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Retrato do

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BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 84043313NCOA, p 4

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Capa: Layout - Thais Rebello; ilustração < Nelson Mielnik


Fotos da guarda do volume: Cynthia Brito/Agência F4
- BR DFANBSB V8.GNC.AMA, 87 3393 AnCO2 y P 68

(Da Monarquia ao Estado Militar)

VOLUME II

$)

Keditora
POLÍTICA
BRDFANSSS V8.GNC.AM.RA0413313nCO02
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ECONOMIA/EMPREGO: as causas do desemprego e subemprego

há vagas .
Não

A partir do início dos anos 80, o desemprego assume proporções dramáticas no


País. E cresce o subemprego tanto no campo como na cidade, reflexo de uma
política recessiva e, também, de uma doença estrutural da economia brasileira

Quando a Volkswagen do Brasil de- vência para jovens e velhos operários do qual podem resultar situações igual-
cidiu cortar 15% de sua folha de paga- desempregados, parecia ser incapaz de mente novas. Nas próximas semanas
mentos, reagindo, no início de 1981, à sustentar tanta gente. Muitos desem- pode ser criado em São Bernardo um
brutal queda de vendas, cerca de seis pregados já haviam queimado a parca quadro muito tenso, próximo ao das ci-
mil metalúrgicos foram colocados na munição das indenizações, suficiente dades do sertão nordestino nos mo-
rua, quase de um dia para outro, so- para viver não mais do que dois ou três mentos de seca prolongada. Nesse ca-
mente na sua principal fábrica, em São meses. O clima era tenso. so, não está afastada a possibilidade de
Bernardo do Campo, no ABC paulista. Um jornalista, Antônio Carlos Fer- saques a armazéns e mercados."
Como a Volks, a maioria das indústrias reira, do semanário Movimento, foi ao O jornalista acertou quase na mosca.
de São Bernardo demitia aos borbo- ABC, em abril daquele ano, para des- A tensão acumulada pelo desemprego
tões. Ao todo, cerca de 10 mil desempre- crever a situação. Ele fez um prognósti- crescente explodiria dois anos depois,
gados peregrinavam de porta em porta co aterrador: "Os 10 mil metalúrgicos não exatamente no ABC, mas a poucos
de fábrica ou faziam biscates pelas desempregados que perambulam por quilômetros a oeste, na Zona Sul da ca-
ruas da cidade. Mesmo o comércio am- São Bernardo à procura de emprego pital paulista. No dia 4 de abril de 1983,
bulante, última alternativa de sobrevi- são um fato político e sociológico novo, um terremoto político-social abalaria o

BRS
265
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 3341 anco2 , pa

Brasil. Com epicentro no bairro de


Santo Amaro, ondas de saques ao co-
mércio de alimentos, principalmente,
se estenderiam por toda Grande São Governo Castello, amo? cem a a
Paulo durante três dias seguidos. O E, 2 Ne ag.
'a;
abalo repercutiria, por várias semanas, 1966: surge o
em ondas de saques nos bairros pobres
dos principais centros urbanos do País, FGTS, clara s

especialmente o Rio de Janeiro, vantagem patronal


A "rebelião de Santo Amaro", como
ficou conhecido o episódio, não foi sur- r

presa para aquelas pessoas que, como o di


O Fundo de Garantia por Tempo
repórter de Movimento, prestavam a
de Serviço (FGTS) foi instituído por
devida atenção a uma série de fa-
um decreto-lei do presidente Castello
tos e indicadores da economia brasilei-
Branco, em 13 de setembro de 1966,
ra que se acumulavam havia anos,
suprimindo praticamente o direito à
Quando as empresas do ABC paulis- estabilidade no emprego.
ta gomeçaram a demitir em massa, em A Consolidação das Leis do Traba-
1981, as autoridades de governo avalia- lho (CLT), promulgada em 1943, dizia
vam o fato como um "problema locali- que o empregado com mais de um
zado", "facilmente superável". Era um ano de serviço numa empresa só po-
engano, no entanto. Um simples anún- deria ser demitido sem justa causa
cio na seção de classificados dos jornais mediante uma indenização igual ao
cariocas, oferecendo 352 vagas na número de anos de serviço multiplica-
Rede Ferroviária Federal, provocou a do pela sua maior remuneração men-
corrida de uma multidão de mais de 30 sal. Ao empregado com mais de 10
mil pessoas às portas da Estação Barão anos de casa, a CLT garantia o direito
de Mauá, no dia 25 de maio daquele à estabilidade. Sua dispensa somente Um estudo do economista João Men-
ano, O fato, por si só, seria suficiente poderia ocorrer por falta grave, ava- donça da Costa Rego, publicado na
re-
para descartar a hipótese do "problema liada pela Justiça do Trabalho. vista Conjuntura, mostrou que havia
localizado". Quanto ao nível das difí- A nova lei estabeleceu a constitui- acontecido uma grande contração
nos
culdades para superar o problema, os ção de um fundo, administrado pelo investimentos na indústria de transfor-
números da economia falavam mais BNH (Banco Nacional de Habita: mação, entre 1978 e 1980, Além disso,

alto do que os discursos pedindo calma. ção), resultante dos recolhimentos a produção da indús
tria de bens de ca-

Tomando o Estado de São Paulo mensais feitos pelos empregadores de pital - máquinas e equipamentos -
como termômetro da economia brasilei- 8% das remunerações pagas aos em- também vinha dimin
uindo desde 1979,
ra, o alarme já vinha soando pelo me- "pregados. Sobre a conta de cada tra- Como este setor é exatamente aquele
nos desde 1974, quando o número de balhador seriam acrescidos juros e que possibilita a ampliação e constru-

novos empregos industriais passou a correção monetária, em contraparti- ção de novas fábricas,
seria fácil prever

crescer em ritmo cada vez mais lento. da pelo uso do fundo no financia- o aumento do dese
mprego nos anos se-

Em 1981, pela primeira vez, no período mento da construção civil, 'guintes, já que a popul
ação continuaria

pôs-"milagre econômico", as demis- Com a criação do FGTS, as demis- a crescer em ritmo mais ou menos
sões no setor industrial, superariam as sões passaram a poder acontecer a constante, a curto prazo
, e não encon-

admissões. qualquer momento e a um custo mui- traria um mercado de trabalho em ex-

A crise na indústria automobilística to baixo para os empregadores. Além pansão. A "rebelião de Santo Amaro"

de São Paulo, manifestada de maneira disso, abriu a possibilidade para o em- foi, assim, fenômeno perfeitamente

inequivoca no final de 1980, seria mais pregador burlar os reajustes salariais previsível, dispensand
o bolas de cristal.

do que suficiente para conduzir o de- decididos em dissídio coletivo. O me- O saldo dos quatro anos
de recessão

semprego urbano em direção a um canismo é muito simples: na época do em que foi jogado o País após 1980 é

agudo agravamento. Naquele ano, o se- reajuste, despedem-se os trabalhado- dramático. Entre o final
de 1980 e o ini-

tor era responsável por cerca de 500 res menos qualificados, substituindo- cio de 1984, cerca de 5 milhõ
es de bra-

mil empregos diretos e indiretos em os por outros que, por serem novatos, sileiros ingressaram no
mercado de tra-

todo o País. Seria ingenuidade acredi- não têm direito aos salários previstos balho e não encontrara
m emprego, sem

tar que as demissões em massa nas no dissídio. Assim, ao facilitar a alta contar o incalculável contingente dos

montadoras de automóveis não afeta- rotatividade de mão-de-obra, atuaria que perderam seus empr
egos no perío-

riam de modo generalizado todo o se- também como uma força extra de do, de acordo com dado
s do Ministério

tor industrial. - achatamento generalizado dos salá- do Trabalho, Dos quase 51 milhões de

Outro indicador de que o nível de rios. Um informativo do DIEESE re- brasileiros que compunham a Popula-

emprego estava num processo de que- velou como isto se deu em uma em- ção Economicamen
te Ativa, em 1983,

da de difícil e complicada reversão po- presa de ônibus de São Paulo; entre apenas pouco mais de
30 milhões esta-

deria ser encontrado nos índices de in- 1970 e 1971, a empresa substituiu 93% vam registrados regularmente em seus

vestimento industrial, também em ten- dos seus cobradores e a folha de paga- empregos. No mesmo ano, o nível de

dência decrescente: as taxas "futuras" mentos baixou 3,4%, quando deveria emprego industrial na
Grande São Pau-

de crescimento da economia e do nível aumen tar 24%, se mantidos os níveis lo estava abaixo do de
1973, de acordo

de emprego dependem muito da ex- salariais determinados pelo dissídio. com dados da Federação das Indústrias

do Estado de São Paulo


pansão "presente" dos investimentos. a (FIESP), e um
os terço da população do
Estado em con-
266
V8.GNC.AAA, 8404] 334 ancoa, pIO

Gilson Barreto/Agência JB

Juca Martins/F4
Os saques, como em Santo Amaro, SP, em 1983 (na pág. ao lado), foram consequência dos altos índices de desemprego no início
dos anos 80. Acima,filas para empregos numa universidade do Rio (à esq.) e na Volks, em S. B. do Campo

dições de trabalhar estava desemprega- tempo integral, recebe remuneração fica, fazendo com que a agricultura vá
da ou tentando viver de "bicos", segun-. inferior a um salário mínimo. Esse últi- deixando de ser a principal fonte de
do o Departamento Intersindical de Es- mo caso se manifesta, por exemplo, emprego. Mas a industrialização não
tatísticas e Estudos Sócios Econômicos quando uma pessoa recorre a trabalhos gerava empregos nas cidades na mesma
(DIEESE). transitórios, "bicos" e "biscates", para proporção em que crescia a população
Esta era a realidade que explicava os garantir sua sobrevivência. No País, es- urbana. E isso por dois motivos básicos:
vários movimentos de protesto contra a tas últimas categorias de trabalhadores 1) a industrialização apoiava-se princi-
política recessiva e o desemprego acon- sempre predominaram, em números palmente na importação de tecnologias
tecido após a explosão de Santo Ama- absolutos e relativos, sobre a dos traba- que, além de poupadoras de mão-de-
ro, como o acampamento de dezenas lhadores regulares aqueles enquadra- obra, eram - e são ainda - poupadoras
de famílias de desempregados no par- dos perfeitamente nas normas legais. de produtos primários, recursos e ma-
que do Ibirapuera, em São Paulo, no fi- A economista Helga Hoffmann, au- térias-primas abundantes no País, dimi-
nal de 1983, ou a ocupação do prédio tora de um dos mais importantes estu-. nuindo, assim, as possibilidades de ge-
do SINE (Sistema Nacional de Empre- dos sobre o tema, Desemprego e Subem- ração de empregos indiretos; 2) além
gos), em agosto de 1984, também em prego no Brasil, mostrou, em 1975, de "puxadas" pela industrialização, as
São Paulo. como o processo de urbanização acele- populações rurais eram "empurradas"
O desemprego que se manifestava rada vivido pelo Brasil nas últimas dé- para as cidades pelo secular processo
nos anos 80 não seria, no entanto, ape- cadas tornou visível esse problema. de concentração da posse e uso da ter-
nas o resultado de uma política circuns- Primeiro, "pode-se dizer que a famií- ra e pelas dificuldades, cada vez maio-
tancialmente recessiva. Tratava-se, isto lia patriarcal brasileira ocultava o sub- res, de expansão das fronteiras agrico-
sim, da manifestação aguda de um dos emprego na cidade". Hoffmann las (a que se poderia acrescentar ainda
sintomas de uma doença estrutural da lembrava que até os anos 20 era co- a substituição de lavouras por pecuá-
economia brasileira: a histórica subutili- mum encontrar na crônica da época rias e a modernização tecnológica de
zação do enorme potencial de mão-de- referências a famílias com até uma vin- setores de ponta da lavoura).
obra de que sempre dispôs o Brasil. tena de empregados domésticos, de- De acordo ainda com Hoffmann, a
pendentes e agregados, com laços fami- capacidade de absorção de mão-de-
Sempre houve mais "biscateiros" liares mais ou menos longínquos. Com obra do setor industrial brasileiro era
as transformações no estilo de vida ur- uma das mais baixas do mundo. Entre
que desempregados
bana e nos padrões familiares e sociais, 1949 e 1966, em média, menos de 10%
O subemprego ou desemprego dis- o subemprego nas cidades seria mais da População Economicamente Ativa
farçado semprefoi, no Brasil, mais im- evidente. estavam na indústria. Muito pouco,
portante do que o desemprego aberto, Segundo, até 1940 o campo era o considerando que o Brasil já tinha, nes-
aquele que se manifesta quando uma principal responsável pela absorção da se período, porcentagens do produto
pessoa perde o seu lugar no mercado maior parte dos novos contingentes da industrial no Produto Interno Bruto
formal de trabalho e continua a procu- população que ingressavam no mercado típicas dos países capitalistas desenvol-
rar um emprego equivalente. O subem- de trabalho. O desemprego e o sub- vidos. Basta dizer, que, em 1964, o pro-
prego se caracteriza quando uma pes- emprego rural ficavam, assim, ocultos duto industrial correspondia a 30% do
soa trabalha em tempo parcial, mas nas lavouras de subsistência. A partir Produto Interno Bruto brasileiro e a
gostaria de trabalhar em tempo integral; dos anos 50, entretanto, o ritmo de in- população empregada na indústria não
Ou quando, mesmo rabalhando em dustrialização e urbanização se intensi- passava de 8% da Ropulação Economi-
267
BR DFAinoso VB.GNCIAMA. 840443341 an0coAa , p 44

Em 1983, dos quase 51


milhões que compunham
a População
Economicamente Ativa,
apenas pouco mais de 30
milhões de brasileiros
estavam registrados
regularmente em seus
empregos. Um terço dos
habitantes de São Paulo
em condições de
trabalhar vivia de
subempregos. Ao lado,
o "bico" do anunciante
de empregos.
Na extrema dir., fiscais
da prefeitura apreendem
a anca de um camelô
no centro de São Paulo

Daniel Augusto Jr/


Juca Martins/F4
camente Ativa. Nos Estados Unidos, a destruira as mínimas garantias de esta- sivo de capital, mantendo a baixa capa-
relação entre essas grandezas era de bilidades no emprego, permitindo às cidade de absorção de mão-de-obra
30% para 25%, em média, no período empresas jogar com a alta rotatividade pelo setor industrial. "A disparidade
1949- 59. Na Argentina era de 34% para da mão-de-obra para comprimir os sa- entre a geração de emprego industrial e
25%, em 1964. lários. Uma pesquisa sobre o mercado o crescimento da oferta de mão-de-
Esta característica é que explica o fa- de trabalho no Brasil, realizada pelo obra nos centros urbanos redundou na
to de, entre 1950 e 1960, o produto in- Departamento de Economia, da Uni- ampliação de ocupações informais de
dustrial brasileiro ter crescido, em mé- camp, mostrou que, em 1970 - no auge baixa qualificação ligadas ao setor de
dia 9% ao ano e o crescimento dos em- do "milagre", portanto -, apenas 63% serviços. A forte migração rural-urbana
pregos industriais não ter passado dos dos empregos urbanos podiam ser con- provocou o explosivo crescimento de
2,4% ao ano, enquanto a população ur- siderados tipicamente capitalistas; 27% algumas cidades dotadas de infra-
bana crescia, em média, 5,6% ao ano. eram não tipicamente capitalistas (ou se- estrutura deficiente e reduzida capaci-
O que determinava, inclusive, uma ja, eram subempregos); e 10% eram da dade de gerar empregos industriais,
queda na participação relativa do setor construção civil. De acordo com o eco- ocasionando "déficits" habitacionais,
industrial no emprego total. Isto, justa- nomista Paulo Renato Souza, que crescimento de favelas e crises no abas-
mente, numa década em que a indus- acompanhou a pesquisa , os novos em- tecimento de água e esgotos." Cresce-
trialização foi das mais aceleradas. pregos criados durante a década de 70 ram o desemprego e o subemprego ur-
Quando as taxas de crescimento da foram apenas suficientes para manter banos, e caiu o nível de vida da popu-
economia entraram em declínio, no ini- essa mesma proporção entre emprego lação com renda mais baixa.
cio dos anos 60, o aumento conjuntural e subemprego no Brasil, inalterada des- 2) A COALBRA (Coque e Álcool de
do desemprego aberto, somando-se ao de a década de 40. Madeira S/A), empresa estatal ligada
subemprego crônico, trouxe à tona a si- ao Ministério da Agricultura, publicou,
tuação do mercado de trabalho urbano Cresceram o desemprego e em 1983, um detalhado estudo sobre o
de forma não menos dramática do que impacto da produção de álcool de
o subemprego rurais
aquela que se manifestariaem 1983, na cana-de-açúcar e de madeira sobre a
"rebelião de Santo Amaro": os subúr- Assim, o "milagre" não fez mais do geração de empregos. No capitulo des-
bios do Rio também foram sacudidos que reproduzir, em escala exacerbada, tinado a analisar a dinâmica e a moder-
por ondas de saques, em 1962. a mesma estrutura de emprego em vi- nização recente da agricultura, lêem-se
Este era o quadro herdado pelos mi- gor há décadas, tanto no meio urbano algumas conclusões fundamentais: a) a
litares ao assumirem o poder, em 1964. como no rural. As evidências em favor utilização de máquinas e equipamentos
As transformações econômicas deter- dessa avaliação não puderam ser des- agrícolas cada vez maiores, exigindo á-
minadas pelo novo Estado, nas duas prezadas nem mesmo em estudos reali- reas também cada vez maiores para
décadas seguintes, não teriam sequer o zados por órgãos ligados ao próprio go- dar-lhes rentabilidade máxima, refor-
papel de cosmético sobre o velho verno federal. Vale citar dois deles: çou a manutenção da estrutua fundiá-
problema. Ao contrário, foram acen- 1) Um estudo assinado por responsá- ria concentrada; b) a mecanização de
tuados os principais fatores que antes já veis pelo escritório do Instituto de Pla- algumas operações agrícolas tornou in-
influíam para seu agravamento. nejamento Econômico e Social (IPEA), viáveis os cultivos de gêneros de subsis-
Se, por um lado, o "milagre econô- no Rio de Janeiro, divulgado em 1978, tência (como o feijão), intercalados em
mico" dos anos 68-73 parecia atenuar assinalava que a política de subsídios e cultivos comerciais (como o café), re-
temporariamente o desemprego e o sub- incentivos fiscais posta em prática nas forçando o processo de especialização
emprego urbanos - a economia cres- décadas de 60 e 70, beneficiando as da unidade produtiva e a transforma-
cia a taxas médias em torno dos 10% ao grandes empresas em detrimento das ção de muitos pequenos produtores
ano -, de outro lado, o Regime Militar pequenas, estimulou o emprego inten- (parceiros, colonos, ocupahtes, etc.)
268
abroranBss ve.enc.aaAa, 8404133 3a cOoe, p IQ

A espera dos robôs

Quem estiver interessado em acom- significar a automação indiscrimina-


panhar os progressos da robótica da:
e da automação, no Brasil e no mun- € Estudos realizados em outros países
do, não pode deixar de ler regular- mostram que um robô pode substituir
mente o boletim mensal publicado de seis a oito trabalhadores na indús-
pelo Departamento Intersindical de tria automobilística, de acordo com
Estatísticas e Estudos Sócio- um relatório da Comissão de Estudos
Econômicos (DIEESE), de São Pau- de Automação na Manufatura, da Se-
lo. A publicação sempre traz informa- cretaria Especial de Informática.

Juca Martins/F4
ções recentes sobre o assunto. Entre- e O número de trabalhadores na
tanto, está longe de fazer a apologia indústria automobilística dos EUA
da nova era que se avizinha. poderá ser reduzido de um milhão em
Um documento publicado na edi- 1978 para cerca de 800 mil em 1990,
ção de junho de 1983, por exemplo, mesmo prevendo um modesto cresci- O processo de modernização da
explicitava que os sindicatos não po- mento de 1,8% ao ano nas vendas, se- agricultura fez crescer o número de
deriam ser contra o progresso tecno- gundo o Sindicato dos Trabalhadores assalariados temporários, os bóias-frias
lógico. Apenas queriam que os tra- desse setor nos EUA.
balhadores fossem beneficiários desse & Uma fábrica de lâmpadas na Gran- em trabalhadores assalariados; c) a me-
progresso, e não suas vítimas. O pro- de São Paulo produzia 20 mil unida- canização e o uso intensivo de fertili-
gresso técnico deveria servir, por des por turno de trabalho (8 horas) de zantes, corretivos e defensivos reduzi-
exemplo, para reduzir a jornada de 12 pessoas. Ao introduzir um proces- ram drasticamente a necessidade de
trabalho e não para aumentar o nível so de fabricação automatizada, essa mão-de-obra nas fases de preparação
de desemprego. Eis porque e DIEE- fábrica passou a produzir 25,6 mil do solo, plantio e trato das culturas; d)
SE se dedicava a divulgar, sistemati- lâmpadas por turno com apenas cinco em consequência do uso de tais "insu-
camente, estudos sobre as conseguên- trabalhadores. Portanto, 5,6 mil mos modernos", no entanto, o aumen-
cias da automação no mercado de lâmpadas a mais com sete trabalha- to da produtividade e da produção ele-
trabalho. Ao mesmo tempo, insistia dores a menos por turno, vou a exigência de mão-de-obra na fase
na necessidade de os sindicatos se & Uma siderúrgica de Minas Gerais, da colheita, a mais difícil de ser meca-
prepararém para incluir, nas pautas utilizando determinada aciaria (con- nizada. Conclusão final: o processo de
de negociações com as entidades pa- junto de equipamentos), produziu modernização da agricultura brasileira
tronais, os termos em que se deverá num ano 915 mil toneladas de aço agravou a sazonalidade da ocupação de
dar a implantação de processos e má- com o trabalho de 271 pessoas. Na mão-de-obra e induziu ao crescimen-
quinas automáticas de produção de mesma empresa, existe uma aciaria to do número de trabalhadores assala-
mercadorias ou prestação de serviços. mais automatizada, que produziu riados temporários. Traduzindo: cres-
Nada mais prudente, Bastam al- 1.620 mil toneladas ocupando apenas ceram o desemprego e o subemprego
guns exemplos extraídos do boletim 115 pessoas. Cada trabalhador dessa rurais,
do DIEESE, de junho de 1984, para aciaria produz quatro vezes mais que
percebermos a dimensão do que pode os trabalhadores da antiga aciaria. Os principais beneficiados
foram os grandes proprietários
Robôs na solda das chapas de automóveis na Ford, em São Paulo
E, para que não se conclua que tudo
foi obra do acaso, o documento da
COALBRA lembra que "esse processo
de tranformações nas formas de organi-
zação da produção agropecuária foi
acelerado pela política agrícola vigente,
cujas principais formas são o estabele-
cimento de preços mínimos e a conces-
são de crédito rural a taxas de juros
reais negativas para a compra de equi-
pamentos e insumos modernos", cujos
principais beneficiados foram os gran-
des proprietários,
E foi assim que se gerou a situação
explosiva do mercado de trabalho no
Daniel Augusto Jr/F4

começo dos anos 80: às taxas históricas


de subemprego permanente ou sazonal
de 20% a 30% da população ativa, su-
perpuseram-se, com a recessão e num
país sem mecanismo de seguro-desem-
prego, taxas de desemprego aberto
de 5% a 10% da força de trabalho.
269
2ADFAN Bus VE.GNCAMA, $40H13318nCO2 p 13

carróceiros, responsáveis pelo trans-


porte de um Rio de Janeiro que se or-
gulhava de sua condição de capital da
adolescente República, mas sem conse-
guir ocultar sua condição de paraíso da
febre amarela. Gustavo, então com 55
anos, sobreviveu pouco a seu sonho:
menos de um ano e meio depois, em se-
tembro de 1909, morreu num leito obti-
do quase de favor na Santa Casa de Mi-
sericórdia, sem chegar a fundar o retiro
dos jornalistas, uma de suas preocupa -
ções ao criar a ABI,
Gustavo de Lacerda não suspeitava
que a entidade pobre, fundada com tão
parcos recursos, cresceria e se consoli-
daria com o tempo, sobretudo a partir
dos anos 20, Nessa época, por inspira-
ção do jovem jornalista Alexandre José
Barbosa Lima Sobrinho, que viera de
Pernambuco para aCapital, as institui-
ções de imprensa se unificaram para
transformar a Associação Brasileira de
Imprensa na sua instituição de maior
representatividade. O gesto de Barbosa
Lima, que 50 anos depois, em 1978, vi-
ria a assumir novamente a presidência da
associação, abriu caminho para a elei-
ção de Herbert Moses. Este, ao longo
de 40 anos, de 1932 até ficar parcial-
mente inválido, no fim dos anos 60, do-
Arquivo ABI

tou a ABI de prestígio político e de so-


«.

lidez material. O prestígio adveio do re-


nome conquistado pela ABI com sua
Dois nomes importantes na luta da ABI pelos Direitos Humanos: Prudente de Moraes intervenção vigorosa na defesa da liber-
Neto (à esq.) e Barbosa Lima Sobrinho dade de imprensa e dos direitos indivi-
duais dos jornalistas, quaisquer que fos-
POLÍTICA/IMPRENSA: a história da Associação Brasileira de Imprensa sem as suas idéias - de Carlos Lacerda,
com suas contundentes campanhas de
direita contra o presidente Getúlio Var-
0 gas, nos anos 50, a Pedro Mota Lima,
vigor da ABI
destacando jornalista de esquerda, res:
ponsável pelos principais jornais do
Desde a sua fundação, em 1908, a mais antiga instituição de
PCB desde os anos 30.
jornalistas do País vem atuando vigorosamente na defesa da
A propriedade material fora planta-
liberdade de imprensa da na antiga esplanada do Castelo, na
rua Araújo Porto Alegre. Ali, com con-
Uma sala cedida pela caixa benefi- época de sindicatos e de previdência tribuições de jornalistas, donativos de
cente dos empregados de O Paiz -jor- social para os jornalistas, Gustavo pas- empresas privadas e empréstimos ofi-
nal do Rio de Janeiro, destruído para seara sua inquietação intelectual e polí- ciais, Moses comandou a construção
sempre pela fúria popular na revolução tica por obras de Marx e de Kropotkin, da ABI, dotando-a de uma singularida-
de 30 - acolheu os oito visionários que o teórico do anarquismo. Trabalhara de: junto com a antiga sede do Ministé-
a 7 de abril de 1908 fundaram a ABI como repórter de O Paiz e tivera uma rio da Educação e Cultura, situada uma
(Associação Brasileira de Imprensa), a atuação no tênue movimento sindical quadra adiante, o edifício que hoje tem
mais antiga instituição de jornalistas do da época. seu nome é um dos marcosda arquite-
Brasil. Em 1892, ele fundara o Centro Ope- tura contemporânea brasileira.
O animador do grupo era úm mula- rário Radical, na esperança de reunir o A partir do caso Vladimir Herzog,
to, o catarinense Gustavo Adolfo Fra- nascente proletariado urbano para a assassinado nos porões do DOI-CODI
ga, que se tornara conhecido sob o luta por reivindicações econômicas e de São Paulo, em 25 de outubro de
nome de Gustavo de Lacerda, escolhi- políticas que incluíam desde a românti- 1975, a legenda de Gustavo de Lacerda
do por ele próprio quando serviu o ca extinção dos privilégios em geral à li- e Moses juntou-se à luta de Barbosa
Exército. mitação da jornada de trabalho para os Lima Sobrinho e Prudente de Moraes
Antes de comandar a fundação da menores, então impiedosamente explo- Neto, falecido em dezembro de 1977,
ABI, da qual foi o primeiro presidente, rados. em favor dos Direitos Humanos.
com objetivos culturais e de assistência Em 1900, era Gustavo um dos esti-
social, que supriram a inexistência na muladores da greve dos cocheiros e Maurício Azedo
270
BRDFANBSBVB.GNCAAA, 84041333 3n0o6A2,p234

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO: a história das centrais sindicais ma, superintendente da Polícia Federal
em São Paulo, declarou, no dia seguinte
ao encerramento do congresso de fun-
dação da CUT, que dispunha de um
Em busca de unidade arsenal de leis para bloquear a ação da
entidade a qualquer momento.
CUT e Conclat têm a mesma matriz:
Apesar das proibições, desde 1937 os trabalhadores tentam a 1a Conclat (Conferência Nacional das
organizar-se nacionalmente através de centrais sindicais, como Classes Trabalhadoras), realizada de 21
a 23 de agosto de 1981, no município de
a CUT e a Conclat nos anos 80
Praia Grande, no litoral de São Paulo,
reunindo 5.036 delegados de 1.091 enti-
dades de trabalhadores rurais e urba-
nos de 22 Estados e mais o Distrito Fe-
deral. Foi a maior reunião de trabalha-
dores que aconteceu no País depois do
golpe de 64. A conferência definiu um
"Plano de Lutas" comum para toda a
classe trabalhadora e formou a Comis-
são Nacional Pró-CUT, incumbida de
organizar um congresso de fundação da
central única. Mas a conferência da
Praia Grande não chegou ao final de
maneira unitária, como fora conduzida
inicialmente. As diversas tendências
presentes, agrupadas em dois grandes
blocos, acabaram-se confrontando exa-
tamente no momento de eleger a Co-
Juca Martins/F4
missão Pró-CUT, expondo ao plenário
suas divergências antes contidas aos
bastidores. Embora superficialmente
sejam apresentadas como simples dis-
putas partidárias, envolvendo de um
Quatro vezes, antes do golpe de 64, 0s A 1a Conclat (acima, na Praia Grande, lado o PT e de outro o PMDB, que
trabalhadores repetiram o ritual de rea- SP, agosto de 1981) foi a raiz da Central abriga o Partido Comunista Brasileiro e
lizar um congresso com participação Unica dos Trabalhadores e da Partido Comunista do Brasil, as diver-
dos setores mais representativos do Coordenação Nacional das Classes gências no fundo expressam concep-
movimento sindical e criar um organis- Trabalhadoras, entidades que reúnem ções sindicais diferentes, que resultam
mo central para dirigir suas lutas. Igual categorias diversas em métodos de ação diversos.
número de vezes, o governo decretou a
ilegalidade destes organismos e os re- Nos anos 80 foram criadas
primiu duramente. federações estaduais ou interestaduais duas centrais diferentes
O choque é compreensível. Os traba- de um determinado ramo de atividade
lhadores, quando adquirem consciên- econômica. Apesar da proibição, surgi- A corrente sindical petista, à qual se
cia de classe, sabem que, para poderem ram a CSUB (Confederação Sindical juntam os ativistas das pastorais e outros
expressar toda sua força, precisames- Unitária Brasileira), a CGTB (Confe- movimentos da Igreja Católica e mili-
tar organizados nacionalmente, sem li- deração Geral dos Trabalhadores do tantes de grupos trotskistas e anar-
mites geográficos e abrangendo todas Brasil) e o CGT (Comando Geral de quistas, combate radicalmente a estru-
as categorias profissionais. Mas, num Trabalhadores), que foram tolerados tura sindical vigente, apóia decidida-
país de tradição autoritária e marcado por algum período e posteriormente mente as oposições sindicais contra os
por acentuadas desigualdades sociais, a desmantelados pela repressão. "pelegos", admite o pluralismo sindi-
organização horizontal dos trabalhado- É dentro desse limite de tolerân- cal e sempre defendeu uma CUT cons-
res sob o comando de uma central sin- cia que funcionam hoje a CUT (Cen- truída "pela base", independente das
dical única representaria um risco mui- tral Única dos Trabalhadores) e a federações e confederações.
to grande para uma minoria apegada a Conclat (Coordenação Nacional das Ao contrário, a corrente representa-
seus privilégios. Por essa razão, todas as Classes Trabalhadoras). As duas foram da pelo PMDB e partidos comunistas
iniciativas da classe operária neste sen- criadas em congressos que a rigor con- considera indispensável a aliança com
tido foram barradas à força. frontam a legislação sindical, porque dirigentes das federações e confedera-
Com exceção da COB (Contedera- reuniram trabalhadores das mais diver- ções no processo de construção da cen-
ção Operária Brasileira), criada no 1o sas categorias e profissões, de todos os tral sindical e não exclui nem os "pele-
Congresso Operário Brasileiro, em pontos do País. A CUT, que assume o gos", embora descarte a participação
1906, as demais já nasceram com á pe- papel de central sindical - diferente da autônoma das "oposições", porque
cha de "ilegais", pois organismos dessa Conclat -, tem inclusive diretoria for- acredita ser este o caminho para a uni-
natureza são proibidos pela legislação malmente constituída e uma sede esta- dade do movimento. Unidade é a sua
sindical vigente desde 1937. A entidade belecida, num flagrante desafio à estru- palavra de ordem principal.
de mais alto grau permitida é a confede- tura sindical imposta pelo Regime Mili- A contraposição da "CUT pela ba-
tação nacional, que reúne a cúpula das tar. Tanto que o delegado Romeu Tu- se", sem "pelegos", e "unidade" inclu-
271
BRDFANBSB V8.GNC;AA
Á, 54 0441334 an
002, p 15

Iconographia

R
y No Brasil, as centrais sindicais já
nasceram ilegais, com exceção da COB
(acima, Edgard Leuenroth discursa no
congresso de 1913, O Malho,
13/9/1913). O CGT, tolerado até 1964,

Iconographia
Joi desmantelado (ao lado, manifestação
em 1962, RJ)
sive com "pelegos", aprofundou a ci- festações que evidenciam a primeira to- Em 1949, nada menos que 234 sindi-
são, inviabilizando a realização do con- mada de consciência do recente opera- catos estavam sob intervenção federal.
gresso em 1982, e culminou em 1983 riado brasileiro. No ano seguinte, 1906, mas. começo dos anos 50 os trabalha-
com a fundação da CUT, liderada pela realiza-se o Congresso Operário Brasi- dores retomaram as ações visando à or-
corrente petista, e da Conclat - ado- leiro, com 43 delegados de 28 síndica- ganização horizontal de todos os traba-
tando o mesmo nome da conferência tos, e nasce a COB, nossa primeira cen- lhadores enquanto uma classe, e não a
de 1981- , comandada por sindicalistas tral sindical, que, em 1915, foi empaste- organização vertical por corporações
dos dois partidos comunistas, indepen- lada, definitivamente pela polícia. imposta pela CLT. Greves de grandes
dentes e um setor dos "pelegos"., A segunda central brasileira surgiu proporções foram deflagradas, como a
Não se pode deixar de reconhecer, em maio de 1935, num congresso do "dos 300 mil", envolvendo metalúrgi-
porém, que a realização da conferên- qual participaram 243 delegados. Bati- cos, gráficos, têxteis e químicos de São
cia foi a consequência de um processo zada com o nome de Confederação Paulo, em 1953. Surgiram articulações
de mobilização desencadeado pelo Sindical Unitária Brasileira, esta enti- horizontais - como a PUI (Pacto de
movimento sindical de maio de 1978 dade teve curta duração. Foi desman- Unidade Intersindical), em São Paulo,
em diante. Somente no ano de 1979, a telada em novembro do mesmo ano, a CPOS (Comissão Permanente das
imprensa registrou a deflagração de em consequência da repressão que se Organizações Sindicais), no Rio de Ja-
113 greves, envolvendo 3,2 milhões de seguiu à tentativa de insurreição da neiro, e finalmente o PUA (Pacto de
' trabalhadores. Em 1980, a mobilização Aliança Nacional Libertadora, Unidade e Ação) - que tiveram partici-
se manteve, atingindo inclusive a zona A CSUB era controlada por ativistas pação decisiva na fundação do CGT
rural, onde o fato marcante foi a greve do Partido Comunista, fundado em (Comando Geral dos Trabalhadores),
de 240 mil canavieiros em Pernambu- 1922, que logo assumiu a hegemonia no durante o Congresso realizado em
co. Como o movimento estava em ple- movimento operário brasileiro, toman- agosto de 1962, reunindo 1.400 delega-
na efervescência, alastrando-se pelo do as principais iniciativas de articula- dos. Com o golpe, dois anos depois, o
País inteiro, mobilizando de médicos a ção sindical. Em 1940, conforme relato CGT foi arrasado pelos militares.
camponeses, de funcinários públicos a de Rolando Fratti, um ativista da épo-
motoristas, as lideranças começaram a ca, os militantes do PC começaram a Em 1984 CUT e Conclat
organizar a Conclat tendo em vista a articular, clandestinamente, o MUT
constituição da central sindical única. (Movimento Unificador dos Trabalha- são apenas toleradas
dores), que se tornou público em 1943,
A primeira centralfoi quando foi lançado abertamente seu A sombra do clima de liberalização
empastelada em 1915 primeiro manifesto. Uma das palavras que atravessa o País, a CUT - que já
de ordem do documento era "Por uma realizou seu primeiro congresso - e a
Este processo não difere basicamen- CGT" e em 1945 foi realizado o con- Conclat estão sendo toleradas. Garan-
te do que se verificou quando da cons- gresso, reunindo 1.752 delegados de tia plena de existência, porém, elas te-
trução da COB. Entre os anos de 1900 1.494 entidades, que fundou a CGTB rão se o País democratizar-se o suficiente
a 1903, São Paulo foi profundamente (Confederação Geral dos Trabalhado- para autorizar, e não apenas tolerar
abalada por grandes greves, principal- res do Brasil). Dois anos depois, em conforme as conveniências dos governan-
mente na fábrica de vidros Santa Mari- 1947, o governo desfechou um ataque tes, a livre organização dos trabalhadores.
na e nas tecelagens Anhaia e Penteado, maciço: interveio e cassou a diretoria
Em 1905, as greves prosseguem, com os de 144 sindicatos ligados à CGTB, que
patrões ainda atônitos diante das mani- não resistiu e acabou no final do ano. Valdeci Verdelho
272
com os cabelos puxados para cima des-
cobrindo-lhes a nuca, não muito longe
dali, no Clube Militar, jogava-se a sorte
do Segundo Império.
Naquela mesma poite, Benjamin
Constant conseguia finalmente conver-
ter Deodoro da Fonseca à causa re-
publicana, convencendo-o de que o go-
verno havia ofendido os brios do Exér-
cito ao punir dois oficiais por indiscipli-
na. Começava a ser urdido o golpe mi-
litar que, seis dias depois, a 15 de no-
vembro, derrubaria o imperador.
O baile exacerbou as animosidades.
Segundo o registro da Revista Ilustrada,
"as conversas em geral versavam sobre

Biblioteca Nacional
o custo da festa. Havia cálculos para
200 e para 300 contos, Só o bufê consta

<
que andou por uma pelga de 50 con-
tos".
A Monarquia se foi com suas manei-
Ilha Fiscal, Rio, 9 de novembro de 1889: monarquistas se divertem enquanto ali perto o ras elegantes. Deixou o exemplo de
Exército trama a queda do Império (óleo de Aurélio Figueiredo) como exibir, na sua contradança, o
fascínio social. Seus sucessores apren-
deram rápido. O casamento do presi-
COMPORTAMENTO/ALTA SOCIEDADE: as festas que marcaram época
dente Hermes da Fonseca com Nair de
Teffé, em 1910, conferiu ao já não ado-
lescente presidente da República, fran-
A ostentação do poder camente antipatizado em seu confronto
com Rui Barbosa, os primeiros sinais
de alguma indulgência popular." Nair
Do baile da Ilha Fiscal às noitadas atuais do jet-set
era bela, desinibida, avançada para os
tupiniquim, os privilegiados têm festejado, para exibicionismo padrões da época. E, no entanto, cap-
de nomes, riquezas e poderio turava um férreo general. A crônica
mundana, sempre solícita, delirou. A
classe média brasileira já tinha sua Cin-
Todo poder é transparente. Ele não no Rio, a então capital do País, em 9 de derela. Ao povo, porém, restava apenas
se exerce apenas com decretos-leis, novembro de 1889. A conspiração re- o destino histórico de consumir o so-
com medidas de emergência ou com a publicana estava no ar. Mas a corte e o nho e o encantamento dessas exibições
prisão dos adversários políticos. O po- diminuto séquito de cortesãos que ain- do poder e riqueza.
der busca sua legitimação, aos olhos da se agarravam ao manto do impera-
dos súditos, através de um imenso arse- dor, na maioria empedernidos burocra- Em nome do povo, somente
nal de dispositivos simbólicos. Festeja tas da Fazenda real, não perdiam a alguns saboreiam o banquete
seu predomínio, e o predomínio daque- ocasião de ostentar o ilusório brilho de
les que ele privilegia, por meio de uma seu poder. O baile marcaria a inaugura- Em 1930, o povo teve enfim a honra
sequência de ritos e solenidades que ção, em grande estilo, do prédio da Ilha de ser convidado, mas apenas para fa-
tenta envolver toda a coletividade. É Fiscal, inspirado convenientemente em zer a figuração. A revolução de Vargas
também através de ritos de aceitação castelos europeus do século 14 e plane- foi feita em nome do povo, Pretendiz.
generalizada que a sociedade indica o jado pelo arquiteto italiano Adolpho mostrar que nova República não igno-
nível de sua adesão ao sistema de poder Del Vecchio. rava a sua existência. Mas, novamente,
vigente. Ainda hoje, os franceses de Finalmente, chegou a grande noite. a história mostrou que só alguns pou-
província envergam a roupa plebéia Das 20h30 às 23 horas, as balsas fizeram cos favorecidos continuariam, em
dos sans-coulottes para festejar, no dia tantas viagens quantas foram necessá- nome do povo, saboreando o banquete. .
14 de julho, uma revolução que preten- rias para transportar quatro mil convi- O Estado Novo (1937-45) foi particu-
dia ser popular. A burguesia, que ga- dados, "fidalgos, fidalguetes, conselhei- larmente eficiente nesse aspecto. Con-
nhou e levou, deixa o povaréu festejar a ros de Estado, ministros, altos funcio- vocava multidões para manifestações
ilusão de sua vitória. nários e membros da alta finança, do em estádios, numa cópia subnutrida e
Do circo romano às apoteoses guer- comércio, da indústria e das artes". Se caricata das exibições do fascismo. De-
reiras nazi-facistas, cada príncipe tra- a dissipação noturna não fosse tão ame- pois da interminável xaropada de desfi-
tou de exprimir, à sua maneira, seu po- na, os convivas poderiam ter notado a les, discursos e hinos cívicos capazes de
derio. O Brasil não é a corte de Versa- inquietante circunstância de que havia encher de orgulho pátrio os peitos juve-
lhes, mas jamais dispensou o direito ali uma abundância de oficiais da Mari- nis, servia um lanchezinho e dispensava
de ensaiar seu minueto. Os privilegia- nha - arma tradicionalmente conserva- a garotada. A imagem do Estado Novo
dos têm a mania de festejar nem que dora - e pouquissimos oficiais do Exêr- estará eternamente ligada aos acenos
seja os estertores de seu próprio poder. cito. Na verdade, enquanto emperiqui- de Vargas à multidão comprimida no
Foi assim que a Monarquia brasileira tadas senhoras exibiam seus passos de estádio de São Januário, campo do
dançou sua última valsa, na Ilha Fiscal, dança e a nova moda de penteados, Vasco da Gama. Largos sorrisos, cha-
273
ar DFANBSB VB.GNCAMA, 404% 323 1 an 002, p 6
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, 84044 4231 an COZ2
JP AR

rutos baianos e terno de linho 90, numa


bonomia tropical que contrastava com
os chefes autoritários da Europa, fero-
zes em suas camisas pretas e botas de
couro, Vargas afagava o ego nacional
com a invariável exertação de seus dis-
cursos: "Trabalhadores do Brasil . . . "
No doce acalanto do populismo, os
trabalhadores recolhiam-se cedo para
construir, com seus braços, o dia de
amanhã e o futuro da Nação. Era a
hora da burguesia vestir summer jacket,
gravata borboleta e o plastron e ir es-
banjar a prosperidade nos cassinos do
Rio.
Os anos de Vargas foram o apogeu
da jogatina, No cassino da Urca, o mais
;: eleganteúde todos, uma orquestra con-
&
tratada na América atacava um foxtro-
te, competindo com o barulho das fi-
chas e os convites animados dos cru-
piês. Após a pausa, subiria ao palco a
expressão mais brasileira de todo o
show-business: o teatro-revista. Carlos
Machado, o grande mestre-de-
cerimônia do gênero, lembrou em suas começava a inclinar-se em favor de um para o maior de todos os desfiles de sua
memórias: "O Coronel Bejo [Benjamin sentimento pan-americanista que iria, caravana de grá-finos: o casamento da
Vargas, irmão de Getúlio] era quem no futuro, determinar nossa adesão ao filha do conde Matarazzo, em 29 de se-
dava as maiores gratificações à minha lado dos aliados. Ou seja, dos Estados tembro de 1945, O jornalista Joel Silvei-
orquestra ( . . .). De qualquer ponto em Unidos. No ano seguinte, em troca des- ra, em sua reportagem "A 1002: Noite
que se encontrasse no gril! do Tênis sa aliança, o presidente Franklin Roo- da Avenida Paulista", resumia o espan-
Clube, levantava-se de sua mesa e ati- sevelt viria ao Brasil assinar o protoco- to do maior cronista social da época:
rava violentamente, em direção aos lo de ajuda à construção de Volta Re- "Jacinto de Thormes, que sabe ser co-
meus músicos, fichas de jogo de madre- donda, medido, escreveu que nunca viu uma
pérola, no valor de quinhentos mil réis Nem todos estavam dispostos, po- coisa tão impressionante."
ou de um conto de réis. Eram torpedos rém, a se encantar com essas sutilezas.
milionários que vinham acompanhados Depois da inauguração do espetáculo,
Os Matarazzo, na "1002a
de estrepitosa gargalhada." apareceu pichado no muro do Palácio
do Catete, a residência do presidente, a Noite da Avenida Paulista" -
Joaquim Rolla, dono de seguinte frase: "Basta de balangandans, Casava-se Filly Matarazzo com João
cassinos, financia "Joujoux" o que nós queremos é água." Pelo des- de Souza Lage. O casamento civil se
cuido, a guarda presidencial foi presa e deu no Palácio da Avenida Paulista. O
"Coronéis" e senadores, diplomatas o tráfego da rua interrompido até que o interventor em São Paulo, Fernando
e figuras do alto escalão do Estado Novo grafite fosse removido. Costa, teve a honra da primeira valsa,
promoviam um intenso tráfego social, Vargas, em pessoa, não era muito com a condessa Mariângela. Só com
ao qual não se furtava a primeira dama, afeito à badalação social. O mundo fogos de artifício foram gastos 300 mil
dona Darcy Vargas, uma animada pa- de sua preferência era o campo e lá cruzeiros. O conjunto de bailado de
tronesse. Foi ela quem incansavelmente ia refugiar-se frequentemente da agita- Maria Oleneva recebeu 400 mil para
anfitrionou os figurões em 24 de julho ção política e mundana. Nas comemo- duas horas de apresentação. Havia
de 1941, por ocasião de parte das co- rações de seu 58o aniversário, por duas orquestras, com 150 músicos -
memorações do quarto aniversário do exemplo, a 19 de abril de 1941, os gran- uma delas contratada especialmente no
Estado Novo. No Teatro Municipal, des salões cariocas se abriram para fes- Rio, por 200 mil cruzeiros. No dia se-
inaugurava-se a revista Joujoux e Balan- tejar. No Clube Ginástico Português, a guinte prossegue a festa: cerimônia reli-
gandans, milionária produção financia- alta sociedade dançava aos pés de um giosa na igreja do Convento do Carmo.
da por Joaquim Rolla, proprietário dos gigantesco retrato do ditador. Getúlio, Terminado o casório, dirigem-se os
cassinos da Urca, de Icaraí (Niterói), da porém, escondeu-se na fazenda do co- convidados, em comitiva, para a fazen-
Pampulha (Belo Horizonte) e de Araxá ronel João Scarpa, um amigo seu, em da do Piqueri, onde teve lugar um al-
(estância mineral de Minas). Minas Gerais. Nem assim deixou de ser moço ao ar livre para 800 convidados,
Espetáculo de encomenda, Joujoux e incomodado pela visita de 40 aviões da 300 dos quais foram escolhidos a dedo
Balangandans não escondia suas entreli- Força Aérea, que sobrevoaram o casa- no milieu mais exclusivo da sociedade
nhas políticas. Narrava a movimentada rão despejando flores. carioca.
viagem que a pitoresca família Mota O primeiro governo da redemocrati- O Rio iria superar a primazia, como
Durães realizou pelas Américas, a bor- zação prescreveu os cassinos e conferiu epicentro do torvelinho mundano,
do de um navio da "Frota da Boa Vizi- ao poder a imagem e semelhança de * quando Getúlio Vargas voltou ao po-
nhança". Nada podia ser mais claro: a seu circunspecto ocupante, o general der, em 1951, desterrando o moralismo
Segunda Grande Guerra seguia seu Eurico Gaspar Dutra. Ofrisson carioca de Dutra. E, em 1955, viria Júscelino
curso, na Europa, e o Brasil de Vargas diminuiu. E São Paulo pedia passagem Kubitschek, que os conterrâneos de
274
BR DFANBSB 24044334 an COB, P

lhões de dólares, comandou o festival


Patião - uma interminável sequência
de recepções, almoços, jantares com
que o high-society tupiniquim quis reve-
renciar a figura do rei do Bstanho boli-
viano, Antenor PatiãÃo. Em 1980,
Ibrahim celebrou seu próprio sucesso,
na forma de casamento de sua filha,
Isabel Cristina (Bebel), com César Ra-
mos Filho, de tradicional família catari-
nense. O anfitrião esmerou-se a tal
ponto nos detalhes que exigiu um Ca-
dillac 1940, pilotado pelo ex-
"cafajeste" Mariozinho de Oliveira,
para transportar os nubentes e consu-
miu 120 caixas de champanha francesa
e uísque escocês no jantar de 1.600 ta-
lheres no Jockey Club. Oito mil doci-
nhos vieram de Leopoldina, Minas Ge-
rais. Comparável ao casamento da filha

Arquivo. Nacional
de Ibrahim, só mesmo a comemoração
dos seus 30 anos de colunismo, no Co-
pacabana Palace, em 1983. A doce dis-
iaioi --- se sipação dos tempos do "milagre" tinha
cedido lugar à retração tímida decreta-
Diamantina chamavam o "pé-de- Da Monarquia ao Regime Militar, os da pela recessão econômica, mas o co-
valsa". Os aromas democráticos, reani- privilegiados ostentaram o poder e a lunista não se fez de rogado: 6 vinho
mados pela promessa juscelinista de riqueza. Em 1941, a revista "Joujoux e ainda era Beajolais e o queijo, Camem-
uma rápida industrialização, inebria- Balangandans" (acima) marcou as bert. Os convivas passaram de três mil.
ram osnarizes da burguesia. A velha comemorações do quarto ano do Estado Nos últimos anos, esses transborda-
aristocracia vai ser atropelada pela for- Novo, um regime de frequentes festas, mentos se tornaram exceção. Mas,
tuna rápida dos arrivistas. Será o apo- como a do 58o aniversário de Vargas, "enquanto a plebe rude na cidade dor-
geu do colunismo social, veículo privi- quando a elite carioca lotou os salões do me", como diz uma música do sambista
legiado para a exibição dos novos no- Clube Ginástico Português (na pag. ao Jorge Veiga, e numa época que pouco
mes e das novas riquezas. O dernier cri lado). Já em 1980, o cronista do jet-set há para comemorar, ainda existem noi-
do alpinismo social determina: em so- tupiniquim Ibrahim Sued (abaixo) festejou tes de Balangandans. Na inauguração
ciedade, tudo se exibe. Em 1954, vol- o próprio sucesso e a fortuna, no da boate Regine's em São Paulo, em 26
tando de Paris, a "locomotiva" Josefine casamento de sua filha, no Jockey Club, de março de 1981, a festa começou
Jordan declara que trouxe na bagagem no Rio com a presença da primeira dama da
32 pares de sapatos Christian Dior.
"Locomotiva", diga-se, é expressão
inventada por Ibrahim Sued, "um turco
que só comia uma vez por dia", segun-
do suas próprias palavras, e que se con-
verteu na figura mais característica des-
*a
**
se alpinismo social dos anos 50. Sua co-
luna virou o barômetro da ascensão. E,
ao fim de cada ano, com desígnios de
sumo-sacerdote do mundanismo,
Ibrahim decretava a recompensa para
o esforço dos eleitos na lista das "Dez
Mais Elegantes" e dos "Dez Mais Ele-
gantes". Ibrahim dosava suas listas com
estratégica inteligência. Entre as mu-
lheres, consagrava o trio de ouro da
movimentação noturna: Tereza Souza
Campos, Lourdes Catão e Carmen
Mayrink Veiga. Mas não se descuidava
de reiterar a elegância tradicional de
Alcyr Cavalcanti/Agência O Globo

dona Mariazinha Guinle ou da embai-


xatriz Elizinha Moreira Salles. Entre os
homens, elegia o badalado Didu Souza
Campos, sem se esquecer do sangue
azul de dom João de Orleans e Bragan-
ça.
Em 1972, Ibrahim, que confessa pos-
suir um patrimônio superior a 5 mi-
275
rou de gritar quando os "leões-de-
chácara" da boate a empurraram para
o banco traseiro de um automóvel pre-
to, que a levou dali.
Em dezembro de 1983, a CMW Vej-
culos, Comercial e Importação Ltda.,
de São Paulo, patrocinou um "almoço
de confraternização" para seus clientes
na boate Gallery. Ali, promoveu o sor-
teio de carros importados e os convida-
dos foram recebidos por um grupo de
recepcionistas. Regada a Ballantines 12
anos, a festa teve uma atração extra: o
leilão de peças íntimas de uma atriz do
cinema pornô, tendo como leiloeiro
Chiquinho Scarpa, dono de uma das
maiores fortunas do País e conhecido
«y por suas atitudes insólitas e por tentar
reviver as fantasias do famoso play

Carlos Namba/Abril Press


boy paulista dos anos 50 Baby Pignata-
ri. Segundo a Folha de S. Paulo, "pela
primeira vez que [a atriz] tirou a cami-
seta recebeu um cheque de Cr$ 250
mil, a calça jeans, que custou Cr$ 15
mil, foi arrematada por Cr$ 320 mil.
Apesar da súplicas dos presentes, resis-
tiu em ficar sem a calcinha". O playboy
não se conformou com o fim do ato e
propôs o sorteio da própria atriz. Matil-
de Mastrangi, experiente artista em
mais de 40 filmes pornôs, pegou o mi-
crofone e avisou que a "festa tinha aca-
bado".

"É o medo do Leão",


diagnostica cronista social

Os tempos de crise recomendaram


ao jet-set maior moderação na ostenta-
ção, se não nos próprios gastos. "É o
medo do Leão", diagnostica Gilberto
" Di Piero, o cronista paulistano Giba Um,
referindo-se ao Imposto de Renda. Na
verdade, há alguns anos se observa o
progressivo enclausuramento dos
Luizinho Coruja/Abril Press

sobrenomes dourados. Decididamente,


não se fazem mais festas como antiga-
mente. Veja-se o caso dos Monteiro de
Carvalho, que foram os maiores acio-
nistas particulares da Volkswagen do
Brasil e dispõem de sociedades com o
grande capital internacional. Nos últi-
Os tempos de crise recomendaram maior moderação nos anos 80. Mesmo assim,
os mos tempos, eles circulam pouco e re-
esbanjamentos são comuns, como o leilão das roupas da atriz/Matilde Mastrangi
cebem menos ainda nos seus domínios
(acima) e a inauguração da boate Regine's (no alto), que contou com
Dulce do alto da Glória, no Rio. Quando re-
Figueiredo, o ator Omar Sharif e Sílvia Maluf (à dir.)
cebiam, porém, afinesse obrigava que o
champagna fosse Moet et Chandon e
República, Dulce Figueiredo, acompa- tratado para documen
tar a inaugura- que os comensais mergulhassem
nhada pelo ator egípcio Omar Shariff. em
ção, resolveu fotografar o carnaval da cascatas de
A festa chegou ao auge quando o artis- primeira dama e acabou lagostas e camarões, como
levando vários na recepção para 5 mil pessoas que se
ta convidou dona Dulce para dançar, à safanões dos agentes
de segurança. seguiu ao casório de Lilibeth, filha do
meia-noite. As 2 da manhã, foi a vez de Teve um filme apreend
ido e foi expulso patriarca Joaquim (Baby), com Fer-
começar o show das mulatas seminuas da boate. Mas, durante
a festa, uma nando Collor de Mello, filho do sena-
de Sagentelli, que se juntaram à já en- nova confusão envolveria dona Dulce. dor biônico Arnon de Mello, do PDS
tão passista primeira dama. Foi aí que Uma dama da sociedade paulista co- alagoano, em 1975.
surgiu o primeiro incidente da noite, meçou a gritar palavrões, em francês,
Um fotógrafo da revista Manchete, con- ao casal Dulce-Shariff. A
mulher só pa- Nirlando Beirão
276
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 2404 12234 ô 002 249
BR DFANBSB 840434333 dn má) P 20

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POLÍTICA/RELACOES EXTERNAS: as relações Brasil-EUA

A dominação americana

No início do século, a hegemonia inglesa no Brasil começa a ser contestada


pelos americanos. A partir daí e sobretudo após a Segunda Grande Guerra, os
EUA consolidam a sua dominação sobre o País, da economia à cultura

"O BRAZIL QUEM USA EUA, na forma de tropas, munições e novo país, 0 Brasil, já nascia endivi-
SOU EEUU navios. Jefferson recusou qualquer dado.
compromisso. Mas insinuou que, efeti- Em 1824, dois anos depois da inde-
(Grafite em um muro de São Paulo)
vada a independência, os americanos pendência, o Brasil fazia seu primeiro
Para os brasileiros envolvidos em poderiam enviar apoio, se os brasileiros empréstimo, no valor de 3 milhões de
conspirações contra o poder colonial se comprometessem a comprar deles libras. Vários empréstimos se se-
português, a vitória dos Estados Unidos trigo e bacalhau. guiram e, no seu ocaso, o Império de-
na luta pela independência da Ingla- Foi na Inglaterra, porém, a maior via 30,4 milhões de libras, em sua esma-
terra, em 1776, serviu como um grande potência econômica da época, que o gadora maioria a bancos ingleses.
estímulo. Alguns deles chegaram a pen- Brasil teve de se apoiar no seu processo No plano comercial, a Inglaterra ob-
sar que a nascente nação republicana de emancipação. Os ingleses forçaram tivera de Portugal, em 1810, tratamento
estivesse disposta a apoiar a luta do Portugal a reconhecer a nossa indepen- vantajoso para suas mercadorias nos
Brasil pela sua emancipação política. dência e abriram as portas do conti- portos brasileiros. Esse privilégio se
Com essa perspectiva, o estudante nente europeu para a nova Monarquia. manteve depois de 1822 e foi ratificado
brasileiro José Joaquim da Maia conta- Em troca, uma das condições aceitas por um tratado de 1827, com duração
tou, em 1786, Thomas Jefferson, o re- pelo Brasil, para conseguir o reconhe- de 15 anos. Rapidamente a Inglaterra
dator do prelúdio da Declaração da In- cimento de Portugal à sua emancipa- superou Portugal em volume de comér-
' dependência, que representava o go- ção, foi assumir um débito de 1,4 mi- cio com o Brasil. Por todo o século 19,
verno americano na França. Expôs a si- lhão de libras que aquele país tinha os ingleses foram nossos principais par-
tuação do Brasil e solicitou ajuda dos com os ingleses. Assim, em 1822, o ceiros comerciais. Em 1842, as exporta-
277
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 8404122
, paa

ções da Inglaterra para o Brasil eram solidou.


mais de quatro vezes maiores que as
Em 1921, o governo federal nego-
americanas. Vinte anos depois, em
ciou o primeiro empréstimo com uma
1862, tinham dobrado, enquanto as dos casa bancária americana, no valor de
EUA permaneciam no mesmo nível.
50 milhões de dólares. Deu como ga-
Nessa década de 1860, 55% de nossas
rantia as arrecadações do imposto de
importações vinham da Inglaterra e
consumo e das alfândegas nacionais.
33% de nossas exportações iam para
Os principais empréstimos que o
aquele país.
Brasil obteve na década de 20 foram
Em meados do século 19, quando os negociados em Nova Iorque que, assim,
países capitalistas iniciaram o movi-
desbancava Londres como o principal
mento de exportação de investimentos centro financeiro para o Brasil. Já em
para todo o mundo, foram os capitais 1927, os EUA detinham cerca de 35%
britânicos que predominaram no Bra- das nossas dívidas externas. Dez anos
sil. Concentravam-se nas ferrovias e depois, em 1937, quando o País suspen-
meios de comunicação, atividades liga- deu os pagamentos da dívida e, depois,
das a seus interesses comerciais. quando renegociou seu montante, o
Em 1823, ao ser formulada a Dou- Brasil tentou explorar as diferenças de
trina Monroe -"A América para os objetivos entre a potência que expan-
ameritanos" -, que visava a impedir dia seus interesses e a que se retirava, a
tentativas de recolonização dos países Inglaterra.
americanos por parte das potências eu-

Biblioteca Nacional
ropéias, o peso político e econômico Bondes a burro: os primeiros
dos EUA era suficiente apenas para es-
tabelecer uma espécie de escudo co- investimentos dos EUA no País
brindo a região do Caribe.
Os primeiros investimentos america-
nos no Brasil foram feitos na década de
Aventureiros agem na América
Nas guerras da Independência, a 1860. O visconde de Mauá transferiu
Central, apoiados pelos EUA Marinha de Guerra nacional contou uma de suas concessões a uma firma
com oficiais ingleses, comandados americana de carros a cavalo, a Ma-
Na década de 1840, os americanos pelo almirante Lorde Cockrane (acima) nhattan's Bleecker Street, empresa que
arrebataram o Texas, o Arizona e a Ca- introduziu os bondes puxados a burro
lifórnia do país vizinho, o México. Era dívidas atrasadas daquele país com po- no Rio, em 9 de outubro de 1868.
o início da expansão dos EUA, que já tências européias. Mas foi na década de 20 do nosso sé-
eram a quinta potência manufatureira No caso brasileiro, foi através do co- culo que muitos trustes americanos ini-
do mundo. Numa espécie de messia- mércio que os americanos iniciaram ciaram suas atividades no Brasil. Entre
nismo nacional, surgiu a doutrina do sua penetração e criaram as bases para eles, a Firestone, a Armour, as Refina-
"destino manifesto" e tudo servia para o futuro domínio. Em 1870, logo após o ções de Milho Brazil, a Burroughs, a
justificar a expansão daquele país: pre- final da Guerra Civil Americana (1861- Pan-American é outros, Com a Swift e
destinação geográfica, tarefa de rege- 1865), os EUA já compravam 75% do a Wilson, a Armour controlava a pro-
neração, alargamento da área de liber- nosso café, um produto responsável dução e o mercado de carne. A Ameri-
dade, etc. Nessa.época, aventureiros, por mais da metade de nossas exporta- can & Foreign Power (Electric Bond &
apoiados pelo governo americano, co- ções. No início do século 20, os ameri- Share) detinha com a canadense Brazi-
meçam .a agir na América Central e canos eram O nosso principal cliente, lian Traction Light & Power o mono-
seus olhos cobiçosos voltam-se para a absorvendo 43% de nossas exporta- pólio da indústria de eletricidade no
Amazônia. O mais famoso deles, Wil- ções. O monopólio virtual sobre a ex- País. Oficinas para a montagem de car-
liam Walker, chegou a tornar-se "presi- portação de café, que se estendia a to- ros foram instaladas: o Brasil revelava-
dente" da Nicarágua, em 1860. das as fases da comercialização, prati- se um mercado promissor. A principal
No alvorecer do século 20, a hege- camente colocava a economia brasi- mercadoria importada dos EUA de
monia inglesa no Brasil já começa a ser leira nas mãos americanas. As grandes 1913 a 1928 foram os automóveis, Em
contestada pelos EUA. O acelerado empresas de torrefação dos EUA pro- 1927, o Brasil já era o quarto melhor
desenvolvimento capitalista deste país vocavam manobras baixistas para al- mercado do mundo para os automóveis
americano estendera seu interesse e cançar lucros fabulosos, As sucessivas dos EUA, absorvendo 10% das expor-
sua capacidade de intervenção para baixas no preço do café provocavam tações americanas de veículos.
todo o Continente. crises na economia brasileira. Por todo o século 19, a influência
Em 1904, o presidente Theodore Com ameaças de taxar a entrada do predominante na cultura brasileira foi
Roosevelt, numa declaração, delineou café nos EUA, o governo americano européia. Mesmo no começo do século
uma política que seria o corolário da arrancou dos primeiros governos repu- 20, "a atitude comum da pessoa culta é
Doutrina Monroe. Afirmava que os blicanos favores alfandegários para os de admiração pela Europa, mas de des-
EUA teriam o poder internacional de seus produtos industrializados. Mesmo prezo pelos Estados Unidos", diz o his-
polícia. Ou seja, o direito de intervir em assim, esses produtos não conseguiam toriador Nélson Werneck Sodré. Ape-
qualquer nação latino-americana, para competir com Os ingleses e alemães. sar disso, suas instituições políticas fo-
garantir a ordem., Era a política do big Porém, com a Primeira Grande Guerra ram imitadas pelos fundadores da Re-
stick (grande porrete), como ficou co- (1914-18), que impediu ou dificultou o pública brasileira. Mas foi o cinema,
nhecida. Os EUA usaram desse suposto fluxo de comércio com a Europa, foi transformado em uma indústria por
direito em 1905 na República Domini- possível aos EUA conquistar o mer- Hollywood, que propagandeou de ma-
cana, apossando-se da renda de suas al- cado brasileiro. A partir daí, a presença neira intensa o american way of life no
fândegas para garantir o pagamento de americana em nossa economia se con- País. No ano em que lançaram os pri-
278 *
BRDFANBSB V8.GNCAAA.0413234 ân0o 2, p22

meiros filmes sonoros (1928), os ameri- Já no início No


canos já detinham a supremacia no da República,
mercado brasileiro de cinema. a influência dos
O processo de crescente dominação EUA se consolida no
americana nos mais diversos setores da País: da bandeira
vida nacional foi de certa maneira de- brasileira (ao lado)
sacelerado na década de 30. Por um copiada da americana
lado, pela crise que se abateu sobre to- ao primeiro
dos os países capitalistas e, por outro, empréstimo com uma
pelas disputas entre esses países. No casa bancária de
caso da América Latina, os EUA, cuja Nova Iorque, no valor
ascensão se fazia até então em detri- de 50 milhões de
mento da influência inglesa, têm de en- dólares, em 1921
frentar a Alemanha, que voltara seus (abaixo, por J. Carlos)

Iconographia
olhos para este subcontinente. A exis-
tência de matérias-primas, um mercado
para suas mercadorias e para seus capi-
tais, e até a possibilidade de ocupar ter-
ras americanas, chamavam sua aten-
ção.
A influência alemã no Brasil era re- O emprestimo
forçada pela presença de colônias no
Sul do País, onde até um partido na-
zista foi organizado. Setores signifícati-
vos do governo surgido da revolução
de 30 inclinavam-se pelo nazismo e
para uma aproximação maior com a
Alemanha. O general Góes Monteiro
chegou a aceitar um convite de Hitler
para visitar a Alemanha e participar
como comandante de manobras de
uma divisão da Wehrmacht.
O presidente Vargas tentou utilizar a
rivalidade entre as duas potências para
levar adiante o plano de instalar a in-
dústria siderúrgica no País. Iniciou con-
tatos ao mesmo tempo com a U.S.
Steel, americana, e com a Krupp,
alemã. Esta última, aliás, foi quem for-

Biblioteca Nacional
neceu material para a construção do
Parabens, Jéca ! Que arranjo, hein ?
arsenal da Marinha na Ilha das Cobras, - Mas isso não é meu, não. Eu sou apenas o carregador.
no Rio. hp
Mas o Brasil, inclusive por sua posi-
ção geográfica, tinha importância de-
masiada no conflito, que se travaria no exportação de borracha (Banco da ram a padronizar seus armamentos

O
continente europeu e no Norte da Amazônia) e de ferro (Cia. Vale do Rio até suas fardas pelo modelo americano.
África, para conseguir manter por Doce), congelando os preços dessas A relação Brasil-EUA trazia, porém,
muito tempo sua neutralidade. Os EUA matérias-primas, que eram necessárias consequências a longo prazo. Durante
chegaram a ameaçar que tomariam as ao esforço de guerra dos aliados, Em a guerra na Europa, um oficial ameri-
bases aéreas e navais de que necessitas- troca, Vargas havia conseguido, em cano serviu de ligação entre os oficiais
sem no Nordeste, se o governo brasi- 1940, financiamento de 20 milhões de da Força Expedicionária Brasileira
leiro não as cedesse. As pressões ameri- dólares do Eximbank para a constru- (FEB) e o comando do V Exército
canas, somavam-se, internamente, as ção da siderúrgica de Volta Redonda, americano, na Itália. Era o coronel
exigências das forças democráticas e que veio a ser inaugurada em 12 de ou- Vernon Walters, que se tornou amigo
populares para que o Brasil se incorpo- tubro de 1946. de vários oficiais brasileiros, como Cas-
rasse à frente democrática mundial tello Branco e Cordeiro de Farias.
contra o Eixo nazi-fascista. Após 45, a presença americana Sempre ligado ao Brasil, esse militar te-
Os esforços feitos pelos EUA para consolida-se no País inteiro ria papel destacado na conspiração
que o Brasil rompesse a neutralidade e contra o governo Goulart, como adido
se posicionasse com os aliados no con- Os Estados Unidos emergiram da Se- militar da embaixada americana,
flito mundial em desenvolvimento se gunda Grande Guerra, em 1945, como cargo que exerceu entre 1962 e 1967.
prendiam muito pouco à questão de a mais poderosa potência capitalista, : De volta aos Estados Unidos, chegaria
tropas. Além das posições estratégicas tanto do ponto de vista econômico a vice-diretor da CIA, no governo Ni-
a serem asseguradas no litoral do Nor- quanto militar. Sua presença, influên- xon.
deste, era o fornecimento de matérias- cia e domínio estenderam-se a todos Quando a Escola Superior de
primas o que atraia os americanos, os setores da vida brasileira. In- Guerra, cuja missão seria a de formular
Os Acordos de Washington, em tensificaram-se as relações militares. uma nova doutrina de segurança e de-
1942, criaram o monopólio estatal da As Forças Armadas brasileiras chega senvolvimento nacional, começou a ser

279
sr pranBsa V8.GNC.AMA. 840453331 anda 23

"!

Agência O Globo
formada, em 1947, solicitou-se uma riam de tempo e até da ajuda de capi- de 1947, rompeu relações com a União
missão conselheira americana para aju- tais americanos para se reerguer. Por Soviética, surpreendendo os próprios
dar na organização da escola. Esta mis- outro lado, crescia na Ásia e na África americanos, Aferrado a um liberalismo
são permaneceu no Brasil de 1948 a o movimento anticolonialista, que se comercial ultrapassado, torrou as divi-
1960. voltava na época, basicamente, contra sas que O País acumulara durante a
Mas essa interação entre os militares as grandes potências européias. guerra e, além disso, elaborou um pro-
dos dois países, que era justificada no jeto de Estatuto do Petróleo que tende-
quadro da "guerra fria" como neces- Governos adotam atitudes ria a entregar a exploração dessa ri-
sária ao inevitável e próximo confronto diversas frente aos EUA queza aos trustes internacionais.
com a URSS, atingiu seu auge com a O segundo governo Vargas (1951-
assinatura do Acordo Militar Brasil- A hegemonia mundial dos Estados 54) fez diversas tentativas de enfren-
EUA, em 15 de março de 1952. Além Unidos necessariamente se refletiria tar o poderoso aliado. Seu empenho na
de se comprometer a apoiar incondi- numa presença avassaladora na constituição da Petrobrás e da Eletro-
cionalmente qualquer ação de guerra América Latina. No caso do Brasil, os brás se chocava com a posição de inte-
dos EUA, o Brasil se dispunha a forne- governos que se instalaram entre o final resses industriais americanos. Vargas
cer aos americanos matérias-primas es- do Estado Novo (1945) e o golpe militar viu-se forçado a ceder na exportação
tratégicas, necessárias à defesa do de 1964, embora sem romper nem de minerais atômicos e na permissão
"mundo livre". Manganês, urânio e ameaçar uma ligação íntima com os para o levantamento aerofotogramé-
areias monazíticas eram visados pelos EUA nos diversos campos de ativida- trico de nosso território feito pela
EUA, que não haviam até então desco- de, adotaram atitudes diversas frente à Força Aérea americana. Mas tentou
berto jazidas de urânio importantes em " grande potência. resistir, propondo ao presidente argen-
seu próprio território, Pressionados por reações nacionalis- tino, Juan D. Perón, uma aliança
O nivel da influência americana no tas crescentes, que se manifestavam no Argentina-Brasil-Chile para fortalecer
período pode ser avaliado no governo Congresso, no movimento estudantil e a posição desses três países frente a
Dutra (194651), quando se permitiu tendiam a ganhar cada vez mais res- Washington. Vargas fez, ainda, algumas
o estabelecimento de uma Comissão paldo popular, e, por outro lado, pelas tentativas de controlar a remessa de lu-
Mista Brasil-EUA, que traçou um pro- dificuldades econômicas, principal- cros dos capitais estrangeiros. Essas
grama para o desenvolvimento econô- mente comerciais, que a política de tentativas foram abandonadas no go-
mico do País, baseado na atividade dos subordinação sem limites produzia, al- verno intermediário de Café Filho,
capitais estrangeiros que atuariam nos guns desses governos (Vargas, Goulart quando Eugênio Gudin e Raul Fernan-
setores-chave da economia brasileira. e em certa medida Juscelino e Jânio) des, firmes partidários da atração de '
O representante do Brasil na comissão tomaram atitudes, seja no plano in- capitais estrangeiros e da aliança com
era o economista Octávio Gouvéia de terno, seja no campo da diplomacia e os EUA, ocuparam, respectivamente,
|
Bulhões, que, depois do golpe de 1964, das relações internacionais, que se cho- as pastas da Fazenda e de Relações Ex-
seria ministro da Fazenda do governo cavam com os ditames imediatos de teriores,
Castello Branco. Washington. O governo Juscelino enfrentou ini-
A partir do final da Segunda Grande Mas, quando Otávio Mangabeira, na cialmente uma resistência americana a
Guerra, os EUA encontram-se numa condição de ex-chanceler, prostrou-se seus planos de instalar indústrias no
situação em que a sua hegemonia sobre e beijou a mão do general Eisenhower, País, O FMI (Fundo Monetário Inter-
todo o nundo capitalista não enfren- que comandara as tropas americanas nacional) colocou-se contra o Plano de
tava concorrentes. O Japão estava sob na Europa e estava em visita ao Brasil, Metas e com isso dificultava a conces-
seu controle direto. A Alemanha des- em 1946, esse gesto transmitiu uma boa são de empréstimos americanos ao go-
truída e dividida. A França e a Itália imagem do servilismo do governo Du- verno brasileiro. Juscelino voltou-se
devastadas e a Inglaterra exaurida pelo tra em relação aos EUA. Mais realista para os capitais europeus e, para am-
esforço de guerra. Estes países precisa- que o rei, o governo Dutra, em outubro pliar suas alternativas de comércio, es-
280
BRDFANBSBVB.GNCAMA. 40413343 ano a, p24

Vernon Walters, oficial


americano e amigo de oficiais
brasileiros que estiveram na
Itália, sempre esteve ligado ao
Brasil, de intérprete na Segunda
Grande Guerra à conspiração contra
o governo Goulart, em 1964, como
adido militar da embaixada
americana no País. Na pág. ao
lado, na extr. esq.,
Walters (à esq.) com Mascarenhas
de Moraes, comandante da FEB e
Harold Alexander, comandante aliado
da área do Mediterrâneo; à esq.,
entre o gen. Eisenhower e Dutra,
em 1946; ao lado, com Castello
Branco, após o golpe; ao centro,
já como vice-diretor da CIA, com
Médici e Nixon; embaixo,
Agência JB

com Figueiredo, em 1981

tabeleceu relações comerciais com a


União Soviética. Em junho de 1959,
suspendeu os entendimentos com o
FMI. Mas o fato é que ele manteve a
abertura do País aos capitais estrangei-
tos prevista na Instrução 113 da SU-
MOC (Superintendência da Moeda e
do Crédito), oriunda do governo Café
Filho (195455), da qual os capitais
americanos também se aproveitaram.

neto -40FRdoe alhoOâ>lana


O governo Jânio (1961), no plano da

eipressao S iaea
economia interna, adotou resoluções
na direção proposta pelo FMI, mas
tentou manter no plano externo certa
independência. Anunciou que reataria
relações diplomáticas com a URSS e
enviou o vice-presidente João Goulart
à China Popular. Recusou-se a apoiar
os EUA na invasão de Cuba e marcou
mais ainda sua posição condecorando
Ernesto "Che" Guevara, ministro da
de Cuba, em passagem pelo Brasil.

Acordos MEC-USAID
reestruturam ensino superior

O presidente João Goulart (1961-64)


fez algumas tentativas de aproximar-se
de Washington, tendo até mesmo visi-
tado o novo presidente do EUA, John
Kennedy, em abril de 1962, Mas atraiu
a ira americana por sua política externa
independente. O Brasil foi acusado de
ter contribuído para evitar que os EUA
conseguissem apoio de toda a América
Latina para suas represálias contra
Cuba, na Conferência de Punta del
Este, em janeiro de 1962. No plano in-
terno, as encampações de empresas
americanas e a Lei da Remessa de Lu-
cros, regulamentada em 1964, contri-
buiram para afastar ainda mais o go-
verno americano. Os EUA passam a
apoiar diretamente, com empréstimos,
os governos estaduais que se opunham

281
BR DFANBSB V8.GNCIAAMA, SLO 413
34 an co y p25

Mas, com a recessão da economia, to-


dos esses países -- particularmente os
Estados Unidos, nosso cliente principal
- vêm fechando seus mercados com
sucessivas medidas protecionistas,
Como a instalação de indústrias no
Brasil tinha sido feita sem gerar um
mercado interno proporcional às po-
tencialidades de um país continental,
surgiu a necessidade de escoar parte
significativa dessa produção no Exte-
rior. Esta seria, portanto, a base obje-
tiva dos esforços feitos para sair de uma
relação excessivamente restrita com os
EUA

Em 1976, a URSS é o quinto


maior comprador brasileiro

A situação mundial também se alte-


rara. A hegemonia dos Estados Unidos
sobre o mundo capitalista, já questio-
nada no plano político pela França de
De Gaulle, começava a ser contestada
Ao no plano econômico pela Alemanha
Durante a guerra, o presidente Roosevelt visita Natal (RN) Ocidental e Japão. Derrotados na
com Vargas (atrás): além China, na Coréia e no Vietnã, os EUA
de matérias-primas, os EUA asseguram posições estratég
icas no litoral nordestino viram lutas de libertação nacional se
ao governo Goulart, como o de Carlos multiplicarem pelo continente africano
Se no plano cultural a presença ame- e asiático, já agora voltadas principal-
Lacerda na Guanabara, e o de Adhe- ricana
vinha crescendo depois da Se- mente contra sua influência. Um bloco
mar de Barros, em São Paulo,
gunda Grande Guerra, sob o Regime de nações do Terceiro Mundo se agru-
Depois do golpe militar de 1964, que Militar
chega ao máximo, quando os pou para defender seus interesses nos
derrubou o governo constitucional de
convênios entre o Ministério da Educa- fóruns internacionais, abalando a pola-
João Goulart, onde tiveram papel des-
ção e Cultura (MEC) e a United States rização das votações característica do
tacado tanto na fase de conspiração
Agency for International Development períod o da "guerra fria", O fortaleci-
quanto na de execução, os americanos
(USAID) - os famosos "Acordos mento da URSS também gerava um
viram instalar-se no Brasil o governo
MEC-USAID" - são estabelecidos contrapeso político e militar à influên-
Castello Branco, que, a pretexto de
para reestruturar o ensino superior no cia americana. .
"fronteiras ideológicas" e "interdepen-
País. Ou quando contratos de financia- O Brasil, tentando situar-se nesse
dência" entre as nações "livres", optou
mento e assistência técnica, firmados novo quadro, procurou intensificar
pelo alinhamento automático de nosso
com grupos americanos, ajudarão a suas relações diplomáticas e comerciais
país com as posições dos EUA, Globo a se tornar a rede de rádio e te-
Se o governo Vargas, respaldado com os países do Leste europeu e com
levisão mais poderosa do País. aquele
pela mobilização social, particular- s que se libertavam do jugo colo-
Essa política de alinhamento incon- nial, Em 1976, a URSS já era o quinto
mente estudantil, resistiu a enviar tro- dicional com os EUA iria esgotar-se e,
pas brasileiras para lutar na Coréia em comprador das exportações brasileiras.
dez anos depois, ao se iniciar o governo No reajuste diplomático, pesou tam-
1951, o governo Castello Branco (1964- Geisel, em 1974, a expressão "pragma-
67) não vacilou em enviar soldados bém a grande dependência energética
tismo responsável" surgiria para definir do Brasil em relação às importações de
brasileiros para apoiar a intervenção uma nova política externa que procu-
americana na República Dominicana, petróleo de países árabes,
rava realinhar os compromissos do Nesse contexto, uma série de atritos
em 1965. Brasil num mundo em transição.
A partir daí, toda uma série de medi- surgiu com os EUA. O acordo militar
O alinhamento com os Estados Uni- de 1951 foi denunciado pelo governo
das favorece os interesses americanos dos, da maneira que foi articulado,
no Brasil, anulando medidas de defesa brasileiro em 1977, no bojo de uma
pressupunha que o mercado americano crise nas relações entre os dois países,
da economia nacional adotadas pelos iria absorver os produtos fabricados no
governos anteriores, como a nova Lei de causada pela aplicação da política de
Brasil. Na nova divisão internacional Direitos Humanos do governo Carter.
Remessa de Lucros, o Acordo de Ga- do trabalho, instaurada depois da Se-
rantia de Investimentos, a compra da O estabelecimento do acordo ;nuclear
gunda Grande Guerra, uma certa in- com a Alemanha (1975) foi efetivado
AMFORP pelo preço pretendido pelos dustrialização ocorreu nos países peri-
proprietários. Em troca, é garantido o apesar da oposição americana.
féricos mais desenvolvidos, enquanto Mas, no fundamental, a dependência
reescalonamento da dívida externa e o as renovações tecnológicas e as indús- de nosso País
afluxo de financiamentos oriundos de frente aos EUA conti-
trias chamadas de ponta se concentra- nuava em
agências governamentais americanas 1984, e até se reforçava no
vam nas matrizes. Como complemento terreno das
ou internacionais onde o governo ame- relações comerciais e finan-
desse processo, os países capitalistas ceiras, embor
ricano tem controle decisivo, a já não fosse provável,
avançados deveriam absorver produtos por exempl
iniciando-se assim um novo ciclo de En- o, o enviotde soldados brasi-
manufaturados e semimanufaturados leiros para
dividamento. reforçar uma eventual inva-
produzidos na periferia do sistema. são americana da Nicarágua.
282
"ar DFANBSB V8.GNCIAAA. 84041334anCcO2, p26

POLÍTICA/ENTIDADES DEMOCRÁTICAS: a história da OAB A luta contra a ditadura xculminou

com a eleição de Raul Fernandes, vin-


culado à UDN, o que marcou a ruptura
definitiva com o Estado Novo. Na fase
A resistência da Ordem que se seguiu, a OAB permaneceu pró-
xima à UDN, elegendo novos presiden-
tes ligados a este partido.
Desde a sua criação, em 1930, a Ordem dos Advogados
Esta proximidade com a UDN pode
do Brasil esteve presente - do Estado Novo ao Regime explicar porque a OAB não reagiu ao
Militar - nas lutas pelas liberdades democráticas golpe de 64. A OAB, porém, se desvin-
cula do sistema com a eleição de José
Cavalcanti Neves, em 1971. "A tortura e
os métodos de brutalidade levaram os
advogados a reagir", lembra o jurista
Raymundo Faoro, presidente da Or-
dem no período 1977-79. "Mas a rea-
ção não foi política", ressalva. "Os
pressupostos da advocacia estavam
sendo feridos - os juízes não tinham as
garantias constitucionais."
De fato, Cavalcanti Neves pauta sua
gestão pela defesa intransigente do res-
tabelecimento das garantias da magis-
tratura, da plenitude do habeas-corpus,
do respeito aos preceitos da Declara-
ção Universal dos Direitos do Homem
e do respeito aos princípios do Estado
de Direito.
A gestão seguinte é menos expres-
siva. Em 1975, com a eleição de Caio
Mário da Silva Pereira, a Ordem volta
a defender o restabelecimento das ga-
rantias constitucionais dos advogados e
dos cidadãos e, em 1977, Raymundo
Faoro é eleito presidente e torna a Or-
Agêncua Estado

dem uma das entidades mais represen-


tativas da sociedade civil. Sua atuação
foi pautada pela defesa do retorno ao
Estado de Direito democrático. O novo
Durante a gestão de Raymundo Faoro (1977-79), a OAB destacou-se pela tese do presidente entendia que a Ordem de-
retorno ao Estado de Direito democrático, através de uma Assembléia Constituinte. veria limitar-se às demandas específicas
Acima, Faoro (à esq.) com o senador Petrônio Portela dos advogados. Com isto poderia aglu-
tinar os profissionais de todo o País, in-
Em 1980, a OAB (Ordem dos Advo- os advogados tiveram o mesmo posi- clusive os que militavam no partido do
gados do Brasil) comemorou com sole- cionamento contra o arbítrio. governo. Defendeu o retorno ao Es-
nidade, mas sem festas, o seu cinquen- A OAB foi criada em 18 de novem- tado de Direito como pressuposto
tenário. Durante a fase de organização bro de 1930, com o desmembramento básico do exercício da advocacia. E,
das festividades comemorativas, um do antigo Instituto da Ordem dos Ad- como forma de atingir este objetivo, a
atentado terrorista sacudiu as suas ins- vogados do Brasil, este de 1843. Obje- defesa da convocação de uma Assem-
talações e matou dona Lyda Monteiro tivo: disciplinar e selecionar os profis- bléia Nacional Constituinte, Interlocu-
da Silva, funcionária da Ordem havia sionais. Apesar das intenções corpora- tor privilegiado do senador Petrônio
mais de 40 anos. Dois dias antes de tivas de sua criação, a força da tradição Portela, presidente do Congresso, Ray-
morrer, dona Lyda prestara um depoi- do instituto impediu que a OAB se tor- mundo Faoro limitou suas reivíndica-
mento ao advogado Alberto Venâncio nasse uma entidade vinculada ao Es- ções aos pleitos específicos dos advoga-
Filho, que fazia um levantamento para tado. Até por volta de 1943 a Ordem se dos: restabelecimento da plenitude do
escrever a história da OAB. Dona Lyda manteve dentro dos limites de órgão se- habeas-corpus, das garantias da magis-
explicara que pouca coisa havia res- lecionador e disciplinador da categoria, tratura e retorno ao Estado de Direito,
tado das discussões havidas nas sessões quando então começa a reagir ao Es- através de uma Assembléia Consti-
da OAB no período do Estado Novo tado Novo. Antes, já havia a atuação tuinte. Outra questão proposta por
(1937-45), e sobretudo no período final, do advogado Heráclito Fontoura de Faoro a Portela: a alteração do Artigo
durante a campanha contra a ditadura Sobral Pinto na defesa dos comunistas 185 da Constituição, que tornava ine-
varguista. As atas da entidade eram pu- Luis Carlos Prestes e Harry Berger. In- legíveis todos os cidadãos que tivessem
blicadas no Jornal do Comércio (RJ) e dicado pela OAB, este advogado de ' tido os direitos políticos cassados. O
passaram a sofrer censura, razão pela formação católica lutou durante nove presidente da OAB alertava o senador
qual se decidiu omitir as manifestações anos para livrar seus constituintes das Portela de que a anistia viria mais cedo
decaráter público. A funcionária da Or- torturas degradantes a que eram sub- ou mais tarde e de que este artigo seria
dem fazia a ligação de duas fases (o Es- metidos, chegando a invocar em seu um entrave. O presidente do Senado
tado Novo e o Regime Militar) em que benefício a lei de proteção aos animais. argumentava que o problema era a
283
» DFANBSB V8.GNG;AAA, R4 334 an 008 ,P2Y

existência de três nomes não absorvi- Faoro, foi que a OAB passou a empu- sos comuns, à reforma do ensinojuri-
veis pelo sistema: Luís Carlos Prestes, nhar bandeiras gerais, indo além das dico e ao relacionamento internacio-
Miguel Arraes e Leonel Brizola. Ouviu demandas específicas dos advogados. nal. Durante sua gestão ocorre o aten-
então do presidente da OAB o desafio A Ordem se coloca contra a Lei de Se- tado do Riocentro. A OAB, através do
de encontrar uma fórmula legal de dei- gurança Nacional e a sobrevivência da CDDPH, reage energicamente, exi-
xar apenas os três fora de um projeto comunidade de informações. O projeto gindo um completo esclarecimento do
de liberalização. de anistia do governo também teve a episódio.
Petrônio Portela, porém, não encon- repulsa da Ordem, pelo seu caráter de No período iniciado em 1983, a
traria a fórmula e a 13 de outubro de 78 indulto e pela questão da reciproci- OAB, sob a presidência de Mário Sér-
caia o AI-5. Pela edição da Emenda dade. Participando do CDDPH (Con- gio Duarte Garcia, continua partici-
Constitucional no 11, eram restabeleci- selho de Defesa dos Direitos da Pessoa pando das lutas pelas liberdades demo-
das as prerrogativas da magistratura, o Humana), Seabra Fagundes luta contra cráticas no País, às vezes se envolvendo
habeas-corpus pleno e alterado o Artigo a imposição do sigilo e constitui uma com a truculência do Regime Militar.
185 da Constituição, caindo a inelegibi- comissão de 15 advogados para Em 24 de outubro de 1983, durante a
lidade dos cassados e abrindo-se cami- assessorá-lo. Dezenas de pessoas pas- votação do Decreto-Lei no 2.045,
nho para a anistia. sam a procurar a OAB, pedindo ajuda Brasília se encontrava sob o regime
Eduardo Seabra Fagundes assume a para questões como o esclarecimento das medidas de emergência. Mesmo as-
presidência em 1979, reconhecendo as do desaparecimento de presos políti- sim, o Conselho Seccional do Distrito
conquistas obtidas*na gestão anterior e cos. Entre estas questões figuram a ten- Federal decidiu manter a realização do
ressalvando que ainda faltava muito à tativa de reabertura do processo do de- I Encontro dos Advogados. O executor
plena restauração do Estado de Di- putado Rubens Paiva e o acompanha- das medidas, general Newton Cruz, o
reito. Começapregando a anistia am- mento da localização de uma antiga "Nini", mandou invadir e interditar as
pla, geral e irrestrita e sem gradualis- casa de torturas de presos políticos na instalações da OAB-DF, mas o presi-
mos; a convocação de uma Assembléia cidade de Petrópolis (RJ). dente do Conselho, Maurício Correa,
Constituinte que restaure as eleições resistiu à intervenção, posteriormente
diretas em todos os planos, assegure a Em 84, a OAB participa com
revogada pelo Planalto sob a alegação
liberdade de organização partidária e destaque da campanha das diretas de ter havido um mal-entendido. Ao fi-
sindical e estabeleça uma justa distri- nal do episódio, o general Cruz chegou
buição de renda. Como principal dife- O atentado contra a OAB ocorre a admitir, publicamente, que "havia
rença do presidente anterior, havia o nessa gestão. A Ordem contrata um pe- quebrado a cara".
entendimento do caráter do Estado rito independente para acompanhar as Em 1984, quando a campanha pelas
brasileiro: para Faoro, autoritário; para investigações, mas o caso permaneceu diretas-já empolgou todo o País, a
Seabra, totalitário. Foram cortadas as sem esclarecimento. Um militante de OAB, juntamente com outras entida-
negociações com o regime e es- direita, Ronald Watters, foi preso, mas des, compôs o Comitê Suprapartidário
tabeleceu-se uma linha de luta intransi - absolvido por falta de provas. Pró-Diretas e teve participação desta-
gente pela restauração da democracia,. A gestão seguinte, de José Bernardo cada de seus representantes.
Outra diferença na gestão de Seabra Cabral, caracteriza-se pela ênfase à
Fagundes, ao contrário da gestão de questão dos direitos humanos dos pre- Márcio Bueno
No I Encontro dos Advogados, a sede da OAB em Brasíliafoi invadida por ordem do gen. Newton Cruz, executor das medidas de
emergência. Abaixo, participantes do encontro protestam contra a invasão, out./83 (Maurício Correa, presidente da Seccional
do
Distrito Federal é o 5o da esq. p/ dir.)

| <p "!

#
Paula Simas
R DranBsB V8.GNCIAMA, 3404133 4ancoa , p2s

plicados pelos temas tratados.Este mo-


vimento se dissolveu por volta de 1975,
em parte porque alguns dos cineastas
que o integravam queriam partir para
outros trabalhos cinematográficos, em
parte porque os primeiros sinais da
chamada "abertura" exigiam uma res-
posta diferente: filmes mais nitida-
mente políticos, ou melhor, filmes que
refletissem de alguma forma as diferen-
ças que surgiam entre as oposições, en-
quanto o Cinema de Rua representava
algo como um consenso das oposições
na época Médici.
Em relação aos anos 60, esses filmes
ofereciam uma grande diferença: em-
bora pudessem tratar dos mesmos te-
mas (migração, construção civil), aban-
Nair Benedicto/F4

donavam o tom sociológico para se


centrar em casos muito concretos, em
que operários e moradores da periferia
pudessem identificar seus próprios pro-
blemas. Em Onibus, por exemplo, a câ-
Braços Cruzados, Máquinas Paradas, de Roberto Gervitz e Sérgio Segall mera está num ponto de ônibus num
bairro afastado do centro, no fim da
ARTES/CINEMA: as produções militantes madrugada. Passageiros são entrevista-
dos, bem como cobrador e motorista.
Após longa espera, a câmera sobe no
ônibus repleto: fica clara a insuficiência
Cineastas em ação
da condução, a insegurança das via-
gens, o atraso na chegada ao serviço
A partir da década de 70, pela primeira vez no motivado pela precariedade dos trans-
cinema brasileiro, filmes agem de forma vinculada portes, os descontos no salário advin-
dos dai.
à ação política, intervindo na realidade do País
Um dos pontos mais relevantes desse
movimento é que, em alguns casos, o
Cinema militante é, certamente, uma ciológica. Embora seus realizadores ti- filme deixa de ser uma mensagem que
expressão recente no vocabulário cine- vessem posições políticas definidas, se leva ao público para se tornar uma
matográfico usado no Brasil. Há diver- eram produções independentes e não intervenção na realidade. Cite-se ape-
gências quanto ao que seja este tipo de realizações estreitamente vinculadas a nas o exemplo de um projeto de João
cinema, mas em geral se concorda que movimentos ou instituições políticas Batista de Andradepara a televisão, o
os filmes militantes são curtos, tratam ou a situações políticas específicas. É qual, infelizmente, não foi levado a
de problemas sociais e políticos canden- bem verdade que Maioria Absoluta se cabo por problemas de produção na
tes no momento de sua realização, são enquadrava no projeto de reformas de tevê. Pelo jornal, o cineasta fica sa-
instrumentos a ser usados pela ação base do governo João Goulart. De bendo que a prefeitura pretende trans-
política e devem motivar rapidamente qualquer modo, a ditadura no pós-64 ferir favelados instalados numa avenida
os seus espectadores. impediu que estes filmes circulassem e marginal, em São Paulo, para um ter-
Em 1984, considerava-se como o principalmente atingissem as pessoas reno baldio próximo a um conjunto re-
principal movimento de cinema mili- diretamente concernidas pelos assuntos sidencial operário, e que esposas de
tante o conjunto dos filmes realizados que abordavam. operários reagiram mandando uma
no final da década de 70 por cineastas Nos anos 70, em torno de João Ba- carta à imprensa, opondo-se a esta
como Renato Tapajós, João Batista de tista de Andrade se desenvolveu em transferência: "Como poderiam educar
Andrade, Sérgio Toledo Segal ou Ro- São Paulo um movimento conhecido os filhos tendo como vizinhos margi-
berto Gervitz, em torno das greves de como Cinema de Rua, dentro de mol- nais, ladrões, assassinos?" O cineasta
metalúrgicos de São Paulo e do ABC, des de produção extremamente pre- dirige-se ao conjunto operário, filma e
Em realidade, muitos filmes de curta- cários. Um filme como Restos, por grava entrevistas com operários que ex-
metragem trataram de problemas so- exemplo, nem foi sonorizado, O pri- põem a sua posição. Dirige-se em se-
ciais, sobretudo de situações populares, meiro dessa série foi Migrantes, guida à favela, onde, pelo gravador, fa-
já nos anos 60. Por exemplo, Maioria realizado em 1972, ainda sob o governo veladas ouvem as declarações das ope-
Absoluta (1964-66), onde León Hirzman Médici. Os temas não eram direta- rárias. Elas reagem violentamente e de-
tratava da situação dos camponeses mente políticos, pois a ditadura não o fendem que seus maridos não são la-
nordestinos, do analfabetismo e do di- permitia. Abordavam temas como a si- drões nem assassinos, mas também tra-
reito de voto aos camponeses; ou tuação dos migrantes nordestinos, o balhadores. O filme termina aí. O cine-
Viramundo (1965), em que Geraldo trabalho na construção civil, acidentes asta informa operárias e faveladas da
Sarno analisava a situação do contin- de trabalho, etc. Graças a organizações hora em que o programa irá ao ar, prin-
gente nordestino da classe operária populares, cineclubes, setores da Igreja cipalmente para que as operárias to-
paulista. Mas esses filmes estavam em Católica, estes filmes conseguiram cir- mem conhecimento da resposta das fa-
geral mais voltados para a análise so- cular e atingir públicos diretamente im- veladas. O prosseguimento do projeto

285
BR DFANB ONCAA 1404
138334 ano0
2, 029

A 27 de março de 1979, a greve de


São Bernardo é suspensa, abrindo-se
uma trégua de 45 dias para discutir um
acordo entre operários, empresários e
governo. Durante esses dias, é neces-
sário manter a mobilização dos meta-
lúrgicos e o sistema de informação: foi
nessas condições que Para que nunca
mais e Greve começaram a ser exibidos,

José Lucena da Cruz/ Diário do Grande ABC


isto é, absolutamente colados à ação.
Disto decorre a necessidade de uma
produção muito ágil (os fatos não espe-
ram), um tempo mínimo de montagem
e finalização dos filmes. Se se tomasse
os dois meses que um documentário ci-
nematográfico costuma levar para ser
finalizado, os 45 dias já se teriam esgo-
tado. Provavelmente pela primeira vez
na história do cinema no Brasil, filmes
agiam de forma tão precisamente vin-
culada à ação política,
A produção de Para que nunca mais
foi iniciada pelo Sindicato dos Metalúr-
gicos de São Bernardo e retomada,
após a intervenção no sindicato, por
uma entidade cultural vinculada à co-
missão de salários. Isto também é uma
novidade, a produção de um filme por
um sindicato operário. Neste caso, o
filme tende a expressar as posições
políticas dos produtores, o que, no
filme, se manifesta pela valorização de
Luis Inácio Lula da Silva e a relativa-
mente pouca importância dada à co-
missão de salários.
Mas filme militante não é necessaria-
mente produzido por sindicato ou par-
tido político: Braços Cruzados é uma
produção independente. Seus autores
apóiam claramente as posições da cha-
pa 3, uma das concorrentes à eleição
do Sindicato dos Metalúrgicos de São
Paulo; aí, a orientação política do filme
depende da opção dos autores que tra-
balharam em estreita colaboração com
os integrantes da chapa 3.
Greve também é uma produção inde-
pendente e aí o cineasta assume um
distanciamento crítico em relação às
Ao alto, A Greve, de J. B. de Andrade. Acima, Em nome da Segurança Nacional, diversas forças políticas em jogo no
de Renato Tapajós filme.,
Como a produção de cinema mili-
teria consistido em o cineasta voltar ao versos se fazem presentes em produ- tante não constitui um movimento polí-
conjunto operário e fazer novas entre- ções realizadas principalmente em São tico em si, nem decorre da organização
vistas a fim de perceber se as operárias Paulo e no Rio de Janeiro, mas tam- política de profissionais de cinema, este
tinham mudado de opinião, ou não, em bém em outros pontos do País, tais tipo de produção retrocedeu com o re-
função da resposta das faveladas. E é como a mulher trabalhadora, ecologia, fluxo do movimento dos metálúrgicos,
evidente que a expectativa do cineasta, acidentes de trabalho, mutirões para e estes cineastas se orientaram para
ao propiciar através do filme um construção de moradias em bairros movimentos pluriclassistas ocorridos
diálogo entre os dois grupos antagôni- operários, saúde pública, etc. Mas é em nos últimos anos, Disto são testemu-
cos, era de que a opinião das operárias torno dos movimentos dos metalúrgi- nhos filmes como o Tribunal Bertha
de alguma forma se modificasse. cos que se realizam os três filmes de Lutz, de João Batista de Andrade, ou
maior repercussão. 1978, em São Em Nome da Segurança Nacional, sobre
Na greve de 1979, filmes Paulo: Braços Cruzados, Máquirias Para- o Tribunal Tiradentes,
ajudam a manter mobilização das (Segal e Gervitz); 1979, São Ber-
nardo do Campo (SP): Para que nunca
Uma nova etapa do cinema militante mais (ou Dia Nublado ou Greves de
começa por volta de 1978. Temas di- Março, Tapajós) e Greve (Batista). Jean-Claude Bernardet

286 .
"aroransss ve.enciam, 8404133) 30

N
COMPORTAMENTO/SEXO: prostituição e comércio sexual

Sexo à venda

No final dos anos 70, com a liberalização dos


costumes no governo Figueiredo, aumenta a
mercantilização do sexo, dos motéis aos sex-shops

118 - « iru,
mtO

Avani Stein/ Abril Press


Em 1978, estimava-se que metade da
prostituição de rua de São Paulo
era exercida por travestis
(acima). Nos anos 80 proliferavam

Paulo Salomão/ Abril Press


anúncios de massagistas e
acompanhantes (abaixo,
à esq., classific: dos publicados
em jornais do Rio e São Paulo) e
também os motéis (à esq.), frequentados
inclusive por namorados e mesmo
por maridos e mulheres

"DUO BALLS - 1.000 anos de pra- cados, de pessoas oferecendo-se para


zer. São as famosas esferas mágicas. Se- Mulher Por Tel.257-4429
"serviços sexuais" de todos os tipos. O
gredo milenar das fabulosas gueixas Belas mulheres.Atend.hotel,motel,resid. 24 horas.
períódico paulista, pertencente à tradi-
orientais, as verdadeiras Vênus do GAROTAS cional e conservadora família Mes-
UNIVERSITÁRIAS GAROTAS DO
Amor! Estas esferas são as únicas que LEBLON quita, também lucrava, indiretamente,
At. F.: 259.4118.
conseguem satisfazer estas deusas do Só garotas estudantes nível com as novas formas do comércio se-
TÁNIA DOMINADORA colegial ao universitàr a-
sexo. Experimente. O prazer que estas das de alto padrão intelectual e kual.
Ativa e passivo p/ visual, Atend. locais priv: alto
bolas lhe dão tem 1.000 anos de sabe- executivos e casais. luxo, hotéis e domicílio. Tel Em 31 de outubro de 1982, a Folha
258.9749. 226-41 50
doria." Anúncios insólitos como este dê S. Paulo noticiava com destaque o
eram facilmente encontráveis nas cha- provável fechamento, depois de 40
Mulher à Domic. 258.3645
madas revistas masculinas nos fins dos Ligue e terá a mulher dos seus sonhos. 24 horas. anos de funcionamento ininterrupto,
anos 70, após a liberalização dos costu- de um dos mais famosos rendez-vous do
OI! VENHA CURTIR -As deli- CASADAS, BONITAS, RO-
mes promovida pela abertura do go- cias do Amor á três. Somos MANTICAS e COMPLETAS País; a casa de dona Eni, em Bauru, no
verno Figueiredo. duas garotas Bi e muito car- - Sômente das 11 às 18
nhosas Gisa. T. 2564900 - horas. Reservas 242-3784 interior de São Paulo, reduto de deli-
"DUO BALLS" era apenas uma en- 10/19hs. Local.
cias orgiásticas de políticos e milio-
tre inúmeras opções à venda nos sex- nários. Porém, apesar de a sexagenária
shops (lojas de "complementos" se- Tá Chegando a Hora...
Eni estar fechando sua "pensão", a
xXuais) das grandes cidades brasileiras. De curtir um lugar diferente. Com mil mulheres,
homens e casais em total liberdade no Ele & Ela Club prostituição feminina não estava em
Nesses estabelecimentos se encontrava A sauna mista no 1 do Brasil. E você conhecerá ao baixa, vencida na concorrência pelas
vivo, o templo dos prazeres do Calígula. De 2a a sáb.
"de tudo", de simples pomadas lubrifi- de 15 às 3 hs. Manobristas e C.C. R. Pires da Mota, novas formas de comércio do sexo ou
cantes até produtos que prometiam de- 494 (esq. da Av. da Aclimação). F.: 279-2756.
pela celebrada "revolução" comporta-
volver a virgindade. Com fachadas e MOÇA SENSUAL BONITA E mental. -
DISCRETA - Atende damas, CAROLINA 247-9693
funcionários geralmente discretos, para cavalh. e casais local, domici- - Meninas, meninos, Estudo realizado por Délcio Mon-
lio e hotéis completo: sigilo
evitar qualquer constrangimento aos 235-5870. bonecas, hot. dome. teiro de Lima junto a urologistas dos
clientes, os sex-shops eram uma expres- E-
grandes centros do País, cuja especiali-
são da intensa mercantilização do sexo, Fantasias Eróticas dade facilita a observação de pacientes
que pretendia aproximar, em termos Moças, rapazes e casaiS. 35-6478 - 34-5879. sexualmente ativos, revelou que, na
comportamentais, as metrópoles brasi- BONECA PRISCILA, NINFETA opinião desses profissionais, o envolvi-
JUNIOR ATLETA GAY Ativa, loira, sexy, exube-
leiras dos centros do capitalismo inter- atend. 24 hs., inesque- rante, recém chegada SP. F mento de homens com prostitutas
nacional, cível F: 37.4638. 541-8093 apto. privê. "mantém-se igual" para 56%, "vem au-
Ainda um "sinal dos tempos" era a mentando" para 36%, e "vem dimi-
publicação diária nas páginas do Jornal "Xuxa" à Partir das 10Hs nuindo" para 8%. Inquérito seme-
da Tarde (SP), em sua seção de classifi- Você + Elas e Sauna. Lins Vasconcelos, 1821. lhante, feito junto a prostitutas, obteve
287
BR DFANBSB V3.GNC.AAA, 24041334 an 06 2, p 31

a resposta "é igual" de 71% das entre- sem a se prostituir nas zonas de me- mos , seviciadas e abandonadas.
vistadas, "está diminuindo" de 24%, e retrício das capitais ou cidades maio- Em abril de 1981, já durante a aber-
"está aumentando" de 5%. res. Sobrevivia também, no Norte, a tura do general Figueiredo, o Supremo
Comprova-se, com o percentual su- "zona flutuante", constituída de uma Tribunal Federal decidia que a polícia
perior a 50% para ambos os segmentos embarcação abarrotada de prostitutas, tinha amparo legal para reprimir o
pesquisados, que a prostituição manti- em geral muito jovens, que percorria os trottoir de prostitutas e travestis em to-
nha a sua importância no comércio se- rios da região satisfazendo sua clien- das as vias públicas do País. Porém, o
xual. O que mudava - e isso explica o tela, majoritariamente composta de ga- mesmo STF concederia habeas-corpus a
anunciado fechamento da "casa" de rimpeiros, Clarice da Mata e Sousa e Sônia Maria
dona Eni - era a forma de exercer a A lei brasileira não punia a prostitui- de Sousa, presas sob a acusação de es-
prostituição, que deixava progressiva- ção. Entretanto, em setembro de 1972, tarem fazendo trottoir.
mente de ser confinada ou semiconfi- A polícia, entretanto, não era a única
nada (em bordéis e zonas de meretri- dificuldade na vida das prostitutas.
cio). ELITE ESCORTS Apesar de terem uma clientela mais
Segundo estudiosos do assunto, a Estamos lhe esperando 24 específica, os prostitutos e travestis pas-
prostituição confinada ou semiconfi- horas com belas garotas e saram a ocupar as ruas e avenidas das
nada estava irremediavelmente com- rapazes. Nível classe A.
grandes cidades, não raramente deslo-
prometida à extinção no prazo de mais
Fone: 259-3903 cando as mulheres para outros "pon-
de uma década, pelo menos nos gran-
tos". A prostituição masculina, apesar
des cegitros urbarios. A estratégia, sem-
de antiga, só se tornou amplamente co-
pre respaldada em argumentos de or- for friends nhecida a partir dos anos 70. Praticada
dem moral e higiênica, de "resolver" o Bath House
problema da prostituição com o confi- em guetos, banheiros públicos, boites
Open every day a week gay, casas de massagens, saunas ou a
namento em zonas de meretrício não
ONLY FOR MEN domicílio, ela não diferia muito da fe-
resistia à pressão da especulação imobi-
Tels.: 570-9468 e 570-1887 minina: homens prestam serviços se-
liária. Também o semiconfinamento
não podia competir com os modernos xuais a outros homens.
motéis. é Quanto aos travestis, já em 1978,
O estudo já citado de Délcio Mon- SCORTS SERVICE estimava-se que pelo menos metade da
teiro de Lima revelava, por outro lado, Acompanhantes prostituição de rua da cidade de São
que, ao contrário do que se afirma fre- Paulo fosse exercida por eles. Sua
Classe, Sensualidade e Discreção clientela era constituída predominante-
quentemente, não eram os homens
mais jovens, que se estavam iniciando mente por homens maduros, de posi-
ção social elevada, muitas vezes ho-
na vida sexual, os que apresentavam
maior percentual de envolvimento com mossexuais não "assumidos".
prostitutas. De fato, ocorria exata-
Os sofisticados "templos"
mente o contrário: o percentual crescia
com a idade. Ele era de 11% na faixa sexuais do Brasil moderno
etária dos 15 aos 20 anos; 24% na faixa Em 1984, longe do brilho criado pela
dos 20 aos 30; 32%na faixa dos 30 aos imprensa em torho de Roberta Close, o
40; e 33% na faixa dos 40 ao 50. dia-a-dia dos travestis menos célebres
estava associado invariavelmente à vio-
Prostitutas eram mais Atraentes companhias onde há
lência. Não foram poucos os casos, aba-
nível e beleza não só física mas
procuradas pelos casados fados, de altos políticos e executivos
também cultural com jovens
envolvidos com travestis e vitimados
Também a procura de prostitutas universitárias, modelos e
por chantagens, extorsões e até agres-
não era um substitutivo para, a "vida se- manequins
sões físicas,
xual normal" supostamente proporcio- Atendimento rápido e
Ao lado das "casas de massagem"
nada pelo casamento, já que entre os peronalizado (inclusive casais)
para hetero e homossexuais, substitutas
Fones: 259-8282 - 255-7113
homens que se envolviam com prosti- sofisticadas dos velhos bordéis, os mo-
Atendemos a domicílio, hotéis e
tutas era maior o percentual de casados téis, frequentados também por casais
motéis.
(52%) do que de solteiros (48%). de namorados e até por maridos e mu-
A modernização acelerada do País lheres, eram os "templos" sexuais do
no pós-64, se não fez declinar a prosti- Na década de 80, anúncios Brasil modernizado. Nos anos 70,
tuição, multiplicou seu leque de moda- destacavam "acompanhantes" multiplicaram-se nos arredores de
lidades. Estudantes universitárias que universitárias (Revista Rádio Táxi L grandes cidades, e, em 1984, eles já ha-
faziam "bicos" nos fins de semana nos nov./84) viam conquistado a área urbana.
chamados "serviços noturnos" dos ho- Para os que não tinham dinheiro,
téis de luxo, acompanhantes para via- durante a feroz ditadura do general lembrava a revista carioca Ele e Ela ,
gens internacionais, trottoir motorizado Médici, o Jornal do Brasil noticiava vio- restava a opção dos drive-in , em muitos
eram, entre outras, as novas formas que lenta repressão policial às prostitutas da dos quais não era necessário sequer
adquiria a chamada "profissão mais an- cidade de São Paulo. Como os cárceres que o cliente estivesse motorizado: bas-
tiga do mundo", estivessem lotados e o secretário de tava "escolher o bom acabamento de
Fruto, porém, do desenvolvimento Segurança do Estado tivesse determi- um Simca Chambord ou o confortável
desigual do. capitalismo brasileiro, era nado que os recursos fossem concen- banco traseiro de um Aero-Willys",
comum, ainda em 1984, sobretudo nas trados "na guerra aos crimes contra o que se encontravam há anos estaciona-
regiões mais atrasadas do Nordeste, patrimônio", a tática adotada foi o es- dos em pequenos compartimentos.
que pais, inconformados com deflora- tabelecimento de pânico entre as pros-
mento de suas jovens filhas, as levas- titutas, que eram levadas para locais er- Márcia Micheli
288
BR DFANBSB VB.GNCAAMA, 041334 An AR, 3a

Yi
ARTES/TEATRO: história do teatro brasileiro

Luz/treva no palco

O confronto com o Regime Militar encerrou uma fase

brilhante e criativa do teatro brasileiro, que não teve liberdade para


continuar avançando. ""O Arena foi assassinado. O Oficina se suicidou"

"Não estamos atrás de novidades, esta- cendo. Destruída a democracia dos grande laboratório de idéias que foram
mos atrás de descobertas." palcos, nos anos seguintes também de- os palcos 20 anos antes. E, apesar do
(Oduvaldo Vianna Filho, dramaturgo ) finhariam as experiências pioneiras en- bom teatro que se fez na década de 70,
tão em pleno desenvolvimento. não surgiu daí um novo elenco à altura
O teatro brasileiro chegou a 1964 no Em 1984, o teatro brasileiro não ha- do que existia nos anos 60.
auge de um período de grande criativi- via ainda recuperado o antigo vigor. Em 1968, quando foi promulgado o
dade. A arte dessa época havia nascido Do seu grande elenco original, alguns Ato Institucional no 5, dando amplos
no final do período democrático ini- já não existiam, como Paulo Pontes poderes ao Regime Militar, Fer-
ciado em 1946 e entre os seus grupos (1940-76) e Oduvaldo Vianna Filho, o nando Peixoto, um dos artistas mais im-
mais importantes estavam o Arena e o Vianninha (1936-74). Outros, como Au- portantes dessa época, estava no Ofi-
Oficina, de São Paulo, e o núcleo tea- gusto Boal e José Celso Martinez Cor- cina, preparando uma peça do autor
tral do CPC da UNE, que formaria, rêa, haviam sido forçados ao exílio e só alemão Bertolt Brecht. Conta ele:
após o golpe, o Teatro Opinião, do Rio. retornariam após 1978. Afinal, os pou- "Dia 13 de dezembro, enquanto estáva-
Após anos de resistência à censura e à cos que continuavam em ação, como mos fazendo o ensaio geral de Galileu
violência, no entanto, estes e muitos Gianfrancesco Guarnieri e Plínio Mar- Galilei, ouvimos no rádio a decretação
outros grupos acabaram desapare- cos, não eram suficientes para recriar o do AI-5. A partir daí, o teatro foi per-
nr oranssa V8.GNCAMA 84041331 an co 2 ,p 33
dendo aquela força de reflexão, força
mais transformadora ( . . .). O Arena foi
assassinado, foi estrangulado pouco a
pouco. O Oficina se suicidou. Mas não
houve mortes naturais. São dois cami-
nhos provocados por uma violência re-
pressiva de fora."
O período tenebroso iniciado em
1968 perduraria até 1973, mas o AI-5 só
cairia em 1979. Assim, tentando impe-
dir o debate sobre os rumos que o País
estava tomando, o Regime Militar se
colocou em rota de colisão com o tea-
tro, que reivindicava liberdade para
avançar. "Exigem que não nos manifes-
temos sobre uma realidade dolorosa,
enquanto a denúncia, o debate e a dis-
cussão só podem contribuir para o en-
contro de soluções para os problemas"
(Viaggiinha, em 7968).
Acervo INACEN

A partir de 1750, surgem no


Brasil as "Casas de Ó/u'm"

O denominador comum da década


de 60, de fato, era a idéia de emancipar entre outros.
o teatro dos moldes estrangeiros. Era cano Hermilo Borba Filho (1917-76).
Profissionais competentes e experi- O primeiro grande sucesso do Arena
uma luta antiga. Até 1750, o Brasil nem mentados, esses diretores prestariam
teatros tinha. Foi por essa época que foi a montagem de Eles não Usam
diversos serviços de extrema relevância Black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri,
começaram a surgir as primeiras "Ca- para o País. Contribuiram certamente
sas da Ópera", essenciais para que as em 1958. Black-tie marcava o início de
para aprimorar a formação da nova ge- uma pesquisa teatral em nova direção,
montagens tivessem alguma regulari- ração de brasileiros que estava saindo
dade e continuidade no País. Em 1838, as condições sociais dos brasileiros,
da Escola de Arte Dramática, criada inaugurando o teatro político no País,
Gonçalves Magalhães escreveu no pro- em São Paulo também em 1948, Além
grama de sua peça Antonio José ou O O Oficina nasceu em 1958, inicial-
disso, foram importantes para atualizar mente procurando abordar temas
Poeta e a Inquisição: "Lembrarei apenas 0 Brasil com uma tendência em voga
que esta é a primeira tragédia escrita como a família. Foi o caso de A Incuba-
na Europa desde 1890: a unificação do deira, peça com que venceu o festival
por um brasileiro e a única de assunto espetáculo teatral sob a batuta do dire-
nacional." organizado em 1959 por um dos des-
tor. No Brasil, essa experiência fora rea- bravadores do . teatro nacional mo-
Menos de cem anos depois, o desen- lizada com sucesso em 1943, no Rio, derno, Paschoal Carlos Magno, criador
volvimento do País ainda avançava len- com Vestido de Noiva, peça do genial
tamente e a cultura continuava com do Teatro do Estudante do Brasil, em
Nélson Rodrigues, montada pelo dire- 1938. Mas, já em 1960, o Oficina en-
formidáveis problemas de fundo. O tea- tor polonês (depois naturalizado) Zibig- trava no repertório do Arena, discutindo
tro era em grande parte feito por ama- niew Ziembinski. Com o correr dos questões políticas como o campo.
dores e - o que era pior - para um pú- anos, essa tendência se firmaria em de-
blico pequeno e restrito. Apenas com a finitivo, A Arena e o Oficina aprendem
industrialização, de fato, em 1930, as A partir do TBC, multiplicaram-se as
mudanças se tornariam mais rápidas, para renovar o teatro no País
companhias independentes, tendo à
refletindo-se, no teatro, às vêsperas da frente futuros grandes nomes, como
Segunda Grande Guerra e logo após, Os dois grupos, além disso, iriam ab-
Sérgio Cardoso, Tônia Carrero, Paulo sorver influências semelhantes, como a
Em 1948, um industrial italiano, Autran, Fernanda Montenegro. Atra-
Franco Zampari, associou-se no Brasil do grupo realista americano Actor's
vês da Escola de Arte, revelavam-se Studio, e também os métodos de Sta-
a Francisco Matarazzo Sobrinho e Flávio Rangel, Antunes Filho, Zé
montou uma casa onde os grupos ama- nislavski, Mas não se tratava de mera
Celso, ampliando também o potencial adaptação: a idéia era aprender para
dores de São Paulo pudessem se apre- da dramaturgia brasileira. No Rio, realizar uma renovação completa do
sentar. Foi como surgiu o TBC (Teatro ainda, apareciam Millôr Fernandes,
Brasileiro de Comédia), precursor di- teatro brasileiro. Com o mesmo
Dias Gomes, Antônio Callado. espírito, passaram a recriar a obra de
reto das inovações que explodiram nos O Arena surgiria em 1953, alimen- grandes autores estrangeiros, como o
anos 60. Uma casa de espetáculos sem tado por essa grande expansão do tea-
igual no Brasil de então, confortável e francês Jean-Paul Sartre, o soviético
tro. Com esse grupo, deu-se uma gui- Valentin Katáiev, o americano Tenes-
bem equipada, o TBC foi o apogeu do nada radical nas concepções existentes see Williams e principalmente o ale-
teatro do ator - das grandes estrelas, de teatro e sua experiência seria assi- mão Bertolt Brecht.
encabeçadas certamente pela grande milada e reproduzida em vários pontos A década de 60 havia nascido do
Cacilda Becker. Mas o TBC iria além do País, do Teatro de Equipe, em TBC, mas também voltava-se contra o
disso: contou também com um exce- Porto Alegre, ao Movimento de Cul- velho esquema de fazer teatro. "O Tea-
lente conjunto de diretores, importados tura Popular de Pernambuco. Ou ao tro de Arena apareceu com outro jeito
da Europa por Zampari. Eram Adolfo Teatro Popular do Nordeste, fundado desde 0 início", afirmava Vianninha.
Celi, Ruggero Jacobbi e Gianni Ratto, pelo escritor e dramaturgo pernambu- "Mesmo sem uma linha cultural defi-
290
BRDFANBSB VB.GNC.AMA, S40O043a] ânCco2r 3 1934
%1
Vestido de Noiva (na pág. ao lado), de
Nélson Rodrigues, dirigida por
Ziembinski, Rio, em 1943, é um marco no
teatro brasileiro. Pela primeira vez,
unifica-se o espetáculo sob a batuta do
diretor. Com o surgimento do Arena, em
1953, há uma guinada radical, marcando
uma nova direção: a realidade dos
trabalhadores. O início disso é Eles não
Usam Black-Tie, de Guarnieri (ao lado L
Guarnieri e Francisco de Assis na
montagem de 1958). Fundado em 1958, o
Oficina entraria no repertório do Arena
em 1960, levando longe a discussão da
nossa realidade imediata, mesmo usando
textos estrangeiros, como Pequenos
Burgueses, de Máximo Gorki, espetáculo
dirigido por José Celso Martinez Corrêa.
Abaixo, montagem de 1963, com Raul
Cortez e Itala Nandi

Iconographia
nida, surgia mais adequado às condi-
ções econômicas e sociais. Sem poder
apoiar-se em figuras de cartaz, cenários
bem feitos, em peças estrangeiras de
sucesso comercial, mais cedo ou mais
tarde teria de apoiar-se na parcela poli-
tizada do público paulista."
Em 1956, Boal ajudaria a organizar o
novo teatro. A idéia era o aproveita-
mento máximo de recursos. Não havia
funções estanques de ator, diretor, ilu-
minador. E os artistas ainda aprendiam
e trabalhavam na área de finanças, ad-
ministração e publicidade. "A época de
mecenas acabou, agora começa a dura
realidade", afirmaria Vianninha, numa
alusão à figura de Zampari.

Iconographia
Ao contrário do TBC, que era uma
empresa média, propriedade de um
protetor das artes, os novos grupos se
mantinham por conta própria - uma
pequena empresa formada a partir de própria estréia do grupo Opinião, em gina. Foi uma mostra do quanto o novo
uma subscrição inicial de capital entre co-produção com o Arena e encenado teatro aproveitou e valorizou a música
alguns sócios: os próprios artistas, que no Rio. Era o musical Opinião, de popular.
dependiam da bilheteria para viver. vários autores, dirigido por Boal. Para Mas se o Opinião nasceu com o
Os novos grupos enfrentaram a eclo- Fernando Peixoto, era "uma forma (e golpe, o Centro Popular de Cultura, da
são do golpe militar defendendo-se fórmula) de protesto que teve sucesso UNE, desapareceu nessa época. Antes
com as forças que tinham. O primeiro imediato e grande repercussão". Já de ajudar a fundar o Opinião, no final
grande sucesso do Oficina foi Pequenos marcava o período de resistência, de 1964, junto com Paulo Pontes, De-
Burgueses, peça de 1902, de Máximo quando, segundo acreditava Vianninha, noy de Oliveira e João das Neves, Vian-
Gorki, onde Zé Celso utiliza seus re- o teatro passava a deixar na história ninha já havia passado do Arena para o
cursos extraordinários de encenador "não a obra, mas a posição". CPC. A idéia, ventilada inicialmente
para transformar um texto estrangeiro Arena Conta Zumbi veio em seguida, pelo diretor Francisco de Assis, era ten-
em um texto nacional. A peça já vista ainda em 1965, mas agora em São tar popularizar ainda mais o teatro,
por 27 mil pessoas desde o ano ante- Paulo. Boal e Guarnieri contaram a levando-o aos sindicatos e outras orga-
rior, ainda estáva em cartaz quando o história de Zumbi, negro que chefiou a nizações populares que nessa época
golpe de 64 obrigou os artistas a um resistência do Quilombo de Palmares, fervilhavam de atividade. O CPC foi
"veraneio forçado no litoral", lembra- refúgio de escravos do século 15. montado em dezembro de 1961 e apro-
ria Fernando Peixoto. Zumbi era um musical, com música de vado no Congresso da União Nacional
O teatro levou algum tempo para es- Edu Lobo. Uma de suas composições, dos Estudantes (UNE) como o seu ór-
boçar a reação ao golpe, no entanto. Upa Negrinho, Upa!, tornou-se muito gão cultural. Apesar disso, tinha auto-
Um dos primeiros contra-ataques foi a popular depois de gravada por Elis Re- nomia administrativa e financeira: ga-
291
BR DFANBSB VB8.GNC. - S4O044 33 )anco2, p 35

do teatro brasileiro apareceriam de ou-


tra forma quando o Serviço Nacional
de Teatro (SNT), um órgão do go-
verno, passou a contar com verbas re-
ais, e não fictícias, como ocorrera entre
1966 e 1974 - quando fora o "órgão
mais inútil do País", segundo o crítico
Sábato Magaldi. Seu diretor a partir daí
fora Orlando Senna, que "fazia o que
podia" para melhorar a situação do
teatro. Em 1977, no entanto, o que
Senna podia não foi suficiente para im-
pedir que uma peça premiada pelo
SNT, Rasga Coração, de Vianninha,
fosse simplesmente engavetada pelo
ministro da Justiça da época, Armando
Falcão.
Mas, afinal, nem isso impediria que o
teatro continuasse, embora precaria-

Iconographia
mente, a produzir boas peças e tomasse
iniciativas ousadas. Em 1975, Chico
Buarque produziria Gota D'Água, em
parceria com Paulo Pontes; em 1978,
Mesmo após :o golpe de 64, inúmeras peças atestaram o vigor
do novo teatro, Acima, Chico Buarque paresentaria Ópera do
cena de Morte e Vida Severina, representada em 1969,
em São Paulo Malandro, uma livre adaptação do texto
de Brecht. Trate-me Leão, em 1977,
nhava a vida como os outros grupos. blico era o mesmo que tivera o TBC, mostrou o excelente trabalho de um
Seus diversos núcleos disseminaram-se segundo observou Vianninha em 1968 novo grupo, Asdrúbal Trouxe o Trom-
principalmente através das universida- Casa de Chá Luar de Agosto, do ame- bone. Macunaíma, de Mário de An-
des do País, desenvolvendo um pro- ricano John Patrick, fora vista por 60 drade, foi uma montagem de extraordi-
grama exaustivo de trabalho que se es- mil pessoas em 1956. Um êxito seme- nária repercussão em 1978, Realizado
tendia também ao cinema, livros, revis- lhante. de 1965, a peça Liberdade, Li- por Antunes Filho, foi um espe-
tas e seminários. Em sua curta vida de berdade, de Millôr Fernandes e Flávio táculo de seishoras que envolveu seis
dois anos, visitou camponeses, favelas e Rangel, teve 50 mil espectadores. meses de ensaio do elenco,
as periferias das grandes cidades. Fauzi Arap, em 1975, concluía que o Antunes Filho realizava o seu traba-
O golpe não impediu que os outros desfecho foi uma ruptura no nível de lho, nessa época, através do Grupo
grupos continuassem a fazer sucesso. criatividade atingido em 1964. "Desde Pau Brasil, procurando aproveitar ao
Ao contrário disso, inúmeras peças 1971 não temos um grupo estável e de máximo o imenso potencial do teatro
atestaram o vigor do novo teatro. Por importância fazendo teatro no País e ainda latente no final da década de 70.
exemplo, a montagem histórica do Ofi- dando continuidade àquele trabalho." Utilizava inclusive amadores dispostos
cina de 1967, O Rei da Vela, uma mira- Daí porque a década de 70, para mui- a fazer teatro e sem encontrar Oportu-
bolante recriação do texto de Oswald tos, foi o período das grandes empresas nidade. Que esse potencial existia, nin-
de Andrade que causou impacto inter- no teatro brasileiro - uma evolução guém podia duvidar - mesmo entre os
nacional. Morte e Vida Severina, do "natural", dizia Arap, em função do artistas profissionais, onde o desem-
poeta João Cabral de Melo Neto, foi alto nível técnico atingido pelo teatro prego, em 1979, era de 80%, segundo
montada em 1966 pelo Teatro da Uni- desde o TBC. "Hoje, o esquema é o da Cláudio Mamberti, então na presidên-
versidade Católica (TUCA), de São great production (superprodução)", as- cia do Sindicato dos Artistas de São
Paulo. Com esta peça o grupo venceu o segurava em 1975 o produtor Henrique Paulo. Mas era também vigoroso o mo-
mais importante festival de teatro, o de Suster, responsável pela montagem da vimento amador, que voltou a se disse-
Nancy, na França. peça Equus. "O franco-atirador fatal- minar após a anistia, em 1978,
Apesar do sucesso, porém, o teatro mente sucumbe", concluía ele. formando-se inúmeros grupos em bair-
foi perdendo sua força. O Arena Essa evolução foi muito facilitada ros, sindicatos, escolas, no movimento
extinguiu-se em 1971. O Oficina seguiu pela ação econômica e não apenas negro e outros,
com Zé Celso para o exílio, em 1974, política da censura. O exemplo mais Nessa época, esperava-se que os au-
tentando sobreviver no Exterior, inclu- claro foi a companhia de Fernanda tores simplesmente abrissem as gavetas
sive em Portugal. O Opinião, que pro- Montenegro, que, em 1973, tentou en- e recomeçassem de onde haviam pa-
curou ampliar a resistência atraindo cenar Calabar, de Paulo Pontes e Chico rado há mais de dez anos. Mas isso só
profissionais menos comprometidos Buarque. Era a montagem mais cara aconteceria, dizia Guarnieri, em 1979,
politicamente, perdeu a equipe gra- do teatro até então: 400 mil cruzeiros à se o teatro pudesse novamente procurar
dualmente, João das Neves, solitaria- época. Mas a peça foi "avocada" pelo e ampliar o seu público. "Sem esse
mente, ainda conservava o nome do governo, que a segurou durante meses, mergulho", alertava o autor de Black-
grupo em 1983, para então vetá-la, causando imenso Tie, "ficaremos nisso: um teatro onde
O novo teatro, de fato, dera um salto prejuízo à companhia. Dois anos de- 90% da produção não são divulgados,
qualitativo no "plano cultural", no di- pois, em 1975, Fernanda Montenegro produção de pequenos grupos, de gen-
zer do diretor Fauzi Arap. Mas não receberia golpe semelhante, desta vez te que trabalha nas piores condições,
teve tempo nem condições para com Um Elefante no Caos, de Millôr mas que está realizando. Esse é o mate-
consolidar-se em termos práticos. Na Fernandes. 8 rial rico que pode dar um impulso em
verdade, a partir do golpe, o seu pú- Intromissões semelhantes na linha nosso teatro em geral".
292
A tarefa maior e mais traumákca do
novo Exército foi atacar e conquistar
Canudos, o reduto dos sertanejos agru-
pados em torno de Antônio Conse-
lheiro, no sertão da Bahia. Entre no-
vembro de 1896 e outubro do ano se-
guinte, a população do arraial enfren-
tou quatro expedições militares, que re-
uniram no total mais de 11 mil soldados
e 19 canhões. A vila só foi destruída
pela quarta expedição.
A derrota das três primeiras expedi-
ções causou um verdadeiro trauma na-
cional. E mesmo a vitória final teve um
sabor amargo, quando se revelaram as

Biblioteca Nacional
violências cometidas pelos soldados
contra os sertanejos feitos prisioneiros.
O aperfeiçoamento técnico das For-
ças Armadas se fez combatendo o ini-
migo interno. A primeira utilização da
nossa força aérea em operações de
Para esmagar Canudos, o Exército enviou quatro expedições, num total de 11 mil combate, com os aviões fazendo mis-
soldados sões de reconhecimento, foi na campa-
POLÍTICA/MILITARES: a repressão a movimentos populares nha contra o Contestado (1912 - 15),
uma rebelião de camponeses sem terra
que eclodira na fronteira entre o Pa-
raná e Santa Catarina.
0 inimigo no 1
Com o golpe, chegam ao poder
Da origem aos dias de hoje, as nossas Forças Armadas foram militares doutrinados na ESG
usadas em ações repressivas. No alvo das armas, um inimigo Se, através de toda a nossa história,
surpreendente: o povo brasileiro as Forças Armadas foram utilizadas
como milícia repressora da população,
o que caracteriza o período pós-64 é
No dia 2 de abril de 1980, cerca de 50 gadas de reprimir a Confederação do que, no nível da doutrina, essa ativi-
mil metalúrgicos em greve realizavam Equador - uma tentativa de aglutinar dade passa a ser justificada, explicada e
uma assembléia, no estádio da Vila Eu- as províncias do Nordeste numa repú- reforçada.
clides, em São Bernardo do Campo, blica federativa. Pode-se dizer que o golpe militar de
em São Paulo, quando foram surpreen- Em 1834, toda a província do Pará se 1964 significou a tomada do poder pelo
didos pelos vôos rasantes de dois heli- levantou em armas e conseguiu, no ano setor das Forças Armadas orientado
cópteros do Exército, equipados com seguinte, constituir um governo. A re- pela doutrina gerada na Escola Supe-
metralhadoras. Apesar do insólito da si- volta, conhecida como a Cabanagem, rior de Guerra (ESG). Esta se organi-
tuação, não foi a única vez durante teve um cunho nitidamente popular. A zou, em 1949, tendo como modelo o
aquela greve que os operários se viram repressão foi intensa e generalizada, National War College americano. Mas,
frente a frente com o Exército brasi- provocando cerca de 40 mil mortes desde o início, diferenciou-se de seu
leiro, que parecia ter e mesmo triste numa população que não chegava a modelo original, por estar mais voltada
destino dos demais exércitos latino- 100 mil pessoas. para os aspectos internos e menos para
americanos: o de estar mais preparado Apesar do sucesso em reprimir estas a defesa do País de um ataque externo.
para combater seu próprio povo do que e outras revoltas, o Exército perdeu a A concepção que nasceu e se desen-
inimigos externos. confiança das classes governantes, por- volveu na ESG se caracteriza por inter-
Desde sua origem, nossas Forças Ar- que parte das tropas sempre aderia às relacionar os temas da segurança e do
madas foram utilizadas em ações repres- revoltas. Assim, para sua garantia, as desenvolvimento. Só o desenvolvi-
sivas. Nosso processo de independên- oligarquias criaram, em 1831, a Guarda mento econômico do País poderia ga-
cia, tendo sido basicamente conserva- Nacional, cujos membros seriam arre- rantir a sua segurança e só um clima de
dor, gerou, para os novos dirigentes, a gimentados entre os cidadãos com alta segurança podia permitir o desenvolvi-
necessidade de combater ao mesmo renda, para se encarregar da repressão mento. Garantir esse clima de segu-
tempo as últimas resistências portugue- interna. Ao Exército, desprestigiado e rança significava minimizar as fontes de
sas e as tentativas de fazer acompanhar reduzido, restaria a tarefa de preservar cisão e desunião e seria tarefa das For-
a separação de Portugal de algum tipo o País contra agressões externas. cas Armadas.
de alteração na situação política e eco- A situação só se inverteria como Por essa concepção, as elites do País
nômica. consequência da Guerra do Paraguai são "a mola propulsora do processo de
Na tarefa de organizar suas Forças (1865-1870). Novamente fortalecido mudança" (Manual Básico da ESG,
Armadas, a nova Monarquia contou por sua conduta vitoriosa na guerra, o 1977), enquanto o movimento operário
com o apoio inglês. Lorde Cochrane, Exército voltou a ser o guardião da si- e popular se torna alvo potencial das
que participara da luta pela indepen- tuação interna, enquanto a Guarda Na- políticas de segurança. Ele passa a ser
dência, já em 1824 comandava a força cional só seria convocada em caso de visto como fator de cisão. Por um lado,
naval que deslocou as tropas encarre- ameaça externa, como força auxiliar. porque, no entender dos formuladores
293

BR DFANBSB VB.GNC.AAA, p 26
de 3
da doutrina, os trabalhadores tende
- O Exército contra o
riam a colocar suas necessidades cor-
povo: em 68, no Rio,
porativas acima dos interesses nacio
- reprime manifestações _
nais e, por outro, porque seriam sus-
estudantis (ao lado); em
cetíveis às influências da propagan
da 70, na Amazônia, em
comunista.
treinamentos
Nas palavras de um tenente-coronel
antiguerrilha (abaixo);
falando a empresários do sul do País,
em abril de 80,
em dezembro de 1964: "Nós, soldados,
helicóptero sobrevoa a
procuramos conservar a ordem, para
assembléia dos
que vocês, empresários, arriscando
, metalúrgicos, em São
criando, produzindo e multiplicando,

Iconographia
Bernardo do Campo
possam nos dar o progresso."
(SP)
Em quatro anos, o campus da
UNB foi ocupado sete vezes
As Forças Armadas, então, come-
cam a preocupar-se cada vez menos
com suas tarefagclássicas. Um exemplo
diss& pode ser encontrado na evolução
do currículo da Escola de Comando do
Estado Maior das Forças Armadas. Em
1956, ele não continha qualquer refe-
rência à guerra contra-guerrilhas, A
partir de 1961, os cursos sobre essas
questões já se faziam presentes. Em
1968, o currículo destinava 222 horas-
aula para a questão da segurança in-
terna, 129 para a guerra irregular e ape-
nas 21 eram dedicadas aos tópicos
relacionados à defesa do território,
Apoiadas na Doutrina da Segurança
Nacional, as Forças Armadas brasile
i-
ras, no período do Regime Militar,
in-
vestiram contra todos os setores
do
povo brasileiro: operários, estudantes,
camponeses e intelectuais.
Em julho de 1968, reprimindo um
surto grevista, o Exército ocupou mili-
tarmente a cidade de Osasco, em São
Paulo, e deu cobertura à invasão
da
empresa Cobrasma pela Polícia Mili-
tar, que prendeu cerca de 400 ope-
rários,
O campus da Universidade de
Brasília foi ocupado sete vezes entre
1964 e 1968. Na primeira vez, em abril
de 1964, a biblioteca central ficou inter-
ditada por 16 dias; na segunda, em
agosto de 1968, um estudante foi atin-
gido na cabeça por uma bala calibre 43.
Ricardo Malta/F4

O CRUSP (Conjunto Residencial da


Universidade de São Paulo) também
foi invadido várias vezes naque
le
período. A procura de armas, as tropas
que O ocuparam, em dezembro alimentos para os guerrilheiros. Tais
de tantos os camponeses presos que eram
1968, ali permaneceram por três meses denúncias se generalizaram depois
. das mantidos em buracos cavados no chão
As tropas do Exército que tomaram três campanhas de cerco e aniquila-
0 vale do Ribeira, em São Paulo, no e cobertos com arame,
mento que as Forças Armadas promo
primeiro semestre de 1970, na tentativa - Na ânsia de combater todas as mani-
veram na região do Araguaia, no sul do
de cercar e prender membros da orga- festações de inconformismo e protesto
Pará, entre abril de 1972 e janeiro de
nização Vanguarda Popular Revolucio- ou mesmo lutas puramente reivíndica
1975, contra guerrilheiros liderados -
nária (VPR) que tinham instalado ali tórias, os militares chegaram a voltar-se
pelo Partido Comunista do Brasil. A
uma base de treinamento, sob a lide- contra si mesmos. Os fuzileiros navais
violência foi utilizada indiscriminada-
rança do ex-capitão do Exército Carlos encarregados de reprimir a greve de
mente contra a população trabalhadora
Lamarca, foram acusadas de assassinar oficiais e soldados da Polícia Militar da
da região, pequenos comerciantes, pa-
um casal de camponeses que fornecera Bahia, em março de 1981, mataram um
dres e freiras. Em alguns períodos eram
tenente e feriram gravemente outro.
294

BR DFANBSS V3.GNC.aaA, 1041334 an co 2


, p3r
er oraness ve.encam, R40433Jânco2, p38

%1
REGIÓES/NORDESTE: a política agrícola da SUDENE
O propósito da SUDENE era reali-
zar ensaios de fertilização nestes tabu-
leiros costeiros e, no momento em que
tivesse conhecimento de como
Verso e reverso
aproveitá-los no cultivo econômico de
alimentos, iniciar o processo de desa-
No período 1960-64, a SUDENE apresentou vários projetos propriação por interesse social dessas
para os problemas da população nordestina que, em 1984, só áreas abandonadas.
Por outro lado, enquanto se realiza-
serviam a poucos privilegiados
» vam as pesquisas para saber como cor-
rigir a acidez dos solos de tabuleiros, a
SUDENE teve a oportunidade impar
No período entre 1960 e 1964, o de fazer uma experiência no campo da
plano da SUDENE (Superintendência organização econômica e social na
do Desenvolvimento do Nordeste) para zona úmida do Nordeste. Os trabalha-
a agricultura nordestina estava apoiado dores rurais de cinco engenhos da
no estudo da realidade da região e Usina Salgado, no município do Cabo,
constava dos seguintes programas prio- em Pernambuco, tinham entrado em
ritários: 1) produção. de alimentos na greve e não havia acordo. Usineiro e
zona umida do Nordeste ; 2) desenvolvi- trabalhadores procuraram a SUDENE
mento no semi-árido de uma agricultura para dar uma solução, pois já tinham
resistente aos efeitos da seca; 3) esgotado as negociações junto ao Mi-
colonização do Maranhão; 4) desenvolvi- nistério do Trabalho e outras autorida-
mento da irrigação no São Francisco. des. Nessa oportunidade, o Departa-
mento de Agricultura e Abastecimento
Produção de alimentos da SUDENE propôs ajudar os campo-
na zona úmida neses na organização de uma Coopera-
tiva de Trabalho para explorar as terras
O programa de produção de alimen- dos engenhos de Tiriri, Massangana,
tos na zona úmida, uma das poucas
Algodoais, Serraria e Jardim e
áreas existentes no Nordeste isentas do
constituir-se em fornecedora de cana
problema da seca, tinha como principal
para a Usina Salgado. Aceita a pro-
objetivo combater a fome secular que
posta, depois de um trabalho de cons-
se abate sobre aquela região do País.
cientização dos camponeses sobre or-
A produção de alimentos deveria ganização de cooperativa e trabalho
desenvolver-se com base nas terras li-
Solano Jos&/Abril Press

comunitário, foi organizada a Coopera-


beradas pela modernização do com- tiva de Tiriri e eleita a primeira direto-
plexo agroindustrial da cana-de-açúcar ria, formada integralmente de campo-
do Nordeste. A SUDENE iniciou con- neses. A cooperativa firmou um con-
tatos com usineiros no sentido de pro- trato de fornecimento de cana à Usina
por um plano de modernização da agri- Salgado, ao preço oficial; o pagamento
cultura da cana e reaparelhamento das
usinas, Os investimentos necessários se- em
riam financiados pelo governo e parte
desta inversão paga com terras libera-
das, que seriam entregues à SUDENE,
Esta proposta despertou interesse dos
usineiros mais progressistas, mas não
logrou o consenso da classe, que rejei-
tou a oferta. A oligarquia agrária da
cana-de-açúcar não era tão progressista
como a SUDENE pensava, e era muito
mais apegada à terra do que se poderia
prever. O primeiro sonho frustrou-se.
A SUDENE iniciou então um estudo
sobre os tabuleiros da região litorânea e
delimitou áreas totalizando aproxima-
damente 3 milhões de hectares, exis-
tentes entre Salvador e Fortaleza, todas
Júlio Jacosina/Abril Press

elas servidas de infra-estrutura de estra-


das pavimentadas, energia elétrica e
próximas aos principais centros consu-
midores do Nordeste. Esta vasta exten-
são de terra estava praticamente deso-
cupada, pois se tratava de solos muito
lavados, de baixa fertilidade, para os
quais não se conheciam técnicas eco- Em 1983, as terras irrigadas pelo São Francisco produziam finas uvas para exportação
nômicas de manejo. (acima), tomates para suco (ao alto) e álcool para automóveis
295
5R DFANBSB V8.GNC;AAA, 002, p 39

do arrendamento das terras seria reali- apresentam melhores condições de to- desenvolvimento da pecuária no semi-
zadoem base a 10% da produção bruta pografia para sua expansão. árido baseava-se fundamentalmente na
de cana colocada na Usina. A Coope- A região semi-árida abarca quase melhoria da alimentação do rebanho.
rativa pagava salário mínimo aos traba- dois terços da área do Nordeste, com Em grandes áreas do sertão, o gado era
lhadores por uma quantidade fixa de cerca de 1 milhão de quilômetros qua- miúdo e com visíveis características de
cana cortada e adicionais pela margem drados, e abriga uma população de raquitismo, por falta suficiente de ali-
de produção alcançada acima destes aproximadamente 20 milhões de habi- mentação. A perfuração de poços, e
níveis fixados. No fim de cada ano agri- tantes. consequente descentralização das
cola, o balanço da Cooperativa, depois Nessa região, a seca periódica dizima aguadas, permitiria melhor aproveita-
de proceder à integralização do fundo as lavouras e quebra o equilíbrio entre mento das pastagens, evitando maior
de capitalização, distribuia 50% dos lu- a população e os recursos existentes e pisoteio e destruição dos pastos.
cros entre os trabalhadores, de acordo os nordestinos se transformam em fla- A perfuração de poços foi uma ação
com o trabalho aportado por cada um gelados e retirantes. de impacto. O poço não seria mais per-
durante o ano.
furado nas fazendas dos grandes pro-
A SUDENE dava assistência técnica Agricultura resistente
prietários e chefes políticos locais,
na elaboração do plano anual de cul-
à seca no semi-árido constituindo-se em propriedade pri-
tivo e corte de cana, assim como na ges-
vada. A SUDENE estabeleceu priori-
tão da Cooperativa. Os camponeses O programa da SUDENE para esta dade para a perfuração de poços públi-
assumiram as tarefas cotidianas de im- área foi concebido para enfrentar essa cos nos povoados, não só para atender
plantação dos cultivos e administração dura realidade. Em primeiro lugar, a às necessidades da população humana
da Cooperativa. Retiraram as mulheres SUDENE concentrou os recursos fede- carente d'água, mas também como sus-
e meninos do árduo trabalho da cana. rais num plano de ação prioritário (Pri- tentação do desenvolvimento da pe-
As mulheres, com assistência da SU- meiro Plano Diretor), a fim de evitar a cuária.
DENE, organizaram um programa de atomização dos recursos em obras sem Depois de 1964, o governo apoiou-se
aprendizagem de corte e costura e pro- importância e combater o clientelismo no poder dos latifundiários do semi-
dução de roupas para os trabalhadores político institucionalizado no Nordeste. árido. Em consequência, os subprogra-
rurais de Pernambuco. Os meninos iam Assumiu também o controle do Plano mas para a região só foram implanta-
às escolas e os adultos frequentavam de Emergência contra as Secas, distri- dos nas partes que beneficiavam os
cursos noturnos de alfabetização. Tal- buindo as obras programadas com as grandes proprietários e chefes políticos
vez pela primeira vez, foi posto em prá- entidades especializadas e procedendo locais.
tica no meio rural o método de alfabeti- à fiscalização de sua execução. Por úl-
zação do professor Paulo Freire. timo, passou a distribuir os alimentos Colonização
Os problemas internos de gestão da nas frentes de trabalho. )
do Maranhão
Cooperativa eram resolvidos com certa No setor agropecuário, a SUDENE
facilidade. Contudo, aqueles derivados adotou uma estratégia no sen- A SUDENE, através de seus estudos
de contatos externos da Cooperativa, tido de desenvolver uma agricultura re- sobre o Nordeste, constatou a existên-
principalmente no que se refere à ob- sistente aos efeitos da seca. Nesse sen- cia de uma progressiva corrente migra-
tenção de crédito e compra de equipa- tido, definiu subprogramas para o semi- tória de cerca de cinco mil famílias por
mentos e insumos, se constituiram em árido, entre os quais o desenvolvimento ano do sertão de Pernambuco, Paraíba,
sérios obstáculos. A cooperativa de tra- da pecuária. Rio Grande do Norte e principalmente
balhadores era uma exceção, difícil de O subprograma da SUDENE para o do Ceará e Piauí para as áreas de Ca-
se relacionar com o sistema bancário e
com os fornecedores de insumos,
Depois de 1964, a ação foi no sentido
de descaracterizar o trabalho comuni-
tário desenvolvido pelos camponeses
de Tiriri. As terras dos engenhos foram
parceladas e vendidas a cada família
camponesa, Os camponeses sabiam
que era difícil manter cultivos de cana
em pequena escala, pois este cultivo só
é econômico quando produzido em
larga escala. Contudo, ante a alterna-
tiva de ficarem sem nada, aceitaram a
imposição do parcelamento das terras.
Entraram na Cooperativa alguns ele-
mentos estranhos, que não eram cam-
poneses. Como era de se esperar, estes
foram comprando as parcelas dos de-
mais e concentrando a propriedade da
terra. Em 1984, a Cooperativa de Tiriri
estava disvirtuada e em plena crise.
Quanto ao programa de fertilização
de tabuleiros, para produção de ali-
mentos, foi imediatamente desativado.
Em seu lugar, com o advento do Proál-
Abril Press

cool, seria intensificado o cultivo da


cana-de-açúcar nos tabuleiros que
296
BRDFANBSB V8.GNC;AAA, 041334 anõo2 , p40

Os planos da SUDENE, anteriores a meeiro na esteira do latifúndio em for- não gerou emprego, pois a criação de
1964, incluíam a perfuração de poços mação ou ganhar a estrada e abrir ou- gado extensiva requer apenas duas jor-
públicos nos povoados. Com o golpe, tro roçado mais adiante, em terra pú- nadas de trabalho por hectare ao ano:
técnicas sofisticadas foram aplicadas nas blica, que lhe renovava a ilusão de ter se bem melhorou a oferta de carne, não
grandes propriedades (pág. ao lado), um dia o seu próprio chão. contribuiu para aumentar a produção
enquanto a população carente de água O Estado do Maranhão, através de de azeite no Nordeste, assim como de
usava meios tradicionais para o lei estadual de 1961, colocou as terras outros alimentos, nem gerou exceden-
abastecimento (acima) compreendidas entre os rios Pindaré e tes exportáveis e suas consequentes di-
Turiaçu, ao longo da atual BR-316, à visas; desencadeou um processo vio-
xias, Bacabal e Pindaré-Mirim no Ma- disposição da SUDENE para o projeto mento de erosão e desequilíbrio ecolo-
ranhão, à medida que se abria a BR- de Colonização do Maranhão. gico emtoda a região compreendida en-
316, ligando o Nordeste seco à Amazô- O projeto previa a incorporação tre o Pindaré-Mirim e a fronteira do
nia. Em 1960-61, quando a SUDENE anual de umas cinco mil famílias, pois o Pará.
estudou esta corrente migratória, a po- processo migratório se estava desenca-
pulação migrante entrava pela picada deando num rito acelerado. A SU- Irrigação na região
aberta para a costrução da estrada. Os DENE, então, preparou uma estratégia da bacia do São Francisco
nordestinos forjavam com sacrifício para enfrentar os problemas de manejo
mais uma saga na história de sua sobre- dos solos; estudou as melhores formas O rio São Francisco é conhecido
vivência. de nucleação para ordenar o povoa- como o rio da integração nacional. A
A população camponesa, tangida mento da região e assessorou a organi- bacia hidrográfica do São Francisco
pela agrura das secas, ia em busca de zação de uma cooperativa central, para abarca uma área de aproximadamente
novas terras para reconstruir suas vi- garantir o abastecimento de insumos à 670.000 quilômetros quadrados. Colo-
das. Alimentava a esperança de conse- produção e comercialização das colhei- nizada desde o século 17, constituiu-se
guir um pedaço de chão. Contudo, a tas. na principal via de comunicação inte-
omissão premeditada do governo facili- Depois de 1964, a SUDENE, junto rior entre o sul do País e o Nordeste até
tava a grilagem das terras e sua reparti- com o Banco Mundial, redefíniria a os anos 40, quando, com o bloqueio
ção entre empreiteiros e políticos lo- orientação do projeto de Colonização marítimo das costas brasileiras durante
cais. Depois de formados o roçado e do Maranhão. O desenvolvimento da a Segunda Grande Guerra, iniciaram-
a plantação de arroz, aparecia o grileiro pecuária passou a ter prioridade. O se os primeiros esforços para implantar
para cobrar ao camponês a "meia" e, Banco Mundial financiou a formação uma infra-estrutura rodoviária de inte-
caso não fosse atendido, botava a polí- de pastagens e o desenvolvimento da gração do interior do Nordeste com o
cia em cima do "invasor" para obrigá- criação de gado na área. Este projeto resto do País.
lo ao pagamento do "tributo". O cam- foi danoso por vários motivos: concen- O São Francisco corta uma vasta re-
ponês tinha que optar entre ficar como trou a propriedade da terra e da renda; gião de caatingas secas dos sertões da
297
Br DranNBSB Va.GNC.AMA, 4043342002 , p44

Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe. vos de mercado mais importantes de- só poderia gerar uma grande oferta de
Esta área, por suas características fa- senvolveram-se dos anos 50 em alimentos no sertão e aplacar a fome
voráveis à criação de gado, foi o centro diante, no médio São Francisco: em secular do Nordeste, como daria para
mais importante de desenvolvimento Pernambuco, com a cultura da cebola, abrigar diretamente cerca de 50 mil
da pecuária extensiva da zona seca no principalmente em Cabrobó; com o ar- famílias de pequenos produtores agri-
Brasil, desde a época colonial. oz, nas vazantes das várzeas alagadas colas, com um nível de renda elevado,
Até os anos 50, antes da construção do baixo São Francisco, em Alagoas e além de gerar mais 300 mil empregos
da Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso Sergipe, assim como nas "lagoas de ar- indiretos (transporte, comercialização,
(1954), a irrigação no São Francisco era roz" formadas ao longo das margens agroindústrias, bancos, pesquisas e as-
incipiente. As populações ribeiri- pelo transbordamento anual do rio. sistência médica); 3) as amplas áreas da
nhas aproveitavam as vazantes para, A SUDENE estudou o São Fran- região oeste da Bahia, que vão da mar-
nas terras umedecidas e fertilizadas cisco e as primeiras conclusões foram gem esquerda do São Francisco até a
pelo húmus trazido pelo rio, estende- as seguintes: 1) o rio São Francisco ti- fronteira do Estado de Goiás, cujas ter-
rem progressivamente suas culturas de nha uma grande potencialidade de pro- ras na sua maioria eram de propriedade
arroz, jerimum, batata-doce, milho e dução de alimentos à base de irriga- do Estado, ficariam como uma grande
feijão de corda. Essas "culturas de va- ção, pois os primeiros trabalhos revela- reserva para programas futuros de co-
zantes" garantiam a subsistência da po- ram que existiam aproximadamente lonização e de produção de alimentos;
pulação, Os excedentes eram comer- 150 mil hectares de terras baixas e de 4) por último, o trabalho revelou que a
cializados nos centros urbanos dos ser- caatingas aptas para a irrigação; 2) o SUDENE não poderia contar com a
tões nordestinos entro da área de in- aproveitamento progressivo desses 150 cooperação da Comissão do Vale de
fluência do "Grande Rio". Os culti- mil hectares com culturas irrigadas não São Francisco (CVSF), pois este orga-
nismo federal especializado no aprovei-
tamento dos recursos do vale era pri-
sioneiro de poderosos políticos corrup-
tos da Bahia e Pernambuco. Com a im-
possibilidade de superar a situação
existente, a SUDENE teria que enfren-
"| 3? f tar diretamente os problemas da irriga-
ção no São Francisco.
#a
>" F/A
d Assim, foi iniciada a primeira expe-
29 riência da SUDENE em Bebedouro,
entre Juazeiro, na Bahia, e Petrolina,
3 em Pernambuco, que contou com a
* ) cooperação da FAO, organismo das
Nações Unidas.
+ | A partir de 1974, a autoridade fede-
-" "" ral encarregada dos projetos de irriga-
€ duma

ção e desenvolvimento do rio é a CO-


%

Pa 2a DEVASF (Companhia de Desenvolvi-


mento do Vale do São Francisco). A
CODEVASF, mesmo tendo conheci-
mento dos trabalhos da SUDENE so-
bre a grande subocupação existente no
Jem Nordeste e a necessidade de aumentar
a produção de alimentos a fim de mino-
rar as deficiências alimentares e garan-
tir o abastecimento da área, deu prio-
riedade ao desenvolvimento de destila-
rias do Proálcool, de usinas de açúcar e
de grandes empresas, inclusive de cria-
ção de gado.
Quando, em 1983, o autor desta ma-
téria e Estevam Strauss, ex-diretor da
SUDENE para os projetos de irrigação,
percorreram o Nordeste para a avalia-
ção dos resultados de 20 anos de ação
da SUDENE após 1964, constataram
que nas terras irrigadas do São Fran-
cisco estavam sendo produzidos álcool
para O parque automobilístico, sucos
de tomate para abastecimento dos
Agência O Globo

grandes centros urbanos e uvas de alta


qualidade a serem exportadas para Pa-
ris. Enquanto isso, milhares de flagela-
dos da seca invadiam cidades para ma-
tar a fome e dar alimentos a seus filhos
As frentes de trabalho dos flagelados da seca foram empregadas na construção de famintos,
canais de irrigação do rio São Francisco Jáder de Andrade .
298
3FANBSB VB.GNCAM, 24041334 âCO 2, p 432

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/SINDICATOS: os metalúrgicos de SP e SBC 1959, paralelamente à implantação da


indústria automobilística no Brasil.
Nesta data foi fundada a associação
que deu origem ao sindicato. A partir
Força metalúrgica dai, Ourissom Saraiva de Castro exer-
ceu o comando como secretário-geral
até março de 1964, quando o sindicato
Desde os anos 60, os metalúrgicos estão à frente do
sofreu sua primeira intervenção. Para
movimento sindical. E os dois sindicatos mais representativos seu lugar o governo designou um ope-
são os de São Bernardo e São Paulo Tário paulista, Clemiltre Guedes da
Silva, que teve como mérito atrair dois
ativistas que se destacariam nos anos
Desde julho de 1983, os metalúrgicos seguintes.
de São Bernardo do Campo e Diadema Um deles foi Afonso Monteiro da
têm um sindicato sem memória. Pelo Cruz. Ligado ao movimento cristão da
menos aquela que depende de dados Frente Nacional do Trabalho, Afonso
de arquivo, lembranças de datas, rela- tornou-se presidente do sindicato no
tos de reuniões - isso tudo sumiu com fim da intervenção, em agosto de 1964.
a última intervenção. É na cabeça dos O outro foi Paulo Vidal Neto, que per-
seus dirigentes e dos ativistas que está o maneceu na diretoria por 11 anos, seis
registro de lutas e movimentos que de- como presidente. Paulo Vidal procurou
ram prestígio internacional a um per- dar ordem à vida jurídica e financeira
nambucano chamado Luís Inácio da do sindicato, levar a organização sindi-
Silva - o Lula. cal às bases e atrair novos ativistas -
A estréia de Lula no sindicato foi em entre eles, Lula.
1972, quando ele assumiu o cargo de Em junho de 1971, Vidal lançou o
diretor do Departamento de Previdên- jornal Tribuna Metalúrgica e, em 1972,
cia Social. Em 1975, era presidente, re- concluiu a atual sede do sindicato. Du-
eleito em 1978, Em 1979, no Congresso rante uma de suas gestões, em 1966, foi
dos Metalúrgicos de Lins, interiot de formado em São Bernardo o MIA
São Paulo, ele propõe à criação de um (Movimento Intersindical Antiarro-
partido de trabalhadores, o que acon- cho), desarticulado dois anos depois.
tece no mesmo ano, com o PT. Com o Em 1975, Lula subiu à presidência,
fim da última intervenção, Lula volta à mantendo Vidal como secretário. Em
Juca Imartins/F4

diretoria do sindicato, eleito em junho 1977, com a denúncia da fraude no cál-


de 1984, como representante na Fede- culo da inflação brasileira em 1973, o
ração dos Metalúrgicos. Muita coisa sindicato entra em evidência. A cam-
aconteceu em pouco tempo. panha que reclama as perdas de salário
O próprio sindicato é muito jovem. Em Foram os movimentos grevistas iniciados decorrentes desse erro de cálculo pro-
maio de 1984, completou 26 anos. Sua em 1978 que fortaleceram o sindicato de jeta Lula e os operários do ABC. Em
história comecou em 12 de maio de São Bernardo. Acima, a greve de 1980 maio do ano seguinte, a indústria auto-

