Professional Documents
Culture Documents
Resumo: Este trabalho aponta os resultados de uma pesquisa feita em área indígena. Para
dar consta dos dados coletados tive de recorrer a história da matemática e a outras áreas das
ciências. Deparo-me com aspectos da história da matemática esquecidos e/ou não
mencionados no espaço escolar por motivos diversos, mas que pesquisadores como
Seindenberg e Keller traz-nos informações de que este lado da geometria não esta
esquecido.
Introdução:
1
Doutor em Educação pela UNESP – Marília – SP e professor assistente na UNESP de São José do Rio Preto
– SP.
Desenvolvimento do tema:
5
Fernando Vieira é astrônomo do planetário do Rio de Janeiro e seu endereço eletrônico é:
planetário_rio@hotmail.com
Que observam os kuikuro, através das sombras durante o ano?
Apesar da pergunta estar falando no geral, para todo o povo kuikuro,
sabemos que existem os especialistas observadores que passam estas informações nos
diálogos diários. Não sei informar se as mulheres fazem observações deste tipo, mas pude
perceber que os homens as fazem.
No dia dos dois solstícios – o do inverno e do verão – quando a curva feita
pela sombra de algum objeto e que foi observada no percurso de um dia é a que se distancia
mais deste objeto, perceberão que elas formam os dois lados da hipérbole6, enquanto que,
no dia do equinócio7, - que acredito ser o das festas do quarup, pois estas festas são em
setembro – eles vêem uma reta. O sol sai no horizonte, lança seus raios solares em direção à
casa dos homens, passa pelo local do huka-huka, pela tora e pela porta central e segue seu
caminho passando pela casa do chefe da casa dos homens. Neste dia do equinócio, a casa
dos homens e a casa do chefe da casa dos homens receberão a luz do sol mais intensamente
pela porta de entrada.
Estas observações solares e lunares, entre os solstícios e equinócios estão
relacionadas com as colheitas e plantios uma vez que o povo kuikuro tem as estações da
seca e das chuvas. Por exemplo, início da coleta dos ovos de tracajá é sinal de que as
chuvas estão chegando, que o dia da passagem do sol pela porta central da casa dos
homens, onde está a flauta kagoto, também está chegando. O equinócio da primavera se
aproxima. Será nesta época que os arcos da hipérbole vão trocar o lado, mudar a sua
posição em relação ao eixo de simetria, que, neste caso, é a sombra produzida pelo
equinócio, e as sombras se projetarão simetricamente, até que volte ao equinócio do outono.
A simetria de reflexão ocasionada pelos movimentos do sol é observável no decorrer de um
ano.
A lua por sua vez estará produzindo uma mesma figura hiperbólica
durante o ano, mas suas sombras podem ser observáveis somente na lua cheia, ou nos dias
próximos a esta fase da lua. Será por causa das observações serem feitas a partir do sol e da
6
Estes dados, que garantem que as sombras no local da aldeia desenham uma hipérbole, foram confirmados
por Vieira no email citado acima.
7
No hemisfério Sul, no ano 2000 o equinócio da primavera foi dia 22 de setembro as 17h27’ e equinócio de
outono 20 de março as 07h35’. (site: http://www.if.ufrg.br/~kepler/fis207/estaçoes.htm)
lua que a forma geométrica do círculo e da circunferência estão presentes? Podem também
se juntar a estas observações as quatro fases da lua? Esta última interrogação é proveniente
de que a observação lunar, durante as quatro fases da lua, também produz uma figura
hiperbólica, com eixo central de reflexão na lua nova e seus extremos estão de uma lua
cheia a outra, caracterizando o mês, por isso o uso de “meu filho tem x luas”.
Estas observações confirmam as conclusões de Carvalho (1979) a respeito
da tríplice encruzilhada, quando discute o desenho feito por Steinen (1940). A tríplice
encruzilhada se dá entre três círculos que se interceptam, produzindo três espaços
definidos: o espaço que permite o relacionamento com pessoas e “coisas” que não
pertencem à aldeia, chamado por Carvalho de “mundo exterior” geográfico; o outro espaço
é o que simboliza o “mundo nosso”, mundo dos kuikuro. Estes dois espaços permitem a ida
e vinda, enquanto o terceiro espaço, que é o espaço formado pelas curvas da hipérbole –
espaço onde se dá o eixo da simetria da hipérbole, onde está o jogo da vida e morte, da lua
e do sol – este não tem retorno.
Conclusão: