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CURSO

Reitor Supervisão de Tutoria Audiovisual


Ubaldo Cesar Balthazar Fernando Wolf Carolina Arruda (supervisão)

Vice-reitora Luiz Gabriel Braun


Técnico-Científica
Alacoque Lorenzini Erdmann Leonardo Campos Silva
Deidvid Abreu
Nathan Luchina
Laura Brehmer
Secretário de Educação a Distância
Bruna Korb
Fernando Alvaro Ostuni Gauthier Design Instrucional
Ketryn Alves
Maria Alice de Carvalho Echevarrieta (supervisão)
Ivan Merten
EQUIPE DE PROJETO Thiago Panegace de Avila
Lucas Bruni
Coordenação Marcia Bortolato
Eleonora Milano Falcão Vieira Linguagem & Memória
Pupella Machado Cardoso
Samara Laís Zimermann (supervisão)
Vice-Coordenação Letícia Possamai Della
Cleusa Iracema Pereira Raimundo
Luciano Patrício Souza de Castro Paulo Otávio D´Tolis
Larissa Malu dos Santos
Magno Cruz
Gestão Suziane da Silva Mossmann
Luísa Scaff (supervisão) Design Gráfico
Programação
Giovana Schuelter Lara Lodi da Silva (supervisão)
Alexandre Garcez
Sibéli Regina da Silva Julia Carmen Damiani
Felipe Santos
Felipe Castoldi Luka Ferreira Rezende

Grasiele Fernandez Maria Eduarda Zimmermann

Jaqueline de Ávila Paulo Otávio Coimbra

Andreia Mara Fiala (supervisão de moodle) Rodrigo dos Santos Silva


Matheus Lufiego
Secretaria
Tarcila Zanatta
Luis Antônio Bento
Natassia Alano
ENTREVISTA MOTIVACIONAL

Neste módulo, aprenderemos sobre a Entrevista Motivacional, uma


ferramenta essencial para o uso diário nos acolhimentos e tratamentos
de pessoas dependentes de álcool e/ou outras drogas na rede de
saúde. Estudaremos as principais indicações dessa ferramenta,
compreendendo possíveis encaminhamentos a serem utilizados
quando determinadas estratégias não são efetivas em relação à
motivação para mudança de hábito por parte do paciente. Na segunda
parte deste módulo, serão apresentadas as principais estratégias
motivacionais utilizadas na prática clínica e as diferenças entre elas.
Após a leitura deste módulo, você compreenderá os diferentes tipos
de estratégias motivacionais, suas características, modificações de
perspectivas teóricas ao longo do tempo e como tais estratégias podem
ser utilizadas de forma singular.

Conteudista: Carga horária:


Leonardo Moreira 22 horas
Objetivo Educacional do Módulo

O principal objetivo deste módulo é que o profissional identifique


pessoas que já procuraram seu local de trabalho com algum problema
relacionado ao consumo de substâncias psicoativas, podendo aplicar
ou pressupor uma possível intervenção para o tratamento desses
usuários, lançando mão das habilidades relacionadas à estratégia da
Entrevista Motivacional. A partir desse exercício, podemos esperar,
ainda, que o profissional efetivamente inicie sua experiência prática
na aplicação da empatia, da escuta reflexiva, do plano de ajuda ativa
e demais técnicas, de acordo com estado de motivação para mudança
de cada pessoa.
SUMÁRIO

Capítulo 1
Bases da Entrevista Motivacional

Capítulo 2
Princípios da Entrevista Motivacional
Introdução ao Módulo

Você já tentou mudar um hábito difícil de ser mudado? Por exemplo:


iniciar uma dieta, uma atividade física ou um planejamento financeiro?
Caso já tenha tentado, certamente percebeu como é difícil mudar um
padrão de comportamento que está enraizado em nossos hábitos.
Da mesma maneira, as pessoas que tentam mudar ou interromper
um padrão de consumo de substância psicoativa enfrentam dilemas
e dificuldades que as distanciam desse objetivo. Neste módulo, você
iniciará seu contato com a Entrevista Motivacional, uma técnica já
validada pela evidência científica como eficaz para o auxílio relacionado
a esse tipo de mudança!
A partir de suas vivências anteriores a este módulo, reflita e
responda se você já usou a ferramenta da Entrevista Motivacional
(EM). E, nesse contexto, pense sobre os aspectos da entrevista que
te chamaram atenção no momento da utilização.

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CAPÍTULO 1
BASES DA ENTREVISTA MOTIVACIONAL

Neste capítulo, você aprenderá o que é o Modelo Transteórico, suas


características e mudanças ocorridas, indicações de uso da Entrevista
Motivacional e as diferenças entre outras ferramentas motivacionais.
Também abordaremos as formas de agir em situações adversas,
o empoderamento e a importância da motivação como agente
transformador da mudança de hábitos para pessoas dependentes de
álcool e outras drogas.

Seções de estudo:
1. Conhecendo os princípios da Entrevista Motivacional
2. Modelo Transteórico
3. Indicações do uso da Entrevista Motivacional
4. Quadro comparativo das terapias psicológicas
5. Manejo de situações adversas
6. Confiança e importância da motivação

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1. Conhecendo os princípios da Também quando pensamos em
Entrevista Motivacional economizar, mas nos deixamos levar e
acabamos aproveitando a oferta daquele
Algumas premissas sobre a Entrevista Saiba Mais sapato que muito encantou, apesar de
resistência
Motivacional (EM) são comuns para não ser um item necessário. Podemos,
todos os estágios de motivação relativos Abordaremos com mais detalhes esse con- então, por meio de ocorrências como
ceito adiante, mas já é importante salientar
à mudança e para a maioria das pessoas que a resistência constitui-se, nesse con- as citadas, tentar nos colocar no lugar
que chegam a um local de tratamento. texto, como uma resposta natural a uma da pessoa e entender que o uso de uma
tentativa de mudar um comportamento
Nesses termos, desenvolver e expressar que ofereça conforto ou ganho à pessoa. substância tem um sentido dentro do
empatia, bem como deixar a pessoa falar, contexto da vida dela, por mais que
estimulando-a com perguntas abertas, esse uso inclua malefícios muito mais
sem enfrentar comportamentos de Antes de falar sobre cada estágio de evidentes do que qualquer benefício.
resistência, faz parte da construção de motivação para mudança, é importante Nesse sentido, considerando que
uma boa relação entre quem busca a recordar que todos já passamos por todos temos dificuldade de mudar
ajuda (que pode ser o dependente de situações nas quais tivemos dificuldades os hábitos enraizados, e sabendo da
álcool e/ou outras drogas, o familiar, o para mudar um hábito: seja no início de síndrome de dependência, o desafio é
amigo) e o profissional. Aliás, você sabe o uma dieta, no controle das finanças ou unir as diferentes técnicas para auxiliar
que é resistência? na organização do tempo das atividades a pessoa em sofrimento na retomada do
diárias. Podemos estar extremamente protagonismo nas decisões de sua vida.
empenhados a iniciar uma dieta até o Observe, assim, que o processo
momento em que somos tentados com de recuperação de uma síndrome de
o prato favorito, que nos é, por exemplo, dependência química é uma mudança no
insistentemente oferecido. estilo de vida.

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Glossário
A síndrome de dependência é uma doença
que dificulta a possibilidade de a pessoa es- $$ $$
$$
colher livremente a mudança.

Assim, é fundamental que o profissional


que trabalha com a temática da dependên-
Síndrome de
cia de álcool e/ou outras drogas na rede de dependência
saúde atue apontando as potencialidades
e os perigos de uma caminhada na qual a
pessoa toma decisões e delimita possíveis
mudanças em seu comportamento. O su-
jeito deve receber aconselhamento técnico
para escapar das armadilhas que a depen-
dência pode apresentar neste percurso.

