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VOLUME II
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Keditora
POLÍTICA
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Retrato do Brasil é uma publicação de POLÍTICA EDITORA DE LIVROS, JORNAIS E REVISTAS LTDA
Redação: rua Engenheiro Aubertin, 216, CEP 05068, Lapa, São Paulo. Telefone: 832-2212.
Composição, fotolitos e impressão: oficinas gráficas do Grupo de Comunicação Três, rua William Speers, 1000,
Lapa, São Paulo.
Copyright 1984 POLÍTICA EDITORA (artigo 15 da Lei no 5.988 de 14/12/1973)
sroransss , ps
há vagas .
Não
Quando a Volkswagen do Brasil de- vência para jovens e velhos operários do qual podem resultar situações igual-
cidiu cortar 15% de sua folha de paga- desempregados, parecia ser incapaz de mente novas. Nas próximas semanas
mentos, reagindo, no início de 1981, à sustentar tanta gente. Muitos desem- pode ser criado em São Bernardo um
brutal queda de vendas, cerca de seis pregados já haviam queimado a parca quadro muito tenso, próximo ao das ci-
mil metalúrgicos foram colocados na munição das indenizações, suficiente dades do sertão nordestino nos mo-
rua, quase de um dia para outro, so- para viver não mais do que dois ou três mentos de seca prolongada. Nesse ca-
mente na sua principal fábrica, em São meses. O clima era tenso. so, não está afastada a possibilidade de
Bernardo do Campo, no ABC paulista. Um jornalista, Antônio Carlos Fer- saques a armazéns e mercados."
Como a Volks, a maioria das indústrias reira, do semanário Movimento, foi ao O jornalista acertou quase na mosca.
de São Bernardo demitia aos borbo- ABC, em abril daquele ano, para des- A tensão acumulada pelo desemprego
tões. Ao todo, cerca de 10 mil desempre- crever a situação. Ele fez um prognósti- crescente explodiria dois anos depois,
gados peregrinavam de porta em porta co aterrador: "Os 10 mil metalúrgicos não exatamente no ABC, mas a poucos
de fábrica ou faziam biscates pelas desempregados que perambulam por quilômetros a oeste, na Zona Sul da ca-
ruas da cidade. Mesmo o comércio am- São Bernardo à procura de emprego pital paulista. No dia 4 de abril de 1983,
bulante, última alternativa de sobrevi- são um fato político e sociológico novo, um terremoto político-social abalaria o
BRS
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BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 3341 anco2 , pa
alto do que os discursos pedindo calma. ção), resultante dos recolhimentos a produção da indús
tria de bens de ca-
Tomando o Estado de São Paulo mensais feitos pelos empregadores de pital - máquinas e equipamentos -
como termômetro da economia brasilei- 8% das remunerações pagas aos em- também vinha dimin
uindo desde 1979,
ra, o alarme já vinha soando pelo me- "pregados. Sobre a conta de cada tra- Como este setor é exatamente aquele
nos desde 1974, quando o número de balhador seriam acrescidos juros e que possibilita a ampliação e constru-
novos empregos industriais passou a correção monetária, em contraparti- ção de novas fábricas,
seria fácil prever
crescer em ritmo cada vez mais lento. da pelo uso do fundo no financia- o aumento do dese
mprego nos anos se-
Em 1981, pela primeira vez, no período mento da construção civil, 'guintes, já que a popul
ação continuaria
pôs-"milagre econômico", as demis- Com a criação do FGTS, as demis- a crescer em ritmo mais ou menos
sões no setor industrial, superariam as sões passaram a poder acontecer a constante, a curto prazo
, e não encon-
A crise na indústria automobilística to baixo para os empregadores. Além pansão. A "rebelião de Santo Amaro"
de São Paulo, manifestada de maneira disso, abriu a possibilidade para o em- foi, assim, fenômeno perfeitamente
inequivoca no final de 1980, seria mais pregador burlar os reajustes salariais previsível, dispensand
o bolas de cristal.
do que suficiente para conduzir o de- decididos em dissídio coletivo. O me- O saldo dos quatro anos
de recessão
semprego urbano em direção a um canismo é muito simples: na época do em que foi jogado o País após 1980 é
agudo agravamento. Naquele ano, o se- reajuste, despedem-se os trabalhado- dramático. Entre o final
de 1980 e o ini-
tor era responsável por cerca de 500 res menos qualificados, substituindo- cio de 1984, cerca de 5 milhõ
es de bra-
mil empregos diretos e indiretos em os por outros que, por serem novatos, sileiros ingressaram no
mercado de tra-
todo o País. Seria ingenuidade acredi- não têm direito aos salários previstos balho e não encontrara
m emprego, sem
tar que as demissões em massa nas no dissídio. Assim, ao facilitar a alta contar o incalculável contingente dos
montadoras de automóveis não afeta- rotatividade de mão-de-obra, atuaria que perderam seus empr
egos no perío-
riam de modo generalizado todo o se- também como uma força extra de do, de acordo com dado
s do Ministério
tor industrial. - achatamento generalizado dos salá- do Trabalho, Dos quase 51 milhões de
Outro indicador de que o nível de rios. Um informativo do DIEESE re- brasileiros que compunham a Popula-
emprego estava num processo de que- velou como isto se deu em uma em- ção Economicamen
te Ativa, em 1983,
da de difícil e complicada reversão po- presa de ônibus de São Paulo; entre apenas pouco mais de
30 milhões esta-
deria ser encontrado nos índices de in- 1970 e 1971, a empresa substituiu 93% vam registrados regularmente em seus
vestimento industrial, também em ten- dos seus cobradores e a folha de paga- empregos. No mesmo ano, o nível de
dência decrescente: as taxas "futuras" mentos baixou 3,4%, quando deveria emprego industrial na
Grande São Pau-
de crescimento da economia e do nível aumen tar 24%, se mantidos os níveis lo estava abaixo do de
1973, de acordo
de emprego dependem muito da ex- salariais determinados pelo dissídio. com dados da Federação das Indústrias
Gilson Barreto/Agência JB
Juca Martins/F4
Os saques, como em Santo Amaro, SP, em 1983 (na pág. ao lado), foram consequência dos altos índices de desemprego no início
dos anos 80. Acima,filas para empregos numa universidade do Rio (à esq.) e na Volks, em S. B. do Campo
dições de trabalhar estava desemprega- tempo integral, recebe remuneração fica, fazendo com que a agricultura vá
da ou tentando viver de "bicos", segun-. inferior a um salário mínimo. Esse últi- deixando de ser a principal fonte de
do o Departamento Intersindical de Es- mo caso se manifesta, por exemplo, emprego. Mas a industrialização não
tatísticas e Estudos Sócios Econômicos quando uma pessoa recorre a trabalhos gerava empregos nas cidades na mesma
(DIEESE). transitórios, "bicos" e "biscates", para proporção em que crescia a população
Esta era a realidade que explicava os garantir sua sobrevivência. No País, es- urbana. E isso por dois motivos básicos:
vários movimentos de protesto contra a tas últimas categorias de trabalhadores 1) a industrialização apoiava-se princi-
política recessiva e o desemprego acon- sempre predominaram, em números palmente na importação de tecnologias
tecido após a explosão de Santo Ama- absolutos e relativos, sobre a dos traba- que, além de poupadoras de mão-de-
ro, como o acampamento de dezenas lhadores regulares aqueles enquadra- obra, eram - e são ainda - poupadoras
de famílias de desempregados no par- dos perfeitamente nas normas legais. de produtos primários, recursos e ma-
que do Ibirapuera, em São Paulo, no fi- A economista Helga Hoffmann, au- térias-primas abundantes no País, dimi-
nal de 1983, ou a ocupação do prédio tora de um dos mais importantes estu-. nuindo, assim, as possibilidades de ge-
do SINE (Sistema Nacional de Empre- dos sobre o tema, Desemprego e Subem- ração de empregos indiretos; 2) além
gos), em agosto de 1984, também em prego no Brasil, mostrou, em 1975, de "puxadas" pela industrialização, as
São Paulo. como o processo de urbanização acele- populações rurais eram "empurradas"
O desemprego que se manifestava rada vivido pelo Brasil nas últimas dé- para as cidades pelo secular processo
nos anos 80 não seria, no entanto, ape- cadas tornou visível esse problema. de concentração da posse e uso da ter-
nas o resultado de uma política circuns- Primeiro, "pode-se dizer que a famií- ra e pelas dificuldades, cada vez maio-
tancialmente recessiva. Tratava-se, isto lia patriarcal brasileira ocultava o sub- res, de expansão das fronteiras agrico-
sim, da manifestação aguda de um dos emprego na cidade". Hoffmann las (a que se poderia acrescentar ainda
sintomas de uma doença estrutural da lembrava que até os anos 20 era co- a substituição de lavouras por pecuá-
economia brasileira: a histórica subutili- mum encontrar na crônica da época rias e a modernização tecnológica de
zação do enorme potencial de mão-de- referências a famílias com até uma vin- setores de ponta da lavoura).
obra de que sempre dispôs o Brasil. tena de empregados domésticos, de- De acordo ainda com Hoffmann, a
pendentes e agregados, com laços fami- capacidade de absorção de mão-de-
Sempre houve mais "biscateiros" liares mais ou menos longínquos. Com obra do setor industrial brasileiro era
as transformações no estilo de vida ur- uma das mais baixas do mundo. Entre
que desempregados
bana e nos padrões familiares e sociais, 1949 e 1966, em média, menos de 10%
O subemprego ou desemprego dis- o subemprego nas cidades seria mais da População Economicamente Ativa
farçado semprefoi, no Brasil, mais im- evidente. estavam na indústria. Muito pouco,
portante do que o desemprego aberto, Segundo, até 1940 o campo era o considerando que o Brasil já tinha, nes-
aquele que se manifesta quando uma principal responsável pela absorção da se período, porcentagens do produto
pessoa perde o seu lugar no mercado maior parte dos novos contingentes da industrial no Produto Interno Bruto
formal de trabalho e continua a procu- população que ingressavam no mercado típicas dos países capitalistas desenvol-
rar um emprego equivalente. O subem- de trabalho. O desemprego e o sub- vidos. Basta dizer, que, em 1964, o pro-
prego se caracteriza quando uma pes- emprego rural ficavam, assim, ocultos duto industrial correspondia a 30% do
soa trabalha em tempo parcial, mas nas lavouras de subsistência. A partir Produto Interno Bruto brasileiro e a
gostaria de trabalhar em tempo integral; dos anos 50, entretanto, o ritmo de in- população empregada na indústria não
Ou quando, mesmo rabalhando em dustrialização e urbanização se intensi- passava de 8% da Ropulação Economi-
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BR DFAinoso VB.GNCIAMA. 840443341 an0coAa , p 44
Juca Martins/F4
ções recentes sobre o assunto. Entre- e O número de trabalhadores na
tanto, está longe de fazer a apologia indústria automobilística dos EUA
da nova era que se avizinha. poderá ser reduzido de um milhão em
Um documento publicado na edi- 1978 para cerca de 800 mil em 1990,
ção de junho de 1983, por exemplo, mesmo prevendo um modesto cresci- O processo de modernização da
explicitava que os sindicatos não po- mento de 1,8% ao ano nas vendas, se- agricultura fez crescer o número de
deriam ser contra o progresso tecno- gundo o Sindicato dos Trabalhadores assalariados temporários, os bóias-frias
lógico. Apenas queriam que os tra- desse setor nos EUA.
balhadores fossem beneficiários desse & Uma fábrica de lâmpadas na Gran- em trabalhadores assalariados; c) a me-
progresso, e não suas vítimas. O pro- de São Paulo produzia 20 mil unida- canização e o uso intensivo de fertili-
gresso técnico deveria servir, por des por turno de trabalho (8 horas) de zantes, corretivos e defensivos reduzi-
exemplo, para reduzir a jornada de 12 pessoas. Ao introduzir um proces- ram drasticamente a necessidade de
trabalho e não para aumentar o nível so de fabricação automatizada, essa mão-de-obra nas fases de preparação
de desemprego. Eis porque e DIEE- fábrica passou a produzir 25,6 mil do solo, plantio e trato das culturas; d)
SE se dedicava a divulgar, sistemati- lâmpadas por turno com apenas cinco em consequência do uso de tais "insu-
camente, estudos sobre as conseguên- trabalhadores. Portanto, 5,6 mil mos modernos", no entanto, o aumen-
cias da automação no mercado de lâmpadas a mais com sete trabalha- to da produtividade e da produção ele-
trabalho. Ao mesmo tempo, insistia dores a menos por turno, vou a exigência de mão-de-obra na fase
na necessidade de os sindicatos se & Uma siderúrgica de Minas Gerais, da colheita, a mais difícil de ser meca-
prepararém para incluir, nas pautas utilizando determinada aciaria (con- nizada. Conclusão final: o processo de
de negociações com as entidades pa- junto de equipamentos), produziu modernização da agricultura brasileira
tronais, os termos em que se deverá num ano 915 mil toneladas de aço agravou a sazonalidade da ocupação de
dar a implantação de processos e má- com o trabalho de 271 pessoas. Na mão-de-obra e induziu ao crescimen-
quinas automáticas de produção de mesma empresa, existe uma aciaria to do número de trabalhadores assala-
mercadorias ou prestação de serviços. mais automatizada, que produziu riados temporários. Traduzindo: cres-
Nada mais prudente, Bastam al- 1.620 mil toneladas ocupando apenas ceram o desemprego e o subemprego
guns exemplos extraídos do boletim 115 pessoas. Cada trabalhador dessa rurais,
do DIEESE, de junho de 1984, para aciaria produz quatro vezes mais que
percebermos a dimensão do que pode os trabalhadores da antiga aciaria. Os principais beneficiados
foram os grandes proprietários
Robôs na solda das chapas de automóveis na Ford, em São Paulo
E, para que não se conclua que tudo
foi obra do acaso, o documento da
COALBRA lembra que "esse processo
de tranformações nas formas de organi-
zação da produção agropecuária foi
acelerado pela política agrícola vigente,
cujas principais formas são o estabele-
cimento de preços mínimos e a conces-
são de crédito rural a taxas de juros
reais negativas para a compra de equi-
pamentos e insumos modernos", cujos
principais beneficiados foram os gran-
des proprietários,
E foi assim que se gerou a situação
explosiva do mercado de trabalho no
Daniel Augusto Jr/F4
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO: a história das centrais sindicais ma, superintendente da Polícia Federal
em São Paulo, declarou, no dia seguinte
ao encerramento do congresso de fun-
dação da CUT, que dispunha de um
Em busca de unidade arsenal de leis para bloquear a ação da
entidade a qualquer momento.
CUT e Conclat têm a mesma matriz:
Apesar das proibições, desde 1937 os trabalhadores tentam a 1a Conclat (Conferência Nacional das
organizar-se nacionalmente através de centrais sindicais, como Classes Trabalhadoras), realizada de 21
a 23 de agosto de 1981, no município de
a CUT e a Conclat nos anos 80
Praia Grande, no litoral de São Paulo,
reunindo 5.036 delegados de 1.091 enti-
dades de trabalhadores rurais e urba-
nos de 22 Estados e mais o Distrito Fe-
deral. Foi a maior reunião de trabalha-
dores que aconteceu no País depois do
golpe de 64. A conferência definiu um
"Plano de Lutas" comum para toda a
classe trabalhadora e formou a Comis-
são Nacional Pró-CUT, incumbida de
organizar um congresso de fundação da
central única. Mas a conferência da
Praia Grande não chegou ao final de
maneira unitária, como fora conduzida
inicialmente. As diversas tendências
presentes, agrupadas em dois grandes
blocos, acabaram-se confrontando exa-
tamente no momento de eleger a Co-
Juca Martins/F4
missão Pró-CUT, expondo ao plenário
suas divergências antes contidas aos
bastidores. Embora superficialmente
sejam apresentadas como simples dis-
putas partidárias, envolvendo de um
Quatro vezes, antes do golpe de 64, 0s A 1a Conclat (acima, na Praia Grande, lado o PT e de outro o PMDB, que
trabalhadores repetiram o ritual de rea- SP, agosto de 1981) foi a raiz da Central abriga o Partido Comunista Brasileiro e
lizar um congresso com participação Unica dos Trabalhadores e da Partido Comunista do Brasil, as diver-
dos setores mais representativos do Coordenação Nacional das Classes gências no fundo expressam concep-
movimento sindical e criar um organis- Trabalhadoras, entidades que reúnem ções sindicais diferentes, que resultam
mo central para dirigir suas lutas. Igual categorias diversas em métodos de ação diversos.
número de vezes, o governo decretou a
ilegalidade destes organismos e os re- Nos anos 80 foram criadas
primiu duramente. federações estaduais ou interestaduais duas centrais diferentes
O choque é compreensível. Os traba- de um determinado ramo de atividade
lhadores, quando adquirem consciên- econômica. Apesar da proibição, surgi- A corrente sindical petista, à qual se
cia de classe, sabem que, para poderem ram a CSUB (Confederação Sindical juntam os ativistas das pastorais e outros
expressar toda sua força, precisames- Unitária Brasileira), a CGTB (Confe- movimentos da Igreja Católica e mili-
tar organizados nacionalmente, sem li- deração Geral dos Trabalhadores do tantes de grupos trotskistas e anar-
mites geográficos e abrangendo todas Brasil) e o CGT (Comando Geral de quistas, combate radicalmente a estru-
as categorias profissionais. Mas, num Trabalhadores), que foram tolerados tura sindical vigente, apóia decidida-
país de tradição autoritária e marcado por algum período e posteriormente mente as oposições sindicais contra os
por acentuadas desigualdades sociais, a desmantelados pela repressão. "pelegos", admite o pluralismo sindi-
organização horizontal dos trabalhado- É dentro desse limite de tolerân- cal e sempre defendeu uma CUT cons-
res sob o comando de uma central sin- cia que funcionam hoje a CUT (Cen- truída "pela base", independente das
dical única representaria um risco mui- tral Única dos Trabalhadores) e a federações e confederações.
to grande para uma minoria apegada a Conclat (Coordenação Nacional das Ao contrário, a corrente representa-
seus privilégios. Por essa razão, todas as Classes Trabalhadoras). As duas foram da pelo PMDB e partidos comunistas
iniciativas da classe operária neste sen- criadas em congressos que a rigor con- considera indispensável a aliança com
tido foram barradas à força. frontam a legislação sindical, porque dirigentes das federações e confedera-
Com exceção da COB (Contedera- reuniram trabalhadores das mais diver- ções no processo de construção da cen-
ção Operária Brasileira), criada no 1o sas categorias e profissões, de todos os tral sindical e não exclui nem os "pele-
Congresso Operário Brasileiro, em pontos do País. A CUT, que assume o gos", embora descarte a participação
1906, as demais já nasceram com á pe- papel de central sindical - diferente da autônoma das "oposições", porque
cha de "ilegais", pois organismos dessa Conclat -, tem inclusive diretoria for- acredita ser este o caminho para a uni-
natureza são proibidos pela legislação malmente constituída e uma sede esta- dade do movimento. Unidade é a sua
sindical vigente desde 1937. A entidade belecida, num flagrante desafio à estru- palavra de ordem principal.
de mais alto grau permitida é a confede- tura sindical imposta pelo Regime Mili- A contraposição da "CUT pela ba-
tação nacional, que reúne a cúpula das tar. Tanto que o delegado Romeu Tu- se", sem "pelegos", e "unidade" inclu-
271
BRDFANBSB V8.GNC;AA
Á, 54 0441334 an
002, p 15
Iconographia
R
y No Brasil, as centrais sindicais já
nasceram ilegais, com exceção da COB
(acima, Edgard Leuenroth discursa no
congresso de 1913, O Malho,
13/9/1913). O CGT, tolerado até 1964,
Iconographia
Joi desmantelado (ao lado, manifestação
em 1962, RJ)
sive com "pelegos", aprofundou a ci- festações que evidenciam a primeira to- Em 1949, nada menos que 234 sindi-
são, inviabilizando a realização do con- mada de consciência do recente opera- catos estavam sob intervenção federal.
gresso em 1982, e culminou em 1983 riado brasileiro. No ano seguinte, 1906, mas. começo dos anos 50 os trabalha-
com a fundação da CUT, liderada pela realiza-se o Congresso Operário Brasi- dores retomaram as ações visando à or-
corrente petista, e da Conclat - ado- leiro, com 43 delegados de 28 síndica- ganização horizontal de todos os traba-
tando o mesmo nome da conferência tos, e nasce a COB, nossa primeira cen- lhadores enquanto uma classe, e não a
de 1981- , comandada por sindicalistas tral sindical, que, em 1915, foi empaste- organização vertical por corporações
dos dois partidos comunistas, indepen- lada, definitivamente pela polícia. imposta pela CLT. Greves de grandes
dentes e um setor dos "pelegos"., A segunda central brasileira surgiu proporções foram deflagradas, como a
Não se pode deixar de reconhecer, em maio de 1935, num congresso do "dos 300 mil", envolvendo metalúrgi-
porém, que a realização da conferên- qual participaram 243 delegados. Bati- cos, gráficos, têxteis e químicos de São
cia foi a consequência de um processo zada com o nome de Confederação Paulo, em 1953. Surgiram articulações
de mobilização desencadeado pelo Sindical Unitária Brasileira, esta enti- horizontais - como a PUI (Pacto de
movimento sindical de maio de 1978 dade teve curta duração. Foi desman- Unidade Intersindical), em São Paulo,
em diante. Somente no ano de 1979, a telada em novembro do mesmo ano, a CPOS (Comissão Permanente das
imprensa registrou a deflagração de em consequência da repressão que se Organizações Sindicais), no Rio de Ja-
113 greves, envolvendo 3,2 milhões de seguiu à tentativa de insurreição da neiro, e finalmente o PUA (Pacto de
' trabalhadores. Em 1980, a mobilização Aliança Nacional Libertadora, Unidade e Ação) - que tiveram partici-
se manteve, atingindo inclusive a zona A CSUB era controlada por ativistas pação decisiva na fundação do CGT
rural, onde o fato marcante foi a greve do Partido Comunista, fundado em (Comando Geral dos Trabalhadores),
de 240 mil canavieiros em Pernambu- 1922, que logo assumiu a hegemonia no durante o Congresso realizado em
co. Como o movimento estava em ple- movimento operário brasileiro, toman- agosto de 1962, reunindo 1.400 delega-
na efervescência, alastrando-se pelo do as principais iniciativas de articula- dos. Com o golpe, dois anos depois, o
País inteiro, mobilizando de médicos a ção sindical. Em 1940, conforme relato CGT foi arrasado pelos militares.
camponeses, de funcinários públicos a de Rolando Fratti, um ativista da épo-
motoristas, as lideranças começaram a ca, os militantes do PC começaram a Em 1984 CUT e Conclat
organizar a Conclat tendo em vista a articular, clandestinamente, o MUT
constituição da central sindical única. (Movimento Unificador dos Trabalha- são apenas toleradas
dores), que se tornou público em 1943,
A primeira centralfoi quando foi lançado abertamente seu A sombra do clima de liberalização
empastelada em 1915 primeiro manifesto. Uma das palavras que atravessa o País, a CUT - que já
de ordem do documento era "Por uma realizou seu primeiro congresso - e a
Este processo não difere basicamen- CGT" e em 1945 foi realizado o con- Conclat estão sendo toleradas. Garan-
te do que se verificou quando da cons- gresso, reunindo 1.752 delegados de tia plena de existência, porém, elas te-
trução da COB. Entre os anos de 1900 1.494 entidades, que fundou a CGTB rão se o País democratizar-se o suficiente
a 1903, São Paulo foi profundamente (Confederação Geral dos Trabalhado- para autorizar, e não apenas tolerar
abalada por grandes greves, principal- res do Brasil). Dois anos depois, em conforme as conveniências dos governan-
mente na fábrica de vidros Santa Mari- 1947, o governo desfechou um ataque tes, a livre organização dos trabalhadores.
na e nas tecelagens Anhaia e Penteado, maciço: interveio e cassou a diretoria
Em 1905, as greves prosseguem, com os de 144 sindicatos ligados à CGTB, que
patrões ainda atônitos diante das mani- não resistiu e acabou no final do ano. Valdeci Verdelho
272
com os cabelos puxados para cima des-
cobrindo-lhes a nuca, não muito longe
dali, no Clube Militar, jogava-se a sorte
do Segundo Império.
Naquela mesma poite, Benjamin
Constant conseguia finalmente conver-
ter Deodoro da Fonseca à causa re-
publicana, convencendo-o de que o go-
verno havia ofendido os brios do Exér-
cito ao punir dois oficiais por indiscipli-
na. Começava a ser urdido o golpe mi-
litar que, seis dias depois, a 15 de no-
vembro, derrubaria o imperador.
O baile exacerbou as animosidades.
Segundo o registro da Revista Ilustrada,
"as conversas em geral versavam sobre
Biblioteca Nacional
o custo da festa. Havia cálculos para
200 e para 300 contos, Só o bufê consta
<
que andou por uma pelga de 50 con-
tos".
A Monarquia se foi com suas manei-
Ilha Fiscal, Rio, 9 de novembro de 1889: monarquistas se divertem enquanto ali perto o ras elegantes. Deixou o exemplo de
Exército trama a queda do Império (óleo de Aurélio Figueiredo) como exibir, na sua contradança, o
fascínio social. Seus sucessores apren-
deram rápido. O casamento do presi-
COMPORTAMENTO/ALTA SOCIEDADE: as festas que marcaram época
dente Hermes da Fonseca com Nair de
Teffé, em 1910, conferiu ao já não ado-
lescente presidente da República, fran-
A ostentação do poder camente antipatizado em seu confronto
com Rui Barbosa, os primeiros sinais
de alguma indulgência popular." Nair
Do baile da Ilha Fiscal às noitadas atuais do jet-set
era bela, desinibida, avançada para os
tupiniquim, os privilegiados têm festejado, para exibicionismo padrões da época. E, no entanto, cap-
de nomes, riquezas e poderio turava um férreo general. A crônica
mundana, sempre solícita, delirou. A
classe média brasileira já tinha sua Cin-
Todo poder é transparente. Ele não no Rio, a então capital do País, em 9 de derela. Ao povo, porém, restava apenas
se exerce apenas com decretos-leis, novembro de 1889. A conspiração re- o destino histórico de consumir o so-
com medidas de emergência ou com a publicana estava no ar. Mas a corte e o nho e o encantamento dessas exibições
prisão dos adversários políticos. O po- diminuto séquito de cortesãos que ain- do poder e riqueza.
der busca sua legitimação, aos olhos da se agarravam ao manto do impera-
dos súditos, através de um imenso arse- dor, na maioria empedernidos burocra- Em nome do povo, somente
nal de dispositivos simbólicos. Festeja tas da Fazenda real, não perdiam a alguns saboreiam o banquete
seu predomínio, e o predomínio daque- ocasião de ostentar o ilusório brilho de
les que ele privilegia, por meio de uma seu poder. O baile marcaria a inaugura- Em 1930, o povo teve enfim a honra
sequência de ritos e solenidades que ção, em grande estilo, do prédio da Ilha de ser convidado, mas apenas para fa-
tenta envolver toda a coletividade. É Fiscal, inspirado convenientemente em zer a figuração. A revolução de Vargas
também através de ritos de aceitação castelos europeus do século 14 e plane- foi feita em nome do povo, Pretendiz.
generalizada que a sociedade indica o jado pelo arquiteto italiano Adolpho mostrar que nova República não igno-
nível de sua adesão ao sistema de poder Del Vecchio. rava a sua existência. Mas, novamente,
vigente. Ainda hoje, os franceses de Finalmente, chegou a grande noite. a história mostrou que só alguns pou-
província envergam a roupa plebéia Das 20h30 às 23 horas, as balsas fizeram cos favorecidos continuariam, em
dos sans-coulottes para festejar, no dia tantas viagens quantas foram necessá- nome do povo, saboreando o banquete. .
14 de julho, uma revolução que preten- rias para transportar quatro mil convi- O Estado Novo (1937-45) foi particu-
dia ser popular. A burguesia, que ga- dados, "fidalgos, fidalguetes, conselhei- larmente eficiente nesse aspecto. Con-
nhou e levou, deixa o povaréu festejar a ros de Estado, ministros, altos funcio- vocava multidões para manifestações
ilusão de sua vitória. nários e membros da alta finança, do em estádios, numa cópia subnutrida e
Do circo romano às apoteoses guer- comércio, da indústria e das artes". Se caricata das exibições do fascismo. De-
reiras nazi-facistas, cada príncipe tra- a dissipação noturna não fosse tão ame- pois da interminável xaropada de desfi-
tou de exprimir, à sua maneira, seu po- na, os convivas poderiam ter notado a les, discursos e hinos cívicos capazes de
derio. O Brasil não é a corte de Versa- inquietante circunstância de que havia encher de orgulho pátrio os peitos juve-
lhes, mas jamais dispensou o direito ali uma abundância de oficiais da Mari- nis, servia um lanchezinho e dispensava
de ensaiar seu minueto. Os privilegia- nha - arma tradicionalmente conserva- a garotada. A imagem do Estado Novo
dos têm a mania de festejar nem que dora - e pouquissimos oficiais do Exêr- estará eternamente ligada aos acenos
seja os estertores de seu próprio poder. cito. Na verdade, enquanto emperiqui- de Vargas à multidão comprimida no
Foi assim que a Monarquia brasileira tadas senhoras exibiam seus passos de estádio de São Januário, campo do
dançou sua última valsa, na Ilha Fiscal, dança e a nova moda de penteados, Vasco da Gama. Largos sorrisos, cha-
273
ar DFANBSB VB.GNCAMA, 404% 323 1 an 002, p 6
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JP AR
Arquivo. Nacional
de Ibrahim, só mesmo a comemoração
dos seus 30 anos de colunismo, no Co-
pacabana Palace, em 1983. A doce dis-
iaioi --- se sipação dos tempos do "milagre" tinha
cedido lugar à retração tímida decreta-
Diamantina chamavam o "pé-de- Da Monarquia ao Regime Militar, os da pela recessão econômica, mas o co-
valsa". Os aromas democráticos, reani- privilegiados ostentaram o poder e a lunista não se fez de rogado: 6 vinho
mados pela promessa juscelinista de riqueza. Em 1941, a revista "Joujoux e ainda era Beajolais e o queijo, Camem-
uma rápida industrialização, inebria- Balangandans" (acima) marcou as bert. Os convivas passaram de três mil.
ram osnarizes da burguesia. A velha comemorações do quarto ano do Estado Nos últimos anos, esses transborda-
aristocracia vai ser atropelada pela for- Novo, um regime de frequentes festas, mentos se tornaram exceção. Mas,
tuna rápida dos arrivistas. Será o apo- como a do 58o aniversário de Vargas, "enquanto a plebe rude na cidade dor-
geu do colunismo social, veículo privi- quando a elite carioca lotou os salões do me", como diz uma música do sambista
legiado para a exibição dos novos no- Clube Ginástico Português (na pag. ao Jorge Veiga, e numa época que pouco
mes e das novas riquezas. O dernier cri lado). Já em 1980, o cronista do jet-set há para comemorar, ainda existem noi-
do alpinismo social determina: em so- tupiniquim Ibrahim Sued (abaixo) festejou tes de Balangandans. Na inauguração
ciedade, tudo se exibe. Em 1954, vol- o próprio sucesso e a fortuna, no da boate Regine's em São Paulo, em 26
tando de Paris, a "locomotiva" Josefine casamento de sua filha, no Jockey Club, de março de 1981, a festa começou
Jordan declara que trouxe na bagagem no Rio com a presença da primeira dama da
32 pares de sapatos Christian Dior.
"Locomotiva", diga-se, é expressão
inventada por Ibrahim Sued, "um turco
que só comia uma vez por dia", segun-
do suas próprias palavras, e que se con-
verteu na figura mais característica des-
*a
**
se alpinismo social dos anos 50. Sua co-
luna virou o barômetro da ascensão. E,
ao fim de cada ano, com desígnios de
sumo-sacerdote do mundanismo,
Ibrahim decretava a recompensa para
o esforço dos eleitos na lista das "Dez
Mais Elegantes" e dos "Dez Mais Ele-
gantes". Ibrahim dosava suas listas com
estratégica inteligência. Entre as mu-
lheres, consagrava o trio de ouro da
movimentação noturna: Tereza Souza
Campos, Lourdes Catão e Carmen
Mayrink Veiga. Mas não se descuidava
de reiterar a elegância tradicional de
Alcyr Cavalcanti/Agência O Globo
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A dominação americana
"O BRAZIL QUEM USA EUA, na forma de tropas, munições e novo país, 0 Brasil, já nascia endivi-
SOU EEUU navios. Jefferson recusou qualquer dado.
compromisso. Mas insinuou que, efeti- Em 1824, dois anos depois da inde-
(Grafite em um muro de São Paulo)
vada a independência, os americanos pendência, o Brasil fazia seu primeiro
Para os brasileiros envolvidos em poderiam enviar apoio, se os brasileiros empréstimo, no valor de 3 milhões de
conspirações contra o poder colonial se comprometessem a comprar deles libras. Vários empréstimos se se-
português, a vitória dos Estados Unidos trigo e bacalhau. guiram e, no seu ocaso, o Império de-
na luta pela independência da Ingla- Foi na Inglaterra, porém, a maior via 30,4 milhões de libras, em sua esma-
terra, em 1776, serviu como um grande potência econômica da época, que o gadora maioria a bancos ingleses.
estímulo. Alguns deles chegaram a pen- Brasil teve de se apoiar no seu processo No plano comercial, a Inglaterra ob-
sar que a nascente nação republicana de emancipação. Os ingleses forçaram tivera de Portugal, em 1810, tratamento
estivesse disposta a apoiar a luta do Portugal a reconhecer a nossa indepen- vantajoso para suas mercadorias nos
Brasil pela sua emancipação política. dência e abriram as portas do conti- portos brasileiros. Esse privilégio se
Com essa perspectiva, o estudante nente europeu para a nova Monarquia. manteve depois de 1822 e foi ratificado
brasileiro José Joaquim da Maia conta- Em troca, uma das condições aceitas por um tratado de 1827, com duração
tou, em 1786, Thomas Jefferson, o re- pelo Brasil, para conseguir o reconhe- de 15 anos. Rapidamente a Inglaterra
dator do prelúdio da Declaração da In- cimento de Portugal à sua emancipa- superou Portugal em volume de comér-
' dependência, que representava o go- ção, foi assumir um débito de 1,4 mi- cio com o Brasil. Por todo o século 19,
verno americano na França. Expôs a si- lhão de libras que aquele país tinha os ingleses foram nossos principais par-
tuação do Brasil e solicitou ajuda dos com os ingleses. Assim, em 1822, o ceiros comerciais. Em 1842, as exporta-
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, paa
Biblioteca Nacional
ropéias, o peso político e econômico Bondes a burro: os primeiros
dos EUA era suficiente apenas para es-
tabelecer uma espécie de escudo co- investimentos dos EUA no País
brindo a região do Caribe.
Os primeiros investimentos america-
nos no Brasil foram feitos na década de
Aventureiros agem na América
Nas guerras da Independência, a 1860. O visconde de Mauá transferiu
Central, apoiados pelos EUA Marinha de Guerra nacional contou uma de suas concessões a uma firma
com oficiais ingleses, comandados americana de carros a cavalo, a Ma-
Na década de 1840, os americanos pelo almirante Lorde Cockrane (acima) nhattan's Bleecker Street, empresa que
arrebataram o Texas, o Arizona e a Ca- introduziu os bondes puxados a burro
lifórnia do país vizinho, o México. Era dívidas atrasadas daquele país com po- no Rio, em 9 de outubro de 1868.
o início da expansão dos EUA, que já tências européias. Mas foi na década de 20 do nosso sé-
eram a quinta potência manufatureira No caso brasileiro, foi através do co- culo que muitos trustes americanos ini-
do mundo. Numa espécie de messia- mércio que os americanos iniciaram ciaram suas atividades no Brasil. Entre
nismo nacional, surgiu a doutrina do sua penetração e criaram as bases para eles, a Firestone, a Armour, as Refina-
"destino manifesto" e tudo servia para o futuro domínio. Em 1870, logo após o ções de Milho Brazil, a Burroughs, a
justificar a expansão daquele país: pre- final da Guerra Civil Americana (1861- Pan-American é outros, Com a Swift e
destinação geográfica, tarefa de rege- 1865), os EUA já compravam 75% do a Wilson, a Armour controlava a pro-
neração, alargamento da área de liber- nosso café, um produto responsável dução e o mercado de carne. A Ameri-
dade, etc. Nessa.época, aventureiros, por mais da metade de nossas exporta- can & Foreign Power (Electric Bond &
apoiados pelo governo americano, co- ções. No início do século 20, os ameri- Share) detinha com a canadense Brazi-
meçam .a agir na América Central e canos eram O nosso principal cliente, lian Traction Light & Power o mono-
seus olhos cobiçosos voltam-se para a absorvendo 43% de nossas exporta- pólio da indústria de eletricidade no
Amazônia. O mais famoso deles, Wil- ções. O monopólio virtual sobre a ex- País. Oficinas para a montagem de car-
liam Walker, chegou a tornar-se "presi- portação de café, que se estendia a to- ros foram instaladas: o Brasil revelava-
dente" da Nicarágua, em 1860. das as fases da comercialização, prati- se um mercado promissor. A principal
No alvorecer do século 20, a hege- camente colocava a economia brasi- mercadoria importada dos EUA de
monia inglesa no Brasil já começa a ser leira nas mãos americanas. As grandes 1913 a 1928 foram os automóveis, Em
contestada pelos EUA. O acelerado empresas de torrefação dos EUA pro- 1927, o Brasil já era o quarto melhor
desenvolvimento capitalista deste país vocavam manobras baixistas para al- mercado do mundo para os automóveis
americano estendera seu interesse e cançar lucros fabulosos, As sucessivas dos EUA, absorvendo 10% das expor-
sua capacidade de intervenção para baixas no preço do café provocavam tações americanas de veículos.
todo o Continente. crises na economia brasileira. Por todo o século 19, a influência
Em 1904, o presidente Theodore Com ameaças de taxar a entrada do predominante na cultura brasileira foi
Roosevelt, numa declaração, delineou café nos EUA, o governo americano européia. Mesmo no começo do século
uma política que seria o corolário da arrancou dos primeiros governos repu- 20, "a atitude comum da pessoa culta é
Doutrina Monroe. Afirmava que os blicanos favores alfandegários para os de admiração pela Europa, mas de des-
EUA teriam o poder internacional de seus produtos industrializados. Mesmo prezo pelos Estados Unidos", diz o his-
polícia. Ou seja, o direito de intervir em assim, esses produtos não conseguiam toriador Nélson Werneck Sodré. Ape-
qualquer nação latino-americana, para competir com Os ingleses e alemães. sar disso, suas instituições políticas fo-
garantir a ordem., Era a política do big Porém, com a Primeira Grande Guerra ram imitadas pelos fundadores da Re-
stick (grande porrete), como ficou co- (1914-18), que impediu ou dificultou o pública brasileira. Mas foi o cinema,
nhecida. Os EUA usaram desse suposto fluxo de comércio com a Europa, foi transformado em uma indústria por
direito em 1905 na República Domini- possível aos EUA conquistar o mer- Hollywood, que propagandeou de ma-
cana, apossando-se da renda de suas al- cado brasileiro. A partir daí, a presença neira intensa o american way of life no
fândegas para garantir o pagamento de americana em nossa economia se con- País. No ano em que lançaram os pri-
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Iconographia
olhos para este subcontinente. A exis-
tência de matérias-primas, um mercado
para suas mercadorias e para seus capi-
tais, e até a possibilidade de ocupar ter-
ras americanas, chamavam sua aten-
ção.
A influência alemã no Brasil era re- O emprestimo
forçada pela presença de colônias no
Sul do País, onde até um partido na-
zista foi organizado. Setores signifícati-
vos do governo surgido da revolução
de 30 inclinavam-se pelo nazismo e
para uma aproximação maior com a
Alemanha. O general Góes Monteiro
chegou a aceitar um convite de Hitler
para visitar a Alemanha e participar
como comandante de manobras de
uma divisão da Wehrmacht.
O presidente Vargas tentou utilizar a
rivalidade entre as duas potências para
levar adiante o plano de instalar a in-
dústria siderúrgica no País. Iniciou con-
tatos ao mesmo tempo com a U.S.
Steel, americana, e com a Krupp,
alemã. Esta última, aliás, foi quem for-
Biblioteca Nacional
neceu material para a construção do
Parabens, Jéca ! Que arranjo, hein ?
arsenal da Marinha na Ilha das Cobras, - Mas isso não é meu, não. Eu sou apenas o carregador.
no Rio. hp
Mas o Brasil, inclusive por sua posi-
ção geográfica, tinha importância de-
masiada no conflito, que se travaria no exportação de borracha (Banco da ram a padronizar seus armamentos
O
continente europeu e no Norte da Amazônia) e de ferro (Cia. Vale do Rio até suas fardas pelo modelo americano.
África, para conseguir manter por Doce), congelando os preços dessas A relação Brasil-EUA trazia, porém,
muito tempo sua neutralidade. Os EUA matérias-primas, que eram necessárias consequências a longo prazo. Durante
chegaram a ameaçar que tomariam as ao esforço de guerra dos aliados, Em a guerra na Europa, um oficial ameri-
bases aéreas e navais de que necessitas- troca, Vargas havia conseguido, em cano serviu de ligação entre os oficiais
sem no Nordeste, se o governo brasi- 1940, financiamento de 20 milhões de da Força Expedicionária Brasileira
leiro não as cedesse. As pressões ameri- dólares do Eximbank para a constru- (FEB) e o comando do V Exército
canas, somavam-se, internamente, as ção da siderúrgica de Volta Redonda, americano, na Itália. Era o coronel
exigências das forças democráticas e que veio a ser inaugurada em 12 de ou- Vernon Walters, que se tornou amigo
populares para que o Brasil se incorpo- tubro de 1946. de vários oficiais brasileiros, como Cas-
rasse à frente democrática mundial tello Branco e Cordeiro de Farias.
contra o Eixo nazi-fascista. Após 45, a presença americana Sempre ligado ao Brasil, esse militar te-
Os esforços feitos pelos EUA para consolida-se no País inteiro ria papel destacado na conspiração
que o Brasil rompesse a neutralidade e contra o governo Goulart, como adido
se posicionasse com os aliados no con- Os Estados Unidos emergiram da Se- militar da embaixada americana,
flito mundial em desenvolvimento se gunda Grande Guerra, em 1945, como cargo que exerceu entre 1962 e 1967.
prendiam muito pouco à questão de a mais poderosa potência capitalista, : De volta aos Estados Unidos, chegaria
tropas. Além das posições estratégicas tanto do ponto de vista econômico a vice-diretor da CIA, no governo Ni-
a serem asseguradas no litoral do Nor- quanto militar. Sua presença, influên- xon.
deste, era o fornecimento de matérias- cia e domínio estenderam-se a todos Quando a Escola Superior de
primas o que atraia os americanos, os setores da vida brasileira. In- Guerra, cuja missão seria a de formular
Os Acordos de Washington, em tensificaram-se as relações militares. uma nova doutrina de segurança e de-
1942, criaram o monopólio estatal da As Forças Armadas brasileiras chega senvolvimento nacional, começou a ser
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sr pranBsa V8.GNC.AMA. 840453331 anda 23
"!
Agência O Globo
formada, em 1947, solicitou-se uma riam de tempo e até da ajuda de capi- de 1947, rompeu relações com a União
missão conselheira americana para aju- tais americanos para se reerguer. Por Soviética, surpreendendo os próprios
dar na organização da escola. Esta mis- outro lado, crescia na Ásia e na África americanos, Aferrado a um liberalismo
são permaneceu no Brasil de 1948 a o movimento anticolonialista, que se comercial ultrapassado, torrou as divi-
1960. voltava na época, basicamente, contra sas que O País acumulara durante a
Mas essa interação entre os militares as grandes potências européias. guerra e, além disso, elaborou um pro-
dos dois países, que era justificada no jeto de Estatuto do Petróleo que tende-
quadro da "guerra fria" como neces- Governos adotam atitudes ria a entregar a exploração dessa ri-
sária ao inevitável e próximo confronto diversas frente aos EUA queza aos trustes internacionais.
com a URSS, atingiu seu auge com a O segundo governo Vargas (1951-
assinatura do Acordo Militar Brasil- A hegemonia mundial dos Estados 54) fez diversas tentativas de enfren-
EUA, em 15 de março de 1952. Além Unidos necessariamente se refletiria tar o poderoso aliado. Seu empenho na
de se comprometer a apoiar incondi- numa presença avassaladora na constituição da Petrobrás e da Eletro-
cionalmente qualquer ação de guerra América Latina. No caso do Brasil, os brás se chocava com a posição de inte-
dos EUA, o Brasil se dispunha a forne- governos que se instalaram entre o final resses industriais americanos. Vargas
cer aos americanos matérias-primas es- do Estado Novo (1945) e o golpe militar viu-se forçado a ceder na exportação
tratégicas, necessárias à defesa do de 1964, embora sem romper nem de minerais atômicos e na permissão
"mundo livre". Manganês, urânio e ameaçar uma ligação íntima com os para o levantamento aerofotogramé-
areias monazíticas eram visados pelos EUA nos diversos campos de ativida- trico de nosso território feito pela
EUA, que não haviam até então desco- de, adotaram atitudes diversas frente à Força Aérea americana. Mas tentou
berto jazidas de urânio importantes em " grande potência. resistir, propondo ao presidente argen-
seu próprio território, Pressionados por reações nacionalis- tino, Juan D. Perón, uma aliança
O nivel da influência americana no tas crescentes, que se manifestavam no Argentina-Brasil-Chile para fortalecer
período pode ser avaliado no governo Congresso, no movimento estudantil e a posição desses três países frente a
Dutra (194651), quando se permitiu tendiam a ganhar cada vez mais res- Washington. Vargas fez, ainda, algumas
o estabelecimento de uma Comissão paldo popular, e, por outro lado, pelas tentativas de controlar a remessa de lu-
Mista Brasil-EUA, que traçou um pro- dificuldades econômicas, principal- cros dos capitais estrangeiros. Essas
grama para o desenvolvimento econô- mente comerciais, que a política de tentativas foram abandonadas no go-
mico do País, baseado na atividade dos subordinação sem limites produzia, al- verno intermediário de Café Filho,
capitais estrangeiros que atuariam nos guns desses governos (Vargas, Goulart quando Eugênio Gudin e Raul Fernan-
setores-chave da economia brasileira. e em certa medida Juscelino e Jânio) des, firmes partidários da atração de '
O representante do Brasil na comissão tomaram atitudes, seja no plano in- capitais estrangeiros e da aliança com
era o economista Octávio Gouvéia de terno, seja no campo da diplomacia e os EUA, ocuparam, respectivamente,
|
Bulhões, que, depois do golpe de 1964, das relações internacionais, que se cho- as pastas da Fazenda e de Relações Ex-
seria ministro da Fazenda do governo cavam com os ditames imediatos de teriores,
Castello Branco. Washington. O governo Juscelino enfrentou ini-
A partir do final da Segunda Grande Mas, quando Otávio Mangabeira, na cialmente uma resistência americana a
Guerra, os EUA encontram-se numa condição de ex-chanceler, prostrou-se seus planos de instalar indústrias no
situação em que a sua hegemonia sobre e beijou a mão do general Eisenhower, País, O FMI (Fundo Monetário Inter-
todo o nundo capitalista não enfren- que comandara as tropas americanas nacional) colocou-se contra o Plano de
tava concorrentes. O Japão estava sob na Europa e estava em visita ao Brasil, Metas e com isso dificultava a conces-
seu controle direto. A Alemanha des- em 1946, esse gesto transmitiu uma boa são de empréstimos americanos ao go-
truída e dividida. A França e a Itália imagem do servilismo do governo Du- verno brasileiro. Juscelino voltou-se
devastadas e a Inglaterra exaurida pelo tra em relação aos EUA. Mais realista para os capitais europeus e, para am-
esforço de guerra. Estes países precisa- que o rei, o governo Dutra, em outubro pliar suas alternativas de comércio, es-
280
BRDFANBSBVB.GNCAMA. 40413343 ano a, p24
eipressao S iaea
economia interna, adotou resoluções
na direção proposta pelo FMI, mas
tentou manter no plano externo certa
independência. Anunciou que reataria
relações diplomáticas com a URSS e
enviou o vice-presidente João Goulart
à China Popular. Recusou-se a apoiar
os EUA na invasão de Cuba e marcou
mais ainda sua posição condecorando
Ernesto "Che" Guevara, ministro da
de Cuba, em passagem pelo Brasil.
Acordos MEC-USAID
reestruturam ensino superior
281
BR DFANBSB V8.GNCIAAMA, SLO 413
34 an co y p25
existência de três nomes não absorvi- Faoro, foi que a OAB passou a empu- sos comuns, à reforma do ensinojuri-
veis pelo sistema: Luís Carlos Prestes, nhar bandeiras gerais, indo além das dico e ao relacionamento internacio-
Miguel Arraes e Leonel Brizola. Ouviu demandas específicas dos advogados. nal. Durante sua gestão ocorre o aten-
então do presidente da OAB o desafio A Ordem se coloca contra a Lei de Se- tado do Riocentro. A OAB, através do
de encontrar uma fórmula legal de dei- gurança Nacional e a sobrevivência da CDDPH, reage energicamente, exi-
xar apenas os três fora de um projeto comunidade de informações. O projeto gindo um completo esclarecimento do
de liberalização. de anistia do governo também teve a episódio.
Petrônio Portela, porém, não encon- repulsa da Ordem, pelo seu caráter de No período iniciado em 1983, a
traria a fórmula e a 13 de outubro de 78 indulto e pela questão da reciproci- OAB, sob a presidência de Mário Sér-
caia o AI-5. Pela edição da Emenda dade. Participando do CDDPH (Con- gio Duarte Garcia, continua partici-
Constitucional no 11, eram restabeleci- selho de Defesa dos Direitos da Pessoa pando das lutas pelas liberdades demo-
das as prerrogativas da magistratura, o Humana), Seabra Fagundes luta contra cráticas no País, às vezes se envolvendo
habeas-corpus pleno e alterado o Artigo a imposição do sigilo e constitui uma com a truculência do Regime Militar.
185 da Constituição, caindo a inelegibi- comissão de 15 advogados para Em 24 de outubro de 1983, durante a
lidade dos cassados e abrindo-se cami- assessorá-lo. Dezenas de pessoas pas- votação do Decreto-Lei no 2.045,
nho para a anistia. sam a procurar a OAB, pedindo ajuda Brasília se encontrava sob o regime
Eduardo Seabra Fagundes assume a para questões como o esclarecimento das medidas de emergência. Mesmo as-
presidência em 1979, reconhecendo as do desaparecimento de presos políti- sim, o Conselho Seccional do Distrito
conquistas obtidas*na gestão anterior e cos. Entre estas questões figuram a ten- Federal decidiu manter a realização do
ressalvando que ainda faltava muito à tativa de reabertura do processo do de- I Encontro dos Advogados. O executor
plena restauração do Estado de Di- putado Rubens Paiva e o acompanha- das medidas, general Newton Cruz, o
reito. Começapregando a anistia am- mento da localização de uma antiga "Nini", mandou invadir e interditar as
pla, geral e irrestrita e sem gradualis- casa de torturas de presos políticos na instalações da OAB-DF, mas o presi-
mos; a convocação de uma Assembléia cidade de Petrópolis (RJ). dente do Conselho, Maurício Correa,
Constituinte que restaure as eleições resistiu à intervenção, posteriormente
diretas em todos os planos, assegure a Em 84, a OAB participa com
revogada pelo Planalto sob a alegação
liberdade de organização partidária e destaque da campanha das diretas de ter havido um mal-entendido. Ao fi-
sindical e estabeleça uma justa distri- nal do episódio, o general Cruz chegou
buição de renda. Como principal dife- O atentado contra a OAB ocorre a admitir, publicamente, que "havia
rença do presidente anterior, havia o nessa gestão. A Ordem contrata um pe- quebrado a cara".
entendimento do caráter do Estado rito independente para acompanhar as Em 1984, quando a campanha pelas
brasileiro: para Faoro, autoritário; para investigações, mas o caso permaneceu diretas-já empolgou todo o País, a
Seabra, totalitário. Foram cortadas as sem esclarecimento. Um militante de OAB, juntamente com outras entida-
negociações com o regime e es- direita, Ronald Watters, foi preso, mas des, compôs o Comitê Suprapartidário
tabeleceu-se uma linha de luta intransi - absolvido por falta de provas. Pró-Diretas e teve participação desta-
gente pela restauração da democracia,. A gestão seguinte, de José Bernardo cada de seus representantes.
Outra diferença na gestão de Seabra Cabral, caracteriza-se pela ênfase à
Fagundes, ao contrário da gestão de questão dos direitos humanos dos pre- Márcio Bueno
No I Encontro dos Advogados, a sede da OAB em Brasíliafoi invadida por ordem do gen. Newton Cruz, executor das medidas de
emergência. Abaixo, participantes do encontro protestam contra a invasão, out./83 (Maurício Correa, presidente da Seccional
do
Distrito Federal é o 5o da esq. p/ dir.)
| <p "!
#
Paula Simas
R DranBsB V8.GNCIAMA, 3404133 4ancoa , p2s
285
BR DFANB ONCAA 1404
138334 ano0
2, 029
286 .
"aroransss ve.enciam, 8404133) 30
N
COMPORTAMENTO/SEXO: prostituição e comércio sexual
Sexo à venda
118 - « iru,
mtO
a resposta "é igual" de 71% das entre- sem a se prostituir nas zonas de me- mos , seviciadas e abandonadas.
vistadas, "está diminuindo" de 24%, e retrício das capitais ou cidades maio- Em abril de 1981, já durante a aber-
"está aumentando" de 5%. res. Sobrevivia também, no Norte, a tura do general Figueiredo, o Supremo
Comprova-se, com o percentual su- "zona flutuante", constituída de uma Tribunal Federal decidia que a polícia
perior a 50% para ambos os segmentos embarcação abarrotada de prostitutas, tinha amparo legal para reprimir o
pesquisados, que a prostituição manti- em geral muito jovens, que percorria os trottoir de prostitutas e travestis em to-
nha a sua importância no comércio se- rios da região satisfazendo sua clien- das as vias públicas do País. Porém, o
xual. O que mudava - e isso explica o tela, majoritariamente composta de ga- mesmo STF concederia habeas-corpus a
anunciado fechamento da "casa" de rimpeiros, Clarice da Mata e Sousa e Sônia Maria
dona Eni - era a forma de exercer a A lei brasileira não punia a prostitui- de Sousa, presas sob a acusação de es-
prostituição, que deixava progressiva- ção. Entretanto, em setembro de 1972, tarem fazendo trottoir.
mente de ser confinada ou semiconfi- A polícia, entretanto, não era a única
nada (em bordéis e zonas de meretri- dificuldade na vida das prostitutas.
cio). ELITE ESCORTS Apesar de terem uma clientela mais
Segundo estudiosos do assunto, a Estamos lhe esperando 24 específica, os prostitutos e travestis pas-
prostituição confinada ou semiconfi- horas com belas garotas e saram a ocupar as ruas e avenidas das
nada estava irremediavelmente com- rapazes. Nível classe A.
grandes cidades, não raramente deslo-
prometida à extinção no prazo de mais
Fone: 259-3903 cando as mulheres para outros "pon-
de uma década, pelo menos nos gran-
tos". A prostituição masculina, apesar
des cegitros urbarios. A estratégia, sem-
de antiga, só se tornou amplamente co-
pre respaldada em argumentos de or- for friends nhecida a partir dos anos 70. Praticada
dem moral e higiênica, de "resolver" o Bath House
problema da prostituição com o confi- em guetos, banheiros públicos, boites
Open every day a week gay, casas de massagens, saunas ou a
namento em zonas de meretrício não
ONLY FOR MEN domicílio, ela não diferia muito da fe-
resistia à pressão da especulação imobi-
Tels.: 570-9468 e 570-1887 minina: homens prestam serviços se-
liária. Também o semiconfinamento
não podia competir com os modernos xuais a outros homens.
motéis. é Quanto aos travestis, já em 1978,
O estudo já citado de Délcio Mon- SCORTS SERVICE estimava-se que pelo menos metade da
teiro de Lima revelava, por outro lado, Acompanhantes prostituição de rua da cidade de São
que, ao contrário do que se afirma fre- Paulo fosse exercida por eles. Sua
Classe, Sensualidade e Discreção clientela era constituída predominante-
quentemente, não eram os homens
mais jovens, que se estavam iniciando mente por homens maduros, de posi-
ção social elevada, muitas vezes ho-
na vida sexual, os que apresentavam
maior percentual de envolvimento com mossexuais não "assumidos".
prostitutas. De fato, ocorria exata-
Os sofisticados "templos"
mente o contrário: o percentual crescia
com a idade. Ele era de 11% na faixa sexuais do Brasil moderno
etária dos 15 aos 20 anos; 24% na faixa Em 1984, longe do brilho criado pela
dos 20 aos 30; 32%na faixa dos 30 aos imprensa em torho de Roberta Close, o
40; e 33% na faixa dos 40 ao 50. dia-a-dia dos travestis menos célebres
estava associado invariavelmente à vio-
Prostitutas eram mais Atraentes companhias onde há
lência. Não foram poucos os casos, aba-
nível e beleza não só física mas
procuradas pelos casados fados, de altos políticos e executivos
também cultural com jovens
envolvidos com travestis e vitimados
Também a procura de prostitutas universitárias, modelos e
por chantagens, extorsões e até agres-
não era um substitutivo para, a "vida se- manequins
sões físicas,
xual normal" supostamente proporcio- Atendimento rápido e
Ao lado das "casas de massagem"
nada pelo casamento, já que entre os peronalizado (inclusive casais)
para hetero e homossexuais, substitutas
Fones: 259-8282 - 255-7113
homens que se envolviam com prosti- sofisticadas dos velhos bordéis, os mo-
Atendemos a domicílio, hotéis e
tutas era maior o percentual de casados téis, frequentados também por casais
motéis.
(52%) do que de solteiros (48%). de namorados e até por maridos e mu-
A modernização acelerada do País lheres, eram os "templos" sexuais do
no pós-64, se não fez declinar a prosti- Na década de 80, anúncios Brasil modernizado. Nos anos 70,
tuição, multiplicou seu leque de moda- destacavam "acompanhantes" multiplicaram-se nos arredores de
lidades. Estudantes universitárias que universitárias (Revista Rádio Táxi L grandes cidades, e, em 1984, eles já ha-
faziam "bicos" nos fins de semana nos nov./84) viam conquistado a área urbana.
chamados "serviços noturnos" dos ho- Para os que não tinham dinheiro,
téis de luxo, acompanhantes para via- durante a feroz ditadura do general lembrava a revista carioca Ele e Ela ,
gens internacionais, trottoir motorizado Médici, o Jornal do Brasil noticiava vio- restava a opção dos drive-in , em muitos
eram, entre outras, as novas formas que lenta repressão policial às prostitutas da dos quais não era necessário sequer
adquiria a chamada "profissão mais an- cidade de São Paulo. Como os cárceres que o cliente estivesse motorizado: bas-
tiga do mundo", estivessem lotados e o secretário de tava "escolher o bom acabamento de
Fruto, porém, do desenvolvimento Segurança do Estado tivesse determi- um Simca Chambord ou o confortável
desigual do. capitalismo brasileiro, era nado que os recursos fossem concen- banco traseiro de um Aero-Willys",
comum, ainda em 1984, sobretudo nas trados "na guerra aos crimes contra o que se encontravam há anos estaciona-
regiões mais atrasadas do Nordeste, patrimônio", a tática adotada foi o es- dos em pequenos compartimentos.
que pais, inconformados com deflora- tabelecimento de pânico entre as pros-
mento de suas jovens filhas, as levas- titutas, que eram levadas para locais er- Márcia Micheli
288
BR DFANBSB VB.GNCAAMA, 041334 An AR, 3a
Yi
ARTES/TEATRO: história do teatro brasileiro
Luz/treva no palco
"Não estamos atrás de novidades, esta- cendo. Destruída a democracia dos grande laboratório de idéias que foram
mos atrás de descobertas." palcos, nos anos seguintes também de- os palcos 20 anos antes. E, apesar do
(Oduvaldo Vianna Filho, dramaturgo ) finhariam as experiências pioneiras en- bom teatro que se fez na década de 70,
tão em pleno desenvolvimento. não surgiu daí um novo elenco à altura
O teatro brasileiro chegou a 1964 no Em 1984, o teatro brasileiro não ha- do que existia nos anos 60.
auge de um período de grande criativi- via ainda recuperado o antigo vigor. Em 1968, quando foi promulgado o
dade. A arte dessa época havia nascido Do seu grande elenco original, alguns Ato Institucional no 5, dando amplos
no final do período democrático ini- já não existiam, como Paulo Pontes poderes ao Regime Militar, Fer-
ciado em 1946 e entre os seus grupos (1940-76) e Oduvaldo Vianna Filho, o nando Peixoto, um dos artistas mais im-
mais importantes estavam o Arena e o Vianninha (1936-74). Outros, como Au- portantes dessa época, estava no Ofi-
Oficina, de São Paulo, e o núcleo tea- gusto Boal e José Celso Martinez Cor- cina, preparando uma peça do autor
tral do CPC da UNE, que formaria, rêa, haviam sido forçados ao exílio e só alemão Bertolt Brecht. Conta ele:
após o golpe, o Teatro Opinião, do Rio. retornariam após 1978. Afinal, os pou- "Dia 13 de dezembro, enquanto estáva-
Após anos de resistência à censura e à cos que continuavam em ação, como mos fazendo o ensaio geral de Galileu
violência, no entanto, estes e muitos Gianfrancesco Guarnieri e Plínio Mar- Galilei, ouvimos no rádio a decretação
outros grupos acabaram desapare- cos, não eram suficientes para recriar o do AI-5. A partir daí, o teatro foi per-
nr oranssa V8.GNCAMA 84041331 an co 2 ,p 33
dendo aquela força de reflexão, força
mais transformadora ( . . .). O Arena foi
assassinado, foi estrangulado pouco a
pouco. O Oficina se suicidou. Mas não
houve mortes naturais. São dois cami-
nhos provocados por uma violência re-
pressiva de fora."
O período tenebroso iniciado em
1968 perduraria até 1973, mas o AI-5 só
cairia em 1979. Assim, tentando impe-
dir o debate sobre os rumos que o País
estava tomando, o Regime Militar se
colocou em rota de colisão com o tea-
tro, que reivindicava liberdade para
avançar. "Exigem que não nos manifes-
temos sobre uma realidade dolorosa,
enquanto a denúncia, o debate e a dis-
cussão só podem contribuir para o en-
contro de soluções para os problemas"
(Viaggiinha, em 7968).
Acervo INACEN
Iconographia
nida, surgia mais adequado às condi-
ções econômicas e sociais. Sem poder
apoiar-se em figuras de cartaz, cenários
bem feitos, em peças estrangeiras de
sucesso comercial, mais cedo ou mais
tarde teria de apoiar-se na parcela poli-
tizada do público paulista."
Em 1956, Boal ajudaria a organizar o
novo teatro. A idéia era o aproveita-
mento máximo de recursos. Não havia
funções estanques de ator, diretor, ilu-
minador. E os artistas ainda aprendiam
e trabalhavam na área de finanças, ad-
ministração e publicidade. "A época de
mecenas acabou, agora começa a dura
realidade", afirmaria Vianninha, numa
alusão à figura de Zampari.
Iconographia
Ao contrário do TBC, que era uma
empresa média, propriedade de um
protetor das artes, os novos grupos se
mantinham por conta própria - uma
pequena empresa formada a partir de própria estréia do grupo Opinião, em gina. Foi uma mostra do quanto o novo
uma subscrição inicial de capital entre co-produção com o Arena e encenado teatro aproveitou e valorizou a música
alguns sócios: os próprios artistas, que no Rio. Era o musical Opinião, de popular.
dependiam da bilheteria para viver. vários autores, dirigido por Boal. Para Mas se o Opinião nasceu com o
Os novos grupos enfrentaram a eclo- Fernando Peixoto, era "uma forma (e golpe, o Centro Popular de Cultura, da
são do golpe militar defendendo-se fórmula) de protesto que teve sucesso UNE, desapareceu nessa época. Antes
com as forças que tinham. O primeiro imediato e grande repercussão". Já de ajudar a fundar o Opinião, no final
grande sucesso do Oficina foi Pequenos marcava o período de resistência, de 1964, junto com Paulo Pontes, De-
Burgueses, peça de 1902, de Máximo quando, segundo acreditava Vianninha, noy de Oliveira e João das Neves, Vian-
Gorki, onde Zé Celso utiliza seus re- o teatro passava a deixar na história ninha já havia passado do Arena para o
cursos extraordinários de encenador "não a obra, mas a posição". CPC. A idéia, ventilada inicialmente
para transformar um texto estrangeiro Arena Conta Zumbi veio em seguida, pelo diretor Francisco de Assis, era ten-
em um texto nacional. A peça já vista ainda em 1965, mas agora em São tar popularizar ainda mais o teatro,
por 27 mil pessoas desde o ano ante- Paulo. Boal e Guarnieri contaram a levando-o aos sindicatos e outras orga-
rior, ainda estáva em cartaz quando o história de Zumbi, negro que chefiou a nizações populares que nessa época
golpe de 64 obrigou os artistas a um resistência do Quilombo de Palmares, fervilhavam de atividade. O CPC foi
"veraneio forçado no litoral", lembra- refúgio de escravos do século 15. montado em dezembro de 1961 e apro-
ria Fernando Peixoto. Zumbi era um musical, com música de vado no Congresso da União Nacional
O teatro levou algum tempo para es- Edu Lobo. Uma de suas composições, dos Estudantes (UNE) como o seu ór-
boçar a reação ao golpe, no entanto. Upa Negrinho, Upa!, tornou-se muito gão cultural. Apesar disso, tinha auto-
Um dos primeiros contra-ataques foi a popular depois de gravada por Elis Re- nomia administrativa e financeira: ga-
291
BR DFANBSB VB8.GNC. - S4O044 33 )anco2, p 35
Iconographia
mente, a produzir boas peças e tomasse
iniciativas ousadas. Em 1975, Chico
Buarque produziria Gota D'Água, em
parceria com Paulo Pontes; em 1978,
Mesmo após :o golpe de 64, inúmeras peças atestaram o vigor
do novo teatro, Acima, Chico Buarque paresentaria Ópera do
cena de Morte e Vida Severina, representada em 1969,
em São Paulo Malandro, uma livre adaptação do texto
de Brecht. Trate-me Leão, em 1977,
nhava a vida como os outros grupos. blico era o mesmo que tivera o TBC, mostrou o excelente trabalho de um
Seus diversos núcleos disseminaram-se segundo observou Vianninha em 1968 novo grupo, Asdrúbal Trouxe o Trom-
principalmente através das universida- Casa de Chá Luar de Agosto, do ame- bone. Macunaíma, de Mário de An-
des do País, desenvolvendo um pro- ricano John Patrick, fora vista por 60 drade, foi uma montagem de extraordi-
grama exaustivo de trabalho que se es- mil pessoas em 1956. Um êxito seme- nária repercussão em 1978, Realizado
tendia também ao cinema, livros, revis- lhante. de 1965, a peça Liberdade, Li- por Antunes Filho, foi um espe-
tas e seminários. Em sua curta vida de berdade, de Millôr Fernandes e Flávio táculo de seishoras que envolveu seis
dois anos, visitou camponeses, favelas e Rangel, teve 50 mil espectadores. meses de ensaio do elenco,
as periferias das grandes cidades. Fauzi Arap, em 1975, concluía que o Antunes Filho realizava o seu traba-
O golpe não impediu que os outros desfecho foi uma ruptura no nível de lho, nessa época, através do Grupo
grupos continuassem a fazer sucesso. criatividade atingido em 1964. "Desde Pau Brasil, procurando aproveitar ao
Ao contrário disso, inúmeras peças 1971 não temos um grupo estável e de máximo o imenso potencial do teatro
atestaram o vigor do novo teatro. Por importância fazendo teatro no País e ainda latente no final da década de 70.
exemplo, a montagem histórica do Ofi- dando continuidade àquele trabalho." Utilizava inclusive amadores dispostos
cina de 1967, O Rei da Vela, uma mira- Daí porque a década de 70, para mui- a fazer teatro e sem encontrar Oportu-
bolante recriação do texto de Oswald tos, foi o período das grandes empresas nidade. Que esse potencial existia, nin-
de Andrade que causou impacto inter- no teatro brasileiro - uma evolução guém podia duvidar - mesmo entre os
nacional. Morte e Vida Severina, do "natural", dizia Arap, em função do artistas profissionais, onde o desem-
poeta João Cabral de Melo Neto, foi alto nível técnico atingido pelo teatro prego, em 1979, era de 80%, segundo
montada em 1966 pelo Teatro da Uni- desde o TBC. "Hoje, o esquema é o da Cláudio Mamberti, então na presidên-
versidade Católica (TUCA), de São great production (superprodução)", as- cia do Sindicato dos Artistas de São
Paulo. Com esta peça o grupo venceu o segurava em 1975 o produtor Henrique Paulo. Mas era também vigoroso o mo-
mais importante festival de teatro, o de Suster, responsável pela montagem da vimento amador, que voltou a se disse-
Nancy, na França. peça Equus. "O franco-atirador fatal- minar após a anistia, em 1978,
Apesar do sucesso, porém, o teatro mente sucumbe", concluía ele. formando-se inúmeros grupos em bair-
foi perdendo sua força. O Arena Essa evolução foi muito facilitada ros, sindicatos, escolas, no movimento
extinguiu-se em 1971. O Oficina seguiu pela ação econômica e não apenas negro e outros,
com Zé Celso para o exílio, em 1974, política da censura. O exemplo mais Nessa época, esperava-se que os au-
tentando sobreviver no Exterior, inclu- claro foi a companhia de Fernanda tores simplesmente abrissem as gavetas
sive em Portugal. O Opinião, que pro- Montenegro, que, em 1973, tentou en- e recomeçassem de onde haviam pa-
curou ampliar a resistência atraindo cenar Calabar, de Paulo Pontes e Chico rado há mais de dez anos. Mas isso só
profissionais menos comprometidos Buarque. Era a montagem mais cara aconteceria, dizia Guarnieri, em 1979,
politicamente, perdeu a equipe gra- do teatro até então: 400 mil cruzeiros à se o teatro pudesse novamente procurar
dualmente, João das Neves, solitaria- época. Mas a peça foi "avocada" pelo e ampliar o seu público. "Sem esse
mente, ainda conservava o nome do governo, que a segurou durante meses, mergulho", alertava o autor de Black-
grupo em 1983, para então vetá-la, causando imenso Tie, "ficaremos nisso: um teatro onde
O novo teatro, de fato, dera um salto prejuízo à companhia. Dois anos de- 90% da produção não são divulgados,
qualitativo no "plano cultural", no di- pois, em 1975, Fernanda Montenegro produção de pequenos grupos, de gen-
zer do diretor Fauzi Arap. Mas não receberia golpe semelhante, desta vez te que trabalha nas piores condições,
teve tempo nem condições para com Um Elefante no Caos, de Millôr mas que está realizando. Esse é o mate-
consolidar-se em termos práticos. Na Fernandes. 8 rial rico que pode dar um impulso em
verdade, a partir do golpe, o seu pú- Intromissões semelhantes na linha nosso teatro em geral".
292
A tarefa maior e mais traumákca do
novo Exército foi atacar e conquistar
Canudos, o reduto dos sertanejos agru-
pados em torno de Antônio Conse-
lheiro, no sertão da Bahia. Entre no-
vembro de 1896 e outubro do ano se-
guinte, a população do arraial enfren-
tou quatro expedições militares, que re-
uniram no total mais de 11 mil soldados
e 19 canhões. A vila só foi destruída
pela quarta expedição.
A derrota das três primeiras expedi-
ções causou um verdadeiro trauma na-
cional. E mesmo a vitória final teve um
sabor amargo, quando se revelaram as
Biblioteca Nacional
violências cometidas pelos soldados
contra os sertanejos feitos prisioneiros.
O aperfeiçoamento técnico das For-
ças Armadas se fez combatendo o ini-
migo interno. A primeira utilização da
nossa força aérea em operações de
Para esmagar Canudos, o Exército enviou quatro expedições, num total de 11 mil combate, com os aviões fazendo mis-
soldados sões de reconhecimento, foi na campa-
POLÍTICA/MILITARES: a repressão a movimentos populares nha contra o Contestado (1912 - 15),
uma rebelião de camponeses sem terra
que eclodira na fronteira entre o Pa-
raná e Santa Catarina.
0 inimigo no 1
Com o golpe, chegam ao poder
Da origem aos dias de hoje, as nossas Forças Armadas foram militares doutrinados na ESG
usadas em ações repressivas. No alvo das armas, um inimigo Se, através de toda a nossa história,
surpreendente: o povo brasileiro as Forças Armadas foram utilizadas
como milícia repressora da população,
o que caracteriza o período pós-64 é
No dia 2 de abril de 1980, cerca de 50 gadas de reprimir a Confederação do que, no nível da doutrina, essa ativi-
mil metalúrgicos em greve realizavam Equador - uma tentativa de aglutinar dade passa a ser justificada, explicada e
uma assembléia, no estádio da Vila Eu- as províncias do Nordeste numa repú- reforçada.
clides, em São Bernardo do Campo, blica federativa. Pode-se dizer que o golpe militar de
em São Paulo, quando foram surpreen- Em 1834, toda a província do Pará se 1964 significou a tomada do poder pelo
didos pelos vôos rasantes de dois heli- levantou em armas e conseguiu, no ano setor das Forças Armadas orientado
cópteros do Exército, equipados com seguinte, constituir um governo. A re- pela doutrina gerada na Escola Supe-
metralhadoras. Apesar do insólito da si- volta, conhecida como a Cabanagem, rior de Guerra (ESG). Esta se organi-
tuação, não foi a única vez durante teve um cunho nitidamente popular. A zou, em 1949, tendo como modelo o
aquela greve que os operários se viram repressão foi intensa e generalizada, National War College americano. Mas,
frente a frente com o Exército brasi- provocando cerca de 40 mil mortes desde o início, diferenciou-se de seu
leiro, que parecia ter e mesmo triste numa população que não chegava a modelo original, por estar mais voltada
destino dos demais exércitos latino- 100 mil pessoas. para os aspectos internos e menos para
americanos: o de estar mais preparado Apesar do sucesso em reprimir estas a defesa do País de um ataque externo.
para combater seu próprio povo do que e outras revoltas, o Exército perdeu a A concepção que nasceu e se desen-
inimigos externos. confiança das classes governantes, por- volveu na ESG se caracteriza por inter-
Desde sua origem, nossas Forças Ar- que parte das tropas sempre aderia às relacionar os temas da segurança e do
madas foram utilizadas em ações repres- revoltas. Assim, para sua garantia, as desenvolvimento. Só o desenvolvi-
sivas. Nosso processo de independên- oligarquias criaram, em 1831, a Guarda mento econômico do País poderia ga-
cia, tendo sido basicamente conserva- Nacional, cujos membros seriam arre- rantir a sua segurança e só um clima de
dor, gerou, para os novos dirigentes, a gimentados entre os cidadãos com alta segurança podia permitir o desenvolvi-
necessidade de combater ao mesmo renda, para se encarregar da repressão mento. Garantir esse clima de segu-
tempo as últimas resistências portugue- interna. Ao Exército, desprestigiado e rança significava minimizar as fontes de
sas e as tentativas de fazer acompanhar reduzido, restaria a tarefa de preservar cisão e desunião e seria tarefa das For-
a separação de Portugal de algum tipo o País contra agressões externas. cas Armadas.
de alteração na situação política e eco- A situação só se inverteria como Por essa concepção, as elites do País
nômica. consequência da Guerra do Paraguai são "a mola propulsora do processo de
Na tarefa de organizar suas Forças (1865-1870). Novamente fortalecido mudança" (Manual Básico da ESG,
Armadas, a nova Monarquia contou por sua conduta vitoriosa na guerra, o 1977), enquanto o movimento operário
com o apoio inglês. Lorde Cochrane, Exército voltou a ser o guardião da si- e popular se torna alvo potencial das
que participara da luta pela indepen- tuação interna, enquanto a Guarda Na- políticas de segurança. Ele passa a ser
dência, já em 1824 comandava a força cional só seria convocada em caso de visto como fator de cisão. Por um lado,
naval que deslocou as tropas encarre- ameaça externa, como força auxiliar. porque, no entender dos formuladores
293
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, p 26
de 3
da doutrina, os trabalhadores tende
- O Exército contra o
riam a colocar suas necessidades cor-
povo: em 68, no Rio,
porativas acima dos interesses nacio
- reprime manifestações _
nais e, por outro, porque seriam sus-
estudantis (ao lado); em
cetíveis às influências da propagan
da 70, na Amazônia, em
comunista.
treinamentos
Nas palavras de um tenente-coronel
antiguerrilha (abaixo);
falando a empresários do sul do País,
em abril de 80,
em dezembro de 1964: "Nós, soldados,
helicóptero sobrevoa a
procuramos conservar a ordem, para
assembléia dos
que vocês, empresários, arriscando
, metalúrgicos, em São
criando, produzindo e multiplicando,
Iconographia
Bernardo do Campo
possam nos dar o progresso."
(SP)
Em quatro anos, o campus da
UNB foi ocupado sete vezes
As Forças Armadas, então, come-
cam a preocupar-se cada vez menos
com suas tarefagclássicas. Um exemplo
diss& pode ser encontrado na evolução
do currículo da Escola de Comando do
Estado Maior das Forças Armadas. Em
1956, ele não continha qualquer refe-
rência à guerra contra-guerrilhas, A
partir de 1961, os cursos sobre essas
questões já se faziam presentes. Em
1968, o currículo destinava 222 horas-
aula para a questão da segurança in-
terna, 129 para a guerra irregular e ape-
nas 21 eram dedicadas aos tópicos
relacionados à defesa do território,
Apoiadas na Doutrina da Segurança
Nacional, as Forças Armadas brasile
i-
ras, no período do Regime Militar,
in-
vestiram contra todos os setores
do
povo brasileiro: operários, estudantes,
camponeses e intelectuais.
Em julho de 1968, reprimindo um
surto grevista, o Exército ocupou mili-
tarmente a cidade de Osasco, em São
Paulo, e deu cobertura à invasão
da
empresa Cobrasma pela Polícia Mili-
tar, que prendeu cerca de 400 ope-
rários,
O campus da Universidade de
Brasília foi ocupado sete vezes entre
1964 e 1968. Na primeira vez, em abril
de 1964, a biblioteca central ficou inter-
ditada por 16 dias; na segunda, em
agosto de 1968, um estudante foi atin-
gido na cabeça por uma bala calibre 43.
Ricardo Malta/F4
%1
REGIÓES/NORDESTE: a política agrícola da SUDENE
O propósito da SUDENE era reali-
zar ensaios de fertilização nestes tabu-
leiros costeiros e, no momento em que
tivesse conhecimento de como
Verso e reverso
aproveitá-los no cultivo econômico de
alimentos, iniciar o processo de desa-
No período 1960-64, a SUDENE apresentou vários projetos propriação por interesse social dessas
para os problemas da população nordestina que, em 1984, só áreas abandonadas.
Por outro lado, enquanto se realiza-
serviam a poucos privilegiados
» vam as pesquisas para saber como cor-
rigir a acidez dos solos de tabuleiros, a
SUDENE teve a oportunidade impar
No período entre 1960 e 1964, o de fazer uma experiência no campo da
plano da SUDENE (Superintendência organização econômica e social na
do Desenvolvimento do Nordeste) para zona úmida do Nordeste. Os trabalha-
a agricultura nordestina estava apoiado dores rurais de cinco engenhos da
no estudo da realidade da região e Usina Salgado, no município do Cabo,
constava dos seguintes programas prio- em Pernambuco, tinham entrado em
ritários: 1) produção. de alimentos na greve e não havia acordo. Usineiro e
zona umida do Nordeste ; 2) desenvolvi- trabalhadores procuraram a SUDENE
mento no semi-árido de uma agricultura para dar uma solução, pois já tinham
resistente aos efeitos da seca; 3) esgotado as negociações junto ao Mi-
colonização do Maranhão; 4) desenvolvi- nistério do Trabalho e outras autorida-
mento da irrigação no São Francisco. des. Nessa oportunidade, o Departa-
mento de Agricultura e Abastecimento
Produção de alimentos da SUDENE propôs ajudar os campo-
na zona úmida neses na organização de uma Coopera-
tiva de Trabalho para explorar as terras
O programa de produção de alimen- dos engenhos de Tiriri, Massangana,
tos na zona úmida, uma das poucas
Algodoais, Serraria e Jardim e
áreas existentes no Nordeste isentas do
constituir-se em fornecedora de cana
problema da seca, tinha como principal
para a Usina Salgado. Aceita a pro-
objetivo combater a fome secular que
posta, depois de um trabalho de cons-
se abate sobre aquela região do País.
cientização dos camponeses sobre or-
A produção de alimentos deveria ganização de cooperativa e trabalho
desenvolver-se com base nas terras li-
Solano Jos&/Abril Press
do arrendamento das terras seria reali- apresentam melhores condições de to- desenvolvimento da pecuária no semi-
zadoem base a 10% da produção bruta pografia para sua expansão. árido baseava-se fundamentalmente na
de cana colocada na Usina. A Coope- A região semi-árida abarca quase melhoria da alimentação do rebanho.
rativa pagava salário mínimo aos traba- dois terços da área do Nordeste, com Em grandes áreas do sertão, o gado era
lhadores por uma quantidade fixa de cerca de 1 milhão de quilômetros qua- miúdo e com visíveis características de
cana cortada e adicionais pela margem drados, e abriga uma população de raquitismo, por falta suficiente de ali-
de produção alcançada acima destes aproximadamente 20 milhões de habi- mentação. A perfuração de poços, e
níveis fixados. No fim de cada ano agri- tantes. consequente descentralização das
cola, o balanço da Cooperativa, depois Nessa região, a seca periódica dizima aguadas, permitiria melhor aproveita-
de proceder à integralização do fundo as lavouras e quebra o equilíbrio entre mento das pastagens, evitando maior
de capitalização, distribuia 50% dos lu- a população e os recursos existentes e pisoteio e destruição dos pastos.
cros entre os trabalhadores, de acordo os nordestinos se transformam em fla- A perfuração de poços foi uma ação
com o trabalho aportado por cada um gelados e retirantes. de impacto. O poço não seria mais per-
durante o ano.
furado nas fazendas dos grandes pro-
A SUDENE dava assistência técnica Agricultura resistente
prietários e chefes políticos locais,
na elaboração do plano anual de cul-
à seca no semi-árido constituindo-se em propriedade pri-
tivo e corte de cana, assim como na ges-
vada. A SUDENE estabeleceu priori-
tão da Cooperativa. Os camponeses O programa da SUDENE para esta dade para a perfuração de poços públi-
assumiram as tarefas cotidianas de im- área foi concebido para enfrentar essa cos nos povoados, não só para atender
plantação dos cultivos e administração dura realidade. Em primeiro lugar, a às necessidades da população humana
da Cooperativa. Retiraram as mulheres SUDENE concentrou os recursos fede- carente d'água, mas também como sus-
e meninos do árduo trabalho da cana. rais num plano de ação prioritário (Pri- tentação do desenvolvimento da pe-
As mulheres, com assistência da SU- meiro Plano Diretor), a fim de evitar a cuária.
