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COMUNICAÇÃO E CONSUMO

Força de
expressão:
construção,
consumo e
contestação das
representações
midiáticas das
minorias O VERBO REPRESENTAR POSSUÍA, originariamen-
te, um significado restrito: “apresentar de
RESUMO novo”. Com o tempo, o termo passou a ser
Testemunhamos, hoje, um crescente interesse acadêmico usado, em latim, como sinônimo de “subs-
pelo processo através do qual imagens das minorias são tituir”, “fazer as vezes de”, no sentido de
concebidas, estruturadas e apresentadas ao público pelos que a pintura de um rei “estaria no lugar”
meios de comunicação de massa. Após fornecer um panora- do soberano retratado. Na concepção mo-
ma histórico da pesquisa neste campo, examino os proble- derna e liberal do processo democrático, a
mas teóricos e metodológicos que envolvem a análise de es- idéia de representação está associada à de-
tereótipos e distorções nas representações midiáticas de gru- legação de poderes, por meio de votos, a
pos marginalizados ou oprimidos. um conjunto proporcionalmente reduzido
de indivíduos, na expectativa de que os
ABSTRACT eleitos articulem e defendam pontos de
There is nowadays an increasing academic interest in the vista e interesses dos eleitores. De forma
processes through which media images of minorities are análoga, o termo designa, também, o uso
conceived, structured and presented to audiences. After dos variados sistemas significantes dispo-
providing a historical overview of research in this field, I níveis (textos, imagens, sons) para “falar
exam the theoretical and methodological problems entailed por” ou “falar sobre” categorias ou grupos
by the analysis of stereotypes and distortions in mass media sociais, no campo de batalha simbólico das
representations of marginalized or oppressed groups. artes e das indústrias da cultura.
Quem consulta o Novo Dicionário Auré-
lio, à procura das definições canônicas de
PALAVRAS-CHAVE (KEY WORDS) representar e representação, em nosso idioma,
- Minorias (Minorities) obtém uma noção preliminar das relações
- Representação Midiática (Media Representation) de poder em que tal família de palavras se
- Estudos Culturais (Cultural Studies) encontra envolvida. Os exemplos que
acompanham algumas das 19 acepções do
verbo representar são bastante eloqüentes, a
este respeito: “1. Ser a imagem ou a repro-
dução de: Uma das telas de Pedro Américo
representa a Batalha do Avaí; 2. Tornar pre-
sente; patentear, significar: A vitória repre-
João Freire Filho sentou a bravura de nosso povo; 5. Chefiar
UFRJ missão junto a (governo, organismo inter-

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nacional, congresso, etc.): O Chanceler re- levantes, de que maneira gêneros e artefa-
presentou o Brasil na ONU; 6. Estar em lu- tos culturais funcionam tanto para forjar a
gar de, substituir: O ajudante-de-ordens re- aceitação do status quo e a dominação social
presentou o governador na cerimônia; 7. como para habilitar e encorajar os estratos
Ser procurador ou mandatário de: Os advo- subordinados a resistir à opressão e a con-
gados representaram as partes litigantes; testar ideologias e estruturas de poder con-
16. Dirigir uma representação; expor uma servadoras (Kellner 2001, 2003).
queixa ou censura: Os pequenos funcioná- Como os costumes, o cotidiano, os en-
rios, sentindo-se injustiçados, representa- tretenimentos, os dilemas e as formas cole-
ram ao Presidente”. Somos lembrados, ain- tivas de luta das minorias são apresentadas
da, de que o substantivo feminino represen- nos meios de comunicação de massa?
tação se refere, entre outros significados, à Quais os fatos históricos, os feitos artísticos
qualidade indispensável ou recomendável e políticos, os pontos de vista e as caracte-
para o exercício de um cargo (“Falta-lhe rísticas enfatizadas ou silenciadas? Que
certa representação para o cargo que aspi- ambivalências, tensões e contradições são
ra”) e ao status social elevado (“família de possíveis detectar no interior destas repre-
representação”). sentações impressas e audiovisuais? Quais
As implicações políticas das formas os seus aspectos progressistas ou reacioná-
de representação (nos múltiplos significa- rios? Estas são algumas das interrogações
dos do termo, tanto como prática de retra- basilares que, em regra, animam as investi-
tação como de delegação) têm mobilizado gações acadêmicas sobre a relação entre
a atenção de pesquisadores de várias disci- mídia, poder e alteridade.