Figura 1: Síndrome de dependência - Compras; celular; álcool; fumo; fast food, e a dificuldade para mudar
um hábito. Fonte: SEAD-UFSC (2018).

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Desse modo, fica perceptível que condição tão heterogênea quanto a das um processo de mudança, mantendo-a
não há como generalizar e empregar pessoas com problemas relacionados ao engajada nessa transformação.
apenas uma única técnica para todas uso e abuso de álcool e outras drogas. A Prevenção de Recaída (PR), por
as situações. Nesses termos, o que Dessa maneira, para lidarmos de forma sua vez, é uma técnica que identifica
a evidência científica propõe é que mais assertiva com as Histórias da Vida armadilhas, mentais ou situacionais,
os profissionais tenham domínio na que apresentamos neste curso, bem como as quais podem ocasionar o que
condução e na indicação da melhor com aquelas com as quais nos deparamos chamamos de recaída, além de oferecer
abordagem, a depender do momento em nosso dia a dia, recorremos à subsídios e outras ferramentas para
em que a pessoa está e do seu grau de literatura, que nos fornece suporte sólido auxiliar, caso ocorra o retorno ao uso da
motivação para mudança. relativo aos resultados positivos. substância psicoativa.
Como exemplo, citamos o uso da
2. O que é o Modelo Transteórico? Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)
(BECK, 1976), a Entrevista Motivacional Glossário
Antes de adentrarmos no Modelo (EM) (MILLER; ROLLNICK, 2001) e a A recaída acontece quando o usuário retor-
na ao uso de álcool e outras drogas na mesma
Transteórico, é importante considerar Prevenção de Recaída (PR) (MARLATT; proporção anterior.
a complexidade no trabalho com GORDON, 1993).
pessoas dependentes de álcool e outras Resumidamente, a Terapia Cognitivo-
drogas, tendo em vista os diversos Comportamental (TCC) tem como alvo a
fatores envolvidos, sejam eles: sociais, mudança de pensamentos disfuncionais
psicológicos, culturais e/ou biológicos. a respeito do uso de substâncias em
Atualmente, é consensual entre os detrimento dos pensamentos de maior
estudiosos da área não fazer o uso de funcionalidade.
apenas uma técnica, mas de todos os Já a Entrevista Motivacional (EM)
recursos conhecidos para tratar uma baseia-se em motivar uma pessoa para

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Tendo em vista a possibilidade de uso Alguns trabalhos embasados no
de diferentes técnicas para o tratamento Modelo Transteórico analisaram como
de usuários de álcool e outras drogas, as pessoas mudavam espontaneamente
vamos iniciar nosso estudo pelo Modelo o comportamento de dependência sem Saiba Mais
transteórico
Transteórico. Desde o começo dos qualquer ajuda profissional. Em 1979,
anos oitenta, o grupo de Prochaska, Di Prochaska e colaboradores buscaram Para saber mais sobre o Modelo Trans-
teórico, sugerimos a leitura do texto: O
Clemente e Norcross (1992) trabalhou identificar, a partir da análise comparativa Modelo Transteórico no tratamento da
em prol do que hoje é conhecido como o dos dezoito maiores sistemas de dependência química. <http://pepsic.bv-
salud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
Modelo Transteórico. psicoterapia, os processos de mudança d=S1516-36872008000100012>.
comuns a todos eles.
Assim, o modelo que surgia
nesse contexto foi denominado
como “transteórico” e teve como Em outras palavras, o Modelo Transteórico
Saiba Mais principal pressuposto a noção de
nada mais é do que a combinação de ideias
Modelo Transteórico que visam propiciar um modelo de ação
que automudanças bem-sucedidas que não depende especificamente de uma
A partir de Prochaska, Di Clemente e Nor- única teoria.
dependem de ações certas (processos)
cross (1992), temos alguns trabalhos que
mostraram que a aderência a um trata- no momento correto (estágios)
mento formal faz com que as pessoas mo- (PROCHASKA; DI CLEMENTE;
difiquem comportamentos indesejados;
outros estudos, no entanto, apresentaram NORCROSS, 1992).
resultados indicando que as mudanças po-
dem acontecer sem nenhum tipo de ajuda
profissional; outros, ainda, afirmavam que
mudanças bem-sucedidas podem ocorrer
com ou sem ajuda profissional.

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Como visto no Módulo 1, as fases A mudança intencional é a base do
são elencadas em estágios de mudança Modelo Transteórico, ou seja, na
pelos quais transpassam as pessoas tomada de decisão do indivíduo, ao
Saiba Mais contrário de outras abordagens que
e seu comportamento. Inicialmente se baseiam em influências sociais ou
seis estágios
classificavam-se em quatro estágios biológicas no comportamento. Desta
principais (pré-contemplação, Foi verificado que, entre o estágio da con- forma, as pessoas que modificam
templação e o da ação, as pessoas pas- comportamentos aditivos tendem a se
contemplação, ação e manutenção). savam por uma fase de planejamento da mover através de uma série de estágios,
ação. Esse período foi denominado “deter- que envolvem emoções, cognições e
Atualmente, são identificados seis
minação” e passou a ser incluído como o
comportamentos, independentemente
estágios. Para os autores, a implicação terceiro estágio (PROCHASKA et al., 1992).
de estarem ou não em tratamento.
mais importante de suas pesquisas (ORSI; OLIVEIRA, 2006, p. 5).
foi a descoberta da necessidade de,
inicialmente, acessar o estágio de Tendo essa visão ampla do processo,
prontidão para a mudança do sujeito fica mais claro entender o que grupo
e só então adequar as intervenções de Prochaska, Di Clemente e Norcross
terapêuticas a ele (PROCHASKA; DI (1992, p1.102) pretendia quando se
CLEMENTE; NORCROSS, 1992). dedicaram a responder à seguinte
pergunta científica:

“Existem princípios básicos e comuns que


podem revelar a estrutura da mudança
ocorrida com e sem psicoterapia?”

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Como apresentado anteriormente, os diminuição na motivação para a mudança Ainda sobre o tema, de acordo com
estágios de motivação para a mudança de comportamentos considerados Miller (1998), é fundamental enfatizar
(espiral do processo de mudanças) problemáticos. que, das muitas pessoas com problemas
reproduzem a dimensão temporal Ao analisar as histórias apresentadas com o álcool que conseguem parar de
do Modelo Transteórico. É a partir neste curso, especificamente o caso de beber, somente uma pequena minoria
daí que devemos nos atentar e saber Luiza, dependente de álcool, a literatura delas usou algum tipo de tratamento
identificar cada um dos estágios, para sugere que aproximadamente 70 a 80% formal para a dependência. Os motivos
que entendamos quando mudanças desses pacientes transitam por várias dessa baixa procura por tratamentos
particulares nas atitudes, intenções e vezes na espiral do processo de mudança. formais vão desde o estigma de que o
comportamentos tendem a acontecer. problema é visto como uma questão
Destaca-se também que a motivação de caráter até a baixa informação da
para a mudança pode (e parece) ser Faz-se necessário reforçar que: disponibilidade desses serviços.
influenciada tanto pela presença de 1. o processo de mudança não é linear, uma Nesse contexto, para podermos ajudar
sintomas psiquiátricos quanto pelo pessoa pode entrar em qualquer estágio da as pessoas que procuram assistência no
espiral após a recaída;
grau de intensidade da dependência. campo da saúde, mesmo aqueles que
Evidências decorrentes de pesquisas 2. a motivação não é estática, uma pessoa continuamente recaem no uso de drogas,
pode pular estágios nas duas direções;
demonstraram ao longo dos anos que é imprescindível um aconselhamento
fatores como a presença de sintomas 3. as técnicas utilizadas em um estágio não efetivo. Tal condição requer que o
necessariamente podem ser válidas em
de depressão e ansiedade (KLUDT; outro estágio. Por exemplo, uma pessoa na profissional de saúde construa uma
PERLMUTER, 1999; SOFUOGLU et al., pré-contemplação foca menos no proble- parceria com o sujeito, a fim de ampará-lo
ma, despende menos tempo reavaliando a
2001) e a gravidade da dependência si próprio, e experiencia menores proble- na mudança do hábito em que se encontra.
(JOE; SIMPSON; BROOME, 1999; mas emocionais relacionados ao uso de Além disso, o profissional deve sempre
substâncias psicoativas.
NWAKEZE; MAGURA; ROSENBLUM, ter em mente um processo de resolução
2002) podem estar relacionados a uma do problema, tendo em vista que não é

