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Maureen Murphy, Hofstra University, Estados Unidos da América do Norte
Pedro Schacht Pereira, The Ohio State University, Estados Unidos da América
do Norte
Vera Lúcia Menezes de Oliveira Paiva, UFMG
FICHA CATALOGRÁFICA
Seda - Revista de Letras da Rural/RJ – v. 2, n. 6, set./dez., 2017. Seropédica (RJ):
Departamento de Letras e Comunicação/ICHS, 2016: quadrimestral.
ISSN: 2525-5940
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SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 6-7.
Esperamos que os artigos aqui reunidos tragam momentos de crescimento
acadêmico para estudantes e profissionais de Letras e do ensino de línguas.
Boa leitura.
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Reflexões sobre o ensino de línguas estrangeiras na Educação Básica -
A proposta da BNCC de ensino exclusivo de uma delas é o desejo dos
estudantes?
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo comprovar se os estudantes do Ensino Médio estão a favor da
proposta da BNCC (2017) de se oferecer apenas uma língua estrangeira na escola e que tal língua
seja, de maneira obrigatória, o inglês. Para tanto, foram entrevistados 220 estudantes do Colégio
Pedro II, ingressantes no nível analisado, para o qual o colégio oferece três opções de línguas
estrangeiras. No questionário, foi perguntado aos estudantes que língua escolheram, por que a
escolheram e o que acham da possibilidade de decidir que língua vão estudar. Também
consideramos a experiência prévia dos mesmos com relação às aulas de línguas estrangeiras. Como
resultados, observamos que os estudantes valorizam a possibilidade de escolher a língua objeto de
estudo e que há público para várias línguas; além disso, há estudantes que consideram pouco
estudar uma única língua estrangeira.
RESUMEN
Este trabajo tiene por objetivo comprobar si los estudiantes de la Enseñanza Media están a favor de
la propuesta de la BNCC (“Base Nacional Comum Curricular” - 2017) de que se ofrezca tan solo
una lengua extranjera en la escuela y que tal lengua sea, de manera obligada, el inglés. Para tanto, se
entrevistaron 220 estudiantes del Colegio Pedro II, ingresantes en el nivel analizado, para el cual el
colegio ofrece tres opciones de lenguas extranjeras. En el cuestionario, se les preguntó a los
estudiantes qué lengua escogieron, por qué la escogieron y qué piensan de la posibilidad de decidir
qué lengua van a estudiar. También tuvimos en cuenta la experiencia previa de los estudiantes en
cuanto a las clases de lenguas extranjeras. Como resultados, se observa que los estudiantes valoran
la posibilidad de elegir la lengua objeto de estudio y que hay público para varias lenguas; además,
hay estudiantes que consideran poco estudiar una única lengua extranjera.
1 INTRODUÇÃO
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ensinavam-se várias línguas; já na segunda metade desse século, porém, os documentos
oficiais sequer mencionavam a referida disciplina. No entanto, sempre que se falou de
ensino de línguas, foi considerada a necessidade de se ensinarem diversas delas, ainda que
os estudantes só pudessem estudar uma. Tal visão era a recomendada pelos documentos
oficiais mais recentes. No entanto, de forma bastante repentina, a nova proposta da BNCC,
que passará a vigorar em breve, propõe o ensino exclusivo do Inglês.
Este trabalho tem por objetivo identificar se a proposta da BNCC coincide com as
opiniões do público discente, a partir da aplicação de um questionário a alunos ingressantes
no Ensino Médio do Colégio Pedro II. Buscam-se as razões pelas quais os estudantes
optam por determinada língua – e se consideram que apenas uma é suficiente. Antes de
apresentarmos a metodologia de aplicação do questionário e a análise de seus resultados,
traçamos um panorama histórico do ensino de línguas no Brasil, a fim de identificarmos os
valores atribuídos a elas ao longo do tempo.
Para este breve panorama histórico sobre o ensino de línguas estrangeiras no Brasil,
tomamos como ponto de partida o início do século XX e a situação vivenciada na época
pelo Colégio Pedro II, considerado, no período em questão, o colégio padrão do Brasil.
Por essa razão, “seu programa servia como modelo de educação de qualidade para os
colégios da rede privada que solicitavam ao Ministério da Educação brasileiro o
reconhecimento de seus títulos justificando a semelhança de seus currículos com os do
Colégio Pedro II”. (MARTÍNEZ-CACHERA, 2008, p. 53). O colégio tinha autonomia
para selecionar suas disciplinas e seus conteúdos, ou seja, ele próprio determinava as
línguas a serem estudadas lá. Dessa forma, o Inglês e o Francês sempre estiveram
presentes, desde a sua fundação, em 1837; o Alemão foi ensinado na maior parte do tempo;
com uma presença mais limitada, ensinou-se o Italiano e, de forma ainda mais discreta, o
Espanhol. Além dessas, também eram ensinadas línguas clássicas: o Latim e o Grego. Vale
ressaltar que as línguas ocupavam boa parte da carga, uma vez que várias línguas eram
estudadas de maneira concomitante.
Em 1931, realizou-se a primeira reforma educacional de caráter nacional, como
atesta o site HELB (História do Ensino de Línguas no Brasil). A reforma se denominou
Reforma Francisco de Campos, por ter sido realizada pelo referido Ministro da Educação e
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Saúde. Segundo HELB, a reforma, quanto às línguas, excluiu as línguas clássicas e incluiu
três línguas vivas no seu currículo: Inglês, Francês e Alemão.
Já em 1942 foi levada a cabo a Reforma Capanema, pelo então Ministro da
Educação Gustavo Capanema. O objetivo da reforma era reestruturar a educação nacional
por um conjunto de medidas conhecidas como Lei Orgânica do Ensino Secundário,
promulgada em 09 de abril de 1942. Houve um total, inicialmente, de quatro decretos-lei,
sendo 3 de 1942 e 1 de 1943. De acordo com Lombardi, Saviani e Nascimento (2006),
houve mais cinco decretos-lei, todos de 1946. O que nos interessa é o Decreto-lei n. 4.244,
de 09 de abril de 1942, que reorganizou o ensino secundário.
No que se referia ao ensino de línguas estrangeiras modernas, o Decreto-lei n. 4.244
manteve a obrigatoriedade do Inglês e do Francês e substituiu o Alemão pelo Espanhol.
Vale mencionar que o Alemão e o Italiano foram mencionados no corpo da lei, mas apenas
para apresentar a impossibilidade de sua presença dado o estudo das outras três. Além das
três línguas estrangeiras modernas, seriam ensinadas, também, duas línguas clássicas: o
Latim e o Grego. Apesar de cinco línguas serem obrigatórias, a carga de cada uma delas era
diferenciada.
As determinações da Reforma Capanema perderam sua validade no ano de 1961,
quando se promulgou a 1ª Lei de Diretrizes e Bases. Desde a Constituição de 1934 já se
previa uma reforma no sistema educacional brasileiro, mas ela só veio a se efetivar em
1961, “quase trinta anos depois do previsto”. (Martínez-Cachero, 2008, p. 57). A efetivação
se deu por meio da Lei 4.024, conhecida como a 1ª Lei de Diretrizes e Bases da Educação
(1ª LDB), que foi promulgada no dia 20 de dezembro de 1961.
Como visto também em Martínez-Cachero (2008, p. 57), “a LDB estabelece que as
matérias obrigatórias são determinadas pelo Conselho Federal de Educação; as matérias
complementares, pelos Conselhos de Educação dos Estados e as matérias optativas, pelos
centros escolares”. As línguas estrangeiras, que tinham grande prestígio durante a Reforma
Capanema, passaram por um período de quase exclusão, uma vez que a nova lei “retira a
obrigatoriedade do ensino de LE e deixa a cargo dos conselhos Estaduais de educação a
opção pela inclusão (de uma LE) nos currículos”. (ARAUJO; PÉREZ MONTAÑÉS, 2012,
p. 242).
A LDB de 1961 não apresenta, de acordo com Rodrigues (2010, p. 16-17),
nenhuma referência ao ensino de línguas estrangeiras: “nenhuma das línguas que
compunham o currículo da Reforma de Capanema – francês, inglês, espanhol, latim ou
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grego – aparece entre as disciplinas obrigatórias do currículo nessa LDB”. As línguas
estrangeiras só não estavam completamente excluídas porque o texto da LDB
descentralizou as determinações sobre a educação no país quando criou os Conselhos
Estaduais de Educação; esses órgãos se tornaram corresponsáveis pela elaboração da
estrutura curricular com o fim de completar o quadro de disciplinas. Ao ter o poder de
determinar que disciplinas seriam incluídas como optativas, as línguas estrangeiras
acabaram sendo mantidas em algumas situações. Como afirma Rodrigues (2010, p. 17), tal
situação se manteve na maioria dos Estados pelo fato de terem organizado uma estrutura
para sua prática, dada a situação anterior à promulgação da lei.
A segunda LDB, promulgada em 11 de agosto de 1971 (Lei 5.692), na prática, é
uma continuação da anterior: “a aprendizagem de línguas estrangeiras mantém seu papel
marginal, carecendo de caráter obrigatório e sendo unicamente recomendado quando a
escola pudesse oferecer condições adequadas e eficazes para seu ensino”. (MARTÍNEZ-
CACHERO, 2008, p. 58).
O que difere uma LDB da outra está no fato de a de 1971 mencionar as línguas
estrangeiras; no entanto, de acordo com Rodrigues (2010, p. 18), a menção se dá “apenas
como sugestão de disciplina a ser escolhida pelos CEE’s para compor os currículos dos
estabelecimentos de ensino”. A situação das línguas estrangeiras apresentou uma leve
melhora em 1976, quando uma Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE)
determinou que as línguas estrangeiras voltassem a ser obrigatórias no núcleo comum da
estrutura curricular do que, na época, se chamava 2º Grau (hoje, Ensino Médio); além
disso, as línguas eram recomendadas para o então 1º Grau (nos dias atuais, Ensino
Fundamental). Como afirma Rodrigues (2010, p. 18), no entanto, não havia qualquer
referência à língua estrangeira que deveria ser estudada; dessa forma, nenhuma língua
possuía caráter obrigatório. Uma novidade da época é que o adjetivo “Moderna” foi
incluído ao se fazer referência à disciplina Língua Estrangeira, o que excluiu as línguas
clássicas.
A terceira LDB, promulgada em dezembro de 1996, finalmente retomou a
obrigatoriedade das línguas estrangeiras, mas apenas uma; uma segunda língua só seria
oferecida se a escola tivesse condições de fazê-lo. A disciplina se chamava Língua
Estrangeira Moderna e deveria ser estabelecida segundo os desejos da comunidade escolar.
Sobre o atual Ensino Fundamental, a lei diz, no artigo 26, parágrafo 5º: “Na parte
diversificada do currículo se incluirá, obrigatoriamente, a partir da quinta série (atual 6º
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ano), o ensino de ao menos uma língua moderna, cuja escolha ficará a cargo da
comunidade escolar, dentro das possibilidades do centro”. Já sobre o Ensino Médio, o
artigo 36, parágrafo 3º, estabelece que “será incluída uma língua estrangeira moderna,
como disciplina obrigatória, escolhida pela comunidade escolar, e uma segunda, optativa,
dentro das possibilidades do centro”.
Com o objetivo de nortear o ensino em geral no Brasil, apesar de a 3ª LDB manter sua
validade, foram publicados alguns documentos, denominados Parâmetros ou Orientações,
que comentamos a seguir.
Em 1998, a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) do Ensino
Fundamental apresenta, em sua primeira parte, justificativas para a inclusão de línguas
estrangeiras. Faz-se importante destacar que o documento menciona a dificuldade de se
oferecer mais de uma língua: “Independentemente de se reconhecer a importância do
aprendizado de várias línguas, em vez de uma única, e de se pôr em prática uma política de
pluralismo linguístico, nem sempre há a possibilidade de se incluir mais do que uma língua
estrangeira no currículo”. (BRASIL, 1998, p. 22). As razões seriam falta de professores e
número elevado de disciplinas.
Ao se considerar a língua a ser estudada, o documento sugere que se considerem os
fatores históricos, relativos às comunidades locais e relativos à tradição. Assim, vai
mostrando situações em que uma ou outra língua seria mais aceita. Nos exemplos,
aparecem inglês, espanhol e francês, além de línguas usadas em comunidades locais por
imigrantes e também por indígenas. Ainda sobre o tema, na página 40, afirma-se que é
necessário “considerar o valor educacional e cultural das línguas, derivado de objetivos
tradicionais e intelectuais para a aprendizagem de Língua Estrangeira que conduzam a uma
justificativa para o ensino de qualquer língua” e, também, “há de se considerar as
necessidades lingüísticas da sociedade e suas prioridades econômicas, quanto a opções de
línguas de significado econômico e geopolítico em um determinado momento histórico.
Isso reflete a atual posição do inglês e do espanhol no Brasil”.
Os PCN do Ensino Médio, publicados em 1999, afirmam que a falta de professores
com formação adequada e a predominância do inglês levavam ao desinteresse de estudar
outras línguas - assim, mesmo se a escola quisesse oferecer outra língua, ficava difícil.
Encontramos uma crítica ao monopólio linguístico do inglês, principalmente nas escolas
públicas: “Sem dúvida, a aprendizagem da Língua Inglesa é fundamental no mundo
moderno, porém, essa não deve ser a única possibilidade a ser oferecida ao aluno”.
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(BRASIL, 1999, p. 149). Apresenta-se o recente interesse pelo espanhol, mas não seria o
caso de substituir um monopólio linguístico por outro, mas apresentar mais línguas como
possibilidades. Para definir a língua, seria necessário considerar características sociais,
culturais e históricas da região - pensar “no atendimento às diversidades, aos interesses
locais e às necessidades do mercado de trabalho no qual se insere ou virá a inserir-se o
aluno”. Já que a lei prevê a possibilidade de uma segunda língua estrangeira, optativa, seria
válido “vincular tal oferta aos interesses da comunidade”. O documento apresenta uma
situação em que seria mais válido estudar Italiano do que Francês e outra em que o Alemão
se tornaria mais necessário do que o Japonês.
Em 2006, são publicadas as Orientações Curriculares Nacionais (OCEM), com duas
seções interessantes para este trabalho: uma voltada para Línguas Estrangeiras em geral e
outra específica de Espanhol; esta última se deve à promulgação da Lei nº 11.161
(05/08/2005), que “torna obrigatória a oferta da Língua Espanhola, em horário regular nas
escolas públicas e privadas brasileiras” no Ensino Médio. (BRASIL, 2006, p. 127). Esse
gesto de política linguística reflete “certo desejo brasileiro de estabelecer uma nova relação
com os países de língua espanhola, em especial com aqueles que firmaram o Tratado do
Mercosul”. Vale ressaltar que “a LDB prevê a possibilidade de oferta de mais de uma
língua estrangeira, sem nenhuma outra especificação”. (BRASIL, 2006, p. 127).
Quanto à seção de Línguas Estrangeiras em geral, fala-se sempre no plural, ainda que o
documento enfatize que apresenta resultados de levantamentos realizados para inglês;
então, é necessário que se façam “adaptações e ajustes em função das especificidades de
cada idioma estrangeiro”. (BRASIL, 2006, p. 87). O que se observa é que os temas tratados
se voltam para aS línguaS, mas as análises a partir do Inglês destacam a importância
atribuída a essa língua.
