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ATIVIDADE AVALIATIVA
DELMIRO GOUVEIA
2018
LUCAS BRITO SANTANA DA SILVA
ATIVIDADE AVALIATIVA
DELMIRO GOUVEIA
2018
CERRI, Luis F. Os conceitos de consciência histórica e os desafios da Didática
da História. Revista de História Regional. Ponta Grossa, v. 6, n. 2, p. 93-112, 2001.
Por fim Cerri aborda a relação entre saber histórico e saber escolar. O que
deve-se considerar primeiramente é que existem diversos saberes históricos,
consequência própria da diversidade de formas que a consciência histórica pode
assumir; desse modo, aqueles tipos seriam apenas dois entre muitos, ainda que
quando se trate do saber histórico acadêmico este tenha-se tornado o referencial mais
atravessado por poder. Há diferenças qualitativas entre o saber histórico produzido na
academia e o saber histórico manifestado na escola, diferenças que passam pelas
“finalidades, fontes de informação, procedimentos de trabalho e resultados” (p.108); é
por conta disso, Cerri citando Rüsen, que se faz necessária uma disciplina para o
aperfeiçoamento do ensino de história, sua didática. Cerri também acredita valiosas
as contribuições de Klaus Bergmann sobre o papel da didática do ensino de história.
Esta comporia uma subdisciplina interna à História como campo disciplinar, e estaria
preocupada com a “formação, conteúdo e efeitos da consciência histórica”
(BERGMANN apud CERRI, p. 109). Assim tomada, a didática da história não se
reduziria à metodologia de ensino, mas também seria pesquisa, que se realiza no seio
da realidade social e assumiria uma postura propositiva na hora do ensino; isso
acabaria por contribuir para o retorno social dos investimentos feitos na História, uma
vez que os pesquisadores, através mesmo da pesquisa de professores, estariam mais
alertados sobre as “demandas de sentido” que a dinâmica histórica produz em dado
momento.
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Uma pergunta que sempre faço-me durante a leitura de qualquer que seja o
texto: em qual mundo a visão desse autor faria sentido sem que fosse solapada por
outras formas de enxergar as coisas, o mundo e os homens? Apesar da diferença
entre o conceito de consciência histórica em Ariès e Gadamer, construção, e em
Rüsen e Agnes, imanente, na sociedade ela acaba por impor-se prática e eticamente
como proposições que levem à transformação social; para os dois primeiros essa
transformação estaria no sentido de possibilitar o desenvolvimento da consciência
histórica aos que não a possuem; nos outros dois, por reconhecerem a multiplicidade
do saber histórico, logo de diferenciadas consciências históricas, a transformação se
daria por proposições que sejam consensuais, não um resgate dos alienados como
soaria nos primeiros, mas a definição consensual e intencional dos desdobramentos
do saber histórico dominante ou que se assumirá dominante (pergunto-me,
consensual e intencional quanto a quem? Pois no seio social, precipuamente nos
espaços públicos oficiais, a hegemonia do saber histórico acadêmico assume uma
postura clara de violência simbólica, nos termos de Pierre Bourdieu, até mesmo
prática quanto aos outros saberes e os sujeitos que os produzem).
No que Cerri traz de Rüsen e Agnes em seu artigo, a consciência histórica seria
consequência de se estar num mundo histórico e do próprio sujeito humano ser
histórico e por conseguir projetar-se nos três sentidos do tempo, o que instauraria uma
necessidade de significação constante do estar-no-mundo, uma vez que uma das
consequência da consciência é a intencionalidade e o agir humano sempre seria
atravessado por algum grau desta. Com isso temos historicidade, consciência
histórica e significação, os três interagem e são constantes na existência humana
independentemente do espaço-tempo. Há algo que se deixou passar nas
considerações sobre historicidade e que me parece permitir habilitar também o
conceito de consciência histórica enquanto construção sem se cair na implicância de
considerar outros indivíduos ou sociedade alienados: aceitamos, atualmente e em
bom número, que tudo na existência humana sofre da história, ou melhor, do princípio
de historicidade, assim o é e foi em todas as épocas que o ser humano esteve. Por
outro lado, se tudo na existência humana sofre de historicidade, na prática, aquilo que
vem à consciência histórica como sendo histórico nem sempre é o mesmo. Em
diferentes épocas há coisas que se admite ou não históricos, assim como Gadamer
parece-me que só recentemente tudo o que existe passou a ser tomado como
atravessado pela historicidade. Rüsen traduz isso como a “forma” histórica que algo
geral, a consciência histórica, toma. Ainda assim, não soa-me incorreto falar de
“tomada de consciência” da historicidade de algumas coisas ou abertura da forma da
consciência histórica para coisas que antes não se davam a ela, assim não sendo
consideradas históricas ou parte da consciência histórica; parece-me que são a essas
coisas que, de forma muito mais restrita do que acredito ser, Rüsen chama “tradição”.
