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A produção social da arte pública: participação

Teoria e Cultura
ampliada e site specificity
The social production of public art:
broadened participation and site specificity

Daniel Ferreira de Toledo*

Resumo
O artigo problematiza as negociações e os processos sociais envolvidos na produção de obras de
arte pública orientadas pelo conceito de site specificity. Esses fenômenos são analisados a partir da
sua relação com condições essencialmente contemporâneas, como a implementação de políticas
de participação ampliada e a disseminação de redes midiáticas e de turismo. Ao longo do artigo, as
obras de arte pública, ao lado dos seus processos de produção e suas trajetórias, são tratadas como
arenas de conflito entre os interesses de gestores públicos, artistas e integrantes da sociedade civil,
no que se refere à produção dos espaços que compõem as grandes cidades contemporâneas.

Palavras-chave: Arte pública. Participação ampliada. Site specificity.

D esde o surgimento do urbanismo na se-


gunda metade do século XIX, e mesmo
em épocas anteriores, a arte esteve presente como
compreensão do público. (FLEMING,
2005, p. 65, tradução nossa).1

importante elemento de mobiliário urbano. Essas Até o início do Modernismo, predominava


manifestações artísticas são hoje conhecidas como a produção de obras de arte pública com caráter
arte pública e, quando comparadas a obras de arte ordenador e monumental, cujo conteúdo tradu-
convencionais, expostas em ambientes específicos zia com clareza os interesses dominantes. “Hou-
como igrejas e museus, despertam formas de com- ve uma época em que os monumentos eram, ao
preensão que revelam características particulares. lado das escolas e dos museus, um cenário legiti-
mador do culto tradicional” (CANCLINI, 1998,
Em museus e galerias, a importância da p. 291). Os monumentos históricos e políticos,
arte é assegurada – as pessoas estão lá nesse contexto geralmente patrocinados pelo Es-
especificamente para vê-la. Esses museus tado, ilustram a imposição de valores e, em certa
e galerias [...] mobilizam uma emoção medida, a dominação de homens sobre homens,
estética cuja particularidade é definida,
de uma classe sobre outra.
em parte, por sua separação da vida
cotidiana. Nos espaços públicos não Apesar de comumente tratados como obje-
há nada que mobilize esse sentimento. tos principalmente ornamentais, essas obras es-
A arte deve relacionar-se ao observador tavam, no entanto, muito longe da inutilidade.
de um modo diferente do que acontece Contrariando a percepção da obra de arte como
na galeria [...] Quando a arte encontra
um objeto sem função prática, os monumentos
a vida cotidiana, como acontece na arte
pública, as justificativas românticas históricos serviam aos Estados como importantes
válidas para o mundo da arte são instrumentos de propaganda ideológica e políti-
insuficientes diante das demandas de ca. Ainda que atendessem a necessidades simbóli-
Juiz de Fora
v.3, n. 1/2

*
Graduado em Comunicação Social pela PUC-MG, pós-graduado em Imagens e Culturas Midiáticas pela UFMG e mestrando em p. 33-50
jan./dez.
Sociologia pela UFMG. – Rua Nascimento Gurgel, 21/704 Gutierrez BH MG - Telefone: (31) 8834-1077 – dotoledo@gmail.com 2008
cas, essas obras podem ainda ser enquadradas sob luta de classes. Contribuições teóricas e
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a noção marxista de mercadoria: “A mercadoria metodológicas de Gramsci e Bourdieu


podem ajudar-nos a estudar a arte como
é, antes de tudo, um objecto exterior, uma coisa
instrumento para constituir a hegemonia
que, pelas suas propriedades, satisfaz necessidades das classes dominantes e desenvolver
humanas de qualquer espécie. Que essas necessi- a impugnação das classes subalternas,
dades tenham a sua origem no estômago ou na legitimar a opressão e desmobilizar os
fantasia, a sua natureza em nada altera a questão” oprimidos, conhecer e comunicar, mas
também mascarar e dividir. (CANCLINI,
(MARX, 1983).
1969, p. 116).
Durante séculos a arte e a arquitetura foram
orientadas principalmente segundo o sentido e
Desde o final do século XIX, no entanto, os
a perspectiva que interessavam a grandes insti-
monumentos tradicionais passaram a conviver
tuições, e assim como havia arte a serviço da po-
com novas formas de arte pública. O Modernis-
lítica, havia a serviço da religião. Diante dessa
mo trouxe ao espaço das cidades obras de arte de
relação, Weber (2006) destaca a semelhança en-
caráter abstrato, baseadas na harmonia de formas
tre emoções artísticas e religiosas e a via de mão
geométricas, por exemplo. Essa autonomização da
dupla que se estabelece entre os campos, moti-
arte costuma ser vista como um reflexo da com-
vada pela vocação artística de atrair e manter a
plexificação do processo produtivo que, por sua
atenção do público.
vez, separou os aspectos da atividade humana –
Na realidade empírica da história,
cultural, político, econômico etc. – e libertou-os,
esse parentesco psicológico levou con­ progressivamente, do controle religioso, num mo-
tinuamente, é um facto, àquelas alianças, vimento que tem início nos séculos XVI e XVII.
importantes para o desenvolvi­mento da Sobre esse processo histórico e social, Canclini
arte, que a grande maioria das religiões (1969) elabora uma breve revisão.
estabeleceu de uma maneira ou de outra;
e tanto mais sistematicamente quanto
Até fins da Idade Média, os artistas
mais elas pretendessem ser religiões
recebiam do poder eclesiástico a
universalistas de massas, dependendo,
encomenda de seus trabalhos, junto
por conseguinte, do efeito sobre as
com os códigos simbólicos e figurativos
massas humanas e da propaganda
que deviam repetir sem pretensões de
emocional. (WEBER, 2006, p. 339).
originalidade. Durante a época clássica,
os gostos dos artistas, que ainda não
Mas se esse tipo de produção artística parece se consideravam criadores, estavam
confinado ao passado, é importante ressaltar que subordinados às diretrizes das cortes.
a estética monumental e suas obras sobrevivem Com o crescimento do capitalismo e
a liberação cultural burguesa, a tutela
ao tempo, preservando heróis políticos e figuras
religiosa enfraquece, a vida cortesã se
religiosas, destacando datas históricas e materia- dissolve, a aristocracia se mistura com a
lizando símbolos de poder. Muitas obras de arte intelectualidade laica e surge um público
pública produzidas há décadas ou séculos atrás especial para as atividades artísticas.
continuam instaladas nas cidades, abertas à dinâ- O público burguês torna possível um
mercado específico para os objetos
mica urbana. Além disso, inúmeras outras, orien-
culturais, em que as obras são escolhidas
tadas por interesses dominantes, continuam sen- e valorizadas com critérios propriamente
do encomendadas – pelo Estado, pela Igreja e por estéticos. (CANCLINI, 1969, p. 60).
grandes instituições econômicas.
A arte pública que toma corpo no final do
A sociologia da arte deve desembocar numa século XIX e na primeira metade do século XX
teoria do poder simbólico. O próprio caracteriza-se por esculturas cujo sentido político
Juiz de Fora
v.3, n. 1/2 marxismo interpreta comportamentos
p. 33-50 e produções simbólicas segundo a é, aparentemente, ofuscado por traços estéticos e
jan./dez.
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maneira como os homens participam da estilísticos. Assim como a pintura, a escultura mo-

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derna torna-se um campo de investigação especí- 2002, p. 60). Seja por meio de estruturas híbridas

