uma fazenda (espécie da colônia. Enquanto alguns de seus homens
de acampamento), que mais tarde seria um arraial. realizavam a busca de índios, outros faziam entradas
Os estudiosos Emílio A. Ferreira, em Mogy das pelo sertão em busca do ouro, contudo, mesmo
Cruzes: dados históricos e notas diversas,13 e Dom diante dos fluxos e refluxos populacionais, foi
Duarte Leopoldo e Silva, em Notas de história “possível um desenvolvimento demográfico mais
eclesiástica,14 afiançam a proximidade do ano de regular e a fixação definitiva de núcleos importantes
1560 com a primeira bandeira a penetrar Mogi das de população”17 e aos 17 de agosto de 1671 é assinado
Cruzes, sendo essa data recorrente na maioria dos o decreto de criação do Município de Mogi das
estudos existentes sobre sua fundação. Cruzes.

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Dentro desse contexto histórico de formação do afastada geograficamente – Meio norte de Minas
povoado inicial de Mogi das Cruzes é possível Gerais.24
assinalar a presença da Ordem de Nossa Senhora do É na igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do
Carmo, embora não haja uma data conclusiva para a Carmo que encontraremos a pintura objeto deste
chegada dos primeiros frades ao antigo povoado, trabalho, localizada no forro do vestíbulo da sacristia
Grinberg (1961) afiança que a partir de 1626 pleiteou da dita igreja a pintura que ocupa quase a totalidade
o padre Gaspar Sanches junto à Câmara Municipal a do forro não possuía nenhuma atribuição de autoria
fundação de um convento para o Carmo. Isso ou maiores dados concretos a respeito de sua
demonstra que deveria haver frades carmelitas história.
residindo na vila antes desse período, devido ao
interesse na fundação de um convento.18 Nem mesmo os irmãos sabem informações da obra
ou conheciam documentos sobre a mesma. Sequer
O que se pode afirmar diante dos documentos é que, supõem uma datação para a obra ou falam sobre a
em 1627, o padre Gaspar Sanches doa seus bens aos diferença desta obra em comparação às demais
frades carmelitas e no ano de 1629 é dado o despacho existentes na mesma igreja. A pintura lhes é tão
favorável à construção do convento na vila, sendo rotineira que pouco a apreciam, especialmente pela
então designados os primeiros frades para irem dificuldade em percebê-la em sua completude devido
residir na Vila de Mogi das Cruzes: frei Manoel à baixa altura do cômodo, o qual utilizam pouco, é
Pereira e frei Sebastião da Encarnação.19 O mais um espaço de guarda dos hábitos e passagem
pesquisador e professor mogiano Jurandyr Ferraz de para uma grande sala na qual sempre ocorrem
Campos aponta a chegada dos carmelitas à Mogi eventos, esta sim, muito frequentada. O visitante
pelos idos de 1625.20 desavisado passa sem sequer elevar a vista para o
forro, sem notar a preciosidade sobre sua cabeça.
No ano de 1698 é anexada ao Convento do Carmo a Entretanto, novos dados e documentos puderam
Igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do trazer esclarecimentos acerca da obra que fica
Carmo, que até essa época realizava seus ritos num reclusa das vistas do observador comum, preservada
dos altares laterais da Igreja da Ordem Primeira. até mesmo da luz do sol.
Caracteriza-se essa construção, dos terceiros, como
uma das mais íntegras e completas igrejas dentre as Documentos acerca da obra
outras obras coloniais paulistas.21
A pintura (Fig. 1) encontra-se no forro do vestíbulo
Nesse sentido, pode-se fazer uso das palavras de da sacristia da igreja e hipóteses aventavam que não
Aracy Amaral, ao tratar de monumentos que teria sido pintada para o cômodo onde se localiza.
receberam pouca atenção de especialistas, como é o Antes de esquadrinhar as questões que esta pintura
caso da Igreja dos Terceiros de Mogi das Cruzes: suscita, são necessárias algumas informações a
respeito do estado da obra, baseadas no que é
[...] esses monumentos expressam com perceptível e em relatório técnico.25
veracidade e plena beleza um momento de
intensa articulação entre a nova terra e uma O forro possui 6,78m x 5,40m, num total de 40
população tão pobre de bens materiais pranchas, destas, 8 possuem pintura total de um tom
quanto carregada de motivações que os
elevava a alturas hoje impensáveis. Muitos
de cinza bastante espesso, outras 4 mais estreitas
surgiram como ex-votos pessoais ou de um (mesma espessura das demais pranchas que
pequeno grupo, construídos que foram por possuem camada pictórica) possuem repintura
devoção ou promessa, materialização de um parcial, sendo duas de cada lado, o taboado é plano,
gesto de fé.22 ao contrário dos demais forros abobadados e há
maior dificuldade em expor o real estado das taboas
A igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do pelo verso, uma vez que o acesso à este forro é
Carmo de Mogi das Cruzes, tal qual uma caixa de diferente dos demais, o que impossibilita tal
joias conserva em seu interior três forros pintados de conhecimento.
grandes proporções com características ímpares na
produção da pintura na antiga Capitania de São Outra dificuldade é averiguar se as extremidades do
Paulo. forro próxima às portas foram cortadas ou não, uma
vez que sem projetos para restauro da pintura não se
Tais exemplares constituem-se como casos de pode desmontar a cimalha que arremata o encontro
excepcionalidade segundo especialistas,23 filiando-se entre as pranchas e a parede.
à tipologia de outras pinturas de região muito

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Fig. 1. Lourenço da Costa, Nossa Senhora entregando o escapulário à São Simão Stock, ca. 1750. Dimensiones: 6,78 m. x 5,40 m,
têmpera, forro do vestíbulo da sacristia da Igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, São Paulo (BR),
Foto: Luciara Bruno Garcia, 2015.

Mesmo em extenso relatório técnico26 não existem especializada, equipamentos técnicos e análises
maiores detalhes, exceto algo que é perceptível a olho microquímicas.
nu, que o estado de conservação desta pintura é Quanto aos documentos, perscrutamos os Livros de
melhor do que a das demais obras pictóricas da Receitas e Despesas da Ordem Terceira do Carmo a
mesma igreja. É crível que essa condição de fim de se obter informações. Contudo, novamente, a
conservação, da pintura, tenha ocorrido em virtude busca foi infrutífera, o livro contém dados de
da localização onde provavelmente sempre estivera, despesas e receitas dos anos de 1768 a 1818.28
pois, o vestíbulo (atual nome do cômodo onde está a
pintura) é uma sala de pequenas proporções que Ciente de que as pinturas do forro da nave e forro da
serve de passagem entre a entrada lateral da igreja e capela-mor foram pintadas entre 1801 a 1814/15, tal
a sala dos fundos onde ocorrem os eventos da pintura (forro do vestíbulo) ou teria sido executada
fraternidade, além destas portas há duas janelas no antes de 1768 ou após 1818, uma vez que o livro de
cômodo que raramente são abertas, acarretando em receitas e despesas não possui nenhuma indicação da
pouca incidência de luz solar direta sobre a pintura. obra. Esta afirmação é segura, pois o citado livro fora
lido e relido algumas vezes, esquadrinhando
A obra também recebe pouca incidência de luz minuciosamente todos os lançamentos, sejam eles de
elétrica, uma vez que o cômodo serve mais como receitas ou despesas.
passagem de um local ao outro, é pouco utilizado;
tais fatores segundo Júlio Moraes ou Elizabeth Kajiya Logo, se a dita pintura não encontrava-se aí, restava
(ambos restauradores)27 foram decisivos na buscar em livros anteriores ou posteriores a ele.
conservação da obra pictórica. Anteriores não seria possível, este é o livro de
Receitas e Despesas mais antigo da Ordem Terceira
Dos questionamentos existentes acerca da pintura arquivado no Arquivo da Província Carmelitana.29
poderemos, agora, preencher algumas lacunas com a
ampliação na busca documental e um grande Quanto aos livros mais recentes, tal busca fora feita,
mapeamento da obra feito por profissional mas resultou-se infrutífera, o que já era esperado,

