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dição

o grande desafio do método didático é articular os


diferentes estruturantes sem exclusivizar nenhum
deles. Importa superar o formalismo, o reducionismo
e enfatizar a articulação. Há que superar a dicotomia
entre processo e produto na atividade de ensino-
aprendizagem, entre dimensão intelectual e afetiva,
entre aspectos gerais da aprendizagem e aspectos
próprios de uma área específica, entre dimensão
lógica e dimensão psicológica do processo de ensino-
aprendizagem, entre fins da educação, meios e
estratégias. Os autores propõem que a didática se
situa nesta perspectiva de multidimensionalidade que
articula as diferentes dimensões do processo de
ensino-aprendizagem.

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9788532600936
1
A didática e a formação de educadores -
Da exaltação à negação:
a busca da relevância

VERA MARIA CANDAU


PUC/RJ

Todo processo de formação de educadores - especialistas e


professores - inclui necessariamente componentes curriculares
orientados para o tratamento sistemático do "que fazer" educati-
vo. da prática pedagógica. Entre estes, a didática ocupa um lugar
I ' destaque.
No entanto, a análise do papel da didática na formação de
.ducadores tem suscitado uma discussão intensa. Exaltada ou ne-
ada, a didática, como reflexão sistemática e busca de alternativas
para os problemas da prática pedagógica, está, certamente, no mo-
mento atual, colocada em questão.
De uma posição tranquila, em que se dava por suposta a afir-
mação da importância da didática, seu papel passou a ser fortemen-
te contestado. As principais acusações são de que seu conhecimen-
to, quando não é inócuo, é prejudicial.
A acusação de inocuidade vem geralmente da parte de profes-
sores dos graus mais elevados de ensino, onde sempre vingou
a suposição de que o domínio do conteúdo seria o bastante c-
para fazer um bom professor (e talvez seja, na medida em
que esses graus ainda se destinem a uma elite). A acusação de
prejudicial vem de análises mais críticas das funções da edu-

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I ,\ ,\I rd g m humanista é unilateral e reducionista, fazendo
cação, em que se responsabiliza a Didática pela alienação dos
1I dllll -nsâ humana o único centro configurador do processo de
professores em relação ao significado de seu trabalho.
I I1 IIII! ,1pr ndizagem, no entanto, ela explicita a importância dessa
(SALGADO, 1982, p. 16).
,I 1111 1\1'1. o. ertamente o componente afetivo está presente no pro-
No entanto, esta problemática só pode ser adequadamente I II I nino-aprendizagem. Ele perpassa e impregna toda sua
compreendida se for historicizada. Ela se dá num contexto con- tlllloIll\ i '< não pode ser ignorado.
creto, em que o ensino de Didática se foi configurando segundo
lIJI1l à dimensão técnica, ela se refere ao processo de ensi- c~
umas características específicas que têm de ser analisadas em fun-
IIII ,Ipr .ndizagem como ação intencional, sistemática, que procura
ção ~o contexto educacional e político-social em que se situam.
1I1>:,llli/,ar as condições que melhor propiciem a aprendizagem.
E nesta perspectiva que tenta se colocar o presente trabalho,
pl' L como objetivos instrucionais, seleção do conteúdo, estra-
que pretende oferecer subsídios para o aprofundamento da com-
II ',IS d ensino, avaliação ete., constituem o seu núcleo de preocu-
preensão da polêmica atual sobre o papel da didática na formação
P'\\ () .s. Trata-se do aspecto considerado objetivo e racional do pro-
dos educadores e sugerir algumas pistas para a sua superação.
\ I :-,(d ensino-aprendizagem.

