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Recife
2009
recife
Introdução
Nas últimas décadas as grandes e médias cidades condições de moradia da população de baixa renda a luta pela moradia social no Centro já tem mais de vem estar previstos nos planos diretores municipais.
brasileiras e suas regiões metropolitanas passaram por que já reside nessas áreas. dez anos e tem como marcas a ocupação de edifícios Os imóveis públicos subutilizados devem ser des-
dinâmicas socioespaciais muito semelhantes. Houve O projeto foi desenvolvido por organizações parcei- vazios pelo movimento organizado e a produção de tinados prioritariamente à produção de habitação
queda generalizada das taxas de crescimento popu- ras em cinco capitais: São Paulo (Instituto Pólis), Belém moradia através de vários tipos de programas: refor- social, especialmente nas cidades onde existem em
lacional e o aumento de população nessas cidades (FASE — Federação de órgãos para Assistência Social ma de edifícios antigos, construção nova, intervenção grande quantidade.
deu-se de forma bastante desigual entre os bairros e e Educacional — Amazônia), Fortaleza (Cearah Perife- em cortiços. No entanto, a escala de produção ainda é Além disso, é imprescindível a concessão de subsí-
municípios de suas regiões metropolitanas. ria), Recife (FASE/ HABITAT) e Rio de Janeiro (FASE e muito pequena diante da demanda e dos problemas a dios nos financiamentos, garantindo que sejam aces-
De um lado, houve perda de população nos bair- Fórum Nacional de Reforma Urbana — FNRU). serem enfrentados. síveis à população de menor renda, frequentemente
ros das áreas centrais, providas de infraestrutura, e, de Em cada uma dessas cidades foram estabelecidas No Rio houve experiências de reforma de imóveis excluída dos programas existentes.
outro, crescimento significativo nos bairros e municí- parcerias com os Fóruns Regionais, movimentos or- históricos para transformação em habitação. Os movi- Destacamos ainda, a importância de desenvolver
pios periféricos, áreas precárias e ambientalmente frá- ganizados, universidades, pesquisadores e técnicos mentos sociais têm se organizado, ocupando prédios programas de aluguel social e subsídio ao aluguel,
geis. Enquanto as áreas centrais perderam população, dos governos locais. A coordenação das atividades e casarões abandonados, lutando para que a produ- que podem contribuir para a diminuição das uni-
bairros afastados dos centros e municípios periféricos foi feita pelo Instituto Pólis com o apoio técnico e fi- ção seja ampliada e atinja a população de menor ren- dades imobiliárias vagas em edifícios situados em
cresceram a taxas que superaram 10% ao ano. O poder nanceiro da OXFAM GB — agência internacional com da, principalmente através da utilização de imóveis áreas centrais.
público contribuiu para esse processo, principalmente sede no Reino Unido, que apoia projetos sociais nos públicos vazios e subutilizados. Por fim, consideramos fundamental conhecer me-
através da construção de grandes conjuntos habita- países em desenvolvimento. No Recife também há acúmulo de discussão, prin- lhor as áreas centrais das cidades, levantando usos, ti-
cionais em áreas com carência de infraestrutura, de As cinco capitais envolvidas no projeto têm em co- cipalmente sobre a questão da garantia de manuten- pologias construtivas, imóveis de valor histórico e cul-
onde a população tem que se deslocar por quilôme- mum a situação de perda de população nos bairros ção das comunidades pobres que vivem em áreas tural, espaços públicos e, principalmente, a situação
tros diariamente para chegar ao trabalho. centrais, existência de número significativo de imó- centrais através de instrumentos urbanísticos, como de seus usuários e moradores, de forma a desvendar
Hoje, os centros urbanos dessas cidades perma- veis e domicílios vazios nessas áreas e crescimento ZEIS — Zonas Especiais de Interesse Social — e pro- os problemas e as potencialidades dessas áreas, que
necem como regiões de grande concentração de das áreas periféricas. Seus centros apresentam ótimas jetos de urbanização. Houve experiência de produ- apresentam especificidades em cada cidade.
