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São Paulo
2014
Versão corrigida
A versão original encontra-se na biblioteca do MAE
São Paulo
2014
ii
Nome: Vanessa Linke Salvio
Título: Os conjuntos gráficos pré-históricos do centro e norte mineiros: estilos e territórios
em uma análise macro-regional
Aprovado em:
Banca Examinadora:
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LINKE, Vanessa. Os conjuntos gráficos pré-históricos do centro e norte mineiros:
estilos e territórios em uma análise macro-regional. Tese (doutorado). Museu de
Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo. 2013
i
LINKE, Vanessa. Os conjuntos gráficos pré-históricos do centro e norte mineiros:
estilos e territórios em uma análise macro-regional. Tese (doutorado). Museu de
Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo. 2013
In a forty years period of archeological researches in the Center and in the North of
Minas Gerais, in which rock art was contemplated, a scenario of an almost uninterrupted
researched areas was created. In these areas, the parietal graphics traces were organized in
sets, using the great classificatory unities, usual in archaeology, communicating with the
notions of style and tradition. This research compared the graphical sets of some regions of
the north and center of Minas Gerais, making use of typological analyses and thematic
associations, aiming to discuss the filiations of the sets in wide classificatory categories
and the design of some possible territories. In order to achieve it, sets of primary and
secondary data were utilized, the ones that are available in the dissertations, thesis, articles
and collections of Museu de História Natural da Universidade Federal de Minas Gerais and
in dialogs between concept and style, and others associated to the methodological
reflection, sighting an approach between the anthropological and archaeological
bibliographic production.
Key words: rock art, Minas Gerais, style, thematic associations, tradition
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Este texto é apresentado ao Programa de Pós Graduação do Museu de Etnologia da
Universidade de São Paulo enquanto resultado de pesquisa de doutoramento.
Fazer esta pesquisa se fez em meio a necessidade de se discutir macro-
regionalmente conjuntos de grafismos rupestres e as unidades estilísticas nas quais foram
atribuídos em uma escala macro-regional, buscando relacionar as unidades, grandes
categorias classificatórias, à noção de territórios.
O texto é dividido em sete capítulos que buscam compartilhar as reflexões,
procedimentos, análises.
O capítulo inicial apresenta o cenário da pesquisa, recorte geográfico da mesma,
contexto das pesquisas nas regiões selecionadas para análise, além de objetivos e
justificativa.
O capítulo seguinte, chamado de múltiplos estilos, apresenta uma revisão
bibliográfica do conceito de estilo, usual na arqueologia e importante para as discussões
aqui empreendidas.
O capítulo três, sobre materiais e métodos, contém não apenas os procedimentos
utilizados e os materiais em si, mas congrega reflexões metodológicas, conceituais e
epistemológicas, em uma certa medida. Desta maneira, as discussões metodológicas e seus
referenciais encontram-se distribuídas ao longo do texto.
No capítulo quatro apresento as regiões trabalhadas no que tange a seus conjuntos
gráficos, apresentando já algumas das discussões e perguntas cujo método desenhado
buscou responder.
Os capítulos cinco e seis expõem as análises empreendidas e algumas reflexões
desenvolvidas a partir delas.
O capitulo sete trás as considerações e objetiva refletir nas possibilidades de
respostas obtidas e perguntas derivadas.
Por fim, este texto contém um epílogo, que de forma breve, compartilha uma
reflexão deste processo acadêmico, do seu percorrer.
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2 A maior parte das pesquisas em arte rupestre em Minas Gerais foi realizada pela equipe do Setor de Arqueologia do Museu de História Natural e
Jardim Botânico da UFMG.
3 Os trabalhos de Águeda Vilhena-Vialou e Denis Vialou destacam-se pelo oposto.
3
de cronoestilística, em que os grafismos são analisados considerando os distintos
“momentos” de construção pictórica de um painel, um sítio e uma região. Estas análises
fazem uso das categorias classificatórias criadas, buscando agrupar os grafismos em
conjuntos segundo critérios já mencionados, e os analisam segundo suas relações de
sobreposição. Estas análises têm sido frequentemente utilizadas pela equipe do Setor de
Arqueologia da Universidade Federal de Minas Gerais (ver Ribeiro & Isnardis, 1996/97;
Isnardis, 2004; Ribeiro, 2006 entre outros). A cronoestilística4 permitiria, em uma escala
regional, porém mais restrita geograficamente do que aquela que define a tradição, traçar
um quadro de variabilidades normativas dentro de uma lógica contextual mais ampla.
Mais recentemente, alguns pesquisadores passaram a considerar diferentes atributos
na análise cronoestilística, que não fossem apenas aqueles estritamente relacionados aos
aspectos gráficos das pinturas e aos painéis nos quais elas se colocam. Em um estreito
diálogo com a chamada Arqueologia da Paisagem, diferentes pesquisadores (Isnardis, op
cit; Ribeiro, op cit; Berra, 2003; Linke, 2008) passaram a considerar atributos físicos dos
locais em que os conjuntos gráficos se localizam, de modo que os aspectos possivelmente
relacionados às escolhas feitas de onde colocar os grafismos, por parte de seus autores,
passaram a ser consideradas. A posição dos grafismos no painel e no sítio passou também
a ser um critério para a definição de diferentes conjuntos estilísticos, assim como as
características morfológicas dos suportes, do sítio, bem como a relação deste último com
diversos outros atributos físicos da paisagem, como a proximidade com cursos d’ água,
características de acesso, posição topográfica. Tal abordagem foi aplicada por Isnardis
(2004) no vale do Rio Peruaçu, em sua dissertação de mestrado, por Loredana Ribeiro
(2006), que extrapolou as análises começadas por Isnardis para outras regiões do norte de
Minas e sudoeste da Bahia, e por mim em minha dissertação de mestrado, em Diamantina
(Linke, 2008). Em todas estas áreas, a abordagem se mostrou bastante profícua, indicando
que os aspectos dos locais, em micro e macro escala, nos quais os diferentes conjuntos
gráficos observados são tão recorrentes quanto os atributos estritamente gráficos e
temáticos utilizados até então para a definição de unidades estilísticas.
Nos itens que se seguem apresento um breve histórico das pesquisas em arte
rupestre conduzidas em cada uma das regiões que compõem a área de estudo selecionada
para esta tese, a fim de ir traçando um esboço de abordagens empregadas e que
influenciam, sem dúvida, no conjunto de materiais e métodos selecionados aqui.
4 Esta é construída analisando as sobreposições entre as figuras, utilizando suas características estilísticas, as tintas com que foram produzidas e as
intempéries e processos biológicos que podem ter atuado sobre elas.
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Com este objetivo foram iniciadas as pesquisas na Lapa Vermelha, que mais tarde
viria a tornar-se referência em função da descoberta do esqueleto de “Luzia” (Piló e Neves,
2008).
Na medida em que os trabalhos de escavações e prospecções iam ocorrendo,
aumentava-se a necessidade em se fazer os levantamentos e análises dos grafismos
rupestres regionais. Embora Laming-Emperaire tenha realizado seu trabalho de
doutoramento em arte rupestre do Velho Mundo, solicitou ajuda a Pierre Colombel para
que orientasse a equipe que faria as análises dos vestígios gráficos, equipe esta coordenada
pelo então jovem André Prous. Em 1977, inaugurava o Setor de Arqueologia da UFMG,
tendo o Professor André Prous como seu coordenador, que deu continuidade às pesquisas
de Lagoa Santa juntamente com seus colaboradores.
Embora os estudos realizados na região tenham sido pouco concentrados, já que a
equipe do Setor de Arqueologia, rapidamente rumou seus trabalhos a norte dali, em área
vizinha (que será apresentada no próximo item deste capítulo), vários foram os sítios que
tiveram seus vestígios gráficos levantados sistematicamente através do calque (cópia em
escala 1x1 dos vestígios gráficos e características dos suportes)5. Os vestígios gráficos
foram aí também analisados, buscando agrupá-los em conjuntos observando suas
semelhanças e diferenças, além de observando características associativas e de
posicionamento relacional no sítio.
Estas abordagens aplicadas combinavam um conjunto de referências e práticas, que
embora nunca explicitamente assim colocados pelo coordenador dos projetos, combinavam
elementos estruturalistas e também histórico-culturais.
No momento em que as análises começaram a ser sistematizadas, ganhava corpo no
Brasil as abordagens histórico-culturais, sobretudo com influência do PRONAPA, em que
os vestígios eram organizados em tradições e fases. Não diferente das demais categorias de
vestígios no Brasil, os grafismos rupestres da região de Lagoa Santa foram assim
agrupados – em analogia também ao que ocorria no Nordeste do Brasil. Contudo, ao invés
de aplicar tais categorias buscando-se linhas evolutivas ou explicações pautadas, sobretudo
na difusão, buscava-se este agrupamento de conjuntos tentando decifrar as normas
organizativas dos mesmos, dialogando com as abordagens estruturalistas emprestadas da
Lingüística.
Após o início dos investimentos do Setor de Arqueologia da UFMG a outras áreas
fora do Planalto Cárstico, as pesquisas na região foram tornando-se esporádicas e pontuais,
5 Nos anos de 1980 os vestígios gráficos ainda foram sistematicamente analisados pela equipe de André Pous, mas nos anos 1990 as análises foram
tornado-se esporádicas.
7
até que, nos anos de 1990 projetos coordenados por Walter Neves, do Instituto de
Biociências da Universidade de São Paulo, tiveram início na região. No contexto das
pesquisas do Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos do referido Instituto, buscou-se
enfatizar as análises paleoambientais conjuntamente com as análises dos sepultamentos
identificados, sob o enfoque da Bioantropologia (Piló e Neves, 2008).
As pesquisas arqueológicas realizadas pela equipe de Walter Neves incrementaram
as discussões a cerca dos processos de ocupação do Planalto Cárstico de Lagoa Santa à
medida que suas abordagens dialogam com linhas teóricas diversas daquelas até então
experimentadas pela região: alicerçadas nas escolas anglo-saxônicas, nas quais se discute
diretamente com a teoria dos sistemas, sistemas de assentamento e teorias neo-
evolucionistas.
As pesquisas coordenadas por André Prous do Setor de Arqueologia da UFMG e
aquelas realizadas por seus colaboradores foram responsáveis pelo delineamento e análise
de conjuntos gráficos estilísticos e suas relações cronológicas, definindo a chamada
Tradição Planalto.
Além da Tradição Planalto, outros conjuntos gráficos foram identificados na região
de Lagoa Santa, como a Tradição Nordeste e a Tradição Agreste (Prous et al, 2003;
Isnardis, 2009; Baeta, 2011), ambas definidas na região nordeste do país.
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em área vizinha – escolha recorrente nas áreas pesquisadas pelo Setor de Arqueologia, até
a primeira década do presente século – demonstra a influência direta das escolas Francesas,
frequentemente optantes pelas monografias de sítio, com interesses secundários em
análises inter-sítios, padrões de assentamento e organização tecnológica.
As prospecções arqueológicas realizadas na Serra do Cipó, região vizinha ao
Planalto Cárstico de Lagoa Santa, mas com características ambientais marcadamente
distintas, objetivou a identificação de sítios com condições de preservação melhores do que
aquelas encontradas pelos pesquisadores nas grutas calcárias, após as escavações não
controladas na região.
Posteriormente à identificação do Grande Abrigo de Santana do Riacho e de seus
vestígios, foram então realizadas campanhas de prospecções oportunísticas em outras áreas
da Serra do Espinhaço, a fim de identificar sítios potenciais para novas intervenções. Nesta
ocasião, sítios nos municípios do Serro, Diamantina, Gouveia e Datas foram identificados
e registrados no IPHAN.
Desde finais dos anos de 1960, pesquisadores do IAB estiveram nestes municípios
e outros da porção mais setentrional do Planalto Meridional do Espinhaço realizando
também prospecções oportunísticas no âmbito do PRONAPA e PROPEVALE (Seda,
1998).
Os trabalhos sistemáticos, portanto, foram concentrados no Grande Abrigo de
Santana do Riacho, até os anos de 1990, período no qual as atividades de escavação e
levantamento dos grafismos rupestres do sítio foram finalizadas.
Na região da Serra do Cipó, a partir deste período, as pesquisas arqueológicas
passaram a ser pontuais em âmbito de processos de licenciamento ambiental, ou
vinculados à preservação do patrimônio. Alenice Baeta, interlocutora constante de André
Prous e parte da equipe do professor, continuou realizando, de maneira autônoma6,
levantamentos na região, buscando a identificação de novos sítios, sobretudo rupestres.
Estes levantamentos, conjuntamente com aqueles realizados no Planalto Cárstico de Lagoa
Santa, compuseram a tese de doutoramento da pesquisadora (Baeta, 2011).
Conceição do Mato Dentro tem suas pesquisas arqueológicas realizadas no âmbito
da Arqueologia Preventiva. Seus vestígios e sítios arqueológicos só foram alvo de
levantamentos sistemáticos a partir dos trabalhos de avaliação de impacto ou relacionados
a projetos municipais de inventários de patrimônios culturais para ICMS cultural (Spelyon,
2008).
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Os trabalhos no Vale do Rio Peruaçu iniciaram-se em 1977, com Alan Bryan, Ruth
Gruhn e Carlos Magno Guimarães, através do Setor de Arqueologia da UFMG, realizando
as primeiras prospecções.
Em 1981, teve início o projeto Arqueologia do Médio-Alto São Francisco, em que a
cada ano campanhas de 1 a 2 meses eram responsáveis por atividades de prospecção,
escavação/sondagem e levantamento dos vestígios rupestres (Prous, 1996/97).
As pesquisas na região buscavam o entendimento da ocupação regional, onde se
apreende delineamento de cronologias e atribuições dos vestígios em unidades culturais.
Algumas teses e dissertações de mestrado foram responsáveis por estudos aprofundados
em tecnologia dos vestígios líticos e em arte rupestre (Fogaça, 2001; Isnardis, 2004; Rodet,
2005; Ribeiro, 2006). Destaca-se ainda o trabalho de Renato Kpinis (2002), que em
abordagens complementares àquelas tradicionalmente aplicadas pelo Setor de Arqueologia
a UFMG, analisou os vestígios do Vale refletindo sobre modelos econômicos de
subsistência e de ocupação do território em uma perspectiva evolutiva.
Os trabalhos de Fogaça e Rodet, ambos teses de doutoramento, centraram-se em
análises tecnológicas dos períodos mais antigos da ocupação do Vale.
Já os trabalhos de Ribeiro e Isnardis são focados nos vestígios gráficos rupestres,
11
suas relações cronoestilísticas e, no caso da dissertação de Isnardis, na relação destas com
as diferentes inserções dos sítios na paisagem do Vale.
As pesquisas relacionadas à elaboração do Plano de Manejo do Parque Cavernas do
Peruaçu possibilitaram, através de prospecções, o incremento ao número de sítios
identificados e também favoreceram novas possibilidades de análise.
Deve-se ressaltar, contudo, que tais unidades classificatórias, em sua maioria
definidas e discutidas em profundidade por jovens pesquisadores do Setor de Arqueologia,
foram delineadas elencando em seus critérios de definição elementos complementares à
técnica, tema e associação temática (critérios gerais utilizados em diferentes regiões e por
diferentes pesquisadores). Foram no Vale utilizadas reflexões acerca de comportamentos
diante das figuras, dos painéis e dos sítios que denotassem escolhas e interações
intencionais por parte dos autores dos grafismos (Ribeiro & Isnardis, 1996/97; Isnardis,
2004; Ribeiro, 2006), inserindo, assim, uma compreensão mais dinâmica e particularizada
dos grafismos rupestres na área de pesquisa.
Os conjuntos cronoestilísticos, portanto, foram construídos a partir da observação
de temática, justaposição, sobreposição, pátinas, características técnicas de composição das
figuras e características das tintas (Ribeiro & Isnardis, 1996/97). Ademais, dados que
definem comportamentos de seleção dos locais escolhidos para grafar no conjunto de
paredes disponíveis no cânion e nos sítios também foram utilizadas nas definições dos
conjuntos estilísticos (Isnardis, 2004; Ribeiro, 2006).
Foram delineados na região do Vale do Peruaçu três grandes conjuntos que se
enquadram no termo tradição, uma vez que se percebem nestes profundidades cronológicas
e espaciais. Foram ainda delineadas duas unidades estilísticas8 e um complexo.
Enumera-se, pois: Tradição São Francisco, em seus vários momentos estilísticos,
Unidade Estilística Desenhos, Unidade Estilística Piolho de Urubu, Complexo
Montalvânia, Tradição Agreste e Nordeste. O extenso patrimônio gráfico do Vale é
responsável pela identificação e pela criação de unidades classificatórias.
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8 Ribeiro (2006) explica que o termo unidade estilística tal como tomada no vale do Rio Peruaçu objetivava o agrupamento de conjuntos de grafismos
que no Vale demosntrava um unidade, mas que não apresentava dispersão espacial para colocá-los enquanto uma tradição. O termo unidade
estilística, contudo, já foi apresentado por mim em outros momentos desta tese, como um sinônimo de conjunto estilístico. Faço este uso do termo
(Linke, 2008), uma vez que considero-o recurso útil para falar da unidade existente entre grafismos de estilos agrupáveis.
12
Os trabalhos na Serra do Cabral iniciaram-se na década de 1970, a partir do
investimento de diferentes grupos de pesquisa.
Os arqueólogos canadenses Alan Bryan e Ruth Gruhn realizaram levantamentos em
várias regiões do Norte de Minas, incluindo a Serra do Cabral, em colaboração com o CPG
(Centro de Pesquisas Geológicas), o Setor de Arqueologia da UFMG e a Universidade de
Alberta, Canadá. Contudo, os trabalhos foram apenas exploratórios, não avançando além
da identificação de sítios, ao menos no Cabral.
A partir da década de 1970, como em outras regiões apresentadas, as equipes do
IAB e da UFMG realizaram prospecções, sendo que os distintos pesquisadores centraram-
se nas faces opostas da serra.
Dado o potencial identificado pelos pesquisadores do IAB, os mesmos, a partir dos
anos de 1980, passaram a pesquisar a região de modo sistemático, realizando escavações –
em ao menos dois sítios - e levantamento dos grafismos em mais de uma dezena de sítios.
As pesquisas do IAB na região ainda continuam.
As análises e abordagens empreendidas pelos pesquisadores do IAB, coordenadas
por Paulo Seda, apresentam semelhanças com as demais abordagens empreendidas em
Minas Gerais. Os estudos dos vestígios líticos ou cerâmicos foram realizados a partir de
análises tecnológicas dos artefatos. Os vestígios gráficos foram analisados montando-se
um quadro cronoestilístico. A maior novidade das abordagens em arte rupestre está na
tentativa de criar tipologias para os vestígios gráficos a partir de espécies animais
reconhecidas nas pinturas pela população local, hoje vivente na Serra (Seda, 1998).
É preciso também considerar o fato de ser o trabalho de Seda, aquele que primeiro,
no centro-norte de Minas Gerais, dialoga explicitamente com perspectivas teóricas anglo-
saxônicas, utilizando-as para fundamentar suas escolhas metodológicas. Em sua tese,
aborda o modo de subsistência caçador-coletor valendo-se das discussões entre ecologia e
cultura (Seda, 1998).
As figurações atribuídas à Planalto correspondem a zoomorfos, sobretudos,
cervídeos e outros quadrúpedes, por vezes flechados e peixes. Prous (1980) associa à
Tradição Planalto algumas das figurações antropomorfas que aparecem na região e chama
atenção para a frequente associação temática entre peixe e cervídeo e ainda para uma
geometrização do preenchimento do corpo dos grandes zoomorfos. Estas ponderações de
Prous a cerca do acervo gráfico da região levou-o a chamar de estilo Serra do Cabral da
Tradição Planalto. Seda (1998) apresentou o conjunto gráfico regional mostrando algumas
divergências com a apresentação de Prous. Contudo, cabe ressaltar que as áreas da Serra
13
do Cabral visitadas pela equipe de Prous e analisada pela equipe de Seda eram então
distintas uma da outra, focando Prous na porção oriental da serra e Seda na porção
ocidental. Seda (op. cit) define ainda distintos momentos de execução dos grafismos com
diferenças estilísticas existentes entre eles. O pesquisador também atribui alguns grafismos
como sendo São Francisco, os quais são representados por figurações geométricas e
biomorfas9. Com a presença destas duas unidades, Seda propõe se tratar a Serra do Cabral
como uma área de transição cultural.
, - .
9 Prous, no início de suas pesquisas no norte de Minas Gerais, delineia a Tradição São Francisco e nela foram também incluídos o que depois veio a
ser conhecido como Complexo Montalvânia. Parece que as figurações da Serra do Cabral atribuídas a São Francisco se assemelham, enquanto à
temática, daquela conhecida a posteriori como Complexo Montalvânia.
14
que se localizam as cavidades pintadas. Este objetivo acabou se tornando mote de
discussão da dissertação de mestrado de Rogério Tobias Jr., defendida em 2010 no
PPGAN-FAFICH-UFMG.
A partir de 2010, a arqueóloga Maria Jacqueline Rodet, do Setor de Arqueologia da
UFMG, investe de forma sistematizada na região realizando novas prospecções e iniciando
os trabalhos de escavação - por enquanto, em dois sítios - dando também continuidade aos
levantamentos gráficos rupestres, totalizando nove sítios calcados.
As abordagens realizadas na região mais uma vez dialogam com as correntes
francesas. Os vestígios gráficos foram analisados de modo a agrupá-los em conjuntos a
partir de semelhanças e diferenças. Foram empregadas análises cronoestilísticas e também
tipológicas.
Embora as análises dos registros rupestre tenham seguido, e seguem, as abordagens
já em prática pelo Setor de Arqueologia, Rogério Tobias Jr. (2010) buscou agregar uma
nova leitura às normas observadas nos conjuntos gráficos rupestres, dialogando com
referências da História, buscando integrar em profundidade a noção de tempo e espaço.
Para Tobias Jr.,
15
/ $
0 1 + 1
17
Mapa 3: Mapa de distribuição de conjuntos de baixo alcance geográfico
18
Mapa 4: Mapa de distribuição das tradições Agreste e Nordeste na área de pesquisa
19
manifestações de tradições delineadas em outras regiões do Brasil, conforme os
pesquisadores Isnardis e Ribeiro. Em Lagoa Santa, segundo Baeta (2011) e Prous et al.
(2003), a tradição Nordeste aparecia representada pelos grafismos Ballet11 e outras
figurações - as quais teriam sofrido “influência”, segundo Baeta, nordeste -, embora esta
atribuição pareça ainda pouco consolidada, visto o isolamento das figurações quando assim
colocadas em meio a um universo tão representativo de grafismos cuja unidade é melhor
percebida.
Quanto à distribuição dos grafismos, das duas principais tradições presentes na área
de pesquisa, poderíamos questionar se: há aí expressão de dois territórios de grupos com
repertórios culturais muito distintos?
Pensando assim, as reflexões de Rogério Tobias Jr. (2010) e Seda (2008) seriam
contempladas, uma vez que as regiões de Jequitaí e Serra do Cabral estariam a meio
caminho das principais áreas em que as manifestações gráficas destes supostos distintos
grupos fazem-se proeminentes. Os grafismos rupestres encontrados nas duas áreas seriam
denotativos de interações existentes entre estes distintos grupos.
Segundo Zedeño (2008), quando estamos lidando com o conceito de território,
precisamos considerá-lo enquanto composto de substratos naturais e culturais e que se
relacionam à territorialidade, a qual emprega materialidade ao território. Por estas
questões, o território é uma estrutura ou fenômeno dinâmico. Este dinamismo restringe a
possibilidade de tratarmos os territórios enquanto possuidores de limites bem definidos e
também enquanto espaço exclusivo de controle de um mesmo grupo cultural em todo seu
processo histórico de formação.
Neste raciocínio, não seria absurdo pensarmos que estamos lidando com territórios
ou regiões de identidade territorial, nas quais, em suas franjas, veríamos os “encontros” de
seus distintos grupos a partir de seus repertórios gráficos. Obviamente este encontro não
precisa significar encontros físicos: uma vez que os elementos da paisagem também
exercem agência sobre os homens e suas culturas. Isso permite dizer que o uso de uma
mesma paisagem não precisa ser sincrônico.
Este modo de pensar as regiões nos leva ainda para a unidade que há entre grupos
culturais e que permite ser identificada a partir das práticas replicativas e transformadoras,
a quem chamamos de tradição (Zedeño, 2010), e que são expressas na cultura material.
Aqui a tradição é usada enquanto recurso conceitual e analítico para entender a
historicidade dos territórios e das paisagens.
11 Grafismos antropomorfos em cena e alguns grafismos zoomorfos que aparecem na região do Planalto Cárstico de Lagoa Santa, cuja estética se
diferencia, em um primeiro olhar, dos grafismos predominantes na área e atribuídos à Tradição Planalto.
20
Encontra-se aqui, pois, um modo de lidar com as categorias classificatórias não
enquanto fim, mas enquanto recurso para abordar, não somente o entendimento sobre a
formação do território, mas para abordar as dinâmicas culturais envolvidas.