plinas e de militantes de diversos movi- O pesquisador interessado, todavia,
mentos e organizações sociais. Na área es- em ultrapassar os limites da análise textual
pecífica dos estudos midiáticos, testemu- – integrando a representação aos processos
nhamos um crescente interesse pelo com- distintos e mutuamente constitutivos do
plexo processo de produção, circulação, “circuito cultural” (Johnson, 1986; du Gay
consumo e contestação de representações et al. 1997) – se depara com um leque mui-
das minorias – conceito usado, aqui, para to mais amplo de questões inter-relaciona-
abarcar todo grupo social cujas perspecti- das: Que atores e instituições sociais são
vas e vozes são marginalizadas pelas estru- responsáveis pela geração e disseminação
turas de poder e pelos sistemas de signifi- massiva das imagens das comunidades mi-
cação dominantes numa sociedade ou cul- noritárias? Em conjunção com quais fatores
tura (Edgar & Sedgwick 2003: 213-214). políticos e econômicos? Amparados por
Influentes quadros teóricos de refe- quais discursos, códigos culturais, conven-
rência (variantes do neomarxismo, da críti- ções genéricas e tecnologias comunicacio-
ca feminista e dos estudos pós-coloniais) e nais? Visando preferencialmente a que fatia
sofisticadas ferramentas de análise (estu- de mercado? Como as representações gera-
dos culturais, economia política, sociologia das pela cultura midiática globalizada são
das organizações e das profissões) infor- assimiladas, negociadas ou resistidas pelas
mam as abordagens (já estabelecidas ou diversas audiências, de acordo com suas
emergentes) de como as imagens de po- distintas “competências de recepção” (Mar-
bres, mulheres, homossexuais, negros, en- tín-Barbero [1998] 2003)? Em que medida a
tre outros grupos inferiorizados, são conce- estigmatização, a folclorização, a exotização
bidas, estruturadas e apresentadas ao pú- afetam a auto-estima de indivíduos e gru-
blico, por todo o aparato da cultura da mí- pos estereotipados, gerando eventuais sen-
dia e do consumo. timentos de embaraço e ressentimento em
O foco nas representações midiáticas relação à sua identidade social e desejos de
nos permite avaliar, entre outros tópicos re- refutar sua herança cultural? Qual a influ-

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ência destas práticas representacionais, por A análise crítica da sub-representação
sua vez, sobre as crenças e atitudes da soci- ou da representação distorcida de identida-
edade em geral, no que concerne à perti- des sociais (classes, gêneros, orientações
nência das reivindações das minorias por sexuais, raças, etnias, nacionalidades) se
liberdade, democracia, justiça social e cida- consolidou, desde a década de 1960, como
dania? Quais as estratégias mais efetivas um dos temas centrais da agenda dos estu-
para confrontar publicamente as represen- dos culturais e midiáticos. Tal inclinação
tações mainstream perniciosas? Como se vê, teórica se harmoniza com a pauta de reivin-
são indagações que dizem respeito não só dicações dos novos movimentos sociais,
às estruturas e interpelações do conteúdo, notabilizados por uma preocupação pro-
mas, também, às lógicas da produção (inte- funda com a questão da identidade – o que
resses econômicos, ideologias profissio- ela significa, como é produzida e questio-
nais, rotinas laborativas, estratagemas de nada.
comercialização), ao impacto e aos usos so- A chamada política de identidade se
ciais das representações midiáticas. caracteriza pela afirmação e defesa da sin-
Na primeira parte deste artigo, deli- gularidade cultural dos grupos oprimidos
neio um panorama da emergência da re- ou marginalizados. Ativistas negros, femi-
presentação das minorias como objeto de nistas e homossexuais estenderam definiti-
reflexão teórica e investigação empírica no vamente o sentido do político para além de
campo da comunicação, ressaltando a con- suas fronteiras convencionais – sem negli-
tribuição do protocolo investigativo formu- genciar as origens econômicas dos proces-
lado pela tradição dos estudos culturais sos de exclusão e a importância das dispu-
britânicos. Discuto, em seguida, as limita- tas tradicionais pelo acesso às riquezas ma-
ções teóricas e metodológicas das análises teriais, ratificaram o caráter estratégico da
pioneiras sobre distorções e estereótipos na representação nas diversas instâncias e ins-
mídia. Na conclusão, destaco o crescente e tituições culturais (materiais didáticos, cur-
auspicioso surgimento de novos lugares de rículos escolares, meios de comunicação de
enunciação, onde grupos sociais sub-repre- massa) que afetam o modo como nós ve-
sentados nas bancadas parlamentares, nos mos e como somos vistos e tratados pelos
textos midiáticos e no mundo das artes in- outros. Candentes polêmicas públicas e
ventam e circulam contradiscursos, com acadêmicas chamaram a atenção para o pa-
objetivo de construir interpretações oposi- pel crucial da cultura da mídia na formula-
cionistas de suas identidades, seus interes- ção, no reconhecimento e na legitimação de
ses e suas necessidades. modelos daquilo que significa ser homem
ou mulher, moral ou imoral, feio ou bonito,
bem-sucedido ou fracassado, entre outros
Política de identidade e a luta pela critérios e referenciais significativos para a
visibilidade midiática condução da vida diária e a capacidade de
situar-nos no mundo moderno (Kellner,
“Hollywood, grande criadora de mitos, ensi- 1995; Gripsrud, 2002; Silverstone, 2002).