postos de trabalho em escala metropolitana, mas condições de infraestrutura urbana e de serviços e ção através de reforma de um edifício no Centro e A caracterização dessas áreas centrais, suas rela-
apresentam número significativo de imóveis e domi- concentram postos de emprego, mas caracterizam- o debate dos movimentos junto ao poder público ções com a dinâmica de crescimento das metrópoles
cílios vazios e subutilizados. se por situações urbanas específicas, que devem ser tem se centrado na estruturação de uma política em e com a questão da habitação social e das políticas
Por isso, movimentos sociais ligados à temática da levadas em consideração na discussão acerca da pro- larga escala que envolva também a recuperação do públicas formuladas até hoje, foram pontuadas nes-
reforma urbana e da moradia, técnicos e estudiosos moção de habitação social nessas áreas. patrimônio histórico. ta publicação, que é composta de um caderno por
que historicamente centraram-se na luta por deman- Recife, Rio de Janeiro e Belém têm áreas centrais Em Fortaleza a discussão sobre a melhoria do Cen- cidade. Em cada caderno buscamos desenvolver os
das mais relacionadas aos problemas das periferias portuárias parcialmente desativadas, com significa- tro com promoção de habitação social está no início, seguintes temas: a problemática habitacional e urba-
— urbanização e regularização de favelas e loteamen- tivo patrimônio histórico edificado e abandonado, e envolvendo técnicos e movimentos sociais locais em na; a dinâmica de crescimento nas últimas décadas;
tos, implantação de redes de serviços e equipamen- grandes áreas públicas subutilizadas. torno da elaboração do “Plano Habitacional para a Re- as características do Centro; os atuais moradores,
tos públicos, produção de habitação em mutirão com As áreas centrais de Fortaleza e São Paulo desta- abilitação da Área Central de Fortaleza”. trabalhadores e usuários das regiões centrais e as
autogestão — hoje têm como bandeira a defesa da cam-se pela grande concentração de empregos ao Em Belém a discussão também está começando e propostas e experiências de produção de habitação
moradia em áreas centrais. mesmo tempo em que apresentam taxas acima de envolve a questão da reabilitação de edifícios históri- social no Centro.
Reivindicam a implementação de uma política ha- 20% de domicílios vazios. cos para promoção de habitação social. Alguns proje- O objetivo é que o presente material sirva como
bitacional que reverta a lógica histórica de assenta- Na última década essa problemática vem sendo tos, realizados pelo governo estadual e pelo Programa instrumento de disseminação e aprofundamento da
mento da população de baixa renda nas periferias e cada vez mais debatida no Brasil e, embora todas as Monumenta (do IPHAN, Ministério da Cultura), estão discussão acerca da habitação em áreas centrais entre
contribua para que as cidades caminhem rumo a uma capitais parceiras do projeto, entre outras, tenham em andamento. técnicos, lideranças, movimentos, gestores públicos e
configuração socioespacial mais justa e sustentável. propostas em andamento pelos três entes federativos, As experiências mostram que muitos são os de- entidades. Todo o material aqui sistematizado é fruto
Partindo desse contexto, o projeto “Moradia é Cen- ainda foram poucas as ações concretas no sentido de safios a serem enfrentados para a efetivação de uma de um ano de trabalho do projeto “Moradia é Central”,
tral — inclusão, acesso e direito à cidade”, teve como viabilizar uma política habitacional nas áreas centrais, política habitacional em áreas centrais. Para que os durante o qual foram promovidos seminários locais e
objetivo sensibilizar a opinião pública acerca da im- com prioridade para as famílias de menor renda. imóveis vazios e subutilizados localizados em áreas uma exposição itinerante — atividades realizadas com
portância da efetivação de políticas públicas de pro- Houve experiências significativas de produção de providas de infraestrutura sejam objeto de políticas os parceiros do projeto nas cinco capitais — que ti-
moção de habitação social nos centros urbanos, ten- habitação social nas áreas centrais em São Paulo e Rio habitacionais, garantindo o acesso da população de veram como objetivo gerar o comprometimento de
do como princípios a utilização de imóveis vazios e de Janeiro, que envolveram movimentos sociais e téc- baixa renda à terra urbanizada, é necessária a aplica- políticos, gestores públicos, entidades e atores sociais
ociosos para produção habitacional e a melhoria das nicos comprometidos com a questão. Em São Paulo, ção dos instrumentos do Estatuto da Cidade, que de- com a questão.
