Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 1017175-
96.2014.8.26.0196, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes DIRETOR DO
DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO ESTADO DE SÃO PAULO - DETRAN e
DIRETOR DA 21ª CIRCUNSCRIÇÃO REGIONAL DE TRÂNSITO, é apelado GUILHERME
GOULART ROSSI.
ACORDAM, em 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de
São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores AROLDO
VIOTTI (Presidente) e JARBAS GOMES.
São Paulo, 20 de setembro de 2016.
OSCILD DE LIMA JÚNIOR
RELATOR Assinatura Eletrônica PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 11ª Câmara de Direito Público
VOTO Nº 20.111
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1017175-96.2014.8.26.0196
COMARCA: SÃO PAULO
APELANTE: DIRETOR DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO
ESTADO DE SÃO PAULO DETRAN E OUTRO
APELADO: GUILHERME GOULART ROSSI
Juiz de 1ª instância: Fernão Borba Franco
MULTA DE TRÂNSITO/SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR
Pretensão de anulação de auto de infração de trânsito e de extinção do procedimento instaurado para suspender o direito de dirigir do impetrante Ausência de prova de que o impetrante conduzia o veículo embriagado Recusa à realização do teste do bafômetro que não pode levar à conclusão de que o motorista estava embriagado Aplicação dos arts. 165 e 277 do CTB - Autoridade policial que se recusou a acompanhá-lo à delegacia de trânsito competente para realização do exame clínico pertinente Inexistência de motivo do ato administrativo Anulação do auto de infração que se impõe - Sentença concessiva da segurança mantida Precedente deste Egrégio Tribunal.
Recurso desprovido.
Trata-se de Mandado de Segurança com pedido de
liminar impetrado por Guilherme Goulart Rossi contra ato praticado pelo Diretor do Departamento Estadual de Trânsito do Estado de São Paulo DETRAN/SP e pelo Diretor da 21ª Circunscrição Regional de Trânsito, pretendendo a decretação de invalidade integral do processo administrativo de imposição de penalidade por infração de trânsito, com a confirmação dos efeitos jurisdicionais da tutela de urgência na sentença de mérito.
A liminar pretendida foi indeferida pela decisão de
fls. 48/49.
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A r. sentença de fls. 118/119 julgou procedente o
pedido e anulou o auto de infração.
Condenou os impetrados ao pagamento das custas.
Inconformado, o Departamento Estadual de Trânsito
- DETRAN interpôs Recurso de Apelação a fls. 121/125.
Alega, em síntese, que para a caracterização da
infração de trânsito na esfera administrativa, recusando-se o motorista a realizar testes e exames, não é necessário o exame médico, pois é legal e legítimo que sejam aplicadas as medidas administrativas quando o condutor não se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput do art. 277.
Aduz, ainda, que não pende nenhuma mácula que
comprometa a higidez do ato impugnado, devendo, pois, permanecer válido em face da presunção de legitimidade e legalidade, bem como de veracidade, que traz como corolário a inversão do ônus da prova.
O recurso foi respondido a fls. 128/132.
É o relatório.
O recurso não deve ser provido.
O impetrante relata que, em 28 de maio de 2014, foi
parado em bloqueio policial realizado na Rua Amaral Gurgel, n° 58, Consolação, na Comarca de Franca/SP, às 23h28min.
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Na ocasião, após o agente de trânsito ter realizado
os procedimentos de consulta da validade e eficácia dos documentos apresentados pelo impetrante, perguntou-lhe se havia ingerido bebida alcoólica.
Ante a resposta negativa, a autoridade perguntou se
ele poderia realizar o teste do bafômetro.
O impetrante se assustou com o pedido, pois havia
vários veículos parados e sendo guinchados naquele momento. Então, ligou para seu advogado para tirar algumas dúvidas quanto à realização do teste.
A autoridade coatora, vendo que o impetrante
estava demorando em sua ligação, não hesitou em lhe aplicar a penalidade de multa, com base na recusa.
Assim, a autoridade policial reteve a CNH do
impetrante, somente liberando-a no outro dia, bem como pediu para que a pessoa que estava com o impetrante no veículo o conduzisse.
O impetrante assevera, ainda, que perguntou ao
policial sobre a possibilidade de ser acompanhado até a delegacia competente para que fosse submetido ao exame clínico, ou exame de sangue, o que foi prontamente negado pela autoridade coatora, sob a alegação de que tinha de continuar a fiscalizar os veículos que por ali passavam.