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possível evitar completamente as recaídas; obesidade, câncer) e outras condições que
devemos, pelo menos, fazer o possível para necessitam de cuidado especial.
que essa fase dure pouco e tenha pequenos A EM baseia-se em dois conceitos-
efeitos deletérios na vida da pessoa chave: a ambivalência e a prontidão
dependente. Talvez uma das tarefas mais para a mudança. No primeiro conceito,
difíceis seja exatamente fazer com que a deve-se deixar claro que a ambivalência
pessoa com dependência faça a “balança” não significa apenas a relutância a fazer
pesar mais para o lado da mudança. algo, mas sim a experiência de um conflito
psicológico para decidir entre dois
3. Indicações do uso da caminhos distintos. No segundo conceito,
Entrevista Motivacional a base advém do modelo de Estágios de
Mudança, o qual acredita que a mudança
Na temática de dependências químicas, a se faz por meio de um processo, como
EM apresenta-se como uma ferramenta visto anteriormente.
potente para auxiliar os profissionais
de saúde no atendimento a pessoas em
diferentes estágios de motivação de Glossário
mudança. Do mesmo modo, o uso da EM é O conceito de ambivalência apresenta dois
componentes de sentidos opostos. É uma
indicado para diversos serviços de saúde,
tendência para nos levar a racionalizar e a
não abrangendo apenas a temática da minimizar nosso próprio consumo de drogas,
pensado a partir da possibilidade dos senti-
dependência. Há outros campos em que essa dos opostos ou não, contemplados por essa
ferramenta pode ser utilizada, como para o condição da ambivalência.
tratamento de doenças crônicas (diabetes,

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Metodologia PARR sendo pensada como mais uma tarefa
Identificam-se quatro elementos princi-
pais utilizados como ferramentas durante do profissional de saúde, provavelmente
a Entrevista Motivacional; são eles: enga- a mais difícil, quando se trata de
jamento, foco, evocação e planejamento,
estando interligados à metodologia PARR dependência química. Novamente,
(MILLER; ROLLNICK, 2013). frisamos que a motivação deve ser
compreendida no contexto dos projetos
de vida das pessoas e nas estruturas
que conectam meios e fins (NUTTIN,
1983; SAMPAIO, 2010). É importante
compreender, nesses termos, o dinamismo
Saiba Mais do processo motivacional em uma
Figura 2: Metodologia da Entrevista Motivacional. Fonte: Miller e
metodologia PARR Rollnick (2013), adaptado por SEAD-UFSC (2018).
perspectiva temporal (FERNET, 2013).
O acrônimo de PARR (em inglês, OARS) Dentre as dificuldades reconhecidas,
também pode ser visto como: P: perguntas
abertas; A: afirmar – reforço positivo; R: Diversos trabalhos apontam para uma das principais é em relação ao
refletir; R: resumo. (MILLER, W. R.; ROLL- resultados satisfatórios e positivos em facilitador. O facilitador é o profissional
NICK, S. Motivational Interview: helping
people change. 3. ed. New York: The Guil- contextos em que a EM é utilizada no de saúde que avalia e aborda a pessoa.
ford Press, 2013). início do tratamento. Essa ferramenta Esse profissional pode tanto acelerar o
pode produzir resultados rápidos, mas processo de mudança, fazendo com que
outros estudos demonstram que esses a pessoa transite nas diferentes fases
resultados tendem a diminuir após 12 e mude seu comportamento, quanto
meses e, por causa disso, essa ferramenta desacelerar o processo. Tal cenário
tem sido modificada e aperfeiçoada. depende da atitude do profissional frente
Como visto anteriormente, a à pessoa que avalia. Vejamos a seguir.
motivação da pessoa, hoje em dia, vem

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Atitudes que podem
contribuir favoravelmente
para os bons resultados:

ter uma postura acolhedora;

desenvolver uma escuta empática e atenciosa;

mostrar-se autenticamente interessado em


compreender a pessoa e ajudá-la ativamente;

contribuir favoravelmente para se alcançar bons


resultados com pessoas acometidas por um
transtorno por uso de substância.

Figura 3: ilustração com um usuário do serviço de saúde com um profissional, ao lado texto com atitudes que podem contribuir
favoravelmente para os bons resultados. Fonte: SEAD-UFSC (2018).

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Reflexo Corretor peculiar e, por esse motivo, requer que o profissional não pode aconselhar
Faz contraposição a esse tipo de intervenções específicas. ou fornecer informações às pessoas. As
abordagem uma atitude do profissional de pessoas ambivalentes, quando expostas
saúde pautada em críticas, julgamentos, Abordagem motivacional a uma abordagem completamente não
confrontação, ironia, coerção ou Numa abordagem motivacional, o diretiva, podem se sentir confusas ou
imposições, pois sabe-se que esse tipo de profissional de saúde deve dialogar e inseguras.
comportamento aumenta a resistência à compreender quais são os aspectos
mudança e diminui as chances de adesão e positivos e negativos que a pessoa avaliada Entrevista motivacional
de sucesso a um tratamento. Esse segundo obtém com o uso da droga. Começar A EM encoraja os profissionais a fornecerem
tipo de postura é chamado de “reflexo conversando sobre os aspectos positivos informações e conselhos, principalmente
corretor”, que deve ser evitado sempre que ou desejáveis do uso de drogas é também quando requeridos pelas pessoas assistidas,
possível na interação com as pessoas que uma forma de diminuir a resistência à o que deve ocorrer em contextos em que
estão em tratamento. abordagem e de demonstrar empatia estes aconselhamentos sejam importantes e
e aceitação na compreensão de quais complementares ao processo de construção
Estratégias profissionais fatores positivos fazem a pessoa manter e de descoberta por parte de cada sujeito. No
Assim, cabe aos profissionais saber o uso de drogas. Essa abordagem ajuda entanto, é fundamental ter cautela para não
reconhecer a fase do processo de o paciente que possui um transtorno por se enveredar para o caminho de persuasão
mudança em que a pessoa avaliada está uso de substâncias a ganhar consciência e da pessoa. A informação e o aconselhamento
e as estratégias para ajudá-la a transitar a refletir sobre seu uso de drogas, e essa (sempre com permissão) devem funcionar
dentro dessas etapas de maneira mais tomada de consciência visa favorecer, com como um dos ingredientes para a mudança.
rápida e eficaz. A EM entende que o tempo, a própria pessoa a argumentar
o manejo de situações envolvendo a favor da necessidade de mudar seu
pessoas ambivalentes no auxílio ao comportamento de uso. Nesse cenário,
movimento para a mudança é bastante percebe-se como é errônea a crença de