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uma vez que a pintura liga-se muito mais à pinturas A análise dos diversos lançamentos e despesas do
setecentistas, onde o espaço é completamente Livro de Receitas e Despesas dos Terceiros permite
preenchido, as cores são mais fortes e carregadas, constatar que estava mesmo a igreja passando por
entre inúmeros outros elementos formais que profundas obras, aliás sendo totalmente
afastam essa pintura do estilo das pinturas reconstruída, após a queda de 1776, visto que as
oitocentistas, como é o caso do forro da capela-mor e tentativas de salvar o templo foram em vão “[...]
da nave. Assim estava remediada a Capela, mas não resistiu
não ser até o anno de 1776[...]”,31 nesse franco desejo
Restava, somente, buscar referências sobre a pintura de reedificar a Capela é que praticamente os terceiros
em livros que não fossem Receitas e Despesas da constroem novo templo, dispondo de todos os
Ordem Terceira do Carmo. Face a diversidade dos recursos financeiros quanto fossem necessários para
documentos coligidos e analisados encontramos um “formosura e embelezamento” da nova Capela.
documento que nos traria luz sobre tal obra e a Intensificadas as obras de ornamentação novas
revelaria no panorama da pintura colonial como pinturas foram feitas em substituição às pinturas que
sendo uma das obras mais longínquas da antiga não resistiram à ruína, momento esse em que os
Capitania de São Paulo. pintores Manoel do Sacramento e Antonio dos
Santos são contratados para a fatura de pinturas nos
Encontramos, no Arquivo da Província Carmelitana forros recém instalados, enquanto a pintura que se
de Santo Elias, na cópia de um livro datilografado salvou seria reinstalada.32
intitulado: A Ordem Terceira do Carmo e sua Igreja,
escrito por Frei Timotheo Van den Broek, baseado Indo além, é sabido que o forro da capela-mor fora
nos relatórios do Prior Francisco Pinheiro Franco, inclusive reaproveitado, pois foi pago ao pintor
que em 1900 teve acesso a documentação dos Antonio dos Santos para que raspasse as taboas
Terceiros, a informação que responderia a maior antes mesmo da execução de seu trabalho,33 portanto
parte das hipóteses formuladas sobre a obra, como se é crível que tanto a nave quanto a capela-mor, assim
poderá constatar; na página 12 do referido e precioso como o consistório tivessem trabalhos de pintura,
relatório:30 mas como se apura no relatório, somente ficou salvo
da ruína o do consistório.
Transcrição do trecho:
Logo, podemos afirmar que essa pintura sempre
Nota: De 1769 data a tentativa de salvar o pertenceu aos Terceiros Carmelitas de Mogi das
templo antigo da ordem Terceira. O mestre Cruzes, contudo cremos que o cômodo recebeu no
Pedreiro, Paulo Gomes reformou a Capela correr dos anos diversificadas funções, alterando
com novo reboque e retelha e levou só assim a nomenclatura do espaço. Quando a pintura
15.000. O carpinteiro André da Costa
concertou as janelas e a escada do
fora executada o cômodo tinha função de consistório
Noviciado, como também as “sepulturas”e “[...] O Consistório ficou salvo, e a pintura feita em
banqueta. Fez o serviço quasi de graça por mais ou menos 1750 por Lourenço da Costa ficou
4$600. José Francisco dos Santos forneceu preservada da ruína. [...]”,34 depois o cômodo passou
os pregos e José Alvares Viana fez a a ser utilizado como sacristia (como se poderá
encarnação nova da imagem do Senhor para constatar adiante na análise da pintura) e atualmente
o altar por apenas dez patacas ou seja trata-se do vestíbulo para os irmãos.
5$200. Os negros para a factura do trabalho
foram pagos com 8$400. Assim estava Ao observar o forro nota-se nas extremidades das
remediada a Capela, mas não resistiu não ser
até o anno de 1776, em que ruiu o tecto da
pranchas sem pintura ou com camadas de tinta
igreja. O Consistório ficou salvo, e a pintura homogênea os “supostos” acréscimos no
feita em mais ou menos 1750 por Lourenço madeiramento e “recortes”. Recorrendo, uma vez
da Costa ficou preservada da ruína. Só mais mais, aos documentos observamos que “[...] mais
tarde levou concerto a taboada. (grifo nosso) tarde levou concerto a taboada [...]”,35 para que
ficasse preservada a pintura que não desmoronou
Diante do exposto, não resta dúvida de que a pintura com a queda da primitiva capela. As taboas foram
indicada como sendo realizada em meados de 1750 consertadas de modo a continuar servindo como
por Lourenço da Costa é a que se encontra hoje no forro para o espaço, mas consertadas devido ao abalo
forro do vestíbulo da sacristia. Embora se possa na estrutura da edificação que veio abaixo.
apontar o documento como lacônico, o cruzamento Entretanto não é possível determinar os consertos
do referido documento com outros lançamentos no exatos que essas taboas tiveram em 1776, contudo
mesmo livro ou em outros permitiu estabelecer e agora sabemos que o forro pintado ficou no mesmo
fundamentar diversas relações que corroboraram local desde a construção da nova igreja, mas com
com tal indicação. nomenclaturas diferentes para o mesmo cômodo:

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consistório, sacristia ou atualmente o cômodo do fls. 30 Recebido de Foros (1754)