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fico, estruturado a partir de uma lógica interna de como fóruns, conselhos e orçamentos participa-
produção de sensações. O Modernismo introduz tivos ou sob a forma de negociações e parcerias
o “monumento como abstração, [...] funcional- pontuais, é solicitada dos indivíduos uma postura
mente sem lugar e extremamente auto-referen- cada vez mais autônoma, livre e responsável.
cial.” (KRAUSS, 1984, p. 89).
As cidades brasileiras, por exemplo, recebem ...assistimos a um processo onde as cidades
amplo investimento estatal para a aplicação do aboliram a visão de administrações
limitadas à cosmética urbana, e buscam
Modernismo em espaços públicos, tendo como parcerias e novas reengenharias sociais
principais referências o Edifício Gustavo Capa- para recuperar o seu espaço econômico,
nema (Rio de Janeiro), a Pampulha (Belo Hori- a cidadania local. [...] De certa forma, a
zonte) e a cidade de Brasília. Trata-se de projetos cidade está recuperando gradualmente
que integram arquitetura, paisagismo, escultura um espaço de decisão direta sobre a
polis, recuperando a dimensão mais
e pintura, buscando associar à imagem brasileira expressiva da política e da democracia.
valores como “modernidade” e “progresso” e pre- (DOWBOR, 1996, p. 69).
servando, de certo modo, o seu valor de troca para
as instituições patrocinadoras – valor que então se E se a partir dos anos 80 a produção do espaço
processa dentro do campo de valores da arte. urbano passa, cada vez mais, a relacionar-se com
Os anos 80, contudo, trazem uma série de significados culturais e identidades subjetivas
transformações que reconfiguram a agenda e o reveladas por meio de debates públicos, não por
modo de funcionamento das políticas públicas acaso um fenômeno análogo e praticamente
urbanas. Segundo Pereira (2002), seria relevante simultâneo acontece no campo da arte pública. O
considerar processos relacionados à globalização, mesmo indivíduo que reivindica uma participação
fragmentação e poder local, assim como a reestru- política mais expressiva pode rejeitar uma obra de
turação do capitalismo e as novas regras que passam arte pública que não se articule com a realidade em
a reger as relações econômicas. “Nos âmbitos po- que se insere. “O debate destacava uma questão
lítico e geopolítico, configura-se um novo quadro fundamental: a tensão entre os direitos de artistas
identificado pelos teóricos da pós-modernidade individuais sobre a criação de obras sem orientações
como a ‘revanche’ do indivíduo, no que diz respei- e imposições e os direitos do público sobre a
to aos seus particularismos e a suas identidades.” instalação de obras de arte efetivas e significativas,
(PEREIRA, 2002, p. 60). Também sobre as novas que refletissem as necessidades do público”.
práticas que passam a conduzir o planejamento das (FLEMING, 2005, p. 64, tradução nossa).2
cidades, Dowbor (1996, p. 62-63) observa que “... Desde os anos 60 a arte contemporânea vinha
o governo central vê o seu papel profundamente sendo empurrada para o rompimento dos muros
alterado pela própria aceleração das transformações dos museus e galerias, para a instauração plena nos
econômicas e sociais. [...] Problemas mais específi- espaços públicos das cidades, superando as con-
cos terão de ser transferidos para espaços de decisão dições de isolamento do cubo branco ideal que
mais próximos do cidadão.” deixava o mundo do lado de fora. Nesse sentido,
Começa a estabelecer-se, desse modo, uma vale destacar algumas das orientações elaboradas
nova relação entre indivíduo e Estado. A socieda- pelo artista brasileiro Hélio Oiticica e divulgadas
de civil ganha expressividade ao ocupar, por meio na exposição “Nova Objetividade Brasileira”, rea-
de representantes, os “novos espaços ampliados de lizada em 1967:
participação”. Compõe-se, nesse contexto, a no-
ção de participação ampliada: “Isto vem a alterar 2. Tendência ao objeto e negação das
categorias tradicionais das artes plásticas
a estrutura antes consolidada de participação po-
(pintura, escultura, desenho etc.); 3. Juiz de Fora
lítica e aproximar o indivíduo dos seus valores, da Criação de uma obra aberta à participação
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sua cultura e das suas identidades.” (PEREIRA, do espectador; 4. Tomada de posição jan./dez.
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frente aos problemas políticos, sociais Quando o lugar é o fundamento do
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e étnicos que emergiam da realidade projeto, a arquitetura torna-se transfor-


brasileira e internacional; 5. Tendência mação do que está dado. Só assim, [...]
à arte pública, interagindo com as enquanto modificação silenciosa de um
manifestações nas ruas das cidades. presente específico, a arquitetura pode-
(RIBEIRO, 1998, p. 171). rá ultrapassá-lo, reatando enfim com sua
tarefa de representar o que de alguma
Avançando sobre o ecletismo de monumentos maneira não se encontra no presente.
(ARANTES, 1993, p. 72).
a heróis políticos, figuras religiosas, datas histó-
ricas e símbolos de poder, algumas obras de arte
Com poucas décadas de existência, o conceito
introduzem novas mensagens e, mais uma vez,
de site specific art ganha relevância à medida que as
novas linguagens ao cotidiano das cidades.
obras baseadas em seus pressupostos configuram-
Como uma espécie de reação ao Modernismo,
se como prática artística formal, servindo como
sua excessiva autonomia formal e seu descolamen-
orientação para políticas públicas, planos diretores,
to da realidade social, surge na década de 1970,
programas culturais e iniciativas da sociedade
dentro do que se conhece como arte contempo-
civil. Ao envolver o artista e a obra de arte em uma
rânea, a site specific art, uma prática artística de-
complexa rede de grupos interessados, a site specific
dicada à criação de obras de arte a partir de um
art exige a elaboração de arranjos sociais múltiplos,
diálogo com o espaço e o contexto de criação.
capazes de organizar as negociações entre os
O termo “sítio específico” faz menção a interesses do artista, da instituição patrocinadora
obras criadas de acordo com o ambiente (Estado, empresa etc.) e da comunidade que
e com um espaço determinado. Trata-se, receberá a obra – tudo isso dentro de um contexto
em geral, de trabalhos planejados – muitas
vezes fruto de convites – para um certo perpassado por redes midiáticas e de turismo. As
local, em que os elementos esculturais novas formas de arte estão fundamentalmente
dialogam com o meio circundante, relacionadas a modificações nas relações entre
para o qual a obra é elaborada. Nesse artistas, obras, intermediários e público, e de
sentido, [...] sinaliza uma tendência da todos eles com a estrutura social. Segundo Canclini
produção contemporânea de se voltar
para o espaço, incorporando-o à obra (1969, p. 32), “criar uma nova arte requer, tanto
e/ou transformando-o, seja ele o espaço quanto um conjunto de imagens nunca vistas,
da galeria, o ambiente natural ou as áreas outra maneira de produzi-las, comunicá-las e
urbanas. (SITE..., 2006). compreendê-las: gerar um novo modo de relação
entre os homens”.
As obras de site specific art instaladas em am- Enquanto alguns países (como os Estados
bientes públicos urbanos, no entanto, guardam Unidos) e cidades (como Düsseldorf, na Ale-
marcantes particularidades: são desenvolvidas manha) já possuem programas permanentes de
segundo características topográficas e traços cul- produção e instalação de obras de arte pública
turais locais, envolvem um conhecimento ante- nos espaços urbanos de convivência, as cidades
rior sobre o espaço que receberá a intervenção brasileiras e o país, de um modo geral, come-
– temporária ou permanentemente – e devem çam, agora, a voltar-se para essa questão. Brissac
considerar os diferentes interesses que atuam (2002, p. 12) apontava, há apenas seis anos, para
sobre o mesmo espaço. Em outras palavras, as a inexistência de um programa oficial na cidade
esculturas – ou objetos – passam a considerar de São Paulo: “A realização de intervenções sem
o local, o ambiente, as pessoas que ocupam os um contexto institucional preestabelecido, que
espaços naturais e construídos, dialogando com determine o seu formato, organização e recur-
a arquitetura e a natureza, em seus respectivos sos, implica buscar novas formas de iniciativa.”
Juiz de Fora
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contextos. As obras constroem-se a partir dessa Por outro lado, orientações generalistas sobre a
p. 33-50 relação, integram-se ao entorno e não podem ser instalação de obras estão incluídas nos planos di-
jan./dez.
2008 transportadas para outro lugar. retores das cidades de São Luis3 e Fortaleza: “Lei
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Nº 7.503, de 07 de janeiro de 1994, que obriga de pedestres ao redor da sua estrutura.