A Região Metropolitana do Recife (RMR) é hoje a As necessidades de deslocamentos e viagens co- Em 1913, o Recife possuía uma população de 182 do Capibaribe redirecionaram a ocupação do territó-
maior aglomeração urbana do Nordeste e a quinta do tidianas geradas por esse padrão de crescimento ur- mil habitantes. Uma década depois chegava a 313 mil rio, provocando seu crescimento para o sul. A partir
Brasil, com 3,6 milhões de habitantes, segundo os da- bano revelam a dimensão do problema: a frota de 4,6 — incremento populacional de mais de 58%. da implantação de equipamentos e infraestrutura viá-
dos do IBGE de 2007. mil ônibus transporta diariamente 1,7 milhões de pas- Ao longo do século XX, o crescimento populacio- ria no bairro de Boa Viagem, a zona sul do Recife tam-
A cidade do Recife, dividida em seis Regiões Po- sageiros e o metrô, outros 180 mil. nal e um conjunto de intervenções urbanas criaram bém passou a ser ocupada pela população de média
lítico-Administrativas (RPA), concentra cerca de 1,5 As intervenções públicas realizadas no Recife na nova fisionomia e delimitação da cidade e de sua área e alta renda, atraída pela paisagem da orla marítima.
milhões de habitantes, abrigando 42% da população segunda metade do século XX seguiram um modelo central. Destaca-se a remoção de cerca de 13 mil habi- Isto ocasionou um crescimento populacional progres-
total da Região Metropolitana. de planejamento urbano que reforçou esse processo tantes do Bairro do Recife por ocasião da reforma do sivo na zona sul do Recife, tornando-a a região mais
O crescimento urbano da Região se caracterizou de expansão periférica do tecido urbano, intensifi- porto. A demolição dos sobrados nos anos 1910 e a er- populosa do município.
por uma ocupação inadequada nos morros e áreas de cando as situações de precariedade habitacional e radicação dos mocambos, nos anos 1930 e 1940, que Em 1980, a população do Recife já ultrapassava
mangue na direção norte da capital e dos municípios subutilização de áreas com infraestrutura. Enquanto neste período abrigavam cerca de 165 mil habitantes, um milhão de habitantes e em 1990 correspondia a 1,3
metropolitanos, elevando progressivamente a deman- se consolidava a ocupação nas periferias, uma enor- caracterizaram estas intervenções. milhões, dos quais 64% continuava vivendo em condi-
da por deslocamentos entre estes e a região central me área edificada cujo uso característico era o resi- A política de erradicação dos mocambos imple- ções habitacionais precárias.