vestíbulo da sacristia.36 Lourenço da Costa, paga para André Lopes,
de sua chácara $320
O documento, minudenciado, acima é o mesmo que
nos revela o nome do pintor que executou a obra: Os lançamentos indicados, acima, já bastariam para
Lourenço da Costa, o qual segundo Frei Timotheo assegurar a circulação do pintor Lourenço da Costa
Van den Broek é pintor da cidade de Santos e mestre em Mogi das Cruzes, trabalhando para os carmelitas
do conhecido pintor Jesuíno do Monte Carmelo.37 da Ordem Primeira na carnação de uma imagem
para a igreja conventual e como foreiro da Câmara
Conseguimos cruzar dados de outros documentos38 e Municipal em Mogi das Cruzes entre os anos de 1752
comprovar a circulação de Lourenço da Costa em a 1754.
Mogi das Cruzes nos anos situados como o da fatura
da pintura do forro do vestíbulo (antigo consistório), No mesmo livro “cópia” onde estão os lançamentos
meados do ano de 1750, fator essencial para a de Lourenço da Costa como foreiro da Câmara, há
verificação da autoria da obra, uma vez que o nome um lançamento equivocado onde mais uma vez
do pintor não é conhecido nos circuitos da pintura apuramos o nome de Lourenço da Costa trabalhando
paulista colonial, portanto confirmar sua circulação como pintor, tal qual nos registros das igrejas do
em Mogi das Cruzes tornou-se fator preponderante, Carmo. O livro da Câmara Municipal 43 de Mogi das
algo que poderia nos indicar quiçá a trajetória do Cruzes legitima a presença do pintor na vila,
artista. conforme transcrição, abaixo, da página 147,
referente ao ano de 1750:
Dentre os documentos coligidos que demonstram a
Alguns destes recibos por engano acham-se
circulação de Lourenço da Costa em Mogi das Cruzes lançados neste livro. São interessantes os de
e seu ofício de pintor há no Livro de Receitas e fls. 147
Despesas do Convento de Nossa Senhora do Carmo Recebi do Sr. Bento de Araújo, como
de Mogi das Cruzes de 1749 a 1768 um lançamento procurador da Camara 11$200 da pintura
ao pintor Lourenço da Costa, no ano de 1752, na das varas do Senado desta Camara e para
página 41 (verso), conforme se transcreve abaixo:39 sua clareza lhe passei este de minha letra e
sinal. 5 de Maio de 1750 anos. (a) Lourenço
Pintura - G. Sete mil e duzentos na pintura da Costa de Macedo.
em Carne de S. José ... ao pintor Lourenço
da Costa -------7$200. Nos livros da Câmara posteriores ao ano de 1800
Lourenço da Costa desaparece dos pagamentos de
Tal lançamento comprova que Lourenço da Costa era foreiros da Vila de Mogi das Cruzes, então é possível
efetivamente pintor, pois como se pode observar ele inferir que tenha sido foreiro em caráter temporário,
recebe pelo encarne de São José. No período colonial provavelmente enquanto estivera na vila executando
era comum aos pintores não só executarem trabalhos trabalhos de pintura.
de pintura de forros, como carnação de imagens,
dourações em retábulos e imagens, entre inúmeros Face ao exposto, legitima-se o trânsito de Lourenço
outros trabalhos (Flexor, 2015).40 Comprovadamente da Costa atuando como pintor em Mogi das Cruzes e
então o documento apresenta Lourenço da Costa como foreiro da Câmara. Sabendo também que seu
exercendo seu ofício de pintor na igreja contígua à nome aparece em alguns documentos como
Ordem Terceira, a igreja dos frades carmelitas. Lourenço da Costa, ou Lourenço da Costa de
Macedo, algo recorrente nos registros e lançamentos
Ainda no Arquivo da Província Carmelitana de Santo dos documentos do período colonial, a subtração de
Elias, em Belo Horizonte (MG) nos deparamos com a algum ou alguns nomes de artistas e artífices, tal
cópia datilografada de um Livro da Câmara como o ocorrido com o pintor José Patrício da Silva
Municipal de Mogi das Cruzes,41 cujas páginas Manso, cujo nome é lançado nos documentos da
revelam que Lourenço da Costa esteve ou mesmo Ordem Terceira de São Francisco da Penitência em
residia em Mogi das Cruzes no ano mencionado pelo São Paulo somente como José Patrício.44
Prior Francisco Pinheiro Franco para a pintura do
forro consistório dos Terceiros, a cópia intitulada: Ao buscar os documentos originais da Câmara de
Livro Cópia de 1749 a 1800 – Receitas e Despesas da Mogi das Cruzes foi possível perceber que Lourenço
Câmara de Mogi42 à página 30 v., ano de 1754, da Costa de Macedo em alguns documentos assina
consta: como Lourenço da Costa de Macedo e em outros
assina somente Lourenço da Costa, ou seja, mesmo o
fls 25 v. Recebido de foros (1753) pintor em alguns documentos passa recibo
Lourenço da Costa de sua chácara alternando seus sobrenomes.
$320

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a percepção dos detalhes dos medalhões existente na


Após encontrar tais documentos, com informações obra pictórica que se revelam um pouco mais claros
tão preciosas sobre a pintura e o pintor, foi nessa imagem, porém, como fora dito a oxidação do
conduzida uma análise científica minuciosa na obra verniz, ainda, impede que os elementos constituintes
com obtenção de imagens em infravermelho, dos medalhões sejam integralmente perceptíveis;
ultravioleta, visível, análises microquímicas, etc. identificação mais clara dos frutos e flores presentes
na representação, assim como na representação do
Análises Técnico-científicas na pintura quadro central, no qual Nossa Senhora do Carmo
entrega o escapulário à São Simão Stock.
A perita em imagens e análises científicas em obras
de arte Elizabeth Alfredo de Mattos Kajiya Através da luz visível foi possível distinguir melhor
contratada para o mapeamento profundo da obra os pigmentos empregados pelo artista, em cuja paleta
pictórica executou as seguintes técnicas: luz visível, de cores houve predomínio dos tons azul, vermelho,
reflectografia de infravermelho (IR), fluorescência amarelo e marrom com gradação destas mesmas
visível com radiação de ultravioleta (UV) e cores e alguns tons ocres. A técnica empregada para
espectroscopia.45 a inserção da camada pictórica foi a tempera e notou-
se também que há perda da policromia em algumas
A técnica de luz visível “reproduz a obra de forma áreas da obra (Fig. 3), bem como diversas manchas
fidedigna, quanto cor e forma, auxiliando nas provocadas pelo verniz.
análises da superfície da pintura. [...] como:
composição, texturas, detalhes estilísticos, estado de
conservação geral dos materiais e a paleta
cromática”.46

Logo, essa é a forma mais convencional de análise de


uma fotografia. Contudo, na análise científica de luz
visível a imagem total é obtida pela junção de
diversas imagens menores que formam o todo, pois
dessa maneira todos os pormenores da obra são
capturados com riqueza de detalhes, assim, é
possível esquadrinhar cada detalhe da
imagem/pintura que se julgava totalmente
apreensível a olho nu. Contudo a sujidade
impregnada na pintura e a oxidação do verniz
aplicado na camada pictórica escureceram a obra, até
Fig. 3. Lourenço da Costa, Detalhe com luz visível– perda
mesmo diante de lentes especiais. material pictórico, ca. 1750, têmpera, forro do vestíbulo da
sacristia da Igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo,
Mogi das Cruzes, São Paulo (BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya,
2015.

A segunda técnica utilizada foi a Reflectografia de


Infravermelho (IR) (Fig. 4 e 5), “é uma técnica
óptica não destrutiva na qual a imagem [...]
observada resulta da conjunção dos fenômenos de
reflexão, absorção e transmissão da camada
superficial revelando peculiaridades escondidas”.47
Com a obtenção destas imagens a pintura executada
em meados de 1750 por Lourenço da Costa se revelou
em todos os seus contornos e pormenores.

Foi possível determinar que o artista empregou uma


Fig. 2. Lourenço da Costa, Imagem em luz visível - Nossa
Senhora entregando o escapulário à São Simão Stock, ca. 1750,
técnica recorrente no período colonial para a
têmpera, forro do vestíbulo da sacristia da Igreja da Ordem transferência do risco (Fig. 5), que é o “Spolvero”,
Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, São Paulo essa técnica consiste na transferência do desenho
(BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya, 2015. feito normalmente em papel para o suporte onde
será executado, nesse caso o forro em madeira,
Vários foram os resultados alcançados com a
utilização da técnica de luz visível (Fig. 2), tais como

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[...] observa-se que o artista utilizou a pagodes, a vegetação exótica, pássaros e ornamentos
técnica do “spolvero” para transpor o florais, também corrobora para nossa assertiva
desenho no suporte. O desenho é passado quanto a datação dessa pintura, pois tais desenhos
para a parede com pulverização de carvão ou eram mais frequentes nas obras setecentistas,
pigmento em pó, em um papel perfurado
através de um chumaço de pano (boneca)48
enquanto as pinturas do oitocentos são mais leves e,
portanto, não caberia essa inserção.49 Há dois
Em toda a composição foi possível localizar os pontos medalhões na pintura do forro e, em ambos a
subjacentes feitos para a transposição do desenho presença de elementos dessa tipologia com
por meio do spolvero. preenchimento semelhante, porém não idênticos,
cujo conteúdo é perceptível com a captura das
imagens em infravermelho (Fig. 6 e 7).