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a colocação de obras de arte de artistas plásticos O sutil protesto de Serra estava inten-
cionalmente em conflito com as práti-
cearenses nas praças e edificações públicas com
cas de uso da praça. Mas enquanto as
mais de 2000m2” (VASCONCELOS, 2003, p. pessoas conviviam diariamente com a
11) – sem, contudo, determinar os arranjos de inconveniência da obra, sua interpreta-
produção dessas obras. Já em Florianópolis, o ção pretendida era tão sutil – ou obscu-
desejo de inclusão da arte pública no Plano Di- ra – que poucas pessoas entenderam-na.
(FLEMING, 2005, p. 67-68, tradução
retor Participativo da cidade tem motivado con-
nossa).5
tínuas articulações entre Estado e sociedade civil,
com destaque para a realização do conjunto de
seminários Arte Pública e Plano Diretor Partici- As tensões que a partir dessa situação se es-
pativo, cuja terceira edição foi realizada em 2008 tabeleceram entre os representantes do órgão res-
(GRAD, 2007). ponsável pela produção e instalação da obra, o
Para compor o quadro complexo em que se artista e o público local podem ser resumidas nas
situa a produção contemporânea de site specific seguintes palavras de Archer (2001):
art, vale ampliar o campo de análise para o con-
texto mundial. Sob o critério da diversidade, são A escultura em aço – muito mais alta que
um homem – cortava a praça, restringin-
brevemente analisadas, a seguir, três obras que do em muito a visão dos pedestres. Em
representam articulações singulares entre os in- 1985, o protesto dos que trabalhavam
teresses de órgãos públicos, artistas e integrantes em edifícios das imediações tornou-se
da sociedade civil. São elas: Tilted Arc (Estados tão intenso que a Administração dos Ser-
Unidos), Floralis Genérica (Argentina) e She viços Gerais [...] anunciou que ela seria
removida. Seguiu-se um processo jurí-
Changes (Portugal). dico, com Serra afirmando que sua re-
A trajetória do Tilted Arc, instalado em Nova moção constituiria uma violação ao seu
York no início da década de 1980 e removido contrato e que uma proposta de deslo-
alguns anos depois, é uma das experiências mais camento para um dos lados da praça era
discutidas no campo da arte pública. Trata-se de inútil, pois a obra havia sido concebida
para ocupar sua posição original. [...] Ela
um evento icônico, em que se representa com foi finalmente removida em 1989.
clareza o desacordo entre o valor da obra para o (ARCHER, 2001, p. 196-197).
Estado patrocinador, o artista e os frequentado-
res do espaço. Prestes a completar vinte anos, a remoção do
Em 1981, o programa Art in Architecture4, Tilted Arc foi certamente um marco para a his-
gerenciado pela Administração dos Serviços Ge- tória recente da arte pública. Essa experiência
rais (GSA) do governo federal norte-americano, estimulou uma série de discussões sobre as difi-
encomendou ao renomado artista plástico – e culdades, nas políticas culturais que incorporam
também norte-americano – Richard Serra uma a site specific art, de conseguir alinhar interesses
escultura que seria instalada na Federal Plaza, em populares, artísticos e estatais – articulando em
Nova York. Sem ter recebido qualquer orientação uma mesma obra, por exemplo, o valor de uso
do programa, Serra pôde expressar livremente o para seus frequentadores e o valor de troca para os
seu ponto de vista artístico sobre o local. seus patrocinadores.
Simultaneamente, ao representar a vitória de
Serra pretendia que a parede divisória pressões políticas sobre artifícios jurídicos, o epi-
tivesse implicações profundas e incô­ sódio mostra de que forma a produção social da
modas, para destacar de que modo a
vida pública e o envolvimento com o site specific art pode ser tratada como um acordo
governo nos afeta. (…) O artista criou, entre Estado e sociedade civil. Assim como de- Juiz de Fora
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deliberadamente, uma parede que divi- cisões relacionadas a questões como trabalho e p. 33-50
diria a praça e redirecionaria o tráfico moradia, as negociações que se dão no campo da jan./dez.
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arte pública requerem esforços ao mesmo tempo arquiteto argentino Eduardo Catalano foi respon-
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jurídicos e políticos. sável pela criação e a instalação da obra, estabele-


cendo e reconfigurando, para tanto, relações com
Poucos contenciosos foram, contudo, diferentes atores sociais, dentre os quais podem ser
resolvidos até os dias de hoje através de
contratos e, ainda menos casos, chega- destacados o governo municipal, a empresa Tetra
ram ao seu cumprimento final. Tanto Pak, os moradores de Buenos Aires e os milhares
porque os conflitos entre atores públicos de turistas que diariamente visitam a cidade.
têm habitualmente origens diferentes, O início da década de 2000 marcou o agra-
[...] quanto o não-respeito aos mesmos vamento da crise econômica argentina, que teve
inscreve-se numa relação de forças mais
política do que jurídica. Os contratos consequências severas em relação ao otimismo e à
de ação pública representam, na reali- autoestima da população portenha. Vivendo longe
dade, apenas engajamentos relativos e a do país há mais de trinta anos, o arquiteto doou a
coerção em sua avaliação verifica-se, so- escultura à cidade como “um símbolo de esperança,
bretudo, na ordem política. (GAUDIN, de uma eterna primavera, em que tudo cresce e se
2005, p. 5).
desenvolve”7 (Catalano, in: PENTENERO,
2002). Trata-se de uma flor feita de aço e alumínio,
No próprio ano de 1989, a Administração
com cerca de 20 metros de altura, desenhada pelo
de Serviços Gerais norte-americana aumentou o
arquiteto portenho Eduardo Catalano e encomen-
tamanho dos painéis responsáveis pela seleção de
dada pelo mesmo à fábrica de aviões Lockheed.
artistas para novos projetos. As equipes passaram
Além de alcançar uma harmoniosa integração entre
ainda a incluir representantes civis pertencentes às
natureza e  tecnologia, a obra se destaca pelo so-
comunidades envolvidas e, num segundo momen-
fisticado sistema fotoelétrico que regula seus movi-
to, apresentavam a seguinte formação: um artista
mentos. Esse sistema faz com que, diariamente, as
de reconhecimento nacional, um artista perten-
seis pétalas abram-se no início da manhã e fechem-
cente à comunidade local, um representante civil
se ao cair da noite, quando uma luz avermelhada
da comunidade local, o arquiteto do projeto, um
acende-se dentro da flor.
representante da Administração dos Serviços Ge-
Diversas mobilizações civis, no entanto,
rais e dois associados da mesma instituição.
foram realizadas a partir da iniciativa que deu