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4. Quadro comparativo das as abordagens de linha psicanalista
terapias psicológicas e comportamental, considerando o
contraste existente entre essas técnicas.
As técnicas da Entrevista Motivacional Como exemplo prático, podemos
Para Refletir
que estão sendo apresentadas ao longo mencionar que existem pessoas que irão
Agora, pensando nos casos de Luiza, Gui-
deste curso são diretivas e objetivas, ter um excelente resultado através de
lherme e Vitória, procure distinguir em
qual estágio cada um se encontra. Reflita e podem ser aplicadas por qualquer técnicas comportamentais, como nos
sobre as características de cada estágio e
profissional de saúde treinado. grupos de mútua ajuda. Outras podem
sobre como a motivação seria abordada
durante o acolhimento. Aqui destacamos, por meio de um se beneficiar destes apenas quando
quadro comparativo, a ideia de que, a estiverem motivados para mudança. E
depender do estágio em que o usuário existem outras pessoas que somente se
se encontra, algumas terapias podem ser conduzirão por meio de estratégias de
mais adequadas que outras, considerando Redução de Danos.
possíveis encaminhamentos para tratar Essa singularidade é a ferramenta principal
a síndrome da dependência como um que o profissional deverá levar em conta ao
todo. Nesse sentido, é fundamental ter em aconselhar um tipo de intervenção. Mesmo
mente um leque de opções que pode ser que o desejo seja para a abstinência completa
oferecido à pessoa a cada novo retorno. e a recuperação em todos os campos da vida
A mudança de comportamento pessoal, é importante ter em mente que a
varia em sua técnica e em seu modo de recuperação é um percurso único e tortuoso,
aplicação, mas possui o mesmo ideal, mas possível e que deve ser encorajado.
ou seja, a melhoria da qualidade de Apresentamos, nesse contexto, as
vida e a redução dos comportamentos principais ferramentas psicológicas
prejudiciais. Destacamos, nesses termos, que podem ser utilizadas para elaborar

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Um ponto importante a ser enfatizado
é a linha temporal que relaciona as
diferentes técnicas no desenvolvimento
da recuperação, indo desde a Redução
de Danos até a manutenção da
abstinência. Isso deve ser sempre levado
em consideração, já que a trajetória de
melhora não é linear, mas sim um processo
singular a ser gerenciado por cada pessoa,
considerando as diferentes necessidades
nas etapas da recuperação.
Partindo do que foi apresentado
no Módulo 1, a representação a seguir
ilustra como as diferentes técnicas devem
ser usadas de acordo com o estágio
motivacional. É comum, para fins didáticos,
abreviar os estados de motivação para
quatro, mantendo, no entanto, a ideia do
espiral de evolução para mudança.

Quadro 1: Principais ferramentas psicológicas. Fonte: SEAD-UFSC (2018).

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Em todo o percurso, a Entrevista
Motivacional deve estar presente. Para
tanto, devemos falar sobre os princípios
motivacionais, que podem ser organizados
em estratégias que favoreçam:

1) adesão ao tratamento;
2) tomada de decisão de mudar;
3) resultados obtidos com a intervenção.

Esses princípios podem ser descritos a


Figura 4: Diferente técnicas e estágios de mudança no desenvolvimento da recuperação dos sujeitos em situação de abuso de álcool ou
outras drogas. Fonte: SEAD-UFSC (2018). partir do acrônimo “ABCDEFGH” e estão
sumarizados no quadro a seguir.

22
Quadro 2: estratégias motivacionais eficazes. Fonte: Parada (2017), adaptada SEAD-UFSC (2018).

23
5. Manejo de situações adversas sugerir a possibilidade de manter o
uso de álcool, mas considerando outra
Quando estamos tratando de mudanças maneira de consumi-lo, o profissional
de hábitos em pessoas com dependência deverá ponderar se para aquele paciente
Para Refletir
de álcool e/ou outras drogas, é sabido essa é a melhor estratégia a se seguir
Pensando nas Histórias da Luiza, do
que a disposição para realizar a mudança naquele momento. Levando em
Guilherme e da Vitória, é possível notar
quais são as maiores barreiras para a im- de hábitos é identificada em estágios. consideração o estado motivacional, os
plementação dessas ferramentas apresen-
Eles podem ser identificados nas pessoas prejuízos avaliados e as possibilidades
tadas em cada caso?
desde o primeiro contato ou primeiro que a pessoa apresenta, podem, nesse
acolhimento. Observa-se que as pessoas contexto, decidir qual seria a melhor
estão em algum momento de reflexão opção, desde a autorização para um
relativo a uma ação de transformação consumo com estratégias de Redução
em seu estilo de vida. de Danos até condução da pessoa a
Para conseguir identificar e elaborar outras alternativas.
estratégias para a pessoa, um dos
fundamentos da EM é a confecção de
A estratégia deve ser constantemente re-
um plano de ação. Esse plano deve ser
visada. Não há percurso de recuperação de
elaborado a partir dos elementos que uma síndrome de dependência sem desa-
fios e sem a necessidade constante de mo-
forem expressos pela pessoa que busca nitoramento dos resultados. Portanto, o
ajuda no momento da conversa. Cada fracasso pode ser um dos estados naturais
da evolução em busca da recuperação
uma das possibilidades deve, contudo,
passar pelo crivo técnico do profissional.
Dessa forma, por exemplo, quando
uma pessoa com dependência de álcool

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Cabe dizer que também é papel do Nesse contexto, podemos considerar alguns Em consonância com essa discussão,
profissional monitorar para que os passos questionamentos que são corriqueiros: entendemos que:
decididos pela pessoa não a levem a um


risco iminente, relativo a sua integridade ou “Mas se podemos revisar o plano traçado, e
a de terceiros. Você pode até se questionar até mesmo usar dos erros no próprio projeto Um plano terapêutico, no
se o risco não está sempre rondando quem de recuperação, quando de fato podemos contexto da dependência química,
é eficiente quando a pessoa tem a
já desenvolveu uma dependência de uma
substância. E é importante estar ciente de
que esse risco está mesmo presente, mas
afirmar que a estratégia deu errado?”

“Mas, então, pode se pedir uma internação



certeza de que encontrou o local
ou profissional aos quais poderá
recorrer independente do que
o profissional que desenvolveu um bom involuntária?”
acontecer (MOREIRA, 2016).
vínculo com essa pessoa deve ser capaz
de convidá-la para revisar a estratégia Para responder a essas perguntas,
tomada quando o risco se colocar de forma devemos levar em conta uma discussão Se considerarmos a afirmativa acima,
iminente, ou até mesmo colocar limites para mais aprofundada devido à polêmica que haverá falha quando: a pessoa não se
preservar a pessoa. ela carrega em si. É fundamental retomar, sentir acolhida; não puder recorrer ao
nesses termos, a Lei 10.216, de 2001, mesmo local devido a exigências feitas
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ pela equipe; ou quando afastarmos a
leis_2001/l10216.htm> uma vez que é possibilidade da mudança do estado de
ela que rege a questão das internações motivação da pessoa.
em saúde mental, álcool e outras drogas, Como já foi visto no Módulo 1, as
assegurando direito e proteção. É pessoas que sofrem com esse tipo de
importante que fique claro que existem transtorno, na maioria das vezes, possuem
tipos e critérios para a internação, e, outra comorbidade. Isso quer dizer que é
conforme a lei, esta deve ser a última opção. possível que se estabeleça uma chance de