Identificamos que nas bordas da pintura onde as


taboas foram (re)pintadas há continuidade de
pintura (Fig. 8), mesmo debaixo dessa camada
espessa aplicada, foi possível perceber os contornos
do desenho subjacente, mesmo no entorno da obra,
onde aparentemente as pranchas teriam sido
cortadas há continuidade da pintura, até mesmo nas
taboas mais distantes foram encontrados vestígios de
traços subjacentes (Coelho, 1993/6).50 Os desenhos
que se revelam nas pranchas mais afastadas
apresentam flores com folhagens, porém em razão da
espessura da tinta empregada nessas áreas é muito
Fig. 4. Lourenço da Costa, Vista do forro total com difícil conseguir visualizar por completo o desenho
luz Infravermelho, ca. 1750, têmpera, forro do subjacente, em algumas áreas esse trabalho foi
vestíbulo da sacristia da Igreja da Ordem Terceira de possível, mas não em todo o conjunto.
Nossa Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, São
Paulo (BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya, 2015. As imagens obtidas a partir da técnica de
Fluorescência Visível com radiação de Ultravioleta
(UV).51 Com o uso das imagens de UV foi possível
asseverar que essa pintura nunca havia sofrido
nenhum tipo de restauro, se muito, intervenções
feitas nas taboas para poder ajustá-la, sustenta-la
após a queda de grande parte da primitiva igreja,
mas restauros não ocorreram conclusivamente. Por
toda a extensão do forro não há retoques de
policromia, somente perdas de policromia em
algumas áreas da pintura. Em colorações mais
escuras foi identificado que há uma mistura de
pigmento verde a base de ocre, que o torna um tom
quase preto. Acima da cabeça da Nossa Senhora há
uma perda do material pictórico, mas nenhuma
intervenção de restauro, ali o que se observa é
efetivamente a madeira sem reintegração cromática.

Fig. 5. Lourenço da Costa, Detalhe com luz O excesso de verniz aplicado na obra tornou a área
Infravermelho - Spolvero, ca. 1750, têmpera, forro onde os medalhões foram pintados escurecidos em
do vestíbulo da sacristia da Igreja da Ordem Terceira demasia após a oxidação do material empregado,
de Nossa Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, São impedindo ao olho humano a visão dos detalhes
Paulo (BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya, 2015. desses elementos. Dentre os pigmentos e materiais
empregados identificamos que um dos vermelhos
Nas imagens de IR é possível, também, visualizar os presentes na pintura possui característica de
elementos internos dos medalhões presentes na vermelho de cádmium, pigmento difundido no
obra, cujo conteúdo é constituído por diversos período colonial.
elementos orientalizantes, tal como na igreja de
Nossa Senhora das Neves na cidade de Olinda (PE). E por fim, para uma análise mais abrangente
A utilização de elementos orientalizantes como os empregou-se a técnica da espectroscopia.52

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Dos materiais analisados em laboratório, identificou-


se que o verniz empregado na pintura é “uma resina
alquídica, sintética, e comumente usada em pinturas
à óleo”, o emprego desse verniz, bem como seu
surgimento se deu após a II Guerra mundial.53 Na
amostra do pigmento marrom apurou-se que o
pintor utilizou uma têmpera a cola; na amostra do
pigmento vermelho, embora haja na pintura mais de
um vermelho, um deles foi identificado com
características de vermelho de cádmium e o outro
pigmento vermelho analisado em laboratório
apresenta a estrutura do pigmento pau brasil, este,
foi largamente utilizado pelos pintores no século
XVIII.

Os resultados encontrados e apresentados acima não


deixam dúvidas de que essa pintura tenha sido
executada no período setecentista, de acordo com os
documentos coligidos, uma vez que os pigmentos que
a constituem, assim como a composição permeada
por elementos orientalizantes, fauna, flora e a
linguagem formal da pintura foram elementos
fortemente utilizados e difundidos pelos pintores nos Fig. 6 Lourenço da Costa, Detalhe do medalhão com
forros das igrejas setecentistas.54 elementos orientalizantes- lado direito, ca. 1750,
têmpera, forro do vestíbulo da sacristia da Igreja da
A pintura Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi
das Cruzes, São Paulo (BR), Foto: Elizabeth A. M.
Após a análise dos documentos encontrados no Kajiya, 2015.
Arquivo da Província Carmelitana de Santo Elias na
cidade de Belo Horizonte (MG), no Arquivo
Municipal “Historiador Isaac Grinberg” na cidade de
Mogi das Cruzes (SP) e a análise científica da obra
com lentes especiais é possível afiançar e classificar a
pintura do forro do vestíbulo da Igreja da Ordem
Terceira de Nossa Senhora do Carmo na cidade de
Mogi das Cruzes como um dos mais antigos
exemplares existentes da pintura de caráter barroco
na antiga capitania de São Paulo. Especialmente
quando comparada às demais pinturas existentes na
mesma igreja e na igreja contígua, as quais se
relacionam com composições do início do século
XIX, pinturas mais leves tanto nas cores quanto na
forma.55

A arte da pintura transformou-se com o caminhar


dos anos, essa diferença é notória ao olhar as
pinturas, aí mesmo, na igreja dos terceiros. Pinturas
oitocentistas, forro da nave e capela-mor, em
linguagem estilística totalmente distinta da que se
situa no forro do vestíbulo. Ao aplicar a classificação
proposta para o caso da pintura mineira por Affonso
Ávila nas pinturas dos terceiros do Carmo de Mogi
Fig. 7. Lourenço da Costa, Detalhe do medalhão com elementos
das Cruzes encontraremos a seguinte situação orientalizantes- lado esquerdo, ca. 1750, têmpera, forro do
quanto a tipologia/modelo: a pintura do forro do vestíbulo da sacristia da Igreja da Ordem Terceira de Nossa
vestíbulo é marcadamente da 1º fase, até cerca de Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, São Paulo (BR), Foto:
1755, Elizabeth A. M. Kajiya, 2015.

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[...]a pintura é condicionada pela primitiva intervenções na obra, mas deve-se ressalvar que
disposição dos FORROS em PAINÉIS nenhuma das interferências foi de caráter pictórico.
retangulares ou CAIXOTÕES. [...] as
composições permanecem restritas as Dos exemplares da pintura colonial em São Paulo
dimensões do quadro no qual se inserem,
apresentando sentido pictórico autônomo,
filiadas ao partido adotado por Lourenço da Costa
sem ligação ou fusão plástica de conjunto, em Mogi das Cruzes, com o uso de grotescos e com
apesar de integradas na organização datação mais próxima da primeira metade do século
arquitetônica. São geralmente de caráter XVIII está a pintura da capela da Fazenda Santo
estático e arcaizante, sem profundidade ou Antônio na cidade de São Roque, de meados de 1680
perspectiva na relação de volumes, ou ainda a pintura em caixotões da sacristia ou da
predominando o uso de cores em capela-mor da Igreja do Rosário do Embu, de
tonalidades graves.56 meados de 1700-1740. Diferentemente da pintura do
Embu, marcada por elementos orientais e em
Na pintura do forro do vestíbulo a pigmentação da caixotões, a pintura do forro do vestíbulo dos
obra possui cores mais fortes, “tons mais graves”. terceiros do Carmo em Mogi e a do forro da nave da
Quanto à visão central, nota-se ser possível extraí-la capela de Santo Antônio em São Roque estão libertas
do forro, tal qual um quadro, sem prejudicar o de painéis, pintadas sobre tábuas.
exterior à sua volta, as volutas da moldura do quadro
tocam a base da moldura exterior que se desenvolve Embora, nem mesmo a pintura da capela de Santo
por todo o forro, porém o artista não as entrelaçou. Antônio seja da mesma tipologia que a do forro do
vestíbulo em Mogi das Cruzes, pois o quadro central
não se entrelaça por meio de enrolamentos que
ornamentam todo o forro, há uma moldura retilínea
que estabelece a dinâmica da obra. Salomão e
Tirapeli59 relacionam o forro do vestíbulo com a
pintura do teto da sacristia do convento Nossa
Senhora das Neves, em Olinda.

