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MONTEVIDEO, URUGUAY
2011
FRANCISCO IWELTMAN VASCONCELOS MENDES
MONTEVIDEO, URUGUAY
2011
@ by Francisco Iweltman Vasconcelos Mendes
BANCA EXAMINADORA
A Tânia Regina Carneiro Leal Mendes, companheira de longas datas, pela compreensão,
apoio, incentivo recebidos em toda minha carreira profissional;
As minhas filhas Isabelle, Islanne e Ianne (in memorian) pelo carinho, apoio e torcida pela
vitória;
Ao professor Dr. Enrique Martinez Larrechea, pela orientação segura e exigente na condução
dos estudos e elaboração dessa tese;
Ao dramaturgo e diretor de teatro Benjamim Santos, amigo fraterno pelo estímulo sempre
presente;
This thesis is an study about the maintenance and the financing of piauiense education, during
the historical periods Colony (1711 – 1822), Empire (1822 – 1889) and Republic (1889 –
1934), until the creation of resources with constitucional vinculation (1934) for the financing
of basic education in Brazil, having as an analysis space the Capitany/Province/State of Piauí,
in a chronological cut that lasts from 1711 (arrival of the Jesuits at the Capitany) until 1934
(year of the creation of the resources constitutional vinculation for the education financing).
The research on how the process of maintenance and financing for the education during the
colony, the empire and the First Republic in Piauí, a region that, for centuries constituted the
poorest capitany, province, and state of the Brazilian Federation, has a significant relevance,
once that the approaches made in studies about the education at Brazil, assume nacional
contours, once the contributions for the reconstruction of this history are originated in remote
regions of the big decision centers, as Piauí, aren’t inserted in these works. A historical search
was realized, having as one of its references and primordial resource the primary sources,
specifically, Acts and Royal Provisions, Imperial Decrees, Laws and Regulations of the first
period and Annals of Republican constituents, 1823, 1891 and 1934. Hemerographic, literary
and fotografic sources were used and interpreted, as an effort for a better characterization of
reality of each historical period researched, for the comprehension of the whole educational
process developed in Piauí.
SUMÁRIO
01- INTRODUÇÃO................................................................................................................10
02- CAPÍTULO I - O CENÁRIO PIAUIENSE................................................................... 14
10-CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................113
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2 CAPÍTULO I
O CENÁRIO PIAUIENSE
Conforme indica o historiador Michel de Certeau sobre o estudo dos espaços, a
história é produzida em um constante processo, por meio de práticas humanas, movimentos
que dinamizam a convivência social e constroem uma cultura, que elaboram sentidos e
cobram do historiador sua análise. Para esse autor,
Essa história começa ao rés do chão, com passos. São eles o número, mas um
número que não constitui uma série. Não se pode contá-lo, porque cada uma de suas
unidades é algo qualitativo: um estilo de apreensão táctil de apropriação cinésica.
Sua agitação é um imensurável de agilidades. Os jogos dos passos moldam espaços.
Tecem lugares. (CERTEAU, 2007, p. 176).
Tratando o Piauí como espaço praticado, portanto como um lugar em que por meio da
ação do historiador é possível apreender seus significados, sabe-se que é um Estado da
federação brasileira, localizado geograficamente na região denominada Nordeste, palco e
cenário onde ocorreram as experiências e de onde são apontadas as referências educacionais
que neste trabalho serão relatadas. O Piauí é em área territorial, considerado o terceiro maior
Estado nordestino, inferior apenas à Bahia e ao Maranhão, e o décimo Estado brasileiro,
respondendo por 2,9 % da área do território nacional.
Sua economia encontra no setor terciário, responsável por quase 70% da formação de
renda do Estado, ainda que pese a atuação desfavorável de um de seus segmentos mais
importantes, o comércio inter-regional, que acaba transferindo os recursos, via diversos
mecanismos, principalmente tributários, para os Estados mais desenvolvidos da Federação,
notadamente São Paulo. Os setores primários e secundários, embora minoritários na formação
da renda total, absorvem parcelas significativas da mão-de-obra.
A pecuária foi a primeira atividade econômica desenvolvida no Estado, fazendo parte
de sua tradição histórica. Tanto que o folclore e os costumes regionais derivam em grande
parte da atividade pastoril. Entre os principais rebanhos, destacam-se os caprinos, bovinos,
suínos, ovinos e asininos. Nos dias atuais, a caprinocultura, por sua capacidade de adaptação a
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condições climáticas inóspitas, tem proporcionando meio de vida a significantes parcelas
população carente, principalmente nas regiões de Campo Maior, Alto Piauí e Canindé.
A partir do século XVIII, o Piauí consolidou-se como principal potência econômica no
que se refere à pecuária. Segundo Caio Prado Junior em seu livro Formação Econômica do
Brasil, consta que:
O fato é que o Piauí contando com os seus grandes rebanhos, os maiores e melhores
do Norte, e com uma via cômoda de transporte como o rio Parnaíba, suplantou todos
os seus concorrentes e dominará o mercado colonial de carne-seca até ser
suplantado, nos últimos anos do século, pelo charque rio-grandense. (PRADO
JUNIOR, 2004, p. 196)
A organização da pecuária e a forma como foi praticada no início do século XVIII
pode ter contribuído para formar o traçado geográfico piauiense. O território definido como
Estado do Piauí pode ser identificado no mapa abaixo.
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VEGETAÇÃO DO PIAUÍ
Fonte: RODRIGUES, Joselina Lima Pereira. Geografia e História do Piauí – Estudos Regionais. 4 ed.
Teresina- PI, 2007, p 24
HIDROGRAFIA DO PIAUÍ
Fonte: RODRIGUES, Joselina Lima Pereira. Geografia e História do Piauí – Estudos Regionais. 4. ed.
Teresina- PI, 2007, p 104
Foi, porém, exatamente a presença de águas que tornou o território piauiense ponto de
atração de populações migrantes do semi-árido nordestino. Enquanto os Estados do Nordeste
Oriental contam com apenas um rio perene, o São Francisco, com aproximadamente 1.800 km
dentro de seus territórios; o Piauí dispõe do rio Parnaíba e alguns de seus afluentes, entre eles
o Uruçuí Preto e o Gurguéia que, somando-se seus cursos permanentes, ultrapassam 2.600 km
de extensão. O Estado conta ainda com lagoas de notável expressão, tais como a de Parnaguá,
Buriti e Cajueiro, que vêm sendo aproveitadas em projetos de irrigação e abastecimento de
água na região. A perenidade dos rios piauienses, entretanto, encontra-se ameaçada, pois os
rios sofrem intenso processo de assoreamento, sempre crescente, em decorrência do
desmatamento acentuado que ocorre no Estado, principalmente nas nascentes e nas margens
dos rios.
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CLIMA DO PIAUÍ
Fonte: RODRIGUES, Joselina Lima Pereira. Geografia e História do Piauí – Estudos Regionais. 4. ed.
Teresina- PI, 2007, p 70
RELEVO DO PIAUÍ
Fonte: RODRIGUES, Joselina Lima Pereira. Geografia e História do Piauí – Estudos Regionais. 4. ed.
Teresina- PI, 2007, p 56
Nesse espaço geográfico, embora de forma tardia, como informa Caio Prado Junior,
“em suma, podemos sintetizar com esses dados a distribuição do povoamento [...] o Piauí era,
em particular, muito ralo e quase inexistente em alguns setores”. (PRADO JUNIOR, 2004, p.
64).
Segundo alguns dados da historiografia piauiense a colonização do Piauí deu-se do
centro para o litoral. Fazendeiros do São Francisco, à procura de novas expansões para suas
criações de gado, passaram a ocupar, a partir de 1674, com cartas de sesmarias concedidas
pelo governo de Pernambuco, terras situadas às margens do rio Gurguéia. Um desses
sesmeiros foi o Capitão Domingos Afonso Mafrense, também conhecido como Domingos
Sertão, que fundou trinta fazendas de gado, tornando-se o mais eminente colonizador da
região. Por sua própria vontade, as fazendas foram legadas, após sua morte, aos padres da
Companhia de Jesus. Hábeis gerentes, os jesuítas contribuíram de forma decisiva para o
desenvolvimento da pecuária piauiense, que atingiu seu auge em meados do século XVIII.
Nessa época, os rebanhos da região abasteciam todo o Nordeste, o Maranhão e as províncias
do Sul. Com a expulsão dos jesuítas, as fazendas de Mafrense foram incorporadas à Coroa e
entraram em declínio. Esses elementos contribuem para apresentar uma ordem de
configuração do Piauí. Essa compreensão da ordem é explicada por Michel de Certeau da
seguinte maneira:
[...] um lugar é a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuem elementos nas
relações de coexistência. Aí se acha portanto, excluída a possibilidade, para duas
coisas, de ocuparem o mesmo lugar. Aí impera a lei do “próprio”: os elementos
considerados se acham uns ao lado dos outros, cada um situado num lugar “próprio”
e distinto que define. Um lugar é portanto uma configuração instantânea de
posições. Implica uma indicação de estabilidade. (CERTEAU, 1990, p.201).
Essa aproximação do Piauí como lugar próprio e espaço praticado serve, portanto, para
entender as formas educacionais e a rede de poder e de saber nele edificada e reorganizada
historicamente.
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3 CAPÍTULO II
JESUÍTAS NO PIAUÍ: educação no contexto mercantilista
INÁCIO DE LOYOLA
Fonte: Arquivo Histórico da Sociedade de Jesus Roma. In: SAVIANE, Dermeval. História das idéias
pedagógicas no Brasil. 2. ed. São Paulo, 2008, p.42
Aprovada pelo papa Paulo III, em 1540, a regra da Ordem jamais se modificou. Sua
organização, inspirada na formação militar do fundador, é comandada por um Vigário
General eleito pela Ordem em caráter vitalício. Sua estrutura compreende províncias e casas;
seus integrantes professam os votos usuais de castidade e pobreza aos quais acrescentam os
votos de obediência ao papa e ao seu superior geral: “para efetuar trabalho missionário e de
apoio hospitalar em Jerusalém, ou para onde o Papa quiser, sem questionar”.
Os inacianos representam a ação da Igreja Católica, no período da Contra-Reforma,
em que se investe intensamente no processo educativo e na tentativa de retomar o controle
sobre os fiéis na Europa e a catequese de outros povos além mar.
A Companhia de Jesus, também chamada Sociedade de Jesus, tinha por divisa “para
maior glória de Deus” (Ad majorem Dei gloriam) e por guia os exercícios espirituais
redigidos pelo próprio Inácio de Loyola. Grandes missionários, os jesuítas espalharam-se pelo
mundo, fazendo sentir sua presença no Oriente e na América, atuando como confessores,
preceptores e tutores de vários monarcas e alcançando grande renome como educadores.
Os jesuítas, longe de viver em mosteiros, estiveram sempre em contato com o mundo,
permanentemente disponíveis para a evangelização e para o trabalho missionário. Sua regra,
por excelência, é a “cega obediência”. De modo geral, mais instruídos que os demais clérigos
dos séculos XVI e XVII, teólogos notáveis, eles desempenharam um expressivo papel no
combate ao protestantismo e na repressão às heresias.
No continente americano, os jesuítas tiveram papel relevante no processo de
colonização do Brasil, especialmente na catequese, na educação e na instrução dos colonos.
Os colégios jesuítas, erguidos em vários pontos da América portuguesa, formavam elementos
para ingressar na carreira religiosa e tiveram papel de destaque no ensino dos filhos dos
colonos, ministrando-lhes os primeiros ensinamentos, ou mesmo dando a educação necessária
aos que não tinham condições de estudar na Metrópole. Os colégios foram ainda decisivos
para a ocupação das terras brasileiras, servindo também como defesa do território. A educação
jesuítica era considerada muito rigorosa e, durante a colonização, os inacianos detinham
grande poder, na medida em que monopolizavam a instrução.
Extremamente cultos, chegaram a produzir obras importantíssimas, dentre as quais se
destaca o dicionário da língua tupi-guarani, que facilitou a catequese dos indígenas.
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religiões dos índios e dos escravos africanos ou crioulos eram consideradas aberrações
satânicas, que deveriam ser extirpadas pelos missionários, os quais, com zelo e coragem,
convenceriam os indígenas a deixarem a religião errada e seguirem a verdadeira fé: a católica.
Nesse contexto, a escravidão era tolerada em nome de uma causa muito maior: a divulgação
da fé católica no Novo Mundo.
Os inacianos, investidos do poder intelectual na Colônia e incumbidos da
evangelização do gentio da terra, foram, de fato, grandes senhores de escravos, aí incluídos os
indígenas. Seu discurso, quando confrontado com a prática, mostra a sua incoerência, pois ora
se posicionavam contra a escravidão e ora a admitiam na guerra santa.
No Piauí, onde se instalaram em 1711, o trabalho desenvolvido pelos Jesuítas limitou-
se à catequese de filhos de colonos e de índios aldeados, bem como da administração das
fazendas de gado deixadas como herança por um dos principais desbravadores e um dos
primeiros colonizadores da capitania: Domingos Afonso Mafrense.
Os jesuítas assumiram logo, no mesmo ano, a posse das fazendas legadas, sendo seu
primeiro administrador o padre Manuel da Costa, nomeado em 20 de agosto pelo reitor do
colégio Bahia, o padre João Antônio Andreoni, primeiro testamenteiro de Mafrense
No entanto, mesmo antes da fixação dos padres da Companhia de Jesus no Piauí
(1711), o trânsito de Jesuítas pelas terras que, no futuro, se constituiram na Capitania de São
José do Piauí foi marcante. Na parte norte destas terras, era intenso o tráfego dos inacianos
que vagavam entre o Colégio do Maranhão e as missões na Serra da Ibiapaba. Isso pode ser
comprovado com o episódio ocorrido em 1607, quando o padre Luis Figueira, fugindo de
novos ataques indígenas nos contrafortes da Ibiabapa, atravessou com alguns de seus
comandados, o Rio Parnaíba, para refugiar-se no Maranhão, deixando para trás o corpo de seu
companheiro de expedição, Pe. Francisco Pinto, que havia sido trucidado pelos índios
tacarijus no Planalto Ibiapabano.
Muitos foram os jesuítas que fizeram esse percurso entre as missões maranhenses e a
serra da Ibiapaba, utilizando as terras do norte do Piauí: Pedro Pedroso, Antônio Ribeiro,
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Antônio Vieira, célebre autor de “Sermões”, Gonçalo Veras, Pierre Gonçalvi e Ascêncio
Gago.
Em função desse “corredor” de passagem em que se transformaram as terras
piauienses, a região do delta do rio Parnaíba, povoada pelos índios Tremembés, foi alvo de
uma intensa ação dos jesuítas. Em 1704, encontramos registros do Pe. Miguel de Carvalho
“viajando para Lisboa para tratar dos interesses dos indígenas aldeados no delta do Parnaíba”
(MENDES,1996, p.17). Na parte sul, é possível assegurar que “índios do Piauí tenham
seguido os Jesuítas, que os alfabetizaram na Bahia ou Pernambuco antes da chegada de
Domingos Afonso Mafrense e da família Dias D’ávila, primeiros colonizadores”
(CARVALHO, 1983, p.08).
Em terras piauienses, após a instalação oficial (1711), os jesuítas dividiram-se em dois
grupos distintos, um ligado à administração das fazendas de gado e outro aos aldeamentos no
delta do Parnaíba. “[...] A administração das fazendas absorve a atenção dos padres de tal
modo que não lhes deixa espaço às atividades culturais e educacionais nas quais foram
atuantes em outras regiões da Colônia. [...]” (BRITO, 1996, p.13). Em 1723, na Ilha do Caju,
na região deltaica, o Pe. João Tavares chefiava uma missão junto aos índios tremembés. A
cumplicidade entre jesuítas e Coroa Portuguesa no projeto colonizador, leva o Governador e
Capitão-General, João da Maia Gama, a conceder sesmarias aos tremembés sob supervisão
dos jesuítas de quatro léguas de terras na região do delta (21 de junho de 1724); de uma légua
e meia na ilha Paramirim ou Cajuais na mesma região (21 de abril de 1727), bem como a
expedições de Provisões Régias em defesa das aldeias e da posse das terras pelos tremembés
estabelecidos no Delta (25 de janeiro de 1728/29 de novembro de 1731 e 21 de agosto de
1741).
As doações de terras e a intensa correspondência entre os jesuítas e o Conselho
Ultramarino, revelam a forte influência dos jesuítas na defesa dos índios e de suas aldeias
missionárias, justificando, também, o projeto colonizador da Metrópole.
O prestígio dos administradores jesuítas, das missões Tremembés no delta do rio
Parnaíba, junto à Coroa Portuguesa, demonstrava ser grande, pois a farta expedição de
Provisões do Conselho Ultramarino e do próprio Rei em atendimento aos reclames dos
jesuítas e em defesa dos índios é uma constante.
No entanto, a grande quantidade de terras concedidas aos indígenas, mas que ficavam
sob a administração dos jesuítas, despertava a cobiça de aventureiros como os irmãos Lopes,
João, José e Manoel, que invadiram as terras dos Tremembés (1730) introduzindo gado e
instalando currais. O que levou, após apelo dos jesuítas, a expedição da Provisão Régia de 29
de novembro de 1731, do Conselho Ultramarino ao governador do Maranhão, ordenando
garantir a posse dos índios Tremembés na Ilha dos Cajueiros e a expulsão dos irmãos Lopes.
Vários fatores foram determinantes para um acelerado processo de extermínio dos
indígenas da região norte do Piauí, entre eles podemos citar: a Proclamação de 6 de junho de
1755, de D. José I, Rei de Portugal, emancipando todos os índios do Piauí, Maranhão e Pará,
declarando-os livres, o que os desobrigava da servidão e dos aldeamentos e a expulsão dos
padres jesuítas (1759), que, apesar de fazer uso do trabalho indígena, de alguma forma,
proporcionavam aos silvícolas proteção em suas missões. Os indígenas ficavam à mercê da
ação dos aventureiros, caçadores de índios e do sertanismo de contrato. “[...] É bem perecível
o caráter destes povos.” (DURÃO, 1722, p.32).
Uma vez instalados nas terras piauienses por interesses pecuniários, ou seja, a
administração das “39 fazendas, 50 sítios, 489 escravos, 1.010 cavalos, 1.860 bestas e 50.670
cabeças de gado vacum distribuídos em 1.206.612 hectares” (COSTA, op.cit, p. 138) deixadas
de herança por Domingos Afonso Mafrense, os Jesuítas encontraram na distância dos núcleos
populacionais, na pobreza do meio, nas precárias condições de comunicação e acesso e na
baixa densidade demográfica, argumentos para a não implantação de seminários e colégios,
bem como pouquíssimo interesse que a população de vaqueiros e pequenos agricultores
demonstrava pelo ensino das primeiras letras. “[...] A população desta capitania é tão
diminuta, que me parece impossível de se observar a sobredita real ordem na parte que
respeita à indicada separação de classes [...]” (CALDAS, In: COSTA, 1981, p.167).
Tudo concorria para justificar a não aplicação dos rendimentos obtidos com a
administração das fazendas pela Companhia de Jesus na educação do Piauí. “Os recursos
seguiam para a manutenção de Seminários e Colégios em outras regiões do país, notadamente
o Colégio da Bahia e o Noviciato de Jiquitaia”. (FERRO, 1995, p.54).
Vale lembrar, que mesmo tardia, a fixação dos Jesuítas em terras piauienses, ocorre
em momento extremamente conturbado, em função de lutas pela posse das terras que envolvia
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[...] Assim que ponho na presença de Vossa Majestade ser muito preciso que neste
sertão haja quem doutrine os filhos destes habitadores, e que haja missionários de
vida exemplar, que doutrinem aos inumeráveis índios e pretos, que nele há, para que
ouçam missa, e se saibam confessar, e vivam como bons católicos, e não pior que
brutos fazendo mortes continuamente com armas de fogo. E como o dito vigário se
obriga a dar para a ajuda do colégio uma fazenda de gado que bem valha 12.000
cruzados, entendendo que a imitação do dito vigário haverá muitos que concorram
com esmolas; e só muito acho ser preciso para estas terras que os padres, que os
prelados houverem de mandar sejam de exemplar vida, e que se reforme de três em
três anos, e que dois andem pregando pelo sertão, e os outros dois fiquem ensinando,
e que os que ensinarem em um ano saiam no segundo a pregar e confessar, e se
recolham os do ano pretérito a ensinar, e que em nenhum tempo se possa aumentar o
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número de padres mais que tão somente quatro de missa, e um leigo para deles
tratar, me parece que havendo padres que por serviço de Deus e de Vossa Majestade
queiram aceitar a fundação do dito colégio, será uma obra muito útil para estas
terras, e para o bem das almas, pelo que dou esta conta a Vossa Majestade para que à
vista da súplica do dito vigário se digne deferir-lhe como for servido. Mocha do
Piauí, 14 de agosto de 1730. – Dr. Ouvidor-geral do Piauí, José de Barros Coelho.
(COSTA, op.cit, p. 104)
Os jesuítas, tanto mais detestáveis, quando obravam toda a sorte de arbítrios sob a
capa da religião, de posse de uma grande fortuna, e por isso poderosos na capitania,
gozando de grandes privilégios, que os reis imprudentemente lhes haviam
concedido, eram os verdadeiros senhores da situação, eram a verdadeira justiça,
decidiam de todos os pleitos, intervinham em todos os negócios, punham em
antagonismo o povo com a autoridade, e indispunham os índios, sobre quem tinha
muito poder e mando, contra os povoadores. (CALDAS, In COSTA, 1981, p. 131).
coletivamente para o sustento dos alunos, padres e irmãos e como forma de garantir a
gratuidade do ensino. Mas, não era assim que pensavam algumas autoridades portuguesas:
“Senhores, e não administradores da grande fortuna de Domingos Afonso, de que estavam de
posse desde 1711, ninguém ousava contrariá-los.” (COSTA. op.cit, p. 131)
Desta forma, os jesuítas formavam um corpo facilmente visto como ameaça para o
Governo absolutista vigente, que ambicionava controlar todos os aspectos da vida econômica
e social, incluindo uma igreja mais submetida ao estado. Este viés ideológico somado ao
desejo de se lançar mão sobre o considerável patrimônio de posse dos jesuítas reúne as
condições para o desencadeamento de toda a sorte de perseguições.
João Pereira Caldas, logo que tomou conta do governo na capitania, tratou de
apressar a conclusão do seqüestro dos bens dos jesuítas, fazendo ao mesmo tempo
efetiva a prisão e expulsão dos mesmos jesuítas para fora do Piauí; e tomou conta
dos bens que a eles pertenciam, e que passaram para o domínio da coroa, nomeando
administradores idôneos para tomar conta dos mesmos bens. (COSTA, op.cit, p.
133)
Enquanto em todo o Brasil tudo se deve à honestidade dos jesuítas, estes, no Piahuy,
sobravam à cizânia, acirravam ódios entre índios e colonos e destes entre si, e jamais
pretenderam imitar seus irmãos do sul, na faina gloriosa de instruir o povo,
inventando mil processos para a educação dos legítimos donos da América
Portuguesa e dos ávidos colonos que nella penetravam (sic) (SOCIEDADE
AUXILIADORA DA INSTRUÇÃO, 1992, p. 46).
4- CAPÍTULO III
DO RELIGIOSO AO LAICO: a Reforma Pombalina
MARQUÊS DE POMBAL
Fonte: SAVIANE, Dermeval. História das idéias pedagógicas no Brasil. 2. ed. São Paulo, 2008, p.78
O Marquês de Pombal foi o déspota esclarecido que maior destaque teve no governo
português. Sua imagem, indicada acima, é representada na fonte imagética e é testamentária
da sua imponência e status social, tendo atuação expressiva em todas as colônias que
formavam o Reino de Portugal.
O modelo educacional implantado visou criar uma escola diferente da jesuítica que,
segundo o Marquês de Pombal (Ministro de D. José I de 1750 a 1777), fora montada para os
interesses da fé e da própria Sociedade de Jesus. A nova escola seria uniformizada em seu
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Sobre o papel que Vossa Mercê me pede para uso da escola dos rapazes e raparigas
dessa povoação, devo dizer a Vossa Mercê que, lendo as diferentes ordens, que a
Vossa Mercê distribuiu o meu antecessor, tanto para o estabelecimento, como para o
serviço dessa dita povoação, acho em uma delas que a despesa do papel para essa
escola deve sair do produto da roça do comum; por isso não posso ordenar que se
faça a dita despesa à custa da fazenda real, quando há semelhante providência, a
qual insinuo a Vossa Mercê para que assim o execute. (COSTA,op.cit.p.172).
