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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAIBA – FESP

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

FELIPE FRANCO DE HOLANDA CAVALCANTI

ATUAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA E SUAS LIMITAÇÕES


NO SISTEMA ADMINISTRATIVO BRASILEIRO

João Pessoa
2010
FELIPE FRANCO DE HOLANDA CAVALCANTI

ATUAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA E SUAS LIMITAÇÕES NO


SISTEMA ADMINISTRATIVO BRASILEIRO

Monografia apresentada como requisito


complementar para obtenção do grau de
Bacharel em Direito pela Fesp Faculdades-
Faculdade de Ensino Superior da Paraíba.

Orientadora: Prof ª. Dra. Luciana Villar

João Pessoa
2010
C376a Cavalcanti, Felipe Franco de Holanda

Atuação do poder de polícia e suas limitações no sistema


administrativo brasileiro / Felipe Franco de Holanda Cavalcanti –
João Pessoa, 2010.

54f.

Orientadora: Profª. Luciana Vilar de Assis

Monografia (Graduação em Direito) Faculdade de Ensino


Superior da Paraíba – FESP.

1. Poder de polícia 2. Características 3. Atuação 4. Aplicabilidade


abusiva 5. Limitação I. Título.

BC/FESP CDU: 34(043)


FELIPE FRANCO DE HOLANDA CAVALCANTI

ATUAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA E SUAS LIMITAÇÕES NO


SISTEMA ADMINISTRATIVO BRASILEIRO

Aprovada em: ______ / ______ / _______.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________
Profª Luciana Vilar de Assis
Orientadora

__________________________________
Prof.
Membro da Banca Examinadora

__________________________________
Prof.
Membro da Banca Examinadora
Dedicatória

Dedico este trabalho à minha Avó (parte de mãe): Walderez Settime Pessoa Franco,
quem sempre acreditou em mim; ao meu Avô (parte de mãe): Amaury Ferreira Franco
(in memorian) juntamente com meu Pai: Heraclides da R. de H. Cavalcanti Filho,
verdadeiramente os maiores mestres que tive; a minha Avó e meu Avô (parte de pai)
Dona Lia e Seu Hera (in memorian); a minha Mãe: Ilma Brigida Franco Cavalcanti,
quem sempre manteve a fé e a minha Irmã; Amily Franco.
À minha Esposa Lívia Marcella, minhas filhas Thaila e Thalita por ser de belezas
igualmente imensuráveis e admiráveis enquanto pessoas na sua essência, motivação que
me impulsiona a galgar vida nova a cada dia, sou grato por terem se conformado em se
privar de minha companhia pelos estudos, outorgando a mim a chance de me realizar
ainda mais.
AGRADECIMENTOS

Sei que esta monografia é o resultado de uma longa e difícil caminhada, sei também que
agradecer pode não ser tarefa fácil, nem tampouco justa. Agradeço então em primeiro lugar à
Deus quem me concedeu condições para estudar, o que seria de mim sem a fé que eu tenho
nele.
Agradeço a meus pais Holanda e Ilma por cumprirem este papel magistralmente e pelo amor
intenso e a minha irmã Amily, todos diante das circunstâncias com muito esforço me
proporcionaram o conhecimento que consegui adquirir.
Aos meus avôs parte de pai, Dona Lia e Seu Hera (in memorian).
Aos meus avôs parte de mãe Walderez e Amaury (in memorian), com quem aprendi que o
conhecimento é a única coisa que ninguém consegue subtrair do ser humano.
À minha esposa Lívia Marcella e as minhas filhas Thaila e Thalita, que tanto suportaram com
minha ausência quando da elaboração desta monografia e dos diversos trabalhos durante os
cinco anos do curso, e que com muito carinho e apoio, não mediram esforços para que eu
chegasse até esta etapa de minha vida.
À professora Luciana Villar de Assis pela paciência na orientação e dedicação que tornaram
possível a conclusão desta monografia. Aos demais professores desta Faculdade que fizeram
parte dessa jornada em sala de aula.
À todos da minha família pela base sólida que sempre me deu força para encarar a vida de
frente, para não correr o risco de cometer uma injustiça, agradeço também a todos que de
alguma forma passaram pela minha vida e colaboraram para a construção de quem sou hoje,
enfim a todos:

MUITO OBRIGADO!
Epígrafe

“Não podendo fazer que se fosse obrigado a obedecer à justiça, fizeram que fosse justo
obedecer à força.”

Blaise Pascal
RESUMO

Esta monografia faz um breve estudo no que concerne ao poder de polícia exercido pelo
Estado, abordando suas limitações e atuações considerando a autonomia prescrita na
Constituição Federal. Identificando com isso o abuso de poder que vem acontecendo no
sistema administrativo brasileiro. O principal fundamento do poder de polícia é o princípio da
supremacia do interesse coletivo sobre o particular. Por ele, limitam-se os direitos individuais
das pessoas em benefício do interesse geral da sociedade. De certa forma o poder de polícia
pretende proteger com segurança os direitos de liberdade, bens, o direito de saúde e bem estar
do cidadão. No entanto, mesmo limitando a liberdade individual, tem por escopo garantir essa
mesma liberdade e direitos básicos ao particular. De início, faz-se um relato sobre o poder de
polícia, com sua origem, conceito, atuação e características. Identifica-se sua aplicabilidade de
forma abusiva em nosso sistema administrativo, tomando como base suas limitações,
finalidades, fundamento e atuações. Por fim, são apresentadas as polícias administrativas e
judiciárias, as condições de validade dos atos, o controle dos atos feito pela administração e as
limitações feitas pelo Supremo Tribunal Federal.

Palavras-chave: Poder de polícia. Características. Atuação. Aplicabilidade abusiva.


Limitação.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8

CAPÍTULO 1 - DO PODER DE POLÍCIA ......................................................................... 11


1.2 ORIGEM ....................................................................................................................... 11
1.3 CONCEITO .................................................................................................................. 13
1.4 ATUAÇÃO .................................................................................................................... 18
1.4 LIMITAÇÃO ................................................................................................................ 19
1.5 CARACTERÍSTICAS/ATRIBUTOS......................................................................... 20
1.5.1 Discricionariedade ........................................................................................................ 20
1.5.2 Auto-executoriedade..................................................................................................... 21
1.5.3 Coercibilidade ............................................................................................................... 22
1.6 O PODER DE POLÍCIA COMO UMA ATIVIDADE NEGATIVA E POSITIVA ..
........................................................................................................................................ 23

CAPÍTULO 2 - USO E ABUSO DO PODER DE POLÍCIA ............................................. 24


2.1 DO ABUSO DE PODER.............................................................................................. 24
2.1.1 Conceito ......................................................................................................................... 24
2.2 FORMAS DE ABUSO DE PODER ............................................................................ 27
2.3 EXCESSO DE PODER E DESVIO DE FINALIDADE ........................................... 28
2.2.1 Origem do desvio de poder .......................................................................................... 30
2.2.2 Características de desvio de poder.............................................................................. 31
2.2.3 Prova .............................................................................................................................. 32
2.3 PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE NO ABUSO DE PODER .................. 32
2.5 O ABUSO DE PODER NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL ..................................................................................................................... 33

CAPÍTULO 3 - O PODER DE POLÍCIA NO SISTEMA DMINISTRATIVO


BRASILEIRO ......................................................................................................................... 36
3.2 POLÍCIA JUDICIÁRIA .............................................................................................. 38
3.3 CONDIÇÕES DE VALIDADE ................................................................................... 39
3.2 SANÇÕES ..................................................................................................................... 40
3.5 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ................................................... 41
3.6 O PODER DE POLÍCIA DAS FORÇAS ARMADAS ............................................. 43
3.7 LIBERDADES FUNDAMENTAIS NO STF ............................................................. 45

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................49

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 52
INTRODUÇÃO

Em certo momento da história o ser humano começou a viver em grupos, ou seja, em


sociedade. Houve muitos conflitos porque estes estavam agindo motivados pelos interesses
ligados a sua família, ou melhor, ao seu bem-estar particular. No intuito de exterminar esses
conflitos foi necessário criar regras e sanções para trazer de volta a tranquilidade de todos.
Mas, para isso se concretizar, algumas leis infraconstitucionais e uma espécie de Constituição
foi criada, assim como outras leis, estabelecendo aos cidadãos alguns direitos devendo estes
ser voltados não para seu bem-estar particular e sim para o interesse geral da sociedade.
Para que os objetivos do governo não fossem barrados, a propriedade e a liberdade
utilizadas pelos cidadãos teriam que estar em constante entrosamento com interesse geral da
coletividade. Com isso, para limitar e especificar os direitos individuais dos cidadãos, estes
tiveram que ser embasados nas leis. No entanto, foi direcionado para o sistema administrativo
público fiscalizar se estes direitos não estão atingindo direta ou indiretamente o bem-estar da
coletividade.
Para que a Administração Pública conseguisse fiscalizar os direitos individuais dos
cidadãos tiveram que ser criados muitos órgãos. Esses órgãos são responsáveis pela
adequação do direito individual ao interesse geral, dentro desse órgão encontramos o poder de
polícia.
Segundo Meirelles (2007, p. 84) Poder de Polícia é a “faculdade de que dispõe a
Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos
individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”.
A partir da convivência no meio social existe a possibilidade de se adquirir bens com
diferentes maneiras de utilização. Na Constituição Federal brasileira atual, em seu artigo 5°,
inciso XXII, é assegurado o direito de propriedade. Neste mesmo termo, dispõe o Código
Civil de 2002, em seu artigo 1.228 que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor
da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou
detenha.” Em compensação, a Constituição Federal brasileira atual em seu artigo 5°, inciso
XXIII, impõe limites ao direito de propriedade, quando coloca em seu enunciado que a
mesma deverá atender sua função social. Contudo não diferente do tratamento constitucional,
em sentido semelhante tratou o Código Civil de 2002 nos §§ 1° e 2° do artigo 1.228 sobre o
assunto da seguinte forma: “O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com
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as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade


com o estabelecido em lei especial, a flora a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico
e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas” e, ainda,
“São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e
sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.”
O poder de polícia no sistema administrativo brasileiro, de maneira sucinta, trata, de
certo modo, sobre as formas que a Administração Pública encontrou para impor limites ao
direito de liberdade da sociedade, assim como ao modo de utilização e função dos bens
particulares dos administrados, na tentativa de impedir que particulares tirem proveito do seu
patrimônio sem abusar das regras impostas para tanto. De forma simplificada, o poder de
polícia foi criado para não permitir que o interesse particular venha a prevalecer sobre o
coletivo. Contudo o Estado detém a atividade dos cidadãos que se opuserem a esta forma de
controle aplicando sanções.
Mello (2006. p. 789), em se tratando das conceituações do poder de polícia, diz que tal
instituto se “destina a impedir um dano para a coletividade, que poderia resultar do exercício
da liberdade e da propriedade se uma ou outra não fossem contidas em limites estabelecidos à
vista do propósito de harmonizá-las com os interesses da coletividade.”
Muito embora em nosso país possa se admitir normalmente a prática da aquisição de
bens privados por pessoas físicas ou jurídicas, estes devem ser usados de forma que não
prejudique ou coloque em risco toda uma sociedade. Contudo, em todos os níveis da
Administração Pública tem-se o poder de polícia, porém, a definição de quem será o
responsável pela fiscalização é feita através de Lei. Ainda assim, os entes da Federação
podem exercer concorrendo eventualmente o poder de polícia com agentes públicos, quando a
competência o permitir. Como exemplo pode ser citado quando uma determinada cidade
exige, de acordo com lei específica, que seja observado limite de altura para construção de
edifícios à beira-mar da cidade. Se houver o desrespeito a essa lei o Poder Público pode vir a
determinar a interrupção desta construção. Como mais um exemplo pode ser citado o controle
ou proibição das bebidas alcoólicas em postos de combustível. O poder de polícia é taxado
como atividade negativa, pois, impõe uma abstenção ao cidadão de certa obrigação, assim
afirma Mello (2006). As restrições impostas têm o objetivo de evitar que as atividades
pretendidas pelos particulares sejam executadas de uma forma perigosa ou mal intencionadas.
Portanto serão apresentados os critérios de uso do poder de polícia exercido pelo
Estado, abordando suas limitações, princípios que o norteiam e citado o abuso de poder que
vem acontecendo no sistema administrativo brasileiro. Será feito um levantamento a respeito
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do poder de polícia no Brasil dando ênfase no seu meio de atuação, uma análise a respeito da
aplicação do poder de polícia no Brasil, abordagem de temas polêmicos relacionados ao poder
de polícia como exemplo e por fim uma breve explicação de sanções e os meios de atuação do
poder de polícia.
Como este trabalho tem a finalidade de identificar questões relacionadas com atuação
do poder de polícia e suas limitações no sistema administrativo brasileiro, pode-se questionar
o seguinte: quais as formas de atuação do poder de polícia e possíveis conseqüências
referentes à adoção de determinadas posturas sobre o alcance da proteção conferida aos
direitos individuais e liberdades fundamentais dentro de seus limites?
Mediante a abordagem e tentativa de respostas desse questionamento, buscam-se
apresentar o conceito, o uso e abuso, os princípios e as limitações do Poder de Polícia
previstos em nosso ordenamento jurídico. Cogita-se, pelas circunstâncias recém citadas, que o
poder de polícia, ao menos doutrinariamente, tem uma função essencialmente preventiva e
fiscalizadora, também sendo em alguns momentos repressiva, limitando e condicionando a
atividade dos administrados, impondo a eles, através da coercitividade, uma certa dedicação
ao seu dever de fazer cumprir a lei, procurando ajustar o seu comportamento ao interesse da
sociedade. Razão pela qual é indispensável delimitar o alcance pretendido neste trabalho.
CAPÍTULO 1 - DO PODER DE POLÍCIA

No sistema administrativo brasileiro estão designados uma série de deveres aos


agentes públicos, relacionados com o uso, gozo e disposição da propriedade e com o exercício
da liberdade. O exercício desses deveres, apesar disso é limitado e deve ser compatível com o
bem-estar social ou com o próprio interesse do Poder Público. Esse condicionamento da
liberdade e da propriedade dos administrados aos interesses públicos e sociais é alcançado
pela atribuição do poder de polícia.