A composição apresenta no quadro central uma das


visões mais recorrentes nas representações
Carmelitas, Nossa Senhora com o menino no colo
entregando o escapulário à São Simão Stock. Da cena
representada não permanece dúvida quanto ao
motivo iconográfico, pois a imagem congrega em si
todos os atributos reconhecíveis na hagiografia de
Simão Stock e do momento em que o Santo teve esta
visão.

São Simão Stock é responsável por iniciar uma das


maiores devoções da doutrina carmelita: o
escapulário. A cena pintada ilustra a visão que Simão
Fig. 8. Lourenço da Costa, Detalhe do desenho subjacente, ca.
teve após inúmeras orações pedindo auxílio de Nossa
1750, têmpera, forro do vestíbulo da sacristia da Igreja da Ordem Senhora, a qual apareceu para Simão e lhe entregou
Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, São Paulo o escapulário, objeto de salvação à todos aqueles que
(BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya, 2015 o utilizassem.

Quanto a decoração interna está a pintura filiada a Na representação do quadro (Fig. 9) Nossa Senhora
tipologia dos brutescos ou grotescos,57 segundo do Carmo aparece sentada no trono sobre um balcão
Salomão e Tirapeli “é uma pintura que segue a duplo em pedra, ao colo segura com a mão esquerda
tradição dos tetos de sacristias, desde os brutescos ou o menino Jesus enquanto a destra entrega o
ramículos das construções jesuíticas até a observação escapulário à São Simão Stock. A santa traja o hábito
aguda dos artistas franciscanos, que traziam os dos Carmelitas que cai por sobre suas pernas numa
elementos vivos da natureza brasileira”.58 movimentação suave, formando um grande volume
de panejamento próximo à seus pés que estão
A pintura do forro do vestíbulo é muito cara ao ciclo apoiados sobre um almofada vermelha. Acima de sua
da pintura paulista colonial, sendo um dos poucos cabeça somente nuvens aparecem na cena.
exemplares preservadas e íntegros em sua
composição, de meados de 1750, houveram poucas

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São Simão Stock por sua vez aparece ajoelhado Lourenço da Costa pinta uma faixa que remete à uma
diante de Nossa Senhora no momento em que recebe grande moldura em tons marrons na parte mais
da mão desta o escapulário do Carmelo. Seus olhos externa da obra, toda desenhada, nos cantos insere
admiram o amor diante de si, a Virgem com o folhagens que se entrelaçam à moldura. No interior
Menino Jesus no colo, suas mãos se elevam na ele estabelece uma espécie de cartela geométrica ou
direção do sagrado manto que lhe é depositado em moldura que percorre todo o espaço interior,
socorro às aflições dos carmelitas. Próximo ao santo, formando com essa moldura em tom azul e vermelho
na parte inferior há um livro vermelho e um ramo de uma espécie de degrau.
açucena, ambos os objetos são frequentemente
representados nas artes visuais como atributos de No momento em que essa moldura sobe, na área
São Simão Stock. central,60 ela é ornada com enrolamentos que saem
da base e findam na camada superior, destes
enrolamentos em “C” com volutas nas pontas
surgem outros entrelaçamentos que se desenvolvem
por cima da moldura retilínea.

Em nível inferior criado ao lado o artista posiciona


vasos de porcelana (Fig. 10 e 11) com naturezas
mortas, recheado de frutas, e aí percebemos uma
dificuldade técnica do pintor, em inserir um
elemento curvo com profundidade na moldura
retilínea que circunda o forro, essa dificuldade é
notória nos quatro vasos existentes nos “degraus”
onde foram posicionados. A diferença entre os vasos
está no tipo das frutas dispostos e nas pequenas e
delicadas flores pintadas junto às frutas.

Quando a moldura avança para a transversal ela


quase desaparece, por trás de uma grande cartela,
que no interior tem os motivos orientalizantes, o
artista aí cria um jogo, pois esta cartela não dialoga
com seu par que está em frente nem ao lado, os
motivos desta são inseridos na cartela situada em sua
diagonal, e como os elementos estão muitos
escurecidos foi a utilização da imagem Infravermelho
que nos permitiu perceber essa peculiaridade.
Fig. 9 Lourenço da Costa, Detalhe do quadro central com luz
Visível, ca. 1750, têmpera, forro do vestíbulo da sacristia da Igreja
da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, Sendo assim, dois foram preenchidos com uma
São Paulo (BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya, 2015. espécie de rendilhado, onde todos os elementos
disformes são interligados por um fio, no par
Atrás de São Simão Stock o pintor representou uma diametralmente oposto os motivos são
balaustrada que é interrompida pela moldura do orientalizantes, com a presença de ramículos,
quadro central, tal qual uma cercadura entalhada na folhagens e pássaros voando, tal qual ocorrerá nos
madeira, desta nascem folhas de acanto enroladas grandes medalhões octogonais internos.
finalizando em pequenas volutas, criando um jogo de
volumes para dentro e para fora por toda a volta do As cartelas avançam para dentro da moldura com
quadro central. uma coloração marrom, em sua volta se desenvolvem
enrolamentos terminados em volutas em formato de
Na área inferior e superior da cercadura da visão “C”, na área superior se desdobram formando
central o artista inseriu uma tímida rocalha. No espaços côncavos, ainda em forma de “C”, que se
restante do forro foram representados diversos estende para além da moldura maior e perdendo-se
elementos antropomórficos e fitomórficos. Há por debaixo da espessa camada de tinta.
diversos animais como tucanos, papagaios, cobra e
outros pássaros, assim como muitos frutos como a Na parte inferior da cartela as folhagens se
maça, uva, caju, etc. desenvolvem no sentido inverso e do centro das
A composição do forro é simétrica, com exceção dos volutas nascem festões carregados de frutas que se
animais, que não foram repetidos, havendo somente entrelaçam por toda a extensão do taboado,
um exemplar de cada, posicionados simetricamente.

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interligando os medalhões triangulares aos rocalhas que findam em volutas e terminam em


ornamentos centrais. folhagens ou enrolamentos.

Fig. 11. Lourenço da Costa, Detalhe da perspectiva do vaso em


ultravioleta, ca. 1750, têmpera, forro do vestíbulo da sacristia da
Igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi das
Cruzes, São Paulo (BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya, 2015.

