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ANAIS
18 e 19 de setembro de 2015
FRANCA - SP
ISSN 2177-9864
ANAIS
VI SELINFRAN
SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
LINGUÍSTICA DO TEXTO E DO DISCURSO: MOVIMENTOS DO SENTIDO
ISSN 2177-9864
Setembro de 2015
PARECERISTAS
Prof. Dr. Jean Cristtus Portela - UNESP/Araraquara
Profa. Dra. Margibel Adriana de Oliveira - FATEC-SP
Profa. Dra. Renata Coelho Marchezan- UNESP/Araraquara
Profa. Dra. Maria Cecília Souza-e-Silva - LAEL/PUC-SP
Profa. Dra. Joana Plaza Pinto - UFG
AVALIADORES DE PAINÉIS
Arguidores: Prof. Me. Acir de Matos Gomes, Profa. Ma. Ana Cláudia Ferreira da Silveira, Prof. Me. Eval-
do Baviera, Profa. Dra. Marilurdes Cruz Borges, Prof. Ma. Renata Cristina Duarte, Profa. Ma. Rosana
Letícia Pugina
COMISSÃO ORGANIZADORA
Profa. Dra. Camila de Araújo Beraldo Ludovice
Prof. Dr. Fernando Aparecido Ferreira
Profa. Dra. Glenda Cristina Valim de Melo (colaboradora - UNIRIO)
Prof. Dr. Juscelino Pernambuco
Profa. Dra. Luciana Carmona Garcia Manzano
Profa. Dra. Maria Flávia Figueiredo
Profa. Dra. Maria Sílvia Rodrigues-Alves (colaboradora – bolsista PNPD CAPES)
Profa. Dra. Marília Giselda Rodrigues
Profa. Dra. Naiá Sadi Câmara
Profa. Dra. Vera Lúcia Rodella Abriata
MONITORES
Alan Ribeiro Radi, Augusta Cássia Schwtner David, Caio Gomes Ribeiro, Eduardo Zenon de Faria e
S. Gouveia, Farnei Santos, Graziele de Almeida Ferreira, Jessica Cristina Celestino, Juliana Tito Rosa
Ferreira, Luiz Henrique Pereira, Rita de Cássia Devós e Silva, Rodrigo Ziviani, Tarcia Caires Saad
206
Naiá Sadi Câmara AULAS DE INGLÊS ONLINE: O ETHOS
RETÓRICO DO PROFESSOR
RESUMO
A globalização e o avanço nas tecnologias de informação são propulsores da-
reconfiguração dos modelos corporativos ao redor do mundo. Em função de-
les, os acordos financeiros e as demandas existentes em escala internacional
alteraram as negociações e as práticas corporativas para atender às demandas
do mercado globalizado. À luz das reflexões de Michel Foucault, serão obser-
vados, na revista HSM Management, os processos discursivos que caracterizam
o executivo no mundo corporativo e o constroem como “novo líder”. Conside-
rando o lugar institucional que a revista ocupa no espaço social e os discursos
representantes do discurso corporativo que são postos em circulação na mídia,
a revista constrói um sujeito executivo de negócios desejado para a contempo-
raneidade.
PALAVRAS-CHAVE: Análise do discurso; mundo corporativo; sujeito; prática
discursiva.
ABSTRACT
Globalization and the progress of information technology are drivers of busi- 7
ness models reconfiguration around the world. Due to them, financial arrege-
REFERÊNCIAS
ANAZ, S. “A vez dos veteranos está chegando?”.HSM Management. São Paulo, n.106, p. 106-112, set/out.
2014.
16
ARAUJO, I. L. Foucault e a crítica do sujeito. Curitiba: Editora UFPR, 2008.
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
RESUMO
No contexto em que vivemos, cresce o número de mulheres que participam ati-
vamente no mercado de trabalho. O cotidiano não é fácil para mulheres.Con-
siderando que a Modernidade privilegiou alguns corpos em detrimento de ou-
tros (SANTOS, 2004), este estudo traz para o centro as mulheres que ocupam
lugares de poder na sociedade. Esta pesquisa tem como objetivo analisar as
performances identitárias de gênero e de liderança da revista Exame na repor-
tagem publicada na revista Exame, do dia 10 de junho de 2015. A investigação
se embasa na perspectiva de gênero proposta pelas teorias queer (BUTLER
2003 e LOURO 2004) e na concepção de linguagem como atos de fala perfor-
mativos (AUSTIN,1962; DERRIDA,1972). Para a análise das performances dis-
cursivas de gênero e de liderança, utilizamos as pistas indexicais, propostas por
Wortham (2001).
PALAVRAS-CHAVE: Performances discursivas; gênero; liderança; mulheres
17
executivas.
objeto de estudo decorre da minha põe que os atos de fala são divididos
função como gestora de uma insti- em constatativos e performativos.
tuição educativa e à minha visão do Os primeiros são os atos de fala que
mercado empresarial. descrevem e são considerados mal
Para a realização desta pesquisa ou bem-sucedidos; enquanto que os
levamos em conta os princípios teó- segundos são aqueles que ao serem
ricos da linguagem como atos de fala proferidos, uma ação é realizada; es-
performativos (AUSTIN,1962,1990; ses são vistos como felizes, se o con-
DERRIDA,1972) e conceito de gê- trário acontece tais atos são caracte-
nero proposto pelas Teorias Queer rizados como infelizes.
(BUTLER, 2003,2004; LOURO, 2001) De acordo com as teorias des-
e nos conceitos de liderança suge- se filósofo, para que os atos de fala
ridos por Vergana (2007), Morais performativos realizassem uma ação,
(2008) e Costa Reis et al. (2013). eram necessárias condições espe-
ciais, ou seja, ao enunciar, por exem-
LINGUAGEM COMO PERFORMA- plo, o ato de fala performativo “eu os
CE declaro marido e mulher”, quem o
profere, deve ter condições especiais
O desenvolvimento deste trabalho
para fazê-lo ou o ato não seria consi-
está fundamentado na perspectiva da
derado satisfatório ou feliz.
linguagem como performance; para
tal, torna-se imprescindível iniciar- Austin inova ao considerar a lin-
mos pela concepção de linguagem guagem como social e ação; além
sugerida por Austin (1962 [1972]). O disso, ele mesmo percebe problemas
filósofo da linguagem, nascido em em sua teoria e reformula os atos de
26 de março de 1911, em Lancaster, fala, considerando-os todos como
Reino Unido, trouxe contribuições re- performativos, exceto as estiolações.
levantes para o campo dos estudos Ele ainda classifica os atos de fala em
20 três níveis.
linguísticos, como veremos a seguir.
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
afirma que o sujeito, desde que nas- se refere aos cargos de liderança nas
ce está inserido em um contexto que empresas e no mercado empresarial.
o constrói. E que o sujeito pode ser Sabemos também que essa distân-
construído de maneira diferente, sob cia, mesmo de maneira lenta, está
formas que não o limitem e que não diminuindo. Conforme Carly e Eagly
reforcem o poder já existente. (2001), na década de 90 as mulhe-
Para a estudiosa, gênero é com- res começaram a conquistar alguns
preendido como um conjunto de atos cargos na hierarquia das empresas.
realizados a todo momento e a iden- Esse fato representa que a conquista
tidade de gênero é também constru- feminina nesse setor da sociedade é
ída pelo discurso. Butler afirma que recente. Essa diferença entre homens
identidade de gênero é uma suces- e mulheres na cúpula das empresas
são de atos e que não existe nenhum pode ser reflexo de alguns fatores,
sujeito pronto, já idealizado. Isso não como : os indivíduos que se consi-
quer dizer que não exista um sujei- deram mais competentes do que as
to, mas, muitas vezes ele não encena mulheres, por isso, o número de líde-
o que gostaríamos que acontecesse. res masculinos é maior do que a lide-
Para a estudiosa o sujeito é um ser rança feminina; na própria estrutura
inacabado e que é reconhecido não sócio-ambiental das empresas que,
pelo que ele é, mas pelo que faz ou de acordo com sua organização, com
pelo que constrói. (SALIH,2012). seus princípios, valores e na forma de
considerar as características adequa-
Quanto à liderança, podemos tam- das para cargos de liderança passam
bém considerá-la uma construção a contratar mais homens para cargos
discursiva, social e performativa. De de chefia e de confiança (KRUSE;
acordo com Moscovisci (1986), não WINTERMANTEL, 1986).
existem pesquisas que apresentem
diferença no exercer a função entre De acordo com algumas pesquisas
22 as mulheres e os homens; para o au- em ciências sociais, destaca-se a rela-
tor, o que existe é uma cultura em ção entre o comportamento (perfor-
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
que homens e mulheres criam diver- mance identitária) de líder e sua efici-
sos estilos de comportamento (per- ência na liderança. Deve-se levar em
formance) e de liderança. Segundo conta a relação que ele/a tem com
Mugny, Kaiser, Papastamou e Peres sua equipe de trabalho. Essa relação
(1981), determinados indivíduos, mes- já foi comprovada não como uma re-
mo não sendo tão influentes, conse- lação passiva, na qual a equipe aceita
guem exercer certa influência em um as orientações e executa o que lhe é
determinado grupo transformando- pedido. Mas trata-se de uma relação
-o. Nesse tipo de relação pode-se de interação que necessita de troca
destacar o seu estilo de performance de experiências (BERGAMINI,1997).
é o seu principal fator de sucesso.
De acordo com Corsini (2004),
METODOLOGIA E CONTEXTO DE
há uma grande distância entre ho- PESQUISA
mens e mulheres quando o assunto Nesta pesquisa, o instrumento de
SELINFRAN
geração de dados é uma reportagem formances de gênero e de liderança
oriunda da Revista Exame, edição apresentadas na reportagem da Re-
1091, ano 49, nº11 do dia 10 de junho vista Exame, nº 11, do dia 10 de junho
de 2015. Nela foi selecionada a repor- de 2015, sobre cotas para mulheres
tagem com o título que está apresen- na cúpula das empresas. Esta revis-
tado na capa “As mulheres executi- ta foi criada desde 1967, pela editora
vas precisam de cotas?” Optamos Abril e está direcionada ao público
pelos dados da reportagem, porque que atua no mercado empresarial e
eles abordam a temática mulher no que possui interesses em negócios.
mercado de trabalho. A revista Exa- O objetivo da revista é informar seus
me também foi selecionada porque leitores sobre o cenário econômico
apresenta um alto nível de reconhe- do Brasil e do mundo. Sua divulgação
cimento por seus leitores e pelo con- é impressa e online.
teúdo nela encontrado. A reportagem está organizada em
Para a análise das performances quatorze páginas, destacando algu-
discursivas e performances de gê- mas mulheres que estão em evidên-
nero e de liderança, embasamo-nos cia no mercado empresarial nacional,
nas pistas indexicais, propostas por devido suas competências e sucesso
Wortham (2001): referências, predi- no mercado de trabalho e, com de-
cação, citação e índices avaliativos poimentos de mulheres que estão li-
que serão abordados ao longo des- derando alguns setores da sociedade
te estudo. As primeiras são enten- e de executivas internacionais que
didas como elementos que existem estão na cúpula das empresas.A re-
no mundo os quais o narrador cita portagem também consta de fotos
ou a eles se refere; já a citação é a dessas mulheres executivas, de grá-
apresentação da fala de outra pessoa ficos apresentando a evolução das
para criar um momento de diálogo; mulheres na área da educação no
os índices avaliativos são as formas mercado de trabalho, nos últimos 23
apresentadas pela gramática, sota- anos e fazendo comparações entre
REFERÊNCIAS
AUSTIN, J. L. Quando dizer é fazer. Palavras e ação. Tradução de Danilo Marcondes. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1990 [1962].
BUTLER, J. Performative acts and gender constitution: an essay in phenomenology and feminist theory. In:
BIAL, H. (Org). The performance studies reader. New York, 2004.
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Brasileira, 1999/2003.
CARLY, L. & Eagly, A. (2001). Gender, hierarchy and leadership: an introduction. Journal of Social Issues,
57(4), 629-636.
CORSINI, L. & Souza Filho, E. A. (2001). “Socialite linha-dura”: uma análise de representações sociais. Revista
de Ciências Humanas. Série Especial Temática, Representações sociais: questões metodológicas. Florianó-
polis: Editora da UFSC (pp. 175-182).
DERRIDA, J. Signature event context. Limited inc. evanston. Northwestern University Press, pp 1-23, 1988
[1972].
GIDDENS, A. Modernidade e Identidade. Tradução Plínio Denzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.
HILTS, E. Mulheres poderosas no trabalho. São Paulo: Editora Academia, 2013, p.28-42.
STEFANO, Fabiane. Cotas para mulheres?? Revista Exame. São Paulo: Editora Abril, 2015, p. 32.
WORTHAM, S. Narratives in action. NY: Teacher College Press.
ANEXO I
27
Figura 1: Capa da Reportagem apresentada pela revista Exame do dia 10 de junho de 2015.
SELINFRAN
RESUMO
O arquiteto Oscar Niemeyer, que viveu entre os anos de 1907 e 2012, declara-
va-se comunista e ateu, e foi autor de projetos de várias igrejas, dentre elas a
Catedral Cristo Rei, em fase inicial de construção na cidade de Belo Horizonte,
bem como a Catedral de Brasília e a Igreja de São Francisco no conjunto da
Pampulha, também em Belo Horizonte. Nossa pesquisa analisa uma polêmica
que se instaurou em torno da construção dessa nova catedral, opondo aqueles
que defendem o projeto, tido como mais um marco da arquitetura modernista
de Niemeyer, e aqueles que execram a escolha da diocese de Belo Horizonte.
Para a pesquisa, baseamo-nos nos pressupostos da Análise do Discurso de li-
nha francesa, sobretudo aqueles apresentados por Maingueneau (2008b), em
que se destaca a noção de polêmica como interincompreensão regrada.
PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura; discurso católico; polêmica; interincompre-
ensão regrada.
ABSTRACT
28 The architect Oscar Niemeyer, who lived between the years 1907 and 2012,
always declared himself a communist and atheist, and was the author of pro-
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
jects of several churches, among them the Catedral Cristo Rei, at the initial
stage of construction in the city of Belo Horizonte, as well like Catedral de Bra-
sília and the Igreja de São Francisco, in Pampulha, also in Belo Horizonte. Our
research focuses on a controversy that has been established around the cons-
truction of the new cathedral, opposing those who defend the project, seen
as another milestone of modernist architecture of Niemeyer, and those who
decry the choice of the diocese of Belo Horizonte. For this research, we rely on
assumptions of the french line Discourse Analysis, especially those presented
by Maingueneau (2008b), which highlights the notion of controversy as ruled
interincomprehension.
