Professional Documents
Culture Documents
RIO DE JANEIRO
2012
Murilo Neves Almeida
2012
Murilo Neves Almeida
________________________
Professora Doutora Maria José Chevitarese – UFRJ.
________________________
Professor Doutor Sérgio Álvares – UFRJ.
________________________
Professora Doutora Luciana Requião – UFF.
Suplentes:
_________________________________________________
Professor Doutor Marcus Nogueira – UFRJ.
_______________________________________________________
Professora Doutora Laura Rónai - UNIRIO
Aos meus pais, Luiz Mauro Garcia Almeida e Glória Regina Neves Almeida, que não só
me apoiaram e me ajudaram ao longo da minha trajetória, mas sempre me incentivaram
a levar os estudos ao mais alto grau possível.
À Professora Mestre Heliana Farah, pelo apoio incansável e incondicional, e por ter não
só disponibilizado sua fantástica biblioteca mas por ter também contribuído – muito! –
para o crescimento da minha própria.
À Professora Doutora Maria José Chevitarese, minha muito querida orientadora que
com muita paciência e dedicação aceitou me conduzir nesta viagem.
Ao Professor Marcos Menescal, grande amigo e guru, que me ensinou tanto do que eu
sei hoje sobre ópera e sobre vozes, e que gentilmente deu sua valorosa contribuição à
minha pesquisa.
Ao Professor Licio Bruno, querido mestre e amigo, presente na minha vida pela metade
dos meus anos corridos, que tanto me estimulou e inspirou e que deu sua contribuição a
À Professora Ilza Corrêa, sem dúvida uma das pessoas que mais ama e conhece ópera
que eu já conheci na vida, que com sua experiência me ajudou a descobrir minha
verdadeira voz e com sua energia inesgotável muitas vezes me tirou da cama para me
obrigar a ter aulas, além de contribuir nesta pesquisa com o relato de sua experiência.
Ao Professor Doutor Sérgio Álvares, por tudo o que me ensinou sobre Educação, por
fazer parte das minha bancas de Qualificação e de Defesa, e por ter me aguçado o
interesse pelas questões psicológicas e filosóficas que envolvem o processo de ensino e
aprendizado.
Ao Professor Doutro Marcelo Verzoni, pela sua valiosa participação na minha banca de
Qualificação, e por ter, nas disciplinas com ele cursadas, ao longo de exposições sobre
arte, história, filosofia e sociologia, me ajudado a conectar o pensamento acadêmico ao
artístico.
Aos meus queridos alunos, pela confiança que me depositam todos os dias, pela
compreensão por tantas aulas desmarcadas em função desta pesquisa, e por terem me
ajudado, em tantos níveis diferentes, a esclarecer muitas das questões apresentadas nesta
pesquisa.
“Mestre não é quem sempre ensina, mas
quem de repente aprende.”
(Guimarães Rosa)
RESUMO
ABSTRACT
This research has it srcin in the question: is it possible to determine which aspects of
the voice are to be observed in order to make a correct and secure classification? And, if
the aspects are determined, is it possible to define the parameters under which these
aspects are to be observed? In the universe of music pedagogy the teaching of singing
shows peculiarities that much distinguishes it from the teaching of instruments, and
vocal classification is one of this peculiarities. Through the observation of an assorted
bibliography including works on vocal technique, pedagogy and psychology, our intent
is to provide tools for student and teachers to feel secure in the observation of the voice
as an instrument, and may eliminate possible doubts on classification. Throughout the
research we study theories on Education dialoguing with Vocal Pedagogy, the physical
and vocal characteristics to be observed in the process of classification, and also discuss
the influence of the Fach system on the teaching and learning of classical singing. At
the end of the research, we have small interviews made with five voice teachers, in
order to illustrate the dissertation with the experience of the interviewed.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 11
O ENSINO DE CANTO 21
.1 Tendências pedagógicas 23
.2 O ensino/ aprendizado de canto lírico 31
.3 O papel do professor 34
2 A CLASSIFICAÇÃO VOCAL 44
2.1 Meios para classificar uma voz 45
2.2 As características físicas 46
2.3 Timbre 48
2.4 Extensão 52
2.5 Tessitura 55
2.6 Registração 56
3 OS TIPOS VOCAIS 62
.1 Soprano 65
.2 Meio-soprano 67
.3 Contralto 72
.4 Tenor 74
.5 Barítono 77
.6 Baixo 81
Considerações 83
4 AS SUBCLASSIFICAÇÕES E O SISTEMAFACH 85
4.1 Soubrette 89
4.2 Soprano ligeiro 91
4.3 Soprano coloratura 92
4.4 Soprano lírico 94
4.5. Soprano spinto 96
4.6 Soprano dramático 99
4.7 Zwischenfach 102
4.8 Meio-soprano coloratura 103
4. 9 Me io -s op ra no lí ri co
104
INTRODUÇÃO
1 If the scale, power, quality, and compass of the human voice were established as are those of the piano,
the great problem in the training of a singer would be much simplified, possibly eliminated; but the singer
must form the pitch, power, and quality of each tone as he uses it.
!
Giovanni Battista Mancini (1714-1800), italiano, célebre cantor castrato e professor de canto. Autor do
livro Pensieri, e riflessioni pratiche sopra Il canto figurato, um dos mais importantes tratados de canto do
século XVIII.
personalidade do indivíduo, e ainda pelos fatores sociais que formam essa
personalidade. Uma pessoa que desenvolve um trabalho comunicativo direto com o
público provavelmente tenderá a cuidar mais da dicção e da projeção da voz do que uma
que realize um trabalho mais silencioso, por exemplo. Some-se a isso o fato de que cada
ser humano, além de um timbre particular, traz ainda características de fala decorrentes
de aspectos de personalidade (uma pessoa tímida tenderá a falar mais baixo, por
exemplo, do que uma mais desenvolta) e culturais (sotaques, emissões diferenciadas por
identificação de grupo) e temos uma fonte inesgotável de possíveis problemas
decorrentes do processo de reconhecimento da própria voz por parte do aluno. Titze
(2000) diz que “certos padrões habituais de fala podem influenciar a classificação
normal. Aqueles que cresceram acostumados a falar com sons doces e suaves podem se
sentir desconfortáveis fazendo sons que parecem (para eles) gritos desenfreados.” 3
(TITZE, 2000, p. 191)
Quando falamos especificamente de ópera, o caso é ainda mais complexo devido
à distribuição dos papéis pelas diferentes classificações. A associação que beira o
inconsciente (instaurada pela tradição operística do repertório habitual através dos
séculos) do uso das vozes agudas (soprano e tenor) para o casal mocinho/ mocinha da
história e do uso das vozes graves para personagens mais velhos e solenes, por exemplo,
é suficiente para que um estudante neófito experimente uma profunda decepção ao
constatar que, com sua voz, não poderá fazer os papéis que gostaria. Parece ser uma
questão simples de adequação de objetivos por parte do aluno, mas pode se tornar um
grande problema para aquele que aspira a uma carreira. Muitas vezes um indivíduo vai
estudar canto por se identificar com o repertório de tenor, por exemplo, e sofre grande
frustração quando o professor lhe classifica como barítono, ou baixo. Assim, podem ter
início muitos problemas de aceitação vocal que atrasam – quando não impossibilitam –
o desenvolvimento técnico do aluno e o processo de formação da voz lírica.
3 [...] certain habitual speech patterns may influence normal classification. Those who have grown
accustomed to speaking in soft and mellow tones may feel uncomfortable making sounds that appear (to
them) like unrestrained shouts.
Hines4 (1984) relata um interessante trecho da entrevista a ele concedida pelo
célebre baixo italiano Bonaldo Giaotti (1932 - )
No dia de sua primeira aula ele voltou para casa com a notícia de que era um
tenor e esperava em breve estar cantando tudo, de Rodolfo a Radames. No
dia de sua segunda aula foi dito que ele na era, verdade, barítono. Ele e sua
família rapidamente adaptaram-se à idéia de vir a se tornar um grande Iago
ou Rigoletto. No dia de sua terceira aula foi dito que ele era baixo!
“Eu chorei”, 5ele disse. Sendo um baixo, eu entendi perfeitamente. (HINES,
1984, p. 127)
O professor tem, portanto, grande participação nisso. Ele deve ser o condutor do
processo, e a relação do aluno com a própria voz vai certamente depender em boa parte
da forma como seu professor conduz as aulas. Vennard7 (1967) diz:
#
Jerome Hines (1921-2003), baixo norte-americano, notável também por sua pesquisa no campo da
técnica vocal. Autor dos livros Great singers on great singing (1982) e The four voices of men (1997).
5 The day of his first lesson he returned home with the news that he was a tenor and he hoped soon to be
singing everything from Rodolfo to Radames. The day of his second lesson he was told that he was a
baritone instead. He and his family quickly adjusted to that with the thought of his becoming a great Iago
or Rigoletto. The day of his third lesson he was told that he was a bass!
“I cried”, he said. Being a bass, I understood perfectly.
6 A teacher can help this situation by impressing upon the student the advantages of forgetting
classification until his vocal technique has become secure in a comfortable range.
7William Vennard (1909-1971), professor de canto norte-americano, um dos mais influentes autores em
pedagogia vocal do século XX. Foi professor na University of Southern California e membro da National
Association of Teachers of Singing, da qual foi também presidente.
Há a dificuldade fundamental do fato de que o vibrador, sem dúvida o mais
importante elemento da voz, funciona abaixo do nível da consciência e deve
ser controlado indiretamente pelos ressonadores e por imagens de
ressonância. (VENNARD, 1967, p. 160)8
$
There is the underlying difficulty of the fact the vibrator, doubtless the most important element of the
voice, functions below the level of consciousness and must be controlled indirectly through the resonators
and by means of resonance imagery.
%
Johan Sundberg (1936-), sueco, professor na Universidade de Uppsala e membro da Acoustical Society
of America e da Swedish Acoustical Society, tendo sido da última também presidente. Importante autor
sobre a ciência vocal.
&'
An efficient voice teacher may try to develop a “free” tone in the student, wich probably means a tone
relieved of those characteristics that a listener would associate with a person in vocal distress. Then, the
student has to find, in a more or less intuitive way, the type of phonation and articulation wich satisfies
the teacher.
&&
Richard Miller (1926-2009), cantor e professor de canto americano. Fundador do Otto B. Schoepfle
Vocal Arts Institutno Oberlin Conservatory. Autor de oito livros e centenas de artigos sobre canto.
Lamperti12 (Brown, 1931) diz que há uma deterioração da arte do canto e que
desapareceram os cantores genuínos, e pior, também desapareceram os bons professores
de canto (sobre isso voltaremos a falar no capítulo 1). É freqüente no meio lírico a
conversa sobre a decadência do canto, ainda em nossos dias. Mas antes de tomar essa
reclamação como algo atemporal e justifica-la pela resistência ao novo, devemos,
principalmente nesse caso, observar os processos históricos que poderiam levar a isso.
Lamperti viveu em uma fase de profunda mudança no estilo operístico, onde o
virtuosismo vocal do bel canto tinha dado vez a um canto mais apoiado na palavra – o
que certamente veio a afetar o aprendizado. No mesmo capítulo, Lamperti (BROWN,
1931) diz:
dificilmente eram obrigados a cantar em outro idioma, visto que as óperas eram
traduzidas. Hoje o aluno, além de preparar o seu instrumento do ponto de vista da pura
emissão sonora, ainda tem que desenvolver essa emissão através da fonética de
diferentes idiomas, mesmo alguns com os quais não tenha muita – ou, algumas vezes,
nenhuma – intimidade.
A classificação vocal é um assunto amplo, vasto e fonte de diversas dúvidas e
impasses no processo de aprendizado do canto lírico. É verdade que grande parte dos
&!
Giovanni Battista Lamperti (1839-1910), professor de canto italiano, filho do também professor de
canto Francesco Lamperti (1811/13-1892). Teve entre seus alunos cantores célebres como David
Bispham, Marcella Sembrich e Ernestine Schumann-Heink.
&(
In spite of the fact that modern music for light sopranos is devoid of the coloratura of the time of
Mozart and Rossini , it is a necessary principle to again add the gymnastics of the breath, the larynx and
the smoothness of tone (legato).
alunos não sofre dúvidas com relação ao assunto, por possuírem vozes muito
características e portanto de classificação mais óbvia. No entanto, muitos outros penam
por bastante tempo, por vezes anos, até que sintam-se seguros quanto à sua
classificação. Muitos, também, passam muito tempo com dificuldades vocais sem saber
que essas dificuldades, na verdade, devem-se a uma classificação equivocada. Outros,
ainda, passam por períodos de mudança em que, após cantar com desenvoltura por certo
tempo sob uma classificação, são levados por fatores diversos a abordar o terreno de
uma outra. No caso do canto lírico isso afeta bastante a vida do indivíduo, uma vez que
essa mudança altera, além do uso do aparelho vocal, toda a perspectiva de repertório.
Uma mudança de classificação vocal pode vir a influenciar até mesmo na personalidade
artística do cantor, uma vez que a nova classificação trará uma nova gama de papéis de
caráteres diversos.
A escolha do tema desta dissertação deve-se grandemente ao meu histórico
como aluno de canto. Meu primeiro professor, quando eu tinha 17 anos, após alguns
meses de estudos sugeriu (sem ainda afirmar, pois achava ainda cedo para isso) que eu
fosse um baixo-barítono. Embora soasse ainda bastante jovial, a cor sugeria uma voz
grave e a extensão corroborava – exercitava uma extensão média de Fá 1 a Mi 3. Algum
tempo depois passei a fazer aulas com aquele que havia sido o professor do meu
professor, que, após mais alguns meses, classificou-me como barítono. Passei a
exercitar uma extensão maior, ganhando muito mais notas agudas e ainda mais algumas
graves. A extensão total praticada nas aulas era de Ré 1 a Sol 3, e a região mais
confortável da voz evidenciava-se de Lá 1 a Mib 3. Depois de pouco mais de um ano
resolvi parar de fazer aulas com este professor, e passei a estudar com uma professora
que utilizava um pensamento técnico bastante diferente dos anteriores. Foi o momento
em que consegui adquirir uma estabilidade no canto, o que me leva a considerar que
esta foi a fase em que comecei realmente a cantar – e não mais apenas me preparar para
o canto. Efetivamente, foi o momento em que comecei a fazer minhas primeiras
apresentações em recitais, e, a essa altura, a minha voz já soava bastante diferente de
quando eu comecei. Eu realizava uma voz mais firme, mais timbrada e clara, porém
ainda soava como um barítono razoavelmente escuro. A região extremamente grave da
voz não era mais trabalhada, e com efeito os graves passaram a ser mais dificilmente
emitidos, embora os agudos ganhassem mais segurança. Praticava, nesse período, uma
extensão de Lá 1 a Sol 3. Desanimado com um momento de estagnação no
desenvolvimento, resolvi interromper as aulas com essa professora e fiquei um tempo
sem um estudo formal, praticando sozinho apenas. Estimulado por um pensamento mais
leve em relação ao som, passei a cantar com a voz cada vez mais clara. Os agudos
ficaram mais fáceis, os graves praticamente impossíveis. Durante esse tempo, procurei
alguns professores, porém sem fazer mais do que algumas aulas com cada um. Um
deles ficou convencido de que eu era, na verdade, um tenor. Evidentemente isso me
provocou uma grande confusão; contudo, decidido a aprender a cantar, resolvi tentar
esse novo caminho. Embora conseguisse sustentar até um Sib 3, e eventualmente até Si
3 e Dó 3, a qualidade do som não era agradável, e a região muito aguda soava sempre
bastante diferente do resto da voz. Tinha resistência para cantar algumas árias de tenor,
mas sem conforto e apresentando muita fadiga depois. Aulas como tenor efetivamente
tive poucas, mas praticando sozinho logo cheguei à conclusão de que, embora minha
voz naquele momento soasse excessivamente clara para um barítono, aquela não era a
minha tessitura14.
Passei então a ter aulas regulares com uma professora que, embora trabalhasse
muito a leveza da emissão, afirmava que eu não era tenor, e sim barítono. Passei algum
tempo tendo aulas com essa professora, e, depois de interromper as aulas, fiquei mais
um tempo praticando sozinho. Procurei mais alguns professores durante esse tempo,
inclusive alguns com os quais já tinha estudado. Muitas vezes tive a ilusão de algum
da minha voz, logo ela percebeu que algo estava muito errado. Poucas aulas depois veio
a desconfiança de que eu seria, na verdade, um baixo. Isto me parecia absolutamente
&#
Tessitura, como veremos no segundo capítulo, é a região mais confortável da voz de um cantor.
impossível, pois a essa altura um Sib 1 já era uma nota extremamente grave para mim.
Modificando minha atitude técnica e minha concepção sonora, o novo treinamento aos
poucos devolveu-me os graves há tempos abandonados e firmou a minha real região
aguda (que, por muito tempo, trabalhei como centro-aguda). Algumas notas agudas que
eu emitia com relativa facilidade tornaram-se muito difíceis (algumas, ainda,
impossíveis), mas a homogeneidade de som da região mais grave mostravam que
aqueles agudos não faziam mesmo parte de minha extensão utilizável no canto. Ainda
receoso de tantas mudanças, procurei ouvir mais uma opinião, de renomada professora
na Itália, que afirmou categoricamente a minha condição de baixo.
Posteriormente, ao realizar treinamento técnico com um foniatra especializado
em canto lírico, resolvi buscar informações científicas sobre o a natureza do canto. Foi
só então que tomei ciência de fatores importantíssimos como a perfeita adução das
pregas vocais e o fenômeno da registração na voz. Paro de narrar o meu processo aqui,
por que agora precisaria utilizar diversos termos e conceitos que ainda serão
apresentados ao longo deste trabalho. Por hora, basta frisar o quão longo e doloroso foi
todo o processo que passei até encontrar o verdadeiro som da minha voz. Como
veremos mais adiante, podemos especular que a voz de baixo demora mesmo para
amadurecer, e que eu poderia efetivamente ter cantado anos como barítono sem que isso
fosse danoso. Podemos imaginar até mesmo que eu não poderia ter cantado como baixo
antes, por que o instrumento não estava ainda totalmente desenvolvido. No entanto, se o
&)
Sistema de catalogação dos papéis operísticos que leva em consideração questões ligadas às sub-
classificações, bem como a qualidades vocais e/ou artísticas específicas.
1 O ENSINO DE CANTO
&*
David C. Taylor (1871-1918), autor americano sobre pedagogia vocal que dedicou-se a buscar
preservar os preceitos da chamada antiga escola italiana de canto num momento histórico importante, em
que a ciência tornava-se cada vez mais presente no ensino de canto.
órgãos vocais, uma probabilidade que é verificada por muito aspirantes ao
sucesso desapontados. (TAYLOR, 1916, p. v)17
De fato, uma das decisões mais difíceis que o estudante de canto tem de fazer é
escolher um professor.
Correr de um professor famoso para outro, de uma master class para a
próxima, de um simpósio para ainda outro, e ler cada novo método vocal
“completo” publicado podem abrir algumas portas. Mesmo assim, chega o
momento em que o cantor ou professor de canto tem que parar de “ciscar” e
fazer uma escolha. (MILLER, 1986, p. xv) 18
A variedade de escolas, técnicas e abordagens pedagógicas disponíveis no
mercado põe o aluno informado em um momento delicado na hora de decidir com qual
professor estudar. Dependendo do professor, o aluno poderá treinar sua voz sob o
chamado método alemão, sob os preceitos da escola italiana ou pela tradição americana,
por exemplo. Mas as variáveis não se limitam às chamadas escolas nacionais. As
abordagens técnicas podem variar de um professor para o outro a ponto de mostrar-se
verdadeiramente antagônicas. Um aluno que estude com dois professores diferentes
pode, de um, receber instruções para distender o abdômen durante a sustentação do
som, e de outro, para encolher o abdômen. Um professor pode instruir o aluno a
direcionar o som para a frente, o outro, para trás. Um pode dizer que deve-se colocar a
voz na máscara, o outro, no corpo. O fato é que, via de regra, o aluno procura um
professor por que tem dificuldades – nos mais diferentes níveis – a vencer, e o processo
de ensino/ aprendizado de canto consiste basicamente em encontrar os meios para
vencer essas dificuldades.
Eis o que você deve procurar ao avaliar a instrução vocal. A técnica está de
acordo com a função livre e as leis da acústica vocal? Os propósitos dos
padrões vocais estão claros? O professor usa linguagem específica,
compreensível e precisa, evitando tanto o pseudocientífico quanto o
mitológico? Escute para perceber se a técnica e a interpretação estão em
equilíbrio, e verifique se a aula produziu resultados perceptíveis. Há um
senso de honestidade, falta de pomposidade, ausência de solicitude
exagerada, esquiva de um comportamento “Sr. Olimpo” da parte do
professor? As necessidades do aluno estão sendo atendidas? Sobretudo, a
17 No more perplexing task can well be taken up than the study of singing. Everybody knows that the
vocal student´s chances of success depend absolutely on the choice of a correct method of vocal training.
Yet so great is the confusion regarding methods of instruction in singing that a realization of this fact only
adds to the difficulties of the prospective student. A choice must be made, but the experience of countless
other faithful students warns the beginner of the perils attending the selection of an incorrect method. Not
alone the
worse thantime
thisand money
is the that mayofbeserious
probability wastedinjury
in vocal study
to the along
vocal wrongalines
organs, are to bewich
probability considered. Even
is attested by
many disappointed aspirants to fame.
18 Running from one famous teacher to another, from one master class to the next, from one symposium to
yet another, and reading each new “complete” vocal method published, may open some doors. Yet there
comes a time when the singer or teacher of singing must stop shopping around and make a choice.
aula gira em torno do aluno ou mais em torno do professor? (MILLER, 2001,
p. 218)19
Farah20 (2010), em dissertação sob o sugestivo título “Canto lírico – primazia da
técnica ou da estética?”, discute se o desenvolvimento do aluno seria um processo
técnico ou estético. Uma vez que nem o aluno nem o professor tem acesso visual ou
táctil ao aparelho vocal, o processo de ensino de canto se dá, quase que exclusivamente,
através do som. É claro que toda a informação fisiológica poderá trazer ao professor e
ao aluno indicações para uma emissão mais eficaz, mas a aplicação dessas informações
só poderá ser verificada através do som resultante. É comum o professor controlar de
forma mais direta questões ligadas à respiração, como o apoio, a distensão/ contração do
diafragma e a verificação de possíveis tensões indesejáveis em diversos pontos do corpo
causadas por uma respiração menos consciente. Sundberg (1987, p. 25) pondera,
inclusive, que os professores dão muita atenção à respiração no processo de ensino
justamente por que é o único aspecto da técnica que pode ser verificado a olho nu.
Quanto à emissão em si, resta ao professor orientar o aluno – seja através de
informações fisiológicas que não serão necessariamente verificadas, seja através de
imagens abstratas – até que se encontre a melhor sonoridade possível. É o que Farah
questiona: podemos afirmar que isto seja um procedimento puramente técnico? Se
pensarmos no processo de desenvolvimento vocal, de forma simplificada, como a busca
por um ideal sonoro, não seria este um processo mais baseado na estética do que em
preceitos técnicos?
19 Here is what you should be looking for in evaluating voice instruction. Does the technique accord with
free function and the laws of voice acoustics? Are the purposes of the vocalization patterns made clear?
Does the teacher use specific, understandable, and accurate language, avoiding both the pseudoscientific
and the mythological? Listen to see if technique and interpretation are kept in balance, and determine if
the lesson produced some recognizable results. Is there a sense of honesty, a lack of pomposity, an
absence of cloying solicitousness, an avoidance of Mt. Olympian behavior on the teacher´s part? Are the
needs of the student being met? Above all, is the lesson about the student or mostly about the teacher?
Heliana Farah, professora da Escola de Música da UFRJ nas classes de História da Ópera e Oficina de
!'
Ópera.
de processos bastante particulares. Pode-se escpecular que, pelo menos hipoteticamente,
os resultados esperados de qualquer treinamento vocal sejam os mesmos: uma emissão
livre, sem tensões desnecessárias ou excessivas, que permita ao cantor expressar-se
artisticamente e executar com destreza mesmo as passagens mais virtuosísticas de todo
o repertório abordado. No entanto, na busca por um mesmo ideal sonoro, diferentes
professores podem tomar direções diametralmente opostas.
Essas considerações sobre os termos “técnica”, “ensino” e “aprendizado” são
feitas com o mero intuito de liberar deles possíveis conotações negativas que poderiam
se evidenciar em uma pesquisa que pretende ressaltar as características
individualizantes, e não generalizantes, da prática pedagógica do canto lírico. Não
deixaremos, no entanto, de utilizá-los ao longo do trabalho, pois também de forma
alguma consideramos os referidos termos errôneos. Utilizaremos, também, termos como
“treinamento” ou “método” quando eles parecerem mais adequados.
Para observarmos o ensino de canto no universo da pedagogia musical, achamos
interessante fazer agora uma breve revisão de algumas teorias em educação.
O termo
como liberalser
costuma nãousado.
tem oAsentido de liberal
doutrina "avançado", ''democrático",
apareceu "aberto",
como justificativa do
sistema capitalista que, ao defender a predominância da liberdade e dos
!&
José Carlos Libâneo, doutor em Filosofia e História da Educação e mestre em Filosofia da Educação
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, professor da Universidade Federal de Goiás e da
Universidade Católica de Goiás.
interesses individuais na sociedade, estabeleceu uma forma de organização
social baseada na propriedade privada dos meios de produção, também
denominada sociedade de classes. A pedagogia liberal, portanto, é uma
manifestação própria desse tipo de sociedade. (LIBÂNEO, 1985, p. 5,6)
A tendência liberal tradicional visa preparar o aluno para ocupar o seu papel na
sociedade, fornecendo a ele os meios para desenvolver suas aptidões. O processo se dá
de fora para dentro.
Os conteúdos, os procedimentos didáticos, a relação professor-aluno não têm
nenhuma relação com o cotidiano do aluno e muito menos com as realidades
sociais. É a predominância da palavra do professor, das regras impostas, do
cultivo exclusivamente intelectual. (LIBÂNEO, 1985, p. 6)
!#
Sergio Álvares, professor doutor da Escola de Música da UFRJ.
!)
John Locke (1632-1704), filósofo inglês ligado ao liberalismo, principal representante do empirismo
britânico.
facilitar a aplicação dos resultados da pesquisa acadêmica em ação e prática
direta. (ÁLVARES, 2006, p. 433)
26 There are teachers who believe that what is imparted in the privacy of their studio is unique, and they
want to keep it that way. They are convinced that they, and perhaps their former teacher, have stumbled
upon a remarkable system. There is no need to know about what anyone else does. Successful singers new
to the teaching profession may assume that what was taught them regarding the technical aspects of
singing is all there is to know. That same information is to be passed on to every student. Such
questionable pedagogic philosophy is based on the principle of cloning: “This is how my teacher did it,
and how I do it, so you must imitate it”. Success rates in technical voice cloning are not high, because
performance mimicry can belie the individuality of each vocal instrument. Although there is a large
degree of function that is common to all who sing, it is naïve to assume that two individuals, in this case
teacher and student, will have identical physical structures, voice types, psyches, proprioceptive
sensations, and musical concepts. The teacher who comes to voice pedagogy as though it were based
entirely on personal experience, operates in an intellectual and artistic vaccum.
27 Exercises should be devised and adjusted to the performance level and technical needs of the student.
Teaching styles ought to be modified to mesh with the personality of the individual student. A good
instructor will not deliver information to all students within the same span of time or by the same
procedure. One of the great joys of teaching comes in accommodating one´s personal style to the diverse
psyches being taught.
trabalhará essas dificuldades de forma diferente, podemos talvez afirmar que cada
processo de desenvolvimento vocal será único. Enveredando por esse caminho, por
mais que haja um ideal sonoro mais ou menos pré-estabelecido, e que o funcionamento
vocal eficaz exija certos padrões mecânicos, torna-se realmente difícil falar em uma
“técnica vocal” absoluta a ser ensinada, aprendida e dominada. O treinamento vocal de
cada aluno individualmente, sob essa ótica, pode ser encarado como um processo
pragmático. Como diz Miller (2004):
Álvares (2006) apresenta, também, vertentes do que ele chama de ensino não
proposicional. Segundo o autor:
Apesar do valor histórico das teorias proposicionais, tais pensamentos,
contribuições, princípios e procedimentos tornam-se limitados como
fundamentos abrangentes para uma educação musical contemporânea, na
medida em que se fundamentam em convicções nas quais o saber sobre
música pode ser adquirido sistematicamente, em vez de fundamentar-se numa
visão da música como um modo de saber, tendo assim um valor educacional
distinto e não-proposicional. Como profissionais, os educadores musicais
devem levantar questões sobre a autenticidade, a veracidade e a realidade do
ensino e da aprendizagem musical antes de determinarem como, quando e o
que deve ser ensinado e aprendido. Tais indagações surgem, em grande parte,
pelo fato de que as teorias epistemológicas até o início do século XX
fundamentaram-se majoritariamente no conceito do saber proposicional, ou
seja, no “saber o quê?” – uma forma de saber que não empossa a magnitude
do amplo significado universalmente associado à música. (ÁLVARES, 2006,
p. 434)
A compreensão da habilidade humana de transformar simbolicamente sua
experiência e, portanto, sua habilidade de saber e compreender tem sido
limitada pela ênfase no modo conceitual do pensamento associada ao saber
proposicional e às ciências. (Álvares, 2006, p. 437)
28 Each individual has a distinct identity. We learn in various ways. Some persons are visually oriented,
others best respond aurally or kinesthetically. Despite individualism, we share basic physical
commonalities. From the standpoint of physical action, when bodies function well during singing, they
follow explicit physiologic and acoustical laws, channeled through the propensities of each individual.
O construtivismo, segundo Álvares, estimula o aluno a construir seu próprio
conhecimento numa perspectiva integrada dos conteúdos do programa de ensino, e a
relacionar as informações adquiridas com suas experiências pessoais, possibilitando um
aprendizado mais orgânico.
