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2, 2011
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Artigo adaptado do Trabalho de Conclusão de Curso - TCC, relativo ao término da graduação em Psicologia, na Universida-
de Guarulhos, em 2010.
1
Graduado em Psicologia pela Universidade Guarulhos e Instrutor da Universidade Aberta da Terceira Idade (UATI)
2
Professor-Doutor do Curso de Psicologia da Universidade Guarulhos e orientador
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gida qualquer visão espiritualizada. À religião ca e que o espírito não pode ser provado e
cabia lidar com a subjetividade da natureza nem compreendido no mundo exterior.
espiritual do ser humano e as religiões so- A ideia do que é “espiritual” deve ser
friam a influência dos dogmas propiciando a ampliada e ir além das verdades religiosas
ignorância e a fé cega (NOVAES, 2003). ou concepções teológicas. A espiritualidade
deve conter em si toda e qualquer manifes-
O espiritual tação da vida e tudo o que dá a cada coisa
na natureza a sua qualidade essencial (ER-
O Espírito (spiritus, pneuma) em seu THAL, 2004).
caráter arquetípico que significa ar, vento,
respiração são agentes dinâmicos que mo- Enfoques religiosos
vem o ser humano e utilizando a alusão do
vento é possível se dizer que penetram o ho- A religiosidade propicia que o indivíduo
mem como acontece na respiração e o infla se dirija a Deus e o diálogo íntimo com Deus
(JUNG, 1983). é um diálogo que compreende o contato con-
A espiritualidade está presente na busca sigo mesmo e o homem que é teísta colocará
de Deus ou do sagrado pelo homem, mas ela Deus como um parceiro em seu diálogo e o
não se encerra somente nesta busca. A espi- homem ateísta considerará que essa conver-
ritualidade é encontrada em qualquer movi- sa íntima é uma conversa com o próprio eu
mento em que o homem busque superar a si (FRANKL, 2009).
mesmo ou obstáculos em sua vida e nestas A tradição hindu provém historicamente
buscas o homem procura a transcendência do período védico e em sua origem os Vedas
de si mesmo e da sua condição existencial eram a literatura oral transmitida de professor
(ANGERAMI-CAMON, 2004). para o discípulo. O Bhagavad Gita e todos
O espírito humano existe em todos os os seus personagens são representações de
homens e isso independe dele acreditar ou qualidades físicas e psicológicas. O diálogo
não na sua existência. O espírito humano na entre Arjuna (ego) que é um poderoso guer-
logoterapia é concebido como uma dimen- reiro e Krishna que é seu condutor, mestre
são “noética” e esta dimensão inclui atributos espiritual e também uma encarnação do pró-
como: objetivo, ideias, ideais, criatividade, prio Deus (Self) (FADIMAN; FRAGER, 1979).
imaginação, fé, a busca de sentido da vida, O espiritismo diz que há no homem um
o amor que transcende os sentidos físicos, a princípio inteligente que é a alma ou espírito
possibilidade de transcender a si mesmo, o e que este princípio independe da matéria e
livre-arbítrio, responsabilidades, comprometi- que é ele que dá o senso moral e a faculdade
mentos, senso de humor e até a imaginação de pensar. O espiritismo argumenta que se
e a consciência que vai além do superego o pensamento fosse propriedade da matéria
(FABRY, 1984). então a matéria bruta e inerte teria a capaci-
Sharp (1993) fala que na psicologia jun- dade de pensar (KARDEC, 2004).
guiana o espírito é concebido, assim como Nos textos bíblicos do judeu-cristianis-
Deus, como um objeto da experiência psíqui- mo, Deus criou a matéria e o espírito e con-
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jugou ambos no ser humano e o homem foi repousa num self limitado que propicia ape-
concebido como unidade psicossomática nas uma consciência relativa das coisas e a
criada à imagem de Deus. O complexo huma- proposta budista é de auxiliar o indivíduo a
no se visto como uma tríade na bíblia hebrai- mudar e transcender o seu egoísmo e limita-
ca pode ser elaborada tendo o corpo como ção (FADIMAN; FRAGER, 1979).