KEYWORDS: Architecture; catholic discourse; controversy; ruled interincom-
prehension.
SELINFRAN
INTRODUÇÃO errado, do culpado, do falível. Para
construir e preservar sua identidade
Oscar Niemeyer, arquiteto, declara-
no espaço discursivo, o discurso não
damente comunista e ateu, projetou
se relaciona com o Outro enquanto
várias igrejas, espaços destinados à
tal, mas somente com o simulacro
vivência da fé, sendo as mais conhe-
que dele constrói (Cf. MAINGUENE-
cidas a Igreja da Pampulha e a Cate-
AU, 2008b). Assim tais formações
dral de Brasília. Em torno do projeto
discursivas buscam delimitar-se reci-
de uma nova catedral para a cidade
procamente, por meio de uma rela-
de Belo Horizonte, a Catedral Cristo
ção de concorrência, o que significa
Rei, projetada por Niemeyer e com
tanto afrontamento aberto, quanto
obras em andamento, instaurou-se
aliança ou neutralidade aparente.
uma polêmica interdiscursiva, que re-
toma também as demais igrejas cria- Espera-se que, além da compreen-
das pelo arquiteto: de um lado, aque- são do próprio objeto tomado para
les que defendem as obras inspiradas estudo, a pesquisa possa se constituir
do gênio criador Niemeyer; de outro, em uma contribuição para o campo
aqueles que afirmam ser impossível da AD, na medida em que estuda-
entendê-las e viver, naqueles espa- remos e aplicaremos pressupostos
ços, as experiências de oração, de teóricos que foram ainda pouco tes-
inspiração de fé e de contato com o tados em objetos discursivos de do-
divino. Se existe a polêmica em tor- mínios outros que não o linguístico,
no das obras religiosas de Niemeyer sobretudo o domínio da arquitetura.
é porque há um ponto nevrálgico que
lhe dá origem, isto é, um ponto mais OBJETIVOS
importante que instaura a discussão. Investigar as relações interdiscur-
Assim a partir dos pressupostos teó- sivas e intersemióticas no espaço
rico-analíticos da Análise do Discurso discursivo compreendido entre o dis-
de linha francesa (doravante AD), que curso religioso católico e o discurso
29
embasam a pesquisa, compreende- arquitetônico modernista, que fun-
REFERÊNCIAS
“A ARQUITETURA ainda me convoca com toda a força”, diz Oscar Niemeyer. Amaivos. Rio de Janeiro, maio.
2014. Disponível em:
http://uol.amaivos.com.br/amaivos09/noticia/noticia.asp?cod noticia=18969&cod canal=44. Acesso em
27.jun.2014.
ARQUITETURA e discussões urbanas. Disponível em: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?-
t=1460840&page=11. Acesso em 4.set.2014.
CATEDRAL de Brasília. Disponível em: http://www.niemeyer.org.br/obra/pro078. Acesso em 6.jun.2014.
ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
FRADE, Gabriel. Arquitetura sagrada no Brasil: sua evolução até as vésperas do Concílio Vaticano II. São Paulo: 37
Edições Loyola, 2007.
RESUMO
Esta pesquisa se propõe a analisar a versão em quadrinhos da obra “O alienista”
de Machado de Assis, produzida por Fábio Moon e Gabriel Bá. O objetivo é in-
vestigar o processo de retextualização empreendido pelos autores, buscando,
na comparação com o texto-fonte, revelar se novos efeitos de sentido foram
construídos. A análise se fundamenta nas noções de texto e de produção de
sentido apresentadas por teóricos como Cavalcante (2013), Marcuschi (2008,
2012) e Koch (2003), e nos estudos realizados por Dell’Isola (2007) acerca da
retextualização de gêneros escritos. No sentido de auxiliar a leitura dos qua-
drinhos considerando as especificidades de sua linguagem, os trabalhos de
estudiosos como Ramos (2012) e Eisner (1999, 2013) também foram evocados.
Este estudo se propõe a contribuir com os estudos da linguagem que visam
compreender não só a dinâmica da retextualização, mas também o processo
de produção de sentido no texto verbo-visual.
PALAVRAS-CHAVE: Histórias em Quadrinhos; Machado de Assis; texto; retex-
38 tualização.
ABSTRACT
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
This research aims to analyze the comic book version of O Alienista by Macha-
do de Assis, produced by Fabio Moon and Gabriel Bá. The aim is to investigate
the retextualization process undertaken by the authors, seeking, in comparison
with the source text, whether new meaning effects were built. The analysis is
based on the notions of text and meaning production presented by theorists
such as Cavalcante (2013), Marcuschi (2008, 2012) and Koch (2003) and in
studies by Dell’Isola (2007) about retextualization of written genres. In order
to help the reading of the comic books considering the specificities of their
language, work from scholars such as Ramos (2012) and Eisner (1999, 2013) are
also evoked. This study aims to contribute to the language studies that seek to
understand not only the dynamics of retextualization, but also the process of
meaning production in verbal-visual text.
KEYWORDS: Comics; Machado de Assis; text; retextualization.
SELINFRAN
INTRODUÇÃO simples e “fácil”, mas que na verdade
A Linguística Textual surgiu na se revela rica e complexa, necessitan-
Europa na década de 1960, espe- do ser estudada seriamente para ser
cialmente na Alemanha. Ao longo apreendida em toda a sua potencia-
do desenvolvimento de suas fases lidade.
(transfrástica, gramática textual e Como palavras e imagens são dois
teoria do texto) tornou-se uma fer- importantes elementos das histórias
ramenta de grande utilidade para a em quadrinhos, tanto seu emprego,
compreensão, interpretação e produ- enquanto meio de expressão, como
ção de textos. sua compreensão requerem um con-
As escolas de ensino fundamen- junto de habilidades e experiências
tal e médio precisam utilizar os me- tanto do quadrinista (o autor de his-
canismos da Linguística Textual para tórias em quadrinhos) como do leitor.
o ensino da produção e compre- Neste trabalho propomos analisar
ensão textual, tendo a escola como a versão em quadrinhos da obra “O
sua principal aliada. Os Parâmetros alienista” de Machado de Assis, re-
Curriculares Nacionais de língua por- textualizada por Fábio Moon e Ga-
tuguesa procuram difundir e buscar briel Bá.
uma nova metodologia para um ensi- Buscando compreender o proces-
no mais prazeroso e eficaz, mas essa so de retextualização empreendido
teoria ainda não é suficientemente por Fábio Moon e Gabriel Bá, da obra
conhecida pelos professores de lín- de Machado de Assis, estabelecemos
gua portuguesa em geral. E esse é como recorte o primeiro capítulo de
um dos propósitos desta pesquisa. “O Alienista” para os quadrinhos. O
Desde o seu surgimento, as histó- texto de Machado de Assis será con-
rias em quadrinhos são vistas como frontado com o texto e as imagens
um gênero popular, de acesso fácil da versão quadrinizada. 39
e de apelo ao grande público. Nesse Esta análise busca investigar o
Para atingirmos esse objetivo nos dem numa unidade de sentido; pode
amparamos no referencial teórico da ser também uma composição que
Linguística Textual, utilizando autores utilize somente imagem. Sendo o pri-
como Koch (2003), Marcuschi (2008 meiro, configura-se como um texto
e 2012), Cavalcanti (2013), Dell’Isola sincrético, já sendo o segundo, como
(2007), Costa (2014) e Fiorin (2012). um texto não sincrético. Conforme
Para os estudos específicos dos qua- explica Fiorin (2012, p.150):
drinhos, consideramos os trabalhos Existe uma primeira tipologia de
de autores como Eisner (1999 e 2013), textos: os não sincréticos, que
Ramos (2012), Vergueiro e Ramos são a manifestação de um dis-
(2009) e Barbosa (2007). Para tanto, curso por uma só linguagem, ou
algumas definições são relevantes. mais precisamente, por uma só
substância de expressão (um tex-
DO TEXTO À RETEXTUALIZAÇÃO to escrito, uma fotografia, uma
pintura, etc.), e os sincréticos,
Como tratamos, neste trabalho, da que manifestam um discurso por
retextualização do conto “O Alienis- várias linguagens, ou, mais tecni-
ta” para as histórias em quadrinhos, camente, por diferentes substân-
torna-se fundamental, para a análise cias de expressão (o cinema, a
do nosso objeto de estudo, os concei- ópera, o jornal, etc.).
tos de texto, gênero e, naturalmente, Como neste trabalho tratamos da
a noção de retextualização. retextualização de “O Alienista” para
Essas conceituações inclusive re- os quadrinhos, cabe, então, também
forçarão a relevância da Linguística definirmos esse conceito. Confor-
Textual para o estudo da linguagem me Dell’Isola (2007, p.10), a retextu-
e para a compreensão do processo alização pode ser entendida como a
que envolve a construção de senti- transformação de uma modalidade
dos através do texto. textual em outra modalidade, tornan-
40 do evidente o funcionamento da lin-
Segundo Koch (2003, p.30):
guagem nesse processo. Nessa ação,
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
te, levado por suas pesquisas, coloca nagem de D. Evarista, podemos tam-
todos os loucos na rua e se tranca na bém supor a necessidade de uma re-
Casa Verde para estudar a cura de si dução na passagem do tempo, para
mesmo, morrendo pouco depois. que esse primeiro momento se de-
Na retextualização do primeiro ca- senvolva mais rapidamente, manten-
pítulo de “O Alienista” para os quadri- do-se somente o marcador temporal
nhos, Fábio Moon e Gabriel Bá fazem “Aos trinta e quatro anos”, presente
algumas coerções do original para a em ambos os textos, excluindo “Aos
nova versão. Nessas alterações, ainda quarenta anos” nos quadrinhos.
que mantendo muito da narrativa ori- Conforme exposto, como a confi-
ginal, supressões são feitas, para se guração geral da história em quadri-
adequar ao gênero verbo-visual das nhos apresenta uma sobreposição de
HQs. imagens e palavras, é preciso que o
SELINFRAN
leitor acione suas habilidades de in- sões, mas não no estilo. A variação
terpretação visual e verbal para uma dá ritmo para a leitura e cria ênfases.
boa leitura. Moon e Bá adotam um modelo neu-
A história é apresentada em qua- tro do balão, sendo este formado por
drinhos que diferem nas suas dimen- uma linha preta e contínua (curvilí-
nea).
43
usando uma imagem síntese, que re- gens, o sentido permanece o mesmo,
vela o esforço de Bacamarte para a a mudança do discurso indireto para
autorização do tratamento dos “lou- o discurso direto ocorreu, porque o
cos” de Itaguaí. gênero história em quadrinhos pos-
A imagem, de forte simbolismo, sui maior quantidade de diálogos, o
representa Bacamarte e Crispim de que acarreta a mudança, necessária
costas, submissos, diante da câma- para adequação ao gênero.
ra, que é disposta no alto e nas som- Na segunda página da HQ de Moon
bras, reforçando seu poder e papel e Bá (Fig. 2), o 3º, 4º e 5º quadros, es-
julgador. Também cabe notar que as treitos e de igual tamanho, represen-
figuras de Bacamarte e Crispim, nes- tam o ritmo das cenas, a velocidade
ta primeira página, remetem ao Dom com que o diálogo entre Bacamar-
Quixote e Sancho Pança em suas te e sua esposa acontece e também
SELINFRAN
marcam quão distantes eles estão na adaptação, o discurso direto aparece
intimidade. O que Machado de Assis por meio do balão de fala.
dá a entender em palavras, Moon e Ainda na página 2 (fig. 2), de acor-
Bá reforçam em imagens. do com Eisner (1999, p.19), “as mu-
danças de cenário servem para mos-
trar a locação” dos personagens (na
rua e depois dentro de casa) e que
naturalmente envolve a passagem do
tempo, pois no gênero história em
quadrinhos tempo e espaço têm es-
treita relação, o que pode ser confir-
mado através das imagens.
REFERÊNCIAS
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ASSIS, M. de. O Alienista e outras histórias. São Paulo: Ediouro, 2001.
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lo: Contexto, 2007.
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COSTA, S. R. Dicionário de gêneros textuais. 3ª ed. Belo Horizonte: Autentica Editora, 2014.
DELL’ISOLA, R. L. P. Retextualização de gêneros escritos. Rio de Janeiro, Lucerna, 2007.
EISNER, W. Narrativas gráficas sequenciais – princípios e práticas da lenda dos quadrinhos. 3ª ed. São Paulo.
Devir, 2013.
______. Quadrinhos e arte sequencial. 3 ed. São Paulo. Martins Fontes. 1999.
FIORIN, J. L. Da necessidade da distinção entre texto e discurso. In: BRAIT, B.; SOUZA-E-SILVA, M. C. (orgs.).
Texto ou Discurso? São Paulo: Contexto, 2012.
KOCH, I. V. O texto e a construção dos sentidos. 7ª ed. São Paulo. Contexto, 2003.
48 MARCUSCHI, L. A. Linguística do texto – o que é e como se faz? São Paulo: Parábola, 2012.
______. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. 3ª Ed. São Paulo. Parábola Editorial, 2008.
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
MOISÉS, M. Machado de Assis: ficção e utopia. 10ª ed. São Paulo: Cultrix, 2007.
RAMOS, P. A leitura dos quadrinhos. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2012.
PROENÇA, M. C. Introdução. In: ASSIS, M. de. O alienista e outras histórias. São Paulo: Ediouro, 2001.
VERGUEIRO, W.; RAMOS P. Muito além dos quadrinhos: análise e reflexões sobre a 9ª arte. São Paulo: Devir,
2009.
______. Quadrinhos na educação: da rejeição à prática. São Paulo: Contexto, 2009.
SELINFRAN
DO MÍSTICO AO POLÍTICO: UMA LEITURA BAKHTINIANA DO
ROMANCE QUARUP DE ANTONIO CALLADO
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar o processo estilístico do ro-
mance Quarup (1967), de Antonio Callado, que se insere no quadro da litera-
tura produzida pós-64, a qual explora e expressa o meio social de seu tempo.
Consideramos que a construção do estilo não se trata de uma escolha indivi-
dual e isolada, pois está ligada à estilística sociológica, ressoando o diálogo
social no próprio discurso e em todos os seus elementos, tanto em nível formal
quanto de conteúdo. Para tanto, analisaremos dialogicamente o percurso do
herói Nando, sob o viés das relações dialógicas de Bakhtin. Verificou-se que o
gênero romanesco está inserido em uma estratificação interna da linguagem,
revelando a diversidade social e a divergência de vozes sociais que ele encerra,
elencando uma realidade plurilinguística, pluridiscursiva e plurivocal.