A música, como um modo de saber, não pode ser definida por nenhum gênero
em particular, tradição histórica ou qualquer tipo de experiência musical
específica, mas sim pelas múltiplas maneiras nas quais o evento musical pode
ser modelado ou construído em qualquer dado momento do percurso
histórico. O conceito de Ryle (1949) do saber procedimental ajuda na
definição de uma nova orientação à epistemologia musical, na qual o saber
não está simplesmente restrito a um critério ou a outros símbolos, mas
manifesta-se essencialmente por meio do fazer. (ÁLVARES, 2006, p. 438)
Ryle (1949 apud Álvares, 2006) diz que, embora o relógio em bom
funcionamento marque sempre a hora certa e a foca no circo realize com perfeição seus
movimentos, não se pode dizer que eles sejam “inteligentes”. Inteligência seria, para o
autor, a capacidade de perceber erros, corrigi-los e repetir os acertos, numa ação
criteriosa que busca conscientemente o acerto ao invés de estar apenas condicionado a
ele.
Para Álvares (2006):
O instrumento vocal não precisa ser construído, ele está disponível para uso
imediato. Alojado em uma máquina física, ele recebe seu ímpeto de
parâmetros mentais e espirituais da personalidade humana. Sua
adaptabilidade em canalizar comunicação é a fundação em que civilizações
humanas são construídas. (MILLER, 2006b p. 203)29
O instrumento vocal, como diz Miller, está disponível para uso imediato, mas
não necessariamente está, a princípio, apto a produzir os sons inseridos nos padrões do
canto lírico. A fonação depende de diversos fatores físicos, todos eles obviamente
comandados pela mente. Aprender a cantar, portanto, envolve não só processos físicos,
mas também mentais. Ao mesmo passo em que o aluno tem de desenvolver um som
próprio, livre, ele também tem de desenvolver em sua mente um conceito de som. Como
diz Taylor (1908):
29 The vocal instrument does not need to be constructed, it is available for immediate use. Lodged in a
physical machine, it receives its impetus from mental and spiritual parameters of human personality. Its
adaptability in channeling communication is the foundation on which human civilizations are built.
30 Singing is a natural function of the vocal organs. Learning to sing artistically does not involve a
departure from natural and instinctive processes. The training of the voice consists of the acquirement of
skill in the use of the vocal organs, and of nothing more.
Under normal conditions the vocal organs instinctively adjust themselves, by performing the necessary
muscular contractions, to fulfill the demands of the ear. In order that a perfect musical tone be produced
it is necessary in the first place that the ear be keen and well trained; only such a ear can know the exact
sound of a perfect tone, and so demand it of the voice. Second, the vocal organs must make repeated
efforts to produce the perfect tone, each response approaching nearer to the mentally-conceived tone.
Two elements are therefore involved in the training of the voice; first, thecultivation of the sense of
hearing; second, the acquirement of skill in the use of the voice by the actual practice of singing.
professor que deve ensinar a voz, é o aluno que deve desenvolver a
habilidade de ouvir a voz. 31 (MILLER, 1996, p. 46)
31 Teaching someone to sing often becomes teaching someone else to sing the way one sings oneself.
Teaching someone to hear the voice and to discriminate among timbres and the physical and acoustic
maneuvers that produce the differences among them is to allow each individual singer to do his or her
self-teaching. It is not the teacher who must teach the voice, it is the student who must develop an ability
to hear the voice.
(!
Cornelius Reid (1911-2008), professor de canto norte-americano.
33 Unlike the instrumentalist who must systematically progress through a series of graded exercises to
acquire manual dexterity and skill, the singer may have a perfect vocal technique without ever having had
a lesson .Thus, there are instances where singers have become world famous without ever having studied
voice. On the other hand, others have studied diligently for six or more years without having progresses
beyond the first lesson.
(#
Douglas Stanley (1890-?), cientista e professor de canto inglês, importante autor voltado para a técnica
vocal com foco científico.
cantor ou locutor é, na verdade, meramente o estado de seu equipamento
técnico. Treinamento vocal deveria de fato consistir na verdadeira “criação”
de uma “voz natural” em constante melhora. O grau em que o aluno pode ser
treinado depende de sua sociabilidade e talento inato sobre seu equipamento
vocal natural. (STANLEY, 1931, p. 407)35
Sobre os alunos que não apresentam dificuldades vocais, Miller (2006) diz:
É um prazer ter alunos que apresentam poucos problemas vocais, mas ensinar
tais pupilos não é realmente ensinar canto, e sim um coaching sofisticado e
preparação para performance. O professor que ajuda o cantor menos natural a
estabelecer uma base técnica sólida é um verdadeiro professor de canto. O
potencial do aluno precisa ser descoberto, e meios técnicos oferecidos para
retificar problemas que impedem uma ótima performance. (MILLER, 2006,
p. 200)36
Podemos apontar, então, duas situações distintas: o aluno que não apresenta
dificuldades, para o qual o estudo será apenas um treinamento para estabelecer e
aprimorar suas aptidões prévias, e o aluno que apresenta dificuldades, para o qual o
estudo será realmente necessário para corrigir seus defeitos de emissão e condicionar
seu aparelho fonador ao funcionamento otimizado. De qualquer forma, a classificação
vocal só poderá ser atestada quando o aluno adquirir uma segura e estável emissão
vocal. Quanto aos alunos que não apresentam dificuldades, o desenvolvimento
certamente dar-se-á mais rápido, e as características que levarão à classificação vocal
mostrar-se-ão mais claramente desde o início do processo. Apesar disso, como já
dissemos anteriormente, muitas vezes as dificuldades do aluno devem-se a uma
classificação errônea, ou a uma busca equivocada por inserir os sons produzidos nos
padrões esperados para seu tipo vocal – ou para o tipo vocal que o aluno acredita ter.
Portanto, é preferível desenvolver a voz do aluno ao menos o suficiente para que ele se
sinta confortável e seguro ao longo de uma extensão razoável para só então proceder à
classificação.
35 The belief that a great voice is the result of certain anatomical gifts and peculiarities of the individual
possessing it has been universally held. This idea is totally fallacious. It is theoretically possible for any
human voice to produce sounds equal to or better than those phonated by the greatest living artist. What
has, in the past, been believed to be the “natural voice” of the singer or speaker is, in actual fact, merely
the state of his technical equipment. Vocal training should in effect consist in the actual ‘creation’ of an
ever-improving “natural voice”. The degree to which the pupil can be trained depends rather upon his
tractability and innate talent upon his natural vocal equipment.
36 It is a pleasure to have students who exhibit few vocal problems, but teaching such pupils is not really
teaching voice so much as it is sophisticated coaching and performance preparation. The teacher who
helps the less natural singer establish a solid technical basis is a real voice teacher. The potential of the
student must be discovered and technical means offered for rectifying problems impeding fine
performance.
1.3 O papel do professor
Pelo que pudemos ver, Stanley (1931) acredita que, ao menos em teoria,
Com efeito, pode-se imaginar que haja casos em que o professor não tenha de
fato tanta influência no resultado final de um aluno quanto ele, ou o públi
co, acreditam.
A facilidade de um determinado aluno pode ser suficiente para que o seu treinamento
seja bem sucedido, não importando o professor. Por outro lado, pode-se imaginar
também que muitas vezes o aluno causa uma impressão tão segura ao cantar que o
público imagina ser o seu canto puramente natural, quando na verdade aluno e professor
trabalharam muito tempo para que as dificuldades fossem vencidas e a aparente
naturalidade fosse adquirida.
Os professores de canto em nosso tempo normalmente são cantores que em um
determinado momento decidem dedicar-se também ao ensino, ou pessoas que
efetivamente estudaram canto mesmo que não tenham feito necessariamente uma
carreira. Muitas pessoas imaginam que o sucesso no canto assegura o sucesso como
professor. Miller (1996) pondera sobre essa questão:
37 It is not easy to assess the impact of the voice teacher on the successful artist. A final accounting sheet
on the result of pedagogical efforts in professional singing careers might not prove to be as favorable as
the voice teaching profession might wish.
Não se vai alegremente para o ensino por que se tem a capacidade de cantar
bonito. Ensino apurado resulta da aquisição de informação e habilidade
pedagógica, não de sucesso na carreira de performance. Sem dúvida, o
número de cantores de primeira linha em qualquer geração que foram
grandes professores de canto podem ser contados nos dedos de uma mão ou
duas. É válido notar que no século XVIII muitos dos mais respeitados
professores de canto eram compositores de ópera. (É também verdade que
muitos compositores dos primórdios da ópera eram, eles mesmos, cantores.)
No entanto grandes professores de canto não eram frequentemente
conhecidos por excelência na performance. Típico é Manuel Garcia Filho,
conhecido como o maior professor de canto do período de transição de estilos
vocais da primeira para a segunda metade do século XIX. Ela não era um
cantor bem sucedido, embora este tenha sido o primeiro objetivo dele e de
sua família. 38 (MILLER, 1996, p. 33)
38 One does not go blithely into teaching because one is capable of singing beautifully. Master teaching
results from the acquisition of pedagogical information and skill, not from performance carrer success.
Without doubt, the number of premier singers in any generation who have been great voice teachers
could be counted on the fingers of a hand or two. It is worth noting that in the eighteenth century many of
the most respected singing teachers were opera composers. (It is also true that many composers of early
opera were themselves singers of sorts.) Yet major singing teachers were not often known for
performance excelence. Typical is Manuel Garcia the younger, acknowledged as the major teacher of the
transition period in vocal styles from the first to the second half of the nineteenth century. He was not a
successful performer, although that was his srcinal goal and that of his family for him.
39 The main prerequisite for teaching singing today is none of the following: a fabulous ear, excellent
musicianship, highly refined taste, a bubbling personality, goodwill, or a successful singing carrer,
although all of these factors are helpful. The main prerequisite is to know what is malfunctioning in a
singing voice and how to correct it. It is foolhardy to think one can reach a wise and consistently accurate
assessment and resolution if one does not know something about how the vocal machine operates.
A afirmação de Miller, evidentemente, leva em conta a situação atual do
professor de canto, com a possibilidade real de contato com toda a ciência disponível
sobre o aparelho vocal e seu funcionamento. No entanto, não podemos ignorar que,
durante todo o tempo em que essa informação não era conhecida, e ainda até hoje,
professores obtiveram sucesso em desenvolver as potencialidades vocais de seus alunos
sem um conhecimento fisiológico profundo, ou mesmo sem conhecimento fisiológico
algum. O ensino, nestes casos, é guiado puramente pelo ouvido. Levando esses casos
em consideração, podemos entender que quando Miller diz que o principal requisito do
professor é identificar o que não está funcionando e corrigir, isso não significa
necessariamente que o trabalho será feito através de conclusões e direções puramente
fisiológicas (e, em última análise, de pouco efeito prático para o aluno que não tem
controle direto sobre o mecanismo vocal). Sobre a necessidade do conhecimento
científico por parte do professor, voltaremos a falar mais adiante no mesmo capítulo.
Por hora, o que nos interessa é que, independente dos mecanismos pedagógicos
empregados pelo professor, sua função principal é perceber no aluno seus defeitos de
emissão e ajuda-lo a corrigi-los.
Achamos conveniente aqui, mais uma vez, lembrar a questão da abordagem
centrada no indivíduo. Mais importante do que os preceitos técnicos empregados pelo
professor é a sua habilidade de perceber no aluno onde estão as suas dificuldades e,
principalmente, apontar caminhos para que essas dificuldades possam ser superadas. E,
que ele ensina. Miller (1986) desconstrói toda a noção tradicional de aprendizado com
relação ao canto ao afirmar:
[...] todos os cantores devem ser seus próprios professores. Aprender a cantar
envolve unificação do ouvido musical, o controle do corpo e a inteligência
criativa, um ato de integração artística que não pode ser imposto ao cantor de
fora para dentro. Nesse sentido, nenhum professor ensina nenhum cantor a
cantar. 40(MILLER, 1986, p. 214)
40 [..] all singers must be their own teachers. Learning to sing involves unification of the musicianly ear,
the controlled body, and the creative intelligence, an act of artistic integration that cannot be
superimposed on the singer from the outside. In this sense, no teacher teaches any singer how to sing.
41 Although there are some naturally coordinated singers who achieve a certain level of technical skill
without needing to fully understand how, singing itself is a competence that has to be built through
recognition and elimination of faulty technical maneuvers. The singer-turned-teacher must consider
causes of a Instudent´s
prescription. technical
the process, problem,
that teacher and diagnose
is redefining them accurately
and clarifying beforebyrecommending
the principles a
which he or she
sings. St. Paul wisely poses the question “You who teach another, do you not teach yourselves?”
42 The reasons for the inevitable decline of Bel Canto as a singing style are three in number: first,
confusion growing out of nomenclature; second, the appearance of the “virtuoso” teacher; and third,
entry of the scientific investigator into the field of vocal endeavour.
É só lembrar da professora proeminente que dispensou aproximadamente um
terço de todos os alunos que foram admitidos no seu estúdio baseados em
audições exigentes, por que eles se mostraram “ineptos” em captar a
complexidade de sua mensagem pedagógica. “Eles não tinham o necessário.
Eles simplesmente não compreendem”, ela diria. (MILLER, 2004, p.205)43
44 e a
A ciência entrou no universo da didática vocal com Manuel Garcia Filho
invenção do laringoscópio. Garcia Filho desenvolveu em 1854 uma forma de, através de
um instrumento rudimentar, observar a laringe em movimento. Miller (2006b, p. 207)
ressalta o fato de que foi um professor de canto, e não um cientista, que viu pela
primeira vez as pregas vocais em funcionamento no canto e na fala.
O conhecimento científico invadiu definitivamente o ensino de canto, e hoje o
professor tem que lidar com toda a informação disponível. Miller (2006a) destaca a
necessidade por parte do professor de obter todo o conhecimento científico possível.
Mas é em Stanley (1931) que encontramos até mesmo um certo radicalismo ao defender
a relevância da ciência no ensino do canto:
43 One has only to recall the prominent teacher who dismissed approximately one-third of all students
who had been admitted into her studio on the basis of superior audition ratings, because they proved
“inept” at catching on to the intricacies of her pedagogic message. “They didn´t have what it takes. They
just don´t get it”, she would say.
##
Manuel Patricio Rodríguez Garcia (1805-1906), cantor e professor de canto espanhol, filho do também
cantor e professor de canto Manuel del Pópulo Vicente Rodriguez Garcia (1775-1832). Foi professor no
Conservatório de Paris e na Royal Academy of Music em Londres. Professor de cantores célebres como
Jenny Lind, Julius Stockhausen e Mathilde Marchesi.
45 There is only one way in wich the situation now existing in the field of voice training can be rectified.
The scientific world will have to take a hand. Scientists will have to establish and formulate the laws
which govern vocal technic, which laws must rest on the results of scientific research and deduction in all
the different fields of learning involved.
After these laws have been reliably laid down, the scientific world will have to determine the course of
training, in Physics, Anatomy, Physiology, Psychology, Music, Diction an Dramatic Utterance, essential
for the one who intends to become a professional voice teacher. Definite degrees for this profession may
then be granted to those who qualify and NO ONE ELSE SHOULD BE ALLOWED TO TEACH.
No entanto, mesmo Miller (2004), que exalta a necessidade do conhecimento
científico por parte do professor, pondera como as leis científicas não devem atrapalhar
a comunicação simples e direta entre professor e aluno:
46 Some systems of technique are more complex than is necessary. Simplification, not complication,
should be the goal of all instruction. It is unnecessary to invent functions for the breath, the larynx, and
the resonators. Why contrive abdominal muscles that do not exist, place the diaphragm in unknown
regions? Why theorize that laryngeal function can be improved through local controls which are
impossible to accomplish? Why contrive resonance spaces and domes that are not known to the rest of
mankind? It is far easier, simpler, and faster to explain recognizable physical and acoustic facts regarding
the singing voice, and it is far more honest. The syntax of artistic singing is most quickly and securely
built on an assemblage of accurate information, not on a system of imagined structures and controls The
syntax of voice technique emerges by routining onset, breath management, agility, vowel definition and
modification, voiced and unvoiced consonants, nasal and nonnasal consonants, sostenuto, passaggio,
range extension, and messa di voce exercises. Remove the mysteries and let the voice freely function.
mágico que, após descoberto, imediatamente solucionará todas as
dificuldades técnicas. Persistência é essencial. (MILLER, 2004, p. 189)47
Podemos entender que a técnica de canto, então, não deve ser algo imposto de
fora para dentro, o que corrobora nossa sugestão de que o ensino de canto não deve ser
realizado sob um pensamento racionalista. O “músculo mágico” citado por Miller pode
bem ser relacionado a qualquer preceito técnico defendido como uma verdade absoluta
a ser seguida, e que seja apontado como a solução dos problemas de todo e qualquer
aluno. O treinamento só se tornará efetivo à medida que o aluno compreende
fisicamente o processo e consegue não só realizá-lo, mas torná-lo rotina. O autor diz
ainda:
Todo cantor produz certos sons que são melhores do que outros sons. Em vez
de começar atacando o que está faltando, a melhor abordagem pedagógica é
isolar aqueles sons que o cantor produz – uma frase ou alguns tons – que
estão mais próximos dos objetivos do professor. É mais fácil para professor e
aluno concentrar
que iniciar em determinar
imediatamente quais exemplos
uma revisão isolados
técnica total. sãoalterações
Grandes melhores em
do
conceitos tonais raramente podem ser alcançadas rapidamente, elas
acontecem gradualmente. (MILLER, 2004, p. 196)48
É sabido, como já dissemos, que grande parte dos professores de canto são
cantores que em determinado momento de suas vidas decidiram dedicar-se também ao
ensino. Mas será que uma carreira no canto garante as prem
issas necessárias para
formar um bom professor? Reid (1950) pondera:
47 It is the job of the singing teacher to recognize which of the sounds a student can produce are closest to
unhampered vocalism, and to help the singer identify others that fall short of the goal. After a diagnosis
locates the source of malfunction, precise corrective solutions can be prescribed. This is not
accomplished by superimposing generic tonal ideals on every singer, but by uncovering the individuality
of each instrument. Always there will be some note or notes in any problematic singing voice that are
better than others. It is on theses promising sounds that an individualizes tonal concept is to be
constructed. Old muscle habits have to be abandoned, new tracks routined. There is no magic muscle that
upon discovery will immediately solve all technical difficulties. Persistence is essential.
48 Every singer makes certain sounds that are better than other sounds. Rather than begin with an
outright assault on what is missing, the best pedagogic approach is to isolate those sounds the singer
makes – a phrase or a few pitches – that are closest to the teacher´s own goals. It is easier for t eacher
and student to concentrate on determining which isolated examples are better than to immediately initiate
a total technical overhaul. Major alterations in tonal concepts seldom can be accomplished quickly; they
happen incrementally.
apresentados a eles pelos seus professores, e o erro constantemente cometido
tem sido simplesmente duplicar um procedimento pedagógico que eles
mesmos experimentaram como alunos. Esses procedimentos, infelizmente,
não eram aplicáveis de forma generalizada, e, assim, tem decididamente
valor limitado. (REID, 1950, p. 65)49
igual qualidade. Segundo Reid, o método de treinar o aluno de canto segundo suas
próprias sensações seria de pouca valia para o aluno com dificuldades.
49 Few vocalists who are successful performers have either the time or the inclination to carry out a
thorough investigation of the history and development of voice-training methods. In a life crowded with
learning repertoire, making public appearances, and filling social obligations such independent studies
generally have no place. Therefore, when the proper time arrived to take up the duties of teaching, those
who had once been leading singers taught only those principles of tone production made known to them
by their teachers, and the mistake consistently made has been in merely duplicating a pedagogic
procedure they themselves had experienced as students. These procedures, unfortunately, were not
generally applicable and, as such, had a decidedly limited value.
50 In her book How to sing, Madame Lili Lehmann devotes endless pages to descriptions of the vocal
sensations she experienced in singing, as though an attempt to duplicate them could possibly be
successful. (…)In the first place, Madame Lehmann never learned to sing by this method as her own voice
was from earliest childhood quite fenomenal. […] Madame Lehman´s vocal co-ordination, therefore, was
natural rather than adquired and, of course, her entire sensitivity was bound together by the proper ´feel´
of the mechanical adjustments involved.
Por maiores que tenham sido em performance, o que cantores treinados sob
essas condições sabem da mecânica da produção tonal? Como poderia ser
possível a eles ajudar outros quando os únicos problemas que eles
encontraram foram relativamente triviais como “não forçar”, “cantar vogais
puras”, “dominar um legato perfeito”, “manter a intensidade da escala
uniforme”, e “respiração”? Qualquer um pode operar uma peça complicada
de maquinaria quando está em boas condições, mas só um mecânico que
compreende profundamente a relação e função de uma parte com outra está
apto a consertar deficiências mecânicas e colocar as partes que não
funcionam perfeitamente para trabalhar com suavidade e eficiência. (REID,
1950, pp. 163, 164)51
O cantor pode não ter enfrentado grandes problemas vocais, e mesmo passar
toda a sua carreira sem um pensamento técnico. Porém, para tornar-se professor, ele vai
ter que buscar mais informações. Miller (1996) diz:
51 Great as they may have been as performers, what could singers trained under these conditions know of
the mechanics or tone production? How could it be possible for them to help others when the only
problems they had encountered were such relative trivialities as ´don´t force´, ´sing pure vowels´, ´master
a perfect legato´, ´keep the intensity scale even´, and ´breathing´? Anyone can operate a complicated
piece of machinery when it is in good condition, but only a mechanic who fully understands the
relationship and function of one part with the other is able to repair mechanical deficiencies and get the
imperfectly functioning parts working smoothly and efficiently.
52 Skeptics of enlightened voice instruction suggest that one doesn´t have to be an automotive mechanic
in order to drive a car, with which premise there can be no argument. However, if the motor stops
running, the brakes fail, or the muffler needs to be replaced, the driver had better find an expert who can
determine the cause of the malfunctioning and knows how to repair it. If a voice teacher cannot diagnose
what is lacking in timbre because he or she is uncertain as to the physical and acoustic parameters that
determine balanced vocal sound – other than his or her own good ear and personal performance
experience – that teacher may be helpless to repair faulty phonation.
bom professor deve ser capaz de objetivar os componentes da performance e
transmiti-los ao aluno, indiferente de sua categoria vocal. (MILLER, 1996, p.
3)53
Miller toca, aqui, num ponto delicado. Todo professor de canto, como cantor,
tem sua própria classificação vocal. Muitos alunos buscam estudar com professores que
tenham classificação vocal igual à sua, por julgarem que eles terão mais propriedade
para treinar o seu tipo de voz. Muitos professores, também, preferem ensinar alunos
com classificação vocal igual à sua, por sentirem-se mais aptos a trabalhar o tipo de voz
que eles, por razões óbvias, conhecem mais intimamente. No entanto, isso não deve ser
um fator limitador, e cabe ao professor estudar e conhecer profundamente todas as
classificações vocais, para entender as características de cada uma delas e poder, assim,
não só perceber no aluno essas características e proceder a uma classificação correta e
segura, mas também treinar e desenvolver o aluno segundo as particularidades de seu
tipo vocal.
Estudamos, até aqui, os processos pedagógicos peculiares do treinamento vocal
para o canto lírico. Vimos o quanto esses processos são particulares, e dependem (além,
obviamente, de suas capacidades técnicas e de ouvido bastante apurado), de uma atitude
franca, aberta e empática por parte do professor. Vimos também como a prática
pedagógica do canto pode se beneficiar de uma visão do aluno como centro do
processo. Uma postura atenta às peculiaridades da voz de cada aluno é essencial no
procedimento da classificação vocal, assunto que abordaremos no próximo capítulo.
53 There is no reason for the successful performer to describe personal processes to others so long as
performance remains his or her only field of activity. When, however, the performer turns to giving
instruction, communicative, objective language must be developed. In the rare instance in which two
personalities, teacher and student, share almost identical experiences and morphology, there may be less
problem with that
coordination the language
may haveofserved
imagery.
the Even then,Many
teacher. the student seldom has
fine performers havethenever
kind had
of unproblematic
the kinds of
technical problems encountered by the average voice student. That is why a highly successful singer who
also teaches may have success with one singer or with a particular category of voice, but not with others.
A good teacher must be able to objectify the components or performance and convey them to the student,
regardless of the student´s vocal category.
2 A CLASSIFICAÇÃO VOCAL
Doscher57 (1999, p. 195) diz que há muitas maneiras de classificar uma voz,
quase tantas quanto há professores de canto. A literatura normalmente aponta como os
)#
[…] misclassification can rob a voice of tonal beauty and freedom of production, can cause endless
frustration and disappointment, can shorten a singing carrer, and can cause vocal damage of varying
degrees of permanence.
))
I never feel any urgency about classifying a beginning student. So many premature diagnoses have
been proved wrong, and it can be harmful to the student and embarrassing to the teacher to keep striving
for anthe
until ill-chosen goal. Ititself.
voice classifies is best to begin in the middle part of the voice and work upward and downward
)*
Bajo ningún concepto debe hacerse una classificación apresurada; solo después de varios meses de
trabajo y estudio el maestro podrá darse cuenta de las possibilidades del alumno.
)+
Barbara Doscher, professora de canto na University of Colorado-Boulder.
principais critérios para a classificação: timbre, extensão e tessitura. Diversos autores
falam também da evidência das passagens entre os registros, e também da influência das
características físicas do indivíduo na sua classificação. Dinville (1975), numa visão
mais ampla, aponta os diversos fatores que determinam a classificação vocal. Os fatores
predominantes seriam a tessitura, a extensão, o timbre, a forma e o volume das
cavidades de ressonância, o comprimento e a espessura das cordas vocais. Os fatores
secundários seriam a capacidade respiratória e o desenvolvimento torácico e abdominal,
a altura tonal da voz falada, a amplitude vocal, a intensidade que permita potência sem
esforço, o temperamento e as características morfológicas. Segundo Cotton (2007):
A maneira como o instrumento vocal é medido para determinar o tipo de voz
tem mudado nos séculos passados e continuará mudando à medida em que
avanços são feitos na ciência vocal. O que anos atrás era principalmente
uma questão de alcance vocal tornou-se, nas últimas décadas, uma miríade
de questões incluindo categorias como quebras de registro, timbre, zonas de
facilidade de produção e grau de agilidade. O professor de canto de hoje tem
que aprender a ouvir e avaliar cada critério, e entender a hierarquia dos
vários critérios para classificação vocal para determinar a natureza do
instrumento à mão. (COTTON, 2007, p. 4)58
Os critérios indicados por Cotton estão de acordo com aqueles indicados por
Dinville, ao menos os que podem ser percebidos no estúdio (excluindo os critérios
puramente fisiológicos): timbre, extensão, tessitura e passagem de registros. O grau de
agilidade provavelmente tem mais a ver com sub-classificações, como soprano ligeiro
ou coloratura59 . Segundo Doscher (1999, pág. 196):
Timbre ou cor do som é um amálgama da fundamental, o número e
distribuição dos seus harmônicos, e as respectivas amplitudes desses
harmônicos. A onda sonora que determina o timbre é resultado do controle
da respiração, funcionamento das pregas vocais e ajuste dos ressonadores.
Extensão é o alcance de uma voz, os limites superior e inferior de
freqüência. Dentro desse alcance, há um conjunto de notas em que a voz
58 The manner in which the vocal instrument is measured to determine voice type has changed over the
past centuries and will continue to change as advances are made in voice science. What years ago was
primarily a question of range has become, in recent decades, a myriad of questions including such
categories as register breaks, timbre, zones of ease of production, and the degree of agility. Today’s voice
teacher must learn to listen for and assess each criterion, and to understand the hierarchy of the various
criteria for voice classification in order to determine the nature of the instrument at hand.
)%
Soprano ligeiro e soprano coloratura são sub-classificações da voz de soprano. A primeira refere-se à
voz mais leve e aguda, a segunda, à voz cuja habilidade em executar coloraturas é a característica mais
marcante. Estudaremos detalhadamente essas sub-classificações no terceiro capítulo.
apresenta especial facilidade funcional e sonora. Esse conjunto de notas é
chamado tessitura. 60
Agora que identificamos os principais fatores que determinam a classificação
vocal, passaremos a estudar individualmente cada um desses fatores, e a observação
desses como critérios para efeitos classificatórios.
Titze62 (2000) diz que, nos instrumentos musicais, o tamanho do ressonador tem tanta
60 Timbre or tone color is an amalgam of the fundamental, the number and distribution of its harmonics,
and the respective amplitudes of these harmonics. The sound wave which determines timbre is the result
of breath management, vocal fold function and resonator adjustment. Range is the extent of a voice, the
upper and lower limits of frequency. Within that range, there is a certain compass in which the voice
performs with special ease of production and sound. That compass of notes is called the tessitura.
*&
The measurement of such anatomical features as the length and thickness of vocal folds when at rest,
the volume of the resonating tract, and the overall body structure can give some indication of
classification. There are many more tall baritones than there are tall tenors. Short, broad vocal folds are
typical of tenors and sopranos, while long, narrow cords predominate in basses and contraltos. In
general, small resonators are found in high sopranos. All of these tendencies, however, are just that –
tendencies only. Many singers have sounds which simply are not in agreement with their physical
characteristics. A young baritone with all the physical attributes of his voice type may have the ringing
high tones of a tenor. Wich is he? How should he be trained?
*!
Ingo Titze, cientista vocal, diretor executivo do National Center for Voice and Speech na Universidade
de Utah e professor de Communication Science and Disorders na Universidade de Iowa.
influência no alcance do instrumento quanto a fonte sonora em si.63 O autor cita ainda
Cleveland (1977, 1978), que propôs um esquema classificatório baseado nos picos de
LTAS l(ong-time average spectral)64. Em seu estudo, um baixo apresentou picos de
LTAS em torno de 1.3 kHz, três barítonos apresentaram picos em torno de 1.4 kHz e
quatro tenores apresentaram picos em torno de 1.5 kHz. Como há uma relação inversa
entre a freqüência dos formantes e o comprimento do trato vocal, deduziu-se que a
diferença de aproximadamente 15 por cento nos picos de formantes entre o baixo e os
tenores correspondem a 15 por cento de diferença entre o comprimento de seus tratos
vocais. Titze mostra ainda como as proporções do seu trato vocal (e não só o seu
tamanho) podem influenciar no resultado sonoro:
Aqueles com pescoços longos e pregas vocais curtas teriam voz aguda mas
som escuro. Inversamente, aqueles com pregas vocais longas e pescoços
curtos teriam voz grave mas som claro. Algumas subclassificações em ópera
(por exemplo, barítono lírico, ou heldentenor) podem ter resultado, em
parte, desses casos híbridos, mas não há dados disponíveis. (TITZE, 2000, p.
