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20/03/2018 » Antropoceno, Capitaloceno, Plantationoceno, Chthuluceno: fazendo parentes*

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CLIMACOM CULTURA CIENTÍFICA - PESQUISA, JORNALISMO E ARTE | ANO


02 - VOLUME 02

Antropoceno As pessoas iniciaram essa

Capitaloceno
discussão[3] muito cedo e de
forma dinâmica, mesmo antes

Plantationoc deles/nós sermos chamados de

Chthuluceno:
Homo sapiens. Mas penso que a
relevância de nomear de

fazendo Antropoceno, Plantationoceno ou

parentes* Capitaloceno tem a ver com a


escala, a relação taxa/velocidade,
a sincronicidade e a complexidade.
Donna Haraway[1] A questão constante, quando se
considera fenômenos sistêmicos,
 
tem de ser: quando as mudanças
Não há dúvida de que os processos de grau tornam-se mudanças de
antrópicos tiveram efeitos espécie? E quais são os efeitos das
planetários, em inter/intra-ação pessoas (não o Humano) situadas
com outros processos e espécies, bioculturalmente,
desde que nos reconhecemos como biotecnologicamente,
espécie (algumas dezenas de biopoliticamente e historicamente
milhares de anos) e investimos em em relação a, e combinado com,
uma agricultura em larga escala os efeitos de outros arranjos[4] de
(alguns milhares de anos). espécies e outras forças
Certamente que, desde o início, as bióticas/abióticas? Nenhuma
bactérias e seus parentes foram, e espécie, nem mesmo a nossa
ainda são, os maiores de todos os própria – essa espécie arrogante
terraformadores (e reformadores) que finge ser constituída de bons
planetários, também em uma indivíduos nos chamados roteiros
miríade de tipos de inter/intra- Ocidentais modernos – age sozinha;
ação (incluindo as pessoas e suas arranjos de espécies orgânicas e
práticas, tecnológicas e outras)[2]. de atores abióticos fazem história,
A propagação de plantas por tanto evolucionária como de outros
dispersão de sementes, milhões de tipos também.
anos antes da agricultura humana,
Mas há um ponto de inflexão das
representou uma grande mudança
consequências que muda o nome
no planeta, e assim foram muitos
do “jogo” da vida na terra para
outros eventos ecológicos de
todos e tudo? Trata-se de mais do
desenvolvimento histórico,
que “mudanças climáticas”; trata-
revolucionários e evolucionários.
se também da enorme carga de

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produtos químicos tóxicos, de refúgio para as pessoas e outros


