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Aula 01 – 11/02/2019
Definição de processo penal: Conjuntos de normas que vão reger a sanção penal.
Pretensão Punitiva:
Pode ser compreendida como o poder do Estado de exigir de quem comete um delito a
submissão à sanção penal. Através da pretensão punitiva, o Estado procura tornar efetivo o ius
puniendi, exigindo do autor do delito, que está obrigado a sujeitar-se à sanção penal, o cumprimento
dessa obrigação, que consiste em sofrer as consequências do crime e se concretiza no dever de abster-
se ele de qualquer resistência contra os órgãos estatais a que cumpre executar a pena.
Todavia, esta pretensão punitiva não pode ser voluntariamente resolvida sem um processo, não
podendo nem o Estado impor a sanção penal, nem o infrator sujeitar-se à pena. Em outras palavras,
essa pretensão já nasce insatisfeita. Afinal, o Direito Penal não é um direito de coação direta. Apesar
de o Estado ser o titular do direito de punir, não se admite a imposição imediata da sanção sem que
haja um processo regular, assegurando-se, assim, a aplicação da lei penal ao caso concreto, consoante
as formalidades prescritas em lei, e sempre por meio dos órgãos jurisdicionais (nulla poena
sinejudicio). Aliás, até mesmo nas hipóteses de infrações de menor potencial ofensivo, em que se
admite a transação penal, com a imediata aplicação de penas restritivas de direitos ou multas, não se
trata de imposição direta de pena. Utiliza-se, na verdade, de forma distinta da tradicional para a
resolução da causa, sendo admitida a solução consensual em infrações de menor gravidade, mediante
supervisão jurisdicional, privilegiando-se, assim, a vontade das partes e, principalmente, do autor do
fato que pretende evitar os dissabores do processo e o risco da condenação.
É exatamente daí que sobressai a importância do processo penal, pois este funciona como o
instrumento do qual se vale o Estado para a imposição de sanção penal ao possível autor do fato
delituoso.
Mas o Estado não pode punir de qualquer maneira. Com efeito, considerando-se que, da
aplicação do direito penal pode resultar a privação da liberdade de locomoção do agente, entre outras
penas, não se pode descurar do necessário e indispensável respeito a direitos e liberdades individuais
que tão caro custaram para serem reconhecidos e que, em verdade, condicionam a legitimidade da
atuação do próprio aparato estatal em um Estado Democrático de Direito. Na medida em que a
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liberdade de locomoção do cidadão funciona como um dos dogmas do Estado de Direito, é intuitivo
que a própria Constituição Federal estabeleça regras de observância obrigatória em um processo penal.
É a boa (ou má) aplicação desses direitos e garantias que permite, assim, avaliar a real observância dos
elementos materiais do Estado de Direito e distinguir a civilização da barbárie.
Adotado pelo direito canônico a partir do século XIII, o sistema inquisitorial tem como
principal característica o fato de as funções de acusar, defender e julgar encontrarem-se
concentrados em uma única pessoa, que assume assim as vestes de um juiz acusador, chamado
de juiz inquisidor. No processo penal inquisitório, o juiz enfeixava/concentrava em suas mãos
os poderes de acusar e de julgar, ou seja, o próprio juiz formulava a acusação que iria, ao final
do processo, julgar. A defesa era um simulato e o réu era considerado um simples objeto de
investigação e não um sujeito processual
Em virtude dessa concentração de poderes nas mãos do juiz, não há que se falar em
contraditório, o qual nem sequer seria concebível em virtude da falta de contraposição entre
acusação e defesa. Ademais, geralmente o acursado permanecia encarcerado preventivamente,
sendo mantido incomunicável.
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Por essas características, fica evidente que o processo inquisitório é incompatível com
os direitos e garantias individuais, violando os mais elementares princípios processuais penais.
Sem a presença de um julgador equidistante das partes, não há falar em imparcialidade, do que
resulta evidente violação à Constituição Federal e à própria Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (CADH, art. 8, nº 1).