bâssâr (em grego soma ou sarx que é carne); No budismo tibetano há uma interessan-
a alma e princípio vital como nefesh (psychè te metáfora que descreve o funcionamento do
em grego); e neshamá como princípio da ego que é a dos “Três Senhores do Materia-
vida espiritual (pneuma em grego) (LEPARG- lismo”. São eles: o “Senhor da Forma”, que
NEUR, 1994). se refere à busca incessante e neurótica do
Cinco partes constituem a alma segun- conforto físico, da segurança e do prazer; o
do o misticismo judaico: Nefesh, que garante “Senhor da Fala” que promove a utilização do
a possibilidade da vida ao animar o corpo fí- intelecto nas relações do homem com o mun-
sico; Ruach que é aliado às atividades físicas do à sua volta e indica a propensão do ego
como a comunicação, criatividade, afetivida- a neutralizar ameaças que possam na visão
de, relacionamento, sonhos e imaginação; do ego, colocar em risco a sua ideia de “eu”
Neshamá que é responsável pela experiên- e a solidificação das coisas é um meio para
cia espiritual e também pela função mental; e isso; e o “Senhor da Mente”, que através do
Chaiá e Iechidá que são tidos como transpes- esforço da consciência procura preservar a
soais e que transcendem a personalidade, percepção de si mesma e acaba por imperar
mas que, ainda assim, refere-se à individuali- quando o homem utiliza as disciplinas espiri-
dade (SENDER, 2001). tuais e psicológicas e, assim, o ego converte
No cristianismo através do Novo Tes- tudo de acordo com a sua conveniência, até
tamento, especificamente na Primeira Carta a própria espiritualidade (TRUNGPA, 1973).
aos Tessalonicenses, São Paulo fala da uni- O Sufismo geralmente é descrito pelos
dade do homem através da trilogia: soma, historiadores como o cerne místico do Is-
psique e pneuma ou corpo, mente e espírito lamismo. O Islamismo é o sistema religioso
(LEPARGNEUR, 1994). baseado no Alcorão e Al-Ghazzali, uma da
O budismo coloca três características figuras mais importantes na teologia islâmica,
principais da existência humana: a tempora- diz que o corpo deve ser considerado como o
lidade, o desprendimento e a insatisfação. A carregador e a alma como o viajante (FADI-
temporalidade indica que nada é permanen- MAN; FRAGER, 1979).
te, que tudo está em permanente mudança.
O desprendimento indica que o ser humano é Enfoques psicológicos
um conjunto de atributos: intelecto, emoções
e corpo, e que todos são temporais, ou seja, Segundo Netto (1974), a expressão
o corpo e a personalidade são componentes “Psicologia” tem origem nas palavras gregas
mortais e em constante mudança. A insatisfa- “psyché” que pode ser traduzida como “alma ou
ção ou sofrimento indica que o problema bá- espírito” e “logos” que pode ser entendida como
sico do ser humano não é externo, mas que “compreensão, entendimento, concepção”.
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res, tais como ideias, leis e presenças em seu a religiosidade como algo indevido (ANGE-
mundo interior devido às suas experiências e RAMI-CAMON, 2004).
estes fatores passam a conter o significado A relevância não está em se provar ou
de algo poderoso que deve ser adorado ou não a existência de Deus, mas o homem que
temido. A religião pode ser entendida não só vivencia, em sua concepção, a presença divi-
como o meio para exercício da fé, mas sim, na trata a sua experiência de forma pragmáti-
como a experiência com o que é numinoso ca e tal ocorrência não cabe nas limitações do
que resulte em alguma modificação do cons- racionalismo puro e a atitude racionalista fará
ciente (JUNG, 1978). com que se fechem os olhos diante do vivido
A religiosidade vem a ser a busca da e vivenciado pelo homem (JAMES, 1985).
transcendência para que o homem vivencie As religiões são sistemas psicoterapêu-
a sua espiritualidade. A religiosidade faz com ticos, pois assim como os psicoterapeutas
que o homem reflita sobre quem é e sobre procuram curar o sofrimento da mente huma-
quem deve ser e com que busque significa- na, do espírito humano, da psique, também
do para a sua existência para além do sig- as religiões procuram a mesma coisa e, desta
nificado que pode conter o mundo objetivo. forma, Deus pode ser visto como um agente
(ANGERAMI-CAMON, 2004). de cura e que trata dos problemas do espírito
A religiosidade para ser exercida de (JUNG, 1983).
forma plena, muitas vezes, terá que descon-
siderar o empirismo, pois este e a fé podem Psicologia e religião
ficar em posições opostas. A teologia, por
exemplo, quando expressa algum valor para A religião como fenômeno social e histó-
o indivíduo culmina por ter valor em sua vida rico é algo que faz parte da expressão huma-
concreta e aqui não se discute a veracidade na e é um tema de grande importância para
contida na teologia, mas sim que há que se muitas pessoas e a psicologia ao se ocupar
reconhecer a sua presença e influência (JA- com a estrutura da personalidade do ser hu-
MES, 1985). mano não pode menosprezar a sua presença
A religião é concreta, pois possui credo, e importância (JUNG, 1978).