As diferenças das bases

O número de empresas em São Paulo é 14 vezes maior do que em São Bernardo do Campo. Nessa região,
contudo, os metalúrgicos se concentram em indústrias de grande porte, o que facilita a maior mobilização

Distribuição das empresas e trabalhadores metalúrgicos em função do número de empregados, em % (março de 1982)

Fonte: DIEESE
h % / Arquivo Sind. Met. SP

Arquivo Sind. Met. SP


O Sindicato dos Metalúrgicos de São
Paulo participou da campanha das
diretas-já. Acima, Joaquinzão e Jair
Mençgheli, no 1o*de maio de 84 S LW!

mobilística parava e as grandes greves parece cansado de briga e prepara o riodicidade definida até 1980, quando
voltavam a ocupar o cenário brasileiro. seu sucessor para a batalha eleitoral de se tornou mensal. O Metalúrgico
Houve greve em 1979 e a ela se suce- 1987, o ex-pára-quedista Luís Antônio somente se calou temporariamente em
deu uma curta intervenção no sindi- de Medeiros, 1964, quando Afonso Delellis, presi-
cato. Houve greve em 1980 - uma A disputa pela legitimidade do man- dente do sindicato, foi cassado pelo Re-
greve longa, de resistência durante 41 dato vem marcando todas as diretorias gime Militar. Mas, já em novembro de
dias, sucedendo uma longa interven- que se sucederam no comando dos me- 1964, voltava para denunciar casos de
ção. Mas, desde 1979, os metalúrgicos talúrgicos desde 1965. Na última elei- corrupção da diretoria cassada,
de São Bernardo contavam com uma ção, em julho de 1984, a votação Oposi-
entidade paralela - o Fundo de Greve, cionista nas fábricas foi apenas ligeira- Um ambulatório com 89
experiência única no movimento sindi- mente inferior ao voto dos metalúrgi-
cal brasileiro, Estrategicamente situado cos aposentados. Apesar disso, uma su- médicos e dentistas
nas proximidades da sede do sindicato, cessão de greves por empresa, no
o fundo abrigou a diretoria cassada du- Foi durante os anos mais tenebros os
período de julho a outubro de 1984, do Regime Militar que "Joaquinzão"
rante os períodos de tutela do Minis- consagrou os chamados "diretores de
construiu o imenso patrimônio dos me-
tério do Trabalho. base", aproximou-os das práticas e do talúrgicos de São Paulo. A sua sede de
Em 1981, Jair Meneghelli, operário convívio com a histórica Oposição Sin- seis andares da rua do Carmo, inaugu-
da Ford, concorreu à presidência com dical Metalúrgica (que só não disputou
o apoio de Lula e venceu com folgada rada em 1954, foi agregada uma colô-
eleições em 1965 e 1975) e garantiu aos nia de férias com 60 apartamentos, na
maioria. Meneghelli não repetiu o ca-
metalúrgicos paulistanos o reajuste tri- Praia Grande, no litoral paulista, em
risma de Lula, mas sob sua gestão os mestral de salários.
metalúrgicos de São Bernardo paralisa- 1969. Em 1974, inaugurou-se o ambula-
A primeira organização dos metalúr- tório médico de sete andares que, em
ram otrabalho exigindo antecipação de
gicos da capital paulista foi fundada 1984, contava com 65 médicos, 24 den-
salário em outubro de 1982 e realiza- em 1932, no dia 27 de dezembro, pelo tistas e uma média de 40 mil consultas
ram "greves pipoca" (fábrica por fá- operário das indústrias Matarazzo Ro- mensais. Em 1975 foi comprado um si-
brica) em abril de 1983, quando conse- dolfo Mantovani. Aproveitava-se a
guiram obter ganhos salariais acima do tio de 14 alqueires no município de
onda de oficialidade oferecida por Ge- Mogi das Cruzes, na região da Grande
Decreto-Lei 2,065. Em julho desse túlio Vargas em 1931, com a edição da
São Paulo, para cursos e encontros e,
mesmo ano, os metalúrgicos de- primeira legislação sindical no País. em 1979, o Sindicato deu início à cons-
claram-se em "greve política" e o Mi- Até 1935 - ano da repressão desenca- trução de nova sede. Dos 15 andares
nistério do Trabalho decretou nova in- deada após o levante comunista - essa projetados, porém, o novo prédio não
tervenção, suspensa somente um ano organização oficial convivia com o saiu do subsolo. Lá podem acomodar-
depois. "sindicato livre" dos anarquistas. A se até 8 mil pessoas, e desde 1981 o lo-
partir de 1939, com a criação do im- cal é palco de assembléias de toda es-
O Sindicato de São Paulo e seu posto sindical, o Sindicato dos Ope- pécie.
presidente "vitalício" tários Metalúrgicos da Grande São
Essa superestrutura sindical, cobi-
Paulo ganha fôlego e pode ampliar as cada por todas as correntes partidárias
O Sindicato dos Metalúrgicos de São atividades de sua sede, compartilhada
Paulo, considerado o maior organismo com militância entre os trabalhadores,
com outras entidades no antigo edifício assinala em sua previsão orçamentária
sindical da América Latina, tem prati- Santa Helena, na praça Clóvis, centro
camente um presidente vitalício: Joa- para 1985 uma receita de Cr$ 24 bi-
de São Paulo. Após 1962, o Sindicato lhões, entre mensalidades, arrecada-
quim dos Santos Andrade, o "Joaquin- da Grande São Paulo desmembrou-se ções de imposto sindical e juros de ca-
zao . em três, dando independência a Osasco derneta de poupança - uma cifra que
Eleito em 1965, vindo de uma inter- e Guarulhos, municípios industriais da deixa para trás o orçamento da maioria
ventoria no sindicato metalúrgico de Grande São Paulo.
Guarulhos, "Joaquinzão", depois de dos municípios brasileiros.
Em 1942, é lançado o primeiro nú-
atravessar oito mandatos consecutivos, mero do jornal O Metalúrgico, sem pe-
Ricardo Paoletti
300
BR DFANRSRVA GNC.AAA, $4041334 300
2 ;p 43
442 32333
BR DFANBSB V8.GNC.AMA, 240 2 ES"

os "órgãos de proteção"
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO: a situação do menor e

Nossos pixotes

milhões de menores carentes e


Em 1984, o País contava com mais de 25
excludente, que gerou, em 1980, cerca de
abandonados, devido sobretudo ao modelo
ta
4 milhões de famílias na faixa da pobreza absolu

que, exceto o nome, pouca coisa mu- Mas o pior de tudo é que os mesmos
Não foi sem motivo que um dos prin-
dara na substituição do SAM pela FU- métodos violentos continuavam sendo
cipais elementos propagandísticos e de
NABEM: "Milhares de menores aban- empregados contra um número cres-
mobilização utilizado pelos conspirado-
res que preparavam o golpe militar de donados, carentes e com problemas de cente de menores. Como consequência
1964 assumiu a forma de "Marchas da conduta foram torturados e espancados da adoção de um modelo econômico
Família com Deus pela Liberdade". em celas e cubículos fechados, existen- que concentrava cada vez mais a ren-
tes nos subterrâneos do complexo para da, multiplicou-se o número de crian-
Seus ideólogos se apoiavam na crença
de que uma educação severa dada pe- menores de Quintino Bocaiúva, no Rio cas carentes (cujos pais ou responsáveis
los pais aos seus filhos ajudaria o Es- de Janeiro, pertencente à FUNA- não têm condições de suprir suas ne-
tado a assegurar a ordem pública e a li- BEM." Falava ainda de "um quadro de cessidades básicas), abandonadas (sem
berdade de iniciativa privada, garan- horror, um regime disciplinar duro, in- pais ou responsáveis) e infratoras (que
tindo a organização de um conjunto so- flexível, punitivo, voltado para o inter- cometeram atos considerados crimes
cial harmonioso e em constante cresci- nato de menores", que teria existido ou contravenções, mas não podem ser
mento material e espiritual. L sempre na entidade. processadas ou julgadas, por serem ju-
O presidente Médici, em 1970, visi-
tando a sede da Fundação Nacional do
Bem-Estar do Menor (FUNABEM),
que substituira, no final de 1964, o an-
tigo Serviço de Assistência ao Menor
(SAM), usou sua expressão predileta
para comentar o que seria o êxito do
Regime Militar nesta área do atendi-
mento social: "Nesta manhã, vejo um
milagre. Vejo o milagre da transmuta-
ção da "sucursal do inferno", da "escola
do crime", da "fábrica de monstros mo-
rais", em um centro educacional vol-
tado para o desenvolvimento integral
do menor." E prosseguia: "Esse mesmo
milagre que, hoje e aqui, proclamamos
a toda a nação brasileira, nós o deve-
mos por inteiro à Revolução de Março.
E não tenho dúvidas ao afirmar que a
contestação mais cega e mais surda,
que tudo negasse à obra revolucio-
nária, haveria, pelo menos, de bendizê-
la por apagar o sangue, a corrupção e a
vergonha do malsinado SAM, para
neste mesmo lugar erguer a FUNA-
BEM."
O general teria razão para saudar o
fim do SAM, que possuía, justífica-
damente, uma péssima fama. Além de
suas instalações serem precárias e ofe-
recerem péssimas condições de hi-
giene, os menores sofriam maus tratos
e eram explorados por diretores e fun-
cionários. Meninas internas na institui-
ção chegaram a ser emprestadas a boa-
tes, transformando-se em prostitutas.
As rebeliões eram constantes.
Mas em 1980, dez anos depois do
discurso ufanista de Médici, a profes-
sora Ecléa Guazzelli, ao demitir-se da
presidência da FUNABEM, mostrava
301
eRDraNBSB V8.GNC.AAA, $404133)InCOA , p4G,

e 74P

oe
onçnes,
ie «remeta, cê B- ce

Apósa Abolição cresce a utilização da mão-de-obra infantil . .. a tal ponto que, em 1983, cerca de sete milhões de menores
(acima, operários na Fábrica Bangu, Rio, 1893) ... integravam a força de trabalho

ridicamente irresponsáveis). Em 1975, a Tentando substituir a punição e o dade um espírito militar. O próprio Al-
CPI do Menor, instalada no Congresso controle pelo assistencialismo, a FU- tenfelder, já em 1965, registrava com
Nacional, realizou uma pesquisa junto NABEM apresentava o menor como orgulho; "Quis o destino que a minha
aos prefeitos brasileiros e, por amostra- vítima da sociedade e propunha que primeira presença como presidente da
gem, chegou a verificar a existência de toda a comunidade fosse envolvida no fundação fosse numa cerimônia de in-
cerca de 13 milhões e meio de menores seu atendimento. O médico Mário da corporação dos meninos do SAM ao 1o
carentes e mais dois milhões abandona- Silva Altenfelder, que dirigiu a FUNA- Batalhão de Carros de Combate, sob o
dos. Mas, no próprio texto do relatório, BEM desde a sua fundação até 1979, comando do coronel Calderari, ou-
os parlamentares afirmavam que "al- afirmava: "Dar-se-a ênfase ao amparo vindo a vibrante ordem do dia do gene-
guns indicadores sócio-econômicos au- da criança na própria família. A inter- ral Garcia. Com que prazer os vimos
torizam a avaliar em 25 milhões a po- nação só deverá ser admitida quando marchando e com que maior prazer
pulação de menores carenciados e a- não houver mais possibilidade de outra com eles cantamos o Hino Nacional."
bandonados". solução." E mais: "Claro que o go- Em sua denúncia, a professora Ecléa
Em 1982, o consultor regional do verno tem obrigações. Mas não é só o Guazzelli fala com bem menos entu-
Fundo das Nações Unidas para a Infân- governo. É também e principalmente a siasmo do quadro que encontrou na
cia (UNICEF), Pedro Táçon, avaliou comunidade, o agrupamento de indivi- fundação, resultante dessa tentativa de
em 20 milhões o número de menores duos e instituições (. . .). É a comuni- militarização, Afirmou que, entre 1966
carentes no Brasil. Já no ano seguinte, dade que tem que se unir, tomar cons- e 1979, a FUNABEM treinava "jovens
Libonis Siqueira, ex-presidente da As- ciência e agir. O governo deve ser cha- segundo normas disciplinares rígidas,
sociação Brasileira de Juízes de Meno- mado apenas para assistir técnica e fi- estilo militar, para posteriormente se-
res, disse que O Brasil possuia 30 mi- nanceiramente os programas, e não rem utilizados em funções disciplina-
lhões de menores nessa situação. Ce- para executar trabalho social." Era res". Chocou-se ao constatar que "me-
sare Florio La Rocca, consultor da uma conclamação às instituições bene- ninos eram obrigados a aprender mar-
UNICEF, estimou a existência de 32 ficentes religiosas e civis, como o Ro- chas militares e a cumprimentar autori-
milhões de menores carentes no Brasil. tary, Lions, etc. dades com continência. Muitos eram:
Este mesmo número é confirmado por Os homens do novo regime tinham forçados - sob pena de serem tortura-
Terezinha Saraiva, presidente da FU- os seus métodos prediletos. Porém, dos nos porões - a passar horas diante
NABEM . Portanto, segundo as várias passaram a trabalhar no sentido de in- de retratos do presidente da República,
estimativas, de 15 a 30 milhões de me- cutir nos jovens sob sua responsabili- aprendendo a fazer continência, em
nores se encontravam na situação de
carentes, abandonados ou infratores.
Uma cifra terrível,
Não se pode negar que o regime ins- Substituindo o SAM, em
talado no País com o golpe de 1964 se 1964, a FUNABEM (ao
preocupou com a questão do menor e lado, internos numa
implantou mudanças no seu trata- unidade, no Rio) chegou
mento. Criou a FUNABEM, em 1o de aos anos 80 com a
dezembro de 1964, com a Lei no 4.513, mesma triste fama do
que extinguiu o SAM. Este era ligado antigo Serviço de
ao Ministério da Justiça, revelando Assistência ao Menor.
uma visão policial sobre o problema do Com a posse de governos
menor. A nova entidade seria encarre- democráticos em vários
gada de implantar uma Política Nacio- Estados, novas tentativas
nal de Bem-Estar do Menor e foi insti- estavam surgindo em
tuída como entidade autônoma, pas- 1983-84, para resolver
sando em 1974 a vincular-se ao Minis- os problemas do menor.
tério da Previdência e Assistência So- Na pág. ao lado,
cial, então criado, internos da FEBEM (SP)
302
313hnCOA,p 46
BR DFANBSB VB.GNC.AMA, $40443
hi

peração de peças de amortecedores, mês de convalescença e, passando este,


recebendo um salário por isso. Por ou- durante um ano, não trabalhará longe
tro lado, dos 5.800 menores em todo o da cria." Quase 50 anos depois, em 28
Estado assistidos pela FEBEM, 2.500 de setembro de 1871, foi aprovada a
estão matriculados em escolas da rede chamada Lei do Ventre-Livre, que vi-
pública. As duas tentativas se consti- sava a terminar paulatinamente com a
tuem em críticas, no plano da prática, escravidão infantil.
às soluções propostas pelos militares: Com a urbanização do País, as aten-
nem as punições nem o assistencia- ções se voltam para as crianças que
lismo têm sentido, a solução estaria em começam a surgir abandonadas pelos
integrar os menores na comunidade. pais. A partir da década de 1870,
O ex-juiz de menores do Rio de Ja- fundam-se orfanatos, alguns deles com

Juca Martins F4
neiro Alyrio Cavalieri vai além. Reali- objetivos específicos, como abrigar os
O
zou um levantamento demonstrando óriãos dos imigrantes italianos vitima-
que, de cada 100 menores presos no dos pela febre amarela. A Casa dos Ex-
Rio, 84 moram em favelas e 78 são postos, criada em São Paulo em 1896,
L

oriundos de famílias com renda mensal visava a recolher crianças rejeitadas pe-
Na zona rural, 45,4% da população entre inferior a um salário mínimo. Perce- las mães e abandonadas nas portas de
dez e 17 anos já trabalhavam bendo que a causa da criminalidade do casas ou em encruzilhadas de ruas. No
menor é essencialmente social, o juiz plano institucional surge, em 1935, tam-
testes de resistência e de capacidade de mostrou que o problema de fundo é a bém em São Paulo, o Serviço Social de
obedecer a seus instrutores". - desordem na produção econômica do Assistência e Proteção de Menores, li-
Com a posse de governos democráti- País, que marginaliza milhões de gado à Secretaria da Justiça e Negócios
cos em vários Estados, novas práticas famílias. Ou seja, o problema não co- do Interior.
estavam surgindo em 1983-84. Maria meçava na família e por isso não podia Ao mesmo tempo, nascem e se de-
Cecília Zilliotto, ex-presidente da FE- ser resolvido com uma política econô- senvolvem as instituições e a legislação
BEM (Fundação Estadual do Bem- mica que garantiu a liberdade de livre de punição e controle. No Estado de
Estar do Menor, órgão do governo iniciativa aos capitais estrangeiros e à São Paulo, já em 1902, surgia o Insti-
paulista ligado à Secretaria da Promo- produção para o consumo elitista. O tuto Disciplinar para Reeducação, Ins-
ção Social, criado em 1976), propunha juiz chegava a afirmar que o problema trução Literária, Industrial e Agricola
uma alteração na estrutura de atendi- do menor só poderia ser resolvido com de Menores, hoje transformado no Ins-
mento ao menor. Era de opinião que a a reorganização econômica do País. tituto Educacional e Colônia Correcio-
FEBEM deveria fechar, sendo substi- nal da FEBEM. Em 1924, surgiu o
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10176 p»
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tuída por instituições abertas de atendi- Juizo Privativo de Menores da Co-
mento ao menor na comunidade. Assu- cada em a escraraão ar? marca da Capital e, 30 anos depois, o
mindo a presidência da entidade no ini- Recolhimento Provisório de Menores.
cio do governo Montoro, em 1983, ela Logo depois da independência poli- No nível federal, surgiu, em 1913, o
criou nove Casas da Juventude, onde o tica do Brasil, em 1822, quando o Es- Instituto Sete de Setembro, que em
atendimento assistencial incluía a pro- tado começou a preocupar-se com a 1941 transformou-se no SAM.
fissionalização do menor. criança, os dirigentes voltaram seus Enquanto isso, com a abolição da es-
Nessa mesma linha de atuação, em olhos para o menor escravo. Na Consti- cravatura e o início da industrialização,
1984, a unidade da FEBEM de Mogi- tuinte de 1823, José Bonifáfio apresen- voltava a difundir-se o trabalho infantil,
Mirim, interior paulista, onde eclodira tou um projeto onde a linguagem reve- a tal ponto que, em 1983, segundo a
violenta revolta em 1980, firmou um lava mais preocupação com a manu- PNAD (Pesquisa Nacional por Amos-
contrato de prestação de serviços com tenção da mão-de-obra do que consi- tra de Domicílios), quase sete milhões
a firma americana Monroe Auto-Peças deração com a humanidade da criança de menores estavam integrados na
S/A, que produz amortecedores na ci- escrava: "A escrava, durante a prenhez força de trabalho. Na zona rural, 45,4%
dade. Os garotos daquela unidade co- e passando o terceiro mês, só será ocu- da população entre dez e 17 anos traba-
meçaram a trabalhar na seleção e recu- pada em casa; depois do parto terá um lhavam e muitas crianças menores de
Cristina Villares/F4
Nair Benedicto/F4
sransse va.GNe.aaa, 2404123 3anco 2, p A4

Em 1980, um terço das crianças do País


comldade de sete a 14 anos não recebia
nenhum tipo de atendimento escolar. Ao
abandono se somava o abuso do trabalho
precoce, como atividades militarizadas.
Acima, guarda-mirim na periferia de SP

dez anos, certamente, também estavam 5.274, do mesmo ano, estabeleceu o sa- ticipação crescente das mulheres no
trabalhando. Assim, ao abandono se lário mínimo do menor (50% do salário mercado de trabalho, deixando a mãe
somava o abuso do trabalho precoce e mínimo regional para os menores de 16 de ser a "educadora natural dos filhos".
espoliativo. anos e 75% para os menores entre 16 e A falta de "educadora natural" era
As leis sobre o trabalho do menor 18 anos). A mesma lei obrigava as em- mais sentida ainda porque, em 1980,
buscam regular as condições em que se presas a empregar menores (mais de praticamente um terço das crianças
dá esse trabalho, fixar uma idade mi- 5% e menos de 10% do quadro de fun- brasileiras com idade de sete a 14 anos
nima para os trabalhadores e o salário cionários). Essa lei, que muito deve ter não recebiam nenhum tipo de atendi-
do menor. Surgiram inicialmente como colaborado para reforçar o arrocho sa- mento escolar.
medidas de proteção à infância e eram larial, só foi revogada em 1974, mas a O importante papel da família sem-
reivindicadas pelo movimento operário idade mínima de 12 anos se mantinha pre foi ressaltado por aqueles que se
nascente. Na sua evolução, porém, em em 1984. debruçaram sobre a questão do menor.
alguns momentos, visaram a empurrar Os participantes da X Semana de Estu-
uma massa de menores para dentro das ts condições de vida são dos consideraram a internação como o
fábricas, sancionando sua exploração. piores que a vida das ruas último recurso, argumentando que "a
A primeira lei brasileira de proteção criança internada desenvolve-se em
do trabalho dos menores é de 1891. Ela Os defensores da redução da idade condições desfavoráveis, que predis-
proibia o trabalho noturno em certos minima afirmavam que, com o estado pôem ao aparecimento de múltiplos
serviços, estabelecia a idade minima de pauperismo da população, seria im- problemas de comportamento", e, mais
em 12 anos e estipulava que a jornada portante que a criança pudesse ajudar ainda, que a "ruptura dos laços afetivos
de trabalho máxima seria de sete horas no sustento da família e que seria me- familiares arrasta a consequências de-
para as meninas de até 15 anos e para lhor para ela trabalhar que ficar va- sastrosas", porque "a privação de afeti-
os meninos de até 14. Ela ficou sem diando nas ruas. Mas o depoimento do vidade e carinho age na criança como
aplicação, assim como o Decreto no professor João Batista de Arruda Sam- se fosse castigo corporal, provo-
16.300, de 1923, que reduziu a jornada paio na X Semana de Estudos do Pro- cando reações defensivas, que podem
de trabalho para seis horas para todos blema do Menor, realizada em São se converter em agressividade contra a
os menores de 18 anos. O Código de Paulo, em 1971, revela um mundo onde sociedade".
Menores de 1927 manteve os 12 anos as condições de vida são piores que a Mesmo o dr. Altenfelder, primeiro
como idade mínima para O trabalho, vida das ruas: "Quando não se lhes presidente da FUNABEM, ao aplicar a
mas proibia o trabalho noturno e nas usam os pulmões como foles nas fábri- política assistencialista do regime para
praças públicas dos menores de 14 a- cas de vidro, são eles, esse pariazinhos o bem-estar do menor, afirmava que "a
nos. sociais, empregados em trabalhos ma- sociedade deve ser organizada de tal
Foi em 1932, com o Decreto no nuais de nenhuma significação profis- forma que a família encontre meios ca-
22.042, que a idade mínima foi elevada sional, de puro automatismo. Ao cabo pazes de ajudá-lana criação e educa-
para 14 anos. Este limite se manteve na de algum tempo, gastos, depauperados, ção dos filhos". Só não poderia explicar
Constituição de 1934, na de 1937, na sem perspectiva de um trabalho qualifi- como fazer isso com um modelo eco-
Consolidação das Leis do Trabalho de cado, ingressam, aos 18 anos, na grande nômico excludente que gerôu, em
1943 e na Constituição de 1946, que legião das massas amorfas." 1980, mais de quatro milhões de
proibiu a diferença de salário entre me- O desenvolvimento harmonioso da famílias com renda mensal per capita
nores e maiores e o trabalho noturno criança exigiria que suá socialização menor ou igual a um quarto do salário
de menores de 18 anos. fosse feita pela família e complemen- mínimo. Família cujas crianças, se não
Na Constituição de 1967, o Regime tada pela escola. Já em 1975, a CPI do forem abandonadas, certamente esta-
Militar baixou a idade mínima nova- Menor apontava como uma das causas rão sendo empurradas- para o trabalho
mente para 12 anos e eliminou a proibi- da marginalização crescente dos meno- precoce, para o desalento, para as ruas,
ção de diferenças nos salários. E, já res brasileiros a de egação familiar, enfim para o embrutecimento sob di-
dentro da nova orientação, a Lei no provocada pela urbanização e pela par- versas formas.

304
BR DFANBSB VB.GNCAMA
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3
A partir dos anos 50, a capoeira (ao lado,
E
2 gravura de Rugendas) enfrentou a

3 concorrência das lutas orientais,

divulgadas pelo cinema. Acima, Bruce

Lee, famoso ator dos anos 70

CULTURA/ARTE POPULAR: a história da capoeira dos os adversários, mas imobilizá-los

para propiciar a fuga, a liberdade.

Assim, a capoeira, utilizando a

dança, o berimbau, os atabaques, como

disfarces e de certa forma parte inte-


A ginga da liberdade
grante de sua estrutura, acabou tendo

um papel fundamental, não só do

ponto de vista militar, na resistência à


Desenvolvida através da velocidade e da dança, a capoeira
escravidão, como também de união
foi uma das manifestações mais decisivas no processo de cultural entre os líderes e seus grupos.

resistência nos anos da escravidão Foi uma das armas importantes na

constituição dos quilombos, foi funda-

A opressão feroz dos senhores de en- longo dos anos de escravidão. mental para sua defesa, durante mui-

genho e a necessidade de um meca- A capoeira é uma luta. Mas uma luta tos anos. E só quando os exércitos

nismo de defesa que pudesse ser apli- que disfarça-sua violência, sua capaci- portugueses haviam adquirido arma-

cado na prática contra feitores brutais dade de destruir o adversário numa mentos mais poderosos e sofisticados,

fizeram nascer no Brasil uma das mais aparente dança ao som de cantos de como escopetas e canhões leves, foi

fortes manifestações culturais de resis- trabalho. E surgiu assim pela necessi- possível realmente arrasar e derrotar os

tência da história moderna: a capoeira. dade de esconder de feitores e policiais quilombos.

Mistura inquietante de dança e luta, sua característica verdadeira. Sem pos-

música e violência, a capoeira foi-se sibilidades de conseguirem armas e mu- Após a abolição surgem as

constituindo a partir da própria cultura nições, os negros desenvolveram um maltas de capoeiristas


do dia-a-dia dos escravos negros que sofisticado sistema de defender-se com

chegavam aos borbotões para trabalhar o próprio corpo, descobrindo que a ve- Mas, nascida como instrumento de

nos canaviais e fazendas, desde pratica- locidade e a ginga da dança - que ha- resistência e libertação, a capoeira

mente o início da colonização. viam trazido da África - poderiam ser sempre foi vista como uma prática

Membros de nações diferentes, com aliados poderosos. Misturou-se aí o co- marginal e perigosa, símbolo de crimi-

línguas diferentes, religiões, cultos e ex- nhecimento do funcionamento de seus nalidade ao longo de todo o Brasil co-

periências diversas, os negros foram instrumentos de trabalho - o martelo, a lonial e mesmo durante a República

obrigados, para se entenderem, a foice, as enxadas -, que vieram dar ori- Velha. A condenação mais dura da ca-

aprender a própria linguagem do gem a uma série de golpes que imitam poeira acabou-se dando nos anos que

branco, a adaptar-se aos seus rituais, a suas funções. Acrescente-se ainda as se seguiram à libertação dos escravos.

compreender seus mecanismos cultu- várias formas de defesa de animais: a Multidões de trabalhadores negros,

rais. Essa situação, que poderia parecer marrada, a pancada seca com o rabo, o abandonando as roças, chegaram às ci-

mais um instrumento de dominação, coice de uma mula, o estapear dos feli- dades maiores, como o Rio de Janeiro,

acabou servindo para a criação de uma nos. Criou-se então um sistema de gol- Recife e Salvador, em busca de empre-

nova cultura, muito rica, composta de pes de surpreendente eficácia, mas gos. Sem qualificações, sem nenhum

elementos fundamentais das diversas adaptado muito mais à defesa do que tipo de apoio, foram-se instalando nas

nações africanas, modificadas pelas ao próprio ataque. Uma luta rápida, periferias, vivendo de pequenos expe-
condições de trabalho e vida no novo onde se devia tocar o mínimo possível dientes, humilhados, famintos. E se
país. E a capoeira, ao lado do candom- no adversário, geralmente bem mais ar- constituiram no caldo ideal para o apa-

blê, pode-se afirmar, foi a manifestação mado e equipado. -Uma luta de bate- recimento de assaltantes e ladrões, que
aparente mais decisiva de todo o pro- pronto, própria para fugas, pois sua fi- viam nessa atividade a única saída para
cesso de resistência desencadeado ao nalidade 'principal não era derrotar to- a fome e a miséria.

305
Sem armas e munições, os escravos semimarginal por muitos anos.
criaram a capoeira, luta baseada na Transformou-se em folclore, em espe-
ginga, em que os golpes imitam asfunções táculo a que turistas podiam assistir no
dos instrumentos de trabalho, como o velho Mercado Modelo de Salvador. E
martelo e a foice, e as formas de defesa seu desenvolvimento veio dar-se, curio-
animais, como a marrada e o coice. samente, no rastro da invasão cultural
' Tinha como finalidade derrubar e americana da década de 60.
imobilizar momentaneamente o Terminada a Guerra da Coréia, em
adversário, para possibilitar a fuga 1953, e consolidada a influência ameri-
cana em boa parte do Oriente, algumas
das manifestações culturais da região
passaram a ser encaradas como curiosi-

Abril Press
dades pelos dominadores, que pode-
riam "comercializá-las" através do
mundo, destacando seu ar de mistério.
Assim, algumas artes marciais japone-
sas, chinesas e coreanas começaram a
A
! ªra

ser mostradas em programas de televi-


são por toda a América. Sua beleza e
exotismo conquistaram logo a garo-
tada, que via nelas uma saída para seus
desejos infantis de força - novos super-
heróis. A indústria cultural americana
não perdeu tempo, então. Associando-
se a capitalistas de Hong-Kong pas-
sou a produzir séries enormes de filmes
baratos, mostrando os diversos tipos de
lutas, sempre em histórias esquemáticas
e maniqueistas. Com muito dinheiro,
rapidamente todos os países pobres dos
vários continentes viram seus cinemas
invadidos por fitas de kung-fu, judô, ca-
raté e ai-ki-dô. Como consequência, pi-
pocaram por todo o País "escolas" e
"academias" de todo tipo de luta, evi-
dentemente sem muito preparo, já que
não existiam "mestres" disponíveis em
Agência O Globo

todas essas artes marciais.

.*Jhm'; |
; ihêffíªiêifd ““““)?

entre os unroersatarios

Constituiram, então, espontanea- sem, contudo, ter feito qualquer esfor- Por essa ocasião, quando cresciam
mente, as maltas de capoeiristas que usa- ço para torná-la uma atividade esporti- os movimentos estudantis e mesmo de
vam sua técnica para assaltos fulminan- va nacional. Continuava restrita a mar- trabalhadores e intelectuais contra a
tes e enfrentamentos com a polícia, ginais, a negros e brancos pobres, indig- excessiva dominação cultural que os
Além disso, eram guardas ótimos para na como a miséria que sempre repre- Estados Unidos estavam impondo aos
altos funcionários e grandes proprie- sentou. 1 países pobres, a capoeira voltou a sur-
tários, a quem alugavam seus serviços. Foi bem mais tarde que a capoeira gir, principalmente entre universitários,
O governo não teve dúvidas. Declarou retomou seu crescimento, a partir de como uma nova resistência. E foi a par-
criminosos a todos os praticantes de ca- uma formalização e organização que tir daí que retomou sua força e
poeira e, no final do século passado, mestre Bimba, um dos principais mes- transformou-se no que é hoje: prati-
quem fosse pego jogando capoeira po- tres da capoeira baiana, procurou dar à cada por milhares de jovens, em todo o
deria ser condenado ao desterro e pri- luta, através da criação do Centro de País, reconhecida como esporte, orga-
são na ilha de Fernando de Noronha. Cultura Física Regional, em Salvador. nizada para campeonatos através da
É natural que com uma repressão Mais ou menos na mesma época, outro Confederação Brasileira de Desportos
tão brutal a capoeira se tenha tornado mestre baiano, o pescador Pastinha, e crescendo continuamente com a for-
ainda mais disfarçada, incorporando montava seu grupo de lutadores, num mação de federações, associações e
mais e mais elementos de dança, para estilo ligeiramente diferente do ado- grupos. E vai aos poucos readquirindo
que pudesse sobreviver. E somente tado por mestre Bimba, com um jogo seu caráter cultural de resistência, que,
sobreviveu graças ao seu estilo solto, mais próximo ao solo, em movimentos muito mais importante do que sua efi-
sem muitas regras, que podia ser passa- mais acrobáticos, que chamou de An- cácia como luta ou defesa pessoal, é
do para os mais jovens com certa facili- gola. Mas a estrutura da luta manteve- sua maior força. Uma característica
dade, nos pequenos quintais fechados se a mesma, com a mesma dança gin- única, capaz de manté-la tão viva e
ou nas areias das praias. Essa situação gada, os mesmos toques, as mesmas forte como a própria necessidade de li-
de marginalidade durou até pratica- maneiras de encarar o adversário. berdade que a gerou nas senzalas mais
mente 1937, quando Getúlio Vargas Mesmo depois de codificada e orga- escuras e brutais. '
aboliu o caráter criminal da capoeira, nizada, a capoeira manteve seu caráter Murilo Carvalho
306
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, , p 49
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 24044334 NCO A, p 50
)
A pesquisa histórica propriamente
dita no País só começaria no século 19,
POLÍTICA/HISTÓRIA: a interpretação oficial da história brasileira

mas suas obras teriam a forte marca de


uma apologética do poder. Não era
para menos: os historiadores de então
Apologia do poder
eram basicamente figurões do Império,
barões, ministros, senadores, clérigos,
ligados diretamente ao Estado e traba-
Escrita geralmente sob o ponto de vista do elitismo e do
lhando nos Institutos, do qual o pri-
reacionarismo, a história do Brasil começa, nos anos 80, a
meiro e mais importante foi o Instituto
Histórico e Geográfico, criado em
1838. Destacou-se muito entre eles o
superar a mentira e o crioulo doido

visconde de Porto Seguro, Francisco


As vítimas prediletas do impiedoso
Adolfo de Varnhagen. Adepto da cha-
reacionarismo de nossa educação his-
mada "Escola Científica Alemã", ele
tórica são as crianças. Em muitas esco-
valorizou muito a pesquisa documen-
las brasileiras, talvez a maioria, elas
tal, contribuindo com ricas fontes para
ainda aprendem que os índios de Pindo-
nossa pesquisa, particularmente
rama eram "preguiçosos" porque se re-
quando levantou documentos sobre o
cusavam à escravidão; ou que dom Pe-
Brasil na Torre do Tombo, em Portu-
dro proclamou a Independência por-
gal. Mas Varnhagen, que deu o tom
que era "romântico e arrebatado"; ou
básico para muitas décadas de nossa
que a princesa Isabel deu de presente a
historiografia, vincou a ideologia oficia-
abolição da escravatura; ou que Ge-
lista por alguns pontos essenciais: a su-
túlio Vargas "inventou" os sindicatos e
perioridade da raça branca (da qual se
os deu de presente aos trabalhadores.
extrairam inúmeras decorrências sobre
Mas a pobre criança que, ao crescer,
a "inferioridade e incapacidade" de
quiser verificar se tudo o que aprendeu
nosso povo de mestiços), a defesa da
não era mentira, terá também, dificul-
elite aristocrática, a idéia de que a Mo-
dades: se se meter à árdua tarefa dé
narquia foi uma forma superior de or-
abater as milhares de páginas da
História do Brasil de Rocha Pombo, vai ganização política.
teca Nacional
encontrar uma maçaroca imensa de fa-
tos e datas, poucas explicações e a per- O "Samba do Crioulo Doido":
sistente ideologia oficialista de que a
história se faz com um punhado de ho-
desfile de nomes e datas
mens ilustres. Nos anos 80, uma série
de historiadores e algumas editoras se O Império produziu uma elite orgã-
empenham em remover o ranço de VYarnhagen valorizou a pesquisa, mas nica de intelectuais que, através da his-
obscuridade e falseamento que marca a defendia a superioridade dos brancos toriografia, enriqueceram a ideologia
historiografia brasileira. Mas sua tradi- dominante racista e escravocrata. Mas
ção básica, de elitismo, de culto do po- a República pouco ou nada fez para
der, de apresentação de desenvolvi- “ª“, : mudar esse panorama. Nos primeiros
mento brasileiro como harmônico e tempos republicanos, a história ensi-
nada nas escolas manteve os velhos
preconceitos, acrescentando apenas
pacífico, ainda persiste fortemente no
que se escreve para o grande público e
para as crianças, um ingrediente: o patriotismo vazio e
exacerbado, de um conde Afonso Celso
U pesquisa histórica no País com o Porque me Ufano de meu País, ou
de Rocha Pombo com Nossa Pátria. De
braços dados com Olavo Bilac e Coe-
só começaria no século 19

No período colonial, não tivemos lho Neto, os historiadores patrioteiros


propriamente uma historiografia brasi- entupiram as escolas de pieguices e
leira. Isso apesar do excelente trabalho apologias em linguagem bombástica,
de frei Vicente do Salvador, História do na tarefa de fazer o povo crer que vive-
Brasil, 1500 - 1627, das interessantes ob- mos numa nação pacífica e sem confli-
servações de Aires do Casal em sua tos, bela, festeira e sempre o melhor
Corografia Brasílica e de uma série de dos mundos. Tarefa, aliás, mal reali-
relatos e crônicas de viajantes, ricas zada: a ineficiência de se fazer os infeli-
como fontes para a pesquisa atual. Mas zes educandos amarem seu país, atra-
tratavam-se de coisas escritas não para vês do arrolamento de pilhas de fatos e
a imensa massa populacional da Colô- datas heróicas, é óbvia. Basta lembrar
nia, e sim para uns pouquissimos pode- que, por um lado, os alunos fazem pia-
das e chacotas de "personagens ilus-
Iconographia

rosos das metrópoles. Algumas dessas


crônicas já tinham o indisfarçável in- tres" cuja inconsistência percebem di-
tuito de agradar aos donos da terra e do fusamente, ou inconscientemente. Não
mundo, como O Valoroso Lucideno, de
Frei Manuel Callado, sobre a luta con- Sodré organizou o grupo que produziu a
temos entre nós sequer o culto since-
História Nova do Brasil ro,exagerado e cívico que os hispano-
tra os holandeses. americanos devotam a Bolívar e San
307
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Biblioteca Nacional
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Oliveira Vianna produziu o primeiro trabalho de história social, Nos primeiros anos da República, destacou-se o patriotismo
embora racista e autoritário. exacerbado do Conde Afonso Celso

Martin, por exemplo. Por outro lado, a queza de seu conteúdo, Vianna (que se- historiografia marxista com a publica-
impossibilidade de compreensão de ria um dos ideólogos principais do auto- ção de sua obra História da Literatura
qualquer processo significativo de nossa ritarismo no Estado Novo) se pauta por Brasileira: seus Fundamentos Econômi-
história deixa os cidadãos à mercê de toda uma postura racista e autoritária. cos. Mais tarde, sob o impacto do clima
uma imensa confusão de nomes e fatos. Precisariamos esperar os anos 30 para de mobilização popular do início dos
Sérgio Porto, o saudoso Stanislaw ver o surgimento de três obras que An- anos 60, ele reuniu um grupo que fez
Ponte Preta, satirizou brilhantemente tonio Cândido considera essenciais uma importante tentativa de recolocar
esse caos histórico dos brasileiros no para uma nova forma de ver o Brasil o povo e a realidade social no cenário
seu Samba do Crioulo Doido: "Foi em contemporâneo, a partir da compreen- histórico: História Nova do Brasil, que
Diamantina/ Onde nasceu J.K ./ Que a são de sua realidade social. se ressente de uma ótica excessiva-
Princesa Leopoldina/ arresolveu se ca- mente programática, mas que serviu
sar/ Mas Chica da Silva/ Tinha outros Caio Prado introduziu a análise conio arma ideológica contra o oficia-
pretendentes/ E obrigou a Princesa/ a marxista do desenvolvimento lismo tradicional. Na década de 60,
se casar com Tiradentes." principalmente depois do golpe de 64,
A historiografia oficial sempre se As duas primeiras são de 1933: Casa cientistas sociais paulistas, com desta-
ocupou basicamente de nossa história Grande e Senzala, obra monumental de que para Florestan Fernandes, reforça-
política, território de "heroismos." Há Gilberto Freyre, abriu nossa história à ram a tendência de pesquisas em nossa
algumas exceções importantes, como a investigação sociológica. Evolução Poli: história social nos meios universitários,
de Capistrano de Abreu, revisor crítico tica do Brasil, aguda análise de Caio enquanto Celso Furtado criava discipu-
e sério de nossa história, que, com seu Prado Jr., introduziu entre nós a análise los com sua Formação Econômica do
magistral Capítulos de História Colonial marxista do desenvolvimento. A ter- Brasil. Em 1984, ainda temos poucos
(1907), abriu novos horizontes para a ceira, de 1936, Raízes do Brasil, com a produtos, parte deles em linguagem e
compreensão do processo brasileiro. erudição de Sérgio Buarque de Ho- em edições pouco acessíveis. Mas o nú-
Para o oficialismo dominante, era difí- landa, revelou um historiador capaz de mero de pesquisas sobre a história da
cil tratar da história social brasileira induzir à reflexão ampla sobre o ser so- classe operária brasileira e sobre movi-
sem trair a política de ocultamento sis- cial brasileiro, no quadro de uma notá- mentos sociais e lutas de minorias,
temático da vida, dos costumes e das vel preocupação com a pesquisa em atualmente em curso nas universidades,
lutas das camadas subalternas. profundidade. mostra que as crianças ainda têm al-
O primeiro trabalho especificamente Depois desses trabalhos, iniciou-se guma esperança de superar a mentira e
de história social data de 1920; Po- um lento processo de mudança, ainda o crioulo doido.
pulações Meridionais do Brasil, de Oli- em curso. A partir de 1938, Nélson
veira Vianna. Entretanto, apesar da ri- Werneck Sodré ampliou o campo da Ricardo Maranhão

308
+ pranaese va.encaaa,404433 Jan 002 , p5J
5R DFANBSB VB.GNCAMA, 294044334 , 932
. )
Gauchescos, Lendas do Sul, Casos do Ro-
mualdo), onde, pela recuperação da
fala do gaúcho sulino, o , escritor
culto recria todo um mundo fragmen-
tário e evanescente, o do "populário",
como ele mesmo dizia, renegando o
termo folclore. São obras que cristali-
zam "tipos de escrita", na literatura
brasileira moderna: uma, a grande an-
gular explicativa; outra, o ouvido dirigi-
do a registrar os falares de uma época.
Em ambas, o silêncio dos que não tive-
ram monumentos.
Neste enredo, que chega aos anos
50, o Brasil migra por inteiro, no roman-
ce social do Nordeste, como nos de Ra-
chel de Queiroz (O Quinze) e José Lins
do Rego (Fogo Morto, Menino de Enge-
nho), e também nos romances urbanos,
como em Os Ratos, de Dionélio Ma-
chado, O Triste Fim de Policarpo Qua-
, resma, de Lima Barreto, O Amanuense
Belmiro, de Cyro dos Anjos. Pois o Bra-
sil migra principalmente no tempo, da
Machado de Assis (1839-1908): um escritor deaguda ironia velha ex-colônia agrária, exportadora,
para os dramas da modernidade capita-
ARTES/LITERATURA: uma análise ,da literatura brasileira lista. Os velhos coronéis sonhavam com
café, leite, charque, borracha e cana-
de-açúcar. Mal sabiam que se engen-
dravam o sufrágio universal e o futebol.
Sambas-enredo
Nos anos 20, uma atualização
Do Império aos nossos dias, do romance de Alencar à da inteligência nacional
memorialística da repressão, a literatura brasileira nos legou
Na literatura, este é um período rico
alguns dramas da terra - os sambas-enredo em migração de idéias. O grupo moder-
nista de São Paulo, os Andrade Mário e
Uma nação é como um samba- aceito como um enredo de tipo cômi- Oswald à frente, empurram o Brasil
enredo, onde as diferentes alas apre- co, de integração nacional, no tempo do para a prosa fragmentária e a poesia do
sentam o seu número e onde um coefi- Império. Integrar a Nação, fazê-la he- verso livre, do branco verso negro e
ciente de desordem salva o conjunto de roína de uma nova aventura redentora mestiço e de todas as cores, muito lon-
repetição mecânica. Donde se segue da civilização, dar-lhe um lugar no con- ge das melódias do fim do século, numa
'que uma nação não é um samba- certo das civilizadas terras européias, atualização sem precedentes da inteli-
enredo, mas um composto, ou melhor, tal foi o núcleo central de sucessivas ge- gência nacional. Medrava, de par com
um superposto de sambas-enredo, uma rações românticas. O romance de José a tragédia do migrante, uma autêntica
memória viva e cambiante de tudo oo de Alencar e a poesia indianista de redescoberta do Brasil e uma (re)nas-
que foi e deixou de ser. Gonçalves Dias talvez sejam as realiza- cente urbanidade. A oligarquia corneli-
Ao longo da história brasileira houve ções melhor acabadas desse projeto, in- cia transformava a colônia em futuro
alguns sambas-enredo que se tornaram clusive por seu conteúdo crítico em re- cartão postal, acabando com seus res-
clássicos, e a literatura sempre foi privi- lação à mundanidade da Corte e ao quícios nas grandes cidades, abrindo
legiada em revelá-los e dar-lhes forma. projeto colonial que nos deu origem, avenidas a torto e à direita, construindo
Aqui, para melhor compreensão do te- ou pelo menos certidão de batismo e mansões e passeios públicos. Cresciam
ma, cabe tratar de uma distinção teóri- heráldica portuguesa. Machado de As- as vilas operárias e as fábricas de tijolo
ca. A tradição literária admite dois ti- sis passou esse projeto no pente fino de vermelho, enquanto o foot-ball passava
pos de enredo, isto é, de imitações das sua ironia aguda. a ser futebol mesmo, deixando os clu-
ações humanas no plano do imaginário. Com o advento da República (a dos bes de elite, de sport, migrando para os
Um é o tipo trágico, onde a ação se or- coronéis da terra) ganhou-se um novo arrabaldes e subúrbios. !
ganiza do ponto de vista de uma perso- enredo clássico, que se poderia chamar A realização maior de todo esse ciclo
nagem que se vê excluída de um corpo de a tragédia do migrante. A primeira desaguará na obra de Graciliano Ra-
social. O outro é o tipo cômico, onde a obra capital do novo enredo é Os Ser- mos, principalmente em seus três me-
ação se organiza do ponto de vista de tões, de Euclides da Cunha, onde se lhores romances - São Bernardo, An-
uma personagem que se vê incluída, narra, entre o relato jornalístico e a gustia e Vidas Secas - e em seu depoi-
ou aceita, num corpo social tido como : idéia de fazer ciência, entre documen- mento Memórias do Cárcere, sobre o
desejável. tal e épico, o massacre de Canudos.Ou- ano e meio em que esteve nas diferen-
No imaginário - vale dizer, num pla- tra obra de capital importância que tes prisões do Estado Novo. Em con-
no mais real que qualquer outro -, o inaugura esse segundo enredo é a do junto, a literatura desse tempo fixa pa-
Brasil começou predominantemente contista Simões Lopes Neto (Contos drões de leitura que perduram quase

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BR pransss v.enc.ama, 34041931 p53

Zeka Araújo/Agência O Globo


Biblioteca Nacional
até hoje: o gosto médio por um roman- drigues, lagre acima da luta de classes, o Estado
ce descritivo, com sabor a regional e O novo ciclo que se abre é o da co- conduziria o corpo materializado da
característico, um tanto forte na lingua- média do nacional-popular. De caráter Nação à bem-aventurança do progres-
gem, de que Jorge Amado tirará gran- integrador, esse samba-enredo da nova . so. Pois bem, em nosso imaginário, fei
de proveito. Num plano mais profundo, urbanidade impõe o esforço de erguer esse herói que teve um colapso 'em
se instala em nossa visão da realidade 0 Brasil de seu anacronismo crônico e 1964 e morreu, em leito de hospital,
social e da natureza uma constante dia- fazê-lo moderno, burguês, democráti- mas de morte matada, a 13 de de-
lética entre o "velho" e o "novo", pa- co, progressista, mais nacional que po- zembro de 1958, com o Ato 5. Aquele
drão que ainda informará um movi- pular. A expressão "nacional-popular", Estado benfazejo, progressista, meio
mento recente como a Tropicália, em retirada um tanto inadequadamente doméstico, durão no Estado Novo mas
1967-68, e cujo horizonte maior conti- dos escritos de Antônio Gramsci na compreensivo com os intelectuais, todo-
nua a ser a explicação que Euclides da Itália (anti) fascista, abençoava, pela es- poderoso mas bonachão como um lati-
Cunha deu para a Guerra de Canudos, querda, uma política frentista um tanto fundiário no alpendre de sua casa-gran-
como um confronto entre o Brasil lito- carnavalesca e nacionalista que, embo- de, a tomar chimarrão em fim de tarde,
râneo, progressista, republicano, e o ra muito séria no plano das intenções, esse Estado, como o deus de Nieztsche,
Brasil do sertão, arcaico, messiânico, desembocou numa série de equivocos morreu. Em seu lugar ficou esse aí, de
sebastianista, hoje jocosos, dos quais o mais grave hoje, meio bicho-papão meio orgia tec-
A transição para o ciclo seguinte se era fazer do artista retor de política e nocrática, em todo caso incapaz de cen-
faz pelos grandes painéis da nacionali- da arte, roteiro de poder. De qualquer trar qualquer imaginário. E daí entra-
dade. Por aí vai muito da poesia maior modo, não se pode esquecer que o en- mos em novo ciclo ou samba-enredo,
de Carlos Drummond de Andrade, e redo se enquadrava num horizonte de trágico, uma espécie de canto pelos he-
de obras tão desiguais, do ponto de vis- anseios legítimos de se democratizar a róis mortos, pelo herói morto, que ainda
ta da qualidade literária, como as de É- circulação do saber, então confundido não se esgotou. Ao pensar no espaço
rico Veríssimo e de Guimarães Rosa. A com cultura. Esse esforço atingiu em entre esses dois mundos, vem à mente
obra deste último constituirá talvez o Cheio o teatro - ver, por exemplo, as Quarup, de Antônio Callado - onde a
último marco desse ciclo de migrações, peças de Gianfracesco Guarnieri, revolução social aparece já como
onde o Brasil arcaico de todas as lin- como Eles não Usam Black-Tie, toda a problema.
guagens populares se transforma no de- prática e a teoria do Arena, do CPC da
sejo de uma memória, de que a sensa- União Nacional dos Estudantes -, mui- A curiosidade sobre a repressão
ção de perda (a morte de Diadorim) é o to da poesia de engajamento social, en- Javorece a memoriatística
centro silente e irreparável. No teatro, tão na moda (dessa produção a melhor
a ótica do painel, herdeira da grande antologia é ainda Canto Melhor, de Em poesia há duas grandes balizas
angular de Euclides, constituirá, em 1969), e mesmo muito da produção nesse ciclo. Uma é a chamda "geração
parte, a obra de Jorge Andrade, cujo ci- poética e teórica da então vanguarda do mimeógrafo", Enquanto geração, é
clo, panorâmico de dez peças - Marta, (como a do grupo Concreto), que ba- a que mais diretamente se relaciona
a Arvore e o Relógio - revive a história talhava por reproduzir uma moderniza- com a paisagem redefinida pelo regime
de uma família e seus agregados do sé- ção da inteligência nacional nos moldes ditatorial, embora contra. Houve uma
culo 18, até o então presente, Ao lado modernistas. revalorização do quotidiano e do co-
desta, encontra-se o mosaico fragmen- Esse ciclo entronizou em definitivo loquial, da auto-ironia e do desencanto.
tário e irregular da família e do subur- um herói de longo curso em nossa his- A outra baliza demarcatória é a obrá
bio brasileiros na obra de Nélson Ro- tória: o Estado. Pairando meio por mi- do poeta maranhense Ferreira Gullar,
310
BR DFAanNBSB 24042331 3NCO2Z2 , póB4

FERREIRA GULLAR

João Boa- Morte

cabra marcado pra morrer

Lúcio Marreiro/Agência O Globo


Lucio Marreiro/Agência O Globo
conographia

Editõra Universitária ª

que no ciclo anterior fora de tudo -da Ao longo da história brasileira, Que é Isso, Companheiro, indiscutivel-
geração de 45, do engajamento, da van- alguns escritores revelaram e deram mente o grande bom livro da série de
guarda. A partir da experiência dura do forma a samba-enredo. Na pág. ao Fernando Gabeira, Os Carbonários, de
exílio ele encontra seu melhor "pon- lado, Graciliano Ramos (extrema esq.) Alfredo Syrkis, e muitos outros. Esse
to de linguagem", dizendo, em seus Guimarães Rosa (centro) e Antônio elan de memória foi sem dúvida insu-
poemas, do Juniverso do "homem co- Callado. Também Ferreira Gullar flado pela obra do médico Pedro Nava,
num", do nordestino recrescido no (acima, à esq., capa de seu livro João em seis livros, sob cujo olhar passa boa
Rio, das queimadas do exílio e do Boa Morte), Clarice Lispector, Pedro parte das mudanças dramáticas de que
corpo desejoso de memória. Nava (acima) e Fernando Gabeira esse mesmo artigo, de modo incom-
Na ficção narrativa, o grande fio pleto, dá conta.
condutor é o narrar da violência que, Deve-se ainda assinalar o renasci-
ao se institucionalizar, atravessa toda a mento atual de um indianismo às aves-
paisagem - assim como, por exemplo, sas, desejoso de repensar nossas ori-
a fome fora um dos grandes fios narra- gens, onde vamos encontrar de novo
tivos da década de 30. Os anos 50 e 60 Antônio Callado, com A Expedição
fixaram quatro grandes balizas para o Montaigne, e Darcy Ribeiro, com Mai-
conto brasileiro moderno; a linguagem ra, e que o desencanto certamente fa-
mítica de Guimarães Rosa, a prosa iínti- vorece uma literatura sardônica, de
ma de Clarice Lispector, o inventário leve inspiração picaresca, de que Már-
da violência de Rubem Fonseca e o cio de Souza, por vezes, como em al-
mundo da marginalidade social de João guns momentos de Galvez, O Imperador
Antônio. Entre esses marcos crescerá do Acre, tirou bom proveito literário.
toda uma geração de contistas, particu- Ainda é prematura qualquer síntese
larmente no Rio Grande do Sul e Mi- desses tempos. Pode-se dizer que ser
nas Gerais. foram certezas e ingenuidades antigas,
Depois de Quarup, Antônio Callado, e que, atravessada por um canto geral
no romance, continuará a temática re- de ausência e dispersão, a arte, a literá-
volucionária, principalmente, como ria em particular, não se crê mais teste-
não podia deixar de ser, pelo lado do munho fiel, como em 30, nem alavanca
desencanto e da derrota. Nessa esteira da história, como em 60, nem mesmo
se vão Bar Don Juan, Reflexos do Baile como criadora de um território livre,
e o mais recente Sempreviva, que re- como no século passado, mesmo se sob
trata os tortuosos caminhos da volta do o signo da ironia mais cruel, como a de
exílio. Outros romances cuja leitura se Machado. Olhar mais de desencanto,
impõe como um "retrato" dessa época embora não derrotista, ela vem-se pro-
são Zero, de Ignácio Loyola Brandão, duzindo melhor, mesmo, como o espe-
e A Festa, de Ivan Angelo, além de lho da distorsão, a surpreender a histó-
Cabeça de Papel, de Paulo Francis. ria em seus avessos.
Mais recentemente a curiosidade sobre
os anos de maior repressão favoreceu a
memoralística, por, onde entraram -O Flávio Aguiar

311
BR DFANBSB V8.GNCAAA, 8404133 1 Incor, p5S

ECONOMIA/CAPITAL ESTRANGEIRO: a dívida externa do Terceiro Mundo


- seriam repassados através dos gran-
des bancos internacionais para os pro-
jetos das empresas multinacionais em
todo o mundo e também para os países
A epidemia da dívida em desenvolvimento. Em 1975, os ban-
cos se tornariam também repassadores
de petrodólares, criados pela alta do
Os créditos "fáceis", empurrados para os países pobres na petróleo em 1973 e 1974.
década de 60, arruinaram suas economias, transformando-se Isso permitiu revalorizar o custo do
crédito excedente - que estava em
numa bomba financeira, nos anos 80
baixa por ser abundante - e estimular
as exportações dos países ricos, espe-
"O Clube de Paris" - instituição en- Na verdade, os primeiros sinais de cialmente as dos EUA. Como parte do
carregada de examinar os reescalona- desastre eram bem claros já em 1974. "truque", o preço das máquinas indus-
mentos da dívida dos países em difícul- Nesse ano, após obter superávits folga- triais vendidas ao Terceiro Mundo foi
dade financeira - "fez duas reuniões dos no princípio da década - um cres- rapidamente aumentado, acompa-
em 1978, seis em 1980, 14 em 1981 e 20 cimento de mais de 20% em suas recei- nhado de um correspondente décres-
em 1982", diria Jean-Pierre Cot, minis- tas de exportação -, os países latino- cimo do preço das matérias-primas ex-
tro da Cooperação Econômica da americanos começaram a afundar em portadas peles países subdesenvolvi-
França, comentando a preocupação déficits crônicos. Em todo o Terceiro dos. Os países desenvolvidos, assim, pu-
dos países ricos com o brutal endivida- Mundo, as transações comerciais de- deram colocar em dia suas finanças -
mento do Terceiro Mundo. tam prejuízos de 2,7 bilhões de dólares, em parte às custas das remessas de lu-
A preocupação não era sem motivo. em 1974, e de 7,6 bilhões, em 1975. eros obtidos nos países pobres, onde as
Na década de 70, a dívida externa dos Essa corrosiva e violenta inversão no multinacionais se haviam instalado, e
países pobres havia-se alastrado como desempenho econômico já era então em parte às custas dos crescentes déficits
verdadeira epidemia, deixando cerca provocada pelo endividamento, e con- comerciais no Terceiro Mundo, que
de 60 países, em 1982, à beira do caos duziria fatalmente à crise de 1980. transformariam economias inteiras
financeiro, inclusive alguns países do em simples máquinas repassadoras de
Leste europeu, como a Polônia e a Ale- Em 75, os bancos se tornam dólares.. Em 1984, 53% das magras re-
manha Oriental. De cerca de 40 bilhões ceitas de exportação da América La-
repassadores de petrodólares
de dólares, no início dos anos 70, a di-
tina estavam comprometidos com o pa-
vida saltara para 150 bilhões, em 1974, De início, porém, a situação parece gamento da dívida externa.
depois para 190 bilhões, em 1976, e 450 ter-se afigurado aos países ricos como Era natural que, em vista de tudo
bilhões, em 1980. Em 1984, havia supe- um bem arquitetado e barato truque isso, alguns países pobres sugerissem,
rado a marca dos 800 bilhões de dóla- econômico. Ocorre que no final dos em 1984, que os grandes banqueiros
res e ainda estava crescendo, Além anos 60 a economia mundial estava em deviam contentar-se com o que já ha-
disso, como o único meio de pagar os um impasse. Os déficits comerciais dos viam ganho com sua perigosa armadi-
débitos vencidos era recorrer a novos EUA com a Europa e o Japão e gastos lha financeira e cancelar a dívida pas-
empréstimos, os grandes bancos inter- militares americanos em todo o mundo sada. Assim, a crise se resolveria. No
nacionais haviam comprometido com haviam carreado para fora desse país entanto, o presidente Ronald Reagan
a dívida mundial quantias até maiores uma grande quantidade de dólares, As- insistia em manter altas taxas de juros
que o seu capital. Assim, eram real- sim, a partir de 1959, e ainda mais for- como meio de atrair capitais externos
mente sérios os riscos de uma grande temente desde 1967, resolveu-se que para cobrir os déficits orçamentários a-
bancarrota mundial. esses créditos - os célebres eurodólares mericanos.

A enxurrada dos eurodólares


A participação das instituições públicas nos créditos colocado
s à disposição do Terceiro Mundo tornou-se
cada vez menor a partir da década de 60, com a criação do eurodóla
r. Entre 1974 e 1980, o total da dívida
externa dos países pobres cresceu 200%. Mas, enquanto os
empréstimos de fontes públicas aumentaram em
153%, os conseguidos junto aos grandes bancos e instituições privadas
cresceram 281%
Composição dos créditos da dívida externa dos países do
Terceiro Mundo, em bilhões de dólares (1974 e 1980)

Fonte: Banco Mundial, Annual Report 1982


BR OFANBSBVB.GNCAAA. 840413348002, p$6

ECONOMIA/SALÁRIOS: a política salarial do regime

Cintos apertados

Após 64, o Regime Militar adota uma política de arrocho


salarial,
situação agravada nos anos 80 por exigência do FMI, mas
que diante da resistência
do movimento sindical poderá resultar na perspectiva
de negociações diretas

A fórmula de reajuste serve para simplifi- economia brasileira nas mãos. tanto, seria rejeitado pelo Congresso

car e destraumatizar a aplicação dos rea- O primeiro desses decretos, o de nú- Nacional, em 19 de outubro, a despeito

Jjustes de salários nos dissídios coletivos. mero 2.012, de 25 de janeiro de 1983, de Brasília ter sido colocada sob "Es-

Esses não são mais decididos na base de retirou de quem ganhava até três sa- tado de Emergência" e tomada pelas

pressões e greves, mas por um rápido cál- lários minimos o direito de ter reajustes tropas do general Newton Cruz.

culo matemático. com índices 10% superiores ao Índice O quarto decreto, no 2.064, vigorou

(Mário Simonsen, 1975.) Nacional de Preços ao Consumidor apenas de 20 a 26 de outubro de 1983,

(INPC), e impôs índices inferiores a Era estupidamente arrochante e veio à

No futuro, quando os historiadores este para as demais faixas. tona apenas como trunfo do governo

organizarem os fatos indicativos do es- No segundo, o Decreto-Lei no 2.024, em suas negociações com setores polí-

gotamento do Regime Militar, instau- de 25 de maio de 1983, o governo, ticos após a rejeição do Decreto no

rado no Brasil a partir de 1964, não po- diante da reação popular, recuaria um 2.045.

derão deixar de fazer referências ao pouco, estendendo para quem ganhava Fruto dessas negociações, o governo

que aconteceu, em 1983, em torno da até sete salários mínimos os reajustes deu à luz o Decreto-Lei no 2,065, em 27

política salarial: nada menos do que com base em 100% do INPC. de outubro de 1983, um pouco mais

quatro decretos-leis foram baixados, O terceiro, o Decreto-Lei no 2.045, condescendente que os anteriores so-

entraram em vigor e depois foram re- foi baixado em 13 de julho com a chan- bre os reajustes das faixas acima dos

vogados, no curto espaço entre janeiro cela do Conselho de Segurança Nacio- três salários mínimos. O decreto previa

e outubro daquele ano, Cada um deles nal. Era um recado claro de que o gover- também a reintrodução gradativa das

correspondeu a uma tentativa de fazer no não estava mais disposto a transigir: o negociações diretas entre empregado-

passar goela abaixo dos trabalhadores decreto previa violento arrocho, im- res e empregados na discussão dos rea-

uma cavalar dose de arrocho salarial pondo sobre todas as faixas salariais a justes salariais. Depois de duas décadas

exigida pelo FMI (Fundo Monetário obrigatoriedade de reajustes de apenas fixando as regras e fórmulas da política
Internacional), então com as rédeas da 80% do INPC. Este decreto, entre- salarial - postura mais própria dos Es-

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34 an 002, p54

tados fascistas -, o Estado brasileiro es-


boçava assim, um primeiro e leve recuo
em direção ao modeio clássico dos re-
gimes capitalistas liberais, em que o
traço principal é a negociação direta
entre trabalhadores e empresários.
Após a aprovação do Decreto-Lei no
2.065, em 1983, nova força política do
movimento sindical se encarregaria de
revogá-lo, na prática, no dia-a-dia dos
embates entre trabalhadores e empre-
sários. O governo não tinha como ne-
gar essa realidade. A Lei 7.238, de 29

Iconographia
de outubro de 1984, a despeito de man-
ter a imposição de reajustes nunca su-
periores a 100% do INPC, já admitia,
explicitamente, a direta dos Comício pelo aumento do salário mínimo, Rio, em 54, no governo Vargas
índices de reajustes, no intervalo entre
80 e 100% do INPC, para as faixas su- O Brasil foi o 12o pais do mundo, e necessário para que se mantenham vi-
periores a três salários mínimos. A ne- um dos primeiros da América Latina, vos após cada dia de labuta.
gociação direta estava, assim, voltando a incorporar em sua Constituição um Terceiro, ao estabelecer níveis dis-
ao vocabulário na política salarial. artigo específico estabelecendo o di- tintos para o salário minimo em re-
Como acontecia no Brasil até 1965. reito de todo cidadão receber um sa- giões diferentes, a lei passava por
lário nunca inferior a certo nível. A cima de um princípio universal de jus-
Em 1963, surge o Conselho Constituição de 1934 fazia referência tiça: para trabalho igual, salário igual.
Nacional de Política Salarial ao salário mínimo em seu Artigo 121. Quarto, as Comissões de Salário
Coube à Lei no 185, de janeiro de . Mínimo realizaram levantamento em
Antes, o Estado estipulava apenas as 1936, definir seu conceito e instituir as todo o País, mas não para definir o
variações do salário mínimo, cujo valor Comissões de Salário Minimo para custo de todos os bens e serviços es-
foi decretado pela primeira vez, em realizarem os estudos com vistas à fi- senciais, na quantidade definida pela
1940, por Getúlio Vargas, e os reajustes xação do seu valor. Essa lei foi regula- lei. O que se fez, de fato, foi um le-
do funcionalismo público e dos empre- mentada pelo Decreto-Lei no 399, de vantamento geral sobre os níveis sala-
gados das autarquias, empresas estatais 30 de abril de 1938, Em seu artigo 2o, riais mais baixos pagos em todo o
e empresas concessionárias de serviços denominava-se o salário mínimo País, que foram então legalmente re-
públicos. Para coordenar os cálculos como "a remuneração mínima devida ferendados.
desses reajustes, O governo federal a todo trabalhador adulto, sem distin- Quatro décadas depois, esse rol de
criou, em 1963, o Conselho Nacional ção de sexo, por dia normal de ser- injustiças pouco mudou. É certo que
de Política Salarial (CNPS). Enquanto viço, e capaz de satisfazer, em deter- foi instituído, em 1963, o salário-
isso, o surgimento de grandes empre- minada época e região do País, as família - irrisórios 5% do salário mi-
sas, a consolidação da classe operária e suas necessidades normais de alimen- nimo para cada filho de até 14 anos. É
sua crescente organização, sobretudo tação, habitação, vestuário, higiene e certo também que o salário mínimo
nos anos 50, iam soterrando a velha transporte". Finalmente, no dia 1o de seriaunificado para todo o País, pelo
praxe dos acordos individuais de traba- maio de 1940, Getúlio Vargas fixava Decreto no 89.589, de 26 de abril de
lho - emque cada empregado nego- os primeiros níveis do salário mínimo 1984, consumando uma vitória impor-
ciava o seu salário com o patrão -, de- em todo o País, através do Decreto- tante para os trabalhadores, Em 1940
terminando a prática dos acordos Lei no 2.162. foram definidos 14 níveis distintos,
anuais coletivos de trabalho, inicial- mas eles chegaram a ser 38, em 1963.
Getúlio, entretanto, subiria ao pa-
mente nas categorias mais numerosas e A partir desse ano, por pressão do
lanque armado no campo do Vasco
aguerridas. movimento sindical, o número de ní-
da Gama, no Rio, para anunciar, na
O CNPS seria herdado, em 1964, veis foi sendo reduzido até a unifica-
verdade, quatro grandes injustiças
pelo Regime Militar e serviria de tram- ção em 1984. Entretanto, estudos do
contra essa velha aspiração dos traba-
polim para a nova política salarial em DIEESE mostraram que a nivelação
lhadores do Brasil.
gestação e cuja implantação se faria deu-se por baixo. Ou seja, arrochando
Primeiro, a lei que definia o salário
por etapas. Primeiro, ainda em 1964, o os níveis mais altos para diminuir a
mínimo referia-se às necessidades de
governo ampliaria, via CNPS, um me- distância entre estes e os mais baixos.
apenas um trabahador adulto,
canismo de reajustes sobre os salários Assim, se os trabalhadores conse-
esquecendo-se de que, em geral, vive-
do setor público. Depois, em julho de guiram um de seus objetivos históri-
se em famílias.
1965, entrou em vigor a Lei 4.725, atri- cos, um salário mínimo unificado
Segundo, ao definir como essencial nacionalmente, ainda estão longe do
buindo ao governo a responsabilidade
de cálculo dos reajustes salariais em apenas as necessidades de alimenta- outro objetivo: que este salário mi-
ção, habitação, vestuário, higiene e nimo seja real, isto é, assegure efetiva-
todos os setores da economia, através de
fórmulas matemáticas. O pressuposto transporte, a lei esquecia-sé de que, mente a sobrevivência de uma família
era o de que a negociação direta gerava como seres humanos, os trabalhado- trabalhadora. Não perdeu atualidade,
reajustes incompatíveis com os objeti- res têm também direito a educação e portanto, o desabafo de um operário-
vos antiinflacionários da política eco- a lazer, por exemplo. Prevalecia, as- salário-mínimo, já incorporado ao foi-
nômica, além de perturbar a paz social sim, a noção de que aos trabalhadores clore popular: "Cada vez sobra mais ©
com greves, também incompatíveis deve-se pagar apenas o estritamente mês no fim do salário."
com a necessidade de estimular os in- aaa
314
BROFANBSB VB.GNC.AAA, 34041â34 an002ap 5&£

vestimentos e com a política de atração daquele que vigorava 24 meses antes; além de não repor as perdas anteriores,
do capital estrangeiro. A lei estabelecia segundo, porque a inflação "porven- durou pouco. No final de 1968, veio o
que os reajustes não poderiam realizar- tura admitida na programação AI-5; em 1969, a desmobilização dos
se com espaçamento inferior a 12 me- econômico-financeira do governo" se- trabalhadores; e, a partir de 1971, o re-
ses e seriam determinados de modo a ria sempre inferior à inflação real que crudescimento da inflação, fazendo
igualar o salário médio dos últimos 24 se verificaria; terceiro, porque a deter- com que os salários reais voltassem a
meses (e não mais o salário-pico, no minação das taxas de produtividade se cair. Com a reconquista de um espaço
momento do reajuste anterior), acres- faria ao gosto do governo e, em geral, maior de liberdade a partir de 1974, era
cido de uma taxa de produtividade esti- com resultados aquém da realidade. previsível que os protestos dos traba-
mada para o ano anterior e de um per- O achatamento dos salários reais nos lhadores retornassem. E, em novembro
centual que traduzisse a inflação fu- primeiros anos da nova política não po- de 1974, com a Lei 6.147, o governo era
tura, "porventura admitida na progra- deria, é claro, deixar de gerar protestos. forçado a introduzir novas alterações
mação econômico-financeira do go- Foi importante, por exemplo, a greve em sua fórmula salarial.
verno". dos metalúrgicos de Contagem (MG), A partir daí,o salário médio, para o
Para os teóricos do governo, o cál- em 1968. Diante da greve, o governo cálculo do reajuste, passava a ser a mé-
culo dos reajustes asseguraria para os concedeu um abono de emergência de dia dos salários reais dos últimos 12 me-
assalariados uma renda estável, mas 10% para todos os assalariados e reco- ses (e não mais 24 meses), melhorando
que aumentaria na mesma proporção nheceu "distorções" na aplicação da um pouco os reajustes futuros, depois
que a produtividade e a riqueza do fórmula, prometendo acrescentar-lhe do arrocho dos anos anteriores.
País. No entanto, a prática se encarre- um novo elemento para compensar Mas a melhora era muito modesta,
garia de desmentir esses objetivos. subestimações futuras do chamado não repunha as perdas sofridas e, ao to-
Já em 1965, o primeiro ano de apli- "residuo inflacionário" (a tal inflação mar posse, em 1979, o presidente Fi-
cação da fórmula, em São Paulo, por "porventura admitida" na programa- gueiredo já ouvia o pipocar das greves
exemplo, diversas categorias tiveram ção do governo). Esta autocrítica par- anunciando o renascimento do movi-
reajustes em torno de 40%, quando o cial, no entanto, custaria um preço: a mento sindical. Mesmo sem abrir mão
custo de vida subiu 62%. O mesmo de- nova fórmula salarial, agora conside- da repressão às greves, de intervenção
sequilíbrio aconteceria em 1966 e 1967. rada perfeita com o acréscimo do "fa- em sindicatos e da prisão das lideranças
E por quê? € tor de correção" do reajuste, teria du- mais combativas - a praxe desde 1964
Primeiro, porque os reajustes coloca- ração indefinida, enquanto a Lei 4.725, -, o governo foi obrigado a fazer, pela
riam os salários no mesmo nível do valor de 1965, que a criara, previa que ela fi- primeira vez, concessões importantes.
real médio dos últimos 24 meses, um va- casse em vigor por apenas três anos. Através da Lei 6.708, de novembro de
lor evidentemente inferior ao valor real Mas o período de "afrouxo salarial", 1979, foram estabelecidos os reajustes

AH...
ESE aí
Foi O AUMENTO
DE 1971.

- Deve ser o modelo mexicano: transformar a pirâmide salarial em sombrero.

O "aperto dos cintos" e o achatamento dos salários reais durante o Regime


Militar, por Ziraldotao lado) e Chico Caruso

315
ar DFANBSB 342002 , p59

mente, nas folhas de pagamento das


empresas estatais, onde tinham peso
significativo, dando fôlego, de certo
modo, para o cumprimento dos pesa-
dos encargos financeiros que -foram
obrigadas a assumir para captar dólares
no Exterior.
Além disso, o arrocho sobre os sa-
lários mais altos poderia ser anunciado
com ares de autocrítica, já que, nos
anos anteriores, haviam-se ampliado
estupidamente as disparidades entre es-
tes e os salários mais baixos.
Em 1976, a empresa de consultoria
Morris e Morgan publicou uma pes-
quisa mostrando que o salário médio
de um gerente-geral de média e grande
empresa em São Paulo e Rio de Ja-
neiro era 65 vezes maior do que o de
um servente na construção civil, em
1969, tendo evoluído para 90 vezes, em
1975. Ainda de acordo com a mesma
pesquisa, se fossem levados em conta
os benefícios adicionais - como auto-
móvel, viagens, refeições, clubes, alu-
guêis, etc. - concedidos aos executivos,
seus salários reais médios seriam 162
vezes maiores do que o de um ser-
vente,

Entre 1980 e 1983, salários


diminuem pela metade

O pretexto de melhorar a distribui-


ção de renda, entretanto, não seria ca-
paz de esconder a realidade do arro-
cho imposto sobre a classe média. Um
Fernando Pimentel/Abril Press

documento da Ordem dos Economistas


de São Paulo, divulgado em 1984, mos-
trou que os ordenados na faixa de 20 a
30 salários mínimos tiveram seus valo-
res reais diminuídos para pouco mais
da metade, entre o final de 1980 e o ini-
cio de 1983,
O arrocho sobre a classe média, no
Em 83, por pressão do FMI, o arrocho salarial atinge todas asfaixas salariais. entanto, não foi suficiente para acalmar
Acima,
o protesto dos funcionários das empresas estatais, no Rio o FMI. Quando, no início de 1983, o
governo brasileiro acertava o primeiro
"pacote" de emergência para o finan-
semestrais e, para os salários mais bai- minuir o nível da produção, desestimu- ciamento da dívida externa, eram cla-
xos, um adicional de 10% do Índice Na- lando o consumo. Como? Contendo os ras as pressões dos banqueiros interna-
cional de Preços ao Consumidor salários, cionais para que o arrocho fosse esten-
(INPC). Em consequência, depois de Por isso, entrou em vigor, em dezem- dido a todas as faixas salariais, E foi as-
anos de achatamento, os salários reais bro de 1980, a Lei 6.886, determinando
» sim que começou a sequência dos de-
nestas faixas, cresceriam levemente, reajustes de 80% do INPC para a faixa cretos 2.012, 2.024, 2.045 e 2.064.
Mas o estouro da divida externa do de dez a 15 salários mínimos, de apenas Diante da resistência imposta pelo
País faria o governo voltar atrás. De- 50% do INPC para-a faixa de 15 a 20 sa- movimento sindical e pelos setores
pois do relativo "afrouxo" da Lei lários mínimos; e, para as faixas supe- políticos - posto que agora a política
6.708, novas doses de arrocho seriam riores a esta, os reajustes seriam nego- salarial tinha o "mérito" de desagradar
ministradas, já sob pressão dos credo- ciados. Desta vez, portanto, a lei vi- aos assalariados de todas as faixas -, o
res internacionais. Para pagar os juros nha com a pontaria calibrada para pe- governo seria obrigado a fazer uma
escorchantes da dívida externa, o go- gar em cheio a classe média.Havia uma série de manobras e contramanobras
verno embarcava de corpo e alma na lógica nisso: diante do surto grevista que acabaram resultando no Decreto-
tese da necessidade de desaquecer a que ainda ressoava em 1980, o governo Lei no 2.065 e na perspectiva de se vol-
economia. E argumentava: saldos co- evitava, prudentemente, cutucar o ves- tar, em breve, a uma política democrá-
merciais positivos somente seriam peiro dos baixos salários; por outro, o tica de aumentos salariais negociados
possíveis, de imediato, contendo as im- arrocho sobre as faixas de dez a 20 sa- livremente entre empresários e traba-
portações. Para tanto, seria preciso di- lários mínimos repercutiria, principal- lhadores,
316
2404433 J an CO&2, pé0"

POLÍTICA/ELEIÇOÓES: evolução da legislação (1964-384) um escrutinador (que podia "ler" o que


bem entendesse) e incineradas em se-
guida.
As atas de apuração também podiam
Manipulação eleitoral ser falsificadas, a "bico-de-pena", com
alterações, rasuras e emendas. E o can-
didato, uma vez eleito, podia ter sua
Do golpe até o seu esgotamento final, o Regime Militar posse impedida pela bancada majori-
promoveu drásticas mudanças nas regras eleitorais, tentando tária nas Assembléias Legislativas. Na
linguagem da época, sua candidatura
manter o predomínio de forças conservadoras
podia ser "degolada".
Uma das principais bandeiras da re-
Em outubro de 1984, o Senado apro- (ou qualificação) dos eleitores. Ele era, volução de 30, que empolgou amplos
vou a regulamentação do Colégio Elei- geralmente, controlado por um juiz setores da população, foi justamente
toral que, em janeiro do ano seguinte, municipal comprometido com as for- a moralização dos costumes eleitorais.
iria eleger o novo presidente da Repú- ças políticas dominantes no Estado. E isso, realmente, ocorreu em parte:
blica. Como um fruto típico do Regime Nas listas de eleitores organizadas por em 24 de fevereiro de 1932, era promul-
Militar, ele tinha sido construído de tal esses juízes, o contingente dos correli- gado um novo Código Eleitoral, que
maneira que o partido do governo (o gionários do partido situacionista era criava a Justiça Eleitoral, para regula-
PDS), mesmo tendo obtido nas elei- engrossado com a inclusão de pessoas mentar e fiscalizar os pleitos. Instituía o
ções de 1982 para a Câmara Federal já mortas, de menores com compro- voto secreto, estendia o direito de voto
apenas 36,5% dos votos, detinha 358 vantes falsos de idade e de analfabetos. às mulheres e diminuía o limite mínimo
(52,2%) dos 686 votos que elegeriam o E ainda restava a possibilidade de os de idade para votar de 21 para 18 anos,
futuro presidente. eleitores oposicionistas serem excluídos provocando, de imediato, um cresci-
Mas, no correr do processo suces- pura e simplesmente. , mento significativo do eleitorado. Re-
sório, houve uma profunda divisão no A fraude institucionalizada prosse- conhecia partidos estáveis, organizados
partido governamental. Muitos "dos guia, sobretudo na zona rural, com o como sociedades de direito civil, e par-
seus membros formaram a Frente Li- sistema de "currais eleitorais". Neles, tidos formados exclusivamente para
beral, que se uniu ao PMDB, o maior os eleitores "de cabresto", reunidos so- concorrer às eleições, além de permitir
partido da oposição, para constituir a bre rígido controle de "cabos eleito- candidatos avulsos, desde que apoiados
Aliança Democrática e lançar a candi- rais", recebiam cédulas já preenchidas por um certo número de eleitores.
datura do governador de Minas, Tan- e fechadas: as "marmitas".
credo Neves. Ao encerrar-se o ano de As mesas eleitorais, que recebiam os Em 1937, um golpe extinguia os
1984, tudo parecia indicar sua vitória, votos, apuravam os resultados e lavra-
partidos e suprimia eleições
que marcaria o final de um ciclo na his- vam a ata correspondente, também
tória política do País e dos "pacotes eram formadas por vereadores ou auto- Em algumas de suas medidas, como
eleitorais" e presidentes militares elei- ridades judiciárias nomeadas por inter- a relativa à organização partidária, o
tos de forma indireta. ferência do poder local. Os mesários código de 1932 foi o mais avançado que
O Regime Militar instalado em 1964 podiam, então, falsificar os livros de o País já teve, Nas legislações posterio-
promoveu drásticas mudanças nas re- presença, incluindo "assinaturas" de res, sempre foi imposto algum tipo de
gras eleitorais do País. Através de um eleitores ausentes, para os quais já ti- limitação à liberdade para a constitui-
conjunto de medidas de força, fez com nham cédulas preenchidas. As cédulas ção de partidos e apresentação de can-
que os resultados eleitorais se afastas- efetivamente recebidas eram lidas por didatos, Entretanto, esse código teria
sem ainda mais do que seria uma efe-
tiva expressão da "vontade popular". Durante a República
Agravou os mecanismos de manipula- Velha (1889-1930), as
ção das eleições que sempre existiram eleições eram um jogo
na história brasileira. Esses mecanis- de cartas marcadas,
mos, antes como depois de 1964, ti- com a inclusão de
nham uma finalidade inconfessada, votos de pessoas já
mas claríssima: assegurar o predomínio mortas, menores ou
político das forças sociais conservado- cédulas preenchidas,
ras. sempre beneficiando as
Na República Velha (1889-1930), a oligarquias. A dir., um
maioria esmagadora da população flagrante da mesa
adulta não dispunha do direito de voto. eleitoral na prefeitura
Estavam excluídos as mulheres, os carioca, no pleito de 30
analfabetos, os mendigos, os militares de janeiro de 1915, em
com patente inferior à de oficial e os que, segundo a revista
clérigos. O número de votantes era Careta, os juízes
ainda menor do que o de eleitores, já "puderam dormir por
que o voto não era obrigatório. terem trazido o trabalho
Além disso, havia um conjunto de pronto de casa"
expedientes que transformava as elei-
Biblioteca Nacional

ções num jogo de cartas marcadas em


benefício das oligarquias. Nas eleições
a nível municipal ou estadual, a mani-
pulação começava já no alistamento
or DFANBSB V8.GNC;AAA, 24044334 an CO 2,661

simpatizantes, e se transformara na
quarta força eleitoral do País. A cassa-
ção do registro do Partido Comunista,
em 7 de maio de 1947, com base no dis-
positivo citado, era a culminação de
uma série de agressões praticadas pelo -
governo Dutra contra as liberdades de-
mocráticas.
Os partidos majoritários na Assem-
bléia Constituinte de 1946 já haviam
lançado mão de outro expediente vi-
sando ao PC. Estabeleceram que os go-
vernadores de Estado poderiam no-
mear os prefeitos das capitais e de-
veriam nomear os prefeitos de cidades
ita teia 28 EIS es ave m saoR declaradas bases ou portos militares de
excepcional importância. Nas eleições
, I NARE
p &“; apare 1: gti ars vao Path oe oia > oUBA
RR a e,
:Tàçd“;
d ditas
ao 1
| | Justica e Liberd
M
ade) | 4a Dra.
4 presidenciais e legislativas de 1945, o
Juslga e Liber dade
VOTAE na Ora, PC havia vencido em capitais como
na Dra.
' Rio de Janeiro, São Paulo, Recife
(onde obteve 40% dos votos), Natal e
Aracaju, e em cidades importantes
como Santos, Campinas, Sorocaba,
Olinda, etc. A manobra se destinava a
impedir que os comunistas pudessem
ter acesso às prefeituras dessas cidades.
Em 1950, as restrições à liberdade de
organização partidária sofreriam um
agravamento ainda maior. Pelo Código
Eleitoral de 1945, os partidos - embora
devessem ser registrados no Tribunal
Superior Eleitoral - conservavam
ainda seu estatuto de sociedades civis,
regidas pelo Código Civil. A partir de
1950, porém, a lei passou a considerá-
los pessoas jurídicas de direito público.
Assim, os estatutos, os programas e a
vida dos partidos passaram a ser con-
trolados de fora. Além disso, foram au-
mentadas as dificuldades para a legali-
zação dos partidos: eles deveriam ter
no mínimo 50 mil votos, em pelo menos
Iconographia

cinco circunscrições eleitorais, eum de-


putado.
A partir da promulgação de um novo Código Eleitoral, em 24 defevereiro de 1932, o Todas essas manipulações antidemo-
direito de voto chegou às mulheres. Acima, comício realizado no Rio, em 1933, para cráticas das regras eleitorais, porém,
propaganda de Natércia da Cunha Silveira são irrelevantes quando comparadas
» com as que iriam ocorrer após o golpe
militar de 1964.
vigência curta. Em 10 de novembro de cinco Estados, com ummínimo de 500 Em julho de 1965, a nova Lei Orgã-
1937, o golpe de inspiração fascista, assinaturas por Estado. Em maio de nica dos Partidos e o novo Código Elei-
que instituiu o Estado Novo, fechava o 1946, já com o general Dutra na Presi- toral modificavam drasticamente as re-
Congresso Nacional, extinguia os parti- dência da República, a exigência foi gras políticas. Foram proibidas as alian-
dos e suprimia as eleições em todos os ampliada para 50 mil assinaturas. Além ças partidárias nas eleições majoritárias
níveis. A ditadura se prolongaria por disso, proibiu-se a existência legal de e estabelecida a vinculação entre presi-
quase oito anos. partidos considerados "antidemocráti- dente e vice nas eleições presidenciais.
Com o fim do Estado Novo, em cos", que fossem filiados a organiza- Para a legalização dos partidos, foram
1945, iniciou-se uma etapa política que ções internacionais ou que recebessem fixadas condições extremamente difí-
se estenderia até 1964 e seria conheci- dinheiro do Exterior. ceis: o partido deveria existir em pelo
da como "interregno democrático". Es- Este dispositivo legal, que foi utili- menos 11 Estados e neles estar implan-
sa democracia tinha, porém, limites bem zado uma única vez, tinha um endereço tado até o nível municipal. Apenas o
visíveis, começando já com as restri- certo: o Partido Comunista, que obti- PSD e a UDN preenchiam plenamente
ções impostas pelo Código Eleitoral, de vera a sua legalização em 1945, após 23 estas condições, enquanto o PTB, o
28 de maio de 1945, à organização par- anos de clandestinidade e perseguição PDCe o PSP tinham alguma chance de
tidária. Exigia-se que os partidos apre- policial. Principalmente porque o PC tentar.
sentassem, para obter sua legalização, crescera de maneira extraordinária, ar- Essas medidas truculentas, entre-
uma lista com as assinaturas de pelo regimentando, em fins de 1946, cerca tanto, não foram suficientes para o re-
menos dez mil eleitores, espalhados por de 200 mil militantes, sem contar os gime obter o resultado que esperava
318
BROFANBSB VB.GNC.AAA, R4 041333] ACO , pêéa

nas eleições para governadores de Es-


tado, realizadas em 3 de outubro da-
quele ano. Dois entre os 12 governado-
res eleitos, os do Rio de Janeiro e de
Minas Gerais, representavam forças de
oposição aos militares no poder.
, A resposta do regime foi fulminante.
Em 27 de outubro, era baixado o Ato
Institucional no 2, extinguindo os parti-
dos políticos e estabelecendo eleições
indiretas para presidente da República.
O Ato Complementar no 4, de 30 de no-
vembro, impunha restrições extremas
para a legalização de novos partidos,
que tinham um prazo de apenas 45 dias
para se constituir. Eles deveriam ter um
mínimo de 120 deputados e 20 senado-
res e eram proibidos de usar nomes, si-

Iconographia
glas e símbolos das agremiações extin-
tas pelo AI-2. As condições eram tão
difíceis de cumprir que ameaçavam le-
var ao partido único, forçando os estra-
tegistas do regime, que ainda queriam Em 46, o PC era a quarta força
manter certas aparências democráticas, eleitoral do País (ao lado, a sede do
a determinar que alguns de seus corre- partido, no Rio). Em maio de 47, o
ligionários aderissem ao partido de registro do Partido Comunista é cassado,
oposição, para viabilizar sua existência. assim como os mandatos de seus
Surgiram desse ato de força a Arena e representantes (acima, manifestação
o MDB. contra a cassação). Com o golpe de 64,
crescem as manipulações nas regras
iconographia

Em 1966, o AI-3 estendia eleitorais, como após a vitória


oposicionista de Negrão de Lima (abaixo,
eleições indiretas a vários cargos em comício em 65), no governo do Rio

Em 5 de fevereiro de 1966, o Ato Ins-


titucional no 3 estendia as eleições indi-
retas aos cargos de governadores e
vice-governadores de Estados e prefei-
tos das capitais e cidades consideradas
"áreas de segurança nacional". A capi-
tal federal, Brasília, continuava sem a
possibilidade de eleger prefeito, verea-
dor ou qualquer outro representante.
Em 17 de abril de 1968, 68 municípios
seriam declarados "áreas de segurança
nacional", deixando de eleger seus pre-
feitos. O AI-3 criou também as suble-
gendas nas eleições para prefeitos e se-
nadores. Era o expediente para acomo-
dar, nos limites estreitos do bipartida-
rismo artificial, as diferentes correntes
políticas e as ambições pessoais confli-
tantes.
A nova Constituição, redigida por
iniciativa do general Castello Branco e
aprovada pelo Congresso Nacional, sob
protesto do MDB, em 15 de março de
1967, incorporava em seu texto todas
as alterações na legislação eleitoral rea-
lizadas pelos militares e complementa-
res. Mesmo assim, a Constituição se-
ria praticamente revogada, no final do
governo Costa e Silva (1967-69), pelo
Ato Institucional no 5, de 13 de dezem-
bro de 1968, que dava poderes ditato-
Ágéncna O Globo

riais ao presidente da República.


A Emenda Constitucional no 1, de 17
de outubro de 1969, promulgada pela
Junta Militar que sucedeu a Costa e

319
sr oransss va.ene.aaa, 34041331 an co a p63

Silva, reformaria a Constituição de temporariamente o Congresso e bai- agremiações puderam ser formadas
1967, acabando com os resquícios libe- xava o "Pacote de Abril", criando os (PDS, PMDB, PP, PTB, PDT e PT),
rais que ela continha. senadores "biônicos" (eleitos indireta- algumas com bastante dificuldade e
Durante o governo Médici (1969- mente), que deveriam ocupar um terço provisoriamente.
74), as eleições diretas se limitavam, das cadeiras do Senado e participariam Em 13 de novembro de 1980, era
no Executivo, ao cargo de prefeito das dos Colégios Eleitorais que elegeriam aprovada Emenda Constitucional res-
cidades que não eram capitais nem os dois futuros presidentes da Repú- tabelecendo eleições diretas para go-
"áreas de segurança nacional" ou es- blica. Promovia, também, uma nova vernadores de Estado em 1982. Antes
tâncias hidrominerais. distorção na representação dos Estados que elas se realizassem, porém, o re-
Em 13 de agosto de 1973, para refor- na Câmara Federal, com a elevação do gime efetuaria novas manipulações
car ainda mais a maioria do partido si- limite mínimo de deputados por Estado eleitorais e políticas. Em 1o de janeiro
tuacionista no Congresso Nacionai e a fixação arbitrária de um limite má- de 1982, era criado o Estado de Rondô-
que, funcionando como Colégio Eleito- ximo. Com isso, aumentava as banca- nia, cujo controle pelo partido situacio-
ral, homologaria a indicação do novo das dos Estados mais atrasados (domi- nista era líquido e certo. No dia 19 do
presidente (decidida de fato nos altos nados pela situação) e diminuia as dos mesmo mês, era aprovada lei obri-
escalões das Forças Armadas), o Colé- Estados mais desenvolvidos (crescente- gando os partidos políticos a terem
gio foi modificado, acrescentando-se, mente oposicionistas). Por fim, alterava candidatos em todos os níveis, impe-
aos membros do Congresso Nacional, a composição dos colégios eleitorais es- dindo que houvesse coalizões parti-
delegados das Assembléias Legislativas taduais, que deveriam eleger indireta- dárias nas eleições para governadores e
estaduais. mente os novos governadores e os se- prefeitos (pela Reforma Partidária de
Já sob as condições um pouco me- nadores biônicos. 1979, as coligações para a Câmara Fe-
nos opressivas do governo Geisel
deral, Assembléias Legislativas e Câ-
(1974-779), o MDB, utilizando-se de Em 1979, eram extintos maras Municipais). A
relativa liberdade durante a campanha
arbitrariamente Arena e MDB Ficava claríssima a intenção dos és-
eleitoral de 1974, conquista uma vitória
trategistas do regime de neutralizar
extraordinária. Obtém quase o dobro Em parte respondendo a uma das parcialmente o previsível sucesso elei-
dos votos da Arena nas eleições para o reivindicações democráticas da socie- toral das oposições, forçando os parti-
Senado e, ao eleger mais de um terço dade brasileira - a da plena liberdade dos oposicionistas a disputarem uns
dos deputados federais, atinge o de organização partidária -, mas, so- contra os outros. A manobra, entre-
quórum que lhe permitia convocar Co- bretudo, visando a desarticular a ampla tanto, acabaria provocando a incorpo-
missões Parlamentares de Inquérito. frente oposicionista congregada ino ração do Partido Popular ao PMDB,
Tornava-se também majoritário nas MDB, que se fortalecia a cada eleição, com o fortalecimento numérico do
Assembléias Legislativas de São Paulo, o sucessor de Geisel, Figueiredo, pro- maior partido oposicionista.
Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pa- moveu a Reforma Partidária. Em 20 de Embora tenha conseguido eleger os
raná, Amazonas e Acre, o que lhe pos- dezembro de 1979, eram extintos arbi- governadores do Rio Grande do Sul,
sibilitava eleger indiretamente os go- trariamente a Arena e o MDB e esta- Estado majoritariamente oposicionista,
vernadores desses Estados no pleito de belecido um prazo de 180 dias para a e de Santa Catarina, onde se previa
1978. A oposição começava a bater o organização de novas agremiações. uma vitória da oposição, o governo não
regime mesmo sob as regras que este Para impedir que alguma delas utili- pôde impedir que as oposições eleges-
havia criado. Era preciso modificar no- zasse a denominação MDB, a lei sem dez governadores e conquistassem,
vamente essas regras. obrigou a intlusão da palavra "partido" em todo o País, a maioria dos votos po-
Em 1o de julho de 1976, a Lei Falcão em seus nomes. Também para assegu- pulares. O Regime Militar se aproxi-
praticamente acabava com a propa- rar que o MDB realmente se fragmen- mava do esgotamento.
ganda eleitoral no rádio e TV, tasse, foram abrandadas as exigências
limitando-a à apresentação do nome, para a legalização dos novos partidos, Em julho de 1976, o regime modifica
número, legenda e foto dos candidatos. mas não a ponto de permitir um pluri- novamente as regras eleitorais, com a Lei
Em 1o de abril de 1977, Geisel fechava partidarismo autêntico. Apenas seis Falcão. Abaixo, por Ziraldo

DEV
Pal
COMERCIAL

no v e A4

320
DR DFANBSB V8.GNC.AM, R4044334 ân 002 , p 64

Josef Kamuck Hr/Abril Press

Cláudio Edinger/Abril Press


POLÍTICA/HISTÓRIA : o papel dos brasilianistas na história do País
Com a segunda leva de estudiosos
americanos - the modernizers of the
60's - surgem obras importantes sobre
economia e política brasileiras, escritas
De bandidos a mocinhos por brasilianistas como Alfred Stepan
ou Robert Levine ( acima )
No final da década de 70, a inteligentsia local

reconhecia a contribuição de brasilianist
as, que nos
anos da ditadura foram duramente criticados

No final de 1981, num congresso de dos anos 60. Falou de uma época em nanciamentos generosos do Estado e
historiadores americanos, em Los An- que "os brasilianistas estavam delicio- das fundações. Bolsas foram providen-
geles, Richard Morse, figura paternal samente nas margens da academia", e ciadas para estudantes de pós-
no campo de estudos latino-americanos quando "congressos de historiadores graduação. As universidades passaram
nos EUA, foi chamado para fazer um serviam para beber e jogar pôquer, e a oferecer ótimas colocações para eco-
balanço da produção brasilianista. não, como agora, para mercado de es- nomistas, cientistas políticos, críticos li-
Apesar de ter escrito uma das primeiras cravos" (onde professores recém- terários, antropólogos e historiadores
teses de doutoramento sobre o Brasil, doutorados são negociados). A "mi- com especialização em América La-
publicada em português em 1954 com niexplosão" se deu, continuava Morse, tina. Organizaram-se cursos de gradua-
o título A Formação Histórica da Cidade pela invasão burocratizante do governo ção sobre a história do Brasil, da Ar-
de São Paulo, Morse negou que fosse e das fundações culturais (como Ford, gentina, do México, sobre a narrativa
brasilianista. Contou que tivera cinco Carnegie, Tinker) na vida universitária na América espanhola, sobre desenvol-
empregos como professor universitário, norte-americana. A revolução cubana, vimento, revolução, política externa,
um como chefe de departamento, um entre outros eventos políticos, gerou problemas agrários, para dar alguns
lecionando história do Caribe, outro um crescente interesse pelo misterioso exemplos. Acabava de ser inventado o
história da América Espanhola e dois e desconhecido pedaço do continente campo de estudos latino-americanos,
como "generalista", mas "sem ser de ao sul dos EUA. E, não mais que de re- uma área nova na tradição americana
quatro estrelas", Embora não se reco- pente, havia dinheiro para financiar os cada vez mais importante de area stu-
nheça como um brasilianista, ao longo estudantes e professores que se dispu- dies.
da carreira manteve relações profis- sessem a atender esta nova "prioridade Seria equivocado, no entanto, atri-
sionais e pessoais com o brasilianismo nacional"": estudar a América Latina, buir tanta agitação tão-somente à cu-
e o Brasil. Professores com teses já feitas sobre riosidade súbita do governo norte-
AO historiar um pouco da própria outras áreas receberam e aceitaram americano em saber o que se passava
| vida, Morse fez um corte entre o que propostas para mudar de ramo e se es- do lado de baixo do Equador. Do fim
veio antes e depois da "miniexplosão" pecializar em América Latina. Cria- dos anos 50 até meados dos anos 70,
de estudos brasilianistas em meados ram-se centros de estudos com fi- viveu-se nos meios universitários norte-

321
er pransss ve.enc.aaa, R4041 2331an CO2 , pôs

americanos a guerra do Vietnã, a inter- brasilianistas produziam trabalhos sim- tidas. Os intelectuais nacionais come-
venção na República Dominicana, as plesmente empíricos, meros catálogos, caram a reconhecer, já a esta altura, a
guerras coloniais africanas, a ascensão incapazes portanto de contribuir muito contribuição dos americanos, pelo me-
e terrível fim da Aliança Popular do para o esclarecimento dos problemas e nos ao nível de pesquisa.
Chile, os movimentos negros, a cultura questões nacionais. Eram vistos, em A geração brasilianista que iniciou a
negra, jazz, blues, rock, para não falar suma, como o braço intelectual do im- pós-graduação apartir dos anos 70 en-
no misticismo hippie. A populosa gera- períalismo, colecionadores de dados frenta, então, um contexto intelectual
ção concebida na euforia supersônica úteis aos interesses dos EUA, aliados bastante mudado. A geração anterior já
que se seguiu à Segunda Grande da ditadura. ocupa as cadeiras de um sistema uni-
Guerra, os chamados filhos do baby
Tal hostilidade começou a ceder, já versitário que não se expande mais, e
boom, passou pela universidade provo- em meados dos anos 70, a uma convi- onde muitos "terrenos" acadêmicos já
cando uma rápida expansão neste vência mais amena, devido, em parte, à estão demarcados. As relações com os
período. Viveu-se, enfim, a longa e ca- internacionalização - forçada pelo colegas brasileiros são, felizmente, bem
lorosa década chamada the sixties. E foi
exílio - da intelectualidade latino- mais fraternais do que 15 anos atrás.
assim, neste clima, que o Terceiro americana, e à hospitalidade retribuída Mas ficou uma, pelo menos uma, ques-
Mundo passou a existir para os jovens
de alguns brasilianistas que procuraram tão básica: para que serve, ou pode ser-
americanos, ajudar os exilados. Ficou claro para os vir, o brasilianismo? O relatório de mais
brasileiros que a maioria dos brasilia- uma nação, como quer Clifford Ge-
Elesspendiam mais para Kennedy
nistas era ou liberal ou de "centro- ertz? Uma fonte de saber para a forma-
do que para Jimi Hendrix esquerda", contra a ditadura, e que ção mais inteligente da opinião pública
poucos colaboravam com a CIA e cia., e da política externa americanas? Uma
É nesta conjuntura que se forma a pelo menos diretamente. Os exilados, contribuição norte-americana às lutas
segunda leva de estudiosos americanos sobretudo os teóricos da dependência, libertárias no continente? Talvez seja
interessados no Brasil, "the modernizers chegaram, inclusive, a ter grande in- Alexis de Tocqueville - adaptado por
of the 60's", no dizer de Morse. Se estes fluência nos meios universitários norte- Richard Morse - quem tem a resposta
jovens professores tinham, por um americanos, criando assim uma base mais interessante: serviria para focali-
lado, alunos curiosos e animados com a para diálogo. Posteriormente, como zar aquilo que os EUA podem apren-
luta de libertação no Terceiro Mundo, mostra José Carlos Sebe em seu livro der com o Brasil. Inverter ao nível do
sentiam, por outro, a necessidade de Introdução ao Nacionalismo Acadêmico: texto a relação "centro" versus "perife-
demarcar um terreno próprio em um os Brasilianistas, o fim da censura no ria". Uma espécie de antropofagia os-
campo acadêmico ainda mal explo- Brasil na última metade dos anos 70 waldiana às avessas. Ou, se quiserem, o
rado. A carreira universitária norte- (bem como o fim da expansão universi- avesso do avesso do avesso. Mas daí
americana dependia de publicações, e tária norte-americana) fez com que as provavelmente haveria uma mudança:
era imprescindível portanto que a pes- Obras brasilianistas passassem a ser brasilianeiro, em vez de brasilianistas.
quisa de doutoramento, frequente- apenas mais uma entre várias interpre-
mente a primeira investida do estu- tações, tirando-lhes o caráter de uma Matthew Shirts e
dioso em águas brasilienses, virasse li- das poucas palavras e pesquisas permi- Antônio Pedro Tota
vro. Os tempos visavam, quase sempre,
ou à política ou à economia neste
período. Pode-se citar como exemplo
das pesquisas mais importantes os li-
vros de Thomas Skidmore, Politics in
Brazil, 1945-1964: An Experiment in
Democracy (1968), Robert Levine, The
Vargas Regime (1968), Alfred Stepan,
The Military in Politics: Changing Pat-
terns in Brazil (1971), bem como as
análises de Joseph Love sobre o regio-
nalismo gaúcho (1971) e as de John
Wirth sobre a política do aço e do pe-
tróleo no País (1970). O programa de
pesquisa dos brasilianistas seguia basi-
camente a mesma problemática do
latino-americanismo: estudar a ausência
de democracia e desenvolvimento no
continente. Pendiam mais para John
Kennedy do que para Jimi Hendrix.
Embora bem recebidos pessoal-
mente, pela decantada hospitalidade
brasileira, os brasilianistas foram dura-
mente criticados pela inteligentsia local.
Dizia-se que gozavam de privilégios
nos difíceis caminhos para as fontes e
arquivos fechados aos pesquisadores
nacionais. Eram acusados de colaborar
com as "forças ocultas", a CIA, por
exemplo. A crítica mais dura: apesar de Thomas Skidmore, autor de Politics in Brazil, 1945-1964: An Experiment in
tanto financiamento à disposição, os Democracy, de 1968
322
sr praNnBss A, pés

ARTES/MÚSICA: a evolução do País na música popular em qualquer época, só bem recente-


mente começou a aparecer por inteiro
no repertório que as rádios tocam. É
claro que sambas como Ai que Sauda-
Espelho do País des da Amélia (1941) sempre foram
bem-vindos - e o retrato que Ataulfo
Alves e Mário Lago montaram da mu-
Desde o início do século; os autores de música popular lher (pré-feminismo) era tão acertado
refletem o País. Mas nem sempre o poder permitiu retratos que Amélia deixou de ser nome pró-
prio e virou adjetivo. E como este, de-
tão precisos, como nos anos 70 zenas de outros foram contando a his-
tória de mulher por aqui, a princípio se
O chefe da Polícia/ Pelo telefone) ginal dizia: O Bonde de São Januário! detendo mais no vaivém tirânico da
Manda me avisar! Que na Carioca tem Leva mais um sócio otário/Sou eu, que moda: Tudo à la Garçonne, de 1925
uma roleta/ Para se jogar. não vou trabalhar. O DIP exigiu que fi- (Cabelos curtos, bem aparados/Lindos
casse assim: O Bonde de São Januário! cangotes nos deixam ver), Moreninha da
Esta parceria de Donga e Mauro de Leva mais um operário/ Sou eu que vou Praia, de 33 (Que anda sem meia/ Em
Almeida, de 1917, é tida como o pri- trabalhar. plena Avenida). Ela Foi Fundada, de 57
meiro samba gravado. Portanto, a E o index das censuras não surge (Coitada está cansada/ De ficar no espe-
música popular chegou ao disco refle- apenas para temas mais diretamente li- lho/ Tapando seus buracos/ Com creme e
tindo de maneira precisa o universo ao gados com o credo dos poderosos. A pó-de-arroz). Dr. Pitangui, de 64 (Levei a
seu redor. É verdade que o chefe de mulher, um dos assuntos mais comuns Marieta ao Pitangui/ Quando voltou não a
polícia do Rio, na época, Aureliano na música popular de qualquer país e reconheci), etc. As roupas cada vez mais
Leal, comandava, com o maior estar-
dalhaço, uma campanha contra a jo-
gatina. E é claro que o jogo continuou,
como continua. E a música popular,
igualmente, persistiu na sua função de
espelho, retrato certeiro de costumes e
usos. Tanto que, 63 anos depois, um
sambão animadissimo chamado
Reunião de Bacana, uniu todo o País
num coro para entoar o seu refrão:
Se gritar pega ladrão!/ Nãofica um, meu
irmão. E a dupla Maurício Tapajós/ Al-
dir Blanc, em Sobe o Dólar, tornou
tudo ainda mais específico, na relação
cada vez mais sofisticada entre os do-
nos do poder e aquilo que a lei con-
dena: A raiz da mandioca/ Faz com que
homens se matem/ Assassino vive impunel/
Do mendigo ao do Baumgarten/E a Bras-
tel, Coroa/ Faz com que peitos infartem/
Esse regime nos condena/Aspontes de sa-
fena/ Vai passar por Cleveland/ A volta
aos quartéis/ Mas antes fuc-fuc/ No bozo
dos zé-manés.
É óbvio que nem sempre o poder
permitiu retratos tão precisos. Na dé-
cada de 70, por exemplo, os governos.
dos generais Médici e Geisel, com vio-
lência da repressão, cortaram a voz
exuberante dos melhores composito-
res. Em consequência, abriram espaço
para o ufanismo de coisas como Eu te
Amo, meu Brasil (1970) e outras peças
de igual ranço - e, de certa maneira,
essas canções se transformaram, tam-
bém, muma imagem correta daquele
tempo escuro. Na época de outra dita-
dura, a de Getúlio, tinha acontecido.
algo semelhante, com o patrulhamento
do DIP (Departamento de Imprensa e
Propaganda) e outra safra de músicos A modafeminina (acima, ilustrações de J.
Biblioteca Nacional

ufanistas. Um exemplo da minúcia Carlos)foi anotada em vários ritmos pela


mesquinha até onde pode descer a cen- música popular brasileira, como em
sura está no caso de O Bonde de São Garota Saint-Tropez, em 1962 ou
Januário, de Ataulfo Alves, A letra ori- Garota da Minissaia, em 1967
323

lismo feminino perturba demais a cen- anotada no repertório popular desde


sura, Mas o caminho é o mesmo: pri- que Tio Sam foi transformado em mo-
meiro, os indícios (o cabelo curto, delo a ser imitado. Em 32, Lamartine
"masculino", da Menina Guri, 67) e, Babo caprichou em Canção Para Inglês
mais tarde, as pessoas (como em Ver, juntando palavras sem sentido, se-
Bárbara, de Chico Buarque, que a cen- guindo apenas a trilha do som e a pre-
sura vetou em 73: a canção falava do tensão geral de "falar estrangeiro":
encontro de duas amantes, que preten- Yes, my glass/ Salada de alface/ I love
diam mergulhar no poço escuro de nós you/ Abacaxi, uísque! Of chuchu.
LÉ., duas - e a censura vetou precisamente Meio século depois, o grupo paulista
a palavra duas. É claro que o machismo Premeditando o Breque voltaria ao

Iconographia
da maioria se delicia com coisas como mesmo tema e aos mesmos recur-
; Maria Sapatão, que Chacrinha canteu sos, numa faixa preciosa chamada
em 80 (De dia é Maria/ De noite é João), Mascando Chiclê. Entre um lance e ou-
ou com o Rock das Aranhas, de Raul tro, o entreguismo cresceu tanto que,
Hitler (acima, por Belmonte) foi Seixas, do mesmo ano, onde ele sur- em 78, Paulinho Soares sintetizou tudo
debochado com irreverência preende duas mulheres botando aranha em O Patrão Mandou: O patrão mandou
pra brigar. cantar com a língua enrolada/ Everybody
sintéticas também foram anotadas em macacada/ E ainda mandou tirar nosso
vários ritmos: Garota Saint-Tropez (62), Em 1944, a saudação nazista samba da parada/ Very good, macacada!
Garota do Monoquini (65), Garota de Mi- aparece em "Abaixa o Braço" E esta síntese do universo popular
nissaia (67), Mini-Nada (70) ou Garota acaba funcionando como senha ou
Transparente (71). Fora dessa área, a liberdade sempre jingle, concentrando numa canção
Mas, aos poucos, o mundo levezinho foi um pouco maior e o repertório po- toda uma tendência, um compor-
da moda foi dividindo seu espaço com pular foi espelhando o dia-a-dia com tamento geral. Foi assim com
itens mais decisivos, como a necessi- mais rigor - e mais zombaria, também. Caminhando, de Geraldo Vandré, em
dade de evitar muitos filhos: Ela traba- O nazismo, por exemplo, foi cantado 67; com Apesar de Você, de Chico, em
lhava noite e dia/ Não encalhava mercado- com a mais debochada irreverência: o 70 - o hino proibido, enquanto os rá-
ria/ Mas a carestia está medonhal Nin- Pacto de Munique, em 38, virou Salada dios repetiam o "oficial", Eu te Amo,
guém quer nada com a cegonha (Dona Mista; o embate entre Hitler e a Ingla- meu Brasil, cada um fazendo a síntese
Cegonha, de 53). Mas, é lógico, houve terra virou Adolfito Mata-Mouros, 43; no de um ponto de vista; com O Bêbado e
reação: A solução da pilula/ Pra mim ela mesmo ano, o passo de ganso era satiri- o Equilibrista, em 1979, na campanha
é ridícula/ Ondejá se viu/ Um mundo sem zado em Que Passo é Esse, Adolfito?; a pela anistia; ou com Menestrel das Ala-
mamãe (Marcha da Pilula, de 70). Até saudação nazista apareceu em Abaixe o goas, 84, no maior movimento popular
que, em 82, Rita Lee empacou na cen- Braço, em 44, etc. E até os fuzilamentos de toda a história brasileira, a campa-
sura (sempre ela) quando decidiu dizer da vitoriosa revolução de Fidel Castro nha pelas diretas-já, Em cada caso, um
tudo claramente: Mulher é bicho esqui- entraram na Marcha do Paredão, em 62, retrato do Brasil no 3 X4 da canção,
sito/ Todo mês sangra, Essa habilidade de fazer eco preciso desde o tempo em que, pelo telefone,
Mas a tesoura da censura, no caso, para o real, a música sempre manteve, o chefe da polícia avisava que, na Cari-
até que poderia ser prevista: afinal, a A subserviência brasileira aos modismos oca, havia uma roleta para se jogar.
área do tema sexo e suas redondezas importados, por exemplo, vem sendo Maurício Kubrusly
sempre estiveram no centro do alvo de
qualquer inquisição. Em 1984, isso po-
dia sugerir um passado muito distante,
pois o travesti Roberta Close era as-
sunto de página central em revista mas-
culina de mulher nua, e o Capitão Gay
desembarcou em todas as casas de
família em 1982, através de uma can-
ção e na imagem redonda de Jô Soares.
Mas essa "liberação" não mergulha
muito além da casca e o homossexua-
lismo, que os gregos já tinham herdado
de seus antepassados, só aos poucos
pôde ser cantado. Em 1959, com Vai
Ver Que E, iniciou-se a temporada de
suspeitas: Sempre perde o lotação/ Nervo-
sinho bate o pé/ Vai ver que é., Depois, fo-
ram surgindo outros indícios: o cabelo
grande (Cabeleira do Zezé, 64), a bolsa
(Bolsinha do Valdemar, 73) e várias ou-
tras, até que, em 75, Gilberto Gil falou
Carlos Fenerich

em "porção mulher" e Agnaldo Timó-


teo louvou a galeria Alaska, no Rio,
um lugar de emoções diferentes/ muita gen-
te à procura. de gente.
Do outro lado, a repressão é ainda Menestrel das Alagoas, interpretada por Fafá de Belém (acima), marcou a campanha
muito forte, e falar do homossexua- das diretas-já, o maior movimento popular no País, em 84
324
ar DranBsa S40414384 ân coa, p6&8

CULTURA/RELIGIÃO : a evolução das relações entre Igreja e Estado sob o Regime Militar

Os caminhos da Igreja

Em 64, uma Igreja dividida saudava o golpe militar. Em pouco tempo, porém,
os bispos brasileiros viram que estavam embarcando numa canoa furada. E
. quando a Igreja conhece o mais belo período de sua história no País

"O Brasil foi, há pouco, cenário de mos a quantos concorreram para "O milagre brasileiro, despido, de um
graves acontecimentos, que modifica- libertarem-na do abismo iminente." lado, da crença popular, da devoção e
ram profundamente os rumos da situa- Esse é um trecho do documento ofi- da esperança, resulta de outro lado no
ção nacional. Atendendo à geral e an- cial com que a Comissão Central da favorecimento dos não-necessitados,
gustiosa expectativa do povo brasileiro, Conferência Nacional dos Bispos do implicando num castigo aos que foram
que via a marcha acelerada do comu- Brasil saudou o golpe de 1964 no Bra- sacrificados, maldição para aqueles que
nismo para a conquista do poder, as sil. Trata-se da "Declaração da CNBB não o pediram. No rastro do milagre
Forças Armadas acudiram em tempo, sobre a Situação Nacional", fruto de ficou o empobrecimento relativo e ab-
e evitaram se consumasse a implanta- uma reunião da Comissão Central, no soluto do povo (...). A concentração
ção do regime bolchevista em nossa Rio de Janeiro, em maio de 1964, e dis- de renda tende, portanto, a aumentar
terra. (...) Ao rendermos graças a tribuída a 2 de junho do mesmo ano. mais e mais e no seu curso fortalece a
Deus, que atendeu às orações de mi- Nove anos depois, em 1973, os bis- estrutura de classe e de poder que a faz
lhões de brasileiros e nos livrou do pe- pos brasileiros já não davam tantas gra- possível. No processo de empobreci-
rigo comunista, agradecemos aos mili- cas a Deus assim pela implantação do mento dos que são pobres para aumen-
tares que, com grave risco de suas vi- regime que "nos livrou do perigo co- tar a fortuna dos ricos, a concentração
das, se levantaram em nome dos supre- munista". Basta um exemplo para esta- de renda é a demonstração mais clara
mos interesses da Nação, e gratos so- belecer o contraste: da opressão e da injustiça de que é ca-

325
ar oranBss va.GNC.aaA, 4041334 3N00A , pós

a.

Banco de Dados/FSP
0
%-
3o[-
(al
Oo
oo
82
d)

Dois momentos da Igreja no Brasil. Logo após o golpe, o ... no fim do "milagre", em 74, as críticas ao regime. Acima,
apoio da CNBB (acima, reunião em julho de 1964, com dom da esq. p/dir.: dom Avelar Brandão, dom Aloísio Lorscheider,
Agnelo Rossi à esq.) e... pres. da CNBB, e dom Ivo Lorscheiter

paz a estrutura de propriedade privada ser, como o professor Cândido Mendes mente admirado por sua extraordinária
dos meios de produção, em que se fun- chamou com propriedade num de seus originalidade, se deve às igrejas das ir-
damenta Oo atual sistema brasileiro livros, a esquerda católica brasileira. mandades leigas, entidades mistas que
(...). A ausência de liberdade, a vio- de alguma forma conseguiam fugir ao
lência da repressão, as injustiças, o em- Aplauso ao golpe foi resultado
menos em parte da canga do Estado.
pobrecimento do povo e a alienação de um momento de medo Uma Igreja de funcionários do Estado,
dos interesses nacionais ao capital es- ou quase isso, era, já se vê, fragílima,
trangeiro não podem constituir sinal de Das entidades leigas da Igreja só sob o ponto de vista doutrinal ou pasto-
que O Brasil tenha encontrado o cami- apóiam o golpe ostensivamente - e ral. A reação contra isso está na Ques-
nho de sua afirmação histórica." portanto aplaudem aquele documento tão Religiosa, um dos três grandes as-
Esse documento, conhecido como - a Pia União das Filhas de Maria e as suntos políticos que dominaram os 67
Eu Ouvi os Clamores do meu Povo, de 6 Congregações Marianas masculinas, anos do Império do Brasil, segundo o
de maio de 1973, é encabeçado pelas ambas tão piedosas como tradicionalis- historiador Antônio Carlos Vilaça. As
assinaturas de dom Hélder Câmara e tas e conservadoras, uma visão de outras duas foram a Guerra do Para-
do bispo-auxiliar de Olinda e Recife, Igreja parada no tempo. A própria hie- guai e a Abolição da Escravatura.
dom José Lamatine Soares, seguindo- rarquia não seria tão conservadora, Na Por aí se vê a importância da Ques-
se as assinaturas de quinze outros bis- verdade, o documento de aplauso ao tão Religiosa ou Questão dos Bispos,
pos e padres representantes das quatro golpe de 64 - tudo está a indicar - foi como ficou conhecida. Mal estudada,
subdivisões regionais do Nordeste na resultado de um momento de medo. como quase tudo no Brasil, ela cos-
CNBB. Pouco depois os textos dos bis- Bons representantes da classe média tuma ser empurrada goela abaixo aos
pos iriam tornar-se ainda mais políticos brasileira, na segunda metade do sé- nossos estudantes secundários como
e até ideológicos, como mostra a culo, os bispos também viviam apavo- uma briga entre a Igreja e a maçonaria,
Comunicação Pastoral ao Povo de Deus, rados com o fantasma do comunismo, quando é na verdade uma rebeldia da
documento oficial da CNBB, Rio de permanentemente invocado pela cha- hierarquia, paradoxalmente através de
Janeiro, 25 de outubro de 1976, que mada classe conservadora (de que sua ala mais conservadora, contra a de-
trata já da impunidade de policiais cri- ideologicamente a classe média é uma pendência da Igreja ao Estado, situa-
minosos, da má distribuição de terra, parte, pois lhe vai a reboque) e pelo seu ção que os bispos mais ortodoxos não
da situação dos índios e de segurançà braço armado: os generais e coronéis, aceitavam mais: eles queriam ligar-se
nacional e segurança individual, entre Cedo eles descobriram que o perigo direta e exclusivamente ao papa e inde-
outros itens. Vale a pergunta: teria mu- para o povo brasileiro era bem outro: a pendência absoluta em relação ao Es-
dado a Igreja ou o Regime Militar? miséria e a injustiça. Agora vejamos o tado. Dom Vital, bispo de Olinda, e
Uma abordagem cuidadosa, de sentido peso da herança que carregava aquela dom Antônio de Macedo Costa, bispo
histórico, vai mostrar que a Igreja é que Igreja medrosa que redigiu o docu- do Pará, os líderes do movimento, aca-
mudou. mento divulgado a 2 de junho de 1964. baram presos, condenados a quatro
A Igreja que, através de sua hierar- Até a República, o clero e a Igreja anos. Cumprida pouco mais de uma
quia, apóia o golpe de 64 é uma Igreja no Brasil sempre estiveram atrelados quarta parte da pena, foram anistiados.
em processo de mudança, uma Igreja ao Estado, através do instituto do Pa- Deixaram a semente. O Império dura-
dividida. A Ação Católica, através da droado, pelo qual o rei de Portugal, e ria pouco. A República trouxe afinal a
qual finalmente o leigo começa a ter depois o imperador do Brasil, é que no- separação entre Igreja e Estado com
participação na Igreja, no Brasil, de- meava os bispos e páracos e fundava que eles sonharam e pela qual lutaram.
pois de séculos de silêncio, não apoiou paróquias e dioceses. Era a Coroa que Trouxe, porém, apenas a separação
o documento dos bispos. Sobretudo recolhia os dízimos e os devolvia, bem oficial. Frágil, plantinha tenra, apenas
através da JUC (Juventude Universi- mais magros, como salários dos padres expelida do útero confortável do Es-
tária Católica), estava em franco desen- ou para as obras da Igreja. A riqueza tado, a Igreja no princípio não supor-
volvimento nessa época o que viria a do barroco brasileiro, até hoje mundial- tava a luz cá fora. Vivia em permanente
326
Br pransss va.onciama, 84 0424334 8n00a,p%o

aproximação com o governo, aproxi- Separada do Estado


mação que não poucas vezes foi tam- desde a República a
bém cumplicidade e submissão. Com Igreja vivia, porém, em
características ligeiramente alteradas permanente
aqui e ali, isso durou durante toda a aproximação com os
República Velha, a revolução de 30, o sucessivos governos e
Estado Novo e o regime constitucional sem divergências sérias.
Ao lado, no alto, dom

FGV/CPDOC - Arquivo Getúlio Vargas


de 46, até Juscelino Kubitschek. Nunca
houve divergências sérias entre a Igreja Sebastião Leme,
e os governos republicanos até 1930, superarcebispo do Rio de
nunca uma denúncia. O cardeal Leme, Janeiro, e o presidente
o segundo do Brasil (o primeiro foi. Ar- Yargas (em 1938),
coverde, ambos do Rio de Janeiro), era amigos íntimos. Com o
íntimo de Getúlio. Podia até não amar governo JK, a
a ditadura, como de certo não amava, intimidade entre Igreja e
mas não tinha como combatê-la e ad- Estado atingiu seu ponto
mirava a figura bonachona e sorridente máximo. Nessa época, já
do ditador de charuto na boca. Não ha- existia a CNBB,
via ainda a CNBB e dom Leme, incar- concebida em 1952 por
dinado na arquidiocese da capital do dom Hélder Câmara, e
País, era uma espécie de superarce- começava a nascer um
bispo com quem o presidente tratava espírito de
de todo e qualquer problema de al- questionamento. A
guma forma ligado à Igreja no Brasil. amizade de dom Helder
e Juscelino (ao lado,
No governo JK a intimidade abaixo) era tanta que
chegava a prejudicar o
Igreja e governo chega ao máximo
espírito crítico do bispo
Foi assim até o governo de Juscelino,
quando a intimidade entre Igreja e go-
verno no Brasil atingiu seu ponto má- 8o
ximo. É verdade que aí já havia a 2
O
CNBB, concebida, estruturada e assen- o
ao
tada por dom Hélder Câmara em 1952, e
e começava a nascer um certo espírito 5
4
crítico, um espírito de questionamento.
Mas a intimidade pessoal entre Jusce- mudança - e portanto dividida - que o das injustiças, a encorajadora de todo
lino Kubistchek e dom Hélder Câmara golpe de 64 encontrou no Brasil. Essa um esforço de promoção humana".
era tanta que chegava a prejudicar esse Igreja que, medrosa, assustada, deu Em função dessa virada, a Igreja co-
espírito crítico. Dom Hélder, que nos uma freada no movimento de promo- nhece o mais belo período de seus
doze primeiros anos de existência da ção humana que então iniciava, já quase cinco séculos de história no Bra-
CNBB foi seu secretário-geral, já se agora com o respaldo vigoroso do Papa sil. É o período de perseguição, no qual
tornara uma das grandes figuras do João XXIII e suas encíclicas Mater et a Igreja no Brasil se encontra com a
episcopado nacional. Mais tarde, ele Magistra (1961) e Pacem in Terris Igreja primitiva, a Igreja das Catacum-
próprio reconheceria que essa intimi- (1963). Foi essa Igreja que produziu o bas, do Império Romano, perseguida
dade era "perigosa". Não no plano pes- documento de apoio ao golpe militar à do primeiro ao quarto século. É o
soal, evidentemente, que amigos ambos boliviana que derrubou o presidente período em que a Igreja no Brasil se re-
permaneceram até a morte de Jusce- constitucional João Goulart, após dime de tantos anos apagados e de me-
lino. Mas é que, como político, a figura trama sorrateira iniciada em Washing- diocridade, nos quais o heroísmo - no
humana cativante de Juscelino não re- ton, como hoje se prova com rigor do- sentido cristão da palavra - foi sempre
presentava nenhuma virada no sentido cumental. Em pouco, porém, os bispos uma exceção, embora dele sempre
de um governo popular, necessidade brasileiros viram que estavam embar- houvesse focos de grandeza, mas ape-
que a Igreja começava a sentir, com a cando numa canoa furada e saltaram nas focos, aqui e ali. Depois de 64, do
promoção dos leigos iniciada através logo que ela começou a fazer água para golpe, a partir da repressão, num grau
dos movimentos de Ação Católica, viver a fase mais expressiva dos quase até então desconhecido em nossa his-
cedo estendidos à juventude estudantil, quinhentos anos de sua história no Bra- tória, a Igreja, não é exagero dizer,
onde viriam a adquirir contornos revo- sil, atuou como um todo, o que é facil-
lucionários. Foi uma virada brusca, como lembra mente explicável.
Padres e religiosos assistentes da ju- o mesmo dom Hélder Câmara nunca Tudo no País, mas rigorosamente
ventudeda Ação Católica começaram suficientemente citado. Os militares tudo, ficou de uma forma ou de outra,
então a influenciar seus bispos; os bis- golpistas teriam motivos de sobra para mais aqui, menos ali, sob o domínio do
pos começavam a somar a riqueza de se espantar. Diante da violência da re- poder militar arbitrário. A Igreja, não.
algumas dessas experiências, reunidos pressão, de um lado, e da concentração Foi a única exceção, o último refúgio -
na CNBB. Mas era apenas o começo. de renda, de outro, que tornava agres- e isso lhe deu forças. Até porque, desli-
E, como reza a experiência, o começo siva a pobreza e insuportável e nada gada do Estado, o Estado não tinha
é sempre difícil, anda-se sempre às cristão o fosso a separar ricos muito tri- como controlá-la. O Estado era impo-
apalpadelas, qualquer tropeção maior cos e pobres cada vez mais pobres no tente, por exemplo, para tirar dom
assusta. Foi essa Igreja em processo de País, a Igreja passou a "denunciadora Paulo Evaristo Arns da arquidiocese de

327
BR DFANBSB V8.GNC.AAA 2404333 4an coa , py44

Juca Martins/F4
Sérgio Tomisaki/Banco de Dados

Pedro Martinelli/Abril Press


A repressão política e a alta concentração de renda levaram
a Igreja à denúncia e à aproximação com os pobres.
à dir., ato ecumênico pela morte de Wladimir Herzog, Acima,
em 1975, na Sé, SP; ao alto, missa para camponeses
região do Araguaia, em 1980. Com a desagregação do Regime na
Militar, em 1984, porém, surgia internamente
a polêmica em torno da Teologia da Libertação,
en volvendo frei Boff (acima, à esq.)

São Paulo, como certamente desejaria, leigos ligados à Igreja amanhã. Mas
O Estado era impotente para calar as Boff, tivesse que apresentar explica-
nunca conseguiu compreender que a ções à hierarquia da Igreja em Roma,
denúncias de dom Hélder em Paris, de- Igreja cresce no que Ivo Lesbanpin
núncias sobre as torturas, sobre os as- no segundo semestre de 1984, Essa via-
chamou admiravelmente num de seus gem de frei Boff deixou à mostra que
sassinatos, que foram tantos, sobre os livros de "a bem-aventurança da perse-
desaparecidos, O Estado era impotente existem dois blocos que se enfrentam
guição". Nem podia, porque os donos
para afastar dom Pedro Casaldáliga de na Igreja Católica.
do regime nunca tinham estudado his- Politicamente - e, formada por ho-
São Félix do Araguaia e do Brasil,
tória da Igreja. mens, a Igreja é tão política como qual-
como ardentemente desejou. Mas para
isso dependia do Papa e encontrou quer Outra instituição humana - é fácil
Na perseguição pelo regime,
sempre um firme obstáculo em Paulo definir esses dois blocos. Um tenta de-
a hora mais bela da Igreja fender a Igreja da opção preferencial
VI. O Estado era impotente para apli-
car aos dominicanos a solução pomba- pelos pobres, nascida - se se quer uma
No período de transição que o Brasil data - em Medellin, 1968, e reafirmada
lina da expulsão, como também dese- vive em 1984, a Igreja já não parece es-
jou. Assim, em determinado momento, em Puebla, em 1979. É o bloco que so-
tar tão compactamente voltada para freu sob a perseguição pós-64 no Brasil.
quando todo o País, todas as institui- um mesmo objetivo. Depois de uma
ções civis estavam esmagadas pelo ta- O outro, vencida a fase de perseguição,
crise Igreja/Estado, há a crise - durante tenta destruir esse bloco para estar bem
cão da bota, a Igreja era a única que anos encoberta pela outra - que dom
conseguia fustigar o regime autoritário. com qualquer governo que, não sendo
Pedro Casaldáliga chama com proprie- autoritário, não esteja também com-
Isso irritava o poder militar, que inves- dade de conflito Igreja/Igreja. Trata-se,
tia com fúria, mas só conseguia peque- prometido com o povo.
basicamente, da polêmica armada em
nas vitórias aparentes aqui e ali. Ex- torno da Teologia da Libertação e que
pulsava um padre estrangeiro hoje, fez com que um dos seus principais
prendia ou acuava padres, religiosos ou teóricos, o frei brasileiro Leonardo
Marcos de Castro
328
BRDFANBSB VB.GNCAMA, 849041834 An CO2, p 7a

POLÍTICA/RELAÇÓOES EXTERNAS: as relações Brasil-África em continuar de olhos fechados para os


movimentos de autodeterminação dos
povos africanos certamente teria resul-
tado na repetição do retumbante fra-
casso da investida à África esboçada
Negócios africanos
pouco antes, durante o governo do ge-
neral Garrastazu Médici (1969-74).
A partir do final da década de 70, cresce o comércio do Com o mesmo propósito de conquistar
novos mercados, o ex-chanceler Gib-
Brasil com a África, devido às mudanças na política
son Barbosa havia realizado uma piro-
externa do País técnica viagem ao continente africano
em fins de 1972. Para impressionar bem
No final de 1984, a empreiteira brasi- em Portugal, ocorrida um mês após a os africanos, ele chegou a posar mon-
leira Norberto Odebrecht assinou, em posse de Geisel no Palácio do Planalto, tado em um camelo em pleno deserto
Luanda, um fabuloso contrato de US$ em março de 1974. africano. O esforço de Gibson, porém,
650 milhões para a construção de uma foi inútil: o máximo que ele conseguiu,
enorme usina hidrelétrica sobre o rio Em poucos meses de 1974, o após visitar oito países da costa atlân-
Kwanza, no norte de Angola. A nova Itamaraty abre dez embaixadas tica da África, foi assinar um punhado
hidrelétrica terá, quando pronta, uma de acordos genéricos que nunca ti-
potência de 520 mil quilowatts e será a Assim, tentando recuperar o tempo veram qualquer consequência prática.
maior obra já realizada naquela ex- perdido, em poucos meses o Itamaraty
colônia portuguesa., abria mais de dez novas embaixadas do O Brasil foi o 94o país a
Apesar da grande divulgação dada Brasil no continente africano. Como reconhecer a Guiné-Bissau
ao acontecimento, a escolha da cons- era inevitável, as lembranças do pas-
trutora Norberto Odebrecht pelo go- sado afloraram de forma amarga por O resultado dessa tentativa de apro-
verno angolano para executar o em- ocasião do estabelecimento-de relações ximação com a África feita no governo
preendimento não é um caso isolado. com as ex-colônias portuguesas. Cau- Médici não poderia ser diferente,
Ao contrário, é cada vez maior onú- sou impacto, na época, a indagação levando-se em conta as posições retró-
mero de empresas brasileiras operando feita por um dos líderes da Frente de gradas adotadas pelo Itamaraty em re-
na África, seguindo o caminho aberto Libertação de Moçambique (FRE- lação às principais questões africanas.
ao final dos anos 70 pela construtora LIMO), Joaquim Chissano, ao respon- Até início de 1974, os delegados bra-
Mendes Júnior. No final do segundo der a uma pergunta sobre a possível co- sileiros da ONU (Organização das
semestre de 1984, a construtora An- laboração entre o Brasil e Moçambi- Nações Unidas), invariavelmente
drade Gutierrez, por exemplo, estava que independente: "Teria o Brasil tido abstinham-se de votar ou votavam con-
construindo uma estrada de 130 quilô- interesse em cooperar com a FRE- tra resoluções condenando o colonia-
metros na República Popular do LIMO para libertar Moçambique?" lismo, a discriminação racial e a polí-
Congo (ex-Congo Francês), enquanto A eventual insistência do Itamaraty tica de "desenvolvimento separado" da
perto dali outra empreiteira brasileira,
a Guarantã, dirigia as obras da nova
sede do Ministério das Finanças arge-
lino.
Esta intensificação dos negócios com
o continente africano é resultado da vi-
rada verificada durante o governo Gei-
sel (1974-79) na política externa brasi-
leira em relação à África - mais preci-
samente, em relação à África negra, já
que nada mudou no que se refere ao
criticado relacionamento do País com a
África do Sul.
Impulsionada pela necessidade de
abertura de novos mercados para as ex-
portações, a política adotada na gestão
Geisel - a chamada política externa
"pragmática" - elegeu a África como
uma das principais prioridades da ação
do Ministério das Relações Exteriores.
E a primeira iniciativa tomada pelo ex-
chanceler Azeredo da Silveira para tor-
nar possível a aproximação foi jogar no
lixo da história a anacrônica política de
alinhamento diplomático com a chan-
celaria portuguesa - política esta que
se traduzia, fundamentalmente, no
apoio brasileiro ao colonialismo de
Portugal na África. A mudança da po-
sição brasileira foi naturalmente favo- Nofinal de 1972, o ex-chanceler Gibson Barbosa (acima) chegou a posar montado em
recida pela deposição do salazarismo um camelo em pleno deserto para impressionar os africanos

329
BR DFAN 8.GNC. , $4 3 33

zido. No primeiro semestre de 1984,


todo o comércio do Brasil com o conti-
nente africano, com mais de 45 países
soberanos, somou apenas US$ 1,3 bi-
lhão, montante que corresponde a me-
nos de 10% do total do comércio exte-
rior brasileiro nesse período (US$ 19,2
bilhões). Apenas para citar alguns dos
maiores países da África negra, foram
inteiramente nulas as transações co-
merciais do Brasil em 1983 com a So-
mália, Tchad, Uganda, Costa do Mar-
fim, Etiópia, Gabão, Marrocos, Quê-
nia, Tanzânia, República Centro Afri-
cana, Gana, Camarões, Serra Leoa e
Togo. Em termos culturais, as limitadas
relações com a África podem ser facil-
mente avaliadas pelo desconhecimento
que o povo brasileiro ainda tem da exis-
tência da maioria das nações africanas.
Quantos já ouviram falar de Burundi,
Congo-Brazzavile, Ruanda, Tchad,
Alto Volta, etc.?

Ligações com regime racista

prensa - Andrade Guitierrez


causam dissabores ao Brasil

O incômodo relacionamento do Bra-


sil com o governo racista da África do
Sul, por seu lado, constitui um capítulo à
parte. Por motivos injustificados, o
Brasil inclui-se entre os poucos países
(menos de 40) que ainda têm relações
diplomáticas com a África do Sul. Mais
Assessoria de

do que isso, ignorando o boicote eco-


nômico contra o regime de Pretória de-
cretado pela ONU, o Brasil mantém
um ativo intercâmbio comercial com
A partir de 74, cresce o número de empresas brasileiras operando na África, como
aquele país. Com um volume de negó-
a Andrade Gutierrez (acima, transporte de equipamentos da construtora no rio cios que chegou a quase US$ 90 mi-
Congo), devido sobretudo à mudança parcial da política externa do país. No lhões no primeiro semestre de 1984, a
alto, da esq. p/dir.: Joaquim Chissano, ministro de Moçambique; Abilio Augusto
África do Sul é o terceiro principal par-
Monteiro Duarte, ministro de Cabo Verde; Antonio Azeredo da Silveira, ministro das ceiro 'do Brasil no continente africano.
Relações Exteriores do Brasil; Maria Amorim, embaixadora de São Tomé e Este indesejável relacionamento é ou-
Príncipe; e Victor Maria Saude, ministro da Guiné-Bissau, em 75
tra herança deixada pelo Regime Mili-
tar, pois assumiu suas atuais propor-
África do Sul (o apartheid). Na assem- A reativação do intercâmbio do Bra- ções ao longo dos últimos 20 anos: até
bléia da ONU de 1973, por exemplo, o sil com a África que se processa nos 1964 o comércio do Brasil com a África
Brasil foi um dos sete países que vota- anos 80 não se faz em desacordo com do Sul era praticamente nulo. Além de
ram contra a independência da pe- os interesses das potências ocidentais. representar um entrave ao pretendido
quena Guiné-Bissau do jugo português. Muito pelo contrário, muitas das gran- aprofundamento das relações do Brasil
Quando esta posição foi reparada, des corporações multinacionais têm com o resto do continente africano, es-
no governo Geisel, não era possível aproveitado bastante esta aproxima- sas ligações com o regime racista de
apagar a dimensão do grande equivoco ção afro-brasileira, utilizando suas sub- Pretória têm custado frequentes dissa-
do Itamaraty: o Brasil foi o 94o país a sidiárias no Brasil, de modo cada vez bores à diplomacia brasileira no ce-
reconhecer a Guiné-Bissau, fato que mais frequente, para a ampliação dos nário internacional. O maior deles
representa uma dura ironia quando se seus negócios no continente africano. ocorreu em 1969, quando a inaugura-
lembra que o obá (rei) de Benin (hoje Dois dos principais produtos "brasilei- ção de vôos semanais da Sea-South
Nigéria) e seu vassalo, o obá Ajan de ros" exportados para Angola, por África Airways (a companhia aéreá sul-
Onin (atual cidade de Lagos), foram os exemplo, são o leite condensado e a fa- africana) ligando Johannesburg a Nova
primeiros a reconher a independência rinha láctea produzidos pela filial no Iorque, com escala no Rio de Janeiro,
do Brasil. Naquela época, ressalte-se, Brasil da Nestlé, Caminhões, furgões, provocou duros protestos na ONU sob
as afinidades do Brasil com a África camionetas, ambulâncias e automóveis a alegação de que os Estados Unidos e
eram bem maiores. A presença da também são vendidos aos angolanos O Brasil estavam proporcionando uma
África na economia brasileira, então pelas subsidiárias brasileiras da Ford, nova abertura comercial para a África
significativa, diminuiu aos poucos, sob da General Motors e Volkswagen. do Sul.
o peso do colonialismo europeu no Embora crescente, o volume global
continente africano. do comércio do Brasil ainda é redu- Teodomiro Braga
330
, p 84
BR DFANBSB VB.GNCAM. S4HOA/A331Aân002

como de seus limites. Há uma estreita


relação entre a pena e a cultura que a
produz. Seria impossível que as institui-
ções políticas no Brasil estivessem du-
rante toda a sua história embebidas
pelo autoritarismo e as prisões ficassem
imunes a essa continuidade.
Lembrando a denúncia do grande
precursor dos modernos críticos da pri-
são no Brasil, Evaristo de Moraes, as
prisões jamais obedeceram aqui a qual-
quer respeito à pessoa humana. Mesmo
nos momentos mais intensos da mobili-
zação popular, os partidos políticos ja-
mais transformaram a questão peniten-
ciária numa das faces da questão de-
mocrática. Basta lembrar que ne-
nhuma constituição política brasileira

Banco de Dados/FSP
se lembrou, no capítulo dos direitos, de
se preocupar com os direitos dos pre-
sós. Paradoxalmente, será a Constitui-
ção federal de 1967, criatura do Re-
gime Militar, que chamará a atenção
para a integridade física e moral do de-
As prisões no País jamais obedeceram a qualquer respeito à pessoa humana. Acima, a tento (Art. 158 8 14). Satisfação que du-
superpopulação carcerária na capital paulista, em 1954 rou pouquissimo, pois o novo golpe de
Estado que se seguiu, em dezembro de
1968, através do Ato Institucional no 5
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/SEGURANÇA: o sistema penitenciário no País
(AI-5), com a necessidade de assegurar
o rigor contra os presos políticos, tor-
nou inócuo esse dispositivo. A ditadura
crime impõe a necessidade de remover na
Escolas do
prática todas as garantias legais atribui-
das em tese ao encarcerado como titu-
Sobretudo nos últimos anos de autoritarismo, pelo desrespeito lar de direitos subjetivos. Agravam-se
as condições de existência nas prisões
à pessoa humana, as prisões tornaram-se escolas formadoras
em geral, severas limitações são feitas
do crime e fábricas de vinganças ao sistema de privilégios (já precariíssi-
mos) atribuídos aos detidos. Num
As prisões no Brasil sempre esti- cravos criminosos, com a obrigação su- tempo em que as garantias do cidadão
veram em crise. Não é um fenômeno plementar de que os escravos, após se- nas ruas estão suspensas, impossível as-
do presente, mas uma perversa conti- rem açoitados, fossem mantidos a fer- segurar os direitos dos condenados.
nuidade. Até quando é possível recuar ros pelo tempo que o juiz determi-
na história, os diagnósticos nessa área nasse. O saldo no Regime Militar é a
sempre constataram uma permanente Vem a República, em 1889, e abole situação de abandono do preso
falência. Nem o programa mínimo do as penas cruéis, infamantes ou "inutil-
inciso XXI, Artigo 179 da Constituição mente aflitivas". A prisão celular passa O balanço da "reforma" penitenciá-
Imperial de 1824,conseguiu-se pôr em a ser aplicada à generalidade dos cri- ria durante o autoritarismo é ambiente
prática: "As cadeiras serão seguras, mes. Em 1900, um relatório sobre a de promiscuidade, superlotação, convi-
limpas e bem arejadas, havendo diver- Casa de Correção no Rio de Janeiro vência de delinquentes de todos os
sas casas para separação dos réus, con- (que já servira para abrigar os escravos) graus, de doentes e até de menores,
forme suas circunstâncias e natureza informa que o ar é a luz não são recebi- ociosidade, brutalidade, liquidação da
dos seus crimes."' Cento e sessenta anos dos diretamente nas celas, provocando individualidade do condenado, humi-
se passaram e esses preceitos conti- anemias, dispepsias e escorbuto, No lhação. Todos os planos foram, no de-
nuam letra morta. presente,: como no passado, há um pro- polimento de vários funcionários,
Tudo neste país, nessa área das pe- fundo divórcio entre planos, resoluções pouco além da falsa indignação e da re-
nas e das prisões, é muito tardio. Aqui, e códigos e a realidade do sistema peni- tórica. O saldo desse longo percurso é a
sem se dispensar a pena de morte, um tenciário. Humilhação e aniquilação situação de abandono do preso no País
ano depois da independência política parecem ser a via privilegiada para a e a inutilidade do sistema penitenciário
em 1822, ainda vigoravam as penalida- reparação da ofensa, para a defesa da vigente. Não se investiu no sistema pe-
des do Livro V da Ordenação, onde es- segurança pública. nitenciário, abandonou-se à própria
tavam previstas mutilação das mãos, da Reforma do sistema penitenciário sorte a prisão, porque tratar os con-
língua, queimaduras com tenazes ar- brasileiro foi sempre uma dissimulação denados como subcidadãos, como se-
dentes, etc. Essas práticas sobrevivem justificadora. Naturalmente, o sistema res indignos de respeito aos direitos ci-
até o século 19, sem comedimento, de penas de toda a sociedade não é vis, corresponde a certa visão autori-
pelo menos em relação aos escravos. O qualquer coisa de isolado, mas parte in- tária do poder e da relação do poder
artigo 60 do Código Criminal de 1830 tegrante de seu inteiro sistema social, e com a sociedade. O sistema penal é o
mantinha a pena de açoite para os es- participa tanto de suas aspirações lugar onde o poder se mostra de forma
331
mais manifesta. O poder mostra como
a tirania pode ser levada até os mais
ínfimos detalhes sob altas justificativas
morais. Para o autoritarismo, o que se
passa na prisão não interessa, os que
cometeram crimes são responsáveis in-
dividualmente, a culpa precisa ser ex-
purgada através do sofrimento.
Quem perde com essa visão é a pró-
pria população. As prisões, as peniten-
ciárias, no Brasil, se transformaram em
escolas formadoras do crime. Ainda
que as pesquisas oscilem quanto aos
números precisos, seria realista dizer
que mais da metade dos condenados
egressos das prisões voltam ao crime. E
seria de espantar se assim não fosse.
Não se pode esperar que cidadãos se-

Juca Martins/F4
jam reconstruídos dentro de um espaço
de purêarbítrio, de esvaziamento de
quaisquer direitos fundamentais, os
presos submetidos às imposições dos
guardas de presídio, afinal os executan-
tes da pena. A pena dada pelo juiz nada
ou pouco tem a ver com o seu cumpri-
mento. Os prisioneiros estão ao bel dis-
por de pequenas autoridades adminis-
trativas, um tribunal interno nas peni-
tenciárias, sem regras fixas, sem defesa,
que por um sim ou por um não "con-
dena" os internos a isolamentos e a
castigos físicos. As humilhações são es-
tendidas às famílias dos criminosos,
submetidas a vexações que contribuem
para agravar o isolamento do preso, ob-
Jetivo máximo do sistema peniten-
ciário,

Desde o século 19 já existiam


comissões de presos nos EUA

A experiência realizada a partir de


1983 em São Paulo - onde medidas
nada revolucionárias foram ensaiadas
tentando interferir nessa situação de
arbítrio - suscitou enormes resistên-
cias. Porque ainda se acredita que a re- Nos 20 anos de autoritarismo, o saldo das prisões no
taliação contra os criminosos seja a me- País é o ambiente de
promiscuidade, superlotação (no alto, a Casa de Detenç
lhor forma de proteger a sociedade. As ão, SP, 1983), humilhação,
brutalidade, uma situação que às vezes levou à revolta.
comissões de presos, tão execradas, Acima, penitenciários
durante motim em prisão do Paraná, em 1984
não constituem nenhuma novidade e já
existiam nos Estados Unidos no co- mais de seis mil detentos, onde mal ca- anos de crise econômica, afirma um re-
meço do século 19. Ainda que organi- bem dois mil. latório da Comissão Teotônio Vilela
zar os condenados seja tarefa contradi- Mais do que mudanças formais, a es- para as prisões em 1984, e violência
tória e complicada, em razão das regras trutura das prisões deve ser colocada vinda do alto e perpetrada nos porões
que regem a "sociedade dos cativos" em questão, É difícil tocar nas prisões da sociedade dificultam qualquer ino-
(como dizia uma pesquisa de 1984 so- porque o sistema penitenciário é um nó vação; mas, se a população deseja o res-
bre as prisões em Minas Gerais e no no qual estão enredadas as contradi- peito aos direitos das vítimas, precisa
Rio de Janeiro), a intervenção dos con- ções básicas da sociedade: exercício do compreender a necessidade das mu-
denados em seu próprio quotidiano nas poder, controle social, repressão, au- danças nas instituições carcerárias, que
prisões parece essencial, sência de um pacto social legitimado são um cemitério de mortos-vivos para
É evidente que a exigência de es- pela democracia. Mas, sem intervir na seus internos e uma fábrica de vingan-
paço, mesmo que não mais se acredite prisão, é impossível quebrar o círculo cas sucessivas para os que delas saem e
na prisão, é prioritária para que qual- vicioso do aperfeiçoamento dos crimi-
quer intervenção possa ocorrer no sis- a elas retornam.
nosos que farão novas vítimas. Se qui-
tema penitenciário. Especialmente nas sermos defender as vítimas, ataquemos
condições de superpopulação: a Casa as prisões e enfrentemos sem disfarce a
de Detenção, em São Paulo, abriga situação dos presos. Anos de ditadura,
Paulo Sérgio Pinheiro
332
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, RA0433125 002, p 45
sr pranBsa va.GNC.aMa, 240413342002, o 746

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE VIDA: o lazer dos trabalhadores O descanso é sagrado, segundo reza
a Bíblia, mas na prática esse direito
nem sempre foi reconhecido e precisou
ser conquistado através de longa luta.
O direito ao lazer No final do século 19, de fato, esta
questão tornou-se explosiva. No
mundo inteiro, os trabalhadores agita-
Meio século após a conquista do dia de oito horas, o vam a bandeira do direito ao descanso
trabalhador ainda não dispunha de tempo para o lazer nem e se insurgiam contra essa "loucura do
amor ao trabalho", na frase do médico
tinha uma vida social saudável e político francês Paul Lafargue.
Da prisão, em 1883, Lafargue coor-
denou a edição de seu livro O Direito à
Preguiça, onde denunciava a prática en-
tão vigente de reduzir ao mínimo possi-
vel as necessidades do trabalhador -
em termos de lazer, de esportes, de cul-
tura ou de apenas gozar a vida: o dolce
far niente, dos italianos. Aceitar essa si-
tuação, dizia Lafargue, era "suprimir as
alegrias e as paixões dos trabalhado-
res", era "condená-los ao papel de má-
quina de gerar trabalho sem trégua e
sem piedade".
A luta dos trabalhadores, dessa
forma, visava a fixar a jornada de traba-
lho por lei, limitando-a a oito horas
diárias. Essa medida, segundo o movi-
mento operário da época, permitiria di-
vidir o dia em três períodos iguais, de
modo que, além da labuta cotidiana,
restassem Oito horas de sono e oito ho-
ras de tempo livre para os trabalhado-
res.

A partir de 1903, sindicatos


lutam pelo período de 8 horas

No Brasil, a bandeira das oito horas


de trabalho foi empunhada pelo grande
movimento dos trabalhadores condu-
zido, a partir de 1903, pelos primeiros
sindicatos surgidos no País. Mas os tra-
balhadores teriam uma longa luta pela
frente - em 1984, quase cem anos de-
pois, essa luta ainda não se tinha encer-
rado.
O crescimento das reivindicações
trabalhistas confluiu para uma grande
greve, em 1906, iniciada pelos empre-
gados das ferrovias de São Paulo. Os
trabalhadores exigiam melhores sa-
lários, fim do desemprego, além da jor-
nada de oito horas e a regulamentação
do trabalho da mulher e dos menores.
Essa luta demorou a dar resultados.
Em 1912, por exemplo, nas indústrias
têxteis paulistas, trabalhava-se de 12 a
13 horas diárias. Em 1920, a média da
jornada no Estado de São Paulo andava
em torno das dez horas diárias, seis dias
por semana. Mas, em 1926, a situação
começou a mudar. Os trabalhadores
conseguiram impor a jornada de seis
horas para os menores. Então, em
1932, primeiro os trabalhadores do co-
mércio e em seguida os da indústria
conquistaram a jornada de oito horas -
a partir daí transformada numa exigên-

333
SR DFANBSB VB.GNCAAA, 84043334 an oo a F 7%

cia da Constituição, no Brasil. para 30 dias. Em 1977, o Regime Mili- feira a sábado. Dito de outra forma,
O sentido da luta mudou: era pre- tar introduziria uma alteração: 30 dias cerca de 12,3 milhões de trabalhadores,
ciso, então, garantir a aplicação da lei. corridos e o trabalhador poderia "ven- de um total de 43,8 milhões, estavam à
De fato, mais de '50 anos depois, na der" (receber em dinheiro) dez dias das margem da lei.
prática, categorias inteiras permane- suas férias. Mas o tempo livre não era reduzido
ciam à margem da Constituição, como apenas pelo aumento do tempo de tra-
era o caso das empregadas domésticas, Trabalhadores são comumente balho. Os trabalhadores consumiam
que apenas em 1972 obtiveram o di- forçados a "vender" as férias seu descanso também fora do trabalho:
reito de ser registradas no Ministério por exemplo, através do transporte.
do Trabalho. Esse problema, além No entanto, como no caso das horas Era inútil fixar o tempo de trabalho, se
disso, não se restringia às domésticas, já extras, esse período de descanso anual o trabalhador, com o crescimento das
que em 1983, 29% dos trabalhadores seria extremamente ameaçado pelos cidades e da rotatividade de emprego
assalariados no Brasil não possulam salários baixos e pela má vontade de (que muitas vezes o afastava de sua resi-
carteira assinada. muitos empregadores: os trabalhadores dência). precisava gastar cada vez mais
Em segundo lugar, mesmo os traba- eram comumente forçados a "vender" tempo para chegar ao emprego - con-
lhadores formalmente incorporados ao todas as suas! férias, alienando com elas sumindo aí o seu tempo teoricamente
"mercado de trabalho" eram vítimas também o seu direito ao descanso. No- livre. Juntavam-se ainda ao transporte
frequentes de inúmeras espertezas que vamente em São Paulo, nos anos 80, outras exigências práticas e inevitáveis,
lhes rgiibavam o &ireito ao tempo livre. uma proporção espantosa de trabalha- como o tempo para o almoço, a higiene
O primeiro destes expedientes era a dores confessava ter que trabalhar du- pessoal e outros afazeres de rotina. Na
praga epidêmica das horas extras, que rante as férias: 47,7%. Essa cifra, média melhor das hipóteses - em regiões
muitas vezes invadiam o fim de semana para três setores da economia - cons- onde o transporte era mais fácil -, res-
do trabalhador. Em 1979, 10% do trução civil, metalurgia e comércio -, tavam menos de quatro horas de tempo
tempo total empatado na produção era chegava a 86,6% no caso das construto- realmente livre para o trabalhador estu-
constituído por horas extras. Aliado a ras. Em resumo, a soma do tempo livre dar, divertir-se, conviver com a família
esse expediente, também as férias aca- que restava ao trabalhador, em 1982, e amigos, fazer compras ou participar
baram tornando-se vorazes devorado- eeressaya-se nos dados divulgados de suas associações. Esse tempo foi me-
ras de tempo livre, Em 1925, o direito a pela revista Veja (14/04/82); quase um dido de modo rigoroso na periferia de
férias remuneradas, sem prejuízo do sa- terço da força de trabalho no Brasil São Paulo, através de um estudo reali-
lário, tornou-se lei, inicialmente restri- cumpria uma jornada de mais de 48 ho- zado em 1977 pela Emplasa (Empresa
tas a 15 dias por ano. Já na CLT, em ras semanais, em flagrante violação do Metropolitana de Planejamento da
1943, o período de férias foi ampliado limite de oito horas diárias de segunda- Grande São Paulo S.A.).
ª

Um dia na vida de um trabalhador

Este mora longe do trabalho. Seu tempo livre é de 1h 20m

1h 20m __

!!! Trabalho (considerou-se a jornada legal de


48 horas semanais, distribuídas em 5 dias)
Transporte (ida e volta para o trabalho)
Refeições e higiene pessoal
#! Sono
ENS Tempo livre

OBS: no item refeições e higiene pessoal foi considerado o seguinte:


15m - café da manhã
1h - almoço
30m - jantar
30m - banho. etc.

