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MOTIVAGAO: MITOS, CRENCAS E MAL-ENTENDIDOS Cecilia Whitaker Bergamini” HA um tempo para se admirar do poder persuasivo de uma idéia influente, como hé um tempo para se temer que ela nos sufoque. O tempo de nos preocupar ocorre quando a idéia se expandiu a tal ponto que nem sequer notamos ¢ to profunda se tornam suas raizes que nada mais representa do que o senso comum. Quando as objegdes ndo sao mais respondidas, pois nunca mais foram levantadas, perdemos seu controle: néo sabemos como ela nos pegou. Alfie Kohn RESUMO Assim como muitos outros conceitos em psicologia, é, sem du- vida, curioso perceber como cada um tem opinido formada a res- peito do que seja motivagao. De certa forma, todos parecem saber muito a respeito desse assunto, tomando por base opiniées pes- soais e crengas ja cristalizadas de como agit para motivar as pes- soas, bem como de quais sejam os fatores a considerar como os * Professora do Departamento de Administragao Geral de Recursos Humanos da EAESP/FGV. 70 MOTIVAGAO mais importantes para se conseguir chegar a niveis de maior satis- fag&io motivacional. Nao parece, portanto, que, sob o dominio das especulagées puramente intelectuais ¢ interpretagdes abstratas do comportamento humano, o fenémeno.da motivagao oferega tanta complexidade. Tomando por base os conceitos defendidos por lei- gos no assunto é que se conta atualmente com tantos mitos e ta- bus a respeito daquilo que realmente possa ser a motivacao. O mais interessante é notar que, na maioria dos casos, j4 néo se du- vida que tais julgamentos possam conter algum erro perigoso. As- sim sendo, tais suposig6es foram sendo inquestionavelmente incor- poradas ao acervo da sabedoria popular e atualmente fazem parte de um conjunto de premissas tidas como verdade cientifica. A confusao que se faz, misturando fenémenos heterogéneos a respeito das agdes motivacionais é a causa das grandes duvidas que se tem ao se procurar, na pratica, responder a tantas indaga- gdes quando o objetivo € planejar alguma estratégia realmente efi- az para se conseguir levar as pessoas a maiores niveis de satis- fag&o motivacional seja em que campo for. Assim, a motivacdo tem sido confundida com tipos de comportamentos que em nada se as- semelham aqueles conceitos cientificamente aceitos sobre a moti- vagéo humana. Até hoje, por exemplo, aceitam-se como sindnimo de motivacdo situagdes tipicas de condicionamento, também conce- bido por muitas teorias como motivagao extrinseca. Portanto, espe- cialmente dentro das organizagGes, acredita-se firmemente que, para conseguir que o subordinado faga alguma coisa, basta que sejam feitas a ele promessas de prémio por desempenhos acima do normal e de punigéo por comportamentos inadequados. Este artigo tem como objetivo delimitar claramente 0 dominio de cada um desses assuntos absolutamente diferentes entre si. Para tanto, sera mostrado, em particular, quais so as formas de comportamento que podem ser reconhecidas como realmente moti- vadores e quais aqueles que sdo simples conseqiiéncia da agéo de varidveis existentes no meio ambiente e que nada tem a vor com 0 fenémeno comportamental em questio. Esta confuséo preci- sa ser esclarecida para que se consiga compreender melhor a inte- ragao humana, especialmente nos ambientes de trabalho. MOTIVAGAO: MITOS, CRENCAS E MAL-ENTENDIDOS 71 CONDICIONAMENTO NAO E MOTIVACAO Existem pessoas que afirmam ser necessdrio aprender a moti- var 08 outros, enquanto, por outro lado, acredita-se nao ser jamais possivel motivar quem quer que seja, Essas duas maneiras dife- rentes de pensar ilustram a crenga de que podem existir duas dife- rentes maneiras de justificar as agdes humanas. No primeiro caso, supde-se que a forga que da energia ao comportamento motivado esteja fora da pessoa, originando-se dos estimulos externos. No segundo, subjaz a crenga de que as agdes humanas sao esponta- neas ¢ gratuitas, uma vez que acontecem ou deixam de acontecer de acordo com a energia interior, capaz de levar cada um & acao. Em 1904, Pavlov divulga suas descobertas a respeito do “Re- flexo Condicionado”. O reconhecimento do seu trabalho garantiu- Ihe 0 prémio Nobel de Medicina, fazendo dele o primeiro e grande inspirador das teorias behavioristas. Aliando a comida a um estimulo externo representado pelo som de uma campainha, Pavlov conseguiu que © cdo do seu ex- perimento salivasse mediante apenas esse estimulo externo, sem que Ihe fosse apresentada a comida. Portanto, 0 comportamento de salivar, ao ser ouvido o som, foi estruturado pela metodologia do condicionamento classico. Antes desse condicionamento, 0 som da campainha em nada modificava 0 comportamento habitual de salivagéo do cachorro. Outro nome importante que segue a linha experimental é o de Edward Lee Thorndike que, por volta de 1911, também propée uma teoria sobre condicionamento conhecida como “Lei do Efeito”. Trabalhando com gatos famintos colocados no interior de uma cai- xa especial, Thorndike refere-se & estruturagao de comportamentos especificos ligados ao oferecimento de recompensas externas a determinadas agées. Toda vez que o animal ultrapassasse a porta que o levava a um reservatério de alimento, era assim gratificado pelo mesmo. Segundo a lei do efeito, a personalidade deve ser concebida como fruto da aprendizagem que segue a via dos en- saios e erros. A gratificagao dos ensaios bem-sucedidos faz com que os sujeitos do experimento incorporem tais comportamentos ao seu sistema de habitos. Para as concepcées experimentais, também chamadas de be- havioristas, fica bem claro que; para haver qualquer forma de res-

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