Retomando a 3ª Lei de Diretrizes e Bases da Educação brasileira (1996), lembramos
que ela preconizava que o aluno teria o direito de aprender uma língua estrangeira moderna
do segundo segmento do Ensino Fundamental até o Ensino Médio. A responsabilidade
sobre a escolha da língua recaía sobre a comunidade escolar. Porém, a Lei n˚13.415, de 16
de fevereiro de 2017, altera o texto do parágrafo 5 do artigo 26 da LDB; assim, a liberdade
de escolha da Língua Estrangeira Moderna a ser estudada desaparece por completo, uma
vez que se torna obrigatório o ensino de Inglês.
A Base Nacional Comum Curricular (2017), no que diz respeito aos Ensinos Infantil e
Fundamental, foi aprovada com a inclusão da obrigatoriedade exclusiva do Inglês. SE a
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escola tiver condições, pode oferecer uma segunda língua estrangeira, sendo ela,
preferencialmente, o Espanhol. A BNCC do Ensino Médio ainda não foi publicada, mas
deve apresentar o mesmo tratamento ao Inglês. A justificativa para essa obrigatoriedade é
o inglês ser considerado a língua franca dos dias atuais. (BRASIL, 2017).
Em síntese, já se reconheceu, em nosso país, a necessidade de se estudar mais de uma
língua estrangeira e, nos períodos em que apenas uma delas seria oferecida, a importância
de a comunidade escolar ter a liberdade de escolha sobre a língua a ser estudada. No
entanto, de maneira abrupta, a BNCC, de forma contrária ao que vinha acontecendo
quando da consulta popular para a sua aprovação, apresenta o estudo exclusivo do Inglês.
Tal monopólio linguístico havia sido duramente criticado pelos documentos oficiais
nacionais mais recentes. A seguir, pretendemos considerar as ideias dos estudantes sobre
ensino de línguas estrangeiras a fim de identificar se essa situação é o que corresponde às
suas expectativas.
3 METODOLOGIA
Como visto no item anterior, de acordo com a BNCC (2017), o Inglês deve ser
ofertado como língua obrigatória do 6º ano do Ensino Fundamental à 3ª série do Ensino
Médio. Outras línguas podem ser ensinadas; nesse caso, é sugerida uma preferência pelo
Espanhol. No entanto, uma segunda língua estrangeira só se fará presente se a escola tiver
condições, o que não é a realidade da maioria. Nosso objetivo neste trabalho é verificar se
a proposta da BNCC corresponde ao interesse dos discentes, ou seja, se a vontade dos
estudantes é, realmente, estudar apenas Inglês. Para tanto, aplicamos um questionário a
estudantes do Colégio Pedro II que ingressavam no Ensino Médio questionando as razões
pela escolha que fizeram de língua estrangeira – o colégio em questão oferta três opções de
línguas nesse nível; cada aluno estuda apenas uma delas durante todo o Ensino Médio.
O questionário foi aplicado aos alunos ingressantes do campus Realengo II que
compareceram à primeira aula de sua língua estrangeira no ano letivo de 2017, fosse essa
língua Inglês, Francês ou Espanhol. Contamos com um total de 220 participantes,
oriundos de escolas particulares, municipais ou do próprio Colégio Pedro II.
Antes da aplicação do questionário, foi explicado aos estudantes o objetivo da
pesquisa e nenhum deles se recusou a participar. Nenhum outro comentário foi feito, para
que não houvesse influência sobre as respostas. Os estudantes, segundo a origem, se
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distribuem da seguinte forma: 187 são oriundos do próprio colégio (85%); dos 33 que
ingressaram por concurso, 12 vieram de escolas particulares do município do Rio de
Janeiro (5%) e 21 de escolas municipais, também do Rio de Janeiro (10%). Consideramos a
origem do estudante como um fator importante, pois suas opiniões, provavelmente, estarão
pautadas em suas experiências prévias (vale ressaltar que o pequeno número de alunos
provenientes de escolas públicas e particulares se deve à redução de vagas para concurso).
A vivência prévia com língua estrangeira no Ensino Fundamental varia de escola
para escola quando se trata de particulares ou municipais. Quanto aos alunos provenientes
do Colégio Pedro II, porém, a situação é comum a todos: tiveram aulas de Inglês e de
Francês nos 4 anos do Ensino Fundamental, mas nunca de Espanhol.
Dentre os 12 alunos oriundos de escolas particulares, 9 deles estudaram Inglês e
Espanhol (75%) e 3, apenas Inglês (25%). Dos 9 alunos que estudaram Inglês e Espanhol,
apenas um teve Espanhol por 3 anos; todos os demais estudaram essa língua durante os 4
anos do Ensino Fundamental. Ao tratar dos alunos provenientes de escolas municipais, a
situação apresenta maior variedade, porém, nenhum deles estudou Francês. 12 estudaram
apenas Inglês (57%), 7 estudaram Inglês e Espanhol (33%) e 2 estudaram apenas Espanhol
(10%). É válido ressaltar que, dentre os 7 alunos que estudaram as duas línguas, o tempo
para cada uma também variou: 3 tiveram 3 anos de Inglês e 1 de Espanhol (43%); 2 tiveram
2 anos de cada língua (29%); 1 teve 1 ano de Inglês e 3 de Espanhol (14%); o sétimo aluno
não especificou.
Inicialmente, os alunos deveriam informar qual língua haviam escolhido como 1ª
opção (vale ressaltar que nem sempre a solicitação é atendida, por conta do número das
vagas para cada língua). Em seguida, foram solicitadas respostas para três perguntas,
apresentadas a seguir:
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Considerando o pequeno quantitativo de estudantes oriundos de outras instituições
que não o Colégio Pedro II (fato devido, como já mencionado, à diminuição do número de
vagas para alunos novos provenientes de concurso), optamos por nos deter na análise dos
entrevistados desse colégio. A título de comparação, seria complicado falar sobre as demais
instituições; além de os estudantes terem tido vivências diferentes, representam um
pequeno quantitativo do total de entrevistados – apenas 15%. Por essa razão, os dados
relativos a esta última situação serão apresentados apenas a título de ilustração.
Tabela 1 – Escolha de línguas estrangeiras pelos estudantes segundo sua origem (CPII, escola
particular, escola municipal)
Escolas Escolas
Colégio Pedro II TOTAL
Particulares Municipais
Inglês 64 (34%) 9 (75%) 16 (76%) 89 (40%)
Espanhol 68 (36%) 3 (25%) 4 (19%) 75 (34%)
Francês 55 (30%) - 1 (5%) 56 (25%)
TOTAL 187 (85%) 12 (5%) 21 (10%) 220
A pergunta de número 1, “Por que você escolheu essa língua?”, busca levantar as
razões pelas quais cada língua é escolhida e, consequentemente, provar que o público não
deseja estudar exclusivamente o Inglês. Para a análise, consideraremos a situação de cada
língua, a partir da origem de cada grupo.
O Espanhol foi a língua preferida por estudantes oriundos do Colégio Pedro II. Ao
recordarmos que todos esses estudantes estudaram Inglês e Francês por quatro anos sem
nunca terem tido aulas de Espanhol, fica fácil entender o principal motivo por essa escolha:
dos 68 estudantes, 25 (37%) buscavam algo novo. Três razões também bastante
importantes são o simples fato de gostarem da língua (15 – 22%), não quererem estudar as
demais (14 – 21%) e quererem dominar mais línguas (10 – 15%).
Dentre as demais razões, nenhuma alcança um percentual muito alto, mas são todas
dignas de menção: com 4 votos cada uma (6%), encontram-se duas situações: a importância
da língua no mundo e a possibilidade de continuar com colegas. Com 3 votos (4%),
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aprofundar-se por já fazer curso e usar para viagens. Com 2 votos (3%), por ser
considerada mais fácil, pelo mercado de trabalho ou para currículo; e, com apenas 1 voto
(1%), 7 situações: identificação com a língua, gosto pelos países que a falam, localização
geográfica, mãe professora, morar fora, tem facilidade ou foi obrigado.
Dentre os três alunos de escolas particulares que escolheram Espanhol, as razões
são identificação, gosto pelos países e desejo de aprofundamento. Dos 4 alunos de escolas
municipais, observa-se o desejo comum de aprofundamento.
Quanto ao Inglês, língua preferida pela maioria dos estudantes ao se considerarem
todas as origens, a razão principal encontrada nos estudantes do Colégio Pedro II, quase
metade do total (27 – 42%), não se deve a uma preferência pela língua, mas sim a uma
facilidade no seu estudo. As razões com um número razoável de votos são gostar da língua
(15 – 23%), sua importância mundial (10 – 16%), o mercado de trabalho (9 – 14%) e o fato
de não precisar estudar, por já saber a matéria (9 – 14%). Dentre as opções com menos de
10%, encontram-se para filmes e séries ou música (6 – 9%), por eliminação (6 -9%), para
aperfeiçoar o que já sabe (4 – 6%), por ser a preferência dentre as opções (3 – 5%), para
vestibular, concurso ou ENEM (3 – 5%), para praticar mais a língua (3 – 5%), por ser mais
fácil (2 – 3%), para superar dificuldades (2 – 3%) e, com um voto cada opção (2%), por
gostar dos professores, por viagens e por ter sido imposto pelos pais, além de uma resposta
sem sentido (“Gosto da letra I, ela é bonita”).
Dos 9 alunos provenientes de escolas particulares que optaram por Inglês, 4
consideraram a sua importância mundial e outros 4, a facilidade com a língua. 3 querem se
aperfeiçoar. 2 consideraram o mercado de trabalho, o desejo de estudar fora e o gosto pela
língua. 1 considerou a sua utilidade.
Sobre os 16 estudantes provenientes da rede municipal, a escolha pelo Inglês se
deve, principalmente (4 estudantes), ao desejo de aperfeiçoamento. 3 consideram terem
facilidade com a língua, gostarem dela e ser a preferência entre as opções. 2 consideram
sua importância mundial e suas contribuições para filmes e séries ou música. Por fim, um
estudante fez referência a cada um dos seguintes itens: concursos (incluindo vestibular e
ENEM), pela profissão e por considerar mais fácil. Um estudante não justificou.
Por fim, chegamos à 3ª opção de língua estrangeira, o Francês. Essa língua não foi
opção de nenhum estudante de escola particular; o único estudante de escola municipal que
a escolheu o fez pelo desejo de aprender algo novo. Quanto aos estudantes do Colégio
Pedro II, que estudaram a língua por 4 anos, a principal razão foi terem gostado dela (23
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estudantes – 42%). Dentre outras razões de destaque, para dar continuidade (10 – 18%),
por ser a preferência entre as opções (10 – 18%), por conta do DELF 2 (9 – 16%), por
eliminação (8 – 15%), por ser uma oferta “exclusiva” do colégio (8 – 15%) e por ser a
opção mais cara em cursos livres (6 – 11%). Com menos de 10% dos votos, apresentam-se
as seguintes razões: currículo (5 – 9%), maior facilidade (4 – 7%), bom trabalho
desenvolvido pela equipe (4 – 7%), mercado de trabalho (3 – 6%), para continuar com
colegas (2 – 4%) e para usar no futuro (sem maiores especificações – 2 – 4%). Com apenas
um voto (2%), encontra-se cada uma das seguintes razões: morar fora, estudar fora,
dominar mais uma língua e para viajar.
Em síntese, identificamos haver público para as três línguas oferecidas pelo colégio,
além de para outras, se houvesse mais opções (quando os estudantes dizem algo do tipo:
“Opto por tal língua considerando as opções existentes”). Além disso, as razões variam
bastante. Ou seja, a proposta da BNCC não considera os anseios estudantis.
A pergunta de número 2, “As aulas de línguas estrangeiras que você teve no Ensino
Fundamental influenciaram, de alguma forma, a sua escolha? Como?”, tinha como objetivo
verificar se os estudantes reconheciam que tomaram sua decisão sobre a língua a ser
estudada com base nas experiências anteriores ou não.
Independente das respostas apresentadas, parece-nos que a simples escolha
realizada já traz uma resposta à pergunta. Como pode ser identificado na tabela 1, no
cômputo geral, a língua preferida pelos estudantes é o Inglês, seguida de perto pelo
Espanhol; em 3º lugar vem o Francês. Ao considerarmos a origem dos estudantes, porém,
observa-se uma alteração nessa ordem quando se consideram os estudantes do Colégio
Pedro II: ainda que a diferença seja pequena, o Espanhol ocupa a 1ª opção, com o Inglês na
2ª; o Francês se mantém na 3ª posição, mas a diferença entre as línguas se vê
substancialmente diminuída, o que nos leva a crer que a origem discente é um fator
determinante na escolha da língua.
A pergunta número 2 obteve um grande número de respostas “sim”, que
totalizaram 80%, o que confirma nossa hipótese. A tabela 2 indica o percentual de
respostas “sim” e “não” considerando a origem dos estudantes e a língua que escolheram.
Dentre os alunos oriundos do Colégio Pedro II, apenas 18% deles disseram que
não foram influenciados pelas aulas de línguas do Ensino Fundamental.
2O DELF é a prova realizada para obtenção do Diploma de Francês como Língua Estrangeira. O colégio
oferece um curso preparatório para a mesma, do qual só podem participar estudantes de francês.
18
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Tabela 2 – Respostas à possível escolha de língua estrangeira considerando as experiências prévias
SIM NÃO
CPII – Inglês 48 (75%) 16 (25%)
CP II – Francês 51 (93%) 4 (7%)
CPII – Espanhol 55 (81%) * 14 (21%) *
Município – Inglês 11 (69%) 5 (31%)
Município – Francês 1 (100%) -
Município – Espanhol 3 (75%) 1 (25%)
Particular – Inglês 7 (69%) 2 (22%)
Particular – Espanhol 1 (33%) 2 (67%)
TOTAL 177 (80%) 44 (20%)
* Um aluno respondeu com SIM e NÃO, tendo apresentado argumentos para ambas as respostas.
As justificativas do “sim” valem tanto para escolherem uma língua porque gostam
dela quanto porque não gostam das outras. No primeiro caso, os estudantes se afeiçoaram
à língua, creem que têm facilidade nela, desejam aprender mais uma língua ou pretendem
aprofundar o conhecimento que adquiriram, além de a considerarem importante no cenário
mundial. Com relação à escolha de uma língua por exclusão das demais, as justificativas se
referem ao fato de não gostarem da referida língua, terem dificuldade nela ou não quererem
iniciar o estudo de uma nova língua “do zero”.
Quanto às respostas “não”, apenas 12 dos 44 estudantes deram justificativas. A
resposta mais frequente se relaciona ao gosto pela língua (sete estudantes). Dentre os
demais, contamos com respostas individuais: um aluno mencionou que simplesmente tem
preferência por línguas latinas e outro, que tem como objetivo “músicas, séries e afins”.
Um estudante quer ampliar o domínio de línguas, um fez a escolha pela importância da
língua no mundo e o último foi obrigado pela mãe.
O que se observa dessas respostas é que, em geral, a experiência prévia é muito
importante ao decidir a língua estrangeira a ser estudada. Torna-se relevante mencionar a
língua poder ser escolhida pelo desejo de ampliar o número de línguas dominadas ou para
“fugir” de uma língua pela qual não se tem prazer.
A pergunta de número 3, “O que você pensa sobre a possibilidade de poder
escolher a língua estrangeira a ser estudada?”, tem como objetivo identificar que os
estudantes desejam ter autonomia quanto à sua formação e, portanto, terem direito de
escolher o que é melhor para si de acordo com seus planos futuros, o que se encontra
registrado nos próprios documentos oficiais.
