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As sanções administrativas no processo licitatório

Algumas considerações

1 - Noções Introdutórias.

Antes de ingressarmos propriamente no interessante tema das licitações e


contratos administrativos, mormente no que toca respeito às sanções administrativas
prevista no Estatuto das Licitações – Lei 8.666/93, torna-se necessário tecer alguns
comentários sobre dois princípios fundamentais que informam todo o Direito
Administrativo e que serão de grande valia para a compreensão do procedimento
licitatório, da peculiar relação contratual firmada entre particulares e Administração
Pública e do poder que a Administração possui de aplicar penalidades unilateralmente
aos contratados.

Tratam-se dos princípios: 1) da Supremacia do Interesse Público sobre o


Interesse Privado e, 2) da Indisponibilidade do Interesse Público.

2 - Princípio da Supremacia do interesse público (interesse do todo) sobre o


Interesse Particular.

Extrai-se do conteúdo deste princípio que sempre que houver uma relação
jurídica (orientada pelo regime jurídico administrativo) que envolva um particular e a
Administração Pública, esta gozará de diversas prerrogativas, materiais e processuais,
que não são conferidas ao cidadão comum.

Isso porque os eventuais e temporários detentores do “poder” não buscam,


quando estão gerindo a coisa pública (administrando), defender um interesse próprio,
mas sim um interesse coletivo, de toda a sociedade, razão pela qual deve ser
homenageado em detrimento do interesse particular de um indivíduo.

Daí extrai-se como pano de fundo de todo o direito administrativo o magno


princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, que pode ser facilmente
visualizado em diversos exemplos, tais como: a) prazo em dobro para recorrer; b)
prazo em quádruplo para contestar (art. 188 do CPC), c) processo de execução
especial (Lei de execuções fiscais: Lei 6.830/1980), d) presunção de validade,
veracidade, imperatividade e auto-executoriedade do ato administrativo, e
e)existência de cláusulas exorbitantes nos contratos administrativos, cuja
uma das hipóteses é a possibilidade de aplicação unilateral de penalidades
aos contratados.

3 – Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público.

Em estreita síntese, por este princípio tem-se que o interesse público é


indisponível, pois o mesmo (interesse em jogo em um determinada relação) não é do
agente que está ali a buscá-lo. Por não ser seu o interesse, dele não pode dispor.

Diversas são as hipóteses em que se verifica a presença deste sacramental


princípio. A título de elucidação, cita-se como exemplo o fiscal de rendas do Município
que não pode deixar de efetuar um lançamento tributário, seja qual for a razão, se
houver a ocorrência do fato gerador do tributo.

Perceba-se que o fiscal era obrigado a lançar, ou seja, constituir o crédito


tributário, pois este dinheiro que deixou de ser recolhido em razão da benevolência do

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agente municipal não era de sua propriedade, razão pela qual não poderia dispor.
Nota-se que se tratava de verba a ser incorporada ao erário público e posteriormente
investida em benefícios para toda a coletividade.

Outro exemplo em que de destaca a indisponibilidade do interesse público pode


ser encontrado na obrigatoriedade do procedimento licitatório para a aquisição de
determinado objeto.

Isso porque é por meio deste procedimento formal e objetivo que a


Administração Pública selecionará a proposta mais vantajosa para um contrato de seu
interesse, ou melhor, de interesse da sociedade, pois não obstante o manuseio da
máquina estatal pelos agentes públicos, estes sempre buscam atingir o interesse da
coletividade, por isso a existência, dentre outros, dos princípios da legalidade e da
impessoalidade.

4 - Da licitação.

Em síntese, tem-se que o procedimento licitatório é o meio hábil para que a


Administração Pública contrate algo, seja a construção de uma obra, a prestação de
um serviço, alienação de algum de seus bens, ofertando a todos os interessados iguais
condições de participação (isonomia) com o objetivo de selecionar a proposta que
melhor atenda a seus interesses (competitividade).

5 - Características da licitação e conceito:

Saca-se desta idéia a respeito do instituto da “licitação” as seguintes características:

• Visa propiciar iguais condições para todos aqueles que quiserem contratar com
o poder público.
• Atua como fator de moralidade e eficiência (rápido e eficaz) nos negócios
administrativos.
• É um meio técnico legal para verificar-se a proposta mais vantajosa para um
futuro contrato de interesse da Administração Pública.
• Realiza-se através de uma série de atos ordenados vinculantes para a
Administração Pública e para o administrado.

