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ARBITRAGEM NO FUTEBOL – EM BUSCA DA EXCELÊNCIA (TEXTO1)

SOLICITAÇÃO FÍSICA IMPOSTA PELO FUTEBOL – UMA ABORDAGEM COMPARATIVA

ENTRE ATLETAS E ÁRBITROS


POR LUIZ CESAR MARTINS
Nas últimas décadas, o
futebol vem sendo uma
das modalidades que
mais utiliza os recursos
científicos e
tecnológicos.

Este fato tem tornado o


jogo cada vez mais
dinâmico e, a fim de
garantir um ritmo
competitivo satisfatório,
os atletas são expostos
a um grau altíssimo de
stress físico, psicológico
e, até mesmo, social.

Como parte integrante


deste cenário está o
árbitro, que também necessita acompanhar este ritmo intenso, porém, com um fardo a mais
para carregar – a impossibilidade do erro que o persegue a cada menor fração de tempo
durante os 90 minutos.

Um dos pontos fundamentais para amenizar este fardo é propiciar uma evolução no nível de
aptidão física do árbitro, minimizando gradativamente, o impacto entre a diferença na sua
condição física e a do atleta, que evolui absurdamente e de maneira muito rápida.

Para tanto, o primeiro passo é determinar a solicitação física que o jogo impõe ao árbitro e,
traçar um paralelo com a do atleta, principalmente no que diz respeito ao volume (distância
total percorrida) e intensidade (velocidade atingida e % da freqüência cardíaca máxima) e, a
partir daí, estabelecer um programa de preparação física adequada às necessidades
específicas do jogo.

Os dados apresentados a seguir, são fruto do estudo realizado pela Romano & Martins
Esportes junto a Federação Paulista de Futebol, no qual participaram os árbitros que
atuaram no Campeonato Paulista de Futebol, entre as temporadas de 1999 a 2004.
A literatura, desde os
tempos mais remotos, tem
nos demonstrado uma
evolução na distância
percorrida pelos atletas.

Durante a década de 60
observou-se que estes
percorriam uma distância
entre 3.200m e 3.800m, no
máximo.

Hoje, estudos como os de Bangsboo (1994) e Veryehen (2000) mostram uma realidade
completamente diferente.

Segundo estes autores, poderíamos resumir da seguinte forma o trabalho realizado pelos
atletas:
Distância média percorrida: 9.000m a 12.000m

Goleiros Zagueiros Laterais Meias Volantes Atacantes


4.000m 9.000m 12.000m 10.000m 9.600m 9.800m

Utilizando-se os mais diversos tipos de deslocamentos sendo: 24% andando, 20% correndo
forte, 36% trotando, 11% sprintando, 7% correndo de costas e, apenas 2% correndo em
posse de bola. É importante salientar ainda, que à distância percorrida no primeiro tempo é
5% superior a do segundo tempo.

No caso dos árbitros, são poucos os trabalhos


encontrados na literatura que nos dê tantas
referências.

Um dos mais recentes foi o realizado por


Catterall et al (1993), onde este encontrou uma
distância percorrida de 9.500m pelos árbitros da
Liga Profissional Inglesa, sendo: 47.0%
trotando leve, 23.0% andando, 12.0%
sprintando e 18.0% correndo de costas.
Outros autores como Assami (1988), encontraram distâncias entre 9.600 a 10.500m
percorridos por árbitros estrangeiros que atuavam na Liga Nacional Japonesa de Futebol.
Os dados coletados durante
os jogos do Campeonato
Paulista de Futebol
encontram-se na TABELA I.

Nela, podemos observar


que houve um aumento
considerável da distância
total percorrida durante os
últimos cinco anos, sendo
que, ao compararmos a distância percorrida na arbitragem única em 1999 e 2003,
notamos um aumento de 25.9% e um aumento de 23.0% na distância percorrida na
dupla arbitragem de 1999 para 2001.
TABELA I 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Série AI
9.756m - - 10.186m 12.284m 11.794m
(arbitragem única)
Aspirantes
5.281m - - - - -
(arbitragem dupla)
Série AI
- 6.230m 6.495m - - -
(arbitragem dupla)
Obs.: Em 2003, o número de total de jogos monitorados foi de 20; o total de árbitros foi de 13.