Secretaria de Estado dos Negócios Ultramarinos, desenha o mesmo quadro com uma riqueza
maior de detalhes: “Sendo o Piauí habitado por bem estabelecidos lavradores, vive quase tudo
sepultado em total ignorância, não tendo a mocidade quem a estimule: fugem os pais de
família da grande despesa a que se viam obrigados se mandassem seus filhos para outras
capitanias”. (COSTA, op. Cit., p. 200)
Baltazar de Sousa Botelho, que tomara posse como governador, em 09 de janeiro de
1814, ao transitar pelo território piauiense, percebendo a ausência de escolas conclui o quadro
funesto da educação na província: “Há ignorância geral e absoluta” (CARVALHO, 1983, p.
24). Completando o tempo de sua permanência na província e depois de todos os seus
esforços administrativos, Botelho escreve ao Rei: “Com referência à Educação, a coisa ficou
como estava, pois a nomeação de professores para Campo Maior e Parnaíba não daria às
escolas que pouco deixariam de funcionar [...]”. (CARVALHO, op. Cit., p. 24)
Mas, o apelo por escolas feito pelo governador César Bulamarqui, só será atendido dez
anos depois, em 1815, quando em 04 de setembro, daquele ano, uma resolução do Governo
Provincial criou uma cadeira de primeiras letras na Vila da Parnaíba, que pelo baixo salário
Rs 60$000 (sessenta mil réis) anuais nem chegou a ser preenchida, ficando nessa condição até
1821. Essa mesma resolução autorizou a criação de outras duas escolas de primeiras letras:
uma na capital, Oeiras, cujo salário do professor seria de Rs 125$000 (cento e vinte cinco mil
réis) anuais e uma na vila de Campo Maior, onde o ordenado seria de Rs60$000 (sessenta mil
réis) anuais.
A cadeira de latim de Parnaíba, criada em 1788, que se encontrava vaga, foi restaurada
por provisão do governador, em 16 de março de 1820. Nessa restauração, o ordenado anual do
professor foi elevado para RS 200$000 (duzentos mil réis).
A criação oficial dessas escolas não era garantia de seu funcionamento. A escola de
Parnaíba até o ano de 1821, também se encontrava vaga por falta de professores.
Mesmo com esse aumento na oferta de salário para professores da capital, Oeiras, a
condição para preenchimento de mestres para as escolas era dramática. Elias José Ribeiro de
Carvalho, governador da província, escreve ao Ministro de Estado do Reino, Inácio da Costa
Quintela, em ofício que mais parece um lamento, datado de 30 de junho de 1821, apresenta o
seguinte teor:
Ah! Senhor. A minha sorte é tão mesquinha e desgraçada que estou vivendo em um
país e em uma cidade onde não posso ter a consolação de ter duas ou três pessoas
com quem consultar um caso difícil, em que me ache, para nele obrar com acerto e
tranquilidade da minha consciência, mas até de o poder comunicar. [...] O que mais
se deve esperar de uma cidade cujas cadeiras de Primeiras Letras e Gramática Latina
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estão por prover porque não há uma pessoa que possuía medianos conhecimentos
para as ocupar? (CARVALHO, 1983, p.6.)
Fontes documentais revelam uma total miséria dos cofres públicos, na primeira gestão
do Piauí como capitania autônoma. Em 09 de outubro de 1766, o governador João Pereira
Caldas, já lamentava em ofício ao rei:
480 réis um leitoa, 800 réis um par de esporas, 800 réis um facão de trabalho; a
diária de um mestre de carpintaria 400 réis; 160 réis a diária de um escravo alugado;
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um vestido de veludo ou seda 5$000 (cinco mil réis), 2$000 (dois mil réis) de
qualquer outro tecido; feitio de um par de sapatos dando ao mestre tudo 2$560 (dois
mil quinhentos e sessenta réis). (COSTA, op.cit, p. 162-163).
Quando o imposto a ser arrecadado era muito pequeno, passava a ser recolhido pelos párocos;
Renda do Ver o Peso tributo que se devia às Câmaras pela aferição de pesos e medidas
praticados nas vilas; Meia-Sisa tributo instituído pelo Alvará Régio de 3 de junho de 1809;
correspondia a 5% ad valorem e era cobrado sobre o preço de compra e venda do escravo
ladino (negro aculturado, que entendia o português) e a Sisa que era o tributo de 10%,
incidido sobre todas as trocas comerciais; e venda e transmissão de casas e propriedades
imóveis, instituído no Brasil pelo Alvará de 3 de junho de 1809.
O quadro de ações na educação na Província do Piauí no período colonial, concluía-se
em 1822, ano da Proclamação da Independência, quando Portaria do governo da província de
12 de agosto, estabeleceu que nas escolas de primeiras letras na capital Oeiras e nas vilas de
Parnaíba, Campo Maior, Valença, Marvão, Jerumenha e Parnaguá, os ordenados dos
professores ficariam estabelecidos em Rs150$000 (cento e cinquenta mil réis) anuais,
enquanto todo o Subsídio Literário calculado para a arrecadação naquele ano era de RS
908$111 (novecentos e oito mil, cento e onze réis). No entanto, fechada a contabilidade dos
cofres públicos, naquele ano (1822), a Província apresentou um saldo de Rs104:149$654
(cento e quatro contos,cento e quarenta e nove mil e seiscentos e quarenta réis). Levando-se
em conta o pequeno número de escolas e o reduzido quadro de professores, percebe-se que o
setor educacional poderia ter recebido um melhor tratamento, levando-se em conta os salários
pagos e o saldo de caixa apresentado pela Província. “[...] como se houvesse um firme
propósito de manter o povo na mais crassa ignorância”. (ALENCASTRE, 1981, p.89)
44
5- CAPÍTULO IV
DESAFIOS À INSTRUÇÃO NO PIAUÍ: política externa e interna
CORTES DE LISBOA
Fonte: Quadro de Oscar Pereira da Silva- Web
Setenta mil portugueses, cidadãos pacíficos do Piauí são setenta mil cegos que
desejam a luz da instrução pública[grifo meu] para que tem concorrido com seus
irmãos de ambos os hemisférios, pagando o subsídio literário, desde a sua origem e
apenas conhecem três escolas de primeiras letras na distância de sessenta léguas
cada uma, estas incertas, e quase sempre vagas por não haver na província quem
queira submeter-se ao peso da educação da mocidade pela triste quantia de sessenta
mil réis anuais quando a um feitor de escravos, tendo cama e mesa se arbitra no país
a quantia de 200$000 (duzentos mil réis) anualmente. Portanto, proponho: Primeiro
- Que se mande criar 7 escolas de primeiras letras com o ordenado de 120$000 cada
uma anualmente: 1.ª na cidade de Oeiras; 2.ª na vila de Parnaguá; 3.ª na vila de
Valença; 4.ª na vila de Jerumenha; 5.ª na vila de Marvão; 6.ª na vila de Campo
Maior; 7.ª na vila da Parnaíba. Segundo – Três aulas de gramática latina com o
ordenado de 200$000 cada uma: 1.ª na cidade de Oeiras; 2.ª na vila de Campo
Maior, que dista daquela 60 léguas; 3.ª na vila da Parnaíba, que dista desta outras 60.
Terceiro – Uma cadeira de filosofia racional, na cidade de Oeiras, outra de
geometria plana e trigonometria retilínea na vila da Parnaíba, com o ordenado de
400$000 cada uma. E como desgraçadamente na província do Piauí, não haja
pessoas idôneas, que possam e queiram encarregar-se destes magistérios, devem
pôr-se a concurso nesta capital, preferindo-se em iguais merecimentos presbíteros
assim seculares, como egressos, por haver grande falta de sacerdotes na província.
(ITC/ Lisboa, Documentação Manuscrita. 2 de setembro de 1822).
Eu sou deputado da província do Piauí. Dediquei-me aos estudos, vim para Portugal,
aqui estive dez anos; passados eles, eis-me obrigado, descontente talvez, a regressar
à minha pátria. Nenhuns outros conhecimentos tinha mais do que os de sete anos de
universidade, apesar disso, vivia entre homens que quase ignoravam as primeiras
letras, pois na Província do Piauí, dois terço dela não sabe ler nem escrever. Forte
desgraça!.(...) Com o ordenado de Rs 50$000 ( cinqüenta mil réis) ou Rs 60$000
(sessenta mil réis) anualmente, que convidou para professores delas unicamente a
indivíduos que nem são capazes de ser decuriões em escolas presididas por homens
doutos, e versados nos conhecimentos das primeiras letras, da moral e da política,
únicos habilitados para a educação da mocidade.” ( ITC/Lisboa – Documentação
Manuscrita – 14 de setembro de 1822.)
Uma ponte, uma escola e uma rua; patrono de uma cadeira na Academia Parnaibana
de Letras e do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Parnaíba; seu nome
está suspenso por meio de uma teia de narrativas gloriosas, carregadas de um ímã
que atrai todo adjetivo e expressão de grandeza: rico, corajoso, destemido, cruel,
amado e odiado. (MENDES; LIMA, 2009, p. 9).
48
mesma portaria estabelece o salário anual dos professores: O professor da capital (Oeiras)
ficou com o salário estipulado em Rs400$000 (quatrocentos mil réis); o da Vila de Jaicós em
Rs 220$000 ( duzentos e vinte mil réis) e os mestres das demais vilas Rs200$000 ( duzentos
mil réis). Três dias depois (18/07/1829) nova portaria o Presidente da Província, reforça essa
“expansão” pretendida pelo governo imperial com a criação de mais uma cadeira de latim em
Oeiras, Parnaíba e Campo Maior e vencimento aos professores estipuladas em Rs300$000
(trezentos mil réis) anuais e a criação de quatro cadeiras de instrução primária em Piracuruca,
Parnaíba, Marvão (hoje, cidade de Castelo do Piauí) e Piranhas (hoje cidade de Crateús-
Ceará) com ordenados assegurados aos professores em Rs200$000 (duzentos mil réis anuais).
A pressão do poder central do Império pela expansão da rede de ensino ordenava
criar escolas sem, no entanto, assegurar recursos para sua manutenção ou quadro de
professores qualificados para seu funcionamento. As consequências não tardaram a aparecer:
em 1830, em relatório ao Conselho da Província, o Presidente Manoel de Sousa Martins,
comunica que se encontravam vagas 11 (onze) cadeiras primárias, além das de latim de
Oeiras, Campo Maior e Parnaíba e apenas três de instrução primária encontravam-se providas
de mestres: duas em Oeiras e uma em Jaicós, produzindo uma despesa de Rs800$000
(oitocentos mil réis), apesar de se encontrar assegurado em orçamento, para aquele ano, em
gastos com a educação na província a importância de Rs4:250$000 (quatro contos e duzentos
e cinqüenta mil réis).
Apesar de vitalício, o que poderia ser um atrativo, o cargo de professor de cadeiras
de instrução primária e secundária, era sempre incerta e o abandono da cátedra era uma
constante em função dos parcos salários.
Dois anos após o fim das hostilidades com os balaios e a recomposição de toda
estrutura administrativa da província, O Barão da Parnaíba, quando entregou o poder em
dezembro de 1843, apresentou esse balanço do ensino público no Piauí: 21 cadeiras de
instrução primária, sendo 18 do sexo masculino e 3 do sexo feminino e 7 do ensino
secundário, 4 na capital, Oeiras, 02 em Parnaíba e uma em Príncipe Imperial (hoje Crateús-
Ce). É Importante ressaltar que a matrícula em todas essas escolas não chegava a 400
(quatrocentas) crianças e adolescentes.
“ensino mútuo” ou monitorial, ou seja, os alunos mais avançados ensinavam aqueles que
ainda não aprendiam.
O processo de avaliação formava o indivíduo competitivo. A competição era
incentivada com recompensa aos alunos. O sistema constituía-se da seguinte forma: os alunos
avaliavam-se mutuamente e continuamente, quando estavam realizando as tarefas de leitura
entre outras. Com relação aos conteúdos, o Método preocupava-se com o ensino da
aritmética que era o domínio da escrita dos números de 1 a 9, conhecimento das primeiras
tabuadas ou combinações das primeiras quatro regras, ficando estas decoradas na memória:
Adição, Subtração, Multiplicação e Divisão. As outras matérias do currículo pedagógico
eram: livro de soletrar, bilhetes de acusação e de vergonha, títulos de classes e outras.