nou aos heterossexuais o que pensar sobre os Como ratifica Woodward (2000: 17-
homossexuais e aos homossexuais o que de- 18), é por intermédio dos significados pro-
viam pensar sobre si mesmos. Ninguém es- duzidos pelas representações que damos
capou dessa influência”, argumenta, de for- sentido à nossa experiência, àquilo que so-
ma taxativa, o documentário Outro lado de Ho- mos e àquilo que podemos nos tornar:
llywood (1995), respaldado por um extenso ar-
quivo de imagens que abrangem do cinema Os discursos e os sistemas de repre-
mudo ao contemporâneo e por uma já sedi- sentação constroem os lugares a partir
mentada tradição de pesquisa acadêmica. dos quais os indivíduos podem se

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posicionar e a partir dos quais podem 1998: 41-43). Daí, a pujança do célebre slo-
falar. Por exemplo, a narrativa das te- gan: “O pessoal é político”.
lenovelas e a semiótica da publicida-
de ajudam a construir certas identida-
des de gênero. Em momentos particu- A trama dos estereótipos
lares, as promoções de marketing po-
dem construir novas identidades Nos Estados Unidos e na Inglaterra, os es-
como, por exemplo, o “novo homem” tudos culturais e a sociologia da cultura
das décadas de 1980 e de 1990, identi- passaram a dedicar-se, já a partir do final
dades das quais podemos nos apro- dos anos 1950, à análise das representações
priar e que podemos reconstruir para das mulheres na mídia (Cramer, 2000; Cur-
nosso uso. rie, 1999: 22-39; Strinati, 1999: 175-213; van
Zoonen, 1994: 16-18)1 . Uma das teses cen-
Parte fundamental do processo social trais desses trabalhos é que a publicidade,
de constituição de sentido, as representa- as revistas femininas, o cinema hollywoo-
ções são organizadas e reguladas pelos di- diano e a ficção seriada televisiva refletem
ferentes discursos (legitimados, naturaliza- valores sociais dominantes e denigrem
dos, emergentes ou marginalizados) que simbolicamente a mulher, seja por simples-
circulam, colidem e articulam-se num de- mente não representá-las, seja por apresen-
terminado tempo e lugar. Logo, a constru- tá-las em situações ou atividades social-
ção (ou supressão) de significados, identifi- mente desvalorizadas. Tanto a condenação
cações, prazeres e conhecimentos – nos es- silenciosa como a estigmatização ostensiva
paços e mercados midiáticos – envolve, ne- influenciariam, por sua vez, as definições e
cessariamente, a disputa pela hegemonia os parâmetros de feminilidade, domestici-
entre grupos sociais dominantes e subordi- dade e beleza por meio das quais as mu-
nados, com conseqüências bastante concre- lheres passavam a avaliar a si mesmas, aos
tas no tocante à distribuição de riquezas, seus relacionamentos, às suas necessidades
prestígio e oportunidades de educação, e às suas aspirações.
emprego e participação na vida pública. Amparada metodologicamente em
Por intermédio de filmes, ficções seri- análises de conteúdo, a crítica feminista da
adas, canções, videoclipes, noticiários, edi- mídia procurou, a partir dos anos 1970, do-
toriais, artigos, reportagens, entrevistas, de- cumentar, de forma sistemática, os “papéis
poimentos, testes, dicas, concursos e anún- sexuais” (comportamentos, valores e atitu-
cios, as indústrias da cultura fornecem des- des) prescritos como sendo apropriados
crições textuais e visuais daquilo que é (“naturais”) para homens e mulheres. Os
conveniente em matéria de personalidade, meios de comunicação de massa eram de-
aparência, conduta moral e cívica, postura nunciados, em última análise, como verda-
política, relacionamento afetivo e compor- deiras prisões patriarcais, responsáveis
tamento sexual – modelos e recursos sim- pela criação, divulgação e legitimação de
bólicos a partir dos quais os consumidores imagens “negativas”, “limitadas”, “desvir-
podem construir o seu senso do que signi- tuadas” das mulheres, baseadas em interes-
fica ser “moderno”, “civilizado”, “cida- ses e fantasias masculinas. A presença predo-
dão”, “vitorioso”; “atraente”, “cool”, “in”, minante, no campo da produção jornalística e
“fashion”... A avaliação que os indivíduos televisiva, de executivos e funcionários do
fazem de si mesmo e de seus interesses, sexo masculino (cuja socialização de gênero
sob o influxo crescente dos referenciais mi- os levaria a reproduzir os valores dominan-
diáticos, interfere substancialmente, por tes da sociedade) foi apontada, por algumas
sua vez, nas demandas políticas que ex- autoras, como a razão fundamental para as
pressam ou deixam de pleitear (Street, distorções no plano do conteúdo.