Interessada nas possibilidades de análise destes processos e em uma perspectiva
que não pretende enfatizar as questões de “influência, controle e acesso diferencial a
recursos” (Zedeño. 2010), as atribuições dos grafismos às grandes unidades classificatórias
precisam ser discutidas em profundidade, comparando os grafismos e seus
comportamentos nas diferentes regiões da área de estudo. Esta comparação precisa
contemplar os aspectos técnicos, gráficos, comportamentais (sistema tecnológico) em
ampla escala, de modo a alcançar uma expressão o menos errática possível das diferenças e
semelhanças inter e entre conjuntos de grafismos nas diferentes regiões aqui escolhidas
para análise, testando assim as possibilidades ilustrativas e interpretativas das unidades
classificatórias.
O principal objetivo da tese é discutir as categorias classificatórias e sua
distribuição na definição de territórios culturais, que tenham sido, ou não, compartilhados
diacrônica ou sincronicamente, a partir da análise dos conjuntos gráficos rupestres da
região do centro e norte de Minas – regiões assinaladas no Mapa 1 – em escala macro-
regional, tendo por base, sobretudo, a produção já disponível (acervos, artigos, teses e
dissertações).
21
) * +, % , %,
' D
'
* = D % E
12 Os autores utilizaram o conceito de estilo vinculado ao de horizonte estilístico [tradução minha] e a partir da leitura do conceito proposto por Max
Uhle (1913) e Kroeber (1944).
22
discutido, aparece enquanto modos de fazer, que se mantêm no espaço e se alteram no
tempo, em percebida coerência com a maneira como o conceito de estilo foi apresentado
anteriormente neste texto (Laming- Emperaire,1962; Leroi-Gourhan, 2007).
Seguindo as perspectivas de Leroi-Gourhan e Laming-Emperaire a mesma noção
implícita do que seria estilo foi aplicada em muitos trabalhos de arte rupestre, incluindo
aqueles desenvolvidos pela Missão Arqueológica Franco-Brasileira (Vialou, 2000; 1992.;
Prous, 1992; Prous & Baeta, 1992/93; Martin, 1999).
Embora na produção arqueológica o uso de diferenças estilísticas para categorizar
os artefatos sempre tenha ocorrido, somente nas últimas décadas o estilo passou a ser
explicitamente discutido teoricamente (Hegmon, 1992), permitindo a observação das
divergências conceituais que o envolviam e que foram surgindo a partir da elaboração e
incremento epistemológico pelos quais passaram o pensamento e práticas arqueológicas.
No final do decênio de 1960, Martin Wobst inicia as discussões teóricas mais
densas, relacionando estilo a unidades sociais, onde “ stylistic messages play a more active
role in the integration of social groups” (Wobst, 1977). Segundo Hegmon, Wobst trabalhou
dentro da perspectiva da teoria dos sistemas e com uma abordagem funcionalista na qual o
estilo foi considerado uma forma expansiva de comunicação de mensagens recorrentes e
pouco variadas, utilizada em contextos específicos visando máximo de eficiência
(Hegmon, 1992:520).
Algumas críticas foram feitas a esta perspectiva inicial, reconhecidas e pensadas
pelo próprio Wobst (Wobst, 1999). As críticas advêm, sobretudo, de sua visão
funcionalista, uma vez que outros pesquisadores perceberam que questões estilísticas
parecem abranger ou se relacionar a motivações que ultrapassam eficiência, e também
carregar diferentes e ambíguas mensagens, o que convida a discutir questões outras da
dinâmica social na qual o estilo se insere. Mas é notório o marco teórico do trabalho de
Wobst. A partir daí outras perspectivas foram sendo desenvolvidas, em diálogo ou não
com aquela primeira abordagem teórica explicita.
Sackett (1982), reconhecendo que o uso de noções estilísticas perpassa o método
arqueológico, e defendendo que por este motivo deve o estilo ser pensado, responde a
questões como: onde reside o estilo e a que ele se refere na cultura material e no seu
contexto de produção? Ambas as questões são postas para o entendimento e interpretação
da variabilidade artefatual nos contextos arqueológicos.
Neste sentido, Sackett propõe uma noção de estilo que ele nomeia como isocréstica.
Nesta, há uma dicotomização entre estilo e função, na qual estilo seria as diferentes
23
possibilidades existentes e escolhidas por um grupo cultural - ou étnico como coloca o
arqueólogo – na manufatura de um artefato com uma função específica. Nessas escolhas, a
estrutura, ou aquele conhecimento adquirido e passado adiante, tem um importante papel,
pois o conjunto de possibilidades de escolha estabeleceria uma relação às questões étnicas
ao longo do tempo e do espaço (1982:75). O autor mantém, pois, um diálogo com as
abordagens precedentes da arqueologia nas quais o entendimento e aplicabilidade na noção
de estilo Sackett chamou de estilo standard13, contudo Sackett argumenta que em
determinados contextos aquilo que seria entendido como função poderia ter aspectos
estilísticos relevantes e vice-versa. Para ele, mais do que uma distinção esplícita entre
aspectos estilísticos ou funcionais, os artefatos são compostos destes aspcetos que se
complementam.
Binford fez uso da dicotomização entre as noções de estilo e função. Para ele, as
escolhas envolvidas na manufatura de artefatos, que resultam na variabilidade formal dos
mesmos, não são somente irracionais, mas sendo, sobretudo, intencionais e conscientes
para a resolução de questões ambientais, ou mesmo sociais, relacionando-se ao contexto
organizacional na qual se inserem (Binford, 1982). Neste sentido, a variabilidade estilística
dos artefatos, para Binford, seria marcada pela continuidade dos atributos formais, os quais
variariam com os contextos socais de manufatura e uso dos artefatos (Binford, 1972).
Wiesnner (1983) define estilo, para suas análises das pontas de projetil dos Sun do
Kalahari, como a “ variação formal na cultura material que transmite informação sobre
identidades sociais e pessoais” (p.256). Neste sentido, assim como em algumas
perspectivas acima mencionadas, o estilo seria transmissor de informações. A arqueóloga
pontua que há dois tipos de estilo, os quais carregam distintas mensagens: emblemático, o
qual seria detentor de informação a cerca de afiliação ou identidade étnica e fronteiras;
estilo assertivo, o qual carregaria mensagens a cerca das interações sociais, da identidade
individual e relações de reciprocidade, carregando, portanto, informações sobre o grau de
contato entre grupos sociais ao longo de fronteiras (Wiesnner, 1983:258; 259). Na
perspectiva de Polly Wiesnner o estilo não carregaria uma dicotomia com os aspectos
funcionais do artefato, uma vez que as mensagens seriam também funcionais na dinâmica
das relações sociais.
Para Hodder (1982), o estilo dentro de um grupo cultural teria uma participação
muito mais ativa nas relações sociais ou étnicas do que as outras visões apresentadas
13 The standard approach underlies one of the more fundamental tasks in which archaeologists find themselves engaged, that of time-space
systematics. This is the business of ordering the archaeological record into the culture-historically distinct units of ethnic tradition (…) according to the
patterns of artifactual similarities and differences exhibited by assemblages representing different time space segments of archaeological context
(1982:64)
24
objetivaram alcançar. Para ele, os estilos teriam mais do que um papel funcional - à medida
que transmitiriam mensagens - ou gramatical, seriam os estilos feitos de símbolos capazes
de transformar e romper com uma estrutura, tendo, pois um caráter ativo na cultura, por
essência.
Mais recentemente, alguns trabalhos têm focado sobre os estilos tecnológicos, os
quais carregariam não uma dicotomia entre estilo e função, mas que entendem que as
escolhas nos modos de fazer algo são inerentes ao conjunto do universo simbólico de um
grupo cultural (Lemonnier, 1993; Stark, 1998; Hitchcock & Bartram, 1998).
Embora as discussões teóricas sobre estilo sejam muitas, a maior parte delas foi
pensada tendo como objeto de análise material lítico ou cerâmico. Estas categorias de
vestígios apresentam condições contextuais e de materialidade muito diversas dos registros
gráficos parietais pré-históricos.
Do ponto de vista contextual, têm-se duas grandes distinções: a dificuldade de se
datar os grafismos rupestres impõe sérias limitações em relacioná-los a horizontes de
ocupação. Fortemente relacionada ao ponto anterior, está a dificuldade de se relacionar os
vestígios gráficos rupestres a demais categorias de artefatos presentes no sítio, estejam eles
em contextos datados ou não. Do ponto de vista da materialidade, como atingir a função
dos grafismos? Desta questão, outras tantas emergem: como discutir função sem cometer
alu(cinações)sões interpretivas de significado das pinturas (dos temas grafados
propriamente ditos) e da ação de grafar (relacionando os grafismos a atividades xamânicas,
pedagógicas...).
Essas dificuldades limitam o uso de certas noções de estilo anteriormente
pontuadas. Assim, no estudo da arte rupestre, salvos raros casos para os quais se têm a
possibilidade de se trabalhar junto aos grupos culturais autores dos grafismos, o uso de
estilo nas pesquisas acaba sendo centrado na dimensão comunicativa/informativa dos
conjuntos gráficos voltada seja para o entendimento da história cultural de um grupo étnico
ao longo do tempo e espaço - em uma perspectiva histórico-cultural -, seja para o
entendimento do modo como o pensamento de grupos culturais se estrutura e se diferencia
também nas dimensões espaço-temporais. De um modo geral, estas duas possibilidades de
abordagem são majoritárias nas pesquisas com arte rupestre no mundo.
No Brasil, não se faz diferente. Se traçarmos uma trajetória das tendências do uso
do conceito estilo na Arqueologia Brasileira veremos que há pequenas variâncias e, para
traçarmos um quadro dessas variâncias precisamos considerar o conceito de Tradição.
Valentin Calderón foi o primeiro a utilizá-lo no Brasil aplicado à arte rupestre da
25
Bahia, em 1970, definindo-a enquanto um
Segundo Consens & Seda (1990), há uma variedade de conceitos explícitos nas
publicações dos diferentes pesquisadores, variações estas que giram em torno da maior ou
menor valoração aos aspectos cronológicos dos conjuntos.
Quando em 1966 o conceito de estilo é introduzido no Brasil (Consens e Seda,
1990:8) por Meggers e Evans, o mesmo é entendido como “ um conjunto que caracteriza
um horizonte, uma tradição ou um complexo (...) um padrão comum (...) uma regularidade
do comportamento ou de funcionamento na cultura” (p.8).
Embora Meggers e Evans não tenham aplicado a noção estilo enquanto uma
subdivisão de categorias denotativas de unidades étnicas/culturais, o uso que se fez a partir
de então foi entendendo-o como tal (Pessis, 2003; Guidon, 1991; Prous, 1992), sendo o
mesmo representado nos conjuntos gráficos por, sobretudo, recorrências temáticas e
técnicas, entre sítios cujos grafismos eram atribuíveis a uma mesma tradição (Schmitz,
1986), ou pelas mesmas recorrências técnicas e temáticas que variam temporal e
geograficamente dentro de um corpus maior entendido como tradição (Prous, 1992).
Mais recentemente, alguns trabalhos tomam o conceito a partir de perspectivas
derivadas, nas quais é entendido enquanto uma “ maneira muito específica e característica
de se fazer algo” em que a partir de sua definição acham-se “ padrões e estruturas nas
qualidades formais e técnicas que possam estabelecer relações culturais e cronológicas”
(Berra, 2003:18). Estilo nessas perspectivas estaria sendo valorizado por seu caráter visual,
ou no modo de expressão gráfica, em que elementos são representados e articulados entre
si em um painel, em um sítio, na paisagem (Berra, 2003; Vialou, 2006).
Em síntese, pode-se dizer que os trabalhos com arte rupestre no Brasil adotam
principalmente dois principais entendimentos de estilo: um, no qual estilo é considerado
enquanto uma categoria classificatória, expressão de uma variedade regional, contida em
outra grande categoria, a tradição (Prous, 1992; Prous, 1980; Prous, 1999; Martin, 1999;
Seda, 1998, Guidon, 1991; Melo, 2007; Valls, 2007 ); e outro, em que é considerado
enquanto modos de fazer e de se relacionar, com o meio e outros grafismos, que é peculiar
a um contexto de produção específico (Vialou, 2006; Berra, 2003, Comerlato, 2005). Vale
26
notar que a segunda possibilidade se distingue da primeira apenas na tentativa de
distanciamento das unidades classificatórias, a partir das quais os grafismos são mormente
entendidos. Também é preciso observar que alguns trabalhos constroem um híbrido entre
as duas abordagens, resultado de reflexões teóricas que buscam um uso mais crítico e
menos hermético das unidades classificatórias (Isnardis, 2004; Ribeiro, 2006; Tobias Jr.
2010).
A aparente homogeneidade das possibilidades de abordagem do estilo nos
grafismos rupestres na produção brasileira parece advir daquelas restrições ou dificuldades
da pesquisa com os grafismos rupestres (datação e contexto), que dificultariam análises
que dialogassem com as perspectivas mais voltadas para o processo ou comportamento
acessíveis a partir dos outros vestígios. Porém, pode haver ainda influência de uma certa
timidez de diálogo entre a arqueologia brasileira e a antropologia14, e sobretudo, com
aquela antropologia que se faz com as sociedades indígenas ainda viventes no Brasil.
Recentes trabalhos talvez vêm convidar para esta aproximação dos diálogos entre
as duas áreas de conhecimento (Barreto, 2008; Rodrigues, 2011; Jácome, 2011; Valle,
2012), iniciando um movimento renovado na Arqueologia Brasileira.
A partir deste ponto do capítulo apresentarei algumas reflexões sobre estilo em
diálogo com a antropologia, brasileira ou não, na tentativa de aproximar os vestígios
gráficos rupestres de uma conceituação menos alóctone e mais próxima, talvez não no
tempo e nem no espaço, mas ideológica, de estilo.
Não considero aqui a imutabilidade da cultura de modo que seja permitido uma
aplicação diacrônica e análoga dos entendimentos sobre a produção do mundo dos objetos
e suas consequências para as sociedades ameríndias de hoje para aquelas do passado. Mas
me parece ser possível refletir sobre a produção dos artefatos, mesmo que de outrora,
levando-se em conta um “ pensamento ameríndio15” .
Muitos são os trabalhos etnográficos que mergulham no universo da produção
artística/artefatual de grupos indígenas (Muller, 1992; Vidal, 1992; Lagrou, 2007, Van
Veltem, 2003, Barcellos, 2002). Nesses, a complexidade da produção dos objetos e tudo
que esta produção enreda nas dimensões étnicas, éticas e cosmológicas emergem,
fornecendo análises e reflexões teóricas que permitem pensarmos a produção dos
ARTEfatos16 pré-históricos de uma maneira conceitual menos afastada de seus
14 Nos estudos com arte rupestre isso pode dever-se ao fato de que os grandes grupos de pesquisa que focaram nesta categoria de artefatos
estarem associados à arqueologia como história - natural ou não.
15 Tal como vem propondo Viveiros de Castro em suas abordagens
16 A partir deste ponto do texto assumo a arte rupestre enquanto artefato, uma vez que há para sua realização seleção e interação com matérias e
modificação das mesmas em um processo técnico.
27
produtores17.
Embora os autores citados não tenham lidado em suas pesquisas com grafismos
rupestres, não me parece razoável excluir a produção rupestre do restante da produção
artística indígena. Essa não razoabilidade pode ser argumentada a partir da reflexão de Van
Velthem (2003) sobre a produção artística ameríndia as quais
17 Cabe aqui, contudo, refletir que tais conceitos são produções antropológicas, ou seja são leituras de um outro, não estando eu trabalhando com as
narrativas e falas do universo indígena, mas da construção -invenção, nos termos de Roy Wagner, 2010 - daquele universo pelo olhar do etnólogo.
28
para a produção artefatual pré-histórica.
Para Boas (1947), a arte é um caso particular da cultura. O estilo seria observado a
partir da estabilidade de padrão de um dado artefato artístico, em que o padrão em si seria
denotativo de uma permanência histórica e o estilo denotaria a permanência de uma
essência mais profunda, a qual se relacionaria às visões de mundo. Deste modo, o estilo,
para Boas, seria uma parte integral da estrutura da cultura e a partir dele seria possível
chegar às diferentes culturas18.
A partir de sua obra é possível relacionar sua noção de estilo e o método histórico
por ele proposto, no qual a compreensão antropológica da cultura visa romper com o
entendimento de evolução linear até então em voga, questionando também a eficiência do
método comparativo. Propõe, então, o uso de um olhar histórico para a descoberta e
entendimento dos “ processos pelos quais certos estágios culturais se desenvolveram”
(Boas, 2004:33 [1896]), objetivos principais da pesquisa antropológica, segundo o autor.
Há uma profunda relação, segundo Boas (1947), entre a forma a o estilo, sendo que
“ sem estabilidade na forma, não há estilo” (p.17). E a estabilidade da forma, e
consequentemente, do estilo, se relacionaria a um desenvolvimento técnico intimamente
relacionado com uma igual estabilidade dos recursos naturais disponíveis. Por conseguinte,
“ as variações de forma se reduzem aos limites estabelecidos pelos hábitos estáveis de
movimento19 de um grupo” (p.147).
Em sua proposta de abordagem dos desenvolvimentos de estágios culturais, ressalta
que é preciso atentar para o fato de que similaridades superficiais entre culturas não podem
ser consideradas provas de relacionamento entre elas. “ Desse modo, a investigação precisa
procurar sempre a continuidade de distribuição [de formas estáveis e estilos] como uma
das condições essenciais para provar conexão histórica (...)” (Boas, 2004:35 [1896]). Além
disso, o autor propõe (Boas, 1924) que distintos padrões estilísticos seriam denotativos de
organizações sociais distintas, e que entre duas regiões em que ocorrem diferenças
culturais marcantes, expressas em diferentes dimensões da vida, o padrão estilístico se
conformaria como um híbrido, unificando os traços presentes nos dois extremos, fenômeno
explicado pela difusão20.
Em contra-partida, Levi-Strauss traz à luz algumas questões ainda muito modernas
18 No sentido aplicado por Boas e transferindo o mesmo para os conceitos arqueológicos, pode-se traçar um pararelo em que o padrão para Boas
pode ser entendido como as variações, de causas históricas, ao longo de tempo em uma determinada categoria de vestígios, ou seja, aquilo que na
Arqueologia temos chamado de estilo, fácies... Já o estilo definido por Boas se relacionaria àquilo que vimos chamando de Tradição.
19 Movimento aqui pode se relacionar tanto à padrões de mobilidade, vinculados a modos de vida e fronteiras, quanto aos gestos necessários e
desenvolvidos para fabricação de um artefato.
20 Vale ressaltar, contudo, que embora Boas tenha assumido este entendimento de estilo e suas consequências no delineamento de distintas culturas
e suas historicidades, o próprio considerou poder haver diferenças estilísticas significativas, no que ele chamou de desenho realístico e técnico, dentro
de uma mesma cultura, que seria relacionado às práticas cotidianas e rituais (Boas, 1903).
29
quando, em Antropologia Estrutural (1952), afirma que fugindo dos possíveis erros
advindos dos métodos comparativos os interessados no estudo da cultura material não
deixam claro “ a diferença específica que separa um traço cultural, conjuntos de traços, ou
um estilo, suscetível de recorrências independentes e múltiplas, daquele outro cuja
natureza exclui a possibilidade de repetição sem contato” (p. 262). Levi-Strauss argumenta,
comparando objetos de diferentes e distantes regiões do mundo, que considerar as
semelhanças entre os estilos destes objetos, em que se considera não somente seu aspecto
final, mas também seus procedimentos técnicos é sim um método válido. Para ele, se tais
semelhanças são ignoradas pela antropologia moderna, que se pauta nos métodos
históricos que dizem não ser possíveis os contatos entre as diferentes culturas produtoras
de tais artefatos, volta-se ele às abordagens interpretativas que utilizam “ da psicologia ou
análise estrutural das formas para compreender recorrências simultâneas, que tem lugar
com frequência e coesão que não podem resultar do simples jogo de probabilidades”
(p.270). E que, ainda quando for possível evocar a difusão para explicar certas
semelhanças, é preciso considerar que não seria uma simples difusão de detalhes ou traços
isolados, mas sim uma “ difusão de conjunto orgânicos, em que o estilo, as convenções
estéticas, a organização social e a vida espiritual se ligam estruturalmente” (p. 292).
Levis-Strauss (1956), ao analisar os grafismos dos Cadiveu, aponta o estilo
enquanto marcador dos costumes, não sendo o mesmo ilimitado, mas sim gerido em um rol
de possibilidade; escolhas de combinações de um repertório ideal que é sentido por um
determinado grupo cultural e à maneira como o mesmo se organiza.
Seguindo uma linha de pensamento influenciado pelo estruturalismo de Levi-
Strauss, Els Lagrou afirma que a forma e o estilo são como materializações do impacto da
vida sobre as pessoas, uma vez que estes podem ser entendidos enquanto carregados de
sentidos representativos, mas também conceituais que permitem o entendimento do estreito
relacionar existente entre a estética e outros domínios do pensamento (p. 53).
30
a antropóloga conceitua estilo enquanto relações formais entre as formas, e que o mesmo
“ não demonstra nenhuma tendência de quebrar com a tradição, pois a criatividade é
considerada possível somente dentro e nunca fora de sua rede específica de sentidos sociais
sensíveis” (p.100) - à semelhança do que proposto por Levi-Strauss ao analisar os
grafismos corporais Caduveu.
Outrossim, é possível entender as características formais dos objetos par e passo ao
meio nos quais foram produzidos, seus contextos de produção, às histórias e sentidos que
os envolvem, a seus produtores. Os objetos, portanto, tratam de “ uma experiência que se
legitima através da incorporação das características formais e estilísticas de uma filiação
cultural que afirma e confirma um ser humano assim como um artefato (...)” (Van
Velthem, 2003:45).
O pensamento, ou abordagem, de Levi-Strauss desdobrou-se modernamente em um
entendimento do que seria o pensamento ameríndio e sob a luz deste pensamento a arte
indígena passou a ser desnudada a partir de um novo paradigma, no qual Els Lagrou, Lucia
Van Velthem, Aristóteles Barcelos Neto, entre outros, se debruçaram. Nesse entendimento,
atentou-se para a necessidade de incorporar às funções comunicativas de identidades
coletivas21, étnicas e/ou sociais, contidas na cultura material o caráter agentivo dos objetos.
Os artefatos agem, não são meros símbolos que falam sobre ou representam uma
realidade exterior a si (Gell, 1998; Lagrou, 2009; 2011). Desta forma, a atenção voltada
para os objetos se desloca do significado para a agência.
No universo ameríndio, segundo Lagrou (2009), situa no exterior a inspiração
artística e cultural. Isso quer dizer que os modos de fazer, construir, decorar encontram
relação direta a um outro, onde este pode ser os diversos elementos do mundo envolvente,
os seres naturais, sobrenaturais, humanos e não-humanos (Van Velthem, 2003; Barcelos
Neto; 2002; Lagrou, 2007). Este entendimento pode ser visto em diversas sociedades
indígenas, sobretudo amazônicas, como por exemplo entre os Wayana cuja estética ligada
aos seus objetos carrega um cuidado e regras para não ofender aqueles aos quais os objetos
se relacionam. Seus artefatos, que reproduzem e carregam os efeitos de um outro são
como cópias deste e o apelo estético que carrega o conceito de belo, da cópia, são
fundamentais para se evitar que este aja deleteriamente sobre os Wayana. A estética dos
artefatos, portanto, carrega uma ética responsável pela manutenção do estado de equilíbrio
do mundo (Van Velthem, 2003). Ao contrário, para os Kaxinawá os efeitos deletérios do(s)
21 Entender que os objetos carregam em suas formas marcadores sociais e étnicos, e que estes marcadores são muitas vezes sim fatores de
diferenciação intencional (Van Velthem, 1994; Vidal, 1992), permite o estabelecimento de diálogo com alguns arqueólogos que discutem a função
comunicativa do estilo, tal como apresentado alhures.
31
outro(s) ao qual os artefatos remetem são driblados evitando-se a cópia, a perfeição
(Lagrou, 2009).
Essa relação existente entre artefato e agência, entre objeto e os seres assim existe
pois a arte indígena pode ser entendida enquanto uma prática de construir corpos que
habitam mundos. Segundo Lagrou (2011), ao olhar para a produção artefatual indígena, “ o
corpo se torna artefato conceitual e o artefato um quase corpo, e os caminhos seguidos por
corpos e artefatos nas sociedades vão se assemelhando cada vez mais” (p.748). Desta
forma, agentividade, agenciamento e contemplação se tornam inseparáveis.
Se a forma que um artefato adquiri possui em si as relações de predação e
alteridade entre humanos e não humanos, a maneira como o mesmo é construído carrega
também essas mesmas relações. A maneira como um objeto é construído interfere em sua
capacidade agentiva. Portanto, as técnicas fazem parte desse jogo de preservação do
mundo, em que os elementos que compõem corpos e artefatos são selecionados a partir da
ligação que os mesmos possuem com os personagens ontológicos.
Desta forma o estilo é também um ator, possui agência e embora mantenha sua
relação estrutural a um modo de ver o mundo, age sobre o mesmo. O estilo não pode ser
considerado, pois, passivo no processo de fabricação dos artefatos, nem na interação com o
mundo que compõe.
Peter Roe argumenta a respeito dessas interativas relações existentes entre artífice,
material, contexto social e conhecimento, enquanto algo que resulta em realidades
negociáveis tanto da cultura, quanto do estilo. Neste sentido, são estes tanto processo,
como produto (Roe, 1995:28).