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haver impulsividade, oscilação do humor de dependência na vida de seus familiares
ou um transtorno de personalidade que se Não permitirei que atue dessa e daqueles que são afetivamente mais
maneira; eu quero te ajudar, mas,
traduza em um momento de insatisfação e
conflito com o profissional.
Nesse sentido, cabe ao técnico

enquanto estiver assim, não vou
poder fazer nada por você. Vou te
esperar aqui hoje mais tarde, desde
próximos. Essa constatação reflete
a realidade da prática de diferentes
profissionais, que muitas vezes são
preparar-se para não repetir aquilo que a buscados por familiares ou amigos das
pessoa obtinha costumeiramente como que volte sem esse comportamento. pessoas que estão com um problema.
resposta a esse tipo de comportamento:
ao invés de rechaçar a pessoa e repreendê- Esse é, portanto, um exemplo que Codependência
la, deverá identificar o comportamento e, ilustra uma situação de sucesso em um A codependência é a manifestação de
se possível, colocar limites. acompanhamento. Apesar do aparente sintomas de ansiedade, de vigilância e de
Por exemplo: um paciente fica fracasso devido à crise, o manejo dela prejuízo da vida cotidiana em detrimento
agressivo e quebra os móveis de um foi eficiente. E crises em dependência do que o familiar do dependente químico
Centro de Atendimento Psicossocial química são regra. está fazendo. Assim, o familiar acaba
(CAPS) após não conseguir a receita desenvolvendo uma “dependência” por
de um medicamento que pediu. 6. Confiança e importância conta do comportamento daquele com
O assistente social, que já havia feito da motivação quem ele se preocupa e convive.
o vínculo com o paciente, pode tentar
contato, estabilizar o ambiente e colocar Uma das descobertas do II Dilema
um limite claro à situação: Levantamento Nacional de Álcool e Chegamos aqui a um dilema comum visto
Drogas (LENAD, 2012), <http://inpad.org. nas práticas clínicas: a mãe ou esposa chega
Se você mantiver esse comportamento, br/wp-content/uploads/2014/03/Lenad- ao serviço de saúde e conta todo o histórico
nós vamos pedir para que você saia e volte II-Relat%C3%B3rio.pdf>, refere-se às de como o familiar está em processo
quando se acalmar. influências de uma pessoa com a síndrome contínuo de uso de substâncias psicoativas.

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O profissional deve ter a sutileza de iniciar deprimido ou ansioso possa agir a favor
o tratamento por quem está motivado, com de uma mudança de comportamento.
vistas a mudar o cenário no qual a pessoa Isso porque talvez o sujeito possa estar
vive; contudo, muitas vezes o familiar ou o desenvolvendo esses sintomas ao refletir
Para Refletir
amigo não é instruído adequadamente, e sobre os problemas causados pelo uso
Agora, pensando nas Histórias da Luiza, do
realiza ações ou comandos que, ao invés de da droga e considerar a possibilidade de Guilherme e da Vitória, você conseguiria
ajudar, prejudicam a mudança de hábitos. mudança. Mas esses sintomas podem propor um plano estratégico de motivação
para seus respectivos familiares/amigos
agir também contra a mudança, já que que possa instruí-los a ajudar cada um de
Técnicas podem estar associados a sentimentos nossos personagens?
Tendo em vista todas as técnicas para de desesperança frente à vida e à
o desenvolvimento da empatia, é incapacidade de manejar a situação.
fundamental o esclarecimento de que a
postura do profissional perante aqueles Percepção
que podem auxiliar no processo é muito Igualmente, um sujeito com grave
relevante, a fim de conduzir ativamente dependência da droga tanto pode
a pessoa para um processo de mudança. estar motivado para mudar seu
Nesse sentido, outro ponto de atrito na comportamento, por causa da percepção
confiança seria a solicitação, por parte dos danos que a droga causou em sua vida
do empregador, de uma alusão sobre ao longo do tempo de uso, como também
o estado de saúde da pessoa. Com pode não conseguir imaginar uma vida
isso, estaríamos afirmando que o fato sem a droga, já que o consumo passou a
de alguém estar, por exemplo, muito ser parte inerente de seu estilo de vida.

27
RESUMO DO CAPÍTULO

A Entrevista Motivacional é uma estratégia fundamental utilizada nas


diferentes fases de acompanhamento das pessoas com transtornos
por uso de substâncias psicoativas. nesse capítulo, vimos que, para
ajudar nos casos de Guilherme, Vitória e Luiza, existem muitas
abordagens técnicas as quais podem ser pensadas e utilizadas em
um Plano de Ação, objetivando provocar uma mudança de hábito
por parte do paciente. A empatia, a escuta reflexiva e a ajuda ativa
são algumas das abordagens que devem ser levadas em conta no
seu dia a dia. Devemos, nesses termos, compreender o surgimento
dos principais modelos e estudos para que fique claro como se
consolidaram as principais técnicas utilizadas, como o uso da
Terapia Cognitivo-Comportamental, da Entrevista Motivacional e
da Prevenção de Recaída. Destacou-se, nesse contexto, o modelo
transteórico, que foi o principal estudo norteador desta temática,
o qual identificou que automudanças bem-sucedidas dependem da
realização dos processos nos estágios corretos. Importa enfatizar que
cada estágio de mudança possui características ímpares.
Os profissionais devem ter confiança e clareza para saber identificar
em qual estágio se encontra o paciente. É fundamental, assim,
ter a capacidade de se trabalhar ao longo de todo o processo de
acompanhamento, compreendendo que se pode utilizar a Entrevista
Motivacional durante todas as idas e vindas dos estágios de mudança
que o paciente apresentar. Ressaltamos que impulsionar a mudança
de hábito em dependentes não é uma tarefa fácil, para tanto a
entrevista com motivação, pautada em deixar o paciente à vontade
para se expressar e ter um diálogo aberto por meio de perguntas
abertas, é importante para se conquistar um bom relacionamento
e ajudá-lo da melhor forma possível. Em momentos críticos, de
situações adversas, o profissional deve ter sensibilidade para rever
a estratégia e continuadamente realizar o monitoramento dos
resultados. Não obstante, a família e os amigos também necessitam
de cuidados, pois, na maioria dos casos, é possível constatar a
codependência e o dilema moral vivenciados por diversos familiares
e observados nas práticas clínicas. A postura profissional deve se
basear na empatia, pautada na confiança criada entre paciente,
familiares e amigos, de forma que se esteja preparado nos casos em
que é necessário o manejo de situações adversas. Perceber o outro
em toda a sua complexidade requer escutar ativamente o paciente e
captar seus sentimentos, emoções e problemas. O técnico que fizer
o acompanhamento deve estar disponível para, apesar de pontos
de vista contrários ou opiniões divergentes do usuário, conseguir
caminhar para a melhor compreensão da situação e um planejamento
conjunto de ações de sucesso.
CAPÍTULO 2
PRINCÍPIOS DA ENTREVISTA MOTIVACIONAL

Ao final deste capítulo, você poderá compreender e aplicar, na


prática clínica, as principais ferramentas da técnica de Entrevista
Motivacional. Como vimos no Módulo 1, essa abordagem vai muito
além de simplesmente motivar a pessoa para uma mudança.
Ela utiliza mecanismos fundamentados em evidências científicas,
que efetivamente trazem a pessoa para o protagonismo da mudança.
Ao contrário do que naturalmente ocorre dentro do contexto
familiar, espera-se do profissional que lida com pessoas que tenham
problemas relacionados ao uso de substâncias que ele não repita o
que a pessoa já ouviu em casa, como simplesmente dizer para cessar
o uso ou mesmo alertar sobre os riscos. Essas orientações podem até
ser incluídas em um leque de opções, porém no momento correto e
com a consciência de que a escolha deve ser do paciente.
Dessa forma, você conseguirá distinguir o estado motivacional
em que a pessoa se encontra, compreenderá e poderá aplicar os
princípios da empatia, de como transpor e fluir com a resistência,
de como gerar um ambiente sigiloso e seguro, e, sobretudo, como
conseguir ser um catalisador da mudança rumo à redução ou cessação
do uso problemático de substâncias psicoativas.

