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Tipos de intervenção verbal


do terapeuta

Fiorini, H. J. Teoria e técnica de psicoterapias.


Ed.: Francisco Alves - RJ, 1999.

Uma teoria das técnicas de psicoterapia requer uma con


ceituação de seus instrumentos, que está intimamente ligada a
uma concepção do processo terapêutico. As intervenções dos
terapeutas são instrumentos essenciais desse processo. Assim
sendo, é importante deter-se na discussão teórica dos funda-
mentos e alcances de cada um destes recursos técnicos. É im-
portante, sobretudo, clarificar o sentido do emprego de cada
uma destas intervenções e seu valor como agente de modifica-
ção. Para esta compreensão concorrem valiosamente toda a
vasta experiência clínica acumulada no campo das psicotera-
pias, certas contribuições teóricas e técnicas da psicanálise, a
teoria e as técnicas centralizadas na comunicação, teorias da
aprendizagem e conceitos provenientes da psiquiatria social e da
teoria das ideologias.
Um inventário de intervenções verbais do terapeuta que
são ferramentas nas psicoterapias inclui necessariamente as se-
guintes:
1 . Interrogar o paciente1, pedir-lhe dados precisos, am-
pliações e aclarações do relato. Explorar em detalhe
suas respostas.
2. Proporcionar informação.
3 . Confirmar ou retificar os conceitos do paciente sobre
sua situação.

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4 . Clarificar, reformuiat o relato do paciente, de modo guntar é continuamente consultar a consciència jia-Pacjente; é
a que certos conteúdos e relações do mesmo adquiram Também sondar a^limitagões e distorções dessa consciência; é,
maior relevo. ainda, transmitir um "estilo interrogativo", um modo de se co-
5 . Recapitular, resumir pontos essenciais surgidos no pro- locar frente aos fenômenos humanos com atitude investigadora.
cesso exploratório de cada sessão e do conjunto do Revela também um terapeuta não onipotente; isto é básico:
tratamento. na formulação de perguntas ao paciente e no emprego dos da-
6. Assinalar relações entre dados, seqüências, constela- dos por ele fornecidos, está contido um vínculo com papéis
ções significativas, capacidades manifestas e latentes do cujo desnível é atenuado, embora se tratem de papéis dife-
paciente. rentes.
7. Interpretar o significado dos comportamentos, moti- Ao pedir detalhes precisos sobre cada situação pode-se
vações e finalidades latentes, em particular os confli- transmitir, além do mais, um respeito do terapeuta pelo cará-
tuosos. ter estritamente singular da experiência do paciente, isto é,
8. Sugerir atitudes determinadas, mudanças a título de uma atitude não esquemática, que não sofre a tentação das ge-
experiência. ne ralizaçõesT^^ uma maneira de indagar sobre a
9. Indicar especificamente a realização de certos compor- perspectiva em que o paciente coloca sua situação: cada res-
tamentos com caráter de prescrição (intervenções di- posta às perguntas do terapeuta contém elementos (de con-
retivas). teúdo e forma) reveladores de uma mundovisão pessoal, com-
10. Dar enquadramento à tarefa. pletamente singular, da situação.
11. Meta-intervenções: comentar ou aclarar o significado Estas influências do perguntar nas psicoterapias merecem
de haver recorrido a qualquer das intervenções ante- ser destacadas, numa cultura profissional como a nossa, in-
riores. fluenciada marcadamente pela prática técnica da psicanálise,
12. Outras intervenções (cumprimentar, anunciar interrup- já que nesta última nem sempre é tão decisivo pedir detalhes
ções, variações ocasionais nos horários etc.) 2 . sobre as situações reais a que se alude em sessão, visto que
freqüentemente se procura construir um modelo de fantasia
Pelo fato de muitas destas intervenções se acharem histo- inconsciente vincular latente a partir dos conteúdos manifestos
ricamente ligadas ao desenvolvimento da técnica psicanalítica do relato. Neste caso, para abstrair o vínculo objetai contido
e de que esta aparece como a técnica psicoterapêutica com no relato, muitos detalhes podem ser tomados como acréscimos
maior respaldo teórico de base, torna-se importante para uma irrelevantes do manifesto. Nas psicoterapias, pelo , contrário, é
teoria geral das técnicas de psicoterapia deslindar as condições necessário trabalhar muito mais sobre as situações de realidade
de uma utilização técnica diferente destas intervenções, isto é, cio paciente, indagar a complexidade psicológica das mesmas,
compará-las com o sentido de sua utilização tradicional na psi- enredada precisamente em muitos detalhes e matizes reais da
canálise. Acho que isto pode contribuir para que se evitem ex- situação. Um exemplo: se na psicanálise um paciente começa
trapolações indevidas de uma técnica para as outras, permitin- a falar, em sessão, das brigas que tem com o pai por causa
do-se a estas últimas que construam suas próprias leis. do negócio em que ambos são sócios, negócio que o pai tende
a conduzir autoritariamente, é provável que estes elementos
bastem para que se comece a pensar na problemática da de-
1 pendência na transferência. Na psicoterapia ^dinâmica, por
Interrogar ejíemplQ, jmportará^ muitos dadosde realidããeJXZomo
foi que os dois se associaram, de quem foi a iniciativa, se
houve acordos prévios sobre a direção da empresa em comum,
É um dos recursos essenciais ao longo de todo.jQ_processp que perspectivas tem o paciente sobre seu futuro econômico,
terapêutico, não apenas em seu início. Em psicoterapia, per- a atividade se ajusta a seus interesses vocacionais, como encara

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sua esposa esta sociedade etc.? Cada um destes detalhes for- — "Imagine por um momento esle diálogo: ao contrário do que a
senhora acreditava, ele se decide casar, chega e lhe diz de supetão: 'Me
necerá elementos para enriquecer hipóteses que aspirem a dar decidi: vamos casar no fim do ano!' Que resposta a senhora lhe dá?"
conta de uma situação (mundo interno-mundo interpessoal em — "Vejamos: vem seu pai e lhe diz: 'Não vou te dar agora o
suas ações recíprocas) com seus complexos e variados matizes. dinheiro que te cabe, porque preciso dele para um negócio urgente'.
Como o senhor lhe responderia para que ele confirme, uma vez mais,
FRAGMENTO DE UMA SESSÃO DE PSICOTERAPIA que não tem por que pedir-lhe permissão para usar seu dinheiro?"