moral, teologia, ritos, enfim, é algo que pode Ao psicoterapeuta cabe-lhe o papel de
ser externalizado e vivido exteriormente e, ser psicoterapeuta e não um sacerdote e há
por outro lado, a fé é um encontro vivo com que se ter cuidado com isso, pois as inten-
Deus, com o sagrado (BOFF, 2002). ções da psicoterapia e da religião não são as
A religiosidade é algo que constante- mesmas; a primeira tem a sua autonomia na
mente está presente nas psicoterapias, pois ciência e a segunda baseia-se na teologia. A
ela faz parte da vida do cliente e para o psi- psicoterapia procura a cura da alma, ao pas-
coterapeuta isto é conteúdo que precisa ser so que a religião busca a salvação da alma
aceito e compreendido de acordo com a per- (FRANKL, 2009).
cepção e valor dado pelo cliente, pois se as- A experiência religiosa é algo indiscu-
sim não for o homem que é seguidor de uma tível para aquele que a teve e contém forte
religião poderá ser visto como um alienado e significado, o que a coloca com legitimida-
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das, os fenômenos transcendentes são mate- neurose tendo uma causa psíquica poderá
riais trazidos pelas pessoas. A espiritualidade fazer com que o indivíduo, mesmo que confie
é algo que seria benéfico nas relações huma- no profissional que o atenda, adote uma pos-
nas, pois permite que o espírito seja perce- tura inibida na confissão da sua enfermidade
bido e que a alma humana se manifeste pro- porque se verá como alvo da opinião do pro-
piciando o conhecimento de si mesma, por fissional (JUNG, 1978).
isso, a psicologia precisa da espiritualidade, Três considerações sobre a alma estão
pois, é dessa forma, que o indivíduo tenderá presentes na psicologia junguiana: a de que
à organização e totalidade e poderá, por fim, a alma não é superstição nem figura de retó-
lidar com a espiritualidade da alma e com a rica; de que a alma é uma realidade psicoló-
materialidade do corpo (NOVAES, 2003). gica; e que a alma é vivida psiquicamente de
O homem atualmente carece de uma maneira inconsciente, pois se encontra além
maior consciência de si mesmo, pois se das fronteiras do ego, mas, apesar de viver
acostumou com as superficialidades e com o no inconsciente, a alma é quem media o ego
funcionamento mecânico da natureza e vive e o inconsciente, pois é ela quem recebe e
uma desarmonia entre alma e personalidade. transmite as imagens do inconsciente para o
Cabe à psicologia o papel de auxiliadora do consciente (JOHNSON, 1987).
homem no conhecimento integral de si mes- A psicologia deu um grande passo na des-
mo e isso só é pleno quando acontece a inte- coberta do inconsciente com Freud e agora se
gração de todos os aspectos que compõem a faz necessária uma nova elaboração da consci-
natureza humana (ERTHAL, 2004). ência e dos seus limites (ERTHAL, 2004).
A mente causa impacto sobre o corpo e A concepção de uma espiritualidade
exemplo disso é a dificuldade de se curar um inconsciente presente no ser humano indica
doente que não deseja ser curado, seja por que há uma imanente busca de Deus, embo-
masoquismo, seja pelos benefícios decorren- ra, muitas vezes, tal busca permaneça laten-
tes de se ser alguém doente e, dessa forma, te, ou seja, há no homem um eu - espiritual
pode-se dizer que o poder da fé é o placebo e, ao mesmo tempo, indica que há nele uma
da alma, A fé pode ser entendida como uma religiosidade inconsciente. O Deus oculto
convicção psicológica e pode ser algo que presente no texto bíblico vem a ser a expres-
cura ou que pode perturbar o organismo e/ são de um Deus inconsciente no ser humano.
ou a mente. O poder curador da fé, assim, Considerando a existência de uma religiosi-
remete ao poder da mente sobre o corpo per- dade inconsciente há que se considerar tam-
meado pela alma (LEPARGNEUR, 1994). bém que, por ser inconsciente, pode se tornar
As neuroses estão relacionadas com patogênica (FRANKL, 2009).
o mundo interior do ser humano e uma con- A psicoterapia é mais do que um pro-
cepção materialista não terá grande utilidade, cesso que busca a cura de sintomas, ela con-
pois se o sintoma é de natureza psíquica e siste na promoção do autoconhecimento e do
a psique for entendida como produto de pro- autodesenvolvimento e isto pode ser com-
cessos cerebrais, então toda causa terá que, preendido como espiritualidade (ANGERAMI-
necessariamente, ser orgânica ou física. A CAMON, 2004).