30
CAPÍTULO 2
PRINCÍPIOS DA ENTREVISTA MOTIVACIONAL

Seções de estudo:
1. O que é a Entrevista Motivacional?
2. Expressando a empatia
3. Escuta reflexiva
4. Desenvolver discrepância
5. Como lidar com a resistência?
6. Evitar confrontos diretos
7. Aconselhamento
8. Reforçar a autoeficácia
9. Dar feedback

31
1. O que é a Entrevista Motivacional pessoa vive e trabalha. Levam-se em
conta, nesse cenário, os fatores sociais,
Como visto no Módulo 1, uma avaliação econômicos, culturais, étnicos/raciais,
de pessoas que fazem uso de drogas psicológicos e comportamentais que
deve sempre considerar os aspectos exercem influência no desenvolvimento Para Refletir
individuais, os aspectos clínicos, de problemas de saúde, e fatores de
Você já fez uso dessa técnica? Procure refle-
laborais, familiares e do meio social do risco à população, tendo como exemplo tir sobre o que essa experiência apontou em
local onde a pessoa avaliada reside. moradia, alimentação, escolaridade, relação a potencialidades e dificuldades.
O profissional de saúde é a peça- renda e emprego (BUSS; PELLEGRINI
chave no curso clínico da pessoa em FILHO, 2007).
tratamento. Assim, dependendo de
como é feita a condução clínica, quando Resgatando o exposto no capítulo Na Entrevista Motivacional existem
se opta pela Entrevista Motivacional, o anterior, a Entrevista Motivacional seis princípios fundamentais. São eles:
profissional pode acelerar ou regredir é um estilo de aconselhamento
o processo de mudança de hábitos da diretivo centrado na pessoa e tem
1 – expressar empatia;
pessoa em atendimento. como escopo estimular a mudança
Nas três histórias apresentadas do comportamento, permitindo que 2 – desenvolver discrepâncias;
neste curso, verificamos situações com as pessoas explorem e resolvam 3 - gerir a resistência às mudanças;
diferentes elementos pessoais que suas ambivalências. Desse modo, é
4 – evitar confrontos diretos;
envolvem determinantes sociais da importante ter em mente a necessidade
saúde. De acordo com a Organização de colocar a pessoa em movimento no 5 – promover a confiança e a capacidade
do usuário;
Mundial de Saúde (OMS), os caminho para a mudança. A estratégia
determinantes sociais da saúde estão é encorajá-los, escutá-los e aumentar a 6 – realizar perguntas abertas.
relacionados às condições em que uma motivação para a mudança!

32
Neste momento, iremos explorar com o profissional. E, para a Entrevista mais empático. Além disso, a longo prazo,
esses princípios e, ao final, refletir como Motivacional, isso é fundamental do início observa-se uma tendência maior para a
podemos praticar cada um desses pontos ao fim de cada atendimento. mudança de comportamento das pessoas
da melhor maneira nas Histórias de Luiza, que são tratadas com empatia. Portanto, a
Vitória e Guilherme. empatia é uma habilidade específica que
Pensando nas Histórias de Luiza, Vitória
e Guilherme, como treinar e expressar a pode ser treinada e aprendida diariamente
2. Expressando a empatia empatia? com a finalidade de compreender o outro,
mesmo não tendo a experiência pessoal
A empatia deve estar presente ao daquelas situações que se ouve.
longo de todo o processo. O princípio da Um dos movimentos que iremos ver em Você não precisa ter passado por
empatia se baseia na aceitação. Expressar seguida é o processo de escuta reflexiva. situação semelhante às histórias de Luiza,
a empatia significa transmitir respeito e Os profissionais devem proceder, em um Vitória e Guilherme, por exemplo, para
interesse àquela pessoa com a qual se primeiro passo, pensando reflexivamente compreender o que cada dependência
está dialogando. Escutá-la e compreendê- nas situações confrontadas diariamente. significa. É importante que o profissional
la sem juízo de valor ou críticas; embora Essa estratégia deve ser treinada sempre saiba colocar seus argumentos de modo
aceitar não implique que o profissional que possível, o que deve ser desenvolvido muito claro, sempre convidando a pessoa a
deva concordar ou aprovar toda atitude no momento de escuta, de modo que se pensar sobre os assuntos discutidos. Deve-
que a pessoa relata. É permitido, busca ouvir o que o sujeito tem a dizer, se evitar o confronto diretamente com a
nesse âmbito, que o profissional tenha realizando uma reflexão sobre o que se pessoa, tentando realizar afirmações que
outros pontos de vista. O movimento ouviu, sem preconceitos, praticando a aparentam ser mais um palpite sobre o que
de aceitação e de respeito constrói aceitação das informações escutadas. a pessoa diz e não uma pré-concepção,
uma relação saudável com a pessoa Diversos estudos indicam uma tendo em vista que abordagens
e vai influenciar diretamente na sua diminuição da resistência da pessoa por permeadas por confrontos tornam a
autoestima e na confiança dessa relação causa da adoção de um estilo terapêutico pessoa resistente à intervenção.

33
3. Escuta reflexiva “Você realmente tem sofrido com a vida Sugestões de frases que podem ser
que leva.” utilizadas nesse momento são do tipo
A escuta reflexiva é um tipo de “entendo o que você diz”, ou “partindo do
comunicação verbal em que o profissional Ao contrário de: seu ponto de vista”.
reafirma ou faz paráfrases do que a “Você realmente tem sofrido com a vida A escuta reflexiva também é benéfica,
pessoa relata para garantir que ela que leva?” porque é uma forma de o profissional
entendeu o significado e o sentimento continuar a conversa. Se o profissional
da mensagem de partida. A escuta Em todo o processo, o objetivo reflete de forma adequada em relação ao
reflexiva permite ao profissional acolher e do profissional deve ser ajudar o que o paciente diz, ou faz uma pergunta
compreender o ponto de vista da pessoa paciente a passar ao estágio seguinte aberta, o paciente estará apto a falar
sem necessariamente concordar com ela. da modificação e estabelecer metas mais e oferecer mais retorno sobre o
Deve-se compreender os sentimentos alcançáveis, que, por fim, irão resultar assunto. Lembrem-se de que o paciente
sem julgá-la, criticá-la ou culpá-la. na interrupção da dependência química é capaz de apresentar soluções para os
Talvez possa parecer fácil e natural e, consequentemente, na abstinência problemas apresentados.
ter uma escuta reflexiva, contudo essa permanente.
estratégia requer uma atenção ímpar Um dos benefícios da escuta reflexiva 4. Desenvolver discrepâncias
a cada nova afirmação da pessoa. No é ter a sensação de validação. Um
que se percebe em relação ao que foi exemplo desse momento refere-se ao Um ponto importante dentre os princípios
dito, o profissional retorna à pessoa com momento em que o paciente reflete da Entrevista Motivacional refere-se
uma afirmação e não uma pergunta. sobre o que ele ouviu e consegue à apresentação do paciente acerca da
Um exemplo utilizado por Moreira representar de forma precisa o que o discrepância entre o seu comportamento,
(2012), para que fique clara a diferença, profissional está a lhe dizer. Dessa forma, suas metas pessoais e seu pensamento
é que na afirmação o tom de voz desce quando se consegue uma validação, é sobre o que poderia ser feito. Para ajudá-
suavemente ao final: possível criar laços e respeito mútuo. lo, uma estratégia possível é realizar uma

