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anotações de um sonho (não é um poema)

são duas onças esgueirando-se


pelos muros das casas na rua
onde cresci e da qual por mais
forte que queira não me desprendo.

as onças não salivam, sequer


estão insinuam um ataque.
apenas averiguam o ar e algo
que possa estar em meus olhos.

a seguir estou na rua safira.


é noite e pessoas em roda
à beira da ponte conversam
felizes. não sei do que falam.

são pessoas de antes e depois,


amigos, familiares, de antes
e depois. uma prima caminha
recordando, triste, nosso primo.

a noite não oprime e vejo um amigo


da infância, do mesmo bairro, mesma
escola. tínhamos quase os mesmos
medos. mas o meu do escuro, diferenciava-nos.

peço notícias com sede e fome.


ele diz que todos estão bem,
todos estão onde sempre estiveram,
todos vivem e sorriem, vez ou outra.

vivem em lugares que me esforço


para lembrar e traçar as formas
de seus rostos, suas casas. erguer
da memória seus sorrisos. até que consigo.

volto a minha rua à espera de mais uma vez


entrar na casa onde cresci, de onde não saio.
mas um puma esgueira-se e encara-me.
não temo, ou finjo não temer. encaramo-nos.

ele pula no meu colo, apoiando suas patas


dianteiras em meu ombro, que vez ou outra
arranham minha nuca. seguro suas patas traseiras.
sinto que ele quer calor, carinho, um ombro.

tento fazer com que pule e me deixe ir.


mas ele não quer e se prende mais ainda.
fico pensando em como tira-lo sem enfurece-lo.
acordo com a nuca doendo e meu gato pedindo colo.

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