19
SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 8-21.
Como resposta à terceira pergunta, obtivemos uma resposta quase unânime, que
corresponde ao que esperávamos encontrar. Dentre os 220 participantes da pesquisa,
apenas 5 deles, correspondentes a 2% do total, não estão satisfeitos com a liberdade de
escolha. Esses cinco estudantes optaram por Inglês; como justificativa para a resposta,
alegaram que são indecisos e não sabiam exatamente por qual língua se decidir.
Os estudantes como um todo demonstraram muita satisfação em poder escolher
uma entre as três línguas estrangeiras pela instituição. Destacaram que poderiam se dedicar
à língua que desejam, o que lhes traria mais motivação e, consequentemente, uma melhora
no rendimento. Também se sentiram responsáveis por sua formação, uma vez que tal
situação lhes ofereceu autonomia e responsabilidade.
Vale destacar dois tipos de comentários realizados por alguns estudantes. O
primeiro é que nem sempre o desejo do estudante é atendido; isso se deve ao fato de as
turmas serem pré-estabelecidas e, realmente, quando as turmas de determinada língua
estiverem completas, o aluno precisar cursar sua segunda – ou, até mesmo, terceira – opção.
O segundo comentário diz respeito ao estudo se limitar a uma língua – alguns estudantes
demonstraram o desejo de estudar, pelo menos, duas delas, embora alguns estivessem
interessados em cursar as três.
O que se percebe dos comentários discentes é que a imposição de uma determinada
língua estrangeira não é seu desejo, porque existem razões pessoais variadas para essa
decisão, além de alguns crerem que uma única língua não é suficiente para sua formação.
5 COMENTÁRIO FINAIS
20
SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 8-21.
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21
SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 8-21.
As competências nas redações do Enem: ensino e avaliação em turmas do
3º ano do ensino médio na perspectiva da avaliação formativa 1
RESUMO
Este artigo tem por tema o ensino da produção escrita na preparação dos alunos ao Exame Nacional
do Ensino Médio (Enem). A avaliação da redação exigida nesse certame pauta-se em uma matriz de
competências que também está sendo usada para direcionar o processo de ensino e de aprendizagem.
O estudo – empreendido junto a uma turma de terceiro ano do Ensino Médio de uma escola pública
de Belém – tem por objetivo investigar as práticas de ensino da escrita visando à preparação dos
futuros examinandos. Pretende-se descrever e caracterizar essas práticas do ponto de vista formativo,
evidenciando seu potencial regulatório para a aprendizagem. Com base em uma pesquisa bibliográfica
e documental, são apresentados os fundamentos da produção escrita e de sua avaliação no Enem,
relacionando-os com os da avaliação formativa, enquanto processo que favorece a aprendizagem e a
autonomia do aprendente. Esse estudo permitiu evidenciar que a avaliação da produção escrita tem
tido o propósito predominante de classificar os alunos em função da qualidade de seu desempenho,
não havendo a busca por estratégias que desenvolvam as competências que os aprendentes ainda não
atingiram.
The skills in Enem’s essays: teaching and evaluation in classes of the 3rd year of high
school in the perspective of formative evaluation
ABSTRACT
This article has as its theme the teaching of written production in the preparation of students who
will be submitted to the National High School Examination (Enem). The evaluation of the required
essay in this exam is based on a skills matrix that is also being used to guide the teaching and learning
process. The study – carried out together with a third year high school class from a public school in
Belem – aims to investigate teaching practices of writing in order to prepare future students. It is
intended to describe and characterize these practices from the formative point of view, evidencing
their regulatory potential for learning. Based on a bibliographical and documentary research, the
fundamentals of written production and its evaluation in Enem are presented, linking them with the
formative assessment, while process that promotes learning and learner autonomy. This study
allowed evidence that the assessment of written work has the predominant function of classifying
students depending on the quality of their performance, not going on the search for strategies to
develop the competences learners have not yet reached.
Pará, Instituto de Letras e Comunicação, Faculdade de Letras Estrangeiras Modernas e Programa de Pós-
Graduação em Letras. E-mail: mycunha@gmail.com.
22
1 INTRODUÇÃO
O Exame Nacional do Ensino Médio (doravante Enem) tem sido um dos processos
seletivos mais importantes para quem quer ingressar em uma Instituição de Ensino Superior,
no Brasil. Nos últimos anos, o aumento da importância proporcional da pontuação atribuída
à redação, na nota final do exame, levou escolas e cursinhos do país a dedicarem crescente
atenção ao desenvolvimento das competências exigidas na redação.
A apropriação dessas competências, que constituem verdadeiros critérios de avaliação,
é considerada agora como a chave do sucesso na redação e está norteando o trabalho
realizado em sala de aula. Os professores passaram a trabalhar sistematicamente em sala de
aula com essa grade de competências/critérios.
Todavia, adotar uma grade de avaliação não garante que haja a apropriação
correspondente dos critérios pelos alunos. Além do mais, o desenvolvimento das
competências necessárias à produção textual é uma tarefa complexa que não resulta da
simples exposição, pelo professor, de roteiros procedimentais e, menos ainda, da
apresentação de conteúdos conceituais relativos aos tópicos avaliados (“o que é coesão”,
“como escrever uma boa conclusão” etc.).
Autores que trabalham na perspectiva da avaliação formativa têm ressaltado que os
procedimentos que a leitura e compreensão dos critérios não bastam para que o texto
produzido tenha a qualidade esperada. Como já comentava Nunziati (1990 apud BONNIOL;
VIAL, 1997, p. 285), “Como noção instrumental, o critério depende de uma construção ativa
do aprendiz, e o discurso do professor não pode permitir a economia desse procedimento”.
Em outras palavras, não se trata apenas de saberes a serem entendidos e sim de savoir faire
complexos a serem desenvolvidos. Dentre outros, saber (auto)avaliar se os critérios são
cumpridos.
Embora pareça óbvia a inter-relação entre ensino, aprendizagem e avaliação da escrita,
possivelmente, não seja é encarada de modo tão natural nas práticas cotidianas da sala de
aula de Português. Diante dos desafios postos pelo ensino da produção escrita, nas séries em
que a ênfase nas exigências do Enem se torna mais premente, surgem, então, as seguintes
perguntas: Como se ensinam as competências previstas como parâmetros de avaliação? Será
que a ênfase na avaliação por competências favorece a regulação dos textos, por parte do
23
O Enem, criado em 1998, pelo Ministério da Educação, é definido como “um exame
individual e de caráter voluntário, oferecido anualmente aos concluintes e egressos do ensino
médio”. (BRASIL, 2005).
Em 2009, além de um processo avaliativo que procurava avaliar o nível de
aprendizagem dos alunos concluintes do ensino médio, o Enem passou a ser adotado como
processo seletivo para quem quer ingressar no ensino superior. Sendo assim, assumiu a
função de modelo norteador da avaliação nas salas de aula: em muitas escolas, especialmente
nos programas do ensino médio, a matriz de referência do Enem transformou-se no guia do
ensino, em particular na disciplina de redação, em que os professores trabalham com as
competências avaliadas na prova de redação.
Nessa prova, o candidato deve escrever sobre um determinado tema de ordem social,
científica, cultural ou política, obedecendo a um tipo de texto chamado dissertativo-
argumentativo. Carvalho (2005) sublinha a importância dessas características no exame:
24
Não é demais ressaltar também a conhecida crítica de Geraldi (1999), segundo a qual,
na produção escolar de textos, o emprego da língua foge totalmente às condições de uso em
que a preocupação essencial é com o sentido: os alunos escrevem para o professor (único
leitor, quando lê os textos).
O ensino da produção escrita é imprescindível para a formação dos jovens,
considerando as práticas sociais em diferentes esferas de comunicação. Porém, o que se vê
em muitas escolas é apenas uma preocupação em preparar os alunos para a lógica dos
exames.
Bunzen (2006, p. 151) chama a atenção para a dimensão política do espaço dedicado a
aprendizagem da escrita:
27
Seu objetivo é assegurar uma regulação dos processos de formação, isto é, prover
informações detalhadas sobre os processos e/ou os resultados da aprendizagem
do aluno a fim de possibilitar uma adaptação das atividades de ensino/de
aprendizagem. (ABRECHT apud CUNHA, 2006, p. 62).
Assim, do ponto de vista da avaliação formativa, não há uma preocupação em
distinguir o bom e o mau aluno, há um cuidado em acompanhar o desenrolar da ação para,
através dos resultados obtidos ao longo da aprendizagem, agir de forma a desenvolver as
competências que os alunos ainda não atingiram. Trata-se, portanto, de lançar mão de
estratégias que desenvolvam os conteúdos curriculares e que contribuam para os processos
de autorregulação no estudante, enfatizando a autonomia e o controle que o aprendente pode
desempenhar na aprendizagem. (SIMÃO; FRISON, 2013).
Vale também ressaltar, de acordo com Allal (2016, apud Santos, 2017), a importância
da corregulação como um processo de transição na apropriação de estratégias de
autorregulação da aprendizagem através de outro mais capacitado (como o professor, o par
etc.).
29
4 METODOLOGIA
30
Estratégias e instrumentos
pedagógicos visando à
apropriação desses objetivos
Momento em que se encaixa a
avaliação na SD
Feedbacks/regulações
observados na sala de aula (Em
que momento acontecem; de
que natureza são; são
relacionados com os objetivos
das aulas...)
Com base nesta grade, foram registradas as atividades desenvolvidas pelo professor
para levar seus alunos a se apropriar dos critérios de avaliação das redações. Ao longo das 18
horas-aulas de observação foram feitos registros documentais e anotações no diário de
campo.
Os dados gerados com base nas observações das atividades de aula e na análise do
material produzido pelo professor e pelos alunos foram interpretados à luz da concepção
formativa da avaliação, já exposta aqui.
31
Embora o foco da aula seja o ensino da produção textual e o texto como objeto de
análise, as aulas observadas, em sua maioria, partiam de conceitos gramaticais, baseados na
construção de frases isoladas, como se observa na aula A1 sobre conectivos em que o
professor entregou uma lista descrevendo as funções de diversos conectivos (ver material nº.
1, Anexo II) e depois passou um exercício (ver atividade nº. 1, Anexo III), no qual o aluno
tinha que complementar um texto já iniciado, construindo uma argumentação a partir dos
conectivos dados pelo professor.
32
33
34
Anexo IV – redação 2
35
Anexo V – aula 4
36
Anexo VI – atividade 7
Percebe-se que essa retroação está plenamente condizente com o tipo de objetos de
ensino manuseados em sala de aula: ao expor objetos de natureza metalinguística, o professor
demonstra acreditar que as capacidades de produção escrita se constroem pela assimilação
de conteúdos conceituais. Do mesmo modo, os problemas encontrados acabam sendo
solucionados pela reexposição dos mesmos conteúdos conceituais (ver anotações no quadro
nº 7, anexo VII).
37
Este tipo de regulação retroativa também está mais voltado para o produto da unidade de
ensino do que para os processos de aprendizagem.
Outro tipo de regulação identificada nas aulas foi a corregulação, que era realizada de três
formas: nas interações professor e aluno; material e aluno; aluno e aluno.
Na primeira, observou-se que o professor, no momento das atividades de produção
textual e de resolução de exercícios, monitorava os alunos redirecionando-os. Ele lia o que o
aluno escrevia e apontava o que deveria ser melhorado e, de vez em quando, citava algumas
estratégias que poderiam ser utilizadas, na argumentação, por exemplo, em que o aluno
poderia usar conceitos da literatura que fossem coerentes com o tema.
38
6 CONCLUSÃO
39
40
REFERÊNCIAS
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______. Para uma teoria da avaliação formativa. Revista Portuguesa de Educação, Braga, v. 19,
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41
42
RESUMO
O objetivo desse artigo é apresentar e discutir as reflexões iniciais e continuas na área de línguas
estrangeiras – foco em inglês e espanhol – no Bacharelado em Línguas Aplicadas às Negociações
Internacionais além das concepções de linguagem, desenho de cursos, avaliação e elaboração de
material didático. Ainda buscamos oferecer um panorama histórico do ensino das línguas espanhola
e inglesa na instituição ampliando debates previamente iniciados por Ramos (2017).
ABSTRACT
The aim of this paper is to present and discuss the beginning and continuous reflections in the area
of foreign languages by the implementation of a bachelor degree in Applied Languages to
International Negociations as well as language conceptions, course design, material assessment and
design. Not only, a historic view of English and Spanish languages in the institution will be brought
but also contemporary aspects related to languages and cultures dealt with this field will be focused.
Also it is intended to broaden perspectives previously developed by Ramos (2017).
1 Professor EBTT - CEFET - RJ Campus Maria da Graça. Mestrando PPLIN UERJ-FFP. E-mail:
professorricardobenevides@gmail.com.
2 Mestre e Doutor em Letras Neolatinas – UFRJ. Departamento de Línguas Estrangeiras Aplicadas. E-mail:
afjuniorespanhol@gmail.com
3 Professora EBTT CEFET- RJ Campus Maracanã. Mestra e Doutoranda em Linguística – UERJ. E-mail:
alessandrabittencourt@gmail.com.
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A presença do ensino de línguas estrangeiras na educação profissional não tem uma
data precisa. No cenário do Cefet/RJ, nossa instituição de trabalho, a primeira menção ao
ensino de idiomas é decorrente de uma parceria entre o Governo Brasileiro e os Estados
Unidos para a capacitação de professores de todo o Brasil para o ensino industrial. Essa
formação continuada de preparação para o intercâmbio nos Estados Unidos aconteceu na
antiga Escola Técnica Nacional – ainda hoje, Cefet/RJ, durou três meses e incluiu aulas de
língua inglesa. Essa primeira aparição do inglês, no referido contexto, evidencia-se através do
resgate histórico proposto por Ciavatta e Silveira (2010) em relação a atuação do educador
Celso Suckow no cenário da educação profissional brasileira. De acordo com as
pesquisadoras:
44
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[...] O primeiro Concurso Público para professor efetivo de Espanhol do
CEFET/RJ ocorre no ano de 2005, onde sessenta e seis candidatos disputavam
uma única vaga de Língua Portuguesa e Espanhola. No final do processo
seletivo (provas teórica, didática e de títulos) somente dois professores foram
aprovados e classificados na seleção. O professor aprovado tomou posse no
mês de agosto daquele ano com a função lecionar a língua estrangeira nas
turmas do Ensino Médio e Técnico da instituição. Até aquele momento, o
Espanhol somente constava na grade curricular do 3.º ano do Ensino Médio e
do Curso Técnico de Turismo. Nos anos anteriores ao do concurso, duas
professoras substitutas (2001 a 2003) e o segundo professor concursado para a
área de Turismo, no ano de 2004, ministraram as aulas de ELE na instituição.
(SILVA JÚNIOR, 2008, p. 80-81).
De fato, quem melhor que o próprio docente atuante na educação profissional a ser
autor e responsável pela implementação e revisão de políticas para a oferta democrática de
45
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línguas estrangeiras para tal realidade? Dessa forma, além desta primeira seção introdutória,
nosso artigo divide-se em mais duas seções: projeto do Bacharelado LEANI no Cefet/RJ e
o papel das línguas na formação do profissional internacionalista. O artigo finaliza com
alguns encaminhamentos e as referências teóricas adotadas.