34
comparação entre onde o paciente está e a diferença entre onde se está (ou que
onde ele gostaria de estar, tendo em vista caminho está seguindo) e onde quer
que, não raro, existe uma discrepância chegar. Quando seu comportamento
entre esses dois lugares. Muitas vezes, atual é confrontado com isso, é provável
Para Refletir
perguntar ao paciente como ele se que a mudança aconteça. Muitas pessoas
Muitos pacientes irão questionar ou refutar
imagina daqui a algum tempo, além de que buscam algum tipo de ajuda já
as propostas de mudança sugeridas pelo
conversar sobre o que ele está fazendo percebem alguma discrepância relativa profissional. É importante lembrar-se de
que a decisão de mudança é do paciente, e
para atingir as metas propostas, é uma ao caminho percorrido. Nosso objetivo
não do profissional. Então, como podemos
estratégia para que ele entenda o todo. como profissionais então é ampliar lidar com esses problemas tão frequentes?
Assim, o princípio da discrepância baseia- esta discrepância até que o apego ao
se em ampliar as diferenças entre o comportamento atual seja suplantado.
comportamento presente, que pode estar É preciso lembrar mais uma vez que
sendo prejudicial, e as metas, de forma as pessoas, com frequência, são mais Primeiro passo
que a mudança se torne importante para persuadidas pelo que ouvem delas mesmas O primeiro passo é entender que a
o paciente. do que pelo que os outros lhes dizem. ambivalência e a resistência para a
Em geral, as pessoas têm como mudança de comportamento são condições
metas a saúde, o sucesso, a felicidade 5. Como lidar com a resistência? comuns para todas as pessoas. Por
da família e uma autoimagem positiva. exemplo, suponha que um amigo sugira
O ponto principal nessa abordagem A resistência pode acontecer de modo que você pare de beber, porém você não
deve ser o de confrontar o paciente natural se a pessoa acreditar que sua consegue abster-se completamente.
com sua realidade desagradável, e isso dependência não está lhe afetando ou Provavelmente, você resistirá em diversas
quer dizer falar sobre a diferença entre causando mal. ocasiões, mas eventualmente poderá vir a
seu comportamento atual e suas metas tomar um copo de alguma bebida alcoólica
mais amplas na vida; em outras palavras, uma vez no mês. Em paralelo, uma pessoa

35
dependente de substâncias também sentimento de comprometimento, assim, a de aconselhamento ativo) de fumar
poderá achar um tanto quanto exageradas pessoa buscará realizar os primeiros passos em horários que não prejudiquem seu
algumas mudanças propostas pelos rumo à mudança do comportamento. rendimento em sala de aula. Na verdade,
profissionais, pois ela não enxerga, nesse as sugestões partirão da escuta empática
momento, os benefícios de se ter uma vida de diversas respostas às perguntas que
E caso o paciente continue resistente?
ausente de uma droga, seja ela lícita ou não. O que o profissional pode fazer? o profissional fará de maneira aberta.
Voltaremos a esses pontos mais adiante.
Segundo passo
Ainda sobre esse tema, segundo o princípio Em muitos casos, a resistência 6. Evitar confrontos diretos
da resistência, as declarações que um persistirá. Por isso, o profissional deve
paciente oferece podem ser parcialmente ter em mente que é comum ter que Uma das atitudes que os profissionais
reformuladas de maneira que se criem conviver com a resistência e que, nesses precisam ter constantemente quando
novos incentivos de mudanças. Fluir com casos, deverá abrir a possibilidade lidam com pessoas com dependências
a resistência significa saber reconhecer o para estratégias condizentes com é evitar abordar diretamente o seu
momento do paciente e usá-lo para auxiliá- períodos pré-contemplativos, como comportamento, pois isso pode provocar
lo na resolução de sua ambivalência. é o caso da estratégia de Redução aumento da resistência.
Portanto, o profissional deve construir de Danos. Um exemplo seria, através Às vezes, pode acontecer que um
em conjunto com o paciente considerações da empatia, reconhecer que a pessoa ou mais profissionais tenham crescido
sobre novas informações e alternativas não cogita parar com o consumo, mas ou vivenciado situações em suas vidas
quanto ao uso de substâncias psicoativas. Em possivelmente identifica situações que pessoais em que o problema do uso de
momento algum, deve-se impor algo, pois podem mudar sua relação com o uso drogas estava presente. A experiência
cada pessoa é uma rica fonte de soluções da droga. No caso do Guilherme, por vivida pode provocar o desenvolvimento
para os seus próprios problemas. O objetivo, exemplo, ele pode aceitar uma sugestão de atitudes por parte desses profissionais
portanto, é provocar no paciente um (aqui, sugestão é entendida como técnica que sejam rígidas e preconceituosas e,

36
se não forem sensibilizadas, podem ser do usuário e acreditar que ele é capaz determinadas avaliações podem gerar
projetadas em pacientes como Luiza, de mudar. Mais do que dar conselhos efeitos negativos, como o pensamento
Vitória ou Guilherme. Nesse sentido, que levem em consideração a visão de ter um corpo mais resistente, poder
identificar o que se pensa e se sente em do profissional, é importante que esse usar mais e não voltar a procurar aquele
relação ao uso e ao usuário pode ajudar a aconselhamento seja pautado em serviço/profissional. Aconselhar pessoas
desenvolver atitudes mais flexíveis. evidências científicas. Pode ser tentador com problemas relacionados ao uso
Para evitar confrontos diretos, sugerir algo que pessoalmente julgamos de drogas é um passo necessariamente
também devemos lembrar que os eficaz, como por exemplo sugerir leituras posterior ao estabelecimento do vínculo
usuários são livres para decidir o que o de que gostamos ou atividades que podem de confiança e empatia.
profissional lhes oferece, e, em relação às ser boas na nossa experiência pessoal.
opiniões oferecidas, estas podem ser ou Nesse contexto, não cabe nossa
É essencial que o profissional consiga
não aproveitadas. percepção ou julgamento da melhor dica promover a confiança e a capacidade do
a ser dada, o que devemos considerar usuário em atendimento.

é o que está respaldado na literatura e


Contudo, o profissional deve considerar
que, se houver o aparecimento de resis- que leve em conta e faça sentido para a
tência, este é um indicador de reflexão
história da pessoa. Alguns profissionais O profissional deve ser capaz
para mudança de estratégia. E quais se-
riam as opções? costumam amedrontar os pacientes de orientar claramente o paciente.
dizendo que os exames estão ruins Ajudá-lo a identificar o problema ou a
e que, caso a pessoa não interrompa área de risco, explanar as razões de a
7. Aconselhamentos imediatamente o consumo, irá morrer mudança ser importante, defendendo
ou ter uma doença grave. Esse é o ou recomendando, nesse contexto,
No que diz respeito aos aconselhamentos, exemplo do que não fazer. Muitas vezes, mudanças específicas que devem ser
o que queremos indicar aqui é a a pessoa mantém o uso, e a previsão não alcançáveis.
capacidade de reforçar a confiança se realiza, de modo que, nesses termos,

37
É importante nesse cenário destacar de vida que o paciente possua. Afinal,
alguns elementos negativos que devem ser o mundo é diverso e devemos acolher
elencados para permitir maior efetividade toda forma de vivência e cultura. Diante
no tratamento e acompanhamento aos Medo: profissionais mais tímidos e de qualquer suposição, devemos, como
dependentes de substâncias psicoativas. retraídos podem se sentir incomodados profissionais: i) reconhecer que se trata
Estes elementos devem ser reconhecidos por comportamentos hostis de pacientes, apenas de uma suposição; ii) não assumir
e trabalhados para evitar prejuízos ao o que pode acontecer principalmente uma suposição como fato consumado;
longo do cuidado aos pacientes. quando estes são pressionados ou iii) checar se as suposições possuem
Em relação ao profissional: se sentem intimidados. Esse tipo de algum fundamento.
comportamento manifestado não é
contra o profissional em si. Deve-se 8. Reforçar a autoeficácia
ter em mente que isso é resultado de
o paciente querer expressar desacordo Expressar a empatia, desenvolver a
Atitudes negativas: superar o imaginário ou descontentamento por estar em uma discrepância, evitar a argumentação e
social que considera os usuários de drogas situação desconfortável ou em que ele acompanhar a resistência dos pacientes
como sujeitos imorais, sem caráter, sem esteja sendo contrariado. são estratégias profissionais que podem
força de vontade, perigosos ou outras auxiliar o usuário a visualizar que ele tem
características que são atribuídas ao tema um comportamento que pode produzir
e ao usuário. Esse tipo de pensamento sérios problemas de saúde. Entretanto,
pode resultar em estigmatização e algumas vezes, essas ações podem não
hostilidade com o paciente, fato que Pressuposições: ocorre quando os ser eficientes para a história do paciente
não o ajudará na busca pela mudança e profissionais reagem e se expressam e este pode continuar sem esperança de
motivação, afastando-o da possibilidade com base na aparência física, modo de mudança, contribuindo para que as coisas
de tratamento. se vestir, forma de falar ou tipo de estilo permaneçam como estão.