Como se pode ter uma ideia com esta coletânia de referências aqui usadas, as
possibilidades de entendimento e, portanto, de aplicação de estilo são muitas - e mais ou
menos relacionáveis. Para esta pesquisa encontrei amparo teórico na definição de estilo
formulada por Peter Roe (1995). Nesta são consideradas diferentes dimensões do estilo,
que, ao mesmo tempo que pode resultar numa certa abrangência não muito bem vista por
uns, dá conta e permite uma maior fluidez na aplicação do conceito. Fluidez esta que para
mim é mais justa, ou prática, na realidade dos conjuntos gráficos rupestres aqui tomados
por objeto.
Assim, estilo é neste trabalho entendido como
32
variabilidade adequada dentro de corpus artefatual/comportamental.
Estilo é tanto o processo de criação de informação através de
diferenciação, de modo que é, reconhecidamente evocativa de um
contexto cultural específico, e uma forma de circunscrever a escolha
através da imposição de uma moldura dentro da qual a criação ou
recombinação ocorre22 (p. 31).
Para Peter Roe, “ o estilo pode ser definido por um número de propriedades”
(1995:30). As propriedades por ele elencadas serão reproduzidas aqui de acordo com a
síntese que Barreto (2010) elaborou em sua tese de doutoramento. Tais propriedades
seriam:
22 Tradução minha.
33
-* %% .(
' 2
23 Essas duas expressões não me satisfazem inteiramente para falar do SER dos meus materiais, mas as utilizo aqui na falta de um léxico mais
adequado. E elas não me satisfazem, pois considero esses objetos um tanto volúveis, flexíveis, mutantes, o que me leva a questionar a condição de
realidade. Por outro lado, terão estes objetos uma natureza, algo essencial?
34
da região de Diamantina, Conceição do Mato Dentro e Monjolos.
Esses levantamentos combinam duas técnicas mais ou menos sistemáticas de
reprodução e registro dos sítios trabalhados; foram combinadas técnicas de calque dos
sítios e levantamento fotográfico integral dos mesmos.
O levantamento em tamanho 1x1 das figuras - calque - foi escolhido enquanto
técnica, pois os sítios dessas regiões apresentam muitas camadas de sobreposição em
alguns de seus painéis, e a cronologia relativa entre as figuras são dificilmente captadas e
lidas com adequada precisão pelos levantamentos fotográficos - mesmo os de alta
resolução. Embora seja bastante criticado por alguns núcleos de pesquisa, o registro das
figuras e dos painéis a partir da cópia em plástico dos mesmos, tem se revelado ainda a
melhor alternativa para cognição de determinados elementos gráficos e cronológicos
quando os painéis se caracterizam por muitas relações de sobreposição.
O levantamento através de calque - realizado em plástico Volcon N° 10 e caneta de
retroprojetor24 - ou frotagem - realizada utilizando entretela N° 4 e papel carbono - foi feito
amostralmente, privilegiando os painéis com maior informação de sobreposição, cuja
leitura a partir de fotografia seria dificultosa. Nestes foram anotadas informações sobre as
tintas - considerando textura e cor25 -, elementos de forma (as figuras em si), gesto
(delimitação e direção, esta última apenas quando visível - dos traços), pátinas,
características do suporte - descamações, exudações, diáclases - e informações de
sobreposição. Em alguns painéis, mesmo sem sobreposição excessiva, foi aplicado o
calque, visando o registro dos vestígios dos recursos gestuais na composição dos
grafismos.
No levantamento das pinturas foram valorizados os traços originais das mesmas e
observando-se a sequência de elaboração dos mesmos, de modo a permitir recompor o
modo de concepção das figuras (Figura 1).
24 As tintas foram representadas da seguinte maneira: tintas vermelhas com caneta de cor vermelha, tintas amarelas com caneta de cor verde, tintas
brancas com caneta de cor azul, tintas laranjas com caneta vermelha ou verde, dependendo para qual tonalidade o laranja tendia, se para o vermelho
ou amarelo. As características de suporte foram representadas em azul, assim como as anotações necessárias, como as informações de
sobreposição.
25 As cores das tintas foram nomeadas a partir da percepção visual das mesmas nas figuras e considerando a tonalidade predominante. Fizemos
testes com tabela Munsell e não achamos produtivo seu resultado, visto que a tonalidade das tintas variam muito na figura, em função de
características de dissolução dos pigmentos nas misturas, que por vezes se apresentam pouco homogêneas, e também em função de pátinas.
35
Figura 1: Suposição do modo em que a figura foi composta graficamente a partir das informações dos
traços e sequência de traços (Lapa do Galheiros, Diamantina)
36
Figura 2: Calque da Lapa do Voador, em que se preocupou em registrar os traços que compõem os
grafismos e não seu contorno.
Áreas com pigmento, mas sem clareza de forma foram delimitadas, assim como
áreas de manchas naturais, ou não (por vezes resultante de pátina intensa por ação de
umidade), foram representadas delimitando os limites de extensão dos mesmos e a
classificação da natureza do registro foi escrita.
Não foi realizado o quadriculamento dos painéis e, consequentemente dos plásticos,
pois as junções dos plásticos sempre sofrem distorções significativas, seja pela maneira
utilizada na digitalização posterior dos plásticos, seja na deformação que cada pedaço de
plástico sofre em campo (em função das técnicas utilizadas para mantê-los presos na
parede) e quando o mesmo é dobrado e acondicionado. Quanto mais junções, mais
distorções são agregadas cumulativamente aos painéis. Dessa forma os tamanhos dos
calques variam em função do tamanho dos painéis e da possibilidade de prender os
fragmentos de plástico, ou entretela, no suporte (quanto maior o pedaço de plástico, mais
pesado ele é e mais díficil se torna sua fixação).
O levantamento dos grafismos através do calque, mesmo sendo criticado por seu
caráter prejudicial às pinturas, ou mesmo pelas dificuldades nos critérios metodológicos
(bem apontados por Lópes-Montalvo, 2010), permitem um contato longo, corporal e
cinestésico com o registro gráfico rupestre. A posição do corpo (mesmo considerando que
a corporalidade é também um fenômeno cultural - Mauss, 2003), a exposição demorada do
corpo no sítio e defronte ao painel, o contato com as texturas dos painéis (rocha e tinta)
torna a experiência com o vestígio gráfico um fato concreto e concretismo é um fator
valioso para o arqueólogo que lida com uma categoria de vestígio tão abstrata, em que não
se toca, não se leva para a mesa do laboratório.
37
O que se leva é um plástico, uma espécie de relato de campo, em que são
transcritos, buscando uma fidelidade de informações, os desenhos, as cores, as
sobreposições, aspectos do meio, como manchas, diáclases. Esse material é digitalizado
para então ser reduzido e então analisado. Os calques dessas regiões foram digitalizados a
partir de fotografia digital de cada pedaço calcado. Estes arquivos foram então vetorizados
utilizando o Corel Draw 10,11,e X3.
Após terminada a vetorização, para a região de Diamantina apenas, foi realizada a
etapa de conferência dos grafismos. Esta etapa tem como objetivo o retorno aos sítios com
a vetorização e redução dos painéis a fim de conferir as dúvidas com relação às formas da
figuras, cores e relações entre figuras. As correções são feitas por cima dos arquivos
impressos das reduções e voltando ao laboratório essas correções são passadas para os
arquivos digitais. Deste modo, têm-se os arquivos que serão utilizados para a montagem
dos rolos de sítios em que os mesmos são reproduzidos em sua totalidade, incluindo os
aspectos topográficos dos suportes e a relação entre os painéis e suas distribuições nos
sítios, em tamanho reduzido.
A conferência não foi realizada para as outras regiões em função de prazo para as
pesquisas, assim como verbas para campo.
O levantamento fotográfico realizado foi feito de forma assistemática, embora
buscando o registro da totalidade do sítio. Quando afirmo ter sido assistemático é porque
não foram observadas as distâncias do ponto focal da máquina até o painel, bem como não
foram observadas áreas de sobreposição das imagens capturadas para posterior
remontagem do sítio em panorama. As fotos foram tiradas enquanto material
complementar ao calque, tendo como objetivo primeiro o registro da diversidade temática
presente no sítio - e nem sempre bem representada pelas áreas de maior sobreposição, visto
que algumas figuras e estilos, com frequência, foram colocadas em nichos e suportes
específicos, longe da interação direta entre figuras -, e da diversidade topográfica dos
suportes e do sítio. Também é assistemático o horário de fotografia, o tipo de máquina,
angulação de lentes. Foram utilizadas as máquinas disponíveis no momento e que se
relacionam, sobretudo, aos recursos possíveis para tê-las.
38
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26 No caso de Diamantina coloquei os textos aqui como fontes secundárias, mas como produzi o levantamento, tratamento e análise dos dados o
meu conjunto de dados se enquadram mais na categoria de primários.
39
que ciente de ter sido feito de forma assistemática, de modo a contrapor com os dados
obtidos a partir dos levantamentos e interpretações de Seda.
A diversidade de materiais utilizados e o fato deles terem um caráter documental
me leva a refletir sobre o conjunto de fontes, sobre dados, que, como disse antes, agiram
sobre esta pesquisa, suas possibilidades e também objetivos.
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27 Não desmerecendo estes resultados, que afinal são mais do que proveitosos e difíceis de se realizarem.
28 O historiador Jacques Le Goff no capítulo do livro memória e história chamado Documento/Monumento delineia os sentidos primeiros/históricos
dado aos documentos contrapondo-os à noção dos monumentos e seus papéis na construção da memória. O autor chama atenção para a distinção
criada entre os dois fenômenos históricos e construtivos de memória e a desconstrói argumentando que “o documento não é inócuo. É antes de mais
nada, o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziram (...)”(p.537-538).
41
ainda assim, há alguns registros escritos. Foi com os historiadores da École des Annales,
sobretudo Marc Block e Lucien Fevre que a história ampliou a tipologia de suas fontes,
defendendo ser a busca do historiador guiada por tudo que fosse humano (Karnal &
Tatsch, 2012).
Foi na mesma época que o documento enquanto fonte neutra, testemunho
irrefutável do passado passou a ganhar uma reflexão crítica a cerca do “ fetiche da fonte
primária” em que o “ documento seria uma lente transparente capaz de magnificar o
passado real e torná-lo, novamente, visível como o foi aos olhos de seus contemporâneos” ,
ou do caráter autônomo do documento, em que caberia ao historiador uma reverência
silenciosa diante da fala autonôma da fonte histórica (Karnal e Tatsch, 2012: 22).
O documento, pois, passa, com a Nova História, a ser entendido enquanto
29
Elaborando estas reflexões, acabei por pensar no quão subversivo parece discutir em um capítulo de materiais e métodos em uma tese de
Arqueologia questões que ora tendem à História, ora tendem à Antropologia. Aprendemos nos percursos da Arqueologia enquanto área de
conhecimento, que esta esteve por vezes associada ora à História, ora à Antropologia e que as correntes teóricas as quais nos filiamos derivam dessa
associação. E diante do meu percorrer por ideias e pensamentos que aqui constam, me vejo tentando fluir entre às duas outras ciências que tomam
para si a Arqueologia, ou as quais a Arqueologia, ou melhor os arqueólogos, tentam se filiar, ou apoiar seus objetivos fundamentais.Por fim, reflito
sobre uma certa fraternidade existente entre essas ciências, que têm em foco os homens e seus fazeres, que permite uma tecitura de fios mistos, uma
mescla de ideais e paradigmas, cujo produto é capaz de acolher anseios serenados de uma ciência que tem por objeto a fonte histórica (os artefatos),
mas por objetivo o entendimento da vida e do pensar humanos. Portanto, não há subversão, mas sim uma acolher de oportunidades teóricas, sem
busca de definições herméticas do que afinal é a prática arqueológica.
42
pelo autor de existencial ou pessoal é aquela em que “ não temos mais divisões nítidas entre
as etapas da nossa formação científica ou acadêmica, mas por uma espécie de
prolongamento de tudo isso, uma certa visão de conjunto deve coroar todo o nosso esforço
de trabalho” (p.25). Ela deve, ser a etapa integralizadora, em que as experiências teóricas e
práticas possibilitam o entendimento de questões próprias ao seu caso de estudo específico.
Esta é a etapa da concretude do objeto de pesquisa, das experiências com o mesmo, dos
desafios e dificuldades que ele nos coloca. É nesta fase que o outro, para quem o
pesquisador se propõe olhar, toma forma e capacidade agentiva.
É na terceira fase que
30 Expressão da antropóloga Jean Carter Lave, e discutida lindamente por Roberto da Mata (1985).
44
Cultura, nesse sentido, traça um sinal de igualdade invisível entre o
conhecedor (que vem a conhecer a si próprio) e o conhecido (que
constitui uma comunidade de conhecedores) (p.30).
E é por ser relacional, o ato de descrever uma cultura, que Roy Wagner defende a
ideia de que o antropólogo a inventa, já que há uma dialética envolvida na invenção
(invenção/convenção), que “ subverte tanto a subjetividade quanto a objetividade em prol
da mediação” (p.28). O autor, contudo, adverte que por invenção deve-se compreender um
processo de observação e aprendizagem e não livre fantasia (p. 30). É nesta mediação,
entendo, que reside a tênue linha abordada por Da Mata, em que ora se está sob ação do
outro (por ele metaforicamente chamada de natureza), ora se tem a autonomia dos deuses.
Na mesma direção, Cliford Geertz (1989) contribui dizendo “ o que chamamos de
nossos dados são realmente nossa própria construção das construções de outras pessoas, do
que elas e seus compatriotas se propõem” p.19.
E neste sentido, e compreendendo que o entendimento da cultura são as teias de
significado que o homem teceu para sí31, e suas análises, e que por conta disso é a
antropologia uma ciência interpretativa, o etnógrafo tem à sua relativa disposição uma
multiplicidade de estruturas conceituais complexas as quais é sua tarefa “ tentar ler (no
sentido de construir leitura de) uma manuscrito estranho, desbotado, cheio de elipses,
incoerências, emendas suspeitas e comentários tendenciosos, escritos não com os sinais do
som, mas com exemplos transitórios de comportamento modelado” (p. 20).
Para o arqueólogo, assim como para o antropológo na visão de Geertz, lidamos com
as tais estruturas complexas “ muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que
são simultaneamente estranhas, irregulares e inexplícitas” (1989:20), as quais temos que
apreender através daquilo que Clifford Geertz denomina descrição densa32. E o que
fazemos é a tentativa de entender um outro, cujos sistemas de significação se diferem do
nosso. E nesse exercício,
31 Em a interpretação das culturas, Geertz apresenta uma primeira definição do que seria cultura a partir de uma fala de Marx Weber em que, para
ele, o homem seria um animal amarrado a teias de significado que ele mesmo teceu.
32 A expressão descrição densa Geertz retira de Gilbert Ryle, filósofo de Oxford. A descrição densa, apontada por Geertz, se aproxima daquilo que
fazemos quando reunimos um conjunto de métodos que dê conta da coleta e compreensão dos nossos dados. Segundo Geertz, a partir de diferentes
situações nas quais há o uso da comunicação gestual da piscadela, a descrição densa pressupõe um olhar atento a cada uma das situações de modo
a dar conta de entender as sutis diferenças nos gestos, nos contextos que eles encerram, para então interpretá-las, criar seus significados. E mais
além, a descrição densa seria responsável e objetivaria o entendimento das estruturas de significado a partir das quais aqueles conjuntos de gestos,
ou signos, se articulam e partir das quais surgiram e fazem sentido.
Ora, quando inventamos métodos de controle e entendimento de estratigrafia, quando descrevemos em dezenas de atributos um objeto, buscamos
sua funcionalidade, realizamos datações, buscamos conexões entre artefatos, estruturas e tudo que os encerra a fim de entender as teias de
significação tecidas por aqueles homens aos quais os objetos se relacionam, nos aproximamos da descrição densa.
45
linha entre cultura (...) como um fato natural e a cultura (...) como
entidade teórica tende a ser obscurecida (Geertz, 1985:25).
33 No caso dos pré-historiadores (meu caso e daqueles que formaram o acervo documental com que lido).
46
seja em campo ou laboratório34.
E embora o arqueólogo possa ser comparado, como fiz, ao etnólogo, a diferença
fundamental entre os dois ofícios é responsável pela ausência de um importante filtro da
subjetividade do pesquisador das sociedades passadas: a falta dos contextos dinâmicos aos
quais os objetos também são atores e autores, assim como das pessoas com as quais os
objetos se relacionam dificulta a profundidade crítica do arqueólogo a cerca de sua própria
cultura a partir do outro e vice-versa. Desta maneira, as possibilidades de fazermos nosso
contato com este outro a partir de um constructo entre duas formas de ver torna-se mais
frágil, e deste modo os dados, levantamentos e interpretações correm o risco de serem
sempre um exemplar desta fragilidade materializada.
Uma ilustração deste enviesamento ao qual nossos materiais estão expostos é a
interpretação presente em um rolo de sítio da região do Planalto Cárstico de Lagoa Santa
em que uma impressão de mão foi considerada acidental. A tal mão foi realizada com a
mesma tinta de outras figuras cujos traços sugerem terem sido compostas por dedos ou
pincel. Neste caso, por que estaria a mão do pintor completamente suja de tinta? Se usou
só o dedo, por que cobrir a palma da mão com o pigmento? E se considerar o uso da palma
da mão como palheta, como não pensar no extremo cuidado para com a mesma? E, por
fim, por que afinal a impressão da mão não pode ter sido intencional? Provavelmente
porque impressão de mão não está entre as figurações recorrentes no sítio e na região,
cujos temas emblemáticos e característicos o arqueólogo já construiu em sua mente. E,
como tradicionalmente trabalhamos com as recorrências e manutenções de
comportamentos e repertórios, os desvios são simplificados e, por vezes, interpretados
como acidentais.
Um outro exemplo do frágil constructo entre nós e os outros pode ser dado por
algumas figuras da região de Diamantina. Um dos momentos de pintura caracteriza-se por
aquilo que chamamos de um estilo fluido, em que contorno e preenchimento não parecem
ter sido categorias gráficas tão opostas para seus autores quanto parece para nós, que
concebemos nossos desenhos como feitos de contorno e preenchimento, categorias
opostas, porém complementares. Tais figuras em Diamantina possuem contornos que
viram preenchimentos e vice-versa, mas quando foram calcadas tal fluidez foi
minimamente percebida, parecendo ser uma exceção, e não uma regra. Vimos as figuras,
mas não compreendemos o modo como foram concebidas graficamente em função de
34 É preciso ainda considerar que há em muitos desses materiais subjetividades acumuladas, já que há várias mãos autoras deste material, que por
vezes nem dialogaram entre si. Um exemplo disso são os levantamentos de alguns sítios de Lagoa Santa que foram calcados na década de 1970,
mas só tiveram os rolos montados vinte anos mais tarde por outros pesquisadores, alguns que nunca foram nos sítios com os quais estavam
trabalhando.
47
nosso próprio sistema cognitivo. Desta maneira, e se não tivéssemos percebido - através de
uma disposição para a mudança no olhar - análises de gesto e composição gráfica se
tornaria uma possibilidade pouco imaginada.
E como perguntas e possibilidades se metamorfoseiam à medida que caminhamos
pela busca do conhecimento, como disse Rogério Tobias Jr., “ alguns dos materiais do
acervo não dão conta do que nossos olhos hoje querem ver” 35.
Enfim, concluindo, o relativismo de minhas fontes é resultado do relativismo
intrínseco aos seus autores e contextos, cabendo a mim aproveitá-las com suas
especificidades, mas sem deixar-me iludida pelo véu da objetividade acadêmica. Deste
modo, finalizo com uma citação de Malinowski que sabiamente refletiu sobre o manipular
dessas pretensas objetividades nas publicações acadêmicas36.
Nas ciências históricas, como já foi dito, ninguém pode ser visto com
seriedade se fizer mistério de suas fontes e falar do passado como se o
conhecesse por adivinhação. Na etnografia, o autor é, ao mesmo tempo,
seu próprio cronista e historiador, suas fontes de informação são,
indubitavelmente, bastante acessíveis, mas também enganosas e
complexas; não são incorporadas a documentos materiais fixos, mas sim
ao comportamento e memória de seres humanos (Malinowski, 1978:19).
Embora tenha iniciado esta reflexão a partir dos rolos de sítios, a mesma se estende
para as fontes fotográficas. As fotografias, assim como os documentos escritos, foram por
muito consideradas capazes de congelar a realidade e objetificá-la a partir de papel,
revelador e fixador. Era, pois, considerada um instrumento neutro, capaz de fornecer
evidências (Lima & Carvalho, 2012).
O mundo acadêmico, de uma maneira geral,
35 Comunicação pessoal em agosto de 2013 em uma daquelas conversas de café que fazem todo o resto valer a pena.
36 No caso, ele se referia às publicações etnográficas.
37 Discursos desta natureza permeiam a Arqueologia e os estudos de arte rupestre, em que a fotografia é atualmente priorizada nos métodos de
levantamentos dos grafismos. Há alguns que defendem a fotografia por ser uma técnica que não exige o contato de materiais com os grafismos, mas
vê-se quase sempre acompanhando o primeiro argumento, ou sendo argumento único, o valor de precisão das fotografias.
48
pelo público em geral de forma inocente excluindo dela seus sistemas de valores, levou
Roland Barthes (1964) a refletir sobre o caráter discursivo, comunicativo da mensagem
gráfica. Para ele toda imagem é produtora de duas mensagens: 1- uma mensagem
codificada (conotativa), que remete a um determinado saber, contexto cultural específico e
seus significados; 2- uma mensagem não codificada (denotativa), em que se pressupõe a
capacidade da imagem de reproduzir o real38.
A documentação fotográfica com que trabalhei possui este caráter conotativo,
obviamente, por se relacionar há uma produção científica, cuja linguagem lhe é própria.
Portanto, os elementos selecionados no foco se relacionam a esta dimensão da imagem. A
dimensão denotativa está sempre agindo sobre esta seleção do que focar. É preciso que a
foto represente o que há no sítio. Deste modo, as duas mensagens das fotografias com que
trabalhei se fundem, se confundem em resultado e também em motivações.
Mas há no acervo fotográfico que tive disponível um outro aspecto das imagens,
que se relacionam às questões valorizadas por cada observador responsável pela captura da
imagem. Os elementos registrados nas fotos nem sempre são os mesmos, pois os critérios
utilizados não são também iguais. E não se trata de tal sentido obtuso da imagem, pois há
uma consciência de quais elementos selecionados que variam com as perguntas das
pesquisas nas quais as fotos se inserem.
Analisando o acervo vê-se que algumas fotos valorizaram a diversidade temática
presente nos sítios, fotografando cada um dos painéis de pintura, porém a relação entre eles
não foi valorizada. Já em fotos produzidas com outros objetivos científicos, tal relação foi
valorizada, e para isso, desenvolveu-se um método de fotografar os sítios valorizando as
relações entre painéis (Tobias Jr, 2010). O mesmo pode-se dizer para as fotos de inserção
dos sítios na paisagem: há fotos que só enquadrou o maciço, não valorizando elementos do
entorno; outros conjuntos de fotos preocupou-se em gerar sequências panorâmicas, de
modo a incluir um número vasto de elementos da paisagem.
O resultado desses contextos múltiplos aos quais o fazer a foto se relaciona é um
acervo pouco homogêneo. Deste modo, nem todas as informações são possíveis de se
extrair em igual medida das fotos. Afinal, não são elas análogas à realidade que se
apresenta ao observador, são recortes construídos de realidades igualmente construídas e
contextuais. Como afirma Ulpiano B. de Meneses (2003: 137): “ autenticidade ou seu
contrário não são atributos das coisas (das imagens), mas do discurso dos homens a seu
respeito ou por seu intermédio” .
38 Barthes se refere ainda a um sentido obtuso, que seria a porção enigmática e inconsciente da imagem e seu autor.
49
As mesmas críticas e argumentações acima se valem para os diários de campo, as
teses, os periódicos e as documentações de análise. Todas se relacionam a um contexto
específico, a pesquisas distintas, interesses diversos e subjetividades múltiplas.
E considerando tudo isso, me coloco diante de todo este conjunto de fontes,
manipulando-os de modo a extrair dados para uma nova subjetividade que se coloca: essa
pesquisa.
Poderia eu aqui me esforçar para maquiar o problema da heterogeneidade das
informações e assim apresentar os métodos de um modo que os protegesses dos
questionamentos científicos. Mas considero válido e preciso trabalhar na consciência de
que este seria um esforço, talvez em vão, e pouco sincero com o cenário que escolhi para
me imiscuir.
Deste modo, o maior cuidado e o grande ponto metodológico deste trabalho está na
clareza da diversidade, resultado do caráter subjetivo e multivocal das fontes que utilizei.
Sabendo que as mesmas agiram sobre este trabalho, modificando suas perguntas, suas
possibilidades de respostas e agindo sobre a amostra utilizada (que será ulteriomente
apresentada).
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Trabalhar com os artefatos rupestres, como já apontei alhures neste texto, traz
algumas dificuldades ou limitações que são sérias ao entendimento destes artefatos, suas
funções, relações contextuais.
Não conhecemos suas funções, seus significados se oferecem por trás de uma
barreira quase, para não dizer totalmente, intransponível, e as possibilidades de
correlacionar os grafismos a um contexto que os extrapole esbarram nas dificuldades de se
50
estabelecer uma linha temporal em que o tempo, enquanto escala de medida, é de fato
alcançado.