[...] o projeto do curso deveria ser o carro chefe para garantir a qualidade do
ensino. No entanto, a análise dos projetos revela o predomínio de currículos
organizados de forma tradicional, em torno de disciplinas, além de a maioria não
apresentar coerência entre os objetivos e o perfil do egresso. As ementas e
programas se escoram em bibliografia desatualizada, a teoria não dialoga com a
prática, e a metodologia é ainda centrada no professor, dentro do modelo de
transmissão de conhecimento. (PAIVA, 2005).
46
SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 43-55.
formação tornam-se imprescindíveis. O projeto pedagógico acaba sendo entendido como
um gênero responsável pela definição de uma concepção única de formação por parte dos
docentes de um curso, que atribuem sentido ao teor de tais prescrições. Não deixa de ser,
também, um elemento norteador da discussão do perfil de profissional desejado para tal
área de atuação.
Cada instituição de ensino superior precisa refletir sobre a necessidade constante de
estudar o perfil do profissional que deseja formar para o mercado e aquele mais adequado à
realidade histórica do país em dado momento. No tocante ao curso LEANI, essa clareza de
inserção profissional ainda não está definida, nem muito menos é de fácil compreensão por
conta da proposição da junção entre a área de linguagens e a área internacionalista. Isso
implica em reconhecer o projeto de curso como algo em constante movimento e estudo,
conforme assinala Gadotti (2000).
O interesse para a apresentação do Projeto Pedagógico do Curso de bacharelado
em LEANI, no Cefet/RJ, nasce por parte da Coordenação de Línguas Estrangeiras do
Ensino Médio no ano de 2007; primeiro, por anseios profissionais pelo crescimento da área
na estrutura interna da instituição. Segundo, por verificar a oferta de cursos de Licenciatura
em Letras/Espanhol na Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica
(RFEPT), desde o ano de 2006.
A partir daqui, expomos como acreditamos que o projeto do Bacharelado LEANI
pode contribuir para o crescimento institucional e o reconhecimento externo do Cefet/RJ
em seu projeto de transformação em Universidade. Além disso, o curso também reforça o
papel social da instituição em formar profissionais capazes de aplicar conhecimentos
técnicos, científicos e de natureza humana às atividades de produção e serviços de acordo
com a dinâmica social de desenvolvimento do país. Desde a implantação do LEANI,
notamos que o mesmo contribui para a democratização do acesso à educação pública, o
desenvolvimento científico-tecnológico e o atendimento de um campo profissional em fase
de expansão na cidade do Rio de Janeiro e país.
O fato de não existir esse curso no Rio de Janeiro foi um fator decisivo para a
aprovação do projeto pelos Conselhos dirigentes do Cefet/RJ, já que a instituição pôde
inovar e se diferenciar das demais existentes no Estado. A aprovação do projeto gerou
algumas dúvidas porque, num primeiro momento, entendeu-se que a proposta era de um
curso de Letras, mas, no decorrer do primeiro ano de oferta, a concepção de uma formação
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internacionalista através do viés da linguagem foi se tornando mais compreensível à
comunidade interna.
O histórico dos cursos de Bacharelado em LEA (Línguas Estrangeiras Aplicadas)
começa na Universidade de Rochelle, na França, no ano de 1990. No Brasil, a Universidade
Estadual de Santa Cruz (UESC), em Ilhéus, é a pioneira em sua oferta a partir do ano de
2002. O segundo curso do país tem início em 2009 na Universidade Federal da Paraíba
(UFPB), no campus de João Pessoa. Em 2011, a Universidade de Brasília (UnB) inicia as
atividades do Bacharelado em Línguas Estrangeiras Aplicadas ao Multilinguismo e à
Sociedade da Informação, projeto diferenciado em relação aos cursos da UESC e UFPB.
Atualmente, na Europa, principalmente em Portugal e na Espanha, já existe oferta de
Cursos de Mestrado Profissional em Línguas Estrangeiras Aplicadas, com linhas de
pesquisa sobre Comércio e Relações Internacionais, Tradução e Estudos Linguísticos
Aplicados.
A implantação do curso de bacharelado LEANI no Cefet/RJ representa o resgate
do papel formador e da presença da língua estrangeira no histórico das escolas da RFEPT.
Desde o início da década de setenta, as escolas técnicas federais e os CEFET(s)
participaram do Projeto Nacional de Ensino de Inglês Instrumental (ESP), coordenado
pela Professora Doutora Maria Antonieta Alba Celani (PUC-SP), cujo objetivo era
desenvolver a habilidade da leitura em língua estrangeira dos estudantes universitários e do
ensino técnico a partir do desenvolvimento das estratégias de leitura, da noção de gênero
discursivo e do conceito de análise de necessidades. O projeto visava ensinar, basicamente,
naquele momento, a língua inglesa por meio das necessidades mapeadas dos alunos, que
contribuíssem para sua atuação consciente no mercado de trabalho com vistas à sua
inserção, de maneira crítica, nas interações sociais e culturais determinadas na vida em
sociedade. (CELANI, 2002).
A participação do Cefet/RJ como instituição multiplicadora do Projeto da PUC-SP,
desde a origem do programa, em torno de 1978, reforça o compromisso e a competência
da instituição para oferecer um curso superior em área próxima, objetivando a formação de
profissionais multidisciplinares e atuantes em diferentes contextos do mundo empresarial
mediante o uso de línguas estrangeiras e do conhecimento técnico de negociações
internacionais.
No projeto de curso, espera-se que o acadêmico LEANI desenvolva o
conhecimento de três línguas estrangeiras (inglês, espanhol e francês), de suas respectivas
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SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 43-55.
culturas, de políticas linguísticas e de saberes do mundo coorporativo (mediante contato
com conhecimentos advindos da Administração, Economia, Direito, Turismo e
Negociações Internacionais). O objetivo do curso acaba sendo a formação de um
profissional conhecedor de diferentes culturas e questões organizacionais. O projeto
pedagógico possibilita uma maior integração dos Departamentos de Ensino Superior da
própria instituição, já que a matriz curricular propõe disciplinas existentes em outros cursos
de Graduação, como, por exemplo, no curso de bacharelado em Administração,
otimizando recursos humanos e espaço físico, além de promover a interação entre alunos
com diferentes olhares acadêmicos.
O egresso do curso atende a um perfil profissional buscado por muitas empresas
em nossa sociedade global e intercultural: um profissional mais flexível, dinâmico, apto a
promover o diálogo e trocas internacionais. Isso implica em promover uma formação de
nível superior mais articulada entre os processos socioculturais, políticos, tecnológicos e
econômicos do Brasil e a política exterior.
A ausência de profissionais no mundo dos negócios com amplo domínio de
diferentes línguas estrangeiras, o conhecimento técnico advindo da área de Políticas
Linguísticas, Administração, Economia, Direito e cultura geral, a possibilidade de expansão
de convênios com universidades estrangeiras, Institutos e Embaixadas, a experiência do
Cefet/RJ na área internacional mediante sua Assessoria Internacional e a experiência do
corpo docente no tocante ao ensino de idiomas foram argumentos positivos para a
aprovação do projeto e criação do Curso de Bacharelado LEANI no ano de 2014.
Entre os objetivos do curso presentes no projeto estão: (a) dotar o discente de
conhecimento linguístico em três línguas estrangeiras com vistas a sua comunicação em
diferentes situações e contextos (empresas de diferentes setores de atividade, recepção de
eventos, acompanhamentos de grupos, tradução, exposições orais, redação de textos); (b)
possibilitar uma reflexão junto ao discente das diferentes linguagens e saberes do mundo
contemporâneo; (c) apresentar o conhecimento como um saber dialógico e interdisciplinar;
(d) dotar o discente de competências do mundo do trabalho: capacidade de negociação e
gerenciamento, assessoramento empresarial, intermediação de conflitos, coordenação de
processos, elaboração e desenvolvimento de projetos, conhecimento sócio-político de
diferentes culturas, promoção do intercâmbio comercial e cultural; (e) levar o discente a
uma reflexão entre o mundo das negociações internacionais e o universo linguístico.
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O Curso de bacharelado LEANI pretende formar bacharéis aptos a entrar no
mercado de trabalho com as seguintes qualificações básicas: conhecimento, vivência
cultural e competência comunicativa nas três línguas estrangeiras e em técnicas de
negociações internacionais, além da capacidade para assessorar, mediar e coordenar ações
que implicam os diversos tipos de diálogo, troca e intercâmbio internacional, de natureza
comercial e não-comercial, no contexto das organizações contemporâneas.
Tal bacharelado também propõe desafios para seu corpo docente no exercício
diário de relacionar, principalmente, as novas dinâmicas do mundo das organizações e das
negociações internacionais à formação em linguagens.
Por conta da natureza do curso e seu caráter de conhecimento aplicado, pautamo-
nos na abordagem de línguas para fins específicos (LinFE) para desenhar e organizar a
oferta das línguas estrangeiras na matriz curricular. É importante ressaltar a relevância da
abordagem de línguas para fins específicos no planejamento didático das línguas no
LEANI, já que a pluralidade de contextos possíveis para a atuação do profissional é
múltipla. O programa das disciplinas parte de necessidades prévias do contexto dos
negócios, já que, conforme afirma Onodera (2010), não há como pensar em LinFE sem a
realização de análise de necessidades. O conceito de necessidades também é o elemento
basilar no desenho de nossos cursos. Na próxima seção, abordamos tal conceito e
expomos nossas impressões iniciais após a adoção de coleções didáticas para as aulas de
inglês e espanhol do curso LEANI.
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SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 43-55.
profissionais, porém, se verificou a necessidade de mudança que logo em seguida
aconteceu com a adoção de um material focado em negócios e utilizado nas seis disciplinas
de língua inglesa. Ao desenvolver pesquisas junto aos discentes e docentes ao longo dos
primeiros anos, foi verificado que o material didático, embora fosse razoavelmente
adequado, não atende muitas das necessidades linguísticas neste contexto. (ALCÂNTARA,
2016).
Após os anos iniciais e utilizando parâmetros de avaliação de material didático
(RAMOS, 2009) e pesquisas em análise de necessidades (BASTURKMEN, 2006),
verificamos, no material de língua inglesa, que: (a) a proposta inicial contempla mais o viés
de aquisição de línguas,; (b) o material didático, embora bem avaliado pelos professores,
possui diversas críticas feitas pelos alunos e atende mais a profissionais já atuantes que
alunos em formação e ainda direciona a maioria dos tópicos para negócios, não atendendo
as demandas dos diversos eixos como turismo, marketing ou negociações,; (c) há uma
urgente necessidade de complementação e desenvolvimento de material didático
personalizado que esteja mais alinhado com o viés que o curso requer.
Em relação à língua espanhola, no momento de sua implementação, o curso
contava com dois professores que optaram pela adoção da coleção didática Socios (Editora
Difusión) para as quatro primeiras disciplinas, estágio em que o aluno será considerado
como um usuário intermediário da língua. Já para as duas disciplinas finais adotou-se a
coleção didática Expertos, material da mesma editora e destinado para alunos em nível
avançado de estudos. Ambas as coleções são complementares e direcionam o ensino da
língua para o mundo do trabalho no âmbito dos negócios. Após a testagem do material
didático nas primeiras turmas, percebemos sua não adequação ao perfil desejado para o
egresso do curso pelos mesmos motivos expostos para a coleção de língua inglesa. Além
disso, as coleções priorizam a variedade escrita e oral do espanhol peninsular, distanciando-
se das situações empresariais do contexto latino-americano.
O desejo é que os discentes deste curso possam se apropriar das línguas com
autonomia e criticidade, agindo socialmente em diversos contextos como negócios, ONG,
tradução, organização de eventos, revisão de textos, mediação de conflitos... No momento,
buscamos o design de novos materiais, além de disciplinas, com foco em turismo e redação
de documentos específicos de áreas afins a esse profissional, além da investigação do
gênero “simulação de assembleia da ONU” para geração de um modelo didático deste
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gênero (STUTZ, 2014) e posterior aplicação em atividades didáticas. (LEFFA, 2008;
RAMOS, 2004).
Ao longo dos últimos semestres, alguns levantamentos foram realizados.
Entrevistamos docentes de áreas atuantes no curso, tais como identidades culturais,
sociologia, relações internacionais, planejamento internacional, teoria geral de
administração e profissionais de diversos setores como consulado, secretaria de
administração pública e tradução. Após a análise dos dados, verificamos o que pode ser
observado nos seguintes gráficos abaixo:
Artigos Negociações
Científicos
Contratos Acordos
diversos corporativos
Mediação de
Relatórios
conflitos
Turismo e
Entrevistas diplomacia
Contato
Cartas intercultural
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Lidar com uma nova forma de ensino-aprendizagem, neste caso, implicaria em
romper com paradigmas, o que exigiria flexibilidade e abertura grande para que
ultrapassar as barreiras do paradigma tradicional. Por este motivo, o paradigma
complexo também enfrenta as mesmas dificuldades, pois para apresentar novas
ideias, os novos conceitos precisam encontrar espaço e abertura por de
indivíduos, que nem sempre estão dispostos a vislumbrar novos horizontes –
princípio dialógico. (MORIN, 2005, apud SOUZA, 2016, p. 48).
4 CONSIDERAÇÕES EM CONSTRUÇÃO
REFERÊNCIAS
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o curso LEANI. In: Anais da Semana de Ensino, Pesquisa e Extensão. CEFET-RJ, 2016.
BASTURKMEN, Helen. Ideas and options in English for specific purposes. Mahwah: Lawrence
Erlbaum Associates, Inc., Publishers, 2006.
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SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 43-55.
Estrutura retórica dos abstracts
Jéssica Gomes da Silva1
Tania Mikaela Garcia Roberto2
RESUMO
Esta pesquisa propõe uma análise referente à estrutura e organização dos abstracts (resumos
científicos) nas diferentes áreas do conhecimento, com base no modelo adaptado por Motta-Roth e
Hendges (2010), do modelo CARS, de Swales (1981). Objetivou-se verificar se o modelo proposto
pelas autoras apresenta-se consistente à análise de resumos de diferentes áreas do conhecimento.
Foram analisados 70 resumos publicados em periódicos qualificados como A1, na plataforma Scielo,
em quatro diferentes áreas do conhecimento: ciências exatas, biológicas, humanas e sociais, sendo a
maioria do ano de 2013. Os resultados sugerem que nem todos os movimentos propostos pelas
autoras mostram-se presentes da mesma forma em todas as áreas e que a ausência de um ou outro,
ainda assim, não compromete a função expositiva e sintetizadora do resumo científico. Recomenda-
se mais pesquisas que apontem de forma mais precisa particularidades de cada área.
ABSTRACT
This research aims on the analysis of the structure and organization of abstracts (scientific summaries)
in different areas of knowledge, having as a reference the adapted model by Motta-Roth and Hendges
(2010) of the model CARS, of Swales (1981). The goal was to verify if the model presented by the
authors demonstrates consistence in the analysis of abstracts in different areas of knowledge. 70
abstracts published in journals were analyzed and qualified as A1, in the Scielo plataform, in four
different areas of knowledge: exact science, biology, human and social sciences, being the majority of
them from the year 2013. The results suggest that not all of the proposed movements by the authors
are present in the same way in all of the areas and that there is lack of some of them, even though,
this does not compromise the expository and syntheses function of the abstract. Further studies are
recommended in order to point out more precise features of each area.