A evolução procedimental da GSA, origem à Floralis Genérica. Essas mobilizações
trazendo usuários e artistas locais para contestavam, sobretudo, o transtorno provoca-
o processo de seleção, resultou em obras do pela instalação da escultura e o alto valor da
de arte mais acessíveis e agradáveis obra, em um período de agravada crise econômi-
que realmente refletem os valores e
ca. Atualmente, no entanto, além de ter se tor-
preferências das comunidades que
vão conviver com a obra depois que nado um dos pontos turísticos mais visitados da
os próprios administradores tiverem cidade, a obra foi positivamente apropriada pela
deixado seus cargos. (FLEMING, 2005, população portenha, convertendo-se em um im-
p. 72-73, tradução nossa). 6 portante símbolo da cidade.
Para além do pioneirismo do Tilted Arc e da
Ao mesmo tempo em que motivou – sem, singularidade da Floralis Genérica, a obra She
contudo, garantir – a produção de obras de arte Changes foi encomendada à artista norte-ameri-
mais integradas aos seus respectivos contextos so- cana Janet Echelman e instalada em 2005 entre
ciais, a reestruturação do painel de seleção foi fun- as cidades de Porto e Matosinhos, em Portugal.
damental para a preservação do próprio programa Inserida no Programa Polis8, voltado à requalifi-
Art in Architecture. cação dos espaços urbanos de diversas cidades do
Já a escultura Floralis Genérica, instalada há país, a obra é resultado de uma articulação entre o
Juiz de Fora
v.3, n. 1/2 seis anos em Buenos Aires, teve origem a partir de Estado português, as prefeituras locais, um técni-
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jan./dez.
uma iniciativa principalmente civil. Nesse caso, o co-urbanista e a artista plástica convidada.
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Apesar de não incluir representantes da socie- articular o objeto artístico à paisagem local. Ainda

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dade civil durante os processos de decisão, a equi- que possa ser divulgada e consumida como merca-
pe do programa apresentou à artista orientações doria e que o peso do valor de troca tenha exercido
e preocupações em relação a aspectos culturais e grande influência durante a sua produção, a obra
topográficos do lugar – conforme a própria Janet She Changes traz benefícios para a população local
Echelman esclarece em entrevista: ao destacar aspectos marcantes da cultura da cidade
e, principalmente, ao fortalecer um lugar que talvez
Fui convidada para uma visita ao lugar em não existisse antes da instalação da escultura.
2001, quando eles pediram que eu criasse Até o momento presente vem se estabele-
um símbolo para a cidade que pudesse
ser visto a pelo menos um quilômetro cendo um amplo debate sobre os novos rumos
de distância em qualquer direção, que da arte pública e a site specific art, dentre os
não bloqueasse a visão do oceano e quais se observa uma tendência a análises sobre
sobrevivesse a fortes ventos e maresia – o dimensões estéticas e relacionadas à recepção
que foi desafiador. Em 2002, apresentei das obras (ARCHER, 2001; BRISSAC, 2002;
minha proposta ao comitê do Programa
Polis e aos prefeitos de Matosinhos e COSTA, 1998; ESCOBAR, 1998; PALLA-
Porto; felizmente, eles aprovaram imedia­ MIN, 2000; SILVA, 2005). Nota-se um con-
tamente. (Echelman in: MORGAN, junto de análises isoladas, sem que haja busca
2005, tradução nossa).9 de regularidades entre processos de produção e
trajetórias de obras de site specific art.
Tendo como referência o conceito de site specific Poucos são os trabalhos dedicados à análise
art e como objetivo a ideia de tornar a Praça Cidade das obras em relação às instituições que reali-
São Salvador um lugar mais amigável e atrativo, zam a organização da cultura, ou mesmo dos
Echelman investiu em uma ampla pesquisa sobre conflitos entre os artistas e as condições sociais
a história remota e recente do lugar, incorporando que orientam os seus processos de produção. É,
na obra uma série de elementos imediatamente nesse sentido, possível eleger algumas discus-
reconhecíveis pelos habitantes da região. sões em curso que problematizam os interesses
Chaminés, mastros angulados sustentados por e as tendências que orientam a produção social
cabos, redes de pesca, padronagens de vermelho de obras de arte pública e, assim, ampliam o
e branco e o vento constante que caracteriza o debate por elas suscitado.
lugar – ou “wind coreography”, nas palavras de
Echelman – formam o quadro de claras inspirações A crítica sobre a cidade moderna
da artista.
Em seus estudos sobre as primeiras metrópoles,

