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Ezequiel Schukes Quister

O TRÂMITE BRASILEIRO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS: AS


MINÚCIAS DA ASSINATURA, DA APROVAÇÃO E DA RATIFICAÇÃO.

Do tratado internacional

No Brasil, os tratados internacionais que versam sobre direito humanos


têm hierarquia de norma constitucional, desde que cumpridas as etapas
previstas na Emenda Constitucional 45, de 8 de dezembro de 2004, que
acrescentou um terceiro parágrafo ao artigo 5° determinando alguns critérios
para validade deste procedimento. Tal dispositivo estabelece que se o tratado
ou convenção sobre direitos humanos for aprovado pelo Congresso Nacional
com o mesmo procedimento previsto para as emendas, serão equivalentes a
elas1.

Antes disso era a jurisprudências do STF que definia esse tipo de


situação2. Essa condição é importante para a definição sobre o processo de
recepção dos tratados por nosso ordenamento jurídico. Eles, os tratados,
receberam por algum tempo a pecha de norma infraconstitucional, porém,
supralegal. Com isso, certas questões no que diz respeito à sua revogação por
norma infraconstitucional era problema controverso, que não é objeto deste
artigo.

Prevalece então, que, por seu caráter de norma Constitucional, um


tratado não pode ser revogado por norma infraconstitucional3. Dito isso, fica

1MOTTA, Sylvio. A Hierarquia Legal dos Tratados Internacionais. Disponível em: <https://w
ww.conjur.com.br/2009-set-18/convencao-direitos-pessoas-deficiencia-status-ec>. Acesso em
22 de abril 2018.
2 SENA, Fernanda Duarte de. Dos Tratados Internacionais e sua Recepção no Direito
Brasileiro. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/44924/dos-tratados-internacionais-e-sua-
recepcao-no-direito-brasileiro>. Acesso em 22 de abril 2018.

3 SENA, F. Op. Cit. 2015, p?


evidente que os tratados têm, no sistema jurídico brasileiro, aceitação pela Via
da Emenda Constitucional.

A caraterística presente no processo de validação dos tratados é a


necessidade de passar pelo crivo do Congresso, nas duas Câmaras, e ser
assinado e ratificado pelo Presidente, que é a pessoa física com poderes para
representar o Brasil, país soberano, perante aos demais países da comunidade
internacional. Essa característica é evidentemente importante, já que as
normas de direito internacional ditam que somente estados soberanos podem
pactuar. Estes nos papeis de seus presidentes ou outros representantes
plenipotenciários4.

No que diz respeito às estruturas dos tratados, cabe indicar lição de


Valério de Oliveira Mazzuoli, que nos diz ser a convenção de Viena o marco
que estabelece as formas e diretrizes que os tratados devem seguir 5, de
maneira mais ou menos estandardizada.

Da assinatura do tratado

A estrutura dos tratados, como dito anteriormente, é uma forma


estandardizada de contrato que prevê, como qualquer outro contrato, as
mínimas informações sobre o que se pactua, como por exemplo, a matéria
(título) daquilo que se espera encontrar no texto, que nada mais são que os
motivos do tratado (preâmbulo ou exórdio). Os artigos de lei que compõem os
fundamentos jurídicos (dispositivos), o local e data onde se celebra o contrato
(fecho) e as assinaturas propriamente ditas6.

No Brasil, a dinâmica da assinatura prevê que, previamente, o tratado


seja validado nas casas legislativas, para então partir para a assinatura do
4REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 13 ed. São Paulo:
Saravia, 2011, p. 59.
55MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 5 ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2011, p.166.

6MAZZUOLI, V. Op. Cit. 2011, p. 166


executivo, do presidente. Ele tem o poder de assinar ou não tal tratado. Até
este momento ele pode exercer o poder discricionário e se negar a assinar o
documento sem muitas explicações, já que isso faz parte do poder soberano do
Estado. Normalmente, contudo, o ato de não assinar ou, assinar com reserva,
segue-se de uma justificativa. No caso da reserva, entende-se que o presidente
ou mesmo as casas legislativas possam não ter concordado com algum ponto
específico do texto. Por isso chama-se opor reserva: “Ela é maneira de tornar
possível que, entendendo inaceitável apenas parte — em geral mínima, ou,
quando menos, limitada — do compromisso, possa o Estado, não obstante,
ingressar em seu domínio jurídico”7. Frise-se, entretanto, que a oposição de
reserva é elemento que só cabe nos tratados multilaterais, onde há vários
Estados soberanos tentando de uma maneira lógica acatar regras que nem
sempre estão em consonância com suas estruturas jurídicas internas.