DENE, organizaram um programa de atomização dos recursos em obras sem Depois de 1964, o governo apoiou-se
aprendizagem de corte e costura e pro- importância e combater o clientelismo no poder dos latifundiários do semi-
dução de roupas para os trabalhadores político institucionalizado no Nordeste. árido. Em consequência, os subprogra-
rurais de Pernambuco. Os meninos iam Assumiu também o controle do Plano mas para a região só foram implanta-
às escolas e os adultos frequentavam de Emergência contra as Secas, distri- dos nas partes que beneficiavam os
cursos noturnos de alfabetização. Tal- buindo as obras programadas com as grandes proprietários e chefes políticos
vez pela primeira vez, foi posto em prá- entidades especializadas e procedendo locais.
tica no meio rural o método de alfabeti- à fiscalização de sua execução. Por úl-
zação do professor Paulo Freire. timo, passou a distribuir os alimentos Colonização
Os problemas internos de gestão da nas frentes de trabalho. )
do Maranhão
Cooperativa eram resolvidos com certa No setor agropecuário, a SUDENE
facilidade. Contudo, aqueles derivados adotou uma estratégia no sen- A SUDENE, através de seus estudos
de contatos externos da Cooperativa, tido de desenvolver uma agricultura re- sobre o Nordeste, constatou a existên-
principalmente no que se refere à ob- sistente aos efeitos da seca. Nesse sen- cia de uma progressiva corrente migra-
tenção de crédito e compra de equipa- tido, definiu subprogramas para o semi- tória de cerca de cinco mil famílias por
mentos e insumos, se constituiram em árido, entre os quais o desenvolvimento ano do sertão de Pernambuco, Paraíba,
sérios obstáculos. A cooperativa de tra- da pecuária. Rio Grande do Norte e principalmente
balhadores era uma exceção, difícil de O subprograma da SUDENE para o do Ceará e Piauí para as áreas de Ca-
se relacionar com o sistema bancário e
com os fornecedores de insumos,
Depois de 1964, a ação foi no sentido
de descaracterizar o trabalho comuni-
tário desenvolvido pelos camponeses
de Tiriri. As terras dos engenhos foram
parceladas e vendidas a cada família
camponesa, Os camponeses sabiam
que era difícil manter cultivos de cana
em pequena escala, pois este cultivo só
é econômico quando produzido em
larga escala. Contudo, ante a alterna-
tiva de ficarem sem nada, aceitaram a
imposição do parcelamento das terras.
Entraram na Cooperativa alguns ele-
mentos estranhos, que não eram cam-
poneses. Como era de se esperar, estes
foram comprando as parcelas dos de-
mais e concentrando a propriedade da
terra. Em 1984, a Cooperativa de Tiriri
estava disvirtuada e em plena crise.
Quanto ao programa de fertilização
de tabuleiros, para produção de ali-
mentos, foi imediatamente desativado.
Em seu lugar, com o advento do Proál-
Abril Press
Os planos da SUDENE, anteriores a meeiro na esteira do latifúndio em for- não gerou emprego, pois a criação de
1964, incluíam a perfuração de poços mação ou ganhar a estrada e abrir ou- gado extensiva requer apenas duas jor-
públicos nos povoados. Com o golpe, tro roçado mais adiante, em terra pú- nadas de trabalho por hectare ao ano:
técnicas sofisticadas foram aplicadas nas blica, que lhe renovava a ilusão de ter se bem melhorou a oferta de carne, não
grandes propriedades (pág. ao lado), um dia o seu próprio chão. contribuiu para aumentar a produção
enquanto a população carente de água O Estado do Maranhão, através de de azeite no Nordeste, assim como de
usava meios tradicionais para o lei estadual de 1961, colocou as terras outros alimentos, nem gerou exceden-
abastecimento (acima) compreendidas entre os rios Pindaré e tes exportáveis e suas consequentes di-
Turiaçu, ao longo da atual BR-316, à visas; desencadeou um processo vio-
xias, Bacabal e Pindaré-Mirim no Ma- disposição da SUDENE para o projeto mento de erosão e desequilíbrio ecolo-
ranhão, à medida que se abria a BR- de Colonização do Maranhão. gico emtoda a região compreendida en-
316, ligando o Nordeste seco à Amazô- O projeto previa a incorporação tre o Pindaré-Mirim e a fronteira do
nia. Em 1960-61, quando a SUDENE anual de umas cinco mil famílias, pois o Pará.
estudou esta corrente migratória, a po- processo migratório se estava desenca-
pulação migrante entrava pela picada deando num rito acelerado. A SU- Irrigação na região
aberta para a costrução da estrada. Os DENE, então, preparou uma estratégia da bacia do São Francisco
nordestinos forjavam com sacrifício para enfrentar os problemas de manejo
mais uma saga na história de sua sobre- dos solos; estudou as melhores formas O rio São Francisco é conhecido
vivência. de nucleação para ordenar o povoa- como o rio da integração nacional. A
A população camponesa, tangida mento da região e assessorou a organi- bacia hidrográfica do São Francisco
pela agrura das secas, ia em busca de zação de uma cooperativa central, para abarca uma área de aproximadamente
novas terras para reconstruir suas vi- garantir o abastecimento de insumos à 670.000 quilômetros quadrados. Colo-
das. Alimentava a esperança de conse- produção e comercialização das colhei- nizada desde o século 17, constituiu-se
guir um pedaço de chão. Contudo, a tas. na principal via de comunicação inte-
omissão premeditada do governo facili- Depois de 1964, a SUDENE, junto rior entre o sul do País e o Nordeste até
tava a grilagem das terras e sua reparti- com o Banco Mundial, redefíniria a os anos 40, quando, com o bloqueio
ção entre empreiteiros e políticos lo- orientação do projeto de Colonização marítimo das costas brasileiras durante
cais. Depois de formados o roçado e do Maranhão. O desenvolvimento da a Segunda Grande Guerra, iniciaram-
a plantação de arroz, aparecia o grileiro pecuária passou a ter prioridade. O se os primeiros esforços para implantar
para cobrar ao camponês a "meia" e, Banco Mundial financiou a formação uma infra-estrutura rodoviária de inte-
caso não fosse atendido, botava a polí- de pastagens e o desenvolvimento da gração do interior do Nordeste com o
cia em cima do "invasor" para obrigá- criação de gado na área. Este projeto resto do País.
lo ao pagamento do "tributo". O cam- foi danoso por vários motivos: concen- O São Francisco corta uma vasta re-
ponês tinha que optar entre ficar como trou a propriedade da terra e da renda; gião de caatingas secas dos sertões da
297
Br DranNBSB Va.GNC.AMA, 4043342002 , p44
Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe. vos de mercado mais importantes de- só poderia gerar uma grande oferta de
Esta área, por suas características fa- senvolveram-se dos anos 50 em alimentos no sertão e aplacar a fome
voráveis à criação de gado, foi o centro diante, no médio São Francisco: em secular do Nordeste, como daria para
mais importante de desenvolvimento Pernambuco, com a cultura da cebola, abrigar diretamente cerca de 50 mil
da pecuária extensiva da zona seca no principalmente em Cabrobó; com o ar- famílias de pequenos produtores agri-
Brasil, desde a época colonial. oz, nas vazantes das várzeas alagadas colas, com um nível de renda elevado,
Até os anos 50, antes da construção do baixo São Francisco, em Alagoas e além de gerar mais 300 mil empregos
da Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso Sergipe, assim como nas "lagoas de ar- indiretos (transporte, comercialização,
(1954), a irrigação no São Francisco era roz" formadas ao longo das margens agroindústrias, bancos, pesquisas e as-
incipiente. As populações ribeiri- pelo transbordamento anual do rio. sistência médica); 3) as amplas áreas da
nhas aproveitavam as vazantes para, A SUDENE estudou o São Fran- região oeste da Bahia, que vão da mar-
nas terras umedecidas e fertilizadas cisco e as primeiras conclusões foram gem esquerda do São Francisco até a
pelo húmus trazido pelo rio, estende- as seguintes: 1) o rio São Francisco ti- fronteira do Estado de Goiás, cujas ter-
rem progressivamente suas culturas de nha uma grande potencialidade de pro- ras na sua maioria eram de propriedade
arroz, jerimum, batata-doce, milho e dução de alimentos à base de irriga- do Estado, ficariam como uma grande
feijão de corda. Essas "culturas de va- ção, pois os primeiros trabalhos revela- reserva para programas futuros de co-
zantes" garantiam a subsistência da po- ram que existiam aproximadamente lonização e de produção de alimentos;
pulação, Os excedentes eram comer- 150 mil hectares de terras baixas e de 4) por último, o trabalho revelou que a
cializados nos centros urbanos dos ser- caatingas aptas para a irrigação; 2) o SUDENE não poderia contar com a
tões nordestinos entro da área de in- aproveitamento progressivo desses 150 cooperação da Comissão do Vale de
fluência do "Grande Rio". Os culti- mil hectares com culturas irrigadas não São Francisco (CVSF), pois este orga-
nismo federal especializado no aprovei-
tamento dos recursos do vale era pri-
sioneiro de poderosos políticos corrup-
tos da Bahia e Pernambuco. Com a im-
possibilidade de superar a situação
existente, a SUDENE teria que enfren-
"| 3? f tar diretamente os problemas da irriga-
ção no São Francisco.
#a
>" F/A
d Assim, foi iniciada a primeira expe-
29 riência da SUDENE em Bebedouro,
entre Juazeiro, na Bahia, e Petrolina,
3 em Pernambuco, que contou com a
* ) cooperação da FAO, organismo das
Nações Unidas.
+ | A partir de 1974, a autoridade fede-
-" "" ral encarregada dos projetos de irriga-
€ duma
O número de empresas em São Paulo é 14 vezes maior do que em São Bernardo do Campo. Nessa região,
contudo, os metalúrgicos se concentram em indústrias de grande porte, o que facilita a maior mobilização
Distribuição das empresas e trabalhadores metalúrgicos em função do número de empregados, em % (março de 1982)
Fonte: DIEESE
h % / Arquivo Sind. Met. SP
mobilística parava e as grandes greves parece cansado de briga e prepara o riodicidade definida até 1980, quando
voltavam a ocupar o cenário brasileiro. seu sucessor para a batalha eleitoral de se tornou mensal. O Metalúrgico
Houve greve em 1979 e a ela se suce- 1987, o ex-pára-quedista Luís Antônio somente se calou temporariamente em
deu uma curta intervenção no sindi- de Medeiros, 1964, quando Afonso Delellis, presi-
cato. Houve greve em 1980 - uma A disputa pela legitimidade do man- dente do sindicato, foi cassado pelo Re-
greve longa, de resistência durante 41 dato vem marcando todas as diretorias gime Militar. Mas, já em novembro de
dias, sucedendo uma longa interven- que se sucederam no comando dos me- 1964, voltava para denunciar casos de
ção. Mas, desde 1979, os metalúrgicos talúrgicos desde 1965. Na última elei- corrupção da diretoria cassada,
de São Bernardo contavam com uma ção, em julho de 1984, a votação Oposi-
entidade paralela - o Fundo de Greve, cionista nas fábricas foi apenas ligeira- Um ambulatório com 89
experiência única no movimento sindi- mente inferior ao voto dos metalúrgi-
cal brasileiro, Estrategicamente situado cos aposentados. Apesar disso, uma su- médicos e dentistas
nas proximidades da sede do sindicato, cessão de greves por empresa, no
o fundo abrigou a diretoria cassada du- Foi durante os anos mais tenebros os
período de julho a outubro de 1984, do Regime Militar que "Joaquinzão"
rante os períodos de tutela do Minis- consagrou os chamados "diretores de
construiu o imenso patrimônio dos me-
tério do Trabalho. base", aproximou-os das práticas e do talúrgicos de São Paulo. A sua sede de
Em 1981, Jair Meneghelli, operário convívio com a histórica Oposição Sin- seis andares da rua do Carmo, inaugu-
da Ford, concorreu à presidência com dical Metalúrgica (que só não disputou
o apoio de Lula e venceu com folgada rada em 1954, foi agregada uma colô-
eleições em 1965 e 1975) e garantiu aos nia de férias com 60 apartamentos, na
maioria. Meneghelli não repetiu o ca-
metalúrgicos paulistanos o reajuste tri- Praia Grande, no litoral paulista, em
risma de Lula, mas sob sua gestão os mestral de salários.
metalúrgicos de São Bernardo paralisa- 1969. Em 1974, inaugurou-se o ambula-
A primeira organização dos metalúr- tório médico de sete andares que, em
ram otrabalho exigindo antecipação de
gicos da capital paulista foi fundada 1984, contava com 65 médicos, 24 den-
salário em outubro de 1982 e realiza- em 1932, no dia 27 de dezembro, pelo tistas e uma média de 40 mil consultas
ram "greves pipoca" (fábrica por fá- operário das indústrias Matarazzo Ro- mensais. Em 1975 foi comprado um si-
brica) em abril de 1983, quando conse- dolfo Mantovani. Aproveitava-se a
guiram obter ganhos salariais acima do tio de 14 alqueires no município de
onda de oficialidade oferecida por Ge- Mogi das Cruzes, na região da Grande
Decreto-Lei 2,065. Em julho desse túlio Vargas em 1931, com a edição da
São Paulo, para cursos e encontros e,
mesmo ano, os metalúrgicos de- primeira legislação sindical no País. em 1979, o Sindicato deu início à cons-
claram-se em "greve política" e o Mi- Até 1935 - ano da repressão desenca- trução de nova sede. Dos 15 andares
nistério do Trabalho decretou nova in- deada após o levante comunista - essa projetados, porém, o novo prédio não
tervenção, suspensa somente um ano organização oficial convivia com o saiu do subsolo. Lá podem acomodar-
depois. "sindicato livre" dos anarquistas. A se até 8 mil pessoas, e desde 1981 o lo-
partir de 1939, com a criação do im- cal é palco de assembléias de toda es-
O Sindicato de São Paulo e seu posto sindical, o Sindicato dos Ope- pécie.
presidente "vitalício" tários Metalúrgicos da Grande São
Essa superestrutura sindical, cobi-
Paulo ganha fôlego e pode ampliar as cada por todas as correntes partidárias
O Sindicato dos Metalúrgicos de São atividades de sua sede, compartilhada
Paulo, considerado o maior organismo com militância entre os trabalhadores,
com outras entidades no antigo edifício assinala em sua previsão orçamentária
sindical da América Latina, tem prati- Santa Helena, na praça Clóvis, centro
camente um presidente vitalício: Joa- para 1985 uma receita de Cr$ 24 bi-
de São Paulo. Após 1962, o Sindicato lhões, entre mensalidades, arrecada-
quim dos Santos Andrade, o "Joaquin- da Grande São Paulo desmembrou-se ções de imposto sindical e juros de ca-
zao . em três, dando independência a Osasco derneta de poupança - uma cifra que
Eleito em 1965, vindo de uma inter- e Guarulhos, municípios industriais da deixa para trás o orçamento da maioria
ventoria no sindicato metalúrgico de Grande São Paulo.
Guarulhos, "Joaquinzão", depois de dos municípios brasileiros.
Em 1942, é lançado o primeiro nú-
atravessar oito mandatos consecutivos, mero do jornal O Metalúrgico, sem pe-
Ricardo Paoletti
300
BR DFANRSRVA GNC.AAA, $4041334 300
2 ;p 43
442 32333
BR DFANBSB V8.GNC.AMA, 240 2 ES"
os "órgãos de proteção"
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO: a situação do menor e
Nossos pixotes
que, exceto o nome, pouca coisa mu- Mas o pior de tudo é que os mesmos
Não foi sem motivo que um dos prin-
dara na substituição do SAM pela FU- métodos violentos continuavam sendo
cipais elementos propagandísticos e de
NABEM: "Milhares de menores aban- empregados contra um número cres-
mobilização utilizado pelos conspirado-
res que preparavam o golpe militar de donados, carentes e com problemas de cente de menores. Como consequência
1964 assumiu a forma de "Marchas da conduta foram torturados e espancados da adoção de um modelo econômico
Família com Deus pela Liberdade". em celas e cubículos fechados, existen- que concentrava cada vez mais a ren-
tes nos subterrâneos do complexo para da, multiplicou-se o número de crian-
Seus ideólogos se apoiavam na crença
de que uma educação severa dada pe- menores de Quintino Bocaiúva, no Rio cas carentes (cujos pais ou responsáveis
los pais aos seus filhos ajudaria o Es- de Janeiro, pertencente à FUNA- não têm condições de suprir suas ne-
tado a assegurar a ordem pública e a li- BEM." Falava ainda de "um quadro de cessidades básicas), abandonadas (sem
berdade de iniciativa privada, garan- horror, um regime disciplinar duro, in- pais ou responsáveis) e infratoras (que
tindo a organização de um conjunto so- flexível, punitivo, voltado para o inter- cometeram atos considerados crimes
cial harmonioso e em constante cresci- nato de menores", que teria existido ou contravenções, mas não podem ser
mento material e espiritual. L sempre na entidade. processadas ou julgadas, por serem ju-
O presidente Médici, em 1970, visi-
tando a sede da Fundação Nacional do
Bem-Estar do Menor (FUNABEM),
que substituira, no final de 1964, o an-
tigo Serviço de Assistência ao Menor
(SAM), usou sua expressão predileta
para comentar o que seria o êxito do
Regime Militar nesta área do atendi-
mento social: "Nesta manhã, vejo um
milagre. Vejo o milagre da transmuta-
ção da "sucursal do inferno", da "escola
do crime", da "fábrica de monstros mo-
rais", em um centro educacional vol-
tado para o desenvolvimento integral
do menor." E prosseguia: "Esse mesmo
milagre que, hoje e aqui, proclamamos
a toda a nação brasileira, nós o deve-
mos por inteiro à Revolução de Março.
E não tenho dúvidas ao afirmar que a
contestação mais cega e mais surda,
que tudo negasse à obra revolucio-
nária, haveria, pelo menos, de bendizê-
la por apagar o sangue, a corrupção e a
vergonha do malsinado SAM, para
neste mesmo lugar erguer a FUNA-
BEM."
O general teria razão para saudar o
fim do SAM, que possuía, justífica-
damente, uma péssima fama. Além de
suas instalações serem precárias e ofe-
recerem péssimas condições de hi-
giene, os menores sofriam maus tratos
e eram explorados por diretores e fun-
cionários. Meninas internas na institui-
ção chegaram a ser emprestadas a boa-
tes, transformando-se em prostitutas.
As rebeliões eram constantes.
Mas em 1980, dez anos depois do
discurso ufanista de Médici, a profes-
sora Ecléa Guazzelli, ao demitir-se da
presidência da FUNABEM, mostrava
301
eRDraNBSB V8.GNC.AAA, $404133)InCOA , p4G,
e 74P
oe
onçnes,
ie «remeta, cê B- ce
Apósa Abolição cresce a utilização da mão-de-obra infantil . .. a tal ponto que, em 1983, cerca de sete milhões de menores
(acima, operários na Fábrica Bangu, Rio, 1893) ... integravam a força de trabalho
ridicamente irresponsáveis). Em 1975, a Tentando substituir a punição e o dade um espírito militar. O próprio Al-
CPI do Menor, instalada no Congresso controle pelo assistencialismo, a FU- tenfelder, já em 1965, registrava com
Nacional, realizou uma pesquisa junto NABEM apresentava o menor como orgulho; "Quis o destino que a minha
aos prefeitos brasileiros e, por amostra- vítima da sociedade e propunha que primeira presença como presidente da
gem, chegou a verificar a existência de toda a comunidade fosse envolvida no fundação fosse numa cerimônia de in-
cerca de 13 milhões e meio de menores seu atendimento. O médico Mário da corporação dos meninos do SAM ao 1o
carentes e mais dois milhões abandona- Silva Altenfelder, que dirigiu a FUNA- Batalhão de Carros de Combate, sob o
dos. Mas, no próprio texto do relatório, BEM desde a sua fundação até 1979, comando do coronel Calderari, ou-
os parlamentares afirmavam que "al- afirmava: "Dar-se-a ênfase ao amparo vindo a vibrante ordem do dia do gene-
guns indicadores sócio-econômicos au- da criança na própria família. A inter- ral Garcia. Com que prazer os vimos
torizam a avaliar em 25 milhões a po- nação só deverá ser admitida quando marchando e com que maior prazer
pulação de menores carenciados e a- não houver mais possibilidade de outra com eles cantamos o Hino Nacional."
bandonados". solução." E mais: "Claro que o go- Em sua denúncia, a professora Ecléa
Em 1982, o consultor regional do verno tem obrigações. Mas não é só o Guazzelli fala com bem menos entu-
Fundo das Nações Unidas para a Infân- governo. É também e principalmente a siasmo do quadro que encontrou na
cia (UNICEF), Pedro Táçon, avaliou comunidade, o agrupamento de indivi- fundação, resultante dessa tentativa de
em 20 milhões o número de menores duos e instituições (. . .). É a comuni- militarização, Afirmou que, entre 1966
carentes no Brasil. Já no ano seguinte, dade que tem que se unir, tomar cons- e 1979, a FUNABEM treinava "jovens
Libonis Siqueira, ex-presidente da As- ciência e agir. O governo deve ser cha- segundo normas disciplinares rígidas,
sociação Brasileira de Juízes de Meno- mado apenas para assistir técnica e fi- estilo militar, para posteriormente se-
res, disse que O Brasil possuia 30 mi- nanceiramente os programas, e não rem utilizados em funções disciplina-
lhões de menores nessa situação. Ce- para executar trabalho social." Era res". Chocou-se ao constatar que "me-
sare Florio La Rocca, consultor da uma conclamação às instituições bene- ninos eram obrigados a aprender mar-
UNICEF, estimou a existência de 32 ficentes religiosas e civis, como o Ro- chas militares e a cumprimentar autori-
milhões de menores carentes no Brasil. tary, Lions, etc. dades com continência. Muitos eram:
Este mesmo número é confirmado por Os homens do novo regime tinham forçados - sob pena de serem tortura-
Terezinha Saraiva, presidente da FU- os seus métodos prediletos. Porém, dos nos porões - a passar horas diante
NABEM . Portanto, segundo as várias passaram a trabalhar no sentido de in- de retratos do presidente da República,
estimativas, de 15 a 30 milhões de me- cutir nos jovens sob sua responsabili- aprendendo a fazer continência, em
nores se encontravam na situação de
carentes, abandonados ou infratores.
Uma cifra terrível,
Não se pode negar que o regime ins- Substituindo o SAM, em
talado no País com o golpe de 1964 se 1964, a FUNABEM (ao
preocupou com a questão do menor e lado, internos numa
implantou mudanças no seu trata- unidade, no Rio) chegou
mento. Criou a FUNABEM, em 1o de aos anos 80 com a
dezembro de 1964, com a Lei no 4.513, mesma triste fama do
que extinguiu o SAM. Este era ligado antigo Serviço de
ao Ministério da Justiça, revelando Assistência ao Menor.
uma visão policial sobre o problema do Com a posse de governos
menor. A nova entidade seria encarre- democráticos em vários
gada de implantar uma Política Nacio- Estados, novas tentativas
nal de Bem-Estar do Menor e foi insti- estavam surgindo em
tuída como entidade autônoma, pas- 1983-84, para resolver
sando em 1974 a vincular-se ao Minis- os problemas do menor.
tério da Previdência e Assistência So- Na pág. ao lado,
cial, então criado, internos da FEBEM (SP)
302
313hnCOA,p 46
BR DFANBSB VB.GNC.AMA, $40443
hi
Juca Martins F4
neiro Alyrio Cavalieri vai além. Reali- objetivos específicos, como abrigar os
O
zou um levantamento demonstrando óriãos dos imigrantes italianos vitima-
que, de cada 100 menores presos no dos pela febre amarela. A Casa dos Ex-
Rio, 84 moram em favelas e 78 são postos, criada em São Paulo em 1896,
L
oriundos de famílias com renda mensal visava a recolher crianças rejeitadas pe-
Na zona rural, 45,4% da população entre inferior a um salário mínimo. Perce- las mães e abandonadas nas portas de
dez e 17 anos já trabalhavam bendo que a causa da criminalidade do casas ou em encruzilhadas de ruas. No
menor é essencialmente social, o juiz plano institucional surge, em 1935, tam-
testes de resistência e de capacidade de mostrou que o problema de fundo é a bém em São Paulo, o Serviço Social de
obedecer a seus instrutores". - desordem na produção econômica do Assistência e Proteção de Menores, li-
Com a posse de governos democráti- País, que marginaliza milhões de gado à Secretaria da Justiça e Negócios
cos em vários Estados, novas práticas famílias. Ou seja, o problema não co- do Interior.
estavam surgindo em 1983-84. Maria meçava na família e por isso não podia Ao mesmo tempo, nascem e se de-
Cecília Zilliotto, ex-presidente da FE- ser resolvido com uma política econô- senvolvem as instituições e a legislação
BEM (Fundação Estadual do Bem- mica que garantiu a liberdade de livre de punição e controle. No Estado de
Estar do Menor, órgão do governo iniciativa aos capitais estrangeiros e à São Paulo, já em 1902, surgia o Insti-
paulista ligado à Secretaria da Promo- produção para o consumo elitista. O tuto Disciplinar para Reeducação, Ins-
ção Social, criado em 1976), propunha juiz chegava a afirmar que o problema trução Literária, Industrial e Agricola
uma alteração na estrutura de atendi- do menor só poderia ser resolvido com de Menores, hoje transformado no Ins-
mento ao menor. Era de opinião que a a reorganização econômica do País. tituto Educacional e Colônia Correcio-
FEBEM deveria fechar, sendo substi- nal da FEBEM. Em 1924, surgiu o
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L& a V/omaif
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10176 p»
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tuída por instituições abertas de atendi- Juizo Privativo de Menores da Co-
mento ao menor na comunidade. Assu- cada em a escraraão ar? marca da Capital e, 30 anos depois, o
mindo a presidência da entidade no ini- Recolhimento Provisório de Menores.
cio do governo Montoro, em 1983, ela Logo depois da independência poli- No nível federal, surgiu, em 1913, o
criou nove Casas da Juventude, onde o tica do Brasil, em 1822, quando o Es- Instituto Sete de Setembro, que em
atendimento assistencial incluía a pro- tado começou a preocupar-se com a 1941 transformou-se no SAM.
fissionalização do menor. criança, os dirigentes voltaram seus Enquanto isso, com a abolição da es-
Nessa mesma linha de atuação, em olhos para o menor escravo. Na Consti- cravatura e o início da industrialização,
1984, a unidade da FEBEM de Mogi- tuinte de 1823, José Bonifáfio apresen- voltava a difundir-se o trabalho infantil,
Mirim, interior paulista, onde eclodira tou um projeto onde a linguagem reve- a tal ponto que, em 1983, segundo a
violenta revolta em 1980, firmou um lava mais preocupação com a manu- PNAD (Pesquisa Nacional por Amos-
contrato de prestação de serviços com tenção da mão-de-obra do que consi- tra de Domicílios), quase sete milhões
a firma americana Monroe Auto-Peças deração com a humanidade da criança de menores estavam integrados na
S/A, que produz amortecedores na ci- escrava: "A escrava, durante a prenhez força de trabalho. Na zona rural, 45,4%
dade. Os garotos daquela unidade co- e passando o terceiro mês, só será ocu- da população entre dez e 17 anos traba-
meçaram a trabalhar na seleção e recu- pada em casa; depois do parto terá um lhavam e muitas crianças menores de
Cristina Villares/F4
Nair Benedicto/F4
sransse va.GNe.aaa, 2404123 3anco 2, p A4
dez anos, certamente, também estavam 5.274, do mesmo ano, estabeleceu o sa- ticipação crescente das mulheres no
trabalhando. Assim, ao abandono se lário mínimo do menor (50% do salário mercado de trabalho, deixando a mãe
somava o abuso do trabalho precoce e mínimo regional para os menores de 16 de ser a "educadora natural dos filhos".
espoliativo. anos e 75% para os menores entre 16 e A falta de "educadora natural" era
As leis sobre o trabalho do menor 18 anos). A mesma lei obrigava as em- mais sentida ainda porque, em 1980,
buscam regular as condições em que se presas a empregar menores (mais de praticamente um terço das crianças
dá esse trabalho, fixar uma idade mi- 5% e menos de 10% do quadro de fun- brasileiras com idade de sete a 14 anos
nima para os trabalhadores e o salário cionários). Essa lei, que muito deve ter não recebiam nenhum tipo de atendi-
do menor. Surgiram inicialmente como colaborado para reforçar o arrocho sa- mento escolar.
medidas de proteção à infância e eram larial, só foi revogada em 1974, mas a O importante papel da família sem-
reivindicadas pelo movimento operário idade mínima de 12 anos se mantinha pre foi ressaltado por aqueles que se
nascente. Na sua evolução, porém, em em 1984. debruçaram sobre a questão do menor.
alguns momentos, visaram a empurrar Os participantes da X Semana de Estu-
uma massa de menores para dentro das ts condições de vida são dos consideraram a internação como o
fábricas, sancionando sua exploração. piores que a vida das ruas último recurso, argumentando que "a
A primeira lei brasileira de proteção criança internada desenvolve-se em
do trabalho dos menores é de 1891. Ela Os defensores da redução da idade condições desfavoráveis, que predis-
proibia o trabalho noturno em certos minima afirmavam que, com o estado pôem ao aparecimento de múltiplos
serviços, estabelecia a idade minima de pauperismo da população, seria im- problemas de comportamento", e, mais
em 12 anos e estipulava que a jornada portante que a criança pudesse ajudar ainda, que a "ruptura dos laços afetivos
de trabalho máxima seria de sete horas no sustento da família e que seria me- familiares arrasta a consequências de-
para as meninas de até 15 anos e para lhor para ela trabalhar que ficar va- sastrosas", porque "a privação de afeti-
os meninos de até 14. Ela ficou sem diando nas ruas. Mas o depoimento do vidade e carinho age na criança como
aplicação, assim como o Decreto no professor João Batista de Arruda Sam- se fosse castigo corporal, provo-
16.300, de 1923, que reduziu a jornada paio na X Semana de Estudos do Pro- cando reações defensivas, que podem
de trabalho para seis horas para todos blema do Menor, realizada em São se converter em agressividade contra a
os menores de 18 anos. O Código de Paulo, em 1971, revela um mundo onde sociedade".
Menores de 1927 manteve os 12 anos as condições de vida são piores que a Mesmo o dr. Altenfelder, primeiro
como idade mínima para O trabalho, vida das ruas: "Quando não se lhes presidente da FUNABEM, ao aplicar a
mas proibia o trabalho noturno e nas usam os pulmões como foles nas fábri- política assistencialista do regime para
praças públicas dos menores de 14 a- cas de vidro, são eles, esse pariazinhos o bem-estar do menor, afirmava que "a
nos. sociais, empregados em trabalhos ma- sociedade deve ser organizada de tal
Foi em 1932, com o Decreto no nuais de nenhuma significação profis- forma que a família encontre meios ca-
22.042, que a idade mínima foi elevada sional, de puro automatismo. Ao cabo pazes de ajudá-lana criação e educa-
para 14 anos. Este limite se manteve na de algum tempo, gastos, depauperados, ção dos filhos". Só não poderia explicar
Constituição de 1934, na de 1937, na sem perspectiva de um trabalho qualifi- como fazer isso com um modelo eco-
Consolidação das Leis do Trabalho de cado, ingressam, aos 18 anos, na grande nômico excludente que gerôu, em
1943 e na Constituição de 1946, que legião das massas amorfas." 1980, mais de quatro milhões de
proibiu a diferença de salário entre me- O desenvolvimento harmonioso da famílias com renda mensal per capita
nores e maiores e o trabalho noturno criança exigiria que suá socialização menor ou igual a um quarto do salário
de menores de 18 anos. fosse feita pela família e complemen- mínimo. Família cujas crianças, se não
Na Constituição de 1967, o Regime tada pela escola. Já em 1975, a CPI do forem abandonadas, certamente esta-
Militar baixou a idade mínima nova- Menor apontava como uma das causas rão sendo empurradas- para o trabalho
mente para 12 anos e eliminou a proibi- da marginalização crescente dos meno- precoce, para o desalento, para as ruas,
ção de diferenças nos salários. E, já res brasileiros a de egação familiar, enfim para o embrutecimento sob di-
dentro da nova orientação, a Lei no provocada pela urbanização e pela par- versas formas.
304
BR DFANBSB VB.GNCAMA
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A partir dos anos 50, a capoeira (ao lado,
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2 gravura de Rugendas) enfrentou a
A opressão feroz dos senhores de en- longo dos anos de escravidão. mental para sua defesa, durante mui-
genho e a necessidade de um meca- A capoeira é uma luta. Mas uma luta tos anos. E só quando os exércitos
nismo de defesa que pudesse ser apli- que disfarça-sua violência, sua capaci- portugueses haviam adquirido arma-
cado na prática contra feitores brutais dade de destruir o adversário numa mentos mais poderosos e sofisticados,
fizeram nascer no Brasil uma das mais aparente dança ao som de cantos de como escopetas e canhões leves, foi
fortes manifestações culturais de resis- trabalho. E surgiu assim pela necessi- possível realmente arrasar e derrotar os
música e violência, a capoeira foi-se sibilidades de conseguirem armas e mu- Após a abolição surgem as
chegavam aos borbotões para trabalhar o próprio corpo, descobrindo que a ve- Mas, nascida como instrumento de
nos canaviais e fazendas, desde pratica- locidade e a ginga da dança - que ha- resistência e libertação, a capoeira
mente o início da colonização. viam trazido da África - poderiam ser sempre foi vista como uma prática
Membros de nações diferentes, com aliados poderosos. Misturou-se aí o co- marginal e perigosa, símbolo de crimi-
línguas diferentes, religiões, cultos e ex- nhecimento do funcionamento de seus nalidade ao longo de todo o Brasil co-
periências diversas, os negros foram instrumentos de trabalho - o martelo, a lonial e mesmo durante a República
obrigados, para se entenderem, a foice, as enxadas -, que vieram dar ori- Velha. A condenação mais dura da ca-
aprender a própria linguagem do gem a uma série de golpes que imitam poeira acabou-se dando nos anos que
branco, a adaptar-se aos seus rituais, a suas funções. Acrescente-se ainda as se seguiram à libertação dos escravos.
compreender seus mecanismos cultu- várias formas de defesa de animais: a Multidões de trabalhadores negros,
rais. Essa situação, que poderia parecer marrada, a pancada seca com o rabo, o abandonando as roças, chegaram às ci-
mais um instrumento de dominação, coice de uma mula, o estapear dos feli- dades maiores, como o Rio de Janeiro,
acabou servindo para a criação de uma nos. Criou-se então um sistema de gol- Recife e Salvador, em busca de empre-
nova cultura, muito rica, composta de pes de surpreendente eficácia, mas gos. Sem qualificações, sem nenhum
elementos fundamentais das diversas adaptado muito mais à defesa do que tipo de apoio, foram-se instalando nas
nações africanas, modificadas pelas ao próprio ataque. Uma luta rápida, periferias, vivendo de pequenos expe-
condições de trabalho e vida no novo onde se devia tocar o mínimo possível dientes, humilhados, famintos. E se
país. E a capoeira, ao lado do candom- no adversário, geralmente bem mais ar- constituiram no caldo ideal para o apa-
blê, pode-se afirmar, foi a manifestação mado e equipado. -Uma luta de bate- recimento de assaltantes e ladrões, que
aparente mais decisiva de todo o pro- pronto, própria para fugas, pois sua fi- viam nessa atividade a única saída para
cesso de resistência desencadeado ao nalidade 'principal não era derrotar to- a fome e a miséria.
305
Sem armas e munições, os escravos semimarginal por muitos anos.
criaram a capoeira, luta baseada na Transformou-se em folclore, em espe-
ginga, em que os golpes imitam asfunções táculo a que turistas podiam assistir no
dos instrumentos de trabalho, como o velho Mercado Modelo de Salvador. E
martelo e a foice, e as formas de defesa seu desenvolvimento veio dar-se, curio-
animais, como a marrada e o coice. samente, no rastro da invasão cultural
' Tinha como finalidade derrubar e americana da década de 60.
imobilizar momentaneamente o Terminada a Guerra da Coréia, em
adversário, para possibilitar a fuga 1953, e consolidada a influência ameri-
cana em boa parte do Oriente, algumas
das manifestações culturais da região
passaram a ser encaradas como curiosi-
Abril Press
dades pelos dominadores, que pode-
riam "comercializá-las" através do
mundo, destacando seu ar de mistério.
Assim, algumas artes marciais japone-
sas, chinesas e coreanas começaram a
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entre os unroersatarios
Constituiram, então, espontanea- sem, contudo, ter feito qualquer esfor- Por essa ocasião, quando cresciam
mente, as maltas de capoeiristas que usa- ço para torná-la uma atividade esporti- os movimentos estudantis e mesmo de
vam sua técnica para assaltos fulminan- va nacional. Continuava restrita a mar- trabalhadores e intelectuais contra a
tes e enfrentamentos com a polícia, ginais, a negros e brancos pobres, indig- excessiva dominação cultural que os
Além disso, eram guardas ótimos para na como a miséria que sempre repre- Estados Unidos estavam impondo aos
altos funcionários e grandes proprie- sentou. 1 países pobres, a capoeira voltou a sur-
tários, a quem alugavam seus serviços. Foi bem mais tarde que a capoeira gir, principalmente entre universitários,
O governo não teve dúvidas. Declarou retomou seu crescimento, a partir de como uma nova resistência. E foi a par-
criminosos a todos os praticantes de ca- uma formalização e organização que tir daí que retomou sua força e
poeira e, no final do século passado, mestre Bimba, um dos principais mes- transformou-se no que é hoje: prati-
quem fosse pego jogando capoeira po- tres da capoeira baiana, procurou dar à cada por milhares de jovens, em todo o
deria ser condenado ao desterro e pri- luta, através da criação do Centro de País, reconhecida como esporte, orga-
são na ilha de Fernando de Noronha. Cultura Física Regional, em Salvador. nizada para campeonatos através da
É natural que com uma repressão Mais ou menos na mesma época, outro Confederação Brasileira de Desportos
tão brutal a capoeira se tenha tornado mestre baiano, o pescador Pastinha, e crescendo continuamente com a for-
ainda mais disfarçada, incorporando montava seu grupo de lutadores, num mação de federações, associações e
mais e mais elementos de dança, para estilo ligeiramente diferente do ado- grupos. E vai aos poucos readquirindo
que pudesse sobreviver. E somente tado por mestre Bimba, com um jogo seu caráter cultural de resistência, que,
sobreviveu graças ao seu estilo solto, mais próximo ao solo, em movimentos muito mais importante do que sua efi-
sem muitas regras, que podia ser passa- mais acrobáticos, que chamou de An- cácia como luta ou defesa pessoal, é
do para os mais jovens com certa facili- gola. Mas a estrutura da luta manteve- sua maior força. Uma característica
dade, nos pequenos quintais fechados se a mesma, com a mesma dança gin- única, capaz de manté-la tão viva e
ou nas areias das praias. Essa situação gada, os mesmos toques, as mesmas forte como a própria necessidade de li-
de marginalidade durou até pratica- maneiras de encarar o adversário. berdade que a gerou nas senzalas mais
mente 1937, quando Getúlio Vargas Mesmo depois de codificada e orga- escuras e brutais. '
aboliu o caráter criminal da capoeira, nizada, a capoeira manteve seu caráter Murilo Carvalho
306
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, , p 49
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 24044334 NCO A, p 50
)
A pesquisa histórica propriamente
dita no País só começaria no século 19,
POLÍTICA/HISTÓRIA: a interpretação oficial da história brasileira
Biblioteca Nacional
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Oliveira Vianna produziu o primeiro trabalho de história social, Nos primeiros anos da República, destacou-se o patriotismo
embora racista e autoritário. exacerbado do Conde Afonso Celso
Martin, por exemplo. Por outro lado, a queza de seu conteúdo, Vianna (que se- historiografia marxista com a publica-
impossibilidade de compreensão de ria um dos ideólogos principais do auto- ção de sua obra História da Literatura
qualquer processo significativo de nossa ritarismo no Estado Novo) se pauta por Brasileira: seus Fundamentos Econômi-
história deixa os cidadãos à mercê de toda uma postura racista e autoritária. cos. Mais tarde, sob o impacto do clima
uma imensa confusão de nomes e fatos. Precisariamos esperar os anos 30 para de mobilização popular do início dos
Sérgio Porto, o saudoso Stanislaw ver o surgimento de três obras que An- anos 60, ele reuniu um grupo que fez
Ponte Preta, satirizou brilhantemente tonio Cândido considera essenciais uma importante tentativa de recolocar
esse caos histórico dos brasileiros no para uma nova forma de ver o Brasil o povo e a realidade social no cenário
seu Samba do Crioulo Doido: "Foi em contemporâneo, a partir da compreen- histórico: História Nova do Brasil, que
Diamantina/ Onde nasceu J.K ./ Que a são de sua realidade social. se ressente de uma ótica excessiva-
Princesa Leopoldina/ arresolveu se ca- mente programática, mas que serviu
sar/ Mas Chica da Silva/ Tinha outros Caio Prado introduziu a análise conio arma ideológica contra o oficia-
pretendentes/ E obrigou a Princesa/ a marxista do desenvolvimento lismo tradicional. Na década de 60,
se casar com Tiradentes." principalmente depois do golpe de 64,
A historiografia oficial sempre se As duas primeiras são de 1933: Casa cientistas sociais paulistas, com desta-
ocupou basicamente de nossa história Grande e Senzala, obra monumental de que para Florestan Fernandes, reforça-
política, território de "heroismos." Há Gilberto Freyre, abriu nossa história à ram a tendência de pesquisas em nossa
algumas exceções importantes, como a investigação sociológica. Evolução Poli: história social nos meios universitários,
de Capistrano de Abreu, revisor crítico tica do Brasil, aguda análise de Caio enquanto Celso Furtado criava discipu-
e sério de nossa história, que, com seu Prado Jr., introduziu entre nós a análise los com sua Formação Econômica do
magistral Capítulos de História Colonial marxista do desenvolvimento. A ter- Brasil. Em 1984, ainda temos poucos
(1907), abriu novos horizontes para a ceira, de 1936, Raízes do Brasil, com a produtos, parte deles em linguagem e
compreensão do processo brasileiro. erudição de Sérgio Buarque de Ho- em edições pouco acessíveis. Mas o nú-
Para o oficialismo dominante, era difí- landa, revelou um historiador capaz de mero de pesquisas sobre a história da
cil tratar da história social brasileira induzir à reflexão ampla sobre o ser so- classe operária brasileira e sobre movi-
sem trair a política de ocultamento sis- cial brasileiro, no quadro de uma notá- mentos sociais e lutas de minorias,
temático da vida, dos costumes e das vel preocupação com a pesquisa em atualmente em curso nas universidades,
lutas das camadas subalternas. profundidade. mostra que as crianças ainda têm al-
O primeiro trabalho especificamente Depois desses trabalhos, iniciou-se guma esperança de superar a mentira e
de história social data de 1920; Po- um lento processo de mudança, ainda o crioulo doido.
pulações Meridionais do Brasil, de Oli- em curso. A partir de 1938, Nélson
veira Vianna. Entretanto, apesar da ri- Werneck Sodré ampliou o campo da Ricardo Maranhão
308
+ pranaese va.encaaa,404433 Jan 002 , p5J
5R DFANBSB VB.GNCAMA, 294044334 , 932
. )
Gauchescos, Lendas do Sul, Casos do Ro-
mualdo), onde, pela recuperação da
fala do gaúcho sulino, o , escritor
culto recria todo um mundo fragmen-
tário e evanescente, o do "populário",
como ele mesmo dizia, renegando o
termo folclore. São obras que cristali-
zam "tipos de escrita", na literatura
brasileira moderna: uma, a grande an-
gular explicativa; outra, o ouvido dirigi-
do a registrar os falares de uma época.
Em ambas, o silêncio dos que não tive-
ram monumentos.
Neste enredo, que chega aos anos
50, o Brasil migra por inteiro, no roman-
ce social do Nordeste, como nos de Ra-
chel de Queiroz (O Quinze) e José Lins
do Rego (Fogo Morto, Menino de Enge-
nho), e também nos romances urbanos,
como em Os Ratos, de Dionélio Ma-
chado, O Triste Fim de Policarpo Qua-
, resma, de Lima Barreto, O Amanuense
Belmiro, de Cyro dos Anjos. Pois o Bra-
sil migra principalmente no tempo, da
Machado de Assis (1839-1908): um escritor deaguda ironia velha ex-colônia agrária, exportadora,
para os dramas da modernidade capita-
ARTES/LITERATURA: uma análise ,da literatura brasileira lista. Os velhos coronéis sonhavam com
café, leite, charque, borracha e cana-
de-açúcar. Mal sabiam que se engen-
dravam o sufrágio universal e o futebol.
Sambas-enredo
Nos anos 20, uma atualização
Do Império aos nossos dias, do romance de Alencar à da inteligência nacional
memorialística da repressão, a literatura brasileira nos legou
Na literatura, este é um período rico
alguns dramas da terra - os sambas-enredo em migração de idéias. O grupo moder-
nista de São Paulo, os Andrade Mário e
Uma nação é como um samba- aceito como um enredo de tipo cômi- Oswald à frente, empurram o Brasil
enredo, onde as diferentes alas apre- co, de integração nacional, no tempo do para a prosa fragmentária e a poesia do
sentam o seu número e onde um coefi- Império. Integrar a Nação, fazê-la he- verso livre, do branco verso negro e
ciente de desordem salva o conjunto de roína de uma nova aventura redentora mestiço e de todas as cores, muito lon-
repetição mecânica. Donde se segue da civilização, dar-lhe um lugar no con- ge das melódias do fim do século, numa
'que uma nação não é um samba- certo das civilizadas terras européias, atualização sem precedentes da inteli-
enredo, mas um composto, ou melhor, tal foi o núcleo central de sucessivas ge- gência nacional. Medrava, de par com
um superposto de sambas-enredo, uma rações românticas. O romance de José a tragédia do migrante, uma autêntica
memória viva e cambiante de tudo oo de Alencar e a poesia indianista de redescoberta do Brasil e uma (re)nas-
que foi e deixou de ser. Gonçalves Dias talvez sejam as realiza- cente urbanidade. A oligarquia corneli-
Ao longo da história brasileira houve ções melhor acabadas desse projeto, in- cia transformava a colônia em futuro
alguns sambas-enredo que se tornaram clusive por seu conteúdo crítico em re- cartão postal, acabando com seus res-
clássicos, e a literatura sempre foi privi- lação à mundanidade da Corte e ao quícios nas grandes cidades, abrindo
legiada em revelá-los e dar-lhes forma. projeto colonial que nos deu origem, avenidas a torto e à direita, construindo
Aqui, para melhor compreensão do te- ou pelo menos certidão de batismo e mansões e passeios públicos. Cresciam
ma, cabe tratar de uma distinção teóri- heráldica portuguesa. Machado de As- as vilas operárias e as fábricas de tijolo
ca. A tradição literária admite dois ti- sis passou esse projeto no pente fino de vermelho, enquanto o foot-ball passava
pos de enredo, isto é, de imitações das sua ironia aguda. a ser futebol mesmo, deixando os clu-
ações humanas no plano do imaginário. Com o advento da República (a dos bes de elite, de sport, migrando para os
Um é o tipo trágico, onde a ação se or- coronéis da terra) ganhou-se um novo arrabaldes e subúrbios. !
ganiza do ponto de vista de uma perso- enredo clássico, que se poderia chamar A realização maior de todo esse ciclo
nagem que se vê excluída de um corpo de a tragédia do migrante. A primeira desaguará na obra de Graciliano Ra-
social. O outro é o tipo cômico, onde a obra capital do novo enredo é Os Ser- mos, principalmente em seus três me-
ação se organiza do ponto de vista de tões, de Euclides da Cunha, onde se lhores romances - São Bernardo, An-
uma personagem que se vê incluída, narra, entre o relato jornalístico e a gustia e Vidas Secas - e em seu depoi-
ou aceita, num corpo social tido como : idéia de fazer ciência, entre documen- mento Memórias do Cárcere, sobre o
desejável. tal e épico, o massacre de Canudos.Ou- ano e meio em que esteve nas diferen-
No imaginário - vale dizer, num pla- tra obra de capital importância que tes prisões do Estado Novo. Em con-
no mais real que qualquer outro -, o inaugura esse segundo enredo é a do junto, a literatura desse tempo fixa pa-
Brasil começou predominantemente contista Simões Lopes Neto (Contos drões de leitura que perduram quase
309
BR pransss v.enc.ama, 34041931 p53
FERREIRA GULLAR
Editõra Universitária ª
que no ciclo anterior fora de tudo -da Ao longo da história brasileira, Que é Isso, Companheiro, indiscutivel-
geração de 45, do engajamento, da van- alguns escritores revelaram e deram mente o grande bom livro da série de
guarda. A partir da experiência dura do forma a samba-enredo. Na pág. ao Fernando Gabeira, Os Carbonários, de
exílio ele encontra seu melhor "pon- lado, Graciliano Ramos (extrema esq.) Alfredo Syrkis, e muitos outros. Esse
to de linguagem", dizendo, em seus Guimarães Rosa (centro) e Antônio elan de memória foi sem dúvida insu-
poemas, do Juniverso do "homem co- Callado. Também Ferreira Gullar flado pela obra do médico Pedro Nava,
num", do nordestino recrescido no (acima, à esq., capa de seu livro João em seis livros, sob cujo olhar passa boa
Rio, das queimadas do exílio e do Boa Morte), Clarice Lispector, Pedro parte das mudanças dramáticas de que
corpo desejoso de memória. Nava (acima) e Fernando Gabeira esse mesmo artigo, de modo incom-
Na ficção narrativa, o grande fio pleto, dá conta.
condutor é o narrar da violência que, Deve-se ainda assinalar o renasci-
ao se institucionalizar, atravessa toda a mento atual de um indianismo às aves-
paisagem - assim como, por exemplo, sas, desejoso de repensar nossas ori-
a fome fora um dos grandes fios narra- gens, onde vamos encontrar de novo
tivos da década de 30. Os anos 50 e 60 Antônio Callado, com A Expedição
fixaram quatro grandes balizas para o Montaigne, e Darcy Ribeiro, com Mai-
conto brasileiro moderno; a linguagem ra, e que o desencanto certamente fa-
mítica de Guimarães Rosa, a prosa iínti- vorece uma literatura sardônica, de
ma de Clarice Lispector, o inventário leve inspiração picaresca, de que Már-
da violência de Rubem Fonseca e o cio de Souza, por vezes, como em al-
mundo da marginalidade social de João guns momentos de Galvez, O Imperador
Antônio. Entre esses marcos crescerá do Acre, tirou bom proveito literário.
toda uma geração de contistas, particu- Ainda é prematura qualquer síntese
larmente no Rio Grande do Sul e Mi- desses tempos. Pode-se dizer que ser
nas Gerais. foram certezas e ingenuidades antigas,
Depois de Quarup, Antônio Callado, e que, atravessada por um canto geral
no romance, continuará a temática re- de ausência e dispersão, a arte, a literá-
volucionária, principalmente, como ria em particular, não se crê mais teste-
não podia deixar de ser, pelo lado do munho fiel, como em 30, nem alavanca
desencanto e da derrota. Nessa esteira da história, como em 60, nem mesmo
se vão Bar Don Juan, Reflexos do Baile como criadora de um território livre,
e o mais recente Sempreviva, que re- como no século passado, mesmo se sob
trata os tortuosos caminhos da volta do o signo da ironia mais cruel, como a de
exílio. Outros romances cuja leitura se Machado. Olhar mais de desencanto,
impõe como um "retrato" dessa época embora não derrotista, ela vem-se pro-
são Zero, de Ignácio Loyola Brandão, duzindo melhor, mesmo, como o espe-
e A Festa, de Ivan Angelo, além de lho da distorsão, a surpreender a histó-
Cabeça de Papel, de Paulo Francis. ria em seus avessos.
Mais recentemente a curiosidade sobre
os anos de maior repressão favoreceu a
memoralística, por, onde entraram -O Flávio Aguiar
311
BR DFANBSB V8.GNCAAA, 8404133 1 Incor, p5S
Cintos apertados
A fórmula de reajuste serve para simplifi- economia brasileira nas mãos. tanto, seria rejeitado pelo Congresso
car e destraumatizar a aplicação dos rea- O primeiro desses decretos, o de nú- Nacional, em 19 de outubro, a despeito
Jjustes de salários nos dissídios coletivos. mero 2.012, de 25 de janeiro de 1983, de Brasília ter sido colocada sob "Es-
Esses não são mais decididos na base de retirou de quem ganhava até três sa- tado de Emergência" e tomada pelas
pressões e greves, mas por um rápido cál- lários minimos o direito de ter reajustes tropas do general Newton Cruz.
culo matemático. com índices 10% superiores ao Índice O quarto decreto, no 2.064, vigorou
No futuro, quando os historiadores este para as demais faixas. tona apenas como trunfo do governo
organizarem os fatos indicativos do es- No segundo, o Decreto-Lei no 2.024, em suas negociações com setores polí-
gotamento do Regime Militar, instau- de 25 de maio de 1983, o governo, ticos após a rejeição do Decreto no
rado no Brasil a partir de 1964, não po- diante da reação popular, recuaria um 2.045.
derão deixar de fazer referências ao pouco, estendendo para quem ganhava Fruto dessas negociações, o governo
que aconteceu, em 1983, em torno da até sete salários mínimos os reajustes deu à luz o Decreto-Lei no 2,065, em 27
política salarial: nada menos do que com base em 100% do INPC. de outubro de 1983, um pouco mais
quatro decretos-leis foram baixados, O terceiro, o Decreto-Lei no 2.045, condescendente que os anteriores so-
entraram em vigor e depois foram re- foi baixado em 13 de julho com a chan- bre os reajustes das faixas acima dos
vogados, no curto espaço entre janeiro cela do Conselho de Segurança Nacio- três salários mínimos. O decreto previa
e outubro daquele ano, Cada um deles nal. Era um recado claro de que o gover- também a reintrodução gradativa das
correspondeu a uma tentativa de fazer no não estava mais disposto a transigir: o negociações diretas entre empregado-
passar goela abaixo dos trabalhadores decreto previa violento arrocho, im- res e empregados na discussão dos rea-
uma cavalar dose de arrocho salarial pondo sobre todas as faixas salariais a justes salariais. Depois de duas décadas
exigida pelo FMI (Fundo Monetário obrigatoriedade de reajustes de apenas fixando as regras e fórmulas da política
Internacional), então com as rédeas da 80% do INPC. Este decreto, entre- salarial - postura mais própria dos Es-
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34 an 002, p54
Iconographia
de outubro de 1984, a despeito de man-
ter a imposição de reajustes nunca su-
periores a 100% do INPC, já admitia,
explicitamente, a direta dos Comício pelo aumento do salário mínimo, Rio, em 54, no governo Vargas
índices de reajustes, no intervalo entre
80 e 100% do INPC, para as faixas su- O Brasil foi o 12o pais do mundo, e necessário para que se mantenham vi-
periores a três salários mínimos. A ne- um dos primeiros da América Latina, vos após cada dia de labuta.
gociação direta estava, assim, voltando a incorporar em sua Constituição um Terceiro, ao estabelecer níveis dis-
ao vocabulário na política salarial. artigo específico estabelecendo o di- tintos para o salário minimo em re-
Como acontecia no Brasil até 1965. reito de todo cidadão receber um sa- giões diferentes, a lei passava por
lário nunca inferior a certo nível. A cima de um princípio universal de jus-
Em 1963, surge o Conselho Constituição de 1934 fazia referência tiça: para trabalho igual, salário igual.
Nacional de Política Salarial ao salário mínimo em seu Artigo 121. Quarto, as Comissões de Salário
Coube à Lei no 185, de janeiro de . Mínimo realizaram levantamento em
Antes, o Estado estipulava apenas as 1936, definir seu conceito e instituir as todo o País, mas não para definir o
variações do salário mínimo, cujo valor Comissões de Salário Minimo para custo de todos os bens e serviços es-
foi decretado pela primeira vez, em realizarem os estudos com vistas à fi- senciais, na quantidade definida pela
1940, por Getúlio Vargas, e os reajustes xação do seu valor. Essa lei foi regula- lei. O que se fez, de fato, foi um le-
do funcionalismo público e dos empre- mentada pelo Decreto-Lei no 399, de vantamento geral sobre os níveis sala-
gados das autarquias, empresas estatais 30 de abril de 1938, Em seu artigo 2o, riais mais baixos pagos em todo o
e empresas concessionárias de serviços denominava-se o salário mínimo País, que foram então legalmente re-
públicos. Para coordenar os cálculos como "a remuneração mínima devida ferendados.
desses reajustes, O governo federal a todo trabalhador adulto, sem distin- Quatro décadas depois, esse rol de
criou, em 1963, o Conselho Nacional ção de sexo, por dia normal de ser- injustiças pouco mudou. É certo que
de Política Salarial (CNPS). Enquanto viço, e capaz de satisfazer, em deter- foi instituído, em 1963, o salário-
isso, o surgimento de grandes empre- minada época e região do País, as família - irrisórios 5% do salário mi-
sas, a consolidação da classe operária e suas necessidades normais de alimen- nimo para cada filho de até 14 anos. É
sua crescente organização, sobretudo tação, habitação, vestuário, higiene e certo também que o salário mínimo
nos anos 50, iam soterrando a velha transporte". Finalmente, no dia 1o de seriaunificado para todo o País, pelo
praxe dos acordos individuais de traba- maio de 1940, Getúlio Vargas fixava Decreto no 89.589, de 26 de abril de
lho - emque cada empregado nego- os primeiros níveis do salário mínimo 1984, consumando uma vitória impor-
ciava o seu salário com o patrão -, de- em todo o País, através do Decreto- tante para os trabalhadores, Em 1940
terminando a prática dos acordos Lei no 2.162. foram definidos 14 níveis distintos,
anuais coletivos de trabalho, inicial- mas eles chegaram a ser 38, em 1963.
Getúlio, entretanto, subiria ao pa-
mente nas categorias mais numerosas e A partir desse ano, por pressão do
lanque armado no campo do Vasco
aguerridas. movimento sindical, o número de ní-
da Gama, no Rio, para anunciar, na
O CNPS seria herdado, em 1964, veis foi sendo reduzido até a unifica-
verdade, quatro grandes injustiças
pelo Regime Militar e serviria de tram- ção em 1984. Entretanto, estudos do
contra essa velha aspiração dos traba-
polim para a nova política salarial em DIEESE mostraram que a nivelação
lhadores do Brasil.
gestação e cuja implantação se faria deu-se por baixo. Ou seja, arrochando
Primeiro, a lei que definia o salário
por etapas. Primeiro, ainda em 1964, o os níveis mais altos para diminuir a
mínimo referia-se às necessidades de
governo ampliaria, via CNPS, um me- distância entre estes e os mais baixos.
apenas um trabahador adulto,
canismo de reajustes sobre os salários Assim, se os trabalhadores conse-
esquecendo-se de que, em geral, vive-
do setor público. Depois, em julho de guiram um de seus objetivos históri-
se em famílias.
1965, entrou em vigor a Lei 4.725, atri- cos, um salário mínimo unificado
Segundo, ao definir como essencial nacionalmente, ainda estão longe do
buindo ao governo a responsabilidade
de cálculo dos reajustes salariais em apenas as necessidades de alimenta- outro objetivo: que este salário mi-
ção, habitação, vestuário, higiene e nimo seja real, isto é, assegure efetiva-
todos os setores da economia, através de
fórmulas matemáticas. O pressuposto transporte, a lei esquecia-sé de que, mente a sobrevivência de uma família
era o de que a negociação direta gerava como seres humanos, os trabalhado- trabalhadora. Não perdeu atualidade,
reajustes incompatíveis com os objeti- res têm também direito a educação e portanto, o desabafo de um operário-
vos antiinflacionários da política eco- a lazer, por exemplo. Prevalecia, as- salário-mínimo, já incorporado ao foi-
nômica, além de perturbar a paz social sim, a noção de que aos trabalhadores clore popular: "Cada vez sobra mais ©
com greves, também incompatíveis deve-se pagar apenas o estritamente mês no fim do salário."
com a necessidade de estimular os in- aaa
314
BROFANBSB VB.GNC.AAA, 34041â34 an002ap 5&£
vestimentos e com a política de atração daquele que vigorava 24 meses antes; além de não repor as perdas anteriores,
do capital estrangeiro. A lei estabelecia segundo, porque a inflação "porven- durou pouco. No final de 1968, veio o
que os reajustes não poderiam realizar- tura admitida na programação AI-5; em 1969, a desmobilização dos
se com espaçamento inferior a 12 me- econômico-financeira do governo" se- trabalhadores; e, a partir de 1971, o re-
ses e seriam determinados de modo a ria sempre inferior à inflação real que crudescimento da inflação, fazendo
igualar o salário médio dos últimos 24 se verificaria; terceiro, porque a deter- com que os salários reais voltassem a
meses (e não mais o salário-pico, no minação das taxas de produtividade se cair. Com a reconquista de um espaço
momento do reajuste anterior), acres- faria ao gosto do governo e, em geral, maior de liberdade a partir de 1974, era
cido de uma taxa de produtividade esti- com resultados aquém da realidade. previsível que os protestos dos traba-
mada para o ano anterior e de um per- O achatamento dos salários reais nos lhadores retornassem. E, em novembro
centual que traduzisse a inflação fu- primeiros anos da nova política não po- de 1974, com a Lei 6.147, o governo era
tura, "porventura admitida na progra- deria, é claro, deixar de gerar protestos. forçado a introduzir novas alterações
mação econômico-financeira do go- Foi importante, por exemplo, a greve em sua fórmula salarial.
verno". dos metalúrgicos de Contagem (MG), A partir daí,o salário médio, para o
Para os teóricos do governo, o cál- em 1968. Diante da greve, o governo cálculo do reajuste, passava a ser a mé-
culo dos reajustes asseguraria para os concedeu um abono de emergência de dia dos salários reais dos últimos 12 me-
assalariados uma renda estável, mas 10% para todos os assalariados e reco- ses (e não mais 24 meses), melhorando
que aumentaria na mesma proporção nheceu "distorções" na aplicação da um pouco os reajustes futuros, depois
que a produtividade e a riqueza do fórmula, prometendo acrescentar-lhe do arrocho dos anos anteriores.
País. No entanto, a prática se encarre- um novo elemento para compensar Mas a melhora era muito modesta,
garia de desmentir esses objetivos. subestimações futuras do chamado não repunha as perdas sofridas e, ao to-
Já em 1965, o primeiro ano de apli- "residuo inflacionário" (a tal inflação mar posse, em 1979, o presidente Fi-
cação da fórmula, em São Paulo, por "porventura admitida" na programa- gueiredo já ouvia o pipocar das greves
exemplo, diversas categorias tiveram ção do governo). Esta autocrítica par- anunciando o renascimento do movi-
reajustes em torno de 40%, quando o cial, no entanto, custaria um preço: a mento sindical. Mesmo sem abrir mão
custo de vida subiu 62%. O mesmo de- nova fórmula salarial, agora conside- da repressão às greves, de intervenção
sequilíbrio aconteceria em 1966 e 1967. rada perfeita com o acréscimo do "fa- em sindicatos e da prisão das lideranças
E por quê? € tor de correção" do reajuste, teria du- mais combativas - a praxe desde 1964
Primeiro, porque os reajustes coloca- ração indefinida, enquanto a Lei 4.725, -, o governo foi obrigado a fazer, pela
riam os salários no mesmo nível do valor de 1965, que a criara, previa que ela fi- primeira vez, concessões importantes.
real médio dos últimos 24 meses, um va- casse em vigor por apenas três anos. Através da Lei 6.708, de novembro de
lor evidentemente inferior ao valor real Mas o período de "afrouxo salarial", 1979, foram estabelecidos os reajustes
AH...
ESE aí
Foi O AUMENTO
DE 1971.
315
ar DFANBSB 342002 , p59
simpatizantes, e se transformara na
quarta força eleitoral do País. A cassa-
ção do registro do Partido Comunista,
em 7 de maio de 1947, com base no dis-
positivo citado, era a culminação de
uma série de agressões praticadas pelo -
governo Dutra contra as liberdades de-
mocráticas.
Os partidos majoritários na Assem-
bléia Constituinte de 1946 já haviam
lançado mão de outro expediente vi-
sando ao PC. Estabeleceram que os go-
vernadores de Estado poderiam no-
mear os prefeitos das capitais e de-
veriam nomear os prefeitos de cidades
ita teia 28 EIS es ave m saoR declaradas bases ou portos militares de
excepcional importância. Nas eleições
, I NARE
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d ditas
ao 1
| | Justica e Liberd
M
ade) | 4a Dra.
4 presidenciais e legislativas de 1945, o
Juslga e Liber dade
VOTAE na Ora, PC havia vencido em capitais como
na Dra.
' Rio de Janeiro, São Paulo, Recife
(onde obteve 40% dos votos), Natal e
Aracaju, e em cidades importantes
como Santos, Campinas, Sorocaba,
Olinda, etc. A manobra se destinava a
impedir que os comunistas pudessem
ter acesso às prefeituras dessas cidades.
Em 1950, as restrições à liberdade de
organização partidária sofreriam um
agravamento ainda maior. Pelo Código
Eleitoral de 1945, os partidos - embora
devessem ser registrados no Tribunal
Superior Eleitoral - conservavam
ainda seu estatuto de sociedades civis,
regidas pelo Código Civil. A partir de
1950, porém, a lei passou a considerá-
los pessoas jurídicas de direito público.
Assim, os estatutos, os programas e a
vida dos partidos passaram a ser con-
trolados de fora. Além disso, foram au-
mentadas as dificuldades para a legali-
zação dos partidos: eles deveriam ter
no mínimo 50 mil votos, em pelo menos
Iconographia
Iconographia
glas e símbolos das agremiações extin-
tas pelo AI-2. As condições eram tão
difíceis de cumprir que ameaçavam le-
var ao partido único, forçando os estra-
tegistas do regime, que ainda queriam Em 46, o PC era a quarta força
manter certas aparências democráticas, eleitoral do País (ao lado, a sede do
a determinar que alguns de seus corre- partido, no Rio). Em maio de 47, o
ligionários aderissem ao partido de registro do Partido Comunista é cassado,
oposição, para viabilizar sua existência. assim como os mandatos de seus
Surgiram desse ato de força a Arena e representantes (acima, manifestação
o MDB. contra a cassação). Com o golpe de 64,
crescem as manipulações nas regras
iconographia
319
sr oransss va.ene.aaa, 34041331 an co a p63
Silva, reformaria a Constituição de temporariamente o Congresso e bai- agremiações puderam ser formadas
1967, acabando com os resquícios libe- xava o "Pacote de Abril", criando os (PDS, PMDB, PP, PTB, PDT e PT),
rais que ela continha. senadores "biônicos" (eleitos indireta- algumas com bastante dificuldade e
Durante o governo Médici (1969- mente), que deveriam ocupar um terço provisoriamente.
74), as eleições diretas se limitavam, das cadeiras do Senado e participariam Em 13 de novembro de 1980, era
no Executivo, ao cargo de prefeito das dos Colégios Eleitorais que elegeriam aprovada Emenda Constitucional res-
cidades que não eram capitais nem os dois futuros presidentes da Repú- tabelecendo eleições diretas para go-
"áreas de segurança nacional" ou es- blica. Promovia, também, uma nova vernadores de Estado em 1982. Antes
tâncias hidrominerais. distorção na representação dos Estados que elas se realizassem, porém, o re-
Em 13 de agosto de 1973, para refor- na Câmara Federal, com a elevação do gime efetuaria novas manipulações
car ainda mais a maioria do partido si- limite mínimo de deputados por Estado eleitorais e políticas. Em 1o de janeiro
tuacionista no Congresso Nacionai e a fixação arbitrária de um limite má- de 1982, era criado o Estado de Rondô-
que, funcionando como Colégio Eleito- ximo. Com isso, aumentava as banca- nia, cujo controle pelo partido situacio-
ral, homologaria a indicação do novo das dos Estados mais atrasados (domi- nista era líquido e certo. No dia 19 do
presidente (decidida de fato nos altos nados pela situação) e diminuia as dos mesmo mês, era aprovada lei obri-
escalões das Forças Armadas), o Colé- Estados mais desenvolvidos (crescente- gando os partidos políticos a terem
gio foi modificado, acrescentando-se, mente oposicionistas). Por fim, alterava candidatos em todos os níveis, impe-
aos membros do Congresso Nacional, a composição dos colégios eleitorais es- dindo que houvesse coalizões parti-
delegados das Assembléias Legislativas taduais, que deveriam eleger indireta- dárias nas eleições para governadores e
estaduais. mente os novos governadores e os se- prefeitos (pela Reforma Partidária de
Já sob as condições um pouco me- nadores biônicos. 1979, as coligações para a Câmara Fe-
nos opressivas do governo Geisel
deral, Assembléias Legislativas e Câ-
(1974-779), o MDB, utilizando-se de Em 1979, eram extintos maras Municipais). A
relativa liberdade durante a campanha
arbitrariamente Arena e MDB Ficava claríssima a intenção dos és-
eleitoral de 1974, conquista uma vitória
trategistas do regime de neutralizar
extraordinária. Obtém quase o dobro Em parte respondendo a uma das parcialmente o previsível sucesso elei-
dos votos da Arena nas eleições para o reivindicações democráticas da socie- toral das oposições, forçando os parti-
Senado e, ao eleger mais de um terço dade brasileira - a da plena liberdade dos oposicionistas a disputarem uns
dos deputados federais, atinge o de organização partidária -, mas, so- contra os outros. A manobra, entre-
quórum que lhe permitia convocar Co- bretudo, visando a desarticular a ampla tanto, acabaria provocando a incorpo-
missões Parlamentares de Inquérito. frente oposicionista congregada ino ração do Partido Popular ao PMDB,
Tornava-se também majoritário nas MDB, que se fortalecia a cada eleição, com o fortalecimento numérico do
Assembléias Legislativas de São Paulo, o sucessor de Geisel, Figueiredo, pro- maior partido oposicionista.
Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pa- moveu a Reforma Partidária. Em 20 de Embora tenha conseguido eleger os
raná, Amazonas e Acre, o que lhe pos- dezembro de 1979, eram extintos arbi- governadores do Rio Grande do Sul,
sibilitava eleger indiretamente os go- trariamente a Arena e o MDB e esta- Estado majoritariamente oposicionista,
vernadores desses Estados no pleito de belecido um prazo de 180 dias para a e de Santa Catarina, onde se previa
1978. A oposição começava a bater o organização de novas agremiações. uma vitória da oposição, o governo não
regime mesmo sob as regras que este Para impedir que alguma delas utili- pôde impedir que as oposições eleges-
havia criado. Era preciso modificar no- zasse a denominação MDB, a lei sem dez governadores e conquistassem,
vamente essas regras. obrigou a intlusão da palavra "partido" em todo o País, a maioria dos votos po-
Em 1o de julho de 1976, a Lei Falcão em seus nomes. Também para assegu- pulares. O Regime Militar se aproxi-
praticamente acabava com a propa- rar que o MDB realmente se fragmen- mava do esgotamento.
ganda eleitoral no rádio e TV, tasse, foram abrandadas as exigências
limitando-a à apresentação do nome, para a legalização dos novos partidos, Em julho de 1976, o regime modifica
número, legenda e foto dos candidatos. mas não a ponto de permitir um pluri- novamente as regras eleitorais, com a Lei
Em 1o de abril de 1977, Geisel fechava partidarismo autêntico. Apenas seis Falcão. Abaixo, por Ziraldo
DEV
Pal
COMERCIAL
no v e A4
320
DR DFANBSB V8.GNC.AM, R4044334 ân 002 , p 64
No final de 1981, num congresso de dos anos 60. Falou de uma época em nanciamentos generosos do Estado e
historiadores americanos, em Los An- que "os brasilianistas estavam delicio- das fundações. Bolsas foram providen-
geles, Richard Morse, figura paternal samente nas margens da academia", e ciadas para estudantes de pós-
no campo de estudos latino-americanos quando "congressos de historiadores graduação. As universidades passaram
nos EUA, foi chamado para fazer um serviam para beber e jogar pôquer, e a oferecer ótimas colocações para eco-
balanço da produção brasilianista. não, como agora, para mercado de es- nomistas, cientistas políticos, críticos li-
Apesar de ter escrito uma das primeiras cravos" (onde professores recém- terários, antropólogos e historiadores
teses de doutoramento sobre o Brasil, doutorados são negociados). A "mi- com especialização em América La-
publicada em português em 1954 com niexplosão" se deu, continuava Morse, tina. Organizaram-se cursos de gradua-
o título A Formação Histórica da Cidade pela invasão burocratizante do governo ção sobre a história do Brasil, da Ar-
de São Paulo, Morse negou que fosse e das fundações culturais (como Ford, gentina, do México, sobre a narrativa
brasilianista. Contou que tivera cinco Carnegie, Tinker) na vida universitária na América espanhola, sobre desenvol-
empregos como professor universitário, norte-americana. A revolução cubana, vimento, revolução, política externa,
um como chefe de departamento, um entre outros eventos políticos, gerou problemas agrários, para dar alguns
lecionando história do Caribe, outro um crescente interesse pelo misterioso exemplos. Acabava de ser inventado o
história da América Espanhola e dois e desconhecido pedaço do continente campo de estudos latino-americanos,
como "generalista", mas "sem ser de ao sul dos EUA. E, não mais que de re- uma área nova na tradição americana
quatro estrelas", Embora não se reco- pente, havia dinheiro para financiar os cada vez mais importante de area stu-
nheça como um brasilianista, ao longo estudantes e professores que se dispu- dies.
da carreira manteve relações profis- sessem a atender esta nova "prioridade Seria equivocado, no entanto, atri-
sionais e pessoais com o brasilianismo nacional"": estudar a América Latina, buir tanta agitação tão-somente à cu-
e o Brasil. Professores com teses já feitas sobre riosidade súbita do governo norte-
AO historiar um pouco da própria outras áreas receberam e aceitaram americano em saber o que se passava
| vida, Morse fez um corte entre o que propostas para mudar de ramo e se es- do lado de baixo do Equador. Do fim
veio antes e depois da "miniexplosão" pecializar em América Latina. Cria- dos anos 50 até meados dos anos 70,
de estudos brasilianistas em meados ram-se centros de estudos com fi- viveu-se nos meios universitários norte-
321
er pransss ve.enc.aaa, R4041 2331an CO2 , pôs
americanos a guerra do Vietnã, a inter- brasilianistas produziam trabalhos sim- tidas. Os intelectuais nacionais come-
venção na República Dominicana, as plesmente empíricos, meros catálogos, caram a reconhecer, já a esta altura, a
guerras coloniais africanas, a ascensão incapazes portanto de contribuir muito contribuição dos americanos, pelo me-
e terrível fim da Aliança Popular do para o esclarecimento dos problemas e nos ao nível de pesquisa.
Chile, os movimentos negros, a cultura questões nacionais. Eram vistos, em A geração brasilianista que iniciou a
negra, jazz, blues, rock, para não falar suma, como o braço intelectual do im- pós-graduação apartir dos anos 70 en-
no misticismo hippie. A populosa gera- períalismo, colecionadores de dados frenta, então, um contexto intelectual
ção concebida na euforia supersônica úteis aos interesses dos EUA, aliados bastante mudado. A geração anterior já
que se seguiu à Segunda Grande da ditadura. ocupa as cadeiras de um sistema uni-
Guerra, os chamados filhos do baby
Tal hostilidade começou a ceder, já versitário que não se expande mais, e
boom, passou pela universidade provo- em meados dos anos 70, a uma convi- onde muitos "terrenos" acadêmicos já
cando uma rápida expansão neste vência mais amena, devido, em parte, à estão demarcados. As relações com os
período. Viveu-se, enfim, a longa e ca- internacionalização - forçada pelo colegas brasileiros são, felizmente, bem
lorosa década chamada the sixties. E foi
exílio - da intelectualidade latino- mais fraternais do que 15 anos atrás.
assim, neste clima, que o Terceiro americana, e à hospitalidade retribuída Mas ficou uma, pelo menos uma, ques-
Mundo passou a existir para os jovens
de alguns brasilianistas que procuraram tão básica: para que serve, ou pode ser-
americanos, ajudar os exilados. Ficou claro para os vir, o brasilianismo? O relatório de mais
brasileiros que a maioria dos brasilia- uma nação, como quer Clifford Ge-
Elesspendiam mais para Kennedy
nistas era ou liberal ou de "centro- ertz? Uma fonte de saber para a forma-
do que para Jimi Hendrix esquerda", contra a ditadura, e que ção mais inteligente da opinião pública
poucos colaboravam com a CIA e cia., e da política externa americanas? Uma
É nesta conjuntura que se forma a pelo menos diretamente. Os exilados, contribuição norte-americana às lutas
segunda leva de estudiosos americanos sobretudo os teóricos da dependência, libertárias no continente? Talvez seja
interessados no Brasil, "the modernizers chegaram, inclusive, a ter grande in- Alexis de Tocqueville - adaptado por
of the 60's", no dizer de Morse. Se estes fluência nos meios universitários norte- Richard Morse - quem tem a resposta
jovens professores tinham, por um americanos, criando assim uma base mais interessante: serviria para focali-
lado, alunos curiosos e animados com a para diálogo. Posteriormente, como zar aquilo que os EUA podem apren-
luta de libertação no Terceiro Mundo, mostra José Carlos Sebe em seu livro der com o Brasil. Inverter ao nível do
sentiam, por outro, a necessidade de Introdução ao Nacionalismo Acadêmico: texto a relação "centro" versus "perife-
demarcar um terreno próprio em um os Brasilianistas, o fim da censura no ria". Uma espécie de antropofagia os-
campo acadêmico ainda mal explo- Brasil na última metade dos anos 70 waldiana às avessas. Ou, se quiserem, o
rado. A carreira universitária norte- (bem como o fim da expansão universi- avesso do avesso do avesso. Mas daí
americana dependia de publicações, e tária norte-americana) fez com que as provavelmente haveria uma mudança:
era imprescindível portanto que a pes- Obras brasilianistas passassem a ser brasilianeiro, em vez de brasilianistas.
quisa de doutoramento, frequente- apenas mais uma entre várias interpre-
mente a primeira investida do estu- tações, tirando-lhes o caráter de uma Matthew Shirts e
dioso em águas brasilienses, virasse li- das poucas palavras e pesquisas permi- Antônio Pedro Tota
vro. Os tempos visavam, quase sempre,
ou à política ou à economia neste
período. Pode-se citar como exemplo
das pesquisas mais importantes os li-
vros de Thomas Skidmore, Politics in
Brazil, 1945-1964: An Experiment in
Democracy (1968), Robert Levine, The
Vargas Regime (1968), Alfred Stepan,
The Military in Politics: Changing Pat-
terns in Brazil (1971), bem como as
análises de Joseph Love sobre o regio-
nalismo gaúcho (1971) e as de John
Wirth sobre a política do aço e do pe-
tróleo no País (1970). O programa de
pesquisa dos brasilianistas seguia basi-
camente a mesma problemática do
latino-americanismo: estudar a ausência
de democracia e desenvolvimento no
continente. Pendiam mais para John
Kennedy do que para Jimi Hendrix.
Embora bem recebidos pessoal-
mente, pela decantada hospitalidade
brasileira, os brasilianistas foram dura-
mente criticados pela inteligentsia local.
Dizia-se que gozavam de privilégios
nos difíceis caminhos para as fontes e
arquivos fechados aos pesquisadores
nacionais. Eram acusados de colaborar
com as "forças ocultas", a CIA, por
exemplo. A crítica mais dura: apesar de Thomas Skidmore, autor de Politics in Brazil, 1945-1964: An Experiment in
tanto financiamento à disposição, os Democracy, de 1968
322
sr praNnBss A, pés
Iconographia
da maioria se delicia com coisas como mesmo tema e aos mesmos recur-
; Maria Sapatão, que Chacrinha canteu sos, numa faixa preciosa chamada
em 80 (De dia é Maria/ De noite é João), Mascando Chiclê. Entre um lance e ou-
ou com o Rock das Aranhas, de Raul tro, o entreguismo cresceu tanto que,
Hitler (acima, por Belmonte) foi Seixas, do mesmo ano, onde ele sur- em 78, Paulinho Soares sintetizou tudo
debochado com irreverência preende duas mulheres botando aranha em O Patrão Mandou: O patrão mandou
pra brigar. cantar com a língua enrolada/ Everybody
sintéticas também foram anotadas em macacada/ E ainda mandou tirar nosso
vários ritmos: Garota Saint-Tropez (62), Em 1944, a saudação nazista samba da parada/ Very good, macacada!
