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DIPLOMACIA APLICADO

PORTUGUÊS

Texto I: Cafezinho
(Rubem Braga)

1. Leio a reclamação de um repórter irritado que precisava falar com um delegado e lhe disseram que o homem havia ido tomar
um cafezinho. Ele esperou longamente, e chegou à conclusão de que o funcionário passou o dia inteiro tomando café.
2. Tinha razão o rapaz de ficar zangado. Mas com um pouco de imaginação e bom humor podemos pensar que uma das
delícias do gênio carioca é exatamente esta frase: — Ele foi tomar café.
3. A vida é triste e complicada. Diariamente é preciso falar com um número excessivo de pessoas. O remédio é ir tomar um
"cafezinho". Para quem espera nervosamente, esse "cafezinho" é qualquer coisa infinita e torturante. Depois de esperar duas
ou três horas dá vontade de dizer: — Bem cavalheiro, eu me retiro. Naturalmente o Sr. Bonifácio morreu afogado no cafezinho.
4. Ah, sim, mergulhemos de corpo e alma no cafezinho. Sim, deixemos em todos os lugares este recado simples e vago: — Ele
saiu para tomar um café e disse que volta já.
5. Quando a Bem-amada vier com seus olhos tristes e perguntar: — Ele está? — alguém dará o nosso recado sem endereço.
Quando vier o amigo e quando vier o credor, e quando vier o parente, e quando vier a tristeza, e quando a morte vier, o recado
será o mesmo: — Ele disse que ia tomar um cafezinho...
6. Podemos, ainda, deixar o chapéu. Devemos até comprar um chapéu especialmente para deixá-lo. Assim dirão: — Ele foi
tomar um café. Com certeza volta logo. O chapéu dele está aí...
7. Ah! fujamos assim, sem drama, sem tristeza, fujamos assim. A vida é complicada demais. Gastamos muito pensamento,
muito sentimento, muita palavra. O melhor é não estar.
8. Quando vier a grande hora de nosso destino nós teremos saído há uns cinco minutos para tomar um café. Vamos, vamos
tomar um cafezinho.
Rio, 1939.

(In: O Conde e o passarinho & Morro do isolamento. Rio de Janeiro: Record, 2002. p.156-7)

Texto II: Momento num café


(Manuel Bandeira)

Quando o enterro passou


Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.

Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado


Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta.
DIPLOMACIA APLICADO
Questão 01
Julgue os itens que seguem, com base em aspectos de coesão e no sentido do texto I.

I. Pode-se afirmar que o vocábulo “cafezinho”, presente em “lhe disseram que o homem havia ido tomar um cafezinho.”
(texto I, 1º parágrafo) e em “O remédio é ir tomar um ‘cafezinho’” (texto I, 3º parágrafo), recebe aspas na segunda ocorrência,
em função de o termo estar empregado com sentido conotativo, ressaltando o sentido particular conferido à palavra.
II. Verifica-se, nos fragmentos “uma das delícias do gênio carioca é exatamente esta frase: — Ele foi tomar café.” (texto
I, 2º parágrafo), “Ah! fujamos assim, sem drama, sem tristeza, fujamos assim.” (texto I, 7º parágrafo) e “Para quem espera
nervosamente, esse ‘cafezinho’ é qualquer coisa infinita e torturante.” (texto I, 3º parágrafo), que os primeiros dois
vocábulos destacados são elementos coesivos catafóricos, enquanto os últimos dois últimos fazem remissão anafórica.
III. No texto I, as seguintes figuras de linguagem podem ser identificadas: metáfora, em “O remédio é ir tomar um ‘cafezinho’”
(3º parágrafo); hipérbole, em “esse ‘cafezinho’ é qualquer coisa infinita e torturante.” (3º parágrafo); anáfora e polissíndeto,
em “Quando vier o amigo e quando vier o credor, e quando vier o parente, e quando vier a tristeza, e quando a morte
vier” (5º parágrafo); e ironia, em “Naturalmente o Sr. Bonifácio morreu afogado no cafezinho.” (3º parágrafo).
IV. Identifica-se o emprego de elemento coesivo de substituição no excerto “Tinha razão o rapaz de ficar zangado.” (texto I,
2º parágrafo), na medida em que o vocábulo sublinhado retoma o termo “repórter”, presente no parágrafo anterior.

Questão 02
Julgue os itens com base na leitura dos textos I e II.

I. Pode-se afirmar que o autor do texto I recorreu à imagem da imersão no cafezinho em duas ocorrências no texto I — na frase
“Naturalmente o Sr. Bonifácio morreu afogado no cafezinho.” (3º parágrafo) e na frase “Ah, sim, mergulhemos de corpo
e alma no cafezinho” (4º parágrafo) — embora, em ambas, possam ser identificadas diferentes vozes textuais e ambas
expressem sentimentos distintos.
II. Pode-se afirmar que o autor do texto I usa a crônica como meio de divulgar sua opinião crítica sobre o hábito de o brasileiro
fugir dos seus compromissos, criando a desculpa de ir tomar um cafezinho.
III. No texto II, o autor emprega um recurso gráfico, a divisão em estrofes, para separar as duas perspectivas diante da vida e da
morte, descritas no poema: a dos personagens que, num gesto social, apenas saúdam o morto, em uma atitude resumida pelo
advérbio “maquinalmente”; e a do personagem que reflete, devido ao esquife que passa, sobre seu estar no mundo, atitude
que pode ser identificada pelo advérbio “longamente”.
IV. O ponto de vista do autor do texto I contido no trecho “Ah! fujamos assim, sem drama, sem tristeza, fujamos assim.” (7º
parágrafo) pode ser associado, por semelhança, ao ponto de vista do personagem da segunda estrofe do poema, traduzido no
verso “Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade”.

Questão 03
Com base nos textos I e II, assinale a alternativa incorreta, considerando o emprego das figuras de linguagem.

a. “Ele esperou longamente, e chegou à conclusão de que o funcionário passou o dia inteiro tomando café.” (texto I –
2° parágrafo) – elipse.
b. “mergulhemos de corpo e alma no cafezinho.” (texto I – 4° parágrafo) – metáfora.
c. “Quando a Bem-amada vier com seus olhos tristes e perguntar” (texto I – 5° parágrafo) – antonomásia.
d. “Quando vier a grande hora de nosso destino nós teremos saído há uns cinco minutos para tomar um café.” (texto I
– 8° parágrafo) – eufemismo.
e. “E saudava a matéria que passava / Liberta para sempre da alma extinta.” (texto II - 2° estrofe) – metonímia.

Questão 04
Julgue os itens que seguem com base nos aspectos sintáticos do textos I e II.

I. No fragmento “A vida é triste e complicada.” (texto I – 3° parágrafo) e no verso “Que a vida é traição” (texto II - 2° estrofe),
o termo destacado exerce mesma função sintática em suas duas ocorrências.
II. No texto II, os versos “Quando o enterro passou” e “Olhando o esquife longamente” apresentam orações com o mesmo
valor sintático e semântico.
III. Em “E saudava a matéria que passava” (texto II – 2° estrofe), o pronome relativo exerce mesma função que seu
antecedente e inicia oração que restringe o sentido da principal.
IV. Considerando o verso “Os homens que se achavam no café” (texto II - 1° estrofe), pode-se afirmar que a substituição da
forma verbal “se achavam” por “estavam” não acarretaria alterações sintáticas na oração, visto que ambos os verbos
apresentam a mesma transitividade..
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