T: "Que valor teve para o senhor o fato de ela lhe telefonar antes Simplesmente perguntando, dramatizando ou não, o tera-
da viagem?" peuta põe em ação vários estímulos de müHãnçà: um7 primor-
P: "Um valor duvidoso, porque ela lhe telefonou quando já não
nos podíamos encontrar. De qualquer modo, gostei, não é?" dial, é quê exercita com" o paciente uma constante ampliação
T: "Como foi que o senhor lhe transmitiu seu interesse por ela?" do campo pereeptivo (reforçamento de uma das funções egói-
P: "Eu lhe disse: 'Que azar você não me ter encontrado ontem! cas básicas); e mais: toda explicitação Verbal recupera fatos,
Poderíamos ter marcado um encontro'." relações, que se achavam no mundo do implícito emocional.
T: "Para o senhor, isso dela, já que foi dito assim tão em cima Liberman (1) destacou, além disso, o papel reforçador do ego
da hora de partir, não expressava um compromisso profundo?"
P: "Claro, acho que para um compromisso maior não se espera que está contido na experiência de ouvir-se falar. Todo estímulo
dois meses para o momento de se despedir. Essas coisas me para a explicitação visa a romper as limitações e o encobrimen-
dão raiva." to presentes no uso cotidiano da linguagem convencional. Por
T: "Segundo o senhor havia comentado, ela em geral não é de exemplo: Que quer dizer: "fui apresentado a ele, e ele se mos-
expressar seu interesse pelos demais; espera que se interessem
por ela. Sendo assim, o fato de ela lhe telefonar não tinha um trou frio no trato"? Em que consiste a "frieza" dos outros para
valor especial?" cada um? Supõe-se uma observação não participante neste dis-
P: "Sim, encarado do ponto de vista de como ela é em geral, curso, porque qual foi o "calor" com que, em compensação,
pode-se dizer que me estava dando uma bola bárbara, mas contribuiu o sujeito? Na psicoterapia, é essencial passar dos
acontece que para o meu gosto o modo de agir tem que ser
diferente, nada de rodeios." dados iniciais da experiência subjetiva à análise minuciosa dás
T: "Que lhe disse o senhor ao se despedir? Como deixou colocada situações_ Toda situação levanta numerosas questões. Talvez
a coisa?" algo importante para o terapeuta seja compreender que não se
P: "Disse para ela: 'Olhe, gostei de me ter telefonado, mas espero trata de indagar para só depois operar terapeuticamente, mas
que quando voltar não esteja tão ocupada, ouviu? Tchau'." sim que a própria indagação já contém estímulos terapêuticos
de particular importância.
Como se pode ver, estas respostas revelam um estilo, o
funcionamento egóico do paciente para avaliar a situação inter-
pessoal, suas exigências dentro de uma ótica narcisista, a con-
tribuição do paciente com suas mensagens para uma situação 2
evitativa, embora arriscando algumas demonstrações de inte- Informar
resse pessoal pela outra pessoa. Perguntar aqui, e em detalhe,
permite então que se obtenha grande quantidade de informa-
ção, de níveis mais amplos que os de uma mera ampliação "de O terapeuta é não apenas um investigador do comporta-
detalhe" do conteúdo manifesto de um relato. As experiências mento, mas também o veículo de uma cultura humanista e psi-
sobre a utilidade de uma indagação minuciosa são abundantes. cológica. Sob este aspecto, o terapeuta cumpre uma função cul-
Assim sendo, é possível que "perguntar muito" seja uma das Jtural: é docente, dentro de uma perspectiva mais profunHu~e
primeiras regras de uma técnica psicoterapêutica eficiente abrangente de certos fatos humanos. Esta perspectiva é tam-
Uma variedade particular de exploração, sumamente rica, bém alimentada com informação] já que o déficit de informa-
é a que se apóia em intervenções dramatizadoras do terapeuta: ção é um componente às vezes tão importante para a obscuri-

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dade e a falsa consciência de uma situação como os escotomas paciente, de seus dinamismos intrapsíquicos e, no máximo, dos
criados pelos mecanismos repressivos individuais.
de seus pais. Não informar, em tais circunstâncias (omissão
Nas psicpiempias é aLtatjj&Qte pertinente»-aclarar para o técnica), constitui de fato um falseamento da ótica psicosso-
paciente elementos de higiene sexual, perspectivas da "cultura1 cial necessária para compreender os dinamismos psicológicos
adolescente atual, ou a problem^icã"social' da mulher. Também,
individuais e grupais (distorção ideológica).
"explicar-lhe (pode sér uui. inclusive, servir-se de esqtlBfflas)
certos aspectos da dinamica dos conflitos. Esta informação
pode ampliar-se pela recomendação de leituras. A experiência
mostra que a mensagem que"o paciente "retira dessas leituras, 3
sua experiência global frente à "bibliografia", é sumamente Confirmar ou retificar enunciados do paciente
rica para esclarecer conflitos de toda índole (conflitos com o
tema, com o saber, com o autor, com o terapeuta). Ecopor-
çionar ou facilitar esta informação geral que enquadra, a _pro- Este tipo de intervenções é inerente ao exercício de um
blemátiça do paciente desempenha um papel terapêutico espe- papel ativo do terapeuta nas psicoterapias. A retifiçaçãgjs&i-
cífico: cria uma perspectiva dentro da quâTos"problemas cio mite ressaltar os escotomas do discurso, as limitações, dQ-fiam-
paciente, com toda a sua singularidade, deixam de ser~vlstõr po da consciência e o papel das defesas desse estreitamento.
como algo estritamente individual que "só a : eíe'niSnÇêõèr~A Estas intervenções contribuem para enriquecer esse campo.
falta deste quadro de referência cultorãrfávorêcé^íõivSmen- É sumamente proveitoso observar em detalhe como o paciente
te, a sensação de ser o único com tais problemas, isto é, uma manipula a contribuição retificadora do terapeuta (assumin-
perspectiva ditada pelo superego (acusador, às vezes, também, do-a e usando-a, aceitando-a formalmente, ou negando-a e
a partir de seu complementar ideal do ego narcisista onipotente)' retornando a sua perspectiva anterior). A confirmação.pelo
Ao entrevistar famílias, por exemplo, verifiquei que é impor- terapeuta j t e uma. ^determinada jnaneira de compreender-se do
tante incluir referências sobre as dificuldades gerais que a fa- paciente- não é, certamente, um acontecimento de pouca im-
mília, enquanto instituição, enfrenta socialmente. Encaradas portância. Contribui para . consolidar nele uma confiança em
dentro desse quadro de referência, todas as dificuldades par- seus próprios recursos egóicos; isto significa que toda ocasião
ticulares do grupo tornam-se logo passíveis de abordagem, sem em"^ue õ terapeuta possa estar de acordo com a interpretação
o clima persecutório que é criado forçosamente pelo fato de do paciente ê oportuna para estimular seu potencial de cresci-
alguém ficar meramente ocupado vendo "o que acontece com jnento, Êm pedagogia, estas intervenções se destacam como
este grupo que vai mal" (com a suposição tácita de que todas essenciais para um princípio geral da aprendizagem: o reforço
as demais famílias funcionam bem, donde se conclui que os de desempenhos positivos.
problemas desta decorrerão exclusivamente dos defeitos de seus
indivíduos). A capacidade de o terapeuta atuar flexivelmente com re-
tificações e confirmações dos enunciados do paciente é fun-
Naturalmente, esta informação vem a ser sumamente rele- damental para criar um clima de equanimidade, próprio de
vante se a entendermos, também, como portadora de um ques- uma relação "madura" 3 . A falta desse clima de equanimidade
tionamento social das dificuldades criadas para indivíduos e parece refletir-se na queixa de muitos pacientes de que a ses-
grupos inseridos no conjunto do sistema. Ou seja, não_simp]es- são só serve para apontar seus defeitos e erros. Nestes casos,
fflgnte^saber"qae outros também têm dificuldades", mas esbo- sumamente freqüentes, creio que se assiste a uma ligação trans-
S^-ama.jijtej®retaç|o_ds_gue contradições exlsteiHeFénlre exi- ferencial-contratransferencial muito particular: o paciente, acos-
J®S<?l.al_fe--PQ5SÍWljdades dos grupos humanos slo móbílTzãdãs sado por suas auto-agressões superegóicas, encontra no tera-
pelas contradições da estrutura social vigente. Tratar a pro- peuta intervenções predominantemente retificadoras, acentua-
blemática psicológica sem esta perspectiva crítica é criar a doras do seu lado "enfermo", que encarnam o superego pro-
ilusão de que a enfermidade é assunto estritamente pessoal do
jetado, materializam-no. Com este papel contratransferencial

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assumido, fecha-se uma estrutura de vínculo infantil de depen- do terapeuta). O trabalho em cima de tais r e s p o s t a s é por
dência, tendente à inércia e não ao crescimento. isso, ocasião de elaborações imediatas sumamente produtivas..