Alguém pode perceber rapidamente Simmel (1979) e Benjamin (1991) associam a
a conexão com as redes de pesca que vida metropolitana à transformação da luta pela
desempenharam um papel histórico para igualdade em uma luta pela individualização: “os
a economia e a vida desta região durante indivíduos liberados de vínculos históricos agora
séculos. Outra pessoa pode enxergar uma desejavam distinguir-se um do outro.” (SIMMEL,
das criaturas do mar trazidas pela maré.
Há ainda outro aspecto do trabalho que 1979, p. 27). Motivados pelo excesso de vizinhança,
pode ser reconhecido: a sensualidade os habitantes da metrópole moderna desenvolvem
da obra que existe em forma pura, sem um forte desejo de preservar sua autonomia e
cinismo e sem dominação em relação à individualidade. Para tanto, a afetividade e a
extraordinária visão do mar. (MORGAN, subjetividade individual são afastadas de ruas e
2005, tradução nossa).10
praças, que passam a ser vivenciadas com reserva
e impessoalidade.
Se a acessibilidade dos sentidos incrustados na Juiz de Fora
escultura colabora para a sua aceitação pública, Para sobreviver na cidade moderna,
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também o faz o modo como a artista conseguiu o sujeito teve de aprender a resistir, jan./dez.
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a se desligar, a ceder e a selecionar nistas se espalharam pelas principais cidades bra-
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gratificações, a reagir, como diz sileiras. “Esse ideário reflete-se no espaço urbano
Simmel, intelectualmente, ao invés de
das nossas cidades, seja através do planejamento
emocionalmente [...] O cosmopolita blasé,
o flâneur, viveu em meio a estranhos, centralizador-autoritário dos anos 60 a 80, seja
criou uma arte para lê-los e interpretá-los. através do desapego à história das nossas cida-
(KEOHANE, 2002, p. 34-5, tradução des.” (PEREIRA, 2002, p. 59).
nossa).11 Em “Morte e vida das grandes cidades”, Ja-
cobs (2000) aponta a relação com a vizinhan-
No campo da arquitetura e do urbanismo, o ça como o principal fator de influência sobre o
século XIX foi marcado pela transformação das sucesso ou insucesso das praças metropolitanas.
praças em ambientes quase sempre superdimen- Tomando como exemplo a Washington Square12,
sionados, impróprios para a permanência e o uso a autora afirma que “Como todos os parques ur-
coletivo. Esse fenômeno ganhou força durante o banos, ela é fruto da sua vizinhança e da maneira
século XX, quando a arquitetura moderna voltou- como a vizinhança gera uma sustentação mútua
se à criação de ambientes rígidos e padronizados, por meio de usos diferentes ou deixa de gerar
geralmente incapazes de despertar relações que essa sustentação.” (JACOBS, 2000, p. 107). É
ultrapassassem a sua função prática. As grandes a partir de demandas e recursos concretos que
cidades do século XX funcionam, mas não infor- devem ser desenvolvidos os projetos, de modo
mam nem transformam, como em outras palavras que contribuam para a articulação de estruturas
afirma Arantes (1993): e contextos sociais já existentes, conforme em
outras palavras destaca a autora:
As aglomerações urbanas deixaram de
corresponder ao conceito de cidade; Os (parques urbanos) que têm sucesso
nelas predominam as conexões funcio- nunca funcionam como barreira ou
nais, sem a visibilidade do lugar pú- obstáculo ao funcionamento complexo
blico, incompatíveis com a clareza da da cidade que os rodeia. Ao contrário,
autocompreensão prática que caracte- ajudam a alinhavar as atividades vizinhas
riza um mundo de vida. (ARANTES, di­versificadas, proporcionan­do-lhes um
1993, p. 118). lu­gar de confluência agradável; ao mes­
mo tempo, somam-se à diversidade
Os projetos modernistas são criticados pelas como um elemento novo e valorizado e
prestam serviço ao entorno. (JACOBS,
formas baseadas em dados abstratos e não de- 2000, p. 110).
monstráveis, geralmente mais vinculados aos
ideais do Modernismo do que à cultura e às ne- Arantes (1993), como Canclini (1998) e
cessidades manifestadas pelos habitantes – con- Sarlo (1997), aponta a onipresença da mídia
forme aponta Tuan (1980) a respeito do planeja- como o traço fundamental da sociedade con-
mento de Brasília. temporânea. Nesse sentido, os autores destacam
algumas consequências da introdução de novas
Para ele (o arquiteto e urbanista Lúcio
Costa) a capital artificial não é um arenas de interação sobre as relações estabeleci-
organismo que cresce lentamente do chão, das entre indivíduos e ambientes urbanos: além
mas um mundo completamente concebido da desmaterialização de processos de produção,
para ser colocado no terreno. Ele escreve circulação e consumo, verifica-se uma visível re-
que fundar uma cidade é um ato deliberado configuração da sociabilidade.
de possessão, um gesto na tradição colonial
dos pioneiros, a domesticação do selvagem. A inserção das metrópoles em redes informa-
(TUAN, 1980, p. 197). cionais contribui para a desterritorialização do in-
Juiz de Fora divíduo e da sociabilidade, afastando os habitantes
v.3, n. 1/2
p. 33-50 Apesar de encontrar em Brasília seu exemplo das grandes cidades de conceitos como ancestra-
jan./dez.
2008
extremo, os valores e modos de operação moder- lidade e terra natal. Segundo Guattari (1992), é

40
nesse contexto que as cidades e seus espaços de Sobre esse panorama, Southworth (1989) ela-

Teoria e Cultura
convivência assumem um valor fundamental para bora uma hipótese que toma a compreensão do
a produção de identificações. contexto sócio-cultural como um caminho promis-
sor para que os espaços de convivência das grandes
Tudo circula: as músicas, os slogans cidades contemporâneas ganhem novo fôlego: “O
publicitários, os turistas, os chips da planejamento urbano responsável baseia-se em aná-
informática, as filiais industriais e, ao lises sistemáticas do contexto e do modo como os
mesmo tempo, tudo parece petrificar- equipamentos são usados e avaliados. Ao contrário
se, permanecer no lugar, tanto as
diferenças se esbatem entre as coisas,
das obras de arte e de algumas obras arquitetônicas,
entre os homens e os estados de coisas. o planejamento urbano não pode se dar a partir
No seio de espaços padronizados, tudo da visão intuitiva do criador”. (SOUTHWORTH,
se tornou intercambiável, equivalente. 1989, p. 372, tradução nossa).13
(GUATTARI, 1992, p. 169).
Culturalismo de mercado
Diante dessa realidade, o autor afirma crescer
no indivíduo uma sensação de permanência em Há, ainda, diversos trabalhos que tratam do
um mesmo estado, ou seja, de equivalência entre contexto político-artístico que envolve a introdu-
espaços inicialmente propostos como diferentes. ção da site specific art nas grandes cidades. Arantes
Caberia, segundo ele, aos urbanistas e demais (1993, p. 14), por exemplo, trata da transmutação
profissionais responsáveis pelo planejamento ur- dos espaços públicos de grandes cidades em arenas
bano, o desenvolvimento de ambientes singulares, para colaboração entre artistas e comunidade, em
desenvolvidos a partir de projetos abertos a uma um contexto caracterizado pela “substituição da
interlocução simbólica com a subjetividade coleti- política em refluxo pela cultura administrada [...]
va. Também sobre as necessidades dos indivíduos particularmente visível na inclusão da arquitetura
que habitam as metrópoles contemporâneas, Lyn- urbana (patrimônio, grandes equipamentos públi-
ch (1988) afirma que “o que procuramos não é cos, casas de cultura, novos museus) no repertório
uma ordem definitiva mas aberta, capaz de um estratégico das políticas culturais.” Retomando os
desenvolvimento posterior contínuo”. termos de Marx, Arantes (2000) organiza da se-
Lynch (1988) destaca ainda a necessidade de guinte forma o novo conflito da arte pública:
legibilidade, de modo que os espaços sejam toma-
A tese em questão nada mais é portanto
dos como objetos da percepção dos seus habitantes do que uma explicitação da contradição
e frequentadores. Ou seja: faz-se necessário que os recorrente entre o valor de uso que o
indivíduos sejam capazes de reconhecer os signi- lugar representa para os seus habitantes
ficados oferecidos por equipamentos urbanos, de e o valor de troca com ele se apresenta
modo que possam manipulá-los e, a partir dessa para aqueles interessados em extrair
dele um beneficio econômico qualquer,
interação, criar novos significados. sobretudo na forma de uma renda
Guattari (1992, p. 177), por sua vez, defen- exclusiva. (ARANTES, 2000, p. 26).
de o planejamento de ambientes que respondam
ao contexto em que se inserem e afirma que: “a Inseridas em uma nova lógica de produção, as
complexidade arquitetural e urbanística encon- obras de arte pública passam a, ao mesmo tempo,
trará sua expressão dialética em uma tecnologia atender interesses locais e buscar a inserção da cidade
do projeto que não se fechará sobre si mesma, em redes internacionais de cidades. “As metrópoles
mas que se articulará com o conjunto do agen- surgiram com funções centralizadoras relativamente
ciamento de enunciação que é o seu alvo”. Em aos espaços nacionais que as geraram. Hoje, este papel
outras palavras, o planejamento de ambientes e de núcleo de amplas bacias econômicas tende a ser Juiz de Fora
v.3, n. 1/2
intervenções urbanas deveria levar em conta todo substituído pelo papel de elo numa rede internacional p. 33-50
o seu entorno – do geográfico ao simbólico. de cidades mundiais.” (DOWBOR, 1996, p. 65). jan./dez.
2008

41
Muitas vezes o planejamento estratégico de saram elas mesmas a ser geridas e consumidas
Teoria e Cultura

uma cidade assume aspectos de um empreendi- como mercadorias”.