da cidade do Recife, onde se concentra a maior parte dencial, esvaziava-se. mentada pelo Interventor do Estado, Agamenon Ma- As políticas habitacionais historicamente não aten-
dos empregos. A ocupação irregular e precária de áreas alaga- galhães, deu origem à Liga Social Contra o Mocambo deram a demanda criada pelo crescimento popula-
Nas últimas décadas constata-se, à semelhança do diças e de morros tornou-se a solução habitacional que, na década de 1940, promoveu a remoção dos 12 cional da cidade, tampouco houve políticas públicas
que vem ocorrendo em outras áreas metropolitanas para grande parte da população. Atualmente, uma mil mocambos localizados no Centro do Recife, prin- de combate à especulação imobiliária e promoção do
brasileiras, altas taxas de crescimento populacional das características da cidade do Recife é seu déficit cipalmente nas áreas alagadiças entre o Derby e a Ta- acesso à terra urbanizada para a população de baixa
nos municípios da periferia metropolitana e taxas ne- habitacional, que se contrapõe aos imóveis desocu- caruna. Tal intervenção incluiu a abertura do canal de renda. Esse quadro acirrou os processos de perda de
gativas de crescimento em vários bairros centrais da pados no Centro. Segundo dados do IBGE (2000), o drenagem ao longo do qual, na década de 1970, foi população nas áreas servidas de infraestrutra e de au-
cidade do Recife. déficit habitacional do município do Recife é de mais construída a primeira avenida perimetral, hoje, Aveni- mento das ocupações irregulares e precárias no terri-
Entre 1991 e 2000 Recife apresentou uma taxa geo de 58 mil moradias, enquanto há 37 mil domicílios da Agamenon Magalhães. tório metropolitano.
métrica de crescimento populacional de 1,5% — relati- vagos na cidade. Outras tentativas de expulsão das demais comuni- Em 2000 Recife atingiu 1,4 milhões, de um total
vamente baixa, se comparada às dos municípios mais A área central do Recife, que concentra uma par- dades pobres ocorreram nos anos posteriores, mas a de 3,2 milhões de habitantes na Região Metropolitana,
periféricos da Região Metropolitana, que cresceram a cela significativa de empregos da Região Metropoli- resistência popular garantiu a permanência de muitas representando mais de 44% da população da RMR. A
taxas superiores a 2,5%, como Ipojuca, Moreno, Cama- tana, apresentou decréscimo populacional da ordem delas, como a de Coelhos e a de Brasília Teimosa. dinâmica metropolitana no período de 1991 a 2000
ragibe, Araçoiaba e Ilha de Itamaracá. de 5% entre os últimos dois censos realizados pelo Apesar da resistência, as políticas de expulsão re- foi marcado pela perda de população das áreas cen-
IGBE (1991 e 2000), processo que impactou de diver- sultaram na transferência de quase um terço das famí- trais e servidas de infraestrutura e pelo crescimento
sas formas os bairros que a compõem. De forma geral, lias que viviam nos mocambos para regiões periféricas exacerbado das regiões periféricas e assentamentos
houve perda de população, abandono dos imóveis de da cidade, ocasionando o surgimento do chamado precários. Esta dinâmica expandiu a malha urbana e
uso residencial e deterioração do patrimônio edifi- cinturão de áreas pobres do Recife. Grande parte das gerou problemas como a concentração de imóveis
cado na área central. Soma-se a isso a existência de famílias que antes ocupava o entorno da área central vagos no Centro.