1 Jéssica Gomes da Silva é licenciada em Letras pela UFRRJ e este artigo é resultado de seu Trabalho de
Conclusão de Curso, orientado pela coautora. E-mail: jessica.angra06@hotmail.com.
2 Mikaela Roberto é professora adjunta de Língua Portuguesa dos cursos de Letras da UFRRJ. É doutora em
Psicolinguística pela UFSC, com estágio sanduíche na Université Libre de Bruxelles (ULB, 2006), tem mestrado
em Línguística Aplicada pela UFSC (2002) e é licenciada em Letras (Português/Inglês) pela Universidade do
Vale do Itajaí (UNIVALI, 1998).
56
Essa pesquisa se deteve na análise dos resumos de tipo informativo que, segundo a
NBR 6028 (2003), têm por objetivo informar ao leitor finalidades, metodologia, resultados e
conclusões do documento, de tal forma que o texto possa, inclusive, dispensar a consulta à
produção completa. (ABNT, 2003, p. 1). O objetivo geral da pesquisa proposta foi identificar
a estrutura retórica do gênero resumo científico com base no modelo proposto por Motta-
Roth e Hendges (2010) em resumos científicos de diferentes áreas. Os objetivos específicos
consistiram em verificar se há variação significativa quanto à estrutura do resumo científico
nas diferentes áreas analisadas com base no modelo proposto, além de identificar pistas
textuais que evidenciem possíveis causas de variações quanto à estrutura do gênero nas
diferentes áreas. Os resultados apresentados neste artigo foram defendidos em trabalho de
conclusão3 de curso de graduação em Letras.
Todos os artigos foram coletados de periódicos classificados como A1 no sistema
Qualis de avaliação definido pela Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Ensino
Superior (CAPES), no Brasil. Esta lista se pauta ao âmbito da circulação (local, nacional ou
internacional) e à qualidade (A, B, C) de cada periódico, por área de avaliação. Em termos de
3“Resumo científico: uma análise com base na teoria de gêneros”. (Trabalho de Conclusão de Curso).
Defendido por Jéssica Gomes da Silva e orientado pela Prof. Dra. Mikaela Roberto. (SILVA, 2015).
57
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Após a invenção da escrita alfabética, por volta do século VII a.C., multiplicaram-
se os gêneros, surgindo os típicos da escrita. A partir do século XV, os gêneros
expandiram-se com o florescimento da cultura impressa para dar início a uma
grande ampliação. (SILVA, 2008, p. 137).
Essa ampliação que se deu nos gêneros – passando dos gêneros orais para os gêneros típicos
da escrita – mostra que “a utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e
escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade
humana”. (SILVA, 2008, p. 137-138). Esses enunciados, que imprimem sentido à experiência
humana ao sistematizá-la, são denominados gêneros textuais e é através deles que
interpretamos o mundo ao nosso redor. Porém, cabe ressaltar que eles apresentam
características e propósitos distintos, sejam essas características estruturais ou temáticas e seu
domínio, nesse sentido, torna-se imprescindível para os membros de uma comunidade
linguística. Embora as pesquisa sobre os gêneros tenha crescido significativamente nas
últimas décadas, os desafios por compreender suas estruturas e características linguísticas e
textuais, porém, ainda são bastante expressivos. Os resumos científicos, objeto do presente
artigo, por exemplo, mostram-se ainda como um desafio a ser superado por universitários e
pesquisadores em fase de iniciação científica, justificando a pesquisa realizada.
De acordo com Araújo (1999):
58
Embora bastante popular, muitos ainda são os resumos científicos produzidos fora da
estrutura retórica esperada para o gênero, levando, não poucas vezes, a prejuízos dos autores
em processos de seleção, como os de eventos, por exemplo. Sobre isto, Bathia (2001) dirá
que esta é uma das desvantagens de tal popularidade, pois, quanto mais popular um conceito
se torna, mais variações de interpretação, orientação e estruturação são encontradas na
literatura existente”. (BATHIA, 2001, p. 103).
Um dos problemas que contribuem para essa situação é a confusão terminológica
existente com relação aos termos referentes aos gêneros textuais. Tome-se como exemplo o
gênero resumo – foco do presente trabalho. Machado (2005) dirá que este pode ser
empregado tanto para indicar o processo de sumarização quanto o texto produzido – que é
resultado, produto desse processo. (MACHADO, 2005, p. 143). Desse modo, a primeira
coisa que alunos e membros da comunidade acadêmica devem ter em mente é: “qual resumo
lhes interessa?” O resumo ao qual essa pesquisa se refere é aquele que oferece uma
“apresentação concisa, do conteúdo de um artigo, livro etc., a qual, precedida de sua
referência bibliográfica, visa esclarecer o leitor sobre a conveniência de consultar o texto
integral”. (MACHADO, 2005, p. 142).
A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), fundada em 1940, órgão
responsável pela normatização técnica no Brasil, fornecendo a base necessária ao
desenvolvimento tecnológico brasileiro, apresenta, nesse sentido, a norma técnica NBR 6028
(ABNT, 2003), referente a resumos. A NBR 6028 (2003) visa estabelecer critérios para a
produção e apresentação de resumos, a fim de que haja uma maior padronização estrutural
e visando facilitar o entendimento das informações contidas no gênero, uma vez que o
objetivo do resumo é apresentar, de modo conciso, a pesquisa em si. Vale ressaltar que a
instituição não tem qualquer objetivo de apresentar uma normatização com base em
preceitos da teoria de gêneros, conforme Motta-Roth e Hendges (2010) propõem, embora
haja visíveis aproximações – justificadas pela rígida estrutura do gênero em questão – entre
as duas propostas.
Um resumo de tipo informativo ou indicativo, de acordo com a NBR 6028 (2003),
deve apresentar, em um parágrafo único, uma introdução geralmente feita por meio de uma
primeira frase significativa (tópico frasal), objetivos, base teórica da pesquisa realizada,
métodos, resultados e conclusões, preferencialmente em uma sequência de frases concisas e
59
um movimento pode ser definido como um bloco de texto que pode se estender
por mais de uma sentença, realizando uma função comunicativa específica [...] e
que, juntamente com outros movimentos, constitui a totalidade da estrutura
informacional que deve estar presente no texto para que esse possa ser
reconhecido como um exemplar de um dado gênero do discurso. (MOTTA-
ROTH; HENDGES, 1998, p. 2-3).
4Opta-se, no presente artigo, por adotar o termo gênero linguístico com o propósito de não adentrar nas discussões
referentes à diferença entre gêneros textuais e gêneros discursivos, haja vista o escopo da presente pesquisa não
abranger a complexidade da questão.
60
Passo 1A – Contra-argumentar ou
Passo 1B – Indicar lacuna/s no conhecimento ou
Passo 1C – Provocar questionamentos ou
Passo 1D – Continuar a tradição
Enfraquecendo os possíveis
questionamentos
Cabe ressaltar que nem todos os movimentos devem obrigatoriamente cumprir ou apresentar
todos os passos.
A proposta que Motta-Roth e Hendges (2010) apresentam com relação à organização
retórica do resumo científico é baseada nesse modelo. As autoras afirmam que,
semelhantemente à introdução do artigo, “[...] o abstract reflete o conteúdo e a estrutura do
trabalho que resume”. (MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010, p. 153).
Segundo as autoras, em obra de cunho didático, voltada especialmente a acadêmicos
em nível de graduação, todos os abstracts deveriam apresentar cinco movimentos básicos.
Primeiro, o resumo deveria situar a pesquisa; em seguida apresentar a pesquisa com suas
hipóteses e objetivos; descrever a metodologia usada, apontar os resultados encontrados de
modo sumário e, por último, concluir a pesquisa, apontando futuras pesquisas e suas
conclusões. Os cinco movimentos encontram-se expostos no quadro a seguir de modo mais
detalhado, sendo apresentados na ordem citada, com a presença de uma ou mais subfunção
como possíveis desdobramentos.
61
62
63
4 RESULTADOS
64
Este trabalho objetivou avaliar estirpes de bactérias extremófilas facultativas que APRESENTAR A
possuam potencial na promoção de crescimento do eucalipto. PESQUISA
As sementes do híbrido “urograndis” foram microbiolizadas com uma suspensão de
109 UFC/mL das 10 estirpes bacterianas, através da agitação a 150 rpm, em incubador
DESCREVER A
rotativo a 28 ºC, por 24 h. Em seguida, foram plantadas em sementeiras e mantidas
METODOLOGIA
em casa de vegetação. Após 60 dias, avaliou-se o peso de matéria seca da parte aérea
e das raízes.
O peso de matéria seca da parte aérea revelou que todas as estirpes bacterianas
resultaram em ganhos quando comparado com o da testemunha, variando entre 11,3
e 78,0%. Entretanto, as estirpes UnB 1366, UnB 1371, UnB 1375, UnB 1370 e UnB SUMARIZAR OS
1373 foram as que se diferiram significativamente. Em contrapartida, a estirpe UnB RESULTADOS
1368 (Bacillus sp.) destacou-se individualmente no incremento (130,0%) da biomassa
radicular.
Tais estirpes devem ser mais bem estudadas, quanto a formas de veiculação,
DISCUTIR A
combinações, formulações etc., para que possam ser utilizadas na otimização da
PESQUISA
produção de mudas.
65
APRESENTAR A
PESQUISA
DESCREVER A
METODOLOGIA
A traqueia não se ramifica e seu segmento caudal, situado entre os pulmões, foi
denominado brônquio. O pulmão esquerdo é alongado, saculiforme e unicameral,
com parênquima faveolar na porção cranial e trabecular, na porção caudal. Câmaras
respiratórias estão presentes em ambas as regiões do pulmão, mas é possível que a
região caudal funcione também como reservatório de ar. O pulmão direito está
reduzido nas duas espécies, no entanto em A. vermicularis a redução é bastante SUMARIZAR OS
acentuada e apenas um vestígio deste órgão pode ser observado, mas em A. RESULTADOS
microcephala o pulmão direito é um órgão com limites definidos que se comunica
com a porção caudal do tubo traqueal, através de dois orifícios. Pneumócitos tipo I e
tipo II estão presentes nas câmaras respiratórias. As lâminas basais dos pneumócitos
I e das células endoteliais encontram-se fundidas, de forma a diminuir a barreira ar-
sangue, que é de aproximadamente 0,5 µm em A. microcephala.
66
SITUAR A
PESQUISA
DISCUTIR A
PESQUISA
67
Frag. 1: “Os aços inoxidáveis Duplex (AID) aliam uma excelente resistência à
corrosão com elevada resistência mecânica devido à fina microestrutura bifásica
composta por quantidades similares de ferrita (d) e austenita (g). Portanto, estas
ligas são utilizadas em tubulações e equipamentos industriais onde se requer
elevada relação resistência/peso, especialmente em empreendimentos de
construção e montagem off-shore.”
68
69
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
70
Destarte, as reflexões levantadas aqui acerca da evolução nos estudos sobre o gênero
resumo científico; os processos pelos quais a teoria do precursor desses estudos, John Swales
(1990), passaram; e a própria proposta de reformulação da descrição esquemática descrita
por Motta-Roth e Hendges (2010), ilustram o que van Driel e Verloop apud Hemais e Biasi-
Rodrigues (2005) afirmam sobre o fato de que um modelo deveria ser o mais simples possível
e que, ao longo de sua produção na realidade, alguns aspectos ou regras desse modelo matriz
poderiam ser omitidos ou alterados.
Por tudo isso, é possível afirmar que as variações encontradas nas produções
referentes ao gênero resumo científico no corpus analisado, quanto à presença ou não de
todos os movimentos previstos por Motta-Roth e Hendges (2010) não representam prejuízo
ao gênero em análise. O que se evidencia nos resultados da pesquisa é que alguns
movimentos – especificamente os movimentos 1 e 5 –, quando ausentes, não comprometem
o conteúdo veiculado, sendo, ainda, verificado que a ausência de movimentos como o que
aponta os métodos ou os resultados diz respeito a características próprias de determinadas
áreas do conhecimento, em trabalhos nos quais o caráter mais teórico-reflexivo levanta a
possibilidade de apresentar a proposta de pesquisa sem a imposição desses passos rígidos.
O que se evidencia, ainda, é que os problemas surgem quando manifestam uma
inadequação no uso da linguagem em relação ao gênero em análise e ao meio no qual ele se
insere, com uso inadequado – ou não uso – dos devidos marcadores metadiscursivos
associados a cada movimento, de modo a que essas pistas textuais que auxiliam o leitor a
identificar as partes componentes dos resumos não se mostrem eficazes.
As autoras concluem que pesquisas relativas ao estudo dos gêneros acadêmicos
mostram-se relevantes à análise e produção prática desses mesmos gêneros por estudantes
em iniciação científica, em disciplinas como a que deu início à pesquisa relatada no presente
71
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72
73
Roza Palomanes1
Mario Mangabeira2
RESUMO
Considerando a importância da utilização de construções subordinativas e coordenativas para a
produção textos coerentes e coesos, o presente artigo visa apresentar a proposta de mediação
pedagógica realizada com um grupo de alunos de 6º ano de escola pública do município do Rio de
Janeiro, sob a perspectiva teórica da metacognição, metalinguagem e, mais especificamente, da
consciência metassintática. (FLAVELL, 1979; GOMBERT, 1992, 2003 e CORRÊA, 2004). A
ideia de propor uma aplicação da teoria metacognitiva à prática pedagógica partiu da observação
de que a maioria dos alunos que chega ao 6º ano do Ensino Fundamental produz períodos
simples justapostos ou períodos compostos em que se utiliza, prioritariamente, o conectivo “e”.
Foram aplicados pré-teste e pós-teste, no início e no fim da pesquisa, e, entre eles, atividades
voltadas para o aprimoramento da produção de estruturas infra-sentenciais e sentenciais, no que
tange a articulações de orações. Os resultados da pesquisa apontam para a melhoria do
desempenho da produção escrita dos alunos no que se refere às construções que estabelecem
relações lógico-discursivas de adversidade, causa, conclusão e finalidade. Conclui-se, ao final, a
eficácia da proposta e a necessidade de ampliação das investigações propostas pela pesquisa para
a verificação de mais evidências que comprovem a relação entre a consciência metassintática e um
melhor desempenho na produção de textos, no que se refere a sua microestrutura.
ABSTRACT
Considering the importance of the use of subordinate and coordinate clauses for the production
of coherent and cohesive texts, this article aims to present the pedagogical mediation proposal
carried out with a group of students from the 6th grade of a public school in the city of Rio de
Janeiro by means of the metacognition theory, metalanguage and, more specifically, the
metasyntactic awareness. (FLAVELL, 1979; GOMBERT, 1992, 2003 and CORRÊA, 2004). The
proposal of pedagogical mediation was based on the observation that the majority of students
1
Com graduação em Letras (1988), especialização em Língua Portuguesa (UERJ - 1998), Mestrado (UFRJ -2002) e
Doutorado em Linguística (UFRJ-2007). Atualmente é Professor de Linguística na Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro (UFRRJ). Participa do grupo de pesquisa ELMEP certificado pela Instituição. É vinculada ao Programa de Pós-
graduação em Letras – PROFLETRAS - desenvolvendo pesquisas dentro da linha TEORIAS DA LINGUAGEM E
ENSINO, é coautora do livro MANUAL DE LINGUÍSTICA e coautora e organizadora dos livros PRÁTICAS DE
ENSINO DO PORTUGUÊS e ENSINO DE PRODUÇÃO TEXTUAL, todos publicados pela Editora Contexto,
além de ter publicados capítulos em livros e artigos em revistas acadêmicas brasileiras na área de linguística.
