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Introdução
sinalizando, contudo, para o fato de que é na modernidade que ele alcança seu
êxito. No terceiro, apresentaremos algumas reflexões sobre as implicações que
o dualismo homem/natureza aporta à construção de uma Educação Ambiental
consequente no que tange às mudanças que o contexto atual exige.
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A natureza nos contém, nós e nossas obras, daí porque continuamos a existir.
A cultura é uma natureza cultivada, na qual esse produto da natureza, que é o
homem, toma sentido: se a natureza morre, então a cultura, e todos seus
artefatos, morrem também (1997b, p. 15). 3
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pois essa natureza neutra, esse autômato, não tem necessidade dele
(LARRÉRE & LARRÉRE, 1997b, p.84). 7
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como fazendo parte de uma história natural. A alusão que Rousseau faz ao
estado de natureza constitui um recurso retórico que permitiria à humanidade
voltar-se para si mesmo, para seu estado mais primitivo, para sua natureza
genésica, a fim de reinventar seu projeto de civilidade (ROUSSEAU, 1992).
Disso, decorre pensar que apesar das tentativas de se colocar a
natureza num lugar privilegiado, ou ao menos numa posição horizontal em
relação ao humano, o dualismo homem/natureza terminou por triunfar. Não
apenas triunfou, mas, também contribuiu para fundar a mentalidade binária a
partir da qual pensamos e agimos no mundo. Assim, a oposição
homem/natureza se manifesta de outros modos, como por exemplo, pela
oposição homem/mulher, escravo/homem livre, povos de cultura e povos de
natureza.
Assim, as assertivas que sustentam que nossa constituição é biofísica,
que a nossa cultura só se manifesta através de processos biofísicos e físico-
químicos, que o fenômeno social está inscrito em todo sistema vivo e, portanto,
não é uma invenção humana, parecem constituir apenas um conjunto de
afirmações estéreis. Isso porque, embora essas assertivas possam ser
constadas e delas tenhamos evidências empíricas elas ainda não se mostram
capazes de alterar a suposta superioridade do homem em relação as suas
alteridades não humanas.
fato de que tudo que há de mais cultural em nós também é o mais biofísico.
Nascer, morrer, reproduzir, alimentar-se constituem atos profundamente
biológicos, inerentes a todos os seres vivos, que foram, contudo, resignificados
e simbolizados pelas culturas humanas.
Hoje sabemos que somos feitos de processos biofísicos e físico-
químicos, que nossa cultura se manifesta por um corpo biofisicamente
constituído, que os sistemas sociais, a linguagem e a comunicação são
processos profundamente inscritos nos sistemas vivos. Portanto, não é
possível mais sustentar a supremacia humana com base nos argumentos
antropocêntricos que alçaram as sociedades humanas à condição de um
advento prodigioso em relação às outras formas de vida (MORIN, 1975;
MOSCOVICI, 1977). As verdades sobre as quais a suposta supramacia
humana foi forjada e sustentada estão ruindo.
Adepto desse entendimento, Francisco Varela sugere que a relação
entre o interno e o externo, entre a mente e a natureza, entre a vida humana e
as outras formas de vida é absolutamente tênue: “Onde encontramos aqui a
vaidosa distância entre nós e a natureza. Não há distância” (2004, p. 45).
O reconhecimento dessa tênue distância, que cada vez mais só se
mostra possível em termos discursivos, exige uma epistemologia radicalmente
diferente daquela que fundou o dualismo homem/natureza. A concepção que
se tem da vida, sustenta Varela (2004), sobretudo do que é a vida humana e do
lugar que ela deve ocupar, determina a forma como se age em relação às
outras vidas: “Em nossa cultura como um todo – incluindo a ciência – nós nos
vemos como a melhor e única forma possível de seres inteligentes (p. 50).”.
Ou seja, a construção de outra relação homem/natureza demanda a
transformação do modo como entendemos as vidas humanas e não humanas.
Demanda, de um lado, reconhecer como legítima a construção de “uma visão
na qual o conhecimento e o seu universo são tão inseparáveis quanto à
percepção e a ação.” De outro, demanda entender que “Nesta visão de meio-
termo, o que fazemos é o que conhecemos e o nosso mundo é apenas um
entre os muitos existentes (VARELA, 2004, 59).”.
Isso consiste em admitir, como sugere Morin (2003), que não existem
evidências que nos permitam estabelecer as fronteiras que separam o homem
e a natureza. O que há de propriamente humano é o fato de que o humano não
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uma questão meramente de ordem biofísica, como uma crise dos recursos
naturais?
Ou seja, o desafio que se coloca é o de buscar alternativas às
abordagens pragmáticas que pouco contribuem para uma análise mais
profunda sobre a relação do homem com suas alteridades não humanas
(CARVALHO, 2005). As práticas demasiado disciplinares e fragmentárias, tem
se mostrado pouco eficientes para provocar mudanças comportamentais de
vulto. Isso reitera a necessidade de uma reflexão mais ampla sobre os estilos
de vida, as práticas de consumo, os modelos de produção e de
desenvolvimento, os valores e os comportamentos humanos que são o foco
privilegiado das práticas da Educação Ambiental. Mesmo porque, é
precisamente a vida humana e o atual modelo de sociedade, em todas as suas
dimensões, que precisam ser tomados como objeto de reflexão, como ponto de
partida e de chegada dos processos educativos ambientalmente interessados.
O atual contexto sinaliza para a necessidade de um diálogo entre as
ciências humanas e naturais de modo a contribuir para a compreensão da
dimensão complexa dos problemas socioambientais. O diálogo entre os
saberes se mostra hoje como uma via eficaz para a compreensão das múltiplas
dimensões da crise socioambiental, de seus paradoxos e de sua complexidade.
O pensamento complexo constitui, portanto, um caminho promissor que pode
qualificar as práticas de Educação Ambiental, fornecendo-lhe a densidade
teórica da qual se ressente.
Contudo, é preciso evitar o “mal-entendido que consiste em conceber a
complexidade como receita, como resposta, em vez de considerá-la como
desafio e como uma motivação para pensar” (MORIN, 2007 p.176). Essa
advertência amplia ainda mais o desafio da Educação Ambiental, pois nos
mostra que não trata apenas de uma mudança de percurso metodológico e
epistêmico. Trata-se, também, da construção de uma teoria-prática que,
embora parta de fundamentos estabelecidos, é frequentemente revisitada,
questionada, posta à prova. Assim, ao se propor questionar nossas definições
de homem e de natureza e os fundamentos que sustentam essas definições, e
ao se propor recuperar o processo histórico que nos conduziu ao modelo
antitético de relação com a natureza, a Educação Ambiental estará
promovendo, também, uma revisitação de sua base epistêmica e metodológica.
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Considerações finais
Referência bibliográfica