inúmeras áreas públicas vazias, que reforçam o grau migrou para municípios vizinhos e para os morros da O mapa e a tabela a seguir (figuras 6 e 7) ilustram o
de subutilização dos imóveis deste território. São 18 zona norte da cidade. Ao mesmo tempo, a elite se processo, mostrando que 31 bairros perderam popula-
terrenos públicos que contabilizam aproximadamen- concentrou em bairros como Casa Forte e Apipucos — ção em diferentes regiões da cidade. O Centro, espe-
te 145 hectares na orla marítima. Em contraposição, 7 historicamente marcados pela presença de população cialmente os bairros de Paissandu, São José, Cabanga,
núcleos de favelas com 9 mil domicílios, concentra- abastada — e com atrativos como a vegetação nativa Boa Vista, Santo Amaro, Soledade, Ilha do Leite e Coe-
das principalmente nos bairros de Santo Amaro, Ilha e terras planas e secas. lhos, concentrou as maiores perdas. Mas também hou-
do Leite e Coelhos, se adensam com precariedade Nos anos 1960, a população atingiu contingente ve saída de moradores em bairros do entorno do Cen-
da moradia. superior a 763 mil habitantes dos quais 59% residia tro, como Afogados, Ipsep, Estância, Jardim São Paulo,
Estas áreas necessitam de altos investimentos para em áreas com precariedade habitacional. Na década Mustardinha, Mangueira, Derby e Prado; e em bairros
suprir a falta de serviços e equipamentos públicos e de 1970, quando se instituiu a Região Metropolitana da região noroeste da cidade, como Dois Irmãos, Alto
serem consolidadas como bairros centrais, a exemplo do Recife, a cidade já possuía mais de um milhão de do Mandu, Casa Amarela, Nova Descoberta, Vasco da
Figura 1. Recife cresceu de forma desigual nas áreas centrais e de Brasília Teimosa, onde a prefeitura investiu recur- habitantes, ao lado de 1,8 milhões da RMR. Gama, Alto Santa Teresinha, Alto José Bonifácio, Mor-
periféricas nas últimas décadas. Foto: Gilvan Barreto sos para transformá-la no bairro que existe hoje. Ainda nos anos 1970, as sistemáticas inundações ro da Conceição, Água Fria e Fundão.
Figura 8. Mapa — Concentração de domicílios vagos na Região Figura 9. Tabela — Concentração de domicílios vagos no Recife, em Figura 10. Mapa — Concentração de empregos na Região Figura 11. Tabela — Concentração de empregos na Região
Metropolitana do Recife. Olinda e Paulista (destaque para alguns bairros). Metropolitana do Recife. Fonte: CEMPRE, 2006 — Referente a Metropoliatana do Recife. Fonte: CEMPRE, 2006 — Referente a
Fonte: IBGE Censo 2000 (Elaboração própria) Fonte: IBGE Censo 2000 (Elaboração própria) pessoal ocupado assalariado (Elaboração própria) pessoal ocupado assalariado (Elaboração própria)
Recife 925 50,1 49,9 53,9 40,6 5,4 93,6 4,2 2,3 0,0
Santo Amaro 29.140 54,4 45,6 46,7 42,0 11,3 65,4 9,5 13,0 12,1
Boa Vista 14.033 58,2 41,8 33,7 48,7 17,6 22,7 14,9 28,8 33,6
Soledade 2.201 59,6 40,4 32,8 49,5 17,7 22,3 13,7 27,0 37,0
Santo Antônio 539 48,2 51,8 27,5 50,3 22,3 66,3 13,9 9,4 10,4
Paissandu 531 56,7 43,3 38,2 47,8 13,9 12,4 11,8 32,3 43,5
Ilha do Leite 959 56,6 43,4 36,1 49,5 14,4 25,4 10,9 28,7 35,0
Coelhos 6.826 52,4 47,6 51,1 41,0 7,9 89,2 5,4 3,1 2,3
Ilha Joana Bezerra 12.755 52,0 48,0 58,3 36,2 5,5 93,5 4,5 1,8 0,3
Cabanga 1.536 56,1 43,9 41,3 43,4 15,3 61,5 14,3 14,7 9,5
São José 8.653 51,9 48,1 52,5 39,2 8,3 86,6 7,4 4,8 1,3
Total Área Central 78.098 54,4 45,6 46,8 42,5 10,7 65,50 9,84 12,55 12,11
Brasília Teimosa (RPA 6) 19.155 52,3 47,7 47,9 43,3 8,7 81,1 10,8 6,5 1,6
Total Recife 1.422.905 0,53 46,50 46,2 44,4 9,4 61,4 10,4 12,8 15,4
Figura 13. Tabela — Dados da população moradora do Centro (bairros da RPA 1) e Brasília Teimosa (pertencente à RPA 6).