O apelado, todavia, rechaça veementemente a
imputação realizada pelo órgão de trânsito, eis que de fato não havia consumido naquele momento ou pouco antes qualquer tipo de bebida alcoólica que pudesse caracterizar a autuação levada a efeito e, a par disso, não constou da notificação o instrumento do auto de infração, ou os motivos e os
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fatos correspondentes, que pudessem tipificar a infração de trânsito em
comento.
Esses os fatos aferidos da análise dos autos.
Esclareça-se, primeiramente, que o presente julgado
terá como norte o voto proferido pelo ilustre desembargador Ricardo Anafe, integrante da 13ª Câmara de Direito Público deste Egrégio Tribunal, na Apelação de n° 0009115-08.2015.8.26.0297.
Com efeito, enunciam os arts. 165 e 277 do CTB:
Art. 165. Dirigir sob a influência de álcool ou de
qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:
Infração gravíssima;
Penalidade multa (dez vezes) e suspensão do
direito de dirigir por 12 (doze) meses.
Medida administrativa recolhimento do documento
de habilitação e retenção do veículo, observado o disposto no § 4 ° do art. 270 da Lei n ° 9.503, de 23 de setembro de 1997 do Código de Trânsito Brasileiro.
Parágrafo único. Aplica-se em dobro a multa
prevista no caput em caso de reincidência no período de até 12 (doze) meses.
Art. 277. O condutor de veículo automotor envolvido
em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito poderá ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que, por meios técnicos ou científicos, na forma disciplinada pelo Contran, permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine
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dependência.
§ 1 ° (Revogado).
§ 2 ° A infração prevista no art. 165 também poderá
ser caracterizada mediante imagem, vídeo, constatação de sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora ou produção de quaisquer outras provas em direito admitidas.
§ 3 ° Serão aplicadas as penalidades e medidas
administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.
Verifica-se dos dispositivos legais que a embriaguez
ao volante pode ser comprovada por meio de exame de sangue, bafômetro, exame clínico e outras provas em direito admitidas, que podem ser produzidas com o fito de se constatar notórios sinais de embriaguez apresentados pelo condutor, de modo a admitir, inclusive, a prova testemunhal, filmagens, fotos.
Entrementes, em matéria de embriaguez, há uma
premissa básica a ser observada: de que “ninguém está obrigado a fazer prova contra si mesmo”.
Em outras palavras, o condutor não está obrigado a
ceder sangue, nem a soprar bafômetro, pois são atos que envolvem o corpo humano do suspeito, bem como exigem sua postura ativa.
Assim, havendo recusa, restará o exame clínico,
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geralmente realizado nos Institutos Médico-Legais, ou a prova testemunhal.
Nesse quadro, o motorista que for surpreendido pode
se recusar a fazer duas coisas: exame de sangue e bafômetro; porém não pode se esquivar do exame clínico, pois se isso ocorrer será o caso de observar o disposto no parágrafo terceiro do art. 277 do CTB, que apenas tem pertinência em relação ao exame clínico, pois o reconhecido direito ao exercício de não-autoincriminação não pode fazer com que o indivíduo sofra qualquer tipo de punição.
Na hipótese dos autos, o impetrante recusou-se a
fazer o teste do bafômetro, mas requereu ao agente de trânsito que o acompanhasse até a delegacia de trânsito competente para se submeter ao exame clínico, pedido este que foi recusado.
Destarte, como bem concluiu o ilustre magistrado de
primeira instância:
Não há, consequentemente, motivo do ato
administrativo, ou seja, suficiente comprovação do fato jurídico relevante para a autuação. Em outras palavras, a ré não demonstra que o autor estava, suposta ou efetivamente, embriagado, quando da autuação.
Note-se que eventual presunção de legitimidade dos
atos administrativos prevalece apenas até que o ato seja impugnado pelo particular. A partir daí, cabe à Administração comprovar a ocorrência do motivo do ato, ônus de que não se desincumbiu.
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Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao
recurso, mantida a r. sentença tal como proferida.
Eventuais recursos que sejam interpostos deste
julgado estarão sujeitos a julgamento virtual. No caso de discordância, esta deverá ser apresentada no momento da interposição de referidos recursos.
OSCILD DE LIMA JÚNIOR
Relator
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