Nos espaços vazios entre os ornamentados


medalhões octogonais, a visão central e a moldura
Fig. 10. Lourenço da Costa, Detalhe com elementos fitomórficos e falseada do forro o artista inseriu ramos de
antropomórficos, ca. 1750, têmpera, forro do vestíbulo da sacristia
da Igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi diferentes flores carregados por aves, envolto em
das Cruzes, São Paulo (BR), Foto: Danielle M. S. Pereira, 2012, uma serpente ou livres no espaço.
2015
Na análise da pintura do forro do vestíbulo da
Dessa forma, Lourenço da Costa conseguiu inserir sacristia, cabe por fim, explanar que há uma
diversos motivos e relacionar todos eles, formando repintura que destoa do restante do forro, um
uma moldura dentro da outra sucessivamente até pequeno espaço retangular fora pintado de vermelho,
alcançar o momento mais importante de sua obra, onde fora inserido uma espécie de medalhão preto
direcionar o olhar do observador à visão celeste da pintado no centro do retângulo vermelho (Fig. 12).
Virgem em uma das cenas mais significativas para o
Carmelo. Das prospecções empreendidas sobre esta
(re)pintura identificamos que essa pintura ocorreu
No interior dos medalhões octogonais (Fig. 6 e 7) o quando o cômodo era utilizado como sacristia e o
pintor também utilizou motivos orientalizantes, espaço pintado/repintado era o local onde ficava um
assim como nas cartelas, com poucas diferenças retábulo de mesma coloração, o qual fora localizado e
entre ambos, ele secciona cada uma das partes do pertence ao acervo do Museu das Igrejas do Carmo
octógono e nas oito fatias insere um motivo, são de Mogi das Cruzes.
folhagens, pássaros com folhagens na boca e
pagodes. Os medalhões são ricamente ornados com
uma formação retilínea que é preenchida com

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Fig. 12. Lourenço da Costa, Detalhe da (re)pintura no forro, ca. 1750, têmpera, forro do vestíbulo da sacristia da Igreja da Ordem
Terceira de Nossa Senhora do Carmo, Mogi das Cruzes, São Paulo (BR), Foto: Elizabeth A. M. Kajiya, 2015.

Considerações finais português? Teria vindo da cidade de Santos somente


para “embelezar” a igreja dos Terceiros por conta das
A busca pela autoria da pintura mostrou-se festividades do V Centenário do Santo Escapulário de
plenamente satisfatória, encontramos o nome do Nossa Senhora do Carmo conforme as indicações de
artista na documentação pesquisada e avançamos Frei Timotheo Van den Broek?61
encontrando seu nome circulando na cidade de Mogi
das Cruzes no período asseverado para fatura da Seria o artista mestre do famoso pintor Jesuíno do
obra, meados de 1750. Monte Carmelo, como, também, indica o frei
carmelita? Entretanto, não é possível, articular que
As análises científicas corroboram com a nossa Lourenço da Costa, pintor do forro do vestíbulo da
aproximação para datação da obra, que sacristia da Ordem Terceira de Nossa Senhora do
possibilitaram visualizar o emprego dos elementos Carmo em meados de 1750, fora mestre de algum
internos constituintes dos medalhões octogonais com outro pintor reconhecido em São Paulo.
motivos de porcelanas chinesas, o preenchimento
pictórico completo do espaço do forro, melhor São muitas as perguntas e poucas as respostas, até
apreciação e definição das cores mais fortes com tons aqui quase nada se apurou sobre a trajetória de
terrosos, os pigmentos identificados largamente Lourenço da Costa, autor da pintura do forro do
utilizados no período colonial, enfim, as técnicas vestíbulo da Igreja da Ordem Terceira de Nossa
empregadas afiançam que essa pintura tenha sido Senhora do Carmo de Mogi das Cruzes, exceto os
executada ainda na primeira metade do século XVIII. dados encontrados entre os anos de 1750 a 1754,
A fusão entre documentos, análises científicas e após essa data o nome de Lourenço da Costa
análise formal da composição permitem afirmar com desaparece dos lançamentos de foros da Câmara de
segurança essa pintura como obra do pintor Mogi das Cruzes e também dos livros históricos dos
Lourenço da Costa, realizada nos idos de 1750. Carmelitas da Ordem Primeira e Terceira.

Diante dos elementos empregados pelo pintor Esperamos com os dados recém encontrados e
Lourenço da Costa, nota-se ser ele um homem disponibilizados mover outros pesquisadores à
bastante erudito por empregar elementos simbólicos necessidade de buscar mais informações a respeito
e ainda outros não tão usuais na antiga capitania de do pintor, sua origem, trajetória e quiçá outros
São Paulo, como os elementos orientalizantes, porém trabalhos do mestre, o qual para a história da arte
nada sabemos a respeito de Lourenço da Costa, além nacional e também da pintura é novo e
dos dados encontrados sobre sua permanência em desconhecido.
Mogi das Cruzes enquanto trabalhava para os
carmelitas, para a Câmara e como foreiro desta. Com esse ensaio ambicionamos, também, ser o ponto
de partida para maior aprofundamento na leitura da
Ao identificar a autoria de Lourenço da Costa como imagem, no tocante a iconografia, que sabemos ser
pintor do forro do vestíbulo da sacristia dos terceiros importante, porém não foi nosso objetivo realizá-lo
do Carmo em Mogi das Cruzes outros problemas se em tão poucas linhas, trata-se de trabalho de grande
colocam, tais como o nome de Lourenço da Costa fôlego, no qual há que se ler o quadro central da
(pintor) ou Lourenço da Costa de Macedo, nome que pintura, com a imagem consagrada da devoção
não consta da literatura a respeito da pintura carmelita da Entrega do escapulário, relacionando-o
paulista colonial. Diante desse cenário de anonimato com todos os elementos empregados na moldura que
inúmeras indagações são necessárias para que se se projeta à sua volta.
proceda à uma história da pintura paulista
efetivamente, qual seria a origem do pintor? Seria ele

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Por fim, observo que o artigo produzido abre muitas


outras possibilidades a partir da pesquisa inicial um capítulo sobre a pictórica de Padre Jesuíno na pintura
empreendida, a qual buscava tão somente a autoria paulista. Além dos trabalhos mencionados sobre a pintura
da obra e sua datação, o objetivo fora alcançado, paulista há ainda diversos textos dos mesmos autores e de
especialmente no cenário da carestia de informações outros que apresentam aspectos específicos de cada obra
da qual padece a pintura paulista colonial, com isso, ou artista. Como os inúmeros trabalhos sobre a arte sacra
foi-nos possível escrever mais uma linha na pesquisa em são Paulo de Carlos Gutierrez Cerqueira, historiador da
9 SR/ IPHAN, que podem ser consultados em:
embrionária da história da pintura colonial no estado https://sites.google.com/site/resgatehistoriaearte/. Entre
de São Paulo. outros textos e artigos apresentados em congressos e
simpósios.
6 Danielle Manoel dos Santos Pereira, A pintura ilusionista