mineração, de esgotamento de seres. Eu, juntamente com outras
lagos e rios, sob e acima do solo, pessoas, penso que o Antropoceno
de simplificação de ecossistemas, é mais um evento-limite do que
de grandes genocídios de pessoas e uma época, como a fronteira K-Pg
outros seres etc., em padrões entre o Cretáceo e o Paleoceno[6].
sistemicamente ligados que podem O Antropoceno marca
gerar repetidos e devastadores descontinuidades graves; o que
colapsos do sistema. A vem depois não será como o que
recursividade pode ser terrível. veio antes. Penso que o nosso
trabalho é fazer com que o
Anna Tsing (2015), em um artigo Antropoceno seja tão curto e
recente chamado “Feral tênue quanto possível, e cultivar,
Biologies”, sugere que o ponto de
uns com os outros, em todos os
inflexão entre o Holoceno e o
sentidos imagináveis, épocas por
Antropoceno pode eliminar a maior
vir que possam reconstituir os
parte dos refúgios a partir dos
refúgios.
quais diversos grupos de espécies
(com ou sem pessoas) podem ser Neste momento, a terra está cheia
reconstituídos após eventos de refugiados, humanos e não
extremos (como desertificação, humanos, e sem refúgios.
desmatamento…). Isso tem
Então, penso que mais do que um
parentesco com o argumento da
grande nome, na verdade, é
World-Ecology, Research Network,
preciso pensar num novo e potente
coordenada por Jason Moore, de
nome. Assim, Antropoceno,
que a natureza barata está no fim;
Plantationoceno[7] e Capitaloceno
o barateamento da natureza não
(termo de Andreas Malm e Jason
pode continuar mais a sustentar a
extração e a produção no e do Moore antes de ser meu)[8]. E
mundo contemporâneo, porque a também insisto em que precisamos
maioria das reservas da terra de um nome para as dinâmicas de
forças e poderes sim[9]-chthonicas
foram drenadas, queimadas,
em curso, das quais as pessoas são
esgotadas, envenenadas,
uma parte, dentro das quais esse
exterminadas e, de várias outras
processo está em jogo. Talvez,
formas, exauridas[5]. Vastos
mas só talvez, e apenas com
investimentos em tecnologias
intenso compromisso e trabalho
extremamente criativas e
destrutivas podem conter esse colaborativo com outros terranos,
acerto de contas, mas a natureza será possível fazer florescer
barata realmente acabou. Anna arranjos multiespécies ricas, que
incluam as pessoas. Estou
Tsing argumenta que o Holoceno
chamando tudo isso de
foi um longo período em que os
Chthuluceno – passado, presente e
refúgios, os locais de refúgio,
o que está por vir[10]. Estes
ainda existiam, e eram até mesmo
espaços-tempos reais e possíveis
abundantes, sustentando a
não foram nomeados após o
reformulação da rica diversidade
pesadelo-racista e misógino do
cultural e biológica. Talvez a
indignação merecedora de um monstro Cthulhu (note diferença
nome como Antropoceno seja a da na ortografia), do escritor de
ficção científica H. P. Lovecraft, e
destruição de espaços-tempos de
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sim após os diversos poderes e Uma maneira de viver e morrer


forças tentaculares de toda a terra bem, como seres mortais no
e das coisas recolhidas com nomes Chthuluceno, é unir forças para
como Naga, Gaia, Tangaroa reconstituir refúgios, para tornar
(emerge da plenitude aquática de possível uma parcial e robusta
Papa), Terra, Haniyasu-hime, recuperação e recomposição
Mulher-Aranha, Pachamama, Oya, biológica-cultural-política-
Gorgo, Raven, A’akuluujjusi e tecnológica, que deve incluir o
muitas mais. “Meu” Chthuluceno, luto por perdas irreversíveis. Thom
mesmo sobrecarregado com seus van Dooren (2014) e Vinciane
problemáticos tentáculos gregos, Despret (2013) me ensinaram
emaranha-se com uma miríade de isso[12]. Há tantas perdas já, e
temporalidades e espacialidades e haverá muitas mais. Esse renovado
uma miríade de entidades em florescimento generativo não pode
arranjos intra-ativos, incluindo ser criado a partir de mitos de
mais-que-humanos, outros-que- imortalidade ou do fracasso de nos
não-humanos, desumanos e tornarmos parte dos mortos e
humano-como-húmus (human- extintos. Há um monte de trabalho
ashumus). Mesmo num texto em para o Orador dos Mortos de Orson
inglês-americano como este, Naga, Scott Card (1986) e ainda mais
Gaia, Tangaroa, Medusa, Mulher- para a reformulação de Ursula Le
Aranha, e todos os seus parentes, Guin em Always Coming Home.
são alguns dos muitos mil nomes
Eu sou uma compostista, não uma
próprios para uma linhagem de
pós-humanista: somos todos
ficção científica que Lovecraft não
compostos, adubo, não pós-
poderia ter imaginado ou abraçado
– ou seja, teias de fabulação humanos. O limite que é o
especulativa, feminismo Antropoceno/Capitaloceno
significa muitas coisas, incluindo o
especulativo, ficção científica e
fato de que a imensa destruição
fatos científicos[11]. O que
irreversível está realmente
importa é que narrativas contam
narrativas, e que conceitos pensam ocorrendo, não só para os 11
bilhões ou mais de pessoas que vão
conceitos. Matematicamente,
estar na terra perto do final do
visualmente e narrativamente, é
século 21, mas também para uma
importante pensar que figuras
miríade de outros seres. (O número
figuram figuras, que sistemas
incompreensível, mas sóbrio, de
sistematizam sistemas.
cerca de 11 bilhões somente será
Todos os mil nomes propostos são mantido se as taxas de natalidade
grandes demais e pequenos de bebês humanos, em todo o
demais; todas as histórias são mundo atual, permanecerem
grandes demais e pequenas baixas; se elas subirem
demais. Como Jim Clifford me novamente, todas as apostas caem
ensinou, nós precisamos de por terra). “À beira da extinção”
narrativas (e teorias) que sejam não é apenas uma metáfora; e
grandes o bastante (e não mais que “colapso de sistema” não é um
isso) para reunir as complexidades filme de suspense. Pergunte a
e manter as bordas abertas e qualquer refugiado, de qualquer
ávidas por novas e velhas conexões espécie.
surpreendentes (CLIFFORD, 2013).
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O Chthuluceno precisa de pelo até agora, como Kim Stanley