O Método Lancaster permitiu que um mestre instruísse até 1000 alunos por vez. A
função do monitor não era ensinar ou corrigir os erros, mas sim coordenar os alunos para que
se corrigissem entre si. A estrutura física para aplicação do método exigia uma única sala
quadrada, longa e bem ventilada, com uma plataforma elevada, e uma escrivaninha de onde o
professor avistava todos os alunos. Os monitores também eram responsáveis pela
organização geral da escola, pela limpeza e, fundamentalmente, pela manutenção da ordem e
da civilização.
Naquela metodologia adotada achava-se que educando, as crianças desta forma,
tolhiam-se, no futuro, as revoltas populares. Em oito meses, os alunos deveriam ler, escrever e
contar as quatro operações. Como recursos utilizavam pequenas tábuas com areia onde os
alunos escreviam. As lousas pequenas serviam para escrever, as lousas grandes para ler e os
livros eram abolidos, já que o Método se baseava no ensino oral, na repetição e,
principalmente, na memorização. Numa análise dessa fase de ensino Fernando de Azevedo
explica que:
Fonte: SAVIANE, Dermeval. História das idéias pedagógicas no Brasil. 2. ed. São Paulo, 2008, p.127
Pela Imperial Portaria de vinte e dois de agosto deste ano, recebida a doze do
presente mez, fico na intelligencia de que Sua Majestade o Imperador, reconhecendo
a grande utilidade que resulta a seus fiéis súditos do Estabelecimento de Escolas
Públicas de Primeiras Letras pelo methodo Lacastriano que achando-se geralmente
admitido em todas as nações civilisadas tem a experiencia mostrada serem muito
própria para imprimerem na Mocidade os primeiros conhecimentos: Manda por essa
Secretaria dos Negócios do Império que eu promova quanto me for possível, a
introdução a estabelecimento das referidas escolas de cujos benefícios hajão de
aproveitar-se os habitantes desta província. Sobre o que cumpreme participar a
Vossa Excelência para fazer chegar ao conhecimento de Sua Majestade Imperial que
nesta Província não há indivíduos que seja instruídos no methodo Lencastriano, que
o possa ensinar e por isso me vejo impossibilitado de promover o estabelecimento
das referidas escolas: e o Mesmo Augusto Senhor Faria um grande benefício a esta
Província se a Ella Houvesse de Mandar pessôa que tendo os conhecimentos
precisos podesse ensinar indicado methodo. (BRITO, 1996, p. 20, 21)
O método Lancaster voltou a figurar como oficial para as escolas públicas na lei de 15
de outubro de 1827, que regulamentava o item 32 do artigo 170 da Constituição de 1824, e na
portaria ministerial de 15 de junho de 1829, gerando, obviamente, constrangimento para o
governo provincial para a implantação de tão decantado método, uma vez que o governo
imperial nunca atendeu à solicitação do Presidente da Província de promover um treinamento
entre os mestres locais para aplicação do método. Mesmo assim, foram criadas em Parnaíba,
Campo Maior, Oeiras e Jaicós, escolas para aplicação do método de Lancaster.
O método, que tinha por tentativa suprir a falta de professores consistia num "ensino
mútuo", no qual um aluno treinado (decurião) coordenava um grupo de dez alunos (decúria)
sob a rígida vigilância de um professor. A experiência do método Lancaster resultou em um
grande fracasso e no descontentamento geral entre os mestres que já atuavam nas poucas
escolas existentes, o que levou a Sociedade Auxiliadora de Instrução do Piauí, um século
depois, em publicação de 1922, a comentar:
mas deixava bem claro nos decretos de criação que as novas escolas renunciassem o Método
Lancaster e adotassem o método convencional, autorizando para isso, abrir concurso na
Província da Bahia, para ativá-las com professores vindos de fora.
O avanço registrado em decretos governamentais no ensino secundário em 1832, com
a criação das cadeiras de Filosofia, Geometria, Retórica e Francês para a cidade de Oeiras,
não saiu do papel. As cadeiras permaneceriam vagas pelos três anos subsequentes.
Porém, os governos regenciais insistiam na utilização do Método Lancaster. A
Regência Trina Permanente, em decreto de 05 de agosto de 1833, determinou que os governos
provinciais procedessem a novas contratações e que os candidatos aos lugares de professores
primários, segundo o método de Lancaster, poderiam ser examinados, na sede da Corte (Rio
de Janeiro) ou nas capitais das províncias.
Essa medida visava contribuir para suprir a necessidade de professores que atuavam
no ensino de primeiras letras na Província do Piauí.
Mas, a ingerência dos poderes públicos, sobre o que deveria ser utilizado nas escolas
da província era prática comum. Empossada em 04 de maio de 1835, Assembleia Legislativa
Provincial, em sua primeira legislatura, aprovou a lei nº. 01, de 29 de maio de 1835, que
determinava a adoção nas escolas públicas da província, os “Compêndios de Lógica,
Metafísica e Ética”, de autoria de Mr. Edwin Ponelli e traduzidos para o português pelo Dr.
João Cândido de Deus e Silva, ex-Juiz de Parnaíba e herói da independência do Brasil no
Piauí e a obrigatoriedade por destinação de verbas orçamentárias nos anos de 1835-1836, da
adoção do dito método Lancaster nas escolas de Parnaíba e Campo Maior.
Sobre o método Lancaster falou o presidente da província, Manuel de Sousa Martins,
em sua primeira mensagem na instalação da Assembleia Legislativa em 1835: “Vão
recebendo (os alunos) a conveniente instrução e o progressivo adiantamento, segundo suas
capacidades, se bem que o método Lancastrino não tenha podido obter os melhores sufrágios,
ou pelo efeito lento que produz, ou talvez por defeitos no seu prático desenvolvimento. No
Piauí não o julgam preferível.”
José Ricardo Pires de Almeida, em sua clássica obra, Instrução Pública no Brasil,
concluíu de maneira objetiva o balanço da implantação do Método Lancaster no Brasil:
Meninos
Meninos
Meninos
Meninas
Meninas
Meninas
Meninas
Piauí 772 192 18 3 62 32 1.679
Fonte: ALMEIDA, Jose Ricardo Pires de .INSTRUÇÃO PÚBLICA NO BRASIL – História e Legislação (1500
– 1889) p.112
Por meio da citação acima, é possível perceber a precarização das escolas brasileiras,
existentes nesse período, incluindo as escolas da Província do Piauí, como também a falta de
qualificação de professores, o acesso muito restrito aqueles alunos oriundos de camadas mais
favorecidas da sociedade, que formavam turmas heterogêneas, contemplados por um currículo
de fraca exigência.
Em 14 de junho de 1874 ocorre, por iniciativa do Diretor Geral da Instrução pública,
Dr. Polydoro César Bulamarqui, a fundação da Sociedade Promotora da Instrução Pública,
que instalou no ano de sua fundação uma biblioteca em Teresina com um acervo inicial de
1194 volumes e recebeu como doação do Capitão João Gonçalves de Magalhães uma
residência para instalação de um educandário. A sociedade Promotora da Instrução Pública
teve vida efêmera e a Biblioteca por ela fundada foi incorporada ao patrimônio da Província.
Fechada a biblioteca em 1877, por falta de verbas públicas, foi reaberta em 12 de outubro de
64
1883, quando uma Lei Provincial lhe outorgou nova subvenção financeira, garantindo sua
sobrevivência até o período republicano.
O resultado desse triste desempenho da educação na província do Piauí ficou
registrado no primeiro grande censo geral do Império de 1872, que obteve os seguintes dados:
apenas 2.801 crianças livres entre 6 e 15 anos frequentavam a escola; cerca de 23.000
crianças, na mesma faixa etária, estavam fora das escolas; 85% da população adulta era
analfabeta e somente 6 (seis) escravos do sexo masculino sabiam ler.
São dignas ainda de registro no período que vai de 1844 até a Proclamação da
República, as seguintes iniciativas governamentais: concessão de bolsas de estudo para
estudantes que quisessem estudar medicina, engenharia e direito fora do Piauí (1846);
implantação em 13 de setembro de 1859, do cargo de Diretor Geral da Instrução Pública, que
teve como primeiro ocupante o Dr. Umbelino Moreira de Oliveira Lima. Antes da criação
deste cargo, existia um diretor de Instrução em cada comarca e a criação Companhia de
Aprendizes Marinheiros da Parnaíba pelo Decreto nº 5.309 de 18 de junho de 1873 que
iniciando suas atividades somente um ano depois em 1º de junho de 1874. A Companhia de
Aprendizes Marinheiros ganhou certa regularidade com o Aviso do Ministério da Marinha de
12 de julho de 1883, autorizando o Capitão do Porto a contratar professores de instrução
primária ao ordenado de Rs 60$000 (sessenta mil réis) mensais para a Companhia de
Aprendizes Marinheiros da Parnaíba, que em 9 de abril de 1884, ganhou novas instalações em
edifício vasto e com boas acomodações passando, também, a abrigar a própria Capitania do
Porto.
Mas, os esforços do poder público pouco contribuíram para mudar a realidade
educacional do Piauí. Em relatório que o Presidente Dr. Raimundo Vieira da Silvia escreveu
quando passou a administração da província, em 27 de junho de 1889, faltando pouco mais de
quatro meses para findar o período imperial, ao segundo vice-presidente, Dr. Firmino de
Sousa Martins, ficou patente a situação da educação piauiense: “Aqui não há mestres, nem
discípulos [...]. Os professores primários são, em geral, aqueles que não podendo conseguir
65
mais vantajosa colocação, refugiam-se no magistério, para o que, todavia, não têm
aptidão”.(NUNES, op.cit, p 315)
Compondo esse mesmo relatório estava a peça escrita pelo Diretor Geral da
Instrução, que foi enfático:
Nas primeiras décadas do século XIX, a situação educacional era caracterizada pelo
desânimo, negligência, manifestação de vários e graves problemas constantes da educação
piauiense denotando a ausência de uma política educacional proposta em leis, mas que
deveria ser assumida pelo governo provincial, para efetivar maior qualidade de ensino e com
resultados que pudessem contribuir para uma melhor sistematização do ensino na Província
do Piauí.
O ponto de partida de iniciativas mais ousadas do poder público piauiense, foi uma
reforma no ensino público empreendida pelo presidente da província, Zacarias Goes e
Vasconcelos (28.06.1845/07.09.1847), que culminou com a criação, em 04 de outubro de
1845, através da Lei Provincial nº 198, do Liceu Provincial, com sede em Oeiras. Esse Liceu
era um estabelecimento de educação secundária que congregava em um mesmo espaço sete
cadeiras: Latim, Francês, Inglês, Geometria, Aritmética, Geografia e História, Retórica e
Poética, Filosofia racional e moral. O curso teria uma duração de três anos. Na prática, as
atividades educativas do Liceu, só se efetivariam em 1848, somente com a cadeira de Latim.
As matrículas nas diversas outras cadeiras eram livres, por falta de um prédio próprio para
abrigar o Liceu, o que ocasionava uma distribuição de matrícula por conteúdos, levando a
uma disparidade no número de alunos entre as diversas cadeiras, como ficou registrado no ano
de 1849: 30 alunos na cadeira de Latim, 17 em Francês, 4 em Filosofia e 6 em Geometria.
Tentando solucionar o problema e reunir todos os alunos mestres em um mesmo edifício,
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Zacarias Goes, com autorização da Câmara Municipal de Oeiras adquiriu o prédio da cadeia
velha e mandou reformá-lo para abrigar o Liceu. Porém, durante as reformas uma ala do
edifício desmorona e a ideia de acomodar o Liceu na cadeia velha é abandonada e as aulas
continuaram a ser ministradas nas residências do professores.
Porém, a existência do Liceu Provincial na segunda metade do século XIX foi um
tanto conturbada.
O novo presidente da Província, José Antônio Saraiva (07.09.1850 – 12.03.1853),
questionava quanto aos frutos e a importância do Liceu Provincial. Em sua primeira
Mensagem à Assembléia Legislativa (03.07.1851), Saraiva foi enfático: “Nem uma só aula
contava com mais de três discípulos. [...] Pode-se dizer que o Liceu existia apenas na
Legislação e que só sabia de sua existência quando seus empregados iam receber seus
vencimentos”.
Ainda sediada em Oeiras, o presidente da província, José Antônio Saraiva, alugou uma
casa, comprou a mobília necessária e instalou o Liceu em um único lugar.
