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Mourão: alguns ministros "não tinham competência

nenhuma" para estar no STF


www.jota.info

O vice-presidente eleito, Hamilton Mourão. Foto: Jose Cruz /Agência Brasil/Fotos


Públicas

Em entrevista exclusiva concedida ao JOTA, o vice-presidente eleito, general Hamilton


Mourão, a rma que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem em seu quadro ministros que
não teriam condições de ocupar cadeiras na Corte. E defendeu que o Senado realmente
sabatine os nomes indicados pelo presidente da República para o tribunal. “O presidente
indica e o Senado deve sabatinar. Mas o Senado sabatina?”, questiona.

Às vésperas da posse na Vice-Presidência, suas atribuições na gestão Bolsonaro ainda


não foram de nidas, mas ele indicou que quer participar mais do governo e não quer ser
um mero “vice decorativo”. Na entrevista, Mourão falou de uma série de assuntos
sensíveis ao governo de Jair Bolsonaro, como a votação da reforma da Previdência pelo
Congresso Nacional.

O general defende que Bolsonaro articule rapidamente com o Congresso a aprovação da


reforma da Previdência proposta por Michel Temer para garantir a con ança de
investidores externos. Disse que, neste ponto especí co, tem o apoio do futuro ministro
da Economia, Paulo Guedes.

Mourão ainda defendeu que reformas da agenda econômica, como a tributária, sejam
encaminhadas com rapidez ao Legislativo. E comentou sobre como o governo eleito vai
tentar negociar com o Congresso, mantendo o protagonismo de Bolsonaro, apesar da
articulação política estar nas mãos do futuro ministro Onyx Lorenzoni, chefe da Casa
Civil.

Leia a entrevista completa abaixo.

Que avaliação o senhor faz hoje do Judiciário brasileiro, especialmente do Supremo


Tribunal Federal?

Eu sou um crítico do nosso processo judicial. Acho que é um processo lento que, no nal
das contas, bene cia quem tem dinheiro e os melhores advogados. Não mantém os
bandidos na cadeia. O processo de escolha dos nossos ministros, em tese, é correto. O
presidente indica e o Senado deve sabatinar. Mas o Senado sabatina? Você vê o
processo americano, o último indicado cou dois meses sendo sabatinado. Aqui, isso
não acontece. Você começa a ver nos últimos anos o protagonismo dos ministros.
Começaram a aparecer na TV. Eu vou dizer com sinceridade: há 20 anos atrás eu não
sabia quem eram os ministros do Supremo, só um ou outro nome. Aí excitam as
vaidades humanas, tem ministros ali que você sabe que não tinham competência
nenhuma para ocupar uma cadeira ali. Entraram pelas vias que a gente conhece. Pega o
próprio Marco Aurélio Mello, era da Justiça do Trabalho, foi nomeado juiz do Trabalho
porque era aparentado lá nas Alagoas [Marco Aurélio é primo de Fernando Collor e foi
nomeado por ele para o STF]. [Ricardo] Lewandoswki veio porque era amigo da família
do [ex-presidente] Lula.

Então, o senhor acha que vai haver uma mudança no critério de escolha de ministros do
STF?

Se o Senado zer o trabalho dele, não ocorreria isso. Se ele encostasse o cara na parede
e mandasse de volta a indicação para o presidente… Eu só conheço um caso que voltou:
um ministro do Superior Tribunal Militar, o general Raymundo Nonato Cerqueira Filho, por
causa daquela questão que o senador Eduardo Suplicy perguntou do comando de
homossexuais. Foi o único caso que ele voltou no outro dia para responder perguntas. Aí
você olha as entranhas do STF. São desnudas nas discussões entre dois ministros
transmitidas pela televisão. Com isso, cai a percepção que a população pode ter sobre a
lisura dos processos. E outra coisa: como nossa Constituição bate do al nete ao
foguete, tudo virou matéria constitucional e termina no STF, o que é um absurdo.
Enquanto a Suprema Corte americana julga 100 casos por ano, a nossa julga 7 mil, 8 mil,
até mais. Acho que a PEC da Bengala [que ampliou de 70 para 75 anos a idade de
aposentadoria compulsória para juízes de tribunais superiores] não foi bené ca. É o
único lugar que o pessoal casse até os 75 anos é ali, pô. E isso permitiu que esse
pessoal casse mais tempo ali.

O governo pode enviar uma mudança com mandato para ministro?

Haveria mais rodízio. Mas eu acho que devia cair essa indicação política e o Senado tem
de fazer seu trabalho de sabatinar.

Agora falando de política. Como se dará o diálogo com o Congresso? Como separar as
atribuições da Casa Civil e da Secretaria-Geral? Ter dois negociadores não enfraquece
um a autoridade do outro?

O presidente tomou a frente das negociações iniciais com o Congresso. Primeiro, ele se
reuniu com as frentes parlamentares e, depois, com os partidos. O presidente tem 28
anos de Casa [Câmara] e tem o conhecimento de como funciona os meandros daquilo
ali. O ministro Onyx está também buscando fazer essa ponte com os parlamentares que
foram derrotados em eleição para serem assessores dele e serem a ponta de lança para
aquele corpo a corpo que precisa ser travado diariamente no Congresso, uma assessoria
dos parlamentares. O general Santos Cruz cou com parcela dessas atribuições no que
tange às emendas parlamentares.

O senhor ainda não tem as atribuições muito de nidas, então?