Mas diante dessas dificuldades seriam estes vestígios abundantes em diferentes
áreas, mais ou menos distantes entre si, deixados apenas enquanto decoração pictórica dos
sítios? Furtando a nós arqueólogos a possibilidade de nos perdermos entre as miríades de
cores e ausência de cores das paredes grafadas na busca de uma compreensão sequer para
tamanha expressão cultural? Ignoraríamos suas possibilidades analíticas e interpretativas
por não conseguir definir uma função, um significado, uma data?
Obviamente que as tristes possibilidades acima aventadas foram ignoradas por
muitos arqueólogos que se arriscaram ao enfrentar tão sedutoras cores. E arriscaram
funções, interpretações de significado e associações com contextos formados a partir de
materiais outros e datas outras, tudo isso com abordagens próprias e específicas às
diferentes realidades de pesquisa.
Contudo, alguns outros pesquisadores voltaram-se para os grafismos apostando em
seus próprios contextos: enquanto manifestações culturais próprias e que por isso pediam
uma abordagem que lhe fosse igualmente própria. A cronoestilística é uma dessas
abordagens, que buscou, e busca, compreender os grafismos rupestres a partir deles
mesmos, considerando suas características formais e as relações estabelecidas entre os
diferentes grafismos de um sítio e uma região por justaposição e sobreposição.
Reutilizando um trecho de Geertz, quando temos os grafismos rupestres como
objeto de análise, o que enfrentamos “ é uma multiplicidade de estruturas conceituais
complexas, muitas delas sobrepostas, amarradas umas as outras, que são simultaneamente
estranhas, irregulares e inexplícitas” (1989: 20), cabendo a nós arqueólogos “ primeiro
apreender e depois apresentar” (idem, ibdem).
Na busca por este apreender, realizamos uma espécie de descrição densa, em que
observamos, registramos e analisamos os grafismos rupestres buscando entender
semelhanças e diferenças na forma, no gesto, no conjunto técnico e comportamental que os
envolve a fim de se chegar a um entendimento de seus próprios contextos.
Através da análise cronoestilística, buscamos organizar e entender nossos artefatos
para só depois tentar chegar a uma interpretação de seus significados. Se significar é uma
possibilidade ela só se tonará viável após apreendermos ao máximo nossos conjuntos
gráficos.
Afinal,
51
discursos sobre arte que não sejam meramente técnicos ou
espiritualizações do técnico (..)têm, como uma de suas funções
principais, buscar um lugar para a arte no contexto das demais
expressões dos objetos humanos, e dos modelos de vida a que essas
expressões, em seu conjunto, dão sustentação (Geertz, 1997:145).
E isso não parece ser tarefa promissora na maioria dos contextos arqueológicos.
Segundo Geertz, “ falar sobre arte unicamente em termos técnicos (...) é o suficiente
para entendê-la; e que o segredo total do poder estético localiza-se nas relações formais
entre sons, imagem, volumes, temas e gestos” .
E é a partir dessas relações formais entre conjuntos gráficos que a análise
cronoestilística se pauta, na medida em que pretende organizar os grafismos em conjuntos
estilistícos e entender o processo de ocupação dos painéis e sítios de pintura rupestre,
valorizando os aspectos estilísticos dos conjuntos gráficos e suas variações ao longo do
tempo.
Nas diferentes áreas aqui contempladas pelos pesquisadores responsáveis pelas
mesmas, a análise cronoestilística foi aplicada e é possível perceber que todas elas
contemplam, mesmo que de forma inconsciente, os aspectos responsáveis pela
identificação do estilo apontados por Peter Roe: reconhecibilidade, virtuosidade, mídia,
contextualidade, seletividade, natureza normativa, variabilidade limitada e afetamento -
embora na maior parte dos trabalhos são mais exploradas a natureza normativa do estilo e
sua variabilidade limitada.
Contudo, é preciso dizer que os critérios selecionados e utilizados para a
identificação ou delineamento dos conjuntos estilísticos nem sempre são claros nas
pesquisas. Mas entre os trabalhos percebe-se que há uma valorização de aspectos formais
(de forma) dos grafismos, considerando-se os temas, a maneira como os mesmos são
compostos e alguns aspectos técnicos e características estéticas (tamanho, elementos de
composição, volume...).
De um modo geral, a análise cronoestilística pode ser minunciada do ponto de vista
metodológico a partir da seguinte sequência:
1 - levantamento dos grafismos;
2 - observação sistemática dos mesmos quanto à temática;
3 - organização dos grafismos em conjuntos a partir da semelhança temática e
gráfica dos mesmos, considerando tamanho e volume geral das figuras, critérios de
composição gráfica como características de contorno e preenchimento, cores utilizadas;
4 - observação das relações de sobreposição entre diferentes conjuntos gráficos a
52
partir das relações entre as tintas (quem está acima de quem), e de pátinas naturais, bem
como descamamentos.
5 - elaboração de um quadro cronoestilístico em que as relações entre os diferentes
conjuntos delineados são explicitadas.
Os resultados destas análises podem ser vistas no capítulo que segue, momento em
que os diferentes conjuntos presentes nas áreas aqui contempladas são apresentados.
''
39 Aqui faço uso da categoria natural como forma didática de falar do substrato no qual vivem os grupos humanos, sem me ater na discussão entre a
dicotomia entre cultura e natureza, que embora válida nas análises de Arqueologia da Paisagem, neste momento do texto não me vale.
53
formado a partir de fenômenos de aplainamento - e as áreas planas associadas a alguns
sítios do Planalto Cárstico de Lagoa Santa, formadas a partir da dissolução das rochas
cálcareas que dão origem às dolinas e uvalas (Figura 3). Embora a área plana seja um
comum, aquilo que se associa a essas áreas para além dos abrigos parece muito diverso
Figura 3: Acima fotografia da Lagoa do Sumidouro (foto do acervo do prof Kohler); abaixo feições do
Planalto Meridional do Espinhaço próximo ao Distrito de São João da Chapada, Diamantina.
Enfim, as dinâmicas atuantes no relevo e hidrografia das áreas são diversas demais
e qualquer tentativa de aproximação das feições entre áreas poderia representar um
54
enviesamento considerável e comprometedor da análise.
Desta maneira, as características físicas que podem ser consideradas sem que se
estabeleça uma análise por demais arbitrária, são as características dos próprios abrigos
estritamente, considerando aspectos dos suportes disponíveis e ocupados, dimensões dos
abrigos, características do piso.
Entra aqui a ação das fontes com as quais lidei. Não há croquis de todos os sítios
trabalhados pelo Setor de Arqueologia e demais pesquisadores com quem aqui dialogo. Da
mesma maneira o conjunto de fotos não contém o registro sistemático do espaço dos sítios.
Não há como, portanto, fazer uma análise que aplique o mesmo critério no total da minha
amostra, e para assim o ser, teria que reduzir minha amostra a tal ponto que os resultados
não seriam para uma análise macro-regional.
Conquanto, esta análise se tornou impossível. E deverá ser objeto de outro, ou
outros, projetos que tenham a possibilidade de retornar aos sítios e registrar suas
características morfológicas.
'*
55
(rolos de sítios) dos seguintes sítios: Lapa do Ballet, Lapa da Pia, Lapa da Cauaia, Gruta
Rei do Mato, Lapa da Escrivania e Vargem da Pedra. Nestes sítios os levantamentos foram
realizados visando a reprodução da totalidade dos painéis ocupados. Foram selecionados
estes sítios entre todos aqueles levantados por estes possuírem dimensões e diversidade
gráfica que fossem representativas do universo de sítios conhecido da região. Um sítio que
deveria ter entrado nesta amostra e não entrou em função da indisponibilidade do material
do mesmo no acervo é Cerca Grande.
Na região da Serra do Cipó, incluindo Conceição do Mato Dentro, foram analisados
dois sítios: Grande Abrigo de Santana do Riacho e os abrigos do Pocal. O primeiro sítio foi
objeto de levantamento sistemático visando reprodução total de seus vestígios gráficos. Já
o segundo teve levantamento em calque parcial e levantamento fotográfico total. Demais
sítios na região não foram analisados em função do seu estado de preservação ou em
função da baixa intensidade da ocupação de seus suportes, além da não disponibilidade de
consulta dos dados gerados para os mesmos (caso da Lapa dos Gentios e da Lapa da
Sucupira).
Para a região de Diamantina, foram analisados os seguintes sítios amostralmente
calcados: Lapa do Galheiros, Lapa do Boi, Lapa do Boi Leste, Lapinha das Emas, Lapa do
Voador Norte e Lapa do Voador Sul. Apenas dois outros sítios cujos grafismos foram
sistematicamente calcados não foram aqui incluídos, a Lapa do Moisés Leste, em função
dos seus grafismos terem temática reduzida, o que poderia comprometer a análise
exercendo peso que supervalorizaria na região determinadas associações, e a Lapa do
Moisés, cujos calques são muito amostrais na totalidade do sítio, não sendo representativos
do mesmo.
Na região de Jequitaí busquei priorizar os sítios trabalhados e apresentados por
Rogério Tobias Jr. em sua dissertação de mestrado, embora outros sítios já tenham sido
alvo de levantamento sistemático em outros contextos de pesquisa, mas cujos resultados
não haviam ainda sido divulgados seus resultados e problematizações. Foram analisados os
sítios da Lapa do Sol, Lapa Pintada, Abrigo Bibocas I e Abrigo da Sorte. Os levantamentos
nestes sítios foram amostrais, a exceção do Abrigo Bibocas I, cujo levantamento se
pretendeu da totalidade dos grafismos. Contudo, a título de comparação, a fim de se testar
a representatividade desses, demais sítios foram também analisados. São eles: Lapa da
Onça e Lapa do Veado Correndo.
Na Serra do Cabral foram analisados sete sítios de pinturas rupestres (Lapa da
dança, Serra do Palmito, Lapa dos Peixes, Lapa do Nêgo, Lapa do Nêgo III, Lapa do Pau
56
d’ oleo e Lapa da Cobra).. A análise nestes sítios se deu a partir das fotografias de Rogério
Tobias Jr que foram tratadas no Dstretch, programa de tratamento de imagens por banda de
cores (Figura 4).. As fotos disponibilizadas são da totalidade dos sítios, mas análise se deu
amostralmente, em função da possibilidade de visualização dos grafismos, suas formas e
associações.
Na região de Monjolos um único sítio foi analisado, combinando análise dos
levantamentos em calque e frotagem com análises das fotos do sítio,
sítio, também tratadas em
Dstretch.
A B
C
Figura 4:: Exemplo de Imagens tratadas pelo Dstretch. As figuras A e B estão com diferentes bandas de
cores aplicadas. A foto C está sem edição de bandas.
', &
57
o estabelecimento, através da descrição dos artefatos por conjuntos de atributos, de
“ relações espaço-tempo na cultura material, as quais ajudam na formulação de cronologias
culturais” (Chilton, 1999: 44).
Uma classificação tipológica, nos seus termos originais, estaria, segundo Phillips e
Willey (1953), atrás de uma taxonomia cultural, a qual seria composta pela combinação de
três propriedades básicas: espaço, tempo e forma.
59
medida da equipe do Setor com quem ele trabalhava. Isso em si está longe de ser um
problema, antes um desafio de se aplicar a tipologia e estendê-la, observando seus critérios
e coerência interna, para as outras regiões trabalhadas, adaptando-a, contudo, às diferentes
realidades, criando novas classes que dariam conta de englobar a diversidade de grafismos
de toda a área pesquisada.
A mesma questão se coloca para as tipologias realizadas no Planalto Cárstico de
Lagoa Santa, por Anthonioz et al. (1978), e para o Grande Abrigo de Santa do Riacho
(Prous et al., 1996/97), também tomadas enquanto diretrizes para a classificação tipológica
aqui pretendida, com o intuito bastante próximo daquele original anteriormente
apresentado, na medida em que se esperava, a partir de um delineamento de variações de
tipos dentro das categorias classificatórias empregadas dentro das áreas e uma comparação
dos mesmos, afinar os critérios de atribuição dos grafismos a unidades (Tradições, estilos e
complexos), porém em escala macro-regional. Estava eu à procura de redundâncias entre
os conjuntos dentro das áreas, única razão para a classificação, segundo Dunnell (2006:83).
Tomei, portanto, as classificações tipológicas por minhas e para isso precisei
mergulhar em suas classes e atributos, a fim de entendê-las e, enfim, utilizá-las para meu
propósito.
Segundo Dunnell (2006),
61
resultados).
Em função destes problemas, desenvolvi uma classificação do tipo paradigmática,
focando inicialmente em uma amostra de grafismos zoomorfos rupestres atribuídos à
Tradição Planalto da região de Diamantina (definição de escala) - assim definido em
função da minha maior familiaridade com os mesmos, me deixando mais à vontade para
manipulá-los - e depois extrapolado para uma amostra de grafismos zoomorfos do Planalto
Cárstico de Lagoa Santa, a fim de testar a possibilidade de ampliação da escala de
classificação para demais grafismos zoomorfos da Tradição Planalto. O mesmo foi feito
para as figurações antropomorfas das duas áreas.
As figurações geométricas ofereceram outros problemas, sobretudo na definição de
atributos para formar as classes, o que acabou me levando a pensar em desistir de manter
os acervos gráficos do Peruaçu na análise. Porém, os resultados obtidos para as análises
que busquei empreender para os grafismos zoomorfos, conforme apresentado no parágrafo
acima, me fizeram repensar as análises como um todo. Desta forma, não precisei abrir mão
dos grafismos do Peruaçu.
Esta nova forma de análise buscou uma escala um pouco menor para o
entendimento dos conjuntos gráficos e a busca de suas recorrências. Não que as análises
tipológicas não tivessem fornecido resultados, mas não aqueles que procurava ou esperava,
portanto essa nova abordagem teve a função “ da prova dos nove” , buscando analisar outros
aspectos dos conjuntos gráficos que pudessem dizer mais sobre os conjuntos gráficos, suas
diferenças, permanências, mudanças...
Nesta análise, as variações temáticas é que foram consideradas, criando pois tipo-
temáticos, ou “ motif-type” , segundo Tilley (1991).
Para tal classificação me vali das classificações que já haviam sido realizadas para a
região de Diamantina, desenvolvidas por mim e Luiza Câmpera e pelas classificações de
Rogério Tobias Júnior desenvolvidas para a região de Jequitaí, sobre as quais eu fiz
pequenas adaptações para que pudesse servir para as demais regiões aqui consideradas.
Esta análise teve por objetivo definições de temas para que pudessem ser aplicados
em uma análise de associação temática, a fim de se verificar se há uma estrutura de
configuração dos painéis dentro dos conjuntos gráficos coesa o suficiente para tratá-los
enquanto uma unidade.
'/ &3
62
Em virtude dos resultados observados na análise tipológica, foi aplicada uma
análise das associações entre os tipos-temáticos definidos.
A análise de associações temáticas se inspira nas análises das estruturas dos mitos
de Lévi-Strauss, na medida em que se apoia na ideia de que não são os elementos isolados
(os temas) que dão sentido ao mito, mas sim as relações existentes entre tais elementos, ou
nos feixes de relações existentes entre estes. Não quero, contudo, indicar que os grafismos
se assemelham ou se pretendem narrativas míticas, apenas pretendi verificar se há uma
estruturação coerente a cada conjunto gráfico que dê a ele um caráter de unidade para além
da unidade percebida nos aspectos formais dos elementos isolados, buscando evidenciar a
presença de um sentido estabelecido entre as associações de figuras. Mais uma observação
é necessária: já foi sugerida na literatura sobre arte rupestre a existência de mitemas entre
os conjuntos gráficos (Prous, 1980). Não faço uso aqui deste conceito, pois Lévi-Strauss,
ao criá-lo, o fez a partir do entendimento de que o mito faz parte da língua, do discurso,
“ está ao mesmo tempo na linguagem e além dela” (Lévi-Strauss, 2012: 297). Por assim ser,
o mito é conhecido pela palavra, que por sua vez se organiza gramaticalmente exibindo
propriedades específicas dentro da estrutura da língua. Possui, pois fonemas, morfemas e
semantemas e elementos mais complexos ainda que seriam os mitemas: grandes unidades
constitutivas dos mitos. A meu ver há diferenças básicas e relevantes entre o mito e os
conjuntos gráficos os quais pretendo analisar: os mitos possuem por si só uma coerência
temporal ou sequencial a qual é somente pretendida na análise que aqui empreendi.
Enquanto em forma de texto o mito pode ser escrito da esquerda para a direita, por
exemplo no caso das escritas latina e grega, já os painéis rupestres podem ter sido
concebidos em quaisquer ordens ou desordens que pela análise se pretende chegar; quando
diante de um mito, tem-se acesso a uma narrativa e, portanto, um entendimento prévio da
relação existente entre significantes e significados, não atingidos nos conjuntos gráficos,
mormente e a priori; tem-se também no mito uma relação inerente ao discurso entre os
elementos vários da língua em que é possível elencar níveis de complexidade entre estes
(de fonema e mitema), situação difícil de se atingir nos conjuntos gráficos, uma vez que
não se pode garantir se tratar os painéis de narrativas, sejam míticas ou prosaicas. Ao
utilizar deste conceito, damos maior destaque a certas associações atribuindo maior
significância a elas dentro dos conjuntos, tal atribuição pode ser bastante prematura e
culturalmente enviesada pelo nosso próprio circuito cognitivo, que tende a valorizar mais
as recorrências nas atribuições de valores de significância.
A análise aqui empreendida, portanto, se fez crendo que, se há uma gramática, ou
63
modos de se manipular e/ou organizar os tipos-temáticos, haverá recorrências observáveis
destes modos e que podem se aproximar daquelas estruturas inerente, porém não
imutáveis, pelos autores dos conjuntos que dão sentido aos grafismos e à prática gráfica.
A presença de recorrência em associações temáticas se relaciona ao caráter
semiótico da produção material, intrínseco ao pensamento, consubstanciação do mesmo.
Por ser a cultura material, qual seja, mediada pelo pensamento, seus elementos são
organizados, dispostos e agrupados de acordo com uma série de princípios básicos a uma
determinada formação sociocultural, não sendo, pois, um processo aleatório (Troncoso,
2005).
A distinção entre formas e relações entre formas são detectadas a partir
de categorias mentais que estruturam a percepção das formas e das
cores associando-as a conteúdos semânticos específicos que enfatizam
relações e contrastes cognitivamente significativos para o grupo
(Lagrou, 2007:86 ).
As análises foram construídas para cada momento estilístico dos sítios, não
considerando pois cada momento de pintura, uma vez que há conjuntos estilísticos que
realizam sobreposições entre suas próprias figuras. Mas também considerando o arranjo
geral das figuras no painel, a despeito da diacronia, uma vez que as figuras precedentes
podem ter sido absorvidas (predadas) pelos grupos procedentes e integradas em seus
repertórios. Assim, as associações diacrônicas são aqui também consideradas.
Em termos metodológicos, as relações de justaposição e sobreposição foram
organizadas em uma tabela por sítio, valorizando as relações diretas de lateralidade entre
as figuras, dando foco apenas às relações de imediatamente “ acima” , “ abaixo” , “ à direita” ,
“ à esquerda” , sobreposição parcial e sobreposição total. Tais relações de laterialidade
foram observadas a partir do ponto de vista permitido pelo levantamento que torna planas
superfícies tridimensionais. Assim sendo, os nomes aplicados às relações pretendem
apenas dar conta do posicionamento espacial entre grafismos e não se pretende aproximar
das concepções de lateralidade e desenvolvimento linguístico-cognitivo dos autores dos
painéis. Também é preciso ressaltar que outras direções poderiam ter sido valorizadas
como, por exemplo, as diagonais, além de poderem ser valorizadas também combinações
em tríades ou sequências. Escolhi apenas relações diretas, o que resulta em relações entre
duplas de temas, e seis possibilidades de lateralidade enquanto recurso de recorte da
pesquisa.
Inicialmente, pensou-se em subdividir os painéis em três segmentos, mas tão logo
iniciei as análises percebi que não há uma lógica tão cartesiana na distribuição dos
64
grafismos que impedissem os mesmos de ocupar dois destes segmentos ao mesmo tempo.
Deste modo, restringi a análise grafismo/painel às características dimensionais e
morfolológicas dos mesmos: parede ampla ou restrita, teto amplo ou restrito, e blocos
amplos ou restritos, arbitrariamente elegendo painéis maiores que 3m2 enquanto amplos.
Após o preenchimento da tabela por sítio, assim feita para se manter informações
de possíveis particularidades entre os sítios para análises posteriores, foi realizada a
tabulação das associações por região (conforme Tabela de associações temáticas, em
anexo) e depois as análises quantitativas de frequência simples para as associações em
cada conjunto estilístico regional.
A análise de associação temática por conjunto estilístico se fez a partir das
cronologias relativas delineadas e apresentadas nos trabalhos de Isnardis (2004), Baeta
(2011), Tobias Jr. (2010), Seda (1998) e Linke & Isnardis (2013). Os sítios trabalhados
tiveram seus grafismos, no contexto desta tese, classificados a partir dos conjuntos
delineados pelos pesquisadores supracitados. Os momentos foram assim identificados e as
associações analisadas. No caso dos sítios trabalhados no Vale do Rio Peruaçu, os arquivos
digitais que me foram disponibilizados pelos pesquisadores já continham uma classificação
prévia dos grafismos por momento de pintura e/ou conjunto estilístico. Nestes algumas
figuras estavam classificadas enquanto duvidosas e quando possível, dada a semelhança
entre a indicação de tintas, forma e mesmo associação, as inseri em algum dos conjuntos
delineados. Algumas vezes, contudo foram mantidas as dúvidas. Para as figurações do
Planalto Cásrtico de Lagoa Santa, Cabral, Jequitaí e Serra do Cipó as classificações dos
grafismos de cada um dos sítios foram realizadas a partir dos quadros cronoestilísticos
regionais. Contudo, em casos não raros, as relações de cronologia não puderam ser
satisfatoriamente confirmadas, a partir dos arquivos de reprodução dos sítios ou a partir
das fotografias, ou os grafismos não apresentavam características claramente pertencentes
a um ou outro conjunto cronoestilístico. Nesses casos, as associações foram tabuladas não
por conjunto específico mas de uma maneira geral, em campo nomeado de interação, já
que as associações observadas poderiam ser entre conjuntos. Já os grafismos de Monjolos
foram classificados não segundo conjuntos cronoestilísticos, mas considerando apenas os
estilos observados, sem que os mesmos fossem atribuídos a priori a alguma das unidades
estilísticas já delineadas para o Centro e Norte de Minas Gerais.
A análise considerando os distintos painéis, que se distribuem pelos diferentes
espaços do sítio, considerou a noção do espaço ocupado e semantização da paisagem
(Bradley, 1997), utilizando as diferentes escalas propostas por Troncoso (2008), em que o
65
painel é considerado a unidade mínima de análise espacial na arte rupestre (micro-escala) e
o sítio, entendido enquanto um espaço conformado por um conjunto de blocos e painéis
agregados com arte rupestre em um área delimitável e segregada de outras agregações,
uma unidade de semi-micro-escala.
66
/* 0 1 $2%
* ( ) &
67
* 4 & " 5
A Tradição São Francisco foi delineada no Vale do Rio Peruaçu, a partir do extenso
número de figuras geométricas de formas variadas
variadas em intensa e prolongada relação de
palimpsesto nos painéis rochosos.
As figuras são frequentemente policromas, e compostas em cores contrastantes.
São, mormente, de comprimento entre 30 e 60 cm.
Entre os temas mais representativos da tradição no Vale, segundo Isnardis (2004),
estão em primeiro lugar os conjuntos de bastonetes (figuras lineares), justapondo-se
justapondo traços
de cores diferentes (vermelho e amarelo majoritariamente) de modo alternado.
Figura 5:Bastonetes
Bastonetes da Tradição São Francisco
Figura 6: Cartuchos
69
Figura 8: Figurações antropomorfas, zoomorfas e de armas e instrumentos atribuídas à Tradição São
Francisco no Vale do Rio Peruaçu, norte de Minas
Figura 9: Sequência cronoestilística da Tradição São Francisco no Vale do Rio Peruaçu (adaptado de
Isnardis, 2004)
* # 6 $ 17
O complexo Montalvânia foi primeiramente definido nos vales dos rios Cochá e
Carinhanha, em Montalvânia.
No Vale do Rio Peruaçu, o Complexo Montalvânia aparece seguramente, segundo
71
Isnardis (2004) apenas a partir de pinturas, ao contrário de sua área de primeiros
delineamentos em que são numerosas as figuras gravadas.
O corpus temático deste conjunto é composto de grafismos antropomorfos,
biomorfos e bioantropomorfos, além de figurações geométricas, “ pés” e “ objetos” (entre os
quais estão as “ armas” e “ cestas” ).
As figurações antropomorfas e bioantropomorfas parecem corresponder aos
principais temas presentes no Vale, tendo sido executados apresentando variações
morfológicas sobretudo no que diz respeito às noções de movimento, e características das
representações de membros (braços e pernas).
Segundo Isnardis (2004: 88),
72
Figura 10: Grafismos antropomorfos e biomorfos do Complexo Montalvânia no Vale do Rio Peruaçu
* '8 % . 8 +
73
significativa, uma descontinuidade que sugere a chegada de um grupo de repertório
cultural distinto daquele dos autores da tradição São Francisco.
