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Celso Frederico

Comunicação, recepção e consciência


possível - a contribuição de Lucien
Goldmann

Resumo cação social” que estruturam a convi­


O presente texto resgata vência humana - a troca de mulheres
criticamente a contribuição de Lucien (sistema de parentesco), a troca de
Goldmann no âmbito da comunicação bens (sistema econômico) e a troca de
apontando em especial para o nexo mensagens (o sistema lingüístico). Na
entre recepção e política no contexto mesma linha de raciocínio, Lacan
do pensamento do mesmo autor. celebrizou a tese segundo a qual “o
inconsciente é estruturado como uma
Artigo linguagem”.
A comunicação de massa não Nada mais natural, portanto, do
passou despercebida na obra de Lucien que a utilização dos estudos
Goldmann. Nas condições intelectuais lingüísticos, em especial da semiótica,
da época, ele defrontou-se com o para entender os meios de comuni­
Celso Frederico é professor Livre- intenso debate teórico que se desen­ cação de massa. François Dosse
Docente e pesquisador junto ao volvia na França nos anos 60 sobre os arrolou um número impressionante de
Departamento de Comunicações e Artes meios de comunicação. O estrutura- revistas através das quais os
da Escola de Comunicações e Artes da lismo lingüístico, em pleno apogeu, estruturalistas expunham suas idéias:
Universidade de São Paulo. retomava as idéias de Saussure, fazendo La linguistique, Langages, Commu­
delas um modelo rígido de interpre­ nications, Tel quel, La nouvelle
tação aplicável às ciências humanas e, critique, Les cahiers pour l'analyse,
por extensão, aos estudos da comunica­ Langue française, Littérature,
ção. Goldmann, defendendo o método Change1.
estrutural e, ao mesmo tempo, preten­ Goldmann, defendendo o
(01) Cf. François Dosse, História dendo introduzir nele a dimensão estruturalismo-genético, precisou
do estruturalismo, (S. Paulo: Ed. histórica ausente, precisou posicionar- posicionar-se não só no debate teórico
Ensaio, 1993), especialmente, vol. se no intenso debate sobre os meios metodológico, como também em seus
I, cap. 29 "O apogeu das revistas" de comunicação de massa. reflexos nos estudos de comunicação.
e vol. II, cap. 15, "O revistismo Naquele momento, a lingüística O pensamento goldmanniano,
continua próspero". Convém era uma das áreas mais influentes nas contudo, não permaneceu o mesmo,
lembrar que, no Brasil, as editoras ciências humanas - o prestígio de mas oscilou, com o passar dos anos,
Tempo Brasileiro e Perspectiva, Barthes, Kristeva, Todorov, Benveniste de uma visão otimista - advinda de sua
entre outras, encarregavam-se de e Pêcheux vivia então sua fase áurea. leitura de História e consciência de
divulgar entre nós os textos Não por acaso, Lévi-Strauss enfatizava classe, de Lukács - para um pessimis­
produzidos pelos estruturalistas o parentesco entre os fenômenos mo crescente, fruto de seu desalento
franceses e por seus discípulos sociais e os fenômenos lingüísticos: perante as transformações sociais em
brasileiros (um dos livros de Décio ambos seriam exteriores aos indiví­ curso promovidas pelo “capitalismo de
Pignatari, Informação. Linguagem. duos e teriam princípios reguladores organização”.
Comunicação, era leitura dados de antemão. Daí o seu empenho Inicialmente, para opor-se à
obrigatóría em todos os cursos de em estudar os três níveis da “comuni­ rigidez do estruturalismo não-gené-
comunicação no país).