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Tais debates públicos e análises aca- simbólicas enviesadas, infensas à pondera-
dêmicas acerca da veiculação maciça de re- ção racional e resistentes à mudança social.
presentações desfavoráveis e danosas das A disseminação, pelos meios de comunica-
minorias costumam gravitar em torno de ção de massa, de representações inadequa-
um conceito-chave: estereótipo, derivado do das de estrangeiros, classes sociais e outras
grego stereós (“sólido”) + týpos (“molde”, comunidades é destacada como um sensí-
“marca”, “sinal”). vel problema para o processo democrático,
De início, restrita ao jargão da impren- cujo desenvolvimento demanda a opinião
sa e da tipografia, a palavra estereótipo in- esclarecida de cada cidadão a respeito de
gressou metaforicamente no vocabulário questões capitais da vida política e social.
das ciências sociais, no início da década de Logo, a julgar, apenas, por esta última
1920, graças ao escritor e colunista político (e mais proveitosa) tentativa de definição,
estadunidense Walter Lippmann. Em Pu- os estereótipos, a exemplo de outras cate-
blic opinion ([1922] 1965) – “o livro fundador gorias, atuam como uma forma de impor
dos estudos midiáticos americanos” (Ca- um sentido de organização ao mundo soci-
rey, 1989: 75) – Lippmann oscila entre duas al; a diferença básica, contudo, é que os es-
noções distintas de estereótipo. A primeira, tereótipos ambicionam impedir qualquer
de base psicológica, descreve o estereótipo flexibilidade de pensamento na apreensão,
como um modo necessário de processa- avaliação ou comunicação de uma realida-
mento de informação, sobretudo em socie- de ou alteridade, em prol da manutenção e
dades altamente diferenciadas; como uma da reprodução das relações de poder, desi-
forma inescapável de criar uma sensação gualdade e exploração; da justificação e da
de ordem, em meio ao frenesi da vida soci- racionalização de comportamentos hostis e,
al e das cidades modernas. Esta definição in extremis, letais (Seiter, 1986; Sodré, 1992:
equipara o estereótipo a outros padrões 113-127; Hall, 1997; Shoat & Stam, 1994;
mais amplos de tipificação e representação, Cottle, 2000: 2; Pickering, 2001; O’Sullivan
indispensáveis ao processo cognitivo me- et al. 2002: 299-301). Estereótipos, por exem-
diante o qual estruturamos e interpretamos plo, sobre a predisposição natural dos ne-
experiências, eventos e objetos diversifica- gros para atividades físicas (trabalhos bra-
dos e complexos. çais ou, na melhor das hipóteses, esportes e
O argumento de que representações dança), em detrimento de tarefas e ocupa-
seletivas, parciais, ultra-simplificadas e ins- ções intelectuais, almejam explicar e justifi-
trumentais do Outro são parte integral do car sua escassa presença nos níveis superi-
processamento mental dos estímulos atra- ores de ensino, em sociedades cuja ideolo-
vessa grande parte da pesquisa na área da gia oficial é a democracia racial.
psicologia social, com repercussão nos Como práticas significantes, os estere-
campos da ciência política, da história e ótipos não se limitam, portanto, a identifi-
dos estudos culturais e midiáticos. Tal pre- car categorias gerais de pessoas – contêm
missa nos leva, porém, à temerária conclu- julgamento e pressupostos tácitos ou explí-
são da necessidade do estereótipo, inocen- citos a respeito de seu comportamento, sua
tando seus perpetradores, e deixando-nos visão de mundo ou sua história. Embora
inermes diante do racismo, da xenofobia e possam variar em termos de virulência e
da discriminação sexual. apelo emocional, geralmente representam,
A fim de evitar a absolvição açodada expressam tensões e conflitos sociais subja-
e desastrosa dos estereótipos, convém re- centes – o “português boçal”; “o irlandês
cuperar a outra acepção da palavra deline- rude”; “o oriental dissimulado”; “o argen-
ada por Lippmann. Esta segunda conceitu- tino esnobe”; “o imigrante arruaceiro”; “o
ação, de índole ostensivamente política, índio preguiçoso”; “o jovem rebelde sem
apresenta os estereótipos como construções causa”; “a mulher latina amoral e caliente”;

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“o negro de índole escrava, humilde e re- sem na verdade ser provados jamais fora
signado”; “o suburbano farofeiro”; “o ho- do discurso” (Bhabha, 1998: 107).