Para que não continuasse a instrução secundaria em total abandono, aluguei a casa
de D. Mariana Agelica de Menezes Castelo Branco na rua do hospital, Rs 14$000
(quatorze mil reis) mensais, mandei prontificá-la por conta dos mesmos alugueis,
comprei a mobília indispensável, e para ali passei todas as aulas, que se acham
regularmente trabalhando desde o dia 18 de outubro do ano passado [...] (PIAUÍ-
Fala do Presidente da Província - 1851)
professores.
Na administração do Presidente Frederico de Almeida Albuquerque (01.12.1855 –
07.03.1857), as obras do internado continuavam e já haviam consumido somente na
administração de Frederico Albuquerque Rs. 3:090$000 (Três contos e noventa mil réis).
Apesar do esforço governamental para sua conclusão, o Liceu Provincial, contava apenas com
32 alunos matriculados em seis cadeiras.
O Dr. João José e Oliveira Junqueira que governou a província entre 10 de junho de
1857 a 30 de dezembro de 1858, julgava o internato um mero luxo, e as matrículas no início
de sua administração revelaram -se um desastre: 5 alunos matriculados em Língua Nacional e
apenas um nas disciplinas de Filosofia, Retórica, Geografia, Latim e Francês. Assim,
Junqueira empenhou-se em melhorar esse número e conseguiu-se para o ano de 1858 a
matrícula de 60 alunos.
Com a alegação de que a escola apresentava uma frequência extremamente irregular
de seus alunos, o governo tomou a decisão de extinguir o Liceu Provincial, em 1º de agosto de
1861, através da resolução n.511, quando respondia pela presidência da província Antônio de
Brito Sousa Gaioso.
Pereira de Alencastre em 1855, portanto, seis anos antes da extinção do Liceu, já
denunciava:
Criou-se depois o Liceu, porém esse estabelecimento literário de que tão belos frutos
se esperava – nenhum bem tem trazido à Província, também porque aqueles que a
têm governado depois da sua criação, nunca lhe deram a importância merecida,
deixando-o sempre entregue à sua desorganização. (1981, p. 50).
O Liceu foi reaberto, ainda no período imperial, no ano de 1867, sem contar com um
prédio próprio e continuando com uma quantidade reduzida de alunos. Por isto, os
governantes voltaram a ter a idéia de uma nova extinção, porém, isto não aconteceu,
prosseguindo assim, a sua difícil trajetória. (VASCONCELOS, 2009, p. 30) 68
para os alunos que queriam praticar e assumir a carreira do magistério com a extinção da
Escola Normal. Em 1869, o currículo foi ampliado com a introdução da cadeira de Filosofia
Racional. Em 1871, ganha as disciplinas de Aritmética, Álgebra, Geometria, Filosofia e
Retórica. Em 1877, é suprimida a cadeira de Inglês, que voltou ao currículo com nova
reforma em 1885. Reforma curricular procedida em 23 de julho de 1880, que criou uma
cadeira única de “Língua Nacional e Pedagogia” e em 1883 foram separadas em cadeiras
distintas, ficando, pela reforma, empreendidas em 1886, somente à cadeira de Língua
Nacional.
Só terão direito aos socorros públicos os órfãos desvalidos? Quantas meninas, sem
pais e mãe, não se arrancariam a miséria, e finalmente a prostituição, se ellas
também fossem amparadas e socorridas? Eu não posso, Senhores, deixar de
recommendar á vossa proteção aos órfãos do Piauhy, pois que podereis ate,
cuidando da educação de algumas, habilitar boas mestras para as escolas do sexo
feminino. A situação de uma órfã, que não vê diante de si, senão a maior miséria, ou
aviltamento, é digna de vossa consideração. [...]e pois, Senhores, applicai alguma
cousa em beneficio de vosssas patrícias, que tem direito á toda a vossa humanidade
(PIAUHY, FALA DO PRESIDENTE DA PROVINCIA..., 1851).
O resultado concreto desse apelo foi a fundação da “Casa das Educandas” criada pela
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A Escola Normal do Piauí foi outra escola que não ficou livre dos caprichos dos
governantes. Criada pela Lei Provincial n. 565, de 5 de agosto de 1864, no governo do Dr.
Franklin Américo de Meneses Dória, com o objetivo de formar mestras para ensinar as
primeiras letras de preferência no magistério público, tão carente de mão de obra
especializada. Diante dos preparativos e dos discursos em torno da fundação do novo
70
educandário tudo indicava que a escola normal teria melhor sorte. Em 6 de setembro de 1864,
o presidente da Província forneceu os regulamentos da nova escola e nomeou seus primeiros
professores. Mas, o início das atividades só ocorreriam praticamente dois anos depois, em 3
de fevereiro de 1866, com 23 alunas matriculados na modalidade de externato.
Três anos depois, em 09 de outubro de 1867, a Escola Normal foi extinta por Lei
Provincial de nº 599, no governo de Adelino Antônio de Luna Freire. Um dos motivos
apresentado para o fechamento do estabelecimento que cuidava da formação de professores
foi a instituição no governo de Franklin Américo de Menezes Dória, de uma Jóia
(contribuição pecuniária) de RS.80$000 (oitenta mil réis) por ano que deveria ser paga pelas
alunas em quatro prestações. Luna Freire se justifica: “Não se matriculou um só indivíduo,
sendo o curso freqüentado por ouvintes” (Relatório à Assembléia em 09.09.1867).
Ocupava a Presidência da Província, Manoel do Rego Barros Souza Leão, em 29 de
agosto de 1871, quando a Escola Normal foi recriada, por Lei Provincial de Nº 753, como
anexo ao Liceu, com duração de três anos, com o seguinte currículo: 1º ano-Língua Nacional
e Pedagogia; 2º ano - Aritmética, Geometria Plana e Sistema Métrico Decimal; 3º ano-
Geografia, História Pátria e Sagrada.
Um ponto curioso na Resolução que recriava o Curso Normal era o que determinava,
que qualquer egresso desse curso ocuparia, por nomeação, cadeiras no magistério
independente de concurso e, também, teriam preferência na ocupação de cargos públicos.
Em 11 de junho de 1874, em função da Lei Provincial n 858, no governo de Adolfo
Lamenha Lins, o Curso Normal foi novamente extinto. Sem dúvida com a extinção do Curso
Normal para formar professores, a educação piauiense sofreria prejuízos significativos na
educação pública, para onde se destinaria a maioria das novas professoras formadas.
Analisando o prejuízo que fora para a educação na Província, o fechamento do Curso
Normal, a Assembleia Legislativa resolveu por Lei de n. 1.062, de 11 de junho de 1882,
reinstalar a Escola Normal do Piauí, no governo de Miguel Joaquim de Almeida Castro. Esse
mesmo governador, interessado no funcionamento da Escola, forneceu em 27 de julho
daquele mesmo ano, os regulamentos da nova escola, possibilitando sua instalação em 11 de
agosto de 1882.
O curso seria ministrado em apenas dois anos, para ambos os sexos, com um currículo
bem mais enriquecido que o que foi ministrado em sua segunda fase de existência. Vejamos:
1º ano – Gramática Nacional, Recitação e Composição, Instrução Religiosa, Doutrina e
História Sagrada (Antigo e Novo Testamento), Aritmética, Geometria Elementar, Geografia
Elementar do Brasil e Piauí, Costura usual, Trabalhos com Agulhas e Corte de roupa branca.
71
funcionamento àquele que seria o mais pungente dos estabelecimentos educacionais do Piauí.
Nas primeiras décadas do século XX, as aulas de ensino primário já não eram mais
lecionadas e todas as instalações encontravam-se em completo abandono.
Parnaíba, que percebe duzentos mil réis [...] É o subsídio literário, conforme o
cálculo médio a que se procedeu pelas últimas entradas do mesmo rendimento, a
quantia de novecentos e oito mil cento e onze réis (908$111) [...] Não há nesta
Província outro algum imposto destinado em Favor das Escolas".
Com a lei de 15 de outubro de 1827, tentou-se implantar uma das primeiras políticas
nacional de instrução, quando, a citada lei determinou que os povoados e vilas mais populosas
de todas as províncias, nelas fossem criadas escolas destinadas à instrução da população livre,
no mínimo com uma escola para cada sexo e estipulou o ordenado dos professores em Rs
300$000 ou Rs 500$000 (mil réis) conforme a “carestia do lugar” .
Entretanto, no corpo da lei, nenhuma fonte nova de recurso ficou assegurada para esse
desafio, que era levar instrução primária a todas as crianças do império. E como dar cabo a
essa determinação na província do Piauí, onde a arrecadação do Subsídio Literário não
chegava a um conto de réis, possibilitando remunerar no máximo três professores de
primeiras letras ?
O Ato Adicional de 1834, editado no período regencial, que criou as polícias militares
e as assembleias legislativas provinciais, responsabilizava, também, as províncias pela oferta
de educação primária e secundária, ao tempo que autorizava a criação de um novo imposto
sobre vendas e consignações (IVC) efetuadas nas províncias. “Não eram boas as condições
financeiras da Nação. E o orçamento do Piauí não proporcionara recursos para a solução de
seus problemas especialmente com a criação da polícia e da Assembleia legislativa cujas
despesas juntar-se-iam à que já fazia seu erário” (NUNES Op. Cit 2007)
Elevadas as despesas da Província com a criação desses novos organismos
(Assembleia Legislativa e Força Pública), tem-se, observando na análise que se faz dos
orçamentos públicos da Província, o exato tratamento que recebia a instrução pública no
Piauí: Orçamento de 1836/1837 recursos destinados para a Força Pública Rs 41:000$000
(quarenta e um contos de réis) . Para a Instrução Pública Rs 10:600$000 ( dez contos e
seiscentos mil réis). Orçamento de 1837/1838 recursos destinados à Força Pública Rs
47:400$000 (quarenta e sete contos e quatrocentos mil réis) .Para o Ensino Rs 11:250$000
(onze contos e duzentos e cinquenta mil réis). E essa disparidade se repete nos orçamentos da
Província por todo o período imperial.
Essa contenção de recursos para a educação era refletida diretamente na sala de aula,
onde pela Resolução n.84, de 17 de setembro de 1838, a Presidência da Província autorizava
entregar anualmente aos “meninos” mais carentes o seguinte material: “seis resmas de papel
almaço, quatro dúzias de lápis, quinhentas penas e cinco aparelhos de tinta”.
75
Zacarias de Góis e Vasconcelos, que governou o Piauí entre os anos de 1845 e 1847,
tentou convencer a Assembleia Provincial a criar uma taxa escolar inspirada no School fund
dos norte-americanos. Indicando as fontes tributárias de que deveriam emanar os recursos
para “salvar da medonha crise da ignorância o futuro dos nossos descendentes”. Em seu
pedido à Assembleia, Zacarias analisa o mérito dessa medida, seus efeitos na América do
Norte e até mesmo em outras províncias do império, e as virtudes da educação, pois “à
medida que se elevam as despesas com a instrução decrescem os gastos com a polícia e a
justiça” (NUNES, 2007, p 328). O discurso de Zacarias de Gois não convenceu seus colegas
de parlamento e nada foi feito no sentido da criação de um fundo escolar.
No governo de Franklin Américo de Menezes Dória (1864 – 1866), a presidência da
Província, por força da Lei Provincial nº 565 de 5 de agosto de 1864, reabriu a Escola Normal
para o sexo feminino em 3 de fevereiro de 1865, mas por falta de recursos para mantê-la,
instituiu uma Jóia de Rs 80$000 (oitenta mil réis) por ano que deveria ser pagou pelo aluno ou
responsável em quatro prestações. Essa nova fase da Escola Normal foi efêmera: Em 1867, o
presidente da Província Luna Freire encerra novamente as atividades da escola, alegando em
Mensagem que enviou à Assembléia Legislativa em 9 de setembro, que “não se matriculou
um só indivíduo, sendo o curso frequentado apenas por ouvintes”. Apesar do governo da
Província ter gasto com este estabelecimento entre os anos de 1865/1867, Rs 7:400$000 ( sete
contos e quatrocentos mil réis) .
