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2010
MAX WEBER:
DEMOCRACIA PARLAMENTAR OU PLEBISCITÁRIA?1
RESUMO
Em seus últimos escritos políticos, Weber debateu com intensidade os desafios colocados para a Alemanha
naquele momento histórico. Acompanhando o final do II Império e os primeiros passos da República de
Weimar, o autor transitou da preferência por um modelo parlamentar de democracia para sua variante
plebiscitária. O presente trabalho retoma essa discussão e busca situá-la no contexto da evolução política
do pensamento de Weber. Ao mesmo tempo, busca-se reconstruir a argumentação weberiana destacando o
papel que a temática das instituições, da democracia e da racionalidade ocupam em sua avaliação dos
modelos parlamentar e plebiscitário da democracia. Na parte final, o esquema anterior é retomado para
sugerir uma agenda teórica que evidencie as possibilidades e atualidade das problemáticas contidas na
sociologia política que emerge dos escritos político-conjunturais de Weber.
PALAVRAS-CHAVE: Weber; democracia; parlamentarismo; presidencialismo; instituições; racionalidade.
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que Weber não hesitou em chamar de decadente. mos identificar pontos de continuidade e de rup-
Sua análise desloca-se, então, para o exame dos tura. A continuidade é dada pelo tipo de aborda-
outros principais grupos políticos de poder capa- gem existente. Em sua reflexão sobre a Rússia,
zes de fazer frente ao estamento agrário: a bur- Weber repete o esquema de “análise de classes”
guesia e o proletariado. O diagnóstico que ele ela- estabelecido em “O Estado nacional”. A marca
borou sobre essa situação é conhecido: “O ame- dessa análise é a tese de que a maturidade para a
açador da nossa situação, no entanto, é que as liderança política não são reflexos nem frutos di-
classes burguesas parecem fenecer, enquanto retos da posição econômica das classes sociais.
portadoras dos interesses de poder nacionais e que Ela depende da educação política dos grupos so-
ainda não há sinais de que as classes trabalhado- ciais e de suas cosmovisões políticas. A análise de
ras estejam começando a adquirir maturidade para Weber é eminentemente sociológica e coloca como
tomarem o seu lugar” (idem, p. 77). variável chave para entender a correlação entre
grupos econômicos e liderança política o fator
Após os anos de crise que assolaram Weber
aprendizado político, ou seja, a visão cognitiva e
entre os anos de 1897 a 1902, ele volta a interes-
valorativa das forças sociais em luta (SCAFF,
sar-se por problemas políticos e acompanha com
1973). Mas, além disso, há um evidente ponto de
imenso interesse os fatos ligados a revolução
ruptura, dado pela valoração que informa a
constitucionalista de 1905, ocorrida na Rússia.
teorização de Weber que, nesse segundo momen-
Mas, a pergunta que guia suas análises recebe to, é realizada com muito maior acento a partir de
uma nova coloração. Em A situação da democra- premissas liberais. Em suas análises subsequentes,
cia burguesa na Rússia (WEBER, 2004b), ele ri- Weber continuará a pensar a luz desses valores
diculariza aqueles que temem um excesso de de- políticos, mas sua abordagem sofrerá uma im-
mocracia e de individualismo e exaltam valores portante mudança de perspectiva, imposta sobre-
conservadores como autoridade, nobreza e hie- maneira pelas exigências da conjuntura política,
rarquia. Agora mais claramente vinculado a uma como passo a mostrar doravante.