190)65
*(
In musical instruments, the size of the resonator has as much to do with the range of the instrument as
the sound source itself.
64 “O Long-term average spectrum (LTAS), um espectro de força, vem sendo utilizado em numerosos
estudos por permitir “quantificar” a qualidade de uma voz, marcando as diferenças entre gênero, idade,
voz profissional falada e cantada - e vozes disfônicas, contribuindo assim não só para a avaliação como
para o acompanhamento de treinamentos e/ou tratamentos. [...] O LTAS reflete as características tanto da
fonte glótica quanto do filtro para a qualidade de uma voz.” (MASTER, 2005, p. 10)
*)
Those with long necks and short vocal folds would be pitched high but sound dark. Conversely, those
with long vocal folds and short necks would be pitched low but sound bright. Some subclassifications in
opera (e.g., lyric baritone, or heldentenor) may have resulted, in part, from such hybrid cases, but data
are not available.
Ainda que essas relações sejam de interesse, é questionável que qualquer
informação pedagogicamente útil siga nessa direção. Vozes são alojadas em
físicos que em parte determinam sua categorização, mas o ambiente vocal
geral e o treinamento vocal específico que um cantor encontra fornecerá os
fatores decisivos para determinar a categoria vocal e o alcance. (MILLER,
1986, p. 163)66
2.3 Timbre
reconheceremos no som a diferença. Uma viola pode tocar uma determinada peça
escrita para violino que esteja dentro dos seus limites de extensão, mas continuará
soando como uma viola. Da mesma forma, um barítono com extensão excepcional e
domínio técnico suficiente pode cantar uma ária escrita para tenor, mas ainda assim o
ouvido treinado identificará aquele som como sendo de barítono.
O timbre, de fato, como diz Vennard, é um atributo do som mais complexo do
que altura ou intensidade. Jander (2010), nos lembra que estas podem ser medidas em
escala uni-dimensional (agudo/grave, alto/baixo), mas a percepção do timbre envolve
diversos fatores. Seashore 69(1938/ 1967) dá-nos sua definição:
**
Although such correlations are of interest, it is doubtful that any pedagogically useful information lies
in that direction. Voices are housed in physiques that to some extent dictate categorization, but general
vocal environment and the specific vocal training a sing er encounters will provide the decisive factors in
determining voice category and range.
*+
“Em qualquer instante dado, sonância não está presente, mas quando ouvimos um som por um período
de tempo nós percebemos flutuações de instensidade, timbre, e mesmo afinação, e essas mudanças
formam um padrão ao qual o termo sonância é aplicado. Em outras palavras, se um som tem duração, terá
sonância.” (VENNARD, 1967, p. 10)
At any given instant, sonance is not present, but when we listen to tone over a period of time we hear
fluctuations of intensity, timbre, even pitch, and these changes form a pattern to wich the term sonance is
applied. In other words, if a tone has duration, it will have sonance.
68It has been discovered that musical tone has five essential properties: pitch, duration, intensity, timbre,
and sonance. (VENNARD, 1967, pág. 2) Timbre is perhaps the most difficult property of tone to explain.
(VENNARD, 1967, pág. 4)
*%
Carl Seashore (1866-1949), psicólogo sueco naturalizado americano. Sua principal área de interesse é a
Psicologia da Música.
Timbre é aquela característica de um som que depende de sua estrutura
harmônica modificada pela altura absoluta e intensidade total. A estrutura
harmônica é expressa em termos de número, distribuição, e intensidade
relativa dos parciais. (SEASHORE, 1938/ 1967, p. 97)70
O autor diz ainda que há nos sons musicais uma relação entre os vários grupos
de vibração que os enriquecem, e exemplifica com o funcionamento do violino:
Essa relação é bem ilustrada no caso da corda do violino. A corda aberta
vibra como um todo. Isso representa a altura fundamental do som. Ela
também vibra em uma série de partes, cada parte representando um
harmônico. Assim, uma corda vibra em metades, dando-nos o primeiro
harmônico; também vibra em terços, dando-nos o segundo harmônico. Cada
corda também vibra em quatro segmentos iguais, dando-nos o terceiro
harmônico; e em cinco segmentos, dando-nos o quarto harmônico.
(SEASHORE, 1938/ 1967, p. 96)71
Ainda segundo o autor, a riqueza de um som é dada pelo número relativo e pela
proeminência de seus harmônicos. O timbre da voz, segundo Dinville72 (1982):
É o resultado dos fenômenos acústicos que se localizam nas cavidades supra-
laríngeas.
dos lábios Ée das
modificando o volume,
bochechas, a tonicidade
que o som dessas
fundamental, áreas,pela
emitido assim comovaia
laringe,
ser enriquecido ou empobrecido voluntariamente segundo a ordem, o
número, a intensidade dos harmônicos que o acompanham e que são filtrados
nestas cavidades conforme a altura tonal e a vogal. (DINVILLE, 1982, p. 6)
. O timbre depende, então: do número de harmônicos parciais presentes, da
localização relativa desses parciais pela extensão (do mais grave ao mais agudo), e da
força relativa ou predominância de cada parcial. Todos esses fatores serão influenciados
pelas conformações do trato vocal durante a fonação.
Segundo Butenschon e Borchgrevink (1978):
A
ouvoz do soprano
baixo ou tenorescura
é relativamente é claraem
em timbre
ressonância, e nquanto
e resson a do
ância. Isso contraltoa
é porque
anatomia difere de tal forma que os harmônicos reforçados tem uma
freqüência relativamente alta ou baixa. Além disso, toda voz tem um caráter
individual, que depende da técnica do cantor e de variações anatômicas
individuais. O cantor pode também colorir a voz, fazendo-a mais escura
+'
Timbre is that characteristic of a tone wich depends upon its harmonic structure as modified by
absolute pitch and total intensity. The harmonic structure is expressed in terms of the number,
distribution, and relative intensity of its partials.
+&
This relationship is well illustrated in the case of the violin string. The open string vibrates as a whole.
This represents the fundamental pitch of the note. It also vibrates in a series of parts, each part
representing an overtone. Thus, a string vibrates in halves, giving us the first overtone; it also vibrates in
thirds, giving us the second overtone. Each string also vibrates in four equal segments, giving us the third
overtone; and in five segments, giving us the fourth overtone.
+!
Claire Dinville, fonoaudióloga francesa.
aumentando e alongando o trato vocal. (BUTENSCHON e
BORCHGREVIK, 1978, p. 17)73
73 The voice of the soprano or tenor is light in resonance, while that of the alto or bass is relatevely dark
in timbre and resonance. This is because the anatomy differs in such a way that the strengthened
overtones have a relatively high or low frequency. In addition, every voice has an individual character,
dependent on the singer´s technique and the individual anatomical variations. The singer can also colour
the voice, making it darker by extending and lengthening the vocal tract.
74 1º les conditions fixes qui caractérisent chaque individu, telles que la forme, le volume, la consistance,
l’état de santé ou de maladie de l’appareil vocal de chacun; 2º les conditions mobil es, telles que la
direction que prend le son dans le tuyau vocal pendant son émission, soit par le nez, soit par la bouche;
la conformation et le degré de capacité de ce même tuyau, le degré de tension de sés parois, l’action des
constricteurs. . .
+)
Timbre (quality) is relied on heavily by experienced voice teachers in arriving at a voice classification.
This is the most intangible criterion used, however, because the teacher must hear the voice as it sounds
now and picture in his mental ear how it will sound when it is fully developed. To do this the teacher must
recall other voices, other students, desired tonal images, and so forth. Obviously, it is an exact science, as
many phases of voice teaching are, but still vital to many classification decisions. Timbre is the most risky
criterion for the inexperienced teacher, simply because he d oes not have all those tonal memories to call
upon.
som da voz. Se o som da voz dependesse exclusivamente de características inatas, essas
mudanças certamente não seriam possíveis. Miller (1996) diz:
+*
Rare indeed is the young low-voiced male who does not, at least at the beginning of his singing carrer,
assume he must “enrich” his sound by making it “spacious” and “warm”, qualities generally
accomplished through a series of adjustments to his larynx and to his vocal tract that greatly disperse the
inherently beautiful timbre of his instrument. Young tenors often mistake the ingolata (throaty)buffoesque
timbre, characterized by edginess, for “resonance”, “forward placement”, or “projection”. (…) These
incidents are but prototypes that illustrate the frequently encountered viewpoint that in order to comply
with the aesthetics that determine coloration in Fach (category), the basic function of the instrument
should be altered.
Se uma jovem tem uma voz cantada naturalmente mais escura que seus
pares, ela é geralmente classificada como mezzo. Muitas sopranos de voz
grande cantaram como mezzos até os vinte e poucos, até perceber que suas
vozes estavam classificadas erroneamente. O período de re-treinamento
pode ser extensivo e frustrante porque o terço mais agudo de sua voz ficou
inativo por muito tempo. Como resultado, algumas vezes a voz nunca
alcança todo o seu potencial. O triste desse tipo de classificação apenas pelo
timbre é que as vozes raras, como o soprano spinto e o tenor dramático, são
as que mais freqüentemente são mal classificadas. Na melhor das hipóteses,
o potencial nunca é descoberto, na pior, o resultado são danos vocais
permanentes. (DOSCHER, 1999, p. 196)77
2.4 Extensão
77 If a young female has a naturally darker singing voice than her peers, she generally is classified as a
mezzo. Many a big-voice soprano has sung as a mezzo into her mid-20´s, only to find that her voice was
misclassified. The retraining period can be extended and frustrating because the upper third of her voice
has been inactive for so long. As a result, sometimes the voice never reaches its full potential. The sad
thing about this kind of classification by timbre alone is that the rare voices, such as the spinto soprano
and the dramatic tenor, are the ones most often misclassified. At best, their potential is never realized, at
worst, permanent vocal damage results.
+$
Vocal range in singing is defined as the number of frequency changes possible between the lowest and
the highest pitches of the voice.
da voz cantada é de duas oitavas a duas oitavas e meia, sendo que três oitavas é
excepcional e quatro é fenomenal.
Vennard (1967) diz que a voz treinada profissionalmente terá provavelmente
um alcance de duas oitavas. Acrescenta que alcances maiores não são incomuns, mas
que podemos ter em mente, como generalização, o intervalo de uma décima quinta. As
extensões dos diferentes tipos vocais são apresentadas assim pelo autor:
79 The bass voice is roughly from E2 below the bass staff to the E4 above it. The baritone octaves are a
third higher, and the tenor should be able to reach C5 above Middle C. Altos may be thought to as an
octave above bass; mezzo, above baritone; soprano, above tenor. Generally the women´s voices are a
tone or so higher than this, but these boundaries are arbitrary anyhow. Endless embellishments are made
upon this outline, because no two voices are identical.
sem destaque no meio de centenas de outras, apesar da facilidade técnica.
(MILLER, 1986, p. 161)80
McKinney (1995) diz que a classificação vocal pela extensão tem uma
aplicação prática frequentemente ignorada:
Se um indivíduo se considera tenor, isso implica ter todo o alcance necessário
para cantar a maior parte da literatura escrita para essa voz. Por que chamar-
se tenor se seu alcance agudo é tão limitado que a maior parte da literatura
para tenor lhe é vedada? Isto seria trabalhar sob falsas cores, para dizer o
mínimo. Um forma de chegar no alcance da voz de tenor é examinar uma boa
quantidade de literatura vocal escrita para essa voz para ver que tipo de
alcance é requerido para cantar, não tudo, mas a maior parte desta literatura.
O mesmo procedimento é válido para todas as categorias. (MCKINNEY,
1995, p. 110)81
$'
Unfortunately, an extensive range is not a primary determinant in evaluating a voice – quality is. The
agile “nightingale” voice, with fantastic range extension but small in size, is not uncommon; sometimes it
is uninteresting. Such instruments fall into the “normal” soprano category. Unless some highly
individualistic facet of artist imagination or vocal timbre is characteristic, such a voice will remain
undistinguished from hundreds of others, despite technical facility.
$&
If a person is to call himself a tenor, this implies that he has the range needed to sing most of the
literature written for that voice. Why call yourself a tenor if your upper range is so limited that most tenor
literature is closed to you? This is parading under f alse colors, to say the least. One way to arrive at the
range of the tenor voice is to examine a wealth of vocal literature written for that voice to see what sort of
range is required to sing not all but most of it. The same approach is valid for all the voice categories.
pouco útil como ferramenta de classificação vocal durante o treinamento.
(DOSCHER, 1999, p. 196)82
A maioria dos barítonos não-treinados ainda não descobriu como cantar suas
notas agudas, e por isso consideram-se baixos. A maioria dos mezzos não
treinados não gostam dessa categoria, e por terem uma voz de cabeça
satisfatória consideram-se sopranos. (VENNARD, 1967, p. 78)84
2.5 Tessitura
$!
Probably the least reliable and the most dangerous way to classify a voice is by range. Other than
indicating wheter a voice is male or female, a relatively simple judgeme nt to make about normal voices,
range is a “sometime thing”. Particularly in young voices, it can bob up and down like a yo-yo. A mezzo-
soprano range is common for a young soprano who has not yet found the light or head voice. Young male
singers frequently have the low notes of a bass and may eventually become baritones or even tenors. A
conclusive range is almost always a product of vocal maturity and, as such, is of little use as a tool to
classify voices during training.
$(
When range is allowed to serve as the chief consideration in vocal classification, many potential
professional voices of one category are mistakenly classified early as belongin to some other category.
The tenor with full, resonant low voice, the soprano with the temporarily short top, the singer whose
range is limited because of a lack of energy, often mislead as to true vocal category, especially with
regard to range expectation from the respective categories.
$#
Most untrained baritones have not discovered how to sing their top notes, and hence consider
themselves basses. Most untrained mezzos dislike the category, and because they have a satisfactory head
voice consider themselves sopranos.
$)
…problems of range rarely reveal themselves as natural vocal limitations.
O termo tessitura vem do italiano, e significa literalmente textura. Grosso
modo, é a região da voz em que o cantor se sente mais confortável ao cantar. Doscher
(1999) diz que “tessitura e o monitoramento cauteloso das pontes entre os registros são
o caminho mais viável para classificar vozes jovens”86 (DOSCHER, 1999, p. 197).
Vennard (1967) concorda:
Muitos cantores tem grande extensão – mais de duas oitavas – e o critério
importante é a tessitura, ou seja, a parte da extensão em que a voz se
apresenta melhor, tanto em termos de som como de facilidade. (VENNARD,
1967, p 79)87
região onde ele se sente mais confortável, e tem melhor resultado sonoro) deve
corresponder à tessitura (região onde a maior parte das notas se encontra) de uma
$*
"tessitura and the careful monitoring of bridges between registers is the most viable way to classify
young voices.
$+
Many singers have wide ranges – more than two octaves – and the important criterion is tessitura, that
is, that part of the range in which the voice performs best, both as to sound and as to ease.
$$
Singers with very wide ranges often have to make a choice between tenor and baritone or between
soprano and mezzo because they have the range to sing either part. The decision should be made, in part,
on the basis of wich tessitura proves to be more tiring. Vocal longevity bears a direct relationship to vocal
confort. If you can sing well in two different tessituras, it is the better part of wisdom to choose the one
wich is less fatiguing vocally. Normally this will be the lower one.
$%
Tessitura is defined as that part of the compass of a melody or voice part of a musical composition in
which most of its tone lie. This term does not denote the range of a voice but, rather, the adaptability of a
given voice to a given piece of music. By extension, tessitura has also come to mean: the purest, most
factile and singable portion of the vocal range.
determinada peça do repertório que escolhe para si. Portanto, a identificação da
tessitura do aluno é fundamental para uma correta classificação vocal, e
consequentemente para a definição de seu repertório.
Observar a sua região de conforto é essencial para que o aluno se identifique
como instrumento. Mesmo que esqueçamos a questão da classificação, quando o aluno
começa a escolher canções para o seu repertório, precisa perceber em que tom uma
determinada canção lhe fica mais confortável. Ainda que a classificação vocal não seja
uma questão urgente, a escolha da tonalidade será essencial para o aluno que começa a
aplicar em expressão artística os seus avanços, até então, puramente técnicos.
Não se pode desprezar, ainda, a influência do desenvolvimento técnico na
identificação da tessitura. Um aluno de canto pode vir a de
scobrir em notas que a
princípio eram difíceis um conforto especial ao trabalhar tecnicamente sua voz. Miller
(1996) diz:
Um problema para o soprano com voz grande é a tendência das pessoas com
quem ela trabalha de deduzir que, porque ela tem um “topo curto” e um
timbre rico, ela deve por isso ser um mezzo. Um número surpreendente de
vozes líricas e dramáticas tem sido erroneamente classificadas como mezzos
por que elas não tinham a princípio a facilidade na região aguda da categoria
mais leve soubrette/coloratura. (MILLER, 1996, p. 178)90
Logo, podemos ver que muitas vezes um aluno descobre, ao longo dos
estudos, a facilidade de produção vocal numa região que antes não lhe era confortável,
modificando a concepção da sua tessitura. Ainda sobre o assunto, Miller diz:
Um bom número de tenores, a princípio classificados e treinados como
barítonos porque eram incapazes de alcançar a tessitura de tenor com
facilidade, descobrem aos vinte e muitos que são capazes de fazer a mudança
de categoria necessária. (MILLER, 1996, p. 180)91
2.6 Registração
%'
A problem for the soprano with a sizable voice is the tendency for people with whom she works to
assume that because she has “a short top” and a rich timbre she must therefore be a mezzo. A surprising
number of lyric and dramatic voices have been falsely classified as mezzos because they did not early
have the upper range facility of the lighter soubrette/coloratura category.
%&
A number of tenors, earlier classified and trained as baritones because they were unable to achieve the
tenor tessitura with ease, discover in their late twenties that they are capable of making the necessary
category change.
Registro é um dos assuntos referentes ao canto que mais levanta polêmicas. A
terminologia foi herdada do funcionamento do órgão de tubos, e adotamos aqui a
definição de Garcia (1847), até hoje não refutada:
Um registro é uma série de sons homogêneos e consecutivos produzidos pelo
mesmo mecanismo, que difere de uma outra série de sons igualmente
homogêneos, produzidos por outro mecanismo, quaisquer que sejam as
modificações de timbre e força que possam oferecer. Cada um dos três
registros tem sua própria extensão e sonoridade, que varia de acordo com o
sexo do indivíduo, e a natureza do órgão. (GARCIA, 1894, p. 8) 92
Segundo Alderson (1979), “idéias sobre registração na voz são pelo menos tão
antigas como o século XVI.” 93 (ALDERSON, 1979, p. 151) A diferenciação entre os
registros já aparece na literatura sobre canto desde os primórdios, e a terminologia para
esses registros permanece, ainda, baseada nas sensações de ressonância. Caccini, em
Nuove Musiche , já identifica dois registros, que ele chama voce piena e voce finta (voz
plena e voz falsa, disfarçada). James (1906) lembra que já Cerone (1613) reconhecia
%#
Esse registro vocal é observado em ambos os sexos, e é produzido sem contração dos tiro-aritenóides.
95 Many teachers believe that the head and the chest are the only registers. However, just as many believe
that three registers exist (the head, middle, and chest). Despite the confusion in terminology, singers
continue to sing an even scale and teachers continue to theorize.
96 Do registers exist by nature? No. It may be said that they are created throughout long years of
speaking in the vocal range that is easiest to the person,… which means that the notes below and above
the habitual speaking voice zone comprise two other registers.
dificuldades nas transições entre seus registros durante os estudos tenham a tendência a
acreditar na existência de um único registro. Como diz Appelman97 (1967):
Cantores profissionais mais do que professores tendem a acreditar que
registros vocais não existem. A maioria dos profissionais são cantores
naturais que tem perfeita coordenação corporal e nunca realmente
enfrentaram um problema de registro, ou talvez quebras de registros que
ocorreram desapareceram com a maturidade. (APPELMAN, 1967, p. 86)98
Sundberg (1987, p. 50) comenta que as questões de terminologia parecem
ainda mais pitorescas por que a ênfase está mais em escolher os termos corretos do que
em determinar o que eles significam em termos de função glótica. Segundo ele, seria
mais útil substituir os termos por números, que são livres de conotação emocional
(frisando, no entanto, que isso também não resolveria o real problema).
Behlau99 (2001) aponta três registros principais e seus subregistros. Primeiro o
registro basal, onde são produzidas as freqüências mais graves, e que recebe também o
nome pulsátil. Segundo, o registro modal, que é utilizado na fala e é subdividido em
três: peito, misto e cabeça. O terceiro registro, chamado o registro elevado, quase nunca
acontece na fala habitual, e pode ser dividido entre falsete e flauta. Pode-se deduzir que,
no canto lírico, em geral apenas o registro modal será utilizado, em suas sub-divisões
peito, médio e cabeça (fazemos exceções, aqui, para os superagudos do soprano, que
utilizam o registro de flauta).
Doscher (1999, p. 173) relata que, para acabar com os termos extremamente
subjetivos, cientistas identificaram quatro registros: 1. um registro mais grave, 2. um
registro onde a maior parte da fala e do canto ocorre, 3. um registro alto usado
principalmente no canto e 4. um registro muito agudo encontrado apenas em mulheres e
crianças. O comitê de cientistas identificou ainda um quinto registro adicional no meio
da extensão, considerado difícil de definir cientificamente, mas que não poderia ser
ignorado. O primeiro e o quarto são registros extremos e de pouca importância no nosso
estudo. O mais grave é o chamado pulse, growl, ou fry (o registro basal ou pulsátil
apresentado por Behlau) e o mais agudo é o chamadowhistle, flute ou flageolet. O
%+
pesada e a leve como uma voz, e não envolve-lo na discussão dos registros.
Arnold (apud DOSCHER, 1999) compara a transição de registros à troca de
marchas em um carro:
A transição natural entre dois registros adjacentes pode ser comparada ao
câmbio de marcha de um carro... A mesma velocidade absoluta do veículo
pode ser mantida dirigindo em RPM alta em marcha baixa ou por menos
revoluções da máquina na próxima marcha mais alta. Dirigir com uma
mínima quantidade de consumo de combustível em uma determinada
velocidade é a forma mais econômica, tanto em consumo de combustível
quanto em conservação da máquina. (ARNOLD apud DOSCHER, 1999, p.
177)100
Sundberg (1987) faz a mesma comparação:
100 The natural transition between two adjacent registers may be compared to the gearshift of a car. …
The same absolute vehicle speed can be maintained by driving either with high rpm in low gear or by
fewer engine revolutions in the next higher gear. Driving with the minimal amount of gas flow at a given
speed is the most economical manner with regard to gas consumption and engine conservation.
Assim, quando a frequência de fonação é levada acima além de um certo
ponto, parece que todo o aparato de controle é de alguma forma reiniciado,
de forma que os valores usados para a região mais baixa do registro mais
grave podem ser usados novamente para as notas mais baixas do próximo
registro mais grave, quase como ao mudar as marchas do carro.
(SUNDBERG, 1987, p. 53)101
Portanto, podemos entender que a mudança brusca de registros tenderá a ser
suavizada a ponto de se tornar (ao menos quase) imperceptível à medida em que o aluno
evolui tecnicamente. A quebra de registros, então, como instrumento de classificação
vocal, tende a ser menos observável à medida em que a técnica se desenvolve. Doscher
(1999, p. 177) diz que a localização das passagens de registro é ainda um objeto de
controvérsia científica e pedagógica. Lembra, no entanto, que, à medida em que uma
voz cresce em tamanho e em foco, problemas de entonação normalmente aparecem
primeiro nessas passagens. Sobre as passagens de registro como identificadores de
classificação vocal, diz Miller (1986):
O que mais nos chama atenção em Vennard (1967) sobre o assunto é o que ele
chama de registro não utilizado. Segundo o autor, o registro não utilizado do homem é o
falsetto e o da mulher é o de peito. (É importante dizer, aqui, que Vennard usafalsetto
para designar o registro leve, ou de cabeça.) Exceções são apontadas, é claro, para o
tenor e para o contralto, mas o que ele defende é que, via de regra, o homem, após a
puberdade, tende a cultivar uma produção vocal tensa e pesada, a fim de evitar sons
afeminados. Analogamente, a mulher, a fim de evitar sons masculinizados, tende a
cultivar, ao menos no canto, a produção sonora leve (falsete, ou registro de cabeça).
Mesmo aquelas que falam no registro de peito (o que, segundo Vennard, seria uma
101 Thus, when fonation frequency is raised beyond a certain point, it seems that the entire control
apparatus is in some way reset, so that the values used for the bottom range of the lower register can
again be used for the bottom tones of the next higher register, almost as in shifting the gears of a car.
102 The events of register demarcation serve as indicators of vocal categorization; if these events are
overlaid with technical encumbrances, range may be curtailed. The upper range is highly vulnerable to
such limitations. Discovering the passaggi pivotal points of the voice, and avoiding classification based
chiefly on how high or high low a singer can sing at some early stage of vocal development, is wise
procedure.
vantagem para o professor) tendem a evitar, no canto, que suas vozes soem “grosseiras”
como suas vozes faladas.
McKinney (1995, p. 113) aponta o que seriam, em média, os pontos de
transição de registro nas vozes masculinas e femininas segundo os autores. Chama ainda
atenção para o fato de que as passagens de registros mais evidentes acontecem na região
grave feminina e na região aguda masculina, basicamente nas mesmas alturas: tanto o
baixo como o contralto fazem passagem no Réb 3, meio-sopranos e barítonos no Mib 3,
e tenores e sopranos no Solb 3. Uma oitava acima, as mulheres fazem uma segunda
passagem: contraltos no Réb 4, meio-sopranos no Mib 4 e sopranos no Solb 4.
Sobre o domínio e controle das transições de registros, diz Reid (1965):
O som tem srcem no mecanismo laríngeo. Quando a pressão do ar é
direcionada contra as pregas vocais os músculos laríngeos contraem,
segurando as cordas em extensão e tensão correspondentes à imagem mental
de altura e intensidade. [...] Em estado de perfeito equilíbrio, cada nova altura
e intensidade requerem um alinhamento especial do processo coordenativo.
Assim, há apenas um balanço muscular perfeito para cada altura e
intensidade! Outra forma de colocar isso seria dizer que em uma técnica
perfeita há um ajuste diferente no registro para cada nota e volume. (REID,
1965, p. 37)103
Também Miller (2000) atesta a importância da registração no ensino de canto e
na classificação vocal:
&'(
Tone srcinates in the laryngeal mechanism. When the breath pressure is directed against the vocal
cords the laryngeal muscles contract, holding the cords at a length and tension corresponding to the
mental picture of pitch and intensity. […] In a state of perfect equilibrium, each new pitch and intensity
requires a special alignment of the coordinative process. Thus, there is but one perfect muscular balance
for each pitch and intensity! Another way of putting it would be to say that in a flawless technique there is
a different adjustment of the registration for every tone and loudness.
104 The classification of voices and the literature to be selected for them in performance are largely
dependent on the size of the vocal instrument and on the points in the musical scale at which registration
events for that particular voice category occur. Registration undergirds vocal instruction in all of its
dimensions. Knowledge of the basic physiology of vocal registration must guide the pedagogue
throughout both early and advanced instruction. It should be reiterated that wise pedagogy does not
introduce the specifics of registration to the student at an early stage. (MILLER, soprano, 28)
Como vimos, as passagens de registro são apontadas como um dos quesitos
mais importantes na verificação da classificação vocal. No entanto, como vimos, essas
passagens tendem a ser disfarçadas à medida em que o aluno domina o mecanismo.
Portanto, podemos concluir que, ao contrário de timbre, extensão e tessitura, que
tendem a ficar mais claros e portanto mais eficazes como parâmetros classificatórios ao
longo dos estudos, as passagens de registro são mais observáveis quando o aluno
passeia por sua extensão sem um pensamento técnico ou estético de uniformidade
sonora.
Estudamos, neste capítulo, os diferentes meios possíveis para a verificação da
classificação vocal. No próximo capítulo, estudaremos detalhadamente as diferentes
classificações e suas características próprias.
3 OS TIPOS VOCAIS
Agora que estudamos os itens a ser observados para a classificação de uma voz,
passaremos a estudar as características de cada um dos diferentes tipos vocais. Como já
dissemos no capítulo anterior, dividem-se as vozes humanas, pelos padrões atuais, em
sopranos, meio-sopranos, contraltos, tenores, barítonos e baixos. Considerando as vozes
humanas como instrumentos, podemos dizer que, embora os padrões gerais de função
mecânica envolvidos no canto sejam basicamente os mesmos, os diferentes tipos vocais
são como instrumentos diferentes de uma mesma família. Embora representantes de
todas as classificações vocais possam ser designados simplesmente cantores, eles
possuirão, além de timbres característicos, extensão, tessitura, regiões de passagem de
registros (e também os chamados “pontos pivotais”, os pontos culminantes dessas
passagens) particulares.
Evocamos novamente aqui o pragmatismo latente na natureza do ensino de
canto, pois o professor deve estar atento não somente às características de seus alunos
para classifica-los mas também às peculiaridades de cada tipo vocal como instrumento
para realizar um treinamento adequado. Vozes extremamente agudas e extremamente
graves, por exemplo, provavelmente encontrarão dificuldades diferentes no processo de
solidificação técnica.
É interessante notar, no entanto, que apesar da quantidade de tratados de canto
disponíveis desde o século XIX (e ainda antes), estes normalmente dedicavam pouco de
sua atenção ao assunto classificação. Cotton (2007), ao tratar das vozes femininas,
pondera:
105 The seeming lack of publications that dealt with voice classification in the eighteenth century […]
may also point to a conception of voice classification that was remarkably less important in the training
of singers than we believe it to be today. In addition to the possibility that classification played little to no
role in the training of singers, it is also intriguing to consider the possibility that the basic three types
upon which pedagogues today seem to agree (soprano, mezzo-soprano, contralto) were not the concepts
with which earlier pedagogues worked. Specifically concerning the classification of the mezzo-soprano,
this category seems to have been non-existent for many before the late eighteenth century.