RETIFICAÇÕES

— "A senhora destaca como seu marido estava mal-humorado, que 4


se mostrou pouco receptivo para o que a senhora lhe queria transmitir;
mas não menciona como a senhora se encontrava nesses momentos, Claríficações
como se aproximou dele, transmitindo o quê, e bem como se encon-
trava antes, no momento de sair."
— "Veja, não creio que somente tivesse sentido medo de se apro- Estasintervenções visam a conseguir desembaraçar o re-
ximar e medo de que a relação amorosa não íosse sair tão perfeita como lato emaranhado dop^dsotcL-a ,tim ^ . j m i á a i L j a L j l g j a s a i g s
da vez anterior: porque havia dados demonstrativos de que os dois
continuavam bastante ligados. Acho que sentia medo também de ir tão significativos do mesmo. Freqüentemente essa clarificação vem
rápido, em três dias, de tanta entrega de um para com o outro." por meio de uma reformulação sintética do relato. Depois~Hê*
— "O senhor parte da idéia básica de que uma conquista, como foi ouvir por vários minutos, o terapeuta diz:
esta promoção, tem que deixá-lo muito contente, porque era o que o
senhor desejava; não resta dúvida, mas, por outro lado, essa conquista
significa mudanças, deixar o que já tinha como próprio; indica também — "Então o senhor trabalhava confiante em que tudo ia bem, até
que o tempo passa e que o senhor já não é mais uma criança." que esta pessoa lhe fez uma crítica, e daí pra frente o senhor começou
a duvidar de tudo o que fez, e esta dúvida serviu de fato para alterar o
seu rendimento subseqüente."
CONFIRMAÇÕES
— "Nestes dias todos, durante a viagem, havia um clima de paz;
de repente, sem que o senhor saiba como, todo esse clima se desfez e
— "A senhora pensou que algo no seu comportamento desse dia voltaram a surgir desconfianças e censuras."
havia influído para que ele se fechasse; e é muito provável, porque
quase sempre as situações de incomunicação no casal se criam, sutil- ~ "O senhor fala agora não apenas de um problema afetivo den-
mente, pela ação recíproca de ambos. Parece-me importante que a tro da relação de casal, mas de uma dúvida sua, mais geral, sobre o
senhora tenha podido detectar também o seu lado do problema, porque, que o senhor pode dar de si também em outros planos, com seus amigos,
alertada para esta possibilidade, talvez consiga ir observando com maior no trabalho."
sutileza como é que os dois procedem para criar estes poços de inco-
municação."
Estas intervenções vão preparando o campo para uma
— "Acho que a senhora também percebeu que lhe dava medo con- penetração nos aspectos psicologicamente mais ricos e com-
tinuar a 'envolver-se' quando disse a ele que também tinha muita von-
tade de vê-lo logo, depois desligou o telefone, sentiu uma aflição no
preensívéis, o que se fará por meio de assinalamentos e in-
estômago e reparou que estava tensa. Acho que vai se conhecendo terpretações. Ao mesmo tempo, "ensinam" um modo de per-
melhor nesse medo que não julgava ter quanto às relações de casal." ceber a própria experiência: o paciente"aprende com elas a
— "Sim, certamente, além de deixá-lo feliz, esta mudança con- observar s i 3 ê S y a m i n Í g r ^ jtj^_JgQaãB5m5i-
tribuiu para os sentimentos de pesar que o invadiram na mesma hora
ém que recebeu a notícia. Estou de acordo com o senhor: até o fato de tos e de suas vivências e a fixar pontos marcantes, incorpo-
ganhar uma fortuna pode obrigar à perda de certas coisas.e trazer com rando, assim, um método que faz chegar à autocomjagfiasão
isso, paradoxalmente, uma certa tristeza."
pela discriminação. Êm pacientes com funções egóicas enfra-
quecidas, concomitantemente afetadas por uma delimitação
A resposta do paciente a estas confirmações é também precária do ego (ou seja, tendências ao sincretismo e à con-
rica em sugestões: é um índice do nível em que se registra o fusão), as claríficações desempenham, durante grande parte
acordo, ou mais maduro (aceitação d o próprio potencial de do processo terapêutico, o papel de instrumentos primordiais,
avaliação realista de suas circunstâncias), ou mais. infantil na medida em que assentam as premissas para que em algum
(confirmação de sentimentos de onipotência, ou, inversamen- momento outras intervenções, de tipo interpretativo, por exem-
te, negação da evidência de suas capacidades e refúgio nas
plo, possam ser ativamente elaboradas.
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5 de uma escada rolante). Sem se firmar em contínuas sínteses
Recapitulações provisórias, o processo de pensamento não avança. Perma-
nece estancado, sem trampolins, em uma zona difusa e ilimi-
tada de fragmentação "analítica", em segmentos cada vez me-
A certa altura da sessão, o terapeuta diz: nores. Sartre mostrou que a dialética do conhecimento opera
por meio de um movimento contínuo de totalização-destota-
— "Hoje, então, surge em primeiro lugar a circunstância de como lização-retotalizações, movimentos através do qual se visa a
o senhor sempre sofreu, passivamente, o domínio de sua mãe, não se
animou a explodir nunca, e isso deixou também no senhor um ressen- uma "autodefinição sintética progressiva". As recapitulações,
timento enorme consigo mesmo. Depois aparece esse seu modo de estar como as interpretações panorâmicas (diferenciadas das micros-
alerta frente a qualquer propósito de dominação por parte de sua esposa, cópicas), são instrumentos essenciais desse processo.
algo que o torna muito suscetível. E agora isto de o senhor não se
dedicar a si próprio, não se cuidar, não se interessar por sua roupa, Em um paciente com difusão da identidade (limites im-
nem reclamar o cargo que lhe cabe, como se se odiasse. Preste atenção
nestes três elementos que aparecem hoje porque deve haver entre eles precisos do ego) e enfraquecimento egóico numa etapa de
muitas ligações que abarcam sua família, seu casamento e seu trabalho." crise, o método de recapitulações contínuas (ao final de cada
sessão e em períodos de três ou quatro sessões) foi conside-
A certa altura do tratamento, o terapeuta diz: rado altamente proveitoso. Surgiu por proposta do paciente,
depois de haver notado que só conseguia pensar a partir dessas
— "Nos últimos três meses o senhor se havia concentrado no pro- recapitulações. No meu entender, estas intervenções ofereciam
blema que vinha tendo com os estudos. Enquanto isso, a situação sen-
timental ficava relegada a um segundo plano, como para não remoer um suporte provisório no qual se apoiavam, para exercitar-se,
tanta coisa ao mesmo tempo." seus recursos egóicos (percepção, reflexão, descobrimento de
— "Agora, aclarado o problema vocacional, 'está na vez' dos relações).
sentimentos e o senhor nestes últimos dias não faz outra coisa senão'
pensar na sua situação sentimental — e o faz com ênfase excessiva,
provocada pela espera."
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E em outro tratamento: Assinalamentos
— "Até agora, a maior parte do esforço que a senhora fez no tra-
tamento foi para começar a diferenciar quem era a senhora e quem era
a sua família (mamãe, papai, irmão) e dar-se conta de que não eram Estas intervenções, de uso constante nas psicoterapias,
uma só pessoa, nem um corpo único. Só agora entra no trabalho de atuam estimulando no paciente o desenvolvimento de uma
começar a ver, a descobrir o que a senhora pode fazer consigo mesma, nõvjT 'nwnêiíã"^~jgj^ber"^"ptópnã^"êxperiência."Tlecortam
o que pode sair da senhora que não venha deles, e sente-se confusa os elos de uma s e q ü ê n c i a r e c e b e u
porque está muito no início desta etapa."
essa notícia e, em seguida, sem saber por que, começou a se
sentir deprimida"), chamam a atenção sobre componentes
Tal como as clarificações, estas intervenções ^estimulam
significativos, dessa experiência habitualmente passados por
o desMv^ívImêntõ^de Ümã2c|gãci3ãa^dè""síntese. Em nosso
alto ("observe em que momento o senhor decidiu telefonar
meio, pôr uma questão de simples hipertrofia do írabalho "ana-
lítico", muitos terapeutas são levados a descuidar do mo- para ela: justamente quando já não tinham tempo para se
mento sintético, tão essencial como aquele e complementar encontrar"), iností^j^â^fâSL-iieculiarfiS™("já aconteceu vá-
do mesmo. Sempre que não sofra distorções, como quando a rias vezes surgir aqui o tema de suas relações sexuais e o se-
tomam por indutora de fechamentos estáticos, esta atividade nhor me diz que se faz um branco em sua mente e que já
de síntese é fundamental no processo terapêutico para pro- não é capaz de recordar mais nada").„£stei_^sinalamentos
duzir recortes"T' n TêcKã^n65s^R^^ríós'". (como os" degraus <^yiâãm.j_gm_aç»rdo básico sobre os dados a interpretar;,
criam oportunidades de modificar esses dados, são o traba-
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dificação: introduzjama r3CÍCltialidade.„possíve] onde até então
ího preliminar que assenta as bases para interpretar o sentido
havia dados soltos, desconexos, ilógicos ou contraditórios para
desses comportamentos. Nas psicoterapias, talvez se constitua
a lógica habitual. Propõe um modelo para j l . compreensão ...de
em uma regra técnica geral a conveniência de assinalar sempre,
antes de interpretar. O fundamento desta regra está em que o seqüências de fatos'rna..iní£a^Il^a.jb9gaJE9- ® freqüente in-
assinalamento estimula o paciente a sc interpretar a si pró- duzir também a passagem do nível dos fatos para o das sig-
prio com base nos elementos recortados, c um apelo à sua nificações e para a manipulação singular que o sujeito faz
capacidade de autocompreensão. É sumamente útil que esta dessas significações. Procura descobrir com o paciente o mun-
capacidade seja ensaiada insistentemente (treinamento refor- do de suas motivações e seus sistemas internos de transfor-
çador do ego) e em particular com o terapeuta, que pode mação das mesmas ("mecanismos internos" do indivíduo),
então ir guiando o desenvolvimento destas capacidades no ato assim como suas modalidades de expressão e os sistemas de
mesmo de seu exercício. Dado o caráter docente da relação interação que se estabelecem, dadas certas peculiaridades de
de aprendizagem que é a psicoterapia, é melhor que a tarefa suas mensagens ("mecanismos grupais").
possa ser desenvolvida pelo "aluno" sozinho, com poucas in- É importante recordar que toda interpretação é, do ponto
dicações; também porque muitas vezes o docente aprende de vista metodológico, uma hipótese. Sua verificação se cum-
com seu aluno. pre, por conseguinte, como um processo sempre., aberto e
mais terminável, com base no acúmulo de dados que sejam
compatíveis com o modelo teórico contido na hipótese e,
— " O senhor chega, encontra-a distante, de mau humor, o senhor
se mostra carinhoso, quer o carinho dela. Daí a pouco o mau humor fundamentalmente, pela ausência, com o correr do processo
passa, ela se aproxima e então o senhor a ataca. Que lhe parece este investigador instaurado na terapia, de dados que possam re-
vaivém, como o senhor o interpretaria?" futar aquela hipótese. Em princípio, nenhuma hipótese (até
— "Começou falando de seu fracasso de ontem na assembléia. De as interpretações mais básicas sõbrè ã prõBIemática individual
repente, cortou o que estava dizendo para lembrar-se de que obteve a de um paciente) é suscetível.,ds„yexificação definitiva que „a
nota mais alta de sua comissão. Como encara esta mudança de tema?"
dê como assentada na condição de saber acabado. Como em-
Nas respostas do paciente a cada um destes assinala- preendimento que visa ao conhecimento, nenhuma psicotera-
mentos revelam-se com grande nitidez sua capacidade de pia possui maiores garantias de "saber" que as que estabele-
insipht-. (aproximação ou distanciamento de seus dinamismos cem as limitações inerentes ao processo geral do conhecimento
humano. Esta consciência das limitações cognitivas da inter-
psicológicos), seus recursos intelectuais (aptidão para abstrair
pretação pode expressar-se de muitas maneiras na atitude do
e estabelecer relações versus adesão a um pensamento con-
terapeuta, na construção da interpretação, no seu modo de
creto), o papel dos mecanismos defensivos (inibições, nega-
emiti-la, maneiras que terão em comum o sinal de certa hu-
ções, racionalizações) ê à sTtu^ãõ~trãnsfêrencial (cooperação,
mildade. O tom de voz, a ênfase dada, as atitudes gestuais e
perseguição etc.). Cada assinalamento se transforma em um
posturais, se prestam para transmitir essa humildade que re-
verdadeiro teste global do momento que o paciente está atra- sulta da consciência de suas limitações, ou então o oposto: o
vessando no processo terapêutico. desempenho de um papel de autoridade que emite "verdades"
sem jaça. Neste último caso, o que se estará propondo e uti-
lizando é toda uma concepção estática do conhecimento, esti-
7 mulando-se uma relação terapêutica de dependência infantil
(adulto que sabe-criança que ignora), com o que a dis-
Interpretações torção do processo terapêutico é total. Em uma psicoterapia,
é essencial que o conhecimento seja vivido como uma práxis,
isto é, como a tarefa a ser realizada entre duas ou mais pes-
Especialmente nas psicoterapias de esclarecimento, a in-
soas que chegaram a um acordo numa relação de trabalho.
terpretação é um instrumento primordial como agente de mo-