* * 8 % . 2
* , 9 4 & :
76
Figura 16:
16 Temas Nordeste em Painel na Lapa dos Desenhos
* /4 &
77
Figura 17:: Figurações
Figurações zoomorfas atribuíveis á Tradição Agreste
Figura 18: Grafismos antropomorfo Agreste, Lapa do Caboclo, Vale do Rio Peruaçu
*# ! "
78
*# 4 &
79
conjunto Planalto, mas mostrariam diferenças, sobretudo no modo técnico de compor as
figuras, considerando volume corpóreo, tipo de tinta empregada e dimensões. Alguns
destes sub-grupos
grupos corresponderiam a alguns dos seis distintos momentos de pintura da
Tradição Planalto no carste.
*# # ; 4 & :
80
São descritos enquanto manifestação da Tradição Nordeste na região de Lagoa
Santa figurações antropomorfas dispostas em pares ou conjuntos, denotando dinamismos
nas posturas (Prous et al,, 2003).
Baeta (2011) se refere às figuras enquanto sendo uma influência42da Tradição
Nordeste, em especial do Estilo Seridó (p.132), por estas apresentarem-se
apresentarem enquanto
representações dinâmicas que sugerem crônicas do cotidiano.
As figurações não abundam na região e “ parecem fazer parte ou integrar
inte o conjunto
pictural Planalto,
lanalto, em níveis mais recentes” (Baeta, 2011:132). São poucos os sítios em que
as figuras aparecem e parecem ter sido consideradas enquanto parte da Tradição Nordeste
por sua aproximação temática (figuras humanas associadas, com representação de
genitália, compondo “ cenas” ) e ainda por apresentarem a representação da cabeça em
formato de caju, a semelhança do que ocorre no Nordeste do Brasil. Contudo, Prous em
1980 considerou oss grafismos Ballet como parte do repertório Planalto regional, se
utilizando de comparações regionais mais amplas, após as prospecções em outras áreas de
centro e norte mineiros.
É preciso, pois, neste caso, considerar que talvez o uso de categorizações amplas
a
não seja útil para o entendimento desta manifestação gráfica. Prous (2011, comunicação
pessoal) aponta para o fato de que sua intenção no momento em que identificou a“ fácies
Ballet” era tão somente sublinhar uma manifestação temática (cenas entre antropomorfos
ant
“ cara de caju” ) distinta daquela que havia em maioria na região.
Neste sentido, e considerando outras figurações antropomorfas que aparecem
juntamente com o repertório Planalto em outras áreas aqui consideradas, as figurações
Ballet serão tratadas
as como coerentes à temática da Tradição Planalto.
42 Baeta não esclarece o que esta influência significa. Aqui, a meu ver, nos deparamos com um problema sério quando lidamos com as
categorizações,
gorizações, erro ao qual todos incorremos: como pode uma categoria influenciar os grafismos? Ser Tradição Nordeste ou não ser Tradição
nordeste não fazia parte do sistema de identidades e relações entre os grupos autores dos grafismos. Essas são categorias por nós inventadas e que
podem nem de longe chegar perto do conjunto de códigos que caracteriza as relações de identidade e alteridade entre os grupos que por ali grafaram.
81
*# ' 1 ! "
*' "
82
*' 9 4 &
43 Tanto na região da Serra do Cipó, como em Diamantina (localizado na mesma unidade geomorfológica), os antropomorfos de grandes dimensões
foram primeiramente retirados do repertório Planalto, que contava apenas com figurações antropomorfas esquemáticas, seguramente atribuíveis.
Contudo, tais figurações, como venho observando, são realizadas com as mesmas tintas que realizam grafismos mais tipicamente Planalto. Deste
modo, não utilizo aqui a categorização empregada por Baeta, 2011.
83
Figura 22: Figuras pisciformes na Lapa do Fogão
84
Figura 24:Figuração
24 Zoomorfa da região da Serra do Cipó
85
Figura 26: Grafismos da Tradição Planalto no Grande Abrigo de Santana do Riacho, Serra do Cipó
** 2
44 Como neste momento, em outras regiões de Minas Gerais vinham sendo observados grafismos semelhantes com aqueles
a identificados no norte
de Minas e chamados de Complexo Montalvânia, aumentando, pois, sua dispersão geográfica, ele foi tratado em Diamantina já como
com Tradição.
45 Neste momento, todos os sítios calcados já haviam sido digitalizados e estavam sendo iniciadas as análises tipológicas dos grafismos.
gr Esta
análise estava sendo empreendida por mim e, principalmente, por Luiza Câmpera.
86
inevitavelmente, começavam a trazer questionamentos quanto às categorias que estávamos
usando.
Foi na etapa de campo de conferência das reduções dos painéis calcados (no ano de
2010), em que nos detemos à caracterização das tintas (cor e textura) e modos de aplicá-
las, que confirmamos que estávamos equivocados em nossas categorizações.
Percebemos que os grafismos que havíamos atribuído às tradições Nordeste,
Agreste e ao Complexo Montalvânia eram realizados com as mesmas tintas, e em
coerência cronológica, com as figuras mais típicas da Tradição Planalto.
Assim, a variabilidade que havíamos observado e que nos levou a atribuir a
repertórios culturais distintos (Tradições) se mostrava agora interna a uma unidade.
Ao mesmo tempo, algumas figurações apresentam-se exclusivas de determinados
sítios com elementos de inserção na paisagem e de escolha de suportes particulares (por
exemplo, figurações atribuídas inicialmente a Tradição Nordeste e que se restringem a
cenas de atos sexuais, só aparecem em abrigos voltados para o Leste – raros na região em
função dos movimentos tectônicos relacionados à gênese do Espinhaço, e que tiveram
direção leste/oeste influenciando a orientação dos abrigos para a mesma direção (paredes
voltadas para oeste). Esta seleção de sítios com esta orientação cardeal, combinada a uma
temática distinta daquela que nos parece predominante, nos levou a separar estas
figurações em outra categoria classificatória. Contudo, o que parece acontecer, e de forma
aceitável, é que há uma enorme variabilidade no conjunto de vestígios gráficos a que
chamamos de Tradição Planalto, em que há uma relação entre o quê e onde grafar
determinados temas (Linke, 2013, no prelo).
Apresentarei aqui, o conjunto que (re) delineamos para a região: a Tradição
Planalto.
** 4 & 2
87
aparecem, sendo os bastonetes e grades aqueles mais expressivos. Aparecem também, mas
raros, grades, círculos radiados e círculos concêntricos. Figurações ‘biomorfas” também
são encontradas,
contradas, mas também não se fazem representativas nos sítios.
Figura 27:Temática
Temática zoomorfa da Tradição Planalto em Diamantina
As associações temáticas, compondo por vezes cenas, são comuns na região. Entre
elas destacam-se
se as “ cenas de caça” , em que há uma associação entre figurações
zoomorfas e antropomorfas, e as associações entre cervídeos com e sem galhada (que nos
sugere representação de macho e fêmea).
Entre as representações antropomorfizadas, vale ressaltar que, quando
acompanhadas de figuras zoomorfas, são sempre esquemáticas, quase sempre
representadas apenas por um x, que se coloca na extremidade do dardo atravessado sobre a
88
figura zoomorfa, que são sempre absurdamente naturalistas, contendo detalhes anatômicos
(joelhos, cascos, coxas) e alguns elementos em perspectiva. Já quando aparecem sozinhas
ou em grupo de no máximo três e com dimensões que ultrapassam 60 centímetros, as
figuras antropomorfas mostram-se
mostram se muito detalhadas com representações anatômicas e
formas diversificadas de preenchimento do corpo. Quando o grupo ultrapassa três
elementos, as figurações voltam a se simplificar,
simplificar, e são bem menores, mantendo, porém, a
representação do corpo e membros de forma clara.
Figura 30: Figuras zoomorfas chapadas de quarto momento (?) Tradição Planalto
Planalto
*, " +
*, 4 &
Em 1980 com intenção de publicar uma síntese para a arte rupestre do centro e
90
norte mineiros a partir de dados colhidos nas prospecções realizadas no final da década de
1970 por pesquisadores do recém-criado Setor de Arqueologia da UFMG, Prous, em
caráter assumidamente preliminar, define o Estilo Serra do Cabral (a partir das pesquisas
na Serra), comparando-o com o Estilo Alto Jequitinhonha (definido para a região de
Diamantina), ambos expressões regionais da Tradição Planalto. Para o autor, o estilo seria
caracterizado por figurações zoomorfas, predominantemente cervídeos e peixes em
associação, antropomorfos de corpos largos e detalhes anatômicos, incluindo olhos e
representações de genitália. Para este estilo ainda se incluiriam figurações geométricas, por
vezes complexas, e, sobretudo, quadrangulares.
Seda (1998) afirma que estes elementos não são observados por ele em sua área de
pesquisa, mas conforme ressalta, as observações de Prous advêm de outra região da Serra
do Cabral, face contrária àquela trabalhada por ele.
Os dois, todavia, concordam que há nas representações zoomorfas da Serra do
Cabral acentuado naturalismo das figuras e também dinamismo nas representações.
Os grafismos da Serra do Cabral possuem temática variada, contendo zoomorfos
(cervídeos, peixes, tatus, e outros quadrúpedes), antropomorfos de maneiras variadamente
representados (à semelhança da região de Diamantina) e ainda figurações geométricas.
Enquanto em outras áreas em que aparecem grafismos atribuídos à Tradição Planalto, os
geométricos parecem secundarizados em termos de expressividade numérica, na região da
Serra do Cabral a geometrização parece ocupar um lugar mais valorizado. Há muitas
representações geométricas (círculos concêntricos, grades, redes, geométricos lineares), e
há ainda uma tendência em geometrizar os preenchimentos dos corpos das figuras
zoomorfas. Esta geometrização das figurações é responsável por uma associação destes
grafismos à Tradição São Francisco (Seda, 1998).
Seda (op. Cit.) defende a ideia de ser a região da Serra do Cabral uma área de
transição entre as áreas do centro e norte de Minas. Esta transição seria expressa ou visível
nas expressões gráficas da região que embora se comportem dentro da Tradição Planalto,
apresenta “ influências da Tradição São Francisco” , influência esta também aventada por
Prous.
Nenhum dos dois autores discute o que seria esta influência. Seda apenas justifica
esta possibilidade a partir do posicionamento geográfico da Serra do Cabral, situada entre
os vales do Rio Peruaçu e a região de Lagoa Santa.
91
Figura 31: Zoomorfos e figuras geométricas atribuídas à Tradição Planalto, na Serra do Cabral
92
Figura 33: Figura antropomorfa e figuras zoomorfas da Serra do Cabral
*/ - .
*/ 4 &
94
Quando pintados, podem aparecer, quanto aos geométricos46, em bicromia, sendo,
contudo, predominantes as representações monocrômicas.
*0 $
96
Figura 37 - Conjunto estilístico 2 da Lapa da Fazenda Velha
97
Figura 38 - Conjunto estilístico 3 da Lapa da Fazenda Velha
98
Figura 39 - Conjunto estilístico 4 da Lapa da Fazenda Velha
100
3 * $,% % ,41% * ( 5 ,5%
, (
47Pragmático do pragmatismo, corrente teórica interpretativa em que Rorty é referência e defende que os textos são ricos de sentidos vários e que
cabe ao leitor fazer uso deles de acordo com seu próprio repertório e não um repertório ideal que faria com a interpretação ideal fosse extraída
somente e unicamente do próprio texto e de acordo com a expectativa de seus autores.
101
, < = 6 . + 1
+ 1
48 Um exemplo dessa prática é a publicação de Prous em 1980 em que este apresenta uma síntese da Tradição Planalto em Minas Gerais a partir
dos dados colhidos através da identificação de sítios rupestres em prospecções realizadas no último quinquênio do decênio de 1970, sem que tenha
havido levantamento sistemático dos grafismos e posterior análise. Os primeiros sítios calcados, por exemplo, na Serra do Cabral o foram já na
década de 1990 pela equipe do IAB.
102
,# ( &
49 Infiro ser esta tabela a última a ser produzida, pois o documento em que a mesma aparece (Miranda, s/d) reúne as análises tipológicas realizadas
por Cristiana Andrade para as figuras chamadas de Cartuchos. Junto com os documentos que tive acesso há o projeto da pesquisadora datado de
1997. Desta forma, o relatório de Miranda (s/d) só pode ser posterior a 1997. Ao mesmo tempo, a partir de 1998/99 Miranda passou a se dedicar a
outras análises dos conjuntos gráficos do Peruaçu, não se dedicando às tipologias, juntamente com Andrei Isnardis (Isnardis, 2013, comunicação
pessoal).
50 Quando a análise tipológica foi realizada entediam-se as figuras Caboclo como sendo chapadas com acréscimo de linhas em seu preenchimento
compostas por cor distinta deste. Hoje, a partir de novos levantamentos regionais, tem-se a compreensão de que as figuras Caboclo foram, na
verdade, compostas tendo seu preenchimento realizado pela interação entre linhas ora da cor do contorno, amarelo em sua maioria, ora em vermelho
(Isnardis, 2004; 2011)
103
interpretados. Os antromorfos foram subdivididos em vários tipos e variedades.
Para as figuras gravadas, os antropomorfos foram subdivididos em vários tipos e
ainda foram considerados nesta família de figuras os membros (mãos e pés). Os zoomorfos
foram divididos em aves, cervídeos e onças, lagartos e quadrúpedes não identificados,
todos eles apresentando variações tipológicas a partir de atributos. Os biomorfos foram
divididos em tipos de acordo com a aproximação com grafismos de outras classes criadas.
E assim, como para as figurações pintadas, nas classes fitomorfos e instrumentos os
grafismos foram inclusos nelas por sugestão de forma.
Nas páginas seguintes, seguem reproduções das tabelas de classificação produzidas
por Miranda (idem).
104
Figura 41: Classificação dos geométricos lineares do Vale do Rio Peruaçu
105
Figura 42: Classificação dos geométricos não lineares do Vale do Rio Peruaçu
106
Figura 43: Classificação das figuras zoomorfas do Vale do Rio Peruaçu
107
Figura 44: Classificação dos grafismos do Vale do Rio Peruaçu em Armas e objetos
108
Figura 46: Classificação das figurações antropomorfas do Vale do Rio Peruaçu.
109
Figura 47: Classificação dos grafismos gravados do Vale do Rio Peruaçu
Figura 48: Classificação dos grafismos antropomorfos gravados do Vale do Rio Peruaçu
Quanto aos atributos utilizados para a criação das classes, esses variam à medida
que o nível de detalhamento da classificação aumenta. Assim, na definição das famílias o
critério utilizado deriva da forma dos grafismos em reconhecíveis ou não reconhecíveis aos
olhos do observador em categorias temáticas - geométricos para aqueles cuja forma não
remete a nenhum modelo mental específico, e antropomorfos, zoomorfas e outros para
aquelas formas reconhecíveis.
Já para a classificação mais minuciosa, do que Miranda chamou de tipos e
110
variedades, os únicos atributos descritos na documentação com que trabalhei são aqueles
utilizados para classificar os antropomorfos, e que podem ser vistos na Figura 48, ou na
Figura 49.
Figura 49: Atributos utilizados na classificação das figurações antropomorfas pintadas do Vale do Rio
Peruaçu.
112
inerente, natural aos grafismos.
Juntamente com as questões acima apontadas, as análises tipológicas, tal como
realizadas no Vale, foram aos poucos se tornando distantes dos meus objetivos, pois os
tipos já foram delineados considerando-se conjuntos de grafismos e não abrindo mão deles.
Nesta mesma direção, pode-se tomar como ilustrativo a distinção existente entre os
grafismos pintados e gravados, a diferença existente na técnica de execução (materiais
necessários) foi supervalorizada, o que, para análise que eu pretendi nessa pesquisa não
seria necessário, pelo contrário, comprometedor. Isso porque para além da técnica de
execução pode não haver outras distinções entre os grafismos em suas variações de
representações dos temas, ponto que elenquei em grau de valor, no primeiro momento
dessa análise, com objetivo de tornar mais claras as distinções entre os conjuntos gráficos
atribuídos a diferentes unidades classificatórias. Sendo os mesmos considerados em
classificações estanques, as possibilidades de diálogos entre eles se tornam restritas e/ou
replicadoras das diferenças.
Com essas reflexões, além das que apresentarei adiante referentes a outras
tipologias aplicadas às áreas com que trabalhei, esbocei uma nova classificação, cujos
resultados também apresento alhures.
,' ! "
113
Figura 51: Classificação zoológica das figurações zoomorfas de Cerca Grande.
115
Figura 52: Exemplo da tabela de classificação dos grafismos da Lapa da Cerca Grande, onde a
primeira coluna se refere à figura analisada e a primeira linha aos atributos observados. Ao longo das
linhas vêm-se as variações dos atributos para cada figura. A última coluna designa a classe zoológica
das figuras, que no caso é apenas cervídeo.
Figura 53: Quadro de variedades das representações zoomorfas da Lapa da Cerca Grande
desenvolvido por Anthonioz e outros (1978).
117
recorrentes de atributos. As figuras, de um modo geral, são compostas combinando os
atributos de forma muito variada de modo que é possível perceber, ao longo da
classificação, não padrões, mas tendências gerais as quais foram utilizadas pelos
pesquisadores na definição dos conjuntos e nomeadas de características estéticas, em que
foram igualmente valorizadas, se não mais, as impressões cognitivas e sensoriais dos
pesquisadores quanto à forma final das figuras. Um exemplo é o volume corporal dos
cervídeos, critério não contabilizado nas tabelas, mas que aparece nas descrições das
variedades descritas e delineadas, e que, de fato, chamam atenção do observador.
Conquanto, as classificações dos grafismos têm um caráter mais descritivo das
figuras isoladas e não forneceram, ou fornecem, em função da ampla possibilidade de
combinação dos atributos elencados, a possibilidade de se delinear conjuntos tipológicos
específicos.
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118
Figura 54:: Tipologias das figurações antropomorfas do Grande Abrigo de Santana do Riacho
119
Figura 56: Tipologia das figurações zoomorfas do Grande Abrigo de Santana
Santana do Riacho
120
Figura 57: Classificação tipológica das figurações zoomorfas do Grande Abrigo de Santana do Riacho
121
Figura 58: Classificação tipológica das figurações zoomorfas do Grande Abrigo de Santana do Riacho
122
Figura 59: Atributos utilizados na classificação dos cervídeos do Grande Abrigo de Santana do Riacho.
Contudo, segundo Prous et al., ao querer subdividir os dois principais conjuntos por
eles observados (figuras chapadas e figuras contornadas)
Figura 60: Classificação das figuras geométricas do Grande Abrigo de Santana do Riacho
124
Figura 61: Tipologia das Figurações geométricas do Grande Abrigo de Santana do Riacho.
,' 8 6 .
126
Escolhi três dos sítios mais pintados da região, nos quais havíamos feito o
levantamento de mais de 80% dos grafismos através do calque e nos quais já havíamos
realizados a conferência dos mesmos. Foram eles o sítio Lapa do Galheiros, Lapa do Boi e
Lapa do Voador Norte. Além desses o sítio Lapinha das Emas foi incluído na análise em
função da variedade de grafismos, embora pouco em número, de representações de
cervídeos.
Nestes sítios as figuras foram individualizadas e a partir do quadro de morfologia
de cervídeos aplicado para Santana do Riacho com algumas modificações as figuras foram
sendo caracterizadas, utilizando-se de uma tabela, conforme os atributos apresentados no
quadro abaixo.
127
expressivas na análise;
• a maneira como as figuras combinam atributos apresentam-se por demais
variadas.
Todos os pontos me levam a avaliar a validade da análise tipológica para os
objetivos que busquei ao longo do doutoramento. Os processos tafonômicos que agem
sobre os grafismos interferem na medida em que desbotam, mancham e apagam. Lidamos
sempre na Arqueologia com uma amostra definida inicialmente pelo tempo. Dessa
maneira, nos sítios, o acervo com o qual lidamos não pode ser tratado como intacto desde
que os vestígios foram ali colocados, guardados, deixados ou perdidos. Nas análises dos
grafismos, a falta de uma perna em uma figuração zoomorfa pode não corresponder a uma
figura que foi composta sem uma perna, mas a fenômenos naturais que atuaram sobre o
grafismo de forma a intemperizar de tal modo uma porção da figura que a visualização de
uma perna se torna comprometida, e muitas vezes a inferência de que pode ter havido uma
perna que hoje não se vê também. Nem sempre as pátinas, manchas, exudações tem seus
limites óbvios e agem de forma homogênea em todo suporte rochoso, e muitas vezes as
figuras são postas em suportes que já apresentavam, manchas, escorrimentos cujos limites
entre estas e fenômenos continuados de intemperismos não são óbvios. Algumas técnicas,
que hoje têm se desenvolvido para levantamento em rupestre dariam conta desta questão,
mas estas não foram aplicadas até o momento nas áreas que trabalhamos.
A percepção do pesquisador que se coloca em frente aos grafismos e se
disponibiliza a copiá-los, observar o modo como foram feitos, como antes apontado, tem
influência significativa no resultado final das figuras. O olhar e o ciclo hermenêutico,
como já apontaram Hodder (1999) e Câmpera (2011), tem a capacidade de alterar dados.
No caso das pinturas, tomando por exemplo Diamantina, após alguns anos desde que
alguns sítios haviam sido objeto de calque e após uma familiarização do olhar com os
conjuntos gráficos vimos, durante as conferências dos levantamentos, que muitas figuras
foram calcadas excluindo delas suas características próprias em favor de características de
que nós supomos para elas. Por exemplo, muitas das figuras do segundo momento da
Tradição Planalto, cuja característica é a composição fluida entre contorno e
preenchimento, foram calcadas tendo o contorno como um traço contínuo. Como esta
característica, vários outros atributos e formas gráficas foram ignoradas por muito tempo.
Um outro exemplo, são as figuras Caboclo, que como anteriormente escrito, foram
inicialmente concebidas pelos pesquisadores quanto a suas características gráficas de
forma muito diversa do que pelos seus autores.
128
As intensas sobreposições, que marcam um comportamento dos autores das figuras
atribuídas à Tradição Planalto, oferecem desafios no momento de se individualizar os
grafismos. Os níveis de sobreposição são tão intensos, por vezes, que enxergar as primeiras
figuras que compuseram os painéis se torna difícil, os detalhes das figuras mais ainda.
Outra questão, e talvez mais interessante, diz respeito a um comportamento típico da
Tradição Planalto, observado até o momento somente em Diamantina (Isnardis, 2009), em
que as figuras em sobreposição compartilham atributos entre si. Individualizar uma figura
e classificá-las com seus atributos significa decidir a quem pertence a galhada, a pata. As
vezes a figura, se identificada apenas por características de tinta, será apenas um quarto
traseiro de cervídeo, que só faz sentido com a figura precedente que teve seu volume
corporal apropriado e modificado em momento tardio à sua produção.
Figura 62: Figuras da Lapa do Boi em Diamantina, em que a sobreposição entre elas resulta em um
compartilhar de atributos.
129
Figura 63: Intervenções tardias em figura da Lapa do Boi, Diamantina
130
Figura 64: Variedade de representações de cervídeos na região de Diamantina e Planalto Cárstico de
Lagoa Santa
131
,, 8 6 + &3 .
Quando uma pesquisa em que as gravuras e pinturas rupestres são o interesse inicia
seu desenvolvimento, as escolhas metodológicas, na maior parte das vezes, já foram
entoadas antes mesmo das pinturas serem localizadas e registradas, graças às abordagens
precedentes aplicadas a contextos diversos e que em sincronia encontrou lugar nos nossos
anseios, perguntas.
Isto significa que, seja no laboratório cheio de materiais arqueológicos sobre as
bancadas, com acúmulos de papéis nos cantos empoeirados, iluminado pelas lâmpadas
fluorescentes e os brilhos pontuais dos equipamentos eletrônicos; seja se abaixando para
levar ao rosto a água fresca do córrego que desce a serra, como uma pausa na prosa; seja
ao, enfim, descalçar as botas com cadarços eriçados de carrapichos e picões; seja preso no
trânsito arrastado a caminho de qualquer lugar; ou lavando as vasilhas do café da manhã;
enfim, em todos esses momentos diversos em que as melhores ideias nos visitam, as
possibilidades de abordagem estão espalhadas pelo salão, esperando que o objetivo da
pesquisa escolha a parceira de dança que melhor corresponda ao sucesso de sua
performance, que vá girar com ele pelas voltas do círculo hermenêutico.
É importante admitir que, por mais prosaico e despretensioso que pareça o
caminhar em busca dos painéis gravados ou pintados, desde o seu início as opções
metodológicas já estão agindo e não apenas por causa da estratégia de amostragem, mas
também, e sobretudo, porque o que esperamos poder fazer com as pinturas já orienta nosso
primeiro olhar para elas.
Igualmente valioso é assumir que a pesquisa arqueológica é fecundada por intuição
e experiências estéticas, que são depois formatadas por nós de modo cartesiano, com o
intuito de nos convencermos e convencermos aos outros de que há uma coerência nesse
processo, de que ele pode enfim ser conduzido de suas condições poéticas e prosaicas de
nascimento à condição de prática acadêmica.
E apesar de nosso esforço constante, o processo insiste em escapar à formatação
que lhe foi imposta, continua sendo alimentado de emoções e movimentado pelas
experiências que não se cansam de nos surpreender, alterando os compassos da opera
acadêmica.
