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A publicidade, como qualquer outra comunicação, é regida por deveres fundamentais para
coibir abusos contra a sociedade. É o dever do profissional da área seguir esse regimento, e o ponto
mais básico nessa relação é nunca utilizar-se de meios enganosos ou abusivos contra o espectador.
Esse regimento básico se encontra em qualquer código de ética voltado a área, como também faz
parte da própria legislação brasileira no Código de Defesa do Consumidor, sendo seu artigo 37.
O código de ética da publicidade, redigido pelo CONAR também cita como violação da
ética profissional do publicitário o uso de meios enganosos e abusivos. Como no artigo 27 que diz
que “o anúncio deve conter uma apresentação verdadeira do produto oferecido” e no artigo 22
“Nenhum anúncio deve favorecer ou estimular qualquer espécie de ofensa ou discriminação racial,
social, política, religiosa ou de nacionalidade”.
Apesar do código de ética não ter valor legislativo, o CDC possui, e aqueles que infringem
as regras contra publicidade abusiva e enganosa estão sujeitos a enfrentarem processos jurídicos e
outras penalizações.
Essa pesquisa tem como intuito discorrer sobre como as ações de propaganda são voltadas a
esse público, fazendo uma análise de discurso sobre campanhas e como o movimento consumerista
tem tentado regular essa prática que por muitas vezes pode ser considerada antiética.
2. Objetivos Gerais e Específicos
O objetivo geral deste trabalho é de um dialogo com teóricos da área sobre como a
publicidade tem utilizado de formas enganosas e abusivas para atingir o público infantil, um público
facilmente impressionável e facilmente enganado. E como o movimento consumerista tenta
proteger esse público dessas práticas antiéticas.
3. Justificativa
Por boa parte da história da humanidade, a maioria da população consumia apenas para
satisfazer suas necessidades básicas. Não existiam diversidades de produtos nem de pontos de
vendas, e a produção em grande parte era por encomenda. Apenas com advento da Revolução
Industrial no final do século XVIII que começou a criar-se uma cultura de consumo, que por fim
daria no capitalismo moderno e na Publicidade.
Apesar da cultura de consumo como temos hoje só datar a partir da Revolução industrial, há
diversos casos pela história de tentativas de regular e proteger as relações comerciais. Exemplos
iniciais como o Código de Hamurabi, datado do século XVIII a.C, na antiga Babilônia, continha
nele regras para tratar do patrimônio, preço, qualidade e quantidade de produtos e o Código de
Massú da Índia antiga, datado do século XIII a.C. que estabelecia sanções para casos de adulteração
e falsificação. (MIRANDA, 2006)
O código de defesa do consumidor estabelece que é enganosa qualquer publicidade que seja
inteira ou parcialmente falsa que possa induzir em erro o consumidor. Já propaganda enganosa é
aquela que incite a violência, explore a ingenuidade da criança, induza comportamento prejudicial
ou perigoso, entre outras coisas. (GIACOMINI, 1991).
J. Martins Lampreia faz algumas definições sobre formas que a publicidade enganosa possa
conter:
Ao anunciarem roupas de cama, móbiles e brinquedos de berço decorados com logos de marcas ou
imagens de personagens licenciados, os profissionais de marketing fazem o que podem para assegurar que os
bebês reconhecerão e pedirão produtos decorados de maneira semelhante, que vão desde cereais até
bichinhos de pelúcia, à medida que suas habilidades verbais evoluírem. (LINN, 2006, p. 70)
Quando as crianças crescem e já podem verbalizar sobre os seus desejos, se tornam ainda
mais influenciadas pela TV e internet. E mesmo sem o poder de compra, exercem o poder
persuasivo sobre seus pais. Elas querem a bicicleta do homem-aranha, a pasta de dente da Turma da
Mônica, etc. É o chamado inicio da fase do “eu quero”. (GALINDO e ASSOLINI, 2008)
O acesso das crianças às mídias vem se intensificando das últimas décadas devido uma
maior segmentação nas mídias em relação a esse púbico. Antes havia um horário especifico
normalmente matutino focado em crianças, hoje além de canais destinados apenas a eles, como o
Nickelodeon e Cartoon Network, também existe uma ampla diversidade de websites destinados
apenas a esse público. Como diz Inês Sampaio: “A descoberta de que as crianças e os adolescentes
constituem mundialmente um mercado rentável tem ocasionado o desenvolvimento do marketing
infantil e a intensificação da publicidade dirigida a este segmento” (Instituto Alana, 2009, p. 13)
Uma outra forma publicidade abusiva contra esse público, são as criadas para indiretamente
atingir esse público, como uso de desenhos, mascotes, etc. É uma forma utilizada por empresas de
cerveja, indústria automotiva e cigarro para buscar novos consumidores no futuro.