Até 1800, virtualmente todos os papéis operísticos eram compostos com um
cantor e uma ocasião particulares em mente. Não havia expectativa de criar
uma ópera que iria entrar para o repertório, assim como não existia um
repertório consolidado; a maioria das óperas nunca eram remontadas, e
quando eram, eram sujeitas a revisão ou recomposição para adequarem-se a
um novo time de cantores. Portanto os papéis eram concebidos menos para
tipos vocais do que para vozes individuais. Esse procedimento continuou,
especialmente na Itália, até o final do século XIX. Mas o crescimento de um
repertório estabelecido – internacional, mas com variações locais – levou os
cantores a serem requisitados a cantar música não escrita para eles. Com o
tempo isso deu srcem, por causa da necessidade de elencos apropriados, a
um grau de classificação de papéis e cantores, e à identificação de diferentes
tipos vocais [...] Além disso, ao passar do século XIX, ao invés de os
compositores serem requisitados a adequar sua música ao uma voz particular,
o compositor escrevia o que gostaria e a voz tinha que adequar-se às suas
demandas.106 (JANDER, 2010, sem número de página)
106 Up to 1800, virtually every operatic role was composed with a particular singer and a particular
occasion in mind. There was no expectation of creating an opera that would enter the repertory, as no
consolidated repertory existed; most operas were never revived, and when they were they were subject
to revision or recomposition to suit a new team of singers. Accordingly roles were designed less for
voice types than for individual voices. This procedure continued, especially in Italy, into the late 19th
century. But the growth of an established repertory – international, but with local variations – led to
singers being required to perform music not written for them. This in time gave rise, because of the
need for appropriate casting, to some degree of classification of roles and singers, and to the
identification of different voice types […] Further, as the 19th century progressed, instead of a
composer being required to suit his music to a particular voice, the composer wrote what he pleased
and the voice had to be found to cope with his requirements.
das canções a fim de se adequar às particularidades de extensão e tessitura de cada
cantor que as aborde, no repertório operístico o caso é totalmente diverso.
3.1 Soprano
Ainda segundo o Jander, o termo soprano na França era, até o século XVIII,
utilizado apenas para cantores (mulheres e homens castrados) italianos. Lá o termo
utilizado era “dessus”, e até mesmo a primeira edição da ópera Guillaume Tell de
Rossini, de 1892, trazia esse termo para designar as personagens femininas mais agudas.
Até a primeira metade do século XVIII, a extensão das árias compostas para
soprano normalmente não ultrapassava o Lá 4. Não havia, então, o conceito
107 The word itself is built on the root ‘sopra’ or ‘sovra’ (‘above’, ‘over’) and derives (through such
forms as ‘supremus’, ‘supranus’, ‘sovranus’ and ‘sopranus’) from the Latin ‘superius’, the commonest
term for the top voice in 15th-century polyphony. Pietro Aaron (Thoscanello de la musica, 1523) used
it as the equivalent of ‘canto’. Zarlino ( Le istitutioni harmoniche, 1558, p.281) remarked that the
canto is ‘a voice called by some the soprano because of its supreme position’, and used the two terms
with almost equal frequency, writing the canto mostly in the mezzo- soprano clef and the soprano
mostly in the soprano clef. Vicentino (L'antica musica ridotta alla moderna prattica , 1555) used only
the word ‘soprano’ and almost exclusively the soprano clef, reflecting the interest of the Ferrarese
court (where he worked) in music for female sopranos.
Segundo Garcia (1841), a extensão do soprano é de Sib 2 a Dó 5. Quanto à
divisão dos registros, o autor aponta o registro de peito estendendo-se do Sib 2 até Mi 3,
o registro de falsete do Ré 3 (ou Si 2) até Dó# 4 e o registro de cabeça do Ré 4 ao Dó 5.
Lembramos aqui que o que Garcia descreve como falsete falsetto,
( fausset ou falsett)
em nada tem a ver com o que conhecemos normalmente sob esse termo (a voz
masculina sem contração do músculo tiro-aritenóide resultando num som que
percebemos como feminino), mas ao que ele também chama de voz média. Na prática é
um registro intermediário, uma zona de instabilidade entre o registro “puro” de peito e o
registro “puro” de cabeça. Isso nos faz entender, também, o por quê de algumas notas da
escala aparecerem englobadas em dois registros diferentes.
Evidentemente a extensão que Garcia indica para a voz de soprano é baseada na
média (e, principalmente, leva em consideração a regra geral do repertório tradicional
da época), podendo um soprano alcançar notas mais graves ou mais agudas que as
apontadas como pelo autor como limites. Encontramos, inclusive, no repertório
tradicional atual, papéis que apresentam notas além da extensão apontada pelo autor
(podemos lembrar, aqui, momentos extremos, como um Solb 2 para a Salome de Strauss
e três Fás 5 para a Rainha da Noite em Die Zauberflöte (A Flauta Mágica) de Mozart).
Para Miller (1986, p. 134), o registro de peito do soprano vai de Sol 2 a Mib 3, o
centro baixo de Sib 2 a Dó 4, o centro alto de Dó# 4 a Fá#4, o registro agudo de Sol 4 a
Dó5 ou Dó# 5 e o registro flageolet de Ré 5 a Lá 5. É interessante notar que Garcia não
faz menção ao registro superior (flauta, ou flageolet), e também não considera notas
acima do Dó 5 na extensão do soprano. Admitindo que o autor considerava as demandas
do repertório da época, é compreensível que essas notas fossem não necessariamente
desprezadas, mas ignoradas nesta descrição apenas porque representavam exceções. Já
Miller, ao final do século XX, perante o repertório estabelecido, considera essas notas
como algo esperado pelo mercado ao menos para alguns tipos de soprano, em passagens
que levam a cantora ao Mib 5, Mi 5 ou eventualmente Fá 5, mesmo em casos de notas
não escritas mas cultivadas pela tradição. Notas mais agudas podem ser apresentadas
por algumas cantoras em determinadas passagens como efeito de virtuosismo, mas são
raras.
O fato de ser não só a voz feminina mais aguda mas também – evidentemente –
a mais aguda entre as voz humanas traz para o soprano características que a distinguem
das demais. O fato de ter que, além de emitir notas muito agudas, pronunciar palavras
através dessas notas, traz dificuldades relacionadas não só ao mecanismo físico mas até
mesmo a fatores acústicos. Segundo Miller (2000):
No que se refere a integridade da vogal e modificação vocálica na região
aguda, já notou-se que a voz feminina exibe um número de fatores acústicos
diferentes daqueles das vozes masculinas. Como o número de harmônicos
parciais proeminentes tornam-se reduzidos à medida que a fundamental é
elevada, o soprano exibe aproximadamente apenas metade do número de
harmônicos quando canta o seu Dó agudo (Dó 5) em relação ao tenor quanto
canta o seu Dó agudo (Dó 4). Embora na notação atual de quase toda
literatura vocal o Lá médio seja escrito como Lá 440 para ambos tenor e
soprano, ele está na verdade cantando Lá 220, uma oitava abaixo dela. Uma
oitava acima (Lá agudo) o soprano está cantando 880 Hz, o tenor 440 Hz. O
soprano, então, quando canta a nota identicamente escrita, tem alguma
desculpa para não manter uma integridade vocálica tão clara como a do tenor,
por que a sua fundamental tem menos harmônicos definidores que a dele. Por
essa razão, definição vocálica na região aguda sofrerá mais modificação para
ela do que para ele. 108 (MILLER, 2000, p. 132)
Isso não significa dizer, é claro, que os sopranos são dispensados de pronunciar
as palavras com o máximo de clareza possível. No entanto, atenção especial deve ser
dada, no treinamento desse tipo de voz, às dificuldades provenientes dos fatos descritos
pelo autor.
3.2 Meio-soprano
108 With regard to vowel integrity and vowel modification in upper range, it has already been noted that
the female voice exhibits a number of acoustic factors that are different from those of male voices.
Further clarification is in order. Because the number of prominent harmonic partials becomes reduced as
the fundamental is raised, the soprano exhibits roughly only half the number of overtones when singing
her high C (C6) as does the tenor singing his high C (C5). Although in present-day notation of almost all
vocal literature middle-voice A is written as A440 for both tenor and soprano, he is actually singing
A220, an octave lower than she. At an octave higher (high A) the soprano is singing 880 Hz, the tenor
440 Hz. The soprano, then, when singing the identically written high note, has some excuse for not
maintaining as clear vowel integrity as the tenor, because her fundamental has fewer defining harmonics
than his. For that reason, vowel definition at high pitch levels will undergo more modification for her
than it does for the male.
causa do registro não utilizado os fatos estão disfarçados. 109 (VENNARD,
1967, p. 78)
109
say, No statistics
most men areare available,
baritones andbut it women
most may be mezzo-sopranos,
expected that most
butvoices have
we must medium that
remember ranges. Thatofisthe
because to
unused register, the facts are disguised.
110The mezzo-soprano, like the baritone, is the voice of common sense, the happy medium between high
and low. It does not change lady into bird at one end of the scale or into man at the other. Sensibly, it
approximates the singing to the speaking voice.
deixou uma abertura para o meio-soprano e o barítono. 111 (STEANE, 1992, p.
40)
O aumento da extensão exigida nas partes de soprano, bem como a elevação da
tessitura, portanto, foram fatores decisivos para o desenvolvimento e estabelecimento da
voz de meio-soprano como conhecemos hoje. Mas não só questões sonoras e musicais
foram envolvidas nesse desenvolvimento.
111 The term […] is relatively modern. Early sightings occur towards the middle of the eighteenth
century. Before that time there could have been no great need for a word which would denote an
intermediate voice between soprano (or treble) and contralto (or alto), because in song and opera the
soprano range was generally not required to extend far beyond the high G, and this is well within what
we now regard as the normal compass of the mezzo. The distinction became important when composers
found that they wanted to exploit the upper register of the operatic soprano voice and to be able to take
its general availability for granted. Naturally, many singers were not averse to such exploitation, but the
development was not simply a matter of the topnote cult; rather that with the rise of Romantic opera
came an ever more uninhibited and passionate mode of expression in which the upper extreme of the
voice, both male and female, provided intensity and emphasis. So the soprano ascended, as did the tenor.
Basses and contraltos more or less stayed put, wich left an opening for the mezzo-soprano and baritone.
112 Public taste has favoured the extremes, and particularly on high. Public taste has favoured he
extremes, and particularly on high. To be the prima donna, you needed to be Aida, not Amneris, La
Gioconda, not Laura, Isolde not Brangäne. As a mezzo you had to be content very often with a secondary
ingénue part like Siebel in Faust, or with the sort of role that everybody forgets about when discussing the
opera afterwards, such as Magdalene in Die Meistersinger. Sometimes there will be no part for you at all:
no part in Tosca or Bohème for instance, Die Zauberflöte or Fidelio. Meanwhile, out there will be the
soprano, the Lucia di Lammermoor, the Turandot, the star. No wonder, then, that many a voice has been
given a little push upwards in training, and that many mezzos, dissatisfied with their lot and having high
C well within their range, have been tempted to drop the rather belittling ‘half ’ in their trade-description
and become a whole soprano if only for a few years.
em trio, enquanto os dois principais papéis femininos da ópera – Pamina e a Rainha da
Noite – são sopranos, assim como Papagena. Isto, no entanto, é apenas uma
especulação. O que podemos realmente observar neste fato é que Mozart aparentemente
não via necessidade de definir um tipo diferente de voz para suas damas, e, em sua
época, a questão provavelmente resumia-se em distribuir os papéis para cantoras menos
destacadas da companhia que tivessem bom rendimento na região mais grave da voz.
Podemos ver, portanto, que, embora isso não seja recomendável, não é
impossível que um meio-soprano domine a tessitura de um soprano, ainda que por um
tempo. No entanto, para além da opção mercadológica consciente de uma cantora que
decida explorar um repertório mais agudo que o recomendado para sua voz, a fim de
conquistar um nicho maior e maior destaque nos títulos operísticos (visto que a maioria
dos papéis femininos protagonistas do repertório usual são escritos para sopranos),
devemos perceber aqui o quanto os limites tênues entre os dois tipos vocais – soprano e
meio-soprano – podem ser perigosos. No treinamento de uma jovem cantora, esses
limites podem confundir tanto ela quanto o próprio professor, e é necessária muita
atenção às características da voz, aliada a muita paciência para não tomar decisões
precipitadas. Miller (1996) diz:
113 The mezzo, it should be remembered, is a category of soprano. The young mezzo should not be asked
to darken her voice in order to sound more like a mezzo (chances are she is a soprano anyway).
profunda cria uma relação de idade errada entre os dois personagens) mas
sem a habilidade de sustentar uma tessitura de soprano ao longo de um papel.
As partes tem sido por vezes intercaladas por cantoras: pelo menos, não é
incomum para uma Adalgisa tornar-se uma Norma (começando com Grisi
que cantou Adalgisa na première para a Norma de Pasta), embora o
procedimento inverso (como quando Caballé, ela mesma uma Norma
renomada, tornou-se uma apta e honrada Adalgisa na segunda gravação de
Sutherland da ópera) seja uma raridade. O status deprima donna de Norma é
reafirmado nas cenas finais em que Adalgisa não é mais ouvida. E essa era
uma regra geral: por “ prima donna ” poder-se-ia ler “soprano”, e “mezzo”
significava algo como “seconda”.114 (STEANE, 1992, p. 40-41)
Para Garcia (1841), a extensão do meio-soprano abarca do Sol 2 ao Lá 4. Os
registros são divididos da seguinte forma: registro de peito do Sol 2 ao Fá 3 ou Sol 3,
registro de falsete do Si 2 ou Ré 3 até Dó# 4 e registro de cabeça do Ré 4 ao Lá 4.
Também aqui os limites da extensão são aproximados, evidentemente, e muitos meio-
sopranos alcançam notas mais graves e mais agudas do que as apontadas. O repertório
de meio-soprano exige, muitas vezes, até o Si 4 ou mesmo Dó 5.
Segundo Miller (1986), a extensão do meio-soprano compreende do Mi 3 ou Fá
3 ao Si 4 ou Dó 5. Quanto aos registros, segundo o autor o registro de peito vai de de Mi
3 ou Fá 3 a Mi 4 ou Fá 4, o centro baixo de Dó 3 a Sib 3 ou Si 3, o centro alto de Si 3 a
Mi 4 ou Fá 4, o registro alto de Fá 4 ou Fá# 4 a Sib 4 ou Si 4 e o registroflageolet de Si
4 a Dó 5 ou mais.
Pleasants (1966), ao falar de Giuditta Pasta (1797-1865) e Maria Malibran
(1808-1836), nos dá uma idéia sobre a voz de meio-soprano à época do
desenvolvimento deste tipo vocal, a partir de uma apreciação de Stendhal:
114 These, of course, were the parts of the prima Donna. The mezzo had to accept this as a fact of life,
and be grateful when a role like Adalgisa gave her something approaching parity. Adalgisa´s duets with
Noma assign the lower voice to her when the two sing together, but there are imitative phrases in which
both voices in turn are to sing above the stave and even upto the C. The assumption is that the ‘half’-
soprano will be able to do this occasionally during the course of a performance, but not too often. It is
very arguable, in fact, that this is a true mezzo-soprano role, in the sense that what is wanted is a singer
whose voice is that of a soprano in timbre (because a deeper voice creates the wrong age-relationship
between the two characters) but not in ability to sustain a soprano tessitura throughout a long role. The
parts have sometimes been interchanged by singers: at least, it is not uncommon for an Adalgisa to
become a Norma (starting with Grisi who sang Adalgisa at the première to Pasta´s Norma), though the
reverse procedure (as when Caballé, herself a renowed Norma, became an apt and honoured Adalgisa in
the second Sutherland recording of the opera) is something of a rarity. Norma´s prima-donna status is
reaffirmed in the final scenes when Adalgisa is heard no more. And that was the general rule: for ‘prima
donna’ you could read ‘soprano’, and ‘mezzo’ implied something like ‘seconda’.
compositor que escreva para ela deveria usar a extensão de meio-soprano
para o material temático da sua música, enquanto utiliza, como que por
acaso, e de vem em quando, notas que figuram dentro das áreas mais
periféricas de sua excepcionalmente rica voz. Muitas notas desta última
categoria são não apenas extremamente belas em si mesmas, mas tem a
habilidade de produzir um tipo de vibração ressonante e magnética que,
através de algumas combinações ainda não explicadas de fenômenos físicos,
realizam um efeito instantâneo e hipnótico na alma do espectador. 115
(PLESANTS, 1966, p. 144)
Deere (2005) chama atenção para o fato de que sopranos mais pesados
(estudaremos detalhadamente os diferentes tipos de soprano no próximo capítulo)
podem dar a falsa impressão de serem meio-sopranos:
3.3 Contralto
A voz de contralto é a voz mais grave feminina. Jander (2010) discorre sobre a
srcem do termo:
[…] quando o termo primeiro foi usado denotaria um cantor homem,
srcinalmente um falsetista, mais tarde um castrado. As várias tentativas [...]
de uma compreensão etimológica de “contralto” diretamente através de suas
raízes, contra e alto – dessa forma, uma parte escrita contra uma outra parte
alta – são mal concebidas. A palavra srcinou-se no início do século XVI
como “contr´alto”, uma abreviação local do termo do final do século XV
“contratenor altus”. Ao longo do século XVI, no entanto, a forma “contralto”
era usada raramente, sendo “alto” o termo comum. No século XVII, à medida
que castratos tornaram-se mais numerosos na Itália, autores por vezes
buscaram criar distinções. “Alti naturali” era usado para designar falsetistas,
enquanto Andrea Adami (um soprano castrado) usou a palavra “contralto” em
seu “Osservazioni
em 1639) e Mario ”(1711)
Savioni para referir-se
(morto aosmembros
em 1685), castradosdo
Stefano LandiBurney,
coro papal. (morto
no entanto, não fez distinção, e usou “contralto” tanto para castrados como
para mulheres. [...] quando castrados não estavam mais na cena musical,
“contralto” veio a referir-se sempre a uma mulher, distinto de um alto
115 “Madame Pasta´s voice”, wrote Stendhal, when she was at the height of her vocal powers, and before
any signs of decay or damage had set in, “has a considerable range. She can achieve perfect resonance
on a note as low as the bottom A, and can rise as high as C sharp or even to a slightly sharpened D; and
she possesses the rare ability to sing contralto as easily as she can sing soprano. I would suggest that he
true designation of her voice is mezzo-soprano, and any composer who writes for her should use the
mezzo-soprano range for the thematic material of his music, while exploiting, as it were, incidentally, and
from time to time, notes which lie within the more peripheral areas of this remarkably rich voice. Many
notes
of of this last
resonant and category
magneticare not only extremely
vibration, fine in some
which, through themselves, but have the combination
still unexplained ability to produce a kind
of physical
phenomena, exercises an instantaneous and hypnotic effect upon the soul of the spectator.
116The teacher´s responsibility for this voice is to make sure the mezzo is neither a lyric nor lirico spinto
soprano. Again, weight and range are the primary determinants. Darkness may be considered, but is
much less a factor. [...] Of great importance is the nature of the upper voice above F, top line.
masculino (um menino alto, ou um falsetista). 117 (JANDER, 2010, sem
numeração de página)
A voz de contralto é tão rara que muitos professores não encontram cantoras
desta categoria. Um perigo muito real está, no entanto, em dizer a uma jovem
meio-soprano que ela é uma contralto e permitir que ela cante apenas na
metade mais grave de seu alcance negociável. Um ponto de vista lógico
sugere que o contralto pode nem mesmo existir como um veículo prático de
performance na jovem mulher, por que o som potencial de contralto necessita
anos de maturidade e crescimento. Pedir a uma mulher que use atividade
pesada do músculo vocal (“peito”) é correr o risco de ela nunca encontrar a
coordenação gradual própria dos crico-aritenóides na extensão aguda. 118
(MILLER, 1996, p. 178)
117 […] when the term was first used it would have denoted a male singer, srcinally a falsetto singer,
later a castrato. The various attempts […] at an etymological understanding of ‘ contralto’ directly
through its roots, contra (‘against’) and alto (‘high’) – thus, one part written against another high part –
are misconceived. The word srcinated in the early 16th century as ‘contr’alto’, a local abbreviation of
the late 15th-centurycontratenor altus. Throughout the 16th century, however, the form ‘contralto’ was
used only rarely, alto being the common term. In the 17th century, as castratos became more numerous in
Italy, authors sometimes sought to create distinctions. ‘Alti naturali’ was used to designate falsettists,
while Andrea Adami (a castrato soprano) used the wordcontralto’
‘ in his Osservazioni (1711) to refer to
the castratos Stefano Landi (d 1639) and Mario Savioni (d 1685), members of the papal choir. Burney,
however, made no such distinction, and used ‘contralto’ for both castratos and women. […] when
castratos were no longer on the musical scene, ‘ contralto’ came to refer always to a woman, as distinct
from a male alto (a boy alto, or a falsettist).
118 The contralto voice is such a rarity that most teachers do not encounter singers of that category. A
very real danger exists, however, in telling a young mezzo that she is a contralto and in allowing her to
sing in only the lower half of her negotiable range. A logical viewpoint suggests that the contralto may
not even
sound existyears
needs as aofpractical
maturity performance vehiclea inwoman
and growth. Asking the young
to usefemale, becausemuscle
heavy vocalis the potential contralto
activity (“chest”)
runs the risk of her never finding the proper graduated crico-arytenoidal coordinations in upper range.
119 Since the genuine contralto voice is such a rarity, voice teachers are urged to use caution in labeling
a female singer a contralto. Occasionally, a well-intentioned vocal teacher will place this label on a
young low-voiced female singer who is actually a mezzo-soprano or perhaps even a soprano.
3, o centro alto de Sib 3 a Ré 4 e o registro alto de Mib 4 a Láb 4. O autor sugere ainda
uma extensão ao Lá 4, no registro flageolet, segundo ele, raramente desenvolvido.
Embora hoje tenhamos nos acostumado a ver a voz de contralto como uma voz
rara, e a não encontrar normalmente cantoras que se apresentam sob essa classificação,
Deere (2005) pondera:
Mas, tão óbvio como é hoje referir-se às vozes mais graves femininas como
meio-sopranos, a tendência entre os ingleses, e às vezes entre os americanos,
nos anos quarenta e cinqüenta e antes era enfatizar a designação de contralto
para as vozes graves.120 (DEERE, 2005, p. 25)
O fato de ser uma voz rara, aliado ao fato de dispor de poucos papéis específicos
para ela em relação à literatura para qualquer outro tipo vocal põem o contralto em uma
120 But as obvious as it is today to refer to the lower female voices as mezzos, the English, and sometimes
American, tendency in the forties and fifties and earlier was to emphasize the contralto designation for
the lower voices.
121 Of the individual female voice types, Garcia wrote the following: the contralto voice is manly and
energetic in the chest voice, the register in which it is most distinctive. This register was unrecognized or
neglected for the most part, he wrote, especially in France. The contralto voice was not well-understood,
and Garcia seems to have comprehended that to expect this voice type to behave like a different one
would have been ineffective, if not damaging. Regarding tessitura, Garcia did state that the upper register
is fatiguing for the contralto if she is asked to sustain it for a prolonged period of time.
&!!
The contralto voice was virtually unknown in France; the French bas-dessus was of mezzo-soprano
rather than contralto pitch and quality. The contralto hardly appears in the operas of Gluck and indeed is
rare throughout the Classical period; there is no truecontralto role, in terms of range and weight, in any
Mozart opera.
situação realmente delicada. Como vimos, há o perigo de confiar tanto no registro de
peito que a negociação para as notas mais agudas torna-se inviável, e ao mesmo tempo
vimos também que tratar da voz de contralto sem respeitar suas particularidades pode
ser danoso. Garcia diz que o contralto apresenta fadiga se exigido a sustentar o registro
superior por muito tempo, e Miller chega a questionar a viabilidade da voz de contralto
em uma jovem cantora. No entanto, trata-la como meio soprano provavelmente traria
frustrações ou danos para a estudante a quem se propõe um repertório e uma tessitura
não apropriados. Portanto, o professor que orienta uma contralto deve ficar atento para,
ainda que com cautela, desenvolver sua voz gradativamente de acordo com suas
possibilidades, cuidando para preservar as suas qualidades naturais.
3.4 Tenor
A voz de tenor é a mais aguda entre as vozes masculinas. Jander (2010) faz
uma breve revisão do desenvolvimento da voz de tenor como conhecemos hoje:
123 Until the late 18th century and even the early 19th, most tenors in the Italian tradition emphasized the
lyrical quality of their top range and, when required, carried their voices with ease into the ‘head voice’
or falsetto
from C to register.
g in fullAsvoice
!
Joseph
anddetoLalande
"
wrote Voyage
d in falzetto (or fausset
d’un françois en Italie, 2/1786), ‘the tenor goes
’. During the first half of the 19th century,
however, this traditional manner fell into disuse as tenors began to pull the full weight of their middle
voice into the highest registers. The new dramatic potential of the tenor voice led to its increasing
dominance over the castrato or musico for leading roles and the development of specific tenor voice
types, including the lyric, the lyric coloratura, the Heldentenor, the spinto and the robusto.
discrepância com nossos parâmetros pode ser justificada pelo repertório da época.
Garcia faz menção também à extensão e passagens de registro de um tipo de voz
denominado contraltino (ou haute-contre). Como outras fontes também citam um tipo
de voz intermediária entre a voz de tenor e a de contralto sob o nome contraltino mas
também sob o nome tenorino, e esse tipo vocal é apresentado como um tipo de tenor,
detalharemos suas características no próximo capítulo, em que trataremos das
subclassificações.
Miller (1986), para vozes masculinas, aponta apenas as passagens entre registros
(os pontos pivotais) e não sua extensão. No caso dos tenores, define diferentes pontos
de transição entre registros, dependendo do tipo de tenor (detalharemos no próximo
capítulo). No momento, interessa-nos a opinião do autor de que o tenor faz a primeira
passagem entre Dó 3 e Fá 3 e a segunda passagem entre Fá 3 e Sib 3. Em ambas as
passagens, obviamente a primeira opção refere-se ao tipo mais pesado de tenor, a
segunda ao tipo mais leve.
Segundo Garcia (1894), o tenor tem mais facilidade para usar o registro de
falsete e o de cabeça que o barítono e o baixo. Maior facilidade, neste caso,
provavelmente tem mais a ver com mais predisposição do que com ausência de
dificuldade. Devido à natureza de seu instrumento, o tenor emite as notas mais agudas
da extensão masculina e portanto deve usar os registros mais altos com mais
desenvoltura – e por uma região maior de sua extensão – do que o baixo ou o barítono.
Isso não quer dizer que seja uma tarefa fácil. Ao contrário, Miller (1993) afirma ser a
voz de tenor a mais difícil de ser dominada dentre os diversos tipos de voz:
Embora todos os cantores atuem melhor quando usam seus instrumentos
vocais eficientemente, o tenor demanda um nível ainda mais alto de função
precisa que outros cantores, um fato muitas vezes ignorado ou não
compreendido por professores acostumados com o típico homem de voz
média-grave, o barítono. 124 (MILLER, 1993, p. ix)
No entanto, o que faz a voz de tenor ser uma voz particularmente trabalhosa não
é só o fato de cantar notas mais agudas que seus colegas de voz grave ou o fato de usar
mais os registros mais altos. Mesmo dentro da extensão esperada, boa parte da música
124 Although all singers perform best when they use their vocal instruments efficiently, the tenor requires
an even higher level of precise function than do other singers, a fact often overlooked or misundertood by
teachers accostumed to the typical medium-low-voiced male, the baritone.
do repertório operístico tradicional para tenores reside em sua região mais alta. Miller
(1993) diz também:
125 A look at the tessitura of roles sung by protagonists in most operas reveals why the life of the tenor is
not always easy. When one considers where the pivotal points of the register occur in lower male voices
and compares them with register demarcation points in tenor voices – and how the relative literatures lie
with regard to those register events – one realizes that the tenor has to negotiate a greater number of
phrases and sustained notes in upper range than does the baritone or bass with his voice. It may be
asked, “Well, why not? Isn´t that the expectation for a ‘high’ voice?” It is no easier for the tenor to sing
in the upper third of his voice than for the baritone to do so in his, yet the literature demands it more
frequently of the tenor than of any other vocal type. As a result, the breath energy level to be maintained
is frequently much higher for tenor voices than is the case for other singers. Register factors in the
soprano voice, for example, do not parallel those of the tenor, except for some incidental parallelism of
the F# - G passaggio phenomen.
do Sol 4 não requerem o mesmo grau de energia do soprano lírico que as
notas acima do Sol 3 requerem do tenor lírico. 126 (MILLER, 1993, p. 106)
Portanto, assim como a voz de soprano, por ser a voz feminina mais aguda,
guarda peculiaridades decorrentes deste fato, também a voz de tenor – não só em termos
de sonoridade, mas também em termos práticos de produção sonora e musical – guarda
peculiaridades que o distinguem bastante do barítono e do baixo. E, no entanto, pela
afirmação de Miller (1993), podemos entender que o fato de tenores e sopranos serem
as vozes mais agudas dentro de seu gênero, isso não basta para que elas sejam pareadas
em termos práticos. Todas essas ponderações evidenciam, também, que a voz de tenor
tem ao menos a forte tendência a ser a voz mais complicada em termos de domínio
técnico, e atenção especial deve ser dada, ao treinar esse tipo de voz, ao domínio da
passagem para o registro alto e à sustentação da voz na sua região aguda.
3.5 Barítono
A voz de barítono é, dentre as vozes masculinas, a voz média. Como já foi dito
anteriormente, segundo Steane (1992), assim como o meio-soprano, o barítono
aproxima o canto da voz falada. Deere (2005) está de acordo com Vennard (1967) ao
dizer que a maioria entre os homens é barítono: “O barítono poderia bem ser
denominado a voz masculina mais “normal”.127 (DEERE, 2005, p. 33)
Segundo Deere (2005):
Ele frequentemente canta o papel do irmão, do soldado, e, normalmente, o
“pesado”. Essa voz requer apenas pequenos graus de coloração mais escura, e
o barítono pode achar sua voz aguda um pouco mais facilmente que o baixo
ou tenor. Embora possa ser útil principalmente para comédia ou para
“marcar” uma parte no ensaio, sua habilidade de cantar falsetto é
normalmente maior que a das vozes de tenor ou baixo. 128 (DEERE, 2005, p.