Proposta no decênio de 1970, a partir dos sítios do carste de Lagoa Santa, a
Tradição Planalto foi o primeiro grande conjunto classificatório definido para os grafismos
rupestres do Brasil Central, mas logo foi acompanhada de outros similares, como a
132
Tradição São Francisco, criada a partir de sítios do extremo Norte mineiro, da Tradição
Nordeste, criada a partir dos sítios do sudeste do Piauí, da Tradição Agreste, definida
inicialmente na mesma região; alguns anos mais tarde - e até a década de 1990 - novas
unidades classificatórias amplas somaram-se a essas.
O que se pretendia com tais unidades, de uma maneira geral, era mapear
manifestações culturais: agrupar por semelhança a grande abundância e diversidade de
grafismos que se revelava, a partir de áreas de pesquisa que se limitavam a pequenas
janelas abertas sobre uma paisagem muito ampla.
Na construção e delineamentos dos conjuntos, bem como na posterior atribuição de
grafismos a estes conjuntos, a temática teve um papel de relevância e deste modo as
figuras foram sendo individualizadas em unidades gráficas mínimas, para que pudessem
então ser descritas em atributos e, por fim, agrupadas em conjuntos que revelam ora
semelhanças, ora diferenças.
Nessa construção entende-se como temática o elenco de temas. É preciso dizer que
a definição do que é tema é tão intuitiva como o início das pesquisas. Ao tentarmos
formular uma definição de tema, vemos claramente quão intuitiva ela é e percebemos que
o esforço para colocá-la, a posteriori, no papel não é um fenômeno restrito a esta pesquisa,
mas um fenômeno que se observa amplamente na produção sobre arte rupestre em geral,
em que essa definição é vastamente ausente, ou de aparições meteóricas. Como tentativa
de trazer uma conceituação a partir da experiência obtida na revisão das documentações
visitadas aqui e que as considere, como uma busca por uma tradução, tema pode ser
entendido como a menor unidade de figuração. Em que os aspectos de forma,
reconhecíveis e nomináveis dentro de nosso processo cognitivo, como, por exemplo,
cervídeos, aves, antropomorfos filiformes, bastonetes, círculos concêntricos, outros
quadrúpedes, foram considerados, cada um, como tema.
As análises tipológicas, por sua vez, em se tratando dos grafismos rupestres, e não
por coincidência, vêm acompanhada da noção de tema e temática. Quando olhamos as
classes que são criadas, além de serem arbitrárias, mais que isso, elas são sensoriais e
interpretativas. Seus critérios, muito aquém da matemática, se confundem ora valorizando,
ou estimulada, por atributos que contém uma pressuposta relação forma-função, ora
estimulada pelos signos gráficos que acessam através de sistema cognitivo supostos
significantes (e algumas das vezes também putativos significados).
À medida que nossos olhos cruzam, passeiam e se encontram com miríades de
cores e texturas, e tendo já em nosso saber-fazer arqueológico o intuito de organização dos
133
dados, agrupamos conjuntos de grafismos, por forma geral, cor e relações de sobreposição
que de forma mais ou menos consciente atuam em nossas sistematizações posteriores.
Quando montamos conjuntos de critérios, organizamos tabelas, enumeramos
estamos buscando tornar objetivas nossas subjetividades, tentam, alguns, extirpar suas
subjetividades em prol das certezas dos cálculos matemáticos. Mas não há como retirar dos
cálculos, dos organogramas aquilo que os faz existir. Não há como retirar as humanidades
e todo o véu que as envolve, que inclui os gostares, o modo de ver as cores, as formas e
tudo o que vem com o gosto, as cores e as formas.
Nas análises aqui apresentadas e empreendidas buscou-se a objetividade e
organizar os dados gráficos de modo a se extrair informações que pudessem aproximar
arqueólogos e o contexto de produção dos grafismos, seus autores.
Pegando os exemplos das análises tipológicas aplicadas para o Planalto Cárstico de
Lagoa Santa por Anthonioz et al., para Santana por Prous et al. e aquela aqui esboçado por
mim a partir dos grafismos de Diamantina, a dificuldade de se realizar o cruzamento de
variáveis, a fim de se chegar a tipos gráficos ou de se chegar a resultados esperados
(redundâncias), pode muito estar carregado da ação da subjetividade.
Como já apontou Prous et al nas próprias análises de Santana, o que tentamos é
classificar as figuras a partir de critérios que obviamente não são exatamente os mesmos
dos autores dos grafismos, mas tentamos uma aproximação.
O resultado alcançado, que não era o esperado, pode ser resultado da subjetividade,
atuante em critérios que não foram aqueles os mais relevantes para os autores dos
grafismos. Mas o fato de não ter se obtido redundâncias pode sim exprimir objetividade na
análise que foi capaz de mostrar a variabilidade dos conjuntos. A subjetividade aí,
portanto, reside na expectativa de que o resultado deva ser a redundância no nível do
detalhamento das figurações.
As análises das tipologias realizadas tanto em Santana, como no Carste e
Diamantina parecem corroborar, mesmo com todas as subjetividades envolvidas, para a
construção de um entendimento de que as figurações destas regiões, a despeito de seus
momentos ou grandes unidades classificatórias nas quais os grafismos foram atribuídos,
não mantém uma forma rígida na composição dos detalhes das figurações.
Isso quer dizer que não está, em se tratando dos grafismos da Tradição Planalto, no
número de patas, galhadas, orelhas e suas combinações o compartilhamento normativo que
denotaria aproximações culturais profundas entre seus autores.
O que parece ser mais definidor, e que de modo “ intuitivo” foi percebido e aplicado
134
nas definições dos conjuntos, tipos e variedades das regiões do Planalto Cárstico de Lagoa
Santa, Santana do Riacho e também para a região de Diamantina (ao mesmo tempo, para
as demais regiões aqui trabalhadas, mesmo que não tenham sido aplicadas análises
tipológicas para seus grafismos) é a forma final das figuras, incluindo seu volume corporal,
incluindo tamanho da figura e proporcionalidade entre tronco e cabeça (o que de uma
maneira bastante significativa define o grau de naturalismo dos grafismos),
preenchimentos, proporcionalidade entre os apêndices, e características de dinamismo
(posturas) e perspectiva nas representações gráficas. Enfim, seria uma estética das figuras,
suas formas finais que guardariam os modos de fazer, os estilos, dos conjuntos gráficos.
Não importa, pois, o número de galhadas e o número de patas com representações
de cascos ou cochas de uma figura, mas o modo geral em que a figura se apresenta, seu
resultado final. Estariam, possivelmente nos detalhamentos das figuras, os aspectos
idiossincráticos.
,/ &
135
das classes/tipos. Como se busca redundâncias máximas, um outro risco que se corre é de
agrupar grafismos que originalmente, em seus contextos de produção, carregavam
significados absolutamente distintos. Mas estas dificuldades acabam por ser inerentes à
Arqueologia e, espera-se, que a análise para a qual esta classificação se faz dê conta de não
somente avaliar seus problemas, mas fornecer informações que permita perceber as
relações entre significado e significante nas construções dos repertórios envolvidos nas
construções dos painéis gráficos.
Na definição dos tipos-temáticos (motif-type), busquei utilizar apenas critérios de
forma, morfologia, dos grafismos. Assim os tipos definidos podem ser observados nos
quadros seguintes.
136
Quadro 2: Quadro de tipos-temáticos 1
137
Quadro 3: Quadro de tipos temáticos 2
138
Quadro 4: Quadro de tipos-temáticos 3
139
Quadro 5: Quadro de tipos-temáticos 4
140
Quadro 6: Quadro de tipos-temáticos 5
141
Quadro 7: Quadro de tipos-temáticos 6
142
Quadro 8: Quadro de tipos-temáticos 7
143
Quadro 9: Quadro de tipos-temáticos 8
144
6# $,% ( % 7 $%
No total de sítios, e consequentemente painéis, contemplados foram analisados
grafismos classificados em 24 tipos-temáticos (Quadro 2 a Quadro 9).
Se fizermos uma análise de combinações possíveis entre os 24 tipos, considerando
as relações de lateralidade contempladas na análise, teríamos um total de 3408
combinações. Contudo a partir da análise foram observadas 1471 relações. A diferença
entre possibilidades combinatórias e aquelas que foram, de fato, utilizadas aponta para uma
intencionalidade, manipulação dos temas e suas associações.
Os tipos de associações observadas, sem as relações de lateralidade foram: os-tp, b-
b, ps-sc, os-ed, b-v; ps-os, os-z, b-tp, ps-oc, os-os, b-sc, ps-ed, os-v, b-oc, ps-tp, os-p, b-r,
ps-v, os-b, b-pu, ps-os, os-oc, b-z, ps-qc, os-r, b-p, ps-pu, os-ec, b-s, ps-b, os-x, b-ec, ps-z,
os-s, b-x, ps-pt, os-pu, b-pt, tp-qc, oc-pu, cd-a, tp-ed, oc-v, cd-q, tp-ec, oc-sc, cd-oc, tp-pu,
oc-z, cd-qc, tp-tp, oc-oc, cd-pt, tp-p, oc-tp, cd-os, tp-q, oc-p, tp-ec, oc-r, tp-sc, oc-z, tp-pt,
oc-x, tp-r, tp-x, tp-z,tp-s, qc-b, v-tp, cg-b, qc-oc, v-v, cg-cg, qc-sc, v-pt, cg-v, qc-qc, v-z,
cg-c, qc-a, v-ed, cg-q, qc-z, v-r, cg-av, qc-pu, v-s, cg-a, qc-os, v-a, cg-tp, qc-pt, v-ec, cg-
ed, qc-tp, v-pu , cg-r, qc-r, v-qc, cg-pt, qc-x, cg-os, qc-ec, cg-s, cg-oc, cg-cd, cg-qc, cg-f, g-
os, ed-z, sc-ec, c-v, ed-b, sc-v, c-b, ed-oc, sc-pt, c-c, ed-pu, sc-r, c-os, ed-qc, sc-z, c-av, ed-
ed, sc-sc, c-qd, ed-ec, sc-os, c-q, ed-p, c-a, ed-r, c-ed, ed-sc, c-tp, ed-s, c-oc, ed-x, c-ec, ed-
av, c-ed, c-pt, c-r, c-os, c-qc, c-p, z-z, pt-pt, q-q, z-r, pt-ec, q-av, z-p, pt-r, q-p, z-x, pt-z, q-
pt, pt-os, q-a, pt-ed, q-os, pt-oc, q-os, pt-pu, q-b, pt-x, q-oc, q-x, q-ed, q-r, q-z, q-pu, q-s,
q-qc, q-v, q-sc, q-ec, q-qd, a-ed, ec-p, av-av, a-a, ec-ec, av-os, a-p, ec-r¸ av-tp, a-tp, ec-oc,
av-s, a-oc, ec-x, av-b, a-pu, ec-os, a-x, ec-z, a-os, a-z, a-ec, a-r, cgd-c, a-b, cgd-qd, a-sc,
cgd-cd, a-av, cgd-q, a-ps, cgd-tp, a-s, a-pt, p-z, pu-pu, p-pu, pu-ec, p-p, pu-r, p-v, pu-sc,
p-oc, p-x, p-sc, p-qc, x-x, s-z, f-f, x-v, s-oc, f-qc, x-r, s-x, f-tp, x-pu, s-s, f-a, s-pu, s-r, s-qc,
r-r, s-p.
Onde os corresponde a ovalado simples; tp a traços lineares paralelos; b,
bioantropomorfo; ps, pisciforme; sc, setas curtas; ed, eixo com derivação; v a figuras em
forma de ´v`ou ´u`; z a figuras em zig-zag; oc a ovalados compostos; qc, quandrangulares
compostos; r, radiais; pu, a puctiformes; pt, a pectiformes; ec, eixo com apêndices
circulares ou ovalados; a, antropomorfos; x, figuras com traços transversais; p,
podomorfos; q, quadrupediformes; qd, quadrupediforme com traço atravessando; av,
aviformes; s, sauriformes; f, fitomorfos; cg, cervídeoforme com galhada; cgd,
cervídeoforme com galhada com traço atravessando; c cervideoforme; cd, cervideoforme
145
com traço atravessando.
Quando analisamos o total de associações por área, transversalmente aos conjuntos
estilísticos, isto é, sem considerá-los em um primeiro momento, vemos que há:
significativa variação no número de associações ocorridas em cada uma das áreas;
significativa pulverização das associações nas áreas, resultante em recorrências pouco
expressivas (vide tabela de associações gerais por área, em anexo).
As maiores recorrências por áreas são, em sua maioria, menores que 10% do total
de associações observadas nas mesmas. Por exemplo, no Vale do Rio Peruaçu as
associações mais frequentes são representadas pelas associações homotemáticas entre
ovalados simples, bioantropomorfos, e traços lineares paralelos, além das combinações
entre ovalado simples e traços paralelos, bionatropomorfo e traços paralelos e eixo com
derivações mais bioantropomorfo (Gráfico 1). A associação que apresenta maior
recorrência representa 6,33% do total de associações observadas na região - 1105 (vide
tabela de associações gerais por área, em anexo).
Gráfico 1: Frequência simples das associações temáticas mais frequentes no Vale do Rio Peruaçu
52 A região de Monjolos não está presente por apresentar recorrência significativa, módulo de mais de 5%, apenas em associações entre figuras
antropomorfas.
146
Figura 65: Gráficos de associações temáticas recorrentes em Jequitaí, Serra do Cabral, Diamantina e Planalto Cásrtico de Lagoa Santa
147
Esta realidade de recorrências pouco expressivas, em termos quantitativos, das
associações temáticas é também replicada quando são observadas as frequências simples
das associações por unidade estilística em cada uma das áreas.
Antes, contudo, de apresentar tais resultados, é preciso tornar evidente e justificada
a não contemplação de figurações atribuídas às tradições Agreste e Nordeste nas análises
realizadas para o Vale do Rio Peruaçu: os sítios com materiais disponíveis e seguramente
tratados não apresentam figurações destas unidades estilísticas – a exceção da Lapa dos
Desenhos, mas cujo painel em que há figurações atribuídas à Tradição Nordeste não
apresenta-se digitalizado.
Observando a tabela (tabela de associações gerais por área, em anexo) é possível
perceber que os tipos de associação e frequência em que ocorrem são variáveis entre os
conjuntos de uma mesma área, mas também entre conjuntos associados a uma mesma
tradição em áreas diferentes.
Apresentarei a partir deste ponto as associações percebidas para cada uma das áreas
e seus conjuntos cronoestilísticos.
/ &3 ( ) &
148
v-tp ^ 1 tp-r v 1
v-tp # 1 b-oc < 1
ed-ed > 2 b-oc ^ 1
qc-a > 1 p-p > 1
sc-v < 1 a-os V 1
tp-tp > 5 ec-oc v 2
tp-tp v 6 sc-pt ^ 1
b-v > 2 pt-r ^ 3
oc-v v 1 z-z > 1
os-os v 4 tp-s < 1
os-v > 1 r-r > 6
os-v < 1 sc-r ^ 1
os-v v 1 p-v v 1
v-v > 1 v-r < 1
oc-oc > 4 v-r # 1
oc-oc v 6 oc-x > 1
oc-tp < 3 v-ec ^ 1
oc-tp ^ 1 ec-x > 1
oc-tp # 4 b-pt > 1
os-p > 1 v-qc > 1
v-qc ^ 1 v-qc < 1
v-qc # 1
Tabela 1: Frequência simples das associações temáticas realizadas pelo SF1, no vale do Rio Peruaçu
(os sinais indicam a direção da relação de lateralidade, “o” representa sobreposição parcial e #
sobreposição integral entre figuras).
149
sf1
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
tp-tp v os-os > oc-oc v r-r >
Gráfico 2: Recorrências de associações do SF1 no Vale do Rio Peruaçu correspondentes à mais de 5%
cada uma do total de associações realizadas por este conjunto estilístico na região.
Vale ressaltar que as relações de lateralidade para estas associações recorrentes são
exclusivas paras as associações os-os, e r-r. As demais associações recorrentes variam suas
relações de lateralidade (vide Tabela 1), embora em todas elas não ocorra relações de
sobreposição.
Embora haja recorrências nas associações e em suas relações de lateralidade, é
importante notar que há 54 tipos de associações que ocorrem uma única vez.
No conjunto São Francisco denominado SF2 estão presentes nos sítios e painéis
analisados 74 tipos de associação, dentro das quais foram realizadas 132 associações entre
tipos-temáticos.
associação frequência associação frequência
os-tp > 3 tp-pt < 1
os-tp < 4 qc-os < 2
os-tp v 2 b-oc < 1
os-tp ^ 2 b-oc ^ 1
os-ed > 1 tp-x < 1
os-ed < 2 a-os < 1
os-ed v 1 a-os V 1
tp-ed > 2 b-r > 1
tp-ed < 3 b-r < 1
tp-ed ^ 1 z-z v 2
z-tp > 1 oc-z > 3
z-tp < 1 oc-z < 1
z-tp v 1 oc-z v 1
z-tp ^ 1 oc-z ^ 1
p-z > 2 qc-tp v 1
b-b > 4 p-oc v 1
150
b-b v 2 b-z > 1
b-tp V 2 b-z v 1
a-a > 2 b-z # 2
a-tp > 1 x-v > 1
a-tp < 1 os-x > 1
a-tp # 1 os-x< 1
qc-oc > 1 b-ec > 5
tp-ec ^ 1 b-x < 1
ed-qc ^ 1 pt-z v 1
ed-ed > 1 pt-pt v 1
a-oc > 2 p-qc > 1
qc-z > 1 v-qc < 1
qc-z v 2 os-p > 1
qc-z ^ 4 os-p < 1
tp-tp > 5 ec-ec > 15
tp-tp v 1 ed-ec > 2
b-v < 1 tp-p v 1
os-os v 5 os-b < 2
v-pt > 1 os-b v 2
oc-oc > 2 os-oc > 2
os-oc < 1
Tabela 2: Frequência simples das associações temáticas realizadas pelo SF2, no vale do Rio Peruaçu
151
sf2
16
14
12
10
0
os-tp < b-b > qc-z ^ tp-tp > os-os v ec-ec > b-ec >
Gráfico 3: Frequência simples de associações recorrentes em mais 2,5 % do total de associações do SF2
no Vale do Rio Peruaçu
152
No SF2 há 45 tipos de associações que só ocorrem uma única vez.
No momento da Tradição São Francisco chamado de SF3 ocorrem 101 associações,
distribuídas em 58 tipos.
12
10
0
os-tp > tp-ed > a-a > ed-ed > tp-tp > tp-tp v
Gráfico 4: Frequência simples de associações recorrentes em mais 5 % do total de associações do SF3
no Vale do Rio Peruaçu
154
a-ed > 1 qc-tp v 1
b-b > 3 qc-tp ^ 1
b-tp > 1 p-v > 3
b-tp < 2 x-v > 1
b-tp V 1 x-v < 1
a-a > 3 x-v # 4
a-a # 1 v-s < 1
a-p > 1 os-s > 3
a-tp v 1 os-s o 1
qc-oc ^ 1 ed-s < 1
ed-oc > 1 b-p > 1
os-z > 1 b-p < 1
v-tp > 1 v-a > 1
v-tp ^ 1 os-pu v 1
sc-ec > 1 os-pu # 1
qc-sc ^ 1 os-pu 2
tp-ec < 1 z-x ^ 1
ed-qc > 1 b-x > 1
ed-ed v 6 v-qc < 1
qc-qc > 1 ed-ec < 1
qc-a v 1 tp-p v 1
qc-a ^ 2 os-b > 1
tp-tp > 5 os-b < 1
tp-tp v 1 os-oc < 1
os-os v 2 b-sc > 1
a-x # 1 b-sc 1
x-x > 5 tp-pt < 1
os-v ^ 1 ed-p > 1
v-v v 2 qc-os > 1
oc-oc v 1 qc-os v 1
oc-tp v 3 p-p > 1
oc-tp # 3 tp-x < 1
p-pu v 1 tp-x v 1
os-p > 3 ec-ec > 1
Tabela 4: Frequência simples das associações temáticas realizadas pelo SF3, no vale do Rio Peruaçu
155
análise, para os conjuntos anteriores (5%) são as associações homotemáticas entre eixos
com derivações. Contudo, percebe-se que há recorrências de associações entre outros
tipos-temáticos, conforme gráfico abaixo (Gráfico 5).
sf4
0
ed-ed v tp-tp > x-x > v-ed # x-v #
Gráfico 5: Frequência simples de associações recorrentes em mais 3% do total de associações do SF3
no Vale do Rio Peruaçu.
associação frequência
a-a > 4
cg-b < 1
cg-cg > 1
156
cg-cg v 3
cg-v ^ 2
c-v ^ 1
c-b v 1
c-c > 1
c-c v 1
c-c ^ 3
cg-c > 1
cg-c v 1
q-q > 4
cg-av > 1
ed-av > 1
cg-ps < 1
Tabela 5: Frequência simples das associações temáticas realizadas pelo Unidade Estilística Desenhos,
no vale do Rio Peruaçu
4,5
3,5
2,5
1,5
0,5
0
a-a > cg-cg v cg-v ^ c-c ^ q-q >
Gráfico 6: Frequência simples de associações recorrentes entre 6% e 10% do total de associações da
Unidade Estilística Desenhos no Vale do Rio Peruaçu.
53
Entre os quais se encontram as figurações interpretadas em outras publicações enquanto propulsores e
fitomorfos.
158
piolho
10
0
ed-ed > q-q > av-av > av-av v f-qc >
Gráfico 7: Frequência simples de associações recorrentes da Unidade Estilística Piolho de Urubu no
Vale do Rio Peruaçu.
As relações de lateralidade existentes entre ed-ed, av-av, e q-q ocorrem apenas nos
tipos mostrados no gráfico. Já a associação entre fitomorfo e quadrangular composto tem
suas relações de lateralidade variadas.
No total de associações, embora haja recorrências ou tendências observadas, 28
associações ocorrem uma única vez (44%).
No conjunto de grafismos atribuídos ao Complexo Montalvânia, são observadas
360 associações distribuídas em 187 tipos de associação (Tabela 7).
159
ed-z > 1 pt-ed < 1 x-v ^ 1 tp-x ^ 1
ed-z V 1 ec-z > 1 os-x > 3 a-os > 3
ed-z ^ 3 ed-x > 1 b-p < 1 a-os < 1
z-tp > 8 x-pu v 1 v-a > 3 a-os V 2
z-tp < 1 v-pu > 1 v-a < 1 a-os ^ 3
z-tp v 2 pt-z > 1 v-a ^ 1 pu-pu > 1
z-tp o 1 p-sc ^ 1 os-pu > 1 pu-pu v 3
ed-b > 5 pt-pt > 1 z-r > 2 a-z ^ 2
ed-b < 4 pu-ec v 1 z-r < 1 a-z # 1
ed-b v 2 v-qc v 1 s-z > 1 a-ec v 2
ed-b^ 1 ed-a > 1 ps-sc > 1 b-r > 3
a-ed > 4 ed-a v 1 b-v > 3 b-r < 1
a-ed < 2 os-b > 2 b-v v 1 b-r # 1
a-ed ^ 1 os-b < 2 oc-v ^ 1 pt-r > 3
a-ed o 1 os-b v 1 oc-sc < 1 pt-r ^ 1
p-z > 1 os-b # 1 a-x > 1 oc-r v 2
b-b > 14 v-z v 1 x-x v 1 a-r > 1
b-b v 1 v-z ^ 1 os-v > 1 a-r < 1
b-tp > 8 b-sc < 2 os-v v 1 a-r v 2
b-tp < 1 b-sc ^ 1 v-v > 2 a-r ^ 1
b-tp V 3 tp-sc > 2 v-pt > 1 a-b > 4
a-a > 12 tp-sc # 1 oc-tp > 1 a-b < 1
a-a v 2 ed-p < 2 oc-tp < 1 a-b v 1
a-a # 2 qc-os > 1 oc-tp # 2 v-ed > 1
a-p ^ 1 qc-os < 1 os-p < 2 v-ed < 1
a-tp > 3 os-r< 1 os-p # 1 v-ed v 2
a-tp < 1 os-r ^ 1 ec-ec > 2 v-ed # 4
a-tp ^ 2 os-ec < 2 ed-ec > 4 pt-os v 1
a-tp # 1 tp-ec v 1 ed-ec v 1 tp-s ^ 1
ed-oc > 1 ed-qc > 1 tp-p > 2 r-r > 1
oc-pu > 1 ed-qc < 1 tp-p ^ 2 r-r o 1
ed-pu< 1 ed-ed > 1 a-oc v 1 p-v v 1
os-z > 1 ed-ed v 2 tp-pu > 1 sc-ec < 1
os-z ^ 1 qc-qc > 1 tp-pu v 1 tp-ec > 1
v-tp > 1 qc-a < 1 qc-z > 1 tp-ec < 2
v-tp ^ 1 tp-tp v 10 tp-tp > 5
Tabela 7: Frequência simples das associações temáticas realizadas pelo Complexo Montalvânia, no
Vale do Rio Peruaçu
160
CM
14,5
14
13,5
13
12,5
12
11,5
11
b-b > a-a > x-v <
Gráfico 8: Frequência simples de associações recorrentes do Complexo Montalvânia
161
tp-ed # 3 ec-os > 3 oc-r ^ 1 tp-tp > 5
qc-b > 1 s-x < 1 v-ed v 1 tp-tp v 6
qc-b < 3 pt-z v 1 v-ed # 1 tp-tp # 1
qc-b v 4 pt-z # 1 pt-os v 1 b-v > 1
qc-b # 1 sc-sc v 1 z-z v 1 b-v < 1
ed-z o 1 p-qc o 1 z-z # 1 b-v v 1
z-tp > 1 q-p o 2 os-v > 2 b-v o 1
z-tp v 1 b-pt > 1 os-v ^ 2 oc-v < 1
z-tp # 2 os-oc # 2 os-v # 1 oc-v v 1
ed-b > 1 v-z > 1 v-v > 1 os-os o 1
ed-b < 1 v-z ^ 1 oc-oc > 1 a-x > 1
ed-b v 1 tp-sc > 1 oc-oc v 1 x-x > 1
ed-b^ 1 tp-sc < 1 oc-tp > 1 tp-pu 2
ed-b # 2 tp-sc ^ 1 oc-tp v 2 qc-pu v 1
a-ed > 1 tp-sc o 1 oc-tp # 3 os-b > 3
a-ed o 1 ed-p v 1 ec-ec > 1 os-b < 4
p-z > 1 oc-p > 1 ed-ec > 2 os-b v 1
p-z < 1 oc-p v 1 ed-ec < 1 pt-ec > 2
b-b > 10 oc-p ^ 1 ed-ec ^ 1 os-oc ^ 1
b-b v 1 qc-os > 1 ed-ec # 1 oc-pu v 1
b-tp > 2 qc-os ^ 1 tp-p > 2 oc-pu # 1
b-tp < 3 qc-os # 2 tp-p < 6 ed-pu # 1
b-tp V 3 os-ec ^ 1 tp-p v 2 ed-ed > 1
b-tp ^ 3 ed-r # 1 tp-p # 2 ed-ed v 1
b-tp o 1 tp-r < 1 ed-oc > 4 qc-qc o 1
a-a > 1 os-z v 1 ed-oc < 1 ed-qc > 4
a-p > 1 os-z ^ 1 ed-oc ^ 1 ed-qc o 1
a-tp > 1 v-tp v 3 ed-oc o 1 ed-qc # 2
a-tp v 1 v-tp ^ 4 ed-oc # 2 tp-ec < 1
a-tp ^ 1 qc-sc > 1 qc-oc o 1 tp-ec v 1
a-tp o 1
a-tp # 1
Tabela 8: Frequência simples das associações temáticas entre os conjuntos cronoestilísticos do Vale do
Rio Peruaçu
162
!