Fonte: para tempo gasto em transporte para o trabalho - Pesquisa 0-D - Emplasa 1977 vol. 4

334
BR DFANBSBVB.GNC.AMA, 1334 an002, o 57%

Reduzido a um ideal pela metade, vendo em más condições, o trabalha- para 75,2% das pessoas. Os autores da
precário e curto demais diante do que a dor passou a concentrar seu pouco pesquisa chamavam a atenção para o
lei garantia, o tempo livre do trabalha- tempo livre em opções individuais fato curioso de que 0 rádio e a tevê
dor seria ainda prejudicado pela falta igualmente precárias. Na maior parte não eram, no entanto, considerados
de opções de divertimento, O triste la- dos casos, isso significava simplesmente uma forma de lazer pelas camadas de
zer reservado aos trabalhadores, de "descansar" ou então ver televisão - baixa renda. Entre as formas mais co-
fato, seria dramaticamente ilustrado formas passivas de lazer que pouco di- muns de recreação, surgiu com fre-
por uma série de pesquisas realizadas feriam de uma simples "recuperação quência a resposta "não fazer nada": si-
em São Paulo no início dos anos 70, de forças" num ciclo interminável de tuação de até 48% das pessoas, Ou "vi-
Uma das conclusões desse trabalho as- trabalho. sitar amigos e parentes", resposta de
severava que, na periferia, "o paulis- aproximadamente 20% dos trabalhado-
tano não tem para onde fugir, sendo o Trabalhadores não tinham vida res paulistas entrevistados por Sarah
tédio o seu único caminho. O tédio, de- social, indicam pesquisas Bacal em 1978 para elaboração de sua
pois o esgotamento nervoso e por fim a tese Realidade e Uso do Tempo Livre.
loucura configuram os estágios dessa De modo geral, os trabalhadores não Dai, talvez, a grande preocupação dos
motivação neurótica". tinham vida social. Era o que indicava trabalhadores com a construção de
Não era difícil situar as condições uma pesquisa de 1971, coordenada parques e áreas livres. O futebol, ao
que levavam a essa terrível advertência. pelo economista Paul Singer e reali- contrário do que se poderia imaginar,
Com o crescimento das cidades, du- zada na periferia de São Paulo. Apenas foi citado por apenas 6,5% dos entrevis-
rante o rápido desenvolvimento do 3,1% dos entrevistados disseram per- tados como forma importante de diver-
País, principalmente após a Segunda tencer a sociedades de bairro, por exem- timento e descontração.
Grande Guerra, os trabalhadores fo- plo. Nas associações religiosas, a média Não admiraria, portanto, se o Bra-
ram cada vez mais forçados ao corre- era apenas um pouco maior: 8,4%. E, sil de cem anos atrás parecesse um lu-
corre e ao isolamento social. As formas mesmo em clubes, a participação não gar mais aprazível para se viver. Os tra-
de distração e divertimento passaram a passava de 17% - um pouco maior para balhadores, então, concentravam-se
depender em larga escala de equipa- os jovens e homens (23,5%) do que quase que exclusivamente no setor ru-
mentos coletivos - em parques ou em para as mulheres ou pessoas de meia i- ral. Estavam predestinados a uma vida
clubes, por exemplo, estes equipamen- dade. rude e simples e não tinham os direitos
tos geralmente estavam fora do alcance A "participação", na verdade, mais elementares. Mas, ainda assim, a
da grande maioria da população. restringia-se, em grande parte, a ouvir própria rotina do trabalho no campo
Arrancado do campo para a cidade rádio - hábito de 80% dos entrevista- assegurava um tempo livre aos traba-
nos anos de urbanização acelerada e vi- dos - ou ver tevê, atividade rotineira lhadores, nos longos meses entre o
km.—
W

Um dia na vida de um trabalhador

Este mora perto do trabalho. Seu tempo livre é de 3h 45m

Trabalho (considerou-se a jornada legal de

48 horas semanais, distribuídas em 5 dias)

Transporte (ida e volta para o trabalho)


Refeições e higiene pessoal

"Sono
livre

335
BR DFANBSB V8.GNCAMA, $404 2384 an gor
; P 79

plantio e a colheita. E não faltavam al- festa foi no Bosque da Saúde: "Ao balhadoras e para a fragmentação de
ternativas de lazer coletivo, como os meio-dia havia mais de mil operários sua vida social. A televisão tornou-se o
bailes ou as festas religiosas. no Bosque. Correu abundantemente a grande símbolo do chamado lazer pas-
As festas religiosas eram também o cerveja e o vinho ( . . .). Um jovem ope- sivo, penetrando mesmo no interior
ponto alto das formas de lazer nas cida- tário discursou sob muitos aplausos, através das redes de estações retrans-
des emergentes no final do século 19, concitando à solidariedade. A tarde, ao missoras, As pesquisas nos anos 80
segundo a historiadora Judith Elazari. som de três bandas, iniciou-se um baile- mostravam que a televisão era a cam-
"Passear, conversar, dançar, eis algu- monstro, com mais de 200 pares dan- peá absoluta na lista de afazeres das
mas das formas características dessa so- cando até o cair da noite." donas-de-casa, absorvendo um quinto
ciabilidade nos intervalos de ócio." A
de todo o seu dia. Estava acima das ta-
Festa de Nossa Senhora da Penha, em Somem os circos dos bairros e refas de "limpeza" (18% do tempo) e
um bairro paulistano, ocupava então
rareiam os bailes populares de "cuidados com os filhos" (15%), res-
um lugar de destaque, espalhando-se tando para o "lazer e divertimentos" da
por toda a cidade. Promovida pela O lazer coletivo começou a perder dona-de-casa apenas 4% do dia.
Igreja, a festa também se ligava profun- terreno com a industrialização e a ur- Estes números espelhavam uma si-
damente aos festejos de rua. "O povo banização e acompanhou de certa tuação muito semelhante à que levou
divertia-se com jogos de azar, bebidas", forma, a fragmentação da cultura e da ao desabafo contido numa carta do
escreveu Elazari; organização popular. Ao mesmo tempo pensador e político italiano Antonio
A Partir de 1870, começou a se ex- que o circo sumia dos bairros populares Gramsci, endereçada em 1915 a uma
pandir o carnaval de rua e, na entrada - onde era muito comum no início do de suas irmãs. Então um jovem estu-
do século 20, o 1o de Maio - a grande século -, também rareavam os bailes dante, obrigado também a trabalhar
festa dos trabalhadores - começou a se populares. Com a introdução do rádio duramente para ganhar a vida,
tornar um importante momento de di- e do cinema, escasseavam os cantado- Gramsci escreveu ao final daquele ano:
versão e lazer. O jornal Fanfulha, em res e violeiros, ainda existentes no Nor- "Acho que trabalhei demais. Trabalhei
1907, noticiou um dos piqueniques fa- deste. para viver, mas, ao mesmo tempo, para
mosos do 1o de Maio, organizado nesse Em seguida ao golpe militar de 1964, viver, eu teria que repousar, teria que
caso pelo Centro Socialista Internacio- criaram-se as condições para a esmaga- me divertir."
nal, um grupo operário da época. A dora massificação das populações tra-

Ilustração de Maringoni

336
BR DFANBSB VB.GNCAMA, 24044334 ân CO 2 , p 80

ECONOMIA/DISTRIBUIÇÃO DA RENDA: a concentração da renda e da riqueza (1960-830)

Indicadores da miséria

Nos últimos anos, a concentração da renda pessoal no País tornou-se uma das maiores
do mundo. Assim, se uma minoria podia im tar os padrões de vida das classes altas da
Europa e EUA, milhões de brasileiros se debatiam num quadro de miséria

O conteúdo das latas de lixo é um vimentista do "milagre econômico" lações mais pobres, predominavam os
bom indicador do desenvolvimento e da (1968-73), não poderiam deixar detritos orgânicos - restos de comida
riqueza de um povo e, também, um de exibir com orgulho mais aquele indi- não-sofisticada -, ao contrário da Zona
bom indicador das disparidades no usu- cador do "Brasil Potência" que se Sul, onde estão os bairros mais ricos.
fruto dessa riqueza. A quantidade de construía. A pesquisa da Columrb mos- O lixo carioca só era comparável ao das
produtos industrializados consumidos trou que 34% do peso do lixo carioca cidades dos países mais desenvolvidos
pela população reflete-se no lixo pela era composto por papel, papelão e quando analisado juntando num
presença de muito papel, papelão e plástico, número jubiloso, conside- mesmo saco a matéria desprezada por
plástico, em grande parte embalagens rando que a presença desses materiais pobres e ricos., Em outras palavras, o
que se jogam fora. Em 1977, a Divisão no lixo só ultrapassava os 50% em lixo do Rio era "desenvolvido" na mé-
de Pesquisas e Tecnologia da Columrb, países de alto grau de desenvolvimento, dia, desprezando-se asa*disparidades en-
a companhia de coleta do lixo do Rio como os Estados Unidos e a Alemanha tre o lixo dos pobres e dos ricos.
de Janeiro, pesquisou a composição Ocidental. Estava, pois, até o lixo a in- A mesma ilusão é provocada pela
físico-química do lixo do Rio e con- dicar que o Brasil ia para frente. Pura leitura de outros indicadores do desen-
cluiu que, na média, ele era parecido ilusão, no entanto. volvimento brasileiro quando se abstrai
com o de uma cidade de país desenvol- A mesma pesquisa revelou também a realidade da estratificação social.
vido. Os ufanistas, que àquela altura que no lixo. dos bairros da Zona Norte Por exemplo, o PIB (Produto Interno
ainda festejavam o boom desenvol- do Rio de Janeiro, onde vivem as popu- Bruto), a riqueza nacional produzida
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Amilton Vieira/Abril Press


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num ano, é uma grandeza que, de certo acordo com os critérios da pesquisa era declarantes; não incluem, portanto, a
modo, tem significado inverso ao do composta pelas famílias comrendimento renda em espécie produzida e autocon-
lixo. mensal de Cr$ 3,4 milhões, correspon- sumida por trabalhadores autônomos,
Entre 1960 e 1980, o PIB do Brasil dia a pouco menos de 8% da população como pequenos camponeses; em con-
foi multiplicado por quatro - de US$ 55 e abocanhava quase 62% de tudo o que trapartida, não registram a riqueza pa-
bilhões para US$ 228 bilhões -, estava à venda nas cidades. trimonial (como casas e automóveis),
tornando-se o décimo maior do mundo Esses dados evidenciam uma con- que geram rendas "invisíveis" para os
e o terceiro das Américas. Entretanto, centração excepcionalmente alta da ren- declarantes ricos.
na década de 80, milhões de brasileiros da e da riqueza produzidas no País. Depois de 1970, o IBGE passou a rea-
ainda se debatiam num quadro de mi- Por outro lado, ao se refletir na estru- lizar, trimestralmente, as Pesquisas
séria: não conseguiam um trabalho per- tura do consumo, essa disparidade in- Nacionais por Amostras de Domicílio
manente e não ganhavam o suficiente fluencia diretamente a estrutura de (PNADs), que incluem o levantamento
para sequer ter acesso ao padrão de ali- produção. É claro que, estando muito dos rendimentos monetários da Popu-
mentação, instrução e moradia que concentrada a renda, e sendoa produ- lação Economicamente Ativa, tor-
nossa própria sociedade já considerava ção orientada pela busca do lucro nando possível, dentro das limitações já
mínimo. Outro número grande de maior e mais garantido, são produzidos apontadas, acompanhar a evolução da
famílias não passava do nível da subsis- sobretudo os bens e serviços em que a partilha da renda pessoal entre um
tência. Contra esse pano de fundo se minoria privilegiada está interessada e censo e outro. A partir dos dados dos
desenvolveu, no Brasil, o consumo sun- pode adquirir. Assim, capitais escassos, censos de 1960, 1970 e 1980, mais as
tuário das camadas altas e a imitação recursos naturais exauríveis e horas de PNADs de 1976 e 1981, conclui-se que,
cabocla da "sociedade de consumo" trabalho valiosas são desviados para no Brasil, a distribuição pessoal da ren-
existente nos países capitalistas desen- produzir bens e serviços de utilidade da é extremamente desequilibrada e
volvidos. social discutível, como automóveis, ali- regressiva, isto é, tende a beneficiar os
A despeito do inegável surto de ex- mentos finos, etc., enquanto necessida- que já têm muito. Em 1981, 1% da po-
pansão de 1968 a 1973, estimativas le- des vitais de largas faixas da população pulação tinha uma parcelà da renda
vantadas pela empresa publicitária Lin- deixam de ser atendidas. quase igual a de 50% da população. Os
tas, em 1974, indicavam que o poten- S% mais ricos abocanhavam um terço
cial de consumo do mercado interno de toda a renda, apenas um pouco me-
estava concentrado em apenas 123 ci- nos do que dispunha 80% da população
dades dos quatro mil municípios brasi- mais pobre.
leiros, abrangendo cerca de um terço A fonte mais importante de dados Desde a instalação do Regime Mili-
da população na época. Outra pes- sobre a distribuição pessoal da renda tar, a concentração de renda agravou-
quisa, feita pela RBP Pesquisas de no Brasil são os censos demográficos se, A participação dos 50% mais pobres
Mercado, em 1973, apurou que 6% da realizados pelo IBGE de dez em dez na renda, que já era de somente 17,4%
população eram responsáveis pelo con- anos. Desde 1960, além dos dados po- em 1960, caiu para 14,9% em 1970 e es-
sumo de 28,5% dos produtos industria- pulacionais, o IBGE recolhe, por amos- tava em 12,2% em 1983, A fatia dos in-
lizados existentes no mercado. Em ou- tragem, informações sobre os rendi- termediários também caiu de 27,8%, em
tubro de 1984, a revista Veja publicou mentos da População Economica- 1960, para 23,2% em 1983. Já a quota
um resumo do trabalho realizado pela mente Ativa. São dados sujeitos a limi- dos 20% mais ricos se elevou (de 54,8%
Target, uma empresa de serviços es- tações, no entanto. Baseiam-se em de- da renda, em 1960, para 69,6% em
tatísticos, que compilou o comporta- clarações das pessoas recenseadas, o 1983). E aumentou sobretudo a parcela
mento do consumo nas áreas urbanas que sempre conduz a subestimativas das dos muito ricos e riquissimos.
de 1.023 municípios de todos os Esta- rendas mais altas. Limitam-se aos ren- O próprio ex-ministro da Fazenda
dos. A chamada "classe A", que de dimentos monetários recebidos pelos Mário Simonsen, em seu livro Brasil

338
BR DFANBSB 84043334 àn 0a , p 81
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 404/32 P [del

deputado federal Eduardo Matarazzo


Suplicy (PT-SP) tem feito esforços
nesse sentido. Outros economistas in-
vestigaram a distribuição funcional da
renda em setores específicos. É o caso
das pesquisas pioneiras de Roberto
Macedo e Walter Barelli sobre a indús-
tria de transformação e os bancos co-
merciais, respectivamente.
Os estudos desses economistas leva-
ram em conta dados até o ano de 1975.
A despeito de não haver estudos mais
recentes, fica claro que também na dis-
tribuição funcional da renda a regressi-
vidade piorou ao longo do tempo. Os
salários, que ficavam com 29% da ren-
da gerada nas indústrias de transfor-
mação em 1961, passaram a receber
apenas 23% dessa renda em 1973. Em
consequência, a fatia dos lucros na in-
dústria de transformação subia de 71%

Alex Soletto
para 77% da renda nesse mesmo
período. E provável que a disparidade
fosse ainda maior na indústria da cons-
gág.
Na década de 80, milhares de brasileiros se debatiam num quadro de miséria (na trução civil ou na de extração mineral,
ao lado), enquanto se desenvolvia o consumo suntuoso das camadas altas (acima, o onde tradicionalmente os salários são
Shopping Center Eldorado, na capital de São Paulo) os mais baixos.
Os dados sobre a distribuição funcio-
2002, reconheceu essa tendência para a ção. Também não esclarecem a natu- nai da renda nos bancos comerciais são
"reconcentração da renda". Segundo reza da renda auferida, ou seja, se foi também muito reveladores. A fatia do
ele, a distribuição da renda pessoal, que obtida pelo próprio trabalho ou pela capital subiu de 59,8% no período 1968-
já era regressiva em 1960, se tornou exploração de trabalho alheio. Inse- 70 para 65,4% no período 1971-73, su-
ainda mais regressiva em 1970. A pro- rindo esse critério, o quaro da dispari- bindo novamente para 73,5% no período
porção de aumento da renda média en- dade se torna ainda mais clamoroso, 1974-75. Aí está uma indicação segura
tre 1960 e 1970, foi de 8,4% para os 80% pois reflete no fundo o grau de espolia- de que os banqueiros foram uma das
mais pobres e intermediários da popu- ção de uma maioria esmagadora de mi- frações do grande capital melhor con-
lação, de 55,4% para os 20% ricos, de seráveis, pobres e remediados, por uma templadas pelo Regime Militar. Outro
77,6% para os 5% muito ricos e de minoria de ricos. traço a destacar: a distribuição funcio-
103,2% para o privilegiado grupo dos nal dos rendimentos criados nos bancos
1% riquíssimos. Em outras palavras, a comerciais continuou a se concentrar
riqueza nova criada entre 1960 e 1970 ] pessoal
da J ] e funcional
av 71 em favor do capital mesmo depois de
foi absorvida sobretudo pelos mais ri- 1974, quando o governo Geisel (1974-
cos. A despeito de ter-se observado Para ter uma visão aproximada da 79) começou a declamar o propósito de
uma leve tendência a inverter essa par- partilha da renda por esse ângulo, é adotar medidas corretivas da extrema
tilha tão desigual da renda, entre 1970 e preciso estudar sua distribuição funcio- desigualdade na distribuição da renda.
1980, esse quadropermaneceu no essen- nal. A distribuição pessoal da renda Os dados coligidos sobre a distribui-
cial o mesmo. mostra a divisão da renda entre pessoas ção da renda interna urbana aponta-
Observe-se ainda que as faixas de ren- ou faixas da população, independente- vam, à primeira vista, uma divisão mais
da mínima e máxima são abertas. Isto mente de sua condição pessoal ou da favorável à remuneração do trabalho.
significa que a faixa mínima de renda natureza de sua renda. Já a distribuição É preciso levar em conta, porém, que
inclui, por exemplo, uma parcela signi- funcional da renda procura justamente os dados abrangem setores econômicos
ficativa de pessoas, principalmente mu- levar em conta a distinção entre onde é menor a presença de empresas
lheres e crianças, que trabalham sem rendas-trabalho e rendas-propriedade, monopolistas, com suas elevadas taxas
receber nenhuma remuneração. E a ou seja, entre as rendas obtidas com o de lucros; e incluem os trabalhadores
faixa máxima engloba um núcleo de próprio trabalho e rendas obtidas atra- autônomos e os trabalhadores nos ser-
pessoas muito ricas que têm rendas vês da exploração de trabalho alheio. viços públicos e privados, o que amplia
bastante superiores e já elevada renda Em outras palavras, a distribuição fun- o peso da remuneração do trabalho.
média de sua faixa. cional da renda mostra a divisão da ren- Ainda assim, a remuneração do traba-
Mas as estatísticas sobre a repartição da entre a remuneração das diferentes lho declina ao longo do tempo e é pe-
da renda pessoal, por mais chocantes formas de trabalho, por um lado, e a re- quena se comparada à de outros países.
que sejam, não contam ainda toda a muneração das diferentes formas de Nos Estados Unidos, por exemplo, se-
história. Registram apenas os fluxos de capital e de propriedade imobiliária, gundo famoso levantamento do econo-
renda num ano; não incluem o patri- por outro. mista Simon Kusnetz, a parte da remu-
mônio de uso pessoal acumulado e O cálculo rigoroso da distribuição neração do trabalho na distribuição
muito menos a propriedade e controle funcional da renda é muito mais difícil. funcional da renda chegava a 72,6% no
dos meios de produção. Se isso fosse Mas os dados dos Censos Econômicos período de 1948 a 1957. Dados compi-
feito, se agravaria significativamente a do IBGE permitem formar estimativas lados por Eduardo Suplicy indicam
disparidade entre as faixas da popula- globais e aproximadas. O economista e que, no Brasil, as taxas médias anuais
339
». FANBSB VB.GNCAM, 2340431333 ân 002, p 83

Abril Press

São Paulo, bairro do Morumbi, anos 80. A verdadeira face do Brasil: de um lado,
a opulência; de outro, a situação de grande
parte da população que não consegue, satisfazer necessidades vitais, como alimentaçã
o e moradia.

de crescimento dos salários reais foram soal ocupado na produção cresceu


dos que ganham acima de 20 salários
sempre inferiores às da produtividade 5,1%. Portanto, a distribuição da ren- mínimos; entre eles, uma minoria re-
média na indústria de transformação da salarial se tornou mais regressiva,
cebe muito mais do que isso.
entre 1949 e 1974. De 1949 a 1959, a Vários fatores concorreram para esse Para uma visão de conjunto da má
produtividade média aumentou 4% e o resultado. Com o desenvolvimento do distribuição, tanto da pobreza quanto
salário médio total, 3%; de 1959 a 1970, capitalismo no País, aumentou o nú- da riqueza, o mais interessante é reter a
a produtividade média subiu 4,9% e o mero de diretores, executivos e geren- participação média das diferentes cate-
salário médio total, 2,2%; de 1970 a tes profissionais, tanto nas empresas gorias: em 1983, 32,4% da População
1974, a produtividade média cresceu públicas e estrangeiras quanto nas Economicamente Ativa recebiam uma
9,1% e o salário médio total, 7,4%. Isto grandes e médias empresas privadas
renda de até um salário mínimo; 22,1%
significa exploração mais intensa da força nacionais. Aumentou também a par- recebiam apenas de um a dois salários
de trabalho, taxas mais altas de lucro, cela de lucros, transferida sob a forma mínimos; só 10,9% da PEA obtinham
maior concentração de renda pessoal. dissimulada de salários diretos e indire- uma renda superior a cinco salários
No entanto, é indiscutível que, ao tos de executivos. Cresceu igualmente mínimos; destes, é claro, alguns con-
lado do mecanismo básico de concen- a demanda por técnicos universitários e seguiam muito mais do que isso.
tração da renda, que consistiu no acrés- de nível médio e por operários especia- A má distribuição da renda pessoal é
cimo dos ganhos de capital e da renda da lizados, valorizando-se de forma rela- reforçada ainda por uma carga de im-
terra em comparação com a remunera- tiva e temporária, os seus salários. Em postos também regressiva, que penaliza
ção das diferentes formas de paga- contrapartida, ampliou-se o exército de sobretudo os que ganham menos; e por
mento do trabalho, houve um meca- reserva de trabalhadores desempre
ga- oferta de serviços públicos bastante
nismo complementar, centrado na dife- dos, subempregados e
mal-remu- desigual. Enquanto os bairros ricos são
renciação crescente entre os salários. nerados, cortados por redes de esgoto, ilumina-
Os dados reunidos por Suplicy mos- ção pública ou de comunicação telefô-
tram que também este processo vem de Cresce a concentração da renda e nicas, e ruas dos centros das grandes ci-
longe. Entre 1949 e 1959, se o salário caem os salários do trabalhador dades são pavimentadas e repavimenta-
médio total aumentou 3,0%, o salário das várias vezes,os bairros periféricos e
médio do pessoal ocupado na adminis- As informações contidas nos rela- as cidades mais pobres do Interior ve-
tração aumentou 4,5% e o salário mé- tórios RAIS (Relação
Anual de Infor- getam à minguade serviços públicos.
dio ocupado pelo pessoal da produção mações Sociais) mostram que a divisão De todos esses indicadores e fatos
aumentou 2,2%. Entre 1959 e 1970, o do bolo salarial também é claramente emerge a verdadeira face do Brasil:
salário médio total subiu 2,2%, o salário desigual: em 1983, 82% dos emprega- uma sociedade dilacerada por profun-
médio do pessoal ocupado na adminis- dos, que ganhavam menos de cinco sa- das desigualdades. Se uma minoria pode
tração subiu 2,6% e o salário médio do lários mínimos, ficavam com 48% do imitar o padrão de vida de classes mais
pessoal ocupado na produção subiu bolo, pouco menos da metade,
por- altas da Europa e dos EUA, grande
2,2%. Entre 1970 e 1974, o salário mé- tanto. Os restantes 18% dos emprega- parte da população não consegue se-
dio total cresceu 7,4%, o salário médio dos ficavam côm 52% do bolo. Note-se
quer satisfazer necessidades vitais,como
do pessoal ocupado na administração também que a última, faixa salarial é garantir alimentação suficiente e mora-
cresceu 10% e o salário médio do pes- aberta, para incluir todos os emprega-
dia adequada.
340
BR DFANBSB VE.GNCAMA, 8404 12 24 ânCO2, 084

POLÍTICA/CAMPANHAS POPULARES: lutas nacionalistas e democráticas A maior manifestação política


da história brasileira

, 0 povo nas ruas São Paulo, 16 de abril de 1984. No


vale do Anhangabaú, uma multidão es-
timada em 1,7 milhão de pessoas parali-
Da campanha pela abolição da escravatura às diretas-já, o
sou o centro da cidade e concentrou as
povo brasileiro tem saído às ruas, às praças do País, para atenções de todo o País para o comício
marcar sua presença e exigir mudanças que se constituiria no auge da campa-
nha pelas eleições diretas para presi-
dente da República.
No dia seguinte, os jornais utiliza-
riam, pela terceira vez naquele ano, a
expressão "a maior manifestação polí-
tica que o Brasil já viu". E não era exa-
gero. Ela foi utilizada pela primeira vez
referindo-se ao comício realizado na
Praça da Sé, em São Paulo, no dia 25
de janeiro, quando ali se concentraram
mais de 200 mil pessoas que nem
mesmo uma chuva insistente conseguiu
dispersar. Quando o marco de um mi-
lhão de pessoas foi ultrapassado, no
comício da Candelária, no Rio de Ja-
neiro, em 10 de abril, a expressão es-
tava novamente justificada.
Uma característica da campanha pe-
las diretas-já no País era o crescimento
constante. Ela começou com uma con-
centração de dez mil pessoas na praça
Charles Múller, em frente ao estádio
Pacaembu, São Paulo, em 27 de no-
vembro de 1983. Era organizada pelo
Partido dos Trabalhadores (PT), que,
dessa maneira, trazia para as ruas a
campanha que visava a alterar a forma
de escolha do presidente da República
a ser eleito em 1985. Completados 20
anos do golpe militar de 1964, parecia
inaceitável à população que o novo
presidente, com um mandato previsto
de seis anos, fosse escolhido por um
Colégio Eleitoral que, todos sabiam,
fora construído para referendar um
nome já previamente apontado pelos
governantes.
A campanha, em menos de seis me-
ses, espalhou-se pelo País: comícios,
concentrações e passeatas foram reali-
zados nas capitais dos Estados, nas
grandes cidades e também em inúme-
ras pequenas cidades de todo o País.
Levantamentos feitos na imprensa indi-
caram que mais de seis milhões de pes-
soas tinham ido às ruas antes do dia 25
de abril, quando foi votada a emenda
constitucional que, se tivesse sido apro-
vada, restabeleceria as eleições diretas
para presidente da República.
O fato de que, na véspera da votação
da emenda Dante de Oliveira, como
Iconographia

ela ficou conhecida, tivessem ocorrido,


nas principais cidades brasileiras, "pa-
nelaços" - barulho provocado pela po-
pulação batendo panelas vazias - indi-
: Campanha pelas diretas-já para presidente da República. Vale do Anhangab
au, cava, de maneira simbólica, que a cam-
SP, em 16/4/1984 panha brasileira se integrava de alguma

341
sroransss v.enc.aaa, 249041334 an 002 , - 85

forma nas demais lutas do povo latino- País defendiam a causa do governo, Rio pelaxeimo 1884
americano pela redemocratização de uma das principais atividades das Asso-
seus países. Afinal, os "panelaços" ti- elaçoes e Sociedades pró-Abohçao que
nham marcado manlfestaçoes no Chile, surglam foi a criação de ]omals
j aboli-
na Argentina e no Uruguai pelo fim dos cionistas. Pouco a pouco, a opinião pú-
governos militares daqueles países, que blica se apaixona pelo tema. A campa-
tinham sido gerados em processos nha se concentra nas grandes cidades,
muito semelhantes ao brasileiro. onde os clubes abolicionistas promo-
Quando o País se coloriu de amarelo vem quermesses, festas beneficentes, M
unucm"l
ªnu- “A
AGOBTImL.
um nar dirigidas sa
- a cor da campanha pelas diretas-já - conferências e, com o crescimento da
à Rua or humus Dina, o 96.1Ansas. Armas

vimos novamente o fenômeno da opi- campanha, comícios em praças públi-


nião pública brasileira polarizada por cas.
uma idéia. Nessas ocasiões, toda popu- Na fase fmal da campanha, o 80-
lação parece centralizar num objetivo verno tentou apelar para a repressão
todas as suas esperanças. E, portanto, para conter os manifestantes. Em
um tema concentra a possibilidade de agosto de 1887, proibiu as reuniões pú-
solução para uma série imensa de pro- blicas. E, a partir de então, utilizou
blemas. No início de 1984, o que tor- vários expedientes, alguns violentos,
nava tão inaceitáWel a elelçao pelo Co- para dissolver comícios e conferências
légio Eleitoral é que ela representava abolicionistas.
para milhões de brasileiros a continui- Mas a libertação dos escravos pare-
dade de uma situação que se tornara cia inevitável. Em 1884, as províncias
insuportável. A crise econômica, como do Amazonas e do Ceará já haviam li-
sempre, atingira principalmente as ca- bertado os seus escravos e entre os abo-
madas mais pobres da população. O licionistas havia até fazendeiros.
desemprego, o arrocho salarial e a ca- Quando o projeto de lei que abolia a
restia de vida continuavam a atormen- escravidão entrou na Câmara, em 8 de
tar a família operária e começavam maio, o público acompanhou sua tra- +,
Mascim
ci pide a árafr dos dx yranisois da
agora a atingir também a classe média. mitação passo a passo até o dia 13,
Eleger o novo presidente com elei- quando aconteceu a sua aprovação Não confiando no Exército, que
ções livres parecia ser a única forma de pela Câmara, pelo Senado e rápida san- cada vez mais parecia contaminado
mudar a situação do País. O grito de : ção pela Princesa Isabel. pelo germe republicano, as autoridades
diretas-já pelas multidões deveria ser imperiais preferiam utilizar a Guarda
entendido como grito de mudanças-já. Mesmo reprimida, à rdeia Nacional na repressão às manifesta-
Mesmo se levarmos em conta o cres- ções. O clima nas Forças Armadas é
cimento da população, a urbanização republicana percorre o País ilustrado com o episódio do cadete Eu-
do País, e o avanço no sistema de co- Clides da Cunha, da Escola Militar,
municações, poucas campanhas ti- Rio de Janeiro, julho de 1888. O saindo da coluna e atirando seu sabre
veram tal alcance e penetração. Mas chefe de polícia da capital publicou um ao solo depois de tentar vergá-lo, du-
houve outras oportunidades em que o severo edital: "Faz saber a todos os que rante uma visita do ministro da Guerra,
povo brasileiro empolgou-se por uma o presente edital virem ou dele tiverem conselheiro Tomás Coelho de Al-
campanha e marcou sua presença. notícia, que serão processados pelo meida.
crime do artigo 90 do Código Criminal
Nas ruas, as comemorações pelto os indivíduos que, nas praças, ruas ou ) repúdio ao nazismo e a luta
outros lugares públicos ou em presença
fim da escravidão de autoridades derem vivas à Repú- pela democratização

blica, morras à Monarquia, vivas ao


Rio de Janeiro, 17 de maio de 1888. partido republicano ou proferirem gri- Principais cidades do País, 18 de
Por toda a então capital federal têm ini- tos e frases igualmente sediciosas. Fi- agosto de 1942. Milhares de pessoas se
cio as comemorações do final da escra- nalmente, serão dissolvidos, pela forma manifestaram em diversos centros ur-
vidão negra no País, culminadas num legal, os ajuntamentos e reuniões em banos exigindo represálias do governo
domingo, quatro dias depois. Cerca de lugares públicos . . ." contra a Alemanha, que tinha provo-
cem mil tomam as ruas da cidade e a O edital constituía uma tentativa de cado uma nova onda de afundamentos
população tinha conquistado o direito impedir as manifestações crescentes de navios brasileiros. As embarcações
de participar da festa pela sua atuação pela República. A idéia republicana, começaram a ser afundadas por sub-
na luta por aquele resultado. desde a época da independência, em marinos nazistas em fevereiro daquele
O Brasil foi um dos últimos países do 1822, carregava consigo as esperanças ano, quando o Brasil começa a pender
mundo a acabar com a escravidão e de todos aqueles que pretendiam asso- para o lado aliado no conflito mundial.
isso o deixava isolado no plano interna- ciar à autonomia política do País for- Até 1944, 36 navios seriam afundados,
cional. Quando a Lei do Ventre-Livre mas democráticas de governo. Presente provocando a morte de cerca de mil
foi-aprovada, em 1871, a instituição da a todos os movimentos e insurreições pessoas.
escravatura começava a desmoronar e que marcaram o período imperial no A UNE (União Nacional dos Estu-
se tornava objeto de um grande debate Brasil, ela materializou-se em 237 clu- dantes) liderou uma passeata de milha-
nacional que só cresceria nos anos se- bes republicanos e 74 jornais em todo o res de pessoas no Rio de Janeiro em 4
guintes. Os defensores da abolição co- País, sendo que alguns deles, como o A de julho de 1943, onde carros alegóri-
meçavam a reunir cada vez mais pes- República, do Rio de Janeiro, chegou a cos simbolizavam o repúdio ao nazismo
soas em suas conferências e reuniões vender oito mil exemplares diários, na e o apoio aos aliados. A campanha pela -
públicas. Como os principais jornais do década de 1870. entrada do País na guerra ao lado dos

342
BRDFANBSB V8.GNC.AMA. 54041331 anOCO a, p &

sentantes presos ou no exílio. Foi no fi-


nal de 1944 que a campanha ganhou
amplitude e se espraiou pelo País, che-
gando às ruas no ano seguinte. Uma Se-
mana Nacional Pró-Anistia ocorreu si-
multaneamente no Rio e em São
Paulo, em abril de 1945, gerando mani-
festações e comícios. Dia 15, ao seu fi-
nal, numa grande manifestação no
Largo da Carioca, no centro do Rio,
sob chuvas de papel picado, o povo
aplaudiu os nomes de oposicionistas
que se beneficiariam com a anistia que
veio a ser decretada em 18 do mesmo
mês.
Conquistada a anistia, inicia-se a
campanha pela Assembléia Nacional
Constituinte, que teve sua eleição con-
vocada para o dia 2 de dezembro de
1945,

- Rio de Janeiro, julho de 1952. Nesse

Iconographia
mês, realiza-se a Terceira Convenção
Nacional de Defesa do Petróleo, reu-
nindo delegados de 18 Estados. O pro-
jeto em pauta no Congresso sobre a
aliados, que gerava organizações como Muitas campanhas mobilizaram a questão é violentamente atacado. A
a Sociedade dos Amigos da América e opinião pública brasileira. Acima, campanha sob o slogan de "O Petróleo
ressuscitava outras como a Liga de De- protesto contra o afundamento de navios é Nosso" chegava ao seu auge.
fesa Nacional, misturava o repúdio ao brasileiros, agosto de 1942. Abaixo,
Quando fora promulgada a Consti-
nazismo com a luta pela democratiza- concentração pró-anistia, na praça da Sé,
tuição de 1946, em 18 de maio, já ocor-
ção do País. em 3/3/45. Na pág. ao lado, Francisco do
reram protestos contra os dispositivos
Por proposta do Sindicato dos Tece- Nascimento - o "Dragão do Mar" -, que tornavam possível a participação
lões do Rio de Janeiro, realizou-se, em que, à frente dos jangadeiros do Ceará,
do capital estrangeiro na exploração de
maio de 1943, uma Semana Antifas- liderou a luta contra o tráfico de escravos
nossas riquezas minerais. Mas foi no
cista, organizada pela UNE e demais para o Sul do País (ilustração de Angelo
ano seguinte, a partir dos debates que
entidades que participavam da campa- Agostini, Revista Ilustrada, 1884)
ocorreram no Clube Militar, que o
nha. tema do petróleo e da defesa do mono-
Quando o governo brasileiro decla- pólio estatal para sua exploração come-
tou guerra à Alemanha, em 31 de
caram a empolgar o País. Surge o Cen-
agosto de 1942, cem mil pessoas sauda-
tro de Estudo e Defesa do Petróleo. em
ram a decisão nas ruas do Rio.

Lumi? e

TENPO

»::“anan ta
DO
muLpAoPárte
Rio de Janeiro, 3 de outubro de Port as , ENGANAR a
ER-SE-p
1945. Mais de 150 mil pessoas 3 MESMOENGANAR
concentraram-se para ouvir oradores
defenderem a convocação de uma As-
sembléia Constituinte. O comício foi
transmitido para todo o País por várias
emissoras de rádio. Delegações de
vários Estados estavam na Capital Fe-
deral.
Com o final da Segunda Grande
Guerra e a derrota do nazi-fascismo, o
Estado Novo torna-se rapidamente
anacrônico e as manifestações pela de-
mocratização do País se sucedem.
Depois que o Brasil entrou na
Guerra, foi a anistia que passou a preo-
conographie

cupar as oposições e, depois, mobilizar


a população. Todas as correntes políti-
cas foram reprimidas e tinham repre-

343
Devido às características dos gover-

nos do período populista, o movimento

sindical acompanhava de perto os mo-

vimentos políticos e do Congresso em

particular. Quando este vetou


a nomea-

ção de San Tiago Dantas para pri-

meiro-ministro, a Confederação Na-

Amiucuci Gallo/Abril Press


cional dos Trabalhadores na
Indústria e

o Pacto da Unidade e Ação (PUA) con-

vocaram uma greve geral para o dia 5

de julho de 1962, exigindo um gabinete

nacionalista e a antecipação do plebis-

Ex=
cito, que acabou se realizando em ja-

2
neiro de 1963.

.
No Regime Militar, milhares de

pessoas reclamam a anistia

Rio de Janeiro, 14 de agosto de 1979.

Cerca de 20 mil pessoas realizaram dois

comícios e uma extensa passeata na


ci-

dade, reclamando a Anistia Ampla


Ge-

ral e Irrestrita. A data teve o sabor de

um retorno das massas às ruas da an-

tiga capital da República. Foi a maior

manifestação realizada naquela cidade

desde a passeata dos 100 mil, de junho

de 1968, auge dos protestos pela morte

do estudante Edson Luís de Lima

Souto, num confronto com a polícia


no

restaurante estudantil conhecido como

Calabouço.

O tema da anistia surgiu logo depois

do golpe militar de 1964, mas foi no


Iconographia

ano de 1977 que ele se tornou a princi-

pal bandeira das manifestações estu-

dantis e passou a atrair cada vez mais

camadas da população. Depois que di-

Em várias oportunidades, o povo brasileiro empolgou-se por versas e significativas


uma campanha, saiu entidades se ma-

as ruas e praças, marcou sua presença e exigiu mudanças. nifestam a favor


No alto, comício pela da anistia, forma-se,

anistia, centro do Rio, em 1979. Acima, comício das em fevereiro de


reformas de base, Central 1978, o Comitê Brasi-
do

Brasil (RJ), 13/3/64


leiro pela Anistia que, a seguir, cria co-

mitês em todos os Estados.

abril de 1947, que visava a influir na A partir da renúncia do presidente


O ano de 1979 assiste o pipocar de
opinião pública através de artigos, con-
Jânio Quadros, em 25 de agosto de manifestações pela anistia em todo o
ferências, debates e comícios.
1961, o País mergulhou num dos perío-
País e, em 28 de agosto, o presidente

O Centro espalhou pelo País comis-


dos mais conturbados da sua história. A
Figueiredo assina o decreto da anistia,
sões de defesa do petróleo, que nas tentativa de impedir a posse do vice-
embora com algumas restrições e não
suas atividades começam a atrair pla- presidente Goulart, segue-se a campa-
tão ampla quanto era desejada.
téias cada vez maiores. Na época, nha pela legalidade e a posse é nego- Embora, através de sua história, o
considerava-se que as concentrações
ciada em troca da instituição do parla- povo brasileiro se tenha posicionado
promovidas pelo Centro e suas sucur- mentarismo no Brasil.
em campanhas que visavam a atingir
sais pelo País eram as maiores da his- No governo Goulart (1961-64) duas
metas ligadas à independência do País
tória do Brasil. Resultado: em 3 de ou- grandes campanhas centralizavam a
e a sua democratização, esses sucessi-

tubro de 1953 foi sancionada a Lei atenção da população. Inicialmente, a vos movimentos de massas, por suas
2.004, que criou a Petrobrás. campanha para antecipar a data do ple- próprias características, não deixaram

biscito que iria aprovar ou não o ato


um saldo realmente positivo. Sobre-
Vo governo Goulart, os temas
adicional que havia instituído o parla- tudo não significaram um avanço de

são plebiscito e reformas de base mentarismo e que estava marcado para caráter organizativo para esse mesmo

1966. E, depois, a campanha pelas re- povo.

Rio de Janeiro, 13 de março de 1964.


formas de base. As duas se relaciona-
Conquistada, total ou parcialmente,
Um público calculado em 200 mil pes-
vam intimamente, pois ambas se volta- a reivindicação que movia cada cam-
soas, convocado pelos sindicatos,
vam contra o Congresso, que era consi-
panha, a população volta a se encon-
acorre à Central do Brasil para um
derado o baluarte das forças conserva- trar atomizada e enfrentando os mes-
comício em defesa das reformas de
doras e que impedia as reformas pre- mos problemas que pareciam ser resol-
base. O presidente João Goulart foi o
tendidas pelo governo, principalmente
vidos ou teriam sua resolução encami-
último orador.
a reforma agrária.
nhada por aquela campanha.

344

BR DFANBSB VB.GNC.AAA, HO41239 ancoa, p 34


sr oranBSB 40413348 00a, p&8

trialização moderna, tanto na Europa


como no Brasil. Tradicional rota dos
bandeirantes no passado (depois de
1930), o Tietê passou a servir de cloaca
industrial e urbana de uma região onde
viviam mais de dez milhões de pessoas
e funcionavam cerca de 30 mil fábricas,
nos anos 80. Da cidade de São Paulo,
apenas, ele recebia a cada segundo 15,6
milhões de litros de esgotos. Além
disso, graças a uma sugestão infeliz do
o então prefeito Adhemar de Barros -
a,
que em 1955 interligou toda a rede de
ATT escoamento de São Paulo - os dejetos
de toda a indústria paulista passaram a
terminar no Tietê, viessem de onde
viessem.
Em 1950 já se faziam planos para sal-
var o Tietê, mas todos fracassaram. O

Banco de Dados/FSP
principal problema era conciliar os in-
teresses da Light - para quem o rio de-
veria servir antes de mais nada à gera-
ção de energia elétrica - com medidas
despoluidoras que constavam dos pla-
nos Greeley-Hansen, de 1953, Hazen-
Sawyer e Hibrace, de meados dos anos
Os peixes voltaram ao limpo rio Tâmisa, Londres, em 1983
60 Mesmo tentativas de soluções mais
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/AMBIENTE: a poluição dos rios recentes permaneciam num impasse: a
"Solução Integrada", de 1974, e a sua
alternativa, o faraônico projeto Sane-
tan gran (Saneamento da Grande São
ça
dos Paulo).
rio
s
Assim, também um caso exemplar -
mas às avessas -, o Tietê dava a me-
A partir das últimas décadas, os rios das regiões mais dida dos problemas de poluição de
desenvolvidas do País vêm lentamente morrendo, resultado da águas no Brasil. De fato, esses proble-
mas eram mais graves nas grandes
desenfreada poluição das suas águas áreas metropolitanas brasileiras, das
quais a Grande São Paulo era a mais
A lição veio do velho continente eu- lização, transformando o Tâmisa em importante. Vinham em seguida pela
ropeu, em 1983, e foi ministrada com caso exemplar, verdadeira imagem de ordem, os outros grandes centros me-
ajuda apenas de um pequeno barco e uma comunidade urbana harmônica tropolitanos: o Rio, Porto Alegre, Re-
um caniço de pesca. A questão: era onde o rio era também local de lazer, cife, Salvador e Belo Horizonte. A par-
possível recuperar e manter limpo um recreação e beleza. tir daí, a deterioração dos rios
rio que atravessava o coração de um irradiava-se para as grandes regiões
grande centro industrial moderno? A As águas do Tietê, cobertas de desenvolvidas, a começar pelo interior
resposta - positiva - acabou trans- ,
rjfy'u eram 13191 399 rida +rr he do Estado de São Paulo.
um mundo morto
formando-se em um caso exemplar, O próprio Tietê, após deixar a me-
quando o mecânico londrino Rus- Essa era uma imagem totalmente trópole e tornar-se mais volumoso, de-
sell Doig tirou das águas do Tâmisa, o oposta, no entanto, à dos rios brasilei- purava em parte a poluição paulistana.
mais importante rio da Inglaterra, um ros, a começar pelo rio Tietê, Seme- Mas a sua situação voltava a piorar,
salmão de quase três quilos, sendo por lhante ao Tâmisa, mas atravessando a desta vez em seu curso médio, após re-
isso premiado com uma taça e 300 mil cidade de São Paulo, o Tietê em 1983 ceber a carga poluente de grandes
cruzeiros em dinheiro. era um rio imundo e malcheiroso. Suas afluentes do interior: os rios Jundiaí, Pi-
Um dos peixes mais exigentes em águas já sem transparência nenhuma e racicaba, Sorocaba e Capivari. O
matéria de limpeza, o salmão sumira do permanentemente cobertas por uma mesmo ocorria no interior do Paraná,
Tâmisa há exatamente um século, e o película oleosa, eram um mundo onde as cidades médias passavam a
seu retorno em 1983 era um atestado morto, a não ser pela grande variedade contribuir pesadamente para a polui-
fiel de que a poluição havia sido eficaz- de microorganismos perigosos que pro- ção de rios como o Iguaçu, próximo a
mente banida do rio inglês. O estigma liferavam nesse meio. Em vez de um Curitiba, ou o Tibagi, na região de Lon-
da poluição lhe deixara marcas profun- leito rochoso ou arenoso, o Tietê corria drina. E, mais além, no Rio Grande do
das, particularmente quando, em 1861, sobre uma imensa placa de dejetos se- Sul, também se agravavam as condi-
o marido da rainha Vitória - o príncipe dimentados, cujo peso era avaliado em ções das sub-bacias do rio Guaiba, com
Alberto - morreu de febre tifóide de- dois milhões de toneladas. destaque para os rios Gravatai, Sinos,
vido à insalubridade das águas do Tá- Mas o Tietê - assim como o Tâmisa, Taquari e Cai.
misa. No entanto, a partir de 1960, o rio antes da recuperação - era o resul- Nessas regiões se expandiam as con-
foi inteiramente recuperado através de tado da desorganização e da irrespon- tradições criadas entre o desenvolvi-
uma bem estruturada terapia de revita- sabilidade que acompanharam a indus- mento e o aproveitamento real dos rios.

345
ER. pranNBSB VB.GNC.AAA, 84041334 an 002 , p 83

(através da navegação) e ainda a re-


creação. Como acomodar tudo isso à
poluição desenfreada a que se relegou
nossos rios a partir de meados da dé-
cada de 60 principalmente?
Sem controle, sem fiscalização e sem
uma política de aproveitamento siste-
mático dos recursos naturais, os rios
transformaram-se em simples depósitos
de "lixo" industrial e de matéria orgã-
nica, principalmente resíduos de enge-
nhos e usinas de álcool. Assim, os rios
perdiam rapidamente o precioso oxigê-
nio dissolvido em suas águas, levando
os peixes à morte.
Os resíduos de cana ameaçavam 28
rios do Nordeste, em 1980, inclusive o
Capibaribe, que banha Recife. Além
disso, um dos maiores desastres ecoló-

Banco de Dados/FSP
gicos do São Francisco ocorreu em
1984, quando dezenas de toneladas de
peixes morreram perto dos municípios
de Curaçá (BA) e Santa Maria (PE). Os
suspeitos de responsabilidade eram a
Usina de Mandacaru e a Caraíba Me-
tais. Houve ainda o caso do rio Subaé,
perto de Salvador, onde 173 crianças
foram intoxicadas, nessa época, levan-
tando suspeita contra o cádmio, o zinco
e o cobre eliminados pela Companhia
Brasileira de Chumbo, da região.

xr, 05, anos filiª-i, ;;!k IXeS “liv :“ É?


a ] o Anaia DMedanrh.
CMculavam pelo Piracicaba
U

Os fatores que mais pesavam na

carga de poluição dos rios brasileiros

talvez pudessem ser identificados nas

medidas feitas no rio Guaíba, onde


Christiano Diehl Neto/F4

25% dos dejetos vinham do esgoto ur-

bano, 28% das indústrias alimentícias,

18% das metalúrgicas, 17% das fábricas

têxteis e 12% das fábricas de papel.

De qualquer forma, uma coisa é

certa: a longo prazo a poluição com-

promete os resultados da economia. É

o que se vê no caso do rio Piracicaba.


Depósitos de "lixo" industrial e resíduos de cana-de-açúcar, nossos rios morriam,
como Na década de 60, encontravam-se ali
o Tietê (no alto) e o Piracicaba, ambos no Estado de São Paulo
peixes de até 15 quilos, Em 1983, o pro-

fessor Enéas Salati, da Escola Superior


Caso típico era o Paraíba do Sul: com dos com urgência pelo recém-criado
de Agricultura Luiz de Queiroz, afir-
1.050 quilômetros, entre São Paulo e
Comitê Especial de Estudos Integrados mava: "Esse rio não passa de um es-
Rio, servindo a uma população de 3,5 de Bacias Hidrográficas (CEIBH). A goto a céu aberto, e recursos enormes
milhões de habitantes e para o qual se
idéia era planejar melhor o desenvolvi- terão que ser aplicados para implantar-
previa que abastecesse as indústrias e a mento do País - aproveitando os rios se um sistema de saneamento." Com a
população da cidade do Rio de Ja-
brasileiros, mas sem comprometer o es- degradação de seus dois últimos rios de
neiro. Apenas 14% das cidades em suas sencial, a qualidade de suas águas. Os porte, nos anos 80 - o Jaú e o Jacaré -,
margens tinham serviço de tratamento
estudos do São Francisco, posteriores
de esgotos e 114 indústrias despejavam em São Paulo deixou de haver pesca
aos trabalhos iniciais da CEIBH com o em escala comercial. A própria Secre-
sobre ele cargas acima do perigoso pa- Paraíba do Sul, só deveriam dar resul- taria da Agricultura do Estado desistiu
tamar de 100 toneladas diárias de polui- tados depois de 20 anos. de usar os rios como sistema de produ-
ção, comprometendo o abastecimento.
Apesar das diferenças entre si, os ção de peixes, preferindo recorrer às
Problemas semelhantes estendiam-se problemas de nossos rios concen-
fazendas piscicultoras, onde os investi-
também aos rios mais distantes, poluí- travam-se nas mesmas questões bási- mentos necessários eram muito maio-
dos por regiões menos desenvolvidas cas, entre as quais estavam o abaste-
res do que exigia a pesca nos rios. As-
do País, como era o caso do São Fran- cimento de água e de energia elé-
sim, enquanto no Tâmisa se premia a
cisco. Este último, em 1980, foi incluído trica, a produção de alimentos (peixes), pesca, entre nós se desperdiçam recur-
em uma lista de rios a serem examina- a irrigação agrícola, os transportes sos naturais originalmente abundantes.
346
BRDFANBSBVB.GNC.AAA, 8404138345 0a, pB0

Fernando Pimentel/Abril Press

Nos últimos 20 anos, o conto apontou ... dominavam o cenário da história ... indicavam uma grande vitalidade,
uma ampla diversidade na literatura do curta, como Mário de Andrade (à dir.), exemplificadas pela literatura de Rubem
País. Se no passado poucas figuras . .. nos anos 60 as correntes do conto . .. Fonseca (à esq.) e Lygia Fagundes Telles

ARTES/LITERATURA: a evolução doconto sob o Regime Militar Fausto Cunha, Hélio Pólvora, Renard
Perez. As últimas estréias, não casual-
mente, nos haviam trazido escritores
do porte de José J. Veiga, Rubem Fon-
seca e Nélida Pifion, Caio Porfírio Car-
neiro, Julieta de Godoy Ladeira e João
Antônio.
Nos últimos 20 anos, o conto não apenas resistiu Essas eram as linhas gerais do conto
brasileiro em 64. Fundas, nítidas, im-
ao autoritarismo, mas soube enfrentá-lo criticamente,
pressivas. Nunca antes nós tínhamos
- compondo assim um amplo mosaico da vida brasileira visto uma tamanha cota de valores tão
indiscutíveis. Contra eles, contra a flo-
Quando foi deflagrado o movimento Nem evitar alguma cronologia na en- ração em curso, e tentando apagá-la,
de 64, o conto brasileiro já se encon- trada em cena dos contistas, pelo me- extingui-la, varrê-la, se armaram os
trava em plena ascensão. Até esta fase nos útil para localizá-los. Olhando mais processos diluidores de um sistema re-
mais contemporânea, nós nos havia- a sua multiplicidade, a exposição de gressivo. Como foi que atuaram?
mos habituado, e desde o tempo dos tantos desenhos e cores e relevos, pro- É inegável o clima de antiintelectua-
nossos precursores (século e meio curemos reconstituir a extensa galeria lismo destes últimos 20 anos. Ele se es-
atrás), a ver sempre uma grande figura que tinhamos então. tabeleceu numa sombria nuvem geral,
dominando isolada o cenário da his- planejadamente recusando tudo o que
tória curta. Assim acontecera com Jus- significasse a visão humanística da so-
tiniano da Rocha, Machado de Assis e ciedade, e assim fechado, e incivil, caiu
Simões Lopes Neto, com Lima Barreto tempestuoso sobre a produção literá-
ou Adelino Magalhães, e na melhor das As contribuições mais sedimentadas, ria. Isolando-a, pressionando-a,
hipóteses, pelas alturas 'do Moder- e que também se mostravam como intimidando-a. Tal política de contra-
nismo, com as presenças simultâneas aberturas sucessivas, eram personaliza- cultura se exerceu em diferentes senti-
de Mário de Andrade, João Alphonsus das em um Origenes Lessa, um Ber- dos.
e Marques Rebelo. Em começos dos nardo Ellis, um Moreira Campos. A
1
anos 60, entretanto, as correntes cruza- Geração de 45 se mantinha no seu forte
das do conto indicavam uma extraordi- núcleo central, com Breno Accioly, tu
nária vitalidade. O gênero compunha José Condé, Lygia Fagundes Telles e
um extenso e vivo painel, feito de obras Murilo Rurião. A renovação de Gui- A censura foi o principal instru-
sem dúvida importantes. marães Rosa, Clarice Lispector e Dal- mento do sistema militar, para o seu
Seria esquemático buscar o alimento ton Trevisan, as construções pessoais objetivo de tornar a literatura uma ex-
desses escritores, querer ordená-los por de Leonardo Arroyo, Helena Silveira e pressão dócil, amaciada ou inócua,.
tendências e mesmo inflexões. A tônica Almeida Fischer. Os destacados Os- Tem-se discutido o papel que ela de-
da nossa época, ao que aponta, é a di- man Lins, Samuel Rawet, Otto Lara sempenhou, em termos comparativos,
versidade. E esses perfis tão vários nos Rezende, em contraponto com os tam- desejando mostrá-la mais opressiva em
permitem apenas enumerar, ainda que bém excelentes Autran Dourado, Leo outros setores das artes, por exemplo o
não se possa fugir às aproximações. Godoy Otero, Edilberto Coutinho, ou teatro e a música popular. Entretanto,
347
BR DFANBSB VB.GNC.AAA. 84041333 In COR pã]

houve a censura de livros publicados, Nos últimos anos, uma característica


suas edições recolhidas das livrarias.
importantefoi o alargamento da temática.
Houve a censura de livros que não che-
Surgiu o conto da nova mulher, com
' garam a ser editados, vítimas do veto
Marina Colasanti (ào lado) e Tânia
difuso das forças da situação. E houve,
Faillace (centro), que, junto à ficção de
decerto, à censura que desencorajava a
João Antônio, por exemplo, comporia um
criação literária fora dos esquemas do-
grande painel da via brasileira
minantes, altamente limitativa, imobili-
zante e castradora Nomes do valor de Luís Vilela, Moacyr
Outra modificação dessa política rei-
Scliar, Ivan Angelo, ou de Domingos
nante no período, e que se patenteou
Pellegrini Jr., Sérgio Sant'Anna, Sílvio
de forma lenta e progressiva, foi o fe- Fiorani. A representação feminina se
chamento dos canais de veiculação de adensou, com Sônia Coutinho, Edia
literatura além do livro. Em 64, tinha- Van Steen, Ana Maria Martins, ou
mos diversas revistas literárias, seis su-
Hilda Hilst, Dinorath do Valle, Márcia

Luiz Paulo Machado, Abril Press


plementos especializados em São
Denser. Os grupos regionais se ativa-
Paulo, igual número no Rio, existiam ram, com os mineiros Roberto Drum-
esses cadernos em quase todas as nos- mond, Orlando Bastos e Wander Pi-
sas capitais. Neles, os escritores jovens tolli, Duílio Gomes e Garcia de Paiva,
pediam publitar poemas, contos, en-
os recentes gaúchos Sérgio Faraco, Al-
: saios, após algum tempo chegar ao li-
dyr Schlee e Renato Modernell. Mais
vro normalmente. Mas pouco a pouco
que simples continuidade, houve aber-
as revistas e os suplementos foram de- tura de horizontes. Quantitativos, é ver-
saparecendo (em 1982 cessou o último dade, com o boom editorial dos anos
em Porto Alegre), e no início de 1985
70. Mas também qualitativos, pois hoje
temos quando muito suplementos cul-
se escreve mais e melhor.
turais, onde a literatura divide espaço
com as ciências e a tecnologia.
as imikimi/(a traçam o pamel
à a
de uma fªgmf'n'

Uma característica importante da


fase atual é o alargamento da temática.
Enfim, por se julgar duradouro, o au-
Surgiu o conto da vida operária, com
toritarismo visou a universidade. A mé-
Roniwalter Jatobá e Domingos Pelle-
dio e longo prazos, exerceu sobre ela
grini Jr. Surgiu o conto das profissões
uma ação vigilante, que resultou extre-
emergentes, dos executivos diversos,
mamente negativa. Demitindo, cons-
com Roberto Drummond, lãgácio de
trangendo, ameaçando, tornou-a uma
Loyola Brandão e Otto Lara Rezende.
instituição formalista. Isso, que logo se
Surgiu o conto da nova mulher, com
Walter Firmo/Abril Press

refletiu no ensino, alcançou também a


Marina Colasanti, Márcia Denser e Tô-
crítica universitária como um tom de
nia Faillace. Muito naturalmente, a so-
época. Em que pesem as previsíveis re-
ciedade de consumo, o erotismo, as
sistências e exceções, tivemos o pri-
m Pra".

mado do esteticismo, com a abstração


magias contemporâneas entraram na
ordem do dia. Ancorando esses vôos,
de literatura em curso, o retorno a per-
surgiu o conto da repressão, do cala-
3

didos escritores do passado, as teses so-


bouço, da tortura, a nossa variante ne-
bre linguagens e mundos interiores,
gra. Matérias vivas, registro e memória,
Não por acaso, vivemos, todos estes
trânsito em outras direções. E assim es-
anos, a apoteose do estruturalismo.
pelho deste nosso tempo, e nas suas di-
Qual o prejuízo que a chamada "re-
mensões de peças isol"das bem estimá-
volução de 64" nos trouxe? Impossível
veis, traçaram o paint! de uma Época.
delimitar, mas é claro foi grande e defi-
flagrante a predominância do
nitivo. No entanto, muito curiosa-
conto, em nossos dias, como gênero li-
mente, nós não os sentimos. Porque, no
terário. Se antes poesia, se até
conto, aquele panorama de 20 anos
há pouco llamos romance, agora lemos
atrás, já tão surpreendente, só fez
mais conto. As razões dessa preferên-
ampliar-se. Com a evolução ou maturi-
cia são de natureza vária, A multiplici-
dade dos escritores, que nos deram,
dade de bons autores, a sua diversidade
mesmo no caso de desaparecidos (Cla-
e abrangência, a capacidade que mos-
rice Lispector e Osman Lins), o me-
tra o conto de apreender os tantos as-
lhor de sua obra, essa quadra adversa
pectos da nossa realidade. Agilmente,
coincidiu com a consagração de Lygia
Pedro Martinell/Abril Press

ele compõe o grande mosaico da vida


Fagundes Telles, Murilo Rubião e Ru-
brasileira. Pode-se dizer que rão ape-
bem Fonseca, José J. Veiga, Nélida
nas sobreviveu ou resistiu aos nossos
Piion e João Antônio. Todos, aliás,
anos de luto, mas soube enfrentá-los
cresceram em suas personalidades de
criticamente, e na visão participante se
autor, sem dúvida apreciáveis,
renovou agigantado.
E tivemos os novos aportamentos.
Ricardo Ramos
348
Br DFANBSBVB.GNCAAA, 2404433 4an coa, o 93

CULTURA/CIENCIA: a pesquisa científica e dependência tecnológica

De costas para a pesquisa

O modelo científico promovido pelo Regime Militar


levou a um enfraquecimento geral da pesquisa, acentuando a dependência
tecnológica que persegue o País desde o período colonial

"A única finalidade da ciência está qualquer lugar, independentemente com o desenvolvimento científico
em aliviar as canseiras da vida hu- das fronteiras políticas e dos sistemas como também perseguiu ativamente os
mana." (Galileu Galilei, físico italiano econômicos. Mas é totalmente falso que, em Portugal e suas colônias, se
do século 16 e um dos fundadores da que o esforço que foi preciso desenvol- aventuraram nessa atividade por conta
ciência moderna.) ver para se chegar a estas leis universais própria. O Brasil sofreu as consequên-
Quando dom João VI decidiu fundar tenha sido o mesmo em qualquer país. cias «disso desde a sua descoberta e
o Museu Real, no Rio de Janeiro, em D. João VI precisou comprar o acervo ainda não se havia livrado delas no final
1818, dando início, com grande atraso, de um cientista alemão porque, com do século 20.
à moderna investigação científica no exceção de alguns casos isolados, não A vinda do rei de Portugal para o
Brasil, foi preciso resgatar em dinheiro se fazia pesquisa no Brasil, até então. Brasil modificou um pouco a situação
o pequeno conhecimento existente so- As dificuldades estavam relacionadas da colônia. Revelando a preocupação
bre a realidade nacional. O patrimônio com o papel de Portugal na coloniza- de não deixar o conhecimento da reali-
inicial do museu, de fato, foi adquirido ção do País. Embora tivesse absorvido dade nacional nas mãos de estrangei-
ao mineralogista alemão Abraham e cultivado a brilhante ciência surgida ros, a criação do Museu Real - depois
Werner, um dos fundadores dessa ciên- na Europa durante o Renascimento, a Museu Nacional - permitiu que a pes-
cia e também professor do futuro "pa- atrasada metrópole portuguesa caiu quisa científica fosse, pela primeira vez,
triarca da independência", José Boni- logo em seguida sob o domínio intelec- realizada de forma organizada no País.
fácio de Andrada. tual da contra-reforma religiosa. A par- Com poucos recursos e espirito de pes-
As leis da ciência são válidas em tir daí, não só deixou de preocupar-se quisa incipiente, mesmo então o museu

| é .
r-R

á
RCN
SS
BR DFANBSB 4041323 , pq3

avançou pouco, tendo por grandes no-


mes ainda os estrangeiros como Emílio
Goeldi (suíço) e Henry Gorceix (fran-
cês, organizador também da célebre
Escola de Minas de Ouro Preto).
A questão do desenvolvimento
científico independente do País era,
portanto, um problema antigo e com-
plexo. Sob o Regime Militar - que in-
dubitavelmente expandiu a economia
brasileira, a ponto de levar o País do
26o para o sétimo PIB (Produto Interno - g
Bruto) do mundo -, o que aconteceu? à$
Evoluiu a pesquisa científica? De que
3
forma ela se ligou à meta de promover 82
um desenvolvimento autônomo e a EE!
%
auto-sustentado no País? 9
2
Com a ascensão do Regime Militar,
vi O8
os pegquisadoressbrasileiros tornaram-
se uma comunidade em rápido cresci- O biólogo Luís Hildebrando: exilado O sociólogo Florestan: perseguido
mento, fato que se verifica com facili-
dade. Um exemplo: a Universidade de
São Paulo tinha três mil estudantes em Cientistas punidos
1935, ano de sua fundação, e em 1960
ainda contava com apenas 9,5 mil alu- "Nós fomos proibidos de ensinar, que inclusive inocentava das acusa-
nos. Em 1980, o quadro discente da no Brasil, proibidos de fazer pesquisa ções de "atividade subversiva". boa
maior universidade brasileira havia e estigmatizados como elementos in- parte dos demitidos -, os cientistas te-
mais que triplicado, saltando para desejáveis do ponto de vista político riam que enfrentam o AI-5, já então no
30.934 alunos. Ainda mais impressio- (.. .). Nós tentamos enfrentar o regi- período de 1967 a 1969. Uma lista par-
nante havia sido a progressão dos pós- me, que nos puniu usando o arbítrio cial dos cassados até 1971 incluía 91
graduandos: eram apenas dois em 1935, de que dispunha." Este depoimento intelectuais de todo o País. Alguns
110 em 1965 e cinco mil em 1970, Além foi feito em 1978 pelo professor Flo- dos cientistas atingidos foram Josué
disso, o orçamento do Estado passou a restan Fernandes, um dos pioneiros de Castro (médico), Jaime Tiommo
contar com uma parcela cada vez da Sociologia no Brasil e autor de um (físico), José Leite Lopes (físico), Al-
maior destinada à ciência e à tecnolo- dos mais importantes trabalhos sobre berto Carvalho (pesquisador), Luís
gia. as culturas indígenas brasileiras. Ex- Hildebrando da Silva (biólogo), Aluí-
professor titular da Universidade de sio Pimenta (químico), Maria Nilde
Os números cresciam, mas os São Paulo (USP), foi preso em 1964 e Mascellani (educadora), Paulo Duar-
estímulos se foram reduzindo "aposentado compulsoriamente" em te (professor).
1969, com base no Ato Institucional A repressão teve efeitos danosos
No entanto, embora fosse extrema- no 3. para a pesquisa devido à perda de ho-
mente difícil medir com precisão o vo- Dezenas de outros tiveram o mes- mens experientes, indispensáveis na
lume da produção científica de um mo destino. Logo após o golpe, uma formação de novos quadros no Brasil.
país, os cientistas brasileiros afirma- comissão de inquérito secreta, instau- Anos de trabalho foram desperdiça-
vam, na década de 80, que a nossa ciên- rada pelo então reitor da USP, Gama dos, O professor Florestan Fernandes
cia permanecia extremamente atrasada e Silva, sugeriu a suspensão dos direi- era de opinião que a repressão aos
em relação aos grandes centros inter- tos políticos de 52 professores, alunos cientistas teve uma importância se-
nacionais. Em 1975, embora o Brasil e funcionários; entre eles, o professor cundária, diante de outros setores
fosse o quinto país em população, nú- Mário Schemberg, físico respeitado também atingidos, mais relevantes
meros divulgados pela Sociedade Bra- no mundo inteiro, que seria preso - politicamente. Mas não perdoava o
sileira para o Progresso da Ciência em verdadeiro ato de vandalismo - reitor Gama e Silva, por colaborar
(SBPC) mostravam que o País não pas- por policiais que invadiram sua casa e com o regime: "Foi uma coisa extre-
sava da 29a colocação em número de depredaram sua biblioteca e obras de mamente vergonhosa na história da
trabalhos científicos publicados; nesse arte. : educação no Brasil."
ano, O Brasil produziria um trabalho Encerrado o inquérito de 1964 -
por cem mil habitantes, enquanto nos
EUA a proporção era de um por 1,5
mil habitantes; na Argentina, um por
24 mil; e no Chile um por 36 mil. A leiro", declarou o professor Juarez Lo- uma criação individual"; concluindo
conclusão que acompanhava esses nú- pes, do Centro Brasileiro de Análise e ainda que "não há como se distinguir o
meros era a de que nos países mais de- Planejamento (CEBRAP), "não esti- saber científico da sociedade onde ele
senvolvidos a ciência avançava forte- mulam a demanda de tecnologia e pes- vive".
mente amparada pelo Estado e estreita- quisa científica". Tornava-se claro, Por aí se vê, em retrospectiva, que os
mente ligada à economia, enquanto no dessa forma, o que queria dizer o enge- planos do Regime Militar para a ciên-
Brasil as pesquisas já chegavam pron- nheiro Milton Vargas quando, em uma cia continham duas idéias desastrosas:
tas, através das filiais das grandes em- palestra proferida em 1984, afirmou: primeiro, a de que os cientistas não de-
presas multinacionais sediadas entre "Uma das características mais notáveis viam meter-se na política, mas dedicar- '
nós. "Essas filiais e o governo brasi- da ciência moderna é a de ela não ser se candidamente à ciência por si
360"
bBroranssB v.enNciaaa, AnCO2a, p 34

mesma, como uma coisa desligada do


top poesia
Hrstorpa Na-: pTv rorRAS
gccomer: O No século 17, a ciência no Brasil era
BR A si %. ALC. a estrangeira: ao lado, a "História Natural
. mundo real; segundo, a concepção de
A 485Mípicio et Ber
1. M aVRIT : 24 do Brasil", do holandês Marcgreve. Só
que o pesquisador brasileiro não de-
neste século é que nossa ciência passou a
veria ter a pretensão de "reinventar a
obra de brasileiros: ao centro, o
roda", mas ganhar tempo absorvendo a
pesquisador médico Carlos Chagas e,
ciência e a tecnologia já prontas, cria-
embaixo, o sanitarista Oswaldo Cruz,
das pelos países desenvolvidos, Ou,
pioneiros da saúde.
como disse, em 1977, um dos grandes
cientistas brasileiros, o geneticista gen. As empresas nacionais realmente
Newton Freire-Maia, limitar-se a "re- eram carentes de tecnologia, mas não
solver tarefas menores", dentro da podiam dar-se ao luxo de comprar tec-
ciência mundial. nologia externa, um dos mais caros e
monopolizados produtos comerciais
O Brasil não podia fazer nem existentes. Já as multinacionais adqui-
mesmo uma ciência bem [mln'f' riam tecnologia de suas matrizes, fa-
zendo remessas para o Exterior a título
Na realidade, nem o papel de uma de "assistência técnica" - um item que
ciência pobre - preocupada apenas englobava 68% dos gastos totais do
com a adaptação de conhecimentos Brasil com importação de tecnologia
básicos desenvolvidos por outros - es- (aqui é preciso cuidado: segundo de-

Bibliotecas Nacional
távamos em condições de desempe- núncias frequentes, este item era tam-
nhar. O físico José Goldemberg, em bém inflacionado por remessas "esca-
1975, embora ressaltando a enorme im- moteadas" de lucros não relacionados
portância das verbas destinadas à ciên- i L #! necessariamente com importação de
ª "r_AFITII'Gbªnl,

cia no Brasil, afirmou que estávamos &?“ Lad sá tecnologia).


ainda muito longe de nossas necessida-
des reais. Nossa verba de 1974, segundo A meta sempre era absorver os
Goldemberg, era de 400 milhões de conhecimentos vindos de fora
dólares: quatro dólares por habitante,
uma ninharia face à taxa de um grande Enfim, além de insuficientes, as ver-
país como os EUA (110 dólares per bas para a ciência eram mal distribui-
capita) e ainda menor que a metade da das - ou melhor, eram distribuídas de
taxa de uma nação média como a Itália modo a privilegiar os objetivos econô-
(nove dólares per capita). Pior do que micos, dentro do modelo dependente
isso, afirmava o físico brasileiro, era o implantado pelo Regime Militar. Uma
fato de que a importação de tecnologia análise criteriosa dos dois primeiros
estrangeira estava ascendendo a um pa- grandes Planos Básicos de Desenvolvi-
tamar muito acima do orçamento mento Científico e Tecnológico
científico, com gastos de 800 milhões (PRODCTs, editados a partir de 1973)
de dólares em 1973 e perto de três bi- mostrava que suas áreas prioritárias de
lhões em 1974. pesquisa coincidiam com os setores de
Esse problema se revelava ainda ponta da economia internacional: ener-
mais perverso quando examinado com gia nuclear, computadores, indústrias
maior detalhe. Assim, verifica-se que o aeroespacial e petroquímica: Certa-
grosso de nossos gastos com tecnologia mente não era uma tentativa de con-
externa, entre 1965 e 1970, não era se- correr, nesses setores, com um país
quer realizado por empresas nacionais como os EUA - onde a verba para a
carentes de ciência própria, como se ciência em 74 era de 25 bilhões de dóla-
poderia pensar. Nesse período, 73% das res -, mas de persistir na idéia de ficar
importações foram feitas por grandes para sempre como um país absorvedor
empresas estrangeiras, fossem elas in- de conhecimentos alheios. Além disso,
dependentes, em menor proporção, ou notavam-se clareiras importantes na
filiais de multinacionais, principal- distribuição de recursos no que con-
mente. Apenas 27% das importações cerne, por exemplo, às ciências huma-
corriam por conta de empresas brasilei- nas, aí compreendidas áreas nobres
ras. Era possível até mesmo conhecer como a Antropologia, a Política, o Di-
estas grandes firmas estrangeiras, já reito, a Educação, a História e a Eco-
que 40% dos gastos se originavam no nomia.
setor de transportes, mais específica- Não se pode esquecer, ainda, o atre-
mente no râmo de veículos (32% do to- lamento da pesquisa ao problema do
tal das importações). Nada mais natu- endividamento externo: programas
ral, portanto, do que identificar como como os de melhoramentos genéticos
principais países exportadores da tec- avançaram substancialmente a partir
Biblioteca Nacional

nologia que comprávamos a Alemanha da década de 70, devido ao problema


(33% do total) e os EUA (30%). Eram de se montarem gigantescas culturas
desses países as maiores empresas de homogêneas, compostas de uma só
veículos instaladas no Brasil, como a planta, como a soja ou a cana-de-
Ford, a General Motors e a Volkswa- açúcar. A agronomia mostra que plan-

351
BR DFANBSB V8.GNC.AMA, $4041B3an
002, p 95

tações desse tipo - imensas fontes de quezas, entre outros temas. Assim, a re-
alimentos - transformam-se em verda- ligadas à ciência.
união de 1977, marcada inicialmente
deiros imãs de pragas, a ponto de O fato é que o Regime Militar insti-
para Fortaleza, foi transferida para São
ameaçar torná-las inviáveis economica- tucionalizou a ciência de modo autori-
Paulo, onde contou com a ajuda de di-
mente, se não se aprimorassem varie- tário, centralizando absurdamente seus
versos setores da oposição. A arquidio-
dades geneticamente mais resistentes. órgãos principais. O comando geral da
cese paulistana, através da Pontifícia
Ocorre que o Regime Militar tinha in- política científica atuava sob o Minis-
Universidade Católica (PUC), cedeu
teresse na soja - produto muito bem tério do Planejamento, que interligava
suas instalações para o encontro.
pago no mercado internacional - como ações do CNPq e outras entidades
O recuo do regime desencadeou rea- como a FINESP (Financiadora de Es-
forma de obter divisas externas. Assim ções diferentes entre os cientistas e, em
se explicavam os gordos recursos da tudos e Projetos) e o BNDES (Banco
1978, Rocha e Silva revelou-se contra
EMBRAPA (Empresa Brasileira de Nacional de Desenvolvimento Econô-
uma tentativa de aproximação entre a mico e Social). A política científica,
Pesquisa Agrícola), comprometida com SBPC e o governo. As diretrizes poste-
estudos importantes para diversos pro- além disso, foi organizada a partir de
riores da SBPC mostraram que a co-
dutos de exportação. Ela recebeu, no diretrizes estipuladas, em 1964, com
munidade científica tendia a despoliti-
orçamento de ciência e tecnologia de participação do próprio Conselho de
zar gradualmente a entidade, uma vez
1981, recursos maiores que o próprio Segurança Nacional. Na verdade,
encerrado o ciclo mais terrorista dos
CNPq (Conselho Nacional de Desen- desde a Segunda Grande Guerra, o pla-
governos do Regime Militar.
volvimento Científico e Tecnológico), nejamento da ciência era uma necessi-
o principal órgão governamental para o dade cada vez mais premente das gran-
As multinacionais precisavam no
planejamento científico no Brasil, A des empresas internacionais. Para
EMBRAPA nesse ano recebeu 18% do País só de técnicas simples implantar-se nos países subdesenvolvi-
Orçamento para a ciência, contra 14o% dos, as multinacionais precisavam de
No entanto, as dificuldades políticas técnicos locais que conhecessem e sou-
destinados ao CNPq, com o governo prosseguiriam, como se bessem lidar com as novas tecnologias
via por um documento da SBPC, de em surgimento: radares, foguetes, com-
Após 64, a SBPC denuncia o
1983, dirigido ao Ministério do Planeja- putadores, produtos químicos deriva-
fechamento político mento, pedindo reformas nos mecanis- dos de moléculas complexas, etc. Exa-
mos de decisão e de fomento da polí- tamente como estava nos planos do
Em vista de todos esses fatos, os pla- tica científica,
nos do Regime Militar acabaram, ironi- Regime Militar.
O jornal O Estado de S. Paulo O CNPq era de 1951, criado por Ge-
camente, forçando os cientistas a sair comentou em editorial o documento, túlio Vargas com atribuições muito li-
dos laboratórios e vir para as ruas dis- afirmando que ele representava uma
mitadas (desenvolver a energia nu-
cutir política. E em nenhum lugar isso manifestação de "cansaço, impaciência clear). No mesmo ano foi criado um
se revelou melhor dos que nas famosas e desconfiança" por parte dos cientis-
reuniões anuais da SBPC, Após o golpe órgão-chave para a formação de pes-
tas. Afirmava ainda que estes últimos quisadores, a CAPES (Campanha de
de 1964, sob a presidência de seu fun- não se consideravam representados nos
Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino
dador, fisiologista Maurício da Rocha e órgãos de decisão, "atribuindo a condi- Superior). Ambos passaram por diver-
Silva, a entidade máxima da comuni- ção de usurpadores" aos então ocupan- sas reformulações sob o Regime Mili-
dade científica denunciou o fecha- tes do comando das entidades oficiais
tar, até cair sob o comando do Minis-
mento político e se recusou a negociar
com os governos dos generais, Nesse
período, até 1969, perdurou um clima
de expectativa em que ainda se articu-
Modelo americano
lavam os novos planos para a ciência
nacional, As reuniões da SBPC se tor-
Nos EUA, a estrutura de planeja- contra apenas 22% em 1921.
nariam cada vez mais importantes en-
mento e gastos científicos privilegia as Outro aspecto importante. Essa oli-
tre 1969 e 1973, a etapa mais dura da
grandes empresas e a pesquisa em ar- garquia privilegiada se distribuía pra-
repressão política, quando os cientistas
mamentos, em detrimento das univer- ticamente por apenas cinco grupos de
seriam perseguidos, presos, cassados e
sidades e da busca do conhecimento indústrias, nessa ordem: aeroespacial,
demitidos às dezenas. da natureza em benefício dos ho-
Foi então que o regime impôs o seu eletro-eletrônica, metalúrgica-
mens. Segundo uma análise feita em mecânica, química pesada e instru-
esquema institucional de pesquisa. Mas
1962, quando se gastou 15 bilhões de mentação. Monopolizados pelas mui-
também abriu seus flancos políticos: a
dólares com ciência e tecnologia nos tinacionais, nesses grupos se instalava
partir de 1974, em plena "distensão" do
EUA, a maior parte dos recursos dis- a poderosa indústria militar ameri-
presidente Geisel, os cientistas tiveram
poníveis (65%) saia do bolso do Es- cana. Dados posteriores confirma-
o seu período de maior agitação oposi-
tado, sendo o restante investimentos riam a força da indústria bélica: em
cionista, só arrefecendo seus ataques
privados. No entanto, menos de 26% 1982, ela era responsável por 75% dos
após a "abertura" do general Figuei-
desses gastos eram feitos nos institu- gastos com pesquisa nos EUA, Nesse
redo, em 1978, tos federais ou nas universidades.
Os encontros mais concorridos da ano, apenas 3,6% desses investimen
Computadas apenas as 400 maiores -
SBPC, de fato, começaram em 1974, tos, segundo os analistas, tinham rela-
empresas (com mais de cinco mil em- ção com a busca de conhecimentos
em Recife, passando depois por Belo
pregados), verifica-se que elas. captu- básicos. Um ano depois, a parcela da
Horizonte, Brasília e São Paulo. Neste
ravam 62%, do total de gastos. Assim, indústria bélica subiria para 76,6%,
último, de 1977, não contou com ver-
não surpreende constatar que, em enquanto a busca do conhecimento -
bas oficiais, um revide do governo às
1957, estas empresas detivessem 60% mero subproduto das artes de matar
denúncias corajosas, levantadas nos de-
das patentes registradas nos EUA, - cairia para 3,5%.
bates e assembléias anteriores, contra a
tortura e a distribuição desigual das ri-

352
BR DFANBSB V8.GNC.AAA. 24044 32 ANCO2D qo 96

Agencia Estado
Sílvio Ferreira/mpril Press

Paulo Barvosa

Crodowaldo Pavan (à esq.), presidente da SBPC


numa fase de vigorosa militância (à dir., o congresso
de 1977, em São Paulo) e o fisiologista Rocha e Silva
(ao centro): a luta pela liberdade e pela ciência
tornou-se uma so p

tério do Planejamento, em 1974. menor que o dos holandeses nas pri- tes da criação da SBPC, episódio em
Assim, embora tenha sido útil para o meiras manifestações científicas no que Rocha e Silva teve um papel desta-
regime, a política econômica teve um Brasil. E de um holandês, Georg Marc- cado. Uma personalidade marcante,
efeito limitado para a ciência brasileira, grave, o livro História Natural do Brasil, tido como briguento e brilhante, o físio-
pouco mais que uma reedição de seus de 1648, onde aparecem as primeiras logista havia tido uma carreira comum
pequenos avanços em certos períodos descrições sistemáticas da flora nordes- a muitos outros dos nossos grandes
do passado. Era interessante constatar tina. Continha também um capítulo so- cientistas deste século. Filho de médico
que alguns desses períodos de avanço bre medicina no Brasil que o tornou e neto de um pequeno comerciante
ocorreram quando nossos cientistas pu- um dos livros sobre o assunto mais im- português emigrado, Rocha e Silva
deram dedicar-se aos problemas rela- portantes do século 17. teve sua iniciação à pesquisa, na dé-
cionados com a realidade nacional. Os Isso não significava, de forma al- cada de 30, com os célebres irmãos
cientistas dos institutos biológicos, na guma, que os cientistas brasileiros pre- Osório de Almeida, conhecidos por te-
virada do século, voltados para o pro- tendessem fechar os olhos às áreas de rem formado várias gerações de fisiolo-
blema das doenças tropicais, foram ca- vanguarda da ciência internacional. Ao gistas em um laboratório montado em
pazes de fazer a caracterização de contrário, denunciavam a ciência utili- sua própria residência, no Rio.
patologias ainda desconhecidas, tarista promovida pelo Regime Militar, Em 1948, ele estava no Butantã -
como a febre tifóide, em São Paulo. alertando que, quando a pesquisa fun- que então passava por um período de
Desenvolveram-se, nesses institutos, damental foi deixada de lado, houve restauração de seu antigo prestígio - e
grandes cientistas, como Vital Brasil, um enfraquecimento geral da pesquisa participou do episódio que deu origem
descobridor do soro antiofídico, tam- no País. à SBPC.
bém trabalhando em uma área pouco O incidente detonador foi a designa-
conhecida pelos europeus. Outro A SBPC já surgiu para combater ção de Eduardo Vaz para a direção do
exemplo é o de Oswaldo Cruz, que de- arbitrariedades obscurantistas Instituto - um ato arbitrário do gover-
senvolveu métodos pioneiros de saúde nador de São Paulo à época, Adhemar
pública. O mesmo se pode dizer de Mas, certamente, não foi por acaso de Barros. Mais ligado à indústria far-
Carlos Chagas, o primeiro a descrever que uma das maiores descobertas da macêutica que à pesquisa, Vaz decidiu
a terrível doença que leva seu nome. ciência no Brasil, destacando seu des- fechar seções importantes de pesquisa
Ao mesmo tempo, Santos Dumont cobridor numa das áreas mais ativas da no Butantã, como o Hospital Endocri-
tornou-se o inventor do avião apenas pesquisa mundial, tenha sido feita nológico. Também demitiu pesquisado-
porque teve acesso à tecnologia fran- num instituto biológico. Seu autor foi o res por motivos políticos, como Gastão
cesa, em 1906. falecido professor Maurício Rocha e Rosenfeld. O resultado, um ano depois,
Os portugueses, em 1711, apreende- Silva, (1910-83), que em 1984 identifi- seria o reconhecimento, por parte dos
ram um livro denunciando o descaso cou a bradicinina, uma molécula natu- cientistas, de que precisavam de uma
com que tratavam o desenvolvimento e ral dos tecidos vivos que mais tarde se entidade representativa - a SBPC.
o ensino das técnicas empregadas no demonstrou ter papel importante em Através dela, pretendiam veicular suas
fabrico do açúcar, então a principal ati- diversos mecanismos fundamentais dos idéias e suas posições, voltando-se,
vidade econômica do País: Cultura e organismos, como a pressão arterial, a como afirma já sob o Regime Militar
Opulência no Brasil por suas Drogas e coagulação sanguinea e as defesas or- um cientista, "contra a desastrosa in-
Minas, de André Antonil. Por atitudes gânicas. tromissão dos governos na vida das
como essa, acabaram tendo um papel Essa descoberta foi feita um ano an- instituições de pesquisa".
353
BR DFANBSB VB.GNC.AAA. 4041334300 2,09%

COMPORTAMENTO/FEMINISMO: as mulheres na política


méstico para reivindicar, ao nível do es-
paço público, a garantia da sobrevivên-
cia do grupo familiar.
A desigualdade gerada pela distribui-
A mulher na rua ção de renda aliou-se ao arrocho sala-
rial. Na segunda metade da década de
60 desponta o Movimento do Custo de
Desde o século 19; a mulher vem desenvolvendo marcan
te Vida, liderado por donas-de-casa. Num
trajetória política. Uma história que, como a dos esforço extraordinário, em 1978 esse
negros e
pobres, muitas vezes tem sido ocultada movimento colheu mais de um milhão
de assinaturas contra a "carestia" e
essa lista de nomes foi entregue em
Sempre que se fala em atuação da política diversificada em várias corren- Brasília, em 1978. Nas eleições desse
mulher, seja no trabalho, seja na polí- tes. A "Marcha da Família, com Deus, ano, o movimento, com o apoio da
tica, ouve-se dizer que agora ela mudou, pela Liberdade" ficou conhecida como Igreja Católica, elegeu uma mulher,
que somente agora a mulher moderna um movimento liderado pelas mulheres Irma Passoni, deputada estadual.
tende a trabalhar fora de casa e co- das camadas dominantes contra o go-
meça finalmente;a se interessar por verno constitucionalmente eleito e Em 1975, é fundado
o
política: A verdade é que, assim como como detonador do golpe militar de 31 Movimento Feminino pela
para o negro ou as classes pobres, tam- de março. É claro que este movimento Anistia
bém a história da mulher tem sido integrava-se a todo um conjunto de for- A partir de 1975, com as comemora-
ocultada. Ao procurar nossa trajetória, ças que visava a romper a ordem insti- ções do Ano Internacional da Mulher e
vemos, por exemplo, que na segunda tucional e sua vitória representou a im- com os Congressos da Mulher Paulista,
metade do século 19 existiam pelo me- plantação da censura à imprensa e às expande-se o movimento de luta por
nos seis jornais feministas em circula- artes, um cerceamento maior às ativi- creches como um direito da mulher lu-
ção no Rio de Janeiro (em 1984 existia dades dos sindicatos, aos partidos polí- tar pela guarda de seus filhos.
um, apenas em São Paulo), nos quais ticos e às liberdades individuais. Além O resultado desses movimentos foi a
matérias sobre política, direitos e litera- disso, arrocharam-se os salários e a implementação de alguns programas
tura podiam ser encontradas. classe trabalhadora perdeu suas condi- de vendas de produtos alimentícios di-
Em cada período da história brasi- ções mínimas de reprodução. Por retamente ao consumidor e o início da
leira, a mulher, através de grupos de li- exemplo, no ano de 1973, no auge do construção de creches públicas, espe-
derança, tem participado nos movi- milagre econômico, na região da cialmente em São Paulo. Em fevereiro
mentos contemporâneos, embora fre- Grande São Paulo, o índice de mortali- de 1975 é fundado o Movimento Femi-
quentemente sua presença seja omi dade infantil era superior a cem em nino Pela Anistia, pelas mães e filhas de
tida. cada mil crianças nascidas vivas. presos políticos, exilados e banidos
A partir de 1964, a presença femi- Donas-de-casa ou trabalhadoras se pelo Regime Militar. Em 1979, ano de
nina desenvolveu marcante trajetória viram, assim, emergindo do espaço do- aprovação da lei de anistia, essa ban-
Agência O Globo

Nos últimos 20 anos, a mulher desenvolve uma diversificada trajetória política


no País.
Dasfolclóricas "marchadeiras" que comemoraram o golpe, no Rio, em 2/4/64 (acima),
à forte oposição ao regime: na votação do projeto de anistia, no Congresso, agosto
de
1979 (ao lado): e na manifestação pelas eleições presidenciais diretas,
em Brasília,
1984 (pág. ao ado)
354 "
BR DFANBSB VB.GNCIAAA. $4 p93&

deira já havia ganho âmbito nacional questão da sexualidade, da saúde, de sendo eleitas, mas elegeu-se uma vice-
com a fundação do Movimento Brasi- conscientização até a atuação política. governadora (no Estado do Acre) en-
leiro pela Anistia. Todos eles foram importantes, fosse tre sete candidatas. E, das que disputa-
Essa forma de exercer a cidadania se para a organização de mulheres, fosse ram o cargo de prefeita, 81 tiveram é-
somou à ideologia do movimento femi- para romper o debate público. Nesse xito.
nista, que preconizava justamente a sentido foi significativa a Frente de
plenitude da igualdade de direitos. Não Mulheres Feministas de São Paulo, que Nos anos 80 a muiher participa
se tratava, como muitos tentaram misti- produziu em 1980 e 1981 uma série de mais na vida política do País
ficar, de abandonar a casa ou a família, debates públicos sobre a questão da
mas de ter direito de lutar por ela, se mulher, procedimento este que poste- Na década de 80, aliás, observava-se
este fosse 0 caso, no espaço político. riormente foi seguido por outras enti- uma maior participação quantitativa e
Tratava-se de levar para a arena as dades. Nesta série, o primeiro debate qualitativa da mulher na vida política
questões do espaço supostamente pri- realizado no Teatro Ruth Escobar, dis- brasileira. A partir de 83 esse movi-
vado. cutia com todos os partidos suas pro- mento apresentou algumas inovações,
A repercussão destas posições se fez postas para com a mulher. Como se dentre as quais cabe destacar a criação,
sentir também ao nível dos sindicatos, pode imaginar, a maioria não tinha pro- a nível de Estado, de dois conselhos
que, conquanto tenham em seus qua- postas, exetuando-se o PMDB, que de Condição Feminina, o de São Paulo
dros poucas mulheres, passaram a trouxe um pré-projeto de criação de e o de Minas Gerais. A característica
incorporá-las em maior número. um Departamento Feminino. As elei- destes Conselhos é a de, ao abrir um es-
E este novo quadro permitiu que os ções de 1982 marcaram algumas inova- paço para a atuação da mulher na es-
grupos feministas do Brasil todo ini- ções. O eleitorado feminino represen- trutura do Estado, tentar também abrir
ciassem um projeto de transformação tava então 45% dos votos. As mulheres 'um espaço para que os movimen-
do Código Civil no sentido de equipa- se candidataram a todas as instâncias, tos femininos e feministas tenham um
rar as condições jurídicas da mulher e mas não em todos os Estados. Pôde-se canal que veícule suas reivindicações
do homem. A proposta foi encami- observar que houve uma elevação no dentro do mecanismo do Estado. No
nhada e aprovada pela Câmara de De- número de candidatas e de eleitas, ca- conselho de São Paulo, por exemplo,
putados em 1984 e aguardava a ratifica- racterizando uma tendência de que 60% das conselheiras são mulheres da
ção do Senado. mais mulheres entraram na disputa sociedade civil e 40% são funcionárias
eleitoral. Candidataram-se duas mu- de secretarias de Estado. Com isto se
Em 82, o eleitorado feminino lheres para o Senado, 58 para a Câmara procura preservar a autonomia dos gru-
representava 45% dos votos dos Deputados. Nenhuma mulher foi pos organizados, que têm sua atuação
eleita para o Senado, mas para a Câ- absolutamente autônoma e específica,
A ação dos grupos feministas mara dos Deputados oito se elegeram. mas se abre um espaço onde a partici-
diferencia-se e multiplica-se pelos Para as Assembléias Legislativas pação se faz presente.
vários Estados brasileiros. Formaram- candidataram-se 134, elegendo-se 28
se grupos com as mais diversas preocu- mulheres no Brasil todo. Duas
pações: desde aqueles dedicados à candidataram-se a governador, não Eva Blo

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Namba/Abril
Agência O Globo

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Carlos
BR DFANBSB V8.GNCIAAMA, 84043334 an Coa ,p39

Mas a mesma autora acrescenta, en-


tretanto, que em alguns casos esse mo-
delo está desaparecendo ou já desapa-
receu. É que, apesar de todas as difícul-
dades, a participação popular, inicial-
mente nas grandes cidades e depois
também no interior, foi abrindo cami-
nhos, contribuindo para a elevação da
consciência política.
Para revigorar o modelo antigo,
atualizá-lo, adaptando-o às modifica-
ções ocorridas no País, a tendência dos
governos militares pós-64 foi a de res-
tringir a participação popular, a auto-
nomia dos Estados e municípios e os
poderes das Câmaras de deputados e
vereadores. A ordem institucional colo-
cada em vigor permitiu "decretar o re-
cesso das Câmaras de vereadores" ou
"cassar mandatos eletivos municipais"
ou "suspender os direitos políticos" de
prefeitos e vereadores. Também as
constituições de 1967 e 1969 determi-

Dados/FSP
naram que os prefeitos das capitais pas-
sariam a ser nomeados e não mais elei-
tos; aumentou-se, além disso, o número
de municípios classificados como "es-
tâncias hidrominerais" ou "áreas de se-
gurança nacional", cujos prefeitos tam-
A partir de 1982, após a vitória da oposição em vários Estados, a insatisfação dos bém não eram eleitos, mas nomeados
prefeitos leva-os, sob a liderança de Orestes Quércia (ao centro), a formar a Frente (no final de 1984, quando o Regime
Municipalista Militar já parecia exaurido, foi devol-
vida a autonomia para 74 desses mu-
POLÍTICA/MUNICIPALISMO: a perda de autonomia dos municípios nicípios).

As prefeituras tinham direito a


tão somente dois impostos
Poder de baixo
Da mesma forma, foi restringida a
autonomia financeira dos municípios.
Após 64, a tendência do regime foi restringir a autonomia
Segundo as constituições de 1967 e
dos municípios, voltando a uma tendência centralizadora 1969, os municípios, além de taxas e
característica dos anos 30 contribuições de melhorias, só podem
cobrar dois impostos: sobre proprie-
dade territorial e urbana e sobre servi-
Segundo a tradição constitucional Ao se reunir a Constituinte de 1946, ços de qualquer natureza, não com-
brasileira, os municípios deveriam go- os setores que defendiam os interesses preendidos na competência tributária
zar, embora com restrições, de autono- populares ainda eram fracos. Quando a da União ou dos Estados. Como são
mia política, financeira e administra- autonomia municipal foi reafirmada e justamente os impostos de menor im-
tiva. Mas até que ponto os 4.130 mu- ampliada pela nova Carta, os maiores portância, representavam apenas 3% e
nicípios brasileiros dispõem, de fato, beneficiários acabaram sendo as cor- 1%, respectivamente, da receita da
dessa tríplice autonomia? Ao examinar rentes liberais conservadoras. Estudos maioria dos municípios interioranos,
a história do Brasil, fica visível a cone- sobre a realidade política dos munici- que ficavam assim na completa depen-
xão entre o tipo de desenvolvimento pios, realizados na década de 50, identi- dência das cotas do ICM (Imposto so-
econômico-social e a efetiva autono- ficaram algumas constantes. De acordo bre Circulação de Mercadorias) a se-
mia das menores unidades administrati- com a pesquisadora Ana Maria Brasi- rem transferidos pelos Estados e das
vas do Estado. leiro, em seu trabalho O município como contribuições do Fundo de Participa-
O desenvolvimento do capitalismo, sistema político, "em primeiro lugar, ção dos Municípios, controlado pelo
nas primeiras décadas do século 20, famílias e parentelas exercem um papel governo federal. E, como essas transfe-
criou a necessidade de uma integração básico em todas as comunidades estu- rências não eram automáticas, repre-
maior da vida política e econômica do dadas. Em muitos casos, a estrutura de sentavam novas fontes de dificuldades
País e de um fortalecimento do apare- poder é realmente monolítica e pirami- financeiras e de aumento das possibili-
lho administrativo central. Com a revo- dal. A elite possui riqueza, status e po- dades de pressões políticas sobre os
lução de 30, a tendência centralizadora der. Riqueza é geralmente represen- municípios. Também a autonomia ad-
passou a dominar e, salvo o curto tada pela posse das terras; status, pela ministrativa dos municípios sofreu mo-
período de vigência da Constituição de condição de família tradicional; e po- dificações: as prefeituras perderam até
1934, a autonomia dos Estados e mu- der, pelo controle de postos e empre- mesmo o poder de combater a polui-
nicípios foi praticamente revogada. gos públicos e de votos". ção através do fechamento de fábricas.
356
BROFANBSBVB.GNCAAA. 2S4O04J33329n00a, £09

ECONOMIA/INDÚSTRIA: o setor de material bélico lança-chamas, mísseis e foguetes, ca-


nhões, fuzis, metralhadoras e pistolas
automáticas, além de muitos outros
produtos.
A guerra é nossa Embora o Brasil produzisse arma-
mentos desde a chegada de dom João
VI (1808), foi depois da proclamação da
Em 1984, o Brasil era o maior exportador de armas do República (1889), com a crescente im-
portância que os militares passaram a
Terceiro Mundo, tornando-se uma ameaça à paz e um ter na vida política, que a preocupação
reforço às ditaduras do subcontinente americano com o preparo e o equipamento das
tropas se conseguiu impor.
Em 1964, analistas europeus, sempre
atentos à evolução do armamento Vargas queria siderúrgicas
mundial, afirmavam que as Forças Ar- para modernizar Forças Armadas
madas brasileiras, equipadas com ma-
terial obsoleto, estavam sendo supera- O movimento tenentista, nos anos 20,
das pelas da Argentina, que estavam sempre associou a questão da moderni-
adquirindo material europeu moderno. zação do aparelho militar com a neces-
Naquela época, todo o material bélico sidade de um desenvolvimento indus-
utilizado por nossas Forças Armadas trial autônomo para o País. Essa idéia
era americano, com exceção de armas orientaria todos os esforços do governo
leves e munições que eram fabricadas Vargas (1930-45), onde a influência te-
em pequenas empresas isoladas. nentista era decrescente, mas ainda
Em 1984, depois de 20 anos de Re- presente, para conseguir créditos ame-
gime Militar, o Brasil tornou-se o ricanos e instalar a siderurgia no Brasil.
maior exportador de armas de todo o No início da Segunda Grande
Terceiro Mundo e o sexto produtor e Guerra, a indústria brasileira já produ-
exportador no ranking mundial. E havia zia revólveres, fuzis, uniformes e toda a
montado um complexo militar, indus- munição leve de que o Exército neces-
trial e institucional capaz de produzir sitava. Mas, depois do final do conflito,
Agência O Globo

um veículo blindado a cada 18 horas, em 1945, o Brasil foi inundado por ar-
um avião a cada 20 horas e mil armas li- mas e equipamentos bélicos cedidos
geiras e médias por semana. pelos americanos.
Esse complexo era composto por Terminada a guerra, uma nova reali-
mais de 350 empresas estatais e priva- dade internacional surgia. Os Estados
das (nacionais e estrangeiras), das O Regime Militar alçou o País ao sexto Unidos passam a ter um papel determi-
quais 50 produziam material bélico di- lugar no ranking mundial dos nante em todo o mundo capitalista e
retamente. Empregava mais de 200 mil exportadores de armamentos. uma tensão surge entre a nação ameri-
pessoas e movimentava algo em torno Acima, Silvio Frota, então ministro do cana e a URSS. Com a justificativa de
de dez bilhões de dólares por ano, o Exército, examina carros Cascavel, em defender seus aliados, os Estados Uni-
que representava 5% do PNB (Produto set./75; abaixo, o lança-foguetes Astros dos criaram o Programa de Assistência
Nacional Bruto). II, produzido pela Avibrás Militar (MAP), visando a fornecer ar-
Segundo estimativas, o País, na dé-
cada de 80, conseguia exportar por ano
mais de dois bilhões de dólares e as ar-
mas passaram a ocupar o terceiro lugar
entre nossos produtos de exportação,
competindo com o tradicional café,
Tornavam assim, em plena recessão
mundial, uma esperança de manter em
pé o modelo de desenvolvimento brasi-
leiro, atolado numa dívida externa que
chegava a 100 bilhões de dólares em
1984.
Nossos clientes, mais de 30 nações
'por todo o mundo, cobriam todo o
continente latino-americano, espa-
lhavam-se pela Africa Negra e Ori-
ente Médio, reunindo num mesmo
conjunto países como o Qatar, um pe-
queno emirado árabe, e a República
Popular da China. Eles podiam esco-
lher entre aviões (para transporte de
tropas, de patrulha, de treinamento
avançado, de ataque), tanques e carros
blindados de combate e reconheci-
mento, navios, lanchas de patrulha,

357
ar va.Gnc.aaa, 84044334 ancoõap 204

mamentos, créditos e treinamento para estrategistas, que sonhavam em tornar trial, nos moldes daquele. Nesse

as forças armadas latino-americanas. o Brasil uma grande potência. Um mesmo ano, era instalada a Comissão

Na verdade, aproveitando-se de sua aliado se apresentou de imediato: a ini- de Mobilização Industrial de nível

hegemonia econômica e política na re- ciativa privada. nacional, na Confederação Nacional

gião, os Estados Unidos garantiam um Os militares agora no poder eram li- da Indústria.

mercado para suas armas, em geral já gados a vários empresários paulistas Tendo decidido basear no mercado
utilizadas na Segunda Grande Guerra que, arregimentados pelo IPES (Insti- interno o seu reequipamento, as Forças
ou na guerra da Coréia, na década de tuto de Pesquisas e Estudos Sociais), ti- Armadas puseram a serviço da indús-
50, afastando concorrentes europeus. E, nham participado da conspiração con- tria privada os seus centros de pesquisa
assumindo a responsabilidade de trei- tra o governo Goulart. Estes formaram, e desenvolvimento, como o Centro
nar os militares latinos no seu manejo, em 1965, em São Paulo, o Grupo Per- Tecnológico Aeroespacial, o Instituto
o Departamento de Defesa americano manente de Mobilização Industrial de Engenharia Militar e o Centro de
criava vários mecanismos para influir (GPML). A iniciativa partiu de empre- Pesquisa da Marinha.
diretamente naquelas forças armadas. sários organizados na Federação das As encomendas feitas pelas três Ar-
Para ter acesso àquele armamento, Indústrias do Estado de São Paulo mas, nos anos que se seguiram ao
nosso país assinou um acordo militar (FIESP) e principalmente dos setores golpe, representaram um mercado ga-
com os EUA, em 1952, Ele não impli- ligados à indústria automobilística. rantido numa época de recessão e mui-
cavá" na transferência de tecnologia e, tas indústrias começaram primeiro a
Empresário, líder do IPES, define
quando o Brasil o denunciou, em 1977, fornecer a elas equipamento militar,
era considerado um entrave ao desen- os objetivos do grupo depois a prestar serviços técnicos e, por
volvimento, de nossa indústria bélica. último, absorvendo tecnologia, des-

Ao se iniciar a década de 1960, já ti- O empresário Vitório Ferraz, líder locando-se para a produção direta de
nha ficado claro aos militares brasilei- do IPES e primeiro presidente do produtos bélicos.

ros o preço de uma vinculação unilate- GPM, definiu os objetivos do grupo Foi o caso da Bernardini S.A. Indús-
ral e sem limites com uma grande po- no seu lançamento: "Tentará alcan- tria e Comércio e da Biseli Viaturas e
tência. O material bélico se tornava ra- car a adequação dos padrões indus- Equipamentos Industriais Ltda., anti-
pidamente obsoleto e era cada vez mais triais às necessidades das Forças Ar- gas fabricantes paulistas de cofres-
difícil conseguir peças de reposição. madas. Dará incentivo à pesquisa in- fortes e de caminhões blindados para
Surgiu uma defasagem entre o arma- dustrial no campo militar. Ajustará a transporte de valores. Com a experiên-
mento que era enviado ao nosso país e fabricação de equipamentos, máqui- cia adquirida ao modernizarem, com a
o que estava sendo fabricado nas gran- nas e acessórios para as Forças Ar- assessoria de técnicos do Exército, os
des potências, e as necessidades de ma- madas. Indicará as firmas que esti- velhos tanques Stuart M-3AL, proje-
nutenção esbarravam sempre nas nos- verem melhor adaptadas à execução taram o Carcará, um carro de combate
sas dificuldades cambiais. do serviço ou fabricação de equipa- moderno e ágil, que passaram a forne-
Para complicar ainda mais, com o mentos militares." cer ao próprio Exército e a exportar.
envolvimento crescente dos Estados Uma prova de que esse relaciona- A empresa que se tornou o carro-
Unidos na guerra do Vietnã, aquele mento prosperou e uma indicação de chefe da indústria bélica no Exterior foi
país se viu frente a necessidades gigan- que a indústria bélica se espalhou a Engesa (Engenheiros Especializados
tescas de material e munições e passou pelo País podem ser vistas no fato de S.A.). Organizada no início dos anos
a restringir a transferência de equipa- que, em 1984, as federações indus- 60, em São Paulo, ela adaptava tração
mentos para a América Latina. triais de 18 Estados tinham criado de- total em caminhões civis e militares.
Por outro lado, os americanos come- partamentos de mobilização indus- Criou um sistema inédito de tração.
cavam a se mover num novo parâmetro
estratégico. Não se tratava mais de ar-
mar seus aliados para que se defendes-
sem de um inimigo externo, mas prepa-
rar e armar os exércitos para missões
de contra-insurgência. O MAP é gra-
dualmente esvaziado de suas verbas em
prol de um novo programa - o Security
Assistance,
Em busca do armamento que não
era fornecido pelos EUA, o subconti-
nente latino-americano retornou ao
tradicional mercado europeu de armas. Abs um e ”!"/'.
No período compreendido entre 1967 e sia, --SRA É. vt. a

1972, enquanto os EUA vendiam 230


milhões de dólares em armas na
América Latina, os países europeus
venderam 1,2 bilhão,
Embora tenham tido, por todo o sé-
culo, uma presença marcante na vida
política brasileira, foi com o golpe mili-
João Bittar/Abril Press

tar de 1964 que os militares tomaram


para si o controle total do Estado brasi-
leiro. Reuniram assim as condições ne-
cessárias para reequipar as Forças Ar-
madas de acordo com as idéias de seus

358
nentes de antanho, o Brasil não cons-

truiu sua indústria de armamentos ba-

seada no desenvolvimento industrial

autônomo do País. Para substituir o

fornecimento americano, os militares

brasileiros tiveram que aceitar todo

tipo de associação com as multinacio-

nais, detentoras do capital e do conhe-

cimento tecnológico.

No período 1967-73, foram estabele-

cidas no País mais de 100 joint-ventures,

associações com capitais europeus,

principalmente, que incluíam transfe-

rência de linha de montagem para fa-

bricar armas. Além disso, firmas euro-

péias instalaram filiais aqui, como as

alemãs Krauss-Maffei (tanques), NAK

(tanques leves) e Zeiss (miras e preci-

são) -e a italiana Oto Melara (equipa-

mentos marítimos).

Além da mão-de-obra barata, da

abundância de matéria-prima, e da le-

gislação favorável, o que atraia esses

Capitais era a possibilidade de, através

do Brasil, penetrar nos promissores

mercados do Terceiro Mundo sem os

controles políticos geralmente impos-

tos por seus países de origem.

Entre as iniciativas governamentais

visando a viabilizar o complexo bélico

destacam-se a criação da IMBEL (Em-

presa Brasileira de Material Bélico), os

incentivos fiscais e os financiamentos

oriundos do BNDES (Banco Nacional

de Desenvolvimento Econômico e So-

cial) e da Finep (Financiadora de Estu-


Orlando Brito/Abril Fress

dos e Projetos).

A EMBEL, proposta pelo Ministério

do Exército e criada em 1975, é uma

holding estatal que inicialmente reuniu

as esparsas fábricas do Exército,

associou-se a empresas privadas e assu-


miu a coordenação de todo o setor,

Nos anos 80, o Brasil já amealhava entre capacitando-o para a exportação. To-

seus compradores de equipamento militar dos os negócios com o Exterior são fei-

mais de 30 nações. Em outubro de 84, o tos de governo a governo e toda a

País recebia a visita do príncipe Sultan, da venda de equipamentos deve ser apro-

Arábia Saudita (acima, com Whitaker vada pelo Conselho de Segurança Na-

Ribeiro, da Engesa, inspecionando o cional, que coordena o Programa Na-

tanque Osório), que conheceria as cional de Exportação de Material e

instalações da Embraer (pág. ao lado, Equipamento Militar.

linha de montagem do avião Tucano),

onde até mesmo as fichas de apresentação O mercado principal do País

do produto estavam redigidas em árabe


encontra-se no Terceiro Mundo

que mais tarde aplicaria nos carros As exportações são vitais para essa

blindados desenvolvidos com o auxílio indústria que supre 75% das necessida-

do Instituto de Pesquisas e Desenvolvi- des das Forças Armadas brasileiras

mento do Exército (Cascavel, Urutu, com apenas 5% de sua produção. Seu

Jararaca, Sucuri). Em 1984, ela detinha mercado principal encontra-se no Ter-

ceiro Mundo, onde o produto brasi-


a metade do mercado mundial de car-
a ros de combate leves e apresentava ao leiro é bem recebido por ser de boa
9
pls bi qualidade, barato e, mesmo incorpo-
Exército o projeto do tanque Osório,
glam "9" o 3 er Ramo 1) a as ca df sa e
rando alguns avanços tecnológicos, ter
de 35 toneladas e equipado com tecno-
Esl. / (JSEÁX z ar
PRECO
Jr R3
54
E)
logia que inclui o computador e o laser, um manejo simples, não representando
As 15 1 (ze E
e
(lua com o qual pretendia penetrar no mer- problema para soldados inexperientes
axe 9 © End H $
- cado de tanques pesados. com baixo nível de instrução.
ab f.,-9130“ » gmadt ik 5
asit o Ao contrário do que sonhavam os te- A venda de suas armas sem cláusula
s Y
gate Ia MH ão AAA * e + las! , Liss licumo .. lote bão E 359

BR DFANBSB VB.GNC.AMA, 240413331 300a , p10A


8R DFANBSB V8.GNCAMA, 340441 233 an oo 2 , pJOs

O sigilo que cerca estas atividades


em todo o mundo causa inquietação
em nosso país, com escassa ou inexis-
tente tradição democrática e de con-
trole social sobre as atividades do Es-
tado.
O exemplo mais potencialmente trá-
gico é o projeto Sonda (desenvolvido
pela CTA e Avibrás). O aperfeiçoa-
mento de foguetes de sondagem para
lançar instrumentos científicos sempre
andou de mãos dadas com o desenvol-
vimento de foguetes para uso militar. O
Sonda IV, lançado em 1984, foi o ul-
timo estágio do programa para se atin-
gir o VIS (Veículo Lançador de Sa-
télite). O jornal O Estado de S.Paulo,
em 26 de maio de 1982, revelou que
dele derivarià o primeiro MRBM
(Medial Range Balistic Missile) brasi-
leiro. Um gigante de 25 metros, com
dez toneladas, guiado por sofisticado
computador e capaz de levar uma
carga a até três mil quilômetros de dis-
tância.
Se o acordo nuclear com a Alema-
nha, como se suspeita, vier a viabilizar
uma arma atômica, veremos nosso
país, sem qualquer discussão ou con-

Iconographia
trole por parte da comunidade, cami-
nhar a passos largos para a produção
de mísseis balísticos com cargas nuclea-
res. Produtos inúteis - pois não resol-
A partir da Segunda Grande Guerra, o País foi inundado pelo equipamento bélico veriam qualquer dos principais proble-
americano. Acima, soldados da FEB, em campanha na Itália, utilizando material mas nacionais - e perigosos.
de combate fabricado nos EUA
A exportação bélica transformou o
de uso final (não impor limitações ao mas faz lembrar que elas não são um Brasil numa ameaça à paz
destino que o comprador dará a elas) e produto neutro. Mais que simples mer-
a grande integração entre fornecedores cadorias, as armas são instrumentos de A necessidade de exportar a qual-
e clientes são fatores extras que expli- destruição e seu aumento desenfreado quer custo levou o País a se tornar, no
cam o êxito brasileiro nesse mercado. ameaça os precários equilíbrios regio- subcontinente americano, uma ameaça,
O Iraque, nosso principal cliente e o nais onde se apóia a paz mundial. E o para a paz e um reforço para regimes
segundo maior comprador de armas do Brasil, sendo responsável por 40% das rendenados em todo o mundo. A
mundo, fez 220 sugestões para modifi- exportações de armas do Terceiro venda de aviões Tucano da Embraer
car o protótipo original do Cascavel e Mundo, contribui para fomentar ou no para Honduras, em 1984, foi conde-
muitas delas foram incorporadas ao mínimo viabilizar, essas guerras entre nada pelo Grupo de Contadora -
modelo. Também financiou a constru- miseráveis, países empenhados na procura de uma
ção dos Astros II, um complexo sis- Especialistas de todo o mundo, liga- saída pacífica para os conflitos da
tema de lançadores múltiplos de fogue- dos aos organismos e entidades defen- América Central.
tes apontados eletronicamente. O item soras do desarmamento, há anos se Em 1979, durante a vigência da polí-
mais vistoso na prateleira bélica brasi- preocupam com o fato de que de um tica de defesa dos Direitos Humanos
leira foi desenvolvido pela Avibrás, terço à metade dos recursos mundiais do governo Carter, o Brasil substituiu
que, tendo sido criada em 1961 por en- empregados em ciência e tecnologia es- os Estados Unidos no fornecimento de
genheiros oriundos do ITA (Instituto tão a serviço da indústria armamentista armas a uma das mais sanguinárias di-
de Tecnologia da Aeronáutica), come- e de que nela se concentram 40% dos taduras da América Latina - o Chile.
çou produzindo foguetes meteorológi- quadros técnicos e científicos mais qua- José Luiz Whitaker Ribeiro, presidente
cos e passou, com sucesso, aos artefa- lificados. Alertam que recursos escas- da Engesa que em 1982 assumiria a pre-
tos bélicos, sos que poderiam ser empregados na sidência da IMBEL, articulador do ne-
Se levarmos em conta que, desde saúde e na agricultura são desviados gócio, passou a gozar de tanto prestígio
1945, 9%, dos conflitos armados aconte- para essa atividade. Esse quadro só se naquele país que chegou a ser convi-
ceram em países de economia sub- agrava no continente latino-americano. dado para um jantar íntimo no palácio
desenvolvida - a guerra entre as gran- O Instituto Internacional de Pesquisa presidencial. Compareceu, ergueu
des potências manteve-se relativa- sobre a Paz, de Estocolmo, estima que brindes aos anfitriões e presenteou a
mente sob controle -, veremos que o 25% da divida externa da América La- primeira dama com uma água-marinha.
Brasil está atuando no filé mignon do tina, que monta a 350 bilhões de dóla- Afinal, era aniversário de casamento
mercado mundial de armas. res, derivam da compra de armas no do casal Pinochet.
Essa proximidade entre pobreza e ar- Exterior.
360
BR DFANBSB VB.GNCAMA, 84044331 an 002, o IO4

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/EDUCAÇÃO: a evolução do sistema educacional brasileiro (1964-84)

A crise da educação

Com o Regime Militar, aumentou o número de alunos, em


todos os níveis, mas o funil educacional mantinha-se como um
sério problema, associado à má qualidade de ensino

A primeira vista, o Regime Militar de universitários no País, número dez colar (atual primeira série do primeiro
instalado no País em 1964 podia apre- vezes maior que em 1964, e os alunos grau), 4,7 estudantes concluíam a uni-
sentar, depois de 20 anos, números que de pós-graduação tinham multiplicado versidade; em 1980, esse número já
indicassem resultados auspiciosos no por 15 o seu número, chegando a 29 chegava a 34. E esta melhora era geral.
campo da educação,. mil no mesmo ano. Sempre tomando aquelas mil matricu-
A taxa de 'analfabetismo caira de Entre 1960 e 1980, triplicou o corpo las como referência, em 1960, 24,6 alu-
46,8% em 1960 para 32% em 1980 e a docente do primeiro grau e quintupli- nos terminavam o ginásio (equivale a
população em idade pré-escolar, prati- cou o número de professores no se- concluir a oitava série do atual pri-
camente desassistida na década de 60, gundo grau e nas universidades. meiro grau) e 127 conseguiam isso em
viu as matrículas da pré-escola mais Na formação de pesquisadores de 1980. E quase quadruplicou (22,2 para
que quintuplicarem depois de 1970. alto nível, no biênio 1970-71, 2.683 alu- 81) o número daqueles que concluíam
Enquanto a população aumentou nos concluiam o mestrado e apenas 87 o segundo grau (o antigo colegial). En-
cerca de 70%, entre 1960 e 1980, as terminavam o doutoramento. No início tretanto, como a estrutura educacional
matrículas do primeiro grau passaram da década seguinte esses números ti- atendia às necessidades de um determi-
de 8,4 milhões para 22,6 milhões - um nham aumentado para 20.744 e 1.697, nado tipo de industrialização e desen-
aumento de 170%. As matrículas do se- respectivamente - formavam-se 20 ve- volvimento, atrelados ao capital estran-
gundo grau decuplicaram no mesmo zes mais doutores, geiro e que excluiam dos seus benefi-
período, chegando a 2,8 milhões. Em 1960, para cada mil alunos matri- cios parcelas significativas da popula-
Em 1980, havia mais de 1,3 milhão culados no primeiro ano do grupo es- ção, essa estrutura de educação refletia

, 361
va DFANBSB V8.GNC;AAA, 4 2232 - an (DQ/. p 1O5

as contradições e limites do "modelo"


1982, 37% das crianças atendidas provi-
de desenvolvimento.
. Um exemplo marcante é o caso das
nham de famílias com renda mensal su-
creches e instituições pré-escolares,
perior a cinco salários mínimos. Essas
que deveriam servir basicamente aos fi-
famílias, que em grande parte, a rigor,
lhos das classes populares. Isso porque
não precisariam desse atendimento,
foram pensadas para compensar defi-
constituíam nesse mesmo ano de 1982
ciências nutricionais e educacionais
um total de apenas 24,1% das famílias
do País.
que prejudicariam o rendimento das
crianças pobres nos primeiros anos de O Mobral, "orgulho" do
sua vida escolar.
Desde os anos 20, o movimento ope-
regime, tornou-se um fracasso
rário brasileiro inclui entre suas reivin-
No campo do combate ao analfabe-
dicações a instalação de creches para
tismo, o MOBRAL (Movimento Brasi-
os filhos das mulheres que trabalham.
leito de Alfabetização), criado em
A Consolidação das Leis do Trabalho
1970, foi por muitos anos ostentado
(1943) prevê a instalação de berçários
como um dos orgulhos do Regime Mi-
nas empresas com mais de 30 mulheres
litar. O MOBRAL pretendeu erradicar
empregadas, mas é notório o descum- O analfabetismo adulto no País, mas,
priMento dessa determinação. contrariando essas expectativas, o nú-
Pressionadas pelos movimentos de mero de analfabetos com mais de 15
mulheres, organizadas em comunida- anos aumentou, passando de 15,6 mi-
des de base e associações de bairros, lhões, em 1976, para 16,9 em 1981, Os
que brotaram na década de 70, as pre- 27,6 milhões de analfabetos que o Bra-
feityras das grandes cidades brasileiras sil possuía em 1960 se tinham tornado
se viram forçadas a voltar suas aten-
32,8 milhões em 1980,
ções para esse problema até então es-
No plano internacional, as taxas de
quecido. Em 1970, o município de São
alfabetização do Brasil (74,5 adultos al-
Paulo tinha apenas três creches manti- fabetizados em cada grupo de 100) o
das pelo poder público e entre 1979 e
Nair Benedicto/F4
colocavam ao lado de países como a
1982 construiu 120, República Dominicana (74). Sendo su-
Nesse mesmo período se multiplica- perado por países próximos como Ar-
ram programas oficiais voltados para a gentina (95,5) e Uruguai (95), o Brasil
pré-escola e organizações encarregadas ficava muito distante dos países desen-
de implantá-la - mas havia deficiências volvidos: Estados Unidos (99) e União
graves: em 1983, a Fundação Carlos A reivindicação por creches é tão antiga Soviética (98,5).
Chagas registrou a existência, só no quanto os movimentos de trabalhadores
município de São Paulo, de 13 órgãos
Para o professor Alceu Ferrari, mes-
no Brasil. E foi a partir dessa
tre em Sociologia da Educação da Uni-
governamentais, federais, estaduais e reivindicação popular, na década de 70 versidade. Federal do Rio Grande do
municipais, aplicando 25 programas di- (acima) que a necessidade da pré-escola Sul, o MOBRAL não pode resolver o
ferentes e desarticulados entre si. Com surgiu. Embora crescente, a educação prê- problema do analfabetismo e a solução
tudo isso, no início da década de 80,
menos de 6% das crianças brasileiras na
escolar nas décadas de 80 (abaixo à esa. ) surgirá "com melhor distribuição de ren-
era de pequeno alcance e não privilegiava da, crescimento da urbanização e da
faixa de zero a seis anos recebiam al- a população mais carente dela. E das produção interna. A aceleração do pro-
gum tipo de atendimento pré-escolar. E crianças que ingressavam no primeiro cesso de alfabetização acompanhou,
mais: segundo a Pesquisa Nacional por grau, metade não chegava ao 2o ano em linhas gerais, a concentração do
Amostragem de Domicílio (PNAD) de (abaixo à dir.) desenvolvimento industrial".

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362
BR DFANBSB V8.GNCAMA, 24043 333 n pÃ

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Repressão

nas escolas

Aqueles professores e alunos que


pretenderam discutir politicamente o
que estava acontecendo com a educa-
ção brasileira e, criticando os cami-
nhos adotados, quiseram propor solu-
ções diferentes foram duramente re-
primidos pelo Regime Militar.
O incêndio do prédio da União Na-
cional dos Estudantes (UNE), logo
após o golpe militar de 1964, e a de-
missão em massa de professores da
Universidade de Brasília, naquele
mesmo ano, foram os marcos iniciais
de um período negro para os

Banco dt Dados, SH
membros da universidade.
Um indicador da violência com
que o regime se empenhou em com- Convota ça“? f
bater a organização e participação
política dos estudantes brasileiros é
fornecido pelo destino dos nove presi-
E xce de nt e
dentes da UNE que tiveram suas ges- O movimento dos excedentes - aprovados nos vestibulares que não tinham vagas nas
tões na década de 1960: Quatro foram
universidades - teve grandeforça nos anos 60. Vinte anos depois, o regime tinha a sua
presos, dois exilados, dois banidos e
um deles - Honestino Guimarães -
solução: ampliou as vagas, apoiado sobretudo em universidades particulares
desapareceu em 1972. Os dados do Censo de 1980 confir- cio da década de 1980, ainda tinha um
A primeira tentativa de destruir as mam essa visão, pois embora o índice perfil altamente excludente. Pratica-
entidades autônomas dos estudantes de analfabetismo no Brasil estivesse na mente a metade das crianças que entra-
veio com a Lei Suplicy de Lacerda casa dos 32%, ele era de 18% nos Esta- vam na primeira série do primeiro grau
(4.464/64), de 9 de novembro de 1964, dos de São Paulo e Rio de Janeiro e de não chegavam à série seguinte. A
que criava o Diretório Nacional dos 17,3%no Rio Grande do Sul. Por outro UNESCO considera desastrosa a situa-
Estudantes para substituir a UNE, os lado, Estados como Pernambuco ção daqueles países onde entre cada
diretórios estaduais para o lugar das (50,2%) e Piaui (56,7%) tinham índices mil crianças menos de quinhentas con-
uniões estaduais (UEEs) e os diretó- comparáveis aos que o Estado de São cluem o primeiro grau. No Brasil, esse
rios acadêmicos, que fariam as vezes Paulo ostentava na década de 30. número não chegava a 140.
dos centros acadêmicos e grêmios. Talvez o dado mais preocupante
A UNE e as UEEs foram tornadas fosse constatar que, em 1981, sete mi- Metade dos alunos abandona a
ilegais pelo Decreto-Lei no 228, de 28 lhões de crianças em idade escolar escola já na primeira série
de fevereiro de 1967, mas foi o Decre- obrigatória (sete a 14 anos) eram anal-
to-Lei no 477 (26 de fevereiro de fabetas.
1969), diretamente derivado do AI-5, O Censo de 1980 já revelara que 7,5 E se atentássemos para a qualidade
que marcou todo um período de re- milhões de crianças naquela faixa de do ensino oferecido nas escolas brasi-
pressão e controle sobre a vida acadê- idade estavam fora da escola. E os edu- leiras, veríamos que ele se ressentia da
mica. cadores paulistas, que avaliavam a si- brutal queda no poder aquisitivo dos
Esse Decreto-Lei no 477, previa tuação do Estado em 1984, ao terem professores brasileiros ao longo daque-
como punição o afastamento da uni- encontrado 500 mil crianças de sete a les 20 anos. Um estudo realizado pela
14 anos analfabetas no Estado mais rico APEOESP (Associação dos Professo-
da Federação e tendo constatado que res do Ensino Oficial do Estado de São
versidade, de três a cinco anos, de

10% dos alunos matriculados anual» Paulo) e pelo DIEESE (Departamento


qualquer professor ou estudante que

mente na primeira série da rede escolar Intersindical de Estudos Econômicos e


"incite ou colabore para a paralisação
de aulas; organize comícios, passeatas
abandonavam a escola antes de com- Sociais) mostrou que os professores do
pletarem o processo de alfabetização, segundo grau do Estado de São Paulo
ou desfiles não autorizados ou deles
participe."
concluíam pelo fracasso do atual sis- tiveram seus salários reais reduzidos a
tema educacional. Percebiam que a es- praticamente um terço no período
Entre 1969 e 1973, foram punidas

cola fazia uma "seleção" social dos alu- 1964-83 - o que explica o processo rei-
diretamente com esse Decreto-Lei no
477 um total de 263 pessoas, mas o
nos por estar adaptada às necessidades vindicatório iniciado em 1978 e que
mais importante é que ele foi sendo
da classe média e por ministrar um en- culminou com a grande e vitoriosa
|-3
incorporado aos regimentos universi-
sino que nada tinha a ver com a reali- greve dos professores paulistas no pri-
tários, que se tornaram instrumentos
dade das camadas populares. meiro semestre de 1984.
antidemocráticos e repressivos.
Apesar das melhorias registradas, o O professor Hermes Zanetti, presi-
"funil" da educação brasileira, no ini- dente da Confederação dos Professores
363
sr DFANBSB VB.GNCAAA, 840443
34 3002, pYp5

meiro grau em todo o Brasil, embora


retivessem apenas 2% dos recursos re-
colhidos através de impostos.

O ensino profissional foi mai


s
um passo em falso

Contraditoriamente, enquanto redu-


zia as verbas destinadas à educação, o
Regime Militar tentou uma abrangente
e ousada reforma em todo o segundo
grau. Em agosto de 1971, em pleno
"milagre econômico", durante o go-
verno do general Médici, foi votada
pelo Congresso Nacional, em regime
de urgência (40 dias), com ameaça de o
Executivo aprová-la pelo decurso de
prazo, a Lei no 5-692/71, conhecida
como Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação Nacional. Sem consultar os
maiores: interessados (alunos, professo-
res e pais), a reforma pretendia estabe-
lecer a "profissionalização universal e

Banco de Dados/FSP
compulsória" em todo o segundo grau.
Esperava que todo o sistema educacio-
nal assumisse a função de preparar
mão-de-obra para suprir as necessida-
des decorrentes do processo então ace-
lerado de crescimento econômico. Ao
do Brasil, em depoimento na CPI da mesmo tempo, pretendia desviar da
Apesar de o presidente Médici ter
Câmara Federal que investigava os universidade um público ' crescente,
Jestejado o Mobral (acima), o número de
efeitos da reforma do ensino, em 1981, que ela não podia atender, na Suposi-
analfabetos aumentou no País após a
denunciou que 35% dos professores de Jundação do órgão. Enquanto isso, o ção de que muitos jovens se dirigiam à
primeiro e segundo graus em todo o salário de Hélio Pereira (abaixo), universidade por não haverem adqui-
Brasil trabalhavam sem nenhum vin- professor em São Paulo, não dava para o rido habilitação profissional no se-
culo empregatício.. Registrou ainda ônibus, o que levou os mestres paulistas à gundo grau.
que, no Rio Grande do Norte e no greve em 1984 (pág. ao lado) Mas a lei foi implantada sem que as
Piauí, havia professores recebendo sa- escolas contassem com recursos huma-
lários equivalentes a 10% do salário mi-
nimo.,
Banco de Dados/FSP

Ocorria que, apesar de a ONU reco-


mendar que os países em desenvolvi-
mento dedicassem 25% de seu orça-
mento para a educação, a participação
t

do Ministério da Educação e Cultura


(MEC) no orçamento da União caiu de
10,6% em 1965 para 4,8% em 1981.
Uma pequena melhora elevou esse
índice para 6,1% em 1983.
No final desse mesmo ano de 1983
foi aprovada uma emenda constitucio-
nal de autoria do senador João Calmon
(PDS-ES), garantindo 13% do orça-
mento da União e 25% da receita orça-
mentária dos Estados e Municípios
para a educação. Mas as autoridades
econômico-financeiras do governo fe-
5

deral tentavam manobrar, conside-


rando gastos com educação aqueles
consumidos com a educação militar
oferecida pelos ministérios ligados às
Forças Armadas, como a verba da Es-
cola Superior de Guerra (ESG),
Em seu depoimento, Hermes Zanetti
lembrava que as prefeituras eram res-
ponsáveis por 65% das escolas de pri-

364 .
oo apI 08
BR DFanNBSB Va.onNcaMA, 24041334 an

nos especializados, instalações apro- Outra decisão que acarretou pre- Num país que em 1984 se estimava ha-
priadas, equipamentos e laboratórios juízo para a qualidade do ensino médio ver mais dé 80 milhões de desnutridos,
necessários à formação profissional dos foi a de unificar os exames vestibulares, cerca de 65% da população, só 2,3%
alunos. Calculou-se que, se tudo isso em 1971, quando eles passaram a ser dos universitários matriculados em
viesse a ser implantado, haveria um au- regidos por normas federais. Até então, 1982 faziam cursos ligados à área
mento de cerca de 60% do custo por cada escola fazia seu exame de acordo agrária e, dos 410 doutores que apre-
aluno de um curso secundário, num com suas próprias características. Com sentaram sua tese em 1979, só 24 (5,8%)
momento em que a participação das esse vestibular unificado, na base de estavam ligados a essa área.
verbas do MEC no orçamento federal testes de múltipla escolha e que até

caia ano a ano. Impossibilitadas de 1977 não incluia redação, todo o ensino Orgão do MEC traça perfil do

cumprir a lei, as escolas passaram a ficou condicionado a preparar os estu- universitário brasileiro
adotar apenas formalmente as novas di- dantes para aquele tipo de prova.
retrizes. Quanto ao ensino superior, o que se Ao final dos 20 anos do Regime Mili-
Em vista disso, o governo tentou so- pôde observar é que o crescimento do tar, uma nova tendência parecia estar
luções conciliatórias, como a do pare- número de vagas pareceu mais um se consolidando. Um levantamento pa-
cer 76 de 1975 do Conselho Federal de inchaço com componentes doentios do trocinado pela Coordenação de Aper-
Educação, que criou a possibilidade de que um desenvolvimento harmônico. feiçoamento do Pessoal de Nível Supe-
as escolas oferecerem o que se cha- rior (CAPES), órgão subordinado ao
mou de profissionalização parcial. Na Dois terços dos universitários MEC, feito em 44 instituições no ano
prática, isso passou a significar que as de 1983, traçou um surpreendente per-
escolas apenas distribuíam as matérias estão em escolas particulares
fil do universitário brasileiro.
do currículo tradicional com cargas ho- Esse universitário "médio" tem
rárias diferentes, adaptadas às áreas de Em 1960, do total de universitários, cerca de 30 anos, já está integrado ao
profissionalização, além de algumas ou- 44,3% estudavam em escolas particula- mercado de trabalho e chega ao cam-
tras que supostamente orientariam o res; essa porcentagem passou para pus para "adquirir cultura geral" ou
aluno na escolha de uma profissão. Em 66,5% em 1982. Isso quer dizer que o com a "expectativa de crescimento
1982, a Lei no 5.692 foi extinta, num re- crescimento do número de vagas no pessoal".
conhecimento tácito do fracasso da ini- ensino superior, que permitiu a grande Se esse perfil for verdadeiro, todo o
ciativa. melhora do "funil" da educação brasi- dispendioso aparato institucional con-
Um subproduto dessa lei foi a insti- leira, se deveu em grande parte à priva- centrado no conjunto das universida-
tuição da licenciatura curta, para for- tização do ensino. E se sabe que o en- des brasileiras estaria sendo colocado a
mar professores polivalentes em cursos sino privado se dá majoritariamente em serviço do esforço individual para a su-
de três a quatro semestres, a pretexto escolas que dispõem de poucos recur- peração das grandes deficiências do en-
de suprir deficiências locais e regionais sos, não desenvolvem pesquisas e são sino médio. Como o daquela candidata
de ensino. Proliferaram as faculdades administradas autoritariamente por ao vestibular de 1984 que, fazendo um
de fim de semana, que jogaram no mer- seus proprietários, balanço dos resultados positivos de seu
cado de trabalho profissionais despre- Por outro lado, os cursos que mais se sacrifício em frequentar o "cursinho"
parados, que muito contribuiram para desenvolveram não estavam associados preparatório, afirmou: "Agora eu já sei
rebaixar mais ainda o nível do ensino. às principais necessidades do Brasil. onde fica o Oriente Médio."

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» R DFANBSB VB.GNC.AAA, 84 044834 an co2,p 409

ARTES/LITERATURA: a evolução da poesia

A poesia em progresso

Desde os anos 60, tem havido cada vez mais poetas e tem
surgido grande número de bons poemas - mas o círculo
de leitores tem continuado restrito

Quem tiver acompanhado o que an- coisas. Tais manifestações, por sua vez,
dou acontecendo no campo da poesia têm alguma conexão com a contracul-
brasileira a partir dos anos 60 certa- tura e o tipo de inquietação e interesse
mente concordará que, vinte anos de- pelo novo que caracterizam os anos 60
pois, muita coisa mudou para melhor. em escala mundial.
Há muito mais gente escrevendo, inclu- Há ainda outras coisas boas a serem
sive há#mais texto8 de boa qualidade li- assinaladas a propósito da moderna
terária. Percebe-se uma abertura maior poesia brasileira. Por exemplo, o apare-
para o novo, um interesse maior por cimento, de meados dos anos 70 para
textos que sejam originais e incorpo- cá, de uma nova poesia feminina, cor-
rem as conquistas dos movimentos de respondendo a um novo tipo de cons-
vanguarda do século 20. O panorama é ciência da mulher, do seu posiciona-
mais pluralista e quase acabou total- mento na sociedade e da sua relação
mente o sectarismo do começo dos com a linguagem. Podem ser citadas
anos 60, dos grupos fechados como o como exemplo dessa tendência, mar-

Agência O Globo
movimento concreto, a poesia-práxis, a cada por um texto informal, espontá-
vertente engajada ligada ao PCB, o neo e desinibido, autoras tão diferentes
poema-processo, etc. A quantidade de entre si, sob outros aspectos, como Ana
textos teóricos que esses movimentos Cristina César e Leila Miccolis.
produziram, justificando suas posições
e pontos de vista, foi, num dado mo- Uma produção poética menos blicados são edições de autor, que não
mento, maior que sua produção de acadêmica e mais coloquial Chegam às livrarias; ou, quando che-
obras especificamente poéticas. gam, ficam um tempo na estante do
Deve ser registrada, a constribuição De modo geral - e essa poesia de fundo, em consignação, antes de serem
do Tropicalismo nesse processo de mulheres talvez seja um aspecto parti- devolvidos. O saldo da noite de autó-
abertura e ventilação do ambiente e, cular de um fenômeno mais geral - te- grafos acaba sendo distribuído para os
dentro do Tropicalismo, a marcante mos hoje uma produção mais atenta amigos do autor, críticos (que normal-
presença do Torquato Neto, legítimo para a linguagem falada, menos acadê- mente não tomam conhecimento) e
poeta maldito, neo-romântico, que se mica e mais informal e coloquial. E um eventuais leitores qualificados. E isto
matou em 1972, na época do maior su- equivoco, todavia, atribuir isso a um re- vale, inclusive, para textos da melhor
foco político e também cultural. Tor- flexo do tipo de criação literária feita qualidade.
quato deixou uma obra pequena, in- no campo das letras musicais, ou então A busca de circuitos alternativos tem
conclusa, porém na qual se percebe o afirmar que os modernos poetas são os algo de transitório, e o vôo das edições
brilho de um imenso talento. letristas como Antonio Carlos de Brito "marginais" e independentes foi mais
Apesar de sua breve duração, de (Cacaso), Vilhena, Geraldo Carneiro e curto do que seria de esperar, embora
apenas um ano, interrompida que foi outros. Acontece apenas que a letra de alguns autores - como Ulisses Tavares
pela prisão e exílio de Caetano Veloso, música, uma vez veiculada em disco, e Nicolas Behr - possam gabar-se de
Gilberto Gil, a Tropicália deixou sua tem uma circulação muito maior, atin- ter vendido tiragens de até 30 mil
marca, abalando os alicerces de um de- gindo muito mais gente. E, dos letristas exemplares dos seus poemas irreveren-
terminado tipo de hiperintelectualismo que também se aventuraram à edição tes, em versos curtos ou epigramas,
e também as concepções demasiado em livro, alguns provaram ser poetas numa linguagem atualizada, buscando
simplistas do que venha a ser uma refle- genuínos (Geraldo Carneiro, por exem- a comunicação imediata com um pú-
xão sobre a realidade brasileira. plo); outros, meros equivocos. blico mais amplo.
Convém ressaltar que esta contribui- Mas, com tudo isso, com todos esses Mas o ciclo da produção entrou em
ção do Tropicalismo faz parte de um avanços, a poesia brasileira continua recesso e seus melhores representantes
contexto mais amplo, de um processo existindo mais como assunto, como ingressaram no mercado editorial con-
de modernização cultural brasileira que pretexto para discussões literárias, do vencional: Ulisses, Touchê, Chacal (do
durou dos meados dos arios 60 até o co- que como presença no mercado edito- grupo Nuvem Cigana do Rio de Ja-
meço. da década de 70, e que inclui a rial. A verdade é que livro de poesia neiro), todos editados pela Editora Bra-
vanguarda nas artes plásticas (Hélio Oi- vende pouco - e não só no Brasil, mas siliense, de São Paulo.
tícica, Rubens Guerchman, etc.), o ci- no mundo todo. Acontece que, dada a O elenco de poetas contemporâneos
nema underground e experimental anormal pequenez do nosso mercado brasileiros lançados por essa editora, a
(principalmente Rogério Sganzerla e editorial, aqui o vender pouco corres- partir de 1982, é considerável, contri-
4

Júlio Bressane), espetáculos multimídia ponde ao ostracismo, a ficar estocado buindo para projetar nacionalmente
como os de Agripino de Paula, a atua- depois de livrar-se do risco de ficar en- nomes como Paulo Leminski, Fran- '
ção do Teatro Oficina e muitas outras gavetado. A maior parte dos títulos pu- cisco Alvim e Ana Cristina César. Esta,
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«Nani Gois/Abril Press


sos...

Agência O Globo

morta prematuramente em 1983 ção da geração de 45, mas que a


(suicidou-se), é de fato inovadora da transcende (principalmente em Da Morte
nossa poesia, com seus fragmentos inti- - Odes Mínimas e A Obscena Senhora D.).
mistas em prosa e versos cujo tom in- A propósito de Hilda Hilst e de Piva,
formal não escondem uma alta cultura cabe mencionar a tese, levantada re-
literária na coletânea A Teus Pés. centemente, sobre a existência de uma
geração 60, ou seja, de um movimento
Editora carioca contribuiu para de poetas com características próprias
divulgação da poesia surgido nesse período, A tese é discuti-
vel, pois implicaria juntar na mesma
Outra grande editora que contribuiu vertente autores com propostas tão dis-
para a divulgação da poesia foi a Nova tintas como os já citados Piva e Hilda
Fronteira, do Rio de Janeiro, com sua Hilst, o carismático Lindo!f Bell (que
coleção Poiesis, dedicada só a este gê- lançou o excelente O Código das Aguas,
nero, onde se destacaram Carlos Nejar, pela ed. Global, sem a mesma reper-
R Neide Archanjo (Escavações), o carioca cussão da sua obra juvenil) ou então o
V egresso do movimento praxista Ar- texto apolíneo e contido de Renata Pal-
mando Freitas Filho e, principalmente, lotini, o hiper-romantismo de Álvaro
a mineira Adélia Prado, com seus poe- Alves de Faria, o intimismo de Eunice
mas e fragmentos em prosa combi- Arruda, o texto mais engajado de
nando de modo original a captação do Eduardo Alves da Costa, e outros. Da
cotidiano (da sua cidade, Divinópolis), mesma maneira, a discussão - susci-
a religiosidade tradicional brasileira, o tada principalmente pela pesquisadora
misticismo e a sensualidade. Heloisa Buarque de Hollanda - sobre
Kl Mesmo sem alcançarem esta divul- uma possível geração 70 também deve
E
O gação em âmbito nacional, há autores ser vista com restrições. Na verdade, a
o que, nesse período, conseguiram o partir dos anos 60, iniciou-se um pro-
t
£oé justo reconhecimento, por parte da cri- cesso contínuo, marcado pela plurali-
€ dade de propostas e pela coexistência
« tica e da parcela mais esclarecida do
público leitor. É o càso de Roberto da continuação da tradição e da rup-
A produção da poesia brasileira, após 64, Piva, certamente o mais consistente tura e inovação. Em meados da década
foi ampla e generosa:de Torquato Neto inovador da nossa poesia (Paranóia, de 80, faltava um maior apoio institu-
(na pág. ao lado), a Ana Cristina César Piazzas, Vinte Poemas com Brócoli, cional, com mais revistas e suplemen-
(no alto), passando por Paulo Leminski Quizumba, entre outros), marginalizado tos literários, para que toda essa rica
(no alto à dir.) e Chacal! ( acima, à esq. ) por um bom tempo. E, sem dúvida, produção conquistasse seu público.
do grupo Nuvem Cigana Hilda Hilst, poetisa ligada à tradi- Cláudio Willer
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BR DFANBSB V8.GNGAAA, 84044331 ancoa, p 111

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Miguel Chikaoka/F4
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Carlos Namba/Abril Press

O general Venturini (à esq.), principal dirigente do GETAT, entregou títulos a posseiros do Araguaia. A militarização da questão
agrária, no entanto,não satisfez os homens do campo. A dir., o protesto numa igreja no ano de 1979

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/DISTRIBUIÇÃO DE
TERRAS: os conflitos da posse eles em sua base a luta desesperada
pela sobrevivência daqueles que neces-
sitavam da terra para produzir e eram
excluídos do direito de possuí-la.
Mapa de sangue
Esses conflitos pela posse' da terra
intensificaram-se através dos tempos e
A história da propriedade da terra no Brasil é uma a partir dos anos 80 deste século atingi-
sucessão
de brutalidades contra as massas que trabalham no campo ram 0 climax. Para esse agravamento
, da concorreram vários fatores, como a
extorsão ao homicídio abertura de novas áreas do País, a atra-
ção que essa abertura exerceu sobre os
O processo de formação da proprie- apenas quisessem a propriedade para pequenos lavradores sem terra - e tam-
dade da terra no Brasil foi marcado explorar o trabalho alheio. bém sobre capitalistas - e a invasão do
pela violência, pela imprecisão dos li- Essa propriedade da terra, formada campo agrícola pelo capital.
mites dos lotes; consequentemente, pela violência, precisava ser mantida: o A abertura de novas estradas, como
pela falta de garantia. A violência con- registro das propriedades, inicialmente a Beléêm-Brasília, a Transamazônica e a
tra o índio, o primeiro dono da terra, feito nas igrejas, passou para os car- Perimetral Norte, atraiu, mesmo
foi o passo inicial para essa formação. tórios, Mas estes apenas registram pa- quando as estradas não passaram de
Alguns autores - ignorando os índios - péis - na maioria das vezes sem ne- simples tentativas fracassadas como a
consideram que a terra no Brasil era nhuma ligação com a realidade da Perimetral, grande número de peque-
obrigatoriamente propriedade da Co- terra, sem preocupação com a identifi- nos lavradores sem terras, esperanço-
roa Portuguesa, com base no Tratado cação das glebas "registradas" -, em sos de se verem livres da exploração.
de Tordesilhas . . . grande número de casos falsificados, Além de antigos pioneiros, novos lavra-
Somente entre 1822, pouco antes da dores surgiram, apossando-se de áreas
Independência, e 1850, tendo sido ex- A força é a única garantia do de terra para seu trabalho. E essas pos-
tinta a aplicação da Lei de Sesmarias e
direito à propriedade no campo ses, pela Constituição de 1891 e por to-
não havendo outra lei sobre o assunto,
das as demais constituições que o País
houve alguma formação de proprie- Com essa formação e com esses re- teve, davam aos posseiros o direito de
dade pelo trabalho da terra - a terra gistros, não há a menor garantia para o registrá-las até 30 hectares (aumenta-
para quem nela trabalha. Mas, a partir direito de propriedade; apenas a força dos para até cem hectares pela Emenda
de 1850, com a Lei de Terras do sena- garante tal "direito", e dele apenas os Constitucional no 10, de novembro de
dor: Vergueiro, dispondo que as terras grandes e poderosos podem usufruir. É 1964), como propriedade. Mas nunca
públicas só poderiam ser cedidas de natural, portanto, o surgimento de con- foi dada, a tais pequenos lavradores,
forma onerosa e em hasta pública, fi- flitos pela posse de terra. qualquer oportunidade de conseguir tal
cou afastada a possibilidade de o verda- Fatos históricos, como as rebeliões
Emis

registro, sendo intransponíveis as difi-


deiro lavrador, aquele que trabalha a de Canudos e do Contestado, são culdades levantadas em seu caminho
terra e a faz produzir, tornar-se seu pro- exemplos frisantes desses conflitos. pela burocracia.
prietário, Só os ricos e poderosos, em Descritos, muitas vezes, como resul- Atrás desses desbravadores, vinham
condições de oferecer melhores lances tado apenas do fanatismo religioso, ou os grandes capitalistas nacionais e, o
em leilão, poderiam tornar-se proprie- como reação de monarquistas contra a que é pior, internacionais, apoiados em '
tários, ainda que nada produzissem e República, na realidade tiveram todos seu dinheiro, nas falhas da lei, na falta
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de registros das propriedades legitima- grande campeã a região Norte, com


mente constituídas pelo trabalho, «e 514, seguida do Centro-Sul (Centro-
ainda mais nas "autoridades" sempre Oeste, Centro-Leste e Sul), com 192, e
dispostas a apoiar o mais forte. E con- As novas do Nordeste, com 190.
seguiam expulsar antigos posseiros, uns Evidencia-se o aumento dos confli-
mais recentes, de alguns anos de posse, tos nas regiões de fronteira de ocupa-
violências
outros antigos, com famílias vivendo ção. Nas demais áreas também aumen-
até mais de um século nas terras. tam, mas é no Norte que esse aumento
Era natural que os conflitos se inten- 1981 a 1984 é mais violento.
sificassem. Além desses fatores citados, Os Estados com maiores números de
havia a absoluta falta de áreas livres "Junto com o crescimento dos con-
conflitos, em 1981, foram o Pará (185
para onde os lavradores pudessem flitos em torno da terra e dos conflitos
conflitos) e Maranhão (134), na Ama-
deslocar-se, uma vez que, onde quer trabalhistas no campo, crescem as
zônia; Bahia (97), no Nordeste; e Rio
que fossem, logo que desbravassem a violências contra os trabalhadores.
de Janeiro (60), no Centro-Sul.
terra, apareciam os inevitáveis "donos" Em 1981, o Movimento Sindicalista
Houve grande concentração de con-
a expulsá-los, Essa falta de áreas livres Trabalhadores Rurais denunciou 26
flitos em alguns municípios, como Con-
forçava os posseiros a resistirem às ex- casos de violência e, em 1982, 41. Em
ceição do Araguaia, no Pará, com 46;
pulsões recentes com mais energia do 1983, eles subiram para 134. Os assas- Santa Luzia, no Maranhão, com 28; Vi-
que faziam antes. Os modernos meios sinatos de dirigentes sindicais, asses- zeu, Oeiras e Marabá, todos no Pará,
de comunicação, penetrando em todo sores e trabalhadores em luta pelos com 15 cada um, no ano de 1981.
o território nacional, também serviriam seus direitos, que foram dez em 1980,
para de algum modo conscientizar o 15 em 1981, 16 em 1982, foram 46 em Empresas, bancos e órgãos
pequeno posseiro, que antes aceitava 1983, dos quais 17 só no Estado da ofitiais envolvidos nos conflitos
passivamente a expulsão, mas que Bahia.
agora sabia que tinha direitos sobre a "Nos seis primeiros meses de 1984 Nos anos de 1980-81, esses conflitos
terra e não devia abandoná-la sem luta. já tivemos mais assassinatos do que afetaram quase 1,2 milhão de pessoas,
durante todo o ano de 1980, 1981 e pertencentes a 365 mil famílias, e
1982. Entre janeiro e junho de 1984, abrangeram pouco mais de 40 milhões
Da prisão à morte, todo tipo de
foram assassinados no Brasil 21 traba- de hectares de terras. Nesse mesmo
violência contra os lavradores lhadores rurais e líderes sindicais." ano foram registrados 518 feridos,
(Trecho do documento "A Estru- sendo 297 no Mato Grosso, 73 no Pará,
O desenvolvimento do sindicalismo tura Agrária e a Violência no seguindo-se Maranhão e Paraíba, com
rural, pela criação de novos sindicatos Campo", apresentado por ocasião do 28 cada um. A ABRA aponta também
e pela conscientização dos trabalhado- lançamento da Campanha Nacional 87 empresas, 27 órgãos oficiais e sete
res, estimulado pela Confederação Na- pela Reforma Agrária, em 3 de abril bancos envolvidos nos conflitos.
cional dos Trabalhadores Agrícolas de 1984, e atualizado pela Confedera- Em resposta a essa situação de vio-
(CONTAG) e apoiado por instituições ção Nacional dos Trabalhadores na lência, o Regime Militar tentou toda
ligadas à Igreja Católica, como as Co- Agricultura, em junho de 1984). sorte de desvios - desde que não impli-
missões Pastorais de Terra (CPIs), tam- cassem na solução real: a verdadeira
bém contribuiu para que essa resistên- reforma agrária.
cia fosse fortalecida.
Prisões de posseiros, assassinatos, ex-
Juca Martins/F4

pulsões de padres, toda espécie de vio-


lência foi adotada para impedir que pe-
quenos lavradores tomassem conheci-
mento do simples fato de que são cida-
dãos brasileiros com direitos em sua
terra.
Com o aumento da resistência, de
um lado, e da violência, de outro, os
conflitos se intensificaram.
Procurando conhecer e registrar a
extensão desses conflitos pela terra, a
Associação Brasileira de Reforma
Agrária (ABRA) iniciou, desde 1970,
um levantamento dos conflitos surgidos
no País. Nos anos de 1980 e 1981, esses
levantamentos foram sistematizados e
intensificados pelo Projeto Jurídico da
Associação.
Em 1971 foram localizados 109 con-
flitos sendo mais numerosos na região
Nordeste (45), seguida pelo Centro-Sul
(34) e pelo Norte (30); já em 1976, eram
126 conflitos, sendo 85 no Norte (Ama-
zônia), 21 no Centro-Sul e 20 no Nor- Em Conceição do Araguaia, um ato público em homenagem a Gringo, líder dos !
" deste. Em 1981, foram registrados nada trabalhadores rurais assassinado em 1981. Mais um capítulo de sangue na luta já
menos que 896 conflitos, sendo a secular e sempre mortal para dar a terra a quem nela trabalha

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BR DFANBSB VB.GNC.AAA, 8404333 an 002, p 413

Dentre os desvios, sobressai a propa-


ganda sobre a entrega de terras pelo
Instituto Nacional de Colonização e Os mortos pela posse da terra
Reforma Agrária (INCRA), que vai das
notícias de televisão até os discursos do Municípios onde ocorreram mortes em conflitos pela posse da terra (1980-81)
presidente da República.
De acordo com os relatórios do ge-
neral Figueiredo, durante o ano de
1984 foram entregues um milhão de ti-
tulos de terras pelo Regime Militar,
através do INCRA. Esse milhão de ti-
tulos tão festejado, no entanto, não re-
presenta um milhão de novos lavrado-
res assentados na terra, nem mesmo
aproximadamente.