Em uma coluna online datada de 2007, Gilmar Piolla afirma que “investir na criança hoje,
como fazem a indústria de cerveja e de automóveis é garantir que daqui a 10 e 15 anos poderá ser
lembrada por ela”. Segundo pesquisa realizada pelo instituto IBOPE em 2005, a criança brasileira
passa uma média de 5 horas por dia em frente à televisão. Existe dados que indicam que para uma
criança ser influenciada bastam 30 segundos, fácil de perceber o efeito que essa exposição assume
na formação do individuo. (GALINDO e ASSOLINI, 2008)
Além disso, crianças até pelo menos os quatro anos de idade não conseguem discernir a
diferença entre um comercial e um programa de TV deixando-as mais vulneráveis as ações de
marketing. (Op. Cit., pag. 8, 2008).
Há propagandas que chegam a extrapolar a ética, utilizando técnicas engenhosas e até mesmo
enganosas para os pequenos, como o exemplo encontrado no livro Desenvolvimento e Personalidade da
Criança:
[...] um menino de 4 anos persuadiu sua mãe a comprar-lhe uma marca de tênis que ele tinha visto na
TV. Chegando em casa, calçou os tênis e tentou dar um salto através da sala de estar, e explodiu em lágrimas.
A explicação para o seu desapontamento? Quando os meninos na TV usavam aquele tênis, conseguiam saltar
uma cerca de quase 2 metros, inclusive em câmera lenta (MUSSEN et al. 1988, p. 430).
(2008, OPC CID, pag. 8)
a. procurar contribuir para o desenvolvimento positivo das relações entre pais e filhos, alunos e professores, e
demais relacionamentos que envolvam o público alvo; b. respeitar a dignidade, ingenuidade, credulidade,
inexperiência e o sentimento de lealdade do público-alvo; c. dar atenção especial às características
psicológicas do público-alvo, presumida sua menor capacidade de discernimento; d. obedecer a cuidados tais
que evitem eventuais distorções psicológicas nos modelos publicitários e no público-alvo; e. abster-se de
estimular comportamentos socialmente condenáveis.
Em 2013, ainda foi adicionado novas regras que proíbem ações de merchandising em
programas voltados para o público infantil.
4. Descrição do Produto ou Processo
Essa pesquisa é feita por pesquisa bibliográfica e análise de discurso de casos de anúncios e
ações de marketing que transgridam as regras sobre publicidade abusiva e enganosa em relação ao
público infantil, trazendo uma análise e explicação do porquê dessas publicidades infringiram o
direito do consumidor. É também importante trazer como o movimento consumerista reagi em
relação a casos de abusos por parte da publicidade.
5. Corpus
5.1. McDonald’s
Além de ser abusiva no sentido de utilizar de imaginário infantil para deixar o produto mais
chamativo a esse público, é também abusiva, pois induz a um consumo de um produto não
saudável, extremamente desaconselhado por pediatras e nutricionistas. Os produtos da empresa são
gordurosos e calóricos, o consumo excessivo pode causar obesidade infantil. Para piorar, existe uma
diversidade grande de brinquedos oferecidos que até 2006 só podiam ser adquiridos
individualmente a cada compra e só estavam disponíveis por tempo limitado, o que induzia a
criança consumir mais para completar a coleção.