1.2 ORIGEM

Guimarães (2004, p. 431) define a palavra polícia como sendo:

Órgão do Poder Público incumbido de garantir, manter, restaurar a ordem e a


segurança públicas; zelar pela tranqüilidade dos cidadãos; pela proteção dos bens
públicos e particulares; prevenir as contravenções e violações da lei Penal e auxiliar
a Justiça. A que vem do latim “politia” e do grego “politea”, ligada como o termo
política, ao vocábulo “polis”.

Durante o período feudal, se tinha como detentor nato de um poder chamado “jus
politea” um príncipe, este que sempre dava ordens pra que tudo ocorresse da melhor maneira
possível e para que o bom costume fosse mantido na sociedade civil, tudo conforme o Estado,
contudo, a igreja mantinha a boa ordem moral e religiosa.
Faz-se necessário no momento mencionar o significado da palavra poder na breve
definição de Guimarães (2004, p. 430):

Uma força iminente do Governo para atingir sua finalidade; possibilidade legal de
agir, de fazer. Direito de ordenar, de fazer-se obedecer, pela força coercitiva da lei
ou das atribuições de que se reveste o cargo de que está investido quem tem a
faculdade de ordenar.

Em meados do século XV, na Alemanha o jus politea retoma toda a atividade do


Estado, dando plenos poderes ao príncipe, intervindo assim na vida particular dos cidadãos,
com a intenção de alcançar o bem estar da sociedade. Porém o direito de polícia do príncipe
começou a ser restringido primeiramente nas atividades da igreja vindo a sofrer alterações
também nas atividades militares chegando ao ponto de ficarem voltadas apenas as atividades
internas da Administração. Tudo isso se deu devido ao fato de que foram feitas uma diferença
12

entre justiça e polícia; estando assim a justiça longe da alçada do príncipe ficando apenas
voltadas aos juízes e a polícia eram justamente as normas que o próprio príncipe colocava em
vigor sem dar chance alguma de apelo aos indivíduos perante os Tribunais. Contudo a
expressão poder de polícia era utilizada para toda ação estatal dirigida ao bem-estar dos
administrados. Essa visão é própria da época dos Estados absolutos, nos quais a autoridade
era incontestável perante seus súditos. O direito era considerado como emanado do soberano
(rei), que não errava.
Nascia então uma nova fase, a qual não era mais aceito que o príncipe não se
submetesse a algumas leis. Baseado no princípio do liberalismo o Estado de Direito assegurava
aos cidadãos direitos, sendo um deles a liberdade. Com isso ficavam limitados os direitos
individuais desses mesmos cidadãos, assegurando assim a ordem pública.
Já em outra fase o Estado liberal começa a transformar-se em Estado intervencionista,
ou seja, ele passou também a atuar na ordem econômica e social não ficando apenas limitado a
segurança.
Di Pietro (2004, p. 94) conceitua de forma clássica o poder de polícia como sendo:
“Pelo conceito clássico, ligado à concepção liberal do século XVIII, o poder de polícia
compreendia a atividade estatal que limitava o exercício dos direitos individuais em benefício
da segurança”.
Vê-se que, por essa acepção clássica, a atividade de polícia compreendia atos que
limitavam o exercício dos direitos individuais em benefício da segurança da cidade (polis).
Medauar (2004, p. 392) nos lembra que:

Nos ensinamentos de Caio Tácito a expressão poder de polícia ingressou pela


primeira vez na terminologia legal no julgamento da Suprema Corte norte-
americana, no caso Brown x Maryland, de 1827; a expressão aí se referia ao poder
dos Estados-membros de editar leis limitadores de direitos, em benefício do
interesse público. Em 1915, Ruy Barbosa utiliza pela primeira vez a expressão
"poder de polícia" em parecer da época. Em 1918, Aurelino Leal publica o livro
Polícia e poder de polícia consagrando-se o uso da expressão no direito brasileiro.

Como se vê na citação acima, os autores antes do século XX, já começam a usar a


expressão poder de polícia. Essa expressão vem se tornando cada vez mais comum entre eles e
sendo verificado que esse poder começou a atuar nas mais variadas partes das atividades dos
cidadãos, visando o interesse do bem-estar destes.
Contudo o poder de policia até o presente momento cresceu rapidamente e logo
começou tratar de assuntos diferentes da segurança, antes a própria segurança era relacionada à
ordem pública, em seguida passou a tratar de assuntos referentes à ordem social e econômica,
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como por exemplo, algumas medidas relacionadas ao exercício das profissões, aos espetáculos
públicos, ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e artístico nacional, à saúde, todas essas
medidas com o intuito de preservar o direito individual e o bem-estar de cada cidadão.
Há pouco tempo atrás, a polícia passou a ter a nobre missão de manter a ordem, a
tranqüilidade e a salubridade públicas, seja prevenindo, fiscalizando os cidadãos e realizando
sanções para quem vier a descumpri-las. Com o passar do tempo o nome “polícia” foi se
ramificando em várias outras atividades no sistema administrativo brasileiro. Em outros
países foram aos poucos surgindo vários outros nomes. No Brasil surgiram a policia
judiciária, administrativa e sanitária (ramo da policia administrativa), assim como foi
atribuído ao Estado pela primeira vez na Constituição 1824, art.169, poderes expressos em lei
maior referente a poder de policia e sua postura.
O poder de polícia é taxado como sendo uma atividade negativa, pois, impõe uma
abstenção ao cidadão de certa obrigação, assim afirma Mello (2006). Na verdade, sendo
obrigação negativa ou obrigação positiva, a pessoa que a cumpre sempre estará coagida a uma
limitação da sua liberdade, em beneficio do interesse público sobre o particular.
Melo (2006, p. 776) nos permite ter um breve resumo sobre poder de polícia de uma
forma clara e objetiva:

Através da Constituição e das leis os cidadãos recebem uma serie de direitos.


Cumpre, todavia, que o seu exercício seja compatível com o bem-estar social. Em
suma, é necessário que o uso da liberdade e da propriedade esteja entrosado com a
utilidade coletiva, de tal modo que não implique uma barreira capaz de obstar à
realização dos objetivos públicos.

1.3 CONCEITO

Na lição de Di Pietro (2004, p. 94) temos que: “Pelo conceito moderno, adotado no
direito brasileiro, o poder de polícia é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício
dos direitos individuais em benefício do interesse público”.
No Estado de Polícia, os poderes eram determinados segundo uma avaliação da
consciência do cidadão do que deveria ser considerado interesse público. O interesse público
supracitado esta voltado a diversas áreas da sociedade, sendo elas: segurança, saúde, meio
ambiente, defesa do consumidor, patrimônio cultural, propriedade entre outros. Para atender o
interesse público nessas diversas áreas, surgiram a polícia de segurança, das florestas, das
águas, de trânsito, sanitária etc. Sendo elas divididas dentro da policia administrativa. Sendo
assim, uma classificação que separa a polícia em duas classes: polícia de segurança e polícia
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administrativa, entende-se a primeira como a que tem por objetivo defender os direitos dos
indivíduos e do Estado, e a segunda como a tutela da boa ordem administrativa.
Nesse sentido, Sundfeld (1997, p. 14) em excelente monografia, contribui com maestria
em sua explanação:
A idéia de poder de polícia foi cunhada para um Estado mínimo, desinteressado em
interferir na economia, voltado, sobretudo, à imposição de limites negativos à
liberdade e à propriedade, criando condições para convivência dos direitos. Daí
haver-se definido o poder de polícia como imposição ao particular do dever de
abstenção, de não fazer. Mas, modernamente, a interferência estatal se intensificou e
mudou de qualidade, por conta da superação do liberalismo clássico. O Estado
Social, mais do que pretender a harmonização dos direitos individuais, impõe
projetos e serem implementados coletivamente: o desenvolvimento nacional, a
redução das desigualdades, a proteção do meio ambiente, a preservação do
patrimônio histórico.

Várias são as criticas apontadas pela doutrina, mencionando tal poder como sendo
limitador e regulador, no entanto será adotada a expressão poder de polícia ao longo deste
trabalho, haja vista que é recepcionada em texto legal pela Constituição Federal.
Caetano (1990, p. 1150) define poder de polícia como:

O modo de atuar da autoridade administrativa que consiste em intervir no exercício


das atividades individuais susceptíveis de fazer perigar interesses gerais, tendo por
objeto evitar que se produzam, ampliem ou generalizem os danos sociais que as leis
procuram prevenir.

Na tentativa de prevenir ou reprimir danos sociais foi criada a polícia, esta detém o
poder de reprimir determinados atos de indivíduos que pretendem colocar em risco os
interesses comuns da sociedade. A expressão poder "de" polícia não se confunde com poder
"da" polícia, porque se a polícia tem a possibilidade de agir, em concreto, pondo em atividade
todo o aparelhamento de que dispõe, isso se deve à potes tas que lhe confere o poder de
polícia. O poder "de" polícia é que fundamenta o poder "da" polícia. Deixa claro que o poder
de polícia é a causa, o fundamento, sendo que a polícia é a conseqüência. Por fim, conceitua o
poder de polícia como a faculdade discricionária do Estado de limitar a liberdade individual,
ou coletiva, em prol do interesse público (CRETELLA JÚNIOR, 1999).
Neste sentido se faz oportuno transcrever a conceituação do poder de polícia
apresentada por Faria (2000, p. 206-207), a saber:

Pode-se afirmar que poder de polícia, em sentido estrito, é a atribuição legal conferida à
Administração Pública para, no exercício de suas competências (regrada ou discricionária),
promover a fiscalização do exercício do direito de propriedade e de liberdade, com vistas a
evitar abusos em prejuízos da coletividade ou do Estado. Para isso, pode valer-se de seus
meios próprios, nos limites da lei, para coibir os atos lesivos e impor sanções previstas em
lei.
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Existem no poder de polícia elementos essenciais para defini-lo, são eles: o primeiro
elemento, de obrigatória presença na definição de polícia, é o da fonte de que provém, o
Estado, ficando, pois, de lado, qualquer proteção de natureza particular; o segundo elemento,
o escopo, de natureza teleológica , também é essencial para caracterizar a polícia, ou seja, não
existe o instituto se o fim que se propõe por outro que não o de assegurar a paz, a
tranqüilidade, a boa ordem, para cada um e para todos os membros da comunidade; o terceiro
elemento que não pode faltar na definição de polícia é o que diz respeito, in concreto, às
limitações a qualquer tipo de atividade que possa perturbar a vida em comum.(CRETELLA
JÚNIOR, 1999)
O verdadeiro fundamento do poder de polícia administrativo é evitar danos à
coletividade pela ação de particular. É a atividade do Estado que tende a regular o equilíbrio
necessário entre a existência individual e o bem comum quando perturbado. É sabido que o
serviço público pode ser prestado por particulares, mas o exercício do poder de polícia de
acordo com decisão do Supremo Tribunal Federal (publicada em vinte e cinco de fevereiro de
dois mil), não pode ser delegado, porque se trata de poder de império, o que provocaria o
desequilíbrio entre os particulares.
Diante dessas considerações, se faz importante mostrarmos a diferença entre o poder
de polícia e o serviço público, devido ao fato de que essas duas atividades são decorrentes da
função administrativa em pleno exercício. De um lado, coloca o Poder de polícia como limite
à conduta individual, e, portanto, atividade negativa, e de outro, o serviço público, como
atividade positiva, que se traduz em atividade da Administração que vai trazer um acréscimo
aos indivíduos. (BATISTA JÚNIOR, 2001)
De uma forma mais branda o poder de polícia tem o objetivo de assegurar o bem estar
geral da sociedade, evitando, através de ordens, proibições e apreensões, o exercício anti-
social dos direitos individuais, o uso abusivo da propriedade, ou a prática de atividades
prejudiciais aos cidadãos. Sendo Exercido por meio de órgão e serviços públicos incumbidos
de fiscalizar, controlar e deter as atividades individuais que se revelem contrárias à higiene, à
saúde, à moralidade, ao sossego, ao conforto público e até mesmo à boa conduta humana.
Temos o poder de polícia em uma tentativa de ajudar a acontecer uma convivência social mais
harmoniosa, para evitar conflitos no exercício dos direitos e atividades do individuo entre si,
perante o interesse de toda a população.
Em relação aos direitos individuais o direito administrativo possui suas características.
Ele trata de um embate de temas que possuem dois pontos díspares: um refere-se à autoridade
da administração pública, a qual possui o dever de delimitar o exercício dos direitos
16

individuais relacionados ao bem estar coletivo, o outro esta focado na liberdade individual, no
qual o individuo deseja exercer plenamente os seus direitos como cidadão. Na incumbência de
resolver este conflito de maneira rápida, foram aplicados ao poder de polícia, dois sentidos:
um sentido amplo e um sentido estrito. Este ultimo, é focado no poder de polícia
administrativo. Nota-se que o poder de polícia administrativo tem intervenção especifica do
Poder Executivo, voltados apenas para o fim de interferir nas atividades de particulares tendo
em vista os interesses sociais. A sociedade deve se basear nos limites determinados pelo poder
público quando estiver exercendo sua atividade particular, pois, este poder é quem define
perante leis as garantias fundamentais dos cidadãos. Temos este mesmo cidadão tentando
ampliar-se de um lado e do outro temos a administração pública analisando cada um dos seus
atos como cidadão, fiscalizando até que ponto as atividades desenvolvidas por ele se integram
com o Poder Público harmoniosamente.
Em nossa Constituição mais precisamente no artigo 5º e incisos IV, XIII, XV e XXII,
temos assuntos relacionados ao direito de uso, gozo e disposição da propriedade e ao
exercício da liberdade, os quais são conferidos aos cidadãos no ordenamento jurídico do
nosso país. Como podemos tomar como base os ensinamentos do doutrinador (MEIRELLES
2007, p. 127):
Poder de Policia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para
condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em
beneficio da coletividade ou do próprio Estado.

