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Saulo Oliveira dos Santos, Claudete Francisco de Sousa, Analícia Martins de Souza,
Lia Yamada , Paula Rego Monteiro, José Novaes, Carlos Eduardo Norte, José Rodrigues
Priscila Bastos, Janaína Sant Anna, Eliana Olinda, Priscila Correa e André Rangel
e-mail:
avaliacaopsicologica@crprj.org.br
Introdução
A partir de demandas específicas do Sistema Conselhos de Psicologia, fora instituído que o
ano de 2011 teria como tema para discussão e reflexão, questões relacionadas à prática da avaliação
psicológica.
Tal iniciativa ocorreu em virtude de inúmeros questionamentos e impasses sobre as
implicações das avaliações psicológicas, bem como sobre a elaboração de documentos pelos
profissionais psicólogos resultantes de seus trabalhos. Cabe sublinhar que nos últimos anos, novas
resoluções, diretrizes e outros materiais de referencia foram construídos pelo Conselho Federal de
Psicologia (CFP), com o objetivo de definir parâmetros para a realização de avaliações psicológicas.
No entanto, verifica-se que tem havido progressivo aumento no número de denúncias éticas feitas
nos Conselhos Regionais de Psicologia (CRP) a partir de laudos e pareceres emitidos por psicólogos
que, por vezes, trazem sérios prejuízos à vida dos sujeitos avaliados.
Assim, o Sistema Conselhos de Psicologia por considerar importante a reflexão sobre as
práticas produzidas e relacionadas à avaliação psicológica, definiu os seguintes eixos para disparar
a discussão entre os profissionais:
1 . Qualificação da avaliação psicológica
1.1. Critérios de reconhecimento e validação a partir dos direitos humanos;
1.2. Avaliação psicológica enquanto processo;
1.3. Manuais especificando seus contextos de aplicação e âmbitos de ação.
2. Relações institucionais a partir dos contextos em que a avaliação se insere;
3. Relação com o contexto de formação;
O primeiro eixo pretendeu destacar os princípios que devem nortear a prática profissional
do psicólogo durante a realização da avaliação psicológica, bem como os instrumentos utilizados
para sua elaboração, a partir do marco legal do Código de Ética Profissional do Psicólogo (CEPP) e
das resoluções que regulamentam esta prática, exclusiva do profissional psicólogo, pensadas sob a
perspectiva da promoção dos direitos humanos. O segundo eixo teve como objetivo contextualizar
a prática da avaliação psicológica com as diferentes áreas de atuação profissional, que, para além
de suas atribuições profissionais têm recebido demandas relacionadas à realização de inquirições,
mensurações, fiscalizações e investigações; objetivando assim, promover a reflexão com os
profissionais, acerca da práxis, considerando o compromisso ético-político da categoria.
O terceiro e último eixo refere-se à maior reflexão sobre o ensino da avaliação psicológica,
tanto na formação do psicólogo durante a graduação, bem como em cursos de pós-graduação e/ou
em outros espaços de ensino e divulgação do saber relacionado à avaliação psicológica. Para isso,
buscou-se dialogar com os diversos atores envolvidos na temática, com o intuito de qualificar o uso
das diversas ferramentas relacionadas à avaliação psicológica, bem como a elaboração adequada
de laudos, diagnósticos e pareceres psicológicos.
Assim, o XIII Plenário do Conselho Regional de Psicologia do Estado do Rio de Janeiro
(CRPRJ), ciente da importância e da relevância do assunto escolhido para o ano temático de
2011, aprovou a criação do Grupo de Trabalho Regional do Ano Temático da Avaliação Psicológica
(GTRATAP), com o objetivo de estruturar eventos preparatórios no âmbito estadual para promoção
de debates junto à categoria acerca da Avaliação Psicológica, da produção de documentos e das
repercussões que têm recaído sobre os envolvidos em tal prática.
Objetivos
• Mapear os principais entraves encontrados pelos representantes das diferentes
entidades formadoras e as estratégias encontradas para tal superação;
• Identificar fluxos de trabalhos nos diferentes campos de atuação profissional;
• Estimular e fomentar reflexões acerca das práticas profissionais, através de um
posicionamento ético-político;
• Refletir sobre o ideário social quanto a prática do profissional psicólogo e o que se
espera de uma avaliação psicológica;
• Difundir e discutir os instrumentos normativos da prática profissional;
• Organizar encontros regionais e estadual no intuito de estruturar as diretrizes
do posicionamento da categoria profissional do estado do Rio de Janeiro sobre a
temática;
• Fomentar junto ao Sistema Conselhos a implementação dos encaminhamentos
acordados em âmbito nacional.