33)
126 Considering the larger size of his instrument (his laryngeal structure, the character of the
surrounding musculature, and other contributing factors of the male physique), his feat in producing a
ringing high Bb 4 in the third-act unison duet with the soprano is more remarkable than her Bb 5.
Because of physical and acoustic differences between the tenor and soprano instruments, pitches above G
5 do not require the same degree of energization from the lyric soprano than those above G 4 demand of
the lyric tenor.
127
The baritone might well be termed the most “normal” male voice.
128 He often sings the role of the brother, the soldier, and, generally, the “heavy”. This voice requires only
smaller degrees of darker coloration, and the baritone may find his high voice a bit more easily than the
bass or tenor. While it may be useful primarily for comedy or for “marking” a part in rehearsal, his ability
to sing falsetto is often greater than that of the tenor or bass voices. (DEER E, 2005, p. 33)
Por falsetto, na afirmação de Deere, entenda-se a produção vocal sem contração
dos tiro-aritenóides, provocando a impressão de uma voz feminina.
Para o barítono, Garcia (1841) apresenta duas tabelas de extensão e registros
diferentes. A primeira descreve uma extensão de Solb 1 (ou Mi 1) a Solb 3, com registro
de peito de Solb 1 (ou Mi 1) a Ré 3 ou Ré# 3 e registro de falsete de Solb 2 a Solb 3. A
segunda, por sua vez, descreve uma extensão de Sib 1 (ou Sol 1) a Láb 3, com registro
de peito de Sib 1 (ou Sol 1) a Fá 3 ou Fá# 3 e registro de falsete de Sib 2 a Láb 3. As
duas tabelas diferentes provavelmente referem-se a dois tipos de barítono diferentes,
que, como vamos ver no próximo capítulo, podem ser identificados como barítono lírico
e barítono dramático, ou mesmo uma voz intermediária denominada baixo-barítono.
Sendo uma voz intermediária, é natural que determinados barítonos estejam mais
próximos de algum dos extremos do que outros. Percebemos, também, que Garcia não
apresenta voz de cabeça para o barítono, o que, junto com o registro de cabeça
apresentado para o tenor, apenas no extremo agudo de sua extensão, corrobora com a
tese de apenas dois registros na voz masculina (com exceção do extremo da voz
masculina), diferente da voz feminina que apresenta três registros.
Miller (1986) diz que o barítono tem sua primeira passagem no Si 2 ou Sib 2 e a
segunda no Mi 3 ou Mib 3. É interessante notar que, ao contrário de Miller, que aponta
pontos de passagem de registro variantes dentro de uma mesma classificação vocal para
todas as vozes masculinas, dada a sua subclassificação, Garcia (1841) o faz apenas para
Antonio Tamburini (1800-1876) tinha a voz mais aguda entre os dois. Sua
extensão é variavelmente dada como de Dó a Sol e de Fá a Fá. Ambas podem
estar corretas, a primeira referindo-se à sua juventude, a segunda à sua
maturidade. Quando jovem sua voz pode, por um tempo, ter tido algumas das
características dos barítonos agudos de hoje, embora não houvesse partes
para esse tipo de voz na época. Um fato ilustrativo é sua recusa a cantar o
papel de Don Carlo em Ernani por ser muito agudo para ele. Isso foi em
1847, quando Tamburini tinha quarenta e sete anos, uma idade em que a
maioria dos barítonos reais ainda tem um Sol. É significante, também, que a
parte foi por fim cantada por Alboni, um meio-soprano. Simplesmente não
havia, naqueles dias, muitos barítonos agudos reais disponíveis. 129
(PLEASANTS, 1966, p. 184-185)
129 Antonio Tamburini (1800-1876) had the higher voice of the two. Its range was variously given as from
C to G and from F to F. Both may be correct, the first applying to his youth, the latter to his maturity. As a
young man his voice may, for a time, have had some of the characteristics of today´s high baritones,
although there were no parts for such a voice at the time. An illustrative fact is his declining to sing the
role of Don Carlo in Ernani on the grounds that it was too high for him. That was in 1847, when
Tamburini was forty-seven, an age when most true baritones still have a G. It is also significant that the
part was ultimately sung by Alboni, a mezzo-soprano. There simply were not, in those days, many true
high baritones around.
O barítono, no repertório tradicional, dificilmente é o protagonista, embora
normalmente os títulos apresentem papéis de destaque para esse tipo de voz. É
normalmente associado ao vilão ou ao rival amoroso, mas também a personagens mais
velhos, pais da mocinha ou do mocinho. É importante ter muita atenção às
características indicativas da voz de barítono, pois, assim como no caso do meio-
soprano, as perspectivas de repertório para a voz grave masculina podem induzir o
jovem barítono com facilidade de agudos a investir perigosamente na tessitura tenoril,
por ambições artísticas ou mesmo mercadológicas.
Mesmo a clareza ou leveza da voz de um jovem barítono podem induzir aluno e
professor a presumirem que ele é, na verdade, um tenor, por ele não apresentar o som
mais escuro que se esperaria de uma voz média. Timbre, nesse caso, pode não ser um
fator tão determinante na classificação como a percepção minuciosa das passagens de
registro, e sobretudo da tessitura (mesmo levando em consideração que um tenor, por
ainda não dominar seu registro alto, pode não se sentir confortável, a princípio,
cantando na tessitura esperada para seu tipo de voz). Justamente por ser uma voz
intermediária e por se aproximar, em alguns casos, dos tenores mais pesados, o barítono
pode ter características que dão pistas erradas sobre sua classificação. Segundo Miller
(1993):
130 Sometimes the wide range of categories within the tenor classification is not recognized, and voices
that exhibit registration events appropriate to heavier tenor instruments are perceived as indicating a
baritone, or even a bass-baritone. Nor is range an entirely reliable indicator of vocal category, inasmuch
as some tenors have a good low G 2 and some baritones do not. A baritone, on the other hand, may
actually have a better A 4 than the potential tenor. Many young tenors do not know how to achieve entry
into upper voice, and if the voice is sizable they may well be falsely classified as baritones.
da maioria das condições por ele descritas indica um tenor não desenvolvido, o que
pode ser um método eficaz de verificação. Por outro lado, devemos considerar também
a possibilidade de que um barítono real seja considerado um tenor que ainda não
dominou a passagem para o registro agudo. A voz de barítono, como vimos, pode
apresentar muitas variações, e a indecisão entre tenor e barítono é uma situação a ser
encarada com muita atenção.
3.6 Baixo
A voz de baixo é a voz mais grave masculina, e portanto a mais grave entre as
vozes humanas.
Garcia apresenta a extensão do baixo de Fá 1 ou Mi 1 a Sol b 3, com registro de
peito de Fá 1 ou Mi 1 a Ré 3 ou Mi 3 e registro de falsete de Sib 2 a Solb 3. Vemos que,
enquanto o tenor utiliza a voz de cabeça apenas no extremo agudo de sua extensão e o
barítono canta a maior parte de sua extensão no registro de peito, o baixo utiliza o
registro de peito na absoluta maioria das notas de sua extensão. Miller (1986), como faz
na descrição de todas as vozes masculinas, aponta apenas as passagens de registros: a
primeira passagem no Lá 3 e a segunda passagem no Ré 4.
Como já vimos, até o estabelecimento da voz de barítono, todos os homens de
voz grave eram classificadas como baixos. A voz de barítono, portanto, por contraste,
evidencia as características particulares da voz que hoje compreendemos como o baixo,
e evidencia inclusive o quão inadequados papéis antes destinados a essa classificação
revelam-se à voz de baixo segundo os padrões atuais. Segundo Miller (2008):
131 With the growing demand for dramatic contrast among all types of voices, male singers became
identified by subcategories: (I) baritone, (2) bass-baritone, and (3) bass. Certainly, roles in the operas of
Mozart and Rossini forever altered the notion that male voices are either patently tenor or distinctively
bass. Voices within theses subcategories may be lyric or dramatic, calling forth additional labels such as
lyric baritone, dramatic baritone, basso-cantante, lyric bass, and dramatic bass. In addition, there are
“buffo” divisions to correspond to each of the “serious” categories.
Miller apresenta diversas subclassificações que srcinaram-se, de certa forma,
do conceito de baixo antes do estabelecimento da classificação de barítono. Muitos dos
papéis Mozartianos citados por Miller, embora sejam hoje tradicionalmente cantados
por barítonos devido à sua tessitura essencialmente central e à necessidade de contraste
sonoro entre personagens, podem com facilidade ser cantados por alguns baixos, e
efetivamente o são. A menção à subclassificação “ buffo” mostra-nos uma faceta
bastante explorada deste tipo vocal, pois embora haja na literatura papéis cômicos para
tenores ou mesmo para barítonos, esses papéis normalmente são destinados à voz de
baixo.
A voz de baixo, porém, é também associada a personagens solenes, mais velhos,
sábios, profetas, deuses e demônios. A identificação desses personagens com a voz
escura e profunda do baixo, a quem cabem as notas mais graves da extensão humana, é
no mínimo compreensível. Sobre a voz de baixo, diz Jander (2010):
Miller (2008) faz uma apreciação das possibilidades da voz de baixo em termos
sonoros e mercadológicos:
132 The depth of his voice was commonly taken to suggest advanced age (though Puccini probably had
the right idea when he made his aged Emperor inTurandot an enfeebled tenor). In Verdi’sErnani the
bass is allotted the part of Silva, habitually addressed as ‘vecchio’, ‘ vecchio misero’ and so forth. In
his I masnadieri the bass’s role is that of Count Massimiliano, old enough to have begotten the tenor
and the baritone who play his sons. The voice-casting of Simon Boccanegra provides an example of
the way in which operatic convention established an unwritten law to the effect that depth of voice was
directly proportionate to advance in years: thus the tenor is the young hero in love with the daughter
of the baritone who in turn loves the daughter of the bass.
papéis para baixos compreende uma vasta gama, desde o ancião respeitado
ao amante sensual. Além disso, a literatura para baixo buffo representa uma
importante faceta do repertório potencial. E muito da literatura de oratórios
para voz grave é propriedade do baixo. Quando a voz de baixo treinada
possui a capacidade de profundidade e brilho, é difícil imaginar um timbre
masculino mais gratificante. 133 (MILLER, 2008, p. 11, 12)
Considerações
Como vimos, cada um dos seis tipo vocais (soprano, meio-soprano, contralto,
tenor, barítono, baixo) possui características distintas, e podemos distingui-las
utilizando parâmetros ora mais, ora menos perceptíveis, como extensão, passagens de
registro, tessitura e timbre. É interessante notar que, embora os autores detalhem os
limites de extensão total e de extensão dos registros, sobre o timbre particular de cada
tipo vocal pouco é dito. Evidentemente, isso se deve ao fato de que o timbre, como
vimos no capítulo 2, é a mais abstrata entre as propriedades do som musical. Ainda que
se possa identificar a classificação de um aluno pela percepção de seu timbre, isto
exigirá muita experiência auditiva pessoal do professor, e as diferenças entre os timbres
não podem ser descritas com maior precisão do que “mais claro”, “mais escuro”, “mais
leve, mais pesado”.
Quaisquer que sejam os meios que levem o professor a classificar uma voz, é
essencial que todos os alunos sejam classificados corretamente e que sejam trabalhados
de acordo com suas particularidades. McKinney (2005, p. 111) diz que os perigos de
uma classificação errada são: perda de beleza do som e liberdade de produção, uma
carreira no canto encurtada, frustração e desapontamento contínuos e a possibilidade de
sérios danos vocais. Diz também que infelizmente esses perigos não são imediatos.
Devido à grande resistência da voz humana, especialmente no jovem adulto, os danos
podem demorar meses ou até mesmo anos para aparecer, mas persistir em cantar fora de
sua melhor região em algum momento trará consequências. O autor diz ainda:
&((
A number of contemporary performing artists are listed as adhering to both the bass-baritone and the
bass categories. Among all low-voice categories of the singing voice, the true bass is the most rare. His
sonorous depth of quality is impressive. Much of his literature demands the same degree of velocity as
that required of higher, lighter voices. The spectrum of roles for the basscovers a wide range from
respected elder to sensuous lover. In addition, the bass buffo literature represents a major facet of
potential repertoire. And much of the oratorio literature for low voice is the property of the bass singer.
When the schooled bass voice possesses the capability of depth and brilliance, it is difficult to envision a
more gratifying male timbre.
nível de afinação muito agudo pode contribuir para certas desordens vocais.
Dr. F. S. Brodnitz relaciona cantar em um nível muito agudo ao
desenvolvimento de nódulos vocais, e Margaret Greene declara, “Sopranos
cantando acima de sua extensão natural podem desenvolver nódulos vocais,
uma vez que muitas são meio-sopranos mas o gosto hoje é por cantoras
sopranos.” Canto extensivo nos limites superiores de sua voz natural é um
pouco como dirigir um carro em velocidade máxima o tempo todo. Você
pode percorrer muitas milhas, mas o motor vai desgastar muito mais cedo do
que se você dirigisse em velocidades normais, e provavelmente teria que
pagar algumas multas. Tensão crescente nas cordas vocais é uma das formas
de subir a afinação. Cantar acima de sua melhor tessitura mantém suas cordas
vocais sob uma grande quantidade de tensão desnecessária por longos
períodos de tempo, e a possibilidade de abuso vocal é grandemente
aumentada. (MCKINNEY, 2005, p. 111)
preceitos do sistema fach, que leva em consideração fatores mais específicos como
aptidões artísticas e tipo físico.
4 AS SUBCLASSIFICAÇÕES E O SISTEMA FACH
O autor diz também que os alemães usam a palavra Fach tanto para indicar
classificação de papéis como para as demandas da voz. Vemos aqui como são tênues os
limites entre a análise e categorização da literatura vocal, a adequação das qualidades
vocais à parte e a rotulação do cantor-instrumento. Fach significa em alemão
departamento ou seção e designa, em termos profissionais, área de atuação. Embora um
cantor possa optar por cantar papéis de características bastante divergentes, o sistema
previne que alguém seja obrigado, por contrato, a cantar um papel que não seja
adequado para sua voz. E, também por uma questão mercadológica, algumas dessas
classificações extrapolam questões vocais e musicais, encontrando em aptidões
artísticas e até mesmo físicas suas características.
Esse sistema é utilizado em teatros que mantém cantores contratados por
temporada, o que não é realidade no Brasil. Mas a relevância do assunto é atestada pelas
publicações específicas utilizadas neste trabalho. Mesmo Titze (2000), autor
essencialmente científico que em quatrocentas e nove páginas esmiúça questões
atual que dialoga com o gosto do público moderno, com as práticas atuais e com a
realidade do mercado. A classificação vocal, como vimos, é fundamental para que o
aluno desenvolva-se técnica e artisticamente, mas há ainda uma questão pós-
classificatória. A percepção de onde ele se encontra dentro no universo de sua
classificação vocal é importante para que ele possa entender a melhor forma de se
inserir no mercado – que é, afinal, o desejo de todo aluno aspirante a cantor
profissional.
Os diferentes autores apresentam formas de categorização e nomenclaturas
diversas. Esta seria uma boa prova – se é que uma prova se faz necessária – de que essas
subclassificações não são mais do que uma observação da média para catalogação e
posterior identificação dos cantores profissionais (não devendo jamais ser encaradas
como uma “verdade absoluta” ou um “veredito final”). Ao longo do capítulo,
comentaremos essas discrepâncias e buscaremos o diálogo entre elas. Assim como
podemos facilmente observar que não há uma concordância absoluta quanto à
categorização ou à nomenclatura das subclassificações, também é fácil perceber que
sopranos e tenores despertam uma variedade maior de categorizações, talvez pelo fato
de serem vozes mais requisitadas no repertório e portanto apresentarem também maior
variedade entre si. As vozes de barítono e meio-soprano apresentam menos variações no
geral, e as vozes de baixo e contralto são as que menos se subdividem. Isto pode se
dever a alguns fatores: um número mais discreto de representantes (o que diminui as
possibilidades de variedades notáveis entre elas), o uso predominante de um único
registro ao longo da maior parte da extensão (o que pode limitar as possibilidades de
variedades de colorações no canto) e um número menor de papéis de destaque no
repertório (o que reduz evidentemente a possibilidade de contrastes entre papéis da
mesma categoria).
Podemos observar também que algumas categorizações apresentadas trazem
parâmetros tão específicos que é impossível não esperar alguma intercambialidade entre
elas. De fato, a descrição de algumas destas categorias sugerem que elas sejam, na
verdade, mais uma variação de uma determinada subclassificação do que uma
subclassificação em si. Para efeitos de organização deste trabalho, identificamos
algumas especificidades marcantes no processo de subclassificações que facilitam a
identificação e compreensão das categorias tradicionalmente conhecidas.
Naquela época, todos os cantores eram chamados líricos, que era o termo
genérico denotando uma voz treinada para oteatro lírico. Mas depois, com o
advento de orquestras maiores e uma profusão de estilos operísticos, novas
135
categorias vocais apareceram. (BOLDREY, 1994, p. 7)
135 At that time, all singers were called lyric, which was the generic term denoting a voice trained for
lyric theatre. But then, with the advent of larger orchestras and a profusion of operatic styles, new voice
categories appeared.
Titze (2000, p. 195) apresenta-nos uma lista de termos utilizados nestas
subclassificações. As vozes são subdivididas em termos de peso, cor e grau de
agilidade, e os termos-chave utilizados nas classificações são ligeiro, lírico e dramático
(referindo-se a cor e peso), coloratura (referindo-se a um alto grau de agilidade) e spinto
(uma qualidade de lírico que será explicada oportunamente). Há ainda termos
influenciados mais por aptidões artísticas do que propriamente vocais, como soubrette,
cômico, buffo, característico ou Spiel. Titze (2000, p. 195), além destes termos, cita
ainda cantante e profondo (aplicados apenas aos baixos), flageolet (para vozes finas e
agudas – o termo não aparece em nenhuma outra das fontes estudadas indicando
classificação) e Helden (que significa heróico e, segundo o autor, é aplicado a tenores,
embora seja utilizado também para sopranos e eventualmente barítonos, como veremos
adiante).
A variedade de tipos vocais é grande, assim como são variados os parâmetros.
Diz Steane (1992):
136 Repertoires overlap, range may be misleading, and power is not such a straightforward proposition
as it may seem (think of those performances of Siegfried with their Wotan world-famous for his massively
powerful voice which, however, we hear less than the squeaky and insignificant tenor of Mime, which
comes over loud and clear). At several points I felt a strong desire to cut across the recognized types
(lyric, dramatic, spinto and so forth) and recategorise them timbre. Vocabulary would then have been a
difficulty. The ‘thin’ and the ‘fat’, the ‘dark’ and the ‘light’, the ‘straight’, the ‘ripe’, ‘the lush’ and the
‘loose’: such not satisfactory terms would be the ones we would have to use till somebody devises better.
It must have been some such problems of nomenclature that led the French to commemorate their Marie
Corneille Falcon (1812-1897) and Jean-Blaise Martin (1769-1837) by naming voice-types after them.
The trouble is that their precise timbre is now lost to memory: if a number of singers whose records
served for reference could be set up as archetypes of the essential timbres, there might be something in it.
Passaremos agora a analisar as características que levam um cantor a ser inserido
em cada uma destas categorias, e para tal organizaremos as subclassificações desta
forma: “Soubrette”, “Soprano Ligeiro”, “Soprano Lírico”, “Soprano Spinto”, “Soprano
Dramático”, “Meio-soprano ligeiro”, “Meio-soprano lírico”, “Meio-soprano dramático”,
“Contralto lírico”, “Contralto dramático”, “Tenor Ligeiro”, “Tenor Cômico”, “Tenor
Lírico”, “Tenor Spinto”, “Tenor Dramático”, “Barítono Lírico”, “Barítono Dramático”,
“Baixo-Barítono”, “Baixo buffo”, “Baixo cantante”, “Baixo profundo”.
4.1 Soubrette
Para o autor, as características da soubrette são: voz leve, flexível, boa região
aguda, registro médio claro e região grave mais fraca, além de aparência graciosa,
habilidades como atriz e boa dicção dos idiomas. É claro que isso não significa que
cantoras das outras categorias femininas não precisem ser boas atrizes ou ter boa dicção.
Antes, significa que é esperado que a soubrette tenha essas características mais
destacadas por serem elas mais relevantes – na maioria das vezes – do que seus méritos
vocais, visto que a esse Fach estão associados papéis cômicos, de caráter jocoso e
faceiro.
O autor diz ainda que, apesar de ser o termo normalmente associado a sopranos,
a soubrette pode ser um meio-soprano ou até mesmo um contralto. A Despina, por
exmplo, em conjuntos, fica abaixo de Fiordiligi e Dorabella, mesmo sendo a segunda
137 An operatic soubrette is in a direct line of character types evolved from the Columbine of the older
commedia dell´arte tradition of the Italian theatre, epitomized in 18th-century opera by Serpina
(Pergolesi, La Serva Padrona). By 1800, the term in opera primarily meant a cunning servant girl, such
as Despina (Mozart, Così fan tutte). The term soubrette has also been extended in opera to include any
clever young girl, such as Zerlina (Mozart, Don Giovanni).
normalmente cantada por meio-sopranos. Considerando que Mozart concebeu as três
personagens femininas de sua ópera para sopranos, é compreensível que, mesmo tendo
a mesma categoria vocal, Despina, por ser uma personagem cômica não protagonista,
receba linhas mais graves do que as de Fiordiligi ou Dorabella. Steane (1992) diz que,
dentre as soubrettes mozartianas, Blonde (Die Entfürung aus dem Serail) é a que mais
exige vocalmente, Zerlina (Don Giovanni) é a mais recompensante, Susanna Le
( Nozze
di Figaro) é a mais sutil e Despina (Così fan Tutte) a mais arquetípica. O autor diz ainda
que esses são papéis-chave do repertório, ponderando ainda que uma PapagenaDie
(
Zauberflöte) provavelmente migrará, mais tarde, para a heroína Pamina na mesma
ópera.
Boldrey (1994, p. 20) chama-nos atenção para o fato de que os papéis de
soubrette estão normalmente associados a papéis cômicos cujo nome termina com-ina
ou -etta, sufixos italianos que indicam diminutivo. O autor dá como exemplos
personagens de outros compositores de óperas cômicas, como a Lisetta de Haydn, a
Giulietta de Jomelli e a Livietta de Sarti.
Assim como Lisetta significa “Pequena Lisa”, ou “Querida Lisa”, assim a
soubrettte é uma moça jovem e esperta, com uma voz jovial – uma voz que é
leve, delgada, ágil e brilhante. Essa definição de soubrette também inclui
papéis secondários como Papagena (Mozart, Die Zauberflöte), Marzelline
(Beethoven, Fidelio) e heroínas de operetta como Patience (Sullivan,
Patience).138 (BOLDREY, 1994, p. 20)
Lirismo leve, agilidade fácil, charme físico e aparência jovial são qualidades
essenciais da soubrette. Obrigações da soubrette abrangem efervescência
vocal e negociação melismática fácil ao longo de uma extensão ampla
138 Just as Lisetta means “Little Lisa” ou “dear Lisa”, so the soubrette is a young and sprightly girl-
woman, with a youthful voice – a voice that is light, slender, agile, and bright. This definition of a
soubrette voice also includes secondary roles such as Papagena (Mozart, Die Zauberflöte) and
Marzelline (Beethoven, Fidelio) e heroínas de operetta como Patience (Sullivan, Patience).
(embora a soubrette seja menos dependente das regiões agudas que a soprano
coloratura). 139 (MILLER, 2000, p. 7)
139Light lyricism, facile agility, physical charm, and youthful appearance are essential qualities for the
soubrette. Soubrette duties encompass vocal effervescence and easy melismatic negotiation over a wide
range (although the soubrette is less dependent on the highest regions than is the coloratura soprano).
qualidades que fazem sua individualidade e sua especial utilidade. 140
(STEANE, 1992, p. 4)
Um soprano lírico coloratura leve é uma cantora de voz leve cuja qualidade é
mais próxima de uma soubrette do que de um soprano lírico verdadeiro, cuja
voz é normalmente mais brilhante do que quente, que pode facilmente cantar
escalas, grupetos e harpejos, e é conhecida por seu alcance extremamente
agudo. Ela também é por vezes chamada sopranoleggero, embora esse seja
um termo mais genérico que refere-se a qualquer soprano leve e ágil com ou
sem alcance agudo. 141 (BOLDREY, 1994, p. 21)
o termo coloratura:
140 There are vocal limitations as well. She is a light soprano in two senses: that is, she has no great
reserves of power, and her voice will be bright in tone-colour. What this really means in practice is that a
small voice, of a type that would otherwise not be associated with grand opera, is trained to develop a
penetrative capacity sufficient to compete with the orchestra and to carry in a large auditorium. This
often means that the natural tone will be given a sharper point, and in this process the brightness will
also be intensified (because a mellower, softer tone will be less likely to project). This bright edge to the
voice becomes very like the fixed smile: it is part of the character, the very condition of the performance.
It can be more limiting still, for while the smile is an external feature that can be dropped, the brightness
is in the voice, has become the voice´s character. Much of the art of the light soprano involves the
transcending of these limitations: slipping out of the portrait-frame, giving the character and independent
life without affronting the conventions for which she was created, and extending the colour-range of the
voice (and hence its emotional possibilities) without weakening the qualities which make up its
individuality and its special usefulness.
141 A light lyric coloratura soprano is a singer with a light voice whose quality is closer to a soubrette
than to a true lyric soprano, whose voice usually is more brilliant than warm, who can easily sing scales,
turns, and arpeggios, and who is known for her extremely high range. She is also sometimes called a
soprano leggero, though that is a more general term refering to any light agile soprano with or without a
high range.
Posto de forma mais razoável, a questão contra “coloratura” é a seguinte:
“Coloratura” em italiano deve ter algo a ver com cor: esse é o significado da
raiz da palavra. O que entendemos por “soprano coloratura” não tem
nenhuma conexão com o que normalmente entendemos por “colorir” no
canto: falamos sobre a coloração de uma voz, a arte de colorir uma frase,
ambos sendo atos interpretativos, enquanto muito frequentemente o
“soprano coloratura” é um tipo de voz menos preocupado com esse tipo de
coisa. Na verdade o termo vem do alemão “ Koloratur”, e o “colorir”
entendido tem um sentido bastante diferente. No estudo medieval da
Retórica, “cores” eram expressões figurativas, ou ornamentos estilísticos ao
longo da linha principal do argumento. Então, na música, uma melodia segue
em sua linha não adornada até que, pelo bem da variação talvez, ela é
embelezada, ou, como costumava-se chamar, “figurada”. Então surgiu um
tipo de cantor virtuoso que especializou-se nesta “figuração” ou “colorido”
da linha melódica, e é nesse sentido que ele ou mais frequentemente ela é
definida pelo estranhamente enganoso termo “coloratura”. 142 (STEANE,
1992, p. 8)
Pela descrição de Steane, não é difícil entender o por que de a categoria soprano
coloratura (ou lírico-coloratura) ser intimamente associada ao repertório da primeira
metade do século XIX, período a que refere-se normalmente como obel canto. O
repertório desta época alia linhas melódicas amplas com embelezamentos e grandes
passagens de agilidade. Segundo Jayden (2010):
142 Put more reasonably, the case against ‘coloratura’ goes as follows: ‘Coloratura’ in Italian must have
something to do with colour: that is the root meaning of the word. What we understand by ‘coloratura
soprano’ has no connection with what we normally think of as ‘colouring’ in singing: we talk about the
colouration of a voice, or the art of colouring a phrase, both of these being interpretative acts, whereas
very often the ‘coloratura soprano’ is the voice-type least concerned with that sort of thing. In fact the
term comes from the German ‘Koloratur’, and the ‘colouring’ implied has quite a different meaning. In
the mediaeval study of Rhetoric, ‘colours’ were figurative expressions, or stylistic ornaments along the
main line of argument. So, with music, a melody goes its straightforward, unadorned way until, for
variety´s sake perhaps, it is embellished or, as it used to be called, ‘figured’. So there came into being a
type of virtuoso singer who specialized in such ‘figuring’ or ‘colouring’ of the melodic line, and it is in
this sense that he or more frequently she is denoted by the oddly misleading term ‘coloratura’.
em Don Pasquale (1843). 143 (JAYDEN, 2010)
coloratura leve”, “soprano lírico coloratura cheio”, “soprano dramático coloratura leve”,
“soprano dramático coloratura cheio”. Para as duas primeiras indica características
semelhantes com exceção do peso/ volume, leve para a primeira e médio para a
143 In Italy, the lyric coloratura was central to the works of Rossini, Bellini and Donizetti. The voice
type was first personified by the Spanishsoprano Isabella Colbran, and then by a remarkable pair of
sopranos, Giuditta Pasta and Giulia Grisi. Colbran created leading roles in ten of Rossini's serious
operas, 1815–23 (the two were married in 1822), including Elisabetta, regina d'Inghilterra, Otello,
Mosè in Egitto, La donna del lago, Maometto II and Semiramide. Her flexible and powerful voice was
said to extend from g to e . Pasta created the title role, Amina, in La sonnambula (1831); Bellini also
!
wrote the more dramatic title roles ofNorma (1831) and Beatrice di Tenda (1833) for this singer's
magnificently vibrant voice, which extended from a to e . Another opera composed around Pasta's
!
talents was Donizetti's Anna Bolena (1830), his first opera to achieve wide international acceptance,
quickly reaching
première; London
later she and Paris
was majestic as with
NormaPasta in theIt title
herself. wasrole.
also Grisi created
for Grisi that Adalgisa in NormaElvira
Bellini composed at its
in I puritani (1835); although less dramatic in character than the roles for Pasta, Elvira nonetheless
embodies stylistic elements of a typical Bellini soprano heroine, combining vocal agility with long-
breathed melodic lines. In operas by Donizetti, Grisi created the tragic role of Elena in Marino Faliero
(1835) and the comic role of Norina in Don Pasquale (1843).
segunda. Para as duas últimas apresenta também a mesma extensão básica das outras,
mas diz que são mais fortes em peso e volume, enfatizando que o dramático coloratura
leve apresenta timbre mais escuro que o soprano lírico e o dramático coloratura cheio
apresenta timbre metálico, mais escuro que do sopranospinto. Apresenta a extensão
deste tipo de soprano até o Fá 5 (enquanto dos sopranos líricos, como já visto, não é
esperado muito mais do que um Dó 5).
