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“O conhecimento não se estende do que se julga

O LIVRO DO HORTO sabedor até aqueles que se julga não saberem; o


conhecimento se constitui nas relações homem-

SEMENTES, RAÍZES mundo, relações de transformação, e se aperfeiçoa


na problematização crítica destas relações.”
(PAULO FREIRE, em “Extensão ou Comunicação”).
E RIZOMAS Invoco Paulo Freire para que desde já se entenda
o que será encontrado quando esta obra for aberta e
sua leitura iniciada. Fala de conhecimento, de troca,
de solidariedade e de um aprendizado só capaz de ser
verdadeiro, se for fruto da compreensão da presença
do outro. O descrito pela Gema e pela Pâmela é
mais do que uma sistematização de experiências.
É a escrita de quem vive e quer levar vida para outros
apresentando os desafios, as dores e os prazeres de um
fazer coletivo, compartilhado. A Pâmela aprende com a
Gema que aprende com a Pâmela que se somam para
aprender com todos os envolvidos no projeto.
O Horto é um espaço físico que precisa ser
A ideia de sistematizar a história do Horto foi fecundada na prática
compreendido também como um espaço abstrato de
acadêmica, enraizada nas tradições populares. Suas páginas
comunhão desde a sua pré-história (como o livro vai
foram construídas como rizoma à medida em que, universidade
contar) passando pelas crises e chegando à atualidade
e comunidade compartilhavam saberes e fazeres. Escolhemos o para além do arco-íris, e que, neste percurso, permitiu a
KORU como imagem representativa deste processo, fechando produção de filmes, artigos, trabalhos de Conclusão de
assim mais um ciclo do Horto. Sua leitura abre um novo caminho, Curso e jornais, encontros e desencontros. A extensão
ressignificando o Horto, em ciclos sem fim, cientes de que a vida universitária, a partir da sistematização das experiências
se multiplica seguimos sonhando e cultivando uma iniciativa – um ensinamento pertinente de Oscar Jara – tem
cada vez mais compartilhada, ecológico e saudável. Se for bom conseguido, não apenas na prática da atividade, e,
pra ti, venha fazer parte desta história, desta prática terapêutica muito especialmente, nas rodas de conversa, dialogar
na rede de saúde da periferia. com o ensino e a pesquisa de uma forma mais efetiva.
A imagem acima retrata a placa, colocada no centro da espiral O LIVRO DO HORTO: SEMENTES, RAÍZES E RIZOMAS
do Horto desde 2013, contendo, além da mensagem escrita, a é a essência dessa indissociabilidade. Cumpre-se assim
espiral desenhada com as sete cores do arco-íris representando UNIVERSIDADE E COMUNIDADE não só um preceito constitucional, mas um urgente e
os elementos da natureza e as dimensões humanas. FAZERES
COMPARTILHANDO SABERES E FAZERE S fundamental eixo formativo da universidade, onde as
trocas de experiências e a integração entre projetos
Apoio: e programas, entre ensino, extensão e pesquisa se
Projeto gráfico e editoração: Paulo Baldo Gema Conte Piccinini tornam realidade.

Pâmela Oliveira da Silva Sandra de Deus


Pró-Reitora de Extensão da UFRGS
O LIVRO DO HORTO
SEMENTES, RAÍZES
E RIZOMAS

Dedicamos este livro a mãe terra - pacha mama –

e pedimos a Ela para que não deixe faltar água,

para que todos seus filhos tenham vida longa,

saudável e feliz.

Gema e Pâmela

O LIVRO DO HORTO | 1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

REITOR
RUI VICENTE OPPERMANN

VICE-REITORA
JANE FRAGA TUTIKIAN

PRÓ-REITORA DE EXTENSÃO
SANDRA DE FÁTIMA BATISTA DE DEUS

DIRETORA DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO


E DESENVOLVIMENTO SOCIAL - DEDS
RITA DE CÁSSIA DOS SANTOS CAMISOLÃO

DADOS INTERNACIONAIS PARA CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)

P588l Piccinini, Gema Conte


O livro do horto: sementes, raízes e rizomas /
Gema Conte Piccinini, Pâmela Oliveira da Silva - Porto
Alegre: UFRGS, 2016.
193 p. : il.

ISBN 978-85-9489-031-3

1. Desenvolvimento sustentável 2. Educação


ambiental 3. Ecologia 4. Extensão universitária I. Silva,
Pâmela Oliveira da II. Título

CDU 338
NLM GF 31

CATALOGAÇÃO NA FONTE: RUBENS DA COSTA SILVA FILHO CRB10/1761

O LIVRO DO HORTO
Gema Conte Piccinini
Pâmela Oliveira da Silva

O LIVRO DO HORTO
SEMENTES, RAÍZES
E RIZOMAS

UFRGS/PROREXT/DEDS
2016

O LIVRO DO HORTO
AGRADECIMENTOS

À COMUNIDADE do Bairro Cruzeiro do Sul, e à Equipe da USF


- UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA, que, desde sua criação em 1996,
nos acolhe como professores, extensionistas, pesquisadores, estudantes
da UFRGS e como amigos. O espírito de família nos possibilitou
compartilhar sonhos e realidades. O HORTO e seu livro são parte disso.

Ao Sr. OSVALDO, da Borracharia Santos - anjo da guarda do


Horto, pelo companheirismo, acolhida e zelo.

Ao GRUPO da TERCEIRA IDADE RAIO DE LUZ, pela escuta inicial,


acolhida ao projeto, sábia orientação e parceria em todos os momentos
possíveis, tanto de confraternização como estudo ou pesquisa.
Guardiões do conhecimento e das práticas tradicionais, sábia presença.

À SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE – SMS, que generosamente


cedeu espaço inicial para o experimento fitotécnico. Em um generoso
esquecimento, deixou rolar oito anos de rico inquilinato, cheio de
aprendizados e desafios.

Aos GUARDIÕES MIRINS e suas FAMÍLIAS, que desde o primeiro


contato, foram os mensageiros da dinâmica da vida da comunidade e
parceiros confiáveis.

À FAMÍLIA do Sr. BOMFIM, pela amorosidade e acolhida


incondicional.

AOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE – ACS, NELI que

O LIVRO DO HORTO
sempre foi o elo forte, amoroso e possível entre a comunidade e a
equipe, entre o posto e o Horto, entre a medicalização e a interação
terapêutica com a natureza. Exemplo vivo da “terrapia”. E ao seu
CHICO, presença forte, guardião de hábitos e valores antigos, amoroso,
observador e amigo. E ALEX, Enfermeiro Chefe da Equipe que acolheu
o Horto, presença querida nesta comunidade desde a Pré-História do
Horto.

Ao Sr. ISRAEL MARTINS dono da fruteira, pela parceria em ceder


insumos para a composteira, bem como pela doação de sementes, além
das orientações quanto ao cultivo e uso.

Às ESCOLAS: EEEF Almirante Álvaro da Motta e Silva, Instituto


de Educação Infantil Maria Dolabella Portela, Escola Municipal
de Educação Infantil Osmar dos Santos Freitas,e às creches Nossa
Senhora de Nazaré e Nossa Senhora de Fátima Dom Orione, ao
SASE Cruzeiro e demais entidades, nossa motivação raiz, por manter o
Horto seguro e saudável para visitação e realização de oficinas com seus
estudantes e nossos acadêmicos.

Ao Centro Administrativo Regional - CAR Cruzeiro, na pessoa do


Sr. Hermínio pelo apoio.

À GERENCIA DISTRITAL da Coordenadoria de Saúde Glória


Cruzeiro Cristal , pela parceria de todos os momentos e por apreciar
o Horto e seus produtos, servindo de estímulo para mantê-lo rico,
saudável e belo.

Aos “FILHOS DO HORTO”: Horto Comunitário Ilha da Pintada,


Horto na Escola Infantil Ilha da Pintada, Secretaria Estadual do Meio
Ambiente - SEMA, Escola Almirante Barroso, Associação dos Amigos,
Artesãos e Pescadores da Ilha da Pintada - AAAPIP, Mulheres do
Beco, Ilha das flores – ONG, Ilha dos Marinheiros, Escola Municipal
em Florianópolis - iniciativas de ampliação da família do Horto,
pelo carinho das pessoas, espaços e instituições envolvidas, seja na
construção de novas propostas, seja na expectativa de construí-las ou

O LIVRO DO HORTO
apenas sonhar projetos conjuntamente.

Aos BOLSISTAS de Extensão, Pesquisa, Popularização da


Ciência/POP, PRAE e voluntários que escolheram fazer sua formação
complementar neste espaço, com esta comunidade onde certamente
forjaram e testaram seu humanismo e suas teorias acadêmicas, deixando
suas marcas da magia, do aprendizado e do que é viver comunidade.

À GRÁFICA da UFRGS pela corajosa acolhida e desafio em tornar


esta obra publicável.

AO DEDS pelo entusiasmo no reconhecimento social do livro e


apoio em sua finalização.

À prefaciadora, Professora Doutora INGRID BERGMAN


INCHAUSTI DE BARROS do PPG/Faculdade de Agronomia da UFRGS,
corajosa orientadora de uma enfermeira/professora quase anciã, no
Doutorado em Fitotecnia à qual queremos homenagear com este livro.
Sua prática antecipa o futuro promissor da Universidade por sua ousadia
em acolher o diferente e contribuir na construção de seu caminho.

À todos os seres da terra e do ar que estiveram conosco


compartilhando ecologicamente o trabalho, as responsabilidades
e a vida da periferia, espaço privilegiado onde a Universidade
oportuniza forjar os profissionais e os líderes do futuro.

A(o) leitor(a) desta obra, esta flor, acostumada a veicular o que


temos de melhor em nós.

Gema ee
Gema
Pâmela
Pâmela
O LIVRO DO HORTO
LISTA DE SIGLAS/ABREVIATURAS

AAAPIP – Associação dos Amigos, Artesãos e Pescadores da Ilha da Pintada


ABRASCO – Associação Brasileira de Saúde Coletiva
ACS – Agente Comunitário(a) de Saúde
AMOVICS/SASE – Associação dos Moradores da Vila Cruzeiro Do Sul/ Serviço
de Apoio Social ao Estudante
ANEPS – Associação Nacional de Educação Popular em Saúde
APA – Área de Preservação Ambiental
CAD – Centro Agrícola Demonstrativo
CAR – Centro Administrativo Regional
CBEU – Congresso Brasileiro de Extensão Universitária
CONGRADES – Coordenações de Graduação
CORSAÚDE – Coordenação de Saúde
DEDS – Departamento de Educação e Desenvolvimento Social
DMLU – Departamento Municipal de Limpeza Urbana – Porto Alegre
FACED – Faculdade de Educação
FASE – Fundação de Atendimento Sócio-Educativo
ONG – Organização Não Governamental
PET Saúde – Programa de Educação pelo Trabalho
PNEP – Política Nacional de Educação Popular
PNPIC – Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares
PPG – Programa de Pós Graduação
PRAE – Pró-Reitoria de Assitência Estudantil
PROPESQ e PROPESQ/POP – Pró-Reitoria de Pesquisa
PROREXT – Pró-Reitoria de Extensão
SEMA – Secretaria Estadual do Meio Ambiente
SEPED/HCPA - Setor de Pediatria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre
SMS – Secretaria Municipal de Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
TCC – Trabalho de Conclusão de Curso
UBS – Unidade Básica de Saúde
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
USF – Unidade de Saúde da Família

O LIVRO DO HORTO
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ............................................................................... 10

PREFÁCIO ......................................................................................... 12

INTRODUÇÃO ................................................................................. 15

CAP. 1 - PRÉ-HISTÓRIA DO HORTO ................................................ 18


1.1 Alguns Anos Depois .................................................................. 24
1.2 Precursores do Horto ................................................................ 26

CAP. 2 - O NASCIMENTO DO HORTO ............................................. 32


2.1 Um experimento Fitotécnico de Plantas Medicinais ................... 32
2.2 Início da Construção .................................................................. 36
2.3 As 12 Plantas ............................................................................. 38

CAP. 3 - PARTICIPANTES DA VIDA E DINÂMICA DO HORTO .......... 52


3.1 Os Guardiões Mirins ................................................................. 52
3.2 Grupo de Terceira Idade Raio de Luz ......................................... 62

CAP. 4 - UM LUGAR PARA TODOS ................................................... 66


4.1 A vida do Horto Pós-Término do Cultivo Fitotécnico ................. 70
4.2 Espiritualizando o Horto ............................................................ 72

CAP. 5 - OS AMBIENTES DO HORTO ............................................... 72


5.1 Espaço da Criação: Sala 220 e à Sombra da Tiouana ................. 77

O LIVRO DO HORTO
CAP. 6 - O HORTO COMO ESPAÇO DE ENSINO, PESQUISA
E EXTENSÃO: COMO FOI ISSO NA PRÁTICA ................................. 86
6.1 Ensino - O Horto como Sala de Aula ......................................... 88
6.2 Pesquisa - Popularização da Ciência ......................................... 93
6.3 Extensão - Horto como Cenário de Prática .............................. 100

CAP. 7 - PRODUÇÕES DO HORTO ................................................ 110


7.1 Filmes ...................................................................................... 110
7.2 Artigos ..................................................................................... 112
7.3 Trabalhos de Conclusão de Cursos – TCC ................................ 114
7.4 Jornais ..................................................................................... 116

CAP. 8 - O HORTO ALÉM DO ARCO-ÍRIS ...................................... 150


8.1 Colônia Z5 ............................................................................... 151
8.2 O Museu da Ilha e a AAAPIP ................................................... 152
8.3 Hortos na Ilha .......................................................................... 153
8.4 O Livro Ilhas ............................................................................ 158
8.5 SEMA: Sede da APA no Delta ................................................... 159
8.6 Uma Reflexão: A Permanência no Revezamento ...................... 160

CAP. 9 - RETRATOS DE VIVÊNCIAS ................................................. 162

CAP. 10 - DEPOIMENTOS ............................................................... 168

CAP. 11 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................... 184

UMA RETROSPECTIVA ................................................................... 186

LISTA DE BOLSISTAS QUE ATUARAM NO HORTO ........................... 190

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................... 192

O LIVRO DO HORTO
APRESENTAÇÃO

A ciência e a arte fizeram morada no Horto, enquanto a vida lá


acontecia. Atores e visitantes puderam conhecer o espaço, participar
de encontros e refletir sobre seu lugar na natureza e junto a uma
Unidade de Saúde da Família, considerada porta de entrada ao Sistema
de Saúde, SUS/BRASIL. Nós acreditamos que conservá-lo e manejá-lo
ecologicamente é ação de saúde. O portão do Horto pode ser também
porta de acesso à saúde. Hortoterapia foi uma expressão muito
ouvida por lá. Parte desta obra registra que no Horto fomos e somos
atores sociais, contribuindo para que o paradigma da sustentabilidade
saudável, tanto do homem como da natureza, pode se forjar e se tornar
realidade fora dos muros do Posto de Saúde, mas bem pertinho, de
portas abertas.

Você tem à mão “O Livro do Horto” cuja história ajudou a construir,


direta ou indiretamente. Alguém de sua família, da sua escola, de suas
relações, contribuiu para que este espaço existisse e se mantivesse
por mais de oito anos, se multiplicando para atender demandas de
“construção de um horto como esse.” Ele foi e é um ponto de encontro,
um espaço de sonhos, de pesquisa, de criação, de vivências e de
recordações.

A escrita não se detém na cronologia dos fatos, nem se classifica


por ordem de importância. É uma compilação dos dados das diferentes
fontes e do tempo de vigência do projeto. As fotos são patrimônio
e fazem parte da memória de quem passou pelo Horto, pontuam
fragmentos da dinâmica do cotidiano e sua presença em eventos.

10 | O LIVRO DO HORTO
Muitas pessoas, de muitas maneiras, participaram da criação do Horto,
ajudaram a cuidá-lo, viram seu crescimento e desenvolvimento. Outros
tantos vivenciaram suas frequentes transformações, colocando nele seu
amor, seu suor, seu conhecimento, sua pureza, seu sonho, mas nem
tudo está registrado. Muitas sementes germinaram ali, outras migraram,
criando outros Hortos.

Embora chamado “O Livro do Horto”, e assim o é, foi colocado, no


capítulo inicial como “pré-história do horto” um texto que pertence ao
momento de entrada no território da Vila Cruzeiro, antes da criação da
Estratégia de Saúde da Família (ESF), onde a realidade encontrada nos
permitia sonhar. Há nesse escrito, uma realidade em transformação,
há personagens e ideias que perpassam como se fossem um fio que
dá unidade ao passado e ao futuro, tanto do território da Vila Cruzeiro
como na trajetória dos estudantes. Assim, ao percorrer as páginas,
propomos uma viagem de volta ao vivido. A todos que vierem a ler,
esperamos o encontro com pontos de luz. Aos viventes da comunidade
que participaram de sua criação, ou desfrutaram dela, desejamos que
se reconheçam em algum lugar, em alguma imagem, numa frase, num
tempo, num vazio. Encontre-se com alguém, algum pensamento ou
sentimento bom. Perceba a vida que há. Nesse caminhar, folhando o
livro, vá adentrando em sua vida, como se fosse a espiral do Horto.
Refaça o caminho, permaneça na luz e siga, pois, de alguma forma, há
muita vida lá dentro.

Somos gratas e felizes por fazer parte desta história e resgatar


fragmentos do feito. Montamos esta pequena obra, feita de mosaicos,
cuidadosamente distribuídos para colocá-lo em suas mãos. Boa leitura.
Risque e rabisque. Este livro foi nosso, agora é seu.

O LIVRO DO HORTO | 11
PREFÁCIO

Atualmente um horto é concebido como uma pequena área


cultivada com plantas medicinais e algumas plantas de jardim e
aromáticas, mas, na verdade um horto é muito mais do que isto.
O Livro do Horto-Sementes, Raízes e Rizomas nos brinda com muitas
histórias fundamentadas em vivências e escritas pela Profª Gema Conte
Piccinini e sua colaboradora Pâmela da Silva, as quais fazem com que
seja possível entender o quão amplo e importante é um pequeno espaço
cultivado como um Horto. Imaginem este Horto cultivado ao lado de
uma Unidade de Saúde, como espaço de participação popular.

Um horto é, antes de mais nada, um jardim cultivado com plantas


de cura. Historicamente temos hortos que são marcos fundamentais na
história humana. Cito somente dois como espaços sagrados da tradição
judaico-cristã: o Jardim do Éden, o paraíso do homem original sem
males, e o Jardim das Oliveiras, citado em João 18:1 como o Horto de
Getsêmani, onde Jesus orou na véspera de sua crucificação, na busca da
redenção dos males da humanidade.

Ainda como lugar de cura, porém tendo como objeto principal o


ensino dos caminhos em busca da saúde pelas plantas medicinais, temos
o belíssimo Jardim de Minerva, resgatado como um horto histórico da
primeira escola de Medicina do Ocidente,museu vivo da Escola Medica
Salernitana (estabelecida no século IX) situado como monumento na
cidade de Salerno, na Itália.

Neste contexto, há muito tempo a Profª Gema sonhou a

12 | O LIVRO DO HORTO
constituição de um horto como espaço de ensino-aprendizagem e de
vivências de cura pelas plantas medicinais. E passo a passo, liderando
uma construção coletiva, nos presenteou com o Horto Ecológico da Vila
Cruzeiro.

Nas ações básicas em saúde a Organização Mundial da Saúde


tem salientado a importância de que o indivíduo seja visto como uma
integração bio-psíquico e social, entendendo-se o social de uma maneira
ampla e abrangente, incluindo aí o meio ambiente. Dessa forma,
ahumanização da assistência também requer mudanças no ambiente
de acolhimento e nada como um jardimde plantas repleto de formas,
luzes, aromas para ancorar quem está chegando a procura da cura de
seus males. Assim, O Livro do Horto nos revela como este espaço se
constituiu em um oásis, pleno de energias curativas, emergindo da
aridez do asfalto urbano, florescendo pela beleza singela da construção
a muitas mãos.

Por outro lado, lembrando os desafios do acolhimento de pacientes


nos serviços ambulatoriais e de unidades básicas de saúde, que ricas
possibilidades de desfrutar de métodos de ensino de enfermagem, de
suas estratégias para apreender a busca de saúde pelos pacientes, em
seus aspectos biológicos, em sua subjetividade e em sua dimensão
social. As espécies medicinais componentes do Horto podem se
constituir nas intermediadoras do diálogo com os pacientes, sem que
nada de matéria prima seja utilizada, mas tão somente o resgate das
memórias, histórias de vida, simbologia das plantas no contexto do bem-
estar proporcionado pela visita ao Horto e pelas conversas articuladas
no meio do verde.

O arranjo de espécies medicinais, aromáticas, ornamentais,


alimentícias como hortaliças e pequenas frutas ali cultivadas,
obviamente se prestam ao ensino pragmático de sua importância,
sua correta identificação, suas possibilidades de usos. Nesta visão, o
Horto se constitui em um elemento de promoção do ensino e da saúde
pública através das inúmeras ações de extensão universitária sobre o
uso racional das plantas medicinais.

O LIVRO DO HORTO | 13
Outro destaque é a função mediadora entre o ensino formal da
sala de aula e a aprendizagem dinâmica da vivência com os recursos
naturais disponíveis na rica biodiversidade, resgatada para constituir
o Horto Ecológico da Vila Cruzeiro, e a multidisciplinaridade de
questõesdespertadas pelos desafios de atender os indivíduos carentes
de saúde plena. Portanto, este espaçode aprendizagem a céu aberto
também tem atendido a formação de profissionais de outras áreas do
conhecimento como biólogos, geógrafos, engenheiros agrônomos, e
tantos outros, fato que podemos apreciar pelos trabalhos de conclusão
de cursos que o Horto Ecológico da Vila Cruzeiro do Sul proporcionou.

De todas as passagens registradas neste Livro do Horto, a que mais


me emociona é a atuação dos Guardiões Mirins, que são as próprias
sementes deste espaço mágico. As crianças, se reconhecendo como
as protetoras do Horto, revelam a dimensão que o projeto tomou no
sentido da formação de cidadãos, os quais no futuro poderão contribuir
significativamente para uma melhor saúde social.

Gema e Pâmela, agradeço o privilégio das primeiras leituras deste


livro e espero que o relato de suas histórias e seu entusiasmo contagiem
muitas pessoas no sentido de torná-las também criadoras de hortos.

Sucesso às autoras e vida longa ao Horto Ecológico da Vila Cruzeiro!

Ingrid B. I. de Barros

14 | O LIVRO DO HORTO
INTRODUÇÃO

A decisão de escrever este trabalho foi fruto de pensar a saúde


no Brasil e o povo brasileiro com seus saberes, sonhos e realidades.
A Constituição Brasileira trata da saúde em seus artigos 196 a 200 e a
lei nº 8080, de 19 de setembro de 1990, regulamentando sua prática.
Acreditamos que à Universidade compete preparar os profissionais para
cultivar cada vez mais e melhor essa saúde tão singular e tão plural.

Pensar este livro foi refletir sobre a saúde em Porto Alegre com sua
dinâmica política, seus recursos, suas prioridades, a partir da relação
com o USF - Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul e sua equipe.
Pensar este livro foi imaginá-lo fruto da atuaçãodo profissional da
saúde, do ensino e da assistência mergulhados no complexo cotidiano
da população de periferia. Pensar este livro foi dar ouvidos à realidade
teórico-prática existencial, ímpar na vida e na saúde de cada brasileiro.
Pensar esse livro foi considerar as melhores situações de aprendizagem
para nossos estudantes. E é na família, na escola e no território onde
temos os principais pontos de encontro da saúde com a doença.