6 - Breves notas sobre o procedimento licitatório.

Neste contexto, tem-se que por meio da licitação a Administração oferece a


todos oportunidades para apresentarem propostas sendo que, após um procedimento
administrativo, selecionar-se-á a mais vantajosa para atender aos seus interesses.

Em estreita síntese, a etapa externa do certame licitatório compreende as


seguintes fases: a) publicidade do instrumento convocatório, b) recebimento dos
documentos de habilitação e propostas, c) habilitação dos licitantes, d) julgamento das
propostas, e) homologação e e) adjudicação do objeto ao licitante que ofereceu a
proposta mais vantajosa.
Todo este procedimento está devidamente previsto na Lei 8.666/93, sendo que
deve ser observado fielmente pelo administrador sob pena de flagrante nulidade.

Após este procedimento seletivo será encontrada a proposta que melhor atende
aos interesses da Administração Pública, sendo que esta poderá contratar com o
proponente da proposta classificada como a mais vantajosa.

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Importante salientar que uma vez que o interessado apresenta proposta para a
participação no certame fica o mesmo vinculado à sua proposta, vinculação esta
relativa, diga-se por oportuno, pois ainda não se sabe qual proposta será selecionada
como a mais vantajosa.

Todavia, com o fim do procedimento licitatório, identificada a proposta mais


vantajosa, a vinculação outrora existente (até então relativa) passa a ser absoluta,
obrigando o proponente a assinar o contrato, sendo-lhe proibida a recusa, exceto se o
prazo de sua proposta (geralmente de 60 dias) tiver se exaurido.

Afora esta situação, não há direito do licitante que ofertou a proposta


selecionada se recusar à assinatura do contrato administrativo. Caso o mesmo se
recuse a assinar estará o mesmo sujeito às sanções previstas no artigo 87 da Lei de
Licitações.

7 - Da execução do contrato e das causas que acarretam sua rescisão.

Todavia, a regra é que quem ganha a licitação assina o contrato administrativo,


pois que se não fosse assim não teria sentido participar do certame, vez que o mesmo
(procedimento licitatório) não é um fim em si mesmo, mas um procedimento
necessário a uma futura contratação.

Firmado o pacto contratual, que em muito se diferencia do contrato privado


regido pelo direito civil, eis que aqui há um amplo campo de liberdade das partes
contratantes, no contrato administrativo isso não ocorre, vez que o mesmo é
institucionalizado, ou seja, todas suas cláusulas, pelo menos de uma forma geral, já
encontram-se previstas na Lei de Licitações, mormente nos artigos 55 (cláusulas
necessárias) e 58 (cláusulas exorbitantes).

Dentre as cláusulas necessárias, ou seja, aquelas que obrigatoriamente devem


estar previstas no pacto contratual, destacam-se os motivos que podem ensejar a
rescisão contratual.

O artigo 78 da Lei de Licitações traz em seu bojo todas as hipóteses que podem
acarretar a rescisão contratual. Deste dispositivo, composto de 18 (dezoito) incisos,
apenas os incisos de I ao XII e XVII despontam como causas de rescisão do contrato
por culpa do contratado.

Nestes casos, quando os motivos determinantes da rescisão contratual for


alguma conduta culposa ou dolosa do contratante, poderá a Administração rescindir
unilateralmente o pacto, ou seja, sem ter que bater às portas do Poder Judiciário,
devendo ainda sancionar o contratado com uma das penalidades previstas no artigo 87
da Lei 8.666/93, tais sejam: a) advertência, b) multa, c) suspensão temporária, e d)
declaração de inidoneidade.

8 - Da aplicação das sanções administrativas previstas no artigo 87 da Lei de


Licitações.

Interessante notar que ao contrário do Direito Penal não há, em regra, em


matéria de sanções administrativa, uma tipicidade fechada, ou seja, em matéria de
sanções administrativas o legislador prevê as hipóteses infracionais e as possíveis
sanções a serem aplicadas, não determinando qual sanção aplicar para cada caso,

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deixando esta margem de liberdade para o administrador, baseado no caso concreto,
aplicar a sanção que melhor atenda à situação.