2 Licenciado em Letras - Português e Inglês (UCB), Especialista em Língua Portuguesa (UERJ) e Mestre em
Letras pelo programa PROFLETRAS (UFRRJ), sendo bolsista CAPES, na área de concentração "Teorias
da Linguagem e Ensino."
74
1 INTRODUÇÃO
75
76
77
78
79
80
3 Acreditamos não ser relevante para a pesquisa explicitar informações relativas a sexo, idade e situação
socioeconômica devido ao encaminhamento teórico-metodológico utilizado. A pesquisa foi desenvolvida
em uma escola pública do município do Rio de Janeiro e os alunos tinham de 9 a 12 anos de idade.
4 O pré-teste mencionado tinha o objetivo de verificar, principalmente, a qualidade das produções escritas
dos alunos, sobretudo com relação ao uso dos conectivos. Foi proposta uma produção de uma reescritura
do capítulo “Uma aventura no cemitério” do livro “As aventuras de Tom Sawyer”. e analisou-se a escrita
dos alunos, baseando-se no universo de períodos compostos por coordenação e subordinação, conforme
critérios que serão apresentados nesta seção.
81
COORDENAÇÃO
VALOR SEMÂNTICO CONECTIVO OCORRÊNCIA
ADIÇÃO E 96
CONCLUSÃO ENTÃO 3
E 5
ADVERSIDADE MAS 20
PORÉM 1
PORQUE 4
CAUSA
POIS 1
TOTAL 130
82
ENCONTROS –
MEDIAÇÃO PROPOSTA ATIVIDADES
PEDAGÓGICA
Manipulação oral (drill) e escrita de períodos
Introduzir a proposta de análise de
a partir da escolha e uso de conectivos que
1º ENCONTRO períodos e a reflexão sobre a produção dos
estabelecem relações lógico-discursivas de
períodos.
adversidade, causa, conclusão e finalidade.
Substituir conectivos de mesmo valor
semântico, atentando para o arranjo Exercícios de completar os períodos
sintático em cada caso e os possíveis empregando conectivos apropriados, a partir
2º ENCONTRO
efeitos de sentidos produzidos em das relações lógico-discursivas estabelecidas
decorrência da escolha intencional dos por um dado contexto.
conectivos.
Observar períodos produzidos na
atividade de intervenção anterior, em que
Exercícios de substituição de conectivos de
3º ENCONTRO os alunos foram levados a perceber o uso
semelhante valor semântico.
dos conectivos de acordo com as situações
discursivas apresentadas.
Atividades em quatro blocos de análise: 1º -
Perceber possibilidades de uso de Exercícios com estruturas coordenativas e
diferentes conectivos os quais conferem subordinativas de causa. 2º - Exercícios com
semelhantes valores semânticos. Manipular estrutura subordinada de finalidade. 3º
4º ENCONTRO
e construir períodos de diferentes formas, Exercícios com estruturas coordenadas de
garantindo a manutenção das relações conclusão. 4º - Exercícios de manipulação e
lógico-discursivas estabelecidas. reflexão sobre as possibilidades de produção
de períodos com orações adversativas.
Refletir metalinguisticamente acerca dos
aspectos estruturais dos períodos. Pensar Exercícios de emprego de conjunções para
5º ENCONTRO
sobre as diferentes configurações de interligar as orações justapostas.
organização dos períodos.
Desenvolver a consciência de julgamento –
saber estrutural com atividades de Exercícios de análise de uso inadequado de
localização de elementos linguísticos – conectivos, do ponto de vista sintático-
6º ENCONTRO conjunções e valores semânticos e de semântico e reescrita de períodos. Reflexão
análise – reflexão sobre a utilização dos sobre as dificuldades e facilidades
elementos linguísticos e dos efeitos dessa encontradas em realizar o exercício.
utilização em termos de estruturação.
Após o último encontro de uma série de sete5, incluindo o encontro reservado para a
diagnose, foi aplicado o pós-teste que consistiu em solicitar a produção de uma reescritura do
capítulo “Uma aventura no cemitério” do livro “As aventuras de Tom Sawyer”. Optamos por
solicitar a mesma produção, justamente para comparar a evolução dos alunos, após as atividades
de consciência metassintática desenvolvidas. Na ocasião do pós-teste, os alunos, munidos do
texto do pré-teste, foram orientados sobre a possibilidade de modificá-lo estruturalmente,
levando em conta o percurso realizado nas etapas da mediação pedagógica, isto é, fazendo uma
reflexão metassintática acerca do uso consciente das estruturas coordenativas e/ou subordinativas
83
84
7 As atividades planejadas para o segundo encontro seguiam o mesmo modelo da anterior, solicitando que os alunos
selecionassem de um quadro dado, conectivos que completassem as frases, de acordo com as informações entre
parênteses.
8 Para a atividade realizada no 3º encontro, foi selecionada uma tirinha da turma da Mônica sem texto escrito e
solicitado aos alunos que construissem períodos inteiros, desde que a segunda oração de cada um deles estabelecesse
a ideia apresentado no exercício.
9 Um exemplo de atividade proposta no 4º encontro é completar os períodos de modo que as relações de
85
Atividade 1: Identifique o equívoco quanto ao uso dos conectivos nos trechos retirados do texto “Você
sabe tudo sobre os animais? Faça o teste e descubra!” e reescreva-os utilizando os conectivos adequados.
a) Os olhos dos jacarés absorvem o máximo de luz do ambiente, mas esses animais enxergam muito bem
também no escuro.
b) O sapo-andarilho mora na Mata Atlântica e se movimenta caminhando a fim de que suas pernas sejam
muito curtas para saltar.
c) A espécie mais conhecida de hipopótamo mede 4 metros de comprimento, por isso o hipopótamo
pigmeu tem o tamanho de um porco e vive na África.
d) O Voo das corujas é bem silencioso, porém, elas contam com penas muito macias, que quase não
causam atrito durante o voo.
10 Para o 5º encontro, foram pensadas atividades que levassem o aluno a transformar as frases em um único período
utilizando um conectivo apropriado em cada caso, explicando o que justificou o uso do conectivo escolhido.
11 Um exemplo de atividades propostas para o 6º encontro é solicitar que os alunos identifiquem o equívoco quanto
ao uso dos conectivos nos trechos retirados do texto “Você sabe tudo sobre os animais?
86
87
88
89
Pré-teste Pós-teste
Rel. lógico-discursivas Conectivos Ocorrências Rel. lógico-discursivas Conetivos Ocorrências
e 10
adição adição e 2
mas 2
mas 1
porém 1
adversidade mais* 1 adversidade no entanto 1
entretanto 1
tempo quando 1 tempo quando 1
conclusão por isso 1
causa pois 1
Tabela 4 – Análise do desempenho dos alunos com relação ao uso dos conectivos e estabelecimento de relações
lógico-discursivas, após a mediação pedagógica
90
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
91
92
ABSTRACT
Reflective teaching is a powerful tool for professional development in the sense that the teacher
engages in self-monitoring of his/her own beliefs about English Language Teaching (ELT) with
reflections on classroom practices and procedures. What follows is an account on important concepts
related to critical reflections on the role of the teacher in ELT beyond the boundaries of current
methodologies and an example of an actual experience with the work of acting upon one’s own
pedagogy within an English learning classroom.
RESUMO
A reflexão sobre o ensino é uma ferramenta poderosa para o desenvolvimento professional no
sentido de que o professor engaja no auto monitoramento de suas crenças sobre o ensino de língua
inglesa com reflexos em práticas e procedimentos pedagógicos. Segue uma abordagem sobre
conceitos importantes relacionados com a reflexão crítica sobre o papel do professor no ensino de
língua inglesa para além das fronteiras de metodologias vigentes e um exemplo de uma experiência
real com o trabalho de agir sobre a própria pedagogia do professor dentro de uma sala de aula de
aprendizado da língua inglesa.
1 INTRODUCTION
The aim of the current assignment is to discuss several aspects related, either directly
or indirectly, to the effectiveness and usefulness of a teacher’s classroom behavior. In
addition, we discuss the extent to which teachers may be enlightened by theory and practice.
The teacher’s crucial role as a mediator and facilitator throughout the learning process is
highlighted and measured according to classroom procedures adopted.
1 Professora de Língua Inglesa com Especialização em Linguística Aplicada e mestrado em Letras pela
Universidade Federal Fluminense. Atua há mais de 20 anos como professora de língua inglesa em escolas
públicas e cursos livres de idiomas. Coordenadora pedagógica geral do ensino de idiomas do Centro Interescola
Ulysses Guimarães (CIUG), projeto de ensino de idiomas da Secretaria de Educação do município de São
Gonçalo, Rio de Janeiro. E-mail: chrislps2006@gmail.com.
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In the initial section, the role of English as a global language and its influence on the
approaches to teaching EFL adopted by Brazilian educational authorities are presented. Such
views are confronted with the actual needs, aims and interests of Brazilian learners.
An overview of the teaching principles that seem to underlie teaching practices in a
broader sense are also focused. The variety of pre-established principles that should take into
account target learners, contexts and aims, among other relevant key-elements influencing
the teacher’s decisions in the language classroom are praised and discussed.
Finally, for the purpose of this piece of work, I would also appreciate to take the
opportunity and draw upon my own experience and impressions as a teacher of English as a
foreign language. Thus, in the final section of the assignment, the fundamental role played
by self-monitoring in the language classroom is highlighted. I discuss its importance as a self-
awareness raising tool in the light of the analysis of three aspects observable in the recording
of one of my own lessons.
95
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To teach or not to teach the four skills (writing, reading, speaking and listening) at
the Brazilian public schools still emerges as a recurrent question, which seems far from being
answered satisfactorily. Teaching the four skills has become a nearly unattainable goal, mainly
in schools of the public sector, where teachers have to “squeeze” the content so that it fits
the pre-determined timetable which most of the time does not correspond to the learners
long-term needs and aims.
As Vereza highlights, “the English language teaching profession in Brazil seems to
be facing what would be characterized as a paradox”. (VEREZA, 1998, p. 1). On one side,
the Brazilian scenario acknowledges the global tendency embedded in the teaching of
English. A wide number of language schools have been mushrooming all over the country
and hundreds or maybe thousands of course books have been imported in order to
materialize the learners’ goal of acquiring a foreign language and, as a consequence, achieving
a higher social status as well as access to a wider range of benefits. There is also a trend
among major language schools to produce their own learning materials, though, following
pedagogic trends already consolidated overseas.
On the other side, the way foreign language teaching has been treated in Brazil in
nothing reflects what is established in the Parâmetros Curriculares Nacionais. Although it seems
to acknowledge the fact that learning languages may contribute positively to one’s
professional as well as personal well-being, an attentive look at the Brazilian foreign language
teaching scenario is likely to reveal that foreign languages do not seem to be regarded as
valuable tools towards promoting individuals’ educational development in a broader sense.
Unfortunately, it seems that nothing or very little has been done in order to change this
situation.
In fact, a reformulation of our means and aims in order to justify language teaching
in our country seems urgent and fundamental. We ought to question and re-consider the
assumption of the mastery of the English language as the key to professional success.
Moreover, it appears of a great deal of importance to adapt and adjust our teaching practice
to our own needs, which certainly differ from the needs of several if not to say many other
third-world nations. Regarding English as the “magic potion” with solutions to the hardships
faced by a great percentage of Brazilian citizens sounds rather ambitious. However, English
may certainly function as a useful and helpful tool within our competitive job market if its
teaching is adapted to our learner’s needs, aims and contexts. As pointed out in the Parâmetros
Currículares Nacionais, to consider the development of the four skills a central aim in foreign
96
SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, mai./set., 2017, p. 93-107.
language teaching in Brazil appears to disregard the fundamental aspect of social relevance
that foreign language teaching and learning should comprise.
3 TEACHING PRINCIPLES
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In other words, motivation should stem from “needs, wants, or
desires within oneself, the behavior itself is self-rewarding” (p. 20).
(5) The Strategic Investment Principle focuses on the learner’s own
personal “investment”. In other words, his/her individualized
battery of strategies and techniques towards achieving the mastery
of the target language.
The second set of principles is entitled Affective Principles and, as the title suggests,
this principle is closely related to the emotional processing of human beings. It demands that
feelings be carefully considered. Thus, “feelings about self, about relationships in a
community of learners, and about the emotional ties between language and culture must not
be discharged, but carefully considered” throughout the language acquisition process (p. 22).
The Affective Principles comprise:
(1) The Language Ego Principle that advocates that the learners’
sense of fragility and defensiveness throughout the target language
learning process needs to be respected and treated with “tender
loving care” (p. 22).
(2) The Self-Confidence Principle preaches the belief that “the
eventual success that learners attain in a task is at least partially a factor
of their belief that they are fully capable of accomplishing the task” (p. 23).
That is to say, learners need to believe in their capacity to succeed.
(3) According to the Risk-taking Principle, learners need to be
encouraged to “try out” language, that is, to take calculated risks
in attempting to use the target language. They need to recognize
that they will be able to produce the language both productively
and receptively despite the difficulties they may encounter as the
learning process progresses.
(4) The Language-Culture Connection Principle. The teaching of a
language would also imply the teaching of a highly complex
system of “cultural norms, values, and ways of thinking, feeling and acting”
(p. 25) that belong to the speakers of that language.
Finally, stand the Linguistic Principles that focus on the language itself as well as on
how learners cope with the recently-acquired linguistic systems. The Linguistic Principles are
subdivided into three major subcategories, which are:
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(1) The Native language Effect: this principle stresses the importance of
the learners’ native language and how interfering or facilitating it may
be on the process of second/foreign language acquisition.
(2) The Interlanguage Principle that deals with the developmental
processes undergone by learners in order to become linguistically
competent in the target language.
(3) The Communicative Competence Principle: it consists of a
harmonious combination of Organizational and Pragmatic
Competences, Strategic Competence and Psychomotor skills. As
Brown puts it, communicative competence may be best achieved when
equal attention is provided to all the preceding components. Thus,
there should be a balance among use and usage, fluency and accuracy,
authentic language and contexts and the learners’ eventual need to
confront “unrehearsed contexts in the real world” (p. 29).
Brown highlights in his article that the moment language teachers, mainly foreign
language teachers, are undergoing today may be considered as “the best of times and the
worst of times” (p. 15) in the language teaching scenario. According to him, such a paradox
could be justified by the recent breakthroughs in the field of language learning.
It seems undeniable that language teachers have benefited a great deal from research.
The principled approach to language pedagogy developed by Brown seems to corroborate
the belief that there seems to be a number of variables to be considered apart from methods.
Methods are certainly important, however, they cannot be regarded as the unique elements
responsible for the development of an individual’s mastery of the target language. It is at this
point where teachers emerge as valuable tools in favor of the learner. Teachers need to make
use of their common sense whenever appropriate and attempt to develop the crucial “ability
to comprehend when to use a technique, with whom it will work, how to adapt if for their
audience, or how to judge its effectiveness”. (BROWN, 1994, p. 16). Thus, the teacher’s
education appears to constitute a fundamental element in order to promote effective learning
in the classroom.
Studies of classroom events have demonstrated that teaching is not a static element.