mento de comunicação e promoção, cuja “âncora
identitária” recai justamente na animação cultu- A expansão do campo artístico
ral, na busca do equilíbrio entre o valor de uso e o
valor de troca de um determinado espaço, edifício A site specific art surge em um momento em
ou obra de arte. São estabelecidas novas relações que a criação artística é ressignificada e muitos
entre subjetividade e materialidade, em um cená- artistas se distanciam do trabalho solitário para
rio que dedica verbas consideráveis à revitalização aproximarem-se de experiências mais diretas com
de regiões históricas e tradicionais, em que “a cul- o cotidiano das grandes cidades, não raro em
tura não é o outro ou mesmo a contrapartida, o colaboração criativa com o público – e colaboração
instrumento neutro de práticas mercadológicas, formal com o Estado. Nesse contexto, destacam-
mas é parte decisiva dos negócios e o é como gran- se intervenções que funcionam como “um enigma,
de negócio.” (ARANTES, 2000, p. 48). uma provocação ou, ela mesma, uma reflexão
Nesse sentido, o “tudo é cultura” que se inau- sobre a vida em geral ou sobre a vida na cidade
gurou na década de 1960 transforma-se, em se- em particular.” (COELHO, 1997, p. 50); obras
guida, no que Arantes (2000) chama de cultura- que se posicionam como crítica à amnésia cultural
lismo de mercado. Se a arte moderna conquistou e à banalidade do cotidiano – como a exposição
a autonomia da forma artística, a site specific art Places with a past15, realizada em 1991 na cidade
trouxe a autonomia da arte pública em relação de Charleston (EUA), em que diversos artistas
ao conteúdo e aos discursos de dominação. No internacionais foram convidados a criar instalações
entanto, a autonomia da arte pública nunca é que remetessem a aspectos pouco conhecidos da
absoluta quando analisada segundo os interesses história da cidade. Ao representar valores e ideologias
do patrocinador e do gestor urbano, conforme as que destacam referências locais, a site specific art
palavras de Arantes e o seguinte comentário de estabelece caminhos mais claros para a entrada do
Brissac (2002) sobre o grupo Arte/Cidade14: espectador. A inserção de obras de arte nos espaços
públicos pode, agora, voltar-se, por exemplo, para
A proposta emplacou com o governo o despertar da sensibilidade e a introdução ao gosto
estadual e o establishment. Em termos
gerais, o binômio arte/cidade já vem pela arte, funcionado ainda como quebra agradável
sendo usado há algum tempo como uma de um cotidiano tumultuado ou como ponto de
maneira de valorizar a cidade, se não fuga para os transeuntes que convivem com as
substancialmente, ao menos em termos obras diariamente (PALLAMIN, 2000).
de imagem, marketing, sobretudo Sobre a situação da site specific art no Brasil,
numa época de globalização, quando
as identidades nacionais parecem dar a Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais
lugar a outras, mais locais. (BRISSAC, (2006) traz um breve histórico:
2002, p. 285).
[...] seria possível aproximar da idéia
Os objetos são criados sob um regime de li- de trabalhos site specific algumas
experiências artísticas realizadas sobre
berdade apenas formal, sendo avaliados a partir
o ambiente natural, como por exemplo
de leis do mercado de bens simbólicos ou da re- as que têm lugar no interior do Projeto
ceita gerada por meio do turismo, num contexto Fronteiras, desenvolvido pelo Itaú
em que Canclini (1998) e Sarlo (1997), entre Cultural em 1999, quando nove artistas
muitos outros autores, afirmam a mídia como [...] realizam intervenções em diferentes
lugares das fronteiras do Brasil com países
a grande mediadora da sociedade. Talvez seja a
do Mercosul. Algumas experiências
Juiz de Fora isso que Arantes (2000, p. 26) esteja se referindo urbanas de Antonio Lizarraga e de
v.3, n. 1/2
p. 33-50
quando afirma que “há algo de novo a registrar Gerty Saruê nos anos 1970, cujo
jan./dez. nessa fase do capitalismo em que as cidades pas- primeiro resultado é Alternativa Urbana
2008

42
[...], guarda alguma proximidade com Atualmente o grupo, vinculado à PUC-SP, traba-

Teoria e Cultura
a idéia de trabalhos e intervenções em lha de forma independente, articulando parcerias
contextos específicos. O Espaço de
com instituições públicas e privadas de acordo
Instalações Permanentes do Museu do
Açude (Rio de Janeiro), circuito ao ar com as características de cada projeto.
livre criado em 1999, conta com obras Pallamin (2000), uma das principais estudiosas
contemporâneas pensadas precisamente do tema no Brasil, apresenta a arte pública atual
para o local. (SITE..., 2006). como uma arena de diálogo entre “as identidades
que se mostram, que se definem e redefinem no
Outra importante iniciativa em território na- ambiente urbano.” A site specific art, como obra
cional é a Fundação Bienal do Mercosul16, origi- e como processo, materializa as conflitantes rela-
nada em Porto Alegre, em 1997. Desde então a ções sociais que envolvem a produção das cidades,
instituição vem realizando exposições regulares estabelecendo uma ampla reflexão sobre “o que
que trazem obras de arte contemporânea para es- são, o que deveriam ser e o que têm sido” os es-
paços públicos de convivência, deslocando para paços públicos que as compõem. A autora associa
lugares alternativos o olhar do transeunte acostu- a questão da especificidade contextual da obra à
mado. Uma particularidade bastante interessante afirmação de um compromisso cultural, social e
das exposições realizadas pela instituição é a cria- político para a arte.
ção de algumas obras permanentes, ou seja, que
permanecem instaladas na cidade após o término Em sua versão funcionalista, essa
do evento. Essa característica é destacada no site especificidade restringe-se ao ponto de
oficial do evento, sendo associada à “estreita liga- vista físico, sustentando-se numa cesura
entre a arte e o social. [...] A transformação
ção da Bienal do Mercosul com a cidade onde está mais profunda no percurso da noção de
inserida” e à “redescoberta dos espaços públicos”. especificidade local ocorreu quando da
Em 2005, os curadores da 5ª edição do evento passagem do paradigma formalista para
incorporaram uma nova exigência para os artis- o da historicidade. Abriu-se o caminho
tas convidados: projetar obras que substituíssem para a investigação, na construção da
arte pública, da “intersecção entre dois
a relação contemplativa pela possibilidade de uso processos materiais: a produção social do
literal pela população. Essa proposta deu origem a local e a produção social da percepção
quatro obras que permanecem instaladas em um estética”. O sentido de especificidade
dos mais importantes espaços públicos de convi- ampliou-se incluindo novos significados
vência na capital gaúcha, situado nas margens do políticos. (PALLAMIN, 2000, p. 49).
Rio Guaíba (ALVES, 2006).
Há, ainda, eventos significativos voltados à A distinção entre “produção social do local”
instalação de obras temporárias de arte pública em e “produção social da percepção estética” é chave
diálogo com o contexto social. O grupo Arte/Ci- para a diferenciação entre as abordagens adota-
dade, coordenado por Nelson Brissac Peixoto, foi das, respectivamente, por pesquisadores das artes
fundado em 1994, numa parceria com a Secretaria visuais e das ciências sociais. Enquanto os pri-
do Estado de Cultura de São Paulo. Articulando meiros colocam a percepção estética no centro da
equipes multidisciplinares na escolha dos locais, discussão, caberia aos cientistas sociais compre-
discussão teórica e prática, busca de parceiros e ender de que forma a produção de arte pública
patrocinadores e considerando a participação do materializa negociações entre Estado, técnicos,
público no evento, o projeto teve como objetivos artistas e comunidades sobre a produção social
“intensificar a percepção dos espaços, trazendo à dos lugares urbanos.
tona significados ocultos ou esquecidos, apontar
O relevo dos significados das obras de arte
para novas possibilidades de usos, redimensionar urbana17 e sua concretização no domínio Juiz de Fora
sua organização estrutural, sugerir novas e inusi- público dão-se em meio a espaços v.3, n. 1/2
p. 33-50
tadas configurações.” (PEIXOTO, 1996, p. 13). permeados de interdições, contradições e jan./dez.
2008