Refletir sobre a força do conhecimento e da Educação Popular em


Saúde no Brasil, despertou a esperança de que em breve o Horto seja
acolhido na Política Municipal de Saúde e, então, avance para ocupar
seu lugar. A iniciativa serviu, e poderá continuar servindo, de apoio às
aulas de ciência, de educação ambiental, de fortalecimento de culturas
tradicionais com plantas, de espaço de integração, de cultivo e de
conservação de recursos naturais nas escolas, emergindo como parte
inerente ao sistema de saúde, como espaço terapêutico para saúde

O LIVRO DO HORTO | 15
física e mental. Afinal, assim foi sonhado a partir de uma realidade de
Farmácias Vivas, num pensar a inclusão das práticas e conhecimentos
tradicionais no SUS.

Aqui está O Livro do Horto. O essencial não ficou restrito ao escrito,


mas ao vivido pelos participantes. Esta é a mensagem para que o Horto
se mantenha aberto, permaneça e se multiplique ecologicamente,
ocupando seu lugar no sistema de saúde e na vida da comunidade. Um
lugar para todos onde reine a pluralidade e se cultive vidas.

16 | O LIVRO DO HORTO
O LIVRO DO HORTO | 17
CAPÍTULO 1

A PRÉ-HISTÓRIA DO HORTO

Andando pelos becos da vila, na avenida do tempo, em busca de


marcas da passagem de pessoas que trabalharam no Projeto “Promoção
da Qualidade de Vida na Vila Cruzeiro do Sul”, em Porto Alegre, nos
defrontamos com um misto de sentimentos. São lembranças de fatos
e realizações, medos e sonhos que nos desafiaram a escrever e refletir
acerca da história da comunidade, a partir do significado da presença
de alguns personagens em momentos marcantes desta história. Uma
reflexão enquanto conteúdo e continente, parceria de caminhada
na formação acadêmico-comunitária de professores e alunos, no
processo do que é viver comunidade, compartilhando experiências com
famílias, idosos, adolescentes, organizações e lideranças comunitárias,
profissionais de saúde, entre outros, resultando para todos a certeza de
um saldo positivo.

18 | O LIVRO DO HORTO
Ao nos reportarmos ao ano de 1996, guiados pela “Márcia
do Postinho”, como era conhecida a Servidora do Posto de Saúde,
desenhamos, caminhando, o mapa da pobreza da Vila Cruzeiro do Sul.

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O LIVRO DO HORTO | 19
Em nossas mentes ficou a imagem do caos de alguns setores e o
desejo velado de ali lançar âncoras para fixar um espaço de aprendizado
acadêmico, compartilhando experiências com uma comunidade em
busca de sua qualidade de vida. Esta experiência se somou a uma
trajetória de onze anos no Amazonas e quatro na periferia de Canoas
em trabalhos com população marginalizada.

Na época não fazíamos ideia do tempo de ancoragem neste porto,


assim como na Amazônia, onde desenvolvemos intenso trabalho
acadêmico-comunitário, transculturando, a todo instante, vivências
entre índios, peruanos, colombianos, sulistas, andarilhos e outros, num
intenso viver comunidade.

Voltando na avenida do tempo, as atividades comunitárias, na Vila


Cruzeiro, envolveram muitos personagens:

LADILA: Era e é, até hoje, visitadora incansável e parceira


incondicional nas andanças pela alma da Pedreira. Alegre presença
nos lares e nos sombrios becos do bairro, reduto espacial dos já
desesperançados migrantes do interior, consolo dos pobres na dor,
alegria das crianças nas atividades de grupo e alento dos drogados na
hora do caos.

SEU ALZIRO: Dono de um bar na entrada do beco que levava seu


nome, falecido em 2001. Era nosso guardião. Nossa referência para
acesso seguro na Pedreira pela Ursa Maior.

ROSA: Lembrança boa do primeiro grupo de acadêmicos em


estágio na disciplina de Enfermagem em Saúde Comunitária na
Pedreira. Aluna pobre, sonhadora, generosa, organizou o “Primeiro
Encontro de Mulheres da Pedreira” em 1996, no Beco do Seu Alziro.
Sempre se mostrou muito hábil na condução das atividades envolvendo
os diferentes integrantes da comunidade. Grande Rosa! Concluído o
estágio, veio a formatura e, mesmo formada, permaneceu no Projeto.
Deixou sua patente no primeiro grupo de adolescentes da Arapeí e nas
famílias da Pedreira.

20 | O LIVRO DO HORTO
FELIPE: Querido Felipinho! Primeiro bolsista de Extensão do
Projeto. O amado, o amigo, o líder dos meninos no planejamento e
execução dos passeios.

CLÁUDIO: O bixo-capitão, bolsista, guardião dos princípios


religiosos e valores sociais dos meninos cuja bolsa gastava toda na
manutenção das atividades do grupo. Nosso baluarte no passeio à praia
da Ponta Grossa.

ALEX: Braço forte, acolhedor, o único que, com sua austeridade e


bondade, conseguia manter o grupo razoavelmente disciplinado. Juiz de
futebol, parceiro nas caminhadas.

MARINÊS: Revelação em aula. Mística, vocacionada para a


comunidade, pessoa que fazia as coisas acontecerem. Mesmo como
enfermeira do Programa Saúde da Família, no município de Charqueadas,
intercambiava suas experiências entre as duas comunidades, nas
atividades de grupo.

CRISTINE: Artista, irrequieta e sonhadora. Junto com Marinês e


Alex participava das atividades com os grupos de mães e adolescentes.

DEYSE: Além de aluna do curso de Enfermagem da UFRGS, cantora


no Coral da ULBRA. Meiga bolsista que magistralmente sintetizou as
idéias para a elaboração do crachá do Grupo de Adolescentes da Arapeí.

RENATA: Bolsista do curso de Enfermagem, meiga menina que


articulou a integração do grupo de adolescentes com estudantes do
Colégio Santo Antônio na visita que realizaram ao Projeto Arapeí. Esta
aproximação foi conseqüência do vínculo dos religiosos Lassalistas desta
escola com a comunidade, pois foram responsáveis pela organização do
Centro Comunitário Arapeí, quando trabalhavam na localidade em uma
missão evangelizadora e cidadã.

GRAZIELA: Inquieta e criativa bolsista que levou ao limite o


compromisso com o projeto. Sua atuação, desde a organização dos

O LIVRO DO HORTO | 21
encontros semanais até a compreensão do complexo processo sócio-
cultural desta comunidade, contribuiu significativamente para a
elaboração desta publicação. Sua iniciativa permitiu testar e patentear
uma metodologia de trabalho que facilita a comunicação com o paciente
em consulta de enfermagem. Com a certeza de que este método foi
gestado a partir da convivência com os jovens da comunidade, ousada
e disponível, a aluna apresentou sua experiência em duas edições do
Seminário de Extensão Universitária da Região Sul – SEURS.

FERNANDO: Inicialmente atuou como aluno voluntário passando


à bolsista no semestre seguinte. Com atuação intensa junto ao grupo
de idosos e crianças da creche, deixou sua marca de presença amiga e
entusiasmada.

DAYANE: Bolsista que atuava, principalmente, com as adolescentes


e com o grupo de idosos, destacando-se pelo carinho e afeto
demonstrados.

MICHELE: Inseriu-se no projeto desde o início do curso como


voluntária. Foi assumindo compromissos e criando vínculos. Levou
adiante o projeto comunitário, passou a atuar como bolsista,
intensificando a organização dos registros utilizados nesta
sistematização. Sua energia, entusiasmo e empatia para com os
participantes das ações iluminavam os encontros. Inseriu a mãe,
Zuleika, em um trabalho voluntário na creche.

LILIANE: Com formação em pedagogia, catequista e com


experiência em grupos de formação religiosa de adolescentes na escola
dos fundadores do Centro Comunitário Arapeí, articulou uma atividade
envolvendo os integrantes do grupo em que atuava e os jovens da
comunidade. Participou também de uma tarde de convivência com as
mães.

Aproximações acadêmicas importantes foram construídas


quando, por exemplo, nos deparamos com as professoras da Escola
de Enfermagem da UFRGS, rodeadas de adolescentes animados com

22 | O LIVRO DO HORTO
os passeios educativos e alunos da Universidade relatando os impactos
das vivências transformadoras em suas formações profissionais.
Nesta mesma vertente temos a professora Ana Bonilha1 extensionista
e pesquisadora na área, mas que, pela sua inserção e características
físicas poderia ser confundida com as demais jovens. Destas iniciativas
vários encontros foram realizados, ora na casa de uns, ora na casa de
outros, sempre com a finalidade de afinar objetivos, clarear a caminhada,
planejar e organizar atividades.

Pelos becos da Pedreira muitos encontros aconteceram, alguns


mais fugazes, anônimos, com fisionomias, mas sem identificação, outros
não. Além dos rostos temos nomes, temos aproximações que permitem
registros. Este é o caso de Beto, que amparou por um ano nosso sonho
em obter um espaço próprio para o desenvolvimento das atividades com
os grupos e integrou várias gestões da diretoria da Associação. É irmão
da Lourdes, que ainda hoje atua como agente de saúde e desempenha
importante papel na comunidade. Temos também as enfermeiras Gisa
e Lu, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, voluntárias do projeto de
extensão universitária “Acolhendo e crescendo juntos na Pedreira”, que
viabilizaram o desenvolvimento de diversas ações.

Nesta caminhada podemos lembrar Saint Exupery, quando diz que


“o essencial é invisível aos olhos” (SAINT-EXUPÉRY, 2009). Sim, pois o
que os olhos vêem nesta caminhada é desestruturação, pobreza e caos.
Porém para quem apura os sentidos, como nós, estes becos guardam
memórias, silêncios e muitas possibilidades. As casas mal construídas
guardam pessoas que lutam e que sonham. Os becos são dinâmicos,
ativos e cheios de esperança.

1  Professora Dra. Ana Bonilha- Docente do Programa de Pós Graduação de Enfermagem,


da Escola de Enfermagem da UFRGS

O LIVRO DO HORTO | 23
1.1 ALGUNS ANOS DEPOIS

Na periferia a gente se encontra.


Na periferia a gente encontra gente como a gente.
Na periferia a gente encontra adolescentes valentes,
Compartilhando com a gente suas historias,
Suas encruzilhadas, suas construções.
Com eles numa garagem sentamos muitas vezes.
E juntos desenhamos nossos destinos em papel,
em arte e em sonhos.
Dessa garagem nós saímos mais humanizados.

24 | O LIVRO DO HORTO
A foto abaixo retrata um momento da história do convívio entre
acadêmicos de enfermagem e adolescentes da periferia em atividade
de extensão, no qual todos adquiriram perspectivas e possibilidades
mais positivas. Falamos de um processo de formação para vida. Os
profissionais que formamos tiveram nesta vivência a oportunidade
de refinar seu olhar para o outro e depoimentos de adolescentes,
encontrados tempos depois, nos levam a acreditar que a experiência
causou impactos muito positivos em suas vidas. Por isto, afirmamos:
A ESPERANÇA PREVALECE!

O LIVRO DO HORTO | 25
1.2 PRECURSORES DO HORTO

Durante a abordagem comunitária talvez tenhamos muitos


precursores a elencar, mas elegemos apenas cinco:

1.2.1 UMA EQUIPE SONHADORA

A Vila Cruzeiro foi uma das primeiras regiões de Porto Alegre


onde a Secretaria Municipal de Saúde implantou o Programa Estratégia
de Saúde da Família - ESF, pois esta possui uma população bastante
numerosa e com alto grau de vulnerabilidade.

Uma das equipes da ESF foi acolhida em 1996 pela Associação dos
Moradores da Vila Cruzeiro do Sul – AMOVICS – imagem acima, que

26 | O LIVRO DO HORTO
cedeu o andar térreo da entidade, para o atendimento da população,
abrangendo o território situado entre as ruas Dona Malvina, Padre
Nóbrega, Orfanotrófio e Cruzeiro do Sul. As famílias cadastradas tinham
como referência o “barracão” – uma velha construção em meio a uma
área verde existente na época. Atualmente este espaço é utilizado pela
comunidade para atividades de lazer e educação e, algumas pessoas,
ainda se referem ao local como “barracão”. Essa equipe e esse pequeno
espaço foram base de referência para estágios e outras atividades
acadêmicas na comunidade com os quais foram compartilhados sonhos
e realidades. Com eles foram realizados exercícios de permanência na
impermanência, a cada troca de equipe, a cada início de estágio.

1.2.2 UMA OFICINA COM PLANTAS MEDICINAIS

A disciplina de Enfermagem Comunitária, da Escola de Enfermagem


da UFRGS, trabalhando de forma integrada com os Programas existentes
na comunidade procura contemplar os conhecimentos locais. Nesse
convívio, entre os tantos encontros sobre plantas medicinais e práticas
tradicionais, certa vez foi realizada uma oficina com as idosas assistidas
pela equipe. A experiência mostrou-se importante para muitas das
participantes, conhecedoras e usuárias de plantas medicinais. No evento
cada uma levou suas plantas e juntas identificaram suas propriedades
e formas de cultivo. A participação de estudantes de enfermagem
possibilitou a elaboração de documentação fotográfica e descritiva
de todas as plantas. Esta produção foi compactada em um polígrafo,
posteriormente, distribuído. Por muito tempo, as idosas lembraram-se
deste evento como o dia em que escreveram seu livro.

Para algumas delas foi um momento importante de socialização de


conhecimento e de práticas familiares, com profundas raízes, decepadas
ao migrarem do interior para o compactado mundo urbano.

O resumo2 dessa atividade foi apresentado no 56º Congresso 2004.

2  Trabalho disponível em https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/23512/


000397457.pdf?sequence=1

O LIVRO DO HORTO | 27
1.2.3 UM PROJETO DE EXTENSÃO: CINQUENTA ANOS DE
MEMÓRIA VERDE

O projeto de extensão “Cinquenta Anos de Memória Verde”


foi desenvolvido como uma das atividades comemorativas do
cinquentenário da Escola de Enfermagem da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul. Teve como objetivo fazer um levantamento da
parte arbórea da área verde da Escola e resgatar a memória de quem
plantou cada espécime. As árvores foram oferecidas ao corpo docente e
administrativo da UFRGS para adoção. Com o plantio de mudas de erva-
mate e de pau-brasil, durante as comemorações, chegamos ao número
de 100 árvores cultivadas e distribuídas em 18 famílias e 29 espécies,
sendo 15 nativas e 14 exóticas. A inauguração de um marco sinalizou
essa data.

50 anos Escola de Enfermagem –


MARCO COMEMORATIVO

A lembrança da celebração do 50º aniversário da Escola de


Enfermagem –- e o desenvolvimento desse projeto de extensão também
gerou um álbum que permanece, desde então, juntamente com a
identificação das plantas e o artigo produzido por Wachter, Piccininni e

28 | O LIVRO DO HORTO
Matzenbacher3 na sala da Direção da Escola. Na ocasião, a planta mais
antiga foi identificada como a espécie TipuanaTipu. Estava localizada
em frente ao Diretório Acadêmico da Faculdade, próximo à Rua São
Manoel, e foi adotada por uma das autoras deste trabalho – Prof.ª Gema
Conte Piccinini. À sua sombra muitas páginas foram escritas.

Academicos junto ao
monumento com a mensagem
“Como a natureza se renova e
floresce verdejante, a Escola de
Enfermagem da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul,
celebra 50 anos forjando no
cotidiano o profissional do
futuro.

1.2.4 UM APOIO EXTERNO

Com a aprovação do projeto do Horto, fomos com a chefia da


Equipe de Saúde ao Centro Agrícola Demonstrativo – CAD4, propor
parceria para o desenvolvimento de atividades. O apoio técnico recebido
foi fundamental para o preparo do solo e o início do plantio. Prontos
os canteiros, iniciou-se o cultivo das plantas medicinais mais citadas
pelos usuários dos serviços das ESF de Porto Alegre. Esses dados foram
coletados por intermédio de entrevistas na casa dos idosos identificados
como conhecedores e usuários de plantas medicinais no período entre
2005 e 2006.

3 https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/23512/000397457.pdf?sequence=1
4  CAD - O Centro Agrícola Demonstrativo é uma unidade administrativa da Divisão de Fo-
mento Agropecuário e da Gerência de Projetos Especiais da Secretaria Municipal da Indústria
e Comercio de Porto Alegre, com área de 32 hectares. Nele estão centralizados os diversos
projetos e atividades do meio rural.

O LIVRO DO HORTO | 29
1.2.5 UM QUINTAL DOMICILIAR

Uma família da comunidade, composta pelo Senhor Bomfim, Dona


Iva e sua filha especial Cheila, deram início à produção das mudas e de
sementeiras em seu pequeno quintal, enquanto o solo do Horto ia sendo
preparado e o projeto liberado nas instâncias científicas pertinentes.
O Senhor Bomfim, parceiro para troca de mudas, de sementes e de
ideias, se manteve ligado ao Horto e, com frequência, participava de
eventos com alunos e visitantes.

Quintal do Sr. Bonfim


– produção de mudas

30 | O LIVRO DO HORTO
O LIVRO DO HORTO | 31
CAPÍTULO 2

O NASCIMENTO DO HORTO

O Horto Experimental da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do


Sul nasceu como um experimento fitotécnico, a partir de uma tese de
doutorado sobre plantas medicinais. Havia um espaço cercado ao lado
do Posto de Saúde e a equipe recém instalada no local tinha interesse
em construir uma horta e, com apoio da comunidade, a Prefeitura
Municipal liberou o espaço, pois havia interesse em transformar esta
área em um espaço de cultivo.

2.1. UM EXPERIMENTO FITOTÉCNICO DE PLANTAS


MEDICINAIS

O estudo do doutorado dividiu-se em dois momentos. Primeiro:


estudo etnográfico, que consistiu em conhecer as plantas medicinais
mais utilizadas pela população assistida pela ESF em Porto Alegre. Esta
etapa foi realizada a partir de visitas domiciliares a idosos conhecedores
de plantas medicinais de diferentes territórios da região. Segundo:
experimento fitotécnico, que consistiu no cultivo dessas plantas
com tecnologia apropriada, assegurando o poder medicinal quando
da utilização. Para isso foi necessário seguir as etapas: exposição da
proposta para a equipe e para comunidade; oficialização da iniciativa
junto ao Conselho local e a Secretaria Municipal de Saúde; de aprovação
do comitê de ética da Secretaria Municipal de Saúde. Após a aprovação,

32 | O LIVRO DO HORTO
nestas instâncias, os trabalhos foram iniciados no local incluindo a
coleta de amostras solo para análise.

A construção do Horto Experimental da UBS Cruzeiro do Sul foi


amplamente discutida pelas representações e lideranças comunitárias
e o projeto recebeu aprovação em reunião da ESF no dia 20.10.2006.

Após a reunião, a equipe de saúde da ESF, mais autoridades


convidadas, se deslocaram para o local do futuro Horto e discutiram
estratégias para viabilizar sua construção. A imagem abaixo registra a
presença do Enfermeiro Alex A. Bitencourt, chefe da equipe de Saúde,
Dr. Robin, médico da equipe, Técnica de Enfermagem Neura, os Agentes
Comunitários de Saúde Claudete, Chico e Nely, Hermínio, Coordenador
do Centro Administrativo Regional da Grande Cruzeiro – CAR.

O LIVRO DO HORTO | 33
Depois deste encontro, o projeto foi submetido a Conselho Distrital
de Saúde junto à Gerência Distrital Glória, Cruzeiro, Cristal.

O Horto está localizado na Av. Cruzeiro do Sul, esquina com a Rua


Dona Otilia, acesso A, nº 195, ao lado leste do Posto de Saúde. Tem
acesso interno pela área privativa do Posto e externo pelo acesso A.
O local pode ser identificado nas imagens a seguir.

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34 | O LIVRO DO HORTO
A implantação do Horto observou orientações técnicas para
o plantio das mudas no espaço e a distribuição conforme Projeto
Fitotécnico de doutorado.

No sótão da ESF foram projetados os espaços para tratamento


das plantas durante o processo de secagem e armazenamento. Neste
sótão, foi sonhando um protótipo de Farmácias Vivas, com a criação e
construção de um sistema de secagem e espaço de armazenamento.
Lá foi iniciado um processo econômico, simples e seguro de produção
sustentável de produtos fitoterápicos vegetais de uso tradicional local.
As imagens abaixo mostram o processo de secagem. Após as folhas
secas, são colocadas em sacos de papel com uma segunda capa de
material plástico e, assim, guardadas em sala adequada com ventilação
no mesmo espaço.

O LIVRO DO HORTO | 35
2.2. INÍCIO DA CONSTRUÇÃO

O espaço para a construção do Horto foi disponibilizado no


ano de 2006 e nele foi definido o cultivo das plantas utilizadas pela
população de Porto Alegre, que buscava atendimento nos Postos de
Saúde denominados de Unidades de Saúde da Família. O público-alvo
da pesquisa etnográfica foram os anciãos, profundos conhecedores
e usuários destas práticas na comunidade. A partir das 278 plantas
citadas foram destacadas as doze plantas mais referidas para o cultivo
fitotécnico.

As imagens seguintes apresentam, respectivamente, os


procedimentos relativos à medição do terreno e a coleta de amostras
do solo para análise, bem como a demarcação do espaçamento entre
as mudas.

Desencadeado o experimento, um esquema de produção,


secagem, armazenamento de plantas medicinais foi planejado, a partir
da hipótese de que um ciclo se fecharia a partir da produção e prescrição
de produtos fitoterápicos para a comunidade local.

36 | O LIVRO DO HORTO
Foram construídos 12 canteiros. Em cada um deles foi cultivada
uma das plantas destacadas. O processo de construção coletiva,
ilustrado abaixo, foi o adotado e envolveu integrantes da equipe de
saúde da comunidade, além dos guardiões mirins e anciãos5, que
ficaram responsáveis pela proteção das pequenas mudas.

O acompanhamento sistemático de todas as fases de implantação


do Horto foi fundamental para o seu sucesso e, em particular, destacamos
as visitas da Supervisora do Projeto que realizou visitas periódicas para
avaliação dos cultivares, conforme imagem a seguir.

5  Os Guardiões Mirins e o Grupo de Terceira Idade Raio de Luz, são apresentados no Capí-
tulo 3 – Participantes da Vida e Dinâmica do Horto.

O LIVRO DO HORTO | 37
Outro fator importante a destacar, e que decorre da orientação
técnica sistematicamente realizada, foi a construção da barreira sanitária
– foto abaixo, que garantiu a proteção adequada e eficiente do solo do
Horto.

2.3. AS 12 PLANTAS

A partir da metodologia adotada para determinar as plantas que


fariam parte da primeira fase da formação do Horto, como apresentamos
anteriormente e considerando as entrevistas realizadas com o público
alvo obtivemos o rol a seguir: funcho, macela, guaco, tansagem, capim
cidró, hortelã, malva, arruda, boldo, erva cidreira, losna e poejo.

As 12 pranchas de imagem, que seguem, foram extraídas da Tese


de Doutorado Plantas medicinais utilizadas por comunidades assistidas
pelo Programa Saúde da Família, em Porto Alegre: subsídios à introdução
da fitoterapia em atenção primária em saúde6 e apresentam a síntese do
experimento fitotécnico.

6  Tese de Doutorado Plantas medicinais utilizadas por comunidades assistidas pelo Pro-
grama Saúde da Família, em Porto Alegre: subsídios à introdução da fitoterapia em atenção
primária em saúde - Disponível em: www.lume.ufrgs.br/handle/10183/14305?locale=pt_BR

38 | O LIVRO DO HORTO
FUNCHO (Foeniculum vulgare) – As imagens que compõem o
conjunto da primeira prancha e apresentam as etapas do cultivo do
funcho.

A B

C D

FIGURA 9. Etapas do cultivo do funcho (Foeniculum vulgare) no Horto Experimental


da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto Alegre, 2007.
A) Sementeira produzida no Viveiro de Quintal, em adaptação no
horto. B) Linha de canteiro de mudas recebidas do CAD. Janeiro de
2007. C) Identificação do canteiro. Em primeiro plano a espécie em
floração. D) Acondicionamento em cesta plástica das folhas colhidas
para secagem. Maio de 2007.