Much on the contrary, it unquestionably constitutes a dynamic and interactional process in
which the teacher needs to be attentive not only to his/her teaching style but also to the
learner’s profile to adjust such factors to the method used. Teachers need to be aware of
their roles as mediators/facilitators of the learning process as a whole. They need to be
consciously aware of the existing diversity within the classroom boundaries and switch
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strategies whenever they feel appropriate to promote a positive interaction among learners,
instructional tasks and activities.
good teaching is not viewed as something that results from using Method Y or
Method X, or something that results from the teacher modifying teaching
behaviors to match some external set of rules and principles. Rather, it results
from the teacher’s active control and management of the processes of teaching,
learning, and communication within the classroom and from an understanding of
such processes. (RICHARDS, 1990, p. 42).
The learners’ crucial role throughout the learning process must not be overlooked or
ignored. Very often we, teachers, are confronted with situations in which learners manage to
achieve high levels of linguistic competence despite the methods or techniques used.
Therefore, methods and techniques cannot be regarded as the sole elements responsible for
promoting effective learning within the classroom. Different from ineffective learners,
successful learners seem to employ a battery of learning strategies which facilitate their own
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learning and which, to a certain extent, enables them to achieve positive outcomes in their
attempts to acquire the target language.
It is important that teachers be aware of the existing strategies within the learners’
reach as well as encourage them to make use of such strategies. It seems fundamental that
learners achieve a broader understanding as well as control over their own learning processes
so that their “selves” may absorb new content. On the other hand, in order to raise learners’
awareness in relation to the tools at their disposal, it is of crucial importance that teachers
evaluate their teaching strategies on a regular basis. They should play the role of the
investigators who engage in detecting which types of learning strategies they are promoting
in the classroom so that the learners’ already existing strategies may be improved or
enhanced. That is when self-assessment emerges as a powerful tool in order to collect data
regarding the teacher’s open, secret, blind and undiscovered self. Such information is likely
to equip the teacher with the necessary knowledge to improve their classroom behavior and,
therefore, achieve better results.
Thus, prior to replicating the ideas imposed by methods and theories, it is of crucial
importance to think of ourselves as language learners in the first place. In addition, we need
to consider what types of feelings we would like to experience when being introduced to the
target language. I believe that by “putting ourselves in the learners’ shoes” EFL teachers are
not only more likely to achieve a broader understanding of the processes undergone by
learners but also to identify how learners tend to react to such processes.
Richards highlights that “the classroom practices of language teachers are of interest
to many different people” (1990, p. 118) such as researchers, learners, supervisors and course
administrators. In fact, all individuals involved, either directly or indirectly, in the learning
process are always curious about discovering whether the teacher’s practices in the classroom
will promote the fulfillment of their goals and needs, either intellectually or financially.
However, teachers seem to be the professionals with the greatest interest in knowing whether
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what they are doing in the classroom is being fruitful or not. That is the moment when self-
monitoring may emerge as a powerful self-awareness raising tool at the teacher’s disposal.
Self-monitoring might be viewed as a precious component that must not me ignored if
teachers are willing to engage in their professional growth and development. “It refers to a
systematic approach to the observation, and management of one’s own behavior, for the
purposes of achieving a better understanding and control over one’s behavior”.
(RICHARDS, 1990, p. 118).
For a number of reasons, among which we might highlight time constraints, teachers
do not seem to employ self-monitoring on a regular basis. Research has revealed that few
teachers make use of this powerful tool, preventing themselves from attesting how beneficial
and useful self-monitoring may be in the language classroom environment. Rather than a
mere form of assessment, self-monitoring appears as a continuous practice that seems to
enrich our performance and promote our continuous development as professionals through
critical reflection. It enables us to move from a level where we seem to be largely guided by
intuition to a level where our actions are guided by reflection and critical thinking. That
process would enable us, teachers, to arrive at our own judgements as to what works and
what does not work with our learners, regardless of the considerations or comments made
by outsiders such as supervisors, directors or coordinators.
There seems to exist a number of variables that should not be ignored in order to
promote effective and meaningful learning in the classroom. Teachers are certainly the most
valuable tools in order to promote learning. It seems fundamental that they develop the
ability to analyze their performance critically and be always willing to improve their
performance through critical thinking. We, as teachers, need to bear in mind that not all
groups of learners are the same. Consequently, relying solely on methods does not provide
us with any guarantee that what is being done in the classroom will promote the desired
outcome. Valuable insights are often generated through self-monitoring and it may be argued
that it is certainly one of the reasons why this powerful self-awareness raising tool should
always have a place in a teacher’s timetable.
6 RECORDED LESSON
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order to illustrate our belief in the importance of self-monitoring, we proceed to an analysis
of part of a class given to learners of English as a foreign language. Within this analysis, we
provide comments on a number of points raised by Richards (1990: 126). Richards describes
a set of 12 behaviors on which teachers should focus when monitoring their own teaching.
For our purposes in this paper, we decided to narrow down the focus to feedback, classroom
management and classroom interactions.
6.1 Feedback
Feedback on the teacher’s part within the lesson under analysis is analyzed in terms
of the presence or the absence of the teacher´s comments in view of the adequacy of forms
and structures employed by the learners. A sample of such concern would be the following
passage:
In this passage, learners seem highly motivated to participate and contribute with
samples of restaurants. Since this was an introduction (a kind of warm up activity) to the
main theme of the lesson, the teacher did not provide feedback on form. She was only
interested in keeping students involved in this sharing of preferences concerning restaurants.
Therefore, she opted for not insisting on accuracy at this stage. However, she could have
used a number of techniques that would have helped learners perceive the most appropriate
ways to convey their ideas without being time-consuming. For instance, St1 says:
In this part, she could have written on the board everybody = all people Vs everything =
all things Vs every restaurant, etc. Then, she could have elicited from the same learner the
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appropriate form: “Every restaurant! I think every restaurant!” or “All the restaurants! I think
all the restaurants!”
Another sample would be (again St1):
Here, the teacher could simply have isolated the problematic parts and asked the
same student first, and later the class as a whole to repeat. Thus:
The teacher could have been more attentive when planning instructions for the tasks
proposed. They did not seem clear and straightforward to the learners, which resulted in an
unnecessary high TTT (Teacher Talking Time). This is noticed in certain instances of the
lesson that the teacher spent some precious time over explaining instructions. The passage
below attempts to serve as a sample of such drawback:
T: Very good! There are many good restaurants in Niterói! All right! Now, today we’re
going to talk about something that you like very much (T writes on the board): foods
and drinks, yeah? So, what I would like you to do now is... you’re going to work with
your partner, yes? And you’re going to make a list of foods and drinks that you know
in English. I’ll give you about three minutes. When I say stop, you have to stop, ok?
St5: favorites?
(While the learners are performing the activity. Teacher monitors and provides learners
with words they do not know).
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The teacher could have minimized the problem by providing learners with clear
instructions. She could have even provided examples or asked learners for examples and, by
writing them on the board, explained what she expected from them. The instructions needed
sequencing and exemplification so that the learners did not get lost when performing the
task. Thus, she could have adopted the following procedure:
(After writing foods and drinks on the board) Now let’s make a list of foods
and drinks that we know in English, only in English. Can you give me some
suggestions? (as she writes the suggestions on the board). Ok, now you’re going
to work in pairs and add more items to the list for three minutes, ok?
The teacher talk was quite superior to the learner talk throughout the development
of the part of the lesson under analysis. The major pattern of interaction observed is Teacher-
individual student or Teacher-whole class, which leads us to conclude that this segment of
the lesson was mainly teacher-centered. The teacher could have provided learners with more
opportunities to interact among themselves and report their conclusions instead of “spoon
feeding” them. The passage below attempts to exemplify an instance of the lesson in which
the teacher could have asked for more collaborative work from the learners’ part.
(Silence)
T: What can you see? What examples of foods and drinks can you see in the
picture?
Rather than ‘spoon feeding” the learners, the teacher could have referred to their
course book and asked them to discuss what the text is about via group or pair work.
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7 ENLIGHTENED BY THEORY AND PRACTICE
Considering that the aim of this piece of work consists of providing my profile as an
EFL teacher and to what extent my practice has been enlightened by theory and practice, it
appears of a great deal of importance to draw upon my professional experience prior to
starting my academic career. When I started working as an EFL teacher, I was not much sure
whether I really wanted to become a teacher. Therefore, much of what I did in the classroom
reflected either my own experience as a language learner or the procedures dictated by the
audiolingual method, which was the methodology adopted by the language school where I
worked at that time.
My performance as a teacher stemmed not from my critical thinking, but from a
number of pre-established procedures and rules, which in nothing seemed to reflect my
learners’ long-term objectives. I had no knowledge whatsoever as to the approaches or
strategies that could be employed in order to promote meaningful learning in the classroom.
I just accepted everything that was imposed upon me and was “brainwashed” into believing
that my group of learners would only learn if I did exactly what was prescribed in the teacher’s
manual. I cannot recall having treated my learners differently from what was established in
that manual, which assumed that all learners and teaching contexts were the same. Much on
the contrary, I followed it “step by step” and whenever I went back home, I had the feeling
that my job had been done perfectly well. Actually, I never regarded my groups of learners
as human beings who certainly had the need to express themselves more freely and I failed
to experience one of the most rewarding things about teaching: the exchanges among
teachers and learners. The use of the mother tongue was forbidden in class and I do not
remember having used the mother tongue very often in order to clear out my learners’
doubts.
Nowadays, however, as I look back in time, I see that those days are gone and much
has changed since then. I view myself as a much better professional whose teaching has been
enlightened by a harmonious combination between practice and theory. I have come to
realize that we, as teachers, have a lot to contribute to our learners’ learning process and that,
as Richards (ibid.) points out, teachers can certainly go further beyond methods. Through
self-monitoring, I have managed to pinpoint my strengths and weaknesses as a professional
and have come to realize that despite being much more professionally mature, I still seem to
follow a variety of principles and beliefs that I already had when I started my career. The
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difference lies in the fact that nowadays my classroom behavior emerges not only from
intuition but also from critical thinking. I am no longer strict regarding methods. I have
learned to be more flexible and am fully aware of the fact that there is no perfect or best
method whatsoever. Thus, the techniques and strategies I use nowadays seem to constitute
a mixture of beliefs and concerns that, most of the times, have managed to produce positive
outcomes. As I progressed in my career, I not only gained more professional experience but
I also became more sensitive to my learners’ needs and I have come to realize that effective
teaching certainly stems from a number of variables apart from methods.
REFERENCES
BROWN, H. D. Teaching by Principles: an interactive approach to language Pedagogy. New York.
Prentice Hall Regents, NJ, 1994.
MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais: Terceiro e Quarto Ciclos do Ensino
Fundamental – Língua Estrangeira (versão preliminar), Brasília: Secretaria de Educação
Fundamental, 1998.
RICHARDS, J.C. The Language Teaching Matrix, Cambridge University Press, 1990.
RICHARDS, J.C. LOCKHART, C. Reflective Teaching in Second Language Classrooms,
Cambridge University Press, 1996.
VEREZA, S. The role of ideology and identity in the teaching and learning of English as a foreign
language in Brazil. Anais do XII Enpuli UFMG, 1998.
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‘Você pode achar que o que conto é uma confissão’ 1: uma análise sobre
memória em Compaixão de Toni Morrison
Douglas Santana Ariston Sacramento2
Fernanda Mota Pereira3
RESUMO
O presente artigo retrata a condição da memória em personagens vinculados à narrativa Compaixão
(2009), da escritora afro-americana Toni Morrison, vencedora do Nobel de Literatura (1993). O livro
retrata uma narrativa ambientada no século XVI, ao retratar os primórdios do sistema escravocrata e
sua relação em uma pequena comunidade: a fazenda Jublio, pós morte de Jacob Vaark – dono da
fazenda. O tom memorialístico e passível de análise discorre sobre as personagens subalternas Florens
e Sorrow, escravas; Lina que é remanescente indígena; Rebekka esposa do dono da fazenda Jublio; e
Jacob, dono da fazenda. Assim sendo, a narrativa apresenta o uso constate da memória para narrar
as personagens que evocam suas memórias individuais e remetam a uma memória coletiva para o
leitor e um grupo social. O uso de memórias involuntárias e ícones que trazem à consciência
memórias passadas contribuem para a formação dessas personagens.
'You can find that what I tell is a confession': an analysis of memory in A Mercy by
Toni Morrison
ABSTRACT
This article describes the condition of memory in characters linked to the narrative A Mercy (2009)
by the African-American writer Toni Morrison, winner of the Nobel Prize for Literature (1993). The
book portrays a narrative set in the sixteenth century, portraying the beginnings of the slave system
and its relationship in a small community: the Jublio, after death of Jacob Vaark - owner of the farm.
The memorialist and analyzable tone discusses the subaltern characters Florens and Sorrow, slaves;
Lina, a remnant indigenous; Rebekka, the wife of the owner of Jublio farm; and Jacob, owner of the
farm. Thus, the narrative presents the constant use of memory to narrate the characters that evoke
their individual memories and refer to a collective memory for the reader and a social group. The use
of involuntary memories and icons that bring back past memories contribute to the formation of
these characters.
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Toni Morrison é uma escritora afro norte-americana, que tem em sua lista prêmios
como o Pulitzer Prize (1988), pelo romance Amada, e o prêmio Nobel de Literatura (1993)
pelo conjunto de sua obra. Toni Morrison tem doutorado na Universidade de Cornell, onde
estudou sobre alienação e suicídio em algumas obras dos escritores William Faulkner e
Virginia Woolf. Além de escritora, Toni Morrison foi criadora de uma editora Random House,
onde esteve à frente, por anos de sua vida, e lançou livros de outros escritores afro-
americanos, ajudando na proliferação de uma literatura negra. (CUTI, 2010).
A literatura negra remete a um coletivo, o coletivo negro, que vive sob o estigma da
cor e do racismo e que teve uma perda identitária provocada pelos processos de diáspora e
que, por meio da literatura, tenta construir uma identidade para resultar numa reinvindicação
contra esse sistema racista que é ainda presente à sociedade contemporânea. (CUTI, 2010).
Ao narrar esse passado e afetar uma coletividade, Toni Morrison desrecalca um passado
histórico (MOTA, 2015) que é vinculado por um cânone literário e hegemônico
(MORRISON, 1993), ou seja, traz os holofotes para uma produção negra com suas
demandas particulares.
A sua produção literária consiste em 11 livros, uma peça e dois livros infantis, mas
Toni Morrison é reconhecida pela sua técnica narrativa presente em seus romances. Existe o
uso descontínuo do presente, narrado com a inserção do passado das personagens,
caracterizando, assim, uma dialética narrativa (DAIBERT, 2009), com o uso contínuo da
rememoração para caracterizar as personagens no seu passado e a influência para o presente
narrado. Além do uso descontínuo do tempo, há um fator histórico que ambienta seus
romances, um evento da história que está latente na memória do leitor. Portanto, notam-se
os mecanismos da narrativa em Toni Morrison, o passado e o presente narrado na
individualidade das personagens em suas múltiplas vozes (COSME, 2005), mas que se
expandem para fora das páginas dos livros e invadem o coletivo social (UMBARCH, 2008),
trazendo à tona uma potência coletiva e questionamentos para a sociedade contemporânea.
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4 Ela (Toni Morrison) usa técnicas de escrita (múltiplas vozes, por exemplo) para criar um tom confuso e
fragmentado e a técnica cerebral de conscientização é usada para permitir que o leitor ouça os pensamentos
internos dos personagens. (Tradução livre).