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O caráterjbipolético-da-interpretado sultado, de modo que o senhor pôde, não só decidir, mas dar sua opinião
na c o r r u ç ã o de seu discurso. Formulações que destaquem seu sobre em que condições essa tarefa deveria ser cumprida. Veja só tudo o
êwf^'o5SdicíonaT ("Ê provável que.. .", "Temos que ver, que o senhor não sabia (não queria crer) que podia fazer por iniciativa
própria."
como uma possibilidade. se. ""l|m'a idéia, para nos munir-
mos de mais dados e verificar se é assim, seria que. . .", "Uma (EL) Tornar compreensível a conduta dos outros em função
visão possível_do pjroblema consiste em pensar q u e . . . " ) su-
dos novos comportamentos do paciente (ciclos de interação
blinham nitidamente~liquèTe caráter. Sua ausência tende visi-
velmente a obscurecê-lo. compreensíveis em termos comunicacionais).
As interpretações em psicoterapia devem cobrir um am- "Desta vez seu pai acedeu. Pensemos se não terá sido porque o
plo espectro: senhor colocou seu problema de outra maneira, com uma atitude mais
firme, talvez mais adulta, que ele o atendeu com um respeito diferente.
Com sua atitude, o senhor lhe estava dizendo 'não vou aceitar que me
/ O Proporcionar hipóteses sobre conflitos atuais na vida trate como uma criança, porque já não me sinto uma criança", e evi-
do paciente, isto é, sobre motivações e defesas. dentemente ele notou a mudança."