PALAVRAS-CHAVE: Estilo em Bakhtin; relações dialógicas; Quarup; Antonio
Callado.
ABSTRACT
The present work has as objective analyzes the stylistic process of the romance 49
Quarup (1967), of Antonio Callado, that interferes in the picture of the produced
conflitos políticos da nação, uma vez Bakhtin nos lembra acerca dessa
que em Pernambuco, percebemos a “arena”, desse campo de réplicas que
crise da igreja, nas figuras dos padres transformou o herói, conforme já ci-
Hosana e André; também percebe- tado: “Sabemos que cada palavra se
mos o coronelismo ainda açoitando apresenta como uma arena em mi-
os trabalhadores, que iniciam, de for- niatura onde se entrecruzam e lutam
ma tímida, uma luta por seus direitos; os valores sociais de orientação con-
no Rio de Janeiro, adentramos na cor- traditória. (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV,
rupção das funcionalidades públicas, 2009, p. 67, grifos nossos)
onde a burocracia se mostra como Percebemos que as relações dialó-
um ingrediente que leva à corrupção; gicas exercem um tônus fundamental
e no Xingu, assistimos a índios que na constituição do herói, que transige
têm seus costumes deturpados, sen- do místico ao político, a partir da sua
do condenados, drasticamente, ao relação com o outro, a partir do inter-
esquecimento e ao extermínio; além câmbio de ideais, sejam políticos ou
da tortura sofrida por Nando e seus meramente sexuais.
companheiros, nos porões da ditadu-
ra.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nando, portanto, ao participar do
Percebemos que o todo arquite-
conjunto histórico (crono) e do ge-
tônico da obra Quarup, de Antonio
ográfico (topos), revela e forma sua
Callado, foi concebido a partir da vi-
subjetividade, sua consciência, rede-
são que o autor-pessoa teve na ten-
senhando sua forma de interação e
tativa de encontrar o Centro do Bra-
de interpretação do mundo, a partir
sil.
do encontro com outras persona-
gens e com situações conflitantes es- A partir dessas perspectivas, rei-
boçadas nesses cantos diversos do teramos que o romance Quarup
60 Brasil, porém, percebemos que suas carrega em sua multiplicidade de si-
mudanças se darão, frequentemente, tuações, um conteúdo cultural e es-
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
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VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
SELINFRAN
UM AUTOR E SUAS FACES: A BUSCA DA CONSTITUIÇÃO DO ETHOS
RETÓRICO EM CONTOS DE MACHADO DE ASSIS
RESUMO
Neste trabalho, teremos, como arcabouço teórico, estudos advindos do âmbito
da linguística, mais especificamente da área de Retórica e Argumentação. A
partir dessa área, contaremos com os conceitos de ethos, de figuras de retó-
rica e também com os conceitos do segundo pilar do discurso retórico, a dis-
posição. A análise, que tem como corpus o conto “O enfermeiro”, do escritor
Machado de Assis, objetiva averiguar a constituição do ethos do contista, além
das estratégias argumentativas utilizadas pelo orador, com vistas à adesão do
auditório/leitor. Para tanto, efetuamos uma análise qualitativa do conto, a fim
de apreender os ethe evidenciados. Com essa análise, esperamos contribuir
com a ampliação do estudo em torno da constituição do ethos retórico no
conto “O enfermeiro”.
PALAVRAS-CHAVE: Retórica; ethos; Machado de Assis; conto.
ABSTRACT
In this work, we have, as a theoretical framework, studies from the scope of
linguistics, specifically in the area of Rhetoric and Argumentation. From this 63
area, we will have the concepts of ethos, of the rhetorical figures and concepts
INTRODUÇÃO A RETÓRICA
O objetivo do presente trabalho é O estudo da retórica possui a fun-
averiguar e analisar o ethos retórico ção, dentro de seu escopo de utilida-
do contista/orador Machado de As- des, de colaborar com o processo de
sis no conto “O Enfermeiro”, o qual interpretação de textos. É na retórica
constitui o corpus deste trabalho. que se dá o encontro dos homens e
Para tanto, observar-se-ão as estra- da linguagem na exposição de suas
tégias argumentativas adotadas por diferenças e de suas identidades.
ele com vistas à adesão de seu leitor/ Portanto, pode-se dizer que a retóri-
auditório. ca é a negociação da distância entre
Para empreender a análise retóri- os homens a propósito de uma ques-
ca, foram selecionados os seguintes tão, de um problema.
autores: Abreu (2009), Aristóteles Segundo Aristóteles, a retórica é
(2005), Eggs (2005), Ferreira (2010), uma questão de discurso, de racio-
Fiorin (2014, 2015), Meyer (1993, nalidade, de linguagem; é um dis-
2007), Perelman e Tyteca (2005) e curso que um orador possui e que é
Reboul (2004). Acerca da constitui- adequado a persuadir um auditório.
ção dos gêneros textuais com vistas A retórica possui, então, um relacio-
à compreensão do gênero “conto”, namento estreito com a linguagem,
selecionamos Marcuschi (2010) e pois é através desta que a comuni-
Costa (2012). cação e a argumentação acontecem.
No que se refere aos procedi- Sempre que falamos e/ou escre-
mentos metodológicos utilizados, vemos, levantamos uma questão, daí
efetuou-se, em primeiro lugar, uma não nos manifestarmos sobre aquilo
revisão bibliográfica dos teóricos que é evidente, ou seja, sobre o que
mencionados; em seguida, proce- não suscita uma questão, consoante
deu-se à seleção do corpus, a partir Meyer (1993).
64
da obra machadiana, com vistas à Ainda segundo o autor, a Retórica
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
análise do ethos, assim como de sua também pode ser entendida como
relação com as demais provas retó- a arte de bem falar, e este advérbio
ricas. “bem” carrega consigo uma carga
rica de sentidos, dos quais podemos
Com esta pesquisa, espera-se: pro- citar alguns: persuadir, convencer,
mover a ampliação da discussão em criar o assentimento, seduzir ou ma-
torno do ethos retórico, sobretudo nipular, sugerir, criar um sentido figu-
em sua relação com o gênero textual rado, descobrir as intenções daquele
ao qual o corpus selecionado perten- que se exprime.
ce, isto é, o conto; revelar os recursos
discursivos utilizados pelo contista/ De acordo com Aristóteles, esse
orador no conto em questão, com campo de estudos é sustentado por
o intuito de constituir os seus ethe; um tripé constituído por orador/audi-
mostrar as figuras de retórica adota- tório/discurso. O orador é simboliza-
das por ele com vistas à adesão de do pelo ethos (credibilidade de quem
seu leitor/auditório. fala para ganhar a adesão do auditó-
SELINFRAN
rio), o auditório refere-se ao pathos esforço de seu interlocutor para que
(jogo com as paixões e emoções dos as palavras sejam interpretadas de
ouvintes) e o discurso é simboliza- acordo com o que ele quis dizer. Para
do pelo logos (meio para se atingir a tanto, o contexto em que o texto foi
persuasão do auditório). expresso também deve ser conside-
O orador, que deve inspirar con- rado, (PERELMAN; OLBRECHTS-TY-
fiança, busca sempre agradar, persu- TECA, 2005).
adir, seduzir e convencer seu públi- Ainda sobre a noção de ethos, te-
co, não se importando com a forma mos a seguinte contribuição:
utilizada para atingir tais objetivos o étos é o caráter que o orador
(MEYER, 1993). Se as afirmações da- deve assumir para inspirar con-
das pelo orador são verdadeiras ou fiança no auditório, pois, sejam
não, isso pouco importa, pois o que quais forem seus argumentos ló-
se faz necessário é que elas passem gicos, eles nada obtêm sem essa
para o auditório a sensação de ver- confiança: [...] é um termo moral,
dade e de verossimilhança, como nos “ético”, e que é definido como o
diz Ferreira (2010). É por isso que caráter moral que o orador deve
aquilo que o orador considera como parecer ter, mesmo que não o te-
nha... (REBOUL, 2004, p. 48).
sendo verdadeiro tem pouca impor-
tância, pois o que realmente se faz Surge, daí, a ideia de que a equida-
relevante é o parecer de seu auditó- de é a prova que surte maior efeito
rio, de acordo com Perelman (2005). na argumentação.
A eficácia de um discurso está A partir do seu discurso, o orador
muito ligada à autoridade atribuí- suscita no auditório várias emoções,
da ao orador, o qual também pode paixões e sentimentos, e isso é o que
acrescentar ao seu discurso o seu chamamos de patos. O ethos, então,
modo de ser, de agir e de ver o mun- está relacionado ao orador; o patos,
do, segundo Ferreira (2010). O autor ao auditório; e o logos, ao discurso, 65
prossegue dizendo que, para que o isto é, à argumentação apresentada
Meyer (2007).
Perelman (apud MEYER, 1993, p.
Podemos dizer, então, que o ethos 106) dizia que “o objectivo das figu-
nada mais é que a capacidade de pôr ras é evocar uma presença, reforçá-
termo a uma questão que parece infi- -la ou atenuá-la, fazer ver melhor ou
nita. Para tanto, o orador deve provar de um modo diferente aquilo que de
que tem um saber sobre o assunto outra maneira poderia permanecer
que ele está abordando. É importan- despercebido ou percebido como
te que locutor e interlocutor com- inessencial.” Através da figura, a acei-
partilhem do mesmo saber. Tal sa- tação do argumento pode ser facili-
ber compartilhado nada mais é que tada, pois a figura relaciona-se com o
o contexto (conjunto de respostas delectare, isto é, com a fruição.
que supostamente orador e auditório
Segundo Fiorin (2014), a retórica,
compartilham). Sempre há alguém
ao voltar-se para o estudo das figu-
que fala/escreve e que se dirige a ou-
ras, passa a considerar os tropos, os
trem, buscando convencê-lo, agradá-
SELINFRAN
quais indicam uma mudança de sen- sua intensidade. (FIORIN, 2014, p.
tido. No tropo, cuja unidade básica 70).
é a palavra, o sentido literal de um
termo é substituído por um sentido FUNÇÕES DA RETÓRICA
figurado, e é por isso que os tropos Segundo Reboul (1998), a retórica
podem ser chamados de figuras de criou uma estética da prosa bastante
palavra. objetiva, funcional, que diz que aqui-
Uma figura que aparece no conto lo que não tem importância deve ser
em análise é a prosopopeia ou per- descartado, inutilizado, pois qualquer
sonificação. Por meio dela, busca-se artifício pode ser entendido como
“um alargamento do alcance semân- preciosismo ou vulgaridade e pode
tico de termos designativos de entes prejudicar a persuasão.
abstratos ou concretos não humanos Reboul considera que três pon-
pela atribuição a eles de traços pró- tos devem ser conservados para que
prios do ser humano.” (FIORIN, 2014, haja uma conservação do estilo retó-
p. 51). A prosopopeia pode ter a di- rico. Estes três pontos correspondem
mensão de um sintagma (substanti- aos três polos do discurso, que são o
vo e adjetivo) ou de um texto. assunto, o auditório e o orador.
Nesse corpus, também percebe- O estilo mais eficaz, mais conve-
mos que há uma inversão semântica niente, aquele que pode chegar à
do que foi dito. Trata-se, portanto, de persuasão é o que melhor se adapta
uma ironia. ao assunto. Portanto, o estilo não é
Segundo Fiorin (2014) a ironia (do algo rígido, mas se moldará confor-
grego eironéia, que significa “dissi- me o assunto em questão.
mulação”) ou antífrase (do grego an- Os latinos distinguiam três gêne-
típhrasis, que quer dizer “expressão ros de estilo: o nobre (grave), o
contrária”) é uma figura que consis- simples (tenue) e o ameno (me- 67
te num alargamento semântico. Com dium), que dá lugar à anedota e
assembleia, decide-se agir pelo útil identifica os gêneros como ações re-
ou pelo prejudicial. tóricas recorrentes, pois acredita que
a identificação de um gênero não re-
O propósito comunicativo do gê- side na similaridade de formas, mas
nero judiciário é atacar ou defender nos atos praticados com recorrência.
alguém, ver o que foi justo ou não; o Sendo assim, é a partir da ação que
deliberativo tem como objetivo acon- as estruturas são criadas.
selhar ou desaconselhar e o epidícti-
co tem como finalidade a censura ou Portanto, como os gêneros estão
o elogio. em constante movimento (alguns
desaparecem, outros ressurgem sob
CONTO: CONSIDERAÇÕES GE- novos formatos e, ainda, surgem no-
RAIS ACERCA DO GÊNERO vos gêneros), torna-se difícil estabe-
lecer demarcações entre eles.
Para o nosso objeto de estudo, se-
lecionamos o gênero textual conto. O conto é um exemplo de gênero
SELINFRAN
textual que possui uma linguagem rarmos uma amostragem suficiente
simples, acessível, direta e dinâmica. para demonstrar como a imagem do
De acordo com Costa (2012), esse orador se constrói por meio do dis-
gênero se caracteriza por ser uma curso, e por não haver trabalhos re-
narrativa curta e é escrito em prosa. alizados na área da Retórica que se
Ele possui uma configuração mate- reportem à constituição do ethos do
rial narrativa pouco extensa, com um orador nos contos machadianos.
número reduzido de personagens; os Uma vez postas as considerações
acontecimentos são breves; o enredo gerais sobre o gênero, bem como
apresenta um único drama, um úni- considerada a justificativa da escolha
co conflito, uma só história e uma só do corpus, passemos às suas especi-
ação, não sendo possível intrigas se- ficidades.
cundárias, como ocorre no romance
e na novela; o tempo e o espaço são OBJETO DE ANÁLISE
reduzidos, ou seja, o conto apresen-
ta um esquema temporal e ambiental A) O CONTO E SEU ESCRITOR
econômico e/ou restrito. O presente trabalho terá como
A pequena extensão e a síntese do corpus o conto de Machado de Assis,
conto se justificam pelas origens do intitulado “O enfermeiro”.
mesmo, o qual teve início nos “causos No conto, a atenção do leitor/audi-
populares”, com função lúdica e mo- tório é capturada a partir da identida-
ralizante. Pode-se dizer, então, que o de que o mesmo cria com a narrativa
conto tem suas raízes na cultura oral. e com o encadeamento dos fatos, os
Edgar Alan Poe, em seu livro “A fi- quais, por sua vez, dão sentido à tra-
losofia da composição”, dá-nos pis- ma e envolvem o leitor. Para isso, a
tas acerca do funcionamento do gê- verossimilhança dos fatos narrados
nero textual conto, afirmando que a faz-se imprescindível.