Gráfico 9: Frequência simples de associações recorrentes em uma análise sincrônica dos sítios e painéis
do Vale do Rio Peruaçu.
163
os-ed > os-ed < os-ed v os-ed ^
os-tp > os-tp < os-tp v os-tp ^ os-tp #
12 6
10 5
8 4
6 3
4 2
2 1
0 0
sf1 sf3 desenhos CM interação sf1 sf3 desenhos CM interação
tp-ed > tp-ed < tp-ed v tp-ed ^ tp-ed o tp-ed # tp-tp > tp-tp v tp-tp o tp-tp #
8 20
6 15
4 10
2 5
0 0
sf1 sf3 desenhos CM interação sf1 sf3 desenhos CM interação
v-ed > v-ed < v-ed v v-ed #
9 b-oc > b-oc < b-oc v b-oc ^ b-oc #
8 6
7 5
6
4
5
4 3
3 2
2
1 1
0 0
sf1 sf3 desenhos CM interação sf1 sf3 desenhos CM interação
164
oc-tp > oc-tp < oc-tp v oc-tp ^ oc-tp # os-b > os-b < os-b v os-b ^ os-b #
10 7
6
8
5
6 4
4 3
2
2
1
0 0
sf1 sf3 desenhos CM interação sf1 sf3 desenhos CM interação
Figura 66: Gráficos de contraste de algumas associações temáticas entre os conjuntos estilísticos do Vale do Rio Peruaçu
165
Esta coerência ajuda a pensar a coesão e existência na escala da região de conjuntos
gráficos cujos autores compartilharam repertórios culturais. Tal como Loredana Ribeiro
propôs (2006), e mesmo Prous no início das pesquisas no Vale, há uma aproximação entre
os grafismos, e os comportamentos que os envolvem, dos conjuntos São Francisco e
Complexo Montalvânia. Esta aproximação, contudo, pode ser pensada justificada pelo
comportamento já descrito (Ribeiro e Isnardis, 1996/97) das figurações do Complexo
Montalvânia de se colocar junto às figuras SF, como forma de interação por cópia. Aqui,
contudo, apresento, a partir das análises de associação temática, que mais do que um cópia,
os grafismos atribuídos ao Complexo Montalvânia se assemelham e se associam a
grafismos atribuídos à Tradição São Francisco por compartilhamento de repertório, por
reconhecimento.
Se por um lado a análise aqui empreendida aproxima os grafismos do Complexo
Montalvânia dos grafismos São Francisco, por outro ela ajuda a mostrar a diferença
existente entre os repertórios da Unidade Estilísticas Desenhos e Piolho de Urubu dos
conjuntos anteriormente discutidos.
Se olharmos para estas duas últimas unidades, anteriormente propostas por Isnardis
(2004) como próximas, sendo uma possivelmente expressão tardia da outra, vistas do
ponto de vista das associações mostram-se muito diversas (Gráfico 10).
Embora compartilhem de certos temas, as unidades básicas valorizadas nas
associações são bastante distintas, sendo mais restritiva na U.E Desenhos. Embora as
diferenças sejam significativas, e seja tentador hipervalorizá-las, é preciso considerar que
pode residir na diferença técnica existente entre os grafismos das duas unidades – as
figurações desenhos só ocorrem em gravuras – as regras associativas. Ou seja, a técnica e
consequentemente o resultado estético das figurações podem se relacionar aos textos que
lhe são mais adequados, ou linguagens que lhes são próprias, sem que isso signifique
distâncias ou diferenças culturais entre seus autores.
Destarte, a diferença técnica acaba sendo um fator para o qual é preciso considerar
passível de diferenças semânticas, sem que para isso precise haver diferenças estruturais
fundantes. Mas esta é apenas uma possibilidade que precisará ser mais bem discutida em
outras pesquisas em que outros aspectos das unidades sejam considerados.
166
&
!
#
" $
#
" '
"( $
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("( '
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"( #
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#
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"
"
"
"
"
"
Gráfico 10: Frequências comparativas das associações temáticas das unidades estilísticas Desenhos e Piolho de Urubu, no Vale do Rio Peruaçu.
167
As tendências aqui discutidas podem ser observadas e utilizadas para refletir sobre
os fenômenos culturais regionais, porém, é importante frisar que a análise mostrou ser as
associações muito menos normativas do que se esperava.
Isso se reflete também quando consideramos as possíveis relações sintáticas
existentes entre o suporte e os grafismos. Não foi possível perceber na amostra trabalhada
uma exclusividade de determinadas associações a suportes com características específicas.
Embora pareça haver uma maior frequência de certos temas e associações a certos suportes
(frequências estas não contabilizadas nesta análise), não há tabus gráficos quando se trata
da relação suporte x desenho, ou suporte x associação.
/# &3 ! "
Associação frequências
os-oc v 1
a-os < 1
q-q v 1
cg-q > 1
cg-q ^ 1
tp-q > 1
ps-ps > 7
q-oc v 1
Tabela 9: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP1 do Planalto
Cárstico de Lagoa Santa
168
TP1
0
os-oc v a-os < q-q v cg-q > cg-q ^ tp-q > ps-ps > q-oc v
Gráfico 11: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP1 do Planalto
Cárstico de Lagoa Santa
associação frequência
a-a > 1
os-os v 1
os-ec < 1
os-ec 1
pt-ed < 1
q-q > 1
q-q v 1
q-q # 1
q-av > 1
q-a > 1
ps-ps > 1
169
ps-ps v 2
q-ed v 1
q-pt < 1
q-pt ^ 1
q-pu v 1
cd-a ^ 1
cd-a 1
Tabela 10: Frequência simples das associações temáticas entre os conjuntos cronoestilístico TP2 do
Planalto Cárstico de Lagoa Santa
As associações aparecem muito pulverizadas com 94% ocorrendo uma única vez. A
associação que se repete é aquela realizada entre pisciformes, variando a relação de
lateralidade.
Se, contudo, forem retiradas as relações de lateralidade das associações, as
recorrências tornam-se um pouco mais expressivas, conforme gráfico, em que as relações
entre quadrúpedes são responsáveis por 17%.
+,
Gráfico 12: Frequência simples das associações do conjunto cronoestilístico TP2 do Planalto Cárstico
de Lagoa Santa
associação tp3
os-tp < 1
q-q v 2
q-os v 1
q-os ^ 1
Tabela 11: Frequência simples das associações do conjunto cronoestilístico TP3 do Planalto Cárstico
de Lagoa Santa
associação frequência
a-a > 37
b-tp > 1
c-c > 1
cg-a > 1
ps-ps > 10
ps-ps v 3
q-a ^ 2
q-a < 1
q-a v 8
q-av ^ 3
q-av < 1
q-av v 1
q-oc > 1
q-q > 2
r-r > 1
r-r v 1
sc-pt ^ 1
sc-pt < 1
v-pt > 1
Tabela 12: Frequência simples das associações temáticas do conjuntos cronoestilístico TP4 do Planalto
Cárstico de Lagoa Santa
171
tp4
40
35
30
25
20
15
10
0
a-a > q-a v ps-ps >
Gráfico 13: Frequência simples das associações que se repetem em 10% ou mais do total de associações
do conjunto cronoestilístico TP4 do Planalto Cárstico de Lagoa Santa
A única relação de lateralidade que não varia é para a-a, em que a única lateralidade
observada é apresentada no gráfico. Considerando as variações de lateralidade entre as
relações entre os temas, 12 associações ocorrem uma única vez (16%). Porém, sem
considerar as relações de lateralidade, apenas cinco tipos de associação entre temas não se
repetem (Gráfico 14).
( -
Gráfico 14: Frequência simples das associações observadas para o conjunto cronoestilístico TP4 da
Tradição Planalto do Planalto Cárstico de Lagoa Santa.
.
172
O quinto conjunto, TP5, apresenta-se como os três primeiros, com um número
baixo de associações, sendo ele 5, distribuídos em 4 tipos, os quais possuem apenas uma
possibilidade de lateralidade por associação (Tabela 13).
associação TP5
ed-qc > 1
oc-oc v 1
cg-q > 1
q-oc v 2
Tabela 13: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP5 do Planalto
Cárstico de Lagoa Santa
associação frequência
a-a > 17
a-a v 5
a-oc < 1
a-r < 1
a-r > 2
a-r o 2
av-av > 1
b-b v 1
c-a ^ 1
c-q v 1
ed-z < 1
os-b < 2
q-a > 1
q-a v 1
q-av < 1
q-q > 4
q-q v 3
qc-tp 1
qc-tp > 1
Tabela 14: Frequência simples das associações temáticas das figurações Ballet do Planalto Cárstico de
Lagoa Santa
173
BALLET
18
16
14
12
10
0
a-a > a-a v q-q > q-q v
Gráfico 15: Frequência simples das associações que se repetem em 10% ou mais do total de associações
das figurações Ballet do Planalto Cárstico de Lagoa Santa
Entre as associações, chamam atenção as combinações entre temas até então pouco
expressivas no conjunto gráfico regional, sobretudo, no conjunto gráfico que recebeu o
nome da região (Tradição Planalto). As associações mais frequentes são as associações
homotemáticas entre eixos com derivações e quadrupediformes.
175
TN
12
10
0
ed-ed > tp-tp v ed-ec > q-q > q-q v q-ed v
Gráfico 16: Frequência simples das associações que se repetem em mais de 5% do total de associações
das figurações com “influência da Tradição Nordeste”.
associação frequência
av-ps ^ 1
c-av < 1
c-ps < 1
c-tp # 1
c-tp ^ 1
ed-ed > 2
ed-qc > 1
ed-r > 1
oc-oc > 6
oc-oc v 4
oc-tp # 2
oc-tp ^ 1
oc-tp < 1
176
os-tp # 1
ps-ps > 17
ps-ps v 5
q-oc < 1
qc-qc > 1
tp-pt < 1
tp-tp > 21
Tabela 16: Frequência simples das associações temáticas das incisões do Planalto Cárstico de Lagoa
Santa
incisões
25
20
15
10
0
tp-tp > oc-oc > oc-oc v ps-ps > ps-ps v
Gráfico 17: Frequência simples das associações temáticas recorrentes das incisões do Planalto Cárstico
de Lagoa Santa
a-ed ^ 1 ps-tp ^ 2
a-ed < 1 ps-tp < 1
a-oc < 1 ps-v o 1
a-p < 1 pt-oc ^ 1
a-ps > 1 q-av > 1
a-tp # 1 q-oc < 1
av-ps o 1 q-oc > 1
177
b-tp < 1 q-os # 1
b-tp V 1 q-os > 1
c-c v 1 q-ps # 1
c-ed # 4 q-ps ^ 1
c-os < 1 q-ps < 1
c-ps # 1 q-q # 1
c-ps < 1 q-q > 1
c-pt # 1 q-q v 2
c-q ^ 2 q-r ^ 1
c-q o 1 q-r v 1
c-q v 1 q-z < 2
c-r < 1 qc-oc ^ 1
c-tp # 2 tp-ed < 1
cg-tp < 1 tp-qc < 2
ed-b < 1 v-ed # 1
ed-oc # 1 v-ed > 1
ed-oc ^ 1 ps-ed 1
ed-oc v 3 ps-ed < 1
ed-qc < 1 ps-oc # 1
oc-oc > 1 ps-oc ^ 1
oc-tp # 4 ps-oc < 1
oc-tp ^ 3 ps-oc > 2
oc-tp v 1
os-tp < 2
Tabela 17: Frequência simples das associações temáticas das interações entre conjuntos estilísticos do
Planalto Cárstico de Lagoa Santa
178
&
Gráfico 18: Frequência simples das associações observadas nas interações dos conjuntos do Planalto
Cárstico de Lagoa Santa, excluindo-se as relações de lateralidade.
" # " #
" "
%
.
179
!
(" '
(" '
(" $
(" $
(" #
(" #
("
("
%
.
.
("
(" $ ("( )
(" # ("( #
(" ("(
%
.
Figura 67: Gráficos de contraste entre associações temáticas transversais aos conjuntos estilísticos do
Planalto Cárstico de Lagoa Santa.
Vale notar que os poucos casos de transversalidade, mesmo com baixa frequência,
acontecem nas associações entre os principais temas que caracterizam a Tradição Planalto,
de um modo geral, e também na área. Ao mesmo tempo, o padrão na não recorrência de
associações também é um fenômeno que precisa ser valorizado enquanto possível norma,
compartilhada entre os conjuntos, assim como são alguns temas e algumas associações.
Desta forma, e combinado às discussões levantadas quando os conjuntos gráficos
da região foram apresentados, e às questões de cronologia relativa, é possível pensar que
todo o conjunto de grafismos do Planalto Cárstico de Lagoa Santa seja relacionado a um
único grande contexto cultural.
Pensando nas relações suporte x associações não foram percebidos padrões ou
tendências. Assim como no Vale do Peruaçu as associações acontecem na diversidade de
suportes aproveitados, sem que haja restrições. Não parece ser significativo restringir
associações a determinados tipos de suporte e extensões dos mesmos quando se trata de
associações.
180
conjuntos cronoestilísticos propostos para Santana do Riacho por Baeta (2011) e o
conjunto de figurações do complexo de abrigos da Lapa do Pocal, para os quais não foi
possível delinear conjuntos estilísticos, ou estilísticos apenas bem definidos.
Nos grafismos atribuídos à Tradição Planalto, em seu primeiro conjunto expresso
na Serra do Cipó (TP154), foram realizadas 34 associações entre 15 tipos (Tabela 18)
associação frequência
a-a > 7
a-a v 3
c-c v 5
c-c ^ 1
c-c o 1
c-c # 1
q-q v 1
c-ps ^ 1
c-a > 3
c-a v 4
c-a ^ 2
c-a o 1
c-a # 1
ps-ps > 1
a-ps > 2
Tabela 18: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP1 da Serra do
Cipó
54 Mantenho a nomenclatura dos conjuntos dada por Baeta (2011). Contudo, é preciso ressaltar que embora os nomes dados aos conjunto na Serra
do Cipó sejam os mesmo para o Planalto de Lagoa Santa não é possível afirmar uma correspondência entre os mesmos.
181
tp1
0
a-a > a-a v c-c v c-a > c-a v
Gráfico 19: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP1 da Serra do
Cipó
tp2
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1,5
1
0,5
0
ed-ed > tp-tp > cg-c > cg-c v c-a # cg-cd ^
Gráfico 20: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP2 da Serra do
Cipó
183
entre quadrupediformes, figurações ovaladas simples associadas a sauriformes, e entre
pisciformes e quadrangulares complexos (Gráfico 21).
tp3
10
0
os-s > q-q > q-q v ps-qc o
Gráfico 21: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP3 da Serra do
Cipó.
As associações que ocorrem uma única vez representam 20% ou 8 unidades, em 36.
O momento TP4 associa, com clareza, em cinco tipos de associação, sendo todas
representadas apenas por um unidade. Desconsiderando relações de lateralidade apenas um
tipo teria repetição, sendo representada por duas unidades.
associação frequência
q-q > 1
q-q v 1
c-q > 1
q-a v 1
q-s ^ 1
Tabela 21: Frequência simples das associações temáticas do conjunto cronoestilístico TP4da Serra do
Cipó.
184
associação frequên associação frequên associação frequên associação frequên
cia cia cia cia
os-tp o 1 q-pu ^ 1 cg-c > 1 pu-pu v 1
os-tp 1 c-os # 1 cg-c # 3 a-z < 1
os-ed # 1 cg-tp # 1 pt-pt # 1 a-ec < 1
os-ed 1 ps-os > 1 q-q > 13 a-ec ^ 1
tp-qc > 1 cg-ed < 1 q-q v 1 a-b > 2
tp-qc 1 ps-qc # 1 cg-q < 1 a-b < 2
tp-ed > 1 pt-pu v 1 cg-q v 1 a-b # 1
tp-ed ^ 1 pt-pu ^ 1 cg-q # 1 v-ed > 1
tp-ed 2 c-qc < 1 q-av > 2 v-ed # 1
a-ed > 1 c-qc v 1 q-av < 1 qc-pt < 1
b-b > 1 c-qc o 1 q-av ^ 1 tp-s < 1
b-b 1 c-qc # 3 b-pt < 1 tp-s v 1
a-a > 23 s-pu v 1 tp-q v 1 tp-s # 1
a-a v 4 ps-pu > 2 tp-q ^ 1 oc-x v 1
a-p < 1 ps-pu ^ 1 tp-q # 2 ps-sc < 1
a-tp < 1 av-s # 1 c-ps < 1 z-x v 1
qc-oc # 1 a-s > 1 c-av v 1 qc-r < 1
oc-pu v 1 cg-pt > 1 c-q v 2 qc-r # 1
oc-pu 1 cg-pt ^ 2 c-a > 2 a-sc < 1
qc-qc > 1 cg-ps # 1 c-a v 2 pt-ed > 1
qc-a > 2 cg-ps 1 q-a < 1 v-pu > 1
qc-a < 1 a-pt > 1 q-a ^ 1 v-pu ^ 1
qc-a v 1 a-pt < 2 q-a # 1 cg-cg o 1
qc-a # 3 pu-r v 1 c-tp v 1 cg-cg 1
a-oc > 1 q-qc > 2 c-tp # 1 c-b # 1
a-oc < 1 q-qc v 1 c-oc < 1 c-c > 3
a-oc v 2 q-qc ^ 1 c-oc # 2 c-c # 1
a-pu v 1 q-qc # 2 ps-ps v 1 a-ps < 2
tp-pu # 1 pt-x ^ 1 cg-a # 4 a-ps # 3
qc-z ^ 1 cg-s # 1 q-oc v 1 q-r ^ 2
tp-tp > 1 tp-pt < 1 q-ed> 1 q-pu > 1
oc-sc v 1 tp-pt v 1 c-pt > 2 qc-pu < 1
oc-oc > 1 os-r > 1 c-pt v 1 qc-pu ^ 2
oc-tp > 1 os-r< 1 c-pt ^ 2 os-oc # 1
oc-tp # 1 a-os # 1 c-pt # 1 pu-pu > 1
Tabela 22: Frequência simples das associações temáticas entre conjuntos cronoestilísticos da Serra do
Cipó.
Embora seja possível perceber que há repetições nas associações, estas não são
largamente significativas quantitativamente, pois, por exemplo, a representatividade de
uma repetição de sete unidades em 162 associações é de apenas 4%. A representação mais
significativa de recorrências ocorre entre figurações antropomorfas (14%), que à exceção
no TP1, não são representativas em número. Observando o Gráfico 22 e a Tabela 22 vê-se
que as recorrências que excedem duas unidades, se localizam entre 4% e 14% do total de
185
associações entre momentos.
interação
25
20
15
10
0
a-a > qc-a q-q >
Gráfico 22: Frequência simples das associações temáticas entre conjuntos cronoestilísticos da Serra do
Cipó.
186
Tabela 23: Frequência simples das associações temáticas da Lapa do Pocal na Serra do Cipó.
35
30
25
20
15
10
0
b-b > a-a > q-q > c-a o q-a ^ ps-ps >
Gráfico 23: Frequência simples das associações temáticas da Lapa do Pocal na Serra do Cipó.
188
qc-a > qc-a < qc-a v qc-a # ps-ps > ps-ps v
8 20
7
6 15
5
4 10
3
2 5
1
0 0
tp1 tp3 interação tp1 tp3 interação
8
15
6
10
4
5
2
0 0
tp1 tp3 interação c-a > c-a < c-a v c-a ^ c-a o c-a #
8
15
6
10
4
5 2
0 0
tp1 tp3 interação tp1 tp3 interação
Figura 68: Gráficos de contraste entre principais associações recorrentes a cada um dos conjuntos
analisados na região da Serra do Cipó
/* &3 2
189
ao longo dos mesmos, sem associação de proximidade direta -, ou não figuram nos sítios
que tiveram seus grafismos sistematicamente levantados através do calque – caso do
quarto momento, cuja presença na região é bastante discreta, conforme apontado
anteriormente.
O segundo momento cronoestilístico da Tradição Planalto realizou 91 associações,
distribuídas em 48 tipos (Tabela 24).
190
planalto 2
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
a-a > c-c > c-c # q-q v cg-q < av-av > av-av v q-av v c-ps #
Gráfico 24: Frequência simples das associações temáticas do segundo momento estilístico da região de
Diamantina
associação frequência
os-tp v 1
os-os v 2
q-q > 15
q-q v 7
q-q # 1
tp-q # 1
q-ps # 8
ps-ps > 4
q-os ^ 1
Tabela 25: Frequência simples das associações temáticas do terceiro momento estilístico da região de
Diamantina
191
planalto 3
16
14
12
10
8
6
4
2
0
os-os v q-q > q-q v q-ps # ps-ps >
Gráfico 25: Frequência simples das associações temáticas do terceiro momento estilístico da região de
Diamantina
associação interação
os-tp o 1
qc-b > 1
a-tp > 1
os-z ^ 1
v-tp # 2
ed-qc < 2
ed-qc # 1
qc-z > 1
tp-r v 1
qc-tp ^ 1
q-b v 1
q-b # 1
Tabela 26: Frequência simples das interações entre segundo e terceiro momentos cronoestilísticos da
Tradição Planalto em Diamantina
Assim, podemos pensar que ou não há uma gramática, uma ordem, quando se trata
de interações entre os conjuntos, ou a norma está na não recorrência e em uma sintaxe
cujas unidades mínimas (temas) sejam diversas daquelas utilizadas quando se trata de um
conteúdo autóctone ao conjunto. Ou seja, na relação sincrônica entre figuras diacrônicas
são outros os temas que se associam e em outra frequência. Nestes casos, não são as
192
relações homotemáticas valorizadas.
Quanto às putativas relações entre suporte e associações, não foram observadas
lógicas organizativas ou restrições. Os temas e suas associações, sejam quais forem, podem
ocorrer em suportes de qualquer natureza.
/, &3 " +
193
planalto 1
25
20
15
10
0
q-q > q-q # c-q > c-q # ps-ps > ps-ps v
Gráfico 26: Frequência simples das associações temáticas do primeiro momento estilístico da Serra do
Cabral
Gráfico 27: Frequência simples das associações temáticas do primeiro momento estilístico da Serra do
Cabral, desconsiderando relações de lateralidade
As associações que ocorrem uma única vez são 12 delas, correspondendo a 16%.
Os grafismos do segundo momento da Tradição Planalto na Serra do Cabral
associaram-se 14 vezes em 13 tipos de associação. As associações aparecem de modo
muito pulverizado, sem recorrências significativas. Desconsiderando as relações de
lateralidade as recorrências tendem a ocorrer, sendo as associações que se repetem aquelas
entre cgb-b, q-q, q-ed e q-b.
associação frequência
v-ed < 1
cg-b ^ 1
cg-b 1
q-q > 2
194
q-q # 1
q-b > 1
q-b < 1
q-b v 1
q-ed v 1
q-ed # 1
q-v > 1
q-sc # 1
cg-qc # 1
Tabela 28: Frequência simples das associações temáticas do segundo momento estilístico da Serra do
Cabral
O terceiro momento só apresenta uma associação interna, sendo ela entre q-os na
qual os está abaixo de q.