cosmovisão liberal, Weber entende que os valores
III. DEMOCRACIA PARLAMENTAR
do individualismo e dos direitos humanos foram
fruto de uma combinação contingente que ocor- No contexto da derrota da Alemanha na I Guer-
reu somente na Europa Ocidental. Ele era pessi- ra Mundial e queda da monarquia prussiana, a
mista quanto à plausibilidade dessa mesma cons- necessidade de reorganização da estrutura políti-
telação diante dos rumos do capitalismo contem- ca do Estado alemão vai envolver diretamente
porâneo: “É ridículo no mais alto grau imaginar Weber, resultando em dos períodos mais produti-
de qualquer afinidade eletiva entre a “democra- vos em termos de sua obra política. Para apre-
cia” ou “a liberdade” (em qualquer sentido que sentar a reflexão weberiana a esse respeito, toma-
essas palavras possam ter) e o alto capitalismo de rei como ponto de partida o texto Parlamento e
nossos dias – fase ‘inevitável’ do nosso desenvol- governo na Alemanha reordenada. Escrito na for-
vimento econômico, o qual predomina nos Esta- ma de artigos entre abril e junho de 1917, esse
dos Unidos e agora está sendo importado pela texto sempre mereceu destaque não apenas pelas
Rússia” (idem, p. 103). reflexões que levanta a respeito da conjuntura ale-
mã, mas especialmente pela forma em que Weber
Daí que sua reflexão foi buscar na análise dos
conecta sua avaliação do quadro político
grupos sociais e políticos da Rússia quem seriam
germânico com suas teses sociológicas de longo
os possíveis veículos e portadores de um projeto
alcance. Buscarei reconstruir o argumento
liberal. Weber examina em seqüência os zemtstvos,
weberiano levando em consideração três temáticas
os cadetes (Partido Constitucional Democrata), a
que articulam sua reflexão: o papel das institui-
burguesia, as forças operárias (e seu populismo
ções, a concepção de democracia e a problemáti-
romântico!) e ainda o campesinato. Sua conclu-
ca da racionalidade.
são mais uma vez é pessimista, pois ele não vê em
nenhuma das classes sociais economicamente Do ponto de vista institucional, o centro da
acedentes um vínculo com o ideário liberal. discussão weberiana é o papel do Parlamento. Tal
discussão é encetada por Weber tendo em vista o
Comparando a reflexão de Weber sobre a po-
problema da liderança política, desenvolvido pelo
lítica econômica do Estado Alemão (feita antes de
autor em dois níveis inter-relacionados: conjuntural
sua crise) e sobre a democracia na Rússia pode-
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mento histórico. Com base nesse novo ponto de presidencialista, ao contrário, reforçaria a unida-
vista, ele rejeita a idéia de que o Presidente deva de e a visão universalista de condução política na
ser indicado pelo Parlamento: “um Presidente do esfera administrativa. Nas palavras de Weber, “só
Reich eleito pelo Parlamento em função de cons- um Presidente do Reich se apoiando sobre mi-
telações e de coalizões precisas entre os partidos lhões de votos pode ter a autoridade que lhe per-
é um homem politicamente morto se estas cons- mite engajar a socialização” (idem, p. 503). Por
telações vierem a mudar” (idem, p. 506). O mo- socialização, explica Weber, leia-se administração,
delo proposto por Weber prevê, então, a eleição entenda-se ela apenas no sentido de medidas fi-
popular e o reforço do poder presidencial: “Um nanceiras inevitáveis ou mesmo como transfor-
Presidente eleito pelo povo enquanto chefe do mação completa da economia (qual seja, as op-
Executivo e da atribuição de cargos administrati- ções políticas de direita e esquerda que estavam
vos dispondo (eventualmente) de um veto disponíveis naquele momento histórico). Ele en-
suspensivo, do direito de dissolver o Parlamento tende, pois, que a nova Constituição “[...] deve
e de consultar o povo é a segura garantia de uma suprimir os obstáculos para tornar possível todas
verdadeira democracia (idem, p. 506-507). as tarefas imagináveis que possam se apresentar
a administração” (idem, p. 504). Ele cita como
Na continuidade, tomando como base o texto
exemplo negativo a inoperância da organização
O Presidente do Reich (idem) exponho a nova
política da França “[...] que não poderia jamais
posição de Weber tomando em consideração as
aportar a administração esta unidade sem a qual a
mesmas variáveis teóricas utilizadas acima.
reconstrução de nossa economia é impossível”
Relembremos que a discussão institucional de (ibidem; sem grifo no original). E, de outro lado,
Weber tem como cerne o Parlamento e envolve afirma; “o particularismo reclama alguém que seja
como seu tema básico a questão da liderança, sendo o vetor da idéia de unidade do Reich” (idem, p.