tico, ele lançou mão, como veremos a a) a primeira delas, apoia-se na ca­
seguir, do conceito de consciência tegoria da possibilidade. Essa corrente,
possível, fazendo-o migrar dos estudos diz o autor, “permite reconhecer em
filosóficos e artísticos para o estudo todas os domínios da realidade natural e
dos meios de comunicação. Contra o humana o papel do acaso e fala apenas de
descentramento do sujeito, anunciado ordens plúrimas, relativas e variáveis, de
pela vaga estruturalista, ele trouxe à esquemas operativos e de modelos,
cena a consciência possível dos sujei­ planos ou projetos, nos quais as opções
tos coletivos. do homem se podem inserir com alguma
probabilidade de êxito”. Nessa tendência,
O colóquio de Royaumont o autor inclui o pragmatismo, o
neoempirismo, a teoria da informação, a
Em 1965, em Genebra, num dos cibernética e o estruturalismo;
colóquios de Royaumont, dedicado ao b) a segunda corrente, baseia-se na
tema “O conceito de informação na categoria da necessidade. Aqui, exclui-se
ciência contemporânea”2, Goldmann o acaso e se reconhece “a necessidade dá
falou sobre “A importância do conceito ordem ou das ordens que se sucedem no
de consciência possível para a comuni­ movimento do universo e consente apenas
cação” e travou, em seguida, um acirra­ que se fale em nome ou por conta da
do debate com diversos interlocutores. Totalidade absoluta, da Razão, do Ser, do
Examinando o conjunto das Mundo, reduzindo a um grau mínimo ou a
comunicações apresentadas naquele zero a possibilidade de interferência do
encontro, percebe-se que a intelec­ homem em qualquer setor da
tualidade presente, formada por realidade4. A matriz dessa concepção é
acadêmicos que trabalhavam nas a biologia oitocentista, que teria inspirado
ciências exatas, discutia basicamente o positivismo, o espiritualismo, o natura­
as idéias de Norbert Wiener, o criador lismo, bem como autores tão diferentes (2) Le concept d'information dans
da cibernética, também participante do como Nietzsche, Pierce, Bergson, Ia Science contemporaine. Cahiers
evento. Goldmann pretendia participar Santayana, Teillard de Chardin etc. de Royaumont (Paris: Les Éditions
do congresso apenas como ouvinte, Evidentemente, essas duas cor­ de Minuit-Villars: 1965). A
mas, convidado na última hora para rentes não abarcam todo o pensamento comunicação de Goldmann, "A
substituir um dos oradores, impro­ filosófico e o próprio autor se apressa importância do conceito de
visou uma comunicação que se tomou a citar inúmeros filósofos que se consciência possível para a
referência básica nos estudos opõem ao esquema proposto sem, comunicação", foi publicada em
comunicacionais e presença constante entretanto, referir-se a Hegel, que, em três obras, em diferentes
em diversas antologias. seu tempo, havia-se empenhado na traduções, no Brasil. Cf. Gabriel
Em Genebra, as várias interven­ superação do “eterno” dilema entre Cohn (org.), Comunicação e
ções gravitaram em tomo da teoria da possibilidade e necessidade. Na indústria cultural (S. Paulo:
informação e da cibernética. Uma dialética hegeliana, a possibilidade, Companhia Editora Nacional e
estreita relação teórica aproximava além de não se opor rigidamente à Edusp, 1971); como anexo na
essas teorias do estruturalismo. Para necessidade, não deve ser identificada dissertação de mestrado de
entendermos as implicações gerais à probabilidade, conceito estatístico Jussara Resende Araújo, A dialética
dessa relação, podemos remeter às abstrato, vazio, “não-essencial”. Na na relação emissor receptor: o
idéias propostas no último volume da Lógica, Hegel insiste na oposição referencial de Lucien Goldmann
extensa História da Filosofia do entre: (São Bernardo do Campo: Instituto
pensador italiano Nicola Abbagnano3. a) a “possibilidade abstrata” ou Metodista de Ensino Superior,
Num esforço final para classificar “formal”, que separa o real do possível, 1993); L. Goldmann, A criação
as linhas mestras que conduziram as entregando o devir ao puro acaso, à cultural na sociedade moderna (S.
diversas correntes na história da filosofia contingência, a fatores externos; Paulo: Difusão Européia do Livro,
até o presente e, assim, poder enquadrar b) a “possibilidade concreta”, 1972). Utilizaremos esta última
as perspectivas que se projetam no aquela que tem o fundamento do seu tradução.
futuro, Abbagnano propôs uma divisão ser em si mesma, e que, quando todas (3) Nicola Abbagnano, História da
entre duas tendências recorrentes do as condições estão dadas, efetiva-se filosofia, vol. XIV (Lisboa: Editorial
pensamento filosófico através das necessariamente. O necessário, portan­ Presença, quarta edição, 1993).
“categorias modais” que as orientam: to, não decorre daquilo que é provável (4) Op. cit., pp.205-6.
ou de fatores externos aleatórios, mas pensamento humano”7. Inspirado no
sim da evolução objetiva da coisa, da “segundo princípio da termodinâmica”,
razão nela presente: “que tal coisa seja Wiener construiu a teoria cibernética,
possível ou impossível, depende do visando acompanhar a tensão entre
conteúdo, isto é, da totalidade dos informação e entropia - entendendo
momentos da realidade que, desenvol­ esta última como perda de energia
vendo-se, se põe e se afirma como ocorrida na “transformação do trabalho
necessidade”5. mecânico em calor”. Também na comu­
Goldmann recorre à tradição dia­ nicação, a interferência do acaso pro­
lética sem comprometer-se, como duz entropia: “assim como a entropia
veremos mais em frente, com o caráter é uma medida de desorganização, a
imanente da dialética hegeliana. A seu informação produzida por um grupo de
modo, procurou enfrentar a cibernética mensagens é uma medida de
e o estruturalismo, recorrendo à cate­ organização”8.