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A logoterapia lida com a ideia de que donado, desprotegido e angustiado, pois não
quando o homem ignora a sua dimensão es- se sente preparado para assumir a missão de
piritual ele passa a sentir um mal-estar, uma buscar o significado de sua própria existência
sensação de vazio e a vida é então vista (FABRY, 1984).
como não tendo significado. Assim, a saúde
é relacionada ao significado e não cabe ao O vazio existencial e a busca de novos
terapeuta instituir um significado na vida de valores
seu paciente, mas sim permitir que ele des-
cubra o seu próprio significado da vida tendo Conceber o homem como um ser psi-
como premissa as suas próprias referências cofísico representa enxergá-lo somente como
(FABRY, 1984). um ser pessoal, mas há que se considerar o
O meio acadêmico habilita o profissional homem em uma dimensão mais profunda e
de psicologia a atuar diante de neuroses, psi- concebê-lo como um ser espiritual existencial
coses, complexos e mecanismos de defesa, (FRANKL, 2009).
bem como entender o funcionamento mecâ- O homem tem uma busca que é inces-
nico do que é físico e avaliar processos que sante: o sentido da vida. O ser humano con-
envolvam o pensamento e as suas reações, figura a sua existência na direção da realiza-
mas a unidade que dá coesão a tudo isso que ção e na transcendência de si mesmo e essas
é a “alma” é desconsiderada e a plenitude do buscas são orientadas pela sua consciência.
ser humano é tratada de forma materialista A atualidade é permeada pela angústia hu-
(ERTHAL, 2004). mana que pode ser dita como a “angústia do
O reducionismo do homem a um ser nada” que é o temor da ausência de sentido
biológico movido por forças psicológicas e so- do que lhe é exterior (ERTHAL, 2004).
ciais deve ser evitado, pois a dimensão huma- Mais do que uma adaptação o homem
na permite-lhe apreciar a arte, experienciar a atual precisa assumir uma responsabilidade
religião, ter o anseio pela verdade, buscar um individual. Mais do que observar os traumas
significado para a própria existência e conce- do passado, o homem necessita conquistar
ber o mundo em conformidade com a percep- força para lidar com as tensões do presente e
ção que ele tem do mundo. Hoje o homem com as tarefas do futuro (FABRY, 1984).
vive um momento difícil e relevante, pois con- Hoje o homem, especialmente o ociden-
ferir um sentido à sua existência é algo que tal, não encontra um contexto favorável para
compete ao próprio homem que já não aceita abrir-se à aspiração espiritual, pois o materia-
passivamente imposições que outrora eram lismo é vivido intensamente e o ego fica con-
feitas pela Igreja ou instituições, pelo Estado centrado na busca e aquisições que o contex-
e pela família e a busca do significado da vida to impõe (JOHNSON, 1987).
não pode ser imposto, desta feita, pelas auto- A aspiração espiritual é uma presença
ridades científicas. A autoridade para a busca constante na vida do ser humano, mesmo
do significado de sua própria vida deve advir que não seja percebida ou associada com
de uma autoridade autoimposta e a situação a sua natureza humana. O amor romântico
atual faz com que o homem sinta-se aban- é fruto dessa aspiração espiritual, pois o ho-
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mem que se encontra apaixonado investe na antagonismo entre o que é material e o que é
pessoa, que é objeto de sua paixão, o sim- espiritual. O estudo do que é material, concre-
bolismo do que é transcendente e de alguém to e objetivo trouxe à ciência a concepção de
que lhe completa e faz com que ele se sinta não validade para o que é espiritual, abstrato
pleno, nobre, realizado e que, por fim, traz um e subjetivo. A ciência passou a focar seus ob-
sentido e significado à sua existência com a jetos de estudo no que poderia ser delimitado
possibilidade de fazê-lo feliz. O que se busca no racionalismo e no intelectualismo e o que
e se vivencia no amor romântico é o mesmo é espiritual e religioso passou a ser sinônimo
que é buscado e vivenciado na realidade es- de irracional. A cultura ocidental, em especial,
piritual, mas o amor romântico não consegue se tornou materialista e a espiritualidade foi
suprir à aspiração de espiritualidade no ho- posta de lado, à margem do que poderia ser
mem, porém, ainda assim, é uma vivência da concebido como real e existente. A concep-
espiritualidade que traz conteúdos do incons- ção de um homem somente concreto, fruto
ciente (JOHNSON, 1987). da hereditariedade genética, manipulado por
O homem busca mais do que prazer e condicionamentos e pelo contexto social e
