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Abstract: In the following article we will analyze the administration of justice, noting
specifically the actions of the general governor when conflicts of jurisdiction occurred. To
this end we will briefly reflect on the role of justice as purpose of government. We will
analyze which powers and competences were granted to the general governor by his regiment
and how this fidalgos were using their assignments.
Key-words: justice; general government; conflicts of jurisdiction.
“Dar se lhes o premio ou castigo q. merecerem que he o que pedem todas as leis, e
razoes de bom governo...”1. Este foi o parecer redigido pelos membros do Conselho
Ultramarino em 1651 quando realizaram consulta sobre os motivos apresentados pelo Conde
de Castelo Melhor, governador geral do Estado do Brasil, sobre os atrasos da Armada da
Companhia Geral do Comércio. Tal “matéria” foi considerada de muita importância pelos
conselheiros, “por serem muy prejudiciaes consequencias as que seguem de estes gastos [com
* Mestrando em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista CAPES-REUNI. Este trabalho
apresenta resultados da monografia de conclusão de Curso de História: ARAÚJO, Hugo André F. F. “He o que
pedem todas as leis, e razoes de bom governo”. Trajetória e governo do 2º. Conde de Castelo Melhor. Junho de
2011. Viçosa, MG.
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a Armada] se naõ apurarem com toda a verdade”2. O parecer formulado aconselhava o
monarca a averiguar os problemas apontados pelo Conde de Castelo Melhor para descobrir os
reais culpados do atraso da Armada, a fim de “se dar satisfaçaõ a justiça”3, função principal
do governo.
A justiça ao longo do antigo regime sempre representou prerrogativa régia de mais
importância, pois “o próprio ofício de reinar estava assimilado à actividade de ‘fazer justiça’,
e a imagem do rei que governa como se de um juiz se tratasse é extremamente recorrente na
literatura desse período” (CARDIM, 2003: 69). Nesse sentido entendemos e utilizamos a
definição de justiça apresentada por António Manuel Hespanha, sendo que esta é um
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Ressaltamos que a jurisprudência do Antigo Regime divida a justiça em campos, de acordo com a função
específica à qual ela se destinava, dessa forma havia justiça comutativa, justiça distributiva e justiça vindicativa,
das quais não trataremos neste artigo, para mais informações Cf: CARDIM, 2003:71.
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Segundo definição de D. Raphael Bluteau, Regalia “he um sinal exterior, demonstrativo da authoridade &
Magestade Real. As Regalias essenciaes saõ fazer leys, investir Magistrados, eleger Ministros dignos, & a seus
tempos publicar guerra, & fazer pazes”. BLUTEAU, s/d, vol. VII: 193.
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Neste sentido, a regalia imbuia os governadores gerais de poderes régios, entre eles as
prerrogativas próprias da justiça. Os poderes concedidos ao governador geral no regimento,
através das instruções expressas em capítulos, são dotados de um caráter “costumeiro”
(Cf:CARDIM, 2003: 73-74), como se observa no 3° capítulo do regimento:
3º Tanto q chegardes à Bahia presentareis aos goves q agora servem a patente q vos
mandey passar do cargo de Capitão geral de mar e terra daquelle estado, e os mais
despachos q levais para logo vos houvessem de entregar o governo q se fará na
forma acustumada, sendo prezente as pessoas q neste alto se achão ordinariamte, e
da entrega se farão autos q se mi hão de enviar para todo o tempo constar q se
procedeo conforme a ordem q sempre se usou em altos semelhantes.6
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Aliado a esse entendimento da divisão social vigorava a compreensão da repartição do
poder entre as várias partes do “corpo”, pois de acordo com a cultura política então vigente
“um poder político ‘simples’, ‘puro’, não partilhado” (XAVIER; HESPANHA, 1998: 114) era
rejeitado pelos corpos sociais constituintes da monarquia, porque “tão monstruoso como um
corpo que se reduzisse à cabeça, seria uma sociedade, em que todo o poder estivesse
concentrado no soberano” (XAVIER; HESPANHA, 1998:114). Estes traços corroboram o
entendimento diferenciado que se desenvolve sobre a monarquia lusitana, pois como podemos
perceber os próprios sujeitos históricos buscavam vias de manifestação de seus interesses, não
assistindo passivos a imposição de um modelo de governo, como classicamente foi retratado
por aqueles que enxergam uma concepção absolutista de governo na América portuguesa.