goria da possibilidade - entendida pela Se formos acompanhar as impli­
ótica da liberdade humana e do papel cações filosóficas dessas teorias, vere­
ativo da consciência na construção da mos, sem muita dificuldade, que elas
realidade social, opondo-se, com essa partem de uma clara negação do
visão, à teoria da probabilidade. evolucionismo presente na biologia e,
O texto de Abbagnano tem ainda por extensão, às idéias de progresso,
o mérito de rastrear o método estrutu- desenvolvimento etc. Para Wiener,
ralista e mostrar o seu parentesco com “palavras como vida, finalidade e alma
a teoria da informação e a cibernética. são toscas e inadequadas para o
Como é sabido pelos estudiosos da pensamento científico preciso”9. Além
comunicação de massa, a teoria da disso, a comunicação (confundida com
informação, também conhecida como informação) é vista como atividade
“teoria matemática da informação”, foi própria da máquina, do autômato,
inventada por dois engenheiros ameri­ projetando, assim, a utopia de um
canos, Shannon e Weaver, preocupados mundo governado pelas máquinas
com a transmissão de sinais entre as pensantes. Nesse prisma, a questão
máquinas. O objetivo desses autores central é a tensão entre ordem e
era saber como transmitir a máxima desordem, informação e entropia,
quantidade de informação no menor comunicação e ruído, tensão contorná-
tempo possível, com a máxima fideli­ vel pela auto-regulagem por feedback
dade e sem a interferência do acaso - - a auto-ordenação cada vez maior das
os ruídos que se interpõem no pro­ máquinas, que se reproduzem por si
cesso comunicacional. mesmas, sobre o mundo dos homens.
No mesmo período, Norbert A informação, observa Abbagnano,
Wiener, que havia sido professor de “torna-se um modelo do qual são
Shannon e Weaver, produzia os fun­ excluídos todos os elementos humanos
damentos da cibernética. Contra o e que se pode portanto aplicar aos
(5) G. W. F. Heget, Lógica (Madrid: determinismo da física newtoniana, campos mais diversos do saber”10. Não
Miguel Aguillera Editor: 1971), p. que “descrevia um universo em que é casual, portanto, que Lévi-Strauss
239. tudo acontecia de acordo com a lei; um tenha chamado a sua antropologia
(6) Norbert Wiener, Cibernética e universo compacto, cerradamente estrutural de “teoria da comunicação”.
sociedade. O uso humano de organizado, no qual todo futuro As bases filosóficas, segundo o autor
seres humanos (S. Paulo: Ed. depende estritamente de todo o italiano, são as mesmas, já que todas
Cultrix, segunda edição, 1968), p. passado”6, Wiener recorre a Gibbs, que elas se submetem “à exigência de
9. colocou no centro da física a categoria encontrar uma mediação entre a ordem
(7) Op. cit., p. 13. da probabilidade, do acaso, para, com e a desordem, ou seja de reduzir a
(8) Idem, p. 21. isso, poder reconhecer “um elemento causalidade dos fenômenos que sur­
(9) Idem, p. 31. de determinismo incompleto, de quase gem num certo campo (ou em vários
(10) N. Abbagnano, História da irracionalidade no mundo”, análogo “à campos) de investigação ou expe­
filosofia, cit., p. 297. admissão freudiana de um profundo riência a uma ordem relativamente
componente irracional na conduta e no constante que mostre as suas relações
recíprocas e tome possível a sua ex­
plicação e provável previsão”11. “...numa transmissão de infor­
Os teóricos marxistas não demo­ mações, não há apenas um homem ou
raram a perceber no apego ao descen- um aparelho que emite informações e
tramento do sujeito “o reflexo ideoló­ um mecanismo que as transmite, mas
gico do mundo manipulado”12. Henri também, em qualquer parte, um ser
Lefebvre, que também percebeu a humano que as recebe (...) e nós sabe­
“combinatória universal” do estrutura­ mos que a sua consciência não pode
lismo como sendo uma “retomada da “deixar passar” seja o que for”14.