No entanto, quando esta dimensão é dissociada das demais,


1. Um ponto de partida: a multidimensionalidade do
1\'\11- o tecnicismo. A dimensão técnica é privilegiada, analisada
processo de ensino-aprendizagem \11' r' irma dissociada de suas raízes político-sociais e ideológicas, e
. O objeto de estudo da didática é o processo de ensino-apren- \ 11-11 como algo "neutro" e meramente instrumental. A questão <'
=s= Toda proposta didática está impregnada, implícita ou 1<)..fazer" da prática pedagógica é dissociada das perguntas sobre
explicitamente, de uma concepção do processo de ensino-aprendi- I! "por que fazer" e o "para que fazer" e analisada de forma, mui-
zagem. us v zes, abstrata e não contextualizada.
Parto da afirmação da multidimensionalidade deste processo: Se o tecnicismo parte de uma visão unilateral do processo en-
O que pretendo dizer? Que o processo de ensino-aprendizagem, , i no-aprendizagem, que é configurado a partir exclusivamente da
para ser adequadamente compreendido, precisa ser analisado de 1i mensão técnica, no entanto esta é sem dúvida um aspecto que
tal modo que articule consistentemente as dimensões humana 11·0 pode ser ignorado ou negado para uma adequada compreen-
técnica e político-social. ' sã o e mobilização do processo de ensino-aprendizagem, O domí- r :
Ensino-aprendizagem é um processo em que está sempre pre- nio do conteúdo e a aquisição de habilidades básicas, assim como
sente, de forma direta ou indireta, no relacionamento humano. c busca de estratégias que viabilizem esta aprendizagem em cada
Para a abor~agem humanista é a relação interpessoal o centro situação concreta de ensino, constituem problemas fundamentais
do processo. Esta abordagem leva a uma perspectiva eminente- para toda proposta pedagógica. No entanto, a análise desta pro-
mente subjetiva, individualista e afetiva do processo de ensino- blemática somente adquire significado pleno quando é contextua-
aprendizagem. Para esta perspectiva, mais do que um problema de lizada e as variáveis processuais tratadas em íntima interação com
técnica, a didática deve se centrar no processo de aquisição de atitu-
as variáveis contextuais.
des tais como: calor, empatia, consideração positiva incondicional.
Se todo o processo de ensino-aprendizagem é "situado", a di- «.,
, A did~tica é então, "privatizada". O crescimento pessoal, interpes-
mensão político-social lhe é inerente. Ele acontece sempre n~ma
soal e mtragrupal e desvinculado das condições socioeconômicas e
políticas em que se dá; sua dimensão estrutural é, pelo menos, co- cultura específica, trata com pessoas concretas que têm uma po-
locada entre parênteses. sição de classe definida na organização social em que vivem. Os

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ndicionamentos que advêm desse fato incidem sobre o preces- vida era a crítica à chamada didática tradicional e a afirmação da ~
o de ensino-aprendizagem. A dimensão político-social não é um perspectiva escolanovista. Ao mesmo tempo, o Colégio de Aplica-
a pecto do processo de ensino-aprendizagem. Ela impregna toda ção da PUC/RJ promovia uma experiência de educação personalí-
a prática pedagógica que, querendo ou não (não se trata de uma zada em que se enfatizava a associação entre Montessori e Lubiens-
decisão voluntarista) , possui em si uma dimensão político-social. ka e a utilização de técnicas inspiradas no Plano Dalton. Esta escola
No entanto, a afirmação da dimensão política da educação em oferecia campo privilegiado de estágio para os licenciandos que
geral, e de prática pedagógica em especial, tem sido acompanha- observavam os princípios básicos da Escola Nova.
da entre nós, não somente da crítica ao reducionismo humanista
Nos últimos anos da década de SO e nos primeiros da de 60, o
ou tecnicista, frutos em última análise de uma visão liberal e mo-
país passa por um período de grande efervescência político-social
dernizadora da educação, mas tem chegado mesmo à negação des-
educacional. O debate em torno da Lei de Diretrizes e Bases mo-
sas dimensões do processo de ensino-aprendizagem.
biliza a área educacional. Se enfrentam diferentes posições, mas a
-~ / De fato, o dificil é superar uma visão reducionista, dissociada matriz liberal predomina. r__
ou justaposta da relação entre as diferentes dimensões, e partir para
Neste contexto a didática faz o discurso escolanovista. O pro-
urna perspectiva em que a articulação entre elas é o centro configu-
blema está em sup~rar a escola tradicion~em reformar interna-
rador da concepção do processo de ensino-aprendizagem. Nesta
mente a escola. Afirma-se a necessidade de partir dos interesses
perspectiva de uma multidimensionalidade que articula organica-
pontâneos e naturais da criança; os princípios de atividade, de
mente as diferentes dimensões do processo de ensino-aprendiza-
individualização, de liberdade, estão na base de toda proposta di-
gem é que propomos que a didática se situe.
lática; parte-se da importância da psicologia evolutiva e da apren-
2. Ensinando didática lizagem como fundamento da didática: trata-se de uma didática
lc base psicológica; afirma-se a necessidade de "aprender fazen-
Não pretendo fazer a história da didática ou do ensino de di- 10" e de "aprender a aprender"; enfatiza-se a atenção às díferen-
dática no Brasil. Considero que esta é uma tarefa importante e ~'asindividuais; estudam-se métodos e técnicas como: "centros de
urgente. O que pretendo é partir da minha experiência pessoal interesse", estudo dirigido, unidades didáticas, método de proje-
como professora de Didática desde 1963, e situar esta experiência LOS, a técnica de fichas didáticas, o contrato de ensino ete.; pro-
na evolução político-social e educacional do país. Procurarei rea- movem-se visitas às "escolas experimentais", seja no âmbito do
lizar uma análise crítica da evolução do ensino de Didática da dé-
nsino estatal ou privado.
cada de 60 até hoje.
Soares (81), referindo-se aos primeiros anos da década de ~,
0 identifica este mesmo predomínio da perspectiva escolanovista
2.1. 1 Momento: A afirmação do técnico e o silenciar do político: o
11.0 ensino de Didática:
pressuposto da neutralidade
A proposta da Escola Nova - ideológica, que era, como toda
Cursei a Licenciatura em Pedagogia na PUC/RJ de 19 S9 a e qualquer proposta pedagógica - apresentava-se a mim, e a
1962 e, no ano seguinte, comecei a lecionar Didática nesta mes- quase todos os educadores, àquela época, como um conjunto
ma universidade. O núcleo inspirador dos meus primeiros anos lógico e coerente de ideias e valores, capaz não só de explicar a
d professora de Didática foi certamente minha própria experiên- prática pedagógica como também, e sobretudo, de regulá-Ia,
ia omo aluna de Didática. Qual a temática privilegiada? Sem dú- fornecendo regras e normas para que ela se desenvolvesse de