"Neste momento sua paralisia em relação ao estudo expressa pos- ^jÈ) Destacar as conseqüências que decorrerão de o pa-
sivelmente um duplo problema: não pode abandoná-lo porque o título ciente encontrar alternativas capazes de substituir estereótipos
é importante para o senhor e para a sua família; ao mesmo tempo,
evita dar qualquer novo passo porque isto significaria efetivamente pessoais ou grupais4.
diplomar-se e mudar de vida, ter que ir para a frente sozinho."
"Como reagiria seu namorado se a senhora lhe mostrasse que é
capaz de resolver um assunto pessoal sem consultá-lo? Continuaria com
Reconstruir determinadas constelações históricas sig- a mesma atitude dominante? Só v e n d o . . . "
nificativas (por exemplo, momentos marcantes na evolução
familiar).
Em contraste com a técnica psicanalítica, onde um de-
terminado tipo de interpretação (transferenciai) é privilegiado
" O que parece haver acontecido é que, naquele momento, quando como agente de modificação (2), nas psicoterapias, uma vez
seu pai se viu diante da empresa arruinada e se sentiu deprimido, o
senhor se achou na obrigação de adiar todos os projetos pessoais e que se trabalha simultânea ou alternativamente com vários
socorrê-lo; mas não registrou isso como uma decisão própria, e sim níveis e mecanismos de modificação, não existe qma hierar-
como imposição dele." quia para os tipos de interpretação: todos eles são instromen-
tos igualmente essenciais dentro do processo. Cada paciente
Explicitar situações transferenciais que pesem no pro- e cada momento de seu processo requererão particularmente
cesso.
certo tipo de interpretação; esse será o que melhor se ajuste
tecnicamente ao momento dado, mas toda distinção hierár-
" O senhor tem sofrido pela perda desta amizade, que tanto o quica que se atribua a algum tipo de interpretação será tran-
afetou. Teve então uma experiência dolorosa do que significa depender
muito de outra pessoa. Acho que esta experiência está pesando no se- sitória, conjuntural.
nhor, a ponto de torná-lo reticente aqui na sessão, e fazer com que
prefira não se entregar muito a mim. Está tomando também suas pre-
cauções para não vir a sofrer por causa de nossa separação daqui a 2
meses, quando passar para o grupo." 8
Sugestões
^d). Recuperar capacidades do paciente negadas ou não
cultivadas.
— "Seria interessante ver o que acontece, como seu pai reagiria,
se o senhor lhe mostrasse em sua atitude que está realmente disposto
"O senhor se viu, de repente, ante a obrigação de decidir o que a encarar a fundo com ele tudo o que está pendente entre ambos."
fazer com esse emprego. Seu pai estava ausente e não podia ser con-

166 159
— "Talvez o mais necessário para o senhor seria que se organizasse que foi vivido como do que pode vir a sê-lo. Um paciente
mentalmente, traçasse um quadro com suas prioridades."
— "Em vez de precipitar-se a tomar uma decisão que sinta como
experimentou assim essa proximidade:
sua de fato, talvez lhe convenha mais deter-se algum tempo em réver — "Outro dia estava envolvido numa discussão com minha mulher
o que aconteceu, verificar qual foi o seu papel em tudo isto, e, inclu-
sive, detectar melhor o que está sentindo intimamente." e naquele momento me lembrei de algo que o senhor me havia dito
numa sessão passada: 'E o que aconteceria se, quando ela ficasse vio-
lenta, o senhor a freasse?' Fiz isso na mesma h o r a . . . e não aconteceu
Com^estas intervenções n ífrapfiuta propõ-S—3Q__^ciente nada!"
çon^íB-Stemiatiia^ para...ensaiar experiências ori-
ginais, Mas o sentido de tais intervenções não e meramente As sugestões em psicoterapia geralmente (exceto em si-
o de promover a ação em direções diferentes, e sim o de pro- tuações agudas de crise) vêm inserir-se em desenvolvimentos
porcionar insights a partir de ângulos novos. Fundamental- do processo terapêutico com base nos demais tipos de inter-
mente, contêm um pensamento que antecipa a ação (aspecto venção. São oportunas quando as condições do paciente para
relevante dentro do conjunto de funções egóicas a exercitar em assumi-las (redução de ansiedade a níveis toleráveis, fortale-
todo tratamento), que facilita uma compreensão prévia à cimento egóico) e as do vínculo interpessoal em funcionamen-
ação. A ação ulterior, caso chegue a ser experimentada, po- to chegaram a um momento de sua evolução que as torne
derá dar ocasião a confirmações, reajustamentos ou amplia- "fecundas", receptivas para esse tipo de estímulo. O terapeuta
ções do insight prévio. Muito freqüentemente fornecerá novos deverá detectar, inclusive, um momento dessas condições e
dados e com eles uma nova problemática a investigar. Com do desenvolvimento do vínculo em que "faça falta" uma ex-
a compreensão destas fases do processo que se inicia por uma periência diferente, nova, para que muito do que foi esclare-
sugestão, este tipo de intervenção adquire uma eficácia parti- cido se cristalize em ato. A sugestão recorre, indubitavelmen-
cularmente interessante. te, com a dramatização, ao papel revelador do ato, à riqueza
vivencial do fato, de que muitas vezes carece o discurso re-
ymJj£o__dfi_^ügesiões Xquasczsugestõ^^-seL^páia-acuüSo
flexivo.
de dramatizações iinaginájias de.„ .outras alternativas para o
comportamento interpessoal:

— "Que teria acontecido se nessa hora a senhora o interrompesse


e dissesse: 'Escute aqui, não me venha com indiretas, o que é que você
9
está querendo me dizer com tudo isto, afinal o que é que você sente Intervenções diretivas
por mim?' "
— "Suspenda toda decisão imediata sobre o problema de seu casa-
Ou então: mento. O senhor agora não se encontra em condições de enfrentar mais
uma mudança."
— "E se a senhora telefonasse para ele e dissesse: 'Tudo o que — "Se surgir uma oportunidade de o senhor falar a sós com seu
você me falou ontem me pareceu meio estudado e ficou meio no ar. pai, tente fazê-lo; ainda que não consiga dizer tudo o que gostaria de
Quero isto mais definido', como acha que ele reagiria?" colocar diante dele, veja até onde consegue chegar, de que modo o
consegue e qual a reação dele."
— "Até nossa próxima entrevista, procure observar atentamente,
Este tipo de intervençõesj^§titui um caminho diferente na relação com sua esposa, quantas vezes e em que momentos o senhor
para o /njJg7r sobTr ay;;próprÍas dificuldades, sobre asdificüf!- tende a se mostrar violento e exigente."
dades iiQ outro.e, soSSja.. ffinâmjcajla comunicação" entre •am- — "Para que o senhor perceba melhor qual é a sua dificuldade no
bos^ Opera fazendo ressaltar contrastes entre o vivo e o pos- diálogo comigo, traga o gravador; assim, depois o senhor ouvirá tudo
sível, e estes contrastes não são comentados em um discurso sozinho em casa e examinaremos o fato juntos nas sessões seguintes."
de "idéias", e sim mostrados graças a uma linguagem de ação. As diretivas que surgem em psicoterapia referem-se, como
Contêm uma compreensão que fica muito próxima tanto do
se vê nestes exemplos, tanto a necessidades próprias do pro-
169 159
cesso terapêutico como a atitudes-chave a serem evitadas ou Outro nível de atuação está no insight que se pode obter
ensaiadas fora da relação terapeuta-paciente. depois da ação. Fazer ou não fazer algo que resultava "na-
Uma cultura psicoterapêutica de forte influência psicana- tural" transforma-se em uma experiência original. Uma aná-
lítica (que atribui valor preferencial à aquisição de atitudes lise do sentido de uma atitude anterior ou da nova (induzida),
novas posteriores a um insight, tende, com freqüência, a ques- sua comparação minuciosa, servem de ocasião para uma ela-
tionar a validez e a utilidade das intervenções diretivas. Todos boração freqüentemente rica. A experiência clínica mostra
os que sofremos as pressões dessa influência (o superego ana- fartamente que, em psicoterapias, diretividade e insight não
lítico) tivemos que passar por um longo processo de luta para são em princípio antagônicos. Muitas vezes, pelo contrário,
descobrir na prática clínica que tais intervenções, empregadas funcionam como complementares. As dificuldades que o pa-
no momento certo e com tato terapêutico, eram instrumentos ciente teve para trazer seu gravador e em seguida escutar sua
valiosos e necessários em todo processo psicoterapêutico. (Foi
sessão foram claramente ilustrativas. Tiveram o valor do vi-
a consciência de sua necessidade e a experiência de sua utili-
vido, do ato, submetido às condições de uma observação par-
dade que nos levaram claramente a inverter tal ponto de vista:
questionável é a não-uíilização deste tipo de intervenções em ticularmente atenta.
situações que claramente as requerem; já discutiremos como Jay Haley (3) forneceu ilustrações sobre o uso de um
caracterizar tais situações 5 .) tipo particular de intervenções diretivas cujo propósito con-
siste em produzir "manobras comunicacionais" (por exemplo:
Antes, convém analisar de que maneira podem ser com- prescrição do sintoma, destinada a criar situações paradoxais
preendidas as influências exercidas pelas intervenções diretivas. no uso interpessoal do sintoma e na luta pelo controle da rela-
Há um nível de ação no plano do ato em si mesmo, a que se ção paciente-terapeuta).
refere o conteúdo da intervenção. Se o ato pode ter as con-
Que situações tornam necessária uma intervenção direti-
seqüências de uma decisão importante, a intervenção tem
va do terapeuta? Em especial todas aquelas em que o paciente
condições de desempenhar um papel preventivo, valorizável
não em termos de dinamismos (pensando muito seletivamente (e/ou o grupo) se^ eMontreln ^em os indispensáveis recursos
na transferência, pensa-se facilmente em "não fazer o jogo das egóicos (isto é, sem os mecanismos adaptativos em força e
exigências regressivas", por exemplo), mas sim em termos de diversidade suficientes) p/ura manejar uma situação traumática
existência. Justamente o vício das oposições "psicanalíticas" sendo em geral vítimas de uma ansiedade excessiva, que tende
ao uso em psicoterapias de intervenções diretivas consiste em a ser em si mesma invalidante ou agravante das dificuldades
dar mais valor a óticas parciais (dinamismos transferenciais, próprias da situação (situações de crises súbitas em pessõás
riscos contratransferenciais) do que a uma ótica centralizada ou grupos de moderado ajustamento prévio; mudanças evolu-
na existência. Esta ótica, no entanto, leva em conta e mesmo tivas "normais" em personalidades ou grupos que gozam de
confere tratamento privilegiado ao plano das experiências um equilíbrio precário, com carência, ou tendência à perda,
concretas e das conseqüências concretas que decorrem dessas de autonomia; psicoses agudas; deterioramentos de origem di-
experiências: considera-se importante, por exemplo, que a versa). Em todos estes casos (situados nos momentos de de-
decisão precipitada de consumar um divórcio, quando não há sorganização ou em fases regressivas de uma evolução), sem
condições para que ele seja tolerado satisfatoriamente, possa dúvida muito freqüentes na prática terapêutica, determinadas
ser adiada. intervenções diretivas são estritamente indicadas, constituem a
intervenção técnica cuja escolha se impõe. Até quando? Até
Este plano de existência é importante, mas não é o o preciso instante em que o paciente recupera ou adquire re-
único em jogo quando são emitidas diretivas. Outro é o das cursos egóicos necessários para obter autonomia e capacidade
aprendizagens. É possível pensar que o que se produz ou se de elaboração (momento de progressão), passando então as
evita nessa oportunidade deixa "um saldo interno", incorpo-
intervenções diretivas a serem contraproducentes (em sua
ra-se como experiência transferível para outros contextos. A
qualidade de estimulantes do vínculo regressivo com o tera-
experiência clínica repetidamente dá mostras disso.
peuta) e requerendo comumente sua substituição por outras,

171 159
orientadas no sentido de esclarecer, as quais se tornam nesse
momento especialmente recomendáveis. É importante ter em situação de consulta, há tão-somente uma única maneira efi-
conta que este movimento nos recursos egóicos do paciente caz de tratamento. Em primeiro lugar, a pluralidade de dire-
(muitas vezes inversamente proporcionais ao montante de an- ções abertas atualmente no campo das psicoterapias torna
siedade) possui ritmos variados, podendo ocorrer de uma cada vez mais duvidosa a validez de semelhante exclusivismo.
semana para a seguinte, de um mês para o seguinte, ou de Além do mais, a pressão exercida para se impor uma determi-
um instante para outro na mesma sessão. Frente a esta mo- nada técnica parte de uma distorção na concepção do su-
bilidade, que requer do terapeuta uma combinação ágil de jeito a que se destina a psicoterapia, já que se dirige a um
intervenções, atenta às flutuações daquelas capacidades, qual paciente-objeto, mero portador de uma enfermidade ou de
poderia ser o sentido de certos "estilos" psicoterapêuticos es- uma estrutura de personalidade que seriam o mais imporlante
tereotipados, que dirigem sempre, ou não dirigem nunca, o pa- (de acordo com o modelo médico para o qual a hepatite é
ciente? Que fundamentos teóricos e técnicos poderão encon- muito mais realçada do que a pessoa que sofre da afecção
trar semelhantes posições de "escola" em psicoterapia? Não hepática). De nenhum modo, por este caminho, demonstra-
estou pensando, com isto, que faltem justificações à opção se reconhecer no paciente uma pessoa. Finalmente, e também
técnica, na psicanálise, de o analista evitar emitir diretivas em termos técnicos, o trabalho conjunto de elaboração do en-
diretas (as únicas, de resto, que ele pode evitar, porque indi- quadramento a ser adotado constitui, na experiência clínica,
retamente toda intervenção dirige o paciente) 6 . O que carece uma instância muito mais rica, do ponto de vista dos dados
de justificação é estender ao campo mais amplo das psicote- que fornece sobre a problemática do paciente. Muitos desses da-
rapias em geral o princípio de evitar-dar-diretivas, como regra dos ficam obscurecidos quando ele é submetido a um enquadra-
universal, e pretender respaldar essa posição nos fundamentos mento imposto. Se o que se pretenae é cultivar as tendências pas-
teórico-técnicos que apoiam o mesmo ponto de vista no con- sivas e regressivas do paciente e a correlata onipotência do
texto do processo psicanalítico. terapeuta, não há dúvida de que a imposição do enquadra-
mento será o método mais indicado. Em caso contrário, terão
que ser emitidas sugestões de enquadramento, explicitados os
fundamentos da proposta para essa terapia em particular e
10 submetê-los a reajustes.
Operações de enquadramento