cibernética e da teoria da informação”,
afirmou a respeito de Lévi-Strauss e A consciência humana não é
sua escola: “se se vai até o fim de seu passiva, e nem é moldável pelas
pensamento, encontra-se uma predi­ mensagens e sua correção através de
leção curiosa, quase maníaca, quase feedbacks do processo comunica­
esquizofrênica, pelo imóvel, pelo cional. A consciência é “opaca a toda
quadro, pela grade. O tipo de inteli­ uma série de informações que não
gibilidade que eles valorizam exclui o passam em razão mesmo de sua
movimento. Em lugar de procurar as estrutura”15 - outras, passam de modo
insuficiências de uma matriz, de uma deformado. O eixo da pesquisa, por­
grade, de uma tabela, para apreender a tanto, deve se deslocar para a esfera da
mobilidade, eles preferem negar a recepção, esfera que será marcada pelo
mobilidade...”13. E, com a negação da descompasso entre a consciência real (11) Um dos exemplos dados é o
“mobilidade”, desaparece a possibili­ e a possível. estudo das relações de
dade humana de interferir na realidade. Tal descompasso encontra, em parentesco em Lévi-Strauss,
Promover a volta da “mobilidade” Lênin, um exemplo clássico para a fundadas, como se sabe, na
foi a intenção de Goldmann no coló- reflexão. Em 1917, o revolucionário proibição do incesto: "se a
quio de Royaumont. Para isso, apresen­ russo surpreendeu o movimento natureza abandona o conúbio ao
tou uma comunicação em que se comunista internacional ao levantar a acaso e ao arbítrio, é impossível à
alinhava à “categoria modal” da pos­ palavra de ordem “terra para os cultura não introduzir uma ordem
sibilidade procurando, entretanto, camponeses”. Como se sabe, a tradição de qualquer natureza, lá onde ela
diaietizá-la e, assim procedendo, socialista defendia até então a não existe. A principal tarefa da
permanecer longe da probabilidade, propriedade coletiva da terra. Por isso, cultura é a de garantir a
essa abstração estatística vazia de Lênin foi duramente criticado, entre existência do grupo como grupo e
conteúdo. outros por Rosa Luxemburgo. portanto de substituir, neste
Os sociólogos que realizam Goldmann, tomando a defesa do domínio como nos outros, o acaso
pesquisas empíricas geralmente pri­ revolucionário russo, observou que a pela organização" (Lévi-Strauss,
vilegiam o que os indivíduos, tomados partir de 1917 as idéias socialistas Les structures élémentaires de Ia
isoladamente, pensam. Assim fazendo, haviam penetrado no meio rural, parenté, 1967, p. 37, citado por N.
eles enfatizam a imobilidade e transformando rapidamente a men­ Abbagnano, p. 217.
duplicam o real. Goldmann, em sua talidade dos camponeses. Mas, a defesa (12) Entre nós, Carlos Nelson
comunicação, pretendia uma nova da propriedade coletiva era ainda Coutinho, O estruturalismo e a
modalidade de pesquisa sociológica, inviável, pois estava muito além do miséria da razão (Rio de Janeiro:
propondo o deslocamento do foco da máximo de consciência possível dessa Ed. Paz e Terra, 1972), p. 61.
consciência real dos indivíduos atomi- classe social, sendo, desse modo, uma (13) Henri Lefebvre, "Claude Lévi-
zados para a consciência possível dos “informação” impossível de ser Strauss e o novo eleatismo", in
indivíduos integrados a grupos e assimilada. Por isso, Lênin, fazendo Debate sobre o estruturalismo (S.
classes sociais diferenciadas. Percebe- papel de “sociólogo e mesmo de Paulo: Ed. Documentos, 1968), p.
se aqui o seu desejo deliberado de teórico da informação”, percebeu “ser 40.
intervir nas mensagens comunica­ possível transmitir aos camponeses (14) L. Goldmann, "A importância
cionais, de tomar os meios de determinado número de palavras de do conceito de consciência
comunicação como momento estra­ ordem socialistas, porém em nenhum possível para a comunicação", in A
tégico de uma política cultural. caso fazer-lhes compreender as criação cultural no mundo
Contra a teoria da informação, vantagens da grande exploração e os moderno, cit., p. 13.
centrada na perspectiva da emissão, convencer de que deviam renunciar à (15) Idem, p. 8.
Goldmann observa: propriedade individual da terra” (16) Idem, p. 9.