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Não há
contraditorio
Juiz dotado de
ampla iniciativa
probatória
Verdade real
Como exemplo do papel do juiz na produção de prova, tem-se o art. 212 do CPP que
trata do método de questionamento das testemunhas, conhecido como exame direto e cruzado.
Antes de 2008, cabia ao juiz a formulação de perguntas. Atualmente, as perguntas são feitas
diretamente pelas partes, cabendo ao magistrado atuação residual.
CPP Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o
juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de
outra já respondida.
Por fim, aqui o princípio da verdade real é substituído pelo princípio da busca da
verdade (verdade processual), devendo a prova ser produzida com a fiel observância ao
contraditório e à ampla defesa.
Não há separação das funções de acusar, Separação das funções de acusar, defender e
defender e julgar, que estão concentradas em julgar. Por consequência, caracteriza-se pela
uma única pessoa, que assume as vezes de presença de partes distintas, contrapondo-se
um juiz inquisidor. acusação e defesa em igualdade de
condições, sobrepondo-se a ambas um juiz,
de maneira equidistante e imparcial.
A gestão da prova está concentrada nas mãos O juiz não é dotado do poder de determinar
do juiz, que pode produzir provas de ofício de ofício a produção de provas, já que estas
em qualquer fase da persecução penal. devem ser fornecidas pelas partes. Parcela
da doutrina admite certa iniciativa
probatória residual do magistrado,
exclusivamente, durante a fase judicial.
Esse sistema é usado nos países que adotam o Juizado de Instrução, o qual possui uma
fase inquisitiva e uma fase acusatória.
Obs: Quadro mental paranoico do julgador: É primado das hipóteses sobre os fatos. Uma vez
estabelecido uma hipótese, todo o esforço é montado para que aquela hipótese fosse confirmada.
A ação penal é, em regra, pública, cabendo ao MP promovê-la com exclusividade (art. 129, I,
CRFB). Este dispositivo aboliu do processo penal brasileiro a ação penal de ofício, a qual dava ensejo
à formação de um processo ou procedimento judicialiforme. Isso porque até 1988 havia, no processo
penal brasileiro, a ação penal de ofício, que era iniciada por portaria ou auto de prisão em flagrante,
ou seja, até 1988, o processo penal brasileiro seguia o sistema misto. Nas contravenções penais e nos
crimes de lesão corporal culposa e homicídio culposo, o próprio juiz podia dar início à ação penal por
meio de portaria, bem como a autoridade policial por meio de portaria ou auto de prisão em flagrante.
Assim, a CRFB purificou o sistema acusatório de processo, já adotado pelo CPP excluindo os
resquícios do sistema inquisitório.
Há uma fase da persecução penal que é inquisitiva. A persecução penal se desdobra em duas
fases, a saber: a) investigação criminal – sua finalidade básica é apurar o fato criminoso, suas
circunstâncias e autoria a fim de que o MP (ação penal pública) ou o particular (ação penal de iniciativa
privada) possa promover a ação penal; b) ação penal – processo penal propriamente dito.
O MP não pode presidir inquérito policial porque o inquérito de que trata o CPP é chamado de
inquérito policial justamente porque é presidido por uma autoridade policial. Por outro lado, o MP
pode realizar diretamente atos de investigação criminal para subsidiar a sua atividade persecutória em
Juízo, conforme entendimento do STF. No entanto, isso não pode ocorrer por meio de inquérito
policial, pois este é da competência da polícia judiciária e não do MP. Desde 2006, a resolução nº 13
do CNMP disciplina a atividade investigatória do MP.
E o juiz? Ele pode realizar atos de investigação criminal? Num sistema acusatório que se
caracteriza basicamente pela absoluta separação entre as funções de acusar e julgar, não. No CPP de
1940, o juiz tinha funções persecutórias, mas essas funções foram excluídas do ordenamento jurídico
com a CRFB/88. O juiz não é órgão da persecução penal, mas sim da jurisdição.