menos um slogan (certamente, Robinson (2012) colocou em 2312,
mais do que um); continuam estamos vivendo tempos de
gritando “Ciborgues para “Hesitação” (esta narrativa de
Sobrevivência Terrestre”, “Corra ficção científica, que vai de 2005 a
Rápido, Morda Forte” e “Cale-se e 2060, é demasiado otimista?), um
Treine”, eu proponho “Faça “estado de agitação incerto”[14].
Parentes, Não Bebês!”. Fazer Talvez “A Hesitação” seja um
parentes é, talvez, a parte mais nome mais apropriado do que
difícil e mais urgente do problema. Antropoceno ou Capitaloceno! “A
As feministas do nosso tempo têm Hesitação” será gravada nos
sido líderes em desvendar a estratos rochosos da terra; na
suposta necessidade natural dos verdade, já está escrita nas
laços entre sexo e gênero, raça e camadas mineralizadas da terra.
sexo, raça e nação, classe e raça, Os sim-ctônicos não hesitam; eles
gênero e morfologia, sexo e compõem e se decompõem,
reprodução, e reprodução e práticas tão perigosas quanto
composição de pessoas (nossa promissoras. O mínimo que se pode
dívida aqui especialmente para dizer é que a hegemonia humana
com os melanésios, em aliança não é um caso sim-chthonico.
com Marilyn Strathern (1990) e Como definem os artistas
seus parentes etnógrafos). Se for ecossexuais Beth Stephens e Annie
para existir uma ecojustiça de Sprinkle, a compostagem é tão
multiespécies, que esta também quente!
possa abraçar a diversidade das
Meu propósito é fazer com que
pessoas. É chegada a hora de as
feministas exercerem liderança “parente” signifique algo
diferente, mais do que entidades
também na imaginação, na teoria
ligadas por ancestralidade ou
e na ação, para desfazer ambos os
genealogia. O movimento suave de
laços: de genealogia/parentesco e
desfamiliarização pode parecer,
parentes/espécies.
por um momento, um erro, mas
Bactérias e fungos são excelentes depois (com sorte) aparecerá
para nos dar metáforas, mas, sempre como correto. Fazer
metáforas a parte (boa sorte com parentes é fazer pessoas, não
isso!), nós temos um trabalho de necessariamente como indivíduos
mamífero a fazer com os nossos ou como seres humanos. Na
colaboradores e co-trabalhadores Universidade, fui movida pelos
sim-poiéticos, bióticos e abióticos. trocadilhos de Shakespeare, kin e
Precisamos fazer parentes sim- kind (parente e gentil em
chthonicamente, sim- português) – os mais gentis não
poieticamente. Quem e o que quer eram necessariamente parentes de
que sejamos, precisamos fazer- uma mesma família; tornar-se
com – tornar-com, compor-com – parente e tornar-se gentil (como
os “terranos” (obrigado por esse categoria, cuidado, parente sem
termo, Bruno Latour-em-modo laços de nascimento, parentes
anglófono)[13]. Nós, pessoas paralelos, e vários outros ecos)
humanas em todos os lugares, expande a imaginação e pode
devemos abordar as urgências mudar a história. Marilyn Strathern
sistêmicas intensas; no entanto, me ensinou que os “parentes”, em
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inglês britânico, eram REFERÊNCIAS