A partir desse exemplo, Goldmann sociólogo deve isolar as estruturas
propõe quatro níveis de análise - “para sociais e “construir, em cada caso, o
quem deseje intervir na vida social” - conceito de consciência possível”.
para entender os obstáculos à trans­ Para isso, ele precisa recorrer aos
missão de informações: ensinamentos de Piaget que demons­
tram o caráter significativo dos fatos
1) uma informação pode não pas­ humanos, sempre orientados para
sar por falta de informação prévia. Uma equilíbrios dinâmicos e provisórios.
fórmula matemática complexa, apre­ Trata-se, em poucas palavras, de des­
sentada a um leigo, exemplificaria esse cobrir as estruturas significativas,
primeiro nível de análise; construídas pelos grupos sociais e que
2) um segundo obstáculo diz orientam o seu comportamento. O
respeito à estrutura psíquica do indi­ máximo de consciência possível de um
víduo. Recorrendo a Freud, Goldmann grupo é explicitado pelas obras
lembra os processos de resistência do literárias, artísticas e filosóficas -
eu consciente que bloqueiam ou aquelas que “aspiram à totalidade”, à
deformam o sentido das informações. afirmação de uma visão global do
Esse obstáculo só pode ser removido mundo. Em todos os grupos existe
através do tratamento psicanalítico; sempre um mínimo de coerência, que
3) o terceiro nível situa-se já no estrutura de forma significativa os
plano sociológico. Um grupo social valores comuns compartilhados. Sem
particular resiste a certas informações esse conhecimento prévio, a trans­
que possam contrariar a estrutura de sua missão de mensagens encontrará
consciência real. O exemplo citado: bloqueios.
pesquisadores ligados a uma determi­ Goldmann encerrou a comuni­
nada escola científica tendem a recusar cação reafirmando sua tese central: o
teses formuladas por pesquisadores sociólogo não deve restringir-se à
ligados a uma outra escola, porque consciência real dos indivíduos, mas
essas podem pôr em xeque os resul­ sim sondar as mudanças suscetíveis de
tados de suas próprias pesquisas. Aqui, se produzirem em sua consciência.
a dificuldade pode ser superada pelo Após a comunicação, iniciou-se
diálogo, e a transformação da cons­ um confuso debate, reunindo, basica­
ciência real não ameaça a existência do mente, acadêmicos ligados às ciências
grupo social; exatas (biólogos, engenheiros eletrô­
4) o último nível de análise nicos, físicos etc). As diversas inter­
refere-se ao máximo de consciência venções demostram um típico diálogo
possível. Há situações em que a de surdos. Em meio a um encontro que
aceitação de determinada informação reuniu pessoas interessadas princi­
implica no desaparecimento do grupo palmente em discutir o aspecto
ou na perda de suas características quantitativo, mensurável, da informa­
sociais básicas. Portanto, a informação ção, Goldmann transpôs para o estudo
não pode ir além dos limites da da comunicação as categorias centrais
consciência possível do grupo, não de sua teoria sociológica. Desse modo,
pode contrariar os fundamentos de sua deixou perplexos os cientistas
existência social. A atitude de Lênin presentes que nada entenderam de sua
perante a questão agrária exemplifica palestra. E, como é natural nesses
bem a relação entre existência social momentos, os participantes derivaram
e consciência possível. a conversa para assuntos periféricos (a
objetividade nas ciências humanas, a
O esforço analítico de Goldmann interferência dos valores no julgamen­
para classificar os entraves à comuni­ to dos fatos etc).
cação enfatiza, como era de se esperar, A objeção de fundo, implícita no
a dimensão social. A sociedade, diz ele, debate, diz respeito à intenção de
não é um todo homogêneo, ela “com­ nosso autor em utilizar-se dos meios
põe-se de grupos sociais”. Assim, o de comunicação para interferir no
curso da vida social. Não faltaram sua obsessão pelos aspectos sintáticos,
censuras nesse sentido: “nós formais e estruturais da organização e
discutimos proposições que não são transmissão de mensagens.
informativas, mas monitórias, Finalmente, marcava sua distância em
exortativas, recomendativas, e é um relação ao existencialismo e à tradição
erro falar delas como se fossem uma fenomenológica que enfocavam a
informação”; “a palavra informação linguagem como transmissão da
tem um sentido termodinâmico”; experiência vivida, consagrando, desse
“Goldmann utiliza a palavra informação modo, a centralidade do sujeito
tanto no sentido de educação quanto no individual e da subjetividade como
de propaganda”; “no decorrer desse criadora dos sentidos (e não das
colóquio, nós passamos de operações estruturas mentais dos grupos sociais
de filtragem eletrônica, que podemos e da relação entre consciência real e
calcular de maneira precisa, às consciência possível).