que esta desdobra-se de acordo com duas preo- 505). A eleição direta também seria um contrape-
cupações básicas: garantir a preponderância do so às tendências regionalistas da organização par-
político sobre o burocrático e a seleção de líderes tidária, pois tal “[...] movimento eleitoral será uma
políticos capazes. Mas, ao voltar a esses temas, barreira à proliferação em uma só direção de tais
em 1919, vemos que a reflexão weberiana é tendências, porque os partidos serão, então, obri-
enriquecida por um novo eixo de avaliação: a uni- gados a se organizar e a entrar em acordo sobre a
dade e a universalidade. Nesses termos, Weber feição unitária em todo Reich, da mesma maneira
deixou de acreditar no Parlamento como meca- que o Presidente do Reich eleito pelo povo face
nismo eficiente de direção política efetiva porque ao Bundesrat [Parlamento], tal é inevitável, um
entendeu que este acentuava a fragmentação e dis- contrapeso na direção da unidade do Reich”
persão política do Estado. Dois fatores adicionais (ibidem; sem grifos no original).
são apresentados por Weber nessa direção. O pri-
Ambos argumentos deixam claro que a pre-
meiro envolve a adoção do sistema de representa-
ponderância do político em relação ao burocráti-
ção proporcional. Seu resultado seria a composi-
co é transferida por Weber do Parlamento para a
ção de um Parlamento essencialmente corporativo,
figura do Presidente eleito, na medida em que sua
representando interesses seccionais e setoriais. No
base popular dar-lhe-ia a força necessária para
dizer de Weber, o sistema proporcional engendra
impor sua vontade aos quadros burocráticos e
representantes “[...] munidos de um mandato im-
tarefas administrativas, sobrepujando as tendên-
perativo em proveito de grupos que tem interes-
cias particularistas e centrípetas da estrutura par-
ses econômicos a defender” (WEBER, 2004b, p.
lamentar alemã. Agora é o Presidente e não mais o
505). A mesma tendência seria reforçada pelo ca-
Parlamento a força capaz de impor o político
ráter federalista da organização política alemã, seja
(carisma) sobre a administração (burocracia).
por conta de sua estrutura partidária, seja por conta
do poder dos governadores dos entes federativos Tal mudança de postura foi acompanha tam-
(particularmente da Prússia). De novo, o Parla- bém de uma reavaliação da capacidade parlamen-
mento ver-se-ia preso à representação de interes- tar de seleção de dirigentes: “Só a eleição pelo povo
ses de minorias em conflito: “nós ignoramos se o de um Presidente do Reich dá a ocasião e a possi-
desenvolvimento de partidos puramente regionais bilidade de uma seleção de chefes políticos de se
não continuará a progredir” (ibidem). A opção fazer, permitindo assim uma reorganização de par-
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tidos que colocará fim ao sistema atual [...] de ser em situações de crise momentânea insolúveis”
notáveis e suas práticas” (idem, p. 504). O atual (idem, p. 505-506). Mesmo assim, assevera
sistema preservava a continuidade de políticos de Weber, “devemos dar-lhe [ao Presidente] por meio
carreira e afastava os melhores quadros para o do sufrágio popular um assento sólido que lhe seja
domínio da economia. Nesse contexto, ele con- próprio” (idem, p. 506).
clui, “só a eleição pelo povo do mais alto funcio-
Ocorre, portanto, que o fluxo de poder que se
nário do Reich pode criar um novo apelo” (ibidem).
origina na vontade do povo e tinha o Parlamento
Note-se, mais uma vez, que o problema da li- como elemento de racionalização é pensado de
derança continua sendo a tônica das discussões outra forma. A vontade popular é transferida dire-
de Weber, mas a ele são agregados novos critéri- tamente à figura do Presidente, funcionando o
os de avaliação. Weber continua na busca de líde- Parlamento apenas, no limite, como guardião dos
res carismáticos capazes de imporem-se diante excessos, mas não mais da racionalidade do fluxo
do aparato administrativo, mas seu recrutamento político. Em termos conceituais, a novidade da
e seleção, bem como sua capacidade diretiva, pro- formulação weberiana não está na constatação de
vêm da força que lhes advém do apoio popular. um fator plebiscitário próprio à democracia. A
Nessa direção, o modelo presidencialista é superi- noção de democracia plebiscitária já tinha sido
or ao parlamentarista, pois este acentua as ten- apresentada em “Parlamento e governo”, pois, de
dências centrípetas do sistema, enquanto o pri- acordo com a argumentação de Weber, o elemen-
meiro oferece a possibilidade de uma visão to cesarista e plebiscitário é fator inerente da de-
universalista e unitária das tarefas políticas do mocracia. A novidade, nesse caso, parece-me re-
Estado. sidir em outro plano. Primeiro, no abandono do
tipo ideal “democracia parlamentar” como elemen-
Também podemos notar importantes desloca-
to de correção da democracia plebiscitária e, em
mentos de Weber em relação a sua concepção de
segundo lugar, na clara defesa normativa (em seus
democracia. Partindo do pressuposto de que, em
resultados) do segundo modelo de democracia.