69
relação efeito e extensão é um princí- A trama do conto é objetiva e line-
pio do conto, pois este não pode ser
•Gastava mais enfermeiros que re- subjetiva de uma questão vista pelo
médios; ângulo do prazer e do desprazer e,
•riso maligno; enquanto resposta, torna a questão
em algo particular, subjetivo. Dessa
•feições que eram duras; forma, o esquema prazer/desprazer
•as relações foram se tornando é ultrapassado.
melindrosas; A paixão transfere o problema
•escassa dose de piedade; para o plano da resposta; ela cria uma
identidade entre pergunta e resposta
•fermento de ódio e aversão;
e, neste caso, a pergunta passa a ser
•delírio vago e estúpido; tratada como resposta, e isso anula
•Parecia-me que as paredes ti- toda problematicidade. Quanto mais
nham vultos; estivermos na paixão, mais teremos
resposta para o que está em ques-
•escutava umas vozes surdas; tão, e isso nos leva a cair na ilusão. A
•O mesmo som do relógio, lento, paixão é retórica justamente por en-
igual e seco, sublinhava o silêncio e a terrar as questões nas respostas que
solidão; fazem crer que elas estão resolvidas,
conforme Meyer (2007 p. 36-38).
•a memória tornou-se cinzenta e
desmaiada. Meyer (2007), retoricamente fa-
lando, também nos diz que lidar com
A figura de retórica ironia está pre-
as paixões é mais útil, pois elas são
sente também. Ela pode ser eviden-
muito importantes para mobilizar o
ciada no fato de Procópio ir trabalhar
auditório.
na casa do coronel Felisberto com o
objetivo de ajudá-lo a cuidar de sua Na recepção de uma mensagem,
saúde, mas o enfermeiro acaba pro- sempre há uma lógica que pode ir do
72 vocando sua morte. Como se isso prazer retórico à convicção funda-
não bastasse, toda a herança do co- mentada na razão. Muitas vezes, essa
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
sonagem Procópio. O auditório, for- O orador fez uso das figuras retóri-
mado pelos leitores do conto, pode cas, as quais facilitam a aceitação do
tanto defender o enfermeiro como argumento, pois elas se relacionam
condená-lo pela atitude apresentada com o delectare, com a fruição.
na narrativa, pois Procópio estrangula Observamos também, dentro das
o coronel Felisberto. O tempo verbal funções da retórica, que o orador
utilizado na história é o tempo pas- adotou o estilo ameno, que busca
sado, bastante comum nesse gênero. agradar (delectare), e o simples (do-
Na análise desse conto, tratamos cere), bastante comum na narração e
de apresentar as provas retóricas na confirmação e muito apropriado
(ethos, pathos e logos) utilizadas quando se busca convencer.
pelo orador com vistas à adesão de
seu auditório/leitor.
SELINFRAN
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RESUMO
Este artigo tem como objetivo analisar o programa educativo audiovisual Cas-
telo Rá-Tim-Bum, série que mescla educação e entretenimento e se mantém no
ar desde 1994. Tendo em vista as novas formas de produção e sociabilização
dos saberes que os avanços tecnológicos promovem e que mudam significa-
tivamente as formas de vida contemporâneas, iremos analisar como se esta-
belece a relação de interação entre enunciador e enunciatário nesse programa
considerado, neste trabalho, como um gênero didático pedagógico do proces-
so de educação não formal midiática. Nossas análises serão fundamentadas
pelos pressupostos da teoria semiótica francesa, com o uso dos regimes de
interação, a fim de identificar quais as estratégias de interação e persuasão que
o Programa estabelece.
PALAVRAS-CHAVE: Castelo-ra-tim bum; gênero didático pedagógico; regi-
mes de interação.
ABSTRACT
This article aims to analyze the audiovisual educational program Castelo Ra-
76 -Tim-Bum, series that combines education and entertainment and still remains
on the air since 1994. The new forms of production and socialization of know-
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
84
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Figura 6 - Monstro Mau.11
A partir dessas concepções basea-
Observamos então que a Cobra das nos pressupostos dos regimes de
Celeste, a bruxa Morgana, o Rato e interação propostos por Landowski
o Mau estão ligados à ruptura de re- (2005), percebemos, neste estágio
gularidades da crença social. Há uma de nossas pesquisas, que a adesão
releitura com textos bíblicos e cren- ao Programa Castelo Rá-Tim-Bum é
ças populares nesses personagens. concretizada pela troca de experi-
A cobra Celeste no Castelo repre- ências do enunciador e enunciatário 85
senta o início de tudo, já que ela mora que parece se estabelecer entre os
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VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
RESUMO
A “pregação religiosa” é de um gênero estritamente oral, produzido por um líder
religioso e que tem, como destinatários, fiéis pertencentes a um grupo comum.
Para aprofundar nesse tema, buscaremos descrever o desempenho do ethos
do orador em pregações religiosas, refletindo sobre seu alcance persuasivo no
referido gênero. Contaremos com a conceituação tripartite de éthos proposta
por Aristóteles: phronesis, arete e eunoia. Com vistas a empreender a análise
proposta, recorreremos a Aristóteles, Perelman e Olbrechts-Tyteca, Meyer, Re-
boul, Eggs e Fiorin. Como consequência de um novo formato de evangelização
do século XXI, selecionamos como corpus de análise a pregação dos Padres
Fábio de Melo, Léo e Mons. Jonas Abib. A análise por nós empreendida visa
contribuir para o entendimento das implicações retóricas do éthos do prega-
dor dentro do gênero “pregação religiosa”.
PALAVRAS-CHAVE: Retórica; ethos; gênero textual; pregação religiosa.
ABSTRACT
The “religious preaching” is a strictly oral genre, produced by a religious leader
and that has a target audience composed by faithful people that belong to a 87
common group. In order to reflect on this topic, we will seek to describe the
trados.
sentarem-se constantemente em
Uma das formas de propagação programas televisivos por meio da
da fé escolhida pelos religiosos en- Comunidade Católica que represen-
volvidos no catolicismo midiático é o tam.
proferimento de “pregações religio-
sas” em mídias de amplo alcance de OBJETIVO
fiéis, tais como a TV e o rádio.
A escolha dos pregadores se deu
As “pregações religiosas”, tais pela expressividade dos escritos e
como descritas por Figueiredo et al. discursos de Padre Jonas Abib, Pa-
(2009) em artigo intitulado “Prega- dre Léo e Padre Fábio de Melo. Cada
ção religiosa: uma caracterização à um desses sacerdotes apresenta seu
luz da teoria dos gêneros”, consti- estilo contemporâneo de evangeliza-
tuem um gênero estritamente oral, ção que leva à fidelização de seus se-
produzido por um líder religioso e guidores. São missionários da religião
SELINFRAN
católica, praticantes e divulgadores Reboul (2004), Meyer (1998, 2007),
dos carismas da Renovação Carismá- Ferreira (2010), Tringali (1988), Abreu
tica Católica e, como mencionado, (2009), Fiorin (2015) e Eggs (2005).
fazem uso de diferentes mídias para Outros estudiosos também farão
aproximar o público na sua missão parte desta pesquisa: para nos ajudar
evangelizadora. nas reflexões sobre a teoria dos es-
Sendo assim, este trabalho propõe tudos prosódicos, contaremos com
um estudo sobre os aspectos per- Figueiredo (2006) e Cagliari (2007),
suasivos e os recursos argumentati- no que concerne ao gênero prega-
vos utilizados por esses oradores em ção, nos valeremos das proposições
suas pregações. Partimos da premis- de Figueiredo et al. (2009), e, no que
sa de que os mecanismos persuasi- se refere ao discurso religioso, conta-
vos presentes nos discursos desses remos com Orlandi (1987a e 1987b).
líderes religiosos se devam ao intuito
de garantir a adesão de um auditório METODOLOGIA
específico que se compõe da comu- Em termos metodológicos, proce-
nidade de fiéis. demos a uma revisão da literatura no
Por meio da análise empreendida, que consiste a bibliografia supraci-
buscaremos descrever o ethos retóri- tada, isto é, as obras de renomados
co dos pregadores Jonas Abib, Léo e autores da Retórica. Além disso, fize-
Fábio de Melo, por meio de suas pre- mos um levantamento acerca o gêne-
gações religiosas. Assim, averigua- ro a ser analisado, isto é, a “pregação
remos a forma como se manifesta o religiosa”. Em um segundo momento,
ethos desses pregadores por meio partimos para a seleção do material
das estratégias argumentativas en- que comporia o corpus. Essa seleção
contradas nessa modalidade de dis- foi feita por meio do acesso às pre-
curso religioso: a pregação. Assim, gações disponíveis em CD e DVD que
deteremos nossa atenção sobre os estão à venda pela Internet. Selecio- 89
diferentes tipos de ethe: phronesis, namos, então, três pregações de três
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VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
RESUMO
Esta pesquisa visa analisar a trajetória textual do slogan “Somos Todos Maca-
cos” em textos na mídia online. As teorias que embasam o estudo são os atos
de fala performativos, Austin ([1962] 1990) e Derrida ([1972] 1988), e a concep-
ção de raça proposta pelas Teorias Queer (SOMMERVILLE, 2000; SULLIVAN,
2003; BUTLER, ([1999] 2003); BARNARD, 2004; LOURO, 2004, WILCHINS,
2004). A pesquisa é de caráter etnográfico (Hine, 2000) e utiliza os construtos
teórico-analíticos de trajetória textual (BLOMMAERT, 2006, 2010) e de entex-
tualização (BAUMAN; BRIGGS, [1990] 2008), além das pistas indexicais indica-
das por Wortham (2001). A relevância deste trabalho está na medida em que
aborda as relações raciais contribuindo para uma reflexão sobre a raça como
uma construção histórica, social, discursiva e performativa.
PALAVRAS-CHAVE: Somos todos Macacos; trajetória textual; raça; teorias
queer; mídias sociais e online.
ABSTRACT
This research aims at analyzing the textual trajectory of the slogan “We Are 101
All Monkeys” in online media. The theories that underlie the study are the per-
111
REFERÊNCIAS
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Anexo A
112
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
Fonte: Instagram
Anexo B
Anexo B
Fonte: Facebook
Fonte: Instagram
SELINFRAN
SELINFRAN
RESUMO
Quando vida e obra não mais se separam, a arte passa a não mais “nascer” das mãos,
mas, principalmente, da mente do artista, que se sente à vontade para inclusive
se apropriar de qualquer objeto mundano. Objetos do cotidiano inserem-se no
circuito da Arte e os conceitos dessas apropriações passam a ser argumentos.
Nesse contexto, o artista paulistano Nelson Leirner vem problematizando a lógica
e a racionalidade que ordenam os modos de produção, de institucionalização e de
inserção social da prática artística. Selecionada a série Sotheby´s como corpus,
buscamos desvelar as estratégias argumentativas como recursos empregados pelo
orador (o artista) para angariar a atenção e a adesão de seu auditório à sua visão
crítica e engajada sobre o conceito e o lugar da arte e o contexto sócio-econômico
em que ela se insere. A presente pesquisa fundamentar-se-á nas exposições
de Barthes (1990) acerca da retórica da imagem, nos pressupostos teóricos da
Argumentação e Retórica, expostos por Aristóteles, Reboul (2004), Meyer (2007),
Ferreira (2010) e Fiorin (2014) e em noções advindas da Linguística Textual com
contribuições de Koch e Cavalcante (2008).
PALAVRAS-CHAVE: Arte; argumentação; intertextualidade; retórica; texto
sincrético.
114 ABSTRACT
When life and work no longer separate, the art is no longer “born” from hands, but
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
mainly from the mind of the artist, who feels comfortable to even take ownership
of any mundane object. Everyday objects fit into the art circuit and the concepts of
this appropriation become arguments. In this context, the São Paulo artist Leirner
is questioning the logic and rationality ordering modes of production, institutio-
nalization and social inclusion of artistic practice. Selected the Sotheby’s series as
corpus, we seek to uncover the argumentative strategies as resources used by the
speaker (the artist) to raise attention and adherence of his audience to his critical
and committed vision of the concept and the place of art and socio-economic
context in which it is inserted. This research will be supported by Barthes (1990)
exhibitions about the image rhetoric, the theoretical assumptions of Argumenta-
tion and Rhetoric, exposed by Aristotle, Reboul (2004), Meyer (2007), Ferreira
(2010) and Fiorin (2014) and notions from Textual Linguistics with contributions
from Koch and Cavalcante (2008).
KEYWORDS: Art; argumentation; intertextuality; rethoric; sincretical text.
SELINFRAN
INTRODUÇÃO nas de alegorias sobre paradoxos da
arte e do mundo contemporâneo, do
Brasil, anos 1970, crise da teoria
banal e do genial.
modernista no campo da Arte. Re-
definição da função artística e muta- Leirner, utilizando-se desse seu ar-
ção histórica do estatuto do artista. senal de objetos e ideias, transforma
Opera-se o deslocamento do fazer o jogo de apropriações e assembla-
artístico da produção de objetos, gens1 da arte em armadilhas visuais,
subsumindo especialização e noção questionando os paradoxos do mun-
de originalidade e unicidade da obra, do da arte, indagando seus lugares e
para a constituição de uma rede de suas condições de ser arte.
significações, com a exploração sis- Por que arte, artistas, curadores,
temática da combinação de diferen- mercadores e críticos fazem parte
tes meios, artísticos ou não, e a con- de indagações constantes em seus
taminação entre as artes. trabalhos, tanto visuais e sincréticos
Objetos do cotidiano inserem- quanto em suas considerações re-
-se no circuito artístico e os concei- gistradas em textos verbais. Nelson
tos dessas invenções manifestados Leirner, desde o início da sua traje-
também através do verbo tornam-se tória, ainda nos anos 1960, ocupa-se
parte constituinte do objeto artístico, em apontar as contradições e a mis-
seja para comentá-lo, interpretá-lo, tificação que sempre rondou o meio
defini-lo, contestá-lo ou valorizá-lo. artístico como, por exemplo, as cons-
tantes visitas de um grande público a
Deixa de existir, de um lado, a obra
um museu mais por causa do prédio
e, de outro, os discursos sobre ela. Os
considerado arquitetonicamente um
diferentes domínios materiais, técni-
motivo de apreciação do que pela
cos e simbólicos e suas interpenetra-
arte contemporânea propriamente
ções são também artes do dizível, o
dita ali exposta (exemplo disso foi
que contribui para a abertura desse 115
sua exposição “Por que museu”, no
complexo pensamento visual que ex-
Museu de Arte Contemporânea de
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dez.2014.
