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Muitas vezes nos dizem que a Maçonaria especulativa nasceu em Londres, em junho de
1717, no bairro do “Fleet Street”. Mas sempre se esquece de salientar que, ao mesmo
tempo se integrava um bom número de clubes de convivência, mais ou menos
pitorescos e com tendências festivas, tais como os Gorgomons (Ancient Noble Order of
the Gormogons) e outros grupos de taberna, próprios da Inglaterra daquele tempo.
De fato, aquela fundada no solstício de 1717, não era nem mais nem menos do que uma
Sociedade de Taberna que se unia a outros clubes do mesmo tipo, em torno da ideia de
realizar, em conjunto, uma festa de verão de São João para que ficasse menos caro para
todos.
O que permanece como um particular desta fundação é a instituição que dali resultou.
A Maçonaria Antiga foi assim libertada de seus deveres e mistérios para se tornar
“free”, “livre” e adotar o nome de “Freemasonry”. Foi organizada como um órgão de
gestão e desenvolvimento, sempre com relação à antiga sociedade, passando a se
chamar de “Grande Loja”.
Como o clube teve vocação universal, sua sede foi fixada em Londres e foi assim que a
“Grande Loja de Londres” viu a luz.
Ele a viu como um excelente meio de ascensão social e de reconhecimento, sem relação
com religião e para conseguir ser convidado de imediato, para a alta nobreza.
Afim de garantir a lenda e manter o mistério, ele pede a um amigo, o pastor James
Anderson, um presbiteriano também, mas principal especialista em brasões duvidosos e
genealogias de famílias imaginárias, para construir uma Ordem, na forma de
Constituições.
Este clube de sociabilidade, tendo conseguido ser protegido pela nobreza, começou a
buscar uma reputação, passando rapidamente a um jogo de influências entre católicos
(Jacobitas) e protestantes (Hanoverianos).
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Indo para Paris, em 12 de junho de 1725, data que foi criado, a pedido do Lord
Derwenwater, refugiado católico jacobita, a Loja Saint Thomas, que se instala em uma
taberna frequentada por imigrantes ingleses, em Barnabé Hute, Rua Açougues.
Uma loja rival foi instalada pelos protestantes calvinistas em 1732, algumas ruas depois,
no Albergue do Louis d´Argent.
Essa evolução afastou a maçonaria francesa do conflito que ocorria em solo britânico, a
corrente que se denominavam “antigos”, em referência a uma longa tradição que
supostamente pertenciam, desde as lojas de York e as guildas de construtores, com os
nobres intelectuais e cortesões, novos adeptos de um rigoroso protestantismo e que
desqualificavam os “modernos”.
Não vamos discutir agora esse problema, que seria mais especifico sobre a introdução
de fato, de uma nobreza orgulhosa, a fim de reivindicações igualitárias e intelectuais,
em vez de analisar os possíveis conteúdos místico-esotéricos mais do que duvidosos em
sua maior parte.
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Esta Grande Loja com vocação universalista foi consagrada em 30 maio de 1816
durante a realização de uma cerimônia chamada “Grande Loja” presidida pelo Mui
Venerável Grão-Mestre, Sua Alteza Real, o Duque de Sussex, com base em uma
cerimônia onde o ritual foi formado especialmente, por 80% do ritual dos “antigos”, e
que hoje em dia conhecemos como “Perfect Ceremonies” ou “Ritual Emulação”.
Antes desse período do século XVIII, a maçonaria dos antigos jamais tinham se
agrupado em uma federação geral, mas apenas em guildas estatutariamente
independentes e dirigidas pelos Mestres de Obras nomeados pelo rei, tal como William
Shaw.
As Lojas não existiam mais do que o tempo de uma obra e eram constituídas conforme
a necessidade. Se reconheciam pelos conhecimentos e não por um “recibo de
capitação”.
O que ainda surpreende hoje em dia, é a energia usada para competir com uma
sociedade que era totalmente estranha e onde a sua existência, até certo ponto, estava
declinando gradualmente.
Esse grupo foi tardiamente chamado de Grande Loja dos Antigos. Tal apelido foi
resultado de 1717, quando passou a ser mais fácil falar sobre Maçonaria por referência à
obediência do que pela qualidade de maçom.
Hoje em dia sabemos uma série de coisas daqueles “antigos” e sua organização
ritualística. Os graus, as ordens, seus vínculos e tudo que formava o foco de progressão,
pois seus rituais e conhecimentos eram ensinados progressivamente. Já no início eram
apresentados aos Aprendizes, os elementos que seriam estudados em uma progressão
até a transmissão dos segredos do Arco.