Todos esses direitos em seu exercício terão que ser obrigatoriamente harmonizados
com o bem-estar da coletividade ou com o próprio interesse do poder público. Os direitos ao
serem criados possuem seus limites de utilização, devido ao fato de que essa utilização do
direito individual não poderá ferir o direito de outros cidadãos, nem o interesse da sociedade
em geral. Dentro das prioridades pode-se destacar o direito coletivo acima do direito
individual. Contudo, é essencial, que tenha uma atividade juntamente aos direitos individuais,
para adaptar e ajustar esses direitos na tentativa de que se possa obter uma ótima utilização
dos mesmos. Para que essa atividade seja cumprida com galhardia se faz necessário, em
primeiro momento, ser exercida através do Poder Legislativo, o qual edita as leis
impulsionadoras que fazem fruir estes direitos. Tal atividade exercida pelo Poder Legislativo
é o poder de polícia, na qual temos em um primeiro instante, a liberdade do direito individual
do cidadão e em um segundo instante, a obrigação da Administração em condicionar o
exercício dos direitos coletivos da sociedade. O Poder Legislativo exerce o poder de policia
autorizando a lei a impor restrições sem vir a ferir a nossa Constituição, até mesmo porque
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esse exercício é previsto na mesma. De acordo com muitos doutrinadores o poder de polícia
permite traduzir verdadeira realidade de um poder da administração em impor limites de
modo direto, as liberdades fundamentais em defesa do bem comum baseado na lei. Nestes
termos podemos trazer a este trabalho opiniões de vários doutrinadores a respeito do conceito
de Poder de Polícia:
Tem-se Tácito (1975 apud MEIRELLES, 2007, p. 128):

O Poder de Policia é, em suma, o conjunto de atribuições concedidas a


Administração para disciplinar e restringir, em favor do interesse público
adequando, direitos e liberdades individuais.

Podemos citar também Cooley (1903, p. 829 apud MEIRELLES, 2007, p. 128):

O Poder de Policia (police power), em seu sentido amplo, compreende um sistema


total de regulamentação interna, pelo qual o Estado busca não só preservar a ordem
pública senão também estabelecer para a vida de relações do cidadão àquelas regras
de boa conduta e de boa vizinhança que se supõem necessárias para evitar conflito
de direitos e para garantir a cada um o gozo ininterrupto de seu próprio direito, até
onde for razoavelmente compatível com o direito dos demais.

Pode-se observar que vários são os conceitos referentes ao poder de polícia, porém a
grande maioria dos autores refere-se a este como sendo respeitado o interesse geral da
sociedade, sempre levando em consideração a liberdade individual e de propriedade.
Tem-se ainda Cavalcanti (1956, p. 07 apud MEDAUAR, 2004, p. 390):

Poder de polícia é a faculdade de manter os interesses coletivos, de assegurar os


direitos individuais feridos pelo exercício de direitos individuais de terceiros. O
poder de polícia visa à proteção dos bens, dos direitos, da liberdade, da saúde, do
bem-estar econômico. Constitui limitação à liberdade e os direitos essenciais do
homem.

Ainda este doutrinador Cavalcanti (1956, p. 07 apud MEDAUAR, 2004, p. 390): “O


poder de polícia constitui limitação à liberdade individual, mas tem por fim assegurar esta
própria liberdade e os direitos essenciais do homem”.
Como visto nas citações supracitadas, existem vários doutrinadores com conceituações
diferentes a respeito do poder de policia, porém, o Código Tributário Nacional1 é o mais
amplo e explicativo.

1
Art. 78 Considera-se poder de policia a Atividade da Administração Pública que, limitando ou disciplinando
direito, interesse ou liberdade, regula a pratica de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público
concernente à segurança, à higiene, á ordem, aos costumes, a disciplina da produção e do mercado, ao exercício
de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Publico, à tranqüilidade pública ou
ao respeito à propriedade e os direitos individuais ou coletivos.
18

Verifica-se, portanto, que todos os doutrinadores examinam a disposição que


Administração Pública possui em editar e colocar em pratica medidas que restringem o direito
do individuo em favor do bem-estar da coletividade e preservação do próprio Estado.
Como visto o poder de polícia em exercício, age de maneira preventiva expedindo
normas de conduta (ordens e proibições) previstas em lei, que implicam em limitações
individuais. A atividade de polícia envolve também medidas concretas e específicas como as
autorizações, licenças e injunções do Poder Público. Outro meio de expressão do poder de
polícia é a fiscalização das atividades e bens sujeitos ao controle da Administração de modo a
verificar as condições e requisitos para o uso da propriedade e exercício das atividades
regulamentadas.

1.4 ATUAÇÃO

O poder de polícia se expandiu muito, hoje é encontrado em pleno exercício nos mais
variados setores da Administração Pública sempre com o objetivo de garantir o bem estar
geral, seja ele no trânsito, na economia popular, na segurança e ordem pública, saúde e
alimentação, valores culturais, estéticos e artísticos do nosso país. Observa-se que, o poder de
polícia possui um âmbito ocorrência bastante amplo sendo organizado em toda atividade
estatal. A atuação do poder de polícia se dá inicialmente através de atos normativos de
alcance geral e também de atos específicos e concretos.
Para se ter uma noção melhor da atuação do Poder Público devemos se basear nas
atividades do Legislativo e do Executivo e no poder de polícia em seu sentido amplo. De
acordo com essas atividades os meios utilizados geralmente são as Leis, estas chamadas de
atos normativos em geral. Através destes atos serão criadas algumas limitações
administrativas das quais encontramos as limitações ao exercício dos direitos individuais,
estas são dirigidas sem distinção para todas às pessoas que se encontrem na mesma situação,
enquanto isso a Administração Pública disciplina a aplicação da lei e o Executivo baixa
decretos, resoluções, portarias e instruções normativas referentes ao poder de polícia. Ainda
temos os atos administrativos e as operações materiais de aplicação da lei ao caso concreto o
qual pode se dar a partir de atos preventivos, fiscalizadores e repressivos. Os primeiros são os
regulamentos administrativos enviados com o objetivo de padronizar alguns comportamentos
e até mesmo por meio de autorizações e licenças às quais cabe ao Poder Público determinar.
Já o segundo é voltado para as inspeções, vistorias e exames realizados pela Administração
19

com a intenção de fazer valer os regulamentos e normas próprias. O ultimo que são os atos
repressivos se voltam exclusivamente à aplicação de sanções devido à desobediência das
normas de conduta que são impostas aos administrados.
Ainda assim, pode-se perceber o poder de polícia atuando nas mais variadas áreas: a
polícia de caça e pesca que é voltada à proteção da fauna terrestre e aquática, a polícia
florestal que tem a finalidade de proteger a flora, a polícia de trânsito e tráfego a qual tem por
objetivo garantir a segurança e a ordem nas estradas, a polícia sanitária sempre se
preocupando com a proteção da saúde pública, a polícia edilícia, muito atuante em cidades
que possuem leis para não construírem prédios com determinada altura como em João Pessoa.
É Importante ressaltar que, estes são apenas setores na qual as normas de polícia se fazem
presente e que não são espécies de polícia.

1.4 LIMITAÇÃO

Ensina Di Pietro (2004, p. 99) que:

Como todo ato administrativo, a medida de polícia, ainda que seja discricionária,
sempre esbarra em algumas limitações impostas pela lei e mesmo com relação aos
motivos ou ao objeto ainda que a Administração disponha de certa dose de
discricionariedade também deverá exercida nos limites traçados pela lei.

Sabe-se da importância em impor limites as medidas de policia até mesmo quando nos
referimos a sua competência e à forma, isso se faz necessário para que não aconteça o abuso
de poder. Podem ser observadas também como forma de limitação: a finalidade do poder de
polícia, pois este poder só deve ser exercido para atender ao interesse público, até mesmo com
a lei colocando a disposição varias alternativas possíveis os meios de ação do poder de policia
ainda assim sofrem limitações.
Quando se utiliza meios coercitivos na tentativa de fazer valer o poder de polícia
administrativa é de praxe respeitar à proporcionalidade da medida adotada pelo Poder Público
uma vez que envolve a liberdade individual do cidadão. Dessa forma pode-se mencionar aqui,
a aplicação do conhecido princípio de direito administrativo, a saber, o da proporcionalidade
dos meios aos fins, pois este se refere à liberdade individual do cidadão dando ênfase ao bem-
estar da coletividade. A Administração Pública deve atuar com o máximo de cuidado nesse
aspecto, não exercendo o poder de polícia através de meios excessivos para se alcançar o fim
desejado. A desproporcionalidade do ato de polícia ou seu excesso equivale a abuso de poder
20

e, como tal, tipifica ilegalidade nulificadora da sanção (Meirelles, 2007). Portanto, o poder de
polícia não pode ir além do necessário para satisfação do interesse público almejado.
Nesse sentido, Meirelles (2007, p. 103) alerta que:

Sob a invocação do poder de polícia não pode a autoridade anular as liberdades


públicas ou aniquilar os direitos fundamentais do indivíduo, assegurados na
Constituição, dentre os quais se inserem o direito de propriedade e o exercício de
profissão regulamentada ou de atividade lícita.

Quando a polícia administrativa for exercer seu poder, sempre deverá respeitar as
liberdades públicas e os direitos individuais previstos na Constituição Federal, caso contrário,
não será considerado legítimo e proporcional o seu ato. A coibição do exercício de poder de
polícia, quando houver excessos, é feita pelo controle judicial ou administrativo podendo
ainda não haver prejuízo da responsabilidade criminal, civil e administrativa dos servidores
envolvidos, porém cabe indenização ao lesado através do art. 37, § 6.º da CF.

1.5 CARACTERÍSTICAS/ATRIBUTOS

Vivendo em coletividade muitas pessoas não lembram que devem respeitar o direito
do próximo por isso a Administração Pública se ver obrigada a relacionar o interesse dos
cidadãos ao interesse do bem-estar geral. Com o intuito em defender tais interesses, o ato de
polícia administrativa contém determinadas características, são elas: geralmente é editado pela
Administração Pública, a supremacia do interesse público é seu fundamento, o poder de
império é tomado como base entre a ligação que tais administrados tem com o Poder Público
e ainda atua na propriedade ou sobre a liberdade dos particulares. Se por algum motivo não
houver a incidência de algum desses caracteres ou até mesmo for baseado em outro tipo de
vinculo o ato de polícia não existirá.
De acordo com Di Pietro (2004, p. 77), “Costuma-se apontar como atributos do poder
de polícia a discricionariedade, a auto-executoriedade e a coercibilidade.”

1.5.1 Discricionariedade

Com os ensinamentos de Batista Junior (2001, p. 79):

A polícia é um setor só parcialmente controlado pela lei, porque nunca foi possível
cingi-la completamente na legalidade, diante das manifestações multímodas das
condutas individuais e da vida social, que forçam a que se deixe certa margem de
liberdade de atuação.
21

Neste atributo a lei deixa uma lacuna de liberdade em certas situações, isso acontece
porque nem sempre o legislador poderá prevê todas as ocasiões possíveis de acontecer. Porém
a Administração deve decidir em que ocasião, qual o melhor meio, momento e sanção que
pode vim a ser aplicada a determinada situação. É ai que visualizamos o poder discricionário,
onde a Administração poderá escolher a melhor maneira de solucionar tal problema ou
situação. Nem sempre iremos encontrar presente nas medidas de polícia a discricionariedade,
sabendo que a lei determina em alguns casos que a Administração adote soluções já reguladas
e estabelecidas, sem o uso da discricionariedade, assim teremos o vinculo do poder a lei
escrita.
Ensina Mello (2006, p. 790) que:

Em rigor, não há propriamente dito, um poder que seja discricionário fruível[sic]


pela Administração Pública. Há, na verdade, atos em que a Administração Pública
pode manifestar competência discricionária e atos a respeito dos quais a atuação será
totalmente vinculada.

Assim, existem diferenças entre os atos vinculados e atos discricionários. Nestes


termos, explica Di Pietro (2004, p. 77) que:

Em grande parte dos casos concretos, a Administração terá que decidir qual o melhor
momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível diante
das previstas na norma legal. Em tais circunstâncias, o poder de polícia será
discricionário. Em outras hipóteses a lei já estabelece que, diante de determinados
requisitos, a Administração terá que adotar solução previamente estabelecida, sem
qualquer possibilidade de opção. Nesse caso, o poder será vinculado. A exemplo
temos a licença.

1.5.2 Auto-executoriedade

Segundo a ilustre Di Pietro (2004, p.77):

A auto-executoriedade (que os franceses chamam de executoriedade apenas) é a


possibilidade que tem a Administração de, com os próprios meios, pôr em execução as
suas decisões, sem precisar recorrer previamente ao Poder Judiciário.

Sendo assim, a Administração tem o livre arbítrio de tomar decisões sobre as quais
não necessitaram dirigir-se a um juiz, para solicitar uma obrigação ao administrado, ou seja, a
Administração impõe de forma direta aos administrados, as medidas ou sanções de polícia
administrativa, que são necessárias à coibição de atividades que não sejam benéficas ao bem-
estar social.
22

Temos ainda o desdobramento deste atributo por parte de alguns autores em: a
exigibilidade e a executoriedade, a saber: a primeira é a possibilidade que tem a
Administração Pública de tomar decisões de execução, porém pelo atributo da exigibilidade, a
administração se faz valer através de meios indiretos de coação. A segunda é a opção que a
Administração tem, de executar o poder de maneira direta, utilizando até mesmo se houver
necessidade, do uso da força para obrigar o administrado a cumprir algumas decisões da
administração pública. A Administração por ser um órgão do Estado e ter o objetivo de buscar
o bem da sociedade nem sempre toma decisões as quais os administrados podem estar de
acordo, caso isso venha acontecer o particular que se sentir ofendido deverá recorrer ao Poder
Judiciário utilizando o mandado de segurança e o habeas corpus, estes são os remédios
processuais indicados e mais efetivos para tais casos.
Segue-se então um julgamento do Tribunal de São Paulo mencionado pelo ilustre
Meirelles (2007, p. 133):

Exigir-se previa autorização do Poder Judiciário equivale a negar-se o próprio poder


de polícia administrativa, cujo ato tem que ser sumário, direto e imediato, sem as
delongas e as complicações de um processo judiciário prévio.