Metodologia
Os encontros com a categoria profissional aconteceram em regiões que pudessem abarcar
o maior número possível de profissionais e estudantes. Assim, durante os meses de agosto a
dezembro de 2011, o GTRATAP organizou e realizou, com o apoio e parceria do CRPRJ, 02 encontros
na região metropolitana, sendo um específico para representantes de entidades formadoras, 01 na
região Serrana, 01 na Baixada Fluminense, 01 na região Norte Fluminense, 01 na Baixada Litorânea,
01 na região Médio Paraíba, 01 na região Costa Verde e 01 evento estadual, com o objetivo de
aprofundar a discussão sobre o tema, a partir das propostas e discussões realizadas em diferentes
regiões do estado do Rio de Janeiro. Neste último encontro, foram relacionados e discutidos junto
à categoria e estudantes os pontos que o CRPRJ apresentou e defendeu no Seminário Nacional de
Avaliação Psicológica, promovido pelo Conselho Federal de Psicologia, pautando possíveis novas
diretrizes para a prática profissional.
Cabe destacar ainda que a criação do GTRATAP possibilitou uma maior aproximação com a
categoria profissional e com representantes de entidades formadoras, por meio da promoção de
espaços de encontros regionalizados, onde se pode construir propostas e reivindicações, fomentar
questionamentos e elucidar entraves sobre a temática em tela.
O GTRATAP espera que os dados aqui expostos sejam analisadores potentes de reflexão
e de questionamentos acerca das práticas profissionais, lembrando que tais informações foram
construídas, discutidas e pensadas em conjunto com todos os participantes dos encontros
realizados no âmbito estadual e posteriormente deliberadas em nível nacional, em decorrência do
Seminário Nacional do Ano Temático da Avaliação Psicológica.
1
Tal Manifesto do CRP-05 contra a criação do título de especialista em avaliação psicológica, segue em anexo.
Eixo 01:
• Necessidade de criar estratégias de maior divulgação das Resoluções do Conselho
Federal de Psicologia relativas à avaliação psicológica, bem como a necessidade do
Sistema Conselhos de Psicologia revisar e atualizar outros documentos relativos
ao tema;
• Que o Sistema Conselhos fomente a discussão sobre o tema, ressaltando a diferença
entre “testagem” e “avaliação”;
• Que os testes avaliados e aprovados pela comissão consultiva do Sistema de
Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI) contemplem a realidade temporal,
social e cultural do indivíduo e principalmente considere as possíveis violações dos
direitos humanos ao ser utilizado;
• Que para além da comissão consultiva do SATEPSI, seja formada uma comissão
ad hoc no intuito de, conjuntamente, dirimir situações especificas que demandem
outros olhares;
• Que o CFP em parceria com entidades afins ao tema, fomente a prática de pesquisa
na área da avaliação psicológica;
• Necessidade de posicionamento público do CFP sobre divulgação indevida de testes
pela internet e em cursos ministrados, tendo em vista, que, sua exposição restringe
e/ou limita a possibilidade de utilização e validação dos mesmos;
• Que sejam realizadas reuniões ampliadas entre a comissão consultiva do SATEPSI
com comissões regionais e nacional de direitos humanos;
• Que seja disponibilizado no site do SATEPSI, informações relativas aos critérios
utilizados para validação de cada instrumento aprovado, com acesso restrito ao
psicólogo.
Eixo 02:
• Que o Sistema Conselhos promova amplos e contínuos debates sobre o tema,
problematizando os limites e possibilidades frente às diferentes inserções
profissionais;
• Divulgar através de publicações para a categoria e sociedade, os desdobramentos
advindos dos debates sobre a temática retratada;
• Que o Sistema Conselhos crie canais de interlocução com os diferentes órgãos,
entidades e instituições onde o profissional se insere, no sentido de viabilizar
discussões, orientações e esclarecimentos, ampliando o olhar sobre a avaliação
psicológica;
• Necessidade de criação de GT’s de avaliação psicológica, específicos nas áreas de
saúde, justiça, sistema prisional e trânsito.