A oscilação de matrículas e de número de estabelecimentos públicos era uma
constante nos governos provinciais do Piauí, como se pode observar no quadro que segue
retratando o momento de 1870, comparando-o ao que trazia a realidade de 1864:
QUADRO II
BALANÇO DA EDUCAÇÃO DO PIAUÍ EM 1870
Montante
Estabelecimentos de Ensino
Escolas Primárias de despesas
Secundário
com Ensino
PROVÍNCIA Público
Pública Particular Pública Particular (Em mil
réis)
N° Alunos N° Alunos N° Alunos N° Alunos 76
Piauí 47 1.174 2 25 3 57 25 386 36:400$000
Fonte: ALMEIDA, Jose Ricardo Pires de .INSTRUÇÃO PÚBLICA NO BRASIL – História e Legislação (1500
– 1889) p.120
76
Assim, justificava as cobranças das taxas escolares, José Ricardo Pires de Almeida,
77
em sua clássica obra de 1889, “Instrução Pública no Brasil”, na qual defende a participação
dos pais no financiamento do ensino, manutenção das escolas e pagamento de professores.
Formas alternativas de financiamento do ensino tinham de ser criadas diante das
reduções drásticas observáveis nos orçamentos públicos do Piauí para com a educação: em
1874 foram gastos Rs 48:961$543 (quarenta e oito contos,novecentos e sessenta e um
mil,quinhentos e quarenta e três réis), contra Rs 38:175$180 (trinta e oito contos, cento e
setenta e cinco mil,cento e oitenta réis) que estavam orçados. Portanto, as subscrições
públicas (listagem com doações de particulares oferecidas aos governos da província),
doações, loterias, multas cobradas aos professores e pais “Os pais, tutores, curadores ou
protetores que tenham consigo filhos de mais de sete anos, sem impedimento físico ou moral
e não lhe derem ensino de primeiro grau serão passíveis de uma multa de 20.000 réis, segundo
as circunstâncias.” A primeira condenação será duplicada em caso de reincidência. (Artigo 64
do Regimento da Educação de 17 de fevereiro de 1854. Almeida 2000 p.139) e taxas cobradas
às escolas particulares estipuladas em: Rs 25$600 para abrir ou dirigir uma escola – Rs
12$800 licença anual – Rs 10$000 para ministrar matéria do ensino primário (ALMEIDA.
2000), se constituíram nos principais mecanismos de financiamento da educação no Piauí e
nas demais províncias brasileiras.
O quadro que segue, possibilita analisar o montante das despesas efetuadas pela
província do Piauí, no último quartel do século XIX:
QUADRO III
DESPESAS COM A INSTRUÇÃO PÚBLICA DO PIAUÍ, DE 1874 A 1890
PROVÍNCIA 1874-1875 1875-1876 1877-1878 1878-1879 1879-1880 1880-1881
Réis Réis Réis Réis Réis Réis
38:121$163 42:293$257 52:854$018 37:121$632 34:196$683 38:175$190
1881-1882 1882-1883 1883-1884 1884-1885 1885-1886 1886-1887
Piauí 45:419$134 61:802$883 53:369$476 53:500$000 53:980$750 54:540$000
1888 TOTAL DOS RECURSOS GASTOS PELA
PROVÍNCIA
54:540$000 3,817:476$216
Fonte: ALMEIDA, Jose Ricardo Pires de .INSTRUÇÃO PÚBLICA NO BRASIL – História e Legislação (1500
– 1889) p.293
78
O que se percebe é que não houve um aumento nos investimentos com a educação.
Os valores se mantiveram reduzidos e insuficientes para atender às reais necessidades de um
78
CAPÍTULO VI
AS INICIATIVAS PARTICULARES NO PIAUÍ IMPERIAL
secundário na fazenda Boa Esperança, nas proximidades da vila de Jaicós, pelo Padre Marcos
de Araújo Costa, proprietário da referida fazenda, onde sua vocação para o magistério
manifestou-se em toda sua plenitude, demonstrando ser uma herança genética, pois seu pai,
Sargento-Mor Marcos Francisco, mantivera na mesma fazenda um educandário, no qual
estudara Manoel de Souza Martins, primeiro governador da Província do Piauí imperial.
A escol,a fundada pelo Pe. Marcos Araújo Costa, funcionou em regime de internato
gratuito por mais de trinta anos em pleno sertão piauiense, com uma média anual de vinte e
cinco crianças e jovens que recebiam casa e comida, só fechando suas atividades em 1859,
nove anos após a morte de seu fundador, ocorrida em 4 de novembro de 1850.
A rotina das tarefas diárias desse sacerdote estava marcada não somente dos afazeres
religiosos mas, também das atividades de instrução escolar. Era nesse horário que
ele transmita os saberes e a cultura escolar aos seus alunos tornando-se, assim, um
grande mestre de almas e da sofrível tarefa de educar a juventude piauiense. Após
estudarem na Escola Boa Esperança, os jovens ingressavam nos serviços da
administração da província e nas faculdades do Ensino Superior. (SOUSA, 2009, p.
70)
Este colégio teve funcionamento efetivo e ininterrupto por trinta anos, pois só
fechou com a morte do seu idealizador e proprietário em 1850. Pode, portanto, ser
considerado como a primeira escola a existir de fato, e o Padre é considerado por
muitos dos seus coestaduanos como o primeiro mestre-escola do Piauí.
poucos, havia muitos anos que o Padre Marcos mantinha em sua casa um internato gratuito no
qual permaneciam vinte rapazes até adquirirem noções regulares da Língua Latina e
elementos de Filosofia e Matemática. Era o padre um perfeito erudito e possuía uma
biblioteca bastante copiosa em livros clássicos e filosóficos” (NUNES,2007 p.47)
Padre Marcos fora uma das figuras públicas das mais expressivas nas primeiras
décadas do século XIX. Entre as muitas atividades assumidas pelo sacerdote encontramos: a
construção da Igreja de Jaicós, que chamou às suas custas as despesas de sua construção, só
posteriormente recebendo auxílio de particulares e do governo para sua conclusão; restaurou o
Hospital de Caridade de Oeiras e construiu a Casa da Câmara de primeira capital piauiense.
Pe. Marcos ainda serviu ao Piauí como secretário do primeiro governo eleito da província
(20/09/1824 a 01/05/1825) e como vice Presidente da Província em dois mandatos (1825-
1826 e 1826-1829) e foi deputado quando da implantação de Assembleia Provincial em sua
primeira legislatura (1835- 1836).
A próspera vila, que abrigava a primeira escola regular do Piauí, recebia vários
jovens pobres ou ricos advindos de qualquer localidade. O padre Marcos dedicou-se
a educá-los sem a cobrança de nenhum provento, gastando inclusive seus bens
patrimoniais. Muitos desses jovens que estudaram na fazenda Boa Esperança
seguiram carreira de desembargador, advogado, servidor público, entre outras. A
escola Boa esperança era motivo de orgulho para o Piauí no período em que era
bastante valorizada pela população da época – por não ser apenas uma escola de
primeiras letras, mas também de ensino de latim, aritmética, francês, retórica,
filosofia e teologia; o que possibilitava a alguns jovens mais abastados o sonho de
ingressar numa faculdade ou então ocupar altos cargos. Alimento, conforto, dinheiro
e instrução eram a combinação perfeita para os mancebos num Piauí em que a
instrução era bastante atrasada. (SOUSA, 2009, p. 51).
Com uma matrícula inicial de 25 alunos nos cursos de instrução primária e secundária,
o Colégio Nossa Senhora das Dores trabalhava na primeira fase do ensino primário com
leitura, caligrafia, princípios de moral e religião, sistema métrico decimal, noções de
gramática portuguesa e trabalhos com agulhas. Na segunda fase do primário estudava-se:
Gramática portuguesa, Aritmética, Noções de Geografia e História. O Curso secundário, com
um quadro de professores formado de significativos nomes da elite intelectual teresinense,
apresentava um diversificado currículo que incluía: Português, Latim, Francês, Inglês,
Geometria, Álgebra, Aritmética, Geografia, História, Filosofia, Música, Escrituração
Mercantil, Retórica e Poética.
Por meio do discurso inaugural da Escola Nossa Senhora das Dores, é possível
perceber que havia uma necessidade constante de proporcionar ensino qualificado os jovens
piauienses e de possibilitar chances para que pudessem participar de quadros efetivos da
administração pública.
85
8- CAPÍTULO VII
PANORAMA EDUCACIONAL NA PRIMEIRA REPÚBLICA
O panorama educacional no final do século XIX e das três primeiras décadas do século
XX, no Piauí, foi marcado por influências do poder político sobre a instrução pública através
de um forte controle ideológico e do “assédio moral” sobre os professores e diversas
arbitrariedades cometidas em nome de acomodações políticas ao regime republicano, além de
consecutivas e desconexas reformas educacionais.
se sucedem no Piauí, ignoravam essa realidade. Gabriel Luís Ferreira em seu curto governo
de maio a dezembro de 1901, baixou em 08 de junho de 1901, o Decreto de nº 211, que
mandava adotar no Liceu Piauiense o Regulamento do Ginásio Nacional (Colégio Pedro II).
Em 1906, novamente é frustrada a tentativa de implantação de uma Escola Normal no
Piauí. A Lei Nº 419, de 13 de julho de 1906, que regulamentava o ensino primário no Estado,
contemplava, também, a criação de uma Escola Normal. E durante todo o governo de Álvaro
de Assis Osório Mendes (1904-1907), tal empreendimento não saiu do papel.
Uma das mais significativas reformas da instrução pública primária e secundária no
Estado do Piauí na “República Velha”, deu-se no governo de Anísio Auto de Abreu (1908-
1909), que através da Lei nº 527, de 06 de julho de 1909, instituiu: a obrigatoriedade da
frequência escolar das crianças do sexo masculino de 7 a 14 anos e sem limite de idade às do
sexo feminino e também dos jovens matriculados no ensino secundário; obrigava a assinatura
do ponto dos professores que recebiam dos cofres estaduais; concedia subvenção financeira as
escolas particulares de ensino primário e secundário nos municípios onde não existissem
escolas públicas dos mesmos níveis; criava nos municípios Comissões de Educação, formadas
pelo Juiz de Direito, o Intendente (prefeito), o Delegado de Polícia e o professor mais antigo
da localidade (Secretário da Comissão), para em reuniões anuais (mês de novembro), ouvir
pais e responsáveis por crianças menores e proceder o recenseamento dessas crianças em
idade escolar; criou a Delegacia Geral do ensino com jurisdição estadual e as Inspetorias
Municipais com jurisdição local; abriu a possibilidade de construção de Grupos Escolares nos
municípios que tivessem no mínimo 4 escolas primárias isoladas (funcionando na casa do
professor), nascendo a simbólica figura Grupo Escolar que se constituirá no espaço
educacional por excelência da grande maioria dos municípios piauienses.
Não havia decorrido um ano das medidas acima citadas e a educação estadual se ver
obrigada a tentar ajustar-se a um novo Regulamento Geral da Instrução Pública, nascido do
Decreto nº 434, de 1910 e consolidado em forma de lei em 22 de junho do mesmo ano, no
governo de Antonino Freire da Silva (15/03/1910 á 1/07/1912), que entre muitas medidas
regulamentadas destacavam-se: o estabelecimento dos princípios gerais para o desempenho
do ensino público no Estado (liberdade, laicidade e gratuidade); definição da estrutura legal,
administrativa e pedagógica da educação primária, secundária, normal e profissional;
assegurava, mediante fiscalização do Estado, liberdade para particulares e associações
ministrarem o ensino em qualquer nível ou ramo; valorização da Educação Moral e Cívica
como conteúdo curricular; entregava aos municípios a responsabilidade pela oferta e
manutenção do ensino primário e ao Estado o ensino secundário ministrado exclusivamente
88
no Liceu Piauiense que concedia o grau de Bacharel aos concludentes; criava o Conselho
Superior de Instrução (com jurisdição estadual) e os Conselhos de Instrução nos municípios
formados pelo Juiz de Direito, Intendente Municipal, Promotor Público e por dois pais
representado as famílias com filhos matriculados em escolas públicas. O Regulamento e Lei
do Ensino de 1910, incorreram no mesmo erro de tentar impor uma grade curricular
importada da capital da República ou de centros educacionais mais desenvolvidos, quase
sempre inexequíveis e distante de nossa realidade, bem como não citar as formas de
financiamento dessas medidas implantadas.
Havia um distanciamento significativo entre a normatização do ensino e a prática
executada nas escolas nos municípios do interior do Estado. Currículos e programas,
estabelecidos por leis e decretos emanados do governo estadual, quase sempre inexequíveis
por serem cópias de currículos do Ginásio Nacional (RJ) e por não encontrar nas cidades do
interior, pessoas qualificadas para ministrar as disciplinas e por uma estrutura administrativa
incapaz de acompanhar a aplicação dos currículos e procedimentos didáticos. A prática
educativa era feita conforme convinha ao professor.