Notas no meio norte de Minas Gerais – Diamantina e Serro – e


em São Paulo – Mogi das Cruzes (Brasil), Dissertação
(mestrado), Instituto de Artes, Universidade Paulista
1 Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira, “A pintura de “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, 2012.
perspectiva em Minas colonial”, em Barroco teoria e 7 Myriam Salomão e Percival Tirapeli, “Pintura colonial...”,
análise, São Paulo, Perspectiva; Belo Horizonte, art.cit., p. 114.
Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, 1997.
8Entrevista do restaurador Júlio Eduardo Correa de
2 Carlos Del Negro, Nova Contribuição ao estudo da Moraes, concedida à autora em 23 de maio de 2008.
pintura mineira: Norte de Minas,Rio de Janeiro, IPHAN,
1978. 9 Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira, “A pintura de
perspectiva...”, art.cit.
3Fernando Correia Dias, “A redescoberta do barroco pelo
Movimento Modernista”, em Barroco, Belo Horizonte, 10Myriam Salomão e Percival Tirapeli, “Pintura colonial...”,
UFMG, 1972, n. 4. art.cit.
4Mario de Andrade, Padre Jesuíno do Monte Carmelo, Rio 11Manoel do Sacramento em 1801 executou a pintura do
de Janeiro, Ministério da Educação e Saúde – SPHAN, forro da nave da igreja, enquanto Antonio dos Santos foi o
1945. responsável pela pintura do forro da capela-mor em
meados de 1814.
5 Sobre a pintura paulista colonial contamos com o estudo
elaborado por Mário de Andrade (1945), op. cit. sobre o 12 Dados disponíveis no site da prefeitura de Mogi das
Padre Jesuíno do Monte Carmelo, o qual apresenta Cruzes. Acesso em mai 2016.
também obras de José Patrício da Silva Manso, mas o http://www.mogidascruzes.sp.gov.br/desenvolvimento/loc
enfoque da pesquisa está na pessoa de Jesuíno do Monte alizacao.php
Carmelo; em Percival Tirapeli e Myriam Salomão, “Pintura
colonial paulista”, em Arte Sacra Colonial: barroco 13Emilio A. Ferreira, Mogy das Cruzes: dados históricos e
memória viva, São Paulo, UNESP, 2005; teremos uma notas diversas – 1611-1935, [s.l:s.n], 1935.
visão mais próxima do conjunto da pintura paulista
colonial, e há alguns outros textos (em outras publicações) 14 Dom Duarte Leopoldo da Silva, Notas de história
dos mesmos autores sobre aspectos da pintura paulista.; ecclesiástica, São Paulo, Empresa Graphica da “Revista
Maria Lucília Viveiros Araújo “O mestre pintor José dos Tribunaes”, 1937.
Patrício da Silva Manso e a pintura paulista do Setecentos”
Dissertação (mestrado em Artes). Departamento de Artes 15Isaac Grinberg, História de Mogi das Cruzes, São Paulo,
Plásticas, USP, São Paulo, 1997 – a autora estabelece a Saraiva, 1961, p. 22.
trajetória do pintor, buscando ainda agrupar as obras do
artista; Eduardo Tsutomu Murayama, A pintura de 16 Idem.
Jesuíno do Monte Carmelo na Igreja da Ordem Terceira
do Carmo de são Paulo, Dissertação (Mestrado em Artes). 17Celso Furtado, Formação Econômica do Brasil, São
Instituto de Artes, UNESP, São Paulo, 2010 – apresenta as Paulo, Companhia das Letras, 2007, p. 124.
pinturas de Jesuíno na Igreja dos Carmelitas,
especificamente tratando das transformações pós restauro; 18Isaac Grinberg, História de Mogi das Cruzes..., op. cit.
Maria Lucia Bighetti Fioravanti. A pintura franciscana dos
séculos XVIII e XIX na cidade de São Paulo: fontes e 19 Dom Duarte Leopoldo e Silva, Notas de história..., op.
mentalidades, Dissertação (mestrado), USP, São Paulo, cit.
2007 – a autora dá um panorama completo da pintura dos
franciscanos, em seu trabalho inclui a Igreja da Ordem 20 Jurandyr Ferraz de Campos, Suma histórica da
Primeira e Terceira de São Francisco de São Paulo e ainda venerável Ordem Terceira do Carmo de Mogi, Mogi das
as pinturas do Convento da Luz; Elza Ajzemberg, “Padre Cruzes, Murc Editora Gráfica, 2004.
Jesuíno do Monte Carmelo” em Igrejas Paulistas: barroco
e rococó, Percival Tirapeli (Org.), São Paulo, UNESP ; 21Myriam Salomão e Percival Tirapeli, “Pintura colonial...”
Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2003 - apresenta op. cit.

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22Aracy Amaral, “Da terra: madeira e barro como suporte 37 Jurandyr Ferraz de Campos, Suma histórica da
para a cor e o ouro”, Barroco: teoria e análise, São Paulo, venerável..., op. cit., p. 14. Embora nos estudos de Mario
Perspectiva, 1997, p. 282. de Andrade (1945) sobre o Padre Jesuíno do Monte
Carmelo não haja nenhuma referência ao nome Lourenço
23 Myriam Salomão e Percival Tirapeli, “Pintura da Costa. Mário de Andrade pesquisou a vida e a obra do
colonial...”, art.cit. mestre Jesuíno do Monte Carmelo (ou Jesuíno de Paula
Gusmão, nome de batismo, antes de sua ordenação como
24 Danielle Manoel dos Santos Pereira, A pintura padre), contudo em seu livro publicado sobre o padre
ilusionista..., op. cit. pintor, Mário de Andrade não faz nenhuma referência ao
25Julio Eduardo Correia de Moraes, JULIO MORAES nome Lourenço da Costa, tampouco como mestre de
conservação e restauro SCL. Relatório Técnico de Jesuíno. O nome que aparece como mestre de Jesuíno é o
Restauro: altar-mor da Igreja da Ordem Terceira do do pintor José Patrício da Silva Manso, relação que tem
Carmo, Mogi das Cruzes, SP, São Paulo, 2005. sido revista pela historiografia, uma vez que só há certeza
da relação de compadrio entre Jesuíno e José Patrício,
26 Ibídem. conforme podemos apreender em Maria Lucília Viveiros
Araújo, O mestre pintor José Patrício da Silva Manso e a
27 Entrevistas de Júlio Eduardo Correa de Moraes e pintura paulista dos setecentos, Dissertação de mestrado,
Elizabeth Alfredo de Mattos Kajiya, concedidas à autora São Paulo: Universidade de São Paulo, 1997 ou em Carlos
em abril de 2015. Gutierrez Cerqueira, José Patrício da Silva Manso (1740-
1801): um pintor colonial paulista restaurado. São Paulo:
28 Jurandyr Ferraz de Campos, Suma histórica..., op. cit. 9º SR/IPHAN, 2007.
Jurandyr Ferraz de Campos informa que este Livro de
Receitas e Despesas estende-se até meados do ano de 1824, 38Todos os documentos citados (a respeito de Lourenço da
porém ao estudar o material notamos que várias páginas Costa) encontram-se no Arquivo da Província Carmelitana
não existem mais, tanto no final do livro quanto no início e de Santo Elias e os que se referem às cópias de livros da
está sem capa. Logo é cabível que Campos tenha tido Câmara Municipal foram localizados os originais no
contato com os anos finais do livro, sobretudo porque o Arquivo Municipal de Mogi das Cruzes “Historiador Isaac
próximo livro é iniciado ao término do ano anterior, ou Grinberg”.
seja, o ano de 1824. Entretanto, adota-se a datação de 1818
como período final, por ser o que resta do documento, a 39Belo Horizonte, Arquivo da Província Carmelitana de
fim de evitar afirmações equivocadas. Santo Elias..., op. cit.
29Desconhece-se qualquer outro arquivo ou repositório 40 Segundo Maria Helena Flexor “Os pintores, além das
que possua documentos da Ordem Terceira de Nossa obras tradicionais de pintura, encarnavam, ou estofavam,
Senhora do Carmo de Mogi das Cruzes, São Paulo. como se dizia então e, tanto pintavam e douravam
imagens, quanto as talhas, molduras de painéis, retábulos,
30 Belo Horizonte. Arquivo da Província Carmelitana de emblemas, urnas, grades, interior de arcas, preparavam
Santo Elias. Cidade: Mogi das Cruzes. Monumento: Igreja e andores para procissões, figuras, pendões, tochas,
Convento do Carmo. Dados históricos e notas diversas, restauravam pinturas, douravam ou prateavam castiçais,
1611-1935; Bens Urbanos; Desenhos do Terreno; Livro: cimalhas, sanefas, jarrinhas, cujas bases tinham sido feitas
Tombo, 1629; Livro: Receita e despesa, 1749-1768; pelo escultor”. Maria Helena Flexor, “Estudo da escultura
Documentos avulsos: maço irmandades. Seção: Mogi das setecentista baiana: questões de autoria”, em Patrimônio
Cruzes. Sacro na América Latina, Percival Tirapeli (org.), São
Paulo, Arte Integrada, UNESP, Instituto de Artes, FAU-
31 Idem. USP, Faculdade de São Bento de São Paulo, 2015, p. 169.
32 Idem. 41A cópia do Livro da Câmara Municipal nos parecia um
documento aparentemente sem importância, pois contém
33 Danielle Manoel dos Santos Pereira, A pintura lançamentos de foros e foreiros, mas seu conteúdo revelou-
ilusionista no meio-norte..., op. cit., p. 128. se salutar na busca por dados de Lourenço da Costa.
34 Belo Horizonte. Arquivo da Província Carmelitana..., op. 42 Não compreendemos a razão da existência desse livro no
cit. Arquivo Central dos Carmelitas, mas a presença dele e seu
conteúdo são sobremaneira importantes para a explanação
35 Idem. feita. No original há assinaturas de Lourenço da Costa ou
Lourenço da Costa de Macedo.
36A mudança de nome/função do cômodo ocorreu e ocorre
em conformidade com as necessidades da Irmandade, que 43Belo Horizonte, Arquivo da Província Carmelitana de
adequa os espaços às suas necessidades. Portanto, o Santo Elias, op. cit.
cômodo que atualmente nomeiam por vestíbulo, há alguns
anos atrás era a sacristia, como se comprovou durante a
análise da pintura.