toda parte, o sufrágio indireto estava sendo supri-
mido, ele vê como um fato absolutamente neces- Nesse contexto, a difícil dialética entre a
sário um Estado “[...] repousando sem contesta- racionalidade e a irracionalidade continua
ção possível sobre a vontade do povo todo inteiro permeando a apreciação weberiana. No entanto,
e sem que intermediários possam aí se interpor” o objetivo da mesma não é mais limitar os fluxos
(idem, p. 503). Mais a frente ele dirá ainda que emocionais da democracia plebiscitária pela me-
“[...] a ditadura das massas da qual tanto se falou diação racionalizadora da democracia parlamen-
exige justamente um ‘ditador’, um homem que as tar. A racionalidade do sistema é transferida para a
massas, elas mesmas, escolheram e no qual elas figura do Presidente e a democracia plebiscitária,
confiam e ao qual se submetem enquanto possu- de tom antes completamente negativo, ganha con-
em sua confiança” (idem, p. 504) para, ao final, tornos positivos. Essa mudança valorativa, con-
arrematar dizendo: “[...] a palavra mestre da de- tudo, não envolve uma redefinição da tese da
mocracia [é] o direito de escolher diretamente um emotividade da vontade popular. O que ocorre é
chefe” (idem, p. 506). uma reavaliação do mecanismo capaz de conferir
racionalidade à participação das massas derivada
Comparada com sua visão anterior da demo-
de sua incorporação à democracia mediante a ex-
cracia, a nova composição weberiana apresenta,
pansão do sufrágio eleitoral. Mas, como entender
de fato, uma diferenciação qualitativa importante.
o sentido dessa mudança?
Afinal, se antes sua reflexão pautava-se pela defe-
sa da democracia parlamentar diante dos elemen- Para explicitar essa transformação, podemos
tos cesaristas da democracia moderna, agora é a recorrer a outro texto de Weber. Em Economia e
democracia plebiscitária que configura a aposta sociedade, não por acaso, em tópico que trata da
política weberiana. Em seu novo esquema, o Par- dominação carismática, Weber detém-se sobre a
lamento continua a ter um papel de salvaguarda e “reinterpretação antiautoritária do carisma”. Ele
contenção das liberdades e dos limites do poder explica, então, que a figura do líder de partido
político: “como sempre, é preciso restringir o poder eleito popularmente no Estado moderno representa
do Presidente eleito pelo povo, velando para que um tipo transitório flutuante entre a dominação
ele não possa intervir na máquina do Reich a não carismática e a racional-legal: “o tipo transitório
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mais importante é a dominação plebiscitária” sua relação com o governo (quadro administrati-
(WEBER, 1994, p. 176). Em seguida, ele trata vo). É por essa razão, podemos supor, que Weber
explicitamente da “democracia plebiscitária”, que faz a aposta na direção de uma democracia
é assim definida: “ o tipo mais importante da de- plebiscitária e no reforço da figura do Presidente
mocracia de líderes – em seu sentido genuíno, é do Reich.