operações de filtragem quase
biológicas e, até mesmo, com o sr. O real e o possível
Goldmann, às operações de filtragem
de estruturas sociais” 17 etc. As duas formas de consciência -
O que se pode dizer, para a real e a possível - permanecem,
permanecermos no interior da teoria entretanto, tensionadas na reflexão de
desenvolvida por Goldmann, é que sua Goldmann, numa relação de
exposição procurava manter distância exterioridade, num dualismo. Percebe-
em relação à teoria da informação e sua se aqui a diferença de Goldmann em
influência sobre o estruturalismo. As relação à dialética hegeliana e à sua
bases filosóficas dessas duas correntes utilização no Lukács de História e
são, como vimos anteriormente, consciência de classe. Também nesta
idênticas, mas havia entre elas uma obra, a passagem da consciência real
diferença de enfoque nos estudos para a Consciência de Classe
sobre comunicação de massa. permanecia um mistério. O próprio
Enquanto a teoria de informação Lukács, no posfácio de 1967 para
pressupunha o controle do emissor História e Consciência de Classe,
sobre a informação posta em chamou atenção para o fato: ignorando
circulação, o estruturalismo, os chamados “estudos de opinião”, as
concentrava sua atenção no código, pesquisas sobre a consciência empírica
enfatizando de tal forma o significante dos indivíduos que compõem a classe
que, no limite, chegava a constituir o operária, a consciência verdadeira, num
próprio significado. passe de mágica, era chamada para
Num contexto de hegemonia do realizar a revolução social. O caráter
pensamento estruturalista, Goldmann messiânico dessa passagem não
apegou-se ao conceito de consciência invalida, contudo, a sua rigorosa
possível. Com isso, ele pôs em coerência lógica. Admitindo, como
primeiro plano a recepção, o papel ativo Hegel, a identidade entre sujeito e
do receptor na decodificação da objeto e, ao mesmo tempo
mensagem. A decodificação, como identificando objetivação com
procurou demonstrar, depende das alienação, o proletariado em Lukács,
estruturas mentais dos diversos grupos ao realizar a revolução, suprimia a
sociais. Goldmann, assim, opunha-se às alienação e, assim, tornava-se um
tentativas de entender a comunicação sujeito-objeto idêntico.
como uma mera transmissão de sinais, Goldmann, contrariamente, não
desprovidos de qualquer carga fala em classes, mas, quase sempre,
semântica e, por isso mesmo, num sujeito coletivo fluido e
destinados aos exercícios de impreciso - os grupos sociais. Além
quantificação (teoria matemática da disso, admite apenas a identidade “parcial” (17) Cf. Le concept d'informations
informação); mas, ao mesmo tempo, entre sujeito e objeto. Portanto, livra-se dans Ia sciences contemporaines,
distanciava-se do estruturalismo e de com essa admissão do logicismo e da cit., pp. 61, 71, 73.
tendência a ver a história como o curso revolucionária, a reconciliação final. No
de um silogismo lógico que se realiza, jovem Marx, é o ser do proletariado e a
necessariamente, através da falsa cons­ ação conforme esse ser; no texto da
ciência dos homens. Mas, nem por isso maturidade, é a humanidade que
consegue equacionar a relação entre o real “levanta” e “resolve” os problemas que
e o possível. Como se dá essa passagem? lhe foram postos pela história, e que só
Em Hegel e em Lukács, quando as con­ são postos quando as “condições
dições necessárias estão dadas, o possível materiais” de resolução já se apresen­
se realiza necessariamente. O possível, tam. Mas, nesses três autores, estamos
assim, não é o outro do real, mas sua ne­ perante uma concepção de totalidade
cessidade interna. que se autodesenvolve. Nada, portanto,
O próprio Marx não escapou das está fora da totalidade. No caso que nos
tentações logicistas em sua juventude, interessa: a possibilidade não está fora
embora conservasse sempre uma visão da totalidade, pois, se algo fora existir,
imanentista da história. Na famosa a totalidade espatifou-se, perdeu sua
passagem de A Sagrada Família, afirmou coesão interna, transformou-se numa
que o importante não é saber o que parte coexistindo ao lado de outra.
pensa tal ou qual operário, mas de Em Goldmann, contrariamente, há
saber “o que é o proletariado” e “o que uma “aspiração à totalidade”, a busca de
deve historicamente fazer de acordo algo fora da realidade “in progress”. O
com o seu ser. Sua finalidade e sua ação possível, posto fora da totalidade, é
histórica estão traçadas, de maneira perseguido pelos grupos sociais e não
tangível e irrevogável, em sua própria pelas classes - e, nessa substituição dos
situação de existência e em toda a sujeitos coletivos transparece outra
organização da sociedade burguesa demonstração da fragmentação da
atual”18. Muitos anos depois, voltou ao totalidade. Adorno e Horkheimer
tema, reafirmando sua visão imanen­ observaram, a propósito, que a palavra
tista do processo histórico, mas evi­ grupo assemelha-se ao que a teoria da
tando o logicismo (que, como se sabe, linguagem chama de “expressão oca­
contaminou alguns textos de seu amigo sional”, ou seja, “um lugar vazio que,
Engels). No famoso prefácio à segundo o contexto de cada ocasião, se
Contribuição à Crítica da Economia enche de diferentes significados” 20. Em
Política, afirmou: “... a humanidade só Goldmann, sobe para o primeiro plano, na
levanta os problemas que é capaz de conceituação de grupo, a dimensão
resolver e assim, numa observação subjetiva, a “estrutura mental”. Nesse
atenta, descobrir-se-á que o próprio contexto, a “consciência possível”,
problema só surgiu quando as con­ desponta como uma projeção utópica -
dições materiais para o resolver já uma aposta, como diria Pascal.