mossexual erotomaníaco”; “o artista afemi- A esta altura, fica evidente quão errô-
nado”; “o intelectual frankfurtiano elitista e neo é atribuir a origem dos estereótipos a
carrancudo”... etc. uma útil (e não necessariamente indesejá-
Tal qual atestam os exemplos supraci- vel) “economia do esforço”, edificada por
tados, o estereótipo – “o vírus da essência”, leis universais da cognição; em verdade,
na definição lapidar de Barthes ([1956] eles necessitam ser conceituados (e contes-
1963: 71) – reduz toda a variedade de carac- tados) como estratégias ideológicas de
terísticas de um povo, uma raça, um gêne- construção simbólica que visam a naturali-
ro, uma classe social ou um “grupo desvi- zar, universalizar e legitimar normas e con-
ante” a alguns poucos atributos essenciais venções de conduta, identidade e valor que
(traços de personalidade, indumentária, emanam das estruturas de dominação soci-
linguagem verbal e corporal, comprometi- al vigentes. Sua formulação e difusão, con-
mento com certos objetivos etc.), suposta- forme sugere Hall (1997: 259), são um dos
mente fixados pela Natureza. Encoraja, as- aspectos daquilo que Gramsci chamou de
sim, um conhecimento intuitivo sobre o luta pela hegemonia – ou seja, da tentativa
Outro, desempenhando papel central na habitual das classes dominantes de mode-
organização do discurso do senso comum. lar toda a sociedade de acordo com sua vi-
Os estereótipos constituem “o lugar são de mundo, seu sistema de valores e
de um superávit ilícito de significado” (Ja- sua sensibilidade, de modo que sua ascen-
meson, 1998: 106); a abstração em virtude dência comande, arregimente um consenti-
da qual minha individualidade é alegoriza- mento amplo e pareça natural, inevitável e
da e transformada em ilustração abusiva de desejável para todos.
outra coisa, algo não concreto e não indivi- Tais artifícios discursivos costumam
dual. Como forma influente de controle so- ser acionados, com mais assiduidade e vi-
cial, ajudam a demarcar e manter fronteiras rulência, em clima de tensão e conflito soci-
simbólicas entre o normal e o anormal, o al, como demonstrou a sociologia britânica
integrado e o desviante, o aceitável e o ina- dos anos 1970, nos estudos sobre desvio
ceitável, o natural e o patológico, o cidadão comportamental e criminologia juvenil
e o estrangeiro, os insiders e os outsiders, (Young, 1971; Cohen, 1971, [1972] 1980, Co-
Nós e Eles. Tonificam a auto-estima e facili- hen & Young, 1973). O objetivo destes tra-
tam a união de todos “nós” que somos nor- balhos é, em linhas gerais, descrever e ana-
mais, em uma “comunidade imaginária”, lisar o processo mediante o qual uma con-
ao mesmo tempo em que excluem, expe- dição, um episódio, um indivíduo ou um
lem, remetem a um exílio simbólico tudo grupo de pessoas passa a ser encarado
aquilo que não se encaixa, tudo aquilo que como ameaça para os valores e os interes-
é diferente. ses basilares de uma sociedade. Às vezes, o
Modo de representação complexo (an- objeto de “pânico moral” é bastante recen-
sioso e afirmativo, na mesma proporção), o te; em outros casos, já existia havia muito
estereótipo, ao embasar estratégias de indi- tempo, mas repentinamente recebe os holo-
viduação e marginalização, produz um fotes da mídia e torna-se o cerne das preo-
efeito de verdade probabilística e previsi- cupações públicas de agentes da lei, religi-
bilidade que, no caso, deve sempre estar osos, intelectuais, políticos, entre outros
em excesso do que pode ser provado empi- atores sociais com credibilidade e morali-
ricamente ou explicado logicamente – dade reconhecida. Às vezes, o pânico se
“como se a duplicidade essencial do asiáti- dissipa e logo é esquecido (exceto no fol-
co ou a bestial liberdade sexual do africa- clore e na memória coletiva); em outras
no, que não precisam de prova, não pudes- ocasiões, apresenta repercussão mais séria

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e duradoura, podendo ocasionar mudanças Entre as teses mais influentes do tra-
nas esferas judiciária e da política social, balho de Cohen, destaca-se a idéia de que
ou, até mesmo, na forma como a sociedade cada pânico moral tem seu bode expiató-
concebe a si mesma. rio, um “folk devil” sobre o qual o público
A chamada sociologia do pânico mo- projeta seus medos e suas fantasias. Isto
ral se desenvolveu a partir da já então bem não equivale a dizer que o “folk devil” é
estabelecida teoria do rótulo, perspectiva criado pelo pânico moral. O autor fez ques-
analítica que considera o desvio uma cons- tão de frisar que, a despeito de usar termos
trução social e não uma qualidade intrínse- como “pânico” e analogias com o estudo
ca de atos ou atores sociais específicos. Tal das histerias e das ilusões de massa, não
abordagem está associada especialmente tencionava sugerir que mods e rockers não
ao trabalho do sociólogo norte-americano teriam existido, se não fosse o pânico mo-
Howard Becker (1963), que enfatizou o pa- ral, ou que teriam desaparecido, caso tives-
pel dos agentes de controle social – os “em- sem sido simplesmente ignorados. Sua in-
preendedores morais” – na fabricação do tenção, em realidade, era sugerir que a dia-
comportamento desviante. bolização destes movimentos era uma so-
Os meios de comunicação de massa lução inadequada para a “questão juvenil”.