VELOCIDADE MÉDIA: indica-nos o grau de intensidade imposta pelo jogo, bem como o
limite inferior e superior no qual o árbitro deve trabalhar durante as sessões de treinamento.

No caso dos atletas, as velocidades são definidas por Bangsboo e Reily (2000) da seguinte
forma: andando 6km/h (40%), trotando 8km/h (17%), correndo entre 13 e 18km/h (25%),
sprintando 30km/h (1%0).

No trabalho realizado com os árbitros, entre os anos de 1999 a 2003, encontramos os


resultados contidos na TABELA II.

TABELA II 1999 2000 2001 2002 2003 2004


Série AI 11,1 13,4 13,3 13,7
- -
(arbitragem única) km/h km/h km/h km/h
Aspirantes 13,4
- - - - -
(arbitragem dupla) km/h
Série AI 11,6 13,2
- - - -
(arbitragem dupla) km/h km/h
FREQÜÊNCIA CARDÍACA MÉDIA: da mesma forma que velocidade, a freqüência
cardíaca média indica-nos o padrão de intensidade do jogo, já que é diretamente
proporcional ao comportamento da intensidade. Ou seja, quando esta aumenta a freqüência
cardíaca também aumenta, indicando uma tendência de aumento do ritmo de jogo. Assim,
torna-se possível caracterizar o quanto intenso é o jogo e, de certa forma, definir quanto da
capacidade máxima do árbitro este solicitou.

A freqüência cardíaca do atleta varia durante o jogo de acordo com a sua posição. Os
volantes e zagueiros obtêm uma média de 155bpm, já os meios de campo 168bpm e os
laterais 171bpm, o que representa 85.0% a 90.0% da freqüência cardíaca máxima do atleta
(Bangsboo, 1994).

Catterall (1993) observou uma freqüência cardíaca média de 165bpm em árbitros durante
jogos da liga inglesa, o que segundo Reily representa de 75.0% a 80.0% da freqüência
cardíaca máxima.

A TABELAS III e IV demonstram os resultados obtidos no nosso trabalho. Ao compararmos


os dados da arbitragem única de 1999, 2002 e 2003, observamos que ocorreu um aumento
considerável da intensidade do jogo para o árbitro.

TABELA III 1999 2000 2001 2002 2003 2004


Série AI
158 bpm - - 166 bpm 157 bpm 162 bpm
(arbitragem única)
Aspirantes
162 bpm - - - - -
(arbitragem dupla)
Série AI
- 157 bpm 151 bpm - - -
(arbitragem dupla)

Série AI Aspirantes Série AI


TABELA IV
(arbitragem única) (arbitragem dupla) (arbitragem dupla)
1999 69,1% 82,1% -
2000 - - 84,3%
2001 - - 83,2%
2002 - - 84,8%
2003 - - 75,5%
2004 78,0% - -

Porém, ao observarmos a % da freqüência cardíaca máxima obtida no jogo e cruzarmos


com o limite de Resistência Aeróbia (Limiar Anaeróbio), notamos que estes se tornaram
mais resistentes à fadiga, pois mesmo com o aumento do ritmo de jogo este ainda
apresenta uma característica predominantemente aeróbia (ver tabela abaixo). O mesmo
vem ocorrendo ano a ano na dupla arbitragem.

Relação entre Freqüência Cardíaca de jogo X Freqüência Cardíaca no Limiar


1999 2000 2001 2002 2003 2004
92.8% 94.0% 93.9% 91.2% 85.7% 81.9%

A tabela mostra que até os percentuais acima citados, o trabalho ainda é


predominantemente aeróbio.