originalmente “relações lógicas” e
 
só se tornaram “membros da
família” no século 17. Este,
BARAD, K. Meeting the Universe
definitivamente, está entre os
Halfway. Durham, UC: Duke
factoides que eu amo[15]. Saia do University Press, 2007.
inglês e os selvagens se
multiplicam. Penso que a extensão CARD, O. S. Speaker for the Dead.
e a recomposição da palavra New York: Tor Books, 1986.
“parente” são permitidas pelo fato
de que todos os terráqueos são CLIFFORD, J. Returns: Becoming
Indigenous in the Twenty-first
parentes, no sentido mais
profundo, e já passaram da hora Century. Cambridge MA: Harvard
University Press, 2013.
de começar a cuidar dos tipos-
como-arranjos (não espécies uma DESPRET, V. Ceux qui insistent. In:
por vez). Parentesco é uma
DEBAISE, D et al. (dir.). Faire Art
palavra que traz em si um arranjo.
comme on fait societé: les
Todos os seres compartilham de
nouveaux commanditaires. Dijon:
uma “carne” comum,
Le Presses du Réel, 2013.
paralelamente, semioticamente e
genealogicamente. Os GILBERT, S.F.; EPEL, D. Ecological
antepassados mostram-se Developmental Biology. 2nd ed.
estranhos muito interessantes; USA: Sinauer Associates, 2015.
parentes são não familiares (fora
do que pensávamos ser a família HAKIM, D. Sex Education in Europe
ou os genes), estranhos, Turns to urging more births. The
assombrosos, ativos[16]. New York Times, 8/4/2015.
Disponível em:
Demais para um pequeno slogan, <http://www.nytimes.com/2015/04/09/business/inte
eu sei! Ainda assim, tente. Nos education-in-europe-turns-to-
próximos dois séculos, ou mais, urging-more-births.html>.
talvez os seres humanos deste
planeta possam ser novamente LATOUR, B. Facing Gaïa: Six
dois ou três bilhões, lectures on the political theology
aproximadamente e, nesse tempo, of Nature. Gifford Lectures, 18-28
fazer parte de um bem-estar cada febr. 2013.
vez maior para os diversos seres
MOORE, J. Capitalism in the Web
humanos e outros seres, agindo
of Life. New York: Verso, 2015.
como meios e não apenas como
fins. Então, faça parentes, não ROBINSON, K. S. 2312. London:
bebês! O que importa é como Orbit, 2012.
parentes geram parentes[17].
SKURNICK, L. That should be a
  word. New York: Workman, 2015.

Tradução de Susana Dias, Mara STRATHERN, M. The gender of the


Verônica e Ana Godoy gift: problems with women and
problems with society in
  Melanesia. Oakland CA: University
of California Press, 1990.