Garota do Monoquini (65), Garota de Mi- aparece em "Abaixa o Braço" E esta síntese do universo popular
nissaia (67), Mini-Nada (70) ou Garota acaba funcionando como senha ou
Transparente (71). Fora dessa área, a liberdade sempre jingle, concentrando numa canção
Mas, aos poucos, o mundo levezinho foi um pouco maior e o repertório po- toda uma tendência, um compor-
da moda foi dividindo seu espaço com pular foi espelhando o dia-a-dia com tamento geral. Foi assim com
itens mais decisivos, como a necessi- mais rigor - e mais zombaria, também. Caminhando, de Geraldo Vandré, em
dade de evitar muitos filhos: Ela traba- O nazismo, por exemplo, foi cantado 67; com Apesar de Você, de Chico, em
lhava noite e dia/ Não encalhava mercado- com a mais debochada irreverência: o 70 - o hino proibido, enquanto os rá-
ria/ Mas a carestia está medonhal Nin- Pacto de Munique, em 38, virou Salada dios repetiam o "oficial", Eu te Amo,
guém quer nada com a cegonha (Dona Mista; o embate entre Hitler e a Ingla- meu Brasil, cada um fazendo a síntese
Cegonha, de 53). Mas, é lógico, houve terra virou Adolfito Mata-Mouros, 43; no de um ponto de vista; com O Bêbado e
reação: A solução da pilula/ Pra mim ela mesmo ano, o passo de ganso era satiri- o Equilibrista, em 1979, na campanha
é ridícula/ Ondejá se viu/ Um mundo sem zado em Que Passo é Esse, Adolfito?; a pela anistia; ou com Menestrel das Ala-
mamãe (Marcha da Pilula, de 70). Até saudação nazista apareceu em Abaixe o goas, 84, no maior movimento popular
que, em 82, Rita Lee empacou na cen- Braço, em 44, etc. E até os fuzilamentos de toda a história brasileira, a campa-
sura (sempre ela) quando decidiu dizer da vitoriosa revolução de Fidel Castro nha pelas diretas-já, Em cada caso, um
tudo claramente: Mulher é bicho esqui- entraram na Marcha do Paredão, em 62, retrato do Brasil no 3 X4 da canção,
sito/ Todo mês sangra, Essa habilidade de fazer eco preciso desde o tempo em que, pelo telefone,
Mas a tesoura da censura, no caso, para o real, a música sempre manteve, o chefe da polícia avisava que, na Cari-
até que poderia ser prevista: afinal, a A subserviência brasileira aos modismos oca, havia uma roleta para se jogar.
área do tema sexo e suas redondezas importados, por exemplo, vem sendo Maurício Kubrusly
sempre estiveram no centro do alvo de
qualquer inquisição. Em 1984, isso po-
dia sugerir um passado muito distante,
pois o travesti Roberta Close era as-
sunto de página central em revista mas-
culina de mulher nua, e o Capitão Gay
desembarcou em todas as casas de
família em 1982, através de uma can-
ção e na imagem redonda de Jô Soares.
Mas essa "liberação" não mergulha
muito além da casca e o homossexua-
lismo, que os gregos já tinham herdado
de seus antepassados, só aos poucos
pôde ser cantado. Em 1959, com Vai
Ver Que E, iniciou-se a temporada de
suspeitas: Sempre perde o lotação/ Nervo-
sinho bate o pé/ Vai ver que é., Depois, fo-
ram surgindo outros indícios: o cabelo
grande (Cabeleira do Zezé, 64), a bolsa
(Bolsinha do Valdemar, 73) e várias ou-
tras, até que, em 75, Gilberto Gil falou
Carlos Fenerich
CULTURA/RELIGIÃO : a evolução das relações entre Igreja e Estado sob o Regime Militar
Os caminhos da Igreja
Em 64, uma Igreja dividida saudava o golpe militar. Em pouco tempo, porém,
os bispos brasileiros viram que estavam embarcando numa canoa furada. E
. quando a Igreja conhece o mais belo período de sua história no País
"O Brasil foi, há pouco, cenário de mos a quantos concorreram para "O milagre brasileiro, despido, de um
graves acontecimentos, que modifica- libertarem-na do abismo iminente." lado, da crença popular, da devoção e
ram profundamente os rumos da situa- Esse é um trecho do documento ofi- da esperança, resulta de outro lado no
ção nacional. Atendendo à geral e an- cial com que a Comissão Central da favorecimento dos não-necessitados,
gustiosa expectativa do povo brasileiro, Conferência Nacional dos Bispos do implicando num castigo aos que foram
que via a marcha acelerada do comu- Brasil saudou o golpe de 1964 no Bra- sacrificados, maldição para aqueles que
nismo para a conquista do poder, as sil. Trata-se da "Declaração da CNBB não o pediram. No rastro do milagre
Forças Armadas acudiram em tempo, sobre a Situação Nacional", fruto de ficou o empobrecimento relativo e ab-
e evitaram se consumasse a implanta- uma reunião da Comissão Central, no soluto do povo (...). A concentração
ção do regime bolchevista em nossa Rio de Janeiro, em maio de 1964, e dis- de renda tende, portanto, a aumentar
terra. (...) Ao rendermos graças a tribuída a 2 de junho do mesmo ano. mais e mais e no seu curso fortalece a
Deus, que atendeu às orações de mi- Nove anos depois, em 1973, os bis- estrutura de classe e de poder que a faz
lhões de brasileiros e nos livrou do pe- pos brasileiros já não davam tantas gra- possível. No processo de empobreci-
rigo comunista, agradecemos aos mili- cas a Deus assim pela implantação do mento dos que são pobres para aumen-
tares que, com grave risco de suas vi- regime que "nos livrou do perigo co- tar a fortuna dos ricos, a concentração
das, se levantaram em nome dos supre- munista". Basta um exemplo para esta- de renda é a demonstração mais clara
mos interesses da Nação, e gratos so- belecer o contraste: da opressão e da injustiça de que é ca-
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ar oranBss va.GNC.aaA, 4041334 3N00A , pós
a.
Banco de Dados/FSP
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Dois momentos da Igreja no Brasil. Logo após o golpe, o ... no fim do "milagre", em 74, as críticas ao regime. Acima,
apoio da CNBB (acima, reunião em julho de 1964, com dom da esq. p/dir.: dom Avelar Brandão, dom Aloísio Lorscheider,
Agnelo Rossi à esq.) e... pres. da CNBB, e dom Ivo Lorscheiter
paz a estrutura de propriedade privada ser, como o professor Cândido Mendes mente admirado por sua extraordinária
dos meios de produção, em que se fun- chamou com propriedade num de seus originalidade, se deve às igrejas das ir-
damenta Oo atual sistema brasileiro livros, a esquerda católica brasileira. mandades leigas, entidades mistas que
(...). A ausência de liberdade, a vio- de alguma forma conseguiam fugir ao
lência da repressão, as injustiças, o em- Aplauso ao golpe foi resultado
menos em parte da canga do Estado.
pobrecimento do povo e a alienação de um momento de medo Uma Igreja de funcionários do Estado,
dos interesses nacionais ao capital es- ou quase isso, era, já se vê, fragílima,
trangeiro não podem constituir sinal de Das entidades leigas da Igreja só sob o ponto de vista doutrinal ou pasto-
que O Brasil tenha encontrado o cami- apóiam o golpe ostensivamente - e ral. A reação contra isso está na Ques-
nho de sua afirmação histórica." portanto aplaudem aquele documento tão Religiosa, um dos três grandes as-
Esse documento, conhecido como - a Pia União das Filhas de Maria e as suntos políticos que dominaram os 67
Eu Ouvi os Clamores do meu Povo, de 6 Congregações Marianas masculinas, anos do Império do Brasil, segundo o
de maio de 1973, é encabeçado pelas ambas tão piedosas como tradicionalis- historiador Antônio Carlos Vilaça. As
assinaturas de dom Hélder Câmara e tas e conservadoras, uma visão de outras duas foram a Guerra do Para-
do bispo-auxiliar de Olinda e Recife, Igreja parada no tempo. A própria hie- guai e a Abolição da Escravatura.
dom José Lamatine Soares, seguindo- rarquia não seria tão conservadora, Na Por aí se vê a importância da Ques-
se as assinaturas de quinze outros bis- verdade, o documento de aplauso ao tão Religiosa ou Questão dos Bispos,
pos e padres representantes das quatro golpe de 64 - tudo está a indicar - foi como ficou conhecida. Mal estudada,
subdivisões regionais do Nordeste na resultado de um momento de medo. como quase tudo no Brasil, ela cos-
CNBB. Pouco depois os textos dos bis- Bons representantes da classe média tuma ser empurrada goela abaixo aos
pos iriam tornar-se ainda mais políticos brasileira, na segunda metade do sé- nossos estudantes secundários como
e até ideológicos, como mostra a culo, os bispos também viviam apavo- uma briga entre a Igreja e a maçonaria,
Comunicação Pastoral ao Povo de Deus, rados com o fantasma do comunismo, quando é na verdade uma rebeldia da
documento oficial da CNBB, Rio de permanentemente invocado pela cha- hierarquia, paradoxalmente através de
Janeiro, 25 de outubro de 1976, que mada classe conservadora (de que sua ala mais conservadora, contra a de-
trata já da impunidade de policiais cri- ideologicamente a classe média é uma pendência da Igreja ao Estado, situa-
minosos, da má distribuição de terra, parte, pois lhe vai a reboque) e pelo seu ção que os bispos mais ortodoxos não
da situação dos índios e de segurançà braço armado: os generais e coronéis, aceitavam mais: eles queriam ligar-se
nacional e segurança individual, entre Cedo eles descobriram que o perigo direta e exclusivamente ao papa e inde-
outros itens. Vale a pergunta: teria mu- para o povo brasileiro era bem outro: a pendência absoluta em relação ao Es-
dado a Igreja ou o Regime Militar? miséria e a injustiça. Agora vejamos o tado. Dom Vital, bispo de Olinda, e
Uma abordagem cuidadosa, de sentido peso da herança que carregava aquela dom Antônio de Macedo Costa, bispo
histórico, vai mostrar que a Igreja é que Igreja medrosa que redigiu o docu- do Pará, os líderes do movimento, aca-
mudou. mento divulgado a 2 de junho de 1964. baram presos, condenados a quatro
A Igreja que, através de sua hierar- Até a República, o clero e a Igreja anos. Cumprida pouco mais de uma
quia, apóia o golpe de 64 é uma Igreja no Brasil sempre estiveram atrelados quarta parte da pena, foram anistiados.
em processo de mudança, uma Igreja ao Estado, através do instituto do Pa- Deixaram a semente. O Império dura-
dividida. A Ação Católica, através da droado, pelo qual o rei de Portugal, e ria pouco. A República trouxe afinal a
qual finalmente o leigo começa a ter depois o imperador do Brasil, é que no- separação entre Igreja e Estado com
participação na Igreja, no Brasil, de- meava os bispos e páracos e fundava que eles sonharam e pela qual lutaram.
pois de séculos de silêncio, não apoiou paróquias e dioceses. Era a Coroa que Trouxe, porém, apenas a separação
o documento dos bispos. Sobretudo recolhia os dízimos e os devolvia, bem oficial. Frágil, plantinha tenra, apenas
através da JUC (Juventude Universi- mais magros, como salários dos padres expelida do útero confortável do Es-
tária Católica), estava em franco desen- ou para as obras da Igreja. A riqueza tado, a Igreja no princípio não supor-
volvimento nessa época o que viria a do barroco brasileiro, até hoje mundial- tava a luz cá fora. Vivia em permanente
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Br pransss va.onciama, 84 0424334 8n00a,p%o
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BR DFANBSB V8.GNC.AAA 2404333 4an coa , py44
Juca Martins/F4
Sérgio Tomisaki/Banco de Dados
São Paulo, como certamente desejaria, leigos ligados à Igreja amanhã. Mas
O Estado era impotente para calar as Boff, tivesse que apresentar explica-
nunca conseguiu compreender que a ções à hierarquia da Igreja em Roma,
denúncias de dom Hélder em Paris, de- Igreja cresce no que Ivo Lesbanpin
núncias sobre as torturas, sobre os as- no segundo semestre de 1984, Essa via-
chamou admiravelmente num de seus gem de frei Boff deixou à mostra que
sassinatos, que foram tantos, sobre os livros de "a bem-aventurança da perse-
desaparecidos, O Estado era impotente existem dois blocos que se enfrentam
guição". Nem podia, porque os donos
para afastar dom Pedro Casaldáliga de na Igreja Católica.
do regime nunca tinham estudado his- Politicamente - e, formada por ho-
São Félix do Araguaia e do Brasil,
tória da Igreja. mens, a Igreja é tão política como qual-
como ardentemente desejou. Mas para
isso dependia do Papa e encontrou quer Outra instituição humana - é fácil
Na perseguição pelo regime,
sempre um firme obstáculo em Paulo definir esses dois blocos. Um tenta de-
a hora mais bela da Igreja fender a Igreja da opção preferencial
VI. O Estado era impotente para apli-
car aos dominicanos a solução pomba- pelos pobres, nascida - se se quer uma
No período de transição que o Brasil data - em Medellin, 1968, e reafirmada
lina da expulsão, como também dese- vive em 1984, a Igreja já não parece es-
jou. Assim, em determinado momento, em Puebla, em 1979. É o bloco que so-
tar tão compactamente voltada para freu sob a perseguição pós-64 no Brasil.
quando todo o País, todas as institui- um mesmo objetivo. Depois de uma
ções civis estavam esmagadas pelo ta- O outro, vencida a fase de perseguição,
crise Igreja/Estado, há a crise - durante tenta destruir esse bloco para estar bem
cão da bota, a Igreja era a única que anos encoberta pela outra - que dom
conseguia fustigar o regime autoritário. com qualquer governo que, não sendo
Pedro Casaldáliga chama com proprie- autoritário, não esteja também com-
Isso irritava o poder militar, que inves- dade de conflito Igreja/Igreja. Trata-se,
tia com fúria, mas só conseguia peque- prometido com o povo.
basicamente, da polêmica armada em
nas vitórias aparentes aqui e ali. Ex- torno da Teologia da Libertação e que
pulsava um padre estrangeiro hoje, fez com que um dos seus principais
prendia ou acuava padres, religiosos ou teóricos, o frei brasileiro Leonardo
Marcos de Castro
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Banco de Dados/FSP
se lembrou, no capítulo dos direitos, de
se preocupar com os direitos dos pre-
sós. Paradoxalmente, será a Constitui-
ção federal de 1967, criatura do Re-
gime Militar, que chamará a atenção
para a integridade física e moral do de-
As prisões no País jamais obedeceram a qualquer respeito à pessoa humana. Acima, a tento (Art. 158 8 14). Satisfação que du-
superpopulação carcerária na capital paulista, em 1954 rou pouquissimo, pois o novo golpe de
Estado que se seguiu, em dezembro de
1968, através do Ato Institucional no 5
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/SEGURANÇA: o sistema penitenciário no País
(AI-5), com a necessidade de assegurar
o rigor contra os presos políticos, tor-
nou inócuo esse dispositivo. A ditadura
crime impõe a necessidade de remover na
Escolas do
prática todas as garantias legais atribui-
das em tese ao encarcerado como titu-
Sobretudo nos últimos anos de autoritarismo, pelo desrespeito lar de direitos subjetivos. Agravam-se
as condições de existência nas prisões
à pessoa humana, as prisões tornaram-se escolas formadoras
em geral, severas limitações são feitas
do crime e fábricas de vinganças ao sistema de privilégios (já precariíssi-
mos) atribuídos aos detidos. Num
As prisões no Brasil sempre esti- cravos criminosos, com a obrigação su- tempo em que as garantias do cidadão
veram em crise. Não é um fenômeno plementar de que os escravos, após se- nas ruas estão suspensas, impossível as-
do presente, mas uma perversa conti- rem açoitados, fossem mantidos a fer- segurar os direitos dos condenados.
nuidade. Até quando é possível recuar ros pelo tempo que o juiz determi-
na história, os diagnósticos nessa área nasse. O saldo no Regime Militar é a
sempre constataram uma permanente Vem a República, em 1889, e abole situação de abandono do preso
falência. Nem o programa mínimo do as penas cruéis, infamantes ou "inutil-
inciso XXI, Artigo 179 da Constituição mente aflitivas". A prisão celular passa O balanço da "reforma" penitenciá-
Imperial de 1824,conseguiu-se pôr em a ser aplicada à generalidade dos cri- ria durante o autoritarismo é ambiente
prática: "As cadeiras serão seguras, mes. Em 1900, um relatório sobre a de promiscuidade, superlotação, convi-
limpas e bem arejadas, havendo diver- Casa de Correção no Rio de Janeiro vência de delinquentes de todos os
sas casas para separação dos réus, con- (que já servira para abrigar os escravos) graus, de doentes e até de menores,
forme suas circunstâncias e natureza informa que o ar é a luz não são recebi- ociosidade, brutalidade, liquidação da
dos seus crimes."' Cento e sessenta anos dos diretamente nas celas, provocando individualidade do condenado, humi-
se passaram e esses preceitos conti- anemias, dispepsias e escorbuto, No lhação. Todos os planos foram, no de-
nuam letra morta. presente,: como no passado, há um pro- polimento de vários funcionários,
Tudo neste país, nessa área das pe- fundo divórcio entre planos, resoluções pouco além da falsa indignação e da re-
nas e das prisões, é muito tardio. Aqui, e códigos e a realidade do sistema peni- tórica. O saldo desse longo percurso é a
sem se dispensar a pena de morte, um tenciário. Humilhação e aniquilação situação de abandono do preso no País
ano depois da independência política parecem ser a via privilegiada para a e a inutilidade do sistema penitenciário
em 1822, ainda vigoravam as penalida- reparação da ofensa, para a defesa da vigente. Não se investiu no sistema pe-
des do Livro V da Ordenação, onde es- segurança pública. nitenciário, abandonou-se à própria
tavam previstas mutilação das mãos, da Reforma do sistema penitenciário sorte a prisão, porque tratar os con-
língua, queimaduras com tenazes ar- brasileiro foi sempre uma dissimulação denados como subcidadãos, como se-
dentes, etc. Essas práticas sobrevivem justificadora. Naturalmente, o sistema res indignos de respeito aos direitos ci-
até o século 19, sem comedimento, de penas de toda a sociedade não é vis, corresponde a certa visão autori-
pelo menos em relação aos escravos. O qualquer coisa de isolado, mas parte in- tária do poder e da relação do poder
artigo 60 do Código Criminal de 1830 tegrante de seu inteiro sistema social, e com a sociedade. O sistema penal é o
mantinha a pena de açoite para os es- participa tanto de suas aspirações lugar onde o poder se mostra de forma
331
mais manifesta. O poder mostra como
a tirania pode ser levada até os mais
ínfimos detalhes sob altas justificativas
morais. Para o autoritarismo, o que se
passa na prisão não interessa, os que
cometeram crimes são responsáveis in-
dividualmente, a culpa precisa ser ex-
purgada através do sofrimento.
Quem perde com essa visão é a pró-
pria população. As prisões, as peniten-
ciárias, no Brasil, se transformaram em
escolas formadoras do crime. Ainda
que as pesquisas oscilem quanto aos
números precisos, seria realista dizer
que mais da metade dos condenados
egressos das prisões voltam ao crime. E
seria de espantar se assim não fosse.
Não se pode esperar que cidadãos se-
Juca Martins/F4
jam reconstruídos dentro de um espaço
de purêarbítrio, de esvaziamento de
quaisquer direitos fundamentais, os
presos submetidos às imposições dos
guardas de presídio, afinal os executan-
tes da pena. A pena dada pelo juiz nada
ou pouco tem a ver com o seu cumpri-
mento. Os prisioneiros estão ao bel dis-
por de pequenas autoridades adminis-
trativas, um tribunal interno nas peni-
tenciárias, sem regras fixas, sem defesa,
que por um sim ou por um não "con-
dena" os internos a isolamentos e a
castigos físicos. As humilhações são es-
tendidas às famílias dos criminosos,
submetidas a vexações que contribuem
para agravar o isolamento do preso, ob-
Jetivo máximo do sistema peniten-
ciário,
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE VIDA: o lazer dos trabalhadores O descanso é sagrado, segundo reza
a Bíblia, mas na prática esse direito
nem sempre foi reconhecido e precisou
ser conquistado através de longa luta.
O direito ao lazer No final do século 19, de fato, esta
questão tornou-se explosiva. No
mundo inteiro, os trabalhadores agita-
Meio século após a conquista do dia de oito horas, o vam a bandeira do direito ao descanso
trabalhador ainda não dispunha de tempo para o lazer nem e se insurgiam contra essa "loucura do
amor ao trabalho", na frase do médico
tinha uma vida social saudável e político francês Paul Lafargue.
Da prisão, em 1883, Lafargue coor-
denou a edição de seu livro O Direito à
Preguiça, onde denunciava a prática en-
tão vigente de reduzir ao mínimo possi-
vel as necessidades do trabalhador -
em termos de lazer, de esportes, de cul-
tura ou de apenas gozar a vida: o dolce
far niente, dos italianos. Aceitar essa si-
tuação, dizia Lafargue, era "suprimir as
alegrias e as paixões dos trabalhado-
res", era "condená-los ao papel de má-
quina de gerar trabalho sem trégua e
sem piedade".
A luta dos trabalhadores, dessa
forma, visava a fixar a jornada de traba-
lho por lei, limitando-a a oito horas
diárias. Essa medida, segundo o movi-
mento operário da época, permitiria di-
vidir o dia em três períodos iguais, de
modo que, além da labuta cotidiana,
restassem Oito horas de sono e oito ho-
ras de tempo livre para os trabalhado-
res.
333
SR DFANBSB VB.GNCAAA, 84043334 an oo a F 7%
cia da Constituição, no Brasil. para 30 dias. Em 1977, o Regime Mili- feira a sábado. Dito de outra forma,
O sentido da luta mudou: era pre- tar introduziria uma alteração: 30 dias cerca de 12,3 milhões de trabalhadores,
ciso, então, garantir a aplicação da lei. corridos e o trabalhador poderia "ven- de um total de 43,8 milhões, estavam à
De fato, mais de '50 anos depois, na der" (receber em dinheiro) dez dias das margem da lei.
prática, categorias inteiras permane- suas férias. Mas o tempo livre não era reduzido
ciam à margem da Constituição, como apenas pelo aumento do tempo de tra-
era o caso das empregadas domésticas, Trabalhadores são comumente balho. Os trabalhadores consumiam
que apenas em 1972 obtiveram o di- forçados a "vender" as férias seu descanso também fora do trabalho:
reito de ser registradas no Ministério por exemplo, através do transporte.
do Trabalho. Esse problema, além No entanto, como no caso das horas Era inútil fixar o tempo de trabalho, se
disso, não se restringia às domésticas, já extras, esse período de descanso anual o trabalhador, com o crescimento das
que em 1983, 29% dos trabalhadores seria extremamente ameaçado pelos cidades e da rotatividade de emprego
assalariados no Brasil não possulam salários baixos e pela má vontade de (que muitas vezes o afastava de sua resi-
carteira assinada. muitos empregadores: os trabalhadores dência). precisava gastar cada vez mais
Em segundo lugar, mesmo os traba- eram comumente forçados a "vender" tempo para chegar ao emprego - con-
lhadores formalmente incorporados ao todas as suas! férias, alienando com elas sumindo aí o seu tempo teoricamente
"mercado de trabalho" eram vítimas também o seu direito ao descanso. No- livre. Juntavam-se ainda ao transporte
frequentes de inúmeras espertezas que vamente em São Paulo, nos anos 80, outras exigências práticas e inevitáveis,
lhes rgiibavam o &ireito ao tempo livre. uma proporção espantosa de trabalha- como o tempo para o almoço, a higiene
O primeiro destes expedientes era a dores confessava ter que trabalhar du- pessoal e outros afazeres de rotina. Na
praga epidêmica das horas extras, que rante as férias: 47,7%. Essa cifra, média melhor das hipóteses - em regiões
muitas vezes invadiam o fim de semana para três setores da economia - cons- onde o transporte era mais fácil -, res-
do trabalhador. Em 1979, 10% do trução civil, metalurgia e comércio -, tavam menos de quatro horas de tempo
tempo total empatado na produção era chegava a 86,6% no caso das construto- realmente livre para o trabalhador estu-
constituído por horas extras. Aliado a ras. Em resumo, a soma do tempo livre dar, divertir-se, conviver com a família
esse expediente, também as férias aca- que restava ao trabalhador, em 1982, e amigos, fazer compras ou participar
baram tornando-se vorazes devorado- eeressaya-se nos dados divulgados de suas associações. Esse tempo foi me-
ras de tempo livre, Em 1925, o direito a pela revista Veja (14/04/82); quase um dido de modo rigoroso na periferia de
férias remuneradas, sem prejuízo do sa- terço da força de trabalho no Brasil São Paulo, através de um estudo reali-
lário, tornou-se lei, inicialmente restri- cumpria uma jornada de mais de 48 ho- zado em 1977 pela Emplasa (Empresa
tas a 15 dias por ano. Já na CLT, em ras semanais, em flagrante violação do Metropolitana de Planejamento da
1943, o período de férias foi ampliado limite de oito horas diárias de segunda- Grande São Paulo S.A.).
ª
1h 20m __
Fonte: para tempo gasto em transporte para o trabalho - Pesquisa 0-D - Emplasa 1977 vol. 4
334
BR DFANBSBVB.GNC.AMA, 1334 an002, o 57%
Reduzido a um ideal pela metade, vendo em más condições, o trabalha- para 75,2% das pessoas. Os autores da
precário e curto demais diante do que a dor passou a concentrar seu pouco pesquisa chamavam a atenção para o
lei garantia, o tempo livre do trabalha- tempo livre em opções individuais fato curioso de que 0 rádio e a tevê
dor seria ainda prejudicado pela falta igualmente precárias. Na maior parte não eram, no entanto, considerados
de opções de divertimento, O triste la- dos casos, isso significava simplesmente uma forma de lazer pelas camadas de
zer reservado aos trabalhadores, de "descansar" ou então ver televisão - baixa renda. Entre as formas mais co-
fato, seria dramaticamente ilustrado formas passivas de lazer que pouco di- muns de recreação, surgiu com fre-
por uma série de pesquisas realizadas feriam de uma simples "recuperação quência a resposta "não fazer nada": si-
em São Paulo no início dos anos 70, de forças" num ciclo interminável de tuação de até 48% das pessoas, Ou "vi-
Uma das conclusões desse trabalho as- trabalho. sitar amigos e parentes", resposta de
severava que, na periferia, "o paulis- aproximadamente 20% dos trabalhado-
tano não tem para onde fugir, sendo o Trabalhadores não tinham vida res paulistas entrevistados por Sarah
tédio o seu único caminho. O tédio, de- social, indicam pesquisas Bacal em 1978 para elaboração de sua
pois o esgotamento nervoso e por fim a tese Realidade e Uso do Tempo Livre.
loucura configuram os estágios dessa De modo geral, os trabalhadores não Dai, talvez, a grande preocupação dos
motivação neurótica". tinham vida social. Era o que indicava trabalhadores com a construção de
Não era difícil situar as condições uma pesquisa de 1971, coordenada parques e áreas livres. O futebol, ao
que levavam a essa terrível advertência. pelo economista Paul Singer e reali- contrário do que se poderia imaginar,
Com o crescimento das cidades, du- zada na periferia de São Paulo. Apenas foi citado por apenas 6,5% dos entrevis-
rante o rápido desenvolvimento do 3,1% dos entrevistados disseram per- tados como forma importante de diver-
País, principalmente após a Segunda tencer a sociedades de bairro, por exem- timento e descontração.
Grande Guerra, os trabalhadores fo- plo. Nas associações religiosas, a média Não admiraria, portanto, se o Bra-
ram cada vez mais forçados ao corre- era apenas um pouco maior: 8,4%. E, sil de cem anos atrás parecesse um lu-
corre e ao isolamento social. As formas mesmo em clubes, a participação não gar mais aprazível para se viver. Os tra-
de distração e divertimento passaram a passava de 17% - um pouco maior para balhadores, então, concentravam-se
depender em larga escala de equipa- os jovens e homens (23,5%) do que quase que exclusivamente no setor ru-
mentos coletivos - em parques ou em para as mulheres ou pessoas de meia i- ral. Estavam predestinados a uma vida
clubes, por exemplo, estes equipamen- dade. rude e simples e não tinham os direitos
tos geralmente estavam fora do alcance A "participação", na verdade, mais elementares. Mas, ainda assim, a
da grande maioria da população. restringia-se, em grande parte, a ouvir própria rotina do trabalho no campo
Arrancado do campo para a cidade rádio - hábito de 80% dos entrevista- assegurava um tempo livre aos traba-
nos anos de urbanização acelerada e vi- dos - ou ver tevê, atividade rotineira lhadores, nos longos meses entre o
km.—
W
"Sono
livre
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; P 79
plantio e a colheita. E não faltavam al- festa foi no Bosque da Saúde: "Ao balhadoras e para a fragmentação de
ternativas de lazer coletivo, como os meio-dia havia mais de mil operários sua vida social. A televisão tornou-se o
bailes ou as festas religiosas. no Bosque. Correu abundantemente a grande símbolo do chamado lazer pas-
As festas religiosas eram também o cerveja e o vinho ( . . .). Um jovem ope- sivo, penetrando mesmo no interior
ponto alto das formas de lazer nas cida- tário discursou sob muitos aplausos, através das redes de estações retrans-
des emergentes no final do século 19, concitando à solidariedade. A tarde, ao missoras, As pesquisas nos anos 80
segundo a historiadora Judith Elazari. som de três bandas, iniciou-se um baile- mostravam que a televisão era a cam-
"Passear, conversar, dançar, eis algu- monstro, com mais de 200 pares dan- peá absoluta na lista de afazeres das
mas das formas características dessa so- cando até o cair da noite." donas-de-casa, absorvendo um quinto
ciabilidade nos intervalos de ócio." A
de todo o seu dia. Estava acima das ta-
Festa de Nossa Senhora da Penha, em Somem os circos dos bairros e refas de "limpeza" (18% do tempo) e
um bairro paulistano, ocupava então
rareiam os bailes populares de "cuidados com os filhos" (15%), res-
um lugar de destaque, espalhando-se tando para o "lazer e divertimentos" da
por toda a cidade. Promovida pela O lazer coletivo começou a perder dona-de-casa apenas 4% do dia.
Igreja, a festa também se ligava profun- terreno com a industrialização e a ur- Estes números espelhavam uma si-
damente aos festejos de rua. "O povo banização e acompanhou de certa tuação muito semelhante à que levou
divertia-se com jogos de azar, bebidas", forma, a fragmentação da cultura e da ao desabafo contido numa carta do
escreveu Elazari; organização popular. Ao mesmo tempo pensador e político italiano Antonio
A Partir de 1870, começou a se ex- que o circo sumia dos bairros populares Gramsci, endereçada em 1915 a uma
pandir o carnaval de rua e, na entrada - onde era muito comum no início do de suas irmãs. Então um jovem estu-
do século 20, o 1o de Maio - a grande século -, também rareavam os bailes dante, obrigado também a trabalhar
festa dos trabalhadores - começou a se populares. Com a introdução do rádio duramente para ganhar a vida,
tornar um importante momento de di- e do cinema, escasseavam os cantado- Gramsci escreveu ao final daquele ano:
versão e lazer. O jornal Fanfulha, em res e violeiros, ainda existentes no Nor- "Acho que trabalhei demais. Trabalhei
1907, noticiou um dos piqueniques fa- deste. para viver, mas, ao mesmo tempo, para
mosos do 1o de Maio, organizado nesse Em seguida ao golpe militar de 1964, viver, eu teria que repousar, teria que
caso pelo Centro Socialista Internacio- criaram-se as condições para a esmaga- me divertir."
nal, um grupo operário da época. A dora massificação das populações tra-
Ilustração de Maringoni
336
BR DFANBSB VB.GNCAMA, 24044334 ân CO 2 , p 80
Indicadores da miséria
Nos últimos anos, a concentração da renda pessoal no País tornou-se uma das maiores
do mundo. Assim, se uma minoria podia im tar os padrões de vida das classes altas da
Europa e EUA, milhões de brasileiros se debatiam num quadro de miséria
O conteúdo das latas de lixo é um vimentista do "milagre econômico" lações mais pobres, predominavam os
bom indicador do desenvolvimento e da (1968-73), não poderiam deixar detritos orgânicos - restos de comida
riqueza de um povo e, também, um de exibir com orgulho mais aquele indi- não-sofisticada -, ao contrário da Zona
bom indicador das disparidades no usu- cador do "Brasil Potência" que se Sul, onde estão os bairros mais ricos.
fruto dessa riqueza. A quantidade de construía. A pesquisa da Columrb mos- O lixo carioca só era comparável ao das
produtos industrializados consumidos trou que 34% do peso do lixo carioca cidades dos países mais desenvolvidos
pela população reflete-se no lixo pela era composto por papel, papelão e quando analisado juntando num
presença de muito papel, papelão e plástico, número jubiloso, conside- mesmo saco a matéria desprezada por
plástico, em grande parte embalagens rando que a presença desses materiais pobres e ricos., Em outras palavras, o
que se jogam fora. Em 1977, a Divisão no lixo só ultrapassava os 50% em lixo do Rio era "desenvolvido" na mé-
de Pesquisas e Tecnologia da Columrb, países de alto grau de desenvolvimento, dia, desprezando-se asa*disparidades en-
a companhia de coleta do lixo do Rio como os Estados Unidos e a Alemanha tre o lixo dos pobres e dos ricos.
de Janeiro, pesquisou a composição Ocidental. Estava, pois, até o lixo a in- A mesma ilusão é provocada pela
físico-química do lixo do Rio e con- dicar que o Brasil ia para frente. Pura leitura de outros indicadores do desen-
cluiu que, na média, ele era parecido ilusão, no entanto. volvimento brasileiro quando se abstrai
com o de uma cidade de país desenvol- A mesma pesquisa revelou também a realidade da estratificação social.
vido. Os ufanistas, que àquela altura que no lixo. dos bairros da Zona Norte Por exemplo, o PIB (Produto Interno
ainda festejavam o boom desenvol- do Rio de Janeiro, onde vivem as popu- Bruto), a riqueza nacional produzida
Em. . sd
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num ano, é uma grandeza que, de certo acordo com os critérios da pesquisa era declarantes; não incluem, portanto, a
modo, tem significado inverso ao do composta pelas famílias comrendimento renda em espécie produzida e autocon-
lixo. mensal de Cr$ 3,4 milhões, correspon- sumida por trabalhadores autônomos,
Entre 1960 e 1980, o PIB do Brasil dia a pouco menos de 8% da população como pequenos camponeses; em con-
foi multiplicado por quatro - de US$ 55 e abocanhava quase 62% de tudo o que trapartida, não registram a riqueza pa-
bilhões para US$ 228 bilhões -, estava à venda nas cidades. trimonial (como casas e automóveis),
tornando-se o décimo maior do mundo Esses dados evidenciam uma con- que geram rendas "invisíveis" para os
e o terceiro das Américas. Entretanto, centração excepcionalmente alta da ren- declarantes ricos.
na década de 80, milhões de brasileiros da e da riqueza produzidas no País. Depois de 1970, o IBGE passou a rea-
ainda se debatiam num quadro de mi- Por outro lado, ao se refletir na estru- lizar, trimestralmente, as Pesquisas
séria: não conseguiam um trabalho per- tura do consumo, essa disparidade in- Nacionais por Amostras de Domicílio
manente e não ganhavam o suficiente fluencia diretamente a estrutura de (PNADs), que incluem o levantamento
para sequer ter acesso ao padrão de ali- produção. É claro que, estando muito dos rendimentos monetários da Popu-
mentação, instrução e moradia que concentrada a renda, e sendoa produ- lação Economicamente Ativa, tor-
nossa própria sociedade já considerava ção orientada pela busca do lucro nando possível, dentro das limitações já
mínimo. Outro número grande de maior e mais garantido, são produzidos apontadas, acompanhar a evolução da
famílias não passava do nível da subsis- sobretudo os bens e serviços em que a partilha da renda pessoal entre um
tência. Contra esse pano de fundo se minoria privilegiada está interessada e censo e outro. A partir dos dados dos
desenvolveu, no Brasil, o consumo sun- pode adquirir. Assim, capitais escassos, censos de 1960, 1970 e 1980, mais as
tuário das camadas altas e a imitação recursos naturais exauríveis e horas de PNADs de 1976 e 1981, conclui-se que,
cabocla da "sociedade de consumo" trabalho valiosas são desviados para no Brasil, a distribuição pessoal da ren-
existente nos países capitalistas desen- produzir bens e serviços de utilidade da é extremamente desequilibrada e
volvidos. social discutível, como automóveis, ali- regressiva, isto é, tende a beneficiar os
A despeito do inegável surto de ex- mentos finos, etc., enquanto necessida- que já têm muito. Em 1981, 1% da po-
pansão de 1968 a 1973, estimativas le- des vitais de largas faixas da população pulação tinha uma parcelà da renda
vantadas pela empresa publicitária Lin- deixam de ser atendidas. quase igual a de 50% da população. Os
tas, em 1974, indicavam que o poten- S% mais ricos abocanhavam um terço
cial de consumo do mercado interno de toda a renda, apenas um pouco me-
estava concentrado em apenas 123 ci- nos do que dispunha 80% da população
dades dos quatro mil municípios brasi- mais pobre.
leiros, abrangendo cerca de um terço A fonte mais importante de dados Desde a instalação do Regime Mili-
da população na época. Outra pes- sobre a distribuição pessoal da renda tar, a concentração de renda agravou-
quisa, feita pela RBP Pesquisas de no Brasil são os censos demográficos se, A participação dos 50% mais pobres
Mercado, em 1973, apurou que 6% da realizados pelo IBGE de dez em dez na renda, que já era de somente 17,4%
população eram responsáveis pelo con- anos. Desde 1960, além dos dados po- em 1960, caiu para 14,9% em 1970 e es-
sumo de 28,5% dos produtos industria- pulacionais, o IBGE recolhe, por amos- tava em 12,2% em 1983, A fatia dos in-
lizados existentes no mercado. Em ou- tragem, informações sobre os rendi- termediários também caiu de 27,8%, em
tubro de 1984, a revista Veja publicou mentos da População Economica- 1960, para 23,2% em 1983. Já a quota
um resumo do trabalho realizado pela mente Ativa. São dados sujeitos a limi- dos 20% mais ricos se elevou (de 54,8%
Target, uma empresa de serviços es- tações, no entanto. Baseiam-se em de- da renda, em 1960, para 69,6% em
tatísticos, que compilou o comporta- clarações das pessoas recenseadas, o 1983). E aumentou sobretudo a parcela
mento do consumo nas áreas urbanas que sempre conduz a subestimativas das dos muito ricos e riquissimos.
de 1.023 municípios de todos os Esta- rendas mais altas. Limitam-se aos ren- O próprio ex-ministro da Fazenda
dos. A chamada "classe A", que de dimentos monetários recebidos pelos Mário Simonsen, em seu livro Brasil
338
BR DFANBSB 84043334 àn 0a , p 81
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 404/32 P [del
Alex Soletto
para 77% da renda nesse mesmo
período. E provável que a disparidade
fosse ainda maior na indústria da cons-
gág.
Na década de 80, milhares de brasileiros se debatiam num quadro de miséria (na trução civil ou na de extração mineral,
ao lado), enquanto se desenvolvia o consumo suntuoso das camadas altas (acima, o onde tradicionalmente os salários são
Shopping Center Eldorado, na capital de São Paulo) os mais baixos.
Os dados sobre a distribuição funcio-
2002, reconheceu essa tendência para a ção. Também não esclarecem a natu- nai da renda nos bancos comerciais são
"reconcentração da renda". Segundo reza da renda auferida, ou seja, se foi também muito reveladores. A fatia do
ele, a distribuição da renda pessoal, que obtida pelo próprio trabalho ou pela capital subiu de 59,8% no período 1968-
já era regressiva em 1960, se tornou exploração de trabalho alheio. Inse- 70 para 65,4% no período 1971-73, su-
ainda mais regressiva em 1970. A pro- rindo esse critério, o quaro da dispari- bindo novamente para 73,5% no período
porção de aumento da renda média en- dade se torna ainda mais clamoroso, 1974-75. Aí está uma indicação segura
tre 1960 e 1970, foi de 8,4% para os 80% pois reflete no fundo o grau de espolia- de que os banqueiros foram uma das
mais pobres e intermediários da popu- ção de uma maioria esmagadora de mi- frações do grande capital melhor con-
lação, de 55,4% para os 20% ricos, de seráveis, pobres e remediados, por uma templadas pelo Regime Militar. Outro
77,6% para os 5% muito ricos e de minoria de ricos. traço a destacar: a distribuição funcio-
103,2% para o privilegiado grupo dos nal dos rendimentos criados nos bancos
1% riquíssimos. Em outras palavras, a comerciais continuou a se concentrar
riqueza nova criada entre 1960 e 1970 ] pessoal
da J ] e funcional
av 71 em favor do capital mesmo depois de
foi absorvida sobretudo pelos mais ri- 1974, quando o governo Geisel (1974-
cos. A despeito de ter-se observado Para ter uma visão aproximada da 79) começou a declamar o propósito de
uma leve tendência a inverter essa par- partilha da renda por esse ângulo, é adotar medidas corretivas da extrema
tilha tão desigual da renda, entre 1970 e preciso estudar sua distribuição funcio- desigualdade na distribuição da renda.
1980, esse quadropermaneceu no essen- nal. A distribuição pessoal da renda Os dados coligidos sobre a distribui-
cial o mesmo. mostra a divisão da renda entre pessoas ção da renda interna urbana aponta-
Observe-se ainda que as faixas de ren- ou faixas da população, independente- vam, à primeira vista, uma divisão mais
da mínima e máxima são abertas. Isto mente de sua condição pessoal ou da favorável à remuneração do trabalho.
significa que a faixa mínima de renda natureza de sua renda. Já a distribuição É preciso levar em conta, porém, que
inclui, por exemplo, uma parcela signi- funcional da renda procura justamente os dados abrangem setores econômicos
ficativa de pessoas, principalmente mu- levar em conta a distinção entre onde é menor a presença de empresas
lheres e crianças, que trabalham sem rendas-trabalho e rendas-propriedade, monopolistas, com suas elevadas taxas
receber nenhuma remuneração. E a ou seja, entre as rendas obtidas com o de lucros; e incluem os trabalhadores
faixa máxima engloba um núcleo de próprio trabalho e rendas obtidas atra- autônomos e os trabalhadores nos ser-
pessoas muito ricas que têm rendas vês da exploração de trabalho alheio. viços públicos e privados, o que amplia
bastante superiores e já elevada renda Em outras palavras, a distribuição fun- o peso da remuneração do trabalho.
média de sua faixa. cional da renda mostra a divisão da ren- Ainda assim, a remuneração do traba-
Mas as estatísticas sobre a repartição da entre a remuneração das diferentes lho declina ao longo do tempo e é pe-
da renda pessoal, por mais chocantes formas de trabalho, por um lado, e a re- quena se comparada à de outros países.
que sejam, não contam ainda toda a muneração das diferentes formas de Nos Estados Unidos, por exemplo, se-
história. Registram apenas os fluxos de capital e de propriedade imobiliária, gundo famoso levantamento do econo-
renda num ano; não incluem o patri- por outro. mista Simon Kusnetz, a parte da remu-
mônio de uso pessoal acumulado e O cálculo rigoroso da distribuição neração do trabalho na distribuição
muito menos a propriedade e controle funcional da renda é muito mais difícil. funcional da renda chegava a 72,6% no
dos meios de produção. Se isso fosse Mas os dados dos Censos Econômicos período de 1948 a 1957. Dados compi-
feito, se agravaria significativamente a do IBGE permitem formar estimativas lados por Eduardo Suplicy indicam
disparidade entre as faixas da popula- globais e aproximadas. O economista e que, no Brasil, as taxas médias anuais
339
». FANBSB VB.GNCAM, 2340431333 ân 002, p 83
Abril Press
São Paulo, bairro do Morumbi, anos 80. A verdadeira face do Brasil: de um lado,
a opulência; de outro, a situação de grande
parte da população que não consegue, satisfazer necessidades vitais, como alimentaçã
o e moradia.
341
sroransss v.enc.aaa, 249041334 an 002 , - 85
forma nas demais lutas do povo latino- País defendiam a causa do governo, Rio pelaxeimo 1884
americano pela redemocratização de uma das principais atividades das Asso-
seus países. Afinal, os "panelaços" ti- elaçoes e Sociedades pró-Abohçao que
nham marcado manlfestaçoes no Chile, surglam foi a criação de ]omals
j aboli-
na Argentina e no Uruguai pelo fim dos cionistas. Pouco a pouco, a opinião pú-
governos militares daqueles países, que blica se apaixona pelo tema. A campa-
tinham sido gerados em processos nha se concentra nas grandes cidades,
muito semelhantes ao brasileiro. onde os clubes abolicionistas promo-
Quando o País se coloriu de amarelo vem quermesses, festas beneficentes, M
unucm"l
ªnu- “A
AGOBTImL.
um nar dirigidas sa
- a cor da campanha pelas diretas-já - conferências e, com o crescimento da
à Rua or humus Dina, o 96.1Ansas. Armas
342
BRDFANBSB V8.GNC.AMA. 54041331 anOCO a, p &
Iconographia
mês, realiza-se a Terceira Convenção
Nacional de Defesa do Petróleo, reu-
nindo delegados de 18 Estados. O pro-
jeto em pauta no Congresso sobre a
aliados, que gerava organizações como Muitas campanhas mobilizaram a questão é violentamente atacado. A
a Sociedade dos Amigos da América e opinião pública brasileira. Acima, campanha sob o slogan de "O Petróleo
ressuscitava outras como a Liga de De- protesto contra o afundamento de navios é Nosso" chegava ao seu auge.
fesa Nacional, misturava o repúdio ao brasileiros, agosto de 1942. Abaixo,
Quando fora promulgada a Consti-
nazismo com a luta pela democratiza- concentração pró-anistia, na praça da Sé,
tuição de 1946, em 18 de maio, já ocor-
ção do País. em 3/3/45. Na pág. ao lado, Francisco do
reram protestos contra os dispositivos
Por proposta do Sindicato dos Tece- Nascimento - o "Dragão do Mar" -, que tornavam possível a participação
lões do Rio de Janeiro, realizou-se, em que, à frente dos jangadeiros do Ceará,
do capital estrangeiro na exploração de
maio de 1943, uma Semana Antifas- liderou a luta contra o tráfico de escravos
nossas riquezas minerais. Mas foi no
cista, organizada pela UNE e demais para o Sul do País (ilustração de Angelo
ano seguinte, a partir dos debates que
entidades que participavam da campa- Agostini, Revista Ilustrada, 1884)
ocorreram no Clube Militar, que o
nha. tema do petróleo e da defesa do mono-
Quando o governo brasileiro decla- pólio estatal para sua exploração come-
tou guerra à Alemanha, em 31 de
caram a empolgar o País. Surge o Cen-
agosto de 1942, cem mil pessoas sauda-
tro de Estudo e Defesa do Petróleo. em
ram a decisão nas ruas do Rio.
Lumi? e
TENPO
»::“anan ta
DO
muLpAoPárte
Rio de Janeiro, 3 de outubro de Port as , ENGANAR a
ER-SE-p
1945. Mais de 150 mil pessoas 3 MESMOENGANAR
concentraram-se para ouvir oradores
defenderem a convocação de uma As-
sembléia Constituinte. O comício foi
transmitido para todo o País por várias
emissoras de rádio. Delegações de
vários Estados estavam na Capital Fe-
deral.
Com o final da Segunda Grande
Guerra e a derrota do nazi-fascismo, o
Estado Novo torna-se rapidamente
anacrônico e as manifestações pela de-
mocratização do País se sucedem.
Depois que o Brasil entrou na
Guerra, foi a anistia que passou a preo-
conographie
343
Devido às características dos gover-
Ex=
cito, que acabou se realizando em ja-
2
neiro de 1963.
.
No Regime Militar, milhares de
Calabouço.
tubro de 1953 foi sancionada a Lei atenção da população. Inicialmente, a vos movimentos de massas, por suas
2.004, que criou a Petrobrás. campanha para antecipar a data do ple- próprias características, não deixaram
são plebiscito e reformas de base mentarismo e que estava marcado para caráter organizativo para esse mesmo
344
Banco de Dados/FSP
principal problema era conciliar os in-
teresses da Light - para quem o rio de-
veria servir antes de mais nada à gera-
ção de energia elétrica - com medidas
despoluidoras que constavam dos pla-
nos Greeley-Hansen, de 1953, Hazen-
Sawyer e Hibrace, de meados dos anos
Os peixes voltaram ao limpo rio Tâmisa, Londres, em 1983
60 Mesmo tentativas de soluções mais
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/AMBIENTE: a poluição dos rios recentes permaneciam num impasse: a
"Solução Integrada", de 1974, e a sua
alternativa, o faraônico projeto Sane-
tan gran (Saneamento da Grande São
ça
dos Paulo).
rio
s
Assim, também um caso exemplar -
mas às avessas -, o Tietê dava a me-
A partir das últimas décadas, os rios das regiões mais dida dos problemas de poluição de
desenvolvidas do País vêm lentamente morrendo, resultado da águas no Brasil. De fato, esses proble-
mas eram mais graves nas grandes
desenfreada poluição das suas águas áreas metropolitanas brasileiras, das
quais a Grande São Paulo era a mais
A lição veio do velho continente eu- lização, transformando o Tâmisa em importante. Vinham em seguida pela
ropeu, em 1983, e foi ministrada com caso exemplar, verdadeira imagem de ordem, os outros grandes centros me-
ajuda apenas de um pequeno barco e uma comunidade urbana harmônica tropolitanos: o Rio, Porto Alegre, Re-
um caniço de pesca. A questão: era onde o rio era também local de lazer, cife, Salvador e Belo Horizonte. A par-
possível recuperar e manter limpo um recreação e beleza. tir daí, a deterioração dos rios
rio que atravessava o coração de um irradiava-se para as grandes regiões
grande centro industrial moderno? A As águas do Tietê, cobertas de desenvolvidas, a começar pelo interior
resposta - positiva - acabou trans- ,
rjfy'u eram 13191 399 rida +rr he do Estado de São Paulo.
um mundo morto
formando-se em um caso exemplar, O próprio Tietê, após deixar a me-
quando o mecânico londrino Rus- Essa era uma imagem totalmente trópole e tornar-se mais volumoso, de-
sell Doig tirou das águas do Tâmisa, o oposta, no entanto, à dos rios brasilei- purava em parte a poluição paulistana.
mais importante rio da Inglaterra, um ros, a começar pelo rio Tietê, Seme- Mas a sua situação voltava a piorar,
salmão de quase três quilos, sendo por lhante ao Tâmisa, mas atravessando a desta vez em seu curso médio, após re-
isso premiado com uma taça e 300 mil cidade de São Paulo, o Tietê em 1983 ceber a carga poluente de grandes
cruzeiros em dinheiro. era um rio imundo e malcheiroso. Suas afluentes do interior: os rios Jundiaí, Pi-
Um dos peixes mais exigentes em águas já sem transparência nenhuma e racicaba, Sorocaba e Capivari. O
matéria de limpeza, o salmão sumira do permanentemente cobertas por uma mesmo ocorria no interior do Paraná,
Tâmisa há exatamente um século, e o película oleosa, eram um mundo onde as cidades médias passavam a
seu retorno em 1983 era um atestado morto, a não ser pela grande variedade contribuir pesadamente para a polui-
fiel de que a poluição havia sido eficaz- de microorganismos perigosos que pro- ção de rios como o Iguaçu, próximo a
mente banida do rio inglês. O estigma liferavam nesse meio. Em vez de um Curitiba, ou o Tibagi, na região de Lon-
da poluição lhe deixara marcas profun- leito rochoso ou arenoso, o Tietê corria drina. E, mais além, no Rio Grande do
das, particularmente quando, em 1861, sobre uma imensa placa de dejetos se- Sul, também se agravavam as condi-
o marido da rainha Vitória - o príncipe dimentados, cujo peso era avaliado em ções das sub-bacias do rio Guaiba, com
Alberto - morreu de febre tifóide de- dois milhões de toneladas. destaque para os rios Gravatai, Sinos,
vido à insalubridade das águas do Tá- Mas o Tietê - assim como o Tâmisa, Taquari e Cai.
misa. No entanto, a partir de 1960, o rio antes da recuperação - era o resul- Nessas regiões se expandiam as con-
foi inteiramente recuperado através de tado da desorganização e da irrespon- tradições criadas entre o desenvolvi-
uma bem estruturada terapia de revita- sabilidade que acompanharam a indus- mento e o aproveitamento real dos rios.
345
ER. pranNBSB VB.GNC.AAA, 84041334 an 002 , p 83
Banco de Dados/FSP
gicos do São Francisco ocorreu em
1984, quando dezenas de toneladas de
peixes morreram perto dos municípios
de Curaçá (BA) e Santa Maria (PE). Os
suspeitos de responsabilidade eram a
Usina de Mandacaru e a Caraíba Me-
tais. Houve ainda o caso do rio Subaé,
perto de Salvador, onde 173 crianças
foram intoxicadas, nessa época, levan-
tando suspeita contra o cádmio, o zinco
e o cobre eliminados pela Companhia
Brasileira de Chumbo, da região.
Nos últimos 20 anos, o conto apontou ... dominavam o cenário da história ... indicavam uma grande vitalidade,
uma ampla diversidade na literatura do curta, como Mário de Andrade (à dir.), exemplificadas pela literatura de Rubem
País. Se no passado poucas figuras . .. nos anos 60 as correntes do conto . .. Fonseca (à esq.) e Lygia Fagundes Telles
ARTES/LITERATURA: a evolução doconto sob o Regime Militar Fausto Cunha, Hélio Pólvora, Renard
Perez. As últimas estréias, não casual-
mente, nos haviam trazido escritores
do porte de José J. Veiga, Rubem Fon-
seca e Nélida Pifion, Caio Porfírio Car-
neiro, Julieta de Godoy Ladeira e João
Antônio.
Nos últimos 20 anos, o conto não apenas resistiu Essas eram as linhas gerais do conto
brasileiro em 64. Fundas, nítidas, im-
ao autoritarismo, mas soube enfrentá-lo criticamente,
pressivas. Nunca antes nós tínhamos
- compondo assim um amplo mosaico da vida brasileira visto uma tamanha cota de valores tão
indiscutíveis. Contra eles, contra a flo-
Quando foi deflagrado o movimento Nem evitar alguma cronologia na en- ração em curso, e tentando apagá-la,
de 64, o conto brasileiro já se encon- trada em cena dos contistas, pelo me- extingui-la, varrê-la, se armaram os
trava em plena ascensão. Até esta fase nos útil para localizá-los. Olhando mais processos diluidores de um sistema re-
mais contemporânea, nós nos havia- a sua multiplicidade, a exposição de gressivo. Como foi que atuaram?
mos habituado, e desde o tempo dos tantos desenhos e cores e relevos, pro- É inegável o clima de antiintelectua-
nossos precursores (século e meio curemos reconstituir a extensa galeria lismo destes últimos 20 anos. Ele se es-
atrás), a ver sempre uma grande figura que tinhamos então. tabeleceu numa sombria nuvem geral,
dominando isolada o cenário da his- planejadamente recusando tudo o que
tória curta. Assim acontecera com Jus- significasse a visão humanística da so-
tiniano da Rocha, Machado de Assis e ciedade, e assim fechado, e incivil, caiu
Simões Lopes Neto, com Lima Barreto tempestuoso sobre a produção literá-
ou Adelino Magalhães, e na melhor das As contribuições mais sedimentadas, ria. Isolando-a, pressionando-a,
hipóteses, pelas alturas 'do Moder- e que também se mostravam como intimidando-a. Tal política de contra-
nismo, com as presenças simultâneas aberturas sucessivas, eram personaliza- cultura se exerceu em diferentes senti-
de Mário de Andrade, João Alphonsus das em um Origenes Lessa, um Ber- dos.
e Marques Rebelo. Em começos dos nardo Ellis, um Moreira Campos. A
1
anos 60, entretanto, as correntes cruza- Geração de 45 se mantinha no seu forte
das do conto indicavam uma extraordi- núcleo central, com Breno Accioly, tu
nária vitalidade. O gênero compunha José Condé, Lygia Fagundes Telles e
um extenso e vivo painel, feito de obras Murilo Rurião. A renovação de Gui- A censura foi o principal instru-
sem dúvida importantes. marães Rosa, Clarice Lispector e Dal- mento do sistema militar, para o seu
Seria esquemático buscar o alimento ton Trevisan, as construções pessoais objetivo de tornar a literatura uma ex-
desses escritores, querer ordená-los por de Leonardo Arroyo, Helena Silveira e pressão dócil, amaciada ou inócua,.
tendências e mesmo inflexões. A tônica Almeida Fischer. Os destacados Os- Tem-se discutido o papel que ela de-
da nossa época, ao que aponta, é a di- man Lins, Samuel Rawet, Otto Lara sempenhou, em termos comparativos,
versidade. E esses perfis tão vários nos Rezende, em contraponto com os tam- desejando mostrá-la mais opressiva em
permitem apenas enumerar, ainda que bém excelentes Autran Dourado, Leo outros setores das artes, por exemplo o
não se possa fugir às aproximações. Godoy Otero, Edilberto Coutinho, ou teatro e a música popular. Entretanto,
347
BR DFANBSB VB.GNC.AAA. 84041333 In COR pã]
"A única finalidade da ciência está qualquer lugar, independentemente com o desenvolvimento científico
em aliviar as canseiras da vida hu- das fronteiras políticas e dos sistemas como também perseguiu ativamente os
mana." (Galileu Galilei, físico italiano econômicos. Mas é totalmente falso que, em Portugal e suas colônias, se
do século 16 e um dos fundadores da que o esforço que foi preciso desenvol- aventuraram nessa atividade por conta
ciência moderna.) ver para se chegar a estas leis universais própria. O Brasil sofreu as consequên-
Quando dom João VI decidiu fundar tenha sido o mesmo em qualquer país. cias «disso desde a sua descoberta e
o Museu Real, no Rio de Janeiro, em D. João VI precisou comprar o acervo ainda não se havia livrado delas no final
1818, dando início, com grande atraso, de um cientista alemão porque, com do século 20.
à moderna investigação científica no exceção de alguns casos isolados, não A vinda do rei de Portugal para o
Brasil, foi preciso resgatar em dinheiro se fazia pesquisa no Brasil, até então. Brasil modificou um pouco a situação
o pequeno conhecimento existente so- As dificuldades estavam relacionadas da colônia. Revelando a preocupação
bre a realidade nacional. O patrimônio com o papel de Portugal na coloniza- de não deixar o conhecimento da reali-
inicial do museu, de fato, foi adquirido ção do País. Embora tivesse absorvido dade nacional nas mãos de estrangei-
ao mineralogista alemão Abraham e cultivado a brilhante ciência surgida ros, a criação do Museu Real - depois
Werner, um dos fundadores dessa ciên- na Europa durante o Renascimento, a Museu Nacional - permitiu que a pes-
cia e também professor do futuro "pa- atrasada metrópole portuguesa caiu quisa científica fosse, pela primeira vez,
triarca da independência", José Boni- logo em seguida sob o domínio intelec- realizada de forma organizada no País.
fácio de Andrada. tual da contra-reforma religiosa. A par- Com poucos recursos e espirito de pes-
As leis da ciência são válidas em tir daí, não só deixou de preocupar-se quisa incipiente, mesmo então o museu
| é .
r-R
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RCN
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BR DFANBSB 4041323 , pq3
Bibliotecas Nacional
távamos em condições de desempe- núncias frequentes, este item era tam-
nhar. O físico José Goldemberg, em bém inflacionado por remessas "esca-
1975, embora ressaltando a enorme im- moteadas" de lucros não relacionados
portância das verbas destinadas à ciên- i L #! necessariamente com importação de
ª "r_AFITII'Gbªnl,
351
BR DFANBSB V8.GNC.AMA, $4041B3an
002, p 95
tações desse tipo - imensas fontes de quezas, entre outros temas. Assim, a re-
alimentos - transformam-se em verda- ligadas à ciência.
união de 1977, marcada inicialmente
deiros imãs de pragas, a ponto de O fato é que o Regime Militar insti-
para Fortaleza, foi transferida para São
ameaçar torná-las inviáveis economica- tucionalizou a ciência de modo autori-
Paulo, onde contou com a ajuda de di-
mente, se não se aprimorassem varie- tário, centralizando absurdamente seus
versos setores da oposição. A arquidio-
dades geneticamente mais resistentes. órgãos principais. O comando geral da
cese paulistana, através da Pontifícia
Ocorre que o Regime Militar tinha in- política científica atuava sob o Minis-
Universidade Católica (PUC), cedeu
teresse na soja - produto muito bem tério do Planejamento, que interligava
suas instalações para o encontro.
pago no mercado internacional - como ações do CNPq e outras entidades
O recuo do regime desencadeou rea- como a FINESP (Financiadora de Es-
forma de obter divisas externas. Assim ções diferentes entre os cientistas e, em
se explicavam os gordos recursos da tudos e Projetos) e o BNDES (Banco
1978, Rocha e Silva revelou-se contra
EMBRAPA (Empresa Brasileira de Nacional de Desenvolvimento Econô-
uma tentativa de aproximação entre a mico e Social). A política científica,
Pesquisa Agrícola), comprometida com SBPC e o governo. As diretrizes poste-
estudos importantes para diversos pro- além disso, foi organizada a partir de
riores da SBPC mostraram que a co-
dutos de exportação. Ela recebeu, no diretrizes estipuladas, em 1964, com
munidade científica tendia a despoliti-
orçamento de ciência e tecnologia de participação do próprio Conselho de
zar gradualmente a entidade, uma vez
1981, recursos maiores que o próprio Segurança Nacional. Na verdade,
encerrado o ciclo mais terrorista dos
CNPq (Conselho Nacional de Desen- desde a Segunda Grande Guerra, o pla-
governos do Regime Militar.
volvimento Científico e Tecnológico), nejamento da ciência era uma necessi-
o principal órgão governamental para o dade cada vez mais premente das gran-
As multinacionais precisavam no
planejamento científico no Brasil, A des empresas internacionais. Para
EMBRAPA nesse ano recebeu 18% do País só de técnicas simples implantar-se nos países subdesenvolvi-
Orçamento para a ciência, contra 14o% dos, as multinacionais precisavam de
No entanto, as dificuldades políticas técnicos locais que conhecessem e sou-
destinados ao CNPq, com o governo prosseguiriam, como se bessem lidar com as novas tecnologias
via por um documento da SBPC, de em surgimento: radares, foguetes, com-
Após 64, a SBPC denuncia o
1983, dirigido ao Ministério do Planeja- putadores, produtos químicos deriva-
fechamento político mento, pedindo reformas nos mecanis- dos de moléculas complexas, etc. Exa-
mos de decisão e de fomento da polí- tamente como estava nos planos do
Em vista de todos esses fatos, os pla- tica científica,
nos do Regime Militar acabaram, ironi- Regime Militar.
O jornal O Estado de S. Paulo O CNPq era de 1951, criado por Ge-
camente, forçando os cientistas a sair comentou em editorial o documento, túlio Vargas com atribuições muito li-
dos laboratórios e vir para as ruas dis- afirmando que ele representava uma
mitadas (desenvolver a energia nu-
cutir política. E em nenhum lugar isso manifestação de "cansaço, impaciência clear). No mesmo ano foi criado um
se revelou melhor dos que nas famosas e desconfiança" por parte dos cientis-
reuniões anuais da SBPC, Após o golpe órgão-chave para a formação de pes-
tas. Afirmava ainda que estes últimos quisadores, a CAPES (Campanha de
de 1964, sob a presidência de seu fun- não se consideravam representados nos
Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino
dador, fisiologista Maurício da Rocha e órgãos de decisão, "atribuindo a condi- Superior). Ambos passaram por diver-
Silva, a entidade máxima da comuni- ção de usurpadores" aos então ocupan- sas reformulações sob o Regime Mili-
dade científica denunciou o fecha- tes do comando das entidades oficiais
tar, até cair sob o comando do Minis-
mento político e se recusou a negociar
com os governos dos generais, Nesse
período, até 1969, perdurou um clima
de expectativa em que ainda se articu-
Modelo americano
lavam os novos planos para a ciência
nacional, As reuniões da SBPC se tor-
Nos EUA, a estrutura de planeja- contra apenas 22% em 1921.
nariam cada vez mais importantes en-
mento e gastos científicos privilegia as Outro aspecto importante. Essa oli-
tre 1969 e 1973, a etapa mais dura da
grandes empresas e a pesquisa em ar- garquia privilegiada se distribuía pra-
repressão política, quando os cientistas
mamentos, em detrimento das univer- ticamente por apenas cinco grupos de
seriam perseguidos, presos, cassados e
sidades e da busca do conhecimento indústrias, nessa ordem: aeroespacial,
demitidos às dezenas. da natureza em benefício dos ho-
Foi então que o regime impôs o seu eletro-eletrônica, metalúrgica-
mens. Segundo uma análise feita em mecânica, química pesada e instru-
esquema institucional de pesquisa. Mas
1962, quando se gastou 15 bilhões de mentação. Monopolizados pelas mui-
também abriu seus flancos políticos: a
dólares com ciência e tecnologia nos tinacionais, nesses grupos se instalava
partir de 1974, em plena "distensão" do
EUA, a maior parte dos recursos dis- a poderosa indústria militar ameri-
presidente Geisel, os cientistas tiveram
poníveis (65%) saia do bolso do Es- cana. Dados posteriores confirma-
o seu período de maior agitação oposi-
tado, sendo o restante investimentos riam a força da indústria bélica: em
cionista, só arrefecendo seus ataques
privados. No entanto, menos de 26% 1982, ela era responsável por 75% dos
após a "abertura" do general Figuei-
desses gastos eram feitos nos institu- gastos com pesquisa nos EUA, Nesse
redo, em 1978, tos federais ou nas universidades.
Os encontros mais concorridos da ano, apenas 3,6% desses investimen
Computadas apenas as 400 maiores -
SBPC, de fato, começaram em 1974, tos, segundo os analistas, tinham rela-
empresas (com mais de cinco mil em- ção com a busca de conhecimentos
em Recife, passando depois por Belo
pregados), verifica-se que elas. captu- básicos. Um ano depois, a parcela da
Horizonte, Brasília e São Paulo. Neste
ravam 62%, do total de gastos. Assim, indústria bélica subiria para 76,6%,
último, de 1977, não contou com ver-
não surpreende constatar que, em enquanto a busca do conhecimento -
bas oficiais, um revide do governo às
1957, estas empresas detivessem 60% mero subproduto das artes de matar
denúncias corajosas, levantadas nos de-
das patentes registradas nos EUA, - cairia para 3,5%.
bates e assembléias anteriores, contra a
tortura e a distribuição desigual das ri-
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Agencia Estado
Sílvio Ferreira/mpril Press
Paulo Barvosa
tério do Planejamento, em 1974. menor que o dos holandeses nas pri- tes da criação da SBPC, episódio em
Assim, embora tenha sido útil para o meiras manifestações científicas no que Rocha e Silva teve um papel desta-
regime, a política econômica teve um Brasil. E de um holandês, Georg Marc- cado. Uma personalidade marcante,
efeito limitado para a ciência brasileira, grave, o livro História Natural do Brasil, tido como briguento e brilhante, o físio-
pouco mais que uma reedição de seus de 1648, onde aparecem as primeiras logista havia tido uma carreira comum
pequenos avanços em certos períodos descrições sistemáticas da flora nordes- a muitos outros dos nossos grandes
do passado. Era interessante constatar tina. Continha também um capítulo so- cientistas deste século. Filho de médico
que alguns desses períodos de avanço bre medicina no Brasil que o tornou e neto de um pequeno comerciante
ocorreram quando nossos cientistas pu- um dos livros sobre o assunto mais im- português emigrado, Rocha e Silva
deram dedicar-se aos problemas rela- portantes do século 17. teve sua iniciação à pesquisa, na dé-
cionados com a realidade nacional. Os Isso não significava, de forma al- cada de 30, com os célebres irmãos
cientistas dos institutos biológicos, na guma, que os cientistas brasileiros pre- Osório de Almeida, conhecidos por te-
virada do século, voltados para o pro- tendessem fechar os olhos às áreas de rem formado várias gerações de fisiolo-
blema das doenças tropicais, foram ca- vanguarda da ciência internacional. Ao gistas em um laboratório montado em
pazes de fazer a caracterização de contrário, denunciavam a ciência utili- sua própria residência, no Rio.
patologias ainda desconhecidas, tarista promovida pelo Regime Militar, Em 1948, ele estava no Butantã -
como a febre tifóide, em São Paulo. alertando que, quando a pesquisa fun- que então passava por um período de
Desenvolveram-se, nesses institutos, damental foi deixada de lado, houve restauração de seu antigo prestígio - e
grandes cientistas, como Vital Brasil, um enfraquecimento geral da pesquisa participou do episódio que deu origem
descobridor do soro antiofídico, tam- no País. à SBPC.
bém trabalhando em uma área pouco O incidente detonador foi a designa-
conhecida pelos europeus. Outro A SBPC já surgiu para combater ção de Eduardo Vaz para a direção do
exemplo é o de Oswaldo Cruz, que de- arbitrariedades obscurantistas Instituto - um ato arbitrário do gover-
senvolveu métodos pioneiros de saúde nador de São Paulo à época, Adhemar
pública. O mesmo se pode dizer de Mas, certamente, não foi por acaso de Barros. Mais ligado à indústria far-
Carlos Chagas, o primeiro a descrever que uma das maiores descobertas da macêutica que à pesquisa, Vaz decidiu
a terrível doença que leva seu nome. ciência no Brasil, destacando seu des- fechar seções importantes de pesquisa
Ao mesmo tempo, Santos Dumont cobridor numa das áreas mais ativas da no Butantã, como o Hospital Endocri-
tornou-se o inventor do avião apenas pesquisa mundial, tenha sido feita nológico. Também demitiu pesquisado-
porque teve acesso à tecnologia fran- num instituto biológico. Seu autor foi o res por motivos políticos, como Gastão
cesa, em 1906. falecido professor Maurício Rocha e Rosenfeld. O resultado, um ano depois,
Os portugueses, em 1711, apreende- Silva, (1910-83), que em 1984 identifi- seria o reconhecimento, por parte dos
ram um livro denunciando o descaso cou a bradicinina, uma molécula natu- cientistas, de que precisavam de uma
com que tratavam o desenvolvimento e ral dos tecidos vivos que mais tarde se entidade representativa - a SBPC.
o ensino das técnicas empregadas no demonstrou ter papel importante em Através dela, pretendiam veicular suas
fabrico do açúcar, então a principal ati- diversos mecanismos fundamentais dos idéias e suas posições, voltando-se,
vidade econômica do País: Cultura e organismos, como a pressão arterial, a como afirma já sob o Regime Militar
Opulência no Brasil por suas Drogas e coagulação sanguinea e as defesas or- um cientista, "contra a desastrosa in-
Minas, de André Antonil. Por atitudes gânicas. tromissão dos governos na vida das
como essa, acabaram tendo um papel Essa descoberta foi feita um ano an- instituições de pesquisa".
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deira já havia ganho âmbito nacional questão da sexualidade, da saúde, de sendo eleitas, mas elegeu-se uma vice-
com a fundação do Movimento Brasi- conscientização até a atuação política. governadora (no Estado do Acre) en-
leiro pela Anistia. Todos eles foram importantes, fosse tre sete candidatas. E, das que disputa-
Essa forma de exercer a cidadania se para a organização de mulheres, fosse ram o cargo de prefeita, 81 tiveram é-
somou à ideologia do movimento femi- para romper o debate público. Nesse xito.
nista, que preconizava justamente a sentido foi significativa a Frente de
plenitude da igualdade de direitos. Não Mulheres Feministas de São Paulo, que Nos anos 80 a muiher participa
se tratava, como muitos tentaram misti- produziu em 1980 e 1981 uma série de mais na vida política do País
ficar, de abandonar a casa ou a família, debates públicos sobre a questão da
mas de ter direito de lutar por ela, se mulher, procedimento este que poste- Na década de 80, aliás, observava-se
este fosse 0 caso, no espaço político. riormente foi seguido por outras enti- uma maior participação quantitativa e
Tratava-se de levar para a arena as dades. Nesta série, o primeiro debate qualitativa da mulher na vida política
questões do espaço supostamente pri- realizado no Teatro Ruth Escobar, dis- brasileira. A partir de 83 esse movi-
vado. cutia com todos os partidos suas pro- mento apresentou algumas inovações,
A repercussão destas posições se fez postas para com a mulher. Como se dentre as quais cabe destacar a criação,
sentir também ao nível dos sindicatos, pode imaginar, a maioria não tinha pro- a nível de Estado, de dois conselhos
que, conquanto tenham em seus qua- postas, exetuando-se o PMDB, que de Condição Feminina, o de São Paulo
dros poucas mulheres, passaram a trouxe um pré-projeto de criação de e o de Minas Gerais. A característica
incorporá-las em maior número. um Departamento Feminino. As elei- destes Conselhos é a de, ao abrir um es-
E este novo quadro permitiu que os ções de 1982 marcaram algumas inova- paço para a atuação da mulher na es-
grupos feministas do Brasil todo ini- ções. O eleitorado feminino represen- trutura do Estado, tentar também abrir
ciassem um projeto de transformação tava então 45% dos votos. As mulheres 'um espaço para que os movimen-
do Código Civil no sentido de equipa- se candidataram a todas as instâncias, tos femininos e feministas tenham um
rar as condições jurídicas da mulher e mas não em todos os Estados. Pôde-se canal que veícule suas reivindicações
do homem. A proposta foi encami- observar que houve uma elevação no dentro do mecanismo do Estado. No
nhada e aprovada pela Câmara de De- número de candidatas e de eleitas, ca- conselho de São Paulo, por exemplo,
putados em 1984 e aguardava a ratifica- racterizando uma tendência de que 60% das conselheiras são mulheres da
ção do Senado. mais mulheres entraram na disputa sociedade civil e 40% são funcionárias
eleitoral. Candidataram-se duas mu- de secretarias de Estado. Com isto se
Em 82, o eleitorado feminino lheres para o Senado, 58 para a Câmara procura preservar a autonomia dos gru-
representava 45% dos votos dos Deputados. Nenhuma mulher foi pos organizados, que têm sua atuação
eleita para o Senado, mas para a Câ- absolutamente autônoma e específica,
A ação dos grupos feministas mara dos Deputados oito se elegeram. mas se abre um espaço onde a partici-
diferencia-se e multiplica-se pelos Para as Assembléias Legislativas pação se faz presente.
vários Estados brasileiros. Formaram- candidataram-se 134, elegendo-se 28
se grupos com as mais diversas preocu- mulheres no Brasil todo. Duas
pações: desde aqueles dedicados à candidataram-se a governador, não Eva Blo
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BR DFANBSB V8.GNCIAAMA, 84043334 an Coa ,p39
Dados/FSP
naram que os prefeitos das capitais pas-
sariam a ser nomeados e não mais elei-
tos; aumentou-se, além disso, o número
de municípios classificados como "es-
tâncias hidrominerais" ou "áreas de se-
gurança nacional", cujos prefeitos tam-
A partir de 1982, após a vitória da oposição em vários Estados, a insatisfação dos bém não eram eleitos, mas nomeados
prefeitos leva-os, sob a liderança de Orestes Quércia (ao centro), a formar a Frente (no final de 1984, quando o Regime
Municipalista Militar já parecia exaurido, foi devol-
vida a autonomia para 74 desses mu-
POLÍTICA/MUNICIPALISMO: a perda de autonomia dos municípios nicípios).
um veículo blindado a cada 18 horas, em 1945, o Brasil foi inundado por ar-
um avião a cada 20 horas e mil armas li- mas e equipamentos bélicos cedidos
geiras e médias por semana. pelos americanos.
Esse complexo era composto por Terminada a guerra, uma nova reali-
mais de 350 empresas estatais e priva- dade internacional surgia. Os Estados
das (nacionais e estrangeiras), das O Regime Militar alçou o País ao sexto Unidos passam a ter um papel determi-
quais 50 produziam material bélico di- lugar no ranking mundial dos nante em todo o mundo capitalista e
retamente. Empregava mais de 200 mil exportadores de armamentos. uma tensão surge entre a nação ameri-
pessoas e movimentava algo em torno Acima, Silvio Frota, então ministro do cana e a URSS. Com a justificativa de
de dez bilhões de dólares por ano, o Exército, examina carros Cascavel, em defender seus aliados, os Estados Uni-
que representava 5% do PNB (Produto set./75; abaixo, o lança-foguetes Astros dos criaram o Programa de Assistência
Nacional Bruto). II, produzido pela Avibrás Militar (MAP), visando a fornecer ar-
Segundo estimativas, o País, na dé-
cada de 80, conseguia exportar por ano
mais de dois bilhões de dólares e as ar-
mas passaram a ocupar o terceiro lugar
entre nossos produtos de exportação,
competindo com o tradicional café,
Tornavam assim, em plena recessão
mundial, uma esperança de manter em
pé o modelo de desenvolvimento brasi-
leiro, atolado numa dívida externa que
chegava a 100 bilhões de dólares em
1984.
Nossos clientes, mais de 30 nações
'por todo o mundo, cobriam todo o
continente latino-americano, espa-
lhavam-se pela Africa Negra e Ori-
ente Médio, reunindo num mesmo
conjunto países como o Qatar, um pe-
queno emirado árabe, e a República
Popular da China. Eles podiam esco-
lher entre aviões (para transporte de
tropas, de patrulha, de treinamento
avançado, de ataque), tanques e carros
blindados de combate e reconheci-
mento, navios, lanchas de patrulha,
357
ar va.Gnc.aaa, 84044334 ancoõap 204
mamentos, créditos e treinamento para estrategistas, que sonhavam em tornar trial, nos moldes daquele. Nesse
as forças armadas latino-americanas. o Brasil uma grande potência. Um mesmo ano, era instalada a Comissão
Na verdade, aproveitando-se de sua aliado se apresentou de imediato: a ini- de Mobilização Industrial de nível
gião, os Estados Unidos garantiam um Os militares agora no poder eram li- da Indústria.
mercado para suas armas, em geral já gados a vários empresários paulistas Tendo decidido basear no mercado
utilizadas na Segunda Grande Guerra que, arregimentados pelo IPES (Insti- interno o seu reequipamento, as Forças
ou na guerra da Coréia, na década de tuto de Pesquisas e Estudos Sociais), ti- Armadas puseram a serviço da indús-
50, afastando concorrentes europeus. E, nham participado da conspiração con- tria privada os seus centros de pesquisa
assumindo a responsabilidade de trei- tra o governo Goulart. Estes formaram, e desenvolvimento, como o Centro
nar os militares latinos no seu manejo, em 1965, em São Paulo, o Grupo Per- Tecnológico Aeroespacial, o Instituto
o Departamento de Defesa americano manente de Mobilização Industrial de Engenharia Militar e o Centro de
criava vários mecanismos para influir (GPML). A iniciativa partiu de empre- Pesquisa da Marinha.
diretamente naquelas forças armadas. sários organizados na Federação das As encomendas feitas pelas três Ar-
Para ter acesso àquele armamento, Indústrias do Estado de São Paulo mas, nos anos que se seguiram ao
nosso país assinou um acordo militar (FIESP) e principalmente dos setores golpe, representaram um mercado ga-
com os EUA, em 1952, Ele não impli- ligados à indústria automobilística. rantido numa época de recessão e mui-
cavá" na transferência de tecnologia e, tas indústrias começaram primeiro a
Empresário, líder do IPES, define
quando o Brasil o denunciou, em 1977, fornecer a elas equipamento militar,
era considerado um entrave ao desen- os objetivos do grupo depois a prestar serviços técnicos e, por
volvimento, de nossa indústria bélica. último, absorvendo tecnologia, des-
Ao se iniciar a década de 1960, já ti- O empresário Vitório Ferraz, líder locando-se para a produção direta de
nha ficado claro aos militares brasilei- do IPES e primeiro presidente do produtos bélicos.
ros o preço de uma vinculação unilate- GPM, definiu os objetivos do grupo Foi o caso da Bernardini S.A. Indús-
ral e sem limites com uma grande po- no seu lançamento: "Tentará alcan- tria e Comércio e da Biseli Viaturas e
tência. O material bélico se tornava ra- car a adequação dos padrões indus- Equipamentos Industriais Ltda., anti-
pidamente obsoleto e era cada vez mais triais às necessidades das Forças Ar- gas fabricantes paulistas de cofres-
difícil conseguir peças de reposição. madas. Dará incentivo à pesquisa in- fortes e de caminhões blindados para
Surgiu uma defasagem entre o arma- dustrial no campo militar. Ajustará a transporte de valores. Com a experiên-
mento que era enviado ao nosso país e fabricação de equipamentos, máqui- cia adquirida ao modernizarem, com a
o que estava sendo fabricado nas gran- nas e acessórios para as Forças Ar- assessoria de técnicos do Exército, os
des potências, e as necessidades de ma- madas. Indicará as firmas que esti- velhos tanques Stuart M-3AL, proje-
nutenção esbarravam sempre nas nos- verem melhor adaptadas à execução taram o Carcará, um carro de combate
sas dificuldades cambiais. do serviço ou fabricação de equipa- moderno e ágil, que passaram a forne-
Para complicar ainda mais, com o mentos militares." cer ao próprio Exército e a exportar.
envolvimento crescente dos Estados Uma prova de que esse relaciona- A empresa que se tornou o carro-
Unidos na guerra do Vietnã, aquele mento prosperou e uma indicação de chefe da indústria bélica no Exterior foi
país se viu frente a necessidades gigan- que a indústria bélica se espalhou a Engesa (Engenheiros Especializados
tescas de material e munições e passou pelo País podem ser vistas no fato de S.A.). Organizada no início dos anos
a restringir a transferência de equipa- que, em 1984, as federações indus- 60, em São Paulo, ela adaptava tração
mentos para a América Latina. triais de 18 Estados tinham criado de- total em caminhões civis e militares.