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-- - -- --
forma "científica" e "justa". De um lado, a teoria sociológica
base científica desta perspectiva se apoia fundamentalmente na
de Durkheím fundamentava a concepção de educação como so-
p icologia.
cialização do indivíduo, de outro lado, a psicologia experímen-
No período de 1966 a 1969 me ausentei do país para realizar
tal conferia racionahdade e objetividade à prática pedagógica.
um curso de pós-graduação no exterior. Ao propor-me elaborar
(p.31-32) um trabalho sobre tema de atualidade na área da didática, o as-
O livro-texto mais am.plamente adotado neste período é o Su- sunto escolhido não poderia ser outro: Ensino programado.
mário de DidáticaGeral (1957) de Luiz Alves de Mattos. Este livro foi Desde o início dos anos 60 o desenvolvimento da Tecnolo-
apontado em pesquisa realizada em 1978 entre os professores de gia Educacional e, concretamente, do Ensino Programado, vinha
Didática de Belo Horizonte, entre as 13 publicações mais repre- .xercendo forte impacto na área da Didática. De uma concepção
sentativas do conteúdo da didática (OLIVEIRA, 1980). Segundo Ia tecnologia educacional que enfatiza os meios, conceito cen-
Soares (1981), uma análise de conteúdo ideológico deste tex- trado no meio e, consequentemente, os recursos tecnológicos, se
to "desvendaria a ideologia liberal-pragmatista, os princípios da passava a uma visão da tecnologia educacional como processo. De
Escola Nova e o mito da neutralidade dos métodos e técnicas de r to esta concepção partia da conjugação da psicologia behavío-v .
ensino que informam, sem que sejam explicitados, a Didática pro- ri ta, da teoria da comunicação e do enfoque sistêrnico e se pro-
posta pelo autor" (p. 34). I unha desenvolver uma forma sistemática de planejar o processo
Segundo Saviani (80) o movimento escolanovista se baseia na I ensino-aprendizagem, baseando-se em conhecimentos cientí-
tendência do "humanismo moderno" e esta predominou na edu- fi os e visando a sua produtividade, isto é, o alcance dos objetivos
cação brasileira de 1945 a 1960 e o período de 1960 a 1968 se ca- propostos de forma eficiente e eficaz.
racteriza pela crise desta tendência e pela articulação da tendência Volto ao Brasil em 1969. Instalada a revolução de 1964 e pas-
tecnicista. S do o período de transição pós-64, é retomada a expansão eco-
Nesta etapa, o ensino da didática assume certamente uma 11 ômica e o desenvolvimento industrial. O modelo político refor-
perspectiva idealista e centrada na dimensão técnica do processo \' o controle, a repressão e o autoritarísmo. A educação é vincula- «-
de ensino-aprendizagem. É idealista porque a análise da prática I à Segurança Nacional. Enfatiza-se seu papel de fato de desen-
pedagógica concreta da maioria das escolas não é objeto de re- v lvimento e são propostas medidas para adequá-Ia ao novo mo-
flexão. Considerada "tradicional", ela é justificada pela "ignorân- 10 econômico,
cia" dos professores que, uma vez conhecedores dos princípios e E a didática? Assim como no momento anterior as palavras-
técnicas escolanovistas, a transformariam. Para reforçar esta tese, r, rça eram: atividade, individualidade, liberdade, experimenta-
experiências pedagógicas que representam exceções dentro do (o, agora se enfatiza a produtividade, eficiência, racionalização,
sistema e que, mesmo quando realizadas no sistema oficial de peracionalização e controle, A visão "industrial" penetra o cam-
nsino, se dão em circunstâncias excepcionais, são observadas e I o educacional, e a didática é concebida como estratégia para
analisadas. Os condicionamentos socioeconômicos e estruturais alcance dos "produtos" previstos para o processo de ensino-
da educação não são levadas em consideração. A prática pedagó- e prendizagem. Agora mais do que confrontar a didática tradicio- --
i a depende exclusivamente da "vontade" e do "conhecimento" nal e a didática renovada, o centro nuclear do curso é o confronto
d professores que, uma vez dominando os métodos e técnicas ntre o enfoque sistêmico e o não sistêmico da didática. Se um
s nvolvidos pelas diferentes experiências escolanovistas, pode- nfatiza objetivos gerais, formulados de forma vaga, o outro en-
râ aplicá-los às diferentes realidades em que se encontrem. A fatiza objetivos específicos e operacionais. Se um enfatiza o pro-