A titulo de exemplificação dos atos de polícia auto-executáveis tem-se: a apreensão de


mercadorias impróprias para o consumo, a interdição de estabelecimento que não atenda às
normas de segurança ou higiene, a ordem de interrupção de um espetáculo teatral obsceno, a
demolição de uma construção que ameaça ruir e põe em perigo a população das imediações, a
dissolução de passeata sem prévio aviso à autoridade competente e assim por diante.

1.5.3 Coercibilidade

Esta característica tem uma interpretação parecida com a da auto-executoridade,


devido à imposição coativa de suas medidas. Meirelles (2007, p. 130) afirma que “não há ato
de polícia facultativo para o particular”. Também nos ensina Di Pietro (2004, p.77) que “a
coercibilidade é indissociável da auto-executoriedade”, por ser uma medida de polícia repleta
de força coercitiva. Os atos administrativos são necessários e obriga a todos que se encontram
a sua volta, ou melhor, que estão em seu círculo de atuação mesmo que isso venha a contrariar
o interesse de alguns particulares, pois a única intenção é o interesse coletivo e seu bem-estar.
23

1.6 O PODER DE POLÍCIA COMO UMA ATIVIDADE NEGATIVA E POSITIVA

Alguns autores destacam o poder de polícia como uma atividade negativa e positiva.
Mello (2006, p. 799) é um dos autores que destaca o poder de polícia como sendo uma
atividade negativa: “No sentido de que sempre impõe uma abstenção ao particular, uma
obrigação de não fazer. Mesmo quando o poder de polícia impõe aparentemente uma
obrigação de fazer”.
A exemplo destes atos temos: exibir planta para licenciamento de construção, fazer
exame de habilitação para motorista, colocar equipamento contra incêndio nos prédios. A
intenção do poder publico com isto é, prevenir com estes atos que as atividades executadas
pelos cidadãos sejam feitas perigosamente ou que seja nociva a sociedade, portanto a intenção
da administração Publica é evitar o mau exercício do direito individual.
Com relação à atividade positiva, esta em seu desenvolvimento realizará uma
atividade a qual irá trazer um acréscimo aos indivíduos, isoladamente ou em conjunto. A
Administração exerce uma atividade material, que vai trazer de certa forma um benefício ao
cidadão. Tem-se como exemplo, quando a Administração executa os serviços de energia
elétrica, de distribuição de água e gás, de transportes etc. Na atividade de polícia, a
Administração tem a função de impedir que os particulares pratiquem atos contrários ao
interesse público, ou seja, ela impõe limites à conduta individual.
Di Pietro (2004, p. 77) nos ensina que:
O critério é útil apenas na medida em que demonstra a diferença entre poder de
polícia e serviço público. Mas tem-se que levar em conta que, a que se qualificar o
serviço publico como atividade positiva, está-se considerando a posição da
Administração: ela desenvolve uma atividade que vai trazer um acréscimo aos
indivíduos, isoladamente ou em conjunto; no poder de polícia, o aspecto negativo diz
respeito ao particular frente à Administração: ele sofrerá um limite em sua liberdade
de atuação, imposto pela Administração.

Na tentativa de não esgotar esta matéria passarei a tratar a respeito do uso e abuso do
poder de polícia, com o intuito de demonstrar poderes os quais não estão sendo cumpridos
adequadamente, ou seja, dentro de suas finalidades.
CAPÍTULO 2 - USO E ABUSO DO PODER DE POLÍCIA

2.1 DO ABUSO DE PODER

Este tema exige certa reflexão, pois o abuso de poder no ordenamento jurídico
brasileiro está ficando cada vez mais presente a partir dos excessos que estão sendo praticados
por agentes no exercício das suas funções, caracterizando, assim, atentados à normalidade
jurídica e desvio da finalidade de suas atribuições concedidas pela Administração Pública,
através da violação aos direitos fundamentais da cidadania.

2.1.1 Conceito

De acordo com os ensinamentos de Meirelles (2007, p. 83):

O abuso do poder, como todo ilícito, reveste as formas mais diversas. Ora se
apresenta ostensivo como a truculência, às vezes dissimulado como o estelionato, e
não raro encoberto na aparência ilusória dos atos legais. Em qualquer desses
aspectos – flagrante ou disfarçado – o abuso do poder é sempre uma ilegalidade
invalidadora do ato que o contém.

Nos dias atuais vivenciamos ações praticadas por agentes públicos, sejam eles
administrativos ou políticos, em excesso. Devido a este fato, tem-se realizado estudos através
da doutrina e jurisprudência que ajudam a identificar como ocorrem e os efeitos que podem vir
a ser produzidos na sociedade pelo abuso de poder.
A palavra abuso é um substantivo masculino originário do latim abusu que quer dizer
“mau uso, ou uso errado, excessivo ou injusto; excesso, de comedimento, abusão; exorbitância
de atribuições ou poderes; aquilo que contraria as boas normas, os bons costumes” como é
encontrado no Minidicionário Aurélio (1993, p. 05). Porém, no Direito, esta palavra é aplicada
quando nos referimos ao excesso de poder, abuso de poder, desvio de finalidade ou até mesmo
mau uso deste poder.
Cretella Júnior (1984, p. 349), de forma clara, em comentário a Constituição de 1946
sobre a expressão “abuso de poder”, destaca que:
25

Observes-se, porém, que a expressão global ‘abuso de poder’ é constituída de dois


termos bem distintos, com significados diferentes, ‘abuso’ e ‘poder’, ligados pelo
conectivo preposicional ‘de’, ambos com sentido técnico, que é necessário elucidar.
‘Abuso’, a primeira parte da expressão, é de fácil entendimento, pois conserva a
acepção vulgar, não técnica, de ‘além do uso’, ‘uso intensivo’, ‘uso indevido’,
‘desdobramento do uso’, ‘ultrapassagem do uso’, ‘uso exorbitante’. Nesse caso, o
agente público, embora competente para o ‘uso do poder’, exagera ou distorce esse
‘poder’, abusivamente. A segunda parte da expressão ‘poder’ potestas, em latim,
puissance e não pouvoir, em francês , complementando a idéia contida no substantivo
qualificado abuso, é explicada pela doutrina como o emprego do poder
administrativo, exercido, não em sua justa medida, mas ultrapassando os fins visados
pela lei. Abuso de poder é o uso imoderado do Poder (‘poder’, com p minúsculo). É o
equivalente ao francês puissance, ao português potestade e ao latim potestas; ‘Poder’
(com P maiúsculo) é o equivalente ao francês Pouvor, e ao português Poder, nas
expressões, o Poder Legislativo, Exeutivo, Judiciário. Nesse caso, o agente, embora
competente, ‘abusa’, ‘ultrapassa’ essa competência.

Diante de tal menção ao abuso de poder, se faz necessário destacar um dos


ensinamentos do Professor Meirelles (2007, p. 112) acerca do assunto:

O uso do poder é prerrogativa da autoridade. Mas o poder há que ser usado


normalmente, sem abuso. Usar normalmente do Poder é empregá-lo segundo as
normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as suas exigências do
interesse público. Abusar do poder é empregá-lo fora da lei, sem utilidade pública. O
poder é confiado ao administrador público para ser usado em benefício da
coletividade administrativa, mas usado nos justos limites que o bem-estar social
exigir. A utilização desproporcional do poder, o emprego arbitrário da força, a
violência contra o administrado, constituem formas de uso do poder estatal, não
toleradas pelo Direito e nulificadoras dos atos que as encerram.

Em um determinado Estado que adota o regime democrático de direito, o abuso de


poder fica caracterizado quando este poder é usado fora dos limites impostos pelos
administradores, pelos princípios e pelo ordenamento jurídico. Contudo, temos que o abuso de
poder pode ser caracterizado, até mesmo, quando é exercido por uma pessoa autorizada, porém
praticado contrariamente às causas, aos modos ou aos motivos para os quais foi atribuído.
Sendo assim, de acordo com os ensinamentos supracitados tem-se que o abuso de poder
é a conduta do administrador público contaminado de anormalidades, a qual pode se
manifestar de diferentes maneiras se tornando assim um ato ilegal. Existem várias maneiras de
manifestação do abuso de poder, a saber: pela falta de competência legal, pelo não atendimento
do interesse público e pela omissão. Abuso de poder é toda ação que torna irregular a
execução do ato administrativo, legal ou ilegal, e que propicia contra seu autor medidas
disciplinares, civis e criminais (GASPARINI, 2003).
Tendo em vista o abuso de poder em sua fase executória fica fácil perceber que tal
anormalidade, pode acontecer tanto na execução de um ato legal como na de um ato ilegal,
senão vejamos:
26

O ato pode atender aos requisitos de competência, finalidade, forma, motivo,


conteúdo, objeto e causa e mesmo assim ser executado com abuso de poder. O ato
pode ser perfeito e válido, mas executado com inobservância dos meios e cuidados
necessários à sua concreção. Pode não apresentar vícios ou defeitos de espécie
alguma em face da legalidade, não obstante ser concretizado irregularmente. A
legitimidade do ato não é garantia de que será executado com as cautelas exigidas
pelo ordenamento. O ato legal mesmo que isso pareça um paradoxo, pode ser
executado irregularmente. Embora não devesse, pode ser executado irregularmente.
Se isso ocorre com os atos legais, resta óbvio que com os ilegais pode acontecer o
mesmo, ou seja, ser executados (embora não devesse) irregularmente.
(GASPARINI, 2003 p. 136)

Portanto também encontramos no abuso de poder a execução de um ato ilegítimo, mas


com traços de legítimo. Nos atos executados pelos agentes administrativos nem sempre
podemos perceber as ilegalidades, o que facilita para que os mesmos realizem tais atos de
maneira constante.
No abuso de poder encontramos vários níveis de poder, desde o doméstico, existente
entre os membros de uma mesma família, até na Administração Pública, o que nos leva a
concluir que este pode ser exercido de tal forma que o indivíduo, ou coletividade, têm
influência direta sobre outros. Sendo assim, tal poder não fica submetido apenas a estes
aspectos vindo a ser um pouco mais complexo do que o simples exercício do agente sobre
outrem. O abuso de poder não é só a atuação do mais forte sobre o mais fraco, ele se torna
uma tarefa de difícil identificação, pois, passa de mãos em mãos entre os agentes da
administração pública.
Em torno do Direito Administrativo, temos os poderes administrativos (poderes de
polícia, hierárquico, regulamentar, disciplinar e, para alguns doutrinadores, vinculado e
discricionário), que são privilégios concedidos à Administração Pública para que ela, em seu
exercício, possa chegar à sua finalidade maior: o interesse público. O administrador público
não pode se negar a utilizar tais poderes uma vez que eles são irrenunciáveis.
Em nosso país o ordenamento jurídico trata de maneira diversificada os interesses
públicos e privados. Devido a este fato, o próprio ordenamento jurídico acaba deixando de
forma desigual a atuação dos titulares desses interesses, porque imputa à Administração
Pública poderes que não são utilizados pelos administrados. Sendo assim, temos a
possibilidade que a Administração Pública possui de exercer sua função impondo obrigações
aos administrados ou mesmo executando seus próprios atos. Com isso, a Administração
Pública fica submetida a um regime próprio de atuação o qual lhe atribui ônus, restrições e
sujeições juntamente com poderes para cumprir de forma correta suas finalidades, pois atua
prezando pelos interesses dos particulares, mas nunca em detrimento do interesse público,
grande norteador de suas atividades.
27

Os agentes públicos possuem poderes, os quais são distribuídos pelo sistema


administrativo. Todos eles são destinados a agir conforme previsto em lei. Assim, todo ato
exercido pelos agentes que não estiver previsto em lei, ou seja, uso de força bruta, invasão de
domicílio sem previa autorização, dentre tantos outros, irá acarretar o abuso de poder. É de se
ressaltar, ainda, que o abuso de poder é uma das formas de abuso de autoridade, assim como
também o é o desvio de finalidade.
Necessariamente os atos de polícia devem estar ajustados à lei, sempre respondendo
positivamente ao interesse público. Os atos de polícia para serem legais devem ter motivo,
conteúdo, finalidade, forma e competência, todos elementos dos atos administrativos. Pelo
bem da moral, dos bons costumes e da harmonia coletiva o poder de polícia tem atuação livre
dentro dos limites previstos legalmente.
Contudo, na tentativa de impedir o uso arbitrário e sem limites do poder de polícia foi
criada uma porção de recursos administrativos, sendo estes a representação, a reclamação, o
pedido de reconsideração e os recursos hierárquicos (próprio e impróprio). Existem, ainda, os
recursos judiciais, como o mandado de segurança, previsto na CF, art. 5º, LXIX, e na Lei nº
1.553/51, assim como a ação ordinária. Ainda assim, a Constituição Federal amparou toda
pessoa ao direito de representação contra abusos de autoridade (art. 5º, XXXIV, “a”). Para
complementar esse sistema de proteção contra os excessos de poder existe a Lei n° 4.898 de
1965, que pune criminalmente esses mesmos atos caracterizadores de abusos de autoridade.

2.2 FORMAS DE ABUSO DE PODER

O abuso de poder possui diversas formas. Dentre elas pode-se destacar:


1. Econômico – ocorre quando o indivíduo ou coletividade tira vantagem ilícita do
dinheiro ou bens materiais em detrimento de outrem;
2. Político – pode ser visto como o uso indevido de cargo ou função pública, com o
fim de obter votos para determinado candidato. Sua gravidade consiste na utilização do
encargo público para influenciar o eleitorado, com desvio de finalidade;
3. Domínio da informação – geralmente utilizado por quem detém o conhecimento ou
a informação e os nega aos demais como forma de proteger-se ou de tirar vantagem;
4. Ideológico – ocorre quando se utiliza ilicitamente da ideologia socialmente aceite
como forma de tirar vantagens ou de vencer opositores;
28

5. Apadrinhamento – conhecido, vulgarmente, como nepotisrmo, é usado por


autoridade para favorecer outrem de forma ilícita).(WIKIPEDIA, 2010).