Por outro lado, os americanos come- partamentos de mobilização indus- Criou um sistema inédito de tração.
cavam a se mover num novo parâmetro
estratégico. Não se tratava mais de ar-
mar seus aliados para que se defendes-
sem de um inimigo externo, mas prepa-
rar e armar os exércitos para missões
de contra-insurgência. O MAP é gra-
dualmente esvaziado de suas verbas em
prol de um novo programa - o Security
Assistance,
Em busca do armamento que não
era fornecido pelos EUA, o subconti-
nente latino-americano retornou ao
tradicional mercado europeu de armas. Abs um e ”!"/'.
No período compreendido entre 1967 e sia, --SRA É. vt. a
358
nentes de antanho, o Brasil não cons-
cimento tecnológico.
mentos marítimos).
dos e Projetos).
Nos anos 80, o Brasil já amealhava entre capacitando-o para a exportação. To-
seus compradores de equipamento militar dos os negócios com o Exterior são fei-
País recebia a visita do príncipe Sultan, da venda de equipamentos deve ser apro-
Arábia Saudita (acima, com Whitaker vada pelo Conselho de Segurança Na-
que mais tarde aplicaria nos carros As exportações são vitais para essa
blindados desenvolvidos com o auxílio indústria que supre 75% das necessida-
Iconographia
trole por parte da comunidade, cami-
nhar a passos largos para a produção
de mísseis balísticos com cargas nuclea-
res. Produtos inúteis - pois não resol-
A partir da Segunda Grande Guerra, o País foi inundado pelo equipamento bélico veriam qualquer dos principais proble-
americano. Acima, soldados da FEB, em campanha na Itália, utilizando material mas nacionais - e perigosos.
de combate fabricado nos EUA
A exportação bélica transformou o
de uso final (não impor limitações ao mas faz lembrar que elas não são um Brasil numa ameaça à paz
destino que o comprador dará a elas) e produto neutro. Mais que simples mer-
a grande integração entre fornecedores cadorias, as armas são instrumentos de A necessidade de exportar a qual-
e clientes são fatores extras que expli- destruição e seu aumento desenfreado quer custo levou o País a se tornar, no
cam o êxito brasileiro nesse mercado. ameaça os precários equilíbrios regio- subcontinente americano, uma ameaça,
O Iraque, nosso principal cliente e o nais onde se apóia a paz mundial. E o para a paz e um reforço para regimes
segundo maior comprador de armas do Brasil, sendo responsável por 40% das rendenados em todo o mundo. A
mundo, fez 220 sugestões para modifi- exportações de armas do Terceiro venda de aviões Tucano da Embraer
car o protótipo original do Cascavel e Mundo, contribui para fomentar ou no para Honduras, em 1984, foi conde-
muitas delas foram incorporadas ao mínimo viabilizar, essas guerras entre nada pelo Grupo de Contadora -
modelo. Também financiou a constru- miseráveis, países empenhados na procura de uma
ção dos Astros II, um complexo sis- Especialistas de todo o mundo, liga- saída pacífica para os conflitos da
tema de lançadores múltiplos de fogue- dos aos organismos e entidades defen- América Central.
tes apontados eletronicamente. O item soras do desarmamento, há anos se Em 1979, durante a vigência da polí-
mais vistoso na prateleira bélica brasi- preocupam com o fato de que de um tica de defesa dos Direitos Humanos
leira foi desenvolvido pela Avibrás, terço à metade dos recursos mundiais do governo Carter, o Brasil substituiu
que, tendo sido criada em 1961 por en- empregados em ciência e tecnologia es- os Estados Unidos no fornecimento de
genheiros oriundos do ITA (Instituto tão a serviço da indústria armamentista armas a uma das mais sanguinárias di-
de Tecnologia da Aeronáutica), come- e de que nela se concentram 40% dos taduras da América Latina - o Chile.
çou produzindo foguetes meteorológi- quadros técnicos e científicos mais qua- José Luiz Whitaker Ribeiro, presidente
cos e passou, com sucesso, aos artefa- lificados. Alertam que recursos escas- da Engesa que em 1982 assumiria a pre-
tos bélicos, sos que poderiam ser empregados na sidência da IMBEL, articulador do ne-
Se levarmos em conta que, desde saúde e na agricultura são desviados gócio, passou a gozar de tanto prestígio
1945, 9%, dos conflitos armados aconte- para essa atividade. Esse quadro só se naquele país que chegou a ser convi-
ceram em países de economia sub- agrava no continente latino-americano. dado para um jantar íntimo no palácio
desenvolvida - a guerra entre as gran- O Instituto Internacional de Pesquisa presidencial. Compareceu, ergueu
des potências manteve-se relativa- sobre a Paz, de Estocolmo, estima que brindes aos anfitriões e presenteou a
mente sob controle -, veremos que o 25% da divida externa da América La- primeira dama com uma água-marinha.
Brasil está atuando no filé mignon do tina, que monta a 350 bilhões de dóla- Afinal, era aniversário de casamento
mercado mundial de armas. res, derivam da compra de armas no do casal Pinochet.
Essa proximidade entre pobreza e ar- Exterior.
360
BR DFANBSB VB.GNCAMA, 84044331 an 002, o IO4
A crise da educação
A primeira vista, o Regime Militar de universitários no País, número dez colar (atual primeira série do primeiro
instalado no País em 1964 podia apre- vezes maior que em 1964, e os alunos grau), 4,7 estudantes concluíam a uni-
sentar, depois de 20 anos, números que de pós-graduação tinham multiplicado versidade; em 1980, esse número já
indicassem resultados auspiciosos no por 15 o seu número, chegando a 29 chegava a 34. E esta melhora era geral.
campo da educação,. mil no mesmo ano. Sempre tomando aquelas mil matricu-
A taxa de 'analfabetismo caira de Entre 1960 e 1980, triplicou o corpo las como referência, em 1960, 24,6 alu-
46,8% em 1960 para 32% em 1980 e a docente do primeiro grau e quintupli- nos terminavam o ginásio (equivale a
população em idade pré-escolar, prati- cou o número de professores no se- concluir a oitava série do atual pri-
camente desassistida na década de 60, gundo grau e nas universidades. meiro grau) e 127 conseguiam isso em
viu as matrículas da pré-escola mais Na formação de pesquisadores de 1980. E quase quadruplicou (22,2 para
que quintuplicarem depois de 1970. alto nível, no biênio 1970-71, 2.683 alu- 81) o número daqueles que concluíam
Enquanto a população aumentou nos concluiam o mestrado e apenas 87 o segundo grau (o antigo colegial). En-
cerca de 70%, entre 1960 e 1980, as terminavam o doutoramento. No início tretanto, como a estrutura educacional
matrículas do primeiro grau passaram da década seguinte esses números ti- atendia às necessidades de um determi-
de 8,4 milhões para 22,6 milhões - um nham aumentado para 20.744 e 1.697, nado tipo de industrialização e desen-
aumento de 170%. As matrículas do se- respectivamente - formavam-se 20 ve- volvimento, atrelados ao capital estran-
gundo grau decuplicaram no mesmo zes mais doutores, geiro e que excluiam dos seus benefi-
período, chegando a 2,8 milhões. Em 1960, para cada mil alunos matri- cios parcelas significativas da popula-
Em 1980, havia mais de 1,3 milhão culados no primeiro ano do grupo es- ção, essa estrutura de educação refletia
, 361
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Repressão
nas escolas
Banco dt Dados, SH
membros da universidade.
Um indicador da violência com
que o regime se empenhou em com- Convota ça“? f
bater a organização e participação
política dos estudantes brasileiros é
fornecido pelo destino dos nove presi-
E xce de nt e
dentes da UNE que tiveram suas ges- O movimento dos excedentes - aprovados nos vestibulares que não tinham vagas nas
tões na década de 1960: Quatro foram
universidades - teve grandeforça nos anos 60. Vinte anos depois, o regime tinha a sua
presos, dois exilados, dois banidos e
um deles - Honestino Guimarães -
solução: ampliou as vagas, apoiado sobretudo em universidades particulares
desapareceu em 1972. Os dados do Censo de 1980 confir- cio da década de 1980, ainda tinha um
A primeira tentativa de destruir as mam essa visão, pois embora o índice perfil altamente excludente. Pratica-
entidades autônomas dos estudantes de analfabetismo no Brasil estivesse na mente a metade das crianças que entra-
veio com a Lei Suplicy de Lacerda casa dos 32%, ele era de 18% nos Esta- vam na primeira série do primeiro grau
(4.464/64), de 9 de novembro de 1964, dos de São Paulo e Rio de Janeiro e de não chegavam à série seguinte. A
que criava o Diretório Nacional dos 17,3%no Rio Grande do Sul. Por outro UNESCO considera desastrosa a situa-
Estudantes para substituir a UNE, os lado, Estados como Pernambuco ção daqueles países onde entre cada
diretórios estaduais para o lugar das (50,2%) e Piaui (56,7%) tinham índices mil crianças menos de quinhentas con-
uniões estaduais (UEEs) e os diretó- comparáveis aos que o Estado de São cluem o primeiro grau. No Brasil, esse
rios acadêmicos, que fariam as vezes Paulo ostentava na década de 30. número não chegava a 140.
dos centros acadêmicos e grêmios. Talvez o dado mais preocupante
A UNE e as UEEs foram tornadas fosse constatar que, em 1981, sete mi- Metade dos alunos abandona a
ilegais pelo Decreto-Lei no 228, de 28 lhões de crianças em idade escolar escola já na primeira série
de fevereiro de 1967, mas foi o Decre- obrigatória (sete a 14 anos) eram anal-
to-Lei no 477 (26 de fevereiro de fabetas.
1969), diretamente derivado do AI-5, O Censo de 1980 já revelara que 7,5 E se atentássemos para a qualidade
que marcou todo um período de re- milhões de crianças naquela faixa de do ensino oferecido nas escolas brasi-
pressão e controle sobre a vida acadê- idade estavam fora da escola. E os edu- leiras, veríamos que ele se ressentia da
mica. cadores paulistas, que avaliavam a si- brutal queda no poder aquisitivo dos
Esse Decreto-Lei no 477, previa tuação do Estado em 1984, ao terem professores brasileiros ao longo daque-
como punição o afastamento da uni- encontrado 500 mil crianças de sete a les 20 anos. Um estudo realizado pela
14 anos analfabetas no Estado mais rico APEOESP (Associação dos Professo-
da Federação e tendo constatado que res do Ensino Oficial do Estado de São
versidade, de três a cinco anos, de
cola fazia uma "seleção" social dos alu- 1964-83 - o que explica o processo rei-
diretamente com esse Decreto-Lei no
477 um total de 263 pessoas, mas o
nos por estar adaptada às necessidades vindicatório iniciado em 1978 e que
mais importante é que ele foi sendo
da classe média e por ministrar um en- culminou com a grande e vitoriosa
|-3
incorporado aos regimentos universi-
sino que nada tinha a ver com a reali- greve dos professores paulistas no pri-
tários, que se tornaram instrumentos
dade das camadas populares. meiro semestre de 1984.
antidemocráticos e repressivos.
Apesar das melhorias registradas, o O professor Hermes Zanetti, presi-
"funil" da educação brasileira, no ini- dente da Confederação dos Professores
363
sr DFANBSB VB.GNCAAA, 840443
34 3002, pYp5
Banco de Dados/FSP
compulsória" em todo o segundo grau.
Esperava que todo o sistema educacio-
nal assumisse a função de preparar
mão-de-obra para suprir as necessida-
des decorrentes do processo então ace-
lerado de crescimento econômico. Ao
do Brasil, em depoimento na CPI da mesmo tempo, pretendia desviar da
Apesar de o presidente Médici ter
Câmara Federal que investigava os universidade um público ' crescente,
Jestejado o Mobral (acima), o número de
efeitos da reforma do ensino, em 1981, que ela não podia atender, na Suposi-
analfabetos aumentou no País após a
denunciou que 35% dos professores de Jundação do órgão. Enquanto isso, o ção de que muitos jovens se dirigiam à
primeiro e segundo graus em todo o salário de Hélio Pereira (abaixo), universidade por não haverem adqui-
Brasil trabalhavam sem nenhum vin- professor em São Paulo, não dava para o rido habilitação profissional no se-
culo empregatício.. Registrou ainda ônibus, o que levou os mestres paulistas à gundo grau.
que, no Rio Grande do Norte e no greve em 1984 (pág. ao lado) Mas a lei foi implantada sem que as
Piauí, havia professores recebendo sa- escolas contassem com recursos huma-
lários equivalentes a 10% do salário mi-
nimo.,
Banco de Dados/FSP
364 .
oo apI 08
BR DFanNBSB Va.onNcaMA, 24041334 an
nos especializados, instalações apro- Outra decisão que acarretou pre- Num país que em 1984 se estimava ha-
priadas, equipamentos e laboratórios juízo para a qualidade do ensino médio ver mais dé 80 milhões de desnutridos,
necessários à formação profissional dos foi a de unificar os exames vestibulares, cerca de 65% da população, só 2,3%
alunos. Calculou-se que, se tudo isso em 1971, quando eles passaram a ser dos universitários matriculados em
viesse a ser implantado, haveria um au- regidos por normas federais. Até então, 1982 faziam cursos ligados à área
mento de cerca de 60% do custo por cada escola fazia seu exame de acordo agrária e, dos 410 doutores que apre-
aluno de um curso secundário, num com suas próprias características. Com sentaram sua tese em 1979, só 24 (5,8%)
momento em que a participação das esse vestibular unificado, na base de estavam ligados a essa área.
verbas do MEC no orçamento federal testes de múltipla escolha e que até
caia ano a ano. Impossibilitadas de 1977 não incluia redação, todo o ensino Orgão do MEC traça perfil do
cumprir a lei, as escolas passaram a ficou condicionado a preparar os estu- universitário brasileiro
adotar apenas formalmente as novas di- dantes para aquele tipo de prova.
retrizes. Quanto ao ensino superior, o que se Ao final dos 20 anos do Regime Mili-
Em vista disso, o governo tentou so- pôde observar é que o crescimento do tar, uma nova tendência parecia estar
luções conciliatórias, como a do pare- número de vagas pareceu mais um se consolidando. Um levantamento pa-
cer 76 de 1975 do Conselho Federal de inchaço com componentes doentios do trocinado pela Coordenação de Aper-
Educação, que criou a possibilidade de que um desenvolvimento harmônico. feiçoamento do Pessoal de Nível Supe-
as escolas oferecerem o que se cha- rior (CAPES), órgão subordinado ao
mou de profissionalização parcial. Na Dois terços dos universitários MEC, feito em 44 instituições no ano
prática, isso passou a significar que as de 1983, traçou um surpreendente per-
escolas apenas distribuíam as matérias estão em escolas particulares
fil do universitário brasileiro.
do currículo tradicional com cargas ho- Esse universitário "médio" tem
rárias diferentes, adaptadas às áreas de Em 1960, do total de universitários, cerca de 30 anos, já está integrado ao
profissionalização, além de algumas ou- 44,3% estudavam em escolas particula- mercado de trabalho e chega ao cam-
tras que supostamente orientariam o res; essa porcentagem passou para pus para "adquirir cultura geral" ou
aluno na escolha de uma profissão. Em 66,5% em 1982. Isso quer dizer que o com a "expectativa de crescimento
1982, a Lei no 5.692 foi extinta, num re- crescimento do número de vagas no pessoal".
conhecimento tácito do fracasso da ini- ensino superior, que permitiu a grande Se esse perfil for verdadeiro, todo o
ciativa. melhora do "funil" da educação brasi- dispendioso aparato institucional con-
Um subproduto dessa lei foi a insti- leira, se deveu em grande parte à priva- centrado no conjunto das universida-
tuição da licenciatura curta, para for- tização do ensino. E se sabe que o en- des brasileiras estaria sendo colocado a
mar professores polivalentes em cursos sino privado se dá majoritariamente em serviço do esforço individual para a su-
de três a quatro semestres, a pretexto escolas que dispõem de poucos recur- peração das grandes deficiências do en-
de suprir deficiências locais e regionais sos, não desenvolvem pesquisas e são sino médio. Como o daquela candidata
de ensino. Proliferaram as faculdades administradas autoritariamente por ao vestibular de 1984 que, fazendo um
de fim de semana, que jogaram no mer- seus proprietários, balanço dos resultados positivos de seu
cado de trabalho profissionais despre- Por outro lado, os cursos que mais se sacrifício em frequentar o "cursinho"
parados, que muito contribuiram para desenvolveram não estavam associados preparatório, afirmou: "Agora eu já sei
rebaixar mais ainda o nível do ensino. às principais necessidades do Brasil. onde fica o Oriente Médio."
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» R DFANBSB VB.GNC.AAA, 84 044834 an co2,p 409
A poesia em progresso
Desde os anos 60, tem havido cada vez mais poetas e tem
surgido grande número de bons poemas - mas o círculo
de leitores tem continuado restrito
Quem tiver acompanhado o que an- coisas. Tais manifestações, por sua vez,
dou acontecendo no campo da poesia têm alguma conexão com a contracul-
brasileira a partir dos anos 60 certa- tura e o tipo de inquietação e interesse
mente concordará que, vinte anos de- pelo novo que caracterizam os anos 60
pois, muita coisa mudou para melhor. em escala mundial.
Há muito mais gente escrevendo, inclu- Há ainda outras coisas boas a serem
sive há#mais texto8 de boa qualidade li- assinaladas a propósito da moderna
terária. Percebe-se uma abertura maior poesia brasileira. Por exemplo, o apare-
para o novo, um interesse maior por cimento, de meados dos anos 70 para
textos que sejam originais e incorpo- cá, de uma nova poesia feminina, cor-
rem as conquistas dos movimentos de respondendo a um novo tipo de cons-
vanguarda do século 20. O panorama é ciência da mulher, do seu posiciona-
mais pluralista e quase acabou total- mento na sociedade e da sua relação
mente o sectarismo do começo dos com a linguagem. Podem ser citadas
anos 60, dos grupos fechados como o como exemplo dessa tendência, mar-
Agência O Globo
movimento concreto, a poesia-práxis, a cada por um texto informal, espontá-
vertente engajada ligada ao PCB, o neo e desinibido, autoras tão diferentes
poema-processo, etc. A quantidade de entre si, sob outros aspectos, como Ana
textos teóricos que esses movimentos Cristina César e Leila Miccolis.
produziram, justificando suas posições
e pontos de vista, foi, num dado mo- Uma produção poética menos blicados são edições de autor, que não
mento, maior que sua produção de acadêmica e mais coloquial Chegam às livrarias; ou, quando che-
obras especificamente poéticas. gam, ficam um tempo na estante do
Deve ser registrada, a constribuição De modo geral - e essa poesia de fundo, em consignação, antes de serem
do Tropicalismo nesse processo de mulheres talvez seja um aspecto parti- devolvidos. O saldo da noite de autó-
abertura e ventilação do ambiente e, cular de um fenômeno mais geral - te- grafos acaba sendo distribuído para os
dentro do Tropicalismo, a marcante mos hoje uma produção mais atenta amigos do autor, críticos (que normal-
presença do Torquato Neto, legítimo para a linguagem falada, menos acadê- mente não tomam conhecimento) e
poeta maldito, neo-romântico, que se mica e mais informal e coloquial. E um eventuais leitores qualificados. E isto
matou em 1972, na época do maior su- equivoco, todavia, atribuir isso a um re- vale, inclusive, para textos da melhor
foco político e também cultural. Tor- flexo do tipo de criação literária feita qualidade.
quato deixou uma obra pequena, in- no campo das letras musicais, ou então A busca de circuitos alternativos tem
conclusa, porém na qual se percebe o afirmar que os modernos poetas são os algo de transitório, e o vôo das edições
brilho de um imenso talento. letristas como Antonio Carlos de Brito "marginais" e independentes foi mais
Apesar de sua breve duração, de (Cacaso), Vilhena, Geraldo Carneiro e curto do que seria de esperar, embora
apenas um ano, interrompida que foi outros. Acontece apenas que a letra de alguns autores - como Ulisses Tavares
pela prisão e exílio de Caetano Veloso, música, uma vez veiculada em disco, e Nicolas Behr - possam gabar-se de
Gilberto Gil, a Tropicália deixou sua tem uma circulação muito maior, atin- ter vendido tiragens de até 30 mil
marca, abalando os alicerces de um de- gindo muito mais gente. E, dos letristas exemplares dos seus poemas irreveren-
terminado tipo de hiperintelectualismo que também se aventuraram à edição tes, em versos curtos ou epigramas,
e também as concepções demasiado em livro, alguns provaram ser poetas numa linguagem atualizada, buscando
simplistas do que venha a ser uma refle- genuínos (Geraldo Carneiro, por exem- a comunicação imediata com um pú-
xão sobre a realidade brasileira. plo); outros, meros equivocos. blico mais amplo.
Convém ressaltar que esta contribui- Mas, com tudo isso, com todos esses Mas o ciclo da produção entrou em
ção do Tropicalismo faz parte de um avanços, a poesia brasileira continua recesso e seus melhores representantes
contexto mais amplo, de um processo existindo mais como assunto, como ingressaram no mercado editorial con-
de modernização cultural brasileira que pretexto para discussões literárias, do vencional: Ulisses, Touchê, Chacal (do
durou dos meados dos arios 60 até o co- que como presença no mercado edito- grupo Nuvem Cigana do Rio de Ja-
meço. da década de 70, e que inclui a rial. A verdade é que livro de poesia neiro), todos editados pela Editora Bra-
vanguarda nas artes plásticas (Hélio Oi- vende pouco - e não só no Brasil, mas siliense, de São Paulo.
tícica, Rubens Guerchman, etc.), o ci- no mundo todo. Acontece que, dada a O elenco de poetas contemporâneos
nema underground e experimental anormal pequenez do nosso mercado brasileiros lançados por essa editora, a
(principalmente Rogério Sganzerla e editorial, aqui o vender pouco corres- partir de 1982, é considerável, contri-
4
Júlio Bressane), espetáculos multimídia ponde ao ostracismo, a ficar estocado buindo para projetar nacionalmente
como os de Agripino de Paula, a atua- depois de livrar-se do risco de ficar en- nomes como Paulo Leminski, Fran- '
ção do Teatro Oficina e muitas outras gavetado. A maior parte dos títulos pu- cisco Alvim e Ana Cristina César. Esta,
366 '
BRDFANBSB VB.GNC.AAA, 240443393 anco2, p 433Q
Agência O Globo
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O general Venturini (à esq.), principal dirigente do GETAT, entregou títulos a posseiros do Araguaia. A militarização da questão
agrária, no entanto,não satisfez os homens do campo. A dir., o protesto numa igreja no ano de 1979
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/DISTRIBUIÇÃO DE
TERRAS: os conflitos da posse eles em sua base a luta desesperada
pela sobrevivência daqueles que neces-
sitavam da terra para produzir e eram
excluídos do direito de possuí-la.
Mapa de sangue
Esses conflitos pela posse' da terra
intensificaram-se através dos tempos e
A história da propriedade da terra no Brasil é uma a partir dos anos 80 deste século atingi-
sucessão
de brutalidades contra as massas que trabalham no campo ram 0 climax. Para esse agravamento
, da concorreram vários fatores, como a
extorsão ao homicídio abertura de novas áreas do País, a atra-
ção que essa abertura exerceu sobre os
O processo de formação da proprie- apenas quisessem a propriedade para pequenos lavradores sem terra - e tam-
dade da terra no Brasil foi marcado explorar o trabalho alheio. bém sobre capitalistas - e a invasão do
pela violência, pela imprecisão dos li- Essa propriedade da terra, formada campo agrícola pelo capital.
mites dos lotes; consequentemente, pela violência, precisava ser mantida: o A abertura de novas estradas, como
pela falta de garantia. A violência con- registro das propriedades, inicialmente a Beléêm-Brasília, a Transamazônica e a
tra o índio, o primeiro dono da terra, feito nas igrejas, passou para os car- Perimetral Norte, atraiu, mesmo
foi o passo inicial para essa formação. tórios, Mas estes apenas registram pa- quando as estradas não passaram de
Alguns autores - ignorando os índios - péis - na maioria das vezes sem ne- simples tentativas fracassadas como a
consideram que a terra no Brasil era nhuma ligação com a realidade da Perimetral, grande número de peque-
obrigatoriamente propriedade da Co- terra, sem preocupação com a identifi- nos lavradores sem terras, esperanço-
roa Portuguesa, com base no Tratado cação das glebas "registradas" -, em sos de se verem livres da exploração.
de Tordesilhas . . . grande número de casos falsificados, Além de antigos pioneiros, novos lavra-
Somente entre 1822, pouco antes da dores surgiram, apossando-se de áreas
Independência, e 1850, tendo sido ex- A força é a única garantia do de terra para seu trabalho. E essas pos-
tinta a aplicação da Lei de Sesmarias e
direito à propriedade no campo ses, pela Constituição de 1891 e por to-
não havendo outra lei sobre o assunto,
das as demais constituições que o País
houve alguma formação de proprie- Com essa formação e com esses re- teve, davam aos posseiros o direito de
dade pelo trabalho da terra - a terra gistros, não há a menor garantia para o registrá-las até 30 hectares (aumenta-
para quem nela trabalha. Mas, a partir direito de propriedade; apenas a força dos para até cem hectares pela Emenda
de 1850, com a Lei de Terras do sena- garante tal "direito", e dele apenas os Constitucional no 10, de novembro de
dor: Vergueiro, dispondo que as terras grandes e poderosos podem usufruir. É 1964), como propriedade. Mas nunca
públicas só poderiam ser cedidas de natural, portanto, o surgimento de con- foi dada, a tais pequenos lavradores,
forma onerosa e em hasta pública, fi- flitos pela posse de terra. qualquer oportunidade de conseguir tal
cou afastada a possibilidade de o verda- Fatos históricos, como as rebeliões
Emis
369
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, 8404333 an 002, p 413
Miguel Chikaoka *
Pro-Labore. Permitindo o usucapião
sobre terras públicas, não existente an-
teriormente, e reduzindo o prazo para a
conquista desse direito, essa lei criou
condições aparentemente positivas
para que se realizasse a conquista da
propriedade pelo trabalho; mas são
tantas as limitações a este direito inclui-
2a %
das na própria lei que raramente ela
A
poderá ser usufruída. Por outro lado,
nada foi feito para facilitar ao posseiro
o requerimento desse direito, nem para
prover as comarcas onde existem gran-
des áreas de terras devolutas de meios
para processar e encaminhar tais re-
querimentos. O emperramento buro-
crático impedirá, praticamente, o fun-
cionamento deste dispositivo legal.
Como válvula de escape, em alguns
casos em que a pressão social se torna
perigosa, o governo tem desapropriado
algumas áreas de terra, entregando-as a
verdadeiros lavradores. Mas tais desa-
propriações têm sido pequenas, insigni-
ficantes para influir sobre a viciada es-
trutura agrária do País. Servem, apenas,
para desmobilizar grupos mais decidi-
dos de pequenos lavradores.
Ainda simulando querer intervir na
estrutura agrária, o Regime Militar al-
terou os artigos do Estatuto da Terra
que dispunham sobre o Imposto Terri-
torial Rural (ITR), tornando-o muito:
mais rigososo quanto à progressividade
em função do tamanho da propriedade.
A Lei no 6.746, de 10 de dezembro de
1979, elevou essa progressividade a
ponto de ter, teoricamente, a maior ali-
quota do imposto (14%), 700 vezes
maior que a alíquota mínima (0,02%),
enquanto no Estatuto da Terra essa va-
riação era de 144 vezes. Só em relação
ao tamanho da propriedade, sem consi-
derar outros fatores, o Estatuto da
Terra permitia uma variação de quatro,
cinco vezes e a nova legislação, de 175
vezes. É uma lei muito boa; melhor
mesmo, só se fosse aplicada.
Alcebiades Silva
mil hectares tiveram o imposto reco- veram sua atenção voltada para aquela blicas transferidos para o governo fede-
Ihido). De maneira que não há a menor área e se interessaram por seus proble- ral,
diferença entre um imposto 144 vezes mas, Além disso, as enormes riquezas Os órgãos militares (GETAT, Grupo
maior e outro 700 vezes maior. E não se minerais reveladas pelo Projeto Radar Executivo para a Região do Baixo
tem notícia de qualquer ação, seja judi- da Amazônia (RADAM) na região em Amazonas - GEBAM - e MEAF) têm
cial seja militar, visando a forçar esse torno da Serra dos Carajás despertaram "reconhecido", de forma totalmente
pagamento. a cobiça de outros países, Para permitir ilegal, supostos direitos de grandes pro-
Finalmente, entre as medidas do go- sua exploração pelas multinacionais, prietários e de empresas multinacionais
verno visando a solucionar os proble- era preciso "limpar" a área. sobre áreas que tentam "limpar" de
mas agrários, tivemos a militarização A ação, além do aspecto propria- posseiros. Aliás, isso tem acontecido,
do assunto, com a interferência do mente militar contra a guerrilha, procu- também, em áreas marginais ao São
Conselho de Segurança Nacional e a rou envolver a população local, através Francisco, junto às barragens, mesmo
criação de órgãos como o GETAT, de uma operação de assistência social. sem a militarização direta; os pequenos
GEBAN e, finalmente, do Ministério Daí à extrapolação política dessa ação, são expulsos pela construção das barra-
Especial de Assuntos Fundiários foi um passo. gens e as terras nas margens das repre-
(MEAF), A ação paternalista, ao lado das sas se tornam, misteriosamente, pro-
Como tudo no Brasil do Regime Mili- pressões, além do atendimento de pe- priedades de grandes empresas, inclu-
tar, a alavanca para essa militarização quena percentagem de posseiros (e em sive multinacionais. Nota-se aí clara-
foi agegurança acional. . . Parece que áreas minúsculas, como já se obser- mente a transformação do poder pú-
os pequenos posseiros e proprietários vou), representa tentativa de desmobili- blico em mera extensão do poder de
do Araguaia-Tocantis representavam zação dos posseiros organizados. particulares bem-colocados.
séria ameaça à segurança nacional; Todos esses fatos, levando à concen-
essa segurança ficou melhor assegu- Os órgãos militares têm dado tração cada vez maior da posse da terra
rada com a entrega de enormes áreas a e à expulsão cada vez mais numerosa
apoio aos grandes proprietários
empresas americanas, japonesas, ale- dos lavradores, explicam a multiplica-
mãs, etc. Esta militarização teve também ca- ção e o agravamento dos conflitos so-
A guerrilha do Araguaia, entre 1972 racterística de verdadeira invasão do bre terras.
e 1975, foi talvez um dos fatores que in- governo federal em áreas de autonomia
fluiram para essa militarização. No dos Estados. O Estado do Pará teve Carlos Lorena e
combate à guerrilha, os militares ti- mais de 75% de sua área de terras pú- Maria Tereza Leopardi Mello
<Júca Martins/F4
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BR DFANBSB V8.GNCAAA 043313002, pJI6
Os grilhões partidários
As elites políticas brasileiras jamais reito de organizar-se livremente. da decretação do estado de sítio. Em
foram capazes de desenvolver um sis- Mesmo na Espanha, que não podia ser 1927, findo o estado de sítio, o PC vol-
tema democrático de partidos políticos, tomada como um modelo liberal, du- tou à legalidade, mas por apenas sete
no qual todas as correntes tivessem o rante a abertura controlada do meses, Em agosto daquele ano, a "Lei
direito de se organizar livremente. primeiro-ministro Adolfo Suárez, após Celerada" tornou-o novamente ilegal.
Também jamais conseguiram formar a morte de Francisco Franco, em 1975, Após a revolução de 1930, a legisla-
partidos nacionais sólidos, constituídos existiram nada menos que 160 partidos. ção partidária tornou-se mais liberal;
com base em programas e princípios Essa liberdade, se já existiu no Brasil, reconhecia os partidos estáveis, organi-
duradouros; e o medo de uma partici- na letra das leis, ou sofreu limitações zados como sociedades civis, e os parti-
pação popular efetiva e crescente fez práticas ou durou pouco. dos organizados apenas para concorrer
com que os partidos que se permitiram Na República Velha (1889-1930), a uma eleição, sendo dissolvidos em se-
formalizar fossem usados somente em prevaleceram os partidos regionais, ex- guida. Permitia também a apresentação
épocas eleitorais. E foi durante o Re- pressões das oligarquias dos Estados: de candidatos avulsos, desde que
gime Militar (1964-84) que esses vícios eram os "PRs", em que se encastela- apoiados por certo número de eleito-
e restrições à vida dos partidos se tor- vam os clãs locais. Era, assim, um sis- res. Em 1937, no entanto, esse sistema
naram mais agudos. tema partidário compatível com o fede- foi interrompido com o golpe que im-
Numa democracia liberal autêntica ralismo estruturado no poder das oli- plantou o Estado Novo: os partidos fo-
não deveriam teoricamente existir res- garquias, O Partido Comunista (PC), ram fechados e sua reorganização proi-
trições para a organização partidária. fundado em março de 1922, foi consi- bida.
Todos os grupos políticos teriam o di- derado ilegal três meses depois, quando Os partidos só reapareceram na vida
379
brasileira em 1945, com o fim da dita-
dura de Vargas; e logo encontraram as
primeirdàs restrições a sua organização.
O código eleitoral daquele ano exigia
que, para legalização, os partidos apre-
sentassem assinaturas de dez mil eleito-
res, espalhados por cinco Estados, com
um mínimo de 500 por Estado. Em
maio de 1946, o presidente Dutra am-
pliou a exigência para 50 mil assinatu-
ras. A lei vetava ainda a formação de
partidos considerados "antidemocráti-
Iconograplia
cos", que fossem filiados a organiza-
ções internacionais e que recebessem
dinheiro do Exterior. Esse dispositivo
foi usado somente uma vez, em 1947,
para cassar o registro do PC (no ano se-
guinte, todos os parlamentares - de
vergêedor a sen&dor - eleitos pela sigla
do PC foram cassados). No entanto, o
Partido Integralista, de Plínio Salgado,
de tendência reconhecidamente fas-
cista, continuou funcionando normal-
mente, com o nome de Partido de Re-
presentação Popular. Pode-se dizer,
portanto, que essas regras visavam a
bloquear os comunistas. As eleições
para a Constituinte de 1945 haviam
mostrado aos conservadores as grandes
possibilidades eleitorais dos comunis-
tas. ledo Fiuza, candidato do PC à Pre-
Iconograplia
sidência da República, lançado apenas
15 dias antes da eleição, obteve quase
10o, dos votos (569.818, em 5,8 mi-
lhões). O PC elegeu ainda um senador
- Luis Carlos Prestes - e 14 deputados quenos agrupamentos nascidos de riva- fechou esse leque de 13 partidos. Eles
à Assembléia Constituinte e fez maioria lidades locais. Outro partido pequeno, foram relegados a um plano secundário
de vereadores em diversas cidades im- caracterizado por uma conotação ideo- na vida política e tiveram sua represen-
portantes do País. lógica mais definida, era o Partido So- tatividade reduzida, principalmente
'cialista Brasileiro. pela cassação dos membros mais nacio-
Constatação de enfraquecimento O golpe de 1964 encontrou 13 parti- nalistas e dos mais identificados com as
leva a direita ao golpe de 64 dos registrados na Justiça Eleitoral. O causas populares. Em 1965, o Regime
PSD e a UDN - dois entre os mais con- Militar ainda realizou eleições com o
Com a cassação do PC, o quadro servadores - dominavam amplamente quadro partidário vigente antes do
partidário legal ficou com apenas três o quadro político desde 1945, mas vi- golpe, depois de cassar 31 deputados
grandes partidos nacionais: o Partido nham perdendo terreno. A constatação do PTB e mais dez parlamentares pro-
Social Democrático (PSD) e a União desse declínio pelos estrategistas da di- gressistas de outros partidos. A grande
Democrática Nacional (UDN), dos reita foi, sem dúvida, um dos fatores derrota sofrida pelo novo regime - es-
grandes empresários e fazendeiros; e o que determinaram a decisão pelo aban- pecialmente a perda das eleições para
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), dono da via eleitoral para chegar ao po- governador em Minas Gerais e na
dos empresários médios e da burocra- der. Em 1962, esses dois partidos esti- Guanabara - indicava a perspectiva de
cia sindical. Com força em alguns Esta- veram a um passo de tornar-se minori- uma rearticulação dos setores banidos.
dos, havia ainda o Partido Social Pro- tários: tinham juntos 54% dos deputa- Diante disso, o presidente Castello
gressista (PSP), de Adhemar de Barros dos federais, quando em 1945 tinham Branco expediu o Ato Institucional no
e Chagas Freitas, e o Partido Demo- cerca de 75%, dos votos e mais de 80% 2, de 27 de outubro de 1965, extin-
crata Cristão (PDC), que abrigava cor- da representação parlamentar. Nem guindo os partidos registrados. Foram
rentes distintas, desde a ligada a Ney mesmo o PTB, partido reformista que também criadas regras de difícil atendi-
Braga, no Paraná - que após 1964 iria Getúlio Vargas imaginou para contra- mento para forçar o sistema a tornar-se
para a Aliança Renovadora Nacional por à influência do PC, tinha seu futuro bipartidário e os parlamentares eleitos
(Arena) e depois para o Partido Demo- assegurado. Ao contrário, estagnara foram obrigados a se reagrupar em
crático Social (PDS) -, passando pela em torno dos 14% dos votos, após um duas coligações: a Arena e o MDB,
de Franco Montoro, eleito governador de crescimento a partir de 8% em 1945. As próprias circunstâncias da forma-
São Paulo, em 1982, pelo Partido do Por outro lado, cresciam as alianças e ção desses agrupamentos atestavam
Movimento Democrático Brasileiro coligações; em especial aquelas mais à não se tratar de partidos políticos nor-
(PMDB), até Plínio de Arruda Sam- esquerda, de caráter nacionalista e po- mais. O MDB estava condenado a re-
paio, candidato a deputado federal, em pular, que engrossavam a Frente Parla- presentar O papel de oposição; a
1982 pelo Partido dos Trabalhadores mentar Nacionalista. Arena, embora apoiasse o governdó,
(PT). Os partidos restantes eram pe- De início, o movimento de 1964 não não exercia de fato o poder. A vida
374
BR DFANBSB VB.GNCAAA, 24041334 an
0o a ; o 133
BRDFANBSB VE.GNCAM. SHO41334ân co 2, p 4418
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Arquivo Naci
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Ao
lo mais desfavorável à oposição - Militar realizou manobra oposta à de ção preferiram, no entanto, organizar-
como ocorreu com a "Lei Falcão", em 1965: abrandou as exigências para a or- se em novas agremiações:
1976, que limitou drasticamente a pro- ganização de partidos, € Os herdeiros do antigo trabalhismo
paganda eleitoral gratuita no rádio e Houve intensa polêmica na oposição engalfinharam-se numa acirrada dispu-
TV (Lei no 6.339/76) -, mas ainda assim quanto a como encarar a proposta de ta pela sigla do velho PTB. De um
prosseguiu a tendência de crescimento pluripartidarismo restrito do regime. Se lado, o grupo liderado por Ivete Var-
eleitoral do MDB. Em 1976, o partido havia consenso na oposição aos aspectos gas, e de ligações com o general Gol-
avançou nas eleições municipais e o g0- da lei que tornavam obrigatória a extin- bery do Couto e Silva; de outro, a cor-
verno reagiu com o famoso "Pacote de ção do MDB e impunham as tradicio- rente de Leonel Brizola. A briga foi de-
Abril", de 1977, criando os senadores nais restrições à organização livre dos finida pela Justiça em favor de Ivete
"biônicos" e cancelando as eleições di- partidos, não havia quanto ao que fazer Vargas, enquanto Brizola organizou o
retas para governadores previstas para em resposta à manobra oficial. Os libe- Partido Democrático Trabalhista
1978. Apesar disso, nesse ano, o MDB rais do MDB em geral, e mesmo cama- (PDT).
deu mais um salto à frente nas eleições das populares e nacionalistas dessa agre- € O PT nasceria principalmente da
para 0 Senado, Câmara e Assembléias miação tenderam a condenar qualquer conjunção do novo sindicalismo brasi-
Legislativas, iniciativa de formar novos partidos; sin- leiro - com berço no ABC paulista -,
Restavam, então, duas alternativas dicalistas, nacionalistas e mesmo outras movimentos reivindicatórios urbanos,
para o governo, Uma seria aprofundar camadas democráticas do MDB acha- setores progressistas da Igreja Católica,
o caminho das restrições, mas, com ram que a manobra do regime era um setores de esquerda egressos do MDB
isso, aumentar seu isolamento político recuo que permitia avanços parciais, e outros, (Houve tentativas de articula-
e sua dependência da força militar. A como a formação de novos partidos, ções entre os sindicalistas e os autênti-
outra seria pôr termo à experiência bi- mesmo sob restrições. cos do MDB para formar um partido
partidária, estimulando o surgimento mais amplo que veio a ser 0 PT; de-
de vários partidos, Com isso se retira- 1 manobra do regime era que o pois de vários encontros - em São Ber-
ria, em primeiro lugar, o caráter plebis-
MDB se dividisse nardo, Porto Alegre e Brasília -, com a
citário das eleições - não se trataria
participação inclusive de Miguel Ar-
mais simplesmente de votar contra ou a O sucesso da manobra oficial, con- raes, ex-governador de Pernambuco,
favor do governo. Por outro lado, tudo, não seria simples. Era preciso que esses esforços fracassaram.)
incentivando-se O reagrupamento do o MDB se dividisse, desmanchando a € O Partido Popular (PP) seria for-
MDB em novos partidos, o governo coligação liberal, nacionalista e popular mado principalmente por egressos dos
acreditava ser mais fácil dividir a frente que o mantinha. No entanto, o seu su- setores mais moderados do MDB -
oposicionista e isolar seus setores mais cedâneo, o PMDB, abrigou essencial- cuja expressão maior estava em Tan-
combativos, mente a mesma composição anterior. credo Neves - e liberais da Arena.
E foi assim que, em 1979, o Regime Alguns setores importantes da oposi- A legislação partidária de 1979 esti-
376
Com a reforma compor, com o PMDB, o PDT e o
partidária, Ivete Vargas PTB, a Aliança Democrática para
e Brizola iniciam luta apoiar Tancredo Neves, do PMDB, no
pela legenda do PTB Colégio Eleitoral que escolheria o su-
(abaixo, por C. Caruso); cessor do presidente João Figueiredo,
é formado o PT (ao em 15 de janeiro de 1985. O PDS, suce-
lado, a comissão que dâneo da antiga Arena - "o maior par-
registrou o partido no tido do Ocidente" -, encolheria até
TSE); e liberais criam o tornar-se, praticamente, o partido de
PP, que acabou um homem, o deputado Paulo Maluf,
incorporado ao PMDB paulista de ultradireita, adversário de
3 (abaixo, à esq., Olavo Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.
Setubal e Montoro O governo finalmente estava em mino-
3
O selam o acordo , SP, 82) ria, E a oposição, a um passo do poder.
Esse fracasso se explicava pela falên-
cia dos esforços das correntes ultra-
reacionárias das nossas elites, que arti-
cularam o golpe de 1964, de cons-
truirem uma alternativa político-
ideológica para o desenvolvimento do
País. Era evidente também a necessi-
dade de se criar um novo sistema parti-
dário, mais livre,
tecnológica. Em 1957, havia 11 firmas dólares por ano com esse comércio.
sasqousaisdesemedicação
poderiam
tais estrangeiros voltavam-se, antes de competindo com uma quantidade in-
dapopulaçãob rasileiRENAME(
ra. Essalista,Requela-
nacionais porque estes eram respeita- tórios se vêem forçados a investir prin-
recebeu o nomede
dos por sua "tradição científica". Ou cipalmente na promoção de seus pro-
çãoNacionaldeMedicamentosE s am-en-
seja: eram os que tentavam inovações dutos. E com isso provocam o encare-
cpilaiiasd)a,, fchegandoem
oi sendo aperfeiçoada e
tecnológicas ou pelo menos tendiam a cimento dos remédios. A estrutura de
sOrganização
ubstâncias báMundial 480pde rSaúde,
ressam ao apetite do capital estran- cio da década de 80, revelava que o
geiro os laboratórios com boas organi- custo industrial dos remédios represen-
tt1io9cs8a0erams
, consideravaque500medicamen-
zações de marketing voltados para os tava apenas 35% dos custos totais - po-
rDevidoacionauàdlf.iceiesnntaecsioparaumat erapéu-
produtos de consumo popular e que rêm as despesas promocionais repre-
nlaólgiizcaoçsãoquec, osopnrsi--
mentos mais complexos.
meirose s t á g i o s t e c n o
Investimentos de laboratórios
tituem reaaliizrnaaddsúoissltrnoPapesquisaed
ia farmacêutica
aís. Nemseseenrevnãoaolli--
provocam o aumento dos remédios
eramzavamnoB
deformações na situação da saúde
Para se ter uma idéia do volume de
vimentodenovosfármacos( as substân- |
A presença do capital estrangeiro le- gastos com propaganda, basta registrar
cdosremédios)nemoestudo
ias queconstituemas matérias-primas
vou à deformação. Ao fabricar seus que, em 1980, o laboratório Dorsay
dosprodu-pro-
próprios medicamentos, a Santa Casa Farmacêutico, uma pequena empresa
cçãoem
es os queescatornam v i á v e i s sua
de Misericórdia de São Paulo percebeu nascida num "fundo de quintal", que se
l,adosindu1s.tr8i0al.fármacosu
Noiníciotidali-
que podia reduzir a lista de remédios expandiu comercializando um com-
décadade8 0
que utilizava a cerca de 600 produtos. plexo vitamínico famoso durante a dé-
zados
no Brasnail, produção 80%eramdeimportados,g medicamentosas-
Número que revela quão absurdo era o cada de 70 - o Vitasay -, ficou em
fato de que, em 1982, no Brasil, tossem quarto lugar entre os maiores anun-
que eram criadas para burlar os contro- E, voltando-se para a parcela mais
antrácidos
anti-sÉépticos
e
vita8m7in,a6%812 65%
antigripais
X,
Abril Pres
R
379
BR DFANBSB VB.GNC.AMA, 8404423jan 002,
p 123
Agência O Uiobo
ria através da lei.
No 1o Congresso Nacional de Traba-
lhadores Rurais, realizado antes da
aprovação do ETR, a 17 de novembro
de 1961, em Belo Horizonte, a reforma
agrária já era uma das principais ban- D E Goulart (acima, com
deiras. Esse congresso, organizado pela Magalhães Pinto, então
ULTAB, contou com ajuda financeira governador de Minas, e
do governo e a presença do então pre- Tancredo Neves,
sidente Goulart, que procurava apoiar primeiro-ministro, no
o sindicalismo e esvaziar as ligas cam- congresso de 61, em
ponesas. BH) procurou esvaziar
as ligas e apoiar o
1pós o golpe, há um congresso sindicalismo, contra a
nacional de trabalhadores rurais radicalização pela
reforma agrária. Em
Logo após o golpe de 1964, no agosto de 83, na 1a
período em que a CONTAG esteve nas CONCLAT, José
mãos dos interventores, foi realizado Francisco da Silva (ao
um congresso nacional de trabalhado- lado), presidente da
res rurais, em março de 1966, em São CONTAG, também
Paulo, que contou com a participação 15 defenderia a reforma
3 agrária
de recursos técnicos e financeiros do s
Instituto Nacional de Desenvolvimento
Agricola (INDA). Durante o congres- redo, em Brasília, houve ampla partici-
so, predominou o debate do ETR, do pação. Nessa ocasião, o movimento,
vamente à política agrária: a decisão da
luta conjunta de todos os trabalhadores
Estatuto da Terra e da política agricola através da CONTAG, já contava com
de então. A reforma agrária defendida estudos sobre a realidade agrária que
pela reforma agrária.
nesse congresso, posteriormente repu- permitiram elaborar propostas mais
Em abril de 1983, a CONTAG
associou-se a mais cinco entidades
diada pelos sindicalistas que assumiram fundamentadas do que nos encontros (CPT - Comissão Pastoral da Terra,
a direção da CONTAG após 1968, des- anteriores. A reforma agrária foi nova- CIMI - Conselho Indigenista Missio-
tinava-se a resolver conflitos localiza- mente a bandeira central, Nesse con- nário, CNBB - Conferência Nacional
dos no campo. Em maio de 1973, em gresso, no dia 23 de maio, o então mi- dos Bispos do Brasil, ABRA - Asso-
Brasília, foi realizado o 2o Congresso nistro da Agricultura, Delfim Netto, foi ciação Brasileira de Reforma Agrária e
Nacional de Trabalhadores Rurais. A vaiado ao apresentar suas idéias sobre IBASE - Instituto Brasileiro de Análi-
atuação dos trabalhadores foi cautelo- os problemas do campo. ses Sociais e Econômicas) e iniciou
sa, em virtude de o encontro realizar-se No começo, dos anos 80, o sindica- uma campanha nacional pela reforma
em pleno governo Médici. Mas con- lismo rural mostrou uma atuação mar- agrária,
cluiu-se pela necessidade da pronta cante, Na 1a CONCLAT (Conferência Na CONCLAT realizada no início
realização da reforma agrária; e ficou Nacional da Classe Trabalhadora), rea- de novembro de 1983, também na
claro que, para .os trabalhadores, refor- lizada em agosto de 1983, no município Praia Grande, com 1.265 entidades, os
ma agrária não se confundia com colo- paulista de Praia Grande, participaram trabalhadores rurais ampliaram sua
nização, programa de governo da épo- 1.091 entidades. De cinco confedera- participação e contavam na ocasião
ca. ções, uma era a CONTAG; havia 363 com mais da metade das entidades pre-
No terceiro congresso, realizado de sindicatos rurais; 469 urbanos; e 16 fe- sentes.
21 a 25 de maio de 1979, em pleno derações rurais. Dentre as resoluções
clima de abertura do governo Figuei- desse congresso, uma se referia exclusi- Luzia A. Conejo Guedes Pinto
384
ar oransss S404132J en p IR
As inovações tecnológicas chegaram A partir daí, que papel se poderia es- tos no Brasil. Estávamos ainda longe de
sempre com atraso ao Brasil e não pou- perar para o Brasil no campo da infor- dominar completamente a sofisticada
cas vezes se tornaram instrumentos de mática? Desenvolvida pelos america- tecnologia da informática, mas, segun-
espoliação do País. O exemplo extremo nos durante a Segunda Grande Guerra, do avaliações mais otimistas, principal-
é o do avião: apesar de um de seus in- a indústria de computadores parecia mente na área do governo, o Brasil co-
ventores ser um brasileiro, só começa- inacessível, inicialmente, mesmo para meçava a se equiparar a França, Ingla-
ria a ser timidamente produzido entre outras nações economicamente avan- terra e Alemanha, ficando atrás apenas
nós cerca de 70 anos depois de seu apa- cadas. de gigantes como os EUA e o Japão.
recimento, no começo do século. Te- Raciocínios lineares, porém, podem Essa posição, porém, não foi conquis-
mos também o automóvel. A indústria levar a conclusões errôneas quando se tada sem uma longa luta, que provocou
automobilística, a mais dinâmica do trata de tecnologia. Apesar de não ter fissuras e disputas nos meios empresa-
pós-guerra, implantou-se no Brasil ainda uma indústria automobilística ge- riais e até em gabinetes ministeriais. A
através de filiais de grandes empresas nuinamente nacional na década de 80, formulação da política nacional de in-
multinacionais, que utilizavam uma ve- as empresas brasileiras de computado- formática, desde o início, esbarrou em
lha "novidade" tecnológica: o modelo res já detinham quase, metade da pro- seu principal obstáculo; as empresas es-
básico do automóvel, praticamente dução e do mercado do País. Em 1984, trangeiras sediadas no Brasil. Que pa-
sem alterações nos últimos 50 anos. atingindo o climax de um comércio que pel caberia a elas no desenvolvimento
Mesmo assim, o País pagava royalties crescera 10.000% desde 1979, vendeu- da indústria nacional? Em 1970, quan-
por esses calhambeques tecnológicos. se um computador a cada cinco minu- do surgiu a idéia de que o Brasil preci-
BR DFANBSS 84044 3334 87002, p 29
a "fais 19!"
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Agência Estado
Agência O Globo
militares em função de seu passado
O combate à corrupção corria o
permeado de escândalos (ficou famosa
risco de pisar em calos aliados a consigna: "Ele rouba, mas faz", vei-
culada explicitamente por seus cabos
O fervor anticorrupção dos discursos eleitorais na campanha presidencial de
golpistas pôde ser posto em prática 1955, para fazer frente à contrapropa-
após o golpe de 1964. Em menos de ganda dos adversários). Castello
dois meses, os militares instauraram Branco foi obrigado a destituir da che-
mais de 200 Inquéritos Policiais Milita- fia dos IPMs contra Adhemar o "duro"
res (IPMs), em quase todos os níveis da general Menna Barreto, homem que
administração pública. Foi criada uma nutria por ele exacerbada antipatia pes-
comissão para coordenar os IPMs e en- soal. Apesar disso, Adhemar acabaria
viar ao Conselho de Segurança Nacio- cassado, em junho de 1966, também
nal as listas de nomes das pessoas que sob o pretexto de corrupção. Mas, en-
deveriam ser punidas. "O ferro deve tão, ele já era um crítico pertinaz do
ser malhado enquanto está quente e o governo federal, que havia frustrado
mal, extirpado pela raiz", diziam os ofi- sua candidatura à Presidência da Repú-
ciais, no seu afã de colocar o Brasil nos blica com a prorrogação do mandato
trilhos. Na aurora do Regime Militar, de Castello Branco. Contra Adhemar.
parecia mesmo que os tempos haviam a imprensa governista exumou velhos
mudado. Mas nem tanto. escândalos dos anos 50, esquecidos en-
No dia 30 de junho de 1964, no en- quanto ele foi um aliado do novo re-
tanto, o marechal Castello Branco dizia gime.
que a "revolução" já não podia mais se A partir da cassação de Adhemar, o
Agência O Globo
Sob o manto da censura que viria a ser tral à corretora Laureano, emtroca de
implantada após a edição do AI-5, em promessas de favorecimentos que não
1968, acentuou-se a proteção reciproca foram cumpridas. Daí por que Paim
dos envolvidos em irregularidades e o colocara a "boca no trombone".
acobertamento por parte de quem dis- Outro exemplo de uso político, dessa
punha de poderes para punir. Os cor- vez pela direita, de denúncias de cor-
ruptos ligados ao governo não eram pu- rupção é o caso do desvio de cerca de 1
nidos porque se imaginava que esti- trilhão de cruzeiros pelo Banco Nacio-
vesse em causa a imagem da "revolu- nal de Crédito Cooperativo (BNCC) e
ção". pela Centralsul, entidades gaúchas de
No momento em que começaram a cooperativismo. As denúncias contidas
se manifestar as primeiras fissuras no no livro Viva a Corrupção, do jornalista
interior das forças que apoiavam o Re- Francisco Oliveira, pareciam apenas
gime Militar - e a grande imprensa li- um golpe final na diretoria chefiada por
beral pôde respirar, com o afrouxa- Ari Dalmolin, que por dez anos, até o
mento da censura -, a corrupção vol-
final de 1982, esteve à frente da Central-
tou a ser tema corrente. Desta vez, no sul e em negócios com o banco e, por-
entanto, o feitiço voltava-se contra o tanto, dos desvios. O alvo principal da
feiticeiro. denúncia e a difusão acelerada do livro
Descontente com os rumos que to-
©
©O
a61
Agêncna' O Globo
treliana (PE). Meses depois, em agosto,
era assassinado em També (PE) o mili-
tante trotskista Paulo Roberto Pinto,
conhecido como Jeremias.
Apesar da violência, as ligas conti-
nuavam a crescer, congregando, por
volia de 1960, 35 mil associados em
Pernambuco e 70 mil em todo o Nor-
deste. Em 1961, já existiam federações
camponesas em dez Estados do País.
No ano seguinte era criada a liga do Es-
tado do Rio de Janeiro, com sede em
Campos.
O movimento camponês expandia-
se, assim, em escala nacional. Em 1954,
havia sido criada, em São Paulo, a UL-
TAB (União dos Lavradores e Traba-
lhadores Agricolas do Brasil), controla-
da pelo Partido Comunista. Em 1960,
finalmente, surgia no Rio Grande do
Sul o Movimento dos Trabalhadores
Sem Terra (MASTER), apoiado pelo
então governador Leonel Brizola e
contando com cerca de cem mil asso-
ciados.
mil em todo o Nordeste; em 1962, era qual o patrão anestesia, engana e re-
criada a liga do Estado do Rio de Janeiro, tarda o amadurecimento político da
Agência O
(ao lado, invasão de terras em Caxias, classe operana“ Essa premlssa teve
RJ, 1964) duas conseguências: a primeira foi a
395
BR DFANBSB V8.GNC.AMA. 24 Q4 IS 002, p/38
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 4041324 an coa ,p 139
.“
tornou-se, então: "Reforma agrári
a na
lei ou na marra." Essa proposta
camponesa no Brasil teve um im- Coutinhodae sua repressão antipopular, A polêmica entre Julião e o PC ex-
pacto tão grande que até abalou a apontados pela equipe foram presos, plodiu com certa virulência no Pri-
imprensa
tradição de a temática das artes do banos", e as cópias do filme como "cu- meiro Congresso dos Lavradores e Tra-
País estar distante dos dramas sofri- apreendidas, menos uma queforam
balhadores Agrícolas do Brasil, reunido
dos pela esmagadora maioria da po- estava com Coutinho no momento não em Belo Horizonte em novembro de
pulação. Exemplo disso é o filme da prisão. Dezessete anos depois, 1961. Nessa reunião, da qual participa-
Em 1964,antes do golpe militar, demãosnovoda seuspolícia política e foi buscar "A etapa atual de luta revolucionária
Coutinho, militante do Centro Po- morou meses:personagens, o que de- no Brasil é socialista. (...) A burguesia
a vida de João Pedro Teixeira, líder filhos. Assim, Cabra Marcado para dez para o julianismo. A maioria dos diri-
dos latifundiários em 1962. Para Morrer narra o drama dessa família num Conselho Nacional e responsáve
camponesa dispersada pela repres- is
com Elizabeth, a viúva de Teixeira, terial. O único filho que estava bem
mado por intelectuais e estudantes. Por
e os dez filhos do casal. Além da mi- era o que tinha ido para Cuba, onde
volta de 1962, uma parte desses qua-
tivas, ficaram documentadas tam- foi filmado como médico lá for- núcleos de treinamento guerrilheiro, à
bém a dignidade moral e a criativi- mado. margem do movimento real dos cam-
Cena de Cabra Marcado... : Elizabeth, viúva de João Pedro Teixeira, efamília tal. Legalmente, cada município só po-
dia ter uma organização trabalhista.
Onde havia uma liga e um sindicato (e
“
havia muitos casos assim), o governo
dava prioridade a este último, ao qual
tentativa de unificar as bandeiras ime- A radicalização política de Julião en-
era entregue uma carta sindical de re-
diatas das ligas (luta contra o cambão e contrava suporte no triunfo da revolu-
conhecimento. A partir dessa época, as
contra as ameaças de despejo que pai- ção cubana (1959), nos entrechoques
ligaspassaram a sofrer um esvazia-
ravam sobre os foreiros) com a luta cada vez mais violentos entre campo-
mento constante. Assim, quando Fran-
pela terra e pelo socialismo. A outra neses e latifundiários e no desenvolvi-
cisco Julião foi preso, após o golpe mili-
consequência foi dar ensejo a que ou- mento da crise brasileira, precipitada
tar de 1964, o outrora aguerrido e orga-
tras correntes políticas - principal- pela renúncia de Jânio Quadros e pela
nizado movimento camponês nada
mente o PCB e a Igreja - organizassem tentativa militar de impedir a posse do
pôde fazer para defendê-lo.
os combativos assalariados agrícolas da vice-presidente João Goulart.
região canavieira. A palavra de ordem central das ligas Cláudio Cavalcanti
396
BRDFANBSB V8.GNCAM, 840411323 3n Co, p 14%
Na noite de 15 de janeiro de 1985 - - então em pleno auge -, transmitindo berto Marinho, "por violação da Cons-
data em que foi eleito o primeiro presi- ao vivo o comício da Candelária, no tituição Federal em permitir, mediante
dente civil da República após 1964 - a Rio de Janeiro. Depois o dr. Roberto, acordo, que o grupo estrangeiro Time-
Rede Globo usou pela primeira vez a no Especial do dia 15, "tancredou" de Life mantenha veículo de opinião", Era
expressão "Regime Militar", no mo- vez. Mas, os governos passam, há de o início do escândalo Time-Life. Em
mento em que ele se aproximava rapi- pensar ele. A Rede Globo e seu plim- 1966, o deputado João Calmon, ligado
damente de seu final com a vitória de plim continuam. aos Diários Associados e à Rede Tupi,
Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, A Globo chega aos 20 anos de idade a pioneira da televisão no Brasil, pediu
depois de terem os militares dominado na condição de quarta maior rede de uma Comissão Parlamentar de In-
o País por mais de 20 anos. Sintomati- televisão privada do mundo. Suas ori- queérito sobre as denúncias de Lacerda.
camente, a expressão inédita para os gens foram obscuras e tempestuosas, Em setembro de 66, a CPI convo-
padrões globais de jornalismo foi pro- tanto que a jovem Globo foi em 1965 cada por Calmon aprovou, por oito vo-
nunciada em um Especial, altamente investigada por uma Comissão Parla- tos a zero, o parecer do relator, depu-
laudatório, sobre a vida do presidente mentar de Inquérito. Em junho de 65, tado Djalma Marinho, de que os con-
eleito, Pragmático, o dr. Roberto Mari- dois meses após a inauguração da pri- tratos entre a TV Globo e o grupo
nho, o chefe do império da televisão meira estação da Rede Globo, o canal Time-Life feriam o Artigo 160 da Cons-
brasileira, adaptava-se a novos tempos, 4, do Rio, o governador do então Es- tituição. O deputado afirmou, com
que jamais podiam ser detectados tado da Guanabara, Carlos Lacerda, base naquele artigo, que "uma empresa
quando a Globo se dignou tomar co- enviou ao ministro Milton Campos, da estrangeira não pode participar da
nhecimento da campanha das diretas-já Justiça, uma representação contra Ro- orientação intelectual e administrativa
«'( PW Xx “.WX
tulo
Nm24
x')(
Br pranssa vs.onc.aaa, 8404 4323ancO2 , pI41
A tôjetória da pioneira
Tupi: em 50, o cantor
frei José Mojica
(acima) inaugura a
emissora de
Chateaubriand (ao lado).
Nos anos 60, João
Calmon, ligado aos
Diários Associados,
denuncia as ligações da
Globo com o grupo Time-
%
Life numa CPI (ao alto, à
dir. , ao microfone). Mas
isso não impediu a
decadência da Tupi,
obsoleta técnica e
administrativamente. No
Agência O Globo
último programa da
emissora (à dir.)
restava aos funcionários
Chorar, como o câmera
da sociedade concessionária de canal economias nacionais com o capitalismo com a Nacional do Rio no auge,. A TV
de televisão". Apesar do resultado da monopolista internacional. Os conglo- entra nesse cenário como um "brin-
CPI, em março de 1967, o presidente merados e as multinacionais passavam quedo de elite" - um aparelho de tele-
Castello Branco aprova o parecer do a explorar os mercados representados visão custava três vezes mais que a mais
consultor-geral da República,Adroaldo pelos países subdesenvolvidos. Na área cara radiola da época. E a TV assumiu
Mesquita da Costa,segundo o qual os cultural, multiplicavam-se nos meios de seu elitismo; os raros telespectadores
acordos entre Globo e Time-Life "não comunicação dos países dependentes eram contemplados com espetáculos
infringiam a legislação vigente". Final- elementos que reproduziam a forma e como Música e Fantasia, que apresen-
mente, em setembro de 68, já no go- o espírito de seus modelos norte- tava temas baseados em compositores
verno do presidente Costa e Silva, o americanos. Fora já nesse quadro que clássicos, Tchaikovsky, Grieg. O TV de
"Diário Oficial" publica um despacho Assis Chateaubriand, o caudilho dos Vanguarda encenava Shakespeare, Pi-
em que declara que "os contratos não Diários Associados, se lançara à aven- randello, e fazia adaptações de roman-
violam nenhum dispositivo da lei vi- tura da televisão no Brasil, iniciada em ces, Os Miseráveis, Senhora. Surgiram
gente no País". A verdade é que mais 1950, com a Tupi de São Paulo. Não as primeiras manifestações de telejor-
de cinco milhões de dólares foram apli- havia aqui ainda nem uma indústria de nalismo, com noticiários de estilo ra-
cados num canal de televisão brasileiro, componentes técnicos de TV. Até as diofônico, debates, entrevistas. Todos
a Globo, por um grupo estrangeiro, válvulas eram de fabricação americana. os programas eram produzidos no Bra-
Time-Life - quando a Constituição o Chateaubriand comandava um oligo- sil e por não serem gravados - não ha-
proibia. Por aí se vê como, desde o ini- pólio - chegou a ter 36 emissoras de rá- via aindo o videoteipe - não eram "ex-
cio, as relações estre a Rede Globo e o dio, 34 jornais e mais tarde 18 canais de portados" de uma região para outra.
Regime Militar foram amistosas. TV -, montado à base da audácia e do Até 1959, a expansão das tevês se limi-
A polêmica Time-Life era apenas a oportunismo. Era um mestre da impro- tava praticamente ao eixo Rio-São
ponta de um iceberg. Quando do nasci- visação e sua primeira emissora de TV Paulo, que tinha meia dúzia de esta-
mento da Rede Globo, o Brasil entrava foi o seu retrato, adaptando às pressas ções.
decisivamente na fase de internaciona- programas de rádio ao vídeo. Nos anos 60, a privilegiada minoria
lização de seu mercado interno, reflexo O mercado urbano de bens indus- já soma mais de 700 mil aparelhos, tam-
de uma nova ordem econômica (que se trializados engatinhava; as verbas de bém concentrados no Rio e São Paulo.
iniciara após a Segunda Guerra Mun- publicidade se dividiam entre jornais, Impunham-se o acelerado crescimento
dial e que completara a integração das revistas e o rádio, em sua grande fase, da população urbana e a implantação
398
BRDFANBSBVB.GNCAMA, S404/3343hCO02,pI42
A televisão brasileira funciona sob ção das concessões, o CBT previa in- uma imensa lista de mutilações. Algu-
regime de concessão de canais, assim frações e penalidades no uso da TV. mas - como O Selvagem, de Janete
como o rádio, já que o Estado brasi- As infrações iam desde fazer propa- Clair (1973), Roque Santeiro, de Dias
leiro é o titular da radiodifusão, po- ganda de guerra ou de processos vio- Gomes (1975), Despedida de Casado,
dendo, periodicamente, segundo ale- lentos para subverter a ordem política de Walter Durst (1976-777), apenas
gislação, ceder o direito de uso de on- ou social até ofender a moral familiar. para citar alguns exemplos - foram
das e canais a empresas privadas ou a Na Lei de Segurança Nacional do vetadas na integra, antes mesmo de
instituições. Este instrumento, aliado Regime Militar se previam penas de irem para o ar. Outras, como Duas Vi-
à censura, dá ao governo grande po- até 30 anos de prisão para "crimes das, de Janete Clair (1977), sofreram
der de ingerência na programação das políticos" cometidos via televisão. cortes que obrigaram os autores a
emissoras. Além da legislação restritiva, a TV reescrever diversos capítulos; e mui-
Desde 1931, as concessões eram foi cerceada também pela censura. tas vezes a censura chegou até a alte-
feitas por períodos de dez anos. En- De início, ela era realizada com a rar o encaminhamento da trama.
tretanto, em 1451, já com a inaugura- presença de agentes nas redações dos Exemplos extremos da falta de
çãoda TV, o presidente Getúlio Var- telejornais. Depois, bastava um tele- critérios da censura foram a proibição
gas, em seu segundo governo, pressio- fonema do censor para vetar determi- do espetáculo do Balé Bolshoi, em
nado pelos meios de comunicação, nados assuntos. Para se ter uma idéia 1976, cujo motivo nunca foi revelado
que se opunham a sua política nacio- do volume de proibições, é suficiente (curiosamente, a apresentação foi
nalista e de regulamentação de direi- lembrar que, em 1973, as emissoras substituída pela apresentação de um
tos trabalhistas, procurou neutralizar do Rio de Janeiro receberam 97 ve- filme sexy americano), e o veto à obra
a radiodifusão e impôs uma revisão tos; em 1974, 103; em 1975 (já no go- Romeu e Julieta, de Shakespeare, "por
do prazo de concessão a cada três verno Geisel), 16; em 1976, sete; e em falar de amores proibidos e de uma
anos, A medida, no entanto, não 1977, 20, entre os quais comentários relação ilícita entre jovens e ocorrer
sobreviveu a seu governo, interrompi- sobre o fechamento do Congresso e o na peça um assassinato, um suicídio
do por seu suicídio, em 1954. Mais "pacote de abril "(medidas tomadas e um pacto de morte". No mesmo
tarde, o governo Jânio Quadros por Geisel em abril de 1977), divulga- pacote que definiu as 53 obras imor-
(1961) propôs a redução do direito de ção do manifesto de cientistas brasi- tais da literatura que não poderiam
exploração de emissoras para três leiros contra o acordo nuclear com a ser exibidas na TV, em que estava
anos, mas sua renúncia não permitiu Alemanha, comentários sobre a de- Shakespeare, foram relacionados
que a proposta vigorasse, missão do ministro do Exército, Sílvio também Sófocles (Édipo Rei),
Sob o governo João Goulart (1961- Frota, e outros. Aristófanes (Lisistrata), Goethe
64),0s empresários do setor fundam a Mas a censura à TV não se restrin- (Fausto) e outros "subversivos".
Associação Brasileira de Emissoras giria somente ao telejornalismo. Pelo No final de 1979 e início dos anos
de Rádio e Televisão (ABERT). A in- Index do regime passaram também 80, era a vez das séries brasileiras.
fluência dessa entidade conseguiu programas de variedades, novelas, o Malu Mulher, com Regina Duarte, so-
derrubar, no Congresso, 52 vetos de Balé Bolshoi e até a obra de William freu diversas mutilações e teve alguns
Goulart ao Código Brasileiro de Tele- Shakespeare. Em 1969, os animadores episódios vetados na integra, o mes-
comunicações (CBT) de 1962, que - Chacrinha e Dercy Gonçalves foram mo acontecendo com Amizade Colori-
refletindo a força e os interesses das impedidos de apresentar seus respec- da, com Antônio Fagundes, de curtis-
empresas de rádio e TV - elevava tivos programas por 15 dias; segundo sima duração justamente por causa da
para 15 anos os prazos de concessão. a censura, por atentarem contra os censura,
Apesar de fávorecer as empresas bons costumes. Entre as novelas, os Em 1984, a censura do regime dava
no que diz respeito ao tempo de dura- governos do Regime Militar deixaram ainda alguns sinais inconfundiíveis de
vitalidade. Por ocasião da votação da
Do jornalismo às novelas, emenda propondo eleições diretas,
todo tipo de programa foi em Brasília, as emissoras de todo o
alvo da censura. Em 1984, País foram proibidas de enviar para
ela ainda dava sinais de fora do Distrito Federal qualquer ma-
vitalidade: em 25/4, por terial não submetido a censura prévia.
"ousar" entrevistar o
Em São Paulo, num programa da TV
senador Orestes Quércia
Gazeta, um repórter "ousou" entre-
diretamente de Brasília,
vistar por telefone o senador Orestes
quando as transmissões do
Quércia, que estava na capital federal
Distrito Federal estavam
acompanhando a votação. No dia se-
SOb censura prévia em
guinte, dois agentes do Departamento
razão da votação da
de Telecomunicações (DENTEL) la-
emenda das diretas, a TV
cravam os transmissores da emissora,
Gazeta, de São Paulo,
Agência Estado
400
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%
clara função mercadológica. A Globo nro e oo e os do ea u aa
procura formar um público básico para *Mêªã'ºªªí“ª?*“ªª%<933ff$;*ffifªªcfªiâk
o seu grande salto. Assalariados de
da202200202A.
base, migrantes, trabalhadores inde-
pendentes, favelados, as chamadas
classes C e D, passam a interessar à
empresa de televisão. Era o período do
boom econômico-financeiro. Graças ao
crédito direto ao consumidor, criado
ums came. se
vendas de aparelhos receptores de TV &
aumentaram em 48% sobre 1967. O
"grotesco" liderou a audiência entre 68
e 72. Em 71, 70% dos aparelhos ligados
em São Paulo já pertenciam às famílias
das camadas C e D. Os principais anun-
ciantes eram outro fenômeno dos anos A exportação de novelas como A Escrava Isaura (à esq.) e Gabriela para o Terceiro
60: os supermercados, dispostos a liqui- Mundo abriu para a Globo uma nova fonte de receita
dar a concorrência dos pequenos arma-
zêns e feiras-livres. Rockfeller, de Bráulio Pedroso - o ini- exportava seus programas para 50
cio da novela como um gênero especi- países. E também ganhava prêmios in-
fico da televisão e de know-how ternacionais, como o dado pela Unesco
brasileiro. A Globo logo lançou Assim em 79 ao Sítio do Pica-Pau Amarelo ou o
na Terra como no Céu, de Dias Gomes, Salute, norte-americano, "pelo nível de
Desde 1969, a Globo concentrara a sua primeira telenovela apoiada no dia- sua programação". Mas a influência es-
produção de programas no Rio e am- a-dia nacional. Surgiram dramas inte- trangeira na televisão não terminou;
pliara suas redes de operação, ado- rioranos (Verão Vermelho, O Bem- longe disso. O perfil de seus anuncian-
tando o modelo norte-americano de li- Amado), urbanos (Selva de Pedra, Ban- tes dá bem um retrato econômico do
gações contratuais com emissoras inde- deira 2), os "casos especiais". O telejor- Brasil: em 1980, entre seus dez maiores
pendentes, as afiliadas, nos outros Esta- nalismo ganha impulso. O Fantástico clientes publicitários, apenas um, o Ba-
dos, A rede permite a concentração mistura humor, aventura, uma pretensa nespa, era nacional.
técnica e burocrática da produção, di- divulgação científica, música e esporte,
minuindo os custos. E é também espe- sob a forma de notícia jornalística. En-
cialmente vantajosa para os anuncian- fim, a Globo adotou uma fórmula
tes. Ainda em 1969, a Globo lança o básica jornalistico-telenovelesca, que
Jornal Nacional, primeiro programa a se mantinha até o final de 1984 - re- A Globo tem os melhores artistas, os
ser transmitido simultaneamente para cheada por programas de humor e de melhores humoristas, os melhores jor-
todo o País. esporte e especiais com os grandes no- nalistas. Ela pode sentir-se tranquila em
Assim, a Globo fabricara o público mes da música popular brasileira. Em sua posição de líder do mercado, ape-
de que necessitava como audiência de 1976, a Globo produzia 75% de sua sar do aparecimento de novas redes
base. Atinge mais de 90% dos lares com programação, um recorde mundial, e concorrentes, como o Sistema Brasi-
aparelhos receptores em todo o Brasil e faturava 120 milhões de dólares - 18% leiro de Televisão (SBT) de Sílvio San-
as outras redes não têm condições de do total da receita de propaganda no tos e da Manchete, e do crescimento
lhe fazer concorrência. Está portanto Brasil. Dona do mais poderoso instru- da Bandeirantes, que repartiram o es-
pronta nessa época para conquistar te- mento de venda do País, com 20 mi- pólio dos Diários Associados, cuja con-
lespectadores mais "elevados" e anún- lhões de aparelhos receptores - em cessão o governo cassou em julho de
cios mais luxuosos. Passa a impor uma 1980, 37% das verbas publicitárias fica- 1980, após quase uma década de ago-
nova fórmula: o padrão global de quali- ram com a TV -, a Globo é insaciável. nia. Um balanço final dessa história da
dade. Como sempre, no momento Ela abriu mais espaço para anúncios ao TV entre nós, principalmente após
certo - a TV em cores, que exigia pro- ocupar o horário da manhã, com TV 1964, mostraria que o País que se viu
gramas de mais apuro técnico, era a Mulher e noticiário. Em suas cinco se- em suas telas estava longe do Brasil
grande novidade de 1972, num mer- des - Rio, São Paulo, Belo Horizonte, real. E foi o grande senhor do País du-
cado quase saturado para os aparelhos Brasília e Recife - a criação de progra- rante o período mais negro do Regime
em preto e branco. E, ainda que passa- mas jornalísticos regionais atraiu anun- Militar, o general Emílio Garrastazu
geiros, a televisão enfrentava arrufos ciantes locais, esquema que se repete Médici, quem destacou, em 1973, o pa-
com o governo Médici, preocupado com subsedes instaladas no interior de pel da TV: "Sinto-me feliz, todas as noi-
com a violência e com a "falta de pa- São Paulo na década de 80. Para os fa- tes, quando ligo a televisão para assistir
drôes culturais" dos programas, devido bricantes de máquinas e produtos agri- ao jornal. Enquanto as notícias dão
à invasão dos enlatados. colas, surgiu o Globo Rural. Nas nove- conta de greves, agitações, atentados e
Nessa época, a TV começa a aban- las, o merchandising - espécie de propa- conflitos em várias partes do mundo, o
donar o velho padrão sentimentalóide ganda disfarçada - às vezes predomina Brasil marcha em paz, rumo ao desen-
mexicano-argentino das telenovelas e a sobre o próprio enredo, tantas são as volvimento. É como se eu tomasse um
retomar o filão da Excelsior, que re- marcas de roupas, cigarros, toalhas, au- tranquilizante, após um dia de traba-
correra a temas brasileiros. E -o pri- tomóveis e remédios que aparecem no lho."
meiro marco dessa tendência surgiu na vídeo. No início dos anos 80, a Globo
já então decadente Tupi, com Beto controlava 36% das emissoras do País e Sérgio Pompeu
401
BR DFANBSB 1232324 an 002, 4444
BR DFANBSB VB.GnC.aAA, 4233 Jnoo2 p 145
402
13834 27 COA , p 4346
BR DFANBSB VB.GNCAAA,
Agência O Globo
boa para o Brasil principalmente por- como estudos nacionais pelo enge-
que empregava urânio 235 (U235) "en- nheiro Hervásio de Carvalho - que
riquecido", O Brasil tinha pouco urá- pouco depois também derrubaria o al-
nio e muito tório, outro mineral radia- mirante Alberto, estabelecendo um im-
tivo, que pode ser transformado em pério particular à frente da CNEN (Co-
combustível nuclear, O correto era tra- missão Nacional de Energia Nuclear,
balhar de forma independente com o criada em 1956 por desmembramento
tório, alegavam os cientistas. "A fécno- do CNPq).
logia não é complexa e pode ser desen- Em 1956, diante da recente vitória na
volvida no Brasil", afirmou o Grupo do estatização do petróleo, houve protes-
Tório em seu último parecer, em 1968, tos públicos contra a venda de areia
Nesse conflito espelhava-se um monazítica e, sob grande pressão por
longo e severo controle mantido pelos parte de "alguns setores ' militares,
Agência O Globo
EUA sobre a indústria nuclear mundial instaurou-se uma CPI para rever os
desde 1946, às vêsperas do início da acordos nucleares brasileiros, Como re-
"guerra fria" com a União Soviética. sultado, o Conselho de Segurança Na-
Foi quando surgiu a "política de re- cional adotou uma resolução que con-
cusa", destinada a eternizar o mono- siderava um ponto "fundamental" da
pólio americano no setor. "Pensavam política nuclear manter o combustível
que podiam parar o tempo", afirmou atômico "sob o controle e a proprie-
um dos cientistas americanos de então. dade do governo",
Em 1954 esta atitude tomou corpo atra- O fato é que nessa época a "política
vês da Lei MacMahon, que transfor- da recusa" dos americanos havia se tor-
mava a tecnologia americana em se- nado inviável, na prática, já que outros
gredo de Estado que não deveria ser países, como a Inglaterra, a França e
Agência O Globo
adquirida por nenhum país que não os mesmo a Índia e a Argentina, tinham
EUA. obtido acesso aos segredos nucleares
Assim, em 1945, quando fez o pri- por conta própria, Os americanos en-
meiro acordo atômico com os EUA, o tão iniciaram a campanha "Atomos
403
BR DFANBSS 4044333 an co2 , p 144
PERVÍBE II Prevista
PERVÍBE | Prov sta
Dependência
para a Paz", com a qual podiam pres- bustível ao Brasil. Os países detentores preço da independência com relação
sionar para que outros países compras- de tecnologia nuclear, consorciados no aos EUA seria muito alto, já que se
sem a tecnologia e o combustível ame- seleto Clube de Londres, procuravam continuaria usando o U235: assim,
ricano. De fato, até recentemente, resguardar seus privilégios comerciais. mesmo se a técnica de enriqueci-
mesmo os países desenvolvidos prefe- Tinham também interesse em congelar mento alemã ocidental funcionasse,
riam recorrer ao U235 enriquecido nos o mercado atômico para evitar uma teriamos que montar um sofisticado ci-
EUA, disseminação descontrolada de outras clo industrial exigido por esse tipo de
A partir de 1965, já sob a égide do potências nucleares no campo militar. combustível nuclear.
programa Atomos para a Paz, o Re- Foi nessas circunstâncias que o pre- Essas críticas não eram novas, em si,
gime Militar brasileiro começou a pre- sidente Geisel, em 1975, virou as cos- mas agora adquiriam uma nova força
parar o atrelamento ao monopólio tas aos seus aliados do Norte, devido ao esgotamento do próprio re-
americano. Inicialmente, após 1965, os comprometendo-se com o pretensioso gime. Em 1968 elas haviam sido feitas
institutos de pesquisa nuclear foram acordo com a Alemanha Ocidental. principalmente através de uma campa-
postos sob o controle do Ministério das Repetiu então as preocupações de nha encabeçada pelo físico José Leite
Minas e Energia, obedecendo ao 1956, afirmando ser "imperativo dar ao Lopes. Mas com a edição do Ato Insti-
Decreto-Lei no, 200, de autoria de Ro- País a indispensável autonomia nu- tucional no 5 (AI-5), Lopes seria com-
berto Campos. Em 68, afinal, decidiu- clear". Assim, angariou a simpatia pulsoriamente "aposentado" pelo Re-
se que Angra-I seria construída por mesmo de alguns setores da oposição, gime Militar. Outros físicos que se des-
Furnas e usaria combustível fornecido que saudaram a decisão como o pri- tacaram ao seu lado teriam destino
pelos EUA. Em 72, foi comprado o rea- meiro desafio aberto do Brasil aos idêntico, como Marcelo Damy, Jayme
tor Westinghouse de 627 imW. EUA em trinta anos. Tiomno e Mário Schenberg. Em 74,
Entretanto, em 1969 já se pensava no Nesse mesmo ano, no entanto, os no entanto, com a abertura política, as
acordo com a Alemanha Ocidental. físicos brasileiros retomaram o com- críticas ao acordo com a Alemanha
Essa idéia foi então explicitamente su- bate à política nuclear, argumentando Ocidental alastraram-se rapidamente.
gerida pelo ministro das Minas e Ener- que não estavam em jogo apenas as re- Nesse mesmo ano o físico José Gol-
gia, Costa Cavalcanti. Ela se tornaria nos lações com os EUA, mas todo o mo- demberg voltou a defender a opção
anos seguintes "o segredo mais bem- delo de desenvolvimento dependente, pelo combustível nacional, e em 75 o
guardado do País", segundo confes- mantido agora com relação à Alema- tema foi um dos mais concorridos da
sou mais tarde o senador Virgílio Tá- nha Ocidental. Esta, segundo o acordo, reunião da SBPC (Sociedade Brasileira
vora. O motivo é que a situação inter- ainda teria direito a 20% das reservas para o Progresso da Ciência), em Belo
nacional, então, estava se alterando ra- de urânio que ajudasse a encontrar no Horizonte. Os engenheiros e os econo-
pidamente: já em 1973, com a crise Brasil - para muitos, a verdadeira ra- mistas, além disso, em 77, ampliariam ,
mundial de energia, os EUA deixaram zão de ter feito o acordo em 1975. Os consideravelmente o círculo de oposi-
de garantir o fornecimento de com- cientistas alegaram também que o tores à política nuclear brasileira.