O LIVRO DO HORTO | 39
MACELA (Achirocline satureioides) – As imagens que compõem
o conjunto da segunda prancha e apresentam as etapas do cultivo da
macela.

A B

C D

FIGURA 10. Etapas do processo do cultivo da marcela (Achyrocline satureioides)


no Viveiro de Quintal, na comunidade e no Horto Experimental da
Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto Alegre, 2007.
A) Sementeira de marcela no Viveiro de Quintal. B) Canteiro regado
após receber as mudas de marcela. C) Identificação do canteiro.
D) Canteiro com cobertura morta, protegendo o solo e as mudas, já em
floração, poucos dias após o plantio em canteiro. Fevereiro de 2007.

40 | O LIVRO DO HORTO
GUACO (Mikania laevigata) – As imagens que compõem o conjunto
da terceira prancha e apresentam as etapas do cultivo do guaco.

A B

FIGURA 11. Propagação do guaco (Mikania laevigata) no Horto Experimental da


Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto Alegre, 2007.
A) Placa de identificação da planta. B) Planta de guaco atacada por
predadores herbívoros (Helix aspersa). C) Planta de guaco com bom
desenvolvimento, em local ensolarado e com barreira vegetal de
cerca-viva. Maio de 2007.

O LIVRO DO HORTO | 41
TANSAGEM (Plantago spp) – As imagens que compõem o conjunto
da quarta prancha e apresentam as etapas do cultivo da tansagem.

A B

C D

FIGURA 12. Etapas do processo do cultivo da tansagem (Plantago spp) no Horto


Experimental da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto
Alegre, 2007. A) Plantio de muda de tansagem produzido no Viveiro
de Quintal, em canteiro no horto. B) Identificação de canteiro de
tansagem. C) Colheita de amostras de folhas de tansagem (Plantago
major) para secagem. Maio de 2007. D) Planta de tansagem (Plantago
major) em frutificação no canteiro. Junho, 2007.

42 | O LIVRO DO HORTO
CAPIM-CIDRÓ (Cymbopogon citratus) – As imagens que compõem
o conjunto da quinta prancha e apresentam as etapas do cultivo do
capim cidró .

A B

C D

FIGURA 13. Cultivo e colheita de capim-cidró (Cymbopogon citratus) no Horto


Experimental da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto
Alegre, 2007. A) No detalhe, vista do canteiro após plantio das mudas.
Janeiro de 2007. B) Identificação do canteiro. C) Canteiro com plantas
no ponto de colheita. Maio de 2007. D) Colheita de capim-cidró. Maio
de 2007.

O LIVRO DO HORTO | 43
HORTELÃ (Mentha piperita) – As imagens que compõem o conjunto
da sexta prancha apresentam as etapas do cultivo da hortelã.

A B

C D

FIGURA 14. Cultivo de hortelã (Mentha piperita) no Horto Experimental da


Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto Alegre, 2007. A)
Detalhe das plantas de hortelã em desenvolvimento. Março de 2007.
B) Identificação de canteiro de hortelã. C) Recipiente plástico com
material coletado. Maio de 2007. D) Vista do canteiro de hortelã, após
a colheita, protegido com garrafas PET. Junho de 2007.

44 | O LIVRO DO HORTO
MALVA (Malva sp) – As imagens que compõem o conjunto da
sétima prancha e apresentam as etapas do cultivo da malva.

A B

C D

FIGURA 15. Etapas do cultivo de malva (Malva sp.) no Horto Experimental da


Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto Alegre, 2007.
A) Canteiro de malva protegido com cobertura morta produzida no
horto. B) Malva em franco desenvolvimento. C) Eliminação de malva
portadora de doença não identificada. D) Fruto de malva produzida na
samenteira do horto. Junho de 2007.

O LIVRO DO HORTO | 45
ARRUDA (Ruta graveolens) – As imagens que compõem o conjunto
da oitava prancha e apresentam as etapas do cultivo da arruda.

A B

C D

FIGURA 16. Etapas do processo de cultivo da arruda (Ruta graveolens) no Horto


Experimental da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto
Alegre, 2007. A) Vista do canteiro da arruda logo após o plantio das
primeiras mudas. Janeiro de 2007. B) Lagarta (Heraclides cresphontes)
sendo observada em galho de arruda. C) Canteiro de arruda ao lado
do espaço holístico. D) Identificação do canteiro da arruda. Março de
2007.

46 | O LIVRO DO HORTO
BOLDO (Plectrantus barbatus) – As imagens que compõem o
conjunto da nona prancha e apresentam as etapas do cultivo do boldo.

A B

C D

FIGURA 17. Etapas do processo de cultivo do boldo (Plectrantus barbatus) no Horto


Experimental da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto
Alegre, 2007. A) Canteiro de mudas de boldo recém plantadas. Janeiro
de 2007. B) Placa de identificação do boldo em canteiro. C) Canteiro
de boldo protegido com cobertura morta de grama retirada na limpeza
inicial da área do horto. D) Amostra de boldo colhida para secagem no
sótão da USF. Abril de 2007.

O LIVRO DO HORTO | 47
ERVA-CIDREIRA (Aloysia triphilla) – As imagens que compõem o
conjunto da décima prancha e apresentam as etapas do cultivo da erva-
luísa.

A B

C D

FIGURA 18. Etapas do processo de cultivo da erva-luisa (Aloysia triphilla) no Horto


Experimental da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto
Alegre, 2007. A) Detalhe da linha de mudas, logo após o plantio, no
canteiro. Janeiro de 2007. B) Identificação de canteiro. C) Primeira
colheita de ramos florais. Abril de 2007. D) Secagem em bandeja
suspensa. Abril de 2007.

48 | O LIVRO DO HORTO
LOSNA (Artemisia absinthium) – As imagens que compõem o
conjunto da décima primeira prancha e apresentam as etapas do cultivo
da losna.

A B

C D

FIGURA 19. Etapas do processo de cultivo da losna (Artemisia absinthium) no


Horto Experimental da Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul,
Porto Alegre, 2007. A) Plantas regadas, recentemente transplantadas.
Janeiro de 2007. B) Guardião Mirim observando a dinâmica dos
insetos (joaninhas) em pé de losna. C) Identificação da espécie em
floração. Abril de 2007. D) Colheita manual de folhas para secagem no
sótão da USB. Maio de 2007.

O LIVRO DO HORTO | 49
POEJO (Cunila microcephala) – As imagens que compõem o
conjunto da décima segunda prancha e apresentam as etapas do cultivo
do poejo.

A B

C D

FIGURA 20. Cultivo de poejo (Cunila microcephala) no Horto Experimental da


Unidade de Saúde da Família Cruzeiro do Sul, Porto Alegre, 2007.
A) Plantio de muda em canteiro. B) Sofrendo efeito da seca e de altas
temperaturas. Fevereiro de 2007. C) Após proteção com sombrite.
Abril de 2007. D) Acondicionando a colheita em caixa plástica para
transporte e pesagem. Maio de 2007.

50 | O LIVRO DO HORTO
O LIVRO DO HORTO | 51
CAPÍTULO 3

PARTICIPANTES DA VIDA E DINÂMICA


DO HORTO

Este capítulo se divide em duas partes. Inicialmente apresentamos


os Guardiões Mirins do Horto e, a seguir, o Grupo de Terceira Idade
Raio de Luz importantes organizações para a sobrevivência do Projeto.
É difícil identificar quem mais participou da vida e da dinâmica
do Horto. O certo é que com todos aprendemos muito e queremos
preservar este aprendizado.

3.1. OS GUARDIÕES MIRINS

A corrente que perpassou todas as fases do Projeto do Horto


Experimental foi o grupo de crianças da comunidade. Passados oito
anos, eles ainda rondam e visitam o Horto, dando significado a tudo.

Na primeira visita à comunidade era impossível imaginar o


significado de atender ao pedido de: “Bate uma foto de nóis aqui, tia”,
em um cenário de quatro crianças jogando “bolitas”7 na rua. Este gesto

7  Bolitas - bola de gude, gude ... pequena bola de vidro maciço, pedra oumetal, normal-
mente escura, manchada ou intensamente colorida, de tamanho variável, usada em jogos
infantis. Consiste em um círculo desenhado no chão, onde os jogadores devem, com um
impulso do polegar, jogar a bolinha. Vence aquele que ficar com as bolinhas de seus compa-
nheiros.Wikpedia: https://en.wikipedia.org/wiki/Bolita, consulta em 16.09.2015.

52 | O LIVRO DO HORTO
foi a porta de entrada e permanência das crianças no cotidiano do
projeto, pois passados alguns dias, as crianças voltaram. E voltaram
muitas vezes mais. Nesses retornos, aos poucos, outras foram se
aproximando uma após outra, até serem muitas. Meninos e meninas.
Dia após dia, aos poucos, em horários inesperados, eles foram
adentrando, querendo tudo fazer, tudo saber, tudo tocar, começando
pelos menores. Assim se inteiraram do trabalho e compartilharam
suas histórias de vida. Diante deste panorama, a equipe do Programa
Saúde da Família - PSF engajou-se na organização de uma reunião com
as crianças da rua da Unidade Básica de Saúde - UBS para que sua
presença no Horto fosse prazerosa, segura e de aprendizado, além
de favorável ao desenvolvimento do trabalho. No primeiro encontro
foram levados a conhecer a área, a metodologia e objetivo do Horto.
Participaram também de uma oficina de desenho na qual projetaram as
expectativas individuais de colaboração.
Seguiram-se encontros semanais para fortalecimento do grupo e
sistematização das atividades. Identificá-los como membros do grupo
foi um processo de envolvimento e comprometimento familiar, através
do uso de fotografias, confecção de crachás, escolha de lideranças,
sempre aberto a entrada de novos membros. Desse modo a organização
dos pequenos se consolidou, e desde então estes passaram a usufruir
do Horto e a protegê-lo. Os Guardiões Mirins, como foram batizados,
portavam crachás com foto, confeccionados nas oficinas semanais.
Assumiram a divulgação positiva do Horto e a proteção contra
predadores, embora, com certa freqüência, a bola, dos joguinhos na rua
no final da tarde, entrasse no espaço e jogador o mais leve ou o mais
rápido, pulava a tela para buscá-la.
Os Guardiões Mirins foram crescendo, revezando lideranças,
assumindo compromissos e estabelecendo vínculos, nem sempre
duradouros. Estes compromissos consistiam no cuidado com as plantas,
no controle de pragas ou identificação de mudanças no ambiente.
Interagiam também em outras atividades lúdico-científicas. Não poucas
vezes associavam assuntos escolares com questões do Horto. Exemplo
disso foi quando uma guardiã, andando pelo Horto, observou um pé
de funcho, bonito e saudável, crescendo no meio de um passeio entre
canteiros. Animada, ela correu para contar o achado. Ante a situação de

O LIVRO DO HORTO | 53
risco de ser pisada, a muda foi transplantada para lugar mais seguro e
passou a ser por ela cuidada, imagens abaixo, chamando-a pelo nome
de Anita, pois em aula tinha estudado sobre Anita Garibaldi e aprendera
que ela foi uma mulher guerreira e forte.

Os Guardiões Mirins foram o elo mais forte e mais presente no


processo de construção do Horto, pois foram ativos na divulgação e
na proteção do espaço, além de contribuírem com a aproximação das
famílias em trabalhos voluntários. A iniciativa tornou-se um espaço
holístico de poder e de crescimento, uma semente de futuro nas relações
com as plantas, e, para a tradição milenar de cultivo, uma ponte.
Os pais, muitas vezes, demonstraram a satisfação e tranquilidade
em ter os filhos inseridos no Projeto.

54 | O LIVRO DO HORTO
Algumas presenças se destacaram neste processo, marcaram
presença, como amostra da diversidade cultural emergente a desafiar a
saúde das próximas gerações:
MANINHO: referência do grupo no Horto. Morava ali, portão com
portão. Presença alegre, inteligente, “mão direita” do pai na borracharia.
Estudante, moleque, amoroso e vivaz nos momentos que lhe sobravam
para brincar. Foi ele quem, liberado pelo pai, fez a primeira colheita de
plantas.
LUCIANO: primeiro líder do grupo, reeleito por competência,
também morava perto da UBS. Era amigo da equipe, presença ativa,
guardião da própria casa e de si mesmo, já que durante o dia, os pais
trabalhavam fora. Por ser leve, rápido e conversador, geralmente era ele
quem pulava a cerca para pegar a bola que ia parar nos canteiros, quando
do futebol de rua. Com ele presente era difícil cumprir o programado:
ele criava.
EDÍLSON: vizinho de Luciano, perspicaz, cientista, irrequieto
e curioso era o primeiro que percebia as novidades. No início das
atividades, percebendo a ausência de malva nos canteiros, trouxe uma
das duas mudas que tinha no quintal de sua casa e passou a ser um
exemplar cuidador. Chamado pelos colegas de Didi, fazia judô nas
horas vagas e estudava pela manhã.
CLÁUDIO: amigo do Luciano. Menino sério, inteligente,
disciplinado, contributivo. Podia confiar a ele a rega com mangueira
que o Horto sobrevivia inteiro.
FELIPE e EMANUEL: irmãos, com traços quase orientais, moravam
com o pai. Frequentavam pouco o Horto, mas quando lá estavam
queriam trabalhar. Moravam um pouco afastados e um deles, além
de estudar, trabalhava. De vez em quando o pai passava pelo Horto a
caminho do trabalho e dava notícias dos meninos.
MARINA: tranquila, serena, a primeira menina a visitar o Horto.
Veio com o pai em um domingo de manhã para participar de um mutirão
de capina. Mais adiante ela foi vice-líder das meninas, quando o grupo
já tinha nome. Com ela aprendemos um pouco mais sobre a vida na vila
e os costumes dos moradores.
CAROLINE e JAQUELINE: Caroline fez parte do grupo dos maiores
e foi líder das meninas e sua irmã, Jaqueline, sempre junto, pertencia ao

O LIVRO DO HORTO | 55
grupo dos pequeninos. Estes só podiam entrar acompanhados dos mais
velhos, para a segurança de todos.

Em fins de semana, feriados ou férias, o número de participantes


era maior porque, além de não terem aula, eles traziam amigos e
parentes para conhecerem o trabalho, do qual eles se orgulhavam por
serem ativos colaboradores.

As imagens,que ilustram este tópico, apresentam o Horto como


uma extensão das atividades escolares e a importante atuação dos
Guardiões.

A atuação dos Guardiões sempre foi muito ativa e necessária para


a manutenção do Horto tanto na construçãodos canteiros com garrafas
pets como efetuando a rega das plantas.

A freqüência cotidiana no local permitiu às crianças o


acompanhamento do desenvolvimento das plantas e a associação de
muitos conhecimentos apresentados nas aulas de ciências na escola,
como podemos observar na imagem abaixo.

56 | O LIVRO DO HORTO
A observação de práticas e técnicas adequadas sempre foi uma
preocupação presente entre os integrantes dos Guardiões Mirins e, por
isso, foi criado um espaço para organizar ecologicamente o sustento
do Horto com alunos dos Cursos de Enfermagem e da Agronomia, da
UFRGS, em 2007, com a formação de uma composteira8, conforme
podemos ver a seguir.

O Horto Experimental também guarda muitas memórias. Como


nas atividades de integração com acadêmicos da Escola de Enfermagem/
UFRGS, estagiários no Setor de Pediatria do Hospital de Clínicas de Porto
Alegre - SEPED/HCPA e também na comunidade Cruzeiro do Sul. Ou
ainda, quando jovens, que atuaram no grupo quando crianças, revisitam
o espaço, desta vez trazendo seus próprios filhos para conhecerem o
projeto.

8  Composteira: espaço de reciclagem de produtos orgânicos (ex: cascas, frutas, folhas,


fezes de animais) para produzir alimento para as plantas.

O LIVRO DO HORTO | 57
A iniciativa sempre teve reconhecimento de diversos setores da
sociedade, contudo um dos momentos que mais impactou os Guardiões
Mirins foi durante a visita de uma comitiva da Secretaria Municipal
da Saúde, conforme registra a imagem abaixo, onde apresentaram
detalhadamente o Projeto e a participação do grupo na construção e
manutenção do Horto.

Com a finalidade de ilustrar as memórias dos Guardiões Mirins,


que referimos anteriormente, bem como esta trajetória relacionada à
vida do Horto Experimental, destacamos o painel de fotografias, ao lado.

58 | O LIVRO DO HORTO
No sorriso, na pisada ou nas mãos, aqui estão eles, no Horto ou
em aula, compartilhando entre si e conosco o melhor de cada um.

O LIVRO DO HORTO | 59
Outra fonte de memória do projeto é a coletânea das falas de seus
integrantes, que destacamos a seguir:

Recuperando dizeres, sonhando em voz alta:

- “A minha primeira vez aqui eu plantei feijão, os chás (macela e


manjericão).”

- “Nós fizemos o centro do minhocário.”

- “A minhoca é importante porque vai ajuntando adubo. Depois vieram


as minhocas e comeram do montão.”

- “Nós plantamos cidró. Foi numa quinta e comecei a chamar minhas amigas
pro Horto. Quem mais vem sou eu, a Marina, a Carol e o Yuri que é meu irmão.”

- “Me sinto bem porque estou no meio do verde. No meu quarto tem
muitas plantas verdes.”

- “A planta mais cheirosa é o cidró. O chá é muito gostoso. Eu também


gosto de suco de luz”.

- “Eu peguei a receita e minha mãe faz em casa”.

- “Este daqui também eu adoro ele é bem cheiroso. Manjericão, meu


pai bota no feijão.”

- “Dá pra chamar o pessoal nas casas, todo mundo mora aqui pertinho.
Eles vão gostar de plantar!”

- “Nós plantamos cenouras e beterrabas em novembro.”

- “Eu vi muitas lesmas. Queima, queima.”

- “Já vi um pássaro de bico amarelinho aqui na florestinha do Horto, até


Pica-pau. E chamei meu pai pra ver.”

60 | O LIVRO DO HORTO
Por último, apresentamos alguns, dos muitos, “bilhetinhos”
carinhosos e recados trocados durante o Projeto.

Bilhetinhos dos Guardiões Mirins

O LIVRO DO HORTO | 61
3.2. GRUPO DE TERCEIRA IDADE RAIO DE LUZ

O Grupo de Terceira Idade Raio de Luz tem a idade do Posto de


Saúde. É um grupo de idosas da comunidade que se reúne toda quarta-
feira no PSF com o objetivo de fazer artesanato, festejar, conversar, realizar
caminhadas orientadas, planejar passeios, excursões e desenvolver
atividades no Horto. Elas se auto-denominam“grupo da melhor idade”.
O Posto de Saúde, a equipe de Saúde da Família e o Grupo Raio de Luz
foram a base de apoio e a razão de ser do Horto, desde sua concepção.
Eles acolheram a Universidade e a ideia do Horto Experimental. Juntos,
trabalhando em reciprocidade com os acadêmicos, foram responsáveis
pela vida do Projeto.
Com este Grupo foi feito um importante trabalho de identificação
e catalogação das plantas medicinais.
A maioria das integrantes do Grupo é migrante da zona rural e
trazem, silenciadas em seu passado, muitas vivências e práticas em
saúde. A falta de espaço em seus quintais levou-as ao Horto cultivando,
desta forma, sua saudade, conhecimentos e fazeres. Além disso, o
Horto se transformou em um precioso ambiente de compartilhamento
de histórias de vida e relíquias em saúde e se consolida, cada vez mais,
como lugar de acolhimento, diálogo e partilha de conhecimentos,
laboratórios vivos de amplos aprendizados.

62 | O LIVRO DO HORTO
Outra característica que traz destaque ao trabalho comunitário
na Cruzeiro do Sul é a integração entre seus diversos atores, como
podemos constatar na imagem anterior, onde os Guardiões Mirins
distribuem plantas medicinais na feira do Grupo de Terceira Idade Raio
de Luz em frente ao USF, no ano de 2010.
Membros do Grupo de Terceira Idade Raio de Luz são presenças
constantes no Horto e acompanhadas dos agentes de saúde, dos
bolsistas de extensão e de moradores da comunidade cultivam saúde
em pequenos passeios aromáticos. Sem perder de vista que desfrutam,
no presente, as profundas e marcantes vivências do passado,
compartilhando conhecimento e a amizade, como na oficina de cheiros,
foto a seguir,realizada no Horto, onde foram estimulados os sentidos e
as lembranças.

A estreita convivência entre as integrantes do Grupo e os elos


que as mantém unidas, deu origem a colcha símbolo da relação entre
elas, conforme imagem a seguir. Produzida a muitas mãos, é produto
de muita criatividade e habilidade, e reúne milhares de pedaços de lã
trabalhados em diversos encontros. Cada quadradinho carrega consigo
muitas histórias, alguns sonhos e muitos segredos. Cada idosa fez sua
criação e, juntando esta produção, obtivemos uma verdadeira obra de

O LIVRO DO HORTO | 63
arte, que se tornou a identidade do Grupo, no mais diversos eventos em
que o Horto participa. Esta colcha as mantém unidas e em movimento.

Além das atividades vinculadas ao Horto, e observando seus


objetivos lúdicos, o grupo realiza passeios e comemorações. Abaixo,
foto de visita à Ilha da Pintada para um piquenique de integração e
de uma das culminâncias na celebração do dia do idoso em que foi
saudado por um poema de autoria da Professora Gema Conte Piccinini.

64 | O LIVRO DO HORTO
IDOSO É QUEM QUER

Quem quer viver muito SE IMPORTA


Quem tem motivos para viver COMPARTILHANDO VIDA.
Quem se sente amado
Quem se sente útil IDOSO QUE SE PREZA
Quem semeou o bem UM DIA VIRA ANCIÃO.
Quem trabalhou muito
ANCIÃO É AQUELE CARA
Idoso é aquele que sofreu Que está bem, apesar de tudo.
Amou, sonhou,
E não deu conta de tudo. ANCIÃO aprendeu a conviver
Idoso é o cara que deixou a deixar-se envolver de vida.
o velho ranzindo para traz.
Ancião é aquele
Idoso que se preza vai vivendo
que tem PAZ no olhar
VIVENDO intensamente
VIVENDO calmamente ANCIÃO,
APAIXONADAMENTE É VIDA VIVENDO.
DESPRENDIDAMENTE
O tempo que lhe resta viver. ANCIÃO NÃO MORRE,
Se mistura com a VIDA.
IDOSO QUE SE PREZA
apesar da catarata AQUI NO PSF

VÊ PRIMAVERA HÁ UM ESPAÇO DE VIDA


em todas as manhãs, De cura para os VELHOS,
Idoso que se preza se sente De ocupação para os IDOSOS,
jovem, e vai construindo De desfrute para os ANCIÕES.
sonhos ao som cadenciado do
toque da bengala no chão. O HORTO, ACOLHE

IDOSO QUE SE PREZA Velhos, Idosos e Anciões


Pode ter fala mansa. Porque nele tem VIDA
Ou gargalhar como criança. E vida em ABUNDÂNCIA.
Não importa.
Não importa se a úlcera furou
ou se o câncer chegou.
Não importa!

O LIVRO DO HORTO | 65
CAPITULO 4

UM LUGAR PARA TODOS

O que balizou o cotidiano no Horto em suas múltiplas e diferentes


faces, fases, formas, produções e vivências, foi, ao mesmo tempo,
a permanência de uns e o revezamento de muitos, fazendo com
que referenciais históricos, ideológicos e práticos oscilassem nessa
“sala de aula”. Momentos, ora influenciados por mestres trazidos da
Universidade como Morin9 - pela compreensão sobre complexidade;
Matos10 - sobre o cultivo de plantas; Steiner11 - que aborda a pedagogia
da educação integral; Capra12 - que usa a natureza e a educação,
como alfabetização ecológica e Tompkins13 - pela ciência da alma das
plantas; ora pelo aprendizado com educadores populares, sabedores
tradicionais, população e equipes envolvidas, enfim, o espaço se
consolidou como um lugar de muitas trocas.