poder em sua vida, ele busca um sentido e movido por impulsos e desejos cristalizou a
se ele se sente frustrado diante dessa busca ideia do homem como uma máquina pensan-
do sentido ele sente em si um vazio interior, te desprovida de alma. A espiritualidade foi
um vazio existencial. Na percepção da ges- confinada nas religiões e até hoje se comete
talt o sentido da vida seria a figura e o fundo o engano de se considerar que ambas são si-
seria a realidade. Não há como se prescrever nônimos, mas ressalte-se que a religiosidade
um sentido da vida para um paciente, mas há é apenas uma das formas de expressão da
como encorajá-lo de que há sentido em cada espiritualidade. Diante de tal contexto o que
situação da vida (FRANKL, 2009). é espiritual passou a ser negligenciado e a
espiritualidade humana recebeu o rótulo de
Considerações Finais “não existente” ou “não importante” e, assim
como uma máquina, o ser humano passou
É possível entender que a espiritualida- a ser concebido como algo material movido
de é parte integrante da natureza humana e por mecanismos. O existente é o que poderia
que tem importante presença no modo como ser comprovado cientificamente e o espírito
o ser humano percebe e apreende o mun- que não pode ser comprovado desta forma
do, além de ser também forma de expressão foi através da lógica e do racionalismo tido
diante desse mundo, tendo como exemplo como inexistente. Mas a espiritualidade nun-
para tal, a religiosidade. A alma desperta o ca deixou de existir, ela apenas deixou de ser
interesse humano e seu estudo atualmente enxergada e hoje, ainda que timidamente, co-
ultrapassa os limites da religião e da filosofia meça a ocupar um espaço que a torna visível
e alcança a ciência. aos olhos de pesquisadores que se sentem
A unidade do ser humano foi fragmenta- incomodados com as delimitações do racio-
da e corpo e alma se tornaram pólos opostos nalismo e intelectualismo material.
em associação com a ideia da existência do A alma é incorpórea e o que é espiritual
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não há como se investigar dentro dos limites pessoais da vontade que fazem com que seja
da ciência. Tais afirmações poderiam ser jus- importante ferramenta para a psicologia já
tificativas para se excluir a espiritualidade de que esta dimensão espiritual acaba por in-
qualquer campo que seja reconhecido como fluenciar a dimensão psíquica onde existem
científico. Mas a psicologia caminha por um os impulsos e desejos do homem, bem como
campo que transcende o que é estritamente seus pensamentos e padrões de comporta-
científico e exemplo disto é a própria con- mento. Sem a percepção da unidade humana
cepção da natureza psíquica do ser humano, fica inconcebível a ideia da matéria ser espi-
sendo a personalidade algo não fisiológico e, ritualizada ou do espírito ser corporalizado e
portanto, tão incorpóreo como a própria alma. assim fica a ilusão de que um homem que
O que é espiritual, por certo, não caberá na reza não faz tal coisa também com o corpo e
delimitação do rigor científico, assim como também a ideia de que o homem que adoe-
não cabem as experiências vividas pelo ho- ce tem apenas o seu corpo hospitalizado. O
mem, mas a vivência da espiritualidade pelo homem é, a todo o momento, essa unidade
ser humano pode ser campo de investigação corpo-e-alma. O homem que entra no setting
científica. A psicologia por sua etimologia psicoterapêutico entra sendo essa unidade e
e por sua própria natureza de também lidar não há como deixar de sê-lo.
com o que é subjetivo vem a ser a ciência A religiosidade vem a ser um meio para
adequada a lidar com o que é espiritual. Des- que o ser humano vivencie a sua natureza
prezar a natureza espiritual do ser humano é espiritual e a experiência religiosa do contato
negar a totalidade da sua natureza e conotar com o sagrado permite ao homem um conta-
“espiritual” com “não existente”. to profundo consigo mesmo, pois ao comun-
O espírito move o ser humano, quer ele gar com o sagrado estabelece um diálogo
acredite ou não em sua existência, e a espi- interior em que expressa suas aspirações e
ritualidade do ser humano é que faz com que emoções que resulta num processo de au-
esse se importe que a vida tenha um senti- toconhecimento e na tentativa de alcançar e
do que, por sua vez, faz com que ele busque assemelhar-se ao divino acaba por transcen-
o sagrado, procure amar e ser ético em sua der o mundo material que vive e a si mesmo
atuação na vida para que esta seja mais do estabelecendo, assim, um processo de auto-
que um simples processo de sobrevivência e desenvolvimento.