O abuso de poder ainda pode se apresentar, nas seguintes formas: abuso de Poder de
Legislar (presidente cria uma lei ou portaria autorizando a reeleição para se favorecer), abuso
de Poder administrativo (agentes públicos se prevalecem do poder concedido pelo Estado para
se beneficiarem colocando pessoas da própria família para trabalharem consigo sem prestar
concurso público), abuso de Poder policial (quando policiais “plantam” provas para incriminar
alguém inocente) e abuso de Poder Judicial (liberação de escuta telefônica para alguém
conhecida, sem previsão de investigação policial).

2.3 EXCESSO DE PODER E DESVIO DE FINALIDADE

Com a intenção de abordar aspectos de tamanha importância a respeito dos diversos


tipos de abuso de poder, desvio de finalidade (desvio de poder) e excessos encontrados na
atuação da Administração Pública, passa-se a citar suas definições, características,
modalidades, atuação e desenvolvimento.
Seguindo o tema, explica o mestre Meirelles (2007, p. 112): “É a violação ideológica
da lei, ou por outras palavras, a violação moral da lei, colimando o administrador público fins
não queridos pelo legislador, ou utilizando motivos e meios imorais para a prática de ato
administrativo aparentemente legal”.
O termo “abuso de poder” é dividido em duas espécies que, embora correlacionados
com o poder de polícia, com ele não se confundem, a saber: o excesso de poder e o desvio de
finalidade.
Sendo assim, pode-se dizer que o abuso de poder causa uma desestabilidade à
estrutura legal. É de se mencionar que, qualquer manifesto em descordo com a lei poderá ter
sua ilegalidade decretada, podendo esta se realizar em duas formas, quais sejam: pela falta de
competência legal (excesso de poder) ou pelo não atendimento do interesse público (desvio de
finalidade).
O “excesso de poder” praticado pelo agente público termina tornando-se um ato
inválido devido ao fato de que a Administração não permite que seus agentes exerçam suas
funções fora da lei, ou seja, no caso do poder de polícia, ocorre um excesso quando
desvirtuam o modo de utilizar, afastando-se dos motivos que autorizam o exercício do poder
29

(motivos determinantes) ou gerando um resultado ilegal, ficando caracterizado como crime de


abuso de autoridade quando o ato incide nas previsões penais da Lei 4.898/65, assim, tais atos
seriam anuláveis. O excesso de poder, por vício de forma, porém, somente é reconhecível
quando recai sobre elemento essencial do ato praticado com base no poder concedido. “Se
contraria meros elementos acidentais, não se pode falar em anulação” (Bento Soares, 2004,
p.137)
De acordo com os ensinamentos de Meirelles (2007, p. 83):

A conduta abusiva, por meio do excesso de poder, tanto se caracteriza pelo


descumprimento frontal da lei, para arrogar-se poderes que não lhe são atribuídos
legalmente. Em qualquer dos casos há excesso de poder, exercido com culpa ou
dolo, mas sempre com violação da regra de competência, o que é o bastante para
invalidar o ato assim praticado.

No abuso de poder encontra-se o desvio de finalidade, o qual é uma violação


da lei. O agente que extrapola o uso do poder se afasta da finalidade pública e comete um
desvio de poder ficando na iminência sofrer as sanções penais, civis e administrativas. No
entanto, o desvio de finalidade pode ser identificado facilmente quando o agente usa os atos
administrativos em beneficio próprio ou de determinados indivíduos.
Como afirma Di Pietro (2004, p. 99):

Quanto aos fins, o poder de polícia só deve ser exercido para atender ao interesse
público. Se o seu fundamento é precisamente o princípio da predominância do
interesse público sobre o particular, o exercício desse poder perderá a sua
justificativa quando utilizado para beneficiar ou prejudicar pessoas determinadas; a
autoridade que se afastar da finalidade pública incidirá em desvio de poder e
acarretará a nulidade do ato com todas as conseqüências nas esferas civil, penal e
administrativa.

Para ficar um pouco mais claro, pode-se citar alguns casos que vemos, ou até mesmo
ouvimos comentários a respeito deles. São os casos de Prefeitos que, pelo fato de não se
reelegerem, exoneram, como forma de castigo, servidores municipais, que haviam sido
nomeados pelo mesmo, ou seja, este prefeito usa o poder para interesse e finalidade pessoal,
ou até mesmo para ajudar, ou prejudicar, alguém determinado.
A nossa Carta Magna, no seu art. 37, caput, prevê que a administração pública tem
que obedecer aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência. A
legalidade quer dizer que o poder público só pode fazer o que está descrito na lei. Um pouco
mais amplo que o anterior, os princípios da moralidade e da impessoalidade relacionam a ação
administrativa, ou o ato administrativo, ao interesse público. Conforme o exemplo já referido,
a infringência a tais princípios ocorre quando o agente público vislumbre apenas seus
interesses, este ato não será válido. Por último, temos o mais moderno dos princípios que
30

regem tal Administração Pública, o princípio da eficiência. Este princípio possui dois
aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se
espera o melhor desempenho possível de suas atuações e atribuições, para lograr os resultados
melhores; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública,
idem quanto ao intuito de alcance de resultados na prestação do serviço público (DI PIETRO,
2004, p. 98). O principio da eficiência pode ainda ser somado aos demais princípios impostos
à Administração, no entanto, jamais poderá sobrepor-se a nenhum deles.
Ademais, se tem discutido sobre a qualidade das obras e serviços exercidos pelo poder
público. O cidadão participa de diversas formas na Administração Pública, como estabelece o
§ 3o do art. 37 da Constituição Federal2. O principio da eficiência funciona como uma mola
propulsora para que a atuação da Administração Pública aconteça de maneira adequada,
sempre procurando a melhor solução que atenda ao interesse público.

2.2.1 Origem do desvio de poder

O termo “desvio de poder” tem sua origem no Conselho de Estado francês. A intenção
ao ser criado referido termo foi sustar algumas ações ou mesmo acabar com os abusos
relacionados à natureza humana e ao egoísmo que vinha acontecendo da parte dos agentes
públicos.
A palavra “desvio”, de acordo com o Aurélio (1993, p. 183), significa ato ou efeito de
desviar-se da posição normal, mudança de direção ou afastamento, Subtração fraudulenta. A
expressão “desvio de poder” significa afastamento prático de determinado ato. É poder
exercido em sentido diferente daquele em vista do qual fora estabelecido (MEIRELLES,
2007, p. 293).
Em nosso ordenamento jurídico a teoria foi acolhida de maneira diferente, pois a teoria
do desvio de finalidade foi admitida primeiramente pela doutrina vindo a inclusão de tal teoria
em nossos tribunais logo depois esse momento. Importante se faz ressaltar que jamais houve
em nosso ordenamento jurídico alguma legislação que tratasse especificamente do desvio de
poder, porém isso não vem a dizer que o tal ordenamento não tenha tratado da teoria do

2
“a lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando
especialmente: I- as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção
de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços; II- o
acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo...; III- a disciplina da
representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na administração pública.”
31

desvio de finalidade, uma vez que esta se incorporou de fato em nossos julgamentos
brasileiros em decorrência de um acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte a
qual teve como relator Seabra Fagundes, em 1948, tendo a seguinte ementa citada por Velloso
(2007, p. 198):

PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO – ABUSO DESSE PODER –


MANDADO DE SEGURANÇA – DIREITO LÍQUIDO E CERTO – No que
concerne à competência, à finalidade e à forma, o ato discricionário está tão sujeito
aos textos legais como qualquer outro. O ato que, encobrindo fins de interesse
público, deixe à mostra finalidades pessoais poderá cair na apreciação do Poder
Judiciário, não obstante originário do exercício de competência livre. O “fim legal”
dos atos da Administração pode vir expresso ou apenas subentendido na lei. O
direito, que resulta não da letra da lei, mas do seu espírito, exsurgindo
implicitamente do texto, também pode apresentar a liquidez e certeza que se exigem
para concessão do mandado de segurança. (sic)

2.2.2 Características de desvio de poder

Quando se fala em competência e procedimento para praticar o uso do poder de


polícia, a autoridade pública comete erro quando se afasta das normas legais. O poder de
polícia não deve ir alem do necessário para alcançar a satisfação do interesse público.
Buscando ensinamentos de Cretella Júnior (1997, p. 37) temos que:

[...] o fim de todo ato administrativo, discricionário ou não, é o interesse público. O


fim do ato administrativo é assegurar a ordem da Administração, que restaria
anarquizada e comprometida se o fim fosse privado ou particular [...]

De acordo com a citação acima, todo ato tem finalidade própria fixada pela lei que o
gerou. Portanto, através do ato somente pode-se buscar a finalidade que lhe é atribuída de
acordo com a norma e sem agir em beneficio próprio.
O desvio de poder não se prende a determinadas situações em que o agente age de má-
fé. Certamente ele pode ficar caracterizado quando o agente age sobre vicio e nem sempre no
desvio de poder em encontramos o uso de má-fé.
Nestes termos, o ilustre Mello (2006. p. 378) nos lembra que “[...] o que vicia não é o
defeito de intenção, quando existente – ainda que através disto se possa, muitas vezes,
perceber o vício -, mas o desacordo objetivo entre a finalidade do ato e a finalidade da
competência.”
Normalmente o desvio de finalidade é verificado quando se encontra revestido do
mencionado vício de intenção repleto de satisfação de vontade pessoal. O desvio de poder
(finalidade) se dá quando o agente, mesmo que na sua competência, utiliza-se do ato para
32

lograr finalidade alheia à sua natureza. Em outras palavras, há o desvio de poder quando o
agente utiliza sua competência de maneira errada.
O desvio de poder pode ser manifestado pela busca do fim diferente ao do interesso
público quando o agente procurasse, ao realizar o ato, beneficiar a si próprio ou a terceiros,
conforme esclarece Bastos (2001, p. 111). A título de exemplo tem-se que no exercício de
poder de polícia incumbido de fiscalizar as construções, o chefe do órgão responsável pela
fiscalização se negar a aprovar uma planta de obra pelo simples fato de somente ele não
encontrar beleza no projeto.

2.2.3 Prova

Os meios de prova do desvio de finalidade são de grande importância para o


ordenamento jurídico. Inicialmente se faz necessário atentar de onde emana o ato de desvio de
finalidade. Este surge do vício relacionado com a vontade humana. O agente possui vontades
ao exercer seu poder de polícia e este sempre estará passível de erros. Porém, a tarefa de
provar tal desvio é bastante complicada uma vez que o desvio de poder jamais é confessado,
ou seja, ele só é identificado através de indícios como afirma Dallari (2006).
Contudo, ainda podemos citar varias provas trazidas pela doutrina clássica de vários
países, a saber: Contradição do ato com atos ou medidas posteriores e/ou anteriores, alteração
dos fatos, precipitação na edição do ato, caráter sistemático de certas proibições, entre outros.
Neste sentido, Meirelles (2007, p. 92), com galhardia, nos transmite um amplo ensinamento:

[...] O ato praticado com desvio de finalidade – como todo ato ilícito e imoral – é
praticado – ou é consumado às escondidas ou se apresenta sob o capuz da legalidade
do interesse público. Diante disso há que ser surpreendido por circunstâncias que
revelem a distorção do fim legal, substituído habilidosamente por um fim ilegal ou
imoral não desejado pelo legislador. A propósito, já decidiu o STF que ‘indícios
vários e concordantes são provas. [...]. Tudo isso dificulta a prova do desvio de
poder ou finalidade, mas não a torna impossível se recorrermos aos antecedentes do
ato e à sua destinação presente e futura por quem o praticou [...].

2.3 PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE NO ABUSO DE PODER

Seguindo os ensinamentos de Faria (2000, p. 208) temos que:


[...] o exercício do Poder de polícia, para encontrar validade no ordenamento
jurídico, deve observar a proporcionalidade entre a restrição imposta ao particular e
o benefício social pretendido, e também a proporcionalidade entre o dano causado
pelo infrator da norma administrativa e a sanção imposta ao agente. A
desproporcionalidade no comportamento de polícia da Administração, quanto aos
citados aspectos, implicam a nulidade do ato.
33

Não sendo diferente com os atos de polícia, o principio da proporcionalidade é de


caráter essencial para que qualquer ato da Administração Pública seja considerado valido.
Sendo assim, é de enorme importância que seja apurada a legitimidade da norma para que seja
avaliado o dano causado pelo infrator e a punição que foi imposta ao agente pelo abuso de
poder cometido pelo mesmo, tendo como base os meios empregados e os fins que se pretendia
obter pelo interesse público.
Nestes termos, Carvalho Filho (2008, p. 84) enaltece a respeito do assunto que: “Não
havendo proporcionalidade entre a medida adotada e o fim a que se destina, incorrerá a
autoridade administrativa em abuso de poder e ensejará a invalidação da medida na via
judicial, inclusive através de mandado de segurança”.
Ressalte-se um exemplo de ofensa ao princípio da proporcionalidade, a saber: os usos
de violência exagerada por parte da polícia nos campos de futebol, agentes policiais que
deveriam cumprir a ordem e a segurança do evento, espancam torcedores na tentativa de
conter anarquias de torcidas organizadas. Qualquer tipo violência excessiva é conduta
desproporcional, ou seja, os responsáveis por tais atos devem sofrer as devidas sanções.
Contudo, qualquer ato da Administração Pública que imponha ao administrado certa restrição
em sua liberdade de propriedade, que não se refira ao interesse público satisfeito, será
considerado ilegal. O principio da proporcionalidade está previsto no art. 37, da CF,
juntamente com os arts. 5°, II, e 84, IV, do mesmo diploma.
Diante das considerações feitas acima, pode-se afirmar que o poder de polícia não é
ilimitado, ou seja, não é absoluto, nem tampouco incontrolável. Pode-se dizer que, caso
ocorra a sua utilização excessiva ou sem finalidade, tal ato configurará abuso de poder.
Portanto, se faz importante que o princípio constitucional da proporcionalidade sempre regre
o exercício do poder de polícia pelos seus agentes, para que não se torne um abuso de
autoridade constante e sem impunidade em nosso sistema administrativo brasileiro.