Por fim, é oportuna a citação do ex-ministro Francisco Rezek sobre a


reserva:

Por quebrar a uniformidade absoluta do regime jurídico convencional,


a reserva é tradicionalmente entendida como um mal necessário à
prevenção de mal maior, que seria a marginalização de Estados
diversos nos pactos a cujo texto fizessem restrição tópica, tantas
vezes mínima, ou inexpressiva na essência. Assim, a retirada de
reservas é gesto não apenas aceito, mas incentivado na cena do
direito internacional público. Muitos são os tratados que, facultando
reservas, encerram também norma que prevê e facilita sua retirada 8.

Desta feita, isso não ocorre nos tratados bilaterais, pois, conforme sua
própria natureza é imprescindível que as partes cheguem a um consenso antes
da assinatura, o que coloca como inútil a questão da reserva. Neste caso, a
aceitação expressa é regra, ressalvadas as alterações que se fizerem
necessárias.

7 REZEK, F. Op. Cit. 2011, p. 90 e 91.

88 REZEK, F. Op. Cit. 2011, p. 93.


Por fim, nos diz Mazzuoli que a assinatura é um aceite precário e formal,
que não acarreta (salvo a exceção do art. 12 da Convenção de 1969) efeitos
vinculantes (...)9

Da provação do tratado

Conforme visto anteriormente, antes de partir para a assinatura do


presidente o tratado precisa da aprovação nas casas legislativas. Com relação
à validade do tratado quando da sua assinatura, Mazzuoli nos diz que, “em
verdade, o tratado internacional assinado já existe, mas antes de ser aprovado
pelo Congresso e ratificado pelo Presidente da República não entra no mundo
jurídico como negócio jurídico perfeito”10. Todavia, a simples assinatura serve
apenas para identificar que “se chegou ao cabo as negociações e que os
representantes dos Estados ali apuseram suas assinaturas”11. Com a
aprovação, portanto, está tacitamente realizado o negócio jurídico e, se com a
assinatura o tratado passa a existir, ainda que não ratificado, já está em vias de
concretizar tudo o que fora negociado, e, principalmente, apto a gerar efeitos
após ratificação.

Da ratificação do tratado

Sem dúvida esse é o ponto culminante do processo que levou o tratado


à sua existência no mundo jurídico.

Depois de aprovado e assinado pelo presidente, o processo de


ratificação confirma que o Estado signatário se submete às regras do tratado e,
obrigar-se-á a cumpri-lo. Nas palavras do ex-ministro Rezek: “Ratificação é o
ato unilateral com que a pessoa jurídica de direito internacional, signatária de

9 MAZZUOLO, V. Op. Cit. 2011, p. 211.

10 MAZZUOLI, V. Op. Cit. 2011, p. 174.

11 Idem, p. 175.
um tratado, exprime definitivamente, no plano internacional, sua vontade de
obrigar-se”12. A partir deste momento o negócio jurídico está aperfeiçoado.

É o presidente quem ratifica o tratado, pois somente ele, como


representante do Estado soberano tem esse poder. É um ato pelo qual ele
demonstra à comunidade internacional as intenções do Estado e sua sujeição
ao que foi pactuado. Conforme nos ensina Rezek:

Não se pode entender a ratificação senão como ato internacional, e


como ato de governo. Este, o poder Executivo, titular que costuma
ser da dinâmica das relações exteriores de todo Estado, aparece
como idôneo para ratificar — o que no léxico significa confirmar —,
perante outras pessoas jurídicas de direito das gentes, aquilo que ele
próprio, ao término da fase negocial, deixara pendente de
confirmação, ou seja, o seu consentimento em obrigar-se pelo pacto.
Parlamentos nacionais não ratificam tratados, primeiro porque não
têm voz exterior, e segundo porque, justamente à conta de sua
inabilidade para a comunicação direta com Estados estrangeiros,
nada lhes terão prenunciado, antes, por assinatura ou ato
equivalente, que possam mais tarde confirmar pela ratificação13.

É importante destacar que, após assinado e ratificado, o pacto torna-se


irretratável. Assim o é para que se possa garantir a segurança jurídica.
Considerando que o Estado teve tempo e condições para analisar o tratado,
não há que se falar em retratação após sua ratificação. É a pacta sunt
servanda que se consuma com tal dever. Entretanto, é evidente que certas
condições pactuadas dependam, por exemplo, de questões orçamentárias, ou
de legislação para que seja possível por em prática o avençado.

Se a aprovação pelas Câmaras legislativas é um primeiro passo,


seguido das assinaturas ou oposição de reservas, culminando com a
ratificação, cabe salientar que este trâmite não tem prazo estabelecido. A
assinatura, conforme visto, já consagra, em partes, o que foi avençado. Porém,
somente a ratificação, que, segundo lição de Mazzuoli, é a “troca ou depósito

12 REZEK, F. Op. Cit. 2011, p. 74.

13 Idem, p. 73.
dos instrumentos” 14 na sede estipulada no acordo, é que torna o tratado um
acordo em sua mais ampla definição.

14 MAZZUOLI, V. Op. Cit. 2011, p. 212

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