SELINFRAN
AS RELAÇÕES ENTRE PLANO DE EXPRESSÃO E PLANO DE CONTEÚ-
DO EM “POEMA”, DE MANOEL DE BARROS
RESUMO
Este trabalho analisa o texto “Poema”, de Manoel de Barros do livro Tratado Geral
das Grandezas do ínfimo, por meio do referencial teórico da semiótica francesa
com o objetivo de descrever as relações entre o plano de conteúdo e o plano de
expressão do poema para mostrar que o conceito de semissimbolismo deve ser
ampliado, conforme Fiorin (2003), buscando-se correlações entre categorias da
expressão e categorias do conteúdo em todos os níveis do percurso gerativo e não
apenas nos seus níveis mais profundos. Aplicamos também ao texto elementos do
percurso gerativo de sentido para observar a construção do sujeito poético, simu-
lacro do enunciador, que assume em “Poema” o papel de sujeito apaixonado pela
palavra poética. Desse modo, temos por objetivo desvelar o caráter metadiscursivo
do texto.
PALAVRAS-CHAVE: Semiótica francesa; plano de conteúdo; plano de expressão;
Manoel de Barros.
ABSTRACT
This paper analyzes “Poema”, by Manoel de Barros, from the book Tratado Geral das
Grandezas do ínfimo by means of the theoretical frame of French Semiotics aiming
at describing the relations between the content plane and the expression plane of
this poem in order to show that the semi-symbolic concept must be expanded, ac- 125
cording to Fiorin (2003), seeking correlations between the expression categories
licos, de um modo geral, reconhece- não guarda, por sua vez, relação com
mos a predominância das vogais orais os versos que se seguem. A abertura,
fechadas. Porém, nas sílabas tônicas concretizada nas dez vogais a, indica
encontramos a repetição do fonema um ritmo sem impedimentos, fluido,
/a/ e do fonema /e/: ambos aparecem que remete à necessidade de desco-
nove vezes. Sabe-se que o fonema /a/ brir a poesia guardada nas palavras,
é classificado como central (zona de de descobrir o que de fato é signifi-
articulação), baixo (altura da língua), cante, aberto, portanto. Tal abertura
não-arredondado (posição dos lábios) cria tensão tendo em vista o fecha-
e centrífugo (forma de ressonar); já o mento de vogais predominantes nos
fonema /e/ é anterior ou palatal (zona versos seguintes; este fechamento,
de articulação), médio (altura da lín- por sua vez, pode referir-se ao que
gua), não- arredondado (posição dos parece insignificante, para o sujeito
SELINFRAN
poético, no sentido de ser automati- as rimas agudas são formadas por pa-
zado, fechado, portanto. Assim, te- lavras agudas ou oxítonas como ocor-
mos: abertura vs. fechamento em que: re em fiquei/ chorei e imbecil/elogios;
descobrir é expandir (abrir); e guardar rimas graves são formadas por pala-
é concentrar (fechar).No nível fônico vras graves ou paroxítonas, como em
isso constitui uma rima. Sabe-se que profundidades/ realidade; No texto
as rimas podem aparecer no final, no em questão, as rimas agudas do pla-
interior ou em várias outras posições no sonoro que aproximam imbecil de
no verso (GOLDSTEIN, 1985, p.44). elogios revelam a ironia do enuncia-
Em “Poema”, encontramos três rimas dor em relação aos valores esteroti-
consoantes (semelhança de consoan- pados daqueles que consideram que
tes e vogais), que se manifestam nos ele não tem conexões com a realida-
seguintes versos: de, demonstrando, portanto, que eles
são os verdadeiros alienados. É inte-
Sobre o nada eu tenho profundi- ressante observar ainda a oposição
dades.
entre os fonemas vocálicos fechados
Não tenho conexões com a reali- (predominantes) e fonemas vocálicos
dade. abertos (em menor número). Esse fe-
chamento, predominante no plano de
expressão, parece se associar à alie-
Por essa pequena sentença me
elogiaram de imbecil. nação que o sujeito poético ironiza no
plano de conteúdo, quando se refere
Fiquei emocionado e chorei. aos valores pragmáticos estereotipa-
Sou fraco para elogios dos daqueles que o consideram im-
becil Já a abertura dos fonemas vo-
Observemos a primeira rima: ela
cálicos, em menor número no poema,
ocorre no final do verso a partir da
parece se relacionar à função da poe-
semelhança das vogais e consoantes
sia, que propõe valores de conscienti-
ADE/ADE, em que a vogal tônica tam- 133
zação por meio do belo.
bém é o /a/; a segunda rima também
Não tenho conexões com a reali- A palavra nada pode ser conside-
dade. rada, segundo Ferreira (2010, 1448)
como um pronome indefinido subs-
Poderoso para mim não é aquele
tantivado, com o significado de “ni-
que descobre ouro.
nharia”: “Sobre o nada eu tenho pro-
Para mim poderoso é aquele que fundidades”. Assim, o sujeito poético
descobre as afirma ter profundidades sobre o que
SELINFRAN
os outros pensam ser as “ninharias”, Insignificâncias (do mundo e as
as insignificâncias. Como já foi men- nossas).
cionado anteriormente, o primeiro Dos versos em que há “enjambe-
verso abre o poema com uma afirma- ment”, o primeiro se inicia depois do
ção que, ademais de ser impactante, travessão. Nota-se que o enjambe-
conduz todo o sentido do texto. Par- ment do primeiro verso está constitu-
tindo, então, da afirmação: “a poesia ído por três palavras “é tudo que”. Tal
está guardada nas palavras” repara- período está incompleto, tensionado
mos que o sujeito poético faz menção pela quebra da sequência da oração,
à potencialidade das palavras, isto o que instaura uma espera pelo com-
é, alude à capacidade de a palavra, plemento. A ruptura em “que” é res-
de seu ponto de vista, transformar o ponsável pelo retardamento da ação
nada em palavra poética. e pelo surgimento de expectativa, en-
c) Nível sintático: analisamos a or- quanto o verso seguinte “eu sei” alivia
ganização sintática do texto, partindo a tensão e completa o verso anterior.
da pontuação. Logo no início do po- No exemplo seguinte, ocorre o mes-
ema, identificamos dois períodos di- mo, o artigo “as” marca a quebra de
vididos por uma cesura (simbolizada sequência e cria a tensão, e o verso
com um travessão), sendo o primeiro seguinte complementa seu sentido. A
simples e o segundo composto. De um partir da construção destas estruturas
ponto de vista geral, os onze versos especiais reconhecemos uma oposi-
do poema se intercalam entre perío- ção entre tensão vs. distensão, a qual
dos simples (5) e períodos compostos enfatiza os termos que se seguem
(5), todos concluídos com um ponto após a tensão. Assim, “eu sei” reafir-
final. Observamos, também, uma pre- ma o modo da certeza e a construção
dominância de períodos curtos, tor- de um sujeito cognitivo, ao mesmo
nando o texto dinâmico. Verificamos tempo em que “Insignificâncias (do
dois períodos com uma construção mundo e as nossas)” configura os va- 135
especial chamada de “enjambement”: lores que o enunciador considera im-
so” e “para mim” que invertem de po- cação eufórica. Dessa forma, além de
sição: utilizar a ironia, o enunciador, renova a
ondem sintática e manifesta, por meio
– é tudo que eu sei.
de seu fazer, a descoberta da poesia
contida nas palavras.
d) Nível semântico: o nível se-
Meu fado é o de não saber quase tudo. mântico já foi explorado nas consi-
derações sobre o plano de conteúdo.
Poderoso para mim não é aquele que des-
Porém, vale ressaltar que, em relação
cobre ouro.
às figuras de oposição (GOLDSTEIN,
1985, p.66), encontramos a ironia ma-
nifestada, mais fortemente, nos ver-
Para mim poderoso é aquele que desco- sos finais:
bre as
Por essa pequena sentença me
Essas inversões presentes no texto,
elogiaram de imbecil.
por meio da mudança da ordem sintá-
tica das palavras, concretizam a inver- Fiquei emocionado e chorei.
são de valores manifestada no plano Sou fraco para elogios.
de conteúdo, pois ao invés de valo- Tal figura retoma todos os elemen-
rizar “aquele que descobre ouro”, o tos que configuraram essa oposição
enunciador valoriza “aquele que des- de pontos de vista, enquanto o enun-
cobre as insignificâncias (do mundo ciador valoriza as coisas desimpor-
e as nossas)”. Portanto, o enunciador tantes o outro valoriza o “ouro”. Essa
segue em direção contrária ao saber divergência é simbolizada nos outros
estereotipado daqueles que valori- níveis: a predominância das consoan-
zam o dinheiro, metaforizado pela fi- tes oclusivas, por exemplo, caracteriza
gura “ouro”. a ruptura na pronúncia, assim como
136 A nova forma de olhar o mundo, ocorre uma ruptura com o senso co-
voltando-se para o que é tido como mum através do estabelecimento de
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
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138
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
SELINFRAN
NARRATIVA E INTERAÇÕES EM ASSASSIN´S CREED REVELATIONS
RESUMO
A presente pesquisa tem como objetivo fazer uma análise dos regimes de intera-
ção do jogo Assassin´s Creed Revelations por meio da intersecção entre os pres-
supostos teóricos da sociossemiótica e o modelo de análise do percurso gerativo
de sentido. Por se tratar de um texto digital, que apresenta um conteúdo dinâmico,
imersivo e que permite formas de interação diferenciadas, decidimos investigar
como ocorre a produção e apreensão de sentido em uma narrativa que é cons-
truída em ato. Neste caso, no ato de jogar. Com base nos preceitos da semiótica
francesa, em estudos realizados por autores como Fiorin (2005), Bertrand (2003)
e Landowski (2014), nossa pesquisa busca compreender como uma narrativa com-
plexa audiovisual produz seus efeitos de sentido e mantém a adesão do enuncia-
tário jogador.
PALAVRAS-CHAVE: Jogo; digital; game; narrativa; percurso.
ABSTRACT
This research aims to analyze the game interaction schemes Assassin’s Creed Re-
velations through the intersection of the theoretical assumptions of sociossemi-
ótica and the analysis model of the generative sense route. Because it is a digital 139
document, in a dynamic, immersive content and allowing differentiated forms of
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151
RESUMO
As mulheres brasileiras, em tempos de Copa do Mundo 2014, foram retratadas em
dois objetos de consumo polêmicos que geraram protestos e se espalharam na
web. Nossos objetivos são os de identificar a trajetória textual e analisar algumas
entextualizações em contextos online/digital. Para isso, esta pesquisa se emba-
sa nos atos de fala performativos (AUSTIN ([1962] 1990), na releitura de Derrida
([1972] 1988), nos estudos de gênero e sexualidade das Teorias Queer (LOURO,
2004; BUTLER, 1997, 2003), no conceito de trajetória textual (BLOMMAERT, 2010)
e nas entextualizações propostas por Baumam e Briggs (1999) e Melo e Moita Lo-
pes (2015). O instrumento de geração de dados são os dois textos publicitários e
os textos encontrados nas mídias digitais/online. As categorias de análise são as
pistas indexicais propostas por Wortham (2001).
PALAVRAS-CHAVE: Gênero e brasilidade; camisetas da Copa do Mundo;
trajetória textual; entextualização; teorias queer.
ABSTRACT
152 The Brazilian Women, during the 2014 World Cup organization, were presented in
two polemical consumer objects that caused protests which spread on the web.
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
Our objectives are to identify the textual trajectories and analyse some entextua-
lizations in online contexts. In order to do it, this research is based on the
performative speech acts (AUSTIN ([1962] 1990; DERRIDA ([1972] 1988), in
gender and sexuality Queer Theories (LOURO, 2004; BUTLER, 1997, 2003), on the
concept of textual trajectory (BLOMMAERT, 2010) and on the definition of entex-
tualizations proposed by Baumam and Briggs (1999) and Melo and Moita Lopes
(2015). The data generation instrument are the two advertising texts and the texts
found on digital/online media. The analysis categories are indexical clues proposed
by Wortham (2001).
KEYWORDS: Gender and Brazilianness; T-shirts of the 2014 World Cup; Textu-
al trajectory; Entextualization; Queer Theory.
SELINFRAN
INTRODUÇÃO novo capitalismo, que necessita
de novos conhecimentos para en-
A sociedade que entra no século frentá-lo. Como os pesquisadores
XXI é caracterizada por um tipo de da área da linguagem podem pro-
Modernidade diferente da que en- duzir conhecimento sem se envol-
trou no século XX. Nesse período de verem com essas questões? Se o
um século a outro aconteceram duas fizeram em tempos passados, as
grandes guerras mundiais, que muda- mudanças que vivemos, no mo-
ram o cenário tecnológico, deixando mento atual, não nos deixam es-
os sujeitos sociais mais confusos em paço para respirar: é tempo de
relação às suas crenças, ideologias, repensar os percursos epistemo-
lógicos que têm nos orientado.
valores e aumentando os conflitos
(MOITA LOPES, 2004, p.162).
existenciais. Desta forma, o sujeito
se percebe perdido dentre tantas re- Além de não ser mais possível essa
ferências, confuso diante de tantas e crença de que há um afastamento te-
tão rápidas mudanças, cético quanto órico necessário, em tempos Moderni-
à estabilidade de valores. dade Tardia (GIDDENS, 1990) também
se desvenda a crença de neutralida-
Neste cenário, a Modernidade Re-
de nas pesquisas. Para Moita Lopes
flexiva (GIDDENS, 1991) nos propor-
(2004, p.159), as Ciências Humanas
ciona a mudança de olhar do centro
e Sociais estão vivendo uma “grande
para a margem, possibilitando deba-
ebulição”, que:
tes sobre temáticas apagadas na Mo-
dernidade, tais como gênero, raça, se- [...] se explica por uma série de
xualidade e classe social. Intrínseca a mutações experienciadas na vida
ela está a possibilidade de reflexivida- contemporânea que requerem
teorias e metodologias novas e
de sobre nós mesmxs1, ou seja, refle-
que, portanto, põem em xeque
tir sobre corpos considerados abjetos modos de produzir conhecimen-
na perspectiva de Butler (2003), que to que não dão conta dessas mu- 153
são mulheres, negrxs, transgêneros, danças. Além disso, fala-se cada
deficientes, etc. É neste contexto de
mar a um casal heteronormativo: “Eu não ser necessário existir pessoa es-
vos declaro marido e mulher”, ou um pecífica, nem ação prévia, para repe-
padre, representante do catolicismo, tir esses atos de fala performativos.
ao dizer: “Eu te batizo em nome do Sendo assim, ele existe, ganha força,
Pai, do Filho e do Espírito Santo”. Nas se sedimenta e se torna uma verda-
duas situações ambos fazem um pro- de, porque é repetido e citado inú-
ferimento que ao ser enunciado reali- meras vezes através da iterabilidade e
za-se e atendem às condições espe- da citacionalidade. Para o autor, é im-
ciais sugeridas por Austin: possível recuperar o primeiro ato de
verdade dentro deste emaranhado de
Deve existir um procedimento
atos de fala que são repetidos. Derri-
convencionalmente aceito, que
apresente um determinado efei- da questiona de quem é a responsa-
to convencional e que inclua o bilidade já que não se consegue recu-
perar o primeiro ato de fala proferido.