2.5 O ABUSO DE PODER NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL


FEDERAL

As seguintes decisões podem ilustrar o posicionamento dos tribunais pátrios a respeito


do assunto:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ELEITORAL. MANDATO ELETIVO: AÇÃO
DE IMPUGNAÇO. ABUSO DE PODER POLÍTICO. USO INDEVIDO DOS
MEIOS DE COMUNICAÇO SOCIAL. VICE-GOVERNADOR DO ESTADO
34

CANDIDATO A SENADOR. I. - Apreciação da questão, pelo Tribunal Superior


Eleitoral, mediante o exame da prova, porque em recurso ordinário, que a este negou
provimento, confirmando decisão proferida pelo TRE/MG. II. - Não cabe, em sede de
recurso extraordinário, reexaminar os fatos e as provas considerados nas decisões dos
Tribunais Eleitorais. No caso, a apreciação do recurso não prescindiria desse
reexame. III. - R.E. a que se negou trânsito. Agravo improvido. (RE 307446 AgR /
MG - MINAS GERAIS, AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a):
Min. CARLOS VELLOSO , Julgamento: 06/03/2002 Órgão Julgador: Tribunal
Pleno, Publicação: DJ DATA-05-04-2002 PP-00062 EMENT VOL-02063-08 PP-
01481).

EMENTA: Recurso extraordinário. Competência para processar e julgar habeas


corpus impetrado contra ato de membro do Ministério Público Federal. - Ambas as
Turmas desta Corte (assim, nos RREE 141.209 e 187.725) têm entendido que, em se
tratando de "habeas corpus" contra ato de Promotor da Justiça Estadual, a
competência para julgá-lo é do Tribunal de Justiça por ser este competente para seu
julgamento quando acusado de crime comum ou de responsabilidade. O fundamento
dessa jurisprudência - como salientado pelo eminente Ministro Néry da Silveira no
RE 187.725 - "foi sempre o de que da decisão do habeas corpus pode resultar
afirmação de prática de ilegalidade ou de abuso de poder pela autoridade" e isso
porque "ao se conceder o habeas corpus, se reconhecer, expressamente, que a
autoridade praticou ilegalidade, abuso de poder, em linha de princípio, poderá
configurar-se algum crime comum. Dessa maneira, a mesma autoridade que julgar o
habeas corpus será a competente para o processo e julgamento do crime comum,
eventualmente, praticado pela autoridade impetrada". - No caso, em se tratando,
como se trata, de habeas corpus contra membro do Ministério Público Federal que
atua junto a Juízo de primeiro grau, e tendo em vista que, em virtude do disposto no
artigo 108, I, "a", da Constituição, compete aos Tribunais Regionais Federais
processar e julgar originariamente esses membros, a esses Tribunais compete,
também, por aplicação do mesmo fundamento, julgar os habeas corpus impetrados
contra essas autoridades. Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 285569 /
SP - SÃO PAULO, RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator (a): Min. MOREIRA
ALVES, Julgamento: 18/12/2000 Órgão Julgador: Primeira Turma, Publicação: DJ
DATA-16-03-2001 PP-00102 VOL-02023-07 PP-01435).

Sobre as dificuldades em demonstrar o desvio de finalidade devido ao fato de que na


ação de Mandado de Segurança não se admite dilação probatória, o Supremo Tribunal Federal
já se manifestou sobre o assunto, conforme se depreende da seguinte ementa:

EMENTA: Mandado de Segurança. Servidor Público. Processo Administrativo. Pena


disciplinar de demissão. Alegação de decisão contrária às provas dos autos e
conseqüente desvio de finalidade do procedimento. Pretensão de reexame do
conjunto fático-probatório coligido no processo disciplinar inconciliável com o rito
do writ. Recurso ordinário a que se nega provimento” (RMS 23988 / DF - DISTRITO
FEDERAL / Relator (a): Min. ELLEN GRACIE / Órgão Julgador: Primeira Turma).

Ainda assim, o desvio de finalidade pode se encontrar claro, não havendo qualquer
impedimento à decisão da questão em sede de Mandado de Segurança. Sobre este tema, faz-se
necessário acrescentar o seguinte acórdão do Superior Tribunal de Justiça:

EMENTA. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO


DISCIPLINAR. EXONERAÇÃO. DEMISSÃO. ATO INCOERENTE COM SEU
FUNDAMENTO. DESVIO DE FINALIDADE. NULIDADE. A fundamentação que
35

traz idéia incompatível com o ato promove sua nulidade. A exoneração de ofício é
nula se o ato reconhece a prescrição e a impossibilidade de demitir o servidor. A
exoneração não se confunde com penalidade, e o ato de exoneração que visa a
substituir pena de demissão sofre de desvio de finalidade. Segurança concedida
em parte” (MS 7706 / DF; MANDADO DE SEGURANÇA 2001/0074669-0 –
RELATOR: MINISTRO PAULO MEDINA - TERCEIRA SEÇÃO).

Como se pode notar nas decisões supracitadas, é de difícil identificação o desvio de


finalidade. Já no excesso de poder, a sua comprovação é mais simples, pois basta apenas a
verificação da existência ou não de competência do agente para o ato, dentro das normas.
Sendo assim, o abuso de autoridade, na Lei nº 4.898, de 9 de Dezembro de 1965, tem seus
traços marcantes, como:

Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado:


a) à liberdade de locomoção;
b) à inviolabilidade do domicílio;
c) ao sigilo da correspondência;
d) à liberdade de consciência e de crença;
e) ao livre exercício do culto religioso;
f) à liberdade de associação;
g) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto;
h) ao direito de reunião;
i) à incolumidade física do indivíduo;

Art. 4º Constitui também abuso de autoridade:


a) ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades
legais ou com abuso de poder;
b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não
autorizado em lei;
c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de
qualquer pessoa;
d) deixar o Juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja
comunicada;
e) levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida
em lei;
f) cobrar o carcereiro ou agente de autoridade policial carceragem, custas,
emolumentos ou qualquer outra despesa, desde que a cobrança não tenha apoio em
lei, quer quanto à espécie quer quanto ao seu valor;
g) recusar o carcereiro ou agente de autoridade policial recibo de importância
recebida a título de carceragem, custas, emolumentos ou de qualquer outra despesa;
h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando
praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal;
i) prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança,
deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de
liberdade. (Incluído pela Lei nº 7.960, de 21/12/89.)
CAPÍTULO 3 - O PODER DE POLÍCIA NO SISTEMA
ADMINISTRATIVO BRASILEIRO

No capítulo anterior, observou-se com minúcia o uso e abuso do poder de polícia em


nosso sistema administrativo brasileiro. Como visto, o abuso de poder é de difícil controle e
surge do vício relacionado com a vontade humana. O agente possui vontades ao exercer seu
poder de polícia e este, como qualquer outra atitude de um servidor público, estará passível de
erros.
É sabido que o poder de polícia é exercido pela Administração Pública sobre direitos,
bens e atividades que afetem ou possam vir a afetar a coletividade. Como podem afetar a
coletividade, na tentativa de conter tais desrespeitos aos direitos, bens ou atividades dos
mesmos, são previstos regulamentação, sanções e controle através Poder Público no sistema
administrativo brasileiro.
Neste capítulo, para tratar do poder de polícia no nosso ordenamento jurídico, é
necessário analisar a polícia administrativa e judiciária, as condições de validade dos atos do
poder de polícia executados por seus agentes, as sanções previstas para quem utiliza de
maneira incorreta tal poder, o controle administrativo do poder e o poder de polícia das forças
armadas.

3.1 POLÍCIA ADMINISTRATIVA

No primeiro capítulo pode ser observado que o poder de polícia administrativo se


orienta através do princípio da predominância do interesse público sobre o do particular, com
isso a Administração Pública fica em uma posição de superioridade sobre o particular tendo
em vista que a sua atuação visa o bem-estar da sociedade.
Diante dos ensinamentos de Gasparini (2003, p. 123) tem-se que:

[...] O exercício da policia administrativa está disseminado pelos órgãos e agentes da


Administração Pública. [...] o objeto da polícia administrativa é a propriedade e a
liberdade. [...], com efeito, a policia administrativa é essencialmente preventiva,
embora algumas vezes seus agentes ajam repressivamente, a exemplo da apreensão
de mercadoria imprópria ao consumo público ou da cessação de uma reunião de
pessoas tida por ilegal.
37

A polícia administrativa é considerada como sendo uma atividade repleta de ações


preventivas que tem o dever de evitar danos futuros que possam vir a ser causados por
indivíduos que insistem em agir de forma irregular aparentando perigo a boa ordem. Com
isso, o poder de polícia tem o objetivo de fazer com que o interesse particular não venha
atingir o interesse público, ou seja, sua finalidade última é impedir, de maneira preventiva,
infrações à lei que possa vir a ser perturbada pelo indivíduo mantendo-se, assim, a ordem
pública e a conseqüente satisfação da sociedade.
A atividade da polícia administrativa é meramente discricionária, nela se pode agir
com livre escolha no que diz respeito à oportunidade e à conveniência contanto que seus
agentes se contenham nos limites legais pré-estabelecidos para não ferirem os direitos dos
cidadãos, estes previstos no artigo 5º da Carta Magna3. Todavia, o poder de polícia pode vir a
atingir direitos, bens e atividades, difundidas pela administração de todos os Poderes e
entidades públicas do nosso país. A principal preocupação da polícia administrativa é com o
comportamento de alguns indivíduos que não condizem com o interesse público e tem o
intuito de zelar pela tranqüilidade do cidadão, pela proteção dos bens públicos e particulares
sem que com isso prejudique outros.
A polícia administrativa manifesta-se através de atos normativos concretos e
específicos e atua de maneira preventiva e repressiva. Nesse sentido, pode-se destacar que
agindo preventivamente, a polícia administrativa pode orientar comerciantes sobre o risco de
expor à venda produtos fora do prazo de validade ou impróprios para o consumo e até mesmo
produtos deteriorados; outro exemplo é o de proibir o porte de armas. De outra forma, agindo
repressivamente, a polícia administrativa pode apreender os produtos fora da validade
(mencionados acima) dos estabelecimentos comerciais, também apreender a arma usada por
quem não tem porte e por quem a usa indevidamente. Segundo Di Pietro (2004, p.128), pode-
se dizer que, nas duas hipóteses, ela está tentando impedir que o comportamento individual
cause prejuízos maiores à coletividade; nesse sentido, é certo dizer que a polícia administrativa
é preventiva.
Ensina Di Pietro (2004, p. 129), nesse norte, que:

A polícia administrativa se reparte entre diversos órgãos da Administração, incluindo,


além da própria polícia militar, os vários órgãos de fiscalização aos quais a lei atribua
esse mister, como os que atuam nas áreas da saúde, educação, trabalho, previdência e
assistência social.

3
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade.
38

Guimarães (2004, p.431) em seu dicionário técnico jurídico conceitua polícia


administrativa de forma nobre dizendo que:

É aquela que assegura o cumprimento dos atos da Administração Pública e a boa


execução das leis e regulamentos a que deve obedecer. É geral, quando cuida
genericamente da segurança, da salubridade e da moralidade públicas; e especial
(como um dos exemplos pode-se citar a polícia sanitária), quando cuida de setores
específicos da atividade humana que afetem bens de interesse coletivo, como
construção, indústria de alimentos, venda de remédios, uso de águas, exploração de
minas e florestas etc.

Enfim, entende-se que fica a cargo da polícia administrativa a manutenção da ordem,


vigilância, e proteção da sociedade, além de assegurar, a todos, os direitos individuais e
auxiliar a execução dos atos e decisões da justiça.

3.2 POLÍCIA JUDICIÁRIA

Sabe-se que o poder de polícia exercido pelo Estado pode atuar na área
administrativa ou judiciária. Alguns doutrinadores estabelecem diferenças entre tais polícias
afirmando que, enquanto a polícia administrativa tem caráter preventivo, pelo fato de ter por
objetivo atuar em setores específicos da atividade humana que afetem bens de interesse
coletivo, a polícia judiciária age de forma repressiva, investigando e punindo os autores de
infrações da norma. No entanto pode-se perceber no item anterior que tal diferença não é
única, pois a polícia administrativa pode agir das duas formas: preventivamente e também
repressivamente (GUIMARÃES, 2004).
Sendo assim, e a respeito desse assunto, Di Pietro (2004, p.129) contribui com seus
ensinamentos afirmando que:

[...] se pode dizer que a polícia judiciária, embora seja repressiva em relação ao
indivíduo infrator da lei penal, é também preventiva em relação ao interesse geral,
porque, punindo-o, tenta evitar que o indivíduo volte a incidir na mesma infração.

A polícia judiciária tem como finalidade auxiliar diretamente o Poder Judiciário na


aplicação da lei. Tal polícia tem a função de conter a atividade de infratores da lei penal,
investigando delitos ocorridos e capturando delinqüentes, atuando de maneira repressiva e
ostensiva, ou seja, atua na perseguição de marginais e efetuando prisões de pessoas que
praticam delitos penais.
39

No dicionário técnico jurídico de Guimarães (2004, p. 431) tem-se uma definição de


polícia judiciária, qual seja:
Aquela a qual incube a investigação e apuração de fraudes e infrações à norma
penal, prisão de seus autores, reunião de provas contra ele, em inquérito policial
regular, que é entregue à justiça como base do procedimento criminal. É auxiliar
direto da justiça.