Esses segredos sempre foram considerados como o “coração”, a “medula” da Maçonaria
para os antigos, a tal ponto que uma das palavras mais usadas é “medula nos ossos”,
“marrow in the bone”, “mah-ha-bone”.
A Maçonaria dos “antigos” tem outra diferença e tamanho. É organizado, pelo menos,
desde as tradições dos Maçons de York, a cerca dos aprendizes e companheiros, quando
estes últimos deveriam se tornar “homens de Marca” antes de ser Mestres de loja e,
finalmente Companheiro do Real Arco.
Quando houve a exportação do rito para as colônias americanas, que se deu a separação
entre a Marca, o Arco e os três graus, até que fosse integrada a lenda do Mestre,
proveniente dos “Modernos”.
O reagrupamento de suas lojas “antigas” foi realizado por seis lojas independentes, sob
a égide de Laurence Dermott, artesão e intelectual burguês de origem irlandesa.
Esta assembleia que formou a Grande Loja foi realizada em 17 de julho de 1751 na
taberna “Turk´s Head” 1 na Greek Street, no bairro Soho, em Londres, ou seja, do outro
lado do bairro Strand, bairro de lojistas, no lado oposto do local de fundação da Grande
Loja dos “Modernos” em 1717.
Durante esta fundação, para o historiador Inglês Bernard Jones, não havia mais do que
oitenta pessoas, todos comerciantes, mecânicos e pequenos artesãos, imigrantes, em sua
maior parte de origem Irlandesa, instalados em Londres.
Esta nova estrutura rapidamente tomou o hábito de se reunir em uma taberna ocupada
por uma oitava loja que se uniu a eles e ofereceu suas instalações, a loja “Temple and
Sun” em Shire Lane, em Temple Bar, outro bairro de Londres.
Esta Grande Loja dos Antigos, também era conhecida na época, por Grande Loja
Atholl, pelo nome dos Duques de Atholl, protetores da Corporação, de longa data e que
ocuparam o Grão-Mestrado a partir de 1771. Esta nova instituição pretendia reunir
todos de uma vez, o Grão-Mestre dos Antigos e da Grande Loja da Escócia,
estabelecida em 1736, depois que os Saint-Clair de Roslyn foram removidos do seu
cargo de protetores hereditários da Maçonaria escocesa.
Outra peculiaridade, é que os membros da Grande Loja dos Antigos, reivindicavam uma
denominação particular, o de “Maçons Livres e Aceitos”. O adjetivo “livre” (free) era
uma denominação da maçonaria especulativa, que gradualmente, foi transformado em
freemason.
Alguns autores, como Eric Ward, dizem que o termo freemason derivou de free-stone
(algo como pedra polida) que geralmente era acompanhada do nome de quem trabalhou
ela, o maçom (pedreiro). Essa fórmula teve sua primeira aparição no século XIV, com o
estabelecimento de uma espécie de primeira lei do trabalho, Statutes of Labourers
(Estatuto de Trabalhadores) em 1351, que definiu um estatuto para os mestres pedreiros,
bem antes da redação do Poema Regius que se supõe ter sido escrito por volta de 1390,
pois no documento não há data da redação. Daí surgiram diversos termos derivados do
freemason, como por exemplo, frimason, freymason e free-stone mason.
Eric Ward, pesquisador da Ars Quatuor Coronatorum, remonta estes vestígios históricos
dos séculos XIII e XIV, o que parece estar confirmado por certos documentos da época.
Então porque denominar todos os membros de uma sociedade com o nome de somente
uma parte de seus membros?
Esta liberdade, este privilégio que qualifica o maçom é onipresente em vários escritos
sobre as corporações de construtores e das antigas lojas onde eram realizados os
negócios de construção de edifícios. Todos aqueles homens se reagruparam sob o nome
de maçons “operativos”, ou seja, aqueles cujo trabalho era participar da operação de
construção.
E esse termo ainda está em uso hoje em dia. Sabemos que os operativos formaram a
Ordem, pelo menos, entre os “antigos” e se você quiser entender uma das realidades
culturais do final do século XVIII, devemos observar o que dizem os mais antigos
catecismos maçônicos, ou seja, que um maçom deve ser “nascido livre” e/ou nascido de
uma “mulher nascida livre”.