Pedro Cardim observou que as relações de negociação do poder eram incontornáveis
ao monarca, uma vez que
neste ambiente social juridizado a sua relação com os corpos obedecia à mesma
matriz ético-jurisdicional, pois entre o rei e cada um deles existia como que um
acordo tácito que consagrava a capacidade política dos diversos corpos do reino:
tal acordo habilitava esses corpos a participar do governo através do dispositivo
polissinodal, ou seja, mediante a rede de conselhos e de tribunais, cada qual
especializado em lidar com a sua respectiva área jurisdicional. (CARDIM, 1998:
19-20)
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Como Francisco Cosentino apontou as cartas patentes “eram instrumentos régios de nomeação para os diversos
ofícios e para transferência de poderes. (...) são os instrumentos usados pelos monarcas para realizar a provisão
do ofício de governador geral.” (COSENTINO, 2009: 73)
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regimentos (Cf: HESPANHA, 2010: 60), uma vez que as instruções destes indicavam que “os
casos omissos delas deveriam ser decididos pelo governador, depois de consultar o bispo, o
chanceler da Relação da Bahia e o provedor da Fazenda Real” (HESPANHA, 2010: 61). O
57º capítulo do regimento instruía o governador geral se aconselhar com as outras jurisdições
presentes no Estado do Brasil, contudo a decisão final sobre o procedimento cabia ao
governador geral:
provereis nellas como ouverdes mais por meu serviço e sendo as tais couzas de
qualidade q convenha ter se nellas segredo, as praticareis com quais quer das ditas
pessoas q for prezente q vos melhor parecer e se nas couzas assy praticardes a tal
pessoa ou pessoas fordes differentes nos pareceres se fará cumprir o em q vós vos
resolverdes e as couzas q assy comunicardes fareis por escrito com declaração dos
pareceres das pessoas com quem os praticardes e assente q sobre ellas tomardes. 10
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Ressaltamos que a utilização dos regimentos é uma característica fundamental do viés
jurisdicional da monarquia portuguesa, uma vez que não compreendemos as jurisdições na
América Portuguesa como rigidamente hierarquizadas, mas como justapostas
institucionalmente, conforme o modelo sugerido por António Manuel Hespanha (Cf:
HESPANHA, 2010: 57), de modo que cabia ao governador geral zelar pelo respeito e
coexistência das mesmas. Dessa forma os regimentos eram fonte de jurisdição, pois
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fato que gerou discussão no Conselho Ultramarino, gerando um parecer ao Monarca que
retomava itens do regimento. O parecer formulado pelos conselheiros era favorável a António
Camelo, indicando que o regimento não concedia aos governadores gerais o monopólio para
prover serventia dos ofícios, mas “He concedido por elles somte, poderem os govres prover as
serventias em quanto VMgde naõ mandar o contro e ainda com obrigação de avizarem das q
provem, pa VMgde ”15.
Em anexo à consulta constavam as cópias dos capítulos 8º e 41º do regimento do
governador geral, essas instruções especificavam as questões relativas ao provimento de
ofícios. O 8º capítulo indica que o governador geral ao constatar que haviam vagas dos ofícios
de justiça e fazenda, poderia prover pessoas qualificadas para aquela função “ate se
prézentarem pessoas q tenhaõ provizões minhas para haverem de servir os taes officios”16,
instrução que o governador parece ter negligenciado e por conseqüência originando essa
discussão no Conselho Ultramarino. O 41º capítulo repete basicamente a instrução do 8º,
acrescentando apenas que o governador deveria prover no ofício as pessoas mais aptas, com
ênfase de que ao fazê-lo deveria dar conta ao rei “dizendo o cargo q vagou, e porquem, se
deixou filhos, e em que o provestes” 17.
Não encontramos documento que indicasse a efetivação do parecer remetido pelo
Conselho Ultramarino ao Monarca, mas consideramos salutar identificar os procedimentos
que a Monarquia utilizava para resolver questões conflituosas de ordem jurisdicional: a
análise dos conselheiros visava estabelecer o respeito à jurisdição prevista pelo regimento; as
consultas eram elaboradas tendo em vista as instruções regimentais para determinar como
resolver os conflitos.
Na consulta do Conselho Ultramarino de 13 de Outubro de 1651, encontramos uma
situação semelhante a que analisamos acima. Luis de Mello Pinto fazia petição ao Monarca
para que se lhe restituísse a companhia na qual deveria servir como Sargento-mor, este foi
destituído desta companhia pelo governador geral, Conde de Vila Pouca de Aguiar, e ao
verificar-se o equivoco do governador, o ofício lhe foi restituído, porém em outra companhia.
Luis de Mello Pinto não concordou com essa ordem, “por querer antes servir com os
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soldados que por seu respeito sentaraõ praça na dita sua companhia, e por naõ largar o
serviço de VMgde o foi continuar e noutra compa”18.
O parecer formulado na consulta foi favorável a Luis de Mello Pinto, aconselhando o
monarca a ordenar o governador geral restituir o sargento-mor a sua antiga companhia, onde
novamente os conselheiros fizeram referência a capítulos do regimento do governador geral,
além de enfatizar que os governadores do Ultramar não andavam cumprindo as instruções dos
regimentos19.
Tal como na consulta que analisamos anteriormente os conselheiros enviaram cópias
dos mesmos capítulos do regimento e ainda remeteram a cópia de um alvará datado de três de
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Dezembro de 1621 . Neste alvará o Monarca comunicava estar ciente que os governadores
das partes ultramarinas, não apenas o Brasil, não “guardavam” as instruções do regimento
sobre o provimento das “serventias”, pois estes deveriam ocupar esses ofícios vagos com
pessoas qualificadas mas em caráter provisório, enquanto não chegasse a ordem régia
provendo o cargo segundo os meios costumados e previstos no regimento. A redação do
alvará tem como finalidade reforçar as instruções existentes no regimento, e por isso os
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conselheiros remetem a cópia deste para o monarca . Como temos salientado, quando os
governadores gerais excediam o limite de suas jurisdições, as partes “lesadas” recorriam
contra essas atitudes apelando ao monarca. Como resultado estabelecia-se uma discussão
sobre como resolver o conflito respeitando a justiça, o que se dava através da consulta aos
seus conselhos governativos, neste caso o Conselho Ultramarino.
4- Considerações finais:
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A data do alvará nos indica que este foi formulado durante a União Ibérica. O fato deste alvará ser lembrado e
utilizado como norteador da formulação de um parecer por um alto Conselho régio, como Ultramarino, torna
mais uma vez evidente a incorporação de práticas castelhanas no modo bragantino de governar, estando em
acordo com o que os estudos recentes têm indicado (Cf: COSENTINO, 2011; COSENTINO, 2009: 240-241).
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Cf: PR-LF:AHU_ACL_CU_Cx.12.D. 1444.
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Compreendemos também que os conflitos de jurisdição que analisamos são uma característica
intrínseca dessa conformação do Império Luso, pois
Bibliografia:
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