Segundo Meirelles (2007, p. 115), na polícia judiciária tem-se a incidência sobre as


pessoas através de órgãos especializados, pois esta se concentra em determinados órgãos,
como por exemplo, na Secretaria Estadual de Segurança Pública, em cuja estrutura se insere,
de regra, a polícia civil e a polícia militar. Sabendo ainda que a função da polícia judiciária
não se resume somente ao caráter repressivo, ela atua também na esfera preventiva em relação
ao interesse geral, quando realiza rondas de policiamento nas favelas ou em regiões que
apresentem alto grau de risco prendendo tais infratores, pois punindo tais indivíduos
provavelmente estes não cometerão mais crimes, agindo, assim, de forma preventiva também.
É comum encontrarmos na doutrina um parâmetro de diferenciação entre a polícia
administrativa e a polícia judiciária no que tange a respeito de ações preventivas e repressivas.
O que efetivamente aparta a Polícia Administrativa da Polícia Judiciária é que a
primeira se predispõe unicamente a impedir, ou paralisar, atividades anti-sociais enquanto a
segunda se preordena à responsabilização dos violadores da ordem jurídica (MELLO, 2006, p.
361).
A polícia administrativa, ou o poder de polícia de que aqui se trata, restringe o
exercício de atividades lícitas reconhecido pelo ordenamento como direitos dos particulares,
isolados ou em grupo. (MEDAUAR, 2004, p. 392). É notável então que não se diferencia o
poder de polícia administrativa do poder de polícia judiciária, somente pelo caráter preventivo
de uma e pelo caráter repressivo da outra.
Com os ensinamentos de Lazzarini, (RJTJ-SP, v.98:20-25, apud DI PIETRO, 2004, p.
129) pode-se obter uma breve noção de como diferenciar tais polícias:

A melhor maneira de se diferenciar o poder de polícia administrativa do poder de


polícia judiciária seria analisar se houve o ilícito penal (a polícia responsável é a
judiciária), ou se a ação fere somente questões administrativas que buscam o bem
coletivo (a polícia responsável é a administrativa).

3.3 CONDIÇÕES DE VALIDADE

Nos atos da polícia administrativa têm-se as mesmas condições de validade que as de


qualquer outro ato administrativo. No ato administrativo comum deve-se observar as
40

seguintes condições: primeiramente, como todo ato administrativo comum, tem-se o sujeito,
competência, finalidade, forma, objeto, motivo estas previamente são condições para validade
do ato de polícia. Em seguida, pode-se observar a proporcionalidade entre a restrição que a
Administração impõe ao particular no exercício do poder de polícia e o beneficio social que se
almeja alcançar para tornar válido o ato de polícia. Nos atos praticados pela polícia
administrativa podem-se observar a lei sendo aplicada ao caso concreto como nas medidas
preventivas sendo elas: fiscalização, ordem, notificações, vistorias licenças e etc. Têm-se,
ainda, as medidas repressivas executadas pela policia administrativa, a saber: interdição de
atividades, dissolução de reuniões, apreensão de mercadorias que possam prejudicar o
cidadão, dentre tantas outras.
Meirelles (2007, p. 141) ensina que:

Sacrificar um direito ou uma liberdade do cidadão sem vantagem para a coletividade


invalida o fundamento social do ato de polícia, pela desproporcionalidade da
medida. Desproporcional é também o ato de polícia que aniquila a propriedade ou
atividade a pretexto de condicionar o uso do bem ou de regular a profissão. O poder
de polícia autoriza limitações, restrições, condicionamentos; nunca supressão total
do direito individual ou da propriedade particular, o que só poderá ser feito através
de desapropriação.

Como visto, essa desproporcionalidade do ato de polícia ou seu excesso é considerado,


tanto pela doutrina, como pela jurisprudência, ato caracterizado pelo abuso de poder.
Por fim, tem-se a legalidade dos meios que são empregados pela Administração,
devendo tais meios ser legítimos e usados com intuito de prevenir a infração da norma por
parte do particular, mesmo que pra isso seja preciso usar a força. Sendo assim, a sua
finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício,
condicionando-o ao bem-estar social e, só poderá reduzi-los, quando em conflito com
interesses maiores da coletividade e na medida estritamente necessária à consecução dos fins
estatais, ou seja, só serão usadas de tais medidas extremas caso o administrado venha a se
opor as atuações do poder de polícia.

3.2 SANÇÕES

Para os infratores da norma temos as sanções servindo de punição para os mesmos. O


poder de polícia é coercitivo sujeitando o agente público responsável, de qualquer dos poderes
políticos às sanções legais, de natureza administrativa, criminal e civil.
41

Intimidando e coagindo, as sanções podem ser pecuniárias, em forma de multas;


restritivas, fechando estabelecimentos e interditando atividades; destrutivas, como a
demolição de construções4; proibitivas, como a proibição de fabricação ou comércio de
determinados produtos ou a vedação de localização de indústrias ou de comércios em
determinados zonas do Estado; assim como podem também desencadear a inutilização de
gêneros alimentícios impróprios para consumo e tudo mais que houver de ser impedido em
defesa da moral, da saúde e da segurança pública, bem como da segurança nacional, desde
que esteja previsto em lei ou ate mesmo em regulamento (MEIRELLES, 2007, p. 140). Ainda
assim, outras sanções podem ser estabelecidas pela legislação de entidade política
competente, ou seja, pela União, Estado-Membro, Distrito Federal e Município, contudo, a
aplicação dessas sanções não pode ser de caráter perpétuo e tampouco podem ser colocadas
em nosso ordenamento jurídico através de decreto.
É de se mencionar que na esfera federal a prescrição é de cinco anos este prazo é
contado a partir da data que foi praticado o ato. No que tange ao fato constituir crime, tal
prescrição está prevista no artigo 1º e seus parágrafos da Lei 9.873/99. Ainda na Lei 9.873, de
23.11.99, o artigo 5º prevê que não será aplicada sanção às infrações de natureza funcional, ou
seja, as praticadas pelos servidores públicos.
Vale ressaltar que, se orientando pelos princípios do contraditório e ampla defesa,
previstos art. 52, LIV e LV da Constituição Federal, devem ser dados ao infrator no processo
o amplo direito de defesa e garantido o contraditório antes de se aplicar qualquer tipo de
sanção decorrente do poder de polícia.
No Tribunal de Justiça de São Paulo foi julgado que o mesmo fato pode gerar
pluralidade de ilícitos e de sanções administrativas5. Observando o princípio da
proporcionalidade na aplicação de sanções, pode-se afirmar que a Administração Pública deve
sempre se pautar por tal princípio, além de ser necessário observar, também, a razoabilidade
na aplicação de sanções, uma vez que a interferência do Poder Pública na esfera privada do
indivíduo deve primar, sempre, pelo menos sacrifício do cidadão.

3.5 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A Administração sempre deve agir de acordo com os princípios que estão expressos
no caput do artigo 37 da Constituição Federal, quais sejam: legalidade, impessoalidade,

4
O STJ julgou legal o exercício do poder de polícia para demolir construções irregulares decorrentes de invasão
de área non aedificandi (REsp nº 626.224-RS, rel. Min. Luiz Fux, DJU 14.4.2004).
5
TJSP, Ap.cível 125.348-1, j. 30.10.90
42

moralidade, publicidade e eficiência. Porém, ela mesma deve controlar seus próprios atos
como decorrência do poder de autotutela. Ainda assim, existe o controle também por parte
dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário sobre os atos administrativos praticados pelo
Poder Público.
Di Pietro (2004, p. 478) define a palavra controle como sendo:

O Poder de fiscalização e correção que os órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo


e Executivo exercem sobre Administração Pública, com o objetivo de garantir a
conformidade de sua atuação com os princípios que lhe são impostos pelo
ordenamento jurídico.

A Administração Pública deve fiscalizar o ato de polícia de modo a lhe garantir a sua
legalidade (do ato) e conveniência (da administração). Dentro do Poder Hierárquico, é dever
do superior funcional verificar preventivamente se ato de seu subordinado é legal. Caso haja
falha no controle interno dos atos administrativos porque o superior, por ação ou omissão,
autorizou seu subordinado a cometer abuso de poder, o administrado que se sinta prejudicado
poderá buscar a correção desse ato, ou até mesmo a sua nulidade, através a própria
administração ou mesmo do órgão judiciário competente.
Para Meirelles (2007, p. 662), “Nem mesmo os atos discricionários fogem do controle
judicial, porque, quanto à competência, constituem matéria de legalidade, tão sujeita ao
confronto da Justiça como qualquer outro elemento do ato vinculado.”
Os meios de controle administrativo e judiciário do ato de policia servem para impedir
o abuso de poder que possa vir a ser cometido pelo agente público quando da prática desse
ato. Vários critérios existem para classificar as modalidades de controle, sendo eles:
- controle quanto ao órgão executor que pode ser: administrativo, legislativo e judicial;
- controle quanto ao momento em que se efetua, que pode ser: prévio (visa impedir
que o ato ilegal seja praticado) , concomitante (acompanha a realização do ato), posterior ou
corretivo (serve para revisar os atos e se for preciso corrigir, desfazer ou apenas confirmar tais
atos);
- controle quanto à localização do órgão que os realiza que pode ser interno ou
externo; e, por fim,
- controle quanto ao aspecto controlado, a saber: de legalidade ou legitimidade e de
mérito (tem por objetivo verificar a discricionariedade do ato controlado).
43

O controle do ato administrativo é, de acordo com Meirelles (2007, p. 569):

Todo aquele que o Executivo e os órgãos de administração dos demais Poderes


exercem sobre suas próprias atividades, visando a mantê-las dentro da lei, segundo
as necessidades do serviço e as exigências técnicas e econômicas de sua realização,
pelo que é um controle de legalidade e de mérito.

A invalidação dos atos administrativos inconvenientes, inoportunos ou ilegítimos é de


extrema importância para a Administração Pública e para o Poder Judiciário, tendo em vista
que a cada um cabe, desfazer os atos que forem inadequados aos fins buscados pelo Poder
Público ou contrário às normas legais. Sendo assim, pode-se afirmar que a própria
Administração controla seus atos até mesmo porque possui mecanismos hábeis para isso,
como o exercício dos poderes de autotutela e hierárquico. O controle é exercido,
naturalmente, dos órgãos superiores sobre os inferiores, mas ainda existem outros meios de se
controlar o próprio ato administrativo, por exemplo, quando a Administração Pública é
provocada pelo particular.
Sobre controle do ato de poder de polícia, Cretella Junior (2002, p. 32), diz que:

Julgando embora casos concretos, o Poder Judiciário tem assinalado, de modo


genérico, os limites do poder de polícia, sob a forma de regra ou própria finalidade,
que é a promoção do bem público, pois, o poder de polícia entra no conceito da
defesa dos direitos e interesses sociais do Estado, cabendo aos tribunais dizer dos
limites em que aquele exercício deve conter-se.

3.6 O PODER DE POLÍCIA DAS FORÇAS ARMADAS

Com o intuito de demonstrar que o exercício do poder de polícia desenvolvido pelo


Exército vem sendo bastante cogitado na Câmara dos Deputados, será apresentada a nova
função atribuída às Forças Armadas definida pelo governo federal recentemente. O Projeto de
Lei Complementar (PLP) 543/09, do Executivo, atribui poder de polícia às Forças Armadas
nas áreas de fronteira. A matéria, aprovada por 328 votos a 5 e 3 abstenções, deve ser votada
ainda pelo Senado.(GLOBO, 2010).
A defesa da Pátria, a preservação das instituições, a proteção do cidadão e da
coletividade é direito do cidadão e dever do Estado. Nenhuma Nação pode sobreviver com
independência, se não lhe for reconhecida a prerrogativa de defender, com o poder e pela
força, se necessária, o seu território, o seu povo, o seu regime político e o seu sistema
constitucional, contra a violência das minorias inconformadas e o ataque das ideologias
contrárias à ordem jurídica vigente (MEIRELLES, 1972, p. 287-298).
44

A tarefa de garantir os poderes constitucionais é atividade de competência exclusiva


das Forças Armadas prevista na Constituição6 e traz à tona a expectativa de deixar a sociedade
tranqüila para ter o mínimo possível de segurança garantido.
Tem-se observado que a atividade de manter a ordem pública é das polícias (polícia
federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares
e corpos de bombeiros), as quais têm o objetivo de prevenir, coibir ou reprimir condutas que
possam ameaçar a ordem pública. Porém, raramente se usou as forças armadas nesta
atribuição ou em determinadas situações como eleições, ou seja, em missões como as da
polícia militar.
O poder de polícia a ser exercido pelas Forças Armadas deve ser realizado de acordo
com o poder de polícia exercido no Estado. No entanto, o poder de polícia das Forças
Armadas não pode deixar de obedecer às garantias individuais previstas na Constituição em
seu artigo 5º.7
O poder de polícia das forças armadas contém algumas peculiaridades como, por
exemplo, ter sido solicitado por um dos poderes da União, Executivo, Legislativo ou
Judiciário, com o intuito de atuar dentro das diretrizes presidenciais ou, ainda, caso esgotem
os meios policiais dos Estados, este atuará por tempo limitado e em local especificamente
previsto assumindo assim a competência da polícia militar estadual. Portanto, se observa
facilmente que no caso de combate às ações desenvolvidas por organizações criminosas,
principalmente nas grandes favelas do país, as Forças Armadas podem ser chamadas a intervir
na tentativa de se restaurar a paz, tranqüilidade e segurança daquele local.
Finalizando esse aspecto do poder de polícia, pode-se destacar as novas diretrizes das
Forças Armadas aprovadas pela Câmara dos Deputados. Foi proposta a unificação das
operações da Marinha, da Aeronáutica e do Exército concedendo-se poder de polícia às
Forças Armadas nas regiões de fronteira cujas atuações poderão ser desenvolvidas através de
patrulhamento, revista de pessoas, de veículos, de embarcações e de aeronaves, assim como
efetuar prisões em flagrante e combater os crimes ambientais e de tráfico de drogas nas
fronteiras terrestres e marítimas. Essa aprovação veio a somar com mais outra atribuição das
Forças Armadas: o poder-dever de cooperar com os órgãos federais no combate aos ilícitos de
6
Art. 144 da CF “A segurança pública é dever do Estado, sendo exercida para a preservação da ordem pública e
da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Sua competência originária pertence as polícias: polícia federal,
polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpos de bombeiros
militares.”
7
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à
propriedade, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei; III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
45

repercussão nacional e internacional com apoio logístico, de comunicações, de instrução e de


inteligência.