são a grande fonte de difusão e legitimação Em primeiro lugar, as atividades dos mods
dos rótulos, colaborando decisivamente, e rockers constituíam somente um aspecto
deste modo, para a disseminação de pâni- temporário e epidérmico do “problema”;
cos morais. A inter-relação entre forças de as causas subjacentes do pânico moral
controle social, a mídia de massa e certas eram, de fato, a ambigüidade e a tensão
formas de atividade desviante foi abordada cultural causadas pela mudança social. Em
por Stanley Cohen, no seminal Folk devils outras palavras: o objeto do pânico moral
and moral panics ([1972] 1980). O livro logo não eram tanto os mods e os rockers quan-
se tornou uma referência fundamental para to a afluência e a liberdade sexual do pós-
os estudos culturais e sociológicos a res- guerra que eles representavam; sendo as-
peito das subculturas espetaculares juvenis sim, estes movimentos juvenis seriam es-
e sua demonização na mídia. quecidos dentro de alguns anos, e novas
Cohen focalizou, em especial, a cober- encarnações do Mal emergiriam para subs-
tura sensacionalista das desavenças entre tituí-los.
mods e rockers, em locais de veraneio do sul A reação exagerada dos guardiões da
da Inglaterra, nos anos 1960. Os conflitos moral não era apenas míope, mas também
foram ampliados pela imprensa muito contraproducente, servindo, apenas, para
além de sua escala e de seus significados incrementar a polarização social – embora
reais, gerando sentimento de grande inqui- este pudesse ser precisamente o efeito polí-
etação no público ante as práticas culturais tico desejado, como demonstraram, poste-
das duas subculturas jovens (constituídas riormente, Stuart Hall et al (1978), em sua
por membros da classe operária). Ao soció- tentativa de introduzir o conceito de hege-
logo inglês interessava, sobretudo, a di- monia, na análise das formas por intermé-
mensão simbólica das ondas de pânico – os dio das quais pânicos morais criam condi-
conflitos morais e os estilos de vidas amea- ções sociais de consentimento necessárias
çados. A criação do pânico moral, no enten- para a construção de uma sociedade mais
dimento do autor, fornece oportunidade centralizada na lei e na ordem e menos in-
preciosa para os partidários de um univer- clinada ao “liberalismo” e à “permissivida-
so simbólico moral forjarem um universo de” dos anos 1960. A faceta mais importan-
moral antagônico, atacá-lo, e redefinirem, a te deste trabalho era o reconhecimento de
partir daí, as fronteiras entre o moralmente que a ideologia não é um processo social
desejável e indesejável. baseado apenas na distorção da verdade,

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mas sim uma força que opera continua- ckering, 2001: 192-197; Freire Filho & Hers-
mente por intermédio da mobilização do chmann, 2003).
“senso comum”. Igualmente comprometedora é sua
falta de perspectiva histórica, que inviabili-
za a plena elucidação de questões funda-
Análise de representação das mino- mentais: As condições para os surtos de pâ-
rias: armadilhas teóricas e nico moral são inteiramente contingentes e
metodológicas imediatas ou preparadas por uma concate-
nação muito mais longeva de eventos, epi-
A teoria do pânico moral nos forneceu um sódios, mudanças e conjunturas? Por que
relato profícuo de temores simbolicamente determinadas ondas de pânico moral so-
carregados dos anos 1960 e 1970, revelando bre, por exemplo, delinqüência juvenil ou
os modos operativos de constituição – pela entretenimentos populares exibem caracte-
mídia e por diversos agentes sociais – do rísticas semelhantes? Por que ocorrem cicli-
consenso e da retórica da “maioria moral”. camente? Como se conectam, ao longo do
Contribuiu, desta forma, para uma revisão tempo, canalizando efetivamente imagens
do conceito de ideologia, em que foram e valores, no processo da transmissão cul-
descartadas as noções do estereótipo como tural, e vinculando recursos do passado e a
simples distorção de uma realidade, em produção de sentido no presente?