seja uma vivência com significado. O ser hu- A tradição hindu conceitua que o ser hu-
mano, mesmo sem perceber, delineia o seu mano tem que conhecer a sua essência ou
livre-arbítrio e busca transcender a si mesmo Self e no Bhagavad Gita há o diálogo entre
devido à sua natureza espiritual. A essência o guerreiro Arjuna e o mestre Krishna, sen-
que o faz ser humano e a própria manifesta- do o primeiro uma representação do ego e o
ção humana da vida e na vida advém de seu segundo do Self e, desta forma, o hinduísmo
espírito. simbolicamente expressa o propósito da psi-
Na dimensão espiritual do ser humano cologia junguiana do ego ser orientado pelo
há a busca da transcendência, há também Self.
a presença do senso ético e há as decisões As concepções do espiritismo colocam
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pois se assim não for, sentir-se-á insatisfeito e alma como o viajante e a ideia é de que a
com sua existência. O budismo contempla a alma guia o homem em seu desenvolvimento
ideia de que o sofrimento que está dentro do interior e, assim, também no Sufismo, o as-
ser humano, ou seja, o sofrimento psicológi- pecto espiritual se faz presente no homem
co é alimentado, amenizado ou finalizado por como constituindo a sua natureza e fazendo
aquele que sofre. Tais conceitos remetem ao com que esse venha a ter aspirações de au-
pressuposto de que a sustentação psíquica e todesenvolvimento.
o significado da existência advêm do mundo Etimologicamente pode se compreen-
interior do ser humano e que, dentre todos os der a Psicologia como o “entendimento da
aspectos da natureza humana, o aspecto es- alma”. Porém, situar a atuação do homem em
piritual prevalece sobre os demais aspectos termos que acomodem a expressão “alma”
que são temporais. é tarefa que pode promover resistência de
O conhecimento do processo de fun- muitos, pois o que diz respeito à alma e, por
cionamento da condição humana pode ser consequência, à espiritualidade envereda por
definido como o “autoconhecimento”, termo um campo que não foi explorado no meio
tão comum e necessário à psicologia. A re- acadêmico por aqueles que hoje atuam na
sistência em se perceber a espiritualidade psicologia, além do fato de que acomodar a
como um aspecto da natureza humana pode espiritualidade no campo da ciência é algo
ser associada à metáfora do budismo tibeta- que inquieta materialistas e intelectualistas.
no do homem que atua na vida sob o jugo Mas a psicologia tem como objeto de estudo
dos “Três Senhores do Materialismo” que caí o homem e a sua natureza e é importante que
num funcionamento que encontra afinidade se ressalte que este objeto de estudo abran-
com o que é concreto e tal concretude cabe ge o homem em sua totalidade e a sua na-
nas delimitações impostas pelo rigor científi- tureza compreende todos os seus aspectos,
co. Em relação aos aspectos constituintes da sejam eles biológicos, psíquicos, sociais e/
natureza humana, o “Senhor da Forma” en- ou “espirituais”. Por ser papel de a psicologia
contra espaço no aspecto biológico do ser hu- estudar e buscar compreender o ser humano
mano, o “Senhor da Fala” no aspecto social em sua totalidade, ou seja, em “todos os seus
e o “Senhor da Mente” no aspecto psíquico, aspectos”, a espiritualidade pode ser entendi-
porém, de acordo com as ideias do budismo da como uma das dimensões no homem ao
clássico, há no homem a “natureza búdica” lado da dimensão somática e da dimensão
que promove o encontro com a sua “essên- psíquica. A não aceitação do espiritual no ser
cia” e com seu “eu real” e não apenas com o humano fará com que a psicologia considere
seu “eu consciente” e aqui pode se associar qualquer manifestação provida da espiritu-
a “natureza búdica” com o aspecto espiritual alidade como devaneio ou psicopatologia e
do ser humano e o pleno autoconhecimento cabe à psicologia ser coerente na conside-
só acontecerá mediante o contato com o ser ração do espiritual e do científico sem que a
humano integral. validade de um acarrete a nulidade do outro.
O Sufismo, que é a parte mística do isla- A psicologia junguiana permite pressu-
mismo, considera o corpo como o carregador por que há no psiquismo humano além dos
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conteúdos inconscientes e conscientes, tam- doença ao fazer com que o aspecto gerador
bém conteúdos que são pertinentes a uma da doença não seja cuidado e seria como cui-
consciência superior e tais conteúdos podem dar de uma cefaléia negando a existência da
ser pressupostos ao aspecto espiritual do ser cabeça. A psicologia necessita de uma visão
humano. Havendo uma consciência superior ampliada ao lidar com o ser humano ou então
e que, portanto, transcenda o eu pessoal faz incorrerá no erro de ter que limitar o ser huma-
com que a plenitude do homem contenha no para que esse seja espremido ou reprimido
mais do que impulsos oriundos do psiquismo, dentro das delimitações da teoria que o psicó-
condicionamentos vindos do contexto em que logo seguir e a psicoterapia seria somente a
se encontra, influências sociais e hereditarie- situação de um enquadramento do ser huma-
dade genética, pois tudo isso faz parte do eu no e de sua situação dentro de uma teoria que
pessoal e a ampliação do homem para uma “supostamente” contivesse toda a verdade.
