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Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Jorge Amado

CC – Pensar e Fazer Ciência

Programas de Pesquisa, Anomalias e


“Anarquismo” Epistemológico

Profª. Joseline Pippi


Programas de Pesquisa: alternativa ao indutivismo

Imre Lakatos (1922-1974) – graduou-se em matemática, física e filosofia em Debrecen (Hungia) em 1944.
Fugiu do nazismo e tornou-se comunista.
Influências: Hegel, Marx, Popper e George Polya
Obra mais conhecida: “Provas e Refutações” (1976)
Classifica o falsificacionismo como ingênuo, pois como critério de demarcação entre ciência e não ciência
desconsidera a notável “resistência” das teorias. Essa observação pode ser comprovada pelo fato de que
quando os cientistas deparam-se com anomalias persistentes, tendem a ignorá-las e centrar esforços na
resolução de outros problemas.

Argumenta que é sempre possível evitar que uma teoria seja refutada fazendo modificações nas hipóteses
auxiliares.

Consideremos a seguinte situação:


Um planeta hipotético se desvia da órbita calculada pela teoria de Newton.

De um ponto de vista lógico, isso seria a falsificação da teoria.

Contudo, em vez de abandonar a teoria,


o cientista pode supor que um outro corpo
celeste esteja influenciando a órbita do planeta.

Só que mesmo os telescópios mais potentes não


encontram evidência do dito orbe...

O cientista, então, afirma que há uma nuvem de


Poeira estelar que impede a detecção do orbe.

Desse modo, sempre se pode propor uma hipótese adicional, salvando a teoria da refutação.
Ou seja:

Refutações de teorias podem sempre ser


transformadas em anomalias,
atribuídas a hipóteses auxiliares incorretas.

Contrariando Popper, afirma que as teorias são


irrefutáveis.

Aponta que a história da ciência está repleta


de exemplos de que as teorias não são
abandonadas, mesmo quando refutadas por
enunciados de teste.

As teorias não são modificadas ao longo do


tempo de forma completamente livre: certas
leis e princípios fundamentais resistem às
modificações.
Aponta a existência de regras com poder heurístico que orientam as modificações e servem de guia para a
pesquisa.

O trabalho do cientista, assim, consistiria em realizar pequenas modificações na teoria, substituindo-a por outra
ligeiramente modificada.

Essa sucessão de teorias é denominada de “programa de pesquisa”.

Heurística: arte de inventar ou descobrir; forma de resolver problemas complexos;


Programa de Pesquisa

Formado por um “núcleo rígido” que, por decisão metodológica ou convenção entre os
cientistas, é formado por princípios e leis irrefutáveis. É o elemento que não pode
mudar, não pode ser alterado em face de anomalias.

O núcleo rígido é formado, portanto, pelos princípios fundamentais de uma teoria.


Mantém-se constante em todo o programa de pesquisa, à medida que as teorias
auxiliares vão sendo modificadas.

Se houver mudança no núcleo rígido, estaremos diante de um novo programa de


pesquisa.

Exemplo de núcleo rígido: na mecânica newtoniana, as 3 leis de Newton e a lei da


gravitação universal.

Mudança de programa: a passagem da astronomia ptolomaica para a copernicana.


Programa de Pesquisa

Para resolver as anomalias (inadequações entre as previsões da teoria e as observações


ou experimentos), o cientista tenta sempre modificar uma hipótese auxiliar ou uma
condição inicial, conservando o núcleo.

As hipóteses auxiliares e as condições iniciais constituem o que Lakatos chamou de


“cinto de proteção”.

A função do cinto de proteção é blindar o núcleo rígido contra refutações.

Heurística negativa: regra metodológica que mantém o núcleo rígido intacto.

Heurística positiva: conjunto de sugestões sobre como modificar e sofisticar o cinto de


proteção.
Programa de Pesquisa

Para explicar mudanças mais radicais como as que ocorrem nas revoluções científicas, Lakatos propõe
critérios para avaliar um PP:

- É progressivo se:
a) Usa sua heurística positiva para mudar as hipóteses auxiliares de modo a gerar previsões novas e
inesperadas;
b) Se pelo menos algumas dessas previsões são corroboradas.
Se somente a primeira exigência for atendida, ele será teoricamente progressivo; se a segunda também for
satisfeita, ele será também empiricamente progressivo.

- É degenerativo se: as modificações das hipóteses auxiliares são realizadas apenas para explicar fenômenos
já conhecidos ou descobertos por outros PP’s. Nesse caso as modificações servem apenas ao propósito de
manter o núcleo.
Programa de Pesquisa

Concorda com Popper quando afirma que a ciência tende a aumentar o conteúdo empírico e preditivo de
suas teorias, procurando prever fatos novos. Para que a previsão de fatos novos sejam possíveis, as
modificações propostas não podem ser do tipo ad hoc.

Hipóteses ad hoc: hipóteses que tem por função explicar certos resultados que contrariam uma teoria e que
não são independentemente testáveis, ou seja, explicam apenas os fatos para os quais foram criadas.
Diminuem o grau de falseabilidade da teoria e devem ser rechaçadas.

A recusa de um cientista em aceitar a refutação do núcleo de seu programa será racional enquanto o
programa for capaz de modificar as hipóteses auxiliares de forma a prever fatos novos. Portanto, um PP é
racionalmente recusado quando ele fizer uso de hipóteses ad hoc, e não quando ele sofrer refutações ou
deparar-se com anomalias incapazes de serem solucionadas.
Programa de Pesquisa

Outra discordância entre Lakatos e Popper:

Para Lakatos um PP nunca é refutado, mas pode ser rejeitado quando


um PP rival melhor explicar o êxito do programa anterior e
demonstrar maior capacidade (força heurística) de realizar previsões.
Para ele, assim, o que conta é o sucesso das previsões de fatos novos
e não as refutações.