Eslas-intencencQ&s. abxangem-iQdas as especificações rgla- 11


tivas à modalidade espacial e temporal que deverá assumir a Meta-intervenções*1
r
5ÍâSâ2.JtêiapSiiíisa: local das sessões, posição enTque~'fIcãm
colocados os participantes um em relação ao outro, duração
e Designamos com este termo, todas aquelas intervenções, do
freqüência das sessões, ausências, honorários.
terapeuta cujo oJ»jetõ_sãp_^^ Podem
Uma distinção importante a ser feita é aquela entre as ' visar a aclarar o significadode determinada intervenção ter
x x ^ r y m ^ ^ ^ c ^ é s t a b e l e c e m u m enquadramento, .e outras.,em
sido feita nesse momento da sessão ou nessa etapa do trata-
que se propõe" lim enquadramento a ser reajustado e elaborado mento.
conjuntamente com o paciente. Por esta diferença passa uma
linha divisória ideológica: a relação terapêutica concebida Exemplos:
como autoritária ou como igualitária. O autoritarismo do en-
quadramento imposto costuma apoiar-se em pressupostos de a. Terapeuta: "De que maneira o senhor deu a entender a ela que
tipo técnico pelos quais se pretende que, para determinada desejava' vê-la?"
Paciente: . . . (gesto de desconcerto, fica em silêncio)...
157 173
Terapeuta (meta-intervenção): "Sabe por que lhe pergunto isto?" — "Quando assinalo para o senhor que pode haver uma atitude
Paciente: " N ã o . . . " (silêncio) sua de autopunição no fato de perder o capital que conseguira juntar
Terapeuta: "Porque, tempos atrás, víramos que havia no senhor com tanto esforço, esta minha colocação parte de um pressuposto que
duas maneiras de expressar interesse; às vezes com gestos de desejar também precisa ser questionado: o de que perder um capital acumulado
o encontro, outras com certa rejeição encoberta, um tanto distante."
não é um acontecimento benéfico. Mas, vendo-se a coisa por outro
b. Terapeuta: "Inclino-me a pensar que o fator determinante aí era ângulo, considerando-se o que o dinheiro representa, como ele amarra
o seu medo de aclarar mais a situação." as pessoas, talvez se possa encarar a sua conservação como algo pre
Paciente: (silêncio) ... judicial e não positivo."
Terapeuta: "Sabe por que penso assim? Acho que há Indicações
claras de que ele parecia disposto a querer falar, não tinha vindo Estas especificações tornam-se imprescindíveis, na medida
'fechado', mas a senhora, mesmo assim, disse a si própria: 'certa-
mente não vai querer me. ouvir'." em que abrem a busca também a outro plano de determina-
ções inconscientes, colocando em questão a v i4eologia de am-
Nestes casos, a segunda intervenção serve para precisar b o s — a do terapeuta também. O terapeuta põe-se em evi-
os fundamentos da primeira, de um modo tal que seja possível dência em sua realidade questionável, suscetível de exame
ao paciente acompanhar de perto o método de compreensão crítico em suas premissas, com um ofício que também está
utilizado pelo terapeuta na primeira. Esta aclaracão.-sobte-~a sujeito à revisão. E outro modo de colocar o vínculo tera-
própria intervenção é fundamental,já que a aprendizagem es- pêutico em relações de reciprocidade, evitando o efeito sub-
sencial está nos métodos .nQ&..çr0íEtt08. Uma reptício de doutrinação que é próprio das relações autoritá-
variante de meta-intervenção pode ser o questionamento pelo rias nas quais o terapeuta apresenta suas opiniões como cons-
terapeuta de sua própria intervenção, assinalando o caráter tituindo o "saber", sublinhando a presença da ideologia na
parcial de seus fundamentos, ou o caráter ainda hipotético de base de suas elaborações.
alguma de suas premissas. E uma terceira variante consiste
na explicitação pelo terapeuta da ideologia subjacente a alguns
pressupostos de sua própria intervenção. Uma visão de conjunto deste amplo espectro
— "Veja bem, até agora tomamos como problema sua dificuldade de intervenções
para chegar ao orgasmo na relação sexual. Isto deve ser encarado, por
sua vez, com precauções, porque há toda uma série de reformulações
sexológicas e ideológicas sobre o orgasmo feminino que poderia mostrar
Se refletirmos sobre esta série de intervenções técnicas
alguma de nossas premissas como sendo em si mesma questionável." (que constituem boa parte da "caixa de ferramentas" do te-
— "Há pouco eu lhe assinalava que a senhora agira nessa situa- rapeuta), um primeiro aspecto que ressalta é a amplitude de
ção lançando-se nela sem ter uma idéia precisa de para onde ela a seu espectro. Esta amplitude abarca a variada gama de pos-
iria conduzir. Por sua vez, não está livre de objeções o pressuposto — sibilidades abertas, no trabalho de cada sessão, onde o tera-
que se poderia ver por trás deste modo de encarar sua reação — de peuta vai encontrar, muitas vezes pelo método de tentativa
que sempre, antes de lançar-se à ação, é preciso ter in mente um
plano, não é mesmo? (pois há situações em que só há condições de se e erro, aquelas que são as mais necessárias, as> que abrem
armar um plano depois de vivida uma experiência)." caminho para uma penetração maior. Suas combinações são
— "Momentos atrás eu estava falando de quais os problemas seus infinitas, como no xadrez, e cada sessão, como cada partida,
e os de seu marido que podem criar dificuldades para a convivência. configura o perfil singular de uma constelação de intervenções
Mas não devemos supor que estas dificuldades contrastem com o mo-
delo de um casal ideal possível, fi preciso que fique bem claro que, próprias.
atualmente, além destes problemas de cada um, há que ver quais os O segundo aspecto a destacar é que, dada esta variedade
problemas criados para qualquer casal pelo tipo de relação que se
considera como ideal de casal normal em nossa cultura, e quais os de intervenções, não há uma hierarquia no conjunto que per-
problemas que ainda se acrescentam a esses pelas dificuldades que cada mita distinguir algumas como sendo mais importantes do que
um vive fora da situação de casal e que terminam sendo descarregadas outras para o processo psicoterapêutico. Nisto se assinala uma
dentro de tal situação." diferença básica em relação à teoria da técnica psicanalítica,