3.7 LIBERDADES FUNDAMENTAIS NO STF

É certo que em um país como o nosso, democrático, algum ato que possa vir a
restringir os direitos e liberdades individuais gerará uma enorme repercussão. Em exercício, é
de se mencionar que o poder de polícia é capaz de restringir as liberdades fundamentais do
particular.
Sobre o conceito de liberdade Guimarães (2004, p. 383) destaca ser a:

Faculdade natural que permite a pessoa fazer o que quer nos limites da lei, da moral e
dos bons costumes, respeitados os direitos de cada um. A Constituição Federal
garante que ninguém será privado de sua liberdade e de seus bens sem o competente
processo legal [...].

O cidadão poderá gozar de sua liberdade desde que se comporte de acordo com a lei,
com os bons costumes e não almeje coibir o direito do próximo, pois o exercício do poder de
polícia é amplo e abrange a proteção à moral e a boa ordem, a censura de espetáculos
públicos, a segurança das construções e dos transportes, a manutenção da ordem pública em
geral e ainda outros. Sendo assim, pode-se observar que a polícia sanitária, a polícia florestal,
a polícia das construções, as polícias previstas para manter a ordem publica previstas no artigo
144 da Constituição Federal e ainda assim, outras polícias atuando sobre as atividades do
particular. Sabe-se, que o poder de polícia atua sobre as atividades individuais dos particulares
que afetam, ou possam vir a afetar, os interesses da coletividade, a que incumbe ao Estado
velar e proteger. Enfim, em regra, onde existir interesse relevante para a sociedade deverá
haver, proporcionalmente, poder de policia para proteger o interesse público.
O direito individual é conceituado no Dicionário (MELO, 1978, p. 38):

Conjuntos de direitos essenciais da pessoa natural, assegurados pela Constituição do


país, sujeitos apenas, às limitações estabelecidas em lei com vistas ao resguardo dos
direitos de terceiros ou dos interesses prevalentes da sociedade.

Sob o conceito de Administração Pública (CRETELLA JÚNIOR, 1999, p. 22) tem-se


que:
A atividade que o Estado desenvolve mediante atos concretos e executórios para a
consecução direta, ininterrupta e imediata dos diferentes fins públicos, ou seja,
interesse público.
46

A finalidade de toda e qualquer Administração é o interesse público. Os direitos e


garantias fundamentais previstos na Constituição ao cidadão são essenciais e acabam quando
começa o direito de outra pessoa ou da sociedade de uma forma geral, entende-se que o
Estado proporciona proteção e segurança ao particular quando estes direitos são atingidos por
outrem. (CRETELLA JÚNIOR, 1999, p. 308)
A Administração resguarda o direito de liberdade, ao mesmo tempo em que a limita
por meio da ação de agentes ou de juízes que despacham mandado de prisão, estes servem de
“complementação” a Administração Pública por delegação dela recebida com o intuito de
manter os interesses coletivos e assegurar os interesses individuais feridos (CRETELLA
JÚNIOR, 1999, p. 399). Toda essa atuação serve para demonstrar e deixar claro a liberdade
do homem e as razões que fazem cessar tal liberdade.
No Supremo Tribunal Federal, pode-se destacar em um acórdão a forma na qual o
referido Tribunal trata as restrições a liberdades individuais (liberdades fundamentais previstas
no artigo 5º da CF8) através da discricionariedade do poder de polícia.
O acórdão abaixo transcrito trata de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade nº
1969-4/99, impetrada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), em face de Decreto nº 20.098/99,
expedido pelo Governador de Brasília, à época, Joaquim Domingos Roriz. Eis os termos do
referido Decreto

DECRETO nº 20.098, DE 15 DE MARÇO DE 1999.


Disciplina as manifestações públicas em locais que menciona. O Governador do
Distrito Federal, no uso de suas atribuições que lhe confere o art. 100, inciso VII, da
Lei Orgânica do Distrito Federal, e Considerando que o disposto no art. 5º, inciso
XVI, da Constituição Federal há que ser exercido em conjunto com a legislação
infraconstitucional; Considerando, também, que a questão da livre reunião merece um
disciplinamento, de molde a que esteja sempre presente o respeito mútuo, sem que
sejam agredidos postulados básicos da democracia; Considerando, finalmente, que a
utilização de carros, aparelhos e objetos sonoros nas manifestações tende a causar
incômodos à população em geral, em especial àqueles que se encontram exercendo
atividade laborial;
DECRETA:
Art. 1º - Fica vedada a realização de manifestações públicas, com a utilização de
carros, aparelhos e objetos sonoros na Praça dos Três Poderes, Esplanada dos
Ministérios e a Praça do Buriti e vias adjacentes.
Art 2º - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art 3º - Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 15 de Março de 1999.
111º da República e 39º de Brasília
Joaquim Domingos Roriz

8
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao
público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para
o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
47

Pode-se identificar facilmente no Decreto supracitado que existe uma autoridade


competente (Governador) com o intuito de restringir a liberdade fundamental das pessoas de
Brasília através da discricionariedade do poder de polícia. Porém, o STF se posicionou de
maneira ilustre ao entender que tinha procedência a argüição de inconstitucionalidade
impetrada e suspendeu a validade do decreto. Tal decisão foi embasada no art. 5º, inciso VI, da
Constituição Federal, pois a mesma não acata restrições impostas a seu texto pelo fato de ser
auto-aplicável. Portanto, o STF não admite restrição que não esteja contida nos limites da
Constituição.
“É desnecessária autorização, apenas limitando-se o direito quando já prevista para o
mesmo local, outra reunião. Sob o ângulo da atuação administrativa, considerado até
mesmo o poder de polícia, apenas previu-se a necessidade de comunicação do intuito
de realizar-se a reunião. A isto soma-se a premissa segundo a qual não cabe à
autoridade local regulamentar preceito da Carta da República, muito menos a ponto
de mitigá-lo, como ocorreu na espécie dos autos”.

Observa-se que a decisão se fundamentou no texto da Constituição deixando claro que


mencionado Decreto não tinha compatibilidade com a mesma, pelo fato de não estar previsto
na Carta tal restrição a reuniões.
O ilustre Vedel (apud, CRETELLA JÚNIOR, 1986, p.38) se refere à Administração e
o poder de polícia como sendo: “Se por um lado cabe a Administração o papel de
regulamentar as atividades dos particulares, sem sombra de dúvida tal regulamentação não
admite poder absoluto da Administração sobre os administrados”.
É de extrema importância que se reconheça os direitos previstos na Constituição, saber
que este não é absoluto (como no caso do direito a reunião), pois apenas a competência
discricionária da autoridade do Governador de Brasília não é o suficiente, uma vez que tal
autoridade deve se deter ao texto constitucional ao impor restrições.
Ao vislumbrar a decisão do STF, o conceito de poder de polícia tornou-se mais
contemporâneo, pois fica fácil observar que as decisões ligadas aos direitos fundamentais estão
cada vez mais voltadas para o princípio da proporcionalidade, não somente para aplicação da
norma baseado na discricionariedade do poder de polícia de um agente ou autoridade
competente.
Contudo, é importante para o Direito que a discricionariedade do poder de polícia seja
direcionada para o texto da Carta Magna antes de restringir algumas liberdades fundamentais
do cidadão.
O poder de polícia limita direitos como a propriedade e a liberdade em favor da
coletividade, porém não deve restringi-los de forma indevida. Uma vez que, existe limitação
48

ao direito propriamente dito, o poder de polícia deve se adequar aos contornos que as normas
lhe conferem.
O poder de polícia não é ilimitado, a limitação é previstos na lei. Tem como uma de
suas características a discricionariedade, no entanto não pode ser usado de forma arbitrária, ou
seja, de qualquer maneira.
Sobre limitação do poder de polícia pela Administração Pública afirma Mello (2006,
p.60): “Existe na área do poder de polícia, como em qualquer outro setor da Administração,
um limite conatural ao seu exercício; ou o atingimento da finalidade legal em decorrência da
qual foi instituída a medida de polícia”.
Contudo, tem-se uma limitação do poder de polícia bem como de qualquer ato
administrativo, feita pela Administração Pública, observando-se a forma, a finalidade e a
competência. No que tange a forma, esta deverá estar em conformidade com a lei, atingindo
assim a finalidade pública que é o bem comum da coletividade, mediante ato oriundo de
autoridade competente. Se o agente se desviar de qualquer um dos requisitos mencionados,
ficará caracterizado abuso de poder, assim a Administração poderá revogar o ato ou tal ato
será anulado pelo Poder Judiciário, este que analisa a forma do ato perante sua legalidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho mostrou-se, mediante pesquisa bibliográfica e virtual, uma breve


introdução do surgimento do poder de polícia, em seguida foram analisados, respeitosamente,
alguns conceitos sobre o mesmo, seus limites, sua atuação, sua finalidade, suas características
e, finalmente, a sua possibilidade de restringir direitos vinculados à liberdade e à propriedade
privada. Também foi feita uma abordagem a respeito do abuso de poder, seu conceito, suas
características, as formas e, ainda, o uso do principio da proporcionalidade direcionado ao
poder de polícia. Em ultima análise, observou-se as polícias administrativas e judiciárias, as
condições de validade para o ato do poder de polícia, assim como previsto para qualquer outro
ato administrativo, o controle feito pela Administração Pública em seus atos, bem como as
sanções aplicadas. Por fim, foi analisado o poder de polícia destinado às Forças Armadas e,
ainda, as limitações feitas pelo STF, através de jurisprudências, no poder de polícia.
Diante dos diversos tipos de dificuldades sociais que o cidadão enfrenta, procurou-se
identificar a intervenção soberana que o Estado exerce sobre a propriedade e nas atividades
socialmente desenvolvidas, baseada no interesse coletivo do bem comum. Sabendo que o
interesse individual não supera o coletivo, a intervenção do Estado, ao invés de ser um ato
considerado opressivo, se torna um instrumento de construção da sociedade, que diminui os
conflitos que existem entre o particular e a administração, ajudando assim na formação de
uma Administração mais eficaz.
Para alcançar o objetivo de manter a ordem e o bem estar social, foi dito que a
Administração Pública possui nos atos do poder de polícia, características que a auxiliam no
controle e manutenção da sociedade como um todo. Dentre as características viu-se a auto-
executoriedade, na qual a administração pública impõe sua vontade através de medidas ou
sanções necessárias para coibir a desordem na sociedade, tomando decisões que não precisam
da autorização do poder judiciário para ser realizada, como apreensões e interdições; na
discricionariedade (esta presente na maioria dos atos do poder de polícia) tem-se o poder-
dever de a Administração decidir qual o melhor meio, momento e sanção aplicável para a
ocasião ainda assim existem situações em que a lei determina que a Administração adote
soluções já pré-estabelecidas pelo legislador, ou seja, sem o atributo da discricionariedade,
onde encontramos o poder vinculado; na coercibilidade tem-se a atuação do poder de polícia
50

dotada de força coercitiva podendo ser classificada como atividade negativa (quando ocorre
perante o cidadão uma obrigação de não fazer) ou positiva (o particular obtém acréscimos).
Exercendo suas atividades, as polícias são autorizadas a empregar a força necessária
para a manutenção da ordem pública, limitando os direitos individuais que contrariem a
norma pertinente. Porém, nesse sentido, observou-se que o poder de polícia deve ser
vinculado às normas e ser direcionado ao interesse público, jamais beneficiando o próprio
agente, visando assim o bem-estar social, caso contrário será considerado abuso de poder.
Verificou-se ainda que a autoridade sofre limitações também quanto ao objeto, ou meio de
ação, ainda que a lei ofereça inúmeras alternativas.
Analisou-se a aplicação do princípio da proporcionalidade no poder de polícia e viu-se
que este não precisa ir além do necessário para obter a satisfação do interesse público que visa
proteger, ou seja, deve ser utilizado verificando os meios e os fins que pretendem atingir.
Ainda que os agentes pratiquem atos discricionários estes devem estar focados na legalidade.
Sendo assim, pode-se afirmar que a utilização do principio da proporcionalidade é limitador
do poder de polícia, pois promove atos simultâneos para o mesmo fim entre a atuação da
Administração na busca do interesse público e o respeito aos direitos dos particulares.
Enfim, os direitos do cidadão, as prerrogativas individuais e as liberdades públicas
previstas nos dispositivos constitucionais e nas leis são as limitações que o poder de polícia
sofre. Porém, o conceito de poder de polícia ficou mais limitado ainda ao ser observado que o
STF vem tomando decisões voltadas à necessidade de se observar o principio da
proporcionalidade e também os direitos fundamentais, deixando um pouco de lado a
discricionariedade exercida pela autoridade que não pode ser usada de forma arbitrária (fora ou
além da legalidade). Portanto, antes de se utilizar da discricionariedade faz-se necessário que a
autoridade competente observe o texto da Constituição Federal antes de restringir algumas
liberdades fundamentais do cidadão.
Contudo, tem-se uma limitação do poder de polícia na Administração, bem como de
qualquer ato administrativo, feita pela Administração Pública, observando-se a forma, objeto,
motivo, finalidade e a competência. Se o agente se desviar de qualquer um dos requisitos
mencionados, ficará caracterizado abuso de poder, assim a Administração revoga o ato ou
ainda tal ato será anulado pelo Poder Judiciário, este que analisa a forma do ato perante sua
legalidade.
Observou-se que a própria Administração controla os atos editados por ela mesma
como decorrência do exercício do poder de autotutela. Os meios de controle administrativo e
51

judiciário do ato de polícia servem para impedir o abuso de poder que possa vir a ser
cometido pelo agente público quando da prática desse ato.
Conclui-se então, que o poder de polícia não é ilimitado, é discricionário e ainda
vinculado. Os atos da Administração são controlados por ela mesmo assim como, o STF vem
atuando de maneira concisa no que diz respeito ao principio da proporcionalidade no poder de
polícia, por vezes, os atos devem ser praticados com proporcionalidade aos meios e fins para
que estão sendo destinados.
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