A legitimação das posses não se


confunde com reforma agrária

Nesse total estão incluidas simples li-


cenças de ocupação, anuências para a
tomada de crédito rural, licitações de
Em 1980-81,
grandes glebas para capitalistas, além morreram em conflitos pela
das autorizações a títulos concedidos a posse da terra, 72 pessoas no Pará,
posseiros. Na realidade, esses docu- 46 no Maranhão, 22 em Rondônia
mentos não criam novos lavradores, e 21 no Mato Grosso. Por categoria, as
vítimas classificavam-se:
pois os posseiros já se encontravam na
POBSBMOS S cio ease eita oo o aa cos i 107
terra com ânimo de proprietários. Jagunços e pistoleiros .................... 38
A legitimação das posses, Trabalhadores rurais não-posseiros .. 20
transformando-as em propriedades, é fndios ia avi a vedes avia 13
uma medida justa, mas não se con- Dirigentes sindicais ............. 1.1
funde com a reforma agrária, pois não Advogados , .... v...... .3
cria novos lavradores; apenas confirma Policiais ...... sa
Capatazes ..... RW
aqueles que já se encontravam nessas O ese ese o erre ea 2
condições, Além disso, como se veri- : Tratonstar, .... iii.... 1
fica na farta documentação publicada Grifeirg , oi ea aia Aa diva 1
pelo boletim Reforma Agrária, editado
pela ABRA, números 3 e 4 de 1984, os
posseiros tiveram sistematicamente
suas posses reduzidas, em favor da ocu-
pação das terras por grandes empresas.
Os cem hectares garantidos pela
Emenda Constitucional no 100, ao Como se pode notar pelo gráfico abaixo, o acirramento dos conflitos
pela posse da terra - assim como a veiculação desses fatos na imprensa
tempo do marechal Castello Branco, fi- - se dá principalmente no período de preparo da terra e plantio; ou seja:
cam reduzidos a áreas muito menores, quando a mão-de-obra não está ocupada na atividade de colheita.
às vezes de menos de dez hectares, Ao
assinarem a contraprova dos documen-
tos, os posseiros, em sua ingenuidade, Distribuição do noticiário sobre conflitos pela posse da terra (1980-81)
estão renunciando à maior parte das 24
terras a que teriam direito. E mais: nos
documentos, reconhecem no INCRA 22
ou outro órgão, o Grupo Executivo 20
de Terras do Araguaia-Tocantins (GE- 18
TAT), o direito de alterar a qualquer
momento suas divisas e de transferi-los 16
para outras glebas; ficando assim, sem 14
qualquer garantia, espoliados do direito
121%
constitucional a uma área suficiente
para sobreviverem. 10
Essa redução da área "titulada" dos
posseiros tem duas finalidades princi-
pais: uma, deixar mais terras à disposi-
ção das grandes empresas, principal-
mente das múltis; outra, a criação de
mão-de-obra barata para o trabalho nas
grandes propriedades e nas multinacio- Yan. Fev.. "Mar.. "Abr.. Mai. Jun. Jul.. Ago. Set Out Noy, Der
nais. Em cem hectares, a família teria Fonte: Associação Brasileira de Reforma Agrária - ABRA
condições de absorver toda a sua mão-
370
r A
rarÃo ANDAMS SoOMETIDA ,
TERRA PR
t v
de-obra por duas ou três gerações; em
cinco, dez ou 20 hectares, com o cresci-
mento dos filhos, em pouco tempo a
propriedade já não absorverá toda a
mão-de-obra, que, para não morrer de
fome, irá trabalhar para os grandes pro-
prietários vizinhos.
Outra resposta do governo, cercada
de grande propaganda, foi a Lei de
Usucapião Especial, ou de Usucapião

Miguel Chikaoka *
Pro-Labore. Permitindo o usucapião
sobre terras públicas, não existente an-
teriormente, e reduzindo o prazo para a
conquista desse direito, essa lei criou
condições aparentemente positivas
para que se realizasse a conquista da
propriedade pelo trabalho; mas são
tantas as limitações a este direito inclui-

2a %
das na própria lei que raramente ela

A
poderá ser usufruída. Por outro lado,
nada foi feito para facilitar ao posseiro
o requerimento desse direito, nem para
prover as comarcas onde existem gran-
des áreas de terras devolutas de meios
para processar e encaminhar tais re-
querimentos. O emperramento buro-
crático impedirá, praticamente, o fun-
cionamento deste dispositivo legal.
Como válvula de escape, em alguns
casos em que a pressão social se torna
perigosa, o governo tem desapropriado
algumas áreas de terra, entregando-as a
verdadeiros lavradores. Mas tais desa-
propriações têm sido pequenas, insigni-
ficantes para influir sobre a viciada es-
trutura agrária do País. Servem, apenas,
para desmobilizar grupos mais decidi-
dos de pequenos lavradores.
Ainda simulando querer intervir na
estrutura agrária, o Regime Militar al-
terou os artigos do Estatuto da Terra
que dispunham sobre o Imposto Terri-
torial Rural (ITR), tornando-o muito:
mais rigososo quanto à progressividade
em função do tamanho da propriedade.
A Lei no 6.746, de 10 de dezembro de
1979, elevou essa progressividade a
ponto de ter, teoricamente, a maior ali-
quota do imposto (14%), 700 vezes
maior que a alíquota mínima (0,02%),
enquanto no Estatuto da Terra essa va-
riação era de 144 vezes. Só em relação
ao tamanho da propriedade, sem consi-
derar outros fatores, o Estatuto da
Terra permitia uma variação de quatro,
cinco vezes e a nova legislação, de 175
vezes. É uma lei muito boa; melhor
mesmo, só se fosse aplicada.
Alcebiades Silva

Mas essa lei ultra-rigorosa, da


mesma maneira que os artigos 59 e 60
do Estatuto da Terra, ficou no tinteiro.
Os grandes proprietários simplesmente
não pagam o ITR (em 1976, último ano
A luta pela terra semprefoi marcada por manifestações populares. No alto, lavradores em que foram publicados os dados do
do Pará realizam ato no dia do trabalhador rural. Ao centro e acima, no Ceará: INCRA, antes da militarização do as-
Caminhada Pela Libertação ( Cratéus; 1954) e ato pela aplicação do Estatuto da Terra sunto, apenas 7% das guias de ITR emi-
(Quixeramobim, anos 70). tidas para propriedades de mais de cem
371

BR DFANBSB V8.GNC.AMA, 24041331&3OD2, p 414


*"aNBSB VB.GNC.AAMA, 84
044 3313nC0 2, p 15

mil hectares tiveram o imposto reco- veram sua atenção voltada para aquela blicas transferidos para o governo fede-
Ihido). De maneira que não há a menor área e se interessaram por seus proble- ral,
diferença entre um imposto 144 vezes mas, Além disso, as enormes riquezas Os órgãos militares (GETAT, Grupo
maior e outro 700 vezes maior. E não se minerais reveladas pelo Projeto Radar Executivo para a Região do Baixo
tem notícia de qualquer ação, seja judi- da Amazônia (RADAM) na região em Amazonas - GEBAM - e MEAF) têm
cial seja militar, visando a forçar esse torno da Serra dos Carajás despertaram "reconhecido", de forma totalmente
pagamento. a cobiça de outros países, Para permitir ilegal, supostos direitos de grandes pro-
Finalmente, entre as medidas do go- sua exploração pelas multinacionais, prietários e de empresas multinacionais
verno visando a solucionar os proble- era preciso "limpar" a área. sobre áreas que tentam "limpar" de
mas agrários, tivemos a militarização A ação, além do aspecto propria- posseiros. Aliás, isso tem acontecido,
do assunto, com a interferência do mente militar contra a guerrilha, procu- também, em áreas marginais ao São
Conselho de Segurança Nacional e a rou envolver a população local, através Francisco, junto às barragens, mesmo
criação de órgãos como o GETAT, de uma operação de assistência social. sem a militarização direta; os pequenos
GEBAN e, finalmente, do Ministério Daí à extrapolação política dessa ação, são expulsos pela construção das barra-
Especial de Assuntos Fundiários foi um passo. gens e as terras nas margens das repre-
(MEAF), A ação paternalista, ao lado das sas se tornam, misteriosamente, pro-
Como tudo no Brasil do Regime Mili- pressões, além do atendimento de pe- priedades de grandes empresas, inclu-
tar, a alavanca para essa militarização quena percentagem de posseiros (e em sive multinacionais. Nota-se aí clara-
foi agegurança acional. . . Parece que áreas minúsculas, como já se obser- mente a transformação do poder pú-
os pequenos posseiros e proprietários vou), representa tentativa de desmobili- blico em mera extensão do poder de
do Araguaia-Tocantis representavam zação dos posseiros organizados. particulares bem-colocados.
séria ameaça à segurança nacional; Todos esses fatos, levando à concen-
essa segurança ficou melhor assegu- Os órgãos militares têm dado tração cada vez maior da posse da terra
rada com a entrega de enormes áreas a e à expulsão cada vez mais numerosa
apoio aos grandes proprietários
empresas americanas, japonesas, ale- dos lavradores, explicam a multiplica-
mãs, etc. Esta militarização teve também ca- ção e o agravamento dos conflitos so-
A guerrilha do Araguaia, entre 1972 racterística de verdadeira invasão do bre terras.
e 1975, foi talvez um dos fatores que in- governo federal em áreas de autonomia
fluiram para essa militarização. No dos Estados. O Estado do Pará teve Carlos Lorena e
combate à guerrilha, os militares ti- mais de 75% de sua área de terras pú- Maria Tereza Leopardi Mello

<Júca Martins/F4

No Araguaia, como em outras regiões do Brasil, asfamílias de posseiros estão


permanentemente armadas para defenderem suas
terras, sempre ameaçadas pelo "direito" dos grandes às violências

372
BR DFANBSB V8.GNCAAA 043313002, pJI6

POLÍTICA/PARTIDOS: a evolução dos partidos e da legislação partidária no Brasil

Os grilhões partidários

Até os anos 80, a ampla liberdade de organização partidária -


inexistente ou de pouca duração desde a República Velha - ainda era, para
o povo brasileiro, apenas uma esperança

As elites políticas brasileiras jamais reito de organizar-se livremente. da decretação do estado de sítio. Em
foram capazes de desenvolver um sis- Mesmo na Espanha, que não podia ser 1927, findo o estado de sítio, o PC vol-
tema democrático de partidos políticos, tomada como um modelo liberal, du- tou à legalidade, mas por apenas sete
no qual todas as correntes tivessem o rante a abertura controlada do meses, Em agosto daquele ano, a "Lei
direito de se organizar livremente. primeiro-ministro Adolfo Suárez, após Celerada" tornou-o novamente ilegal.
Também jamais conseguiram formar a morte de Francisco Franco, em 1975, Após a revolução de 1930, a legisla-
partidos nacionais sólidos, constituídos existiram nada menos que 160 partidos. ção partidária tornou-se mais liberal;
com base em programas e princípios Essa liberdade, se já existiu no Brasil, reconhecia os partidos estáveis, organi-
duradouros; e o medo de uma partici- na letra das leis, ou sofreu limitações zados como sociedades civis, e os parti-
pação popular efetiva e crescente fez práticas ou durou pouco. dos organizados apenas para concorrer
com que os partidos que se permitiram Na República Velha (1889-1930), a uma eleição, sendo dissolvidos em se-
formalizar fossem usados somente em prevaleceram os partidos regionais, ex- guida. Permitia também a apresentação
épocas eleitorais. E foi durante o Re- pressões das oligarquias dos Estados: de candidatos avulsos, desde que
gime Militar (1964-84) que esses vícios eram os "PRs", em que se encastela- apoiados por certo número de eleito-
e restrições à vida dos partidos se tor- vam os clãs locais. Era, assim, um sis- res. Em 1937, no entanto, esse sistema
naram mais agudos. tema partidário compatível com o fede- foi interrompido com o golpe que im-
Numa democracia liberal autêntica ralismo estruturado no poder das oli- plantou o Estado Novo: os partidos fo-
não deveriam teoricamente existir res- garquias, O Partido Comunista (PC), ram fechados e sua reorganização proi-
trições para a organização partidária. fundado em março de 1922, foi consi- bida.
Todos os grupos políticos teriam o di- derado ilegal três meses depois, quando Os partidos só reapareceram na vida
379
brasileira em 1945, com o fim da dita-
dura de Vargas; e logo encontraram as
primeirdàs restrições a sua organização.
O código eleitoral daquele ano exigia
que, para legalização, os partidos apre-
sentassem assinaturas de dez mil eleito-
res, espalhados por cinco Estados, com
um mínimo de 500 por Estado. Em
maio de 1946, o presidente Dutra am-
pliou a exigência para 50 mil assinatu-
ras. A lei vetava ainda a formação de
partidos considerados "antidemocráti-

Iconograplia
cos", que fossem filiados a organiza-
ções internacionais e que recebessem
dinheiro do Exterior. Esse dispositivo
foi usado somente uma vez, em 1947,
para cassar o registro do PC (no ano se-
guinte, todos os parlamentares - de
vergêedor a sen&dor - eleitos pela sigla
do PC foram cassados). No entanto, o
Partido Integralista, de Plínio Salgado,
de tendência reconhecidamente fas-
cista, continuou funcionando normal-
mente, com o nome de Partido de Re-
presentação Popular. Pode-se dizer,
portanto, que essas regras visavam a
bloquear os comunistas. As eleições
para a Constituinte de 1945 haviam
mostrado aos conservadores as grandes
possibilidades eleitorais dos comunis-
tas. ledo Fiuza, candidato do PC à Pre-

Iconograplia
sidência da República, lançado apenas
15 dias antes da eleição, obteve quase
10o, dos votos (569.818, em 5,8 mi-
lhões). O PC elegeu ainda um senador
- Luis Carlos Prestes - e 14 deputados quenos agrupamentos nascidos de riva- fechou esse leque de 13 partidos. Eles
à Assembléia Constituinte e fez maioria lidades locais. Outro partido pequeno, foram relegados a um plano secundário
de vereadores em diversas cidades im- caracterizado por uma conotação ideo- na vida política e tiveram sua represen-
portantes do País. lógica mais definida, era o Partido So- tatividade reduzida, principalmente
'cialista Brasileiro. pela cassação dos membros mais nacio-
Constatação de enfraquecimento O golpe de 1964 encontrou 13 parti- nalistas e dos mais identificados com as
leva a direita ao golpe de 64 dos registrados na Justiça Eleitoral. O causas populares. Em 1965, o Regime
PSD e a UDN - dois entre os mais con- Militar ainda realizou eleições com o
Com a cassação do PC, o quadro servadores - dominavam amplamente quadro partidário vigente antes do
partidário legal ficou com apenas três o quadro político desde 1945, mas vi- golpe, depois de cassar 31 deputados
grandes partidos nacionais: o Partido nham perdendo terreno. A constatação do PTB e mais dez parlamentares pro-
Social Democrático (PSD) e a União desse declínio pelos estrategistas da di- gressistas de outros partidos. A grande
Democrática Nacional (UDN), dos reita foi, sem dúvida, um dos fatores derrota sofrida pelo novo regime - es-
grandes empresários e fazendeiros; e o que determinaram a decisão pelo aban- pecialmente a perda das eleições para
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), dono da via eleitoral para chegar ao po- governador em Minas Gerais e na
dos empresários médios e da burocra- der. Em 1962, esses dois partidos esti- Guanabara - indicava a perspectiva de
cia sindical. Com força em alguns Esta- veram a um passo de tornar-se minori- uma rearticulação dos setores banidos.
dos, havia ainda o Partido Social Pro- tários: tinham juntos 54% dos deputa- Diante disso, o presidente Castello
gressista (PSP), de Adhemar de Barros dos federais, quando em 1945 tinham Branco expediu o Ato Institucional no
e Chagas Freitas, e o Partido Demo- cerca de 75%, dos votos e mais de 80% 2, de 27 de outubro de 1965, extin-
crata Cristão (PDC), que abrigava cor- da representação parlamentar. Nem guindo os partidos registrados. Foram
rentes distintas, desde a ligada a Ney mesmo o PTB, partido reformista que também criadas regras de difícil atendi-
Braga, no Paraná - que após 1964 iria Getúlio Vargas imaginou para contra- mento para forçar o sistema a tornar-se
para a Aliança Renovadora Nacional por à influência do PC, tinha seu futuro bipartidário e os parlamentares eleitos
(Arena) e depois para o Partido Demo- assegurado. Ao contrário, estagnara foram obrigados a se reagrupar em
crático Social (PDS) -, passando pela em torno dos 14% dos votos, após um duas coligações: a Arena e o MDB,
de Franco Montoro, eleito governador de crescimento a partir de 8% em 1945. As próprias circunstâncias da forma-
São Paulo, em 1982, pelo Partido do Por outro lado, cresciam as alianças e ção desses agrupamentos atestavam
Movimento Democrático Brasileiro coligações; em especial aquelas mais à não se tratar de partidos políticos nor-
(PMDB), até Plínio de Arruda Sam- esquerda, de caráter nacionalista e po- mais. O MDB estava condenado a re-
paio, candidato a deputado federal, em pular, que engrossavam a Frente Parla- presentar O papel de oposição; a
1982 pelo Partido dos Trabalhadores mentar Nacionalista. Arena, embora apoiasse o governdó,
(PT). Os partidos restantes eram pe- De início, o movimento de 1964 não não exercia de fato o poder. A vida
374
BR DFANBSB VB.GNCAAA, 24041334 an
0o a ; o 133
BRDFANBSB VE.GNCAM. SHO41334ân co 2, p 4418

Em 64, havia 13 partidos vembro de 1965, esclareceria os reais


registrados na Justiça objetivos do novo sistema partidário:
FOLHA DE S. PAULO
I'm jornal a serviço do Brasil * NOVO ATO VALIDO Eleitoral. O PSD (na "O problema do governo é constituir,
msm a-ve ATÉ MARÇO DE 67 unida e coesa, uma base parlamentar, a
pág. ao lado,a
NOVO ATO DÁPLENOS PODERES AO GºVERNO convenção do partido em mais ampla possível, que lhe dê segu-
Junho de 45, em São rança na tramitação da matéria legisla-
Paulo) e a UDN (na tiva e política de interesse governamen-
Partidos extintos, tal" (citado por Kinzo).
pág. ao lado, embaixo,
convenção simultânea do De fato, a inicial fraqueza eleitoral
garantias suspensas PRP e da UDN, em do MDB parecia confirmar o êxito da
agosto de 50) tática do Regime. Mas, o arranjo bipar-
dominavam amplamente tidário começou a entrar em pane após
e eleição indirela o desastre da Arena no pleito de 1974.
ssnmerms&s» o quadro político desde
1 -tamaI Abe Ilo, 45, mas vinham Até então, o MDB vinha perdendo sis-
2- Rala de ParInline; tematicamente para a Arena porque,
3 Musi # tis ri sta perdendo terreno. Esse
«4 mesmins, declínio foi, sem dúvida, por sua postura excessivamente pru-
um dos fatores que, dente e conciliadora - adesista em cer-
determinaram os tas ocasiões -, não conseguia atrair boa
estrategistas da direita a parte do protesto oposicionista canali-
“'I—ª.“— de =

seu « «= « decidir pelo abandono da


zada para os votos brancos e nulos e
para as abstenções. Contudo, a partir
via eleitoral para .chegar
de 1970, com a aprovação do seu pro-
Mstets ao poder, Nas primeiras
grama e a constituição do "grupo au-
-A do Podar Joao eleiçoes apos o golpe, em
re para aunia as dais da Comando
PAA
+ 1;
65, o Regime Militar
têntico" - parlamentares que se pauta-
10 - O dino de e pré, ! ' vam por uma postura mais combativa
sofreu uma grande
na oposição ao Regime Militar e que
n Ende, derrota. Assim, em 26 de
atuavam em bloco -, o MDB começou
outubro de 65, o governo
R- [“i—— a se aproximar das camadas populares
-aenaormeada |- a EXÚNÇÃO dos
e de outras correntes oposicionistas.
Banco de Dados/t SH

Juraci falou com o Bám « "=** U) partidos, pelo Al-2


NAS FORÇAS ARMADAS*presidente do STF Estas, por sua vez, enfrentando grandes
e

Nossa: opinião - dificuldades de atuação, não podiam


desperdiçar qualquer possibilidade le-
£. plasfs pa 10 ao, pelo proto
asacio do manda e files gal de difundir suas teses, de elevar o
d tala. nível de consciência e organização po-
pular e de unir os mais amplos setores
política real passou a correr, portanto, das dificuldades para a formalização de sociais e políticos numa frente demo-
por fora dos canais estreitos desse bi- novos partidos, basta lembrar os esfor- crática de oposição. Essa confluência
partidarismo forçado, tanto do ponto ços de Pedro Aleixo - vice-presidente de fatores embaralhou, de repente, a
de vista das forças de oposição como de Costa e Silva, impedido de tomar rotina eleitoral. Mantidas as regras da
das de situação. posse quando da morte deste, em 1969 disputa política, inclusive o bipartida-
- e, depois de seu filho, Maurício, rismo, surgia a possibilidade de o MDB
Com o AI-2, o governo impõe para obter o registro do seu Partido conquistar maioria no Congresso, em
a extinção dos partidos
Democrático Republicano: entre 1971 várias assembléias e câmaras de verea-
e 1977, foram feitas sete tentativas, to- dores e mesmo de eleger governadores
,A mudança para o bipartidarismo se das frustradas diante do rigor da legisla- e prefeitos em alguns dos Estados e
deu em duas etapas. Primeiro, ção. municípios mais importantes do País. O
determinou-se que qualquer partido Em sua Mensagem Presidencial à bipartidarismo se voltava, assim, contra
deveria ter 3% dos votos nas eleições Câmara dos Deputados, em 1966, Cas- o regime que o criara.
leglslallvas em 11 Estados, e no mi- tello Branco argumentou em favor da Essa tendência, entretanto, só seria
nimo 2% por Estado; eleger 12 deputa- extinção dos antigos partidos alegando percebida pelo governo após a derrota
dos federais, distribuídos por sete Esta- que sua multiplicação contribuira para da Arena, em 1974. Antes, o governo
dos; ter pelos menos 11 diretórios re- tumultuar e deformar a fisionomia polí- até se preocupava com o fraco desem-
gionais, organizados obrigatoriamente tica do País, "É o passo inícial para penho que o MDB vinha apresentando
em diretórios municipais, que por sua uma sadia vida partidária", afirmava - um entrave para a política de "dis-
vez só poderiam ser organizados se o ele. Mas era de Juracy Magalhães, mi- tensão" do presidente Geisel -, já que
partido tivesse um minimo de eleitores nistro da Justiça de Castello, a defesa seus ideólogos julgavam inconveniente
por município. Nessas condições, so- mais fervorosa do bipartidarismo, "pro- um esforço que levasse, na prática, ao
mente a UDN e o PSD poderiam so- vavelmente partindo da suposição de partido único. Por isso, Geisel permitiu
breviver. O PTB, o PSP e o PDC não que esse sistema, praticado nos Estados a aplicação da lei de propaganda eleito-
tinham nenhuma chance. A extinção Unidos e na Inglaterra, produziria a es- ral gratuita no rádio e TV para dar al-
pura e simples dos partidos viria com o tabilidade política", de acordo com a gum fôlego ao MDB. Mas o tiro saiu
AI-2, acompanhada de mais dificulda- análise de Maria D'Alva Gil Kinzo pela culatra: o partido de oposição
des para a organização partidária: além (Novos Partidos: o início do debate", cresceu brutalmente, a despeito de
das exigências anteriores, os partidos um dos artigos do livro Voto de manter-se minoritário.
também deveriam ter 120 deputados Desconfiança, organizado por Bolivar A princípio, o governo tentou ainda
federais e 20 senadores e não poderiam Lamounier). No entanto, o jornalista salvar o bipartidarismo, empenhando-
usar nomes, siglas ou símbolos das anti- Carlos Castello Branco, do Jornal do se mais a fundo na disputa eleitoral e
gas organizações, Para se ter uma idéia Brasil, em sua coluna do dia 25 de no- alterando as regras do jogo para torná-
375
an coa, p 119

yormAPA

Arquivo Naci
pe:
Ao

Ao fim de 14 anos de bipartidarismo (acima, a executiva da


Arena em 66, com Castello Branco; ao lado, em 79, ato contra
a extinção do MDB), o regime tentou uma nova manobra, sem
resultados, com o pluripartidarismo limitado

lo mais desfavorável à oposição - Militar realizou manobra oposta à de ção preferiram, no entanto, organizar-
como ocorreu com a "Lei Falcão", em 1965: abrandou as exigências para a or- se em novas agremiações:
1976, que limitou drasticamente a pro- ganização de partidos, € Os herdeiros do antigo trabalhismo
paganda eleitoral gratuita no rádio e Houve intensa polêmica na oposição engalfinharam-se numa acirrada dispu-
TV (Lei no 6.339/76) -, mas ainda assim quanto a como encarar a proposta de ta pela sigla do velho PTB. De um
prosseguiu a tendência de crescimento pluripartidarismo restrito do regime. Se lado, o grupo liderado por Ivete Var-
eleitoral do MDB. Em 1976, o partido havia consenso na oposição aos aspectos gas, e de ligações com o general Gol-
avançou nas eleições municipais e o g0- da lei que tornavam obrigatória a extin- bery do Couto e Silva; de outro, a cor-
verno reagiu com o famoso "Pacote de ção do MDB e impunham as tradicio- rente de Leonel Brizola. A briga foi de-
Abril", de 1977, criando os senadores nais restrições à organização livre dos finida pela Justiça em favor de Ivete
"biônicos" e cancelando as eleições di- partidos, não havia quanto ao que fazer Vargas, enquanto Brizola organizou o
retas para governadores previstas para em resposta à manobra oficial. Os libe- Partido Democrático Trabalhista
1978. Apesar disso, nesse ano, o MDB rais do MDB em geral, e mesmo cama- (PDT).
deu mais um salto à frente nas eleições das populares e nacionalistas dessa agre- € O PT nasceria principalmente da
para 0 Senado, Câmara e Assembléias miação tenderam a condenar qualquer conjunção do novo sindicalismo brasi-
Legislativas, iniciativa de formar novos partidos; sin- leiro - com berço no ABC paulista -,
Restavam, então, duas alternativas dicalistas, nacionalistas e mesmo outras movimentos reivindicatórios urbanos,
para o governo, Uma seria aprofundar camadas democráticas do MDB acha- setores progressistas da Igreja Católica,
o caminho das restrições, mas, com ram que a manobra do regime era um setores de esquerda egressos do MDB
isso, aumentar seu isolamento político recuo que permitia avanços parciais, e outros, (Houve tentativas de articula-
e sua dependência da força militar. A como a formação de novos partidos, ções entre os sindicalistas e os autênti-
outra seria pôr termo à experiência bi- mesmo sob restrições. cos do MDB para formar um partido
partidária, estimulando o surgimento mais amplo que veio a ser 0 PT; de-
de vários partidos, Com isso se retira- 1 manobra do regime era que o pois de vários encontros - em São Ber-
ria, em primeiro lugar, o caráter plebis-
MDB se dividisse nardo, Porto Alegre e Brasília -, com a
citário das eleições - não se trataria
participação inclusive de Miguel Ar-
mais simplesmente de votar contra ou a O sucesso da manobra oficial, con- raes, ex-governador de Pernambuco,
favor do governo. Por outro lado, tudo, não seria simples. Era preciso que esses esforços fracassaram.)
incentivando-se O reagrupamento do o MDB se dividisse, desmanchando a € O Partido Popular (PP) seria for-
MDB em novos partidos, o governo coligação liberal, nacionalista e popular mado principalmente por egressos dos
acreditava ser mais fácil dividir a frente que o mantinha. No entanto, o seu su- setores mais moderados do MDB -
oposicionista e isolar seus setores mais cedâneo, o PMDB, abrigou essencial- cuja expressão maior estava em Tan-
combativos, mente a mesma composição anterior. credo Neves - e liberais da Arena.
E foi assim que, em 1979, o Regime Alguns setores importantes da oposi- A legislação partidária de 1979 esti-
376
Com a reforma compor, com o PMDB, o PDT e o
partidária, Ivete Vargas PTB, a Aliança Democrática para
e Brizola iniciam luta apoiar Tancredo Neves, do PMDB, no
pela legenda do PTB Colégio Eleitoral que escolheria o su-
(abaixo, por C. Caruso); cessor do presidente João Figueiredo,
é formado o PT (ao em 15 de janeiro de 1985. O PDS, suce-
lado, a comissão que dâneo da antiga Arena - "o maior par-
registrou o partido no tido do Ocidente" -, encolheria até
TSE); e liberais criam o tornar-se, praticamente, o partido de
PP, que acabou um homem, o deputado Paulo Maluf,
incorporado ao PMDB paulista de ultradireita, adversário de
3 (abaixo, à esq., Olavo Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.
Setubal e Montoro O governo finalmente estava em mino-
3
O selam o acordo , SP, 82) ria, E a oposição, a um passo do poder.
Esse fracasso se explicava pela falên-
cia dos esforços das correntes ultra-
reacionárias das nossas elites, que arti-
cularam o golpe de 1964, de cons-
truirem uma alternativa político-
ideológica para o desenvolvimento do
País. Era evidente também a necessi-
dade de se criar um novo sistema parti-
dário, mais livre,

Os partidos continuaram sendo


autênticos "balaios de gatos"

O Brasil não teve ainda a oportuni-


dade de viver em um regime político de
plena liberdade de organização parti-
- memes dária. Dentro do MDB, e depois do
PMDB, estiveram presentes os antigos
pulava que o registro definitivo dos outubro de 1981, o governo foi derro- PTB, PDC, PSB, ao lado de organiza-
partidos seria concedido desde que es- tado na votação do projeto que preten- ções de esquerda como o Partido Co-
tivessem organizados pelo menos nove dia a realização das eleições de gover- munista Brasileiro, o Partido Comu-
diretórios estaduais; estes, por sua vez, nadores previstas para 82 com suble- nista do Brasil, etc. A Arena e, depois o
exigiam a organização de diretórios gendas que permitissem ao PDS agregar próprio PDS também foram balaios de
municipais em pelo menos um quinto suas várias correntes. Em São Paulo, gatos, desaguadouros do grosso dos ve-
dos municípios do Estado; e os dire- por exemplo, houve uma acirradíssima lhos PSD e UDN,. Mesmo o PT, ideolo-
tórios municipais exigiam um número disputa entre o grupo de Paulo Malut, gicamente mais homogêneo, abrigava,
mínimo de filiados, definido por um que defendia a candidatura Reinaldo por exemplo, alguns partidos comunis-
percentual do número de eleitores no de Barros, e o de Laudo Natel, ele pró- tas e algumas correntes trotskistas, que
município. Essas exigências tornavam prio candidado. não tinham chance de vida legal fora
difícil o registro definitivo dos partidos A reação do regime ao final das su- dele ou não admitiam alianças com se-
menores (PT, PTB e PDT), já que mui- blegendas veio no início de 1982, com a tores da burguesia liberal através de ou-
tos dos seus diretórios municipais pode- edição da Lei no 6.978, de 19 de janeiro, tras legendas. O PDT, pela liderança de
riam ser dissolvidos por não cousegui- que impediu as coligações partidárias. Leonel Brizola, era o herdeiro natural
rem 0 número mínimo de filiados até a A impossibilidade de os partidos fa- do velho PTB do período democrá-
data-limite fixada pela lei (24 de abril de zerem coligações colocou em risco a tico de 1945 a 1964. No entanto, após
1984). Através de um projeto de lei do viabilidade eleitoral do PP - nas cir- as eleições de 1982, selou aliança em
deputado Nilson Gibson (PDS-PE), o cunstâncias da ocasião -, levando-o a São Paulo com Adhemar de Barros Fi-
governo prorrogou o prazo por mais uma aliança com o PMDB. A fusão lho, herdeiro da máquina eleitoral de
dois anos, facilitando o registro daque- desses dois partidos, selada em conven- seu pai, o PSP, até então embutida no
les partidos. (O projeto de Gibson foi ção conjunta em 14 de fevereiro de PDS. O atual PTB, no pleito de 1982,
aprovado com o apoio do PTB e do 1982, foi, praticamente, a definição an- havia ressuscitado Jânio Quadros,
PDT ; votaram contra o PMDB e o PT, tecipada de mais uma esmagadora vi- lançando-o candidato a governador de
apesar de este último se favorecer tória oposicionista no pleito de novem- São Paulo, enquanto, no Rio de Ja-
dele.) bro daquele ano: a oposição obteve neiro, lançava Sandra Cavalcanti, her-
O êxito da manobra do regime em maioria de sete milhões de votos para o deira política de Carlos Lacerda.
direção ao pluripartidarismo depende- Congresso e dos 22 governos estaduais Esse quadro poderia ser alterado;
ria de o governo conseguir atrair para em disputa, o PMDB conquistou nove, era falso evidentemente. E as mudan-
seu lado o PP. Entretanto, o regime o PDT um e o PDS os outros dez.. cas surgiriam logo que houvesse liber-
cercou a legislação partidária e eleito- O fracasso dos sistemas partidários dade para o povo procurar - através de
ral com tantos dispositivos defensivos do Regime Militar era evidente em sua experiência concreta e não por de-
que estes acabaram por traí-lo. Esse 1984, Nesse ano, esfacelava-se o PDS, cretos do poder - a sua verdadeira
processo teve duas etapas. No dia 22 de dando origem à Frente Liberal que iria identidade político-partidária.
377

BR DFANBSB V8.GNC.MMA, 340414 334 anCO a, p 320


3RDFANBSB
840412341 an co 2,P
/ J2a

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/SAÚDE: a produção de medicamentos fonte de lucro na indústria farmacêu-


tica mundial. Através do sistema de pa-
tentes, estabeleceram-se verdadeiros
monopólios sobre as novas descober-
tas. Nesse contexto, a abertura do País
O remédio é espoliar
ao capital estrangeiro fez com que as
décadas de 50 e 60 se tornassem a
"idade de ouro" das subsidiárias das fir-
A indústria farmacêutica do País, dominada pelas
mas estrangeiras. Em 1969, todos os
multinacionais, atendia a menos de um quarto da população grandes laboratórios europeus e norte-
nos anos 70, investindo muito em propaganda americanos já estavam instalados no
Brasil.
O clima político de incerteza e a
Em meados da década de 70, a Santa País, mas sim o fato de o mercado en- crise econômica do início da década de
Casa de Misericórdia de São Paulo, es- contrar-se fortemente concentrado 60 afetaram basicamente os labora-
pecializada no atendimento à popula- nas regiões mais ricas do País. O tórios nacionais e 75 deles desaparece-
ção carente, economizava cerca de 400 diretor-presidente da Pfizer Corpora- ram entre 1960 e 1962. Os que sobrevi-
mil dólares por ano retomando uma tion do Brasil, - um dos grandes labo- veram foram sendo adquiridos pelas
prática muito co&ium nos hospitais bra- tatórios instalados no País -, Roberto multinacionais. No período 1957-79, 35
sileifos antes da Segunda Grande Schneider, admitia, em 1974, que só
Guerra, Para fugir dos altos preços im- laboratórios brasileiros foram adquiri-
22% da população brasileira era atin-
dos por grupos estrangeiros.
postos pela indústria farmacêutica, ela gida pela indústria farmacêutica,
passou a produzir, nos porões do hospi- No final da década de 50, os labora-
Em 1979, 60% dos remédios vendi- tórios estrangeiros já controlavam 80%
tal, a maior parte dos remédios que dos no Brasil ficaram nos Estados de do mercado brasileiro e mantiveram
consumia. Mesmo operando em escala São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Ge- esse controle acompanhando o seu
reduzida, aquela instituição conseguia rais, onde residia apenas 40% da popu- crescimento.
produzir aspirina a preços dez vezes lação brasileira. As compras de empresas nacionais que
menores que os do mercado. E o Para as multinacionais da indústria se seguiram tiveram o efeito muito
mesmo ocorria com diversos outros farmacêutica, no entanto, o Brasil era mais importante de impedir que essas
produtos, um mercado a ser conservado. Já em" empresas nacionais ameaçassem a es-
Tais resultados serviam de indicador 1974, o faturamento anual dos labora- tratégica fonte de lucros da indústria
das profundas deformações que atin- tórios estrangeiros em nosso país era farmacêutica originária dos países de-
giam a produção de remédios no Bra- comparável aos gastos totais do Serviço
sil. O mercado brasileiro de medica- Nacional de Saúde da Grã-Bretanha,
mentos era oligopolizado; ou seja, um país onde a medicina é estatizada.
pequeno número de grandes grupos A conquista do mercado brasileiro
controlava a maior parte das vendas. pelas empresas estrangeiras é um fend- re
Além disso, esse mercado era quase meno do pós-guerra. Nas décadas de 30 ad
que totalmente dominado pelo capital e 40, com a introdução dos derivados
estrangeiro, da sulfa e depois com a descoberta da
Segundo dados do Boletim de Mer- penicilina, a produção de remédios
cado de 1982 da Associação Brasileira passa a ser feita em bases mais cientifi-
de Indústrias Farmacêuticas (ABI- cas, o que exigia uma escala de produ- $
FARMA), os cinco maiores grupos far- ção maior que a necessária para fabri-
macéêuticos em operação no País eram car os antigos remédios populares.
responsáveis por 18% das vendas; os 20 como o conhecidissimo Biotônico Fon-
maiores, por 50%; e 81% do mercado toura, por exemplo. Foram poucos os
eram controlados pelos 50 maiores. laboratórios nacionais que consegui-
Um levantamento realizado pela Cen- ram sobreviver e dar o salto técnico ne-
tral de Medicamentos (CEME), Órgão cessário. Esse foi um período em que o
do governo federal, naquele mesmo Paíls se, viu forçado a "voltar-se para
ano, revelou que atuavam no Brasil 75 dentro"; primeiro como consequência
firmas estrangeiras, que controlavam da crise que abalou o sistema capita-
79,25%, do mercado, e 379 empresas lista na primeira metade da década de
nacionais, que dividiam entre si os res- '30, depois pelas dificuldades cambiais
tantes 20,75%. E se tratava de um mer- e, por último, pela guerra, que inter-
cado bastante significativo. A venda de rompia os fluxos comerciais. Surgiram,
remédios no Brasil, que fora de um bi- então, aqueles que viriam a ser os gran-
lhão de dólares em 1975, superou a bar- des laboratórios nacionais.
reira dos dois bilhões de dólares em Depois da Segunda Grande Guerra,
1982, O Brasil tornara-se o sexto maior quando surgiram os antibióticos de
consumidor de remédios entre os largo espectro (remédios eficazes con-
países capitalistas, embora seu con- tra um conjunto de infecções), a pes-
sumo per capita, em 1980, fosse seis ve- quisa científica tornou-se a principal
zes menor que o da Argentina.
Esse último dado deixa claro que Nos anos 80, "supermercados-farmácia"
não era o tamanho de nossa população vendiam cerca de 8 mil medicamentos,
que garantia aquela posição para o em 24 mil apresentações diferentes
378
BRDFANBSB VB.GNCAMA. 3404/3234ANCO2, p 122
lrieasldepreçodoConselhoI
dePreços-ea s q u a i s nterministlei--
estavama
cmentando adas. neces idades artificialmaernttier
riACentraldeMedicamentos,ap
senvolvidos - o monopólio da inovação tando o País cerca de 300 milhões de

tecnológica. Em 1957, havia 11 firmas dólares por ano com esse comércio.

de um974,cuidadoso levantamento, fme-eito


locais entre as principais do setor - Dependendo de vendas feitas a uma

em1dicamentoscomo elaborouumal i s t a de2 9 3


mas só restava uma em 1974. Os capi- parcela muito pequena da população e

sasqousaisdesemedicação
poderiam
tais estrangeiros voltavam-se, antes de competindo com uma quantidade in-

atender 95% dos c


mais nada, para os maiores laboratórios crivelmente alta de marcas, os labora-

dapopulaçãob rasileiRENAME(
ra. Essalista,Requela-
nacionais porque estes eram respeita- tórios se vêem forçados a investir prin-

recebeu o nomede
dos por sua "tradição científica". Ou cipalmente na promoção de seus pro-

çãoNacionaldeMedicamentosE s am-en-
seja: eram os que tentavam inovações dutos. E com isso provocam o encare-

cpilaiiasd)a,, fchegandoem
oi sendo aperfeiçoada e
tecnológicas ou pelo menos tendiam a cimento dos remédios. A estrutura de

sicas e 1983ai ondcultuoirs.320emA


desenvolver produtos originais. Não inte- custos dessa indústria no Brasil, no iní-

sOrganização
ubstâncias báMundial 480pde rSaúde,
ressam ao apetite do capital estran- cio da década de 80, revelava que o

geiro os laboratórios com boas organi- custo industrial dos remédios represen-

tt1io9cs8a0erams
, consideravaque500medicamen-
zações de marketing voltados para os tava apenas 35% dos custos totais - po-

rDevidoacionauàdlf.iceiesnntaecsioparaumat erapéu-
produtos de consumo popular e que rêm as despesas promocionais repre-

não se aventuravam a produzir medica- sentavam 36%.

nlaólgiizcaoçsãoquec, osopnrsi--
mentos mais complexos.

meirose s t á g i o s t e c n o
Investimentos de laboratórios

O capital estrangeiro causa graves

tituem reaaliizrnaaddsúoissltrnoPapesquisaed
ia farmacêutica
aís. Nemseseenrevnãoaolli--
provocam o aumento dos remédios

eramzavamnoB
deformações na situação da saúde
Para se ter uma idéia do volume de

vimentodenovosfármacos( as substân- |
A presença do capital estrangeiro le- gastos com propaganda, basta registrar

cdosremédios)nemoestudo
ias queconstituemas matérias-primas
vou à deformação. Ao fabricar seus que, em 1980, o laboratório Dorsay

dosprodu-pro-
próprios medicamentos, a Santa Casa Farmacêutico, uma pequena empresa

cçãoem
es os queescatornam v i á v e i s sua
de Misericórdia de São Paulo percebeu nascida num "fundo de quintal", que se

l,adosindu1s.tr8i0al.fármacosu
Noiníciotidali-
que podia reduzir a lista de remédios expandiu comercializando um com-

décadade8 0
que utilizava a cerca de 600 produtos. plexo vitamínico famoso durante a dé-

zados
no Brasnail, produção 80%eramdeimportados,g medicamentosas-
Número que revela quão absurdo era o cada de 70 - o Vitasay -, ficou em

fato de que, em 1982, no Brasil, tossem quarto lugar entre os maiores anun-

comercializados 8.000 medicamentos ciantes da "mídia", tendo a Volkswa-

em 24.000 apresentações diferentes, gen ficado em nono.

que eram criadas para burlar os contro- E, voltando-se para a parcela mais

' Tºbª DIZ antic9oag,u4l%antes 69,4%

antrácidos

anti-sÉépticos
e

vita8m7in,a6%812 65%

antigripais

X,
Abril Pres
R

379
BR DFANBSB VB.GNC.AMA, 8404423jan 002,
p 123

gime Militar, na criação de um Órgão


governamental que pudesse alterar essa
situação.
Quando essa instituição, a CEME,
foi fundada, em 1971, como órgão da
Presidência da República, ela se propu-
nha a comprar remédios e distribuí-los
às populações carentes do País. Mas,
aproveitando-se da decisão tomada
pela Junta Militar, em 1969, de não re-
conhecer os direitos de patentes sobre
medicamentos e seus processos de fa-
bricação, a CEME também visava de-
senvolver a produção de fármacos no
Brasil,
No entanto, derrotada pelas pressões
dos capitais estrangeiros, a CEME foi
esvaziada e partida em duas. Pôde
prosseguir na distribuição de remédios
(Principalmente soros e vacinas) - par-
cela de sua atividade que ficou subordi-
nada, a partir de 1975, ao Ministério da
Previdência Social - desde que não in-
fluísse no mercado das indústrias priva-
das. Sua metade dedicada ao desenvol-
vimento tecnológico foi subordinada
ao Ministério da Indústria e Comércio,
onde foi relegada ao esquecimento.

A CEME tentou e não conseguiu


a produção de remédios

Emabril de 1983, com o lançamento


do Programa Nacional da Indústria
Química e Farmacêutica, a CEME
re-
tomava a tentativa de alcançar o
seu
s Objetivo mais importante - a prod
ução
: de remédios. As dificuldades cambi
ais
; Que 0 País passou a enfrentar a
partir
de 1982 reforçaram os argumentos dos
s defensores dessa produção de remé
dios
pela CEME. O programa pretendia
apoiar-se na indústria privada nacional,
a quem a CEME entregaria o processo
Nos anos 30 e 40, a produção de remédios de produção e os financiamentos ne-
em bases mais científicas exigiu uma escala cessários e para a qual a CEME garan
de produção maior que a necessária parafabrica -
r os antigos remédios populares, como tiíria a reserva de mercado, inclusive
o Biotónico Fontoura (acima, anúncio de 1930)
proibindo a importação das matérias-
rica dos habitantes do País, a indús primas que fossem passar a ser produzi-
tria média na América Latina era de 2,2
farmacêutica ignorava as reais neces das no País,
si- dólares e chegava a 4,5 dólares nos Es-
dades da população brasileira. O es- Ao mesmo tempo, através da RE-
tados Unidos e a 5,2 dólares na Argen
tudo da CEME, de 1974, concluía que - NAME, a CEME pretendia sanear
tina, o
"a oferta de medicamentos de certa mercado, institucionalizando a nomen-
O presidente da Comissão de Saúde
forma condiciona o perfil de sua de- clatura científica dos principais ingre
da Câmara Federal, deputado Jaiso -
manda" e que as doenças que predomi- n dientes, para reduzir e cercear
Barreto (PMDB-SC) em 1974, denun- a prática
navam no Brasil não influíam na esco- de se multiplicarem as várias marc
ciava que 110 medicamentos perigosos, as
lha dos medicamentos a serem come com que cada substância chegava ao
r- com venda proibida ou restrita nos
cializados, mercado. No entanto, analistas do
EUA, eram comercializados livremente se-
Isso tornava-se perigoso à medida tor indagavam sobre a viabilidade
no Brasil, a maior parte deles sem re- des-
em que sempre foi pequeno no Brasil.o ses planos, Em primeiro lugar, as pres-
ceita médica,
controle sobre a comercialização de re- sões dos laboratórios estrangeiros não
Impressionados com essas deforma- estavam eliminadas, e também nada
médios. Em 1974, a Organização
Pan- ções e com a dependência do País
americana de Saúde calculou que para garantia que grupos privados nacionais,
diante dos grupos internacionais, ofi- uma vez dominando o conhecimento
cada mil dólares comercializados em
ciais do Estado-Maior das Forças Ar- da fabricação de fármacos, não conti
remédios o Brasil gastava 0,7 dólares -
madas se empenharam, apesar de forte nuassem a lançar no mercado uma infi-
com o controle dos medicamentos, A Oposição de setores do governo do Re- -
nidade de remédios desnecessários.
380
&n Opa, pJ24
sr oraNsss va.enc.aaa, 2404834

fica, a despeito das lutas na Bahia e no


Maranhão, que envolveram um nú-
mero de soldados maior do que o mo-
bilizado pela campanha de Simón Boli-
var! Caracteristicamerite, Varnhagen
valorizou em excesso a luta dos colonos
pernambucanos, liderados pelos gran-
des senhores de terras e de escravos,
contra a invasão holandesa, no século

O resgate da memória de Tiradentes


e sua ascensão ao panteão dos heróis
nacionais é outro exemplo de como as
classes contam a história, Durante o
Império, Tiradentes foi relegado a um
segundo plano, e Varnhagen - na pri-
meira edição de sua História Geral do
Brasil, de 1857 - chamou-o de insignifi-
cante e indiscreto, a quem a morte na
forca atribuiu méritos que não tinha.
Afinal, Varnhagen era o historiador da
classe e da dinastia que condenara Ti-
radentes, classe à qual também o trai-
dor Joaquim Silvério dos Reis se ligou
em 1791, desposando uma das filhas do
oligarca Luís Alves de Freitas Belo.
Outra filha desse personagem se casou,
depois, com Francisco de Lima e Silva,
um dos chefes militares mais eminentes
do Primeiro Reinado, regente do Im-
pério durante a menoridade de Pedro
4. 11 e pai de Luiz Alves de Lima e Silva, o
duque de Caxias. Dessa forma, o trai-
Tiradentes: para a Monarquia, um bandido; para a República, um herói dor da Inconfidência Mineira foi tio,
por afinidade, do duque de Caxias - o
POLÍTICA/HISTÓRIA: a concepção de classe na historiografia patromo do Exército -,0 que denota li-
gações familiares e de classe que real-
mente não permitiam a valorização da
atividade conspiratória do alferes.
Pela atuação do movimento republi-
Reescrevendo a história cano e posterior advento da República,
O papel de Tiradentes pôde ser reavali-
dado. A primeira homenagem oficial a
No final do Regime Militar se divisavam sinais claros de que ele prestada ocorreu em Minas Gerais,
a forma de contar a história do País mudava para uma em 1867, quando o presidente da
perspectiva mais ampla e democrática Província e futuro fundador do Partido
Republicano, Joaquim Saldanha Mari-
Contar a história é uma atividade está em revisão constante. A medida nho, mandou construir um monumento
que reflete as convicções políticas e so- que o processo democrático se apro- a Tiradentes em Ouro Preto. Após a
ciais das classes e grupos sociais aos funda, a história tende a ser contada do queda da Monarquia, em 1889, Tira-
quais o historiador está ligado. Por isso, ponto de vista de camadas mais amplas dentes foi transformado em herói na-
a história não só traduz as idéias daque- da população. "E o desenvolvimento cional.
les que dominam, mas também deixa da consciência social e política do povo Com a emergência das classes popu-
transparecer a visão do mundo dos gru- que exige a revisão de nossa história", lares na vida política nacional - intensa
pos emergentes, que lutam contra a he- reconheceu o historiador José Honório depois da Segunda Grande Guerra -,
gemonira política, econômica, social e Rodrigues, numa conferência de 1965. outros heróis de nossa história de ori-
ideológica das classes que estão no po- A historiografia brasileira oferece gem plebéia tiveram sua memória recu-
der. exemplos disso. A obra do historiador perada. Zumbi, líder do Quilombo dos
Cada classe busca no passado os fa- do século passado Francisco Adolfo Palmares, e Antônio Conselheiro, diri-
tos que compõem o mosaico de sua vi- Varnhagen é um deles. Segundo José gente do arraial de Canudos, por exem-
são de mundo - podemos dizer esque- Honorio Rodrigues, Varnhagen foi o plo, passaram a ser considerados sob
maticamente. Procura seus heróis e va- principal responsável "pela criação da um ponto de vista mais positivo. O pri-
loriza os momentos mais criativos de história oficial, que sempre defende a meiro era até então tido como um ban-
seus antepassados de classe, momento razão do Estado e com ela se identi- dido cujas atividades mereceriam an-
em que - agindo em defesa de seus fica". Apologista da dinastia dos Bra- tes fazer parte da crônica policial do
próprios objetivos - eles puderam re- gança, protegido de Pedro II, Varnha- que propriamente da história, e Conse-
presentar a vontade geral da sociedade. gen inaugurou também a versão de que lheiro foi descrito como um louco mis-
Por isso a história é uma ciência que nossa Independência teria sido paci- tico liderando jagunços fanatizados.
381
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, 840444334
3 062P J25

Quando a causa pela qual morreram


publicação, em 1978, do já clássico
pôde ser identificada como acausa de Machado - estudante e ex-vice-
Escravismo Colonial, de Jacob Goren-
enormes parcelas do povo, ambos pas- presidente da União Nacional dos Estu-
der.
saram a ser reivindicados como heróis. dantes (UNE), assassinado em 1973
Com a perspectiva do fim próximo
Esses exemplos pretendem mostrar pela polícia política pernambucana, du-
do Regime Militar, alguns sinais muito rante o governo do mesmo general
que o reconhecimento dos heróis pelos Mé-
claros mostravam que mudavam tam-
que contam a história está intimamente dici -, acontecimento carregado de
bém as atitudes em relação aos heróis
relacionado com a atividade daqueles simbologia.
homenageados pelo cambaleante Re-
que fazem a história. Assim, durante o Outro caso: na periferia pobre de
gime Militar. Um caso expressivo: o
Império, um setor da oligarquia, origi- São Paulo, durante os saques de abril
policial americano e instrutor de polí-
nário do Nordeste, dominava a cena de 1983, populares arrancaram a placa
cias políticas latino-americanas Dan
nacional, e seus heróis foram os chama- de uma rua com o nome do general Eu-
Mitrione, morto pelos guerrilheiros tu-
dos restauradores pernambucanos, que clides Figueiredo, pai do último presi-
pamaros no Uruguai, foi homena-
lutaram contra os invasores holandeses dente militar, João Figueiredo - o
geado, durante o governo Médici, com
- uma luta que, no entanto, destinava- chefe de um regime agonizante e repu-
a atribuição de seu nome a uma rua de
se a restabelecer a soberania portu- diado pelo povo.
Belo Horizonte. Em 1983, essa home-
guesa sobre o território ocupado. Com
nagem foi cancelada e a rua rebatizada
a República, outro setor da oligarquia,
com o nome de José Carlos da Matta
localizado principalmente em Minas José Carlos Ruy
Geráis e São Páulo, ascende, Traz con-
sigo novos heróis. Tiradentes, o maior
deles, personagem central do episódio
mais marcante em que esse setor liberal
oligárquico esteve envolvido - a Incon-
fidência Mineira -, é transformado em
herói nacional.
Uma hipótese que se pode formular
aqui é de que a revisão da história
ocorre nos momentos em torno da rup-
tura institucional ou social, como no fi-
nal da Monarquia e do Estado Novo.
São períodos em que os problemas
mais gerais são amplamente debatidos,
e soluções para as questões mais can-
dentes são propostas pelas classes e pe-
los grupos sociais,
O reexame da história é uma tenta-
tiva de detectar esses temas no passado
e de reavaliar a solução a eles dada.

Após 30, surgem importantes


obras de análise do País

Os anos que se seguiram à revoluçã


o
de 1930, por exemplo, foram parti
cu-
larmente notáveis: nessa época
apare-
cem obras importantes como as de
Gil-
berto Freyre, Caio Prado Júnior, Sér-
gio Buarque de Holanda, Roberto Com o fim do Regime Militar,
Si-
monsen, Azevedo Amaral, entre também os "heróis" do período
ou-
tros, consolidando algumas das pós-64 estavam sendo reavaliados. Acima
linhas ,
de interpretação histórica ainda domi lado, com afamília, José Carlos da Matta
-
nantes entre os pensadores nacio Machado, ex-vice-presidente da União
nais.
A rica atividade intelectual do perí Nacional dos Estudantes, morto pela
odo
que vai do fim do Estado Novo polícia pernambucana no governo do
até
pouco depois do golpe militar de general Médici e cujo nome foi dado a
1964
sugere também que a vigência de uma rua de Belo Horizonte, em 1983, em
liber-
dades democráticas, mesmo que limit substituição ao de Dan Mitrioni, instrutor
a-
das, propicia momentos criadore de polícias políticas latino-americanas
s para
a historiografia, morto pelos guerrilheiros tupamaros no
No início dos anos 80, para algu Uruguai
mas
correntes intelectuais se tornava
mais
nítida uma tendência à divisão
da his-
tória do Brasil baseada não nos gran
des
eventos políticos, mas nas alternânci
as
dos modos de produção e nos tipos
de
relação de trabalho. Um exemplo
é a
382
BRDFANBSBVB.GNCAMA, &AO4 1334 ancog, P 126

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHADORES DO CAMPO: No início dos anos 60 os trabalhado-


a história daslutas e da organização res rurais aumentavam seu nível de or-
ganização, e o governo sentia que os fa-
tos ocorriam sem o seu controle. As
contradições entre os interesses do Es-
A luta pela terra tado e do homem do campo se eviden-
ciaram. A reinvindicação da reforma
agrária, revelou com clareza a oposição
Desde 1930, o trabalhador rural luta organizadamente pela entre o Estado populista e os trabalha-
mudança da estrutura de posse da terra. Na pauta, uma dores rurais. A necessidade de mudar a
reivindicação crescente: a reforma agrária estrutura agrária ameaçava abalar a
classe proprietária, representada politi:
camente pela UDN e principalmente
pelo PSD, os maiores partidos de en-
tão. As pressões aumentavam. A partir
de 1961, o Estado decidiu apoiar o sin-
dicalismo - ainda não legalizado - e
reprimir as ligas. Isto porque o sindica-
lismo propunha a reforma agrária pela
via legal, enquanto as ligas a queriam
pela lei ou à força, o que significava um
confronto direto com o governo.
A 2 de março de 1963, durante o go-
verno Goulart, era assinado o Estatuto
do Trabalhador Rural (ETR). Foi o ins-
trumento que legalizou - e, portanto,
atrelou ao Ministério do Trabalho - o
movimento sindical rural.
Mesmo com o ETR a reforma
agrária continuou sem solução
3
O9 O ETR atendeu várias reinvindica-
oe ções importantes dos trabalhadores ru-
]oC[+] rais, mas o problema fundamental, da
< reforma agrária, continuou sem solu-
ção. Ficavam evidenciadas, assim, as
Em 1961, durante a realização do 1o Congresso de Trabalhadores Rurais, em Belo contradições
tado e dos
entre os interesses do Es-
trabalhadores rurais.
Horizonte, as ligas exigem a reforma agrária pela lei ou à força
Mesmo assim, após a assinatura do
As tentativas de organização do ho- ção democrático-burguesa" pregada ETR, o movimento sindical cresceu, a
mem do campo não são recentes. O pelo partido. ponto de, em 31 de janeiro de 1964, ob-
primeiro sindicato rural data de 1930, No Nordeste surgiram as famosas li- ter o reconhecimento de seu órgão na-
no Rio de Janeiro. Com o fim do Es- gas camponesas, um dos movimentos cional, a CONTAG (Confederação Na-
tado: Novo, em 1945, o Partido Comu- mais radicais conhecidos no campo. cional dos Trabalhadores na Agricul-
nista (PC) empenhou-se na organização Pregavam a reforma agrária, legal ou à tura). Porém, após o golpe militar, a
de ligas camponesas. Foi um período força, e visavam despertar a consciên- CONTAG sofreu intervenção (abril).
agitado: entre 1947 e 1955 se registra- cia política do trabalhador rural. A Nas eleições da entidade em 1965 foi
ram inúmeras tentativas de organiza- Igreja Católica, outra importante força escolhida uma diretoria integrada pelos
ção dos trabalhadores rurais e ocorre- atuante na organização dos trabalhado- interventores. Trabalhadores rurais que
ram muitas revoltas no campo. res do campo, decidiu atuar através do participavam do movimento sindical
Após 1955, quando se avivou o de- sindicalismo rural a partir de meados desde 1960 discordavam da orientação
bate sobre a realidade nacional, a ques- de 1960, iniciando pelo Nordeste. Na da diretoria eleita. A insatisfação era
tão agrária passou a ocupar papel im- ação da Igreja despontavam dois gru- maior no Nordeste, Um grupo de líde-
portante. A reforma agrária foi tema pos: o inicial, com uma posição antico- res radicados em Pernambuco assumiu
central e polêmico. Vários segmentos munista, e preocupado em não perder a liderança da oposição e articulou a
da sociedade mobilizaram-se e procu- a influência sobre o camponês para os retomada da CONTAG. Assim, nas
raram orientar a organização dos traba- comunistas e outras correntes; e outro eleições de 1968 venceu uma chapa
lhadores rurais no sentido de conquis- mais progressista, identificado como a comprometida com os interesses dos
tá-la. Ação Popular (AP), organização de es- trabalhadores rurais. Em meados dos
A União dos Lavradores e Trabalha- querda. A atuação da Igreja no sindica- anos 80, esse mesmo grupo, através de
dores Agrícolas do Brasil (ULTAB), lismo rural representou uma tomada de diferentes composições, mantinha-se
cuja direção era controlada pelo PC, posição que se contrapunha, em parte, na direção da confederação. E já então
fundava as "uniões de lavradores", à das ligas. Embora a bandeira central os trabalhadores rurais representavam
principalmente em São Paulo, A UL- fosse a reforma agrária, as ligas e os sin- uma força poderosa no sindicalismo
TAB propunha aliança entre operários dicatos propunham formas de luta dife- brasileiro. Em 1984, filiados à CON-
e camponeses para realizar a "revolu- rentes. TAG, existiam 22 federações, uma de-
383
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 84041331
80094, pIB25
legacia em Rondônia, 2.600 sindicatos
e 8.248 associados.
Embora vários programas governa-
mentais procurassem desviar os rumos
do sindicalismo, a CONTAG preser-
vava a bandeira central, da reforma
agrária, que unificava o movimento. A
despeito de os sucessivos governos e se-
tores da sociedade confundirem re-
forma agrária com colonização, polí-
tica agrícola, etc., para os trabalhado-
res rurais, através dos anos, a concep-
ção pouco mudou quanto à idéia cen-
tral: a reforma agrária nunca deixou de
ser encarada como uma mudança es-
trutural, com distribuição massiva de
terra e participação do camponês, As
formas de lutaé que têm variado, As li-
gasfexigiram-nà pela lei ou pela força; o
sindicalismo lutava pela reforma agrá-

Agência O Uiobo
ria através da lei.
No 1o Congresso Nacional de Traba-
lhadores Rurais, realizado antes da
aprovação do ETR, a 17 de novembro
de 1961, em Belo Horizonte, a reforma
agrária já era uma das principais ban- D E Goulart (acima, com
deiras. Esse congresso, organizado pela Magalhães Pinto, então
ULTAB, contou com ajuda financeira governador de Minas, e
do governo e a presença do então pre- Tancredo Neves,
sidente Goulart, que procurava apoiar primeiro-ministro, no
o sindicalismo e esvaziar as ligas cam- congresso de 61, em
ponesas. BH) procurou esvaziar
as ligas e apoiar o
1pós o golpe, há um congresso sindicalismo, contra a
nacional de trabalhadores rurais radicalização pela
reforma agrária. Em
Logo após o golpe de 1964, no agosto de 83, na 1a
período em que a CONTAG esteve nas CONCLAT, José
mãos dos interventores, foi realizado Francisco da Silva (ao
um congresso nacional de trabalhado- lado), presidente da
res rurais, em março de 1966, em São CONTAG, também
Paulo, que contou com a participação 15 defenderia a reforma
3 agrária
de recursos técnicos e financeiros do s
Instituto Nacional de Desenvolvimento
Agricola (INDA). Durante o congres- redo, em Brasília, houve ampla partici-
so, predominou o debate do ETR, do pação. Nessa ocasião, o movimento,
vamente à política agrária: a decisão da
luta conjunta de todos os trabalhadores
Estatuto da Terra e da política agricola através da CONTAG, já contava com
de então. A reforma agrária defendida estudos sobre a realidade agrária que
pela reforma agrária.
nesse congresso, posteriormente repu- permitiram elaborar propostas mais
Em abril de 1983, a CONTAG
associou-se a mais cinco entidades
diada pelos sindicalistas que assumiram fundamentadas do que nos encontros (CPT - Comissão Pastoral da Terra,
a direção da CONTAG após 1968, des- anteriores. A reforma agrária foi nova- CIMI - Conselho Indigenista Missio-
tinava-se a resolver conflitos localiza- mente a bandeira central, Nesse con- nário, CNBB - Conferência Nacional
dos no campo. Em maio de 1973, em gresso, no dia 23 de maio, o então mi- dos Bispos do Brasil, ABRA - Asso-
Brasília, foi realizado o 2o Congresso nistro da Agricultura, Delfim Netto, foi ciação Brasileira de Reforma Agrária e
Nacional de Trabalhadores Rurais. A vaiado ao apresentar suas idéias sobre IBASE - Instituto Brasileiro de Análi-
atuação dos trabalhadores foi cautelo- os problemas do campo. ses Sociais e Econômicas) e iniciou
sa, em virtude de o encontro realizar-se No começo, dos anos 80, o sindica- uma campanha nacional pela reforma
em pleno governo Médici. Mas con- lismo rural mostrou uma atuação mar- agrária,
cluiu-se pela necessidade da pronta cante, Na 1a CONCLAT (Conferência Na CONCLAT realizada no início
realização da reforma agrária; e ficou Nacional da Classe Trabalhadora), rea- de novembro de 1983, também na
claro que, para .os trabalhadores, refor- lizada em agosto de 1983, no município Praia Grande, com 1.265 entidades, os
ma agrária não se confundia com colo- paulista de Praia Grande, participaram trabalhadores rurais ampliaram sua
nização, programa de governo da épo- 1.091 entidades. De cinco confedera- participação e contavam na ocasião
ca. ções, uma era a CONTAG; havia 363 com mais da metade das entidades pre-
No terceiro congresso, realizado de sindicatos rurais; 469 urbanos; e 16 fe- sentes.
21 a 25 de maio de 1979, em pleno derações rurais. Dentre as resoluções
clima de abertura do governo Figuei- desse congresso, uma se referia exclusi- Luzia A. Conejo Guedes Pinto
384
ar oransss S404132J en p IR

ECONOMIA/INDÚSTRIA: a história do setor de informática

Uma indústria de futuro

Embora ainda longe da auto-suficiência tecnológica, havia, nos anos 80,


bons indícios para o setor de informática no País, principalmente em razão da
reserva de mercado para minis e microcomputadores

As inovações tecnológicas chegaram A partir daí, que papel se poderia es- tos no Brasil. Estávamos ainda longe de
sempre com atraso ao Brasil e não pou- perar para o Brasil no campo da infor- dominar completamente a sofisticada
cas vezes se tornaram instrumentos de mática? Desenvolvida pelos america- tecnologia da informática, mas, segun-
espoliação do País. O exemplo extremo nos durante a Segunda Grande Guerra, do avaliações mais otimistas, principal-
é o do avião: apesar de um de seus in- a indústria de computadores parecia mente na área do governo, o Brasil co-
ventores ser um brasileiro, só começa- inacessível, inicialmente, mesmo para meçava a se equiparar a França, Ingla-
ria a ser timidamente produzido entre outras nações economicamente avan- terra e Alemanha, ficando atrás apenas
nós cerca de 70 anos depois de seu apa- cadas. de gigantes como os EUA e o Japão.
recimento, no começo do século. Te- Raciocínios lineares, porém, podem Essa posição, porém, não foi conquis-
mos também o automóvel. A indústria levar a conclusões errôneas quando se tada sem uma longa luta, que provocou
automobilística, a mais dinâmica do trata de tecnologia. Apesar de não ter fissuras e disputas nos meios empresa-
pós-guerra, implantou-se no Brasil ainda uma indústria automobilística ge- riais e até em gabinetes ministeriais. A
através de filiais de grandes empresas nuinamente nacional na década de 80, formulação da política nacional de in-
multinacionais, que utilizavam uma ve- as empresas brasileiras de computado- formática, desde o início, esbarrou em
lha "novidade" tecnológica: o modelo res já detinham quase, metade da pro- seu principal obstáculo; as empresas es-
básico do automóvel, praticamente dução e do mercado do País. Em 1984, trangeiras sediadas no Brasil. Que pa-
sem alterações nos últimos 50 anos. atingindo o climax de um comércio que pel caberia a elas no desenvolvimento
Mesmo assim, o País pagava royalties crescera 10.000% desde 1979, vendeu- da indústria nacional? Em 1970, quan-
por esses calhambeques tecnológicos. se um computador a cada cinco minu- do surgiu a idéia de que o Brasil preci-
BR DFANBSS 84044 3334 87002, p 29

a "fais 19!"

Tude Munhoz/Abril Press


Alex Soletto
Q *
Do Pato Feio, projeto da USP, ao Nexus 1.
600, da Scopus (à esq.), a indústria nacional deu
ataques do senador Roberto Campos (à dir., com grandes passos, a despeito dos
Edison Dytz, pres. da SEI, e o senador Severo
Gomes )
sava ter computadores próprios, pensa-
Do outro lado, quase isolados, haviam Naturalmente, essa jovem indústria
va-se em criar empresas nacionais atra- ficado alguns empresários que comba-
vês de associações de capital com as es- apresentava inúmeras fraquezas. Em
tiam a reserva de mercado por excluir primeiro lugar, a fatia do mercado a ela
trangeiras, Elas forneceriam seu conhe- associações de capital com estrangei-
cimento tecnológico e experiêncie co- reservada não fora selecionada pelo
10s, joint ventures. Alguns dos grupos Regime Militar a partir das necessida-
mercial, Aos poucos, esperava-se que derrotados eram simples empresas que
as novas indústrias adquirissem maturi- des do País: na verdade, o principal fa-
já funcionavam segundo o esquema de tor foi a posição das multinacionais no
dade para andar com as próprias per- Joint ventures,
nas. A partir de 1976, no entanto, a mercado. Como o capital estrangeiro
orientação do governo começou a mu- dominava a fabricação dos grandes
A penas 20% do parque estava
dar por uma série de fatores: as empre- computadores, as empresas nacionais
com as empresas nacionais não cogitavam enfrentá-lo nesse cam-
sas se desenvolveriam melhor se fossem
inteiramente nacionais, comprando pa- po. Elas dirigiam-se então para a pro-
Os principais argumentos favoráveis dução de micros e mínis, que não eram
tentes de projetos no exterior. Além
à indústria nacional eram seus próprios fabricados no País. Mas, embora esse
disso, para protegê-las de uma concor- feitos. Contra ataques de inimigos
rência desigual com as grandes empre- tipo de computador pertencesse ao se-
como o senador Roberto Campos tor mais dinâmico da informática - o
sas estrangeiras, decidiu-se que pode- (PDS-MT), ministro do Planejamento
riam fabricar alguns tipos de computa- que possibilitou às empresas brasileiras
no governo Castello Branco e um velho um rápido crescimento -, os fabrican-
dores com exclusividade. Essa resolu- aliado do capital estrangeiro, Edson tes de grandes computadores eram
ção de 1977, criou a "reserva de merca- Fregm, fundador da Scopus e presi-
do", afastando as multinacionais do se- muito mais poderosos: na década de
dente da Associação Brasileira da In- 80, as empresas nacionais detinham
tor de mínis e microcomputadores, dústria de Computação e Periféricos
principalmente, por sete anos. apenas 20% do valor do parque indus-
(ABICOMP), afirmava: "Nos 20 anos trial do setor instalado no Brasil,
Mas, à medida que cresceu à mar- em que as empresas estrangeiras estive-
gem do governo uma indústria nacional Em segundo lugar, muitas empresas
ram sozinhas no Brasil, nenhuma tec- brasileiras estavam menos preocupadas
de informática, o confronto com as nologia foi desenvolvida aqui." O mer-
multinacionais também cresceu e esca- com as necessidades tecnológicas do
cado mostrava, então, que, dos 31 pro- País do que com a oportunidade de lan-
pou dos gabinetes fechados do Regime dutos lançados no País, havia 25 desen- car um produto qualquer no mercado,
Militar. volvidos aqui e apenas seis montados preferindo, portanto, comprar projetos
Sete anos depois, em outubro de com projetos vindos do Exterior. Esses
1984, a política de reserva de mercado no Exterior. Isso era melhor do que
números se referiam apenas às máqui- permitir a importação através das mul-
foi levada ao escrutínio do Congresso. nas, mas estas também empregavam
Aí, em clima de festas, ela seria prorro- tinacionais (responsáveis por quase
equipamentos adicionais fabricados 80% das importações em 1983), mas
gada por mais oito anos. Refletindo a por companhias brasileiras, os chama-
coligação de forças que se havia alinha- não contribuia para aumentar a nossa
dos "periféricos". Nessa área, a indús-
do em favor da nova lei, o placar final capacitação tecnológica.
tria nacional criara 120 produtos, dos
foi de 338 votos a um. No plenário, a Em terceiro lugar, de modo ainda
quais apenas 24 eram importados e 15
comemoração era comandada pelo mais profundo, salientava-se a nossa
montados a partir de projetos estran-
Movimento Brasil Informática, forma- dependência da matéria-prima básica
geiros; e 81 equipamentos representa-
do por vários grupos nos debates dos dos computadores: os componentes
vam tecnologia brasileira.
meses anteriores - empresários nacio- eletrônicos. A lei de 1984 reconhecia
"É' importante observar", acrescen- essa fragilidade, providenciando a re-
nais, clubes de engenharia, sindicatos tava Fregni, "que a indústria nacional
de engenheiros, a sociedade científica e gulamentação do Centro Tecnológico
caminha rapidamente no sentido de de Informática (CTI), inaugurado, no.
associação de trabalhadores na indús-
utilizar cada vez menos tecnologia es- mesmo ano, pelo presidente Figueire-
tria de informática. trangeira". do. Sediado em Campinas, o CTI tinha
386
A lei de reserva de a missão de criar os nossos próprios
mercado para micros e chips: microcomponentes de uma única
minicomputadores peça de metal nos quais são gravados
permitiu, segundo o milhares de circuitos de uma só vez e
empresário Edson que antes ocupavam espaço muito
Fregni (ao lado), maior.
presidente da - Moa É
ABICOMP, que as A indústria nacional entra
empresas nacionais no clube dos fabricantes
(como a Cobra, ao
centro) caminhassem no Contraditoriamente, foi a partir des-
sentido de utilizar cada sa fraqueza que surgiu a oportunidade
vez menos tecnologia para romper o cerco das multinacio-

Luiz Alberto França/Abril Press


estrangeira. O mercado nais, Embora considerados a maior ino-
de grandes vação tecnológica desdeoaparecimento
computadores, no da máquina a vapor, as grandes empre-
entanto,continuou aberto sas não se interessaram inicialmente
à participação das múltis pelos chips. Afinal, elas estavam firme-
(embaixo, vista parcial mente estabelecidas no mercado e ne-
da IBM do Brasil, em cessitariam fazer novos e grandes inves-
Campinas, São Paulo) timentos para utilizar a nova tecnolo-
gia. O resultado foi que, na década de
80, havia milhares de pequenas compa-
nhias desenvolvendo e vendendo esses
"mágicos" módulos no mercado inter-
nacional. E foi por essa brecha - utili-
zando os chips importados de um mer-
cado estrangeiro relativamente livre
para montar os mínis e micros no Brasil
- que a indústria nacional penetrou no
seleto clube dos fabricantes de compu-
tadores, aproveitando as decisões ini-
cialmente tomadas pelo Regime Mili-
tar. Portanto, paralelamente aos esfor-
Luiz Paulo Machado/Abril Press

ços oficiais de montar uma indústria es-


tatal associada ao capital estrangeiro,
que fracassou, surgiram empresas na-
cionais autenticamente independentes,
e com maior poder de pressão.
A idéia de construir computadores
no Brasil surgiu em 1970, na Marinha.
Depois de encomendados alguns na-
vios de guerra à Inglaterra, os militares
assustaram-se com o preço dos compu-
tadores ingleses responsáveis pela pon-
taria dos canhões. Assim, compraram
os navios, mas dispensaram os artilhei-
ros eletrônicos. Depois, pediram um
projeto de computador a engenheiros
das universidades de São Paulo e Cató-
lica do Rio de Janeiro. Diminuir o cus-
to era realmente premente, já que essas
máquinas se haviam tornado, em 1974,
o terceiro item da pauta de importa-
ções do País, Já, no governo Médici,
essa questão havia sido bastante debati-
da, mas pouco se fez de concreto.

Em 1972, começam a surgir os


conflitos com as multinacionais

Com o fim do "milagre" e a ascen-


são do governo Geisel, algumas medi-
das foram adotadas. Uma delas foi a
importanciaque adquiriu o principal ór-
gão governamental para a informática,

BR DFANBSB VB.GNC.AAA, $4/04233429n00RA, **


BR DFANBSB V8.GNCIAAA, p 134

sionais de Processamento de Dados


(APPD); os usuários ganharam uma
entidade, a Sociedade dos Usuários de
Computadores e Equipamentos Subsi-
diários (SUCESU); e a comunidade
acadêmica manifestava-se através da
Sociedade Brasileira de Computação
(SBO,
Assim, enquanto as multinacionais
preparavam o seu contra-ataque, esses
setores adquiriam importância crescen-
te na luta. A APPD, por exemplo, rea-
giu energicamente no caso /32: "Mais
uma vez, o esforço de inúmeros profis-
sionais para criar um desenvolvimento
tecnológico independente se encontra
seriamente ameaçado de ser totalmen-
te destruído", dizia um documento di-
vulgado pela associação em 1976.

Uma empresa americana exige


represália dos EUA ao Brasil

Dentro do governo, o veto da


CAPRE dividiu as opiniões. Talvez por
isso, a CAPRE tenha ensaiado um pe-
queno recuo em 1978, As pressões das
multinacionais haviam-se tornado sufo-

Luigi Mamprim/Abril Press


cantes, então, a ponto de uma grande
empresa americana, a Data General,
passar a exigir represálias de seu gover-
no à política brasileira de reserva de
mercado. No documento que enviou
ao governo americano em 1978, a data
General acusava essa política de "práti-
Em 84, ainda se procuravam maneiras de democratizar os benefícios da ca discriminatória", que poderia enco-
informática, ampliando seu uso para além de bancos e supermercados rajar outros países a agir da mesma for-
ma. Mais tarde em 1983, o governo
a Comissão de Coordenação de Pro- ano, a CAPRE havia decidido que, no dos Estados Unidos enviou carta de
cessamento de Dados (CAPRE), Cria- setor de mínis e micros, a política na- protesto ao governo brasileiro, anun-
da em 1972, para organizar os gastos e cional deveria levar à "consolidação de ciando ainda que o assunto seria inseri-
o uso de computadores pelo governo, a um parque industrial com total domi- do nas negociações do Brasil com o
partir de 1975 a CAPRE passou a con- nio e controle de tecnologia e decisão FMI (Fundo Monetário Internacional),
trolar todas as importações do setor, dentro do País". Portanto, não podia Mas nem pressões desse tipo muda-
começando também a delinear pela aprovar o pedido da IBM que, segundo ram o resultado da histórica votação do
primeira vez uma política para a infor- 0 parecer, tinha "centro de decisão e dia 3 de outubro de 1984, que aprovou
mática nacional. Não foi por acaso que controle de capital no Exterior". também a instalação de um órgão no-
nessa época também surgiram os pri- O próprio clima de distensão política vo, 0 Conselho Nacional de Informáti-
meiros conflitos com as multinacionais. do governo Geisel estimulou a luta ca e Automação (CONIN) - vinculado
Em 1976, a CAPRE rejeitou um pe- contra o capital estrangeiro no setor. A à Presidência da República e fiscaliza-
dido da IBM - a International Busi- despeito da inércia inicial, em 1974 a do pelo Congresso -, ao qual passava a
ness Machines, principal fabricante de iniciativa da Marinha havia levado ao subordinar-se à Secretaria Especial de
computadores do mundo - para pro- surgimento da Cobra (Computadores e Informática, criada em 1979 sob forte
duzir um mini conhecido pela sigla /32 Sistemas Brasileiros S.A.), empresa de inspiração do Serviço Nacional de In-
(barra" trinta e dois). Seu parecer capital misto que em 1984 ainda era a formações (SNI). Mas, nesse emara-
sobre o pedido revelava a disposição principal fabricante de minicomputa- nhado de siglas, para onde iria a indús-
reinante, então, no governo e que mar- dores no País. Foi também a parir daí tria nacional de informática, após a
cou a mudança na política de informá- que nasceu a Scopus, em 1975. Contan- prorrogação da vigência da reserva de
tica. Segundo o parecer, a IBM não do-se apenas as mais importantes, ha- mercado?
pretendia transferir tecnologia alguma via, em 1976, 18 novas companhias na- Ainda em seus primórdios no Brasil,
para o País, mas persistir na estratégia cionais na área de processamento de criada a partir de uma estratégia de
de importar pacotes tecnológicos de dados, congregando milhares de traba- mercado que a afastava do setor de
seus laboratórios no Exterior. As verda- lhadores. O crescimento dessa indústria grandes computadores, a indústria na-
deiras intenções da empresa eram usar logo gerou outros frutos. Os em- cional de informática não tinha ainda,
0/32 para "obter uma fração do merca- presários se Organizaram através em 1984, uma definição melhor de suas
do brasileiro" - quase uma acusação da ABICOMP, os trabalhadores cria- aplicações além de aos bancos, super-"
de prática monopolista. No mesmo ram a Associação Nacional dos Profis- mercados e brinquedos.
388
BR DFANBSB VB.GNCIAMA. 404133 19nCoO2, p 132

POLÍTICA/CORRUPÇÃO: os grandes escândalos queriam vender ao Brasil equipamen-


tos cujas características não nos inte-
ressavam. Por isso, em 1954, por inter-
médio do almirante, o Brasil comprou
equipamentos da Alemanha Ocidental.
Mar de lama
Esses equipamentos, no entanto, foram
apreendidos pelas autoridades de ocu-
pação, que controlavam então a Ale-
As grandes denúncias sempre vieram na esteira das crises
manha, por ordem expressa do Alto
políticas, mas corrupção e fraudes podem ser detectadas em Comissariado americano naquele país,
qualquer ponto da história do País a despeito de já terem sido devida-
mente pagos. "Eu estava pressentindo
"Quem furta pouco é ladrão! Quem O Império caiu ouvindo a crítica às que as forças ocultas haviam de se mo-
furta muito é barão! Quem mais furta e regalias da Corte, exemplificadas na ver e não podia lutar contra a maré",
esconde/ Passa de barão a visconde." pompa do seu último baile, o da Ilha disse o almirante à Comissão Parla-
Fiscal; a República Velha ruiu quando mentar de Inquérito (CPI) da Câmara
(Quadrinha de autor anônimo que corria pela
boca do povo do Rio de Janeiro, em 1808.) se tornou desinteressante para setores dos Deputados instaurada para investi-
das oligarquias o esquema eleitoral gar o assunto em 1956. De fato, um in-
montado essencialmente na fraude des- cidente sepultou definitivamente o
Se o Estado brasileiro começou a lavada; Getúlio Vargas, que sofria feroz acordo, levando-o a pedir demissão do
nascer com a chegada de dom João VI, oposição da UDN contra seu programa CNPq em março de 1955: a denúncia
em 1808, a quadrinha acima é, prova- econômico e sua política de aliança de irregularidades na contratação da
velmente, o primeiro registro de uma com setores populares, naufragou tragi- construção de um tipo de equipamento
característica que o iria marcar por camente, em 1954, no "mar de lama" de pesquisa, atribuída a um alto funcio-
toda a história: a corrupção. agitado pelo jornal Tribuna da Im- nário do CNPq.
E, se ao longo da história do País é prensa, do líder direitista Carlos
Lacerda. Goulart acusado de pretender
possível encontrar inúmeros casos iso-
lados, um exame mais atencioso pode É da mesma época outro exemplo uma "República Sindicalista"
detectar que as grandes ondas de de- muito ilustrativo, que envolveu um na-
núncias, aquelas que trazem à tona os cionalista, o almirante Álvaro Alberto A demissão do almirante foi sugerida
escândalos de primeiro escalão, sempre da Mota e Silva, primeiro presidente do pelo general Juarez Távora, chefe do
aconteceram acopladas às marés das Conselho Nacional de Pesquisas Gabinete Militar da Presidência da Re-
crises políticas, como armas de grande (CNPq). A frente do órgão, o almirante pública e secretário-geral do Conselho
eficácia para o desgaste dos adver- procurava desatrelar a política nuclear de Segurança Nacional, a quem estava
brasileira dos interesses dos EUA, que subordinado o CNPq. Távora era expli-
sários.

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Agência Estado

Juscelino Kubitschek (ao lado com Tancredo), tachado de


Agência O Globo

corrupto e cassado em 1964, e Adhemar de Barros (acima, na


charge de Biganti, em O Estado de S. Paulo, 14/04/64), que
teve os IPMs que investigavam seus atos à frente do governo
paulista esvaziados por Castello Branco, ilustram as formas Aces
como o Regime Militar utilizou as denúncias de corrupção
BR DFANBSB V8.GNG,AAA, S40441 334 an ©0202, p 33

citamente alinhado com a posição gime, que ficara neutralizado no mo-


norte-americana na questão nuclear. mento do golpe, era potencialmente
Cerca de nove anos mais tarde, nos um aglutinador das correntes descon-
meses que precederam o golpe de 1964, tentes com o novo regime, na condição
o jornal O Estado de S. Paulo, que cons- de candidato à Presidência no pleito
pirava abertamente contra o presidente previsto para 1965. Por isso, ele foi cas-
Goulart, acusava o governo de desviar sado em junho de 1964, mas sob o pre-
verbas para comprar o apoio dos sindi- texto de enriquecimento ilícito. As
catos, preparando um golpe para pro- fragílimas provas arroladas contra ele
clamar uma certa "República Sindica- foram suas declarações de bens de an-
lista". Mais tarde, o caráter eminente-
tes e depois de exercer a Presidência:
mente político das denúncias contra de proprietário de uma casa e dois
Goulart transpareceram com clareza apartamentos, em 1955, ele passou a
numa "notícia" publicada por O Estado
proprietário de duas casas e seis aparta-
de S. Paulo, no dia 7 de abril de 1964: o
mentos, em 1960.
ex-presidente teria sido visto embar-
cando para o exílio carregando sacos Exatamente na mesma época em
de dinheiro. Estereótipo tão grotesco se que Juscelino era cassado, o governo
encaixàva perfeitâmente no espírito da fazia todos os esforços para esvaziar os
campanha em favor dos golpistas, cen- IPMs que investigavam irregularidades
trada na conquista do apoio das classes na administração de Adhemar de Bar-
médias, tradicionalmente mais recepti- tos, então governador de São Paulo e
"revolucionário de primeira hora".
vas aos apelos moralizantes.
Adhemar atraía a ira da "linha dura" dos

Agência O Globo
militares em função de seu passado
O combate à corrupção corria o
permeado de escândalos (ficou famosa
risco de pisar em calos aliados a consigna: "Ele rouba, mas faz", vei-
culada explicitamente por seus cabos
O fervor anticorrupção dos discursos eleitorais na campanha presidencial de
golpistas pôde ser posto em prática 1955, para fazer frente à contrapropa-
após o golpe de 1964. Em menos de ganda dos adversários). Castello
dois meses, os militares instauraram Branco foi obrigado a destituir da che-
mais de 200 Inquéritos Policiais Milita- fia dos IPMs contra Adhemar o "duro"
res (IPMs), em quase todos os níveis da general Menna Barreto, homem que
administração pública. Foi criada uma nutria por ele exacerbada antipatia pes-
comissão para coordenar os IPMs e en- soal. Apesar disso, Adhemar acabaria
viar ao Conselho de Segurança Nacio- cassado, em junho de 1966, também
nal as listas de nomes das pessoas que sob o pretexto de corrupção. Mas, en-
deveriam ser punidas. "O ferro deve tão, ele já era um crítico pertinaz do
ser malhado enquanto está quente e o governo federal, que havia frustrado
mal, extirpado pela raiz", diziam os ofi- sua candidatura à Presidência da Repú-
ciais, no seu afã de colocar o Brasil nos blica com a prorrogação do mandato
trilhos. Na aurora do Regime Militar, de Castello Branco. Contra Adhemar.
parecia mesmo que os tempos haviam a imprensa governista exumou velhos
mudado. Mas nem tanto. escândalos dos anos 50, esquecidos en-
No dia 30 de junho de 1964, no en- quanto ele foi um aliado do novo re-
tanto, o marechal Castello Branco dizia gime.
que a "revolução" já não podia mais se A partir da cassação de Adhemar, o
Agência O Globo

sustentar apenas com 6 noticiário farto combate à corrupção deixou de ser a


sobre inquéritos e investigações e que tônica dos discursos de apoio ao re-
ele identificava um certo cansaço com gime, como havia recomendado Cas-
a monótona repetição diária de escân- tello Branco, e pôde muito bem ter-se
dalos apurados. A figura de um go- tornado inconveniente, no sentido
verno implacavelmente empenhado em Dois exemplos do uso político das "chão" de ferir interesses dos que pas-
punir, disse Castello, precisava ser subs- denúncias de corrupção: em 1955, saram a exercer parcelas do poder. O
stituída pela de um governo voltado informações apontando a corrupção de historiador Georges-André Fiechter
para os problemas estruturais do País. alto funcionário do CNPq levam o diz que "alguns inquisidores não resisti-
Havia sentido nas palavras do mare- almirante Alvaro Alberto (no alto, ram às tentações monetárias a que fica-
chal. O pragmatismo político rezava depondo na CPI sobre energia atômica, ram expostos, e suas malversações ter-
que o combate à corrupção não podia em 56), um intransigente defensor do minaram por comprometer a imagem
ser generalizado, sob o risco de pisar 'desatrelamento da política nuclear da "pureza austera" que a "linha dura?
em calos aliados. Ilustra muito bem nacional dos EUA, a demitir-se da buscava projetar nos meios econômi-
esse primeiro dilema do Regime Mili- presidência do CNPq; Assis Paim Cunha cos e financeiros do País".
tar, sua postura contraditória quanto ao (acima ), denunciou, em 1984, Esvaziado de seu sentido moraliza-
tratamento que se deu a duas personali- ter permitido que o Banco Central dor, portanto, o aparato policial-militar
dades marcantes da época: Juscelino usasse sua corretora para repassar tornou-se inofensivo àqueles sobre
Kubitschek e Ademar de Barros. Jusce- dinheiro à corretora Laureano, em troca quem não poderia haver dúvidas
lino, um dos expoentes do antigo re- de promessas de favorecimentos quanto à fidelidade ao novo regime.
390
BRDFANBSBVE.GNCAMA, 104/3234

Sob o manto da censura que viria a ser tral à corretora Laureano, emtroca de
implantada após a edição do AI-5, em promessas de favorecimentos que não
1968, acentuou-se a proteção reciproca foram cumpridas. Daí por que Paim
dos envolvidos em irregularidades e o colocara a "boca no trombone".
acobertamento por parte de quem dis- Outro exemplo de uso político, dessa
punha de poderes para punir. Os cor- vez pela direita, de denúncias de cor-
ruptos ligados ao governo não eram pu- rupção é o caso do desvio de cerca de 1
nidos porque se imaginava que esti- trilhão de cruzeiros pelo Banco Nacio-
vesse em causa a imagem da "revolu- nal de Crédito Cooperativo (BNCC) e
ção". pela Centralsul, entidades gaúchas de
No momento em que começaram a cooperativismo. As denúncias contidas
se manifestar as primeiras fissuras no no livro Viva a Corrupção, do jornalista
interior das forças que apoiavam o Re- Francisco Oliveira, pareciam apenas
gime Militar - e a grande imprensa li- um golpe final na diretoria chefiada por
beral pôde respirar, com o afrouxa- Ari Dalmolin, que por dez anos, até o
mento da censura -, a corrupção vol-
final de 1982, esteve à frente da Central-
tou a ser tema corrente. Desta vez, no sul e em negócios com o banco e, por-
entanto, o feitiço voltava-se contra o tanto, dos desvios. O alvo principal da
feiticeiro. denúncia e a difusão acelerada do livro
Descontente com os rumos que to-

Adolfo Gerchmann/Abril Press


decorriam, no entanto, de outras moti-
mara o Regime Militar - principal-
vações.
mente após 1968, quando assumiu o ca-
ráter de ditadura -, o jornal O Estado
de S. Paulo publicou, em 1976, extensa Caso BNCC, 200 mil pequenos
reportagem denunciando as mordo- e médios produtores ameaçados
mias e gastos abusivos na manutenção
das residências oficiais do primeiro es- A diretoria que assumiu áàpós a de-
calão do governo. A reportagem deto- missão de Dalmolin procurou recupe-
nou uma onda de denúncias que atin- rar a Centralsul - ligada a 68 cooperati-
giu níveis sem precedentes na história
vas de 200 mil pequenos, médios e
do País. grandes produtores, que, com razão,
Quase duas décadas depois do golpe
não podiam ser punidos por desvios
que "purificaria" o País, o Regime Mi-
dos eventuais corruptos que as diri-
litar cambaleava, atingido por sucessi-
giam. Em paralelo, moveu ação judicial
vas denúncias. As demais grosso cali-
contra o Bank of America, nitidamente
bre eram disparadas principalmente
envolvido em operações ilegais com
por setores dissidentes. Gente que "sa-
dólares de exportações da cooperativa,
bia de tudo", portanto, e fazia vazar
questionando a dívida contraída. O
pela imprensa liberal os podres dos ad- O ESCANDALO BNCC/CENTRALSUL novo presidente da Centralsul, Jarbas
versários de ocasião. Evidentemente, a
FRANCISCO Machado, fora também a principal fi-
oposição jamais deixou de se aprovei-
OLIVEIRA gura do "Grito do Campo", uma reu-
tar dessas denúncias, incorporando-as a Prênio RS80de informação Econômica
nião de 40 mil pequenos produtores do
suas justificadas críticas ao regime. nísupo(us
Sul, com a presença do então candida-
O escândalo da Coroa deixa to da oposição Tancredo Neves, no fi-
nal de 1984, para reclamar a participa-
um rombo de US$ 500 mi ção dos trabalhadores do campo nas
mudanças políticas de que o País ne-
No primeiro semestre de 1984, o de-
cessitava. Aproveitando-se do fato de
putado Eduardo Suplicy (PT-SP) ten-
Machado ter sido do conselho fiscal na
tava, sem êxito, marcar uma audiência
gestão anterior, Francisco Oliveira o
com o presidente Figueiredo para
acusava no livro de ser cúmplice da
entregar-lhe um dossiê com provas do
envolvimento de dois dos seus minis- Também a direita fez uso das corrupção. No entanto, para os jorna-
tros numa sequência de favorecimentos denúncias de corrupção, durante o listas gaúchos, que conheciam tanto o
que culminara com a quebra da finan- Regime Militar. Apesar de sua disposição trabalho de Jarbas como o de Oliveira,
ceira Coroa, em 1983. Um escândalo em recuperar a Centralsul, da qual era chefe da sucursal de O Estado de S.
que deixou um rombo da ordem de 500 presidente, e o BNCC, para evitar a Paulo, não havia dúvidas de que o alvo
bilhões de cruzeiros, na época (cerca injusta penalização de 68 cooperativas efetivo dos ataques deixara de ser a
de 500 milhões de dólares), e ligado a agrícolas, Jarbas Machado (no alto) foi corrupção em si e a necessidade de de-
outro - o da quebra da corretora Lau- acusado pelo jornalista Francisco volver o dinheiro aos principais preju-
reano, em 1980 -, em que, indireta- Oliveira, no livro Viva a Corrupção dicados, mas passara a ser a disposição
mente, estava envolvido pelo menos (acima) de ter sido cúmplice nas de Jarbas Machado de levar os produ-
um ministro do governo anterior. O irregularidades cometidas na gestão tores rurais gaúchos a insistir na defini-
dossiê tinha como peça fundamental o anterior a 1984. O verdadeiro alvo de ção de uma nova política agrícola e de
depoimento do empresário Assis Paim Oliveira, no entanto, era a insistência apontar as autoridades monetárias bra-
Cunha, dono da Coroa. Nele, Paim ex- com que Jarbas estimulava os sileiras e o Bank of America como os
plicava como sua financeira fora usada produtores a reivindicar uma nova principais inspiradores e beneficiários
para repassar dinheiro do Banco Cen- política agricola dos abusos verificados.
381
BR DFANBSSB V8.GNC.AAA, S4 04) 234 3nCOA ,

ECONOMIA/INDÚSTRIA: o setor têxtil no Nordeste


Delmiro - um filho natural cearense
que chegara ao Recife analfabeto, aos
.a 15 anos - fizera fortuna com a exporta-
o a ção de couros e, em 1910, importava da
Nas malhas Inglaterra a maquinária mais moderna
das múltis
da época para instalar a Cia. Agrofabril
Mercantil da Pedra, situada a 24 quilô-
Um assassinato e um suicídio - amb metros da cachoeira de Paulo Afonso.
os relacionados à
atuação das multinacionais - resumem Pioneiro da exploração hidrelétrica do
a história da São Francisco, Delmiro inovou em
indústria têxtil no Nordeste, do pioneirism tudo: sua fábrica de linhas Estrela en-
o ao abismo
frentou o monopólio da Machine Cot-
No dia 10 de maio de 1983, o empre- em lugar de dinheiro, cobertores que ton no mercado, do Prata aos Andes
sário industrial pernambucano Antônio eles próprios fabricavam: com isso o Os ingleses decidiram deter essa
Carlos Azevedo de Menezes, 61 anos, presidente da empresa, o senador pau- ameaça, representada pela alta quali-
acossado pelas dívidas, trancou-se na lista do PMDB Severo Gomes, conse- dade do produto Estrela e pela pujança
sala de onde comandava três fábricas guia não dispensar os empregados quê do empreendimento que já oferecia mil
têxteis e 3,500 gperários, escreveu um restavam. Em Paulista, o antigo centro empregos, jornada já então de oito ho-
bilhefê pedindo ão governo que não os têxtil ao norte do Recife, implantado ras e vila residencial para os trabalha-
deixasse passar fome e arrebentou sua pelos imigrantes suecos da família dores. Primeiro, ofereceram dinheiro
própria cabeça com uma bala calibre Lundgrene, que chegou a ter seis mil para Delmiro desistir. Ele recusou. A
38. Seu gesto emocionou os meios em- operários, mantinha 300 ou 400 vagas. saída fci um rifle: três tiros, de tocaia,
presariais de todo o País, mas entre as Das 60 indústrias catalogadas pela SU- afastariam o entrepreneur das caatingas
empresas do suicida Menezes nem a DENE no Nordeste em 1960, que ha- do caminho. Seus herdeiros venderam
ACM Empreendimentos SA, de Cama- viam chegado a garantir 80 mil empre- a fábrica para o grupo pernambucano
ragibe, a 15 quilômetros do Recife, £0s em 1950, a maioria sucumbiu à pre- Menezes Irmãos e Cia. - os avôs de
nem a fábrica da Pedra, em Alagoas, sença dos grupos estrangeiros instala- Antônio Carlos Menezes,
foram salvas da crise. dos na região no período pós-64 - pas-
Em 1985, a indústria têxtil de Per- sando a dar trabalho, nos primeiros As máquinas da Pedra são
nambuco - e de todo o Nordeste - anos da década de 80, a apenas 38 mil
continuava em queda livre: em Mo- atiradas no São Francisco
nordestinos - repetindo a tragédia de
reno, tradicional centro têxtil a 50 qui- Delmiro Gouveia, o grande pioneiro Os Menezes inicialmente tentaram
lômetros do Recife, os operários fre- abatido a tiros pelo truste internacio- conviver com O imperialismo, mas
quentemente recebiam como salário, nal, no dia 10 de outubro de 1917. quase faliram com a prática de dumping
da Cotton. Em 1926, graças à política
A atuação das múltis
nacionalista do presidente Artur Ber-
na indústria têxtil no
nardes, a linha da Pedra beneficiou-se
Nordeste foi marcada
com a tarifa de importação imposta às
por crimes e pressões.
linhas inglesas. Mas, em 1928, o presi-
Em outubro de 1917, o
dente Washington Luís libera a impor-
pioneiro Delmiro
tação do produto da Cotton, que volta
Gouveia, que entre
a praticar o dumping para reaver o mo-
outros empreendimentos
nopólio. Em 1931, os Menezes capitu-
procurou promover
lam; e dois ingleses vão à Pedra retirar
melhores condições de
as máquinas de fabricar linhas, arre-
vida para seus
bentam com marretas toda a área de
empregados (na pág. ao
produção e atiram os destroços nas
lado, Delmiro e a vila
profundezas do rio São Francisco. A
operária da fábrica da
fábrica só teria o direito de funcionar
Pedra), foi abatido a
como malharia, e na produção de teci-
tiros a mando do capital
dos e confecções.
estrangeiro. Seus
Na economia algodoeira-têxtil do
herdeiros venderam a
Nordeste, a dependência externa co-
Jábrica para o grupo
meça a ser tecida na primeira remessa
pernambucano Menezes
de algodão do Maranhão para Man-
Irmãos e Cia., avôs do
chester, ainda em 1760, num embarque
empresário Antônio
experimental de 561 arrobas,
Carlos de Menezes (ao A partir do fim do século 18, quando
lado, com o presidente a Revolução Industrial descobre a má-
Figueiredo) que, em quina a vapor e o tear mecânico, as ex-
Manoel Novais/Abril Press

1983, acossado pelas portações nordestinas de algodão cres-


dividas no Exterior, cem geometricamente. O clima do
suicidou-se Nordeste propicia a produção de fibras
longas, de excelente qualidade para os
fusos ingleses, e isso logo é percebido
pela Machine Cotton, pela Sanbra e
pela Anderson Clayton.
392
ar 8404233 lan ooa , p 136

©
©O
a61

rápido crescimento. Na década de 40, o


Em 1808, o Brasil já exportava mais quele ano, os ingleses já dispunham de
11 milhões de fusos, 600 mil operários Nordeste tinha uma das indústrias têx-
de três milhões de libras/peso (ceféa de teis mais importantes do mundo. Em
seis mil toneladas) ao ano para a Ingla- em atividade, em três mil fábricas, con-
1950, com 80 mil operários, começaria
terra, enquanto os Estados Unidos ven- sumindo 12 milhões de arrobas para ex-
a entrar em colapso.
diam 41 milhões de libras, segundo o portar 2,8 bilhões de jardas (2,5 bilhões
Nessa época, a política de favoreci-
Correio Braziliense de junho daquele de metros) de tecidos. A Associação
para o Suprimento de Algodão de mento ao capital estrangeiro adotada
ano. pelo presidente Café Filho com a
Manchester, principal centro industrial
Secessão impulsiona as inglês de então, lança um apelo aos sú- morte de Vargas abria o setor têxtil ao
ditos britânicos em todo o mundo para capital estrangeiro. Chegaram as fibras
vendas brasileiras de algodão sintéticas, houve a modernização da in-
localizarem novas fontes de supri-
dústria de São. Paulo sem cobertura
No Recife, em 1822, surge uma ten- mento. Em São Paulo, Jean Jacques
cambial. Os mecanismos de desenvolvi-
tativa de implantação da primeira fá- Aubertin, diretor da estrada de ferro
São Paulo Railway, pesquisando as vár- mento subsidiados do Nordeste traziam
brica de fiação e tecelagem. Em 1844,
embutidas a abertura ao capital estran-
depois de experiências frustradas em zeas do Tietê, descobre um algodoeiro
remanescente de antigas lavouras geiro, via artigo 18 da lei da SUDENE.
Conceição e Queimadas, aparece uma
Enfim, a luta então não era lançar no
fábrica bem-sucedida em Valença, na abandonadas, envia-o para a Inglaterra,
e poucos anos depois São Paulo estaria rio os equipamentos, mas controlar o
Bahia. Mas os comerciantes preferem
progresso tecnológico e o mercado. A
vender o algodão e importar o tecido. na lista dos exportadores de bom algo-
dão, embarcando 50 mil fardos em fábrica da Pedra e as outras tinham en-
O ouro branco, como ficou conhecido
1886, de 334 mil vendidos pelo Brasil. velhecido. Antônio Carlos de Menezes
o algodão, desbancaria até mesmo o
Mas em 1882 a Inglaterra já consoli- tentou reagir, endividando-se no Exte-
açúcar, em alguns Estados, como a pri-
rior, mas aí vieram as maxidesvaloriza-
meira riqueza da região. dara seu protetorado sobre o Egito, ga-
ções do cruzeiro. Menezes tentou
Além de explorar a mão-de-obra dos rantindo suprimento cativo de algodão
aproximar-se de grupos estrangeiros,
sem-terra, recebendo parcelas da safra, a preços baixos, fazendo as cotações do
mas as contas de luz, os salários e as di-
os fazendeiros, sob controle das três ir- algodão brasileiro despencarem de
das vidas se acumulavam. Tentou novos
mês - Clayton, Sanbra e Cotton -, Norte a Sul. O Nordeste possuía seis
empréstimos oficiais, mas o ministro
eram ainda intermediários comerciais. nove fábricas de tecidos instaladas em
todo o País. Os capitais que abandona- Delfim Netto exigiu garantias que ele já
Conforme explica o economista Fran-
vam o comércio externo decidiram ins- não podia dar. Ele, um homem que te-
cisco Oliveira, em Elegia para uma Re-
ria laços com os serviços de informação
(li)gião, eles acumulavam, igualmente, a talar novas fábricas rapidamente, pro-
americana, defensor da repressão poli-
intermediação financeira, comprando movendo um grande surto industrial
tica dos anos 70 e admirador do golpe
"na folha" - isto é, fixando os preços que beneficiária diversas cidades.
de 64, sucumbiu, vítima da políticà eco-
antecipadamente para as safras, sem
Nos anos 80, um desesperado e nômica que ajudara a implantar. Em
repassar possíveis altas na hora da co-
meados dos anos 80, com o colapso do
lheita, mas abatendo as quebras de improvável retorno ao século18 setor têxtil tradicional, a elite nordes-
preço.
No começo do século, a indústria tina tentava reaver o tempo perdido,
Com a eclosão da Guerra de Seces-
têxtil avançaria com velocidade, e, nas indiferente à história: tirava o algodão
são nos Estados Unidos, em 1861, a
décadas seguintes, beneficiada pelas do Agreste e punha o boi, num impro-
qual bloqueou a saída do algodão ame-
duas guerras, que impossibilitavam as vável retorno ao século 18.
ricano para a Inglaterra, as vendas do Furico Andrade
Brasil teriam um enorme impulso. Na- importações, o setor experimentou um
393
BR DFANBSB 24904 3 22 1 an 002 , p 34

trão - dono do engenho Galiléia -


para presidente de honra da associa-
ção.
Mais ambiguamente ainda, Oscar
Beltrão aceitou a duvidosa honraria. A
notícia espalhou-se imediatamente por
toda a região. Latifundiários vizinhos
alertaram o senhor do Galiléia para os
perigos do que estava acontecendo em
suas terras. Voltando atrás, Beltrão pas-
sou a exigir a extinção da sociedade,
ameaçando seus membros de despejo.
Esses procuraram então um advogado
que defendesse a sua causa. E foi assim
que entraram em contato com Fran-
cisco Julião, advogado no Recife e de-
putado estadual pelo Partido Socialista
Brasileiro.
Ao assumir a defesa dos "galileus",
Julião procurou generalizar o tipo de
organização criada por Zezé e seus
companheiros. Lançou-se, assim, a um
intenso trabalho de agitação e cons-
cientização das massas do campo.
"Não tardaram a surgir novos grupos
de camponeses, organizados e filiados à
Galiléia" , conta Julião.

Projeto desapropria terras, mas


Agência OEstado

"galileus"" não as recebem

Em 1959, após vários anos de deba-


tes e mobilizações camponesas, a As-
sembléia Legislativa de Pernambuco
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHADORES DO CAMPO: aprovou um projeto do deputado socia-
lista Carlos Luís de Andrade desapro-
história das ligas camponesas
priando o engenho Galiléia. As terras,
contudo, não foram entregues aos "ga-
lileus", Para impedir que isso aconte-
Fogo morto cesse, o governador Cid Sampaio (um
usineiro da UDN - partido elitista que
veio: dar parte ao PDS dos anos 80 -
Em 1954, as ligas camponesas iniciavam um vigoro eleito no ano anterior com o apoio do
so Partido Comunista e do próprio Julião,
movimento de reivindicação - que se apagaria
aos poucos e na chamada Frente de Recife) criou a
seria extinto de vez pelo Regime Militar Companhia de Revenda e Coloniza-
ção, que se assenhoreou do antigo en-
Existe, nas proximidades de Vitória genho.
rando resistir, os moradores do enge- A notícia da desapropriação, no en-
de Santo Antão, cidade do interior de nho constituíram, em fins de 1954, a
Pernambuco situada entre o agreste e a tanto, ecoou como uma bomba em
Sociedade Agrícola de Plantadores e todo o interior do Nordeste. Já em
Zona da Mata, a cerca de 60 quilôme- Pecuaristas de Pernambuco. Era o iní-
tros do Recife, um antigo engenho de 1958, três mil camponeses reuniram-se
cio de um vigoroso movimento que fi- no Recife, no Primeiro Congresso de
"fogo morto" - ou seja, com as máqui- caria internacionalmente conhecido Foreiros e Pequenos Proprietários de
nas desligadas - chamado Galiléia. com o nome de ligas camponesas. Pernambuco, marchando depois pelas
Suas terras haviam sido arrendadas a De início, os objetivos da associação
140 famílias, que produziam mandioca, ruas da cidade, escandalizando as elites
eram bem delimitados: liderados por locais.
frutas, legumes e algodão em pequenos José Francisco de Souza (Zezé), seus Em represália, os senhores de terra
lotes, pelos quais pagavam um "foro" membros pretendiam fundar uma es- reforçaram o armamento de seus inú-
(aluguel) anual, Em 1954, essa taxa era cola primária, organizar um fundo fu- meros capangas, que formavam verda-
de seis mil cruzeiros por hectare, ou nerário (a taxa de mortalidade infantil deiras milícias privadas. Choques arma-
seja, cerca de metade do preço da sempre foi alta na região) e obter facili- dos envolvendo jagunços e camponeses
terra, que ali era vendida, em média, dades para adquirir implementos agri- não tardaram a acontecer. A história
por 12.500 cruzeiros o hectare. Nesse colas (sementes, adubos, etc.). Era, das ligas seria assim uma história de
ano, alguns foreiros (assim são chama- portanto, uma sociedade de auxílio mú- sangue, por força da violência e reacio-
dos os arrendatários) foram ameaçados tuo. Ambiguamente, os fundadores da narismo dos grandes proprietários, Já
de despejo pelo proprietário. Procu- liga convidaram Oscar de Arruda Bel- em 1955, era emboscado em Goiana
394
(Pernambuco) o camponês João To-
más, que tivera dois de seus irmãos as-
sassinados por capangas. No ano se-
guinte, o próprio Francisco Julião era
preso e ameaçado de morte na sede da
liga de Vitória de Santo Antão e solto
mais tarde em virtude de suas imunida-
des parlamentares. Em abril de 1962,
João Pedro Teixeira, líder da Liga de
Sapé (Paraíba), caia sob as balas de um
grupo de latifundiários e capangas.
Pouco tempo depois, os camponeses
justiçariam um de seus assassinos. Em
janeiro de 1963, o industrial José Lopes
de Siqueira Santos abatia cinco traba-
lhadores na esplanada de sua usina Es-

Agêncna' O Globo
treliana (PE). Meses depois, em agosto,
era assassinado em També (PE) o mili-
tante trotskista Paulo Roberto Pinto,
conhecido como Jeremias.
Apesar da violência, as ligas conti-
nuavam a crescer, congregando, por
volia de 1960, 35 mil associados em
Pernambuco e 70 mil em todo o Nor-
deste. Em 1961, já existiam federações
camponesas em dez Estados do País.
No ano seguinte era criada a liga do Es-
tado do Rio de Janeiro, com sede em
Campos.
O movimento camponês expandia-
se, assim, em escala nacional. Em 1954,
havia sido criada, em São Paulo, a UL-
TAB (União dos Lavradores e Traba-
lhadores Agricolas do Brasil), controla-
da pelo Partido Comunista. Em 1960,
finalmente, surgia no Rio Grande do
Sul o Movimento dos Trabalhadores
Sem Terra (MASTER), apoiado pelo
então governador Leonel Brizola e
contando com cerca de cem mil asso-
ciados.

Ligas excluem os assalariados,


Iconographia

que também se organizam

As ligas congregavam, contudo, fo-


reiros, parceiros, pequenos proprie-
Iniciado na Sociedade Agricola e tários e alguns moradores, mas deixa-
Pecuária dos Plantadores de Pernambuco vam de lado os assalariados agrícolas.
(na pág ao lado), em 1954, com Julião explicava essa exclusão tentando
pretensões modestas, o movimento das elaborar uma teoria da "revolução
ligas camponesas iria generalizar-se após camponesa Para ele, "as relações
Dete a - , r É a adesão do advogado Francisco Julião existentes entre operários e patrões têm
a 2 1
(no alto, entre lavradores, como base o salário, sendo portanto de
- cumprimentando José Francisco de
é *
“**—hªnª
- natureza econômica", enquanto que
Souza, o "Zezé", líder da primeira liga, entre o camponês e o latifundiário as
em 59; e, ao centro, na ABI-RJ, falando relações são de direito, de modo que a
t
'- ,; durante a Campanha Pró Reforma luta, para eles, quando se esboça, já as-
4a Agrária Radical, set./1961). No iníciodos sume caráter político. O campones
anos 60, apesar da violência nos conflitos quando se organiza, dá, assim, um
com os senhores de terras, o movimento salto, adquirindo sua luta substância re-
continuava a crescer: havia 35 mil voluc1onana porque quase não passa
associados às ligas em Pernambuco e 70 pela fase de luta econômica, durante a
Eªtado

mil em todo o Nordeste; em 1962, era qual o patrão anestesia, engana e re-
criada a liga do Estado do Rio de Janeiro, tarda o amadurecimento político da
Agência O

(ao lado, invasão de terras em Caxias, classe operana“ Essa premlssa teve
RJ, 1964) duas conseguências: a primeira foi a
395
BR DFANBSB V8.GNC.AMA. 24 Q4 IS 002, p/38
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 4041324 an coa ,p 139

.“
tornou-se, então: "Reforma agrári
a na
lei ou na marra." Essa proposta

' A luta chega ao cinema


assus-
tava não só a governos como
a grupos

Embora minimizada pelos gran- Com o golpe militar e a intensifi-


de esquerda mais moderados, como
o

des veículos de comunicação, a luta cação


Partido Comunista Brasileiro,

camponesa no Brasil teve um im- Coutinhodae sua repressão antipopular, A polêmica entre Julião e o PC ex-

pacto tão grande que até abalou a apontados pela equipe foram presos, plodiu com certa virulência no Pri-
imprensa
tradição de a temática das artes do banos", e as cópias do filme como "cu- meiro Congresso dos Lavradores e Tra-

País estar distante dos dramas sofri- apreendidas, menos uma queforam
balhadores Agrícolas do Brasil, reunido

dos pela esmagadora maioria da po- estava com Coutinho no momento não em Belo Horizonte em novembro de

pulação. Exemplo disso é o filme da prisão. Dezessete anos depois, 1961. Nessa reunião, da qual participa-

Cabra Marcado Para Morrer, do ci- em 1981, Coutinho, então traba-


tam cerca de 1.500 delegados, os repre-

neasta Eduardo Coutinho, que ga- lhando na Rede


sentantes das ligas defendiam uma re-
Globo, sentiu que
nhou o Grande Prêmio do Festival havia condições políticas forma agrária radical, contra a posição

Internacional do Rio em 1984, para reto- da ULTAB, que propunha o encami-

A história do filme é um pouco a pia do filme que estava foraa das


mar seu trabalho. Recuperou cóô- nhamento de medidas graduais. Julião

história daluta do povo brasileiro.


venceu o debate e passou a declarar:

Em 1964,antes do golpe militar, demãosnovoda seuspolícia política e foi buscar "A etapa atual de luta revolucionária

Coutinho, militante do Centro Po- morou meses:personagens, o que de- no Brasil é socialista. (...) A burguesia

pular de Cultura da União Nacional plo, para fugir às perseguiçõesexem-


Elizabeth, por nacional é vacilante e tende a compro-

dos Estudantes, estava fazenda no mudado de nome e desde 1964tinha


missos com o imperialismo, ' Interna-

interior do Nordeste um filme sobre tinha notícias de nove de seus não


mente, porém, as coisas não iam bem

a vida de João Pedro Teixeira, líder filhos. Assim, Cabra Marcado para dez para o julianismo. A maioria dos diri-

camponês assassinado por agentes


gentes nacionais das ligas - agrupados

dos latifundiários em 1962. Para Morrer narra o drama dessa família num Conselho Nacional e responsáve
camponesa dispersada pela repres- is

tanto, Coutinho filmou entrevistas são, em meio à miséria moral e ma-


pela edição do Jornal A Liga - era for-

com Elizabeth, a viúva de Teixeira, terial. O único filho que estava bem
mado por intelectuais e estudantes. Por

e os dez filhos do casal. Além da mi- era o que tinha ido para Cuba, onde
volta de 1962, uma parte desses qua-

séria material e das lutas reivindica-


dros passou a preconizar a formação de

tivas, ficaram documentadas tam- foi filmado como médico lá for- núcleos de treinamento guerrilheiro, à

bém a dignidade moral e a criativi- mado. margem do movimento real dos cam-

dade cultural dos camponeses.


poneses. Para implementar essa polí-

Renato Pompeu tica, foi comprada uma propriedade


em Goiás, onde se concentravam al-
guns militantes. Enquanto isso, Julião
lançava, através da Carta de Ouro
Preto (21 de abril de 1962), o Movi-
mento Radical Tiradentes (MRT),
numa tentativa de retomar o controle
das várias tendências que atuavam no
interior das ligas. Em outubro de 1962,
no entanto, o movimento foidissolvido,
devido a divergências internas. Por essa
época, o núcleo guerrilheiro de Goiás
foi cercado e dispersado por tropas do
Exército. Os anos seguintes marcaram
o ocaso das ligas camponesas, Dividi-
das em sua cúpula por divergências poli-
ticas, esvaziadas parcialmente pela pas-
sagem dos assalariados agrícolas aos
iconographia

sindicatos, as ligas receberam um sério


golpe em 1962, quando João Goulart
passou a estimular a sindicalização ru-

Cena de Cabra Marcado... : Elizabeth, viúva de João Pedro Teixeira, efamília tal. Legalmente, cada município só po-
dia ter uma organização trabalhista.
Onde havia uma liga e um sindicato (e

havia muitos casos assim), o governo
dava prioridade a este último, ao qual
tentativa de unificar as bandeiras ime- A radicalização política de Julião en-
era entregue uma carta sindical de re-
diatas das ligas (luta contra o cambão e contrava suporte no triunfo da revolu-
conhecimento. A partir dessa época, as
contra as ameaças de despejo que pai- ção cubana (1959), nos entrechoques
ligaspassaram a sofrer um esvazia-
ravam sobre os foreiros) com a luta cada vez mais violentos entre campo-
mento constante. Assim, quando Fran-
pela terra e pelo socialismo. A outra neses e latifundiários e no desenvolvi-
cisco Julião foi preso, após o golpe mili-
consequência foi dar ensejo a que ou- mento da crise brasileira, precipitada
tar de 1964, o outrora aguerrido e orga-
tras correntes políticas - principal- pela renúncia de Jânio Quadros e pela
nizado movimento camponês nada
mente o PCB e a Igreja - organizassem tentativa militar de impedir a posse do
pôde fazer para defendê-lo.
os combativos assalariados agrícolas da vice-presidente João Goulart.
região canavieira. A palavra de ordem central das ligas Cláudio Cavalcanti
396
BRDFANBSB V8.GNCAM, 840411323 3n Co, p 14%

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/COMUNICAÇÓES: as redes de televisão no Brasil

A televisão espalhou-se pelo País após o golpe de 1964.


Mas o Regime Militar tinha suas preferências: apostou na Globo, que tomou
conta do mercado e afinal ""tancredou"*

Na noite de 15 de janeiro de 1985 - - então em pleno auge -, transmitindo berto Marinho, "por violação da Cons-
data em que foi eleito o primeiro presi- ao vivo o comício da Candelária, no tituição Federal em permitir, mediante
dente civil da República após 1964 - a Rio de Janeiro. Depois o dr. Roberto, acordo, que o grupo estrangeiro Time-
Rede Globo usou pela primeira vez a no Especial do dia 15, "tancredou" de Life mantenha veículo de opinião", Era
expressão "Regime Militar", no mo- vez. Mas, os governos passam, há de o início do escândalo Time-Life. Em
mento em que ele se aproximava rapi- pensar ele. A Rede Globo e seu plim- 1966, o deputado João Calmon, ligado
damente de seu final com a vitória de plim continuam. aos Diários Associados e à Rede Tupi,
Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, A Globo chega aos 20 anos de idade a pioneira da televisão no Brasil, pediu
depois de terem os militares dominado na condição de quarta maior rede de uma Comissão Parlamentar de In-
o País por mais de 20 anos. Sintomati- televisão privada do mundo. Suas ori- queérito sobre as denúncias de Lacerda.
camente, a expressão inédita para os gens foram obscuras e tempestuosas, Em setembro de 66, a CPI convo-
padrões globais de jornalismo foi pro- tanto que a jovem Globo foi em 1965 cada por Calmon aprovou, por oito vo-
nunciada em um Especial, altamente investigada por uma Comissão Parla- tos a zero, o parecer do relator, depu-
laudatório, sobre a vida do presidente mentar de Inquérito. Em junho de 65, tado Djalma Marinho, de que os con-
eleito, Pragmático, o dr. Roberto Mari- dois meses após a inauguração da pri- tratos entre a TV Globo e o grupo
nho, o chefe do império da televisão meira estação da Rede Globo, o canal Time-Life feriam o Artigo 160 da Cons-
brasileira, adaptava-se a novos tempos, 4, do Rio, o governador do então Es- tituição. O deputado afirmou, com
que jamais podiam ser detectados tado da Guanabara, Carlos Lacerda, base naquele artigo, que "uma empresa
quando a Globo se dignou tomar co- enviou ao ministro Milton Campos, da estrangeira não pode participar da
nhecimento da campanha das diretas-já Justiça, uma representação contra Ro- orientação intelectual e administrativa

«'( PW Xx “.WX
tulo
Nm24
x')(
Br pranssa vs.onc.aaa, 8404 4323ancO2 , pI41

A tôjetória da pioneira
Tupi: em 50, o cantor
frei José Mojica
(acima) inaugura a
emissora de
Chateaubriand (ao lado).
Nos anos 60, João
Calmon, ligado aos
Diários Associados,
denuncia as ligações da
Globo com o grupo Time-

%
Life numa CPI (ao alto, à
dir. , ao microfone). Mas
isso não impediu a
decadência da Tupi,
obsoleta técnica e
administrativamente. No
Agência O Globo

último programa da
emissora (à dir.)
restava aos funcionários
Chorar, como o câmera

da sociedade concessionária de canal economias nacionais com o capitalismo com a Nacional do Rio no auge,. A TV
de televisão". Apesar do resultado da monopolista internacional. Os conglo- entra nesse cenário como um "brin-
CPI, em março de 1967, o presidente merados e as multinacionais passavam quedo de elite" - um aparelho de tele-
Castello Branco aprova o parecer do a explorar os mercados representados visão custava três vezes mais que a mais
consultor-geral da República,Adroaldo pelos países subdesenvolvidos. Na área cara radiola da época. E a TV assumiu
Mesquita da Costa,segundo o qual os cultural, multiplicavam-se nos meios de seu elitismo; os raros telespectadores
acordos entre Globo e Time-Life "não comunicação dos países dependentes eram contemplados com espetáculos
infringiam a legislação vigente". Final- elementos que reproduziam a forma e como Música e Fantasia, que apresen-
mente, em setembro de 68, já no go- o espírito de seus modelos norte- tava temas baseados em compositores
verno do presidente Costa e Silva, o americanos. Fora já nesse quadro que clássicos, Tchaikovsky, Grieg. O TV de
"Diário Oficial" publica um despacho Assis Chateaubriand, o caudilho dos Vanguarda encenava Shakespeare, Pi-
em que declara que "os contratos não Diários Associados, se lançara à aven- randello, e fazia adaptações de roman-
violam nenhum dispositivo da lei vi- tura da televisão no Brasil, iniciada em ces, Os Miseráveis, Senhora. Surgiram
gente no País". A verdade é que mais 1950, com a Tupi de São Paulo. Não as primeiras manifestações de telejor-
de cinco milhões de dólares foram apli- havia aqui ainda nem uma indústria de nalismo, com noticiários de estilo ra-
cados num canal de televisão brasileiro, componentes técnicos de TV. Até as diofônico, debates, entrevistas. Todos
a Globo, por um grupo estrangeiro, válvulas eram de fabricação americana. os programas eram produzidos no Bra-
Time-Life - quando a Constituição o Chateaubriand comandava um oligo- sil e por não serem gravados - não ha-
proibia. Por aí se vê como, desde o ini- pólio - chegou a ter 36 emissoras de rá- via aindo o videoteipe - não eram "ex-
cio, as relações estre a Rede Globo e o dio, 34 jornais e mais tarde 18 canais de portados" de uma região para outra.
Regime Militar foram amistosas. TV -, montado à base da audácia e do Até 1959, a expansão das tevês se limi-
A polêmica Time-Life era apenas a oportunismo. Era um mestre da impro- tava praticamente ao eixo Rio-São
ponta de um iceberg. Quando do nasci- visação e sua primeira emissora de TV Paulo, que tinha meia dúzia de esta-
mento da Rede Globo, o Brasil entrava foi o seu retrato, adaptando às pressas ções.
decisivamente na fase de internaciona- programas de rádio ao vídeo. Nos anos 60, a privilegiada minoria
lização de seu mercado interno, reflexo O mercado urbano de bens indus- já soma mais de 700 mil aparelhos, tam-
de uma nova ordem econômica (que se trializados engatinhava; as verbas de bém concentrados no Rio e São Paulo.
iniciara após a Segunda Guerra Mun- publicidade se dividiam entre jornais, Impunham-se o acelerado crescimento
dial e que completara a integração das revistas e o rádio, em sua grande fase, da população urbana e a implantação
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BRDFANBSBVB.GNCAMA, S404/3343hCO02,pI42

ainda no governo de Juscelino Kubits- dade. A TV Record, criada nos anos


chek de um modelo de desenvolvi- 50, também tentou ganhar o mercado
mento baseado na indústria de bens de publicitário. Mas tanto a Excelsior, que
consumo duráveis - entre eles, os pró- não tinha uma administração eficiente
prios aparelhos de TV, que já eram fa- e sumiu como um meteoro, quanto a
bricados no Brasil, barateando seu Record, uma empresa familiar, apenas
custo. Aí, entrou em cena o persona- lançaram as sementes que a Globo,
gem mais importante da televisão brasi- adubada pelos dólares de Time-Life,
leira até agora: o golpe militar de 1964, iria não só colher como multiplicar a
que derrubou João Goulart. O modelo níveis inimagináveis. Os televisores já
de desenvolvimento implantado pela eram respeitáveis promotores de ven-
revolução se dispunha a modernizar o das em potencial: em 1965, havia
País - e não enfrentaria os entraves pouco mais de dois milhões de apare-
políticos do passado, varridos com o lhos. A expansão da indústria de bens
golpe. A participação do Estado na de consumo duráveis, principalmente
economia aumentou e a renda se re- de luxo, que se diversificava com rapi-
concentrou, possibilitando uma maior dez, precisava de um agente para levar
expansão do capitalismo empresarial. suas mensagens a novos mercados. E a
Criaram-se facilidades para os investi- Globo também está pronta para isso.
mentos multinacionais - e se desenvol- Ela manobra dentro de um modo ra-
veram as condições básicas para a inte- cional capitalista de produção e não no
gração nacional, através do sistema de esquema improvisado de velhos capi-

João Bittar/Abril Press


telecomunicações. 1967 foi o ano que tães de indústria, como Chateaubriand.
marcou a mudança da política de co- O oligopólio da Tupi, criado na era do
municações, com a criação do Minis- populismo, não consegue adaptar-se às
tério das Comunicações e a implanta- regras do jogo dos governos pós-64.
ção através da Empresa Brasileira de Chateaubriand era visto com descon-
Telecomunicações (EMBRATEL), fi- fiança pelos militares, que o considera-
liada ao Consórcio Internacional de vam um "aventureiro", O dr. Roberto
Comunicações por Satélite (INTEL- Marinho, não; é um empresário "mo-
SAT), do Plano Nacional de Telecomu- dernizante" - e a Globo, uma corpora-
nicações, que tornou possível, tecnica- ção, dirigida por executivos profissio-
mente, a existência de uma rede verda- nais. Enquanto outros copiavam idéias
deiramente nacional de televisão, com de programas da TV americana, como
as estações repetidoras e os canais de O Céu é o Limite, da Tupi, e os "enlata-
microondas. A TV deixara de ser uma dos" começavam a ser exibidos por to-
curiosidade eletrônica. No mundo das as emissoras, inclusive a Globo, o
todo, ela estava associada ao nível de dr. Roberto Marinho ia além: ele im-
modernização atingido pelos países. E portou os próprios padrões de adminis-
o Regime Militar concentrou esforços tração, de produção e programação da
na disseminação daquele testemunho televisão norte-americana. Primeiro, é
de modernidade pelo Brasil. Ao preciso conseguir audiência, para
mesmo tempo, através do rádio e da te- vendê-la ao anunciante. Antes, a Tupi,
levisão, toda a população, alfabetizada de um modo geral, dominava a prefe-
ou não, poderia ser-informada das rea- rência do público. Houve momentos de
lizações do regime, E a Globo estava pico de outras emissoras, como a fugaz
pronta para essa missão, Já na CPI Ti- Excelsior, que inaugurou a era dos
me-Life, Calmon denunciara que um grandes musicais e lançou, em 1963, a
dos objetivos da rede de emissoras que primeira telenovela em capítulos
Roberto Marinho pretendia montar diários, 2-5499, Ocupado. A Record, en-
era o de "mobilização da opinião pú- tre 64 e 68, promoveu em larga escala
blica em torno do Regime Militar". programas de auditório (O Fino da
Banco de Dados/FSP

Bossa, Bossaudade, Jovem Guarda, Esta


O part Noite se Improvisa), que surgiriam, em
do
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parte, devido ao sucesso dos festivais
ªfªªínfzrí B. TA [35 x da canção e revelariam muitos ídolos:
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© poim 1 *e F# o Roberto Carlos, Gilberto Gil, Caetano
Com a modernização e o cresci- AArr RA8 11 *
mento da economia, a TV começou en- Veloso, Chico Buarque, Elis Regina, A
tão a disputar verbas publicitárias, com A Globo sempre foi uma espécie de filha Globo entra nesse mercado com duas
base na busca de maior audiência. No dileta do Regime Militar. De Castello armas - as telenovelas, adaptando ve-
início dos anos 60, a TV Excelsior de Branco a João Figueiredo, a Rede de lhos originais latino-americanos, como
São Paulo, ligada a capitais gerados Roberto Marinho (acima, com era moda na época, e, principalmente,
pela exploração do café, dera um passo Figueiredo) esteve de braços dados com o com uma programação popularesca.
importante nesse sentido: seus anún- governo, Em 1984, a Globo só deu maior Foi o que o estudioso de TV Muniz So-
cios podiam ser aproveitados em várias importância à campanha das diretas a drê chamou "A Estética do Grotesco":
praças, graças ao videoteipe, uma ino- partir do comício da Candelária, no Rio Chacrinha, Raul Longras e seu
vação da década de 60 que permitia a (ao centro). No início do ano seguinte, Casamento na TV, Dercy Gonçalves,
gravação de programas e de publici- em 1985, "tancredou" Sílvio Santos, atrações que tinham uma
399
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, 84044334 8nCOA, p 143

Sob o controle do governo

A televisão brasileira funciona sob ção das concessões, o CBT previa in- uma imensa lista de mutilações. Algu-
regime de concessão de canais, assim frações e penalidades no uso da TV. mas - como O Selvagem, de Janete
como o rádio, já que o Estado brasi- As infrações iam desde fazer propa- Clair (1973), Roque Santeiro, de Dias
leiro é o titular da radiodifusão, po- ganda de guerra ou de processos vio- Gomes (1975), Despedida de Casado,
dendo, periodicamente, segundo ale- lentos para subverter a ordem política de Walter Durst (1976-777), apenas
gislação, ceder o direito de uso de on- ou social até ofender a moral familiar. para citar alguns exemplos - foram
das e canais a empresas privadas ou a Na Lei de Segurança Nacional do vetadas na integra, antes mesmo de
instituições. Este instrumento, aliado Regime Militar se previam penas de irem para o ar. Outras, como Duas Vi-
à censura, dá ao governo grande po- até 30 anos de prisão para "crimes das, de Janete Clair (1977), sofreram
der de ingerência na programação das políticos" cometidos via televisão. cortes que obrigaram os autores a
emissoras. Além da legislação restritiva, a TV reescrever diversos capítulos; e mui-
Desde 1931, as concessões eram foi cerceada também pela censura. tas vezes a censura chegou até a alte-
feitas por períodos de dez anos. En- De início, ela era realizada com a rar o encaminhamento da trama.
tretanto, em 1451, já com a inaugura- presença de agentes nas redações dos Exemplos extremos da falta de
çãoda TV, o presidente Getúlio Var- telejornais. Depois, bastava um tele- critérios da censura foram a proibição
gas, em seu segundo governo, pressio- fonema do censor para vetar determi- do espetáculo do Balé Bolshoi, em
nado pelos meios de comunicação, nados assuntos. Para se ter uma idéia 1976, cujo motivo nunca foi revelado
que se opunham a sua política nacio- do volume de proibições, é suficiente (curiosamente, a apresentação foi
nalista e de regulamentação de direi- lembrar que, em 1973, as emissoras substituída pela apresentação de um
tos trabalhistas, procurou neutralizar do Rio de Janeiro receberam 97 ve- filme sexy americano), e o veto à obra
a radiodifusão e impôs uma revisão tos; em 1974, 103; em 1975 (já no go- Romeu e Julieta, de Shakespeare, "por
do prazo de concessão a cada três verno Geisel), 16; em 1976, sete; e em falar de amores proibidos e de uma
anos, A medida, no entanto, não 1977, 20, entre os quais comentários relação ilícita entre jovens e ocorrer
sobreviveu a seu governo, interrompi- sobre o fechamento do Congresso e o na peça um assassinato, um suicídio
do por seu suicídio, em 1954. Mais "pacote de abril "(medidas tomadas e um pacto de morte". No mesmo
tarde, o governo Jânio Quadros por Geisel em abril de 1977), divulga- pacote que definiu as 53 obras imor-
(1961) propôs a redução do direito de ção do manifesto de cientistas brasi- tais da literatura que não poderiam
exploração de emissoras para três leiros contra o acordo nuclear com a ser exibidas na TV, em que estava
anos, mas sua renúncia não permitiu Alemanha, comentários sobre a de- Shakespeare, foram relacionados
que a proposta vigorasse, missão do ministro do Exército, Sílvio também Sófocles (Édipo Rei),
Sob o governo João Goulart (1961- Frota, e outros. Aristófanes (Lisistrata), Goethe
64),0s empresários do setor fundam a Mas a censura à TV não se restrin- (Fausto) e outros "subversivos".
Associação Brasileira de Emissoras giria somente ao telejornalismo. Pelo No final de 1979 e início dos anos
de Rádio e Televisão (ABERT). A in- Index do regime passaram também 80, era a vez das séries brasileiras.
fluência dessa entidade conseguiu programas de variedades, novelas, o Malu Mulher, com Regina Duarte, so-
derrubar, no Congresso, 52 vetos de Balé Bolshoi e até a obra de William freu diversas mutilações e teve alguns
Goulart ao Código Brasileiro de Tele- Shakespeare. Em 1969, os animadores episódios vetados na integra, o mes-
comunicações (CBT) de 1962, que - Chacrinha e Dercy Gonçalves foram mo acontecendo com Amizade Colori-
refletindo a força e os interesses das impedidos de apresentar seus respec- da, com Antônio Fagundes, de curtis-
empresas de rádio e TV - elevava tivos programas por 15 dias; segundo sima duração justamente por causa da
para 15 anos os prazos de concessão. a censura, por atentarem contra os censura,
Apesar de fávorecer as empresas bons costumes. Entre as novelas, os Em 1984, a censura do regime dava
no que diz respeito ao tempo de dura- governos do Regime Militar deixaram ainda alguns sinais inconfundiíveis de
vitalidade. Por ocasião da votação da
Do jornalismo às novelas, emenda propondo eleições diretas,
todo tipo de programa foi em Brasília, as emissoras de todo o
alvo da censura. Em 1984, País foram proibidas de enviar para
ela ainda dava sinais de fora do Distrito Federal qualquer ma-
vitalidade: em 25/4, por terial não submetido a censura prévia.
"ousar" entrevistar o
Em São Paulo, num programa da TV
senador Orestes Quércia
Gazeta, um repórter "ousou" entre-
diretamente de Brasília,
vistar por telefone o senador Orestes
quando as transmissões do
Quércia, que estava na capital federal
Distrito Federal estavam
acompanhando a votação. No dia se-
SOb censura prévia em
guinte, dois agentes do Departamento
razão da votação da
de Telecomunicações (DENTEL) la-
emenda das diretas, a TV
cravam os transmissores da emissora,
Gazeta, de São Paulo,
Agência Estado

A Gazeta ficou dois dias fora do ar e


teve seus transmissores
ainda sofreu um processo, movido
lacrados pelo DENTEL
pelo órgão, por desrespeitar a proibi-
(ao lado)
ção.

400
. sas

L%
%
clara função mercadológica. A Globo nro e oo e os do ea u aa
procura formar um público básico para *Mêªã'ºªªí“ª?*“ªª%<933ff$;*ffifªªcfªiâk
o seu grande salto. Assalariados de
da202200202A.
base, migrantes, trabalhadores inde-
pendentes, favelados, as chamadas
classes C e D, passam a interessar à
empresa de televisão. Era o período do
boom econômico-financeiro. Graças ao
crédito direto ao consumidor, criado

Maurício Domingues/Abril Press


pelo governo em 1968 para facilitar a
venda de bens de consumo produzidos

Lúcio Marreiro/Abril Press


pela indústria e anunciados pela TV, as

ums came. se
vendas de aparelhos receptores de TV &
aumentaram em 48% sobre 1967. O
"grotesco" liderou a audiência entre 68
e 72. Em 71, 70% dos aparelhos ligados
em São Paulo já pertenciam às famílias
das camadas C e D. Os principais anun-
ciantes eram outro fenômeno dos anos A exportação de novelas como A Escrava Isaura (à esq.) e Gabriela para o Terceiro
60: os supermercados, dispostos a liqui- Mundo abriu para a Globo uma nova fonte de receita
dar a concorrência dos pequenos arma-
zêns e feiras-livres. Rockfeller, de Bráulio Pedroso - o ini- exportava seus programas para 50
cio da novela como um gênero especi- países. E também ganhava prêmios in-
fico da televisão e de know-how ternacionais, como o dado pela Unesco
brasileiro. A Globo logo lançou Assim em 79 ao Sítio do Pica-Pau Amarelo ou o
na Terra como no Céu, de Dias Gomes, Salute, norte-americano, "pelo nível de
Desde 1969, a Globo concentrara a sua primeira telenovela apoiada no dia- sua programação". Mas a influência es-
produção de programas no Rio e am- a-dia nacional. Surgiram dramas inte- trangeira na televisão não terminou;
pliara suas redes de operação, ado- rioranos (Verão Vermelho, O Bem- longe disso. O perfil de seus anuncian-
tando o modelo norte-americano de li- Amado), urbanos (Selva de Pedra, Ban- tes dá bem um retrato econômico do
gações contratuais com emissoras inde- deira 2), os "casos especiais". O telejor- Brasil: em 1980, entre seus dez maiores
pendentes, as afiliadas, nos outros Esta- nalismo ganha impulso. O Fantástico clientes publicitários, apenas um, o Ba-
dos, A rede permite a concentração mistura humor, aventura, uma pretensa nespa, era nacional.
técnica e burocrática da produção, di- divulgação científica, música e esporte,
minuindo os custos. E é também espe- sob a forma de notícia jornalística. En-
cialmente vantajosa para os anuncian- fim, a Globo adotou uma fórmula
tes. Ainda em 1969, a Globo lança o básica jornalistico-telenovelesca, que
Jornal Nacional, primeiro programa a se mantinha até o final de 1984 - re- A Globo tem os melhores artistas, os
ser transmitido simultaneamente para cheada por programas de humor e de melhores humoristas, os melhores jor-
todo o País. esporte e especiais com os grandes no- nalistas. Ela pode sentir-se tranquila em
Assim, a Globo fabricara o público mes da música popular brasileira. Em sua posição de líder do mercado, ape-
de que necessitava como audiência de 1976, a Globo produzia 75% de sua sar do aparecimento de novas redes
base. Atinge mais de 90% dos lares com programação, um recorde mundial, e concorrentes, como o Sistema Brasi-
aparelhos receptores em todo o Brasil e faturava 120 milhões de dólares - 18% leiro de Televisão (SBT) de Sílvio San-
as outras redes não têm condições de do total da receita de propaganda no tos e da Manchete, e do crescimento
lhe fazer concorrência. Está portanto Brasil. Dona do mais poderoso instru- da Bandeirantes, que repartiram o es-
pronta nessa época para conquistar te- mento de venda do País, com 20 mi- pólio dos Diários Associados, cuja con-
lespectadores mais "elevados" e anún- lhões de aparelhos receptores - em cessão o governo cassou em julho de
cios mais luxuosos. Passa a impor uma 1980, 37% das verbas publicitárias fica- 1980, após quase uma década de ago-
nova fórmula: o padrão global de quali- ram com a TV -, a Globo é insaciável. nia. Um balanço final dessa história da
dade. Como sempre, no momento Ela abriu mais espaço para anúncios ao TV entre nós, principalmente após
certo - a TV em cores, que exigia pro- ocupar o horário da manhã, com TV 1964, mostraria que o País que se viu
gramas de mais apuro técnico, era a Mulher e noticiário. Em suas cinco se- em suas telas estava longe do Brasil
grande novidade de 1972, num mer- des - Rio, São Paulo, Belo Horizonte, real. E foi o grande senhor do País du-
cado quase saturado para os aparelhos Brasília e Recife - a criação de progra- rante o período mais negro do Regime
em preto e branco. E, ainda que passa- mas jornalísticos regionais atraiu anun- Militar, o general Emílio Garrastazu
geiros, a televisão enfrentava arrufos ciantes locais, esquema que se repete Médici, quem destacou, em 1973, o pa-
com o governo Médici, preocupado com subsedes instaladas no interior de pel da TV: "Sinto-me feliz, todas as noi-
com a violência e com a "falta de pa- São Paulo na década de 80. Para os fa- tes, quando ligo a televisão para assistir
drôes culturais" dos programas, devido bricantes de máquinas e produtos agri- ao jornal. Enquanto as notícias dão
à invasão dos enlatados. colas, surgiu o Globo Rural. Nas nove- conta de greves, agitações, atentados e
Nessa época, a TV começa a aban- las, o merchandising - espécie de propa- conflitos em várias partes do mundo, o
donar o velho padrão sentimentalóide ganda disfarçada - às vezes predomina Brasil marcha em paz, rumo ao desen-
mexicano-argentino das telenovelas e a sobre o próprio enredo, tantas são as volvimento. É como se eu tomasse um
retomar o filão da Excelsior, que re- marcas de roupas, cigarros, toalhas, au- tranquilizante, após um dia de traba-
correra a temas brasileiros. E -o pri- tomóveis e remédios que aparecem no lho."
meiro marco dessa tendência surgiu na vídeo. No início dos anos 80, a Globo
já então decadente Tupi, com Beto controlava 36% das emissoras do País e Sérgio Pompeu
401
BR DFANBSB 1232324 an 002, 4444
BR DFANBSB VB.GnC.aAA, 4233 Jnoo2 p 145

POLÍTICA/RELAÇÓES EXTERIORES: o acordo nuclear com a Alemanha


Nosso prrimeiro reator de 627 mega-
watts(mW), era americano, da empresa
Westinghouse, e veio de um acordo
com os americanos, de 1968, Os outros
oito reatores (1.300 mW cada) também
eram modelos originais da Westing-
house, mas sua tecnologia fora repas-
Na luta pela independência nuclear do País, de
um lado sada aos alemães da empresa KWU
estão os cientistas e nacionalistas. De outro, os acordo (Kraftwerk Union), que por sua vez os
s
do regime com os EUA e com a Alemanha repassara ao Brasil, nos termos do
acordo com a Alemanha, de 1975, Os
custos da primeira usina alemã (Angra
"Virada uma página da história." As- delas estava semiconcluída e suas II, em 1984 ainda em construção junto
sim noticiavam os jornais, em 1975, obras empregavam alguns milhares de com Angra III) foram avaliados pelo
saudando a assinatura do acordo nu- trabalhadores - sendo um grande nú- governo em 400 dólares por quilowatt
clear Brasil-Alemanha Ocidental, se- mero de profissionais altamente espe- (kW). De fato o custo ficou em 3.000
gundo o qual o País construiria as cializados - e já reuniam mais de uma dólares por kW, enquanto as usinas hi-
maiores centrais. atômicas para a pro- dezena de indústrias nacionais e estran- drelétricas eram construídas a 1.000
duçãode energià elétrica do mundo. geiras, dólares o kW ,
Quase dez anos após ter sido iniciado Os desencontros do programa nu- Nessa época avaliou-se também com
pelo governo do presidente Geisel, o clear começaram logo com o primeiro mais precisão o potencial hidrelétrico
programa nuclear brasileiro estava em reator brasileiro - Angra I - inaugu- do País: 213 milhões de kW , dos quais
escombros, Transformara-se no exem- rado, com atraso, em 1982. Os reatores apenas 30 milhões estavam sendo apro-
plo extremo do fracasso do modelo de seguintes também se atrasaram, Houve veitados. Para se ter uma idéia do
desenvolvimento dependente imposto erros até na construção de fundações quanto isso significava, os 183 milhões
pelo Regime Militar, que em 1984 le- mal calculadas, em virtude do desco- de kW restantes podiam ser aproveita-
vantava uma tormentosa questão: nhecimento do solo da região de Angra dos com um investimento de 200 mi-
como aproveitar o que já fora feito sem dos Reis, no Estado do Rio de Janeiro. lhões de dólares ao longo de 20 anos.
incorrer em novos erros e desperdi- Outro erro foi o cálculo do custo da Assim, quando a hidrelétrica de Itaipu
cios? As nove usinas previstas no energia nuclear relativamente à energia ficou pronta em 1982, aumentando o
acordo haviam sido orçadas em algo hidrelétrica, que foi grosseiramente excesso já existente de energia elétrica
próximo de 30 bilhões de dólares. Parte subestimada. do País, o governo decidiu ordenar
uma revisão dos planos energéticos.
Em 1980, o prazo para a instalação final
das oito usinas já havia sido adiado de
1990 para 1995; em 1982, estando cer-
tas apenas a construção de quatro usi-
nas alemãs, o prazo final deslizou para
o ano 2000. E, embora o governo afir-
masse que, pelo menos, o País a havia
dominado, a 'tecnologia alemã
ocidental tinha sido testada sem su-
Hicardo Chaves/Abril Press

cesso ao longo de 30 anos em todo o


mundo, Em nenhum lugar, inclusive no
Brasil, alguém a havia visto funcionar
em escala industrial. Esse desfecho re-
tomava uma disputa que começou em
meados da década de 50.
Após o golpe militar, apesar de assi-
Em 1985, dez anos depois da assinatura
do acordo Brasil-Alemanha Ocidental ao
lado , o ministro das Relações Exteriores,
Azeredo da Silveira, do Brasil, e o
ministro das Relações Exteriores da
Alemanha, Hans-Dietrich Genscher,
durante a assinatura do acordo nuclear
em Bonn, em 1975),0 programa nuclear
brasileiro transformara-se num fracasso:
além do grosseiro erro de cálculo do custo
por quilowatt, e da avaliação subestimada
do potencial hidrelétrico do Brasil, houve
erros na construção das fundações e
atraso na inauguração da primeira usina
(acima, Angra 1)

402
13834 27 COA , p 4346
BR DFANBSB VB.GNCAAA,

nar, já em 1965, um acordo de coopera- Brasil se obrigava a exportar valiosas


ção com Washington, o novo regime reservas de areia monazítica, abun-
sanciona oficialmente um dos mais im- dante em tório. Mas os EUA se recusa-
portantes movimentos nacionais inde- vam a nos fornecer seus segredos tec-
pendentes pela energia nuclear: o nológicos. E não apenas isso: em 1954,
Grupo. do Tório, criado embrionaria- as autoridades de ocupação dos EUA
mente dois anos antes junto ao Insti- na Europa simplesmente confiscaram
tuto de Pesquisas Radioativas (IPR) de três máquinas experimentais de enri-
Belo Horizonte, Neste Instituto, desde quecimento de urânio que haviam sido
1956 funcionava um dos reatores expe- encomendadas à Alemanha Ocidental
rimentais já instalados no País. Outros pelo almirante Álvaro Alberto, então
reatores seriam instalados no Instituto presidente do CNPq (Conselho Nacio-
de Energia Atômica (IEA), de São nal de Pesquisa), do Brasil: Ao mesmo
Paulo, e no Instituto de Engenharia tempo, através de aliados como o gene-
Nuclear, no Rio. ral Juarez Távora, então chefe da Casa
Mas o Grupo do Tório teve vida Militar, os americanos introduziam
curta: apenas quatro anos. Os militares suas próprias diretrizes de política nu-
no poder optaram por um modelo de clear no País. Quatro documentos re-
reator compatível com a tecnologia do- presentativos dessas diretrizes america-
minante, a americana, e que não era nas foram falsamente apresentados

Agência O Globo
boa para o Brasil principalmente por- como estudos nacionais pelo enge-
que empregava urânio 235 (U235) "en- nheiro Hervásio de Carvalho - que
riquecido", O Brasil tinha pouco urá- pouco depois também derrubaria o al-
nio e muito tório, outro mineral radia- mirante Alberto, estabelecendo um im-
tivo, que pode ser transformado em pério particular à frente da CNEN (Co-
combustível nuclear, O correto era tra- missão Nacional de Energia Nuclear,
balhar de forma independente com o criada em 1956 por desmembramento
tório, alegavam os cientistas. "A fécno- do CNPq).
logia não é complexa e pode ser desen- Em 1956, diante da recente vitória na
volvida no Brasil", afirmou o Grupo do estatização do petróleo, houve protes-
Tório em seu último parecer, em 1968, tos públicos contra a venda de areia
Nesse conflito espelhava-se um monazítica e, sob grande pressão por
longo e severo controle mantido pelos parte de "alguns setores ' militares,
Agência O Globo

EUA sobre a indústria nuclear mundial instaurou-se uma CPI para rever os
desde 1946, às vêsperas do início da acordos nucleares brasileiros, Como re-
"guerra fria" com a União Soviética. sultado, o Conselho de Segurança Na-
Foi quando surgiu a "política de re- cional adotou uma resolução que con-
cusa", destinada a eternizar o mono- siderava um ponto "fundamental" da
pólio americano no setor. "Pensavam política nuclear manter o combustível
que podiam parar o tempo", afirmou atômico "sob o controle e a proprie-
um dos cientistas americanos de então. dade do governo",
Em 1954 esta atitude tomou corpo atra- O fato é que nessa época a "política
vês da Lei MacMahon, que transfor- da recusa" dos americanos havia se tor-
mava a tecnologia americana em se- nado inviável, na prática, já que outros
gredo de Estado que não deveria ser países, como a Inglaterra, a França e
Agência O Globo

adquirida por nenhum país que não os mesmo a Índia e a Argentina, tinham
EUA. obtido acesso aos segredos nucleares
Assim, em 1945, quando fez o pri- por conta própria, Os americanos en-
meiro acordo atômico com os EUA, o tão iniciaram a campanha "Atomos

A política nuclear e todo o modelo de


desenvolvimento dependente do Brasil
sempre foram criticados pelos nossos
cientistas, como (do alto p/ baixo) Mário
Schenberg, Jaime Tiomno, Luis Carlos
Pinguelli Rosa e Marcelo Damy, todos
perseguidos pelo Regime Militar. Com a
abertura política, as críticas ao acordo
nuclear BrasilAlemanha Ocidental
alastram-se rapidamente. Em 1975, o
acordo foi o tema mais concorrido na
reunião da SBPC, em Belo Horizonte
(MG), que contou com (ao lado, da esq.
p/ dir.) João André Guillaumon Filho,
Agência O Globo

Eugênio Lerner, José Goldemberg e


Antonio Expedito Gomes Azevedo-

403
BR DFANBSS 4044333 an co2 , p 144

PERVÍBE II Prevista
PERVÍBE | Prov sta
Dependência

vai tais brasileiras, principalmente a Nu-


clebrás, criada em 1974 através de
uma associação de capital (joint ven-
ao átomo
es ELETROBRÁS ture) com a filial brasileira da KWU.
+ (FURNAS)
Combustivei* Através desta, se repassaria a tecno-
O acordo nuclear assinado com a logia nuclear da matriz. Diversas ou-
4 Alemanha Ocidental em 1975 obe- tras empresas alemãs se consorcia-
INDÚSTRIA
Combustivel" NUCLEAR decia ao mesmo tipo de desenvolvi-
EUROPEIA riam à Nuclebrás; passaram assim a
Equipamento mento dependente adotado, no ge- controlar várias partes do ciclo in-
convencional ral, pelo Regime Militar, sempre dustrial nucleoelétrico. Embora cer-
INDÚSTRIA KWU - NUCLEBRÁS com altíssimo custo social. Segundo
BRASILEIRA E ca de 80% desse ciclo não envolves-
SUBSIDIÁRIAS* mostra o esquema, esse modelo pri-
ta se tecnologia nuclear, apenas três
Ar « K vilegiava as multinacionais encarre- grandes empresas brasileiras foram
Tecnologa nuclear
e equipamentos gadas de nos venderem conheci- convidadas a participar do acordo. A
Tecnooga mentos técnicos nucleares ou con- tecnologia de enriquecimento de
convencional
KW- SIEMENS vencionais, mantidos sob seu con-
ALEMÃ urânio usada no Brasil seria diferen-
trole total. Também elas venderiam te da americana, mas, como esta,
grande quantidade de equipamentos também envolvia uma sofisticada
INDÚSTRIA Equipamentos
ALEMÃ 8 componentes e componentes. Além da KWU ale-
Tecnologa orginal base industrial. O acordo devia ser
mã, muitas outras firmas alemãs capaz de operar desde a prospecção
ocidentais participavam do acordo, e tratamento do urânio até a cons-
Tecnog a ongina
t WESTINGHOUSE entre as quais algumas já atuantes
AMERICANA trução das centrais nucleares, assim
no Brasil como a Hoechst e a Bayer. como sua inclusão na rede de for-
Os pesados investimentos de infra-es- necimento de energia elétrica do
* 0 fomeemento do com mto logo que a Nuciebrés Noiasse sua produção trutura caberiam às empresas esta- País.
** As vês principais rás Engenharia, a Naclep INuclebrás Equpamen
tos) e a Nacir (Nuclerás

para a Paz", com a qual podiam pres- bustível ao Brasil. Os países detentores preço da independência com relação
sionar para que outros países compras- de tecnologia nuclear, consorciados no aos EUA seria muito alto, já que se
sem a tecnologia e o combustível ame- seleto Clube de Londres, procuravam continuaria usando o U235: assim,
ricano. De fato, até recentemente, resguardar seus privilégios comerciais. mesmo se a técnica de enriqueci-
mesmo os países desenvolvidos prefe- Tinham também interesse em congelar mento alemã ocidental funcionasse,
riam recorrer ao U235 enriquecido nos o mercado atômico para evitar uma teriamos que montar um sofisticado ci-
EUA, disseminação descontrolada de outras clo industrial exigido por esse tipo de
A partir de 1965, já sob a égide do potências nucleares no campo militar. combustível nuclear.
programa Atomos para a Paz, o Re- Foi nessas circunstâncias que o pre- Essas críticas não eram novas, em si,
gime Militar brasileiro começou a pre- sidente Geisel, em 1975, virou as cos- mas agora adquiriam uma nova força
parar o atrelamento ao monopólio tas aos seus aliados do Norte, devido ao esgotamento do próprio re-
americano. Inicialmente, após 1965, os comprometendo-se com o pretensioso gime. Em 1968 elas haviam sido feitas
institutos de pesquisa nuclear foram acordo com a Alemanha Ocidental. principalmente através de uma campa-
postos sob o controle do Ministério das Repetiu então as preocupações de nha encabeçada pelo físico José Leite
Minas e Energia, obedecendo ao 1956, afirmando ser "imperativo dar ao Lopes. Mas com a edição do Ato Insti-
Decreto-Lei no, 200, de autoria de Ro- País a indispensável autonomia nu- tucional no 5 (AI-5), Lopes seria com-
berto Campos. Em 68, afinal, decidiu- clear". Assim, angariou a simpatia pulsoriamente "aposentado" pelo Re-
se que Angra-I seria construída por mesmo de alguns setores da oposição, gime Militar. Outros físicos que se des-
Furnas e usaria combustível fornecido que saudaram a decisão como o pri- tacaram ao seu lado teriam destino
pelos EUA. Em 72, foi comprado o rea- meiro desafio aberto do Brasil aos idêntico, como Marcelo Damy, Jayme
tor Westinghouse de 627 imW. EUA em trinta anos. Tiomno e Mário Schenberg. Em 74,
Entretanto, em 1969 já se pensava no Nesse mesmo ano, no entanto, os no entanto, com a abertura política, as
acordo com a Alemanha Ocidental. físicos brasileiros retomaram o com- críticas ao acordo com a Alemanha
Essa idéia foi então explicitamente su- bate à política nuclear, argumentando Ocidental alastraram-se rapidamente.
gerida pelo ministro das Minas e Ener- que não estavam em jogo apenas as re- Nesse mesmo ano o físico José Gol-
gia, Costa Cavalcanti. Ela se tornaria nos lações com os EUA, mas todo o mo- demberg voltou a defender a opção
anos seguintes "o segredo mais bem- delo de desenvolvimento dependente, pelo combustível nacional, e em 75 o
guardado do País", segundo confes- mantido agora com relação à Alema- tema foi um dos mais concorridos da
sou mais tarde o senador Virgílio Tá- nha Ocidental. Esta, segundo o acordo, reunião da SBPC (Sociedade Brasileira
vora. O motivo é que a situação inter- ainda teria direito a 20% das reservas para o Progresso da Ciência), em Belo
nacional, então, estava se alterando ra- de urânio que ajudasse a encontrar no Horizonte. Os engenheiros e os econo-
pidamente: já em 1973, com a crise Brasil - para muitos, a verdadeira ra- mistas, além disso, em 77, ampliariam ,
mundial de energia, os EUA deixaram zão de ter feito o acordo em 1975. Os consideravelmente o círculo de oposi-
de garantir o fornecimento de com- cientistas alegaram também que o tores à política nuclear brasileira.
404
Br pransss va.encaaa, 410413393 9002 , o J4£

Iconographia
a

Iconographia
Alguns dos direitos "concedidos" pela CLTjá eram reivindicados pelos trabalhadores na greve geral de 1917, em São Paulo
(à esq., comício no Brás), em que a morte de um sapateiro em choque com a polícia gerou gigantescos protestos (à dir.)

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO: a evolução da legislação como "o proletário número um do Bra-


sil".
Mas toda essa propaganda lauda-
tória recebeu o alento final com a assi-
natura da CLT. As próprias datas fo-
ram escolhidas meticulosamente: a
CLT foi promulgada no 1o de maio,
Ainda há setores que acreditam que as leis trabalhistas Dia dos Trabalhadores, para entrar em
vigor no dia 10 de novembro, aniver-
foram outorgadas por Getúlio. Na verdade, o que houve
sário da instituição do Estado Novo.
foi a luta operária Desde aquele. sábado calorento de
1943, portanto, o esforço propagandis-
Fazia sol e muito calor no dia 1o de cuja sacada falou à multidão de 100 mil tico do regime se concentrou em apre-
maio de 1943. Era um sábado, o mundo pessoas, anunciando a Consolidação sentar a legislação trabalhista sindical
estava em guerra e a peça Vitória à das Leis do Trabalho - CLT. Nesse dia como sendo fruto exclusivo da inicia-
Vista estava em cartaz em São Paulo, nasceu definitivamente o mito de Ge- tiva pessoal e generosa de Getúlio,
no Cassino Antarctica, com Oscarito e túlio como "pai dos pobres" e "prote- Na realidade, desde o final do século
Beatriz Costa. tor dos trabalhadores". 19, quando começam a difundir-se no
No estádio paulista do Pacaembu, País as relações de trabalho assala-
recem-inaugurado, milhares de assala- riado, os Operários já vinham bata-
riados, bandeirinhas brasileiras nas lhando arduamente contra os abusos
mãos (as paulistas estavam proibidas), patronais e por uma legislação acaute-
acomodavam-se para assistir a uma Já em 1933 o então ministro do Tra- ladora de seus direitos básicos. Assim,
partida entre Corinthians e São Paulo, balho, Salgado Filho, escrevia sem ne- já em 1901, o Centro Socialista Enrico
a qual só começaria depois que o dis- nhuma preocupação com os fatos his- Ferri e a Liga Democrática lançam um
curso de Getúlio Vargas fosse retrans- tóricos: "O que se chama de reivindica- manifesto, por ocasião do 1o de maio,
mitido "diretamente do Rio" pelo DIP ções trabalhistas não foram jamais obti- onde se encontram as seguintes reivin-
(Departamento de Imprensa e Propa- das em qualquer país como estão sendo dicações operárias: "I - Modificações
ganda). verificadas aqui. No Brasil não há rei- dos artigos do Código Penal e Civil que
No Rio de Janeiro, desde o meio-dia, vindicações nesse assunto. Há conces- prejudicam a personalidade humana e
grupos organizados de trabalhadores sões. Concessões do Governo aos efi- jurídica do trabalhador; 2 - Reconhe-
dirigiam-se para a Esplanada do Cas- cientes colaboradores, que são os ho- cimento da plena liberdade de reunião
telo, onde, por volta das 14 horas, a mens do trabalho". Em 1942, o DIP pu- e de greve; 3 - Leis protetoras do tra-
' multidão já era imensa em frente ao blicava um balanço da política traba- balho das mulheres e das crianças; 4 -
Palácio do Trabalho, sede do Minis- lhista do governo com um título pom- Fixação do máximo das horas de traba-
tério do Trabalho, Indústria e Comér- poso e expressivo: "O Nume Tutelar lho; 5 - Fixação do mínimo de salários;
cio. das Massas Trabalhadoras do Brasil: 6 - Criação da caixa-pensão para os
Getúlio chegou ao local às 15 horas, Benefícios e Direitos Assegurados pelo velhos e para os incapazes de traba-
acompanhado do ministro do Traba- Presidente Getúlio Vargas ao Proleta- lhar."
lho, Alexandre Marcondes Filho. En- riado Nacional". O balanço terminava Durante a famosa greve geral de
trou no prédio sob aplausos, tomou o por aclamar o chefe do governo - co- 1917 em São Paulo, o Comitê de De-
elevador, subiu ao terceiro andar, de ronel da reserva e grande fazendeiro - fesa Proletária formulou as seguintes
405
condições para a volta ao trabalho: "1 deputado Maurício de Lacerda, a Cô-
- Que sejam postas em liberdade todas mara dos Deputados decide for-
as pessoas detidas por motivo de greve; mar em 1918 uma Comissão de Le-
2 - Que seja respeitado do modo mais gislação Social, depoi8 tornada órgão
absoluto o direito de associação para os permanente da Câmara. Ainda por ini-
trabalhadores; 3 - Que nenhum ope- ciativa de Maurício de Lacerda, é
rário seja dispensado por haver partici- criado em 1918 o Departamento Na-
pado ativa e ostensivamente no movi- cional do Trabalho, transformado em
mento grevista; 4 - Que seja abolida de Conselho Nacional do Trabalho em
fato a exploração do trabalho de meno- 1923,
res de 14 anos nas fábricas, oficinas, Existia, desde 1907, uma lei autori-
etc.; 5 - Que os trabalhadores com me- zando a formação de sindicatos como
nos de 18 anos não sejam ocupados em sociedades civis, E, apesar de suas limi-
trabalhos noturnos; 6 - Que seja abo- tações e de constantemente ser desres-
lido o trabalho noturno das mulheres; 7 peitada, essa lei dispunha em seu artigo
- Aumento de 35% nos salários inferio- 2o que os sindicatos podiam constituir-
res a 59000 e 25% para os mais elevados; se "livremente, sem autorização do go-
8 - Que o dos salários seja verno", bastando depositar os docu-
efetuado pontualmente, cada 15 dias, e, Da luta do deputado Maurício de Lacerda mentos constitutivos em cartório; e seu
o mais tardar, 5 dias após o venci- resultou, em 1918, a criação do artigo 4o reconhecia aos sindicatos a
mento; 9 - Que seja garantido aos ope- Departamento Nacional do Trabalho "faculdade de se federar em uniões ou
rários trabalho permanente; 10 - Jor- sindicatos centrais", No entanto, é sig-
nada de 8 horas e semana inglesa; 11 - de um livrinho pioneiro, Apontamentos nificativo que fossem aprovadas, ao
Aumento de 50% em todo trabalho ex- de Direitos Operários), ou de políticos mesmo tempo, uma série de leis de ní-
traordinário," Finalmente, em 1927, o como Maurício de Lacerda, sensíveis tido caráter repressivo, destacando-se a
programa de legislação social dos can- à chamada "questão social", Lei Adolfo Gordo de 1913, a "Lei In-
didatos do Bloco Operário, organizado fame" de 1921 e a "Lei Celerada", de
pelo Partido Comunista, reclamava as 1927, todas prevendo para os que parti-
seguintes medidas: "a) Máximo de 8 cipassem de greves ou outros movimen-
horas de trabalho diário e 44 horas se- tos "subversivos" penalidades severas,
manais, e redução a 6 horas nos traba- Para essa tendência contribuíam a que iam do fechamento de entidades à
lhos malsãos; b) Proteção efetiva às nova doutrina social-reformista da expulsão dos operários de origem es-
mulheres operárias, aos menores ope- Igreja Católica, pregada pelo papa trangeira, então maioria entre os traba-
rários, com a proibição de trabalho a Leão XJII a partir de 1891, e a assina- lhadores mais combativos,
menores de 14 anos; c) Salário mínimo; tura do Tratado de Versalhes e criação
d) Contratos coletivos de trabalho; e) da Sociedade das Nações e da Organi-
Seguro social a cargo do Estado e do zação Internacional do Trabalho, em
patronato, contra o desemprego, a in- 1919, sob o impacto da crise que se se-
validez, a enfermidade, a velhice; f) guiu à Primeira Grande Guerra e à Re- Portanto, quando Getúlio Vargas as-
Enérgica repressão ao jogo e ao alcoo- volução Socialista de Outubro, na Rus- sumiu a chefia do Governo Provisório,
lismo; g) Licença, às operárias grávi- sia, em 1917, Esses acontecimentos le- após a vitória do movimento revolucio-
das, de 60 dias depois do parto, com vam, pouco a pouco, a uma ruptura nário. de 1930, já existia no País um mo-
pagamento integral dos respectivos sa- com o individualismo jurídico e a con- vimento operário ativo e já se iniciara o
lários; h) Extinção dos serões e extraor- cepção não-intervencionista do Estado, reconhecimento legal de direitos bási-
dinários; i) Descanso hebdomadário prevalecentes no século 19, e à aber- cos dos trabalhadores. Além disso, os
em todos os ramos do trabalho, na in- tura de um novo ramo jurídico, o Di- trabalhadores do campo e da cidade
dústria, no comércio, nos transportes, reito do Trabalho, cujos princípios re- continuariam exigindo, em greves e
na lavoura; j) Proibição da dormida nos gulamentadores do conflito entre capi- manifestações, a ampliação de seus di-
locais de trabalho; l) Água filtrada nas tal e trabalho começam a ser incorpo- reitos, até que o movimento operário
fábricas e oficinas; m) Saneamento rural rados às constituições do primeiro pós- fosse temporariamente desarticulado a
sistemático, visando à regeneração guerra a partir da Constituição alemã partir de 1935, com a implacável re-
física e moral do trabalhador agrícola, à de 1919, pressão que se seguiu à insurreição na-
higienização das condições de trabalho Na confluência da luta operária com cional-libertadora tentada pelo Par-
e habitação na lavoura, assistência mé- essas novas tendências jurídicas e polí- tido Comunista. Portanto, Getúlio não
dica gratuita aos doentes pobres; n) Fo- ticas é que as primeiras leis de proteção realizou nenhuma obra gratuita, nem
mento e facilidades às cooperativas ao trabalho são aprovadas no Brasil. É original, A própria denominação de sua
operárias de consumo e às cooperativas de 1917 a lei que proibe o trabalho de obra máxima, a CLT, o comprova. Ge-
de produção na pequena lavoura," As- menores de 12 anos e de mulheres no túlio não promulgou em 1943 um
sim, todos os pontos da moderna legis- último mês de gravidez e primeiro de Código do Trabalho, vale dizer, um
lação do trabalho já haviam sido levan- puerpério, Em 1919, é aprovada a pri- corpo inovador de normas jurídicas,
tados pelo movimento operário em meira lei de acidentes do trabalho. Em mas apenas uma Consolidação, isto é,
suas greves, manifestações e congressos 1923, é instituída a estabilidade no em- uma sistematização das leis já existen-
das primeiras décadas do século. prego para ferroviários, benefício mais tes sobre a regulamentação e organiza-
Por outro lado, nos anos 20, a luta per- tarde estendido a outras categorias. ção do trabalho. Sem dúvida, preocu-
sistente dos proletários começou a en- Criam-se as primeiras Caixas de Apo- pado em conter as tensões sociais e dis-
contrar eco na consciência progressista sentadorias e Pensões, em 1923 para os ciplinar as relações capitalistas de tra-
de juristas como Joaquim Pimenta e ferroviários, em 1927 para o pessoal balho, num momento em que a expan-
Evaristo de Moraes (autor, já em 1905, dos serviços públicos. Por indicação do são delas iria acelerar-se no País, Ge-
406
RR DFANBSB V8.GNC.AAA, 404/3331 an 00 2 ,P
149
Rua
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túlio intensificou a elaboração do di-

reito trabalhista sindical, desenca-

deando já em 1931 uma avalancha de

leis, decretos-leis, decretos e portarias

- mas ele apenas acelerava e coroava

um movimento legislativo e doutrinário

em curso desde 1917,

A obra getulista em matéria social

foi eminentemente contraditória:

reconhecem-se algumas reivindicações

dos trabalhadores, incorporam-se avan-

ços anteriores, mas perseguem-se as li-

deranças operárias independentes,

atrelam-se os sindicatos, proibem-se as

greves. Essa hábil mistura de paterna-

lismo e tutela fica patente ao se distin-

guir a legislação trabalhista em sentido

estrito da sindical, É na regulamenta-

ção das relações de trabalho que a CLT

abrigou alguns dispositivos benéficos

aos trabalhadores e que vinham sendo

reivindicados por eles há bastante

tempo e alguns até já haviam sido

parcialmente atendidos, como institui-

ção do salário mínimo e estabilidade no

emprego, jornada de 8 horas diárias, re-

pouso semanal e férias anuais remune-

Arquivo Nacional
radas, medidas de proteção ao trabalho

do menor e da mulher, criação do sis-

tema de seguro e previdência social, or-

ganização de uma Justiça específica e

mais rápida para resolver os conflitos

trabalhistas. Em contrapartida, a CLT

incorporou a proibição expressa do di-

reito de greve e consagrou o atrela-

EÉFEÃERÉÉE ªªª“|t ea |, P 4
mento final dos sindicatos ao Minis-
=iyo

ja

tério do Trabalho, de conformidade


4 e com as idéias corporativo-fascistas pre-

dominantes no governo de 1937 em

diante.