uma espécie de dominação carismática oculta sob
V. CONCLUSÕES
a forma de uma legitimidade derivada da vontade
dos dominados e que só persiste em virtude des- As posições de Weber sobre a conjuntura po-
ta” (ibidem). Na sequência, ele lembra que o ele- lítica alemã e sua visão da democracia provoca-
mento característico da democracia com líderes ram alguns dos mais duros debates entre os espe-
é seu caráter emocional e é justamente nesse as- cialistas no autor (PFAFF, 2002). De fato, seus
pecto que “[...] estão os limites da racionalidade críticos mais acerbos (particularmente o trabalho
desse tipo de administração nos tempos moder- de Mommsen (1990)) chamaram a atenção para a
nos, racionalidade que, mesmo nos Estados Uni- ênfase exagerada de Weber na figura do líder, seu
dos, nem sempre correspondeu às esperanças” apoio ao artigo 48 da Constituição de Weimar (que
(idem, p. 177). fortalecia o poder do Presidente) e a conexão des-
ses elementos com a ascensão dos movimentos
O detalhe a observar é que Weber fala em limi-
totalitários ao longo da década de 1930. Em res-
tes, mas não em impossibilidade. Pois, logo à frente
posta a essa leitura, a adesão de Weber a princípi-
(ibidem), ao tratar da relação entre a democracia
os liberais e sua distância em relação aos fatos
plebiscitária com a economia, Weber menciona o
posteriores também foi lembrada (LÖEWENS-
potencial racional desse tipo de democracia. O
TEIN, 1966). Não obstante o valor histórico-
trecho é assaz importante, e o transcrevo inte-
exegético implicado nesse debate (que este artigo
gralmente: “A redefinição do carisma como
não pretende esgotar), esta parte final procura ir
antiautoritário conduz, em regra, ao caminho da
além do marco interpretativo para sugerir, de for-
racionalidade. O dominador plebiscitário procu-
ma indicativa, a atualidade das questões levanta-
rará geralmente apoiar-se em um quadro de fun-
das por Weber em seus últimos escritos. Para tan-
cionários que opere com rapidez e sem atritos.
to, retomo o esquema de conceitos dos quais me
Quanto aos dominados, tentará vinculá-los a seu
utilizei na apresentação do debate weberiano da
carisma, como ‘ratificado’, ou por meio de honra
democracia.
e glória militar ou promovendo seu bem-estar
material – em certas circunstâncias, pela combi- A temática institucional confere uma excepci-
nação de ambas as coisas” (ibidem). onal atualidade ao pensamento weberiano, espe-
cialmente se levarmos em conta a centralidade que
A partir desse elemento torna-se inteligível a
o tema das instituições adquiriu nos marcos da
guinada weberiana em direção à democracia
discussão política contemporânea. Ainda que a
plebiscitária. Weber não nega, mais uma vez, a
aproximação entre Weber e as teorias neo-
possibilidade de que “os poderes plebiscitários
institucionalistas (HALL & TAYLOR, 2003) não
podem ter efeitos enfraquecedores para a
nos permita converter Weber na fonte privilegia-
racionalidade (formal) da economia” (idem, p.
da dessa abordagem; a dimensão institucional da
178). Mas, tome-se nota, a democracia
vida política recebeu uma acentuada atenção da
plebiscitária, vista antes como meramente irraci-
parte do Weber tardio. Esse aspecto, até agora
onal e emocional possui, nessa nova visão, possi-
pouco explorado, permite-nos uma agenda de dis-
bilidades racionais que antes não haviam sido des-
cussões teórico-empíricas que contemplam, a meu
tacadas. As indicações de Weber nesse sentido
ver, três ordens de questões. A primeira tem a ver
também são bastante claras. A racionalidade da
com o critério que guia a análise institucional de
democracia plebiscitária repousa na capacidade de
Weber, critério esse que nos remete ao problema
seu líder de dominar o quadro administrativo e,
da liderança ou, para buscar uma formulação atu-
por outro lado, de sua capacidade de vincular os
al, a produção da governabilidade (capacidade de
dominados ao seu carisma. Weber, mais uma vez,
formulação e implementação de uma agenda de
pensa as duas pontas do processo político (soci-
políticas). À luz desse critério emerge a questão
edade e Estado) e conecta o papel racionalizador
do próprio desenho institucional proposto por
do líder político tanto à sua base popular quanto à
Weber (seja ele o modelo parlamentar ou
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plebiscitário) e o modo como ele concebia a ca- sua dimensão de accountability horizontal (o pa-
pacidade das organizações de processar os objeti- pel de salvaguarda das liberdades do Parlamento).
vos políticos que naquele momento ele julgou Além disso, Weber apresentou uma descrição so-
prioritários. Por fim, caberia destacar também o bre as formas modelares da democracia contem-
estatuto teórico-sociológico que Weber confere porânea (os tipos parlamentar e plebiscitário) que
ao tema das instituições sociais e políticas. Em- merecem um confronto com os outros parâmetros
bora saibamos que Weber não concebia as insti- teóricos de reflexão sobre os tipos de democracia
tuições em um vácuo teórico ou mesmo como realmente existentes (penso, por exemplo, nos
variáveis ontologicamente determinantes da vida modelos de democracia de Liphardt (2003), pos-
política, pouco se esclareceu sobre o modo como sibilitando-nos pensar as tipologias (marcos teó-
ele pensou as organizações políticas como variá- ricos) e topologias (os regimes políticos do ponto
veis independentes de análise, as múltiplas rela- de sua vista de sua concretude histórica) de nos-
ções que ele estabeleceu entre os elementos que sas poliarquias contemporâneas.