9  Edgar Morim: Antropólogo, sociólogo e filósofo francês considerado um dos principais pen-
sadores contemporâneos e um dos principais teóricos da complexidade. (Fonte: Wikipédia).
10  Abreu de Mattos: Doutor em Farmacognosia, professor da Universidade Federal do Cea-
rá, criador do Projeto Farmácias Vivas, dedicado à assistência social farmacêutica por meio
das plantas medicinais.
11  Rudolf Steiner: Filósofo, educador, artista e esoterista.
12  Frijot Capra: Físico teórico e escritor que desenvolve trabalho na promoção da educação
ecológica.
13  Tompkins: Jornalista, americano, autor do livro A vida Secreta das Plantas.

66 | O LIVRO DO HORTO
O Horto também foi utilizado como apoio logístico para a
realização de encontros, projetos especiais, oficinas e apresentações,
mas a atividade cotidiana estava no cultivo da terra,cuidado das
plantas, momentos de contemplação e acolhimento de visitantes. As
contribuições para a vida comunitária podem ser percebidas em muitos
âmbitos. Porém, foi na área da educação o impacto mais significativo,
através da formação das crianças e da qualificação profissional, além da
ampliação da consciência social, dos estudantes que por lá construíram
sua experiência de viver comunidade. Alguns forjaram sua crítica em
relação à população carente vinculada aos serviços do Posto de Saúde.

O desenvolvimento de projetos de extensão, pesquisa e


ensino, vinculados a esta iniciativa, oportunizaram experiências
interdisciplinares únicas a esses acadêmicos. Vindos das mais diversas
áreas de formação, destacamos alunos da Enfermagem, Geografia,
Biologia, Agronomia, História, Filosofia, Medicina, Educação Física,
Farmácia, Fonoaudiologia, Odontologia, Serviço Social, Psicologia,
Arquitetura, Saúde Coletiva e Nutrição, entre os que escolheram
fortalecer sua vivência comunitária literalmente de pés descalços no
Horto Experimental da USF Cruzeiro do Sul.

A frequência e a intensidade dessas experiências aumentaram


após a socialização do Projeto com a comunidade do bairro Arquipélago
no Delta do Jacuí, especialmente na Ilha Mauá e da Pintada a partir da
experiência do projeto Convivências, no ano de 2011.

A ideia central em um espaço de saúde é a valorização da natureza


e sua contribuição para a manutenção da dinâmica ecológica do
conhecimento e desse espaço. O contato com a comunidade e com
as práticas compartilhadas sobre as plantas, suas propriedades e seus
usos, alimentam o sonho da efetivação dessa proposta como base para
a adoção da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares
- PNPIC, preconizadas pelo Ministério da Saúde - BRASIL, 2006.
O movimento dentro do Horto atravessou a porteira e dialogou com
escolas, creches, associações comunitárias e moradores da região.
Em 2011este diálogo se expandiu e fez ponte com o bairro Arquipélago,

O LIVRO DO HORTO | 67
criando uma rede de intercâmbio, interação e trocas. Fez do Horto um
espaço de práticas sociais enriquecedoras da essência de cada ser e
de cada grupo, aqui e acolá. Com isso, oportunizamos a expressão
do conhecimento e da aprendizagem que cada um pode ter com o
outro, estimulando a consciência, não só acerca da tradição local, mas
também sobre as riquezas humanas e ecológicas existentes nesses dois
lugares tão diferentes e tão iguais, de Porto Alegre. Tudo no Horto tem
um significado muito especial para alguém, para muitos e para todos.
A partir desta experiência, e ancorado no Delta, nasceu, no ano de 2011,
o Programa Ilhas de Conhecimento, que estendeu a rede de atividades
fortalecendo a parceria entre escolas de ensino fundamental.

O Horto da USF possui composteira14, minhocário15 e plantas:


medicinais, aromáticas e alimentícias, além de um espaço coberto
para reuniões. Tem também, árvores frutíferas e paisagismo eclético,
conforme os atores que nele vem deixar suas mudas, suas histórias,
suas marcas.

Através dos sonhos, projeções e “mão na massa”, em 2013, de


forma mais intensa, o Horto continuou sendo revitalizado. Definições
relativas a não realização de obras viárias que inviabilizariam o
local,foram definitivas para agilização do processo. E assim, o humus
do minhocário, o composto orgânico da composteira, a reestruturação
de canteiros, o escoamento do esgoto pluvial e o reforço das barreiras
sanitárias renovaram a face do Horto. No entorno da espiral16 construiu-
se uma cerca para fortalecê-la, protegê-la e embelezá-la.

Oportunizar vivências entre as crianças e os idosos é uma das


prioridades no Horto. O trabalho com as crianças em meio natural

14  Composteira: Espaço de reciclagem de produtos orgânicos (ex: cascas, frutas, folhas,
fezes de animais) para produzir alimento para as plantas.
15  Minhocário: Sistema de reciclagem do lixo orgânico caseiro, onde minhocas transfor-
mam restos de alimento em húmus, adubo.
16  Espiral: canteiro construído em formal de espiral com a finalidade de concentrar ener-
gias, harmonizar cultivos, facilitar vivencias e acrescentar novas plantas, sementeiras e placas
de identificação de espaços para atividades socioeducativas e de espiritualidade.

68 | O LIVRO DO HORTO
é uma experiência única. Motivadas, espontâneas e dispostas, elas
transformam um simples encontro em um momento especial e
produtivo. Ao compartilhar uma simples técnica de plantio, fazendo
dinâmicas de integração e de contato direto com a natureza, a criança
é estimulada a se expressar a partir da essência do seu ser e faz suas
descobertas. O Horto, lugar para todos, hoje e sempre.

Já para os idosos, a iniciativa, além de valorizar as culturas


tradicionais e garantir seu conhecimento e permanência, insere este
público em um espaço específico de interação geracional garantindo a
troca e o intercâmbio, preconizados pelo projeto, transformando-o em
um laboratório vivo de múltiplas culturas e conhecimentos.

O LIVRO DO HORTO | 69
4.1. A VIDA DO HORTO PÓS-TÉRMINO DO CULTIVO
FITOTÉCNICO

Ao longo dos oito anos de existência do Horto, após a conclusão


da experiência fitotécnica das doze plantas selecionadas, passou-se
a cultivar outras espécies medicinais, nativas e exóticas, bem como
hortaliças e árvores. Estas culturas foram objetos de oficinas, trocas e
doações. No quadro, a seguir, estas espécies foram catalogadas e estão
classificadas em ordem alfabética:

70 | O LIVRO DO HORTO
A B C
Abacateiro, Babosas de Cabaças-esponjas,
Abóboras, Alecrim, diferentes espécies, Camomila, Cânfora,
Alevante, Alface, Bálsamo alemão, Capim cidró, Carqueja,
Alfazema, Alipia Alba, Bananeira, Cavalinha,Cebolinha,
Alho, Arnica, Batata doce, Cenoura, Chuchus,
Artemísia - 3 espécies: Bardana, Beldroega, Cipó milhome,
da môxa, Berinjela, Bertalha, Citronela, Coentro,
das frituras e Beterraba Confrei, Couve,
dos licores de absinto Cravo de sagu,
Cravos, Cúrcuma

E F G
Erva de Santa Maria, Fisalis, Gerânio, Girassol,
Erva de Santa Luzia, Flor do Mel, Goiabeira, Guaxuma,
Erva mate, Folha da Fortuna, Guiné
Espada de São Jorge, Frágole,
Espinheira Santa, Fumo brabo,
Estévia Flor do beija-flor

H I L
Hibisco Insulina Lança de ogum,
Limoeiro,
Linhaça,
Lírio da paz

M O P
Malva Cheirosa, Ondas do mar Parreira,
Mamoeiro, Mamona, Penicilina,
Manjericão, Pepino,
Manjerona, Picão branco,
Maracujá, Picão preto,
Maria pretinha, Pimentões,
Mastruço, Melissa, Pinheiro,
Mil em rama, Milho, Pitangueira,
Moranguinho Pulmonária

Q R S
Quaresmeira, Rabanete, Sabugueiro,
Quebra pedra Radicci, Salsa,
Roseira, Salvia,
Rúcula Sinamomo

T X Y
Tiririca, Xuxu Yacon
Tomate arbóreo,
Tomate cereja,
Tomilho

O LIVRO DO HORTO | 71
4.2. ESPIRITUALIZANDO O HORTO

Em 2008 o espaço dos fundos do horto foi revitalizado com a


construção de um grande canteiro em espiral para vivências múltiplas
em saúde, incluindo bioenergia17 e espiritualidade18 . Medindo 43
metros de extensão espiralada em três voltas, que pode ser visualizado
na imagem a seguir,o canteiro de mais ou menos um metro de largura
foi construído com ajuda de estudantes e comunidade local.

17  Bioenergia: por acreditar na força energética individual de cada planta e sua ação no
corpo humano, concepção adotada no texto.
18  Espiritualidade: Esse espaço da espiral se tornou em centro de espiritualidade ecológica
cultivada. Acesso ao leste através do portal com a placa de “Vá ao centro”. Compreende um
túnel de luz coberto de cristais, imagens, estatuas,placas coloridas, plantas e flores. (signifi-
cado assumido no texto).

72 | O LIVRO DO HORTO
O portal de entrada, foto abaixo, aberto no sentido do sol nascente
apresenta uma placa indicativa do caminho a ser percorrido até o centro
da espiral, orientando o visitante no processo de vivência.

A caminhada na espiral foi um detalhe especial e espacial do Horto


onde a aprendizagem, tanto individual como a grupal se processou
muito mais na vivência do que na escuta.

Após algum tempo de sua criação, as visitas intensivas à espiral


do Horto, demandaram o fortalecimento da proteção externa de todo
o canteiro com uma cerca de madeira que servia também de apoio as
plantas maiores.

Os cultivos e a distribuição de plantas levaram em consideração


cores, aromas, formas, texturas e seu potencial terapêutico.

O LIVRO DO HORTO | 73
O Horto iniciou com perspectiva de se tornar Farmácia Viva19.
Aos poucos foi se transfigurando em um laboratório de vivências
socioeducativas e tradicionais em saúde. Acessos individuais ou
em grupos, em busca de boa energia, conhecimento, integração,
desaceleração, troca de plantas, partilha, sossego foi dando o tom de
um espaço de Espiritualidade Ecológica20.

19  Farmácia Viva - conceito adotado no texto.


20  Espiritualidade Ecológica: Carta Encíclica do Sumo Pontífice Francisco Laudato Si’ Louva-
do seja. Sobre o cuidado da casa comum. Papa Francisco, 2015

74 | O LIVRO DO HORTO
O LIVRO DO HORTO | 75
CAPÍTULO 5

OS AMBIENTES DO HORTO

O Horto apresenta uma estrutura que contempla diversos espaços


destinados a múltiplos usos e funções e, neste capítulo, apresentamos
cada um deles a fim de ilustrar esta diversidade.

A pérgola é um espaço nobre, é a “sala” do Horto. Comparando


com nossa casa, escolhemos a “sala” para denominar o espaço coberto
do Horto. Outras denominações poderiam ser adotadas para este
local. Poderíamos chamá-lo de Hall de entrada, varanda, alpendre,
caramanchão, local de proteção, ponto de encontro, espaço de
meditação, sala VIP, telhado vivo e muitas outras denominações, tendo
em vista suas múltiplas funções.

Esse espaço, inicialmente coberto com sombrite21, foi criado


emergencialmente, em 2007, como ilustra a foto na página 79, para
proteger as pequenas mudas e as sementeiras produzidas no quintal
da casa de Seu Bomfim. Sob essa cobertura nos recolhíamos nas horas
mais quentes, em momentos de reflexão, para o tratamento das plantas
em observação, para produzir mudas ou receber os visitantes.

21 Sombrite:.Tem a função principal de proteção das plantas contra o sol. A nomenclatura


é dada em porcentagem e se refere a quantidade de proteção da luz, ou seja um sombrite de
60% só deixa passar 40% dos raios solares.

76 | O LIVRO DO HORTO
5.1. ESPAÇO DA CRIAÇÃO: SALA 220 E À SOMBRA DA TIPUANA

A coordenação do projeto tinha como base a sala 220 da Escola de


Enfermagem, que é lembrada carinhosamente pelos bolsistas desde a
década de noventa como um espaço de orientação, avaliação, elaboração
de relatórios, preparo de trabalhos, planejamento, celebrações. Partes
desses registros estão materializados em formas de fotos, livros, troféus,
pôsteres e estão guardados no armário com o código 3066, ponto de
partida para a construção deste livro. Dentro da sala foram trocadas
diversas energias e fluidos de acordo com cada época e cada bolsista.
Nestas fotos abaixo o essencial é quase invisível.

A foto à esquerda registra o flagrante de uma Vivência de Kántele.


Da direita para esquerda: Sofia, Franciele, Andrya, Liv, Bruna, e a profª
Adriana. Na foto abaixo Camila e Mel ensaiando uma oficina.

O LIVRO DO HORTO | 77
A Tipuana por mim
(autora) adotada no
50º da EEnf projeto
de extensão “50 anos
de memória verde”.

À sombra da Tipuana muitos encontros de planejamento, preparo


de sachês aromáticos, celebrações, enfim, a Escola de Enfermagem, por
dentro e por fora dando suporte à extensão de periferia. Esta árvore é a
mais antiga no pátio da Escola e guarda um segredo.

Chegando no Horto encontra-se a seguinte mensagem de boas-vindas:

78 | O LIVRO DO HORTO
Passado esse período, o espaço foi alterando sua configuração tanto
no que diz respeito à construção, como com relação à funcionalidade.
Ele foi se ajustando às necessidades de seus usuários que podiam ser
integrantes da equipe de saúde, os bolsistas, ou ainda, os guardiões e
seus familiares.

Além destas mudanças, as alterações na cobertura, no solo, nos


objetos produzidos artesanalmente, como mesas e bancos foram
muitas. Algumas podem ser percebidas nas diversas imagens que
ilustram esta publicação, porém outras constam apenas na memória de
quem as acompanhou.

O LIVRO DO HORTO | 79
A utilização do Horto como espaço de descanso, sempre foi, e
permanece sendo, prática comum para os servidores do PSF, mas além
desta função servia também como uma sala para reflexões. Os bancos
e a mesa de madeira foram improvisados a partir de reciclagens. Nas
imagens,a seguir, pode ser visto que ele vai tomando sentido de saúde
e bem estar, um espaço terapêutico.

80 | O LIVRO DO HORTO
Por tratar-se de construções elaboradas pela comunidade, sem
contar com mão-de-obra especializada para tanto e, também por utilizar
sempre materiais oriundos de reciclagem, submetidos à exposição e
variações climáticas, o ato de construir e reconstruir foi uma constante
na vida do Horto. Estas fases são ilustradas nas fotos abaixo.

O acolhimento de visitantes foi um dos usos mais constantes da


Pérgola, servindo como espaço de partilha de sonhos e construção de
algumas realidades.

O LIVRO DO HORTO | 81
Outra utilização enfatizada neste ambiente é como sala de aula
alternativa. Muitas oficinas, experimentos, observações e estudos foram
desenvolvidos no local envolvendo os Guardiões Mirins e acadêmicos
dos diversos cursos da Universidade, além dos Agentes de Saúde da
ESF.

82 | O LIVRO DO HORTO
A “sala” também foi utilizada para a projeção de filmes. Na
atividade batizada como Cinema no Horto foram apresentados filmes,
como o “Mágico de Óz”, onde após a projeção, crianças vivenciaram o
que assitiram, percorrendo o caminho amarelo de Dóroti andando na
espiral do Horto.

Imagem acima mostra instante em que Dóroti aparece na tela


durante a projeçao do filme.

O LIVRO DO HORTO | 83
Além disso, a comunidade, em várias oportunidades, foi convidada
a participar de iniciativas no Horto e, em muitas delas, o ambiente serviu
de espaço de celebrações e integração.

A realização de oficinas também possibilitou a inserção e troca


de conhecimentos entre todos os participantes da vida e dinâmica do
Horto e a abordagem dos mais variados temas aproximou muito as
pessoas, porém os assuntos relacionados com alternativas e práticas
em saúde sempre foram prioritários.

84 | O LIVRO DO HORTO
O LIVRO DO HORTO | 85
CAPÍTULO 6

O HORTO COMO ESPAÇO DE ENSINO,


PESQUISA E EXTENSÃO: COMO FOI ISSO
NA PRÁTICA?

Veio o ensino e ficou;


Acolheu a extensão e casou;
Chegou a pesquisa e enraizou a ciência no lugar;
Que foi criando vida.

Este capítulo apresenta uma reflexão sobre o Horto e a prática


acadêmica, nesse lugar de periferia de Porto Alegre onde a Universidade,
junto com as equipes de saúde vem forjando a formação humana e
profissional de seus alunos, principalmente da Enfermagem. É difícil
identificar separadamente as ações de Ensino, Pesquisa e Extensão,
porque na prática estas foram criando-se juntas, no caminho trilhado,
pouco documentado, mas muito vivido no período entre os anos de
1996 e 2014.

Neste tempo-espaço muitas mudanças aconteceram: na


universidade, no sistema de saúde, no distrito Glória-Cruzeiro-Cristal
e na comunidade, e o grupo viveu essas mudanças. Este trabalho é o
retrato de práticas acadêmicas vitalizadas no convívio fraterno e no

86 | O LIVRO DO HORTO
sensível cotidiano do viver a periferia no âmbito do ensino, pesquisa e
extensão, focado no Horto e sua abrangência.

A UFRGS está presente nesse território desde a década de 70,


através do curso de Enfermagem, cruzando também com estudantes
de Medicina, em atividades de ensino e extensão. Vivendo essa
realidade perceberam-se questões de pesquisa que foram trabalhadas
principalmente dentro da proposta da Alfabetização Ecológica de Frijot
Capra. A partir da iniciativa da PROPESQ22 em tornar a Pesquisa mais
acessível e, utilizando a linha Ciência na Sociedade, Ciência na Escola,
PROPESQ-POP23, em 2009 foi introduzida a modalidade de ciência
junto às crianças e a comunidade. Tendo como referência o Horto,
foram construídos e desenvolvidos projetos integrados. Este trabalho
completou, em 2015 sua 6ª edição.

A seguir estão registrados alguns fragmentos e referência das


seis etapas executadas, com diferentes bolsistas, dos diversos cursos,
trabalhando de forma integrada. Estas iniciativas abrangem, na Vila
Cruzeiro, a Escola Estadual de Ensino Fundamental Almirante Álvaro
da Motta e Silva, Escola Infantil Dollabella Portela, Horto da USF e a
comunidade. Na Ilha da Pintada fazem parte a Escola Estadual Almirante
Barroso, crianças e mulheres da AAAPIP, Grupo de Mulheres da USF,
famílias de pescadores e grupos da comunidade.

Quando a UFRGS aumentou sua presença na Vila Cruzeiro, levando


todos os cursos da área de Saúde, ampliou o potencial de partilha e de
conhecimento entre a população e a Universidade.

22 PROPESQ - Pró-Reitoria de Pesquisa


23 Vertente criada pela Pró-Reitoria de Pesquisa em 2009 sob denominação Ciência na
Sociedade e Ciência na Escola conhecida como POP

O LIVRO DO HORTO | 87
6.1. ENSINO - DISCIPLINAS NO HORTO

Além da função ecológica de conhecimento de plantas, usos


terapêuticos, técnicas de cultivo e produção de mudas, o Horto serviu
de cenário de aula de várias disciplinas acadêmicas entre elas:

6.1.1 DISCIPLINA ENFERMAGEM COMUNITÁRIA/ENF 3006

É uma disciplina semestral que visa oportunizar aos acadêmicos de


enfermagem vivenciar o que é ser enfermeira na comunidade, conhecer
a realidade e interagir de diferentes formas na promoção da saúde
individual e coletiva, em sintonia com a Equipe de Saúde em diferentes
situações e espaços, tais como: atendimento domiciliar, em escolas,
creches, em ONGs e outros espaços coletivos como o Horto.

88 | O LIVRO DO HORTO
Acadêmicas de enfermagem em estágio de prática disciplinar na
Atenção Básica, utilizam o Horto como sala de aula, compartilhando
práticas e saberes com crianças, estimulando a percepção da vida no
ambiente, formas, cores, aromas e sabores. Desenvolvendo a escuta
sobre os conhecimentos e práticas em família através de oficinas,
vivenciam técnicas de cultivo do solo, degustação de produtos do
Horto, produções de artefatos e parcerias com a comunidade e bolsistas
de extensão. E o acolhimento de visitantes, em busca de plantas, gera
produção de conhecimento e reflexão sobre a prática acadêmica em
construção. Na imagem a seguir se verifica a construção de soluções de
espaço à sombra do abacateiro.

O LIVRO DO HORTO | 89
6.1.2 DISCIPLINA INTEGRADORA: ODO99037 - PRÁTICAS
INTEGRADAS EM SAÚDE (2013)

A maioria das disciplinas dos cursos da área da saúde, excetuando


as da Enfermagem, não tinham essa presença na comunidade. Em
decorrência disso, foi criada pelo COORSAUDE24 uma disciplina
envolvendo todos os cursos com a finalidade de oportunizar vivências
interdisciplinares em sala de aula e em territórios de saúde de Porto
Alegre. Participam acadêmicos dos quinze cursos de saúde, contanto que
as respectivas COMGRADs25 disponibilizem professor e determinem
seus pré-requisitos.

24  COORSAUDE: Coordenadoria de Saúde, criado em 2008, é um órgão colegiado vin-


culado à Pró-Reitoria de Graduação – PROGRAD/UFRGS, formado pelas Coordenações dos
Cursos de Graduação da área da saúde e pelos projetos desta área da Universidade. Parceria
com a Secretaria Municipal de Saúde e no Distrito Glória Cruzeiro Cristal.
25  COMGRADS: Comissões de Graduação, dos Cursos de Graduação UFRGS.

90 | O LIVRO DO HORTO
Nas imagens há o registro da vivência dos alunos da Disciplina
Integradora, onde participam da vivência de “Ir ao centro”, no canteiro
espiral do Horto. O espaço vem sendo um importante ponto de
encontro, um local de escutas, falas, trocas e de muita aprendizagem
com os grupos em estágio de Enfermagem comunitária, Estágio
Curricular, Bolsista de Extensão, POP, Equipe de Saúde e comunidade.
Para os encontros de partilha e escutas a sala de aula torna-se pequena
e incapaz de proporcionar tantos aprendizados.

6.1.3 DISCIPLINA: ENF3066 - PRÁTICAS INTEGRATIVAS E


COMPLEMENTARES EM SAÚDE (2014)

Disciplina criada para oportunizar aos acadêmicos conhecer e


vivenciar práticas em saúde não convencionais do SUS26, presentes nas
comunidades, atendendo o preceito da equidade e o reconhecimento
do saber popular. Esta disciplina foi desenvolvida em módulos em
diferentes lugares de Porto Alegre.

26  SUS: Sistema Único de Saúde.

O LIVRO DO HORTO | 91
Abaixo, cartaz de divulgação da disciplina.

Práticas Integrativas e Complementares em Saúde:


Uma disciplina para todos

Semeando saúde. Cultivando vidas.