Compro Além disso, as medidas mesmo limi-


R 24 "“i—»“ < me bo s tas
tadas de proteção ao trabalhador, pre-
Ji & -
# 'Há Raso vistas na CLT, não se aplicavam aos
Papelas do.
* funcionários públicos (para os quais se-
L
a < |
riam criados estatutos próprios, sempre

lhes negando o direito de greve e de

sindicalização), aos trabalhadores ru-

a nd. rais (que só começariam a ter seus di-


.. *
reitos reconhecidos a partir de 1963) e

aos empregados domésticos (cujos di-

reitos só mais recentemente ainda co-

meçaram a ser reconhecidos, a partir

da Lei 5.859, de 1973, de autoria do en-


k x w
tão senador Franco Montoro); por-

tanto, não se aplicavam à maioria da

força de trabalho do País. E, com a en-


h:
trada do Brasil na Segunda Grande
Arquivo NaClonáI

i Guerra ao lado dos Aliados, boa parte


d k
dessas medidas protetoras deixaram de

.efa *o t 2 : ser aplicadas aos próprios empregados

5: sul 3 das ci CMR da indústria, comércio e sistema ban-

cário, em nome do "esforço de guerra"

No 1o de maio de 1943, Getúlio Vargas (no alto) anunciava a CLTpara uma multidão e da "batalha da produção".
Mais; a CLT, embora admita a possi-
de 100 mil pessoas reunida na Esplanada do Castelo, RJ (acima)
407
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, 84 O41 3a N 002, 2 124

bilidade de convenções coletivas de


trabalho, dá preferência aos contratos
individuais de trabalho, por muitos jus-
tificados em nome de uma pretensa li-
berdade de contratar das partes. Na
prática, confrontados isoladamente
com seus empregadores e premidos
pela urgência de obter um meio de sus-
tento, os trabalhadores não têm condi-
ções efetivas de influir na estipulação
das cláusulas contratuais a que se sub-
metem.

Portanto, se à CLT reconheceu al-


gus direitos básicos dos trabalhadores,
na realidade seus traços distintivos são
outros: o contrato individual de traba-
lho, que facilita a subordinação dos
empregados aos empregadores; uma
Justiça do Trabalho, tripartite, de inspi-
ração corporativista voltada para os
dissídios individuais, sempre mais difí-
ceis para os empregados; os impedi-
mentos ao direito de greve; e o atrela-
mento sindical ao Ministério do Traba-
lho. Assim fica evidente que sua preo-
cupação básica, como a de Getúlio ao
promulgá-la, não foi defender os traba-
lhadores, como apregoava o DIP, mas
preservar a ordem vigente e facilitar o
desenvolvimento capitalista, na forma
autoritária e marginalizadora de larga
maioria da população, que o distingue
até hoje no Brasil. Diante disso, muitos
trabalhadores cunharam o comentário
jocoso que fez carreira: "Se Getúlio foi F
um pai para os pobres, foi uma mãe
para os ricos". "As Leis SOcIAlsCOM OUE
Por estar tão adaptada às particulari- o ATUAL GOVERNO
dades e vicissitudes do desenvolvi- OR INICIATIVA PROPRIA,TEM
mento capitalista em nosso país, a CLT PROCURADO AMPARAr
permanece em vigor, em suas linhas es- AS CLASSES TRABALHADORA ©
senciais, há mais de 40 anos. Nos perio- S, DEVEM CONSTITUI E
Arquivo Nacio

dos de avanço da luta operária e de go-


MOTIVO DE ORGULHO PAR
vernos mais abertos, ainda foi possível A OS BRASILEIROS"
enxertar-lhe emendas progressistas,
como a abolição do "atestado de ideo-
Desde o anúncio da CLT, o esforço propagandístico do governo
logia" para candidatos a eleições sindi- de Getúlio Vargas se
deu sempre no sentido de mostrar, como no cartaz acima,
cais em 1952, a abertura para a síndica- as leis trabalhistas como
Jruto de sua iniciativa e generosidade pessoais
lização rural em 1962, a instituição do
13o salário em 1962 e do salário-família A CLT já sobreviveu ao naufrágio de vigorosa e persistente, é que depende
em 1963, ou ainda, em 1963, a aprova- três Constituições: a de 1937, a de 1946 basicamente a possibilidade de con-
ção do Estatuto do Trabalhador Rural. e a de 1967. Resistirá também aos ven-
Em compensação, durante o Regime quistar uma Constituição democrática,
tos democratizantes que se anunciam antiimperialista e socialmente avan-
Militar, se impuseram a fixação autori- com o fim do Regime Militar? Certa-
tária de reajustes salariais subestima- cada e, em seguimento a ela e no lugar
mente não lhe faltarão amigos e advo- da CLT de origem e inspiração fascis-
dos, a supressão do poder normativo da gados, para defender que seja apenas
Justiça do Trabalho, a legislação anti- tas, um autêntico Código do Trabalho,
reformada. O próprio regime mori- igualmente democrático, moderno e
greve; a criação do Fundo de Garantia bundo tentou essa manobra em 1978- socialmente avançado, como os justos
do Tempo de Serviço, que pratica- 79. Por isso, sem desprezar a contribui- anseios dos trabalhadores, há muito
mente eliminou o regime de estabili: ção de nenhuma corrente amiga ou
dade no emprego; ou a tentativa de tempo reprimidos, merecem e recla-
progressista, os trabalhadores, escalda- mam.
transformar os sindicatos em centros dos pelas lições passadas, precisam
assistenciais e recreativos. compreender que de sua luta, unitária,
Duarte Pereira
408
BR DFANBSB VB.GNCAMA, 3404133. â 009, pÃSo

REGIOES/NORDESTE: o "desenvolvimento" sob o Regime Militar

0 outro lado do progresso

A inegável modernização do Nordeste após 1964 não se refletiu em


melhores condições de vida para a população. Em 1984, mantinham-se a alta taxa
de mortalidade infantil e a exportação de mão-de-obra para outras regiões

A seca que se abateu sobre o Nor- rada, sem equipamentos e sem recursos recadado 16,4 mil toneladas de alimen-
deste nos anos 1877-79 foi de fato terri- para enfrentar a mais abrangente seca tos, pouco mais de 1,5 kg de comida
vel. Seus efeitos comoveram de tal ma- da história. para cada flagelado.
neira o imperador dom Pedro II que No seu auge, em 1983, ela atingiu Essas duas situações semelhantes,
ele afirmou: "Não restará uma única 1,126 municípios, numa área de 1,439 distantes mais de um século, não reve-
jóia na coroa, mas nenhum nordestino milhão de quilômetros quadrados.onde lavam, porém, o quanto o Nordeste ha-
morrerá de fome." viviam24!lmilhões de pessoas, das quais via mudado, especialmente após 1964.
Um século depois, as jóias da Coroa dez milhões foram consideradas flage- Os que chegaram ao poder com o
permaneciam intocadas num museu; os ladas, ou seja, perderam as plantações golpe podiam afirmar que tinham sido
nordestinos tinham morrido de fome ou empregos e passavam fome. bem-sucedidos seus esforços no sentido
em diversos períodos de seca e a região Sem jóias da coroa para vender, a de modernizar essa região do País,
vivia, de novo, drama semelhante, poderosa Rede Globo de Televisão re- principalmente aqueles que visaram a
Só que pior: dessa vez, o período de solveu apelar para uma campanha na- sua industrialização.
estiagem fora previsto pelo Centro cional visando arrecadar alimentos Entre 1960 e 1980, a economia do
Tecnológico Aeroespacial de São José para as vítimas da seca. Ao seu final, Nordeste cresceu, em média, apesar da
dos Campos-SP. E mesmo assim a re- após mobilizar os recursos técnicos e ocorrência de secas, 7,2% ao ano, uma
gião foi surpreendida, como nas situa- artísticos da Globo em todo o País, a taxa significativa por ser equivalente à
ções anteriores, totalmente desprepa- campanha Nordeste Urgente tinha ar- do País como um todo (7,3%). Apenas
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Abril Press
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Julio Jacobina/Abril Press


A modernização do NE criou contrastes gritantes. Enquanto certas
áreas, como as turisticas (à dir., praia da Boa Viagem, Recife,
PE), se beneficiavam do progresso, em outras a miséria
persistia (à esq., Alagados, Salvador, BA)

na década de 70, o montante de investi- trouxe para a região um grande nú- tros quadrados que receberia trata-
mentos da economia regional triplicou. mero de técnicos e profissionais de ní- mento governamental privilegiado.
E esse dinamismo privilegiou a econo- vel superior. Com isso se desenvolveu Até meados do século 20, o Estado
mia urbana. O setor industrial a indústria da construção civil e se es- brasileiro atuava no Nordeste segundo
expandiu-se 8,9% ao ano, no período palhou, no dizer do economista Fran-
a concepção de que a seca era o grande
1965-80, e o Nordeste quadruplicou sua cisco de Oliveira, um Northeast way of
problema da região. Ela causaria a po-
produção industrial em 20 anos. O pes- life em alguns bairros ricos das grandes breza e explicaria o atraso da econo-
soal ocupado na indústria dobrou entre cidades nordestinas. mia. Ao governo central caberia, por-
1960 e 1975, tendo quintuplicado na in- Os governos do Regime Militar não tanto, ajudar com créditos a juros sub-
dústria de bens de capital e de con- foram, porém, os primeiros a voltar sidiados, perdoando dívidas, garan-
sumo durável. A parcela da População suas atenções para a região nordes- tindo preços também subsidiados, fa-
Economicamente Ativa empregada na tina. zendo doações e, principalmente, au-
indústria quase dobrou, passando de
mentando os investimentos públicos na
7,8%, em 1960, a 14,9%, 20 anos depois, De 30 açudes propostos, somente
região.
quando menos da metade (49,1%) per-
um foi construído As grandes beneficiárias eram as oli-
manecia no antes dominante setor pri-
garquias locais, que tinham seu poder
mário. Aquela mesma seca que comoveu o bem alicerçado na estrutura econômica
E esse crescimento industrial se deu imperador provocou a criação de uma que o Nordeste herdara do período
principalmente nos setores dinâmicos, Comissão Imperial que recomendou, colonial, onde predominavam o latifún-
como metalurgia, mecânica, material como solução para o problema da re- dio e a monocultura de exportação.
elétrico e de comunicações. Em 1960, gião, a construção de três ferrovias, 30 As oligarquias aperfeiçoaram um
esses setores concentravam 30% do va- açudes e um canal ligando os rios São procedimento que veio a ser conhecido
lor de transformação industrial; em Francisco e Jaguaribe. De concreto re- como a "indústria da seca". A debili-
1974, já chegavam a 49,8%. O cresci- sultou o açude de Quixadá, no Ceará, dade da economia da região fazia com
mento médio anual do produto real do concluído em 1906, já no período repu- que qualquer abalo produzido por uma
período 1960-75 atingiu índices de blicano. seca, inundação ou queda de preço dos
15,8% na metalurgia, 33,6% na mecáê- Em 1909 foi criado o primeiro órgão produtos agrícolas pudesse ser apresen-
nica e 36% nos materiais elétricos e de estatal dedicado ao combate das secas: tada como uma "crise". Daí surgiam
comunicações, a Inspetoria de Obras-Contra as Secas pressões por ajudas provenientes do
Também no plano de consumo se re- (10CS). Depois de algumas transforma- governo central que eram apropriadas
gistraram profundas alterações. Do to- ções, ela tornou-se, em 1945, Departa- por essas oligarquias.
tai de domicílios da região, 98,7% ti- mento Nacional de Obras Contra as Se- Dessa maneira, a maioria dos açudes
nham fogão em 1980, contra apenas cas (DNOCS). construídos pelo DNOCS ficava em
79,4% em 1970, As residências com ge- Foi necessária outra grande seca propriedades particulares e as grandes
ladeira tinham passado de 9,2% para (1951-52) para que, no governo de Ge- fortunas do Nordeste sempre estiveram
23,8%, no mesmo período, e 50% dos túlio Vargas, surgissem O Banco do associadas ao exercício do poder polí-
domicílios urbanos tinham televisão, Nordeste do Brasil (BNB) e a delimita- tico, que se confundia com o controle e
em 1980, em comparação com os ção de um Polígono das Secas - pela a aplicação das verbas federais desti-
14,6% de dez anos antes. Lei no 1.348, de 10 de dezembro de nadas à região. Políticos como o sena-
O processo de industrialização 1951 -. uma região de 950 mil quilôme- dor Dinarte Mariz, do Rio Grande do

410

R DFANBSB VE.
GNCAAA &H 04/331an
(os á cá 153
er oransass 24043334 oo a, p 354

Celso Furtado (ao lado, sua posse na


Arquivo Nacional

SUDENE, 25/1/60, com o então ministro


da Justiça Armando Falcão) procurou
combater as causas não-naturais da
miséria no NE. Após 64, no entanto, o
órgão burocratizou-se e virou apenas um
"elefante branco" (abaixo, prédio da
SUDENE em Recife, PE)

Arlindo Marinho/Abril Press


Norte, representavam os interesses o plano propunha mudanças na econo- ram até o fim em aprovar o projeto; foi
desse grupo social. mia agrícola de tal maneira que a re- preciso uma greve de trabalhadores,
Em meados da década de 50, du- gião dependesse menos da monocul- que se espalhou da Bahia ao Mara-
rante o governo Kubitschek (195661) e tura açucareira, tivesse assegurada uma nhão, e o apoio de políticos progressis-
no bojo da teoria desenvolvimentista, oferta crescente de alimentos para os tas da região, como Miguel Arraes, en-
surge uma nova ótica para a questão centros urbanos e, com a criação de tão prefeito de Recife, para que hou-
nordestina. novas fronteiras agrícolas, pudesse em- vesse a aprovação da lei orçamentária
Os empresários do Sul do País, prin- pregar o excedente populacional da da SUDENE.
cipalmente de São Paulo, apontavam o zona semi-árida. Para criar os recursos necessários à
atraso do Nordeste como um dos maio- industrialização da região foi aprovada
res obstáculos à ampliação do mercado Criação da SUDENE enfrentou a Lei no 3.995/61, cujo artigo 34 autori-
interno, por excluir da economia cerca oposição de oligarquias locais zava as pessoas jurídicas a deduzirem
de um terço da população brasileira. até 50% do imposto de renda devido
A seca de 1958 seguiram-se saques e Para executar essa política de desen- para aplicá-los em indústrias no Nor-
invasões e crescia a pressão camponesa volvimento para a região foi criada, deste. O artigo 18 da Lei no 4.239, de
pela terra, materializada na multiplica- como agência governamental, a Supe- 1963, estendeu esse direito às empresas
ção de ligas camponesas e sindicatos rintendência do Desenvolvimento do estrangeiras. Esse mecanismo se popu-
rurais. O desenvolvimento da região Nordeste (SUDENE), pela Lei no 3.962, larizou com o nome de 34/18.
parecia o antídoto indicado para uma de 15 de dezembro de 1959. As podero- O fato de que a ligação rodoviária do
possível "explosão social". sas oligarquias locais, como era de se Nordeste com o Centro-Sul fosse com-
Como resultado desse tipo de pres- esperar, percebendo que o projeto vi- pletada, com a conclusão da rodovia
sões, em 1956 o governo criou o sava fortalecer uma burguesia indus- Rio-Bahia em 1963, na mesma época
Grupo de Trabalho para o Desenvolvi- trial nordestina que viria a disputar em que se iniciava a implementação da
mento do Nordeste (GTDN). Em 1959, com elas o controle político e econô- estratégia defendida pela SUDENE,
já sob a direção do economista Celso mico da região, fizeram violenta oposi- poderia ser tomado como símbolo da
Furtado, essa comissão elaborou o do- ção ao novo órgão. Essa resistência só impossibilidade de realizar aquele de-
cumento "Uma Política para o Desen- se intensificou quando no Primeiro senvolvimento mais autônomo da re-
volvimento Econômico do Nordeste". Plano Diretor da SUDENE ficou evi- gião, proposto por essa agência gover-
Esse foi o primeiro documento go- dente que os recursos destinados à re- namental.
vernamental que atribuía causas não gião teriam sua aplicação orientada A grande indústria oligopolista, na-
naturais ao subdesenvolvimento da re- pelo próprio órgão, pondo fim à pul- cional e estrangeira, tendo conseguido
gião, que era explicado como produto verização desse dinheiro em inúmeras consolidar sua posição no País a partir
da forma como se deram o povoa- obras locais, que eram a característica da região Sudeste, iniciava o violento
mento e a exploração de recursos. O essencial da "indústria da seca". Utili- processo de constituição do mercado
documento designava ao Estado a ta- zando sua força no Congresso Nacio- nacional, o que significava expansão do
refa de provocar ali transformações nal, essas oligarquias atrasaram em dois comércio inter-regional, transferência
econômicas que apontassem para o anos a aprovação da lei orçamentária de capitais e, finalmente, possibilidade
desenvolvimento da região. Garan- da SUDENE, que só foi aprovada em de mobilizar mão-de-obra em escala
tindo a intensificação dos investimen- 14 de dezembro de 1961, já no governo nacional.
tos industriais, o projeto deveria conso- Goulart. Políticos como o governador O mecanismo 34/18, proposto e de-
lidar um novo centro dinamizador da de Pernambuco no período 1958-62, fendido pelos grupos econômicos do
economia e absorver um grande con- Cid Sampaio, representando os interes- Nordeste, por sua própria lógica in-
tingente de mão-de-obra. Em seguida, ses de setores das elites locais hesita- terna favorecia as empresas detentoras

411
sr oransss S404) 331 an 00da ,pI55

Em várias áreas do NE
se instalaram indústrias
que geraram poucos
empregos a exemplo
de Camaçari. BA (à dir.,
o Complexo
Petroquímico).
Em consegiuência,
grande parte da

Luciano Andrade/Abril Press


população continuou Gildo Lima/Abril Press
trabalhando, durante as
secas, nas frentes de
trabalho da SUDENE,
como em Itapicuru, BA
(ao lado) E

de grandes capitais e grandes lucros trial regional saltou de 16%, em 1950, não conseguia atender as necessidades
para aplicar, via incentivos fiscais, Os para 42%, em 1975. alimentares de sua própria população.
empresários regignais se viram sufoca- Também esse processo não servia Metade de sua produção agrícola
dos pelas multinacionais que penetra- para incentivar a renda em outras ativi- destinava-se à exportação (principal-
ram no Nordeste: Plumbum, Brasilit, dades, Uma pesquisa SUDENE/BNB, mente cana-de-açúcar e cacau) e a re-
Five Lives, Firestone, Good Year, Wa- de 1978, revelou que a indústria incen- gião abastecia-se em outras áreas do
lita, Nestlé, General Foods, Coca-Cola, tivada importava de fora da região, em País até de produtos da dieta básica,
Philips, Ford, etc. Fortaleceram-se média, 48% dos insumos que transfor- como milho, feijão, batata, legumes,
políticos como Luiz Viana Filho, que mava. Essa porcentagem chegava a carne e leite. Daí os índices de au-
governou a Bahia de 1967 a 1971, 90% na indústria de material elétrico, mento do custo de vida de suas princi-
quando implantou o Centro Industrial 70% na metalurgia, 80% na mecânica e pais cidades serem elevados - eram
de Aratu, oferecendo incentivos e favo- 83% na de matérias plásticas. E 58% de "movidos a petróleo".
res aos empresários nacionais e sua produção eram vendidos fora do Sua mão-de-obra era a mais mal
estrangeiros. Nordeste, sendo 15% no Exterior. paga do País. Em 1980, antes de se
As oligarquias ligadas à economia Não se podia, assim, cumprir um dos aprofundar a crise econômica, 64% das
agrária, com o golpe militar de 1964, principais objetivos da estratégia elabo- pessoas ocupadas ganhavam até um sa-
puderam reprimir o campesinato que rada pelo GTDN - absorver a mão-de- lário mínimo. Esses sub-remunerados
se organizava e conservar um poder de Obra excedente da região -, pois as formavam 82% da mão-de-obra agri-
pressão tal que, mesmo tendo de dividir empresas, como indústrias modernas, cola e 51% dos operários da indústria
sua liderança com as novas forças eco- faziam uso não-intensivo de mão-de- de transformação.
nômicas emergentes, garantiu que a obra, E, forçando com sua presença
modernização da atividade agrícola se um aumento da produtividade média, Com 30% da população do País,
fizesse sem alterar a estrutura de pro- provocaram o reequipamento e moder- o NE tinha 50% dos analfabetos
priedade da terra e, mais ainda, que a nização de indústrias tradicionais da re-
zona de novas fronteiras agrícolas fosse gião, como a têxtil, que, em 1980, em- Nas duas décadas que se seguiram ao
apropriada de forma tradicional, em pregava menos da metade do número golpe militar de 1964, o Nordeste so-
grandes latifúndios. de operários de 30 anos antes, reduzido freudiversas mudanças que o integra-
O processo de industrialização que de 80 mil para 38 mil. O Projeto Nor- ram profundamente na economia na-
resultou desse conjunto de fatores teve deste, documento elaborado por uma cional, Mas, ao se iniciar a década de
um impacto social limitado na região comissão interministerial, nos primei- 1980, seus indicadores sociais ainda
nordestina. No início da década de 80, ros anos da década de 80, constatava mostravam que as condições de vida de
o parque industrial que ali se instalara taxas de desemprego e subemprego da sua população eram piores que na mé-
estava articulado com o do Sudeste e ordem de 45%. é dia do País.
com o internacional, com os quais Dessa forma, a modernização a que Embora 30% da população brasileira
mantinha uma relação de complemen- se viu submetida a região não impediu vivessem no Nordeste, a região concen-
taridade, mas permanecia pratica- que persistissem seus graves problemas trava mais da metade dos analfabetos
mente desligado do resto da economia sociais, Ela manteve seu tradicional pa- com mais de dez anos; 63% da popula-
nordestina. pel de reserva de mão-de-obra para o ção com deficit de calorias; 45% dos
resto do País - 3,4 milhões de pessoas trabalhadores que recebiam até um sa-
Em 1980, metade da população foram expulsas do Nordeste no período lário mínimo; e 54% dos que recebiam
do NF vivia na zona urbana 1960-80. E, como a forte concentração apenas metade desse valor. O nordes-
da propriedade da terra se manteve, o tino tinha uma esperança de vida (52
Não foram as indústrias produtoras êxodo rural dentro da própria região anos) inferior em dez anos a um mora-
de bens de consumo final, que podiam provocou o intenso crescimento das dor do Sudeste e a mortalidade infantil
ser consumidos pela população, que se grandes cidades. Em 1980, mais da me- era quase 40% maior. Sua renda per ca-
desenvolveram. Cerca de dois terços tade da população do Nordeste vivia na pita era igual à metade da brasileira e a
dos investimentos realizados através zona urbana. O número de habitantes um terço da verificada na região Su-
de incentivos fiscais na região se dirigi- de Salvador e Fortaleza triplicara e o deste. E a renda no Nordeste era mais
ram para a indústria de bens interme- de Recife mais que dobrara em duas concentrada. Foi sobre uma região
diários, que são consumidos por outras décadas, com esses problemas que se abateu,
indústrias. A participação dessa indús- Sendo responsável por 20% da pro- nos primeiros anos da década de 80,
tria no valor da transformação indus- dução agropecuária do País, a região uma das maiores secas da história.
412
a, pI56
A, 4041334 anOo
BR DFANBSBVB.GNCAM

viam mudado algum dia e viviam fora


do município onde nasceram. E
É verdade, entretanto, que o movi-
mento mais expressivo da população
brasileira tem sido, de modo geral, na
direção dos campos para as cidades.
Entre as regiões, no entanto, o Nor-
deste foi a que mais perdeu gente. Em
1872, era a região mais populosa do País:
46,7% dos brasileiros ali viviam. O
êxodo contínuo, porém, levou a área a
ter,em 1980,menos de 30% do totaldeha-
bitantes do País. Nesse período, en-
quanto a população do Nordeste teve
Irmo Celso/Abril Press

um crescimento absoluto de oito vezes,


a do Sudeste cresceu 22; a do Sul, 28; e
a do Centro-Oeste, 41 vezes. Outro in-
dicador: em 1940, cerca de 5% das pes-
soas naturais do Nordeste viviam fora
é da região, proporção essa que não pa-
O Norte e o Centro-Oeste, que antes recebiam parte do fluxo migratório do NE, rou de crescer. Em 1960, 11% dos nor-
passaram, a partir dos anos 60, a receber também migrantes da região Sul. Abaixo, destinos viviam noutras plagas, em
embarque de migrantes em Cascavel, Paraná; no alto, chegada de uma família em 1970, já eram 13% e, em 1980, chega-
Vilhena, Rondônia vam aos 17%.
Já o segundo grande fluxo migra-
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO: os processos migratórios tório, o que parte do Sul - com pólo no
Paraná - rumo ao Oeste, Norte e Su-
A deste, tem apenas duas décadas. O Pa-
raná era uma região para onde conver-
um povo n o m a d e giam migrantes até o início dos anos 60.
Nas quatro décadas anteriores, a popu-
S praia lação do Estado cresceu vertiginosa-
Desde 1500, a população do País não parou de se deslocar. mente. Entre 1920 e 1960, sua popula-
atraíam a migração,
Nos anos 80, dois pólos frontci os centros , SãO foi multiplicadapor seis (de 685 mil
icola para 4.262 mil habitantes), enquanto a
urbanos do Sudeste e a fronteira agrico do Brasil como um todo pouco mais

Se uma civilização extraterrestre es-


tiver observando, há pelo menos um sé-
culo, o que se passa com os seres hu-
manos que habitam o lado oriental da
América do Sul, deve certamente ter
chegado a uma conclusão: a região do
planeta chamada Brasil é habitada por
um povo nômade.
De fato, a população brasileira não
parou de se deslocar, desde quando os
portugueses aqui desembarcaram, há
quase 500 anos, dando um primeiro
"chega-pra-lá" nos índios. Tomado o li-
toral pelos brancos, o movimento, no
entanto, não parou.
As estatísticas populacionais existen-
tes desde o final do século passado per-
mitem concluir, entre outras coisas,
que aconteceram dois grandes fluxos
migratórios no País. O mais impor-
tante, e mais antigo, é o que se dá a
partir do Nordeste via Minas Gerais,
em direção ao Sul do País e, em meno-
res proporções, ao Norte e ao Centro-
Oeste. O segundo fluxo, mais recente, é
o que parte do Sul rumo ao Centro-
Nani Gois/Abril Press

Oeste e ao Norte e, secundariamente,


faz uma "marcha à ré", em direção ao
Sudeste. Resultado dessas andanças:
em 1970, pelo menos um terço dos 23
milhões de brasileiros de então já se ha-
413
BR DFANBSB 24041934 8nCO 2 , Pp I5%

que duplicava. Entretanto, nos anos 70, xada pela industrialização mais intensa (Gan./fev. de 1984), apesar do apelo da
o Paraná apresentou a menor taxa de do Sul-Sudeste. A vertente que foi em migração para as cidades, as popula-
crescimento demográfico do Pais - direção ao Norte e Centro-Oeste foi ções rurais do Brasil também apresen-
0,94% ao ano, bem inferior ao que seria atraída pelos imensos espaços vazios, tam constante movimento migratório
de se esperar pelo crescimento vegeta- para expandir a fronteira agrícola. O para novas áreas agrícolas. Segundo
tivo. Ou seja, o Estado também come- Paraná também atraiu migrantes en- ela, "a fronteira agricola brasileira ca-
çou a esvaziar-se, com exceção das re- quanto foi uma área de fronteira agri- minhou nos últimos 20 anos ao longo
giões em torno de Londrina e do Norte cola. Entretanto, o campo paranaense - de duas grandes frentes de penetração:
do Estado. Em 1980, 1,1 milhão de pes- como de resto, toda a região Sul - se a primeira, que chamamos de "sulista",
soas que viviam no resto do País decla- tornou produtor intensivo de itens de compõe-se de um fluxo de migrantes
raram ter emigrado do Paraná nos últi- exportação, especialmente soja, café e oriundos principalmente das regiões
mos anos, A esta última grande cor- cana; o sistema tradicional de produ- Sul e Sudeste, bem como de nordesti-
rente migratória se deve acrescentar ção agrícola, baseado na pequena pro- nos "reciclados". Tem penetrado na
outra, não tão volumosa, mas significa- priedade familiar, foi substituído pelas Amazônia através do Centro-Oeste,
tiva: o deslocamento, dentro da região grandes propriedades mecanizadas, dis- hoje, dirige-se prioritariamente para
Sudeste, de mineiros e capixabas em di- pensando um contingente de mão-de- Rondônia e Mato Grosso. A outra, que
reção a São Paulo e Rió de Janeiro. obra que não pôde ser completamente chamamos prosaicamente de outros mi-
absorvido pela indústria. grantes", compõe-se de um fluxo predo-
No Sul, a mecanização acaba minantemente nordestino; no entanto,
com & pequenás propriedades Havia migração também para as incluiu também capixabas e migrantes
novas áreas agrícolas de outras partes do País. Tem pene-
Mas quais foram as forças que deter- trado na Amazônia geralmente através
minaram esses. deslocamentos? A velha De acordo com artigo da economista do Pará e já se defronta com o fluxo su-
corrente migratória nordestina foi em- Anna Luiza Ozório de Almeida, da lista na região marcada por conflitos do
purrada pela concentração crescente Universidade Federal do Rio de Ja- leste mato- grossense e sudeste do Pará".
da posse da terra no Nordeste, e pu- neiro, publicado na revista Ciência Hoje

A população no Brasil (regiões)


Os dois fluxos

1972-1985 Primeiro, os migrantes salam principalmente do Nordeste, vítimas


da concentração da propriedade da terra e das secas, atraídos pelas
indústrias do Sudeste. Depois, o fluxo mais intenso passa a ser no
Participação das regiões no sentido do Sul para o Centro-Oeste e Norte, esvaziando
notadamente o Paraná
SUDESTE total da população brasileira,
] ss.7x

em % (1872-1985)
& NORDESTE
%!
Jas.ox
] se.s*

] 39%
]a3.7%
] a3.0%
Ja2.*
] az.ex

IEDES
]404%

|ae.7x
|se.7%
Jas.ox
fase
_Jsrex

Nordeste
| 30.2x
__ 29,0%
|28.5x

CENTRO-OESTE
8.7%
L:.“
]s:
]a2*
1960
isax]

Sudeste
Fonte: FIBGE
02 58
BR DFANBSB VB.GNCAMA, 3404/4331 20

ECONOMIA/ENERGIA : a evolução do Proálcool ampliação das destilarias, de até dois


anos, quando anexas a uma refinaria de
açúcar, ou mais, quando autônomas.
Entre 1977 e 1979, houve expansão
Uma solução-problema satisfatória da produção e o País conse-
guiu chegar ao limite de 20% na adi-
ção de álcool à gasolina em pratica-
Juntamente com a economia de divisas, o Programa mente todo o território nacional. A
Nacional do Álcool trouxe poluição, competição entre partir daí, o Proálcool passaria para
uma segunda fase, a produção de vei-
culturas e fortalecimento da concentração fundiária culos movidos apenas a álcool hidra-
tado (combinado com água).
A mesma falta de previsão das con- Inicialmente, porém, essa proposta
dições econômicas futuras que levou o enfrentaria a oposição da indústria au-
Brasil a chegar aos anos 80 enterrado A energia do álcool tomobilística. A Volkswagen, cuja ma-
numa fantástica dívida externa esteve triz, na Alemanha, estava desenvol-
presente nos primórdios do desenvolvi- Em dez anos, a participação do vendo motores movidos a metanol, se-
mento do Programa Nacional do Al- álcool! como fonte energética ria especialmente crítica ao programa.
cool (Proálcool), iniciado em 1973 para multiplicou por cinco Mas a queda nas vendas de veículos,
promover a substituição de combusti- Produção de álcool! de cana, em mil ma, causada pelos aumentos de preço da
veis derivados do petróleo pelo álcool, e sua participação no total do consumo gasolina e pelas demais medidas restri-
diante das bruscas elevações do preço final de energia, em % (1973-84) tivas ao consumo adotadas pelo go-
do óleo cru por parte dos países produ- verno, se encarregaria de fazer mudar a-
tores. Embora as primeiras propostas opinião da indústria automobilística,
para sua utilização como carburante te- levando-a a voltar-se para o álcool
nham surgido juntamente com o motor PRODUÇÃO CONSUMO FINAL como a única salvação.
ano TOTAL PE ENERGÉTICO
a explosão e apesar de o País adicionar ÁLCOOL Rapidamente, a produção de carros
álcool à gasolina desde 1939, para regu- em 1.000ma em 1.000ma em% a álcool ultrapassou todas as expectati-
lar os estoques de açúcar - com éxce- 1973 441 309 0,5 vas, mesmo antes que diversos proble-
1974 403 190 0.4
ção do período da Segunda Grande 1975 383 162 94 mas técnicos fossem superados, adqui-
Guerra, quando a mistura era feita de- 1976 421 172 03 rindo um ritmo superior ao do cresci-
1977 984 639 07
vido às dificuldades de abastecimento 1978 1.607 1.506 1,2 mento da capacidade de produção de
-, somente em 1977 se verificaria um 1979 2.037 2.235 1.5 álcool. Com a perspectiva de escassez
1980 2.542 2.682 1,8
aumento significativo na produção 1981 2.794 2.538 1.6 de álcool em fins de 1980, e com as his-
1982 3.952 3.695 F
desse combustível. E esse atraso na 1983 5.408 5147 29 tórias cada vez mais comuns de proble-
principal resposta brasileira ao "cho- 1984(*) 9.100 6.500 - mas de manutenção nos automóveis, o
que do petróleo" aconteceu, entre ou- movimento inverteu-se e houve uma
tros motivos, em razão da falta de inte- (*) Estimativa Sociedade dos Produtores de Açúcar fuga em massa do carro movido a com-
resse dos usineiros, fascinados até 1975 e de Álcool (SOPRAL) bustível vegetal. Em seis meses, a
pelos altos preços do açúcar no mer- FONTE: BEN-1984, exceto para 1984 venda desses veículos caiu de Sómil
Fonte: BEN-1984, exceto para 1984
cado internacional, e da demora na para duas mil unidades por mês.

A utilização do álcool no
País esteve longe de ter
constituído um processo
ordenado e racional.
Apesar de o choque dos
preços do petróleo ter
ocorrido a partir de 73,
foi só em 77 que a
alternativa do álcool
passou a se concretizar.
Isso porque as usinas
(ao lado) estavam
fascinadas com os altos
preços que o açúcar
conseguia no mercado
internacional.
O álcool, além disso, foi
lançado sem a prévia
solução de seus
problemas técnicos e de
poluição e acabou
lrmo Celso/Abril Press

consolidando a opção
rodoviária, em
detrimento de ferrovias
e hidrovias

415
despejos nos cursos d'água provocaram
mortandade de peixes e contaminação
em grandes extensões. Com a vigência
de legislação restritiva a essa prática, os
casos diminuiram.
Já o problema fundiário resultante
do estímulo à produção de álcool é de
outra natureza: uma destilaria típiica,
que produz 180 mil litros por dia, ne-
cessitava, nos anos 80, de oito a dez mil
hectares de cana; dada a estrutura da
agroindústria caravieira no Brasil, isso

" J. Albuquerque
levou à concentração de terra. Por ou-
tro lado, como a safra é de 180 dias, ha-
via tendências à utilização de mão-de-
obra temporária - bóias-frias - aumen-
tando os problemas sociais no campo.
Uma última questão era a competi-
ção entre cana-de-açúcar e outras cul-
turas, especialmente de alimentos, não
apenas em termos do uso das terras,
mas também em recursos humanos, ge-
renciais e financeiros; em particular, a
cana competia com a produção de ali-
mentos tanto para consumo interno
quanto para exportação., Até meados
dos anos 80, a área plantada com cana
havia crescido cerca de dois milhões de
hectares, enquanto a produção de
grãos marcava passo.

Cálculos indicavam triplicação da


produção até o ano 2000

Tecnicamente, 0 Proálcool foi um su-


cesso. Na safra 1984-85 foram produzi-
dos nove bilhões de litros, ou cerca de
J. Albuquerque

120 mil barris equivalentes de petróleo


por dia; novas tecnologias permitiram
reduzir em seis vezes ou mais o volume
de vinhoto produzido. Os automóveis a
Os custos sociais da opção brasileira pelo álcoolforam altos. De um lado, aumentou a álcool resolveram seus problemas téc-
extensão da monocultura canavieira (ao alto) e, por outro, agravou ainda mais a nicos e o álcool estava efetivamente
situação dos boias-frias (acima) deslocando a gasolina (mas não o die-
sel, combustível responsável pela maior
Em março de 1982, abaixou-se a re- velha aristocracia do açúcar, seguiam parte do transporte de cargas no País),
lação de preços álcool-gasolina, deram- mais ou menos a reboque, mas sufoca- Projeções efetuadas, levando em
se descontos na Taxa Rodoviária Única dos pela baixa produtividade e pelos al- conta a manutenção do programa, indi-
(TRU) paga pelos proprietários de au- tos custos. Assim, no Centro-Sul, a pro- cavam, para o ano 2000, uma triplica-
tomóveis e incentivos especiais para tá- dução de um litro de álcool custava, ção ou quadruplicação da produção de
xis a álcool e montou-se uma campa- em 1985, 25 a 35 centavos de dólar, en- álcool; nesse caso a cana-de-açúcar
nha publicitária para mostrar que ha- quanto no Nordeste esse custo estava ocuparia cerca de dez milhões de hec-
viam sido resolvidos os problemas me- ao redor de 50 centavos por litro. tares, entre açúcar e álcool, A título de
cânicos. Ao mesmo tempo, o aumento Como o preço do álcool na bomba es- comparação, isso é pouco menor que a
da capacidade de produção de álcool tava, no mesmo ano, em torno de 35 área plantada com milho no País em
afastava o espectro da escassez. Os re- centavos de dólar o litro, o subsídio de 1984 (12,2 milhões de hectares) e equi-
sultados foram rápidos e, em 1984, os milhões de dólares só existia então, vale à soma das áreas de arroz e feijão
veículos a álcool dominavam larga- grosso modo, para os usineiros nordesti- (10,6 milhões de hectares). Isso não sig-
mente (80% a 90%) a venda de automó- nos. nificava que os alimentos seriam neces-
veis novos. Outra questão ligada ao álcool é a da sariamente deslocados na mesma pro-
Mas o Proálcool não tinha apenas poluição ambiental: o vinhoto - resi- porção, mas o programa do álcool não
sucessos a relatar. A agroindústria do duo líquido da destilação - e as águas podia crescer indefinidamente, e seu
açúcar não era homogênea. Os usinei- de lavagem da usina são poluidores crescimento devia ser compatível não
ros paulistas comportavam-se como muito ativos. O grande volume de vi- apenas com uma política energética
empresários modernos, buscando cons- nhoto - com a tecnologia tradicional, global, mas com uma política agrária e
tante melhoria da produtividade e tes- para um litro de álcool são produzidos agrícola dentro de um projeto coerente
tando aperfeiçoamentos tecnológicos, de 13 a 16 litros - exacerba o pro- de desenvolvimento.
enquanto os do Nordeste, herdeiros da blema. Assim, no início do Proálcool, João Lizardo:
416
BR DFANBSB VB.GNCAAA, 8404) 224 an (o 2,
p 159
BR DFANBSB VB.GNC.AAA, S40413 a 4 ânco0a, o IGO

"Agência O Globo
Biblioteca Nacional

Agência O Globo
Miguel Lemos: divulgador do pensamento O padre jesuíta Henrique Vaz: uma Emanuel Carneiro Leão: escritos sobre
de Comte junção do cristianismo com dialética Martin Heidegger

CULTURA/FILOSOFIA : a evolução das idéias mais generalizada, de que a qualidade


da argumentação não tinha nenhuma
importância: o que contava era a quali-
dade - o poder - de quem estava no
Asas cortadas palco da política e da cultura. A filoso-
fia sofria pressões instrumentalizado-
ras. Para que empenhar-se em ter ra-
Questionada até então acerca de seu valor utilitário, zão, se isso não valia de nada, se o que
realmente importava era ter força?
somente nos anos 50 a filosofia brasileira começa a Para que tratar de articular laboriosa-
recuperar o espaço que lhe é próprio mente o pensamento e desenvolver sua
capacidade de persuasão no confronto
Quem somos nós? Para onde vamos? de estudos e discussões, depende de es- sério de correntes de interpretação di-
Quais são, exatamente, as responsabili- forço e disciplina. A mani- versas? Valia mais a pena investir as
dades que temos, uns em relação aos festa espontaneamente, no pensamento energias intelectuais na preparação e
outros? O que devemos considerar cotidiano, mas, para produzir todos os execução de "golpes"pragmaticamente
como essencial na nossa vida? Em que seus frutos, demanda um laborioso capazes de derrubar os adversários, os
medida podemos confiar nos nossos aprendizado. E esse aprendizado, por rivais.
conhecimentos? Essas e outras ques- sua vez, requer investimentos; sua im-
tões de natureza filosófica têm-se colo- portância precisa ser efetivamente re- Os debates se davam em torno de
cado no caminho dos brasileiros mais conhecida pela sociedade. posições predeterminadas
ou menos com a mesma insistência de- Quais têm sido as condições propor-
safiadora com que se têm apresentado cionadas pela sociedade brasileira à fi- O público que podia acompanhar as
a todos os povos do mundo. losofia? Dificilmente elas poderiam ter polêmicas era muito reduzido, e os
Por serem muito amplas, muito ge- sido mais hostis do que foram. As clas- poucos cidadãos a que os debatedores
rais, as questões de que se ocupa a filo- ses dominantes nunca se preocuparam se dirigiam já tinham posição tomada,
sofia desbordam do campo particular com problemas estratégicos: bastava- estavam filiados a um ou ao outro dos
de cada ciência e nos põem em contato lhes improvisar medidas paliativas, ma- dois lados em choque: ou não aceita-
com a infinitude do real, com a irredu- nobras táticas de efeito imediato. Uma riam nunca o pensamento exposto ou
tibilidade do real ao saber. Os homens estrutura elitista e rudemente autori- já o tinham aceitado previamente. O
são levados a buscar respostas nas ciên- tária mantinha as massas populares que importava então era o impacto e
cias (ou na religião), mas as perguntas desorganizadas, impossibilitadas de não a solidez do raciocínio. A "tor-
reaparecem sempre, numa clara de- participar nos processos em que se de- cida" esperava jogadas brilhantes ou
monstração de que se referem a pro- cidiam as grandes questões nacionais. truculentas e os jogadores tratavam de
blemas que não admitem soluções defi- Tanto a vida política como a vida cultu- lhe dar o que ela queria: piruetas retóri-
nitivas. ' ral giravam em torno de um número cas, esquemas simplistas, sarcasmo
Não é preciso ser um sábio para filo- extremamente reduzido de pessoas. As grosseiro, insultos.
sofar. Todos filosofamos, quando pro- controvérsias não se aprofundavam A crítica de idéias escorregava facil-
curamos fundamentar nossas opiniões teoricamente, porque ficavam marca- mente para as ofensas pessoais. Jorge
sobre a vida em geral, sobre o mundo, das pela estreiteza de horizontes dos Amado ridicularizava as "gordas náde-
sobre o futuro da humanidade, sobre o grupos oligárquicos e das pequenas gas" de Gustavo Barroso. Luis Carlos
que é justo e injusto. Mas o aprofunda- confrarias de privilegiados. Prestes chamou Juarez Távora, no co-
mento da reflexão filosófica depende Difundia-se a convicção, cada vez meço dos anos 30, de "imbecil" e de
417
Br DFranBsa va.encaa. p J6]

João Bittar/Abril Press


ar eoug&y/p|egoau1 opjeuoy
Carlos Nelson Coutinho: da crítica literária ao ensaio político, a Marilena Chauí: a reunião do pensamento consagrado de
influência de Lukacs e de Gramsci Espinoza com inovações do francês Claude Lefort

"safadissimo", sem que ocorresse a gir e procuravam ser originais, a ideolo- dos esforços metódicos dos nossos pen-
qualquer dos seus contemporâneos gia dominante os desviava para inócuas sadores.
observar-lhe que havia incoerência no combinações ecléticas ou os seduzia Um exemplo disso? Machado de As-
xingamento, já que a safadeza, em grau com máscaras bizarras provincianas. E sis. Se compararmos os "momentos" fi-
superlativo, exige uma esperteza que é depois essa mesma ideologia domi- losóficos de Machado ao tratado que
incompatível com a imbecilidade. nante tratava de convencer o grande seu contemporâneo Farias Brito
Vivia-se numa sociedade na qual as público com a tese de que tudo aconte- (1864-1917) dedicou à Finalidade do
idéias valiam muito menos pelo conhe- cia porque o brasileiro não tinha "voca- Mundo, não poderemos deixar de cons-
cimento que podiam proporcionar do ção para a filosofia". tatar que o pensamento do autor do
que por seu uso "pugilístico" (ou como Quincas Borba está mais vivo que o do
instrumento para obtenção de presti- Pressionada, a filosofia deslocou- outro. Também o poeta Carlos Drum-
gio). O imediatismo, o utilitarismo e o se para a literatura mond de Andrade pode ser lembrado
pragmatismo cultivados pela ideologia para confirmaro que dizemos: os frag-
dominante cortavam as asas da teoria, Apesar de toda essa pressão hostil, a mentos de filosofia que se acham em
tornavam a reflexão incapaz de grandes filosofia não desapareceu da vida cultu- sua obra parecem bem mais instigantes
vôos. A ideologia dominante interpe- ral brasileira. Nossos intelectuais, ao lon- que as idéias sistematizadas pelo douto
lava, cinicamente: "Para que serve a fi- go dos séculos, abordaram temas filo- jesuita Leonel Franca (1893-1948).
losofia?" Se não servia para nada - se sóficos. Os que insistiram em fazê-lo de Nestas últimas três décadas, com o
não se dispunha a servir - era caracteri- forma sistemática expuseram suas surto de desenvolvimento capitalista,
zada como pura perda de tempo. O sis- idéias à erosão do ambiente adverso e estão surgindo possibilidades novas
tema que roubava o espaço em que a não conseguiram nos legar grandes rea- para a filosofia no Brasil; ela está lu-
filosofia podia florescer tinha o des- lizações. Independentemente de sua tando para recuperar o terreno que lhe
plante de condená-la por não possuir coragem cívica, o materialista baiano é próprio. Está mostrando vitalidade e
um espaço próprio. Domingos Guedes Cabral (1852-83) ambição. Alguns êxitos que ela já ob-
Essa situação, evidentemente, teve não nos ajuda a compreender melhor teve são animadores: o pensamento,
reflexos muito negativos sobre a elabo- as relações entre o cérebro e o pensa- entre nós, está se universalizando.
ração filosófica entre nós. Acumu- mento. O franciscano Mont' Alverne Um estudioso europeu, hoje, teria
lavam-se os obstáculos nos cami- (1784-1858) não acrescentou nada às certamente algo a aprender lendo, por
nhos daqueles que procuravam criti- idéias - que, em si mesmas, já eram exemplo, escritos de Gerd Bornheim
car as falácias da linguagem, as ilusões pouco significativas - do francês Victor sobre Sartre, de Marilena Chauí sobre
do dado, os enganos da aparência. Cousin. Miguel Lemos (1854-1916) se Espinoza, de Carlos Nelson Coutinho
Tanto os católicos tradicionalistas limitou, no essencial, a divulgar o pen- sobre Gramsci, de Bento Prado Júnior
como os positivistas de diversos matizes samento de Comte. sobre Rosseau, de José Arthur Gian-
revelaram-se incapazes de apreender Mas a filosofia, reagindo contra essa notti sobre Marx, de Emanuel Carneiro
toda a riqueza das mediações e toda a erosão, se deslocou para um terreno Leão sobre Heidegger, ou de Henrique
complexidade das contradições da onde não podia se desenvolver de Cláudio de Lima Vaz sobre Hegel. Mas
nossa realidade. forma sistemática, porém conseguia so- o que é mais importante é que os brasi-
Os nossos filósofos ficavam, com fre- breviver: foi acolhida nas artes e na lite- leiros, lendo esses nossos compatriotas,
quência, reduzidos à condição de epi- ratura. E o resultado é que as obras de poderão ver a filosofia alçando vôo,
gonos dos pensadores europeus, diante alguns artistas e escritores brasileiros com asas novas.
dos quais eram levados a assumir pos- apresentam acenos filosóficos que che-
tura reverencial. Quando tentavam rea- gam a oferecer interesse maior que o Leandro Konder
418
IJG2
er oransss 44041334 ânco2,p

gem prioritária no Primeiro, todas as


noções do público advém da visão
que dessa parte do mundo fazem as
empresas jornalísticas do mundo capi-
talista desenvolvido. Daí o desprezo pe-
los interesses de cada país e a ênfase na
visão do mundo subdesenvolvido a par-
tir do rio Potomac, que corta Washing-
ton.
Contudo, não tem sido apenas essa
Ótica a falsificar as visões e os conceitos
de nossos concidadãos sobre os proble-
mas que afetam nossos próprios países.
Um dos exemplos mais escandalosos da
distorção da realidade é a visão que nós
brasileiros tivemos durante décadas, ou
mesmo durante um século, da figura de
Artigas, o libertador das Américas, por
efeito de um conceito errôneo que dele
Iconographia

lizeram os marxistas de primeira água.


As formulações de Artigas, muito mais
libertárias do que os pensadores e ana-
listas do século 19 julgaram, foram ig-
A diplomacia latino-americana sempre serviu os EUA, apesar da oposição popular noradas por revolucionários do século
(acima) a atos como a ação da OEA na República Dominicana em 65 20,

POLÍTICA/RELAÇÓES EXTERNAS: o Brasil no Sistema Interamericano A América Latina desconhece seus


mártires e heróis

A ignorância de nossas histórias é


Subserviência externa outro fator que contribui para a au-
sência de políticas externas consisten-
A atual política externa dos países da América Latina é o tes e de lógica nas formulações de nos-
sas linhas de ação no plano internacio-
resultado de séculos de vassalagem, antes a Lisboa e
nal. As noções que abrigamos sobre
Madri, depois a Londres, hoje aos EUA vários países latino-americanos são na
verdade caricaturas produzidas pelos
Países submetidos ao regime colonial apoio ao governo sandinista da Nicará- norte-americanos, com sua literatura,
e neste século ao neocolonialismo, as gua, invadida por somozistas e merce- seus filmes e suas práticas. A Bolíviaé
nações americanas sempre mantiveram nários, não são seguidas de medidas o mais gritante exemplo disso: ela é
relações entre si condicionadas pelos efetivas desses governos aparente- vista como um país folcloricamente
interesses de cada metrópole. Ao domi- mente em discordância com Washing- interesting, confuso, onde houve mais
nio de Espanha e Portugal se sucedeu o ton. de duzentos golpes de Estado, quando
domínio inglês e a este, o americano. A Na realidade, as relações interameri- na verdade o povo boliviano tem uma
partir daí, a maior parte das ações e das canas foram frequentemente inconciu- tendência histórica a organizar-se mili-
iniciativas dos países latino e centro- dentes porque a subordinação de fato tarmente e é um dos raros a poder os-
americanos submeteu-se aos interesses aos interesses dos EUA impediu a tentar com orgulho o fato de ter derru-
da política externa dos EUA. maioria dos países de nosso continente bado mais de um presidente da Repú-
Houve alguns hiatos, como a formal de ter realmente políticas externas. A blica através do recurso da greve de
oposição da Argentina aos norte- atitude das nações americanas em rela- fome.
americanos durante o primeiro go- ção a Cuba, na década de 60, é exem- Esse trabalho de sabotagem das his-
verno de Juan Perón (1943-55) e a ati- plo gritante. Cuba foi expulsa da Orga- tórias nacionais não se deve só à in-
tude titubeante, pró-Eixo nazi-fascista, nização dos Estados Americanos fluência norte -americana, mas principal-
de Getúlio Vargas no final dos anos 30, (OEA) em 1962, depois de expropriar mente ao domínio intelectual e mental
em pleno Estado Novo. Atitude do companhias norte-americanas e rom- da oligarquia colonizada sobre as aca-
mesmo tipo foi adotada em 1977, per relações diplomáticas com os EUA. demias, os jornais e os meios de divul-
quando, durante o governo Geisel, o O envio de tropas latino-americanas, gação em geral.
Brasil denunciou o acordo militar inclusive brasileiras, para São Domin- O desconhecimento, pelas popula-
Brasil-EUA sobre armamentos, medida gos, em 1965, sob a bandeira da OEA, é ções americanas, como um todo, de
que se destinava a estimular a produ- outro exemplo. seus mártires e heróis (como Frei Ca-
ção de armamentos e munições pelo A ótica dos interesses de Washington neca, Mariátegui, Farabundo Marti,
nosso país. Há também, como dado ex- não afeta apenas os responsáveis pela Sandino, Artigas, Tupac Katari, Luís
cepcional, a recusa do Brasil em assi- condução das políticas externas dos di- Carlos Prestes e centenas de outros)
nar o Tratado de Não-Proliferação Nu- versos países americanos, como ainda inibe a diplomacia latino-americana da
clear, mas que não tem a sustentá-la exerce influência na própria noção so- posse de dados referenciais, síndrome
nenhuma iniciativa de ordem prática. bre esses assuntos por parte dos habi- que, aliada à subordinação aos interes-
Mesmo as retóricas manifestações de tantes em geral. Como o noticiário da ses das oligarquias locais interme-
alguns países latino-americanos em imprensa no Terceiro Mundo tem ori- diárias, torna a fixação de linhas de poli-

419
tica externa extremamente improvável.
"As relações interamericanas", por-
tanto, não existem senão como fingi-
mentos da imaginação, pois frequente-
mente e de hábito não são comple-
mentadas por ações substantivas.
Alguns exemplos são suficiente-
mente elucidativos para nos permiti-
rem dispensar outros: o primeiro deles
é o da guerra das Malvinas, ocorrida
em 1982. Nesse lamentável episódio de
noss história, a maioria dos jornais
brasileiros, diferentemente de nossa
Chancelaria do Itamaraty (que no en- tha
tanto pouco fez de efetivo) apoiou a In- ses]
glaterra, enquanto uma parcela redu-
zidíssima da imprensa apoiava a Argen-
tina. Isso como atitude retórica, pois,
nnªprática, mesmo esta parcela mínima
val pró-Argentina apoiou de fato a In-
glaterra, pois escolheu eleger as alega-
das "negociações" (que na realidade
foram desconsideradas por Londres)
como instrumento possível de trazer a
paz e o entendimento, quando eram
apenas um estratagema londrino para
preparar a invasão militar das ilhas. Ou-
tro exemplo escandaloso e mais dramá-
tico foi a invasão de Granada pelos
EUA, em 1983, episódio no qual tanto
a chancelaria brasileira quanto a im-
prensa nativa se portaram com abso-
luto descaso pela verdade. Os jornais
brasileiros desconsideraram a posição
contrária de Fidel Castro ao gople de
Estado que resultou no assassínio do
primeiro-ministro Maurice Bishop e
que serviu de pretexto para a invasão
americana. A assustadora dívida ex-
terna que incidia sobre quase todo o
território latino-americano nos anos 80
tornava qualquer política externa de
nossos países fútil e inoperante, se- A intervenção dos EUA no Hemisfério: acima, soldados hondurenhos são treinados por
gundo a visão da maioria dos tecnocra- oficiais americanos; abaixo, a ação americana em Granada. Se para atos como esses
tas instalados nas diversas administra- os EUA já não contam com o antigo apoio maciço dos governos latino-americanos, a
ções nacionais. Não há possibilidade de oposição que enfrentam é muito frágil
reação a certos interesses americanos,
argumenta-se, quando os ministros da dido muito pouco na direção certa. Um que, Londres e Paris e são intérpretes
Fazenda e da Economia estão amarra- exemplo da absoluta descoordenação dessas capitais. Nisso reside a incorrigi-
dos interesses dos países latino- vel fragilidade das políticas externas
A relação com os EUA é uma americanos pode ser encontrado, por dos países da região, seja nas suas rela-
relação entre servo e senhor acaso, no Instituto Internacional do ções mútuas, seja nas suas relações
Café, onde os países produtores se di- com os EUA. A dominação estrangeira
dos a compromissos com os bancos gladiam como delinquentes juvenis é tal que nenhum país consegue ou
americanos, Essa é contudo uma visão diante do olhar severo dos consumido- pode ter uma política externa consis-
estreita; uma das saídas óbvias para a res do Primeiro Mundo - e um fato re- tente, As relações entre os países
situação em que se encontram esses go- levante a ser considerado é que até latino-americanos e Washington é uma
vernos é precisamente a de transferir o hoje os produtores de café não conse- relação entre servo e senhor. E as rela-
debate da dívida do plano econômico e guiram estabelecer um cartel de produ- ções entre os países, do Rio Grande -
financeiro para o político. tores, Uma tentativa feita a partir da que separa os EUA do México - para
Algumas tentativas têm sido feitas Venezuela esbarrou com a resistência baixo, é uma relação de servo para
para ordenar regionalmente as relações feroz dos EUA e se perdeu nas fumaças servo, isto é, caracterizada pela ânsia
e a interdependência de interesses de dos restaurantes londrinos, de agredir o vizinho para agradar ao se-
países vizinhos, no continente latino- O pólo de atenção das chancelarias nhor.
americano, Deve-se a isso a existência, latino-americanas está ao Norte, em
por exemplo, do Pacto Andino e do Washington, enquanto intelectuais e
Mercado Comum dos Países do Ca- elites em cada país latino-americano
ribe, mas efetivamente se tem progre- têm os olhos voltados para Nova Ior- Cláudio Abramo
420
BR DFANBSB V8.GNC.AAMA, 3404 1 3 3 4 an fo 163
sr oransss 240413313 00a,p 464

a história das greves


LUTAS SOCIAIS/ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES:

? Re nuc anças

No passado, quando o movimento popular cresc


eu e agitou o País, foi barrado por

golpes, como em 1937 e 1964. Mas retornou


à cena nos períodos de maior
busca de mudanças
liberdade, como em 1946 ou a partir de 1978, em

para pôr fim ao Estado Novo, de certa a Confederação Geral dos Trabalhado-
No início de 1945, o agonizante Esta-
forma só seria encerrada 20 anos de- res do Brasil (CGTB), primeira tentati-
do Novo e seu líder, Getúlio Vargas,
pois, com o golpe militar de 1964. Du- va de unificar formalmente a luta dos
viam ressurgir um personagem notável
rante esse período, sua tendência geral trabalhadores, intervindo em inúmeros
na história do País: o povo organizado.
foi de crescimento, embora refluísse sindicatos que a apoiavam. A CGTB
O Estado Novo havia sido instituído
por alguns momentos. fechou, e o governo instituiu a Confe-
como uma espécie de dique para con-
Logo no início, o governo Dutra viu- deração Nacional dos Trabalhadores
ter a intensa agitação social dos anos 20
se em dificuldades com a intensa agita- na Indústria (CNTI), atrelada ao Minis-
e 30. Com seu fim, abria-se, um perio-
ção social. Para contê-la, agiu de duas tério do Trabalho. Até o final de seu
do favorável ao crescimento das orga-
formas: 1) colocou o Partido Comunis- governo, Dutra promoveu cerca de 400
nizações e lutas populares.
ta na ilegalidade, cassando seus repre- intervenções em sindicatos. Mesmo as-
A nova onda de participação popu-
sentantes parlamentares; 2) inviabilizou sim, nos primeiros dois anos em que es-
lar, que já se iniciara no movimento
teve na Presidência, o número de gre-
vistas oscilou entre 200 e 250 mil anual-
mente.
Já no início do governo Vargas, em
1952, o número de grevistas chega a
400 mil. Desses, 150 mil eram têxteis, o
setor industrial mais importante da é-
poca. Também no mesmo ano, as "pas-
seatas da panela vazia" chegam a reu-
nir, em São Paulo e no Rio, 500 mil
pessoas.
Em março de 1953 é deflagrada a fa-
mosa "Greve dos 300 mil" em São Pau-
lo. Iniciada pelos têxteis, ela ganha a
adesão dos metalúrgicos, marceneiros,
vidreiros e gráficos. Durou 21 dias e foi
considerada vitoriosa.
Durante o governo Juscelino, em
1957, nova greve geral realiza-se em
São Paulo e paralisa 400 mil trabalha-
dores durante dez dias do mês de ou-
tubro. O aumento salarial obtido pelos
trabalhadores, no entanto, ficou bem
abaixo do que eles pretendiam.
A organização dos trabalhadores ru-
rais também avançava. A criação das li-
gas camponesas, em meados da década
de 50, incentivadas pelo então deputa-
do socialista Francisco Julião, deu pro-
jeção nacional às lutas dos campone-
ses; Além disso, a União dos Lavrado-
res e Trabalhadores Agrícolas do Brasil
(ULTAB), antes restrita a São Paulo,
viria a ser uma entidade nacional nos
anos 60. Surgia também o Movimento
dos Trabalhadores Sem-Terra (MAS-
TER) e crescia o movimento da Igreja
pela sindicalização rural.
Desde 1953, o movimento sindical
procurava reunir as lutas das diversas
categorias sob comando único. Ainda
na década de 50 são criados o PUI
(Pacto de Unidade Intersindical), em
São Paulo; as CPOS (Comissões Per-
421
o

[+++
"*!js

Adad
e

Iconographia

Iconographia
) a R A3 ae iz
Marcehieiros, metàlúrgicos , vidreiros e gráficos aderiR am,
Acima, líderes sindicais discutem a "Greve da legalid
em 53, à "Greve dos 300 mil", iniciada ade",
pelos têxteis agosto/61, pela posse de Goulart. A esq., de pé,
facima, assembléia da categoria, março/54 o advogado
| José Carlos Dias; a seu lado, Dante Pelaca
ni
manentes das Organizações Sindicais),
tantes conquistas populares dos 20 anos "política de alívio" ensaiada no gover-
no Rio; e o PUA (Pacto de Unidade e
anteriores. Entre elas, o próprio direito no Costa e Silva, sem ter ainda efetiva-
Ação). Os trabalhadores buscavam
de sindicalização, o serviço de assistên- do o controle completo das organiza-
"um organismo nacional que dirija as
cia social aos previdenciários, o 13o sa- ções populares, teria fôlego curto. As
forças dos trabalhadores de todo o
lário e a reforma agrária anunciada por manifestações voltam de imediato às
País", conforme a expressão adotada
Goulart no famoso "comício das re- ruas e são reprimidas com violência.
no Congresso Sindical de Belo Hori-
formas", em 13 de março, no Rio,
zonte, em 1960. Esse objetivo seria atin- Em março de 1968, depois de espe-
Novamente, como no golpe do Esta- cializa
gido coma criação do CGT (Comando r-se em "comiícios-relâmpago "
do Novo; as elites conservadoras pro- contra a privatização do ensino, os es-
Geral dos Trabalhadores) que agrupou
curavam conter o avanço das lutas so- tudantes reúnem 100 mil pessoas no
586 sindicatos, em 1962,
ciais e o movimento popular ainda não Rio, numa manifestação de protesto
A formação do CGT ocorreu num
tinha forças para reverter essa tendên- pela morte do estudante Edson Luis,
momento crucial na vida do País, já en-
cia, Ao lado disso, crescia a insatisfação
tão abalada por seguidas crises políti-
cas. Primeiro, a renúncia de Jânio Qua- operária, estimulada por dispensas em
dros, em 1961, Depois, as ameaças de massa nas fábricas. Já em março de
alguns setores militares à posse do vice- 1968 os trabalhadores formavam um
presidente João Goulart. Comit ê Intersindical Antiarrocho, em
Com o golpe, começam a ser demo- Belo Horizonte. Em abril, estoura
As organizações sindicais, a essa al- lidas as conquistas dos trabalhadores, a
tura, assumem também bandeiras polí- também uma grande greve em Conta-
começar pela destituição de Jango -
ticas e, por exemplo, apóiam a posse de gem, encerrada pelas tropas da Polícia
que eles haviam ajudado a empossar e
Goulart, realizando a "Greve da legali- Militar, que ocuparam aquela cidade
com quem colaboraram para assegurar mineira em meados de junho. Em ju-
dade", em agosto de 1961. o mandato pleno com as lutas pelo ple-
Durante o ano de 1962, por duas ve- lho, nova greve, de seis mil Operários,
biscito - e o fim das eleições presiden- em Osasco, SP, com duas fábricas ocu-
zes os trabalhadores voltaram a realizar
ciais diretas. A seguir, viriam as leis an- padas. O movimento foi rapidamente
greves gerais de cunho político: na pri- tigreve e os reajustes salariais com base
meira, em junho, para não permitir que declar ado ilegal, e as fábricas, desocu-
em índices oficiais. Foram afastadas li- padas à força por tropas da PM,
o Congresso impusesse O nome de deranças de 342 sindicatos, 43 federa-
Auro de Moura Andrade como primei- No dia 13 de dezembro de 1968 foi
ções e três confederações. O regime decret
ro-ministro, no lugar de San Thiago ado o Ato Institucional no 5 (AI-
procurou atingir principalmente os 5), outorgandô ao general presidente
Dantas, indicado por Goulart; na se- grandes sindicatos, com mais de mil as-
gunda, em setembro, com entidades es- da República e ao Conselho de Segu-
sociados, sobre os quais se abateram rança Nacional, controlado pelos mili-
tudantis e as ligas camponesas, para 70% das intervenções federais. Cerca
forçar a antecipação do plebiscito que tares, poderes ditatoriais completos,
de 90% dos sindicatos rurais criados em Estava nas mãos do regime o instru-
poria fim ao parlamentarismo. 1963 e 64 foram fechados por decreto,
Em outubro de 1963, rebenta nova mento para tentar liquidar a agitação
assim como qualquer tipo de entidade das
greve geral em São Paulo: 700 mil tra- ruas e fábricas. Do final de 1968
intersindical autônoma. Em 1965, até 1977, o movimento popular retraiu-
balhadores obtêm sucesso em suas rei- aconteceram apenas 25 greves, contra
vindicações de aumento salarial. se, principalmente devido ao regime
mais de 150 em 1963. Nesse momento, terrori
A essa altura, os setores mais reacio- sta que se implantava à sombra
a contenção do movimento popular da AI-5, com torturas e assassinatos nas
nários das elites nacionais empenha- ainda era relativamente não-violenta.
vam-se em articular o golpe militar de prisões políticas e órgãos de repressão.
Já em 1967, o marechal Castello Bran- De 1968 a 1972 o movimento popu-
1964. Os grupos ligados ao golpe ata- co outorga uma Constituição ao País; o
cam duramente o regime democrático, lar reflui das ruas e adota novas táticas,
regime ensaia retirar de cena os instru- Setores da vanguarda do movimento
visando explicitamente às mais impor- mentos ditatoriais. Mas a chamada estudantil e lideranças operárias for-
422
BR DFANBSO VE.GNCAMA 34041221 ânCpa, p 65
BR DFANBSB VB.GNCIAAA, 840413334 , pJGO

mam organizações de ação armada. Al-


gumas dessas organizações tentam im-
por-se através de um terror revolucio-
nário, com assaltos e sequestros. O Par-
tido Comunista do Brasil trabalha para
articular a guerra revolucionária a par-
tir das lutas camponesas do Araguaia.
Diversos grupos, independentemente
do apoio à luta armada ou não, unem-
se num movimento mais amplo de ação
reivindicatória nos bairros em que pas-
sam a ser despejadas pelo "milagre
econômico" centenas de milhares de
trabalhadores. Já em 1972, por exem-
plo, mesmo sob o regime de terror polí-
tico existente, uma assembléia de três
mil moradores da zona Sul - onde se
destacam lideranças como a da profes-
sora Irma Passoni e do operário Auré-
lio Peres, depois deputados eleitos por

Juca Martins/F 4
áreas operárias - reivindica melhores
condições de transporte.
Essas lutas nos bairros foram as mais
importantes até 1975. Neles, a organi-
zação popular se beneficiou do apoio
de setores da Igreja, mais difícil de ser
Descoberta a manipulação dos reprimida.
índices do custo de vida nós anos do
"milagre econômico" a partir de 1977,
o movimento sindical exige a correção
dessa defasagem.
Em maio de 79, 113 mil operários Um primeiro grande resultado desse
fazem a primeira grande greve trabalho miúdo surgiria em 1975 com o
metalúrgica do ABC, exigindo 78% de Movimento Custo de Vida (MCV), em
reposição salarial (no alto, assembléia São Paulo. Em setembro de 1978, o
no estádio de Vila Euclides; em MCV reuniu uma lista de 1,3 milhão de
primeiro plano, Luís Inácio da Silva); assinaturas exigindo do governo uma
também em 79, em agosto, greve de 15 redução do custo de vida. Represen-
im B

mil operários da construção civil, em tantes do movimento que se desloca-


,(

BH (embaixo, assembléia da ram até Brasília para entregar a lista ao


categoria), termina com violenta presidente não foram recebidos.
repressão e com um trabalhador morto O próprio governo, então, encontra-
por um tiro perdido.O MCV(ao centro) va dificuldades crescentes para manter
na praça da Sé, SP, em reuniu sua política econômica. Em 1977, o mi-
Sandra Adams

1,3 milhão de assinaturas num nistro da Fazenda, Mário Henrique Si-


documento protestando contra a monsen, numa crítica às políticas ante-
caresi'a, que o governo se recusou riores, abre caminhô para reconhecer a
Em LA Es o ia a receber. adulteração dos índices do custo de
vida utilizados no cálculo da inflação
de d ! para os reajustes anuais de salários.

N Em razão das adulterações, os ope-


rários iniciaram uma das grandes cam-
panhas dessa época, exigindo a reposi-
ção salarial. Embora o movimento não
fosse vitorioso, serviria de base para as
grandes lutas operárias de 1979. E ser-
viria também para fazer despontar o
nome de um líder operário que se tor-
naria famoso nos anos seguintes: Luis
Inácio da Silva, o Lula, presidente do
Sindicato dos Metalúrgicos de São Ber-
nardo do Campo e Diadema.
Em 12 de maio de 1978, 2.500 operá-
rios da Scania, em São Bernardo do
Campo, na Grande São Paulo, cruza-
Central

ram os braços, iniciando a primeira


grande greve do País em dez anos. No

423
dia seguinte, 9.500 trabalhadores da
Ford aderiram à paralisação. Em me-
nos de dois meses, a greve espalhou-se
pôr 18 cidades e 400 indústrias, mobili-
zando meio milhão de operários. As-
sim, a legislação antigreve instituída em
1964 ficou, na prática, desmoralizada.
Em última instância, a ação do pró-
prio regime contribuiu para fortalecer a
luta popular. Com sua política de favo-
recimento ao grande capital nacional e
estrangeiro, os governos pós-64 haviam

Carlos Fenerich/Abril Press


concentrado milhões de trabalhadores
nas periferias dos grandes centros in-
dustriais, e legiões de operários traba-
lhavam agora numa mesma fábrica, fa-
cilitando sua organização. Em 1978, só
a Volkswagen, êm São Bernardo, tinha
38 mil trabalhadores. Concentrando 5,
200 mil operários, a região do ABCD policiais no Rio e na Bahia, de motoris- dos. Em 1974, 0 presidente Geisel já
paulista (Santo André, São Bernardo, tas de ônibus no Rio (45 mil) e em São instituira a política de "distensão"
São Caetano e Diadema) era então o Paulo (150 mil). E há a grande greve como forma de retorno "lento e gra-
novo centro da movimentação operária dos operários da construção civil de dual" à democracia. No final de seu go-
do País, tomando o lugar antes ocupa- Belo Horizonte, em agosto de 1979. Os verno, ele decretaria o fim do AI-5. Em
do pelo bairro da Mooca, em São Pau- 15 mil grevistas foram violentamente 1979, essa política teria continuidade
lo. E havia novos centros também em reprimidos e a polícia terminou matan- com a "abertura" de Figueiredo, cujas
Minas Gerais, no Rio e nointerior de do um operário com um tiro perdido, consequências práticas mais importan-
São Paulo. Além da repressão, o governo procu- tes foram a anistia e o pluripartidarismo
rava minar a organização popular atra- limitado,
Maio de 79; 113 mil operários
vês da intervenção nos sindicatos. As concessões não foram suficientes
truzam os braços no ABC Em outubro de 1979, no entanto, as para conter o crescimento das reivindi-
greves já estavam de volta aos centros cações. O ano de 1980 começaria com
Das greves por fábricas os operários mais experientes dos metalúrgicos de uma grande greve dos metalúrgicos do
passam às paralisações por categoria. São Paulo, Guarulhos e Osasco. Em ABC; prosseguiria com uma greve es-
Em meados de maio de 1979, 113 mil confronto com a Polícia Militar, é as- tudantil nacional de três dias, reunindo
operários cruzaram os braços no ABC, sassinado em São Paulo um dos líderes mais de um milhão de alunos contra os
na primeira grande greve organizada da mais importantes do movimento operá- aumentos nasaniversidades privadas; e
região. Pediam 78%, de aumento sala- rio em todo o País: Santo Dias da Silva, terminaria com as primeiras grandes
rial, Os patrões ofereceram 45%, Surgi- Ele havia participado ativamente. dos greves no campo, revelando que a ma-
ram as assembléias-monstro de 60, 70 e movimentos de periferia, convocando ré de reivindicações havia extravasado
até 90 mil trabalhadores. Reunidos no assembléias de bairro, organizando gru- os limites urbanos. E ocorreu a primei-
estádio de Vila Euclides,em São Bernar- pos de teatro e núcleos operários de de- ra greve geral no campo desde 1963, a
do, eles rechaçaram a exigência de vol- bates, principalmente em colaboração de 250 mil canavieiros da Zona da Ma-
ta ao trabalho imposta pelos patrões com a Igreja.
como condição para negociar o au- ta, em Pernambuco,
A resistência dos trabalhadores e o Mas a campanha popular mais im-
mento. O governo, em resposta, decre- desgaste político da repressão levam o portante foi a grande greve metalúrgi-
tou intervenção no Sindicato dos Meta- governo a procurar resolver o proble- ca de 1o de abril, no ABC. Os operários
lúrgicos. A Polícia Militar ocupou o es- ma dos salários através de ajustes na reivindicavam estabilidade no emprego
tádio, e dois mil soldados chegaram a política econômica. Os reajustes sala- e exigiam também que os patrões reco-
ser aquartelados no pátio da Volkswa- riais, segundo nova legislação, passa- nhecessem as comissões de fábrica elei-
gen. Travam-se até mesmo lutas de rua, ram a ser feitos a cada seis meses. Cria- tas nos locais de trabalho. Esses repre-
em certos momentos: logo após a inter- ram-se também novos índices para o sentantes de trabalhadores tiveram pa-
venção no sindicato, por exemplo, uma cálculo do custo de vida e estipulou-se pel relevante na organização da greve.
invasão a paus e pedras conduzida por que os trabalhadores que ganhassem Em uma categoria de 120 mil metalúr-
três mil grevistas desalojou provisoria- até três salários mínimos teriam rajuste gicos (São Bernardo e Diadema), a gre-
mente os soldados que ocupavam a de 10% acima dos índices oficiais. A in- ve foi coordenada nas fábricas por uma
sede da entidade, flação, no entanto, dispara e corrói os equipe de 450 operários, eleitos nas se-
Nesse momento, apesar da repres- salários, num mecanismo perigoso, que ções de fábrica com esse objetivo, Aci-
são, a confiança dos trabalhadores es- estimulava a especulação financeira, ma dessa grande comissão havia um
tava em alta. No Rio de Janeiro, 82 mil improdutiva. A crise não deixava mui- comando de 16 trabalhadores eleitos
professores haviam paralisado o traba- tas saídas para os homens no poder,
lho, em março. Um mês depois, 65 mil nas assembléias gerais.
que já não podiam manter o ritmo de Por seu lado, a repressão também es-
funcionários municipais de São Paulo crescimento ordeiro dos anos de "mila- tava mais preparada. Ocupou o estádio,
também param, sendo acompanhados gre econômico". Assim, mesmo sem a sede do sindicato e prendeu, no dia
pelos 250 mil funcionários do Estado. grandes mudanças, o regime fazia con- 19, o próprio Lula e a diretoria do sin-'
Há paralisações de funcionários públi- cessões liberalizantes, procurando dicato, depois processados segundo a
cos no Rio Grande do Sul, greves de atrair os setores políticos mais modera- Lei de Segurança Nacional (LSN). Mas
424
BR DFANBSB VB8.GNC.AAA, 32) an 002; PA&4
ção Nacional das Classes Trabalhado-
ras), em novembro de 1983.

--ea
Revelaria o ano de 1984 as dificulda-
des políticas crescentes do Regime Mi-

2
litar; a grande campanha por eleições
presidenciais imediatas incendiaria o
País.

Carlos Fenerich/Abril Press


Também derrotada no Congresso,

A
como no caso das leis salariais, desta

N
D
vez a campanha popular deu origem a
um pacto político entre grande parte da
oposição e dissidentes do regime. Essa
aliança, por sua vez, escolheu o primei-
ro presidente civil do País em 20 anos:
Tancredo Neves, do PMDB, represen-
tante da parcela das elites derrotada
Agitações extremas marcariam 1983 (na pág. ao lado, saldo de quebra-quebra em
em 1964, que propõe uma Nova Re-
estação de subúrbio) e, em 84, a onda grevista alcançaria os bõias-frias (acima, Aderval
pública, a volta às tradições liberais.
Alcides, líder do movimento, à frente de piquete em Guariba, SP, maio/84)
Em 1984, as relações entre as diver-
multiplicava-se também a força dos operárias do período de 1981-82, no en- sas forças políticas haviam-se transfor-
grevistas: sustentaram a greve por 41 tanto, visavam especificamente aos mado consideravelmente, abrindo es-
dias, porque receberam o apoio de um atrasos de salários e às demissões - o paço para uma participação muito mais
dos maiores movimentos de solidarie- que caracteriza um certo refluxo. Tam- efetiva dos setores populares na vida
bém se mobilizaram os médicos que nacional. Embora o sindicalismo oficial
dade da história do País.
A manifestação do 1o de maio em pararam em 14 Estados, em abril de fosse ainda muito forte, havia também
São Bernardo, em 1980, torna-se o 1981, e os trabalhadores da construção um considerável movimento pela orga-
símbolo dessa resistência. Uma imensa civil, motoristas de ônibus e funcioná- nização independente dos trabalhado-
massa humana de 100 mil pessoas faz rios públicos. res. A greve geral de julho de 1983, diri-
com que a polícia seja obrigada a ceder Em outras áreas, porém, o movimen- gida de forma unitária por sindicatos da
espaço e acabe permitindo uma passea- to ainda começava. Os conflitos no CUT e da CONCLAT, a despeito de
ta dos trabalhadores, numa São Ber- campo, em 1981, envolveram cerca de seu sucesso relativo, diante do vasto
nardo do Campo ocupada pela PM e 40 mil famílias, ou perto de 200 mil pes- potencial de mobilização do País, cum-
com tropas do Exército de prontidão, soas. E eles avançavam. Em 1984, a pre seu objetivo de ser um dia nacional
às margens das rodovias vizinhas. Nos luta grevista chegava a um setor novo, de protesto. As paralisações mais am-
dias seguintes, porém, a repressão au- o dos bóias-frias, assalariados rurais plas ocorreram em São Paulo e no Rio
mentou, até que, no dia 11, uma as- temporários. Em Goiás, Minas, Rio e Grande do Sul, e no conjunto houve a
sembléia determinou o fim da greve. São Paulo, a nova categoria agrícola adesão de três milhões de trabalhado-
desencadeou uma série de greves - al- res.
Da ABI à fííf'lí'bié, ÃW'IIÍM' gumas violentas, com mortes, depreda-
( am ba “;;;“ ::]: AJ «]“ clas "luª Pa
solidários com os operários ções, incêndios -, que, no fim do ano,
atingiu meio milhão de trabalhadores. revela forma de unificação
A campanha de solidariedade aos Paralelamente ao crescimento de
operários contou com a participação suas lutas, os trabalhadores elevaram Além disso, a campanha pelas "dire-

de políticos, como o senador Teotônio sua organização. Em 1981, já haviam tas- já",em 1984, revelou uma outra for-

Vilela, da Igreja e das associações civis sido criadas diversas organizações po- ma de unificação dos setores: através

mais importantes, como a Associação pulares nacionais, a despeito da lei e da da luta política, o que se deu no Comitê

Brasileira de Imprensa (ABI) e a Or- repressão que as destruiram em 64 e as Nacional Pró-Diretas, que unia CUT,

dem dos Advogados do Brasil (OAB). perseguiam desde então. Foi recriada a CONCLAT, ANDES e UNE às entida-

Ficava claro, assim, que a política eco- União Nacional dos Estudantes (UNE); des liberais como OAB e ABI e parti-

nômica do governo era repudiada por surgiu a Associação Nacional dos dos políticos de oposição.

uma ampla maioria. Em 1983, ao tentar Docentes no Ensino Superior (AN Embora não tenha tido uma atuação

aprofundar a política de arrocho sala- DES). Em 1981, ocorre a primeira Con- determinante na campanha, o setor po-

rial para satisfazer as exigências do ferência Nacional da Classe Trabalha- pular foi responsável por a luta não se

FMI, o governo acabou sendo derrota- dora. Nela, cinco mil ativistas, repre- ter interrompido prematuramente após

do no Congresso. sentando mil entidades sindicais, con- o sucesso dos primeiros comícios.

O ano de 1983 foi marcado também denaram a política econômica e decidi- Com a eleição de Tancredo Neves

por agitações populares, de formas ex- ram criar a Central Unica dos Traba- pelo Colégio Eleitoral, começava a ga-

lhadores (CUT). Prevista para 1982, a nhar força o importante movimento


tremas e desorganizadas, com saques e
formação da CUT foi depois atrapalha- pela convocação da Assembléiá Cons-
quebra-quebras em todo o País. O mo-
vimento grevista havia refluído um da pela divisão da cúpula sindical en tituinte, em 1986. A experiência politi-

dois movimentos: um, que criaria : ca da greve geral de 1983 e dos comitês
pouco nos anos anteriores, em compa-
ração com o período 1978-80, devido às CUT, controlada por ativistas do Parti- das diretas seria tanto mais importante

concessões e à repressão rigorosa. Um do dos Trabalhadores; e outro, com ve- na medida em que o País se preparava

ano após a greve dos 41 dias no ABC, lhos dirigentes sindicais e ativistas do para uma nova fase de sua história, em

uma paralisação dos empregados da PCB e PC do B, que se opôs à criação que a presença política dos trabalhado-

Fiat, no Rio, termina em derróta, de- imediata da Central e adotou o nome res poderia ser o fator determinante

pois de 42 dias de resistência. As greves provisório de CONCLAT (Coordena- das muitas mudanças necessárias.

425
BR DFANBSB 240 J a a anos p 68
/
BR DFANBSB Va.GNC.aaa, 2404/35 an 002 , p 169

CULTURA/ARTES GRÁFICAS: a história dos quadrinhos Ocupar suas páginas: Jerônimo Mon-
teiro, Cláudio de Souza, Jayme Cortez.
A partir da Segunda Grande Guerra
o Brasil é invadido pelos quadrinhos
made in USA, Nessa época, São Paulo
acelera a sua industrialização, a cidade
cresce vertical e horizontalmente. Em
Desde os anos 50, o quadrinho nacional luta por 1950, a Editora Abril surge no mer-
uma reserva de mercado que permita sua expansão e cado, publicando os personagens de
Walt Disney. A partir daí, o espaço do
atrapalhe a ação dos super-heróis no mercado nacional quadrinho nacional diminuiu mais e
mais. Sem nenhuma regulamentação
No começo do século, o Senado da
jovem República brasileira vivia mo- ANO I RIO DE JANEIRO, QUARTA-FEIRA. 1! DE OUTUBRO DE 1905 N.o 1
mentos agitados. Na tribuna, o baiano roça k
Rui Barbosa. De repente, um de seus do
companheiros 0 interpela insistente-
mente sobre onge fora buscar a afirma-
ção"que acabara de fazer. Rui res-
ponde: "Li n'O Tico-Tico."
Primeira revista brasileira no gênero
infantil, O Tico-Tico (190560) marcou
época e gerações. Em suas páginas co-
loridas, os traços lúdicos de gente
como J. Carlos, Luiz Sá, Max Yantok,
Theo A. Rocha, Alfredo Storni, Paulo
Affonso, Oswaldo Storni, Angelo Agos-
tini e muitos outros.

Nos anos 20, São Paulo ainda engati-


nhava na área de editoração, compa-
rada com a capital do País, Do Rio,
chegavam Revista da Semana, O Cru- O MALHO: -- Mas isso é grave! É, revolução ? Que O MALHO: -- Eu acho que vocês todos têm razão. Ni
é que vocês querem, afinal de contas, ó pequenas esperanças verdade, chega a ser uma injustiça que no Brasil todas as classes!
zeiro, O Malho, Para-Todos, A Cigarra, da Pátria ? tenham o seu jornal e só vocês não o tenham. Pois bem ! Futuro:
- Queremos um jornal exclusivamente para nós. da Pátria e mães de família futuras ! Daqui em dian-
Pelo Mundo e O Tico-Tico. O jornalismo seu MALHO, é muito bem feito, é muito divertido, mas. ..Você,
não te, às quartas-feiras, exigi de vossos pais O TICO-TICO ! Viva!
paulistano, no entanto, começava a nos basta ! !. . .
acompanhar os novos tempos. Em
1928, surgia o semanário A Gazeta
Esportiva, um ano depois, a 5 de setem-
bro de 1929, A Gazetinha, dirigida ao
público infantil. O preço: 200 réis. Um
grande sucesso. Importantes desenhis-
tas da época fizeram a alegria da garo-
tada paulistana que acompanhava A
Gazetinha às quintas-feiras: Nino Bor- nel—f
ges, Belmonte, Ícaro, Sigismundo,
Messias de Mello. A partir do quinto CARLITO e ZIZI: - Papai! Papai! Que é que o se- CARLITO e ZIZI, (furiosos, atirando os embrulhos e
nhor traz ai ? esborrachando-0s): -- Não era isto o que estávamos esperando !
número, o artista Gomes Dias passa a AMULHERenSOGRA:—S-Húuodml
oduahm Era O TICO-TICO ! Então papal não se lembrou de que hoje era
naturalmente . , quarta-feira ?
desenhar uma série de aventuras com o O PAI: - Penso que sim. Ora, tomem lá, seus maganões.
. . A MULHER: - Tambem, você não trazer uma coisa que as
São gostosíssimos êsses biscoitos !
já famoso palhaço Piolim. Grande cen- crianças estavam: esperando há tanto !
A SUGRA: - Realmente, sr. meu h...
tro de produção brasileira de histórias
em quadrinhos, A Gazetinha viveu algu-
ia, O
mas fases importantes. Na primeira de-
las, destaca-se a quadrinização de - (%?—
Capitão Blood, romance de Rafael Sa-
batini, por Messias de Mello, Na se-
gunda (1934-39), o grande sucesso foi A
Garra Cinzenta, de Francisco Armond,
Arquivo V Jai ger Augusto

desenhado por Renato Silva. Publica- +


dos em álbum, como edição especial,
os desenhos dos brasileiros foram edita- - E olhem que não tive remédio senão vir mesmo comprar - Mas, entãr, os senhores estão nas suas sete quintas
êste tal TICO-TICO ! Para que O MALHO foi inventar mais essa" E até a sogra !
dos também no México e na França. Só se vêem pequenos por todos os cantos a ler O, TICÓO-TICO . Eu não dizia ? Sabes que mais, minha cara mulher ? NÓ
Na terceira e última fase (1948-50), já Vá, passe-me 3 números; « sogra também há de querer, dois não podemos ficar roubados! Vou comprar mais 2 TICO
que os velhos viram crianças. .. qui em diante |
com o título mudado para A Gazeta
Juvenil, uma criativa equipe passa a Red. e Administração, R. do Ouvidor, 132-Rio de Janeiro. Publicação d'O MALHO - Número avulso 200 réis.

426
An Coa, pJ3%0
Broransse vs.enc.aaa, 2404das]

para a entrada do material estrangeiro, ano, no jornal Folha de S. Paulo, um jo- vendo com um acontecimento his-
os quadrinhos americanos chegavam vem desenhista dá os seus primeiros tórico: a primeira Exposição Interna-
ao País a preços baixíssimos (e isso traços, publicando em tiras o seu perso- cional de Histórias em Quadrinhos, no
ainda acontecia em 1984), em certos nagem Bidu. Era Maurício de Souza, bairro do Bom Retiro. Participam Al-
casos até 70% menores que o do mate- que, dez anos depois, em 1969, iria pu- varo Moya, Miguel Penteado, Rei-
rial nacional, graças a uma estrutura de blicar a revista Mónica, maior sucesso naldo de Oliveira, Sillas Roberg, Jayme
distribuição mundial realizada pelos dos quadrinhos brasileiros, pela Editora Cortez e muitos outros. Os franceses
Abril. até a década de 70 se consideravam os
syndicates. Mesmo assim, em 1959, a
Não se pode esquecer, no entanto, primeiros a se preocupar com os qua-
Editora Continental, em São Paulo, as-
sumiu compromisso de publicar so- do dia 18 de junho de 1951, quando a drinhos como objeto de estudo. Mas
mente autores nacionais. Nesse mesmo friorenta São Paulo amanhece convi- reconhecem a nossa primeira exposi-
ção como um acontecimento inédito
no mundo. É dessa época também o
início da luta pela nacionalização dos
quadrinhos, quando vários artistas tun-
dam a Associação Paulista de Dese-
nhistas. Sob a presidência de Romeu
Cozzi, tenta formar quadros de dese-
nhistas e abrir caminho para a produ-
ção brasileira.

Durante o governo Jânio Quadros,


em 1961, aventa-se uma atitude drás-
tica contra os quadrinhos estrangeiros.

Maurício de Souza Produções


A própria Presidência da República de-
clara, no entanto, que não estava "cogi-
tando" de proibir histórias em quadri-
nhos, mas, sim, de "nacionalizá-las". O
assunto torna-se polêmico. O escritor
Sérgio Milliet, articulista do jornal O
Abril Press

Estado de S. Paulo, por exemplo, diz:


"Já me referi ao absurdo de se aplicar à
arte uma espécie de lei dos dois terços.
Por que não foi preciso regular de igual
modo a caricatura, no Brasil? Porque
nossos caricaturistas souberam encon-
trar seu estilo pessoal e os temas de
nossa vida social e política."
Dois anos depois, em 1963, já no go-
verno João Goulart, um decreto presi-
dencial (no 52.497, de 23/9/63) discipli-
nou a publicação das histórias em qua-
drinhos. Dizia o artigo 1o: "As empre-
sas editoras de histórias em quadrinhos
deverão publicar, no conjunto de suas
edições, histórias em quadrinhos nacio-
nais nas seguintes proporções minimas:
30% a partir de 1o de janeiro de 1964;
40% a partir de janeiro de 1965; e, final-
mente, 60% a partir de janeiro de
1966."
1964: o País virou uma imensa ca-
Press

serna, vigiada por "super-heróis", ex-


tremamente atentos. A lei do presi-
dente Goulart, uma imensa pedra de
João Bittar

kriptonita, "não pegou". Capitão


América, Jim Gordon (personagem an-
ticomunista ativo no auge da Guerra
apenas dez anos à Fria), o arquimilionário Tio Patinhas, o
O Tico-Tico (1905-60), na pág. ao lado, resistiria por
ções estrange iras, intensif icada com quadrinhos de policial Mickey, Super-Homem e Bat-
concorrência de publica
à esq, Victor Civita, diretor da man festejaram em Gotham City e Pa-
Disney, em 50, pela Editora Abril (no alto,
(à dir.) publica ria a partir de 69 o maior sucesso das tópolis. No Brasil, os criadores de qua-
editora). Maurício de Souza
. Em 84, a luta pelo quadrin ho nacional drinhos comeram o pão que o diabo
HQ nacionai s, a revista Mônica
boneco amassou. Na época do "Brasil
continuava, com a Associação dos Quadrinistas e Caricaturistas ( acima,
pela AQCpa ra a campan ha das diretas) . Grande", no governo Médici, Zé Ca-
do senador Teotônio Vilela feito
427
BR DFANBSB V8.GNCLAAA, 84044334 An 002
p.J7J

Nrioca,: personagem de Disney roteiri- do deputado. Pelo menos parte dos au- lei de 1963, com algumas ressal
"zado e desenhado no Brasil, mudou-se tores era a princípio favorável, apesar
vas,
ainda em vigor dentro da legisl
©*de uma favela no Rio para uma casa de das evidentes dificuldades iniciais que
ação
brasileira.
"tijolos financiada pelo Banco Nacional haveria para cumprir o que dispunha
o
da Habitação (BNH). projeto. Afinal, depois de anos massa- Nos anos 80, a situação das
Em 1979, sem consultar nenhum au- crados pelos estrangeiros, não seria
tor ou editor de quadrinhos, o depu-
fá- H (à continuava a mesma
cil para o autor nacional ocupar
de
tado Jorge Paulo (PDS-SP) apresentou
um projeto que dispunha sobre a obri-
uma hora para outra metade do espaço
Em 1977, o jornalista e estudioso de
dos quadrinhos publicados no País,
gatoriedade de publicação de histórias quadrinhos Wagner Augusto já definia
em quadrinhos de autores nacionais.
Em 1984, o projeto foi aprovado na
o principal entrave à produção nacio-
Segundo o projeto, as editoras seriam
Câmara e chegou ao Senado. Ali fun-
nal de quadrinhos, "A não-existência
obrigadas a publicar no conjunto de
cionou um grande lobby das maiores
de uma produção de história em qua-
suas edições 50% de histórias de auto-
editoras nacionais, que se orgulhavam
drinhos brasileira se deve ao grande nú-
res nacionais,
de ser grandes produtoras mundiais de
mero de material estrangeiro que entra
Disney, Recruta Zero, Fantasma etc., e
no País sem pagar qualquer taxa de im-
Uma nova kimi/"Hii“; surge entre
surgiu uma emenda: as histórias com
portação." Mesmo com as elevadas ta-
personagens estrangeiros criadas no xas para a importação e resoluções
alt/113,1“. t flffswilª Brasil contariam como sendo nacio-
como o comunicado no 543 da CACEX
O assunto criou nova polêmica entre
nais. Nesse mesmo ano, a AQC (Asso-
(Carteira de Comércio Exterior) sus-
as editoras e os artistas. O Jornal do
ciação dos Quadrinistas e Cartunistas),
pendendo a importação de produtos
Brasil, que, junto à Folha de S. Paulo,
fundada em 1983, em São Paulo, reu-
considerados supérfluos, o material es-
era um dos únicos órgãos da imprensa
nindo artistas como Fortuna, Henfil,
trangeiro para publicação das revistas
diária que publicavam mais de 50% de
Jayme Leão, Chico Caruso, Maringoni
de quadrinhos continuava, nos anos 80,
autores nacionais, criticou a iniciativa
e outros, decidiu repudiar o projeto-lei
a ser despejado no mercado como uma
emendado. Seus associados preferiam a
grande avalancha.

Breve história da HQ, no Brasil

1869: Publicação de As aventuras de Nhô


Quim, ou Impressões de uma viagem à Corte,
realiza o Congresso Internacional de HQ; o Special, em Lucca, por "uma vida dedicada às
primeira história em quadrinhos brasileira, de-
prof. Francisco Araújo introduz a cadeira de HQ"; o cartunista Fortuna edita a revista B/-
senhada por Angelo Agostini, na revista Vida
HQ no curso de Comunicação da Universidade Cho.
de Brasília;, é também incluída no curso de
Fluminense. Editoração da ECA (Escola de Comunicações e
1976: É relançada a revista Sacarrolha de Pri-
1905: É lançado O Tico-Tico,
Artes) da USP, pela profa Sônia Luyten. maggio Mantovi, pela Editora Abril

1947: Jayme Cortez publica, emtiras diárias,


1971: Maurício de Souza recebe em Lucca (|- 1977: A Editora Abril lança Pelezinho, de
. adaptação do romance O Guaran, de José de
tália) o prêmio Yellow Kid. Maurício de Souza, e Cacá e sua turma, de Eli
Alencar, no Diário da Noite (SP).
Barbosa.
1972: É lançada a revista Sacarrolha, de Pri-

1948: A EBAL publica em quadrinhos Edição


maggio Mantovi, pela Rio Gráfica e Editora; na 1978: A Editora Abril cria o Projeto Tiras, para
Maravilhosa, com clássicos da nossa literatu-
USP, a profa Zilda Augusta Anselmo defende distribuir trabalhos de autores nacionais aos
ra: José de Alencar, Machado de Assis, Jorge
tese sobre influência da HQ na adolescência. É jornais do País, que não duraria 12 meses.
a primeira doutora do mundo em HQ. Circula
Amado, José Lins do Rego, Joaquim Manuel
de Macedo e outros
Balão a primeira revista underground de qua- 1981: A Rio Gráfica e Editora, que já publica
drinhos, Sítio do Picapau Amarelo, baseada na obra de
1951: Primeira Exposição Internacional de
Monteiro Lobato, relança Cacá e sua turma, de
Histórias em Quadrinhos, em São Paulo,
1973: Pela Editora Abril, sai Cebolinha, de Eli Barbosa. Sai, pela Editora Abril, A Turma do
Maurício de Souza. Lambe-Lambe, de Daniel Azulay.
1959: A Editora Continental, em São Paulo,
assume compromisso de só publicar HQ de
1974: É lançada a revista Crás, pela Editora 1982: A Editora D-Arte pública Mestres do
autores nacionais. Nas capas, um selo: "Escri-
Abril, com vários autores nacionais; 1o Con- Terror e Calafrio, criação nacional,
gresso Universitário de HQ, em Avaré, SP ; cria-
ta e desenhada no Brasil,"
da a ABCPHOQ (Associação Brasileira de Críti- 1983: É fundada a AQC (Associação dos Qua-
1960; Edições O Cruzeiro, no Rio, publica Pe-
cos e Professores de Histórias em Quadri- drinistas e Caricaturistas), em São Paulo.
nhos); o prof. Antônio Luís Cagnin recebe o
reréê, de Ziraldo. grau de mestre na Faculdade de Letras da 1984: É lançada a revista Inter-Quadrinhos, da
1963: É assinado pelo presidente João Gou-
USP por seu trabalho /ntrodução à análise das Editora Ondas, só com autores nacionais; três
lart o Decreto-Lei no 52.497 de nacionalização
HQ. cartunistas lançam edições de HQ: Angeli (Ré
das HQ
Bordosa, Bob Cuspe e Outros Inúteis), Luís Gê
1975: É lançada a revista Satanésio, de Ruy (Quadrinhos em Fúria), pela Editora Circo, e
1969: A Editora Abril publica a revista Mônica,
Perotti, é relançada Pererê, de Ziraldo, pela Paulo Caruso, em parceria com Alex
de Maurício de Souza.
Editora Abril; Jayme Cortez recebe o troféu O (Bar Brasil), pela Editora Três,
Tico-Tico pelo conjunto de suas obras, no 2o

1970: O MASP (Museu de Arte de São Paulo)


Congresso Universitário de HQ, em Avaré, SP; 19856: É instituído o Dia do Quadrinho Nacio-
Adolfo Aizen, da EBAL, ganha o Yellow Kid nal (30 de janeiro).

428
AIANCOS,pI%2
BR DFANBSB VE.GNCAM. S4O4J3

seriam subscritos pela Fundação.


Mas o Banco Hipotecário de Investi-
mento e Financiamento da Habitação
Popular não foi adiante, e a construção
de moradias continuou dependendo .
dos institutos de pensão e aposentado-
ria.
As tentativas de se criar um banco
da habitação só retornariam à cena
política no governo Jânio Quadros,
quando as bandeiras das reformas so-
ciais empolgavam setores cada vez
mais amplos das camadas populares.
No documento em que se propunha a
criação do Instituto Brasileiro de Habi-
tação (BNH), ficava patente a mesma
visão ideológica herdada do governo
Dutra. "O status de proprietário dá ao
trabalhador um senso elevado de res-
ponsabilidade", rezava o documento,
"levando-o a fazer todos os sacrifícios e
a empenhar seus esforços para manté-
lo. De revoltado contra a ordem social,
o beneficiário passará a ser um susten-
táculo dela, um homem que acredita na

Iconographia
ascensão social". O IBH morreu com a
renúncia. Mas, enquanto viveu, foi pró-
digo em metas não cumpridas. A curto
prazo, havia programado a construção
A Fundação da Casa Popular, primeiro esboço de política habitacional, foi de 100 mil casas, entre julho de 1961 e
criada no governo Dutra. Acima, o presidente inaugura casas populares em dezembro de 1962. Tomou 80 milhões
de dólares junto ao Banco Interameri-
Coelho Neto, RJ, 1950, com Remy Archer (à dir.) e Mendes de Moraes (à esq.)
cano de Desenvolvimento (BIRD) e
planejou a construção de conjuntos ha-
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/HABITAÇÃO: a história do BNH
bitacionais simples, de chão de con-
a a creto, sem revestimento nem portas in-
ternas.

A política nacional de habitação é uma sucessão de


fracassos. Em 84, os mutuários do BNH enfrentavam a A política habitacional voltaria a ser
contemplada no Plano Trienal elabo-
inadimplência e ainda crescia o déficit habitacional
rado pelo então ministro do Planeja-
resgate desses empréstimos era supe- mento, Celso Furtado, para o governo
A primeira tentativa de se traçar um
rior a 30 anos. Mas o decreto morreu Goulart. No plano, previa-se o desem-
plano nacional de acesso à casa própria
antes de ser implementado, deixando bolso de 373 bilhões de cruzeiros para a
surgiu no governo Dutra (1946-51). E,
como herança a contribuição obriga- formação do capital fixo para o setor.
como em todos os governos conserva-
tória de 1% sobre o valor do imóvel ad- Desse total, 12,4% seriam destinados à
dores que o sucederiam, com a pecu-
quirido, cobrado juntamente com o im- construção residencial.
liar visão ideológica de que o proletário
posto de transmissão de valor. Em 1963, em mensagem ao Con-
com casa própria tende a se comportar
Em janeiro de 1953, houve uma ten- gresso, Jango propôs uma reforma ur-
como um burguês, favorecendo uma
tativa de se transformar a Fundação da bana, "primeiro passo para a formula-
certa estabilidade política.
Casa Popular em banco hipotecário. ção de uma política habitacional capaz
Na época, fim do Estado Novo, para
Inicialmente, pensou-se em uma car- de disciplinar o vertiginoso e desorde-
contrapor-se à expansão da influência
teira hipotecária, que emprestasse até nado crescimento urbano". Dizia a
do Partido Comunista nos grandes cen-
50 mil cruzeiros a pequenos proprie- mensagem: "A falta de uma legislação
tros urbanos, Dutra criou a Fundação
tários de terrenos que desejassem cons- reguladora tem permitido que a indús-
da Casa Popular. Quatro meses depois,
truir. Mas, como carteira, sempre fica- tria de construção se transforme em
a área de atuação da fundação foi am-
ria na dependência de taxas e impostos. presa favorita dos especuladores, impe-
pliada para o setor de política urbana
Como banco, a política habitacional dindo o, acesso à residência por parte
em geral. As fontes de financiamento
poderia tornar-se auto-sustentável. das camadas mais pobres da popula-
previstas seriam constituídas de doa-
Previa-se, como fontes de captação, ção".
ções, contribuições e transferências do
depósitos, lucros de operações de fi- O golpe de 1964 abortou qualquer
Tesouro, empréstimos compulsórios de
nanciamento, vendas de letras hipote- tentativa de mudança nessa área. E as
pessoas físicas que adquirissem ter-
cárias e subscrição compulsória por preocupações ideológicas manifestadas
reno de valor superior a 200 mil cruzei-
particulares que viessem a contrair em- no período Jânio ressurgiram com
ros ou construissem em áreas maiores
préstimos; 90% do capital do banco maior intensidade no Regime Militar.
que 200 metros quadrados. O prazo de
429
peap
ima |
O suntuoso BNH do regime ( à dir., a sede do banco no Rio ) nasceu sob o Agência O Globo
signo do escândalo. Em março de 65, Sandra
Cavalcanti, presidente do órgão, interveio numa cooperativa da Guanabar
a. Motivo: corrupção e irregularidades
administrativas. Na pág. ao lado, conjunto habitacional em Santos, SP,
retrato do padrão oferecido aos mutuários.
Cinco meses após o golpe, a Lei no salários mínimos e de 4% a 6o% sobre corrência, constituiu um grupo para
4.380, de 21 de agosto, instituía o Plano aluguéis. Finalmente, complementava-se prestar serviços administrativos, em tro-
Nacional de Habitação, o BNH e o o capital do banco: dotações orçamen- ca de 7% da renda da cooperativa, e
Serviço Federal de Habitação e Urba- tárias e doação de terrenos pela União, vendeu casas sem urbanização, embol-
nismo. Na exposição de motivos, San- A intenção do governo - válida para sando, ainda, 5%, a título de correta-
dra Cavalcanti, presidente do Órgão, di- todas as políticas sociais implantadas gem.
ria ao presidente Castello Branco que pelo Regime Militar - era criar um Nos anos que se seguiram, as rela-
"a solução dos problemas de moradia, banco auto-sustentável. Para tanto, ções de interesses entre diretores do
pelo menos nos grandes centros, atua- adotou o princípio de correção mone- BNH e a iniciativa privada tornaram-se
ria de forma amenizadora e balsâmica tária tanto para a dívida quanto para o cada vez mais estreitas, enquanto o defi-
sobre suas (das massas "órfãs e magoa- reajuste das prestações. Estipulou taxas cit habitacional do País se expandia de
das") feridas cívicas". Dentro do de juros variadas, de acordo com as ta- maneira assustadora.
mesmo diapasão, o então ministro do xas de financiamento. Exigiu o retorno Em novembro de 1964, quando veio
Planejamento, Roberto Campos, sus- do investimento e deixou de lado, defi- à luz o Programa de Ação Econômica
tentava que "o proprietário da casa nitivamente, quaisquer veleidades de (PAEG), do governo Castello Branco,
própria pensa duas vezes antes de se praticar uma política social. o déficit era estimado em sete milhões
meter em arruaças ou depredar pro-
de moradias - dois milhões a mais do
priedades alheias e tornar-se um aliado
que as estimativas efetuadas no go-
da desordem".
verno Goulart. Mas, para alguns direto-
O BNH foi concebido como órgão
res do BNH, tratava-se de uma questão
central do sistema e do setor de sanea- Mas foi somente em setembro de de ponto de vista. Como declarou em
mento. Com capital inicial de um mi- 1966 pela Lei no 5.107, que o transfor- 1968 o diretor João Fortes, "se fôsse-
lhão de cruzeiros - correspondente a mou em gestor dos recursos do FGTS, mos comparar com os padrões dos Es-
910 mil dólares -, sua receita provinha que O banco se tornaria definitiva- tados Unidos, nosso déficit seria de 15
do recolhimento de 1%sobre a folha de mente auto-sustentável. O sistema nas- milhões de moradias. Mas, com os pa-
pagamento dos salários de todos os em- ceu, porém, sob o escândalo e no favo- drões dos países da África, não temos
pregados sujeitos à Consolidação das recimento. Em março de 1965, a presi- déficit nenhum".
Leis do Trabalho (CLT). Seu patrimô- dente Sandra Cavalcanti interveio na A medida que o banco ia ampliando
nio inicial seria constituído com a aqui- Cooperativa Habitacional da Guana- sua área de atuação, a execução dos
sição de letras imobiliárias pelo Serviço bara. programas passava para a iniciativa pri-
Social da Indústria e Serviço Social do A entidade havia entrado em funcio- vada - e muitos de seus diretores tam-
Comércio, em volume correspondente namento três meses antes, sob a dire- bém, Não se sabe se a privatização fez
a 20%, de suas receitas compulsórias. ção do empresário e conspirador Go- bem para a política habitacional; para
Além disso, foi instituído um imposto mes de Almeida, de Gomes de Al- os diretores do BNH, certamente.
de 5% a 10% sobre a construção de meida, Fernandes, que conquistou a ad- O diretor João Fortes, oficial da Re-
propriedades de valor superior a 850 ministração da cooperativa, sem con- serva, da primeira geração de tecnocra-
430
BR DFANBSB VB.GNC.AMA, 24H04J£34ânçoa, p 143
34 an coa , p 1344
BR DFANBSB V8.GNC.AAA, 840413

tas do BNH, largou-o para fundar uma


construtora que, em poucos anos, seria
uma das mais poderosas do País. Da
mesma maneira agiu o diretor José Oli-
veira Penna, posteriormente dono da
Letra S.A., sociedade de crédito imobi-
liário e capitalização, que estouraria no
final do regime.
Essa estreita ligação entre as empre-
sas e a tecnocracia do BNH perpassou
por toda a história do banco. Na virada
do governo Geisel, por exemplo, a
Haspa S.A., uma das maiores caderne-
tas de poupança do Pais, foi vendida à
Colméia, pequena sociedade de crédito
imobiliário sediada em Brasília. Na fu-
são, assumiu uma das diretorias da
empresa Oswaldo Iório, funcionário do
BNH que coordenara a operação.
Em 1971, o banco atravessou sua pri-
meira grande crise. Até então, atuava
como banco de primeira linha. Parte da
crise foi provocada por créditos mal
produzidos - junto a empresários-,que
repassados aos agentes, resultaram em
altíssimo índice de inadimplência. A
crise culminou com denúncias do gene-
ral Gerson de Pina, diretor do BNH, de
que o banco apenas dava lucros a
"amigos e parentes dos diretores das
carteiras". As denúncias provocaram a
queda do então presidente Mário Trin-
dade, mas não afetaram a vida dos dire-
tores acusados. Nessa fina malha de in-
teresses particulares, à medida que os
aspectos financeiros eram privilegia-
dos, as metas sociais do banco
tornavam-se cada vez mais diluídas.
De 1974 até 1980, o BNH tentou co-
locar em prática o chamado modelo de
indução. Por meio dele, o banco autori-
zava as sociedades de crédito imobi-
liário a operar em faixas livres, com ju-
ros liberados. A margem das faixas li-
vres dependia do volume de aplicações
nas faixas sociais.
O modelo não funcionou. A dividir
suas aplicações nas faixas livres e so-
ciais, as sociedades de crédito imobi-
liário preferiram concentrar-se nas al-
tas faixas de financiamento, que pro-
porcionavam uma remuneração mais
satisfatória. Além disso, havia carac-
terísticas regionais que descaracteriza-
vam o modelo. Exemplo era o fato de
no Norte e Nordeste não haver de-
manda suficiente para os financiamen-
tos da faixa livre - desestimulando,
portanto, as aplicações na área social.
No balanço final da atuação do
banco durante o Regime Militar cons-
tava o financiamento de 4,3 milhões de
moradias (número inferior ao déficit
habitacional de 1963) e ameaça de co-
Agência Estado

lapso total do sistema, devido aos es-


cândalos, à crise econômica e à má ad-
ministração. A I
Luís Nassif

431
2 ( 9 A3 B AMPLIAÇ A ; PRAZO
LEPAGUE
NÃ OSAIA : NÃO VENDA

e éo

Ricardo Chaves/Abril Press


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aia CONTRA AcioraGem po Brisa Ta PASSO FUNDO feraramos: -


199 !Dr pisso
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-UP4

As elevadas prestações causa


ram

Adolfo Gerchmann
protestos em todo o Prís.
A esq.,
reunião de mutuários em Alvora
da, RS,
Jul./83; acima, preenchiment
o de
procurações judiciais na
sede da
FAMERJ, também jul./83.

el Va

Os abalos no alicerce do sis


tema

Cerca de quatro milhões de brasi- grande parte dos mutuários


pagarem
leiros tinha, em julho de 1983, uma ra- ções de Moradores do Estad
o do Rio
suas parcelas,
zão a mais que o resto da população Em razão dessa disparidad
de Janeiro (FAMERJ), estima
va, em
e, um al-
do País para angustiar-se com o envio voroço
setembro de 1984, que 230
mil mu-
percorreria 0 País. De um tuários moviam ações judici
ao Congresso do Decreto-Lei no lado, o
ais contra
BNH, pressionado pela ina-
2.045, pelo presidente Figueiredo, dimplência
os reajustes.
de 18% dos mutuários,
que limitava, por dois anos, o reajuste procurava alternativas
Novamente pressionado -
também
que lhe garan-
dos salários a 80%, do Índice Nacional tissem o retorno dos finan
pelos construtores, que não
mais con-
ciamentos;
de Preços ao Consumidor (INPC). de outro, os compradore
seguiam negociar seus imóvei
s, tanto
s, iniciando a
Eram os mutuários do Sistema Finan- formação
por causa dos aumentos
das presta-
de associações de mu-
ceiro de Habitação (SFH), vitimados, tuários em todo o País,
ções quanto por culpa do arroc
ho sa-
organizavam larial -, o SFH optou então
no mesmo mês, por um reajuste de protestos, impetravam mand
por subsi-
ados de diar as prestações pelo períod
128o, nas prestações das casas adqui- segurança contra o aume
o de um
nto e inicia- ano, adotando uma bonifi
ridas através do Banco Nacional da vam boicotes às prestações
cação de-
, exigindo crescente nas parcelas a serem
Habitação (BNH), aumento superior, solução para o caso, Pela
pagas
adoção de
em 10" ,, à evolução dos salários, no medidas paliativas - como
até setembro do ano seguinte. Esse
o desdo- subsídio,
período de junho de 1982 a julho da- bramento dos reajustes anuai
no entanto, representaria
s em se- acréscimo de 4% nas presta
quele ano - o mesmo considerado no mestrais -, o BNH conse
ções dos
guiu afastar,
aumento da casa própria. provisoriamente, o colap
novos mutuários e, para aliviar
a co-
so do sis- notação negativa dessa medid
O esquema adotado pelo Regime tema.
a na
venda de unidades novas,
Militar para atrelar o trabalhador ao Em 1984, porém, o fanta
o BNH
sma do es- criou o plano de equivalência
compromisso da casa própria - touro
salarial,
do SFH retornava, represen- que garantiria reajustes propor
tornando-o, consequentemente, fator tado,
cionais
dessa vez, por um reajuste de aos dos salários e nunca
de estabilidade política e social, por 190% nas prestações. Com
superiores
atraso de aos 107% do INPC. Apesar
estar amarrado à necessidade de se- uma ou mais parcelas, já se
do alívio
contabili- financeiro representado pelo
gurança - havia falhado em todos os bônus,
zavam 53%, do total de mutuários. as associações e certos setore
seus aspectos. Com a crise econômica Nem era necessário articu
s da im-
lar um boi- prensa não deixavam de alerta
e o desemprego, aumentaram os sa- cote em nível nacional. Na
r que
prática, essa era mais uma bomba-relógi
ques no Fundo de Garantia do ele já existia. Em todo o País,
o co-
as asso- locada no sistema. Com a
Tempo de Serviço e nas cadernetas ciações de mutuários estim
mudança
ularam a de governo, em 1985, previa-se
de poupança - estas e aquele usados ida em massa à Justiça
que os
e nos obscuros salários deveriam ser parcia
no financiamento da construção e contratos adotados pelo siste
lmente
ma fo- desarrochados,
venda de moradias, De outra parte, o ram encontradas brechas que
levando a novos au-
permiti- mentos
aumento das prestações pela primeira Tam ganho de causa, em prime
significativos da prestação.
ira ins- Por outro lado, o bônus termin
vez superou o dos salários, fato que tância, aos compradores. Jó
aria e o
Resende, reajuste do ano ameaçava
trazia consigo a impossibilidade de presidente da Federação das
chegar aos
Associa- 300%, graças à inflação galopa
nte. '
oo a - JOMAR C -=-

432
BR DFANBSB VB8.GNC.AAA, 3 4,
41334 an 0a, py
p 1%
2404133 an co2,
sr Dransss

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CIDADES: a evolução da urbanização

As cidades inchadas

Em 1960, viviam nas cidades brasileiras 45% da população. Em 1980, já eram


67%, como nos países ricos. Mas esses recordes não permitiam nenhuma
comemoração: eram recordes de problemas

Meados de 1971. O governo Médici pertório das glórias do novo Brasil dos No Rio de Janeiro, entre 1960 e
trombeteia os.recordes da nossa econo- militares. É que, se indicava os avanços 1970, duplicou o número de favelas (de
mia, anunciando o "milagre econô- da industrialização acelerada, não po- 147 para 300) e triplicou o número de
mico". A propaganda oficial não des- dia esconder um grave drama: as cida- favelados (355 mil para 1 milhão).
perdiça sequer um único índice estatis- des brasileiras, principalmente as maio- Em Recife, das 195 mil habitações
tico comparável aos seus equivalentes res, haviam crescido rápido demais e da cidade, mais de 100 mil eram mo-
desordenadamente - incharam, na ver- cambos, em 1972. No mesmo ano, Sal-
de países ricos.
Eis que o Instituto Brasileiro de Geo- dade. Estavam abarrotadas de gente vi- vador servia com esgotos apenas 4%
grafia e Estatística (IBGE) divulga os vendo em condições miseráveis. dos seus pouco mais de um milhão de
primeiros resultados do Censo Demo- Eis uma amostra: em São Paulo, no habitantes. Os Alagados, uma espécie
gráfico de 1970 e se vê que, finalmente, início dos anos 70, a população fave- de cidade dentro da cidade de Salva-
o Brasil deixara de ser um país eminen- lada crescia a uma taxa de 25% ao ano, dor, construída em cima da lama e do
temente rural. Pela primeira vez, um cinco vezes mais depressa do que a po- lixo, possuiam cerca de 15 mil casas,
Censo Demográfico registrava mais pulação total da cidade. Ela recebia abrigando perto de 80 mil pessoas.
gente vivendo nas cidades do que nos quase 150 migrantes por hora, que se Em Fortaleza, a população da área
campos. Igualzinho aos países ricos in- iam despejando nas favelas e nos bair- metropolitana havia triplicado entre
dustrializados. Aqui, 56% da população ros periféricos, em loteamentos clan- 1950 e 1970, atingindo 900 mil habitan-
era urbana em 1970, contra 45% em destinos, sem água, luz e esgotos, mal tes. Destes, 300 mil eram menores de
1960. Um salto espantoso. servidos por ônibus urbanos e quase 18 anos vivendo em estado de "aban-
A virada, no entanto, foi pouco di- sem nenhuma estrutura de segurança dono material", dos quais 60 mil em
vulgada e contou muito pouco no re- pública e assistência médica e social. abandono total. Três mil crianças vi-
BR DFANBSB 2404 1334 anCo2a,

viam com suas mães na zona do me- as migrações e a estimativa da ONU fia, adiantando em quase 20 anos a
retrício. acabou não se confirmando. proporção dos brasileiros vivendo na-
"Ribeirão Preto, no interior de São Mesmo assim, o processo de urbani- quelas metrópoles. Além disso, o
Paulo, tinha cerca de 10% dos seus 200 zação não parou nem deixou de ser im- mesmo Censo de 1980 constataria que
mil habitantes vivendo como marginais pressionante. Um exemplo é o que 67% da população viviam nas cidades e
"*"rurbanos", palavra inventada por so- aconteceu nas nove principais áreas 33% no campo. Em 1950, a proporção
ciólogos para indicar as pessoas que vi- metropolitanas do Brasil, que se forma- era quase a mesma, mas invertida: 36%
viam nas favelas urbanas, mas trabalha- ram em torno de Belém, Fortaleza, Re- nas cidades e 64% no campo. Ou seja,
vam no campo como bóias-frias. cife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de em apenas 30 ános, o País virou do a-
Esse era o resultado de um cresci- Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto vesso.
mento urbano que a ONU classificava Alegre. Até os anos 40, exceto em áreas
como o mais rápido do mundo. Se per- Em 1972, aproximadamente 25% dos como São Paulo, não se podia dizer
manecesse naquele ritmo, a ONU esti- brasileiros viviam nessas nove áreas. Na que a população urbana do Brasil es-
mava, no início dos anos 70, que São época, a projeção mais aceita entre os tava crescendo vertiginosamente, a
Paulo poderia ser a maior cidade do demoógrafos era a de que, no ano 2000, despeito de crescer mais rápido do que
mundo em 1984, com cerca de 20 mi- estariam vivendo nesses locais algo em a população total. A industrialização,
lhões de habitantes. Entretanto, a crise torno de 29% da população do País. grande responsável pela urbanização,
econômica que atingiria seu auge no Pois bem, o Censo Demográfico de tomou impulso decisivo a partir dos
início dos anos B0 se encarregaria de co- 1980 constatou que os 29% da popula- anos 30, mas seria na década de 50, so-
locar freios no Brasil em geral. A quedà ção já então estavam concentrados nes- bretudo na sua segunda metade, que
violenta no ritmo da produção indus- sas áreas. Em outras palavras, a urbani- seus reflexos na estrutura populacional
trial e o consequente acirramento do zação do País prosseguiu violenta, a do Brasil se tornariam mais visíveis.
desemprego fizeram refluir um pouco ponto de driblar a ciência da demogra- Nos anos 40, a proporção dos brasilei-

0 inchaço da Grande São Paulo

a o
edil

& ª das Cruzes


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l Cê) LESTE
O
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3 A-
Itapecerica da Serra QÚ:
QC? Q Ga
Evolução da mancha urbana até 1980

até 1930

O 1930 a 1962 O
O
O 1962 a 1980 o SUL

O mapa representa a expansão da mancha plificação daquela publicada em A.Grande São áreas ociosas, à espera de valorização. Um es-
urbana da Grande São Paulo emtrês períodos Paulo Hoje, pela Empresa Metropolitana de tudo da EMPLASA, feito em 1980, mostrou
até 1930; de 1930 a 1962; e de 1962 a Planejamento da Grande São Paulo (EMPLA- que havia 1.124 terrenos vagos, perfazendo
1980. Foi elaborado pelo pesquisador Flávio SA). Por ela se vê que a expansão da mancha 10.449 hectares (cerca de 8% da área total da
Villaça, a partir da análise de fotos do satélite urbana não aconteceu de forma contínua, prin- mancha urbana)
Landsat. A versão aqui reproduzida é uma sim- cipalmente devido à retenção especulativa de

434
pesa,
Jussi Lento/Abril Press

Juca Martins

Júlio Cezar Pereira/Agência O Globo


25
"um“

Nos anos 70, as cidades brasileiras, sobretudo as maiores, haviam crescido rápida e desordenadamente. Acima, à esq., os grandes
congestionamentos nas "marginais" de São Paulo; no meio, o centro paulistano; à dir., a favela da Rocinha, no Rio

ros vivendo nas cidades cresceu em 5% veriam muito menos mão-de-obra do população crescia como nunca e era
(de 31%, em 1940, para 36%, em 1950); que a disponível. Além disso, fábricas atraída para as cidades em busca de
na década de 50, essa proporção cresceu de alta produtividade precisavam de emprego - que em termos absolutos
em 9% (atingindo 45% em 1960); e nos muita gente para comprar seus produ- crescia realmente -, as indústrias ten-
anos 60 se deu o grande salto de 11% tos; e esse mercado interno, entretanto, diam a utilizar relativamente menos
(56%% da população em 1970). Se colo- é relativamente pequeno nos países mão-de-obra que no passado. Resul-
cássemos esses números em um grá- pobres. Neles, a agricultura não se de- tado: as cidades vão inchando.
fico, teriamos uma curva com uma senvolveu de maneira a criar uma classe O modelo de desenvolvimento esbo-
acentuada inflexão para o alto em 1950. numerosa de consumidores e, nas cida- sado na segunda metade dos anos 50 e
Longe de ser uma coincidência, isso re- des, o desemprego e o subemprego são adotado firmemente pelos militares a
flete a reorientação dada à economia altos. Por outro lado, é muito difícil partir de 1964, "resolveu" o problema
nos anos 50, durante o governo de Jus- para esses países venderem seus produ- da escassez de capitais escancarando as
celino Kubitschek, quando a industria- tos industrializados no mercado ex- portas às multinacionais e endividando
lização foi acelerada pelo ingresso ma- terno, onde enfrentam a concorrência excessivamente o País. Os juros dessa
ciço dos capitais e técnicas estrangei- de trustes multinacionais de altíssima dívida e as pesadas importações de má-
TOS. eficiência e as barreiras protecionistas quinas, insumos industriais e tecnologia
A partir daí, o processo de urbaniza- dos países ricos. Com isso, os países po- tiveram de ser pagos, inicialmente com
'ção do Brasil passou a seguir o padrão bres que decidiram manter-se na com- mais destaque, com os produtos agrico-
comum ao dos países subdesenvolvi- petição tenderam a baixar ao máximo las e minerais de que mais necessitavam
dos que enveredaram para a industriali- seus preços, adotando tecnologia mais os países ricos e que tinham de ser pro-
zação atrelados às economias dos avançada (importando-a), o que só fez duzidos em padrões também "moder-
países ricos. A grande diferença entre crescer a incapacidade de oferecer em- nos", acelerando ainda mais o processo
esse padrão e o que se verificaria déca- pregos urbanos. Mas as cidades não pa- de expulsão do homem do campo.
das antes nos países desenvolvidos foi a raram de receber migrantes, e foram O problema do estreito mercado in-
incapacidade de as economias sub- inchando, inchando . . . terno foi "resolvido" privilegiando a
desenvolvidas garantirem empregos su- produção e o consumo de bens durá-
ficientes para absorver o próprio cres- A partir de JK, o País utiliza veis relativamente sofisticados por
cimento natural das populações urba- mais o capital estrangeiro parte das classes altas e médias altas,
nas e ainda os enormes contingentes de cujo poder aquisitivo seria incremen-
migrantes expulsos das áreas rurais. A década de 50 é o período para en- tado por uma política concentradora
Quando a tecnologia atingiu um ni- tender problemas da urbanização do de renda. Esse modelo de desenvolvi-
vel que determinava mais drastica- País. Foi a partir do governo Juscelino mento precisou de grandes contingen-
mente a dispensa de braços operários, a que o País passou a utilizar mais inten- tes de mão-de-obra concentrados em
partir do início deste século, as popula- samente o capital estrangeiro para de- pequenas áreas para facilitar a implan-
ções dos países ricos já haviam redu- senvolver a economia. E com ele che- tação da complexa infra-estrutura in-
zido em muito seus ritmos de cresci- gam tecnologias que se caracterizam dustrial que se fazia necessária. Rapi-
mento. Os países subdesenvolvidos, po- por utilizar relativamente pouca mão- damente, o Brasil transformou-se num
tém, não tiveram a mesma sorte. Eles de-obra. E tudo isso ocorreu justa- país dotado de moderna e extensa rede
entraram na fase de industrialização mente no período de maior cresci- de telecomunicações e com energia
quando a tecnologia já havia melho- mento populacional do País - de 52 mi- elétrica à vontade, mas vendida a pre-
rado muito a eficiência das máquinas. lhões, o Brasil saltava para 70 milhões ços subsidiados às indústrias. Aos tra-
Os países subdesenvolvidos, se quises- de habitantes, um aumento de 35%. balhadores, porém, esses avanços não
sem industrializar-se depressa, precisa- O rápido processo de industrializa- deram mais do que a oportunidade de
riam de capital em quantidade que não ção desse período gera também uma ter como principal atividade de lazer o
tinham, para fazer indústrias que absor- rápida urbanização. Assim, enquanto a passivo hábito de assistir pela televisão
435
BR DFANBSBV8.GNC.AAA, 10441 324 ano0oa, p538
b.. "ANBSB VB.GNCAM 404 ) 3234 anCO2, p 133

ao bombardeio sistemático da propa- complementaridade -, assistiu-se ao

Agência O Globo
ganda das "novidades" consumíveis agravamento das pressões sobre o uso
apenas pelas parcelas mais favorecidas. indevido do solo urbano: crescimento
O automóvel, por exemplo, principal vertical exagerado nos espaços intra-
propulsor da industrialização brasileira urbanos, destruição de espaços verdes,
nas últimas décadas: para recebê-lo, as construção desordenada de vias eleva-
nossas grandes cidades sofreram pro- das, falta de racionalidade na ocupação
fundas transformações. dos espaços periféricos, etc." Pode-se
Quando se tornaram insuportáveis os dizer, segundo Barat, que muitas das
monstruosos congestionamentos de deformações surgidas em nosso pro-
trânsito nas grandes metrópoles, o go- cesso de urbanização foram, de certa
verno investiu em gigantescas obras forma, uma consequência do mau
viárias, em detrimento do saneamento equacionamento da expansão dos siste-
básico, transportes coletivos e moradia mas de transportes,
para os trabalhadores de baixa renda. Outro aspecto que merece ser ressal-
Verdadeiro símbolo dessa política são tado é a estreita vinculação entre a es-
aqueles mais de 3,5 quilômetros de via peculação com terras urbanas e o mo-
elevada que a população da capital delo econômico. O Estado promoveu a
paulista apeldou de "minhocão". industrialização de forma seletiva, es-
Cofistruído durante a gestão do então colhendo empresas ou grupos econô-
prefeito Paulo Maluf, o "minhocão", micos para os quais deu total apoio,
oficialmente conhecido como Elevado tanto em crédito como em investimen-
Costa e Silva, é também poderoso tos em infra-estrutura, Quem ficou de
exemplo do desprezo ao planejamento fora desses setores escolhidos tinha
urbano: ele foi feito exatamente onde o pouca chance de se dar bem investindo
Plano Urbanístico Básico de São Paulo, em atividades produtivas. Então, a.
elaborado na gestão do prefeito Faria terra ganhou força como um investi-
Lima , previa a construção de um dos mento seguro, nas cidades ou no
mais importantes ramos do metrô ! campo, O resultado disso é que, em
média, metade das áreas urbanas, em
Privilégio ao automóvel ficou 1981, era composta por terrenos vazios
explícito no governo Médici destinados apenas a reter valor, de
acordo com estimativas do professor
O privilégio ao automóvel nas políti- Cândido Malta Campos Filho, da Fa-
cas de transportes no Brasil ficou expli- culdade de Arquitetura e Urbanismo
cito no Programa Nacional de Vias Ex- da USP (Folha de S. Paulo, 25/10/81).
pressas (PROGRES), lançado em 1972 Segundo ele, esses terrenos eram com-
pelo governo Médici. O PROGRES prados por investidores à espera da va-
previa "integrar a rede rodoviária na- lorização trazida pelas melhorias na
cional e a rede viária urbana para esta- infra-estrutura urbana, Em outras pala-
belecer um sistema de circulação rá- vras, eram os investimentos públicos
pida e econômica", através da constru- que valorizavam esses terrenos: "Para o
ção e melhorias de vias expressas, anéis trabalhador", disse o professor Cân-
rodoviários e estradas de contorno nas dido Malta, "isso significa que ele vai
grandes cidades, Como se vê, um plano morar mais longe. Se ele vai comprar
pujante. Mas por ele se percebe clara- um terreno, só conseguirá comprar
mente que não foi por acaso que se de- muito longe, porque essa retenção de
teriorou o sistema de transporte ferro- valor levanta o preço da terra e cria
viário urbano até o ponto crítico de uma escassez artificial", Isto significa
Agência Estado

provocar mais de trinta explosões de que, morando mais longe, se criará um


revolta e "quebra-quebras" de trens e "vazio urbano intermediário", Quando
estações, em São Paulo e Rio de Ja- se formam aglomerados, explica o pro-
neiro, entre 1974 e 1984, fessor, vai ser solicitada a urbanização
De acordo com o economista Josef da área distante; para chegar até lá, os
Barat, estudioso dos problemas dos ônibus passam pelo vazio interme-
transportes urbanos no Brasil, até a dé - diário, valorizando-o cada vez mais . . .
cada de 50 as cidades grandes e inter- e empurrando para mais longe ainda a
mediárias viveram um processo de "fronteira urbana",
crescimento orientado através do trans- Ao mesmo tempo em que adotava
porte público. Essa concepção foi res- esse modelo de desenvolvimento que
ponsável, em grande medida, por pa- faria inchar caoticamente as cidades, o
drões mais racionais de ocupação do Regime Militar se encarregava de colo-
solo. Entretanto, "a partir do momento car sérios obstáculos à solução dos pro-
em que ficou claro o papel do trans- blemas urbanos, considerados de "res-
porte como condicionante e orientador ponsabilidade dos municípios". Uma
da expansão urbana - com papéis defi- contradição, pois foram exatamente es-
nidos para cada modalidade e dentro tes os mais prejudicados pelo autorita-
de uma concepção de integração e rismo e por uma política tributária que

436
BroranssB Vs.GNCAAA, 132. Anco2, p. 8&O

concentrou na esfera federal a parte


João Bittar/Abril Press

mais polpuda dos recursos públicos.


Osasco, município da região Oeste
da Grande São Paulo, é um bom exem-
plo dos efeitos dessa contradição. Em
1983, quando completou 25 anos de au-
tonomia política, a cidade de Osasco ti-
nha a feição de um pólo industrial cer-
cado de vilas e bairros operários, Todo
o seu poderio econômico, no entanto,
pouco resultava em benefícios. A ci-
dade não tinha recursos e se debatia
com problemas gigantescos. Apenas
para resolver o mais sério deles - as
inundações frequentes causadas por
uma retificação no rio Tietê - seriam
necessárrios dez bilhões de cruzeiros,
valor de 1983, durante 15 anos. Entre-
A política de transporte do Regime Militar privilegiou o automóvel (na pág. ao lado,
tanto, a prefeitura não dispunha de
viaduto e avenidas em São Paulo), em detrimento do transporte coletivo, sobretudo
mais do que 2,02 bilhões de cruzeiros
ferroviário (na pág. ao lado, acima, pingentes da RFF - Rede Ferroviária Federal),
para aplicar em "todos" os problemas
situação que gerou violências, como a depredação da estação Jaraguá (SP), em 83
de infra-estrutura urbana, naquele ano.
Nas cidades, o saneamento básico
Zona Sul de São Paulo: um exemplo urbano teve um desenvolvimento manco
Outro exemplo se encontra na polí-
A zona Sul da capital de SãoPaulo os esgotos clandestinos, que jogavam tica de saneamento básico adotada a
é um exemplo típico de aglomerado os dejetos nos rios e reservatórios que partir de 1964, Em teoria, era permitido
urbano gerado pelo crescimento açce- abasteciam a cidade de água., Exce- às administrações municipais e esta-
lerado das cidades brasileiras. Nela, tuando-se as grandes avenidas, a gran- duais realizarem obras de saneamento,
apenas os bairros de Santo Amaro e de maioria das ruas da zona Sul, mas a carência de recursos as obrigava
Capela do Socorro tinham mais de 1,2 quando existiam, eram de terra, Os a adequar-se aos planos do governo fe-
milhão de habitantes, em 1980, Ao ônibus que operavam na região per- deral, Assim, as soluções adotadas aca-
longo dos anos 70, o número de in- corriam caminhos esburacados, peri- bavam não levando em conta as especifi-
dústrias na região passou de dois mil g0sos e longos, "excelentes para assal- cidades dos problemas de saneamento,
para seis mil. tantes", nas palavras de um motorista. como seria de se esperar caso fossem
Esse crescimento aconteceu apesar Em Campo Limpo, em 1983, não planejadas inteiramente pelas adminis-
da existência do Plano Metropolitano existia sequer um metro de esgoto. trações locais, A concentração de re-
de Desenvolvimento Integrado Apesar de todas as dificuldadese cursos na área federal levou à realiza-
(PMDL), elaborado em 1971 para ten- sofrimentos, a zona Sul de São Paulo ção de grandes obras que só podiam ser
tar orientar o crescimento da cidade se transformou numa das regiões mais executadas pelas grandes empreiteiras
no sentido leste-oeste, e de uma Lei politizadas do País. Aliás, foramjusta- especializadas, Resultado: o sanea-
de Mananciais, de 1975, para prote- mente as péssimas condições de vida mento básico nos grandes centros urba-
ger a água da cidade, impedindo altas as responsáveis pela crescente organi- nos teve um desenvolvimento manco
densidades populacionais nas proxi- zação da população. Em Santo de uma perna: de modo geral, o abaste-
midades de rios e represas (estão na Amaro e Campo Limpo, existiam cimento de água teve um crescimento
zona Sul de São Paulo as represas de pelo menos 85 associações de mora- satisfatório (76% dos domicílios urba-
Guarapiranga e Billings). dores cadastradas, em 1981, além de nos estavam ligados às redes de água
A despeito disso, a zona Sul um incontável número de organiza- em 1980, contra 54% em 1970), mas
tornou-se a região de mais fácil acesso ções de favelados. Para os médicos não foi acompanhado pelo necessário
' da capital. Para lá, vão grandes aveni- sanitaristas do Estado que atuavam na crescimento das redes de esgoto. Tam-
das como a Vinte e Três de Maio, a região, ouvidos por O Estado de S. bém neste caso se vê a mão de uma
Santo Amaro e a Marginal do rio Pi- Paulo (18/01/81), "tudo que se conse- "política": a urbanização sem planeja-
nheiros, Essas facilidades atraíram as guiu em Santo Amaro se deve à mento, caótica e rápida, criou grandes
indústrias, que também se aproveita- atuação sistemática desses grupos". aglomerados em pequenas áreas, im-
ram do rio Pinheiros como escoa- Estavam também na zona Sul os possibilitando o acesso das redes de es-
douro de seus resíduos. Conseguente- grandes redutos do chamado bloco goto por absoluta falta de espaço para
mente, atraíram também mão-de- popular doPMDB e um grande nú- cavar galerias. Como essa dificuldade
obra, O resultado é que, em 1983, mero de Comunidades Eclesiais de não é tão grande para o caso das redes
existiam 250 mil favelados vivendo Base, em geral ligadas ao PT, respon- de água - custam três vezes menos, em
em mais de 300 núcleos, somente em sáveis por boa parte das votações que média, do que as redes de esgoto -,
Campo Limpo, e no bairro de Santo elegeram, em 1982, deputados fede- criaram-se situações absurdas, como a
Amaro existiam cerca de 300 lotea- rais como o metalúrgico Aurélio Pe- de favelas, em São Paulo, com água en-
mentos clandestinos, sem qualquer res (PMDB) e a professora Irma Pus- canada pelo menos em algumas bicas,
infra-estrutura urbana, Eram comuns soni (PT). 5 mas "flutuando" nos seus próprios es-
gotos. Um símbolo da urbanização do
A Regime Militar.
437
BR DFANBSB VB.GNCIAMA, 840412331 neo, pIJSI

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/EDUCAÇÃO: as universidades brasileiras


bolo de luta pela superação do atraso
cultural e do subdesenvolvimento bra-
sileiro. Foi preciso contentar-se com o
caráter da reforma universitária em-
preendida pelo Regime Militar.
Universidade sufocada O presidente Castello Branco, ao to-
mar a reforma nas mãos, realmente
romperia com o padrão da escola supe-
A luta pela reforma universitária exigia um ensino livre numa rior do passado, mas na direção dos in-
sociedade livre. O Regime Militar "reformou" o ensino com teresses que podem ser resumidos na
lapidar frase do político baiano Juracy
repressão e obscurantismo
Magalhães: "O que é bom para os Esta-
dos Unidos ébom para o Brasil." Neste
"Estamos em 1897. Em São Paulo, ti- pulação. Resumindo: mesmo após a re- sentido, a política de repressão a estu-
nham acabado de construir o prédio do volução de 30, com exceção feita à dantes e intelectuais após o golpe mili-
Museu do Ipiranga, feito para come- Universidade do Distrito Federal, logo tar deve ser encarada como parte da
morar a Independência, mas não sa- vítima da repressão da ditadura do Es- necessária desmobilização das resistên-
biam o que fazer dele porque não havia tado Novo, e da criação inovadora, em cias à desnacionalização do ensino.
material parazo museu... Aí, resol- 1934, da Faculdade de Filosofia, Ciên- O Regime Militar precisava dispor
veram fundar lá uma umversndade cias e Letras da Universidade de São de uma estrutura legal que preparasse o
idéia que acabou não se concreti- Paulo, não existiam no País condições terreno para adaptar o sistema universi-
zando." É assim que Paulo Duarte, um para a concretização de uma autêntica tário ao novo modelo econômico que
dos organizadores da Umversndade de vida universitária. se pretendia implantar Seria preciso
São Paulo (USP), se refere à primeira No início da década de 60, erguiam- preparar quadros técnicos para as mul-
tentativa de criação de uma universi- se vozes em torno do problema da es- tinacionais que aqui se instalariam,
dade no País. cola superior brasileira. Em maio de bem como preparar pessoal capaz de
Na realidade, ela ainda não fazia 1960, a União Nacional dos Estudantes mover a infra-estrutura de comunica-
muita falta. As necessidades sociais (UNE) promove o Primeiro Seminário ções, transporte, energia etc., neces-
eram perfeitamente atendidas pelo fun- Nacional da Reforma Universitária. sária para o funcionamento daquelas
cionamemo isolado de faculdades, até . Dele resulta um documento que afirma empresas. A política universitária pós-
o início da década de 30, quando no ser a universidade incapaz de elaborar 64 vai consolidar-se em duas etapas: a
primeiro governo Vargas (1930-45), uma cultura nacional e popular. Rei- pnmelra até 1968, onde as medidas to-
Francisco Campos, também conhe- vindica uma reforma universitária que madas têm um caráter de contenção,
cido, pejoratlvamente por "Chico possibilite à universidade a participa- tanto da mobilização estudantil como
Ciência", o primeiro a ocupar o recém- ção na construção de um modelo eco- da expansão do sistema. Embora o
criado Ministério da Educação, Saúde nômico definido por interesses nacio- novo modelo econômico necessitasse de
e Higiene, propõe a organização de um nais. O ideal de reconstruir a universi- um maior número de profissionais de
sistema universitário - na verdade, um dade passou a associar-se definitiva- nível superior, constata-se que o nú-
agrupamento de faculdades desvincula- mente à solução dos problemas econô- mero de vestibulandos entre 1964 e 68
das umas das outras. micos, sociais e políticos do País. A de- cresce 120% em relação ao período
mocratização interna é vista como ne- 60-64, mas o número de vagas entre 64-
Diploma universitário era cessária para a construção de uma uni- 68 decresce 11% em relação a 60-64.
indicador de status social versidade nova, criadora, crítica e so-
cialmente atuante. Reivindica-se a au- Na escola do regime, preparação
Na década de 50, esse tipo de sis- tonomia de pensamento na universi- para quadros das múltis
tema universitário estava já atrasado dade e o desenvolvimento econômico
em relação às necessidades sociais e independente do País - uma universi- Isto gera um crescente protesto de
econômicas do País. O setor de pes- dade livre numa sociedade livre . .. docentes e discentes, aumentando a
quisa, por exemplo, fundamental para A criação da Universidade de força de mobilização e organização do
sustentar o desenvolvimento industrial, Brasília, em 1961, pode ser vista como movimento Estudantil, a despeito de o
continuava como um corpo estranho e tentativa de concretização dessa re- governo já se ter prevenido com medi-
sem funçao definida. A universidade forma. Os intelectuais Anísio Teixeira e das repressivas. Por exemplo, a "Lei
daquela época se caracterizava por feu- Darcy Ribeiro, entre outros, baseados Suplicy" (em "honra" a Suplicy de La-
dos, dominados pela figura de um pro- na integração do ensino com a pes- cerda, ministro da Educação de Cas-
fessor catedrático, a imprimir aos cur- quisa, propunham a organização de fa- tello, lei de 9 de novembro de 64), que
sos um caráter enciclopédico, elitista, culdades e institutos centrais e a cria- extinguiu a autonomia e representati-
não voltado para as necessidades obje— ção de cursos introdutórios (que da- vidade das entidades estudantis,
tivas de um país que passava por signifi- riam a formação básica para cada área transformando-as em apêndice do Mi-
cativas modificações no campo econô- de conhecimento), cursos de bachare- nistério da Educação; extinguiu a
mico. lado, mestrado e doutorado. A fase de UNE, as UEEs e os CAs (Uniões Esta-
Além disso, o diploma universitário implantação dos institutos estava em duais de Estudantes e Centros Acadê-
era uma espécie de indicador de presti- seu momento decisivo quando, em 9 de micos); criou o Diretório Nacional dos
gio e status social. Em 1942, por exem- abril de 1964, a UnB é invadida a Estudantes, que só poderia reunir-se
plo, de quase 1,7 milhão de alunos que mando do marechal Castello Branco. convocado pelo Ministério ou pelo Con-
ingressaram na primeira série do então Fechada a universidade, destituídos selho Federal de Educação e ainda as-
curso primário, somente 16.450 chega- os diretores, presos professores e alu- sim no período de férias. Em 1967, pelo
ram ao ensino superior em 1953, o que nos, queimados os livros "subversivos" Deereto-Lei no 252lflcou determinado
correspondia a menos de 0,25% da po- da biblioteca, estava destruído um sím- que a representação discente se limi-
438
Br DFANBSB V8.GNÇÃAA, p I8A

3- tasse ao âmbito de cada universidade e


29 sem manifestar-se politicamente.
S
% Na segunda etapa, ou seja, pós-68, as
Pm 2 medidas repressivas concretizam-se no
8
AI-5 e, no âmbito universitário, no
A Decreto-Lei no 477/69, que proibe qual-
quer manifestação de professores, alu-
nos ou funcionários, sob pena de pro-
Jl cesso, prisão e perda dos direitos.
F em
< af g" s£ É nesta segunda etapa que a reforma
A ,
universitária se configura em lei. A re-
forma universitária do Regime Militar
i3
Li
.a
2
tem origem nos chamados Acordos
MEC-USAID (Ministério da Educação
ª4 KQ
à Sa $ |

e Cultura do Brasil-Agência dos Esta-


: ª
;4 ç
A dos Unidos para o Desenvolvimento
Internacional), ponto-chave da política
EF ,o de desnacionalização do ensino brasi-
leiro. Através desses acordos técnicos,
americanos e brasileiros (sob a coorde-
ni-

nação do teórico da filosofia educacio-


2a e
nal americana para a América Latina,
ir 7 Rudolph Atcon) procurariam propor a
a
modernização do ensino superior em
nosso país.

A reforma universitária tem


origem nos acordos MEC-USAID

No final de 1967, o governo brasi-


leiro criou uma comissão chefiada pelo
coronel do Exército Meira Mattos, para
fazer um levantamento da crise e inter-
vir nas universidades. O que a comissão
o
propôs se encaixava perfeitamente no
espírito dos acordos MEC-USAID. O
2
ks]
o

o mesmo aconteceu com as propostas


[
o do Grupo de Trabalho da Reforma
[3

d
4
Universitária, materializadas na Lei no
5.540, aprovada em 28 de novembro de
odete" 2 f 1968.
A modernização ocorre, assim, me-
<br É A Ba
. mivo 9a esto E
io ao sea E 2
K" “"“"“. f l
nos por pressão estudantil e mais pela
174 - ! 1 | deca
descoberta de que a inovação poderia
» 1 ser manipulada sem ameaças à estru-
tura de poder.
Efra 2 ato -
E ha # Hoc pee A educação passa a ser encarada ofi-
#4 ** cialmente como um fenômeno isolado
HH es ca do resto do contexto social e político,
INI -- identificando-se a reforma universitá-
inn -- ria com remodelações técnico-
| Nini-- -- administrativas, Bastaria uma "boa di-
titia reção" para se ter um "bom rendi-
mento". Racionalização, eficiência e
produtividade tornam-se valores abso-
lutos, sobrepondo-se, pretensamente, a
qualquer opção política.
Em termos organizacionais a lei pro-
punha que o ensino superior fosse mi-
nistrado preferencialmente em universi-
dades, nas quais a menor estrutura se-
ria o departamento, congregando disci-
plinas afins. Propõe também a não du-
plicação de serviços, visando maior
economia e melhor produtividade.
A criação da Universidade de Brasília (no alto, o presidente João Goulart assina o Além do reitor, as universidades de-
decreto de criação da UnB, em 16/12/1961) foi uma tentativa de intelectuais como Darcy veriam ser administradas por conselhos
Ribeiro e Anísio Teixeira ( acima) deformar no País uma universidade nova, criadora, compostos de membros das comunida-
crítica . . . Mas, em 9 de abril de 1964, a UnB é invadida a mando de Castello Branco des acadêmicas, representantes do Mi-
439
er praNBSB VBGNGÃAA 2404334 an002, p 18 3

nistério da Educação e representantes de estudantes que, antigamente, cami- dignidade seu trabalho.
das comunidades locais, que na prática nhavam juntos na vida acadêmica. Para se ter uma idéia da evolução do
funcionariam como emissários do po- Elimina-se, desta forma, uma das vigas ensino privado, basta dizer que em
der. mestras da organização estudantil, 1963 o País contava com 28.944 docen-
Dezesseis anos após a retomada do tes e em 1980 eram 116.827, dos quais
Com 'a unificação do vestibular, Regime Militar, a universidade era mais de dois terços trabalham em esta-
surge a "geração cruzinha" mais conservadora que o antigo mo- belecimentos particulares. Do ponto de
delo, O que lhe dava um toque moder- vista mais geral, o ensino particular
As unidades universitárias deve- nizante era o fato de que se utilizava de cresceu cinco vezes mais que o ensino
riam promover cursos de graduação, recursos mais modernos de comunica- público de 1963 para 1980.
pós-graduação, aperfeiçoamento e es- ção e de controle administrativo e pe-
pecialização, bem como a pesquisa. dagógico. Sem dúvida, sob alguns as- A universidade estava distante
Extingue-se a cátedra, criando-se a car- pectos, como o da diversificação dos da realidade nacional
reira docente, Isto, entretanto, gera a cursos, a situação melhorou: em 1960
corrida pela titulação, que se traduz havia 1.115 faculdades no País; em Nos anos 80 a universidade se deba-
numa produção acadêmica desvincu- 1980 contávamos com 4,394 estabeleci- tia para encontrar seu caminho, reivin-
lada das necessidades sociais - ascen- mentos de ensino superior. Mas um dicando maior autonomia e democrati-
der na carreira acaba sendo umadas exame mais cuidadoso demonstra zação interna, exigindo a destruição
pouças alternativas para obter melho- como se chegou a isso: em parte atra- dos canais de arbítrio e controle polí-
rias" salariais. Unifica-se o vestibular, vés da implantação da "indústria do sa- tico que a tornaram uma massa amorfa.
dando origem à "geração cruzinha", ber", com o surgimento de cursos de A crise da universidade era a crise de
aquelas legiões de candidatos mais preo- fim de semana e do inchaço da rede uma máquina cara e imanejável, dis-
cupados em aprender as "mancadas" particular que atua principalmente na tante da realidade nacional, que difícul-
dos exames do que em se preparar para área de Ciências Humanas. E essa é tava a pesquisa e sufocava a criativi-
serem profissionais competentes. uma "indústria" com um grande lucro, dade, que era incapaz de fornecer ins-
Criam-se os currículos mínimos, com pois necessita de uma infra-estrutura trumentos de reflexão crítica séria so-
prioridade do cumprimento de deter- que se restringe quase sempre a salas bre os problemas do País, divorciada
minado número de horas-aula e não de aula superlotadas de sonolentos alu- dos anseios da população.
do conteúdo a ser transmitido aos alu- nos; lousa; giz e um professor hora-aula
nos. Introduz-se a matrícula por disci- dedicado, mas mal remunerado - sem
plina, desfazendo-se, assim, os grupos as minimas condições de exercer com Maria Evelma P. N. Caropreso

+
#
14
114
3 )
18 |
%
[]
1
1

No final de 1967, o governo brasileiro criou uma comissão para fazer um levantamento da crise e intervir nas universidades. Era
chefiada pelo coronel do Exército Meira Mattos (acima, ao centro, com papel na mão), e a proposta da comissão se encaixou,
perfeitamente no espírito dos acordos MEC-USAID, um dos pontos-chave da política de desnacionalização do ensino brasileiro
440
ar Ve.eNG.aaa 284 ©4$4334 an 002, o Et

Iconographia
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Iconographia
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Europa no começo do século (acima, à esq.) às roupas mais


no Brasil: das desconfortáveis indumentárias vindas da
A moda

30, com a mulher já presente no mercado de trabalho


descontraídas, nos anos

quipadas com 150 mil teares e 5,6 mi-


COMPORTAMENTO/MODA: a indústria da moda

lhões de fusos. A capacidade de absorver

500 mil operários fazia desse setor fabril

um dos maiores empregadores de mão-

de-obra. Para efeito de comparação,


A montagem da moda

basta observar que a indústria automo-

bilística instalada no Brasil empregava,

em 1984, cerca de 123 mil pessoas.


Os estilistas de moda se apresentam como criadores levados

Em 1980, a indústria têxtil atingira

pelos impulsos da arte. Na verdade, a criação da moda está


a produção de 1 milhão de toneladas de

estritamente dirigida pela indústria fibras têxteis, entre naturais, artificiais e

sintéticas. Com o aprofundamento da

circular a roupa por meio de maior crise econômica, essa produção se re-
"Uma sociedade industrial, sendo

consumo, já que é comercialmente im- traiu, cessando um crescimento que vi-


calculadora, está por isso "condenada"

praticável a renovação ficar na depen- nha desde 1963. Mesmo assim, a pro-
a formar consumidores que "não calcu-

dência e na expectativa do seu desgaste dução de 1983 - 844 mil toneladas -


lam': pois, se produtores e comprado-

natural, para assegurar a rotatividade era duas vezes maior que a de 1963.
res de vestuário tivessem uma consciên-

de produtos." E ainda advertia para o A indústria têxtil tem ainda o impor-


cia idêntica, o vestuário só se compra-

outro lado da questão: o industrial que tante papel social de gerar outros mi-
ria - e se produziria - na proporção,

não acompanhasse a moda e ficasse de- lhares de empregos indiretos, desde a


muito lenta, de seu desgaste pelo uso."

fasado com o mercado passaria mo- produção de matérias-primas, pas-


É assim que o pensador francês Roland

mentos amargos e comprometeria a sando pela indústria de confecções e


Barthes se refere ao aparente paradoxo

saúde financeira de sua empresa, "já atingindo o varejo, onde são comercia-
que move a "indústria da moda".

que a mercadoria tradicional não pro- lizados seus produtos.