404
Br pransss va.encaaa, 410413393 9002 , o J4£
Iconographia
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Iconographia
Alguns dos direitos "concedidos" pela CLTjá eram reivindicados pelos trabalhadores na greve geral de 1917, em São Paulo
(à esq., comício no Brás), em que a morte de um sapateiro em choque com a polícia gerou gigantescos protestos (à dir.)
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túlio intensificou a elaboração do di-
Arquivo Nacional
radas, medidas de proteção ao trabalho
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mento final dos sindicatos ao Minis-
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diante.
No 1o de maio de 1943, Getúlio Vargas (no alto) anunciava a CLTpara uma multidão e da "batalha da produção".
Mais; a CLT, embora admita a possi-
de 100 mil pessoas reunida na Esplanada do Castelo, RJ (acima)
407
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, 84 O41 3a N 002, 2 124
A seca que se abateu sobre o Nor- rada, sem equipamentos e sem recursos recadado 16,4 mil toneladas de alimen-
deste nos anos 1877-79 foi de fato terri- para enfrentar a mais abrangente seca tos, pouco mais de 1,5 kg de comida
vel. Seus efeitos comoveram de tal ma- da história. para cada flagelado.
neira o imperador dom Pedro II que No seu auge, em 1983, ela atingiu Essas duas situações semelhantes,
ele afirmou: "Não restará uma única 1,126 municípios, numa área de 1,439 distantes mais de um século, não reve-
jóia na coroa, mas nenhum nordestino milhão de quilômetros quadrados.onde lavam, porém, o quanto o Nordeste ha-
morrerá de fome." viviam24!lmilhões de pessoas, das quais via mudado, especialmente após 1964.
Um século depois, as jóias da Coroa dez milhões foram consideradas flage- Os que chegaram ao poder com o
permaneciam intocadas num museu; os ladas, ou seja, perderam as plantações golpe podiam afirmar que tinham sido
nordestinos tinham morrido de fome ou empregos e passavam fome. bem-sucedidos seus esforços no sentido
em diversos períodos de seca e a região Sem jóias da coroa para vender, a de modernizar essa região do País,
vivia, de novo, drama semelhante, poderosa Rede Globo de Televisão re- principalmente aqueles que visaram a
Só que pior: dessa vez, o período de solveu apelar para uma campanha na- sua industrialização.
estiagem fora previsto pelo Centro cional visando arrecadar alimentos Entre 1960 e 1980, a economia do
Tecnológico Aeroespacial de São José para as vítimas da seca. Ao seu final, Nordeste cresceu, em média, apesar da
dos Campos-SP. E mesmo assim a re- após mobilizar os recursos técnicos e ocorrência de secas, 7,2% ao ano, uma
gião foi surpreendida, como nas situa- artísticos da Globo em todo o País, a taxa significativa por ser equivalente à
ções anteriores, totalmente desprepa- campanha Nordeste Urgente tinha ar- do País como um todo (7,3%). Apenas
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na década de 70, o montante de investi- trouxe para a região um grande nú- tros quadrados que receberia trata-
mentos da economia regional triplicou. mero de técnicos e profissionais de ní- mento governamental privilegiado.
E esse dinamismo privilegiou a econo- vel superior. Com isso se desenvolveu Até meados do século 20, o Estado
mia urbana. O setor industrial a indústria da construção civil e se es- brasileiro atuava no Nordeste segundo
expandiu-se 8,9% ao ano, no período palhou, no dizer do economista Fran-
a concepção de que a seca era o grande
1965-80, e o Nordeste quadruplicou sua cisco de Oliveira, um Northeast way of
problema da região. Ela causaria a po-
produção industrial em 20 anos. O pes- life em alguns bairros ricos das grandes breza e explicaria o atraso da econo-
soal ocupado na indústria dobrou entre cidades nordestinas. mia. Ao governo central caberia, por-
1960 e 1975, tendo quintuplicado na in- Os governos do Regime Militar não tanto, ajudar com créditos a juros sub-
dústria de bens de capital e de con- foram, porém, os primeiros a voltar sidiados, perdoando dívidas, garan-
sumo durável. A parcela da População suas atenções para a região nordes- tindo preços também subsidiados, fa-
Economicamente Ativa empregada na tina. zendo doações e, principalmente, au-
indústria quase dobrou, passando de
mentando os investimentos públicos na
7,8%, em 1960, a 14,9%, 20 anos depois, De 30 açudes propostos, somente
região.
quando menos da metade (49,1%) per-
um foi construído As grandes beneficiárias eram as oli-
manecia no antes dominante setor pri-
garquias locais, que tinham seu poder
mário. Aquela mesma seca que comoveu o bem alicerçado na estrutura econômica
E esse crescimento industrial se deu imperador provocou a criação de uma que o Nordeste herdara do período
principalmente nos setores dinâmicos, Comissão Imperial que recomendou, colonial, onde predominavam o latifún-
como metalurgia, mecânica, material como solução para o problema da re- dio e a monocultura de exportação.
elétrico e de comunicações. Em 1960, gião, a construção de três ferrovias, 30 As oligarquias aperfeiçoaram um
esses setores concentravam 30% do va- açudes e um canal ligando os rios São procedimento que veio a ser conhecido
lor de transformação industrial; em Francisco e Jaguaribe. De concreto re- como a "indústria da seca". A debili-
1974, já chegavam a 49,8%. O cresci- sultou o açude de Quixadá, no Ceará, dade da economia da região fazia com
mento médio anual do produto real do concluído em 1906, já no período repu- que qualquer abalo produzido por uma
período 1960-75 atingiu índices de blicano. seca, inundação ou queda de preço dos
15,8% na metalurgia, 33,6% na mecáê- Em 1909 foi criado o primeiro órgão produtos agrícolas pudesse ser apresen-
nica e 36% nos materiais elétricos e de estatal dedicado ao combate das secas: tada como uma "crise". Daí surgiam
comunicações, a Inspetoria de Obras-Contra as Secas pressões por ajudas provenientes do
Também no plano de consumo se re- (10CS). Depois de algumas transforma- governo central que eram apropriadas
gistraram profundas alterações. Do to- ções, ela tornou-se, em 1945, Departa- por essas oligarquias.
tai de domicílios da região, 98,7% ti- mento Nacional de Obras Contra as Se- Dessa maneira, a maioria dos açudes
nham fogão em 1980, contra apenas cas (DNOCS). construídos pelo DNOCS ficava em
79,4% em 1970, As residências com ge- Foi necessária outra grande seca propriedades particulares e as grandes
ladeira tinham passado de 9,2% para (1951-52) para que, no governo de Ge- fortunas do Nordeste sempre estiveram
23,8%, no mesmo período, e 50% dos túlio Vargas, surgissem O Banco do associadas ao exercício do poder polí-
domicílios urbanos tinham televisão, Nordeste do Brasil (BNB) e a delimita- tico, que se confundia com o controle e
em 1980, em comparação com os ção de um Polígono das Secas - pela a aplicação das verbas federais desti-
14,6% de dez anos antes. Lei no 1.348, de 10 de dezembro de nadas à região. Políticos como o sena-
O processo de industrialização 1951 -. uma região de 950 mil quilôme- dor Dinarte Mariz, do Rio Grande do
410
R DFANBSB VE.
GNCAAA &H 04/331an
(os á cá 153
er oransass 24043334 oo a, p 354
411
sr oransss S404) 331 an 00da ,pI55
Em várias áreas do NE
se instalaram indústrias
que geraram poucos
empregos a exemplo
de Camaçari. BA (à dir.,
o Complexo
Petroquímico).
Em consegiuência,
grande parte da
de grandes capitais e grandes lucros trial regional saltou de 16%, em 1950, não conseguia atender as necessidades
para aplicar, via incentivos fiscais, Os para 42%, em 1975. alimentares de sua própria população.
empresários regignais se viram sufoca- Também esse processo não servia Metade de sua produção agrícola
dos pelas multinacionais que penetra- para incentivar a renda em outras ativi- destinava-se à exportação (principal-
ram no Nordeste: Plumbum, Brasilit, dades, Uma pesquisa SUDENE/BNB, mente cana-de-açúcar e cacau) e a re-
Five Lives, Firestone, Good Year, Wa- de 1978, revelou que a indústria incen- gião abastecia-se em outras áreas do
lita, Nestlé, General Foods, Coca-Cola, tivada importava de fora da região, em País até de produtos da dieta básica,
Philips, Ford, etc. Fortaleceram-se média, 48% dos insumos que transfor- como milho, feijão, batata, legumes,
políticos como Luiz Viana Filho, que mava. Essa porcentagem chegava a carne e leite. Daí os índices de au-
governou a Bahia de 1967 a 1971, 90% na indústria de material elétrico, mento do custo de vida de suas princi-
quando implantou o Centro Industrial 70% na metalurgia, 80% na mecânica e pais cidades serem elevados - eram
de Aratu, oferecendo incentivos e favo- 83% na de matérias plásticas. E 58% de "movidos a petróleo".
res aos empresários nacionais e sua produção eram vendidos fora do Sua mão-de-obra era a mais mal
estrangeiros. Nordeste, sendo 15% no Exterior. paga do País. Em 1980, antes de se
As oligarquias ligadas à economia Não se podia, assim, cumprir um dos aprofundar a crise econômica, 64% das
agrária, com o golpe militar de 1964, principais objetivos da estratégia elabo- pessoas ocupadas ganhavam até um sa-
puderam reprimir o campesinato que rada pelo GTDN - absorver a mão-de- lário mínimo. Esses sub-remunerados
se organizava e conservar um poder de Obra excedente da região -, pois as formavam 82% da mão-de-obra agri-
pressão tal que, mesmo tendo de dividir empresas, como indústrias modernas, cola e 51% dos operários da indústria
sua liderança com as novas forças eco- faziam uso não-intensivo de mão-de- de transformação.
nômicas emergentes, garantiu que a obra, E, forçando com sua presença
modernização da atividade agrícola se um aumento da produtividade média, Com 30% da população do País,
fizesse sem alterar a estrutura de pro- provocaram o reequipamento e moder- o NE tinha 50% dos analfabetos
priedade da terra e, mais ainda, que a nização de indústrias tradicionais da re-
zona de novas fronteiras agrícolas fosse gião, como a têxtil, que, em 1980, em- Nas duas décadas que se seguiram ao
apropriada de forma tradicional, em pregava menos da metade do número golpe militar de 1964, o Nordeste so-
grandes latifúndios. de operários de 30 anos antes, reduzido freudiversas mudanças que o integra-
O processo de industrialização que de 80 mil para 38 mil. O Projeto Nor- ram profundamente na economia na-
resultou desse conjunto de fatores teve deste, documento elaborado por uma cional, Mas, ao se iniciar a década de
um impacto social limitado na região comissão interministerial, nos primei- 1980, seus indicadores sociais ainda
nordestina. No início da década de 80, ros anos da década de 80, constatava mostravam que as condições de vida de
o parque industrial que ali se instalara taxas de desemprego e subemprego da sua população eram piores que na mé-
estava articulado com o do Sudeste e ordem de 45%. é dia do País.
com o internacional, com os quais Dessa forma, a modernização a que Embora 30% da população brasileira
mantinha uma relação de complemen- se viu submetida a região não impediu vivessem no Nordeste, a região concen-
taridade, mas permanecia pratica- que persistissem seus graves problemas trava mais da metade dos analfabetos
mente desligado do resto da economia sociais, Ela manteve seu tradicional pa- com mais de dez anos; 63% da popula-
nordestina. pel de reserva de mão-de-obra para o ção com deficit de calorias; 45% dos
resto do País - 3,4 milhões de pessoas trabalhadores que recebiam até um sa-
Em 1980, metade da população foram expulsas do Nordeste no período lário mínimo; e 54% dos que recebiam
do NF vivia na zona urbana 1960-80. E, como a forte concentração apenas metade desse valor. O nordes-
da propriedade da terra se manteve, o tino tinha uma esperança de vida (52
Não foram as indústrias produtoras êxodo rural dentro da própria região anos) inferior em dez anos a um mora-
de bens de consumo final, que podiam provocou o intenso crescimento das dor do Sudeste e a mortalidade infantil
ser consumidos pela população, que se grandes cidades. Em 1980, mais da me- era quase 40% maior. Sua renda per ca-
desenvolveram. Cerca de dois terços tade da população do Nordeste vivia na pita era igual à metade da brasileira e a
dos investimentos realizados através zona urbana. O número de habitantes um terço da verificada na região Su-
de incentivos fiscais na região se dirigi- de Salvador e Fortaleza triplicara e o deste. E a renda no Nordeste era mais
ram para a indústria de bens interme- de Recife mais que dobrara em duas concentrada. Foi sobre uma região
diários, que são consumidos por outras décadas, com esses problemas que se abateu,
indústrias. A participação dessa indús- Sendo responsável por 20% da pro- nos primeiros anos da década de 80,
tria no valor da transformação indus- dução agropecuária do País, a região uma das maiores secas da história.
412
a, pI56
A, 4041334 anOo
BR DFANBSBVB.GNCAM
que duplicava. Entretanto, nos anos 70, xada pela industrialização mais intensa (Gan./fev. de 1984), apesar do apelo da
o Paraná apresentou a menor taxa de do Sul-Sudeste. A vertente que foi em migração para as cidades, as popula-
crescimento demográfico do Pais - direção ao Norte e Centro-Oeste foi ções rurais do Brasil também apresen-
0,94% ao ano, bem inferior ao que seria atraída pelos imensos espaços vazios, tam constante movimento migratório
de se esperar pelo crescimento vegeta- para expandir a fronteira agrícola. O para novas áreas agrícolas. Segundo
tivo. Ou seja, o Estado também come- Paraná também atraiu migrantes en- ela, "a fronteira agricola brasileira ca-
çou a esvaziar-se, com exceção das re- quanto foi uma área de fronteira agri- minhou nos últimos 20 anos ao longo
giões em torno de Londrina e do Norte cola. Entretanto, o campo paranaense - de duas grandes frentes de penetração:
do Estado. Em 1980, 1,1 milhão de pes- como de resto, toda a região Sul - se a primeira, que chamamos de "sulista",
soas que viviam no resto do País decla- tornou produtor intensivo de itens de compõe-se de um fluxo de migrantes
raram ter emigrado do Paraná nos últi- exportação, especialmente soja, café e oriundos principalmente das regiões
mos anos, A esta última grande cor- cana; o sistema tradicional de produ- Sul e Sudeste, bem como de nordesti-
rente migratória se deve acrescentar ção agrícola, baseado na pequena pro- nos "reciclados". Tem penetrado na
outra, não tão volumosa, mas significa- priedade familiar, foi substituído pelas Amazônia através do Centro-Oeste,
tiva: o deslocamento, dentro da região grandes propriedades mecanizadas, dis- hoje, dirige-se prioritariamente para
Sudeste, de mineiros e capixabas em di- pensando um contingente de mão-de- Rondônia e Mato Grosso. A outra, que
reção a São Paulo e Rió de Janeiro. obra que não pôde ser completamente chamamos prosaicamente de outros mi-
absorvido pela indústria. grantes", compõe-se de um fluxo predo-
No Sul, a mecanização acaba minantemente nordestino; no entanto,
com & pequenás propriedades Havia migração também para as incluiu também capixabas e migrantes
novas áreas agrícolas de outras partes do País. Tem pene-
Mas quais foram as forças que deter- trado na Amazônia geralmente através
minaram esses. deslocamentos? A velha De acordo com artigo da economista do Pará e já se defronta com o fluxo su-
corrente migratória nordestina foi em- Anna Luiza Ozório de Almeida, da lista na região marcada por conflitos do
purrada pela concentração crescente Universidade Federal do Rio de Ja- leste mato- grossense e sudeste do Pará".
da posse da terra no Nordeste, e pu- neiro, publicado na revista Ciência Hoje
em % (1872-1985)
& NORDESTE
%!
Jas.ox
] se.s*
] 39%
]a3.7%
] a3.0%
Ja2.*
] az.ex
IEDES
]404%
|ae.7x
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Jas.ox
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Nordeste
| 30.2x
__ 29,0%
|28.5x
CENTRO-OESTE
8.7%
L:.“
]s:
]a2*
1960
isax]
Sudeste
Fonte: FIBGE
02 58
BR DFANBSB VB.GNCAMA, 3404/4331 20
A utilização do álcool no
País esteve longe de ter
constituído um processo
ordenado e racional.
Apesar de o choque dos
preços do petróleo ter
ocorrido a partir de 73,
foi só em 77 que a
alternativa do álcool
passou a se concretizar.
Isso porque as usinas
(ao lado) estavam
fascinadas com os altos
preços que o açúcar
conseguia no mercado
internacional.
O álcool, além disso, foi
lançado sem a prévia
solução de seus
problemas técnicos e de
poluição e acabou
lrmo Celso/Abril Press
consolidando a opção
rodoviária, em
detrimento de ferrovias
e hidrovias
415
despejos nos cursos d'água provocaram
mortandade de peixes e contaminação
em grandes extensões. Com a vigência
de legislação restritiva a essa prática, os
casos diminuiram.
Já o problema fundiário resultante
do estímulo à produção de álcool é de
outra natureza: uma destilaria típiica,
que produz 180 mil litros por dia, ne-
cessitava, nos anos 80, de oito a dez mil
hectares de cana; dada a estrutura da
agroindústria caravieira no Brasil, isso
" J. Albuquerque
levou à concentração de terra. Por ou-
tro lado, como a safra é de 180 dias, ha-
via tendências à utilização de mão-de-
obra temporária - bóias-frias - aumen-
tando os problemas sociais no campo.
Uma última questão era a competi-
ção entre cana-de-açúcar e outras cul-
turas, especialmente de alimentos, não
apenas em termos do uso das terras,
mas também em recursos humanos, ge-
renciais e financeiros; em particular, a
cana competia com a produção de ali-
mentos tanto para consumo interno
quanto para exportação., Até meados
dos anos 80, a área plantada com cana
havia crescido cerca de dois milhões de
hectares, enquanto a produção de
grãos marcava passo.
"Agência O Globo
Biblioteca Nacional
Agência O Globo
Miguel Lemos: divulgador do pensamento O padre jesuíta Henrique Vaz: uma Emanuel Carneiro Leão: escritos sobre
de Comte junção do cristianismo com dialética Martin Heidegger
"safadissimo", sem que ocorresse a gir e procuravam ser originais, a ideolo- dos esforços metódicos dos nossos pen-
qualquer dos seus contemporâneos gia dominante os desviava para inócuas sadores.
observar-lhe que havia incoerência no combinações ecléticas ou os seduzia Um exemplo disso? Machado de As-
xingamento, já que a safadeza, em grau com máscaras bizarras provincianas. E sis. Se compararmos os "momentos" fi-
superlativo, exige uma esperteza que é depois essa mesma ideologia domi- losóficos de Machado ao tratado que
incompatível com a imbecilidade. nante tratava de convencer o grande seu contemporâneo Farias Brito
Vivia-se numa sociedade na qual as público com a tese de que tudo aconte- (1864-1917) dedicou à Finalidade do
idéias valiam muito menos pelo conhe- cia porque o brasileiro não tinha "voca- Mundo, não poderemos deixar de cons-
cimento que podiam proporcionar do ção para a filosofia". tatar que o pensamento do autor do
que por seu uso "pugilístico" (ou como Quincas Borba está mais vivo que o do
instrumento para obtenção de presti- Pressionada, a filosofia deslocou- outro. Também o poeta Carlos Drum-
gio). O imediatismo, o utilitarismo e o se para a literatura mond de Andrade pode ser lembrado
pragmatismo cultivados pela ideologia para confirmaro que dizemos: os frag-
dominante cortavam as asas da teoria, Apesar de toda essa pressão hostil, a mentos de filosofia que se acham em
tornavam a reflexão incapaz de grandes filosofia não desapareceu da vida cultu- sua obra parecem bem mais instigantes
vôos. A ideologia dominante interpe- ral brasileira. Nossos intelectuais, ao lon- que as idéias sistematizadas pelo douto
lava, cinicamente: "Para que serve a fi- go dos séculos, abordaram temas filo- jesuita Leonel Franca (1893-1948).
losofia?" Se não servia para nada - se sóficos. Os que insistiram em fazê-lo de Nestas últimas três décadas, com o
não se dispunha a servir - era caracteri- forma sistemática expuseram suas surto de desenvolvimento capitalista,
zada como pura perda de tempo. O sis- idéias à erosão do ambiente adverso e estão surgindo possibilidades novas
tema que roubava o espaço em que a não conseguiram nos legar grandes rea- para a filosofia no Brasil; ela está lu-
filosofia podia florescer tinha o des- lizações. Independentemente de sua tando para recuperar o terreno que lhe
plante de condená-la por não possuir coragem cívica, o materialista baiano é próprio. Está mostrando vitalidade e
um espaço próprio. Domingos Guedes Cabral (1852-83) ambição. Alguns êxitos que ela já ob-
Essa situação, evidentemente, teve não nos ajuda a compreender melhor teve são animadores: o pensamento,
reflexos muito negativos sobre a elabo- as relações entre o cérebro e o pensa- entre nós, está se universalizando.
ração filosófica entre nós. Acumu- mento. O franciscano Mont' Alverne Um estudioso europeu, hoje, teria
lavam-se os obstáculos nos cami- (1784-1858) não acrescentou nada às certamente algo a aprender lendo, por
nhos daqueles que procuravam criti- idéias - que, em si mesmas, já eram exemplo, escritos de Gerd Bornheim
car as falácias da linguagem, as ilusões pouco significativas - do francês Victor sobre Sartre, de Marilena Chauí sobre
do dado, os enganos da aparência. Cousin. Miguel Lemos (1854-1916) se Espinoza, de Carlos Nelson Coutinho
Tanto os católicos tradicionalistas limitou, no essencial, a divulgar o pen- sobre Gramsci, de Bento Prado Júnior
como os positivistas de diversos matizes samento de Comte. sobre Rosseau, de José Arthur Gian-
revelaram-se incapazes de apreender Mas a filosofia, reagindo contra essa notti sobre Marx, de Emanuel Carneiro
toda a riqueza das mediações e toda a erosão, se deslocou para um terreno Leão sobre Heidegger, ou de Henrique
complexidade das contradições da onde não podia se desenvolver de Cláudio de Lima Vaz sobre Hegel. Mas
nossa realidade. forma sistemática, porém conseguia so- o que é mais importante é que os brasi-
Os nossos filósofos ficavam, com fre- breviver: foi acolhida nas artes e na lite- leiros, lendo esses nossos compatriotas,
quência, reduzidos à condição de epi- ratura. E o resultado é que as obras de poderão ver a filosofia alçando vôo,
gonos dos pensadores europeus, diante alguns artistas e escritores brasileiros com asas novas.
dos quais eram levados a assumir pos- apresentam acenos filosóficos que che-
tura reverencial. Quando tentavam rea- gam a oferecer interesse maior que o Leandro Konder
418
IJG2
er oransss 44041334 ânco2,p
419
tica externa extremamente improvável.
"As relações interamericanas", por-
tanto, não existem senão como fingi-
mentos da imaginação, pois frequente-
mente e de hábito não são comple-
mentadas por ações substantivas.
Alguns exemplos são suficiente-
mente elucidativos para nos permiti-
rem dispensar outros: o primeiro deles
é o da guerra das Malvinas, ocorrida
em 1982. Nesse lamentável episódio de
noss história, a maioria dos jornais
brasileiros, diferentemente de nossa
Chancelaria do Itamaraty (que no en- tha
tanto pouco fez de efetivo) apoiou a In- ses]
glaterra, enquanto uma parcela redu-
zidíssima da imprensa apoiava a Argen-
tina. Isso como atitude retórica, pois,
nnªprática, mesmo esta parcela mínima
val pró-Argentina apoiou de fato a In-
glaterra, pois escolheu eleger as alega-
das "negociações" (que na realidade
foram desconsideradas por Londres)
como instrumento possível de trazer a
paz e o entendimento, quando eram
apenas um estratagema londrino para
preparar a invasão militar das ilhas. Ou-
tro exemplo escandaloso e mais dramá-
tico foi a invasão de Granada pelos
EUA, em 1983, episódio no qual tanto
a chancelaria brasileira quanto a im-
prensa nativa se portaram com abso-
luto descaso pela verdade. Os jornais
brasileiros desconsideraram a posição
contrária de Fidel Castro ao gople de
Estado que resultou no assassínio do
primeiro-ministro Maurice Bishop e
que serviu de pretexto para a invasão
americana. A assustadora dívida ex-
terna que incidia sobre quase todo o
território latino-americano nos anos 80
tornava qualquer política externa de
nossos países fútil e inoperante, se- A intervenção dos EUA no Hemisfério: acima, soldados hondurenhos são treinados por
gundo a visão da maioria dos tecnocra- oficiais americanos; abaixo, a ação americana em Granada. Se para atos como esses
tas instalados nas diversas administra- os EUA já não contam com o antigo apoio maciço dos governos latino-americanos, a
ções nacionais. Não há possibilidade de oposição que enfrentam é muito frágil
reação a certos interesses americanos,
argumenta-se, quando os ministros da dido muito pouco na direção certa. Um que, Londres e Paris e são intérpretes
Fazenda e da Economia estão amarra- exemplo da absoluta descoordenação dessas capitais. Nisso reside a incorrigi-
dos interesses dos países latino- vel fragilidade das políticas externas
A relação com os EUA é uma americanos pode ser encontrado, por dos países da região, seja nas suas rela-
relação entre servo e senhor acaso, no Instituto Internacional do ções mútuas, seja nas suas relações
Café, onde os países produtores se di- com os EUA. A dominação estrangeira
dos a compromissos com os bancos gladiam como delinquentes juvenis é tal que nenhum país consegue ou
americanos, Essa é contudo uma visão diante do olhar severo dos consumido- pode ter uma política externa consis-
estreita; uma das saídas óbvias para a res do Primeiro Mundo - e um fato re- tente, As relações entre os países
situação em que se encontram esses go- levante a ser considerado é que até latino-americanos e Washington é uma
vernos é precisamente a de transferir o hoje os produtores de café não conse- relação entre servo e senhor. E as rela-
debate da dívida do plano econômico e guiram estabelecer um cartel de produ- ções entre os países, do Rio Grande -
financeiro para o político. tores, Uma tentativa feita a partir da que separa os EUA do México - para
Algumas tentativas têm sido feitas Venezuela esbarrou com a resistência baixo, é uma relação de servo para
para ordenar regionalmente as relações feroz dos EUA e se perdeu nas fumaças servo, isto é, caracterizada pela ânsia
e a interdependência de interesses de dos restaurantes londrinos, de agredir o vizinho para agradar ao se-
países vizinhos, no continente latino- O pólo de atenção das chancelarias nhor.
americano, Deve-se a isso a existência, latino-americanas está ao Norte, em
por exemplo, do Pacto Andino e do Washington, enquanto intelectuais e
Mercado Comum dos Países do Ca- elites em cada país latino-americano
ribe, mas efetivamente se tem progre- têm os olhos voltados para Nova Ior- Cláudio Abramo
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? Re nuc anças
para pôr fim ao Estado Novo, de certa a Confederação Geral dos Trabalhado-
No início de 1945, o agonizante Esta-
forma só seria encerrada 20 anos de- res do Brasil (CGTB), primeira tentati-
do Novo e seu líder, Getúlio Vargas,
pois, com o golpe militar de 1964. Du- va de unificar formalmente a luta dos
viam ressurgir um personagem notável
rante esse período, sua tendência geral trabalhadores, intervindo em inúmeros
na história do País: o povo organizado.
foi de crescimento, embora refluísse sindicatos que a apoiavam. A CGTB
O Estado Novo havia sido instituído
por alguns momentos. fechou, e o governo instituiu a Confe-
como uma espécie de dique para con-
Logo no início, o governo Dutra viu- deração Nacional dos Trabalhadores
ter a intensa agitação social dos anos 20
se em dificuldades com a intensa agita- na Indústria (CNTI), atrelada ao Minis-
e 30. Com seu fim, abria-se, um perio-
ção social. Para contê-la, agiu de duas tério do Trabalho. Até o final de seu
do favorável ao crescimento das orga-
formas: 1) colocou o Partido Comunis- governo, Dutra promoveu cerca de 400
nizações e lutas populares.
ta na ilegalidade, cassando seus repre- intervenções em sindicatos. Mesmo as-
A nova onda de participação popu-
sentantes parlamentares; 2) inviabilizou sim, nos primeiros dois anos em que es-
lar, que já se iniciara no movimento
teve na Presidência, o número de gre-
vistas oscilou entre 200 e 250 mil anual-
mente.
Já no início do governo Vargas, em
1952, o número de grevistas chega a
400 mil. Desses, 150 mil eram têxteis, o
setor industrial mais importante da é-
poca. Também no mesmo ano, as "pas-
seatas da panela vazia" chegam a reu-
nir, em São Paulo e no Rio, 500 mil
pessoas.
Em março de 1953 é deflagrada a fa-
mosa "Greve dos 300 mil" em São Pau-
lo. Iniciada pelos têxteis, ela ganha a
adesão dos metalúrgicos, marceneiros,
vidreiros e gráficos. Durou 21 dias e foi
considerada vitoriosa.
Durante o governo Juscelino, em
1957, nova greve geral realiza-se em
São Paulo e paralisa 400 mil trabalha-
dores durante dez dias do mês de ou-
tubro. O aumento salarial obtido pelos
trabalhadores, no entanto, ficou bem
abaixo do que eles pretendiam.
A organização dos trabalhadores ru-
rais também avançava. A criação das li-
gas camponesas, em meados da década
de 50, incentivadas pelo então deputa-
do socialista Francisco Julião, deu pro-
jeção nacional às lutas dos campone-
ses; Além disso, a União dos Lavrado-
res e Trabalhadores Agrícolas do Brasil
(ULTAB), antes restrita a São Paulo,
viria a ser uma entidade nacional nos
anos 60. Surgia também o Movimento
dos Trabalhadores Sem-Terra (MAS-
TER) e crescia o movimento da Igreja
pela sindicalização rural.
Desde 1953, o movimento sindical
procurava reunir as lutas das diversas
categorias sob comando único. Ainda
na década de 50 são criados o PUI
(Pacto de Unidade Intersindical), em
São Paulo; as CPOS (Comissões Per-
421
o
[+++
"*!js
Adad
e
Iconographia
Iconographia
) a R A3 ae iz
Marcehieiros, metàlúrgicos , vidreiros e gráficos aderiR am,
Acima, líderes sindicais discutem a "Greve da legalid
em 53, à "Greve dos 300 mil", iniciada ade",
pelos têxteis agosto/61, pela posse de Goulart. A esq., de pé,
facima, assembléia da categoria, março/54 o advogado
| José Carlos Dias; a seu lado, Dante Pelaca
ni
manentes das Organizações Sindicais),
tantes conquistas populares dos 20 anos "política de alívio" ensaiada no gover-
no Rio; e o PUA (Pacto de Unidade e
anteriores. Entre elas, o próprio direito no Costa e Silva, sem ter ainda efetiva-
Ação). Os trabalhadores buscavam
de sindicalização, o serviço de assistên- do o controle completo das organiza-
"um organismo nacional que dirija as
cia social aos previdenciários, o 13o sa- ções populares, teria fôlego curto. As
forças dos trabalhadores de todo o
lário e a reforma agrária anunciada por manifestações voltam de imediato às
País", conforme a expressão adotada
Goulart no famoso "comício das re- ruas e são reprimidas com violência.
no Congresso Sindical de Belo Hori-
formas", em 13 de março, no Rio,
zonte, em 1960. Esse objetivo seria atin- Em março de 1968, depois de espe-
Novamente, como no golpe do Esta- cializa
gido coma criação do CGT (Comando r-se em "comiícios-relâmpago "
do Novo; as elites conservadoras pro- contra a privatização do ensino, os es-
Geral dos Trabalhadores) que agrupou
curavam conter o avanço das lutas so- tudantes reúnem 100 mil pessoas no
586 sindicatos, em 1962,
ciais e o movimento popular ainda não Rio, numa manifestação de protesto
A formação do CGT ocorreu num
tinha forças para reverter essa tendên- pela morte do estudante Edson Luis,
momento crucial na vida do País, já en-
cia, Ao lado disso, crescia a insatisfação
tão abalada por seguidas crises políti-
cas. Primeiro, a renúncia de Jânio Qua- operária, estimulada por dispensas em
dros, em 1961, Depois, as ameaças de massa nas fábricas. Já em março de
alguns setores militares à posse do vice- 1968 os trabalhadores formavam um
presidente João Goulart. Comit ê Intersindical Antiarrocho, em
Com o golpe, começam a ser demo- Belo Horizonte. Em abril, estoura
As organizações sindicais, a essa al- lidas as conquistas dos trabalhadores, a
tura, assumem também bandeiras polí- também uma grande greve em Conta-
começar pela destituição de Jango -
ticas e, por exemplo, apóiam a posse de gem, encerrada pelas tropas da Polícia
que eles haviam ajudado a empossar e
Goulart, realizando a "Greve da legali- Militar, que ocuparam aquela cidade
com quem colaboraram para assegurar mineira em meados de junho. Em ju-
dade", em agosto de 1961. o mandato pleno com as lutas pelo ple-
Durante o ano de 1962, por duas ve- lho, nova greve, de seis mil Operários,
biscito - e o fim das eleições presiden- em Osasco, SP, com duas fábricas ocu-
zes os trabalhadores voltaram a realizar
ciais diretas. A seguir, viriam as leis an- padas. O movimento foi rapidamente
greves gerais de cunho político: na pri- tigreve e os reajustes salariais com base
meira, em junho, para não permitir que declar ado ilegal, e as fábricas, desocu-
em índices oficiais. Foram afastadas li- padas à força por tropas da PM,
o Congresso impusesse O nome de deranças de 342 sindicatos, 43 federa-
Auro de Moura Andrade como primei- No dia 13 de dezembro de 1968 foi
ções e três confederações. O regime decret
ro-ministro, no lugar de San Thiago ado o Ato Institucional no 5 (AI-
procurou atingir principalmente os 5), outorgandô ao general presidente
Dantas, indicado por Goulart; na se- grandes sindicatos, com mais de mil as-
gunda, em setembro, com entidades es- da República e ao Conselho de Segu-
sociados, sobre os quais se abateram rança Nacional, controlado pelos mili-
tudantis e as ligas camponesas, para 70% das intervenções federais. Cerca
forçar a antecipação do plebiscito que tares, poderes ditatoriais completos,
de 90% dos sindicatos rurais criados em Estava nas mãos do regime o instru-
poria fim ao parlamentarismo. 1963 e 64 foram fechados por decreto,
Em outubro de 1963, rebenta nova mento para tentar liquidar a agitação
assim como qualquer tipo de entidade das
greve geral em São Paulo: 700 mil tra- ruas e fábricas. Do final de 1968
intersindical autônoma. Em 1965, até 1977, o movimento popular retraiu-
balhadores obtêm sucesso em suas rei- aconteceram apenas 25 greves, contra
vindicações de aumento salarial. se, principalmente devido ao regime
mais de 150 em 1963. Nesse momento, terrori
A essa altura, os setores mais reacio- sta que se implantava à sombra
a contenção do movimento popular da AI-5, com torturas e assassinatos nas
nários das elites nacionais empenha- ainda era relativamente não-violenta.
vam-se em articular o golpe militar de prisões políticas e órgãos de repressão.
Já em 1967, o marechal Castello Bran- De 1968 a 1972 o movimento popu-
1964. Os grupos ligados ao golpe ata- co outorga uma Constituição ao País; o
cam duramente o regime democrático, lar reflui das ruas e adota novas táticas,
regime ensaia retirar de cena os instru- Setores da vanguarda do movimento
visando explicitamente às mais impor- mentos ditatoriais. Mas a chamada estudantil e lideranças operárias for-
422
BR DFANBSO VE.GNCAMA 34041221 ânCpa, p 65
BR DFANBSB VB.GNCIAAA, 840413334 , pJGO
Juca Martins/F 4
áreas operárias - reivindica melhores
condições de transporte.
Essas lutas nos bairros foram as mais
importantes até 1975. Neles, a organi-
zação popular se beneficiou do apoio
de setores da Igreja, mais difícil de ser
Descoberta a manipulação dos reprimida.
índices do custo de vida nós anos do
"milagre econômico" a partir de 1977,
o movimento sindical exige a correção
dessa defasagem.
Em maio de 79, 113 mil operários Um primeiro grande resultado desse
fazem a primeira grande greve trabalho miúdo surgiria em 1975 com o
metalúrgica do ABC, exigindo 78% de Movimento Custo de Vida (MCV), em
reposição salarial (no alto, assembléia São Paulo. Em setembro de 1978, o
no estádio de Vila Euclides; em MCV reuniu uma lista de 1,3 milhão de
primeiro plano, Luís Inácio da Silva); assinaturas exigindo do governo uma
também em 79, em agosto, greve de 15 redução do custo de vida. Represen-
im B
423
dia seguinte, 9.500 trabalhadores da
Ford aderiram à paralisação. Em me-
nos de dois meses, a greve espalhou-se
pôr 18 cidades e 400 indústrias, mobili-
zando meio milhão de operários. As-
sim, a legislação antigreve instituída em
1964 ficou, na prática, desmoralizada.
Em última instância, a ação do pró-
prio regime contribuiu para fortalecer a
luta popular. Com sua política de favo-
recimento ao grande capital nacional e
estrangeiro, os governos pós-64 haviam
--ea
Revelaria o ano de 1984 as dificulda-
des políticas crescentes do Regime Mi-
2
litar; a grande campanha por eleições
presidenciais imediatas incendiaria o
País.
A
como no caso das leis salariais, desta
N
D
vez a campanha popular deu origem a
um pacto político entre grande parte da
oposição e dissidentes do regime. Essa
aliança, por sua vez, escolheu o primei-
ro presidente civil do País em 20 anos:
Tancredo Neves, do PMDB, represen-
tante da parcela das elites derrotada
Agitações extremas marcariam 1983 (na pág. ao lado, saldo de quebra-quebra em
em 1964, que propõe uma Nova Re-
estação de subúrbio) e, em 84, a onda grevista alcançaria os bõias-frias (acima, Aderval
pública, a volta às tradições liberais.
Alcides, líder do movimento, à frente de piquete em Guariba, SP, maio/84)
Em 1984, as relações entre as diver-
multiplicava-se também a força dos operárias do período de 1981-82, no en- sas forças políticas haviam-se transfor-
grevistas: sustentaram a greve por 41 tanto, visavam especificamente aos mado consideravelmente, abrindo es-
dias, porque receberam o apoio de um atrasos de salários e às demissões - o paço para uma participação muito mais
dos maiores movimentos de solidarie- que caracteriza um certo refluxo. Tam- efetiva dos setores populares na vida
bém se mobilizaram os médicos que nacional. Embora o sindicalismo oficial
dade da história do País.
A manifestação do 1o de maio em pararam em 14 Estados, em abril de fosse ainda muito forte, havia também
São Bernardo, em 1980, torna-se o 1981, e os trabalhadores da construção um considerável movimento pela orga-
símbolo dessa resistência. Uma imensa civil, motoristas de ônibus e funcioná- nização independente dos trabalhado-
massa humana de 100 mil pessoas faz rios públicos. res. A greve geral de julho de 1983, diri-
com que a polícia seja obrigada a ceder Em outras áreas, porém, o movimen- gida de forma unitária por sindicatos da
espaço e acabe permitindo uma passea- to ainda começava. Os conflitos no CUT e da CONCLAT, a despeito de
ta dos trabalhadores, numa São Ber- campo, em 1981, envolveram cerca de seu sucesso relativo, diante do vasto
nardo do Campo ocupada pela PM e 40 mil famílias, ou perto de 200 mil pes- potencial de mobilização do País, cum-
com tropas do Exército de prontidão, soas. E eles avançavam. Em 1984, a pre seu objetivo de ser um dia nacional
às margens das rodovias vizinhas. Nos luta grevista chegava a um setor novo, de protesto. As paralisações mais am-
dias seguintes, porém, a repressão au- o dos bóias-frias, assalariados rurais plas ocorreram em São Paulo e no Rio
mentou, até que, no dia 11, uma as- temporários. Em Goiás, Minas, Rio e Grande do Sul, e no conjunto houve a
sembléia determinou o fim da greve. São Paulo, a nova categoria agrícola adesão de três milhões de trabalhado-
desencadeou uma série de greves - al- res.
Da ABI à fííf'lí'bié, ÃW'IIÍM' gumas violentas, com mortes, depreda-
( am ba “;;;“ ::]: AJ «]“ clas "luª Pa
solidários com os operários ções, incêndios -, que, no fim do ano,
atingiu meio milhão de trabalhadores. revela forma de unificação
A campanha de solidariedade aos Paralelamente ao crescimento de
operários contou com a participação suas lutas, os trabalhadores elevaram Além disso, a campanha pelas "dire-
de políticos, como o senador Teotônio sua organização. Em 1981, já haviam tas- já",em 1984, revelou uma outra for-
Vilela, da Igreja e das associações civis sido criadas diversas organizações po- ma de unificação dos setores: através
mais importantes, como a Associação pulares nacionais, a despeito da lei e da da luta política, o que se deu no Comitê
Brasileira de Imprensa (ABI) e a Or- repressão que as destruiram em 64 e as Nacional Pró-Diretas, que unia CUT,
dem dos Advogados do Brasil (OAB). perseguiam desde então. Foi recriada a CONCLAT, ANDES e UNE às entida-
Ficava claro, assim, que a política eco- União Nacional dos Estudantes (UNE); des liberais como OAB e ABI e parti-
nômica do governo era repudiada por surgiu a Associação Nacional dos dos políticos de oposição.
uma ampla maioria. Em 1983, ao tentar Docentes no Ensino Superior (AN Embora não tenha tido uma atuação
aprofundar a política de arrocho sala- DES). Em 1981, ocorre a primeira Con- determinante na campanha, o setor po-
rial para satisfazer as exigências do ferência Nacional da Classe Trabalha- pular foi responsável por a luta não se
FMI, o governo acabou sendo derrota- dora. Nela, cinco mil ativistas, repre- ter interrompido prematuramente após
do no Congresso. sentando mil entidades sindicais, con- o sucesso dos primeiros comícios.
O ano de 1983 foi marcado também denaram a política econômica e decidi- Com a eleição de Tancredo Neves
por agitações populares, de formas ex- ram criar a Central Unica dos Traba- pelo Colégio Eleitoral, começava a ga-
dois movimentos: um, que criaria : ca da greve geral de 1983 e dos comitês
pouco nos anos anteriores, em compa-
ração com o período 1978-80, devido às CUT, controlada por ativistas do Parti- das diretas seria tanto mais importante
concessões e à repressão rigorosa. Um do dos Trabalhadores; e outro, com ve- na medida em que o País se preparava
ano após a greve dos 41 dias no ABC, lhos dirigentes sindicais e ativistas do para uma nova fase de sua história, em
uma paralisação dos empregados da PCB e PC do B, que se opôs à criação que a presença política dos trabalhado-
Fiat, no Rio, termina em derróta, de- imediata da Central e adotou o nome res poderia ser o fator determinante
pois de 42 dias de resistência. As greves provisório de CONCLAT (Coordena- das muitas mudanças necessárias.
425
BR DFANBSB 240 J a a anos p 68
/
BR DFANBSB Va.GNC.aaa, 2404/35 an 002 , p 169
CULTURA/ARTES GRÁFICAS: a história dos quadrinhos Ocupar suas páginas: Jerônimo Mon-
teiro, Cláudio de Souza, Jayme Cortez.
A partir da Segunda Grande Guerra
o Brasil é invadido pelos quadrinhos
made in USA, Nessa época, São Paulo
acelera a sua industrialização, a cidade
cresce vertical e horizontalmente. Em
Desde os anos 50, o quadrinho nacional luta por 1950, a Editora Abril surge no mer-
uma reserva de mercado que permita sua expansão e cado, publicando os personagens de
Walt Disney. A partir daí, o espaço do
atrapalhe a ação dos super-heróis no mercado nacional quadrinho nacional diminuiu mais e
mais. Sem nenhuma regulamentação
No começo do século, o Senado da
jovem República brasileira vivia mo- ANO I RIO DE JANEIRO, QUARTA-FEIRA. 1! DE OUTUBRO DE 1905 N.o 1
mentos agitados. Na tribuna, o baiano roça k
Rui Barbosa. De repente, um de seus do
companheiros 0 interpela insistente-
mente sobre onge fora buscar a afirma-
ção"que acabara de fazer. Rui res-
ponde: "Li n'O Tico-Tico."
Primeira revista brasileira no gênero
infantil, O Tico-Tico (190560) marcou
época e gerações. Em suas páginas co-
loridas, os traços lúdicos de gente
como J. Carlos, Luiz Sá, Max Yantok,
Theo A. Rocha, Alfredo Storni, Paulo
Affonso, Oswaldo Storni, Angelo Agos-
tini e muitos outros.
426
An Coa, pJ3%0
Broransse vs.enc.aaa, 2404das]
para a entrada do material estrangeiro, ano, no jornal Folha de S. Paulo, um jo- vendo com um acontecimento his-
os quadrinhos americanos chegavam vem desenhista dá os seus primeiros tórico: a primeira Exposição Interna-
ao País a preços baixíssimos (e isso traços, publicando em tiras o seu perso- cional de Histórias em Quadrinhos, no
ainda acontecia em 1984), em certos nagem Bidu. Era Maurício de Souza, bairro do Bom Retiro. Participam Al-
casos até 70% menores que o do mate- que, dez anos depois, em 1969, iria pu- varo Moya, Miguel Penteado, Rei-
rial nacional, graças a uma estrutura de blicar a revista Mónica, maior sucesso naldo de Oliveira, Sillas Roberg, Jayme
distribuição mundial realizada pelos dos quadrinhos brasileiros, pela Editora Cortez e muitos outros. Os franceses
Abril. até a década de 70 se consideravam os
syndicates. Mesmo assim, em 1959, a
Não se pode esquecer, no entanto, primeiros a se preocupar com os qua-
Editora Continental, em São Paulo, as-
sumiu compromisso de publicar so- do dia 18 de junho de 1951, quando a drinhos como objeto de estudo. Mas
mente autores nacionais. Nesse mesmo friorenta São Paulo amanhece convi- reconhecem a nossa primeira exposi-
ção como um acontecimento inédito
no mundo. É dessa época também o
início da luta pela nacionalização dos
quadrinhos, quando vários artistas tun-
dam a Associação Paulista de Dese-
nhistas. Sob a presidência de Romeu
Cozzi, tenta formar quadros de dese-
nhistas e abrir caminho para a produ-
ção brasileira.
Nrioca,: personagem de Disney roteiri- do deputado. Pelo menos parte dos au- lei de 1963, com algumas ressal
"zado e desenhado no Brasil, mudou-se tores era a princípio favorável, apesar
vas,
ainda em vigor dentro da legisl
©*de uma favela no Rio para uma casa de das evidentes dificuldades iniciais que
ação
brasileira.
"tijolos financiada pelo Banco Nacional haveria para cumprir o que dispunha
o
da Habitação (BNH). projeto. Afinal, depois de anos massa- Nos anos 80, a situação das
Em 1979, sem consultar nenhum au- crados pelos estrangeiros, não seria
tor ou editor de quadrinhos, o depu-
fá- H (à continuava a mesma
cil para o autor nacional ocupar
de
tado Jorge Paulo (PDS-SP) apresentou
um projeto que dispunha sobre a obri-
uma hora para outra metade do espaço
Em 1977, o jornalista e estudioso de
dos quadrinhos publicados no País,
gatoriedade de publicação de histórias quadrinhos Wagner Augusto já definia
em quadrinhos de autores nacionais.
Em 1984, o projeto foi aprovado na
o principal entrave à produção nacio-
Segundo o projeto, as editoras seriam
Câmara e chegou ao Senado. Ali fun-
nal de quadrinhos, "A não-existência
obrigadas a publicar no conjunto de
cionou um grande lobby das maiores
de uma produção de história em qua-
suas edições 50% de histórias de auto-
editoras nacionais, que se orgulhavam
drinhos brasileira se deve ao grande nú-
res nacionais,
de ser grandes produtoras mundiais de
mero de material estrangeiro que entra
Disney, Recruta Zero, Fantasma etc., e
no País sem pagar qualquer taxa de im-
Uma nova kimi/"Hii“; surge entre
surgiu uma emenda: as histórias com
portação." Mesmo com as elevadas ta-
personagens estrangeiros criadas no xas para a importação e resoluções
alt/113,1“. t flffswilª Brasil contariam como sendo nacio-
como o comunicado no 543 da CACEX
O assunto criou nova polêmica entre
nais. Nesse mesmo ano, a AQC (Asso-
(Carteira de Comércio Exterior) sus-
as editoras e os artistas. O Jornal do
ciação dos Quadrinistas e Cartunistas),
pendendo a importação de produtos
Brasil, que, junto à Folha de S. Paulo,
fundada em 1983, em São Paulo, reu-
considerados supérfluos, o material es-
era um dos únicos órgãos da imprensa
nindo artistas como Fortuna, Henfil,
trangeiro para publicação das revistas
diária que publicavam mais de 50% de
Jayme Leão, Chico Caruso, Maringoni
de quadrinhos continuava, nos anos 80,
autores nacionais, criticou a iniciativa
e outros, decidiu repudiar o projeto-lei
a ser despejado no mercado como uma
emendado. Seus associados preferiam a
grande avalancha.
428
AIANCOS,pI%2
BR DFANBSB VE.GNCAM. S4O4J3
Iconographia
ascensão social". O IBH morreu com a
renúncia. Mas, enquanto viveu, foi pró-
digo em metas não cumpridas. A curto
prazo, havia programado a construção
A Fundação da Casa Popular, primeiro esboço de política habitacional, foi de 100 mil casas, entre julho de 1961 e
criada no governo Dutra. Acima, o presidente inaugura casas populares em dezembro de 1962. Tomou 80 milhões
de dólares junto ao Banco Interameri-
Coelho Neto, RJ, 1950, com Remy Archer (à dir.) e Mendes de Moraes (à esq.)
cano de Desenvolvimento (BIRD) e
planejou a construção de conjuntos ha-
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/HABITAÇÃO: a história do BNH
bitacionais simples, de chão de con-
a a creto, sem revestimento nem portas in-
ternas.
431
2 ( 9 A3 B AMPLIAÇ A ; PRAZO
LEPAGUE
NÃ OSAIA : NÃO VENDA
e éo
Adolfo Gerchmann
protestos em todo o Prís.
A esq.,
reunião de mutuários em Alvora
da, RS,
Jul./83; acima, preenchiment
o de
procurações judiciais na
sede da
FAMERJ, também jul./83.
el Va
432
BR DFANBSB VB8.GNC.AAA, 3 4,
41334 an 0a, py
p 1%
2404133 an co2,
sr Dransss
As cidades inchadas
Meados de 1971. O governo Médici pertório das glórias do novo Brasil dos No Rio de Janeiro, entre 1960 e
trombeteia os.recordes da nossa econo- militares. É que, se indicava os avanços 1970, duplicou o número de favelas (de
mia, anunciando o "milagre econô- da industrialização acelerada, não po- 147 para 300) e triplicou o número de
mico". A propaganda oficial não des- dia esconder um grave drama: as cida- favelados (355 mil para 1 milhão).
perdiça sequer um único índice estatis- des brasileiras, principalmente as maio- Em Recife, das 195 mil habitações
tico comparável aos seus equivalentes res, haviam crescido rápido demais e da cidade, mais de 100 mil eram mo-
desordenadamente - incharam, na ver- cambos, em 1972. No mesmo ano, Sal-
de países ricos.
Eis que o Instituto Brasileiro de Geo- dade. Estavam abarrotadas de gente vi- vador servia com esgotos apenas 4%
grafia e Estatística (IBGE) divulga os vendo em condições miseráveis. dos seus pouco mais de um milhão de
primeiros resultados do Censo Demo- Eis uma amostra: em São Paulo, no habitantes. Os Alagados, uma espécie
gráfico de 1970 e se vê que, finalmente, início dos anos 70, a população fave- de cidade dentro da cidade de Salva-
o Brasil deixara de ser um país eminen- lada crescia a uma taxa de 25% ao ano, dor, construída em cima da lama e do
temente rural. Pela primeira vez, um cinco vezes mais depressa do que a po- lixo, possuiam cerca de 15 mil casas,
Censo Demográfico registrava mais pulação total da cidade. Ela recebia abrigando perto de 80 mil pessoas.
gente vivendo nas cidades do que nos quase 150 migrantes por hora, que se Em Fortaleza, a população da área
campos. Igualzinho aos países ricos in- iam despejando nas favelas e nos bair- metropolitana havia triplicado entre
dustrializados. Aqui, 56% da população ros periféricos, em loteamentos clan- 1950 e 1970, atingindo 900 mil habitan-
era urbana em 1970, contra 45% em destinos, sem água, luz e esgotos, mal tes. Destes, 300 mil eram menores de
1960. Um salto espantoso. servidos por ônibus urbanos e quase 18 anos vivendo em estado de "aban-
A virada, no entanto, foi pouco di- sem nenhuma estrutura de segurança dono material", dos quais 60 mil em
vulgada e contou muito pouco no re- pública e assistência médica e social. abandono total. Três mil crianças vi-
BR DFANBSB 2404 1334 anCo2a,
viam com suas mães na zona do me- as migrações e a estimativa da ONU fia, adiantando em quase 20 anos a
retrício. acabou não se confirmando. proporção dos brasileiros vivendo na-
"Ribeirão Preto, no interior de São Mesmo assim, o processo de urbani- quelas metrópoles. Além disso, o
Paulo, tinha cerca de 10% dos seus 200 zação não parou nem deixou de ser im- mesmo Censo de 1980 constataria que
mil habitantes vivendo como marginais pressionante. Um exemplo é o que 67% da população viviam nas cidades e
"*"rurbanos", palavra inventada por so- aconteceu nas nove principais áreas 33% no campo. Em 1950, a proporção
ciólogos para indicar as pessoas que vi- metropolitanas do Brasil, que se forma- era quase a mesma, mas invertida: 36%
viam nas favelas urbanas, mas trabalha- ram em torno de Belém, Fortaleza, Re- nas cidades e 64% no campo. Ou seja,
vam no campo como bóias-frias. cife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de em apenas 30 ános, o País virou do a-
Esse era o resultado de um cresci- Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto vesso.
mento urbano que a ONU classificava Alegre. Até os anos 40, exceto em áreas
como o mais rápido do mundo. Se per- Em 1972, aproximadamente 25% dos como São Paulo, não se podia dizer
manecesse naquele ritmo, a ONU esti- brasileiros viviam nessas nove áreas. Na que a população urbana do Brasil es-
mava, no início dos anos 70, que São época, a projeção mais aceita entre os tava crescendo vertiginosamente, a
Paulo poderia ser a maior cidade do demoógrafos era a de que, no ano 2000, despeito de crescer mais rápido do que
mundo em 1984, com cerca de 20 mi- estariam vivendo nesses locais algo em a população total. A industrialização,
lhões de habitantes. Entretanto, a crise torno de 29% da população do País. grande responsável pela urbanização,
econômica que atingiria seu auge no Pois bem, o Censo Demográfico de tomou impulso decisivo a partir dos
início dos anos B0 se encarregaria de co- 1980 constatou que os 29% da popula- anos 30, mas seria na década de 50, so-
locar freios no Brasil em geral. A quedà ção já então estavam concentrados nes- bretudo na sua segunda metade, que
violenta no ritmo da produção indus- sas áreas. Em outras palavras, a urbani- seus reflexos na estrutura populacional
trial e o consequente acirramento do zação do País prosseguiu violenta, a do Brasil se tornariam mais visíveis.
desemprego fizeram refluir um pouco ponto de driblar a ciência da demogra- Nos anos 40, a proporção dos brasilei-
a o
edil
// [)
%
3 A-
Itapecerica da Serra QÚ:
QC? Q Ga
Evolução da mancha urbana até 1980
até 1930
O 1930 a 1962 O
O
O 1962 a 1980 o SUL
O mapa representa a expansão da mancha plificação daquela publicada em A.Grande São áreas ociosas, à espera de valorização. Um es-
urbana da Grande São Paulo emtrês períodos Paulo Hoje, pela Empresa Metropolitana de tudo da EMPLASA, feito em 1980, mostrou
até 1930; de 1930 a 1962; e de 1962 a Planejamento da Grande São Paulo (EMPLA- que havia 1.124 terrenos vagos, perfazendo
1980. Foi elaborado pelo pesquisador Flávio SA). Por ela se vê que a expansão da mancha 10.449 hectares (cerca de 8% da área total da
Villaça, a partir da análise de fotos do satélite urbana não aconteceu de forma contínua, prin- mancha urbana)
Landsat. A versão aqui reproduzida é uma sim- cipalmente devido à retenção especulativa de
434
pesa,
Jussi Lento/Abril Press
Juca Martins
Nos anos 70, as cidades brasileiras, sobretudo as maiores, haviam crescido rápida e desordenadamente. Acima, à esq., os grandes
congestionamentos nas "marginais" de São Paulo; no meio, o centro paulistano; à dir., a favela da Rocinha, no Rio
ros vivendo nas cidades cresceu em 5% veriam muito menos mão-de-obra do população crescia como nunca e era
(de 31%, em 1940, para 36%, em 1950); que a disponível. Além disso, fábricas atraída para as cidades em busca de
na década de 50, essa proporção cresceu de alta produtividade precisavam de emprego - que em termos absolutos
em 9% (atingindo 45% em 1960); e nos muita gente para comprar seus produ- crescia realmente -, as indústrias ten-
anos 60 se deu o grande salto de 11% tos; e esse mercado interno, entretanto, diam a utilizar relativamente menos
(56%% da população em 1970). Se colo- é relativamente pequeno nos países mão-de-obra que no passado. Resul-
cássemos esses números em um grá- pobres. Neles, a agricultura não se de- tado: as cidades vão inchando.
fico, teriamos uma curva com uma senvolveu de maneira a criar uma classe O modelo de desenvolvimento esbo-
acentuada inflexão para o alto em 1950. numerosa de consumidores e, nas cida- sado na segunda metade dos anos 50 e
Longe de ser uma coincidência, isso re- des, o desemprego e o subemprego são adotado firmemente pelos militares a
flete a reorientação dada à economia altos. Por outro lado, é muito difícil partir de 1964, "resolveu" o problema
nos anos 50, durante o governo de Jus- para esses países venderem seus produ- da escassez de capitais escancarando as
celino Kubitschek, quando a industria- tos industrializados no mercado ex- portas às multinacionais e endividando
lização foi acelerada pelo ingresso ma- terno, onde enfrentam a concorrência excessivamente o País. Os juros dessa
ciço dos capitais e técnicas estrangei- de trustes multinacionais de altíssima dívida e as pesadas importações de má-
TOS. eficiência e as barreiras protecionistas quinas, insumos industriais e tecnologia
A partir daí, o processo de urbaniza- dos países ricos. Com isso, os países po- tiveram de ser pagos, inicialmente com
'ção do Brasil passou a seguir o padrão bres que decidiram manter-se na com- mais destaque, com os produtos agrico-
comum ao dos países subdesenvolvi- petição tenderam a baixar ao máximo las e minerais de que mais necessitavam
dos que enveredaram para a industriali- seus preços, adotando tecnologia mais os países ricos e que tinham de ser pro-
zação atrelados às economias dos avançada (importando-a), o que só fez duzidos em padrões também "moder-
países ricos. A grande diferença entre crescer a incapacidade de oferecer em- nos", acelerando ainda mais o processo
esse padrão e o que se verificaria déca- pregos urbanos. Mas as cidades não pa- de expulsão do homem do campo.
das antes nos países desenvolvidos foi a raram de receber migrantes, e foram O problema do estreito mercado in-
incapacidade de as economias sub- inchando, inchando . . . terno foi "resolvido" privilegiando a
desenvolvidas garantirem empregos su- produção e o consumo de bens durá-
ficientes para absorver o próprio cres- A partir de JK, o País utiliza veis relativamente sofisticados por
cimento natural das populações urba- mais o capital estrangeiro parte das classes altas e médias altas,
nas e ainda os enormes contingentes de cujo poder aquisitivo seria incremen-
migrantes expulsos das áreas rurais. A década de 50 é o período para en- tado por uma política concentradora
Quando a tecnologia atingiu um ni- tender problemas da urbanização do de renda. Esse modelo de desenvolvi-
vel que determinava mais drastica- País. Foi a partir do governo Juscelino mento precisou de grandes contingen-
mente a dispensa de braços operários, a que o País passou a utilizar mais inten- tes de mão-de-obra concentrados em
partir do início deste século, as popula- samente o capital estrangeiro para de- pequenas áreas para facilitar a implan-
ções dos países ricos já haviam redu- senvolver a economia. E com ele che- tação da complexa infra-estrutura in-
zido em muito seus ritmos de cresci- gam tecnologias que se caracterizam dustrial que se fazia necessária. Rapi-
mento. Os países subdesenvolvidos, po- por utilizar relativamente pouca mão- damente, o Brasil transformou-se num
tém, não tiveram a mesma sorte. Eles de-obra. E tudo isso ocorreu justa- país dotado de moderna e extensa rede
entraram na fase de industrialização mente no período de maior cresci- de telecomunicações e com energia
quando a tecnologia já havia melho- mento populacional do País - de 52 mi- elétrica à vontade, mas vendida a pre-
rado muito a eficiência das máquinas. lhões, o Brasil saltava para 70 milhões ços subsidiados às indústrias. Aos tra-
Os países subdesenvolvidos, se quises- de habitantes, um aumento de 35%. balhadores, porém, esses avanços não
sem industrializar-se depressa, precisa- O rápido processo de industrializa- deram mais do que a oportunidade de
riam de capital em quantidade que não ção desse período gera também uma ter como principal atividade de lazer o
tinham, para fazer indústrias que absor- rápida urbanização. Assim, enquanto a passivo hábito de assistir pela televisão
435
BR DFANBSBV8.GNC.AAA, 10441 324 ano0oa, p538
b.. "ANBSB VB.GNCAM 404 ) 3234 anCO2, p 133
Agência O Globo
ganda das "novidades" consumíveis agravamento das pressões sobre o uso
apenas pelas parcelas mais favorecidas. indevido do solo urbano: crescimento
O automóvel, por exemplo, principal vertical exagerado nos espaços intra-
propulsor da industrialização brasileira urbanos, destruição de espaços verdes,
nas últimas décadas: para recebê-lo, as construção desordenada de vias eleva-
nossas grandes cidades sofreram pro- das, falta de racionalidade na ocupação
fundas transformações. dos espaços periféricos, etc." Pode-se
Quando se tornaram insuportáveis os dizer, segundo Barat, que muitas das
monstruosos congestionamentos de deformações surgidas em nosso pro-
trânsito nas grandes metrópoles, o go- cesso de urbanização foram, de certa
verno investiu em gigantescas obras forma, uma consequência do mau
viárias, em detrimento do saneamento equacionamento da expansão dos siste-
básico, transportes coletivos e moradia mas de transportes,
para os trabalhadores de baixa renda. Outro aspecto que merece ser ressal-
Verdadeiro símbolo dessa política são tado é a estreita vinculação entre a es-
aqueles mais de 3,5 quilômetros de via peculação com terras urbanas e o mo-
elevada que a população da capital delo econômico. O Estado promoveu a
paulista apeldou de "minhocão". industrialização de forma seletiva, es-
Cofistruído durante a gestão do então colhendo empresas ou grupos econô-
prefeito Paulo Maluf, o "minhocão", micos para os quais deu total apoio,
oficialmente conhecido como Elevado tanto em crédito como em investimen-
Costa e Silva, é também poderoso tos em infra-estrutura, Quem ficou de
exemplo do desprezo ao planejamento fora desses setores escolhidos tinha
urbano: ele foi feito exatamente onde o pouca chance de se dar bem investindo
Plano Urbanístico Básico de São Paulo, em atividades produtivas. Então, a.
elaborado na gestão do prefeito Faria terra ganhou força como um investi-
Lima , previa a construção de um dos mento seguro, nas cidades ou no
mais importantes ramos do metrô ! campo, O resultado disso é que, em
média, metade das áreas urbanas, em
Privilégio ao automóvel ficou 1981, era composta por terrenos vazios
explícito no governo Médici destinados apenas a reter valor, de
acordo com estimativas do professor
O privilégio ao automóvel nas políti- Cândido Malta Campos Filho, da Fa-
cas de transportes no Brasil ficou expli- culdade de Arquitetura e Urbanismo
cito no Programa Nacional de Vias Ex- da USP (Folha de S. Paulo, 25/10/81).
pressas (PROGRES), lançado em 1972 Segundo ele, esses terrenos eram com-
pelo governo Médici. O PROGRES prados por investidores à espera da va-
previa "integrar a rede rodoviária na- lorização trazida pelas melhorias na
cional e a rede viária urbana para esta- infra-estrutura urbana, Em outras pala-
belecer um sistema de circulação rá- vras, eram os investimentos públicos
pida e econômica", através da constru- que valorizavam esses terrenos: "Para o
ção e melhorias de vias expressas, anéis trabalhador", disse o professor Cân-
rodoviários e estradas de contorno nas dido Malta, "isso significa que ele vai
grandes cidades, Como se vê, um plano morar mais longe. Se ele vai comprar
pujante. Mas por ele se percebe clara- um terreno, só conseguirá comprar
mente que não foi por acaso que se de- muito longe, porque essa retenção de
teriorou o sistema de transporte ferro- valor levanta o preço da terra e cria
viário urbano até o ponto crítico de uma escassez artificial", Isto significa
Agência Estado
436
BroranssB Vs.GNCAAA, 132. Anco2, p. 8&O
d
4
Universitária, materializadas na Lei no
5.540, aprovada em 28 de novembro de
odete" 2 f 1968.
A modernização ocorre, assim, me-
<br É A Ba
. mivo 9a esto E
io ao sea E 2
K" “"“"“. f l
nos por pressão estudantil e mais pela
174 - ! 1 | deca
descoberta de que a inovação poderia
» 1 ser manipulada sem ameaças à estru-
tura de poder.
Efra 2 ato -
E ha # Hoc pee A educação passa a ser encarada ofi-
#4 ** cialmente como um fenômeno isolado
HH es ca do resto do contexto social e político,
INI -- identificando-se a reforma universitá-
inn -- ria com remodelações técnico-
| Nini-- -- administrativas, Bastaria uma "boa di-
titia reção" para se ter um "bom rendi-
mento". Racionalização, eficiência e
produtividade tornam-se valores abso-
lutos, sobrepondo-se, pretensamente, a
qualquer opção política.
Em termos organizacionais a lei pro-
punha que o ensino superior fosse mi-
nistrado preferencialmente em universi-
dades, nas quais a menor estrutura se-
ria o departamento, congregando disci-
plinas afins. Propõe também a não du-
plicação de serviços, visando maior
economia e melhor produtividade.
A criação da Universidade de Brasília (no alto, o presidente João Goulart assina o Além do reitor, as universidades de-
decreto de criação da UnB, em 16/12/1961) foi uma tentativa de intelectuais como Darcy veriam ser administradas por conselhos
Ribeiro e Anísio Teixeira ( acima) deformar no País uma universidade nova, criadora, compostos de membros das comunida-
crítica . . . Mas, em 9 de abril de 1964, a UnB é invadida a mando de Castello Branco des acadêmicas, representantes do Mi-
439
er praNBSB VBGNGÃAA 2404334 an002, p 18 3
nistério da Educação e representantes de estudantes que, antigamente, cami- dignidade seu trabalho.
das comunidades locais, que na prática nhavam juntos na vida acadêmica. Para se ter uma idéia da evolução do
funcionariam como emissários do po- Elimina-se, desta forma, uma das vigas ensino privado, basta dizer que em
der. mestras da organização estudantil, 1963 o País contava com 28.944 docen-
Dezesseis anos após a retomada do tes e em 1980 eram 116.827, dos quais
Com 'a unificação do vestibular, Regime Militar, a universidade era mais de dois terços trabalham em esta-
surge a "geração cruzinha" mais conservadora que o antigo mo- belecimentos particulares. Do ponto de
delo, O que lhe dava um toque moder- vista mais geral, o ensino particular
As unidades universitárias deve- nizante era o fato de que se utilizava de cresceu cinco vezes mais que o ensino
riam promover cursos de graduação, recursos mais modernos de comunica- público de 1963 para 1980.
pós-graduação, aperfeiçoamento e es- ção e de controle administrativo e pe-
pecialização, bem como a pesquisa. dagógico. Sem dúvida, sob alguns as- A universidade estava distante
Extingue-se a cátedra, criando-se a car- pectos, como o da diversificação dos da realidade nacional
reira docente, Isto, entretanto, gera a cursos, a situação melhorou: em 1960
corrida pela titulação, que se traduz havia 1.115 faculdades no País; em Nos anos 80 a universidade se deba-
numa produção acadêmica desvincu- 1980 contávamos com 4,394 estabeleci- tia para encontrar seu caminho, reivin-
lada das necessidades sociais - ascen- mentos de ensino superior. Mas um dicando maior autonomia e democrati-
der na carreira acaba sendo umadas exame mais cuidadoso demonstra zação interna, exigindo a destruição
pouças alternativas para obter melho- como se chegou a isso: em parte atra- dos canais de arbítrio e controle polí-
rias" salariais. Unifica-se o vestibular, vés da implantação da "indústria do sa- tico que a tornaram uma massa amorfa.
dando origem à "geração cruzinha", ber", com o surgimento de cursos de A crise da universidade era a crise de
aquelas legiões de candidatos mais preo- fim de semana e do inchaço da rede uma máquina cara e imanejável, dis-
cupados em aprender as "mancadas" particular que atua principalmente na tante da realidade nacional, que difícul-
dos exames do que em se preparar para área de Ciências Humanas. E essa é tava a pesquisa e sufocava a criativi-
serem profissionais competentes. uma "indústria" com um grande lucro, dade, que era incapaz de fornecer ins-
Criam-se os currículos mínimos, com pois necessita de uma infra-estrutura trumentos de reflexão crítica séria so-
prioridade do cumprimento de deter- que se restringe quase sempre a salas bre os problemas do País, divorciada
minado número de horas-aula e não de aula superlotadas de sonolentos alu- dos anseios da população.
do conteúdo a ser transmitido aos alu- nos; lousa; giz e um professor hora-aula
nos. Introduz-se a matrícula por disci- dedicado, mas mal remunerado - sem
plina, desfazendo-se, assim, os grupos as minimas condições de exercer com Maria Evelma P. N. Caropreso
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1
No final de 1967, o governo brasileiro criou uma comissão para fazer um levantamento da crise e intervir nas universidades. Era
chefiada pelo coronel do Exército Meira Mattos (acima, ao centro, com papel na mão), e a proposta da comissão se encaixou,
perfeitamente no espírito dos acordos MEC-USAID, um dos pontos-chave da política de desnacionalização do ensino brasileiro
440
ar Ve.eNG.aaa 284 ©4$4334 an 002, o Et
Iconographia
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Iconographia
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circular a roupa por meio de maior crise econômica, essa produção se re-
"Uma sociedade industrial, sendo
praticável a renovação ficar na depen- nha desde 1963. Mesmo assim, a pro-
a formar consumidores que "não calcu-
natural, para assegurar a rotatividade era duas vezes maior que a de 1963.
res de vestuário tivessem uma consciên-
outro lado da questão: o industrial que tante papel social de gerar outros mi-
ria - e se produziria - na proporção,
saúde financeira de sua empresa, "já atingindo o varejo, onde são comercia-
que move a "indústria da moda".
441
sroransssvagnÇAA SOA 1334 8n CO a, p 185
Iconographia
mentos não constituídos legalmente, 1808 provocou grandes alterações. Ela
O Sindicato das Indústrias de Fiação tentou imitar no Rio de Janeiro a vida
e Tecelagem em Geral no Estado de das cortes européias. As famílias mais
São Paulo calculava que, nos primei- ricas começaram a frequentar o teatro,
ros anos da década de 80, no Brasil, ha- a Ópera, os bailes. Modistas instalaram
via cerca de 17 mil confecções, 65% de-
lojas no Rio de Janeiro. França e Ingla-
las localizadas no Estado de São Paulo. terra ditavam a moda e os vestidos che-
No total elas empregariam mais de 400 gavam de Paris e Londres cada vez
mil pessoas, Outras fontes estimam que mais finos e luxuosos.
cerca de 1 milhão de pessoas estavam
Juntavam-se para compor o novo
de uma forma ou de outra envolvidas quadro não só a urbanização e europei-
com a indústria "informal" de confec- zação da vida social das elites brasilei-
ções, incluindo costureiras que traba- ras, que implicavam uma vida social
lham em casa e recebem das indústrias
mais intensa para as mulheres, como as
o produto semi-elaborado.
necessidades da indústria européia em
De qualquer maneira, a indústria de expansão. O Brasil tornara-se mercado
confecções é responsável por 25% das importante, principalmente da Ingla-
exportações têxteis do País. Mas é rela- terra.
tivamente nova e é muito recente esse Quando se inicia o século 20, as mu-
papel destacado da moda. lheres da elite brasileira ampliam seus
No período colonial, o testemunho interesses. A vida social estende-se
deixado pelos cronistas nos fala de uma para os chás beneficentes e para o es-
mulher sem nenhuma atividade social, porte. Num clima mais descontraído,
vivendo em reclusão e só saindo de os vestidos livram-se dos espartilhos e
casa para ir à missa uma vez por se- adereços. No primeiro pós-guerra, a
mana. Os viajantes falam de uma dupli- participação da mulher se amplia e ela
cidade no vestuário feminino. As mu- já se faz presente no mercado de traba-
lheres haviam trazido da Europa rou- lho. E a década de 20 marca, em todo o
pas de veludo, seda e damasco, que
mundo, o início do movimento pela
eram sufocantes no calor da Colônia.
emancipação feminina, que desaguaria
Por isso, as roupas de luxo eram enver-
nos movimentos da década de 60.
gadas apenas na visita dominical à
Depois da Segunda Grande Guerra,
igreja e em casa a mulher permanecia
a indústria e o cinema americanos es-
Iconographia
Feiras
de moda
No período de 15 a 30 de novem-
bro de 1958, no Pavilhão Internacio-
nal do Parque Ibirapuera, em São
Paulo, realizou-se a Primeira Feira
Nacional da Indústria Têxtil (FENIT)
com 157 expositores.
Organizada pelo empresário Caio
de Alcântara Machado e patrocinada
pelo Sindicato das Indústrias de Fia-
Fora de ritmo
Nos anos 80, a MPB era vítima da concorrência estrangeira, tinha o mercado
concentrado na faixa de maior poder aquisitivo e sofria o alijamento da vanguarda e
da velha guarda em favor de um duvidoso "gosto popular"
O crescimento da indústria musical solitário pólo instalado fora do eixo cul- culo da música brasileira, matando, aos
no Brasil confunde-se com a desorde- tural ainda disseminado pelo Rio, por poucos, o teatro de revista como lança-
nada expansão econômica do País, No São Paulo, Minas e Bahia. De visão dor de novos astros.
início do século, os primeiros discos fo- pioneira, conforme conta o historiador A descoberta da televisão, dos anos
nomecânicos ainda competiam com a e folclorista Paixão Cortes, em seu livro 60, com os competitivos festivais e pro-
venda de partituras pelas lojas de ins- Aspectos da Música e Fonografia Gaú- gramas específicos para os diversos es-
trumentos, como a Casa Edison, do chas, Leonetti seria um exportador pre- tilos, como O Fino da Bossa, o
Rio de Janeiro. Amadores saraus fami- coce, Toda a orquestra de Francisco Bossaudade ou a Jovem Guarda, dá-se
liares viviam da compra das últimas no- Canaro foi obrigada a deslocar-se por de forma explosiva, como requer o
vidades em partituras, geralmente che- navio de Buenos Aires a Porto Alegre, novo veículo. A bossa nova, íntima das
gadas da Europa. Os primeiros fonó- em 1914, para gravar o primeiro disco boates e apartamentos, passa para uma
grafos mal reproduziam, através de de tango (E! Chamuyo) de que se tem fase agressiva e coreográfica (basta
suas cornetas, vozes tonitroantes como notícia. Ainda não havia indústria fono- lembrar o gestual da cantora Elis Re-
a do "grande" Caruso. gráfica na bacia do Prata. gina, apresentadora de O Fino da
No Rio Grande do Sul, o industrial Associado ao rádio, em expansão Bossa, o "elis-cóptero"). E a contesta-
Saverio Leonetti, já em 1913, montava fulminante a partir da década de 30, o ção ao Regime Militar, que já barri-
a gravadora Disco Gaúcho, curioso e disco se transformaria no principal vei- cava faculdades e promovia passeatas,
445
# t so .!."
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A+ sp
BR DFANBSBVEGNCAAMAS40
44 3315002, p
IR9
Agência Estado
Iconoaraphia
chega ao paroxismo das torcidas televi- música Café da Manhã, Roberto teve
sadas. A unidade política aparente é de parâmetros. O primeiro, é o mo-
2,800 milhões de compradores para um
cindida em correntes estéticas radical- mento da análise, no fundo do poço de
mercado de 33 milhões de LPs vendi- uma
mente divergentes, como as do tropica- crise econômica generalizada,
dos de todos os outros artistas. Ou seja: combinada
lismo e da canção de protesto. Em 17 com a "decadência
do
quase 10% do movimento geral. disco como veículo musical", de que
de junho de 1967, sai, do largo de São
A música, porém, não se comporta falava André Midani, o diretor da mul-
Francisco para o Teatro Paramount da apenas passivamente em relação à tinacional WEA (Warner/Elektra/A-
Brigadeiro Luis Antônio, em São transformação dos meios de comunica- tlantic). Em termos de diversão caseira
Paulo, uma "passeata contra as guitar- ção e dos consequentes mercados. Ela pura e simples, o disco sofre a concor-
ras elétricas", sintoma de imperialismo também cria seus espaços. Assim como rência do videojogo, do videocassete e
cultural. Uniram-se num mesmo bloco a Festa da Penha, no Rio, funcionava da fita virgem, que possibilita a grava-
artistas como Gilberto Gil, Geraldo como lançadora de música nas primei-
Vandré, Edu Lobo, Elis Regina, Zé ção direta, nas emissoras FM de me-
ras décadas do século, as escolas de
lhor definição sonora, do repertório es-
Ketti e MPB-4. samba, em evidência para a classe mé-
colhido pelo ouvinte, sem a interferên-
dia a partir do final dos anos 60, trans-
Disco independente oxigena cia das gravadoras.
formariam os sambas-enredo na Há números contundentes para sub-
um mercado padronizado música dominante dos carnavais, antes sidiar esse quadro comparativo. Apesar
divididos irmâmente entre marchinhas de o mercado, como um todo, ter cres-
Por outro lado, reservada a um pú- e sambas gravados pelos ídolos do rá- cido 385% entre 1966 e 1983, os com-
blico "cafona, alienado e periférico", a dio. E, proibidas nos festivais da televi- pactos simples, geralmente destinados
jovem guarda, com sua banalidade são, censuradas pela ditadura, as can- aopúblico de menor poder aquisitivo,
poética, tradução musical de gêneros ções de autores universitários e engaja- que compra somente aquela música
importados, sai ganhando em quanti- dos mudariam de endereço. A partir da que toca no rádio ou aparece na TV;
dade. Vende mais discos e faz coroar o excursão pioneira de Vinicius e Toqui- venderam quase 50% menos entre os
longevo soberano do mercado: Ro- nho, em 1971, passariam a frequentar 12,5 milhões de compradores de 1979 e
berto Carlos, Com vendagens ascensio- os circuitos universitários. Da mesma os 6,4 milhões de 1983. O carro-chefe
nais e ligeiros recuos diante de even- forma, o disco independente, oficial- do mercado, os LPs, cairam de 37 mi-
tuais sucessos como o dos Secos & Mo- mente iniciado por Antônio Adolfo, lhões de compradores em seu melhor
lhados (472.023 cópias), em 1973, ou com o Feito em Casa de seu selo Arte- ano, 1979, para 35 milhões, em 1983,
Martinho da Vila (Canta, Canta Minha sanal, em 1977, traria oxigênio a um depois de 27 milhões em 1981, segundo
Gente, 750 mil), em 1974, Roberto Car- mercado contaminado pela padroniza- os dados da Associação Brasileira de
los constitui um caso único no mundo: ção. Patrocinando seu próprio disco e Produtores de Discos. O resultado ne-
uma liderança mercadológica de 20 vendendo-o onde bem entendesse, o gativo dos anos 80 não deveria influir
anos. Seria um caso também política- artista/produtor independente rompeu na perda de uma perspectiva de mais
mente sintomático a aceitação de seu com o autoritarismo estético implan- longo alcance, já que em 1966 o mer-
conformismo ideológico, por platéia tado pelos departamentos de marketing cado de LPs era dez vezes menor: o
tão ampla quanto silenciosa? Misto-frio das gravadoras, elevados à máxima po- País inteiro comprava apenas 3,8 mi-
do intimismo vocal bossa nova (ele co- tência a partir de meados dos anos 70, lhões de unidades.
meçou imitando João Gilberto) com o quando o Brasil passou a ser conside-
bolero de Anísio Silva e o rock de ma- rado, segundo uma pouco precisa es- Rádios FM executam 70%
trizes italo-americanas (Pepino di Ca- tatística, o quinto maior vendedor de
pri, Elvis Presley, Neil Sedaka, Paul discos do mundo, atrás apenas dos
de música importada
Anka), a música de Roberto Carlos EUA, Japão, Alemanha e Inglaterra. Para lançar mais luz neste cipoal de
golpeou em cheio o gosto médio do Para examinar a MPB, sob a ótica 16- dados será necessário situar a parcela
mercado, Em 1978, cumprindo sua me- gica dos números de mercado, no en- da população que compra discos. A
lhor performance no LP puxado pela tanto, é preciso estabelecer uma série classe A - segundo a definição dos
446
e!"su- da . R$? &a
43
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Iconographia
conographia
[ R
Em 1978, Roberto Carlos (abaixo) meios publicitários -, 8% de brasileiros duzir os custos com a distribuição dos
golpeou em cheio o gosto médio dos do topo da pirâmide social, consumia discos dos dois catálogos (que, na
compradores, vendendo mais de nos primeiros anos da década de 80, verdade somam quatro anteriores).