92 | O LIVRO DO HORTO
6.2. PESQUISA – POPULARIZAÇÃO DA CIÊNCIA

As pesquisas relacionadas com o Horto se direcionaram dentro


da perspectiva da popularização da ciência. Vertente criada pela Pró-
Reitoria de Pesquisa em 2009 sob denominação Ciência na Sociedade e
Ciência na Escola conhecida como POP. Tendo como base Alfabetização
Ecológica, foram desenvolvidas seis edições anuais envolvendo o
Horto, escolas, grupos, a população e o conhecimento tradicional
local, utilizando metodologias participativas. Cada bolsista desenvolveu
relacionamentos específicos com escolas, idosos, grupos, espaços e
lugares. Esta iniciativa expandiu-se para a Ilha da Pintada na mesma
proporção.

A seguir estão elencados os projetos desenvolvidos pelas bolsistas


ao término do seu respectivo ano de atuação, ou apenas resumos
para apresentar em eventos científicos com a síntese de cada trabalho
desenvolvido entre 2009 e 2016.

6.2.1 REAÇÕES E MOTIVAÇÕES DE UMA TURMA


PRÉ-ESCOLAR DIANTE DE UM PROJETO DE ALFABETIZAÇÃO
ECOLÓGICA27
BOLSISTA: CARMEM JANETE REKOWISKY - ACADÊMICA
DE GEOGRAFIA

Trabalho desenvolvido durante o Projeto Alfabetização Ecológica.


Esse Projeto tem o objetivo de ampliar o contato com a natureza por
crianças de pré-escola e de ensino básico na Vila Cruzeiro do Sul/Porto
Alegre, através de vivências práticas, principalmente no manuseio de
plantas medicinais, hortaliças e pequenos animais. A primeira etapa foi
desenvolvida em uma creche da Vila e no Horto Ecológico Cruzeiro
do Sul, por meio de oficinas com crianças com idades entre quatro
e cinco anos. A partir desse cenário, a pesquisa formula a seguinte
questão: quais as reações e motivações de uma turma pré-escolar ante

27  Disponível em :http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/41586/Resumo_154.


pdf?sequence=1

O LIVRO DO HORTO | 93
o desenvolvimento de um projeto ecológico na escola de educação
infantil? A justificativa para essa questão reside no fato de a educação
ambiental ser um processo contínuo e importante na formação
individual e coletiva e, se observada desde cedo, os resultados podem
ser potencializados. A geografia, como disciplina que incorpora saberes
tanto da natureza quanto da sociedade, tem um papel integrador nessa
busca. O objetivo geral da pesquisa é observar como acontece a relação
das crianças com o natural em situações de contemplação, interação e
modificação. Assim, os objetivos específicos são: observar mudanças
de comportamento das crianças com o avanço das oficinas; identificar
as principais motivações para participar das atividades e investigar a
afetividade e a curiosidade infantil como propulsoras do conhecimento.
Pretende-se atingir os objetivos através de registros escritos e fotográficos
(individuais e coletivos), após cada oficina, tanto nasala de aula quanto ao
ar livre. Uma vez que a pesquisa está em desenvolvimento não há ainda
resultados consolidados, mas é possível antecipar que atividades como
“contação” de histórias e vivências práticas (como cultivo do horto)
são promissoras na aproximação positiva das crianças com o natural.

6.2.2. ALFABETIZAÇÃO ECOLÓGICA EM SAÚDE28


BOLSISTA: MELINA GONÇALVES - ACADÊMICA DE BIOLOGIA

O projeto Alfabetização Ecológica em Saúde em sua segunda


edição iniciou em junho de 2010, sendo finalizado em maio de 2011.
Tendo em vista a possibilidade de atuar junto a comunidade buscando
ampliar o contato de crianças da escola do ensino básico da Vila Cruzeiro
do Sul/Porto Alegre com o mundo natural, realizaram-se oficinas de
alfabetização ecológica no Horto Ecológico Cruzeiro do Sul ao lado do
Posto de Saúde da Família com crianças da comunidade e na Escola
Motta e Silva. O projeto se desenvolveu em parceria com acadêmicos
integrantes de outros programas da universidade como o PET saúde e
outros programas da universidade.
Iniciando com a construção de um espaço saudável de a

28  Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/71005/Fei-


raIC2011_2011111.pdf?sequence=1

94 | O LIVRO DO HORTO
prendizagem ao ar livre em uma área abandonada cedida pela direção
da escola Estadual Motta e Silva, realizaram-se oficinas que buscavam
integrar conhecimentos nos campos da ecologia em saúde. Através
de práticas de horta, cuidado e planejamento do espaço e atividades
lúdicas, focalizando ações que procuram exercitar o envolvimento
interpessoal, a responsabilidade com o ambiente e com os espaços
coletivos, o cuidado de si, o despertar da curiosidade e consciência das
relações ecológicas e humanas. Dessa forma deu-se continuidade das
atividades também, no Horto Ecológico Cruzeiro do Sul.

O Horto de Plantas Medicinais da vila Cruzeiro do Sul e a


Escola Estadual Motta e Silva deram suporte para a realização das ações
do projeto Alfabetização Ecológica em Saúde, possibilitando assim o
envolvimento de estudantes da UFRGS com as práticas educacionais
em contato com a comunidade. E dessa forma, abrindo possibilidades
de atuação profissional para os acadêmicos e de vivenciar e fortalecer o
espírito cientifico nato das crianças que participaram das atividades.

6.2.3. ALFABETIZAÇÃO ECOLÓGICA EM SAÚDE: PELA CURA


DA TERRA29
BOLSISTA: DÉBORA DA SILVA - ACADÊMICA DE BIOLOGIA

A alfabetização ecológica é um processo de aprendizagem dos


princípios que organizam a vida na Terra. A partir dela podemos
compreender, ambientalmente, o mundo em que vivemos e contribuir
para a saúde do homem e para a sustentabilidade do planeta. Por
meio da vivência, procuramos tomar consciência do lugar a que
pertencemos, de que também fazemos parte da teia da vida e estamos
inseridos num ecossistema, numa paisagem natural com uma flora e
fauna características, num determinado sistema social e cultural. Nosso
projeto almejou transmitir valores ecológicos e ambientais às crianças e
comunidade da Ilha da Pintada, bairro Arquipélago, município de Porto
Alegre, buscando o resgate e a sustentação do vínculo com a terra,

29  Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/71005/Fei-


raIC2011_2011111.pdf?sequence=1

O LIVRO DO HORTO | 95
com a ancestralidade e cultura locais. Por meio de atividades vivenciais
dentro e fora dos muros da escola, buscamos envolver e despertar a
consciência e o interesse das crianças pelo mundo natural, cultural e
social que as cercam. Acreditamos que estes espaços de trocas de saberes
e as experiências vividas proporcionaram aprendizados valiosos para a
compreensão do mundo e formação de valores ambientais e sociais de
todos os envolvidos no projeto. Cremos que uma verdadeira apreensão
de valores ecológicos requer consciência do valor social e cultural da
própria comunidade, bem como de suas formas de interação com o
ambiente. Por essa perspectiva etnobiológica, intencionamos criar redes
comunitárias, propiciando integração entre diferentes escolas do bairro,
e destas com a sede da APA – Delta do Jacuí (SEMA), Associação dos
Amigos, Artesãos e Pescadores da Ilha da Pintada (AAAPIP) e Colônia de
Pescadores Z5. Nossos resultados são as sementes plantadas nas mentes
e corações das crianças, senhores e senhoras da Ilha que permitiram
envolver-se nas atividades por nós propostas. O trabalho realizado pelo
Projeto Alfabetização Ecológica em Saúde: Pela Cura da Terra germinou
e levou à ilha o grupo de Museologia da UFRGS que trabalha com museu
popular, ou seja, com as memórias da comunidade, exatamente uma
das linhas de trabalho desenvolvidas pelo projeto na Ilha. Aprendemos,
pois, que para transmitir valores ambientais às pessoas é necessário
trabalhar a relação destas e seu ambiente, respeitando suas tradições
e cultura.

6.2.4. ALFABETIZAÇÃO ECOLÓGICA EM SAÚDE PELA CURA DA


TERRA - TRANSPONDO EM 201230
BOLSISTA: BRUNA FIORENTIN – ACADÊMICA DE PSICOLOGIA

Inicialmente, dando sequência à edição anterior do Projeto,


construiu-se mais um exemplar do jornal “Angazeiro” na Ilha da Pintada
com as crianças da Escola Almirante Barroso, retratando a importância
do Meio Ambiente e como sentimos/agimos com o ambiente que nos
cerca. Logo após, seguimos o percurso da “contação” de histórias;

30  Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/93303/Fei-


raIC2013_33266.pdf?sequence=1

96 | O LIVRO DO HORTO
iniciado por Débora e Ricardo no período anterior - dando continuidade
valorização da memória, sempre presente nos objetivos do Projeto. No
primeiro livro que construímos, transcrevemos a história de Seu Alfredo,
o pescador mais antigo do Delta, e sua esposa Sueli. Seguimos, com as
crianças, confeccionando livros das histórias contadas pelos anciãos.
Ilustrado pelas crianças e por nós, o livro da Vó CACO, benzedeira
consagrada da Ilha, materializou uma história de milagres, rezas, cura,
amor, desafios em meio às águas do Delta. Através dos ensinamentos
de F. Capra, compreendemos que a vida se baseiaem entender três
fenômenos: o padrão básico de organização da vida é o da rede ou
teia; a matéria percorre ciclicamente a teia da vida; e todos os ciclos
ecológicos são sustentados pelo fluxo constante de energia proveniente
do sol. Trilhamos nosso caminho tentando transmitir estas ideias com
nossos recursos ecológicos, sociais, afetivos para tecer estas teias com
nossas próprias mãos. Assim, realizamos a Oficina dos Filtros dos Sonhos
da Ilha da Pintada. Depois de um processo de planejamento, coleta de
material orgânico na Ilha, convite para comunidade, realizamos o tear
refletindo a história dos índios que criaram este artefato de proteção,
as memórias da noite de sono de cada um, a história da Ilha e de seus
moradores, e as memórias do Projeto Alfabetização Ecológica. Seguindo
nos ensinamentos de Capra, celebramos o astro Rei - Sol. A Vila Cruzeiro,
onde iniciou a primeira edição deste Projeto com a bolsista Carmen, foi
o berço deste caminho há 4 anos; pensamos que seria um bom fim de
ciclo voltarmos para Vila, valorizarmos nossas origens, entendermos
que se estamos aqui, é porque alguém iniciou o processo e cedeu seu
lugar para nós. A Oficina do Dia do Sol no Horto da Cruzeiro foi o nó
que uniu o fim de um ciclo com o início de outro. Os novos bolsistas
chegam e vivenciam estas redes já tecidas – tecendo novas. A última
contribuição de registro que realizamos foi a construção do grande Livro
do Ilhas de Conhecimento, este engloba todos os trabalhos escritos que
fizemos durante os anos de Alfabetização Ecológica. A Alfabetização
Ecológica em Saúde, Pela Cura da Terra – transpondo 2012 foi mais
uma edição de um Projeto que se faz pelo método da convivência, da
popularização da ciência através do contato com a comunidade e sua
cultura; o aprendizado é horizontal e transdisciplinar.

O LIVRO DO HORTO | 97
6.2.5. ALFABETIZAÇÃO ECOLÓGICA31
BOLSISTA: CÂNDICE BOLZAN – ACADÊMICA DE EDUCAÇÃO
FÍSICA

A alfabetização ecológica é um processo de aprendizagem dos


princípios que organizam a vida na Terra. A partir dela podemos
compreender o mundo em que vivemos e contribuir para a saúde do
homem e a sustentabilidade do planeta. O padrão básico da organização
da vida é o da rede ou da teia; a matéria percorre ciclicamente a teia da
vida e todos os ciclos ecológicos são sustentados pelo fluxo constante
da energia proveniente do sol. Esses fenômenos básicos são exatamente
os fenômenos que as crianças vivenciam, exploram e entendem por
meio de experiências diretas com o mundo natural. Por meio de tais
experiências tomamos consciência de que também fazemos parte da
teia da vida, e, com o passar do tempo, a experiência da ecologia na
natureza nos proporciona a consciência do lugar a que pertencemos.
Para as pessoas que vivem no meio urbano as hortas, hortos (um dos
espaços de nossas ações), jardins e parques constituem, por vezes, a
única ligação com o mundo natural. Estes espaços podem proporcionar
aprendizados valiosos para a compreensão do mundo e formação
de valores ambientais e sociais. Os jogos e brincadeiras tradicionais
infantis são atividades passadas de geração a geração, em geral
aprendidas pelas crianças mais novas com as de mais idade, durante
o próprio ato de brincar. A partir do resgate da memória ancestral dos
idosos em interação com as crianças da Ilha da Pintada e Vila Cruzeiro
do Sul, buscamos despertar a consciência da conservação e otimização
dos recursos naturais e reviver os jogos e brincadeiras tradicionais
presentes na comunidade, valorizando as relações entre as crianças e os
idosos e suas práticas de lazer e saúde. Cremos também que o ensino
em um ambiente informal de aprendizagem, aproxima comunidade e
universidade, que juntas, (re)descobrem e (re)significam as ciências e
suas ações. A partir de pesquisa, oficinas e rodas de conversas entre
crianças e idosos, revivemos a história e a prática de jogos e brincadeiras

31  Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/93339/Fei-


raIC2013_33590.pdf?sequence=1&locale=en

98 | O LIVRO DO HORTO
tradicionais e confeccionamos brinquedos e jogos a partir de tais
experiências. Nossa intenção é provocar o reconhecimento sensível e
científico da riqueza do ambiente e da cultura local, e, por conseguinte,
o resgate da valorização pessoal, tornando os ilhéus e os parceiros da
Vila Cruzeiro guardiões do seu ambiente, de sua ancestralidade, e de si
mesmos.

6.2.6. ALFABETIZAÇÃO ECOLÓGICA E INCLUSÃO


TRADICIONAL
BOLSISTA: JANAÍNA LONGHI - ACADÊMICA DE HISTÓRIA

O projeto da 6ª edição foca-se no múltiplo aprendizado sobre


práticas e crenças antigas e ancestrais, pensando a relação entre o
tradicional e o moderno existente nas comunidades, objetivando
proporcionar a revitalização e a ressignificação das memórias e
experiências de vida dos moradores das comunidades Ilha da Pintada, no
bairro Arquipélago, e Cruzeiro do Sul, no bairro Santa Tereza. Pensando
na importância de refletir sobre as grandes transformações percebidas
ao longo do tempo, sobre as vivências passadas e sobre nossas relações
com o ambiente (natural e social) que nos cerca, o projeto buscou
nas memórias (materiais e imateriais) dos idosos a base para essas
reflexões. O projeto desenvolve entrevistas, observações e rodas de
conversa, visando construir práticas que valorizam e empoderam esses
indivíduos, e assim proporcionar uma intensa troca de conhecimentos
e experiências, além de contribuir para uma conscientização sobre as
histórias e os saberes das comunidades. A memória, assim, se torna a
preciosa fonte a qual buscamos e para refletirmos sobre nossas vidas,
sobre o passado e o presente e sobre as complexas transformações no
mundo ao nosso redor.

6.2.7. ALFABETIZAÇÃO ECOLÓGICA INTEGRANDO PRÁTICAS


DO CUIDADO COM GESTANTES E PUÉRPERAS
BOLSISTA: PÂMELA SILVA - ACADÊMICA DE RELAÇÕES PÚBLICAS

A proposta da sétima edição da Alfabetização Ecológica, foi


construída com enfoque de trabalho com gestantes e puérperas,

O LIVRO DO HORTO | 99
mediante o perfil da bolsista selecionada. No meio do processo de
desenvolvimento houve o abandono e a necessidade de substituição
da bolsista. Após resolver a questão, a nova bolsista foi orientada a se
dedicar à compreensão do processo das sete edições consecutivas e
na análise da caminhada feita, buscando documentos e registros de
trabalhos, resultado de um artigo. Este então faz a reflexão de como a
pesquisa se encontra com a extensão e o ensino, na prática.

6.3 EXTENSÃO: O HORTO COMO CENÁRIO DA PRÁTICA

A Extensão entrou no Horto através do Grupo dos Guardiões


Mirins. Em atividades de estágio ou com bolsistas de Extensão ou POP na
Vila Cruzeiro, hortos foram sendo construídos como se fossem rizomas
brotando por onde se andava. Por este caminho foram conectados a
outros atores sociais na própria comunidade – Escola Estadual de
Educação Fundamental G Mota e Silva e Escola Infantil Nossa Senhora
de Nazaré, no bairro Agronomia - Escola Infantil Pitoresca, na Ilha dos
Marinheiros, na Ilha das Flores, Ilha da Pintada e Mauá, sempre no
intuito de tentar, junto a cada comunidade, construir propostas coletivas
de sustentabilidade a partir de demandas, engajamentos e da realidade
local.

6.3.1 ESCOLA INFANTIL PITORESCA

No bairro Agronomia, Vila Pitoresca, foi construído no pátio


da Escola Infantil um “hortinho”, durante o estágio da Enfermagem
Comunitária, posteriormente mantido como projeto de Extensão.

100 | O LIVRO DO HORTO


Nesta escola houve um engajamento imediato de funcionários
e professores, o que facilitou o processo de cultivo e manutenção da
pequena horta. Além de plantas medicinais produziram-se, no local,
insumos para merenda escolar.

6.3.2. EEEF ALMIRANTE ÁLVARO DA MOTTA E SILVA

No próprio território de atuação do PSF Cruzeiro muitos trabalhos


foram realizados no intuito de construir um espaço especial. O espaço
escolhido foi o fundo da escola, onde existia um grande depósito de
entulho. Ali, as atividades envolveram alunos das disciplinas e da
POP, pois havia parceria e sonhos. Nas fotos mostra-se o espaço e o
movimento criado por visitantes, como congressistas da ABRASCO32 e
de outros brasileiros e estrangeiros que militam na Educação Popular e
na promoção das populações de periferia.

32  ABRASCO – Associação Brasileira de Saúde Coletiva

O LIVRO DO HORTO | 101


6.3.3. INSTITUTO DE EDUCAÇÃO INFANTIL MARIA DOLABELLA
PORTELA

Semeando o futuro, crianças do Instituto de Educação Infantil


Maria Dolabella Portela visitaram o Horto acompanhadas de acadêmicos
do Curso de Enfermagem em estágio junto a ESF. Após estas visitas
multiplicam o conhecimento realizando oficinas na escola e fazendo
a síntese do aprendizado. Além disso, desenvolvem atividades de
promoção da saúde escolar, fora da escola. Nessas vivências, as crianças,
sob orientação ou espontaneamente, desenvolvem sua curiosidade
científica natural, dando trabalho para quem os acompanha. Estes
momentos se revestem de aprendizado para todos. Para as crianças,
encarados aparentemente como lazer, para os acadêmicos e professores,
além do gostoso cansaço, muita reflexão sobre teorias na prática, de
vivências e motivações tão singulares, a cada momento, a cada visita.

102 | O LIVRO DO HORTO


6.3.4. ASSOCIAÇÃO DOS MORADORES DA VILA CRUZEIRO
DO SUL/ SERVIÇO DE APOIO SOCIAL AO ESTUDANTE - AMOVICS/
SASE

As crianças e adolescentes da AMOVICS/SASE33, muitas vezes,


visitaram o Horto e participaram de oficinas. Em outros momentos,
o Horto foi até eles com os acadêmicos de Enfermagem e bolsistas
de Extensão. Como a sede da Associação não possuía espaço para a
construção de um “hortinho”, foram realizadas atividades com plantas
e sementes do Horto Ecológico do PSF, no próprio SASE. Plantas, flores,
sementes e frutos. O SASE e Horto sempre foram muito parceiros.

33  AMOVICS/SASE - Associação dos moradores da Vila Cruzeiro Do Sul/ Serviço de Apoio
Social ao Estudante

O LIVRO DO HORTO | 103


6.3.5. CRECHE COMUNITÁRIA NOSSA SENHORA DE NAZARÉ

A Creche Comunitária N. S. de Nazaré mesmo não pertencendo


ao território de abrangência do USF, onde está localizado o Horto, com
freqüência visitava o espaço. A partir do pedido da direção da instituição,
e pela motivação das crianças, foram elaboradas mudas de plantas de
manejo seguro e construiu-se coletivamente uma “Hortinha” no pátio
de lazer como mostram as imagens.

6.3.6. ILHA DAS FLORES

Na Ilha das Flores foram implantadas duas iniciativas: um horto nos


fundos da sede do Instituto de Educação e Desenvolvimento Humano
para suprir necessidades de uma cozinha comunitária já existente, e
uma horta no lado oposto, em uma comunidade ao longo da BR 386.

104 | O LIVRO DO HORTO


As hortas foram construídas em regime de mutirão, durante um fim de
semana.

6.3.7. ESCOLA MUNICIPAL EM FLORIANÓPOLIS EEB HILDA


TEODORO VIEIRA

Durante o 28º SEURS34 foi realizada uma atividade em uma


Escola de Florianópolis com a montagem de um Horto com mudas do
Horto Ecológico Cruzeiro do Sul. A oficina e as vivências ocorreram
em quatro etapas: primeira, montagem uma espiral com os vasos das
plantas; segunda, a vivência dos aromas pelos participantes com os
olhos vendados; terceira, sentados em círculosfoi formada uma roda
para degustação de produtos do Horto e chá das plantas e, na quarta
e última etapa, a construção de um Horto definitivo no pátio da Escola
com a participação de crianças, adultos e integrantes da Direção.

34  SEURS: Seminário de Extensão Universitária da Região Sul, iniciativa realizada anual-
mente, que apresenta trabalhos de Extensão Universitária e reúne Universidades Públicas
dos Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

O LIVRO DO HORTO | 105


6.3.8. HORTA COMUNITÁRIA NO “BÁSICO” DA UFRGS

Uma oca e um espaço para encontros e cultivos transculturais35


foi construído no pátio externo do prédio do “Básico” - hoje conhecido
como prédio de Psicologia, entre a Rua Ramiro Barcellos e a Av. Ipiranga.
Criado como um espaço de partilha de conhecimentos, as ações em
torno de um horto com plantas medicinais contaram com a participação
do Horto Ecológico Cruzeiro do Sul. Esta parceria se deu a partir do
fornecimento de mudas e da partilha de conhecimentos. A oca foi
construída pelos acadêmicos indígenas e foi utilizada para encontros de

35  Transculturais: espaço livre de cultura e cultivos, onde pessoas de diferenças etnias
compartilhavam suas plantas e forma de organização no espaço.

106 | O LIVRO DO HORTO


fim de tarde, confraternizações e convivência.

6.3.9. HORTO NA ESCOLA DE ENFERMAGEM DA UFRGS

Um dos ”filhos” do Horto estabeleceu-se no pátio interno da


Escola de Enfermagem da UFRGS. Foram incluídos no paisagismo
local canteiros de plantas medicinais e aromáticas, com a finalidade de
enriquecer a paisagem, harmonizar o ambiente com aromas, cores e
estímulos próprios de cada planta. Também para chás.

O LIVRO DO HORTO | 107


6.3.10. HORTO NA UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA - USF
GRACILIANO RAMOS

A equipe de saúde da Estratégia de Saúde da Família – USF


Graciliano Ramos, junto com a comunidade, buscou mudas e inspiração
no Horto Ecológico Cruzeiro do Sul para construir o seu projeto. E fez seu
milagre de beleza, organização, criatividade e cuidado, concentrando
variedades, acolhendo a comunidade no Posto de Saúde. Na encosta do
morro do Bairro Glória, com muita arte, espírito criativo e parceria com
a comunidade criou-se o que mais parece um mini paraíso de belezas,
formas, cores, plantas, arte e bem querer.

A partir da parceria participamos de um curso de fitoterapia com


as plantas medicinais cultivas no próprio Horto. Estavam presentes
pessoas da comunidade, portadoras de muito conhecimento, uma
agente comunitária de saúde, residentes do Curso Saúde Coletiva,
entre outros. A experiência foi o sinal da dinâmica viva, da partilha e da
construção de uma prática integrativa, onde comunidade e equipe de
saúde estudam sua realidade, a partir do que institui a Política Nacional
de Plantas Medicinais e Fitoterápicas36.