43
conflitos. Sua efetivação porta relações de Mais uma vez os espaços híbridos de decisão
Teoria e Cultura

força sendo exercidas entre grupos sociais, criados por mecanismos de participação ampliada
entre grupos e espaços, entre interpretações
devem ser lembrados, nesse caso como importan-
do cotidiano, da memória e história dos
lugares urbanos. (PALLAMIN, 2000, tes instâncias de antecipação dos conflitos entre
p. 24, grifo nosso). estratégias e táticas. Comissões, fóruns, conselhos
e orçamentos participativos, por exemplo, podem
Teorias do lugar ser vistos como arranjos que visam conhecer e
articular os interesses dos diferentes públicos in-
Nesse momento, é pertinente convocar alguns teressados, tomando decisões compartilhadas e,
autores que, nas Ciências Sociais, discutem a no- desse modo, minimizando conflitos futuros – in-
ção de lugar. São especialmente interessantes as clusive no que se refere à produção e instalação
dinâmicas entre lugares e espaços, entre estratégias de obras de arte pública. Para visualizar a relação
e táticas, propostas por Certeau (2001). Enquanto da arte pública com os conflitos entre estratégias
os espaços são inicialmente apresentados como am- e táticas, vale a pena relembrar o episódio que,
bientes indiferenciados e instáveis, os lugares corres- devido a um nítido descompasso entre as estraté-
pondem a ambientes próprios, estáveis e ordenados gias do artista e as táticas dos usuários, resultou
– sempre susceptíveis, no entanto, a apropriações na remoção do Tilted Arc.
sociais e operações que os levariam a uma carac- Augé (1994), por sua vez, inaugura três con-
terização de usos aberta, conflituosa e circunstan- ceitos de grande valia para as discussões que
cial. “Diversamente do lugar, [o espaço] não tem tratam da noção de lugar: não-lugar, lugar an-
portanto nem a univocidade nem a estabilidade de tropológico e lugar da memória. O primeiro con-
um ‘próprio’. Em suma, o espaço é um lugar prati- figura-se como lugar de passagem, que não abri-
cado.” (CERTEAU, 2001, p. 202). ga ninguém e não estimula o desenvolvimento
Os significados obtidos a partir das práticas de identificações: “[...] um espaço que não pode
do lugar, ou seja, dos usos e fruições cotidianos, se definir nem como identitário, nem como re-
informariam a “morfologia da prática”, a lógica da lacional, nem como histórico definirá um não-
ação e das “artes do fazer”. Para Certeau (2001), lugar.” (AUGÉ, 1994, p. 73). Já o lugar antropo-
o espaço público só se concretiza com a prática lógico deve ser significativo, não só para os que
do lugar, a partir de uma dinâmica, conflituosa o habitam ou dele usufruem, mas para quem, de
ou não, entre estratégias e táticas. As estratégias fora, procura entendê-lo. Enquanto o significado
são definidas como relações de força cujos sujeitos do lugar antropológico está alicerçado na vida e
têm tempo, lugar de poder e de saber; as táticas, no tempo presente, é no passado que se encontra
como relações de força que se dão no campo do o significado do lugar da memória.
outro, de modo mais dependente do tempo. As- Tomando como princípio a ideia de que uma
sociando as estratégias aos planejadores e gestores obra de arte pública tem a capacidade de atribuir
urbanos e as táticas aos usuários, o autor tece a novos significados ou mesmo de fundar um lugar
seguinte crítica a um modo certamente centrali- que antes dela não existia (como no caso da es-
zador e universalista de tratar a cidade: cultura She Changes), parece possível estabelecer
uma relação, ainda que pouco aprofundada, entre
Estratégias científicas unívocas, possibi­ os três conceitos de Augé e as três orientações da
litadas pela redução niveladora de to- arte pública sugeridas por esse trabalho. Os mo-
dos os dados, devem substituir as táticas numentos e esculturas tradicionais, geralmente
dos usuários que astuciosamente jogam
com as “ocasiões” e que, por esses acon- figurativas e explícitas sobre seus alvos de come-
tecimentos-armadilhas, lapsos da visibi- moração e homenagem, poderiam ser relaciona-
Juiz de Fora lidade, reintroduzem por toda a parte das aos lugares da memória. As obras modernas,
v.3, n. 1/2 as opacidades da história (CERTEAU, comumente caracterizadas pela ilegibilidade e
p. 33-50
jan./dez. 2001, p. 173). incomunicabilidade, contribuiriam para a manu-
2008

44
tenção de não-lugares. As obras de site specific art, complementando-se, uma atividade ou

Teoria e Cultura
orientadas ao presente e à complexidade dos con- uma prática predominante. (MAGNANI,
1998, p. 2-3).
textos sociais que as recebem, teriam a capacidade
de fortalecer lugares antropológicos.
A delimitação dos públicos e dos contextos – Muito similar é o conceito de circuito, o qual
espaciais e simbólicos – com os quais uma obra de se diferencia da mancha por referir-se à congre-
site specific art se articula representa, certamente, gação de equipamentos dispersos (não-contíguos)
outra questão relevante para a composição dos ar- na cidade, em que se promovem práticas e se ofe-
ranjos sociais responsáveis pela seleção dessa obra. recem serviços semelhantes, sendo, portanto, re-
Nesse sentido, alguns conceitos elaborados por conhecidos por usuários individualizados.
Magnani (1998) podem representar importantes Os trajetos, por sua vez, são os caminhos não
referências espaciais e simbólicas. A noção de pe- aleatórios que estabelecem fluxos ao longo da ci-
daço refere-se aos lugares de encontro e lazer em dade e no interior das manchas – delineando rela-
cada bairro, onde seus moradores gastam seu tem- ções com a noção de nomadismo, muito difundi-
po livre. Se nas áreas de uso residencial as pessoas da como atributo das práticas urbanas dos jovens
se conhecem em função de contatos diários, nas e associada a novos padrões de sociabilidade e no-
zonas comerciais o reconhecimento se dá a partir vas arquiteturas subjetivas.
do compartilhamento de gostos, práticas de con- A reconfiguração dos padrões de sociabilidade
sumo, valores, modos de vida e de apropriação do e as novas arquiteturas subjetivas são importantes
pedaço. Nas palavras de Magnani (1998): objetos da obra de Castells (1999), que se refere
às grandes cidades como arenas de diálogo entre
A noção de pedaço, elaborada a partir de espaços de lugares e espaços de fluxos. Enquanto os
pesquisas em bairros da periferia, aponta primeiros aproximam-se da noção tradicional de
para a existência de um espaço social que vizinhança, remetendo a instituições como história
se situa entre a esfera da casa e a da rua. e cultura local, os últimos são definidos como “a
Com base em vínculos de vizinhança,
coleguismo, procedência, de trabalho,
organização material das práticas sociais de tempo
estabelece-se uma forma de sociabilidade compartilhado que funcionam por meio de flu-
mais aberta que a fundada em laços de xos”, tomando-se os fluxos como “seqüências [...]
família, porém menos formal e mais de intercâmbio e interação entre posições fisica-
próxima do cotidiano que a ditada mente desarticuladas, mantidas por atores sociais
pelas normas abstratas e impessoais da
sociedade mais ampla. (MAGNANI,
nas estruturas econômica, política e simbólica.”
1998, p. 2). (CASTELLS, 1999, p. 501). Nesse sentido, podem
ampliar-se ainda mais os públicos e contextos que
Magnani cria também o conceito de mancha, dialogam com uma obra de arte pública.
em que áreas urbanas contíguas (ou um conjunto
de pedaços) marcam seus limites e viabilizam uma Considerações finais
atividade prática predominante, tornando-se pon-
tos de referência para a realização dessas práticas, Fica claro, por fim, que a produção de obras de
construindo e consolidando lugares na cidade. site specific art envolve uma série de variáveis que
Mais uma vez recorrendo às palavras do autor, ultrapassam questões relativas à capacidade inter-
... naqueles territórios mais impessoais
pretativa do artista sobre características visíveis do
das regiões do centro, é possível contexto de instalação do objeto. Para Fleming
distinguir a existência de áreas claramente (2005, p. 56, tradução nossa)18, “A arte pública
demarcadas pela oferta de determinados deve considerar: utilidade pública, possibilidades
bens ou serviços: são as manchas, áreas associativas e significativas, expectativas e preocu-
contíguas do espaço urbano, dotadas Juiz de Fora
de equipamentos que marcam seus
pações artísticas; deve considerar a sensibilidade v.3, n. 1/2
p. 33-50
limites e viabilizam, competindo ou das pessoas que serão obrigadas a conviver com a jan./dez.
2008