2 milhões de discos. O mercado 62% de tudo que era vendido no mer- Quanto aos elencos, há paradoxais re-
fonográfico havia inchado, mas não cado; e certamente era também a duções, como a da multinacional CBS,
amadurecido. Chico Buarque (acitha) e maior consumidora de discos. Segundo de origem americana, que em plena
Milton Nascimento ainda lideravam a mesma pesquisa (da Target, São crise inaugurou, no Rio, "a maior fá-
culturalmente a MPB. Mas o gigantismo Paulo), a classe E (ao redor de um sa- brica da América Latina", com capaci-
da indústria do disco não favorecia a lário mínimo de renda familiar) sim- dade para produzir mensalmente 1,5
criação musical como um todo. Artistas plesmente não teria dinheiro para gas- milhão de discos, e cortou seus contra-
da chamada velha guarda como Elizeth tar com discos ou shows, limitando seu tados de mais de duas centenas para
Cardoso ou novos como Arrigo Barnabé, contato com música, de acordo com três dezenas. "Preferimos um elenco
(na pág. ao lado) encontravam pesquisa da Marplan, ao rádio (88% da reduzido e colocar tudo em cima dele",
dificuldades para gravar população de São Paulo e 80% do Rio garantia Roberto Augusto, da promo-
eram atingidos por esse veículo, em ja- ção da empresa. "Se o potencial de um
neiro de 85) ou à TV (96% das pessoas artista é de 200, 500 mil cópias, adianta-
tado: ao povo, a quem estaria destinada isso." Tal filosofia talvez explique por
funil mais estreito que o vestibular das surge uma casta de artistas ricos, como
Antônio Adolfo, ter recenseado cerca plena recessão, em 1981. "Quero ven-
1983, vendendo seus discos debaixo do ela, logo depois, provocando um de-
braço em shows Brasil afora. Isso por- bate em torno da adesão do artista à sa-
Se é difícil a execução nas rádios, onde tilha mercadológica das cinco grandes
mendados", também é quase impossi- cado, quatro das quais, empresas trans-
vel o contrato com as gravadoras - por nacionais (RCA, CBS, Odeon, Poly-
$i sua vez, em processo de progressiva gram). Quanto à única "brasileira" do
concentração desde 1980. Dois exem- cartel, a Som Livre, uma situação espe-
1985, já se anunciava uma joint-venture ciante brasileira de 1982, com uma des-
criando a empresa Fonobrás, para re- emissora coligada da ordem de 4,7 bi-
447
an Oo2a ,p 1960
BR DFANBSB VB.GNCAMASR4O04A 1331
lhões de cruzeiros; à frente de gigantes
como a Volks, Gessy e General Mo-
tors,
'Mesmo-com a recessão, não são vo-
lumes desprezíveis. Em 1983, só a in-
dústria do disco (parte do complexo
musical que também envolve desde es-
petáculos ao vivo até videoclips) pagou
66 bilhões de cruzeiros de IPI, movi-
mentando, ao todo, 150 milhões de
dólares. Um gigantismo que não favo-
rece a criação musical como um todo,
a não ser tecnicamente, com aperfei-
coamento de estúdios e informática
instrumental. Com raras exceções, os
artistas da chamada velha guarda (de
Elizeth Cardoso e Marlene a Miltinho
nhas rigidamente traçadas pelo mer-
e Elza Soares) estão desempregados.
cado. Pequenos selos, como Som da
Ou,seja, não têm contrato com as gra-
vadoras. As empresas não investem ne- Gente (São Paulo) e Kuarup (Rio),
les, acreditando que estão "obsoletos". centrados basicamente na música ins-
trumental, trabalham quase artesanal-
Da mesma forma, os criadores novos,
mente para manter pulsando, se não as
como a geração paulista de Arrigo Bar-
nabé e do Premeditando o Breque, têm tradições da MPB, como queria a gra-
de custear seus primeiros passos até vadora Marcus Pereira (1973-1981), ao
menos um Índice elevado de qualidade
que, demonstrado o sucesso no campo
independente, finalmente sejam con- e substância artística em seus discos,
tratados pelas grandes empresas, Examinada por essa lente - a sempre
discutível análise crítica -, conclui-se
que o mercado inchou, mas não ama-
O impacto massacrante
dureceu, A geração da época em que
na MPB, que vem de fora se vendiam três milhões de LPs e três
milhões de compactos no País inteiro
Não é essa, entretanto, a única pres-
ainda dá as cartas, Chico Buarque,
são contra dois dos pólos mais consis-
Iconographia
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/PREVIDENCIA a crisedo sistema previdenciário no Brasil vez de concessões demagógicas às vêés-
peras das eleições. a Secretaria de Pla-
deteriorado, abalado por fraudes, custos astronômicos, Nascidos modestos, em 1923 - como
«
institutos de previdência de várias cate-
poder aos civis, o Regime Militar mon- até serem unificados numa só pasta, em
de detetives da televisão. Por volta de do País. Seu orçamento para 1985, que
novembro de 1984, a Polícia Federal dá uma idéia do seu poder, até mesmo
Paulo, Duraria dois meses a espiona- Somente a Petrobrás superava esse gas-
te, e detidos, "arraia miúda" nas pala- micos, as fraudes não passavam de as-
Polícia Federal, não puderam negar especial para que elas fossem especial-
tanto, o resultado era magro, como já tão, os assalariados, que usavam desne-
- as descobertas e as suspeitadas - elas cia? Esse, sem dúvida, 'não poderia ser
Golbery do Couto e Silva, então chefe lhões de pessoas sem assistência médi-
da Casa Civil da Presidência, àinda era ca; entre elas, desempregados, subem-
aos funcionários públicos. A trombada na área rural recebiam apenas meio sa-
nejamento de Delfim Netto foi frontal e O valor médio dos benefícios era
Mais obrigado a atender aos compro- Em 1981 o general Golbery (no alto) mínimo (abono de um salário mínimo;
missos com o grande capital internacio- tinha planos de usar a Previdência, tendo aposentadoria por velhice de 1,1 salário
nal e com os grupos monopolistas, que em vista as eleições de 82. Não mínimo, o mesmo para auxílio-doença;
exigiam austeridade e menos gastos conseguindo, demitiu-se. Já para Hélio e pensões de 0,9 salário mínimo. Em
públicos, o regime não conseguiu ab- Beltrão (acima), ao deixar o Ministério média, 65% dos benefícios prestados
sorver as propostas. Desgastado tam- no final de 83, quem engordava com a estavam abaixo do salário mínimo); 780
bém na área política, Golbery perdeu o Previdência eram dois clientes: bancos e mil aposentados por invalidez ganha-
rumo e demitiu-se do Ministério. Em hospitais conveniados. vam menos de 40% do salário mínimo.
* aaa U, as ao &. +!
449
na pranass 231 ancoa p 193
O prejuízo da Previdência existiria, Brasil dos anos 80, 50% da população e viúvas que tiveram, durante certo
então, devido à indolência dos traba- sofria de subnutrição e doenças endêmi- tempo, reajustes em seus benefícios de
lhadores brasileiros, que se aposenta- cas e a expectativa média de vida era 10% acima do INPC? Na ponta do lá-
vam depois de 35 anos de serviço - ou de 64 anos nos Estados do Sudeste e de pis, isso era verdade. Como 86% dos
menos, como os professores e professo- apenas 52 anos no Nordeste. Tomar di- aposentados receberam, durante um
ras, com direito à aposentadoria aos 30 nheiro do trabalhador na expectativa período, o INPC mais 10%, e a Previ-
e 25 anos de trabalho, respectivamente de que ele morresse antes de usufruir dência recebia contribuições de 70%
-, quando em países desenvolvidos as Os benefícios seria uma crueldade dos segurados calculada sobre o INPC
pessoas só gozavam desse direito de- atroz, pensada e calculada, que nem menos 10%, o estouro era óbvio.
pois de 65 anos? mesmo o Regime Militar teve "cora- Tão óbvio que deveria estar incluído
Essa poderia ser uma desculpa con- gem" de materializar. no orçamento da Previdência. Afinal,
tábil, mas não era uma razão justa. No Seriam então culpados os velhinhos se a razão de ser desse serviço era mi-
ª
Biblioteca Nacional
grave que nem era mais medido
partidos socialistas faziam intensa agi-
anualmente: passou a ser calculado
tação em torno das péssimas condi-
em 20 mil dólares por minuto!
ções em que trabalhavam e viviam os
Apesar da crise, os benefícios eram
operários. Com o fundo de pensão de
tantos que o contribuinte médio ame-
Bismarck, financiado em partes iguais
ricano poderia esperar receber, de-
pelo empregado e pelo empregador, o Bismarck: "Quem tem aposentadoria na pois de aposentado, até cinco vezes
Operário passou a ter algo a perder, velhice é mais fácil de ser manipulado" mais que tudo que ele pagou durante
caso não se comportasse segundo as
a vida de trabalho. Como esses be-
exigências patronais: podia perder o paga pelo trabalhador era de 30 dóla- nefícios geram déficits, tinham de ser
direito à velhice remunerada. res no ano; em meados da década de cobertos pelo Estado, direta ou indi-
Nos anos seguintes, os trabalhado- 70, já havia passado a 825 dólares; e, retamente. Em 1970, os países indus-
res aproveitaram a fresta aberta pelas no começo dos anos 80, atingia os trializados empregavam 19,3% do PIB
promessas do chanceler e escancara- 2.170 dólares. Apesar desse aumento, nos programas de assistência social,
ram a porta dos benefícios sociais, o rombo no sistema previdenciário Em 1983, essa proporção subiu para
cobrando tudo a que tinham direito americano tornou-se cada vez maior. 30%, e não havia sinais de que fosse
no crescente bolo da riqueza das na- A razão principal disso é que, nos pri- estabilizar-se tão cedo. A única espe-
ções. A experiência dos Estados Uni- meiros tempos, não havia ainda mui- rança de conter esses déficits era a de
dos, nesse sentido, é exemplar: o siste- tos aposentados - o dinheiro recolhi- que a economia mundial passasse por
ma previdenciário americano, criado do pela previdência ia apenas engor- um vigoroso reaquecimento, voltando
em 1935 para minorar os efeitos da dando, dando a falsa impressão de a integrar maciçamente os desempre-
depressão econômica que assolava o fartura eterna. Em 1971, por exemplo, gados no mercado de trabalho, au-
país, tirava 1% do envelope de paga- a previdência americana calculava mentando as receitas da previdência e
mento do operário e prometia uma que iria ter reservas de um trilhão de as riquezas do país.
aposentadoria de apenas 22,6 dólares. dólares no ano 2025 e aceitou alegre-
Essa solução havia funcionado nos
A partir daí, a previdência americana mente indexar à inflação todas as ciclos anteriores de opulência, Mas,
foi crescendo, para abranger parcelas aposentadorias. A generosa medida na fase de crise do ciclo dos anos 70-
cada vez maiores da população, con- esbarrou em vários obstáculos. Foi 80, não havia muitos sinais de integra-
cedendo cada vez mais benefícios nessa década que começaram a se ção dos desempregados na economia,
imediatos ao trabalhador, como assis- aposentar as primeiras levas maciças Na indústria americana, alguns de-
tência médica e seguro-desemprego. de trabalhadores. Foi também a épo- sempregados - quase dois milhões
Assim, a cada ciclo de prosperidade ca em que a recessão mundial espa- por ano - viam suas antigas vagas se-
da economia, a lei passava a assegu- lhou o desemprego. Subitamente, rem ocupadas pelos robôs, seres me-
rar aos trabalhadores novos direitos - portanto, o sistema previdenciário ti- cânicos que não fazem greve, têm
impossíveis de serem saldados nas fa- nha de pagar mais aposentadorias e uma produtividade incomparavel-
ses de crise dos ciclos subsequentes. não estava recebendo contribuição mente maior e, ao fim da vida útil,
A solução para cobrir esses rombos dos desempregados: cada um deles, não cobram aposentadoria: são ape-
foi sempre aumentar as contribuições: além de receber seguro-desemprego, nas desligados e vendidos como suca-
em 1937, o limite de contribuição ainda deixava de dar 125 dólares men- ta.
450
RR VBGNOIAAA: É᪪faiââj âncCoA,p 4394
norar o sofrimento dos velhos aposen- afirmava que o País estava perdendo
tados que passaram a vida toda enri- com o desemprego de três milhões de
quecendo a Nação com seu trabalho, trabalhadores uma quantia da ordem
por que o sistema deveria faltar-lhes de 12 trilhões de cruzeiros. Ironicamen-
justamente na hora mais crítica? Ao te, observava o ministro, esse era o va-
longo de toda a sua existência, a União lor do que o Brasil teria de gastar, na-
cumpriu precariamente sua obrigação quele ano, com juros e amortizações de
de cobrir esses déficits inevitáveis. Pior sua dívida externa. Também em agosto
ainda: durante os tempos de vacas gor- de 1983, o presidente do Instituto Na-
das, quando a Previdência nadava em cional da Previdência Social, Luis Car-
dinheiro, a União avançou sobre seus los Mancini, revelaria outro compo-
recursos para financiar obras de inte- nente do estouro da Previdência. "A
crise econômico-social, gerando reces-
«
resse do grande capital, como Itaipu.
Entre 1970 e 73, a União, cumprindo são, falências e desemprego, está pro-
sua obrigação, chegou a tapar em até vocando uma alta na procura aos pos-
9,8% o orçamento da Previdência, taxa tos do INAMPS da ordem de 20% a
que caiu para 5,2% em 1980, no negru- 30% ao mês."
me da recessão, quando mais era ne- Em resumo, as próprias autoridades .
cessária e obrigatória a complementa- reconheciam que assalariados eram
ção da União. prejudicados pelas crises conjunturais e
estruturais da Previdência. E, como
Constatado o prejuízo, sempre ocorreu todas as vezes que os
aumentam-se as contribuições órgãos da Previdência começaram a
dar prejuízo, tratou-se de promover o
Como a recessão brasileira dos anos aumento das contribuições: em 1934, o
70 e 80 foi uma política deliberada, ao recolhimento dos empregados, que era
Estado também devia ser atribuída a de 3% do salário desde 1923, passou a
culpa pela diminuição da recéita da 4%; em 1956, a 7%; e, em 1966, a 8%.
No início dos anos 80, enquanto empregado, o contribuinte era submetido a esperas intermináveis nos postos do INAMPS
(acima); na hora da aposentadoria, novamente asfilas (no alto). E a Previdência ainda ameaçava com a extinção da aposentadoria
por tempo de serviço
451
BR DFANBSS V&GN 334 an coa, p 195
vencimentos até três salários mínimos, nos bancos em média 8,33 dias por vos, era o sistema de hospitais conve-
recolhimento de 8,5%; mais de três a mês. Diga-se ainda que os bancos rece- niados, que forçaram a adoção, no Bra-
cinco salários mínimos, 8,75%; mais de bem uma remuneração de 0,25%, sobre sil, de um sistema de saúde baseado na
cinco a dez, 9%; mais de dez a 15 o total arrecadado." Em outras pala-
3 grande indústria hospitalar, no poder
9,5%; e mais de 15, 10%, vras, em plena recessão, com juros dis- político da Federação dos Hospitais, da
A Previdência, no entanto, tinha dois parados, a Previdência estava pagando Associação Médica Brasileira e da As-
clientes que nunca passaram dificulda- aos bancos. 0,25% do arrecadado para sociação Brasileira de Medicina de
de - até prosperaram durante a crise, eles usarem o dinheiro dos segurados Grupo, Era um sistema centrado no
engordando acintosamente à vista de em diversas aplicações, como o open atendimento curativo, sofisticado e de
todos, Em entrevista à Folha de S. Pau- market ou o overnight. E isso não era tu- custo estratosférico, que não tinha a
lo, em dezembro de 1982, o então mi- do, conforme prosseguia explicando mínima ação preventiva, Para consta-
nistro da Previdência, Hélio Beltrão, Beltrão. Como a outra conta, a de pa-
mostrou os benefícios que os bancos
tar isso, bastava comparar os orçamen-
gamento de benefícios, estava quase tos do INAMPS - que abrangia 3.600
estavam tendo, -numa época de altos ju- sempre a descoberto, os bancos paga- hospitais e 57 mil médicos credencia-
ros, graças ao sistema de duas contas vam o negativo, cobrando uma taxa de
bancárias mantidas pelo Ministério -
dos - com os recursos disponíveis do
redesconto de 4,3%, Ministério da Saúde e dos Órgãos esta-
uma para arrecadação e outra para pa-
gamento de benefícios. "Na conta de
duais e municipais encarregados de sa-
Bancos e hospitais, os neamento básico da população. Contra
arrecadação, os bancos têm cinco dias
clientes privilegiados os 57,2 trilhões de cruzeiros da Previ-
úteis Para depositar o que recolheram
dência, o Ministério da Saúde recebe-
numa determinada semana. Como o Outro enorme cliente da Previdência ria em 1985 apenas 1,7 trilhão de cru-
grosso da arrecadação se dá no fim do que sempre reclamava por mais benefi- zeiros.
mês, o dinheiro das contribuições fica cios,. apesar de cada vez mais lucrati-
Flávio de Carvalho
vn Him
é Q m sr
PD
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dr TerÍhodDE
ores Me
Em todo o País, as ameaças sobre a aposentadoria por tempo de serviço e a qualidade do atendimento da Previdência
geraram
protestos. Acima, manifestação de aposentados, em São Paulo, 24/1/84
452 ,
.. 2802 21 an co 2, p 196
.
Chico Nelson/Abril Press
do e a "ação política de massas".
Para a formação de quadros, a extre-
ma direita investia, nos anos 80, na Es-
cola de Sociologia e Política de São
Paulo, cujo controle assumira no início
P
da década, através de uma manobra
conduzida pelo advogado Carlo Bar-
POLÍTICA/PARTIDOS: os grupos da extrema direita bieri, ex-presidente da WACL (World
Anti Communista League), movimento
anticomunista internacional financiado
pelo governo de Formosa, a China Na-
A espera do pior cionalista, A questão da formação
ideológica dos militantes era conside-
rada pelos dirigentes da ultradireita
Nos anos 80, a extrema direita, sem apoio oficial, debatia-se como um de seus principais problemas.
em busca de fórmulas para voltar ao poder, do qual fora A verdade, no entanto, é que os ultradi-
reitistas haviam envelhecido quase tan-
afastada, segundo seus militantes, em 1974
to quanto suas idéias.
"Em 1964, a direita ganhou, mas não Apesar de ter nas Forças Armadas
levou, chegou ao poder em 1968 e foi uma de suas três fontes básicas de re-
afastada em 1974", garantia, em 1984, o crutamento, do ponto de vista ideológi-
"Panzer", nome de guerra dado por co seus líderes não confiavam então
seus companheiros devido a sua profis- nos militares brasileiros, por considerá-
são de fé nazista. Fundador e principal los excessivamente simpáticos aos Esta-
dirigente nacional do CCC (Comando dos Unidos. E o movimento estudantil
de Caça aos Comunistas), o "Panzer" - e a Igreja já não produziam quadros em
um advogado de 44 anos, 1,90 metro de quantidades e da mesma qualidade de
altura, ex-campeão paulista de judô, antes. Assim, segundo estimativa de um
ex-assessor da Secretaria da Segurança
líder ultradireitista, restariam no Brasil
Pública de São Paulo, ex-chefe de Ga- menos de cinco mil militantes com sufi-
binete do então ministro da Justiça, ciente "consistência ideológica": 1.800
Luís Antônio Gama e Silva -, nos anos sexagenários cadastrados pela antiga
80 um modesto microempresário, con-
Ação Integralista Brasileira, dois mil
fessava-se decepcionado com a extre- militantes da Sociedade de Defesa da
ma direita, que ele preferia chamar de Tradição, Família e Propriedade (TFP)
"direita ideológica", para diferenciar - desprezados pelos outros ativistas por
do que considerava "direita de traseiro
seus fanatismo religioso - e cerca de
lustroso: o empresário que fica lustran-
500 militantes dos grupos paramilitares.
do o fundo das calças numa poltrona e Nos anos 80 a direita tentava Se esse pequeno contingente facilita-
se diz de direita para se beneficiar do articular-se. No alto, o ex-ministro da va a tarefa de construção da infra-
dinheiro do governo", Justiça Armando Falcão e o empresário estrutura logística - uma rede de mi-
"Panzer" tinha, certamente, motivos Carlo Barbieri Filho, no VIII Congresso croempresas capaz de garantir-lhes a
para estar decepcionado. Afinal, em 20 da Liga Mundial Anticomunista, nov./80, auto-suficiência econômica -, ele era,
anos de poder, a ultradireita não teve Rio. Acima, cartaz falso colado por também, o principal empecilho para o
competência política para transformar- agentes do SNI em Brasília, set./84: cumprimento das duas metas no cam-
se na força hegemônica no País, mes- provocações da direita po externo: a formação de um partido e
453
#1
arDFanasa (.a, 1234
<!O" "**" an co a , p 19%
Iconographia
ruas de mãos desarmadas, a ultradireita
apostava na tese do "quanto pior, me-
lhor", desenvolvida pelo estudante pro-
fissional Alexandre Inojosa, um dos
principais articuladores políticos da ex-
trema direita brasileira na década de
80. Somente essa tese poderia dar senti-
do a certos fatos relatados pelos direitis-
tas e que de outra forma seriam inexpli-
cáveis. Eles diziam, por exemplo, que
mobilizaram agentes do SNL, entre eles
Ney Mohn - líder, também, do grupo
Vanguarda Nacionalista Popular -,
para ajudar a direção do Movimento
Revolucionário 8 de Outubro (MR-8),
organização de esquerda, na divulga-
ção de uma nota oficial em Brasília; e
que enviaram militares armados para
dar proteção a grupos de pichadores do
Partido Comunista do Brasil. A tese
explicaria, ainda, a colagem de cartazes
falsos do Partido Comunista Brasileiro
por agentes do SNI, dando apoio a
Tancredo Neves,
O argumento de Inojosa era de que a
extrema direita só cresce e se organiza
diante do aumento da ameaça esquer-
dista, tese de certa forma confirmada
pelo coronel Antônio Erasmo Dias, ex-
secretário da Segurança Pública do Es-
tado de São Paulo. "A direita é basica-
Assis Hoftmann/Abril Press
POLÍTICA/HISTÓRIA: as relações Brasil-América Latina nada a dever à Etiópia, com uma renda
média per capita de 2.550 cruzeiros
para 45% da população do Nordeste,
segundo os dados revelados pela Igreja.
Olho no Primeiro Mundo As teorias sobre a especificidade ab-
soluta do Brasil em relação à América
Latina se baseiam num argumento apa-
Considerando-se superior a outros países da América Latina, rentemente de peso, porque nos diria
o Brasil deixa de ser líder entre seus pares para ser vassalo que "já nascemos diferentes", originá-
rios de berço lusitano, os únicos no
dos Estados Unidos e da Europa
continente. E isso fez diferença: na cul-
tura, na religião, no tipo de colonização
Um país de cara para a Europa e os taleceu a idéia de que o Brasil não per- e, finalmente, nos destinos diversos da
Estados Unidos e de costas para a tence ao Terceiro Mundo, de que pre- Espanha e de Portugal diante do impé-
América Latina: os olhos vivos do lito- ferimos ser rabeiras na divisão dos pai- rio napoleônico e do bloqueio conti-
ral voltados para as metrópoles e o tra- ses industrializados do que líderes entre nental. A consequência mais importan-
seiro assentado displicentemente na di- os não-alinhados. Não interessa se nos- te foi a forma de pacto entre Brasil e
reção do continente. Tudo parece con- sa taxa de mortalidade infantil é similar Portugal que, fundamentalmente, assu-
firmar a teoria do "fatalismo geográfi- à da Nigéria e se o País é, ao mesmo miu a nossa independência, ao contrá-
co" ou do "destino manifesto", segun- tempo, o mais rico e o mais pobre da rio da de outros países latino-
do a qual estamos fatalmente atrelados América Latina, com um parque indus- americanos. Nestes, a independência
ao ocidental, cápitalista e cristão pela trial tantas vezes louvado como um dos foi resultado de um processo de guerra
nossa localização física. A expansão maiores entre os países capitalistas e popular que durou vários anos - como,
econômica das décadas de 60 e 70 for- uma área de pobreza que não deixa por exemplo, o Uruguai, cuja luta de
independêricia, liderada por José Ger-
vásio Artigas, estendeu-se de 1810 a
1814 - e implicou a organização de
exércitos nacionais para lutar contra o
colonizador, incorporando amplos se-
tores populares à luta contra a Espa-
nha. Bolivar, San Martin, Sucre,
O' Higgins, Juarez e Artigas foram os
grandes fundadores da nacionalidade
latino-americana, nascida nas lutas
concretas de solidariedade contra o ini-
migo espanhol. Guerrilheiros, como os
chilenos Carrera e Manuel Rodriguez,
foram o elo da participação ativa dos
setores populares na gesta de nasci-
Biblioteca Nacional
Biblioteca Nacional
América Latina. _
O Paraguai e a Bolívia são vítimas
das gozações brasileiras. Em nossa his-
tória, de tão poucos heróis pátrios e
glórias guerreiras reais, a guerra contra
Ao contrário de seus vizinhos latino-americanos - cujas lutas de libertaçãoforjaram 0 Paraguai (1864-70) é relatada em tom
heróis populares (no alto, à esq., Artigas, à dir., San Martin) -, a independência do épico. Os exércitos brasileiro, argentino
País ( acima, no quadro "Grito do Ipiranga", de Moreaux) se deu como um pacto entre e uruguaio constituiram a Tríplice
Brasil e Portugal Aliança para "libertar" o país vizinho
455
BR RALO 22 J AnCO2 , P 3 C14)
Biblioteca Nacional
Eoao Sao" “ A
774
[;( slRAR
PANA t
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E
Visão histórica deformada: Solano Lopez, A instabilidade política da Bolívia - para alguns um exemplo de que aquele é um país
segundo Vida Fluminense de 12/6/1869, caótico - deve-se, em grande parte, sólida organização sindical. Acima,
era o Nero do Século 19 manifestação em La Paz reúne 20 mil trabalhadores (17/4/84)
do jugo de um "ditador cruel", Solano ao Brasil), foi considerada uma ofensa o regime daquele país, enquanto o Bra-
López. A guerra, contada pela historio- nacional. A Bolívia foi erigida em sil se situa ao lado do Chile de Pino-
grafia oficial brasileira como uma ação exemplo de país "selvagem", de insta- chet, do Paraguai, de Honduras, da
titânica contra um inimigo superior em bilidade política permanente, numa su- Guatemala, de El Salvador, do Haiti,
combatentes, terminou com a vitória cessão incontável de golpes militares na obstinação de desconhecer a reali-
do "bem" (a Tríplice Aliança) sobre o desde sua independência. No entanto, dade inegável de um regime que sobre-
"mal", e o Paraguai foi reincorporado isso se deve, em grande parte, à sólida vive há 25 anos às agressões dos EUA,
ao grupo das nações "livres e civiliza- organização sindical do país, centraliza- O afastamento manipulado do Brasil
das", O patriotismo permeia todos os li- da na COB (Confederação Operária em relação à América Latina também
vros escolares de história, com as bra- Boliviana), que se baseia na maciça nos distancia política e culturalmente
vuras do Duque de Caxias e seus co- mobilização dos mineiros - aqueles do Terceiro Mundo, já que não partici-
mandados, sem mencionar que, para mesmos que, em 1952, protagonizaram pamos do Movimento de Países Não-
além das razões imediatas do conflito uma revolução que impôs uma reforma Alinhados, que procura ampliar o espa-
de fronteiras, estava o empenho inglês agrária no país, a nacionalização das ço dos países com políticas externas in-
em liquidar o desenvolvimento do úni- principais minas e a substituição do dependentes. Nesse movimento, sem
co país latino-americano que se expan- exército por milícias populares. Essas dúvida, o Brasil poderia desempenhar
dia baseado na ampliação do mercado conquistas foram sendo desestabiliza- papel de primeira linha, como passou a
interno, realizando uma reforma agrá- das pelos governos posteriores, mas a ter a Argentina, após a eleição do presi-
ria e construindo um regime voltado capacidade de luta dos trabalhadores dente Raul Alfonsin, em 1983,
' para os seus interesses. bolivianos lhes conferia, ainda em 1984, A própria idéia de que o Brasil fica
Atuando com a mão do gato, a In- um poder de veto fundamental em "perto" da América Latina - basta sair
glaterra conseguiu seu objetivo, acres- nível nacional. daqui para chegar lá - revela um pro-
cido da multiplicação da dependência vincianismo que só pode ser explicado
do Brasil, da Argentina e do Uruguai, Sob pressão dos EUA, o regime a partir do ponto de vista de quem tem
grandemente endividados com aquela não reata relações com Cuba seus interesses ligados às grandes em-
potência européia pelos gastos de guer-
presas das metrópoles capitalistas, se-
ra. O Brasil, por seu lado, incorporava Outro exemplo de como é falaz a jam empresas industriais, financeiras,
um pedaço do território derrotado, de- pretendida superioridade brasileira comerciais ou agroindustriais, Como
pois de ter atuado numa guerra que le- sobre os outros países do continente primos pobres da comunidade do Pri-
vou à morte 75% do povo paraguaio e vem das relações com Cuba, rompidas meiro Mundo, estaremos sempre em
mais de 99% dos homens de mais de 20 exatamente com o golpe militar de atitude subserviente, porque enfeixa-
anos., Essa ação de tropas brasileiras 1964. Hoje, o Brasil se situa ao lado dos dos numa correlação de forças que, por
voltaria a se dar um século depois, em países mais atrasados do continente, na definição, o favorece, na esperança de
1965, quando o Exército nacional parti- insistência em não restabelecer os con- um dia "ser parte dele ",
cipou, junto com o de outros países do tatos rompidos, sob pressão direta dos A reinserção do Brasil na América
continente americano, sob a liderança EUA, por todos os governos latino- Latina faz parte do processo de supera-
dos EUA, do desembarque de tropas americanos, menos o México. Atual- ção da nossa busca de identidade como
naRepública Dominicana, para evitar mente, os governos que exibem um nação: daí sua importância e a possibili-
que um governo legitimamente eleito mínimo de autonomia em relação a dade de que a transição democrática
pudesse tomar posse e pôr em prática Washington, como os da Argentina, da anunciada por Tancredo Neves, que
seu programa. Venezuela, do Peru, da Colômbia, do assumiria a Presidência em 1985, modi-
A menção equivocada do presidente Panamá, do Equador ou da Nicarágua, ficasse também nosso lugar no cenário
Ronald Reagan, dos EUA, no final de mantêm relações com Cuba, indepen- internacional.
1982 (ele disse "Bolívia" referindo-se dentemente do juízo que tenham sobre
Emir Sader
456
BRDFANBSBMB: GAME. Pn CO2, p 200
Iconographia
nos aos internacionais. O Brasil é um
caso paradigmático desse tipo de indus-
a trialização tardia, periférica e por isso
restringida. !
O primeiro período de industrialização do Brasil se estende da última década
do século Durante toda a fase colonial, a eco-
19 aos anos 30 e caracteriza-se pela produção de bens de consumo náão-duráve
is, como nomia brasileira teve seu centro diná-
tecidos. Acima, indústria têxtil em Campinas, SP, 1924
mico na produção de alguns gêneros
agrícolas ou na extração de metais pre-
dernização de qualquer país. tais, representaram tentativas de cons- ciosos para o mercado externo. Essa
Os primeiros processos de industria- trução da base econômica de um re- produção, embora se revestisse de ca-
lização - como os da Inglaterra, da gime social novo, o socialismo. Na ráter mercantil e complementar à das
França, da Holanda e, mais adiante, da maioria desses países e a partir dos economias metropolitanas e concor-
Alemanha, do Japão, dos Estados Uni- anos 60, essas experiências foram inter- resse para a acumulação primitiva de
dos - se conjugaram com a formação rompidas e entraram numa crise pro- capital na Europa, não era ainda capi-
do modo de produção capitalista, já em funda. talista, pois se realizava na moldura da
andamento na Europa Ocidental desde
grande propriedade fundiária e do tra-
o século 16. Representaram o coroa-
balho escravo. Constituía a base econô-
mento dessa formação, quando a pro-
mica de uma formação social caracteri-
' priedade privada capitalista dos meios
zada apropriadamente por Jacob Go-
de produção e o regime de trabalho li- Enquanto isso, um grupo de nações render como escravista-colonial. A pró-
vre assalariado encontraram uma base da América Latina, Ásia e África, no pria comercialização externa se proces-
técnica e forças produtivas também início dos anos 80 designadas como sou, até o começo do século 19, através
apropriadas ao comando e às finalida- " novos países industrializados", pas- da intermediação compulsória da Co-
des do capiital: a gerência por especia- sava por um processo de industrializa- roa portuguesa e dos mercadores a ela
listas, uma divisão minuciosa e autori- ção e modernização de suas economias associados, o que embaraçava a acu-
tária do trabalho e um sistema de má- que nem era socialista nem reproduzia mulação de capitais na colônia mesmo
quinas cada vez mais complexo e inte- inteiramente as características das in- sob as modalidades prévias de capital
grado. Esses processos clássicos de in- dustrializações dos séculos 18 e 19, comercial e bancário.
dustrialização, ocorridos entre os sécu- Para distinguir essa modalidade de No entanto, além das grandes fazen-
los 18 e 19, deram origem aos países ca- industrialização capitalista da anterior, das, das minas disputadas e do impor-
pitalistas adiantados, desenvolvidos, tem sido ressaltado seu caráter tardio tante comércio exportador e importa-
imperialistas, do século 20. ou retardatário. Com efeito, a industria- dor, cresceram, com o tempo, um setor
Bem distintos foram os processos de lização capitalista desses países ocorre interno de produção, transporte e co-
industrialização enfrentados pela numa fase histórica em que já é acirrado mercialização de alimentos e um setor
União Soviética, a partir de 1926, e por e aberto o confronto entre o sistema artesanal, nos quais, a par do recurso à
um grupo de países do Leste europeu e capitalista e o sistema socialista; em mão-de-obra escrava, foram adotados
da Asia, nos anos que se seguiram à Se- que os países capitalistas adiantados já diferentes regimes de trabalho livre.
gunda Grande Guerra. Esses proces- concluiram sua industrialização, passa- Desenvolveu-se também o aparelho
sos, dirigidos e impulsionados por Esta- tam do estágio competitivo ao estágio administrativo, insuflando maior alento
dos pós-revolucionários, de caráter de monopólios cada vez mais podero- às cidades que se formavam e cres-
operário ou operário-popular, e combi- sos e internacionalizados; em que os ciam. E o quadro começou a alterar-se
nados com formas de propriedade so- Estados capitalistas desempenham um mais rapidamente com a transferência
cial dos meios de produção fundamen- papel econômico cada vez mais deci- da Corte portuguesa e a abertura dos
458
#3,
E+
portos brasileiros, em 1808, com a inde-
pendência do Estado brasileiro, em
1822, e sobretudo com a difusão, logo
em seguida, de um novo produto ex-
portável: o café.
Por um lado, a lavoura cafeeira inte-
grava ainda o padrão de crescimento
genericamente denominado de "pri-
mário-exportador", principalmente
em seu período inicial, no Vale do Pa-
raíba, quando ela se desenvolveu com
base no trabalho escravo. Por outro .
lado, porém, o monopólio comercial
metropolitano desaparecera e a grande
propriedade, embora ainda apoiada no
trabalho servil, passou a produzir arti-
culada a um sistema comercial-
financeiro controlado nacionalmente, o
que intensificou a acumulação interna
de capitais. O papel das casas comissio-
nárias estrangeiras ainda era enorme,
mas foram se reunindo condições para
a criação e fortalecimento de grupos
exportadores nacionais e de bancos
vinculados, até nos nomes, ao comér-
cio e à lavoura de exportação.
ROL!
Eo _ ao _ ao, Polp ao oao aaa Ju
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A
A mente livres, livres de laços de sujeição
E-pel
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talistas de produção fizeram sua apari- importante ressaltar que, até meados como Delmiro Gouveia, em Pernam-
ção no Brasil, portanto, ainda no seio dos anos 50 do século atual, o setor pri- buco, e Luís Tarquínio, na Bahia.,
de uma formação social predominante mário da economia brasileira conti- Registraram-se no período os pri-
escravista e como formas subordinadas nuou predominando sobre o setor se- meiros investimentos industriais de ca-
e marginais. O próprio escravismo im- cundário no que diz respeito à geração pitais estrangeiros, como na abertura
pedia, é claro, a generalização da in- de renda e à absorção de força de tra- de frigoríficos ou de oficinas de mon-
dústria fabril. O número de homens li- balho. Portanto, só a partir daí é que a tagem e reparo de veículos. Instalaram-
vres, com poder aquisitivo, era restrito. . indústria se tornou, entre os setores se também algumas indústrias de bens
Os endinheirados adquiriam produtos produtivos, a principal fonte de renda e intermediários, como material de cons-
importados. Os latifúndios escravistas de emprego e que o País pôde trução, e de bens de capital leves, rela-
eram, em larga medida, auto-sufi- considerar-se industrializado. cionados principalmente com a agroin-
cientes. Assim, até a segunda me- Por outro lado, em toda a primeira dústria do açúcar e do café. No en-
tade do século 19, fora da agroindústria metade do século 20, o que predomina tanto, não foram esses empreendimen-
açucareira e de alguma elaboração do no setor primário é a grande agricul- tos que forneceram a marca do
couro ou do algodão, de base escra- tura de exportação e, nela, relações de período, e sim os ramos produtores de
vista, o fundamental da produção in- trabalho que não são mais escravistas, bens de consumo não-duráveis, que re-
dustrial que se fazia era de nível caseiro mas também ainda não são especiífica- queriam tecnologias mais simples e
ou artesanal. mente capitalistas; são relações ineren- acessíveis, investimentos menores de
A* vinda da €orte portuguesa para o temente mistas, próprias a uma fase de capital e prazos mais curtos de instala-
Brasil começa a alterar esse panorama, transição. Só com a prevalência do se- ção, e estavam portanto mais de
conforme já foi assinalado. O próprio tor industrial e do modo de produção acordo com os limites do mercado bra-
monarca adota várias medidas de esti- especificamente capitalista, nas três úl- sileiro e as possibilidades do empresa-
mulo à fiação e tecelagem, às forjias e timas décadas, é que a agricultura co- riado nacional que surgia.
fundições de ferro, à vinda de missões meça também a ser profundamente re- Eram grandes as dificuldades que
técnicas e científicas. Contudo, os re- modelada, com a difusão das relações cercavam essas indústrias nascentes. A
sultados são ainda modestos, inclusive de trabalho assalariado puro e a moder- expansão do setor exportador, primor-
porque contrabalançados pela abertura nização das forças produtivas, proces- dialmente do complexo cafeeiro, é que
dos portos e do mercado brasileiro à sos ainda em andamento nos anos 80. comandava a acumulação de capital no
afluência crescente de mercadorias in- Portanto, o que se abre na história bra- País. O crescimento industrial era obs-
glesas. sileira, no final do século 19, é um tado, além disso, pelas novas condições
Mais vigoroso foi o novo surto indus- período de transição entre a formação internacionais. Surgiria o capitalismo
trial conhecido como "era Mauá", por social escravista-colonial e uma forma- industrial. Operava-se a transição do
ter sido o barão, depois visconde de ção capitalista-dependente, que só vai capitalismo competitivo para o capita-
Mauá, Irineu Evangelista de Souza, sua firmar-se em meados dos anos 50, lismo monopolista. E a economia mun-
figura mais destacada. O novo ciclo de O eixo dessa transição foi o processo dial era reorganizada com base nos mo-
empreendimentos industriais estava re- de industrialização do País, que, to- nopólios"* capitalistas internacionais e
lacionado, basicamente, aos efeitos da mando corpo gradativamente, pode ser numa divisão desigual do trabalho en-
interrupção no tráfico e comércio de dividido em três períodos básicos: o que tre países centrais, industrializados, e
escravos negros, conforme reconheceu se estende da última década do século países periféricos, como O Brasil,
o próprio Mauá, em 1878: "Reunir os 19 a meados dos anos 30; o que se pro- primário-exportadores.
capitais, que se viam repentinamente longa dessa fase à metade dos anos 50; Todavia, esse modelo de desenvolvi-
deslocados do ilícito comércio, e fazê- . € finalmente as três décadas que se se- mento "primário-exportador", louvado
los convergir a um centro donde pudes- guem. interessadamente pelos que propaga-
sem ir alimentar as forças produtivas vam que o Brasil estava destinado a
do País, foi o pensamento que me sur- permanecer "essencialmente agrícola",
giu na mente ao ter a certeza de que tinha sua expansão condicionada à evo-
aquele fato era irrevogável." Tomou, lução favorável dos mercados importa-
assim, a iniciativa de formar sociedades dores e, por conseguinte, era pertur-
de investimentos para implantar ferro- O primeiro período se caracterizou bado sempre que irrompiam crises
vias, estaleiros, bancos, fábricas. Em- pela montagem e expansão dos ramos mais sérias na economia capitalista
preendimentos semelhantes surgiram industriais produtores de bens de con- mundial, Nesses momentos, com a in-
nos principais núcleos urbanos do País sumo não-duráveis, como tecidos, cal- terrupção parcial nas correntes de co-
e até em zonas interioranas, dando ori- cados, alimentos, bebidas e móveis. Es- mércio exterior e o aparecimento de
gem a pequenas fábricas de tecidos, ses ramos foram instalados, em sua recursos ociosos que o setor primário-
chapéus, sapatos, vidros, louças, cer- quase totalidade, por empresas nacio- exportador não lograva absorver, a ex-
veja, vinhos, sabão, velas. A maioria nais privadas - ou de grandes comer- pansão da indústria doméstica era im-
dessas empresas malogrou, mas as que ciantes e grandes proprietários de ter- pulsionada a fim de substituir importa-
vingaram, mesmo que assumidas pelo ras que começaram a aplicar seus capi- ções tornadas inviáveis, ainda mais que
capital inglês como aconteceu com fer- tais também no setor secundário, ou de o mercado interno continuava se am-
rovias implantadas por Mauá, vieram a imigrantes com recursos, que aqui se pliando com a difusão das relações
representar base importante para o radicaram e se voltaram para a indús- mercantis, o incremento da renda na-
novo impulso industrial que se seguiu à tria, como os Matarazzo, Crespi, Kla- cional e a urbanização crescente do
abolição da escravatura, em 1888, e à bin, Jafet. A indústria nascente se mos- País. A industrialização brasileira se
proclamação da República, no ano se- trava também menos concentrada do processou, assim, de início, através de
guinte, que em fases posteriores, e houve nes- surtos descontínuos, como os que pre-
Há quem entenda que, extinto o tra- sas décadas iniciativas importantes cederam e acompanharam a Primeir:
balho servil, o Brasil se tornou imedia- também no Rio Grande do Sul ou no Grande Guerra. 1
tamente um país capitalista. Por isso, é Nordeste, onde despontaram figuras Ainda assim, o Brasil já contava com
460
WE (1), My
sroransse ve.eneaaas 1 an cos, p-20a4
«
vulto, seja na infra-estrutura de trans-
porte (novas ferrovias, primeiras rodo-
vias de porte) e de energia (primeiras
usinas hidrelétricas estatais, como
Paulo Afonso), seja na produção de in-
sumos básicos (a Companhia Vale do
Rio Doce para produção de minério de
ferro, a Companhia Siderúrgica Nacio-
nal e Acesita para produção de aço, a
Companhia Nacional de Álcalis para
fundamental, produtor de motores, cação de bens de consumo duráveis e mento e a diferenciação progressivos do
máquinas-ferramentas e equipamentos. bens de capital tecnologicamente mais mercado interno. Na industrialização
nessas condições que a industriali- refinados, já no século 20, No Brasil, o periférica e tardia, o setor industrial é
zação brasileira passa por uma nova e avanço da industrialização, em vez de levado a adotar imediatamente produ-
decisiva virada, em meio à década de aguardar a consolidação e maturidade tos e processos avançados e a trans-
50. Acompanhando a nova tendência da indústria de bens produtivos, impul- plantar do Exterior uma tecnologia vol-
na divisão internacional do trabalho, sionou o desenvolvimento acelerado da tada para poupar mão-de-obra. Nessas
capitais estrangeiras expressivos diri- indústria de bens de consumo duráveis, condições, produzem-se bens sofística-
gem-se para O Brasil e outros países o que, obviamente, só se tornou possi- dos enquanto a maioria da população
periféricos de características semelhan- vel porque, tratando-se de uma indus- continua privada de bens elementares e
tes, onde vão cumprir, pela primeira trialização tardia, a indústria de bens essenciais. E reeforçam-nas as tendên-
vez, um papel pioneiro no desenvolvi- produtivos dos países centrais passou a cias a marginalizar parcelas crescentes da
mento industrial desses países, implan- alimentar a formação de capital e força de trabalho, com o que não ape-
tando novos ramos de bens de con- mesmo a operação do parque industrial nas se tornam muito altas as taxas de
sumo duráveis e mais sofisticados. brasileiro, Tal situação, porém, além de desemprego e subemprego, mas tam-
Nesse sentido, o festejado Programa aumentar a dependência "estrutural" bém os próprios salários dos trabalha-
de Metas do governo Juscelino Kubits- ou "tecnológica" do País em relação a dores empregados sofrem fortes pres-
chek (1956-61) não representou sim- importações, agora essenciais e difícil. sões baixistas. Assim, a industrialização
plesmente uma nova etapa, mas sim mente comprimíveis, também transfere dependente e retardatária é acompa-
uíha reorientação do processo de in- para o Exterior os impulsos dinâmicos nhada de desigualdades sociais ainda
dustrialização brasileira. Até então, a que poderiam originar-se da inter-rela- mais fortes do que as observadas nos
industrialização fora promovida princi- ção entre os diferentes segmentos in- processos de industrialização capita-
palmente por empresas nacionais, pri- dustriais. lista clássica.
vadas e públicas, e se baseara de início
Em virtude desses traços, os movi-
no setor de bens de consumo não-
mentos cíclicos se apresentam também
duráveis e em seguida no incipiente se-
mais sérios e bruscos. A concentração
tor de bens de produção. Na etapa
da renda sendo mais acentuada, é mais
aberta pelo Programa de Metas, ocorre Outra consequência é que o desen- aguda a contradição entre o cresci-
o ingresso maciço de capitais externos, volvimento do capitalismo no País, que mento acelerado da produção e o cres-
que se dirigem precipuamente para os já se tornara rapidamente estatal, pelo cimento insuficiente do consumo dos
setores de bens de consumo duráveis, papel insubstituível do Estado na mon- trabalhadores. A existência de um sis-
em particular para o automobilístico e tagem da infra-estrutura e na implanta- tema latifundiário-exportador, difícul-
o eletrodoméstico, que se convertem ção de setores básicos da indústria, tando a produção de gêneros alimenti-
nos setores líderes da nova expansão agora se torna também, precocemente, cios, eleva também as pressões inflacio-
industrial. A viabilidade dessa forma de monopolista. O caso da indústria mon- nárias. E esses países, para ampliar sua
expansão estava, até certo ponto, asse- tadora de veículos automotores é capacidade produtiva, dependem em
gurada pela concentração da renda e exemplar. Nos Estados Unidos, em grande parte da importação de
pela estrutura da demanda herdadas do 1910, havia 181 companhias montado- matérias-primas, combustíveis, peças e
período anterior. Viabilizavam-na tam- ras de automóveis. Em 1923, existiam equipamentos. Assim, a continuidade
bém a infra-estrutura de energia, trans- ainda 108. Em 1927 restavam 44. E só da expansão fica condicionada, não
portes e comunicações e os segmentos em 1954, após décadas de competição apenas à acumulação interna de capi-
produtores de bens intermediários e acirrada, é que foram reduzidas a seis tais e à possibilidade de inversões lucra-
bens de capital, criados na fase prece- grandes montadoras. No Brasil, a in- tivas, mas também à disponibilidade de
dente. Mas a industrialização assume, a dústria automobilística já surgiu com- divisas, ou seja, de moedas estrangeiras
partir daí - justamente na fase em que pletamente monopolizada por cinco a para adquirir no Exterior os meios de
a produção industrial supera a produ- seis grandes montadoras multinacio- produção necessários. Dessa maneira,
ção agricola -, características inteira- nais. Pressionados pelas empresas esta- nesses países, é comum que aos pontos
mente novas, que vão ficar ainda mais tais e pelos monopólios internacionais, de estrangulamento na estrutura indus-
claras durante os governos militares, os os grupos brasileiros mais poderosos ti- trial e às pressões inflacionárias inter-
quais não alteram esse padrão mas o veram também que fazer todos os es- nas se juntem desequilíbrios nas rela-
aprofundam. Recorrem ainda mais ex- forços para crescer ou associar-se rapi- ções comerciais e financeiras externas,
tensamente aos capitais externos, Con- damente, sob pena de não sobrevi- encurtando as fases expansivas e pro-
centram ainda mais a renda. Estimulam verem. Os efeitos de uma estrutura in- longando e aprofundando as fases re-
mais ainda a expansão da indústria de dustrial assim rapidamente monopoli- cessivas.
bens de consumo duráveis. zada logo se fariam sentir nas taxas ex- Por ter revestido essas características
Dessa maneira, a sequência da in- traordinárias de lucros, nas manipula- é que a industrialização tardia e depen-
dustrialização capitalista clássica foi al- ções de preços, nas pressões inflacio- dente do Brasil, embora o tenha colo-
terada no Brasil, como em outros nárias. cado entre os dez países de maior pro-
países de industrialização dependente e Acrescente-se que, nos casos de in- duto industrial, não realizou as seduto-
tardia. No caso clássico, a industrializa- dustrialização capitalista tradicional, a ras promessas que despertou inicial-
ção partiu da produção de bens de con- indústria se formou a partir de formas mente. Ao invés de reforçar a sobera-
sumo de uso difundido e popular, como artesanais e pouco eficientes de produ- nia, aprofundou a dependência. Em
tecidos e alimentos, no século 18 e ção, substituídas por formas fabris num vez de atenuar, agravou de forma dra-
começo do século 19; passou à fabrica- processo em que a tecnologia científica mática os problemas sociais já crônicos
ção de bens intermediários e bens de foi sendo criada e difundida de forma do País. E de forma alguma assegurou
capital, que pouco a pouco predomina- gradual, em correspondência com. a o anunciado crescimento contínuo e
ram, na segunda metade do século 19; disponibilidade de capitais e de mão- auto-sustentado. e
alcançando como coroamento a. fabri- de-obra e de acordo com o alarga- Duarte Pereira
462
ar pranãss vaenNcAXA a J In COA , p 206
tidos políticos tradicionais provaram-se de Mercadorias (ICM), destinado aos planos. Em 1983, as receitas dos mu-
incapazes do esforço de formação de Estados. O ICM eliminou o problema nicípios dependiam, em média, de 47%
consenso necessário ao estabeleci- da cobrança em "cascata". Aos mu- das transferências das esferas superio-
mento de um compromisso político nicípios foi atribuída a competência res, e nos municípios menores esse
com determinados objetivos de plane- dos impostos sobre a propriedade terri- índice podia chegar a-76%. Uma incon-
jamento ( . . .). Depois da revolução de torial urbana (IPTU) e sobre os servi- testável situação de submissão, por-
1964 duas medidas de reforma institu- ços de qualquer natureza (ISS). tanto.
cional foram tomadas: primeira, a abo- Em tese, a reforma foi definida pelo Foi por isso que, a partir de maio de
lição dos partidos tradicionais (...) e critério de estimular a poupança - via 1983, começou um movimento supra-
sua substituição por um sistema biparti- incentivos fiscais - e orientar o cresci- partidário, a princípio reunindo prefei-
dário (...); segunda, ab-rogação do mento econômico dentro dos trilhos do tos do Estado de São Paulo, para pres-
poder do Congresso de aumentar o dis- novo regime - via uma política de fixa- sionar o governo federal e o Congresso
pêndio orçamentário." (4 Nova Econo- ção de alíquotas diferenciadas e flu- a alterar a legislação tributária em fa-
mia Brasileira, Editora José Olympio, tuantes do IPI, de acordo com as prio- vor dos municípios. Caravanas de pre-
Rio de Janeiro, 1974.) ridades de momento. O resultado, en- feitos e vereadores foram a Brasília e a
Fez-se, portanto, o "consenso", tretanto, foi uma excessiva complacên- pressão resultou na aprovação pelo
ainda que à força, para impor a re- cia com as rendas de capital. Apenas à Congresso, em 23 de novembro, de
forma, Já em 1964, através de Ato Insti- União permitiu-se a competência de uma emenda constitucional de autoria
tucional, o governo proibia o Con- criar novos impostos e o poder de deci- do senador Passos Porto (PDS-SE). En-
gresso de aprovar emendas no orça- dir sobre isenções e incentivos de im- tre outras coisas, a emenda fortaleceria
mento da União que resultassem em postos estaduais e municipais. Estas as parcelas do IPI e do Imposto de Ren-
aumentos das despesas. Depois, esse instâncias perderam até a prerrogativa da destinadas ao FPEM, escalonada-
mesmo Congresso, combalido pelas de fixar livremente as alíquotas de seus mente, até que, em 1985, atingissem
cassações, aprovaria a Emenda Consti- impostos (com exceção do IPTU). 16% de cada um daqueles impostos; a
tucional no 18 (em 1965) e a Lei no 5.172 alíquota do ICM subiu de 16% para
(de 25/10/1966), que dariam origem ao 17%; e os Estados e municípios ti-
Código Tributário Nacional, em vigor a veram participação ampliada no Im-
partir de 1967. 4 posto Unico sobre Combustíveis e Lu-
Do ponto de vista técnico, essa re- brificantes (IUCL).
forma representou expressiva moderni- Com a reforma, multiplicou-se o nú- A aprovação da emenda Passos
zação. O limite de isenção para o paga- mero e a carga de impostos nas mãos Porto representou uma importante vi-
mento de Imposto de Renda foi rebai- do governo federal. Aparentemente tória política: além de o movimento dos
xado, alargando o número de declaran- para compensar a perda dos Estados e prefeitos e vereadores evoluir para a
tes com imposto a pagar, tanto de pes- municípios, instituiu-se um mecanismo formação de uma Frente Municipalista
soas físicas como jurídicas. As alíquotas de transferência às esferas inferiores, o pelas Eleições Diretas e pela Consti-
dos impostos indiretos foram aumenta- Fundo de Participação dos Estados e tuinte, de caráter nacional, também
das e foi criado o Imposto Sobre Pro- Municípios (FPEM), composto de par- ocorreu que, pela primeira vez durante
dutos Industrializados (IPI), em substi- celas do IPI (10%) e do Imposto de Ren- o Regime Militar, o governo central se-
tuição ao antigo Imposto de Consumo, da (10%). Esse mecanismo, no en- ria obrigado a negociar com o Con-
na esfera federal. Extinguiu-se o Im- tanto, serviu para dar ao governo cen- gresso os termos de uma reforma,
posto de Vendas e Consignações, subs- tral mais instrumentos de controle e ainda que tímida, em matéria de polí-
tituído pelo Imposto sobre Circulação imposição unilateral de suas metas e tica fiscal.
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POLÍTICA/IMPRENSA: a imprensa popular O semanário O Pasquim,
fundado em 1969, chegou a tirar 200
mil exemplares. Opinião fez sucesso
quando saiu, em 1972.
Movimento nasceu em 1975 e
quando fechou, em 1981, anunciou-se
uma crise na imprensa alternativa.
Os pequenos jornais que resistiram ao Regime Militar Mas ela continuou, em parte, nos
jornais partidários, como Hora do
têm uma história que se iniciou há décadas e
Povo, Voz da Unidade e Tribuna da
não parece ter fim previsto Luta Operária.
O começo da década de 70 assistiu já havia sido aplicada com sucesso em Brizola; O Semanário, ligado a setores
no Brasil ao nascimento de um fenô- O Pasquim, semanário de humor que nacionalistas e onde se destacava o his-
meno peculiar e aparentemente novo, até certo ponto se pautava também por toriador Nelson Werneck Sodré; Brasil
em nossa história: os famosos jornais al- um noticiário político de oposição. O Urgente, dos padres dominicanos de
ternativos, diferentes em vários aspec- Pasquim chegou a tirar 200 mil exem- São Paulo, precursor do trabalho que
tos das folhas e revistas normalmente plares no começo dos anos 70. Na levaria às Comunidades Eclesiais de
expostas nas bancas de jornais do País. mesma época, apareceriam Politika, do Base; e Ligas, por fim, voltado para os
Em 1972, causaria sensação o início jornalista Sebastião Nery, Jornal de De- problemas do campo, tendo à frente o
da publicação de Opinião, o mais co- bates, uma reanimação de antigo jornal deputado socialista Francisco Julião.
nhecido órgão político desse tipo de nacionalista, e Versus,o mais cultural e Depois de 1964, o Regime Militar
- imprensa. Era propriedade de Fer- de recuperação da cultura latino- destruiu mesmo um grande diário na-
nando Gasparian, empresário naciona- americana. A inclinação marcada- cionalista, Última Hora, existente desde
lista e dono de uma das maiores empre- mente oposicionista de todos fornece- 1952, que chegou a vender 200 mil
sas do País até 1964, a América Fabril, ria uma pista sobre a origem dessa exemplares só em São Paulo, na época
que emseguida seria negociada. O jornal imprensa alternativa, como foi chamada do golpe. As publicações populares e
semanal, de tamanho tablóide (cerca rapidamente em todo o País. democráticas tentaram persistir como
de metade do tamanho da página dos puderam. Nesse período, nacionalistas
diários normais), voltava-se essencial- de São Paulo fundam o Fato Novo; e
mente para a análise econômica e para aparece também Reunião, do editor
a crítica severa das contradições do fa- Enio Silveira, proprietário da Editora
moso "milagre econômico". Era diri- Na verdade, desde o início do século, Civilização Brasileira. Os estudantes da
gido por Raimundo Rodrigues Pereira, assistia-se no País a proliferações perió- USP, por seu lado, criam o jornal
ex-editor da revista Veja (então uma dicas de pequenos jornais carentes de Amanhã.
novidade bem-sucedida da poderosa recursos e com baixa tiragem. De vida A repressão tornou-se particular-
Editora Abril). Reunia, ainda, vários relativamente curta, estavam geralmente mente violenta entre 1968 e 1973. Era
jornalistas que se haviam destacado na associados a alguns jornalistas ou gru- uma época em que os órgãos dos parti-
grande imprensa. Mas, como Opinião pos intelectuais ou políticos, que não dos de esquerda só conseguiam sair na
era produzido por uma empresa média, encontravam outro espaço para expor mais profunda clandestinidade: entre
a baixos custos gráficos e de recursos suas idéias. outros, circulam então A Voz Operária,
humanos, não se esperava que atingisse Em 1964, essa imprensa tinha grande do PCB; Libertação, da Ação Popular;
o patamar dequase 40 mil exemplares número de representantes, com os jor- A Classe Operária, do PC do B; e
de venda - num momento em que a nais Novos Rumos, do Partido Comu- Unidade Revolucionária, do Movimento
maior revista semanal da grande im- nista Brasileiro, Classe Operária, do Revolucionário 8 de Outubro (MR-8).
prensa brasileira - Veja - vendia em Partido Comunista do Brasil; O Pan- Finalmente, a partir de 1975, o re-
torno de 45 mil exemplares. fleto, ligado ao então deputado do PTB gime foi forçado a um recuo, e a re-
Desde 1969, a "fórmula alternativa" (Partido Trabalhista Brasileiro) Leonel pressão foi relaxada. Nesse mesmo ano
466
' BR DFANBSSB VE.GONCAAAs
33 2,4 MCS, p 209
d
Quem Whª com à
Gonter a sangria externa sªfªmí'j- _ vº
z
"Caso
derrubar a inflação e _
omar o desenvolvimento
ªmmaram país!
Pre sidente falou edisse.
A imagem
re da
ditadura
surgiria o semanário Movimento, com a civis, políticas e sindicais e pela convo- dos Trabalhadores, em 1982 (dirigido
vendagem inicial de cinco mil exempla- cação de uma Assembléia Constituinte. por um ex-editor de Movimento, Perseu
res, mas que, com o avanço da abertura Tornou-se comum assinalar, com o Abramo), que também teve vida curta.
política, passaria a vender nove mil, 15 fim de Movimento, uma "crise da im- A partir de 1978, além disso, Movimento
mil e 21 mil exemplares até 1978. Aí, prensa alternativa". No entanto, longe procurou atingir um público operário
estabilizou-se com uma venda média de entrar em crise, a imprensa alterna- através de outra publicação, o Assuntos,
de dez mil jornais até 1980, quando os tiva cresceu, no período de esfacela- que durou apenas sete números e che-
atentados terroristas de direita às ban- mento do Regime Militar. Mas mudou gou a vender 3.500 exemplares (um re-
cas de jornais, somados a divergências de forma, de acordo com as novas ne- corde nessa faixa, para um jornal políti-
políticas mais abertas entre os grupos cessidades de mobilização política, co).
de esquerda que o apoiavam, e à falta principalmente na área democrática e %)e modo geral, no período de 1975 a
de uma definição melhor e mais rápida popular. Os partidos clandestinos, por 1980, houve uma proliferação de jor-
de seu projeto, levaram-no a perder exemplo, passaram a editar jornais le- nais alternativos de diversos tipos. Al-
terreno, até o fechamento definitivo, gais, ofíciosos, depois da anistia de guns, feministas, como o Brasil Mulher
seis meses depois. Movimento havia sur- 1978. e o Nós Mulheres, em São Paulo. Ou-
gido de uma crise do Opinião, devido a O próprio Movimento, de fato, viveu tros, marcadamente políticos, como o
divergências entre seu proprietário e o permanentemente em crise, refletindo Posição e o Informação, do Rio Grande
editor, demitido então. Com o editor, as tensões inerentes ao processo de dis- do Sul;, o Mutirão, do Ceará; e o
porém, saiu boa parte da redação; tensão "gradual" do regime. Em 1977, Resistência, do Pará. Houve, também ,
fundou-se assim uma empresa de quase o jornal havia "rachado", e parte de jornais importantes publicados por coo-
trezentos jornalistas, de várias tendên- sua equipe formaria o Em Tempo; este, perativas de jornalistas, dos quais o
cias políticas, que se pautavam por um por sua vez, além de dar origem ao mais regular e conhecido foi o
programa mínimo de oposição ao Re- Amanhã, de vida curta, também contri- Coojornal, de Porto Alegre. Surgiram
gime Militar, destacando-se a luta pela buiria com a experiência de parte de jornais de bairro, como o Jornal da
independência econômica, liberdades sua equipe para a fundação do Jornal Vila, de São Paulo, formado por ex-
aus 2 ca __"
i Aa 'à | Emção |
NOTÍCIAS DE HOJE
InformativoDiário doSincicata dos Metlirgcosde São Peco
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M 2222 An Y ata Jia 207206 24000
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2
oeo ao
DIA DE PROTESTO NO ECONÓMICO fºº—mm |
29 ,24, 1eao e de 1965
Os sindicalistas frente
F a com Tlm—demi!
| o restaurante empode
Ninmuém aquenta os preços das refeições
ao pacto sqçlal
e
Juca Martins
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| NA G
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RD
"A revolução de março livrou o dir que apareçam fantasias que ofen- gla: FEBEAPÁ.
mundo da Terceira Guerra Mundial", dam as Forças Armadas"; o diretor de Compreende-se, portanto, que o hu-
afirmava um coronel do Exército brasi- Suprimento de Brasília restringia a mor tenha sido sempre uma arma con-
leiro, em maio de 1966. venda de vodca, "para combater o co- tra os governos militares. Logo depois
O nascimento do Regime Militar, munismo"; a polícia de Niterói apreen- do golpe de 1964, por exemplo, era pu-
que viria a promover um violento e eli- dia a encíclica Mater et Magistra como blicado o livro Hay Gobierno?, uma se-
tista processo de modernização da so- material subversivo; e agentes do De- leção dos trabalhos de três grandes hu-
ciedade brasileira, pareceu aos seus partamento de Ordem Política e Social moristas do Rio, Jaguar, Claudius e
contemporâneos uma vitória do atraso, (DOPS) paulista realizavam diligências Fortuna. Mas já antes do Regime Mili-
dos setores mais conservadores. E, no sentido de deter Sófocles, o autor da tar era tradicional a presença de humo-
como tal, não foi levado muito a sério. peça Electra, que estreara no Teatro ristas comentando a cena política brasi-
E como levar a sério um regime Municipal. leira na imprensa.
onde o general-comandante da Região Essas e tantas outras iniciativas dos As caricaturas acompanham os polí-
Militar de Curitiba mandava fechar agentes da nova ordem fizeram as deli- ticos brasileiros desde o Segundo Im-
uma pré-escola acusando as professo- cias dos leitores do jornalista Sérgio pério, mas foi no período republicano
ras de ensinar marxismo-leninismo às Porto (sob o pseudônimo de Stanislaw que as publicações dedicadas exclusi-
criancinhas; o secretário de Segurança Tunte Preta), que as reuniu no que cha- vamente ao humor se multiplicaram.
de Minas proibia mulheres de pernas mava de Festival de Besteiras que Assola Destacaram-se, a partir do início do sé-
de fora no carnaval de 1965, "para impe- o País, para o qual arrumou até uma si- culo, O Malho (1902), Kosmos (1904),
469
BR DFANBSS VB.GONGAAA:QO
S op 02,
Fon-Fon (1907) e Careta (1908),
que du- M
raram mais tempo, além de
muitas ou-
tras,
Nelas brilharam Raul Pedernei
ras, comunista, comentava o manifesto
que registrava os costumes com o qual Luis Carlos Prestes aderi-
cariocas e
combatia o fascismo; J. Carl ra ao comunismo, em 1930, dizendo
os, que
criou os tipos inesquecíveis que ele, Aporelly era muito mais
da Melin-
drosa e do Almofadinha e que, avançado que o líder tenentista, pois
com
suas charges, retratou a vida propunha uma jornada de trabalho de
política do
País; Calixto, talvez o melh zero hora, em contraposição à de oito
or dese-
nhista da época, cujas caricatu horas defendida por aquele.
ras pre-
cisas tanto incomodaram Pinh
eiro Ma- A irreverência no trato com as au-
chado e Hermes da Fonseca;
Nássara, toridades e seu espírito antimilitarista
que com seus desenhos de
aparente - que transparecia em piadas do tipo:
simplicidade acompanhou
pratica- "Como se chama o assassinato de
mente toda a vida política do País
sob uma criancinha? Infanticídio, E o as-
Getúlio; Belmonte, o criador
do Juca sassinato de uma porção de crianci-
Pato, famoso por suas charges cont
ra o nhas? Infantaria" - custaram ao Ba-
fascismo, que despertaram
a ira de tão várias vicissitudes, incluindo um
Iconographia
Goebbels, aponto deste o
denunciar perío do de um ano e meio de prisão e
emo agente anglo-americano
através o fech amento de seu jornal, em 1935.
da rádio de Berlim. Nas déca
das de 30 Enquanto pôde, manteve campa-
e 40, os políticos brasileiros teri
am no nha contra o integralismo, ironizando
seu encalço o humor ferino do
Barão As lições do Barã seu slogan "Deus, Pátria e Família",
de Itararé, o
Em meados da década de dizendo preferir outro: "Adeus, Pátria
60, o Os jornalistas que criaram O Pas. e Famíl
grande nome do humor brasilei ia."
ro já era quim sempre afirmaram que o patr
o de Millôr Fernandes. Desde o- Findo o Estado Novo, definido por
1945 es- no do jornal era o Barão de Itara
crevendo e desenhando na revi ré, ele como "o estado a que chegamos
sta O O autoconcedido título de barão ",
Cruzeiro, onde criou a seção Aporelly, pôde relançar seu jornal
Pif-Paf, era uma prova de modéstia do jorna- -
que fecharia definitivamente pouc
lista Aparício Torelli- o Aporelly o
Em 64, Millor criou a revi . depois - e, como registra o escri
sta Inicialmente, ele se nomeara Duq tor
ue Leandro Konder numa pequena e co-
Pif-Pof; reunindo grande de Itararé, pensando ser digno do
s artistas titu- movente biografia do Barão, toda
1o pelo seu desempenho numa das a
ba- cidade riá com informações assim:
página dupla semanal de hum
or, ele in- talhas da Revolução de 30, just "O
amen- resultado do exame de sangue do
fluenciou toda uma geração
de humo- te a de Itararé, que entrou na história ex-
chefe de polícia Felinto Múller
ristas. por não ter ocorrido, saiu
Em 1964, Millôr criou a revi
com três cruzes . . . suásticas."
sta Pif Aporelly lançara, em l926_, no Rio
Paf, reunindo os trabalhos de Nos primeiros anos da década de
Sérgio de Janeiro, o semanário A Manh
Porto, Claudius, Fortuna, Zira
a, 50, seus comentários sobre o País
ldo, Ja- com a epigrafe "Quem não chora tor-
Buar, entre outros. A publicaç
não naram-se cada vez mais céticos.
ão durou mama", tendo como redator-chefe O
apenas oito números e o últi o mundo podia ser redondo, mas estav
mo, publi- st. Vaz Antão Luís (Washington a
cado em 27 de agosto de 1964, ficando "cada vez mais chato".
advertia: Luís); segundo o Barão, "nosso com Sua
"Quem avisa amigo é . . . se o - última publicação, de 1955, trazia
governo panheiro que acumula as funções na
continuar deixando que circule de capa Jânio Quadros montado num
esta re- presidente da República".
vista, com toda sua irreverê burrico, em homenagem à "jumenta-
ncia e cri- Sem levar a sério a acusação de ser
tica, dentro em breve estaremo lidade da época".
s caindo
numa democracia." Ainda
não havia
sido criado o mecanismo da
censura de 1969, chega às bancas o sema
prévia, mas a revista foi
à falência
nário evidente paralelismo, Quando o
O Pasquim, que se tornaria a mais jornal
quando este último número foi
apreen-
im- surgiu, fazia principalmente críti
portante publicação de humor nos ca de
dido. 20 costumes, o que em si tinha um
anos do Regime Militar. con-
Com as charges ganhando um teúdo político frente a um regime
con- Propriedade de jornalistas (Tarso que
teúdo cada vez mais oposicio
nista, os
de se apresentava como moraliza
Castro, Jaguar, Sérgio Cabral, Pros dor e
humoristas começaram a perd
er, a par-
peri, guardião dos bons costumes.
Claudius), tinha em Ziraldo, Mill Mas a
tir de 1968, os espaços que aind ôr e evolução do País e os rumos toma
a deti- Henfil seus principais colaboradore dos
nham na grande imprensa. s, pela ditadura - o aguçamento
Seu grande trunfo foi ter chegad da re-
As limitações que sempre surg o no pressão, a criação da censura
iam ao momento em que era mais nece prévia
trabalho dos humoristas ness ssário, através de um decreto secreto de
es Órgãos Com sua linguagem irreverente, 1970
foi reforçando a idéia de que
era neces- O - geravam resistência. O humor
Pasquim galvanizou todo o sentimen brasi-
sária uma publicação que, send to leiro tornou-se, na expressão de Mill
o feita oposicionista e de descontentam ôr,
por eles, permitisse uma: maio ento "quase que exclusivamente polít
r liber- de estudantes, jornalistas e intelect ico",
dade de expressão, uais Justificava ele: "Nós não podi
em geral e, em menos de um ano, amos
Com a decretação do Ato Inst sua ficar nos alienando e fazendo cois
itucio- tiragem já atingia 220 mil exemplar as
nal no 5 (AI-5), em dezembro de es, que não fossem políticas, porque
1968, o número nunca alcançado pelos o im-
País começa a perder a graç jornais portante era frisar que havia uma
a, mas o da chamada imprensa alternativa. re-
humor era cada vez mais nece
ssário; e, pressão e tentar combatê-la,"
A evolução do jornal O Pasquim e
seis meses depois, no dia 26
de junho
do A censura governamental, ciente
humor brasileiro no período tem da
um força corrosiva do humor e da sátir
470 a,
BR DFANBSS VB.ONG;AAA. S404)3s4an cos, pad
"ª 3.3. BV Emi
ne ri, RK
tornava-se cada vez mais atenta a essas ruso e outros publicaram nove núme-
formas de expressão. A censura à re- ros da revista Balão, editada em São
vista Veja começou com uma charge de Paulo e voltada para o público universi-
Millôr onde ele denunciava a existên- tário, entre 1973 e 1975. Nesse ano, sur-
cia de tortura nas prisões políticas. gia o Bicho, liderado por Fortuna, que
Anos depois, só para se ter uma idéia, o sobreviveu por oito números. Em Mi-
jornal Movimento teria 2.200 charges e nas Gerais, o Humordaz foi abatido
caricaturas censuradas, nos três anos pela censura,.
que ficou sob censura, a partir de 1975. Angeli, Laerte, Jota e Glauco, que
No governo do general Médici, o hu- publicaram por determinado período
morbrasileiro teve como característica uma página de humor no jornal Folha
Agência O Globo
uma queda na importância relativa da de S. Paulo chamada Vira Lata, no inf
caricatura, que tanto marcara o humor cio da década de 80 ainda estavam fir-
político no País. Como explicava Zi- mes na idéia de lançar uma revista com
raldo, havia chegado o momento em esse título, mas não conseguiam encon-
que ninguém conhecia as caras dos ca- trar editor para ela.
ricaturáveis. Não havia vida política tal
Em 1981, foi lançada a revista
que criasse personagens e o público
Careta, aproveitando o nome da publi-
praticamente só conhecia o presidente, cação do início do século, que só sobre-
do qual ninguém podia fazer uma cari- viveu por oito meses. Ao final de 1984,
catura.
O Pasquim se mantinha com grandes
O Pasquim foi apreendido diversas dificuldades e, a rigor, não havia ne-
vezes e seus redatores sofreram vários nhum outro órgão dedicado ao humor,
processos. Mesmo perseguido, com embora o humor político houvesse
problemas econômicos crescentes e
conquistado seu espaço na imprensa
atravessando grandes períodos sem
brasileira e alguns desenhistas conse-
conseguir publicidade, o semanário
guissem mesmo publicar livros com
conseguiu manter-se, preservando um seus trabalhos.
Agência O Globo
| C :IPcHIcDL
?ª
ALTA
- LMA itª—t" A4
.A
"BRAHMA "
Daine
Algumas vertentes da propaganda no País. Em 1914, padre em reclame de bebida; nos anos 80, heróis infantis (Popeye e Brutus)
anunciam calças jeans (ao centro, 1982) e a sósia de Lady Dy é usada para vender calcinhas e sutiãs (à dir., 1981)
A propaganda e a crise
Os maiores
anunciantes do Brasil A propaganda brasileira também foiatingida pela crise econômica apartir
do final da década de 70. No período compreendido entre 1979 e
Entre as 20 empresas que 1984, ela sofreu quedas no montante de investimentos em quatro
mais investem em publicidade anos
encontramos nove multinacionais Evoluçãodo
empresa estatal 197% crescimento real do investimento em propaganda, em % 1197784)
1 - Souza Cruz 11 - Gessy Lever
2 - Pão de Açúcar 12 - Volkswagen
3 - Nestlé 13 - Caixa Econômica Federal 3.58
4 - Dorsay 14 - Banco Itaú
5 - Alpargatas 15 - Mappin
6 - Mesbla 16 - Fiat . 1a w
1983 1864
dam: "Seja infiel." O Dodge, tão bonito uma importante vertente da nossa com o luminoso do Conjunto Nacional
em seu novo modelo, explica a prefe- publicidade. na avenida Paulista: "O Cristo Reden-
rência: "Seduzido dentro do automó- Mas a propaganda acompanha o tor de São Paulo." No Dia das Mães, a
vel." A lógica é imbatível: "Toda mu- País. E sabemos que houve resistência. fábrica de perfumes Rastro passa o te-
lher tem pelo menos duas razões para E anúncios muito significativos marca- legrama: "Mamãe, eu te amo. Édipo."
usar Soutiens Vivien." E, já que fala- ram o período. Parao governista"Ame-o Ecos de samba já se ouvem: "Se a sua
mos nisso, a Sadia. a do peru, organiza ou deixe-o", houve o do Salão da mulher pedir desquite por causa do
a guerra: "Calma, há peito para todos!" Criança: "Ame-o e deixe-o ir." Ou "Os gravador Akai, conceda. Mulher a
Claro que 1964 interveio nesse feitio Subversivos", da agência de publici- gente encontra em toda parte."
brasileiro de propaganda. Houve dade Norton. Conquistamos a abertura Apesar dos 20 anos sofridos vividos
mesmo restrição, a se confundir com e recrudescemos. Kissinger e Reagan. pelo País, que a propaganda reproduziu
censura. E determinou uma auto- Delfim e Jânio na televisão. Em 1984, com suas distorções e enganações, no
censura institucionalizada. Desencora- comunicando seu novo endereço no final de 1984 ela começava a dar a volta
jando ou impedindo, os poderes ditato- Rio, a agência mostra o Cristo de bra- por cima.
riais sem dúvida castraram a criação, ços abertos e diz:; "Compramos uma
interrompendo o desenvolvimento de casa deste tamanho." E o banco repica, Ricardo Ramos
473
sr pranssa vs. L10412334 an 002, p 244
Um regime de castas
Sempre que os governos do Regime Civis da União. Esse estatuto, que data
Militar recorreram aos bancos e orga- de 1952, garante uma série de vanta-
nismos financeiros internacionais, seja gens inexistentes na CLT, como a li-
para obter empréstimos e financiamen- cença-prêmio, a licença para tratamen-
tos, seja para conseguir aval para rene- to de saúde e, o mais importante, a es-
gociar a dívida externa do País, uma tabilidade.
onda de deve ter per-
corrido os lares dos funcionários públi- Contratação de serviços leva à
cos. criação do bóia-fria urbano
Isso porque aquelas instituições sem-
pre consideraram uma condição sine A partir daí, alterou-se rapidamente
qua non para o bom funcionamento da o perfil da administração pública. Fo-
economia a existência de empresas ram criadas, em menos de dez anos,
públicas que pudessem ser avaliadas na 116 empresas públicas e muitos órgãos
sua eficácia e rentabilidade com os federais foram transformados em em-
mesmos parâmetros das empresas pri- presas públicas e sociedades de econo-
vadas. Na verdade, se dependesse ape- mia mista. No início da década de 80,
nas desses organismos internacionais, chegava a 600 o número de empresas
muitas das empresas públicas brasilei- públicas. E a centralização de poder e
ras teriam sido privatizadas. recursos no governo federal, que carac-
Compreende-se, assim, por que a re- terizou esse período, permitiu que ele
forma administrativa foi uma das pri- impusesse esse mesmo modelo aos Es-
meiras preocupações do governo Cas- tados e prefeituras, onde também proli-
tello Branco (1964-67) e porque seu feraram essas empresas.
principal teórico, o ex-ministro Hélio Os antigos funcionários dos órgãos
Beltrão, a considerava como "um dos que foram transformados em empresas
atos mais rigorosamente revolucioná- - como a Rede Ferroviária Federal, o
rios", ligando-a umbilicalmente aos su- Departamento de Correios e Telégra-
cessos econômicos obtidos no pe- fos, o IBGE, a Casa da Moeda -, para
ríodo do chamado "milagre" (1968-73). continuar nos seus empregos, tiveram
Em outubro de 1964, foi criada a Co- de optar pela CLT. Aqueles que se re-
missão Especial de Estudos da Refor- cusaram, para não perder as vantagens
ma Administrativa, que elaborou as do regime estatutário, deveriam ser re-
medidas que compuseram o Decreto- distribuídos pelo DASP (Departamen-
Lei no 200, de fevereiro de 1967. Como to Administrativo do Serviço Público) a
tantas outras decisões daquela época, o outros órgãos da administração direta.
decreto também contribuía para enfra- Mas, como a maioria deles exercia fun-
quecer o Congresso Nacional, que per- ções muito específicas (ferroviários e
deu a atribuição exclusiva de criar car- carteiros, por exemplo), foram "encos-
gos públicos e de fixar os vencimentos tados" e ficaram recebendo seus venci-
do funcionalismo. A administração fe- mentos líquidos sem trabalhar. Nessa
O funcionalismo lutava por melhores
deral foi dividida em administração di- situação, perderam chances de promo-
salários já antes de 1964 (acima,
reta, que engloba os organismos admi- ção, estacionando na carreira. Em
manifestação de funcionários federais em
nistrativos da Presidência da República 1977, cerca de 70 mil funcionários esta-
1960, RJ). A reforma administrativa do
e dos ministérios, e administração indi- vam nessa situação.
regime, considerada pelo ex-ministro
reta, composta pelas autarquias, em- Coerente com o objetivo de privati-
Hélio Beltrão (no alto, à dir.), um de
presas públicas e sociedades de econo- zar os serviços públicos, o Decreto-Lei seus principais teóricos, como "um dos
mia mista. As empresas públicas e as no 200, com a justificativa de "impedir atos mais rigorosamente revolucionários",
sociedades de economia mista foram o crescimento desmesurado da máqui- em lugar de melhora, trouxe significativa
autorizadas a funcionar em condições na administrativa", recomendava que a degeneração dessa situação. Entre
idênticas às do setor privado. Assim, administração, "sempre que possível", maio e junho de 1983, o funcionalismo
passaram a contratar seus funcionários recorresse à contratação de serviços da federal realizou greves por salários
pelo regime da Consolidação das Leis empresa privada. Foi principalmente (no alto, manifestação no Rio) que
do Trabalho (CLT) e não mais de acor- nos escalões inferiores do funcionalis- chegaram a mobilizar 200 mil
do com o Estatuto dos Funcionários mo que as consequências dessa reco- funcionários em 14 Estados
474,
b0 %emmâém-Háôâj an voe, ps
nal, a reforma administrativa criou uma
casta de privilegiados. O decreto tor-
nou possível a contratação de altos exe-
cutivos e técnicos pela CLT, sem con-
curso público e com remuneração mui-
to superior às que eram previstas nas
normas salariais válidas para os funcio-
nários públicos. Esses mesmos super-
funcionários formaram o contingente
dos beneficiados com a extensão das
mordomias, até 1964 privilégio exclusi-
vo do presidente da República.