A escola pública jamais falhou na sua finalidade, é certo, mas nas cidades do
interior, longe das vistas da fiscalização oficial, ela não chegava a alcançar a média
dos resultados que deveria produzir. Não se veja nesta declaração uma acusação do
nosso velho leigo antanho. Quem chegou a freqüentar uma daquelas escolas
primárias, ainda se recordará da falta de instalação adequada, absoluta carência de
material escolar, de conforto, de ar, de luz e de tanta coisa mais. O governo não dava
casa nem mobiliária; o professor tinha que instalar mal a sua família, para dividir
com a escola algumas peças de sua residência e de seu mobiliário escasso. Daí as
falhas que se poderia apontar e que contribuíam sem dúvida para a ascendência que
tinham sobre a escola pública as escolas particulares. (CORREIA, 1945, p. 174).
imortalizada nas páginas de “Memórias” de Humberto de Campos, que com maestria descreve
a escola, sua professora, seu método e seus conteúdos:
Dirigia-a uma senhorita que era quase menina, a qual, ainda hoje, parece mais moça
do que eu. Não sei, ao certo, o prenome. Davam-lhe o tratamento de Sinhá Raposo.
Era miúda, gentil, graciosa, de cor moreno-claro. Não me parece que se preocupasse
muito com os alunos. Vivia sempre para o interior da casa, no qual residia a família,
e para onde levava minha irmã pequena, a quem dava doces e outras gulodices. Não
obstante isso, a escola era freqüentadíssima, principalmente por gente pobre, do
bairro dos Tucuns. Tenho, ainda, nítido, na memória, o aspecto da escola pública e
humilde primeira colméia que meu espírito fabricou, fora de casa, a sua primeira
gota de mel. Sala grande, e baixa, de chão de tijolo, com três janelas abrindo para a
praça do mercado. Em uma das extremidades, à esquerda, um estrado baixo, com a
mesa da professora. Diante dela, paralelamente, os bancos de madeira, estreitos e
altos, com a meninada de ambos os sexos, e todas as cores de que se constituía a
população. Comprimidos os pés sem tocar o solo, a cartilha ou a tabuada nas mãos, a
criança se esgoelava, com toda a força dos pulmões, ao mesmo tempo em que
balançava as penas no mesmo ritmo:
Um b com a, b-a ba
Um b com e, b-e bé,
Um b com i, b-i bi,
Um b com o, b-o bó
Um b com u, b-u bu.
E mudando a cadência, seguidos:
Ba, bé, bi, bó, bu
Quando era tabuada, a tonalidade ainda era mais triste, e o estudo variava, de acordo
com a operação:
Dois e ummm três,
Dois e doooois quatro,
Dois e trêees cinco,
Dois e quaaatro seis,
Dois e ciiinco sete,
Dois e seeeis oito,
Dois e seeete nove,
Dois e oooito dez,
Novisfora um.
Os mais adiantados tinham cantiga diferente, e mais alegre, embora mais
complicada:
Cinco “vez” cinco vinte e cinco,
Novisfora sete.
Regra de vinte vão dois;
Ciinco “vez” seis trinta,
Novisfora três.
Regra de trinta vão três.
[...] A aula começava às dez horas, e terminava às duas. Ao meio-dia, havia, no
entanto, uma distração: púnhamo-nos todos de pé, e cantávamos, ou, melhor,
berrávamos, o Hino ao Trabalho, de Castilho:
Trabalhai, meus irmãos, que o trabalho
Nos dá vida, saúde e vigor,
E da orquestra da serra e do malho
Brotam hinos, cidades e amor”. (CAMPOS, Op. Cit. 160-63).
A Lei Estadual nº 642, de 17 de julho de 1911, elevou para quatro anos o tempo de
formação da professora normalista e criou a Escola Modelo para a prática pedagógica das
professorandas. O currículo da Escola Normal ficou assim estabelecido: 1° ano: português,
francês, aritmética, geografia, desenho, musica, trabalhos manuais e ginástica; 2° ano:
português, Frances, aritmética e álgebra, geografia e cosmografia, pedagogia e metodologia,
física e meteorologia, desenho, musica e trabalhos manuais; 3° ano: português, Frances,
geometria e trigonometria, física e química e meteorologia, historia natural, (zoologia e
botânica), arboricultura, horticultura, jardinagem, pedagogia,metodologia e educação moral e
cívica, desenho, musica e trabalhos de agulha; 4° ano: literatura, história natural, mineralogia
e geologia, economia rural e higiene, historia da civilização e do Brasil, pedagogia e
metodologia, economia domestica, educação moral e cívica.
Esse currículo sofreu seguidas modificações em função da Lei nº 863, de 24 de junho
de 1916 no governo de Miguel de Paiva Rosa (1/07/1912 a 1/12/1916); do Regulamento n º
689, de 10 de novembro de 1917 e o do Decreto n º 708, de 2 de outubro de 1918 do governo
de Eurípedes Clementino de Aguiar (1/07/1916 a 1/07/1920); do Decreto nº 771, de 6 de
setembro de 1921 e da Lei n° 1027, de 3 de julho de 1922 ambos do governo de João Luiz
94
No caso do Liceu do Piauí, ele esteve à mercê de todas as experiências por que
passou o ensino secundário no país. Nesse período (República Velha), as reformas
foram tão freqüentes, que algumas nem chegaram a ser implantadas e já era
substituídas. (QUEIROZ. 1992, P.108)
Todos os esforços governamentais não foram, na República Velha (1889 - 1930), capazes
de dotar o Liceu Piauiense de uma matrícula significativa, conforme é possível comprovar no
quadro a baixo:
Pode-se perceber pela análise da tabela acima que a instrução pública no Piauí
manteve-se oscilante, em grande medida por causa das políticas governamentais que pouco ou
quase nada contribuíram com investimentos na instrução pública. Embora o Liceu Piauiense
fosse a referência em instrução pública, o próprio estabelecimento não se mantinha imune das
crises que afetava a sociedade de modo geral.
Como claro exemplo dessa tensão na instrução pública piauiense basta observar a
quantidade de alunos matriculados por ele letivo naquele estabelecimento de ensino. Para Inêz
Vasconcelos (2009, p.44):
97
Aos filhos das camadas mais humildes da população era necessário oferecer, além da
instrução, um ofício. Por isso, desde 1849, quando foi criado na capital Oeiras, o
Estabelecimento dos Educandos Artífices, várias tentativas, se seguiram patrocinadas pelo
poder público, marcadas por fechamentos e reaberturas daquela escola profissionalizante no
Piauí.
Criado em 1849, o Estabelecimento de Educandos Artífices foi extinto em 1873 e
reaberto no mesmo ano. Extinto novamente em 1875. Reaberto por força da Lei Estadual nº
255, de 13 de junho de 1900 com a denominação de Liceu de Artes e Ofícios nem chegou a
funcionar. Reaberto em janeiro de 1910, com o nome de Escola de Aprendizes Artífices,
agora mantida pelo governo federal, em função de Decreto nº 7.566, de 25 de setembro de
1909, apresentando maior solidez, por tratar-se de um programa nacional.
A função desta escola estava bem explícita no decreto de criação, em atender: “aos
desfavorecidos da fortuna “e afastar da ociosidade ignorante, escola do vício e do crime”,
possibilitando condições para um: “indispensável preparo técnico e intelectual” com oferta de
cursos com seis anos de duração em tempo integral que envolvia além de disciplina de cultura
geral, oficinas de mecânica de máquinas, forja, serralheria, marcenaria, modelagem,
carpintaria, desenho técnico, ornamental e decorativo.
Essa escola, em 1918, estabeleceu critérios para o provimento, mediante concurso, de
cargos de magistério e de direção, e em 1921, em função de novas orientações do governo
federal, estabeleceu a necessidade da oferta de ensino elementar além de estabelecer uma
série de seções voltadas para a crescente indústria nacional (trabalhos em madeira, metal,
máquinas, instalações elétricas, artes gráficas, artes decorativas e eletrotécnica) ou outras que
atendessem vocações locais.
Modificada no início dos anos quarenta sua denominação para Escola Industrial do
Piauí (1941), posteriormente denominada Escola Industrial Federal do Piauí (1965); Escola
Técnica Federal do Piauí (1968); Centro Federal de Educação Tecnológica - CEFET (1997) e
98
no seu centenário (2009) modificado para Instituto Federal de Educação Tecnológica – IFET,
que hoje oferece diversos cursos técnicos profissionalizantes em nível de Ensino Médio e
Superior Tecnológico, com campi nos principais municípios piauienses: Teresina, Picos,
Parnaíba e Floriano.
O quadro abaixo revela o quanto foi difícil, pelo número de matriculas que a escola
apresentava a manutenção deste estabelecimento educacional nas primeiras décadas do século
XX.
O Colégio Santo Antônio (1900); o Atheneu Piauiense; a Escola Noturna Municipal (1902);
Escola Noturna 14 de Julho, fundada pelo Centro Proletário (1904); o Seminário Colégio
Diocesano (1906); A Escola de Agrimensura do Piauí 1910, reconhecido de utilidade pública
pela lei 578 de 09 de julho de 1910; O Colégio 24 de janeiro (1915); O Patronato Agrícola,
criado pela lei nº 1.199 de 19 de julho de 1928 , porém, concretamente não chegou a se
efetivar; o Colégio Sagrado Coração de Jesus; o Colégio e Internato Bento XV (1915) .
No entanto, toda a estrutura educacional do Estado, pública e particular, não
conseguia chegar a atender todas as crianças, e o déficit educacional era patente:
número significativo de escolas. Das principais cidades do Estado, nasceram escolas ligadas a
Ciclos Operários, Lojas Maçônicas, Ordens Religiosas, Comerciários e até ligadas as novas
religiões garantidas pela Constituição de 1891. A cidade de Parnaíba foi pródiga nessa
atuação, onde, para efeito de registro destacamos: O “Externato São José” de 1894 dirigida
por José Serra de Miranda; Em 1898, as senhoras Pepina Bastos e Severa Marques, fundaram
o Colégio Parnaibano, que encerrou suas atividade em 1903; Em 1906 fundou-se o Colégio
Diocesano por D. Geracinda Rosa Tavares e Silva. Em 1909, essa escola deixou de existir;
Em 04 de abril de 1907 foi fundado o Colégio Misto São Vicente de Paulo, mantido pelo
Conselho Particular das Conferências Vicentinas de Parnaíba; Em 25 de maio de 1907 é
fundado o Colégio Nossa Senhora das Graças pelas religiosas Irmãs dos Pobres de Santa
Catarina de Siena; Em 1908 o Dr. Olinto Gonçalves Amorim, fez a tentativa de implantação
de um ginásio, porém, de curta duração, denominado "Ginásio Parnaibano", Outro
estabelecimento de vida marcante foi o “Colégio Dom Joaquim”, fundado em 1909 e dirigido
pelos padres Olegário, Aarão e Bianôr Aranha; Dr. Antônio Godofredo de Miranda cria em
1914 o "Colégio Rio Branco"; a União Caixeiral fundada em 1918; Dr. Édson da Paz Cunha
fundou o “Colégio 19 de Outubro”; “Externato Santa Inês” de propriedade de Maria Rosa da
Fonseca, fundado em 1924 teve vida ativa até 1965; o Ginásio Parnaibano; A Escola Normal
(1927); o Instituto Nair Pinheiro; as Escola Maçônica 15 de Novembro e São João Batista e
o Colégio Nossa Senhora de Lourdes, foram iniciativas marcantes no universo educacional de
Parnaíba na Primeira República.
Sobre as diversas iniciativas particulares na educação, no “Livro do Centenário de
Parnaíba” (1945), Benedicto Jonas Correia, deixa o seguinte depoimento:
Em Parnaíba, além das muitas tentativas de criação de colégios, não podemos deixar de
ressaltar, as aulas ou escolas particulares que existiam nas residências de professores e
professoras, que foram marcantes para muitas gerações que conheceram somente esse tipo de
estabelecimento escolar, como foi a escola particular de D. Marocas Lima existente em 1892;
101
A Escolar Particular de Antônio Saraiva Leão de 1897; a Escola Particular do Professor José
Raimundo Serra que iniciou suas atividades no ano de 1900; O Monsenhor Constantino
Bozon e Lima, em 1910, passou a ministrar aulas particulares em espaço da Santa Casa de
Misericórdia onde era capelão. Destacamos, também, a ação educativa das professoras Maria
José de Pinho Raposo (Bibi Raposo); Zélia Mavignier Araújo; Dinorath Guimarães; Torquata
Araújo; Senhorinha Avelino; Maria Helena Oliveira e Raquel Magalhães.