Por isso que quando da aplicação da sanção administrativa deve o


administrador atuar pautado no princípio da proporcionalidade, sob pena da sanção
aplicada desproporcionalmente ser anulada via judicial.

Lançados estes pressupostos, passa-se a analisar as sanções propriamente


ditas.

As sanções previstas no artigo 87 da Lei de Licitações são: a) advertência, b)


multa, c) suspensão temporária, e d) declaração de inidoneidade.

Trata-se de rol taxativo, sendo vedado o contrato administrativo prever outras


possibilidades de punição. Somente por lei (medida provisória também, pois tem força
de Lei) este rol pode ser aumentado, pois que é vedado a qualquer outro instrumento
instituir penalidade.

Dentre as sanções previstas a advertência é a mais tênue. Utilizada para


punição leve. Trata-se de uma censura moral que deve ser adotada diante pequenas
falhas do contratado na execução do contrato.

A princípio não acarreta a rescisão contratual, todavia o cometimento reiterado


de faltas que ensejam a aplicação de advertência pode culminar na rescisão contratual.

No que toca respeito à sanção pecuniária, tem-se a multa. Esta penalidade


atinge o patrimônio do contratado (normalmente refletido em percentual do valor do
contrato) e deve estar devidamente estabelecida no edital e no instrumento contratual,
sob pena de ser inviável sua aplicação.

Já a aplicação da sanção “suspensão provisória” acarreta a proibição do licitante


penalizado de participar de licitações e de contratar com a Administração Pública (em
caso de dispensa e inexigibilidade) por prazo de até 2 (dois) anos.

Importa salientar que a suspensão temporária se restringe apenas ao Órgão


que a decretou, conforme se extrai da exegese proveniente da combinação dos artigos
87, inciso III com o 6º, inciso XII da Lei de Licitações.

Geralmente as sanções previstas até então são aplicadas para a punição de atos
culposos, pois quando os mesmos são praticados com “dolo”, a sanção é a declaração
de inidoneidade.

A declaração de inidoneidade é a penalidade aplicável a faltas graves do


contratado inadimplente. Tal sanção impede dele de contratar com a Administração
por prazo, a princípio, indeterminado.

Devido à gravidade da sanção, a mesma só pode ser aplicada por altas


autoridades na esfera administrativa (Ministros e Chefe do poder Executivo), sendo
que seus efeitos, ao contrário da suspensão temporária, estende-se à toda
Administração Pública, conforme pode-se se aferir pela leitura do artigo 87, inciso IV
combinado com o artigo 6º, inciso XI.

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Isso quer dizer que uma vez aplicada não poderá o penalizado licitar ou
contratar com qualquer órgãos ou entidade de todas as Administrações (Federal,
Estadual, Distrital e Municipal).

Há autores, como Hely Lopes Meirelles, que sustentava que como sanção é
restritiva de direito deve se interpretar restritivamente. Para o saudoso e ilustre
administrativista, a sanção de declaração de inidoneidade apenas inviabilizaria a
participação em licitação ou contratação com o Ente (União, Estado, Municípios) que
aplicou a sanção.

Uma vez aplicada esta severa sanção, poderá o penalizado pleitear, após 2
(dois) anos da data da imposição da penalidade, sua reabilitação. Todavia é condição
para o pleito que o contratante tenha ressarcido os prejuízos causados à
Administração.

Outro fato que merece atenção é que contra a aplicação das sanções de
advertência, multa e suspensão temporária o recurso cabível é o “recurso em sentido
estrito”, previsto no artigo 109, inciso I, alínea “f” do Estatuto das Licitações, o qual
deverá ser interposto em um prazo de 5 (cinco) dias úteis.

Já contra a penalidade de declaração de inidoneidade o recurso cabível é o


“pedido de reconsideração”, previsto no artigo 109, inciso III da Lei de Licitações, o
qual será dirigido à própria Autoridade que aplicou a sanção. O prazo de interposição
deste recurso, ao contrário dos demais, é de 10 (dez) dias úteis.

Por fim é vedado à Administração relevar ou fazer vistas grossas ao ato ilegal
que possa ensejar a aplicação de sanções administrativa, pois como afirmado outrora
trata-se de interesse público indisponível, sendo inclusive ato ilegal e de improbidade
não levar a cabo processo de punição de contratados que venham a infringir as regras
contratuais.

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