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______. Shifting Relations. Paper permission of the copyright holder,


for the Emerging Worlds Workshop, Duke University Press
University of California at Santa (www.dukeupress.edu). This will
Cruz, 8 febr. 2013. also be chapter within the book
Staying
TSING, A. Feral Biologies. Paper with the Trouble forthcoming in
for Anthropological Visions of
2016 from Duke University Press.
Sustainable Futures, University
College London, February 2015. Nossos mais sinceros
agradecimentos a Donna Haraway
______. The Mushroom at the end
e a Diane Grossé pela gentileza e
of the world: on the possibility of generosidade.
life in capitalist ruins. Princeton,
NJ: Princeton University Press, [1] Donna Haraway leciona História
2015. da Consciência na University of
California, Santa Cruz, USA.
VANDOOREN, T. Flight ways: life
and loss at the edge of extinction. [2] Intra-ação é um conceito de
New York: Columbia University Karen Barad (2007). Continuo
Press, 2014. usando inter-ação a fim de
permanecer legível para o público
WILSON, K. The ‘New’ Global que ainda não compreende as
Population Control Policies:
mudanças radicais que a análise de
Fueling India’s Sterilization
Barad exige, mas, também,
Atrocities. Different Takes, n. 87, provavelmente, faço isso em razão
p. 1-5, winter 2015. Disponível em: dos meus hábitos linguísticos
<https://dspace.hampshire.edu/bitstre
promíscuos.
 
[3] [N.T.] Aqui a autora se refere
ao debate em torno das
Recebido em: 1/03/2016
designações Antropoceno,
Aceito em: 10/03/2016 Capitaloceno etc.

  [4] [N.T.] Onde a autora usa


“assemblage” traduzimos por
“arranjos”.
* Permission is granted for non-
exclusive world rights in the [5] Cf. Moore (2015). Muitos dos
Portuguese language for one ensaios de Moore podem ser
edition of the ClimaCom encontrados em:
journal/Spring 2016. No other <https://jasonwmoore.wordpress.com/>.
rights are granted. This is for
electronic/digital media only, of [6] Devo a Scott Gilbert por
the ressaltar, durante o seminário
following described material: Ethnos e outras interações, na
“Anthropocene, Capitalocene, Universidade de Aarhus, em
Plantationocene, Chthulucene: outubro de 2014, que o
Making Kin”, in Environmental Antropoceno (e o Plantationoceno)
Humanities, deve ser considerado um evento-
Volume 6. Copyright, 2015, Duke limite, como a fronteira K-Pg, e
University Press. All rights não uma época. Ver nota 7 abaixo.
reserved. Republished by
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[7] Em uma conversa gravada para de organismos e plantas, animais e


Ethnos, na Universidade de Aarhus, pessoas desenraizados –, é uma
em outubro de 2014, os operação de definição do
participantes coletivamente Plantationoceno, do Capitaloceno
geraram o nome Plantationocene e do Antropoceno tomados em
para a transformação devastadora conjunto. O Plantationoceno
oriunda de diversos tipos de prossegue com crescente
fazendas com tendências humanas, ferocidade na produção global de
pastos, e florestas em plantações carne industrializada, no
extrativas e fechadas, baseadas agronegócio da monocultura, e nas
em trabalho escravo e outras imensas substituições de florestas
formas de trabalho explorado, multiespecíficas, que sustentam
alienado, e, geralmente, tanto os humanos quanto os não
deslocado espacialmente. A humanos, por culturas que
conversa transcrita será publicada produzem, por exemplo, óleo de
como “Anthropologists Are Talking palma. Os participantes do
About the Anthropocene”, em seminário Ethnos incluíram Noboru
Ethnos [N.T. a publicação Ishikawa (Antropologia, Center for
aconteceu em 2016, ver Ethnos: South EastAsianStudies, Kyoto
Journal of Anthropology, v. 81, n. University); Anna Tsing
3). Os estudiosos já entendem faz (Antropologia, University of
tempo que o sistema de plantação California, Santa Cruz); Donna
baseado no trabalho escravo foi o Haraway (História da Consciência,
modelo e motor dos sistemas de University of California, Santa
produção à base de máquinas Cruz); Scott F. Gilbert (Biologia,
ávidas pelo consumo de carbono, Swarthmore); Nils Bubandt
frequentemente citados como (Departamento de Cultura e
ponto de inflexão para o Sociedade, Aarhus University); e
Antropoceno. Nutridas, mesmo nas Kenneth Olwig (Arquitetura e
circunstâncias mais adversas, as Paisagismo, Swedish University of
hortas de escravos não só Agricultural Sciences). Gilbert
forneceram comida humana adotou o termo Plantationoceno
fundamental, mas também para argumentos-chave na sua
refúgios para uma biodiversidade coda para a segunda edição do
de plantas, animais, fungos e tipos livro amplamente utilizado (ver
de solos. As hortas de escravos são GILBERT; EPEL, 2015).
um mundo pouco explorado,
especialmente em comparação [8] Em comunicação pessoal por e-
com jardins botânicos imperiais, mail, Jason Moore e Alf Hornborg,
em termos de dispersão e no final de 2014, disseram-me que
Malm propôs o termo Capitaloceno
propagação de uma miríade de
seres. Mover essa geratividade em um seminário em Lund, na
semiótica material ao redor do Suécia, em 2009, quando ele ainda
era um estudante de pós-
mundo, para a acumulação de
graduação. Usei pela primeira vez
capital e de lucros – o
deslocamento rápido e a o termo de forma independente
reformulação de germoplasma, em palestras públicas a partir de
2012. Moore está editando um livro
genomas, estacas, e todos os
outros nomes e formas de pedaços intitulado Capitalocene (Oakland
CA: PM Press, no prelo), que terá
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ensaios de Moore, Malm, meu e de [13] Ver Bruno Latour, “Facing