existiam ou estavam, pelo menos, em O empenho em afirmar a
vias de aparecer”19. centralidade da consciência possível nos
(18) Karl Marx e F. Engels, La Goldmann, ao contrapor-se à estudos de comunicação levou o nosso
Sagrada família (Buenos Aires: “teoria da informação”, procurou não autor a conceber um amplo projeto de
Editorial Claridad, 19 ), p. 51. identificar o possível com o provável. pesquisa que, infelizmente, não pôde ser
(19) Karl Marx, Contribuição à Mas a consciência possível, que ganha realizado. O projeto, intitulado,
crítica da economia política (S. expressão articulada nas obras de arte “Epistemologie differentielle et
Paulo: Ed. Martins Fontes, 1977), e na filosofia, como pode realizar-se conscience possible” foi descoberto por
p. 25. nos indivíduos empíricos? Se não há dois de seus discípulos, Samir Naïr e
(20) Max Horkheimer e Theodor uma necessidade lógica, imanente, Michael Löwy21.
W. Adorno, Temas básicos de como fundamentar sua efetivação? Na Goldmann pretendia realizar “uma
sociologia (S. Paulo: Ed. Cultrix, lógica hegeliana, é o automovimento pesquisa epistemológica orientada para
1973), p. 61. da totalidade que, ao cancelar as alie­ o estudo diferencial das estruturas
(21) Cf. Goldmann et Ia nações, produz o momento luminoso mentais correspondentes à diversos
dialectique de Ia totalité (Paris: do autoconhecimento. Em Lukács, grupos sociais”. Essas estruturas mentais
Ed. Seghers, 1973), pp. 159-162. cabe ao proletariado realizar, através da constituiriam “campos de variações”
tomada de consciência e da ação possíveis através do quais se estabe­
leceriam as resistências da consciência e as expressões da consciência, trouxe­
possível das camadas médias da ram o “encolhimento” da consciência,
sociedade francesa, representadas por expresso com nitidez nos romances de
dois grupos distintos: a) técnicos de nível Robbe-Grillet, interpretados como
superior e profissionais liberais; b) sintomas do triunfo definitivo da
empregados da administração. reificação.
A pesquisa teria dois momentos: no O ensaio de 1957 começa
primeiro, uma pré-enquete deveria ser apresentando a visão apologética dos
aplicada num grande número de meios de comunicação: as transfor­
indivíduos. Para tanto, seria utilizado um mações recentes do capitalismo exi­
questionário visando descobrir as gem mais qualificação da mão-de-obra,
atividades culturais dos entrevistados e houve uma diminuição da jornada de
seu grau de engajamento em atividades trabalho, aumentou a escolaridade, há
sociais. Com isso, selecionaria inici­ mais tempo livre, aumentou o número
almente um grupo composto de cem de pessoas com acesso aos bens
indivíduos - aqueles que demostraram culturais e, nesse novo contexto, a
um grau mais elevado de consciência. mídia é um agente da democratização
Esses indivíduos selecionados seriam da cultura etc.
objetos de novas entrevistas, dirigidas e Tal visão, segundo o nosso autor,
não-dirigidas. Finalmente, eles seriam ignora “o aspecto fundamental do
ouvidos a respeito de dois livros problema da comunicação: a transmissão
previamente lidos (Madame Bovary, de de um conjunto de conhecimentos não
Flaubert e um romance contemporâneo depende apenas da quantidade, nem
a ser definido), e de dois filmes projeta­ mesmo da natureza (...) das informações
dos (um sobre a atitude perante a vida emitidas, mas, também, e em primeiro
moderna, Sandra, de Visconti ou O lugar, disso que, em linguagem moderna,
deserto vermelho, de Antonioni; e outro, poderíamos chamar a estrutura do
um “filme de evasão”, Zorba, o grego, de receptor e que, no caso preciso, é
Cacoyannis). constituído pela estrutura mental e
Essa interessante e ampla pesquisa, psíquica dos indivíduos que freqüentam
contudo, não pôde ser realizada. as escolas, ouvem rádio, assistem
televisão, vão ao cinema e lêem livros
A comunicação nos tempos de bolso e histórias em quadrinho”23.
do "capitalismo de organização" A estrutura mental, por sua vez,
relaciona-se diretamente com as fases
A segunda intervenção nos da vida social e, no “capitalismo de
estudos de comunicação de massa deu- organização”, ocorre uma drástica
se em 1967, no seminário internacional transformação.