Pintura setecentista na igreja da ordem terceira de Nossa Senhora do Carmo em Mogi das Cruzes (SP – Brasil) – Danielle
Manoel dos Santos Pereira

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44Frei Adalberto Ortmann, O.F.M., História da antiga através de suas bandas típicas de absorção de
capela da Ordem Terceira da Penitência de São Francisco infravermelho. Espectroscopia FT-IR pode ser aplicado
em São Paulo. Rio de Janeiro, DPHAN, 1951. para a caracterização qualitativa dos materiais, bem como
para a sua quantificação. Essas análises foram efetuadas
45 Levantamento fotográfico da obra pictórica realizado em caráter demonstrativo para conhecer a potencialidade
entre os meses de março à abril de 2015, custeado com do equipamento e responder algumas questões. Foram
recursos da Reserva Técnica de Bolsas da Fundação de recolhidas 06 micro-amostras). Se faz necessário mais
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP. análises in loco.” Elizabeth Kajiya, Relatório Técnico..., op.
cit, p .25.
46Elizabeth Kajiya, Relatório Técnico: análise científica da
pintura do forro do vestíbulo da Igreja da Ordem Terceira 53Ibídem.
de Mogi das Cruzes, São Paulo, 2015, p. 3. 54 Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira, “A pintura de
47 Ibídem, p 9. perspectiva...”, art.cit. Ver também: Myriam Andrade
Ribeiro de Oliveira, “A pintura de perspectiva em Minas
48 Ibídem, p.10. Aqui o spolvero fora aplicado numa Colonial – Ciclo Rococó”, en Barroco teoria e análise, São
superfície de madeira. Paulo, Perspectiva; Belo Horizonte: Companhia Brasileira
de Metalurgia e Mineração, 1997.
49 O uso dos elementos orientalizantes em São Paulo
corrobora com a datação na medida em que a pinturas do 55 Danielle Manoel dos Santos Pereira, A pintura
início do XIX não possuem tais elementos, cuja tipologia ilusionista..., op. cit.
adotou o modelo de quadro recolocado ou simplesmente a
visão central (Oliveira, 1997). Neste sentido, o uso dos 56 Affonso Ávila et. al., Barroco mineiro Glossário de
elementos orientalizantes na pintura do forro do vestíbulo arquitetura e ornamentação, São Paulo, Melhoramentos,
da sacristia agrega valor à datação aventada. Mas, é sabido 1980, p. 166.
que o uso de chinoiserie se prolonga inclusive no rococó,
especialmente na França, contudo a manutenção de estilos
na colônia ocorre em datação diversa da metrópole. 57 Sobre as pinturas de brutesco ver Vitor Serrão, “A
Segundo Alvaro Samuel Guimarães da Mota, “a presença pintura de brutesco do século XVII em Portugal e as suas
das chinoiseries e de objectos importados orientais como repercussões no Brasil”, em Barroco, Belo Horizonte,
apropriações do Barroco no século XVII, sobretudo a partir UFMG, 1992, n. 15, p. 113-134.
da sua segunda metade, ao seu entrosamento com o rococó
durante o século XVIII e avança cronologicamente na 58Myriam Salomão e Percival Tirapeli, Pintura colonial
manutenção de um gosto chinês no século XIX, num paulista..., op. cit., p. 114.
contexto já não europeu mas americano. [...] A
compreensão, no século XVIII, não de uma mas de várias 59 Idem.
estéticas, é fundamental para a relação das variadas formas
pictóricas e arquitectónicas e é incontornável quando se 60 O mesmo ocorre na horizontal e vertical.
analisam as formas de ornamento, em íntima associação
com a produção dos modelos, tipos e ornatos decorativos 61Jurandyr Ferraz de Campos, Suma histórica..., op. cit., p.
de chinoiserie”, Alvaro Samuel Guimarães da Mota, 14
Gravuras de chinoiserie de Jean-Baptiste Pillement.
volume I – texto. Dissertação (mestrado de História de
Arte), Universidade do Porto, Faculdade de Letras, Porto, ¿Cómo citar correctamente el
1997, pp. 19-25. presente artículo?
50 Beatriz Ramos de Vasconcellos Coelho, “O desenho
subjacente na pintura de Manoel da Costa Ataíde”, Manoel dos Santos Pereira, Danielle;
Barroco, Belo Horizonte, UFMG, 1993/6, n. 17. “Pintura setecentista na igreja da orden
terceira de Nossa Senhora do Carmo em
51 “[...]é uma técnica fotográfica em que é registrada a
fluorescência gerada pela radiação UV que incide na Mogi das Cruzes (SP – Brasil)”. En caiana.
pintura. Nas medidas UV realizadas utilizam-se dois feixes Revista de Historia del Arte y Cultura
de luz UV, de vapor de mercúrio de 125 W cada, e um filtro Visual del Centro Argentino de
acoplado à lente em uma câmera digital num ambiente
escuro. Investigadores de Arte (CAIA). No 8 | 1er.
A técnica fotográfica sob a excitação de luz ultravioleta, semestre 2016, pp. 105-210
fornece informações sobre as áreas retocada ou áreas
recém-pintada, camadas de verniz e sobre a natureza de
certos pigmentos empregado na pintura.” Elizabeth Kajiya, Recibido: 29/01/2016
Relatório Técnico..., op. cit., p .19. Aceptado: 02/05/2016
52 “[...] O espectrómetro ALPHA diamante analisa as
estruturas e componentes moleculares, são identificados

Pintura setecentista na igreja da ordem terceira de Nossa Senhora do Carmo em Mogi das Cruzes (SP – Brasil) – Danielle
Manoel dos Santos Pereira

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