Fonte: IBGE Censo 2000 (Elaboração própria)
Bairro Taxa de Alfabetização (1) Total de Domicílios Porcentagem de Mulheres Responsáveis Pelo Domicílio
Assim, o Centro é ponto de convergência de mi- de substituição das suas edificações por empreendi-
lhares de pessoas em busca de emprego, serviços e mentos imobiliários destinados à população de média
produtos, além de atividades de cultura e lazer. A pre- e alta renda nestas áreas próximas à orla. O capital
sença desta diversidade econômica (indústria, comér- imobiliário avança sobre parcelas significativas deste
cio, serviços etc.) dá ao Centro, hoje, uma importância território, conforme evidencia a venda dos galpões da
significativa frente às demais regiões da cidade. REFESA e do Edifício JK para empreendedores priva-
Uma excelente rede de infraestrutura cobre a área dos. Nesta dinâmica, o Centro que já vem perdendo
central, permitindo que estas atividades comerciais faixas consideráveis de população, pode também per-
e de serviços se mantenham e se desenvolvam. Um der a atual população moradora, devido ao encareci-
conjunto articulado de vias liga o Centro aos demais mento do custo de moradia e ao efeito transformador
bairros do Recife, muitas utilizadas como corredores provocado pelos novos padrões de moradia.
de transporte urbano. Só no Centro, existem sete des- Segundo dados do IBGE, o Centro perdeu em uma
tes corredores, incluindo a Avenida Norte, por onde década (1991–2000) 6% da população moradora, pas-
circulam 223 linhas de transporte coletivo. A área sando de 83 mil, para 78 mil habitantes. Entretanto,
central é atendida também pelo terminal de metrô para muitas dessas famílias, morar no Centro signifi-
interligado aos municípios de Jaboatão dos Guarara- ca estar próximo do trabalho e obter renda, seja nas Figura 16. Construção abandonada no Centro do Recife. Figura 18. Torres residenciais de alto padrão (Pier Maurício de
pes e Camaragibe, além de uma linha para zona sul atividades formais ou informais. Além disso, muitas Foto: Gilvan Barreto Nassau e Pier Duarte Coelho) em construção na orla do Bairro do
do Recife, que está sendo ampliada para aumentar a das famílias pobres que residem nas comunidades Recife. Ao fundo, vê-se Brasília Teimosa. Foto: Gilvan Barreto
capacidade de transporte de passageiros. Os termi- não consolidadas ou nos cortiços e palafitas têm aí
nais integrados de passageiros promovem o embar- a única possibilidade de moradia, o que reforça a ur-
que intermunicipal para outras cidades da região e gente necessidade de promover a habitação popular
do estado, complementando esta importante rede de no Centro do Recife.
transporte de passageiros. No intuito de urbanizar, regularizar e garantir a al-
A potencialidade do Centro como lugar da diver- gumas destas famílias, o direito à moradia, o Plano Di-
sidade de usos e da moradia para todas as faixas de retor definiu, no interior da RPA 1, quatro Zonas Espe-
renda é reforçada pela quantidade expressiva de imó- ciais de Interesse Social (ZEIS): Coelhos, Coque, Santo
veis e domicílios abandonados, desocupados e fecha- Amaro e João de Barros. A população total abrangida
dos, tanto públicos como privados. Os dados do IBGE por estas zonas era, em 2000, de 38 mil pessoas, o que
de 2000 para a RPA 1 revelam a existência de 3.361 equivalia a 49% da população total moradora da RPA1.