O papel desenvolvido por esses professores, considerando época e local são de valores
inestimáveis e de uma importância inquestionável.
Num pleito de gratidão, Humberto de Campos, externa a importância desses mestres:
Algumas reflexões oportunas, que podem ser ajustadas à história e à vida de quase
todos os professores particulares, das educadoras sem títulos ou recompensas
oficiais, ‘Cornélias mães de cem Gracos’ que formam para o serviço da Pátria,
dando-se em holocausto quotidiano, centenas de cidadãos. [...] Votada à profissão
pela vocação pela necessidade, a retribuição depende, toda, do aproveitamento dos
alunos e da confiança dos pais. Severa e maternal, é ela, em muitos casos, a
formadora dos caracteres, desfigurados no domicílio. É ela, não raro, a verdadeira
mãe dos seus discípulos e a sua mais afetuosa conselheira. E é de imaginar o que
padecem esses corações afeiçoados, tendo de perder, pelo afastamento, cada ano,
uma dezena desses filhos adotivos, que lá se vão rumo dos ginásios ou, quando
pobres, para a luta surda, e sem glória, pela conquista do pão! Os moços, em geral,
são como os pássaros. Emplumada, a ave abandona o ninho que a aqueceu e o bico
que a alimentou. E nunca mais, no espaço imenso, reconhece a ave que, quando
implume, a agasalhou e protegeu. A professora primária, que nos faz digerir a
primeira semente do alfabeto ou nos ministra os ensinamentos rudimentares da
ciência, é essa ave generosa e magnânima, reveladora da imensidade e do mundo. É,
finalmente, a Mãe Preta do espírito, que nos dá o leite da primeira instrução”.
(CAMPOS, Op. Cit. 189-190).
As escolas públicas e primárias e propedêuticas até aqui mencionadas, criadas por leis
estaduais, municipais ou fruto da iniciativa particular, na realidade, funcionavam na casa do
próprio professor, de forma precária, ou em casa alugada para tal fim. A figura do Prédio
Escolar, planejado arquitetonicamente para o trabalho educativo, só vai ser conhecido em
Parnaíba em 1922, com a construção Grupo Escolar Miranda Osório, cuja construção do
prédio foi concluída em 15 de junho de 1922, no governo de João Luiz Ferreira. Em Parnaíba,
seguiu-se a construção do Grupo Escolar José Narcísio em 1928, quando administrava o
Estado Matias Olímpio de Melo e o Grupo João Cândido em 1º de julho de 1933 na
interventoria de Landry Sales Gonçalves.
Nos diversos municípios piauienses, a realidade não era muito diferente da relatada
sobre Parnaíba, segunda maior cidade do Estado. As iniciativas públicas eram extremamente
lentas, diante de um déficit escolar gritante, e repetiam-se os esforços particulares na
102
superação dos problemas educacionais. Merecem destaque no primeiro período republicano
(1889 – 1930), no interior do Piauí, as seguintes ações: Criação do Instituto Arco Verde
(1908), do Colégio Castelo (1913) e das Escolas Reunidas Padre Freitas todas em Piripiri. Em
Picos tivemos a criação do Grupo Escolar Coelho Rodrigues; em Floriano do Grupo Escolar
Agrônomo Parentes (1929), do Liceu Municipal e da Escola Normal de Floriano ambos de
1929. Em Corrente do Colégio Correntino Piauiense (1904) transformado posteriormente em
Instituto Batista Industrial (1920); do Grupo Escolar Costa Alvarenga em Oeiras (1929); do
Ginásio Amarantino (1927) e do Ateneu Rui Barbosa (1931) ambos em Amarante e do
Colégio Pedro II na cidade de Pedro II.
as matrículas chegando até a instituir multas aos pais que não matriculassem seus filhos no
ensino primário (Resolução nº. 267 de 29/06/1901).
O professor Martins Napoleão, Diretor Geral de Ensino do Piauí, em artigo, revela o
quadro até aqui descrito:
Verdade é, sem dúvida, que aquelas condições especiais derivaram sempre, ora do
limitado horizonte visual dos seus administradores; ora da pobreza, sovinice ou
indiferença do tesouro, contrárias ao espírito de iniciativa de alguns dirigentes; ora,
da própria limitação intencional dos serviços, dados, por achegas, entre rebarbas de
outros empregos, a cidadãos em vilegiatura de professores. Sobre isso, o descritério
partidarista, fábrica de escolas e prêmios de eleitores, com os docentes aliciados a
grau de parentes”. (Almanaque da Parnaíba – 1934- p. 57).
Naquele tempo, o Estado não dava prédio escolar, nem mesmo mobiliário. Que
milagres tinha que fazer então um professor estadual, para arranjar casa e tudo mais
que exigia o exercício do magistério! Lembro-me de ter recebido, certo dia, a visita
de um inspetor escolar a quem, depois de apresentar meus 80 alunos de pé uns,
outros sentados em toscos bancos de cedro sem encosto, pedi intercedesse junto ao
governo para melhorar aquele ambiente escolar. Respondeu-me que não era só a
minha escola que assim estava, e acrescentou: “Vá fazendo o que puder e não se
preocupe muito com isso. (CAMPOS, 1940: p.34).
9. CAPÍTULO VIII
O INÍCIO DA ERA VARGAS E A EDUCAÇÃO NO PIAUÍ
Com o início da Era Vargas (1930-1945), criou-se o Ministério de Educação e Saúde (1930),
tendo como primeiro dirigente, Francisco Campos, jurista e político mineiro, que no
ministério tem suas ações orientadas para a reforma do ensino, superior e secundário.
Diante de um quadro mais otimista em que se apresentava a educação no Piauí, ao
final do primeiro período republicano é, principalmente, após o processo revolucionário de
1930, intelectuais como Higino Cunha, Cromwell Barbosa de Carvalho, Luiz Mendes Ribeiro
Gonçalves, Mário José Baptista, Giovani Costa, Leopoldo Cunha, Francisco Pires de Gayoso
e Almendra, Cristino Castelo Branco e Álvaro Ferreira, começam a levantar bandeira, em
artigos na imprensa local, da necessidade urgente de se criar um curso superior no Piauí.
Levada a cabo, essa idéia concretizou-se quando, em 14 de abril de 1931, foi solenemente
instalada a Faculdade de Direito do Piauí, no antigo prédio da Assembléia Legislativa do
Estado.
[...] o título de doutor valia tanto quanto o de proprietário de terras, como garantia
para a conquista de prestígio social e de poder político. Era compreensível, portanto,
que, desprovida de terras, fosse para o título que essa pequena burguesia iria apelar,
a fim de firmar-se como classe e assegurar-se o status a que aspirava.
(ROMANELLI, 2001, p. 37).
Visto que seria impossível a faculdade manter-se como instituição privada, custeada
somente com as mensalidades dos alunos, em 11 de abril de 1938, pelos decretos de números
55 e 56, o interventor Leônidas Melo autorizou o Estado do Piauí a conceder subvenções
financeiras à Faculdade e doar o prédio de propriedade do Estado (Grupo Escolar Abdias
Neves) à rua Coelho Rodrigues, para a pioneira instituição de ensino superior do Piauí.
Terminado o prazo, em abril de 1942, para as adaptações como instituição superior
livre, foi a Faculdade inspecionada por uma comissão composta pelos seguintes membros:
Paulo de Assis Ribeiro, enviado do Ministério da Educação e Saúde; Argemiro Freire
Carneiro, diretor da Escola Industrial de Teresina e José Alves da Silva, Inspetor Federal
junto a Faculdade.
A referida Comissão enviou relatório conclusivo à Diretoria do Ensino Superior em
26 de abril de 1942. Após análise e ajustamentos necessários, a Faculdade recebeu
reconhecimento definitivo pelo Decreto-Lei de número 17.551, de 9 de janeiro de 1945,
assinado pelo presidente Getúlio Vargas.
Em 4 de dezembro de 1950, em função da Lei número 1.254, a Faculdade foi
federalizada, passando a integrar o Sistema Federal de Ensino sob responsabilidade do
Ministério da Educação e Saúde/Diretoria do Ensino Superior.
O Decreto-Lei número 5528, de 12 de novembro de 1968, abriu à expansão de novos
cursos superiores e a possibilidade real da criação da Fundação Universidade Federal do
Piauí- FUFPI, com autonomia administrativa, patrimonial, financeira e didático-científica.
No Congresso Nacional iniciaram-se, em 1969, os debates em torno do projeto de
criação da Universidade Federal do Piauí, que recebeu emenda do deputado federal, Francisco
das Chagas Caldas Rodrigues, incluindo a Faculdade de Administração do Piauí com sede em
Parnaíba, como o quinto curso necessário à criação da Universidade.
Em 1 de março de 1971, foi instituída oficialmente como Universidade Federal do
Piauí. Sua constituição englobou as unidades isoladas de ensino superior preexistentes,
incorporando, assim, a tradicional Faculdade de Direito, além das Faculdades de Filosofia,
Odontologia e Medicina, localizadas em Teresina e mais a Faculdade de Administração, em
Parnaíba.
Somente a partir dos anos de 1930, é que uma agenda social passou a ser
incorporada no discurso e nas políticas do Estado brasileiro, refletindo uma tendência
109
Art 157. A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma parte dos
seus patrimônios territoriais para a formação dos respectivos fundos de
educação.
§ 1° As sobras das dotações orçamentárias, acrescidas das doações,
percentagens sobre o producto de vendas de terras publicas, taxas especiais e
outros recursos financeiros, constituirão, na União, nos Estados e nos
Municípios, esses fundos especiais, que serão applicados exclusivamente em
obras educativas determinadas em lei.
§ 2° Parte dos mesmos fundos se applicará em auxílios a alunnos
necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar, bolsas de
estudo, assistência alimentar, dentaria e medica, e para villegiaturas.
O velho regime monárquico parecia não mais garantir nem viabilizar os sonhos
elementares da população brasileira. A cúpula militar através de um golpe de Estado implanta
a República. Com início do Período Republicano uma onda otimista traz novas esperanças ao
setor educacional. A propalada função redentora da educação traria melhoria de vida aos
cidadãos. Entretanto, assim como no Brasil e no Piauí, seguiu-se a infeliz tradição de se
estabelecer muitas regras e poucos recursos. O Estado continuava fazendo de conta que
tomava conta da educação, mas não conseguia prover seu sustento e ainda dificultava com
normatizações excessivas as tentativas particulares. No primeiro período republicano (1889-
1930) no Piauí, no setor educacional havia em demasia leis, teorias, ideologia, intransigência
e o que era pior: recursos e subvenções de menos.
As elites brasileiras representadas em nosso parlamento sejam no império ou na
república, sempre buscaram alternativas legais para garantir o financiamento da educação
pública como a criação de fundos e caixas educacionais.
Mas somente com a revolução de 1930 e a convocação da constituinte de 1933 é que
ganha corpo e se materializa na Carta Magna de 1934, a vinculação de recursos para a
educação oriundos de impostos, assegurando em percentuais mínimos o comprometimento
orçamentário da União, Estados e Municípios.
A fórmula da vinculação de recursos para a educação, apesar dos reveses que sofreu
em outras Constituições, tem se apresentado como uma das mais eficazes, que somada à
descentralização em fundos específicos nos dias atuais como o FUNDEB, vem conseguindo a
universalização e o estabelecimento de padrões mínimos de qualidade, qualificação do
pessoal do magistério, mas ainda pecando na aplicação correta e coerente dos recursos, na
fiscalização e na cobrança de resultados.
O Brasil é o segundo país do mundo que mais investe dinheiro público em educação,
em relação à percentagem do gasto total do governo, ficando atrás apenas do México. Porém,
a educação brasileira ainda é muito ruim no seu conjunto, pois o número de analfabetos ainda
ultrapassa os 14 milhões e entre as 100 melhores universidades do mundo, não há uma só
brasileira. (Relatório da OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico-2006)
Na maratona da educação, o investimento não é a linha de chegada, mas de partida.
Segundo o jornalista J. R. Guzzo, “o Brasil aprendeu a gastar, mas não aprendeu a ensinar;
continua confundindo o ponto de partida com o ponto de chegada”.
116
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