Então, um maçom não pode ser nem escravo, nem nascido de uma escrava. Esses
termos nos dão um tempo aproximado, fontes e consequências das correntes internas na
Maçonaria, sejam simbólicas ou puramente sociais. As disposições relativas à liberdade,
o privilégio do Maçom e seu nascimento livre, são ainda hoje associados com os
candidatos que desejam receber a iniciação e não são trabalhadores do ofício. A
compreensão total do sentido deste problema de “nascimento livre”, não pode ser
alcançado, se não o colocar no contexto particular de uma sociedade que tinha isso
registrado em suas regras.
É evidente, no estudo, que uma grande parte dos ritos anglo-saxões de estilo do
Emulação e uma menor parte no Rito Escocês Antigo e Aceito, tem uma forte
inclinação para fornecer uma imagem ordenada da sociedade vitoriana do século XIX, a
fim de promover o modelo social como uma referência de uma civilização que, por
vezes, deve justificar as diferenças.
No que diz respeito a esta alegação particular de ser “nascido livre”, deve-se notar que a
exclusão de “Cowans” desapareceram da ritualística moderna continental,
provavelmente porque alguns historiadores da maçonaria não têm abordado a questão
da definição de tal termo e os próprios maçons não sabem muito bem o que significa.
Para alguns, seriam trabalhadores contratados que trabalhavam nas obras, mas de forma
intermitente, e que, por seu estatuto, não tinham a liberdade necessária para se tornar
independentes.
Para outros, é uma antiga distinção entre os pedreiros que construíam sem argamassa
(com as técnicas celtas e nórdicas tradicionais) que dariam à luz a Maçonaria de ofício,
daqueles que usavam argamassa (método importado pelos cristãos do império romano),
e haviam perdido por essa razão, a Arte da Geometria exata.
Entre os Companheiros das antigas lojas e pelo menos desde o século XVI, se constata a
presença de outros membros cujo oficio não era nem a construção nem a arquitetura,
mantendo laços com os construtores além de suas competências, mas particularmente,
sabiam ler e eram versados no conhecimento da lei e dos costumes, além de conhecer o
latim. Eles foram denominados de maçons “aceitos”.
Esta terminologia parece ter sido retomada para se qualificar os fundadores da Grande
Loja de 1717 muito antes de serem chamados de “modernos”.
Para entender a diferença entre “aceito” e “especulativo”, tenha em mente que o ofício
de Maçom é um artesão que não tem uma loja fixa e que o ofício exige que ele se mova
de trabalho em trabalho. Esse é o coração da estrutura da antiga maçonaria: o
nomadismo e a disseminação do conhecimento pelas viagens. As lojas tinham uma
existência passageira e se estabeleciam para construir.
Assim, os primeiros “Supervisores Gerais das Obra do Rei”, como William Shaw, no
século XVI, não eram pedreiros de profissão, mas sim pessoas instruídas, próximas ao
poder e com qualidades reconhecidas para gerir uma corporação de que muitas vezes
dependia da imagem do soberano para a qualidade das obras que marcariam seu estilo.
A guilda e seu endereço também ofereciam a garantia da estabilidade do poder que os
nomeou e, com o tempo, se tornaram a imagem que outros grupos buscavam, com uma
aparência similar.
Para ser mais preciso, sabe-se hoje em dia, que a “aceitação” foi onde personalidades
encontraram recepção nas lojas entre os séculos XVI e XVII, as pessoas envolvidas na
aristocracia ou da burguesia, foram permitidos ser recebidos entre os maçons de ofício.
Foi então formado um grupo de Maçons Antigos, Livres (com privilégios) e Aceitos
(Maçons Livres Antigos e Aceitos).
Portanto, temos o direito de nos preocupar com o fato de que a “Maçonaria Dissecada”
serviu como modelo e referência para inúmeras lojas e argumentos de muitos
historiadores desde então. A preocupação torna-se maior quando se sabe que segredos
são “sinais, toques e palavras” e que os maçons herdeiros de Prichard tomaram como
verdade o que poderia até mesmo ser uma caricatura da realidade praticada.
NOTAS
I – As tabernas Turk´s Head e Queen´s Head eram muito antigas e serviram por um
longo tempo, de assento para clubes de sociabilidade e círculos literários, filosóficos e
artísticos. Foi em uma dessas duas tabernas, a Queen´s Head, onde se reunia a
Sociedade Philomusicae, a mais antiga fonte de uma prática ritual do grau de Mestre.
BIBLIOGRAFIA
Cecille Revauger, 1999 – La querelle des anciens et des modernes, le premier siecle de
la francmaçonnerie anglaise