Mais diretamente envolvido com a

voca o consumo e a oferta fica maior Quanto à indústria de confecções, é


questão no Brasil, o empresário Elias

do que a procura". quase impossível saber o total de esta-


Miguel Haddad, presidente do Sindi-

Sustentar a indústria têxtil no Brasil belecimentos que se espalham pelo


cato da Indústria de Malharia e Meias

tem um grande significado. Em 1984, a País, Primeiro porque este é um ramo,


de São Paulo, afirmava que a moda é o

indústria têxtil brasileira exportou 1,2 no caso dos pequenos fabricantes,


item mais importante a sustentar o par-

muito instável, sendo grande o nú-


que fabril de manufaturados têxteis. bilhão de dólares. De acordo com um

levantamento realizado pelo Conselho mero de confecções que iniciam sua


Ressaltava, em 1983, a necessidade de

de Desenvolvimento Industrial, do Mi- produção para abandoná-la logo de-


estimular mais o uso de vestuário com

pois. E, por outro lado, neste ramo é


mudanças rápidas nas tendências da nistério da Indústria e do Comércio, o

setor contava com 4.900 indústrias e- muito grande o número de estabeleci-


moda, Nas suas palavras: "A moda faz

441
sroransssvagnÇAA SOA 1334 8n CO a, p 185

Iconographia
mentos não constituídos legalmente, 1808 provocou grandes alterações. Ela
O Sindicato das Indústrias de Fiação tentou imitar no Rio de Janeiro a vida
e Tecelagem em Geral no Estado de das cortes européias. As famílias mais
São Paulo calculava que, nos primei- ricas começaram a frequentar o teatro,
ros anos da década de 80, no Brasil, ha- a Ópera, os bailes. Modistas instalaram
via cerca de 17 mil confecções, 65% de-
lojas no Rio de Janeiro. França e Ingla-
las localizadas no Estado de São Paulo. terra ditavam a moda e os vestidos che-
No total elas empregariam mais de 400 gavam de Paris e Londres cada vez
mil pessoas, Outras fontes estimam que mais finos e luxuosos.
cerca de 1 milhão de pessoas estavam
Juntavam-se para compor o novo
de uma forma ou de outra envolvidas quadro não só a urbanização e europei-
com a indústria "informal" de confec- zação da vida social das elites brasilei-
ções, incluindo costureiras que traba- ras, que implicavam uma vida social
lham em casa e recebem das indústrias
mais intensa para as mulheres, como as
o produto semi-elaborado.
necessidades da indústria européia em
De qualquer maneira, a indústria de expansão. O Brasil tornara-se mercado
confecções é responsável por 25% das importante, principalmente da Ingla-
exportações têxteis do País. Mas é rela- terra.
tivamente nova e é muito recente esse Quando se inicia o século 20, as mu-
papel destacado da moda. lheres da elite brasileira ampliam seus
No período colonial, o testemunho interesses. A vida social estende-se
deixado pelos cronistas nos fala de uma para os chás beneficentes e para o es-
mulher sem nenhuma atividade social, porte. Num clima mais descontraído,
vivendo em reclusão e só saindo de os vestidos livram-se dos espartilhos e
casa para ir à missa uma vez por se- adereços. No primeiro pós-guerra, a
mana. Os viajantes falam de uma dupli- participação da mulher se amplia e ela
cidade no vestuário feminino. As mu- já se faz presente no mercado de traba-
lheres haviam trazido da Europa rou- lho. E a década de 20 marca, em todo o
pas de veludo, seda e damasco, que
mundo, o início do movimento pela
eram sufocantes no calor da Colônia.
emancipação feminina, que desaguaria
Por isso, as roupas de luxo eram enver-
nos movimentos da década de 60.
gadas apenas na visita dominical à
Depois da Segunda Grande Guerra,
igreja e em casa a mulher permanecia
a indústria e o cinema americanos es-
Iconographia

em absoluto desleixo. Como eram palham pelo mundo ocidental um


enormes as dificuldades de comunica-
modo de vida no qual cabe à mulher
ção com a metrópole, não havia nada um papel social cada vez mais rele-
que se comparasse com as atuais pres- vante. Ao mesmo tempo surgem novos
sões da moda. O mesmo vestido, guar- Após a Segunda Grande Guerra, roupas fios e tecidos sintéticos, geralmente de-
dado caprichosamente em baús da femininas copiam a moda do Cinema rivados do petróleo (nylon, lycra, po-
família, servia a seguidas gerações de americano (acima) e surge o prêt-à- liéster), que tornaram as roupas mais
mulheres, porter, isto é, as roupas que são fáceis de usar e, para aquela mulher
Também nesse setor da vida brasi- compradas prontas para usar (no alto, que tem cada vez menos tempo de cos-
leira a vinda da Corte portuguesa em vitrine da A Exposição, no Rio) turar para a família, surge a moda prêr-
442
aroranssae J 33 Jan0O2 p.JS6

Feiras

de moda

No período de 15 a 30 de novem-
bro de 1958, no Pavilhão Internacio-
nal do Parque Ibirapuera, em São
Paulo, realizou-se a Primeira Feira
Nacional da Indústria Têxtil (FENIT)
com 157 expositores.
Organizada pelo empresário Caio
de Alcântara Machado e patrocinada
pelo Sindicato das Indústrias de Fia-

Carlos Nanba/Abril Press

Rev. Aealidade dez/1966


ção e Tecelagem em Geral no Estado
de São Paulo, a primeira feira de
moda a se realizar no País tinha o ob-
jetivo de reunir num mesmo evento
produtores de matérias-primas, fios,
A venda em São Pau sos lojos eua
tecidos, confecções e maquinaria. a EaroniÇão, Cures e vou jose.
Tudo isso no meio de muitos desfiles
de moda, visando atrair comerciantes Em torno de Roberto Carlos, líder do iê-ié-iê nacional, a indústria produziu modismos
de todo o País, que se informariam a nos anos 60. E o jeans, exemplo clássico da despersonalização da indumentária, vestiu
respeito dos produtos das indústrias homens e mulheres num mesmo tipo de roupa nos anos 70
ali representadas e poderiam refazer
seus estoques dentro dos últimos pa- à-porter, ou seja, as roupas que são realiza-se, em São Paulo, a Primeira
drões da moda. compradas prontas para usar. Feira Nacional da Indústria Têxtil (FE-
As três primeiras feiras acumula- Durante a Segunda Grande Guerra NIT),
ram um prejuízo de cerca de 1 milhão a indústria têxtil brasileira, que já era a Em 1957, foi criada a Petistil, por
de dólares e a FENIT continuou segunda maior produtora têxtil do David Feldman, um filho de alfaiates
como a única mostra de moda a se mundo, assistiu a um grande aumento poloneses. Até então a roupa infantil
realizar no Brasil por muitos anos. em suas exportações. O Brasil chegou a era uma miniatura da roupa adulta com
Realizando-se em maio, ela lança a exportar 24 mil toneladas de tecidos em terninhos, calças curtas e paletôs tradi-
moda oficial de verão. Desde 1971 fe- 1945, mas, acabada a guerra, os merca- cionais. Com seus novos modelos dese-
chada ao público, a FENIT atende dos internacionais foram reconquista- nhados especialmente para crianças, a
apenas comerciantes que, aos milha- dos pelos Estados Unidos e por países nova firma criou e conquistou um mer-
res, procuram captar as tendências europeus e, em 1950, exportávamos cado que lidera até hoje.
que predominarão na moda dos me- apenas 1.300 toneladas. A necessidade de uma integração
ses seguintes, para poder orientar suas cada vez maior entre a moda e a indús-
compras. Sua realização é precedida Um marco da indústria da moda tria têxtil levou à formação de organis-
de uma expectativa tão grande que já no País: a FENIT, em 58 mos que reuniam diversas indústrias do
é comum ocorrer uma paralisação setor e coordenavam a produção das
dos negócios no setor têxtil nos trinta Com essa base industrial e voltadas filiações, tecelagens e confecções, pa-
dias que antecedem a abertura da para o novo consumidor que surgia, na dronizando uma moda única, Depois
feira. década de 40, criam-se as primeiras con- de produzidas as roupas, essas institui-
A 29a FENIT, realizada em maio fecções. Nelas, o trabalho de uns pou- ções organizavam a publicidade e
de 1984, no Parque Anhembi, em São cos operários era complementado por acompanhavam as roupas até a mão do
Paulo, tomou um espaço de 81 mil dezenas de costureiras que recebiam consumidor. Esta planificação, tão di-
metros quadrados, reunindo mais de em casa os panos já cortados e ali mon retamente vinculada aos interesses da
850 expositores que atraíram 1.600 tavam e costuravam as roupas. Já n: indústria têxtil, serve para abalar o
importadores de vários países - uma década de 50, no largo Santa Cecília mito, citado por Barthes, que trans-
das maiores feiras de moda de todo o em São Paulo, instalou-se a Modas forma 3 moda "em fenômeno gracioso,
mundo. É Clipper, a primeira loja de departamen- em criação intuitiva, em fermentação
Seu sucesso serviu de estimulo para tos femininos, onde se realizaram os irreprimível, portanto vital, de formas
o surgimento de outras e hoje se reali- primeiros desfiles de moda. No Rio de novas",
zam mais de 20 feiras de moda no Janeiro, surgiam a Imperial, a Casa Slo- -São exemplos o Clube 1, que reuniu
Brasil a cada ano. Das mais importan- per, a Casa Canadá e a Capital, toda: oito indústrias no final da década de 60,
tes, duas se realizam no Rio de Ja- vendendo confecções. e o Consórcio Brasileiro dia Moda de
neiro (Moda Rio e Janeiro Fashion A moda já não era um assunto de in- 1972, com 23 indústrias. A Vila Romana,
Show), uma em Fortaleza (Festival da teresse exclusivo dos setores privilegia- que participou de ambos, foi um dos in-
Moda) e outra em Belo Horizonte dos da sociedade. Surgem as revistas trodutores das grifes no Brasil. As
(Feira da Indústria Têxtil e da Con- de moda como A Cigarra, Jóia. O vo- grifes foram o resultado da junção dos
fecção). lume dos negócios já é suficiente para grandes nomes da moda internacional
que ela seja motivo de uma feira, como com o prêt-à-porter. Eles colocavam
acontecia no Exterior. Em 1958, seus nomes nas etiquetas autorizando a
443
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Sommer Andrey/Abril Press


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Sílvio Ferreira/Abril Press

Em 1981, o Brasil era o segundo maior produt


or de jeans do
mundo (acima, a Vila Romana, que contro
lava 50%, do
mercado de confecções masculinas no País)
e cerca de 150
griffes estavam presentes no mercado, como
a Ellus
industrialização dos seus modelos.
%
A originada no pe-
queno ateliê que o húngaro Estêvã
o
Brett montou na rua do Arouche, na
As inspirações importada
São Paulo de 1953, assinou contratos s
com Pierre Cardin, Yves Saint-Lauren
t Quando anunciaram suas novas co-
e Ted Lapidus para fabricar inicial ral. Afirma que não é à toa que a
- leções, em 1982, os principais estilis-
mente ternos com suas grifes. A grife França é um centro de difusão da
tas brasileiros manifestaram a preocu- moda. "Sua escola de moda mais an-
Cardin passou a representar 40% do fa-
turamento da Vila Romana, que come-
pação de oferecer ao público uma tiga é do século 18", afirma ele.
moda própria, nacional. Afirmavam "Existe um conhecimento acumulado
çou a década de 80 controlando só",
do mercado de confecções masculinas
que a utilização do branco e das cores e uma estrutura para que esse conhe-
claras era uma prova de resistência da cimento possa ser transmitido."
do Brasil. E, em 1983, cerca de
150 moda brasileira diante das determina-
grifes estavam presentes no mercado O empresário Raul Souza Sulzba-
ções européias. Mas, quando avança- cher, diretor-presidente da Jeans
brasileiro.
vam na descrição de suas futuras co- Store - uma cadeia de doze lojas es-
O mundo dos anos 60 foi marcado
pelo movimento feminista, que lutava
leções, algo soava estranho, pecializadas em jeans -,nota que os
O estilista Fernando José prometia: veículos de comunicação, que for-
também contra as formas tradicionais
"A noite; a mulher reviverá os sun- mam a opinião pública, dedicam
de identificação da mulher - como
o tuosos e românticos vestidos das cortes grande parte do seu tempo
tipo de roupa, de corte de cabelo etc. -, a divulgar
européias de 1800." Roberto Issa ba- o modo de vida, os hábitos e costu-
pela insatisfação das gerações jovens
tizara sua nova coleção de "Tapete mes do estrangeiro, que acabamos
que se refletia na música e no compor-
Mágico" dizendo: "Inspirei-me no por copiar. As novelas
tamento de um modo geral. A moda , diz ele, que
Irã, nos tapetes persas . .." Ronaldo poderiam difundir uma
que resultou desse período despersona- moda que sur-
Esper, depois de afirmar que "nunca gisse no País, també
lizava a indumentária, tanto em relaçã m veiculam a
o uma moda foi tão coerente com a moda européia e americ
ao sexo quanto à idade, abrindo as por- ana.
nossa realidade", anunciou sua cole- © Augusto Fernandes de Azevedo,
tas para a produção de um mesmo tipo
de roupa - o jeans é o exemplo clássico
ção "junglelook" e dizia que as noites criador e diretor da revista Guia Ofi-
tenderiam para o Oriente, "com mui- cial da Moda Brasileira, concen
- em grande escala. Foi a Starou
p,
tra sua
tas calças Aladim", atenção na base industrial da moda.
criada em 1956, uma das primeiras con-
Os profissionais ligados à indústria "Só conseguimos adaptar o que vem
fecções brasileiras a perceber que nas-
da moda no Brasil estão de acordo ao do Exterior porque estamos defasa-
cia um novo mercado consumidor. Co-
afirmar que não há uma moda brasi- dos na evolução tecnológica, nossos
meçou produzindo calças de brim de
leira, mas apontam causas diversas teares estão ultrapassados e as
algodão, que eram conhecidas como condi-
para o fato. José Gayegos, um dos ções de vida da classe operária brasi-
rancheiras,
criadores e primeiro presidente da leira dificultam o avanço da produti
Quando o rock no Brasil sofreu as -
Associação Brasileira dos Estilistas de vidade." E, conclui ele, "a moda
adaptações que o transformaram no iê- de-
Moda, se detém no problema cultu- pende da tecnologia têxtil".
i-iê nacional, em torno do qual surgi-
ram seus ídolos Roberto Carlos, Eras- É
mo Carlos e Wanderléia, a Staroup,
não sem vacilação, lançou as etiquetas
na direção de um público cada vez lojas especializadas e com espaço cres-
Calhambeque, Tremendão e Ternuri-
mais amplo, sem diferenciações de cente nos magazines e lojas de roupas
nha, cada uma delas associada a um
sexo e idade, atingiu o auge com o de todo o País, a indústria do jeans,
desses artistas. Foi um grande sucesso
boom do jeans, que ocorreu no final da transformada na principal força têxtil
para a época. Entre 1965 e 1967, a em-
década de 70. O tecido indigo blue pas- do País, faturou US$ 8 bilhões em 1981,
presa vendeu cerca de 20 mil calças.
sou a ser produzido no País, em 1972, contribuindo com 3% para a formação
Em 1973, já trabalhando com o tecido
pela São Paulo Alpargatas, firma brasi- do PIB (Produto Interno Bruto). O
indigo blue, ela produziu 600 mil peças leira criada em 1907. Nos primeiros
e, em 1981, chegou a exportar 3 mi- Brasil tornara-se o segundo maior pro-
anos da década de 80 havia dez fabri- dutor mundial de jeans, produzindo
lhões de dólares em confecções. cantes do tecido, que abasteciam qui-
O movimento da indústria da moda uma unidade de calça jeans per capita
nhentas confecções. Através de 3.000 ao ano.
444

BRDFANBSB VB.GNCIAAA, S4O4 122; ângoa p 184


er pranssav.eNGAM; S4 047 333an coa, o 488

ARTES/MÚSICA : a evolução do mercado musical

Fora de ritmo

Nos anos 80, a MPB era vítima da concorrência estrangeira, tinha o mercado
concentrado na faixa de maior poder aquisitivo e sofria o alijamento da vanguarda e
da velha guarda em favor de um duvidoso "gosto popular"

O crescimento da indústria musical solitário pólo instalado fora do eixo cul- culo da música brasileira, matando, aos
no Brasil confunde-se com a desorde- tural ainda disseminado pelo Rio, por poucos, o teatro de revista como lança-
nada expansão econômica do País, No São Paulo, Minas e Bahia. De visão dor de novos astros.
início do século, os primeiros discos fo- pioneira, conforme conta o historiador A descoberta da televisão, dos anos
nomecânicos ainda competiam com a e folclorista Paixão Cortes, em seu livro 60, com os competitivos festivais e pro-
venda de partituras pelas lojas de ins- Aspectos da Música e Fonografia Gaú- gramas específicos para os diversos es-
trumentos, como a Casa Edison, do chas, Leonetti seria um exportador pre- tilos, como O Fino da Bossa, o
Rio de Janeiro. Amadores saraus fami- coce, Toda a orquestra de Francisco Bossaudade ou a Jovem Guarda, dá-se
liares viviam da compra das últimas no- Canaro foi obrigada a deslocar-se por de forma explosiva, como requer o

vidades em partituras, geralmente che- navio de Buenos Aires a Porto Alegre, novo veículo. A bossa nova, íntima das
gadas da Europa. Os primeiros fonó- em 1914, para gravar o primeiro disco boates e apartamentos, passa para uma
grafos mal reproduziam, através de de tango (E! Chamuyo) de que se tem fase agressiva e coreográfica (basta
suas cornetas, vozes tonitroantes como notícia. Ainda não havia indústria fono- lembrar o gestual da cantora Elis Re-
a do "grande" Caruso. gráfica na bacia do Prata. gina, apresentadora de O Fino da
No Rio Grande do Sul, o industrial Associado ao rádio, em expansão Bossa, o "elis-cóptero"). E a contesta-
Saverio Leonetti, já em 1913, montava fulminante a partir da década de 30, o ção ao Regime Militar, que já barri-

a gravadora Disco Gaúcho, curioso e disco se transformaria no principal vei- cava faculdades e promovia passeatas,

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Agência Estado

Iconoaraphia
chega ao paroxismo das torcidas televi- música Café da Manhã, Roberto teve
sadas. A unidade política aparente é de parâmetros. O primeiro, é o mo-
2,800 milhões de compradores para um
cindida em correntes estéticas radical- mento da análise, no fundo do poço de
mercado de 33 milhões de LPs vendi- uma
mente divergentes, como as do tropica- crise econômica generalizada,
dos de todos os outros artistas. Ou seja: combinada
lismo e da canção de protesto. Em 17 com a "decadência
do
quase 10% do movimento geral. disco como veículo musical", de que
de junho de 1967, sai, do largo de São
A música, porém, não se comporta falava André Midani, o diretor da mul-
Francisco para o Teatro Paramount da apenas passivamente em relação à tinacional WEA (Warner/Elektra/A-
Brigadeiro Luis Antônio, em São transformação dos meios de comunica- tlantic). Em termos de diversão caseira
Paulo, uma "passeata contra as guitar- ção e dos consequentes mercados. Ela pura e simples, o disco sofre a concor-
ras elétricas", sintoma de imperialismo também cria seus espaços. Assim como rência do videojogo, do videocassete e
cultural. Uniram-se num mesmo bloco a Festa da Penha, no Rio, funcionava da fita virgem, que possibilita a grava-
artistas como Gilberto Gil, Geraldo como lançadora de música nas primei-
Vandré, Edu Lobo, Elis Regina, Zé ção direta, nas emissoras FM de me-
ras décadas do século, as escolas de
lhor definição sonora, do repertório es-
Ketti e MPB-4. samba, em evidência para a classe mé-
colhido pelo ouvinte, sem a interferên-
dia a partir do final dos anos 60, trans-
Disco independente oxigena cia das gravadoras.
formariam os sambas-enredo na Há números contundentes para sub-
um mercado padronizado música dominante dos carnavais, antes sidiar esse quadro comparativo. Apesar
divididos irmâmente entre marchinhas de o mercado, como um todo, ter cres-
Por outro lado, reservada a um pú- e sambas gravados pelos ídolos do rá- cido 385% entre 1966 e 1983, os com-
blico "cafona, alienado e periférico", a dio. E, proibidas nos festivais da televi- pactos simples, geralmente destinados
jovem guarda, com sua banalidade são, censuradas pela ditadura, as can- aopúblico de menor poder aquisitivo,
poética, tradução musical de gêneros ções de autores universitários e engaja- que compra somente aquela música
importados, sai ganhando em quanti- dos mudariam de endereço. A partir da que toca no rádio ou aparece na TV;
dade. Vende mais discos e faz coroar o excursão pioneira de Vinicius e Toqui- venderam quase 50% menos entre os
longevo soberano do mercado: Ro- nho, em 1971, passariam a frequentar 12,5 milhões de compradores de 1979 e
berto Carlos, Com vendagens ascensio- os circuitos universitários. Da mesma os 6,4 milhões de 1983. O carro-chefe
nais e ligeiros recuos diante de even- forma, o disco independente, oficial- do mercado, os LPs, cairam de 37 mi-
tuais sucessos como o dos Secos & Mo- mente iniciado por Antônio Adolfo, lhões de compradores em seu melhor
lhados (472.023 cópias), em 1973, ou com o Feito em Casa de seu selo Arte- ano, 1979, para 35 milhões, em 1983,
Martinho da Vila (Canta, Canta Minha sanal, em 1977, traria oxigênio a um depois de 27 milhões em 1981, segundo
Gente, 750 mil), em 1974, Roberto Car- mercado contaminado pela padroniza- os dados da Associação Brasileira de
los constitui um caso único no mundo: ção. Patrocinando seu próprio disco e Produtores de Discos. O resultado ne-
uma liderança mercadológica de 20 vendendo-o onde bem entendesse, o gativo dos anos 80 não deveria influir
anos. Seria um caso também política- artista/produtor independente rompeu na perda de uma perspectiva de mais
mente sintomático a aceitação de seu com o autoritarismo estético implan- longo alcance, já que em 1966 o mer-
conformismo ideológico, por platéia tado pelos departamentos de marketing cado de LPs era dez vezes menor: o
tão ampla quanto silenciosa? Misto-frio das gravadoras, elevados à máxima po- País inteiro comprava apenas 3,8 mi-
do intimismo vocal bossa nova (ele co- tência a partir de meados dos anos 70, lhões de unidades.
meçou imitando João Gilberto) com o quando o Brasil passou a ser conside-
bolero de Anísio Silva e o rock de ma- rado, segundo uma pouco precisa es- Rádios FM executam 70%
trizes italo-americanas (Pepino di Ca- tatística, o quinto maior vendedor de
pri, Elvis Presley, Neil Sedaka, Paul discos do mundo, atrás apenas dos
de música importada
Anka), a música de Roberto Carlos EUA, Japão, Alemanha e Inglaterra. Para lançar mais luz neste cipoal de
golpeou em cheio o gosto médio do Para examinar a MPB, sob a ótica 16- dados será necessário situar a parcela
mercado, Em 1978, cumprindo sua me- gica dos números de mercado, no en- da população que compra discos. A
lhor performance no LP puxado pela tanto, é preciso estabelecer uma série classe A - segundo a definição dos
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Em 1978, Roberto Carlos (abaixo) meios publicitários -, 8% de brasileiros duzir os custos com a distribuição dos

golpeou em cheio o gosto médio dos do topo da pirâmide social, consumia discos dos dois catálogos (que, na

compradores, vendendo mais de nos primeiros anos da década de 80, verdade somam quatro anteriores).

2 milhões de discos. O mercado 62% de tudo que era vendido no mer- Quanto aos elencos, há paradoxais re-

fonográfico havia inchado, mas não cado; e certamente era também a duções, como a da multinacional CBS,

amadurecido. Chico Buarque (acitha) e maior consumidora de discos. Segundo de origem americana, que em plena

Milton Nascimento ainda lideravam a mesma pesquisa (da Target, São crise inaugurou, no Rio, "a maior fá-

culturalmente a MPB. Mas o gigantismo Paulo), a classe E (ao redor de um sa- brica da América Latina", com capaci-

da indústria do disco não favorecia a lário mínimo de renda familiar) sim- dade para produzir mensalmente 1,5

criação musical como um todo. Artistas plesmente não teria dinheiro para gas- milhão de discos, e cortou seus contra-

da chamada velha guarda como Elizeth tar com discos ou shows, limitando seu tados de mais de duas centenas para

Cardoso ou novos como Arrigo Barnabé, contato com música, de acordo com três dezenas. "Preferimos um elenco

(na pág. ao lado) encontravam pesquisa da Marplan, ao rádio (88% da reduzido e colocar tudo em cima dele",

dificuldades para gravar população de São Paulo e 80% do Rio garantia Roberto Augusto, da promo-

eram atingidos por esse veículo, em ja- ção da empresa. "Se o potencial de um

neiro de 85) ou à TV (96% das pessoas artista é de 200, 500 mil cópias, adianta-

em São Paulo e 93% no Rio). Resul- se em publicidade o correspondente a

tado: ao povo, a quem estaria destinada isso." Tal filosofia talvez explique por

"historicamente" a missão de preservar que em 1984 a empresa detinha 33% do

a cultura popular, só restariam os ca- mercado, com vendagens superiores a

nais de programação musical mais pa- um milhão de cópias de artistas como

dronizada. Some-se a isso o fato de Julio Iglesias, a Turma do Balão Má-

60% do mercado de discos concentrar- gico e Roberto Carlos. Com a redução

se no eixo Rio-São Paulo e teremos um dos elencos e a fusão das fábricas,

funil mais estreito que o vestibular das surge uma casta de artistas ricos, como

universidades. Algo que explica o fato a.cantora Simone, premiada com um

de a API (Associação dos Produtores Mercedes-Benz, na mesma CBS, no

Independentes) do Rio, presidida por ato da assinatura de seu contrato, em

Antônio Adolfo, ter recenseado cerca plena recessão, em 1981. "Quero ven-

de dois mil artistas/produtores, em der um milhão de cópias", declarou

1983, vendendo seus discos debaixo do ela, logo depois, provocando um de-

braço em shows Brasil afora. Isso por- bate em torno da adesão do artista à sa-

que o afunilamento tem duas pontas. bonetização da música, seguindo a car-

Se é difícil a execução nas rádios, onde tilha mercadológica das cinco grandes

dominam os listões de discos "reco- gravadoras, com mais de 90% do mer-

mendados", também é quase impossi- cado, quatro das quais, empresas trans-

vel o contrato com as gravadoras - por nacionais (RCA, CBS, Odeon, Poly-
$i sua vez, em processo de progressiva gram). Quanto à única "brasileira" do

concentração desde 1980. Dois exem- cartel, a Som Livre, uma situação espe-

plos ilustrativos: a multinacional (de cialíssima: integrante da Rede Globo


Irmo Celso/Abril Press

origem alemã) Ariola vendeu o acervo de Televisão, "preferindo trabalhar

à Polygram (holandesa). A WEA (ame- com fonogramas de terceiros, pagando

ricana) juntou-se à Odeon (inglesa). Em royalties", foi a quinta maior anun-

1985, já se anunciava uma joint-venture ciante brasileira de 1982, com uma des-

das remanescentes Polygram e Odeon, pesa em publicidade de seus discos na

criando a empresa Fonobrás, para re- emissora coligada da ordem de 4,7 bi-

447
an Oo2a ,p 1960
BR DFANBSB VB.GNCAMASR4O04A 1331
lhões de cruzeiros; à frente de gigantes
como a Volks, Gessy e General Mo-
tors,
'Mesmo-com a recessão, não são vo-
lumes desprezíveis. Em 1983, só a in-
dústria do disco (parte do complexo
musical que também envolve desde es-
petáculos ao vivo até videoclips) pagou
66 bilhões de cruzeiros de IPI, movi-
mentando, ao todo, 150 milhões de
dólares. Um gigantismo que não favo-
rece a criação musical como um todo,
a não ser tecnicamente, com aperfei-
coamento de estúdios e informática
instrumental. Com raras exceções, os
artistas da chamada velha guarda (de
Elizeth Cardoso e Marlene a Miltinho
nhas rigidamente traçadas pelo mer-
e Elza Soares) estão desempregados.
cado. Pequenos selos, como Som da
Ou,seja, não têm contrato com as gra-
vadoras. As empresas não investem ne- Gente (São Paulo) e Kuarup (Rio),
les, acreditando que estão "obsoletos". centrados basicamente na música ins-
trumental, trabalham quase artesanal-
Da mesma forma, os criadores novos,
mente para manter pulsando, se não as
como a geração paulista de Arrigo Bar-
nabé e do Premeditando o Breque, têm tradições da MPB, como queria a gra-
de custear seus primeiros passos até vadora Marcus Pereira (1973-1981), ao
menos um Índice elevado de qualidade
que, demonstrado o sucesso no campo
independente, finalmente sejam con- e substância artística em seus discos,
tratados pelas grandes empresas, Examinada por essa lente - a sempre
discutível análise crítica -, conclui-se
que o mercado inchou, mas não ama-
O impacto massacrante
dureceu, A geração da época em que
na MPB, que vem de fora se vendiam três milhões de LPs e três
milhões de compactos no País inteiro
Não é essa, entretanto, a única pres-
ainda dá as cartas, Chico Buarque,
são contra dois dos pólos mais consis-
Iconographia

Caetano Veloso, Gilberto Gil e Milton


tentes -- a raiz e a vanguarda - da
Nascimento ainda lideram cultural
MPB, Outro impacto massacrante vem
mente a MPB. Os ídolos subsequentes,
de fora. Há rádios FM cuja programa-
como Alceu Valença, Moraes Moreira
ção ultrapassa, em determinados ho- Alceu Valença : um dos que lutaram (do grupo Novos Baianos), Fagner, Zé
rários, o índice de 70% de música im- durante uma década por um lugar Ramalho, Belchior, Luís Melodia, en-
portada, embora, segundo a ABPD, ao sol. E a geração posterior devotada a tre outros, lutaram durant
"os discos produzidos no Brasil ven- e uma dé-
aclimatar o tock no País. como o cada pelo lugar ao sol concedido quase
dam entre 65% e 75% do total do mer-
conjunto Paralamas do Sucesso (no alto) imediatamente a seus antecessores,
cado". A batalha pela imposição de
quando o mercado era aparentemente
som estrangeiro não está ligada a uma mercado internacional". No final do mais estreito. Estabeleceram-se (al-
questão puramente ideológica, como evento, um balanço da revista Afinal guns, precariamente) fazendo maiores
parece a princípio, já que o mercado é mostrava uma dilatação nas vendas dos concessões ao departamento de mar-
controlado pelas empresas multinacio- participantes. O "encalhado" James keting. E a geração posterior, já in-
nais. Trata-se de um problema con- , Taylor tinha vendido, subitamente, 15 teiramente devotada a aclimatar o rock
tábil, acima de tudo. "Antes, bastavam mil cópias de um disco antigo. Nina e seus derivados ao Brasil (repetindo a
dez mil cópias para pagar um disco na- Hagen, antes uma "desconhecida", pu- Jovem guarda), lida com material musi-
cional", reclama Armando Pigliani, da lara de cinco mil para 25 mil compra- cal bem mais volátil e descartável. As
promoção da Polygram. "Hoje, já não dores. Mesmo roqueiros nativos ante- exceções consolidam a regra e edificam
se consegue isso antes dos 30 mil," Em riormente pouco prestigiados viram uma faixa marginal à base do humor e
contrapartida, para lançar no Brasil um melhorar suas vendas, como os Parala- do experimentalismo.
disco estrangeiro bastavam 275 dólares, mas do Sucesso, que sairam de cinco Como fiel espelho do País, a MPB
fora a prensagem (incluídos fita master, mil adeptos para 30 mil, após uma festa também transita dos efeitos de uma
mixagem digital, fotolitos e vídeo), se- onde aos brasileiros coube tão somente prolongada dieta de calorias culturais
gundo levantamento com base em pre- esquentar o palco para a entrada dos para uma provável retomada de sua li-
ços de março de 1983, Esse disco esta- importados. nha evolutiva, a que gerou movimentos
ria pago, portanto, de acordo com cál- Essa montanha de condições adver- como a bossa nova e o tropicalismo.
culo corrente nas empresas, com duas sas explica muitas coisas e questiona Mas seria possível voltar aos tempos
a cinco mil cópias vendidas. Isso torna outras, como O chamado mito do em que a iniciativa musical provinha do
mais fácil explicar, inclusive, o maciço "gosto popular". Se o disco de Roberto departamento artístico e não do de
investimento publicitário no festival Carlos sai com garantia de 5.981 execu- marketing? A resposta, certamente,
Rock in Rio, ocorrido em janeiro de ções apenas em seu dia de lançamento, não dependeria de um decreto do pri-
1985, com uma seleção de convidados como ocorreu em 1983, fica claro que meiro presidente civil após 20 anos de
estrangeiros trazidos pelo empresário não há oportunidades sequer aproxi- governo fardado.
Roberto Medina, "a preços abaixo do madas para artistas divergentes das li- Tárik de Souza
448
BR DFANBSO VB.ONCGAMA; 2403234 ân 002 p
494
arpranass 9404 1334 anc0a, p 192

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/PREVIDENCIA a crisedo sistema previdenciário no Brasil vez de concessões demagógicas às vêés-
peras das eleições. a Secretaria de Pla-

nejamento anunciou um aumento de

8% para até 10% nas contribuições re-

A agonia da Previdência colhidas pelos assalariados.

Com isso, foi gravemente torpedea-

do o poder de manipulação política da


Em 1984, o sistema previdenciário estava profundamente Previdência - que nunca foi pequeno.

deteriorado, abalado por fraudes, custos astronômicos, Nascidos modestos, em 1923 - como

respostas à crescente mobilização ope-


diminuição da receita no auge de uma longa crise
rária -, através da Lei Eloy Chaves, os

«
institutos de previdência de várias cate-

Quase às vésperas da devolução do gorias profissionais cresceram muito,

poder aos civis, o Regime Militar mon- até serem unificados numa só pasta, em

tava em São Paulo uma inédita e ro- 1970, O Ministério da Previdência e

cambolesca operação policial, capaz de Assistência Social tornou-se um ser as-

rivalizar com qualquer série de filmes tronômico na vida econômica e política

de detetives da televisão. Por volta de do País. Seu orçamento para 1985, que

novembro de 1984, a Polícia Federal dá uma idéia do seu poder, até mesmo

infiltrara um agente secreto no tradi- por atender clientelas políticas como é

cional Hospital Matarazzo, em São usual, foi de 57,2 trilhões de cruzeiros.

Paulo, Duraria dois meses a espiona- Somente a Petrobrás superava esse gas-

gem. Em fevereiro, usando um radio- to, Diariamente, a Previdência desem-

transmissor camuflado num relógio de bolsava, em 1984, 60 bilhões de cruzei-

pulso, o agente avisou que funcionários ros em benefícios, arrecadando, em

da empresa médica estavam em plena contrapartida, menos que esse total.

sessão de falsificação de guias de auto- Todo mês, o órgão tinha um déficit de

Carlos Namba/Abril Press


rização de internamento hospitalar. Os 100 bilhões de cruzeiros.

funcionários surpreendidos em flagran- Nesse universo de números astronô-

te, e detidos, "arraia miúda" nas pala- micos, as fraudes não passavam de as-

vras do delegado Romeu Tuma, da teróides, e não havia nenhuma razão

Polícia Federal, não puderam negar especial para que elas fossem especial-

que estavam fraudando o INAMPS mente maiores que em outros órgãos

(Instituto Nacional de Assistência Mé- do governo. As causas do déficit da

dica e Previdência Social). Previdência, portanto, eram outras.

Ao término dessa operação, no en- Os culpados pelo déficit seriam, en-

tanto, o resultado era magro, como já tão, os assalariados, que usavam desne-

se esperava. Somadas todas as fraudes cessariamente os serviços da Previdên-

- as descobertas e as suspeitadas - elas cia? Esse, sem dúvida, 'não poderia ser

não ultrapassavam, segundo estimava o 0 caso, simplesmente porque os servi-

ministro Delfim Netto, 10% de todo o ços oferecidos eram - em comparação

déficit da Previdência Social. com outros países e tendo em vista as

Esse era um epilogo policial numa necessidades nacionais - poucos, difí-

história que já tivera momentos mais ceis de conseguir e miseráveis. No co-

elevados. Em 1981, quando o general meço da década de 80, havia 40 mi-

Golbery do Couto e Silva, então chefe lhões de pessoas sem assistência médi-

da Casa Civil da Presidência, àinda era ca; entre elas, desempregados, subem-

ô "mago do regime", que tirava casuis- pregados e não registrados em qualquer

mos da cartola para ganhar eleições emprego. O rosário de deficiências da

para o PDS, a questão estava no nível Previdência no Brasil era longo:

dos ministérios. Aquele seria o "ano so- e Não havia seguro-desemprego; os

cial", quando, com vistas às eleições de trabalhadores do campo não tinham


Tude Munhoz/Abril Press

1982, o regime iria, nos planos de Gol- auxílio-doença, auxilio-natalidade,

bery, dar alimentos subsidiados aos auxilio-reclusão, salário-família e apo-

pobres, passes gratuitos para transporte sentadoria por tempo de serviço; os

urbano dos trabalhadores e 13o salário aposentados por velhice ou invalidez

aos funcionários públicos. A trombada na área rural recebiam apenas meio sa-

com os cálculos da Secretaria de Pla lário mínimo;

nejamento de Delfim Netto foi frontal e O valor médio dos benefícios era

Mais obrigado a atender aos compro- Em 1981 o general Golbery (no alto) mínimo (abono de um salário mínimo;

missos com o grande capital internacio- tinha planos de usar a Previdência, tendo aposentadoria por velhice de 1,1 salário

nal e com os grupos monopolistas, que em vista as eleições de 82. Não mínimo, o mesmo para auxílio-doença;

exigiam austeridade e menos gastos conseguindo, demitiu-se. Já para Hélio e pensões de 0,9 salário mínimo. Em

públicos, o regime não conseguiu ab- Beltrão (acima), ao deixar o Ministério média, 65% dos benefícios prestados

sorver as propostas. Desgastado tam- no final de 83, quem engordava com a estavam abaixo do salário mínimo); 780

bém na área política, Golbery perdeu o Previdência eram dois clientes: bancos e mil aposentados por invalidez ganha-

rumo e demitiu-se do Ministério. Em hospitais conveniados. vam menos de 40% do salário mínimo.

* aaa U, as ao &. +!
449
na pranass 231 ancoa p 193

O prejuízo da Previdência existiria, Brasil dos anos 80, 50% da população e viúvas que tiveram, durante certo
então, devido à indolência dos traba- sofria de subnutrição e doenças endêmi- tempo, reajustes em seus benefícios de
lhadores brasileiros, que se aposenta- cas e a expectativa média de vida era 10% acima do INPC? Na ponta do lá-
vam depois de 35 anos de serviço - ou de 64 anos nos Estados do Sudeste e de pis, isso era verdade. Como 86% dos
menos, como os professores e professo- apenas 52 anos no Nordeste. Tomar di- aposentados receberam, durante um
ras, com direito à aposentadoria aos 30 nheiro do trabalhador na expectativa período, o INPC mais 10%, e a Previ-
e 25 anos de trabalho, respectivamente de que ele morresse antes de usufruir dência recebia contribuições de 70%
-, quando em países desenvolvidos as Os benefícios seria uma crueldade dos segurados calculada sobre o INPC
pessoas só gozavam desse direito de- atroz, pensada e calculada, que nem menos 10%, o estouro era óbvio.
pois de 65 anos? mesmo o Regime Militar teve "cora- Tão óbvio que deveria estar incluído
Essa poderia ser uma desculpa con- gem" de materializar. no orçamento da Previdência. Afinal,
tábil, mas não era uma razão justa. No Seriam então culpados os velhinhos se a razão de ser desse serviço era mi-
ª

Um problema também nos EUA

O chanceler Otto von Bismarck


sais de contribuição, em média. Pior
criou, em 1889, na Alemanha Impe-
ainda, em 1960, havia em média 16,5
rial, o primeiro sistema de aposenta-
trabalhadores pagando contribuições
dorias em escala nacional. Seus obje-
para cada aposentado; no começo da
tivos eram bem claros: "Aquele que
década de 80, havia apenas 3,2 em-
tem a aposentadoria na velhice", dis-
pregados pagando taxas para cada
se Bismarck com toda a franqueza,
inativo. No começo de 1984, o déficit
"está mais satisfeito e é mais fácil de
da previdência americana ficou tão
ser manipulado." Nessa época, os

Biblioteca Nacional
grave que nem era mais medido
partidos socialistas faziam intensa agi-
anualmente: passou a ser calculado
tação em torno das péssimas condi-
em 20 mil dólares por minuto!
ções em que trabalhavam e viviam os
Apesar da crise, os benefícios eram
operários. Com o fundo de pensão de
tantos que o contribuinte médio ame-
Bismarck, financiado em partes iguais
ricano poderia esperar receber, de-
pelo empregado e pelo empregador, o Bismarck: "Quem tem aposentadoria na pois de aposentado, até cinco vezes
Operário passou a ter algo a perder, velhice é mais fácil de ser manipulado" mais que tudo que ele pagou durante
caso não se comportasse segundo as
a vida de trabalho. Como esses be-
exigências patronais: podia perder o paga pelo trabalhador era de 30 dóla- nefícios geram déficits, tinham de ser
direito à velhice remunerada. res no ano; em meados da década de cobertos pelo Estado, direta ou indi-
Nos anos seguintes, os trabalhado- 70, já havia passado a 825 dólares; e, retamente. Em 1970, os países indus-
res aproveitaram a fresta aberta pelas no começo dos anos 80, atingia os trializados empregavam 19,3% do PIB
promessas do chanceler e escancara- 2.170 dólares. Apesar desse aumento, nos programas de assistência social,
ram a porta dos benefícios sociais, o rombo no sistema previdenciário Em 1983, essa proporção subiu para
cobrando tudo a que tinham direito americano tornou-se cada vez maior. 30%, e não havia sinais de que fosse
no crescente bolo da riqueza das na- A razão principal disso é que, nos pri- estabilizar-se tão cedo. A única espe-
ções. A experiência dos Estados Uni- meiros tempos, não havia ainda mui- rança de conter esses déficits era a de
dos, nesse sentido, é exemplar: o siste- tos aposentados - o dinheiro recolhi- que a economia mundial passasse por
ma previdenciário americano, criado do pela previdência ia apenas engor- um vigoroso reaquecimento, voltando
em 1935 para minorar os efeitos da dando, dando a falsa impressão de a integrar maciçamente os desempre-
depressão econômica que assolava o fartura eterna. Em 1971, por exemplo, gados no mercado de trabalho, au-
país, tirava 1% do envelope de paga- a previdência americana calculava mentando as receitas da previdência e
mento do operário e prometia uma que iria ter reservas de um trilhão de as riquezas do país.
aposentadoria de apenas 22,6 dólares. dólares no ano 2025 e aceitou alegre-
Essa solução havia funcionado nos
A partir daí, a previdência americana mente indexar à inflação todas as ciclos anteriores de opulência, Mas,
foi crescendo, para abranger parcelas aposentadorias. A generosa medida na fase de crise do ciclo dos anos 70-
cada vez maiores da população, con- esbarrou em vários obstáculos. Foi 80, não havia muitos sinais de integra-
cedendo cada vez mais benefícios nessa década que começaram a se ção dos desempregados na economia,
imediatos ao trabalhador, como assis- aposentar as primeiras levas maciças Na indústria americana, alguns de-
tência médica e seguro-desemprego. de trabalhadores. Foi também a épo- sempregados - quase dois milhões
Assim, a cada ciclo de prosperidade ca em que a recessão mundial espa- por ano - viam suas antigas vagas se-
da economia, a lei passava a assegu- lhou o desemprego. Subitamente, rem ocupadas pelos robôs, seres me-
rar aos trabalhadores novos direitos - portanto, o sistema previdenciário ti- cânicos que não fazem greve, têm
impossíveis de serem saldados nas fa- nha de pagar mais aposentadorias e uma produtividade incomparavel-
ses de crise dos ciclos subsequentes. não estava recebendo contribuição mente maior e, ao fim da vida útil,
A solução para cobrir esses rombos dos desempregados: cada um deles, não cobram aposentadoria: são ape-
foi sempre aumentar as contribuições: além de receber seguro-desemprego, nas desligados e vendidos como suca-
em 1937, o limite de contribuição ainda deixava de dar 125 dólares men- ta.

450
RR VBGNOIAAA: É᪪faiââj âncCoA,p 4394
norar o sofrimento dos velhos aposen- afirmava que o País estava perdendo
tados que passaram a vida toda enri- com o desemprego de três milhões de
quecendo a Nação com seu trabalho, trabalhadores uma quantia da ordem
por que o sistema deveria faltar-lhes de 12 trilhões de cruzeiros. Ironicamen-
justamente na hora mais crítica? Ao te, observava o ministro, esse era o va-
longo de toda a sua existência, a União lor do que o Brasil teria de gastar, na-
cumpriu precariamente sua obrigação quele ano, com juros e amortizações de
de cobrir esses déficits inevitáveis. Pior sua dívida externa. Também em agosto
ainda: durante os tempos de vacas gor- de 1983, o presidente do Instituto Na-
das, quando a Previdência nadava em cional da Previdência Social, Luis Car-
dinheiro, a União avançou sobre seus los Mancini, revelaria outro compo-
recursos para financiar obras de inte- nente do estouro da Previdência. "A
crise econômico-social, gerando reces-

«
resse do grande capital, como Itaipu.
Entre 1970 e 73, a União, cumprindo são, falências e desemprego, está pro-
sua obrigação, chegou a tapar em até vocando uma alta na procura aos pos-
9,8% o orçamento da Previdência, taxa tos do INAMPS da ordem de 20% a
que caiu para 5,2% em 1980, no negru- 30% ao mês."
me da recessão, quando mais era ne- Em resumo, as próprias autoridades .
cessária e obrigatória a complementa- reconheciam que assalariados eram
ção da União. prejudicados pelas crises conjunturais e
estruturais da Previdência. E, como
Constatado o prejuízo, sempre ocorreu todas as vezes que os
aumentam-se as contribuições órgãos da Previdência começaram a
dar prejuízo, tratou-se de promover o
Como a recessão brasileira dos anos aumento das contribuições: em 1934, o
70 e 80 foi uma política deliberada, ao recolhimento dos empregados, que era
Estado também devia ser atribuída a de 3% do salário desde 1923, passou a
culpa pela diminuição da recéita da 4%; em 1956, a 7%; e, em 1966, a 8%.

Irmo Celso/Abril Press


Previdência - que deixou de receber as Assim, os empregadores passaram a re-
contribuições mensais (de 16% de cada colher ao INAMPS 10% do salário de
salário) referentes aos desempregados. cada funcionário, enquanto estes tive-
Em agosto de 1983, por exemplo, o mi- ram seus recolhimentos escalonados da
nistro do Trabalho, Murilo Macedo, seguinte maneira: trabalhadores com

João Bittar/Abril Press

No início dos anos 80, enquanto empregado, o contribuinte era submetido a esperas intermináveis nos postos do INAMPS
(acima); na hora da aposentadoria, novamente asfilas (no alto). E a Previdência ainda ameaçava com a extinção da aposentadoria
por tempo de serviço
451
BR DFANBSS V&GN 334 an coa, p 195

vencimentos até três salários mínimos, nos bancos em média 8,33 dias por vos, era o sistema de hospitais conve-
recolhimento de 8,5%; mais de três a mês. Diga-se ainda que os bancos rece- niados, que forçaram a adoção, no Bra-
cinco salários mínimos, 8,75%; mais de bem uma remuneração de 0,25%, sobre sil, de um sistema de saúde baseado na
cinco a dez, 9%; mais de dez a 15 o total arrecadado." Em outras pala-
3 grande indústria hospitalar, no poder
9,5%; e mais de 15, 10%, vras, em plena recessão, com juros dis- político da Federação dos Hospitais, da
A Previdência, no entanto, tinha dois parados, a Previdência estava pagando Associação Médica Brasileira e da As-
clientes que nunca passaram dificulda- aos bancos. 0,25% do arrecadado para sociação Brasileira de Medicina de
de - até prosperaram durante a crise, eles usarem o dinheiro dos segurados Grupo, Era um sistema centrado no
engordando acintosamente à vista de em diversas aplicações, como o open atendimento curativo, sofisticado e de
todos, Em entrevista à Folha de S. Pau- market ou o overnight. E isso não era tu- custo estratosférico, que não tinha a
lo, em dezembro de 1982, o então mi- do, conforme prosseguia explicando mínima ação preventiva, Para consta-
nistro da Previdência, Hélio Beltrão, Beltrão. Como a outra conta, a de pa-
mostrou os benefícios que os bancos
tar isso, bastava comparar os orçamen-
gamento de benefícios, estava quase tos do INAMPS - que abrangia 3.600
estavam tendo, -numa época de altos ju- sempre a descoberto, os bancos paga- hospitais e 57 mil médicos credencia-
ros, graças ao sistema de duas contas vam o negativo, cobrando uma taxa de
bancárias mantidas pelo Ministério -
dos - com os recursos disponíveis do
redesconto de 4,3%, Ministério da Saúde e dos Órgãos esta-
uma para arrecadação e outra para pa-
gamento de benefícios. "Na conta de
duais e municipais encarregados de sa-
Bancos e hospitais, os neamento básico da população. Contra
arrecadação, os bancos têm cinco dias
clientes privilegiados os 57,2 trilhões de cruzeiros da Previ-
úteis Para depositar o que recolheram
dência, o Ministério da Saúde recebe-
numa determinada semana. Como o Outro enorme cliente da Previdência ria em 1985 apenas 1,7 trilhão de cru-
grosso da arrecadação se dá no fim do que sempre reclamava por mais benefi- zeiros.
mês, o dinheiro das contribuições fica cios,. apesar de cada vez mais lucrati-
Flávio de Carvalho

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Rolando Freitas/Agência Estado

Em todo o País, as ameaças sobre a aposentadoria por tempo de serviço e a qualidade do atendimento da Previdência
geraram
protestos. Acima, manifestação de aposentados, em São Paulo, 24/1/84
452 ,
.. 2802 21 an co 2, p 196

mo num período de mínima abertura,


Ao contrário, chegava ao final de 1984
ainda mais fracionada e enfraquecida
por suas divergências que seus arquiini-
migos da esquerda. Eram cerca de 50
grupos, a maioria com apenas quatro
ou cinco militantes, que tentavam, des-
de 1982, acertar uma estratégia comum
de atuação, que ficou conhecida nos
cªlculos direitistas como "Pacto Nacio-
nal".
Superada a luta interna entre "bom-
bistas" - os terroristas da Falange Pá-
tria Nova, a maioria encastelada nos
órgãos de segurança - e "moderados",
a direita procurava estabelecer um pla-
no de trabalho para os próximos anos.
No campo interno, as prioridades eram
a formação de novos quadros e a cons-
trução de uma infra-estrutura logística,;
no externo, a constituição de um parti-

.
Chico Nelson/Abril Press
do e a "ação política de massas".
Para a formação de quadros, a extre-
ma direita investia, nos anos 80, na Es-
cola de Sociologia e Política de São
Paulo, cujo controle assumira no início

P
da década, através de uma manobra
conduzida pelo advogado Carlo Bar-
POLÍTICA/PARTIDOS: os grupos da extrema direita bieri, ex-presidente da WACL (World
Anti Communista League), movimento
anticomunista internacional financiado
pelo governo de Formosa, a China Na-
A espera do pior cionalista, A questão da formação
ideológica dos militantes era conside-
rada pelos dirigentes da ultradireita
Nos anos 80, a extrema direita, sem apoio oficial, debatia-se como um de seus principais problemas.
em busca de fórmulas para voltar ao poder, do qual fora A verdade, no entanto, é que os ultradi-
reitistas haviam envelhecido quase tan-
afastada, segundo seus militantes, em 1974
to quanto suas idéias.
"Em 1964, a direita ganhou, mas não Apesar de ter nas Forças Armadas
levou, chegou ao poder em 1968 e foi uma de suas três fontes básicas de re-
afastada em 1974", garantia, em 1984, o crutamento, do ponto de vista ideológi-
"Panzer", nome de guerra dado por co seus líderes não confiavam então
seus companheiros devido a sua profis- nos militares brasileiros, por considerá-
são de fé nazista. Fundador e principal los excessivamente simpáticos aos Esta-
dirigente nacional do CCC (Comando dos Unidos. E o movimento estudantil
de Caça aos Comunistas), o "Panzer" - e a Igreja já não produziam quadros em
um advogado de 44 anos, 1,90 metro de quantidades e da mesma qualidade de
altura, ex-campeão paulista de judô, antes. Assim, segundo estimativa de um
ex-assessor da Secretaria da Segurança
líder ultradireitista, restariam no Brasil
Pública de São Paulo, ex-chefe de Ga- menos de cinco mil militantes com sufi-
binete do então ministro da Justiça, ciente "consistência ideológica": 1.800
Luís Antônio Gama e Silva -, nos anos sexagenários cadastrados pela antiga
80 um modesto microempresário, con-
Ação Integralista Brasileira, dois mil
fessava-se decepcionado com a extre- militantes da Sociedade de Defesa da
ma direita, que ele preferia chamar de Tradição, Família e Propriedade (TFP)
"direita ideológica", para diferenciar - desprezados pelos outros ativistas por
do que considerava "direita de traseiro
seus fanatismo religioso - e cerca de
lustroso: o empresário que fica lustran-
500 militantes dos grupos paramilitares.
do o fundo das calças numa poltrona e Nos anos 80 a direita tentava Se esse pequeno contingente facilita-
se diz de direita para se beneficiar do articular-se. No alto, o ex-ministro da va a tarefa de construção da infra-
dinheiro do governo", Justiça Armando Falcão e o empresário estrutura logística - uma rede de mi-
"Panzer" tinha, certamente, motivos Carlo Barbieri Filho, no VIII Congresso croempresas capaz de garantir-lhes a
para estar decepcionado. Afinal, em 20 da Liga Mundial Anticomunista, nov./80, auto-suficiência econômica -, ele era,
anos de poder, a ultradireita não teve Rio. Acima, cartaz falso colado por também, o principal empecilho para o
competência política para transformar- agentes do SNI em Brasília, set./84: cumprimento das duas metas no cam-
se na força hegemônica no País, mes- provocações da direita po externo: a formação de um partido e
453
#1
arDFanasa (.a, 1234
<!O" "**" an co a , p 19%

o trabalho de massas. Sem condições


de constituir sua própria legenda, os ul-
tra participaram das eleiçoês de 1982
infiltrando-se no Partido TrabalhistaBra-
sileiro, que atraiu suas simpatias devido
à presença do ex-presidente Jânio Qua-
dros. Em 1984, as preferências eram di-
rigidas à Frente Liberal, que se movi-
mentava para formar um partido.
A falta de quadros havia adiado,
também, o principal objetivo da extre-
ma direita em seu "trabalho de mas-
sas": a criação de uma "CNBB de di-
reita" que, segundo o administrador de
empresas Ney Mohn, ex-agente do
CENIMAR (Centro de Informações da
Marinha) e do SNI (Serviço Nacional
de Informações), deveria chamar-se
Conferência Nacional dos Bispos Bra-
sileiros,para impedir a entrada dos bis-
pos não nascidos no Brasil, que eram,
em sua opinião, os principais divulga-
dores no País da chamada Teologia da
Libertação,
Sem forças suficientes para sair às

Iconographia
ruas de mãos desarmadas, a ultradireita
apostava na tese do "quanto pior, me-
lhor", desenvolvida pelo estudante pro-
fissional Alexandre Inojosa, um dos
principais articuladores políticos da ex-
trema direita brasileira na década de
80. Somente essa tese poderia dar senti-
do a certos fatos relatados pelos direitis-
tas e que de outra forma seriam inexpli-
cáveis. Eles diziam, por exemplo, que
mobilizaram agentes do SNL, entre eles
Ney Mohn - líder, também, do grupo
Vanguarda Nacionalista Popular -,
para ajudar a direção do Movimento
Revolucionário 8 de Outubro (MR-8),
organização de esquerda, na divulga-
ção de uma nota oficial em Brasília; e
que enviaram militares armados para
dar proteção a grupos de pichadores do
Partido Comunista do Brasil. A tese
explicaria, ainda, a colagem de cartazes
falsos do Partido Comunista Brasileiro
por agentes do SNI, dando apoio a
Tancredo Neves,
O argumento de Inojosa era de que a
extrema direita só cresce e se organiza
diante do aumento da ameaça esquer-
dista, tese de certa forma confirmada
pelo coronel Antônio Erasmo Dias, ex-
secretário da Segurança Pública do Es-
tado de São Paulo. "A direita é basica-
Assis Hoftmann/Abril Press

mente conservadora", explicava o co-


ronel, "ela não age, só reage". E, com
uma ameaça esquerdista nas mãos, os
militantes da extrema direita poderiam,
então, voltar a bater aos portões dos
quartéis. Afinal, como os "direitistas de
traseiro lustroso" - que odeiam -, eles
No final do Regime Militar a direita não mais conseguia formar quadros também conseguem sobreviver apenas
ideologicamente consistentes como os integralistas dos anos 30 e 40 (no alto] e se com o apoio oficial,
dividia em cerca de 50 grupos com quatro ou cinco militantes cada um. Acima,
pichações de movimentos anticomunistas
Antônio Carlos Fon
454
as
H©A42334 an cor, p I98
BR DFANBSBVS

POLÍTICA/HISTÓRIA: as relações Brasil-América Latina nada a dever à Etiópia, com uma renda
média per capita de 2.550 cruzeiros
para 45% da população do Nordeste,
segundo os dados revelados pela Igreja.
Olho no Primeiro Mundo As teorias sobre a especificidade ab-
soluta do Brasil em relação à América
Latina se baseiam num argumento apa-
Considerando-se superior a outros países da América Latina, rentemente de peso, porque nos diria
o Brasil deixa de ser líder entre seus pares para ser vassalo que "já nascemos diferentes", originá-
rios de berço lusitano, os únicos no
dos Estados Unidos e da Europa
continente. E isso fez diferença: na cul-
tura, na religião, no tipo de colonização
Um país de cara para a Europa e os taleceu a idéia de que o Brasil não per- e, finalmente, nos destinos diversos da
Estados Unidos e de costas para a tence ao Terceiro Mundo, de que pre- Espanha e de Portugal diante do impé-
América Latina: os olhos vivos do lito- ferimos ser rabeiras na divisão dos pai- rio napoleônico e do bloqueio conti-
ral voltados para as metrópoles e o tra- ses industrializados do que líderes entre nental. A consequência mais importan-
seiro assentado displicentemente na di- os não-alinhados. Não interessa se nos- te foi a forma de pacto entre Brasil e
reção do continente. Tudo parece con- sa taxa de mortalidade infantil é similar Portugal que, fundamentalmente, assu-
firmar a teoria do "fatalismo geográfi- à da Nigéria e se o País é, ao mesmo miu a nossa independência, ao contrá-
co" ou do "destino manifesto", segun- tempo, o mais rico e o mais pobre da rio da de outros países latino-
do a qual estamos fatalmente atrelados América Latina, com um parque indus- americanos. Nestes, a independência
ao ocidental, cápitalista e cristão pela trial tantas vezes louvado como um dos foi resultado de um processo de guerra
nossa localização física. A expansão maiores entre os países capitalistas e popular que durou vários anos - como,
econômica das décadas de 60 e 70 for- uma área de pobreza que não deixa por exemplo, o Uruguai, cuja luta de
independêricia, liderada por José Ger-
vásio Artigas, estendeu-se de 1810 a
1814 - e implicou a organização de
exércitos nacionais para lutar contra o
colonizador, incorporando amplos se-
tores populares à luta contra a Espa-
nha. Bolivar, San Martin, Sucre,
O' Higgins, Juarez e Artigas foram os
grandes fundadores da nacionalidade
latino-americana, nascida nas lutas
concretas de solidariedade contra o ini-
migo espanhol. Guerrilheiros, como os
chilenos Carrera e Manuel Rodriguez,
foram o elo da participação ativa dos
setores populares na gesta de nasci-
Biblioteca Nacional
Biblioteca Nacional

mento dos Estados nacionais na Ameéri-


ca Latina. O próprio exército desses
países nasce ligado ao povo, numa luta
nacional contra invasores externos, e o
Estado de cada país surge como resul-
tado da vitória popular. A bandeira, o
hino nacional, os brasões, os caudilhos
líderes da independência têm um signi-
ficadoprofundo, de onde parte o senti-
mento de nacionalidade muito mais en-
raizado que o nosso.
Alguns exemplos de como se vê a
história de nossos vizinhos demonstram
como faz parte da ideologia dominante
no Brasil a exploração do chauvinismo,
para tentar não somente diferenciar-
nos e distanciar-nos deles, como proje-
tar a idéia aristocrática de uma superio-
ridade brasileira sobre o restante da
Biblioteca Nacional

América Latina. _
O Paraguai e a Bolívia são vítimas
das gozações brasileiras. Em nossa his-
tória, de tão poucos heróis pátrios e
glórias guerreiras reais, a guerra contra
Ao contrário de seus vizinhos latino-americanos - cujas lutas de libertaçãoforjaram 0 Paraguai (1864-70) é relatada em tom
heróis populares (no alto, à esq., Artigas, à dir., San Martin) -, a independência do épico. Os exércitos brasileiro, argentino
País ( acima, no quadro "Grito do Ipiranga", de Moreaux) se deu como um pacto entre e uruguaio constituiram a Tríplice
Brasil e Portugal Aliança para "libertar" o país vizinho
455
BR RALO 22 J AnCO2 , P 3 C14)

Biblioteca Nacional
Eoao Sao" “ A
774
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Visão histórica deformada: Solano Lopez, A instabilidade política da Bolívia - para alguns um exemplo de que aquele é um país
segundo Vida Fluminense de 12/6/1869, caótico - deve-se, em grande parte, sólida organização sindical. Acima,
era o Nero do Século 19 manifestação em La Paz reúne 20 mil trabalhadores (17/4/84)

do jugo de um "ditador cruel", Solano ao Brasil), foi considerada uma ofensa o regime daquele país, enquanto o Bra-
López. A guerra, contada pela historio- nacional. A Bolívia foi erigida em sil se situa ao lado do Chile de Pino-
grafia oficial brasileira como uma ação exemplo de país "selvagem", de insta- chet, do Paraguai, de Honduras, da
titânica contra um inimigo superior em bilidade política permanente, numa su- Guatemala, de El Salvador, do Haiti,
combatentes, terminou com a vitória cessão incontável de golpes militares na obstinação de desconhecer a reali-
do "bem" (a Tríplice Aliança) sobre o desde sua independência. No entanto, dade inegável de um regime que sobre-
"mal", e o Paraguai foi reincorporado isso se deve, em grande parte, à sólida vive há 25 anos às agressões dos EUA,
ao grupo das nações "livres e civiliza- organização sindical do país, centraliza- O afastamento manipulado do Brasil
das", O patriotismo permeia todos os li- da na COB (Confederação Operária em relação à América Latina também
vros escolares de história, com as bra- Boliviana), que se baseia na maciça nos distancia política e culturalmente
vuras do Duque de Caxias e seus co- mobilização dos mineiros - aqueles do Terceiro Mundo, já que não partici-
mandados, sem mencionar que, para mesmos que, em 1952, protagonizaram pamos do Movimento de Países Não-
além das razões imediatas do conflito uma revolução que impôs uma reforma Alinhados, que procura ampliar o espa-
de fronteiras, estava o empenho inglês agrária no país, a nacionalização das ço dos países com políticas externas in-
em liquidar o desenvolvimento do úni- principais minas e a substituição do dependentes. Nesse movimento, sem
co país latino-americano que se expan- exército por milícias populares. Essas dúvida, o Brasil poderia desempenhar
dia baseado na ampliação do mercado conquistas foram sendo desestabiliza- papel de primeira linha, como passou a
interno, realizando uma reforma agrá- das pelos governos posteriores, mas a ter a Argentina, após a eleição do presi-
ria e construindo um regime voltado capacidade de luta dos trabalhadores dente Raul Alfonsin, em 1983,
' para os seus interesses. bolivianos lhes conferia, ainda em 1984, A própria idéia de que o Brasil fica
Atuando com a mão do gato, a In- um poder de veto fundamental em "perto" da América Latina - basta sair
glaterra conseguiu seu objetivo, acres- nível nacional. daqui para chegar lá - revela um pro-
cido da multiplicação da dependência vincianismo que só pode ser explicado
do Brasil, da Argentina e do Uruguai, Sob pressão dos EUA, o regime a partir do ponto de vista de quem tem
grandemente endividados com aquela não reata relações com Cuba seus interesses ligados às grandes em-
potência européia pelos gastos de guer-
presas das metrópoles capitalistas, se-
ra. O Brasil, por seu lado, incorporava Outro exemplo de como é falaz a jam empresas industriais, financeiras,
um pedaço do território derrotado, de- pretendida superioridade brasileira comerciais ou agroindustriais, Como
pois de ter atuado numa guerra que le- sobre os outros países do continente primos pobres da comunidade do Pri-
vou à morte 75% do povo paraguaio e vem das relações com Cuba, rompidas meiro Mundo, estaremos sempre em
mais de 99% dos homens de mais de 20 exatamente com o golpe militar de atitude subserviente, porque enfeixa-
anos., Essa ação de tropas brasileiras 1964. Hoje, o Brasil se situa ao lado dos dos numa correlação de forças que, por
voltaria a se dar um século depois, em países mais atrasados do continente, na definição, o favorece, na esperança de
1965, quando o Exército nacional parti- insistência em não restabelecer os con- um dia "ser parte dele ",
cipou, junto com o de outros países do tatos rompidos, sob pressão direta dos A reinserção do Brasil na América
continente americano, sob a liderança EUA, por todos os governos latino- Latina faz parte do processo de supera-
dos EUA, do desembarque de tropas americanos, menos o México. Atual- ção da nossa busca de identidade como
naRepública Dominicana, para evitar mente, os governos que exibem um nação: daí sua importância e a possibili-
que um governo legitimamente eleito mínimo de autonomia em relação a dade de que a transição democrática
pudesse tomar posse e pôr em prática Washington, como os da Argentina, da anunciada por Tancredo Neves, que
seu programa. Venezuela, do Peru, da Colômbia, do assumiria a Presidência em 1985, modi-
A menção equivocada do presidente Panamá, do Equador ou da Nicarágua, ficasse também nosso lugar no cenário
Ronald Reagan, dos EUA, no final de mantêm relações com Cuba, indepen- internacional.
1982 (ele disse "Bolívia" referindo-se dentemente do juízo que tenham sobre
Emir Sader
456
BRDFANBSBMB: GAME. Pn CO2, p 200

ECONOMIA/INDÚSTRIA: as fases da industrialização no Brasil

A partir do governo Juscelino, contrariando o processo clássico, o Brasil sai do


rumo do desenvolvimento industrial parcialmente autônomo. No Regime Militar,
cai de vez nas malhas da dependência externa

Indústria, em sentido amplo, é qual-


quer atividade produtiva que, transfor-
mando matérias-primas, elabora pro-
dutos úteis ao homem. Neste sentido
forma o setor que o economista e so-
ciólogo Colin Clark chamou, no livro
As Condições do Progresso Econômico,
de secundário, distinto do primário,
constituído por atividades extrativas ou
pela lavoura e pecuária, ainda baseadas
fundamentalmente em forças naturais.
Nesta acepção lata, a indústria surgiu
com o próprio homem, desde o instante
em que fabricou os primeiros utensílios.
Entendida assim, a indústria foi du-
rante muitos séculos artesanal, baseada
no trabalho manual e nas habilidades
pessoais de produtores cada vez mais
especializados. Adiante, surgiu também
a indústria manufatureira, já produto da
atividade conjunta e combinada de
vários trabalhadores, mas ainda ba-
seada na técnica artesanal e muito de-
pendente das habilidades pessoais dos
trabalhadores. Só em meados do século
18, com a invenção das máquinas, é
que surgiu uma forma técnica inteira-
mente nova de trabalho, o trabalho me-
canizado, e com ele a indústria em sen-
tido restrito e moderno, a grande indús-
tria mecanizada ou fabril, baseada em
sistemas integrados de máquinas, ope-
radas pelo trabalho em comum de um
número crescente de operários.
A revolução técnica que deu origem
a essa forma mecanizada moderna de
produção - a chamada "revolução in-
dustria!" - foi importante não só por-
que alargou as possibilidades de novos
bens, de qualidade superior e em quan-
tidades incomparavelmente maiores, e
porque aliviou os trabalhadores, substi-
tuindo uma parcela de seu esforço
físico pela ação das máquinas, mas
também porque, com o desenvolvi-
mento da indústria urbana, tornou-se
possível passar em seguida a uma re-
modelação técnica profunda dos trans-
portes, das comunicações, da agrope-
cuária e até dos sistemas de defesa na-
cional. Por isso, a partir do século 18 e
da revolução industrial inglesa, desen-
volvimento material tornou-se sinô-
nimo de industrialização. A indústria se
converteu no fator decisivo impres-
cindível à expansão econômica e à mo-
457
sr oransse 8404 4253 4 anco2, p204

sivo; e em que a circulação mundial de


mercadorias e capitais, a criação de
tecnologias de ponta e o conjunto da
vida econômica, política e cultural do
mundo capitalista já estão sob o con-
trole das nações capitalistas mais pode-
rosas e de suas gigantescas empresas
monopolistas. Daí decorre a série de
marcas novas e desfavoráveis que dife-
renciam a industrialização recente des-
ses países da periferia capitalista: a pre-
sença crescente de empresas estrangei-
ras nos setores mais dinâmicos de suas
economias; o desenvolvimento insufi-
ciente da indústria de bens produtivos e
da criação local de tecnologia; o cará-
ter precocemente monopolista estatal
de seu capital; as tendências mais fortes
para o desemprego e subemprego da
força de trabalho; as desigualdades so-
ciais e regionais mais acentuadas; e,
como produto final desses traços, sua
instabilidade econômica maior, com
crises cíclicas mais constantes e profun-
das pela conjugação dos fatores inter-

Iconographia
nos aos internacionais. O Brasil é um
caso paradigmático desse tipo de indus-
a trialização tardia, periférica e por isso
restringida. !
O primeiro período de industrialização do Brasil se estende da última década
do século Durante toda a fase colonial, a eco-
19 aos anos 30 e caracteriza-se pela produção de bens de consumo náão-duráve
is, como nomia brasileira teve seu centro diná-
tecidos. Acima, indústria têxtil em Campinas, SP, 1924
mico na produção de alguns gêneros
agrícolas ou na extração de metais pre-
dernização de qualquer país. tais, representaram tentativas de cons- ciosos para o mercado externo. Essa
Os primeiros processos de industria- trução da base econômica de um re- produção, embora se revestisse de ca-
lização - como os da Inglaterra, da gime social novo, o socialismo. Na ráter mercantil e complementar à das
França, da Holanda e, mais adiante, da maioria desses países e a partir dos economias metropolitanas e concor-
Alemanha, do Japão, dos Estados Uni- anos 60, essas experiências foram inter- resse para a acumulação primitiva de
dos - se conjugaram com a formação rompidas e entraram numa crise pro- capital na Europa, não era ainda capi-
do modo de produção capitalista, já em funda. talista, pois se realizava na moldura da
andamento na Europa Ocidental desde
grande propriedade fundiária e do tra-
o século 16. Representaram o coroa-
balho escravo. Constituía a base econô-
mento dessa formação, quando a pro-
mica de uma formação social caracteri-
' priedade privada capitalista dos meios
zada apropriadamente por Jacob Go-
de produção e o regime de trabalho li- Enquanto isso, um grupo de nações render como escravista-colonial. A pró-
vre assalariado encontraram uma base da América Latina, Ásia e África, no pria comercialização externa se proces-
técnica e forças produtivas também início dos anos 80 designadas como sou, até o começo do século 19, através
apropriadas ao comando e às finalida- " novos países industrializados", pas- da intermediação compulsória da Co-
des do capiital: a gerência por especia- sava por um processo de industrializa- roa portuguesa e dos mercadores a ela
listas, uma divisão minuciosa e autori- ção e modernização de suas economias associados, o que embaraçava a acu-
tária do trabalho e um sistema de má- que nem era socialista nem reproduzia mulação de capitais na colônia mesmo
quinas cada vez mais complexo e inte- inteiramente as características das in- sob as modalidades prévias de capital
grado. Esses processos clássicos de in- dustrializações dos séculos 18 e 19, comercial e bancário.
dustrialização, ocorridos entre os sécu- Para distinguir essa modalidade de No entanto, além das grandes fazen-
los 18 e 19, deram origem aos países ca- industrialização capitalista da anterior, das, das minas disputadas e do impor-
pitalistas adiantados, desenvolvidos, tem sido ressaltado seu caráter tardio tante comércio exportador e importa-
imperialistas, do século 20. ou retardatário. Com efeito, a industria- dor, cresceram, com o tempo, um setor
Bem distintos foram os processos de lização capitalista desses países ocorre interno de produção, transporte e co-
industrialização enfrentados pela numa fase histórica em que já é acirrado mercialização de alimentos e um setor
União Soviética, a partir de 1926, e por e aberto o confronto entre o sistema artesanal, nos quais, a par do recurso à
um grupo de países do Leste europeu e capitalista e o sistema socialista; em mão-de-obra escrava, foram adotados
da Asia, nos anos que se seguiram à Se- que os países capitalistas adiantados já diferentes regimes de trabalho livre.
gunda Grande Guerra. Esses proces- concluiram sua industrialização, passa- Desenvolveu-se também o aparelho
sos, dirigidos e impulsionados por Esta- tam do estágio competitivo ao estágio administrativo, insuflando maior alento
dos pós-revolucionários, de caráter de monopólios cada vez mais podero- às cidades que se formavam e cres-
operário ou operário-popular, e combi- sos e internacionalizados; em que os ciam. E o quadro começou a alterar-se
nados com formas de propriedade so- Estados capitalistas desempenham um mais rapidamente com a transferência
cial dos meios de produção fundamen- papel econômico cada vez mais deci- da Corte portuguesa e a abertura dos
458
#3,
E+
portos brasileiros, em 1808, com a inde-
pendência do Estado brasileiro, em
1822, e sobretudo com a difusão, logo
em seguida, de um novo produto ex-
portável: o café.
Por um lado, a lavoura cafeeira inte-
grava ainda o padrão de crescimento
genericamente denominado de "pri-
mário-exportador", principalmente
em seu período inicial, no Vale do Pa-
raíba, quando ela se desenvolveu com
base no trabalho escravo. Por outro .
lado, porém, o monopólio comercial
metropolitano desaparecera e a grande
propriedade, embora ainda apoiada no
trabalho servil, passou a produzir arti-
culada a um sistema comercial-
financeiro controlado nacionalmente, o
que intensificou a acumulação interna
de capitais. O papel das casas comissio-
nárias estrangeiras ainda era enorme,
mas foram se reunindo condições para
a criação e fortalecimento de grupos
exportadores nacionais e de bancos
vinculados, até nos nomes, ao comér-
cio e à lavoura de exportação.

Outros acontecimentos marcantes


reforçariam as novas tendências. Em
1850, foi abolido o tráfico negreiro e
vieram, em seguida, as leis do ventre
livre e dos sexagenários, prenunciando
o fim próximo do escravismo. Paralela-
mente, a Lei de Terras, também de
Iconograpria

1850, praticamente vedava o acesso de


pequenos camponeses livres à proprie-
dade e ao uso do solo. Ao mesmo tem-
po, estimulava-se o fluxo de trabalhado-
res imigrantes, vindos principalmente da
xXx Europa. E a própria lavoura cafeeira, à
L_[8/14o

ROL!
Eo _ ao _ ao, Polp ao oao aaa Ju

o
-=: im | 5u

medida que penetrava no Oeste pau-


um! a p ar?AEWBPà

lista a partir de 1870, passava autilizar


crescentemente o colonato e outras
formas de trabalho livre. Assim, iam-se
constituindo as condições essenciais
para o desenvolvimento de indústrias e
yLOMP

do modo de produção capitalista pro-


priamente dito: um mercado consumi-
e dor em expansão, uma acumulação
bio-m/

crescente de capital em suas formas ini-


k! ciais de capital comercial e bancário e
um mercado de trabalhadores dupla-
s

A
A mente livres, livres de laços de sujeição
E-pel
- pm

não-econômica mas livres também da


[I propriedade de meios produtivos. Com
a transferência de tecnologia estran-
geira e a formação da infra-estrutura
energética e viária, ainda em ligação
com o complexo cafeeiro, essas condi-
Iconograpria

ções se completariam, aumentando


gradativamente o número de estabele-
cimentos industriais, principalmente
A partir da metade dos anos 30, o País faz pesados investimentos na produção de nas então províncias do Rio de Janeiro
insumos industriais (no alto, cartaz do DIP, 1944), como a criação da Usina e São Paulo.
Siderúrgica de Volta Redonda (acima, obras de construção, 30/4/41) A indústria fabril e as relações capi-
459
BR DFANBSB VB.GNCIAMA SLO /223 ) 5002, p 202
BR DFaNBSO VB.GNGAAASAHO12393 J am 002, 2203

talistas de produção fizeram sua apari- importante ressaltar que, até meados como Delmiro Gouveia, em Pernam-
ção no Brasil, portanto, ainda no seio dos anos 50 do século atual, o setor pri- buco, e Luís Tarquínio, na Bahia.,
de uma formação social predominante mário da economia brasileira conti- Registraram-se no período os pri-
escravista e como formas subordinadas nuou predominando sobre o setor se- meiros investimentos industriais de ca-
e marginais. O próprio escravismo im- cundário no que diz respeito à geração pitais estrangeiros, como na abertura
pedia, é claro, a generalização da in- de renda e à absorção de força de tra- de frigoríficos ou de oficinas de mon-
dústria fabril. O número de homens li- balho. Portanto, só a partir daí é que a tagem e reparo de veículos. Instalaram-
vres, com poder aquisitivo, era restrito. . indústria se tornou, entre os setores se também algumas indústrias de bens
Os endinheirados adquiriam produtos produtivos, a principal fonte de renda e intermediários, como material de cons-
importados. Os latifúndios escravistas de emprego e que o País pôde trução, e de bens de capital leves, rela-
eram, em larga medida, auto-sufi- considerar-se industrializado. cionados principalmente com a agroin-
cientes. Assim, até a segunda me- Por outro lado, em toda a primeira dústria do açúcar e do café. No en-
tade do século 19, fora da agroindústria metade do século 20, o que predomina tanto, não foram esses empreendimen-
açucareira e de alguma elaboração do no setor primário é a grande agricul- tos que forneceram a marca do
couro ou do algodão, de base escra- tura de exportação e, nela, relações de período, e sim os ramos produtores de
vista, o fundamental da produção in- trabalho que não são mais escravistas, bens de consumo não-duráveis, que re-
dustrial que se fazia era de nível caseiro mas também ainda não são especiífica- queriam tecnologias mais simples e
ou artesanal. mente capitalistas; são relações ineren- acessíveis, investimentos menores de
A* vinda da €orte portuguesa para o temente mistas, próprias a uma fase de capital e prazos mais curtos de instala-
Brasil começa a alterar esse panorama, transição. Só com a prevalência do se- ção, e estavam portanto mais de
conforme já foi assinalado. O próprio tor industrial e do modo de produção acordo com os limites do mercado bra-
monarca adota várias medidas de esti- especificamente capitalista, nas três úl- sileiro e as possibilidades do empresa-
mulo à fiação e tecelagem, às forjias e timas décadas, é que a agricultura co- riado nacional que surgia.
fundições de ferro, à vinda de missões meça também a ser profundamente re- Eram grandes as dificuldades que
técnicas e científicas. Contudo, os re- modelada, com a difusão das relações cercavam essas indústrias nascentes. A
sultados são ainda modestos, inclusive de trabalho assalariado puro e a moder- expansão do setor exportador, primor-
porque contrabalançados pela abertura nização das forças produtivas, proces- dialmente do complexo cafeeiro, é que
dos portos e do mercado brasileiro à sos ainda em andamento nos anos 80. comandava a acumulação de capital no
afluência crescente de mercadorias in- Portanto, o que se abre na história bra- País. O crescimento industrial era obs-
glesas. sileira, no final do século 19, é um tado, além disso, pelas novas condições
Mais vigoroso foi o novo surto indus- período de transição entre a formação internacionais. Surgiria o capitalismo
trial conhecido como "era Mauá", por social escravista-colonial e uma forma- industrial. Operava-se a transição do
ter sido o barão, depois visconde de ção capitalista-dependente, que só vai capitalismo competitivo para o capita-
Mauá, Irineu Evangelista de Souza, sua firmar-se em meados dos anos 50, lismo monopolista. E a economia mun-
figura mais destacada. O novo ciclo de O eixo dessa transição foi o processo dial era reorganizada com base nos mo-
empreendimentos industriais estava re- de industrialização do País, que, to- nopólios"* capitalistas internacionais e
lacionado, basicamente, aos efeitos da mando corpo gradativamente, pode ser numa divisão desigual do trabalho en-
interrupção no tráfico e comércio de dividido em três períodos básicos: o que tre países centrais, industrializados, e
escravos negros, conforme reconheceu se estende da última década do século países periféricos, como O Brasil,
o próprio Mauá, em 1878: "Reunir os 19 a meados dos anos 30; o que se pro- primário-exportadores.
capitais, que se viam repentinamente longa dessa fase à metade dos anos 50; Todavia, esse modelo de desenvolvi-
deslocados do ilícito comércio, e fazê- . € finalmente as três décadas que se se- mento "primário-exportador", louvado
los convergir a um centro donde pudes- guem. interessadamente pelos que propaga-
sem ir alimentar as forças produtivas vam que o Brasil estava destinado a
do País, foi o pensamento que me sur- permanecer "essencialmente agrícola",
giu na mente ao ter a certeza de que tinha sua expansão condicionada à evo-
aquele fato era irrevogável." Tomou, lução favorável dos mercados importa-
assim, a iniciativa de formar sociedades dores e, por conseguinte, era pertur-
de investimentos para implantar ferro- O primeiro período se caracterizou bado sempre que irrompiam crises
vias, estaleiros, bancos, fábricas. Em- pela montagem e expansão dos ramos mais sérias na economia capitalista
preendimentos semelhantes surgiram industriais produtores de bens de con- mundial, Nesses momentos, com a in-
nos principais núcleos urbanos do País sumo não-duráveis, como tecidos, cal- terrupção parcial nas correntes de co-
e até em zonas interioranas, dando ori- cados, alimentos, bebidas e móveis. Es- mércio exterior e o aparecimento de
gem a pequenas fábricas de tecidos, ses ramos foram instalados, em sua recursos ociosos que o setor primário-
chapéus, sapatos, vidros, louças, cer- quase totalidade, por empresas nacio- exportador não lograva absorver, a ex-
veja, vinhos, sabão, velas. A maioria nais privadas - ou de grandes comer- pansão da indústria doméstica era im-
dessas empresas malogrou, mas as que ciantes e grandes proprietários de ter- pulsionada a fim de substituir importa-
vingaram, mesmo que assumidas pelo ras que começaram a aplicar seus capi- ções tornadas inviáveis, ainda mais que
capital inglês como aconteceu com fer- tais também no setor secundário, ou de o mercado interno continuava se am-
rovias implantadas por Mauá, vieram a imigrantes com recursos, que aqui se pliando com a difusão das relações
representar base importante para o radicaram e se voltaram para a indús- mercantis, o incremento da renda na-
novo impulso industrial que se seguiu à tria, como os Matarazzo, Crespi, Kla- cional e a urbanização crescente do
abolição da escravatura, em 1888, e à bin, Jafet. A indústria nascente se mos- País. A industrialização brasileira se
proclamação da República, no ano se- trava também menos concentrada do processou, assim, de início, através de
guinte, que em fases posteriores, e houve nes- surtos descontínuos, como os que pre-
Há quem entenda que, extinto o tra- sas décadas iniciativas importantes cederam e acompanharam a Primeir:
balho servil, o Brasil se tornou imedia- também no Rio Grande do Sul ou no Grande Guerra. 1
tamente um país capitalista. Por isso, é Nordeste, onde despontaram figuras Ainda assim, o Brasil já contava com
460
WE (1), My
sroransse ve.eneaaas 1 an cos, p-20a4

uma razoável indústria de bens de con-


sumo não-duráveis quando irrompeu
na economia capitalista mundial a
grande crise de 1929 e, no Brasil, as ba-
ses sociais do Estado foram parcial-
mente alteradas com o movimento re-
volucionário de 1930. Na sequência
desses acontecimentos, a industrializa-
ção brasileira ingressaria, entre meados
dos anos 30 e meados dos anos 50,
numa fase mais avançada, caracteri-
zada por investimentos estatais de

«
vulto, seja na infra-estrutura de trans-
porte (novas ferrovias, primeiras rodo-
vias de porte) e de energia (primeiras
usinas hidrelétricas estatais, como
Paulo Afonso), seja na produção de in-
sumos básicos (a Companhia Vale do
Rio Doce para produção de minério de
ferro, a Companhia Siderúrgica Nacio-
nal e Acesita para produção de aço, a
Companhia Nacional de Álcalis para

Irmo Cel so/Abril Press


fabricação de barrilha e soda cáustica),
seja diretamente na indústria mecânica,
com a implantação da Fábrica Nacio-
nal de Motores, inicialmente para re-
paro e fabricação de motores de aviões,
depois para a produção de caminhões
que chegaram a ter larga difusão no
País. A esses empreendimentos se so-
maria, já no começo dos anos 50, a
criação e implantação da Petrobrás. A
industrialização brasileira passava, as-
sim, da produção de bens de consumo
não-duráveis à fase decisiva da fabrica-
ção de meios de produção, por inicia-
tiva do Estado, única alternativa viável
para os países periféricos nas condições
de meados do século.
As iniciativas estatais adicionam-se
empreendimentos privados importan-
tes na área de bens intermediários,
como o cimento; novos investimentos
estrangeiros no setor industrial; e a am-
pliação das indústrias nacionais de bens
de consumo não-duráveis. Portanto, é
toda a industrialização que se acelera
no período, registrando-se não apenas
o aumento da produção industrial ou
do número de estabelecimentos fabris,
mas também sua mecanização cres-
cente, a elevação no tamanho médio
dos estabelecimentos e a diversificação
cada vez mais ampla na estrutura in-
dustrial. Declina também a participa-
ção de importações na oferta total de
bens intermediários, de bens de capital
Pedro IMartinell/Abril Press

e até de bens de consumo duráveis.


Ainda assim, no começo da década
de 50, o setor primário-exportador per-
manecia como a principal fonte de ren-
da e de emprego. Na estrutura indus-
trial predominavam ainda, largamente,
os ramos produtores de bens de con-
sumo não-duráveis. E o atraso da in-
No governo Juscelino começa a investida do capital estrangeiro na indústria, acirrada, dústria de meios produtivos era ainda
depois, sob o Regime Militar. No alto, linha de montagem da Sharp, Manaus, 1981; mais claro quando se observava o pre-
acima, pátio da Volkswagen, São Bernardo, SP, 1979 cário desenvolvimento de seu núcleo
461
vaeNtaa 2071294 ancoa, p.205

fundamental, produtor de motores, cação de bens de consumo duráveis e mento e a diferenciação progressivos do
máquinas-ferramentas e equipamentos. bens de capital tecnologicamente mais mercado interno. Na industrialização
nessas condições que a industriali- refinados, já no século 20, No Brasil, o periférica e tardia, o setor industrial é
zação brasileira passa por uma nova e avanço da industrialização, em vez de levado a adotar imediatamente produ-
decisiva virada, em meio à década de aguardar a consolidação e maturidade tos e processos avançados e a trans-
50. Acompanhando a nova tendência da indústria de bens produtivos, impul- plantar do Exterior uma tecnologia vol-
na divisão internacional do trabalho, sionou o desenvolvimento acelerado da tada para poupar mão-de-obra. Nessas
capitais estrangeiras expressivos diri- indústria de bens de consumo duráveis, condições, produzem-se bens sofística-
gem-se para O Brasil e outros países o que, obviamente, só se tornou possi- dos enquanto a maioria da população
periféricos de características semelhan- vel porque, tratando-se de uma indus- continua privada de bens elementares e
tes, onde vão cumprir, pela primeira trialização tardia, a indústria de bens essenciais. E reeforçam-nas as tendên-
vez, um papel pioneiro no desenvolvi- produtivos dos países centrais passou a cias a marginalizar parcelas crescentes da
mento industrial desses países, implan- alimentar a formação de capital e força de trabalho, com o que não ape-
tando novos ramos de bens de con- mesmo a operação do parque industrial nas se tornam muito altas as taxas de
sumo duráveis e mais sofisticados. brasileiro, Tal situação, porém, além de desemprego e subemprego, mas tam-
Nesse sentido, o festejado Programa aumentar a dependência "estrutural" bém os próprios salários dos trabalha-
de Metas do governo Juscelino Kubits- ou "tecnológica" do País em relação a dores empregados sofrem fortes pres-
chek (1956-61) não representou sim- importações, agora essenciais e difícil. sões baixistas. Assim, a industrialização
plesmente uma nova etapa, mas sim mente comprimíveis, também transfere dependente e retardatária é acompa-
uíha reorientação do processo de in- para o Exterior os impulsos dinâmicos nhada de desigualdades sociais ainda
dustrialização brasileira. Até então, a que poderiam originar-se da inter-rela- mais fortes do que as observadas nos
industrialização fora promovida princi- ção entre os diferentes segmentos in- processos de industrialização capita-
palmente por empresas nacionais, pri- dustriais. lista clássica.
vadas e públicas, e se baseara de início
Em virtude desses traços, os movi-
no setor de bens de consumo não-
mentos cíclicos se apresentam também
duráveis e em seguida no incipiente se-
mais sérios e bruscos. A concentração
tor de bens de produção. Na etapa
da renda sendo mais acentuada, é mais
aberta pelo Programa de Metas, ocorre Outra consequência é que o desen- aguda a contradição entre o cresci-
o ingresso maciço de capitais externos, volvimento do capitalismo no País, que mento acelerado da produção e o cres-
que se dirigem precipuamente para os já se tornara rapidamente estatal, pelo cimento insuficiente do consumo dos
setores de bens de consumo duráveis, papel insubstituível do Estado na mon- trabalhadores. A existência de um sis-
em particular para o automobilístico e tagem da infra-estrutura e na implanta- tema latifundiário-exportador, difícul-
o eletrodoméstico, que se convertem ção de setores básicos da indústria, tando a produção de gêneros alimenti-
nos setores líderes da nova expansão agora se torna também, precocemente, cios, eleva também as pressões inflacio-
industrial. A viabilidade dessa forma de monopolista. O caso da indústria mon- nárias. E esses países, para ampliar sua
expansão estava, até certo ponto, asse- tadora de veículos automotores é capacidade produtiva, dependem em
gurada pela concentração da renda e exemplar. Nos Estados Unidos, em grande parte da importação de
pela estrutura da demanda herdadas do 1910, havia 181 companhias montado- matérias-primas, combustíveis, peças e
período anterior. Viabilizavam-na tam- ras de automóveis. Em 1923, existiam equipamentos. Assim, a continuidade
bém a infra-estrutura de energia, trans- ainda 108. Em 1927 restavam 44. E só da expansão fica condicionada, não
portes e comunicações e os segmentos em 1954, após décadas de competição apenas à acumulação interna de capi-
produtores de bens intermediários e acirrada, é que foram reduzidas a seis tais e à possibilidade de inversões lucra-
bens de capital, criados na fase prece- grandes montadoras. No Brasil, a in- tivas, mas também à disponibilidade de
dente. Mas a industrialização assume, a dústria automobilística já surgiu com- divisas, ou seja, de moedas estrangeiras
partir daí - justamente na fase em que pletamente monopolizada por cinco a para adquirir no Exterior os meios de
a produção industrial supera a produ- seis grandes montadoras multinacio- produção necessários. Dessa maneira,
ção agricola -, características inteira- nais. Pressionados pelas empresas esta- nesses países, é comum que aos pontos
mente novas, que vão ficar ainda mais tais e pelos monopólios internacionais, de estrangulamento na estrutura indus-
claras durante os governos militares, os os grupos brasileiros mais poderosos ti- trial e às pressões inflacionárias inter-
quais não alteram esse padrão mas o veram também que fazer todos os es- nas se juntem desequilíbrios nas rela-
aprofundam. Recorrem ainda mais ex- forços para crescer ou associar-se rapi- ções comerciais e financeiras externas,
tensamente aos capitais externos, Con- damente, sob pena de não sobrevi- encurtando as fases expansivas e pro-
centram ainda mais a renda. Estimulam verem. Os efeitos de uma estrutura in- longando e aprofundando as fases re-
mais ainda a expansão da indústria de dustrial assim rapidamente monopoli- cessivas.
bens de consumo duráveis. zada logo se fariam sentir nas taxas ex- Por ter revestido essas características
Dessa maneira, a sequência da in- traordinárias de lucros, nas manipula- é que a industrialização tardia e depen-
dustrialização capitalista clássica foi al- ções de preços, nas pressões inflacio- dente do Brasil, embora o tenha colo-
terada no Brasil, como em outros nárias. cado entre os dez países de maior pro-
países de industrialização dependente e Acrescente-se que, nos casos de in- duto industrial, não realizou as seduto-
tardia. No caso clássico, a industrializa- dustrialização capitalista tradicional, a ras promessas que despertou inicial-
ção partiu da produção de bens de con- indústria se formou a partir de formas mente. Ao invés de reforçar a sobera-
sumo de uso difundido e popular, como artesanais e pouco eficientes de produ- nia, aprofundou a dependência. Em
tecidos e alimentos, no século 18 e ção, substituídas por formas fabris num vez de atenuar, agravou de forma dra-
começo do século 19; passou à fabrica- processo em que a tecnologia científica mática os problemas sociais já crônicos
ção de bens intermediários e bens de foi sendo criada e difundida de forma do País. E de forma alguma assegurou
capital, que pouco a pouco predomina- gradual, em correspondência com. a o anunciado crescimento contínuo e
ram, na segunda metade do século 19; disponibilidade de capitais e de mão- auto-sustentado. e
alcançando como coroamento a. fabri- de-obra e de acordo com o alarga- Duarte Pereira
462
ar pranãss vaenNcAXA a J In COA , p 206

Até 1930, com exceção das sucessi-


vas compras de estoques de café, o go-
verno federal intervinha muito pouco
na economia, então baseada nas ativi-
dades agrário-exportadoras. A Consti-
tuição em vigor (de 1891) fortalecia o
sistema federativo, dando larga autono-
mia aos Estados, destinando-lhes os re-
cursos do imposto sobre as exporta-
ções. Ao governo federal cabia o im-
posto sobre as importações. Mas, com
a grande crise do final dos anos 20, o.
País enveredou definitivamente pelos
caminhos da industrialização. Assim,
cresceram as exigências de maior inter-
venção do Estado na economia, com
ele então se responsabilizando pela
criação e ampliação da infra-estrutura
necessária à industrialização.

A Constituição de 1934 tentou adap-


No segundo semestre de 1983, em Brasília, prefeitos e vereadores pedem reforma tar o sistema tributário a essa nova rea-
lidade, criando o Imposto sobre Vendas
tributária
e Consignações (IVC). Após o golpe do
Estado Novo, em 1937, aumentou tam-
ECONOMIA/FINANÇAS: o sistema tributário brasileiro
bém a carga tributária. A partir de en-
tão, os impostos sobre as atividades
econômicas destinadas principalmente
ao mercado interno passaram a ser as
principais fontes da receita tributária
do Estado. A Constituição de 1946 pre-
O sistema fiscal sempre reflete a relação de forças na servou, no essencial, essas caracteristi-
cas.
economia e na política. No Regime Militar, a carga de
Entretanto, nos anos 40 e início dos
impostos recaiu sobre os de menor renda anos 50, o Estado investiu firme em
grandes projetos de infra-estrutura,
O sistema tributário brasileiro sofreu Quanto aos impostos indiretos, o fei- criando empresas públicas de grande
transformações ao longo da nossa his- jão, arroz e farinha, alimentos essen- porte, e começaram a ocorrer os pri-
tória republicana quase em perfeita ciais para a grande massa dos trabalha- meiros estrangulamentos no sistema fis-
concordância com as transformações dores, recebiam a incidência de 17% do cal. Em 1951, criou-se um "adicional
estruturais pelas quais passaram a eco- Imposto sobre Circulação de Mercado- restituível" do Imposto de Renda, cu-
nomia e a política no País. A mais pro- rias (ICM), enquanto aviões particula- jos recursos comporiam um Fundo de
funda dessas transformações foi feita res nada pagavam. As refeições servi- Reaparelhamento Econômico, para
após o golpe de 1964. A reforma tribu- das em hotéis turísticos estavam isentas projetos de infra-estrutura e desenvol-
tária promovida em 1966 e 1967 de ICM, mas, se servidas em restauran- vimento de indústrias básicas para as
.enquadrou-se perfeitamente no tes modestos, não escapavam aos 17%. atividades agropecuárias. Em 1952,
"espírito" do novo regime: no final de Em 1979, uma pesquisa coordenada esse Fundo se transformaria no Banco
1984, o sistema fiscal brasileiro era es- pelo professor Ibrahim Eris, da Facul- Nacional de Desenvolvimento Econô-
sencialmente regressivo, ou seja, co- dade de Economia da Universidade de mico (BNDE).
brava relativamente menos impostos de São Paulo, levando em conta os impos- Esse quadro, entretanto, mudaria ra-
quem ganhava mais. No caso do Im- tos diretos e indiretos, concluiu que as dicalmente na segunda metade dos
posto de Renda (IR), por exemplo, os pessoas que ganhavam até um salário anos 50. Sob o comando de Juscelino
lucros obtidos em operações de com- mínimo por mês arcavam com uma Kubitschek (195661), foi traçado o
pra e venda de papéis no mercado fi- carga tributária de 33,5% sobre seus ren- Plano de Metas para a industrialização
'nanceiro eram relativamente menos tri- dimentos, enquanto para as que ga- acelerada, baseada no setor de bens de
butados, se comparados com os rendi- nhavam mais de cem salários mínimos consumo duráveis e acompanhada por
mentos do trabalho. Em 1984, o go- a carga tributária não ia além de 15%. uma ampliação de vulto na infra-
verno anunciava uma importante alte- A reforma tributária promovida em estrutura que garantiria ao setor indus-
ração: naquele ano, do total da arreca- 1966-67, no entanto, pode ser conside- trial bens e serviços públicos adequa-
dação do IR, cerca de 79 % provinham rada modernizadora, se levarmos em dos. Nesse período, no entanto, o sis-
dos rendimentos do capital. O fato era conta que, no início dos anos 60, o sis- tema tributário revelou-se obsoleto.
importante porque durante alguns tema fiscal atravessava séria crise de Mas o País vivia um "pacto social" am-
anos, a partir de 1964, os rendimentos obsolescência, incapaz de gerar recur- plo, não havendo as condições políticas
do trabalho eram os que, proporcional- sos em volume compatível com os en- para se realizar uma profunda reforma
mente, mais côntribuiam para o IR. cargos crescentes do Estado. tributária. A saída foi o recurso ao capi-
463
sroranssa S41044234 An 002, p 204

tal estrangeiro e ao chamado "meca-


nismo inflacionário" de financiamento
do desenvolvimento, ou seja, a emissão Um golpe na autonomia
desmesurada de papel-moeda.
No início dos anos 60, no entanto, os
trabalhadores passaram a organizar-se
para recuperar os salários comidos pela A reforma tributária promovida depois de 1964 concentrou recursos
inflação, e a situação social, tensa, ini- nas mãos do governo federal, em detrimento dos Estados e Municípios.
bia o investimento estrangeiro, Urgia, Estes tiveram reduzida até a capacidade de decidir onde investir seus
pois, uma reforma tributária que per- recursos
mitisse ao Estado gerar as receitas que
ajudassem a sustentar o grande volume Evolução da participação da União, Estados e Municípios na receita tributária do
de gastos e ainda colocasse certa or- Brasil, em % (1956-81)*
dem no sistema fiscal.
A "desordem tributária" ma-
nifestava-se em três aspectos: pri-
meiro, o sistema fiscal da época era um
péssimo "cobrador" no que dizia res-
peito.ao Imposto de Renda, de estreita
abratigência. O número de declarantes
com imposto a pagar, por exemplo, unido
caira de 528 mil, em 1964, para 178 mil
REFORMA TRIBUTÁRIA
em 1965,
Segundo, os impostos indiretos (de
Consumo e de Vendas e Consignações)
incidiam sobre as mercadorias em
"cascata", isto é, eram cobrados sobre
o preço final de cada etapa de comer-
cialização, tornando o preço final pago
pelo consumidor muito alto,
Terceiro, a relativa autonomia que
os Estados e municípios tinham para
criar e cobrar novos impostos fez com
que, em certos casos, um mesmo tipo
de imposto fosse cobrado simultanea-
mente nas três instâncias de governo,
Os principais problemas da reforma
tributária poderiam ser resumidos da
seguinte forma: 1) Sobre quem se des-
carregaria o ônus de um aumento da
carga tributária? 2) Haveria de se ferir
ou não a autonomia dos Estados e mu-
nicípios?
' Num regime democrático liberal, o
governo teria de negociar as alterações
com as diversas forças políticas. A par-
tir de 1964, no entanto, o poder militar
não teria necessidade de negociar
muito nem teria dramas de consciência
para impor a sua reforma tributária, Eis
como dois grandes teóricos do novo re-
gime, Mário Simonsen e Roberto Cam-
pos, se referiram à crise do sistema tri-
butário e à essência da reforma por eles
capitaneada: "Os obstáculos institucio-
nais a um planejamento nacional inte-
grado e abrangente são:
"A existência de subdivisões políti-
cas autônomas. Quando essas unidades
têm substancial peso e recursos pró-
prios, e capacidade autônoma de levan-
tar recursos por tributação e emprésti- (*) Sem considerar os repasses das esferas superiores para as inferiores
mos, é extremamente difícil submetê- (**) Dados não disponíveis nos anos de 1974 e 1974
las à disciplina do planejamento central
Fontes: até 1973: "Finanças Públicas Municipais: um estudo de casos", Secretaria de Economia e Planejamento
(3.4 tado de São Paulo, 1979; 1976 a 1981: FIBGE, Anuários Estatísticos do Es-
"Falta de um mecanismo político de
formação de consenso. Impregnados
de facciosismos e personalismo, os par-
464
2, p208
. S4 0428334
sr pranass va.GNC.AM

tidos políticos tradicionais provaram-se de Mercadorias (ICM), destinado aos planos. Em 1983, as receitas dos mu-
incapazes do esforço de formação de Estados. O ICM eliminou o problema nicípios dependiam, em média, de 47%
consenso necessário ao estabeleci- da cobrança em "cascata". Aos mu- das transferências das esferas superio-
mento de um compromisso político nicípios foi atribuída a competência res, e nos municípios menores esse
com determinados objetivos de plane- dos impostos sobre a propriedade terri- índice podia chegar a-76%. Uma incon-
jamento ( . . .). Depois da revolução de torial urbana (IPTU) e sobre os servi- testável situação de submissão, por-
1964 duas medidas de reforma institu- ços de qualquer natureza (ISS). tanto.
cional foram tomadas: primeira, a abo- Em tese, a reforma foi definida pelo Foi por isso que, a partir de maio de
lição dos partidos tradicionais (...) e critério de estimular a poupança - via 1983, começou um movimento supra-
sua substituição por um sistema biparti- incentivos fiscais - e orientar o cresci- partidário, a princípio reunindo prefei-
dário (...); segunda, ab-rogação do mento econômico dentro dos trilhos do tos do Estado de São Paulo, para pres-
poder do Congresso de aumentar o dis- novo regime - via uma política de fixa- sionar o governo federal e o Congresso
pêndio orçamentário." (4 Nova Econo- ção de alíquotas diferenciadas e flu- a alterar a legislação tributária em fa-
mia Brasileira, Editora José Olympio, tuantes do IPI, de acordo com as prio- vor dos municípios. Caravanas de pre-
Rio de Janeiro, 1974.) ridades de momento. O resultado, en- feitos e vereadores foram a Brasília e a
Fez-se, portanto, o "consenso", tretanto, foi uma excessiva complacên- pressão resultou na aprovação pelo
ainda que à força, para impor a re- cia com as rendas de capital. Apenas à Congresso, em 23 de novembro, de
forma, Já em 1964, através de Ato Insti- União permitiu-se a competência de uma emenda constitucional de autoria
tucional, o governo proibia o Con- criar novos impostos e o poder de deci- do senador Passos Porto (PDS-SE). En-
gresso de aprovar emendas no orça- dir sobre isenções e incentivos de im- tre outras coisas, a emenda fortaleceria
mento da União que resultassem em postos estaduais e municipais. Estas as parcelas do IPI e do Imposto de Ren-
aumentos das despesas. Depois, esse instâncias perderam até a prerrogativa da destinadas ao FPEM, escalonada-
mesmo Congresso, combalido pelas de fixar livremente as alíquotas de seus mente, até que, em 1985, atingissem
cassações, aprovaria a Emenda Consti- impostos (com exceção do IPTU). 16% de cada um daqueles impostos; a
tucional no 18 (em 1965) e a Lei no 5.172 alíquota do ICM subiu de 16% para
(de 25/10/1966), que dariam origem ao 17%; e os Estados e municípios ti-
Código Tributário Nacional, em vigor a veram participação ampliada no Im-
partir de 1967. 4 posto Unico sobre Combustíveis e Lu-
Do ponto de vista técnico, essa re- brificantes (IUCL).
forma representou expressiva moderni- Com a reforma, multiplicou-se o nú- A aprovação da emenda Passos
zação. O limite de isenção para o paga- mero e a carga de impostos nas mãos Porto representou uma importante vi-
mento de Imposto de Renda foi rebai- do governo federal. Aparentemente tória política: além de o movimento dos
xado, alargando o número de declaran- para compensar a perda dos Estados e prefeitos e vereadores evoluir para a
tes com imposto a pagar, tanto de pes- municípios, instituiu-se um mecanismo formação de uma Frente Municipalista
soas físicas como jurídicas. As alíquotas de transferência às esferas inferiores, o pelas Eleições Diretas e pela Consti-
dos impostos indiretos foram aumenta- Fundo de Participação dos Estados e tuinte, de caráter nacional, também
das e foi criado o Imposto Sobre Pro- Municípios (FPEM), composto de par- ocorreu que, pela primeira vez durante
dutos Industrializados (IPI), em substi- celas do IPI (10%) e do Imposto de Ren- o Regime Militar, o governo central se-
tuição ao antigo Imposto de Consumo, da (10%). Esse mecanismo, no en- ria obrigado a negociar com o Con-
na esfera federal. Extinguiu-se o Im- tanto, serviu para dar ao governo cen- gresso os termos de uma reforma,
posto de Vendas e Consignações, subs- tral mais instrumentos de controle e ainda que tímida, em matéria de polí-
tituído pelo Imposto sobre Circulação imposição unilateral de suas metas e tica fiscal.

Até os anos 30, quando a economia brasileira se baseava nas


grári
- W
de maior peso arrecadado
o imp
pela União era o de importação. A medida que o País se industrializou, 50%
passaram a ter mais importância os impostos cobrados sobre as
atividades internas
PRODUTOS
Evolução da participação de cada tributo na receita tributária federal, 40% INDUSTRIALIZADOS (**)
em % (1923- 83)*

RENDAS
30% E PROVENTOS

20%»

IMPORTAÇÃO

1923 1925 1930 1950 1960 1970 1982


Fontes. Olveira, Fabrício Augusto cie, A Reforma Tnbutária de 1966 e a acumulação de capita! no Brasi. Editora Brasil (*) As urvas representamaproximações
Debates, SP, 1981 FIBGE, Anuários Estatísticos (**) Imposto de Consumo até 1966. Imposto sobre Produtos Industrializados, de 1967 em diante

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MOVIMENTOMORREU. VIVA MOVIMENTO!
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0QUEDIZEMASGANGSDOPLANALTO
FechamentoreáneGolheryMedeiros
M
v
POLÍTICA/IMPRENSA: a imprensa popular O semanário O Pasquim,
fundado em 1969, chegou a tirar 200
mil exemplares. Opinião fez sucesso
quando saiu, em 1972.
Movimento nasceu em 1975 e
quando fechou, em 1981, anunciou-se
uma crise na imprensa alternativa.
Os pequenos jornais que resistiram ao Regime Militar Mas ela continuou, em parte, nos
jornais partidários, como Hora do
têm uma história que se iniciou há décadas e
Povo, Voz da Unidade e Tribuna da
não parece ter fim previsto Luta Operária.

O começo da década de 70 assistiu já havia sido aplicada com sucesso em Brizola; O Semanário, ligado a setores
no Brasil ao nascimento de um fenô- O Pasquim, semanário de humor que nacionalistas e onde se destacava o his-
meno peculiar e aparentemente novo, até certo ponto se pautava também por toriador Nelson Werneck Sodré; Brasil
em nossa história: os famosos jornais al- um noticiário político de oposição. O Urgente, dos padres dominicanos de
ternativos, diferentes em vários aspec- Pasquim chegou a tirar 200 mil exem- São Paulo, precursor do trabalho que
tos das folhas e revistas normalmente plares no começo dos anos 70. Na levaria às Comunidades Eclesiais de
expostas nas bancas de jornais do País. mesma época, apareceriam Politika, do Base; e Ligas, por fim, voltado para os
Em 1972, causaria sensação o início jornalista Sebastião Nery, Jornal de De- problemas do campo, tendo à frente o
da publicação de Opinião, o mais co- bates, uma reanimação de antigo jornal deputado socialista Francisco Julião.
nhecido órgão político desse tipo de nacionalista, e Versus,o mais cultural e Depois de 1964, o Regime Militar
- imprensa. Era propriedade de Fer- de recuperação da cultura latino- destruiu mesmo um grande diário na-
nando Gasparian, empresário naciona- americana. A inclinação marcada- cionalista, Última Hora, existente desde
lista e dono de uma das maiores empre- mente oposicionista de todos fornece- 1952, que chegou a vender 200 mil
sas do País até 1964, a América Fabril, ria uma pista sobre a origem dessa exemplares só em São Paulo, na época
que emseguida seria negociada. O jornal imprensa alternativa, como foi chamada do golpe. As publicações populares e
semanal, de tamanho tablóide (cerca rapidamente em todo o País. democráticas tentaram persistir como
de metade do tamanho da página dos puderam. Nesse período, nacionalistas
diários normais), voltava-se essencial- de São Paulo fundam o Fato Novo; e
mente para a análise econômica e para aparece também Reunião, do editor
a crítica severa das contradições do fa- Enio Silveira, proprietário da Editora
moso "milagre econômico". Era diri- Na verdade, desde o início do século, Civilização Brasileira. Os estudantes da
gido por Raimundo Rodrigues Pereira, assistia-se no País a proliferações perió- USP, por seu lado, criam o jornal
ex-editor da revista Veja (então uma dicas de pequenos jornais carentes de Amanhã.
novidade bem-sucedida da poderosa recursos e com baixa tiragem. De vida A repressão tornou-se particular-
Editora Abril). Reunia, ainda, vários relativamente curta, estavam geralmente mente violenta entre 1968 e 1973. Era
jornalistas que se haviam destacado na associados a alguns jornalistas ou gru- uma época em que os órgãos dos parti-
grande imprensa. Mas, como Opinião pos intelectuais ou políticos, que não dos de esquerda só conseguiam sair na
era produzido por uma empresa média, encontravam outro espaço para expor mais profunda clandestinidade: entre
a baixos custos gráficos e de recursos suas idéias. outros, circulam então A Voz Operária,
humanos, não se esperava que atingisse Em 1964, essa imprensa tinha grande do PCB; Libertação, da Ação Popular;
o patamar dequase 40 mil exemplares número de representantes, com os jor- A Classe Operária, do PC do B; e
de venda - num momento em que a nais Novos Rumos, do Partido Comu- Unidade Revolucionária, do Movimento
maior revista semanal da grande im- nista Brasileiro, Classe Operária, do Revolucionário 8 de Outubro (MR-8).
prensa brasileira - Veja - vendia em Partido Comunista do Brasil; O Pan- Finalmente, a partir de 1975, o re-
torno de 45 mil exemplares. fleto, ligado ao então deputado do PTB gime foi forçado a um recuo, e a re-
Desde 1969, a "fórmula alternativa" (Partido Trabalhista Brasileiro) Leonel pressão foi relaxada. Nesse mesmo ano
466
' BR DFANBSSB VE.GONCAAAs
33 2,4 MCS, p 209
d
Quem Whª com à
Gonter a sangria externa sªfªmí'j- _ vº
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derrubar a inflação e _
omar o desenvolvimento
ªmmaram país!
Pre sidente falou edisse.
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ditadura

Comunistas reafirmam apoio


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- Patrões do ABC
, Reagan vive da d.. crm medo da|greve
PMMAia

surgiria o semanário Movimento, com a civis, políticas e sindicais e pela convo- dos Trabalhadores, em 1982 (dirigido
vendagem inicial de cinco mil exempla- cação de uma Assembléia Constituinte. por um ex-editor de Movimento, Perseu
res, mas que, com o avanço da abertura Tornou-se comum assinalar, com o Abramo), que também teve vida curta.

política, passaria a vender nove mil, 15 fim de Movimento, uma "crise da im- A partir de 1978, além disso, Movimento

mil e 21 mil exemplares até 1978. Aí, prensa alternativa". No entanto, longe procurou atingir um público operário
estabilizou-se com uma venda média de entrar em crise, a imprensa alterna- através de outra publicação, o Assuntos,
de dez mil jornais até 1980, quando os tiva cresceu, no período de esfacela- que durou apenas sete números e che-
atentados terroristas de direita às ban- mento do Regime Militar. Mas mudou gou a vender 3.500 exemplares (um re-
cas de jornais, somados a divergências de forma, de acordo com as novas ne- corde nessa faixa, para um jornal políti-
políticas mais abertas entre os grupos cessidades de mobilização política, co).
de esquerda que o apoiavam, e à falta principalmente na área democrática e %)e modo geral, no período de 1975 a
de uma definição melhor e mais rápida popular. Os partidos clandestinos, por 1980, houve uma proliferação de jor-
de seu projeto, levaram-no a perder exemplo, passaram a editar jornais le- nais alternativos de diversos tipos. Al-
terreno, até o fechamento definitivo, gais, ofíciosos, depois da anistia de guns, feministas, como o Brasil Mulher
seis meses depois. Movimento havia sur- 1978. e o Nós Mulheres, em São Paulo. Ou-
gido de uma crise do Opinião, devido a O próprio Movimento, de fato, viveu tros, marcadamente políticos, como o
divergências entre seu proprietário e o permanentemente em crise, refletindo Posição e o Informação, do Rio Grande
editor, demitido então. Com o editor, as tensões inerentes ao processo de dis- do Sul;, o Mutirão, do Ceará; e o
porém, saiu boa parte da redação; tensão "gradual" do regime. Em 1977, Resistência, do Pará. Houve, também ,
fundou-se assim uma empresa de quase o jornal havia "rachado", e parte de jornais importantes publicados por coo-
trezentos jornalistas, de várias tendên- sua equipe formaria o Em Tempo; este, perativas de jornalistas, dos quais o
cias políticas, que se pautavam por um por sua vez, além de dar origem ao mais regular e conhecido foi o
programa mínimo de oposição ao Re- Amanhã, de vida curta, também contri- Coojornal, de Porto Alegre. Surgiram
gime Militar, destacando-se a luta pela buiria com a experiência de parte de jornais de bairro, como o Jornal da
independência econômica, liberdades sua equipe para a fundação do Jornal Vila, de São Paulo, formado por ex-

aus 2 ca __"
i Aa 'à | Emção |
NOTÍCIAS DE HOJE
InformativoDiário doSincicata dos Metlirgcosde São Peco
ti
M 2222 An Y ata Jia 207206 24000
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2
oeo ao
DIA DE PROTESTO NO ECONÓMICO fºº—mm |
29 ,24, 1eao e de 1965
Os sindicalistas frente
F a com Tlm—demi!
| o restaurante empode
Ninmuém aquenta os preços das refeições

ao pacto sqçlal

e
Juca Martins
lil

No período 1975-80 houve uma


explosão de pequenos jornais, como
Lampião (acima, a equipe inicial),
que defendia os direitos dos
i;??? liH

homossexuais. A partir de 80,


sil

" Soja nossorepáriar emseu local de trabalho. Lisve 34-2629


prolifera a imprensa sindical (ao lado)
467
aroranssa a
2) 4 33) , o 250
1 si de
isa Neon
com o chaves iH2 uy ate? ec0 1 Ti & $a
3
O que tem a fome
a ver com
a in
--
editores de Movimento. Outro caso seria
o Lampião, defendendo os direitos
dos
homossexuais. Nesse período, a explo-
são das greves leva ao aparecimento de
jornais ligados ao movimento sindical
,
Foi o caso do ABCD Jornal, do Sindi-
cato dos Metalúrgicos de São Ber-
da América
o Bicentenário da Independêr ncia dos Estados Unidos nardo; da Folha Bancária (São Paulo),
fruto da greve dos bancários em 1979;
e
do Sindiluta (São Paulo), ligado aos qui-
micos. O poderoso Sindicato dos Meta-
lúrgicos de São Paulo criou um suple-
mento do seu conhecido jornal A Tri-
buna Metalúrgica; e uma parte das cor-
rentes de oposição sindical criou
pe-
quena publicação feita de recorte
s ,
Chamada Jornal dos Jornais.
A partir de 1980, a maior parte
des-
s S sas publicações deixou de existir,
com
" Capa da edição ro 53, de 5/7/1976, sobre os
200anos da independência americana algumas exceções, como, por exempl
o,
o Em Tempo. Mas, então, as tarefas
da
pequena imprensa estavam concen
tra-
das fortemente nos órgãos partidá
rios,
que, em conjunto, passaram a vender
o
dobro do que vendia Movimento em
seu
pico, atingindo mais de 40 mil exempl
a-
res semanais. Em 1979, haviam surgido
,
simultaneamente, o Hora do Povo
No auge do período ditatorial, a (do
Os censores entraram em pânico MR-8),
. Voz da Unidade (do PCB) e
Censura fazia os jornais da imprensa
Esse conceito subversivo não podia Tribuna da Luta Operária (do PC do
alternativa dançarem miudinho. Só ser
B).
publicado.
Mas como censurar Existiam também vários jornais de i-
para dar um exemplo: a edição no 45 parte de
um texto histórico, ainda nha trotskista, dos quais 0 mais antigo
do jornal Movimento, de maio de 1976,
mais dos Estados Unidos? Depoi
s de (1978) e regular seria O Trabalho.
teve vetadas pela Censura 283 das 305
muita consulta aos níveis superiores
Deve-se destacar também o imenso
laudas de matéria; 58 das 69 fotos
(dizem que a questão chegou até ao crescimento da imprensa sindical
também foram vetadas, assim como ministro da Justiça da época, Ar-
com
a multiplicação, em praticamente
seis dos treze desenhos previstos. mando Falcão), a decisão foi a
todas
cen- as entidades, do número, da frequên
Um massacre. Mas a imprensa da cia
sura total do texto. ) ou da tiragem de seus mensários,
resistência não era presa fácil. Insistia, Como sempre fazia, a direção do
sema-
nário e boletins. Exemplo disso
denunciava, iá criando uma situação jornal enviou aos principais jornai
eram os
s do boletins diários dos sindicatos dos
insustentável para a Censura. E às ve- País e às agências internacionais
Qui-
de micos de São Paulo (15 mil exempl
zes até conseguia inverter a música e notícias um ofício relatando o ocor-
a-
tes), Bancários de São Paulo (30
era a Censura que acabava dançando. tido.
mil) e
Foi um escândalo, Toda a . Metalúrgicos
Em julho de 1976, Movimento de São Bernardo do
grande imprensa noticiou a censur Campo (30 mil). Neste sindicato,
a
publicou um artigo especial sobre a feita e, ainda mais, publicou a Decla-
por
exemplo, além desse diário e
história da Revolução americana, ração. O Estado de S. Paulo de 11/7/7
da Tribu-
6 na Metalúrgica, mensal, já havia
quando os Estados Unidos comemo- fez um editorial. Também no Exteri
tam-
or bém a edição regular de uma dezen
ravam duzentos anosda sua indepen- a repercussão foi grande. O New
a de
York jornais de comissões de fábrica em
dência. Foi um trabalho grande, que Times comentou, Paulo Francis, cor-
ocupou duas páginas do jornal, apesar grandes empresas (Volks, Ford),
respondente da Folha de S. Paulo geral-
nos mente quinzenais, além da publi
de parcialmente censurado, Fazia EUA, ouviu personalidades, O escri- cação
parte da matéria um boxe com a, De- diária de diversos panfletos com
tor Gore Vidal disse: "O governo bra- notícias
claração de Independência dos EUA. urgentes de greves e mobilizaçõ
sileiro deve respeitar muito o povo. es,
A Declaração, como todo mundo A esses jornais caberia dar prosse
Nossa Declaração de Independência gui-
mento - já então em bases
sabe, é um belo texto de cunho demo- 'É altamente subversiva." O senad completa-
or mente novas - a algumas
crático, um convite a que os povos to- Frank Churchill comentou: "Dada
das tarefas
a assumidas com maior ou meno
mem seus destinos em suas próprias situação no Brasil, é perfeitament r clareza
e no período anterior pela cham
mãos. E tem aquela passagem fa- compreensível a censura imposta pelo
ada im-
prensa alternativa, Haviam
mosa: "Mas quando uma longa série governo de Brasília, muito a caráte
fracassado
r, mesmo experiências do perío
de abusos e usurpações perseguindo eu diria."
do ante-
rior, como a do semanário
invariavelmente o mesmo objeto in- Durante semanas prosseguiu a go-
O Repórter,
do Rio, que se propunha
dica o desígnio de reduzi-los (os ho- zação sobre o regime, dos generais
revitalizar a
Teportagem como base do
mens) ao despotismo absoluto, assiste- brasileiros.
noticiário;
O pequeno e bravo ou a experiência do Jornal
lhes o direito, bem como o dever, de abo- Movimento havia posto a ditadura em
da República,
conduzida por excelente quadr
lir tais governos e instituir novos gover- ridículo,
o de jor-
nalistas. Mas a tarefa de
nos .. ." expressar os
Carlos Azevedo pontos de vista populares e
democráti-
cos sobrevivia, procurando
a uma brecha
no sistema empresarial
da informação.
468

2R DFANBSSB VB.GNCAMA.S<404 / 3341amoo


3, p 233
BRDFANBSB VE.GNCIAMA,

| NA G
LP fD AJ
; SAM
RD

ARTES/HUMOR : o humor político no Brasil

Um combate muito sério

Após 1964, os humoristas de modo geral sustentaram a máxima : ""Não há humor a


favor."" Nos anos 80, porém, enfrentavam um espaço profissional instável, tendo de
situar seu trabalho num novo quadro político

"A revolução de março livrou o dir que apareçam fantasias que ofen- gla: FEBEAPÁ.
mundo da Terceira Guerra Mundial", dam as Forças Armadas"; o diretor de Compreende-se, portanto, que o hu-
afirmava um coronel do Exército brasi- Suprimento de Brasília restringia a mor tenha sido sempre uma arma con-
leiro, em maio de 1966. venda de vodca, "para combater o co- tra os governos militares. Logo depois
O nascimento do Regime Militar, munismo"; a polícia de Niterói apreen- do golpe de 1964, por exemplo, era pu-
que viria a promover um violento e eli- dia a encíclica Mater et Magistra como blicado o livro Hay Gobierno?, uma se-
tista processo de modernização da so- material subversivo; e agentes do De- leção dos trabalhos de três grandes hu-
ciedade brasileira, pareceu aos seus partamento de Ordem Política e Social moristas do Rio, Jaguar, Claudius e
contemporâneos uma vitória do atraso, (DOPS) paulista realizavam diligências Fortuna. Mas já antes do Regime Mili-
dos setores mais conservadores. E, no sentido de deter Sófocles, o autor da tar era tradicional a presença de humo-
como tal, não foi levado muito a sério. peça Electra, que estreara no Teatro ristas comentando a cena política brasi-
E como levar a sério um regime Municipal. leira na imprensa.
onde o general-comandante da Região Essas e tantas outras iniciativas dos As caricaturas acompanham os polí-
Militar de Curitiba mandava fechar agentes da nova ordem fizeram as deli- ticos brasileiros desde o Segundo Im-
uma pré-escola acusando as professo- cias dos leitores do jornalista Sérgio pério, mas foi no período republicano
ras de ensinar marxismo-leninismo às Porto (sob o pseudônimo de Stanislaw que as publicações dedicadas exclusi-
criancinhas; o secretário de Segurança Tunte Preta), que as reuniu no que cha- vamente ao humor se multiplicaram.
de Minas proibia mulheres de pernas mava de Festival de Besteiras que Assola Destacaram-se, a partir do início do sé-
de fora no carnaval de 1965, "para impe- o País, para o qual arrumou até uma si- culo, O Malho (1902), Kosmos (1904),
469
BR DFANBSS VB.GONGAAA:QO
S op 02,
Fon-Fon (1907) e Careta (1908),
que du- M
raram mais tempo, além de
muitas ou-
tras,
Nelas brilharam Raul Pedernei
ras, comunista, comentava o manifesto
que registrava os costumes com o qual Luis Carlos Prestes aderi-
cariocas e
combatia o fascismo; J. Carl ra ao comunismo, em 1930, dizendo
os, que
criou os tipos inesquecíveis que ele, Aporelly era muito mais
da Melin-
drosa e do Almofadinha e que, avançado que o líder tenentista, pois
com
suas charges, retratou a vida propunha uma jornada de trabalho de
política do
País; Calixto, talvez o melh zero hora, em contraposição à de oito
or dese-
nhista da época, cujas caricatu horas defendida por aquele.
ras pre-
cisas tanto incomodaram Pinh
eiro Ma- A irreverência no trato com as au-
chado e Hermes da Fonseca;
Nássara, toridades e seu espírito antimilitarista
que com seus desenhos de
aparente - que transparecia em piadas do tipo:
simplicidade acompanhou
pratica- "Como se chama o assassinato de
mente toda a vida política do País
sob uma criancinha? Infanticídio, E o as-
Getúlio; Belmonte, o criador
do Juca sassinato de uma porção de crianci-
Pato, famoso por suas charges cont
ra o nhas? Infantaria" - custaram ao Ba-
fascismo, que despertaram
a ira de tão várias vicissitudes, incluindo um

Iconographia
Goebbels, aponto deste o
denunciar perío do de um ano e meio de prisão e
emo agente anglo-americano
através o fech amento de seu jornal, em 1935.
da rádio de Berlim. Nas déca
das de 30 Enquanto pôde, manteve campa-
e 40, os políticos brasileiros teri
am no nha contra o integralismo, ironizando
seu encalço o humor ferino do
Barão As lições do Barã seu slogan "Deus, Pátria e Família",
de Itararé, o
Em meados da década de dizendo preferir outro: "Adeus, Pátria
60, o Os jornalistas que criaram O Pas. e Famíl
grande nome do humor brasilei ia."
ro já era quim sempre afirmaram que o patr
o de Millôr Fernandes. Desde o- Findo o Estado Novo, definido por
1945 es- no do jornal era o Barão de Itara
crevendo e desenhando na revi ré, ele como "o estado a que chegamos
sta O O autoconcedido título de barão ",
Cruzeiro, onde criou a seção Aporelly, pôde relançar seu jornal
Pif-Paf, era uma prova de modéstia do jorna- -
que fecharia definitivamente pouc
lista Aparício Torelli- o Aporelly o
Em 64, Millor criou a revi . depois - e, como registra o escri
sta Inicialmente, ele se nomeara Duq tor
ue Leandro Konder numa pequena e co-
Pif-Pof; reunindo grande de Itararé, pensando ser digno do
s artistas titu- movente biografia do Barão, toda
1o pelo seu desempenho numa das a
ba- cidade riá com informações assim:
página dupla semanal de hum
or, ele in- talhas da Revolução de 30, just "O
amen- resultado do exame de sangue do
fluenciou toda uma geração
de humo- te a de Itararé, que entrou na história ex-
chefe de polícia Felinto Múller
ristas. por não ter ocorrido, saiu
Em 1964, Millôr criou a revi
com três cruzes . . . suásticas."
sta Pif Aporelly lançara, em l926_, no Rio
Paf, reunindo os trabalhos de Nos primeiros anos da década de
Sérgio de Janeiro, o semanário A Manh
Porto, Claudius, Fortuna, Zira
a, 50, seus comentários sobre o País
ldo, Ja- com a epigrafe "Quem não chora tor-
Buar, entre outros. A publicaç
não naram-se cada vez mais céticos.
ão durou mama", tendo como redator-chefe O
apenas oito números e o últi o mundo podia ser redondo, mas estav
mo, publi- st. Vaz Antão Luís (Washington a
cado em 27 de agosto de 1964, ficando "cada vez mais chato".
advertia: Luís); segundo o Barão, "nosso com Sua
"Quem avisa amigo é . . . se o - última publicação, de 1955, trazia
governo panheiro que acumula as funções na
continuar deixando que circule de capa Jânio Quadros montado num
esta re- presidente da República".
vista, com toda sua irreverê burrico, em homenagem à "jumenta-
ncia e cri- Sem levar a sério a acusação de ser
tica, dentro em breve estaremo lidade da época".
s caindo
numa democracia." Ainda
não havia
sido criado o mecanismo da
censura de 1969, chega às bancas o sema
prévia, mas a revista foi
à falência
nário evidente paralelismo, Quando o
O Pasquim, que se tornaria a mais jornal
quando este último número foi
apreen-
im- surgiu, fazia principalmente críti
portante publicação de humor nos ca de
dido. 20 costumes, o que em si tinha um
anos do Regime Militar. con-
Com as charges ganhando um teúdo político frente a um regime
con- Propriedade de jornalistas (Tarso que
teúdo cada vez mais oposicio
nista, os
de se apresentava como moraliza
Castro, Jaguar, Sérgio Cabral, Pros dor e
humoristas começaram a perd
er, a par-
peri, guardião dos bons costumes.
Claudius), tinha em Ziraldo, Mill Mas a
tir de 1968, os espaços que aind ôr e evolução do País e os rumos toma
a deti- Henfil seus principais colaboradore dos
nham na grande imprensa. s, pela ditadura - o aguçamento
Seu grande trunfo foi ter chegad da re-
As limitações que sempre surg o no pressão, a criação da censura
iam ao momento em que era mais nece prévia
trabalho dos humoristas ness ssário, através de um decreto secreto de
es Órgãos Com sua linguagem irreverente, 1970
foi reforçando a idéia de que
era neces- O - geravam resistência. O humor
Pasquim galvanizou todo o sentimen brasi-
sária uma publicação que, send to leiro tornou-se, na expressão de Mill
o feita oposicionista e de descontentam ôr,
por eles, permitisse uma: maio ento "quase que exclusivamente polít
r liber- de estudantes, jornalistas e intelect ico",
dade de expressão, uais Justificava ele: "Nós não podi
em geral e, em menos de um ano, amos
Com a decretação do Ato Inst sua ficar nos alienando e fazendo cois
itucio- tiragem já atingia 220 mil exemplar as
nal no 5 (AI-5), em dezembro de es, que não fossem políticas, porque
1968, o número nunca alcançado pelos o im-
País começa a perder a graç jornais portante era frisar que havia uma
a, mas o da chamada imprensa alternativa. re-
humor era cada vez mais nece
ssário; e, pressão e tentar combatê-la,"
A evolução do jornal O Pasquim e
seis meses depois, no dia 26
de junho
do A censura governamental, ciente
humor brasileiro no período tem da
um força corrosiva do humor e da sátir
470 a,
BR DFANBSS VB.ONG;AAA. S404)3s4an cos, pad
"ª 3.3. BV Emi
ne ri, RK

tornava-se cada vez mais atenta a essas ruso e outros publicaram nove núme-
formas de expressão. A censura à re- ros da revista Balão, editada em São
vista Veja começou com uma charge de Paulo e voltada para o público universi-
Millôr onde ele denunciava a existên- tário, entre 1973 e 1975. Nesse ano, sur-
cia de tortura nas prisões políticas. gia o Bicho, liderado por Fortuna, que
Anos depois, só para se ter uma idéia, o sobreviveu por oito números. Em Mi-
jornal Movimento teria 2.200 charges e nas Gerais, o Humordaz foi abatido
caricaturas censuradas, nos três anos pela censura,.
que ficou sob censura, a partir de 1975. Angeli, Laerte, Jota e Glauco, que
No governo do general Médici, o hu- publicaram por determinado período
morbrasileiro teve como característica uma página de humor no jornal Folha

Agência O Globo
uma queda na importância relativa da de S. Paulo chamada Vira Lata, no inf
caricatura, que tanto marcara o humor cio da década de 80 ainda estavam fir-
político no País. Como explicava Zi- mes na idéia de lançar uma revista com
raldo, havia chegado o momento em esse título, mas não conseguiam encon-
que ninguém conhecia as caras dos ca- trar editor para ela.
ricaturáveis. Não havia vida política tal
Em 1981, foi lançada a revista
que criasse personagens e o público
Careta, aproveitando o nome da publi-
praticamente só conhecia o presidente, cação do início do século, que só sobre-
do qual ninguém podia fazer uma cari- viveu por oito meses. Ao final de 1984,
catura.
O Pasquim se mantinha com grandes
O Pasquim foi apreendido diversas dificuldades e, a rigor, não havia ne-
vezes e seus redatores sofreram vários nhum outro órgão dedicado ao humor,
processos. Mesmo perseguido, com embora o humor político houvesse
problemas econômicos crescentes e
conquistado seu espaço na imprensa
atravessando grandes períodos sem
brasileira e alguns desenhistas conse-
conseguir publicidade, o semanário
guissem mesmo publicar livros com
conseguiu manter-se, preservando um seus trabalhos.
Agência O Globo

espaço para os humoristas e uma alter-


nativa para os novos talentos. Em 1977,
Posições políticas geram
a editora gaúcha L&PM publicou uma
, Antologia Brasileira de Humor, reu- demissões na grande imprensa
nindo 83 humoristas e grande número
deles tinha passado pelo jornal carioca. Mas esse era um espaço instável e
Os jornais Opinião e Movimento sujeito a chuvas e trovoadas. Millôr
também reservaram espaço ao humor perdeu suas páginas na revista Veja
político. O primeiro, no seu início, era quando apoiou Brizola naselelçoes de
integralmente ilustrado com caricatu- 1982 e Henfil foi demitido da revista
ras e o segundo publicou, por dois Isto É por escrever contra a participa-
anos, a partir de 1978, a seção Corta ção das oposições no Colégio Eleitoral
Essa - uma página de charges políticas. que elegeria o primeiro presidente civil
Marcos Guião/Abril Pres

A importância que o humor tinha após os 20 anos de Regime Militar.


conquistado na sociedade brasileira foi De outra parte, com o renascimento
ilustrada pelo sucesso do Salão Interna- da vida política, a caricatura retomara
cional de Humor de Piracicaba, reali- seu papel e nesse processo Chico Ca-
zado anualmente naquelà cidade do in- ruso ocupou um lugar destacado. Do
terior paulista desde 1974. Inicialmerte seu trabalho, disse Millôr: "Como toda
organizado por Zélio Alves Pinto, ele grande caricatura que se preza, a do
atraía desenhistas de todo o País e até Chico passou a ser a reprodução mais
do Exterior. profunda da personalidade do sujeito
Foram feitas tentativas de criar as re- em questão."
vistas de humor, para abrigar o número Tendo enfrentado a ditadura rindo-
crescente de humoristas, mas nenhuma se dela, os humoristas brasileiros viam
delas resultou numa publicação mais com alívio o seu final, Eles haviam se
duradoura. Em São Paulo, surgiu identificado, no período, com a oposi-
Ovelha Negra, criada por Geandré; e ção e teriam em breve que situar seu
desenhistas que se tinham destacado trabalho numa nova situação política,
nas páginas de O Pasquim, como Nani, criada no País com a posse do governo
Coentro, Guidaci publicaram o eleito pela Aliança Democrática.
Pingente, no Rio de Janeiro. Laerte, Como o humor político se comporta-
Luiz Gê, os irmãos Paulo e Chico Ca- ria frente a um governo oriundo da
oposição, que peso ele teria na produ-
O humor brasileiro contou com um crítico ção humorística em geral e quais as
e combativo elenco de artistas. De Millôr possibilidades de criar veículos pró-
Fernandes (no alto), que, com o EPaf prios para os humoristas eram as ques-
(ao lado) influenciou toda uma geração tões que empolgavam os profissionais
de humoristas, a Ziraldo (ao centro) e do setor nos meses que marcavam o fi-
Chico Caruso nal do Regime Militar.
imaso ""-" 471

| C :IPcHIcDL

ALTA
- LMA itª—t" A4

quase que somente. Como se


eles fos-
sem todo o País,

As limitações básicas pós-6


4 se exer-
ceram, no entanto, sobre
o nosso veio
irreverente. Ele vem de longe
, alegre,
gpARB P Desta vez vali-me fagueiro, desdobrando-se ,
glosa ras,
" DE 1&Y- mitos e costumes; pode
ser olhado
e 4 CAVALOS! como vivo comentário de
época, Mais
ra e para o crítico, o contundente,
e todavia
sempre com uma ligeireza que
abranda
a sátira, aproximando-se do
humor po-
pular, e se encaminha por
três direções
principais.
A mais antiga, herança dos
nossos

Revista Careta, RJ, 12/7/1913


tempos de pasquim, se volta para a
a osm política e os políticos. Usando
MRpig a carica-
sobe" tura e o testemunho de menti
ra, pôs na
/* berlinda nomes famosos: Afon
. so Pena
promoveu o Bazar do Japão,
Pinheiro
CASTRO sAIM
EIDA E: Machado teve um fraco pelas
águas
RUA vos OURIVES «** 9 , São Lourenço, Rui Barbosa
pelos mais
diversos produtos. O Barã
o do Rio
Até o golpe do Estado Novo em 1937, Branco, gordo e saudável,
era assim
a caricatura foi muito usada na
publicidade. Acima, anúncio com teste porque tomava o milagroso
Manah.
munho de Rui Barbosa
Movimentos armados virar
am anúncio:
ECONOMIA/PUBLICIDADE: a evolução "O governo é provisório, mas
o preço é
da propaganda sob o Regime Militar
fixo." Mussolini erguia o braç
o e orde-
nava: "Se avanço, sigam-me!
Se recuo,
matem-me! Se tombar, ving
uem-me !
Se o sangue tornar-se impur
Ricas molduras o, Galeno-
gal!" Com o Estado Novo, acab
aram-
se os testemunhos de fantas
ia, Mas se
Melhorada na embalagem, instauraram o duplo sentido,
mas divorciada da vida naci a alusão
onal, indireta, uma certa sutileza,
a propaganda, sob o Regime
Militar, certamente Menos velha, mas já entra
da em
piorou no produto anos, é a maneira com que falam
os da
religião, de Deus, dos frade
1 s e freiras.
Ao analisarmos a evolução da propa- Em 1913, um padre testemun
hava para
desde cedo professada com entusiasmo
ganda brasileira a partir de 1964, uma o Elixir de Inhame, logo depoi
s um ou-
(traço de um possível perfil nacional),
constatação é evidente: melhoramos na tro para o depurador do sangu
e Luesol.
Ou ainda, e naturalmente, as referên-
embalagem, mas pioramos no produto. O segundo mandamento
nunca teve
cias às coisas nossas: futebol, cafezinho
Se é que, em termos publicitários, esse muita força. Deus é brasileiro
pode ser
e botequim, samba, carnaval e mulata,
produto continua sendo a idéia, Temos uma afirmação que clareia
o futuro e
jogo do bicho, adágio e folclore. Tais
que reconhecer que fomos aqui bem também o título de um outdoor,
com a
características, que no seu conjunto
pouco brilhantes, Seguimos as modas, moça de biquini sumário e a suges
nos personalizavam e emprestavam à tão de
dançamos conforme as técnicas impor- que não merecemos tamanha
graça al-
nossa propaganda um forte acento po-
tadas. E o pior, ao que tudo indica, se cançada. Freiras lavam mais
branco,
pular, diluiram-se ou cederam lugar aos
revelou no divórcio entre os anúncios e frades andam de ônibus e brin
cam com
anúncios de visível inspiração cosmo-
a vida nacional. A propaganda usa uma a louça, padres casam, desc
asam, ao
polita.
linguagem empostada, simbólica, ape- lado surgem os sacristãos. Temo
s rabi-
compreensível que, numa fase de
lativa a necessidades e aspirações satis- nos, temos gurus. O velho
Matias (lem-
corte tecnicista, sintonizada com pa-
feitas. Pois isso caiu no exagero, o que bram?) era macumbeiro da
Rua Larga.
drões internacionais, o uso de elemen-
vale dizer na alienação. Nunca houve E mãe Menininha acreditava
na Singer.
tos populares setenha atenuado. Mas
tamanha distância entre O que os
eles não desapareceram. Refluiram, A vertente irreverente da
"olímpicos" dizem e o que a maior
localizaram-se no interior, na publici-
parte da população entende. publicidade é castrada em
64
dade dirigida às camadas de menor po-
Essa dualidade se evidenciou, em
der aquisitivo. O verso e a rima, parti-
particular, na crescente adesão aos mo- Mais recente, porque reflete
atitudes
cularmente, sobreviveram nesses seg-
delos estrangeiros e no afastamento das que vieram mudando, é o
nosso modo
mentos de viola e sanfona, longe dos
nossas fontes. Não há exagero em afir- irreverente de falar de sexo.
Ingênuo e
comerciais de televisão, dos grandes
mar que a publicidade brasileira, ao pesado, moleque e trocadilhe
anunciantes, que se estabeleceram sco, tão
longo do tempo, veio marcando linhas em gozativo quanto leviano, ele
está bem
figuras alouradas, ambientes moderno-
criativas bem nítidas. Entre elas, a utili- perto do machismo. E do humo
sos, trilhas sonoras de importação. Se r mes-
zação do verso e da rima (para o se- tiço, que tem muito da nossa
vocação
no festival Rock in Rio, no início de
mi-alfabetizado, a ajuda mnemônica para o "deixa cair". "Ora,
pílulas! Use
1985, cem mil jovens cantaram em in-
serve em muito à retenção, à memori- Jontex." Quem recomenda
é a Johnson
glês, esperava-se que a propaganda os & Johnson, uma senhora, enqu
zação da mensagem) ou a irreverência, anto 'os
viesse mostrando. Mas não tanto, ou cigarros Califórnia (machos)
recomen-
472

BR DFANBSB VB.GNCIAAA, 2404 J 2 9, Jan 002, p 215


BR DFANBSSB VE.GNGLAMA. 240413231 an COA ,

Para agradar o seu Príncipe Encantado


MMÉWDÃÉAW

Almanaque Brasileiro Garnier, RJ, 1914


As Cervejas

.A
"BRAHMA "

Melhores ao Brasil e preferidas pelos: apreciadores

a antera & reira ao

Daine
Algumas vertentes da propaganda no País. Em 1914, padre em reclame de bebida; nos anos 80, heróis infantis (Popeye e Brutus)
anunciam calças jeans (ao centro, 1982) e a sósia de Lady Dy é usada para vender calcinhas e sutiãs (à dir., 1981)

A propaganda e a crise
Os maiores
anunciantes do Brasil A propaganda brasileira também foiatingida pela crise econômica apartir
do final da década de 70. No período compreendido entre 1979 e
Entre as 20 empresas que 1984, ela sofreu quedas no montante de investimentos em quatro
mais investem em publicidade anos
encontramos nove multinacionais Evoluçãodo
empresa estatal 197% crescimento real do investimento em propaganda, em % 1197784)
1 - Souza Cruz 11 - Gessy Lever
2 - Pão de Açúcar 12 - Volkswagen
3 - Nestlé 13 - Caixa Econômica Federal 3.58
4 - Dorsay 14 - Banco Itaú
5 - Alpargatas 15 - Mappin
6 - Mesbla 16 - Fiat . 1a w
1983 1864

7 - Colgate Palmolive 17 - Casas Pernambucanas 3 S


8 - Jonhson & Johnson - 18 - Abril Cultural -81% -87%
9 - General Motors 19 - Cica &
-80%

0 - Philip Morris 20 - Gillette For 187742.


preso is e Merápe: blrre Laos ro 15 paode 196; 1000 ioe e146,

Fonte: Meio e Mensagem. Informe Especial no 22, abril de 1984


-28.0%

dam: "Seja infiel." O Dodge, tão bonito uma importante vertente da nossa com o luminoso do Conjunto Nacional
em seu novo modelo, explica a prefe- publicidade. na avenida Paulista: "O Cristo Reden-
rência: "Seduzido dentro do automó- Mas a propaganda acompanha o tor de São Paulo." No Dia das Mães, a
vel." A lógica é imbatível: "Toda mu- País. E sabemos que houve resistência. fábrica de perfumes Rastro passa o te-
lher tem pelo menos duas razões para E anúncios muito significativos marca- legrama: "Mamãe, eu te amo. Édipo."
usar Soutiens Vivien." E, já que fala- ram o período. Parao governista"Ame-o Ecos de samba já se ouvem: "Se a sua
mos nisso, a Sadia. a do peru, organiza ou deixe-o", houve o do Salão da mulher pedir desquite por causa do
a guerra: "Calma, há peito para todos!" Criança: "Ame-o e deixe-o ir." Ou "Os gravador Akai, conceda. Mulher a
Claro que 1964 interveio nesse feitio Subversivos", da agência de publici- gente encontra em toda parte."
brasileiro de propaganda. Houve dade Norton. Conquistamos a abertura Apesar dos 20 anos sofridos vividos
mesmo restrição, a se confundir com e recrudescemos. Kissinger e Reagan. pelo País, que a propaganda reproduziu
censura. E determinou uma auto- Delfim e Jânio na televisão. Em 1984, com suas distorções e enganações, no
censura institucionalizada. Desencora- comunicando seu novo endereço no final de 1984 ela começava a dar a volta
jando ou impedindo, os poderes ditato- Rio, a agência mostra o Cristo de bra- por cima.
riais sem dúvida castraram a criação, ços abertos e diz:; "Compramos uma
interrompendo o desenvolvimento de casa deste tamanho." E o banco repica, Ricardo Ramos

473
sr pranssa vs. L10412334 an 002, p 244

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: o funcionalismo

Um regime de castas

Após 1964, o funcionalismo teve salários arrochados e a


estabilidade praticamente extinta, enquanto uns poucos
privilegiados eram cobertos de mordomias

Sempre que os governos do Regime Civis da União. Esse estatuto, que data
Militar recorreram aos bancos e orga- de 1952, garante uma série de vanta-
nismos financeiros internacionais, seja gens inexistentes na CLT, como a li-
para obter empréstimos e financiamen- cença-prêmio, a licença para tratamen-
tos, seja para conseguir aval para rene- to de saúde e, o mais importante, a es-
gociar a dívida externa do País, uma tabilidade.
onda de deve ter per-
corrido os lares dos funcionários públi- Contratação de serviços leva à
cos. criação do bóia-fria urbano
Isso porque aquelas instituições sem-
pre consideraram uma condição sine A partir daí, alterou-se rapidamente
qua non para o bom funcionamento da o perfil da administração pública. Fo-
economia a existência de empresas ram criadas, em menos de dez anos,
públicas que pudessem ser avaliadas na 116 empresas públicas e muitos órgãos
sua eficácia e rentabilidade com os federais foram transformados em em-
mesmos parâmetros das empresas pri- presas públicas e sociedades de econo-
vadas. Na verdade, se dependesse ape- mia mista. No início da década de 80,
nas desses organismos internacionais, chegava a 600 o número de empresas
muitas das empresas públicas brasilei- públicas. E a centralização de poder e
ras teriam sido privatizadas. recursos no governo federal, que carac-
Compreende-se, assim, por que a re- terizou esse período, permitiu que ele
forma administrativa foi uma das pri- impusesse esse mesmo modelo aos Es-
meiras preocupações do governo Cas- tados e prefeituras, onde também proli-
tello Branco (1964-67) e porque seu feraram essas empresas.
principal teórico, o ex-ministro Hélio Os antigos funcionários dos órgãos
Beltrão, a considerava como "um dos que foram transformados em empresas
atos mais rigorosamente revolucioná- - como a Rede Ferroviária Federal, o
rios", ligando-a umbilicalmente aos su- Departamento de Correios e Telégra-
cessos econômicos obtidos no pe- fos, o IBGE, a Casa da Moeda -, para
ríodo do chamado "milagre" (1968-73). continuar nos seus empregos, tiveram
Em outubro de 1964, foi criada a Co- de optar pela CLT. Aqueles que se re-
missão Especial de Estudos da Refor- cusaram, para não perder as vantagens
ma Administrativa, que elaborou as do regime estatutário, deveriam ser re-
medidas que compuseram o Decreto- distribuídos pelo DASP (Departamen-
Lei no 200, de fevereiro de 1967. Como to Administrativo do Serviço Público) a
tantas outras decisões daquela época, o outros órgãos da administração direta.
decreto também contribuía para enfra- Mas, como a maioria deles exercia fun-
quecer o Congresso Nacional, que per- ções muito específicas (ferroviários e
deu a atribuição exclusiva de criar car- carteiros, por exemplo), foram "encos-
gos públicos e de fixar os vencimentos tados" e ficaram recebendo seus venci-
do funcionalismo. A administração fe- mentos líquidos sem trabalhar. Nessa
O funcionalismo lutava por melhores
deral foi dividida em administração di- situação, perderam chances de promo-
salários já antes de 1964 (acima,
reta, que engloba os organismos admi- ção, estacionando na carreira. Em
manifestação de funcionários federais em
nistrativos da Presidência da República 1977, cerca de 70 mil funcionários esta-
1960, RJ). A reforma administrativa do
e dos ministérios, e administração indi- vam nessa situação.
regime, considerada pelo ex-ministro
reta, composta pelas autarquias, em- Coerente com o objetivo de privati-
Hélio Beltrão (no alto, à dir.), um de
presas públicas e sociedades de econo- zar os serviços públicos, o Decreto-Lei seus principais teóricos, como "um dos
mia mista. As empresas públicas e as no 200, com a justificativa de "impedir atos mais rigorosamente revolucionários",
sociedades de economia mista foram o crescimento desmesurado da máqui- em lugar de melhora, trouxe significativa
autorizadas a funcionar em condições na administrativa", recomendava que a degeneração dessa situação. Entre
idênticas às do setor privado. Assim, administração, "sempre que possível", maio e junho de 1983, o funcionalismo
passaram a contratar seus funcionários recorresse à contratação de serviços da federal realizou greves por salários
pelo regime da Consolidação das Leis empresa privada. Foi principalmente (no alto, manifestação no Rio) que
do Trabalho (CLT) e não mais de acor- nos escalões inferiores do funcionalis- chegaram a mobilizar 200 mil
do com o Estatuto dos Funcionários mo que as consequências dessa reco- funcionários em 14 Estados
474,
b0 %emmâém-Háôâj an voe, ps
nal, a reforma administrativa criou uma
casta de privilegiados. O decreto tor-
nou possível a contratação de altos exe-
cutivos e técnicos pela CLT, sem con-
curso público e com remuneração mui-
to superior às que eram previstas nas
normas salariais válidas para os funcio-
nários públicos. Esses mesmos super-
funcionários formaram o contingente
dos beneficiados com a extensão das
mordomias, até 1964 privilégio exclusi-
vo do presidente da República.
No governo Médici (1969-74), a mor-
domia se estendeu a funcionários gra-
duados do segundo escalão e atingiu os
dirigentes dos órgãos da administração
indireta.

Agência O Globo
No topo da pirâmide,
Abril Press

uma minoria de privilegiados

A reforma foi levada adiante e sem-


pre no mesmo sentido. En dezembro
de 1974, o presidente Geisel estabele-
ceu por lei que, a partir de então, a ad-
ministração pública só admitiria novos
funcionários pelo regime da CLT. Foi
aberta uma exceção apenas para as á-
reas de segurança, diplomacia e arreca-
dação de tributos federais. Medidas
como essa talvez expliquem por que o
regime adiou indefinidamente o envio
de um prometido projeto para um novo
Estatuto do Funcionalismo, em substi-
tuição ao de 1952. Parecia mais decidi-
do a ver passar o tempo, que traria a
aposentadoria dos estatutários rema-
nescentes.
O Decreto-Lei no 1.445, de 1976, foi
mais um passo importante na reformu-
lação da administração pública. Possi-
Léª bilitou a aplicação efetiva do Plano de
Classificação de Cargos (PCC), que
fora aprovado em 1970, mas cujo cum-

"PPI primento foi


de entraves.
atrasado por uma série

aviª"?
O plano elevou a jornada de trabalho
de seis para oito horas para pratica-
cªkkkh ((-
Kã<f 4 mente todo o funcionalismo. A partir
“ªê de um estudo realizado no eixo Rio-
São Paulo, o DASP introduziu no servi-
mendação se fizeram sentir de maneira tando as obrigações trabalhistas e so- ço público as mesmas diferenças sala-
mais aguda. Os motoristas, contínuos, ciais com essa mão-de-obra, que ficava riais que existiam na iniciativa privada.
serventes, ascensoristas, porteiros, gar- vinculada às empresas locadoras. Dez Fez isso concedendo reajustes diferen-
cons, copeiros, vigilantes, faxineiros, anos depois de assinado o decreto-lei, ciados. Enquanto os assessores de nível
etc., que constituíam ampla maioria bavia cerca de três mil locadoras de superior e os ocupantes de cargos de
dos funcionários públicos, tinham uma pessoal no País, dispondo de dois mi- direção tiveram seus salários aumenta-
situação melhor trabalhando para o Es- lhões de pessoas e servindo também à dos em até 570%, cerca de 70% do fur
tado do que aqueles empregados pela iniciativa privada. Os empregados por cionalismo tiveram seus vencimentos
iniciativa privada, pois gozavam de es- essas firmas recebiam pelo seu trabalho reajustados entre 30% e 50%. Os fun-
tabilidade, assistência médica e, naque- geralmente a metade do que os órgãos cionários de nível superior que se en-
la época, salários melhores. públicos pagavam às firmas locadoras e contravam nos degraus mais altos da
Depois do decreto, aadministração formavam um contingente de bóias- hierarquia passaram a contar ainda
pública, através de convênios, passou a frias urbanos prestando serviço nas re- com uma gratificação mensal de 20%
contratar pequenas empresas privadas partições públicas. do salário, que não foi estendida aos
para a prestação desses serviços, evi- Do outro lado da pirâmide funcio- outros níveis.
475
ar pranBsaVe.RCAA RA/O44834 an cosp AII

Ao longo de todo o Regime Militar, gueiredo. 200 mil funcionários parados, em 14 Es-
a grande maioria dos funcionários Para enfrentar essa política de arro- tados. -
públicos teve seu salário reduzido. cho, os funcionários públicos federais O governo, desde que recorrera ao
Aqueles em regime de trabalho pela conseguiram pouco a pouco organizar- Fundo Monetário Internacional, no fi-
CLT, assim como os antigos estatutá- se, vencendo as dificuldades inerentes a nal de 1982, era pressionado a manter e
rios que optaram pela CLT, não têm di- uma categoria dispersa por todo o terri- aprofundar a política de arrocho com a
reito a greve e a sindicalização, que são tório nacional, que reúne diversos tipos justificativa de reduzir o déficit público,
vetadas ao funcionalismo público. Des- de profissionais - de médicos a faxinei- e recusou-se a negociar e ameaçou pu-
sa maneira, o arrocho salarial que o re- ros, de engenheiros a contínuos. Com- nir e demitir os grevistas, A greve esva-
gime aplicou a todos os assalariados foi pensando a proibição de formar sindi- ziou-se depois de um mês do seu início,
particularmente violento sobre o fun- catos, foram-se multiplicando as asso- No ano de 1984, um setor do funcio-
cionalismo. Em 1976, quando foi apli- ciações de funcionários, até que, em 26 nalismo público federal foi o protago-
cado o PCC, calculava-se que, para re- de março de 1983, realizou-se em nista da mais longa e abrangente greve
cuperar o poder de compra de 1964, os Brasília o Primeiro Encontro Nacional nacional ocorrida no País depois de
salários de todo o funcionalismo ti- dos Servidores Públicos Federais, que 1964. Ela envolveu 35 mil professores e
nham de ser reajustados em 120%. reuniu 300 dirigentes de entidades es- 60 mil funcionários de praticamente
E o arrocho Continuou mesmo quan- palhadas por 13 Estados, representan- todas as universidades federais, esten-
do, pressionado pelas greves que eclo- do 80% dos funcionários do País. dendo-se de 15 de maio até 7 de agosto.
diram& partir de1978 e se espalharam Apesar de as reivindicações - au-
pelo País, o regime instaurou a política Em 84, três meses de greve
mentos semestrais com base em 100%
salarial de reajustes semestrais para os nas universidades federais do INPC, reposição salarial de 64,8%,
trabalhadores das empresas privadas. piso salarial de três salários mínimos
O funcionalismo nunca teve uma As principais reivindicações, além de para os servidores e mais verbas para
política salarial favorável. Seus reajus- reajuste de 70% a partir de maio daque- custear as atividades acadêmicas - vi-
tes, mesmo os dos funcionários regidos le ano, em vez dos 30% em junho pro- sarem apenas colocar aqueles funcio-
pela CLT, ficavam ao arbítrio do Poder postos pelo governo, eram o reajuste nários em situação equivalente à de
Executivo. Recebendo reajustes sem- semestral, a concessão do 13o salário muitos setores da classe operária, o gô-
pre abaixo do Índice Nacional de Pre- para os estatutários, a definição de um verno manteve sua tradicional intransi-
ços ao Consumidor (INPC), utilizado piso salarial e o livre direito à sindicali- gência e venceu a greve pelo cansaço e
como base para as demais categorias zação. O encontro programou também com ameaças.
de trabalhadores, o funcionalismo viu para o dia 13 de maio um dia nacional Ao seu final, o Regime Militar, que
seus salários serem corroidos pela infla- de protesto, quando ocorreram parali- pretendeu modernizar a máquina do
ção em alta. sações em Santa Catarina, Rio Grande Estado, entregava ao País uma adminis-
Adotando-se o índice 100 para o sa- do Norte, Paraíba e Bahia. Nos outros tração pública emperrada, e tão buro-
lário real do funcionalismo público fe- Estados, os funcionários realizaram as- cratizada que o último governo desse
deral em março de 1979, constata-se sembléias e, com dificuldade para unifi- regime criaria um Ministério da Desbu-
que, em maio de 1984, ele tinha chega- car o movimento, foram paralisando rocratização, chefiado pelo mesmo Hé-
do ao índice 34,6. Ou seja, seu poder de suas atividades a partir de 18 de maio. lio Beltrão que iniciara a reforma admi-
compra tinha sido reduzido a pratica- No dia 21 de junho, o Comando Nacio- nistrativa e que saiu do governo sem
mente um terço durante o governo Fi- nal de Paralisação calculava que havia conseguir cumprir essa nova missão.
lugo Koyama/Abril Press

DIAS EM GREVE

quer VIVER: VERBAS JÁ! |

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Manoel Novaes/Abril Press

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Em 1984, os professores das universidades federais protagoni


zaram a mais longa e abrangente greve nacional pós-64.
A esq.,
manifestação na Universidade Federal de Pernambuco; à
dir., assembléia na Universidade Federal de Minas Gerais

476 '
ÁS 3 / en coae, o 220

cipal fonte de arrecadação do IPI (Im-


posto sobre Produtos Industrializados),
correspondente a 75% do preço de
cada maço de cigarros. Seguia-se a ar-
recadação proporcionada pela indús-
tria automobilística e pela de bebidas.
Já o álcool era consumido no Brasil,
em 1984, em escala maior que nos Esta-
dos Unidos, onde o consumo anual por
habitante era de 10,7 litros. Aqui, o
consumo era de 11,5 litros para cada
um dos 40 milhões de brasileiros que
compunham o mercado de bebidas. Se-
gundo a Organização Mundial de
Saúde, 10% dos brasileiros eram al-
coólatras. Um vício que aumentou os
casos de cirrose hepática e de moléstias
gástricas, doenças que representavam a
quarta causa mortis no Brasil. O Minis-
tério da Saúde dizia, na época, que 50%
dos leitos em hospitais psiquiátricos
eram ocupados por alcoólatras.
No caso das drogas consideradas ile-
gais, seu consumo, no País, aumentava
de forma alarmante, reproduzindo cer-
tos padrões de comportamento existen-
tes, por exemplo, nos EUA, considera-
dos o maior consumidor mundial de
cocaina e onde viviam, segundo dados
revelados pelo jornal O Estado de S.
Paulo, dez milhões de viciados em
O consumo de tóxicos vem de longe. Acima, policiais preparam-se para queimar 1982. Vinte milhões de americanos, até
maconha apreendida, SP, julho de 1958 aquele ano, já haviam experimentado a
cocaina.
COMPORTAMENTO/TÓXICOS: a evolução do uso de drogas
Entrejaneiro e outubro de 81, são
presos 1.620 traficantes

Consumo em alta No Brasil, os dados sobre consumo


desses produtos eram extremamente
No período 1970-84, cresceu consideravelmente o consumo de imprecisos. No entanto, a partir das in-
formações sobre apreensões realizadas
tóxicos no País. E o pior: o Brasil passava a fazer parte
pela Polícia Federal, pode-se ter uma
da rota internacional do tráfico idéia do montante de consumo e do
tráfico de drogas no País. Entre janeiro
Primeiro o cigarro e o álcool, depois de tensões e frustrações. Logicamente, e outubro de 1981, por exemplo, foram
a maconha e a cocaina, os ácidos para por estarem legalizados, as bebidas al- apreendidos 233 mil quilos de maco-
os mais ousados e a heroína para os coólicas e o cigarro eram - e são - nha, 94 quilos de cocaina, 121 ampolas
mais ricos. Era consumindo algum tipo consumidos numa escala muito maior de Perventin, 1.512 doses de ácido lisér-
de droga - das legais às altamerite proi- que qualquer outra droga. O mercado gico (LSD) e 17 mil psicotrópicos varia-
bidas e caras - que grande parte da po- brasileiro do fumo, por exemplo, atin- dos; foram registrados 1.500 flagrantes
pulação brasileira, principalmente os gia 40% da população; eram vendidos e presos 1.620 traficantes. Em 1984, es-
jovens, enfrentava a dura realidade do anualmente cerca de 135 bilhões de ci- ses números chegaram a ser multiplica-
seu dia-a-dia. A parte o prazer propor- garros. E, segundo os especialistas, a ni- dos até por dez, como no caso da ma-
cionado em diferentes escalas por esses cotina encontrada no cigarro é uma conha: foram apreendidos 2,6 milhões
produtos, sem dúvida o escapismo era substância que, no organismo, se dirige de quilos. Além disso, a polícia captu-
uma razão fundamental para explicar o ao cérebro, provocando a elaboração rou 549 quilos de cocaina, quatro mil
crescente consumo de drogas no Brasil. de substâncias que elevam a pressão e quilos de folhas de coca e 368 quilos de
Pode parecer estranho incluir entre agem sobre o aparelho circulatório e o pasta base (já era a fase da intensífica-
as chamadas drogas o cigarro e o álcool coração. Segundo a Associação Mé- ção do refino de cocaina no Brasil e a
- afinal, a "droga", para a maior parte dica Brasileira, o vício do fumo pro- consolidação da rota do tráfico). E,
das. pessoas, é identificada como algo vocava a morte (no citado período) de pela primeira vez, apreendeu 1,17
proibido e seus consumidores e trafi- cem mil brasileiros por ano, 277 mor- grama de heroína. É preciso levar em
cantes são perseguidos pela polícia. tes por dia ou doze por hora. E quem consideração que as apreensões repre-
Aceitos socialmente e considerados lucrava com isso eram as multinacio- sentam apenas uma pequena parte de
inócuos, o fumo e o álcool, no entanto, nais do setor, cujo faturamento em todo o negócio.
funcionam, para aqueles que já adquiri- 1984 foi superior a 1,5 trilhão de cruzei- O vício das drogas espalhou-se pelas
ram o vício, como uma forma de alívio ros. Um negócio que constituía a prin- capitais brasileiras e particularmente
477
BR DFANBSS Ve.BNQ 34 anos
por São Paulo a partir do início da dé-
cada de 70, Uma pesquisa realizada em
1981 pelo Conselho Brasileiro sobre os
Problemas de Alcoolismo e Toxicoma-
niàs apontava que, em cada grupo de
cem estudantes na faixa de 12 a 18
anos, de 15 a 20 já haviam experimen-
tado ou eram usuários de drogas. As
drogas domésticas - tranquilizantes e
sedativos - eram as mais utilizadas, se-
guidas de maconha, inalantes, cocaina
e anfetaminas. De 1978 a 1982, o uso de
drogas entre escolares aumentou em
300%. Além disso, 42% dos estudantes
entre 12 e 17 anos usavam o álcool com
frequência. O jornal Movimento
apontava, em 1980, que seis milhoes de
pessoas fumavam ou já tinham fumado
maconha no Bragi].
Outos produtos muito utilizados,
principalmente por escolares de baixa
renda, eram solventes e colas indus-
triais, de fácil aquisição, terrivelmente
nocivos à saúde e que provocavam inú-
meras mortes, registradas em pé de pá-
gina pela grande imprensa, que só se
assustava com o problema, e abria
manchetes, quando a vítima do tóxico

Hicardo Malta/F4
era alguém da classe média ou da alta

Agência JB
sociedade, como no caso da morte de
EddaDeddinilOmetto Gianetti. Com
apenas 19 anos - filha adotiva de Wal- - eum,
dir Antônio Gianetti, dono da maior si- 1982, mostrava que no Rio de Janeiro Paulo, quando o deputado estadual
derúrgica particular do País, de usinas existiam cerca de cem mil viciados em
Sérgio Santos, do PT, foi agredido e de-
de açúcar e álcool e empresas de ôni- drogas e 24 mil com problemas psiquiá-
tido por policiais que disseram ter en-
bus -, Edda morreu no dia 4 de janeiro tricos causados pelo tóxico.
contrado maconha em seu carro. O de-
de 1984, vítima de uma overdose de co- Mas, além da discussão das razões putado afirmava que a droga havia sido
caina, na praia de Juquei, em São Se- para o uso de drogas, existia
outro pro- ali colocada pelos próprios policiais
bastião, SP, blema: o tráfico ilegal. No Brasil, os go- que o revistaram e relacionava o episó-
Casos como esse, que vinham ocor- vernos militares insistiram
em remédios dio aos acontecimentos de junho de
rendo há anos, provocaram o debate ditatoriais e repressivos para o controle
1980, na mesma Freguesia do Ó,
sobre a legalização e o uso de certos tó- do problema. Promoveram
legislação e quando policiais e agentes de segu-
xicos. A imprensa, as lideranças políti- criaram órgãos contra a droga,
mas rança de Paulo Maluf, então no go-
cas, os meios intelectuais, os estudiosos nada adiantou. Os militares
usaram verno do Estado, agrediram manifes-
e autoridades do País começaram a dis- campanhas ideológicas tentando
vincu- tantes que vaiavam o governador. Na-
cutir e dar importância ao problema do lar a esquerda à droga, a exemplo
dos quele incidente, Sérgio Santos foi a
uso de drogas entre a juventude. A ma- EUA, que, internacionalmente,
promo- principal testemunha de acusação con-
conha, de longe a mais tolerada das veram uma campanha no sentido
de as- tra os policiais envolvidos.
drogas, foi alvo principal dessas discus- sociar as drogas e seu tráfico
com Mesmo que se constatasse que seto-
sões durante algum período. países socialistas, grupos de esquerda, res da esquerda - principalmente a ju-
Em um ponto, existia mais ou menos movimentos populares e democráticos.
ventude ligada ao movimento estudan-
um senso comum: o problema era ge- Segundo essas campanhas, países como
til - usavam drogas, ficava claro que o
rado pela ordem social desequilibrada. Cuba e Nicarágua agiriam
conjunta- problema de tráfico e os principais res-
Um desenvolvimento desigual de valo- mente na América Latina,
visando de- ponsáveis pelo uso abundante de tóxi-
res materiais e espirituais da sociedade, sestabilizar os governos
da região. cos estavam vinculados a esquemas po-
um desencontro crescente entre o Quando do assassinato
do ministro da liciais, que não eram molestados por-
imenso poder material das nações e o Justiça da Colômbia, em maio de 1984,
que prestavam "serviços" insubstitui-
baixo nível de desenvolvimento cultu- por traficantes de cocaina,
e na poste- veis a importantes setores das elites do
ral e filosófico até de suas elites econô- rior caçada que se seguiu
ao atentado, País.
micas e políticas seriam estímulos ao houve declarações de porta-vozes
ame- Há também indicações de que o trá-
escapismo e ao uso de drogas, não só ricanos de que se naviam encontrado fico era mantido a salvo das costumei-
dos jovens sem compromisso profissio- "nítidas evidências" da
associação en- ras blitz e repressivas porque ele ima
nal algum como de executivos. tre traficantes, o movimento guerri- até os consumidores da chamada alta
Do ponto de vista dos males que lheiro M-19 e Cuba. sociedade, Um caso típico é o da morte
causavam à saúde física e mental dos No Brasil, um exemplo de associa- de Angela Diniz, assassinada em de-
consumidores, os efeitos das drogas ção do uso de drogas com políticos
de zembro de 1976, que ameaçava denun-
eram assustadores. Uma pesquisa da esquerda ocorreu em novembro.
de ciar nomes da alta sociedade do País
Fundação Oswaldo Cruz, feita em 1984, na Freguesia do Ó, bairro
de São envolvidos com tóxicos. Houve pres-
478
er oranass 404403 an 002, paRa

mens do "esquadrão da morte" e de


grupos de ultradireita claramente liga-
dos às máfias e grupos de narcotráfico.
Caso conhecido é o do delegado Sérgio
Paranhos Fleury, que teve quase toda
sua carreira ligada aos órgãos de segu-
P rança e a repressão. Fleury tornou-se
Rã... um dos homens intocáveis dentro da
polícia, o que facilitou seu envolvi-
mento com o "esquadrão da morte"
a - W a (órgão paramilitar organizado por ele-
14 R. _ mentos da polícia para matar margi-
. nais),
Entre suas atividades ilegais estavam
o acobertamento e a organização do
tráfico de tóxicos. Foi processado judi-
cialmente por assassinato, sem ser con-
denado. Fleury morreu em maio de
1979. Para o procurador Hélio Bicudo,
o delegado sabia demais sobre as liga-
ções da polícia com a tortura política, |
com o "esquadrão da morte" e com o
) tráfico de drogas.
ME 1 | aiii O jornalista de assuntos policiais, |
"<a od emai Percival de Souza, do Jornal da Tarde, |
a denunciava que a repressão ao tráfico |

João Bittar/Abril Press


de drogas era dificultada porque exis- |
tiam policiais ligados ao comércio de
narcóticos. Isso se revelou de forma
conclusiva quando da prisão do ma-
Sas
fioso Tomasio Busceta. Descobriu-se
que um dos principais contatos dos ma-
O alto consumo de drogas no País fez muitas vítimas como, por exemplo. Edda fiosos no País era um policial que todos
Deddini Ometto Gianetti (acima), morta por uma overdose de cocaina em 84, e Os domingos se apresentava em um
Cláudia Lessin Rodrigues, assassinada em 77 numafesta de "embalo" promovida pelo programa de TV para alertar a juven-
playboy Michel Frank (na pág. ao lado). Em 1984, o Brasil, sobretudo na Amazônia tude sobre os perigos da droga.
(abaixo, a PF na guerra contra a coca na região) já começava a superar a produção No fundo do poço ficava claro que o
boliviana (na pág. ao lado, o gen. Luis Garcia Meza, ex-presidente da Bolívia, tóxico passou a ser comercializado em
conhecido por seu envolvimento com o tráfico internacional de tóxicos.) escala crescente, no Brasil e no mundo,
por grupos interessados em grandes lu-

sões e ameaça de morte aos jurados


Reginaldo Manente/Agência Estado

para impedir que, no julgamento, em


1979, Raul Fernando do Amaral (Doca
Street), o assassino, contasse suas liga:
(ões com traficantes. O réu, conde-
nado, saiu quase imediatamente, em li-
berdade condicional.
Outro caso envolvendo figuras da
alta sociedade e tóxicos foi o assassi-
nato da jovem Cláudia Lessin Rodri-
gues, morta em junho de 1977, no Rio,
em uma festa de "embalo" promovida
pelo cabeleireiro Georges Kour e pelo
playboy Michel Frank. Quando o caso
foi a julgamento, em 1980, Frank, gra-
ças ao dinheiro e à influência, havia fu-
gido do País. Kour, inocentado da acu-
sação de assassinato, foi condenado a
um ano e quatro meses de detenção
por porte de drogas. Mas foi libertado
no mesmo dia porque estava preso ha-
via três anos.
Enquanto os governos militares ten-
tavam envolver a esquerda no tráfico
de entorpecentes, o que fizeram foi for-
talecer os setores policiais e das Forças
Armadas, dos torturadores, dos ho-
[. TR Bas—2,1. 37.135“; “...:. _,"; "abreu

Em 1984, a indústria sassinado, em maio de 1984, por grupos


de cigarros no País ligados à exportação de cocaína para os
tinha um faturamento A. O presidente Belisário Betancur
superior a 1,5 trilhão decretou estado de sítio (pela primeira
de cruzeiros, gerando vez, um país adotava medidas tão ex-

Manoel Novaes/Abril Press


um lucro fabuloso, tremas para enfrentar a delinquência
principalmente para comum) e começou a maior caçada à
as multi do setor (ao droga e aos traficantes a que a Colôm-
lado, embaixo, as bia já assistira.
máquinas de fumar da E, assim, com a superprodução da
Souza Cruz). Neste cocaina na Bolívia e a repressão que
mesmo ano de 84, o um governo mais democrático imple-
consumo de álcool mentava para combater o tráfico no
era de 11,5 litros país, grande parte da produção começa
para cada um dos 40 a dirigir-se para o Brasil, que passou a
milhões de ser rota privilegiada da droga, Isso
brasileiros que acontecia também por causa das movi-
compunham o mercado mentações dos grupos de libertação na-
de bebidas, cional na América Central, que difícul-
superando os EUA (ao tavam o acesso da coca aos Estados
lado, no alto, as Unidos. O tráfico pelo Brasil era facili-
instalações da
tado ainda por estar o país próximo aos
fábrica de aguardente produtores andinos e por ter uma vasta
Ricardo Chaves/Abril Press Pitu, em São Paulo) fronteira, com problemas de fiscaliza-
ção.