O soprano lírico é aquele que, de voz mais pesada que o soprano ligeiro, não
apresenta como característica uma habilidade particular para realizar ornamentos
(embora deva possuir um certo grau de agilidade) e também não apresenta as
características do dramático em termos de volume e pujança vocais. Segundo Boldrey
(1994):
O soprano lírico (it, soprano lirico, fr. soprano lyrique, al. lyrische Sopran) é
um soprano cuja principal característica é beleza, antes de agilidade ou
potência dramática. A extensão vocal do lírico é normalmente as duas oitavas
de Dó 3 a Dó 5. O soprano lírico é o “soprano de Puccini”, incluindo a mais
leve Lauretta (Gianni Schicchi), a eterna Mimì ( La Bohème), a lírico spinto
Cio-cio-San (Madama Butterfly) e a lírico-dramático Tosca T( osca). Seu
tempo favorito é andante, seu acompanhamento favorito é a orquestra de
cordas, sua estrutura favorita é a frase romântica cheia de rubato. 144
(BOLDREY, 1994, p. 22)
impressionar com virtuosismo e o soprano dramático conta com a potência de sua voz
para arrebatar a platéia, o soprano lírico tem na beleza da voz o seu maior atrativo. Para
Steane, a soprano lírico é a namorada do mundo. O autor diz ainda: (1992):
144 The lyric soprano (It. soprano lirico, Fr. soprano lyrique, Germ lyrische Sopran) is a soprano whose
main characteristics is beauty, rather than either agility or dramatic power. The lyric´s vocal range is
normally the two octaves from c to c´´. Ther dynamic range includes ringing fortissimos and floating
pianissimos. The lyric soprano is the “Puccini soprano”, including the lighter Lauretta (Gianni
Schicchi), the eternal Mimì (La Bohème), the lirico-spinto Cio-cio-San (Madama Butterfly), and the
lirico-dramatico Tosca (Tosca). Her favorite tempo is andante, her favorite accompaniment is the string
orchestra, her favorite structure is the romantic phrase filled with rubato.
stacccatos, escalas e arpejos da coloratura especialista devem ser cultivados,
porque ninguém quer uma Marguerite com um trilo preguiçoso e uma escala
suja na Ária das Jóias, e Donna Elvira, Fiordiligi, Pamina e mesmo a
Condessa em Figaro precisam mover com graça e agilidade. Ainda assim, o
soprano lírico pode passar várias temporadas imaginando se ela não
conquistou esses feitos em vão. Pureza e clareza são o que mais importa. 145
(STEANE, 1992, p. 17)
145 Vocally, we require nothing too much of her. In range, two octaves, C to C, will do very nicely, though,
as Maggie Teyte used to insist, an extension of two notes will help with Mozart. No exceptionally
penetrative powers are needed, though tastes differ nationally on the matter of timbre. Sheer volume is
certainly not a prerequisite, and yet the large heart does not go well with the small voice. The trills,
staccatos, scales and arpeggios of the coloratura specialist are to be cultivated, for nobody wants a
Marguerite with a lazy trill and a smudged scale in the Jewel Song, and Mozart´s Donna Elvira,
Fiordiligi,
lyric Pamina
soprano and whole
may pass even the Countess
seasons in Figaro
wondering needshe
whether to move
has notwith grace these
acquired and agility. Even so, the
accomplishments in
vain. Purity and clarity come uppermost.
146 The pure lyric is the most usual female voice, and the teacher would do well to eliminate the lyric
classification first. An ample chest would immediately suggest the lirico spinto, lower, or more dramatic
voices.
um lírico que tenha algo próximo do poder de sustentação do spinto; ela é um
soprano leve apenas em comparação com a altamente dramática Turandot.
Nedda (I Pagliacci, Leoncavallo), Sophie (Der Rosenkavalier, Strauss) e
Gilda (Rigoletto, Verdi), se a cantora tem habilidades suficientes para
coloratura, são papéis líricos. 147 (MILLER, 2000, p. 9)
147 Many favorite roles in the standard repertory fall to the lyric soprano. She finds satisfying vehicles in
Handel, Mozart, the bel canto composers of the first half of the nineteenth century, Verdi, Massenet, and
Puccini, as well as in the works of numerous twentieth-century composers. In many ways the lyric
soprano is the ideal feminine operatic voice, capable of singing such diverse roles as Susanna (Le nozze
di Figaro, Mozart), Pamina (Die Zauberflote, Mozart), Micaela (Carmen, Bizet), the Massenet Manon
(which demands both power and coloratura capabilities), Tatiana ( Eugene Onegin, Tchaikovsky—
although Tatiana may fit into the spinto category as well), Marzhenka ( The Bartered Bride, Smetana),
and Mimi (La boheme, Puccini). Lauretta (Gianni Schicchi, Puccini) is frequently thought to be the
property of the soubrette but actually belongs to the lyric. (Consider her duet with Rinuccio.) Liu
(Turandot, Puccini) should be given to a lyric who has something close to spinto sustaining power; she is
a light soprano only in comparison with the highly dramatic Turandot. Nedda (I pagliacci, Leoncavallo),
Sophieare
skills, (Der , Strauss), and Gilda (Rigoletto, Verdi), if the singer has sufficient coloratura
lyricRosenkavalier
roles.
148 When the task includes a number of high, sustained tessitura passages that compete with full
orchestral sound, an intermediate Fach is designated: lirico spinto. (The lirico spinto soprano is often
paired with the lirico spinto tenor). In much of verismo opera, even for lyric voices, being un po' spinto is
a necessity.
é uma categoria de soprano lírico. Com efeito, observamos que muitas cantoras, após
um período dedicando-se a papéis essencialmente líricos, passam a abordar papéis
associados ao Fach soprano spinto, quando a maturidade do instrumento e a absoluta
solidificação técnica as permitem abordar papéis que demandam mais energia na
tessitura e maior potência para se sobressair em orquestrações mais pesadas. Deere
(2005) apresenta a categoria sob o termo “lírico spinto”.
Quando Vennard diz que todas as vozes jovens deveriam ser classificadas líricas,
ele provavelmente quer dizer que dar um repertório muito pesado ou que exija muita
agilidade para uma voz ainda não totalmente desenvolvida pode ser prejudicial. Não
podemos negar, no entanto, que muitas vozes jovens mostram-se, desde o princípio,
evidentemente pesadas ou evidentemente leves.
Boldrey (1994) associa o soprano spinto ao que ele chama de “dramático
leve” (Light Dramatic), e Kloiber (2007) nem menciona essa categoria, apresentando os
papéis normalmente associados a esse repertório sob a subclassificação “Jugendlisch-
149 All young voices should be classified lyric, regardless of potential. As they mature some of the will
learn to use the vocalis muscles more actively in the upper range. This is called “pushing” and is
dangerous, but nothing ventured nothing gained. The Italians actually dignify it by recognizing it as a
classification, spinto (literally, pushed). A lirico spinto is an essentially light voice that sings more
powerfully in dramatic climaxes.
cheio na maturidade de sua carreira. Embora isso tenha acontecido em alguns casos,
segundo ele a voz normalmente não muda tanto ao longo do tempo. Embora tendam a
tornar-se mais escuras após anos cantando, o elemento mais importante na classificação
das vozes femininas é o peso, e não se deve confundir cor escura com voz pesada. A
dialética da categorização alemã Jungendlich-Dramatischer Sopran e Dramatischer-
Sopran ou Hochdramatischer-Sopran (algo como “soprano altamente dramático”) vem
de acordo com a colocação dospinto como uma categoria intermediária. É uma espécie
de lírico, e intermediária nesse caso quer dizer entre o lírico e o dramático. A
Jugendlicher carrega este termo em comparação à voz mais portentosa e austera (ou
mais pesada) da Dramatischer. A Jugendlicher não tende, segundo Steane (2007), a
tornar-se um Dramatischer, assim como o spinto não tende a tornar-se um dramático. Já
o chamado lírico puro, dada a descrição das características do spinto, pode
eventualmente migrar para esta categoria.
Steane (2007) apresenta essa categoria como lírico-dramático:
150 If the lyric soprano is the voice of youth, the lyric-dramatic is her elder sister: a woman, mature in
feelings, physically and perhaps morally a more formidable proposition, very probably a fighter, almost
certainly carrying within her the seeds of tragedy. So it is with Tosca, Aida, Sieglinde, Elisabeth de
Valois, the Leonoras ofLa Forza del Destino and Il Trovatore. For these, the voice needs more depth and
volume, the style more intensity and declamatory force. A lyric soprano will often graduate to them by an
insidious process so that it hardly seems as if a particularly momentous decision has been taken, but
innocence once lost cannot be regained, and, though, the transition from (say) Mimì to Tosca, Pamina to
Donna Anna, may not be utterly and immediately irreversible, it is best approached in the spirit of an
impending wedlock which, as the Prayer Book has it, is not to be enterprised, or taken in hand,
unadvisedly, lightly or wantonly.
evidentemente associado a papéis dramáticos, no que tange o caráter das personagens e
a escrita musical. Deere (2005, p. 21) diz que o soprano dramático pode ser tão raro
como o contralto. Segundo Miller (2000), “a mais ampla de todas as vozes de soprano é
aquela do soprano dramático. Ela deve ter grande poder de sustentação, exibindo tanto
profundidade quanto brilho, além de uma presença física imponente.”151 (MILLER,
2000, p. 11)
Boldrey (1994) também subdivide a categoria, em soprano dramático leve (light
dramatic soprano), soprano dramático cheio (full dramatic soprano) e soprano
dramático coloratura cheio (full dramatic coloratura soprano). O dramático leve, como
já comentamos, é associado ao soprano spinto. Steane (1992) pondera sobre os papéis
de soprano dramático:
Como podemos ver, Steane (1992) associa alguns papéis que demandam muita
agilidade ao soprano dramático. Isto pode causar alguma confusão, por estar a agilidade
associada a outras subclassificações distintas do dramático. Dada a intercambialidade
151The most ample of all soprano voices is that of the dramatic soprano. She must have great sustaining
power, exhibiting both depth and brilliance of timbre as well as an imposing physical presence.
152 Norma is a role with which the Brünhilde-voice has associations dating back to the days of Lili
Lehmann, who (famously) declared it to be a more daunting proposition than all the Brünhildes put
together. Frida Leider, supreme Isolde in the opinion of many, sang Norma, and at one time there was a
distinct possibility that Flagstad would be the first Norma at the Metropolitan since Ponselle. Another
fearsomely demanding role is that of Abigail in Verdi´s Nabucco: this also needs a soprano of heroic
power and sheer toughness, a killer of a part otherwise. And then there is Turandot.
dos quatro séculos passados (um estudo em si sobre categorização vocal), as
demandas dos compositores aumentaram de acordo com o crescente
reconhecimento das potencialidades técnicas do instrumento vocal humano.
(Evolução da literatura para voz é paralela à da escrita instrumental – vide a
literatura para instrumentos de teclado, sopro e cordas.) Como as obras mais
duradouras ilustram, compositores habilidosos logo começaram a levar em
consideração peso e extensão do instrumento vocal solo. Independente da
categoria vocal, a tendência composicional era escrever para cantores que
pudessem competir com o volume instrumental crescente e as demandas
acústicas de espaços de performance maiores. Música do século XVIII e do
período do bel canto não deve ser restrita à voz de soprano de pequenas
dimensões.153 (MILLER, 2000, p. 6)
153 Early in any discussion of soprano categories and how to adapt instruction for each, some mention
should be made of a prevalent assumption that music for the high female voice written before the verismo
movement of the late nineteenth century is reserved to the light soprano. As has been the case in the
development of musical composition over the past four centuries (itself a study in evolving voice
categorization), composers' demands have increased in accordance with mounting recognition of the
technical potentials of the human vocal instrument. (Evolution of the literature for voice is paralleled in
instrumental writing—witness the keyboard, wind, and string instrument literatures.) As the most
enduring works illustrate, skillful composers early began to take into account the weight and range of the
solo vocal instrument. Regardless of voice category, the compositional trend was to write for singers who
could compete with increasing instrumental volume and with the acoustic demands of expanded
performance spaces. Music of the eighteenth century and of the bel canto period should not be restricted
to the soprano voice of small dimension.
154 Often the heroic soprano voice has a mezzo or even a contralto underlay. […]
This admixture of mezzo or contralto is common to many heroic sopranos (the relatively uncommon
feature being the skill in lightening and in preserving the graces of the lyric soprano). The supremely
great Brünhilde voice of the century is surely that of Kirsten Flagstad, who retained a strong element of
the mezzo or contralto in her tone.
na tessitura exigente dos papéis mais dramáticos de Wagner. Steane (1992) pondera
sobre a consistência técnica dos sopranos wagnerianos:
A afirmação de Steane deixa bastante claro que a cantora desta categoria terá,
durante o seu treinamento e ainda ao longo da carreira, que primar pelo domínio técnico
absoluto, sob risco de deterioração do instrumento. Vennard (1967, p. 79) diz:
O soprano dramático é um spinto que é agora capaz de “empurrar”
incansavelmente, ou um meio-soprano que aprendeu a carregar sua produção
total (ou quase) para cima até o topo da extensão do soprano, digamos Dó
5. 156 (VENNARD, 1967, p. 79)
A relação do soprano dramático com o meio-soprano é, aparentemente, muito
155 There are times when listening to so many of the ‘heavy’ sopranos on record or in the opera house
that you feel not one truly firm note has been emitted throughout the evening. The big voice is of its
nature most difficult to control, and of all maladies that afflict the imperfectly controlled voice the most
dreaded of all is the ‘spread’ tone, beat or wobble. Sometimes it has become so habitually associated with
certain roles that it passes without critical comment, and of course ears can grow so accustomed to what
would normally be thought of as an undesirable feature that its presence is part of the contract.
Tolerance-levels vary: just exactly how many (or how few) vibrations a second are acceptable and how
many degrees of deviation from pitch can be borne will vary among individuals and (to some extent)
nations. There is also a curious unpredictability about it. Sometimes a wobbly voice will produce a
perfectly firm note, loud, long and high, at the very point where the ears had prepared themselves for
calamity. It is not uncommon for a dramatic or heroic soprano to sing a sustained lyrical phrase with
admirable
singing firmness
specific notesand
at follow
all. Butit this
withisathe
rapid declamatory
direst peril of thepassage in which
voice-type she canone
and, though hardly be said reads
sometimes to be
of a singer whose wobble is said to have disappeared, the evidence of my own ears suggests that as a
general rule the process is irreversible.
156 The dramatic soprano is either a spinto who is now able do “push” relentlessly, or a mezzo who has
learned to carry her full production (or nearly so) clear to the top of the soprano range, say high C6.
Como a voz do soprano dramático não é tão aguda como a voz do soprano
lírico, um soprano dramático tem muito em comum com um meio-soprano
dramático. Muitos papéis dramáticos são por isso cantados intercaladamente
por sopranos e meio-sopranos, incluindo Didon (Berlioz, Les Troyens),
Klytemnästra (Strauss, Elektra) e Kundry (Wagner, Parsifal). 157 (BOLDREY,
1994, p. 24)
4.7 Zwischenfach
157 Because the dramatic soprano´s voice is not as high as a lyric soprano´s voice, a dramatic soprano
has much in common with a dramatic mezzo-soprano. Many dramatic roles are therefore sung
interchangeably by sopranos and mezzo-sopranos, including Didon (Berlioz, Les Troyens), Klytemnätra
(Strauss, Elektra), and Kundry (Wagner, Parsifal).
158 The Zwischenfachsdngerin has a large voice with good command of low range and is most
comfortable in dramatic roles that, while requiring relatively high tessitura, evade exposure of the very
top of the voice for extended periods of time. She is "between categories." This type of singer is able to
portray both dramatic soprano roles and some that lie within the dramatic mezzo-soprano categories,
including Amneris (Aïda, Verdi), Lady Macbeth ( Macbeth, Verdi), Kundry (Parsifal, Wagner), Ortrud
(Lohengrin, Wagner), Santuzza (Cavalleria rusticana, Mascagni), and, if she is physically appropriate, the
Bizet Carmen. Possessing the weight and color of the dramatic soprano, she can manage much of the
same literature as the dramatic, but her most comfortable performance range is closer to that of the
mezzo-soprano.
Miller (2000, p.7) apresenta também o termo c“ross-Fach”. Outra categorização
associada ao Zwischenfach é o “soprano Falcon”, designação baseada nas características
da cantora francesa Marie Cornélie Falcon (1814-1897). Boldrey (1994, p. 15) o coloca
como correspondente aos ingleses “Full Dramatic Soprano” (este também associado ao
“Soprano drammatico italiano”) e “Dramatic Mezzo-Soprano”, além do “Light Lyric
Dramatic Soprano” (este também associado ao “ Soprano Spinto” italiano).
159 In the mid-1930s, the Spanish mezzo Conchita Supervia initiated a renewal of interest in the comic
operas of Rossini by singing the title roles of La Cenerentola and L'italiana in Algeri at Covent Garden
(Rosina in Il barbiere was still being sung in a transposed soprano version). Her successor Teresa
Berganza was also especially admired as Carmen, in Rossini's comic operas and in the Spanish song
repertory. After 1970, Frederica von Stade excelled in much the same coloratura mezzo repertory, as well
as in the roles of Charlotte and Octavian and in 17th- and 18th-century opera. Cecilia Bartoli has risen
to stardom in such roles as Cinderella and Dorabella.
todas as vozes saudáveis treinadas, e ao meio-soprano coloratura não será exigido cantar
uma nota uma quarta acima da nota limite da extensão de sua irmã de classificação
imediatamente abaixo dela (como no caso do soprano coloratura e do soprano lírico),
talvez não houvesse a necessidade desta subclassificação. Observamos que dificilmente
um meio-soprano coloratura não aborda também repertório associado ao meio-soprano
lírico, ou mesmo ao dramático. Jander (2010) afirma:
160 After the bel canto revival of the 1940s and 50s, mezzos once again began to tackle the leading male
roles in Rossini's
and style as Arsaceserious operas.),The
(Semiramide leader( here
Malcolm was Marilyn
La donna del lagoHorne, who displayed
) and Tancredi. amazing
Although Hornevirtuosity
describes
her own voice as a ‘Rossini contralto’ (Ellison, 1997), she also has the upper range for Adalgisa (Norma),
and has sung 18th-century opera, notably the title roles in Handel's Rinaldo and Gluck's Orfeo.
161The coloratura mezzo is similar to the other mezzo categories, except that she can sing the Donizetti,
Rossini, and Mozart coloratura that her other mezzo sister usually do not.
Miller (2000) subdivide o meio-soprano em “lírico (coloratura)” e “dramático”.
Não apenas associa o meio-soprano coloratura ao lírico, mas apresenta a variedade
“coloratura” entre parênteses seguindo a categorização “lírico”. O autor afirma que esta
categoria, depois do soprano coloratura e do tenor ligeiro, é a mais exigida em termos
de flexibilidade vocal. Mas essa afirmação evidentemente leva em conta a parcela
“coloratura” da categoria que Miller interpreta como uma só, e, uma vez que já
discutimos os papéis de coloratura na categoria anterior, daremos maior ênfase aqui à
gama de papéis sem grandes demandas virtuosísticas associadas ao meio-soprano lírico.
Esta categoria canta Charlotte emWerther de Massenet e Dorabella em Così fan
Tutte de Mozart, por exemplo. Está associada também ao que se conhece comoTrouser
roles ou Hosenrollen, (literalmente, “papéis de calças”), que são personagens
masculinos escritos para vozes femininas para ilustrar sua juventude. É o caso de
Cherubino em Le Nozze di Figaro de Mozart, Siebel em Faust e Stéphano em Roméo et
Juliette de Gounod, Nicklausse em Les Contes de Hoffmann de Offenbach, Hänsel em
Hänsel und Gretel e Octavian em Der Rosenkavalier de Strauss.
Muito frequentemente elas podem cantar notas escritas para soprano; pelo
espaço de uma única ópera elas podem até mesmo ser bem sucedidas em
lidar com um papel de soprano, e contanto que isso não aconteça com muita
freqüência pode não ter nenhum efeito nocivo à voz. Mas atenção é essencial
para longa preservação, e é necessário muito cuidado até mesmo nos papéis
destinados ao meio-soprano lírico. 162 (STEANE, 1992, p. 38)
Boldrey (1994) apresenta também um outro tipo de voz que recebeu o nome de
uma cantora, neste caso, Louise Rosalie Dugazon (1755-1821). Segundo Warrack e
West (1992), Madame Dugazon era também atriz e bailarina. Com uma voz não
excepcional e sem treinamento musical, seu grande trunfo eram suas impressionantes
162
dealSo often they with
successfully can asing the notes
soprano role,written for soprano;
and provided it is notforundertaken
the space too
of aoften
single operahave
it may theynomay even
harmful
effect on the voice. But caution is essential for long preservation, and care is needed even in the roles
broadly designed for the lyric mezzo.
163 The “lyric” mezzos may sound a bit like sopranos in the upper part of the voice, and they may have
difficulty singing beyond the high B-flat. Also, their middle voice is a bit stronger than the soprano´s.
habilidades dramáticas. Estreou mais de sessenta óperas de Grétry, Isouard e Boieldieu.
Uma vez que evidentemente não há registros de sua voz, e os papéis para ela criados
não fazem parte do repertório tradicional, a referência a seu nome em classificação
vocal nos remete a aptidões artísticas mais do que vocais. Um papel de Dugazon foi
Pauline em Richard coeur-de-lion de Grétry, papel atualmente associado a sopranos. Os
tipos de papéis que ela interpretou quando nova e aqueles criados em sua maturidade
ficaram conhecidos, respectivamente, como Jeune Dugazon e Mère Duzagon
(literalmente, Jovem Dugazon e Mãe Dugazon).
Embora Clark (2007) e Miller (2000) não apresentem subdivisões para a voz de
contralto, Boldrey (1994) apresenta as subcategorias “contralto lírico” e “contralto
dramático”, enquanto Kloiber (1985) divide os papéis de contralto entre o “contralto
lírico”, o “contralto dramático”, o “ Tiefer Alt” (literalmente, contralto mais grave) e o
164 Dramatic Mezzos are slightly heavier in vocal weight, and these darker voices have a wonderful list
of great roles to sing. They are the mezzos for Verdi, Wagner, and Richard Strauss. Many have sung
Carmen, as well . (What female singer of whatever Fach has not dreamed of Carmen?) One thinks of
Ortrud (Lohengrin), Azucena (possible for contralto) (Il Trovatore), Eboli (with bravura elements) (Don
Carlo), Octavian (this roles has lyric elements as well) (Der Rosenkavalier), and Erda (the Ring).
“Spielalt”. Na tabela de características de Boldrey (1994), o autor diferencia o contralto
lírico e o dramático pelas comparações: o contralto lírico apresenta “bom grave”,
enquanto o dramático “excelente grave e bom agudo”, o lírico apresenta “timbre
escuro” enquanto o dramático apresenta timbre “escuro e metálico”, a voz do contralto
lírico é “cheia” enquanto a do dramático é “espessa e cheia”, e como desafio do
contralto lírico o autor diz apenas que ele tem “menos flexibilidade que o meio-
soprano”, enquanto para o dramático o desafio vocal é “penetração dramática”. Percebe-
se que as variações são sutis demais para ser comparadas àquelas envolvidas na
observação da voz do soprano ou do meio-soprano, e Miller (2000), concorda que a voz
de contralto é uma voz rara, não suscitando, assim, como a do soprano, tantas
possibilidades de variações. Não seria exagero ponderar que essas apreciações sejam
talvez meramente especulativas, uma vez que as variações de características
apresentadas não são grandes, e o repertório de contralto não é tão grande nem tão
variado. Optamos por apresentar este tipo vocal nestas duas subdivisões basicamente
para marcar que também a voz de contralto (como todas as outras, talvez até mesmo o
baixo) tem como princípio de sua subcategorização a linha lírico – dramático.
Se devemos fazer a subdivisão do contralto, o S“pielalt” apontado por Kloiber
(1985) julgamos poder associar ao “Spieltenor” e “Spielbass”, com características não
necessariamente cômicas, mas ligeiras ou de forte caracterização cênica. Sob essa
categoria, o autor lista Martha emFaust de Gounod, Lola em Cavalleria Rusticana de
165 Rossini continued the traditions of using contralto voices for women's roles in both comic and
serious opera. The coloratura contralto roles of Cinderella in La Cenerentola (1817) and Rosina in Il
barbiere di Siviglia (srcinal version, 181 6) were both written for Gertrude Righetti, who had a
"
powerful and
contralto’, rich-toned
Rossini voice inwith
created roles a compass
five operas, ForofMarietta
f–b . that
including Isabella inMarcolini, a Algeri
L'italiana in ‘prima(1813).
donna
166 We tend to think of this movement from contralto to mezzo as a liberation (just as mezzos count it
liberating when they can move into the soprano repertoire): but there is very often an account to be
settled later, not the least important item in which is a loss of richness in quality. The contralto, in other
words, does well to stand her ground and not be pushed up.
O tipo mais leve entre os tenores é o tenor ligeiro, e é a voz mais aguda
masculina. Encontramos também as designações “tenorino”, “contraltino”, “tenor
altino”. Clark (2007) o apresenta sob o termo italiano “ leggero”. Kloiber (1985)
categoriza o “haute-contre”, e atribui a ele papéis em óperas de Rameau, Lully e Gluck.
Papéis típicos citados são Don Ottavio (Don Giovanni), Conte Almaviva (Il
Barbiere di Siviglia), Nemorino (L´Elisir d´amore), Ernesto (Don Pasquale), Fenton
(Falstaff) e papéis leves do repertório francês.
Miller (1993, p. 9) aponta duas categorias de tenor mais agudo: o “ tenorino” e o
“tenore leggero (tenore di grazia)”:
167 The tenore leggero (light tenor) shares some of the characteristics of the tenorino, but his voice is of
sufficient size and quality to be considered a viable professional instrument. His passaggi points are most
likely at Eb 4 and Ab 4, and he does not always sing easily in the lower (voce di petto) range. He is also
called (less frequently than formerly)tenore di grazia because composers often assigned to him florid
writing rich in coloratura passages and vocal embellishments. His timbre is generally characterized by
sweetness (morbidezza), and he must possess considerable control over musical dynamics.
líricos, enquanto Clark (2007) os define como ligeiros e Boldrey (1994) como líricos
leves.
168 On the whole, the light voice expresses the light nature. As with the soubrette, some of the tenore di
grazia´s best roles are in comedy, and when, say, Ernesto in Don Pasquale has his sorrowful aria in minor
key (‘Chercherò lontana terra’) we are not unduly perturbed: in fact we don´t take him seriously. In a
tragic role the tenore di grazia commands sympathy for his said plight, but a bright and slender voice, as
most of these are, is not suggestive of a deep nature.
explica cada uma das categorias, mas pela descrição de Miller, e observando as
diferentes listas, podemos ter uma pista: Monostatos (Die Zauberflöte, Mozart), Pedrillo
(Die Entführung aus dem Serail, Mozart), Goro (Madama Butterfly, Puccini), Spoletta
(Tosca, Puccini), Bardolffo (Falstaff, Verdi) e Trabucco (La Forza del Destino, Verdi)
para o Spieltenor. Hauptmann (Wozzeck, Berg), Herodes (Salome, Strauss), Loge e
Mime (Der Ring des Nibelungen, Wagner) para o Charaktertenor. Aparentemente, o
segundo demanda mais potência vocal, sobretudo na região média da voz, idéia que
pode ser alimentada pelo fato de que, como veremos a seguir, a categoria intermediária
“Baixo-barítono” é também apresentada sob o termo “ Charakterbariton”.
Segundo Deere (2005, p. 30), o tenor lírico é uma das vozes mais úteis, se bem
treinadas, moduladas e articuladas. Como o soprano lírico, seria algo como a “média”
dos tenores, e evidentemente, como o soprano, também apresenta subdivisões. Boldrey
(1994) apresenta duas variedades de tenor lírico: o “tenor lírico leve” e o “tenor lírico
cheio”. O “lírico leve” está associado ao tenorleggero ou di grazia, e ao ténor-léger,
haute-taille ou haute-contre francês. O “lírico cheio” está associado ao que entendemos
também como “lírico puro”, ou simplesmente “lírico”. Pela impressão causada por sua
voz e seu canto é a versão masculina do soprano lírico, embora a personalidade de seus
169 Being male, he is not expected to be as pure and blameless as is opposite number, the lyric soprano:
he may even be Faust to her Marguerite, Pinkerton to her Butterfly. On the whole, however, he has our
sympathy, for he is (vocally) young and handsome, and almost invariably he is in love. When trouble
comes we look to him for the virtues: his depths will be sounded. But character in opera in only in a
nominal, superficial way established through the music. The music in turn comes to us to a very important
extent through the voice, and voices themselves have character.
ambigüidade e versatilidade do tenor lírico, que, com domínio técnico e prudência, pode
abordar grande parte do repertório de tenor disponível. Ainda segundo Steane (1992),
em geral quando a voz ganha um pouco de profundidade e peso (e não precisa ser mais
do que um pouco) o personagem ganha as qualidades que sugerem calor e
masculinidade, adquirindo um tipo mais completo de humanidade. Para Steane (1992),
se dissermos “tenor” sem especificar um tipo particular, esse é o tipo a que estamos nos
referindo – o que o autor chama “a voz de Rodolfo”. O autor refere-se ao tenor
protagonista da ópera La Bohème de Puccini, epíteto do tenor lírico assim como sua
amada Mimì é o epíteto do soprano lírico. Ao versar sobre sua ária do primeiro ato,
“Che gelida manina”, diz:
Aquele solo famoso e o que vamos chamar de tenor lírico “central” servem
um ao outro à perfeição; parte de sua mágica é a forma em que ele desenrola
as belezas de uma voz, dobra a dobra, até que tudo seja estendido, toda o
tecido admirado, suas cores, textura, força e suavidade. 170 (STEANE, 1992,
p. 67)
170 That famous solo and what we´ll call the ‘central’ lyric tenor suit each other to perfection; part of its
magic is the way in which it unfolds the beauties of a voice, pleat by pleat, till all is laid out, the whole
fabric admired, its colors, texture, strength and softness.
para alguns tenores líricos, e para outros pesados demais. Esses, no entanto, segundo o
autor, são papéis ideais para o tenor lírico spinto. Segundo Deere (2005):
A escrita orquestral de Verdi […] era muito bem colocada e balanceada para
sublinhar a voz, ao invés de tentar contar a história com a orquestra, como no
caso de Wagner. Então o líricospinto permaneceu o tipo de voz ideal para
muito da obra de Verdi. Alguns de seus primeiros trabalhos permitem o uso
de um tenor lírico, enquanto apenas Otello, no final, requer uma voz mais
dramática.171 (DEERE, 2005, p. 32)
Com efeito, são normalmente associados ao tenor spinto (ou ao tenor lírico, ou
lírico un po´ spinto) os tenores de Verdi, e também os de Puccini.
