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Vitor Alaiz
Qualquer formador sabe que, no seu trabalho de formação contínua de professores, não são só os
formandos que aprendem. Ele próprio também aprende. Por isso, cabe perguntar: que aprendizagens
decorrem da actividade de formação de professores (e outros interessados) no domínio da avaliação
interna das organizações escolares?
Mais: que lições se podem retirar da actividade de acompanhamento das práticas de “autoavaliação”
das escolas?
As linhas que se seguem procuram ser uma resposta impressionista a estas perguntas, baseada nas
informações recolhidas na actividade de formação contínua (ou pós graduada) de professores (e
outros actores educativos), bem como no decurso do acompanhamento de várias equipas de
avaliação de escolas. Para outro espaço ficará uma resposta mais sistematizada, mais aprofundada,
com maior explicitação da respectiva fundamentação.
1ª lição: As diferenças
Uma primeira impressão geral: a grande diversidade de situações. Diferentes processos e produtos
das várias equipas de avaliação interna das escolas, diferentes efeitos dos mesmos.
a. Diferentes dinâmicas das equipas responsáveis pela avaliação: umas hiperactivas, com um
empenho e um rigor notáveis. Outras, trabalhando com lentidão, incapazes de vencer as
exigências quotidianas das demais actividades profissionais (porque, claro, em nenhuma escola
encontrámos alguém que estivesse a tempo inteiro nesta tarefa).
b. Diferente envolvimento institucional: por vezes, estreita articulação da equipa de avaliação com
o Conselho Executivo (que geralmente tem um membro, mais ou menos interveniente, na dita
equipa). Em outros casos, sendo uma iniciativa autónoma de membros docentes da Assembleia
de Escola, uma articulação mais ténue (ou até conflituosa) com a Direcção da escola.
c. Diferentes pontos de partida: umas escolas importam um modelo teórico disponível, bem como
um referencial pronto-a-vestir. Outras vão construindo o seu próprio caminho (aproveitando ou
não certos procedimentos parcelares anteriormente instituídos na escola, com as estatísticas de
resultados).
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d. Diferentes intervenientes: em geral, equipas quase exclusivamente constituídas por professores.
Noutros casos, equipas que integram outros actores (como funcionários administrativos, pais e
encarregados de educação, psicólogos, …).
a. Numas escolas são produzidos relatórios mais ou menos completos; noutras, todo o trabalho
resultou apenas num conjunto de folhas impressas com inúmeras tabelas estatísticas.
b. A maior parte dos produtos são documentos impressos; porém, algumas equipas de
avaliação, procurando dar a conhecer o seu trabalho à comunidade educativa, constroem
slides para apresentações em reuniões do Conselho Pedagógico, da Assembleia de Escola ou
em sessões abertas, marcadas de propósito para esse efeito. Num caso, pudemos observar,
numa sala anexa à Biblioteca da Escola, uma exposição documental muito pedagógica,
destinada à comunidade escolar e que incluía até actividades para testar a atenção e
aprendizagem dos alunos. Outros usam as TIC: colocam os documentos produzidos na
plataforma da escola (por exemplo, no Moodle da escola, com acesso restrito) ou até na web
(acesso livre).
Esta dupla diversidade pode testemunhar-se igualmente nos próprios efeitos da avaliação: numas
escolas, os professores (bem como outros elementos da comunidade escolar) são informados, há
escuta, recepção atenta, interessada. Noutras, ou por insuficiências do processo de divulgação e
disseminação dos resultados ou por outras razões, a indiferença de professores e outros elementos
da comunidade é a resposta se não universal, pelo menos, largamente maioritária.
A diversidade das situações não impede a existência de alguns traços, se não universais, pelo menos
comuns a quase todas as escolas. O mais saliente foi, sem dúvida, a débil articulação das práticas
de avaliação interna relativamente a outras práticas da escola. O que, aliás, é uma característica
que coincide com uma tendência geral já sobejamente identificada pelos estudos organizacionais.
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A avaliação das organizações educativas deveria estar alinhada com o seu Projecto Educativo, com
o Projecto Curricular de Escola, com o Plano Anual de Actividades. Mas isso só raramente
acontece.
Um outro traço comum às diversas escolas: o esforço de muitos professores que trabalham para
além do que seria exigível pela entidade patronal/ME, sem outros benefícios que os da consciência
do dever cumprido ou do prazer de trabalhar em prol da melhoria de uma organização educativa.
Esforço no sentido de efectuar múltiplas aprendizagens: como construir referenciais, como
estabelecer indicadores ou seleccionar técnicas de recolha de dados, como tratar dados ou
comunicar resultados. Esforço que tem sido muitas vezes inglório, porque recebe dos destinatários
mais indiferença do que seria legítimo ou porque não é suficientemente reconhecido, interna e
externamente.
Não foi encontrado no portal do Ministério da Educação nenhum espaço especificamente dedicado
ao apoio aos professores (ou outros agentes educativos) envolvidos nos processos de avaliação das
organizações escolares. Apenas o site da IGE preenche, de certo modo, essa lacuna na medida em
que publica os documentos orientadores e os relatórios das escolas submetidas ao processo de
avaliação externa. As direcções das escolas, bem como as equipas de avaliação interna, vão fazendo
a leitura desses relatórios como forma de preparação interna para uma futura avaliação externa. Mas
será essa a melhor forma de apoio à auto-avaliação das escolas?
Aqui e além as escolas têm conseguido encontrar os seus “amigos críticos”, os quais exercem
funções de acompanhamento e orientação dos processos das escolas.
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5ª lição: Lacunas (II): a participação da comunidade
Seria calar um aspecto importante não referir que as práticas de avaliação interna não são tão
participadas quanto podiam e deviam ser. É verdade que, num caso ou noutro, os processos não
facilitam essa participação porque são muito centrados na direcção da escola ou em pequenos
grupos (de professores) muito fechados. Mas, na maioria dos casos, há um esforço sincero no
sentido da participação da comunidade educativa (e, em particular, do corpo docente, claro),
assente, nomeadamente, na transparência nos modos de actuar, na divulgação de resultados, na
criação de espaços de diálogo no momento do lançamento ou no termo dos processos de avaliação.
E a resposta é muitas vezes a inércia, a indiferença, a desconfiança, a resistência activa.
Mas, nem tudo está perdido neste aspecto: temos conhecimento de algumas boas práticas em que os
esforços acrescidos das equipas de avaliação conseguiram ultrapassar esses e outros obstáculos.
Sobretudo quando conseguiram mostrar que, na base de uma perspectiva sistémica, não se pretende
uma caça aos culpados. Procura-se apenas a identificação dos aspectos de estruturação e
funcionamento das organizações escolares que devem e podem ser modificados ou das rotinas
profissionais que podem e devem ser alteradas e melhoradas. E, nesses casos, o efeito foi uma
progressiva atenção local às conclusões dos relatórios de avaliação, uma maior disponibilidade para
participar na melhoria da escola, uma maior e mais participada reflexão sobre o que é (ou que deve
ser) a Escola.
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nos resultados obtidos e nas possibilidades de a escola diminuir alguns dos
problemas detectados.
ii) Outros actores educativos (funcionários, pais, etc.) também ganham uma nova
perspectiva da escola: uma visão mais ampla, menos baseada em juízos apressados,
mais distanciada dos seus interesses individuais imediatos.
c. Mudanças na organização:
iii) Planos de melhoria? Sim, em alguns (poucos…) casos. Onde? Nas escolas em que
já se completaram ciclos de avaliação, em que as respectivas equipas já se encontram
consolidadas, em que as lideranças já incorporaram a utilidade dos procedimentos de
avaliação interna. Aí sente-se a necessidade de que todo este trabalho não seja mais
um ritual simbólico ou uma rotina a acrescentar às já existentes (algumas delas
desgastantes e que os professores sentem como sendo meras exigências burocráticas
e de eficácia muito discutível). E essa necessidade vai sendo traduzida em tentativas
de definir problemas prioritários e de identificação de metas de curto e médio prazo.
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Sumário:
As práticas de avaliação interna ensinam-nos que muitos professores (e alguns outros actores
educativos), aproveitando as zonas de liberdade que subsistem apesar da imensa normatividade do
sistema educativo, têm conseguido realizar processos de desenvolvimento das organizações
escolares que têm melhorado ainda que parcialmente a respectiva estruturação e funcionamento.
Uma dúvida, porém, é suscitada pela actual conjuntura: estas práticas serão desenvolvidas,
aprofundadas ou, pelo contrário, serão interrompidas, bloqueadas, pela previsível conflitualidade
emergente da avaliação de desempenho dos professores?
Referências:
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