No governo Médici (1969-74), a mor-
domia se estendeu a funcionários gra-
duados do segundo escalão e atingiu os
dirigentes dos órgãos da administração
indireta.
Agência O Globo
No topo da pirâmide,
Abril Press
aviª"?
O plano elevou a jornada de trabalho
de seis para oito horas para pratica-
cªkkkh ((-
Kã<f 4 mente todo o funcionalismo. A partir
“ªê de um estudo realizado no eixo Rio-
São Paulo, o DASP introduziu no servi-
mendação se fizeram sentir de maneira tando as obrigações trabalhistas e so- ço público as mesmas diferenças sala-
mais aguda. Os motoristas, contínuos, ciais com essa mão-de-obra, que ficava riais que existiam na iniciativa privada.
serventes, ascensoristas, porteiros, gar- vinculada às empresas locadoras. Dez Fez isso concedendo reajustes diferen-
cons, copeiros, vigilantes, faxineiros, anos depois de assinado o decreto-lei, ciados. Enquanto os assessores de nível
etc., que constituíam ampla maioria bavia cerca de três mil locadoras de superior e os ocupantes de cargos de
dos funcionários públicos, tinham uma pessoal no País, dispondo de dois mi- direção tiveram seus salários aumenta-
situação melhor trabalhando para o Es- lhões de pessoas e servindo também à dos em até 570%, cerca de 70% do fur
tado do que aqueles empregados pela iniciativa privada. Os empregados por cionalismo tiveram seus vencimentos
iniciativa privada, pois gozavam de es- essas firmas recebiam pelo seu trabalho reajustados entre 30% e 50%. Os fun-
tabilidade, assistência médica e, naque- geralmente a metade do que os órgãos cionários de nível superior que se en-
la época, salários melhores. públicos pagavam às firmas locadoras e contravam nos degraus mais altos da
Depois do decreto, aadministração formavam um contingente de bóias- hierarquia passaram a contar ainda
pública, através de convênios, passou a frias urbanos prestando serviço nas re- com uma gratificação mensal de 20%
contratar pequenas empresas privadas partições públicas. do salário, que não foi estendida aos
para a prestação desses serviços, evi- Do outro lado da pirâmide funcio- outros níveis.
475
ar pranBsaVe.RCAA RA/O44834 an cosp AII
Ao longo de todo o Regime Militar, gueiredo. 200 mil funcionários parados, em 14 Es-
a grande maioria dos funcionários Para enfrentar essa política de arro- tados. -
públicos teve seu salário reduzido. cho, os funcionários públicos federais O governo, desde que recorrera ao
Aqueles em regime de trabalho pela conseguiram pouco a pouco organizar- Fundo Monetário Internacional, no fi-
CLT, assim como os antigos estatutá- se, vencendo as dificuldades inerentes a nal de 1982, era pressionado a manter e
rios que optaram pela CLT, não têm di- uma categoria dispersa por todo o terri- aprofundar a política de arrocho com a
reito a greve e a sindicalização, que são tório nacional, que reúne diversos tipos justificativa de reduzir o déficit público,
vetadas ao funcionalismo público. Des- de profissionais - de médicos a faxinei- e recusou-se a negociar e ameaçou pu-
sa maneira, o arrocho salarial que o re- ros, de engenheiros a contínuos. Com- nir e demitir os grevistas, A greve esva-
gime aplicou a todos os assalariados foi pensando a proibição de formar sindi- ziou-se depois de um mês do seu início,
particularmente violento sobre o fun- catos, foram-se multiplicando as asso- No ano de 1984, um setor do funcio-
cionalismo. Em 1976, quando foi apli- ciações de funcionários, até que, em 26 nalismo público federal foi o protago-
cado o PCC, calculava-se que, para re- de março de 1983, realizou-se em nista da mais longa e abrangente greve
cuperar o poder de compra de 1964, os Brasília o Primeiro Encontro Nacional nacional ocorrida no País depois de
salários de todo o funcionalismo ti- dos Servidores Públicos Federais, que 1964. Ela envolveu 35 mil professores e
nham de ser reajustados em 120%. reuniu 300 dirigentes de entidades es- 60 mil funcionários de praticamente
E o arrocho Continuou mesmo quan- palhadas por 13 Estados, representan- todas as universidades federais, esten-
do, pressionado pelas greves que eclo- do 80% dos funcionários do País. dendo-se de 15 de maio até 7 de agosto.
diram& partir de1978 e se espalharam Apesar de as reivindicações - au-
pelo País, o regime instaurou a política Em 84, três meses de greve
mentos semestrais com base em 100%
salarial de reajustes semestrais para os nas universidades federais do INPC, reposição salarial de 64,8%,
trabalhadores das empresas privadas. piso salarial de três salários mínimos
O funcionalismo nunca teve uma As principais reivindicações, além de para os servidores e mais verbas para
política salarial favorável. Seus reajus- reajuste de 70% a partir de maio daque- custear as atividades acadêmicas - vi-
tes, mesmo os dos funcionários regidos le ano, em vez dos 30% em junho pro- sarem apenas colocar aqueles funcio-
pela CLT, ficavam ao arbítrio do Poder postos pelo governo, eram o reajuste nários em situação equivalente à de
Executivo. Recebendo reajustes sem- semestral, a concessão do 13o salário muitos setores da classe operária, o gô-
pre abaixo do Índice Nacional de Pre- para os estatutários, a definição de um verno manteve sua tradicional intransi-
ços ao Consumidor (INPC), utilizado piso salarial e o livre direito à sindicali- gência e venceu a greve pelo cansaço e
como base para as demais categorias zação. O encontro programou também com ameaças.
de trabalhadores, o funcionalismo viu para o dia 13 de maio um dia nacional Ao seu final, o Regime Militar, que
seus salários serem corroidos pela infla- de protesto, quando ocorreram parali- pretendeu modernizar a máquina do
ção em alta. sações em Santa Catarina, Rio Grande Estado, entregava ao País uma adminis-
Adotando-se o índice 100 para o sa- do Norte, Paraíba e Bahia. Nos outros tração pública emperrada, e tão buro-
lário real do funcionalismo público fe- Estados, os funcionários realizaram as- cratizada que o último governo desse
deral em março de 1979, constata-se sembléias e, com dificuldade para unifi- regime criaria um Ministério da Desbu-
que, em maio de 1984, ele tinha chega- car o movimento, foram paralisando rocratização, chefiado pelo mesmo Hé-
do ao índice 34,6. Ou seja, seu poder de suas atividades a partir de 18 de maio. lio Beltrão que iniciara a reforma admi-
compra tinha sido reduzido a pratica- No dia 21 de junho, o Comando Nacio- nistrativa e que saiu do governo sem
mente um terço durante o governo Fi- nal de Paralisação calculava que havia conseguir cumprir essa nova missão.
lugo Koyama/Abril Press
DIAS EM GREVE
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Manoel Novaes/Abril Press
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Hicardo Malta/F4
era alguém da classe média ou da alta
Agência JB
sociedade, como no caso da morte de
EddaDeddinilOmetto Gianetti. Com
apenas 19 anos - filha adotiva de Wal- - eum,
dir Antônio Gianetti, dono da maior si- 1982, mostrava que no Rio de Janeiro Paulo, quando o deputado estadual
derúrgica particular do País, de usinas existiam cerca de cem mil viciados em
Sérgio Santos, do PT, foi agredido e de-
de açúcar e álcool e empresas de ôni- drogas e 24 mil com problemas psiquiá-
tido por policiais que disseram ter en-
bus -, Edda morreu no dia 4 de janeiro tricos causados pelo tóxico.
contrado maconha em seu carro. O de-
de 1984, vítima de uma overdose de co- Mas, além da discussão das razões putado afirmava que a droga havia sido
caina, na praia de Juquei, em São Se- para o uso de drogas, existia
outro pro- ali colocada pelos próprios policiais
bastião, SP, blema: o tráfico ilegal. No Brasil, os go- que o revistaram e relacionava o episó-
Casos como esse, que vinham ocor- vernos militares insistiram
em remédios dio aos acontecimentos de junho de
rendo há anos, provocaram o debate ditatoriais e repressivos para o controle
1980, na mesma Freguesia do Ó,
sobre a legalização e o uso de certos tó- do problema. Promoveram
legislação e quando policiais e agentes de segu-
xicos. A imprensa, as lideranças políti- criaram órgãos contra a droga,
mas rança de Paulo Maluf, então no go-
cas, os meios intelectuais, os estudiosos nada adiantou. Os militares
usaram verno do Estado, agrediram manifes-
e autoridades do País começaram a dis- campanhas ideológicas tentando
vincu- tantes que vaiavam o governador. Na-
cutir e dar importância ao problema do lar a esquerda à droga, a exemplo
dos quele incidente, Sérgio Santos foi a
uso de drogas entre a juventude. A ma- EUA, que, internacionalmente,
promo- principal testemunha de acusação con-
conha, de longe a mais tolerada das veram uma campanha no sentido
de as- tra os policiais envolvidos.
drogas, foi alvo principal dessas discus- sociar as drogas e seu tráfico
com Mesmo que se constatasse que seto-
sões durante algum período. países socialistas, grupos de esquerda, res da esquerda - principalmente a ju-
Em um ponto, existia mais ou menos movimentos populares e democráticos.
ventude ligada ao movimento estudan-
um senso comum: o problema era ge- Segundo essas campanhas, países como
til - usavam drogas, ficava claro que o
rado pela ordem social desequilibrada. Cuba e Nicarágua agiriam
conjunta- problema de tráfico e os principais res-
Um desenvolvimento desigual de valo- mente na América Latina,
visando de- ponsáveis pelo uso abundante de tóxi-
res materiais e espirituais da sociedade, sestabilizar os governos
da região. cos estavam vinculados a esquemas po-
um desencontro crescente entre o Quando do assassinato
do ministro da liciais, que não eram molestados por-
imenso poder material das nações e o Justiça da Colômbia, em maio de 1984,
que prestavam "serviços" insubstitui-
baixo nível de desenvolvimento cultu- por traficantes de cocaina,
e na poste- veis a importantes setores das elites do
ral e filosófico até de suas elites econô- rior caçada que se seguiu
ao atentado, País.
micas e políticas seriam estímulos ao houve declarações de porta-vozes
ame- Há também indicações de que o trá-
escapismo e ao uso de drogas, não só ricanos de que se naviam encontrado fico era mantido a salvo das costumei-
dos jovens sem compromisso profissio- "nítidas evidências" da
associação en- ras blitz e repressivas porque ele ima
nal algum como de executivos. tre traficantes, o movimento guerri- até os consumidores da chamada alta
Do ponto de vista dos males que lheiro M-19 e Cuba. sociedade, Um caso típico é o da morte
causavam à saúde física e mental dos No Brasil, um exemplo de associa- de Angela Diniz, assassinada em de-
consumidores, os efeitos das drogas ção do uso de drogas com políticos
de zembro de 1976, que ameaçava denun-
eram assustadores. Uma pesquisa da esquerda ocorreu em novembro.
de ciar nomes da alta sociedade do País
Fundação Oswaldo Cruz, feita em 1984, na Freguesia do Ó, bairro
de São envolvidos com tóxicos. Houve pres-
478
er oranass 404403 an 002, paRa
Espoliação mineral
Em março de 1964, uma alta autori- mericano de Desensolvimento (BID) a mico dos países produtores".
dade norte-americana, de nome Char- estenderem seus créditos às compa- Vinte anos depois, nenhuma expres-
les Wright, que havia sido chefe da Di- nhias de mineração americanas nas siva melhoria dos padrões sociais e eco-
visão de Mineração do U.S. Bureau of quais participem investidores e bancos nômicos dos países produtores se verifi-
Mines (o Departamento Nacional da locais [isto é, dos países onde estiverem cou, muito embora o plano proposto
Produção Mineral - DNPM dos Esta- localizadas), não só em mineração pro- por Wright tivesse sido colocado em
dos Unidos), escreveu: "A principal priamente dita, como em projetos me- prática. Pelo menos no que toca ao
preocupação atual da nação americana talúrgicos. Com essas medidas, subirá a Brasil: durante o governo Castello
é suprir suas futuras necessidades mine- produção para exportação de minerais Branco (1964-67), foi elaborado e posto
rais para manter seu poderio militar e de que carecem os Estados Unidos." em execução um Plano Decenal de
industrial." Assim, recomendava: "O Mais adiante, propunha a "execução Mineração que, sem dúvida, contribuiu
governo deve se esforçar por todos os de um plano decenal dentro das Améri- para um extraordinário aumento do co-
meios, através de benefícios fiscais e ta- cas, de acordo com a Aliança para o nhecimento sobre a riqueza mineral do
rifários, para encorajar companhias Progresso, estabelecendo reformula- País e, consequentemente, permitiu a
americanas mineradoras com interes- ções locais que prestigiem o desenvol- implantação de grandes projetos no se-
ses no Exterior a expandirem suas opera- vimento de recursos minerais dentro de tor, prioritariamnte voltados para a ex-
ções e projetos de desenvolvimento, in- cada país, pela livre iniciativa, aumen- portação.
duzindo, também, o Banco Mundial tando as exportações, o que, é claro, Com as descobertas resultantes do
(BIRD), o Eximbank e o Banco Intera- contribuirá para o bem-estar econô- Plano Decenal, os investimentos es-
NNO
N
N / p
N 2a]
4
N //
481
BR 247123 Jon COA ,p 225
Arquivo Nacional
7
Arquivo Nacional
trangeiros em mineração experimenta-
de minério de ferro, derúrgica. Entre outras alegações, di-
ram vigoroso aumento a partir de 1974, A entrada do Estado na mineração
Desde o final do século 19 até 1973, es- ziam que retrações no mercado finan-
foi consequência de lutas que começa-
ses investimentos somavam 1,7 bilhão ceiro europeu atrasavam o projeto. Na
Tam nos anos 20, contra trustes que ten-
de dólares, Já entre 1974 e 1978, foram década de 20, cresce o clamor naciona-
tavam controlar as jazidas do Quadrilá- lista contra as concessões a Faquhar,
investidos no setor 2,4 bilhões de dóla- tero Ferrifero, na parte central de Mi-
res. ao qual, porém, não faltava apoio in-
nas Gerais. Até essa época, as únicas terno dos eternos agentes do capital es-
Em compensação, segundo um le- atividades minerais importantes no País
vantamento feito pela economista He- trangeiro, além das pressões financeiras
eram a exploração dos últimos veios de
lena M.M, Lastres, no mesmo quadriê- e diplomáticas do governo inglês, A
Ouro e gemas existentes em Minas Ge- luta contra a Itabira Iron foi a primeira
nio, as multinacionais expatriaram, a ti- rais, em que se destacava a St. John
tulo de remessa de lucros e pagamento campanha nacional em defesa dos re-
d'El Rey Mining Company Ltd., que, cursos naturais de nossa história,
de tecnologia, exatamente US$ 1,7 bi- desde 1831, tirava ouro da velha mina
Ihão; ou seja, o mesmo que aqui aplica- Faquhar ficou "sentado em cima"
de Morro Velho. é das jazidas de Itabira até 1939, quando
ram antes de 1974, Como, entre 1974 e
1978, o déficit comercial acumulado do Getúlio Vargas declarou caducas as
Um inglês consegue informações concessões. Em 1940, Vargas, aprovei-
setor mineral foi de US$ 6,6 bilhões
(exclusive petróleo e gás), verifica-se e compra as jazidas de Itabira tando o interesse dos Estados Uniddos
que, nesses anos de acelerado aumento em alinhar o Brasil contra o Eixo, con-
A expansão da indústria siderúrgica segue um financiamento do Eximbank
nas atividades minerais, o País perdeu européia, no início do século 20, pro- para a usina siderúrgica de Volta Re-
US$ 5,9 bilhões, voca a busca de jazidas de ferro em
E verdade que a política mineral dos donda. Em 1942, ele assina o Acordo
todo o mundo. O governo brasileiro de Washington, que, entre outros pon-
governos pós-64 logrou reduzir impor- cria um Serviço Geológico, que logo
tações e aumentar exportações. Como tos, estabelecia a obrigação de o Brasil
inicia pesquisas na região de Itabira. suprir os Aliados com minério de ferro
consequência do Plano Decenal, o País Um agente inglês, Muley Cotto, conse-
tornou-se auto-suficiente em recursos em troca de recursos para a implanta-
gue informações sobre os resultados ção da Companhia Vale do Rio Doce
de cuja existência mal se suspeitava até desses estudos, compra, por uma baga-
1964: bauxita, cobre, fosfatos, potássio, (CVRD), sucessora da Itabira Iron,
tela, extensas regiões de terra em lta- Nesses acordos, porém, o Eximbank
estanho, etc. Entretanto, parte dessa ri- bira (na época, o proprietário do solo
queza foi colocada sob controle de gru- ganha o direito de indicar dois dos
era também dono do subsolo) e, em cinco diretores da companhia.
pos estrangeiros, seja diretamente 1909, organiza o Brazilian Hematite
(posse de jazidas pelas múltis), seja indi- Além de criar a Vale (em junho de
Syndicate, para explorar o minério. O 1942), o primeiro governo Vargas
retamente (através de testas-de-ferro e problema surgiu na hora de obter con-
das empresas estatais que se sujeitaram (1930-45) ainda faria importantes modi-
cessão para construir a ferrovia que li- ficações na legislação mineral brasi-
a acordos com grupos estrangeiros lesi- garia Itabira ao mar: o governo mineiro
vos aos interesses nacionais, leira. A Constituição democrática de
conseguiu apoio do governo federal 1934 separou as propriedades do solo e
Na primeira metade dos anos 80, as para a idéia de, em troca da concessão,
multinacionais controlavam cerca de subsolo e estabeleceu que apenas cida-
obter investimento inglês para a im- dãos brasileiros ou empresas "organiza-
42%, do produto mineral brasileiro, se- plantação de uma siderúrgica em Mi-
gundo um levantamento feito pelo eco- das" no País poderiam explorar mi-
nas. Acordo feito, acordo descum- nérios. A Constituição ditatorial de
nomista Francisco Chaves Fernandes, prido, Cotto e seu sucessor, o aventu-
As empresas privadas nacionais deti- 1937 faria uma sutil, porém impor-
reiro Percival Faquhar, que organizou tante, modificação nesse princípio: a
nham outros 40%, sobretudo porque a Itabira Iron e herdou os direitos do
predominavam nos não-metálicos e no mineração poderia ser feita apenas por
Syndicate em 1911, esforçaram-se para empresa genuinamente nacional. (A
carvão. As estatais, ao contrário do que obter o monopólio sobre o transporte
parecia, ficavam com menos de 1,8%. Carta de 1946 restabeleceria o critério
de qualquer minério através da Estrada da Constituição de 1934, que permitia a
Na verdade, a presença do Estado só de Ferro Vitória a Minas e nunca cum-
era mesmo importante na exportação presença disfarçada do capital estran-
priram as cláusulas de construção da si-
geiro na mineração.)
482
ar VoNCA SOA J 23 p226
Agência O Globo
Agência O Globo
Agência O Glo
Terminada a guerra, o futuro da Vale Hanna Mining, em meados dos anos Em 42, o Brasil obtém recursos para
ficou indefinido. Além de perder seu 50, Assessorada pela "famosa" Consul- explorar o minério de Itabira, MG (na
mercado cativo, a empresa sofria pres- tec, empresa de consultoria de Roberto pág. ao lado, à esq., o ministro Oswaldo
sões do Eximbank, que só concordava Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões, Aranha e o chanceler inglês Noel Charles
em liberar novos financiamentos para a Hanna logra confirmar suas conces- assinam o acordo que daria origem à
sua expansão se pudesse aumentar sua sões durante o governo Kubitschek CVRD, 2/6/42; à dir., obras da Vale,
ingerência na diretoria. Nova batalha. (1956-61) e dá início a um projeto de 13/10/43). Nos anos 50, a St. John d'El
Os ministros da Fazenda que se Suce- mineração com apoio do Eximbank. Rey (acima, à esq., a entrada da mina de
diam no governo Dutra apoiavam as Logo começa a sofrer violenta oposi- Morro Velho, explorada no passado pela
exigências do banco. O presidente da ção no Congresso, alimentada pelo go- companhia), dona das jazidas de Aguas
companhia, Demerval Pimenta, trava verno de José Francisco Bias Fortes Claras, MG, é vendida à Hanna Mining.
dura luta para tirar os americanos da em Minas Gerais (que desejava recupe- Protestos levam Jânio a cassar essa
diretoria, o que finalmente consegue rar as jazidas de Aguas Claras) e pelos concessão. Em 64, Azevedo Antunes (ao
em 1950. Assim, 40 anos depois de te- dirigentes da Vale (que ainda lutavam centro) cria a mineradora Jangada, tendo
rem sido "compradas" por Coito, as para firmar a estatal no mercado ex- como sócio Eliezer Batista ( à dir.), que
minas de Itabira eram definitivamente terno). É um novo caso Itabira Iron, seria depois presidente da CVRD.
nacionalizadas. mais emocionante porque se segue à Castello Branco dá a concessão de Aguas
Outra sorte tiveram as jazidas de campanha "O petróleo é nosso". Du- Claras à Jangada; esta tem o nome
manganês da serra do Navio, no rante o governo Jânio Quadros, as con- mudado para MBR e a Hanna adquire
Amapá, e de minério de ferro de A- cessões são cassadas, João Goulart 49% do capital da nova empresa. Tudo
guas Claras, em Minas Gerais, Des- confirma a cassação. A disputa chega à fica como antes
cobertas no início da déc.da de 40, as Justiça e vai subindo de instância em
jazidas de manganês foram transforma- instância até que, com o golpe de 1964,
das em "reserva nacional" em 1946 e aterrissa na mesa de Castello Branco, tórios de venda da Vale, mas lá conti-
logo postas em licitação pelo governo que, dois dias antes de deixar o governo, nuaria prestando serviços à MBR, até
Dutra, Concorrendo contra as podero- devolve à Hanna as concessões. voltar à presidência da Vale, em 1979,
sas U.S. Steel e Hanna Mining, ganhou Só que não diretamente. O presti- no governo do general Figueiredo.
a pequena empresa nacional Icomi, de moso Antunes havia criado a Minera- Até o início dos anos 80, muita coisa
Augusto Trajano de Azevedo Antunes. ções Brasileiras Reunidas (MBR), da mudou no setor mineral brasileiro, O
Depois de obter do governo todas as qual a Hanna adquiriu 49% do capital. Plano Decenal foi cumprido, demons-
concessões possíveis, Antunes, me- Detalhe curioso: em julho de 1964, An- trando que o subsolo do País é muito
diante artifícios jurídicos, entregou 49% tunes criou uma pequena empresa de mais rico do que cantam os hinos ufa-
da empresa à Bethlehem Steel, que vi- mineração denominada Jangada Indús- nistas oficiais, O general Médici criou a
nha financiando suas atividades no tria e Comércio. Um de seus sócios, e Companhia de Pesquisas de Recursos
Amapá, primeiro presidente da Jangada, foi um Minerais (CPRM). Através dela, o Es-
Desde então, transformado no mais ex-ministro das Minas e Energia de tado gastava dinheiro nas pesquisas de
famoso e bem-sucedido testa-de-ferro João Goulart e presidente da Vale do novas jazidas (quando não se acha
de interesses estrangeiros no Brasil, An- Rio Doce até abril de 1964, Eliezer Ba- nada, o dinheiro é perdido) e, depois,
tunes prestar-lhes-ia um novo serviço tista. Demitido pelos golpistas, Batista vendia o que achasse, a preço de custo,
no famoso "caso Hanna". conseguiu emprego imediato junto a para algum empresário supostamente
Nos anos 20, a já quase centenária um dos maiores conspiradores contra nacional. Foi assim que Lynaldo
St. John d'El Rey adquiriu as terras Goulart. Um ano depois, em agosto de Uchôa de Medeiros, representando os
onde estavam as jazidas de ferro de 1965, a Jangada tem o nome mudado interesses do cartel internacional do
Águas Claras, As mudanças constitu- pala MBR, e Batista continua sendo potássio, adquiriu as imensas jazidas de
cionais e legais operadas na década de seu presidente, cargo- do qual só se sal-gema de Carmópolis, em Sergipe,
40 provocaram conflitos políticos e afestou em agosto de 1967, depois de que a CPRM descobrira, e "sentou em
jurídicos entre a empresa inglesa e o resolvido o problema da Hanna. Vai, cima" delas por dez anos. Só saiu
governo, até que ela foi vendida à então, para a Europa, chefiar os escri- quando o seu grupo Lume, envolvido
483
BR 23 Jon CO 2, p 224
assos/Abril Press
Empresárial Japonesa, estudos para o
aproveitamento econômico da região
que seria percorrida pela Estrada de
Ferro Carajás-São Luis.
485
/
ar pranasa vgana22
0 72 3342002p
2a
Julio Bernardes/F4
(prometera 830).
O II Congresso da Mulher Paulista,
em 1980 - ano em que houve ainda o I
Congresso da Mulher Fluminense -,
reuniu quatro mil mulheres e foi orga-
nizado por 54 entidades - sindicatos,
associações de bairro, UNE, grupos fe-
ministas - e ficou famoso como palco
de brigas de tendências políticas, em
relação ao rumo do movimento de mu-
lheres.
A principal divergência do congresso
foi quanto ao eixo em torno do qual se
organizariam as mulheres. De um lado,
uma corrente defendia que o movimento
deveria organizar-se em função, princi-
palmente, das reivindicações mais ge-
rais da sociedade e, secundariamente,
em torno dos problemas específicos das
mulheres, como creches, violência se-
xual, etc. De outro lado, grupos de mu-
lheres defendiam a prioridade inversa,
com diversas nuanças entreeles, A pri-
Banco de Dados/FSP
487
ar pranaSEVBISGNOAMALASÁÇOA! A 3.23 Ja00a , p34
Nair Benedicto/F4
putada federal (PMDB-PE) -, os parti-
dos incluem em sua propaganda as mu-
lheres como tema importante,
á, a 4
Os governos de oposição eleitos em
São Paulo e Minas Gerais criam, em
Em 1981, forma-se em Recife o SOS-Corpo, voltado para questões de saúde 1983, Conselhos da Condição Femi-
e
sexualidade. Acima, participação do grupo no Encontro de Saúde de nina, Nesse mesmo ano, o Ministério da
Itapecerica,
SP, em 1984 Saúde anuncia o Programa de Assistên-
cia Integral à Saúde da Mulher em que,
num convento em Valinhos (SP), Chamada história silenciosa das mu- além de assumir a reivindicação femi-
onde debatem contradições surgidas lheres. Formam-se grupos que lidam nina de acesso à contracepção na rede
entre as próprias feministas, como a com saúde e sexualidade feminina - pública, chama os grupos de mulheres
inserção dos grupos homossexuais no SOS-Corpo, em Recife; Sexualidade e para participar de sua implantação,
movimento. E se decide pela criação Política, em São Paulo. Em 1981, ainda, Eleito presidente, Tancredo Neves
do SOS-Violência, um centro que pas- forma-se a União de Mulheres em São anunciou um Conselho Nacional da
sou a receber denúncias de agressões Paulo e no Ceará, que se propõe orga- Condição Feminina em seu governo,
contra as mulheres, tentando apoiá-las nizar as mulheres nos bairros da perife- ao mesmo tempo em que muitos dos
com atendimento psicológico e juri- ria das grandes cidades. Em 1982 grupos do movimento de mulheres -
dico, criando grupos de reflexão e de-
realiza-se em São Paulo o Tribunal cerca de 200 formalizados em todos
nunciando a impunidade dos agresso-
Bertha Lutz, denunciando a discri- os Estados - se preparavam para partici-
res.
minação contra as trabalhadoras, par do Fórum das Organizações Não-
A linha divisória expressa no II Con- Organizam-se coletivos de negras, de Governamentais, a se realizar em Nai-
gresso da Mulher Paulista aprofundou- homossexuais, de mulheres que defen- tóbi em julho de 1985, dias antes da
se. A reflexão sobre a especificidade da dem o aleitamento materno, que fazem Conferência oficial da ONU que ava-
opressão da mulher foi cada vez mais filmes, vídeos, audiovisuais. O merca- liaria o resultado do Decênio da Mu-
reforçada, inclusive pela volta de mui- do editorial sobre a questão da mulher lher, instituído na Conferência do Mé-
tas anistiadas, que trouxeram em sua se amplia, publicando teses, pesquisas xico, em 1975.
bagagem a experiência de um amplo ou ficção. Os programas de televisão e Se, por volta de 1975 o feminismo
movimento feminista, sobretudo na rádio se renovam, intercalando qua- era tratado pela universidade e pelos
França e na Itália, dros de decoração e culinária com se- meios de comunicação como ideologia
Em 1981, o III Congresso da Mulher xualidade e direitos da mulher. importada, nos anos 80 ele é reconhe-
Paulista - realizado na PUC-SP, com a
cido como expressão social interna da
presença de 300 delegadas represen- Direito ao prazer e diretas-já,
sociedade brasileira,
tando seis mil mulheres -, o II Con- reivindicações dos anos 80 Diversamente, no entanto, de outros
gresso da Mulher Fluminense e os con-
países, no Brasil, as mulheres não fize-
gressos ou encontros que se realizam A questão da mulher ganha espaço ram conquistas legais e as próprias polí-
em diversas capitais são todos dividi- social e institucional, revelando mu- ticas públicas implementadas após a am-
dos. Em São Paulo ocorrem dois con- danças na sociedade brasileira. As ati- pla mobilização das mulheres - como o
gressos simultaneamente. De um deles, vidades tradicionais nas organizações caso das creches em São Paulo - não
o realizado no ginásio do Pacaembu, populares de mulheres convivem, nos responderam satisfatoriamente às rei-
saía a resolução de criar a Federação anos 80, com discussões sobre o ma- vindicações.
de Mulheres, nos moldes da antiga fe- chismo na família, a sexualidade femi- Muita mobilização, algum espaço so-
deração da década de 50, nina ou o direito ao aborto. Alternam- cial e poucas conquistas institucionais
A partir de 1981, com a reformula- se manifestações de rua nos grandes eram algumas das características do
ção partidária, deixam de ser realizados centros, reivindicando um basta à polí- movimento de mulheres no Brasil em
os congressos. Surgem no período o tica econômica do governo e direito ao 1984,
jornal Mulherio (São Paulo), vinculado prazer, diretas-já ou punição para as- Em 1984, as marchadeiras retiraram
à Fundação Carlos Chagas, como vei- sassinos de mulheres, seu apoio ao Regime Militar. E a única,
culo dos grupos de mulheres e também Se, por um lado, as manifestações senadora, Eunice Michiles, do PDS,
das pesquisas sobre a mulher que se multiplicaram-se, por outro, nenhuma aderiu à Frente Liberal, apoiando Tan-
multiplicam em várias universidades, É delas alcançou destaque pela grande credo Neves. O regime perdeu a "ala
fundado o Centro Informação Mulher participação popular - com exceção suave" de sua sustentação,
(CIM), que se propõe a documentar a da ida de quatro mil mulheres a Brasília Ethel Leon
488
BROFANBSSVOIGNOAMSÁOS1 2 3 1 an 000,
p234
A proclamação da Independência
foi liderada por dom Pedro I, rodeado
da mesma corte que o apoiava como
representante da metrópole; foi
apoiada pela esquadra inglesa, o que
nos custou assumir uma dívida de mais
de 3 milhões de libras esterlinas, em
parte contraída por Portugal para -
ironia - combater a independência do
Brasil e em parte para pagar indeniza-
ção pelos "direitos" da Coroa porty-
guesa, dívida gostosamente aceita pelo
príncipe português . ..
A libertação dos escravos não lhes
deu o direito a um pedaço da terra que
desbravaram com seu sangue, nem se-
quer o direito ao trabalho remunerado,
permitindo que eles fossem simples-
mente expulsos das fazendas que cons-
truiram.
A proclamação da República foi
mais um episódio com pouquíssima
participação popular, realizada por
uma fração da própria elite dominante.
489
pr J 23 J pa3s
capitães-gerais podiam ceder faixas de 500 acres (202 hectares), vendidos aos
terras a quem se dispusesse a cultivá- colonizadores que procuravam terra.
-las -, pelo período 1822-50 - em que Essa reforma agrária não foi apenas
não houve legislação específica sobre a A legislação drástica, mas permanente; as 13 colô-
propriedade rural -, até a Lei Verguei- nias renunciaram, em favor do Con-
ro, de 1850 - que dispunha que as ter- gresso Continental, a todos os direitos
ras públicas só poderiam ser vendidas americana
às terras a oeste de suas divisas; desta
em hasta pública -, apresentou sempre maneira, o governo americano ficou
a tendência de impedir a posse da ter- proprietário da totalidade das terras em
ra por pequenos lavradores e a aquisi- que se daria, posteriormente, a expan-
ção da propriedade pelo esforço e traba- ' A legislação que regula a proprie- são do país.
lho. A situação na década de 1980 persis- dade da terra nos Estados Unidos é, Essa expansão deu-se sempre através
tia: pequenos proprietários eram cons- ao contrário da brasileira, bastante da ocupação por grande número de
tantemente esbulhados em seus direitos, precisa desde o século 18. Já em 1785 pioneiros, cada um recebendo pequeno
constituindo o registro da propriedade se estabelecia um sistema de levanta- lote. Logo no início da caminhada para
em cartório verdadeira piada. Essa in- mentos (Survay System): meridianos e o Oeste, os lotes eram de no mínimo
segurança sobre a propriedade foi cui- paralelos, distantes seis milhas entre 640 acres (259 ha); esse limite foi dimi-
dadosamente preservada, apesar dos si, determinavam uma fownship, que nuindo rapidamente, e em pouco
levhtamentos* aerofotogramétricos era dividida em 36 "seções" de uma tempo os lotes eram de no máximo 160
existentes no País, do conhecimento da milha por uma milha, numeradas a acres (65 ha).
tecnologia de cadastros, que poderia partir do canto superior esquerdo até Não havia possibilidade de especula-
ser aplicada. o canto inferior direito. Cada seção ção com terras, pois elas existiam à
media 640 acres (250 ha) e era, por vontade, de graça ou quase de graça.
Lincoln, um homem da fronteira Além disso, não havia possibilidade de
sua vez, dividida em "quartos", de
agrícola, lidera abolicionistas 160 acres. Esse sistema permitia a formação de grandes latifúndios, pois
qualquer pessoa, medianamente ins- como todos podiam obter lotes de 65
Comparando isso com a situação nos truída, localizar com precisão, por ha, suficientes para viver, ninguém iria
Estados Unidos, torna-se chocante o exemplo, uma propriedade repre- se sujeitar a trabalhar para outros, por
contraste, A independência dos EUA sentada pela "metade norte do quarto salários de fome.
foi conquistada na Revolução Ameri- sudoeste da Seção 20, ©"Township'
cana, que rompeu completamente com 13N, faixa 6W do 5o meridiano princi- EUA impedem a concentração
os ingleses e seus aliados. A liderança pal". e o Brasil consagra o latifúndio
da revolução foi assumida por comer- Este sistema funcionou muito bem
ciantes, advogados e plantadores, cujos nos Estados Unidos, um país com A Lei de Terras americana, de 1862,
interesses tanto econômicos como enormes planícies, de terras férteis e consagrou definitivamente esse limite
ideológicos conflitavam com os da In- razoavelmente servidas de água. As máximo de 160 acres. É interessante
glaterra, A força diretora da revolução, divisas dos Estados americanos, em notar que, no Brasil, a Lei Vergueiro,
porém, era fornecida por trabalhadores que predominam as linhas retas, são 12 anos antes, consagrava a grande pro-
urbanos, mecânicos, pequenos lavrado- consequência desse sistema. Não se- priedade - para os ricos e poderosos -,
res e lenhadores que empurraram os li- ria ele aplicável em outros países, em enquanto a lei americana consagrava a
deres da classe média para posições ex- que as condições topográficas não propriedade familiar, impedindo a con-
tremadas. Boa parte dos autonomistas fossem tão favoráveis, como é o caso centração da posse da terra. Aqui está
era composta de homens da fronteira do Brasil. a causa principal do desenvolvimento e
agricola, descendentes de imigrantes Mas no Brasil o essencial é que poderio econômico de um país, e da
que tinham ido para a América em existam, em cada município, um ou triste situação do outro. Sem desenvol-
busca de terra e de liberdade. A liberta- mais pontos rigorosamente determi- vimento agrícola não existe desenvolvi-
ção dos escravos resolveu-se com a nados, aos quais se refeririam os pon- mento industrial, e sem liberdade de
Guerra de Secessão, que envolveu os tos de cada imóvel, Tais pontos muni- acesso à terra para o pequeno lavrador
Estados do Norte - abolicionistas - cipais poderiam ser assinalados por não há desenvolvimento agrícola,
contra os do Sul - escravocratas. Abra- marcos, pois se estes fossem desloca- Nos anos 80, um terço das terras dos
ham Lincoln, também originário da dos ou destruídos poderiam ser facil- Estados Unidos pertenciam ao governo
fronteira agricola, liderava os abolicio- mente localizados novamente por mé- federal; as terras agrícolas estavam dis-
nistas vitoriosos, todos astronômicos, tribuidas em praticamente sua totali-
Antes disso, o Congresso Continen- O que acontece, atualmente, no dade, embora houvesse alguma tendên-
tal (que a partir de 1774 reuniria repre- Brasil, é que os documentos registra- cia à especulação. A grande maioria
sentantes das 13 colônias que lutariam dos em cartório não têm nenhuma das terras ainda nas mãos do governo
pela independência, agindo como ór- amarração com pontos de latitude e caracterizavam-se por serem muito aci-
gão central dos rebeldes) decidiria que longitude conhecidos, referindo-se a dentadas (montanhas rochosas, por
todas as colônias deviam confiscar as marcos artificiais que, uma vez remo- exemplo), ou muito áridas (deserto de
- terras dos ingleses "e de seus aliados", vidos, não se tem como determinar Nevada, por exemplo), ou geladas (no
dividindo-as em lotes, vendendo-as e sua posição com exatidão, ou a uma Alasca). Eram terras para pastagens e
aplicando o dinheiro em bônus da re- árvore facilmente eliminável, ou a para exploração florestal, ou ainda para
volução., Como quase todas as grandes córregos e riachos cujos nomes são recreação e preservação da vida selva-
propriedades eram de ingleses ou de facilmente substituídos ou cujos cur- gem. Essas terras eram exploradas sob
aliados destes, foi realizada uma das sos são desviados pela construção de a forma de arrendamento, o que freava
mais drásticas reformas agrárias do estradas ou de barragens. um pouco a especulação com terras
mundo. A Pensilvânia, por exemplo, foi agrícolas.
quase totalmente dividida em lotes de No Brasil, se não pudemos adotar
490
BR DFANBSBNVB/GNB;AAA;;SÍO 41334 p 2 as
tal legislação, seria preciso que, tanto trutura de classes; por grandes diferen-
do ponto de vista fiscal, como do ponto ças na distribuição da renda, da riqueza
de vista do direito de propriedade e das e do poder; e pela ausência de partici-
relações de trabalho na agricultura, a pação democrática dos seus membros.
legislação desestimulasse a posse impro- Por outro lado, o País sempre contou
dutiva da terra, E seria também neces- com uma disponibilidade relativamente
sária uma reforma agrária drástica, abundante de mão-de-obra não qualifi-
< para corrigir inicialmente as injustiças cada, havendo a persistência através do
E" a existentes. tempo de baixíssimos níveis de remune-
* ração para a maior parte da força de
Terra na mão de poucos rçflete trabalho, tanto rural como urbana.
a estrutura social e política Com o crescente processo de urbaniza-
do a ção a partir dos anos 50 e especial-
>> N A evolução da estrutura fundiária do mente a partir da década de 60, a oferta
- "a A Brasil tem sido bastante diversa da dos de mão-de-obra acumulou-se nas cida-
Estados Unidos. Isto se deve menos a des e possibilitou a manutenção dos sa-
razões econômicas do que a fatores lários em níveis baixos. Nos anos 80, o
políticos e sociais. A extrema concen- subemprego nas grandes cidades atin-
tração da propriedade da terra em gia taxas que variavam de 20%até 30%
nosso país, assim como a sua imutabili- E a existência e o contínuo crescimento
dade através do tempo, constitui uma dessa massa de miseráveis constituíam,
manifestação expressiva do tipo de so- pelo menos em parte, uma decorrência
ciedade e de regime político em que te- da falta de acesso à terra para uma
mos vivido durante a maior parte da crescente maioria dos trabalhadores do
nossa história. Trata-se de uma socie- campo.
o dade caracterizada por uma rígida es- Baixos salários podem ser encarados
Biblioteca Nacional
Nos EUA, a lei de 1862 consagrou a propriedade familiar, impedindo a concentração da posse da terra (no alto, pioneiros a
caminho de suas terras, no Estado do Colorado, em 1870). No Brasil, mesmo com a libertação dos escravos, a propriedade
continuou concentrada nas mãos dos grandes fazendeiros (acima, alegoria da Revista Ilustrada ao primeiro aniversário da Lei
Aurea)
491
V&EdNEARAS4O04
1 93314 anço
92 : p 235
desenvolvimento auto-sustentado da
de Pesquisas e Estudos Sociais). De de reforma agrária no Brasil. guns dos nossos iluminados tecnocratas
E
Carlos Lorena/Tamás Szmrecsányi
492
, BRDFANBSOMAÇNGÃM,S04 334 An002, posé
1
Rrbp
22Ae
Insatisfeito com as estatísticas exis- mesa, meses depois, era desconfor- no Brasil", Dessa vez, as fontes eram o
tentes sobre mortalidade infantil no tante. Em 1984, segundo o estudo, mor- Fundo das Nações Unidas de Socorro à
País, o então ministro da Saúde, o reriam cerca de 308 mil crianças com Infância (UNICEF) e a Organização
piauiense Waldyr Arcoverde, enco- menos de um ano de idade. Era como Pan-americana de Saúde (OPAS). Os
mendou a seus assessores, no início de se toda a população de uma cidade técnicos das duas instituições, depois
1984, um minucioso levantamento a res- como Londrina, no Paraná, fosse dizi- de examinarem exaustivamente milha-
peito do problema. Ele não queria in- mada em 12 meses. res de informações do Instituto Brasilei-
formações genéricas, mas números ab- Em dezembro daquele ano, o minis- ro de Geografia e Estatística (IBGE),
solutos. Queria saber, por exemplo, tro Arcoverde recebeu outro docu- chegaram à conclusão de que morrem
quantas crianças poderiam morrer em mento focalizando o problema da mor- diariamente cerca de mil crianças, viti-
1984, antes de completar um ano de talidade infantil, que levava o título mas principalmente de doenças trans-
vida, A resposta que chegou à sua "Perfil Estatístico das Crianças e Mães missíveis, como meningite ou sarampo.
493
er praNBSSÚEÇGNÇÃAA SAH 041383 4 ân00a pÃ3%
O ministro não fez nenhum alarde mais precisam deles", afirmava, em Assim, com dois decretos, o governo
em torno desses números trágicos. E ti- 1984, o oficial de planejamento e pro- desobrigou-se da prestação de serviços
nha suas razões para o mutismo. Afinal, gramação da agência da UNICEF no médicos aos trabalhadores e colocou
os dois relatórios ajudavam a diagnosti- Brasil, Eduardo Bustello. sua saúde sob controle direto das em-
car, com precisão cristalina, o fracasso A privatização dos serviços cresceu à presas.
da política de saúde no Brasil, pela qual custa de fortificantes oferecidos pelo As firmas comerciais e industriais,
seu ministério erá um dos órgãos res- governo. E a primeira dose foi minis- para dar assistência médica a seus em-
ponsáveis. A saúde da maioria da po- trada em 1966, quando os trabalhado- pregados, passaram a estabelecer con-
pulação, revelavam os números, ia de res foram aliados dos centros de deci- vênios com empresas médicas de
mal a pior. são sobre questões relacionadas com a grupo, cujo pagamento é descontado
saúde. Em 26 de novembro daquele do que a empresa contratante deve à
ano, o então ministro do Trabalho, Luis Previdência Social, podendo ainda ser
Gonzaga do Nascimento e Silva, sus- deduzido do Imposto de Renda. Trata-
pendeu, por um decreto, a representa- se de um excelente negócio, não ape-
A morte prematura não é o único ção paritária de empregados e empre- nas pelos descontos dos impostos, mas
sintoma de agravamento da saúde dos gadores na direção dos institutos de também pelo maior controle que as
brasileiros. Para onde quer que se previdência social. No mesmo dia, o empresas passam a ter sobre os assala-
apontassem os medidores de saúde no governo autorizou a transferência para riados. A observação do trabalho das
Paísseriam desgobertos dados chocan- as empresas da tarefa de assistência empresas de medicina revela que se-
tes. Durante o XXI Congresso Brasi- médica dos empregados. Era a oficiali- guem rigidamente as orientações de
leiro da Sociedade de Medicina Tropi- zação de um sistema que já vinha seus contratantes e não dos usuários
cal, realizado em fevereiro de 1985, em sendo incentivado desde 1964, quando dos serviços. Os médicos, por exemplo,
São Paulo, um grupo de médicos sani- a Volkswagen começou a utilizá-lo. são orientados para reduzirem as au-
L
taristas revelou que a malária, quase
banida do País em 1950, ressurgiu com
impressionante vigor. O número de ca- 0 surto das cesarianas
sos passou de 52 mil em 1970 para 342
mil em 1984. O calazar, ou leishma- Nos hospitais particulares conveniados com o INAMPS a incidência de
niose visceral, doença também transmi- cesarianas no total dos partos realizados saltou de 14,6%, em 1970,
tida por mosquitos e sob controle até para 31% em 1980. Na Holanda, por exemplo, nesse mesmo ano, a
1964, reapareceu. Em 1984 foram diag- taxa era de 1,5%.
nosticados 1.500 casos dessa doença,
que pode ser fatal. Dez milhões de pes- Evolução da participação das cesarianas no total de partos realizados em hospitais
soas eram afetadas pela doença de contratados do INAMPS, em % (1970-80).
Chagas e outro tanto pela esquistosso-
31,0%
mose. Doenças típicas de regiões sub-
desenvolvidas, com populações subnu-
tridas e pouca resistência, também se
alastravam,como a tuberculose e a han-
seniase. O número de pessoas infecta-
das pelo bacilo da tuberculose ultrapas-
sava 40 milhões e os casos notificados
aumentavam numa escalada de cerca de
90 mil por ano. Oficialmente, em 1984
havia 200 mil pessoas com hanseniase
e o número de novas vítimas era de 15
mil por ano.
O rosário de cifras trágicas é longo.
Desfiá-lo é como cutucar uma chaga
que cresce sem parar, apesar da quanti-
1970 72 74 76 78 1980
dade cada vez maior de medicamentos
que lhe aplicam. Para resolver os pro-
blemas de saúde no País foi montada ANO TOTAL DE PARTOS CESARIANAS
uma estrutura de serviços que, basica-
mente, procurou curar os brasileiros
depois que eles adoeciam, em lugar de 1970 602.108 88.115
prevenir as doenças. E o pior é que es- 1971 700.682 110517
1972 766.707 131.150
ses serviços eram inadequados à maio-
1973 796.069 148.154
ria da população, pois eram dominados 1974 874.665 177.050
por empresas privadas, interessadas so- 1975 1.021.904 235.898
mente em aumentar seus lucros. Isso 1976 1211159 305.164
gerou graves distorções, como a con- 1977 1.376.307 354.869
centração de leitos hospitalares em re- 1978 1.379.230 378.586
giões mais ricas. O Sudeste, por exem- 1979 1.490.860 446.185
1980 1591716 493.436
plo, tinha uma taxa de leitos hospitala-
res por habitante duas vezes superior à
taxa do pobre Nordeste. "Os atuais ser-
'Fonte: Landmann, Jayme, A Outra Face da Medicina, Salamandra, Rio de Janeiro, 1984.
viços dificilmente alcançam os que
494
er BAETS s3 an cos , o 238
2
E
-i
sências ao trabalho com rígido controle uma conferência que fez -no Conselho comprava de particulares, segundo o
do fornecimento de atestados de Regional de Medicina, Landmann foi dr. Elio Fiszbejn, ex-presidente do Sin-
doença. Outro recurso é a redução dos interrompido por um médico, dono de dicato dos Médicos de São Paulo, 300
períodos de licença para convalescença empresas, que contra-argumentou: "Se mil leitos e oferecia na rede pública
de doenças mais graves. Nos exames o médico não fiscalizar o ausentismo, o apenas 7.800. O governo deixava seus
pré-admissionais, descartam os candi- trabalhador invocará a doença para ir hospitais à mingua e encaminhava os
datos portadores de doenças crônicas, pescar ou cuidar de outros interesses." pacientes para os hospitais particulares
os que estão saindo de uma convales- A resposta de Landmann foi fulmi- conveniados. No final de 1984, a capa-
cença prolongada, as mulheres grávi- nante: "Não é função do médico impe- cidade ociosa dos hospitais da rede pú-
das e até mesmo os que revelam a exis- dir o operário de pescar ou divertir-se, blica em São Paulo atingia 50%.
tência, na família, de filhos ou esposas ainda mais que existem profundas ra- O volume crescente de dinheiro pú-
com problemas de saúde. "Tudo isso 2des sociais para o ausentismo." blico que jorrou, sem controle, na dire-
recomenda imediatamente que esse in- ção das empresas privadas causou uma
feliz não tenha o emprego", denun- incontrolável febre de corrupção. Em
ciava, em 1982, o secretário-geral do 1981, o INAMPS constatou que 90%
Sindicato dos Metalúrgicos de São das contas apresentadas pelos hospitais
Paulo, Clemitre Guedes da Silva, du- Calcula-se que atualmente as malhas apresentavam irregularidades. As frau-
rante o III Simpósio sobre Política Na- das empresas médicas de grupo já te- des mais comuns eram contas de pa-
cional de Saúde, na Câmara dos De- nham atingido quase 30% dos trabalha- cientes fantasmas e de exames não rea-
putados. dores no Estado de São Paulo, Mas não lizados. Nos primeiros meses de 1985,
Além de exercerem uma função re- foi somente através dessas empresas foram descobertas irregularidades se-
pressora, segundo Guedes da Silva, as que o governo se desobrigou de suas ta- melhantes em 33 hospitais de São
empresas de medicina de grupo pres- refas, repassando dinheiro público aos Paulo, havendo, em todos os casos,
tam serviços de péssima qualidade. Em empresários. Outra de suas fórmulas de participação na fraude de funcionários
busca da redução de custos, os donos sucesso foi aumentar a contratação de do INAMPS.
destas empresas obrigam os médicos a serviços particulares para atendimento O estímulo à corrupção é um duplo
solicitar o mínimo de exames comple- dos trabalhadores previdenciários. O ataque à já combalida saúde dos traba-
mentares para a formulação de um Plano de Pronta Ação da Previdência lhadores. Em primeiro lugar, porque o
diagnóstico, O encaminhamento a ou- (PPA), lançado em 1974, logo após a dinheiro que sustenta a orgia dos em-
tro médico especializado também é criação do Ministério da Previdência e presários sai de seu bolso, feito uma he-
controlado. Assistência Social, recomendava que o morragia. E, em segundo, porque é
Por causa dessas atitudes, as empre- número de hospitais da rede pública obrigado a sujeitar-se a um atendi-
sas de medicina têm sido bombardea- não fosse ampliado, enquanto os exis- mento de baixa qualidade: É tratado
das pelas criticas de médicos preocupa- tentes deveriam ser paulatinamente pri- como uma peça insignificante numa
dos com a saúde dos trabalhadores, vatizados. Essa política foi seguida à imensa máquina de fazer dinheiro.
como o cirurgião Jayme Landmann, do risca. Em 1981, do total de recursos Como, até 1983, o pagamento aos labo-
Rio de Janeiro. Em seu livro Evitando a destinados à assistência médica e previ- ratórios e hospitais era feito em cada
Saúde e Promovendo a Doença, editado dência social no País, 72% iam parar "ato médico", tentava-se efetuar nos
em 1982, Landmann é categórico: "Es- nas mãos dos empresários da saúde, pacientes a maior quantidade de
tas empresas constituem um elemento vendedores de serviços ao governo. "atos". A preferência recaia sobre os
nocivo ao sistema de saúde." No ano Ainda naquele ano, o Instituto Nacio- exames mais sofisticados, cirurgias e in-
seguinte, ao denunciar a ação perni- nal de Assistência Médica da Previdên- ternações, que rendiam mais, pela ta-
ciosa da medicina de grupo, durante cia Social (INAMPS), criado em 1977, bela do INAMPS. Resulta dessa época,
495
aR'oFAN'ÉÉÉVÉmeÉXlrQZJ 1333 an coa, p 239
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28
$a.o2
por exemplo, enorme quantidade de INAMPS gasta mais por ano do que o mento de água e esgotos também é fun-
cesarianas feitas desnecessariamente. Ministério da Saúde em seus progra- damental. No Brasil, a rede de abaste-
Em 1970, a incidência de cesáreas nos mas de suplementação alimentar ma- cimento de água ainda não chegava,
hospitais particulares conveniados do terno-infantil e de interiorização da em 1983, a 65% dos domicílios. A rede
Rio de Janeiro já era 100% maior que medicina. de esgotos atingia apenas 30% dos do-
nos hospitais próprios do INAMPS. A ênfase à medicina curativa, num micílios brasileiros.
Naquele mesmo ano, de cada 100 nas- país pobre como o Brasil, é a prova O modelo de desenvolvimento do
cimento no País, 14 se deram por cesa- mais evidente de que, ao examinarem o País, que se baseia na exploração pre-
riana. Dez anos depois, em 1980, a inci- paciente, os responsáveis pela política datória da força de trabalho, também
dência já era de 31 em cada 100. En- de saúde fecharam sua boca e viraram- propiciou o surgimento de locais de
quanto isso, na Holanda, também em lhe as costas. Resultado: o remédio re- trabalho que são. verdadeiras fábricas
1980, os bebês nascidos de cesárea ceitado não faz efeito. Em meados de de doenças; e fechou os olhos para a
eram somente 2 em cada 100. 1984, quando se registrou em São deterioração do ambiente. Em 1976, ao
Para executar a sangria dos cofres Paulo uma epidemia de sarampo, as fazer uma avaliação dos serviços de
públicos com maior eficiência, as em- crianças eram internadas em hospitais saúde no Brasil, publicada na revista
presas médicas equiparam-se com as que dispunham de alta tecnologia, in- Proposta, o médico Sérgio Goes frisava
máquinas mais sofisticadas do mundo. clusive na periferia da cidade. Mas que a melhoria dos padrões de saúde
O médico Élio Fiszbejn revelava, em morriam porque eram subnutridas; As estava profundamente vinculada a uma
1984, que a quantidade de tomográfos possibilidades de a criança subnutrida melhoria geral na vida dos trabalhado-
- equipamentos de raios X com com- ser abatida pelo sarampo são 400 vezes res. "A saúde das pessoas depende, em
putadores e dispositivos de televisão - maiores que as da criança bem alimen- primeiro lugar, de como elas ganham a
existente no País era muito superior às tada. Apenas em julho e agosto da- vida, como trabalham, o que comem,
necessidades. Os 60 tomógrafos - con- quele ano morreram de sarampo mais quanto ganham, em que gastam o seu
centrados principalmente no eixo Rio- de 100 crianças em São Paulo. No Bra- dinheiro e onde moram", dizia Sérgio
São Paulo - dariam para atender a sil, onde a desnutrição atinge 12 mi- Goes.
uma população de 300 milhões de pes- lhões de crianças entre um e seis anos O descaso pelas causas sócio-e-
soas. "Veja o que se investiu à toa", di- de idade, o sarampo mata dez mil por conômicas da morbidade e da morta-
zia o médico. ano. lidade é estimulado a partir das esco-
A corrupção é um terrível efeito co- las de medicina, onde os currículos, ba-
lateral da privatização da medicina. O seados em padrões norte-americanos,
principal e o mais perverso desses efei- privilegiam a especialização. Isso ajuda
tos, porém, é a ênfase dada à medicina a explicar o fato de haver no País, em
curativa, em detrimento do trabalho O técnico Eduardo Bustello acredi- 1982, o dobro de cardiologistas em re-
preventivo. O Ministério da Saúde - ao tava que o número de mortes infantis lação aos cirurgiões gerais. Segundo o
qual o Sistema Nacional de Saúde, or- poderia ser reduzido à metade, se cui- médico Élio Fiszbejn, as escolas privile-
ganizado em 1975, atribuiu oficial- dados básicos fossem tomados. Basta- giam o aprendizado das doenças com-
mente o encargo de cuidar da preven- vam coisas simples, como o acompa- plicadas, dando pouca ênfase a alguns
ção de doenças - recebe recursos que nhamento médico às mulheres grávi- dos mais importantes aspectos da medi-
não chegam a 10% do total destinado à cas, em ambulatórios. cina, como o aleitamento materno. Es-
Previdência, encarregada da parte cu- No final de 1984, 25% das mulheres sas escolas refletem o sistema de servi-
rativa, segundo o médico Jayme Land- grávidas do País não tinham nenhum ços de saúde do País, que, na definição
mann. Em dois procedimentos médicos tipo de acompanhamento médico. Na do médico Carlos Gentile de Mello, é
que utilizam alta tecnologia e servem zona rural, 51% davam à luz sem ver o "caótico, elitista, corruptor, irracional
no máximo 20 mil pacientes (as pon- médico durante toda a gravidez. e incontrolável". P
tes de safena e as hemodiálises), o A melhoria dos serviços de abasteci- Roldão Arruda
496
BR Vá,GNÇG,A 32 ân 00a, p240
AA.
Aga) 1a «se: m ';“? «
Biblioteca Na:
Foi tambem a partir dos anos 40 que
o Estado passou a encampar as ferro-
vias de capital privado. O caso da en-
campação da São Paulo Railway (de-
Sob o domínio econômico inglês, ferrovias como a E. F. Oeste de Minas (acima, foto de poischamada Estrada de Ferro Santos
1881) foram construídas para escoamento de produtos primários a Jundiai), em 1946, ilustra muito bem a
guinada em direção. ao rodoviarismo.
ECONOMIA/TRANSPORTES: a estrutura de transportes no Brasil Sofrendo a concorrência da Via An-
chieta (que liga São Paulo a Santos), a
mm
B ferrovia estava praticamente liquidada.
ea
497
er pranBsa VB.GNCAMA, 2404 4223 p 244
Arquivo Nacional
Agência Estado
&voLW Y1
Agência Estado
Para escoar minérios para exportação, o Regime Militar iniciou duas grandesferrovias: Carajás (à esq., a inauguração em 85) e a
Ferrovia do Aço(à dir.,em obras, 76), cujo orçamento inicial, de 1,8 bilhão de dólares, foi reavaliado em 3,6 bilhões dedólares em 79
diloquência propagandística, como a lentamente ainda no início de 1985. trangulou decisivamente, o governo
Transamazônica. Seus custos, inicialmente previstos em passou a usar parcelas crescentes da
A crise do petróleo, desencadeada a 1,8 bilhão de dólares, seriam reavalia- taxa sobre os fretes de importação para
partir de 1973, e a perspectiva de desa- dos em 3,6 bilhões de dólares, em 1979. rolar a dívida externa, secando, assim, a
celeração econômica em função das Mesmo assim, a construção prosseguiu, principal fonte de financiamentos e
crescentes dificuldades no balanço de tropeçando na falta de verbas determi- subsídios dos estaleiros do Brasil. Estes,
pagamentos, imporiam, a partir de nada pela política de "desaqueci- sem condições de competir em preços
1974, a necessidade de se pensar em mento" da economia. com os concorrentes estrangeiros, fo-
mudanças na estrutura de consumo de ram perdendo encomendas e acumu-
combustíveis no País. O II Plano Na- lando dívidas, No início de 1985, sete
cional de Desenvolvimento, elaborado estaleiros negociavam uma dívida de
no governo Geisel (1974-79), admitia 546 milhões de dólares, contraída em
dar atenção à eletrificação de ferrovias Os investimentos no transporte hi- bancos nacionais e estrangeiros com
e deslocar o transporte de grandes mas- droviário serviriam, fundamental- duvidoso aval da SUNAMAM ,. Apenas '
sas nas cidades para sistemas ferro- mente, para a ampliação da frota mari- um deles, e o maior, o estaleiro Mauá,
hidroviários. Quanto às rodovias, o tima, através de um programa da Supe- devia 291 milhões de dólares, o que le-
plano previa apenas a pavimentação da rintendência Nacional da Marinha vou ao suicídio seu proprietário, Paulo
rede existente, em lugar de novas cons- Mercante (SUNAMAM), com o obje- Ferraz.
truções. " tivo de melhorar a posição brasileira No campo da indústria de equipa-
Já estava claro que, para saldar os nos fretes internacionais e, com isso, mentos ferroviários, em 1981, a capaci-
pesados compromissos da dívida ex- aliviar o balanço de pagamentos. Além dade instalada de produção era de 200
terna, o País teria que apostar num disso, em meados da década passada, o locomotivas, mas a produção efetiva no
grande aumento de suas exportações. governo passou a cobrar uma taxa de primeiro semestre não ultrapassara 11
Para tanto, seria expandida a frota 20% sobre os fretes de importação, des- unidades; e a produção mensal de va-
marítima e fluvial, construídos novos tinada à SUNAMAM, que deveria usar gões estava em torno de dez unidades,
portos nas saídas dos chamados corre- esse dinheiro para cobrir a diferença de enquanto a capacidade instalada era de
dores de exportação e reequipados os preço entre os navios produzidos no 750 unidades por mês. Nesse mesmo
portos mais importantes já existentes. Brasil e os produzidos nos grandes esta- ano, a MAFERSA (Material Ferro-
Foi dentro dessa política que se ini- leiros do Exterior. viário S.A.), sob controle acionário do
ciaram as construções das duas únicas Essa facilidade e outras fizeram cres- BNDE, demitia mais de dois mil em-
ferrovias de porte no período do Re- cer as encomendas e os estaleiros no pregados. E José Burlamaque de An-
gime Militar: a Ferrovia do Aço, para Brasil investiram pesado. Em 1981, o drade, presidente da Fábrica Nacional
escoar minérios de ferro de Minas Ge- País era o segundo fabricante mundial de Vagões, explicava à Gazeta Mercantil
rais para o porto de Sepetiba, no Rio de navios, responsável por 5,5% da pro- (19/6/81) as razões da maior crise já vi-
de Janeiro; e a Estrada de Ferro Cara- dução (o Japão estava em primeiro lu- vida pelo setor: "As nossas estradas de
jás, inaugurada no início de 1985, li- gar, com 46,5%da produção). Esse es- ferro cairam no abandono, mesmo de-
gando a riquíssima província mineral forço, entretanto, não representou uma pois da crise do petróleo, época em que
da serra dos Carajás, no Pará, ao litoral ampliação do transporte hidroviário in- ampliamos nossas fábricas, na certeza
do Maranhão. A Ferrovia do Aço, terno, cujos recursos permaneceram de que as encomendas fatalmente te-
anunciada em 1975 pelo presidente Gei- insignificantes. riam de vir em grande número." Entre-
sel como a "obra do século", seria, no A aventura naval teria, isto sim, fim tanto, a política de desaceleração da
entanto, um dos maiores fracassos. Sua trágico. Se, em 1975, a diferença entre economia resultou em drásticos cortes
construção foi conturbada por erros de os custos dos navios produzidos no nos investimentos estatais; as encomen-
planejamento e dimensionamento eco- Brasil e no Exterior estava em torno das sonhadas por Burlamaque de An-
nômico tão grotescos que, prevista dos 35%, em 1983 já havia alcançado drade não vieram e a indústria se viu
para ser "a ferrovia dos mil dias" 47%. Quando, a partir de 1982, a ba- obrigada a diversificar sua produção,
(pouco mais de três anos), arrastava-se lança de pagamentos do Brasil se es- em direção ao setor automobilístico.
499
Br 2404/23an Cop
ar pranBSa 331 an (oa, p24s
Iconographia
Participantes do levante liderado pelo coronel Cardim (ao lado), RS, mar./65
Iconographia
A mais expressiva guerrilha, a do Araguaia, enfrentou o
Exército por dois anos, no período 1972-74
Em 26 de março de 1965 aconteceu a desencantando setores que o haviam ria militares cassados, ligados ao movi-
primeira tentativa de reação armada apoiado. Quanto mais se evidenciava mento dos sargentos, ativo antes do
organizada contra o governo imposto que o uso da força por parte dos milita- golpe.
pelo golpe militar de 1964. Naquele dia, res, em todos os aspectos, não era for- Políticos do Partido Socialista Brasi-
com não mais de 30 homens, o coronel tuito, mais ficava claro, na concepção leiro (PSB), então já extinto pelo re-
Jefferson Cardim de Alencar Osório, de alguns grupos políticos, que à vio- gime, apoiaram a guerrilha de Caparaó.
um dos muitos militares progressistas lência do regime teria de se contrapor a Leonel Brizola também apoiou o movi-
perseguidos pelo novo poder, tomou a "violência revolucionária". mento, embora sua participação não
cidade de Três Passos, no Rio Grande O exemplo da revolução cubana - estivesse ainda perfeitamente expli-
do Sul, cumprindo o plano que come- comandada por um grupo de guerri- cada. "No caso da guerrilha de Capa-
çou a ser elaborado em Montevidéu, lheiros revolucionários que tinha suas raó, tive a oportunidade de colaborar
onde o coronel estava exilado. Cardim bases nas montanhas e desceu às cida- com o que estava a meu alcance", disse
atravessou a fronteira com quatro ho- des para tomá-las, com apoio popular ele à imprensa após a Anistia.
mens, cruzou uma parte do território - e das lutas guerrilheiras em alguns
gaúcho e conseguiu algumas adesões. países da América Latina davam alento
Houve alguma luta na tomada de Três à organização de algumas outras ações
Passos (um sargento do Exército mor- no Brasil. A medida que o governo ia
reu), mas não veio, entretanto, o so- fechando os canais políticos - editara o O comandante militar do MNR era
nhado apoio popular. Três dias depois, Ato Institucional no 2, a 27 de outubro o ex-sargento Amadeu Felipe da Luz
o movimento seria derrotado, com os de 1965; tratava reivindicações dos es- Ferreira; e o líder político nacional era
líderes presos pelo Exército. Mais do tudantes e setores democráticos com o professor e ex-presidente do PSB
que um sonho, a aventura do coronel truculência; e mostrava sua face pró- Bayard De Maria Boiteaux. O MNR
foi um erro grave de cálculo político. americana -, parcelas da oposição chegou a tirar um número do primeiro
Os militares que tomaram o poder esta- mais se convenciam de que a luta ar- jornal clandestino dos movimentos ar-
vam avançando ainda, e já estava em mada era a única solução para o fim do mados pós-64, O Levante, mas a guerri-
pleno curso uma efetiva reestruturação regime, lha não passou da fase de treinamento,
dos órgãos de repressão. No plano ideológico, a luta armada Em março de 1967, o Exército, a
Os movimentos que poderiam tentar teve duas vertentes. Uma, de conteúdo Força Aérea (FAB) e a Polícia Militar
alguma resistência armada - como as nacionalista, não comunista e bastante mineira, numa operação que durou
ligas camponesas ou os "grupos de 11" difusa. E outra, mais à esquerda, desen- 13 dias e empregou seis mil homens,
do ex-governador do Rio Grande do volvida por organizações comunistas, com o uso de dezenas de aviões e heli-
Sul, Leonel Brizola - foram logo domi- A primeira ação um pouco mais du- cópteros, desmantelaram a tentativa,
nados. Nos quartéis, a ala progressista e radoura, depois da tentativa do coronel prendendo oito dos 14 guerrilheiros.
nacionalista foi imediatamente expur- Jefferson Cardim Osório, foi a cha- Pelo menos uma morte foi registrada, a
gada. Em alguns pontos do País onde mada guerrilha de Caparaó, organizada do guerrilheiro Milton Soares de Cas-
militantes da esquerda tentaram ações pelo Movimento Nacionalista Revolu- tro. A versão oficial é de que ele se sui-
de resistência, elas mal chegaram a se cionário (MNR). Ela começou em 26 cidou na prisão, mas sobreviventes afir-
concretizar. de novembro de 1966, na área da serra mam que ele foi vítima de torturas. O
A medida que mostrava sua verda- de Caparaó, entre as divisas do Espirito comandante militar que combateu a
deira face, bem diferente dos apregoa- Santo e Minas Gerais, com a participa- tentativa guerrilheira, major Ralph
dos "ideais democráticos", o regime ia ção de não mais de 20 homens, a maio- Grunewald Filho, assumiu parte da res-
500 ,
"er 2nCOA p 244
ponsabilidade pela morte de Milton, ser a norma nos órgãos da repressão. propriar o dinheiro dos burgueses as-
reconhecendo que ele ficou "muito Apesar do ascenso de passeatas estu- saltar quartéis militares, justiçar crimi-
abalado" com os interrogatórios. dantis e greves operárias, em 1968, o nosos, elementos da CIA; e lutar cons-
A luta armada dirigida por organiza- movimento democrático-popular fora tantemente, em todos os terrenos, con-
ções comunistas, ou assim considera- temporariamente derrotado pela vio- tra o inimigo imperialista e os que no
das, tem uma história mais sólida. Sua lência. O Congresso de Ibiúna, da Brasil estão a seu serviço. A luta ar-
origem mais próxima está nos "rachas" União Nacional dos Estudantes (UNE), mada é isso: não deixar o inimigo tran-
ocorridos em três organizações: o Par- que se realizava clandestinamente, foi qúilo em nenhum lugar. Este é o ABC
tido Comunista Brasileiro (PCB), o desbaratado pela polícia. E a ação ar- da subversão."
Partido Comunista do Brasil (PC do B) mada dos vários grupos da esquerda - Em janeiro de 1968, ocorre o pri-
e a Política Operária (POLOP). Do em cuja composição, de modo geral, meiro assalto a banco, numa agência
PCB, por discordarem de sua linha pa- pesava muito a presença dos setores do Bradesco, em São Paulo. Em junho
cifista, sairam grupos como a Ação Li- médios da sociedade - pareceu assim do mesmo ano, uma ação mais espeta-
bertadora Nacional (ALN), o Movi- um dos caminhos mais lógicos para se cular: um comando da VPR apodera-se
mento Revolucionário 8 de Outubro contrapor ao regime. Alguns dos gru- de dez fuzis modelo FAL do Hospital
(MR-8) e o Partido Comunista Brasi- pos apostaram na guerrilha urbana, ou- Militar do Cambuci, em São Paulo. In-
leiro Revolucionário (PCBR). Do PC tros na guerrilha rural ou em formas dignado, o então comandante do II
- do B, ele próprio favorável à luta ar- combinadas dos dois métodos de luta. Exército, general Manoel Rodrigues
mada, sairam a Ala Vermelha e o Mo- Carvalho Lisboa, faz um desafio: se os
vimento Revolucionário Tiradentes guerrilheiros entraram no hospital, não
(MRT). Da POLOP, surgiram os gru- conseguiriam fazer nada contra o quar-
pos Comando de Libertação Nacional tel sob seu comando. Quatro dias de-
(COLINA) e Vanguarda Popular Revo- Outubro de 1967. Uma bomba de fa- pois, um carro-bomba é jogado contra
lucionária (VPR). Existiram ainda a bricação caseira explode na casa da fi- o quartel do II Exército. Um soldado,
Vanguarda Armada Revolucionária lha do governador de São Paulo, Abreu Mário Kosel Filho,morreu na explosão.