SELINFRAN
Portanto, embasados nessa teoria de gênero são múltiplas, proporcio-
dos atos de fala performativos, nesta nando diversas maneiras de encená-
pesquisa, a linguagem é vista como -las. Além disso, para a autora, uma
ação. Ao enunciarmos, uma ação está mulher é um conjunto, um plural e
sendo realizada. Estes pressupostos não singular. No caso específico das
são importantes para compreender- mulheres brasileiras, observamos que
mos também as Teorias Queer, gênero a nacionalidade perpassada por gê-
e brasilidade, como veremos a seguir. nero constrói uma mulher brasileira
hipersexualizada. Compreendemos,
GÊNERO E BRASILIDADE PELO então, que tais construções discursi-
VIÉS DAS TEORIAS QUEER vas, históricas, sociais e performativas
sobre as mulheres brasileiras são re-
Nesta seção, apresentaremos o ou-
petidas na web, na tv, na mídia nacio-
tro pilar teórico de nossa investigação,
nal e internacional ao longo de anos,
as Teorias Queer, que são bastante
e enfatizam uma mulher brasileira, hi-
recentes e buscam contestar as dico-
persexualiza, com corpo curvilíneo, da
tomias e/ou binarismos que trazem
pele morena à negra, disponível para
sofrimentos e mitigam as pessoas.
o sexo.
Esses binarismos privilegiam no lugar
que representam, nas práticas sociais, É sob a ótica dessa teoria que
a supremacia do primeiro em relação olharemos essas intersecções de gê-
ao segundo, por exemplo: homem vs. nero e nacionalidade que apontam
mulher, branco vs. negro, masculino para Discursos de sexualidade sobre
vs. feminino, rico vs. pobre. as mulheres brasileiras representadas
nos dois objetos de consumo. Esses
Segundo Salih (2012) e Louro
textos viajaram pela internet, segui-
(2004), as Teorias Queer se origina-
ram uma longa trajetória textual e se
ram de uma aliança entre três movi-
entextualizaram em diferentes sites.
mentos: teorias feministas, teorias
157
pós-estruturalistas da linguagem e
INSTRUMENTAL TEÓRICO - ANA-
teorias psicanalíticas, que se questio-
entextualizados.
Segundo Blommaert (2005) en-
textualização é o processo de retirar
um texto ou um pedaço dele do con-
texto e colocá-lo em outro contexto,
ou seja, materializá-lo. Nas palavras
de Blommaert (2006, p. 5): “[...] dis-
cursos retirados de seu ambiente de
interação e transmitidos em conjunto
com novas sugestões de contexto”.
Neste estudo, compreendemos, en- Figura 1- objetos de consumo camisetas
Melo e Moita Lopes (no prelo) são lheres contra o feminismo”, no dia 05
“[...]usados pelo narrador para se re- de março, “A Cortesã”, etc. Durante
ferir ou predicar o que é contado na a Copa foram criadas páginas espe-
história.” cíficas para notícias da Copa, os tex-
A seguir apresentamos a análise tos também as percorreram, no dia
piloto da trajetória textual e especifi- 25, “Lance nete Copa 2014”, “Folha
camente da entextualização no blog na Copa”, etc. A trajetória textual dos
Mulheres contra o feminismo: orgu- textos publicitários também percor-
lhosas e felizes de sermos mulheres. reu, no dia 25, os sites de variedades:
Uol, R7, Ig, G1, Terra, etc.
ANÁLISE PILOTO DA TRAJETÓRIA Os múltiplos textos presentes na
TEXTUAL trajetória textual trazem à tona posi-
SELINFRAN
cionamentos através das entextua- ra, prostituta, de bundas, da Adidas)
lizações. Neste artigo, mostraremos e entrelaçadas pelo verbo de ligação
uma das entextualizações durante a (é), no presente do indicativo, suge-
longa trajetória textual, a de um blog rem uma imagem do Brasil em con-
que contesta o feminismo. texto mundial, na qual as mulheres
brasileiras são construídas como unas,
ANÁLISE PILOTO DO BLOG “MU- singulares, com ênfase na construção
LHERES CONTRA O FEMINISMO: sexual, apagando sua pluralidade. O
ORGULHOSAS E FELIZES DE SER- título do blog indexa sentidos de que
MOS MULHERES” as mulheres que vivem no país das
bundas são prostitutas e foram re-
O artigo de opinião foi intitulado tratadas pelas camisetas da Adidas.
“Carnaval – Copa do mundo: Mulher Tais construções discursivas apontam
brasileira é prostituta, Brasil é terra de para além da entextualização dos ob-
bundas e as camisas da Adidas”, pu- jetos de consumo, indicam a entextu-
blicado em 24 de fevereiro de 2014. alização da mulher brasileira.
Ao explorar o blog, observamos que
como plano de fundo há imagem de Os objetos de consumo são en-
uma mulher sentada lendo e a frase textualizados logo no início do artigo
em inglês “ladies against feminism”, de opinião, alinhado à esquerda, ante-
sinalizando o vínculo internacional cedido pela frase:
com mulheres que combatem o femi- Como muitos já sabem, a Adidas
nismo. O blog tem uma página tanto resolveu fazer camisas “homena-
no Facebook como no Twitter, porém, geando” a nossa cultura. Claro,
nossa pesquisa não olha redes so- com bundas. Vejam a imagem
abaixo: (BLOG, 2014)
ciais. Há um conjunto de textos, víde-
os, imagens, história em quadrinhos, As referências (Adidas, camisas,
ora produzidos pelxs participantes do cultura, imagens) e a predicação (com
próprio espaço, ora escritos por outr- bundas) sinalizam que, para o blog, há 161
xs, eles têm em comum críticas ao fe- uma única ótica pela qual o Brasil é
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MELO, G. C. V. As ordens de indexicalidade sobre ensino de Inglês e Raça mobilizadas na narrativa de uma
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
RESUMO
Com a investigação em curso, propomo-nos a identificar as relações dialógicas
entre letras do compositor Gonzaguinha e o discurso ufanista do Estado totalitário
instaurado em 1964. Para tanto, interessam-nos formas da esfera carnavalesca, a
saber, a polêmica velada (ironia) e a paródia. Dentre as colunas teóricas, o refe-
rencial bakhtiniano é o responsável pelo principal aporte ao exercício heurístico. A
análise será estruturada em metodologia de revisão bibliográfica de cunho qualita-
tivo, acompanhada da aplicação de teoria analítica.
PALAVRAS-CHAVE: Relações Dialógicas; carnavalização; ironia; paródia; letras
de música.
ABSTRACT
With this investigation, we aim at identifying the dialogical relations between Gon-
zaguinha’s lyrics and the proud discourse of the totalitarian Estate established in 165
1964. For this purpose, we are interested in forms of the carnival area, specifically,
mação dos canais televisivos em as- co” – refletido por Wisnik (2007), em
censão, responsáveis por transmitir a datas comemorativas escolares e em
Era de Ouro dos Festivais (VILARINO, eventos cívicos prestavam-se home-
2006), por um viés contrário, angaria- nagens aos “heróis” da nacionalidade.
va para a mesma canção, os holofotes É justamente contra a versão unívoca
da vigília do Estado autoritário. da história oficial, à voz hegemônica
que cristaliza essas referências, e às
Para cercear discursos em colisão próprias referências, que se volta a
com os valores do regime, instituiu-se voz que instaura o riso paródico na le-
uma rígida censura (KUSHNIR, 2004). tra de Desenredo:
O recrudescimento gradativo da cen-
sura fomentou a criação de enuncia- 1 Vasconcellos (1977), a partir da letra de Festa Imodesta, de Caetano
Veloso, criou o conceito até hoje empregado em estudos sobre a canção
ções mais elaboradas na esfera da do período, chamado “linguagem de fresta”. A expressão passou a re-
música popular. Aliada à “canção de presentar a comunicação astuta, a constituição de um universo crítico
de decodificação política que, no contexto, reforçava, consideravelmen-
te, o laço ideológico entre os artistas e seu público.
SELINFRAN
No dia em que o jovem Cabral em seu sentido comum aos dicioná-
chegou por aqui, ô ô rios, teremos a conotação de “desen-
Conforme diversos anúncios na lace”, “desfecho”, a “conclusão da tra-
televisão ma” (CUNHA, 1997). Entretanto, em
Havia um coro afinado da tribo uma leitura prévia dos enunciados,
tupi é perceptível que a enunciação trata
Formado na beira do cais cantan- de um episódio bem conhecido dos
do em inglês brasileiros, que ao contrário de “des-
Caminha saltou do navio asso- fecho”, marca o “início” de um ciclo, o
prando um apito em free bemol “início” oficial de “nossa” história (ou o
Atrás vinha o resto empolgado da início de nossa “história oficial” – que
tripulação ignora a história indígena anterior) – a
Usando as tamancas no acerto da partir da introdução do elemento eu-
marcação ropeu, o que provoca uma incoerên-
Tomando garrafas inteiras de vi- cia – “início” e “desfecho” (“desenre-
nho escocês. do”). Partindo do pressuposto de que
o corpus em investigação é de autoria
Partiram num porre infernal por de um autor-criador satírico, traço ar-
dentro das matas, ô ô quitetônico da obra que se configura
Ao som de pandeiros, chocalhos como pista enunciativa para desvela-
e acordeão mento de sentidos, é coerente supor
Tamoios, Tupis, Tupiniquins, Aca- que a escolha do termo foi proposital
rajés ou Carijós, sei lá! a fim de engendrar as disjunções se-
Chegaram e foram formando
mânticas.
aquele imenso cordão, meu Deus Por outra via, se observarmos o sig-
“quibão” no “desenredo” como um neologismo
E então de repente invadiram a formado pelo prefixo latino “des” –
Avenida Central, mas que legal que significa “negação”, somado ao 171
E meu povo vestido de tanga substantivo “enredo”- que significa
Cabe citar que, por meio de pes- porciona a palavra bivocal - ampliado-
quisa em documentação disponível ra do campo semântico, desencadea-
no Arquivo Nacional, identificamos dora do riso paródico e irônico.
por meio dos pareceres sobre a le- Em Desenredo, o discurso sério da
tra, que o compositor enviou os mes- história oficial é recuperado sob um
mos enunciados por três vezes ao novo acento apreciativo, desencade-
DCDP, somente alterando o enuncia- ador das disjunções semânticas. Os
do-título da canção, provavelmente sentidos da enunciação presente na
uma outra estratégia do autor-pes- letra, e o discurso do Estado, não con-
soa para driblar a vigilância censória: vergem para um entendimento, mas
“Escola do Coco Unidos do Pau Brasil estabelecem relações dialógicas em
(12/01/1973)”, “Unidos do Pau-Brasil” colisão. Observa-se a instauração do
(04/04/1973), e por fim, “Desenredo” duplo destronante carnavalesco, tra-
(19/08/1978). tado por Mikhail Bakhtin (1987; 1997).
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177
RESUMO
Este trabalho se propõe a analisar as aulas de Língua Inglesa do programa te-
levisivo-educativo Telecurso. Acreditamos que ao analisar as características que
configuram esse programa e as estratégias criadas pelo enunciador para levar o
enunciatário a aderir ao processo de ensino e aprendizagem de Língua Inglesa
proposto o enunciatário-aluno, identificaremos estratégias de interação de um gê-
nero educativo, poderemos contribuir para o processo de ensino e aprendizagem-
da língua inglesa do ensino médio nas escolas públicas. Escolhemos como base
teórica a Semiótica Francesa, e nosso foco é observar as estratégias de interação
responsáveis pelo estabelecimento do contrato fiduciário entre o enunciador (au-
tores, diretores, equipe de produção etc) e o enunciatário-aluno, por meio da ex-
plicitação das estratégias de adesão realizadas na configuração da relação entre o
conteúdo educativo e o narrativo do programa.
PALAVRAS-CHAVE: Telecurso; semiótica francesa; metodologias de ensino;
contrato fiduciário; língua inglesa.
178 ABSTRACT
This study aims to analyze the English classes of television - education program
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
Telecurso. We believe that by analyzing the characteristics that make up the pro-
gram and the strategies created by the enunciator to take enunciatee to join the
process of teaching and learning English language proposed the enunciatee stu-
dents, identify strategies of interaction of an educational genre , we can contribute
to the teaching process and aprendizagemda English high school in public scho-
ols. Chosen as theoretical basis the French Semiotics , and our focus is to observe
the interaction strategies responsible for establishing the trust deed between the
enunciator ( writers , directors, production staff etc. ) and the enunciatee student ,
through the explanation of membership strategies performed in the configuration
of the relationship between the educational content and the narrative of the pro-
gram.
KEYWORDS: Telecurso; french semiotics; teaching methodologies; trust deed;
English language.