36  POLÍTICA NACIONAL DE PLANTAS MEDICINAIS E FITOTERÁPICOS :http://bvsms.


saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_fitoterapicos.pdf

108 | O LIVRO DO HORTO


O LIVRO DO HORTO | 109
CAPÍTULO 7

PRODUÇÕES DO HORTO

As vivências no Horto Ecológico da Cruzeiro deram origem a


várias produções nas mais diferentes modalidades. Neste capítulo serão
apresentadas algumas referências divididas pelos formatos em que
foram produzidas.

7.1. FILMES

Estão elencados a seguir três filmes realizados pelos bolsistas de


Extensão e POP em atividades compartilhadas com as participantes e
frequentadores do Horto em ações sócio-educativas e de promoção da
saúde humana e ambiental.

Horto Ecológico Cruzeiro do Sul

110 | O LIVRO DO HORTO


Horto ecológico, criado em 2006, desenvolve atividades de
educação em saúde e educação ambiental na vila Cruzeiro do Sul, Porto
Alegre/RS37.

Cultivando Vidas

Experiência do Horto Ecológico Cruzeiro do Sul que compartilha a


sabedoria da comunidade sobre plantas medicinais, condimentares e
aromáticas com os conhecimentos acadêmicos e acolhe grupos do ESF
Cruzeiro do Sul em vivências que promovem saúde e aprendizados com
a natureza38.

Horto: vivências e aprendizado


37  Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9yZ2C4xP1AU
38  Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=it9_xcPTYr0

O LIVRO DO HORTO | 111


Apresentação do Horto Ecológico da Vila Cruzeiro tem como
objetivo proporcionar um espaço seguro, dinâmico e terapêutico para
os moradores da comunidade, visitantes e estudantes. Está localizado
ao lado do PSF Cruzeiro do Sul e conta com uma equipe que o mantém
vivo e saudável39.

7.2 ARTIGOS

A participação das iniciativas do Horto também propiciou a


produção de vários artigos onde constam destacadamente:

7.2.1 ARTIGO: ENERGIA QUE CONTAGIA CULTIVANDO REDES

Resumo: Artigo escrito a partir da experiência da construção de


um espaço saudável onde reinava o caos e o abandono nos fundos de
uma escola. A ideia era construir um horto, pois acreditávamos que
com esta dinâmica de integrar as três dimensões fundamentais do
desenvolvimento humano, saúde, ambiente e educação, possibilitaria
encontrar e harmonizar as crianças nesse espaço, em tudo e com o
todo. Foi um ano de muita presença, cultivos, criação e aprendizados.
A dinâmica inicial foi retirar do terreno objetos de riscos. A partir daí, o
lugar passou a ser de encontros semanais, vivências com as crianças, e
a construção deste lugar foi se transformando em um espaço ecológico
e saudável, florido e produtivo. O maior aprendizado foi perceber e
compreender a impermanência e mesmo assim acreditar nos resultados
que podem ter ficado na vivência de cada criança que participou desse
processo ecológico de lidar com a terra e com a vida.

Autores: Gema Conte Piccinini, Melina Muccilo Gonçalves, Diogo


Antunes, Franciele M. Montenegro Silveira, Monique Scapinello, Sofia
Zutin Gasparotto.

39  Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=6vus3AqqZSk

112 | O LIVRO DO HORTO


7.2.2. ARTIGO: EGAL40

Resumo: O que se pretende abordar neste trabalho é como os


valores ambientais dos camponeses urbanizados repercutem em suas
ações no meio urbano e, principalmente, como são transmitidos e
incorporados pelos seus descendentes. Para a delimitação da pesquisa,
optou-se pela investigação a respeito de tradições de cultivo e uso de
plantas medicinais, devido à importância cultural, medicinal, ambiental,
ornamental e terapêutica-ocupacional destas. O desenvolvimento
da pesquisa ocorreu em um ambiente informal de aprendizagem,
pensando-se assim contribuir para a construção de valores voltados
para a compreensão de problemas locais. A pesquisa se desenvolveu
em um horto na vila Cruzeiro do Sul, em Porto Alegre, Rio Grande do
Sul – Brasil. O uso tradicional de plantas medicinais pelas famílias desta
vila é bastante frequente e pode-se dizer faz parte da bagagem cultural
de muitas pessoas. O horto tem despertado o interesse das crianças
pelo uso tradicional de plantas e uma das fontes de pesquisa tem sido
seus próprios familiares. As tradições de uso de plantas medicinais
foram, em grande parte, aprendidas na zona rural.O grupo de trabalho
foi composto por crianças com idades entre cinco e quatorze anos,
moradoras da vila. Algumas destas crianças já faziam parte do Grupo de
Guardiões Mirins do Horto, que acompanhou o processo de construção
do horto e foi um importante agente de integração horto-comunidade.
A participação destas crianças e de outras nas oficinas se deu sob a
forma de adesão. Tem-se por objetivo principal estudar a contribuição
da geografia na manifestação e construção de saberes ambientais,
utilizando como baliza conceitos como ambiente, natureza, meio
urbano e lugar.

Autora: Carmen Janete Rekowisky.

40  Artigo apresentado no Encontro Geógrafos da América Latina em 2009 (Uruguai). Artigo
na íntegra: http://hum.unne.edu.ar/revistas/geoweb/Geo11/contenidos/noti0.htm

O LIVRO DO HORTO | 113


7.2.3. ARTIGO: O USO DE PLANTAS MEDICINAIS POR IDOSAS
ATENDIDAS EM UMA ESF -ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA41.

Resumo: Este estudo teve como objetivo conhecer como ocorreu a


transmissão do conhecimento acerca do uso de plantas medicinais por
idosas usuárias de uma Estratégia Saúde da Família em Porto Alegre/RS.
Pesquisa qualitativa, exploratório-descritiva. A coleta de dados ocorreu
no período de maio a julho de 2011, por meio de grupos focais com sete
idosas, em três encontros. A análise dos dados foi do tipo temática. Os
temas relacionados foram: transmissão de conhecimento e o uso das
plantas medicinais. Os resultados indicaram a valorização das plantas
medicinais pelas usuárias da Estratégia de Saúde da Família. Com relação
ao aprendizado ressalta-se a presença masculina no conhecimento
sobre o uso das plantas medicinais. Esta pesquisa mostra a necessidade
de conhecimento sobre plantas medicinais pelos profissionais de saúde.

Descritores: Plantas medicinais, Medicina tradicional, Programa


Saúde da Família.

Autor: Gema Conte Piccinini

7.3 TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO – TCCS42

Este tópico contempla os Trabalhos de Conclusão de Curso - TCCs


realizados com interface com o Horto Ecológico. Os que seguem foram
desenvolvidos por bolsistas do Horto, o primeiro na comunidade da
Cruzeiro do Sul e outro na da Ilha da Pintada, ambos aprovados tanto
pela banca avaliadora como pelas comunidades.

41  Este artigo está no prelo.


42  TCC = Trabalho de Conclusão de Curso – trabalho acadêmico amplamente utilizado no
ensino superior, no Brasil, como forma de efetuar uma avaliação final dos graduandos, que
contemple a diversidade dos aspectos de sua formação universitária.

114 | O LIVRO DO HORTO


7.3.1. CURSO DE FARMÁCIA – MANUAL DE BENEFICIAMENTO
DE PLANTAS MEDICINAIS NO HORTO ECOLÓGICO CRUZEIRO DO
SUL - ALUNO JAURI JUNIOR

Jauri Junior, acadêmico de Farmácia, fez seu TCC no Horto através


de oficinas de identificação de plantas aromáticas e medicinais, produção
de sabonetes e oficina de higienização das mãos.

7.3.2. CURSO DE BIOLOGIA/BACHARELADO –


ETNOECOLOGIA E TRANSFORMAÇÕES NA PAISAGEM: ESTUDO
SOBRE AS PRÁTICAS E OS SABERES RELACIONADOS AOS
RECURSOS VEGETAIS NA ILHA DA PINTADA43 - ALUNA SOFIA
ZUTIN GASPAROTTO

Após participar do Projeto Convivências44 em janeiro de 2011, a


aluna permaneceu na Ilha da Pintada, trabalhando no Programa Ilhas de
Conhecimento45, especificamente dentro do Projeto Bacatelas46 com o
foco na promoção da saúde ambiental e humana através de construção
de Hortos, junto com a comunidade, compartilhando práticas, saberes
e fazeres. A partir desta experiência elaborou o TCC ampliando a visão
e análise sobre a realidade. Conheceu pessoas que ainda cultivavam
plantas medicinais e mantinham a prática tradicional de uso e com eles
compartilhou suas horas na Ilha.

43  Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/49229/000835473.


pdf?sequence=1
44  Projeto Convivências: atividade de extensão realizada pela UFRGS em período de férias,
com a participação professores e acadêmicos de graduação, em comunidades pré-contatadas
para, convivendo, detectar necessidades e a possibilidade de construir projetos conjuntos e
fixar permanência.
45  Programa Ilhas de Conhecimento: Programa de Extensão resultante do Convivências.
46  Projeto Bacatelas: Projeto de extensão, que visa contemplar uma expressão cultural e
antiga usada pelos ilhéus para definir uma pequena canoa que usavam com remo de taquara
para transporte em época de enchente.

O LIVRO DO HORTO | 115


7.3.3. CURSO DE BIOLOGIA/LICENCIATURA – MANDALAS DA
VIDA - ALUNA SOFIA ZUTIN GASPAROTTO

A construção de saberes em espaços de cultivo de plantas tem


sido desenvolvida através de diversos enfoques, olhares e perspectivas.
O cultivo e manejo de plantas medicinais e hortaliças tem sido um
dos principais enfoques nessas práticas pedagógicas, pois através das
mesmas pode-se exaltar e apreciar as interações ecológicas, a diversidade
da vida, os fenômenos naturais, além de provocar a necessária reflexão
acerca da necessidade de atitudes cooperativas no convívio social,
ambiental, planetário e cósmico. É importante pensarmos que os
conflitos ambientais não serão solucionados somente com atitude
práticas, mas sim com uma consciência coletiva acerca dos conflitos de
valores que estabelecemos ao nos relacionarmos com os seres e com
a Vida.

Neste sentido, o TCC apresentado para a obtenção da Licenciatura


em Biologia, pela aluna Sofia Zutin Gasparotto propõe a reflexão sobre
a importância do sentir e do habitar nas atividades que se dispõe a atuar
para uma educação a favor da vida. Deixado de lado o pragmatismo
e o enfoque produtivo, permitindo que o contato com a vida e com
sentimentos de cooperação e harmonia habitem as crianças. A partir
desta perspectiva destacam-se as práticas pedagógicas no espaço de
educação e cultivo do Horto Ecológico Cruzeiro do Sul, no ano de
2014, exaltando sua relevância e contribuição nesta encantadora arte
de conviver e pulsar com a natureza.

7.4 JORNAIS

Os jornais consolidaram-se como produção periódica dos bolsistas


com o propósito de sistematizar e divulgar suas práticas e percepções.
Cada edição foi produzida a partir da caminhada traçada no início do
trabalho das equipes, com o objetivo de oportunizar aos iniciantes
um espaço de criação e de partilha. Foram realizadas seis diferentes
versões de jornal a partir da percepção e da criação dos bolsistas de
cada período, criando logo e trocando nome.

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O primeiro jornal foi criado, no horto da vila cruzeiro, em março
de 2010 e teve três edições sendo a última em dezembro, do mesmo
ano. Inicialmente foi criada a logo e a partir dela surgiu o nome: A Folha
do horto.
O Angazeiro foi criado na ilha da pintada em 2011. Assim chamado
por ser o ingazeiro uma árvore nativa da ilha e esse o jeito que os ilhéus o
chamaram. A logo deste jornal, que saiu na segunda edição em 2012, foi
elaborada pelas crianças do projeto alfabetização ecológica (PROPESQ/
POP) e representa o nascimento do ingazeiro a partir de sua semente,
ainda dentro da vagem. Visão sistêmica das crianças que a desenharam
em oficina de verão, após um passeio à margem do Guaíba, na ilha da
pintada, nos fundos da escola Almirante Barroso, onde estudam.
A terceira versão da logo e o nome do jornal foram conseqüência
do trabalho integrado de representantes da Ilha da Pintada e do
horto experimental da cruzeiro do sul, onde foi pensado um arco íris
representando uma ponte entre a “folha do horto” e o “angazeiro”,
trazendo a ideia de organizar as plantas da espiral do Horto conforme
as sete cores dos chácras e a respectiva fitoenergética47.
A quarta versão surgiu em maio de 2014, a partir da visita ao
horto, de uma jovem grávida, com oito meses de gestação. Esta jovem
participou do grupo guardiões mirins do Horto em 2007. A logo
apresenta uma foto da barriga da gestante e o nome escolhido para
o jornal foi sementes do Horto. Esta versão teve três edições, sendo a
última publicada em dezembro de 2014.
Em 2015, continuando as atividades com os moradores da Ilha
da Pintada, o jornal passou a chamar-se “O Porto”, por estarmos lá
atracados, trabalhando com a comunidade e escrevendo o livro do
Horto.
A 15ª edição traz novo olhar sobre os espaços e os projetos em
desenvolvimento. O jornal muda de nome e de personagens, ”Ilhas de
todos” passa a ser seu nome incluindo novo espaço para sonhar saúde,
junto da natureza na USF Osmar Freitas.

47  Fitoenergética: Conceito por Gimenes Bruno J.

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2016, semeado.
Terreno fértil para prosseguir,
sonhando e realizando.

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CAPÍTULO 8

O HORTO ALÉM DO ARCO-ÍRIS

Em janeiro de 2011, a realização da edição do Projeto Convivências


– ver nota de rodapé 44 na página 115, com a ação denominada
“Quem sujou minha água”, coordenada pelo Prof. Clovis Buges48 e
Profª Gema Conte Piccinini49 , contou com participação de alunos de
diversos cursos da UFRGS. A partir desta iniciativa, os participantes
permaneceram na Ilha Mauá, durante uma semana, alojados na sede da
Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA/RS), da Área de Proteção
Ambiental (APA) do Delta do Jacuí. Durante este período, a equipe teve
como tarefa conhecer a realidade da comunidade e da Ilha da Pintada,
diagnosticando suas necessidades. A proposta inicialmente previa
atuação na Vila Cruzeiro do Sul e nas Ilhas, porém tendo em vista o
surgimento de alguns problemas decorrentes de obras de expansão
viária - duplicação da Av. Cruzeiro do Sul, que incluía a possibilidade de
remoção do Horto e do PSF, o grupo optou por permanecer somente
nas Ilhas, com a implantação de projetos específicos.

48  Clovis Buges: Biólogo, Professor Dr. do Curso de Biologia da UFRGS.


49  Gema Conte Piccinini: Enfermeira, Dra. em Fitotecnia, Profª da Escola de Enfermagem
da UFRGS

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8.1 COLÔNIA Z5

A Colônia Z5, cuja sede pode ser vista na imagem abaixo, se


consolidou como ponto de referência na Ilha da Pintada, apoiando
eventos e todasas ações do projeto, além de uma sólida parceria na
integração do Horto Experimental Cruzeiro do Sul e as atividades no
Delta.

Diante da acolhida da comunidade, foi criado um Programa de


Extensão, como estratégia para construir algo que trouxesse benefício
tanto para a comunidade como para a formação acadêmica dos alunos
da Universidade, ampliando as ações de sala de aula. Assim, a partir
de um processo de planejamento coletivo e participativo, numa
dimensão interdisciplinar, nasceu o “Programa Ilhas de Conhecimento:
compartilhando práticas e saberes entre as comunidades universitárias
e a APA Delta do Jacuí” coordenado pela Profª Gema Conte Piccinini.
Estudantes que trabalhavam no Horto e atuaram no Projeto Convivências
participaram da construção do Programa enriquecendo a caminhada
acadêmica. Esta iniciativa deu origem a Projetos e Ações como o Projeto
Bacatelas e a celebração do dia da Biodiversidade.

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8.2 O MUSEU DA ILHA E A AAAPIP

A AAAPIP, também foi uma organização com quem criamos


vínculo, convivendo com as crianças e com a direção. Não tardou para
se perceber que havia no local uma realidade em transformação onde,
entre progresso e desenvolvimento, parecia haver sinais de fragilização
do ecossistema local. Desse modo, nasceu dentro do Programa a ideia da
montagem de um museu que documentasse esse processo. A AAAPIP
acolheu a ideia e cedeu um espaço para receber as primeiras peças.
E, desta forma, se iniciou a coleta e registro de objetos representativos
do patrimônio local. A primeira peça recolhida foi uma carcaça de uma
pequena tartaruga atropelada na estrada. Daí surgiu a proposta da
equipe em priorizar o olhar para o cuidado com a natureza da região.

152 | O LIVRO DO HORTO


Na busca de concretização da ideia, foi encontrada no curso de
Museologia da FABICO/UFRGS a parceria necessária para abraçar esse
empreendimento. Uma realidade sob o nome de Museu Ilha da Pintada,
com sede no CTG Madrugada Campeira, e concretizado também num
Museu Virtual50, que acolhe e possibilita o registro e a divulgação da
caminhada ininterrupta do Programa Ilhas de Conhecimento na Ilha da
Pintada.

8.3 HORTOS NA ILHA:

8.3.1 HORTO DA USF DA ILHA DA PINTADA

A horta, situada ao lado do USF da Ilhada Pintada contribuiu para a


construção do primeiro filho do Horto Experimental Cruzeiro do Sul na
Ilha, gerenciado pela equipe de saúde e com a participação dos alunos
extensionistas do Projeto Convivências, que permaneceram em estágio
na comunidade.

50  Disponível em: http://museudailhadapintada.org/

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8.3.2. HORTO COMUNITÁRIO NA ILHA DA PINTADA

Outro fruto do Projeto Convivências foi a construção compartilhada


de um horto comunitário no pátio externo da Igreja Católica, localizado
às margens da Av. Presidente Vargas. Integraram esta iniciativa alunos
da Universidade, a comunidade da Ilha da Pintada, representantes da
SEMA51, da Prefeitura/CAR e da Escola Estadual de Ensino Fundamental
Maria José Mabilde. A produção do horto comunitário foi destinada à
merenda escolar da Escola.

8.3.3. HORTO NA ESCOLA INFANTIL ILHA DA PINTADA

Motivamos pelos assuntos da terra e das plantas, adultos e crianças


da comunidade foram levados a compartilhar, com bolsistas da UFRGS,
de ações promovidas na Escola Infantil da Ilha da Pintada. A construção
canteiros de parede em garrafas pet envolveram as crianças maiores
e as menores trabalharam com plantas aromáticas fazendo sachês.

51  SEMA: Secretaria Estadual do Meio Ambiente – Governo do Estado do Rio Grande do
Sul

154 | O LIVRO DO HORTO


O grupo participou também de atividades na comunidade,como a feira
da biodiversidade realizada na Colônia de Pescadores Z5.

8.3.4. HORTO DA ESCOLA ALMIRANTE BARROSO

A implantação do Horto na Escola Almirante Barroso ocorreu a


partir da dinâmica dos bolsistas e das crianças, sendo modificado
por diversas vezes conforme a disponibilidade e interesse de seus
participantes, porém permaneceu sempre no mesmo espaço físico.

O LIVRO DO HORTO | 155


8.3.5. HORTO NO BECO

Assim chamado, pois no ano de 2011 conhecemos estas famílias,


moradoras em terreno alagadiço de difícil acesso, denominado Beco.
Junto com a equipe de saúde da Ilha da Pintada, trabalhamos com as
mulheres questões como autonomia, acesso ao posto de saúde e outros
recursos em saúde. Em 2014 o acesso foi melhorado e o espaço recebeu
aterro, estimulando a melhoria das casas e dos pátios. Neste local foram
realizadas vivencias de cultivo de plantas medicinais com as crianças e
mulheres da comunidade. Foi construída uma horta suspensa, utilizando
garrafas recicladas pelas crianças e penduradas em árvores existentes
no pátio aberto de algumas casas. E, também em pequenos quintais
que já haviam recebido aterro. As mudas foram produzidas no Horto
da Vila Cruzeiro do Sul e trazidas pelos acadêmicos de enfermagem
comunitária que participaram desta vivencia junto com os bolsistas de
extensão e agentes de saúde do Posto da Ilha da Pintada.

A foto a seguir marca a visita feita para apresentar as novas bolsistas


de extensão 2014/2 nessa área de atuação. Está junto a professora da
Universidade Federal de Sergipe e Presidente Nacional na ANEPS52,
Simone Leite, que trabalha essencialmente na Educação Popular em
Saúde e na promoção de saúde popular e empoderamento da população
de periferia.

52 ANEPS: Associação Nacional de Educação Popular em Saúde

156 | O LIVRO DO HORTO


Seguindo a parceria com a Equipe de saúde, que, mesmo em fase
de mudança de gestão e de profissionais, naquela oportunidade, se
manteve presente, aproveitando a oportunidade para integrar o novo
Agente Comunitário de Saúde ao nosso trabalho. A Celebração de Natal
com as crianças do Beco teve foco agroecológico, degustando frutos
do horto e outros da comunidade. A agente de saúde que acompanhou
o desenvolvimento dessa comunidade, em seu último mês de vínculo
profissional com o PSF , conosco reafirmou junto às famílias que por
anos acompanhou a importância de cultivar a saúde nos mínimos
detalhes dentro e fora da casa. Levou consigo o novo agente de saúde
motivando-o a continuar o trabalho. Na oficina foram levadas para as
crianças frutas diferentes do cotidiano como fisális, amora, mirtilo. Após
a degustação, as mudas feitas no horto foram doadas para a comunidade
para cultivo em suas residências, enriquecendo de verde seus pequenos
espaços.

O LIVRO DO HORTO | 157


8.4. O LIVRO ILHAS

O Livro Ilhas de Conhecimento documenta um pouco das historias


e memórias de ilhéus anciãos com quem tivemos o privilégio de conviver.
Alguns participaram da construção dos hortos contribuindo com plantas
e conhecimentos. O manuscrito contém cinco pequenos livros escritos
com participação de crianças da comunidade e acadêmicos da UFRGS,
oriundos de diferentes cursos e inseridos em diferentes projetos do
Programa Ilhas do Conhecimento. O livro foi produzido artesanalmente
e na capa foi reproduzido o desenho de Bruna Fiorentin53 que mostra
a Ilha da Pintada dentro do filtro dos sonhos. Sonhos que de alguma
forma abraçam todos os escritos e feitos na Ilha.
Sua arte criativa está também no editorial e na introdução.
Pode-se encontrar a publicação inteira e também os cinco
livros54 avulsos em bibliotecas da UFRGS55.

Capa do
livro Ilhas.

53  Bruna Fiorentin: Bolsista do Programa Popularização da Ciência da PROPESQ-POP,


Alfabetização Ecológica.
54  Títulos dos Livros: As historias do Seu Salomão; As aventuras do Seu João; As velhas
Historias da Ilha da Pintada; Iscas biográficas do Delta: Nossas escritas e Fragmentos na Vida
de um Pescador; Iracema, a Cema da Ilha e Vó Caco.
55  Sistema de Bibliotecas da UFGRS: http://sabi.ufrgs.br/F/YP1DGC9YTGDR9J-
5648SE31KKV4LT7GN2EKS4QJAQ1NFK5HRCMF-15217?func=full-set-set&set_num-
ber=024814&set_entry=000001&format=999

158 | O LIVRO DO HORTO


8.5. SEMA: SEDE DA APA NO DELTA

A Secretaria Estadual do Meio Ambiente, sediada na Ilha Mauá,


APA Delta do Jacuí nos acolheu e abrigou o Projeto Convivências. Nesse
local ganhamos espaço, amizade e apoio para ensaiar construções de
hortos com as crianças da comunidade, realizar oficinas, trabalhar a
terra, ministrar aulas e participar de confraternizações. Desde então,
lembramos com gratidão de toda equipe, que viabilizou as vivências
saudáveis e as conexões coletivas com o ambiente e a comunidade
do local. As fotos abaixo registram momentos de confraternização, de
diferentes encontros realizados com diferentes grupos nesse espaço
onde fomos acolhidos.