45
obra todos os dias.” É nesse sentido que as obras ao processo permanente de planejamento e ordenação do ter-
Teoria e Cultura

ritório. [...] Art. 70. Fazem parte da política de preservação do


de arte pública, se analisadas em conjunto com
patrimônio cultural do município: [...] X. definição de critérios,
seus singulares processos de produção e suas múl- elaboração e gestão democrática de programa de instalação de
tiplas trajetórias, oferecem-se como ricos objetos arte pública. Disponível em http://www.saoluis.ma.gov.br.
de reflexão sobre a produção social dos lugares 4
www.gsa.gov/artinarchitecture
que compõem as cidades em que vivemos. 5
Serra intended the dividing wall to have deep and disturbing
implications, to underline the ways in which our public life
and involvement with government affect us. [...] Serra delib-
erately designed a wall that would divide the plaza and appear
to reroute walking traffic around his structure. Serra’s subtle
Abstract protest was purposely in direct conflict with the plaza’s ease of
The article presents the negotiations use. (…) But while people could experience firsthand how this
and the social processes involved in the structure was supposedly inconveniencing them every day, its
production of public artworks guided intended interpretation was so subtle – or obscure – that few
by the concept of site specificity. These people understood it.
phenomena are analysed from their 6
The GSA’s procedural evolution [...], bringing users and lo-
relation to essentially contemporary cal arts professionals into the comissioning process, results in
conditions as the implementation of more approachable and likable artworks that actually reflect
the values and preferences of the communities that have to
broadened participation policies and
contend with the art long after the administrators have gone
the dissemination of media and tourism away.
networks. Throughout the article, 7
Un símbolo de esperanza, una eterna primavera en la que todo
the public artworks, alongside their crece y se desarrolla.
production processes and trajectories, 8
www.polis.maotdr.gov.pt/
are treated as arenas of conflict between 9
I was invited for a site visit in 2001, when they asked me to
the interests of public administrators, create a symbol for the city that would be visible from at least
artists and members of civil society, in a kilometer in all directions, one that wouldn’t block any views
their relations to the production of the of the ocean and could survive high winds and salt air – which
spaces that comprise the contemporary was challenging. In 2002, I presented my proposal to the Polis
committee and the mayors of Matosinhos and Porto; happily,
cities.
they approved it immediately.
10
One can readily make a connection with the fishing nets that
Keywords: Public art. Broadened have played a historical role in the economy and life of this
participation. Site specificity. region for centuries. One may also envision sea creatures from
the tide pools, as one of my colleagues pointed out. Yet there
is another aspect of the work that can also be recognized and
that is the sensuality of the piece as it exists in a pure form
Notas without cynicism and without domination in relation to this
remarkable seaside vista.
11
To survive in the modern city the subject had to learn to resist,

1
In a museum or gallery setting, the importance of art is taken
to detach himself, do defer and to select gratifications, to re-
for granted – people are there specifically to see it. These mu-
spond, as Simmel says, intellectually rather than emotionally.
seums and galleries (…) mobilized an aesthetic emotion whose
(…) The blasé cosmopolitan, the flâneur made his life among
specialness is defined, in part, by its separateness from every-
strangers, made an art of reading and interpreting them.
day life. Yet in public spaces there is nothing to mobilize that 12
Praça localizada em Filadélfia (EUA), cujos únicos usuários
sentiment. The art must relate to the viewer in a different way
potenciais são os funcionários dos escritórios que a cercam.
than is the case in a gallery. [...] When art meets everyday life,
Devido a esse uso específico, tornou-se lugar de crime e
as it does in public art, the romantic justifications put forth
tráfico. Depois de um processo de revitalização, os usuários
by the institutional art world fall short of meeting our under-
se dispersaram e a praça retomou a situação caracterizada
stood requirements for the public realm.
pelo uso escasso e concentrado. Ver JACOBS (2000, p.
2
The debate highlighted the underlying issue: the tension be-
101-107).
tween the rights of individual artists to create work without 13
Responsible urban design is based on a systematic analysis of
direction or input and the public’s right to have effective and
Juiz de Fora the environment and the way it is used and valued. Unlike a
meaningful artwork that reflected people’s needs.
v.3, n. 1/2 work of art and some works of architecture, urban design can-
p. 33-50
3
Lei nº 4.669 de 11 de outubro de 2006. “Parágrafo único. A
not be the intuitive vision of a single creator.
jan./dez. proteção do patrimônio cultural do Município fica incorporada
2008
14
www.artecidade.org,br

46
15
Places with a past foi a primeira exposição norte-americana de CERTEAU, M. de. A invenção do cotidiano: 1. Artes

Teoria e Cultura
site specific art, documentada em um livro homônimo publica-
de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 37-74; p. 169-
do pela Ed. Rizzoli. É considerada pelo jornal The New York
Times e pela revista Artforum como uma das mais emocionan-
220.
tes e originais exposições de arte da década de 90.
16
www.fundacaobienal.art.br COELHO, T. Dicionário de política cultural. São
17
A autora não faz distinção entre os termos “arte pública” e Paulo: Ed. Iluminuras, 1997, p. 49-50.
“arte urbana”, empregando de forma livre as duas expressões.
18
Public art must consider: public utility, associational signifi-
cance, expectations and artistic concerns; must take account of
COSTA, C. T. Arte nos espaços públicos: o metrô
the sensibilities of the people who will have to see the artwork de São Paulo. In: FABRIS, Annateresa. Arte &
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ANEXOS

Teoria e Cultura
Figura 1. Tilted Arc (Nova York, Estados Unidos)

Figura 2. Floralis Genérica (Buenos Aires, Argentina)

Juiz de Fora
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Teoria e Cultura

Figura 3. She Changes (Porto, Portugal)

Juiz de Fora
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jan./dez.
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