SELINFRAN
INTRODUÇÃO gias de interação são utilizadas no te-
lecurso que o mantém na mídia por
Na atualidade, a educação passa
tanto tempo? Como esse gênero se
por mudanças significativas, sobretu-
configura? Que estratégias de motiva-
do pelo avanço tecnológico, tais como
ção e adesão estabelecem?
a escola não ser mais o único espaço
de acesso ao conhecimento (CAMA- Trata-se de uma pesquisa analítico-
RA, 2014), o crescimento do ensino -descritiva sobre os episódios de au-
a distância; a inserção cada vez mais las de inglês voltadas para o Ensino
expressiva da tecnologia nas escolas, Médio do Telecurso e será fundamen-
entre outras que determinam modifi- tada no referencial teórico da semió-
cações principalmente nas estratégias tica francesa a partir do conceito de
metodológicas utilizadas em todas as contrato fiduciário que, segundo Grei-
etapas do ensino. mas e Courtés (2008, p. 85-86):
[...] consiste na relação de con-
Considerando que o processo de fiança que o sujeito do estado
ensino e aprendizagem organiza-se mantém com o sujeito do fazer na
como uma prática comunicativa, nos- espera fiduciária, um contrato de
sa pesquisa se propõe a analisar as confiança, de veridicção. Instala-se
aulas de Língua Inglesa do Telecurso, no discurso um fazer persuasivo,
programa educativo televisivo, a fim um fazer-crer e um fazer interpre-
de compreendermos um gênero didá- tativo na relação entre enunciador
tico pedagógico tecnológico bem su- e enunciatário, por meio de valo-
cedido, já que se mantém em exibição res epistêmicos e pelo comparti-
lhamento de crenças (GREIMAS;
desde os anos oitenta.
COURTÉS, 2008, p. 85-86).
Com base em conceitos teóricos da A teoria semiótica francesa foi es-
semiótica francesa acreditamos que, colhida como base teórica do trabalho
ao identificarmos as características por fornecer subsídios para a análise
dos gêneros utilizados nessa prática, de diferentes formas de manifesta- 179
estaremos também identificando as ção textual. Textos verbais, orais ou
p. 94).
ge na interpretação e que resulta do
A proposta de um contrato pelo reconhecimento das razões do enun-
enunciador e a interpretação do di- ciador em dizer o que disse. A prá-
zer-verdadeiro de um enunciatário tica de certos atos linguísticos para
se baseia em contratos anteriores re- atingir determinados fins, a lingua-
lativos à cultura, formação ideológi- gem não é apenas um instrumento
ca e da concepção de discurso e de de dizer o mundo, mas uma forma
seus tipos. O enunciatário não é um de nele agir, permite caracterizar o
ser passivo, é um ser que interpreta, sujeito da enunciação por seus atos
avalia, e pode, inclusive, rejeitar signi- de linguagem, cuja escolha é bastan-
ficações. te marcada do ponto de vista socio-
Na operação de manipulação há cultural. Persuadir, impressionar, con-
dois tipos de manipulador: o manipu- vencer, informar, ameaçar, prometer,
jurar e argumentar.
SELINFRAN
São condições prévias da argu- percurso temático. Para conhecer e
mentação e caracterizam o ‘con- explicar este fazer e apreender a ins-
tato dos espíritos’: a língua co- tância da enunciação é através da
mum a enunciador e enunciatário, análise interna e imanente do texto.
o fato de manterem relações so-
ciais, o desejo do enunciador de A enunciação como comunicação
entrar em comunicação e, em pode ser observada no discurso atra-
resposta, a atenção e o interesse vés do fazer emissivo e persuasivo do
do enunciatário (BARROS, 2002, enunciador e do fazer receptivo e in-
p. 107). terpretativo do enunciatário, o cará-
O enunciatário não adere ao dis- ter manipulador do discurso, a inten-
curso apenas pelo conjunto de ideias. cionalidade narrativa e a finalidade
Para a eficácia do discurso, o enun- argumentativa-discursiva que falam
ciatário se identifica com um sujeito do sentido. A enunciação como ins-
da enunciação (caráter, corpo, tom). tância de mediação entre estruturas
O modo de dizer é tão importante semio-narrativas e discursivas
quanto o que é dito, o conteúdo. E, O enunciador e enunciatário, sin-
assim, são construídos os sujeitos da cretizados no sujeito da enunciação,
enunciação, o enunciador e o enun- são produtores do discurso-objeto
ciatário, através do discurso, dos me- e responsáveis pela construção do
canismos sintáticos que promovem sentido.
esta relação.
Segundo Barros (2002, p. 141) “os
Os efeitos de realidade, que ga- objetos são construídos com duas
rantem a relação entre o discurso e o finalidades: suprir as carências ou
mundo, são construídos pelo investi- responder aos anseios do receptor”.
mento figurativo dos conteúdos pela Quando pensamos no programa em
semântica discursiva e estes efeitos análise, o Telecurso, observamos que
colaboram para convencer e persua- a carência de um programa educa- 183
dir. A conversão dos percursos nar- cional que atendesse à população
rativos em percursos temáticos, o
cação e o objeto-valor (aprender in- e assim uma adesão. “Uma etapa im-
glês) é compartilhado. portante do fazer interpretativo do
enunciatário acontece quando ele
A ESTRATÉGIA DA INTERAÇÃO identifica o universo do discurso (ou
parte deste universo) com seu pró-
PROXIMIDADE E IDENTIDADE prio universo” (GREIMAS; COURTÉS,
2008, p. 224).
Conforme Fiorin (2008), “a eficá-
cia do discurso está diretamente li- Os cenários, as personagens e a
gada à questão da adesão do enun- composição das imagens corrobo-
ciatário ao discurso.” É preciso que ram para o fazer interpretativo do
o enunciatário se veja constituído enunciatário e, consequentemente,
como sujeito, identificando-se com o sua adesão. Logo na primeira aula,
enunciador. O enunciador em ques- em que a apresentação começa na
tão é formado por todo o corpo da cozinha dos Carter, com Diana ali-
produção, desde quem dirige, quem mentando Bob, enquanto interage
escreve, quem produz, enfim, o cole- com o público, o processo de identi-
tivo da produção, mas sob o ponto de ficação se instala.
vista da significação, ele se constitui
numa imagem unitária do enunciador RECURSOS/LINGUAGENS
e assim a significação pode ser apre- As aulas do Telecurso apresentam-
endida em sua totalidade. -se como um texto predominante-
O termo ‘sujeito da enunciação’ mente narrativo, demonstra sempre
não diz respeito apenas ao enun- de maneira concreta as temáticas
ciador, mas cobre de fato as duas desenvolvidas. A escolha por apre-
posições actanciais de enuncia- sentar as aulas através de narrati-
dor e de enunciatário”, conside- vas é uma forma de concretização
rando o fazer do enunciatário um
do sentido segundo Fiorin (1992), e
188 ato de significar e não apenas
o destinatário da comunicação
essa é uma estratégia de interação e
de metodologia de aprendizagem. O
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
gular.
O uso de músicas é incentivado processo de ensino e aprendizagem
pela figura da personagem Ney, que da língua inglesa, pois considerando
cantarola alguma música de vez em o programa como uma prática co-
quando, contextualizando o uso de municativa, acreditamos que essas
algum conteúdo. Na aula 11, por exem- estratégias fundamentam as meto-
plo, Ney introduz a música “Let’s try dologias utilizadas, foco de nossa
again” de Frank Sinatra, ilustrando o pesquisa.
uso da expressão usada para fazer A utilização de mídias torna o
sugestões. aprender lúdico e prazeroso, diversifi-
cando a forma de interação do aluno
METODOLOGIA DA REPETIÇÃO,
com o conteúdo. O inglês, como lín-
DA ROTINA, ESPIRALADA
gua presente em noticiários interna-
O Currículo do Estado de São Pau- cionais e eventos culturais de grande
lo (2008, p. 111) fala que “o ensino e
SELINFRAN
parte do mundo, pode ser aprendi- metodologia Telessala aplicada des-
do, em sala de aula, ouvindo a pro- de 1995, a partir do Telecurso 2000,
núncia do falante nativo e em tempo fez e faz parcerias com governos
real, através do uso da internet, por e prefeituras, com o exército, com
exemplo, ou através de excertos de presídios, com iniciativas privadas e
filmes, séries, músicas, games e tex- públicas e leva esta aula onde quer
tos midiáticos diversos com os quais que precise de um professor para im-
os alunos convivem, revelando que o plantar uma sala de aula e erradicar a
material utilizado pode ir muito além distorção. Qualquer lugar do mundo
do material impresso, sem dispensá- em que a língua portuguesa é falada
-lo, é claro. A persistência de Paulo tem a possibilidade de ter uma teles-
Freire, em 1960, para o uso de recur- sala, corrigindo a defasagem na mo-
so tecnológico (o projetor de slides), dalidade EJA ou até como recurso de
e o sucesso do programa de alfabe- ensino regular, em algumas regiões.
tização implantado naquela época, O aluno é modalizado pelo dever
confirmam a eficiência da diversifica- concluir o ensino médio como funda-
ção de recursos. mental para a sua interação social, a
No dizer de Arlindo Machado: “À conquista de um espaço na socieda-
medida que o mundo natural, tal de, numa empresa.
como conheceram as gerações de Através da proximidade e identi-
outros séculos, vai sendo substituí- dade, adequando a linguagem para
do pela tecnosfera - a natureza cria- promover a interação, uso de várias
da ou modificada pela ciência, novas linguagens e textos diversos, diver-
realidades se impõem” (MACHADO, sificando a utilização de recursos
2010, p. 31). midiáticos, estratégias que atraem a
O modo de se relacionar, de cir- atenção do aluno persuadindo e pro-
cular, de perceber, de existir e de re- vocando a adesão ao ensino propos-
presentar o mundo sofreram mudan- to e proporcionando a possibilidade
191
ças profundas. As novas tecnologias de aprendizagem. O professor pro-
REFERÊNCIAS
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192
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
SELINFRAN
PERFORMANCES IDENTITÁRIAS DE RAÇA E GÊNERO E AS ORDENS
DE INDEXICALIDADE NO DESABAFO DE UMA MULHER NEGRA NO
YOUTUBE
RESUMO
Esta pesquisa pretende, especificamente, analisar as performances discursivas de
raça e gênero e as ordens de indexicalidade mobilizadas no desabafo gravado por
uma mulher negra, ao tecer críticas sobre a minissérie de televisão “Sexo e as Ne-
gas”. Para realizar esta investigação, embasamo-nos na linguagem como atos de
fala performativos e nas concepções de raça e gênero como construções sociais,
históricas, discursivas e performativas segundo as Teorias Queer. Esta pesquisa é
de cunho etnográfico virtual, realçando a preocupação com a visão dos participan-
tes no contexto social. Para análise das performances discursivas de raça e gênero
e ordens de indexicalidade, faremos usos das categorias de análises sugeridas por
(WORTHAM, 2001). A análise piloto mostra que as performances identitárias da
advogada oscilam entre uma postura queer e performances essencializadas.
uso do corpo para ganhar dinheiro. raça para retratar a mulher negra na
Aqui, ela aciona através dos índices televisão, sugerindo outras possibili-
linguísticos mencionados, a ordem dades, demonstrando preocupação
de indexicalidade da mulher negra e com as referências para a nova gera-
objeto do samba. ção de mulheres negras. Ao mostrar
no vídeo a sua posição profissional
CONSIDERAÇÕES FINAIS através do ambiente, ela encena uma
performance discursiva de orgulho
No desabafo da advogada, veicula-
pela profissão que exerce enquanto
do no YouTube, fica evidente sua per-
mulher negra, indicando que existem
formance discursiva de uma mulher
diversas áreas onde essa mulher pos-
negra que contesta os atos de fala
sa ser retratada. De acordo com as
performativos que sedimentam Dis-
Teorias Queer, esta questão demons-
cursos que constroem as mulheres
tra essencialismo, o que contraria as
negras negativamente e as colocam
propostas desta Teoria de compre-
em posições sociais de desprestígio.
ender as subjetividades raciais como
Ela encena também em sua perfor-
interseccionadas por gênero, raça,
mance discursiva de raça e gênero a
classe social etc (LOURO, 2000;
mulher negra para além desses dis-
BUTLER, 2003, 2004; BARNARD,
cursos de inferiorização. Em seu de-
2004; MELO, MOITA LOPES, 2013).
sabafo, a autora do vídeo sugere que
se dê outra perspectiva de mulheres Dessa forma, espera-se contribuir
negras na TV, com outras referências para a desconstrução e desnaturali-
para “as meninas”. De acordo com o zação dos discursos de inferiorização
seu argumento, os idealizadores da e a falta de visibilidade das mulheres
minissérie reforçam a condição de in- negras, sedimentados histórica e so-
ferioridade das mulheres negras, se- cialmente. Almeja-se também incen-
dimentando os atos de fala que co- tivar a linha de estudos sobre a lin-
204 locam a mulher negra em uma única guagem, raça e gênero tão pouco
situação. explorada cientificamente.Está pes-
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
REFERÊNCIAS
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WORTHAM, S. Narratives in action. New York: Teacher College Press, 2001.
RESUMO
Em toda enunciação o orador tenta usar mecanismos que favoreçam a construção
de uma imagem de si. Essa imagem do orador, revelada por meio do discurso, é
denominada ethos - “o caráter que o orador deve assumir para chamar a atenção
e angariar a confiança do auditório” (REBOUL, 2004, p. XVII). Para a retórica, os
éthe revelados pelos oradores ao defenderem suas teses são relevantes para o êxi-
to de suas discussões e para a defesa de seus pontos de vista. O presente estudo
será realizado analisando-se o ethos de professores em quatro diferentes aulas de
inglês online, divididas entre níveis básico e intermediário, que serão escolhidas no
site YouTube. Almejamos traçar o perfil dos professores das aulas analisadas. Des-
sa forma, esperamos contribuir para o meio acadêmico através do possível vislum-
bre da relação entre o ethos apresentado e a eficácia retórica da aula ministrada.
PALAVRAS-CHAVE: Retórica; ethos; professor de língua inglesa.
ABSTRACT
In every utterance the speaker tries to use mechanisms that favor the construction
of his/her image. This image, revealed through the speech, is called ethos - “the
206 character that the speaker should assume to draw the attention and raise the con-
fidence of the audience” (REBOUL 2004: XVII.). For the rhetoric, the ethe revealed
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
by speakers to defend their theses are relevant to the success of their discussions
and to defend their views. This study will be conducted by analyzing the ethos of
teachers in four different online English classes, divided into basic and interme-
diate levels, which will be on the YouTube site. We aim to trace the profile of the
teachers from these analyzed classes. Thus, we hope to contribute to the academic
environment through the possible glimpse of the relationship between the ethos
presented and the rhetorical effectiveness of the given class.
KEYWORDS: Rhetoric; ethos; English teacher.