compõem a estrutura política e, na ordem inver-
O tema da racionalidade presente em Weber
sa, a relação de causalidade dos elementos soci-
permite-nos, por sua vez, um duplo desdobramen-
ais, históricos e culturais sobre o nível
to. No plano formal, a problemática da racionali-
organizacional.
zação e do desencantamento do mundo é apre-
Embora Weber seja considerado autor consa- sentada pelos mais atuais especialistas no autor
grado nos marcos dos compêndios das teorias como a chave de seu pensamento
contemporâneas da democracia (HELD, 1987), (SCHLUCHTER, 1986). Logo, tomar o tema da
sua usual apresentação como precursor (ou fun- racionalidade como foco conduz-nos à conexão
dador, como se queira) de uma versão elitista da da sociologia política de Weber com sua sociolo-
democracia (elitismo democrático) tende muito gia global, evitando o confinamento de suas refle-
mais a obscurecer do que esclarecer as intenções xões de conjuntura nos marcos estritos de uma
de seus escritos. Assim, apresentado na versão reflexão política per se. Esse ganho, por sua vez,
acabada que lhe teria sido dada por Joseph transborda os limites do meramente hermenêutico,
Schumpeter, sugere-se que o núcleo da visão indicando-nos a possibilidade de pensar o político
weberiana da democracia seria a demonstração em chave sociológica ou o social na sua conexão
da impossibilidade de formas de democracia dire- com o político, e vice-versa. Assim compreendi-
ta, posto que calcado em uma versão realista e da, a discussão weberiana apresenta-nos um mo-
não normativa da democracia e no diagnóstico da delo de Sociologia Política (mais do que em uma
irracionalidade das massas e da complexidade Ciência Política isonomicamente concebida) que,
burocrática do Estado contemporâneo em última instância, representa também uma so-
(AVRITZER, 1996; BREUER, 1998). Ainda que ciologia da modernidade. Do ponto de vista subs-
essa seja uma formulação que possa ser conside- tantivo, o tema da racionalidade e de suas múlti-
rada global e formalmente correta, ela tende a ig- plas formas já está mais do que presente na Ciên-
norar a historicidade do pensamento weberiano e cia Política (teoria da escolha racional, etc.) e na
menospreza as sutilezas e oscilações de suas re- Sociologia contemporânea (racionalidade instru-
flexões, como se propôs a mostrar este artigo. mental e comunicativa de Habermas, por exem-
Mais importante do que isso, essa formulação plo), dispensando-nos da necessidade de argumen-
parece deslocar o ponto mais saliente das preocu- tar sobre a validade de um autor que tem nessa
pações de Weber cujo eixo, de fato, tinha muito dimensão seu próprio eixo de análise. Saliento
mais a ver com as características e o futuro do apenas que a ênfase na racionalidade tende a es-
regime representativo em gestação na Alemanha quecer seu contraponto (a irracionalidade), tema
do que com a crítica da democracia direta. É nes- que, weberianamente pensado, aparece tanto nas
se ponto, portanto, que uma suas contribuições suas possibilidades (carisma) quanto nos seus li-
analíticas devem ser buscadas. Nessa direção, mites (a emotividade das massas). Mais um bom
Weber não só examinou o impacto da democrati- tópico a recuperar, portanto.
zação nas instituições e no comportamento políti-
Nessas múltiplas acepções, a problemática das
co, como também pensou a democracia tanto em
instituições, da democracia e da racionalidade,
sua capacidade de produção de condições de
muito mais do que uma grade de leitura do pensa-
governabilidade (produção de liderança) quanto na
mento político weberiano, indicam possibilidades
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MAX WEBER: DEMOCRACIA PARLAMENTAR OU PLEBISCITÁRIA?
de uma agenda de problemas teóricos que nos con- com ou contra, a partir de Weber. Um motivo a
vida ao sempre renovado exercício de pensar, seja mais para retomarmos sua leitura.