domicílios vagos nesta área. Próxima a estas quatro ZEIS foi também delimitada a
Uma pesquisa realizada pela Prefeitura do Recife ZEIS Brasília Teimosa, que embora não esteja incluída
em 2008 apontou a presença de 253 imóveis priva- na RPA 1, sofre forte pressão do mercado imobiliário,
dos abandonados, desocupados ou fechados. Quan- por conta de sua localização estratégica próxima à
to aos imóveis públicos, os números são ainda mais área da REFESA. Outras áreas pertencentes à RPA 1,
expressivos, já que na área central há um conjunto também precárias, não foram delimitadas como ZEIS,
pertencente à União e que perfaz 145 hectares, parte correndo risco de remoção: a Favela do Rato, localiza-
do qual poderia ser utilizado para a construção de da no Bairro do Recife; Frei Casemiro; Vila do Papel e
novas moradias. Vila dos Motoristas, no Bairro de São José; Roque San-
Com esta potencialidade e disponibilidade de teiro, no Bairro dos Coelhos e Vila Brasil, localizada no Figura 17. Edifício JK: abandonado há anos, foi recentemente
área, o Centro vem assistindo a um gradual processo Bairro de Ilha Joana Bezerra. vendido a um empreendedor privado. Foto: Gilvan Barreto
Situada em uma área de grande interesse para pro- Teme-se que o projeto Recife–Olinda, que interliga A faixa de renda familiar de 3 a 6 salários mínimos
moção imobiliária, a comunidade Brasília Teimosa está os centros das duas cidades, e que incorpora o terri- constituiu um terço (33%) dos entrevistados e a de 7
localizada entre o bairro de Boa Viagem e o Centro tório de Brasília Teimosa em sua área de intervenção, a 10, cerca de um décimo deles (11%). Na faixa entre
tradicional do Recife, oficialmente situada no territó- destitua o direito à moradia das famílias que ali resi- 10 e 20 salários mínimos, a pesquisa abarcou 5,4%
rio da RPA 6, e uma Zona Especial de Interesse Social dem, promova sua expulsão ou impacte na permanên- dos entrevistados e 4,6% na faixa superior a vinte
— ZEIS (ver Figura 12). cia das mesmas. Portanto, considerar Brasilia Teimosa salários mínimos.
Como o próprio nome indica, Brasília Teimosa é um território do Centro do Recife é estratégico para A diversidade do Centro, com suas atividades vol-
fruto de intensa luta popular pelo direito à moradia. os movimentos sociais e entidades envolvidos no pro- tadas para vários públicos e faixas de renda, transpa-
Surgida em meados dos anos 1950, a comunidade tem jeto Moradia é Central. rece nas respostas dadas sobre hábitos e atividades
resistido às pressões do capital que tem tentado in- A proximidade com o Centro possibilita o acesso aos desenvolvidas nos seus bairros. Mais de 90% dos en- Figura 20. Cena cotidiana do Centro.
corporar o lucro de sua localização estratégica. serviços, equipamentos e postos de trabalho oferecidos trevistados fazem compras e mais de 80% trabalham Foto: Prefeitura do Recife
A Comunidade está separada fisicamente do nú- nessa área da cidade. Além disso, a pouca distância que ou “negociam” no bairro. Do total de entrevistados,
cleo principal do município pela Bacia do Pina, toda- separa as duas áreas facilita o acesso ao Centro de for- 53% utiliza os bares e restaurantes e 37,4% os cinemas
via o mesmo não se dá com as relações socioespaciais. mas alternativas como de bicicleta ou a pé, barateando e teatros, constituindo o público que comparece ao
A integração entre a comunidade de Brasília Teimosa o custo de deslocamento da população local ao Centro. Centro em horários noturnos.
e o Centro é intensa e também se dá nas propostas Por tudo isto os movimentos populares da cidade con- Os equipamentos de saúde foram avaliados
estratégicas do planejamento municipal. Propostas sideram Brasília Teimosa uma parte da área central do como bons e ótimos por dois quintos dos entrevis-
como a criação de uma ponte interligando o Centro Recife. Assim, garantir a permanência da população de tados. Do universo que utiliza os serviços, a metade
tradicional do Recife ao território de Brasília Teimosa menor poder aquisitivo em Brasília Teimosa e impedir (50,7%) o considerou bom e um quarto (24,8%) o
ou como o projeto Recife-Olinda, destaca a área de processos de especulação, expulsão e encarecimento avaliou como regular. Parcela pouco significativa fez
Brasília Teimosa como espaço estratégico para o de- do solo urbano são reivindicações trabalhadas e deba- avaliações negativas.