Elmar Altvater. Nossas redes Gaïa: Six Lecture son the Political
colaborativas aumentaram. Theology of Nature”, Gifford
Lectures, 18-28 de fevereiro de
[9] [N.T.] No original, a autora
2013.
utiliza o prefix sym- (ou syn-).
Etimologicamente, seu sentido é [14] Esta narrativa de ficção
“junto, conjuntamente”, caso do científica extraordinária ganhou o
prefixo sim- (ou sin-) em Prêmio Nebula de melhor
português. romance.

[10] O sufixo “-ceno” prolifera! [15] Ver Strathern (2013). Fazer


Arrisco esta superabundância parentes é uma prática popular em
porque estou no encalço dos alta, e os novos nomes também
significados da raiz de “- estão proliferando. Veja Lizzie
cene/kainos”, a saber, a Skurnick, That Should Be a Word
temporalidade do “agora” espesso, (NY: Workman Publishing, 2015)
fibroso e irregular, que é antiga, para “parentinovador”
mas não é. (kinnovator), uma pessoa que cria
famílias de formas não
[11] “Mil Nomes de Gaia/The convencionais, à qual acrescento
Thousand Names Of Gaia” foi uma
parentinovação (kinnovation).
conferência internacional
Skurnick também propõe
organizada por Eduardo Viveiros de “clãnarquista” (clanarchist). Estas
Castro, Déborah Danowski e seus não são apenas palavras; são pistas
colaboradores, em setembro de
e estímulos para sismos na criação
2014, no Rio de Janeiro. Algumas de parentes que não estão
em português e algumas em inglês, limitados aos dispositivos da
muitas das palestras da família ocidental,
conferência podem ser assistidas
heteronormativos ou não. Penso
em: que os bebês deveriam ser raros,
<https://www.youtube.com/c/osmilno cuidados, e preciosos; e os
Minha contribuição sobre o
parentes deveriam ser abundantes,
Antropoceno e o Chthuluceno foi
inesperados, duradouros e
feita por Skype, e está disponível preciosos.
em:
<https://www.youtube.com/watch? [16] “Gens” é outra palavra, de
v=1x0oxUHOlA8>. origem patriarcal, que as
feministas estão usando. As origens
[12] Encontramos importantes e os fins não determinam um ao
ensaios de Vinciane Despret outro. Parentes e gens fazem parte
traduzidos para o inglês, ver
da mesma origem na história das
Angelaki, v. 20, n. 2, número línguas indo-europeias. Para
especial Etologia II: Vinciane esperançosos momentos
Despret, publicado em 2015 e comunistas de intra-ação, veja
editado por Brett Buchanan,
<http://culanth.org/fieldsights/652-
Jeffrey Bussolini e Matthew gens-afeminist-manifesto-for-the-
Chrulew, prefácio de Donna study-of-capitalism>, por Laura
Haraway, intitulado “A Curious
Bear, Karen Ho, Anna Tsing e
Practice”.
Sylvia Yanagisako. A escrita é