O LIVRO DO HORTO | 159


8.6. UMA REFLEXÃO: A PERMANÊNCIA NO REVEZAMENTO

Na foto, a seguir, tirada a partir da ponte que une a Ilha da Pintada


com a Ilha Mauá, vê-se uma escada que sai da água, um trapiche, um
porto com o humano invisível se revezando, indo ou vindo. É a dinâmica
do cotidiano desenhada na foto.

O que é ponte hoje, já foi trapiche, já foi balsa. Hoje, pela ponte
da Mauá, passam pedestres, bicicletas e carros. Tem linha de ônibus,
que começa e termina por lá. Nas imediações vemos sinais do Estaleiro
Mabilde. Nessas ilhas ainda existem muitas histórias boiando às margens
desse desenho de progresso. Algumas delas escutamos ajoelhados ao
lado de anciãos em pequenos lares quase silenciados, mas cheios de vida.
É revigorante compartilhar falas e escutas nesses lugares. É um privilégio
fazer parte de uma Universidade que permite, estimula e valoriza a vida
acadêmica na periferia. Certamente laboratório vivo para humanizar-se,
fortalecer-se e ser feliz. Esta prática nos possibilita uma constante de
vivências numa dinâmica orgânica com o lugar. Oxigenando o sentido
de Universidade onde se vive a Extensão Comunitária, o Ensino e a
Pesquisa, sob a luz do arco-íris que conecta as ações na Ilha e na Vila
Cruzeiro.

160 | O LIVRO DO HORTO


O LIVRO DO HORTO | 161
CAPÍTULO 09

RETRATOS DE VIVÊNCIAS

O Horto desde que foi criado fez-se presente em inúmeros eventos


acadêmicos. Participou de todos os Salões de Extensão da UFRGS no
período de 2008 a 2016, e, não poucas vezes, com a presença ativa
de representantes da comunidade. Outras vezes foi selecionado para
edições do SEURS56 - nos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande
do Sul e, em edições do Congresso Ibero-Americano de Extensão57
e Congresso Brasileiro de Extensão Universitária - CBEU. Atuou nas
realizações das Tendas Paulo Freire em Brasília, Recife, Fortaleza e Porto
Alegre e, em diversos Seminários – como a VI Semana de Alimento
Orgânico no Rio Grande do Sul58 em maio de 2010, Encontros de
Educação Popular em Saúde em várias regiões do Brasil pelo Ministério
da Saúde, inclusive na Mostra Nacional da Experiência na Atenção
Básica, em Brasília, no ano de 2014.

56  SEURS: Seminário de Extensão Universitária da Região Sul


57 http://www.noticias.uner.edu.ar/noticias/xi-congreso-iberoamericano-de-extensi%C3%B-
3n-en-santa-fe
58 http://www.vidasustentavel.com/index.php/2010/05/vi-semana-do-alimento-organico-i-
nicia-com-mais-de-150-eventos-no-rio-grande-do-sul/

162 | O LIVRO DO HORTO


Uma das atividades mais significativas para os acadêmicos que
atuaram no Projeto foi a apresentação teatral “O Mágico de Oz” na
segunda edição do evento da PROREXT Maré de Arte, no município de
Tramandaí, documentada na imagem abaixo.

A confraternização com a comunidade e as celebrações


especiais também marcaram a vida do Horto, destacando que todas
as programações tinham como foco a ecologia, promoção da saúde,
sustentabilidade e a promoção de hábitos saudáveis. Esta prática pode
ser vista nas imagens a seguir que destacam uma das comemorações de
Natal na localidade, com Mamãe Noela, frutas e Duendes.

O LIVRO DO HORTO | 163


Muitas pessoas e instituições visitaram o Horto, no intuito
de conhecer a experiência. Neste âmbito se destacam as visitas de
adolescentes da FASE59 da Ilha dos Marinheiros estiveram no Horto
buscando inspiração para a implantação de iniciativas da mesma
natureza. Na imagem abaixo, pode ser visto o Francisco Yalá60,
acompanhando o grupo.

A visita de escolares também se consolidou no cotidiano do Horto.


Com as crianças de uma escola de Novo Hamburgo foi possível vivenciar
o funcionamento do espaço, a dinâmica das plantas e o meio ambiente,
bem como a importância da identificação correta das plantas e seu uso
medicinal61. Já com os alunos da Escola Nossa Senhora do Carmo, do
bairro Restinga, o desejo de conhecer a experiência levou ao interesse
em replicá-la na própria Escola.

59  FASE- Fundação de Atendimento Sócio-Educativo.


60  Francisco Yalá: Queniano - Acadêmico do Curso de Direito da PUC/RS, Programa PECG
- Governo Federal, parceria do MEC-Ministério da Educação e Cultura e MRE-Ministério das
Relações Exteriores. com Instituições de Ensino Públicas e Privadas
61 https://sites.google.com/site/oficinaannefrankciencias2010/visita-ao-horto-ubs-cruzeiro-
-do-sul

164 | O LIVRO DO HORTO


A visita de especialistas e representantes de organizações
enriqueceram as atividades do Projeto e estimularam o crescimento
e ampliação da iniciativa. O professor Nilton José dos Reis Rocha,
conferencista do 5º CEBEU, que aconteceu em Porto Alegre, em 2011,
esteve no Horto e foi recebido por integrantes do grupo Guardiões
Mirins. Este fato foi documentado na imagem abaixo.

O LIVRO DO HORTO | 165


O Horto faz parte do Comitê Gestor do CORSAÚDE, e as visitas
de outras representações também foi prática constante no ambiente,
conforme registra a foto abaixo.

A realização de oficinas no ambiente do Horto proporcionaram


momentos únicos. Um dos exemplos destas vivências pode ser visto
nas imagens abaixo, onde crianças de olhos vendados participam de
oficina de exploração dos sentidos do olfato e do tato, além de trabalhar
a questão da confiança, ao serem conduzidas por outras crianças.

166 | O LIVRO DO HORTO


O LIVRO DO HORTO | 167
CAPÍTULO 10

DEPOIMENTOS

Neste capítulo compilamos os depoimentos de pessoas que tiveram


suas vivências entrelaçadas com a vida do Horto Experimental Cruzeiro
do Sul. São depoimentos espontâneos e que registram impressões
pessoais.

- ALEX BITTENCOURT - Coordenador da Equipe do USF

Já conhecia a Profª Gema e das suas ideias além do seu tempo.


Mais uma vez fui surpreendido, apareceu no serviço que acabara de
assumir a coordenação – ESF Cruzeiro do Sul e me fez o seguinte convite:
Gostaria de fazer um projeto aqui do posto, se aceitar construiremos
um Horto, me explicou que o projeto serviria para o seu Doutorado,
mas também como uma proposta de começar a discutir com a equipe,
usuários e gestor e questão da Fitoterapia na ESF/SUS. Prontamente lhe
falei, das dificuldades que poderíamos ter, uma vez que a área pertence
ao município e era usada como estacionamento. A Profª Gema, não
deixou por menos e me disse “Eu sei que tu vai conseguir”, daquele
dia em diante nos reunimos com os demais membros da equipe da
ESF, após com a Gerente Distrital. Tudo “aprovado” faltava ver quem
poderia nos ajudar na preparação da terra, já que a mesma tinha como
contrapiso “brita” uma espécie de cascalho; mudas para iniciarmos o
plantio, apesar de ter realizado contato com alguns moradores e um

168 | O LIVRO DO HORTO


deles se prontificou a fazer algumas mudas, mas, a sua produção não
atenderia a necessidade do projeto. Em 31 de Dezembro de 2006,
como por encanto tínhamos um trator arando a terra (o operador de
trator sairia de férias nesse dia e só retornaria em fevereiro) e mudas
conseguidas junto ao centro agrícola municipal. Era para ser..... Acredito
que quando se divide um sonho e encontra no outro o mesmo desejo
se forma em torno desse sonho a energia necessária para ocorrer.
Dessa forma nasceu o Horto do ESF Cruzeiro, cheio de amor e desejo
de todos que abraçaram esse projeto, que apesar de se ter avaliado as
dificuldades que poderíamos encontrar, nunca deixamos de acreditar.
Hoje olhando para trás posso ver que quando sonhamos o mesmo
sonho tudo é possível, pode demorar, mas, com certeza, se concretizará.
O Horto serviu para o Doutorado, mas mais ainda para unir a equipe,
comunidade, universidade e gerador de uma possibilidade que novas
práticas na região e no município. Agradeço de ter feito parte desse
projeto e do que ele representa para todos os que sonharam ele.

- Sr. OLIVO BOMFIM - Morador da Comunidade Cruzeiro do Sul


e companheiro da construção e manutenção do Horto

O Horto é um espaço de grande conquista de quem construiu.

- ELISABETE NUNES - Prestadora de serviços de higienização da


unidade

O projeto é algo Importante para a aprendizagem da saúde e a


sabedoria das ervas.

- BRUNA FIORENTIN - Bolsista de Extensão, do Horto e na Ilha da


Pintada

É sobre uma experiência ilhada em pontes...


Da distância, em tempo ou em léguas, já tomei que chega pra

O LIVRO DO HORTO | 169


poder narrar. O difícil é tomar lonjura da memória. É pra poucos poder
falar do tempo que fez marca nos corpos...Não sei se sou desse pouco,
mas vou desdobrar esforço pra botar em palavras o que é se atravessar.
Sim. Porque pra viver uma ilha, é preciso atravessar um bocado de
pontes e riachos. Há quatro anos atravessei uma ponte de arcos.
Planejei encontrar sossego e liberdade do outro lado.Grande fantasia!
Já inicio a travessia aprendendo sobre expectativas delirantes...No La
delá, encontrei mais pontes e mais riachos. Que baita boa ventura
me era esperada no La decá! Lá pela terceira ponte que atravessei,
um Frei me acompanhou. Paulo Freire me ensinou a atravessar de
sandália rasteira, olhando no olho, sentindo vento e cheiro, usando
mais a orelha do que a boca e verbos mais que artigos (acadêmicos).
Além do frei, acompanhei-me de coragem e comi muito ovo. Mas só a
parte amarela do ovo. Degustei de todos os nutrientes. Ela também me
degustou. A Gema me deu, muito generosamente, a energia necessária
pra atravessar todas as pontes do percurso. Ficamos nos mastigando
por perto de quatro anos, contando esse que já comeu o rabo. Nunca
quero engolir!Numa ponte encontrei até rei! Rei Salomão representa
sabedoria e sabe fazer uma taquara para o peixe dormir em chama,
que tem gosto de arte e cheiro de domingo. Noutra cruzada, um moço
muito jovem de amor, que preserva a casa colorida pra esposa que já se
acinzentou. Seu João cura urticária e solidão. Velhas a fiar. A mulher no
homem, o homem do boi, o boi na água, a água no fogo, o fogo no pau,
o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha,
a aranha na mosca, a mosca nas velhas e as velhas: a fiar. Que bonito
ouvir essas velhas histórias de quando nem havia pontes – e elas já
estavam a fiar!Achando que ia ajudar uma moça cega a atravessar uma
ponte, fui-me cheia de cuidados. Quanta bobeira! Fui eu quem recebeu
cuidado! A moça era pura alegria, graça, mãe. Iracema já foi, atravessou
sua última ponte.Quem disse que paixão é passageira não pegou barco
com Alfredo e Sueli. Quanto amor em xícaras de açúcar e canto de
passarinho voltando da pesca.Estava eu, andando sem olhar pro chão,
admirada com o sol se despedindo da ilha pintada, quando “trupiquei
em caco!” Era um pedaço de Santa. Não encontrei os outros pedaços, aí
tratei de encaixar em mim! Olhando detalhadamente em volta, percebi
que todos tinham pedacinhos de Caco encaixados em si! Essa Santa

170 | O LIVRO DO HORTO


Caco dá luz e paz, hoje e eternidade.Ah! Não falei dos pequenos.Muita
gente pequena que lembro direitinho de cada rosto e de cada dente
que falta, os pequenos me fizeram criança de novo e olho a brilhar.Eles
são a prova de que o tempo venceu. Passou sem pedir licença. Não faz
mal! Nessa brincadeira muito séria de atravessar pontes, aprendi a me
molhar, respingar experiência no presente, que é o único tempo que me
faz gente-carne-osso-pele-pescoço. É um presente ter compartilhado
vida nas beiradas da Ilha, com toda essa gente, bicho, horto, cipó
entortado por mil homens, construindo sonhos em rede. Nessa rede,
pescamos (além de sonhos) histórias coloridas no papel, tecemos
juntos esse manto de retalhos. A companhia fez desse temporal, de
ventos e muita água, uma vivência atemporal, ilhada em pontes de amor
e respeito – que revisito em cada dia de Sol.De mesma quentura que o
sol, algumas pontes que provei trouxeram um ar quentinho, saindo do
forno, que me fizeram sentir em casa. Na verdade não sei a que casa é
essa que me refiro. Depois que naveguei minha primeira ponte, não sei
mais onde moro! Quem prova desse fruto, abarcado de raízes, não sabe
mais o que é ser um só. Esquece de desgrudar da memória e só sabe
fiar em companhia: em confiança.O desfecho é que, agora, necessito
dessa gente toda, das pontes, dos ri(s)os. Peguei o gosto pela travessia.
É viciante a benquerença de descobrir querências e de ser cativada por
elas. Abro meu segredo profano pra ti: estou em cativeiro ilhado Ad
Aternum.
Graças!!!!!!

- CAMILA NICHES - Bolsista de monitoria

Horto: Uma rica sala de aula


Escrevo este texto como monitora da disciplina Enf.3066 - Práticas
Integrativas e Complementares em Saúde. Essa disciplina foi planejada
a partir da construção do horto em 2006 e no 1º semestre de 2014, foi
disponibilizada pela UFRGS como uma disciplina itinerante juntamente
com o Projeto de Extensão Teko Porã, sendo o 2º encontro, no dia
25 de março de 2014/1,no Horto Ecológico da USF, Cruzeiro do Sul.
Reuniram-se no horto, alunos da disciplina, o pessoal do projeto de

O LIVRO DO HORTO | 171


extensão, a enfermeira Quésia coordenadora da ESF e pessoas da
comunidade como o Sr. Osvaldo, o motorista do carro da UFRGS,
que nos levou,compartilhando conhecimentos sobre saúde. Foi uma
incrível troca de experiências. Conhecimento acadêmico unindo-se aos
conhecimentos populares, vivos e experimentais.
Logo que as pessoas iam chegando, faziam uma vivência de ir até
o centro do canteiro em espiral e escolher uma pedrinha no espaço
chamado de túnel de luz onde também tem alguns objetos de religiões.
No caminho: lindas plantas, deliciosos aromas, alguns insetos, placas
coloridas representando os chacras com as sete cores do arco-íris. Um
lugar perfeito para respirar fundo, admirar a perfeição da natureza e
sentir as boas vibrações que esse local pode proporcionar-nos. Tudo
isso, bebendo um delicioso chá das ervas recém-colhidas.
Fizemos uma dinâmica com caixinhas de madeira que continham
ervas e iam passando de mão em mão numa roda. Sem olhar, as
pessoas iam sentindo os cheiros e tentando adivinhar qual era a
planta. Essa experiência remeteu boas lembranças para muitos que se
emocionaram, falando da comida da avó, do chá da mãe, da infância e de
outros momentos e pessoas que foram lembrados devido aos aromas.
Logo após, conversamos sobre as plantas, tanto as que vivenciamos os
aromas, como outras. A professora Gema Conte Piccinini, responsável
pela disciplina e a professora Maria Gabriela Godoy, do projeto de
extensão, contextualizaram esta aula na PNPIC e na PNEP Como fazer
uma muda, colher, secar, armazenarplantas medicinais bem como sua
parcimoniosa utilização em saúde.Eu permaneço como monitora dessa
disciplina e sou muito grata por tudo o que ela vem me oferecendo
desde março. O próximo encontro no horto, será dia 23 de setembro,
início da primavera com nova turma, pessoas diferentes, momento
especial. Camila Niches, acadêmica de odontologia.

- GABRIELA GODOY - Professora e coordenadora do Projeto de


Extensão Teko Porã

Conheci o Horto no início de 2014. Posso dizer que é um lugar


denso. Denso de verde, que eu adoro, com plantas bem cuidadas, de

172 | O LIVRO DO HORTO


boa energia, de cuidado e afeto. É um pequeno lugar no meio de uma
vila pobre de Porto Alegre que rompe com a lógica de urbanização
na periferia, onde praças mal cuidadas e falta de verde nas calçadas
predomina. Em uma pequena área, Gema criou um jardim-horto que
é mágico. Conhecer o horto foi especial, para mim. Uma sala de aula
diferente, ao ar livre, em contato com a natureza. Poder receber os
alunos e ajudar a reconectar-me e reconectá-los com a natureza é uma
atividade inovadora no campo da saúde dentro da universidade. Meu
desejo é que as sementes do horto se propagassem, fazendo brotar
jardins-hortos em todos os lugares da cidade, com plantas medicinais e
oficinas diversas para toda a população. Sonhar é o primeiro passo para
que as coisas se tornem realidade. E agora é o momento de desejar que
o horto chame novos cuidadores para mantê-lo. É o ciclo da natureza,
onde cuidar de si é necessário para cuidar do outro, que também é
prerrogativa para cuidar do mundo. E assim, a energia do cuidado
circula e se difunde. Desejo ao Horto bons cuidadores da vida que lá
foi plantada!

- GEMA CONTE PICCININI - Professora e idealizadora do Projeto


Horto Experimental

Sendo profissional da saúde, a busca de doutoramento em


fitotecnia foi fundamentada em décadas de experiência profissional
junto a populaçõesde periferia. Constatando em seu cotidiano
muito conhecimento e práticas tradicionais como modo de vida e
de sobrevivência. Práticas essas vindas de geração pós-geração e
ultimamente, se fragilizando pela migração desordenada para periferias
urbanas, como os entrevistados em Porto Alegre, na fase etnográfica
desta pesquisa. O embasamento teórico em Morin e Matos serviu de
baluartes desde a escolha do assunto, balizando a fase etnográfica,
acompanhando a construção do Horto, sua utopia de fazer parte das
práticas da ESF e sua manutenção por oito anos consecutivos, nessa
intenção. Acreditando sempre na iminência de ser implantado o sistema
Farmácias Vivas ou processo semelhante, o Horto foi mantido através
de projetos acadêmicas até o final de 2014 quando foi entregue,

O LIVRO DO HORTO | 173


para que seu destino se defina politicamente, pois a área física é da
Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre, cedida generosamente
em 2006 para realizar um experimento fitotécnico de cultivo de
plantas medicinais que terminara em 2007. As plantas cultivadas foram
funcho,marcela, guaco, tansagem, capim cidró, hortelã, malva, arruda,
boldo, cidrozinho, losna e poejo.

- JANAÍNA LONGHI - Bolsista de Extensão e PROPESQ-POP

Tudo começou com a celebração ao Sol...


Depois de me perder e me aventurar por um lado de Porto Alegre
em que nunca tinha ido, a moça do interior chega ao misterioso Horto,
que teria seus encantos revelados a cada visita ou atividade que era
realizada. Era um dia muito importante, e eu estava empolgada e
ansiosa. Algo novo iria começar a acontecer, e não só para minha vida
acadêmica.
Encontrando PSF Cruzeiro do Sul, e conseguindo chegar ao Horto,
deparei-me com muitas coisas que alegravam os olhos. Bruna (ou
Buba), bolsista da quarta edição do projeto “Alfabetização Ecológica”
da PROPESQ-POP, estava organizando uma linda confraternização,
juntando no Horto diversas pessoas, com diversos objetivos e caminhos
a trilhar. Também seria a despedida do projeto que estava acabando,
para assim renascer com uma nova personalidade.
Diversos alimentos com as cores do sol formavam o “Sol de
Frutas”, feito com muito capricho pela Bruna. Também havia sachês
cheirosos para levar de lembrança desse dia. Conversas, risadas,
música (com Bruna tocando e mostrando mais um dos seus talentos),
comidas saudáveis, e até um exercício da yoga chamado “saudação
ao Sol” preencheram minha primeira experiência no Horto. Foi muito
positivo e animador, e percebi que poderia fazer e explorar coisas muito
interessantes, que fariam bem a outras pessoas e a mim também.
O primeiro semestre em 2013 já havia começado, e eu estava à
procura de alguma atividade, além dos estudos da faculdade. Na FACED
um colega meu falou de um cartaz, que em poucas palavras mostrou
algo que poderia ser interessante. Uma bolsa de extensão, para trabalhar

174 | O LIVRO DO HORTO


com comunidades em Porto Alegre. Foi assim que conheci o trabalho da
professora Gema, pude ter a primeira experiência com o Horto (através
da celebração ao Sol) e muitas outras que viriam.
Depois de inteirar-me com os objetivos dos projetos, que envolviam
não apenas o Horto na Vila Cruzeiro, mas também a Ilha da Pintada,
pude buscar algo que combinaria com minha personalidade e com a
da minha colega de trabalho, Juliana. O relacionamento da professora
Gema e dos bolsistas com as escolas das duas comunidades era muito
bom, já que muitas atividades diferentes e com múltiplos aprendizados
poderiam ser feitas. Como meu curso é licenciatura, encontrei nesses
locais possibilidades envolventes de trabalhar.
Concentramo-nos em algumas atividades, mas as mais importantes,
que mais se mostraram positivas, que mais geraram reflexões marcantes
para todos os envolvidos, foram atividades envolvendo a história
do“Mágico de Oz”. No Horto, foi organizado o evento “Cinema no
Horto”, em que quase todo filme do “Mágico de Oz” foi passado. Foi
um dia muito diferente, com bastante trabalho para que fosse possível
passar o filme (afinal, não é fácil criar um canto escuro ao ar livre, em
plena luz do dia). Mas tudo valeu a pena. A magia proporcionada pela
terra de Oz com certeza estava presente.
Dorothy tinha um objetivo, um sonho, que desejava com todo seu
coração, e percorreu o longo e inusitado caminho dos tijolos amarelos.
Todos nós temos algo de Dorothy, e a atividade que se seguiu ao filme
foi pensada para refletir sobre isso. Na espiral, para fazer um caminho
amarelo ao modo do Horto, foi colocada areia ao invés de tijolos.
As crianças andaram pelo caminho amarelo, pensando em coisas
boas, no que mais desejavam e seus sonhos para o futuro, e no final
encontravam os cristais, que representavam esses pensamentos. No
final do ano, fizemos um pequeno documentário do Horto, chamado
“Horto: vivências e aprendizado”, encontrado no YouTube. Em
aproximadamente 25 minutos, são mostradas a história do Horto, suas
finalidades, as vivências que aconteceram ao longo do ano.
No ano de 2014, finalizei como bolsista o projeto “Alfabetização
Ecológica em Saúde - Ressignificando espaços e práticas para a saúde
dos filhos da Terra”, e iniciei em maio o novo projeto “Alfabetização
Ecológica e Inclusão Tradicional - memórias, vivências e aprendizado”,

O LIVRO DO HORTO | 175


ambos da PROPESQ-POP. Ao longo desse ano, com este último projeto
trabalhei com os idosos da Vila Cruzeiro e da Ilha da Pintada, buscando,
através das memórias, histórias e vivências que pudessem fazer refletir
sobre os conhecimentos ancestrais e as mudanças constantes no mundo
ao nosso redor.
O Horto foi um importante espaço de interação, não apenas por
acolher diversas atividades envolvendo os idosos, acadêmicos e outros
moradores da comunidade, mas também por ter, desde suas raízes,
a presença dos saberes ancestrais, que tanto tem a ensinar sobre a
natureza, suas propriedades e sua importância.
Foram experiências muito intensas e cheias de aprendizado.
O Horto se tornou, para mim, a base para muitas reflexões sobre o
mundo, e me mostrou novas maneiras de interagir e aprender com a
natureza, outras pessoas, e comigo mesma.