Eixo 03:
• Necessidade do Sistema Conselhos articular ações conjuntas com o Ministério
da Educação (MEC), visando produzir discussões e encaminhamentos frente os
entraves elencados durante todo o ano temático;
• Necessidade de maior aproximação do Sistema Conselhos com os Serviços-Escola,
visando refletir sobre o processo de formação conciliado com as repercussões
éticas e técnicas da avaliação psicológica;
• Que o Sistema Conselhos garanta espaços de discussão sobre a concessão do título
de especialista em avaliação psicológica;
• Que o Sistema Conselhos promova discussões sobre os impactos da possível criação de
prova para obtenção do registro do CRP, como elemento de qualificação do profissional.
Diante do exposto, e a partir dos principais encaminhamentos aqui elencados, foi possível
considerar que o compromisso social e ético-político da Psicologia é consensuado entre a categoria
profissional. Contudo, o que fora possível identificar durante a realização do Ano Temático,
principalmente nas discussões em âmbito nacional, é que o debate sobre o fazer do psicólogo,
como também, a reflexão sobre os possíveis impactos na construção da subjetividade do avaliando;
e a reflexão sobre a influência exercida pelo profissional psi sobre o indivíduo, a partir de suas
avaliações psicológicas, diferem entre a categoria profissional.
Isto posto, cabe ressaltar que se torna imprescindível uma maior aproximação das questões
que perpassam a avaliação psicológica com as discussões dos direitos humanos, a fim de pensar
o lugar ocupado pela categoria profissional e principalmente refletir sobre o uso que fazemos dos
variados conceitos e definições matemáticas (desvio/padrão) que nos atravesessam em detrimento
da compreensão do indivíduo como um todo a partir dos condicionantes que o constituem.
Não obstante, é preciso ainda desmistificar que as demandas endereçadas aos profissionais
psis não devem ser vistas como encomendas, que necessariamente deverão ser levadas a termo pelo
psicólogo. E para isso se faz forçoso pensar nas questões éticas para além das Resoluções e do Código
de Ética, problematizando e questionando também os efeitos que nossas práticas produzem.
Por fim, entendemos que a Psicologia não deveria se pautar em uma discussão técnica da
avaliação psicológica. É preciso nos apropriar e veicular as questões epistemológicas através de
debates, do pensar e do posicionamento sobre o fazer profissional ao considerar, no momento da
avaliação psicológica, questões relacionadas à complexidade humana e sua potencialidade criativa,
bem como atentar para questões históricas, políticas, econômicas e culturais que nos atravessam.
E neste sentido, entendemos que tal conduta profissional, distanciada de uma visão
exclusivamente tecnicista e/ou psicométrica, não seria atribuição específica de um profissional
especialista sobre a temática aqui retratada, porém, é condição de todo o profissional psicólogo
convocado a intervir.
Consideramos que apenas uma visão tecnicista da Psicologia, como uma disciplina
objetiva, neutra, asséptica, ancorada em uma pretensa cientificidade a-histórica e não-
ideológica, é capaz de criar regras universais e absolutas para a avaliação psicológica. É
também esta orientação teórico-sistemática da Psicologia que, na discussão sobre critérios
éticos e de respeito aos Direitos Humanos para a construção e uso dos instrumentos e
ferramentas da avaliação psicológica, apresenta teses que subordinam estes critérios à
abordagem e aos requisitos unicamente psicométricos. O argumento é o de que, uma
vez estes requisitos atendidos, a Ética e os Direitos Humanos seguem a reboque, como
na tese da “validade conseqüencial” – que seria nada mais que um delírio psicométrico e
positivista, simplesmente.
Não são apenas os argumentos lógicos e teóricos, alguns elencados acima, que
nos levam a manifestar a presente moção. A prática profissional nos mostra, ao longo do
tempo, como os diversos títulos de especialista promovem distorções e usos perversos no
exercício profissional, ensejando, por exemplo, reserva de mercado. É o caso das empresas
de seguro-saúde que ao oferecerem serviços de Psicologia só aceitam psicólogos (as) que
tenham Titulo de Especialista na área clínica. Ou ainda, recentemente, os (as) psicólogos
(as) que atuam nas Clínicas de Trânsito terem que se submeter à obtenção do Título da
área para poder continuar trabalhando. O título de especialista em trânsito evidencia
novamente o perigoso efeito que a oferta gera na produção de demandas. Apesar da
garantia dada em reunião de Assembléia das Políticas Administrativas e Financeiras (APAF)
em que se aprovou a necessidade deste título apenas para os novos peritos de trânsito,
o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) atualmente exige que todos os psicólogos,
independente do tempo e experiência no campo sejam obrigados a apresentarem o título.