Carlos Eduardo Sell (sell@cfh.ufsc.br) é Doutor em Sociologia Política pela Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC) e Professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da mesma
instituição.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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_____. 1994. Economia e sociedade. 3ª ed. V. 1. _____. 2004b. Le président du Reich. In: _____.
Brasília: UNB. Oeuvres politiques. Paris: A. Michel.
_____. 2004a Estudos políticos: Rússia (1905 e
1917). Rio de Janeiro: Azougue.
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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 18, Nº 37: 295-300 OUT. 2010
on the social function of this power and/or this State and its relationship to social mores that Durkheim's
political sociology should be understood.
KEYWORDS: Emile Durkheim; State; Political Sociology; sociological theory.
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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 18, Nº 37: 303-309 OUT. 2010
(en spécial, l'Etat), surgissent dans la sociologie de Durkheim. En conclusion, nous affirmons que ce
n’est pas à partir d’une réflexion sur la question du pouvoir (ou sur l'Etat) en soi, mais sur la fonction
sociale de ce pouvoir et/ou de cet Etat et sa relation avec la morale sociale, qu’on doit comprendre
la sociologie politique de Durkheim.
MOTS-CLES : Emile Durkheim ; Etat ; Sociologie Politique ; Théorie Sociologique.
* * *
MAX WEBER: DE LA DEMOCRATIE PARLEMENTAIRE OU PLEBISCITAIRE?
Carlos Eduardo Sell
En ses derniers écrits politiques, Weber a examiné avec intensité les défis de l’Allemagne à ce
moment historique. En accompagnant la fin du II Empire et les premiers pas de la République de
Weimar, l’auteur a passé de la préférence pour un modèle parlementaire de démocratie à sa variante
plébiscitaire. Le présent travail reprend cette discussion et cherche à la situer dans le contexte de
l’évolution politique de la logique de Weber. Au même temps, on cherche à reconstruire l’argumentation
“weberienne”, en mettant l’accent sur le rôle que la thématique des institutions, de la démocratie et
de la rationalité occupe dans son évaluation des modèles parlementaire et plébiscitaire de la démocratie.
Dans la partie finale, le schéma précédent est repris pour suggérer un agenda théorique qui rend
évidentes les possibilités et l'actualité des problématiques, contenues dans la sociologie politique qui
émerge des écrits politiques et conjoncturels de Weber.
MOTS-CLES : Max Weber ; démocratie ; parlementarisme ; présidentialisme ; institutions ; rationalité.
* * *
LES POSITIONS ET DIVISIONS DANS LA SCIENCE POLITIQUE BRESILIENNE
CONTEMPORAINE : EXPLICATION DE SA PRODUCTION ACADEMIQUE
Fernando Baptista Leite
L’article est une étude préliminaire, exploratoire, de l’histoire de la Science Politique brésilienne.
Nous cherchons à fournir des éléments auxiliaires pour identifier les raisons historiques derrière les
deux principes de division de la production académique de la Science Politique contemporaine : le
continu théorique et le continu de politique et de société. Premièrement, nous présentons le schéma
théorique utilisé pour interpréter l’histoire de la Science Politique brésilienne. Nous profitons de cette
présentation pour discuter quelques questions théoriques importantes, spécialement d’ordre
conceptuelle. Deuxièmement, nous présentons l’hypothèse de recherche, construite à la lumière du
schéma, avec l’objectif de fournir une direction pour l’élaboration de l’explication historique. Enfin,
avec cet hypothèse dans les mains et en utilisant quelques évidences bibliographiques, nous anticipons
une interprétation provisoire. Cet interprétation est basée sur les axes suivants : le processus
d’institutionnalisation et le processus d’autonomisation du domaine de la Science Politique, divisé en
deux types ; l’autonomisation culturelle (de valeurs, théories, méthodes etc.), et l’institutionnelle (qui
fait référence au processus d’institutionnalisation de la discipline), qui impliquent un conflit plus ou
moins explicite entre des visions distinguées de science politique.
MOTS-CLES : Science Politique brésilienne ; histoire de la Science Politique ; intellectuels ; principes
de division ; visions de Science Politique.
* * *
L'ACCOUNTABILITY DANS DES LISTES OUVERTES
Luis Felipe Miguel
L'article discute critiquement la perception, courante dans les études sur le système électoral brésilien,
que la représentation proportionnelle avec des listes ouvertes, est un obstacle pour que l’accountability
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