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cesso, o outro o produto. Se um parte de um enfoque da avalia- I " I1Iu . mo ponto de referência os problemas reais da prática
ção baseada na "norma", o outro enfatiza a avaliação baseada I" ,1.1It' 1i a quotidiana, aqueles que enfrentam os professores de
em "critérios". Se no primeiro o tempo é fixo, o segundo tende I , " r us, tais como: precárias condições econômicas das es-
a trabalhar a variável tempo. Se um enfatiza a utilização dos mes- ,d I , d alunos, classes superlotadas, taxas significativas de
mos procedimentos e materiais por todos os alunos, o outro faz ,I (I I r petência, conteúdos inadequados, condições de traba-
variar os procedimentos e materiais segundo os indivíduos. E as- 11", ,I III rires, etc. Como a didática não fornece elementos signifi-
sim por diante ...
, IIIv IS para a análise da prática pedagógica real e o que ela propõe
Nesta perspectiva, a formulação dos objetivos instrucionais, 1101111 -m nada que ver com a experiência do professor, este tende
as diferentes taxionomias, a construção dos instrumentos de ava- I 1llIlsiderá-Ia um ritual vazio que, quando muito, pertence ao
liação, as diferentes técnicas e recursos didáticos, constituem o I1III1II dos" sonhos", das idealizações que não contribuem senão
conteúdo básico dos cursos de Didática. Modelos sistêmicos são 1"11,1I' ,r, rçar uma atitude de negação da prática real que não ofe-
estudados, habilidades de ensino são treinadas e são analisadas 1II t' as condições que tornariam possível a perspectiva didática
metodologias tais como: ensino programado, Plano Keller, apren- 1"1 p ) ta. A desvinculação entre a teoria e a prática pedagógica re- --_
dizagem para o domínio, módulos de ensino ete. 1," I formalismo didático: os planos são elaborados segundo as
Entre as publicações indicadas pela pesquisa de Oliveira (80) 1111111 S previstas pelos cânones didáticos; quando muito, o dis-
como mais representativas do conteúdo atual da Didática segun- 1111'.'0dos professores é afetado, mas a prática pedagógica perma-
do os professores de Didática de Belo Horizonte, o predomínio da 1II intocada.
I

tecnologia educacional é, sem dúvida, evidente.