outras condições, prontamente acessível, Como argumenta Pickering (2001), o
em benefício de uma abordagem focada estudo e a crítica dos estereótipos se reve-
nas mais abrangentes conexões sociais e es- lam sempre inadequados, quando não são
truturas de construção discursiva da alteri- informados por tal compreensão histórica
dade (Pickering, 2001: 182-196). do objeto discriminado. O processo e a prá-
A despeito de insights esclarecedores tica de estereotipagem e de construção da
para a pesquisa em comunicação, o modelo alteridade estão relacionados – comple-
canônico do pânico moral comporta, po- menta o autor – a questões centrais de per-
rém, equívocos e lacunas importantes. Não tencimento no mundo moderno (à nação e
importa quão útil tenha sido no desenvol- ao passado cultural nacional; a diferentes
vimento de um vocabulário para a compre- estágios do progresso civilizacional, men-
ensão do poder exercido pela mídia, a teo- surados em termos de evolução social e hi-
ria do pânico moral necessita ser revista e erarquização racial), como também a ques-
refinada teoricamente, a fim de ajustar-se a tões de poder e autoridade no contexto da
relevantes tendências sociais, econômicas e construção nacional, do colonialismo e do
culturais da contemporaneidade. Este tipo imperialismo. Muitas das construções este-
de abordagem acerta quando vai além das reotípicas do Outro, como representações
investigações sociológicas que enfocam pa- de diferentes culturas e países, estão enrai-
drões de propriedade e controle como os zadas em nacionalismos do século XIX e
signos da cumplicidade entre mídia e go- em racionalizações pseudocientíficas da di-
verno. Falha, entre outros pontos, quando ferença racial desenvolvidas, naquele perí-
tende a tratar de maneira monolítica a pro- odo, nas sociedades européias autoprocla-
dução e o consumo midiático – negligenci- madas modernas.
ando, de um lado, a crescente exploração Em sintonia com este apelo por uma
comercial e o marketing da rebeldia e da introdução da perspectiva histórica, nos es-
infração juvenil; do outro, as inovações tec- tudos culturais e midiáticos sobre os este-
nológicas e miríades de novos canais de reótipos, examinei, em outro trabalho (Frei-
distribuição (sujeitos a interesses comerci- re Filho, 2004), as estratégias discursivas
ais e ideológicos heterogêneos) que facili- empregadas, no início do século XX, pelo
tam a expressão de vozes discrepantes (Pi- escritor e jornalista João do Rio, para repre-

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sentar a ambiência sociocultural do misteri- presentações a um conjunto restrito de fór-
oso continente negro carioca. Busquei ressal- mulas reificadas: “Por trás de toda criança
tar como a construção ideológica da alteri- artista negra o crítico enxerga um picka-
dade cultural/histórica/racial do “popula- ninny, por trás de todo ator negro sexual-
cho”, em suas crônicas e reportagens, se mente atraente um buck; por trás de toda
mantém mais ou menos fiel aos motivos negra corpulenta ou de uma criada uma
centrais da teoria da degeneração (junto com ‘mãe preta’” (Stam & Shohat, 1995: 76).
a idéia cognata da decadência, a mais domi- Teoricamente pouco sofisticadas e
nadora obsessão do fin-de-siècle). presas a considerações eminentemente des-
No desfecho do artigo, argumentei critivas do conteúdo manifesto da mensa-
que o legado mais fundamental das crôni- gem, as análises canônicas das imagens das
cas e reportagens do multifacetado autor minorias tendem a efetuar generalizações a
carioca não é o conteúdo informativo, o valor respeito da natureza estereotípica da mí-
documental; sua importância e atualidade, dia, sem levar em conta especificidades
como objeto de estudo, reside mais no fato culturais e estéticas, como as peculiarida-
de elas porem em relevo, com eloqüência des da paródia e da sátira, por vezes fun-
ímpar, resistências internas e externas que damentadas em exageros calculados e sub-
limitam a representação literária e midiáti- versivos (Shohat & Stam, 1994; Stam & Sho-
ca do Outro extremo – um projeto que pare- hat, 1995: 81-84; Stam, 1997: 339-341, 2002:
ce, hoje, ainda longe de ter esgotado seu 305).
encanto radical e seu atrativo mercadológi- No caso das realizações audiovisuais,
co, como prova o recente boom de romances costuma-se menosprezar, também, a influ-
e filmes que pretendem esboçar, com base ência de todos os tipos de códigos e con-
em discrepantes propostas estéticas e dis- venções narrativas, genéricas e estilísticas
tintas plataformas políticas, um mapea- que participam ativamente da construção
mento físico e social da criminalidade ur- de sentido, por meio da escolha da ilumi-
bana, desvelando, para o grande público, nação, do enquadramento, da mise-en-scè-
modos e costumes de matadores, trafican- ne, do som, da música e das formas de atu-
tes e delinqüentes de toda espécie, encerra- ação:
dos em presídios ou entrincheirados nos
morros cariocas e na periferia paulista. Para falar da “imagem” de um grupo
A miopia histórica é, todavia, apenas social, nós devemos fazer perguntas
um dos possíveis fatores limitantes dos es- precisas sobre imagens. Quanto espa-
tudos de representações das minorias. Os ço os representantes desses grupos
trabalhos pioneiros sobre a estereotipagem ocupam na tela? São vistos em close ou
de raça e gênero na mídia, por exemplo, somente em tomadas a distância?