SELINFRAN
INTRODUÇÃO Os ethé revelados na enunciação dos
oradores ao defenderem suas teses
Aulas online, videoaulas e cursos
são relevantes para o êxito de suas
à distância vêm crescendo de forma
discussões e defesa de pontos de
exponencial por todo o Brasil criando
vista.
novas formas de ensinar e de apren-
der e novas interações entre profes- Pensando no novo papel desse
sores e alunos. Tal mudança não se professor virtual, este trabalho visa
dá somente no âmbito universitário, analisar os ethé revelados nos discur-
mas também no aprendizado de lín- sos de 04 professores de língua in-
guas que já conta com variados cur- glesa.
sos desenvolvidos por escolas ou por Este estudo tem relevância no
professores autônomos. meio educacional pois almeja identi-
Como professora de inglês, que ficar quais aulas são mais eficientes e
acompanha as mudanças tecnológi- eficazes retoricamente para o apren-
cas no mundo, sempre me pergun- dizado de inglês através da análise
tava qual o papel do professor de do ethos dos professores nas aulas
Língua Estrangeira Moderna em au- estudadas, proporcionando aos pro-
las online – como deveriam ser suas fissionais da educação, que já atuam
aulas, sua metodologia, os conteúdos em salas virtuais ou que pretendam
apresentados. Mais tarde, em contato começar, um material de pesquisa
com a Retórica, meus questionamen- para uma aula bem dada.
tos passaram a ser:
•de que forma o professor pode OBJETIVO
usar a sua imagem, o seu ethos, para O objetivo do presente trabalho
conseguir a atenção de alunos via in- é analisar o ethos do profissional de
ternet? língua inglesa em aulas online com o
•o ethos tem uma influência direta intuito de vislumbrar a relação entre 207
na eficácia retórica da aula? o ethos apresentado e a eficácia re-
para ser exibida online, percebe-se meio de sorrisos diante de todo o es-
o uso de um quadro negro (confor- forço da aluna e, em termos linguísti-
me observado anteriormente), sem cos, por meio das expressões: “Very
nenhum outro recurso midiático. A good”, “Ok”, “It’s OK”, como vemos
vestimenta da professora também nos exemplos abaixo:
salienta esse traço de tradição: um
“J: Listen. What is your name?
típico suéter listrado de gola rolê,
de cores escuras que não chamam a N: What is your name?
atenção para nenhum aspecto físico J: Very good. Again.”
da professora. Não há maquiagem
forte, na verdade, talvez somente “N: My name is... my name is Na-
um batom bem claro nos lábios, nem tasha. What your ... What is ...?
tampouco bijuterias. Seu cabelo está J: Ok, It’s ok. What is. Try again.”
SELINFRAN
“N: What is your? My name is Na- contrário, seu sorriso nos lábios e nos
tasha. What is your name? olhos é facilmente visto. A seriedade
J: My name is Jennifer, ok? And está na forma como conduz sua aula,
then we say: Nice to meet you. com explicação clara, repetição e
preocupação com a atitude respon-
N: Nice to meet you. siva da aluna.
J: OK.”
Meios de persuasão e tipos de
Sobre essas respostas positivas
dadas pela professora, Leffa (2008)
ethe encontrados
nos fala que tal procedimento segue Vale observar que a professora usa,
a teoria do behaviorismo de Skin- em sua aula, os seguintes meios de
ner, que via a língua como um hábito persuasão: o docere (ensinar, instruir)
condicionado que era adquirido por – lado argumentativo do discurso – e
meio de um processo de estímulo e o movere (comover) – lado emotivo
resposta. No caso da aula em ques- do discurso –, visando, nesse sentido,
tão, a professora parece se valer do persuadir o auditório com sua fala.
estímulo para lograr o aprendizado Sobre esse assunto nos explica Re-
por parte da aluna. boul (2004) quando trata dos estilos
Também são suaves os aspectos dos latinos: o nobre (grave), o simples
gestuais que a oradora usa, como o (tênue) e o ameno (médium). Para
movimentar das mãos e da cabeça. uma oratória eficaz, o orador deve
Por meio desses elementos, ela con- escolher o estilo que mais convir. O
segue estabelecer uma comunicação nobre está relacionado ao pathos e
positiva com sua interlocutora. Como tem a função de comover. O simples
Reboul (2004) nos mostra, todos os está ligado ao logos e sua função é
gestos e inflexões da voz do orador a de explicar e informar. Finalmente,
são puramente retóricos. o ameno, ligado ao ethos, tem a fun-
211
ção de agradar. Nossa oradora bus-
Ethos de comprometida cou ensinar e comover a aluna e seu
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______. A retórica. Tradução Marli M. Peres. São Paulo: Ática, 2007. (Série Essencial)
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo verificar quais discursos e quais respostas
são revelados na propaganda eleitoral de abertura de Dilma Rousseff em 2014,
transmitida pelo Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE), e de que forma
foram construídos para tentar seduzir e convencer os eleitores. Os enunciados
proferidos revelam marcas fortemente dialógicas e ideológicas, em virtude de o
enunciador tentar convencer o seu interlocutor a aceitar o seu projeto enunciativo
e a ele responder. Por meio dos conceitos do dialogismo e da ideologia entendidos
por Bakhtin, faz-se uma análise dos discursos proferidos na propaganda abertura
da campanha, e também pela sua concepção de gênero discursivo, por meio da
qual se pode definir e compreender a estrutura composicional, o conteúdo temá-
tico e o estilo da propaganda da presidente.
PALAVRAS-CHAVE: Bakhtin; dialogismo; propaganda eleitoral; Dilma Rousseff.
ABSTRACT
This work aims at verifying which discourses and which answers are revealed in
216 Dilma Rousseff’s opening electoral propaganda in 2014, exhibited by the Brazilian
election propaganda program, and how they were built in order to try to convince
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
the electors. The utterances reveal strongly dialogical and ideological traits, once
the one who enunciates tries to convince his interlocutor to accept his utterance
project and to reply to him. By means of the concepts of dialogism and ideology
as regarded by Bakhtin, an analysis of the discourses present in the opening pro-
paganda of the campaign is carried out, and also by his conception of discursive
genres, by which the compositional structure, the theme and the President’s pro-
paganda style can be defined and understood.
KEYWORDS: Bakhtin; dialogism; electoral propaganda; Dilma Rousseff.
SELINFRAN
INTRODUÇÃO uma vez que essas evidências carac-
terizam um discurso heterogêneo,
A presente pesquisa pretende rea-
no sentido atribuído por Bakhtin, ou
lizar uma análise bakhtiniana sobre as
seja, composto por múltiplas vozes
relações dialógicas e, por extensão,
sociais, em que o outro está sempre
ideológicas presentes na propagan-
presente e é elemento imprescindível
da eleitoral de abertura da presidente
na constituição dos sentidos.
Dilma Rousseff em 2014, transmitida
pelo Horário Gratuito de Propaganda Para a composição do corpus, foi
Eleitoral (HGPE) no dia 19 de agosto feita a gravação televisiva da propa-
de 2014, utilizando-se para esta aná- ganda eleitoral de abertura. Assistiu-
lise, também, dos recursos estilísticos -se à propaganda, posteriormente,
intrínsecos ao gênero propaganda realizou-se sua transcrição e, por últi-
eleitoral em questão. mo, fez-se a análise das ocorrências.
A propaganda foi transmitida no dia
Pretendemos verificar quais efei-
19 de agosto de 2014 pelo horário
tos de sentidos produzidos e apre-
eleitoral gratuito.
endidos pelos eleitores são suscita-
dos para construir a imagem de uma Os enunciados desse gênero dis-
mulher presidente do Brasil, cujo cursivo, por terem por princípio con-
discurso está acompanhado e sem- vencer os eleitores sobre o seu pro-
pre perpassado pelos discursos de jeto de governo e a fidelidade da sua
seu antecessor na política, o ex-pre- imagem e ações, de modo a levá-los
sidente Lula, quais discursos e quais a tomar uma atitude responsiva ati-
respostas se entrecruzam nos enun- va em relação ao que se diz e aceitar
ciados produzidos, bem como quais o que se diz, evidenciam que o seu
ideologias eles carregam para tentar conteúdo verbal confere fortemente
convencer seus possíveis eleitores. marcas dialógicas e ideológicas para
atingir o seu objetivo final, o voto.
A análise da propaganda eleitoral 217
da atual presidente Dilma Rousseff Neste trabalho, considera-se o tri-
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VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
SELINFRAN
OS POSTS E “A VOZ SOCIAL” DA JUVENTUDE: POSICIONAMENTOS
INTERACIONAIS E ORDENS DE INDEXICALIDADE DE GÊNERO E
SEXUALIDADE NO BLOG “INTEGRA”
RESUMO
Neste trabalho, analisamos os posicionamentos interacionais de sexualidade e
gênero dos artigos de opinião do blog Integra e identificamos as ordens de in-
dexicalidade de sexualidade e gênero presentes em tais artigos. O escopo teórico
parte da concepção de linguagem como performance de Austin (1990), Derrida
(1988) e Butler (2003), de letramentos digitais propostos por Davies & Merchant
(2009) e das conceituações de sexualidade e gênero pelas teorias queer (BUTLER,
2003; LOURO, 2004). A pesquisa é de cunho etnográfico virtual (HINE, 2004) e
os instrumentos de geração de dados são artigos de opinião encontrados no blog.
O instrumental analítico se embasa em posicionamentos interacionais propostos
por Goffman ([1979], 1998) e nas ordens de indexicalidade de Blommaert (2008,
2010). As categorias de análise são as cinco pistas indexicais definidas por Wor-
tham (2001).
PALAVRAS-CHAVE: Linguagem como performance; teorias Queer; sexualidade
e gênero; ordens de indexicalidade; posicionamentos interacionais.
229
ABSTRACT
desenvolvida por Austin e à “cons- cerá cada vez mais instável. Assim, o
trução discursiva das sexualidades” gênero é radicalmente independente
foucaultiana, que se instaura a con- do sexo (...).” (SALIH, 2013, p. 71). Esta
cepção de “queer”: inicialmente tido distinção é claramente desenvolvida
como “estranho” ou “bizarro”, o ter- por Butler em Problemas de Gênero,
mo passa a remeter-se às pessoas onde deparamo-nos com a seguinte
cujas subjetivações realizam abalos reflexão:
na categoria normatizadora de sujei- Concebida originalmente para
to. Neste aspecto, o pensamento de questionar a formulação de que
Butler aproxima-se das teorias queer, a biologia é o destino, a distin-
ao tratar das concepções de sexuali- ção entre sexo e gênero atende à
dade e gênero, capitais à linguagem tese de que, por mais que o sexo
butleriana. pareça intratável em termos bio-
lógicos, o gênero é culturalmente
Segundo Salih (2013), a sedimen- construído: consequentemente,
tação do gênero sempre se apre- não é nem o resultado causal do
senta como algo natural que ocorre sexo, nem tampouco tão apa-
por meio de práticas instituídas por rentemente fixo quanto o sexo.
normas socialmente hierarquizadas, (BUTLER, 2003, p.24)
procurando moldar os sujeitos e en- Então, passando pela ideia de “po-
quadrá-los num padrão binário. Tudo litização dos corpos” colocada pelas
o que propõe deslocar categorias feministas desde o século XIX, pelos
como macho/fêmea, homo/héte- movimentos gays dos anos 60, por
ro ameaça a característica “natural” Foucault (1988) e discutida no con-
apregoada ao gênero construído por texto do cotidiano escolar por Lou-
uma matriz heterossexual de poder. ro (2000), podemos dimensionar a
Aquilo que se tem usualmente por linguagem enquanto performance/
gênero acontece no interior das leis construção de um sujeito em um
236 que regem os jogos de poder na so- contexto prévio de significações,
ciedade, sendo por elas conformadas. como o faz Butler (2003), e entender,
VI SEMINÁRIO DE PESQUISA EM LINGUÍSTICA DA UNIFRAN
Neste sentido, são as identidades de enfim, até que ponto os artigos pro-
gênero que legitimam os juízos que duzidos no blog Integra são atos de
as fundamentam, na medida em que fala performativos dos sujeitos que
“são construídas e constituídas pela os produzem, mas também produto
linguagem. O que significa que não do contexto social em que os Discur-
há identidades de gênero que pre- sos se constroem, conforme descre-
cedam a linguagem” (SALIH, 2013, ve Silva:
p. 91). Desta prerrogativa conclui-se, A partir dessas considerações,
portanto, que “se aceitamos que o podemos afirmar, então, que as
gênero é construído e que não está, mesmas práticas discursivas po-
sob nenhuma fórmula, ‘natural’ ou dem indexicalizar diferentes dis-
inevitavelmente preso ao sexo, então cursos, operando em diferentes
a distinção entre sexo e gênero pare- ordens de indexicalidade pelo
SELINFRAN
modo como são entextualiza- dos. Ao nos engajarmos em pro-
das e por quem as entextualiza. cessos reflexivos, lançamos mão
Todavia, apesar de serem entex- de recursos semióticos que não
tualizadas e se guiarem por de- se relacionam apenas aos usos
terminadas ordens de indexicali- normativos (nível denotativo).
dade, nossas escolhas semióticas Em conjunto com sentidos refe-
podem ser (re)ordenadas e atua- renciais projetamos também sen-
lizadas de acordo com as regras tidos inferidos em um nível cono-
de outras ordens de indexicalida- tativo ou “interacional” (Agha,
de, dependendo dos processos ibid.: 45). Os sentidos indexicais
de entextualização em jogo. (SIL- apontam para a natureza da rela-
VA, 2015, p. 79) ção entre esses dois níveis, são as
“relações entre forma linguística
Indispensável ressaltar o efeito que
e padrões culturais” (Blommaert,
esses Discursos causam sobre o cor- 2005: 41). (ROCHA, 2013, p. 126)
po nas relações sociais, a ponto de
Se considerarmos, como o fez Fou-
marcá-los de forma indelével. Neste
cault (1987), que processos sociais de
sentido, orientados pelas pesquisas
coconstrução do significado não são
em LA, identificamos a relação dos
livres ou aleatórios, chegamos à con-
“enunciados a momentos, lugares e
cepção de ordens de indexicalidade,
pessoas em determinadas circuns-
que seriam “procedimentos impostos
tâncias, ou seja, o processo de indexi-
ou por qualquer sociedade ou pelo
calidade” (PONTES, 2009, p. 30) nos
próprio discurso que controlam as
textos publicados no blog.
produções discursivas, ora fazendo
Tal processo demarca, a priori, a emergir alguns discursos, ora outros”
natureza ambígua intrínseca à lingua- (BLOMMAERT, apud MELO E MOITA
gem na qual a individualidade dos LOPES, 2014, p. 660).
atos de fala converge com os juízos Os posicionamentos interacionais,
de valor subscritos no cotidiano em por sua vez, também se referem às
que eles se inserem. Vejamos a seguir 237
marcas identitárias que localizam o
qual foi o arcabouço teórico utilizado
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