Os grafismos atribuíveis à Tradição São Francisco se combinam em 29 associações,
distribuídas em 27 tipos (Tabela 29).
Vê-se que não há muitas recorrências sendo elas existem apenas entre z-z e v-a.
No que tange às interações associativas entre os conjuntos55, há na Serra do Cabral,
na amostra trabalhada, há 342 associações, sendo distribuídas em 173 tipos associativos.
55
Lembrando que, como nos demais conjuntos e áreas, os grafismos de difícil atrbuição só foram analisados
na interação, fato que justifica a diferença de representação de tipos e associações.
195
associaç frequênc associaç frequênc associaç frequênc associaç frequênc
ão ia ão ia ão ia ão ia
os-tp v 1 cg-ps v 1 q-pt # 1 c-q ^ 2
os-ed < 1 cg-ps ^ 1 q-pu # 1 av-ps > 1
os-ed v 1 cg-ps # 4 cd-a < 1 c-a > 1
tp-qc # 1 q-qc # 2 cd-a v 3 c-a ^ 1
tp-ed < 2 c-p # 3 pt-oc v 1 c-a # 1
qc-b < 1 q-v ^ 1 c-os # 1 q-a # 6
z-tp v 1 q-v o 2 ps-ed > 1 c-ed v 1
p-z < 1 cg-oc V 1 ps-tp > 2 c-tp > 1
p-z v 1 cg-oc o 1 ps-tp < 1 c-tp ^ 1
b-b > 12 cg-oc # 1 ps-tp # 1 c-tp # 1
b-b v 4 q-sc v 1 ps-v v 1 q-ps > 5
a-a > 18 q-sc ^ 1 ps-v o 1 q-ps v 2
a-a v 8 q-ec v 1 cg-ed o 1 q-ps ^ 1
a-a o 1 ps-b < 1 cg-ed # 1 q-ps # 7
a-tp > 2 ps-b v 1 av-tp < 1 ps-ps # 1
a-tp # 1 cd-q o 1 av-tp ^ 1 q-os ^ 1
ed-pu< 1 s-qc > 1 s-s > 1 cg-a < 1
ed-pu o 1 ps-z v 1 ps-qc v 3 a-av > 1
ed-pu # 1 ps-z o 1 ps-qc ^ 1 q-oc < 1
os-z > 1 s-p v 1 ps-qc o 1 q-oc v 1
ed-qc < 1 cgd-q v 1 ps-qc 5 q-oc # 1
ed-qc o 1 cgd-tp > 1 cg-r # 1 c-ed # 1
ed-ed > 3 ps-pt > 1 q-s > 1 a-ps > 1
qc-qc > 2 av-b > 1 pt-pu v 1 a-ps v 1
qc-qc v 22 cd-qc ^ 1 s-pu < 1 q-r # 1
qc-qc o 1 cd-ps # 1 ps-pu # 1 q-z < 1
qc-qc # 2 sc-os # 1 a-s > 1 q-z v 1
qc-a # 3 pu-sc ^ 1 a-s < 1 p-p > 1
a-oc < 2 cg-os # 1 z-p < 1 a-os > 1
sc-v < 1 q-q o 3 z-p v 2 pu-pu > 1
qc-z ^ 1 q-q # 7 qc-r v 1 a-z > 1
oc-v > 1 q-av > 1 qc-r 1 a-b < 1
os-os > 2 q-av < 2 pt-ed v 1 z-z > 1
a-x > 1 q-av ^ 1 c-c > 4 qc-tp > 1
x-x > 10 q-av # 1 c-c v 2 qc-tp # 1
x-x v 15 q-p < 1 c-c ^ 1 os-s < 1
oc-oc v 1 q-p # 1 cg-c v 1 os-pu > 1
qc-pu < 1 tp-q > 2 cg-c # 1 os-pu # 1
qc-pu # 1 tp-q< 1 sc-sc > 1 s-oc # 1
b-sc > 1 tp-q v 4 sc-sc v 1 c-av < 1
b-sc < 1 tp-q # 3 q-q > 11 c-av # 1
tp-pt v 1 c-ps ^ 1 q-q v 13 c-q > 2
os-r v 1 b-oc < 1 c-q v 1 b-oc v 1
ed-r ^ 2
Tabela 30: Frequência simples das interações momentos cronoestilísticos da Serra do Cabral
196
Entre as associações as mais recorrentes são expressas por interações
homotemáticas entre bioantropomorfos, antropomorfos, quadrangulares compostos, figuras
em ´x`e quadrúpedes.
interação
25
20
15
10
0
b-b > a-a > qc-qc v x-x v q-q v
Gráfico 28: Frequência simples das interações momentos cronoestilísticos da Serra do Cabral
197
%
" " ( "( " ("( ("( ("( (" (" "(
Gráfico 29: Frequência simples das interações entre momentos cronoestilísticos da Serra do Cabral,
sem considerar relações de lateralidade
// &3 - .
associação planalto
tp-tp > 1
q-q v 1
tp-q > 1
tp-q v 1
c-q ^ 1
Tabela 31: Associações entre figurações atribuíveis à Tradição Planalto em Jequitaí.
56
No caso, à expressão nomeada de Complexo Montalvânia.
198
O conjunto, portanto, apresenta-se muito pouco expressivo – não apenas em
número de associação, mas em número de temas atribuíveis – para se achar tendências que
sejam comparáveis a outras regiões em que é utilizada a Tradição Planalto enquanto
unidade classificatória.
As figurações atribuíveis à Tradição São Francisco associam-se 157 vezes,
distribuídas em 98 tipos associativos (Tabela 32).
199
sf
16
14
12
10
8
6
4
2
0
v-tp tp-tp > x-x > tp-pt
Gráfico 30: Associações entre figurações atribuíveis à Tradição São Francisco em Jequitaí.
" " " " " " " " " "
Gráfico 31: Associações entre figurações atribuíveis à Tradição São Francisco em Jequitaí, sem
considerar relações de lateralidade
As interações entre grafismos que poderiam ser atribuídos aos dois grandes
conjuntos estilísticos regionais perfazem 17 associações em 13 tipos (Tabela 33).
associação frequência
sc-v > 1
x-x v 2
oc-tp > 1
200
oc-tp # 1
oc-z ^ 1
x-v > 1
pt-z # 2
c-tp # 3
ps-ps > 1
q-b ^ 1
q-oc > 2
q-v # 1
Tabela 33: Frequência simples das interações entre momentos cronoestilísticos da Serra do Cabral,
sem considerar relações de lateralidade
interação
3,5
2,5
1,5
0,5
0
x-x v pt-z # c-tp # q-oc >
Gráfico 32: Frequência simples das interações entre momentos cronoestilísticos da Serra do Cabral,
sem considerar relações de lateralidade
/0 &3 ! 5 < ( $
201
associação frequência associação frequência
tp-ed < 1 tp-pt > 1
tp-ed v 1 tp-pt ^ 1
a-ed v 2 pu-pu > 3
ed-pu > 1 pu-pu v 1
qc-qc > 1 qc-tp > 1
tp-pu < 2 qc-tp < 1
tp-pu ^ 1 q-q > 1
tp-tp > 2 tp-q ^ 2
tp-tp v 4 c-a > 1
tp-tp # 1 c-ed v 1
oc-tp > 1 c-tp ^ 1
oc-tp < 1 cg-pu v 1
oc-tp # 2
Tabela 34: Frequência simples das associações do Conjunto 1 da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos
Entre estas associações aquelas que representam, cada uma, 2,5% ou mais do total
de associações podem ser vistas no Gráfico 33.
conj 1
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1,5
1
0,5
0
a-ed v tp-pu < tp-tp > tp-tp v oc-tp # pu-pu > tp-q ^
Gráfico 33: Frequência simples das associações recoorentes em mais de 2,5% do Conjunto 1 da Lapa
da Fazenda Velha de Monjolos
associação frequência
oc-sc o 1
oc-oc > 4
oc-oc v 1
oc-oc o 1
oc-r v 1
oc-r # 1
c-qc ^ 1
cg-oc v 1
cg-oc ^ 2
cg-oc o 2
202
Tabela 35: Frequência simples das associações do Conjunto 1 da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos
conj 2
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1,5
1
0,5
0
oc-oc > cg-oc ^ cg-oc o
Gráfico 34: Frequência simples das associações recoorentes em mais de 2,5% do Conjunto 1 da Lapa
da Fazenda Velha de Monjolos
Gráfico 35: Frequência simples das associações recoorentes em mais de 2,5% do Conjunto 1 da Lapa
da Fazenda Velha de Monjolos, sem relações de lateralidade.
associação frequência
qc-b v 1
qc-b ^ 1
b-b > 2
a-a > 10
a-a v 2
v-v v 1
a-b ^ 1
r-r > 2
b-z > 1
203
b-z < 1
b-z # 2
c-b > 1
c-b v 1
q-q > 3
q-q v 4
q-a ^ 1
q-b ^ 1
Tabela 36: Frequência simples das associações do Conjunto 3 da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos
conj 3
12
10
0
b-b > a-a > a-a v r-r > b-z # q-q > q-q v
Gráfico 36: Frequência simples das associações do Conjunto 3 da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos
associação frequência
ed-b^ 1
a-a > 3
ec-ec > 2
ec-ec # 2
ed-r < 1
a-r ^ 1
z-z > 1
av-av > 2
Tabela 37: Frequência simples das associações do Conjunto 4 da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos.
204
com apêndices ovalados (Gráfico 37).
conj 4
3,5
3
2,5
1,5
1
0,5
0
a-a > ec-ec > ec-ec # av-av >
Gráfico 37: Frequência simples das associações do Conjunto 4 da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos.
205
conj 5
0
b-b > os-z ^ os-os > os-os v oc-oc > oc-tp # sc-sc > sc-sc v
Gráfico 38: Frequência simples das associações do Conjunto 5 da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos.
associação interação
b-b > 2
b-sc < 1
a-b v 2
b-z > 1
b-z # 1
q-av # 9
c-av # 4
av-b o 2
av-b # 5
Tabela 39: Frequência simples das associações resultantes da interação entre os conjuntos gráficos da
Lapa da Fazenda Velha de Monjolos.
206
interação
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
b-b > a-b v q-av # c-av # av-b o av-b #
Gráfico 39: Frequência simples das associações recorrentes resultantes da interação entre os conjunto
gráficos da Lapa da Fazenda Velha de Monjolos.
207
8* 7 2, '7 9 %( (
Observando os conjuntos gráficos regionais em suas diferentes dimensões e
aspectos aqui apresentados ou analisados podemos refletir sobre a existência concomitante
de permanências e variações em seus corpura, que perpassam temática, cânones de grafia,
estética, relações entre temas e cronologia.
Enquanto busca-se, tal como se fez neste trabalho, estruturas organizativas, lógicas
estruturantes, o olhar, o fim, se volta para busca de regularidades que seriam denotativas
destas estruturas, de um modus operandi que reside nos padrões de fazer, padrões de
entender o mundo.
As análises tipológicas por atributos, porém, na escala em foi aplicada, foi capaz de
perceber que, se há uma lógica, que perpassa tempo e espaço no que diz respeito à
Tradição Planalto no centro e norte de Minas Gerais, esta lógica reside na possibilidade de
ampla manipulação de detalhes gráficos, onde pode reinar o lugar das expressões da pessoa
que manipula um repertório finito de possibilidades em suas invenções e atos gráficos de
estar e agir no mundo. Estaria a norma em um comportamento fluido do detalhe, mas ao
mesmo tempo na manutenção de um estética final, mais ou menos naturalista, para cada
um dos conjuntos estilísticos em cada uma da áreas. Assim as práticas replicadoras e
transformativas parecem ser mais fluidas e dinâmicas do que normativa, articulando
manutenção e a inovação a um modo de fazer.
Na análise tipo-temática não diferente foi possível desenhar tendências
organizativas nas relações entre os temas de cada um dos conjuntos, e muitas vezes
transversais a eles - como no Planalto Cárstico de Lagoa Santa que permite aproximar por
coerência temática e de sintáxe entre grafismos as figurações Planalto e aquelas que
primeiramente foram entendidas como sob influência de repertórios gráficos alóctones à
região, como Ballet e outras figurações entendidas como Nordeste -, mas que se baseiam
não apenas nas recorrências como também nos desvios e irrecorrências.
A partir das análises é possível pensar que as distintas regiões guardam entre si
particularidades significativas (momentos cronoestilísticos presentes, maneira estética e
gráfica, modos de associação entre temas), que poderiam ser entendidas enquanto
identidades regionais.
O que sugiro é que, por exemplo, não teríamos dois grandes territórios
homogêneos, um ocupado por povos autores da Tradição São Francisco e povos autores da
208
Tradição Planalto, e que no meio deles, na região de Jequitaí e Cabral restariam os
vestígios de uma área de interseção.
Que há diferenças marcantes entre o repertório Planalto e São Francisco, quando
analisamos seus temas emblemáticos e definidores inclusive dos grandes conjuntos, não há
dúvida. Certamente que a maneira de se lidar com os grafismos, e os grafismos no sítios,
se fazem bastante distintos entre os dois conjuntos. Basta olhar o número de associações
temáticas atribuídas a eles e a diferença se torna também evidente aí.
Contudo, quando buscamos correlacionar áreas como Diamantina, Cabral, Serra do
Cipó e Planalto de Lagoa Santa as descrições dos conjuntos parecem aproximar os
repertórios gráficos, envolvendo não apenas a Tradição, mas também seus estilos
regionais. Por exemplo, havia uma impressão de que os desenvolvimentos cronoestilísticos
em Diamantina e Cabral aconteciam de modo concomitante e de maneira muito
semelhante no carste de Lagoa Santa, em que há uma progressão de grafismos zoomorfos
muito naturalistas e ricos em detalhes para figuras mais simples em silhueta. Estas
impressões povoavam nosso imaginário na possibilidade de estarmos lidando com grupos
ou repertórios culturais mais do que próximos, iguais, inclusive em historicidade.
Mas debruçando sobre as análises tipológicas, tipo-temáticas e de associação entre
temas as diferenças estilísticas tornam-se evidentes, permitindo, não mais pensar em
historicidades coladas e gerais, mas em histórias particulares, em que as diferenças
observadas na arte rupestre expressariam questões comunitárias e também ligadas à pessoa
(Van Velthem, 2003).
Diferenças entre as áreas nos estilos gráficos e consequentemente nas associações
temáticas, poderia dialogar com o entendimento de Boas de que estilo estaria relacionado
às diferenças de recursos naturais - o que me parece, por sua vez, dialogar com a noção de
território. Recursos aqui, não no entendimento deste como meio e possibilidades de
subsistência em que predominaria uma concepção determinista do mundo envolvente. Mas
recurso enquanto aspecto de realidades negociáveis, enquanto elementos significantes e
ativos no processo de construção histórica. As diferenças no meio envolvente prove
diferentes “ peles” , diferentes “ corpus"57 os quais os grafismos constroem e que agem na
produção dos grafismos. Assim, teríamos então territórios menores, cujos limites não
podem ser determinados, territórios em que as particularidades se manifestam nos artefatos
gráficos parietais.
57 Aqui aponto para uma sugestão de que para aproximar as interpretações em arte rupestre das produções etnográficas, seria um recurso analítico
entender os sítios e a fabricação dos mesmo enquanto atos de se fazer e modifica corpos, análogo a modos de entender outros conjuntos artefatuais
e que vem sendo posto em prática, não só etnograficamente, mas também arqueologicamente.
209
Quanto ao Peruaçu, há uma manutenção mais marcada de recorrências combinada a
uma área mais limitada, que dá coesão não só aos conjuntos gráficos, mas também a noção
de território. Os conjuntos estilísticos, contudo, Desenhos e Piolho de Urubu, e mesmo
aqueles aqui não contemplados, como Nordeste e Agreste, parecem, por quebras nas
regularidades, tratar-se de manifestações associadas a realidades culturais muito distintas,
mas é preciso mais do que aqui foi feito para se apresentar possibilidades menos evasivas e
erráticas.
Quando nos debruçamos sobre as datas disponíveis, mesmo que escassas, para os
conjuntos gráficos das regiões da Serra do Cipó e do Vale do Rio Peruaçu58, vimos que os
horizontes datados não encontram-se tão distantes, o que permite pensar na interação,
compartilhamento sincrônicos de territórios, entre grupos com diferenças fundantes e
marcantes, por exemplo na Serra do Cabral. Local em que figurações atribuíveis a
Tradição São Francisco e Planalto ocupam o mesmo espaço de blocos agregados (o sítio)
cada um com seu repertório, mas nos quais pode-se vislumbrar influências mútuas (por
exemplo, a presença de cervídeoformes em conjuntos São Francisco e a geometrização dos
preenchimentos dos corpos dos zoomorfos Planalto, que não se vê em nenhuma das áreas
em que a tradição aparece.
A região de Jequitaí, arriscaria dizer, com base nas análises, possui manifestações
gráficas daquela repertório cultural que analiticamente etiquetamos como Tradição São
Francisco e que ali expressa, através das figurações zoomorfas, esta absorção de temas e
resignificação dos mesmos resultado da troca, interação e compartilhamento dos espaços
de Serra, nos quais o Cabral se insere. Poderíamos pensar, e aqui deixo apenas alusão, na
possibilidade de que esta incorporação do repertório do outro seria uma forma de predação,
em que as relações geram acumulação subjetiva das pessoas que vão incorporando partes
de outros no processo da vida (Lagrou, 2007).
Voltando para região onde dominam os grafismos Planalto e a ideia de se tratar de
vários territórios por conterem nas áreas manifestações de desenvolvimentos, significações
próprios, ainda é relevante a semelhança guardada entre os conjuntos que figuram nas
áreas. Esta semelhança não foi aqui capaz de ser tratada em tabelas e gráficos, mas parece
haver uma coerência temática entre as áreas (expressa inclusive pela presença, não
insiginificante, de ênfases de associação que envolvam os mesmos temas, como
pisciformes, quadrúpedeformes/cervídeoformes, antropomorfos nestas áreas), na presença
58 Para o grande Abrigo de Santana do Riacho há uma data mínima para grafismos da Tradição Planalto, datação relativa a prtir de um bloco pintado
cuja face pintada caiu em uma camada de 4.350 BP e pinturas datadas entre 4350 e 3990 BP, e uma pintura com data máxima (datação relativa) de
2000 BP (Prous & Baeta, 1992/93). Para grafismos da Tradição São Francisco as datações absolutas que se têm são de 2700 BP (Russ et al., 1990).
210
de figuras dentro dos conjuntos que estabelecem relações de sobreposição e na ocupação
intensa dos painéis mais visíveis no sítio. Desta forma, a Tradição enquanto recurso
diluidor de diferenças e particularidades continua a existir, mas como algo abstrato, em que
o nível de proximidade, o grau de relação existe entre os autores das diferentes regiões
continua de difícil nomeação e medida. Talvez seja necessário, tal como aponta Plhilipps e
Willey (1953) de mais do que um conjunto de vestígios para que o nível de abstração da
categoria se torne menor e suas possibilidades interpretativas vão aos poucos tornando-se
mais concretas.
Quanto à Monjolos, o fato de ser apenas um sítio, torna qualquer interpretação ou
sugestão de aproximação com alguma realidade bastante frágil. Mas é preciso aqui
considerar um aspecto que foi ao longo deste trabalho considerado apenas qualitativamente
e ainda não apresentado.
Embora não tenha sido possível perceber uma relação sintática repleta de normas
para o posicionamento de certos temas e associações entre os temas no interior de cada
sítio, percebe-se que dentro da amostra trabalhada algumas associações só foram realizadas
em determinados sítios ou exclusivas a alguns sítios, como percebido já para alguns temas
na região de Diamantina (Linke, 2013, no prelo). Isnardis (2004) explorou as relações
entre os sítios, características dos abrigos, e as unidades estilísticas do Peruaçu, mas não
investiu, por questões de objetivos nos quais focou, nos temas dentro destas unidades e os
sítios. O que quero dizer é que a norma que pode vir a existir entre grafismos, associações,
sintáxes entre estas e o lugar que ocupam podem residir em conjuntos de atributos que
envolvam mais do que a superfície estrita onde os grafismos se encontram.
Certamente que os grafismos, os desenhos, não são imagens deslocadas das
realidades que ocupam, dependem, e mais, agem e se relacionam nos seus contextos, nos
quais estão presentes as dimensões de quem realizou o desenho e onde (Lagrou, 2006). Na
Lapa da Fazenda Velha de Monjolos, a relação entre o que foi pintado e os suportes
escolhidos se mostra de forma pouco implícita. A distribuição dos conjuntos em diferentes
tipos de suportes disponíveis nos sítios é refletida nos tipos de associação existente em
cada suporte. Temos em Monjolos um comportamento diante das sintáxes entre desenho x
desenho, desenho x desenho x suporte em que parece atuar estruturas mais normativas. Tal
comportamento contrasta com os demais percebidos no conjunto das áreas estudadas.
Embora precoce, e necessitando que a região seja analisada considerando um conjunto de
sítios e não apenas um sítio, podemos estar diante de uma outra realidade cultural.
211
Estas são apenas algumas das possibilidade diante dos resultados percebidos,
possibilidades estas que se relacionam à necessidade, aqui não exaurida de se discutir a
natureza das regularidades e das irregularidade nos registros arqueológicos, em que ao
mesmo tempo que se tem traços que parecem advir de uma manutenção, uma prática
tradicional, há também uma fluidez constitutiva dos nossos artefatos.
212
:, 1 9 2, % (
Trabalhar com arte rupestre surgiu para mim. Em meio às dicotomias da geografia
(ora ciência humana, ora ciência natural) convidaram-me a navegar por outras paisagens,
com cores muito charmosas: a Arqueologia.
Dentro de um projeto, ainda como graduanda, experimentei as atividades
multidisciplinares e interdisciplinares que reunia a Geografia a História e a Arqueologia
para descrever as tecituras da paisagem do Antigo Distrito Diamantino. Em um momento
em que me via obrigada a escolher entre as ciências humanas geográficas ou as ciências
naturais geográficas, a Arqueologia me pareceu uma ciência acolhedora e disposta a reunir
o humano e o natural.
Passados os meses da pesquisa, que tinha como foco as paisagens de Diamantina, o
Setor de Arqueologia da UFMG passou a desenvolver pesquisas na região e eu passei a
integrar a sua equipe. Percorri pelos caminhos da análise de material lítico até, por fim,
voltar às cores e formas das paredes: os grafismos rupestres.
Desenvolvi meu mestrado aliando análises dos grafismos rupestre à paisagem, até
então tomada por mim enquanto fenômeno que aliava atributos fisiográficos e culturais.
Ao final do mestrado e tendo a sorte de compor a equipe de Lucas Buenos nos
trabalhos realizados em Montes Claros, norte de Minas, e sendo constantemente inundada
pela diversidade de grafismos presentes na Lapa Pintada de Montes Claros, surgiu a ideia
de trabalhar com uma revisão ou uma leitura dos grafismos rupestres do centro e norte de
minas de forma integrada e buscando-se uma relação entre as Unidades Estilísticas
(tradições e estilos regionais) e territórios.
Talvez, ou certamente, se tivesse esperado alguns anos para que essa ideia
amadurecesse antes de entrar em programa de pós-graduação, meu projeto e este texto
seriam outro. Com algumas leituras e novos períodos em campo a ideia da construção de
um mapa de distribuição de estilos me parecia pouco provocativa. Mas então? O que fazer
com ‘Estilos e territórios em uma análise macro-regional’ ?
Certamente, essa é uma pergunta que não consigo responder , livre de erros, ainda
hoje mirando as letras preenchendo este texto. Contudo, essa pergunta garantiu as muitas
crises entre mim, arqueóloga, e meus objetos de análise, e ajudou a reestruturar minhas
abordagens e expectativas com o processo de pesquisa.
Assim, se na versão do pré-projeto de doutoramento meu objetivo dialogava com a
213
expectativa de se “ validar” as unidades estilísticas através da comparação dos grafismos
das distintas áreas que compõem o centro e norte de Minas Gerais e traçar territórios
culturais, ao longo do proecsso é possível dizer que meu objetivo dialoga com a reflexão e
busca das diferentes possibilidades do uso de categorias classificatórias e de se criar mapas
territoriais a partir dessas categorias. Hoje, ao invés de produtos (como mapas), meu
trabalho ao longo de todos estes anos têm a oferecer, talvez, mais perguntas do que
respostas. E ainda corro o risco de não estar fazendo as perguntas certas, como um colega
etnógrafo sabiamente pontuou. E, embora um outro colega tenha dito, ao saber que não
conseguiria e nem estava mais interessada em produzir resultados, ou respostas, certeiros e
definitivos, que meu doutorado não serviria para nada, acredito que reflexões, mesmo que
sejam apenas reflexões, são válidas e contribuem para o fazer científico.
Ao longo da construção da tese, por meus objetivos e tamanho do meu recorte
geográfico e natureza dos dados, vi me imiscuindo e necessitando das reflexões
metodológicas, que por certo senti falat de suas existências prévias a este texto.
Não tenho a pretensão de que este trabalho tenha preenchidos possíveis lacunas na
Arqueologia Brasileira, mas, certamente, para mim e para meu processo, foram as
discussões aqui empreedidas enriquecedoras e (des)construtivas do meu entendimento do
fazer (-se) científico. Que elas possam ser uteis no processo de saber-fazer de outros e que
possam ser replicadas, justificando seu caráter científico.
214
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