Neste enfoque a acentuação da dimensão técnica do processo , o Momento: A afirmação do político e a negação do técnico: a
de ensino-aprendizagem é ainda mais enfatizada do que na abor-
lun(e lação da didática
dagem escolanovista. Nesta, pelo menos em algumas de suas ex-
pressões, a dimensão humana também é salientada e a relação pro- Principalmente a partir da metade da década de 7O, a crítica às
fessor-aluno é repensada em bases igualitárias e mais próximas, Ili rspectivas anteriormente assinaladas se acentuou. Esta crítica teve <:-.
do ponto de vista afetivo. 11111 aspecto fortemente positivo: a denúncia da falsa neutralidade
..., Na perspectiva da tecnologia educacional a didática se centra I1) L' cnico e o desvelamento dos reais compromissos polítíco-so-
na organização das condições, no planejamento do ambiente, na Ictis das firmações aparentemente "neutras", a afirmação da im-
elaboração dos materiais instrucionais. A objetividade e racionali- I)().sibilídade de uma prática pedagógica que não seja social e poli-
dade do processo são enfatizadas. 1 'mente orientada, de uma forma implícita ou explícita. Mas,
[unto com esta postura de denúncia e de explicitação do compro-
Mas, se estas duas abordagens se diferenciam, elas partem de
m i. so com o status quo do técnico aparentemente neutro, alguns au-
-- ;:,um pressuposto comum: "o salientar da dimensão política". E
1Ires chegaram à negação da própria dimensão técnica da prática
este silêncio se assenta na afirmação da neutralidade do técnico,
I ente.
isto é, na preocupação com os meios desvinculando-os dos fins a
que servem, do contexto em que foram gerados. Significa ver a Há uma suposição firmada entre os críticos do "saber fazer"
prática pedagógica exclusivamente em função das variáveis inter- de que a dimensão de eficácia do trabalho pedagógico é, de-
nas do processo de ensino-aprendizagem, sem articulação com o finitivamente, uma invenção do pragmatismo pedagógico.
contexto social em que esta prática se dá. Neste sentido, a didática Dessa forma todas as técnicas e meios pedagógicos são pro-
dutos da burocracia e instrumentos do poder dominador exer-

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cido pelo professor [ .. .J. Há um consenso tácito de que as no- '111') 11111 l'l nc de procedimentos pressupostam.ente neutros e
ções de "eficácia", racionalidade, organização, "ínsrrurnenra 111 I I ,\I~, ou ritica esta perspectiva, denuncia seu compromisso
lizaçâo", "disciplina", estão indissoluvelmente ligadas ao mo- I, '''''>'Il () , 11 ga a Didática como necessariamente vinculada a
delo burocrático capitalista e, onde exisr m, são restritoras 1111 I I ,\U l nicísta da educação.

dos processos de democratização da escola e da sociedade. [ ...] ( I I (,\111 mre, na maior parte das vezes, o ensino de Didática