Geralmente um PP progressivo suplanta um degenerativo, mas


admite-se que um PP degenerativo possa tornar-se progressivo,
desde que atenda aos critérios já apontados.

Em revisão aos conceitos, admitiu que sua epistemologia não é


normativa, sendo possível ser analisada somente post facto (em
perspectiva histórica).
Feyerabend e o “Anarquismo Epistemológico”

Paul Karl Feyerabend (1924-1994)


Atuou na 2ªGM como oficial do exército alemão, na
França.
Estudou ciência e filosofia na Universidade de Viena.

Foi orientado de Popper, a quem opôs-se inúmeras


vezes e conterrâneo de Kuhn, com quem formulou o
conceito de “incomensurabilidade”.

Contestou, também, os apontamentos de Lakatos.

Criticou avidamente o racionalismo e advogou


favoravelmente à prática científica livre, aberta e
pluralista.
Para ele, o racionalismo crítico não é uma filosofia verdadeira, é uma divagação confusa, incorreta e acrítica
sobre a ciência.

A eliminação de programas de pesquisa regressivos pelos progressivos implica que ambos podem ser
comparados, o que somente seria possível se ambos tivessem estruturas essencialmente lógicas. Ambos
programas são incomensuráveis, incomparáveis; consequentemente, não podem ser consideramos melhores
ou piores, apenas diferentes.

Afirma que a ciência não tem um método próprio, sendo sequer um empreendimento racional. É, sim, uma
atividade anárquica na qual todas as regras metodológicas foram e devem ser quebradas para que se possa
progredir.
O progresso da ciência depende, também, da adoção do pluralismo teórico: estímulo à proliferação do maior
número possível de teorias que competem entre si para explicar os mesmos fenômenos.

Feyerabend é mais radical que Kuhn em relação às críticas à racionalidade da ciência. Enquanto este admite
que existam valores (regras metodológicas) para avaliar teorias científicas, aquele defende a inexistência de
quaisquer tipos de regras. As teorias seriam escolhidas, assim, por fatores externos à ciência (sociais,
políticos, subjetivos, etc.).

Adota posição não-racionalista, de total relativismo (“vale-tudo” metodológico).

Utiliza a história da ciência para exemplificar que o progresso somente foi alcançado quando alguma regra
metodológica foi quebrada.
Defende a tese de que é importante não abandonar uma teoria em face de refutações, já que enunciados de
testes e hipóteses auxiliares podem ser revistos, e que somente assim as teorias podem ser melhoradas.

Propõe o princípio da incomensurabilidade em sua forma mais radical: a mudança de paradigma implica na
adoção de uma nova visão de mundo.

Defende que os cientistas devem defender suas teorias com tenacidade. Segundo ele, essa postura
sustentaria o pluralismo teórico.

Para ele a ciência não é superior – em relação a seus métodos e resultados – a nenhuma outra forma de
conhecimento. Assim, não haveria necessidade de demarcação de limites entre o que é e o que não é ciência.

O respeito dogmático ao método, para ele, impede o progresso científico e estanca a ciência.

Como elemento entre a lógica e o conhecimento está a criatividade, a mudança de ideia e os desejos
humanos. Tais elementos não podem ser desconsiderados na pesquisa.
Discussão do texto:

“Como salvar a sociedade contra a ciência?”, de Paul Feyerabend.


Fontes consultadas:

ALVES-MAZZOTTI, A. J. e GEWANDSZNAJDER, F. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa


quantitativa e qualitativa. 2.ed. São Paulo: Thompson, 1998.

CHALMERS, A. F. O que é ciência afinal? São Paulo: Brasiliense, 1993.

Stanford Encyclopedia of Philosophy. https://plato.stanford.edu/entries/feyerabend/


Imagens utilizadas:

Astronauta: https://www.google.com.br/search?hl=pt-
BR&tbm=isch&q=planeta&chips=q:planeta,g_1:sistema+solar&sa=X&ved=0ahUKEwj06JWKi_jeAhWES5AKHUAUCo8Q4lYIJigA&biw=1920&bih=976&dpr=1#imgrc=CL
1OW-ugB_ersM:

Átomo: https://www.google.com.br/search?hl=pt-
BR&tbm=isch&q=%C3%A1tomo&chips=q:%C3%A1tomo,g_1:representa%C3%A7%C3%A3o&sa=X&ved=0ahUKEwjf9P74iPjeAhUFGJAKHb0qDOgQ4lYILCgG&biw=192
0&bih=927&dpr=1#imgrc=7qWzeVNdyqLFIM:

Imre Lakatos: https://pt.wikipedia.org/wiki/Imre_Lakatos#/media/File:Professor_Imre_Lakatos,_c1960s.jpg

Paul Feyerabend: https://pt.wikipedia.org/wiki/Paul_Feyerabend#/media/File:Paul_Feyerabend_Berkeley.jpg

Planeta: www.google.com.br/search?hl=pt-BR&biw=1920&bih=927&tbm=isch&sa=1&ei=yg3_W-
S0Hs_4wASXyKKICA&q=planeta&oq=planeta&gs_l=img.3..0l10.551293.553535..554162...0.0..0.387.1435.0j4j2j1......0....1..gws-wiz-
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Vidro quebrado: https://www.google.com.br/search?hl=pt-


BR&biw=1920&bih=927&tbm=isch&sa=1&ei=kR3_W8m0KcXEwASXgKrgAw&q=vidro+estilha%C3%A7ado&oq=vidro+estilha%C3%A7ado&gs_l=img.3..0l2j0i24.2471
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