- JULIANA DECONTO - Bolsista de Extensão

Minha experiência no Horto!


O projeto sempre foi encantador. Imagina só construir uma espiral
de flores e plantas com as sete coresdo arco íris. O ‘caracol’,aquele que
limpa as tuas energias na entrada e recarrega com energias positivas na
saída.
O processo todo é mágico, algo que dá para sentir. Caminhar pelo
caminho da espiral é como entrar em um mundo mágico, como aqueles
que ouvimos em contos de fada. Acho que talvez seja por isso que ele
é tão querido pelas crianças.
A contribuição ecológica para a comunidade da Vila Cruzeiro
também é um ponto a ser considerado. Além de embelezar a paisagem,
o Horto provém temperos, chás, ervas, flores e frutos.Ali as vezes é
tão calmo que podemos parar, refletir e ouvir a natureza cantando, e
quando ela fala, todos os outros sons são silenciados. As placas que
colocamos junto à espiralsurgiram pelo conhecimento da cultura de um
outro povo, os maoris - povo nativo da Nova Zelândia.O símbolo maori
“Koru”, pintado nas placas, representa o broto da samambaia antes de
desabrochar, significa recomeço, criação. A forma circular transmite a

176 | O LIVRO DO HORTO


ideia de movimento perpétuo e as espirais interiores sugerem o retorno
às origens. Foram pintadas sete placas com as sete cores do arco-íris
e uma com todas as cores, onde está escrita a história do símbolo
escolhido.
Acho muito difícil descrever o poder do horto, podemos apenas
senti-lo.

- MARIA FRANCISCA DO AMARAL - Enfermeira

Há muitos anos tive a ventura de visitar o Horto. O que recordo é


que aquele pedaço de terra cultivada me transmitiu naquele momento
uma visão futura de que ali estava tendo origem um grande reduto de
saúde.

- MONIQUE SCAPINELLO - Bolsista de Extensão

Fazer o bem sem olhar a quem


Trabalhar com crianças em meio natural é uma experiência única.
Motivadas, espontâneas e dispostas, fazem de uma comum tarde de
quarta-feira um dia especial e produtivo. Ao passo que ensinamos
simples técnicas de plantio, fazemos dinâmicas de integração e
tentamos passar alguns valores imprescindíveis para o bom convívio
em sociedade, aprendemos que um largo sorriso pode trazer o sol para
um céu nublado. Convivendo com a infância, também aprendemos a
ver nosso dia a dia com um olhar diferente, com o olhar inocente de
uma criança. É gratificante enxergar o brilho em seus olhos e ver que
nossa oficina semanal tráz muito mais que diversão e conhecimento;
tráz felicidade e paz.

- NATÁLIA ABRAHÃO - Bolsista do Projeto de Extensão Sustenta-


bilidade e Elaboração de Cosméticos Naturais, oficineira no Horto

O ano de 2014 foi repleto de conquistas, felicidades e novas

O LIVRO DO HORTO | 177


amizades. É com muita alegria no coração que participei deste lindo
projeto, e pude obter grandes aprendizados e fazer maravilhosos
amigos. O horto ecológico teve momentos lindos e que certamente
ficarão na memória e no coração. Porém, 2015 nos reserva grandes
surpresas e lindas histórias, que serão vividas e contadas neste cantinho
da natureza que cativa e acolhe a todos que o visitam.

- NELI TAVARES - Agente de Saúde do ESF e do Horto

O Horto foi um espaço pensado para cultivo de ervas. Eu sempre


gostei de chás e como eu venho de uma família bem pobre a qual não
usava medicamentos somente chás, e a Profª Gema também gostava,
nos juntamos e a idéia do Horto deu certo. Unímo-nos e conseguimos
concretizá-lo. E também temos muitas pessoas depressivas na
comunidade e por vezes chegava alguma pessoa chorando desesperada
no Posto e na verdade era problema emocional e não doença física.
Então eu pedia licença para pessoa que estava atendendo e me oferecia
para trazer a pessoa até o horto para conversarmos. Chegando no
Horto a pessoa se encantava e perguntava sobre as plantas e quando eu
percebia ela já estava sorrindo, dando risada. E a partir daí eu decidi que
só irei parar de trabalhar no Horto quando eu não puder mais. E temos
o propósito de continuar com esse trabalho. E o Horto ajuda nessa cura.
Tem épocas em que ele está cheio de borboletas e quando chove fica
cheio de pombas e eu adoro o Horto. Final de semana quando eu posso
eu venho plantar, capinar, ver como está. Para mim o Horto é tudo. Ele
foi uma mudança muito boa na minha vida. Isso tudo nós construímos
com a Profª Gema, arrancando pau e juntando material na rua. O Horto
já fez e faz muito bem para muitas pessoas. Já trouxemos as crianças
da creche aqui com a coordenadora Silvana porque tinham alguns
deles que não queriam comer cenoura, couve e quando eles vieram,
ajudamos eles a plantar e semear. Depois que nasceram as verduras nos
chamamos eles pra verem como ficou e foi algo muito legal porque eles
descobriram de onde veio a cenoura, a couve .

178 | O LIVRO DO HORTO


- NELSON DIAS DIEHL - Membro da Biobacter’s e da Guayí

Postos de Saúde existem muitos em Porto Alegre. Mas Postos de


Saúde com horta e plantas medicinais são poucos. Mas um Posto de
Saúde como o da Vila Cruzeiro é uma jóia preciosa. Primeiro pela e
satisfação com que os funcionários olhavam o horto. Depois pelo carinho
e envolvimento da comunidade com aquele espaço saudável, vivo e
dinâmico. Além de horto - onde alimento é remédio, remédio é alimento
e remédio é remédio - havia o sentido de envolvimento e acolhimento
para o público interno e externo. Das poucas vezes que fui lá encontrei
mulheres e homens, de diferentes localidades, profissões nas formas
de crianças, jovens, adultos e velhos. Vi estudantes universitários de
diversos cursos ensinando e aprendendo. Nós da Biobacter’s e da
Guayí contribuímos com doação de adubos orgânicos e nossos pós
de rochas, realizamos oficinas de compostagem e mineralização dos
solos, alimento vivo, sucos verdes e germinação de grãos. Colocamos
nossa gotinha de carinho e gratidão naquele oceano. Pela primeira vez
queremos externar nosso agradecimento à Professora Gema da Escola
de Enfermagem UFRGS pelo convite que nos oportunizou conhecer
e trocar experiências com pessoas trabalhando por um outro mundo,
mais harmônico nas relações cidadãs e planetárias. Por fim relato um
comentário que ouvi de um funcionário do posto, num período de forte
seca no verão, o pessoal do DMLU, que doa o adubo orgânico, disse
que este posto têm o melhor horto de Porto Alegre”. Eu concordo.

- OSVALDO SANTOS - Dono da Borracharia Santos, pai do


Guardião Mirim Maninho e protetor do Horto

O projeto é algo benéfico para a comunidade, principalmente as


crianças que são carentes de atividades positiva. Se estão no Horto não
se influenciam com coisas ruins.

O LIVRO DO HORTO | 179


- PAULA NILSSON - Voluntária e oficineira

A natureza fez parte da minha vida porque morei muito na minha


infância no sitio onde o meu pai morava. Trabalhar no horto foi uma
forma de resgatar essas vivências junto com a comunidade da Cruzeiro
com uma troca maior de experiências e saberes. Foi muito encantador
trabalhar de forma voluntária com esta comunidade e com a Prof.
Gema que pode me proporcionar uma nova perspectiva do curso de
Enfermagem bem mais rica e além da saúde curativista e de valorização
real da natureza. Com certeza a minha vivencia com o horto e algumas
vezes que tive oportunidade ir na Ilha da pintada, foram vivencias que
vou guardar com todo o carinho.

- SOFIA GASPAROTTO – Bolsistade Extensão

Quando se semeia o amor...


Era uma vez uma menina que adorava cuidar das pessoas e
ouvir suas histórias. Ela também estava apaixonada pelas plantas,
especialmente aquelas que têm, entre tantas belezas, o dom de ajudar
as pessoas. Assim, um dia ela ouviu falar num tal de Horto da Cruzeiro,
e não demorou muito para que ela mergulhasse por inteira neste espaço
e neste universo grandioso. Falando assim até parece que esse espaço
tem vida própria. E é isso mesmo. Falo “O Horto” como uma entidade,
como algo que tem vida própria, pois é assim mesmo que o vejo:
Potencialidade Pura.
E pra mim, o Horto faz todo o sentido quando penso nas crianças
que por lá estiveram ou nas que ainda passarão. Ver as crianças
plantando, regando, brincando por entre os canteiros, descobrindo a
vida, o cuidado com os seres, se alimentando são as memórias mais
vivas que me acompanham sempre que penso no Horto! Meu amor
e a minha compaixão por todas as formas de vida ganharam potência
depois que vivi esses momentos libertadores com as crianças.
Agora, vejo que tudo o que aprendi e vivi retorna para as minhas
experiências mais primordiais da vida, e quem sabe de um ciclo de
gerações. Entendo que o amor e o ser agrofloresteiro que foi desenvolvido

180 | O LIVRO DO HORTO


em mim, aperfeiçoado a cada momento vivido no Horto, foi uma
continuidade da sabedoria de minha avó, ser de muita sensibilidade e
integração com todo o Universo. Com o mesmo propósito, porém de
outra forma, vim a Terra para semear o amor e a vida que seguirá por
muitos ciclos. Tenho muito a agradecer pelos aprendizados sobre as
plantas, o ser humano, a terra e as crianças à generosidade de várias
gerações de mulheres que se propuseram a viver essa dimensão de
cuidado com a vida! Gratidão!

- VITÓRIA MONTEIRO - Guardiã Mirim do Horto

Horto fez parte da metade da minha vida. Foi a melhor coisa que
aconteceu comigo,era tão pequena mas foi tão rápido . Não tinha nada
para fazer e o horto ocupou meu tempo, era sensacional porque eu
estudava e de tarde não tinha nada para fazer ,contava os minutos
,os segundos para vir para o horto... Era tão pequeno de repente foi
crescendo e virou o que virou!!! A tia Gema deve estar orgulhosa tudo
isso que ela construiu com as próprias mãos. Pelos menos eu estou feliz
que um dia vou falar para os meus filhos que existia o horto que fez
parte da minha vida. Já trouxe várias vezes muitas pessoas para vir mais
nunca levaram a sério, mas eu levei e sempre levarei para o resto da
minha vida... Tinha seis anos e plantei um pé de mamão,hoje é grande
e está dando fruto.

- MARIA NELCI CASTRO (TATA) - Visitante

Eu sou a Tata. Conheci o Horto quando estava sendo feito a


composteira então ali estava nascendo algo bom para comunidade. Já
pensou colher um chá direto de Horto? Isto é maravilhoso.

- MARINA PEREIRA - Guardiã Mirim do Horto

Eu me lembro que papai (Sr. Lorí ) acordava cedo para ir pro Horto.

O LIVRO DO HORTO | 181


Eu vinha junto. Com o tempo eu fui chamando outras crianças e elas, o
pai delas para eles também vir ajudar. Era terra e pedras... nada plantado.
Só tinha grama porque iam fazer estacionamento. Começamos a tirar
as pedras, fazer canteiros e eu estava sempre aqui e quando papai não
ia trabalhar, vinha ajudar a tia Gema a construir o horto. Quando dava,
vinha também seu Osvaldo (pai do maninho) e o senhor Bonfim (aquele
que emprestou o quintal de sua casa para fazer as mudas enquanto
o Horto ficava pronto). A senhora começou a chamar as crianças e
formar grupo. A gente era pequena. E um dia numa oficina da tia Gema
escolhemos o nome para o Grupo Guardiões Mirins do Horto. Hoje
crescemos e não nos sentimos satisfeitos com tudo o que fizemos
aqui desde o começo do Horto. Com 12 anos feitos anteontem, penso
que valeu a pena ter feito o Horto porque muitas pessoas vem aqui
pegar folhas de chá, conversar, fazer oficinas. Espero que o Horto fique
aqui para que nossos filhos conheçam o que a gente viveu. Chamar
pessoas para cortar a grama, trabalhar, fazer mutirão para que ele
continue do jeito que ele está agora: bonito, verde, com borboletas.
O que marcou minha vida foi poder vir aqui e conhecer mais as plantas,
os chás... Gostaria de que as pessoas pudessem sentir o que estou
sentindo agora... quem participou desde o inicio do horto: a Carol,
Felipe Luciano, maninho, seu Osvaldo, meu pai, a senhora, seu Bomfim,
certamente gostaram de participar.... meu pai disse que o pessoal do
posto deveria colocar os nebulizadores no horto para aproveitar o
ambiente saudável que tem o horto. Isso seria bom, fazer pelo menos
um dia para que eles sentissem o cheiro da natureza, dos chás. Olhando
as fotos vejo a diferença, como aumentou as plantas, o formato do
horto... quando me lembro que saímos por ali catando fezes de cavalo e
na fruteira frutas estragadas para fazer a composteira. Depois, a Carmen
teve a idéia de construir o minhocário, com o Heitor, a Maína (levou
o pé de bananeira pequenino; trouxe a escola antroposófica), a Sofia
tivemos muitas idéias e começamos a falar com outras crianças e trazer
cascas de frutas e legumes para colocar no minhocário. Foi difícil....

182 | O LIVRO DO HORTO


O LIVRO DO HORTO | 183
CAPÍTULO 11

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Completando o ciclo, reportamos o leitor à introdução do livro:

“A decisão de escrever este livro foi fruto de pensar a saúde no


Brasil, de pensar o povo brasileiro com seus saberes, seus sonhos e
suas realidades. A Constituição Brasileira trata da saúde em seus artigos
196-200. A lei nº 8080 regulamenta sua prática. Acreditamos que à
Universidade compete preparar os profissionais para cultivar cada vez
mais e melhor essa saúde tão singular e tão plural.”

E consideramos:

A construção do Horto Experimental se consolidou como um


importante processo sonhado pela equipe em 1996, construído
efetivamente em 2006 e que se emancipa no momento em que
finalizamos esta publicação.

Porém permanece a dúvida: Como colocar em prática a saúde


no cotidiano de uma Unidade de Saúde da Família num país tão
grande, tão desigual, tão rico, repleto de saberes que permanecem
enraizados na população que bate à porta para atendimento? Dizem
que, quem sabe faz a hora. Quem sabe? Qual é a hora? E por fim....

O Horto lá está, vivo, esperando você. Faça parte dessa história.

184 | O LIVRO DO HORTO


O LIVRO DO HORTO | 185
UMA RETROSPECTIVA

UM CHAMADO PARA READEQUAÇÃO DO


HORTO - 2016

Enquanto no “Livro do Horto” se processava a revisão para


publicação, o Horto, entregue para a ESF (Estratégia Saúde da Família)
e comunidade em 2015, sofria um processo físico de mutilação pelas
máquinas que, ainda estão processando a ampliação da Av. Cruzeiro do
Sul (PAC, Copa do Mundo, 2014).

Debridaram o barranco sobre o qual está a Unidade de Saúde


da Família Cruzeiro do Sul e o Horto, desde 2006, removendo,
temporariamente, a Equipe de Saúde da Família desse local, por questões

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de segurança e condições de trabalho. Ao retornarem, perceberam
a amputação da metade inferior do Horto, tendo levado consigo a
composteira, o minhocário, o bananal, o abacateiro. A tela aramada
coberta de trepadeiras que servia de proteção, apareceu, desnuda,
recolocada acima do corte dos canteiros inferiores do horto, amparada
por tapumes, tirando a segurança e a estética do espaço e parte de
sua história registrada neste livro, conforme mostra a foto na página
anterior.

Percebendo essa realidade, a Equipe de Saúde solicitou nosso


apoio para a readequação do que ficou do horto, tendo em vista nossa
história pregressa e o vínculo criado. Assim sendo, com a participação
de duas bolsistas PRAE (Pró Reitoria de Assuntos Estudantis): Ester
Borba da Enfermagem e Maira Miguel do Jornalismo, que estavam
comigo, participando, desde o início do projeto “Extensão de Fronteira”,
livro que historia parte da extensão, vivenciada nos últimos 40 anos.
Estando esse em fase adiantada, decorridos cinco meses intensos de
trabalho, no qual foram mostrados seus aprendizados nesse processo
de buscas, escutas das historias relatadas e da escrita, Ester:- “mesmo
sem vivenciar aqueles relatos podíamos sentir um sentimento de
pertencimento, e viver extensão através da escrita, além de praticar a
empatia a cada vírgula”. O relato desta experiência acadêmica já esta

O LIVRO DO HORTO | 187


sendo apresentado em eventos de extensão como o Salão de Extensão
UFRGS e o Seminário de Extensão Universitária da Região Sul (34º
SEURS).

Elaboramos um Projeto de Extensão [31528] Readequação do


Horto Ecológico Cruzeiro do Sul e depois mais outro complementar:
[32543] - Readequação do Horto Ecológico Cruzeiro do Sul – Parte
2, para continuar apoiando a equipe a viabilizar recursos e facilitar
o processo de retomada e revitalização desse espaço histórico de
vivências de Educação Popular em Saúde na periferia de Porto Alegre.
A readequação inclui atividades de troca de conhecimentos a partir das
vivências no Horto. As principais técnicas propostas foram: adubação
verde, cobertura morta, calagem, rotação e consorciação de culturas.
Com apoio da PROREXT, estamos realizando eventos, acessando insumos
e estimulando a equipe e a comunidade a levar adiante e revitalizar o
que sobrou desse histórico espaço de térrapia, contemplação, contação
de histórias e acolhimento. Vivenciar esse novo espaço sob a gestão da
Equipe de Saúde, florescem novas e antigas práticas.

Esse processo manifesta a magnífica resiliência de hábitos


e costumes, ressurgindo nos antigos e atuais atores do horto,

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descortinando esperança, beleza e paz naquele lugar que já está lindo
útil e produtivo.

A volta ao horto é uma janela que se abre para que novos e


velhos desafios da inclusão da fitoterapia de uso tradicional no SUS
na Atenção Básica em Porto Alegre, se mantenham vivos e recebam
mais luz e recursos para que em algum momento essa prática mantida
na comunidade e na boa vontade da ESF possa ser institucionalizada
nesta Unidade no momento em que houver uma Política Municipal que
respalde e uma equipe preparada para dar conta deste conhecimento,
desta prática terapêutica e de uma prescrição correta.

Em agosto, Maira migrou para outra bolsa, vindo em seu lugar


Bruna Zanatta, acadêmica de Filosofia que, de imediato se inteirou
no processo, foi a campo, pôs a mão na terra, e ajudou a preparar, o
espaço e mudas para vitalizar reencontros retomando algumas práticas
do passado e comemorações.

Esse espaço, iniciado como pesquisa e chamado de Horto


Experimental, passou a ser Horto Ecológico Cruzeiro do Sul, acolhendo
precocemente a extensão e vivenciando o ensino, mantendo essa
tríplice prática integrada até 2015. Hoje, cultivado pela equipe, agora
denominado ora de “Horto” ora de “Horta“ mostrando lindos canteiros
de couve, alface, beterrabas entre tantas plantas medicinais. Ester diz:
-“Esse lugar, que por tantos é lembrado como sala de aula ao ar livre,
espaço de convivências, está revivendo viveres e saberes. Cada ciclo é
uma nova história para se contar. ”Entre os eventos festejamos a chegada
da Primavera com o lançamento do livro Jornal de Memórias, que é
um compacto transdisciplinar dos 15 jornais ali produzidos. Também
está sendo estimulada a equipe e a comunidade a escreverem sua
experiência de apropriação do horto, sua reconstrução e seu destino.

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BOLSISTAS

Bolsistas são acadêmicos de diferentes cursos em diversos períodos


que vivenciaram a extensão e/ou a pesquisa junto às populações de
periferia. Compartilhando seres, saberes e fazeres entre si e com a
comunidade. Entre os tantos bolsistas que passaram por estas vivencias
e que ajudaram a manter o Horto, relacionamos alguns, citando nome,
vínculo e curso:

Carmen Janete Rekowisky - Bolsista Extensão e POP - Geografia


Mariane Castro da Silva - Bolsista de extensão - Enfermagem
Sofia Zutin Gasparotto - Bolsista de Extensão - Biologia
Liv Gonçalves - Bolsista de Extensão - Biologia
Luís Fernando de Carvalho Leal - Bolsista de Extensão - Geografia
Fernando Stoffels - Bolsista de Extensão - Filosofia
Janaína Giordani Longhi - Bolsista de Extensão e POP - Historia
Juliana Deconto - Bolsista de Extensão - Filosofia e Arquitetura
Caroline Almeida dos Santos - Bolsista de Extensão - Agronomia
Juliana Marasini - Bolsista de Extensão - Biologia
Viviane Brixner Jost - Bolsista de Extensão - Enfermagem
Nathyely Truylio - Bolsista de Extensão - Enfermagem
Karina Rocco - Bolsista de Extensão - Educação Física
Pâmela da Silva - Bolsista de Extensão - Relações Públicas
Paula Nilsson - Acadêmica Voluntária - Enfermagem
Monique Scapinello - Bolsista de Extensão - Psicologia
Thaís Regina Silva da Silva - Bolsista de extensão - Enfermagem
Evelyne Duarte de Amorim Silva - Bolsista de extensão - Enfermagem

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Thiago Antônio Gomes da Silva - Bolsista de extensão - Física
Maína Sulzbach Petry - Bolsista de extensão - Enfermagem
Heitor Tagliaro Lopes - Bolsista de extensão - Agronomia
Camila Leidens Corrêa Silvello - Bolsista de extensão - Enfermagem
Jéssica Telles - Bolsista de pesquisa - Enfermagem
Francyele Melgarejo Montenegro Silveira - Bolsista de Extensão -
Serviço Social
Jefferson Delgado - Bolsista de Extensão - Biologia
Gláucia Bohusch - Voluntária vinculada ao PET Saúde - Enfermagem
Bruna de Souza Fiorentin - Bolsista POP e voluntária de extensão -
Psicologia
Andrya Nayane Machado Vicente - Voluntária - Enfermagem
Melina Mucilo Gonçalves - Bolsista de extensão e Bolsisata POP -
Biologia
Mauricio Nardi Valle - Voluntário vinculado ao PET Saúde -
Psicologia
Diogo Antunes - Voluntário vinculado ao PET Saúde - Educação Física

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Petrópolis: Vozes, 1999.

BRASIL, Ministério da Saúde. Política Nacional de extensão popular


em saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2012.

BRASIL, Ministério da Saúde. Portaria nº 971, de 03 de maio de 2006.


Aprova a política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares
(PNPIC) no Sistema único de Saúde. Diário Oficial da União. Brasília,
04 de maio de 2006.

CAPRA, F. et al. Alfabetização ecológica: a educação das crianças


para um mundo sustentável. São Paulo: Cultrix; 2006

CAPRA, F. et al. Alfabetização Ecológica. 1ª Ed. São Paulo. 2005. 312 p.

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sustentável. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2001.

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MOLLISON, Bill; SLAY, Reny M. Introdução à Permacultura,
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buenasprácticas agrícolas y de recolección (BPAR) de plantas
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PAPA FRANCISCO - Carta Encíclica Laudato Sí do Santo Padre Francisco


sobre o cuidado da casa comum. Brasília, Edições CNBB, 2015. 144 p.

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