Essa ação da empresa também é uma forma de fidelizar o individuo deste sua infância, como
diz Gilmar Piolla. Uma pessoa que cresceu comendo Mc Lanche Feliz possivelmente cria uma
conexão emotiva com a empresa e se torna fiel à marca McDonald’s na fase adulta.
Pressionado pelo Ministério Público e por pais a empresa começou a vender o brinquedo
separado do lanche a partir de 2006. Mudou também um pouco seu cardápio, depois de pressão pelo
movimento chamado slow food a empresa passou a ofertar possibilidades mais saudáveis para o
consumidor, como no caso do Mc Lanche Feliz, uma maça em vez de batata-frita, para dar a
impressão que agora fica na mão dos pais a escolha pelo saudável e ou não.
5.2. Mascotes da Brahma
Existem também publicidades que indiretamente atingem o público infantil, mesmo quando
teoricamente não são voltadas a ele. Caso de campanhas realizadas na década de 2000 para
empresas de cervejas utilizando mascotes. Nessas peças apresentava-se personagens como um “siri”
que roubava bebida um rapaz distraído, e num gesto de provocação rebolava para ele e de uma
tartaruga com grande habilidades no futebol, ambas campanhas promovidas pela marca Brahma.
(Affornalli, 2006)
Apesar de não ser destinada diretamente ao público infantil, e mesmo não sendo veiculada
em horário específico para esse público, foi possível constatar que muitas crianças brasileiras
imitavam os gestos desses simpáticos mascotes. Passou-se a questionar que mensagem esses
personagens passavam para o público infantil, e principalmente, se essas campanhas não foram
criadas no intuito de seduzir esse público, vistos como futuros consumidores, como também atingir
mais efetivamente o público adolescente, que mesmo ilegalmente, gera lucro para os fabricantes da
bebida. (Op. Cit., 2006)
Esse uso de artefatos infantis em produtos não utilizados por ele acontece em outros tipos de
produtos além da cerveja. Como o uso de desenho animado e o slogan “te dar asas” da RedBull.
Um outro exemplo é pela indústria automotiva, que investe forte em brinquedos infantis com seus
modelos, como também desenhos animados como Transformers.
Essa é uma forma encontrada por essas empresas não de gerar lucro agora, mas sim no longo
prazo. É uma visão que deste a infância já somos consumidores, e precisam ser fidelizados.
6. Considerações Finais
O proposito deste trabalho foi apresentar como a publicidade utiliza de formas abusivas em
anúncios voltados para o público infantil, e os riscos que essa prática pode trazer. É importante
lembrar que a fase da infância é a principal na formação do individuo, e incentivar o consumismo
desenfreado não é nem ético, nem produtivo para a sociedade.
O profissional de propaganda tem como princípios éticos zelar pelo bem comum do
consumidor, abusa-lo é um desrespeito as legislações e da boa conduta profissional. Aqueles que
trabalham com publicidade devem constantemente lembrar que acima dos números de lucro estão
princípios que regem a sociedade.
7. Referências
“Consumidor versus propaganda”; FILHO, Gino Giacomini, 1991, Sammus Editorial, São Paulo - SP
“A infância Roubada”; LINN, Susan; 2006, Instituto Allana, São Paulo – SP.
“O direito do consumidor aplicado aos dias atuais”, MIRANDA, Maria Bernadette; 2006, UFSC, Santa
Catarina.
“Eatertainment: a divertida publicidade que alimenta o público infantil”, GALINDO, Daniel e ASSOLINI,
José Pablo; 2008; o XI Congresso Latinoamericano de investigadores de la Comunicación; Cidade do
México – México.
“Sites consumeristas, redes sociais virtuais e comportamento do consumidor”; GOLLNER, André Petris e
MACHADO, Carlos; 2010; Revista Eletrônica do Programa de Pós-graduação da Faculdade Cásper Líbero
Volume nº 2, Ano 2; São Paulo – SP.