Supersafras da coca levam à

popularização do uso no Brasil

Assim, a Amazônia tornou-se


um
centro de rotas de drogas, além
de ser
utilizada para o refino da cocaina
eros e com poder político expressivo. tra a proibição de plantação de coca e,
e
E, o que é pior, o desenvolvimento de- aumentar sua própria produção. Se-
por motivos como esse, as autoridades
sigual das nações contribuiu para trans- gundo técnicos do governo brasileiro,
bolivianas opuseram-se à destruição de
formar países ricos em altos consumi- as plantações de coca aumentaram
cocaina apreendida em 1985. Alegando
substancialmente na região e em pouco
dores de drogas e países pobres em dificuldades pelas quais o país passava,
tempo sua produção poderia até
sede da produção em larga escala, com propuseram a compra do produto por
mesmo superar a da Bolívia.
populações pobres envolvidas e defor- países interessados em sua utilização
Tudo isso fez com que ocorresse um
madas culturalmente por essa produ- medicinal.
crescimento acentuado de consumo da
ção. Não por acaso, os maiores produ-
cocaina no Brasil, antes restrito às ca-
tores mundiais de drogas eram países Produção de cocaima na Bolívia
madas de alto poder aquisitivo por
da América Latina e da Ásia; os maio-
res consumidores, os Estados Unidos, chega a 46 mil quilos por ano causa do elevado preço. Após as super
-
safras dos países vizinhos e do aumento
seguidos pela Europa Ocidental. No
Em 1984, a Bolívia - pais que produ- da própria produção brasileira, no iní-
início de 1985, num artigo de capa alar- zia 46 mil quilos de cocaina anualmente cio dos anos 80, houve constante dimi-
mado com o incrível crescimento do - convivia com um impasse. De um nuição do preço. Estava popularizado o
uso de cocaina nos EUA, a revista lado, o governo organizava verdadeiras uso da cocaina entre os brasileiros.
Time estimava em 100 bilhões de dóla- operações de guerra para acabar com a Calculava-se que cerca de 150 mil qui-
res anuais - 0 valor da dívida externa produção e comercialização da droga los de cocaina passavam anualmente
brasileira - o consumo de coca pelos e, de outro, não podia acabar com as no Brasil, dos quais apenas 10% perma-
americanos, plantações com receio de perder todo neciam dentro de suas fronteiras, O
Ficava difícil a extinção de tais pro-
o apoio dos camponeses e dos trabalha- fato de o Brasil ter-se tornado,
duções porque muitas vezes eram parte sob o
dores produtores de cocaina, alguns Regime Militar, centro vital para
integrante da economia desses países, o tra-
dos quais passaram a crer que a droga fico de drogas no mundo tinha
assim como o cultivo e o tráfico muitas causas
era a grande saída para superar a crise políticas, evidentemente. O Vietnã,
vezes estavam ligados às autoridades econômica vivida pelo país. Depois que
o
Irã e a Bolívia passaram a desman
governamentais, Um bom exemplo, o telar
os militares abandonaram o poder e as- o esquema de tóxicos depois
caso do Paraguai, a mais antiga dita- que go-
sumiu um presidente civil eleito, falava- vernos nacionalistas, populares ou
dura da América do Sul: no início de de-
se em substituir as plantações por outros mocráticos assumiram o poder.
1985, o governo recusou-se a destruir E, ao
produtos agrícolas. Mas era difícil en- que parecia, empurraram os trafica
material utilizado para a produção de ntes
contrar uma cultura tão lucrativa: os na direção de países como o Brasil,
cocaina descoberto no país, segundo que
camponeses recebiam até 1.000 dólares até 1984 era governado por uma
revelou o New York Times. Em Belize, dita-
por quilo da pasta base de cocaína. dura militar de direita atolada
na América Central, a produção de em cor-
Outro grande produtor de cocaina, a tupção, um prato cheio para as
maconha chegava a ser 15 vezes mais máfias
Colômbia, passava por um processo de das drogas.
lucrativa do que a de açúcar. Na Bolí-
repressão à droga depois que o ministro
via, os campuneses tizeram greve con- da Justiça, Rodrigo Lara Bonilla, foi as-
Otto Filgueiras
, 480

BR DFANBSB VB.GNCLAAA, 24/


04/33an 02, p22s
Br oranBSBVB.ONCAAA, &404 1332Jan 224

ECONOMIA/RIQUEZAS MINERAIS: a evolução da exploração e da industrialização

Espoliação mineral

Sob o Regime Militar, cresceram a extração de minérios e


o conhecimento do solo brasileiro. Paralelamente, ampliaram-se as exportações e,
com elas, os lucros das multinacionais

Em março de 1964, uma alta autori- mericano de Desensolvimento (BID) a mico dos países produtores".
dade norte-americana, de nome Char- estenderem seus créditos às compa- Vinte anos depois, nenhuma expres-
les Wright, que havia sido chefe da Di- nhias de mineração americanas nas siva melhoria dos padrões sociais e eco-
visão de Mineração do U.S. Bureau of quais participem investidores e bancos nômicos dos países produtores se verifi-
Mines (o Departamento Nacional da locais [isto é, dos países onde estiverem cou, muito embora o plano proposto
Produção Mineral - DNPM dos Esta- localizadas), não só em mineração pro- por Wright tivesse sido colocado em
dos Unidos), escreveu: "A principal priamente dita, como em projetos me- prática. Pelo menos no que toca ao
preocupação atual da nação americana talúrgicos. Com essas medidas, subirá a Brasil: durante o governo Castello
é suprir suas futuras necessidades mine- produção para exportação de minerais Branco (1964-67), foi elaborado e posto
rais para manter seu poderio militar e de que carecem os Estados Unidos." em execução um Plano Decenal de
industrial." Assim, recomendava: "O Mais adiante, propunha a "execução Mineração que, sem dúvida, contribuiu
governo deve se esforçar por todos os de um plano decenal dentro das Améri- para um extraordinário aumento do co-
meios, através de benefícios fiscais e ta- cas, de acordo com a Aliança para o nhecimento sobre a riqueza mineral do
rifários, para encorajar companhias Progresso, estabelecendo reformula- País e, consequentemente, permitiu a
americanas mineradoras com interes- ções locais que prestigiem o desenvol- implantação de grandes projetos no se-
ses no Exterior a expandirem suas opera- vimento de recursos minerais dentro de tor, prioritariamnte voltados para a ex-
ções e projetos de desenvolvimento, in- cada país, pela livre iniciativa, aumen- portação.
duzindo, também, o Banco Mundial tando as exportações, o que, é claro, Com as descobertas resultantes do
(BIRD), o Eximbank e o Banco Intera- contribuirá para o bem-estar econô- Plano Decenal, os investimentos es-

NNO

N
N / p
N 2a]
4
N //

481
BR 247123 Jon COA ,p 225

Arquivo Nacional
7

Arquivo Nacional
trangeiros em mineração experimenta-
de minério de ferro, derúrgica. Entre outras alegações, di-
ram vigoroso aumento a partir de 1974, A entrada do Estado na mineração
Desde o final do século 19 até 1973, es- ziam que retrações no mercado finan-
foi consequência de lutas que começa-
ses investimentos somavam 1,7 bilhão ceiro europeu atrasavam o projeto. Na
Tam nos anos 20, contra trustes que ten-
de dólares, Já entre 1974 e 1978, foram década de 20, cresce o clamor naciona-
tavam controlar as jazidas do Quadrilá- lista contra as concessões a Faquhar,
investidos no setor 2,4 bilhões de dóla- tero Ferrifero, na parte central de Mi-
res. ao qual, porém, não faltava apoio in-
nas Gerais. Até essa época, as únicas terno dos eternos agentes do capital es-
Em compensação, segundo um le- atividades minerais importantes no País
vantamento feito pela economista He- trangeiro, além das pressões financeiras
eram a exploração dos últimos veios de
lena M.M, Lastres, no mesmo quadriê- e diplomáticas do governo inglês, A
Ouro e gemas existentes em Minas Ge- luta contra a Itabira Iron foi a primeira
nio, as multinacionais expatriaram, a ti- rais, em que se destacava a St. John
tulo de remessa de lucros e pagamento campanha nacional em defesa dos re-
d'El Rey Mining Company Ltd., que, cursos naturais de nossa história,
de tecnologia, exatamente US$ 1,7 bi- desde 1831, tirava ouro da velha mina
Ihão; ou seja, o mesmo que aqui aplica- Faquhar ficou "sentado em cima"
de Morro Velho. é das jazidas de Itabira até 1939, quando
ram antes de 1974, Como, entre 1974 e
1978, o déficit comercial acumulado do Getúlio Vargas declarou caducas as
Um inglês consegue informações concessões. Em 1940, Vargas, aprovei-
setor mineral foi de US$ 6,6 bilhões
(exclusive petróleo e gás), verifica-se e compra as jazidas de Itabira tando o interesse dos Estados Uniddos
que, nesses anos de acelerado aumento em alinhar o Brasil contra o Eixo, con-
A expansão da indústria siderúrgica segue um financiamento do Eximbank
nas atividades minerais, o País perdeu européia, no início do século 20, pro- para a usina siderúrgica de Volta Re-
US$ 5,9 bilhões, voca a busca de jazidas de ferro em
E verdade que a política mineral dos donda. Em 1942, ele assina o Acordo
todo o mundo. O governo brasileiro de Washington, que, entre outros pon-
governos pós-64 logrou reduzir impor- cria um Serviço Geológico, que logo
tações e aumentar exportações. Como tos, estabelecia a obrigação de o Brasil
inicia pesquisas na região de Itabira. suprir os Aliados com minério de ferro
consequência do Plano Decenal, o País Um agente inglês, Muley Cotto, conse-
tornou-se auto-suficiente em recursos em troca de recursos para a implanta-
gue informações sobre os resultados ção da Companhia Vale do Rio Doce
de cuja existência mal se suspeitava até desses estudos, compra, por uma baga-
1964: bauxita, cobre, fosfatos, potássio, (CVRD), sucessora da Itabira Iron,
tela, extensas regiões de terra em lta- Nesses acordos, porém, o Eximbank
estanho, etc. Entretanto, parte dessa ri- bira (na época, o proprietário do solo
queza foi colocada sob controle de gru- ganha o direito de indicar dois dos
era também dono do subsolo) e, em cinco diretores da companhia.
pos estrangeiros, seja diretamente 1909, organiza o Brazilian Hematite
(posse de jazidas pelas múltis), seja indi- Além de criar a Vale (em junho de
Syndicate, para explorar o minério. O 1942), o primeiro governo Vargas
retamente (através de testas-de-ferro e problema surgiu na hora de obter con-
das empresas estatais que se sujeitaram (1930-45) ainda faria importantes modi-
cessão para construir a ferrovia que li- ficações na legislação mineral brasi-
a acordos com grupos estrangeiros lesi- garia Itabira ao mar: o governo mineiro
vos aos interesses nacionais, leira. A Constituição democrática de
conseguiu apoio do governo federal 1934 separou as propriedades do solo e
Na primeira metade dos anos 80, as para a idéia de, em troca da concessão,
multinacionais controlavam cerca de subsolo e estabeleceu que apenas cida-
obter investimento inglês para a im- dãos brasileiros ou empresas "organiza-
42%, do produto mineral brasileiro, se- plantação de uma siderúrgica em Mi-
gundo um levantamento feito pelo eco- das" no País poderiam explorar mi-
nas. Acordo feito, acordo descum- nérios. A Constituição ditatorial de
nomista Francisco Chaves Fernandes, prido, Cotto e seu sucessor, o aventu-
As empresas privadas nacionais deti- 1937 faria uma sutil, porém impor-
reiro Percival Faquhar, que organizou tante, modificação nesse princípio: a
nham outros 40%, sobretudo porque a Itabira Iron e herdou os direitos do
predominavam nos não-metálicos e no mineração poderia ser feita apenas por
Syndicate em 1911, esforçaram-se para empresa genuinamente nacional. (A
carvão. As estatais, ao contrário do que obter o monopólio sobre o transporte
parecia, ficavam com menos de 1,8%. Carta de 1946 restabeleceria o critério
de qualquer minério através da Estrada da Constituição de 1934, que permitia a
Na verdade, a presença do Estado só de Ferro Vitória a Minas e nunca cum-
era mesmo importante na exportação presença disfarçada do capital estran-
priram as cláusulas de construção da si-
geiro na mineração.)
482
ar VoNCA SOA J 23 p226

Agência O Globo
Agência O Globo

Agência O Glo
Terminada a guerra, o futuro da Vale Hanna Mining, em meados dos anos Em 42, o Brasil obtém recursos para
ficou indefinido. Além de perder seu 50, Assessorada pela "famosa" Consul- explorar o minério de Itabira, MG (na
mercado cativo, a empresa sofria pres- tec, empresa de consultoria de Roberto pág. ao lado, à esq., o ministro Oswaldo
sões do Eximbank, que só concordava Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões, Aranha e o chanceler inglês Noel Charles
em liberar novos financiamentos para a Hanna logra confirmar suas conces- assinam o acordo que daria origem à
sua expansão se pudesse aumentar sua sões durante o governo Kubitschek CVRD, 2/6/42; à dir., obras da Vale,
ingerência na diretoria. Nova batalha. (1956-61) e dá início a um projeto de 13/10/43). Nos anos 50, a St. John d'El
Os ministros da Fazenda que se Suce- mineração com apoio do Eximbank. Rey (acima, à esq., a entrada da mina de
diam no governo Dutra apoiavam as Logo começa a sofrer violenta oposi- Morro Velho, explorada no passado pela
exigências do banco. O presidente da ção no Congresso, alimentada pelo go- companhia), dona das jazidas de Aguas
companhia, Demerval Pimenta, trava verno de José Francisco Bias Fortes Claras, MG, é vendida à Hanna Mining.
dura luta para tirar os americanos da em Minas Gerais (que desejava recupe- Protestos levam Jânio a cassar essa
diretoria, o que finalmente consegue rar as jazidas de Aguas Claras) e pelos concessão. Em 64, Azevedo Antunes (ao
em 1950. Assim, 40 anos depois de te- dirigentes da Vale (que ainda lutavam centro) cria a mineradora Jangada, tendo
rem sido "compradas" por Coito, as para firmar a estatal no mercado ex- como sócio Eliezer Batista ( à dir.), que
minas de Itabira eram definitivamente terno). É um novo caso Itabira Iron, seria depois presidente da CVRD.
nacionalizadas. mais emocionante porque se segue à Castello Branco dá a concessão de Aguas
Outra sorte tiveram as jazidas de campanha "O petróleo é nosso". Du- Claras à Jangada; esta tem o nome
manganês da serra do Navio, no rante o governo Jânio Quadros, as con- mudado para MBR e a Hanna adquire
Amapá, e de minério de ferro de A- cessões são cassadas, João Goulart 49% do capital da nova empresa. Tudo
guas Claras, em Minas Gerais, Des- confirma a cassação. A disputa chega à fica como antes
cobertas no início da déc.da de 40, as Justiça e vai subindo de instância em
jazidas de manganês foram transforma- instância até que, com o golpe de 1964,
das em "reserva nacional" em 1946 e aterrissa na mesa de Castello Branco, tórios de venda da Vale, mas lá conti-
logo postas em licitação pelo governo que, dois dias antes de deixar o governo, nuaria prestando serviços à MBR, até
Dutra, Concorrendo contra as podero- devolve à Hanna as concessões. voltar à presidência da Vale, em 1979,
sas U.S. Steel e Hanna Mining, ganhou Só que não diretamente. O presti- no governo do general Figueiredo.
a pequena empresa nacional Icomi, de moso Antunes havia criado a Minera- Até o início dos anos 80, muita coisa
Augusto Trajano de Azevedo Antunes. ções Brasileiras Reunidas (MBR), da mudou no setor mineral brasileiro, O
Depois de obter do governo todas as qual a Hanna adquiriu 49% do capital. Plano Decenal foi cumprido, demons-
concessões possíveis, Antunes, me- Detalhe curioso: em julho de 1964, An- trando que o subsolo do País é muito
diante artifícios jurídicos, entregou 49% tunes criou uma pequena empresa de mais rico do que cantam os hinos ufa-
da empresa à Bethlehem Steel, que vi- mineração denominada Jangada Indús- nistas oficiais, O general Médici criou a
nha financiando suas atividades no tria e Comércio. Um de seus sócios, e Companhia de Pesquisas de Recursos
Amapá, primeiro presidente da Jangada, foi um Minerais (CPRM). Através dela, o Es-
Desde então, transformado no mais ex-ministro das Minas e Energia de tado gastava dinheiro nas pesquisas de
famoso e bem-sucedido testa-de-ferro João Goulart e presidente da Vale do novas jazidas (quando não se acha
de interesses estrangeiros no Brasil, An- Rio Doce até abril de 1964, Eliezer Ba- nada, o dinheiro é perdido) e, depois,
tunes prestar-lhes-ia um novo serviço tista. Demitido pelos golpistas, Batista vendia o que achasse, a preço de custo,
no famoso "caso Hanna". conseguiu emprego imediato junto a para algum empresário supostamente
Nos anos 20, a já quase centenária um dos maiores conspiradores contra nacional. Foi assim que Lynaldo
St. John d'El Rey adquiriu as terras Goulart. Um ano depois, em agosto de Uchôa de Medeiros, representando os
onde estavam as jazidas de ferro de 1965, a Jangada tem o nome mudado interesses do cartel internacional do
Águas Claras, As mudanças constitu- pala MBR, e Batista continua sendo potássio, adquiriu as imensas jazidas de
cionais e legais operadas na década de seu presidente, cargo- do qual só se sal-gema de Carmópolis, em Sergipe,
40 provocaram conflitos políticos e afestou em agosto de 1967, depois de que a CPRM descobrira, e "sentou em
jurídicos entre a empresa inglesa e o resolvido o problema da Hanna. Vai, cima" delas por dez anos. Só saiu
governo, até que ela foi vendida à então, para a Europa, chefiar os escri- quando o seu grupo Lume, envolvido
483
BR 23 Jon CO 2, p 224

contratos para a compra de minério


que viabilizavam a construção do porto
de Tubarão. Um aparente bom negócio
para a Vale, que conquistava um com-
prador cátivo. Um ótimo negócio para
o Japão, que punha brasileiros e austra-
lianos competindo em seu mercado.
Desde então mantendo ótimas relações
com o Japão, Batista negociou com a
Agência de Cooperação e Desenvolvi-
mento Internacional (IDJC), orga-
nismo ligado à poderosa Confederação

assos/Abril Press
Empresárial Japonesa, estudos para o
aproveitamento econômico da região
que seria percorrida pela Estrada de
Ferro Carajás-São Luis.

Nos anos 80, a Vale quase é


Extjuanto se dêsenrolava a polêmica sobre Carajás, era entregue às múltis
a bauxita da
Amazônia. Acima, Joel Mendes Renno, pela CVRD, e Isao Kawaguch privatizada. Discretamente
i, pela Nalco,
assinam acordo para criação da Albrás (jun./78)
A IDJC fez esses estudos durante o
ano de 1979, quando assumiu o go-
em inúmeras falcatruas, faliu. O Brasil, Mineração S.A. (AMZA), da qual a es- verno o general
até 1984, ainda importava todo o potás- Figueiredo, que recon-
tatal ficou com 51% e a U.S: Steel com duziu Eliezer Batista
sio que consumia, embora aquela ja- à presidência da
49%. »
zida pudesse atender a toda a demanda Vale. Nasceria depois o Projeto
Grande Carajás, que Batista anunciou
brasileira por 500 anos. Em 77, U. S. Steel sai de
com estardalhaço, em meados de 1980:
As maiores descobertas ocorreram
Carajás. Entram os japoneses um plano de US$ 60 bilhões que pre-
na Amazônia, onde empresas multina-
tendia atrair investimentos estrangeiros
cionais como a U,S, Steel, Alcan, Rio Os sócios, porém, logo se desenten- para a Amazônia aproveitando as faci-
Tinto Zine, British Petroleum, Inco, deram. Os americanos preferiam ter Ca- lidades criadas com a construção, pelo
Ludwig e a estatal Vale se lançaram em rajás como estoque estratégico, já que governo, da estrada de ferro e da hidre-
gigantescos programas de pesquisas. dispunham de melhores alternativas de létrica de Tucuruí,
Em 1967, geólogos da U.S. Steel, de investimento em outros países, A Vale, Para construir a ferrovia, a um custo
forma aparentemente casual, desco- ao contrário, viu em Carajás a possibili- de dois bilhões de dólares, Eliezer Ba-
brem as "montanhas" de ferro da serra dade de consolidar sua posição, con- tista recorreu a financiamentos de or-
dos Carajás. No mesmo ano, a Alcan quistada no final da década de 60, de ganismo internacional, Para dar os
descobre a bauxita do rio Trombetas, maior mineradora de ferro do mundo. créditos, o banco exigiu que 30% do ca-
Para explorar Carajás, a U.S. Steel re- O conflito eclodiu de vez no governo pital da Vale fossem transferidos para
quereu do DNPM a concessão de 32 Geisel (1974-79), quando era presidente mãos privadas, através do mecanismo
áreas contíguas, cada uma com cinco da Vale o economista Fernando Ro- de debêntures conversíveis em ações
mil hectares, o limite legal da época, quette Reis. Foi um combate de gabi- (20% do capital da empresa já eram ne-
Em outubro de 1971, a revista netes, em escritórios no Brasil, Estados gociados em bolsa de valores). Esse
Realidade, em número especial sobre a Unidos, Europa e Japão, ao fim do plano foi executado discretamente, em
Amazônia, publicava declarações do qual, em 1977, a U.S. Steel concordou três anos, e, ao fim do governo Figuei-
funcionário da U.S. Steel John Tri- em receber um ressarcimento pelo que redo, a Nação descobriu estarrecida
maine, um dos responsáveis pelos tra- Já gastara em Carajás e retirar-se do que a União quase perdera o controle
balhos em Carajás. Trimaine afirmava projeto. da empresa, transferindo-o , por meros
que uma das áreas havia sido pedida
Saem os americanos, entram os japo- 180 milhões de dólares, a um grupo de
em nome da Cia. Meridional de Mi- ieses. O Japão é um país essencial- empresários liderados pelo Bradesco,
neração, subsidiária da multinacional, e mente dependente da importação de O Projeto Grande Carajás gerou
as outras em nome de diretores e ve- matérias-primas minerais e alimentos. forte oposição. Geólogos, através de
lhos funcionários da empresa. A da Toda sua política internacional se ba- suas entidades profissionais, a Socie-
Cia. Meridional foi concedida ime- seia em estimular o aumento da produ- dade Brasileira para o Progresso da
diatamente; as outras ficaram em estu- ção desses bens, de forma a gerar exce- Ciência e o Clube de Engenharia con-
dos por dois anos. Ao final desse dentes e manter baixas suas cotações denaram os planos de internacionaliza-
período, continuava Trimaine, o go- nos mercados. Em meados da década ção da Amazônia implícitos no pro-
verno acabou mudando 'a lei, favore- de 70, através da Agência Japonesa de grama. Em novembro de 1981, viria a
cendo a U.S. Steel. A área-limite de Cooperação Internacional (JICA), o público o relatório da IDJC, até então
concessão foi aumentada para 50 mil Japão passa a estudar o aproveitamento secreto. No Congresso, os deputados
hectares e foi permitido à multinacio- agricola de vastas e inexploradas re- Odacyr Klein e Marcelo Cordeiro e o
nal ter uma subsidiária em Carajás, giões do interior brasileiro. Surge daí o senador Henrique Santillo, todos do
com mais 30 mil hectares. Metade da Projeto Cerrado, para plantio de soja, PMDB, lutavam contra os decretos-leis
Jazida ficava, assim, para a U.S. Steel. trigo e arroz no noroeste de Minas Ge- que criaram o Projeto em novembro
Em abril de 1970, a Vale - que ficou rais. Um dos articuladores do Projeto de 1981, exigindo discussão pública da
com a outra metade - e a empresa Cerrado foi Eliezer Batista, cujas rela- questão. Três candidatos a governador
americana constituiram, para iniciar a ções com os japoneses começaram no pelo PMDB, Renato Archer (Mara-
exploração do minério, a Amazônia governo Goulart, quando ele obteve os nhão), Jáder Barbalho (Pará) e Íris Re-
484
ar pranis 1234 Sn COpz 8

zende (Goiás), assinaram a Carta de |


Imperatriz (cidade do interior do Ma- No 4 K
ranhão), denunciando que o Projeto
não traria maiores vantagens para seus N| t D | F/
Estados. t)ua
4 «WWW? à
Enquanto crescia a polêmica em |! ANA é
torno de Carajás, o Regime Militar en-
tregava às multinacionais as jazidas de
bauxita da Amazônia, a terceira maior
reserva do mundo,
A produção mundial de alumínio é
controlada por um cartel de seis empre-
sas, lideradas pela Alcoa e Alcan. Nos
anos 60, os países produtores de bau-
xita, tendo à frente a Jamaica, inicia-
ram esforços para elevar o preço inter-
nacional do minério. As múltis reagi-
ram abrindo minas na Austrália e no
Brasil, onde grandes reservas foram
oportunamente descobertas. Além
Miguel Chikaoka/F4

disso, devido a problemas com polui-


71
ção e aumento dos custos de energia,
as "seis irmãs" resolveram transferir
suas usinas para países do Terceiro
Mundo.
No governo Geisel, a Vale teve de
assinar acordos de associação com a
Alcan (para explorar bauxita Ão rio
Trombetas) e com os japoneses da
Nalco (para construir a Albrás, uma fá-
brica de alumínio nas vizinhanças de
Belém) nas quais a estatal não tinha
maiores poderes de gerência, desenvol-
vimento tecnológico e definição de
preços de venda. Geisel ainda colocou
as reservas de bauxita de Paragominas
(as maiores do País) sob controle indi-
reto da Rio Tinto Zine, como "garan-
tia" para financiamentos ingleses desti-
nados à construção da Açominas, obra
iniciada pelo então governador de Mi-
nas Gerais, Aureliano Chaves.

O GETAT "pacifica" para as


muúltis explorarem tranquilas 5
É
3
O governo Figueiredo, além de acei- £
tar todos os atrasos impostos pelos ja-
poneses ao projeto Albrás, ainda con- Para garantir a "pacificação", o SNI passou a atuar nas áreas de mineração (no alto,
cedeu incentivos para a Alcoa se insta- comício do conhecido agente major Curió para garimpeiros, Serra Pelada, 1982). A
lar nas proximidades de São Luis. Entre Amazônia "trangóila" viabilizaria Carajás (acima, usina piloto de beneficiamento de
tais incentivos, incluiu-se um grande minério de ferro) e outros projetos
subsídio na tarifa de energia elétrica, o
mais importante insumo para produção cão do ouro brasileiro por portugueses, nacional não poderia implementar seus
de alumínio. Tiradentes foi assassinado na forca, Em projetos minerais e agricolas destinados
Com as jazidas de bauxita que possui 1984, por reagir com violência à violên- a suprir O mundo desenvolvido de
e o potencial energético dos rios ama- cia dos jagunços pagos pelo grande ca- matérias-primas e alimentos. Isso ex-
zônicos, o Brasil poderia ter enfrentado pital, um líder de posseiros de nome plica a militarização do problema fun-
o cartel mundial do alumínio. O re- Quintino foi assassinado a tiros no sul diário da região através do Grupo Exe-
gime, entretanto, preferiu servi-lo, en- do Pará. Aparentemente - mas só apa- cutivo de Terras do Araguaia-
tregando nossas reservas, facilitando a rentemente -, sua morte nada tem a ver Tocantins (GETAT), o aliciamento dos
vinda de suas fábricas e boicotando os com o controle das riquezas minerais garimpeiros de Serra Pelada pelo SNI
esforços da associação de países produ- da região. O relatório da IDJC, no en- (Serviço Nacional de Informações) e os
tores de bauxita (IBA) para elevar os tanto, clara e explicitamente, cobrava constantes assassinatos de líderes e mi-
preços internacionais da matéria- do governo uma solução "rápida e efi- litantes do movimento camponês na
prima, $ caz" para os conflitos sociais na Ama- área. A luta de Tiradentes continua-
Em 1789, por ter liderado uma cons- zônia oriental. Sem a pacificação da re- va ?. :
piração cuja origem estava na explora- gião, o grande capital internacional e Marcos Dantas

485
/
ar pranasa vgana22
0 72 3342002p
2a

COMPORTAMENTO/FEMINISMO: o movimento feminista


Delineiam-se, nesse momento, duas
vertentes sociais do movimento de mu-
lheres. Uma delas, composta principal-
mente por mulheres dos setores médios
As lutas das mulheres dos grandes centros urbanos, produ-
zirá, muito rapidamente, grupos feminis-
tas, mantendo em seu horizonte de de-
Apesar do avanço da mobilização, os grupos de mulheres, que bate e intervenção política a pauta de
ressurgiram a partir de 1975, haviam obtido, até 1984, preocupações que, desde o fim dos anos
60, atingia mulheres nos Estados Uni-
poucas conquistas institucionais
dos e na Europa: o questionamento da
divisão sexual no trabalho e na vida co-
Durante muito tempo as mulheres fo- tidiana, a separação entre a esfera pú-
ram consideradas peças importantes de blica e privada, a maternidade como
sustentação do Regime Militar. Como encargo feminino, o direito às decisões
imagem mais forte de sua incursão na sobre o próprio corpo, etc.
vida pública permaneceu a das Mar- A outra vertente mobiliza as mu-
chasda Família com Deus pela Liber- lheres nas periferias das grandes cida-
dade, realizadds em apoio ao golpe de des, estimulada pela Igreja Católica,
1964. que, depois da reunião de Medellin,
A imagem das "marchadeiras", no persegue claramente objetivos sociais.
entanto, prevaleceu como modelo de Os clubes de mães promovidos pela
conduta feminina do pré e imediata- Igreja desenvolvem, a exemplo das an-
mente pós-64 à custa da repressão e rá- tigas uniões, trabalhos manuais e pas-
pida supressão das lutas a que as mu- sam a ser, em muitos casos, local de
lheres se vinham dedicando desde a Se- formulação de reivindicações por me-
gunda Grande Guerra. lhores condições de vida: carestia, sa-
Terminada a guerra, muitos dos gru- neamento, postos de saúde, creches,
pos de mulheres transformaram-se em
comitês femininos pela anistia. E, con- Grupos feministas procuram
quistada a anistia para os presos políti-
aproximar-se de setores populares
cos em 1945, os comitês assumiram um
programa de defesa dos direitos da mu- No entanto, essas duas vertentes so-
lher, da infância e da soberania nacio- ciais do movimento de mulheres não
nal.
permaneceram estanques. Os grupos
Incentivada pela Federação Demo- feministas que se formaram no Brasil
Sandra Adams

crática Internacional de Mulheres - tiveram, em sua maioria, a perspectiva


formada logo após a guerra por mulhe-
clara de aproximação dos meios popu-
res que participaram da resistência ao
lares. Pode-se dizer, inclusive, que o
fascismo e claramente apoiada pela surgimento do jornal Brasil Mulher -
União Soviética -, funda-se no Brasil, Em 1979, o movimento de mulheres composto quase exclusivamente por
em 1949, a Federação das Mulheres realiza o I Congresso da Mulher Paulista, ex-presas políticas - partia muito mais
Brasileiras, que conta com 800 participantes e origina da necessidade de atingir setores popu-
Atuante até 1956, a federação não o Movimento de Luta por Creches lares, escudada pelo Ano Internacional
conseguiu manter daí em diante as mu-
da Mulher, do que como reflexo de
lheres que organizara sobretudo em Em 1975, a Organização das Nações uma consciência da opressão feminina.
torno de campanhas políticas gerais. Unidas (ONU) institui o Ano Interna- Tanto Brasil Mulher como Nós Mu-
E a organização das mulheres só vai cional da Mulher. A própria ONU e a lheres procuraram ampliar seu público
tomar fôlego em 1959, quando se forma Cúria Metropolitana de São Paulo pro- leitor junto aos grupos de mulheres dos
a Liga Feminina do Estado da Guana- movem o Encontro para Diagnóstico bairros populares, Brasil Mulher
bara, que centrou sua atuação no com- da Mulher Paulista em outubro desse ajudou, inclusive, a preparar o I Con-
bate à elevação do custo de vida, Sua mesmo ano. A partir de então, come- gresso da Trabalhadora Metalúrgica,
campanha pelos direitos da criança fez cam a surgir organizações de mulheres: organizado pelo Sindicato dos Metalúr-
com que formulasse a tese do Leite = o Centro de Desenvolvimento da Mu- gicos de São Bernardo do Campo, em
Alimento Social, denunciando as multi- lher Brasileira, o jornal Brasil Mulher - 1978. Cerca de 400 mulheres partici-
nacionais do mercado e exigindo o então porta-voz do recém-formado pam do evento e, em meio às denún-
congelamento de preços. Movimento Feminino pela Anistia -, o cias dos problemas que sofrem, não só
Com o golpe de 64, a liga foi fechada jornal Nós Mulheres, primeiro grupo a na fábrica, como em casa, resolvem
e muitas de suas participantes persegui- se denominar feminista. criar um departamento feminino no
das. Até 1975 não se ouve mais falar em Em 1975 ainda se formaliza o Movi- sindicato. A direção sindical é contra:
movimento de mulheres no País. mento Custo de Vida, iniciativa de clu- organizar as mulheres é dividir a classe
Aliás, no período anterior a 1964, a bes de mães e setores populares que operária, A partir daí, embora poucos
expressão "movimento de mulheres" atuavam na periferia de São Paulo departamentos femininos chegassem a
não existia. Falava-se em "organiza- desde o final dos anos 60 e que, mais se formar nos sindicatos, houve inúme-
ções femininas", indicando que a mobi- tarde, passa a se chamar Movimento ros encontros e comissões em diversas
lização e organização das mulheres era Contra a Carestia (MCC), ganhando categorias profissionais.
concebida apenas como meio de refor- caráter nacional, O MCC tinha compo- Esse argumento não se restringiu 'à
car lutas políticas gerais. sição fundamentalmente feminina, área sindical e se tornaria daí em diante
488
ar ve / 33 4 ân CO 2 , p230

bem frequente, refletindo uma nova


aquisição da sociedade brasileira: as lu-
tas de setores oprimidos, por outras ra-
zdes além das de classe social, tais
como as mulheres, os negros, os ho-
mossexuais. Em várias ocasiões, as ten-
tativas de organização desses setores
acabaram sendo acusadas de separatis-
tas ou divisionistas.
Em 1979, feministas e mulheres da
periferia decidem convocar o I Con-
gresso da Mulher Paulista, em comemo-
ração ao Dia Internacional da Mulher.
Oitocentos participantes debatem du-
rante três dias e formam o Movimento
de Luta por Creches. Nos quatro anos
que se seguiram, pressionada, a prefei-
tura paulistana construiu 120 creches

Julio Bernardes/F4
(prometera 830).
O II Congresso da Mulher Paulista,
em 1980 - ano em que houve ainda o I
Congresso da Mulher Fluminense -,
reuniu quatro mil mulheres e foi orga-
nizado por 54 entidades - sindicatos,
associações de bairro, UNE, grupos fe-
ministas - e ficou famoso como palco
de brigas de tendências políticas, em
relação ao rumo do movimento de mu-
lheres.
A principal divergência do congresso
foi quanto ao eixo em torno do qual se
organizariam as mulheres. De um lado,
uma corrente defendia que o movimento
deveria organizar-se em função, princi-
palmente, das reivindicações mais ge-
rais da sociedade e, secundariamente,
em torno dos problemas específicos das
mulheres, como creches, violência se-
xual, etc. De outro lado, grupos de mu-
lheres defendiam a prioridade inversa,
com diversas nuanças entreeles, A pri-
Banco de Dados/FSP

meira corrente aglutinou-se, mais


tarde, em torno da Federação das Mu-
lheres. Os grupos feministas pertencen-
tes à segunda corrente realizam um en-
contro separado em junho de 1980,

Apesar da intensa participação, esboça-se,


nos anos 80, uma profunda divisão entre
os diversos grupos do movimento de
mulheres. De um lado, colocam-se
aqueles que priorizam questões específicas
da mulher, como creches e violência
sexual; de outro, aglutinam-se
movimentos preocupados, em primeiro
lugar, com questões mais gerais da .
sociedade, como desemprego e carestia.
No alto, ato de mulheres mineiras contra
crimes passionais, Belo Horizonte,
ago./80, No centro, fundação da União
das Mulheres do Município de São Paulo,
dez./81. Embaixo, Congresso da
Federação das Mulheres Paulistas, jul./84
Banco de Dados/FSP

487
ar pranaSEVBISGNOAMALASÁÇOA! A 3.23 Ja00a , p34

« às vésperas da votação da emenda


" «
Mo, Alea Dante de Oliveira, pelas eleições dire-
%
tas, em 1984. Outra característica, es-
pecialmenté do lado das organizações
femininas, foi a não-existência de um
organismo nacional (ou mesmo regio-
nal) do movimento.
O movimento social das mulheres se
expressou ainda nas eleições parlamen-
tares e dos governos estaduais em 1982.
Além de candidatas feministas - são
eleitas, por exemplo, Irede Cardoso,
vereadora (PT-SP); Lúcia Arruda (PT-
RJ) e Ruth Escobar (PMDB-SP), de-
putadas estaduais; Cristina Tavares, de-

Nair Benedicto/F4
putada federal (PMDB-PE) -, os parti-
dos incluem em sua propaganda as mu-
lheres como tema importante,
á, a 4
Os governos de oposição eleitos em
São Paulo e Minas Gerais criam, em
Em 1981, forma-se em Recife o SOS-Corpo, voltado para questões de saúde 1983, Conselhos da Condição Femi-
e
sexualidade. Acima, participação do grupo no Encontro de Saúde de nina, Nesse mesmo ano, o Ministério da
Itapecerica,
SP, em 1984 Saúde anuncia o Programa de Assistên-
cia Integral à Saúde da Mulher em que,
num convento em Valinhos (SP), Chamada história silenciosa das mu- além de assumir a reivindicação femi-
onde debatem contradições surgidas lheres. Formam-se grupos que lidam nina de acesso à contracepção na rede
entre as próprias feministas, como a com saúde e sexualidade feminina - pública, chama os grupos de mulheres
inserção dos grupos homossexuais no SOS-Corpo, em Recife; Sexualidade e para participar de sua implantação,
movimento. E se decide pela criação Política, em São Paulo. Em 1981, ainda, Eleito presidente, Tancredo Neves
do SOS-Violência, um centro que pas- forma-se a União de Mulheres em São anunciou um Conselho Nacional da
sou a receber denúncias de agressões Paulo e no Ceará, que se propõe orga- Condição Feminina em seu governo,
contra as mulheres, tentando apoiá-las nizar as mulheres nos bairros da perife- ao mesmo tempo em que muitos dos
com atendimento psicológico e juri- ria das grandes cidades. Em 1982 grupos do movimento de mulheres -
dico, criando grupos de reflexão e de-
realiza-se em São Paulo o Tribunal cerca de 200 formalizados em todos
nunciando a impunidade dos agresso-
Bertha Lutz, denunciando a discri- os Estados - se preparavam para partici-
res.
minação contra as trabalhadoras, par do Fórum das Organizações Não-
A linha divisória expressa no II Con- Organizam-se coletivos de negras, de Governamentais, a se realizar em Nai-
gresso da Mulher Paulista aprofundou- homossexuais, de mulheres que defen- tóbi em julho de 1985, dias antes da
se. A reflexão sobre a especificidade da dem o aleitamento materno, que fazem Conferência oficial da ONU que ava-
opressão da mulher foi cada vez mais filmes, vídeos, audiovisuais. O merca- liaria o resultado do Decênio da Mu-
reforçada, inclusive pela volta de mui- do editorial sobre a questão da mulher lher, instituído na Conferência do Mé-
tas anistiadas, que trouxeram em sua se amplia, publicando teses, pesquisas xico, em 1975.
bagagem a experiência de um amplo ou ficção. Os programas de televisão e Se, por volta de 1975 o feminismo
movimento feminista, sobretudo na rádio se renovam, intercalando qua- era tratado pela universidade e pelos
França e na Itália, dros de decoração e culinária com se- meios de comunicação como ideologia
Em 1981, o III Congresso da Mulher xualidade e direitos da mulher. importada, nos anos 80 ele é reconhe-
Paulista - realizado na PUC-SP, com a
cido como expressão social interna da
presença de 300 delegadas represen- Direito ao prazer e diretas-já,
sociedade brasileira,
tando seis mil mulheres -, o II Con- reivindicações dos anos 80 Diversamente, no entanto, de outros
gresso da Mulher Fluminense e os con-
países, no Brasil, as mulheres não fize-
gressos ou encontros que se realizam A questão da mulher ganha espaço ram conquistas legais e as próprias polí-
em diversas capitais são todos dividi- social e institucional, revelando mu- ticas públicas implementadas após a am-
dos. Em São Paulo ocorrem dois con- danças na sociedade brasileira. As ati- pla mobilização das mulheres - como o
gressos simultaneamente. De um deles, vidades tradicionais nas organizações caso das creches em São Paulo - não
o realizado no ginásio do Pacaembu, populares de mulheres convivem, nos responderam satisfatoriamente às rei-
saía a resolução de criar a Federação anos 80, com discussões sobre o ma- vindicações.
de Mulheres, nos moldes da antiga fe- chismo na família, a sexualidade femi- Muita mobilização, algum espaço so-
deração da década de 50, nina ou o direito ao aborto. Alternam- cial e poucas conquistas institucionais
A partir de 1981, com a reformula- se manifestações de rua nos grandes eram algumas das características do
ção partidária, deixam de ser realizados centros, reivindicando um basta à polí- movimento de mulheres no Brasil em
os congressos. Surgem no período o tica econômica do governo e direito ao 1984,
jornal Mulherio (São Paulo), vinculado prazer, diretas-já ou punição para as- Em 1984, as marchadeiras retiraram
à Fundação Carlos Chagas, como vei- sassinos de mulheres, seu apoio ao Regime Militar. E a única,
culo dos grupos de mulheres e também Se, por um lado, as manifestações senadora, Eunice Michiles, do PDS,
das pesquisas sobre a mulher que se multiplicaram-se, por outro, nenhuma aderiu à Frente Liberal, apoiando Tan-
multiplicam em várias universidades, É delas alcançou destaque pela grande credo Neves. O regime perdeu a "ala
fundado o Centro Informação Mulher participação popular - com exceção suave" de sua sustentação,
(CIM), que se propõe a documentar a da ida de quatro mil mulheres a Brasília Ethel Leon
488
BROFANBSSVOIGNOAMSÁOS1 2 3 1 an 000,
p234

A proclamação da Independência
foi liderada por dom Pedro I, rodeado
da mesma corte que o apoiava como
representante da metrópole; foi
apoiada pela esquadra inglesa, o que
nos custou assumir uma dívida de mais
de 3 milhões de libras esterlinas, em
parte contraída por Portugal para -
ironia - combater a independência do
Brasil e em parte para pagar indeniza-
ção pelos "direitos" da Coroa porty-
guesa, dívida gostosamente aceita pelo
príncipe português . ..
A libertação dos escravos não lhes
deu o direito a um pedaço da terra que
desbravaram com seu sangue, nem se-
quer o direito ao trabalho remunerado,
permitindo que eles fossem simples-
mente expulsos das fazendas que cons-
truiram.
A proclamação da República foi
mais um episódio com pouquíssima
participação popular, realizada por
uma fração da própria elite dominante.

Pretexto: salvar a cafeicultura.


Mas salvam-se os cafeicultores

Na revolução de 30 chegou a haver


ameaça de luta, e até algumas escara-
muças; mas em pouco tempo viamos
Getúlio Vargas salvando os barões da
cafeicultura. Com a crise de 1929, mui-
tos fazendeiros de café não apresenta-
vam condições de sobrevivência; terras
Banco de Dados/FSP

passavam para as mãos de colonos e


empregados laboriosos em pagamento
de dívidas; pequenas propriedades co-
meçavam a surgir e eis que um decreto
de Vargas perdoa a metade das dividas
dos cafeicultores e estabelece prazos
A independência dos EUA foi conquistada na Revolução Americana. Acima, o enormes para pagamento da outra me-
quadro Espírito de 1776, de Archibald M. Villard tade. O pretexto era a necessidade de
salvar a cafeicultura, base da economia
' ORGANIZAÇÃO SOCIAL/DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS: nacional; na realidade, salvou os cafei-
a concentração da propriedade cultores, que puderam continuar a pro-
duzir e a ganhar, sem muita preocupa-
ção com melhor tecnologia e sem mais
cuidados.
A revolução de 1964 foi feita tam-
Terras, aqui e nos EUA
bém para impedir"'a reforma agrária,
embora de início ainda pretendesse
O modo democrático como se constituiu a posse mudar realmente alguma coisa, che-
das terras nos EUA, comparado com o autoritarismo no gando a editar o Estatuto da Terra, Do
Estatuto, porém, foram cumpridos ape-
caso brasileiro, ajuda a explicar as duas histórias nas os dispositivos referentes à política
agrícola, favoráveis aos grandes donos
O estudo comparativo de situações des conflitos armados de extensão na- de terra, e completamente engavetados
" em dois ou mais países contribui para a cional. Mesmo as diversas modifica- aqueles que levariam à reforma agrária.
compreensão dos problemas de cada ções que tivemos na estrutura governa- Com todas essas mudanças que nada
um deles, E com essa idéia que faremos mental desde 1930 até os anos 80 se de- mudaram, é natural que o problema da
uma comparação entre os problemas e ram de forma mais ou menos pacífica, posse da terra não se tenha resolvido;
as soluções fundiárias nos Estados Uni- Os golpes militares - como em 1937 e ao contrário, a concentração da posse
dos e os mesmos problemas e soluções 1964 - praticamente não encontraram da terra aumentou de forma constante.
encontrados no Brasil. resistência e portanto não houve gran- A legislação sobre terras, começando
No País, as lutas pela Independência, des modificações nas classes dominan- pelas capitanias hereditárias - a partir
pela libertação dos escravos e pela Re- tes, sempre constituídas, com pequenas de 1534 -, passando pela lei das sesma-
pública não foram marcadas por gran- modificações, pela mesma elite. rias - pela qual governadores ou

489
pr J 23 J pa3s

capitães-gerais podiam ceder faixas de 500 acres (202 hectares), vendidos aos
terras a quem se dispusesse a cultivá- colonizadores que procuravam terra.
-las -, pelo período 1822-50 - em que Essa reforma agrária não foi apenas
não houve legislação específica sobre a A legislação drástica, mas permanente; as 13 colô-
propriedade rural -, até a Lei Verguei- nias renunciaram, em favor do Con-
ro, de 1850 - que dispunha que as ter- gresso Continental, a todos os direitos
ras públicas só poderiam ser vendidas americana
às terras a oeste de suas divisas; desta
em hasta pública -, apresentou sempre maneira, o governo americano ficou
a tendência de impedir a posse da ter- proprietário da totalidade das terras em
ra por pequenos lavradores e a aquisi- que se daria, posteriormente, a expan-
ção da propriedade pelo esforço e traba- ' A legislação que regula a proprie- são do país.
lho. A situação na década de 1980 persis- dade da terra nos Estados Unidos é, Essa expansão deu-se sempre através
tia: pequenos proprietários eram cons- ao contrário da brasileira, bastante da ocupação por grande número de
tantemente esbulhados em seus direitos, precisa desde o século 18. Já em 1785 pioneiros, cada um recebendo pequeno
constituindo o registro da propriedade se estabelecia um sistema de levanta- lote. Logo no início da caminhada para
em cartório verdadeira piada. Essa in- mentos (Survay System): meridianos e o Oeste, os lotes eram de no mínimo
segurança sobre a propriedade foi cui- paralelos, distantes seis milhas entre 640 acres (259 ha); esse limite foi dimi-
dadosamente preservada, apesar dos si, determinavam uma fownship, que nuindo rapidamente, e em pouco
levhtamentos* aerofotogramétricos era dividida em 36 "seções" de uma tempo os lotes eram de no máximo 160
existentes no País, do conhecimento da milha por uma milha, numeradas a acres (65 ha).
tecnologia de cadastros, que poderia partir do canto superior esquerdo até Não havia possibilidade de especula-
ser aplicada. o canto inferior direito. Cada seção ção com terras, pois elas existiam à
media 640 acres (250 ha) e era, por vontade, de graça ou quase de graça.
Lincoln, um homem da fronteira Além disso, não havia possibilidade de
sua vez, dividida em "quartos", de
agrícola, lidera abolicionistas 160 acres. Esse sistema permitia a formação de grandes latifúndios, pois
qualquer pessoa, medianamente ins- como todos podiam obter lotes de 65
Comparando isso com a situação nos truída, localizar com precisão, por ha, suficientes para viver, ninguém iria
Estados Unidos, torna-se chocante o exemplo, uma propriedade repre- se sujeitar a trabalhar para outros, por
contraste, A independência dos EUA sentada pela "metade norte do quarto salários de fome.
foi conquistada na Revolução Ameri- sudoeste da Seção 20, ©"Township'
cana, que rompeu completamente com 13N, faixa 6W do 5o meridiano princi- EUA impedem a concentração
os ingleses e seus aliados. A liderança pal". e o Brasil consagra o latifúndio
da revolução foi assumida por comer- Este sistema funcionou muito bem
ciantes, advogados e plantadores, cujos nos Estados Unidos, um país com A Lei de Terras americana, de 1862,
interesses tanto econômicos como enormes planícies, de terras férteis e consagrou definitivamente esse limite
ideológicos conflitavam com os da In- razoavelmente servidas de água. As máximo de 160 acres. É interessante
glaterra, A força diretora da revolução, divisas dos Estados americanos, em notar que, no Brasil, a Lei Vergueiro,
porém, era fornecida por trabalhadores que predominam as linhas retas, são 12 anos antes, consagrava a grande pro-
urbanos, mecânicos, pequenos lavrado- consequência desse sistema. Não se- priedade - para os ricos e poderosos -,
res e lenhadores que empurraram os li- ria ele aplicável em outros países, em enquanto a lei americana consagrava a
deres da classe média para posições ex- que as condições topográficas não propriedade familiar, impedindo a con-
tremadas. Boa parte dos autonomistas fossem tão favoráveis, como é o caso centração da posse da terra. Aqui está
era composta de homens da fronteira do Brasil. a causa principal do desenvolvimento e
agricola, descendentes de imigrantes Mas no Brasil o essencial é que poderio econômico de um país, e da
que tinham ido para a América em existam, em cada município, um ou triste situação do outro. Sem desenvol-
busca de terra e de liberdade. A liberta- mais pontos rigorosamente determi- vimento agrícola não existe desenvolvi-
ção dos escravos resolveu-se com a nados, aos quais se refeririam os pon- mento industrial, e sem liberdade de
Guerra de Secessão, que envolveu os tos de cada imóvel, Tais pontos muni- acesso à terra para o pequeno lavrador
Estados do Norte - abolicionistas - cipais poderiam ser assinalados por não há desenvolvimento agrícola,
contra os do Sul - escravocratas. Abra- marcos, pois se estes fossem desloca- Nos anos 80, um terço das terras dos
ham Lincoln, também originário da dos ou destruídos poderiam ser facil- Estados Unidos pertenciam ao governo
fronteira agricola, liderava os abolicio- mente localizados novamente por mé- federal; as terras agrícolas estavam dis-
nistas vitoriosos, todos astronômicos, tribuidas em praticamente sua totali-
Antes disso, o Congresso Continen- O que acontece, atualmente, no dade, embora houvesse alguma tendên-
tal (que a partir de 1774 reuniria repre- Brasil, é que os documentos registra- cia à especulação. A grande maioria
sentantes das 13 colônias que lutariam dos em cartório não têm nenhuma das terras ainda nas mãos do governo
pela independência, agindo como ór- amarração com pontos de latitude e caracterizavam-se por serem muito aci-
gão central dos rebeldes) decidiria que longitude conhecidos, referindo-se a dentadas (montanhas rochosas, por
todas as colônias deviam confiscar as marcos artificiais que, uma vez remo- exemplo), ou muito áridas (deserto de
- terras dos ingleses "e de seus aliados", vidos, não se tem como determinar Nevada, por exemplo), ou geladas (no
dividindo-as em lotes, vendendo-as e sua posição com exatidão, ou a uma Alasca). Eram terras para pastagens e
aplicando o dinheiro em bônus da re- árvore facilmente eliminável, ou a para exploração florestal, ou ainda para
volução., Como quase todas as grandes córregos e riachos cujos nomes são recreação e preservação da vida selva-
propriedades eram de ingleses ou de facilmente substituídos ou cujos cur- gem. Essas terras eram exploradas sob
aliados destes, foi realizada uma das sos são desviados pela construção de a forma de arrendamento, o que freava
mais drásticas reformas agrárias do estradas ou de barragens. um pouco a especulação com terras
mundo. A Pensilvânia, por exemplo, foi agrícolas.
quase totalmente dividida em lotes de No Brasil, se não pudemos adotar
490
BR DFANBSBNVB/GNB;AAA;;SÍO 41334 p 2 as

tal legislação, seria preciso que, tanto trutura de classes; por grandes diferen-
do ponto de vista fiscal, como do ponto ças na distribuição da renda, da riqueza
de vista do direito de propriedade e das e do poder; e pela ausência de partici-
relações de trabalho na agricultura, a pação democrática dos seus membros.
legislação desestimulasse a posse impro- Por outro lado, o País sempre contou
dutiva da terra, E seria também neces- com uma disponibilidade relativamente
sária uma reforma agrária drástica, abundante de mão-de-obra não qualifi-
< para corrigir inicialmente as injustiças cada, havendo a persistência através do
E" a existentes. tempo de baixíssimos níveis de remune-
* ração para a maior parte da força de
Terra na mão de poucos rçflete trabalho, tanto rural como urbana.
a estrutura social e política Com o crescente processo de urbaniza-
do a ção a partir dos anos 50 e especial-
>> N A evolução da estrutura fundiária do mente a partir da década de 60, a oferta
- "a A Brasil tem sido bastante diversa da dos de mão-de-obra acumulou-se nas cida-
Estados Unidos. Isto se deve menos a des e possibilitou a manutenção dos sa-
razões econômicas do que a fatores lários em níveis baixos. Nos anos 80, o
políticos e sociais. A extrema concen- subemprego nas grandes cidades atin-
tração da propriedade da terra em gia taxas que variavam de 20%até 30%
nosso país, assim como a sua imutabili- E a existência e o contínuo crescimento
dade através do tempo, constitui uma dessa massa de miseráveis constituíam,
manifestação expressiva do tipo de so- pelo menos em parte, uma decorrência
ciedade e de regime político em que te- da falta de acesso à terra para uma
mos vivido durante a maior parte da crescente maioria dos trabalhadores do
nossa história. Trata-se de uma socie- campo.
o dade caracterizada por uma rígida es- Baixos salários podem ser encarados

Biblioteca Nacional

Nos EUA, a lei de 1862 consagrou a propriedade familiar, impedindo a concentração da posse da terra (no alto, pioneiros a
caminho de suas terras, no Estado do Colorado, em 1870). No Brasil, mesmo com a libertação dos escravos, a propriedade
continuou concentrada nas mãos dos grandes fazendeiros (acima, alegoria da Revista Ilustrada ao primeiro aniversário da Lei
Aurea)
491
V&EdNEARAS4O04
1 93314 anço
92 : p 235

como uma vantagem para o cresci-

mento econômico. Trata-se, porém,

apenas de uma vantagem a curto prazo,


e que só benefícia diretamente as em-
O Estatuto presas. Além de não oferecerem quais-

quer vantagens aos próprios trabalha-

dores, baixos níveis de remuneração da


força de trabalho, mais cedo ou mais
da Terra
tarde, acabam impondo limitações ao

desenvolvimento auto-sustentado da

economia como um todo. Este é um


pe processo que só se realiza através da
2o
S expansão e da diversificação (ou ambos
Castello Branco assina a é os processos) da demanda efetiva, Na
regulamentação do Estatuto da Terra E3 primeira metade dos anos 80, a econo-
9
em 20/3/65 « mia brasileira parecia atingir um desses

limites do seu desenvolvimento: o mer-


Antes mesmo do golpe militar de forma agrária em títulos da dívida pú- cado interno encontrava-se virtual-
«4964, as lifthas gerais do Estatuto da blica, e não mais em dinheiro, como mente estagnado, e o externo, a médio
Terra já vinham sendo geradas, em anteriormente, E esse é o pressuposto e longo prazos, só chegava a constituir
estudos realizados no IPES (Instituto fundamental para a viabilização da lei uma alternativa válida na cabeça de al-

de Pesquisas e Estudos Sociais). De de reforma agrária no Brasil. guns dos nossos iluminados tecnocratas

fato, em 1964, Castello Branco enco- Paradoxalmente, em 1969, num e governantes.


mendou, em caráter de urgência, um momento dos mais obscuros do Re-
projeto de lei de reforma agrária a seu gime Militar, é editado o Ato Institu- Nos anos 80, oposição à reforma
ministro do Planejamento, Roberto cional no 9, que possibilita ao Execu- agrária ainda era poderosa
Campos, que dele encarregou o pes- tivo a desapropriação e o pagamento
quisador Paulo de Assis Ribeiro, líder das terras em títulos da dívida pública A reforma agrária seria um instru-
do grupo de estudo do IPES, A essa pelo justo valor e não mais pelojusto e mento de política econômica capaz de
altura, a entidade já possuía um traba- prévio valor. Na prática, o governo fe- elevar, direta ou indiretamente, e em
lho sobre o tema, "Reforma Agrária deral pode transcrever um bem no pouco tempo, os níveis de emprego, de
- Problemas, bases e solução", Registro de Imóveis, em nome da renda e de consumo de toda uma
Para grupos ultraconservadores, União, antes mesmo da notificação ao massa de pessoas à margem do mer-
mesmo partindo de um grupo como o proprietário. cado consumidor de muitos produtos.
IPES, verdadeiro centro ideológico A decisão política de aplicar os ins- claro que o aumento da demanda
das forças que conspiraram contra trumentos jurídicos disponíveis nunca efetiva não seria a única, nem a princi-
João Goulart, tal proposta - já então existiu. Ao contrário, o que ocorreu pal, motivação para se promover a rea-
o projeto de lei específico de "Re- foram as sucessivas modificações bu- lização da reforma agrária. Trata-se,
forma Agrária" (título II do Estatuto rocráticas e administrativas, para im- afinal, de uma questão de justiça social,
da Terra - ET) - parecia ameaça- pedir as possibilidades de aplicação de um imperativo político de redistri-
dora. Após muitos percalços e pres- efetiva do Estatuto da Terra, A cria- buição da renda, da riqueza e do poder.
sões, a ele anexou-se mais um capií- ção de órgãos como o Instituto Na- Além disso, uma redistribuição a favor
tulo: "Da Política de Desenvolvi- cional de Colonização e Reforma 'dos que produzem riqueza por meio de
mento Rural" (título III do ET). Na Agrária (INCRA), em 1970, e outros seu próprio trabalho é capaz de gerar
verdade, foi a inclusão desse capítulo ligados ao Conselho de Segurança efeitos que vão muito além do setor
que deu condições para a própria Nacional, como os Grupos Executivos agropecuário, atingindo a economia e a
continuidade do projeto de lei de re- de Terras do Araguaia-Tocantins (GE- sociedade como um todo.
forma agrária no Brasil, uma vez que TAT) e do Baixo Amazomas (GE-. Nunca é demais lembrar, no entanto,
cuidava da estabilidade dos já pro- BAM), levaram à militarização da que a reforma agrária não é algo que se
prietários no meio rural. questão agrária no Brasil, elevando o faça de cima para baixo, e que as forças
Várias vezes sujeito ao aborta- número de conflitos sociais e o de que lhe são contrárias continuavam
mento precoce, o projeto do Estatuto mortos e feridos nas lutas no campo. sendo muito poderosas no Brasil da dé-
só conseguiu transformar-se em lei, No final de 1984, o governo deixava cada de 80. Isto, porém, não impede
de um lado, pelas concessões que fez como triste testamento um esboço que se possa afirmar que o desejável
às pressões dos latifundiários e, de ou- parcial de "Anteprojeto de Consolida- aumento de emprego, da remuneração
tro, pela expressão das lutas e movi- ção de Diplomas Agrários", que re- e do consumo dos trabalhadores -
mentos sociais no campo, que exi- presentava grave retrocesso na inter- tanto rurais como urbanos; quer do se-
glam respostas à situação do trabalha- pretação da legislação original. tor agropecuário, quer dos setores in-
dor rural - espoliado e expulso da Mas o Estatuto da Terra em si dustrial e de serviços - dificilmente iria
terra, mesmo, embora contraditório já em materializar-se no contexto da vigente
. O Estatuto da Terra - Lei no 4,504, sua origem, não deixou de represen- estrutura fundiária, Ou seja, embora a
de 30/11/64 - entra em vigor logo tar um fruto das lutas dos trabalhado- reforma agrária não constituísse a solu-
após a Emenda Constitucional no 10, res do campo, que necessitaria ser ção de todos os problemas, parecia ine-
de 9/11/64, que passa a permitir o pa- adaptado aos novos tempos e supe- gável que todas as soluções teriam que
gamento da indenização da terra rado em suas debilidades c omissões. acabar passando, mais cedo ou mais
(nua) desapropriada para fins de re- tarde, por ela.

E
Carlos Lorena/Tamás Szmrecsányi

492
, BRDFANBSOMAÇNGÃM,S04 334 An002, posé
1

Rrbp
22Ae

ORGANIZAÇÃO SOCIAL/SAÚDE : o sistema nacional de saúde

Alta taxa de mortalidade infantil, privatização do atendimento ao trabalhador e até


retorno à cena de doenças anteriormente erradicadas - essas, algumas das
características do catastrófico sistema de saúde do Regime Militar

Insatisfeito com as estatísticas exis- mesa, meses depois, era desconfor- no Brasil", Dessa vez, as fontes eram o
tentes sobre mortalidade infantil no tante. Em 1984, segundo o estudo, mor- Fundo das Nações Unidas de Socorro à
País, o então ministro da Saúde, o reriam cerca de 308 mil crianças com Infância (UNICEF) e a Organização
piauiense Waldyr Arcoverde, enco- menos de um ano de idade. Era como Pan-americana de Saúde (OPAS). Os
mendou a seus assessores, no início de se toda a população de uma cidade técnicos das duas instituições, depois
1984, um minucioso levantamento a res- como Londrina, no Paraná, fosse dizi- de examinarem exaustivamente milha-
peito do problema. Ele não queria in- mada em 12 meses. res de informações do Instituto Brasilei-
formações genéricas, mas números ab- Em dezembro daquele ano, o minis- ro de Geografia e Estatística (IBGE),
solutos. Queria saber, por exemplo, tro Arcoverde recebeu outro docu- chegaram à conclusão de que morrem
quantas crianças poderiam morrer em mento focalizando o problema da mor- diariamente cerca de mil crianças, viti-
1984, antes de completar um ano de talidade infantil, que levava o título mas principalmente de doenças trans-
vida, A resposta que chegou à sua "Perfil Estatístico das Crianças e Mães missíveis, como meningite ou sarampo.
493
er praNBSSÚEÇGNÇÃAA SAH 041383 4 ân00a pÃ3%

O ministro não fez nenhum alarde mais precisam deles", afirmava, em Assim, com dois decretos, o governo
em torno desses números trágicos. E ti- 1984, o oficial de planejamento e pro- desobrigou-se da prestação de serviços
nha suas razões para o mutismo. Afinal, gramação da agência da UNICEF no médicos aos trabalhadores e colocou
os dois relatórios ajudavam a diagnosti- Brasil, Eduardo Bustello. sua saúde sob controle direto das em-
car, com precisão cristalina, o fracasso A privatização dos serviços cresceu à presas.
da política de saúde no Brasil, pela qual custa de fortificantes oferecidos pelo As firmas comerciais e industriais,
seu ministério erá um dos órgãos res- governo. E a primeira dose foi minis- para dar assistência médica a seus em-
ponsáveis. A saúde da maioria da po- trada em 1966, quando os trabalhado- pregados, passaram a estabelecer con-
pulação, revelavam os números, ia de res foram aliados dos centros de deci- vênios com empresas médicas de
mal a pior. são sobre questões relacionadas com a grupo, cujo pagamento é descontado
saúde. Em 26 de novembro daquele do que a empresa contratante deve à
ano, o então ministro do Trabalho, Luis Previdência Social, podendo ainda ser
Gonzaga do Nascimento e Silva, sus- deduzido do Imposto de Renda. Trata-
pendeu, por um decreto, a representa- se de um excelente negócio, não ape-
A morte prematura não é o único ção paritária de empregados e empre- nas pelos descontos dos impostos, mas
sintoma de agravamento da saúde dos gadores na direção dos institutos de também pelo maior controle que as
brasileiros. Para onde quer que se previdência social. No mesmo dia, o empresas passam a ter sobre os assala-
apontassem os medidores de saúde no governo autorizou a transferência para riados. A observação do trabalho das
Paísseriam desgobertos dados chocan- as empresas da tarefa de assistência empresas de medicina revela que se-
tes. Durante o XXI Congresso Brasi- médica dos empregados. Era a oficiali- guem rigidamente as orientações de
leiro da Sociedade de Medicina Tropi- zação de um sistema que já vinha seus contratantes e não dos usuários
cal, realizado em fevereiro de 1985, em sendo incentivado desde 1964, quando dos serviços. Os médicos, por exemplo,
São Paulo, um grupo de médicos sani- a Volkswagen começou a utilizá-lo. são orientados para reduzirem as au-
L
taristas revelou que a malária, quase
banida do País em 1950, ressurgiu com
impressionante vigor. O número de ca- 0 surto das cesarianas
sos passou de 52 mil em 1970 para 342
mil em 1984. O calazar, ou leishma- Nos hospitais particulares conveniados com o INAMPS a incidência de
niose visceral, doença também transmi- cesarianas no total dos partos realizados saltou de 14,6%, em 1970,
tida por mosquitos e sob controle até para 31% em 1980. Na Holanda, por exemplo, nesse mesmo ano, a
1964, reapareceu. Em 1984 foram diag- taxa era de 1,5%.
nosticados 1.500 casos dessa doença,
que pode ser fatal. Dez milhões de pes- Evolução da participação das cesarianas no total de partos realizados em hospitais
soas eram afetadas pela doença de contratados do INAMPS, em % (1970-80).
Chagas e outro tanto pela esquistosso-
31,0%
mose. Doenças típicas de regiões sub-
desenvolvidas, com populações subnu-
tridas e pouca resistência, também se
alastravam,como a tuberculose e a han-
seniase. O número de pessoas infecta-
das pelo bacilo da tuberculose ultrapas-
sava 40 milhões e os casos notificados
aumentavam numa escalada de cerca de
90 mil por ano. Oficialmente, em 1984
havia 200 mil pessoas com hanseniase
e o número de novas vítimas era de 15
mil por ano.
O rosário de cifras trágicas é longo.
Desfiá-lo é como cutucar uma chaga
que cresce sem parar, apesar da quanti-
1970 72 74 76 78 1980
dade cada vez maior de medicamentos
que lhe aplicam. Para resolver os pro-
blemas de saúde no País foi montada ANO TOTAL DE PARTOS CESARIANAS
uma estrutura de serviços que, basica-
mente, procurou curar os brasileiros
depois que eles adoeciam, em lugar de 1970 602.108 88.115
prevenir as doenças. E o pior é que es- 1971 700.682 110517
1972 766.707 131.150
ses serviços eram inadequados à maio-
1973 796.069 148.154
ria da população, pois eram dominados 1974 874.665 177.050
por empresas privadas, interessadas so- 1975 1.021.904 235.898
mente em aumentar seus lucros. Isso 1976 1211159 305.164
gerou graves distorções, como a con- 1977 1.376.307 354.869
centração de leitos hospitalares em re- 1978 1.379.230 378.586
giões mais ricas. O Sudeste, por exem- 1979 1.490.860 446.185
1980 1591716 493.436
plo, tinha uma taxa de leitos hospitala-
res por habitante duas vezes superior à
taxa do pobre Nordeste. "Os atuais ser-
'Fonte: Landmann, Jayme, A Outra Face da Medicina, Salamandra, Rio de Janeiro, 1984.
viços dificilmente alcançam os que
494
er BAETS s3 an cos , o 238

2
E
-i

Rosa Gauditano/Banco de Dados - FSP


1
2
33

O ministro Arcoverde sabia que 308 mil


crianças com menos de 12 meses
morreriam em 84, o que indicava a
falência do sistema de saúde do regime. A
esq., atendimento no Hospital Emílio
Ribas, SP, durante epidemia de sarampo
(jul.-ago./84) que fez dezenas de vítimas

sências ao trabalho com rígido controle uma conferência que fez -no Conselho comprava de particulares, segundo o
do fornecimento de atestados de Regional de Medicina, Landmann foi dr. Elio Fiszbejn, ex-presidente do Sin-
doença. Outro recurso é a redução dos interrompido por um médico, dono de dicato dos Médicos de São Paulo, 300
períodos de licença para convalescença empresas, que contra-argumentou: "Se mil leitos e oferecia na rede pública
de doenças mais graves. Nos exames o médico não fiscalizar o ausentismo, o apenas 7.800. O governo deixava seus
pré-admissionais, descartam os candi- trabalhador invocará a doença para ir hospitais à mingua e encaminhava os
datos portadores de doenças crônicas, pescar ou cuidar de outros interesses." pacientes para os hospitais particulares
os que estão saindo de uma convales- A resposta de Landmann foi fulmi- conveniados. No final de 1984, a capa-
cença prolongada, as mulheres grávi- nante: "Não é função do médico impe- cidade ociosa dos hospitais da rede pú-
das e até mesmo os que revelam a exis- dir o operário de pescar ou divertir-se, blica em São Paulo atingia 50%.
tência, na família, de filhos ou esposas ainda mais que existem profundas ra- O volume crescente de dinheiro pú-
com problemas de saúde. "Tudo isso 2des sociais para o ausentismo." blico que jorrou, sem controle, na dire-
recomenda imediatamente que esse in- ção das empresas privadas causou uma
feliz não tenha o emprego", denun- incontrolável febre de corrupção. Em
ciava, em 1982, o secretário-geral do 1981, o INAMPS constatou que 90%
Sindicato dos Metalúrgicos de São das contas apresentadas pelos hospitais
Paulo, Clemitre Guedes da Silva, du- Calcula-se que atualmente as malhas apresentavam irregularidades. As frau-
rante o III Simpósio sobre Política Na- das empresas médicas de grupo já te- des mais comuns eram contas de pa-
cional de Saúde, na Câmara dos De- nham atingido quase 30% dos trabalha- cientes fantasmas e de exames não rea-
putados. dores no Estado de São Paulo, Mas não lizados. Nos primeiros meses de 1985,
Além de exercerem uma função re- foi somente através dessas empresas foram descobertas irregularidades se-
pressora, segundo Guedes da Silva, as que o governo se desobrigou de suas ta- melhantes em 33 hospitais de São
empresas de medicina de grupo pres- refas, repassando dinheiro público aos Paulo, havendo, em todos os casos,
tam serviços de péssima qualidade. Em empresários. Outra de suas fórmulas de participação na fraude de funcionários
busca da redução de custos, os donos sucesso foi aumentar a contratação de do INAMPS.
destas empresas obrigam os médicos a serviços particulares para atendimento O estímulo à corrupção é um duplo
solicitar o mínimo de exames comple- dos trabalhadores previdenciários. O ataque à já combalida saúde dos traba-
mentares para a formulação de um Plano de Pronta Ação da Previdência lhadores. Em primeiro lugar, porque o
diagnóstico, O encaminhamento a ou- (PPA), lançado em 1974, logo após a dinheiro que sustenta a orgia dos em-
tro médico especializado também é criação do Ministério da Previdência e presários sai de seu bolso, feito uma he-
controlado. Assistência Social, recomendava que o morragia. E, em segundo, porque é
Por causa dessas atitudes, as empre- número de hospitais da rede pública obrigado a sujeitar-se a um atendi-
sas de medicina têm sido bombardea- não fosse ampliado, enquanto os exis- mento de baixa qualidade: É tratado
das pelas criticas de médicos preocupa- tentes deveriam ser paulatinamente pri- como uma peça insignificante numa
dos com a saúde dos trabalhadores, vatizados. Essa política foi seguida à imensa máquina de fazer dinheiro.
como o cirurgião Jayme Landmann, do risca. Em 1981, do total de recursos Como, até 1983, o pagamento aos labo-
Rio de Janeiro. Em seu livro Evitando a destinados à assistência médica e previ- ratórios e hospitais era feito em cada
Saúde e Promovendo a Doença, editado dência social no País, 72% iam parar "ato médico", tentava-se efetuar nos
em 1982, Landmann é categórico: "Es- nas mãos dos empresários da saúde, pacientes a maior quantidade de
tas empresas constituem um elemento vendedores de serviços ao governo. "atos". A preferência recaia sobre os
nocivo ao sistema de saúde." No ano Ainda naquele ano, o Instituto Nacio- exames mais sofisticados, cirurgias e in-
seguinte, ao denunciar a ação perni- nal de Assistência Médica da Previdên- ternações, que rendiam mais, pela ta-
ciosa da medicina de grupo, durante cia Social (INAMPS), criado em 1977, bela do INAMPS. Resulta dessa época,
495
aR'oFAN'ÉÉÉVÉmeÉXlrQZJ 1333 an coa, p 239

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Fernando Pimentel/Abril Press


Enquanto a maior parte da população
tinha um péssimo atendimento (acima,
sala de espera de Hospital das Clínicas,
SP);GPaís tinha, em 84, 60 tomógrafos -
o suficiente para atender 300 milhõe
de pessoas

por exemplo, enorme quantidade de INAMPS gasta mais por ano do que o mento de água e esgotos também é fun-
cesarianas feitas desnecessariamente. Ministério da Saúde em seus progra- damental. No Brasil, a rede de abaste-
Em 1970, a incidência de cesáreas nos mas de suplementação alimentar ma- cimento de água ainda não chegava,
hospitais particulares conveniados do terno-infantil e de interiorização da em 1983, a 65% dos domicílios. A rede
Rio de Janeiro já era 100% maior que medicina. de esgotos atingia apenas 30% dos do-
nos hospitais próprios do INAMPS. A ênfase à medicina curativa, num micílios brasileiros.
Naquele mesmo ano, de cada 100 nas- país pobre como o Brasil, é a prova O modelo de desenvolvimento do
cimento no País, 14 se deram por cesa- mais evidente de que, ao examinarem o País, que se baseia na exploração pre-
riana. Dez anos depois, em 1980, a inci- paciente, os responsáveis pela política datória da força de trabalho, também
dência já era de 31 em cada 100. En- de saúde fecharam sua boca e viraram- propiciou o surgimento de locais de
quanto isso, na Holanda, também em lhe as costas. Resultado: o remédio re- trabalho que são. verdadeiras fábricas
1980, os bebês nascidos de cesárea ceitado não faz efeito. Em meados de de doenças; e fechou os olhos para a
eram somente 2 em cada 100. 1984, quando se registrou em São deterioração do ambiente. Em 1976, ao
Para executar a sangria dos cofres Paulo uma epidemia de sarampo, as fazer uma avaliação dos serviços de
públicos com maior eficiência, as em- crianças eram internadas em hospitais saúde no Brasil, publicada na revista
presas médicas equiparam-se com as que dispunham de alta tecnologia, in- Proposta, o médico Sérgio Goes frisava
máquinas mais sofisticadas do mundo. clusive na periferia da cidade. Mas que a melhoria dos padrões de saúde
O médico Élio Fiszbejn revelava, em morriam porque eram subnutridas; As estava profundamente vinculada a uma
1984, que a quantidade de tomográfos possibilidades de a criança subnutrida melhoria geral na vida dos trabalhado-
- equipamentos de raios X com com- ser abatida pelo sarampo são 400 vezes res. "A saúde das pessoas depende, em
putadores e dispositivos de televisão - maiores que as da criança bem alimen- primeiro lugar, de como elas ganham a
existente no País era muito superior às tada. Apenas em julho e agosto da- vida, como trabalham, o que comem,
necessidades. Os 60 tomógrafos - con- quele ano morreram de sarampo mais quanto ganham, em que gastam o seu
centrados principalmente no eixo Rio- de 100 crianças em São Paulo. No Bra- dinheiro e onde moram", dizia Sérgio
São Paulo - dariam para atender a sil, onde a desnutrição atinge 12 mi- Goes.
uma população de 300 milhões de pes- lhões de crianças entre um e seis anos O descaso pelas causas sócio-e-
soas. "Veja o que se investiu à toa", di- de idade, o sarampo mata dez mil por conômicas da morbidade e da morta-
zia o médico. ano. lidade é estimulado a partir das esco-
A corrupção é um terrível efeito co- las de medicina, onde os currículos, ba-
lateral da privatização da medicina. O seados em padrões norte-americanos,
principal e o mais perverso desses efei- privilegiam a especialização. Isso ajuda
tos, porém, é a ênfase dada à medicina a explicar o fato de haver no País, em
curativa, em detrimento do trabalho O técnico Eduardo Bustello acredi- 1982, o dobro de cardiologistas em re-
preventivo. O Ministério da Saúde - ao tava que o número de mortes infantis lação aos cirurgiões gerais. Segundo o
qual o Sistema Nacional de Saúde, or- poderia ser reduzido à metade, se cui- médico Élio Fiszbejn, as escolas privile-
ganizado em 1975, atribuiu oficial- dados básicos fossem tomados. Basta- giam o aprendizado das doenças com-
mente o encargo de cuidar da preven- vam coisas simples, como o acompa- plicadas, dando pouca ênfase a alguns
ção de doenças - recebe recursos que nhamento médico às mulheres grávi- dos mais importantes aspectos da medi-
não chegam a 10% do total destinado à cas, em ambulatórios. cina, como o aleitamento materno. Es-
Previdência, encarregada da parte cu- No final de 1984, 25% das mulheres sas escolas refletem o sistema de servi-
rativa, segundo o médico Jayme Land- grávidas do País não tinham nenhum ços de saúde do País, que, na definição
mann. Em dois procedimentos médicos tipo de acompanhamento médico. Na do médico Carlos Gentile de Mello, é
que utilizam alta tecnologia e servem zona rural, 51% davam à luz sem ver o "caótico, elitista, corruptor, irracional
no máximo 20 mil pacientes (as pon- médico durante toda a gravidez. e incontrolável". P
tes de safena e as hemodiálises), o A melhoria dos serviços de abasteci- Roldão Arruda
496
BR Vá,GNÇG,A 32 ân 00a, p240
AA.
Aga) 1a «se: m ';“? «

etc. Ao ser instalada a indústria auto-


mobilística no Brasil, a partir da se-
gunda metade dos anos 50, o "rodovia-
rismo" ganhou novo impulso, liqui-
dando definitivamente as ferrovias. _
Durante o período de predomínio in-
glês, as ferrovias brasileiras foram cons-
truídas quase exclusivamente para fa-
zer escoar produtos primários exportá-
veis. Nas ferrovias do Oeste paulista,
por exemplo, os vagões iam vazios para
o Interior, para voltarem carregados de
café. O resultado é que as ferrovias fo-
ram acumulando déficits enormes, ban-
cados pelo Tesouro nacional, a despeito
de a maioria dêlas ser de propriedade
de empresas estrangeiras.

Biblioteca Na:
Foi tambem a partir dos anos 40 que
o Estado passou a encampar as ferro-
vias de capital privado. O caso da en-
campação da São Paulo Railway (de-
Sob o domínio econômico inglês, ferrovias como a E. F. Oeste de Minas (acima, foto de poischamada Estrada de Ferro Santos
1881) foram construídas para escoamento de produtos primários a Jundiai), em 1946, ilustra muito bem a
guinada em direção. ao rodoviarismo.
ECONOMIA/TRANSPORTES: a estrutura de transportes no Brasil Sofrendo a concorrência da Via An-
chieta (que liga São Paulo a Santos), a
mm
B ferrovia estava praticamente liquidada.
ea

Necessitava de carissimas reformas no


traçado e no conjunto de suas composi-
ções, e estava na iminência de perder
mais de 25%, em peso, da carga que en-
Ao contrário dos países desenvolvidos, o Brasil diminuiu tão transportava, diante da instalação
ferrovias e não aproveitou hidrovias. Em 1984, transportava de um novo oleoduto ligando aquelas
duas cidades. No entanto, o governo fe-
75% de suas cargas por estradas de rodagem deral aceitou como preço de indeniza-
ção o capital nominal da empresa - e
Quando se analisa a situação dos de abastecer uma vigorosa malha ferro- não o. "termo médio do rendimento li-
transportes em nível mundial, o fato viária, de construção facilitada pela au- quido dos últimos cinco anos", como
mais evidente é que o transporte rodo- sência de grandes barreiras montanho- estabelecia o contrato de concessão - e
viário não é preponderante em nenhum sas. abriu mão de terrenos e imóveis situa-
país desenvolvido. Mesmo nos Estados A despeito dessas características, en- dos em áreas grandemente valorizadas.
Unidos, o "reino" da indústria automo- tre os anos 40 e o final da década de 70, Evidentemente, péssimos "negó-
bilística, as rodovias não respondem a rede rodoviária evoluiu de 185 mil cios" como esse e a manutenção pre-
por mais do que 25% de toda a carga quilômetros de extensão para cerca de cária das ferrovias encampadas acaba-
transportada através do país. No Brasil, 1,5 milhão de quilômetros. No mesmo ram por favorecer uma verdadeira
entretanto, o quadro é diferente: mais período, as ferrovias tinham suas linhas campanha contra essa modalidade de
de 70% de toda a carga que circula in- reduzidas de 38 mil quilômetros para transporte. Os argumentos centrais
ternamente segue em caminhões, en- pouco mais de 30 mil quilômetros, eram os déficits e as enormes despesas
quanto os ônibus carregam 94% dos sendo apenas 10% eletrificados. com pessoal (os antigos funcionários
passageiros transportados. Está na história do Brasil a explica- passavam a ter os mesmos direitos do
Um paradoxo evidente, pois é do co- ção para esse paradoxo,. Até os anos 30, funcionalismo público). Mas as críticas
nhecimento de todos os especialistas 0 País estava sob a influência predomi- tiveram origem quando o transporte ro-
que para o transporte de uma certa nante da Inglaterra, então grande ex- doviário começou a tomar impulso, e
quantidade de carga o custo por navio portadora de carvão, trilhos, locomoti- progrediram num crescendo a partir da
é igual a 100; o custo por trem, igual a vas, vagões e capitais interessados em implantação da indústria automobilis-
300; por caminhão, igual a 900; por ferrovias. Nessa época, o Brasil desen- tica, nos anos 50. Baseando-se em que
avião, 1.500, Pela lógica, portanto, o volveu extensa rede ferroviária, ainda as ferrovias estavam em péssimo es-
Brasil deveria ter uma estrutura de que em condições técnicas antieconô- tado, a propaganda rodoviarista conde-
transporte completamente diversa da micas. nava, em conjunto, todo o transporte
que tem de fato. Afinal, a população A partir da Segunda Grande Guerra, ferroviário, como se já não houvesse
brasileira está agrupada em áreas dis- no entanto, quando a influência dos mais lugar para ele na história. A reali-
tantes, principalmente ao longo de ex- EUA passou a ser preponderante, o dade, porém, é que já não havia mais o
tenso litoral (mais de seis mil quilôme- País começou a abandonar as ferrovias que transportar pelas ferrovias nas z0-
tros), ou espalhada por um imenso ter- e a desenvolver rodovias. "Coinciden- nas servidas pela maior parte das linhas
ritório penetrado por grandes rios. Es- temente", os EUA eram exportadores construídas no passado. Além disso,
tes, além do potencial como vias de não de carvão, mas de petróleo; não de onde elas poderiam ainda ter algum pc-
transporte, são importantes fontes de vagões e locomotivas, mas de automó- tencial econômico, sofriam a concor-
energia hidrelétrica, capazes, portanto, veis, peças sobressalentes, acessórios, rência das estradas de rodagem, em ge-

497
er pranBsa VB.GNCAMA, 2404 4223 p 244

ral construídas em traçados paralelos às


ferrovias.
A grande verdade, porém, é que as
ferrovias foram sendo encampadas jus-
tamente porque se foram tornando de-
ficitárias, e as que já pertenciam ao Es-
tado foram tratadas como empresas se-
cundárias, que deveriam dar lucros por
mágica, já que os investimentos foram
minguando, em favor das rodovias, es-
pecialmente a partir dos anos 60. Entre
1960 e 70, os investimentos em ferro-
vias cairam de 38,7%, do total dos in-
vestimentos em transportes, para 20%,
enquanto os investimentos em rodovias
subiram de 29,2% para 56,9%.

Arquivo Nacional
Agência Estado
&voLW Y1

Assim, a conclusão mais lógica é a


de que parece ter existido o propósito
de retirar do parque ferroviário a capa-
cidade de concorrência com as rodo-
vias. O próprio Plano de Metas do go-
verno Juscelino Kubitschek (195661)
tentaria ampliar a fronteira agricola do
País através de rodovias de penetração,
enquanto o programa ferroviário se
destinava apenas a fazer alguns acertos
no sistema já existente. Foi nesse
período que se iniciaram as constru-
ções de rodovias como a Rio-Bahia e a
Belém-Brasília. Segundo o economista
José Carlos Braga, ficava claro o papel
secundário das ferrovias no Plano de
Metas: até 1960, foram adquiridos ape-
nas 59% do número de vagões progra-

lugo Koyama/Abril Press


mados; na reparação da via perma-
nente, cerca de 80% da meta foram
cumpridos, enquanto a rede se expan-
dia em apenas, 3,1%, quando o previsto
eram 4,4%. "Já a performance do pro-
grama rodoviário foi espetacular",
afirma Braga em seu trabalho "Os
transportes na política econômica: Bra-
sil 1956/1979". Entre 1955 e 60, as rodo-
vias federais e estaduais cresceram
47,7%. No mesmo período, foram cons-
truídos 12.169 quilômetros de estradas
federais e pavimentados outros 7.215
quilômetros.
Esse "modelo rodoviarista" seria
aprofundado a partir de 1964, com a
implantação do Regime Militar. O Pro-
grama de Ação Econômica do Go-
verno (PAEG), estabelecido pelo presi-
dente Castelo Branco (1964-67), identi-
ficava no setor ferroviário um dos focos
Irmo Celso/Abril Press

de déficit público, o que implicava na


emissão de papel-moeda e, portanto,
seria uma das causas da inflação. As-
sim, o PAEG recomendava uma polí-
tica tarifária mais realista e a limitação
de novas construções no setor ferro-
viário. Durante o celebrado "milagre Após 1964, aprofunda-se o modelo rodoviarista e são construidas obras de grandeza
econômico" (1968-73), o território seria propagandística, como a Transamazônica (no alto, à esq.), a ponte Rio-Niterói (à
rasgado por rodovias com notória gran- dir.), a Transpantaneira (ao centro) e a rodovia dos Imigrantes (embaixo)
498
*
Keiju Kobayashi Abril Press
a

Agência Estado
Para escoar minérios para exportação, o Regime Militar iniciou duas grandesferrovias: Carajás (à esq., a inauguração em 85) e a
Ferrovia do Aço(à dir.,em obras, 76), cujo orçamento inicial, de 1,8 bilhão de dólares, foi reavaliado em 3,6 bilhões dedólares em 79

diloquência propagandística, como a lentamente ainda no início de 1985. trangulou decisivamente, o governo
Transamazônica. Seus custos, inicialmente previstos em passou a usar parcelas crescentes da
A crise do petróleo, desencadeada a 1,8 bilhão de dólares, seriam reavalia- taxa sobre os fretes de importação para
partir de 1973, e a perspectiva de desa- dos em 3,6 bilhões de dólares, em 1979. rolar a dívida externa, secando, assim, a
celeração econômica em função das Mesmo assim, a construção prosseguiu, principal fonte de financiamentos e
crescentes dificuldades no balanço de tropeçando na falta de verbas determi- subsídios dos estaleiros do Brasil. Estes,
pagamentos, imporiam, a partir de nada pela política de "desaqueci- sem condições de competir em preços
1974, a necessidade de se pensar em mento" da economia. com os concorrentes estrangeiros, fo-
mudanças na estrutura de consumo de ram perdendo encomendas e acumu-
combustíveis no País. O II Plano Na- lando dívidas, No início de 1985, sete
cional de Desenvolvimento, elaborado estaleiros negociavam uma dívida de
no governo Geisel (1974-79), admitia 546 milhões de dólares, contraída em
dar atenção à eletrificação de ferrovias Os investimentos no transporte hi- bancos nacionais e estrangeiros com
e deslocar o transporte de grandes mas- droviário serviriam, fundamental- duvidoso aval da SUNAMAM ,. Apenas '
sas nas cidades para sistemas ferro- mente, para a ampliação da frota mari- um deles, e o maior, o estaleiro Mauá,
hidroviários. Quanto às rodovias, o tima, através de um programa da Supe- devia 291 milhões de dólares, o que le-
plano previa apenas a pavimentação da rintendência Nacional da Marinha vou ao suicídio seu proprietário, Paulo
rede existente, em lugar de novas cons- Mercante (SUNAMAM), com o obje- Ferraz.
truções. " tivo de melhorar a posição brasileira No campo da indústria de equipa-
Já estava claro que, para saldar os nos fretes internacionais e, com isso, mentos ferroviários, em 1981, a capaci-
pesados compromissos da dívida ex- aliviar o balanço de pagamentos. Além dade instalada de produção era de 200
terna, o País teria que apostar num disso, em meados da década passada, o locomotivas, mas a produção efetiva no
grande aumento de suas exportações. governo passou a cobrar uma taxa de primeiro semestre não ultrapassara 11
Para tanto, seria expandida a frota 20% sobre os fretes de importação, des- unidades; e a produção mensal de va-
marítima e fluvial, construídos novos tinada à SUNAMAM, que deveria usar gões estava em torno de dez unidades,
portos nas saídas dos chamados corre- esse dinheiro para cobrir a diferença de enquanto a capacidade instalada era de
dores de exportação e reequipados os preço entre os navios produzidos no 750 unidades por mês. Nesse mesmo
portos mais importantes já existentes. Brasil e os produzidos nos grandes esta- ano, a MAFERSA (Material Ferro-
Foi dentro dessa política que se ini- leiros do Exterior. viário S.A.), sob controle acionário do
ciaram as construções das duas únicas Essa facilidade e outras fizeram cres- BNDE, demitia mais de dois mil em-
ferrovias de porte no período do Re- cer as encomendas e os estaleiros no pregados. E José Burlamaque de An-
gime Militar: a Ferrovia do Aço, para Brasil investiram pesado. Em 1981, o drade, presidente da Fábrica Nacional
escoar minérios de ferro de Minas Ge- País era o segundo fabricante mundial de Vagões, explicava à Gazeta Mercantil
rais para o porto de Sepetiba, no Rio de navios, responsável por 5,5% da pro- (19/6/81) as razões da maior crise já vi-
de Janeiro; e a Estrada de Ferro Cara- dução (o Japão estava em primeiro lu- vida pelo setor: "As nossas estradas de
jás, inaugurada no início de 1985, li- gar, com 46,5%da produção). Esse es- ferro cairam no abandono, mesmo de-
gando a riquíssima província mineral forço, entretanto, não representou uma pois da crise do petróleo, época em que
da serra dos Carajás, no Pará, ao litoral ampliação do transporte hidroviário in- ampliamos nossas fábricas, na certeza
do Maranhão. A Ferrovia do Aço, terno, cujos recursos permaneceram de que as encomendas fatalmente te-
anunciada em 1975 pelo presidente Gei- insignificantes. riam de vir em grande número." Entre-
sel como a "obra do século", seria, no A aventura naval teria, isto sim, fim tanto, a política de desaceleração da
entanto, um dos maiores fracassos. Sua trágico. Se, em 1975, a diferença entre economia resultou em drásticos cortes
construção foi conturbada por erros de os custos dos navios produzidos no nos investimentos estatais; as encomen-
planejamento e dimensionamento eco- Brasil e no Exterior estava em torno das sonhadas por Burlamaque de An-
nômico tão grotescos que, prevista dos 35%, em 1983 já havia alcançado drade não vieram e a indústria se viu
para ser "a ferrovia dos mil dias" 47%. Quando, a partir de 1982, a ba- obrigada a diversificar sua produção,
(pouco mais de três anos), arrastava-se lança de pagamentos do Brasil se es- em direção ao setor automobilístico.
499

Br 2404/23an Cop
ar pranBSa 331 an (oa, p24s

Iconographia
Participantes do levante liderado pelo coronel Cardim (ao lado), RS, mar./65

POLÍTICA/LUTAS POPULARES: a reação armada ao Regime Militar

Diversos grupos reagiram pelas armas aos governos militares.

Iconographia
A mais expressiva guerrilha, a do Araguaia, enfrentou o
Exército por dois anos, no período 1972-74

Em 26 de março de 1965 aconteceu a desencantando setores que o haviam ria militares cassados, ligados ao movi-
primeira tentativa de reação armada apoiado. Quanto mais se evidenciava mento dos sargentos, ativo antes do
organizada contra o governo imposto que o uso da força por parte dos milita- golpe.
pelo golpe militar de 1964. Naquele dia, res, em todos os aspectos, não era for- Políticos do Partido Socialista Brasi-
com não mais de 30 homens, o coronel tuito, mais ficava claro, na concepção leiro (PSB), então já extinto pelo re-
Jefferson Cardim de Alencar Osório, de alguns grupos políticos, que à vio- gime, apoiaram a guerrilha de Caparaó.
um dos muitos militares progressistas lência do regime teria de se contrapor a Leonel Brizola também apoiou o movi-
perseguidos pelo novo poder, tomou a "violência revolucionária". mento, embora sua participação não
cidade de Três Passos, no Rio Grande O exemplo da revolução cubana - estivesse ainda perfeitamente expli-
do Sul, cumprindo o plano que come- comandada por um grupo de guerri- cada. "No caso da guerrilha de Capa-
çou a ser elaborado em Montevidéu, lheiros revolucionários que tinha suas raó, tive a oportunidade de colaborar
onde o coronel estava exilado. Cardim bases nas montanhas e desceu às cida- com o que estava a meu alcance", disse
atravessou a fronteira com quatro ho- des para tomá-las, com apoio popular ele à imprensa após a Anistia.
mens, cruzou uma parte do território - e das lutas guerrilheiras em alguns
gaúcho e conseguiu algumas adesões. países da América Latina davam alento
Houve alguma luta na tomada de Três à organização de algumas outras ações
Passos (um sargento do Exército mor- no Brasil. A medida que o governo ia
reu), mas não veio, entretanto, o so- fechando os canais políticos - editara o O comandante militar do MNR era
nhado apoio popular. Três dias depois, Ato Institucional no 2, a 27 de outubro o ex-sargento Amadeu Felipe da Luz
o movimento seria derrotado, com os de 1965; tratava reivindicações dos es- Ferreira; e o líder político nacional era
líderes presos pelo Exército. Mais do tudantes e setores democráticos com o professor e ex-presidente do PSB
que um sonho, a aventura do coronel truculência; e mostrava sua face pró- Bayard De Maria Boiteaux. O MNR
foi um erro grave de cálculo político. americana -, parcelas da oposição chegou a tirar um número do primeiro
Os militares que tomaram o poder esta- mais se convenciam de que a luta ar- jornal clandestino dos movimentos ar-
vam avançando ainda, e já estava em mada era a única solução para o fim do mados pós-64, O Levante, mas a guerri-
pleno curso uma efetiva reestruturação regime, lha não passou da fase de treinamento,
dos órgãos de repressão. No plano ideológico, a luta armada Em março de 1967, o Exército, a
Os movimentos que poderiam tentar teve duas vertentes. Uma, de conteúdo Força Aérea (FAB) e a Polícia Militar
alguma resistência armada - como as nacionalista, não comunista e bastante mineira, numa operação que durou
ligas camponesas ou os "grupos de 11" difusa. E outra, mais à esquerda, desen- 13 dias e empregou seis mil homens,
do ex-governador do Rio Grande do volvida por organizações comunistas, com o uso de dezenas de aviões e heli-
Sul, Leonel Brizola - foram logo domi- A primeira ação um pouco mais du- cópteros, desmantelaram a tentativa,
nados. Nos quartéis, a ala progressista e radoura, depois da tentativa do coronel prendendo oito dos 14 guerrilheiros.
nacionalista foi imediatamente expur- Jefferson Cardim Osório, foi a cha- Pelo menos uma morte foi registrada, a
gada. Em alguns pontos do País onde mada guerrilha de Caparaó, organizada do guerrilheiro Milton Soares de Cas-
militantes da esquerda tentaram ações pelo Movimento Nacionalista Revolu- tro. A versão oficial é de que ele se sui-
de resistência, elas mal chegaram a se cionário (MNR). Ela começou em 26 cidou na prisão, mas sobreviventes afir-
concretizar. de novembro de 1966, na área da serra mam que ele foi vítima de torturas. O
A medida que mostrava sua verda- de Caparaó, entre as divisas do Espirito comandante militar que combateu a
deira face, bem diferente dos apregoa- Santo e Minas Gerais, com a participa- tentativa guerrilheira, major Ralph
dos "ideais democráticos", o regime ia ção de não mais de 20 homens, a maio- Grunewald Filho, assumiu parte da res-
500 ,
"er 2nCOA p 244

"* Carlos Lamarca (à esq.) comandou 17 guerrilheiros no Vale do


Ribeira, São Paulo, combatidos pelo Exército, numa operação de
grandes proporções (à dir., tropas em Registro, SP, 70). Sena morto
& em 1971, no interior da Bahza

ponsabilidade pela morte de Milton, ser a norma nos órgãos da repressão. propriar o dinheiro dos burgueses as-
reconhecendo que ele ficou "muito Apesar do ascenso de passeatas estu- saltar quartéis militares, justiçar crimi-
abalado" com os interrogatórios. dantis e greves operárias, em 1968, o nosos, elementos da CIA; e lutar cons-
A luta armada dirigida por organiza- movimento democrático-popular fora tantemente, em todos os terrenos, con-
ções comunistas, ou assim considera- temporariamente derrotado pela vio- tra o inimigo imperialista e os que no
das, tem uma história mais sólida. Sua lência. O Congresso de Ibiúna, da Brasil estão a seu serviço. A luta ar-
origem mais próxima está nos "rachas" União Nacional dos Estudantes (UNE), mada é isso: não deixar o inimigo tran-
ocorridos em três organizações: o Par- que se realizava clandestinamente, foi qúilo em nenhum lugar. Este é o ABC
tido Comunista Brasileiro (PCB), o desbaratado pela polícia. E a ação ar- da subversão."
Partido Comunista do Brasil (PC do B) mada dos vários grupos da esquerda - Em janeiro de 1968, ocorre o pri-
e a Política Operária (POLOP). Do em cuja composição, de modo geral, meiro assalto a banco, numa agência
PCB, por discordarem de sua linha pa- pesava muito a presença dos setores do Bradesco, em São Paulo. Em junho
cifista, sairam grupos como a Ação Li- médios da sociedade - pareceu assim do mesmo ano, uma ação mais espeta-
bertadora Nacional (ALN), o Movi- um dos caminhos mais lógicos para se cular: um comando da VPR apodera-se
mento Revolucionário 8 de Outubro contrapor ao regime. Alguns dos gru- de dez fuzis modelo FAL do Hospital
(MR-8) e o Partido Comunista Brasi- pos apostaram na guerrilha urbana, ou- Militar do Cambuci, em São Paulo. In-
leiro Revolucionário (PCBR). Do PC tros na guerrilha rural ou em formas dignado, o então comandante do II
- do B, ele próprio favorável à luta ar- combinadas dos dois métodos de luta. Exército, general Manoel Rodrigues
mada, sairam a Ala Vermelha e o Mo- Carvalho Lisboa, faz um desafio: se os
vimento Revolucionário Tiradentes guerrilheiros entraram no hospital, não
(MRT). Da POLOP, surgiram os gru- conseguiriam fazer nada contra o quar-
pos Comando de Libertação Nacional tel sob seu comando. Quatro dias de-
(COLINA) e Vanguarda Popular Revo- Outubro de 1967. Uma bomba de fa- pois, um carro-bomba é jogado contra
lucionária (VPR). Existiram ainda a bricação caseira explode na casa da fi- o quartel do II Exército. Um soldado,
Vanguarda Armada Revolucionária lha do governador de São Paulo, Abreu Mário Kosel Filho,morreu na explosão.
(VAR) Palmares, a Ação Popular Sodré. É a primeira açaoconhecida da Carlos Marighela foi um dos dirigen-
Marxista-Leninista (APML) e o Par- guerrilha urbana, mas não teve reper- tes mais importantes desta fase. Ex-
tido Operário Revolucionário. Essas cussão mais séria. Um de seus partici- dirigente nacional do PCB, deputado
organizações,no geral, com conteúdo e pantes, Pedro Lobo de Oliveira, da constituinte em 1946, rompeu com o
métodos diferentes, optaram pelas ar- VPR, conta a experiência no livro A Es- partido e fundou a ALN. Marighela foi
mas como forma de resistência ao Re- querda Armada no Brasil. Ele diz; "Não um dos grandes teóricos e práticos da
gime Militar. existem vias pacíficas para derrubar a luta armada no Brasil. Ficou famoso o
A intensificação da luta armada ditadura brasileira. Sem eleições, com documento que escreveu em dezembro
ocorreu entre 1968 e 1974, com mo- os sindicatos de trabalhadores fecha- de 1968, "Quem samba fica, quem não
mentos de avanço e de refluxo. Mas se dos, os camponeses famintos, o povo samba vai embora", que diz, dirigindo-
acentuou a partir de 1969, quando o re- massacrado pela repressão, a única via se aos revolucionários de São Paulo:
gime apelou para o governo à base do possível para a hbcrcaçao é a luta ar- "Não devemos dar trégua. Cada dia
terror político. Já havia sido editado o mada, E o que é fazer luta armada? É uma ação pequena e de vez em quando
AI-5 e o Congresso entrara em recesso. fazer a revolução; é realizar ações ar- as grandes. Vocês têm carta branca na
A tortura aos presos políticos passou a madas contra o inimigo de classe, ex- frente guerrilheira para desencadear a
501
pr oranBSBYSLGNÇAMME404 1334 ancoa, p 245

ação. Só não têm carta branca para da ALN, Virgílio Gomes da Silva, o
coisas burocráticas, isto é, para impedir "Jonas", chefe do grupo que segues-
ações planejadas pelos grupos, sejam trou o embaixador americano, é preso
eles quais forem. Nem podem fazer dis- e morto sob torturas. Mas as ações
cussões formais. É preciso ação e mais continuam. Em 1970 são sequestrados
ação. Distribuir manifestos, pintar mu- o embaixador da Suíça, Giovanni En-
ros, sabotar, fazer política de terra arra- rico Bucher; o embaixador da
sada, tudo isto com o trabuco na cin- Alemanha, Ebhrenfried von Holleben,
tura. Ninguém deve se deixar prender e o cônsul japonês Nobuo Okushi.
sem resistência. Por isso deve andar ar- O governo, no entanto, vai conse-
mado. E atirar para matar policiais e guindo controlar a situação. Joaquim
dedos-duros. A ditadura tem medo e Câmara Ferreira, outro importante di-
nós não vamos parar nem sair do ritmo rigente da ALN, é morto sob torturas,
porque os fascistas deram um golpe em outubro de 1970. Nas cidades, as
dentro do golpe." ações guerrilheiras continuam até 1972,
Pouco antes, em outubro de 1968, mas já em refluxo, com algumas orga-
num episódio de ampla repercussão, nizações preparando ações na área ru-
Iconographia

um grupo da VPR mata o capitão ame- ral.


ricano Charles Rodney Chandler, ex-
combatente no Vietnã, acusado de ser
agente da CIA. Foi a primeira ação em
que os guerrilheiros deixaram um do-
cumento, responsabilizando-se pelo Entre elas, está a guerrilha do Vale
fato. Em junho de 1969, mesmo com a do Ribeira, a de maior vulto até então,
repressão agindo a todo pano, uma comandada pelo ex-capitão do Exér-
ação guerrilheira possibilita a fuga de cito Carlos Lamarca, entre abril e ju-
presos políticos da Penitenciária Lemos nho de 1970. Um expoente da luta ar-
de Brito, Rio de Janeiro. Os assaltos a mada no Brasil, Lamarca era um dos
banco se sucedem, assim como as em- dirigentes da VPR, passando depois
boscadas a militares para conseguir ar- para o MR-8. Como capitão da ativa,
mas. Em agosto de 1969, Carlos Mari- ele fugiu do 4o Regimento de Infanta-
ghela ocupa a Rádio Nacional de São ria, em Quitaúna, São Paulo, com sete
Paulo e lê uma mensagem da ALN. No outros militares, em janeiro de 1969, le-
mês seguinte, dias após a Junta Militar vando um caminhão com armas. Como
que substituiria o general Costa e Silva Marighela e Joaquim Câmara Ferreira,
ter empalmado o poder, a ALN e o Lamarca passou a ser dos mais perse-
MR-8 sequestram o embaixador dos guidos opositores do regime. Ele dirige
Iconographia

Estados Unidos no Brasil, Charles e participa diretamente de operações


Burke Elbrick. Ao mesmo tempo em guerrilheiras urbanas, até passar a co-
que negocia, o governo reforça a estru- mandar a organização da guerrilha no
tura da repressão, edita decretos que Vale do Ribeira, no litoral Sul de São
permitem o banimento e a pena de Paulo, a região mais pobre do Estado.
morte, outorga uma nova Constituição A guerrilha reuniu apenas 17 militan-
e reforma a Lei de Segurança Nacio- tes. O combate aos guerrilheiros foi
nal, adaptando-a à nova conjuntura. feito pelo Exército, numa operação de
Mas é obrigado a ceder às exigências grandes proporções, comandada pelo
dos sequestradores, libertando 15 pre- coronel Erasmo Dias. Lamarca e al-
sos políticos - entre eles o dirigente co- guns guerrilheiros, no entanto, conse-
munista Gregório Bezerra, o líder estu- guiram romper o cerco, de forma espe-
dantil Wladimir Palmeira e o líder ope- tacular. O capitão foi perseguido tenaz-
rário José Ibrahim -, e divulgando na mente, até que as forças do governo
imprensa um manifesto dos guerrilhei- conseguiram matá-lo, indefeso, no inte-
ros. O trecho final desse manifesto di- rior da Bahia, em 1971. Era o fim vir-
Iconographia

zia: "Queremos advertir a todos aque- tual da guerrilha no Centro-Sul do País.


les que torturam, espancam e matam Faltava, entretanto, o movimento
nossos companheiros que não permiti- guerrilheiro mais expressivo desde
remos que isso continue. Este é o nosso 1964, a famosa guerrilha do Araguaia,
Após 68, com o aumento da repressão, último aviso. De agora em diante será organizada pelo Partido Comunista do
grupos de esquerda reagem mais olho por olho e dente por dente." Brasil. Desde 1966, o partido discutia
energicamente, Em outubro, a VPR mata Em 1970, a ALN sequestra um avião, possíveis áreas para a guerra revolucio-
o capitão americano Charles Rodney exige 15 presos como resgate, mas a nária. Até 1972, 69 militantes do par-
Chandler (no alto), acusado de ser agente polícia reage, prende três guerrilheiros tido - a grande maioria do Centro-Sul
da CIA. Em setembro de 69, ALN e MR- e mata outro, Eraldo Palha Freire. Car- do País e boa parte composta de ex-
8 sequestram o embaixador americano los Marighela já havia sido assassinado estudantes - chegaram à região, no Sul
Charles Burke Elbrick (ao centro), pela polícia em novembro de 1969, em do Pará, passando a viver como mora-
exigindo a libertação de 15 presos São Paulo, numa emboscada coman- dores do local, fazendo treinamentos e
políticos (embaixo, a casa onde Elbrick dada pelo famoso delegado Sérgio preparando-se para o início da luta.
foi mantido prisioneiro, no Rio) Fleury. Em setembro, outro dirigente Os combates com o Exército

502
523 ANCOZ, p 246

A primeira ação um pouco duradoura de


resistência armada ao regime foi a
chamada guerrilha de Caparaó,
organizada pelo MNR. Em 1967, porém,
o Exército, a FAB e a Polícia Militar
mineira desmantelaram a tentativa,
prendendo oito dos 14 guerrilheiros (ao
lado). Na guerrilha do Araguaia (abaixo,
o gen. Hugo Abreu, comandante de uma
das fases da repressão, na região em 71),
0 Exército reuniu cerca de 20 mil homens,
na maior operação militar desde a ,
Segunda. Grande Guerra, para aniquilar
os guerrilheiros, que resistiram até 1974.
Morto também foi Carlos Marighela,
assassinado pela políciá em 69, em São
Paulo, numa emboscada comandada pelo
delegado Sérgio Fleury

Iconographia
Iconographia

iniciaram-se naquele ano. Os guerri- mente a guerrilha do Araguaia, no ainda é tabu. Até o final de 1984 não ti-
lheiros resistiram até 1974. As Forças bairro da Lapa, em São Paulo. Dois di- nham sido abertos os arquivos oficiais
Armadas, utilizando um efetivo calcu- rigentes, Pedro Pomar e Angelo Ar- sobre o que os militares consideravam
lado em 20 mil homens, tiveram que rea- roio, foram assassinados no local e uma "guerra psicológica adversa".
lizar três campanhas para aniquila- vários outros foram presos. Mais tarde, Entre as organizações da esquerda
mento dos guerrilheiros do PCdoB, na um dos presos, João Batista Drum- brasileira, a discussão ia desde a corre-
maior operação das Forças Armadas mond, morreu em consequência de tor- ção ou não de se empregar a luta ar-
no Brasil desde a Segunda Grande turas. mada para derrubar governos burgue-
Guerra. Há denúncias de que alguns O final do movimento guerrilheiro ses até o contexto adequado em que ela
guerrilheiros - como "Osvaldão", um no Araguaia marcou o término das podéria dar-se. Discutia-se também o
dos mais famosos - tiveram a cabeça ações armadas organizadas pela es- isolamento social e político das ações
cortada pelas tropas do governo. Toda querda. A repressão do Regime Militar da guerrilha, se tiveram ou não tiveram
a região viveu, nesses anos, o maior ter- desarticulou ou destruiu várias das or- apoio da população, em que sentido e
ror de toda a sua história. Igreja, cam- ganizações que pregavam a luta ar- em que proporção. A
poneses, a população em geral foi vi- mada, elas próprias envolvidas em pro- Com a abertura política, a oposição
tima direta ou indireta da violência de- blemas politico-organizativos comple- recuperou a imagem de Marighela e
sencadeada pelo Exército. Poucos guer- xos e sem sólida base social que pu- Lamarca, retomou a discussão da luta
rilheiros sobreviveram, e o PCdoB, por desse respaldá-las. armada, publicou livros sobre o assunto
longo tempo, passou a ser uma das or- A discussão sobre a luta armada e até encaminhou processos para obri-
ganizações clandestinas mais persegui- como uma forma de resistência ao Re- gar o governo a dar informações e es-
das. gime Militar mal está iniciada. Alguns clarecimentos sobre os mortos e desa-
Em 1976, outra operação do Exér- dos partidos da época não existem parecidos.
cito descobriu uma reunião de dirigen- mais, outros mudaram inteiramente de
tes do partido, que avaliavam justa- tática e, para o governo, o assunto Luiz Maklouf Carvalho

503
3 31 an 00 a p

Carlos Namba/Abril Press


Nas décadas de 70 e 80, surgiram novos protagonistas na ficção brasileira - como o executivo - presentes nas obras de Ricardo
Ramos (à esq.) e Ivan Angelo

ARTES/LITERATURA: personagens de ficção boliza a objetualização das pessoas e


das relações, projetadas vertiginosa-
mente no sistema de trocas, reduzidas a
mercadorias e condenadas a relaciona-
mentos superficiais, medidos, crono-
metrados, deslocados do seu valor de
uso para o valor de troca.
A modernização promovida sob o Regime Militar inspirou
Daí o erotismo decadente que to-
os ficcionistas a usar novos protagonistas. E surgiram mou conta da literatura brasileira - por -
exemplo, uma discutida seleção de
histórias de executivos, bóias-frias e operariado urbano
Gaspariano Damata, Histórias do Amor
Maldito (1967), e a coletânea Erotismo
Em períodos de rápida transforma- do-se contemporâneo da tecno- no Conto Brasileiro (1980) de Edilberto
ção da sociedade, novas relações se cracia esclarecida que se apossou do Coutinho. A consciência deste drama
manifestam, novos papéis são desem- País na sequência do golpe de 1964. na sociedade contemporânea projeta-
penhados na cena cotidiana. Para o fic- se no texto de Márcia Denser, Animal
, cionista, aparecem novas personagens. dos Motéis (1981). Mas aí somos leva-
E o que aconteceu entre nós, em de- dos a outro assunto. O surgimento da
corrência da "modernização" da eco- mulher-sujeito na ficção brasileira, em
nomia nacional. Os sinais da mudança na escolha dos substituição da mulher-objeto.
Tornou-se grotesco o confronto dos heróis da nova ficção acham-se parti- Clarice Lispector, por exemplo, no
novos magnatas surgidos da "moderni- cularmente projetados em Ricardo Ra- conto "Miss Algrave" de A Via Cru-
zação" e seus satélites com a velha aris- mos. Tome-se, por exemplo, o livro cis do Corpo (1974) manipula, de modo
tocracia do poder, de hábitos refinados, Circuito Fechado (1978). Há um sintoma mágico, a progressão do desejo de sua
já cristalizados ao longo do tempo de da época nos próprios títulos dos con- personagem.
sua dominação. tos: "Procurando apartamento" e Periferia do sistema é também a
A "modernização" do País foi em- "Corretor e cliente", por exemplo. Na marginalidade urbana, de vagabundos,
purrada por uma espécie de tecnocracia obra, ingressam no circuito da narra- crianças, velhos e desempregados,
esclarecida, que pretendeu sujeitar os tiva lugares e personagens da nova era: como aparecem nos contos de João
movimentos sociais da mudança a um bolsa de valores, despachantes, corre- Antônio e de uma legião de bons con-
planejamento. A idéia do plano, com tores, publicitários, executivos, secre- tistas contemporâneos, a começar por
efeito, permeou a consciência nacional tárias, gabinetes refrigerados, etc. Wander Piroli.
sob o comando da ideologia domi- Ivan Angelo põe também um execu- E, finalmente, assinala-se a emergên-
nante. Também nas letras presumiu-se tivo em jogo, no conto "Conquista" de cia de uma. nova personagem, oriunda
a anterioridade do plano à realização A Casa de Vidro. A personagem se dis- da marginalidade rural, o bóia-fria, ob-
da obra, da razão a emoção, tribui entre uma greve que precisa ser jeto dos contos de Murilo Carvalho, em
decretando-se o primado da consciên- superada e a cata de mulheres para sua A Cara Engraçada do Medo (1978).
cia sobre o inconsciente ou a expressão satisfação erótica. Resta mencionar a visão do trabalha-
espontânea. Há, ainda, uma casa de banhos e dor urbano, de que Crônicas da Vida
Ivan Angelo, em A Festa (1976) e A masssagens como lugar refinado de ali- Operária (1978), de Roniwalter Jatobá,
Casa de Vidro (l979), nos dá exemplos vio das tensões, às vezes um disfarce é um exemplo.
de controle da matéria verbal, tornan- sofisticado da prostituição. Tudo sim- Fábio Lucas
504
BR ÁSIA 233.4 A COR, p 248

Num de seus poemas, "Boca do In-


ferno", como era chamado Gregório
de Matos Guerra, escreve:
Que falta nesta cidade? . . . Verdade.
Que mais por sua desonra? . . . Honra.
Falta mais que se lhe pedia . . . Vergonha. .
Crítico dos costumes e crítico da arte
poética classicista, o poeta simultanea-
mente agride a sociedade e o forma-
lismo da poesia.
Dando um grande salto histórico, va-
mos encontrar o quadro O Poema de
Anchieta, de Benedito Calixto (lta-
nhaém, 1853-1928), no qual o padre,
com uma vara, escreve seus versos na
areia, enquanto, na paisagem ao fundo,
dois Índios o olham, apavorados. Neste
óleo, um poeta padre, representante da
cultura branca, exercita seus dotes inte-
lectuais enquanto os índios da terra es-
tão distanciados e amedrontados. A lei-
tura desse quadro é simples: uma cul-
tura branca dominadora é visivelmente
colocada em oposição à cultura indi-
gena dos donos da terra.

Um sistema social acomodado


pelo clientelismo político

A expressão poética ou a expressão


ARTES/ARTES PLÁSTICAS: os aspectos políticos e sociais plástica correlacionam-se naturalmente
com as situações sociais, políticas, cul-
turais, econômicas, etc. Sem fazer ne-
nhum juízo de valor, apenas vendo as
coisas como elas são na realidade apa-
Uma arte politizada
rente, poderiamos apreciar o crescente
uso de nomes estrangeiros dados às fa-
Um levantamento, mesmo provisório, da história da arte bricas de roupas, aos restaurantes, etc,,
em São Paulo. Esse costume estrangei-
brasileira neste século mostra que os artistas expressaram nas
rizado corresponde aos modelos inter-
obras as contradições da sociedade nacionais de arte, cooptados por uma
grande parte dos artistas brasileiros dos
A fisionomia contemporânea da arte centros mornopolistas da cultura nacio-
brasileira não está definida nem sob o nal, como Rio e São Paulo. Não será a
seu aspecto formal e artesanal nem pe- facilidade da comunicação via TV, ci-
las conotações sociais sobre o que os nema, jornais, revistas, a responsável
artistas pretendem dizer com suas me- única pela réplica dos modelos artísti-
táforas. Essa definição, que não é apa- cos internacionais no Brasil. Possivel-
rente atualmente, só poderia ser con- mente O padrão sócio-cultural brasi-
cretizada após amplo e exaustivo levan- leiro não ofereça estimulos maiores
tamento das obras. E após a compara- além dos que são transmitidos implici-
ção dessa produção artística com as tamente nos modelos culturais interna-
condições sociais e políticas em que cionais. Além do mais, possivelmente
esta arte se originou e foi consumida os abstratos, os minimalistas - uma
pela sociedade. corrente artística preocupada com de-
Entretanto, já há alguns dados que talhes - e outros de gosto expresso pelo
podem ser importantes para a análise consumo da arte norte-americana re-
da arte produzida no Brasil. Levando plicada no Brasil contenham em si pró-
em conta que um poeta faz, em versos, prios uma voltagem de maior contesta-
o mesmo que um artista plástico em ção do que uma arte "brasileira" ao
suas obras - a criação de uma metáfora processo cultural nacional. Não será
-, será pertinente reler os versos de obviamente a frase "Abaixo o colonia-
Gregório de Matos Guerra (Recife, lismo" a expressão mais eficaz do ata-
1623-1696) para compreendermos to- que à colonização cultural brasileira, A
das as implicações políticas, sociais e Cândido Portinari (acima, em 1959) situação da interdependência econô-
culturais da sua metáfora poética cor- criou símbolos denunciadores da vasta mica, a ausência de uma política cultu-
relacionada à Bahia colonial, onde vi- abandonada área do Nordeste do País, ral, um sistema social ainda acomo-
veu - mas metáfora válida ainda hoje. como Criança Morta (1944) dado pelo clientelismo político - tudo
505
er oranssaYe.angina,4044224 an coz, p 2349

isso não fica mais adequadamente ex- Nos anos 30, é


presso pelas expressões minimalistas vastíssima a iconografia
"internacionalizadas" de inúmeras formada por Lívio
obras de artistas brasileiros do que por Abramo, Tarsila do
uma arte "brasileira"? Amaral, Segall, Di
Voltemos da era contemporânea Cavalcanti e outros que
para o passado recente, O Estado Novo representaram em suas
(1937-1945) teve sua cena cultural co- obras as questões sociais
mandada por Gustavo Capanema, mi- do País em todos os
nistro da Educação de Getúlio Vargas. níveis (na pág. ao lado,
Capanema procurou incentivar os ar- as Cinco Moças de
tistas plásticos e arquitetos, ainda que Guaratinguetá, 1930,
fossem de esquerda. Foi ele que incen- de Di Cavalcanti , foto
tivou, por exemplo, Portinari e Oscar menor, à esq.). Nos
Niemeyer, na pintura e na arquitetura. anos 40 e 50, muitos
Esse é um paradoxo do período do Es- artistas tratam dos
tado Novo: o mesmo regime que tran- desastres da guerra, da
cafiava os seus opositores, principal- opressão e da pobreza
mente de esquerda, e, na polícia de Fi- do povo brasileiro, como
linto "Muller (depois figura importante Carlos Prado, em A
no Regime Militar como presidente do
Fila (ao lado).
Senado, e no Estado Novo chefe da
Após 64, a situação
Polícia do Distrito Federal, então o
sócio-política tornou-se
Rio), chegava a arrancar as unhas de
movediça. Na época
militantes populares - esse mesmo re-
maisfechada do Regime
gime incentivou artistas de esquerda.
Militar, obra como o
Capanema estava certo. Ele poderia,
monumento a Garcia
como o fez, cooptar a intelectualidade,
Lorca (na pág. ao lado)
mesmo que de feições esquerdizantes,
de Flávio de Carvalho
para criar os templos representativos
(foto à dir.) foi
do crescimento cultural do estadono-
destroçada na praça das
vismo. De outro lado, não foi preciso
Guianas, em São Paulo.
que os grandes artistas deixassem de
pensar e de fazer aquilo em que acredi- Mas a resistência
travam. Portinari, com suas pinturas so- democrática dos artistas
bre a miséria do Nordeste, como os continuou
Retirantes (1940), criou símbolos de- a x4
nunciadores do monopolismo dos gran-
des centros do Sul do País contra a vasta pressivo das lutas e reivindicações so- nina Kats, Carlos Scliar, Márcio Gru-
e abandonada área do Norte e Nordeste ciais, de forma não aparente, alimentou ber, Luiz Ventura, Octávio Araújo,
brasileiro. certamente a gestação criadora das fu- Vasco Prado, José Cláudio e outros re-
turas gerações de artistas, gistram nas suas obras as contradições
Sentimento nacionalista se A situação sócio-política dos anos 20 dessa sociedade. Entretanto, todos eles,
amplia depois dos anos 20 encontra correspondência na Semana em seguida - com a euforia industriali-
de Arte Moderna de 22, como nos anos zante dos anos 50 -, diluem-se em di-
Mas essa história tem também um 30 a situação político-social modificada versas vertentes artísticas nas quais a
outro lado. Na década de 20, a Coluna é igualmente correspondente à produ- propaganda social é superada. Nem
Prestes, que fez a mais longa marcha ção artística das décadas de 30 a 40. por isso suas obras perdem o sentido de
militar da história mundial contempo- Aqui vem um paradoxo: os anos 30 se- crítica social. A arte de propaganda so-
rânea, chefiada por Luis Carlos Prestes, rão um período no qual uma consciên- cial dilui-se prioritariamente nas artes
o "Cavaleiro da Esperança", colabora cia social mais flexível facilitará a ação gráficas; por exemplo, nas campanhas
para a emergência de um sentimento cultural de cunho nacionalista do mi- de "O petróleo é nosso".
nacionalista que se ampliará nas déca- nistro Gustavo Capanema, que, entre-
das posteriores. As Ligas Mutualistas tanto, relega a segundo plano as possi- Nos anos 40 e 50, a arte
(associações de trabalhadores) e os sin- veis complicações subversivas das do País se institucionaliza
dicatos vinham gradativamente desen- obras de denúncia de Portinari. Nesse
volvendo uma consciência reivíndica- momento, para os artistas, era mais im- Mas, acima de tudo, a arte se institu-
tória de direitos trabalhistas. Disso tudo portante um crescimento cultural do cionalizou: em 1947 é criado o Museu
decorreu que um componente político- País, que participava da Segunda de Arte de São Paulo e depois surgem
revolucionário, a partir desse período, Grande Guerra. Afinal, o Brasil lutava o Museu de Arte Moderna do Rio e o
fará parte da cosmovisão dos produto- na Europa contra o nazismo, contra a de São Paulo, e em 1951 a Bienal de
res culturais do País. É vastíssima a ico- violência e contra o Estado arbitrário. São Paulo.
nografia formada por Lívio Abramo, Após o Estado Novo, cresce a arte A contextura sócio-política brasileira
Tarsila do Amaral, Segall, Di Caval- nacional. Por toda a década de 40, e sofre em 1950 uma mudança, com a
canti e outros, que durante a década de também na de 50, muitos artistas trata- eleição de Getúlio Vargas. Em 1947, os
30 representam em suas obras as ques- ram dos desastres da guerra, da opres- comunistas eleitos (com a nova Consti-
tões sociais brasileiras em todos os ni- são e da pobreza das maiorias brasilei- tuição de 1946) já tinham perdido os,
veis. Todo esse repertório plástico ex- ras. Manuel Martins, Carlos Prado, Re- seus mandatos. Mas a Igreja começava

506
ar va. AMATO 234 AnCO A2 , paso

L$s
Juca Martins/F4

a asssumir um papel social ao lado de definiu drasticamente com o golpe de de Brecht. O artista Samuel Spiegel fez
seu ofício religioso: uma consciência 1964. A arte respondeu imediatamente, as ilustrações para o livro-poema, as
social em desenvolvimento jamais seria com o fim das obras em movimento: na pranchas foram expostas, o ator e dra-
sustada por convulsões políticas e arbi- década de 70, grande parte dos artistas maturgo Gianfrancesco Guarnieri e
trariedades policiais. fez objetos, uns presos às paredes, ou- vários atores do Teatro de Arena, sen-
Depois, enquanto Juscelino Kubits- tros criados para ocupar os espaços dos tados nas escadas da galeria, diziam os
chek construía Brasília, Bruno Giorgi pisos. versos de Brecht no estilo de jograis.
fazia as suas esculturas para o Palácio De repente, a multidão fechou a rua;
todos queriam ver um espetáculo de
da Alvorada, Mas o sistema político Poema de Brecht serve para criar
ruía em pedaços com a renúncia de arte integrada. Policiais correram até a
subprodutos artísticos rua Martins Fontes, onde ficava a Am-
nio Quadros, Essa ruptura do sistema
político foi acompanhada de uma mu- biente, viram o povo admirando arte e
dança nos rumos da arte brasileira. Por Não há nenhum maniquelsmo nesses foram embora, O registro policial do
exemplo, o pintor Di Prete, autor de pequenos ensaios de correspondência evento naquela noite, na galeria, serviu
Limões, obra que lhe deu um prêmio na entre as contexturas sociais e as expres- para que depois, nos dias do golpe, dois
Bienal de 1951, passou na nova situa- sões plásticas. Vejamos mais de perto: investigadores fossem até lá, para averi-
ção a fazer uma arte abstrata e cinética, em fins de 1963, antes do golpe de 64, guações.
misturando materiais e tornando as for- uma ação cultural integrada ocorreu na Outro exemplo, agora, da época
mas móveis: a arte cinética se casava extinta Galeria Ambiente, em São mais fechada do Regime Militar: o
bem com o terreno social então move- Paulo. Um poema de Brecht, "A quadro de Cláudio Tozzi, Guevara Vivo
diço do País. Enquanto o espectador Mãe", foi o centro do qual se criaram ou Morto, sofreu diversas escoriações e
andava, a obra cinética se movia, mas vários subprodutos artísticos, (Estamos golpes, em São Paulo, Brasília e outras
suas formas se mantinham estáticas. deixando de lado o CPC - Centro Po- cidades. Em 1984 foi finalmente ex-
Isso estava relacionado com a situação pular de Cultura, o MPC - Movimento posto na excelente mostra "Tradição e
sócio-política. Nessa mesma situação, Popular de Cultura e manifestos de tra- Ruptura", feita na Bienal de São
as experiências concretistas de Walde- balhadores intelectuais que reivindica- Paulo. Mais um exemplo: o monu-
mar Cordeiro, Geraldo de Barros e ou- vam atividades culturais gerais e áber- mento a Garcia Lorca, do artista Flávio
tros geraram pesquisas com informá- tas para a população, Mário de An- de Carvalho (que nunca foi comunista, -
tica, com a arte pop. Depois, a situação drade também pretendera isso.) No dia apesar de sua fama), foi destroçado na
sócio-política até então movediça se aprazado, abriu-se a mostra da "Mãe", praça das Guianas, em São Paulo, no
507
BR DFANBSB V ET 0us3a1 an00a,
p 254

Artistas como Guima (à esq., sua obra Inquisição), João Câmara (obra à dir.) e muitos outros elegeram para as suas metáforas
plásticas e poéticas imagens relacionadas com a contextura política dos últimos anos

fim da década de 60. Vários tiros ava- paganda. Depois do assassinato do jor- eram opositores do regime autoritário.
riaram essa obra, que foi retirada e nalista Wladimir Herzog, em 1975, no Mas houve também a atuação dos
oculta, finalmente, anos depois, na DOL-CODI de São Paulo, o pintor An- artistas brasileiros no Exterior. Em Pa-
época da "abertura", foi recolocada na tônio Henrique do Amaral fez em me- ris, Gontran Neto, artista e professor
mesma praça. Um outro caso do papel mória de Herzog uma alegoria, Morte integrante de um grupo de latino-
da arte no Regime Militar: em 1968 um no Sábado, que foi entregue ao Sindi- americanos também oriundos de países
fato inusitado ocorreu nas passeatas de cato dos Jornalistas de São Paulo. ditatoriais, participa da Brigada Inter-
estudantes e nos comícios: os manifes- nacional de Artistas (Le Parc, Cueco,
tantes, todos exigindo a volta da demo- Em 72, artista francês foi Ernest Pignon, Gamarra e outros) que
cracia e uma nova Constituição, exi- preso e enviado ao DOPS fazem murais e painéis de protesto con-
biam faixas e estandartes feitos com tra as violências na América Latina.
precisão artística. Nunca a cidade de Três anos antes, o artista Fred Fo- Foi essa brigada que pintou a Câmara
São Paulo teve uma programação grá- rest, francês, então participante da Bie- Negra, em homenagem a frei Tito - pa-
fica tão bonita, em meio ao terror do nal de São Paulo, depois de exibir seu dre dominicano que esteve preso em
Regime Militar. projeto de Arte na Rua - quadros São Paulo e se suicidou em Paris por
Então, os artistas, depois de verem brancos que as pessoas perguntavam sequelas psíquicas da tortura -, se-
suas obras cortadas pelos júris dos sa- por que brancos -, quando se apres- gundo o relato feito por ele das cenas
lões, ou discretamente postas nos cor- sava a recolhê-los na praça da Sé, foi que se passavam no DOI-CODI de São
redores da Bienal (1967), passaram a seguro pela polícia e enviado ao DOPS, Paulo. Depois, a partir da segunda me-
integrar os movimentos contra a dita- O escândalo foi grande: ajudou a piorar tade dos anos 70, os imensos quadros
dura. A arte de propaganda política lá fora a imagem do País. Os artistas de Gontran Neto só retratam os bóias-
tornou-se tão perigosa que muitos artis- Cildo Meireles, Avatar de Moraes, frias. Os europeus compram esses qua-
tas começaram a colaborar de outras Mário Ishikawa, João Câmara, Antô- dros e antropofagicamente engolem
formas nas lutas pela democracia. Em nio Dias, Guima, Sérgio Ferro (este um dos nossos grandes problemas na-
vez de fazerem pinturas, gravuras e preso como militante), Gilberto Salva- cionais.
desenhos sobre lutas democráticas, dor (preso por causa de um quadro ex- Portanto, vemos que, mesmo sem
eles partiram para a luta democrática. posto num salão em Santos, SP) e tan- um levantamento completo, é possível
Uns faziam cartazes, outros davam suas tos outros elegeram para as suas metá- colher alguns traços ainda que rarefei-
obras para fundos que proporcionaram foras plásticas e poéticas imagens rela- tos da produção artística do Brasil.
fugas e livraram da morte muitos jo- cionadas com a contextura política dos A olho nu percebe-se um cresci-
vens, Muita obra de arte vendida serviu últimos anos. Em 1977-78, quando mento no processo cultural dos artistas
para salvar "resistentes", enviando-os Olavo Setúbal era prefeito de São em correspondência ao seu comporta-
para fora do Brasil. E muitas famílias Paulo e instalou o Museu de Escultura mento político, sejam eles abstratos,
sem pai comeram feijão da venda de na praça da Sé, de certa forma realizou concretos ou figurativos. A consciência
muito quadro abstrato, concreto ou fi- algo que lembra a ação cultural de de cidadania dos artistas plásticos vem
gurativo. A consciência social foi mais Gustavo Capanema no Estado Novo. sendo construída no processo de cons-
forte do que as tendências artísticas Entre os escultores convidados para fa- trução desta nação. ,
que poderiam facilitar uma arte de pro- zer obras para a praça da Sé, alguns Radha Abramo
508
BroFaNBSE VE. GNÇãAA, 407433 Bh 00a , P2SA

POLÍTICA/REGIME : as perspectivas da transição democrática em 1985

Depois do ciclo militar

A eleição de um governo civil encaminhou a solução


do mais imediato problema do País - a democracia.
Mas as grandes questões econômicas continuavam intocadas

No dia 15 de janeiro de 1985, após na qual se uniram partidos-de oposição espécie de posse em funeral: a Nova
um ano inteiro de gigantescos comícios e uma expressiva fração de dissidentes República era inaugurada sob maus
por todo o País, um candidato da opo- do velho regime, anunciava, com essa presságios.
sição à presidência da República, Tan- expressão, o início de um novo período No lugar de Tancredo Neves subiu
credo Neves, derrotava o candidato do na história do País, em que prevalece- ao poder José Sarney, o vice-pre-
partido do governo, Paulo Maluf, por riam os métodos democráticos de go- sidente, indicado para a chapa ven-
uma dilatada contagem de votos. As verno. cedora pelos dissidentes do regime - e
eleições foram decididas num Colégio A teia do destino armaria, no en- que até seis meses antes fora o diri-
Eleitoral que por duas décadas funcio- tanto, uma trama insólita para os pri- gente máximo do partido governista.
nara exclusivamente para homologar a meiros dias do regime civil: na véspera A morte dramática não foi sufi-
troca de generais no comando supremo de sua posse, o candidato eleito - ho- ciente, no entanto, para alterar os ru-
do regime; a despeito disso, e mesmo mem de 75 anos, um reformista conci- mos democratizantes já delineados: as
de pressões militares de última hora, liador, que fora ministro da Justiça de forças vitoriosas reafirmaram sua dis-
nada impediu a derrocada final do si- Getúlio Vargas e primeiro-ministro de posição de convocar a Assembléia Na-
tuacionismo. Era o marco para e en- João Goulart - caia enfermo de um tu- cional Constituinte para 1986; e o Con-
cerramento do ciclo militar iniciado em mor benigno infeccionado no intestino. gresso Nacional prosseguiu na sua ta-
1964. E para o anúncio de uma Nova E, após 39 dias de hospital e sete inter- refa de remover o chamado "entulho
República: o candidato oposicionista, venções cirúrgicas, seu caixão subia a do autoritarismo", conjunto de leis ar-
representando a Aliança Democrática, rampa do palácio em Brasília para uma bitrárias do tempo da ditadura. Uma

509
er

27

Agência O Globo

-.
comissão de vários partidos anunciou, fora uma crise política delicada na su- do mercado brasileiro através de redes
inclusive, o reconhecimento dos parti- perfície da vida do País: o Regime Mili- nacionais de televisão, transportes ro-
dos clandestinos - que só existira, até tar ruía por causas estruturais profun- doviários e de crédito facilitou o acesso
então, em menos de três anos em toda das. aos centros urbanos, aos bens de con-
a história da República; a eleição direta O sistema implantado em 1964 durou sumo duráveis e à cultura de massa,
para prefeitos das capitais e o voto do mais de duas décadas porque conse- através da novela, do telejornal de ca-
analfabeto, direitos também raros na guiu realizar extensas modificações na ráter nacional e dos enlatados, Mas foi,
'vida do País, estrutura social do País. Após um também, o incentivo à desintegração
período de consolidação (entre 1964 e das famílias, à marginalização em mas-
Regalias militares iriam 1967), quando promoveu diversas re- sa dos menores, ao esmagamento das
dificultar transição formas visando coibir as manifestações fontes culturais nativas, à comercializa-
populares e criar facilidades para os in- ção dos costumes, à desorganização
Permaneceram privilégios militares vestimentos, especialmente estrangei- das cidades.
consolidados nas duas décadas anterio- ros, o Regime Militar beneficiou-se de
res; a elevação do chefe da Casa Mili- um surto de crescimento econômico No início dos anos 70, o modelo
tar da Presidência e do Chefe do quase sem paralelo, conhecido interna- brasileiro entrou em crise
Estado-Maior das Forças Armadas à cionalmente como o "milagre brasi-
condição de ministros de Estado; a ma- leiro": nesta fase, o Brasil foi o país que Com a crise no desenvolvimento dos
nutenção do controle militar sobre o mais cresceu em todo o mundo capita- países capitalistas centrais no início dos
Serviço Nacional de Informação e a lista subdesenvolvido. Esse período - anos 70, e seu agravamento com a ele-
preservação de sua vasta estrutura de 1968 a 1973 - de intensa acumulação vação brusca nos preços de petróleo
espionagem, fora e dentro do governo, de riqueza, acumulou também tensões em fins de 1973, o modelo brasileiro de
criada após o golpe; a supremacia do sociais e políticas de todo o tipo. A - desenvolvimento entrou em crise desde
ministro do Exército sobre os coman- contrapartida do crescimento acele- seus alicerces, E todas as contradições
dos das Polícias Militares estaduais; e rado com base na tecnologia, nos capi- que ele acumulou no crescimento vie-
outros abusos, Essas regalias militares tais estrangeiros, na preservação e mo- ram à superfície.
iriam dificultar a transição para o novo dernização lenta do latifúndio e na mo- De 1974 a 1980, o Brasil viveu anos
regime e diminuir a soberania da Cons- nopolização precoce da indústria e dos de crescimento instável, na antevéspera
tituinte, serviços foi a concentração de renda e da grande crise, E os anos de 81, 82 e 83
Os ventos democratizantes, porém, o endividamento externo brutais, tam- foram, enfim, os anos de mergulho no
eram fortes, O que inviabilizara a per- bém os maiores do mundo capitalista abismo.
manência dos militares no poder não subdesenvolvido. A integração global No início de 1985, a falência do mo-
510
sroransss percam,14404123 an Coa, p 254

«9

Agência O Globo
Ágênma O Globo

delo adotado em 1964 tornara-se evi-


dente, O debate que se instaurou no
País, então, visava saber os rumos que
se poderiam trilhar daí por diante, : i
Mwm

Com o refluxo pelo menos tempo-


rário dos partidários da solução milita- ' -mM»i
rista de direita que acabava de naufra-
gar, havia uma unanimidade nacional:
o sistema de governos escolhidos por
colégios eleitorais controlados por mili-
tares, a supressão das liberdades públi-
cas, a centralização imposta à adminis-
tração do País com a perda de autono-
mia dos Municípios e dos Estados e
com a redução dos poderes do Legisla-
tivo e do Judiciário agravaram os pro-
blemas nacionais. Mesmo que a crise
não decorresse essencialmente da
Ricardo Azoury/F4

forma de governo adotado no País após


1964, ela fora ampliada pelo regime au-
tocrático.
A ditadura dificultou o debate das al-
ternativas para a crise, favoreceu a
aprovação de projetos megalomania- O enterro do último herói. A partir de sua queda em 1945, Getúlio Vargas passou a ser
cos, reduziu a fiscalização sobre os atos uma espécie de símbolo da elite brasileira reformista e perseguida pelos militares, políticos
do governo e assim retardou o apareci- reacionários e golpistas. Essa ala direitista das camadas dominantes do País levou Getúlio
mento público de males que engorda- ao suicídio em 1954, deu o golpe em 1964, cassou Juscelino Kubitschek e João Goulart.
vam sob a censura, marginalizou lide- Tancredo Neves sobreviveu a todos: foi orador nos enterros de Vargas (na pág. ao lado),
ranças que poderiam ter sido úteis na Juscelino (no alto, à esq.) e Jango (no alto). Sua morte em 21 de abril de 1985, no fim do
descoberta , favoreceu a corrupção de- ciclo militar, foi como o enterro de um último herói, pungente e enigmático (acima, o
senfreada e a incompetência sustenta- caixão sobe a rampa do Planalto, Brasília, em 22/4/8565)
da no poder discricionário.
511
aroransss 224 an co2, p 255
Em 15 de janeiro de Er
1985, Tancredo Neves
(ao lado, de mãos dadas
com Ulysses Guimarães
após a votação) era
eleito presidente da
República, contando
com os votos de todos os
partidos de oposição, da
Frente Liberal e outros
dissidentes do Partido
Democrático Social
(PDS). Foram 300 votos
à frente do candidato
governista, o ex-
governador nomeado de
São Paulo, Paulo Salim
Maluf

&&: 53E

Ricardo Azoury/F4
O sistema da ditadura militar fora,
pois, a causa mais imediata da crise, de
sua extensão e persistência. A vitória 0 feitiço ___. tado por Maluf na convenção do par-
da Aliança Democrática era, portanto, tido, em 11 de agosto de 1984. Os dis-
contra o feiticeiro
a superação do primeiro e maior obstá- sidentes pedessistas liderados por Au-
culo prático com vistas à solução das O Colégio Eleitoral que se reuniu reliano se agrupariam na Frente Libe-
dificuldades nacionais, em 15 de janeiro de 1985 foi definido ral, que comporia, junto com o Par-
É claro, porém, que o método de go- por normas que, em princípio, de- tido do Movimento Democrático
verno não fora a única razão dos pro- veriam favorecer o candidato gover- Brasileiro (PMDB), a Aliança Demo-
blemas e nem mesmo o fator determi- nista à Presidência da República. A crática, lançando o então governador
nante do surgimento desses males, O vitória de Tancredo Neves, da oposi- de Minas Gerais, Tancredo Neves (do
Regime Militar agravara o endivida- ção, só foi possível porque essas re- PMDB), um dia após a convenção
mento externo do País, a distribuição gras não previam a desagregação da pedessista, como candidato a presi-
de renda, a fome, a estrutura oligár- agremiação governista, o Partido De- dente e o senador José Sarney candi-
quica de posse da terra, a inadequação mocrático Social (PDS). Essa desa- dato a vice. Sarney fora o presidente
da estrutura da produção e de serviços gregação foi precipitada com a luta do PDS até pouco antes da conven-
do País em relação às necessidades da interna pela definição do candidato ção que escolheu Maluf, mas renun-
população, as condições de cultura e do partido que deveria ser apresen- ciou e ajudou a formar a Frente Libe-
comportamento do povo. Agravara; e tado ao Colégio Eleitoral. Foram der- ral. Para concorrer no Colégio Eleito-
não criara. rotados nessa luta, entre outros, no- ral como vice de Tançredo teve que
mes de peso como o do então vice- filiar-se ao PMDB, em 13 de agosto.
Vinte anos depois, as presidente Aureliano Chaves - apoi- A dupla Tancredo-Sarney seria vi-
ado, por exemplo, pelo ex-pre- toriosa no Colégio Eleitoral contando
mesmas crises do pré-64
sidente Ernesto Geisel -, e o do com os votos de todos os partidos de
então ministro do Interior, Mário An- oposição, da Frente Liberal e de outros
Os problemas, pois, eram anteriores; dreazza, apoiado pelo próprio presi- dissidentes do PDS, como os lidera-
muitos deles, seculares, dente João Figueiredo. Ambos foram dos pelo ex-governador da Bahia, An-
O que deveria ser mudado, então, atropelados pelo poderio da campa- tônio Carlos Magalhães (depois esco-
além do modelo autoritário? Evidente- nha do deputado federal Paulo Maluf, lhido por Tancredo para ocupar o
mente, o modelo de desenvolvimento que trabalhava de forma indisfarçável Ministério das Comunicações).
econômico-social, fortalecido a partir por sua candidatura desde quando
de 1964, exerceu o governo de São Paulo
a
Em dezembro de 1962, no início da s da vitóri
(1979-82). Maluf viajou por todo o Os número
penúltima grande crise econômica e País à cata de votos dos convencio-
s! dente da
política brasileira, o governo João Gou- Votaçã& o para Pre
nais do PDS e também teve expres- égio Eleutoral1 a
lart distribuiu uma síntese do Plano sivo apoio de setores empresariais. República no Col
de janeiro de
Trienal, com o qual o economista Cel- Aureliano Chaves seria excluído da reunido em 15
so Furtado apresentava um diagnós- no DE VOTOS
luta antes mesmo da Convenção do
tico e soluções para a crise na qual 480
PDS e Mário Andreazza seria derro- Tancredo Neves 180
0 País mergulhava. Embora em nível 17
Paulo Maluf
menor, os problemas eram os mesmos
Abstenções 9
512 Ausentes
Total
s É 3 f 4
saoransss vaíeNg, 2704/3934 an cor,

da crise que viria 20 anos depois: queda desse bloco, a inflação era causada ba- pelo seu valor de mercado atualizado,

no ritmo de crescimento econômico e sicamente pela desordem institucional Para esse bloco - onde se abriga-

recessão; dificuldades no pagamento - excesso de gastos públicos, ineficiên- vam, com diferenças, setores do velho

da divida externa; e inflação elevada, e cia e corrupção; excesso de greves, PSD (Partido Social Democrático) e

em alta. conluio do governo central com os sindi- praticamente toda a UDN (União De-

De que forma as diversas forças em catos; ameaças de nacionalização e ex- mocrática Nacional), partidos conser- ©

luta no cenário político nacional equa- propriação de empresas e terras -, pela vadores e oligárquicos - havia uma

cionavam esses desarranjos e se propu- elevação dos salários sem aumento de saída financeira para a crise: trazer os

nham solucioná-los? Pode-se dizer, re- produtividade, pelos subsídios do Es- capitais de fora e reorientar o processo

sumidamente, que havia três blocos de tado ao consumo de trigo, petróleo, pa- de formação de capital dentro do País,

equações e propostas para a crise brasi- pel. Para eles, além disso, a reforma elevando a renda nas mãos dos grandes

leira. agrária de que se cogitava era mais empresários e fazendeiros - da indús-

uma ameaça: desorganizaria a produ- tria de bens de consumo duráveis edas

1 - O bloco da modernização elitista e ção rural, e colocaria as terras nas exportações agrícolas -, reduzindo, em

conservadora. Buscava manter ou mãos de quem não teria nem capital consequência, a massa de salários e de

mesmo acelerar o ritmo de desenvolvi- nem técnica para desenvolvê-las. Seria subsídios da indústria tradicional e da

mento econômico e o modelo do preferível, portanto, ampliar o crédito produção de gêneros para o mercado

período de Juscelino, baseado no de- agrícola, de modo a permitir a moder- interno. O sistema de crédito deveria

senvolvimento da indústria de bens de nização dos latifúndios; e aperfeiçoar a favorecer a indústria de bens de con-

consumo duráveis, em especial a auto- tributação sobre terras ociosas, de sumo duráveis, como automóveis e ele-

mobilística. Considerava que isso só modo a pressionar os grandes proprie- trodomésticos, as atividades exportado-

poderia ser feito com a ajuda e coope- tários indolentes. Em último caso, sob ras e estimular um forte capitalismo

ração estrangeira, em particular a ame- certas condições, em locais de grandes privado.


ricana. Propunha-se a atrair a "poupança conflitos, a reforma agrária poderia se
externa" e a elevar os níveis de comércio dar mediante o pagamento das terras 2 - Bloco das Reformas de Base. Con-

exterior do País. Para os componentes expropriadas à vista e em dinheiro, siderava que o desenvolvimento do
Juca Martins/F4
«
====

7
grato:
és -s

Maurício Simonett/F4

Depois de gigantescos comícios pró-diretas em 84 (ao lado,


praça da Sé, São Paulo), em janeiro de 1985 o Colégio
Eleitoral escolhia um candidato da oposição para ocupar a
Presidência da República. O eleito, porém, não chegaria ao

A; 2a poder: após 39 dias de internação hospitalar e sete


intervenções cirúrgicas, Tancredo Neves faleceu. Era o dia 21
de abril de 1985 (acima, o cortejo funebre de Tancredo, São
2*

| sd Paulo, em 22/4/85)

513
ar oranssa ve.eNtAM BALAIB p25%

Ascensão e queda do

17/11/1971 - Presidente
Regime Militar Médici assina Decreto-Lei
que lhe dá o poder de edi-
tar decretos secretos

O Regime Militar teve mais força política no período do "milagre" (1968-73), quando a
economia cresceu a altas taxas anuais. A partir de 1974, no entanto, as taxas de crescimento
começaram a diminuir, e os militares precisaram fazer concessões que culminaram com a 13/1/1970 - Estabelecida
a censura prévia de livros
posse de um governo civil, em 1985 e periódicos

Evolução das taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), em % (1958-84)


11,0%

$
10,3%
21/4/1960 - Inauguração 13/12/1968 -- Assinado o
9,6%
de Brasília Ato Institucional no 6. O 10,2%
Congresso é posto em re-
cesso

8,8%

2/12/1959 - Revolta de
31/8/1969 Junta Militar
militares direitistas da Ae- 7,6% substitui o presidente
ronáutica, em Aragarças, 5/2/1966 - Ato Institucio- Costa e Silva
Goiás nal no 3 determina elei-
ções indiretas para gover- 17/10/1969 - Emenda
nadores de Estados Constitucional no 1 refor-
6,5% ªnal; a Constituição de

25/8/1961 - Renúncia de
Jânio Quadros. V i-
mp <; pong. almª;.- 5'396
presidente João Goulart
gera crise que termina 1/4/1964 -- Golpe militar
com adoção do sistema depõe o presidente João
parlamentarista Goulart 4,7%

15/3/1967 - Entra em vi
gor a primeira Constitui-
ção do Regime Militar

2,6%

2,1%
6/1/1963 - Plebiscito re-
voga o sistema parlamen- 27/10/1965 - Ato Institu-
tarista e restabelece o pre- cional no 2 extingue os
sidencialismo partidos ”Nº" e cria a
1,0% Arena e o MDB

1958 1959 1960 1961 1962 1963 1964 1965 1966 1967 1968 1969 1970 19

O Plano de Metas de Juscelino (1956-681) A recessão que derrubou Goulart (1962- O "milagre econômico" da ditadura
€ taxa média anual de crescimento do PIB: 67) (1968-73)
8,0% © taxa média anual de crescimento do PIB: © taxa média anual de crescimento do PIB:
© grande plano rodoviário 4,5% 11,1%
© abertura ao capital estrangeiro © agitação social © abertura ao capital estrangeiro
© retração do capital estrangeiro € grande endividamento externo
© repressão política pesada

514
BR S 22 an Coar ,p 2358

RN

13,6% 4/9/1973 - Ulysses Gui-


marães é indicado pelo
MDB como "anticandida-
to" à Presidência da Re-
pública

12,0%

9/11/1976 - A British Pe-


troleum assina o primeiro
11,1% contrato de risco para
prospecção e extração de
petróleo no Brasil

12/1/1984 - Comício em
9,7% 9,7% Curitiba inicia grande
campanha nacional por
eleições diretas
20/12/1979 - Sancionada
nova Lei Orgânica dos 25/4/1984 - O Congresso
15/11/1974 - Primeira 13 e 14/4/1977 - Com o Partidos. São extintos o rejeita a emenda Dante de
grande vitória eleitoral do Congresso posto em re- MDB e a Arena Ollyolra, que propunha
MDB cesso, o presidente Geisel eleições diretas para a
decreta o "pacote de Presidência da República
abril", outorgando a refor-
ma do Poder Judiciário e 7'2% 15/11/1982 - A oposição :::|/Lªº; - A Fm“; Li-
outras reformas políticas conquista a maioria na credo :Iº ra apoio a Tan-
25/6/1975 - Assinado o Câmara Federal e 10 go-
acordo nuclear Brasil- dente um:”; Em
vemos estaduais ao " 69
ftlemanha 6,4% 26/11/1982 - O governo
- anuncia que o Brasil re-
5,7% correrá ao FMI

+ 4/4/1983 - Inicia-se onda e


5'496 5'0% de saques em São Paulo ( )
4,4%
28/8/1979 - Sancionada 15/6/3983 - Primeiro
22/7/1978 - A Frente Na- a Lei de Anistia comício por eleições dire-
cional de Redemocratiza- tas em Goiânia
ção lança o general Euler
Bentes Monteiro candida-
to da oposição à Presidên-
cia da República
27/7/1978 - Eclode gran- 30/4/1981 - Atentado a
de onda grevista no ABC bomba ho Riocentro, Rio
paulista de Janeiro
1 78 - Pi
(Zeªlªnd, emm 20/12/1981 - O Partido
na! no 11, que revoga o Popular incorpora-se ao
AI-5 a partir de 19/1/1979 PMDB
0,9%

Fonte: Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) 1981

1972: 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1982W 1983 1984

A desaceleração (1974-380) A grande recessão (1981-84)


© taxa média anual de crescimento do PIB: © taxa média anual de crescimento do PIB:
7,0% 1,5%
© início da política de distensão e abertura © estrangulamento das contas externas 1,6%
# política © grande crise política e social !