(VAR) Palmares, a Ação Popular Sodré. É a primeira açaoconhecida da Carlos Marighela foi um dos dirigen-
Marxista-Leninista (APML) e o Par- guerrilha urbana, mas não teve reper- tes mais importantes desta fase. Ex-
tido Operário Revolucionário. Essas cussão mais séria. Um de seus partici- dirigente nacional do PCB, deputado
organizações,no geral, com conteúdo e pantes, Pedro Lobo de Oliveira, da constituinte em 1946, rompeu com o
métodos diferentes, optaram pelas ar- VPR, conta a experiência no livro A Es- partido e fundou a ALN. Marighela foi
mas como forma de resistência ao Re- querda Armada no Brasil. Ele diz; "Não um dos grandes teóricos e práticos da
gime Militar. existem vias pacíficas para derrubar a luta armada no Brasil. Ficou famoso o
A intensificação da luta armada ditadura brasileira. Sem eleições, com documento que escreveu em dezembro
ocorreu entre 1968 e 1974, com mo- os sindicatos de trabalhadores fecha- de 1968, "Quem samba fica, quem não
mentos de avanço e de refluxo. Mas se dos, os camponeses famintos, o povo samba vai embora", que diz, dirigindo-
acentuou a partir de 1969, quando o re- massacrado pela repressão, a única via se aos revolucionários de São Paulo:
gime apelou para o governo à base do possível para a hbcrcaçao é a luta ar- "Não devemos dar trégua. Cada dia
terror político. Já havia sido editado o mada, E o que é fazer luta armada? É uma ação pequena e de vez em quando
AI-5 e o Congresso entrara em recesso. fazer a revolução; é realizar ações ar- as grandes. Vocês têm carta branca na
A tortura aos presos políticos passou a madas contra o inimigo de classe, ex- frente guerrilheira para desencadear a
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pr oranBSBYSLGNÇAMME404 1334 ancoa, p 245
ação. Só não têm carta branca para da ALN, Virgílio Gomes da Silva, o
coisas burocráticas, isto é, para impedir "Jonas", chefe do grupo que segues-
ações planejadas pelos grupos, sejam trou o embaixador americano, é preso
eles quais forem. Nem podem fazer dis- e morto sob torturas. Mas as ações
cussões formais. É preciso ação e mais continuam. Em 1970 são sequestrados
ação. Distribuir manifestos, pintar mu- o embaixador da Suíça, Giovanni En-
ros, sabotar, fazer política de terra arra- rico Bucher; o embaixador da
sada, tudo isto com o trabuco na cin- Alemanha, Ebhrenfried von Holleben,
tura. Ninguém deve se deixar prender e o cônsul japonês Nobuo Okushi.
sem resistência. Por isso deve andar ar- O governo, no entanto, vai conse-
mado. E atirar para matar policiais e guindo controlar a situação. Joaquim
dedos-duros. A ditadura tem medo e Câmara Ferreira, outro importante di-
nós não vamos parar nem sair do ritmo rigente da ALN, é morto sob torturas,
porque os fascistas deram um golpe em outubro de 1970. Nas cidades, as
dentro do golpe." ações guerrilheiras continuam até 1972,
Pouco antes, em outubro de 1968, mas já em refluxo, com algumas orga-
num episódio de ampla repercussão, nizações preparando ações na área ru-
Iconographia
502
523 ANCOZ, p 246
Iconographia
Iconographia
iniciaram-se naquele ano. Os guerri- mente a guerrilha do Araguaia, no ainda é tabu. Até o final de 1984 não ti-
lheiros resistiram até 1974. As Forças bairro da Lapa, em São Paulo. Dois di- nham sido abertos os arquivos oficiais
Armadas, utilizando um efetivo calcu- rigentes, Pedro Pomar e Angelo Ar- sobre o que os militares consideravam
lado em 20 mil homens, tiveram que rea- roio, foram assassinados no local e uma "guerra psicológica adversa".
lizar três campanhas para aniquila- vários outros foram presos. Mais tarde, Entre as organizações da esquerda
mento dos guerrilheiros do PCdoB, na um dos presos, João Batista Drum- brasileira, a discussão ia desde a corre-
maior operação das Forças Armadas mond, morreu em consequência de tor- ção ou não de se empregar a luta ar-
no Brasil desde a Segunda Grande turas. mada para derrubar governos burgue-
Guerra. Há denúncias de que alguns O final do movimento guerrilheiro ses até o contexto adequado em que ela
guerrilheiros - como "Osvaldão", um no Araguaia marcou o término das podéria dar-se. Discutia-se também o
dos mais famosos - tiveram a cabeça ações armadas organizadas pela es- isolamento social e político das ações
cortada pelas tropas do governo. Toda querda. A repressão do Regime Militar da guerrilha, se tiveram ou não tiveram
a região viveu, nesses anos, o maior ter- desarticulou ou destruiu várias das or- apoio da população, em que sentido e
ror de toda a sua história. Igreja, cam- ganizações que pregavam a luta ar- em que proporção. A
poneses, a população em geral foi vi- mada, elas próprias envolvidas em pro- Com a abertura política, a oposição
tima direta ou indireta da violência de- blemas politico-organizativos comple- recuperou a imagem de Marighela e
sencadeada pelo Exército. Poucos guer- xos e sem sólida base social que pu- Lamarca, retomou a discussão da luta
rilheiros sobreviveram, e o PCdoB, por desse respaldá-las. armada, publicou livros sobre o assunto
longo tempo, passou a ser uma das or- A discussão sobre a luta armada e até encaminhou processos para obri-
ganizações clandestinas mais persegui- como uma forma de resistência ao Re- gar o governo a dar informações e es-
das. gime Militar mal está iniciada. Alguns clarecimentos sobre os mortos e desa-
Em 1976, outra operação do Exér- dos partidos da época não existem parecidos.
cito descobriu uma reunião de dirigen- mais, outros mudaram inteiramente de
tes do partido, que avaliavam justa- tática e, para o governo, o assunto Luiz Maklouf Carvalho
503
3 31 an 00 a p
506
ar va. AMATO 234 AnCO A2 , paso
L$s
Juca Martins/F4
a asssumir um papel social ao lado de definiu drasticamente com o golpe de de Brecht. O artista Samuel Spiegel fez
seu ofício religioso: uma consciência 1964. A arte respondeu imediatamente, as ilustrações para o livro-poema, as
social em desenvolvimento jamais seria com o fim das obras em movimento: na pranchas foram expostas, o ator e dra-
sustada por convulsões políticas e arbi- década de 70, grande parte dos artistas maturgo Gianfrancesco Guarnieri e
trariedades policiais. fez objetos, uns presos às paredes, ou- vários atores do Teatro de Arena, sen-
Depois, enquanto Juscelino Kubits- tros criados para ocupar os espaços dos tados nas escadas da galeria, diziam os
chek construía Brasília, Bruno Giorgi pisos. versos de Brecht no estilo de jograis.
fazia as suas esculturas para o Palácio De repente, a multidão fechou a rua;
todos queriam ver um espetáculo de
da Alvorada, Mas o sistema político Poema de Brecht serve para criar
ruía em pedaços com a renúncia de arte integrada. Policiais correram até a
subprodutos artísticos rua Martins Fontes, onde ficava a Am-
nio Quadros, Essa ruptura do sistema
político foi acompanhada de uma mu- biente, viram o povo admirando arte e
dança nos rumos da arte brasileira. Por Não há nenhum maniquelsmo nesses foram embora, O registro policial do
exemplo, o pintor Di Prete, autor de pequenos ensaios de correspondência evento naquela noite, na galeria, serviu
Limões, obra que lhe deu um prêmio na entre as contexturas sociais e as expres- para que depois, nos dias do golpe, dois
Bienal de 1951, passou na nova situa- sões plásticas. Vejamos mais de perto: investigadores fossem até lá, para averi-
ção a fazer uma arte abstrata e cinética, em fins de 1963, antes do golpe de 64, guações.
misturando materiais e tornando as for- uma ação cultural integrada ocorreu na Outro exemplo, agora, da época
mas móveis: a arte cinética se casava extinta Galeria Ambiente, em São mais fechada do Regime Militar: o
bem com o terreno social então move- Paulo. Um poema de Brecht, "A quadro de Cláudio Tozzi, Guevara Vivo
diço do País. Enquanto o espectador Mãe", foi o centro do qual se criaram ou Morto, sofreu diversas escoriações e
andava, a obra cinética se movia, mas vários subprodutos artísticos, (Estamos golpes, em São Paulo, Brasília e outras
suas formas se mantinham estáticas. deixando de lado o CPC - Centro Po- cidades. Em 1984 foi finalmente ex-
Isso estava relacionado com a situação pular de Cultura, o MPC - Movimento posto na excelente mostra "Tradição e
sócio-política. Nessa mesma situação, Popular de Cultura e manifestos de tra- Ruptura", feita na Bienal de São
as experiências concretistas de Walde- balhadores intelectuais que reivindica- Paulo. Mais um exemplo: o monu-
mar Cordeiro, Geraldo de Barros e ou- vam atividades culturais gerais e áber- mento a Garcia Lorca, do artista Flávio
tros geraram pesquisas com informá- tas para a população, Mário de An- de Carvalho (que nunca foi comunista, -
tica, com a arte pop. Depois, a situação drade também pretendera isso.) No dia apesar de sua fama), foi destroçado na
sócio-política até então movediça se aprazado, abriu-se a mostra da "Mãe", praça das Guianas, em São Paulo, no
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BR DFANBSB V ET 0us3a1 an00a,
p 254
Artistas como Guima (à esq., sua obra Inquisição), João Câmara (obra à dir.) e muitos outros elegeram para as suas metáforas
plásticas e poéticas imagens relacionadas com a contextura política dos últimos anos
fim da década de 60. Vários tiros ava- paganda. Depois do assassinato do jor- eram opositores do regime autoritário.
riaram essa obra, que foi retirada e nalista Wladimir Herzog, em 1975, no Mas houve também a atuação dos
oculta, finalmente, anos depois, na DOL-CODI de São Paulo, o pintor An- artistas brasileiros no Exterior. Em Pa-
época da "abertura", foi recolocada na tônio Henrique do Amaral fez em me- ris, Gontran Neto, artista e professor
mesma praça. Um outro caso do papel mória de Herzog uma alegoria, Morte integrante de um grupo de latino-
da arte no Regime Militar: em 1968 um no Sábado, que foi entregue ao Sindi- americanos também oriundos de países
fato inusitado ocorreu nas passeatas de cato dos Jornalistas de São Paulo. ditatoriais, participa da Brigada Inter-
estudantes e nos comícios: os manifes- nacional de Artistas (Le Parc, Cueco,
tantes, todos exigindo a volta da demo- Em 72, artista francês foi Ernest Pignon, Gamarra e outros) que
cracia e uma nova Constituição, exi- preso e enviado ao DOPS fazem murais e painéis de protesto con-
biam faixas e estandartes feitos com tra as violências na América Latina.
precisão artística. Nunca a cidade de Três anos antes, o artista Fred Fo- Foi essa brigada que pintou a Câmara
São Paulo teve uma programação grá- rest, francês, então participante da Bie- Negra, em homenagem a frei Tito - pa-
fica tão bonita, em meio ao terror do nal de São Paulo, depois de exibir seu dre dominicano que esteve preso em
Regime Militar. projeto de Arte na Rua - quadros São Paulo e se suicidou em Paris por
Então, os artistas, depois de verem brancos que as pessoas perguntavam sequelas psíquicas da tortura -, se-
suas obras cortadas pelos júris dos sa- por que brancos -, quando se apres- gundo o relato feito por ele das cenas
lões, ou discretamente postas nos cor- sava a recolhê-los na praça da Sé, foi que se passavam no DOI-CODI de São
redores da Bienal (1967), passaram a seguro pela polícia e enviado ao DOPS, Paulo. Depois, a partir da segunda me-
integrar os movimentos contra a dita- O escândalo foi grande: ajudou a piorar tade dos anos 70, os imensos quadros
dura. A arte de propaganda política lá fora a imagem do País. Os artistas de Gontran Neto só retratam os bóias-
tornou-se tão perigosa que muitos artis- Cildo Meireles, Avatar de Moraes, frias. Os europeus compram esses qua-
tas começaram a colaborar de outras Mário Ishikawa, João Câmara, Antô- dros e antropofagicamente engolem
formas nas lutas pela democracia. Em nio Dias, Guima, Sérgio Ferro (este um dos nossos grandes problemas na-
vez de fazerem pinturas, gravuras e preso como militante), Gilberto Salva- cionais.
desenhos sobre lutas democráticas, dor (preso por causa de um quadro ex- Portanto, vemos que, mesmo sem
eles partiram para a luta democrática. posto num salão em Santos, SP) e tan- um levantamento completo, é possível
Uns faziam cartazes, outros davam suas tos outros elegeram para as suas metá- colher alguns traços ainda que rarefei-
obras para fundos que proporcionaram foras plásticas e poéticas imagens rela- tos da produção artística do Brasil.
fugas e livraram da morte muitos jo- cionadas com a contextura política dos A olho nu percebe-se um cresci-
vens, Muita obra de arte vendida serviu últimos anos. Em 1977-78, quando mento no processo cultural dos artistas
para salvar "resistentes", enviando-os Olavo Setúbal era prefeito de São em correspondência ao seu comporta-
para fora do Brasil. E muitas famílias Paulo e instalou o Museu de Escultura mento político, sejam eles abstratos,
sem pai comeram feijão da venda de na praça da Sé, de certa forma realizou concretos ou figurativos. A consciência
muito quadro abstrato, concreto ou fi- algo que lembra a ação cultural de de cidadania dos artistas plásticos vem
gurativo. A consciência social foi mais Gustavo Capanema no Estado Novo. sendo construída no processo de cons-
forte do que as tendências artísticas Entre os escultores convidados para fa- trução desta nação. ,
que poderiam facilitar uma arte de pro- zer obras para a praça da Sé, alguns Radha Abramo
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BroFaNBSE VE. GNÇãAA, 407433 Bh 00a , P2SA
No dia 15 de janeiro de 1985, após na qual se uniram partidos-de oposição espécie de posse em funeral: a Nova
um ano inteiro de gigantescos comícios e uma expressiva fração de dissidentes República era inaugurada sob maus
por todo o País, um candidato da opo- do velho regime, anunciava, com essa presságios.
sição à presidência da República, Tan- expressão, o início de um novo período No lugar de Tancredo Neves subiu
credo Neves, derrotava o candidato do na história do País, em que prevalece- ao poder José Sarney, o vice-pre-
partido do governo, Paulo Maluf, por riam os métodos democráticos de go- sidente, indicado para a chapa ven-
uma dilatada contagem de votos. As verno. cedora pelos dissidentes do regime - e
eleições foram decididas num Colégio A teia do destino armaria, no en- que até seis meses antes fora o diri-
Eleitoral que por duas décadas funcio- tanto, uma trama insólita para os pri- gente máximo do partido governista.
nara exclusivamente para homologar a meiros dias do regime civil: na véspera A morte dramática não foi sufi-
troca de generais no comando supremo de sua posse, o candidato eleito - ho- ciente, no entanto, para alterar os ru-
do regime; a despeito disso, e mesmo mem de 75 anos, um reformista conci- mos democratizantes já delineados: as
de pressões militares de última hora, liador, que fora ministro da Justiça de forças vitoriosas reafirmaram sua dis-
nada impediu a derrocada final do si- Getúlio Vargas e primeiro-ministro de posição de convocar a Assembléia Na-
tuacionismo. Era o marco para e en- João Goulart - caia enfermo de um tu- cional Constituinte para 1986; e o Con-
cerramento do ciclo militar iniciado em mor benigno infeccionado no intestino. gresso Nacional prosseguiu na sua ta-
1964. E para o anúncio de uma Nova E, após 39 dias de hospital e sete inter- refa de remover o chamado "entulho
República: o candidato oposicionista, venções cirúrgicas, seu caixão subia a do autoritarismo", conjunto de leis ar-
representando a Aliança Democrática, rampa do palácio em Brasília para uma bitrárias do tempo da ditadura. Uma
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er
27
Agência O Globo
-.
comissão de vários partidos anunciou, fora uma crise política delicada na su- do mercado brasileiro através de redes
inclusive, o reconhecimento dos parti- perfície da vida do País: o Regime Mili- nacionais de televisão, transportes ro-
dos clandestinos - que só existira, até tar ruía por causas estruturais profun- doviários e de crédito facilitou o acesso
então, em menos de três anos em toda das. aos centros urbanos, aos bens de con-
a história da República; a eleição direta O sistema implantado em 1964 durou sumo duráveis e à cultura de massa,
para prefeitos das capitais e o voto do mais de duas décadas porque conse- através da novela, do telejornal de ca-
analfabeto, direitos também raros na guiu realizar extensas modificações na ráter nacional e dos enlatados, Mas foi,
'vida do País, estrutura social do País. Após um também, o incentivo à desintegração
período de consolidação (entre 1964 e das famílias, à marginalização em mas-
Regalias militares iriam 1967), quando promoveu diversas re- sa dos menores, ao esmagamento das
dificultar transição formas visando coibir as manifestações fontes culturais nativas, à comercializa-
populares e criar facilidades para os in- ção dos costumes, à desorganização
Permaneceram privilégios militares vestimentos, especialmente estrangei- das cidades.
consolidados nas duas décadas anterio- ros, o Regime Militar beneficiou-se de
res; a elevação do chefe da Casa Mili- um surto de crescimento econômico No início dos anos 70, o modelo
tar da Presidência e do Chefe do quase sem paralelo, conhecido interna- brasileiro entrou em crise
Estado-Maior das Forças Armadas à cionalmente como o "milagre brasi-
condição de ministros de Estado; a ma- leiro": nesta fase, o Brasil foi o país que Com a crise no desenvolvimento dos
nutenção do controle militar sobre o mais cresceu em todo o mundo capita- países capitalistas centrais no início dos
Serviço Nacional de Informação e a lista subdesenvolvido. Esse período - anos 70, e seu agravamento com a ele-
preservação de sua vasta estrutura de 1968 a 1973 - de intensa acumulação vação brusca nos preços de petróleo
espionagem, fora e dentro do governo, de riqueza, acumulou também tensões em fins de 1973, o modelo brasileiro de
criada após o golpe; a supremacia do sociais e políticas de todo o tipo. A - desenvolvimento entrou em crise desde
ministro do Exército sobre os coman- contrapartida do crescimento acele- seus alicerces, E todas as contradições
dos das Polícias Militares estaduais; e rado com base na tecnologia, nos capi- que ele acumulou no crescimento vie-
outros abusos, Essas regalias militares tais estrangeiros, na preservação e mo- ram à superfície.
iriam dificultar a transição para o novo dernização lenta do latifúndio e na mo- De 1974 a 1980, o Brasil viveu anos
regime e diminuir a soberania da Cons- nopolização precoce da indústria e dos de crescimento instável, na antevéspera
tituinte, serviços foi a concentração de renda e da grande crise, E os anos de 81, 82 e 83
Os ventos democratizantes, porém, o endividamento externo brutais, tam- foram, enfim, os anos de mergulho no
eram fortes, O que inviabilizara a per- bém os maiores do mundo capitalista abismo.
manência dos militares no poder não subdesenvolvido. A integração global No início de 1985, a falência do mo-
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sroransss percam,14404123 an Coa, p 254
«9
Agência O Globo
Ágênma O Globo
&&: 53E
Ricardo Azoury/F4
O sistema da ditadura militar fora,
pois, a causa mais imediata da crise, de
sua extensão e persistência. A vitória 0 feitiço ___. tado por Maluf na convenção do par-
da Aliança Democrática era, portanto, tido, em 11 de agosto de 1984. Os dis-
contra o feiticeiro
a superação do primeiro e maior obstá- sidentes pedessistas liderados por Au-
culo prático com vistas à solução das O Colégio Eleitoral que se reuniu reliano se agrupariam na Frente Libe-
dificuldades nacionais, em 15 de janeiro de 1985 foi definido ral, que comporia, junto com o Par-
É claro, porém, que o método de go- por normas que, em princípio, de- tido do Movimento Democrático
verno não fora a única razão dos pro- veriam favorecer o candidato gover- Brasileiro (PMDB), a Aliança Demo-
blemas e nem mesmo o fator determi- nista à Presidência da República. A crática, lançando o então governador
nante do surgimento desses males, O vitória de Tancredo Neves, da oposi- de Minas Gerais, Tancredo Neves (do
Regime Militar agravara o endivida- ção, só foi possível porque essas re- PMDB), um dia após a convenção
mento externo do País, a distribuição gras não previam a desagregação da pedessista, como candidato a presi-
de renda, a fome, a estrutura oligár- agremiação governista, o Partido De- dente e o senador José Sarney candi-
quica de posse da terra, a inadequação mocrático Social (PDS). Essa desa- dato a vice. Sarney fora o presidente
da estrutura da produção e de serviços gregação foi precipitada com a luta do PDS até pouco antes da conven-
do País em relação às necessidades da interna pela definição do candidato ção que escolheu Maluf, mas renun-
população, as condições de cultura e do partido que deveria ser apresen- ciou e ajudou a formar a Frente Libe-
comportamento do povo. Agravara; e tado ao Colégio Eleitoral. Foram der- ral. Para concorrer no Colégio Eleito-
não criara. rotados nessa luta, entre outros, no- ral como vice de Tançredo teve que
mes de peso como o do então vice- filiar-se ao PMDB, em 13 de agosto.
Vinte anos depois, as presidente Aureliano Chaves - apoi- A dupla Tancredo-Sarney seria vi-
ado, por exemplo, pelo ex-pre- toriosa no Colégio Eleitoral contando
mesmas crises do pré-64
sidente Ernesto Geisel -, e o do com os votos de todos os partidos de
então ministro do Interior, Mário An- oposição, da Frente Liberal e de outros
Os problemas, pois, eram anteriores; dreazza, apoiado pelo próprio presi- dissidentes do PDS, como os lidera-
muitos deles, seculares, dente João Figueiredo. Ambos foram dos pelo ex-governador da Bahia, An-
O que deveria ser mudado, então, atropelados pelo poderio da campa- tônio Carlos Magalhães (depois esco-
além do modelo autoritário? Evidente- nha do deputado federal Paulo Maluf, lhido por Tancredo para ocupar o
mente, o modelo de desenvolvimento que trabalhava de forma indisfarçável Ministério das Comunicações).
econômico-social, fortalecido a partir por sua candidatura desde quando
de 1964, exerceu o governo de São Paulo
a
Em dezembro de 1962, no início da s da vitóri
(1979-82). Maluf viajou por todo o Os número
penúltima grande crise econômica e País à cata de votos dos convencio-
s! dente da
política brasileira, o governo João Gou- Votaçã& o para Pre
nais do PDS e também teve expres- égio Eleutoral1 a
lart distribuiu uma síntese do Plano sivo apoio de setores empresariais. República no Col
de janeiro de
Trienal, com o qual o economista Cel- Aureliano Chaves seria excluído da reunido em 15
so Furtado apresentava um diagnós- no DE VOTOS
luta antes mesmo da Convenção do
tico e soluções para a crise na qual 480
PDS e Mário Andreazza seria derro- Tancredo Neves 180
0 País mergulhava. Embora em nível 17
Paulo Maluf
menor, os problemas eram os mesmos
Abstenções 9
512 Ausentes
Total
s É 3 f 4
saoransss vaíeNg, 2704/3934 an cor,
da crise que viria 20 anos depois: queda desse bloco, a inflação era causada ba- pelo seu valor de mercado atualizado,
no ritmo de crescimento econômico e sicamente pela desordem institucional Para esse bloco - onde se abriga-
recessão; dificuldades no pagamento - excesso de gastos públicos, ineficiên- vam, com diferenças, setores do velho
da divida externa; e inflação elevada, e cia e corrupção; excesso de greves, PSD (Partido Social Democrático) e
em alta. conluio do governo central com os sindi- praticamente toda a UDN (União De-
De que forma as diversas forças em catos; ameaças de nacionalização e ex- mocrática Nacional), partidos conser- ©
luta no cenário político nacional equa- propriação de empresas e terras -, pela vadores e oligárquicos - havia uma
cionavam esses desarranjos e se propu- elevação dos salários sem aumento de saída financeira para a crise: trazer os
nham solucioná-los? Pode-se dizer, re- produtividade, pelos subsídios do Es- capitais de fora e reorientar o processo
sumidamente, que havia três blocos de tado ao consumo de trigo, petróleo, pa- de formação de capital dentro do País,
equações e propostas para a crise brasi- pel. Para eles, além disso, a reforma elevando a renda nas mãos dos grandes
1 - O bloco da modernização elitista e ção rural, e colocaria as terras nas exportações agrícolas -, reduzindo, em
conservadora. Buscava manter ou mãos de quem não teria nem capital consequência, a massa de salários e de
mesmo acelerar o ritmo de desenvolvi- nem técnica para desenvolvê-las. Seria subsídios da indústria tradicional e da
mento econômico e o modelo do preferível, portanto, ampliar o crédito produção de gêneros para o mercado
período de Juscelino, baseado no de- agrícola, de modo a permitir a moder- interno. O sistema de crédito deveria
senvolvimento da indústria de bens de nização dos latifúndios; e aperfeiçoar a favorecer a indústria de bens de con-
consumo duráveis, em especial a auto- tributação sobre terras ociosas, de sumo duráveis, como automóveis e ele-
mobilística. Considerava que isso só modo a pressionar os grandes proprie- trodomésticos, as atividades exportado-
poderia ser feito com a ajuda e coope- tários indolentes. Em último caso, sob ras e estimular um forte capitalismo
exterior do País. Para os componentes expropriadas à vista e em dinheiro, siderava que o desenvolvimento do
Juca Martins/F4
«
====
7
grato:
és -s
Maurício Simonett/F4
| sd Paulo, em 22/4/85)
513
ar oranssa ve.eNtAM BALAIB p25%
Ascensão e queda do
17/11/1971 - Presidente
Regime Militar Médici assina Decreto-Lei
que lhe dá o poder de edi-
tar decretos secretos
O Regime Militar teve mais força política no período do "milagre" (1968-73), quando a
economia cresceu a altas taxas anuais. A partir de 1974, no entanto, as taxas de crescimento
começaram a diminuir, e os militares precisaram fazer concessões que culminaram com a 13/1/1970 - Estabelecida
a censura prévia de livros
posse de um governo civil, em 1985 e periódicos
$
10,3%
21/4/1960 - Inauguração 13/12/1968 -- Assinado o
9,6%
de Brasília Ato Institucional no 6. O 10,2%
Congresso é posto em re-
cesso
8,8%
2/12/1959 - Revolta de
31/8/1969 Junta Militar
militares direitistas da Ae- 7,6% substitui o presidente
ronáutica, em Aragarças, 5/2/1966 - Ato Institucio- Costa e Silva
Goiás nal no 3 determina elei-
ções indiretas para gover- 17/10/1969 - Emenda
nadores de Estados Constitucional no 1 refor-
6,5% ªnal; a Constituição de
25/8/1961 - Renúncia de
Jânio Quadros. V i-
mp <; pong. almª;.- 5'396
presidente João Goulart
gera crise que termina 1/4/1964 -- Golpe militar
com adoção do sistema depõe o presidente João
parlamentarista Goulart 4,7%
15/3/1967 - Entra em vi
gor a primeira Constitui-
ção do Regime Militar
2,6%
2,1%
6/1/1963 - Plebiscito re-
voga o sistema parlamen- 27/10/1965 - Ato Institu-
tarista e restabelece o pre- cional no 2 extingue os
sidencialismo partidos ”Nº" e cria a
1,0% Arena e o MDB
1958 1959 1960 1961 1962 1963 1964 1965 1966 1967 1968 1969 1970 19
O Plano de Metas de Juscelino (1956-681) A recessão que derrubou Goulart (1962- O "milagre econômico" da ditadura
€ taxa média anual de crescimento do PIB: 67) (1968-73)
8,0% © taxa média anual de crescimento do PIB: © taxa média anual de crescimento do PIB:
© grande plano rodoviário 4,5% 11,1%
© abertura ao capital estrangeiro © agitação social © abertura ao capital estrangeiro
© retração do capital estrangeiro € grande endividamento externo
© repressão política pesada
514
BR S 22 an Coar ,p 2358
RN
12,0%
12/1/1984 - Comício em
9,7% 9,7% Curitiba inicia grande
campanha nacional por
eleições diretas
20/12/1979 - Sancionada
nova Lei Orgânica dos 25/4/1984 - O Congresso
15/11/1974 - Primeira 13 e 14/4/1977 - Com o Partidos. São extintos o rejeita a emenda Dante de
grande vitória eleitoral do Congresso posto em re- MDB e a Arena Ollyolra, que propunha
MDB cesso, o presidente Geisel eleições diretas para a
decreta o "pacote de Presidência da República
abril", outorgando a refor-
ma do Poder Judiciário e 7'2% 15/11/1982 - A oposição :::|/Lªº; - A Fm“; Li-
outras reformas políticas conquista a maioria na credo :Iº ra apoio a Tan-
25/6/1975 - Assinado o Câmara Federal e 10 go-
acordo nuclear Brasil- dente um:”; Em
vemos estaduais ao " 69
ftlemanha 6,4% 26/11/1982 - O governo
- anuncia que o Brasil re-
5,7% correrá ao FMI
1972: 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1982W 1983 1984
A #
(*) dados preliminares 3'1% ( )
515
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ré Tier So Wassas"8430423 334 an 259
período de Juscelino fora estancado setores do PSD, o PTB (Partido Traba- tores começam a agir em sentido con-
principalmente pela não incorporação lhista Brasileiro), organização criada trário ao do tempo do "milagre". E o
de grande massa de camponeses ao por Vargas para se contrapor ao Par- regime inicia a fase descendente do seu
mercado de consumo e pelos padrões tido Comunista, e a esquerda mode- ciclo. A crise econômica latente insufla
insuficientes de crescimento dos sa- rada, o descontentamento popular; o aparato
lários entre os trabalhadores urbanos do governo terrorista amplia as fileiras
mais pobres. Dizia que o consumo su- 3 - O bloco da modernização oposicionistas; o esforço de distensão
perfluo havia crescido com mais inten- revolucionária. Forças à esquerda do política, iniciado no quarto governo
sidade que o de bens essenciais; que o governo Goulart pregavam o rompi- dos generais com Ernesto Geisel, ape-
País perdia renda no seu comércio ex- mento com os latifundiários através de nas realimenta a contestação ao re-
terior, em virtude da deterioração nos uma reforma agrária que expropriasse gime; a enorme concentração operária
preços dos produtos que vendia em re- suas terras com pagamento em títulos promovida pelo desenvolvimento ace-
lação aos preços das exportações; que públicos e aos preços históricos em que lerado da indústria de bens de con-
o setor exportador já era grandemente estivessem registradas. Queriam tam- sumo duráveis - em especial a automo-
privilegiado pelo sistema vigente de bém o rompimento com o capital es- bilística naregião doABC paulista onde
câmbio, que favorecia o dólar-ex trangeiro pela nacionalização de seus se concentram diversas fábricas com
portação. Para contornar as difícul- monopólios no País. E faziam propa- dezenas de milhares de operários cada
dades com a obtenção de divisas em ganda dos modelos de desenvolvi- uma - criam um adversário implacável
dólar, esse bloco propunha-se a expandir mento cubano e chinês, cujas revolu- do Regime Militar, a periferia operária
o externo particularmente ções vitoriosas eram de 1959 e 1949, res- das grandes cidades, que mostra as li-
em direção aos países socialistas, me- pectivamente. Para essas forças, o ar- mitações definitivas da abertura polí-
diante acordos bilaterais de comércio, gumento de Celso Furtado de que era tica, Finalmente, após a dramática re-
sem intermediação da moeda interna- preciso eliminar os subsídios ao trigo e cessão dos anos 81, 82 e 83 - forçada
cional, o dólar americano. De certo ao petróleo a fim de facilitar as diversas pela cessação de novos empréstimos
modo, descartava também a elevação reformas - agrária, urbana, bancária, externos - e sem poder resolver a crise
do recurso aos capitais de fora, embora de ensino . . . - devia ser combatido. com uma nova política de arrocho -
se propusesse a pagar a dívida externa O golpe de 1964 implantou pela que apenas esboçou em 1983, encon-
- com adiamentos, se possível, força o rumo do desenvolvimento sem trando enorme reação -, o regime so-
revolução e sem reformas. Até 1967, fre seu golpe de morte com a campa-
Em 64, a solução da crise os militares e seus inspiradores - a nha pelas eleições diretas, depois trans-
passou por alterações expressivas maioria dos grandes proprietários bra- formadas na eleição indireta do candi-
sileiros, o capital estrangeiro - ainda dato oposicionista Tancredo Neves.
trabalhavam com a possibilidade de
Para os seguidores desse rumo, uma institucionalização rápida do novo Vitória da Aliança deixou
como Celso Furtado e João Goulart, a regime, Essa possibilidade fora aberta
solução dos problemas estava em se ainda em 1964, na "eleição" do general intocadas questões econômicas
conseguir um compromisso que permi- Castello Branco para primeiro presi-
tisse: 1) sem romper com os latifun- dente indireto: Castello elegeu-se com Pode-se ver, no entanto, que a solu-
diários, expropriar parte de suas terras o apoio de todo o PSD, de Juscelino ção política da crise, com a vitória da
com pagamento em títulos da dívida Kubitschek inclusive (a exceção hon- Aliança Democrática, deixou intoca-
pública e por preços razoáveis, a fim de rosa foi exatamente Tancredo Neves, dos todos os gigantescos problemas
permitir a realização de reforma que se absteve). Com a agitação social econômicos exacerbados nos anos de
agrária que colocasse os camponeses que se alastra rapidamente no País após governos militares. A fragilidade das
no mercado; 2) sem romper com o ca- a outorga da Constituição de 1967, que forças mais radicalmente empenhadas
pital estrangeiro, prosseguir na política marca o breve período de "legaliza- no fim do regime reacionário e na subs-
de Getúlio Vargas que, desde 1930, ção" do regime de 64, os militares par- tituição do seu modelo econômico le-
mantinha o País com um comércio ex- tem de novo para o governo arbitrário, vou à formação de um governo de coli-
terior incrivelmente baixo, só compará- E vão além: apelam, então, para os mé- gação, com amplo setor de dissidentes
vel ao dos países socialistas; e, ainda todos terroristas de fazer a política com do velho regime. Esses dissidentes esta-
nesse campo, conseguir margem de a edição do Ato Institucional no 5, que vam preocupados, fundamentalmente,
manobra maior em relação aos países lhes assegurava o direito permanente em se opor aos métodos do governo
capitalistas ocidentais, em particular os de governar por atos de exceção e en- militar e não tanto ao modelo de desen-
americanos, ampliando as relações cobria uma violência maior: a estrutu- volvimento adotado pelos militares.
com o Leste europeu e o Terceiro ração de um aparato de segurança ba- Esse fato praticamente limitava as tare-
Mundo;, 3) e, finalmente, sem romper seado na delação, na repressão violenta fas do governo Tancredo Neves-José
com os trabalhadores, realizar reajustes e na tortura. Sarney à preparação de leis democráti-
no consumo popular de modo a ampliar Assim como o golpe fora facilitado cas que permitissem ao País ter de fato
o nível de consumo das camadas mais pelo caráter cupulista do movimento uma Constituição democrática e pro-
pobres, contendo os reajustes salariais sindical que apoiava Jango, a repressão gressista, e não um novo arremedo de
nas faixas mais altas. terrorista é facilitada pela pouca pene- ordem jurídica.
Esse bloco, portanto, não via possibi- tração no movimento popular das orga- Todos os grandes problemas nacio-
lidades de solução da crise sem que nizações de esquerda que procuraram nais - a reforma agrária, a questão do
houvesse alterações expressivas nas es- a resistência armada ao regime do AI- capital estrangeiro, a participação dos
truturas gerais do desenvolvimento bra- 5. O baixo grau de resistência aos mili- trabalhadores e da classe opeária no
sileiro, Buscava, no entanto, a solução tares facilitou o arrocho salarial, a con- governo -- ficavam para ser resolvidos
negociada dessas reformas e afastava centração de renda e o sucesso econô- por quem mais acumulasse forças no
os esquemas considerados radicais mico dos anos 68-73, período da Nova República, tão dra-
para qualquer uma delas. Nele estavam A partir de 1974, porém, todos os fa- mática e enigmaticamente iniciada,
516
BR DFanaSB VEGNCGAM,R2Cê) / 3 31 an CO 2, p2GO
INDICE
517
BR DFANBSSVB.
Este índice, por sua vez, o remete para o Índice de Áreas, Te- CORRUPÇÃO
mas e Assuntos, onde os termos que você procura estão encaixa- DIREITOS HUMANOS
dos. Esta segunda parte do índice é formada por cinco grandes á- ELEIÇÓES !
FEDERALISMO
Populares, Organização Social e Política), subdivididas cada uma
HISTÓRIA
entre quatro a vinte temas (também organizados por ordem alfa-
IMPRENSA
bética), que por sua vez são subdivididos em quatro ou cinco as- JUDICIÁRIO
suntos, cada um. LEGISLATIVO
MILITARES
MUNICIPALISMO
OLIGARQUIAS
OPINIÃO PÚBLICA
ARTES PARTIDOS
CIENCIA POLÍTICA EXTERNA
CAPITAL ESTRANGEIRO
" COMÉRCIO EXTERIOR AMBIENTE
DESEMPENHO ECONOMICO
EMPREGO ECOLOGIA
MINÉRIOS POLUIÇÃO
PUBLICIDADE & RIOS: A situação de poluição dos rios brasileiros, resultante do de-
TRABALHADORES NO CAMPO
No assunto POLUIÇÃO, você encontra os verbetes RIOS,
TRABALHADORES URBANOS
AGROTÓXICOS E CUBATÃO. Os resumos que seguem
os ver-
CONDIÇOES DE VIDA no Índice alfabético de termos, que indicará em que área, tema
DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS e assunto você deve buscar as informações que lhe interessam.
518
HO&sBa, an cos, p262
521
33 1 an coa , p 269
ar pransse viera. A0
MÚSICA FAMÍLIA
e PRODUÇÃO: O mercado da música popular brasileira: a concor- e TAMANHO: O impacto da urbanização acelerada e do modelo eco-
522
GAMAR0
vole 29. ICO2, p AG
pr
PROPAGANDA CARNAVAL
e LEITE EM PÓ: A campanha promocional do leite em pó, apoiada e ESCOLAS DE SAMBA: A evolução das escolas de samba cariocas
na própria estrutura de saúde pública e nos médicos, e os problemas de desde os tempos da marginalização, passando pela oficialização, a os-
saúde das crianças decorrentes do abandono do aleitamento materno tentação que reflete a modernização do País até surgirem os sinais de
p. 29 e 30, v. 1 Uma campanha maléfica mudança
# COCA-COLA : As campanhas promocionais da Coca-Cola e de ou- p. 66 a 68, v. 1 Superescolas S.A.
tros refrigerantes para garantir sua fatia no mercado
p. 175 a 177, v. L É isso' aí
FOLCLORE
e CAPOEIRA : A evolução da luta de capoeira: suas origens como ma-
RACISMO nifestação de resistência dos escravos, e sua expansão -
e HISTÓRIA: O constante processo de discriminação e marginaliza- p. 305 e 306, v. 2 A ginga da liberdade
ção dos não-brancos no nível econômico, social, cultural e existencial,
desde a abolição da escravatura
p. 109 a 113, v. 1 A herança do cativeiro FILOSOFIA
e CONSCIÉNCIA ÉTNICA: As inúmeras formas pelas quais as pes-
soas definem a sua cor
p. 112, v. 1 As cores do brasileiro HISTÓRIA
e SITUAÇÃO DOS NEGROS: A evolução da população não-branca, e EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO: As limitações impostas pelo
sua situação educacional e profissional imediatismo, utilitarismo e pragmatismo das ideologias dominantes
p. 56 e 57, v. 3 Um Brasil cada vez menos branco . . . onde os pretos e par- para o desenvolvimento do pensamento no Brasil
dos ganham pouco . . . têm poucas oportunidades de ascensão social . . . e de p. 417 e 418, v. 2 Asas cortadas
acesso à instrução
e LUTAS DOS NEGROS: A cronologia das lutas dos negros pela li-
bertação e pela conquista da igualdade HISTÓRIA
p. 59 e 60, v. 3 Contra a escravidão e o racismo
v. tb. HISTORIOGRAFIA
e FUTEBOL: A discriminação contra os negros em alguns dos primei-
e DOCUMENTOS: O descaso do governo e de portadores particula-
ros clubes de futebol
res de documentos com a preservação do material histórico nacional
p. 217 a 222, v. 1 No país do futebol
p. 245 e 246, v. 1 Destruição da memória
SEXO
e POLÍTICA OFICIAL: O projeto conservador do Regime Militar na RELIGIÃO
área da família e do comportamento sexual, as mudanças na estrutura
da sociedade que empurraram as mulheres para o mercado de trabalho RELIGIOSIDADE
e as transformações que inviabilizaram esse projeto
p. 49 a 52, v. 1 A moral da história & ADEPTOS: A evolução das religiões no Brasil e no mundo, do ponto
e VIOLÉNCIA SEXUAL: A violência sexual em todas as camadas da de vista do número de adeptos declarados ou estimados
população, com destaque para os casos de Lindomar Castilho-Eliane p. 164 a 166, v. 3 As religiões no Brasil (tabelas e gráficos)
de Grammont, Doca Street-Angela Diniz, Aracelli e Alfredo Buzaid Jr. p. 167 e 168, v. 3 As religiões no mundo (tabelas e mapa)
p. 178 a 180, v. 1 Sexo bruto
e HOMOSSEXUALISMO: Os preconceitos, a repressão e a explora- CULTOS
ção consumista, que cercam o homossexualismo, ao lado de sinais de © CATOLICISMO: A evolução do número de católicos no Brasil, a
mudança, com a conquista de direitos evolução da distribuição dos católicos pelo mundo, o peso dos católicos
, p. 152 e 153, v. 1 O consumo e o medo em cada continente, e os resultados de uma pesquisa sobre a prática da
523
ar oransss vaençaa24 042394 3n0o2, p 26%
524
eroransss aaa. 404482s an 00a,268
GRUPO VOTORANTIM
DISTRIBUIÇÃO DE RENDA © HISTÓRIA : A luta de José Ermírio de Moraes contra as pressões
das multinacionais do alumínio para implantação de uma fábrica na-
cional
ESTRUTURA p. 83 e 84, v. 1 Ermírio e as seis irmãs
e EVOLUÇÃO: O aprofundamento da concentração da renda entre
1960 e 1980, aumentando a miséria de milhares de brasileiros e concen-
trando a capacidade de consumo ENERGIA
p. 337 a 340, v. 2 Indicadores da miséria
p. 170 a 172, v. 3 O paraíso dos ricos
© DEBATE: A posição de economistas do governo e da oposição ao ÁLCOOL
Regime Militar sobre a teoria que defende a necessidade da concentra- e PROÁLCOOL: O sucesso técnico do Programa do Álcool e os pro-
ção da renda para impulsionar o desenvolvimento blemas que ele gerou, como a concentração da terra, a poluição do am-
p. 174, v. 3 O debate sobre o crescimento econômico e a concentração de biente e a competição da cana com os alimentos
renda p. 415 e 416, v. 2 Uma solução-problema
e POSIÇÃO NO MUNDO: A participação das famílias 10% mais ri- e PRODUÇÃO: A evolução da produção de álcool e do consumo
cas na renda nacional, no Brasil e em outros países energético final, de 1973 a 1984
p. 173, v. 3 Uma das maiores concentrações de renda do mundo p. 415, v. 2 A energia do álcool (tabela)
525
BR A 2329 an©or, p r69
© LIGHT: A produção de energia elétrica no Brasil e os escândalos União, Estados e Municípios na receita tributária do Brasil, de 1956 a
que envolveram a Light desde sua instalação em 1899 até a compra 1981
pelo governo Geisel, em 1978 p. 464, v. 2 Um golpe na autonomia
p. 197 a 199, v. 1 O polvo canadense v. tb.
e CENTRALIZAÇÃO: Os efeitos das mudanças na tributação sobre a
HISTÓRIA autonomia dos Estados e Municípios
e FONTES ENERGÉTICAS: A utilização de fontes de energia e o es- p. 114 a 117, v. 1 Imperadores do Planalto
tágio de desenvolvimento produtivo correspondente, na evolução da p. 356, v. 2 Poder de baixo
Humanidade - do uso do músculo humano à utilização da energia nu-
clear
p. 154 a 156, v. 1 Do músculo à fissão INDÚSTRIA
e POLÍTICA ENERGÉTICA : A evolução da estrutura de consumo de
energia, sua associação com as etapas de industrialização e as políticas AUTOMOBILÍSTICA
governamentais adotadas em relação ao uso de diversas fontes de ener- e HISTÓRIA: A evolução da indústria automobilística no Brasil, seu
gia, no Brasil vertiginoso desenvolvimento à custa de todo tipo de favorecimento go-
p. 229 a 232, v. 1 Da lenha à crise vernamental, e a crise do começo dos anos 80
e ESTRUTURA DE CONSUMO: A evolução do consumo de energia p. 261 a 264, v. 1 Rastros das múltis
no Brasil, conforme o tipo, de 1910 a 1983 e PRODUÇÃO: A evolução da produção da indústria automobilística,
p. 230, v. 1 O consumo de energia (tabela) de 1957 a 1983
p. 232, v. | Fontes energéticas p. 262, v. 1 Com a crise, a queda (gráfico)
pyl 19, v. 3 O Resprezo à eletricidade e AUTOPEÇAS: O caso das molas Sueden - o projeto de verticaliza-
&CUSTO DAS IMPORTAÇOES: A evolução dos gastos em divisas ção da produção da Ford e a resistência de Miriam Lee, presidente da
com as importações de carvão, petróleo e seus derivados, de 1950 a Sueden S.A.
1965 p. 264, v. 1 A Ford contra a Sueden. Ou como as múltis se apossam "das
p. 231, v. 1 O custo das importações migalhas"
PETRÓLEO BEBIDAS
© PETROBRÁS: A luta pela criação do monopólio estatal do petróleo, © REFRIGERANTES: A história da Coca-Cola no Brasil e a disputa
as pressões das empresas estrangeiras, a aprovação da lei e a grande do mercado de refrigerantes
campanha nacionalista da década de 50, lembrada 31 anos depois, na p. 175 a 177, v. 1 É isso aí
votação da lei de reserva de mercado da informática p. 176, v. 1 A dona do mercado (tabela)
P. [37 e 198, v. 3 Momentos históricos
v. 10,
p. 341 a 344, v. 2 O povo nas ruas ! BÉLICA
e EVOLUÇÃO: A evolução do consumo, da produção, das importações e HISTÓRIA: A trajetória da indústria bélica brasileira, que em 1964
e das exportações de petróleo; as etapas de exploração e do nível do era incipiente e em 1984 transformou o Brasil em um dos maiores ex-
consumo de petróleo no Brasil e a evolução da porcentagem dos inves- portadores de armas
timentos da Petrobrás destinados à exploração p. 357 a 360, v. 2 A guerra é nossa
p. 116 a 118, v. 3 As quatro etapas da dependência
© EXPLORAÇÃO SUBMARINA : A política da Petrobrás em relação ESTRUTURA
à exploração e à produção em terra e no mar e ESTRUTURA DO PIB: A divisão do PIB brasileiro por grandes se-
p. 118, v. 3 Um erro fatal, corrigido com atraso tores, de 1939 a 1982
p. 230, v. 3 A indústria passou à frente da agricultura...
e ESTRUTURA DA PRODUÇÃO: A evolução da estrutura da indús-
NUCLEAR tria de transformação, de 1949 a 1980
© ACORDO NUCLEAR: A política nuclear brasileira, as pressões p. 230 a 232, v. 3 A industrialização brasileira
americanas, as condições do acordo Brasil-Alemanha e a dependência e CRESCIMENTO: A evolução das taxas geométricas de crescimento
tecnológica do produto e do produto industrial, de 1947-55 a 1973-80
p. 402 a 404, v. 2 Polêmiva nuclear p. 232, v. 3 As fases da industrialização no Brasil
v. tb. © BENS DE CAPITAL: A evolução da produção e da importação de
p. 212 a 215, v. 1 Deserto das invenções máquinas-ferramenta, de 1955 a 1980
p. 233, v. 3 ...e sobretudo a indústria produtora de equipamentos e
máquinas-ferramenta não têm condições de abastecer autonomamente o
FINANÇAS aís
& DEPENDENCIA: O processo de industrialização desequilibrada a
partir de 1956 e o aprofundamento da dependência
SISTEMA FINANCEIRO p. 234, v. 3 A dependência na industrialização
© MUNDIAL: O surgimento e a evolução do sistema financeiro inter-
nacional, intimamente ligado às necessidades de expansão das econo-
mias mais desenvolvidas e seus reflexos sobre o Brasil HISTÓRIA
p. 69 a 72, v. 1 Os dólares marcados e PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO: A evolução da industria-
© NACIONAL: As características do sistema financeiro montado pelo lização brasileira, desde o início relativamente autônomo no começo
Regime Militar para dar suporte ao seu modelo econômico e as dife- do século até o desenvolvimento dependente, que se inicia no período
renças com o surto de desenvolvimento do governo Juscelino de Juscelino e se aprofunda com o Regime Militar
p. Só a 60, v. 1 O castelo de papéis p. 457 a 462, v. 2 Industrialização deformada
© HAVERES FINANCEIROS: A evolução dos haveres financeiros em
poder do público, de 1964 a 1982 INFORMÁTICA
p. 57, v. 1 Nascem novos dinheiros (tabela e gráfico) e HISTÓRIA : A evolução do setor de computação no Brasil, sua orga-
© CRISE: Os efeitos da crise econômica dos anos 80 sobre importantes nização, seu desenvolvimento e a luta pela "reserva de mercado"
sustentáculos do sistema financeiro p. 385 a 388, v. 2 Uma indústria de futuro
p. | a 12, v. 1 Do buraco ao abismo e EMPRESAS: A evolução do número de empresas nacionais instala-
v. th. das entre 1974 e 1982, as dez maiores empresas nacionais segundo o fa-
POEÍTICA/CORRUPÇÃO turamento em 1982 e evolução do valor do parque industrial nacional e
estrangeiro entre 1980 e 1982
p. 194 a 196, v. 3 Nasce uma indústria nacional... mas ainda está longe de
TRIBUTAÇÃO alcançar as estrangeiras (gráfico e tabela)
e HISTÓRIA: A evolução do sistema tributário brasileiro, da Repú- & MERCADO: A evolução do mercado brasileiro de computadores e
blica Velha ao Regime Militar, as mudanças na estrutura de recolhi- da participação da indústria nacional no mercado brasileiro, de 1979 a
mento e distribuição dos impostos e o aumento da carga tributária so- 1983; os dez maiores mercados de informática do mundo em 1981
bre os de menor renda p. 194 a 196, v. 3 Nasce uma indústria nacional... (gráfico e tabela)
p. 463 a 465, v. 2 A nova derrama . [ PRODUÇÃO: A evolução do número de computadores instalados e
© DISTRIBUIÇÃO DE IMPOSTOS: A evolução da participação da da participação dos míni e microcomputadores, de 1975 a 1982
526
samussrmmwáãêâââôjanmâ7, 122590
p. 196, v. 3 ...que domina uma importante parcela da produção...
e EMPREGO E IMPORTAÇÃO: Participação das empresas nacio- p. 242, v. 3 Um crescimento estratégico, a produção cresceu... (gráfico)
nais e estrangeiras instaladas no Brasil na geração de empregos e nas e PROJETOS: A localização dos grandes projetos minerais
importações, em 1983 p. 246, v. 3 Os grandes projetos minerais (mapa)
p. 196, v. 3 ...gera mais empregos, importa menos...
e RESERVA DE MERCADO: A luta pela aprovação da lei de reserva
de mercado para a informática, comparada à campanha do petróleo PUBLICIDADE
p. 197 e 198, v. 3 Momentos históricos
TÉXTIL CAMPANHAS
e NORDESTE: O sucesso e a decadência da indústria têxtil no Nor- © LEITE EM PÓ: A campanha de promoção do leite em pó
deste, pressionada constantemente pelas multinacionais, desde o assas- p. 29 e 30, v. 1 Uma campanha maléfica
sinato
1983 de Delmiro Gouveia até o suicídio de Carlos A. de Menezes, em
© COCA-COLA: Apropaganda para venda de refrigerantes ,
p. 175 a 177, v. 1 É isso aí
p. 392 e 393, v. 2 Nas malhas das múltis v. tb.
e VERBAS DE PUBLICIDADE: A evolução da participação dos vei-
INFLAÇÃO culos na distribuição da verba publicitária
p. 203, v. 3 TV e publicidade
527
sroranassVONT 02 1523an 00, p ou
ORGANIZAÇÃO
e HISTÓRIA: A evolução da organização dos trabalhadores rurais,
desde 1930, a criação do CONTAG, os congressos camponeses e a luta
pela Reforma Agrária
p. 383 e 384, v. 2 A luta pela terra
MOVIMENTOS ESPECÍFICOS
LUTAS
, &) E e CRONOLOGIA: Os principais movimentos de camponeses, em
CARÉSTIA luta pela terra, desde o início da República; as greves de trabalhadores
e HISTÓRIA : A evolução das lutas contra a carestia no Brasil, desde o rurais, de 1946 a 1983
memorial protestando contra o aumento do preço dos bondes, em p. 215 e 216, v. 3 As lutas no campo
1879, até o Movimento do Custo de Vida, no Regime Militar e CONFLITOS DE TERRA : O agravamento e multiplicação dos con-
p. 214, v. protestos contra a carestia v. tb. flitos pela posse da terra durante o Regime Militar, e a política de titula-
e ABAIXO-ASSINADO: A tentativa de integrantes do Movimento ção e militarização do assunto, sem nenhum ganho expressivo para os
contra a Carestia de entregar ao presidente Geisel um abaixo-assinado lavradores
de 1,3 milhão de assinaturas p. 368 a 372, v. 2 Mapa de sangue
p. 85 a 89, v. 1 Saudades dos 80% - 90% de Jango e MORTOS: Os municípios onde ocorreram mortes em conflitos de
p. 421 a 425, v. 2 De volta, por mudanças terra, em 1980 e 1981
© SAQUES:A explosão espontânea da população faminta, principal- p. 370, v. 2 Os mortos pela posse da terra
mente no Nordeste, mas que também se manifesta nas cidades, como e LIGAS CAMPONESAS: A história da organização de ligas campo-
em 1962 no Rio de Janeiro e em 1983 em São Paulo, no bairro de Santo nesas, surgidas em 1954 no Nordeste, e sua vida relativamente curta,
Amaro pressionadas pela sindicalização rural e pela repressão pós-64
p. 167 e 168, v.1 A explosão dos famintos p. 394 a 39%, v. 2 Fogo morto
ESTUDANTES
© UNE: A história da resistência dos estudantes e de sua participação TRABALHADORES URBANOS
nas lutas políticas brasileiras ao lado das forças populares, vista através
das lutas de sua entidade nacional HISTÓRIA
p. 81 e 82, v. 1 A longa resistência
© GREVES: A evolução do movimento popular desde o Estado Novo
HOMOSSEXUAIS -- e especialmente sob o Regime Militar -, principalmente dos movi-
e DISCRIMINAÇÃO: O movimento dos homossexuais contra pre- mentos grevistas, seus momentos de expansão e refluxo, quando o mo-
conceitos e a segregação e a conquista de direitos vimento assume outras formas, como a luta contra a carestia
p. 152 e 153, v. 1 O consumo e o medo p. 421 a 425, v. 2 De volta, por mudanças
e GREVES/ BALANÇO: Um balanço das greves nos períodos de
1945-63, de 1964-78 e 1978-84
HABITAÇÃO p. 212 e 213, v. 3 As greves no País
e MOVIMENTO SINDICAL: O crescimento do movimento sindical
e FAVELADOS: A cronologia dos protestos dos favelados de São a partir de 1978, apesar dás novas limitações impostas pelo Regime Mi-
Paulo e Rio de Janeiro, de 1979 a 1984 litar à organização dos trabalhadores
p. 222, v. 3,0 protesto dos favelados p. 205 a 209, v. 1 Sinal dos tempos
e MUTUÁRIOS DO BNH: A organização e a luta dos mutuários do
BNH contra o aumento excessivo das prestações da casa própria
p. 432, v. 2 Os abalos no alicerce do sistema
MULHERES pala ORGANIZAÇÃO SOCIAL
e HISTÓRIA : A evolução da luta das mulheres contra a discriminação,
sua organização e participação nas lutas políticas do País
p. 486 a 488, v. 2 As lutas das mulheres
e PARTICIPAÇÃO POLÍTICA : A evolução da participação das mu- ADMINISTRAÇÃO
lheres nas lutas políticas do País
p. 354 e 355, v. 2 A mulher na rua FUNCIONALISMO
v. tb. e REFORMA ADMINISTRATIVA: As modificações da reforma ad-
© ANISTIA: A participação das mulheres na luta pela anistia
ministrativa promovida pelo Regime Militar e a situação dos funcio-
p. 31 a 34, v. 1 Em busca da justiça
nários, que continuam com os salários baixos e praticamente sem esta-
NEGROS bilidade p. 474 a 476, v. 2 Um regime de castas
e HISTÓRIA : A cronologia das lutas dos negros contra a escravidão e
a discriminação JUSTIÇA
p. 59 e 60, v.3 Contra a escravidão e o racismo e ESTRUTURA: O elitismo e a centralização do sistema judiciário,
v. tb. que - sem recursos suficientes - funciona mal e lentamente
p. 109 a 113, v. 1 A herança do cativeiro p. 124 e 125, v. 1 Cega. E cara e lenta
TRANSPORTES
e URBANO: A cronologia dos principais protestos de usuários de AMBIENTE
transporte coletivo de São Paulo e do Rio de Janeiro, de 1974 a 1984
p. 221 e 222, v. 3 O protesto dos pingentes ECOLOGIA
e FLORESTA AMAZÓONICA: O esquema dos ciclos básicos de vida
TRABALHADORES da floresta e os riscos de sua ocupação desordenada, .com conseguên-
cias graves para todo o equilíbrio ecológico do planeta
ORGANIZAÇÃO p. 80 a 82, v. 3 A floresta vive de si mesma ... mas é ameaçada pelo
e CENTRAIS SINDICAIS: A história da formação de centrais sindi- homem
528
BRDFANBSSVB,.GN AAA, 24 p24%2
5ao
15siRo muCªsé-'e'“;
a aero RM
URBANIZAÇÃO
e POLÍTICA URBANA: O processo de urbanização acelerado das ci- CONDICOES DE VIDA
dades brasileiras, provocado pelo rápido e concentrado crescimento in-
dustrial, e a consequente desorganização da vida urbana
p. 433 a 437, v. 2 As cidades inchadas EDUCAÇÃO
e GRANDE SÃO PAULO: A evolução da área urbanizada da e POLÍTICA EDUCACIONAL: O aumento do número de alunos e
Grande São Paulo professores em todos os níveis e a queda de qualidade do ensino nos
p. 434, v. 2 O inchaço da Grande São Paulo (mapa) anos do Regime Militar 3
e ZONA SUL DE SÃO PAULO: O crescimento e a politização da P: 361 a 365, v. 2 A crise daeducação _
Zona Sul da cidade de São Paulo f p. 182 a 184, v. 3 A educação no Brasil à -
p. 437, v. 2 Zona Sul de São Paulo: um exemplo urbano e VERBAS: A evolução das verbas destinadas à educação
9Bor
GRAU DE URBANIZAÇÃO:é A evolução
(19'40-1980) UG) da populaç
população rural e ur. B- 199 e 184, v, 3 d queda
© ANALFABETISMO: das verbasno analfabetismo
A evolução
p. 186, v. 3 O analfabetismo no Brasil
p. 218, v. 3 Um país urbano e PRÉ-ESCOLA: O atendimento da pré-escola
e GRAU DE URBANIZAÇÃO: A evolução da população urbana, por p. 185, v. 3 O precário atendimento aos menores de seis anos
região (1940-1980) | © UNIVERSIDADE: A evolução das universidades brasileiras, a luta
p. 218, v. 3 O Sudeste, mais industrial, é mais urbano (quadro) por uma refórma universitária feita a partir de um grande debate e a re-
e REGIOES METROPOLITANAS: A evolução da população que forma imposta pelo Regime Militar
vive nas nove principais regiões metropolitanas (1950-1980) p. 438 a 440, v. 2 Universidade sufocada
p. 219, v. 3 As regiões metropolitanas ficaram superpovoadas . . © REPRESSÃO: Os instrumentos repressivos que o Regime Militar
(gráfico) usou contra os estudantes e professores
* TAMANHO DAS CIDADES: A evolução do número de cidades, p. 363, v. 2 Repressão nas escolas
segundo o tamanho da população (1940-1980) v. tb. E
p. 219, v. 3 ... cresceu o número das grandes cidades , . . (quadro) p. 150 e 151, v. l A revanche do regime
e FAVELAS E CORTIÇOS: A evolução do número de favelas, barra- v. tb. % 2 2
cos e população favelada em São Paulo (1971-1983) e Rio de Janeiro e EVASÃO : A população em idade escolar que está fora das escolas
, (1950-1982) e população residente em cortiços em São Paulo (1983) p. 152 e 153, v. 3 O menor trabalhador _ 3 2 !
p. 220, v. 3 ... mas pioraram as condições de vida dos trabalhadores ur- e ACORDO MEC-USAID: Os reflexos da interferência americana no
hanos Brasil, através dos acordos MEC-USAID
e SANEAMENTO BÁSICO: A evolução da porcentagem de do- p. 438 a 440, v. 2 Universidade sufocada
micílios que possuem saneamento básico, iluminação e bens duráveis v. tb. 2 Na 1
(19404980) € tszl a 282, v. 2 A dommaçao americana
e LUTAS POR TRANSPORTES: A cronologia dos protestos popula- sobre a produção de contos literários
res nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, de 1974 a 1984 p. 2 O arande mosaico
p. 221 e 222, v. 3 O protesto dos pingentes HABITAÇÃO
e LUTAS DOS FAVIÉLADOS: A cronologia do movimento de favela- e POLÍTICA HABITACIONAL: A evolução da política nacional de
dos nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, de 1979 a 1984 habitação, do governo Dutra até a crise atual do BNH
p. 222, v. 3 O protesto dos favelados p. 429 a 432, v. 2 Um sonho em ruínas
© BNH: A crise estrutural do Sistema Financeiro de Habitação. A mo-
COMUNICACOES vimentação dos mutuários e as propostas de saída do Regime Militar
p. 432, v. 2 Os abalos no alicerce do sistema
IMPRENSA $! tb. - e
e MONOPOLIZAÇÃO: A concentração dos órgãos de imprensa nos CIDADES/ URBANIZAÇÃO
anos do Regime Militar 2
p. 210 e 211, v. 1 Monopólio dos barões NUTRIÇÃO $
e PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: A política agrícola do Regime Mi-
RÁDIO litar, privilegiando os produtos voltados para a exportação e o agrava-
e HISTÓRIA : A evolução do rádio no Brasil,.onde as concessões de mento do problema da fome - a despeito da modernização da agricul-
emissoras obedecem a critérios políticos, desde 1930. A utilização do tura
rádio como instrumento do poder institucional p. 61 a 64, v. 1 O regime da fome
p. 43 a 47, v. 1 Os donos da voz p. 38 a 40, v. 3
e APARELHOS E EMISSORAS: A evolução do número de apare- Nossa agricultura de duas caras . . .
lhos receptores, do número de emissoras e da verba publicitária v. tb. OA
p. 44, v. 1 O rádio espalhou-se pelo País na era do transistor . . . mas não p. 121 a 123, v. 1 Do café à soja _ Ea !
conservou a força do passado. E o crescimento das FMs aponta uma nova é DESNUTRIÇÃO; As consequências da desnutrição no desenvolvi-
tendência (tabela) mento físico das crianças
p. 41 e 42, v. 3 Uma raça de andes
TELEVISÃO e CAUSAS DA FOME: Os mitos que tentam explicar as causas da
e HISTÓRIA : A expansão da TV com o modelo econômico - baseado fome £
na expansão dos bens duráveis - e o apoio do Regime Militar à Rede p. 119 e 120, v. 1 A queda dos mitos
Globo, formada em moldes modernos v. tb.
529
J 224 a
ar pranssa VeGNCARA GEEA
nas de controle da populaçã ciário, a estrutura e a política dos órgãos de assistência e a crise estru-
p. 100, v. 1 A reedição de Malthus tural
v. tb. p. 449 a 452, v. 2 A agonia da Previdência
p. 119 e 120, v. 1 A queda dos mitos e ORIGEM: A origem do sistema de aposentadoria na Alemanha e u !
© ESPERANÇA DE VIDA : A esperança de vida ao nascer, no mundo história do sistema previdenciário norte-americano
p. 98, v. 1 O tamanho da vida p. 450, v. 2 Um problema também nos EUA
© MIGRAÇOES: Os deslocamentos da população brasileira do campo
para a cidade, ou de uma cidade a outra, constante desde 1500
p. 413 e 414, v. 2 Um povo nômade REGIÓES
© URBANIZAÇÃO: A evolução da população rural e urbana
p. 2 a 4, v. 3 O novo Brasil (gráfico) AMAZONIA
p. 128, v. 3 A maior parte da população passou a morar nas cidades . . . e POLÍTICA DE OCUPAÇÃO: O processo de ocupação desorde-
(gráfico) nada da floresta amazônica, acelerado nas últimas décadas, e os perigos
p. 218, v. 3 Um país urbano (tabela) de graves alterações ambientais
p. 218, v. 3 O Sudeste, mais industrial, é mais urbano (tabela) p. 157 a 160, v. 1 A destruição do paraíso
© FLORESTA AMAZÓONICA : O esquema dos ciclos básicos da flo-
ÍNDIOS resta e os riscos de sua ocupação desordenada
e POLÍTICA INDIGENISTA : A participação dos índios na história p. 80 a 82, v. 3 A floresta vive de si mesma . . . mas é ameaçada pelo homen.
brasileira, a política indigenista e a luta pela sobrevivência dos povos e CRONOLOGIA : A ocupação da Amazônia
indígenas i p. 83 e 84, v. 3 A ocupação da última fronteira
p. 145 a 149, v. 1 Genocídio sem trégua © INTERNACIONALIZAÇÃO: Os planos de internacionalização,
e INDÍGENAS: A população indígena por área cultural (1982) substituídos, depois de 1964, pela ocupação por empresas estrangeiras
p. 78, v. 3 Quantos são os índios p. 239 e 240, v. 1 O complô da cobiça
© LIDERANÇAS: As personalidades indígenas que se destacaram na v. tb.
luta em defesa dos direitos dos índios AMBIENTE/ECOLOGIA
p. 146, v. l A liderança da resistência indigena
© LUTAS: A cronologia da luta dos povos indígenas NORDESTE
p. 77 e 78, v. 3 Meio milênio de genocídio e INDUSTRIALIZAÇÃO: O esvaziamento dos projetos pré-64 da SU-
© TERRAS: A situação das terras indígenas, os conflitos pela posse da DENE, a industrialização artificial - baseada em incentivos fiscais - e
terra em 1984 e o caminho da legalização odesenvolvimento da região, com a persistência das desigualdades re-
p. 74 e 75, v. 3 A disputa pela terra gionais
p. 76, v. 3 O caminho para legalizar a posse da terra p. 409 a 412, v. 2 O outro lado do progresso
p. 76, v. 3 A situação das terras , e CRESCIMENTO: A comparação do crescimento do PIB no Nor-
deste com o do Brasil e a estrutura de distribuição da população econo-
MENORES micamente ativa por setores de atividade (1961 a 1981, gráfico)
e POLÍTICA DE PROTEÇÃO: A evolução da política de proteção ao p. 206 a 2Q7, v. 3 O Nordeste se desenvolve
menor, a situação de abandono e miséria de grande parcela da popula- e INCENTIVOS: A participação da SUDENE na distribuição dos in-
ção menor, as mudanças implantadas pelo Regime Militar e seus resul- centivos fiscais
tados p. 208, v. 3 ...mas a SUDENE é esvaziada (gráfico)
p. 301 a 304, v. 2 Nossos pixotes e SITUAÇÃO SOCIAL: A participação percentual do Nordeste no
e POPULAÇÃO MENOR: A estrutura etária da população brasileira número dos domicílios que possuem bens de consumo duráveis (1960-
e a de países desenvolvidos e subdesenvolvidos 1980, tabelas) e a participação percentual do Nordeste no total da po-
p. 10, v. 3 Um país de jovens . , . como os subdesenvolvidos pulação, na população por grau de instrução, na população por faixa de
e TRABALHO E EDUCAÇÃO: A situação de trabalho e de educação renda e nos domicílios dotados de infra-estrutura (tabelas e gráficos)
dos menores p. 209 e 210, v. 3 O Nordeste passou a consumir mais. . . mas ainda concen-
p. 154, v. 3 Trabalhando muito . . . ganhando pouco . . . e um terço fora da tra a pobreza
escola © AGRICULTURA : O desvirtuamento, pelo Regime Militar, de qua-
p. 152 e 153, v. 3 O menor trabalhador tro projetos prioritários da SUDENE, elaborados e iniciados antes de
© INFRATORES: O perfil sócio-econômico dos menores infratores 1964
p. 155, v. 3 O menor infrator p. 295 a 298, v. 2 Verso e reverso
© CARENTES: A situação das famílias muito pobres, de onde saem os v. tb,
menores carentes e MIGRAÇÓOES: O êxodo dos nordestinos para outras regiões do País
p. 156, v. 3 As famílias muito pobres p. 413 e 414, v. 2 Um povo nômade
v. tb.
p. 79 e 80, v. 1 O amargo sabor do lar
SEGURANÇA
MULHERES
© MERCADO DE TRABALHO: O crescimento da participação das CRIMINALIDADE
mulheres na PEA, mas ainda longe dos homens, e em situação pior no e EVOLUÇÃO: O crescimento da violência nas cidades brasileiras,
mercado de trabalho apesar do fortalecimento da polícia
p. 32 a 34, v. 3 As mulheres invadem o mercado de trabalho, mas por baixo p. 122 a 124, v. 3 A violência tomou o País de assalto . . . concentrando-se
p. 35 e 36, v. 3 As condições de trabalho melhoram, mas a discriminação nas capitais . . , atingindo mais os meio-ricos. . . enquanto a polícia dobrava
continua sua força, sem resolver
p. 125, v. 3 Belo Horizonte, a evolução do crime (gráfico e tabela)
NEGROS p. 126, v. 3 São Paulo, capital também do crime (gráfico e tabela)
e POPULAÇÃO NEGRA: A evolução da população não-branca © CAUSAS: As relações existentes entre criminalidade e urbanização
p. 56 e 57, v. 3 Um Brasil cada vez menos branco . . p. 123 e 124, v. 3 A máquina do crime urbano
© LOCALIZAÇÃO: A composição da população brasileira, por cor e © MENORES: As relações entre a desagregação familiar e a criminali-
por região dade de menores
p. 58, v. 3 E vivem principalmente no Norte e Nordeste p. 155, v. 3 O menor infrator
v. tb. COMPORTAMENTO/RACISMO p. 156, v. 3 As famílias muito pobres
VELHOS POLÍCIA
e POPULAÇÃO IDOSA: A evolução da população idosa e MILITARIZAÇÃO: As atribuições da polícia e dos organismos poli:
p. 126 a 128, v. 1 Solidão no envelhecer ciais - que quase foram unificados sob um comando civil antes de 1964
© ESPERANÇA DE VIDA: A esperança de vida no mundo - e sua militarização aberta e progressiva sob o Regime Militar
p. 98, v. 1 O tamanho da vida (mapa) p. 241 a 244, v. 1 O reforço do poder
v. tb, p. 116 e 117, v. 1 Sob o controle e vigilância da União e do Exército
COMPORTAMENTO/VELHICE © EFETIVOS: A evolução dos efetivos policiais
CONDIÇOES DE VIDA/SAÚDE/AINDICADORES p. 124, v. 3 . . enquanto a polícia dobrava sua força, sem resolver
e ESQUADRÃO DA MORTE: O crescimento e a atuação dos esqua-
PREVIDENCIA drões da morte formados por policiais -- algunsligados à repressão polí-
e POLÍTICA PREVIDENCIÁRIA: A evolução do sistema previden- tica - a partir de 1968
531
ar pranssa BO 4 1 2 34 An Opa io 235
p. 258 a 260, v. 1 Assassinos de aluguel p: 75, v. 1 Das catacumbas à aliança, unindo a oposição
v. tb. e EXPERIÉNCIAS HISTÓRICAS: As revoluções francesa, ameri-
p. 193 a 196, v. 1 Anos de terror cana e russa e as Constituintes que se seguiram a cada uma delas
p. 76 e 77, v. 1 Constituinte e Revolução
PRISÓES e MÉTODO E CONTEÚDO: As condições em que foram preparadas
e POLÍTICA CARCERÁRIA : A transformação das prisões em esco- as Constituições brasileiras e os princípios essenciais da ordem política,
las formadoras de criminosos, principalmente nos anos do Regime Mi- econômica e social estabelecida em cada uma
litar, em função do tratamento desumano dos presos p. 43 a 48, v. 3 Constituição e Constituinte
p. 331 e 332) v. 2 Escolas do crime
v. tb.
© SEXO: A violência sexual nas prisões CORRUPÇÃO
p. 178 a 180, v. 1 Sexo bruto
DENÚNCIAS
TRABALHO e CASOS FAMOSOS: A associação dos casos de corrupção com as
crises políticas; as tentativas de investigação e punição depois de 1964 e
o acobertamento, que deu origem a escândalos, como BNCC, Coroa-
LEGISLAÇÃO Brastel e outros
© CLT: A consolidação das leis já existentes, resultado de lutas antigas p. 389 a 391, v. 2 Mar de lama
dos trabalhadores, anunciada como um gesto generoso de Getúlio © LIVROS: A resenha de alguns livros publicados para denunciar ca-
p. 405 a 408, v..2 O mito da CLT sos de corrupção e relatos de algumas CPIs importantes instauradas
#GTS: A criação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, em para apurar denúncias de irregularidades
substituição à lei da estabilidade p. 29 e 30, v. 3 Da tribuna à livraria
p. 266, v. 2 Governo Castello, 1966: surge o FGTS, clara vantagem pa- e REMESSA DE DOLARES: A história dos jornalistas do Hora do
tronal Povo, processados criminalmente por terem denunciado o mecanismo
v. tb. _ de remessa ilegal de dólares para o Exterior
e JORNADA DE TRABALHO : A fixação da jornada de trabalho e a p. 18 a 20, v. 1 A crônica de um tesouro
lei de férias v. tb.
p. 333 a 336, v. 2 O direito ao lazer e CRÉDITO AGRÍCOLA : Os mecanismos utilizados para fazer opera-
e JOGADOR DE FUTEBOL: A regulamentação da profissão dos jo- ções irregulares com o crédito agrícola
gadores de futebol p. 121 a 123, v. 1 Do café à soja
p. 218, v. 1 Conquistas trabalhistas © POLÍCIA: O envolvimento do Esquadrão da Morte com a cor-
rupção
RELAÇOES DE TRABALHO p. 258 a 260, v. 1 Assassinos de aluguel
© CAMPO : As relações de trabalho no campo, do escravo ao bóia-fria ©IMPRENSA: A censura imposta para impedir denúncias de cor-
p. 203 e 204, v. 1 Um século de dureza rupção
p. 233 a 235, v. 1 O controle da palavra
SINDICATOS
e POLÍTICA SINDICAL: As novas limitações impostas pelo Regime INVESTIGAÇOES
Militar à atuação dos sindicatos - além da estrutura herdada do Estado W © RESTRIÇOES: Os limites que o Regime Militar criou para a investi-
Novo -, a repressão a sindicalistas e ao direito de greve, e o cresci- gação de casos de corrupção, desde a cassação de parlamentares até a
mento do movimento sindical a partir de 1978 limitação do número de CPIs simultâneas
p. 205 a 209, v. 1 Sinal dos tempos p. 37 a 40, v. 1 A ditadura da corrupção
© LEGISLAÇÃO: A legislação que regulamenta a criação e o funcio- e COMISSOES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO: O número
namento dos sindicatos, herdada do modelo de Mussolini de CPIs requeridas, ano a ano, de 1946 a 1983 (total e as destinadas à in-
p. 208 e 209, v. 1 Sindicalismo à Mussolini vestigação de casos de corrupção), o título das CPIs destinadas a apurar
p. 107, v. 3 Decálogo do atrelamento E casos de corrupção, em cada ano, e um pequeno resumo de seis casos
© ESTRUTURA SINDICAL: A estrutura sindical brasileira, formada famosos
por sindicatos, federações e confederações, ligadas ao Ministério do p. 26 a 28, v. 3 O Parlamento desarmado
Trabalho p. 29, v. 3 Da tribuna às livrarias
p. 104 e 105, v. 3 A pirâmide sindical brasileira
e SINDICALIZAÇÃO: A evolução do número de sindicatos e de tra-
balhadores sindicalizados, sua distribuição geográfica, e comparações DIREITOS HUMANOS
com outros países
p. 106, v. 3 Crescem os sindicatos . . . crescem também os sindicalizados . . ,
mas ainda representam uma parcela pequena dos trabalhadores . . principal- ANISTIA
mente nas regiões menos desenvolvidas e CAMPANHA : O movimento - de 1964 a 1979 - pela conquista de
© INTERVENÇOES: A evolução das intervenções governamentais anistia aos atingidos pela repressão desencadeada pelo Regime Militar
nos órgãos sindicais p. 31 a 34, v. 1 Em busca de justiça
p. 108, v. 3 A pesada mão do Estado © HISTÓRIA: As inúmeras anistias em nossa história, desde 1624,
v. tb. marcadas por acordos, concessões e, sobretudo, pelas lutas populares
p. 150 e 151, v. 1 A revanche do regime p. 33, v. 1 Luta e mobilização pelas anistias no Brasil
© METALÚURGICOS: A história de dois importantes sindicatos meta- v. tb.
lúrgicos - o de São Paulo e o de São Bernardo do Campo © MILITARES: A anistia concedida aos envolvidos na Revolta da Chi-
p. 299 e 300, v. 2 Força metalúrgica bata
p. 223 e 224, v. 1 O brado da caserna
e MULHERES: A participação dos movimentos de mulheres na luta
pela anistia É
POLÍTICA p. 354 e 355, v. 2 A mulher na rua
APARATO REPRESSIVO
CONSTITUIÇÃO e ORGÃOS DE REPRESSÃO: A estrutura criada pelo Regime Mili-
tar para instaurar violenta repressão aos seus opositores, composta por
CONSTITUINTE inúmeros órgãos - desde o SNI aos DOI-CODI e DOPS estaduais
e HISTÓRIA: A maneira como foram elaboradas as oito Constitui- p. 193 a 196, v. 1 Anos de terror
ções brasileiras - apenas três através de Assembléia Constituinte -, © POLÍCIA: O relacionamento existente entre os Esquadrões da
tom pequena participação popular, e o anseio pela convocação de uma Morte e a repressão política
Assembléia Nacional Constituinte que reorganizasse O País depois da p. 258 a 260, v. 1 Assassinos de aluguel
derrota do Regime Militar
p. 73 a 78, v. 1 O método da democracia ATENTADOS TERRORISTAS
© CAMPANHA: O movimento pela Constituinte, desde 1964, come- © ACOBERTAMENTO: O mecanismo de substituição da repressão
ando com as organizações clandestinas, passando pelo MDB e che- oficial por atentados terroristas e a impunidade e o acobertamento dos
'gando à Aliança Democrática em 1984 terroristas, como no caso Riocentro
532
aroranssoVo, 120002,
533
a
er pranass 3454 3921 an co2, p 234
blicana, o fortalecimento do poder federal durante o primeiro governo p. 68 a 70, v. 3 Executivo, voolverrr... EB o
de Vargas e a concentração mais acentuada no Regime Militar, enfra- e COMISSOES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO : A limitação
quecendo os poderes dos Estados das condições para funcionamento de CPIs e seus reflexos sobre a in-
p. 114 a 117, v. 1 Imperadores do Planalto vestigação de casos de corrupção
e POLÍCIA: O controle progressivo das polícias estaduais pela União e p. 37 a 40, v. 1 A ditadura da corrupção
pelo Exército p. 26 a 28, v. 3 O Parlamento desarmado
p. 116 e 117, v. 1 Sob controle e vigilância da União e do Exército
v. tb.
e JUDICIÁRIO: A concentração do Poder Judiciário na área federal, LEGISLAÇÃO
com ampliação da influência do Poder Executivo
p. 37 a 40, v. 1 A ditadura da corrupção LEIS DE EXCEÇÃO Hina,
e SISTEMA FINANCEIRO: A centralização das decisões econômico- e BALANÇO: A extensão das leis excepcionais, Atos Institucionais e
financeiras nas mãos do Poder Executivo
Atos Complementares que serviram de suporte ao Reguª; Mblhtalf
p. 56 a 60, v. 1 Castelo de papéis p. 151, v. | Mais de mil leis. E surgem os "pacotes" e os "biônicos
LEIS DE SEGURANÇA NACIONAL I
HISTÓRIA e HISTÓRIA : As leis de segurança nacional que o País já teve, desde
1935, sempre para conter tensões sociais
HISTORIOGRAFIA p. 65, v. 1 A segurança do poder
e INTERPRETAÇÃO: A visão elitista como tradicionalmente foi es-
critá"a História d& Brasil, e o surgimento nos anos 80 de uma nova in-
terpretação LUTAS DEMOCRÁTICAS E POPULARES
p. 307 e 308, v. 2 Apologia do poder
p. 381 e 382, v. 2 Reescrevendo a história CAMPANHAS
© BRASILIANISTAS: As críticas ao trabalho e ao papel desempe- e HISTÓRIA: Um panorama das lutas populares, dos tempos do Im-
nhado por brasilianistas, e o reconhecimento de sua contribuição ao es- pério até a campanha pelas eleições diretas (1984)
tudo do Brasil no final da década de 70 p. 341 a 344, v. 2 O povo nas ruas
p. 321 e 322, v. 2 De bandidos a mocinhos e PARTICIPAÇÃO DOS ESTUDANTES: A participação da UNE e
dos estudantes nas lutas políticas
p. 81 e 82, v. l A longa resistência
IMPRENSA
e PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES: A participação das mulheres
nas lutas políticas
GRANDE IMPRENSA p. 354 e 355, v. 2 A mulher na rua
e HISTÓRIA : O surgimento tardio da imprensa no Brasil, sua evolu-
ção - desde os primeiros jornais até 1964 - e a concentração durante o GUERRILHA
período do Regime Militar © LUTA ARMADA: Os movimentos armados de resistência ao Re-
p. 210 e 211, v. | Monopólio de barões gime Militar
v. tb. p. 500 a 503, v. 2 Olho por olho
e ÚLTIMA HORA: A CPI para investigar as transações do Banco do v. tb.
Brasil com o jornal Última Hora CONSTITUINTE/CAMPANHA
p. 29, v. 3 Da tribuna às livrarias DIREITOS HUMANOS/ANISTIA/CAMPANHA
ENTIDADES DEMOCRÁTICAS/OAB
IMPRENSA POPULAR MILITARES/DISSIDENCIAS/CLUBE MILITAR
© HISTÓRIA : A evolução dos órgãos de imprensa alternativa, que se
empenharam na resistência ao Regime Militar, do jornal Opinião aos
jornais ligados ao movimento sindical E MILITARES
p. 466 a 468, v. 2 A imprensa alternativa
v. tb. CONTROLE DO ESTADO
e ATENTADOS TERRORISTAS: Os atentados terroristas a jornais e HISTÓRIA : As intervenções dos militares na política, chegando a
alternativos e a bancas de jornais seu apogeu com o regime imposto a partir de 1964, que militarizou o
p. 161 a 165, v. 1 O terror tolerado Estado e controlou todas as atividades no País, através de amplo apa-
v. tb. rato de informações
DIREITOS HUMANOS/CENSURA/IMPRENSA p. 133 a 136, v. 1 Sob a tutela das armas
e PRINCIPAIS INTERVENÇOES: Os movimentos militares que se
JUDICIÁRIO expressaram através de insurreições ou golpes, para manter o controle
político do País, em 1922, 1937, 1945, 1954, 1955, 1964, 1968
ESTRUTURA p. 71 e 72, v. 3 A caminho do poder
e HISTÓRIA : A evolução do sistema judiciário e as restrições impos- e MILITARIZAÇÃO DO ESTADO: A estrutura do Poder Executivo
tas pelo Regime Militar militarizado, os ministérios controlados por militares, os órgãos com-
p. 124 e 125, v. | Cega. E cara e lenta plementares e a diminuição dos poderes civis
p. 68 a 70, v. 3 Executivo, voolverrr...
PRERROGATIVAS
e HISTÓRIA : O enfraquecimento do Poder Judiciário com a cassação DISSIDENCIAS
de juízes, suspensão das garantias da magistratura e perda de compe- e CLUBE MILITAR: A história do Clube Militar e o papel político
tência para julgamento de crimes contra a Segurança Nacional desempenhado por ele como palco de luta ideológica entre correntes
p. 133 a 136, v. l Sob a tutela das armas de militares, de 1887 a 1964, e sua última eleição disputada em 1984
p. 68 a 70, v. 3 Executivo, voolverrr... p. 173 e 174, v. 1 Um clube político
v. tb.
e ATENTATOS TERRORISTAS: A punição a militares que exigiam
LEGISLATIVO esclarecimento dos atentados
p. 161 a 165, v. 1 O terror tolerado
CASSAÇÓOES e CASSAÇÓES: A cassação de militares dissidentes, aos quais não foi
© BALANÇO: A aplicação da legislação de exceção contra membros concedida anistia
do Poder Legislativo e o fechamento do Congresso no período do Re- p. 31 a 34, v. 1 Em busca de justiça
gime Militar
p. 150 e 151, v. l A revanche do regime REPRESSÃO
© HISTÓRIA: As sucessivas investidas do Exército contra o movi-
PRERROGATIVAS mento popular, desde a repressão a revoltas populares no século 19 -
e HISTÓRIA : A limitação das prerrogativas do Congresso Nacional e como Canudos - até as ações recentes contra universidades e trabalha-
a concentração do Poder Executivo dores, amparadas pela Doutrina de Segurança Nacional
» p. 133 a 136, v. 1 Sob a tutela das armas p. 293 e 294, v. 2 O inimigo no 1
534
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cora 5 258
SISTEMA PARTIDÁRIO
RELAÇÓES IGREJA-ESTADO
© HISTÓRIA: A evolução da legislação e da organização partidária,
da República Velha até a eleição de Tancredo Neves em 1985
p. 373 a 377, v. 2 Os grilhões partidários
HISTÓRIA
© PARTIDOS NACIONAIS: Número de partidos nacionais e suas ca-
racterísticas; principal limitação do sistema partidário e liberdade ou © REGIME MILITAR: A evolução das relações Igreja-Estado no
não de organização para os partidos comunistas (1889-1984) período do Regime Militar
p. 188 a 190, v. 3 A nossa precária vida partidária p. 325 a 328, v. 2 Os caminhos da Igreja
© FRENTES POLÍTICAS: A sobrevivência dos antigos partidos -
mesmo as organizações de esquerda - dentro das novas legendas cria-
das pelo Regime Militar SUCESSÃO PRESIDENCIAL
p. 191 e 192, v. 3 Partidos dentro dos partidos, As leis apenas taparam o sol
com a peneira... (tabela)
e PARTIDOS DE ESQUERDA : Número de candidatos de organiza- HISTÓRIA
ções de esquerda que concorreram às eleições de 1982, segundo órgãos
e CONJUNTURA : A posição do governo, dos militares, da esquerda e
militares
das potências internacionais nas crises políticas de 1889, 1930, 1937,
p. 192, v. 3 ...e a esquerda, que os militares pretendiam varrer do cenário
1945, 1954, 1964, 1968 e 1984
político, continuou participando das eleições (tabela)
p. 14 a 16, v. 3 As datas dramáticas EM !
e PREFERENCIAS PARTIDÁRIAS: O resultado de pesquisa de opi-
e SITUAÇÃO INTERNACIONAL: A conjuntura política internacio-
nião realizada em 1983 sobre o quadro partidário da época
nal nos momentos de graves crises políticas brasileiras (1889, 1930,
p. 192, v. 3 Um sistema que não agrada a maioria da população (tabela) 1937, 1945, 1954, 1964, 1968 e 1984), o declínio da hegemonia inglesa e
© ULTRADIREITA : A atuação dos grupos de extrema direita, bus-
o crescimento da influência americana
cando, na década de 80, formas de voltar ao poder
p. 17 e 18, v. 3 A escalada americana
p. 453 e 454, v. 2 A espera do pior
© CRISES: As sucessões presidenciais que aconteceram em meio a cri-
v. tb.
ses econômicas graves e que levaram a mudanças pela força
© LEGISLAÇÃO: As restrições do Regime Militar à livre organização
p. 510 a 512, v. 2 Sucessões e crise
partidária
p. 317 a 320, v. 2 Manipulação eleitoral
REGIME MILITAR
e GOVERNO FIGUEIREDO: A transição do Regime Militar para um
POLÍTICA EXTERNA governo civil, com a eleição de Tancredo Neves, as propostas democrá-
ticas e as dificuldades para a superação dos problemas econômicos es-
truturais, que já se delineavam na crise dos anos 60
DIREITOS DO MAR p. 505 a 512, v. 2 Depois do ciclo militar
© MAR TERRITORIAL: Os avanços e recuos da política externa bra- p. 254 a 256, v. 3 Os dois anos da agonia
535
BR DFANdSS v8.6NCAMA, 8404 1334 An co2, p259
Sumário
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