175 159
foram utilizadas mais intervenções aclaradoras do que inter-
que confere valor supremo à interpretação como intervenção pretações (estas aumentaram, proporcionalmente, apenas nas
decisiva para produzir a modificação específica característica 4 :i e 7? sessões, fato que Strupp interpretou como produto dos
do processo analítico. Esta diferença entre psicanálise e psico- aclaramentos preparatórios das sessões anteriores);' foi em-
terapias em geral foi claramente formulada por Bibring ( 2 ) : pático. benevolente, caloroso; as intervenções mantiveram-se
"a psicanálise está construída em torno da interpretaçãocomo mais freqüentemente em vim nível inferencial baixo ("próximo
agénfé süpremõ n a h i e r ãTqüiá de princípios terapêuticos ca- à superfície") e, secundariamente, moderado; houve fartos co-
racterísticos do processõTliõ sentido de que todp<; os pntrns mentários sobre o vínculo terapêutico estabelecido, mas es-
princípios estão a ele subordinados,.Jstojj^sjio _ utilizados com cassas interpretações transferenciais; predominou uma aceita-
o "propósito constante de-tomat~ajnísmtetacaa possível e efi- ção das formulações do paciente no tocante ao plano em que
caz. Ao passo que a psicoterapia dinâmica está construídã"em localizava sua problemática; o terapeuta atuou sempre com
torno de diferentes seleções e combinações de cinco princípios iniciativa (e não com passividade); realizou intervenções
fórápgíi^ícos; " í E ü ^ g n g ^ g g 8 ^ 0 ' manipulação. clarificação e mínimas freqüentes, destinadas a manter aberto o canal de
interpretação" 7 . Éu acrescentaria que os princípios"enunciados comunicação e a dar mostras ao paciente de que o escutava
por Bibring em 1954 podem hoje ampliar-se, incluindo outros com atenção, ou seja: exatamente o oposto de um terapeuta
princípios terapêuticos: objetivação e auto-afirmação pelo ato
dg__ veifoalização_n3fo jnèramCT^^^ intormacãõ. expè-~ distanciado.
riência emocionai corretiva não simplesmente sugestiva, entre Este trabalho constitui, a meu ver, um bom exemplo do
outros. Não obstante, aquela enumeração define uma peculia- caminho aberto pelo esforço de definir operacionalmente o
ridade teórico-técníca das psicoterapias: o nivelamento hie- repertório de comportamentos do terapeuta.
rárquico de seus diferentes recursos terapêuticos.
Por fim, a possibilidade de se distinguir com precisão os
diferentes tipos de intervenção terapêutica abre um caminho Notas
para a investigação microscópica das técnicas. Se é possível
classificar e quantificar os comportamentos do terapeuta, o 1
Em todas as considerações deste capítulo, o "paciente" pode sei
mito das terapias como "arte" intuitiva, inteiramente pessoal uma pessoa, um casal, um grupo familiar ou outro tipo de grupos
e dificilmente transmissível, pode começar a se desvanecer.
de amplitude variável.
A descrição macroscópica, global, das experiências terapêuti- 2
Este estudo se concentra no conteúdo verbal das intervenções do
cas, forma tradicional da transmissão neste campo, não con- lerapeuta. Outros, complementares deste enfoque, devem estender-se a
tribuiu muito para desacreditar o mito. Os trabalhos de suas intervenções corporais (gestos, posturas, olhares) e paraverbais
Strupp (5), em compensação, destinados à análise micros- (a mímica verbal; variações no tom de voz, na intensidade e no ritmo
cópia das técnicas de psicoterapia, iniciaram, já há 15 anos, da falta, estilo comutiicacional)(l).
3
com seriedade metodológica, uma tarefa promissora no sentido Um paciente de 33 anos, depois de quatro anos de tratamento,
de aclarar "o mistério" das técnicas. passou a outro terapeuta. Decorrido pouco tempo, o terapeuta lhe
disse em uma sessão: "Acho que sua interpretação é mais acertada d o
Com um sistema de várias categorias, que permitem rea-
que a minha. Eu não havia levado em conta isto que o senhor m e
lizar uma análise multidimensional das operações do terapeuta lembrou sobre o papel de sua irmã na relação entre o senhor e seu
(tipo de intervenção, iniciativa do terapeuta, nível inferencial, pai." "Senti então — conta o paciente — uma emoção única, senti-me
foco dinâmico e clima afetivo) aplicada ao estudo de uma psi- tratado como adulto e respeitado como pessoa."
coterapia breve (realizada em oito sessões por L. Wolberg), * O poder de sugestão de u m a intervenção deste tipo pode variar
Strupp (5) conseguiu oferecer um panorama bastante ilustra- conforme o tom de que se sirva o terapeuta: uma determinada acen-
tivo da técnica empregada: o terapeuta dedicou grande parte tuação da frase sublinhará a utilidade da ação, ao passo que outra fará
de suas intervenções à exploração, perguntando, pedindo am- ressaltar o interesse em compreender o que aconteceria, deixando o fato
em si num plano de menor importância.
pliações e exemplos; foi bastante diretivo em todas as sessões;
177
157
B
A "cultura" assentada tradicionalmente na técnica psicanalitica
conferiu situação privilegiada à seqüência: insight que conduz a ações
11
novas. A experiência clínica na utilização de outras psicoterapias permite
detectar também a possibilidade • de um caminho inverso: a ação nova
(ensaiada, imaginada, evitada) que conduz ao insight. O projeto de cer-
tos comportamentos a realizar (realização depois conseguida ou frus-
trada, isto não é decisivo) instala um campo quase "experimental"
Considerações teóricas e técnicas
para a observação, pelo recortamento que produz desse projeto e das
respostas frente ao mesmo.
sobre material de sessões
8
E isto, trabalhando com pacientes de suficiente força egóica, um
dos critérios essenciais de analisabilidade.
7
Por não fazerem claramente esta distinção, há por vezes psico-
terapeutas de formação psicanalitica insatisfeitos com aquelas sessões
em que não conseguem "interpretar", frustração que freqüentemente
contrasta com a experiência vivida por seus pacientes, os quais, não
afetados por preconceitos técnicos, sentem que realizaram nessas sessões
uma tarefa efetivamente produtiva.

Nota do revisor

O propósito deste capítulo é discutir, com base em ma-


• l A partir da Lógica, distinguem-se dois níveis de linguagem: a terial transcrito de sessões (gravadas com autorização do pa-
linguagem-objeto, que fala de objetos, e a metalinguagem, que toma por ciente), a aplicabilidade de alguns dos conceitos teóricos e
objeto a anterior e da qual podemos aproximar a categoria de meta-
intervenção. A função metalingüística que, segundo Jakobson ("Lin- técnicos que foram expostos em capítulos anteriores; traços
güística e poética", in Lingüística e comunicação, São Paulo,. Cultrix, peculiares da técnica de esclarecimento, da relação de traba-
1970), ocorre "sempre que o remetente e/ou destinatário têm necessi- lho, o manejo do foco, a ação recíproca de funções egóicas,
dade de verificai se estão usando o mesmo código", focalizando, por tipos de intervenção verbal do terapeuta, modificações que po-
esta razão, o próprio código, também pode ser aproximada, com maior
precisão, da meta-intervenção de Fiorini. dem ser atribuídas ao processo terapêutico. Nossa indagação
em psicoterapia percorreu amiúde o caminho inverso: foi a
partir do estudo de materiais clínicos que se foi esboçando a
possibilidade de elaborar aqueles conceitos teóricos.
Bibliografia
O tratamento a considerar é o de Ernesto, um paciente
de 30 anos cuja problemática inicial está consignada no ca-
(1) Liberman, David, Lingüística, interacción comunicativa y pro- pítulo que dedicamos ao conceito de foco. Comentarei aspec-
ceso psicoanalítico, vol. 1, Galerna, Buenos Airss, 1970. tos salientes do processo em uma sessão do quinto mês de
(2) Wallerstein, Robert, "La relación entre el psicoanálisis y la
psicoterapia. Problemas actuales", Rev. de Psicoanálisis, vol. XXVIII, tratamento e em outra do décimo mês. Antes de transcrever
1971, PP- 25-49. o material do quinto mês, devo fazer alguns comentários so-
f t ) Haley, Jay, Estratégias en psicoterapia, Toray, Barcelona. bre o processo nesses primeiros meses. O momento inicial se
(4) Strupp, Hans, "A multidimensional system for analyzing definia pela separação recente de sua mulher, provocando-lhe
psychotherapeutic techniques", Psychiatry, XX, 4, 1957, PP- 293-306.
(5) Strupp, Hans, "A multidimensional analysis of technique m
intensa angústia e depressão, com diminuição de seu rendi-
brief psychoterapy", Psychiatry, XX, 1957, PP-387-397. mento no trabalho, ao mesmo tempo que tornava mais agudo
o vínculo conflituoso com sua mãe, por haver tido que voltar
a conviver com ela. Durante os três primeiros meses, com a

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