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talvez demasiado sucinta (embora coletivamente, através das


esses resumos ajudem), e não há diferenças ideológicas e regionais,
exemplos excitantes nesse entre outras. Minha sensação é a
Manifesto para atrair o leitor mal de que nosso povo pode ser
acostumado; mas as referências parcialmente comparado com o
dão muitos recursos para fazer negacionismo cristão das mudanças
tudo isso, a maioria etnografias climáticas: crenças e
fruto de trabalhos de longo prazo, compromissos são profundos
com íntimo envolvimento e demais para permitir uma revisão
profundamente teorizadas. Ver do pensar e do sentir. Ao revisitar
especialmente Anna Tsing (2015). o que foi tomado pela direita e
A precisão da abordagem pelos profissionais do
metodológica na “Gens: a Feminist desenvolvimento como “explosão
Manifesto for the Study of populacional”, nosso povo pode se
Capitalism” está em sua sentir como quem vai para o lado
abordagem voltada àqueles obscuro.
pretensos marxistas ou outros
teóricos que resistem ao Mas a negação não vai nos servir.
feminismo, e que, portanto, não se Sei que “população” é uma
categoria de Estado, o tipo de
envolvem com a heterogeneidade
dos mundos da vida real, mas “abstração” e de “discurso” que
ficam com categorias como refaz a realidade para todos, mas
não para o benefício de todos. Eu
Mercado, Economia,
também penso que evidências de
Financeirização (ou, gostaria de
acrescentar, Reprodução, muitos tipos, epistemológica e
Produção e População, em suma, afetivamente comparáveis às
evidências variadas para as rápidas
categorias supostamente
adequadas de economia política mudanças climáticas, mostram que
socialista liberal e não feminista 7 a 11 bilhões de seres humanos
fazem exigências que não podem
padrão). Go, Honolulu’s Revolution
ser suportadas sem imensos danos
Books e todos os seus afins!
aos seres humanos e não humanos
[17] A minha experiência é que em todo o mundo. Este não é um
aqueles que me são caros, como assunto simples e casual; a
“nosso povo”, na esquerda ou Ecojustiça não tem uma
qualquer nome que ainda possamos abordagem de uma única variável
usar sem apoplexia, escutam possível para os repetidos
neoimperialismo, neoliberalismo, extermínios, empobrecimentos e
misoginia e racismo (quem pode extinções na Terra atualmente.
culpá-los?) na parte “não bebês” Mas culpar o Capitalismo, o
da frase “Faça parentes, não Imperialismo, o Neoliberalismo, a
bebês”. Nós imaginamos que a Modernização, ou algum outro
parte “Faça parentes” é mais fácil, “não nós” pela destruição em
ética e politicamente situada em curso, pavimentada pelo aumento
terreno mais firme. Não é verdade! populacional, também não vai
“Faça parentes” e “não bebês” são funcionar. Estas questões exigem
ambas difíceis; ambas exigem a um trabalho difícil e incessante;
nossa melhor criatividade mas também exigem alegria,
emocional, intelectual, artística e disposição e capacidade de
política, tanto individual como resposta para se envolver com os
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outros inesperados. Todas as costume coercitivo (eu não posso).