Boldrey (1994) apresenta, além da denominação “ tenore lirico spinto”, “tenore
robusto”, também associado ao “Jugendlicher Heldentenor ”, tornando ainda mais clara
a já esperada relação com a categoria “soprano spinto/ Jugendlicher Dramatischer
Sopran”. A categoria tenore robusto, no entanto, Steane (1992) associa à do
Heldentenor. Miller (1993, p. 12) diz que em alguns casos ospinto pode cautelosamente
abordar alguns papéis de tenor robusto (principalmente na maturidade), mas o peso
desses papéis requer normalmente uma produção mais pesada do que a adequada ao
instrumento do tenor spinto.
dramático. Deere (2005) afirma ser esta uma categoria rara. Diz ainda:
Frequentemente confundido com um barítono quando começa os estudos, sua
voz demora para amadurecer e pode ser difícil de manobrar ou cantar
coloratura. Então é a voz ideal para sustentar as frases e cenas
excessivamente longas de Richard Wagner, de Tannhäuser a Tristan und
Isolde. O tenor dramático pode não ter todas as notas agudas do lirico spinto,
seu extremo agudo é mais ou menos o Si b agudo e chega ao Lá grave. 172
(DEERE, 2005, p. 32)
171 Verdi´s orchestral writing [...] was so well-spaced and balanced as to underline the voice, rather that
attempt to tell the story with the orchestra, as in Wagner´s case. So the lirico spinto remained the ideal
voice for
Otello, much
at the of requires
end, Verdi´s awork.
moreSome of his
dramatic earliest works permit the use of a lyric tenor, while only
voice.
172 Often mistaken for a baritone when he begins study, his voice is late to mature and can be difficult to
maneuver or to sing coloratura. So it is the ideal voice to sustain the exceedinly long phrases and scenes
of Richard Wagner, from Tannhäuser to Tristan und Isolde. The dramatic tenor may not have all the high
notes of the lirico spinto, as he tops out about the high B-flat and extends to the low A.
“Tenore robusto”, “Tenore di forza”, e “Wagner Heldentenor”, além do francês
“Ténor dramatique” são terminologias associadas a esse tipo de voz. Por ser a categoria
mais pesada da voz de tenor, pode ser facilmente confundida com um barítono, ou
mesmo um baixo. Jander (2010) cita o tenor Lauritz Melchior que cantou vários anos
como barítono até estrear como Tannhäuser em 1918; Steane (1992) cita também
Giovanni Zenatello, Renato Zanelli e Ramon Vinay, todos com passagens pelo tenor
dramático e pelo barítono. Também Deere (2005, p. 96) diz que muitos tenores
dramáticos começaram como barítonos ou baixos, e cita James King, que começou
como barítono, e Albert da Costa, que estudou no Julliard Conservatory como baixo.
Miller (1993, p. 13) diz que alguns barítonos, na maturidade, migram para o
repertório de tenor heróico e continuam a usar manobras de registro mais apropriadas
aos barítonos. Diz que com freqüência as passagens do tenor heróico são iguais às do
tenor robusto (Dó 3 – Fá 3), mas alguns Helden tem passagens iguais às do barítono
heróico (próximo a Sib 2 e Mib 3) e negociam as notas agudas de sua voz puxando para
cima o registro de peito muito além do que seria considerado saudável. Miller (1967, p.
79) diz que o tenor heróico (Heldentenor, tenore robusto) pode ser desenvolvido de um
spinto, mas é mais frequentemente um “barítono puxado para cima”.
Steane (1992, p. 72) diz que um bom papel para o tenor robusto é Manrico Il(
Trovatore, Verdi), embora não seja tão heróico que um líricospinto não possa canta-lo.
Outro papel verdiano citado por Steane – esse sim, o epítome do tenor dramático
À ponderação “se o dono dela quiser” podemos acrescentar “e se ele tiver boa
predisposição e receber treinamento adequado”, afinal, se como já vimos, a voz de tenor
pode ser a mais difícil de ser dominada, podemos imaginar que a voz de tenor
dramático, robusto ou heróico, entre os tenores, há de ser ainda mais difícil.
173 So, Otello in Italian opera, Siegfried in German, appear to be the terminal points, the ultimate
extension, for the robust, and by this point he has moved into the full heroic territory which, after all, is
that of the Heldentenor. So the question then is whether this development involves a difference in kind;
otherwise the heroic tenor is simply a particularly powerful robust. A supplementary question concerns
the Heldentenor. Is he a different species entirely, and if so is it by virtue of his predominantly German
(and Wagnerian)
description and therepertoire, or goes
‘image’ that is there
witha it?
special kind of style and voice-production that earns him this
174In fact there is probably a need for a different term altogether. A special type of voice does exist that
can (if its owner so desires) undertake heroic roles in both the Italian and German repertoire, and its
main characteristic is that it has weight, the notes of the upper ‘passage’ (the top of the middle register
and the lower notes of the top) having unusual breadth.
linhas elegantes e floridas de Donizetti. Ele pode voltar-se igualmente bem
para Bach e Handel, para o Lied, mélodie, canzone, ou para canção inglesa de
Dowland a Finzi. O repertório francês será sua delícia particular, e ele vai
invejar os barítonos da Ópera-Comique em Paris, que, especialmente ao
longo da segunda metade do século passado e primeira metade deste, tinha
uma oferta de música agradável à audiência como ao cantor, sendo uma boa
parte desta música nova, a outra parte uma cultura afetuosamente
compartilhada.175 (STEANE, 1992, p. 88)
Boldrey (1994, p. 29) diz que vários papéis do repertório francês para barítonos
líricos são muito agudos, e exigem uma extensão no limite da fronteira com o tenor.
Segundo Deere (2005): “O barítono lírico possui o peso mais leve da voz de barítono, e
é essa voz que deve ser diferenciada da do tenor”.176 (DEERE, 2005, p. 33). Com efeito,
podemos imaginar que, sendo a voz mais leve de barítono, pode facilmente ser
confundida com uma voz de tenor, principalmente no aluno que ainda não encontrou
toda a potência de sua voz.
O gosto do repertório francês para barítonos líricos exacerba-se no
desenvolvimento de uma subcategorização particular, barítono-Martin, em homenagem
ao barítono francês Jean-Blaise Martin (1768-1837). Segundo Steane (1992):
175 The lyric baritone – ‘light’ as opposed to dark in timbre, and not necessarily light in volume – is the
most commonly found and perhaps the most versatile of male voice-types. His Prize Song is Germont père
´s ‘Di Provenza’ in La Traviata. The nimble place and brilliant roulades of Rossini will be within his
scope and he will (or should) rejoice in the elegant lines and flourishes of Donizetti. He can turn equally
well to Bach and Handel, to Lied, mélodie and canzone, or to English song from Dowland to Finzi. The
French repertoire will be his particular delight, and he will envy the baritones of the Ópera-Comique in
Paris, who, especially throughout the latter half of the last century and the first of this, had such a regular
supply of music pleasing to audience and singer alike, a good proportion of it new, the rest part of an
affectionately shared culture.
&+*
The lyric baritone possesses the lightest weight of baritone voice, and it is this voice that must be
differentiated from the tenor.
fazer um sentido mais acessível se fosse substituído pelo termo “barítono-
Pélleas”. 177 (STEANE, 1992, p. 88)
o barítono dramático. Deere (2005, p. 33) diz que muitos barítonos de voz mais cheia
começaram a carreira como barítonos líricos. Segundo o autor, isso acontece com
177 In those days the French baritone was of a special type. We still hear sometimes of the baryton-Martin
and catch a general connotation, though its srcin has become obscure. Jean-Blaise Martin flourished as a
leading Parisian baritone in the first three decades of the nineteenth century, famous for the quality and
range of his voice which extended with ease to the high A. That is all a goodish time ago, and it is rather
extraordinary that his name should be preserved in this way when there are plenty of later singer whose
recorded voices would be of more practical use for such purposes of reference: I can´t help suspecting
that the term owes its longevity at least partly to the happy knack such things have of making their users
feel knowledgeable. We certainly ought not to begrudge Jean-Blaise his survival as a ploy in the deadly
game of operatic one-upmanship, but it might make more accessible sense if the term ‘Pelléas-baritone´
were substituted. (STEANE, 1992, p. 88)
178 The baritone´s high notes in Verdi and Puccini are normally there to serve a full-voiced, resonant
climax: in Gounod and Massenet they are much more to be addressed as part of the melody and of
melodic speech. The result is characteristically a raising, freeing and thinning of the tone. French
baritones have rarely produced the richly resonant sound associated with the Italians; and, as with tenors,
this has been their loss. The gains have been a sense of freedom from the throat, and with it an impression
of lightness, grace, intelligence.
cantores que ainda não descobriram toda a força de suas vozes, e este tipo de voz pode
demorar até os trinta e cinco anos para atingir a maturidade.
Steane (1992) diz:
Alguns papéis requerem vozes poderosas com a extensão reconhecida do
barítono, e contanto que haja uma oferta suficiente deles as óperas podem ser
produzidas. Central para o seu repertório é Verdi; de fato frequentemente
ouvimos falar do “barítono verdiano”, e numa visão ampla, o termo sem
dúvidas significa algo. [...] Verdi foi na verdade responsável por alguns
desenvolvimentos notáveis na história da voz de barítono. 179 (STEANE,
1992, p. 86)
O autor usa como exemplo a ária “Il balen del suo sorriso” (Verdi, Il Trovatore),
que começa na região grave da voz mas permanece em geral na parte alta. O baixo-
barítono, para Steane, é capaz de cantar várias páginas do repertório de barítono como a
“Canção do Toreador” (Bizet, Carmen), a Canção da Estrela da Tarde (Wagner,
Tannhäuser), e mesmo (sem os agudos opcionais) o Prólogo (Leoncavallo, I Pagliacci),
mas com “Il balen” é diferente. A sua tessitura também pode bem ser adequada ao
barítono leve ou agudo, que está a meio caminho do tenor, mas para a cabaletta que
vem logo a seguir, “Per me ora fatale”, diz o autor que o barítono leve seria inútil.
Miller (2002, p. 9, 10) também apresenta a categoria “barítono verdiano”, e
segundo ele é a voz masculina mais cobiçada do mundo da ópera atual. Ele deve possuir
um som potente e extenso, que possa competir com o som de uma orquestra cheia,
autoridade em duetos e conjuntos complexos, região grave bem projetada, além de
agudos brilhantes e potentes. Segundo o autor, esta categoria de barítono serve não só às
obras de Verdi, mas às de autores que vieram depois dele, às óperas veristas, e a grande
parte do repertório italiano e francês do final do século XIX e também do século XX.
Boldrey (1994) refere-se também ao barítono heróico, que segundo ele é uma
versão levemente mais grave do tenor heróico. Diz também:
179
Certain roles
a sufficiently […]ofrequire
supply them thepowerful voices
operas can go with the recognised
into production. baritone
Central range,
to their and as long
repertoire as there
is Verdi; is
in fact
we frequently hear of ‘the Verdi baritone’, and in the broad view, the term no doubt means something […]
Verdi was indeed responsible for some remarkable developments in the history of the baritone voice.
180 Heroic refers to the voice, not necessarily to the character. The two villains Telramund (Wagner,
Lohengrin) and Luna (Verdi, Il Trovatore) both have “heroic” voices.
Kloiber (2007) lista todos os papéis de barítono mais pesado, inclusive os
verdianos, sob o termo “Heldenbariton” (“barítono heróico”). Sobre essa categoria,
Deere (2005) diz:
Outros termos citados por Boldrey (1994) para o barítono dramático são
“Characterbariton” e o “Hoher Bass” (“baixo mais agudo”), embora ao segundo ele se
refira também como correspondente ao baixo-barítono. Kloiber apresenta o
“Characterbariton” como uma categoria à parte, e atribui a esta categoria papéis como
Wozzeck (Wozzeck, Berg), Scarpia, (Tosca, Puccini) e Alberich (Der Ring des
Nibelungen, Wagner).
4.20 Baixo-barítono
181 A mostly German brother to the Italian baritone is the Dramatic or Helden Baritone. Notable for the
Wagnerian
G repertory, this somewhat darker voice is closer to that of the higher basses in range, from low
to high A-flat.
182 Bass-baritone is a relatively new designation for deep male voices. The bass-baritone combines a
bass quality with baritonal freedom. His voice is deeper than most baritones, but it is higher than many
basses. For that reason the Germans use the term Hoher Bass (Higher Bass) for a bass-baritone, along
with the more general term Bassbariton.
Steane (1992) diz que diversos papéis de barítono são abordados pelo baixo-
barítono, como Scarpia (Tosca, Puccini), Escamillo, (Carmen, Bizet), Iago (Otello,
Verdi) e Amonasro (Aïda, Verdi). Diz ainda que, segunda sua conta (altamente suspeita,
adverte), na edição de 1982 do “Dicionário de Cantores de Kustsch e Riemen”, cento e
oito cantores são nomeados baixo-barítonos, enquanto cento e setenta e um são baixos e
quinhentos e vinte barítonos. O autor comenta, inclusive, que há muitas surpresas entre
os apontados como baixo-barítonos, incluindo cantores conhecidos geralmente como
barítonos ou baixos. Sobre a voz de baixo-barítono, faz uma importante ponderação:
Talvez antes de olhar para a formidável lista de repertório nós devamos fazer
algumas perguntas sobre a voz de baixo-barítono em si. O nome soa como
um bônus, dois pelo preço de um, mas não seria isso talvez um tipo de
desculpa por não ser nem uma coisa nem outra? A voz tem um caráter
distinto próprio? Para que serve? 183 (STEANE, 1992, p. 100)
O autor pondera ainda (p. 104) que há uma tendência entre os baixos de perder
um pouco de suas características de baixo (“ loose some bassness”, diz o autor, algo
como “perder um pouco da baixeza”). Isto nos leva a crer que muitos baixos, com o
passar do tempo, passam a abordar papéis mais agudos, validando talvez a existência de
uma categoria intermediária.
183Perhaps before looking at the formidable repertoire-list we should ask a few questions about the bass-
baritone voice itself. The name sounds like a bonus, two for the price of one, but it is not perhaps a sort of
apology for being neither one thing nor the other? Does the voice have a distinctive character of its own?
What use is it?
(Strauss, Der Rosenkavalier) requerem vozes mais pesadas, até mesmo
dramáticas.184 (BOLDREY, 1994, p. 29)
Embora não seja comum associar o termo lírico a baixos, Boldrey (1992, p. 30)
cita o baixo lírico, que segundo ele é normalmente chamado basso
“ cantante” (“baixo
cantante” em italiano) ou “basse noble” (“baixo nobre” em francês). Diz ainda que a
184The basso buffo is a staple in the comic operas of the eighteenth century and in the light operas by
Rossini and Donizetti. These early comic bass roles call for a light flexible voice and a lively
characterization. Later comic
Rosenkavalier) requires bass
heavier, roles
even such asvoices.
dramatic Falstaff (Verdi, Falstaff) and Baron Ochs (Strauss, Der
185 The idea of the “character” bass can be translated as “ Basso buffo”, the word “buffo” referring to a
comedic role. Opera singers whose acting skills exceed the lyric qualities of their voices (particularly
men) may make a career in comedy as Tenore Buffo or basso buffo. There is no classification of baritono
buffo, although basso buffo parts often require baritone tessitura.
voz desta categoria de baixo é melíflua, e é a opção para óperas líricas e românticas.
Steane (1992) pondera sobre o termo baixo cantante:
186 Foreign phrases have a way of conferring dignity upon the commonplace, musical terms being no
exception. As a voice-category, ‘singing-bass’ looks more like a tautology than a concept, so basso
cantante remains a generally accepted term, and it has its uses.
187
This typebass-baritone,
is a singing of bass is sometimes referred
he is regarded in to as a bass-baritone
Europe in English-speaking
as a basso cantante, countries,
and is no baritone at all!but if he
188 Essentially, he has his chance to do some real singing: the natural beauty of the voice can flower in
this, and the cultivated employment of a truly even, well-bound legato tone can transform what in the
printed score looks like a very ordinary piece of writing into something which in the opera house may be
a moment of memorable loveliness.
Steane (1992) diz que o baixo cantante eventualmente arrisca Scarpia ( Tosca,
Puccini) e Escamillo (Carmen, Bizet), mas foge de Ochs (Der Rosenkavalier, Strauss)
pela sua tessitura particularmente grave e não necessariamente tem as habilidades
dramáticas para o protagonista de Boris Godunov (Mussorgsky), nem a sonoridade
adequada aos gigantes de Der Ring des Nibelungen (Wagner). Os papéis líricos de Verdi
e Bellini lhe parecem adequados, e de uma maneira geral podemos imaginar que espera-
se do baixo cantante (como uma espécie de baixo lírico) os mesmos predicados dos seus
colegas líricos de voz mais aguda – beleza sonora e fraseado nobre. Jander (2010) diz
que Rossini esperava de seus baixos uma voz tão ágil como as de seus tenores, ou
mesmo dos sopranos e meio-sopranos.
189 Though this repertory is thoroughly international, there have been some major national differences in
characteristics among singers. The typical Italian bass has been endowed with a vibrant richness of tone,
and in the early 19th century elegance and agility, as in several serious Rossini roles or Bellini’s Oroveso.
The French at best have valued freedom and grace (the ‘basse chantante’ or ‘basse noble’) rather than
tremendous power or exceptional depth. The Russians are celebrated for their cavernous basses, though
their opera singers rarely display the deep notes heard in Russian choirs. The German speciality has
been the ‘black’bass, a type in which the weight of the sound, a combination of power and depth, is often
more evident than the beauty. All countries have made some distinction between what are most generally
known as the ‘basso cantante’ (or ‘basse chantante’) and the ‘basso profondo’ (or ‘basse profonde’),
though there is no reason why the terms should be mutually exclusive. Perhaps the best example in
practice of the difference between the two types is to be found in Don Carlos, in the scene between the
King and the Inquisitor. Though the writing for the two parts shows little difference in range or tessitura,
the Inquisitor is associated from the start with the deep sonority of the accompanying orchestration, and
it is clearly more effective if contrasted voices are employed, the Inquisitor here being the deeper in
timbre, closer in type to the Germanic ‘black’bass.
4.23 Baixo profundo
À voz de baixo mais grave e pesada dá-se o nome de baixo profundo. Segundo
Deere (2005):
O baixo mais grave é aquele do “profundo” escuro, ou “Schwarzebass (baixo
preto)”, ou mesmo Strohbass em teatros alemães. Essa voz é a que mais
demora para amadurecer, pode ser difícil de desenvolver, e pode também,
mas não necessariamente, tornar-se algo dura e inflexível, se não instruída
propriamente. Essa que é a mais escura das vozes precisa ter vogais, cor e
ressonância combinadas propriamente por tempo suficiente, como na verdade
todos os cantores precisam.190 (DEERE, 2005, p. 36)
Deere (2005, p. 36) diz também que os baixos mais graves não tem muitos
papéis à disposição, e cita Sarastro (Die Zauberflöte, Mozart), Osmin (Die Entfürung
aus dem Serail , Mozart), Fasolt e Fafner (Der Ring des Nibelungen, Wagner) e O
Grande Inquisidor (Don Carlo , Verdi). Quanto ao Inquisidor, Steane (1992, p. 111) faz
uma interessante ponderação, de acordo com a afirmação de Jayden (2010) (citada na
categoria dos baixos cantantes), de que, uma vez que não há evidências na música de
Verdi que indiquem ser ele um baixo mais grave que o Filippo II, esta é uma das
circunstâncias em que a caracterização dramática é mais decisiva que a partitura ao
determinar o tipo vocal.
190 The lowest bass is that of the dark “profondo”, or “Schwarzebass (Black bass)”, or even Strohbass
(straw bass) in German theatres. This voice takes the longest do mature, can be difficult to develop, and
can also, but not necessarily, become somewhat wooden and inflexible, if not instructed properly. This
darkestdo
indeed of all
voices needs to have vowels, color, and resonance combined properly over sufficient times, as
singers.
191 Volume and weight are the prerequisites, but the blackness also derives from a method of tone-
production that eliminates the more Italian quick vibrato. In its place is a kind of tonal solidity, a wall-
like front, which may nevertheless prove susceptible to the other kind of vibrato, the slow beat or dreaded
wobble.
Conclusões
Podemos deduzir que, para todos os tipos vocais, isso seja um fato: vozes mais
pesadas tenderão a se desenvolver mais lentamente e apresentar mais dificuldades de
192 Soubrettes and coloraturas often display rather remarkable technical powers at an early age, whereas
at a similar age the potential soprano lirico spinto voice remains unwieldy. Just as with the late maturing
male voice, the female with a sizable instrument should understand that her vocally lightweight female
colleague can be expected to sing better at that age than she. It will comfort her to know that the more
dramatic female voice often have a longer carrer expectancy, making up for the slower rate of maturation
that discourages her as a young adult. In general, young female voices of more than soubrette size do not
have the same easy access to upper range as do their lighter voiced friends. Although all human vocal
instruments function by the same fundamental principles, the big soprano voice requires more time to
learn to produce an even scale throughout the range.
aluno, concluímos que subclassificações só devem ser definidas quando a voz estiver
madura o suficiente para exibir as qualidades específicas que a definiriam. O professor
deve estar atento às necessidades de cada voz individualmente, mas em última análise,
como diz Vennard (1967), deve-se trabalhar a voz até que ela se classifique sozinha.
Segundo Miller (1993):
193 Determining the Fach of a singer is not the primary concern for the teacher. Of much greater
importance is the freeing of the instrument from the tensions of malfunction and from preconceived ideas
that so often contribute to incorrect vocal category. The developmental continuum must be kept in mind
when one determines what any singer should currently sing.
Frequentemente, Fach torna-se um fetiche do professor de canto – parte da
síndrome do ensino de canto “eu sei o que você não sabe” – e é
misteriosamente exibida para o jovem cantor como se fosse uma jóia rara da
informação profissional. Fazer da pronta determinação do Fach uma parte
central da pedagogia pode servir para criar uma aura de autoridade em volta
do professor mas contribui pouco para o progresso do cantor estudante. 194
(MILLER, 1996, p. 200)
194 Too often, Fach becomes a voice-teacher fetish – part of the “I know what you don´t know” syndrome
of voice teaching – and is mysteriously waved before the young singer as though it were a rare gem of
professional information. Making the early determination of Fach a central part of pedagogy may serve
to create an aura of authority around the teacher but contributes little to the welfare of the student singer.
5 ENTREVISTAS
Primeira pergunta: Quais os fatores que o/a Sr./Sra. considera primordiais para
classificar a voz de um aluno?
Professora Ilza Corrêa: “O timbre. A voz é classificada sempre pelo timbre, nunca
pela extensão. Um soprano lírico por exemplo normalmente tem uma voz mais curta,
como a gente diz. Não tem tanta facilidade de agudo, e tem que desenvolve-los através
da técnica. Principalmente através da respiração, que para mim é tudo. Mas a
classificação é sempre pelo timbre. E nem sempre o timbre vem logo, às vezes é
impossível de classificar das primeiras vezes que lidamos com um aluno. A pessoa
ainda não está com a voz formada. A não ser com o barítono, que é a voz comum do
homem, por exemplo, a classificação é mais fácil. A mulher tem essa quantidade de
classificações, soprano lírico, ligeiro, spinto, e é difícil saber de uma hora pra outra. A
gente tem que ir sentindo com o desenvolvimento da técnica.”
Professor Inácio De Nonno: “É uma coisa que eu chamo de “pra onde a voz quer ir”.
Isso é, qual a região da voz do aluno onde a gente percebe que há uma riqueza maior,
onde há uma comodidade maior, além de uma riqueza tímbrica mais clara e mais
evidente. A maioria das vezes a classificação é muito óbvia, mas algumas vezes não é.
Quando um aluno vem estudar comigo e eu fico na dúvida com relação à classificação,
então fico pesquisando, subo, desço, procuro encontrar qual a região da voz onde ele
consegue adquirir uma maior beleza vocal e uma maior riqueza tímbrica. A partir dali eu
vou verificando se a voz vai para cima ou para baixo. Normalmente o meu trabalho é
assim, nem tenho muito essa preocupação. Às vezes os alunos ficam meio frustrados
quando vem estudar comigo e no primeiro dia de aula querem saber se são “tenores
líricos com coloratura”, pra poder cantar a “ária não sei do que”. Eu digo: “desculpe,
isso não é assim”. Eu não tenho pressa nenhuma em classificar a voz de um aluno. Com
alguns inclusive demoro muito, por que às vezes a voz vem com defeito, ou mascarada.
A gente percebe que a voz quer ir pra cima, mas não consegue subir porque sente
medo. Tem que resolver esses problemas todos pra chegar até lá. Tem uma série de
fatores, mas o primordial na classificação da voz no meu trabalho com os alunos de
canto é sempre procurar qual a região da voz do aluno onde a riqueza tímbrica aparece
com maior evidência.”
Professor Licio Bruno: “Primeiramente a amplitude de seu registro, depois as notas
características (onde a voz "muda", o que muitos chamam de passaggio). Depois o
timbre e outras características que podem ajudar na sub-classificação, como voz
aveludada ou mais metálica, brilho, legato, potencia e o vibrato natural, que também
ajuda a perceber melhor as notas características ( passaggio). Lembrando que a
classificação vocal não é assunto a ser resolvido nas primeiras aulas, e sim ao longo do
primeiro ano de trabalho. Isto se este for mais ou menos intenso (aulas regulares de
técnica ao menos três ou quatro vezes por mês).”
Professor Marcos Menescal: “Principalmente timbre e extensão. Onde se localizam as
passagens de registro também é um fator importantíssimo, principalmente pra homens.
É importante saber qual a nota de passagem para a região aguda. A extensão na verdade
pode enganar, por que o barítono às vezes tem Dó agudo. Já vi barítonos com Dó, e
barítonos com Sib são comuns, então temos que aliar isso ao timbre e à tessitura. A
extensão tem que ser observada sempre aliada à tessitura, a região da voz em que a
pessoa canta com conforto.”
Dr. Paulo Louzada: “Eu sei o seguinte: a laringe varia de tamanho. Em geral a maior é
a mais grave, a média é barítono, menor é aguda. Mas não existe estudo sobre isso, não
definitivo. O que eu disse sobre isso do ponto de vista anatômico é variável, isso é de
um modo geral. O que classifica é o que você vê que a pessoa pode cantar, a
capacidade que ela tem de executar bem. Isso é o que o professor faz. Se agüentar
cantar de tenor, canta de tenor, se agüentar cantar de barítono, canta de barítono. A
minha área é outra. Ou melhor, a área é a mesma, mas a abordagem é outra. Eu estudei a
formação da voz, como ela se instala, do que ela depende, e como atuar na voz,
modificar. Todo mundo estuda canto, então é porque precisa mudar. Ninguém está
cantando sozinho em casa e vai cantar profissionalmente. Todo mundo tem que estudar,
mesmo quem tem a voz muito generosa. Aí é que eu entro, ensino o que é bom pra voz,
qual o estudo necessário. Classificação quem vai definir é maestro, é mais uma questão
de execução. É ligado à biologia, mas é mais ligado à execução, cantar bem,
desempenhar bem. A gente sabe que o tenor vai lá em cima, o baixo vai lá embaixo.
Aliás, o baixo tem que ter uma extensão enorme, por que ele vai no Fá lá embaixo, vai
no Fá cá em cima, às vezes vai no Fá#. Do ponto de vista da classificação não tenho
muito a dizer. Mas tenho a dizer do ponto de vista biológico, quando ao rendimento da
voz. A palavra que eu prefiro é rendimento, o que a voz é capaz de desempenhar dentro
da sua tessitura. Isso eu sei, quais são as bases fisioacústicas do maior rendimento.
Quem tem a voz natural tem essas bases fisioacútiscas congênitas, facilita. Quem não
tem, tem que fazer uma adaptação. A maioria das pessoas tem uma laringe muito boa,
tem a tessitura, mas em geral faltam os agudos, não alcançam os graves. As laringes
menores teoricamente dão som mais agudo. Toda corda mais curta, em qualquer
instrumento, produz um som mais agudo, e a maior produz um som mais grave. Agora,
isso é da laringe, mas precisa ver a ressonância, o domínio, a palavra. Ninguém vai
examinar a laringe, olhar o tamanho da corda e dizer “você é tenor”. Pode errar. Há
muitos casos em que pode ser um, ou pode ser outro. De baixo pra tenor dá diferença,
mas de baixo pra barítono, ou de barítono pra tenor, nem tanto. A diferença da laringe
não é muita, mas um pouquinho já faz diferença. Existem estudos sobre tamanho, mas
não tem importância. É tão óbvio que baixos tem a laringe maior, tenores tem a laringe
menor, sopranos tem laringes pequenas, sopranos ligeiras tem laringe pequenininha e
são mulheres miúdas, por exemplo. As meio-sopranos de voz grande são altas, tem
pescoço comprido e então tem a laringe maior. Mas o importante é que a ressonância é
mais grave. O tubo de ressonância reforça mais os harmônicos mais graves. O
importante é a ressonância. Uma coisa e outra, o tamanho da laringe e o tamanho do
tubo sonoro – a distância que vai da glote até o plano anterior da boca. Aí é que é o
problema. E a variação da voz com relação ao tubo sonoro, à caixa harmônica, é assim,
variações mínimas da caixa harmônica dão uma diferença enorme na voz. Em geral o
brasileiro tem uma estatura pequena, então barítono tem pouca altura, o baixo deveria
ser mais alto e não é. O tenor leva mais vantagem, os tenores em geral são menores.