esfera que transcende esse eu pessoal ense- Assim como a espiritualidade também
jará a ideia de que há um aspecto transcen- a religiosidade não pode ser tratada como
dente em sua natureza que também orienta devaneio ou coisa não importante, afinal a
as suas aspirações. O homem que esponta- religião é presente entre os homens mesmo
neamente procura o conhecimento e experi- antes da ciência e, portanto, presente no psi-
ências de vida para se tornar mais sábio sem quismo humano de forma consciente e in-
a pretensão de qualquer ganho material ou consciente há muito tempo. O contato com
de status social; que pratica a caridade de for- algo que transcenda o materialismo que é
ma anônima; que medita, seja para refletir so- compelido o ser humano em sua vida permite
bre algo, seja para aproximar-se do sagrado, que esse encontre sentido e significado para
seja para conhecer a si mesmo ou ao buscar a sua existência em coisas que fazem parte
um sentido para sua vida está sendo movido de seu mundo interior e sua vida passa a con-
pelo aspecto espiritual de sua natureza quer templar algo mais do que a obtenção de coi-
ele creia ou não em um Deus ou divindades. sas do mundo externo. A religiosidade pode
O fato é que o homem tem a liberdade de ne- servir como válvula de escape para a espiritu-
gar a existência de Deus, mas não consegue alidade da natureza humana que é sufocada
eliminar a imago de Deus que está além das pelo mundo objetivo.
limitações do ego e, por isso, não pode ser Apesar de a religião poder ser vivencia-
apagado com o racionalismo. da de forma concreta, a relevância da religio-
A logoterapia de Viktor E. Frankl concei- sidade não consiste em provar a sua vera-
tua que doenças podem se originar no aspec- cidade ou não, mas sim considerar o papel
to espiritual da natureza humana ou dimensão que desempenha e a influência dessa sequer
noética e que os sintomas se expressarão em necessita da experiência propriamente dita,
seu aspecto fisiológico ou psicológico e, as- pois só a existência da fé já influencia a vida
sim, negar a existência da espiritualidade do do homem religioso e, em consequência, a
homem faria com que se ocultasse a causa da religião pode tanto exercer uma influência te-
doença que acomete o indivíduo, bem como, rapêutica como também pode ser causa de
impediria ou dificultaria o tratamento desta conflitos psíquicos.
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Há que se buscar a maneira de lidar qualquer outra origem da intuição faria com
com a fé, pois se a ciência lidar com verdades que esta tivesse que ser tida como impulso,
definitivas estará alicerçando as suas verda- instinto ou conteúdo preexistente na memória
des nas mesmas bases que as religiões e o e isto a descaracterizaria. A intuição é algo
racionalismo puro e a fé cega buscam promo- inconsciente e irracional, mas não há como
ver imposições ao ser humano. A fé pode ser enquadrá-la como sendo originada no id psi-
entendida como movimento de energia pro- canalítico e isto leva à suposição da existên-
vinda da natureza espiritual do ser humano e cia de um inconsciente espiritual, ideia que já
que se manifesta através da religião. Assim é presente na logoterapia de Viktor E. Frankl.
pode se conceber no homem, por exemplo, A transcendência do ego é a via de mão
a vitalidade como um movimento do aspecto dupla entre a mente e o espírito e a ampliação
biológico, os desejos como movimentos do do ser humano para alguém além do fisiológi-
aspecto psíquico, a comunicação interpes- co e do psíquico ao considerar que há uma di-
soal como movimento do aspecto social e a mensão espiritual e tal ampliação abre novas
fé como um movimento do aspecto espiritual. perspectivas para a sua existência e também
Assim a fé promove a religiosidade e a fun- para a orientação e significado de sua vida.