“Mass-media e criação imaginária”. A antiga sociedade liberal
Goldmann, então, apresentou o ensaio encerrava uma aparente contradição. O
Possibilidades de Ação Cultural através processo de reificação nela presente
dos “mass-media”22. ocultava o caráter humano das relações
Nesse momento, Goldmann vivia sociais, trazendo para o primeiro plano
um processo de redefinição de sua uma visão individualista que apagava a
teoria marcado pela perda de esperança imagem da comunidade humana e dos
na utopia, em especial no papel valores. Nesse contexto adverso,
revolucionário atribuído à classe contudo, surgiu uma notável floração
operária. A referência à “consciência cultural extremamente crítica da ordem
possfvel”, válida para o capitalismo vigente, cujo exemplo maior é o
concorrencial e a fase imperialista, romance realista. Contra a desuma-
cedeu lugar, no “capitalismo de nização, “o romance guardava, embora (22) O texto encontra-se
organização”, ao completo predomínio unicamente sobre o modo de ser da publicado no livro A criação
do processo de reificação. O desapa­ ausência, o vínculo com os valores...”24. cultural na sociedade moderna.
recimento da antiga “opinião pública”, O “herói problemático”, símbolo maior (23) Idem, p. 20.
mediando as relações entre a sociedade do período, debatia-se nesse mundo (24) Idem, p. 22.
opaco para tentar, inutilmente, realizar informações numa visão global. Esse
os valores ameaçados. é o pano de fundo da dominação
Goldmann busca uma explicação burguesa: a violência física é substi­
sociológica para essa resistência tuída pela “violência intelectual” e pela
cultural: a sociedade liberal gerou uma “redução da atividade do campo da
camada social heterogênea, chamada consciência”.
por ele de notáveis, que incluía os Diante de tal diagnóstico, Goldmann
quadros intelectuais divididos entre o observa o caráter global e circular do
apoio aos setores dominantes ou aos novo padrão de dominação que não pode
partidos operários. Essa camada, esteio mais ser rompido unilateralmente. A ação
da opinião pública e base da democracia cultural encontrará pela frente a
parlamentar, mediava as instâncias que passividade e o desinteresse, isto é, “as
tomavam decisões e os executantes. estruturas de consciência” moldadas pelo
Assim, apesar do processo de reifica- capitalismo. A ação política, por sua vez,
ção crescente, continuava existindo encontrará o mesmo obstáculo, que
“uma importante autonomia da toma incompreensível suas palavras de
consciência individual fundada sobre as ordem. Toda ação em defesa do huma­
responsabilidades”25. nismo terá que ser feita nas duas frentes
O desenvolvimento posterior do de batalha, ganhando assim um caráter
capitalismo suprimiu essa camada in­ global e circular, ao buscar uma reori-
termediária e, com ela, a antiga opinião entação da vida “no sentido de um re­
pública, pondo em seu lugar os nascimento da atividade e das res­
tecnocratas que passaram a monopolizar ponsabilidades dos indivíduos”26.
as decisões. A concentração do poder Como se pode perceber, o
decisório fez-se acompanhar da diagnóstico sombrio apresentado por
passividade da imensa maioria dos Goldmann é acompanhado de indi­
trabalhadores. E a passividade, nos novos cações tímidas e imprecisas sobre as
tempos, não se restringe mais ao possibilidades da emancipação
trabalho, atingindo também à esfera do humana, seja na esfera do mundo do
lazer e, portanto, a elaboração, recepção trabalho, seja através da “ação comuni­
e assimilação dos bens culturais. cativa”. O pessimismo que caracterizou
A recepção integrada, ou melhor o pensamento do autor nesse período
dizendo, mediada, da sociedade foi subitamente abalado pelo vendaval
capitalista liberal, cede agora lugar à revolucionário de 1968. Goldmann,
“desorganização dos receptores”. então, procurou atualizar a sua teoria.
Além disso, a quantidade massiva de Mas não teve tempo: a morte o
informações lançada sobre o receptor surpreendeu, dois anos depois, aos 57
torna impossível a integração dessas anos de idade.

(25) Idem, p. 23.


(26) Idem, p. 27.
Bibliografia do Artigo

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