senvolvimento da cidade. tidas no âmbito deste projeto que merecem atenção. A avaliação sobre os serviços de saúde ali presta-
dos revelou-se positiva e o resultado foi semelhante
em relação aos equipamentos de lazer. Também neste
caso, cerca da metade (48,6%) dos entrevistados ava-
liaram este item positivamente.
Para quase 90% dos entrevistados a facilidade do
transporte público foi um fator preponderante nas
avaliações positivas quanto às atividades realizadas
no Centro. Destes, 60% considerou positiva a acessi-
bilidade ao Centro pelo transporte público oferecido. Figura 21. Paisagem do bairro da Boa Vista.
Quando perguntados sobre a moradia e trabalho, Foto: Prefeitura do Recife
Gente que mora e 44,2% declarou gostar e desejar permanecer no bairro
onde mora ou trabalha.
trabalha no Centro Este percentual amplia-se vigorosamente na pes-
quisa realizada pela Prefeitura do Recife no bairro da
Boa Vista, núcleo histórico do Centro, onde há uma
presença crescente de imóveis vazios e descaracte-
rização provocada pela substituição de usos residen-
O Centro do Recife continua sendo o lugar do ha- ciais para os comerciais em imóveis cedidos ou sim-
bitar, do trabalhar, das compras e do lazer. Uma pes- plesmente ocupados, acarretando sérios problemas
quisa realizada pela Prefeitura, em 2005, para avaliar de conservação.
a opinião dos moradores e trabalhadores, revelou al- O fato de 60% dos imóveis ainda permanecerem
guns de seus traços característicos e permitiu visua- com uso residencial e da maioria dos moradores en-
lizar o perfil de quem mora e trabalha no Centro ou trevistados ter nascido, continuar residindo e ainda
freqüenta o Centro por outros motivos. Esta pesqui- exercer atividades profissionais no próprio bairro,
sa abarcou um público bastante variado, com diver- pode ser uma das razões da satisfação em residir no
sidade de renda, gênero, idade e níveis de escolari- Centro, apesar do processo de perda de população.
dade. O estrato das pessoas com renda inferior a três Do total de pessoas entrevistadas, 80% declararam
salários mínimos concentrou 46% dos entrevistados, que gostam de morar ou trabalhar no Centro pelas se-
maioria constituída de moradores ou trabalhadores Figura 19 Ambulantes / comércio informal no centro. guintes razões — estar “perto de tudo”, “existência de Figura 22. Edifícios históricos na Boa Vista.
dos bairros centrais. Foto: Prefeitura do Recife escola” ou “facilidade do transporte”. Foto: Prefeitura do Recife
A promoção
habitacional no
Centro do Recife
Coordenação
Instituto Pólis
Apoio
OXFAM GB
Parceiros Nacionais
FASE
CEARAH Periferia
HABITAT para a Humanidade
Fórum Nacional da Reforma Urbana
Parceiros em Recife
FERU — Forum Estadual de Reforma Urbana
Observatório de Políticas Públicas — PE
Apoio em Recife
Prefeitura Municipal do Recife
Coordenação e Organização
Margareth Matiko Uemura, Isadora Tami Lemos Tsukumo,
Natasha Mincoff Menegon, Sidney Piochi
Colaboração
Socorro Leite (Habitat), Lívia Miranda (UFPE / FASE) Noé Sérgio e
Patrícia Antonino (Prefeitura do Recife).
Revisão
Marilia Akamine Risi
Produção de mapas
Renato Augusto Dias Machado
Fotos
Gilvan Barreto e Prefeitura do Recife
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