Há certas pessoas que gozam de foro especial por prerrogativa de função e os magistrados estão
nesse rol de pessoas. A quem compete processar e julgar juiz de direito por crime? Do TJ, conforme
art. 96, III, CRFB. No caso do RJ, cabe ao Órgão Especial. De quem é a atribuição originária para
propor a ação penal? Do Procurador-Geral de Justiça, de acordo com art. 29, V, Lei 8.625/93 (Lei
Orgânica Nacional do MP).
Quem preside a investigação criminal quando se tratar de crime praticado por juiz de direito?
Nesse caso, a Lei Orgânica Nacional da Magistratura (LC 35/75) estabelece que a investigação em
crime praticado por magistrado deve ser realizada pelo respectivo tribunal. A jurisprudência está no
sentido de que o art. 33 da LC 35/75 foi recepcionado pela Constituição.
Na prática, como se concilia essa ideia de processo penal acusatório – em que o juiz não
participa da investigação para preservar sua imparcialidade – com a presidência de uma investigação?
As diligências são pedidas pelo PGJ e a execução é determinada pelo desembargador. Essa é a única
hipótese no processo penal brasileiro que o Judiciário interfere na investigação.
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Essas diligências, que só poderão ser realizadas se deferidas pelo juiz são:
a) Interceptação de comunicações telefônicas (art. 5º, XII, CR) – sem exceções, sob pena de a
prova obtida ser taxada de ilícita;
b) Busca domiciliar – em regra, a busca depende de autorização judicial prévia e deve ser feita
durante o dia, sob pena de a prova obtida ser considerada ilícita e, portanto, imprestável. Até 1988, o
próprio Delegado podia realizar pessoalmente a busca ou expedir o respectivo mandado (art. 241,
CPP). Este dispositivo não foi recepcionado pela CR porque o art. 5º, XI, CR passou a exigir a
autorização judicial como regra e, portanto, o art. 241 do CPP não passou no filtro constitucional. No
entanto, há exceções: se houver consentimento do morador; para prestar socorro; se houver flagrante
delito. A configuração do flagrante delito autoriza a busca domiciliar sem a autorização judicial, bem
como autoriza a busca a qualquer hora do dia ou da noite.
O conceito de flagrante delito está no art. 302 do CPP. O flagrante pode ser:
- Flagrante próprio, real ou verdadeiro (302, I e II, CCP). Quando o sujeito está cometendo a
infração ou acabou de cometê-la.
- Flagrante impróprio (art. 302, III, CPP): quando o sujeito é perseguido logo após a prática do
delito quando avistado.
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- Flagrante ficto ou presumido (art. 302, IV, CPP): quando o sujeito é encontrado logo após a
prática do crime com elementos que presumem a sua autoria.
Os flagrantes do art. 303 do CPP são próprios porque a conduta do agente faz com que a
conduta se prolongue no tempo. Assim, não há discussão sobre a licitude da busca domiciliar porque
o flagrante é real na extorsão mediante sequestro.
O STF decidiu há pouco tempo sobre o tema: a busca domiciliar no caso de busca de drogas é
regular e a prova obtida é lícita, desde que haja fundadas suspeitas da caracterização do flagrante delito.
A ação policial não pode ser arbitrária, tem que haver dados concretos. Na prática, sabe-se que não é
assim que acontece.
c) Quebra de sigilo bancário, fiscal ou telefônico – em regra, deve ser precedida de autorização
judicial porque o sigilo desses dados é considerado expressão do direito constitucional à privacidade.
Ao quebrar o sigilo, está se afastando a privacidade no que tange àqueles dados.
No entanto, o STJ admite que a CPI quebre sigilo bancário, fiscal ou telefônico por ato próprio,
desde que devidamente fundamentado. De acordo com o STF, não é permitido que a CPI autorize
busca domiciliar ou interceptação de comunicações telefônicas porque, em relação a essas, há a
chamada reserva de jurisdição. A CPI pode requisitar da concessionária do serviço público de telefonia
informações sobre o uso de determinada linha telefônica.
A Lei 12.850/13 permite, no seu art. 23, ao MP e à autoridade policial obter diretamente dados
relativos às contas correntes, telefônicas, etc no que concerne à atividade organizada. Não há
jurisprudência a respeito do tema.