110
2.1 Florens
Florens é uma heroína épica e sua missão começa na primeira infância, afinal, todos
os heróis têm sua infância como primeiro ato missionário. (CAMPBELL, 1949). A sua
epopeia começa quando sua mãe a entrega para Jacob Vaark, esse ato é rememorado pela
personagem em um momento antes de começar a missão dada por Rebekka – sua dona –,
assim ficando explícita a rememoração de uma primeira missão com o intuito de firmar o ato
heroico que está prestes a realizar novamente.
[...] Assim que a folha de tabaco está pendurando para secar, o reverendo padre
me leva numa balsa, depois num brigue, depois num barco [...] No segundo dia o
frio é de doer e eu fico contente de ter um manto mesmo que fino. (MORRISON,
2009, p. 11).
111
[...] Só mulher ruim usa salto alto. Eu sou perigosa, ela diz, e rebelde, mas ela cede
e me deixa usar os sapatos velhos da casa da Senhora, de bico fino, um salto alto
quebrado, o outro gasto e uma fivela em cima. O resultado disso, Lina diz, é que
meus pés são inúteis, vão ser sempre macios demais para a vida e nunca vão ter
solas fortes, mais grossas que couro, que a vida exige. (MORRISON, 2009, p. 8).
A metáfora dos pés remete à ideia do bloco mágico, em que os traços presentes no
inconsciente não são apagados totalmente. (FREUD, 1925). A imagem dos pés, rememorada
na narrativa, sinaliza para a presença desses traços, no passado, que ainda decalcam a
personagem, que remetem à infância e ao convívio da mãe e modificam, ao tentar, anos mais
tarde, achar um substituto para essa grande falta, já que a falta e o desejo relacionado a um
objeto libidinal movem o ser humano. (FREUD, 1915). A falta de um objeto libidinal é um
trauma e, portanto, na narrativa, o passado de Florens emerge constantemente, ou seja,
rompe as barreiras e chega ao consciente (FREUD, 1923) havendo uma rememoração do
passado, que a leva à mãe. O Ferreiro, que tem a salvação para Rebekka, é o grande amor da
vida de Florens, mas ao encontrá-lo não quer dividir o amor do Ferreiro com o filho dele,
assim, há uma reviravolta na trama, Florens machuca o filho do Ferreiro e é expulsa da casa,
quando retorna, os pés mudaram e sua subjetividade também.
Vou guardar uma tristeza. Que esse tempo inteiro eu não posso saber o que minha
mãe está me dizendo. Nem ela pode saber o que estou querendo dizer para ela,
Mãe, você pode ter prazer agora porque as solas dos meus pés estão duras feito
madeira cipreste. (MORRISON, 2009, p. 151).
[...] enquanto eu via o gato manx parar no meio do gramado, como se também
ele questionasse o universo, algo parecia faltar, algo parecia diferente. Mas o que
faltava, o que estava diferente? [...] Para responder a essa pergunta era preciso me
imaginar fora daquela sala, de volta ao passado, antes mesmo da guerra, e colocar
diante dos meus olhos o modelo de outro almoço, oferecido em cômodos não
muito distantes dali, mas diferentes. (WOOLF, 2014, p. 22-23).
Portanto, há uma relação entre as duas escritoras, ambas rasuram toda uma sociedade
patriarcal ao questionar o poder de escrita e o lugar da mulher. Além disso, ambas fundaram
editoras e apoiaram o crescimento de novas produções artísticas em tempos diferentes do
século XX, mostrando para a sociedade que além de ser um manx com o rabo cortado,
símbolo de uma castração social, elas produziram nas salas de jantar dos homens ricos.
113
Quando ele chega à casa do dono, Jublio, de Florens, há um jantar e ele, ao notar os
filhos do homem, relembra os seus filhos mortos, o ícone – as crianças – traz ao consciente
um fato que Jacob queria reprimir: a morte dos seus filhos, que o deixa triste. Há um
mecanismo de repressão que é acionado pelo ícone e aparece como memória. (FREUD,
1915/1975). A subjetividade, o luto e a morte aparecem como constituidores dessa
personagem. Esse luto é a perda de um objeto em que havia uma transferência libidinal, na
relação de pai para filho e que se perde com a morte. Jacob é um personagem enlutado.
[...] Meninos calados como pedras, treze e catorze anos, usando perucas como as
do pai como se estivessem num baile ou num tribunal de Justiça. Seu azedume,
Jacob entendeu, era indigno, resultado de não ter ele próprio nenhum
descendente – homem ou não. (MORRISON, 2009, p. 22).
Jacob Vaark retrata esse homem, que é retirado várias vezes do exercício da
paternidade. Por meio de um mecanismo involuntário da memória, esse trauma ganha a
consciência, pois há um ícone que faz transpassar as barreiras do ego e o trauma, então, vem
à tona. (FREUD, 1923). Jacob é um órfão do seu meio, pois vivera a esmo até encontrar o
lugar, o Jublio, e acaba fazendo do seu trauma, recorrente em outros tempos de sua vida, um
modo de reprimir a orfandade dos outros personagens, assim ele leva para morar na sua
fazenda outros personagens órfãos (MOTA, 2015): Florens, Lina, Rebekka e Sorrow.
Outro ícone aparece e faz Jacob lembrar da esposa, o cheiro de cravo, presente no
jantar que o dono do Jublio produz para ele. O cheiro o transporta para a primeira vez que
viu Rebbekka, descendo do navio, pois Rebekka é fruto de um negócio entre Jacob e o sogro,
e ele ama a esposa que tem e reconhece o valor que ela possui ao seu lado e na organização
da fazenda. Essa cena exemplifica mais uma vez a utilização da memória involuntária na
narrativa, pois o odor está atrelado ao aparecimento de memórias. (BENJAMIN, 1989).
Sua Rebbekka lhe parecia sempre mais valiosa nas raras vezes em que estava na
companhia das esposas desses homens ricos, [...] Desde o momento em que viu
sua futura noiva lutando para descer a prancha pesada de desembarque com roupa
de cama, duas caixas e uma bolsa pesada, ele entendeu a sorte que teve.
(MORRISON, 2009, p. 23).
O odor como ícone é muito utilizado para ressuscitar uma memória involuntária, mas
também o sentimento envolvendo tal memória, em Marcel Proust, no livro No caminho de
114
[...] Essa escadaria detestada, que eu sempre subo tão tristemente, exalava um
cheiro de verniz que havia de certo modo absorvido e fixado aquela espécie
particular de mágoa que eu sentia cada noite e ornava-a talvez ainda mais cruel
para minha sensibilidade, porque, sob essa forma olfativa, minha inteligência não
mais podia tomar parte dela. (PROUST, 2016, p. 50-51).
2.3 Lina
[...] Lina admitiu o status de pagã e deixou-se purificar por esses justos. Aprendeu
a tomar banho nua no rio era pecado; que apanhar cerejas de uma árvore
carregada era roubo; que comer papa de milho com os dedos era perverso. [...]
deram-lhe um bom vestido de pano grosso. Cortaram as contas de seus braços e
apararam centímetros de seu cabelo. (MORRISON, 2009, p. 48).
Ele queria me contar, ela pensou. Ele quer que eu pergunte para ele como foi para
ele – pergunte como a língua fica machucada apertada pelo ferro, como a vontade
de cuspir é tamanha que dá vontade de gritas. [...] A loucura que congestionava o
olho no momento em que os lábios eram arregaçados para trás. (MORRISON,
2007, p. 105).
Lina exemplifica o poder da sororidade, pois cuidará da fazendo quando Jacob morre
e Rebekka está de cama com varíola, isto é, ficar ao lado de sua dona e no decorrer da estadia
na fazenda, se transformar em confidente e amiga de Rebekka. Portanto, ilustra a igualdade
entre as mulheres e qualquer outra minoria nos momentos de dor.
[...] Ficaram amigas. Não só porque alguém tinha de puxar o ferrão da picada de
vespa do braço da outra. Não só porque era preciso duas para empurrar a vaca
para longe da cerca. [...] Mas também, pensava Lina, ela possuía o Patrão que lhe
gradava mais e mais e logo uma filha, Patrician, duas coisas que abafavam a tristeza
pelos bebês de vida tão curta. Lina fez o parto e enterrou a cada ano seguido.
(MORRISON, 2009, p. 53-54)
2.4 Rebekka
Não havia nada no mundo que a preparasse para uma vida de água, na água, sobre
a água; nauseada por ela e desesperada por ela. Mesmerizada e aborrecida de olhar
para ela, principalmente ao meio dia, quando as mulheres podiam ficar mais uma
hora no convés. (MORRISON, 2009, p. 71).
117
A sós com o bebê que mais que qualquer de seus filhos puxara ao pai, Rebekka
saboreou de novo naquele dia o milagre de sua boa sorte. Espancamento de
esposa era comum, ela sabia, mas as restrições – não depois das noves da noite,
com razão e não raiva – eram para esposas e apenas esposas. (MORRSION, 2009,
p. 91).
A morte dos filhos de Rebekka aparecem como uma repetição no discurso memorial
da personagem, ou seja, há uma quantidade de impressão – sentimento – sobre esse traço
(DERRIDA, 2005), que é um trauma presente na construção da personagem. Portanto,
exemplifica a importância da dor envolvendo essas lembranças e como medidor de
quantitativo de impressão, pois quanto maior a força do trauma maior será a exploração
deixada pelo traço, portanto, havendo uma organização psíquica. (DERRIDA, 2005). A vida
de Rebekka é organizada a partir das perdas, do processo de lutos e os traumas envolvendo
a precocidade das mortes.
[...] Mas ela pariu quatro bebês saudáveis, viu três sucumbirem em idades
diferentes a uma ou outra doença, e depois viu Patrician, sua primogênita, que
chegou a idade de cinco anos e forneceu uma felicidade em que Rebekka não
conseguia nem acreditar, jazer em seus braços durante dois dias antes de morrer
de cabeça quebrada. [..] Mas quando finalmente a terra ficou macia, quando Jacob
conseguiu tração com a pá e baixaram o caixão [...] Ficou ali o dia inteiro e a noite.
(MORRISON, 2009, p. 76-77).
Rebekka, que tem um nome que retoma a uma memória coletiva, pois tem relação
com a Bíblia e toda uma coletividade que segue os dogmas bíblicos, em que há uma
semelhança em relação às duas personagens com os mesmos nomes, ambas têm problemas
relacionados à maternidade. Rebekka, perde todos os filhos e Rebeca, figura bíblica associada
à boa esposa, não consegue ter filhos e para dar herdeiros para a família aceita que a escrava
tenha relações com seu marido. Em momento de doença, Rebekka retoma muitos discursos
e imagens bíblicas para retratar a sua fé e por estar sofrendo da moléstia e das perdas, como
se fosse castigo divino, similar ao que ocorre com a Rebeca bíblica.
[..] Além disso, havia papistas e as tribos de Judá a quem a redenção era negada,
como também a uma variedade de outros que viviam voluntariamente em erro.
Rebekka descartava essas exclusões como as restrições de qualquer religião, mas
tinha uma mágoa mais pessoal contra eles. Seus filhos. Cada vez que um dos delas
morria, ela dizia a si mesma que era antibatismo que a enraivecia. (MORRISON,
2009, p. 89).
118
A criação de uma persona pode ser lida como metáfora, como os processos de
violência são destruidores de subjetividades e de identidades, pois ao ser resgatada do
náufrago, Sorrow convive com os brancos que a salvaram, e eles colocam o nome, e apagam
essa identidade de África, a memória subjetiva é constituída por meio desses processos
escravocratas. Twin pode ser lido como esse novo reflexo, essa outra persona que é mais
docilizada que a própria Sorrow, que aceita, aconselha e é grande amiga para Sorrow.
Sorrow, ao ser recebida na casa das pessoas que a salvaram, sofre violência corporal,
não apenas pelo dono da fazendo, mas pelos filhos do dono também, logo ela fica grávida e
a sua senhora, por achar que estava havendo uma competição pelo senhor, muito propagada
durante os séculos de escravidão, por causa da imagem relacionada a essas duas mulheres no
imaginário social; a mulher negra como o corpo potencialmente sexual e necessitado de uma
violação sexual, física e psíquica e a mulher branca como imagem de candura (HOOKS,
2014), logo a senhora dá Sorrow a Jacob.
[...] De vez em quando tinha companhia secreta que não era Twin, mas não
melhor que Twin, que era sua segurança, seu divertimento, seu guia. A dona da
casa lhe disse que era o sangue menstrual; que todas as mulheres passavam por
119
A relação conturbada existente entre senhora e escravizada, perpassa a segunda fase da vida
de Sorrow. Quando ela chega na fazenda de Jacob, Rebekka não gosta da nova moradora
das terras dela e a trata com indiferença e ela “mal escondeu o aborrecimento”.
(MORRISON, 2009, p. 52). Para Lina há uma maldição envolvendo aquele corpo negro, e
por isso a primogênita de Rebekka morre. Mas, a relação fica mais conturbada quando
Sorrow tem seu filho, pois há uma mudança na psique dela, e o ódio adicionado à tristeza do
luto em Rebekka, e toda essa competitividade existente entre mulheres brancas e negras
persiste até os dias atuais.
3 CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
CAMARGO, Flávio Pereira. A mitologia da memória literária: a memória voluntária e
involuntária em Proust. REVELLI – Revista de Educação, Linguagem e Literatura da
UEG-Inhumas, v.1, n.1, p. 46-64, 2009.
CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. São Paulo: Editora Pensamento, 1949.
120
121
3. As resenhas deverão ter cerca de 4 a 5 páginas com título próprio, diferente daquele da
obra resenha, em português e inglês. Após o título, o autor deverá indicar os dados
bibliográficos do trabalho resenhado.
4. O nome do autor não deverá aparecer no corpo do artigo, para garantir o anonimato no
processo de avaliação.
6. O texto será corrido, com respectivos parágrafos, incluindo as tabelas, gráficos e figuras,
ou seja, se houver imagens, estas já deverão estar inseridas no texto, de acordo com a menção
no mesmo;
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SEDA - Revista de Letras da Rural/RJ. Seropédica/RJ, v. 2, n. 6, set./dez., 2017, p. 122-123.
7. Uma pasta separada deverá conter os arquivos das imagens em extensão JPG e TIFF com
resolução mínima de 400 DPIs;
8. As citações no texto deverão ser apresentadas de acordo com a NBR 10520 da ABNT, de
agosto de 2002. Exemplo:
Nome do autor dentro da citação deverá ser com letras minúsculas: “De acordo Sá
(1995)...”; “... em relação aos dados de Miranda et al. (2006);
Nome do autor fora da citação, mas dentro de parênteses, letras maiúsculas: “Apesar
das aparências ... (DERRIDA, 1967, p. 33)”, “... comportamento seguro (RIMAL et
al., 2001, p. 127)”;
Artigos de periódicos:
SOBRENOME, Nome. Título do livro em negrito: subtítulo normal (se houver). Local da
publicação: nome da editora, ano de publicação.
Capítulo de Livro:
Internet:
10. Para caracteres alheios aos do alfabeto utilize fonte Symbol ou editores de equações
próprios do Microsoft® Word.
12. Os trabalhos que não cumprirem as orientações acima não serão submetidos à análise e
serão retirados do Portal Costa Lima (www.ufrrj.br/SEER).
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