foram bastante prejudicados pelo uso – Com que freqüência aparecem e por
sem maiores problematizações – da análise quanto tempo? São personagens ati-
de conteúdo como ferramenta metodológi- vos, atraentes ou suportes decorati-
ca. Limitadas, em geral, a levantamentos vos? A técnica cinematográfica nos faz
amplos, objetivos e sistemáticos, as aborda- nos identificar mais com um olhar do
gens deste tipo se concentram em definir que com outro? Quais olhares são re-
categorias de análises e estabelecer a fre- cíprocos ou ignorados? Como o posi-
qüência, os papéis e outras características cionamento dos personagens transmi-
da representação dos grupos oprimidos. te distância social ou diferenças de
Tais simplificações analíticas incidem, ami- status? Quem é frente e centro? Como
úde, no erro de reproduzir o próprio essen- a linguagem corporal, a postura e a
cialismo que ambicionavam contestar, re- expressão facial comunicam hierar-
duzindo uma variedade complexa de re- quias sociais, arrogância, servilidade

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(sic), ressentimento, orgulho? (Stam & ra marginal ou prisional (que apresenta a
Shohat, 1995: 80; ver também Stam, visão dos próprios detentos a respeito da
2002: 304-305). criminalidade e da rotina do cárcere) e o
hip-hop (em que se destacam as letras nar-
No que se refere ao consumo dos estereóti- rativas de rap, de forte cunho social e polí-
pos midiáticos, a quase totalidade das aná- tico) lutam para trazer à cena cultural e à
lises de conteúdo parte do pressuposto de esfera pública novas “perspectivas sociais”
que existe relação direta entre a ocorrência (experiências, histórias e conhecimentos)
de um certo item, as intenções do produtor (Young, 2000), derivadas de seu posiciona-
e as reações do público – ou seja, presume- mento particular na sociedade.
se que o conhecimento sobre o conteúdo de Aliadas ao crescente uso (tático) das
revistas femininas ou seriados de TV per- tecnologias interativas da comunicação por
mite inferências inequívocas acerca dos parte de grupos étnicos minoritários e co-
efeitos daqueles artefatos sobre o público. munidades da diáspora, ao surgimento de
É preciso distinguir, no entanto, o leitor/ novos veículos e novas formas de comuni-
receptor implícito ou inscrito nos textos cação comunitária (Cottle, 2000), as produ-
dos artefatos midiáticos das pessoas de car- ções culturais supracitadas podem oferecer
ne e osso que interpretam ou decodificam contribuição valiosa na luta das minorias
os textos, com objetivo de produzir, a par- pela representação. É preciso estar atento,
tir dele, sentidos que se conectem com sua ainda, para alterações dentro da própria
experiência social e cultural. Já dispomos, paisagem da chamada grande mídia, cons-
na atualidade, de um razoável patrimônio trangida, em muitos casos, a rever discur-
de estudos empíricos que demonstram que sos e representações sobre o social, sob in-
o uso da mídia está embebido numa rede fluxo de mudanças históricas, protestos de
complexa de relações culturais e sociais grupo de pressão e identificação de novos
que torna difícil interpretar – que dirá pre- nichos mercadológicos (ver, por exemplo,
ver – suas conseqüências. Araújo, 2000).
Resumindo, um estudo efetivo sobre
a representação das minorias na mídia não
Considerações finais deve restringir-se ao mero levantamento
estático de representações estereotipadas,
Há muito, certamente, o que se protestar (e sem maior embasamento histórico e teóri-
corrigir) em relação à representação midiá- co; é fundamental se interrogar sobre a ori-
tica de negros, mulheres, homossexuais, gem destas imagens social e ideologica-
moradores de favelas e comunidades ca- mente motivadas, por que elas perduram e
rentes, indígenas, entre outros grupos infe- são produzidas, e, por fim, como vêm sen-
riorizados. Uma abordagem crítica, porém, do (ou devem ser) questionadas e rechaça-
que não queira cair nas malhas do pessi- das .
mismo cultural, não pode ignorar o cres-
cente e auspicioso surgimento de novos lu- Nota
gares de enunciação – de “arenas discursi-
vas paralelas” (Fraser, 1989), onde grupos 1 No caso brasileiro, tais investigações se tornaram mais
sociais sub-representados nas bancadas recorrentes, apenas, nos anos 1990 (Bassanezi, 1993,
parlamentares, nos textos midiáticos e no 1996, 1997; Miranda-Ribeiro, 1996).
mundo das artes inventam e circulam con-
tradiscursos, com objetivo de construir in- Referências
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