38
Quando essa situação é constatada, propostas, pois assim ele se sentirá mais principais tarefas do profissional.
uma possibilidade é a autoeficácia. confiante e fortalecido. Neste momento, é importante
Estratégia que é definida como a crença Ressalta-se a importância, ainda, de um monitoramento e, inclusive, um
da própria pessoa em sua habilidade se perceber a baixa autoestima e baixa automonitoramento do paciente. Para
de enfrentar uma tarefa ou desafio autoeficácia por parte do paciente, auxiliar nessa técnica, o profissional
específico, é considerada como elemento- considerando sua imagem de si. Muitas deve ajudar o paciente a estabelecer
chave no processo de motivação para a vezes, nessas circunstâncias, o paciente metas bem delimitadas que facilitem a
mudança, sendo um bom fator preditivo pode achar que seus pontos de vistas e mudança. As metas devem ser realistas
relativamente ao sucesso do tratamento. desejos não são levados em consideração. e alcançáveis, senão pouca ou nenhuma
Dentre alguns exemplos que mudança será observada.
promovem a autoeficácia, tem-se a 9. Dar feedback O feedback e as metas são ferramentas
ênfase na responsabilidade pessoal, a para criar motivação para a mudança.
qual se pauta na ideia de que ninguém O retorno ou feedback deve ser sempre Uma técnica recorrente é a
mais poderá fazer a mudança senão a realizado pelo profissional e apresentado formulação de perguntas abertas pelo
própria pessoa. Uma outra alternativa para o paciente a cada novo encontro. profissional. Uma pergunta aberta,
é que o paciente seja encorajado pelo O feedback refere-se ao estágio em que colocada de forma genuína, sugere que
sucesso de outros. Outra abordagem que a pessoa está e o objetivo que ela quer o profissional está aberto a qualquer
se pode pensar é que o profissional faça a atingir nesse processo. Em diversos casos, resposta. Essa estratégia permite
utilização de estimativas de as pessoas deixam de mudar, pois não que o paciente fale e dê informações
sucesso de outras pessoas. Por fim, recebem retorno suficiente a respeito importantes sobre o que ele pensa.
a cada encontro realizado, o paciente da sua situação naquele momento. Esse momento é especial, já que o foco
deve ser estimulado e encorajado, Proporcionar um feedback claro sobre recai sobre a conquista do paciente de
especialmente quando se supera etapas a situação atual do paciente e indicar conseguir falar mais sobre suas vivências.
suas consequências ou riscos é uma das

39
Isso culminará em uma atmosfera de De que forma...?
aceitação e confiança, pilar fundamental Como se sente sobre...?
para a relação entre o profissional e o Como...?
paciente e para a motivação de mudança. Quando é que...?
Quando se faz perguntas abertas, é Quem...?
importante verificar o estágio motivacional Que importância...?
para abordar o paciente adequadamente. Para que...?
Em outras palavras, se uma pessoa estiver
em pré-contemplação, pode ser útil
estimular a ambivalência, por exemplo:

O senhor me falou do uso da maconha com


grande entusiasmo, fale-me um pouco mais
do prazer e da sensação que ela lhe traz e me
diga o que lhe preocupa quanto a isso?

Abaixo, estão alguns exemplos de


perguntas abertas que proporcionam uma
resposta diferente de “sim” ou “não”:

O que acha...?
O que pensa sobre...?
Como gostaria de ...?
O que sabe sobre...?

40
RESUMO DO CAPÍTULO

Ao longo do que foi estudado aqui, constata-se que a Entrevista


Motivacional é um modelo ímpar muito utilizado pelos profissionais
na prática clínica. O uso dessa ferramenta pode ser muito benéfico
durante o tratamento e pode ser utilizado em todos os estágios,
mesmo quando a pessoa não quer mudar. Assim, o profissional
poderá estar equipado com as técnicas validadas pela ciência para
instruir o paciente no caminho da mudança do comportamento.
Sempre que possível, devemos relembrar os princípios que guiam
a Entrevista Motivacional, para que, quando surgirem casos como
o de Luiza, Vitória e Guilherme, sejamos capazes de atuar de modo
empático, realizando uma escuta reflexiva, sem confrontos, bem como
proporcionar estratégias com metas alcançáveis, criar laços e respeito
mútuo. Em casos em que a resistência persistir, optar por outra
estratégia, por exemplo, a redução de danos. Assim, o objetivo deste
módulo foi capacitá-lo a escutar, encorajar e aumentar a motivação
para a mudança em todos os pacientes que surgirem durante a jornada
profissional ou na vida.
Leituras Complementares

MILLER, W. R.; ROLLNICK, S. Entrevista motivacional. Porto Alegre:


Artmed, 2001.

42
Colocando em Prática

Considerando o que você estudou neste módulo, relate, à luz dos


conhecimentos abordados, o que você acrescentaria na sua atuação
como profissional de saúde? O que essa experiência de estudo
aportou para você de aspectos positivos ou de negativos?
Você avalia que a escolha dessa ferramenta foi adequada?

43
Leonardo Moreira do Distrito Federal (ABRAMER), foi gestor estadual
da Gerência de Saúde Mental da SES- DF, prestou
Graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina da assessoria à Câmara Legislativa do Distrito Federal, além
Universidade de Ribeirão Preto, residente em Psiquiatria de ser convidado para prestar assessoria técnica na feira
pela Secretaria do Estado de Saúde do Distrito Federal BIOEUROPE, em Munique, Alemanha , e de ter atuado
(SES - DF/UNB), especialista em Dependência Química junto a fabricantes de tecnologias relacionadas ao
pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), tratamento de dependência química em Boston, Estados
Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (UNIAD), bem Unidos. Foi gerente e posteriormente gestor estadual
como em Psiquiatria pela Associação Médica Brasileira das Políticas sobre Drogas na Secretaria de Justiça do
(AMB) e pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) Distrito Federal. Presidiu o Conselho de Política sobre
e mestre em Prevenção e Assistência a Usuários de Drogas do Distrito Federal no mesmo período. Também
Álcool e outras Drogas pelo Hospital de Clínicas de Porto foi coordenador do grupo de autores do projeto de
Alegre, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul formação de multiplicadores sociais de ações de apoio
(UFRGS) e Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas aos familiares de dependentes químicos no Distrito
(SENAD). Nas áreas de formação em Psicoterapia, Federal . Assumiu a Coordenação Nacional das pesquisas
possui formação em Psicoterapia Neoreichiana pelo e cursos sobre drogas da Secretaria Nacional de Políticas
Instituto Lúmen de Ribeirão Preto e especialização em sobre Drogas do Ministério da Justiça . Atualmente é
Psicoterapia Cognitiva Comportamental pelo Hospital doutorando em Bioética pela Universidade do Porto-
das Clínicas da Faculdade de Medicina (USP). Foi diretor Portugal e diretor geral do Hospital Psiquiátrico da rede
da Associação Brasiliense de Médicos Residentes SUS do Distrito Federal (HSVP/SES).

44
Referências

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CURSO

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