ção da religião vem a ser a de propiciar ao A superficialidade das aparências que consti-
homem a manifestação da sua espiritualida- tuem o mundo externo será complementada
de. Mas a natureza espiritual humana pode pela profundidade da essência que consti-
ser explorada em campos que vão além do tui o mundo interno e o discernimento entre
que está associado ao que é religioso, pois aparência e essência possibilitará ao homem
ao afirmar que esta natureza é pertinente ao contemplar a sua vida como muito mais do
ser humano, há que se tratar tal afirmação que um simples acumular de cotidianos e os
enxergando todos os seres humanos, des- propósitos de sua existência estarão além do
de os que seguem uma religião e creem em processo de obtenção de coisas para satisfa-
um Deus ou algo sagrado até aqueles que ção de seus desejos. Tal quadro permitirá que
não vivem nenhuma religião e sequer acre- o indivíduo leve também a sua alma ao con-
ditam num Ser ou Presença suprema. Tudo sultório de seu psicólogo de forma autêntica,
que leva o homem à transcendência do ego sem restrições e sem o medo de ver a mani-
acaba por ser um movimento da sua espiri- festação de sua espiritualidade diagnosticada
tualidade e faz parte da natureza humana a como uma psicopatologia.
internalização de tudo com o qual tem conta- A ciência avança e assim como houve
to e, dessa maneira, qualquer percepção fará tempo em que o planeta Terra foi considera-
parte do mundo interior do ser humano, seja do plano e sendo o centro de todo o univer-
ela advinda do que é material, seja advinda so, houve na psicologia um tempo em que o
do que é espiritual. psiquismo era investigado considerando-se
Assim como o pensamento denota a apenas o consciente e Freud veio a indicar
existência de uma realidade psicológica, a um novo caminho ao proclamar a existência
intuição denota a existência de uma reali- do inconsciente. Hoje novos passos precisam
dade espiritual no homem, porque conceber e estão sendo dados e a física quântica é um
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exemplo de novos caminhos que se abrem da natureza espiritual do ser humano. Con-
para a ciência e na psicologia a espiritualida- sequentemente alguém que é ateu e, dessa
de é algo que pode trazer uma nova orienta- maneira, não segue nenhum credo, ainda as-
ção, pois a expansão do homem de um “eu sim atende à unidade do homem como um
pessoal” para um “eu espiritual” apontará a ser biopsicossocial e espiritual.
necessidade de uma compreensão mais am- A possibilidade de o homem poder ex-
pliada do homem. O inconsciente proposto pressar a sua espiritualidade naturalmente o
por Freud será complementado pelo incons- aproximará de sua completude e o libertará
ciente espiritual proposto por Frankl e haverá da pressão de ter que decidir a orientação da
espaço tanto para uma religiosidade incons- sua vida pautada no mundo exterior, ou seja,
ciente quanto para a busca inconsciente de o homem será auxiliado a buscar a sua auto-
Deus e então o homem encontrará no setting ridade a partir do mundo que há dentro de si
psicoterapêutico também um caminho para a e a intuição e o simbólico serão mais recor-
busca de sua totalidade e a psicoterapia será rentes não só na hora terapêutica, mas em
ainda mais uma ferramenta para o autoco- qualquer tempo da vida do indivíduo.
nhecimento e o autodesenvolvimento do ser A existência do homem como ser espi-
humano. Ao psicólogo não caberá o papel de ritual traz um novo sentido para sua vida e a
propagador de crença ou conversão religiosa, permissão para que este trate a realidade es-
mas caberá o papel de compreender o seu piritual de forma consciente será um caminho
cliente através de uma empatia plena, irres- para que sua espiritualidade não fique repri-
trita e verdadeiramente transcendente, pois mida no inconsciente e gerando no homem a
havendo resistências egoicas provindas de angústia em forma de vazio existencial. A su-
suas crenças ou descrenças se verá impossi- perficialidade do mundo externo que só pode
bilitado de compartilhar a condição existencial chegar ao homem pela sua percepção, ou
do outro. A ampliação do homem de um ser seja, através da sua aparência, passará a ser
que deseja para um ser que também tem as- entendido como contexto e meio de expres-
pirações naturais e latentes de espiritualidade são de seu mundo interno e a atitude de va-
possibilitará significações mais elevadas da lorização da essência ao invés da aparência
existência humana que ocasionará um novo será capaz de preencher o vazio existencial
sentido para a sua vida. A alma não será mais tão comum na atualidade, pois o homem terá
um assunto velado pela sua impossibilidade a possibilidade de compreender que o vazio
de ser material e a espiritualidade deixará de que sente em seu mundo interno não pode ser
ser um campo minado para a ciência. preenchido com prazeres do mundo externo
A espiritualidade deixará de ser mo- e o homem priorizará o “ser” ao invés do “ter”.
nopólio da religião e passará a ser aspecto Mais do que instintivo o homem será espiri-
da natureza humana. Por analogia pode se tual e uma nova ótica poderá ser concebida
conceber a moral como manifestação da em temas como, por exemplo, o uso de dro-
ética, assim como a religiosidade como ma- gas para fugir da realidade oferecida ao ser
nifestação da fé e ambas: ética e fé, como humano e a violência decorrente da desigual
movimentos advindos da espiritualidade ou valorização do mundo externo em relação ao
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