A #
(*) dados preliminares 3'1% ( )

515
3R DFANBSB VB.GNG.AAA,
ré Tier So Wassas"8430423 334 an 259
período de Juscelino fora estancado setores do PSD, o PTB (Partido Traba- tores começam a agir em sentido con-
principalmente pela não incorporação lhista Brasileiro), organização criada trário ao do tempo do "milagre". E o
de grande massa de camponeses ao por Vargas para se contrapor ao Par- regime inicia a fase descendente do seu
mercado de consumo e pelos padrões tido Comunista, e a esquerda mode- ciclo. A crise econômica latente insufla
insuficientes de crescimento dos sa- rada, o descontentamento popular; o aparato
lários entre os trabalhadores urbanos do governo terrorista amplia as fileiras
mais pobres. Dizia que o consumo su- 3 - O bloco da modernização oposicionistas; o esforço de distensão
perfluo havia crescido com mais inten- revolucionária. Forças à esquerda do política, iniciado no quarto governo
sidade que o de bens essenciais; que o governo Goulart pregavam o rompi- dos generais com Ernesto Geisel, ape-
País perdia renda no seu comércio ex- mento com os latifundiários através de nas realimenta a contestação ao re-
terior, em virtude da deterioração nos uma reforma agrária que expropriasse gime; a enorme concentração operária
preços dos produtos que vendia em re- suas terras com pagamento em títulos promovida pelo desenvolvimento ace-
lação aos preços das exportações; que públicos e aos preços históricos em que lerado da indústria de bens de con-
o setor exportador já era grandemente estivessem registradas. Queriam tam- sumo duráveis - em especial a automo-
privilegiado pelo sistema vigente de bém o rompimento com o capital es- bilística naregião doABC paulista onde
câmbio, que favorecia o dólar-ex trangeiro pela nacionalização de seus se concentram diversas fábricas com
portação. Para contornar as difícul- monopólios no País. E faziam propa- dezenas de milhares de operários cada
dades com a obtenção de divisas em ganda dos modelos de desenvolvi- uma - criam um adversário implacável
dólar, esse bloco propunha-se a expandir mento cubano e chinês, cujas revolu- do Regime Militar, a periferia operária
o externo particularmente ções vitoriosas eram de 1959 e 1949, res- das grandes cidades, que mostra as li-
em direção aos países socialistas, me- pectivamente. Para essas forças, o ar- mitações definitivas da abertura polí-
diante acordos bilaterais de comércio, gumento de Celso Furtado de que era tica, Finalmente, após a dramática re-
sem intermediação da moeda interna- preciso eliminar os subsídios ao trigo e cessão dos anos 81, 82 e 83 - forçada
cional, o dólar americano. De certo ao petróleo a fim de facilitar as diversas pela cessação de novos empréstimos
modo, descartava também a elevação reformas - agrária, urbana, bancária, externos - e sem poder resolver a crise
do recurso aos capitais de fora, embora de ensino . . . - devia ser combatido. com uma nova política de arrocho -
se propusesse a pagar a dívida externa O golpe de 1964 implantou pela que apenas esboçou em 1983, encon-
- com adiamentos, se possível, força o rumo do desenvolvimento sem trando enorme reação -, o regime so-
revolução e sem reformas. Até 1967, fre seu golpe de morte com a campa-
Em 64, a solução da crise os militares e seus inspiradores - a nha pelas eleições diretas, depois trans-
passou por alterações expressivas maioria dos grandes proprietários bra- formadas na eleição indireta do candi-
sileiros, o capital estrangeiro - ainda dato oposicionista Tancredo Neves.
trabalhavam com a possibilidade de
Para os seguidores desse rumo, uma institucionalização rápida do novo Vitória da Aliança deixou
como Celso Furtado e João Goulart, a regime, Essa possibilidade fora aberta
solução dos problemas estava em se ainda em 1964, na "eleição" do general intocadas questões econômicas
conseguir um compromisso que permi- Castello Branco para primeiro presi-
tisse: 1) sem romper com os latifun- dente indireto: Castello elegeu-se com Pode-se ver, no entanto, que a solu-
diários, expropriar parte de suas terras o apoio de todo o PSD, de Juscelino ção política da crise, com a vitória da
com pagamento em títulos da dívida Kubitschek inclusive (a exceção hon- Aliança Democrática, deixou intoca-
pública e por preços razoáveis, a fim de rosa foi exatamente Tancredo Neves, dos todos os gigantescos problemas
permitir a realização de reforma que se absteve). Com a agitação social econômicos exacerbados nos anos de
agrária que colocasse os camponeses que se alastra rapidamente no País após governos militares. A fragilidade das
no mercado; 2) sem romper com o ca- a outorga da Constituição de 1967, que forças mais radicalmente empenhadas
pital estrangeiro, prosseguir na política marca o breve período de "legaliza- no fim do regime reacionário e na subs-
de Getúlio Vargas que, desde 1930, ção" do regime de 64, os militares par- tituição do seu modelo econômico le-
mantinha o País com um comércio ex- tem de novo para o governo arbitrário, vou à formação de um governo de coli-
terior incrivelmente baixo, só compará- E vão além: apelam, então, para os mé- gação, com amplo setor de dissidentes
vel ao dos países socialistas; e, ainda todos terroristas de fazer a política com do velho regime. Esses dissidentes esta-
nesse campo, conseguir margem de a edição do Ato Institucional no 5, que vam preocupados, fundamentalmente,
manobra maior em relação aos países lhes assegurava o direito permanente em se opor aos métodos do governo
capitalistas ocidentais, em particular os de governar por atos de exceção e en- militar e não tanto ao modelo de desen-
americanos, ampliando as relações cobria uma violência maior: a estrutu- volvimento adotado pelos militares.
com o Leste europeu e o Terceiro ração de um aparato de segurança ba- Esse fato praticamente limitava as tare-
Mundo;, 3) e, finalmente, sem romper seado na delação, na repressão violenta fas do governo Tancredo Neves-José
com os trabalhadores, realizar reajustes e na tortura. Sarney à preparação de leis democráti-
no consumo popular de modo a ampliar Assim como o golpe fora facilitado cas que permitissem ao País ter de fato
o nível de consumo das camadas mais pelo caráter cupulista do movimento uma Constituição democrática e pro-
pobres, contendo os reajustes salariais sindical que apoiava Jango, a repressão gressista, e não um novo arremedo de
nas faixas mais altas. terrorista é facilitada pela pouca pene- ordem jurídica.
Esse bloco, portanto, não via possibi- tração no movimento popular das orga- Todos os grandes problemas nacio-
lidades de solução da crise sem que nizações de esquerda que procuraram nais - a reforma agrária, a questão do
houvesse alterações expressivas nas es- a resistência armada ao regime do AI- capital estrangeiro, a participação dos
truturas gerais do desenvolvimento bra- 5. O baixo grau de resistência aos mili- trabalhadores e da classe opeária no
sileiro, Buscava, no entanto, a solução tares facilitou o arrocho salarial, a con- governo -- ficavam para ser resolvidos
negociada dessas reformas e afastava centração de renda e o sucesso econô- por quem mais acumulasse forças no
os esquemas considerados radicais mico dos anos 68-73, período da Nova República, tão dra-
para qualquer uma delas. Nele estavam A partir de 1974, porém, todos os fa- mática e enigmaticamente iniciada,
516
BR DFanaSB VEGNCGAM,R2Cê) / 3 31 an CO 2, p2GO

INDICE

517
BR DFANBSSVB.

O Índice do Retrato do Brasil começa de forma tradicional com


um Índice alfabético de termos. Nele você descobre as indica- POLÍTICA

ções de onde procurar o assunto que está buscando nas duas


centenas de artigos de nossa enciclopédia, CONSTITUIÇÃO

Este índice, por sua vez, o remete para o Índice de Áreas, Te- CORRUPÇÃO

mas e Assuntos, onde os termos que você procura estão encaixa- DIREITOS HUMANOS

dos. Esta segunda parte do índice é formada por cinco grandes á- ELEIÇÓES !

reas (organizadas em ordem alfabética: Cultura, Economia, Lutas ENTIDADES DEMOCRÁTICAS

FEDERALISMO
Populares, Organização Social e Política), subdivididas cada uma
HISTÓRIA
entre quatro a vinte temas (também organizados por ordem alfa-
IMPRENSA
bética), que por sua vez são subdivididos em quatro ou cinco as- JUDICIÁRIO
suntos, cada um. LEGISLATIVO

Os temas nas cinco áreas são os seguintes: LEGISLAÇÃO

LUTAS DEMOCRÁTICAS E POPULARES

MILITARES

MUNICIPALISMO

OLIGARQUIAS

OPINIÃO PÚBLICA
ARTES PARTIDOS
CIENCIA POLÍTICA EXTERNA

COMPORTAMENTO RELAÇÓOES IGREJA-ESTADO

CULTURA POPULAR SUCESSÃO PRESIDENCIAL


FILOSOFIA
HISTÓRIA Em cada tema você encontra um ou mais assuntos, também

RELIGIÃO subdivididos em aspectos que você identifica pelo verbete que

abre um pequeno resumo das matérias. Nos assuntos, estão to-

das as matérias publicadas sobre eles, e editadas separadamente

nos fascículos do Retrato do Brasil.

Um exemplo: na área ORGANIZAÇÃO SOCIAL, você encon-

tra o tema Ambiente, dividido nos assuntos Ecologia e Poluição.

CAPITAL ESTRANGEIRO
" COMÉRCIO EXTERIOR AMBIENTE

DESEMPENHO ECONOMICO
EMPREGO ECOLOGIA

ENERGIA © FLORESTA AMAZONICA: O esquema dos ciclos


básicos de vida

FINANÇAS da floresta e os riscos da sua ocupação desordenada,


com consequên-

INDÚSTRIA cias graves para todo o equilíbrio ecológico do planeta

p. 80 a 83, v. 3 A floresta vive de si mesma . . . mas é ameaçada


INFLAÇÃO pelo homem

MINÉRIOS POLUIÇÃO

PUBLICIDADE & RIOS: A situação de poluição dos rios brasileiros, resultante do de-

SALÁRIOS senvolvimento e da urbanização desorganizada

TECNOLOGIA p. 345 e 346 v. 2 A matança dos rios


e AGROTÓXICOS: A contaminação do solo pelo
TRANSPORTES uso excessivo do
uso de agrotóxicos

p. 54 e 55, v. 1 A terra envenenada


© CUBATÃO: O desenvolvimento do parque industrial de
Cubatão e
os problemas sociais e ambientais da cidade
vªgª; ):», 2 «ª F s à? à Fo .???
p. 137 a 139, v. 1 As duas caras do milagre
LUTAS POPULARES
© CONTROLE: A ausência de instrumentos municipais
eficazes para
o combate à poluição
MOVIMENTOS ESPECÍFICOS
p. 356, v. 2 Poder de baixo
TRABALHADORES

TRABALHADORES NO CAMPO
No assunto POLUIÇÃO, você encontra os verbetes RIOS,
TRABALHADORES URBANOS
AGROTÓXICOS E CUBATÃO. Os resumos que seguem
os ver-

betes permitem identificar o conteúdo básico dos artigos, dão


uma
visão do conjunto do assunto e ao mesmo tempo facilitam a
locali-

zação de um determinado artigo. Você encontra também uma


re-
ferêricia ao artigo Poder de baixo no verbete CONTROLE.
Embo-

ra o artigo não trate especificamente do assunto POLUIÇÃO,


ele
ADMINISTRAÇÃO
mostra a relação que existe entre a limitação dos poderes dos mu-
AMBIENTE
nicípios com às dificuldades de controle da poluição.
CIDADES
Para consultá-lo, você deve procurar o assunto de seu interesse
COMUNICAÇOES

CONDIÇOES DE VIDA no Índice alfabético de termos, que indicará em que área, tema

DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS e assunto você deve buscar as informações que lhe interessam.

ESPORTE E LAZER Por exemplo, o termo OAB indica Política/Entidades democráti-

POPULAÇÃO cas/O0AB, Isto significa que OAB é um assunto do tema Entidades


REGIOES democráticas, da área de Política, P
SEGURANÇA
Esse Índice remissivo você encontra nas próximas páginas, e a
TRABALHO
seguir o Índice das áreas.

518
HO&sBa, an cos, p262

ÍNDICE ALFABÉTICO DE TERMOS

ABI - v. POLÍTICA/ENTIDADES DEMOCRÁTICAS/ABI COMPORTAMENTO - v. CULTURA/COMPORTAMENTO .


ABORTO - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/SEXO COMPUTADORES - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/INFORMÁTICA
ACORDO MEC;USAID - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE COMUNICAÇOES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/COMUNICAÇÃO
VIDA/EDUCAÇÃO CONCENTRAÇÃO DO PODER - v.
ACORDO NUCLEAR - v. ECONOMIA/ENERGIA NUCLEAR POLÍTICAJFEDERALISMO/CONCENTRAÇÃO DO PODER
ADMINISTRAÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ADMINISTRAÇÃO CONE SUL - v. POLÍTICA/POLÍTICA EXTERNA/RELAÇOES BRASIL-
AGRICULTURA - v. ECONOMIA/AGRICULTURA 3 AMÉRICA LATINA 1
AGROINDÚSTRIA - v. ECONOMIA/AGRICULTURA/AGROINDÚSTRIA CONCESSÓES DE CANAIS DE TV - v. ORGANIZAÇÃO
AGROTÓXICOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/AMBIENTE/POLUIÇÃO SOCIAL/COMUNICAÇOES/TELEVISÃO *
ÁGUA E ESGOTO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇÓES DE CONDIÇÓES DE VIDA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/
VIDA/SANEAMENTO 3 CONDIÇÓES DE VIDA
ÁLCOOL - v. ECONOMIA/ENERGIA/ÁLCOOL CONFLITOS DE TERRA - v. LUTAS POPULARES/TRABALHADORES NO
ALEITAMENTO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE CAMPO/LUTA
VIDA/NUTRIÇÃO CONSCIÉNCIA ÉTNICA - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/RACISMO
ALTA SOCIEDADE - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/ALTA SOCIEDADE CONSTITUINTE - v. POLÍTICA/CONSTITUIÇÃO/CONSTITUINTE
AMAZONIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/REGIOES/AMAZÓNIA CONSTITUIÇÃO - v. POLÍTICA/CONSTITUIÇÃO
AMBIENTE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/AMBIENTE CONSUMO DE ENERGIA - v. ECONOMIA/ENERGIA/HISTÓRIA
ANALFABETISMO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE CONSUMO DE TÓXICOS - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/TÓXICOS
VIDA/EDUCAÇÃO CONTO - v. CULTURA/ARTES/LITERATURA __
ANISTIA - v. POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS/ANISTIA CONTROLE DE NATALIDADE - v. ORGANIZAÇÃO
APARATO REPRESSIVO - v. POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS/APARATO SOCIAL/POPULAÇÃO/DEMOGRA FIA
REPRESSIVO _ à CONTROLE DA POLUIÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO
APARELHOS DE RÁDIO -v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/AMBIENTEPOLUIÇÃO
SOCIAL/COMUNICAÇÃO/RÁDIO A 1 CONTROLE DO ESTADO - v. POLÍTICA/MILITARES/CONTROLE DO
ARROCHO SALARIAL - v. ECONOMIA/SALÁRIOS/POLÍTICA SALARIAL ESTADO
ARTES - v. CULTURA/AREES ? CORRUPÇÃO - v. POLÍTICA/CORRUPÇÃO A
ARTES PLÁSTICAS - v. CULTURA/ARTES/ARTES PLÁSTICAS CORTIÇOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIÁAL/CIDADES/URBANIZAÇÃO
ARTESANATO - v. CULTURA/CULTURA POPULAR/ARTESANATO CPI - v. POLÍTICA/CORRUPÇÃO/INVESTIGAÇOES _
ASSISTENCIA MÉDICA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE CRESCIMENTO POPULACIONAL - v. ORGANIZAÇÃO
VIDA/SAÚDE SOCIAL/POPULAÇÃO/DEMOGRA FIA
ATENTADOS TERRORISTAS - v. POLÍTICA/DIREITOS CRIMINALIDADE - v. ORGANIZAÇÃO
HUMANOS/ATENTADOS TERRORISTAS SOCIALSEGURANÇA/CRIMINALIDADE
ATRIBUIÇOES DO JUDICIÁRIO - v. CRISE ECONOMICA - v. ECONOMIA/DESEMPENHO ECONOMICO/CRISE
POLÍTICA/JUDICIÁRIO/PRERROGATIVAS CRISE FINANCEIRA - v. ECONOMIA/FINANÇAS/SISTEMA FINANCEIRO
ATRIBUIÇOES DO LEGISLATIVO - v. CUBATÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/AMBIENTE/POLUIÇÃO
POLÍTICA/LEGISLATIVO/PRERROGATIVAS CULTOS - y.! CULTURA/RELIGIÃO/CULTOS
AUTONOMIA MUNICIPAL - v. POLÍTICA/MUNICIPALISMO/AUTONOMIA CULTURA POPULAR - v. CULTURA/CULTURA POPULAR |
MUNICIPAL " CUSTO DE VIDA - v. ECONOMIA/INFLAÇÃO/ANDICES INFLACIONÁRIOS
AUTOPEÇAS - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA
DEMOGRAFIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/DEMOGRAFIA
BALANÇA COMERCIAL - v. ECONOMIA/MINÉRIOS/BALANÇA DENÚNCIAS DE CORRUPÇÃO - v. POLÍTICA/CORRUPÇÃO/DENÚNCIAS
COMERCIAL É DESEMPENHO ECONÓMICO - v. ECONOMIA/DESEMPENHO
BEBIDAS - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/BEBIDAS - ECONÓMICO
BENS-DE CAPITAL - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/ESTRUTURA DESEMPREGO - v. ECONOMIA/EMPREGO/DESEMPREGO E
BENS DE CONSUMO - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/ESTRUTURA SUBEMPREGO 2
BIBLIOGRAFIA DA DÍVIDA - v. ECONOMIA/CAPITAL DESNUTRIÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
ESTRANGEIRO/DÍVIDA EXTERNA 5 VIDA/NUTRIÇÃO
BNH - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE VIDA/HABITAÇÃO DIREITO DE VOTO - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/REGRAS ELEITORAIS
BRASILIANISTAS - v. POLÍTICA/AHISTÓRIA/HISTORIOGRA FIA DIREITOS DA MULHER - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/FEMINISMO
BURGUESIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/CLASSES SOCIAIS DIREITOS DO MAR - v. POLÍTICA/POLÍTICA EXTERNA/DIREITOS DO
MAR
CAMADAS SOCIAIS MÉDIAS - v. ORGANIZAÇÃO DIREITOS HUMANOS - v. POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS -
SOCIAL/POPULAÇÃO/CLASSES SOCIAIS DISSIDENCIAS MILITARES - v. POLÍTICA/MILITARES/DISSIDENCIAS
CAMPANHA DA ANISTIA - v. POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS/ANISTIA DISTRIBUIÇÃO DE RENDA - v. ECONOMIA/DISTRIBUIÇÃO DE RENDA
CAMPANHA DA CONSTITUINTE - y, DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/DISTRIBUIÇÃO.
POLÍTICA/CONSTITUIÇÃO/CONSTITUINTE , DE TERRAS
CAMPANHAS POPULARES - v. POLÍTICA/LUTAS DEMOCRÁTICAS E DÍVIDA DO TERCEIRO MUNDO - v. ECONOMIA/CAPITAL
POPULARES/CAMPANHAS ESTRANGEIRO/DÍVIDA EXTERNA
CAMPANHA PUBLICITÁRIA - v. DÍVIDA EXTERNA - v. ECONOMIA/CAPITAL ESTRANGEIRO/DÍVIDA
ECONOMIA/PUB LICIDADE/CAMPANHAS ia EXTERNA
CAMPONESES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/PGPULAÇÃO/CLASSES DOCUMENTOS HISTÓRICOS - v. CULTURA/HISTÓRIA -
SOCIAIS DOENÇAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE VIDA/SAÚDE
CAPITAL ESTRANGEIRO - v. ECONOMIA/CAPITAL ESTRANGEIRO DOENÇAS DA FOME - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
CAPOEIRA - v. CULTURA/CULTURA POPULAR/FOLCLORE VIDA/NUTRIÇÃO
CARESTIA - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS DROGAS - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/TÓXICOS
- _ESPECÍFICOS/CARESTIA e
CÁRIE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES/DE VIDA/SAÚDE ECOLOGIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/AMBIENTE
CARNAVAL - v. CULTURA/CULTURA POPULARI/CARNAVAL EDUCAÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALCONDIÇOES DE
CASSAÇOES - v.POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS/CASSAÇOES VIDA/EDUCAÇÃO
CASUÍSMOS - POLÍTICA/ELEIÇOES/REGRAS ELEITORAIS EDUCAÇÃO SEXUAL - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/SEXO _
CATOLICISMO - v. CULTURA/RELIGIÁO/CATOLICISMO EFETIVOS POLICIAIS -- v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/SEGURANÇA/POLÍCIA
CENSURA - v. POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS/CENSURA ELEIÇOES - v. POLÍTICA/ELEIÇOES
CENSURA AO TEATRO - v. CULTURA/ARTES/TEATRO ELFIÇOES PARA PREFEITO - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/REGRAS
CENTRAIS SINDICAIS - v. LUTAS ELEITORAIS
POPULARES/TRABALHADORES/ORGANIZAÇÃO , ELEIÇÓES PRESIDENCIAIS - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/REGRAS
CESARIANAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE VIDA/SAÚDE ELEITORAIS .
CHARGES - v. CULTURA/ARTES/HUMOR EMISSORAS DE RÁDIO - y. ORGANIZAÇÃO
CHORO - v. CULTURA/ARTES/MÚSICA SOCIAL/COMUNICAÇOES/RÁDIO
CIDADES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CIDADES EMPREGO - v. ECONOMIA/EMPREGO
CIENCIA - v. CULTURA/CIÉNCIA EMPRESÁRIOS - v. ECONOMIA/EMPRESÁRIOS
CINEMA - v. CULTURA/ARTES/CINEMA ENERGIA - v. ECONOMIA/ENERGIA
CLASSES SOCIAIS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/CLASSES ENERGIA ELÉTRICA - v. ECONOMIA/ENERGIA ELÉTRICA
SOCIAIS ENERGIA NUCLEAR - v. ECONOMIA/ENERGIA NÚCLEAR
€LT - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO/LEGISLAÇÃO ENTIDADES DEMOCRÁTICAS - v. POLÍTICA/ENTIDADES
CLUBE MILITAR - v. POLÍTICA/MILITARES/DISSIDENCIAS DEMOCRÁTICAS
COCA-COLA -- v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE ESCOLAS DE SAMBA - v. CULTURA/CULTURA POPULAR/CARNAVAL
VIDA/NUTRIÇÃO ESPERANÇA DE VIDA - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/VELHICE
ESPIRITISMO - v. CULTURA/RELIGIÃO/CULTOS
COLÉGIO ELEITORAL - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/REGRAS ELEITORAIS ESPORTE E LAZER - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E LAZER
COMÉRCIO EXTERIOR - v. ECONOMIA/COMÉRCIO EXTERIOR ESQUADRÃO DA MORTE - v. ORGANIZAÇÃO
COMISSOES DE FÁBRICA - v. LUTAS SOCIALSEGURANÇA/POLICIA
POPULA.RES/TRABALHADORES/ORGANIZAÇÃO ESTABELECIMENTOS RURAIS - v.
COMISSOES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO - y, ECONOMIA/AGRICULTURA/ESTABELECIMENTOS
POLÍTICA/CORRUPÇÃO/INVESTIGAÇOES ESTÁDIOS DE FUTEBOL - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E
519
BR DFANBSB VB.GNGAMBÁA OAS 2 3.3 p .26 a

LAZERI/ESPORTE INVESTIMENTOS PUBLICITÁRIOS - v.


ESTRUTURA DA JUSTIÇA - v. ORGANIZAÇÃO . ECONOMIA/PUBLICIDADE/HISTÓRIA
SOCIAL/ADMINISTRAÇÃO/JUSTIÇA
ESTRUTURA DE CLASSES - v. ORGANIZAÇÃO
SOCIAL/POPULAÇÃO/CLASSES SOCIAIS JOGADOR DE FUTEBOL - v. ORGANIZAÇÃO
ESTRUTURA DE EMPREGO - v. ECONOMIA/EMPREGO/ESTRUTURA SOCIAL/TRABALHO/LEGISLAÇÃO
ESTRUTURA DE TRANSPORTES - v. - JORNADA DE TRABALHO - v. ORGANIZAÇÃO
ECONOMIA/TRANSPORTES/ESTRUTURA SOCIAL/TRABALHO/LEGISLAÇÃO .
ESTRUTURA FUNDIÁRIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/DISTRIBUIÇÃO DE JUDICIÁRIO - y. POLÍTICA/JÚDICIÁRIO
TERRAS/ESTRUTURA FUNDIÁRIA JUROS DA DÍVIDA - v. ECONOMIA/CAPITAL ESTRANGEIRO/DÍVIDA
ESTRUTURA SINDICAL - v. ORGANIZAÇÃO EXTERNA
SOCIALTRABALHO/SINDICATOS JUSTIÇA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ADMINISTRAÇÃO
ESTUDANTES - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
ESPECÍFICOS/ESTUDANTES LAZER - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E LAZER"
EVASÃO ESCOLAR - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE LEGISLAÇÃO] - v. POLÍTICA/LEGISLAÇÃO,
VIDA/EDUCAÇÃO LEIS DE PROTEÇÃO AOCINEMA NACIONAL - v.
EVOLUÇÃO DO VOTO - y. POLÍTICA/ELEIÇOES/EVOLUÇÃO DO VOTO CULTURA/ARTES/CINEMA
EXPORTAÇÃO - v. ECONOMIA/COMÉRCIO EXTERIOR/EXPORTAÇOES LEGISLAÇÃO DE TERRAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/DISTRIBUIÇÃO
DE TERRAS/ESTRUTURA FUNDIÁRIA
FAMÍLIA - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/FAMÍLIA LEGISLAÇÃO DO CAPITAL ESTRANGEIRO - v. ECONOMIA/CAPITAL
FAVELADOS - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS ESTRANGEIRO/LEGISLAÇÃO
ESPECÍFICOS/HABITAÇÃO LEGISLAÇÃO MINERAL - v. ECONOMIA/MINEÉRIOS/LEGISLAÇÃO
FAVELAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CIDADES/URBANIZAÇÃO LEGISLAÇÃO SINDICAL - v. ORGANIZAÇÃO
FEDERALISMO - v. POLÍTICA/FEDERALISMO SOCIAL/TRABALHO/SINDICATOS
FEMINISMO - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/FEMINISMO LEGISLAÇÃO TRABALHISTA - v. ORGANIZAÇÃO
P&RAS DE MOBA - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/MODA SOCIAL/TRABALHO/LEGISLAÇÃO
FESTAS - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/ALTA SOCIEDADE LEGISLAÇÃO - v. POLÍTICA/LEGISLAÇÃO
FGTS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO/LEGISLAÇÃO LEIS DE EXCEÇÃO - v. POLÍTICA/LEGISLAÇÃO/LEIS DE EXCEÇÃO
FILMES - v. CULTURA/ARTE/CINEMA LEIS DE SEGURANÇA NACIONAL - v. POLÍTICA/LEGISLAÇÃO/LEIS DE
FILOSOFIA - v. CULTURA/FILOSOFIA SEGURANÇA NACIONAL
FINANÇAS - v. ECONOMIA/FINANÇAS LEITE EM PÓ - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/PROPAGANDA
FLORESTA AMAZÓNICA - v. ORGANIZAÇÃO LIDERANÇAS INDÍGENAS - v. ORGANIZAÇÃO
SOCIAL/AMBIENTE/ECOLOGIA; ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/ÍNDIOS
SOCIAL/REGIOES/AMAZONIA LIGAS CAMPONESAS - v. LUTAS POPULARES/TRABALHO NO
FOLCLORE - v. CULTURA/CULTURA POPULAR/FOLCLORE CAMPO/LUTAS
FOME - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE VIDA/NUTRIÇÃO LIGHT - v. ECONOMIA/ENERGIA ELÉTRICA
FONTES ENERGÉTICAS - v. ECONOMIA/ENERGIA/HISTÓRIA LITERATURA - v. CULTURA/ARTES/LITERATURA
FRAUDES ELEITORAIS - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/EVOLUÇÃO DO VOTO LUTA ARMADA - v. POLÍTICA/LUTAS DEMOCRÁTICAS E
FUNCIONALISMO - v. ORGANIZAÇÃO POPULARES/GUERRILHA
SOCIAL/ADMINISTRAÇÃO/FUNCIONALISMO LUTAS DAS MULHERES - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
FUTEBOL - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E LAZER/ESPORTE ESPECÍFICOS/MULHERES
LUTAS DEMOCRÁTICAS E POPULARES - v. POLÍTICA/LUTAS
DEMOCRÁTICAS E POPULARES
GRANDE SÃO PAULO - v. ORGANIZAÇÃO LUTAS DOS FAVELADOS - v. ORGANIZAÇÃO
SOCIAL/CIDADES/URBANIZAÇÃO SOCIAL/CIDADES/URBANIZAÇÃO .
GRAU DE URBANIZAÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO LUTAS DOS HOMOSSEXUAIS - y. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
SOCIAL/CIDADES/URBANIZAÇÃO ESPECÍFICOS/HOMOSSEXUAIS
GREVES - v. LUTAS POPULARES/TRABALHADORES LUTAS DOS NEGROS - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
URBANOS/HISTÓRIA _ ESPECÍFICOSNEGROS
GRUPO VOTORANTIM - v. ECONOMIA/EMPRESÁRIOS/GRUPO LUTAS INDÍGENAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/ÍNDIOS
VOTORANTIM 2 LUTAS NO CAMPO - v. LUTAS POPÚLARES/TRABALHADORES NO
GUERRILHA - v. POLÍTICA/LUTAS DEMOCRÁTICAS E CAMPO/LUTAS
POPULARES/GUERRILHA LUTAS POR HABITAÇÃO - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
ESPECÍFICOS/HABITAÇÃO
HABITAÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE LUTAS POR TRANSPORTES - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
VIDA/HABITAÇÃO ESPECÍFICOS/TRANSPORTES
HAVERES FINANCEIROS - v. ECONOMIA/FINANÇAS/SISTEMA
FINANCEIRO MARINHEIROS - v. POLÍTICA/MILITARES/SUBALTERNOS
HISTÓRIA - v. POLÍTICA/HISTÓRIA; CULTURA/HISTÓRIA MAR TERRITORIAL - v. POLÍTICA/POLÍTICA EXTERNA/DIREITOS DO
HISTORIOGRAFIA - v. POLÍTICA/HISTÓRIA/HISTORIOGRAFIA MAR
HOMOSSEXUALISMO - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/SEXO MEDICAMENTOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
HUMOR - v. CULTURA/ARTES/HUMOR VIDA/SAÚDE
MENORES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/MENORES
IDOSOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/VELHOS MERCADO CINEMATOGRÁFICO - y. CULTURA/ARTES/CINEMA
IMPORTAÇÃO - v. ECONOMIA/COMÉRCIO EXTERIORAMPORTAÇOES MERCADO DE TRABALHO FEMININO - v. ORGANIZAÇÃO
SOCIAL/POPULAÇÃO/MULHERES
IMPOSTOS - v. ECONOMIA/FINANÇAS/TRIBUTAÇÃO MESSIANISMO - v. CULTURA/RELIGIÁO/MISTICISMO
IMPRENSA - v. POLÍTICA/AMPRENSA METALÚRGICOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO/SINDICATOS
IMPRENSA POPULAR - v. POLÍTICAAMPRENSA/MPRENSA POPULAR MIGRAÇOES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/DEMOGRAFIA
INCENTIVOS FISCAIS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/REGIOES/NORDE
INDICADORES DE SAÚDE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOESSTEDE
MILITARES - y. POLÍTICA/MILITARES
VIDA/SAÚDE MILITARIZAÇÃO - v. POLÍTICA/MILITARES/CONTROLE DO ESTADO
INDICE DE GINI - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALDISTRIBUIÇÃO DE MILITARIZAÇÃO DA POLÍCIA - v. ORGANIZAÇÃO
TERRA/ESTRUTURA FUNDIÁRIA SOCIALSEGURANÇA/POLÍCIA
INDICES INFLACIONÁRIOS - v. ECONOMIA/INFLAÇÃO/ANDICES MINÉRIOS - v. ECONOMIA/MINÉRIOS
MISTICISMO - v. CULTURA/RELIGIÁO/MISTICISMO
INDIOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/ÍNDIOS MODA - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/MODA
MODALIDADES ESPORTIVAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E
INDÚSTRIA - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA _- LAZER/ESPORTE
INDUSTRIALIZAÇÃO - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/HISTÓRIA MORATÓRIA - v. ECONOMIA/CAPITAL ESTRANGEIRO/DÍVIDA
INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA EXTERNA
AUTOMOBILÍSTICA ! MORTOS E DESAPARECIDOS - y. POLÍTICA/DIREITOS
INDUSTRIA BÉLICA - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA BÉLICA HUMANOS/MORTOS E DESAPARECIDOS _
INDÚSTRIA DE BEBIDAS - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/BEBIDAS MOVIMENTO SINDICAL - v. LUTAS POPULARES/TRABALHADORES
INDÚSTRIA DE COMPUTADORES - v, URBANOS/HISTÓRIA
ECONOMIA/INDÚSTRIA/INFORMÁTICA MOVIMENTOS POPULARES - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
INDÚSTRIA TEXTIL - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA TEXTIL ESPECÍFICOS
INFLAÇÃO - v. ECONOMIA/INFLAÇÃO MULHERES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/MULHERES
INFORMÁTICA - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/ANFORMÁTICA MUNICIPALISMO - v. POLÍTICA/MUNICIPALISMO
INFRATORES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/MENORES MÚSICA - v. CULTURA/ARTES/MÚSICA
INSTITUTOS DE PESQUISA - v. CULTURA/CIÉNCIA/PESQUISA MUTUÁRIOS - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS
CIENTÍFICA ESPECÍFICOS/HABITAÇÃO
INTERNACIONALIZAÇÃO DA AMAZONIA - v. ORGANIZAÇÃO
SOCIAL/REGIOES/AMAZONIA NEGROS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/NEGROS
INTERPRETAÇÃO DA HISTÓRIA - v. NORDESTE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/REGIOES/NORDESTE
NUTRIÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
POLÍTICA/HISTÓRIA/HISTORIOGRAFIA VIDA/NUTRIÇÃO
INTERVENÇOES EM SINDICATOS - v. ORGANIZAÇÃO
SOCIALTRABALHO/SINDICATOS OAB - v. POLÍTICA/ENTIDADES DEMOCRÁTICAS/OAB
INVESTIGAÇÓES DE CORRUPÇÃO - v. OLIGARQUIAS - v. POLÍTICA/OLIGARQUIAS /
POLÍTICA/CORRUPÇÃO/INVESTIGAÇOES OLIMPÍADAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E LAZER/ESPORTE
INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS - v. ECONOMIA/CAPITAL OPERARIADO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/CLASSES
ESTRANGEIROANVESTIMENTOS SOCIAIS
520
2 o né) 12 1 E ,
" BRDFANBSS vaGNWɪºÉÍÇÉ'É n 002, p2ês9
OPINIÃO PÚBLICA - v. POLÍTICA/OPINIÃO PÚBLICA REDES DE TV - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/COMUNICAÇOES/TELEVISÃO
ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES - y. LLHÁAS
POPULARES/TRABALHADORES'ORGANIZL/Ég O
REFORMA ADMINISTRATIVA - v. ORGANIZAÇÃO
SOCIAL/ADMINISTRAÇÃO/FUNCIONALISMO
ÓRGÃOS DE PESQUISA DE OPINIÃO - v. POLÍTICA/OPINIÃO REFORMA AGRÁRIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALDISTRIBUIÇÃO DE,
PÚBLICA/ÓRGÃOS DE PESQUISA DE OPINIÃO TERRAS/ESTRUTURA FUNDIÁRIA ,
ÓRGÃOS DE REPRESSÃO - v. POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS/APARATO REFRIGERANTES - v. ECONOMIA/INDÚSTRIA/BEBIDAS
REPRESSIVO REGIOES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/REGIOES
REGIOES METROPOLITANAS - v. ORGANIZAÇÃO
PADROES MUSICAIS - v. CULTURA/ARTES/MÚSICA SOCIAL/CIDADES/URBANIZAÇÃO
PARTIDOS - v. POLÍTICA/PARTIDOS REGRAS ELEITORAIS - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/REGRAS ELEITORAIS
PATENTES - v. ECONOMIA/TECNOLOGIA/PRODUÇÃO RELAÇÓOES BRASIL-ÁFRICA - v. POLÍTICA/POLÍTICA
PEQUENA PROPRIEDADE - y. 2 EXTERNA/RELAÇOES BRASIL-ÁFRICA
ECONOMIA/AGRICULTURAESTABELECIMENTOS RELAÇOES BRASILAMÉRICA LATINA - v. POLÍTICA/POLÍTICA
PERSONAGEM DE FICÇÃO - v. CULTURA/ARTES/LITERATURA EXTERNA/RELAÇOES BRASIL-AMÉRICA LATINA
PESQUISA CIENTÍFICA - v. CULTURA/CIÉNCIA/PESQUISA CIENTÍFICA RELAÇOES BRASIL-EUA - v. POLÍTICA/POLÍTICA EXTERNA/RELAÇOES
PESQUISA TECNOLÓGICA - y. ECONOMIA/TECNOLÓGIA/PRODUÇÃO BRASIL-EUA
PESQUISADORES - v. CULTURA/CIENCIA/PESQUISA CIENTÍFICA RELAÇÓOES DE TRABALHO - v. ORGANIZAÇÃO -
PETROBRÁS - v. ECONOMIA/ENERGIA/PETRÓLEO SOCIALTRABALHO/RELAÇOES DE TRABALHO
PETRÓLEO - v. ECONOMIA/ENERGIA/PETRÓLEO RELIGIÃO - v. CULTURA/RELIGIÃO
PIB (PRODUTO INTERNO BRUTO) - v. ECONOMIA/DESEMPENHO RELIGIOSIDADE - v. CULTURA/RELIGIÃO/RELIGIOSIDADE
. ECONÓMICO/PIB REMESSA DE LUCROS - v. ECONOMIA/CAPITAL
POESIA - v. CULTURA/ARTES/POESIA ESTRANGEIRO/INVESTIMENTOS /
POLÍCIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALSEGURANÇA/POLÍCIA RENDA FUNCIONAL - v. ECONOMIA/DISTRIBUIÇÃO DE RENDA/RENDA
POLÍTICA AGRÍCOLA - v. ECONOMIA/AGRICULTURA/PRODUÇÃO FUNCIONAL á
POLÍTICA CARCERÁRIA - v. ORGANIZAÇÃO RENDA SALARIAL - v. ECONOMIA/DISTRIBUIÇÃO DE RENDA/RENDA
SOCIAL/SEGURANÇA/PRISÓES T SALARIAL
POLÍTICA CIENTÍFICA - v. CULTURA/CIEÉNCIA/PESQUISA CIENTÍFICA RENEGOCIAÇÃO DA DÍVIDA - v. ECONOMIA/CAPITAL
POLÍTICA DE OCUPAÇÃO DA AMAZONIA - v. ORGANIZAÇÃO ESTRANGEIRO/DÍVIDA EXTERNA P 2
SOCIAL/REGIOES/AMAZONIA RESERVA DE MERCADO - v. ECONOMIA/ANDÚSTRIA/ANFORMÁTICA
POLÍTICA DE PROTEÇÃO AO MENOR - v. ORGANIZAÇÃO ROBOTIZAÇÃO - v. ECONOMIA/EMPREGO/DESEMPREGO E
SOCIAL/POPULAÇÃO/MENORES SUBEMPREGO
POLÍTICA DE SAÚDE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
VIDA/SAÚDE SALÁRIOS - v. ECONOMIA/SALÁRIOS
POLÍTICA DE TRANSPORTES -v. ___ SANEAMENTO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
CONOMIA/TRANSPORTES/ESTRUTURA VIDA/SANEAMENTO
POLÍTICA EDUCACIONAL - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALCONDIÇOES!/ DE SAQUES - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS ESPECÍFICOS/CARESTIA
VIDA/EDUCAÇÃO SARGENTOS - v. POLÍTICA/MILITARES/SUBALTERNOS d
POLÍTICA ENERGÉTICA - v. ECONOMIA/ENERGIA/HISTÓRIA SAÚDE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE VIDA/SAÚDE
POLÍTICA EXTERNA - v. POLÍTICA/POLÍTICA EXTERNA SEGURANÇA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALSEGURANÇA
POLÍTICA HABITACIONAL - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE SERVIÇO DA DÍVIDA - v. ECONOMIA/CAPITAL ESTRANGEIRO/DÍVIDA
VIDA/HABITAÇÃO # , EXTERNA
POLÍTICA INDIGENISTA - v. ORGANIZAÇÃO SEXO - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/SEXO
SOCIAL/POPULAÇÃO/ÍNDIOS SINDICALIZAÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO/SINDICATOS
POLÍTICA POPULACIONAL - v. ORGANIZAÇÃO SINDICATOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRABALHO/SINDICATOS
SOCIAL/POPULAÇÃO/DEMOGRA FIA SISTEMA FINANCEIRO - v. ECONOMIA/FINANÇAS/SISTEMA
POLÍTICA PREVIDENCIÁRIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALPREVIDENCIA FINANCEIRO
POLÍTICA SALARIAL - v. ECONOMIA/SALÁRIOS/POLÍTICA SALARIAL SISTEMA INTERAMERICANO - v. POLÍTICA/POLÍTICA
POLÍTICA SINDICAL - v. ORGANIZAÇÃO EXTERNA/RELAÇOES BRASU;AMÉRICA LATINA !
SOCIAL/TRABALHO/SINDICATOS SISTEMA PARTIDÁRIO - v. POLÍTICA/PARTIDOS/SISTEMA PARTIDÁRIO
POLÍTICA URBANA - v. ORGANIZAÇÃO SOLDADOS - v. POLÍTICA/MILITARES/SUBALTERNOS
SOCIAL/CIDADES/URBANIZAÇÃ SUBEMPREGO - v. ECONOMIA/EMPREGO/DESEMPREGO E
POLUIÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALAMBIENTE/POLUIÇÃO SUBEMPREGO
POLUIÇÃO DOS RIOS - v. ORGANIZAÇÃO SUCESSÃO PRESIDENCIAL - v. POLÍTICA/SUCESSÃO PRESIDENCIAL
SOCIAL/AMBIENTE/POLUIÇÃO SUDENE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/REGIOES/NORDESTE
POPULAÇÃO - v. ORGANIZAEÃO SOCIAL/POPULAÇÃO
PRÁTICA ESPORTIVA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E
LAZER/ESPORTE TAXA DE JUROS INTERNACIONAIS - v. ECONOMIA/CAPITAL
PRÉ-ESCOLA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES ESTRANGEIRO/DÍVIDA EXTERNA
DE VIDA/EDUCAÇÃO TEATRO - v. CULTURA/ARTES/TEATRO
PREFERENCIAS PARTIDÁRIAS - v. POLÍTICA/PARTIDOS/SISTEMA TECIDOS -v. ECONOMIAINDÚSTRIA TEXTIL
PARTIDÁRIO TECNOLOGIA - v. ECONOMIA/TECNOLOGIA
PRERROGATIVAS DO JUDICIÁRIO - v. TECNOLOGIA NUCLEAR - v. ECONOMIA/TECNOLOGIA/PROD'IÇÃO
POLÍTICA/JUDICIÁRIO/PRERROGATIVAS TELEVISÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/COMUNICAÇOES/TELEVISÃO
PRERROGATIVAS DO LEGISLATIVO - v. TEMPO LIVRE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ESPORTE E LAZER/LAZER
- POLÍTICA/LEGISLATIVO/PRERROGATIVAS TENDENCIAS DO ELEITORADO - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/EVOLUÇÃO DO
PRÉVIAS ELEITORAIS - v. POLÍTICA/ELEIÇOES/EVOLUÇÃO DO VOTO VOTO
PREVIDENCIA - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/PREVIDENCIA TERRAS INDÍGENAS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/ÍNDIOS
PRISOES - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/SEGURANÇA/PRISOES TORTURA - v. POLÍTICA/DIREITOS HUMANOS/TORTURA
PROÁLCOOL - v. ECONOMIA/ENERGIA/ÁLCOOL TÓXICOS - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/TÓXICOS
PRODUÇÃO AGRÍCOLA - v. ECONOMIA/AGRICULTURA/PRODUÇÃO TRABALHO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIALTRABALHO
PRODUÇÃO CINEMATOGRÁFICA - v. CULTURA/ARTES/CINEMA TRABALHO DA MULHER - v. ORGANIZAÇÃO
PRODUÇÃO DE ALIMENTOS - v. SOCIAL/POPULAÇÃO/MULHERES N
ECONOMIA/AGRICULTURA/PRODUÇÃO TRABALHO DO MENOR - v. ORGANIZAÇÃO
PRODUÇÃO DE TECNOLOGIA - v. f SOCIAL/POPULAÇÃO/MENORES
ECONOMIA/TECNOLOGIA/PRODUÇÃO , TRABALHADORES - v. LUTAS POPULARES/TRABALHADORES
PRODUÇÃO LITERÁRIA - v. CULTURA/ARTES/LITERATURA TRABALHADORES NO CAMPO - v. LUTAS
PRODUÇÃO MUSICAL - v. CULTURA/ARTES/MÚSICA POPULARESTRABALHADORES NO CAMPO
PRODUTO INTERNO BRUTO - v. ECONOMIA/DESEMPENHO TRABALHADORES URBANOS - v. LUTAS
ECONOMICO/PIB POPULARESTRABALHADORES URBANOS +
PROGRAMAÇÃO DE TV - v. ORGANIZAÇÃO TRANSPORTE URBANO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES
' SOCIAL/COMUNICAÇOES/TELEVISÃO DE VIDA/TRANSPORTE URBANO
PROPAGANDA - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/PROPAGANDA TRANSPORTES - v. ECONOMIA/TRANSPORTES
PROSTITUIÇÃO - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/SEXO TRIBUTAÇÃO - v. ECONOMIA/FINANÇAS/TRIBUTAÇÃO
PROTESTANTISMO - v. CULTURA/RELIGIÃO/CULTOS
PUBLICIDADE - v. ECONOMIA/PUBLICIDADE ULTRADIREITA - v. POLÍTICA/PARTIDOS/SISTEMA PARTIDÁRIO
PUBLICIDADE NA TV - v. ORGANIZAÇÃO UNE - v. LUTAS POPULARES/MOVIMENTOS ESPECÍFICOS/ESTUDANTES
_ SOCIAL/COMUNICAÇOES/TELEVISÃO UNIVERSIDADE - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
PÚBLICO DE TEATRO - v. CULTURA/ARTES/TEATRO VIDA/EDUCAÇÃO 2
URBANIZAÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CIDADES/URBANIZAÇÃO
QUADRINHOS - v. CULTURA/ARTES/QUADRINHOS
VELHICE - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/VELHICE
RAÇÃO ESSENCIAL MÍNIMA - v. ECONOMIA/SALÁRIOS/NÍVEIS VELHOS - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/POPULAÇÃO/VELHOS
SALARIAIS VERBAS PUBLICITÁRIAS - v. ECONOMIA/PUBLICIDADE/CAMPANHAS
RACISMO - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/RACISMO VERBAS PARA EDUCAÇÃO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/CONDIÇOES DE
'RÁDIO - v. ORGANIZAÇÃO SOCIAL/COMUNICAÇÓES/RÁDIO VIDA/EDUCAÇÃO
REAJUSTES SALARIAIS - v. ECONOMIA/SALÁRIOS/INÍVEIS SALARIAIS VIOLENCIA SEXUAL - v. CULTURA/COMPORTAMENTO/SEXO

521
33 1 an coa , p 269
ar pransse viera. A0

ÍNDICE DE ÁREAS, TEMAS E ASSUNTOS

rência estrangeira, o consumo restrito e o alijamento da vanguarda e da


velha guarda
p. 445 a 448, v. 2 Fora do ritmo
e MUSICOGRAFIA : Uma seleção dos discos mais característicos no
CULT período entre 1964 e 1984, em cada um dos tipos da música brasileira:
velha guarda, bossa nova e descendentes, jovem guarda e o rock acli-
matado, festivais e canção de protesto, tropicalismo e afluentes, samba
contemporâneo, neo-regionais e instrumental novo
ARTES p. 224 a 228, v. 3 O som do Brasil
© CHORO: A história do choro e de sua luta pela sobrevivência
ARTES PLÁSTICAS p. 21 a 24, v. 1 A arte do choro e chorões
e HISTÓRIA : A evolução das contradições da sociedade brasileira, na © PADROÓES MUSICAIS: Os reflexos da música estrangeira na
expressão dos artistas plásticos música brasileira e a progressiva invasão da música internacional no
p. 513 a 516, v. 2 Uma arte politizada Brasil, através dos meios de comunicação de massa
p. 200 a 202, v. 1 O sotaque americano
CINEMA P © TEMÁTICA: Os reflexos da realidade do País nos temas da música
e HISTÓRIA: A evolução do cinema nacional, suas dificuldades, as popular
sucessivas leis de proteção, a evolução dos órgãos federais voltados p. 323 e 324, v. 2 O espelho do País
para o cinema e as relações entre os cineastas e a Embrafilme
p. 181 a 186, v. 1 Do cinematógrafo à Embrafilme QUADRINHOS
e PRODUÇÃO: A evolução dosfilmes brasileiros produzidos e dos fil- e HISTÓRIA : Os quadrinhos no Brasil, desde o começo do século, e a
mes estrangeiros exibidos luta pela reserva de mercado para o produto nacional
p. 186 v. 1 Cinema no País (tabela) p. 426 a 428, v. 2 Festa em Patópolis
© FILMES NACIONAIS: Seleção de filmes mais característicos do ci- e CRONOLOGIA : A cronologia da história em quadrinhos nacional
nema nacional, por tipos - os pioneiros, humor paulista, chanchada, ci- p. 428, v. 2 Breve história da HQ, no Brasil
nema novo, alternativos, cangaço e aventura, teatro filmado, políticos,
originalidades TEATRO
p. 92 a 95, v. 3 Os grandes momentos e HISTÓRIA : A evolição do teatro brasileiro, o surgimento de grupos
© LEIS DE PROTEÇÃO: A cronologia da legislação de proteção ao teatrais inovadores no início da década de 60, seu esmagamento pelo
cinema nacional golpe, o surgimento das superproduções e dos novos grupos no final
p. 184, v. 1 Sob a proteção da lei dos anos 70
e FILMES MILITANTES: A produção de filmes vinculados à ação p. 289 a 292, v. 2 Luz/treva no palco
política, a partir da década de 70 © ETAPAS: A evolução do teatro brasileiro, em cinco etapas: 1580 -
p. 285 e 286, v. 2 Cineastas em ação A Catequese; 1780 - O Tema; 1910 - O Ator; 1940 - O Diretor; 1973
e FILMES MILITANTES: A história do filme Cabra Marcado para - A Empresa
Morrer, que narra as circunstâncias da morte de um líder das ligas cam- p. 146 a 148, v. 3 Cinco etapas do teatro nacional
ponesas e PÚBLICO: A evolução do público teatral e da montagem de peças
p. 396, v. 2 A luta chega ao cinema p. 149, v. 3 Um teatro para 5%
e FILMES ESTRANGEIROS: O acesso do público brasileiro ao ci- © CENSURA: A cronologia das grandes ações da censura aos espetá-
nema estrangeiro de boa qualidade, dificultado pela censura e pela ava- culos teatrais, cujos danos foram incalculáveis
lancha hollywoodiana p. 150, v. 3 1964-79: 15 anos de teatro censurado
p. 95 e 96, v. 1 Da treva a Hollywood 7
e MERCADO CINEMATOGRÁFICO: A evolução vista através dos
ingressos vendidos, dos filmes exibidos, das salas de exibição e do pú- CIENCIA
blico
p. 96, v. 3 Os estrangeiros dominam o mercado . . . que diminui a cada ano
p. 96,v. 3 Última sessão de cinema PESQUISA CIENTÍFICA
e POLÍTICA: A dependência tecnológica decorrente do modelo eco-
HUMOR nômico e a luta política dos cientistas, expressa através das reuniões da
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
e HISTÓRIA: A: evolução do humor político no período do Regime p. 349 a 353, v. 2 De costas para a pesquisa
Militar - reeditando uma característica de épocas anteriores -, com
destaque para a história do semanário Pasquim e INVESTIMENTOS: A evolução dos gastos do governo com ciência
p. 469 a 471, v. 2 Um combate muito sério e tecnologia no Brasil e em outros países e a procedência da tecnologia
utilizada pela indústria brasileira
e BARÃO DE ITARARÉ: A história do humorista e suas publicações
p. 470, v. 2 As lições do Barão p. 176 e 177, v. 3 O que se fez pela ciência no Brasil
© CHARGES: Uma seleção de charges de humoristas brasileiros sobre p. 352, v. 2 Modelo americano
temas políticos do período do Regime Militar e PESQUISADORES: A evolução do número de alunos de pós-
graduação, a participação dos pesquisadores na população economica-
p. 236 a 240, v. 3 Vinte anos de humor ... com muita seriedade
mente ativa e na população total em alguns países
p. 178, v. 3 Trabalhadores da ciência: contingente crescendo, mas ainda
LITERATURA muito pequeno,
e HISTÓRIA: A evolução do romance brasileiro, refletindo os movi- e INSTITUTOS DE PESQUISA: As quatro etapas do desenvolvi-
mentos sociais, como memória viva de cada período mento da ciência no Brasil e as instituições criadas em cada uma delas
p. 309 a 311, v. 2 Sambas-enredo p. 179 e 180, v. 3 As quatro etapas das instituições
e CONTO: O painel traçado pelo conto no Brasil, a influência da re- v. tb. A
pressão na produção literária e o surgimento de novos temas e novos POLÍTICA/ DIREITOS HUMANOS/CASSAÇÓOES
contistas
. p. 347 e 348, v. 2 O grande mosaico
e POESIA : A evolução da produção, sua qualidade literária e a evolu- COMPORTAMENTO
ção do mercado, ainda restrito
p. 366 e 367, v. 2 A poesia em progresso
e PERSONAGENS DE FlCÇíO: Os novos personagens, frutos da ALTA SOCIEDADE
modernização conservadora, como os executivos, bôias-frias e ope- e FESTAS: As grandes festas promovidas pelas elites brasileiras - do
rários urbanos baile da Ilha Fiscal até as sofisticadas noitadas dos anos 80
p. 504, v. 2 Novas personagens p. 273 a 276, v. 2 A ostentação do poder

MÚSICA FAMÍLIA
e PRODUÇÃO: O mercado da música popular brasileira: a concor- e TAMANHO: O impacto da urbanização acelerada e do modelo eco-

522
GAMAR0
vole 29. ICO2, p AG
pr

nômico sobre o tamanho da família e EDUCAÇÃO SEXUAL: As tentativas de estabelecer programas de


p. 79 e 80, v. | O amargo sabor do lar educação sexual institucional e a reação a essas iniciativas
v, t6. p. 166, v. 1 Sexo nas escolas /
e IDOSOS: A diminuição do tamanho das famílias e a marginalização e PROSTITUIÇÃO: A evolução da mercantilização do sexo e o surgi-
dos idosos mento de novas formas - dos motéis às sex-shops
p. 126 a 128, v. 1 Solidão no envelhecer p. 287 e 288, v. 2 Sexo à venda
e MENORES: Os reflexos da desagregação familiar sobre a marginali- e ABORTO: A evolução da legislação sobre o aborto e a prática clan-
zação dos menores destina
p. 301 a 304, v. 2 Nossos pixotes p. 118, v. 1 A miopia da lei
%
FEMINISMO TÓXICOS
e HISTÓRIA: A evolução da organização e das lutas das mulheres, e CONSUMO: A evolução do consumo de tóxicos, sua disseminação,
seus congressos e entidades, e sua participação nas lutas da sociedade as mortes associadas ao uso de drogas, a posição do Brasil na rota inter-
p. 486 a 488, v. 2 As lutas das mulheres nacional do tráfico e o combate ao tráfico e ao consumo
& DIREITOS DA MULHER: Os direitos da mulher na legislação bra- p. 477 a 480, v. 2 Consumo em alta
sileira, desde as Ordenações Filipinas até o Código Civil de 1962, e as v. tb.
mudanças propostas para um novo Código e VÍTIMAS: Os casos de violência sexual associados com o consumo
p.. 35 e 36, v. l A sombra do patriarcado de tóxicos
e PARTICIPAÇÃO POLÍTICA : A evolução da participação das mu- p. 178 a 180, v. | Sexo bruto
lheres nas lutas políticas, com destaque para alguns movimentos em
que essa participação foi marcante, como anistia, carestia, etc. VELHICE -
p. 354 e 355, v. 2 A mulher na rua e MARGINALIZAÇÃO: O processo de marginalização dos velhos na
v. tb. família, no trabalho e na vida social, como produto de uma sociedade
e ANISTIA: A participação das mulheres na luta pela anistia voltada para a eficiência do lucro
p. 31 a 34, v. | Em busca de justiça p. 126 a 128, v. 1 Solidão no envelhecer
© ESPERANÇA DE VIDA: As diversas teorias científicas sobre o li-
MODA mite biológico do tempo de vida do homem
e HISTÓRIA: A evolução da moda, acompanhando a tendência de p. 128, v. 1 Até onde pode ir a vida
maior integração das mulheres na força de trabalho e as necessidades e
inovações da indústria têxtil
p. 441 a 444, v. 2 A montagem da moda CULTURA POPULAR
© INFLUENCIA ESTRANGEIRA: A criação da moda em outros
países e o hábito dos estilistas brasileiros de copiá-los ARTESANATO
p. 444, v. 2 As inspirações importadas © NORDESTE: O papel do artesanato na economia nordestina: o
© FEIRAS: O papel das feiras da indústria têxtil no lançamento da apoio governamental, as imposições do mercado e a marginalização
moda dos artesãos
p. 443, v. 2 Feiras de moda p. 236 a 238, v. | A arte de Caruaru

PROPAGANDA CARNAVAL
e LEITE EM PÓ: A campanha promocional do leite em pó, apoiada e ESCOLAS DE SAMBA: A evolução das escolas de samba cariocas
na própria estrutura de saúde pública e nos médicos, e os problemas de desde os tempos da marginalização, passando pela oficialização, a os-
saúde das crianças decorrentes do abandono do aleitamento materno tentação que reflete a modernização do País até surgirem os sinais de
p. 29 e 30, v. 1 Uma campanha maléfica mudança
# COCA-COLA : As campanhas promocionais da Coca-Cola e de ou- p. 66 a 68, v. 1 Superescolas S.A.
tros refrigerantes para garantir sua fatia no mercado
p. 175 a 177, v. L É isso' aí
FOLCLORE
e CAPOEIRA : A evolução da luta de capoeira: suas origens como ma-
RACISMO nifestação de resistência dos escravos, e sua expansão -
e HISTÓRIA: O constante processo de discriminação e marginaliza- p. 305 e 306, v. 2 A ginga da liberdade
ção dos não-brancos no nível econômico, social, cultural e existencial,
desde a abolição da escravatura
p. 109 a 113, v. 1 A herança do cativeiro FILOSOFIA
e CONSCIÉNCIA ÉTNICA: As inúmeras formas pelas quais as pes-
soas definem a sua cor
p. 112, v. 1 As cores do brasileiro HISTÓRIA
e SITUAÇÃO DOS NEGROS: A evolução da população não-branca, e EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO: As limitações impostas pelo
sua situação educacional e profissional imediatismo, utilitarismo e pragmatismo das ideologias dominantes
p. 56 e 57, v. 3 Um Brasil cada vez menos branco . . . onde os pretos e par- para o desenvolvimento do pensamento no Brasil
dos ganham pouco . . . têm poucas oportunidades de ascensão social . . . e de p. 417 e 418, v. 2 Asas cortadas
acesso à instrução
e LUTAS DOS NEGROS: A cronologia das lutas dos negros pela li-
bertação e pela conquista da igualdade HISTÓRIA
p. 59 e 60, v. 3 Contra a escravidão e o racismo
v. tb. HISTORIOGRAFIA
e FUTEBOL: A discriminação contra os negros em alguns dos primei-
e DOCUMENTOS: O descaso do governo e de portadores particula-
ros clubes de futebol
res de documentos com a preservação do material histórico nacional
p. 217 a 222, v. 1 No país do futebol
p. 245 e 246, v. 1 Destruição da memória
SEXO
e POLÍTICA OFICIAL: O projeto conservador do Regime Militar na RELIGIÃO
área da família e do comportamento sexual, as mudanças na estrutura
da sociedade que empurraram as mulheres para o mercado de trabalho RELIGIOSIDADE
e as transformações que inviabilizaram esse projeto
p. 49 a 52, v. 1 A moral da história & ADEPTOS: A evolução das religiões no Brasil e no mundo, do ponto
e VIOLÉNCIA SEXUAL: A violência sexual em todas as camadas da de vista do número de adeptos declarados ou estimados
população, com destaque para os casos de Lindomar Castilho-Eliane p. 164 a 166, v. 3 As religiões no Brasil (tabelas e gráficos)
de Grammont, Doca Street-Angela Diniz, Aracelli e Alfredo Buzaid Jr. p. 167 e 168, v. 3 As religiões no mundo (tabelas e mapa)
p. 178 a 180, v. 1 Sexo bruto
e HOMOSSEXUALISMO: Os preconceitos, a repressão e a explora- CULTOS
ção consumista, que cercam o homossexualismo, ao lado de sinais de © CATOLICISMO: A evolução do número de católicos no Brasil, a
mudança, com a conquista de direitos evolução da distribuição dos católicos pelo mundo, o peso dos católicos
, p. 152 e 153, v. 1 O consumo e o medo em cada continente, e os resultados de uma pesquisa sobre a prática da

523
ar oransss vaençaa24 042394 3n0o2, p 26%

missa Equivalentes-homem da composição do emprego no campo


p. 164 e 165, v. 3 O recuo do catolicismo (tabelas e gráfico) p. 132, v. 1 Uma evolução incompleta
p. 168, v. 3 O continente dos católicos (tabela) v. tb.
e PROTESTANTISMO: A evolução das seitas protestantes no Brasil LUTAS POPULARES/TRABALHADORES NO CAMPO
e a evolução dos pentecostais entre os protestantes
p. 166, v. 3 Entre os protestantes, o salto dos pentecostais (tabela e gráfico)
e ESPIRITISMO: O número total de adeptos do ramo kardecista e CAPITAL ESTRANGEIRO
dos rituais afro-brasileiros
p. 166, v. 3 O peso da umbanda e do candomblé (tabela) DÍVIDA EXTERNA
e HISTÓRIA : A evolução da dívida brasileira, desde a Independência,
MISTICISMO as características e montante em cada período e o eterno mecanismo
e MESSIANISMO: No Nordeste, sua repressão e utilização pelas clas- de contrair dívidas novas para pagar velhas
ses dominantes, e a luta da Igreja progressista para mudar esta situação p. 25 a 28, v. 1 Os grilhões que nos forjaram
p. 101 a 103, v. 1 Crenças da miséria e MORATÓRIA : A história dos reescalonamentos da dívida e da sus-
pensão dos pagamentos em momentos de grandes dificuldades cam-
biais
p. 105 a 108, v. 1 A moratória e sua lógica
ECONOMIA e MONTANTE: O montante da dívida brasileira nos períodos presi-
denciais
p. 20 a 22, v. 3 A dívida (em US$ bilhões) e os períodos presidenciais
AGRIÇULTURA e MONTANTE E PIB: A evolução da dívida como parte do PIB, em
porcentagem
AGROINDÚSTRIA p. 21, v. 3 ... engole o PIB...
e PRESENÇA DO CAPITAL ESTRANGEIRO: A participação es- e SERVIÇO: A evolução do serviço da dívida (amortizações mais ju-
trangeira na especulação da terra, no comércio de produtos agricolas e ros) como parte das exportações torais, em porcentagem de 1929 a 1984
no complexo agroindustrial p. 20 a 22, v. 3 A velha divida, sempre fora de controle...
p. 225 a 228, v. 1 A invasão do campo e SERVIÇO/JUROS: A evolução do total de juros pagos sobre a di-
e MÁQUINAS E INSUMOS: A agricultura, espremida entre as em- vida brasileira, em bilhões de dólares, de 1968 a 1984
presas produtoras de máquinas e insumos e as empresas que processam p. 20, v. 3 ... faz disparar os juros...
produtos agrícolas e SERVIÇO E PETRÓLEO: Valores da importação e exportação de
p. 226, v. 1 Processo "sanduiche": são as múltis na nossa agricultura petróleo comparados à dívida e ao serviço da dívida no Brasil e em ou-
p. 228, v. 1 A montagem do complexo agroindustrial (tabela) tros países da América Latina
p. 22, v. 3 ... e o petróleo é só um bode expiatório
e BIBLIOGRAFIA : Os livros e publicações da imprensa que analisam
AGROTÓXICOS a situação da dívida externa brasileira desde 1935
e CONSUMO: O uso indiscriminado de agrotóxicos em grandes quan- p. 17, v. 1 Não foi por falta de aviso
tidades, seus efeitos nocivos sobre a saúde e as novas pragas que apare- e CREDORES: Os principais credores da dívida brasileira no Império,
ceram na agricultura na República Velha, na era de Vargas, na República Populista e no Re-
p. 54 e 55, v. 1 A terra envenenada gime Militar
p. 55, v. 1 A multiplicação das pragas (gráfico) , 144, v. 3 ...e agora querem receber a conta
e TERCEIRO MUNDO: O alastramento da dívida externa dos países
do Terceiro Mundo, tanto em volume como em número de países atin-
ESTABELECIMENTOS gidos
e ÍNDICE DE CONCENTRAÇÃO: A evolução do índice de Gini da p. 312, v. 2 A epidemia da divida
posse da terra no Brasil, em cada região brasileira e em outros países v. tb.
p. 62 a 64, v. 3 No país dos latifundiários ...principalmente nas regiões mais p. 419 e 420, v. 2 Subserviência externa
pobres, a terra é tão concentrada... como em nenhuma outra parte do mundo e TERCEIRO MUNDO/RENEGOCIAÇÃO: Países que renegocia-
e PEQUENA PROPRIEDADE: A pequena participação das peque-
ram suas dívidas entre 1956 e 1982 e o montante renegociado
nas propriedades na área ocupada e nos financiamentos e sua expres- p. 23 e 24, v. 3 A ascensão dosjuros internacionais... faz explodir o Terceiro
siva participação na produção e na oferta de empregos
p. 47 e 48, v. 1 A força dos pequenos e TAXAS DE JUROS INTERNACIONAIS: O crescimento da prime-
p. 48, v. 1 Menores e melhores (gráfico) rate, taxa preferencial nos EUA
v. tb, p. 23 e 24, v. 3 A ascensão dos juros internacionais...
ORGANIZAÇÃO SOCIALDISTRIBUIÇÃO DE TERRAS e DÍVIDA INTERNA AMERICANA: A evolução da dívida interna
dos EUA, em trilhões de dólares, de 1940 a 1989 (estimativa)
PRODUÇÃO p. 24, v. 3 ...e é puxada pela divida americana
e POLÍTICA AGRÍCOLA : As deformações da estrutura de produção
agrícola, em consequência da concentração da posse da terra e da polí-
tica de incentivos aos produtos destinados à exportação INVESTIMENTOS
e ETAPAS DE PENETRAÇÃO: A instalação do capital estrangeiro
p. 121 a 123, v. 1 Do café à soja
e ALIMENTOS X EXPORTAÇÃO: A evolução da produção de al- no século 19, a aceleração da penetração no início do século, o refluxo
guns produtos agrícolas, a porcentagem destinada à exportação e a pro- entre 1930 e a Segunda Guerra, o impulso no governo Juscelino e o
dução e produtividade do feijão e da soja controle dos setores produtivos dinâmicos no Regime Militar
p. 169 a 172, v. 1 Controle vital
p. 38 a 40, v. 3 Nossa agricultura de duas caras...
e ALIMENTOS/ARROZ E FEIJÃO: A história da produção desses e MONTANTE: A evolução dos investimentos estrangeiros no Brasil
alimentos de largo consumo popular, sempre relegados a plano secun- de 1860-75 a 1983
dário na política agrícola brasileira p. 86 a 88, v. 3 Um peso cada vez maior sobre a economia nacional...
p. 140 e 141, v. 1 O feijão com arroz (gráfico)
e CONTROLE DE SETORES: A diminuição no setor de serviços pú-
v. tb.
e FOME : Os reflexos da política agrícola brasileira sobre o nível de nu- blicos, a participação na produção de bens de consumo duráveis e o au-
trição da população mento da presença nos setores modernos a partir de 1950
p. 61 a 64, v. 1 O regime da fone p. 87, v.3 ...e uma presença cada vez mais internalizada no processo produ-
© ÁLCOOL: Os reflexos do PROÁLCOOL sobre a produção de ali- tivo (gráfico)
e REMESSA DE LUCROS: Um exemplo didático e um exemplo prá-
mentos
p. 415 e 416, v. 2 Uma solução-problema tico demonstram que a saída de lucros em poucos anos paga o investi-
mento
p. 89, v. 3 A multiplicação do capital estrangeiro (tabelas)
RELAÇÓES DE PRODUÇÃO e ENTRADAS E SAÍDAS: As duas formas de entrada do capital - in-
e EVOLUÇÃO: A persistência de formas arcaicas de exploração da vestimento e empréstimo - e as quatro formas de saída, que eviden-
terra, a despeito do processo de modernização por que passou a agri- ciam as vantagens do capital estrangeiro
cultura brasileira p. 90, v. 3 Duas bocas de entrada e quatro de saída (gráficos)
p. 129 a 132, v. 1 Os homens da terra © PIB: A relação entre o montante global de capital estrangeiro inves-
'e COMPOSIÇÃO DO EMPREGO: A evolução em % de tido no País e o PIB (1920 a 1983)

524
eroransss aaa. 404482s an 00a,268

p. 170, v. 1 Capital estrangeiro versus PIB (tabela) RENDA SALARIAL


v. 1D. & EVOLUÇÃO: O número de empregados existentes em cada faixa sa-
MINÉRIOS larial e a parte do total dos salários que os empregados recebem, em
cada faixa, em 1980 e 1983 -
p. 172, v. 3 ...é a pirâmide dos saláriosficou com a base mais larga e o cume
LEGISLAÇÃO mais estreito
e HISTÓRIA: O tratamento dado ao capital estrangeiro, através de
uma legislação de controle - principalmente no que se refere à remessa TRIBUTAÇÃO
de lugros i e CARGA TRIBUTÁRIA: A carga tributária mensal em cada faixa de
p. 189 a 192, v. 1 Leis de rapina renda
© BURLA: Os mecanismos utilizados pelas empresas estrangeiras ins- p. 173, v. 3 Impostos maiores sobre os rendimentos menores
taladas no País para burlar a legislação de controle
p. 190, v. | A burla das múltis
© INCENTIVOS: A história da instalação da Fiat em Minas Gerais EMPREGO
p. 191, v. 1 Investimento à italiana
DESEMPREGO E SUBEMPREGO
COMÉRCIO EXTERIOR # CAUSAS: As origens estruturais do subemprego e do desemprego
no Brasil e seu agravamento dramático na crise dos anos 80
p. 265 a 269, v. 2 Não há vagas
EXPORTAÇOES p. 137, v. 3 Uma legião de desempregados e subempregados
© PRINCIPAIS CLIENTES: A evolução das exportações brasileiras e NÍVEL DE EMPREGO: A evolução do índice de emprego indus-
para os EUA, Inglaterra, Alemanha e Japão, de 1901 a 1984 trial na Grande São Paulo, de 1970 a 1984, a geração de novos empre-
p. 140 a 142, v. 3 Desde o começo do século 20, os Estados Unidos são o gos no Estado de São Paulo, de 1969 a 1983, e a taxa de desemprego
nosso principal cliente ... (gráfico e tabela) aberto no Brasil, de 1981 a 1984
p. 134 e 135, v. 3 Desemprego e crise
IMPORTAÇÓES e CÁLCULO DAS TAXAS: A variação das taxas que medem o nível
e PRINCIPAIS FORNECEDORES: A evolução das importações bra- do desemprego, calculadas a partir de critérios diferentes pelo IBGE,
sileiras dos EUA, Inglaterra, Alemanha e Japão, de 1901 a 1984 DIEESE e CEBRAP, de 1980 e 1984
p. 140 a 142, v. 3 ...a partir da Primeira Grande Guerra tornaram-se o p. 136, v. 3 As medidas do desemprego urbano (gráfico)
nosso maior fornecedor... e MUNDO: A evolução das taxas de desemprego no Reino Unido,
v. tb, Itália, EUA, Japão, Holanda, Canadá, França e Alemanha Ocidental,
e CORRUPÇÃO: A CPI para investigár irregularidades nas operações de 1968 a 1984
da CEXIM p. 138, v. 3 O seguro-desemprego contém o subemprego, nos países ricos
p. 26 a 28, v. 3 O Parlamento desarmado (gráficos)
e ROBOTIZAÇÃO: As perspectivas de robotização da produção in-
dustrial, seus reflexos sobre o nível de emprego e as primeiras experiên-
DESEMPENHO ECONOMICO cias no Brasil
p. 269, v. 2 A espera de robôs
CRISE
ESTRUTURA
© BALANÇO : A comparação das crises dos anos 60 e 80 - o processo
e EVOLUÇÃO: A porcentagem de empregados na agricultura, na in-
de crescimento da economia sob o Regime Militar, seussucessos, suas
dyislria, em comércio e serviços, só na indústria e só em comércio e ser-
limitações e as diferenças e semelhanças entre o modelo de Juscelino e
viços
o dos militares
p. 2, v. 3 O novo Brasil (gráfico)
p. | a 12, v. 1 Do buraco ao abismo
p. 129, v. 3 ...a maioria daforça de trabalho transferiu-se para os setores se-
9 EFEITOS POLÍTICOS: As relações entre as grandes crises econô-
cundário e terciário... (gráfico)
micas e políticas no Brasil
v. tb. -
p. 257 e 258, v. 3 Crises políticas e crises econômicas e PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES: A evolução da participação
PIB das mulheres na População Economicamente Ativa, de 1920 a 1982
© EVOLUÇÃO: A evolução do índice de crescimento do PIB por ha- p. 32 a 34, v. 3 As mulheres invadem o mercado de trabalho, mas por baixo
bitante, de 1940 a 1984 (gráfico)
p. 158 e 159. v. 3 0 país ficou mais rico e os trabalhadores mais pobres e PARTICIPAÇÃO DOS MENORES: A evolução da participação
© VARIAÇÃO: A variação do índice do PIB, de 1921 a 1984 dos jovens e crianças no mercado de trabalho, de 1950 a 1980
p. 258, v. 3 Variação anual do índice do Produto Interno Bruto (%) p. 152 e 153, v. 3 O menor trabalhador
© NORDESTE: A evolução da variação anual do PIB da região Nor-
deste e do Brasil, de 1961 a 1981
EMPRESÁRIOS
p. 206 e 207, v. 3 O Nordeste se desenvolve

GRUPO VOTORANTIM
DISTRIBUIÇÃO DE RENDA © HISTÓRIA : A luta de José Ermírio de Moraes contra as pressões
das multinacionais do alumínio para implantação de uma fábrica na-
cional
ESTRUTURA p. 83 e 84, v. 1 Ermírio e as seis irmãs
e EVOLUÇÃO: O aprofundamento da concentração da renda entre
1960 e 1980, aumentando a miséria de milhares de brasileiros e concen-
trando a capacidade de consumo ENERGIA
p. 337 a 340, v. 2 Indicadores da miséria
p. 170 a 172, v. 3 O paraíso dos ricos
© DEBATE: A posição de economistas do governo e da oposição ao ÁLCOOL
Regime Militar sobre a teoria que defende a necessidade da concentra- e PROÁLCOOL: O sucesso técnico do Programa do Álcool e os pro-
ção da renda para impulsionar o desenvolvimento blemas que ele gerou, como a concentração da terra, a poluição do am-
p. 174, v. 3 O debate sobre o crescimento econômico e a concentração de biente e a competição da cana com os alimentos
renda p. 415 e 416, v. 2 Uma solução-problema
e POSIÇÃO NO MUNDO: A participação das famílias 10% mais ri- e PRODUÇÃO: A evolução da produção de álcool e do consumo
cas na renda nacional, no Brasil e em outros países energético final, de 1973 a 1984
p. 173, v. 3 Uma das maiores concentrações de renda do mundo p. 415, v. 2 A energia do álcool (tabela)

RENDA FUNCIONAL ELÉTRICA


© SALÁRIOS E LUCROS: Distribuição funcional da renda na indús- e CAPACIDADE INSTALADA : A evolução e a taxa de crescimento
tria de transformação e nos bancos comerciais, e distribuição funcional da capacidade instalada de energia hidrelétrica e termoelétrica, de 1900
da renda interna bruta urbana a 1983, o potencial hidrelétrico do Brasil em 1982
p. 172, v. 3 Prosperaram os lucros do capital... p. 119 e 120, v. 3 O desprezo à eletricidade

525
BR A 2329 an©or, p r69

© LIGHT: A produção de energia elétrica no Brasil e os escândalos União, Estados e Municípios na receita tributária do Brasil, de 1956 a
que envolveram a Light desde sua instalação em 1899 até a compra 1981
pelo governo Geisel, em 1978 p. 464, v. 2 Um golpe na autonomia
p. 197 a 199, v. 1 O polvo canadense v. tb.
e CENTRALIZAÇÃO: Os efeitos das mudanças na tributação sobre a
HISTÓRIA autonomia dos Estados e Municípios
e FONTES ENERGÉTICAS: A utilização de fontes de energia e o es- p. 114 a 117, v. 1 Imperadores do Planalto
tágio de desenvolvimento produtivo correspondente, na evolução da p. 356, v. 2 Poder de baixo
Humanidade - do uso do músculo humano à utilização da energia nu-
clear
p. 154 a 156, v. 1 Do músculo à fissão INDÚSTRIA
e POLÍTICA ENERGÉTICA : A evolução da estrutura de consumo de
energia, sua associação com as etapas de industrialização e as políticas AUTOMOBILÍSTICA
governamentais adotadas em relação ao uso de diversas fontes de ener- e HISTÓRIA: A evolução da indústria automobilística no Brasil, seu
gia, no Brasil vertiginoso desenvolvimento à custa de todo tipo de favorecimento go-
p. 229 a 232, v. 1 Da lenha à crise vernamental, e a crise do começo dos anos 80
e ESTRUTURA DE CONSUMO: A evolução do consumo de energia p. 261 a 264, v. 1 Rastros das múltis
no Brasil, conforme o tipo, de 1910 a 1983 e PRODUÇÃO: A evolução da produção da indústria automobilística,
p. 230, v. 1 O consumo de energia (tabela) de 1957 a 1983
p. 232, v. | Fontes energéticas p. 262, v. 1 Com a crise, a queda (gráfico)
pyl 19, v. 3 O Resprezo à eletricidade e AUTOPEÇAS: O caso das molas Sueden - o projeto de verticaliza-
&CUSTO DAS IMPORTAÇOES: A evolução dos gastos em divisas ção da produção da Ford e a resistência de Miriam Lee, presidente da
com as importações de carvão, petróleo e seus derivados, de 1950 a Sueden S.A.
1965 p. 264, v. 1 A Ford contra a Sueden. Ou como as múltis se apossam "das
p. 231, v. 1 O custo das importações migalhas"

PETRÓLEO BEBIDAS
© PETROBRÁS: A luta pela criação do monopólio estatal do petróleo, © REFRIGERANTES: A história da Coca-Cola no Brasil e a disputa
as pressões das empresas estrangeiras, a aprovação da lei e a grande do mercado de refrigerantes
campanha nacionalista da década de 50, lembrada 31 anos depois, na p. 175 a 177, v. 1 É isso aí
votação da lei de reserva de mercado da informática p. 176, v. 1 A dona do mercado (tabela)
P. [37 e 198, v. 3 Momentos históricos
v. 10,
p. 341 a 344, v. 2 O povo nas ruas ! BÉLICA
e EVOLUÇÃO: A evolução do consumo, da produção, das importações e HISTÓRIA: A trajetória da indústria bélica brasileira, que em 1964
e das exportações de petróleo; as etapas de exploração e do nível do era incipiente e em 1984 transformou o Brasil em um dos maiores ex-
consumo de petróleo no Brasil e a evolução da porcentagem dos inves- portadores de armas
timentos da Petrobrás destinados à exploração p. 357 a 360, v. 2 A guerra é nossa
p. 116 a 118, v. 3 As quatro etapas da dependência
© EXPLORAÇÃO SUBMARINA : A política da Petrobrás em relação ESTRUTURA
à exploração e à produção em terra e no mar e ESTRUTURA DO PIB: A divisão do PIB brasileiro por grandes se-
p. 118, v. 3 Um erro fatal, corrigido com atraso tores, de 1939 a 1982
p. 230, v. 3 A indústria passou à frente da agricultura...
e ESTRUTURA DA PRODUÇÃO: A evolução da estrutura da indús-
NUCLEAR tria de transformação, de 1949 a 1980
© ACORDO NUCLEAR: A política nuclear brasileira, as pressões p. 230 a 232, v. 3 A industrialização brasileira
americanas, as condições do acordo Brasil-Alemanha e a dependência e CRESCIMENTO: A evolução das taxas geométricas de crescimento
tecnológica do produto e do produto industrial, de 1947-55 a 1973-80
p. 402 a 404, v. 2 Polêmiva nuclear p. 232, v. 3 As fases da industrialização no Brasil
v. tb. © BENS DE CAPITAL: A evolução da produção e da importação de
p. 212 a 215, v. 1 Deserto das invenções máquinas-ferramenta, de 1955 a 1980
p. 233, v. 3 ...e sobretudo a indústria produtora de equipamentos e
máquinas-ferramenta não têm condições de abastecer autonomamente o
FINANÇAS aís
& DEPENDENCIA: O processo de industrialização desequilibrada a
partir de 1956 e o aprofundamento da dependência
SISTEMA FINANCEIRO p. 234, v. 3 A dependência na industrialização
© MUNDIAL: O surgimento e a evolução do sistema financeiro inter-
nacional, intimamente ligado às necessidades de expansão das econo-
mias mais desenvolvidas e seus reflexos sobre o Brasil HISTÓRIA
p. 69 a 72, v. 1 Os dólares marcados e PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO: A evolução da industria-
© NACIONAL: As características do sistema financeiro montado pelo lização brasileira, desde o início relativamente autônomo no começo
Regime Militar para dar suporte ao seu modelo econômico e as dife- do século até o desenvolvimento dependente, que se inicia no período
renças com o surto de desenvolvimento do governo Juscelino de Juscelino e se aprofunda com o Regime Militar
p. Só a 60, v. 1 O castelo de papéis p. 457 a 462, v. 2 Industrialização deformada
© HAVERES FINANCEIROS: A evolução dos haveres financeiros em
poder do público, de 1964 a 1982 INFORMÁTICA
p. 57, v. 1 Nascem novos dinheiros (tabela e gráfico) e HISTÓRIA : A evolução do setor de computação no Brasil, sua orga-
© CRISE: Os efeitos da crise econômica dos anos 80 sobre importantes nização, seu desenvolvimento e a luta pela "reserva de mercado"
sustentáculos do sistema financeiro p. 385 a 388, v. 2 Uma indústria de futuro
p. | a 12, v. 1 Do buraco ao abismo e EMPRESAS: A evolução do número de empresas nacionais instala-
v. th. das entre 1974 e 1982, as dez maiores empresas nacionais segundo o fa-
POEÍTICA/CORRUPÇÃO turamento em 1982 e evolução do valor do parque industrial nacional e
estrangeiro entre 1980 e 1982
p. 194 a 196, v. 3 Nasce uma indústria nacional... mas ainda está longe de
TRIBUTAÇÃO alcançar as estrangeiras (gráfico e tabela)
e HISTÓRIA: A evolução do sistema tributário brasileiro, da Repú- & MERCADO: A evolução do mercado brasileiro de computadores e
blica Velha ao Regime Militar, as mudanças na estrutura de recolhi- da participação da indústria nacional no mercado brasileiro, de 1979 a
mento e distribuição dos impostos e o aumento da carga tributária so- 1983; os dez maiores mercados de informática do mundo em 1981
bre os de menor renda p. 194 a 196, v. 3 Nasce uma indústria nacional... (gráfico e tabela)
p. 463 a 465, v. 2 A nova derrama . [ PRODUÇÃO: A evolução do número de computadores instalados e
© DISTRIBUIÇÃO DE IMPOSTOS: A evolução da participação da da participação dos míni e microcomputadores, de 1975 a 1982
526
samussrmmwáãêâââôjanmâ7, 122590
p. 196, v. 3 ...que domina uma importante parcela da produção...
e EMPREGO E IMPORTAÇÃO: Participação das empresas nacio- p. 242, v. 3 Um crescimento estratégico, a produção cresceu... (gráfico)
nais e estrangeiras instaladas no Brasil na geração de empregos e nas e PROJETOS: A localização dos grandes projetos minerais
importações, em 1983 p. 246, v. 3 Os grandes projetos minerais (mapa)
p. 196, v. 3 ...gera mais empregos, importa menos...
e RESERVA DE MERCADO: A luta pela aprovação da lei de reserva
de mercado para a informática, comparada à campanha do petróleo PUBLICIDADE
p. 197 e 198, v. 3 Momentos históricos
TÉXTIL CAMPANHAS
e NORDESTE: O sucesso e a decadência da indústria têxtil no Nor- © LEITE EM PÓ: A campanha de promoção do leite em pó
deste, pressionada constantemente pelas multinacionais, desde o assas- p. 29 e 30, v. 1 Uma campanha maléfica
sinato
1983 de Delmiro Gouveia até o suicídio de Carlos A. de Menezes, em
© COCA-COLA: Apropaganda para venda de refrigerantes ,
p. 175 a 177, v. 1 É isso aí
p. 392 e 393, v. 2 Nas malhas das múltis v. tb.
e VERBAS DE PUBLICIDADE: A evolução da participação dos vei-
INFLAÇÃO culos na distribuição da verba publicitária
p. 203, v. 3 TV e publicidade

ÍNDICES INFLACIONÁRIOS p. 43 a 47, v. 1 Os donos da voz


© CAUSAS ESTRUTURAIS: As razões estruturais pelas quais sobe a
inflação no Brasil HISTÓRIA
p.© CUSTO
86 e 87,DEv. 1VIDA:
Por que os preços sobem & MODERNIZAÇÃO: A evolução da publicidade no Brasil, especial-
A evolução do custo de vida, de 1915 a 1983, e as mente sob o Regime Militar
crises políticas associadas aos "picos" do índice p. 472 e 473, v. 2 Ricas molduras
p.e INDICE
50 a 52, GERAL
v. 3 Os preços sobem, o País se agita (gráfico) e INVESTIMENTOS: A relação entre o PIB e os investimentos em
DOS PREÇOS: A evolução da inflação, de 1946 a propaganda, de 1976 a 1984
1983 p. 473, v. 2 A propaganda e a crise
p. 50, v. 3 A inflação no Brasil 1946-1983 © EMPRESAS: As 20 empresas que mais investem em publicidade
p. 473, v. 2 Os maiores anunciantes do Brasil
INFLAÇÃO NO MUNDO
e INFLAÇÃO E CRISE: A relação entre a alta nos preços e crises
políticas na Alemanha, Argentina, Chile, Grécia e Irã SALÁRIOS
p.e REFLEXOS
53 e 54, v. 3NOUm terremoto político no mundo
BRASIL: Os efeitos da inflação dos países desen- NÍVEIS SALARIAIS
volvidos sobre a inflação no Brasil © SALÁRIO MÍNIMO: A evolução do índice do salário mínimo real,
p. 89, v. | A inflação que vem defora comparado com a evolução do PIB, de 1940 a 1984
p. 158 e 159, v. 3 O Paísficou mais rico e os trabalhadoresficaram mais po-
POLÍTICA DE CONTROLE bres
e EVOLUÇÃO: As táticas adotadas pelo Regime Militar para comba- © SALÁRIOS MÉDIOS: A evolução do índice do salário real de ban-
ter o aumento da inflação, seu fracasso no início dos anos 80, quando a cários, químicos e portuários, de 1964 a 1974
inflação
restia atingiu seus níveis mais altos e as manifestaçõescontra a ca-
p. 160, v. 3 E o Regime Militar achatou também os salários médios...
© SALÁRIOS ALTOS: A evolução dos índices salariais de executivos

v.p. tb.85 a 89, v. 1 Saudades dos 80%-90% de Jango


e o arrocho na faixa de 10 a 30 salários mínimos
p. 160, v. 3 ...Permitiu aumentos reais para os mais altos... mas mesmo es-
e MANIPULAÇÃO DOS ÍNDICES: A alteração dos índices inflacio- tes acabaram arrochados
- nários de 1973 e RAÇÃO ESSENCIAL MÍNIMA : A evolução do tempo de trabalho
p. 251 e 252, v. 1 Fraudes salariais necessário para aquisição da ração essencial mínima, de 1959 a 1983
p. 161 e 162, v. 3 O salário da fome di

MINÉRIOS e REAJUSTES: As fraudes nos índices de reajustes dos salários dos


trabalhadores e a manipulação desses índices em 1973
p. 251 e 252, v. 1 Fraudes salariais
BALANÇA COMERCIAL v. tb.
e EXPORTAÇOES: A evolução dos índices de crescimento das ex- e RENDA SALARIAL: A evolução da distribuição da renda salarial
portações minerais e a participação dos bens primários, metais comuns de 1980 a 1983
e seus manufaturados e compostos químicos, de 1974 a 1983 p. 172, v. 3 ...e a pirâmide dos saláriosficou com a base mais larga e o cume
p. 245, v. 3 O crescimento dos minérios manufaturados mais estreito
e SALDO COMERCIAL: A evolução do saldo da balança comercial
mineral, de 1974 a 1983
p. 243, v. 3 ...a balança comercial mineral tornou-se superavitária... POLÍTICA SALARIAL
(gráfico) e ARROCHO: A política do arrocho adotada pelo Regime Militar, o
agravamento provocado pelas exigências de contenção impostas pelo
CAPITAL ESTRANGEIRO FMI e a resistência dos trabalhadores
© CONTROLE: As principais empresas mineradoras, segundo a parti- p. 313 a 316, v. 2 Cintos apertados
cipação global e setorial, em 1984
v.p. tb.244, v. 3 ...mas o capital estrangeiro controla boa parte do setor... TECNOLOGIA
p. 481 a 485, v. 2 Espoliação mineral
LEGISLAÇÃO PRODUÇÃO
e EVOLUÇÃO:
cer As alterações feitas pelo Regime Militar para favore-
o capital estrangeiro
e PESQUISA TECNOLÓGICA: O desenvolvimento incipiente da
pesquisa tecnológica no Brasil, fruto de um processo de desenvolvi-
p.v. 16.244, v. 3 ...beneficiado pela mudança da lei mento dependente, como ilustra o caso do padre Landell e seu trans-
missor de ondas sonoras
p. 189 a 192, v. l Leis de rapina p. 212 a 215, v. 1 Deserto das invenções
e PATENTES: O número de patentes concedidas no Brasil, segundo a
PRODUÇÃO E'INDUSTRIALIZAÇÃO É nacionalidade do titular, em 1980 e 1981
p. 214, v. 1 Domínio estrangeiro
e POLÍTICA: A política de exploração e industrialização de minérios v. tb.
e o controle exercido pelo capital estrangeiro, especialmente pós-64 e TECNOLOGIA NUCLEAR: A compra de tecnologia alemã para a
p. 481 a 485, v. 2 Espoliação mineral produção de energia nuclear
e EVOLUÇÃO: A evolução dos índices de crescimento da produção p. 404, v. 2 Dependência vai ao átomo
de alguns minérios - cobre, bauxita, ferro, ouro, chumbo, manganês - v. tb.
de 1960 a 1980 CULTURA/CIÉNCIA

527
sroranassVONT 02 1523an 00, p ou

cais, em vários momentos do País, e de seu desmantelamento pelo Es-


tado
TRANSPORTES p. 271 e 272, v. 2 Em busca de unidade
e COMISSOES DE FÁBRICA : A organização de comissão de empre-
ESTRUTURA gados em cada empresa, que sempre existiu nas épocas de surtos grevis-
e POLÍTICA DE TRANSPORTES: A evolução da estrutura de trans- tas e seu desaparecimento quando cessa a mobilização
portes no Brasil, o desprezo à rede ferroviária e o estímulo à rede rodo- p. 94, v. l A crise na fábrica
viária que serve à indústria automobilística v. tb.
p. 497 a 499, v. 2 Na contramão ORGANIZAÇÃO SOCIAL/ TRABALHO/ SINDICATOS
v. tb.
ORGANIZAÇÃO SOCIAL/TRANSPORTE URBANO TRABALHADORES NO CAMPO

ORGANIZAÇÃO
e HISTÓRIA: A evolução da organização dos trabalhadores rurais,
desde 1930, a criação do CONTAG, os congressos camponeses e a luta
pela Reforma Agrária
p. 383 e 384, v. 2 A luta pela terra
MOVIMENTOS ESPECÍFICOS
LUTAS
, &) E e CRONOLOGIA: Os principais movimentos de camponeses, em
CARÉSTIA luta pela terra, desde o início da República; as greves de trabalhadores
e HISTÓRIA : A evolução das lutas contra a carestia no Brasil, desde o rurais, de 1946 a 1983
memorial protestando contra o aumento do preço dos bondes, em p. 215 e 216, v. 3 As lutas no campo
1879, até o Movimento do Custo de Vida, no Regime Militar e CONFLITOS DE TERRA : O agravamento e multiplicação dos con-
p. 214, v. protestos contra a carestia v. tb. flitos pela posse da terra durante o Regime Militar, e a política de titula-
e ABAIXO-ASSINADO: A tentativa de integrantes do Movimento ção e militarização do assunto, sem nenhum ganho expressivo para os
contra a Carestia de entregar ao presidente Geisel um abaixo-assinado lavradores
de 1,3 milhão de assinaturas p. 368 a 372, v. 2 Mapa de sangue
p. 85 a 89, v. 1 Saudades dos 80% - 90% de Jango e MORTOS: Os municípios onde ocorreram mortes em conflitos de
p. 421 a 425, v. 2 De volta, por mudanças terra, em 1980 e 1981
© SAQUES:A explosão espontânea da população faminta, principal- p. 370, v. 2 Os mortos pela posse da terra
mente no Nordeste, mas que também se manifesta nas cidades, como e LIGAS CAMPONESAS: A história da organização de ligas campo-
em 1962 no Rio de Janeiro e em 1983 em São Paulo, no bairro de Santo nesas, surgidas em 1954 no Nordeste, e sua vida relativamente curta,
Amaro pressionadas pela sindicalização rural e pela repressão pós-64
p. 167 e 168, v.1 A explosão dos famintos p. 394 a 39%, v. 2 Fogo morto
ESTUDANTES
© UNE: A história da resistência dos estudantes e de sua participação TRABALHADORES URBANOS
nas lutas políticas brasileiras ao lado das forças populares, vista através
das lutas de sua entidade nacional HISTÓRIA
p. 81 e 82, v. 1 A longa resistência
© GREVES: A evolução do movimento popular desde o Estado Novo
HOMOSSEXUAIS -- e especialmente sob o Regime Militar -, principalmente dos movi-
e DISCRIMINAÇÃO: O movimento dos homossexuais contra pre- mentos grevistas, seus momentos de expansão e refluxo, quando o mo-
conceitos e a segregação e a conquista de direitos vimento assume outras formas, como a luta contra a carestia
p. 152 e 153, v. 1 O consumo e o medo p. 421 a 425, v. 2 De volta, por mudanças
e GREVES/ BALANÇO: Um balanço das greves nos períodos de
1945-63, de 1964-78 e 1978-84
HABITAÇÃO p. 212 e 213, v. 3 As greves no País
e MOVIMENTO SINDICAL: O crescimento do movimento sindical
e FAVELADOS: A cronologia dos protestos dos favelados de São a partir de 1978, apesar dás novas limitações impostas pelo Regime Mi-
Paulo e Rio de Janeiro, de 1979 a 1984 litar à organização dos trabalhadores
p. 222, v. 3,0 protesto dos favelados p. 205 a 209, v. 1 Sinal dos tempos
e MUTUÁRIOS DO BNH: A organização e a luta dos mutuários do
BNH contra o aumento excessivo das prestações da casa própria
p. 432, v. 2 Os abalos no alicerce do sistema
MULHERES pala ORGANIZAÇÃO SOCIAL
e HISTÓRIA : A evolução da luta das mulheres contra a discriminação,
sua organização e participação nas lutas políticas do País
p. 486 a 488, v. 2 As lutas das mulheres
e PARTICIPAÇÃO POLÍTICA : A evolução da participação das mu- ADMINISTRAÇÃO
lheres nas lutas políticas do País
p. 354 e 355, v. 2 A mulher na rua FUNCIONALISMO
v. tb. e REFORMA ADMINISTRATIVA: As modificações da reforma ad-
© ANISTIA: A participação das mulheres na luta pela anistia
ministrativa promovida pelo Regime Militar e a situação dos funcio-
p. 31 a 34, v. 1 Em busca da justiça
nários, que continuam com os salários baixos e praticamente sem esta-
NEGROS bilidade p. 474 a 476, v. 2 Um regime de castas
e HISTÓRIA : A cronologia das lutas dos negros contra a escravidão e
a discriminação JUSTIÇA
p. 59 e 60, v.3 Contra a escravidão e o racismo e ESTRUTURA: O elitismo e a centralização do sistema judiciário,
v. tb. que - sem recursos suficientes - funciona mal e lentamente
p. 109 a 113, v. 1 A herança do cativeiro p. 124 e 125, v. 1 Cega. E cara e lenta
TRANSPORTES
e URBANO: A cronologia dos principais protestos de usuários de AMBIENTE
transporte coletivo de São Paulo e do Rio de Janeiro, de 1974 a 1984
p. 221 e 222, v. 3 O protesto dos pingentes ECOLOGIA
e FLORESTA AMAZÓONICA: O esquema dos ciclos básicos de vida
TRABALHADORES da floresta e os riscos de sua ocupação desordenada, .com conseguên-
cias graves para todo o equilíbrio ecológico do planeta
ORGANIZAÇÃO p. 80 a 82, v. 3 A floresta vive de si mesma ... mas é ameaçada pelo
e CENTRAIS SINDICAIS: A história da formação de centrais sindi- homem
528
BRDFANBSSVB,.GN AAA, 24 p24%2
5ao
15siRo muCªsé-'e'“;
a aero RM

POLUIÇÃO --- a p. 397 a 401, v. 2 Umainstituição nacional


e RIOS: A situação de pqlulçgo dos rios brasileiros, resultante do de- e CONCESSÓES: O controle político das emissoras, amparado no re-
senvolvimento e da urbanização desorganizada gime de concessões e na censura
p. 245 e 345, v. 2 A matança dos rios p. 400, v. 2 Sob o controle do governo -
& AGROTÓXICOS: A contaminação do solo pelo uso excessivo de © REDES: A evolução das redes de televisão e do número de apare-
agrotóxicos lhos 1
p. 54 e 55, v. l A terra envenenada p. 200 e 201, v. 3 A TV espalhou-se pelo País . . . cresceu o número de
aparelhos em uso . . .
e CUBATÃO: O desenvolvimento do parque industrial de Cubatão e p.204, v. 3 As redes de televisão
os problemas sociais e ambientais da cidade
e PROGRAMAÇÃO: As origens e os tipos de programação
Pp. 137 a 139, v. l As duas caras do milagre
p. 202, v. 3 . . .mas quase metade da programação era estrangeira e a pro-
e CONTROLE: A ausência de instrumentos municipais eficazes para dução nacional concentrava-se no Sul e Sudeste 8.
o combate à poluição ! p. 204, v. 3 Quase só entretenimento
p. 356, v. 2 Poder de baixo e PUBLICIDADE: A evolução da participação da TV nas verbas pu-"
blicitárias
CIDADES p. 203, v. 3 TV e publicidade

URBANIZAÇÃO
e POLÍTICA URBANA: O processo de urbanização acelerado das ci- CONDICOES DE VIDA
dades brasileiras, provocado pelo rápido e concentrado crescimento in-
dustrial, e a consequente desorganização da vida urbana
p. 433 a 437, v. 2 As cidades inchadas EDUCAÇÃO
e GRANDE SÃO PAULO: A evolução da área urbanizada da e POLÍTICA EDUCACIONAL: O aumento do número de alunos e
Grande São Paulo professores em todos os níveis e a queda de qualidade do ensino nos
p. 434, v. 2 O inchaço da Grande São Paulo (mapa) anos do Regime Militar 3
e ZONA SUL DE SÃO PAULO: O crescimento e a politização da P: 361 a 365, v. 2 A crise daeducação _
Zona Sul da cidade de São Paulo f p. 182 a 184, v. 3 A educação no Brasil à -
p. 437, v. 2 Zona Sul de São Paulo: um exemplo urbano e VERBAS: A evolução das verbas destinadas à educação
9Bor
GRAU DE URBANIZAÇÃO:é A evolução
(19'40-1980) UG) da populaç
população rural e ur. B- 199 e 184, v, 3 d queda
© ANALFABETISMO: das verbasno analfabetismo
A evolução
p. 186, v. 3 O analfabetismo no Brasil
p. 218, v. 3 Um país urbano e PRÉ-ESCOLA: O atendimento da pré-escola
e GRAU DE URBANIZAÇÃO: A evolução da população urbana, por p. 185, v. 3 O precário atendimento aos menores de seis anos
região (1940-1980) | © UNIVERSIDADE: A evolução das universidades brasileiras, a luta
p. 218, v. 3 O Sudeste, mais industrial, é mais urbano (quadro) por uma refórma universitária feita a partir de um grande debate e a re-
e REGIOES METROPOLITANAS: A evolução da população que forma imposta pelo Regime Militar
vive nas nove principais regiões metropolitanas (1950-1980) p. 438 a 440, v. 2 Universidade sufocada
p. 219, v. 3 As regiões metropolitanas ficaram superpovoadas . . © REPRESSÃO: Os instrumentos repressivos que o Regime Militar
(gráfico) usou contra os estudantes e professores
* TAMANHO DAS CIDADES: A evolução do número de cidades, p. 363, v. 2 Repressão nas escolas
segundo o tamanho da população (1940-1980) v. tb. E
p. 219, v. 3 ... cresceu o número das grandes cidades , . . (quadro) p. 150 e 151, v. l A revanche do regime
e FAVELAS E CORTIÇOS: A evolução do número de favelas, barra- v. tb. % 2 2
cos e população favelada em São Paulo (1971-1983) e Rio de Janeiro e EVASÃO : A população em idade escolar que está fora das escolas
, (1950-1982) e população residente em cortiços em São Paulo (1983) p. 152 e 153, v. 3 O menor trabalhador _ 3 2 !
p. 220, v. 3 ... mas pioraram as condições de vida dos trabalhadores ur- e ACORDO MEC-USAID: Os reflexos da interferência americana no
hanos Brasil, através dos acordos MEC-USAID
e SANEAMENTO BÁSICO: A evolução da porcentagem de do- p. 438 a 440, v. 2 Universidade sufocada
micílios que possuem saneamento básico, iluminação e bens duráveis v. tb. 2 Na 1
(19404980) € tszl a 282, v. 2 A dommaçao americana

pfootootot elao oodio: eu eee do PRODUÇÃOLITERÁRIA:Os efeitos da repressão na universidade

e LUTAS POR TRANSPORTES: A cronologia dos protestos popula- sobre a produção de contos literários
res nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, de 1974 a 1984 p. 2 O arande mosaico
p. 221 e 222, v. 3 O protesto dos pingentes HABITAÇÃO

e LUTAS DOS FAVIÉLADOS: A cronologia do movimento de favela- e POLÍTICA HABITACIONAL: A evolução da política nacional de
dos nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, de 1979 a 1984 habitação, do governo Dutra até a crise atual do BNH
p. 222, v. 3 O protesto dos favelados p. 429 a 432, v. 2 Um sonho em ruínas
© BNH: A crise estrutural do Sistema Financeiro de Habitação. A mo-
COMUNICACOES vimentação dos mutuários e as propostas de saída do Regime Militar
p. 432, v. 2 Os abalos no alicerce do sistema
IMPRENSA $! tb. - e
e MONOPOLIZAÇÃO: A concentração dos órgãos de imprensa nos CIDADES/ URBANIZAÇÃO
anos do Regime Militar 2
p. 210 e 211, v. 1 Monopólio dos barões NUTRIÇÃO $
e PRODUÇÃO DE ALIMENTOS: A política agrícola do Regime Mi-
RÁDIO litar, privilegiando os produtos voltados para a exportação e o agrava-
e HISTÓRIA : A evolução do rádio no Brasil,.onde as concessões de mento do problema da fome - a despeito da modernização da agricul-
emissoras obedecem a critérios políticos, desde 1930. A utilização do tura
rádio como instrumento do poder institucional p. 61 a 64, v. 1 O regime da fome
p. 43 a 47, v. 1 Os donos da voz p. 38 a 40, v. 3
e APARELHOS E EMISSORAS: A evolução do número de apare- Nossa agricultura de duas caras . . .
lhos receptores, do número de emissoras e da verba publicitária v. tb. OA
p. 44, v. 1 O rádio espalhou-se pelo País na era do transistor . . . mas não p. 121 a 123, v. 1 Do café à soja _ Ea !
conservou a força do passado. E o crescimento das FMs aponta uma nova é DESNUTRIÇÃO; As consequências da desnutrição no desenvolvi-
tendência (tabela) mento físico das crianças
p. 41 e 42, v. 3 Uma raça de andes
TELEVISÃO e CAUSAS DA FOME: Os mitos que tentam explicar as causas da
e HISTÓRIA : A expansão da TV com o modelo econômico - baseado fome £
na expansão dos bens duráveis - e o apoio do Regime Militar à Rede p. 119 e 120, v. 1 A queda dos mitos
Globo, formada em moldes modernos v. tb.
529
J 224 a
ar pranssa VeGNCARA GEEA

p. 100, v. 1 A reedição de Malthus


e DOENÇAS DA FOME: As doenças causadas pela fome
p. 41 e 42, v. 3 As duas faces da fome ESPORTE E LAZER
e ALEITAMENTO: A campanha do leite em pó, contra o aleitamento
materno
p. 29 e 30, v. 1 Uma campanha maléfica ESPORTE
e COCA-COLA: A história da Coca-Cola no Brasil e FUTEBOL: A evolução do futebol brasileiro, desde os tempos em
p. 175 a 177, v. 1 "É isso aí"
que era um esporte de elite, passando pela popularização e profissio-
nalização, a militarização e o uso político, até desembocar na crise que
SANEAMENTO acaba por estimular mudanças
e REDE DE ÁGUA E ESGOTO: A evolução do número de domicílios p. 217 a 222, v. 1 No país do futebol
cobertos por serviços de saneamento básico e FUTEBOL/DIREITOS DOS JOGADORES: A mobilização dos jo-
p. 220, v. 3 Foram privilegiados os investimentos em infra-estrutura que gadores de futebol ainda é pequena, mas aos poucos surgem as con-
também atendessem às indústrias quistas trabalhistas
p. 218, v. 1 Conquistas trabalhistas
e FUTEBOL/ESTÁDIOS: Alguns dos grandes estádios de futebol, sua
SAUDE 2 capacidade e data de inauguração
e POLÍTICA DE SAÚDE: A prioridade dada à medicina curativa pelo p. 222, v. 1 Estádios no Brasil
Regime Militar, a privatização da assistência, a persistência de altas ta- e MODALIDADES ESPORTIVAS: A origem, introdução e os desta-
xas de mortalidade e incidência de moléstias e o ressurgimento de ques das principais modalidades esportivas praticadas no Brasil: fute-
doenças que tinham praticamente desaparecido bol, futebol de salão, basquetebol, voleibol, natação, atletismo, pugi-
p. 3403 a 496, v. Z De mal a pior lismo, tênis e automobilismo
© INDICADORES: A evolução das taxas de mortalidade infantil, de
p. 113 e 114, v. 3 O esporte entre nós
mortalidade geral e da esperança de vida e OLIMPÍADAS: O balanço da participação do Brasil nas Olimpíadas
p. 248, v. 3 A saúde no Brasil e as medalhas conquistadas
e ASSISTENCIA MÉDICA: A evolução do número de hospitais, lei- p. 110 e 111, v. 3 O fraco desempenho de um país . . .
e PRÁTICA ESPORTIVA : A prática esportiva ainda pequena no Bra-
tos e médicos sil e concentrada em poucas modalidades
p. 249 e 250, v. 3 A medicina curativa cresceu: há mais hospitais e leitos . . .
mas nas mãos da iniciativa privada . . . e os serviços de saúde estão concen- p. 112, v. 3 . . onde há poucos atletas . . . concentrados em poucas modali-
dades . .. e a mais popular delas perde seu espaço e seu público
trados nas regiões mais ricas
© CESARIANAS: A evolução das operações cesarianas no total dos LAZER
partos e JORNADA DE TRABALHO: A luta dos trabalhadores pela con-
p. 494, v. 2 O surto das cesarianas quista do tempo livre, as formas como o tempo livre é consumido - em
© DOENÇAS: As principais doenças dos brasileiros: o que são, formas
horas extras, venda de férias, transporte demorado - e as maneiras
de combate, a situação e regiões do mundo atingidas como o tempo livre é utilizado
p. 251 e 252, v. 3 As doenças do subdesenvolvimento p. 333 a 336, v. 2 O direito de lazer
v. tb. e TEMPO LIVRE: O tempo livre real de um trabalhador, descontados
NUTRIÇÃO/DOENÇAS DA FOME os tempos com transportes, refeições e higiene pessoal
© CARIE: A incidência e o controle da cárie p. 334 e 335, v. 2 Um dia na vida de um trabalhador
p. 187 e 188, v. 1 Um país de desdentados
e MEDICAMENTOS: O domínio de grupos estrangeiros na produção
de medicamentos POPULAÇÃO
p. 378 a 380, v. 2 O remédio é espoliar
v. tb. CLASSES SOCIAIS
e EFEITOS DOS AGROTÓXICOS: Os efeitos do uso excessivo de e HISTÓRIA: A evolução da economia brasileira e a diferenciação
agrotóxicos sobre a saúde * das classes, desde os tempos da colonização portuguesa até a fase de in-
p. 54 e 55, v. 1. A terra envenenada dustrialização acelerada
e EFEITOS DA POLUIÇÃO DO AR: A incidência de doenças respi- p. 253 a 257, v. 1 Do escravo ao metalúrgico
ratórias em Cubatão e ESTRUTURA DE CLASSES: A evolução da estrutura de classes do
p. 137 a 139, v. 1 As duas caras do milagre País entre 1950 e 1980, a urbanização e o crescimento dos setores in-
dustrial e de serviços
TRANSPORTE URBANO p. 128 a 130, v. 3 A nova sociedade brasileira
© BURGUESIA: A evolução do número de empresas pequenas, mé-
e ESTRUTURA: A estrutura do transporte urbano, voltada principal-
mente para o transporte individual dias e grandes entre 1950 e 1980
p. 433 a 437, v. 2 As cidades inchadas p. 130, v. 3 A pirâmide da burguesia
e OPERARIADO: A estimativa do crescimento da classe operária en-
© LUTA POR TRANSPORTES: A cronologia dos protestos popula-
res contra as precárias condições de transportes tre 1950 e 1980 !
p. 221 e 222, v. 3 O protesto dos pingentes p. 131, v. 3 A multiplicação dos operários
© CAMPONESES: A estimativa do número de pequenos proprie-
e TEMPO GASTO EM TRANSPORTE: O tempo que um trabalha-
dor gasta com transporte na Grande São Paulo tários, pequenos posseiros, pequenos rendeiros e parceiros e assalaria-
dos temporais e permanentes em 1975/76
p. 334 e 335, v. 2 Um dia na vida de um trabalhador (gráfico)
p. 131, v. 3 A diferenciação dos camponeses
e CAMADAS SOCIAIS MÉDIAS: A evolução das microempresas
DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS entre 1950 e 1980 e a estimativa das camadas médias assalariadas e não-
assalariadas em 1970
p. 132, v. 3 Nas cidades, velhas e novas camadas médias
ESTRUTURA FUNDIÁRIA
e REFORMA AGRÁRIA : A maneira democrática como se fez a dis- DEMOGRAFIA
tribuição de terras nos EUA, comparada com a permanência da posse e POLÍTICA POPULACIONAL: As tentativas de implantação de
da terra nas mãos de latifundiários no Brasil políticas de incentivo ou controle e as tendências de evolução da popu-
p. 489 a 492, v. 2 Terras, aqui e nos EUA lação brasileira, já observadas em outros países
© LEGISLAÇÃO AMERICANA DE TERRAS: A legislação que re- p. 97 a 100, v. 1. Controle na pobreza
gula a propriedade da terra nos EUA e CRESCIMENTO POPULACIONAL: Evolução e taxas de cresci-
p. 490, v. 2 A legislação americana mento da população no Brasil e no mundo
e LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE TERRAS: A legislação que re- 'p. 8 e 9, v. 3 Ainda crescendo, só que mais devagar . . . como em todo o
gula a propriedade da terra no Brasil mundo (gráfico)
p. 492, v. 2 O Estatuto da Terra p. 8, v. 3 Com o pé no freio (gráfico)
e INDICE DE GINI: A evolução do Índice de Gini da posse da terra p. 11 e 12, v. 3 Crescendo como os ricos, com um século de atraso (gráfico)
no Brasil, em cada região brasileira e em outros países p. 11, v. 3 Crescimento zero e população estabilizada (gráfico)
p. 62 a 64, v. 3 No país dos latifundiários , . . principalmente nas regiões p. 11 e 12, v. 3 As taxas de crescimento demográfico no mundo (mapa)
mais pobres, a terra é tão concentrada . . . como em nenhuma outra parte e CONTROLE DE NATALIDADE: O processo de evolução da popu-
do mundo lação nos países desenvolvidos e a falsidade das teorias neomalthusia-
530
ar pransss vsBNGAAA, SSAQ4I22 anco 2, p 244

nas de controle da populaçã ciário, a estrutura e a política dos órgãos de assistência e a crise estru-
p. 100, v. 1 A reedição de Malthus tural
v. tb. p. 449 a 452, v. 2 A agonia da Previdência
p. 119 e 120, v. 1 A queda dos mitos e ORIGEM: A origem do sistema de aposentadoria na Alemanha e u !
© ESPERANÇA DE VIDA : A esperança de vida ao nascer, no mundo história do sistema previdenciário norte-americano
p. 98, v. 1 O tamanho da vida p. 450, v. 2 Um problema também nos EUA
© MIGRAÇOES: Os deslocamentos da população brasileira do campo
para a cidade, ou de uma cidade a outra, constante desde 1500
p. 413 e 414, v. 2 Um povo nômade REGIÓES
© URBANIZAÇÃO: A evolução da população rural e urbana
p. 2 a 4, v. 3 O novo Brasil (gráfico) AMAZONIA
p. 128, v. 3 A maior parte da população passou a morar nas cidades . . . e POLÍTICA DE OCUPAÇÃO: O processo de ocupação desorde-
(gráfico) nada da floresta amazônica, acelerado nas últimas décadas, e os perigos
p. 218, v. 3 Um país urbano (tabela) de graves alterações ambientais
p. 218, v. 3 O Sudeste, mais industrial, é mais urbano (tabela) p. 157 a 160, v. 1 A destruição do paraíso
© FLORESTA AMAZÓONICA : O esquema dos ciclos básicos da flo-
ÍNDIOS resta e os riscos de sua ocupação desordenada
e POLÍTICA INDIGENISTA : A participação dos índios na história p. 80 a 82, v. 3 A floresta vive de si mesma . . . mas é ameaçada pelo homen.
brasileira, a política indigenista e a luta pela sobrevivência dos povos e CRONOLOGIA : A ocupação da Amazônia
indígenas i p. 83 e 84, v. 3 A ocupação da última fronteira
p. 145 a 149, v. 1 Genocídio sem trégua © INTERNACIONALIZAÇÃO: Os planos de internacionalização,
e INDÍGENAS: A população indígena por área cultural (1982) substituídos, depois de 1964, pela ocupação por empresas estrangeiras
p. 78, v. 3 Quantos são os índios p. 239 e 240, v. 1 O complô da cobiça
© LIDERANÇAS: As personalidades indígenas que se destacaram na v. tb.
luta em defesa dos direitos dos índios AMBIENTE/ECOLOGIA
p. 146, v. l A liderança da resistência indigena
© LUTAS: A cronologia da luta dos povos indígenas NORDESTE
p. 77 e 78, v. 3 Meio milênio de genocídio e INDUSTRIALIZAÇÃO: O esvaziamento dos projetos pré-64 da SU-
© TERRAS: A situação das terras indígenas, os conflitos pela posse da DENE, a industrialização artificial - baseada em incentivos fiscais - e
terra em 1984 e o caminho da legalização odesenvolvimento da região, com a persistência das desigualdades re-
p. 74 e 75, v. 3 A disputa pela terra gionais
p. 76, v. 3 O caminho para legalizar a posse da terra p. 409 a 412, v. 2 O outro lado do progresso
p. 76, v. 3 A situação das terras , e CRESCIMENTO: A comparação do crescimento do PIB no Nor-
deste com o do Brasil e a estrutura de distribuição da população econo-
MENORES micamente ativa por setores de atividade (1961 a 1981, gráfico)
e POLÍTICA DE PROTEÇÃO: A evolução da política de proteção ao p. 206 a 2Q7, v. 3 O Nordeste se desenvolve
menor, a situação de abandono e miséria de grande parcela da popula- e INCENTIVOS: A participação da SUDENE na distribuição dos in-
ção menor, as mudanças implantadas pelo Regime Militar e seus resul- centivos fiscais
tados p. 208, v. 3 ...mas a SUDENE é esvaziada (gráfico)
p. 301 a 304, v. 2 Nossos pixotes e SITUAÇÃO SOCIAL: A participação percentual do Nordeste no
e POPULAÇÃO MENOR: A estrutura etária da população brasileira número dos domicílios que possuem bens de consumo duráveis (1960-
e a de países desenvolvidos e subdesenvolvidos 1980, tabelas) e a participação percentual do Nordeste no total da po-
p. 10, v. 3 Um país de jovens . , . como os subdesenvolvidos pulação, na população por grau de instrução, na população por faixa de
e TRABALHO E EDUCAÇÃO: A situação de trabalho e de educação renda e nos domicílios dotados de infra-estrutura (tabelas e gráficos)
dos menores p. 209 e 210, v. 3 O Nordeste passou a consumir mais. . . mas ainda concen-
p. 154, v. 3 Trabalhando muito . . . ganhando pouco . . . e um terço fora da tra a pobreza
escola © AGRICULTURA : O desvirtuamento, pelo Regime Militar, de qua-
p. 152 e 153, v. 3 O menor trabalhador tro projetos prioritários da SUDENE, elaborados e iniciados antes de
© INFRATORES: O perfil sócio-econômico dos menores infratores 1964
p. 155, v. 3 O menor infrator p. 295 a 298, v. 2 Verso e reverso
© CARENTES: A situação das famílias muito pobres, de onde saem os v. tb,
menores carentes e MIGRAÇÓOES: O êxodo dos nordestinos para outras regiões do País
p. 156, v. 3 As famílias muito pobres p. 413 e 414, v. 2 Um povo nômade
v. tb.
p. 79 e 80, v. 1 O amargo sabor do lar
SEGURANÇA
MULHERES
© MERCADO DE TRABALHO: O crescimento da participação das CRIMINALIDADE
mulheres na PEA, mas ainda longe dos homens, e em situação pior no e EVOLUÇÃO: O crescimento da violência nas cidades brasileiras,
mercado de trabalho apesar do fortalecimento da polícia
p. 32 a 34, v. 3 As mulheres invadem o mercado de trabalho, mas por baixo p. 122 a 124, v. 3 A violência tomou o País de assalto . . . concentrando-se
p. 35 e 36, v. 3 As condições de trabalho melhoram, mas a discriminação nas capitais . . , atingindo mais os meio-ricos. . . enquanto a polícia dobrava
continua sua força, sem resolver
p. 125, v. 3 Belo Horizonte, a evolução do crime (gráfico e tabela)
NEGROS p. 126, v. 3 São Paulo, capital também do crime (gráfico e tabela)
e POPULAÇÃO NEGRA: A evolução da população não-branca © CAUSAS: As relações existentes entre criminalidade e urbanização
p. 56 e 57, v. 3 Um Brasil cada vez menos branco . . p. 123 e 124, v. 3 A máquina do crime urbano
© LOCALIZAÇÃO: A composição da população brasileira, por cor e © MENORES: As relações entre a desagregação familiar e a criminali-
por região dade de menores
p. 58, v. 3 E vivem principalmente no Norte e Nordeste p. 155, v. 3 O menor infrator
v. tb. COMPORTAMENTO/RACISMO p. 156, v. 3 As famílias muito pobres

VELHOS POLÍCIA
e POPULAÇÃO IDOSA: A evolução da população idosa e MILITARIZAÇÃO: As atribuições da polícia e dos organismos poli:
p. 126 a 128, v. 1 Solidão no envelhecer ciais - que quase foram unificados sob um comando civil antes de 1964
© ESPERANÇA DE VIDA: A esperança de vida no mundo - e sua militarização aberta e progressiva sob o Regime Militar
p. 98, v. 1 O tamanho da vida (mapa) p. 241 a 244, v. 1 O reforço do poder
v. tb, p. 116 e 117, v. 1 Sob o controle e vigilância da União e do Exército
COMPORTAMENTO/VELHICE © EFETIVOS: A evolução dos efetivos policiais
CONDIÇOES DE VIDA/SAÚDE/AINDICADORES p. 124, v. 3 . . enquanto a polícia dobrava sua força, sem resolver
e ESQUADRÃO DA MORTE: O crescimento e a atuação dos esqua-
PREVIDENCIA drões da morte formados por policiais -- algunsligados à repressão polí-
e POLÍTICA PREVIDENCIÁRIA: A evolução do sistema previden- tica - a partir de 1968

531
ar pranssa BO 4 1 2 34 An Opa io 235

p. 258 a 260, v. 1 Assassinos de aluguel p: 75, v. 1 Das catacumbas à aliança, unindo a oposição
v. tb. e EXPERIÉNCIAS HISTÓRICAS: As revoluções francesa, ameri-
p. 193 a 196, v. 1 Anos de terror cana e russa e as Constituintes que se seguiram a cada uma delas
p. 76 e 77, v. 1 Constituinte e Revolução
PRISÓES e MÉTODO E CONTEÚDO: As condições em que foram preparadas
e POLÍTICA CARCERÁRIA : A transformação das prisões em esco- as Constituições brasileiras e os princípios essenciais da ordem política,
las formadoras de criminosos, principalmente nos anos do Regime Mi- econômica e social estabelecida em cada uma
litar, em função do tratamento desumano dos presos p. 43 a 48, v. 3 Constituição e Constituinte
p. 331 e 332) v. 2 Escolas do crime
v. tb.
© SEXO: A violência sexual nas prisões CORRUPÇÃO
p. 178 a 180, v. 1 Sexo bruto
DENÚNCIAS
TRABALHO e CASOS FAMOSOS: A associação dos casos de corrupção com as
crises políticas; as tentativas de investigação e punição depois de 1964 e
o acobertamento, que deu origem a escândalos, como BNCC, Coroa-
LEGISLAÇÃO Brastel e outros
© CLT: A consolidação das leis já existentes, resultado de lutas antigas p. 389 a 391, v. 2 Mar de lama
dos trabalhadores, anunciada como um gesto generoso de Getúlio © LIVROS: A resenha de alguns livros publicados para denunciar ca-
p. 405 a 408, v..2 O mito da CLT sos de corrupção e relatos de algumas CPIs importantes instauradas
#GTS: A criação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, em para apurar denúncias de irregularidades
substituição à lei da estabilidade p. 29 e 30, v. 3 Da tribuna à livraria
p. 266, v. 2 Governo Castello, 1966: surge o FGTS, clara vantagem pa- e REMESSA DE DOLARES: A história dos jornalistas do Hora do
tronal Povo, processados criminalmente por terem denunciado o mecanismo
v. tb. _ de remessa ilegal de dólares para o Exterior
e JORNADA DE TRABALHO : A fixação da jornada de trabalho e a p. 18 a 20, v. 1 A crônica de um tesouro
lei de férias v. tb.
p. 333 a 336, v. 2 O direito ao lazer e CRÉDITO AGRÍCOLA : Os mecanismos utilizados para fazer opera-
e JOGADOR DE FUTEBOL: A regulamentação da profissão dos jo- ções irregulares com o crédito agrícola
gadores de futebol p. 121 a 123, v. 1 Do café à soja
p. 218, v. 1 Conquistas trabalhistas © POLÍCIA: O envolvimento do Esquadrão da Morte com a cor-
rupção
RELAÇOES DE TRABALHO p. 258 a 260, v. 1 Assassinos de aluguel
© CAMPO : As relações de trabalho no campo, do escravo ao bóia-fria ©IMPRENSA: A censura imposta para impedir denúncias de cor-
p. 203 e 204, v. 1 Um século de dureza rupção
p. 233 a 235, v. 1 O controle da palavra
SINDICATOS
e POLÍTICA SINDICAL: As novas limitações impostas pelo Regime INVESTIGAÇOES
Militar à atuação dos sindicatos - além da estrutura herdada do Estado W © RESTRIÇOES: Os limites que o Regime Militar criou para a investi-
Novo -, a repressão a sindicalistas e ao direito de greve, e o cresci- gação de casos de corrupção, desde a cassação de parlamentares até a
mento do movimento sindical a partir de 1978 limitação do número de CPIs simultâneas
p. 205 a 209, v. 1 Sinal dos tempos p. 37 a 40, v. 1 A ditadura da corrupção
© LEGISLAÇÃO: A legislação que regulamenta a criação e o funcio- e COMISSOES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO: O número
namento dos sindicatos, herdada do modelo de Mussolini de CPIs requeridas, ano a ano, de 1946 a 1983 (total e as destinadas à in-
p. 208 e 209, v. 1 Sindicalismo à Mussolini vestigação de casos de corrupção), o título das CPIs destinadas a apurar
p. 107, v. 3 Decálogo do atrelamento E casos de corrupção, em cada ano, e um pequeno resumo de seis casos
© ESTRUTURA SINDICAL: A estrutura sindical brasileira, formada famosos
por sindicatos, federações e confederações, ligadas ao Ministério do p. 26 a 28, v. 3 O Parlamento desarmado
Trabalho p. 29, v. 3 Da tribuna às livrarias
p. 104 e 105, v. 3 A pirâmide sindical brasileira
e SINDICALIZAÇÃO: A evolução do número de sindicatos e de tra-
balhadores sindicalizados, sua distribuição geográfica, e comparações DIREITOS HUMANOS
com outros países
p. 106, v. 3 Crescem os sindicatos . . . crescem também os sindicalizados . . ,
mas ainda representam uma parcela pequena dos trabalhadores . . principal- ANISTIA
mente nas regiões menos desenvolvidas e CAMPANHA : O movimento - de 1964 a 1979 - pela conquista de
© INTERVENÇOES: A evolução das intervenções governamentais anistia aos atingidos pela repressão desencadeada pelo Regime Militar
nos órgãos sindicais p. 31 a 34, v. 1 Em busca de justiça
p. 108, v. 3 A pesada mão do Estado © HISTÓRIA: As inúmeras anistias em nossa história, desde 1624,
v. tb. marcadas por acordos, concessões e, sobretudo, pelas lutas populares
p. 150 e 151, v. 1 A revanche do regime p. 33, v. 1 Luta e mobilização pelas anistias no Brasil
© METALÚURGICOS: A história de dois importantes sindicatos meta- v. tb.
lúrgicos - o de São Paulo e o de São Bernardo do Campo © MILITARES: A anistia concedida aos envolvidos na Revolta da Chi-
p. 299 e 300, v. 2 Força metalúrgica bata
p. 223 e 224, v. 1 O brado da caserna
e MULHERES: A participação dos movimentos de mulheres na luta
pela anistia É
POLÍTICA p. 354 e 355, v. 2 A mulher na rua

APARATO REPRESSIVO
CONSTITUIÇÃO e ORGÃOS DE REPRESSÃO: A estrutura criada pelo Regime Mili-
tar para instaurar violenta repressão aos seus opositores, composta por
CONSTITUINTE inúmeros órgãos - desde o SNI aos DOI-CODI e DOPS estaduais
e HISTÓRIA: A maneira como foram elaboradas as oito Constitui- p. 193 a 196, v. 1 Anos de terror
ções brasileiras - apenas três através de Assembléia Constituinte -, © POLÍCIA: O relacionamento existente entre os Esquadrões da
tom pequena participação popular, e o anseio pela convocação de uma Morte e a repressão política
Assembléia Nacional Constituinte que reorganizasse O País depois da p. 258 a 260, v. 1 Assassinos de aluguel
derrota do Regime Militar
p. 73 a 78, v. 1 O método da democracia ATENTADOS TERRORISTAS
© CAMPANHA: O movimento pela Constituinte, desde 1964, come- © ACOBERTAMENTO: O mecanismo de substituição da repressão
ando com as organizações clandestinas, passando pelo MDB e che- oficial por atentados terroristas e a impunidade e o acobertamento dos
'gando à Aliança Democrática em 1984 terroristas, como no caso Riocentro
532
aroranssoVo, 120002,

p. 161 a 165, v. 1 O terror tolerado as restrições que ainda persistem


p. 164, v. 1 A abertura e o terror (gráfico) p. 41 e 42, v. 1 O difícil acesso às urnas
v. tb. p. 41, v. | Cem anos de restrições (tabela)
© ATENTADOS A BANCAS DE JORNAIS: Os atentados a jornais p. 2 a 4, v. 3 O eleitorado e os votantes (tabela)
alternativos e a bancas de jornais, depois do fim da censura p. 2 a 4, v. 3 Mais participação política (gráfico) -
p. 233 a 235, v. 1 O controle da palavra © ELEIÇOES PRESIDENCIAIS: As inúmeras limitações impostas,
desde a Monarquia, ao sistema de sufrágio universal e as limitações à
CASSAÇÓOES participação popular nas eleições dos presidentes desde o início da Re-
pública até o Regime Militar
© BALANÇO : As estimativas do número de pessoas atingidas pelas pu-
p. 13 a 16, v. 1 Pouca República depois da Monarquia
nições oficiais impostas pelos militares a seus opositores e os principais
instrumentos utilizados e ELEIÇÓES PRESIDENCIAIS/VOTANTES: Porcentagem da po-
p. 150 e 151, v. 1 A revanche do regime pulação que podia votar para presidente e o número de pessoas que
© CIENTISTAS: Os cientistas atingidos pelas leis de exceção do Re- Tªll? &pfewnladªs por cada votante (1889-1930, 193045, 1945-64,
gime Militar
p. 350, v. 2 Cientistas punidos p. 14, v. 1 Quem elegeu os presidentes na nossa era republicana (tabela)
v. tb. e ELEIÇOES PRESIDENCIAIS/VOTAÇÃO DOS ELEITOS:
e PODER LEGISLATIVO: As cassações de mandatos de parlamenta- População brasileira no ano de cada eleição, porcentagem dos votantes
res, o controle do Congresso pelo Executivo e as dificuldades para apu- sobre a população total e a votação dos presidenteseleitos pelo voto di-
reto (1894-1960)
rar denúncias de corrupção
p. 37 a 40, v. 1 A ditadura da corrupção p. 15, v. 1 O passo gradua! da República (tabela)
© ELEIÇOES PRESIDENCIAIS/COLÉGIO ELEITORAL: Relação
entre o número de delegados aos Colégios Eleitorais do período do Re-
CENSURA gime Militar e o total de eleitores existentes
© ARTES: O aumento dos poderes da censura e a proibição de produ- P. lg. v. 1 O supervoto que "elegeu" os generais (tabela)
ções culturais e artísticas nos anos do Regime Militar v. 10.
p. 142 a 144, v. 1 A guerra da censura e ELEIÇOES PARA PREFEITO: As restrições às eleições dos prefei-
© IMPRENSA: As medidas do Regime Militar para submeter a im- tos das capitais, durante muitos anos, no período republicano
prensa, através da imposição da censura prévia, de pressões econômi- p. 53, v. 1 A força urbana
cas, violência e terror p. 356, v. 2 Poder de baixo
p. 233 a 235, v. 1 O controle da palavra
e IMPRENSA/JORNAL MOVIMENTO: Um caso exemplar do ab-
surdo dos critérios da censura, que cortou o texto da Declaração de In- TENDENCIAS DO VOTO
dependência dos EUA e TENDÉNCIAS DO ELEITORADO : A tendência de queda do voto
p. 462, v. 2 Quando a Censura cai nó ridículo conservador e a tentativa do Regime Militar de reverter essa tendência
e TEATRO: A cronologia das principais ações da censura ao teatro, de com o bipartidarismo, sem sucesso
1964 a 1979 p. 2, v. 3 O declínio do voto conservador
p. 150, v. 3 1964-79: 15 anos de teatro censurado p. 2 a 4, v. 3 1945-1982: o País se moderniza, os partidos conservadores
v. tb. perdem votos . . . e perdem deputados «
© RÁDIO: A censura na programação de rádio, nos tempos do Estado e VOTO NO NORDESTE: *A concentração dos redutos do voto con-
Novo e sob o Regime Militar servador no Nordeste, em consequência do atraso da região e do poder
p. 43 a 47, v. 1 Os donos da voz político dos latifundiários
© TELEVISÃO : A censura à televisão e os mecanismos de concessão p. 93, v. 1 O covil do PDS (mapa)
de canais, que permitem o controle do governo sobre a programação p. 247 a 250, v. 1 Velhas oligarquias
p. 400, v. 2 Sob o controle do governo p. 65 e 66, v. 3 A face dupla do voto (gráfico)
e VOTO NAS GRANDES CIDADES: A evolução da industrialização
e urbanização e a tendência progressista do voto nas grandes cidades
MORTOS E DESAPARECIDOS p. 53, v. 1 A força urbana
- © BALANÇO: A relação dos mortos e desaparecidos durante o Re- p. 65 e 66, v. 3 A face dupla do voto
gime Militar, vítimas da perseguição política; destaque para os casos; v. tD.
sargento Manoel Raimundo Soares, Rubens Paiva, Stuart Angel Jones, e FRAUDES ELEITORAIS: Os inúmeros recursos irregulares utiliza-
Alexandre Vanucchi, frei Tito, Wladimir Herzog, Manoel Fiel Filho, dos pelas forças situacionistas para fraudar as eleições antes de 1930
Lilian Celiberti e Universindo Diaz, e a chacina da Lapa p. 317 a 320, v. 2 Manipulação eleitoral
p. 98 a 100, v. 3 As vítimas do terror oficial e PRÉVIAS ELEITORAIS: O crescimento da importância das pesqui-
© EVOLUÇÃO: A relação existente entre a diminuição do número de sas de opinião sobre as preferências dos eleitores
mortos e desaparecidos e o crescimento dos atentados p. 216, v. 1 Ciência eleitoral
p. 164, v. 1 A abertura e o terror
ENTIDADES DEMOCRÁTICAS
TORTURA
e ESTADO NOVO: A CPI instaurada em 1947 para investigar as atro-
cidades que o regime cometeu contra seus opositores e trechos de al- ABI
guns desses depoimentos e HISTÓRIA: A criação em 1908 e sua atuação em defesa da liber-
p. 101 e 102, v. 3 O julgamento do Estado Novo dade de imprensa
© REGIME MILITAR: Alguns casos de tortura a presos políticos, mui- p. 270, v. 2 O vigor da ABI
tas vezes responsável pela morte ou desaparecimento de oposicionistas
p. 98 a 100, v. 3 As vítimas do terror oficial OAB
p. 193 a 196, v. 1 Anos de terror e HISTÓRIA : As lutas dos advogados em defesa do Estado de Direito,
seu envolvimento com as lutas pelas liberdades democráticas e as vio-
lências que a Ordem sofreu - atentado a bomba e invasão durante o
ELEIÇÓES
período das medidas de emergência
p. 283 e 284, v. 2 A resistência da Ordem
PAPEL POLÍTICO v. tb.
e PESO NAS MUDANÇAS: Os métodos pelos quais se deram as e ANISTIA: A participação da OAB na campanha pela anistia
grandes mudanças no poder político e o papel das eleições, em acertos p. 31 a 34, v. 1 Em busca de justiça
posteriores e secundários e ATENTADOS TERRORISTAS: O atentado a bomba na sede da
p. 5 e 6, v. 3 O papel secundário das eleições no Brasil OAB-RJ e a morte de Lyda Monteiro da Silva
p. 161 a 165, v. 1 O terror tolerado
REGRAS ELEITORAIS R
e CASUÍSMOS: As mudanças introduzidas pelo Regime Militar nas FEDERALISMO
leis eleitorais, para manter o predomínio das forças conservadoras
p. 317 a 320, v. 2 Manipulação eleitoral
e DIREITO DE VOTAR E SER VOTADO: O crescimento do eleito- CONCENTRAÇÃO DO PODER
rado, decorrente do desenvolvimento e da evolução política do País, e e HISTÓRIA : O surgimento das idéias federalistas na campanha repu-

533
a
er pranass 3454 3921 an co2, p 234

blicana, o fortalecimento do poder federal durante o primeiro governo p. 68 a 70, v. 3 Executivo, voolverrr... EB o
de Vargas e a concentração mais acentuada no Regime Militar, enfra- e COMISSOES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO : A limitação
quecendo os poderes dos Estados das condições para funcionamento de CPIs e seus reflexos sobre a in-
p. 114 a 117, v. 1 Imperadores do Planalto vestigação de casos de corrupção
e POLÍCIA: O controle progressivo das polícias estaduais pela União e p. 37 a 40, v. 1 A ditadura da corrupção
pelo Exército p. 26 a 28, v. 3 O Parlamento desarmado
p. 116 e 117, v. 1 Sob controle e vigilância da União e do Exército
v. tb.
e JUDICIÁRIO: A concentração do Poder Judiciário na área federal, LEGISLAÇÃO
com ampliação da influência do Poder Executivo
p. 37 a 40, v. 1 A ditadura da corrupção LEIS DE EXCEÇÃO Hina,
e SISTEMA FINANCEIRO: A centralização das decisões econômico- e BALANÇO: A extensão das leis excepcionais, Atos Institucionais e
financeiras nas mãos do Poder Executivo
Atos Complementares que serviram de suporte ao Reguª; Mblhtalf
p. 56 a 60, v. 1 Castelo de papéis p. 151, v. | Mais de mil leis. E surgem os "pacotes" e os "biônicos
LEIS DE SEGURANÇA NACIONAL I
HISTÓRIA e HISTÓRIA : As leis de segurança nacional que o País já teve, desde
1935, sempre para conter tensões sociais
HISTORIOGRAFIA p. 65, v. 1 A segurança do poder
e INTERPRETAÇÃO: A visão elitista como tradicionalmente foi es-
critá"a História d& Brasil, e o surgimento nos anos 80 de uma nova in-
terpretação LUTAS DEMOCRÁTICAS E POPULARES
p. 307 e 308, v. 2 Apologia do poder
p. 381 e 382, v. 2 Reescrevendo a história CAMPANHAS
© BRASILIANISTAS: As críticas ao trabalho e ao papel desempe- e HISTÓRIA: Um panorama das lutas populares, dos tempos do Im-
nhado por brasilianistas, e o reconhecimento de sua contribuição ao es- pério até a campanha pelas eleições diretas (1984)
tudo do Brasil no final da década de 70 p. 341 a 344, v. 2 O povo nas ruas
p. 321 e 322, v. 2 De bandidos a mocinhos e PARTICIPAÇÃO DOS ESTUDANTES: A participação da UNE e
dos estudantes nas lutas políticas
p. 81 e 82, v. l A longa resistência
IMPRENSA
e PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES: A participação das mulheres
nas lutas políticas
GRANDE IMPRENSA p. 354 e 355, v. 2 A mulher na rua
e HISTÓRIA : O surgimento tardio da imprensa no Brasil, sua evolu-
ção - desde os primeiros jornais até 1964 - e a concentração durante o GUERRILHA
período do Regime Militar © LUTA ARMADA: Os movimentos armados de resistência ao Re-
p. 210 e 211, v. | Monopólio de barões gime Militar
v. tb. p. 500 a 503, v. 2 Olho por olho
e ÚLTIMA HORA: A CPI para investigar as transações do Banco do v. tb.
Brasil com o jornal Última Hora CONSTITUINTE/CAMPANHA
p. 29, v. 3 Da tribuna às livrarias DIREITOS HUMANOS/ANISTIA/CAMPANHA
ENTIDADES DEMOCRÁTICAS/OAB
IMPRENSA POPULAR MILITARES/DISSIDENCIAS/CLUBE MILITAR
© HISTÓRIA : A evolução dos órgãos de imprensa alternativa, que se
empenharam na resistência ao Regime Militar, do jornal Opinião aos
jornais ligados ao movimento sindical E MILITARES
p. 466 a 468, v. 2 A imprensa alternativa
v. tb. CONTROLE DO ESTADO
e ATENTADOS TERRORISTAS: Os atentados terroristas a jornais e HISTÓRIA : As intervenções dos militares na política, chegando a
alternativos e a bancas de jornais seu apogeu com o regime imposto a partir de 1964, que militarizou o
p. 161 a 165, v. 1 O terror tolerado Estado e controlou todas as atividades no País, através de amplo apa-
v. tb. rato de informações
DIREITOS HUMANOS/CENSURA/IMPRENSA p. 133 a 136, v. 1 Sob a tutela das armas
e PRINCIPAIS INTERVENÇOES: Os movimentos militares que se
JUDICIÁRIO expressaram através de insurreições ou golpes, para manter o controle
político do País, em 1922, 1937, 1945, 1954, 1955, 1964, 1968
ESTRUTURA p. 71 e 72, v. 3 A caminho do poder
e HISTÓRIA : A evolução do sistema judiciário e as restrições impos- e MILITARIZAÇÃO DO ESTADO: A estrutura do Poder Executivo
tas pelo Regime Militar militarizado, os ministérios controlados por militares, os órgãos com-
p. 124 e 125, v. | Cega. E cara e lenta plementares e a diminuição dos poderes civis
p. 68 a 70, v. 3 Executivo, voolverrr...
PRERROGATIVAS
e HISTÓRIA : O enfraquecimento do Poder Judiciário com a cassação DISSIDENCIAS
de juízes, suspensão das garantias da magistratura e perda de compe- e CLUBE MILITAR: A história do Clube Militar e o papel político
tência para julgamento de crimes contra a Segurança Nacional desempenhado por ele como palco de luta ideológica entre correntes
p. 133 a 136, v. l Sob a tutela das armas de militares, de 1887 a 1964, e sua última eleição disputada em 1984
p. 68 a 70, v. 3 Executivo, voolverrr... p. 173 e 174, v. 1 Um clube político
v. tb.
e ATENTATOS TERRORISTAS: A punição a militares que exigiam
LEGISLATIVO esclarecimento dos atentados
p. 161 a 165, v. 1 O terror tolerado
CASSAÇÓOES e CASSAÇÓES: A cassação de militares dissidentes, aos quais não foi
© BALANÇO: A aplicação da legislação de exceção contra membros concedida anistia
do Poder Legislativo e o fechamento do Congresso no período do Re- p. 31 a 34, v. 1 Em busca de justiça
gime Militar
p. 150 e 151, v. l A revanche do regime REPRESSÃO
© HISTÓRIA: As sucessivas investidas do Exército contra o movi-
PRERROGATIVAS mento popular, desde a repressão a revoltas populares no século 19 -
e HISTÓRIA : A limitação das prerrogativas do Congresso Nacional e como Canudos - até as ações recentes contra universidades e trabalha-
a concentração do Poder Executivo dores, amparadas pela Doutrina de Segurança Nacional
» p. 133 a 136, v. 1 Sob a tutela das armas p. 293 e 294, v. 2 O inimigo no 1

534
Q /f A A Aa m,
BR DFAnv do vo. onv, ÃA, Aa</ (.-] 6 n LU
cora 5 258

SUBALTERNOS sileira, na defesa do mar territorial de 200 milhas


© ORGANIZAÇÃO: As lutas dos marinheiros, soldados e sargentos p. 104, v. 1 Braçadas curtas
em defesa de seus direitos, desde o início da República até a greve da
Polícia Militar em Salvador, em 1981 RELAÇOES BRASILÁFRICA
p. 223 e 224, v. 1 O brado da caserna e EVOLUÇÃO: O aumento das relações comerciais com os países
v. tb. .
africanos a partir de 1974, atendendo a interesses que também favore-
©DIREITO DE VOTAR: As restrições a soldados, cabos e sargentos cem as multinacionais
p. 41 e 42, v. 1 O difícil acesso às urnas p. 329 e 330, v. 2 Negócios africanos

RELAÇOES BRASIL-AMÉRICA LATINA


MUNICIPALISMO
e EVOLUÇÃO: As diferenças entre as relações do Brasil e dos outros
países da América Latina com os países desenvolvidos, e o relaciona-
AUTONOMIA MUNICIPAL mento do Brasil na América Latina
© EVOLUÇÃO: A tradição constitucional brasileira de conferir auto- p. 455 e 456, v. 2 Olho noPrimeiro Mundo
nomia política, administrativa e financeira aos municípios, e sua restrita © SISTEMA INTERAMERICANO: A dependência dos países da
aplicação prática, especialmente depois de 1964, América Latina aos espanhóis, portugueses, ingleses é americanos, e a
p. 356, v. 2 Poder de baixo desarticulação dos interesses latino-americanos no tratamento com as
potências
p. 419 e 420, v. 2 Subserviência externa
OLIGARQUIAS v. tb.
© CONE SUL: As ligações das polícias brasileira e uruguaia no se-
questro de Lilian Celiberti e Universindo Diaz
PODER ECONOMICO E POLÍTICO
p. 98 a 100, v. 3 As vítimas do terror oficial
© HISTÓRIA: O domínio das oligarquias agrárias na política nacional
até 1930, as alterações durante o primeiro governo Vargas e a recompo- RELAÇOES BRASIL-EUA
sição sob o Regime Militar
p. 247 a 250, v. 1 Velhas oligarquias e HISTÓRIA: A política americana de consolidação de sua hegemo-
©MODERNIZAÇÃO: Os pactos e alianças políticas no Nordeste - nia na América, o aumento de sua influência no Brasil depois da Pri-
Onde está a maior base de apoio do conservadorismo - e sua adaptação meira Guerra, as atitudes de maior aproximação ou maior independên-
aos novos métodos do Regime Militar cia dos vários governos e sua presença crescente depois de 1964
p. 277 a 282, v. 2 A dominação americana
p. 90 a 93, v. 1 Os modernos coronéis
e RELAÇOES COMERCIAIS: A evolução das exportações e impor-
© NORDESTE: Os reflexos da modernização do País no Nordeste e a
persistência da miséria nos redutos eleitorais do PDS tações brasileiras com os EUA, Inglaterra, Alemanha e Japão
p. 92 e 93, v. 1 Saldos fúnebres © p. 140 a 142, v. 3 Desde o começo do século 20, os Estados Unidos são o
nosso principal cliente... a partir da Primeira Grande Guerra tornaram-se
nosso maior fornecedor... (gráficos e tabelas)
OPINIÃO PÚBLICA e INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS: Participações inglesa e
americana no total dos investimentos no Brasil (1860-1913) e participa-
ções dos EUA, Inglaterra e Alemanha no total dos investimentos e rein-
ÓRGÃOS DE PESQUISA DE OPINIÃO vestimentos estrangeiros registrados no Brasil (1969-83),
© HISTÓRIA: As pesquisas de opinião, sua introdução no Brasil e o p. 143, v. 3 ...substituiram a Inglaterra como o grande investidor...
crescimento de sua importância nas previsões eleitorais e preferências © EMPRÉSTIMOS: Os principais credores da dívida externa brasi-
políticas leira - montante e características da dívida no Império, na República
p. 216, v. 1 Ciência eleitoral Velha, na era Vargas, na República Populista e no Regime Militar
p. 144, v. 3 ...e agora querem receber a conta
v. tb.
PARTIDOS ECONOMIA/ENERGIA/ACORDO NUCLEAR

SISTEMA PARTIDÁRIO
RELAÇÓES IGREJA-ESTADO
© HISTÓRIA: A evolução da legislação e da organização partidária,
da República Velha até a eleição de Tancredo Neves em 1985
p. 373 a 377, v. 2 Os grilhões partidários
HISTÓRIA
© PARTIDOS NACIONAIS: Número de partidos nacionais e suas ca-
racterísticas; principal limitação do sistema partidário e liberdade ou © REGIME MILITAR: A evolução das relações Igreja-Estado no
não de organização para os partidos comunistas (1889-1984) período do Regime Militar
p. 188 a 190, v. 3 A nossa precária vida partidária p. 325 a 328, v. 2 Os caminhos da Igreja
© FRENTES POLÍTICAS: A sobrevivência dos antigos partidos -
mesmo as organizações de esquerda - dentro das novas legendas cria-
das pelo Regime Militar SUCESSÃO PRESIDENCIAL
p. 191 e 192, v. 3 Partidos dentro dos partidos, As leis apenas taparam o sol
com a peneira... (tabela)
e PARTIDOS DE ESQUERDA : Número de candidatos de organiza- HISTÓRIA
ções de esquerda que concorreram às eleições de 1982, segundo órgãos
e CONJUNTURA : A posição do governo, dos militares, da esquerda e
militares
das potências internacionais nas crises políticas de 1889, 1930, 1937,
p. 192, v. 3 ...e a esquerda, que os militares pretendiam varrer do cenário
1945, 1954, 1964, 1968 e 1984
político, continuou participando das eleições (tabela)
p. 14 a 16, v. 3 As datas dramáticas EM !
e PREFERENCIAS PARTIDÁRIAS: O resultado de pesquisa de opi-
e SITUAÇÃO INTERNACIONAL: A conjuntura política internacio-
nião realizada em 1983 sobre o quadro partidário da época
nal nos momentos de graves crises políticas brasileiras (1889, 1930,
p. 192, v. 3 Um sistema que não agrada a maioria da população (tabela) 1937, 1945, 1954, 1964, 1968 e 1984), o declínio da hegemonia inglesa e
© ULTRADIREITA : A atuação dos grupos de extrema direita, bus-
o crescimento da influência americana
cando, na década de 80, formas de voltar ao poder
p. 17 e 18, v. 3 A escalada americana
p. 453 e 454, v. 2 A espera do pior
© CRISES: As sucessões presidenciais que aconteceram em meio a cri-
v. tb.
ses econômicas graves e que levaram a mudanças pela força
© LEGISLAÇÃO: As restrições do Regime Militar à livre organização
p. 510 a 512, v. 2 Sucessões e crise
partidária
p. 317 a 320, v. 2 Manipulação eleitoral
REGIME MILITAR
e GOVERNO FIGUEIREDO: A transição do Regime Militar para um
POLÍTICA EXTERNA governo civil, com a eleição de Tancredo Neves, as propostas democrá-
ticas e as dificuldades para a superação dos problemas econômicos es-
truturais, que já se delineavam na crise dos anos 60
DIREITOS DO MAR p. 505 a 512, v. 2 Depois do ciclo militar
© MAR TERRITORIAL: Os avanços e recuos da política externa bra- p. 254 a 256, v. 3 Os dois anos da agonia

535
BR DFANdSS v8.6NCAMA, 8404 1334 An co2, p259

Sumário

Não há vagas 265 O lazer dos trabalhadores


As causas do desemprego e do subemprego Nas horas de folga 333
Governo Castello, 1966: surge o FGTS, clara vantagem A utilização do tempo livre
patronal 266 Um dia na vida de um trabalhador 334
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
O tempo livre de um trabalhador -
A espera dos robôs 269 Indicadores da miséria 337
A introdução de robôs na indústria
A concentração da renda e da riqueza
O vigor da ABI 270 O povo nas ruas 341
A história da Associação Brasileira de Imprensa
As lutas nacionalistas e democráticas
Em busca de unidade 271 A matança dos rios 345
A história das centrais sindicais
A poluição dos rios brasileiros
A ostentação do poder 273 O grande mosaico 347
As festas que marcaram época
A evolução do conto sob o Regime Militar
A dominação americana 277 De costas para a pesquisa 349
As relações Brasil-Estados Unidos
A pesquisa científica e a dependência tecnológica
A resistência da Ordem 283 Cientistas punidos 350
A história da Ordem dos Advogados do Brasil
Os cientistas atingidos pela repressão
Cineastas em ação 285 Modelo americano 352
A produção de filmes militantes
A estrutura dos gastos com pesquisa nos EUA
Sexo à venda 287 A mulher na rua 354
A prostituição e o comércio sexual
A participação política da mulher
Luz/treva ne palco 289 Poder de baixo 356
A história do teatro brasileiro
A perda da autonomia dos municípios
O inimigo no 1 293 A guerra é nossa 357
A participação dos militares na repressão ao movimento
A indústria bélica
popular
A crise da educação 361
Verso e reverso 295 A evolução do sistema educacional brasileiro
A política agrária da SUDENE
Repressão nas escolas 363
Força metalúrgica 299 A repressão aos estudantes e professores
Qs sindicatos dos metalúrgicos de São Paulo e A poesia em progresso 366
São Bernardo do Campo
A evolução da poesia
As diferenças das bases 299 Mapa de sangue 368
Número de empresas e de trabalhadores metalúrgicos
Os conflitos pela posse da terra
Nossos pixotes 301 As novas violências - 1981 a 1984 369
A situação dos menores e os órgãos de repressão
A violência contra as lideranças rurais
A ginga da liberdade 305 Os mortos pela posse da terra 370
A história da capoeira
Mapa da localização dos mortos em conflitos de terra
Apologia do poder 307 Os grilhões partidários 373
A interpretação oficial da história
A evolução dos partidos e da legislação partidária
Sambas-enredo 309 O remédio é espoliar 378
A análise da literatura brasileira A produção de medicamentos
A epidemia da dívida 312 A receita do oligopólio 379
A dívida externa do Terceiro Mundo O mercadode medicamentos
A enxurrada dos eurodólares 312 Reescrevendo a história 381
A composição da dívida do Terceiro Mundo A concepção de classe na historiografia
Cintos apertados 313 A luta pela terra © 383
A política salarial do regime As lutas dos trabalhadores do campo
Manipulação eleitora 317 Uma indústria de futuro 385
A evolução da legislação eleitoral (1964-84) A história da indústria da informática
De bandidos a mocinhos 321 389
Mar de lama
O papel dos brasilianistas na história Os grandes escândalos de corrupção
Espelho do País 323 Nas malhas das múltis 392
A evolução da sociedade brasileira na música A história da indústria têxtil no Nordeste
Os caminhos da Igreja 325 Fogo morto 394
As relações Igreja-Estado no Regime Militar A história das ligas camponesas
Negócios africanos 329 A luta chega ao cinema 39
As relações Brasil-África A história do filme Cabra marcado para morrer
Escolas do crime 331 Uma instituição nacional 397
O sistema penitenciário no País As redes de televisão no Brasil
O direito ao lazer 333 Sob o controle do governo 400
BR DFANBSB 2404 13234 aân0O0a, p2RQ

As concessões de canal de televisão As fases da industrialização no Brasil


Polêmica nuclear 402 A nova derrama 463
O acordo nuclear Brasil-Alemanha A evolução do sistema tributário
Dependência vai ao átomo 404 Um golpe na autonomia 464
As empresas na área de energia nuclear A evolução da distribuição da receita tributária
O mito da CLT 405 A imprensa alternativa 466
A evolução da legislação trabalhista
A história dos jornais de resistência ao Regime Militar
O outro lado do progresso 409 Quando a Censura cai no ridículo 468
O desenvolvimento do Nordeste sob o Regime Militar A proibição da publicação da Declaração de
Um povo nômade 413 Independência dos EUA
Os processos migratórios Um combate muito sério 469
Uma solução-problema 415 O humor político
A evolução do Proálcool
As lições do Barão 470
A energia do álcool 415 O humor do Barão de Itararé
A participação do álcool como fonte energética Ricas molduras 472
Asas cortadas 417 A evolução da propaganda
A evolução do pensamento filosófico Os maiores anunciantes do Brasil 473
Subserviência externa 419 As 20 empresas que mais investem em publicidade
O Brasil no sistema interamericano A propaganda e a crise 473
De volta, por mudanças 421 Evolução do crescimento real do investimento em
A história dos movimentos populares propaganda
Festa em Patópolis 426 Um regime de castas 474
A história dos quadrinhos nacionais O funcionalismo público
Breve história da HQ, no Brasil 428 Consumo em alta 477
Cronologia dos quadrinhos
A evolução do uso de tóxicos
Um sonho em ruinas 429 Espoliação mineral 481
A história do BNH v Evolução da exploração e industrialização de minérios
Os abalos no alicerce do sistema 432 As lutas das mulheres 486
A crise no Sistema Financeiro de Habitação A história dos movimentos feministas
As cidades inchadas 433
Terras, aqui e nos EUA 489
A evolução do processo de urbanização
A concentração da propriedade da terra
O inchaço da Grande São Paulo 434
A legislação americana 49%
A evolução da mancha urbana da GSP
As leis sobre a posse da terra
Zona Sul de São Paulo: um exemplo urbano 437
O Estatuto da Terra 492
A urbanização e a politização de uma região
As leis sobre a posse da terra sob o Regime Militar
Universidade sufocada 438
As universidades brasileiras De mal a pior 493
A montagem da moda 441 O sistema nacional de saúde
A evolução da indústria da moda O surto das cesarianas 494
Feiras de moda 443 A evolução das cesarianas no total de partos
As feiras da indústria têxtil Na contramão - 497
As inspirações importadas 444 A estrutura de transportes
Os reflexos estrangeiros na moda Olho por olho 500
Fora de ritmo 445 A reação armada ao Regime Militar
A evolução do mercado musical Novas personagens 504
A agonia da Previdência 449 As personagens de ficção
A crise no sistema previdenciário Uma arte politizada 505
Um problema também nos EUA 450 As artes plásticas no Brasil
As origens da Previdência no mundo e a crise atual Depois do ciclo militar 509
A espera do pior 453 As perspectivas do governo civil eleito em 1985
Os grupos de extrema direita O feitiço contra o feiticeiro 512
Olho no Primeiro Mundo 455 A vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral
As relações Brasil-América Latina Ascensão e queda do Regime Militar S14
Industrialização deformada 457 Evolução das taxas de crescimento do PIB
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