Com isso, podemos concluir


que a resposta adaptativa ao
treinamento foi positiva, já que
conseguimos colocar o árbitro
mais próximo do ritmo do jogo,
em condições de equilíbrio
metabólico. Isto lhe garante
manter um padrão de
concentração elevado por um
‘eríodo maior de tempo e, pelo
fato de poder acompanhar as
jogadas de forma mais próxima, lhe garante uma condição visual melhor do jogo,
minimizando assim, a possibilidade de erros.

Outro aspecto importante a ser considerado, é que o jogo é tão intenso para o árbitro
quanto para o atleta. Porém, o atleta apresenta um valor de freqüência cardíaca máxima
maior, o que possibilita a imposição de um ritmo de jogo mais elevado. Para que o árbitro
possa impor um ritmo próximo ao do atleta, faz-se necessário a constante manutenção de
programas de preparação física específica, bem como, controles mais efetivos dos padrões
nutricionais e dos fatores que regem a sua bioquímica sangüínea.

MÉDIA DE PESO PERDIDO DURANTE


O JOGO: a desidratação pode promover
uma queda de até 30% da capacidade
máxima de trabalho, o que ocorre quando
a % do peso corporal perdido exceder
2%.

Quanto maior a intensidade do jogo


maior é a perda de líquidos e, para
minimizar este problema, faz-se
necessário o controle de pesagem antes e após a partida, a fim de detectar o grau de
desidratação e auxiliar na adoção de uma conduta de reidratação eficaz.
O atleta, por exemplo, chega a perder entre 2kg a 3kg por jogo, sendo 1.400 a 1.600g de
água e de 400 a 600g das reservas de energia estocados nos músculos e fígado.

Ao pesarmos os árbitros antes e após os jogos, obtivemos os seguintes resultados:


1999 2000 2001 2002 2003 2004
Média de perda de peso 2.26kg 2.28kg 2.46kg 1.80kg 2.10kg 2.35 kg
% do peso corporal total 2.30% 2.10% 2.80% 2.00% 2.02% 2.20%
Média de temperatura 24.6ºC 25.4ºC 27.7ºC 26.5ºC 26.1ºC 26.4ºC
A tabela acima mostra que a resposta de perda de líquidos do árbitro é bem próxima a do
atleta.

MÉTODOS E EQUIPAMENTOS UTILIZADOS

1. Distância total percorrida:


até 2002, foram utilizados o
marcador e contador de
passos (pedômetro) da
marca Omron (modelo HJ-
102). A partir de 2003,
passamos a utilizar o
Sistema de Monitoração via
Satélite (GPS);

2. Peso corporal: balança digital, marca Tanita;

3. Monitoração da freqüência cardíaca: sistema de telemetria computadorizada marca


Polar (modelo Accurex Plus);
Obs: para o estabelecimento da % da FC máxima imposta pelo jogo ao árbitro,
determinou-se a FC máxima em teste ergoespirométrico realizado em esteira rolante.
Limiar Anaeróbio e VO2 Máximo por Análise de Gases, equipamento Aerosport.

Ao observarmos o
conjunto dos dados
obtidos durante as
cinco temporadas, notamos uma considerável evolução da condição de jogo dos
árbitros de São Paulo.

Apesar de sabermos que, dia-a-dia o jogador de futebol torna-se cada vez mais atleta e
o ritmo de jogo torna-se cada vez mais acentuado, as perspectivas são bastante
positivas, principalmente se aliarmos os recursos tecnológicos e científicos a uma maior
conscientização dos árbitros da necessidade de superação de seus limites físicos.

Porém, não podemos nos dar por satisfeitos com estes resultados, pois os dados
demonstram que ainda há possibilidade de evolução.

Um dos pontos primordiais para que isto ocorra, é a necessidade do árbitro manter-se
em forma durante todo o ano, para que na temporada seguinte ele inicie numa condição
igual a anterior e nunca abaixo.

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