- '> A critiquíce anrítécníca é própria do democratismo e responde I I IId, rmado por uma perspectiva meramente instrum.ental.
em boa dose pela diminuição da competência técnica do edu- I~SlCenfoque limitado reflete-se nos livros sobre o assunto
cador escolar. A ênfase no snber ser, sem dúvida fundamental 11Iesão, em geral, pobres, restringindo-se ao enunciado de
para se definir uma postura crítica do educador freme ao co- "receitas", com uma fundamentação teórica insuficiente e in-
nhecimento e aos instrumentos de ação, não pode dissolver as .onscienre.
outras duas dimensões da prática docente, o saber e o saber fazer, (ALVITRE, 1981, p. 52)
pois a incompetência no domínio do conteúdo e no uso de re-
M.\s a crítica à visão exclusivamente instrumental da didática
cursos de trabalho compromete a imagem do professor-educa-
dor. Tornar nossa prática ineficieme põe em risco os pró-
"" I IHl I se reduzir à sua negação. Competência técnica e compe-
li li' 1,\política não são aspectos contrapostos. A prática pedagógi-
prios fins políticos dessa prática.
I I, r x H mente por ser política, exige a competência técnica. As
(LIBÂNIO, 1982, p. +2-+3). d IIIli nsôes política, técnica e humana da prática pedagógica se
_ Essa tendência reduz a função da didática à crítica da produ- >\ '111 reciprocamente. Mas esta mútua implicação não se dá au-
çao atual, geralmente inspirada nas perspectivas anteriormente 1IIIII,íli'a e espontaneamente. É necessário que seja conscientemen-
mencionadas. 11 II\li alhada. Daí a necessidade de uma didática fundamental.
_ A afirmação da dimensão política da prática pedagógica é en- 1\ perspectiva fundamental da Didática assume a multidímen- -
tao acompanhada da negação da dimensão técnica. Esta é vista co- 11111.:11 idade do processo de ensino-aprendizagem e coloca a articu-
mo necessariamente vinculada a uma perspectiva tecnicista. Mais 1,1 ,\( das três dimensões, técnica, humana e política, no centro
uma vez_as diferentes dimensões do processo de ensino-aprendi- I 111 \ fi gmador de sua temática.
zagem sa~ contrapostas, a afirmação de uma levando à negação Procura partir da análise da prática pedagógica concreta e de
das demais. Afirmar a dimensão política e, consequentemente, es- .\'lIS determinantes.
trutural da educação, supõe a negação do seu caráter pessoal. Com- ontextualiza a prática pedagógica e procma repensar as di-
petência técnica e política se contrapõem. 11\ 'li ões técnica e humana, sempre "situando-as".
Neste momento, mais do que uma didática, o que se postula é Analisa as diferentes metodologias explicitando seus pressu-
uma antididática. pOSlOS, o contexto em que foram geradas, a visão de homem, de
" ) .iedade, de conhecimento e de educação que veiculam.
3. De uma didática instrumental a uma didática fundamental Elabora a reflexão didática a partir da análise e reflexão sobre
-xperiências concretas, procurando trabalhar continuamente a
. ~.o momento atual, segundo Salgado (1 982), ao professor de
I' '"1 ação teoria-prática.
Didática se apresenta duas alternativas: a receita ou a denúncia.
Isto é, ou ele transmite informações técnicas desvinculadas dos Nesta perspectiva, a reflexão didática parte do compromisso
seus próprios fins e do contexto concreto em que foram geradas, . m a transformação social, com a busca de práticas pedagógicas

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•..

que tornem o ensino de fato eficiente (não e deve ter medo da pa


lavra) para a maioria da população. Ensaia. Analisa. Experimenta.
Rompe com uma prática profissional individualista. Promove o
trabalho em comum de professores e especialistas. Busca as for-
mas de aumentar a permanência das crianças na escola. Discute a
questão do currículo em sua interação com uma população con-
creta e suas exigências, etc.
Este é, a meu ver, o desafio do momento: a superação de uma
didática exclusivamente instrumental e a construção de uma di-
dática fundamental.

Referências bibliográficas
ALVITE, M.M.C. Didática e psicologia:crítica do psicologismo na educação.
São Paulo: Loyola, 1981.

LIBÂNIO, j.C. Saber, saber ser, saber fazer, o conteúdo do fazer pedagó-
gico. Revistada Ande. Ano 1, n. 4, 1982.

MATTOS, L.A. de. SumáriodeDidáticaGeral. Rio de Janeiro: Aurora, 1957. i


OLIVEIRA, M.R.N.S. O conteúdoatual da didática:um discurso da neutralidade.
UFMG, 1980 [Tese de Mestrado em Educação].

SALGADO, M.U.C. O papel da didática na formação do professor. Revista


da Ande. Ano 1, n. 4, 1982.

SAVIANI, D. Correntes e tendências da educação brasileira. In: TRIGUEI-


RO, D. Filosofiada EducaçãoBrasileira,Inep, 1980.

SOARES, M. Travessia.Belo Horizonte, 1981. [Memorial apresentado à Fa-


culdade de Educação da UFMG como parte dos requisitos para a inscrição
e concurso de professor titular]

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