partes dessas questões são Por outro lado, e se os novos
importantes demais para a Terra, normais se tornassem uma
para deixarmos nas mãos da direita expectativa cultural que cada nova
ou dos profissionais do criança pudesse ter pelo menos
desenvolvimento, ou de qualquer três pais comprometidos na vida
outra pessoa do ramo de negócios, (que não são necessariamente os
como de costume. Aqui é um casais e que não gerariam mais
parentesco-diferente-não-natal e novos bebês depois disso, embora
sem-categoria! possam viver em casas de
multicrianças, famílias
Temos de encontrar maneiras de multigeracionais)? E se as práticas
celebrar as baixas taxas de
de adoção efetivas por e para os
natalidade e de tomar decisões idosos se tornasse comum? E se os
íntimas pessoais para criar vidas países que estão preocupados com
generosas e que floresçam
as baixas taxas de natalidade
(incluindo um parentesco inovador
(Dinamarca, Alemanha, Japão,
e duradouro), sem fazer mais Rússia, América branca, entre
bebês – urgentemente e outros) reconhecessem que o medo
especialmente, mas não apenas
dos imigrantes é um grande
em regiões, nações, comunidades,
problema e que os projetos e
famílias e classes sociais ricas, fantasias de pureza racial
abastadas e exportadoras de conduzem ao ressurgimento do
miséria. Precisamos encorajar a
pró-natalismo? E se as pessoas, em
população e outras políticas que todos os lugares, procurassem
envolvem questões demográficas parentescos-inovadores não natais
assustadoras por meio da
com indivíduos e coletivos em
proliferação de parentes não
mundos queer, descoloniais e
natais –, incluindo a imigração não indígenas, em vez de buscar nos
racista, ambiental e políticas de segmentos ricos e de extração de
apoio social aos recém-chegados e
riqueza europeus, euro-
da mesma forma aos “nativos” americanos, chineses ou indianos?
(educação, habitação, saúde, É bom lembrar que as fantasias de
gênero e criatividade sexual,
pureza racial e a recusa em aceitar
agricultura, pedagogias para nutrir
os imigrantes como cidadãos
os seres não humanos, tecnologias plenos realmente conduzem a
e inovações sociais para manter as política agora no mundo
pessoas mais velhas saudáveis,
“progressivo” e “desenvolvido”.
produtivas etc.).
Ver Hakim (2015). Rusten Hogness
escreveu em um post no Facebook
O inalienável “direito” (que é uma
em 9 de abril de 2015: “O que está
palavra para uma matéria corporal
tão consciente) pessoal de errado com a nossa imaginação e
nascimento ou não de um novo com a nossa capacidade de
olharmos um para o outro (tanto
bebê não está em questão para
mim; a coerção é errada em todos humanos quanto não humanos), se
os níveis imagináveis neste não podemos encontrar maneiras
de abordar questões levantadas
assunto, e tende a sair pela
pelos mudanças das distribuições
culatra, em qualquer caso, mesmo
que se possa engolir essa lei ou de idade, sem fazer cada vez mais

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20/03/2018 » Antropoceno, Capitaloceno, Plantationoceno, Chthuluceno: fazendo parentes*

bebês humanos? Precisamos homens à meras cifras nas velhas e


encontrar maneiras de celebrar as novas políticas de controle
pessoas jovens que decidem não populacional, e outras práticas
ter filhos, não adicionar o misóginas, patriarcais e racistas
nacionalismo à já potente mistura transformadas em negócio, como
de pressões pró-natalidade que se faz em todo mundo.Ver, por
existe sobre eles.” exemplo, Wilson (2015).

O pró-natalismo, em seus disfarces Precisamos de um grande tempo


poderosos, deveria estar em em que nos apoiamos assumindo
questão quase toda parte. Digo riscos uns dos outros, uns com os
“quase” como uma ressalva sobre outros, sobre todas estas questões.
as consequências de um escândalo
em curso com o genocídio e o  

deslocamento de povos. O “quase”  


é também um estímulo para
lembrar o uso abusivo da  
esterilização na
 
contemporaneidade, o uso de
meios contraceptivos
 
surpreendentemente impróprios e
danosos, a redução de mulheres e

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