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Sob o ponto de vista mais central da realidade humana, seria possível definir o
homem como um ser que fala e não como um ser que escreve. Entretanto, isto
não significa que a oralidade seja superior à escrita, nem traduz a convicção,
hoje tão generalizada quanto equivocada, de que a escrita é derivada e a fala é
primária. A escrita não pode ser tida como uma representação da fala.
Marcuschi (2010, p. 17).
Marcuschi, afirma que o ser humano pode ser delineado “como um ser que fala e
não como um ser que escreve”. Esse processo leva-nos a entender que os seres humanos
nascem com uma capacidade de dotações motoras e cognitivas que vão se alargando com
o passar dos dias, a fala é uma dessas competências, enquanto recém-nascidos nos
comunicamos através do choro e sorriso, e com o tempo vamos enriquecendo os
conhecimentos e desenvolvendo a linguagem oral, nesse sentido Marcuschi (2010)
ressalta que:
Assim, entendemos que a verbalização da fala pode ser desenvolvida, sendo essa
emissão de som uma forma de expressar algo que sentimos.
Na modernidade a comunicação através da oralidade passou por um processo de
desenvolvimento lento que foi se aperfeiçoando ao longo dos tempos, juntamente com a
evolução humana. Na escrita o percurso é diferente, estudos mostram que ela surge cerca
de 5.500 anos atrás, nesse sentido somos condicionados a entender que a fala é primaria
na existência humana. Embora a língua falada seja a inicial, conforme observação de
Marcuschi (2010) ela não pode ser considerada superior à língua escrita ou que a escrita
é oriunda da fala. Sendo ambas, uma forma de representação do sistema linguístico.
Koch (2005) traz uma tabela onde apresenta características da fala e escrita
criticando a divisão existente entre ambas.
Quadro 1- Características da fala e escrita
Fala Escrita
Contextualizada Descontextualizada
Implícita Explícita
Redundante Condensada
Incompleta Completa
Contextualizada Descontextualizada
Dependente Autônoma
Implícita Explicita
Redundante Condensada
Imprecisa Precisa
Fragmentária Completa
Neste quadro apresentado por Marcuschi serve para reafirmar o que Koch pontua,
ambos concordam que as descrições atribuídas à língua são passíveis de questionamento.
Nesse campo que faz referência à dicotomia da língua escrita e língua oral. Crystal (1995)
aponta as semelhanças e as divergências entre ambas, ressaltando que:
O autor afirma que em função da era digital, onde as interações da escrita tornaram
se globalizadas não há uma nitidez quanto à diferenciação entre a fala e a escrita.
Para Marcuschi (2010) além do quadro que ele apresenta, ainda destaca que dentro
dessa vertente que procede a divisão entre a fala e a escrita temos que destacar que
algumas tendências são relevantes, dentre essas temos, o culturalismo, as variedades
linguísticas e as sociointeracionistas. Ainda discorre que ao analisar essas propensões
podemos visualizar que não é possível afirmar que há um acordo de associação entre essas
duas modalidades, em virtude das complexidades que compreendem entre a fala e a
escrita.
(...) e fala/escrita não é referir-se a algo consensual nem mesmo como objeto
de análise. Trata-se de fenômenos de fala e escrita enquanto relação entre fatos
linguísticos (relação fala-escrita) e enquanto relação entre práticas sociais
(oralidade versus letramento). As relações entre fala e escrita não são óbvias
nem lineares, pois elas refletem um constante dinamismo fundado no
continuum que se manifesta entre essas duas modalidades de uso da língua.
(MARCUSCHI, 2010, p. 34)
Com essa definição, o autor procura mostrar que por meio dessas práticas de
linguagem, que determina a função e o espaço, bem como a relevância em que cada
modalidade exerce. Nesse sentido não pode ser definido a fala e escrita como uma distinta
da outra, mas sim, elas podem ser consideradas uma pratica de um “continuum sócio-
histórico”. Podemos observar que para o autor, à fala é “uma forma de produção textual-
discursiva para fins comunicativos na modalidade oral” enquanto que a escrita “produção
textual-discursiva para fins comunicativos com certas especificidades materiais e se
caracterizaria por sua constituição grafia” (Marcuschi, 2010, p.26).
costuma-se olhar a língua falada através das lentes de uma gramática projetada
para a escrita, o que levou a uma visão preconceituosa da fala (descontínua,
pouco organizada, rudimentar, sem qualquer planejamento), que chegou a ser
comparada à linguagem rústica das sociedades primitivas ou à das crianças em
fase de aquisição de linguagem. (Koch, 1997, p. 32).
Com base na visão da autora, podemos ressaltar que ambas as modalidades possui
suas aptidões, mas não há uma característica que pode ser considerada exclusivamente só
da língua falada ou da língua escrita, para Marcushi “as línguas se fundam nos usos e não
o contrário”, assim, mesmo que a fala e escrita possuem aspectos peculiares, ambas
devem ser consideradas de forma ampla e homogenia, tanto nos gêneros textuais como
em toda a prática de comunicação no qual a fala e a escrita não se divide. Marcuschi
(2003) salienta que:
[...] a fala e escrita ocorrem num contínuo. Dessa forma, as novas perspectivas
de texto, gênero, discurso, suas condições de produção e realização. Há uma
revisão da forma de conceber a fala, pois a fala, tida antes como lugar da
desorganização, espontaneidade, passa agora a ser vista como planejada e
organizada segundo critérios que favorecem a interação e compreensão do que
é dito (BATISTA-SANTOS, 2014, p. 50).
Estudos evidenciam que os mitos sobre a fala e escrita, tem sido descodificados,
visto que na era da cultura digital, e principalmente no ambiente virtual surgem novos
gêneros textuais e outras maneiras de comunicação, constituindo assim novas dinâmicas
de comunicação, mesclando a língua falada e a língua escrita.