Mas quando o tenor é maior tem mais vantagem, tem mais extensão. O professor de
canto às vezes sabe isso tudo empiricamente. Essa história é muito complicada, não
acaba.”
segurança do professor, pois o aluno pode facilmente mascarar o seu timbre, mesmo que
inconscientemente, para soar como deseja. O professor deve ser capaz de ouvir o timbre
e perceber se aquela é mesmo a verdadeira voz do aluno. Também Marcos Menescal
ressalta que a extensão deve ser observada junto ao timbre, pois uma voz pode ter
extensão excepcional e confundir um professor que esteja atento apenas a ela.
O Dr. Paulo Louzada reforça a questão fisiológica, e deixa clara a idéia de que a
classificação não pode ser mais importante do que a emissão correta da voz. Esse é o
objetivo a ser alcançado no estudo do canto, sendo a classificação uma questão
secundária. No entanto, diz que o quesito mais importante na variação dos tipos vocais é
o tamanho do órgão vocal, aliado às proporções de sua forma. Esses quesitos, no
entanto, além de só serem verificados com exames muito específicos, não dão respostas
exatas. O que deve ser observado o no estúdio é a tessitura, o que o entrevistado deixa
claro ao dizer que o parâmetro importante é observar aquilo cantor consegue realizar
bem.
Todos os professores concordam que a extensão não é um parâmetro seguro para
classificação.
foram classificados como tenores. Normalmente esses casos são pessoas que vem de
coro, e em geral não estudaram canto sistematicamente, seriamente. Foram quebrar um
galho no coro, se apertaram e foram cantar de tenor. Aí, com o estudo, começaram a
apoiar a voz, a tentar procurar cantar com a garganta aberta, com a laringe baixa,
começou a vir o centro, e então mudaram de registro vocal. Tanto de tenor pra barítono
quanto de soprano pra meio-soprano. Uma aluna que veio como soprano, também com
grandes dificuldades de vencer o repertório, acabou descobrindo um centro muito rico.
Começou a descer, e percebeu que era um meio-soprano lírico. Com graves muito bons,
todos inclusive colocados inclusive de cabeça, sem fazer deslocamento da voz para o
peito. Volta e meia eu encontro esse tipo de aluno que eu preciso reclassificar a voz.”
Professor Licio Bruno:“Sim, às vezes recebemos alunos oriundos de outras escolas ou
professores e muitas vezes eles estão classificados erroneamente. O processo deve ser
natural, com a percepção do próprio aluno de sua capacidade e de como sua voz se
revela dentro dos registros grave, médio e agudo, bem como sua extensão. É um
trabalho que requer muita tranquilidade por parte do professor e muito mais do aluno,
pois muitas vezes este não deseja ser classificado de outra forma e se torna resistente.
Mas na maioria dos casos é uma coisa natural, basta que o aluno perceba ao longo das
aulas que suas habilidades o definem e que não é o professor que o está "enquadrando"
ou colocando numa caixinha...”
Professor Marcos Menescal:“Reclassificar de soprano pra meio-soprano, de tenor pra
barítono, não. Eu não dou aula de canto, e sim de declamação lírica. A pessoa já chega
com sua classificação, seu repertório, não mexo nisso. Ou melhor, mexo às vezes com
repertório. Algumas vezes os alunos vem com uma idéia errada da própria voz. Um
soprano lírico que achava que tinha a voz mais leve, cantava repertório leve demais,
coisas desse tipo. Então, quando acontece isso, na medida do possível eu vou
orientando. Mas oriento através do repertório que eu acho mais justo pra aquela voz.
Muitas vezes o aluno começa a cantar melhor, com mais facilidade, a voz vem mais pra
fora, e tudo se encaixa melhor. É errado cantar pra dentro pra ficar com a voz leve,
fazendo a voz leve demais, nessa idéia errada de cantar leve pra preservar o órgão vocal.
Pelo contrário, cantar pra dentro faz mal, faz pressão nas cordas vocais. Estraga a voz.
Isso pode acontecer ao contrário também. Muitas vezes alunos trouxeram repertório
pesado demais para a voz deles, e eles achavam que podiam cantar por que não
falsete, reduzir, fingir que é mais aguda. Falsete cansa, da até calo, e de repente a
mulher fica afônica. De repente perde a voz. Eu já vi muitos casos com mulheres,
homens menos. Alunas minhas que ficaram afônicas, tiveram disfonia, afonia, uma teve
até nódulo, calo na corda vocal. Eu fui verificar, pesquisar, mudei o regime e a tessitura,
e verifiquei que elas tinham graves. Mas o principal que eu fiz não foi mudar o registro,
foi mudar a maneira de produzir a voz. O falsete favorece muito o aparecimento de
nódulos. Nesses casos eu libero a voz dessa situação, e o calo até regride. Com o tempo,
mudam a maneira de usar a voz, e mudando a maneira o calo some, a voz aparece. Isso
acontece falando também, não só com cantores. É muito frequente professores perderem
a voz. E como cura a voz falada, cura a voz cantada também. O que é curar? É fazer um
rendimento maior. O que é o rendimento da voz? Isso que é importante. O rendimento é
o que você obtém de sonoridade com o esforço físico que faz, o quanto você está
despendendo de força e o quanto está produzindo de som. Isso é o rendimento. Isso é o
que é importante, e isso serve para voz falada e cantada. Tive alguns alunos de voz
falada. Sem voz, disfônicos, com calo, que depois curaram. Eu não sou fonoaudiólogo.
Não sou professor de canto, minha área não é a música. Sou um foniatra que se
especializou no canto. Eu resolvo a voz na fala, resolvo o canto também. Mas tem que
saber na prática, só quem faz na própria voz é que percebe a diferença. A gente pode
falar o que quiser, é tudo palavra perdida, não vale nada. Em termos de voz, a única
coisa que prevalece, que vale, é realizar. E dentro de si perceber o que está fazendo.
“Isso é melhor”, muda, ou “isso é melhor”, muda. Aí você é dono da sua voz. Ler,
vocalizar, não adianta nada. Pode por acaso melhor a voz, melhorar alguns atributos da
voz, mas não dá o domínio sobre a voz, o rendimento real da voz. Ela fica mais
metálica, mais rendosa, com mais intensidade. Quanto à extensão, precisa-se levar em
conta a extensão relativa e a extensão real. A extensão real é aquela que você domina.
Garante que vai dar o grave, o agudo, e dá sem problemas. Agora, existe uma extensão
fictícia, em que se um faz grave diferente, outra maneira de produzir o grave o agudo.
Mas esta não vale nada. Na hora de apresentar, não tem valor nenhum. Não é uma voz
só.”
Todos os professores relataram já ter tido que reclassificar vozes, o que só pode
nos levar a concluir que casos de alunos com problemas de classificação não são
incomuns. Dr. Louzada reforça que o grande problema na maioria das vezes é o mau
uso da voz, mais do que o pensamento de possuir uma classificação diferente. De fato,
podemos imaginar que muitos alunos podem estar tão preocupados com sua
classificação que a preocupação é maior em inserir sua voz em padrões sonoros
preestabelecidos do que em buscar o domínio técnico absoluto. Ao melhorar o
funcionamento vocal do aluno, a verdadeira classificação vem à tona.
O caso relatado pelo Professor De Nonno nos leva a ponderar que o barítono
pode ter sérias questões ao cantar em um coro a quatro vozes, em que tenores e baixos
não terão problemas em se encaixar. Já o barítono, se tiver a voz clara e leve, pode ser
levado a cantar como tenor, dado que o repertório coral pode não lhe exigir as notas que
fazem a diferença entre a extensão de tenor e barítono. Podemos concluir que o mesmo
problema pode acontecer com o meio-soprano. Mais uma vez, aqui, a questão é
observar a região de conforto do aluno, o que pode vir a faze-lo descobrir regiões de sua
voz não ainda trabalhadas.
A Professora Ilza Corrêa mais uma vez reforça a soberania do timbre na hora de
definir a classificação de uma voz, enquanto o Professor Licio Bruno destaca a
necessidade de investigar as propriedades individuais da voz, e ter paciência nesse
processo. Bruno afirma ainda que deve estar claro para o aluno que quem o classifica é
a própria voz, e não uma decisão do professor.
O Professor Menescal chama atenção para o fato de que muitas vozes podem ter
suas reais características mascaradas pela busca por leveza excessiva, o que segundo ele
pode ser prejudicial ao não permitir que o aluno desenvolva toda a potência de sua voz.
Relata que conseguiu, por vezes, auxiliar no desenvolvimento do aluno ao sugerir-lhe
repertório em que suas possibilidades vocais fossem mais exploradas. Podemos
aparelho.
Terceira pergunta: Como você lida com a ansiedade do aluno em saber sua
classificação, ainda que ela não esteja clara?
Ilza Corrêa: “Eu diria pra ter paciência, por que nada se faz no canto apressadamente.
Como diz o ditado, a pressa é inimiga da perfeição. Às vezes é impossível classificar,
“eu sou isso, eu sou aquilo”. A pessoa vai desenvolvendo, e quando começa a cantar
uma música é que a gente vai sentindo. É a forma de cantar... é difícil de explicar. Não
tem nada a ver como extensão. Pode ter agudo, superagudo, ter coloratura e ser um
meio-soprano. O que eu observei nesses anos todos, são características específicas, por
exemplo que que o soprano lírico não tem muita coloratura. Os barítonos e baixos tem
que falar bem todas as notinhas, por que senão podem ter uma tendência a embolar. Mas
não pode querer fabricar um timbre, tem que deixar ele vir com o trabalho. Se você
treina muito, você faz. E se gosta, também. Tem gente que não gosta, se recusa, resiste.
Assim o trabalho não caminha.”
Professor Inácio De Nonno: “A pressa não vai resolver o problema, é isso que eu
sempre faço os meus alunos entenderem. E é natural e previsível que venham com essa
pressa, alguns mais do que outros. Mas eu sempre digo a eles: não pode ter pressa, por
que nesse caso a pressa é inimicíssima da perfeição. Não adianta dizer ao aluno que é
um tenor, um barítono brilhante, um baixo cantante ou um soprano lírico coloratura, se
o aluno não está à vontade com o repertório, se não está formado e não está pronto pra
enfrentar nada daquilo. Isso é uma frase que eu uso muito em sala de aula: é você que
vai me dizer o que você é, não eu. Você é que vai me dar a resposta. Quando a voz
começar a aparecer, quando a gente limpar todos os problemas, as questões de técnicas
fonoacústica, outra produção vocal. Brasileiro não fala como italiano, nem mesmo
como português. Brasileiro não fala com aquela voz, não tem timbre. A laringe funciona
de maneira diferente no alemão, no italiano e no brasileiro. Não precisa ser muito
sabido, basta ouvir o som. Dizem que italiano está sempre gritando. O brasileiro fala
cheio de vento, a voz timbrada é difícil. Às vezes a gente ouve, já ouvi muitas vozes
naturais na rua. Antigamente havia os pregões, os sujeitos que anunciavam a mercadoria
gritando. Os pregões escalavam duas ou três notas, e ali desenvolviam a voz. Pra cima e
pra baixo não tinham nada, mas naquela tessitura – em geral, no início do agudo, depois
da passagem – a voz era bem forte. A pessoa que grita tem muita voz no grito. Na nota
do grito tem muito som, mas pra cima é difícil e pra baixo some. E na ópera a voz tem
que ser sempre a mesma, igual, quando sobe e quando desce, que nem um instrumento.”
Os professores são unânimes em dizer que é preciso ter paciência. Inácio De
Nonno e Ilza Corrêa ilustram a questão com o famoso ditado: “A pressa é inimiga da
perfeição”. Com efeito, uma decisão apressada, feita para saciar a curiosidade do aluno
ou para sanar sua ansiedade, pode provar-se equivocada no futuro, e provocar
dificuldades no desenvolvimento.
Licio Bruno lembra que o mais importante não é a classificação, mas sim o que
o aluno apresenta, como está sua técnica, como está usando sua voz. O professor diz
ainda que, além das classificações iniciais, há as subclassificações, e estas
evidentemente precisarão ainda mais tempo para ser reveladas, devendo ser observadas
no desenrolar dos estudos e no desenvolvimento de um repertório.
Marcos Menescal, que não é professor de canto e portanto não participa do
processo de classificação de seus alunos, relata que diversas vezes influenciou na
mudança de repertório, sugerindo-lhes árias que, segundo ele, mostraram-se mais
apropriadas ao tipo vocal dos referidos alunos e ajudando-lhes assim no
amadurecimento técnico e artístico. Diz também que dúvidas quanto a subclassificações
provavelmente acompanharão o cantor ao longo de toda sua carreira, toda vez que fora
abordar um novo papel e tiver que verificar a adequação deste papel às suas
possibilidades vocais.
Dr. Louzada mais uma vez reforça a importância da correta produção vocal, e
diz que a identificação como instrumento não é tão relevante como o domínio da voz.
Demonstra ainda grande preocupação com o mau uso da voz comum aos brasileiros
devido às peculiaridades do idioma, e reforça que condicionar o órgão vocal aos
parâmetros acústicos dos idiomas em que o cantor lírico se prepara para cantar – o autor
cita italiano, alemão e francês – é tarefa indispensável ao aluno de canto brasileiro. Diz
também que o canto lírico tem demandas que nem todos os aparelhos vocais serão
capazes de produzir, ou ao menos não sem grande dificuldade.
Outro aspecto interessante do relato do Dr. Louzada é a variedade de
possibilidades de abordagens técnicas. Cada professor tem uma estética diferente, e um
objetivo diferente para a voz do aluno. Isso significa dizer que o treinamento do cantor
vai depender em grande parte das opções do professor que ele escolher para si, o que
vem de acordo com a idéia exposta em nossa pesquisa de que o treinamento de cada
aluno com seu professor será um processo único e particular.
Quarta pergunta: Como se deu o seu processo de classificação vocal? Você passou
por dúvidas ou mudanças? Caso afirmativo, como se deu o processo?
Professora Ilza Corrêa: “Eu comecei a estudar canto muito sem horizonte. Sonhava
muito em fazer carreira lírica... Eu gostava muito, por que freqüentava muito desde
pequenina a ópera. Gostava do palco, dos cenários, da indumentária. Mas havia muita
resistência, não por parte do meu pai, mais por parte da minha mãe. Não que achasse a
carreira fosse feia, mas a é por que a gente era sempre muito criticada, as pessoas
davam muitas opiniões sempre. Ela ouvia e dizia: “você está pronta pra passar por isso
tudo?” Ela tinha medo que eu me magoasse. Como eu tinha muito tempo pra estudar,
era muito menina, não tive pressa. Mas desde a primeira vez que eu abri a boca minha
professora disse: “você é um soprano”. Um soprano forte. Não disse dramático, nem
nada, mas sabia que não era um soprano leve. Eu já sabia por mim, de ouvir outros
cantores, que não era soprano ligeiro. Fui desenvolvendo aos pouco, fui chegando lá.
Tinha dificuldade de agudos, por que a voz tinha a tendência a ficar num miolo só. Mas
eu vi que não adiantava criar dificuldade resistência. Se você quer cantar uma ária de
ópera, não pode fazer resistência. Tem que ir treinando, dentro do que o compositor
escreveu, senão não chega nunca. Eu vi isso em algumas aulas de canto. A pessoa ia
cantando, de repente vinha uma dificuldade. Descia uma oitava e os maestros deixavam,
habituavam a fazer isso. Não pode, tem que ser natural, acho que tem que conviver com
o agudo, com sua extensão, sem criar dificuldades. Tem que conviver também com o
seu timbre, e quanto o timbre combina com o temperamento, melhor ainda, é o ideal.
Geralmente acontece. Uns e outros aparecem que tem timbres que não combinam com
temperamento, mas quando há uma combinação, é o ideal.”
Professor Inácio de Nonno:“Logo depois que eu fiz a passagem de voz, de 12 para 13
anos, eu estudava no Pedro II, um colégio tradicional aqui no Rio de Janeiro. Lá entrei
para o coro, e já fui classificado como barítono, nem foi como baixo. Engraçado, por
que era um coro a quatro vozes, e mesmo assim a professora do coro logo disse que eu
era barítono. Quando eu comecei a estudar canto seriamente, a partir dos 17 para 18
anos, nenhum dos meus professores nunca tiveram dúvidas quanto ao meu registro. No
período que eu fui do Coro do Theatro Municipal alguns colegas brincavam que talvez
eu fosse tenor, pelo fato de eu ter notas agudas fáceis. O pessoal brincava que eu era
tenor disfarçado por que eu tinha as notas agudas, mas isso era brincadeira de colega.
Os professores com quem eu estudei sistematicamente nunca tiveram dúvidas, e nem eu
com 57 anos de idade, 29 de carreira, nunca tive dúvida.”
Professor Licio Bruno: “Desde o meu início, meu professor de Canto me classificou
como baixo-barítono. Isto poderia ter causado muitas dificuldades mas no meu caso foi
o melhor, pois eu comecei a me preparar com um repertório intermediário (creio que
TODOS os cantores deveriam fazer isto antes de partir para um repertório operístico
mais definido), o que me trouxe pouco a pouco um maior entendimento de minha voz e
de como ela transitava nas diferentes tessituras de baixo e de barítono. Com o tempo e a
entrada no mercado de trabalho, a própria característica vocal foi se consolidando e
abrindo possibilidades de abordar repertórios antes inimagináveis, como papéis de
baritonos wagnerianos (Wolfram, Telramund) bem como os de bass-bariton (Wotan). A
mesma coisa se deu com Verdi (Rigoletto, Iago, Re Carlo do Ernani, etc...) e outros
papéis como Gerard (Chénier) e Barnaba (Gioconda). Há que se ressaltar que a própria
maturidade técnica ajudou a definir melhor quais as possibilidades de repertório e
também em poder transitar entre alguns papéis mais graves (Cacique do Guarany, Os 4
vilões de Hoffmann) aos mais agudos (Enrico, da Lucia). Mas não creio que houve uma
mudança de classificação, continuo me classificando como baixo-baritono, porém neste
momento tenho dado mais ênfase ao repertório de barítono dramático em minha
carreira, que teve recentemente o papel de Scarpia como um dos grandes desafios, pela
canções do século XVIII, XVII, e são bem centrais. Qualquer voz canta, barítono ou
tenor. Trabalhávamos o centro da voz, até que ela viu fazendo vocalizes, também, que a
voz estava se desenvolvendo mais pra cima do que pra baixo. E foi aos poucos ficando
uma voz que era de tenor, não tinha mais dúvida. Aí ela me deu a serenata do Arlequim,
que eu cantei sem problema, e pronto: tenor. Isso eu ainda tinha 17 pra 18, mas não
havia realmente muita dúvida. Foi só uma cautela da professora. Acho que existe
sempre uma dúvida dentro das subclassificações, e ela acompanha por muito tempo,
pode acompanhar pela vida inteira. É muito difícil escolher o repertório justo. É preciso
ser muito bem orientado, o próprio cantor escolher é muito difícil. Nem sempre aquilo
que é mais fácil é mais adequado. Um exemplo: uma voz ligeira, se cantar uma coisa
mais dramática, mais central, pode ser mais fácil, mas absolutamente inadequado. A voz
não rende, não vai pra frente, a gente não ouve, e no entanto a pessoa se sente
confortável cantando. Um tenor ligeiro que tem que cantarCenerentola resolve cantar,
digamos, Macbeth – a ária do Macduff. Ele se sente muito à vontade naquilo. Ele não
tem que fazer força nenhuma. Mas, também, a voz não sai. Descobrir por ele é mais
difícil, é bom ter alguém ouvindo pra ver saber a voz está indo, se está projetando, se
está encaixada naquele repertorio. É difícil, não é fácil. Tem que ter alguém ouvindo. É
difícil se definir, se classificar em umFach. Ocorre também que a pessoa pode fazer
uma voz, falsificar um timbre. Pode forçar uma barra pra fazer determinado repertório.
Não é bom.”
Dr. Paulo Louzada: “Eu sou um barítono. Um barítono que não tem ressonância grave.
Eu tenho a laringe alta, então minha voz é clara, dá idéia de tenor. Mas não tem
extensão. Tem grave, mas o grave não tem profundidade, então eu sou um barítono
curto, e muito ruim. O meu aparelho vocal é o pior que eu vi na vida, a pior voz que eu
conheci foi a minha. Fui estudar isso por curiosidade, não tinha a intenção de ser cantor.
Mas ia dar meus gritos no banheiro, e depois vi que não podia. Minha voz é das mais
difíceis. Só consegui dominar depois de estudar muito, procurar muito, os métodos
todos. Conheço muito a voz hoje. Estudo há sessenta anos e fiquei conhecendo a voz
bem de cinco anos pra cá, cada vez mais. É um assunto tremendamente difícil.
Tremendamente dissimulado, oculto, escondido. Você olha a garganta, olha a laringe, e
não vê nada. Por que tudo gira em torno das leis de ressonância. O som produzido na
fonte, para ser bem emitido, é preciso que haja a proporção adequada do comprimento
Nonno também não tiveram dúvidas quanto à sua classificação. O Dr. Louzada, por sua
vez, é categórico em dizer que tem o pior instrumento vocal que já viu. Apesar da
limitação de recursos de sua voz, que não a permitem desenvolver-se nos padrões de
extensão e tessitura de um instrumento lírico, ele a classifica como barítono.
Menescal dá-nos um exemplo curioso: o do cantor de voz ligeira que canta
coisas mais pesadas do que o recomendado para sua voz. Essa, como pudemos ver,
poder ser uma situação perigosa, pois ainda que o repertório possa ser desempenhado
com muita desenvoltura pelo cantor, por não apresentar as demandas esperadas para o
seu tipo de voz, o resultado provavelmente não será satisfatório. Diz ainda que as
subclassificações são um assunto muito complicado, e que é muito difícil um cantor
identificar seu próprio Fach (dada a dificuldade do próprio cantor ouvir sua voz e
estabelecer parâmetros reais), e recomenda que haja uma orientação externa com
relação a isso.
Ilza Corrêa destaca um fator importante: a necessidade de lidar com toda a
extensão da voz ao trabalha-la. Segundo a professora, muitos alunos fogem dos agudos
devido às dificuldades, mas não encara-los seria pior. É preciso lidar com toda a
extensão da voz igualmente, sem bloqueios, para que se possa dispor do instrumento
com desenvoltura. Dr. Louzada também reforça a questão do domínio, e segundo ele só
o domínio dá a segurança. Já na resposta anterior o entrevistado chamou atenção para o
fato de que o aluno tem que desenvolver toda sua extensão de maneira uniforme, pois
no repertório operístico o cantor precisará exibir notas graves e agudas com a mesma
desenvoltura, tal qual um instrumento.
A professora Ilza Corrêa toca em outro ponto relevante: a identificação do aluno
com o próprio timbre. Quando há uma coerência entre a personalidade do aluno e sua
voz (o que, segundo ela, normalmente acontece), a situação é ideal. Mas pode haver
discordância, uma pessoa que tenha vocações dramáticas e voz leve, ou a voz pesada
inclinações artísticas leves, ou cômicas. Professor e aluno terão de trabalhar juntos para
resolver esta situação da melhor forma possível.
Licio Bruno traz uma importante contribuição aqui. Tendo sido classificado
desde o início como baixo-barítono, o professor afirma que todos deveriam começar
com um repertório intermediário, para permitir que a voz desenvolva-se naturalmente e
revele aos poucos o seu real caminho. Tendo cantado, ao longo de sua carreira, papéis
de baixo e de barítono, Licio Bruno deixa claro que o que importa, nesses casos, é a
adequação de sua voz ao papel mais do que a definição classificatória, e que não passa a
ser baixo ou barítono por cantar esses papéis. Esse é um ponto muito importante: ter
sempre claro que todos os parâmetros de classificação expostos nesta pesquisa são
apenas um guia facilitador, e o que importa mesmo, em última análise, é que o cantor
conheça bem seu instrumento e todas as suas características para que possa escolher o
repertório que lhe seja adequado.
CONCLUSÃO
desenvolvem-se muito mais rápido que ela, ou o aluno tenor pode se desestimular ao
enfrentar tantas dificuldades para desenvolver sua região aguda. O professor, então,
deve estar apto não só a poder identificar a classificação vocal do aluno, mas também a
ajuda-lo a lidar com o delicado processo de identificação e desenvolvimento de seu
instrumento particular. E, é claro, deve também conhecer profundamente os tipos vocais
e adaptar sua pedagogia às necessidades específicas de cada um deles.
Para poder ouvir e julgar a qualidade de som do aluno, bem como para poder
ajuda-lo a desenvolve-lo e melhora-lo, é necessário que o professor tenha em sua mente
Taylor (1918) diz: “Em outras palavras, conhecimento empírico da voz é uma
compreensão das operações do mecanismo vocal, obtida através da audição atenta de
vozes.” 197 (TAYLOR, 1918, p. 176) Com efeito, o professor necessita muita bagagem
auditiva para ter referências suficientes e garantir poder lidar com as necessidades de
cada aluno através da única coisa real com que ele pode contar para se guiar – o som.
Tudo isso revisto, voltemos às nossas questões iniciais: É possível estabelecer os
fatores a ser observados para que se possa proceder a uma correta e segura
classificação? E, caso afirmativo, é possível estabelecer sob que parâmetros esses
fatores devem ser observados?
A resposta da primeira pergunta é: Sim, podemos. A literatura nos fornece, com
uma riqueza de detalhes que impressiona aquele que se aventura a estudar o assunto, as
características de cada tipo vocal. Extensão, passagens de registro, tessitura,
difere é a posição que essas mudanças ocupam em relação aos seus limites de extensão.
Mesmo a percepção do timbre pode ser bastante alterada dependendo da utilização dos
registros pelo aluno, o que pode ser muito influenciado pela teoria do registro não
utilizado de Vennard (1967).
Esperamos ter, com nossa pesquisa, contribuído para o esclarecimento da
questão da classificação vocal. Esperamos, também, ter sido válida a discussão
realizada entre as posições diversas de tantos autores, muitos dos quais pouco
divulgados apesar da relevância de suas opiniões. O diálogo entre os autores sobre canto
lírico de momentos históricos tão distantes põe-nos em contato com a realidade de cada
momento, possibilitando-nos uma visão ampla e uma perspectiva historicamente
informada de questões eternas da pedagogia vocal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BEHLAU, Mara. Avaliação Global da Voz. São Paulo: Editora Paulista Publicações
Médicas, 1992.
BOLDREY, Richard. Guide to Operatic Roles & Arias. Redmond: PST…Inc., 1994.
BROWN, William Earl. Vocal Wisdom, Maxims of Giovanni Battista Lamperti. New
York: Taplinger Publishing Company, 1957.
BUNCH, Meribeth (1982). Dynamics of the Singing Voice New York: Springer-Verlag,
Wien, 1997.
BURGIN, John Carroll. Teaching Singing. Metuchen: The Scarecrow Press, 1973.
CLARK, Mark Ross: Guide to the Aria Repertoire. Bloomington: Indiana University
Press, 2007.
CLIPPINGER, D. A. The Head Voice and Other Problems– Practical Talks on Singing.
Boston: Oliver Ditson Company, 1917.
COTTON, Sandra. Voice Classification and Fach: Recent, Hitorical and Conflicting
Systems of Voice Categorization. Tese (Doutorado). University of North Carolina.
Greensboro, 2007.
DEERE, James D. Singing in the 20th Century. Bloomington: Authorhouse, 2005.
DOSCHER, B. The Functional Unity of the Singing Voice. Metunchen, NJ: The
Scarecrow Press, Inc., 1994.
FIELDS, Alexander. Training the Singing Voice:An Analysis on the Working Concepts
Contained in Recent Contributions to Vocal Pedagogy. New York: King´s Crown Press,
1947.
GARCIA II, Manuel. A Complete Treatise on the Art of Singing: Complete and
Unabridged. 2 vols. The Editions of 1847 and 1872 Collated, Edited, and Translated by
Donald V. Paschke. New York: Da Capo Press, 1975.
HINES, Jerome. Great Singers on Great Singers. New York: Limelight Editions, 1984.
JAMES, William. The Art of the Singer: Practical hints about vocal technique and style.
New York: Charles Scribner´s Sons, 1906.
KLOIBER, Rudolf; KONOLD, Wulf; MASCHKA, Robert (2002). Handbuch der Oper.
München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 2007.
MILLER, Richard. Training Tenor Voices. New York: Schirmer Books, 1993.
______________. On the Art of Singing . New York: Oxford University Press, 1996.
_____________. Training Soprano Voices. New York: Oxford University Press, 2000.
Pedagogy:
Publishing,Science
2006b. and Assessment. Ed. Sataloff, Robert T., San Diego: Plural
_____________. Securing Baritone, Bass-Baritone and Bass Voices. New York: Oxford
University Press, 2008.
PACHECO, Alberto. O Canto Antigo Italiano, uma análise comparativa dos tratados de
canto de Pier Tosi, Giambattista Mancini e Manuel P.R. Garcia.São Paulo: Annablume
Editora, 2004.
PLEASANTS, Henry (1966). The Great Singers: from Jenny Lind and Caruso to Callas
and Pavarotti. New York: Simon and Schuster, 1981.
REID, Cornelius, L. The Free Voice – A guide to natural singing. New York: Joseph
Patelson Music House, 1971.
REID, Cornelius, L. Bel Canto, Principles and Practices. New York: Joseph Patelson
Music House, 1972.
SUNDBERG, J. The Science of the Singing Voice. Dekalb, Illionis: Northern Illinois
University Press, 1987.
TITZE, Ingo. Principles of Voice Production. Iowa: National Center for Voice and
Speech, 2000.
TOSI, Pier Francesco(1723). Sentiments on the Ancient and Modern Singers. Tradução
Mr. Galliard William Reeves Bookseller, Londres: Projeto Guttemberg, Londres, 2008.
VENNARD, William. Singing – the mechanism and the technic. Revised edition,
greatly enlarged; New York: Carl Fisher, 1967.
WARE, Clifton Ware. Basics of Vocal Pedagogy: The foundations and process of
singing. Boston: McGraw Hill, 1998.
WARRACK, John; WEST, Ewan. The Oxford Dictionary of Opera. New York: Oxford
University Press, 1992).
WILEY, Johh. Opera for Dummies. Hoboken: Wiley Publishing, Inc. 1997.