Ainda não, porque a Constituição é vaga sobre isso. A Constituição diz que eu estou ali
para substituir o presidente e exercer funções especiais e que minhas tarefas seriam
de nidas por lei complementar. Até hoje, não foram de nidas. Eu estou aguardando
terminar esse primeiro momento de acomodação e ver se é o caso de colocar um
projeto de lei ou mesmo um decreto com as minhas atribuições.

O governo de transição e os nomes escolhidos para o ministério indicam uma mudança


na forma de relacionamento com a política. Vai funcionar?

Uma coisa são os emissários, outra coisa é o negociador. A negociação estará muito no
próprio presidente e no ministro Onyx. A palavra nal é do próprio presidente. Ele não vai
se omitir disso aí. É um modelo que a gente pretende que se constitua de exemplo, de
você trabalhar com o Congresso, de convencimento. O Congresso vai estar convencido
de seu papel na nação, independente se ele vai ganhar um cargo aqui ou uma emenda
acolá. Isso tem de ser um trabalho casado de convencer o Congresso e a população,
sem fazer da população um instrumento de pressão sobre o Congresso. Em medidas
mais duras como a reforma da Previdência, se não convencer os dois lados, Congresso
e população, da importância, isso não vai andar.

Aproveitando o tema… Sobre a reforma da Previdência: será mesmo a proposta do


Temer? Ou será uma proposta totalmente nova? Será fatiada?

Se não andar, nós não vamos sair do lugar. Não é só para o setor privado, é para o
externo. Os investidores internacionais precisam acreditar. Eu julgo que tem de ser
mandado o que está no Congresso com alterações pontuais. Nós não vamos perder
tempo e começar da estaca zero. Paulo Guedes e eu temos aquela ideia positiva que se
tivesse aprovado a reforma do [Michel] Temer que está lá, nós estaríamos no dia 1° de
janeiro a mil por hora, em outra situação.

Mas, e quanto às mudanças necessárias para a aposentadoria dos militares?

Isso foi negociado desde o ano passado. Já havia negociação do aumento do tempo de
serviço e das pensionistas pagarem por tempo de contribuição.

A reforma da Previdência já foi anunciada como a reforma das reformas. O governo


encaminhará apenas este tema para o Congresso para concentrar forças ou pode enviar
outros assuntos, como a reforma tributária?

Podem ser mandados outros, mas a prioridade será dada à da Previdência. Tem já o
plano pronto da tributária e tem de ser mandado, não vamos car esperando os
melhores dias.

E quanto à ameaça de congressistas de instaurar a CPI do COAF como instrumento de


pressão para atingir a família do presidente eleito?

Vocês me digam quando uma Comissão Parlamentar de Inquérito deu em algum


resultado? Vocês vejam a quantidade de CPIs e nada, só agitação. É uma coisa fora do
governo, o governo não tem nada a ver com o COAF. É uma investigação para os atos
pregressos. Eu acho que não pode haver esse discurso de que: “ah, por que o COAF só
enxergou isso agora, não enxergou antes?”. Eu acho que o que interessa é daqui para
frente, o que cou para trás não é problema nosso. Senão, a gente não vai conseguir
fazer o que precisa ser feito.

E como o senhor recebeu as explicações de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio


Bolsonaro, que chamou atenção do COAF por movimentações bancárias suspeitas?

É uma questão da Assembleia Legislativa do RJ. Ele apareceu, disse o que tinha para
dizer, agora compete ao Ministério Público chegar à conclusão se aquilo é verdade ou
não. Eu não estou vendo as redes sociais com uma avalanche de coisas em cima disso.
O troço é nebuloso, não tem explicação. Vamos aguardar a investigação que está em
curso.

Independentemente da posse do Congresso em fevereiro, quais mudanças serão


priorizadas já em janeiro?

O previsto é o planejamento dos ministros. Tem uma reunião no dia 14 janeiro para
apresentar as metas de cada ministério. Acho que será editada uma medida provisória.
A própria questão da racionalização. A determinação do presidente é que se pode retirar
as pessoas, mas não se retira o cargo para depois avaliar se o cargo será mantido ou
não. Foi dado como direito aos ministros que todos buscassem medidas [de
desburocratização]. Alguns pela experiência estão mais confortáveis. E outros estão
como cachorro em canoa, ainda se equilibrando. Muitos vão ver que a administração
pública não é uma coisa tão fácil. Eu costumo usar a fala do General George Marshal
que “para cada dólar, 10 centavos são pelo trabalho e 90 centavos para scalização”.
Você vai ter de chicotear para cima e para baixo para a coisa andar. É esse papel que eu
espero que o presidente precise de mim. Senão, vai ser tudo em cima dele. A gente sabe
que a burocracia inchou muito e tem de dar uma desinchada. Tem ministério que levará
uns três ou quatro meses para se organizar. Você vê: na economia, serão sete
secretarias, o Planejamento é uma estrutura, a Fazenda é outra estrutura, Indústria e
Comércio é outra estrutura.

Durante a campanha, o senhor concedeu entrevistas e fez manifestações que o


colocavam com um tom acima do presidente Bolsonaro. Agora, especialmente quando o
tema é política externa, o senhor tem adotado um discurso mais pragmático. Algo
mudou de lá para cá?

Eu não acho que durante a campanha tenha usado um tom acima do presidente. O que
acontece é que ele cou um mês fora. Eu sempre coloquei na campanha que o
presidente é um homem das massas – é o cara que lança poucas ideias e propaga. Eu
sou um propagandista, atuava em ambientes mais restritos e debulhava o que seria esse
processo no próximo governo. Agora é governo, governo não é campanha. Governo é
coisa certa. É organização, é meta.

Bruna Borges – Repórter


Felipe Recondo – Sócio e diretor de conteúdo

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