Schmidt traz Elza Nadai (1992) como exemplo de autor que na década de 90
do século passado estava a esboçar a direção que o ensino de história poderia tomar
para a alteração do cenário que se estende ainda à atualidade: reconhecimento do
saber histórico escolar com legitimidade e especificidade próprias; preferência por
narrativas como as desenvolvidas na história temática ou micro-história; integração
de metodologias do fazer científico da história ao seu ensino; casamento entre ensino
e pesquisa e sua consequente encarnação ao social. Nesta autora ainda não aparece
a primazia por uma concepção do conhecimento histórico que seja própria a essa
forma de conhecimento. Assim como não aparecia não planos oficiais de renovação
do ensino e do currículo, a exemplo dos PCN´s no Brasil, onde irá predominar a
“transformação de determinados procedimentos e atitudes de natureza psicológica e
pedagógica, em conteúdos específicos de História” (SCHMIDT, p. 40). Schmidt nota
que ainda é predominante as formas de ensino que foram canonizadas durante a
criação desses documentos orientadores do currículo, ainda que se integre alguns
pontos de uma outra forma de se ensinar história e que se embase numa concepção
específica da aprendizagem histórica. Daí, em consonância com a proposta de Rüsen,
o historiador Bodo Von Borries apontar um ensino de história que permita a construção
de formas de pensar historicamente que atendam os diferentes contextos e levem em
conta uma diversidade de variáveis, que são condicionantes das diversas
significações da experiência histórica.
Com essas mudanças, a escola deve passar a ser pensada como espaço da
experiência dos alunos com o conhecimento, com suas próprias particularidades
culturais, enquanto alunos e enquanto sujeitos para além da realidade escolar, de
onde o papel do professor em dialogar com essas particularidades como condução
para a aprendizagem histórica, já que são elas os pontos para conexão com os
conteúdos ensinados enquanto referenciais para a orientação prática da vida. É
quando se conecta o conteúdo e o ensino de história com a realidade social vivida
pelos alunos, e professores também, que se abre um campo fértil para o
desenvolvimento das competências cognitivas próprias e fundamentais ao
conhecimento histórico em toda a sua fineza, tais como: “construção de evidências, a
empatia e a narrativa histórica” (SCHMIDT, p. 45).
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Rüsen ainda nos diz que a didática de história pode ser dividida em três áreas:
uma “empírica”, onde se analisa o que é aprendizagem histórica, suas condições e
papel social. Uma “normativa”, referente à análise do que deve ser ensinado em
relação à sociedade pretendida. E a terceira, uma pragmática, que refere-se à
organização da aprendizagem histórica conforme os objetivos pré-estabelecidas.
Nunca se esquecendo que essa didática não pode perder de vista um dos objetivos
fundamentais do conhecimento histórico, que é servir de base, operada pela
consciência histórica, para a orientação dos indivíduos na vida prática. Assim, não é
por acaso que o conceito de consciência histórica é central no campo da didática do
ensino de história: a consciência histórica responde à “carência” de orientação na vida
prática, de onde o presente condiciona as formas de inquerir o passado, sem nunca
se desvencilhar das projeções para o futuro, e a história ou conhecimento histórico
se faz de espaço para o nexo entre três dimensões do tempo tais como a consciência
histórica, neste momento e local mais os limites impostos pelas próprias formas de
diferenciação na sociedade, possibilita os homens e mulheres os experienciarem.
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